A ARBITRAGEM E OS PROCEDIMENTOS CONCURSAIS o

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A ARBITRAGEM E OS PROCEDIMENTOS CONCURSAIS o
A ARBITRAGEM E OS PROCEDIMENTOS CONCURSAIS:
o princípio da autonomia da vontade e as normas de ordem pública
ARBITRATION PROCEDURES AND THE CONTEST:
the principle of freedom of choice and standards of public
Pedro Silveira Campos Soares*
Resumo
A arbitragem tem por fundamento a intenção das partes em se submeter a um método
alternativo de solução de controvérsias, revelando, assim, seu caráter eminentemente
contratualista, no qual o princípio da autonomia da vontade exerce papel dominante. De seu
turno, os procedimentos concursais, pela sua significativa importância social, baseiam-se em
princípios de ordem pública, notadamente, os princípios da preservação da empresa e da
proteção ao interesse dos credores, podendo-se dizer que ao caráter privatista da arbitragem
contrasta o caráter coletivista dos procedimentos concursais. Essa monografia buscará tratar
do embate entre o procedimento arbitral e os procedimentos concursais, tanto no âmbito
falimentar quanto no da recuperação de empresas, tecendo breve paronama histórico dos
institutos e expondo de que forma eventuais divergências entre os princípios norteadores de
tais institutos foram analisados pela doutrina e pela jurisprudência nacional e estrangeira.
Palavras Chaves: Arbitragem. Procedimentos Concursais. Conflito entre princípios.
Autonomia da Vontade. Preservação da Empresa. Proteção do Interesse dos Credores.
Abstract
Arbitration is based on parties’ intention to have its divergencies solved by an alternative
dispute resolution procedure, disclosing, thus, its contractual approach, in which the principle
of party autonomy has a fundamental role. On the other side, insolvency and turnover
procedures are based on public order principles such as the best interest of creditors. In this
* Aluno da Graduação da Faculdade Mineira de Direito da PUC/MG campus Coração Eucarístico. Membro
do Grupo de Estudos em Direito do Comércio Internacional e Arbitragem da UFMG, da International Law
Association e do Young Arbitrators Fórum da Câmara de Comércio Internacional de Paris.
way, to the private aspect of arbitration contrasts the public character of insolvency and
turnover procedures. This article will treat the divergences between arbitration, insolvency
and turnover procedures, analyzing historically these institutes and their basic principles.
Keywords: Arbitration. Insolvency. Turnover. Conflict between principles. Party Autonomy.
Best Interest of Creditors.
1. INTRODUÇÃO
O crescente reconhecimento da arbitragem como método alternativo de solução de
controvérsias muito se deve à atuação do poder judiciário como reconhecedor do instituto,
uma vez que, apesar da autonomia da convenção de arbitragem e da independência dos
árbitros, o poder judiciário permanece como único órgão jurisdicional detentor do poder de
império, cabendo exclusivamente a ele autorizar ações visando ao satisfação do direito objeto
da arbitragem.
* Aluno da Graduação da Faculdade Mineira de Direito da PUC/MG campus Coração Eucarístico. Membro
do Grupo de Estudos em Direito do Comércio Internacional e Arbitragem da UFMG, da International Law
Association e do Young Arbitrators Fórum da Câmara de Comércio Internacional de Paris.
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Uma das principais características das arbitragens é a amplitude das legislações
aplicáveis ao caso, incluindo não só a legislação concernentes aos aspectos processuais e de
mérito, mas também leis relativas ao status jurídico das partes e à execução do sentença
arbitral. Nessa esteira, a lei do local da execução da sentença arbitral, por exemplo, apesar de
ser apenas uma das muitas que devem ser levadas em conta pelo árbitro, tem sua importância
especifica, uma vez que qualquer conflito com ela levaria ao não reconhecimento dela,
tornando todo o procedimento ineficaz.
A esse respeito, muito tem se discutido sobre os fatores que levariam ou não ao
reconhecimento e posterior execução das sentenças arbitrais, sendo um deles a interferência
em normas de ordem pública do foro de execução da sentença arbitral.
Neste particular se incluem os procedimentos concursais, seja ele recuperação de
empresas ou falência. Ora, a sociedade em recuperação ou em falência pode ter firmado
cláusula de arbitragem que a submetesse à arbitragem. Contudo, tendo-se em vista o princípio
da preservação da empresa e da proteção aos interesses dos credores, poderia se sustentar que
a arbitragem não seria aplicável nestes casos, argumento que, como se verá neste trabalho,
não procede.
2. APONTAMENTOS
AO
INSTITUTO
DA
ARBITRAGEM
–
CONCEITO,
HISTÓRICO E VANTAGENS
O instituto da arbitragem consiste um método alternativo de solução de controvérsias,
pelo qual as partes se submetem com objetivo de solucionar suas divergências. Como ensina
Carmona:
A arbitragem – meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção
de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada,
decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a
assumir a mesma eficácia da sentença judicial – é colocada à disposição de quem
quer que seja, para a solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais acerca dos
quais os litigantes possam dispor. (2009, p. 31)
Do mesmo modo, preceitua a doutrina francesa, bem representada por David, que
entende ser a arbitragem:
Uma técnica que visa a solucionar uma questão, de interesse a uma ou mais pessoas,
por outra ou outras pessoas – o árbitro ou os árbitros -, as quais obtêm seus poderes
3
de uma convenção privada e atuam sobre as bases dessa convenção, sem serem
investido dessa missão pelo Estado. 1 (DAVID, 1982, p. 9, tradução nossa)
A partir dessa definição extraem-se os principais elementos constitutivos da
arbitragem: primeiramente, o elemento jurisdicional, consistente na obrigação dos árbitros em
prolatar a sentença arbitral, que dará fim ao conflito. Tal papel é fundamental para a
arbitragem, eis que com ele fica patente a diferença do instituto em relação aos demais
métodos alternativos de solução de controvérsias, como mediação e conciliação, em que não
há decisão vinculante às partes por parte do mediador ou do conciliador. (FOUCHARD, 1999,
p. 12).
Em segundo lugar, o elemento contratual, revelado na convenção privada firmada
entre as partes que submetem à arbitragem eventuais litígios patrimoniais disponíveis
oriundos de determinada relação jurídica. Tal convenção, em verdade, reflete a autonomia da
vontade das partes, que deliberam se subordinar à decisão de uma ou mais pessoas,
renunciando ao juízo estatal. Essa subordinação pode se dar tanto por meio de compromisso
arbitral inserido ao contrato conexo à divergência, quanto na modalidade de compromisso
arbitral firmado entre as partes quando do surgimento das divergências.
Essa é a orientação legal imposta pela Lei de Arbitragem, que, em seu Art. 3º
estabelece que “as partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo
arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o
compromisso arbitral”. (BRASIL, 1996).
Este mesmo diploma legal estabelece limite à arbitragem ao fixar, em seu Art. 1º, que
“as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos
a direitos patrimoniais disponíveis”. Dessa forma, extrai-se que subsistirá arbitragem somente
quando as partes possuírem capacidade civil, bem como quando se tratar de litígios relativos à
direitos patrimoniais disponíveis. Note, neste ponto, que trata-se de capacidade civil e não
processual, o que, como se verá adiante, poderá exercer influência na manutenção deste
instituto em casos envolvendo procedimentos concursais.
1
une technique visant à faire donner la solution d’une question, intéressant les rapports entre deux ou plusieurs
personnes, par une ou plusieurs autres personnes – l’arbitre ou les arbitres – lesquelles tiennent leurs pouvoirs
d’une convention privée et statuent sur la base de cette convention, sans être investis de cette mission par l’État.
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2.1.
Histórico
O professor Joel Dias Figueira Júnior (1997, p. 16) esclarece que a arbitragem é “por
certo, um dos mais antigos de que se tem notícia na história do Direito e, especificamente,
acerca da jurisdição ou justiça privada, noticiado na Babilônia de 3.000 a.C., na Grécia antiga
e em Roma.”
O instituto se origina da evolução dos métodos de solução de conflitos estabelecidos
na história do direito. Pode se dizer que o primeiro método de solução de conflitos foi a
autodefesa. Nas palavras de Cretella Júnior, citado por Lima (2003, p. 29):
No início, os primitivos romanos, como inúmeros outros povos, fazem justiça com
as próprias mãos, defendendo o direito pela força. Dessa fase de vingança privada,
que se dirige contra o autor do dano, passam os romanos por outras, até que, num
alto estágio de progresso, o Estado toma a seu cargo a tarefa de resolver os litígios
entre particulares.
Da autodefesa, passa-se à autocomposição, pela qual as partes em disputa tentavam
resolver amigavelmente suas divergências, sem a presença de um terceiro, o qual só veio a
surgir com a heterocomposição.
Já no direito romano, institui-se a chamada arbitragem facultativa, cabendo às próprias
partes a escolha do juiz ou do árbitro que julgaria a causa. Como ensina Lima (2003), tal
método era dividido em duas partes, primeiramente frente ao pretor romano (in iure) perante o
qual as partes se comprometiam a aceitar a decisão que viesse a ser tomada pelo árbitro por
ele indicado. Já a segunda parte (apud iudicem) efetivamente perante o árbitro indicado, que
tinha a missão de analisar as provas e prolatar a sentença.
Após isso, passa-se a fase da arbitragem obrigatória, pela qual as partes em conflito
eram obrigadas a se submeter à arbitragem, demonstrando, assim, o fortalecimento do estado.
Por fim, o império romano termina na fase do processo extraordinário, pela qual “(...) o pretor
passa a conhecer do mérito dos conflitos e a proferir sentenças. Com isto, o Estado começa a
impor suas decisões, dando início à idéia da jurisdição como monopólio do Estado”. (LIMA,
2003, p. 31).
Tal monopólio perdurou durante séculos, sendo o único meio jurisdicional de
composição de litígios. Contudo, com o tempo, ressurgem os outros mecanismos de solução
de controvérsias, dos quais destaca-se a arbitragem, devido às inúmeras vantagens que a sua
utilização acarreta.
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2.2.
Vantagens
Por estar estritamente vinculada aos interesses das partes (conseqüência do caráter
contratual do instituto), o procedimento arbitral tem a vantagem de ser confidencial e muito
mais especializado que o procedimento judicial. Isso se deve, principalmente, ao fato de que
as partes escolhem seus julgadores, buscando, naturalmente, aqueles mais familiares com o
objeto da controvérsia. Por conseguinte, as decisões formuladas em sede de arbitragem
normalmente são mais adequadas às peculiaridades de cada caso.
Acerca da confidencialidade, Alan Redfern, Martin Hunter, Constantine Partasides e
Nigel Blackaby, esclarecem que:
Alegações de má-fé, de declarações inverídicas, de inabilidade e outras piores são
frequentemente realizadas no curso de litígios comerciais. Seria compreensível se os
litigantes preferissem que essa lavação de roupa suja ocorresse em privado e não em
público, onde reputações empresariais podem ser irreparavelmente – e injustamente
– prejudicadas. 2 (2004, p.32, tradução nossa)
Quanto à especialização dos julgadores, os mesmos autores, ao abordarem a
flexibilidade do procedimento arbitral, estipulam que:
Desde que as partes sejam tratadas isonomicamente, a arbitragem, ao contrário de
ser conduzida de acordo com regras fixas de processo civil, pode ser modelada às
particularidades da disputa. A essa flexibilidade – e a adaptabilidade – do
procedimento arbitral deve ser somada a escolha de um tribunal suficientemente
experiente, que possa tomar vantagem desta liberdade processual. Tal tribunal deve
ser capaz de analisar rapidamente questões controvertidas de fato e direito,
economizando às partes tempo e dinheiro, bem como oferecendo uma sentença mais
sensível ao caso. (2009, p. 33. tradução nossa).3
Além disso, cabe ainda ressaltar a neutralidade do foro arbitral. Aspecto que traz
maior imparcialidade às decisões arbitrais, principalmente aquelas de caráter internacional. A
arbitragem possibilita às partes não terem de recorrer eventualmente ao foro da outra para
resolver determinada controvérsia, o que certo modo geraria dúvidas acerca da real
imparcialidade da decisão do julgador. Ao contrário, aos árbitros impõe-se o dever de
2
Allegations of bad faith, of misrepresentation, of incompetence and worse are often made in the course of
commercial disputes. It would be understandable if the disputants preferred such mud slinging to take place in
private rather than in public, where business reputations might be irreparably – and unjustly – damaged.
3
So long as the parties are treated fairly, an arbitration can be tailored to meet the specific requirements of the
dispute, rather than having to be conducted in accordance with fixed rules of civil procedure. To this flexibility –
and adaptability – of the arbitral process, must be added the prospect of choosing a tribunal which is experienced
enough to take advantage of its procedural freedom. Such a tribunal should be able to grasp quickly the salient
issues of fact and law in dispute. This will save the parties both time and money, as well as offering them the
prospect of a sensible award.
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revelação, dever assaz debatido pela doutrina nacional e estrangeira e incorporado à legislação
pátria por força do § 1º do art. 14 da Lei 9.307/96.
3. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS PROCEDIMENTOS CONCURSAIS E SUA
ATUAL REGULAMENTAÇÃO
Assim como a arbitragem, os procedimentos concursais também remontam ao império
romano. Naquela época, quando as dívidas de um indivíduo fossem superiores ao seu
patrimônio, o devedor respondia com o próprio corpo, dando libras de sua própria carne em
pagamento.
Tal princípio foi, posteriormente, abrandado, impedindo o pagamento de dívidas com
a vida do devedor, mas permitindo que ele pudesse ser vendido como escravo, utilizando-se
do valor arrecadado com sua venda, bem como de seu trabalho escravo para quitar o débito.
Dessa forma, o devedor ficaria pessoalmente vinculado ao credor até que sua dívida fosse
integralmente quitada.
Essa situação vigorou até o ano de 428 a.C. quando passou a viger a Lex Poetelia
Papiria, que proibia tanto morte, quanto a venda para escravidão, estabelecendo o princípio
basilar do direito falimentar de que a garantia do credor é o patrimônio – e não a pessoa – do
devedor.
Contudo, deve-se ainda indagar qual seria a solução quando o patrimônio do devedor
fosse insuficiente para satisfazer seus débitos. A esse respeito, trazendo a baila o direito de
Justiniano, ensina Ramos (2010, p. 625):
(...) no direito de Justiniano havia a previsão de uma execução especial contra o
devedor insolvente: tratava-se da chamada missio in possessi bonorum, através da
qual os credores adquiriam a posse comum dos bens do devedor, os quais, por sua
vez, passavam a ser administrados por um curador, o curator bonorum. A partir de
então, os credores adquiriam, consequentemente, o direito de vender os bens do
devedor, com intuito de saldar a dívida que este tinha em relação àqueles.
É de se ressaltar que os tal procedimento não se aplicava exclusivamente aos
comerciantes, mas a todos os indivíduos indistintamente, o que, como se verá, diverge da
atual tendência do direito concursal. Tal diferenciação só vem a ocorrer com o Code du
Commerce de Napoleão, por meio do qual institui-se “um conjunto de regras especiais,
aplicáveis restritamente aos devedores insolventes que revestiam a qualidade de
comerciantes.” (RAMOS, 2010, p. 625).
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Contudo, devido ao desenvolvimento econômico, os procedimentos concursais deixam
de ter o caráter pejorativo para adquirir o caráter de fenômeno natural inerente ao risco do
negócio. Com isso, passa-se a discutir temas como a função social da empresa e os
mecanismos para sua preservação.
Dessa forma, fica clarividente que o enfoque de tais procedimentos torna-se mais
abrangente e social. Em outras palavras, Tzirulnik (2005, pp. 41-42) “a questão primária deixa
de ser o devedor per se para enfocar as conseqüências sociais e econômicas advindas de sua
inadimplência.”
Devido a tais transformações, em 1993, inicia-se um movimento no Brasil visando à
atualização da regulamentação nacional dos procedimentos concursais, que culmina com a
promulgação da Lei 11.101 de 2005, que regula a recuperação judicial e a falência.
Em síntese, conforme relatório elaborado pela Comissão de Assuntos Econômicos do
Senado Federal (2004), cujo objeto foi a análise do Projeto de Lei nº 71, posteriormente
convertido na Lei 11.101 de 2005, os procedimentos concursais se baseiam nos princípios da
preservação da empresa, da recuperação das sociedades recuperáveis, da proteção aos
trabalhadores, da redução dos custos de crédito, da segurança jurídica, da participação ativa
dos credores, entre outros.
Evidencia-se, desta monta, o caráter coletivista dos procedimentos concursais, que tem
por base princípios de ordem pública, independentemente de qual procedimento seja adotado,
recuperação judicial, extrajudicial ou arbitragem. Tal caráter, diverge do individualismo da
arbitragem, fundado na autonomia da vontade das partes de submeter seus litígios à resolução
arbitral.
4. PRINCIPAIS PONTOS DE CONFLITO
Após estes apontamentos introdutórios, salta aos olhos as diferentes naturezas do
procedimento arbitral e dos concursais. Por estar estritamente vinculada à autonomia das
partes, a arbitragem, normalmente, não busca a satisfação de interesses coletivos, de uma
classe de indivíduos (credores) e nem necessitam da intervenção do Ministério Público no
feito.
Contudo, os procedimentos concursais, como já vistos, têm fundamento no interesse
público, buscando a melhor decisão não apenas para um credor específico, mas para todos os
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credores de determinada sociedade empresária que esteja passando por qualquer dos
procedimentos concursais.
Desse modo, diversas são as indagações que têm sido formuladas pelo poder judiciário
e pela própria doutrina ao se analisar arbitragens em que uma das partes encontrava-se em
processo concursal.
Em primeiro lugar foi objeto de indagação a validade da convenção de arbitragem
frente ao momento de sua assinatura, bem como a existência ou não de conflito de
competências entre a arbitragem e o juízo concursal.
Ultrapassado tal questionamento, os estudiosos passaram a analisar a questão da perda
do poder de disposição da sociedade empresária que passa por um procedimento concursal,
indagando se tal fator poderia obstar o prosseguimento da arbitragem ou se, de alguma forma,
algum ente passaria a representá-la.
Por fim, coube analisar se o principio da exclusividade de jurisdição e da proteção dos
interesses dos credores não serão afetados pelo prosseguimento da arbitragem, que é
mecanismo de solução de controvérsias diverso daquele instituído pelas leis brasileira,
americana e francesa, reguladoras da matéria.
4.1.
Validade da Convenção de Arbitragem
Primeiramente, deve-se verificar o momento em que a convenção de arbitragem foi
assinada. Caso ela tenha sido assinada em momento posterior à decretação de falência ou à
aprovação do plano de recuperação, é unânime para a legislação brasileira e francesa o
entendimento de que a convenção de arbitragem, neste caso, é inválida, já que na legislação
dos dois países a decretação de falência retira a capacidade processual da sociedade, que se
torna, dessa forma, impedida de ser parte em qualquer negócio jurídico (FRANÇA, artigo
L641-1; BRASIL, 2005, artigo 33).
Nesse ponto, cabe destacar a lição do professor Requião a respeito da Lei de Falências
brasileira. Segundo ele:
O estado de falência, atingindo a pessoa do falido, não afeta sua capacidade civil.
Mas fere, profundamente, sua capacidade processual, isto é, sua condição de parte
legítima para postular na justiça. (...) É preciso, porém, compreender, clara e
precisamente, essa perda de capacidade processual que envolve o falido. Torna-se
ele, entenda-se bem, processualmente inabilitado para postular em juízo
relativamente às relações patrimoniais compreendidas na falência, seja como autor
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ou como réu. Essa perda de iniciativa é, com esclarecemos acima, um corolário da
perda de sua capacidade de dispor e administrar seu patrimônio. (1975, p. 140)
Sendo assim, a assinatura de convenção de arbitragem por sociedade sem capacidade
processual para tanto, vicia o instrumento e vai de encontro, por exemplo, com o artigo 1º da
Lei Brasileira de Arbitragem, a qual estabelece que somente “as pessoas capazes de contratar
poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais
disponíveis.” (BRASIL, 2005, artigo 1º).
Ao contrário disso, caso a convenção de arbitragem tenha sido assinada em momento
anterior à decretação de falência ou do plano de recuperação, não há de se falar em sua
invalidade, uma vez que a sociedade estaria plenamente capaz no momento de assinatura,
podendo, dessa forma, estabelecer compromissos da forma que bem entendesse.
O Superior Tribunal de Justiça brasileiro (“STJ”) já regulou este tema. Em decisão
recente do ano de 2008 o Tribunal Superior expôs, ao decidir a Medida Cautelar 14.295, que:
O primeiro aspecto a ser ressaltado é que a cláusula compromissória foi firmada
pelas partes antes da decretação da liquidação extrajudicial, oportunidade em que
esta [parte na arbitragem] detinha capacidade plena para contratar, tendo então
optado por sujeitar à arbitragem a resolução de direitos patrimoniais disponíveis.
Assim, no ato de celebração do compromisso arbitral estavam presentes tanto o seu
requisito subjetivo, previsto na primeira parte do art. 1º da Lei nº 9.307/96,
consistente na capacidade civil para contratar, quanto seu requisito objetivo, também
contido no referido art. 1º, in fine, correspondente à disponibilidade do direito
patrimonial. Não há, pois, dúvida alguma acerca da validade da cláusula
compromissória na espécie. (STJ, MC. 14.295, Rel. Min. Nancy Andrighi, 2008)
Como ensina Armelin:
a extinção da arbitragem neste caso seria o mesmo que “encerrar uma arbitragem
pelo simples fato superveniente de tem sido gravado com indisponibilidade, em
razão de medida cautelar fiscal, os bens que se constituem no seu objeto. (2007, p.
19).
Dessa forma, ficam claros os limites da convenção de arbitragem, que só deverá ser
considerada válida se concluída em momento anterior à decretação de falência ou
homologação do plano de recuperação, não assistindo razão, neste caso, aos que preceituam
que a convenção de arbitragem torna-se inválida quando a sociedade tem sua falência ou
recuperação judicial decretada.
Por fim, é de se destacar que não há conflito de competências entre a jurisdição do
árbitro e a jurisdição estatal, visto que a validez da convenção de arbitragem exclui
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automaticamente a competência do poder judiciário estatal. Assim é o entendimento de
Fouchard (1998, p. 475).
A esse respeito, interessante destacar que, em nenhum dos casos revisados por
Mantilla-Serrano (1995, p. 60) a questão de litispendência foi argüida, o que não deve ser
considerado surpresa, pois, como foi destacado anteriormente, isso demandaria duas
jurisdições competentes para a mesma disputa, o que não é o caso, já que a presença de
convenção de arbitragem exclui a competência da corte estatal.
4.2.
A Representação da Sociedade Empresária sujeita ao Procedimento Concursal
na Arbitragem
Outro aspecto que merece destaque ao se analisar a possibilidade de arbitragens
envolvendo sociedades empresárias em procedimentos concursais é a perda da capacidade de
disposição da sociedade falida e a conseqüente necessidade de representação para ela. Por
essa razão, a presença de um ente representante da sociedade falida é marcante nas legislações
brasileira, norte-americana e francesa.
No Brasil, a Lei 11.101/05 estabelece um administrador judicial como representante
da massa falida, devendo representá-la ativa e passivamente, defendendo, assim, seus
interesses e dos seus credores. Já a Lei de Falências francesa determina que um
“administrateur” ou “liquidateur” deva ser nomeado, assim como nos Estados Unidos, onde
um novo ente, denominado “trustee”, exerce as funções de administrador, tendo como escopo
principal a defesa dos interesses da massa falida.
Nesse sentido, a doutrina dos três países supracitados é unânime quanto às
conseqüências da perda da capacidade de disposição da sociedade falida, concluindo que esta
traz consigo a impossibilidade da sociedade de onerar ou alienar seus bens, agora integrantes
da massa falida.
Entretanto, deve-se frisar que a participação da massa falida em qualquer
procedimento arbitral não tem o condão de onerar tais bens, uma vez que o julgamento terá
caráter meramente declaratório e, além disso, estando a sociedade falida representada por seu
administrador, seus direitos estariam, consequentemente, assegurados.
A esse respeito, conforme ensinou a Ministra Nancy Andrighi na decisão do MC14.295:
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(...) a participação da massa liquidanda no procedimento arbitral, a rigor, não exige a
prática de nenhum ato inclinado a concluir negócios pendentes, tampouco a onerar
ou alienar bens. O fato de a arbitragem envolver direitos disponíveis não significa
que haverá, necessariamente, no curso do procedimento arbitral, atos do liquidante
que impliquem na disponibilização de tais direitos. (STJ, MC. 14.295, Rel. Min.
Nancy Andrighi, 2008)
É nos Estados Unidos que a análise dos poderes do ente representante da massa falida
é mais profunda, nos termos da Lei norte-americana, o “trustee’ deverá ser investido com os
mesmos poderes e títulos de propriedade do devedor, incluindo os mesmos direitos de recusar
direitos de preferência (...).4” (EUA, US Code, §78fff-1, tradução nossa)
Da mesma forma, a jurisprudência desse país é esclarecedora nesse aspecto, na medida
em que, tendo em vista a política favorável à arbitragem, tais cortes, ao se depararem com
execuções de laudos arbitrais estrangeiros, utilizaram-se de critérios interessantes para
permitir o prosseguimento de arbitragens internacionais e deferir as execuções.
Os fatores que deveriam ser levados em conta pelo julgador foram explicitados pela
primeira vez pelas cortes norte-americanas no caso Double TRL Inc. citado pelo juiz Tuohey
na decisão do caso Cordova International Inc (EUA, 1987, p. 6).
De acordo com a decisão, em primeiro lugar deveria-se verificar qual o grau de
preferência que o juízo estatal tem sob o arbitral para solucionar o caso concreto. Nesse
sentido, as matérias intrínsecas à falência como distribuição dos bens do falido e elaboração
do quadro de credores, teria preferência o juízo estatal, enquanto matérias envolvendo
rompimentos de contratos e quantias ilíquidas poderiam ser tratadas em sede de arbitragem.
Nesse aspecto, cabe, ainda, destacar que na Inglaterra as cortes tendem a recusar o
prosseguimento de arbitragens quando se verificar que o procedimento será concluído mais
rápido no juízo estatal.
Em segundo lugar, deveria se analisar a necessidade de julgadores experientes na
matéria objeto da lide. Caso a resposta fosse positiva, a matéria deveria ser encaminhada para
o juízo arbitral, uma vez que um dos maiores benefícios da arbitragem é o julgamento neutro
e por julgadores experimentados nos assuntos a que são designados.
Dessa forma, conclui-se que não existem impedimentos ao prosseguimento de
arbitragens comerciais internacionais que versem sobre quantias ilíquidas e rompimentos
contratuais pelo simples fato de que a sociedade falida (parte na convenção de arbitragem)
teria perdido sua capacidade de disposição ou, como relembra LAZIC, teria sido substituída
pela massa falida e, portanto, nem existiria mais (1999, p. 5).
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a trustee shall be vested with the same powers and title with respect to the debtor and the property of the debtor,
including the same rights to avoid preferences (…).
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Tais alegações são infundadas na medida em que a perda da capacidade de disposição
é dada, como contrapartida, a presença de um representante judicial da sociedade falida, o
qual deve ser citado e comparecer ao procedimento arbitral para defesa dos interesses da
massa.
Concluindo, não há de se falar em prejuízo na possibilidade de execução do laudo,
uma vez que, por tratar de quantia ilíquida, não haveria qualquer motivo para a centralização
dos procedimentos no juízo estatal da falência, já que a sentença, ao final, constituiria título
executivo judicial, podendo ser habilitado no procedimento falimentar .
A Câmara de Arbitragem deve, no entanto, ter cautela nas citações e intimações, para
evitar alegações de ausência de ampla defesa no procedimento. Cabe destacar, a esse respeito,
a atitude da Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional de Paris. Conforme
explicita o seu conselheiro Mantilla-Serrano, a CCI cita e intima a sociedade falida na pessoa
do administrador judicial, em todos os endereços conhecidos dele, evitando dessa forma que a
informação passe despercebida pelos representantes da massa falida e garantindo que o
procedimento arbitral possa ter prosseguimento (1995, p. 67).
Em conclusão, deve ser compreendido que a mera decretação superveniente de
falência de uma das partes em determinado procedimento arbitral não deve ser vista como
impedimento ao prosseguimento do mesmo, tendo em vista que a presença de um ente que a
representará trará consigo a possibilidade de defesa dos interesses da massa e de seus
credores.
4.3.
A Desnecessidade de Suspensão do Procedimento Arbitral
Como forma de proteção aos interesses dos credores e, até mesmo, ao procedimento
falimentar, diversas legislações determinam a suspensão de todas as ações em curso que
envolva o nome da sociedade falida. Tal imposição deve-se ao princípio da exclusividade de
jurisdição do juízo falimentar. No entanto, como se verá mais adiante, este princípio tem sido
mal interpretado, uma vez que não deve ser aplicado com o objetivo de suspender processos
de conhecimento.
No Brasil, a Lei de Falências determina categoricamente, em seu Art. 6º, que “a
decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o
curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos
credores particulares do sócio solidário.” (BRASIL, 2005, art. 6).
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Já no §1º do mesmo artigo, estipulou-se que “terá prosseguimento no juízo no qual
estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.” (BRASIL, 2005, art. 6, §1º).
Por fim, no parágrafo terceiro, os legisladores preverão que “o juiz competente para as ações
referidas nos §§ 1º e 2º deste artigo poderá determinar a reserva da importância que estimar
devida na recuperação judicial ou na falência, e, uma vez reconhecido líquido o direito, será o
crédito incluído na classe própria.” (BRASIL, 2005, art. 6, §3)
Na França esse mesmo princípio integra a legislação, sendo chamado de “arrêt des
poursuites individuelles”. Nas palavras do professor Fouchard, tal princípio se trata da
suspensão ou interdição de certas ações na justiça como forma de proteger e organizar o
procedimento falimentar em curso. (1998, p. 474)
Da mesma forma, nos Estados Unidos este princípio vigora sob o nome de “automatic
stay”, sendo analisado de forma semelhante às duas outras legislações citadas.
Como se pode verificar, tal princípio deve ser aplicado de maneira cautelosa, sempre
tendo em vista seu objetivo. Dessa forma, só há justificativa para a aplicação e conseqüente
suspensão de procedimentos em curso quando houver prejuízo para o procedimento
falimentar, para massa falida e seus credores.
Nesse sentido, é importante frisar que meras ações de reconhecimento de
responsabilidades contratuais visando liquidar os valores devidos não geram, de qualquer
maneira, prejuízos desta natureza, uma vez que tais ações não têm cunho de onerar ou alienar
os bens da sociedade falida, nem tampouco influenciar na distribuição dos bens que deverá ser
feita no juízo falimentar.
A esse respeito, cumpre relembrar os ensinamentos de Armelin:
Deveras, a falência é, sob o prisma processual, uma execução que, por ser
concursal, deve albergar todas as execuções dos credores do falido. Mas inexiste
fundamento jurídico para a suspensão de ações de conhecimento, cujo escopo é tão
somente aparelhar títulos executivos que habilitem os credores do falido a participar
de execução dessa natureza. (2007, p. 21)
Sendo assim, desde que a arbitragem não ultrapasse os limites da convenção arbitral e
trate de rompimentos contratuais, nenhum prejuízo pode ser vislumbrado no prosseguimento
de tais arbitragens envolvendo sociedades em procedimento falimentar, vez que não afetará,
de modo algum, os direitos da massa falida e dos seus credores.
A questão da suspensão de ações no curso da falência foi exaustivamente tratada pela
Corte de Arbitragem da CCI. Em seu relato, Mantilla-Serrano (1995, p. 62) afirma que, assim
que uma das partes da convenção de arbitragem inicia procedimento falimentar, sua primeira
14
reação é requerer a suspensão do procedimento arbitral, com base na Lei aplicável ao caso
concreto. Nessa situação, os árbitros geralmente convidam as partes para uma audiência na
qual eles comentam sobre os efeitos do procedimento falimentar sobre a arbitragem,
solicitando à parte em falência que encaminhe toda a documentação referente à sua
representação no procedimento arbitral.
Caso a sociedade falida se recuse a participar ou repassar informações claras sobre sua
representação, os árbitros costumam proceder com a arbitragem, encaminhando as
correspondências e intimações para o último endereço conhecido da sociedade falida e para os
endereços fornecidos pela parte adversa. Em todos os casos, a outra parte foi indagada se
gostaria de prosseguir com o procedimento arbitral.
Nestes termos, a possibilidade de suspensão da arbitragem deve ser analisada com
muita cautela pelos árbitros e pelas cortes, devendo somente ser declarada quando realmente
houver prejuízo aos credores, afetando, sobremaneira, a distribuição dos bens da sociedade
falida. Caso contrário, não há motivos para a suspensão.
5.
A EXECUÇÃO DA SENTENÇA ARBITRAL
A relevância de se analisar as divergências entre procedimentos falimentares e a
arbitragem comercial internacional encontra-se, como dito na introdução, na dependência do
procedimento arbitral nas cortes estatais, uma vez que às últimas está a incumbência de
concretizar a sentença arbitral, fazendo este ser executado, já que falta ao árbitro o poder de
império do estado que pertence ao juízo, ou seja, o poder de utilizar-se da força para fazer
executar suas sentenças .
A fim de regular a execução de tais sentenças, as Nações Unidas elaborou a
Convenção de Nova Iorque para Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais
Estrangeiras, posteriormente ratificada pelo Brasil, a qual em seu artigo 3º preceitua que:
Quando da assinatura, ratificação ou adesão à presente Convenção, ou da notificação
de extensão nos termos do Artigo X, qualquer Estado poderá, com base em
reciprocidade, declarar que aplicará a Convenção ao reconhecimento e à execução
de sentenças proferidas unicamente no território de outro Estado signatário. Poderá
igualmente declarar que aplicará a Convenção somente a divergências oriundas de
relacionamentos jurídicos, sejam eles contratuais ou não, que sejam considerados
como comerciais nos termos da Lei nacional do Estado que fizer tal declaração
(BRASIL, 2002, art. 3)
15
Seguindo essa mesma linha de raciocínio o órgão das Nações Unidas responsável pelo
Direito do Comércio Internacional, também regulou em sua Lei Modelo o reconhecimento e
execução de laudos arbitrais estrangeiros, da seguinte forma: “a sentença arbitral,
independentemente do país em que fora lavrada, deve ser reconhecida como obrigatória e,
quando do pedido de homologação a corte competente, deverá ser homologada5.”
(UNCITRAL, 2006, art. 35 §1, tradução nossa)
De acordo com tais convenções, todos os estados signatários devem, portanto,
estabelecer uma política internacional favorável à execução e cumprimento de laudos arbitrais
estrangeiros. Entretanto, deve-se frisar que tais Leis possuem exceções para que as cortes
recusem a homologação dos laudos arbitrais, notadamente a ausência de devido processo legal
e a interferência em normas de ordem pública, ambas relativas à Lei do país da execução do
laudo .
Nestes termos cabe destacar que o risco pela execução não recai sobre o árbitro, que
cumpre seu papel ao disponibilizar a sentença arbitral de maneira diligente, mas sim sobre as
partes que desejaram utilizar-se da arbitragem como meio para solução de suas controvérsias.
Por isso, como disse Mantilla-Serrano (1995, p. 70)., muitas arbitragens tiveram
prosseguimento na CCI, tendo como justificativa seu caráter internacional e a não submissão
da mesma aos limites territoriais e legislações domésticas.
Expondo tais razões, o Tribunal Arbitral constituído para solucionar o caso 5996 da
Corte de Arbitragem da CCI, envolvendo autor camaronês e réu francês (aplicando as Leis da
Tunísia) determinou que:
O Tribunal Arbitral, composto amigavelmente, com sede em Tunis numa arbitragem
internacional, não está compelido em prover o requerimento do síndico, relativo à
não obrigatoriedade de observância do tribunal arbitral à qualquer Lei, ou ao menos
à Lei francesa que é completamente estrangeira ao presente procedimento6. (CCI, p.
51, decisão não publicada, tradução nossa).
Nessa mesma linha de raciocínio encontra-se o caso Hupp Industries Inc. v. EPAP,
tramitado na Corte de Falências do estado de Ohio, nos Estados Unidos, no qual o juiz
Randolph Baxter esclarece que a posição adotada pelo Tribunal Supremo norte-americano é a
de reconhecer compromissos arbitrais internacionais válidas, mesmo que estas estejam em
5
an arbitral award, irrespective of the country in which it was made, shall be recognized as binding and, upon
application in writing to the competent court, shall be enforced (…)
6
The [arbitral] tribunal, amiable compositeur, sitting in Tunis in an international arbitration, is not compelled to
grant the trustee's request, for the tribunal is not bound by a particular (substantive or procedural) national law
and, least of all, by the French law that is completely foreign to the present proceedings.
16
desacordo com normas de ordem pública norte-americana, baseando-se no respeito mútuo que
deve existir entre os estados, no reconhecimento da capacidade de tribunais estrangeiros ou
transnacionais, bem como na necessidade de previsibilidade na resolução de controvérsias no
comércio internacional.
Nesse sentido, deve-se compreender que a existência de arbitragens internacionais
envolve não só as partes e o árbitro, mas também todos os países que tiverem suas Leis
afetadas. Sendo assim, é de fundamental importância o respeito mútuo e o reconhecimento da
competência de tribunais estrangeiros para dirimir controvérsias, deixando as razões pelo nãoreconhecimento como exceção e não como regra.
6.
CONCLUSÕES
Com essas palavras, conclui-se que, não obstante as diversas limitações aqui
apresentadas à utilização de arbitragem em matérias ligadas aos procedimentos concursais,
sua suspensão ou a não-execução dos laudos proferidos pelos tribunais arbitrais não são,
certamente, o melhor caminho a ser tomado.
Vivemos num mundo transnacional e globalizado, no qual as Leis se entrelaçam e se
completam, não devendo os países, portanto, utilizarem-se de táticas protecionistas para
impedir o prosseguimento de arbitragens que os afetam.
A esse respeito, é importante salientar, mais uma vez, os diversos benefícios da
arbitragem, dentre os quais inclui-se a celeridade, a qual estaria comprometida no caso de
estados que não valorizassem o instituto.
É por esse motivo que a doutrina preceitua que o árbitro tem poder de aplicar normas
de ordem pública, para ter ciência de seu limite, no que concernem as normas de um suposto
país onde o laudo será executado (FOUCHARD, GAILLARD e GOLDMAN, p. 342).
Entretanto, assim como no exemplo das matérias ligadas à legislação antitruste e
securities, já exaustivamente analisada pelos tribunais arbitrais e por cortes estatais, em que já
se aceita a utilização de arbitragens como meio de solução de controvérsias, matérias ligadas
aos procedimentos concursais e suas implicações também devem ser analisadas sobre o
mesmo prisma.
Isso se deve, repita-se, ao caráter meramente declaratório que a sentença arbitral terá,
servindo a arbitragem apenas como meio de reconhecimento de responsabilidades e
liquidação de dívidas e, de forma alguma, como meio executório, cabendo isso ao poder
17
judiciário que deve reconhecer e executar tais sentenças baseando-se nas regras de cooperação
internacional e no reconhecimento da competência de tribunais estrangeiros.
18
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