A Especialização como Negócio na Indústria Têxtil e

Transcrição

A Especialização como Negócio na Indústria Têxtil e
A Especialização como Negócio na Indústria Têxtil e Vestuário Global
João Paulo Teixeira Duarte, ORGANTEX
Fórum da Indústria Têxtil
Antes de mais agradeço o convite que me foi dirigido para participar neste Fórum. Foi com muita
honra que o aceitei e espero estar à altura das expectativas da assembleia aqui presente…
O tema que me foi proposto foi o da “especialização como negócio”.
De facto ao longo da história têxtil em Portugal (e na Europa) encontramos diversos e inúmeros casos
de sucesso (e insucesso) de “especialistas no sector”: especializaram-se em produzir camisas de boa
qualidade por exemplo, outros em fabricar tecidos técnicos inovadores, alguns especializaram-se em
gerir uma marca, desenvolvê-la e distribuí-la, outros ainda tornaram-se especialistas em… (por
exemplo) felpos para o têxtil-lar com excelente design, etc.
Hoje vou falar-vos de um caso diferente: o de empresas que se tornaram “especialistas… no cliente”.
Independentemente da sua posição na fileira têxtil, estas empresas colocam o cliente no centro de
gravidade da empresa condicionando a sua actividade, organização, estratégia, objectivos e…
concorrência!
Vamos por partes.
Antes de mais, qualquer projecto precisa de estar assente numa estratégia clara, desenhada a partir
de uma visão para o negócio!
A escolha desse caminho constrói-se a partir da análise objectiva do que se passa no meio que
envolve a empresa e o sector.
Atrás de uma boa estratégia, sempre achei que está… uma boa análise – não só do que se passa
dentro da nossa própria empresa como o que se passa “lá fora”. Analisar é comparar, verificar, validar,
entender o como, o porquê, o quando e o quanto para poder prevenir, preparar, antever, escolher…o
melhor caminho. Pergunto-me: quantas são as empresas que dedicam a fazê-lo de modo sistemático,
para melhor planearem o seu futuro?
Traçar e construir um caminho implica ter uma noção exacta onde este começa e onde acaba. É
fundamental ter objectivos claros, simples, mensuráveis, datáveis e exequíveis.
Há mais de 2000 anos, Séneca dizia: “Não há vento favorável para quem não sabe para onde vai!”
A tudo isto carece juntar um gosto pelo risco e uma enorme criatividade e imaginação na concepção
da ideia de negócio.
1
A Especialização como Negócio na Indústria Têxtil e Vestuário Global
João Paulo Teixeira Duarte, ORGANTEX
Ora, a análise das principais tendências verificadas nas últimas décadas na indústria e do têxtil e
vestuário na Europa mostra-nos (com muita aproximação) que aquilo que se passa hoje em Portugal –
pressão nos preços, concorrência de mão-de-obra mais competitiva, deslocalização massiva da
produção, etc, já passou há mais de 30 anos pela Escandinávia, há cerca de 20 pela França e Reino
Unido e chegou a Espanha há pouco mais de 10…
Por outro lado e em pormenor, a análise da concorrência (mais uma vez qualquer que seja o seu
posicionamento na fileira), que décadas antes de Portugal passou pelo mesmo, revelava que
reformularam a sua estratégia, refizeram o seu caminho, reequacionaram o seu modelo de negócio e
readaptaram os seus recursos e produtos, numa escuta permanente do que se passava à sua volta,
antecipando a tendência do mercado.
Esta é (foi) a grande vantagem de Portugal: poder antecipar o futuro com base no passado (mais ou
menos recente) das realidades dos nossos países vizinhos…permitindo assim num exercício refinado
de “benchmarking”, copiar as melhores práticas eleitas por cada um dos concorrentes directos por
nós eleitos.
Hoje, tal como na altura muitos dos mais atentos players do mercado o fizeram, percebemos com
clareza que as vantagens competitivas do Têxtil e Vestuário nacionais são:
• Em primeiro lugar, a invejável proximidade dos grandes mercados europeus permitindo
deste modo o acesso privilegiado às últimas tendências de moda e design. Torna-se assim mais fácil
conhecer o consumidor, os seus hábitos, entender a ciclicidade da procura. Por último o "tempo de
chegada ao mercado” é cada vez mais, um factor decisivo – e aí o tempo de transporte entre a fábrica
e o ponto de venda joga claramente a favor!
• Em segundo lugar, a indiscutível flexibilidade produtiva da maioria das nossas estruturas,
permitindo assim responder à renovação constante da oferta que o mercado exige, proporcionando
prazos de entrega muito curtos e séries de produção – quantidades por modelo – com mínimos
baixos, permitem deste modo aceder a produtos de nicho, a programas flash, que a concorrência
mais longínqua não consegue abordar!
• Em terceiro lugar não podemos deixar de salientar o elevado know-how técnico (o “saber
fazer”) que o ITV nacional possui! Deixemo-nos de pruridos – a nossa fileira está preparada
tecnicamente para produzir o mais difícil, o mais inovador e complexo produto do mercado ou a mais
refinada técnica produtiva!
Só uma nota – não falei na vantagem “qualidade”, porque essa já há muito que é transversal a todo o
mercado e é uma condição sine qua non para estar nele!
Qualidade no produto, mas também no serviço é já hoje uma realidade diária em todo o mundo.
2
A Especialização como Negócio na Indústria Têxtil e Vestuário Global
João Paulo Teixeira Duarte, ORGANTEX
Para a análise ser conclusiva e isenta para a construção e escolha de uma estratégia, deveremos
estendê-la também às desvantagens inerentes de estarmos situados neste “lado da barricada”:
•
O custo da mão-de-obra é claramente superior àquele que encontramos nos países têxteis
emergentes (nomeadamente os asiáticos), o que condiciona indiscutivelmente aquele que é
considerado por muitos o factor mais importante para o consumidor – o preço;
•
Por outro lado não é de desprezar que esses (imensos) mercados são também emergentes em
termos de procura – os mercados asiáticos estão a crescer a uma velocidade significativamente
superior ao mundo ocidental tornando-se assim terrenos muito apetecíveis – Só que…desta vez, a
vantagem da proximidade passa a ser inversa, pendendo assim para quem lá está instalado e aí
produz;
O excesso de capacidade produtiva mundial e a liberalização do comércio, criou um efeito negativo
nos preços de fabrico. Tal significou, nomeadamente para a ITV portuguesa, uma espiral negativa
para aqueles que insistiram no modelo de negócio convencional e no fabrico de artigos
indiferenciados perante rivais cada vez mais competitivos no preço.
Deste modo, foi necessário criar vantagens competitivas, não assentes no preço, mas num novo
modelo de negócio, com base no serviço ao cliente. Incluo aqui a ORGANTEX como exemplo disso –
um novo modelo de negócio que procura incessantemente actualizar-se na prossecução da excelência
no serviço ao cliente!
Foi neste contexto de concorrência crescente que nos últimos anos, muitas empresas em Portugal
desapareceram e… outras evoluíram e constituíram casos inequívocos de sucesso! É dessas que
interessa agora falar – das que estão a ter sucesso!
Será que existe um denominador comum entre elas? Uma ou várias características transversais à
maioria dos casos, que tenham contribuído inequivocamente para a sua perenidade, e em muitos
casos para o seu crescimento?
Há certamente algumas:
1. Em primeiro lugar, parece ser fundamental ter uma Visão para o negócio – aquele sonho que
guia o empresário, que o norteia quando cria a empresa. Foi muitas vezes este, o elemento
diferenciador que viu nascer aquelas que são ainda hoje as grandes empresas vencedoras do ITV
nacional…
Como exemplo, deixem-me partilhar convosco a nossa visão – a da ORGANTEX: “Ser um
reconhecido como um parceiro de referência no sourcing global de vestuário”
3
A Especialização como Negócio na Indústria Têxtil e Vestuário Global
João Paulo Teixeira Duarte, ORGANTEX
2. Parece ser também muito importante ter clara a Missão da empresa, vivê-la todos os dias.
Dirão alguns: parece fácil; dirão outros: parece até que tudo não passa de teoria…mas não é!
Os activos mais valiosos das organizações são as pessoas. Mas são sem dúvida os recursos mais
difíceis de gerir. È necessário estimulá-las, esclarecê-las e congregá-las constantemente à volta do
mesmo fim. O conjunto dos nossos colaboradores é maior que a mera soma das partes – mas isto só
funciona quando todos sentirem e interpretarem da mesma forma a razão de ser da empresa e
trabalharem diariamente em equipa.
Nada como uma simples frase, um texto objectivo e conciso que reúna o consenso à volta do papel da
empresa, claro para todos os interlocutores que com ela interagem – desde os fornecedores, aos
colaboradores, dos concorrentes mais próximos àquele que é o nosso principal alvo – o cliente! Este
também deve estar completamente esclarecido…
Permitam-me que partilhe convosco a nossa missão: “Proporcionar aos nossos clientes as melhores
soluções de sourcing de vestuário através de serviços inovadores (inovação de materiais e
processos, excelência de desenvolvimento e incorporação de design), através de Valor competitivo
(best in class Leadtimes, conceito “one-stop-shop” e custo total de aquisição competitivo), através de
Capacidade Global (pela gestão de uma rede global dos melhores parceiros industriais e pela gestão
dedicada cobrindo todo o processo de A a Z), e sobretudo através do Foco no cliente pela opção por
serviços diferenciados por cliente;
3. Antes de empreender um novo ciclo, todas as organizações definem os seus Objectivos.
Normalmente têm como seu primeiro objectivo um número, que expressa em volume, valor ou
percentagem das vendas ou de rentabilidade, aquilo que querem atingir num determinado período de
tempo.
Sabemos que é importante que sejam objectivos ambiciosos e necessariamente realistas.
Normalmente ficamos por aí, mas não chega! Devem ser sobretudo compreensíveis para toda a
empresa, porque devem comprometê-la como um todo e nas suas partes.
Concorrem para o primeiro, uma série de objectivos intermédios que por sua vez se desdobram em
cascata até aos objectivos de cada departamento e cada indivíduo da empresa. A negociação dessa
responsabilização é hoje considerada fundamental para qualquer organização (a tal ponto que não
raras as vezes, envolvem o próprio cliente…)
4. Escolher um caminho – desenhar a Estratégia
a. Crescimento do negócio, desenvolvendo novas oportunidades no mercado actual
mas também em novos mercados. Optar por não se acomodar à situação actual – o mercado muda e
rapidamente se perde quota!
4
A Especialização como Negócio na Indústria Têxtil e Vestuário Global
João Paulo Teixeira Duarte, ORGANTEX
As oportunidades detectam-se mas carecem de ser desenvolvidas para poderem ser aproveitadas – é
necessário uma incessante proactividade (busca) para chegar lá primeiro que a concorrência…
b. Pôr o cliente no centro da empresa. O foco no cliente (ou mercado) permite ter
sempre presente o principal parceiro no negócio – o cliente! Muitas das empresas vencedoras, estão
construídas em torno de cada um dos seus clientes, dedicando-lhes em exclusivo equipas, adaptando
a sua organização à estrutura do cliente, apresentando-se quase como que uma extensão deste, um
prolongamento…
c. Apostar em ser diferente – “é mais fácil dizer que parecer” – já diz o ditado.
Geralmente entendemos a diferenciação pela inovação ao nível do produto. Mas não só! O elemento
diferenciador pode e deve também surgir pela inovação dos processos e dos serviços.
Para o cliente não interessa só o produto que recebe – interessa-lhe também como o recebe, em
quanto tempo o recebe, que garantias de qualidade lhe estão associadas, quanto lhe custa, que
recursos e custo operacional teve (ou poupou) para o desenvolver, etc – é o produto intangível mais
do que o tangível que deve ser objecto da nossa “criatividade empresarial”!
d. Internacionalização do negócio – assente na globalização das suas actividades. Hoje
em dia o cliente necessita de diferentes soluções para diferentes necessidades.
Para fidelizar o cliente é necessário ter uma carteira de soluções complementares. As fontes
alternativas de fornecimento colocam-nos permanentemente em concurso nos vários mercados
qualquer que seja o posicionamento ou o nível de preço que o cliente procura.
Num mundo cada vez mais global (passo o pleonasmo) é errado limitar o nosso raio de acção ao
mercado interno excluindo outros horizontes porventura complementares, suplementares ou
multiplicadores das nossas competências – e isto é válido mais uma vez para qualquer player,
independentemente do seu lugar na fileira – seja distribuidor, fornecedor / produtor, trading, detentor
duma marca, etc.
O sector nacional (e não só – muitos na Europa…aqui ao lado) está recheado de casos que viram
despoletar verdadeiramente o seu sucesso quando começaram a pensar à escala global! A maior
parte detectou oportunidades onde outros viram ameaças…
e.
Construção de parcerias – não estamos sozinhos no sector!
Todos sabemos quanto a fileira têxtil é extensa e complexa. A montante e a jusante há certamente
uma série de competências que não dominamos mas que são do domínio de diversos especialistas.
Precisamos uns dos outros – nada de mais errado que pensar “que deve ser cada um por si”, que
somos capazes de “ser especialistas em tudo”. Hoje em dia, precisamos cada vez mais, de nos
focalizar naquilo que de facto sabemos fazer – pelo qual somos reconhecidos, “contratando” aquilo
que sai da nossa esfera de competência directa.
5
A Especialização como Negócio na Indústria Têxtil e Vestuário Global
João Paulo Teixeira Duarte, ORGANTEX
Por outro lado, muitas das nossas competências podem ser potenciadas e multiplicadas por uma
simples aliança com o parceiro certo. Como eu costumo dizer: “se ambos tiverem a mesma
estrelinha” – servir o cliente o melhor possível – a sua fidelização, o negócio que lhe está associado, a
sua rentabilidade está garantida…
c. O gosto pelo risco! Nunca falámos nisto e raramente o admitimos, mas esta é de facto
uma qualidade única característica de alguns eleitos, que só poucos – os verdadeiros empreendedores
– a possuem!
A crescente pressão concorrencial nas áreas de negócios onde actuamos, obrigam-nos a rever
constantemente os nossos processos e métodos de trabalho, identificando oportunidades de
melhoria contínua e, com isso garantindo a nossa capacidade competitiva. No percurso empresarial
de cada um, certamente encontrámos significativos sucessos em várias áreas. Outras houve no
entanto, em que apresentam claras debilidades, que nos obrigam a tomar acções de correcção e
reposicionamento. Mas a maior lição e que apenas confirma o que sempre soubemos, é que a
qualidade do serviço ao cliente e o rigor da nossa gestão são condições essenciais do sucesso.
A busca da excelência não é algo que tenha fim mas, antes uma longa caminhada em que só triunfam
aqueles que nela persistem, permanentemente focados nos objectivos e na visão da empresa que
queremos ser…
…com a nossa cabeça, com as nossas mãos e com o nosso coração… os 3H’s anglo-saxónicos (Head,
Hands and heart)
Muito obrigado pela vossa atenção.
IX Fórum da Indústria Têxtil
Vila Nova de Famalicão, 23 de Outubro de 2007
a) João Paulo Teixeira Duarte
6