l`o sse rvator e romano - Paróquia Nossa Senhora da Conceição
Transcrição
l`o sse rvator e romano - Paróquia Nossa Senhora da Conceição
y(7HB5G3*QLTKKS( +.!"!\!#!}! Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00 L’OSSERVATORE ROMANO EDIÇÃO SEMANAL Unicuique suum EM PORTUGUÊS Non praevalebunt Cidade do Vaticano Ano XLVII, número 19 (2.413) quinta-feira 12 de maio de 2016 Francisco recebeu o prémio Carlos Magno Que te aconteceu, Europa? Novo humanismo baseado na capacidade de integrar, dialogar, gerar O que aconteceu com a «Europa humanista, paladina dos direitos do homem, da democracia e da liberdade», com o velho continente «terra de poetas, filósofos, artistas, músicos e letrados», com a Europa mãe de povos e nações, mãe de grandes homens e mulheres que souberam defender e dar a vida pela dignidade dos seus irmãos»? Esta tripla interrogação serviu de base ao longo discurso proferido pelo Papa ao receber Sonho de um filho GIOVANNI MARIA VIAN Durante a entrega do prémio Carlos Magno ao Papa Francisco foi respeitado o seu desejo de ir além da dimensão comemorativa. Com efeito, nas intervenções lidas durante a cerimónia, em particular na do burgomestre de Aachen, ressoaram palavras que reconheceram com franqueza a crise da Europa. Mas, sobretudo, no discurso do Pontífice pareceu clara a sua vontade de dedicar a «este amado continente» o prémio recebido. Num momento em que a confusão é evidente: «O que te aconteceu, Europa», cadenciou três vezes Bergoglio, recordando brevemente o que o velho continente soube realizar nos séculos. Obviamente, não é sem significado que este prémio simbólico para a Europa, instituído poucos anos depois da conclusão da segunda guerra mundial, tenha sido atribuído pela primeira vez em na manhã de 6 de maio o prémio Carlos Magno que lhe foi oferecido pela cidade alemã de Aachen. Na sala Régia do Palácio apostólico no Vaticano, na presença dos máximos dirigentes das instituições europeias e de chefes de Estado e de governo, o Pontífice auspiciou «um impulso novo e corajoso para este amado continente». Citando os pais fundadores Schuman, Adenauer e De Gasperi, recordou que a Europa «no século passado, após anos de conflitos trágicos, culminados na guerra mais terrível que se recorde», «testemunhou à humanidade que um novo início era possível. Mas infelizmente, observou Francisco, nos últimos tempos, «parece que ela não sente suas as paredes da casa comum distanciando-se por vezes, na sua consolidação, do luminoso projeto arquitetado pelos Pais. Aquela atmosfera de novidade, aquele desejo ardente de construir a unidade — comentou com um fio de amargura — parecem cada vez mais ofuscados; nós, filhos daquele sonho, somos tentados a ceder aos nossos egoísmos, tendo em vista apenas os próprios interesses e pensando em construir recintos particulares». Francisco exortou de novo a «construir pontes e derrubar muros», a «não se contentar com retoques cosméticos ou compromissos tortuosos para corrigir qualquer tratado, mas a lançar corajosamente bases novas» para poder «enfrentar com coragem o complexo quadro multipolar dos nossos dias, aceitando com determinação o desafio de “atualizar” a ideia de Europa». Como? Francisco explicou-o com a sua linguagem simples e direta, delineando aquilo que ele definiu o «sonho» de «um novo humanismo, baseado em três capacidades»: integrar, dialogar e gerar. PÁGINAS 7 CONTINUA NA PÁGINA 8 Na audiência os votos de que o Brasil reencontre a harmonia Vigília de oração para enxugar as lágrimas Lógica do abraço Oceano de desolação Na audiência geral de quarta-feira, 11 de maio, prosseguindo o ciclo de reflexões sobre o tema do jubileu relido à luz dos episódios evangélicos, o Pontífice falou sobre o trecho de Lucas (15, 11-32), tirando a conclusão de que «todos aqueles que têm fome de misericórdia e de perdão e pensam que não os merecem», seja qual for a situação de vida na qual se encontrem, não de- vem esquecer que nunca deixarão de ser filhos de Deus, filhos de um Pai que ama. No final da audiência, o Papa dirigiu um pensamento particular ao Brasil, «para que o país, nestes momentos de dificuldade, proceda pelas sendas da harmonia e da paz, com a ajuda da oração e do diálogo». PÁGINA 16 Médicos com a África Carta a Tawadros A saúde negada Inaudita violência PÁGINA 11 II PÁGINA 13 A 10 «Quantas lágrimas são derramadas a cada instante no mundo; uma diferente da outra; e juntas formam como que um oceano de desolação, que invoca piedade». Disse o Papa Francisco durante a vigília de oração para enxugar as lágrimas, presidida na basílica vaticana a 5 de maio, como iniciativa jubilar na solenidade da Ascensão. Depois de ter ouvido alguns testemunhos de dor e sofrimento, o Pontífice pronunciou a homilia frisando que, até na dor, «não estamos sozinhos». Também Jesus sabe «o que significa chorar». PÁGINA 3 L’OSSERVATORE ROMANO página 2 quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19 Gratidão e apreço do Pontífice à Guarda suíça pelo serviço prestado Tempo de fraternidade Apreço e gratidão pelo serviço prestado com «disponibilidade» e espírito de «fidelidade à Santa Sé» foram manifestados pelo Papa Francisco à Guarda suíça pontifícia durante a audiência de 7 de maio na sala Clementina, por ocasião do juramento dos novos recrutas. Foram estas as palavras do Santo Padre. Senhor Comandante Reverendo Capelão prezados Guardas caros familiares e amigos da Guarda Suíça Pontifícia No dia seguinte à vossa festa, sintome feliz por me encontrar e celebrar convosco, inclusive para manifestar o meu apreço e a minha gratidão pelo vosso serviço, pela vossa disponibilidade e pela vossa fidelidade à Santa Sé. Dirijo uma saudação particular aos Recrutas e aos respetivos familiares, assim como aos Representantes das Autoridades suíças aqui presentes. É bom ver jovens como vós, que dedicam alguns anos da própria vida à Igreja, nomeadamente ao Sucessor de Pedro: trata-se de uma oportunidade singular para crescer na fé, para experimentar a universalidade da Igreja e também para viver uma experiência de fraternidade. Crescer na fé. Sois chamados a viver o vosso trabalho como uma missão que o próprio Senhor vos confia; a aproveitar o tempo que transcorreis aqui em Roma, no coração da cristandade, como oportunidade para aprofundar a amizade com Jesus e para caminhar rumo à meta de uma vida verdadeiramente cristã: a santidade. Por isso, convido-vos a alimentar o vosso espírito com a oração e com a escuta da palavra de Deus; a participar com devoção na Santa Missa; a cultivar uma devoção filial à Virgem Maria; e deste modo a cumprir a vossa missão peculiar, trabalhando todos os dias «acriter et fideliter», com coragem e fidelidade. Experimentar a universalidade da Igreja. Os túmulos dos Apóstolos e a Sede do Bispo de Roma são uma encruzilhada de peregrinos provenientes do mundo inteiro. Assim, vós tendes a possibilidade de sentir pessoalmente a maternidade da Igreja que recebe em si mesma, na própria unidade, a diversidade de tantos povos. Podeis encontrar-vos com pessoas de diferentes línguas, tradições e culturas, mas que se sentem irmãos porque irmanados pela fé em Jesus Cristo. Far-vos-á bem desco- Missa celebrada pelo secretário de Estado aos novos recrutas Vale a pena propor-se metas altas Não uma profissão, mas uma missão, não um trabalho, mas uma vocação: na manhã de 6 de maio, dia no qual se comemoram os 147 soldados helvéticos mortos em defesa do Papa durante o saque de Roma em 1527, o cardeal Pietro Parolin celebrou a missa comemorativa no altar da cátedra na basílica de São Pedro, dirigindo-se em particular aos 23 novos guardas suíços que na parte da tarde prestarão juramento solene. As boas-vindas aos recrutas por parte do secretário de Estado teve início com um encorajamento a não «se contentarem com coisas medíocres, efémeras» e a comprometerem-se «com o entusiasmo dos jovens por coisas grandes, verdadeiras, pelo Senhor que é fonte e fundamento de tudo». A cerimónia teve um prólogo no dia 5 de maio com o concerto da Glarner Jugend Blasorchester, formação musical com artistas de 16 a 25 anos. A fazer as honras da casa este ano foi o cantão suíço de Glarona. Depois, à noite a participação na vigília «Para enxugar as lágrimas» presidida pelo Papa Francisco em São Pedro. A inserção deste momento de oração no programa L’OSSERVATORE ROMANO EDIÇÃO SEMANAL Unicuique suum EM PORTUGUÊS Non praevalebunt das celebrações da guarda pontifícia confirma quanto o cardeal Parolin recordou depois na missa: «Prestando o vosso precioso serviço, não contam só as vossas capacidades e competências, embora importantes. O fundamento principal, a base, é a fé na presença e na ajuda do Senhor». De facto, prosseguiu o secretário de Estado, «só com Cristo o serviço cresce e produz fruto, caso contrário seria um funcionamento mecânico sem vida, sem crescimento nem futuro». GIOVANNI MARIA VIAN diretor Giuseppe Fiorentino vice-diretor Cidade do Vaticano [email protected] www.osservatoreromano.va Redação via del Pellegrino, 00120 Cidade do Vaticano telefone +390669899420 fax +390669883675 TIPO GRAFIA VATICANA EDITRICE L’OSSERVATORE ROMANO don Sergio Pellini S.D.B. diretor-geral brir o seu testemunho cristão e oferecer, por vossa vez, um testemunho evangélico sereno e jubiloso. Viver uma experiência de fraternidade. Também isto é importante: estar atentos uns aos outros, para vos ajudar no trabalho quotidiano e para vos enriquecerdes reciprocamente, recordando-vos sempre que «há maior felicidade em dar do que em receber!» (At 20, 35). Sabei valorizar a vida comunitária, a partilha dos momentos felizes mas inclusive dos mais difíceis, prestando atenção a quantos entre vós se encontram em dificuldade e às vezes precisam de um sorriso e de um gesto de encorajamento e de amizade. Assumindo esta atitude, sereis favorecidos também na abordagem diligente e perseverante das pequenas e grandes tarefas do serviço diário, dando a todos testemunho de gentileza e espírito de hospitalidade, altruísmo e humanidade. Estimados Guardas, faço votos a fim de que vivais intensamente os vossos dias, firmes na fé e generosos na caridade em relação às pessoas com as quais vos encontrais. Vos ajude a nossa Mãe Maria, que honramos de modo especial no mês de maio, a experimentar cada vez mais aquela profunda comunhão com Deus, que para nós crentes tem início na terra e será completa no céu. Com efeito, como recorda são Paulo, somos chamados a ser «concidadãos dos santos e membros da família de Deus» (Ef 2, 19). Convido-vos, bem como as vossas famílias, os vossos amigos e quantos, por ocasião do juramento, vieram a Roma, à intercessão de Nossa Senhora e dos vossos Padroeiros são Martinho e são Sebastião. Peço-vos instantemente que oreis por mim e, de coração, concedo-vos a Bênção Apostólica. Assinaturas: Itália - Vaticano: € 58.00; Europa: € 100.00 - U.S. $ 148.00; América Latina, África, Ásia: € 110.00 - U.S. $ 160.00; América do Norte, Oceânia: 162.00 - U.S. $ 240.00. Administração: telefone +390669899480; fax +390669885164; e-mail: [email protected] Serviço fotográfico Para o Brasil: Impressão, Distribuição e Administração: Editora santuário, televendas: 0800160004, fax: 00551231042036, e-mail: [email protected] telefone +390669884797 fax +390669884998 [email protected] Publicidade Il Sole 24 Ore S.p.A, System Comunicazione Pubblicitaria, Via Monte Rosa, 91, 20149 Milano, [email protected] número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016 L’OSSERVATORE ROMANO página 3 Na vigília para enxugar as lágrimas o Papa explicou que as mais amargas são causadas pela maldade humana Oceano de desolação Jesus é o antídoto contra a indiferença pelo sofrimento dos irmãos «Quantas lágrimas são derramadas em cada instante no mundo; uma diferente da outra; e, juntas, formam como que um oceano de desolação, que invoca piedade, compaixão e consolação», observou o Papa Francisco durante a vigília de oração para enxugar as lágrimas, presidida na basílica de São Pedro no final da tarde de 5 de maio, como iniciativa jubilar na solenidade da Ascensão. O Pontífice pronunciou a homilia depois da apresentação de alguns testemunhos de dor e sofrimento. Amados irmãos e irmãs! Na sequência dos testemunhos que escutamos e à luz da Palavra do Senhor que clarifica a nossa situação de sofrimento, comecemos por invocar a presença do Espírito Santo, para que venha entre nós. Seja Ele quem ilumina a nossa mente, quem encontra as palavras certas e capazes de proporcionar conforto; seja Ele quem abre o nosso coração, para ter a certeza da presença de Deus que não nos abandona na provação. O Senhor Jesus prometeu aos seus discípulos que nunca os deixaria sozinhos: em cada situação da vida, estaria junto deles com o envio do Espírito Consolador (cf. Jo 14, 26) que havia de os ajudar, sustentar e confortar. Nos momentos de tristeza, na tribulação da doença, na angústia da perseguição e na desolação do luto, cada um de nós procura uma palavra de consolação. Temos intensa necessidade de alguém que esteja ao nosso lado e sinta compaixão por nós. Experimentamos o que significa estar desorientados, confundidos, feridos profundamente como nunca tínhamos pensado que jamais nos aconteceria. Incertos, olhamos em redor para ver se encontramos alguém que possa realmente compreender a nossa dor. A mente enche-se de interrogações, mas as respostas não chegam. A razão, sozinha, não é capaz de iluminar o nosso íntimo, compreender a dor que sentimos e dar a resposta que esperamos. Nestes momentos, temos mais necessidade das razões do coração, as únicas capazes de nos fazerem entender o mistério que envolve a nossa solidão. Quanta tristeza nos acontece vislumbrar em tantos rostos que encontramos! Quantas lágrimas são derramadas em cada instante no mundo; uma diferente da outra; e, juntas, formam como que um oceano de desolação, que invoca piedade, compaixão e consolação. As mais amargas são as lágrimas causadas pela maldade humana: as lágrimas de quem viu arrancar-lhe violentamente uma pessoa querida; lágrimas de avós, de mães e pais, de crianças... Há olhos que muitas vezes param fixos no pôr do sol e têm dificuldade em ver a alvorada de um dia novo. Precisamos de misericórdia, da consolação que vem do Senhor. Todos nós precisamos dela; é a nossa pobreza, mas também a nossa grandeza: invocar a consolação de Deus, que, com a sua ternura, vem enxu- gar as lágrimas do nosso rosto (cf. Is 25, 8; Ap 7, 17; 21, 4). Nesta nossa dor, não estamos sozinhos. Também Jesus sabe o que significa chorar pela perda de uma pessoa amada. Uma das páginas mais comovedoras do Evangelho é esta: quando Jesus vê Maria a chorar pela morte do irmão Lázaro, também Ele não conseguiu conter as lágrimas. Emocionou-se profundamente e desatou a chorar (cf. Jo 11, 3335). Com esta descrição, o evangelista João quer mostrar como Jesus participa na tristeza dos seus amigos e solidariza com o seu desânimo. As lágrimas de Jesus baralharam muitos teólogos ao longo dos séculos, mas sobretudo lavaram tantas almas, aliviaram tantas feridas! Também Jesus experimentou, em si mesmo, o medo do sofrimento e da morte, a deceção e o desconforto pela traição de Judas e de Pedro, a dor pela morte do amigo Lázaro. Jesus «não abandona aqueles que ama» (Agostinho, In evangelium Johannis 49, 5). Se Deus chorou, também eu posso chorar, ciente de que sou compreendido. O pranto de Jesus é o antídoto contra a indiferença face ao sofrimento dos meus irmãos. Aquele pranto ensiname a assumir a dor dos outros, a tornar-me participante das dificuldades e do sofrimento de quantos vivem nas situações mais dolorosas. Comove-me para me fazer perceber a tristeza e o desespero de quantos viram até roubar-lhes o corpo dos seus entes queridos, e já não têm sequer um lugar onde possam encontrar consolação. O pranto de Jesus não pode ficar sem resposta por parte de quem acredita n’Ele. Como Ele consola, assim somos chamados nós a consolar. No momento do pavor, da comoção e do pranto, surge no coração de Cristo a oração ao Pai. A oração é o verdadeiro remédio para o nosso sofrimento. Na oração, também nós podemos sentir a presença de Deus ao nosso lado. A ternura do seu olhar consola-nos, a força da sua palavra sustenta-nos, incutindo esperança. Junto do túmulo de Lázaro, Jesus rezou dizendo: «Pai, dou-te graças por me teres atendido. Eu bem sei que sempre me atendes» (Jo 11, 41-42). Precisamos de ter esta certeza: o Pai escuta-nos e vem em nosso auxílio. O amor de Deus, derramado nos nossos corações, permitenos dizer que, quando se ama, nada e ninguém poderá jamais separarnos das pessoas que amamos. Assim no-lo recorda, com palavras de grande consolação, o apóstolo Paulo: «Quem poderá separar-nos do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, o perigo, a espada? (...) Mas em tudo isso saímos mais do que vencedores, graças Àquele que nos amou. Estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem a altura nem o abismo, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus que está em Cristo Jesus, Senhor nosso» (Rm 8, 35.37-39). A força do amor transforma o sofrimento na certeza da vitória de Cristo, e da nossa vitória com Ele, e na esperança de que um dia estaremos juntos de novo e contemplaremos para sempre o rosto da Santíssima Trindade, fonte eterna de vida e de amor. Junto de cada cruz, está sempre a Mãe de Jesus. Com o seu manto, Ela enxuga as nossas lágrimas. Com a sua mão, faz-nos levantar e acompanha-nos pelo caminho da esperança! Três lâmpadas Uma família marcada pelo drama de um filho suicida, um refugiado político de origem paquistanesa, jornalista católico, ameaçado de morte e obrigado a abandonar o país e a refugiar-se na Itália com os seus entes queridos, e dois gémeos, um dos quais se converteu e depois transmitiu ao outro o estímulo para mudar a vida. Foram os três testemunhos que caracterizaram a vigília de oração para enxugar as lágrimas, presidida pelo Papa Francisco, a 5 de maio, na basílica de São Pedro. Um encontro importante no calendário do ano santo da misericórdia, que se pode definir como o coração do jubileu, pela mensagem de solidariedade e de proximidade que transmitiu a quantos estão feridos no seu íntimo. Como as histórias narradas pelas três testemunhas, que representam a ponta do iceberg do mundo do sofrimento, da dor, da marginalização e de tudo o que pode provocar o pranto num ser humano. Narrações às vezes dramáticas, mas nas quais se insere a descoberta ou a redescoberta de Cristo como uma âncora de salvação. A consolar tantas pessoas aflitas, a presença de Maria, simbolicamente representada pela imagem e pelo relicário de Nossa Senhora das lágrimas de Siracusa, exposto à veneração dos fiéis, colocado num dos lados do altar da Confissão. Significativamente depois de cada testemunho depuseram uma lâmpada acesa aos pés da imagem da Virgem. Para envolver os fiéis, depois da leitura do evangelho de Mateus e da homilia do Papa, alguns voluntários passaram pelas naves da basílica retirando os bilhetinhos nos quais cada um escrevera as próprias invocações que foram postas aos pés da imagem mariana e idealmente unidas às intenções da oração universal por todas as situações de sofrimento físico ou espiritual. Em particular, rezou-se pelos cristãos perseguidos, pelas pessoas em perigo de vida, torturadas, escravizadas ou submetidas a experimentos médicos, vítimas de guerra, de terrorismo e de violência, pelas crianças abusadas ou pelos jovens que não tiveram infância, por quantos sofrem no físico por uma doença grave, pelas pessoas deficientes e pelas suas famílias. Sem esquecer quantos foram acusados injustamente, os inocentes, os presos, os que sofreram injustiças, os abandonados, deprimidos e desesperados, os angustiados e desanimados, os oprimidos por diversas dependências. Não podia falatr a oração pelas famílias que perderam filhos antes ou depois do nascimento ou que choram um falecido, pelas pessoas separadas das suas famílias e dos seus entes queridos, por quem perdeu a casa, a pátria, o trabalho e a família por várias causas. Depois do canto do Pai-Nosso, o Papa Francisco entregou a dez pessoas que passaram por experiências marcadas pelo sofrimento, como símbolo de conforto e esperança, a imagem do Agnus Dei, benzida por ele. página 4 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19 Por ocasião do dia mundial das comunicações sociais Encontro fecundo DARIO ED OARD O VIGANÒ o ano santo extraordinário o Papa Francisco traça com a mensagem Comunicação e misericórdia: um encontro fecundo uma rota imprescindível para o mundo da comunicação. O sistema dos mass media está chamado a não excluir ninguém, a não guetizar, mas antes a sintonizar-se com os canais justos para acolher e alargar os horizontes, para construir pontes e não para erguer muros como defesa de outras pessoas consideradas um problema e não um recurso. «Muitos profissionais, formadores de opinião, meios de comunicação e centros de poder estão localizados [...] em áreas urbanas isoladas, sem ter contacto direto com os seus problemas. […] Esta falta de contacto físico e de encontro […] ajuda a cauterizar a consciência e a ignorar parte da realidade», lê-se na Laudato si'. Os frequentadores da mídia estão convidados a usar palavras e ações que ajudem a evitar o círculo vicioso da condenação e da vingança, a quebrar as correntes que aprisionam indivíduos e nações. Com efeito, a palavra do cristão tem como objetivo a comunhão e o cancelamento do tom perentório da «excomunhão», convidando a pôr-se à escuta do grito de ajuda que se eleva da humanidade. A este propósito o Papa admoestanos: «ouvir nunca é fácil. Por vezes é mais cómodo fingir-se surdo». Com a eficácia das imagens, o Pontífice convida-nos a deter o processo de aviltamento das palavras, o nominalismo típico da nossa cultura, porque as pessoas estão cansadas de palavras que não se encarnam nesta história maravilhosa e atormentada. Comprometamo-nos a restituir à palavra — sobretudo à da pregação — a sua força expressiva, o fogo que a torna viva e dá calor e sabor humano ao anúncio do Evangelho. Talvez precisemos de descobrir de novo uma comunicação que estimule a criatividade, favoreça a compreensão e enriqueça a convivência entre pessoas e culturas diversas, convictos de que não é a tecnologia que determina a autenticidade das mensagens, mas o coração do homem. Portanto, o compromisso de todos deveria ser orientado para escolher com esmero palavras e gestos a fim de superar as divergências, medicar as feridas e restabelecer relações no sinal do perdão, tornando-nos embaixadores de concórdia. Tecer a trama de uma «diplomacia da misericórdia» significa, para o Papa, nunca considerar nada perdido na relação, não permanecer prisioneiro nas cavidades obscuras de antigas hostilidades. Equivale, ao contrário, a empreender o caminho da misericórdia, reconhecer as próprias responsabilidades, pedir perdão e mostrar compaixão também em relação a quem nos fez mal. Uma comunicação que continua a discriminar entre «vencedores» e «vencidos» debilita a dignidade das pessoas e contribui para criar vagas de marginalização, sobre as quais se erige o orgulho soberbo do triunfo. Ao contrário, que haja transparência N do desejo e da vontade de mitigar os tormentos da vida, uma comunicação capaz de oferecer calor a quantos conheceram só o gelo do juízo ou da rejeição. «A linguagem áspera e bélica da divisão não fica bem nos lábios do Pastor, não tem direito de cidadania no seu coração e, mesmo que pareça por um momento garantir uma hegemonia, unicamente o fascínio duradouro da bondade e do amor permanece deveras convincente», disse Francisco encontrando a 23 de setembro passado os bispos norte-americanos. Portanto, se a comunicação tem uma relevância «política», ela não pode ser subtraída ao papel de tecedora de comunhão e construtora de cidadania. Nesta perspetiva, o reconhecimento da rede como lugar de «comunicação plenamente humana» por parte do Pontífice, abre-nos o caminho rumo à «proximidade», também digital. Estamos convidados a descobrir modalidades ainda inex- ploradas para nos aproximarmos das pessoas, inclinar-nos sobre os seus sofrimentos. Com palavras de Francisco «num mundo dividido, fragmentado, polarizado, comunicar com misericórdia significa contribuir para uma proximidade boa, livre e solidária entre os filhos de Deus e irmãos em humanidade», frequentadores cada vez mais assíduos dos portais, que nos pedem uma presença alimentada por um suplemento de alma e coração. No dvd sobre o evangelho de Lucas distribuído aos participantes no jubileu dos jovens Jesus em quinze línguas Ver Jesus no seu ambiente da Galileia, observá-lo no decorrer do dia a dia na casa de Nazaré. Vê-lo quando ensina e chama os apóstolos para o seguir, enquanto cura os enfermos e faz milagres. Sobretudo, reconhecêlo como Salvador, aquele que anuncia a misericórdia do Pai. Esta é a oportunidade oferecida pelo dvd Jesus. The Gospel according to St. Luke («Jesus segundo o Evangelho de Lucas») distribuído em 120.000 cópias aos participantes no jubileu dos jovens celebrado no domingo 24 de abril na praça de São Pedro. O dvd, que contém realmente um filme sobre Jesus inspirado na narração de Lucas, exigiu um grande es- O segredo dum sucesso Dirigido pelo britânico John Krish e pelo australiano Peter Sykes, ambos provenientes do cinema de género, Jesus (The Jesus Film), é um filme de 1979 tirado do Evangelho de são Lucas. Não obteve um sucesso particular no momento do seu lançamento, mas nos anos seguintes alcançou uma gradual, mas no total, grande difusão, a ponto de ser dobrado em muitas línguas, mesmo não estando isento de alguns limites evidentes; aliás, graças precisamente a alguns destes limites. A produção americana, apesar de ser bastante simples, garante uma confecção sólida e profissional. O que falta ao filme na verdade é uma autêntica construção dramatúrgica. Mas provavelmente este é o segredo do insuspeitável sucesso. Com efeito, a palavra evangélica chega ao espectador sem mediações nem superestruturas artísticas, de modo que apoia a intenção declaradamente divulgadora e didática da obra que, não por acaso, se abre com a insólita frase: «Um documentário tirado do evangelho de Lucas». Características que, geralmente, são apreciadas pelo amplo público do pequeno écran, contexto decididamente apropriado para um filme como este e, sobretudo, ideal para garantir a correta difusão. Tudo isto não contradiz que as interpretações dos atores são convincentes e sentidas, começando pela do Messias oferecida pelo britânico Brian Deacon. (emilio ranzato) forço editorial se considerarmos que o vídeo está dobrado em 15 línguas: árabe, arménio, cantonês, cebuano, inglês, francês, alemão, indonésio, italiano, mandarim, polaco, português, espanhol, tagalog e ucraniano. A iniciativa foi promovida pelas fundações Ramón Pané, com o seu presidente, o argentino Ricardo Grzona, e Jesus film project, com Erick Schenkel, diretor executivo, coadjuvado por António Cabrera, e o site Internet www.cristonautas.com em colaboração com o Pontifício conselho para a promoção da nova evangelização. Na introdução o cardeal Oscar Rodríguez Maradiaga dirige-se aos jovens, convidando-os a prestar atenção sobretudo ao episódio em que se vê Jesus, durante a sua adolescência, «falar com os sacerdotes sobre Deus enquanto todos estavam admirados com aquilo que ele dizia (Lucas 2, 47). Sem dúvida, também a vossa vida tem coisas bonitas que podem surpreender o mundo inteiro, inclusive Deus». O vídeo, explica na apresentação o arcebispo Rino Fisichella, presidente do dicastério para a nova evangelização, «visa levar a história de Jesus aos jovens sedentos de Deus. Através das suas imagens encontrarão Cristo, o rosto misericordioso do Pai». Para ir ao encontro das novas gerações, foi também preparada uma app gratuita: Jesusfilmedia que permite aceder ao vídeo e vê-lo nas 1.400 línguas em que até agora foi traduzido, tornando este filme o mais traduzido (e provavelmente o mais visto) na história. O projeto de rodar um filme sobre o Evangelho de Lucas remonta ao final dos anos setenta. O objetivo era fazer falar Jesus na língua do espetador, para o tornar familiar, alcançando assim um vastíssimo público. O filme foi distribuído em milhares de paróquias, instituições culturais e caritativas, e foi visto por um número incalculável de pessoas. Nesta tarefa de difusão distinguiu-se a Fundação Ramón Pané, que há vinte anos está comprometida no apoio à evangelização e à missão, através de congressos, laboratórios, retiros, conferências, cursos on line, software e aplicações para pc, smarthphone e tablet. A fundação Pané oferece um serviço gratuito todas as semanas aos utentes da rede através de dois sites (www.fundacionpane.com e www.cristonautas.com), oferecendo material de estudo e de aprofundamento para a reflexão e a oração pessoal para adultos, jovens e crianças. (nicola gori) L’OSSERVATORE ROMANO número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016 Desde que Jesus subiu ao céu, os homens de todas as cidades, até «das mais violentas», podem «elevar o olhar com esperança», recordou o Papa no Regina caeli recitado na praça de São Pedro no domingo 8 de maio, dia em que na Itália e noutros países se celebrava a solenidade da Ascensão do Senhor. Queridos irmãos e irmãs, bom dia! Hoje, na Itália e noutros países, celebra-se a Ascensão de Jesus ao céu, ocorrida quarenta dias depois da Páscoa. Contemplamos o mistério de Jesus que deixa o nosso espaço terreno para entrar na plenitude da glória de Deus, levando consigo a nossa humanidade. Isto é, nós, a nossa humanidade entra pela primeira vez no céu. O Evangelho de Lucas mostra-nos a reação dos discípulos diante do Senhor que «se separou deles e foi arrebatado ao céu» (24, 51). Não sentiram dor nem perplexidade, mas «depois de o terem adorado, voltaram para Jerusalém com grande júbilo» (v. 52). É o regresso de quem já não teme a cidade que rejeitou o Mestre, que presenciou a traição de Judas e a negação de Pedro, viu a dispersão dos discí- Regina caeli na Ascensão do Senhor Sob o mesmo céu Uma ave-maria pelas mães pulos e a violência de um poder que se sentia ameaçado. A partir daquele dia para os Apóstolos e para cada discípulo de Cristo foi possível viver em Jerusalém e em todas as cidades do mundo, inclusive naquelas mais atribuladas pela injustiça e violência, porque acima de cada cidade há o mesmo céu e cada habitante pode erguer os olhos com esperança. Jesus, Deus, é homem verdadeiro, com o seu corpo de homem no céu! E esta é a nossa esperança, é ainda nossa, e sentimonos firmes nesta esperança se olharmos para o céu. Neste céu reside o Deus que se revelou tão próximo que até assumiu o rosto de um homem, Jesus de Nazaré. Ele permanece sempre o Deusconnosco — recordemos isto: Emanuel, Deus connosco — e não nos deixa sós! Podemos olhar para o al- to e reconhecer o nosso futuro. Na Ascensão de Jesus, o Crucificado Ressuscitado, há a promessa da nossa participação na plenitude de vida junto de Deus. Antes de se separar dos seus amigos, Jesus, referindo-se ao evento da sua morte e ressurreição, disseralhes: «Disto sois testemunhas» (v. 48). Isto é os discípulos, os apóstolos são testemunhas da morte e da ressurreição de Cristo, naquele dia, também da Ascensão de Cristo. Com efeito, depois de ter visto o seu Senhor subir ao céu, os discípulos voltaram à cidade como testemunhas que com alegria anunciam a todos a vida nova que vem do Crucificado Ressuscitado, em cujo nome «se prega a penitência e a remissão dos pecados a todas as nações» (n. 47). Este é o testemunho — oferecido não só com palavras mas também com a Francisco convidou a servir os necessitados sem procurar o próprio prestígio Ao encontro dos pobres de Roma vida diária — o testemunho que todos os domingos deveria sair das nossas igrejas para entrar durante a semana nas casas, nos escritórios, na escola, nos lugares de encontro e de divertimento, nos hospitais, nas prisões, nas casas para idosos, nos locais cheios de imigrantes, nas periferias da cidade... Devemos oferecer este testemunho todas as semanas: Cristo está connosco; Jesus subiu ao céu, está connosco; Cristo é vivo! Jesus garantiu que neste anúncio e testemunho seremos «revestidos de poder que vem do alto» (v. 49), ou seja, com a força do Espírito Santo. Eis o segredo desta missão: a presença entre nós do Senhor ressuscitado, que com o dom do Espírito continua a abrir a nossa mente e o nosso coração, para anunciar o seu amor e a sua misericórdia também nos âmbitos mais refratários das nossas cidades. O Espírito Santo é o verdadeiro artífice do multiforme testemunho que a Igreja e cada batizado oferece no mundo. Portanto, nunca podemos descuidar o recolhimento na oração para louvar a Deus e invocar o dom do Espírito. Nesta semana, que nos leva à festa do Pentecostes, permaneçamos espiritualmente no Cenáculo, junto com a Virgem Maria, para receber o Espírito Santo. Façamo-lo inclusive agora, em comunhão com os fiéis reunidos no santuário de Pompeia para a tradicional Súplica. No final da oração mariana, depois de ter falado do Dia mundial das comunicações sociais, o Pontífice saudou alguns grupos presentes. «Ir ao encontro dos necessitados» levando-lhes «a visita do Senhor», a exemplo de Maria: foi a tarefa indicada pelo Papa aos sócios do círculo de São Pedro, recebidos em audiência na manhã de 9 de maio, na sala Clementina. Estimados sócios do Círculo de São Pedro! Saúdo carinhosamente todos vós e agradeço ao vosso Presidente-Geral, Duque Leopoldo Torlonia, as suas amáveis palavras. Manifesto a cada um de vós o meu apreço por aquilo que levais a cabo todos os dias ao serviço das camadas mais frágeis da população da nossa cidade. A vossa Associação, inserida na realidade eclesial da diocese de Roma, constitui a expressão de uma Igreja «em saída»: uma Igreja que caminha para procurar, visitar, encontrar, escutar, compartilhar e estar ao lado das pessoas mais pobres. A cada um de vós é pedido não simplesmente que vá ao encontro dos mais necessitados, mas que o faça levando Jesus. Tratta-se de ir como discípulos, como amigos do Senhor; tratase de compartilhar a sua palavra, a do Evangelho, de repetir os seus gestos de perdão, de amor e de dom, de não procurar o próprio prestígio, mas o bem do próximo. Tendes diante de vós o exemplo de Nossa Senhora, a quem rezamos com uma devoção particular durante este mês de maio. Como Ela, também vós não vos canseis de «partir», de ir à pressa, para encontrar as pessoas e para lhes levar a visita de Deus (cf. Lc 1, 39). Ela é portadora da visita de Deus, porque vive em profunda comunhão com Ele. «Bem-Aventurada é Aquela que acreditou!» (Lc 1, 45), diz-lhe Isabel. Maria é o ícone da fé. Só na fé podemos levar Jesus e não nós mesmos. Neste Ano Santo da Misericórdia, enquanto nos esforçamos por percorrer o caminho das obras de misericórdia, somos chamados a renovar-nos na fé. Para levar a visita do Senhor a quantos sofrem no corpo e no espírito, devemos cultivar a fé, aquela fé que nas- página 5 ce da escuta da Palavra de Deus e aspira por uma profunda comunhão com Jesus. Encorajo-vos a dar continuidade ao vosso testemunho do Evangelho da caridade, a ser cada vez mais sinal e instrumento da ternura de Deus para cada pessoa, de maneira especial para as mais frágeis e descartadas. Agradeço-vos também o Óbolo de São Pedro, que angariais em todas as igrejas como sinal da vossa participação na solicitude do Bispo de Roma pelas formas de pobreza desta cidade. A vossa benemérita atividade caritativa seja corroborada pela oração, para encontrar no Coração de Cristo o amor que haveis de oferecer aos irmãos. Confio todos vós, os vossos familiares e o vosso compromisso apostólico à proteção da Virgem Santa, a Salus populi Romani, e à intercessão de são Pedro e de são Paulo. Peço-vos que apoieis o meu ministério sobretudo com a oração, enquanto vos abençoo de todo o coração. Hoje comemora-se o 50º Dia mundial das Comunicações Sociais, desejada pelo Concílio Vaticano II. Com efeito, os padres conciliares, refletindo sobre a Igreja do mundo contemporâneo, compreenderam a importância crucial das comunicações, que «podem lançar pontes entre as pessoas, as famílias, os grupos sociais, os povos. Tanto no ambiente físico como no digital» (cf. Mensagem de 2016). Dirijo a todos os agentes da comunicação uma saudação cordial e faço votos para que o nosso modo de comunicar na Igreja tenha sempre um claro estilo evangélico, que una a verdade e a misericórdia. Saúdo os participantes na Marcha pela Vida, os amigos da Obra do Padre Folci e do Pré-seminário São Pio X, os Escoteiros da Europa de Roma Oeste e Roma Sul, e os numerosos crismandos da Diocese de Génova. Sois rumorosos, genoveses! Hoje celebra-se em muitos países o dia das mães: recordemos com gratidão e carinho todas as mães — as que estão aqui na praça, as nossas mães que estão entre nós e as que já foram para o céu — confiando-as a Maria, a mãe de Jesus. E juntos, por todas as mães, rezemos a Ave-Maria. Desejo a todos um bom domingo. Por favor, não vos esqueçais de rezar por mim. Bom almoço e até à vista! página 6 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19 Uma vista da colina das cruzes em Šiauliai Face às mais de quatrocentas mil cruzes da colina de Šiauliai, lugar de peregrinação para todos os lituanos e coração da nação inteira, o cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado, pronunciou as primeiras palavras públicas da sua visita oficial às Repúblicas da Lituânia, Estónia e Letónia, que tem lugar de 7 a 13 de maio. Durante a missa celebrada no convento de Kryžių Kalnas, o purpurado recordou a «memorável visita» de João Paulo II em 1993 e, reconsiderando que o Papa Wojtyła definiu o santuário um «lugar de esperança, amor e sacrifício», falou da «importância da oração» e da «responsabilidade de partilhar a fé». O Secretário chegou durante a manhã a Vilnius — onde no dia anterior foi inaugurado o Congresso nacional da misericórdia, um dos eventos centrais do ano jubilar dos católicos na Lituânia — e deslocou-se antes de mais ao palácio do Governo para um encontro com o primeiro ministro Algirdas Butkevičius. Após cerca de meia hora de colóquio, o cardeal regressou ao aeroporto da capital, indo em seguida a Šiauliai, onde saudou os funcionários da Otan em missão de polícia aérea nos Estados bálticos e celebrou a missa no convento da colina das Cruzes. O que «tem a ver a misericórdia com a promoção da paz?». E o ano jubilar, inaugurado significativamente em Bangui no dia 29 de novembro passado, o que tem «para dizer ao mundo da política e da diplomacia?». Convidado em Vilnius a falar da diplomacia da Santa Sé ao serviço da paz, o cardeal Pietro Parolin chamou a atenção da política e da diplomacia internacionais para que não sejam míopes nem sacrifiquem à consecução de meros resultados transitórios a construção de um mundo verdadeiramente pacificado. Na conferência que teve lugar na igreja dos Santos João Batista e João Apóstolo, na manhã de 9 de maio — segundo dia da sua visita à Lituânia — o secretário de Estado realçou que os processos de reconciliação entre povos e nações exigem «tempo e esforço paciente». Por isso, «em vez de trabalhar a curto prazo, para alcançar resultados imediatos, a política e a diplomacia empreendam processos de construção da pessoa e da cultura, visando a verdadeira realização humana»: não é de uma diplomacia da conveniência que o mundo de hoje precisa, mas de uma «diplomacia de misericórdia», capaz de enfrentar «a resignação, o interesse pessoal, a apatia e a indiferença», e cultivar «a cultura da solidariedade, da misericórdia e da compaixão». Por isso, acrescentou o purpurado, o jubileu pode dar resultados concretos não só para a vida das pessoas «mas também na vida social e política». Com efeito, a lógica da misericórdia deveria «modelar as relações internacionais» e levar a «um esforço comum para superar e mostrar preocupação pelos membros mais vulneráveis da sociedade, como os prisioneiros, os migrantes, os desempregados e os enfermos». No sulco da mensagem do Papa para o dia mundial da paz de 2016, o secre- Visita oficial do cardeal Pietro Parolin aos Estados bálticos É preciso construir pontes tário de Estado renovou um apelo aos responsáveis das nações: «Abster-se de levar os povos a conflitos e guerras, perdoar ou gerir de modo sustentável a dívida internacional dos países pobres, evitando a imposição de condições inaceitáveis ditadas por pressões ideológicas». Uma evocação significativa também à luz dos seus gestos na mesma manhã, ou seja, a visita ao memorial das vítimas do ataque do Exército vermelho a 13 de janeiro de 1991, e depois ao museu dedicado à história da resistência lituana e das violências do regime soviético. «A misericórdia — disse Parolin concluindo — tem muito a oferecer à diplomacia internacional na busca da paz», favorecendo a construção de uma mentalidade capaz de evitar «juízos fáceis» e «construir pontes». O tema da misericórdia serviu de fio condutor na visita do secretário de Estado à Lituânia. Depois de ter visitado a capela de Nossa Senhora da Porta da Aurora, a 8 de maio o purpurado participou na procissão que, da sede do Parlamento, chegou à catedral de Vilnius. Ali celebrou a missa conclusiva do congresso nacional da misericórdia, inaugurado poucos dias antes. Na solenidade da Ascensão do Senhor, o cardeal Parolin recordou que para fazer nosso o mandato de Jesus aos apóstolos, somos chamados a «proclamar a misericórdia de Deus» e a testemunhá-la. Uma ação de graças a Deus «pelo fiel testemunho de sacerdotes, religiosos e leigos» da Estónia «diante das perseguições, deportações e obstáculos de todos os tipos» impostos «durante os anos de ocupação e de ditadura»: com esta intenção o cardeal Parolin celebrou a 10 de maio a missa na catedral de Tallinn. Proveniente da Lituânia, o secretário de Estado chegou à capital da Estónia na noite de 9 de maio, acompanhado pelo núncio apostólico Pedro López Quintana. No dia seguinte, depois de ter deposto uma coroa no monumento aos mortos na guerra de independência, almoçou com o primeiro-ministro Taavi Rõivas. Em seguida, visitou o palácio do Parlamento («Riigikogu»), onde foi recebido pelo presidente da assembleia Eiki Nestor, encontrandose com a ministra dos Negócios Estrangeiros Marina Kaljurand e com o presidente da República Hendrik Ilves. Após as reuniões protocolares, seguiram-se os momentos de culto: a oração ecuménica com os líderes das várias confissões cristãs presentes em Tallinn e a missa concelebrada pelo bispo Philippe Jourdan, administrador apostólico da Estónia, na catedral católica intitulada aos santos Pedro e Paulo. E inspirando-se precisamente nas palavras de Paulo aos anciãos de Éfeso — propostas pelo trecho litúrgico dos Atos dos Apóstolos (20, 17-27) — o cardeal Parolin relacionou «o testemunho de fidelidade aos sofrimentos» sobre os quais fala o apóstolo das nações, aos oferecidos pela comunidade cristã da Estónia durante os anos obscuros do segundo conflito mundial e da guerra fria. Padecimentos que só terminaram há vinte e cinco anos quando, em 1991, o país recuperou a independência. «No mesmo ano — recordou o purpurado — foram também restabelecidas as relações diplomáticas entre a Santa Sé e a Estónia, interrompidas em 1940». João Paulo II visitou a nação em 1993. Não obstante tudo, também na situação atual não faltam problemas: «Hoje a vossa terra é livre. Todavia, a chamada à fidelidade e ao testemunho corajoso não é menos relevante. Por causa da secularização difundida, da independência religiosa e, às vezes, da hostilidade mal dissimulada em relação aos credos religiosos, que atingem muitas regiões da Europa, é ainda mais urgente a necessidade da nova evangelização». Um convite dirigido em particular à comunidade católica que na Estónia é minoria. «Por conseguinte, é importante — frisou — que cada membro faça a sua parte na difusão do Evangelho» na sociedade. E a este propósito agradeceu «aos sacerdotes, consagrados, consagradas e fiéis leigos o compromisso na Igreja local e o que fazem para promover a missão da Igreja universal, da qual beneficia toda a sociedade». Por fim, o cardeal Parolin realçou que a obra de evangelização tem também uma conotação ecuménica. «Isto é particularmente verdadeiro neste país — explicou — que tem uma forte tradição ortodoxa e luterana. Sei que existe um alto nível de contacto e colaboração entre os fiéis das várias denominações e animovos a continuar a rezar juntos, a promover o diálogo e a cooperar em várias iniciativas para difundir a fé e promover o bem comum, no espírito do Evangelho». De resto, concluiu, «a divisão dos cristãos é contrária à vontade de Cristo. No nosso compromisso as suas palavras devem inspirar os nossos pensamentos e ações para irmos em frente até quando parece que não progredimos». O futuro da Europa e a atual crise de valores do continente, o fenómeno migratório com todas as suas repercussões sobre a sociedade e a situação da Ucrânia, onde o cardeal Pietro Parolin irá no próximo mês para levar a solidariedade do Papa a quantos sofrem: são «as três questões de particular interesse para a Santa Sé neste momento histórico», sobre as quais o secretário de Estado falou na Universidade estónia de Tartu. Convidado pelo ateneu no âmbito da sua viagem aos países bálticos, o purpurado pronunciou no dia 11 de maio uma conferência sobre o tema: «A Santa Sé e as relações internacionais». Depois de uma visão geral do tema, o relator entrou no ponto central da atualidade e refletiu sobretudo acerca da questão europeia, tratada pelo Papa Francisco em várias ocasiões, em particular em Estrasburgo no dia 25 de novembro de 2014, quando «frisou que a busca da unidade e da paz através da promoção dos direitos humanos, da democracia e do estado de direito, requer uma referência constante ao rico património» do velho continente. Para ilustrar este ponto, prosseguiu Parolin, o Pontífice usou uma imagem sugestiva do poeta italiano Clemente Rebora: um choupo, cujos ramos que alcançam o céu, são sacudidos pelo vento, enquanto o tronco permanece plantado em profundidade, através das raízes. Precisamente como a Europa que na sua história alcançou grandes alturas, apostando em novos e ambiciosos objetivos, impelida por uma sede insaciável de conhecimento. Mas o desenvolvimento do pensamento e da cultura e as descobertas científicas devem-se à solidez do tronco e à profundidade das raízes que nutrem a planta. Mas se as raízes se perdem, o tronco murcha lentamente. Eis o paradoxo que para progredir rumo ao futuro precisamos do passado, não podemos fugir do presente e dos seus desafios. Em particular, observou o secretário de Estado, a Europa precisa de superar o individualismo, que leva ao empobrecimento humano e à aridez cultural, por causa dos quais, como diz o Papa, «possuímos um excesso de coisas inúteis, mas já não temos a capacidade de construir autênticas relações humanas vividas na verdade e no respeito recíproco». número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016 L’OSSERVATORE ROMANO página 7 Por uma unidade sem muros As razões da atribuição do prémio Carlos Magno nas palavras do burgomestre de Aquisgrano A Europa precisa hoje como nunca «de vozes admoestadoras» como a do Papa e precisamente «pelo vigor e clareza com que se ocupa desta tarefa» o burgomestre de Aquisgrano, Marcel Philipp, entregou a Francisco o prémio internacional Carlos Magno 2016 durante o encontro na sala régia. Uma cerimónia, reconheceu, que este ano assume «um valor extraordinário». «Nos decénios passados — observou imediatamente — o prémio foi várias vezes plataforma para impulsos destinados a favorecer a unificação da Europa», um verdadeiro «encorajamento em momentos de crise da política europeia». Hoje «a situação parece ser particularmente difícil e o termo Europa agora é pronunciado só quase em concomitância com a palavra crise». Há questões urgentes: «A que ponto estamos com o reforçamento da unidade na diversidade? Ou estamos porventura a mover-nos há tempos na direção oposta? Nas frentes da migração, da segurança e dos valores a Europa vai-se quebrantando com os egoísmos nacionais?», questionou o burgomestre sem esconder uma «preocupação profunda». «Estabelecer paz e coesão na Europa: eis a tarefa do século pelo qual muitos se comprometeram com merecimentos depois dos horrores da segunda guerra mundial» afirmou. E «o sucesso do processo de unificação é notável: setenta anos de democracia e paz tornaram-nos fortes». Precisamente «para enfrentar os desafios comuns nasceram estruturas comuns», mesmo se «hoje nos sentimos impotentes», e «cooperação económica e instituição de estruturas comuns continuam sem dúvida a revestir um papel decisivo». Acrescentam-se, prosseguiu Philipp, «as questões atinentes a uma linha comum e às ajudas nas áreas de crise do mundo, assim como no campo da migração: desenvolver soluções sobre estas frentes pressupõe contudo a existência de uma base que hoje em parte falta». Esta base «consiste na consciencialização partilhada dos valores europeus e dos ensinamentos que nos vêm da história de um continente que por séculos precipitou nas guerras». E «os valores que se trata de reconhecer e fortalecer são essencialmente valores cristãos». Segundo o burgomestre «a erosão do fundamento cultural e moral da Europa é alarmante. Deveríamos ternos apercebido disto há tempos: slogans de extrema direita e expressões de renacionalização ganham terreno no coração da sociedade, a abordagem diferente em relação aos meios de comunicação leva em muitos casos a ignorar a realidade». Além disso «o modelo de consumo da rica Europa é vergonhoso, em certos caCONTINUA NA PÁGINA 10 Intervenções durante a cerimónia É «o compromisso extraordinário» de Francisco «a favor da paz, da compreensão e da misericórdia numa sociedade europeia de valores» a razão da atribuição do prémio internacional Carlos Magno. A confirmação é dada pelo atestado oficial que, durante o encontro, foi lido por Jürgen Linden, presidente da comissão diretiva da associação que o conferiu. O Papa, explicou, «é uma voz da consciência que nos solicita a pôr o homem sempre no centro das nossas ações» e, com a sua altíssima autoridade moral dános «a coragem e a confiança para fazer novamente da Europa aquele sonho que ousámos fazer por mais de sessenta anos». Com efeito, acrescentou Linden, Francisco «recorda-nos, como admoestador e mediador, que na Europa temos a tarefa e o dever, na esteira dos ideais dos pais fundadores, de dar realização concreta aos princípios de paz e liberdade, direito e democracia, solidariedade e salvaguarda da criação». Para o presidente do Parlamento europeu, Martin Schulz «a Europa está a atravessar um período atormentado», a braços com «uma prova decisiva para a sua unidade» sobre questões decisivas como «paz, solidariedade, respeito recíproco». O Papa «argentino, filho de imigrantes italianos, olha de fora para a Europa de maneira genuína» e «remete-nos para o espírito humanista europeu», afirmou Schulz. «Na Europa fizemos nosso o compromisso a favor da dignidade humana Voz da consciência abandonando conscientemente o totalitarismo» que marcou o século XX . Precisamente daquela «página escura» os europeus foram capazes de criar «um contraprojeto extraordinário: a democracia, o Estado de direito, a liberdade de opinião e a cooperação entre povos além das fronteiras». A ponto que «a integração europeia se funda na consciência de que, quando no passado nos combatemos, houve trágicas consequências para todos, e quando permanecemos unidos todos beneficiaram». Contudo, prosseguiu o presidente do Parlamento europeu, «hoje arriscamos dissipar esta herança, porque as forças centrífugas das crises tendem a dividir-nos e não a unir-nos mais estreitamente». Pelo meio estão «os egoísmos nacionais, a renacionalização e o particularismo nacional» que «se vão expandindo». Entretanto «no respeitante aos refugiados, a Europa encontra-se diante a um desafio epocal: desde a segunda guerra mundial não se viam tantas pessoas em fuga de todo o mundo». E se «o medo é compreensível, em política é mau conselheiro» e certamente não favorece a busca de soluções. Além disso, acrescentou Schulz, «esquecendo a história, vinte e cinco anos depois da derrocada da cortina de ferro há quem pretende construir na Europa novos muros, pondo em perigo uma das maiores conquistas europeias que é a liberdade de circulação». Além do mais, «as pessoas que fogem certamente não param diante de muros ou arame farpado». «A Europa — concluiu o presidente Schulz — está a atravessar uma crise de solidariedade e os valores comuns sobre os quais se funda estão a vacilar». Mas o ensinamento do Papa Francisco «dános motivos de esperança», reconheceu o presidente do Parlamento europeu, juntamente com as tantíssimas pessoas que voluntariamente oferecem acolhimento aos refugiados, «em Lesbos e em Lampedusa ou em Mónaco», encarnando «os valores europeus de justiça, solidariedade e respeito da dignidade» e mostrando «aos refugiados e ao mundo o rosto de uma Europa humana». Um convite, precisamente como resposta aos apelos do Papa, a estar «à altura das próprias responsabilidades» face às grandes questões, sem nunca «se fechar na própria concha» foi feito também pelo presidente da Comissão europeia Jean-Claude Junker. De facto o continente deve continuar a ser «a união das forças: pela humanidade, por uma paz que começa no dia a dia», assim, «acolhendo doze refugiados», disse, o Papa «anima-nos com renovada coragem» e aos atentados terroristas «contrapôs um gesto de fraternidade lavando os pés a migrantes de confissões diversas». Francisco, acrescentou, recorda-nos também que «a construção europeia tem a vocação de ser uma obra de pacificação além dos seus confins, porque as desventuras do mundo dizem respeito também a nós: não nos devemos sujeitar à história mas ser seus artífices». Um papel forte para um futuro melhor, segundo Junker, deve ser desempenhado pelos «jovens que não conheceram a guerra e que dizem não à intolerância e sim ao nosso modo de viver juntos, unindo as suas energias». Por fim, tomou a palavra o presidente do Conselho europeu Donald Tusk, que relançou a imagem do «hospital de campo» sugerida pelo Pontífice para apresentar a Igreja. Mencionando a visita que o Papa fará à Polónia em julho, para a Jornada mundial da juventude, Tusk recordou que «ser europeu não é uma declaração geográfica ou política, mas sobretudo axiologia e metafísica» porque, num certo sentido, «a Europa é um artigo de fé». Com efeito, concluiu, «na Europa o espírito do amor e da liberdade está presente» e sê-lo-á ainda se prevalecerem «compaixão e altruísmo» juntamente com os «princípios cristãos dos direitos humanos, da liberdade civil e do respeito por cada ser humano». L’OSSERVATORE ROMANO número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016 página 8/9 Um dos desenhos entregues ao Papa pelas crianças durante a visita ao campo de refugiados de Lesbos O Papa Francisco recebeu o prémio Carlos Magno e relançou o sonho de um novo humanismo para o velho continente Que te aconteceu, Europa? vasta do que as fronteiras atuais da União e chamada a tornar-se modelo de novas sínteses e de diálogo. Com efeito, o que caracteriza o rosto da Europa não é contrapor-se aos outros, mas trazer impressos os traços de várias culturas e a beleza de vencer os confinamentos. Sem esta capacidade de integração, as palavras pronunciadas outrora por Konrad Adenauer ressoarão hoje como profecia de futuro: «O futuro do Ocidente não está ameaçado tanto pela tensão política, como sobretudo pelo perigo da massificação, da uniformidade do pensamento e do sentimento; em resumo, por todo o sistema de vida, pela fuga da responsabilidade, tendo como única preocupação o próprio eu».6 A atual situação deve ser enfrentada sem egoísmos nem vedações porque ser migrante não é um delito «Que te aconteceu, Europa humanista, paladina dos direitos do homem, da democracia e da liberdade? Que te aconteceu, Europa, terra de poetas, filósofos, artistas, músicos, letrados? Que te aconteceu, Europa, mãe de povos e nações, mãe de grandes homens e mulheres que souberam defender e dar a vida pela dignidade dos seus irmãos?»: são estas as interrogações às quais o Papa Francisco deu uma resposta concreta no discurso pronunciado, ao receber o prémio Carlos Magno 2016, durante a cerimónia realizada na manhã de sexta-feira, 6 de maio, na Sala Régia do Palácio apostólico. Ilustres Hóspedes! Dou-vos as minhas cordiais boas-vindas e agradeço a vossa presença. Sinto-me particularmente agradecido aos senhores Marcel Philipp, Jürgen Linden, Martin Schulz, Jean-Claude Juncker e Donald Tusk pelas suas amáveis palavras. Desejo reiterar a minha intenção de dedicar à Europa este prestigioso Prémio com que sou honrado: com efeito não estamos a comemorar qual- Juntamente com os representantes da União europeia — o presidente do Parlamento europeu Martin Schulz, o presidente do Conselho europeu Donald Tusk e o presidente da Comissão europeia Jean-Claude Junker — participaram o rei Filipe VI de Espanha, o grão-duque Henri de Luxemburgo e o presidente lituano Dalia Grybauskaité. Estavam presentes ainda a chanceler alemã Angela Merkel e o presidente do Conselho dos ministros italiano Matteo Renzi. Em lugares reservados estavam também os cardeais Sodano, decano do Colégio cardinalício, Parolin, secretário de Estado, com os quer gesto, mas queremos aproveitar o ensejo para, juntos, almejarmos um novo e corajoso impulso a este amado Continente. A criatividade, o engenho, a capacidade de se levantar e sair dos seus limites pertencem à alma da Europa. No século passado, ela deu testemunho à humanidade de que era possível um novo começo: depois de anos de trágicos confrontos, culminados na guerra purpurados alemães Müller, Marx, Karper e Brandmüller; os arcebispos Becciu e Gallagher, respetivamente substituto da Secretaria de Estado e secretário para as Relações com os Estados; bispos que vieram da Alemanha, entre os quais o de Aquisgrano, Heinrich Mussingoff; e os monsenhores Borgia, Camilleri e Bettencourt, respetivamente assessor, subsecretário para as relações com os Estados e chefe do Protocolo da Secretaria de Estado. À saída da Sala Régia o Papa saudou também o coro da catedral de Aquisgrano que animaram a cerimónia com os seus cânticos. mais terrível de que se tem memória, surgiu — com a graça de Deus — uma novidade sem precedentes na história. As cinzas dos escombros não puderam extinguir a esperança e a busca do outro que ardiam no coração dos Pais fundadores do projeto europeu. Estes lançaram os alicerces dum baluarte de paz, dum edifício construído por Estados que se uniram, não por imposição, mas por livre escolha do bem comum, renunciando para sempre a guerrear-se. Finalmente, depois de tantas divisões, a Europa reencontrou-se a si mesma e começou a edificar a sua casa. Esta «família de povos»,1 que entretanto se foi louvavelmente ampliando, nos últimos tempos parece sentir como menos suas as paredes da casa comum distanciando-se por vezes, na sua consolidação, do luminoso projeto arquitetado pelos Pais. Aquela atmosfera de novidade e aquele desejo ardente de construir a unidade aparecem sempre mais amortecidos; nós, filhos daquele sonho, somos tentados a ceder aos nossos egoísmos, tendo em vista apenas os próprios interesses e pensando em construir recintos particulares. Estou convencido, porém, de que a resignação e o cansaço não pertencem à alma da Europa e que as próprias «dificuldades podem revelar-se, fortemente, promotoras de unidade».2 Sonho de um filho CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1 1989 a uma personalidade religiosa. Com efeito naquele ano, antecipando um pouco a queda do muro de Berlim, foi condecorado Roger Schutz, fundador e prior da comunidade de Taizé que por mais de trinta anos tinha tecido fios ecuménicos de reconciliação e de paz, superando silenciosamente até a cortina de ferro. E em 2004, de forma extraordinária, o prémio foi oferecido ao Papa Wojtyła, quase no final do longuíssimo pontificado. Com uma homenagem implícita à ação levada a cabo durante décadas também pelos seus predecessores a favor do processo de integração europeia. Dinâmica histórica sancionada no ano seguinte pela sucessão na sede romana de um Papa alemão, quase a selar a reconciliação entre Polónia e Alemanha, antecipada pelos respetivos episcopados na época do Concílio. Hoje o discurso do Pontífice é uma continuação daqueles proferidos em Estrasburgo em 2014. Com citações explícitas dos três «pais fundadores» do processo de unificação do continente que, sobre os destroços deixados pelo conflito mundial, «ousaram procurar soluções multilaterais para problemas que pouco a pouco se tornavam comuns»: Robert Schuman, Alcide De Gasperi, Konrad Adenauer. Tendo passado setenta anos daquele «novo início» depois do assustador conflito mundial, enquanto na Síria, no Médio Oriente e na África continuam a recrudescer guerras e miséria que estão a causar uma onda migratória sem precedentes, e enquanto se elevam inúteis muros e clamores de intolerância, o Papa diz que é preciso «atualizar» a ideia do continente, para que seja capaz de integrar, dialogar, gerar. Assim, à imagem de «uma Europa cansada e envelhecida», que assustada quer entrincheirar-se, Bergoglio opõe a necessidade de que o continente volte a ser uma «mãe geradora de processos», novos e positivos. Com efeito, a identidade europeia foi sempre dinâmica e ao longo do tempo soube assumir «os traços de várias culturas», recordou o primeiro Papa americano. De origens italianas, Bergoglio falou «como um filho que reencontra na mãe Europa as suas raízes de vida e de fé». Filho que hoje sonha um «novo humanismo europeu», para o renascimento de um continente que não deve abandonar as suas raízes e a sua história. E para este processo «pode e deve contribuir a Igreja»: ou seja, mulheres e homens testemunhas do Evangelho que ofereçam a sua «água pura» às «raízes da Europa». No Parlamento Europeu, tomei a liberdade de falar de Europa avó. Dizia aos eurodeputados que crescia, de diferentes partes, a impressão geral duma Europa cansada e envelhecida, não fértil e sem vitalidade, onde os grandes ideais que a inspiraram parecem ter perdido o seu fascínio; uma Europa decadente que parece ter perdido a sua capacidade geradora e criativa; uma Europa tentada mais a querer garantir e dominar espaços do que a gerar processos de inclusão e transformação; uma Europa que se vai «entrincheirando», em vez de privilegiar ações que promovam novos dinamismos na sociedade; dinamismos capazes de envolver e mobilizar todos os atores sociais (grupos e indivíduos) na busca de novas soluções para os problemas atuais, que frutifiquem em acontecimentos históricos importantes; uma Europa que, longe de proteger espaços, se torne mãe geradora de processos (cf. Exort. ap. Evangelii gaudium, 223). Que te sucedeu, Europa humanista, paladina dos direitos humanos, da democracia e da liberdade? Que te sucedeu, Europa terra de poetas, filósofos, artistas, músicos, escritores? Que te sucedeu, Europa mãe de povos e nações, mãe de grandes homens e mulheres que souberam defender e dar a vida pela dignidade dos seus irmãos? O escritor Elie Wiesel, sobrevivente dos campos nazistas de extermínio, dizia que hoje é de importância capital realizar uma «transfusão de memória». É preciso «fazer memória», distanciarse um pouco do presente para ouvir a voz dos nossos antepassados. A memória permitir-nos-á não só de evitar cometer os mesmos erros do passado (cf. Exort. ap. Evangelii gaudium, 108), mas dar-nos-á acesso também às conquistas que ajudaram os nossos povos a ultrapassar com êxito as encruzilhadas históricas que iam encontrando. A transfusão de memória liberta-nos da tendência atual, muitas vezes mais fascinante, de forjar à pressa, sobre areias movediças, resultados imediatos que poderiam produzir «ganhos políticos fáceis, rápidos e efémeros, mas que não constroem a plenitude humana» (ibid., 224). Para isso, será útil evocar os Pais fundadores da Europa. Eles souberam procurar estradas alternativas, inovadoras num contexto marcado pelas feridas de guerra. Tiveram a audácia não só de sonhar a ideia de Europa, mas ousaram transformar radicalmente os modelos que provocavam apenas violência e des- Capacidade de diálogo truição. Ousaram procurar soluções multilaterais para os problemas que pouco a pouco se iam tornando comuns. No ato que muitos reconhecem como o nascimento da primitiva comunidade europeia, disse Robert Schuman: «A Europa não se fará duma só vez, nem através duma construção de conjunto; far-se-á através de realizações concretas que criem, antes de tudo, uma solidariedade de facto».3 Precisamente agora, neste nosso mundo dilacerado e ferido, é preciso voltar àquela solidariedade de facto, à mesma generosidade concreta que se seguiu à segunda guerra mundial, porque «a paz mundial — continuava Schuman — não poderá ser salvaguardada sem esforços criativos à altura dos perigos que a ameaçam».4 Os projetos dos Pais fundadores, arautos da paz e profetas do futuro, não estão superados: inspiram-nos hoje, mais do que nunca, a construir pontes e a derrubar muros. Parecem expressar um premente convite a não contentar-se com retoques cosméticos ou compromissos tortuosos para se corrigir qualquer Tratado, mas a estabelecer corajosamente ba- ses novas, com raízes fortes; como afirmava Alcide De Gasperi, é preciso que nós «todos, igualmente animados pela preocupação do bem comum das nossas pátrias europeias, da nossa Pátria Europa», recomecemos, sem medo, um «trabalho construtivo que requer todos os nossos esforços de paciente e longa cooperação».5 Esta transfusão de memória permite inspirar-nos no passado para enfrentar corajosamente o complexo quadro multipolar dos nossos dias, aceitando com determinação o desafio de «atualizar» a ideia de Europa; uma Europa capaz de dar à luz um novo humanismo baseado sobre três capacidades: a capacidade de integrar, a capacidade de dialogar e a capacidade de gerar. Capacidade de integrar Na sua estupenda obra A ideia de Europa, Erich Przywara desafia-nos a pensar a cidade como um lugar de convivência entre vários órgãos e níveis. Estava ciente da tendência reducionista que está presente em cada tentativa de pensar e sonhar o tecido social. A bele- Alcide De Gasperi, Konrad Adenauer e Robert Schuman (1951) za, encontrada em muitas das nossas cidades, deve-se ao facto de serem capazes de conservar ao longo do tempo as diferenças de épocas, nações, estilos, perspetivas. Basta olhar o inestimável património cultural de Roma, para se confirmar uma vez mais que a riqueza e o valor dum povo se radicam precisamente no facto de saber articular todos estes níveis numa sadia convivência. Os reducionismos e todas as tentativas uniformizadoras, longe de gerar valor, condenam os nossos povos a uma pobreza cruel: a da exclusão. E a exclusão, longe de trazer grandeza, riqueza e beleza, provoca vilania, penúria e brutalidade. Longe de proporcionar nobreza ao espírito, fá-lo cair na mesquinhez. As raízes dos nossos povos, as raízes da Europa foram-se consolidando no decurso da sua história, aprendendo a integrar em sínteses sempre novas as culturas mais diversas e sem aparente ligação entre elas. A identidade europeia é, e sempre foi, uma identidade dinâmica e multicultural. A atividade política sabe que tem entre mãos este trabalho fundamental e inadiável. Sabemos que «o todo é mais do que a parte, sendo também mais do que a simples soma delas», pelo que será preciso esforçar-se por «alargar sempre o olhar para reconhecer um bem maior que trará benefícios a todos nós» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 235). Somos convidados a promover uma integração que encontra na solidariedade a forma de fazer as coisas, a forma de construir a história; uma solidariedade que nunca se pode confundir com a esmola, mas há de ser entendida como geração de oportunidades para que todos os habitantes das nossas cidades — e de muitas outras cidades — possam desenvolver a sua vida com dignidade. O tempo tem-nos ensinado que não é suficiente a mera inserção geográfica das pessoas; o desafio é uma vigorosa integração cultural. Assim a comunidade dos povos europeus poderá vencer a tentação de refugiar-se em paradigmas unilaterais e aventurar-se em «colonizações ideológicas»; em vez disso redescobrirá a amplitude da alma europeia, nascida do encontro de civilizações e povos, mais Se há uma palavra que devemos repetir, sem nunca nos cansarmos, é esta: diálogo. Somos convidados a promover uma cultura do diálogo, procurando por todos os meios abrir instâncias para o tornar possível e permitir-nos reconstruir o tecido social. A cultura do diálogo implica uma autêntica aprendizagem, uma ascese que nos ajude a reconhecer o outro como um interlocutor válido, que nos permita ver o forasteiro, o migrante, a pessoa que pertence a outra cultura como sujeito a ser ouvido, considerado e apreciado. Hoje é urgente envolvermos todos os atores sociais na promoção duma «cultura que privilegie o diálogo como forma de encontro», fomentando «a busca de consenso e de acordos mas sem a separar da preocupação por uma sociedade justa, capaz de memória e sem exclusões» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 239). A paz será duradoura na medida em que armarmos os nossos filhos com as armas do diálogo, lhes ensinarmos a boa batalha do encontro e da negociação. Desta forma, poderemos deixar-lhes em herança uma cultura que saiba delinear estratégias não de morte mas de vida, não de exclusão mas de integração. Esta cultura do diálogo, que deveria constar em todos os currículos escolares como eixo transversal das disciplinas, ajudará a incutir nas gerações jovens uma forma de resolver os conflitos diferente daquela a que os temos habituado. Hoje é urgente poder realizar alianças já não apenas militares ou económicas, mas culturais, educacionais, filosóficas, religiosas; alianças que ponham em evidência que frequentemente, por trás de muitos conflitos, está em jogo o poder de grupos económicos; alianças, capazes de defender o povo de ser manipulado para fins impróprios. Armemos o nosso povo com a cultura do diálogo e do encontro. Capacidade de gerar O diálogo, com tudo o que implica, lembra-nos que ninguém se pode limitar a ser espetador, nem mero observador. Todos, desde o menor ao maior, são parte ativa na construção duma sociedade integrada e reconciliada. Esta cultura é possível, se todos participarmos na sua elaboração e construção. A situação atual não admite meros obserCONTINUA NA PÁGINA 10 página 10 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19 Que te aconteceu, Europa? CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 8 vadores de lutas alheias; pelo contrário, é um forte apelo à responsabilidade pessoal e social. Neste sentido, têm um papel preponderante os nossos jovens. Estes não são apenas o futuro dos nossos povos, mas o presente; são aqueles que já hoje estão a forjar, com os seus sonhos, com a sua vida, o espírito europeu. Não podemos pensar no amanhã, sem lhes proporcionar uma participação real como operadores de mudança e transformação. Não podemos imaginar a Europa sem os tornar participantes e protagonistas deste sonho. Refletindo recentemente sobre este aspeto, interrogava-me: Como podemos fazer os nossos jovens participantes desta construção, quando os privamos de emprego, de trabalhos dignos que lhes permitam desenvolver-se com as suas mãos, a sua inteligência e as suas energias? Como pretendemos reconhecer-lhes o valor de protagonistas, quando não param de crescer as taxas de desemprego e subemprego de milhões de jovens europeus? Como evitar a perda dos nossos jovens, que acabam por sair para outros lugares à procura de ideais e sentido de pertença, porque aqui, na sua terra, não lhes sabemos oferecer oportunidades nem valores? «A justa distribuição dos frutos da terra e do trabalho humano não é mera filantropia. É um dever moral».7 Se quisermos imaginar diferentes as nossas sociedades, precisamos de criar postos de trabalho digno e bem remunerado, especialmente para os nossos jovens. Isto requer a busca de novos modelos económicos, mais inclusivos e equitativos, orientados não para o serviço de poucos, mas para benefício do povo e da sociedade. Isto pede-nos a passagem duma economia líquida para uma economia social. Penso, por exemplo, na economia social de mercado, encorajada pelos meus Predecessores.8 Passar duma economia que tenha em vista o rendimento e o lucro com base na especulação e empréstimo com juros, para uma economia social que invista nas pessoas criando postos de trabalho e qualificação. Devemos passar duma economia líquida, que tende a favorecer a corrupção como meio para obter lucro, para uma economia social que garanta o acesso à terra, à casa, por meio do trabalho como âmbito onde as pessoas e as comunidades possam fazer valer as suas «muitas dimensões da vida: a criatividade, a projetação do futuro, o desenvolvimento das capacidades, a exercitação dos valores, a comunicação com os outros, uma atitude de adoração. Por isso, a realidade social do mundo atual exige que, acima dos limitados interesses das empresas e duma discutível racionalidade económica, “se continue a perseguir como prioritário o objetivo do acesso ao trabalho para todos”9» (Enc. Laudato si’, 127). Se quisermos apontar para um futuro que seja digno, se quisermos um futuro de paz para as nossas sociedades, só o poderemos alcançar apostando na verdadeira inclusão: «a inclusão que dá o trabalho digno, livre, criativo, participativo e solidário».10 Esta passagem (duma economia líquida para uma economia social) não só criará novas perspetivas e concretas oportunidades de integração e inclusão, mas dar-nos-á novamente a capacidade de sonhar aquele humanismo, cujo berço e fonte é a Europa. Para o renascimento duma Europa cansada mas ainda rica de energias e potencialidades, pode e deve contribuir a Igreja. A sua tarefa coincide com a sua missão: o anúncio do Evangelho, que hoje, mais do que nunca, se traduz sobretudo em sair ao encontro das feridas do homem, levando a presença forte e simples de Jesus, a sua misericórdia consoladora e encorajadora. Deus quer habitar entre os homens, mas só o pode fazer através de homens e mulhe- Por uma unidade sem muros CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 7 sos destruidor». E «de repente, eis que a globalização bate à nossa porta: tem um rosto, e é diferente de quanto esperávamos apenas há alguns meses; olha para nós com um olhar que fala de medo, êxodo, pobreza, fome, doenças, guerra e morte. É o rosto de um ser humano. São os rostos de muitos seres humanos». Mas «desviar o olhar para outras partes já não é possível», disse Philipp, e «a Europa deve enfrentar a sua responsabilidade global: isto não significa ser capaz de resolver todos os problemas do mundo ou ser responsável pelo seu surgimento». Mas significa «viver o princípio de humanidade: este já por si é uma tarefa tão importante que conseguiremos levá-la por diante unicamente unindo as forças». O velho continente «demonstrou várias vezes que as crises se superam» e «o plano de controle desta crise consiste na estabilidade dos valores». Precisamente «neste difícil caminho que a Europa está chamada a percorrer, o Papa representa uma grande riqueza». Com efeito, Francisco «olha para a Europa com os olhos do hemisfério sul e tem uma visão do nosso continente muito clara, que não está coberta pelo véu do bem-estar». E o ano santo da misericórdia é um elemento unificador para todos, também no contexto do diálogo inter-religioso. Em seguida, Philipp frisou que se «o poder económico torna possível as conquistas sociais, contudo comporta também um perigo de decadência, de declínio moral e cultural». Um sintoma «deste declínio é constituído pela diminuição da confiança do povo em relação à política e às instituições estatais, incapazes de garantir justiça suficiente». «Um segundo sinal negativo — prosseguiu — consiste na tendência ao fechamento por parte quer das nações individualmente quer da Europa. Contudo, muros e vedações não são capazes de resolver problema algum de maneira permanente. Servem só para combater sintomas resultantes de um insuficiente apoio de estruturas sociais e económicas fora da Europa. Os detentores da riqueza têm responsabilidades. A riqueza da Europa implica o dever de agir de maneira mais clarividente e solidária de quanto não fizera no passado». Trata-se de uma «responsabilidade que não deve ser confiada a estruturas anónimas» porque «concerne às pessoas no seu ser e nas suas posições e ações diárias». E a «atribuição do prémio Carlos Magno representa uma chamada à ordem e, como tal, pretende convidar a adotar um rumo de tipo espiritual e tematizar as orientações da ação política europeia», cientes de que este sentido de responsabilidade comum na Europa se tornou frágil. res que, como os grandes evangelizadores do Continente, sejam tocados por Ele e vivam o Evangelho sem outras ambições. Só uma Igreja rica de testemunhas poderá de novo dar a água pura do Evangelho às raízes da Europa. A propósito, o caminho dos cristãos rumo à plena unidade é um grande sinal dos tempos, ditado pela exigência de responder urgentemente ao apelo do Senhor «para que todos sejam um só» (Jo 17, 21). Com a mente e o coração, com esperança e sem vãs nostalgias, como um filho que reencontra na mãe Europa as suas raízes de vida e de fé, sonho um novo humanismo europeu, «um caminho constante de humanização», ao qual servem «memória, coragem e utopia sadia e humana».11 Sonho uma Europa jovem, capaz de ainda ser mãe: uma mãe que tenha vida, porque respeita a vida e dá esperanças de vida. Sonho uma Europa que cuida da criança, que socorre como um irmão o pobre e quem chega à procura de acolhimento porque já não tem nada e pede abrigo. Sonho uma Europa que escuta e valoriza as pessoas doentes e idosas, para que não sejam reduzidas a objetos de descarte porque improdutivas. Sonho uma Europa, onde ser migrante não seja delito, mas apelo a um maior compromisso com a dignidade de todos os seres humanos. Sonho uma Europa onde os jovens respirem o ar puro da honestidade, amem a beleza da cultura e duma vida simples, não poluída pelas solicitações sem fim do consumismo; onde casar e ter filhos sejam uma responsabilidade e uma alegria grande, não um problema criado pela falta de trabalho suficientemente estável. Sonho uma Europa das famílias, com políticas realmente eficazes, centradas mais nos rostos do que nos números, mais no nascimento dos filhos do que no aumento dos bens. Sonho uma Europa que promova e tutele os direitos de cada um, sem esquecer os deveres para com todos. Sonho uma Europa da qual não se possa dizer que o seu compromisso em prol dos direitos humanos constituiu a sua última utopia. Obrigado 1 Discurso ao Parlamento Europeu (Estrasburgo, 25 de novembro de 2014). 2 Ibidem. 3 Declaração de 9 de maio de 1950 (Salon de l’Horologe, Quai d’O rsay, Paris). 4 Ibidem. 5 Discurso à Conferência Parlamentar Europeia (Paris, 21 de abril de 1954). 6 Discurso à Assembleia dos Artesãos Alemães (Dusseldórfia, 27 de abril de 1952). 7 Discurso aos Movimentos Populares (Bolívia — Santa Cruz da Serra, 9 de julho de 2015). 8 Cf. João Paulo II, Discurso ao Embaixador da República Federal Alemã, 8 de novembro de 1990. 9 Bento XVI, Carta enc. Caritas in veritate (29 de junho de 2009), 32. 10 Discurso aos Movimentos Populares (Bolívia — Santa Cruz da Serra, 9 de julho de 2015) 11 Discurso ao Conselho da Europa (Estrasburgo, 25 de novembro de 2014). número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016 L’OSSERVATORE ROMANO página 11 O Pontífice denunciou a exclusão dos pobres da África dos cuidados básicos Saúde negada Aceder às curas e aos remédios deve ser um direito universal e não um privilégio Em várias regiões do mundo, e sobretudo na África, a saúde «é efetivamente negada», denunciou o Papa Francisco recebendo em audiência os membros da organização Médicos com a África — Colégio universitário de aspirantes e médicos missionários (Cuamm). Em seguida, publicamos o discurso proferido pelo Pontífice durante o encontro, que teve lugar na manhã de 7 de maio na sala Paulo VI. Estimados irmãos, estou feliz por vos dar as boas-vindas a cada um de vós, «Médicos com a África — Cuamm», que trabalhais pela salvaguarda da saúde das populações africanas; e ainda mais feliz depois de ter ouvido as palavras que me aproximaram em grande medida daqueles lugares distantes, pois o testemunho destes médicos levou o meu coração até lá, onde vós ides simplesmente para encontrar Jesus. E isto fez-me muito bem. Obrigado! A vossa organização, expressão da missionariedade da diocese de Pádua, ao longo dos anos envolveu numerosas pessoas que, como voluntários, se comprometeram na realização de projetos a longo prazo, numa ótica de desenvolvimento. Agradeço-vos aquilo que estais a levar a cabo a favor do direito humano fundamental da saúde para todos. Com efeito, a saúde não é um bem de consumo, mas um direito universal e portanto o acesso aos serviços médicos não pode ser um privilégio. A saúde, principalmente a básica, é efetivamente negada — negada! — em várias partes do mundo e em muitas regiões da África. Ela não constitui um direito para todos mas, ao contrário, ainda é um privilégio para poucos, para aqueles que têm possibilidades. A acessibilidade aos serviços médicos, aos cuidados e aos remédios ainda permanece uma miragem. Os mais pobres não conseguem pagar e são excluídos dos serviços hospitalares, até dos mais essenciais e primários. Por isso é importante a vossa atividade generosa em benefício de uma rede minuciosa de serviços, capaz de dar respostas às necessidades das populações. Escolhestes os países mais pobres da África, os subsarianos, e as áreas mais esquecidas, «a última milha» dos sistemas de saúde. Trata-se das periferias geográficas para onde o Senhor vos envia, a fim de serdes bons samaritanos, indo ao encontro do pobre Lázaro e atravessando a «porta» que leva do primeiro ao terceiro mundo. Esta é a vossa «porta santa»! Trabalhais a favor das camadas mais vulneráveis da população: as mães, para lhes garantir um parto seguro e digno; e as crianças, de modo especial os recém-nascidos. Na África muitas mães morrem durante o parto e demasiadas crianças não superam o primeiro mês de vida, por causa da subalimentação e das grandes epidemias. Encorajo-vos a permanecer no meio desta humanidade ferida e sofredora: é Jesus. A vossa obra de misericórdia é o cuidado pelo doente, segundo o lema evangélico «Curai os enfermos» (Mt 10, 8). Que possais ser expressão da Igreja mãe, que se debruça sobre os mais frágeis e cuida deles. Para favorecer processos de desenvolvimento autênticos e duradouros são necessários prazos longos, na lógica do semear com confiança e esperar os frutos com paciência. Tudo isto é demonstrado também pela história da vossa Organização, que há mais de sessenta e cinco anos se encontra comprometida ao lado dos mais pobres no Uganda, Tanzânia, Moçambique, Etiópia, Angola, Sudão do Sul e Serra Leoa. A África tem necessidade de um acompanhamento paciente e continuativo, tenaz e competente. As intervenções precisam de programas de trabalho sérios, exigem pesquisa e inovação, e impõem o dever de transparência em relação aos doadores e à opinião pública. Sois médicos «com» a África e não «pela» África, e isto é deveras importante. Sois chamados a envolver as populações africanas no processo de crescimento, caminhando juntos, compartilhando dramas e alegrias, dores e entusiasmos. Os povos são os primeiros artífices do próprio progresso, os seus primeiros responsáveis! Bem sei que enfrentais os desafios de todos os dias de modo gratuito, ajudando de maneira abnegada, sem proselitismos nem ocupações de espaços. Aliás, colaborando Mas a terra é redonda? «As nossas vidas, as nossas famílias, a África e o seu povo, a nossa paixão e o compromisso pelos mais pobres»: são estes — disse o diretor de Médicos com a África Cuamm, o padre Dante Carraro, saudando o Papa — «os tesouros mais preciosos» de quantos há mais de 65 anos desempenham a sua missão em sete países da África subsariana, expressão de uma «Igreja de trabalho que se encarna na história e na vida do mundo». E como testemunho desta fé vivida concretamente no meio do sofrimento, padre Dante leu a Francisco as comovedoras cartas provenientes de dois médicos do Sudão do Sul. Na primeira, Massimo La Raja descreve ao Papa a «periferia extrema» de uma «terra que é redonda só nos mapas-múndi» e onde nos hospitais se respira «odor de terra», odor de «sangue coagulado», odor de «desinfetante, provando que tentamos fazer alguma coisa», e «odor de lágrimas e sorrisos». Uma realidade dura, difícil, na qual — escreveu Arianna Bortolani, diretora clínica do hospital de Yrol — são tantas as ofensas à dignidade humana que é «difícil reconhecer o rosto e a presença de Cristo». Quantas vezes, acrescentou a médica na carta, «tenho vontade de gritar as “minhas” razões: isto é, que são possíveis e boas outras modalidades de relação que não sejam a violência, a vingança, a prepotência, o egoísmo». Por sorte, continuou, às vezes «um sorriso, uma pessoa mais disponível, uma atenção dedicada, repõe o olhar na justa direção, permitindo ver também a beleza que muitas vezes está simplesmente diante dos olhos». São só dois exemplos, explicou o diretor de Médicos com a África Cuamm, que indicam a medida da participação dos agentes da organização, nascida em 1950 em Pádua «para fazer com que todos tenham acesso aos cuidados médicos, pelo menos aos essenciais». Enfim uma proposta: dar vida a um dia para o acesso às curas de todos, a fim de que «todos, especialmente os mais pobres possam ser tratados e assistidos com dignidade». Como recordação da sua missão na África, os participantes ofereceram ao Pontífice uma estátua de ébano, proveniente da Tanzânia, que representa uma mulher grávida. com as Igrejas e os governos locais, na lógica da participação e da partilha de compromissos e responsabilidades recíprocas. Exorto-vos a perseverar na vossa abordagem peculiar das realidades locais, contribuindo para o seu crescimento e deixandoas quando já se tornam capazes de prosseguir sozinhas, numa perspetiva de desenvolvimento e de sustentabilidade. É a lógica da semente, que desaparece e morre para dar frutos duradouros. No vosso inestimável serviço aos pobres da África, tendes como modelos o vosso fundador, doutor Francesco Canova, e o diretor histórico, padre Luigi Mazzucato. O doutor Canova amadureceu na FUCI a ideia de ir pelo mundo em socorro dos últimos, projetando um «colégio para futuros médicos missionários» e delineando a figura do médico missionário leigo. Por sua vez, o sacerdote Mazzucato foi diretor do Cuamm durante 53 anos, tendo falecido no dia 26 de novembro passado com 88 anos de idade. Foi o verdadeiro inspirador das opções de fundo, em primeiro lugar a pobreza. Assim deixou escrito no seu testamento espiritual: «Nasci pobre e sempre procurei viver com o mínimo indispensável. Nada do que possuo é meu e nada tenho para deixar. O pouco vestuário de que disponho seja distribuído pelos pobres». No sulco destas grandiosas testemunhas de uma missionariedade de proximidade evangelicamente fecunda, vós continuais com coragem a vossa obra, dando expressão de uma Igreja que não é uma «super clínica para vips», mas antes de tudo um «hospital de campo». Uma Igreja com um coração generoso, próxima dos numerosos feridos e humilhados da história, ao serviço dos mais pobres. Asseguro-vos a minha proximidade e oração. Abençoo todos vós, os vossos familiares e o vosso compromisso em prol do hoje e do amanhã do Continente africano. E peçovos, por favor, que rezeis também por mim, para que o Senhor me torne cada vez mais pobre. Obrigado! L’OSSERVATORE ROMANO página 12 quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19 Missas matutinas em Santa Marta Sexta-feira 6 de maio Com alegria e esperança O cristão não anestesia o sofrimento, nem sequer o maior que faz vacilar a fé, e não vive a alegria e a esperança como se fosse sempre carnaval. Mas encontra o sentido da sua existência no perfil da mulher que dá à luz: sente tanta felicidade quando nasce a criança que se esquece do seu sofrimento. «Na liturgia da Ascensão do Senhor, observou Francisco, a Igreja explode numa atitude que não é habitual, e no início a primeira oração é um grito: “Exulte, Senhor, a tua Igreja!”». Sim, prosseguiu, «exulte com a esperança de viver e alcançar o Senhor: “Exulte de alegria a tua Igreja”». E na oração da coleta, «hoje rezámos: “Senhor, eleva os nossos corações para Jesus!”». Uma invocação que expressa «precisamente a alegria que invade toda a Igreja, alegria e esperança: ambas caminham juntas». Com efeito, «uma alegria sem esperança é um simples divertimento, uma alegria passageira». E «uma esperança sem alegria não é esperança, não vai além de um otimismo sadio». Eis por que «alegria e esperança caminham juntas — explicou Francisco — e ambas fazem esta explosão que a Igreja na sua liturgia quase, permito-me dizer a palavra, grita sem pudor: “Exulte a tua Igreja!”, exulte de alegria, sem formalidades». Porque «quando há grande alegria, não há formalidade: é alegria». Portanto, explicou o Papa, «Exulte de alegria a tua Igreja, viva na esperança de a alcançar» e «eleva, Senhor, os nossos corações para Jesus que está sentado na glória do Pai». «Com três pinceladas — afirmou o Pontífice — a Igreja diz qual deve ser a atitude cristã: alegria e esperança juntas». E assim «a alegria fortalece a esperança e a esperança floresce na alegria». E «ambas, com esta atitude que a Igreja lhes deseja atribuir, estas duas virtudes cristãs indicam um sair de nós mesmos: o jubiloso não se fecha em si mesmo; a esperança leva-te lá, é a âncora que está precisamente na praia do céu e te conduz para fora». Por isso podemos «sair de nós mesmos com a alegria e a esperança». Uma reflexão que faz referência ao trecho evangélico de João (16, 20-23) proposto pela liturgia. «O Senhor diz-nos que há problemas — prosseguiu o Papa — e na vida esta alegria e esperança não são um carnaval: são outra coisa, também, ter que enfrentar dificuldades». Francisco repropôs «a imagem que o Senhor usa hoje no Evangelho: a mulher quando chega o momento do parto». Sim, explicou, «a mulher, quando dá à luz, sente dor porque chegou a sua hora; mas depois de dar à luz a criança, esquece o sofrimento». E é precisamente «o que fazem a alegria e a esperança juntas, na nossa vida, quando estamos nas tribulações, quando temos problemas, quando sofremos». Não se trata certamente de «uma anestesia: o sofrimento é sofrimento, mas se for vivido com alegria e esperança abre a porta para a alegria de um futuro novo». «Esta imagem do Senhor deve ajudar-nos muito nas dificuldades», acrescentou o Papa, até as «más que nos fazem duvidar da nossa fé». Mas «com a alegria e com a esperança vamos em frente, porque depois desta tempestade chega um homem novo, como a mulher quando dá à luz». E Jesus diz que esta alegria e esperança são duradouras, que não passam». «Assim também vós, agora, estais no sofrimento», são as palavras de Jesus aos discípulos transmitidas pelo Evangelho. Mas tranquiliza-os imediatamente: «Vervos-ei de novo e o vosso coração alegrar-se-á e ninguém vos poderá privar da vossa alegria». São palavras que devem ser frisadas, acrescentou o Pontífice: «A alegria humana pode ser tirada de qualquer coisa, de qualquer dificuldade. Mas esta alegria que o Senhor nos dá, que nos faz exultar, que nos faz elevar na esperança de o encontrar, esta alegria ninguém no-la pode tirar, é duradoura. Até nos momentos mais obscuros». «Alegria, esperança é o grito da Igreja, feliz depois da Ascensão do Senhor». Francisco recordou que «Lucas nos diz nos Atos que, a um certo ponto, quando o Senhor se vai embora e deixam de o ver, os discípulos ficam a olhar para o céu, um pouco entristecidos». E «são os anjos que os despertam, convidando-os a ir. E depois, no Evangelho de Lucas, lê-se: “Voltaram felizes, cheios de alegria”. Precisamente aquela alegria de saber que a nossa humanidade entrou no céu: pela primeira vez!». Francisco concluiu a sua meditação com os votos de «que o Senhor nos conceda a graça de uma alegria grande que seja a expressão da esperança; e uma esperança forte que se torne alegria na nossa vida». E com a oração que «o Senhor conserve esta alegria e esperança, assim ninguém poderá privar-nos delas». Segunda-feira 9 de maio Perfeito desconhecido Um perfeito desconhecido ou até «um prisioneiro de luxo»: eis o que é o Espírito Santo para muitos cristãos que ignoram que é ele quem «move a Igreja», levando-nos a Jesus e tornando-nos «reais» e «não virtuais». O encorajamento a refletir sobre o papel central que o Espírito Santo desempenha na vida dos crentes, precisamente na semana que precede o Pentecostes, esteve no centro da homilia de Francisco. No início da celebração o Papa, indicando a imagem de santa Luísa de Marillac posta ao lado do altar, recordou a comemoração da memória litúrgica. Com efeito, é a primeira vez que se celebra nesta data: des- de a canonização, realizada em 1934, até hoje foi celebrada a 15 de março. Além disso, celebra-se também o aniversário da cerimónia de beatificação da santa, que teve lugar a 9 de maio de 1920. Um dia particularmente importante, explicou o Pontífice, porque Luísa de Marillac foi a fundadora das Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo, «as religiosas que trabalham e gerem» a Casa de Santa Marta. Desta forma, acrescentou Francisco, «ofereço esta missa pelas religiosas da casa». Para a sua reflexão na homilia, o Papa inspirou-se no trecho dos Atos dos Apóstolos (19, 1-8). Paulo encontra-se em Éfeso com alguns discípulos que acreditavam em Jesus e pergunta-lhes: «Recebestes o Espírito Santo quando abraçastes a fé?». E eles, depois de se terem entreolhado surpreendidos, responderam-lhe: «Não, nem sequer ouvimos dizer que há um Espírito Santo!». Portanto, observou o Papa, «acreditavam em Jesus, eram bons discípulos, mas nem sequer tinham ouvido que existia o Espírito Santo». Paulo retoma imediatamente o diálogo perguntando-lhes que batismo tinham recebido. E os discípulos: «O de João». Então, Paulo explica-lhes que «aquele era um batismo de penitência, de preparação». Ouvindo Paulo, os discípulos de Éfeso «foram batizados em nome do Senhor Jesus». Lê-se nos Atos: «E quando Paulo lhes impôs as mãos, o Espírito Santo desceu sobre eles, e falavam em todas as línguas e profetizavam». Portanto, explicou o Papa, «é um caminho: a via da conversão, mas faltavam o batismo e a imposição das mãos, para que viesse o Espírito Santo». «Também hoje acontece o mesmo», afirmou o Pontífice. «A maioria dos cristãos» sabe pouco ou nada sobre o Espírito Santo, a ponto que se pode fazer própria a resposta dos discípulos de Éfeso a Paulo: «Não, nem sequer ouvimos dizer que há um Espírito Santo!». E se perguntássemos a tantas pessoas boas: «quem é o Espírito Santo para ti?» e «o que faz e onde está o Espírito Santo?», a única resposta será: «é a terceira pessoa da Trindade». Exatamente como aprendemos no catecismo. Certamente, «sabem que o Pai criou o mundo, porque a criação é atribuída ao Pai». E sabem também que «o Filho é Jesus, que nos redimiu e nos deu a vida». Portanto, «respondem assim» mas depois em relação ao Espírito Santo sabem que é «a terceira pessoa da Trindade». Mas se lhes perguntas: «o que faz ele?», respondem-te que «está ali!». «Os nossos cristãos são assim». «O Espírito Santo — explicou Francisco — é quem move a Igreja; é quem trabalha na Igreja, nos nossos corações; quem faz de cada cristão uma pessoa diversa das outras, mas de todos faz unidade». Por conseguinte, prosseguiu, o Espírito Santo «é quem leva em frente, abre as portas de par em par e envia a dar testemunho de Jesus». No início da missa, recordou o Pontífice, na antífona de entrada foi dito: «Recebereis o Espírito Santo e sereis minhas testemunhas em todo o mundo». Eis que «o Espírito Santo é quem estimula a louvar a Deus, a rezar: “Ora em nós”». O Espírito Santo «está dentro de nós e ensinanos a olhar para o Pai e a dizer-lhe: “Pai”». E assim «liberta-nos desta condição de órfãos na qual o espírito do mundo nos quer manter». Por todas estas razões, explicou, o Espírito Santo «é tão importante: é o protagonista da Igreja viva: é ele quem trabalha na Igreja». Neste ponto, o Pontífice advertiu sobre um perigo: «Quando não estamos à altura desta missão do Espírito Santo e não o recebemos desta forma», acabamos por «reduzir a fé a uma moral, a uma ética». E pensamos que cumprir todos os mandamentos é suficiente, «e nada mais». Assim, dizemo-nos: «posso fazer isto, não posso fazer aquilo; até aqui sim, até lá não!», caindo na «casuística» e numa «moral fria». Contudo, recordou o Papa, «a vida cristã não é uma ética: é um encontro com Jesus Cristo». E «quem me leva ao encontro com Jesus Cristo» é precisamente o Espírito Santo. Deste modo, «nós, na nossa vida, temos no nosso coração o Espírito Santo como um “prisioneiro de luxo”: não deixamos que nos impulsione, não deixamos que nos mova». E no entanto «ele faz tudo, sabe tudo, sabe recordar-nos o que disse Jesus, sabe explicar-nos os temas de Jesus». Só há uma coisa que «o Espírito Santo não sabe fazer: cristãos de salão. Isto ele não sabe fazer! Não sabe fazer “cristãos virtuais”, não virtuosos». Pelo contrário, «faz cristãos reais: enfrenta a vida real tal como ela é, com a profecia do ler os sinais dos tempos, e leva-nos em frente desta maneira». Por isso «é o grande “prisioneiro do nosso coração” e dizemos que é a terceira pessoa da Trindade e ponto final». «Esta semana — sugeriu Francisco — far-nos-á bem refletir sobre o que faz o Espírito Santo na nossa vida». Para ajudar este exame de consciência o Pontífice propôs algumas questões diretas: «Ensinou-me a estrada da liberdade? Aprendi-a por ele? Mas que liberdade? Qual liberdade? O Espírito Santo, que reside em mim, impele-me a sair: tenho medo? Como é a minha coragem, a que me dá o Espírito Santo, para sair de mim mesmo, para testemunhar Jesus? Como vai a minha paciência nas provações? Pois também a paciência é dada pelo Espírito Santo». Precisamente «nesta semana de preparação para a solenidade de Pentecostes», o Papa convidou os cristãos a perguntar se deveras acreditam no Espírito Santo ou se para eles é só «uma palavra». E «procuremos — exortou — falar com ele e dizer: “Sei que estás no meu coração, que estás no coração da Igreja, que levas em frente a Igreja, que promoves a unidade entre todos nós, mas somos todos diversos, na diversidade de todos nós”». O convite é «dizer-lhe todas estas coisas e pedir a graça de aprender, mas na minha vida, o que faz ele de concreto». É «a graça da docilidade a ele, ser dócil ao Espírito Santo: esta semana façamos isto, pensemos no Espírito e falemos com ele». número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016 L’OSSERVATORE ROMANO página 13 O Papa voltou a denunciar as perseguições contra os cristãos e as minorias religiosas Vítimas de uma violência inaudita Novo apelo de Francisco a favor dos cristãos e das minorias religiosas vítimas de perseguições no Egito e no Médio Oriente. Numa carta enviada a Tawadros II, Papa de Alexandria e Patriarca da Sé de São Marcos, por ocasião do dia da amizade copto-católica — que se celebra no terceiro aniversário do encontro fraterno realizado no Vaticano em 2013, quarenta anos depois do encontro de Paulo VI com Shenouda III — o Pontífice recordou as «grandes dificuldades» e as «situações trágicas» que os crentes estão a viver em muitos países. E pediu à comunidade internacional que «responda de maneira sábia a esta violência inaudita». A Sua Santidade Tawadros II Papa de Alexandria e Patriarca da Sé de São Marcos Recordando com prazer o terceiro aniversário do nosso encontro fraterno em Roma a 10 de maio de 2013, apresento-lhe, Santidade, os meus cordiais auspícios de paz e saúde, e expresso a minha alegria pelos vínculos espirituais cada vez mais profundos que unem a Sé de Pedro e a Sé de Marcos. É com gratidão no Senhor nosso Deus que recordo os passos que demos juntos pelo caminho da reconciliação e da amizade. Depois de séculos de silêncio, de desentendimentos e até de hostilidades, católicos e coptas estão a encontrar-se cada vez com mais frequência, dialogando e cooperando para proclamar o Evangelho e servir a humanidade. Neste renovado espírito de amizade, o Senhor ajuda-nos a ver que o vínculo que nos une nasce da mesma chamada e missão que recebemos do Pai no dia do nosso batismo. Com efeito, é através do batismo que nos tornamos membros do único Corpo de Cristo que é a Igreja (cf. 1 Cor 12, 13), o povo de Deus, que proclama o seu louvor (cf. 1 Pd 2, 9). Que o Espírito Santo, motivo e portador de todos os dons, nos una cada vez mais no vínculo de amor cristão e nos guie na nossa peregrinação comum, na verdade e na caridade, rumo à plena comunhão. Desejo expressar-lhe também, Santidade, o meu profundo apreço pela generosa hospitalidade oferecida durante o décimo terceiro encontro da Comissão Mista Internacional para o Diálogo Teológico entre a Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas Orientais, que se realizou no Cairo a convite do Patriarcado da Sé de São Marcos. Estou-lhe grato por ter recebido os membros da Comissão Mista no mosteiro de São Bishoy em Wadi Natrum, na certeza de que partilhamos a fervorosa esperança de que este importante diálogo possa continuar para progredir e dar frutos abundantes. Mesmo estando ainda a caminho rumo àquele dia no qual nos reuniremos como um só na mesma mesa eucarística, podemos já agora tornar visível a comunhão que nos une. Coptas e católicos podem testemunhar juntos valores importantes como a sacralidade de cada vida humana, a santidade do matrimónio e da vida familiar, o respeito pela criação que nos foi confiada por Deus. Face a tantos desafios contemporâneos, coptas e católicos estão chamados a dar uma resposta comum fundada no Evangelho. Enquanto continuamos a nossa peregrinação terrena, se aprendermos a carregar os fardos uns dos outros e a intercambiar o rico património das nossas respetivas tradições, veremos com maior clareza que aquilo que nos une é mais do que quanto nos divide. Santidade, todos os dias os meus pensamentos e orações se dirigem às comunidades cristãs no Egito e no Médio Oriente, muitas das quais vivem grandes dificuldades e situações trágicas. Estou bem ciente da vossa séria preocupação pela situação no Médio Oriente, sobretudo no Iraque e na Síria, onde os nossos irmãos e irmãs cristãos e outras comunidades religiosas devem fazer face a provas diárias. Que Deus nosso Pai conceda paz e conforto a quantos sofrem e inspire a comunidade internacional a responder de maneira sábia e justa a esta violência inaudita. Nesta ocasião, que justamente já é conhecida como dia da amizade copto-católica, troco de bom grado com Vossa Santidade um abraço fraterno de paz em Cristo, Senhor Ressuscitado. Vaticano, 10 de maio de 2016 FRANCISCO Missas matutinas em Santa Marta Terça-feira 10 de maio Juventude consumida «Consumir a vida por causas nobres»: eis uma oportunidade oferecida aos jovens de hoje, que imersos numa «cultura do consumismo» e «do narcisismo» com frequência vivem insatisfeitos e pouco felizes. Francisco pôs no centro da própria reflexão o testemunho dos missionários — «a glória da nossa Igreja» — propondo-a como modelo para os jovens. A homilia do Papa foi inspirada pela primeira leitura do dia tirada dos Atos dos Apóstolos (20, 17-27), na qual se lê o que — disse o Papa — «poderíamos chamar “a despedida de um apóstolo”». É a passagem na qual «Paulo faz vir a Mileto os presbíteros de Éfeso e diz-lhes que não os verá mais porque deve partir, o Espírito o impele a ir a Jerusalém». Analisando este texto, vê-se que, antes de tudo, o apóstolo faz um «exame de consciência: “sabeis como me comportei convosco todo este tempo”». É um exame minucioso no qual Paulo «faz uma narração do modo como se comportou» e, num primeiro momento, parece até «que se vangloria um pouco». Na realidade «não é assim», a ponto que ele mesmo acrescenta: «Simplesmente foi o Espírito que me levou a isto». E continua: «Constrangido pelo Espírito, vou a Jerusalém. O Espírito enviou-me aqui para anunciar Jesus e agora envia-me a Jerusalém». Depois do exame de consciência emerge outro elemento: a «docilidade» ao Espírito Santo. É uma despedida na qual Paulo exprime quer «uma nostalgia ao constatar o que o Senhor fez com ele», quer «um sentimento de gratidão ao Senhor». Este trecho da Escritura, observou Francisco, faz vir à mente «o bonito excerto literário do espanhol Pemán» no qual se lê «a descrição da despedida da vida de são Francisco Xavier no litoral da China. Também ele faz um exame de consciência: sozinho, diante de Deus». É significativa também a continuação da narração, porque se pode questionar: «O que espera Paulo?». De facto o apóstolo escreve que «vai a Jerusalém “sem saber o que lá acontecerá”». Como um missionário que parte «sem saber o que o espe- ra». Tem a certeza de uma única coisa: «Só sei que o Espírito Santo, de cidade em cidade, me assegura que me esperam cadeias e perseguições». E, comentou o Pontífice, também «o missionário sabe que a vida não será fácil mas prossegue». Por fim Paulo acrescenta «outra verdade, que faz chorar os presbíteros de Éfeso: “Sei agora que não tornareis a ver a minha face, todos vós”». Depois, «dá alguns conselhos. Acompanham-no até à embarcação e na praia lançam-se ao pescoço de Paulo, chorando... Ele despede-se assim» da comunidade de Éfeso, na cidade de Mileto. «O fim do apóstolo é o fim dos missionários» comentou o Papa. «Penso — explicou — que este trecho» evoca «a vida dos nossos missionários: muitos jovens, moças e moços, que deixaram a pátria, a família e foram para longe, para outros continentes, anunciar Jesus Cristo». Também eles «eram “constrangidos” pelo Espírito Santo», era a sua «vocação». E hoje, quando naqueles lugares «visitamos os cemitérios» e «vemos as suas lápides», damo-nos conta de que «tantos morreram jovens, com menos de quarenta anos», frequentemente porque não estavam preparados para suportar as doenças locais. Entendemos que estes jovens «deram a vida», «consumiram a vida». Significativa a reflexão de Francisco: «Penso que eles, naquele último momento, distantes da pátria, da família, dos amigos, disseram: “Valia a pena fazer o que fiz!”». Em recordação destes jovens, «heróis da evangelização dos nossos tempos», considerando que a Europa povoou outros continentes de missionários que partiam sem voltar — e que provavelmente, no seu «último momento», o da «despedida», disseram como Xavier: «Deixei tudo, mas valia a pena!» — o Papa afirmou: «Acho que é justo dar graças ao Senhor pelo seu testemunho». Alguns morreram «anónimos», outros como «mártires, isto é, oferecendo a vida pelo Evangelho»: são, afirmou Francisco, «a nossa glória estes missionários! A glória da nossa Igreja!». Face a tais exemplos, o Pontífice dirigiu um pensamento «aos moços e moças de hoje», com frequência em dificuldade na «cultura do consumismo, do narcisismo». E disseCONTINUA NA PÁGINA 14 L’OSSERVATORE ROMANO página 14 quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19 Declaração final do colóquio entre o Pontifício Conselho para o diálogo inter-religioso e o Royal Institute for Inter-Faith Studies Solidariedade com as vítimas de violências e guerras Concluiu-se com a assinatura de uma declaração final o encontro entre o Pontifício conselho para o diálogo interreligioso e o Royal Institute for InterFaith Studies, que teve lugar em Roma nos dias 3-4 de maio. A seguir, o texto da mencionada declaração. O Pontifício conselho para o diálogo inter-religioso (Cidade do Vaticano), e o Royal Institute for InterFaith Studies (Amã, Jordânia), realizaram o seu quarto diálogo em Roma nos dias 3 e 4 de maio de 2016. O tema escolhido foi o seguinte: «Valores compartilhados na vida social e política: perspetivas cristãs e muçulmanas». Este tema foi analisado a partir de três subtítulos: «Cidadãos e crentes: perspetivas cristãs e muçulmanas», apresentado respetivamente pelo professor Mohan Doss, S.V.D. (Índia) e pelo professor Ahmed Abaddi (Marrocos); «Os nossos valores compartilhados e as respetivas particularidades», apresentado pelo professor Wajih Kanso (Líbano) e pelo professor Salim Daccache, S.J. (Líbano); e «Ir ao encontro dos necessita- Juventude consumida CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 13 lhes: «Olhai para o horizonte! Olhai para os nossos missionários!». Por isso, acrescentou, é preciso «rezar ao Espírito Santo para que os constranja a ir para longe, a “queimar” a vida». Usou precisamente esta expressão forte, explicando: «É uma palavra um pouco dura, mas a vida vale a pena vivê-la; mas para a viver bem» é necessário «“consumi-la” no serviço, no anúncio; e ir em frente. E esta é a alegria do anúncio do Evangelho». Concluindo a homilia, o Papa exortou todos a dar graças ao Senhor «por Paulo, pela sua capacidade de ir a um lugar e de o deixar quando o Espírito Santo o chama para outro», mas também «por tantos missionários da Igreja» que, no passado assim como ainda hoje, tiveram a coragem de partir. O Pontífice convidou também a rezar a fim de que o Espírito entre «no coração dos nossos jovens», onde «há um pouco de insatisfação» e «constranja-os a ir além, a consumir a vida por causas nobres». Provavelmente, disse, disto permanecerá só «uma lápide, com o nome, a data de nascimento, a data da morte; e passados alguns anos ninguém se lembrará deles», mas eles «despedirse-ão do mundo em serviço. E esta é uma coisa boa!». Eis a invocação final: «Que o Espírito Santo, que vem agora, semeie no coração dos jovens esta vontade de partir e anunciar Jesus Cristo, “consumindo” a própria vida». Encontro do Papa com os participantes no colóquio inter-religioso (4 de maio de 2016) dos e dos vulneráveis: uma solicitude comum para cristãos e muçulmanos», apresentado por monsenhor Giovanni Pietro Dal Toso (Vaticano) e pelo doutor Hani El-Banna (Reino Unido). O cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Pontifício conselho para o diálogo inter-religioso, chefiou a delegação católica, enquanto o príncipe El Hassan bin Talal, presidente do conselho do Royal Institute for Inter-Faith Studies, guiou a delegação muçulmana. Outros membros da delegação católica: D. Miguel Ayuso, M.C.C.J, secretário do Pontifício conselho; monsenhor Khaled Akasheh, chefe do departamento para o islão do Pontifício conselho; D. Jean-Paul Vesco, O.P., bispo de Oran (Argélia); a senhora Anne Leahy, embaixadora emérita do Canadá junto da Santa Sé; o doutor Anan Al-Kass Yousif (Iraque); a senhora Ruth Susan Wangeci Maina (Quénia); o engenheiro Riad Sargi (Síria); e o senhor Michael Utama Purnama (Indonésia). Outros membros da delegação muçulmana: o doutor Fareed Yaqoob Yusuf Mubarak AlMuftah (Bahrain); o doutor Amer El Hafi (Jordânia); o doutor Oussama Mohamed Nabil (Egito); o doutor Hassan Nadhem (Iraq); o doutor Majeda Omar, diretor do Royal Institute (Jordânia); e o doutor Nayla Tabbara (Líbano). Os participantes demonstraram grande apreço pelas intervenções, enfrentando os debates com espírito de abertura, num clima de profunda cordialidade. As duas delegações foram recebidas pelo Papa Francisco a 4 de maio e comoveram-se com as suas palavras: «O diálogo é sair de nós mesmos com a palavra e ouvir a palavra do outro. Duas palavras encontramse, dois pensamentos encontram-se. É a primeira etapa de um caminho. Depois desta reunião da palavra, os corações encontram-se e encetam um diálogo de amizade, que acaba com o aperto de mão. Palavra, coração, mãos. É simples! Até uma criança o sabe fazer...». No final da sua reunião, os participantes apresentaram a seguinte proposta: Compartilhamos credos e valores morais. As realidades que temos em comum são muito mais numerosas do que as nossas particularidades, e constituem uma base sólida para vivermos juntos de modo pacífico e frutuoso, inclusive com pessoas de boa vontade que não professam uma religião específica. Cremos no papel humanizador e civilizador das nossas religiões, quando os seguidores aderem aos seus princípios de adorar a Deus e de amar e cuidar do próximo. Acreditamos que Deus conferiu dignidade e direitos inalienáveis a cada pessoa. São seus dons, que devem ser reconhecidos, garantidos e protegidos pela lei. Asseguramos a nossa solidariedade aos nossos irmãos e às nossas irmãs em humanidade que se encontram em necessidade, prescindindo da sua pertença étnica, religiosa ou cultural. A nossa ajuda aos pobres e aos necessitados deve ser oferecida por compaixão e por amor à benevolência de Deus. Nunca deve ser usada para promover o proselitismo. Consideramos que os jovens não representam apenas o futuro da humanidade. São também uma parte importante do seu presente. Têm o direito a uma educação adequada, que os prepare para ser bons cidadãos, no respeito pela diversidade. O nosso mundo, a nossa «casa comum», atravessa muitas crises complicadas e tem necessidade do compromisso constante dos seus habitantes para o transformar num lugar adequado onde poder viver juntos pacificamente, compartilhando os recursos do universo, tendo presentes as gerações vindouras. Manifestamos a nossa proximidade e solidariedade a todos aqueles que sofrem, de modo particular devido à violência e aos conflitos armados. O respeito pelo direito internacional, o diálogo, a justiça, a misericórdia e a compaixão são valores e instrumentos adequados para alcançar a paz e a harmonia. O Pontifício conselho para o diálogo inter-religioso e o Royal Institute for Inter-Faith Studies, gratos a Deus Todo-Poderoso por esta colaboração frutuosa, decidiram continuá-la, encontrando-se no prazo de um ano, em vista de se preparar para o seu quinto diálogo. Mensagem aos budistas na festa do Vesakh Para uma educação ecológica «Budistas e cristãos: promovamos juntos uma educação ecológica»: foi o título da mensagem que o Pontifício conselho para o diálogo inter-religioso enviou aos budistas pela festa do Vesakh, durante a qual se comemoram os principais eventos da vida de Buda. A festa do Vesakh/Hanamatsuri de 2016, nos vários países de cultura budista, é celebrada em datas diversas, segundo as diferentes tradições. Este ano é comemorada nalguns países a 14 de maio e noutros nos dias 20 e 21 de maio. Queridos amigos budistas! Em nome do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-Religioso desejamos mais uma vez apresentar as nossas felicitações mais cordiais por ocasião do Vesakh, enquanto comemorais três eventos significativos da vida de Gautama Buda: o nascimento, a iluminação e a morte. Desejamos-vos paz, tranquilidade e alegria nos vossos corações, nas vossas famílias e nos vossos países. Este ano escrevemos, inspirandonos na Carta Encíclica de Sua Santidade o Papa Francisco Laudato si’, sobre o cuidado da casa comum, na qual ele observa que: «Se “os desertos exteriores se multiplicam no mundo, porque os desertos interiores se tornaram tão amplos” a crise ecológica é um apelo a uma profunda conversão interior» (n. 217). E afirma: «A educação será ineficaz e os seus esforços estéreis, se não se preocupar também por difundir um novo modelo relativo ao ser humano, à vida, à sociedade e à relação com a natureza» (n. 215). «A doação de si mesmo num compromisso ecológico só é possível a partir do cultivo de virtudes sólidas» (n. 211). Em resposta, o Papa Francisco propõe: «São vários os âmbitos educativos: a escola, a família, os meios de comuniCONTINUA NA PÁGINA 15 L’OSSERVATORE ROMANO número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016 INFORMAÇÕES Audiências O Papa Francisco recebeu em audiências particulares: A 6 de maio Suas Ex.cias os Senhores Martin Schulz, Presidente do Parlamento Europeu; Donald Tusk, Presidente do Conselho Europeu; e Jean Claude Juncker, Presidente da Comissão Europeia; e a Senhora Angela Merkel, Chanceler da República Federal da Alemanha. A 7 de maio Sua Ex.cia o Senhor Johann Schneider-Ammann, Presidente da Confederação Helvética, com o Séquito. O Senhor Cardeal Marc Ouellet, Prefeito da Congregação para os Bispos. A 9 de maio O Senhor Cardeal George Pell, Prefeito da Secretaria para a Economia; D. Gabriele Giordano Caccia, Núncio Apostólico no Líbano; D. Silvano Maria Tomasi, Núncio Apostólico; e o Senhor Cardeal Angelo Amato, S.D.B., Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. Renúncias O Santo Padre aceitou a renúncia: No dia 7 de maio De D. John Kudrick, ao governo pastoral da Eparquia de Parma dos Rutenos (EUA), em conformidade com o cânone 210 § 1 do Código dos Cânones das Igrejas Orientais. De D. Gerald Nicholas Dino, ao governo pastoral da Eparquia de Holy Mary of Protection de Phoenix dos Rutenos (EUA), em conformidade com o cânone 210 § 1 do Código dos Cânones das Igrejas Orientais. De D. Sarhad Yawsip Jammo, ao governo pastoral da Eparquia de Saint Peter the Apostle of San Diego dos Caldeus (EUA), em conformidade com o cânone 210 § 1 do Código dos Cânones das Igrejas Orientais. De D. Dominique Nguyên Chu Trinh, ao governo pastoral da Diocese de Xuân Lôc (Vietname), em conformidade com o cânone 401 § 1 do Código de Direito Canónico. De D. Antoni Długosz, ao cargo de Auxiliar da Arquidiocese de Częstochowa (Polónia), em conformidade com os cânones 411 e 401 § 1 do Código de Direito Canónico. De D. John Hine, ao cargo de Auxiliar da Arquidiocese de Southwark (Grã-Bretanha), em conformidade com os cânones 411 e 401 § 1 do Código de Direito Canónico. Nomeações O Sumo Pontífice nomeou: A 5 de maio Bispo de Parramatta (Austrália), D. Vincent Long Van Nguyen, O.F.M.Conv., até esta data Auxiliar de Melbourne. A 7 de maio Enviado Especial à celebração do 25º aniversário de ereção da Arquidiocese de Minsk-Mohilev (BieloRússia), que terá lugar em Budslau a 1 e 2 de julho, o Senhor Cardeal Christoph Schönborn, O.P., Arcebispo de Viena (Áustria). Bispo da Diocese de Xuân Lôc (Vietname), D. Joseph Đinh Đú’c Đao, até esta data Coadjutor da mesma Sede. Bispo da Eparquia de Holy Mary of Protection de Phoenix dos Rutenos (EUA), D. John Stephen Pažak, C.SS.R., até agora Bispo da Eparquia de Saints Cyril and Methodius of Toronto dos Eslovacos de rito bizantino (Canadá). Bispo de San José del Guaviare (Colômbia), o Rev.do Pe. Nelson Jair Cardona Ramírez, do clero da Diocese de La Dorada — Guaduas, até esta data Pároco da Paróquia «Santísima Trinidad» em Puerto Salgar e Delegado diocesano para os ministros ordenados. D. Nelson Jair Cardona Ramírez nasceu no dia 18 de janeiro de 1969, em Norcasia (Colômbia). Foi ordenado Sacerdote a 12 de dezembro de 1992. Administrador Apostólico sede vacante da Eparquia de Parma dos Rutenos (EUA), D. William Charles Skurla, atualmente Arcebispo Metropolitano de Pittsburgh dos Bizantinos (EUA). Administrador Apostólico sede vacante da Eparquia de Saints Cyril and Methodius of Toronto dos Eslovacos de rito bizantino (Canadá), D. John Stephen Pažak, C.SS.R., atualmente Bispo da Eparquia de Holy Mary of Protection de Phoenix dos Rutenos (EUA). Administrador Apostólico sede vacante da Eparquia de Saint Peter the Apostle of San Diego dos Caldeus (EUA), D. Shlemon Warduni, atualmente Auxiliar de Baghdad dos Caldeus (Iraque). Auxiliar de Koszalin-Kołobrzeg (Polónia), o Rev.mo Mons. Krzysztof Stefan Włodarczyk, até esta data Diretor do Departamento Pastoral Diocesano, simultaneamente eleito Bispo Titular de Surista. D. Krzysztof Stefan Włodarczyk nasceu no dia 25 de fevereiro de 1961, em Sławno (Polónia). Recebeu a Ordenação sacerdotal a 21 de junho de 1987. A 11 de maio cação, a catequese, e outros» (n. 213). Caros amigos budistas, também vós manifestais preocupação pela degradação ambiental, como atestam os documentos The Time to Act is Now: A Buddhist Declaration on Climate Change e Buddhist Climate Change Statement to World Leaders. Ambos evidenciam a reflexão comum e partilhada de que no centro da crise ecológica com efeito é uma crise do eu, expressa pela avidez, pela ansiedade, pela arrogância e pela ignorância do ser humano. Por conseguinte, os nossos estilos de vida e as nossas expectativas devem mudar para derrotar o deterioramento do que nos circunda. «Cultivando um olhar interior e a compaixão, seremos capazes de agir por amor, não por medo, para proteger o nosso planeta» (Buddhist Climate Change Statement to World Leaders). Além disso, «quando a Terra adoece, também nós adoecemos pois somos parte dela» (The time to Act is Now). Dado que a crise das mudanças climáticas se deve também à atividade humana, nós, cristãos e budistas, devemos trabalhar juntos para tratar o tema de uma espiritualidade ecológica. O agrava- gia na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Recebeu a Ordenação sacerdotal a 14 de agosto de 1999 e foi incardinado na Diocese de Divinópolis, onde desempenhou os seguintes cargos: Vigário Paroquial e Pároco em diversas paróquias, Reitor do Seminário de Teologia, Coordenador diocesano da Pastoral vocacional e da Pastoral familiar; e Reitor do Seminário Propedêutico, em Pará de Minas. Prelados falecidos Adormeceram no Senhor: No dia 30 de abril D. Alphonsus Flavian D’Souza, S.I., Bispo de Raiganj (Índia). O saudoso Prelado nasceu no dia 4 de julho de 1939, em Mangalore (Índia). Recebeu a Ordenação sacerdotal a 13 de julho de 1971. Foi ordenado Bispo em 17 de maio de 1987. No dia 2 de maio D. Myles McKeon, Bispo Emérito de Bunbury (Austrália). Auxiliar da Arquidiocese de Goiânia (Brasil), o Rev.do Pe. Moacir Silva Arantes, do clero da Diocese de Divinópolis, até esta data Administrador Paroquial da Paróquia de Nossa Senhora da Piedade, em Pará de Minas, simultaneamente eleito Bispo Titular de Tituli in Numidia. O venerando Prelado nasceu em Westport (Irlanda), a 3 de abril de 1919. Foi ordenado Sacerdote no dia 22 de junho de 1947. Recebeu a Ordenação episcopal em 12 de setembro de 1962. D. Moacir Silva Arantes nasceu no dia 3 de junho de 1969 em Itapecirica, no Estado de Minas Gerais. Completou os estudos de Filosofia e de Teolo- D. Tadeusz Gocłowski, Arcebispo Emérito de Gdańsk (Polónia). Mensagem aos budistas na festa do Vesakh CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 14 página 15 mento dos problemas ambientais globais aumentou a urgência da cooperação inter-religiosa. A educação para a responsabilidade pelo meio ambiente e pela criação de uma «cidadania ecológica» requer uma ética ecológica virtuosa que respeite e cuide da natureza. É uma necessidade impelente que os seguidores de todas as religiões atravessem os próprios confins e se unam para construir uma ordem social responsavelmente ecológica baseada em valores partilhados. Nos países onde budistas e cristãos vivem e trabalham uns ao lado dos outros, podemos promover a saúde e a sustentabilidade do planeta através de programas educativos comuns dirigidos a desenvolver a consciência ecológica com iniciativas conjuntas. Queridos amigos budistas, podemos colaborar juntos para libertar a humanidade dos sofrimentos causados pelas mudanças climáticas, e contribuir para o cuidado da nossa casa comum. Neste espírito, mais uma vez fazemos votos por uma pacífica e jubilosa festa do Vesakh. Cardeal JEAN-LOUIS TAURAN Presidente D. MIGUEL ÁNGEL AYUSO GUIXOT, MCCJ Secretário No dia 3 de maio O ilustre Prelado nasceu a 16 de setembro de 1931 em Piski (Polónia). Recebeu a Ordenação sacerdotal no dia 26 de junho de 1956. Foi ordenado Bispo em 17 de abril de 1983. No dia 5 de maio D. Benito Cocchi, Arcebispo Emérito de Modena-Nonantola (Itália). O saudoso Prelado nasceu em Minerbio (Itália), a 5 de novembro de 1934. Foi ordenado Sacerdote no dia 14 de março de 1959. Recebeu a Ordenação episcopal em 6 de janeiro de 1975. D. Gabriel Thohey Mahn-Gaby, Arcebispo Emérito de Yangon (Myanmar). O venerando Prelado nasceu no dia 19 de setembro de 1927, em Kanazogon (Myanmar). Recebeu a Ordenação sacerdotal a 21 de dezembro de 1951. Foi ordenado Bispo em 2 de fevereiro de 1965. No dia 7 de maio D. Gonzalo López Marañón, ex-Vigário Apostólico de San Miguel de Sucumbíos (Equador). O saudoso Prelado nasceu em Medina del Pomar (Espanha), a 3 de outubro de 1933. Foi ordenado Sacerdote no dia 6 de abril de 1957. Recebeu a Ordenação episcopal em 8 de dezembro de 1984. Início de Missão de Núncio Apostólico D. Paolo Rocco Gualtieri, Arcebispo Titular de Sagona, na República das Seychelles (8 de março). L’OSSERVATORE ROMANO página 16 quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19 Na audiência geral o Papa Francisco comentou a parábola do pai misericordioso Lógica do abraço E desejou ao Brasil que encontre a harmonia e a paz através do diálogo A parábola do pai misericordioso levou o Papa a pensar «nas mães e nos pais em apreensão quando veem os filhos afastar-se enveredando por caminhos perigosos» e «em quantos estão na prisão e têm a impressão de que a sua vida acabou». Disse ele mesmo na audiência geral de quarta-feira 11 de maio, na praça de São Pedro. Bom dia, amados irmãos e irmãs! Hoje esta audiência realiza-se em dois lugares: dado que havia previsão de chuva, os doentes estão na sala Paulo VI, em contacto connosco através de uma grande tela; dois lugares mas uma só audiência. Saudemos os doentes que se encontram na sala Paulo VI! Hoje queremos meditar sobre a parábola do Pai misericordioso. Ela fala de um pai e dos seus dois filhos, e leva-nos a conhecer a misericórdia infinita de Deus. Comecemos pelo fim, ou seja, pela alegria do coração do Pai, que diz: «Façamos uma festa. Este meu filho estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado» (vv. 2324). Com estas palavras o pai interrompeu o filho mais jovem no momento em que confessa a sua culpa: «Já não sou digno de ser chamado teu filho...» (v. 19). Mas esta expressão é insuportável para o coração do pai, que ao contrário se apressa a devolver ao filho os sinais da sua dignidade: a roupa bonita, o anel, o calçado. Jesus não descreve um pai ofendido e ressentido, um pai que por exemplo diz ao filho: «Vais pagar»: não, o pai abraça-o, espera por ele com amor. Ao contrário, a única coisa que o pai quer é que o filho esteja diante dele, são e salvo, é o que o torna feliz, e por isso faz festa. A receção do filho que volta é descrita de modo comovedor: «Ainda estava longe, quando o seu pai o viu e, movido de compaixão, correu ao seu encontro, lançou-se ao seu pescoço e beijou-o» (v. 20). Quanta ternura; viu-o de longe: o que significa isto? Que o pai subia continuamente ao terraço para perscrutar a estrada a ver se o filho voltava; aquele filho que tinha feito de tudo, mas o pai esperava-o. Como é bonita a ternura do Pai! A misericórdia do pai é transbordante, incondicional e manifesta-se ainda antes que o filho fale. Sem dúvida, o filho sabe que errou e reconhece-o: «Pequei... Trata-me como a um dos teus servos» (v. 19). Mas estas palavras dissolvem-se diante do perdão do pai. O abraço e o beijo do seu pai levam-no a entender que foi sempre consideriado filho, não obstante tudo. Este ensinamento de Jesus é importante: a nossa condição de filhos de Deus é fruto do amor do coração do Pai; não depende dos nossos méritos, nem dos nossos gestos, e portanto ninguém no-la pode tirar, nem sequer o diabo! Ninguém nos pode privar desta dignidade. Esta palavra de Jesus anima-nos a nunca desesperar. Penso nas mães e nos pais em apreensão quando veem os filhos afastar-se seguindo por caminhos perigosos. Penso nos páro- cos e catequistas que às vezes se interrogam se o seu trabalho foi em vão. Mas penso também em quantos estão na prisão e têm a impressão de que a sua vida acabou; naqueles que fizeram escolhas erradas e não conseguem olhar para o futuro; em todos os que têm fome de misericórdia e perdão, e julgam que não o merecem... Em qualquer situação da vida, não devo esquecer que nunca deixarei de ser filho de Deus, filho de um Pai que me ama e espera a minha volta. Até na pior situação da vida, Deus espera-me, Deus quer abraçarme, Deus aguarda-me. Na parábola há outro filho, o mais velho; também ele tem necessidade de descobrir a misericórdia do pai. Ele permaneceu sempre em casa, mas é muito diverso do pai! As suas palavras carecem de ternura: «Há muitos anos que te sirvo, sem jamais transgredir ordem alguma... E agora que voltou este teu filho» (vv. 29-30). Vemos o desprezo: nunca diz «pai», nunca diz «irmão», só pensa em si mesmo, gaba-se de ter permanecido sempre ao lado do pai e de o ter servido; e no entanto nunca viveu esta proximidade com alegria. E agora acusa o pai porque nunca lhe deu um cabrito para fazer festa. Coitado do pai! Um filho foi embora e o outro nunca permaneceu realmen- Ao chefe dos Bektashi No sinal da fraternidade Foi um encontro no sinal da fraternidade e do diálogo, que teve lugar antes da audiência geral de 11 de maio, no estúdio da sala Paulo VI, onde Francisco recebeu Sua Graça (Haxhi) Baba Edmond Brahimaj, chefe mundial da comunidade dos Bektashi, uma confraria muçulmana de derivação sufi, fundada no século XVIII na Turquia e que se propagou sobretudo na Albânia. O líder bektashi, acompanhado pelo cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Pontifício conselho para o diálogo inter-religioso, já se tinha encontrado com o Papa em setembro de 2014, por ocasião da viagem pontifícia a Tirana. te próximo dele! O sofrimento do pai é como o do Deus, o de Jesus quando nos afastamos ou porque vamos embora ou porque estamos perto mas sem o estar deveras. Também o filho mais velho precisa de misericórdia. Inclusive os justos, aqueles que se julgam justos, têm necessidade de misericórdia. Este filho representa cada um de nós, quando nos perguntamos se vale a pena labutar tanto, se depois nada recebemos em troca. Jesus recordanos que não permanecemos na casa do Pai para receber uma recompensa, mas porque temos a dignidade de filhos corresponsáveis. Não se trata de «negociar» com Deus, mas de seguir Jesus que se entregou incondicionalmente na cruz. «Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. Convinha, porém, fazer festa...» (vv. 31-32). Assim diz o Pai ao filho mais velho. A sua lógica é a da misericórdia! O filho mais jovem pensava que merecia um castigo por causa dos seus pecados, e o filho mais velho esperava uma recompensa pelos seus serviços. Os dois irmãos não falam entre si, vivem histórias diferentes, mas ambos raciocinam segundo uma lógica alheia a Jesus: se fizeres o bem, receberás uma recompensa, se fizerem o mal serás punido; esta não é a lógica de Jesus, não! Esta lógica é invertida pelas palavras do pai: «Convinha, porém, fazer festa, pois este teu irmão estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado» (v. 31). O pai recuperou o filho perdido e agora pode inclusive restituí-lo ao seu irmão! Sem o filho mais jovem, também o filho mais velho deixa de ser um «irmão». A maior alegria para o pai é ver que os seus filhos se reconheçam irmãos. Os filhos podem decidir se querrem unir-se à alegria do pai ou rejeitá-la. Devem interrogar-se sobre os próprios desejos e sobre a sua visão da vida. A parábola termina deixando o final suspenso: não sabemos o que o filho mais velho decidiu fazer. E isto é um estímulo para nós. Este Evangelho ensina-nos que todos temos necessidade de entrar na casa do Pai e participar da sua alegria, na festa da misericórdia e da fraternidade. Irmãos e irmãs, abramos o nosso coração para sermos «misericordiosos como o Pai»! O Brasil «nestes momentos de dificuldade, siga por estradas de harmonia e de paz, com a ajuda da oração e do diálogo». Foram os votos do Papa no final da audiência. Saúdo cordialmente todos os peregrinos de língua portuguesa, de modo particular aos fiéis brasileiros de Araxá. Ao saudar vocês, queridos peregrinos brasileiros, o meu pensamento vai à sua amada Nação. Nestes dias em que nos preparamos para a festa de Pentecostes, peço ao Senhor que derrame abundantemente os dons do seu Espírito, para que o País, nestes momentos de dificuldade, si- Charlie Mackesy, «O filho pródigo» ga por estradas de harmonia e de paz, com a ajuda da oração e do diálogo. Possa a proximidade de Nossa Senhora Aparecida, que como uma boa Mãe nunca abandona os seus filhos, ser defesa e guia no caminho. Dirijo um pensamento especial aos jovens, aos doentes e aos recémcasados. No próximo domingo celebraremos o Pentecostes. Caros jovens, desejo que cada um de vós reconheça, entre as múltiplas vozes do mundo, a do Espírito Santo, que continua a falar ao coração de quem sabe pôr-se à escuta. Amados doentes, confiai-vos ao Espírito que não vos fará faltar a luz consoladora da sua presença. E a vós, prezados recém-casados, desejo que sejais no mundo transparência do amor de Deus com a fidelidade do vosso amor e a união da vossa fé. Olimpíadas no Rio Na audiência estava presente, entre outros, uma delegação de atletas paraolímpicos que se preparam para os próximos Jogos. No Rio de Janeiro, pela primeira vez, a sede geral de uma seleção olímpica será numa paróquia. A iniciativa foi tomada por Luca Pancalli, presidente da comissão paraolímpica italiana, com o cardeal Tempesta, arcebispo do Rio, e com a colaboração do cardeal Ravasi, presidente do Pontifício conselho para a cultura. «Não hotéis nem círculos desportivos — explica Pancalli — mas a paróquia da Imaculada Conceição, porque queremos compartilhar com a comunidade os valores de integração e inclusão social que representam a verdadeira essência do nosso movimento». Em vista dos Jogos, os atletas paraolímpicos italianos comprometer-se-ão na construção de uma estrutura desportiva para portadores de deficiência na paróquia de São Geraldo, «uma das favelas mais pobres», explicou o padre Leandro Lenin, responsável pela pastoral desportiva da arquidiocese.