SALMOS: CÂNTICOS, ORAÇÃO E DEVOÇÃO A DEUS. Celebrando

Transcrição

SALMOS: CÂNTICOS, ORAÇÃO E DEVOÇÃO A DEUS. Celebrando
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SALMOS: CÂNTICOS, ORAÇÃO E DEVOÇÃO A DEUS.
Celebrando os louvores do Senhor!
Lição 13
Tema: As bênçãos de Deus na vida do crente.
Texto: Salmo 127
Introdução.
Nestes dias de Teologia da Prosperidade podemos, equivocadamente, ir para
o outro extremo de seus ensinos. Alguns cristãos mais ciosos da sã doutrina podem
“se esquecer” que Deus abençoa o seu povo com toda sorte de bênçãos, inclusive
com bênçãos materiais.
Por isso, tão errado quanto superenfatizar as bênçãos materiais é
menosprezá-las ou acreditar que Deus não abençoa seu povo com dádivas terrenas.
Ambos os extremos não procedem do Eterno e nem tampouco transmitem a
verdade das Escrituras.
A virtude, diziam os antigos, está no meio. Se por um lado não podemos
pensar que ser abençoado por Deus significa tão somente possuir bens deste
mundo, por outro, não podemos ignorar o fato que, desde o Antigo Testamento,
Deus tem abençoado seu povo com graças materiais.
John Stott tem razão ao afirmar que no Antigo Testamento “as bênçãos
prometidas pelo Senhor eram, em grande medida, materiais. Talvez o exemplo mais
marcante se ache em Dt 28.1-14 onde as bênçãos prometidas a um Israel obediente
eram muitos filhos, uma boa colheita, uma abundância de gados e de ovelhas e a
liderança entre as nações.”1
O ideal, portanto, não é ignorar as bênçãos materiais ou pensar que nós a
adquirimos por nós mesmos, nossos esforços e trabalho. Pelo contrário, devemos
reconhecer que “toda boa dádiva e todo dom perfeito são lá do alto...” (Tg 1.17).
Todas as bênçãos são fruto da doação, direta ou indireta, de Deus (1 Co 4.7)
Devemos nos lembrar que é Deus quem concede forças, vida, saúde e tudo o mais
para que possamos prosperar (Dt 8.11ss). E uma vez que prosperamos, nossa
gratidão e reconhecimento devem ser explicitados ao Senhor.
Concomitantemente ao reconhecimento das graças “ordinárias”, o cristão
deve valorizar ainda mais as bênçãos espirituais porque elas são maiores e
impossíveis de serem conquistadas pelo homem. O perdão dos pecados, a
redenção, o selo do Espírito Santo, entre outras graças, não podem ser tomados à
força pelo mortal. Eles são fruto da graça de Deus. O Eterno os concede
gratuitamente por meio de Cristo a quem ele quer (como Paulo falaria de modo
redundante – Rm 3.24), por meio do arrependimento e da fé.
Resumindo, o cristão não deve menosprezar as bênçãos materiais que
procedem das mãos dadivosas do Senhor. Deus as concede por graça, para alegria
de nossa alma e para o bem de quantos nos cercam. Mas não deve, também,
ignorar que as maiores graças são espirituais e eternas.
1
John Stott. A Mensagem de Efésios: A Nova Sociedade de Deus, p. 15.
2
Desenvolvimento
O Salmo 127 é um dos 15 salmos que são chamados pelos estudiosos e
teólogos de “Cânticos de Romagem”, ou “Cânticos dos Degraus”, ou ainda “Cânticos
de peregrinação”.
Esses Salmos eram entoados enquanto o povo de Deus se dirigia a
Jerusalém a fim de celebrar o nome do Senhor nas principais festas do judaísmo:
Páscoa, Pentecostes e Tabernáculo.
Este poema fala das bênçãos materiais que Deus outorga aos seus. Seguindo
a compreensão de John Stott, aqui, mais uma vez, são as bênçãos materiais que
estão sendo apontadas. O salmo fala sobre as bênçãos do Altíssimo na vida dos
seus filhos.
O salmo se divide em duas partes: 1) Os vv. 1-2 e; 2) Os vv. 3-5.2 Alguns
pensaram, equivocadamente, que este salmo seria, na verdade, a junção de dois
pequenos salmos. Mas esta não é uma percepção correta. O correto é enxergá-lo
como uma unidade que elenca as bênçãos do Senhor sobre o seu povo.
No salmo 127 “três das nossas preocupações mais universais – a construção,
a segurança e a criação de um lar”3 – são enfatizadas. A intenção é dizer que Deus
as concede dadivosamente aos seus. O Senhor deseja abençoar seu povo com
casa, proteção e família.
Um homem sem Deus pode ter casa, proteção e família? Sim, é claro que
pode. Então, qual é a vantagem? A vantagem e grande diferença é que, conforme
nos ensina Pv 10. 22: “A bênção do SENHOR enriquece, e, com ela, ele não traz
desgosto”. Somente com o Senhor se aproveita as dádivas e as bênçãos
corretamente. Somente com Deus pode-se usufruir verdadeiramente todo o bem
recebido. Sem Deus mesmo o mais maravilhoso bem não será adequadamente
aproveitado.
Além disso, não há dúvidas de que o salmista entende que sem Deus tudo é
vão. “A ideia de que o homem pode fazer tudo sozinho nasce da desconfiança em
Deus e da falsa confiança em si mesmo.”4 Sem Deus a vida é vazia, vã e sem
propósito.
A Bíblia é muito clara ao afirmar que, direta ou indiretamente, tudo procede do
Senhor. Ainda que o ser humano ignore ou desacredite, há sempre a mã o e a
bênção de Deus, em alguma medida, em todos os negócios do homem.
Corretamente Calvino acreditava que este salmo mostra que “a ordem da sociedade,
política ou familiar, é mantida tão-somente pela bênção de Deus, e não pela
habilidade, diligência ou sabedoria dos homens”.5
Na verdade, entendendo o autor deste Salmo como Salomão e entendendo
também que o livro de Eclesiastes é de sua lavra, os dois primeiros versos tornamse mais claros. Em Eclesiastes (assim como neste salmo) Salomão entendeu que
tudo que se faça, conquiste e construa sem Deus é vão. Sem o Senhor qualquer
alegria e prazer serão transformados em tristeza e tormento. Em suma: somente o
“agir de Deus tem importância decisiva para a vida prática do homem.”6
2
Arthur Weiser. Os Salmos, p. 596.
Derek Kidner. Salmos 73 a 150: Introdução e Comentário, p. 451.
4
Arthur Weiser. Os Salmos, p. 597.
5
João Calvino, Salmos Vol. IV, p. 373.
6
Arthur Weiser. Os Salmos, p. 596.
3
3
Uma nota triste deste Salmo é que Salomão errou justamente por não colocar
Deus à frente de tudo7. Quanto às suas construções, tantas delas não tinham o
Senhor como centro e objeto do louvor. Ele construiu vários templos para suas
esposas pagãs (1 Rs 11.1-8). Seu reino acabou sendo dividido por causa dos seus
muitos pecados (1 Rs 11.11ss). Sem dúvida, Roboão, seu filho, teve suas culpas e
responsabilidades. Mas o texto bíblico acentua os pecados de Salomão. Seus
múltiplos casamentos eram uma negação do pacto e das responsabilidades que
deveria ter diante de Deus e dos homens ( Dt 17.14-17).
Apesar destas falhas, provavelmente Salomão conseguiu ver a tempo que
somente o Senhor pode conceder as graças e as bênçãos que o ser humano
necessita. Ele, mercê da graça divina, voltou-se ao Senhor em arrependimento de
alma. Além disso, ainda que não seja Salomão o autor deste Salmo, cremos na
inspiração deste documento cujo autor maior é o Espírito Santo do Senhor.
Vejamos quais são as bênçãos do Senhor sobre seu povo e quais lições
podemos apreender com este texto sagrado.
1) Todas as bênçãos e graças não excluem a participação humana (vv. 1-5)
Enganam-se aqueles que acreditam numa atuação mágica de Deus. Sua
atuação é, tantas vezes, sobrenatural e extraordinária, mas não é mágica. Explico.
Deus não opera num vácuo (embora ele tenha poder para fazer o que quiser). Ele
atua, via de regra, tendo o ser humano como seu aliado e cooperador. Ele age por
meio da ação humana. Ele age no tempo e no espaço usando homens, fatos e
circunstâncias.
Desta forma, cremos que Deus cura por meio de médicos e medicamentos
(embora também cure sem eles!). Cremos que Deus nos sustenta através do “suor”
do nosso trabalho. Acreditamos que Deus nos faz prosperar através dos dons
naturais que ele mesmo outorga aos seus.
Com essa concepção da ação e manifestação da bênção de Deus não se
está negando que o Senhor pode prescindir, se assim quiser, de meios ordinários e
naturais. Ele é Deus. Ele age como quiser. Ele pode fazer absolutamente tudo.
Afinal, ele trouxe a existência as coisas que não existiam, não usando nenhuma
matéria pré-existente. (Hb 11.3). Mas, como regra geral, não é assim que o Eterno
tem agido.
Muito do que se tem visto nas comunidades evangélicas do Brasil é a
manifestação de bênçãos e graças “mágicas”. Outro dia uma Igreja neopentecostal
anunciou que um lenço que ela vendia tinha o poder de “limpar” as dívidas, ou seja,
eliminá-las. Como prova, um homem que devia alguns milhares de reais a um banco
deu seu testemunho e, segundo ele, após passar o pano da porta do banco, sua
dívida sumiu, sua conta foi limpa.
Ora, não estou duvidando que Deus tenha o poder de fazer isso e muito mais.
No entanto, não é assim que vemos Deus agir. Isso está mais para uma ação
mágica do que para um milagre. Como regra, vemos Deus abençoar as pessoas por
intermédio do trabalho. A pessoa trabalha duro, poupa e, então, consegue sanar
suas dívidas.
7
Allan Harman, Salmos, p. 434.
4
O salmo é sinergista. Ele não descarta a ação humana. Salomão sabia que
sem o trabalho das mãos humanas nada se edifica. Sabia também que os guardas
da noite não poderiam se descuidar do seu serviço sem eventuais prejuízos. 8
Entretanto, o salmo coloca, acertadamente, o Senhor como o centro de tudo.
O homem pode construir, guardar e prover sozinho (ainda que Deus dê, em última
instância, as condições para essas realizações). No entanto, sem o Senhor, tudo é
vão, sem sentido e, no final, inútil.
Deus não excluí o homem de suas responsabilidades. Calvino observa que
Salomão “não rejeita nem o labor, nem os empreendimentos, nem os conselhos dos
homens, pois é uma virtude louvável cumprir diligentemente os deveres de nosso
ofício”.9
O Senhor escolheu e determinou usar os seres humanos. Em o Novo
Testamento o apóstolo Paulo afirma que “de Deus somos cooperadores” (1 Co 3.9).
Somos ajudantes de Deus nos trabalhos que ele tem realizado. O Eterno é o grande
mestre de obras e nós, suas ferramentas.
O grande desafio que se apresenta aos homens é reconhecer que Deus é
soberano e deve receber toda honra e glória pelos bens da vida. Infelizmente, a
vaidade, a soberba e a altivez humana, principalmente daqueles que não tem o
temor do Senhor, fazem-lhes acreditar, enganosamente, que eles são a medida de
suas bênçãos, graças e realizações.
Calvino observou que “não importa o tipo de prosperidade que advenha aos
homens, sua ingratidão se manifesta imediatamente, ao atribuírem tudo a si
mesmos; assim, Deus é defraudado da honra que Lhe é devida”10
2) Deus edifica a vida e a família dos crentes (v. 1a).
Salomão usa algumas figuras neste salmo. A primeira que ele emprega é a do
construtor. “Se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam” é
a primeira delas.
O que é uma casa? Seria simplesmente uma construção de alvenaria? No
Antigo Testamento a palavra “casa” pode significar tanto moradia quanto família. 11
Por se tratar de uma metáfora, é mais correto interpretar casa aqui como família.
Calvino concordava com esta interpretação aqui neste Salmo. Para ele,
“casa” não é somente um edifício de madeira ou pedra, mas a ordem e governo de
uma família.12 Portanto, Deus é o construtor das vidas e das famílias.
Nosso Deus é aquele que edifica nossas famílias. Ele está construindo uma
maravilhosa mansão em nossas vidas.E ele age em seu favor por meio de Sua
Palavra e Seu Espírito.
A Palavra de Deus é o grande instrumento usado pelo Santo Espírito do
Senhor para formar Cristo na vida dos fiéis. É pela Palavra que o Espírito
transforma, edifica, exorta, corrige e instrui os seus filhos e filhas (2 Tm 3.16-17).
No entanto, ele não age sem seus servos (como foi observado no primeiro
argumento deste estudo). Por isso, em Provérbios se diz que “A mulher sábia edifica
8
Arthur Weiser. Os Salmos, p. 597.
João Calvino, Salmos Vol. IV, p. 374.
10
João Calvino, Salmos Vol. IV, p. 374.
11
Derek Kidner. Salmos 73 a 150: Introdução e Comentário, p. 451.
12
João Calvino, Salmos Vol. IV, p. 374.
9
5
a sua casa, mas a insensata, com as próprias mãos, a derriba” (14.1). O Senhor
constrói e edifica pelas mãos de seus servos quando eles ouvem e praticam os
preceitos do Altíssimo.
O Senhor constrói e edifica os cristãos quando eles se submetem ao Senhorio
do Todo Poderoso. Os crentes são moldados pelo Eterno quando reservam e
investem tempo para orar, ler as Escrituras e meditar nelas. Deus santifica os seus
servos quando eles fogem do mal, não dão lugar a carne; quando se distanciam da
roda dos escarnecedores e quando abominam tudo quanto é contrário ao querer de
Deus.
E quando há quedas, perdas e demolições na vida do indivíduo e das
famílias? Deus é poderoso para fazer todas essas coisas (Jr 1.10). Mas ele não
derriba nem destrói a vida dos seus. Deus não leva seus filhos a negarem suas
famílias e a percorrerem as sendas da perversidade.
Na maioria absoluta dos casos é o próprio individuo quem destrói sua vida e
família. O profeta Oseias, inspirado pelo Santo Espírito, registrou essas palavras: “a
tua ruína, ó Israel, vem de ti, e só de mim, o teu socorro” (Os 13.9). Só edificamos
por causa da graça e da ação de Deus em nossa vida. Mas, sozinhos somos
extremamente nocivos. Nossa inclinação é para o mal. Por isso, precisamos orar e
vigiar para que a edificação e construção do Senhor em nós ocorra.
Mais uma vez é preciso enfatizar que, apesar de Deus em sua bondade e
soberania usar os homens e exigir deles que cumpram suas responsabilidades, toda
honra, glória e louvor pertencem ao Senhor. Atribuir metade da honra ao homem e a
outra metade a Deus é totalmente reprovável.13 Por quê? Simples. A própria ação
humana só pode ser realizada pela provisão dadivosa do Senhor (1 Co 4.7). Além
disso, Deus não divide sua glória com ninguém. Sozinho o homem não constrói
nada que perdura para a eternidade.
3) Deus guarda a vida e a família dos crentes (v. 1b).
A segunda metáfora diz respeito ao guarda. Na antiguidade as cidades eram
protegidas por suas muralhas. Elas eram grandes e espessos muros que serviam de
proteção para os habitantes das cidades.
Além deste muro, havia os guardas. O muro era fundamental para a proteção
dos que viviam dentro dos seus limites. No entanto, ele, por si mesmo, não garantia
a inviolabilidade da cidade nem tampouco a segurança dos seus cidadãos. Era
preciso que soldados, bem armados, colocassem-se como sentinelas contra os
inimigos ou invasores. Era necessário que eles vigiassem a cidade a partir de seus
muros.
Calvino tem uma leitura interessante acerca da cidade. Para ele, o termo
“cidade” denota não somente “os edifícios ou o ambiente dentro dos muros, mas
também o estado geral dentro de toda comunidade.”14
Quais são os pontos que precisam ser guardados? Quais são as áreas que
precisam ser protegidas? Quais são os perigos mais recorrentes?
A Academia Americana de Advogados Matrimoniais alistou cinco grandes
causas de separação entre casais norte-americanos. É claro que essa pesquisa
13
14
João Calvino, Salmos Vol. IV, p. 375.
João Calvino, Salmos Vol. IV, p. 375
6
cobre a população Norte Americana e não a Brasileira. Mas vale a pena observar
estes dados.
Para os americanos, os maiores perigos do casamento são:
1)
2)
3)
4)
5)
Incapacidade de comunicação.
Falta de emprenho em lutar para que o casamento dê certo.
Problemas financeiros.
Mudanças nas prioridades da vida
Infidelidade.
No Brasil, pesquisas apontam os seguintes problemas como causa de
separação:
1) Infidelidade conjugal.
2) Insatisfação com a vida sexual.
3) Perda do amor
4) Falta de diálogo
5) Intromissão dos pais de um ou de ambos no relacionamento do casal,
6) Egoísmo,
7) Amadurecimento desigual,
8) Ciúmes (inclusive dos filhos),
9) Brigas constantes
10) Falta de dedicação.
Como o Senhor guarda o nosso casamento e a nossa vida? Pela sua Palavra
e pelo Seu Espírito. Mas, obviamente, é necessário se submeter tanto à Palavra
quanto ao Espírito. É necessário ter ouvidos para ouvir o que Deus tem dito e quer
que façamos. É necessário ter pés obedientes para percorrer as veredas que ele
mesmo determinou que andássemos.
Além disso, conselhos simples e práticos devem ser observados. Por
exemplo, deve-se fugir de qualquer imagem, ocasião ou circunstância que possa
levar ao pecado (1 Co 6.18). Não se pode confiar em si mesmo. Não se deve
acreditar que se possa domesticar o pecado ou que é possível brincar com ele sem
danos ou prejuízos.
Deus guarda, mas devemos nos guardar também.
4) Deus sustenta a vida e a família dos crentes (v. 2)
A terceira metáfora é a do trabalhador. Salomão diz que inútil será dormir
tarde e acordar cedo se o Senhor não estiver presente, abençoando o labor e os
esforços dos seus.
Sustento é o grande anelo e necessidade das pessoas. Elas precisam de pão,
de vestes, de moradia e de trabalho. Necessitam dessas coisas para existir com
dignidade.
Jesus disse que o Pai Celeste sabe que necessitamos de pão, vestes e
moradia (Mt 6.32). disse também que o Senhor está disposto a suprir as
necessidades daqueles que Lhe pedem (Mt 7.11). Na verdade, por causa da imensa
bondade e misericórdia do Senhor, até mesmo os mais ímpios são agraciados com
7
bênçãos ordinárias (Mt 5.45). No entanto, o Eterno trata com deferência e imenso
amor aos seus, concedendo maiores e melhores graças aos seus.
A expressão “pão que penosamente granjeastes” pode ser entendida como
pão de dores. Ela “pode ser explicada de duas maneiras: ou denotando o que se
adquire mediante trabalho duro e exaustivo; ou o que é comido com inquietude de
coração, tal como o vemos em pessoas parcimoniosas e mesquinhas, que, ao
provarem um bocado de pão, logo afastam a mão da boca”.15
Pelo contexto, a expressão é mais bem compreendida na primeira definição,
ou seja, o pão que se adquire mediante trabalho duro e exaustivo. A ideia aqui não é
que Deus menospreze o labor sério e engajado dos homens, mas que, sem Deus o
trabalho é vão. Sem o Senhor, o homem amealha para dores, angústias e
sofrimentos, posto que a benção do Senhor não está sobre ele. “Pão de dores”
significa trabalhar sem usufruir, verdadeiramente, o fruto do labor. Por isso ele é vão.
Como foi visto acima, mesmo o mais intenso trabalho (que via de regra é visto
com bons olhos pela nossa sociedade e não é desprezado pelo Senhor) não é um
bem se Deus estiver ausente. Com a presença de Deus o fruto do labor é
adequadamente valorizado e usufruído.
A expressão “enquanto dorme” pode ser mais bem compreendida como Deus
dando aos seus servos “aquelas coisas que os incrédulos labutam em adquirir por
meio de seu próprio esforço.”
Tantas vezes Deus concede favores extras, bênçãos adicionais aos seus. Ele
as concede por graça e amor. Ele as concede porque como Pai Celeste sempre faz
o melhor aos seus filhos e filhas.
Faz parte da natureza do Senhor dar sem medida restrita, sem mesquinharia.
Suas bênçãos e seu Espírito são dados abundantemente (Ml 3.10; Jo 3.35). Ele dá
infinitamente mais do que pedimos ou pensamos (Ef 3.20).
Os incrédulos, em sua arrogância e autossuficiência conseguem realizar e
adquirir muitas coisas (ainda que mercê da graça de Deus). Mas, segundo o
salmista, os filhos recebem todas as dádivas de que necessitam enquanto dormem,
porque é Deus quem trabalha para eles e por eles (Is 64.4). É o Senhor que
concede tudo quanto deseja aos seus (Sl 138.9), pois é poderoso para realizar seus
intentos e propósitos.
5) Deus abençoa os casais com filhos (vv. 3-5).
Existe ênfase nos filhos nestes últimos versículos do salmo 127. Eles são
apresentados como grande bênção do Senhor ao casal.
“O quadro pintado nestes versículos não é da mesma grande escala dos
eventos de Gênesis, mas os valores morais são semelhantes. Nada se diz acerca de
riquezas monetárias ou de posição [social]: uma família reta é riqueza e honra
suficientes.”16
A família ideal do salmista é aquela composta de muitos filhos. Quanto mais
filhos, mais abençoada ela é. Este é um pensamento típico das Escrituras e das
sociedades do Antigo Oriente Próximo que via “os filhos provendo proteção em
tempos de tribulação e velhice.”17 Por isso, eles eram grande bênção.
15
João Calvino, Salmos Vol. IV, pp. 376-7.
Derek Kidner. Salmos 73 a 150: Introdução e Comentário, p. 452.
17
Allan Harman, Salmos, p. 435.
16
8
É surpreendente o contraste entre a cultura judaica antiga e a nossa cultura
ocidental. No judaísmo ter filhos era sinônimo de ter a bênção de Deus sobre si.
Significava vantagem, não prejuízo; alegria, não tristeza; benefício, não um fardo
oneroso. Os filhos eram vistos como presentes que Deus confiava aos homens. 18 O
contrário também era verdadeiro: a falta deles era sinônimo de maldição divina. Não
ter filhos era razão para profunda tristeza e vergonha, especialmente para a mulher
– que sempre era vista como a responsável pela infertilidade.
Na contramão da concepção bíblica, no início deste ano de 2014
pesquisadores britânicos divulgaram o resultado de pesquisa realizada entre cinco
mil pessoas com e sem filhos, de todas as idades e opções sexuais.19 Nela é
sugerido que casais sem filhos são mais felizes. Porém, a pesquisa paradoxalmente
constatou que “apesar de se dizerem mais insatisfeitas com a qualidade de seu
relacionamento e com o parceiro, as mães são mais felizes com a vida em geral do
que qualquer outro grupo analisado.”20 Segundo os pesquisadores, “Isto indica que
ter filhos pode ser uma fonte de felicidade para mulheres"21
Em 1996 havia no Brasil 1 milhão de casais sem filhos (não por problemas
relacionados a infertilidade, mas porque simplesmente não queriam filhos). Doze
anos depois, ou seja, em 2008, eram 2 milhões de casais.22 Em geral, tais casais
possuem renda maior e maior escolaridade.
As razões alegadas pelos casais que não pretendem ter filhos são as
seguintes: a) uma vida mais livre de pressões e responsabilidades; b) maior
possibilidades para realização de sonhos e desejos; c) maior possibilidade de
crescimento financeiro e pessoal; d) falta de recursos financeiros; e) falta de
condições, tais como moradia adequada e tempo para ter filhos; f) não precisam
nem sentem falta de uma criança para completar a família.
Segundo o IBGE, na divulgação dos dados de 2010, “Chama atenção o
crescimento dos casais sem filhos: de 14,9% para 20,2%. Mudanças na estrutura da
família, maior participação da mulher no mercado de trabalho, baixas taxas de
fecundidade e o envelhecimento da população influenciaram no aumento da
proporção de casais sem filhos.”23 Este percentual não diz respeito ao casais que
não querem em definitivo ter filhos, mas sim a casais que não os tem por várias
razões, entre elas, infertilidade e adiamento intencional da paternidade/maternidade.
Infelizmente não temos dados relacionados ao universo protestante. O fato,
porém, é que como regra geral, no cristianismo protestante histórico (e praticante)
filhos são desejados e vistos como grande bênção da parte do Senhor.
Conclusão
A Deus toda glória por suas bênçãos na vida de seu povo!
18
Arthur Weiser. Os Salmos, p. 598.
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/01/140113_felicidade_casamento_filhos_fl.shtml
20
Idem.
21
Ibdem
22
http://veja.abril.com.br/110608/p_124.shtml
23
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/imprensa/ppts/00000010435610212012563616217748.pdf
19