A UTILIZAÇÃO DOS JOGOS, BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS NA
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A UTILIZAÇÃO DOS JOGOS, BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS NA
ARTIGO A UTILIZAÇÃO DOS JOGOS, BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS NA APRENDIZAGEM DA NATAÇÃO Cristiane Abranches Pereira ~ e n d a * RESUMO Apresenta-se neste estudo a importância da utilização de jogos, brinquedos e brincadeiras no processo educacional. Utilizar estes recursos como recurso de ensino traz o lúdico para o processo ensino-aprendizagem, o que é essencial para um melhor desempenho dos alunos, principalmente quando se trata de crianças. Sugere-se, então, a utilização de jogos, brinquedos e brincadeiras também na aprendizagem da natação, substituindo uma metodologia tradicional composta de atividades repetitivas e monótonas. Palavras-chave: jogos, brinquedos, aprendizagem da natação. O presente estudo tem como ponto de partida uma experiência pessoal enquanto professora de natação. Sempre procurei proporcionar, em minhas aulas, o lúdico, a presença dos brinquedos e das brincadeiras, para que o objetivo proposto fosse alcançado de forma mais agradável e motivante para os alunos. Esta metodologia me levou, várias vezes, a entrar em conflito com alguns pais, por acreditarem que em aulas de natação não é lugar de brincar. Mesmo após explicar-lhes que por trás de cada atividade realizada de forma lúdica estavam sendo trabalhados processos básicos da natação, os pais coiitinuavam recriminando o uso de brinquedos e brincadeiras durante as aulas de natação. Como tinha consciência do que estava desenvolvendo lios meus alunos e consciência principalmente da importância do Iúdico no processo de aprendizagem, continuei a utilizar os brinquedos e as brincadeiras como uma estratégia nos processos de ensino e aprendizagem. Os brinquedos e as brincadeiras jamais foram utilizados como um fim para o ensino da natação, mas como um meio de tornar este ensino mais eficaz. O uso de brinquedos e brincadeiras como estratégia alcançava grandes resultados no aprendizado da natação pelos alunos. O Iúdico deveria estar sempre presente em ambientes que envolvam a aprendizagem, principalmente com ,crianças. Mas, cada vez mais, os educadores, do ensino formal ou não, neste caso na área da educação física, têm que rever suas ações perante os alunos, devem ter consciência entre a teoria e a prática, saber selecionar e aplicar estratégias de ensino de acordo com as necessidades de um aluno em especial, ou de acordo com as características de toda uma turma. A atuação do professor diante das * Aluna de Pós-Graduação da Faculdade de Educação - USP. Bolsista de Mestrado CNPq. 51 R. min. Educ. Fís., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 expectativas da sociedade e, principalmente, diante das necessidades físicas, intelectuais, afetivas e sociais do aluno requer um profissional conipetente, atualizado e que goste do que faz, para que, desta forma, o faça bem. Quando nos deparamos, aqui em especial, com os processos de ensino e aprendizagem na natação, estes parecem estar limitados a um conteúdo a ser transmitido pelo professor e recebido pelo aluno. Mas é preciso lembrar que este c o ~ t e ú d oserá melhor assimilado se for vivenciado com prazer e motivação. Assim, por que não aprender brincando? Brinquedo e cultura O brincar não tem idade! Este verbo nos acompanha diariamente. O brincar é uma atividade voluntária e muito prazerosa, acessível a todo ser humano, de qualquer idade, classe social ou condição econômica. Nos dias atuais, a infância e a vida dos adultos, de forma geral, vêm sofrendo com a correria do dia-a-dia. O lazer, por muitas vezes, tem sido deixado para segundo plano. Temos nos deparado com limites para brincar! As ruas e as praças já não são tão mais seguras como eram em épocas atrás. Os brinquedos que antes eram tão mais simples, como os ioiôs, as bonecas de pano e as amarelinhas, se transformaram em sofisticados brinquedos eletrônicos. Hoje, tudo mudou! O desenvolvimento tecnológico e o aumento da violência, além da diminuição dos espaços físicos disponíveis, mudaram a forma da brincadeira. As pessoas têm se adaptado a esta nova realidade abandonando os grandes locais que poderiam ser utilizados para brincar e se confinando nos.prédios, nas escolas, nos clubes e nas instituições que ainda abrem as portas para as atividades lúdicas. O trabalho em excesso, a falta de tempo livre e os problemas encontrados nas grandes cidades vêm sufocando o lazer espontâneo. Se analisarmos os brinquedos habituais, veremos que eles não passam de uma reprodução do mundo adulto, como também uma manifestação cultural. Termos como brincadeiras e jogos não podem continuar sendo designados somente para crianças, mas também, e por que não, para os adultos. Se analisarmos o brincar, veremos que este tem traços culturais específicos. Ele faz parte de um contexto social que influenciará o comportamento, assim como a construção e atribuição de significados desde o nascimento da criança. Por isso, o brincar tem funções sociais que irão justificar sua existência. Seu valor cultural é tão rico que, através de um brinquedo, podemos compreender determinada cultura e toda uma sociedade. O brincar reflete a imagem cultural do mundo ao qual o indivíduo pertence, assume um valor diferente conforme cada cultura. O ato de brincar e o uso de determinado brinquedo ou brincadeiras são formas pelas quais a cultura é transmitida. Temos referências culturais através do brinquedo. De acordo com o momento histórico em que vivemos, estas referências culturais tendem a ser modificadas, não somente pela época, como também pela diferenciação de gênero, idade, meio social, escola, família, região, país, dentre outros aspectos. Não podemos deixar de destacar, nos dias atuais, a influência da 52 R. min. Educ. Fís., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 mídia na vida das crianças, como também na dos adultos. A mídia, por muitas vezes, impõe determinados brinquedos que, nem sempre, podem ser consumidos por todos, mas trazem consigo alguma manifestação cultural específica a classe social na qual o fabricante do brinquedo pretende atingir. E, ao falarmos da mídia, nos deparamos com a influência da televisão sobre os brinquedos e o seu uso. A televisão tem um grande poder de comunicação, que atinge todas as classes sociais. Ela transmite o lúdico de acordo com a estrutura e a influência da sociedade e é capaz de trazer de volta brincadeiras de outras épocas, mesmo que fora de nosso contexto atual, devido ao seu poder de persuasão. Existe uma forte relação entre o brincar e a cultura, porém, de acordo com HUIZINGA (1980), o brincar, apesar de ser influenciado pela cultura, pode existir independente dela, como no exemplo dos animais, que apresentam um comportamento Iúdico. A importância do brincar nos dias atuais se torna essencial para nossas vidas, pois no brincar nos deparamos com o lúdico. Conforme FEIJO (1992, p.60), "o lúdico é uma das necessidades básicas da personalidade, do corpo e da mente. O lúdico faz parte das atividades essenciais da dinâmica humana. A atividade lúdica caracteriza-se por ser espontânea, funcional e satisfatória. Sendo o lúdico uma atividade espontânea, ele se coloca no mesmo grupo de todas as necessidades da pessoa, fazendo do lúdico algo /No essencial quanto o respirar e o receber afiro ". TOFFLER e TOFFLER (1994) sugerem que a nova sociedade exige não apenas mais qualidades diferentes de trabalho, e sim, também, mais qualidades diferentes de Inzer. Cabe, portanto, localizarmos a raiz desta questão tão iinportaiite c icpeiisarinos o papel do Iúdico como um fator fundamental para viveriiios coiii inais qualidade, como também para tornar a aprendizagem de iiossos nliiiios iiiais motivante. UMAABORDAGEM SOBRE OS BRINQUEDOS E AS BRINCADEIRAS Muitos briiiqliedos c brincadeiras surgiram de uma mistura de raças e troca de culturas. N5o se sabe a origem destes jogos, os quais são traiisinitidos de geração a geração e passam, até mesmo, a ser considerados Lima atividade folclórica. Os termos aqui abordados são analisados a partir do cotidiano de uma determinada época. E importante destacar que os comportamentos considerados Iúdicos apresentam significados distintos para cada cultura. Os jogos, os briiiquedos e as brincadeiras, por muitas vezes, recebem a mesma conotação, mas apresentam características próprias. O jogo tem vários elemeiitos que o caracterizam: o uso de regras, a ação voluntária de quem o utiliza, o caráter iião-sério e o prazer (KISHIMOTO, 1994). Eles estimulam 53 R. inin. Educ. Fís., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 a descoberta e a reflexão, como também desenvolvem habilidades cognitivas, motoras e sociais. O jogo segue uma seqüência. Integra as pessoas, proporcionando a cooperação, a socialização e, também, a competição. O jogo pode se apresentar como função social ou como função escolar, dependendo de como é utilizado e com qual objetivo. Para existir o jogo, é preciso que os participantes se entendam, é preciso existir a comunicação. O brinquedo, por sua vez, refere-se a um objeto material. É o suporte da brincadeira. Ele estimula a imaginação e a fantasia da criança, que, por muitas vezes, designa ao objeto seus próprios significados. O brinquedo tem a função de mediador entre o mundo adulto e o infantil. Ele substitui o objeto real, mas não necessariamente como réplica idêntica (KISHIMOTO, 1994). A brincadeira é a ação livre e espontânea de brincar. Ela é autoorganizada, com regras preestabelecidas ou estabelecidas no ato de brincar. A brincadeira é sempre um ato imaginário que auxilia o ser humano a ser flexível e capaz de se adaptar a novas situações, portanto, a ser criativo (KISHIMOTO, 1994). Após abordar os termos jogo, brinquedo e brincadeira, torna-se possível diferenciá-los: jogo: designa objeto aliado às regras do jogo da criança; brinquedo: é o objeto da brincadeira; e a brincadeira é a ação de brincar utilizando o imaginário. E necessário reconhecer algumas características comuns entre eles, como: a conduta espontânea dos participantes, a utilização de regras, o prazer e, principalmente, a presença do caráter Iúdico. "As funções dos jogos e brinquedos estão voltadas não somente para o mundo das emoções e da sensibilidade, mas também para o domínio da inteligência, colaborando em linhas decisivas para a evolução do pensamento e de todas as outras funções mentais superiores. O brinquedo é o caminho pelo qual a criança reproduz o mundo que vive" (FERREIRA, 1995). Ao analisarmos os jogos, brinquedos e brincadeiras como um ineio de exploração do ambiente e da imaginação, nos deparamos com as referências psicopedagógicas de Bruner. O jogo permite uma modificação dos padrões de comportamento social. IVo jogo há a possibilidade de experimentar ou, até mesmo, de se arriscar a cometer erros sem o risco de uma punição. Além disso, Bruner sugere que a brincadeira tem um grande potencial para a descoberta das regras e a aquisição da linguagem. Ao brincar, a criança não se importa com os resultados, pois o prazer e a motivação que a conduzem direcionam-na, também, à ação e a explorações livres. O comportamento Iúdico, que não visa o resultado final, inas o processo de brincar, auxilia na exploração e na variação da própria brincadeira. Qualquer pessoa que brinca não tem medo de ir além daquilo que foi proposto, justamente pela ausência de avaliação. O brincar também auxilia no processo de socialização, pois a criança que convive bein com os companheiros numa brincadeira, possivelmente, irá se adaptar bem a sociedade adulta (KISHIMOTO, no prelo). A brincadeira é um precioso instrumento para auxiliar na formação da criança, já que não a pressiona a apresentar determinado comportamento. 54 R. min. Educ. Fis., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 Porém, seria interessante complementar este processo de formação com outras atividades não-lúdicas. Com o jogo, a criança apresenta autonomia e autenticidade. Por isso, o jogo tem sido recomendado a ser utilizado desde o nascimento da criança, porque integra ações sensoriomotoras, responsáveis pela estruturação dos primeiros conhecimentos construídos. Com a brincadeira, a criança se movimenta, conversa, soluciona problemas e, a partir daí, explora o mundo a sua volta, busca novas possibilidades, foge aos padrões estabelecidos e utiliza sua criatividade. Desse modo, o adulto que atua nesta área tem um poderoso instrumento, já que a brincadeira permite a participação e iniciativa por parte do aprendiz. Assim, o uso da brincadeira pode auxiliar o processo de buscas de soluções, enfim, de aprendizagem (KISHIMOTO, no prelo). Opapel do brinquedo na educação Sempre que nos deparamos com a utilização do brinquedo nas salas de aula de nossas escolas, ou em qualquer situação em que ocorram os processos de ensino e aprendizagem, uma questão é problematizada: o brinquedo, quando utilizado na educação, é brinquedo ou material pedagógico? O jogo, o brinquedo e a brincadeira podem e devem servir como material pedagógico, porém sem perder o seu caráter lúdico. A liberdade e a espontaneidade características do jogo devem ser respeitadas com uma certa orientação por parte do educador sim, mas orientação esta para que não se perca, em meio ao momento lúdico, o objetivo educacional que está por trás da atividade. Por que não se aprender brincando? Por que não ter no jogo um recurso auxiliador e facilitador para os processos de ensino e aprendizagem? O jogo só não poderá ser visto como um fim para a educação, porém ser utilizado pela sua função facilitadora do ensino, como também pelo seu caráter motivante e agradável. , O jogo, quando utilizado na educação, jamais poderá deixar de ser visto e utilizado pela criança como brinquedo, só por estar sendo utilizado em uma sala de aula ou qualquer outro ambiente que envolva os processos de ensino e aprendizagem. O sucesso deste recurso educativo depende da capacidade do educador de relacionar o que foi explorado de forma Iúdica ao conteúdo disciplinar que se objetivou alcançar. A participação do professor durante a atividade, a organização do espaço e a utilização adequada do brinquedo serão de grande relevância para o momento lúdico, como principalmente para alcançar o objetivo educacional. Acredito que a resistência por parte de nós educadores em não utilizar o brinquedo para ensinar determinado conteúdo aos nossos alunos ocorre devido a excessiva preocupação que damos aos resultados e não ao processo para se chegar até ele. "O jogo é educativo em sua essência. Em qualquer tipo de jogo a criança se educa" (KISHIMOTO, 1994). E, mesmo assim, continuamos a desvincular o jogo da criança em nossas aulas. Não quero dizer com isso que o jogo deva ser utilizado de forma rotineira ou para o ensino do todo e qualquer conteúdo. Quero dizer que, quando reconhecemos no jogo um grande amigo da criança, que não ressalta seus 55 E.min. Educ. Fis., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 erros, que estimula a investigação e a solução de problemas, que permite a expressão, a exploração, a criação e a interação ao grupo social, dentre muitos outros benefícios, estaremos caminhando lado a lado com o mundo da criança. Através do jogo, fica mais fácil transmitir conhecimentos variados, auxiliar no seu desenvolvimento afetivo, cognitivo, social, motor e cultural, sem perder de vista o real objetivo das instituições de ensino, que é: formar seres humanos críticos, criativos, produtivos, capazes de atuar e transformar o meio social. Os jogos, brinquedos e brincadeiras, quando utilizados durante a aula de natação, possibilitam ao aluno vivenciar e adaptar-se ao meio líquido de maneira mais agradável e prazerosa. Fornece também uma maior descontração e uma menor preocupação com o resultado final da aprendizagem. E por que não dizer que o Iúdico minimiza o medo de estar no meio Iíquido, que é tão diferente do nosso habitual? A NATAÇÃO E A SUA APRENDIZAGEM Cada vez mais, as pessoas procuram as atividades físicas como a natação devido aos vários benefícios que proporciona, os quais, segundo ADAMS (1985), são os seguintes: melhoria da postura, reeducação respiratória, baixo impacto, melhoria do sistema cardiovascular, melhoria das capacidades físicas (força, equilíbrio, resistência, coordenação), dentre outros. "A natação é um meio que traz benefícios tanto físicos quanto mentais, graças aos exercícios e a participação" (ADAMS, 1985). As atividades aquáticas podem oferecer situações de sucesso e satisfação para qualquer pessoa. A contribuição da natação para a manutenção da saúde e do bem-estar, como na promoção da auto-estima, pode ser muito significativa para o desenvolvimento da criança. A natação, talvez mais do que qualquer outra modalidade esportiva, atrai pessoas de todos os tipos e condições físicas. Mesmo as pessoas mais comprometidas, em uma referência especial aos defícientes, podem obter grande satisfação com as atividades desenvolvidas na água. O nadar, por acontecer no meio Iíquido, requer adaptações rigorosas, por se tratar de um meio diferente do nosso habitual. A adaptação ao meio Iíquido e as mudanças que possam ocorrer no mesmo é uma condição indispensável para a sobrevivência do indivíduo. Falar em adaptação é ressaltar a capacidade de convivermos em determinado ambiente, respeitando valores sociais, culturais, como também o ritmo do desenvolvime~ito individual e as limitações deste meio. "O nadar, por acontecer no meio líquido, é por vezes considerado uma habilidade motora não muito natural do ser humano" (MANOEL, 1995). Geralmente, no primeiro contato com o meio líquido o aluno sente alterações em seu corpo, que, na maioria das vezes, são normais. E necessária uma adaptação gradual, com a finalidade de evitar o "trauma de água", como também para não ultrapassar as importantes etapas do aprendizado da natação. São elas, conforme CABRAL et al. (1995), as seguintes: adaptação, respiração, visão subaquática, flutuação, deslize 56 R. min. Educ. Fís., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 frontal e dorsal, iniciação da pernada, lateralidade, braçada, até chegar no ensino dos nados propriamente dito. Quando nos referimos ao desenvolvimento e a apreridizagem de um indivíduo, não podemos deixar de analisar que estes aspectos ocorrem nos mais variados tipos de ambiente que cercam este indivíduo, entre eles estão os ambientes familiar, social, cultural, entre outros. E, em cada um destes ambientes, as interações sociais se apresentam de formas diferentes (SHULTZ et al., 1982). Cabe ao indivíduo adaptar-se a estas diferenças, que nos levam a deparar com as dificuldades interacionais encontradas entre alunos e professores, pois ambos estão presentes nos processos de ensino e aprendizagem, trazendo consigo influências culturais que, por muitas vezes, interferem nesta inter-relação. O professor, por sua vez, tem 1 que se tornar um agente que consiga lidar com a inter-relação social, sem i' que ocorra discriminação cultural, que pode influenciar, de forma negativa, a aprendizagem. Não cabe ao professor rotular seus alunos de acordo com seus próprios valores culturais, mas sim tentar integrar o conjunto de culturas trazidas pelos alunos e torná-las em uma só cultura que favoreça o ambiente de sala de aula, neste caso, a piscina. Os alunos, de forma geral, e principalmente enquanto crianças, se confrontam com interações no meio escolar que se diferenciam da interação no meio familiar e vice-versa. Saber reconhecer estas estruturas e utilizá-las é conhecer os vários tipos de competência que são utilizados em determinadas situações, em vez de interpretar as variações comportamentais por "iiicompetência ou deficiência" (SNILTZ et al., 1982). A aprendizagem i ~ ã oé proveniente somente do meio escolar. Também ocorre de forina individual e baseada nas estruturas já preestabelecidas, como a física, a psíquica e a cultural; porém, é importante destacar que a aprendizagein da natação tem uma ênfase no domínio motor. O ensinar e o aprender estão cada vez mais relacionados a uma nova concepção de inundo e de ciência. Ciência esta que tem sido a principal expectativa da nova sociedade, para melhorar a condição de vida. A coerência entre o discurso e a ação torna o professor facilitador da aprendizagem ou não, da iiiesina forma que o gostar do que se faz e ter conhecimento são fatores que contribuem para a efetividade do ensino (MASETTO, 1996). O processo de ensino é decorrente de uma prática pedagógica em que relações do professor com o ser, o sentir, o saber e o fazer são essenciais para a apreiidizagem. Ninguém pode ensinar bem alguma coisa se não consegue para si uma resposta sobre a finalidade deste conhecimento. A relação do professor com o saber é a percepção de como se dá o conhecimento em aula. O que é aprender e o que é ensinar? Segundo BORDENAVE e PEREIRA (1994), aprendizagem significa modificação relativamente permanente no coinportainento humano, ocorrido como resultado de algum estímulo interno ou externo. E ensino é um processo qus facilita a outra pessoa a desenvolver-se inoral e intelectualmente. Coin base nestes conceitos, faço ineu o questionamento realizado por MASETTO (1996), sobre como tein sido a nossa participação na criação e organização da aprendizagem de nossos alunos. Será que estamos, enquanto educadores, R. min. Educ. Fís., Viçosa, 7(1): 5 1-63, 1999 57 realmente facilitando a aprendizagem para os nossos alunos, objetivando o seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e social? Será que, nas nossas estratégias de ensino, temos envolvido nossos alunos como pessoas que sentem, que têm suas próprias idéias, que trazem consigo toda uma bagagem cultural e influências do seu meio social? E em uma abordagem relacionada aos objetivos educacionais, "para quem estamos ensinando? O que estamos ensinando, como estamos ensinando? Para que e quando ensinar são indagações que, como educadores, em nossa prática diária, devemos sempre nos questionar" (LIBANEO, 1990): E, desta forma, refletir sobre as nossas ações perante nossos alunos (SHON, 1992). O BRINQUEDO E A BRINCADEIRA COMO AUXILIADORES NA APRENDIZAGEM DA NATAÇÃO Várias são as influências que levam uma criança ou um adulto a se dedicar a natação: por uma questão da prática esportiva, pelo fator saúde, pela estética ou pelo simples prazer do contato com a água. A água atrai o liomem de qualquer idade, ainda mais uma criança. "Caberá ao professor motivar suas aulas de um modo tal que o aluno sinta a necessidade de ir a piscina" (MACHADO, 1984). Há vários tipos de motivação: a exercida pelo professor, a exercida pelo grupo e a exercida pelo aluno. O professor motiva uma aula pela sua disposição, pelo seu relacionamento com os alunos e pela sugestão de atividades adequadas ao nível de seus alunos. A motivação dos alunos se dá de. forma intrínseca, pelo seu próprio prazer de realizar a atividade. ou de forma extrínseca. auando asDectos como a im~ortânciae a necessidáde de aprendizagem estãb envolvi'dos. O grupo mitivado pode facilitar o desenvolvimento de uma aula quando apresenta um mesmo objetivo e, em conjunto, trabalha para que possa atingi-lo. O uso dos brinquedos e brincadeiras no aprendizado da natação apresenta-se relevante pela grande motivaçãa, descontração e prazer que o jogo oferece e proporciona ao ser humano. A motivação e o prazer são responsáveis por grande parte do progresso do aluno. As condições em que a aula ocorre e as condições ambientais têm forte relação com a motivação. E existe um ambiente mais agradável do que vivenciarmos os processos de ensino e aprendizagem utilizando o Iúdico? Alguns exemplos práticos da utilização dos brinquedos e brincadeiras em aulas de natação podem ser citados (MACHADO, 1984): 1 - Atividade: trenzinho. Um aluno atrás do outro segurando na cintura do colega se movimentam dentro da água, podendo variar a direção e o ritmo. O ob-jetivodesta atividade é manter o contato com a água e a sua resistência aos movimentos. 58 R. min. Educ. Fis., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 Figura 1 - Primeira atividade - trenzinho. 2 - Atividade: pegar o tesouro. Bolinhas de vidro, pedras, argolas coloridas ou qualquer outro material equivalente serão lançados ao fundo da piscina e os alunos deverão encontrá-los e recolhê-los, o máximo que conseguirem. O objetivo desta atividade é desenvolver a visão subaquática. - -- Figura 2 - Segunda atividade - pegar o tesouro. 3 - Atividade: o reboque. Em duplas, um dos alunos estende-se em decúbito ventral e segura na cintura do colega. Enquanto um caminha pela piscina, o outro está em flutuação. Depois há a inversão de funções. O objetivo da atividade é a própria flutuação. Figura 3 - Terceira atividade - o reboque. R. min. Educ. Fís., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 59 Ao analisarmos a atividade número um, veremos que, pelo seu objetivo, ela poderia ser realizada de várias outras formas, sem a presença do Iúdico. Por exemplo, cada aluno poderia caminhar sozinho, em sua própria raia, o que não teria tanta motivação. Ao passo que, com o uso de uma simples e antiga brincadeira, como o trenzinho, os alunos alcançam o objetivo proposto com mais alegria e descontração. Na segunda atividade, poderíamos apenas pedir para que os alunos mergulhassem a cabeça e olhassem o chão da piscina. Estaria sendo trabalhada a visão subaquática do mesmo jeito, mas sem nenhum atrativo. A presença de bolinhas, pedras, argolas, ou seja, a presença do brinquedo, torna a atividade mais motivante para os alunos. A terceira atividade, como as outras citadas anteriormente, poderia ser realizada de outra forma. O aluno seguraria na borda da piscina, ou com o apoio de uma prancha, e estaria desenvolvendo a flutuação da mesma forma. Contudo, com a ajuda do colega, a atividade torna-se mais agradável, proporciona um contato maior entre os colegas e alcança, de forma lúdica, o objetivo desejado. Nos exemplos de simples atividades, torna-se claro o quanto o uso de brinquedos e brincadeiras é importante no ensino da natação. Não diria somente no processo de iniciação, como também para o aprendizado de movimentos mais complexos, como uma técnica correta. O desenvolvimento de atividades utilizando o jogo, os brinquedos e as brincadeiras nas aulas de natação pode ampliar as possibilidades de aprendizagem. Segundo SAMULSKI (1997), alguns cuidados devem ser tomados pelo professor para a realização das atividades: assegurar as condições básicas para o jogo; planejar bem a atividade; criar condições de segurança necessária para o jogo; ampliar as experiências de jogo; resgatar os jogos conhecidos pelos alunos e adaptá-los ao objetivo da aula; e evidenciar a tarefa do jogo: as idéias do jogo, suas regras e o espaço seriam alguns dos cuidados a serem tomados pelo professor para o sucesso de uma aula. E, finalizando, cabe ao professor saber dirigir a atividade proposta. Scheuerl, citado por SAMULSKI (1997, p.114), sugere que "uma direção educacional é possível quando o educador se coloca por trás das exigências do jogo, coloca todas as exigências educacionais a serviço do jogo". Em um ambiente no qual o jogo se faz presente, a iniciativa do professor só será bem sucedida quando ocorrer a participação efetiva dos alunos. Os jogos, brinquedos e brincadeiras utilizados como estratégia e recurso para o aprendizado da natação destacam a presença do fator inotivacional. Motivar, seguiido FEIJO (1992, p.151), "é o processo de mobilizar necessidades preexistentes que sejam relacionadas com os tipos de comportainento capazes de satisfazê-las. Quando a pessoa percebe a relação de convivêiicia entre sua necessidade e o comportamento que lhe foi apresentado, iiaturalmente se interessará por ele, tentando reproduzi-lo. A motivação foi processada e a atividade realizada". SAMULSKI (1992, p.55) aborda a inotivação como "um processo ativo e intencional dirigido a uma meta, o qual dependa da iiiteração de fatores pessoais (intrínsecos) e ambientais (extrínsecos)". A motivação é o comportamento composto de 60 R. rnin. Educ. Fís., Viçosa, 7(1): 51-63, 1999 intenções, interesses, motivos e metas, o que nos leva ao encontro da autorealização. A motivação é um dos melhores pré-requisitos para o rendimento. Ela funciona como estímulo, como atrativo para a realização do que está sendo proposto. Estando o aluno motivado, vivencia melhor o processo de aprendizagem, valorizando o êxito e não tendo preocupações excessivas com o fracasso. A motivação apresenta-se como um facilitador da aprendizagem. Ela funciona como um meio auxiliador tanto dos aspectos cognitivos quanto dos motores e emocionais. Enfim, a utilização do Iúdico contribui para a motivação e, com isso, para a aprendizagem, pois torna as atividades propostas mais estimulantes, prazerosas, proporcionando a socialização do grupo, e, principalmente, oferece uma sensação de sucesso. O lúdico e a motivação caminham lado a lado, pois desenvolvem a integração e a cooperação social, uma aprendizagem dinâmica, autonomia, autoconfiança, participação ativa, atribui responsabilidades, reforça e estimula o aprendizado, permitindo que o aluno vivencie, explore e crie. CONSIDERAÇOESFINAIS Estamos, a cada dia, caminhando para uma sociedade do conhecimento, na qual a exigência não e somente intelectual, mas também do equilíbrio emocional diante de determinadas situações que podem ocorrer no dia-a-dia (DRUCKER, 1995). Os diferentes modos de vida que as pessoas levam ressaltam a importância de se viver o Iúdico em qualquer tipo de cultura existente em uma sociedade, região ou país. Diante desta exigência social, não podemos mais ver e tratar o nosso aluno como se este somente precisasse de incentivos para o seu desenvolvimento cognitivo e motor, pois nós, seres humanos, somos formados e movidos por um conjunto de habilidades, de capacidades, de sentimentos e de emoções, como também de limitações que precisam ser respeitadas. O desenvolvimento global do indivíduo deve ser a prioridade do educador. Segundo PALMER (1990, p. 19), "todas as crianças adoram jogar. A atividade tratada com o jogo torna a tarefa mais divertida, podendo ser desenvolvida de acordo com a idade e a capacidade dos alunos e devem ser sempre orientados e supervisionados pelos professores ... nadar é divertido: cabe ao professor fazê-lo o tempo todo". Os jogos, os brinquedos e as brincadeiras, em sua essência, desenvolvem atitudes e habilidades em .quem os vivencia. E a valorização destes recursos como auxiliadores para o ensino e a aprendizagem, em especial, aqui neste estudo, para o ensino da natação, é reconhecer que o Iúdico é fator essencial na vida de todos os seres humanos. R. min. Educ. Fís., Viçosa, 7(1): 51 -63, 1999 61 ABSTRACT It is presented in this study the importante of utilizing games, toys and plays in the education process. Using this conduct like a teaching resort brings the amusement for the teaching- learning process, what is essential for a better students performance, mainly among children. It is sugested the use of games, toys and plays also in the swimming learning, replacing a traditional methodology composed of monotones and repeated activities. Key words: games, toys, swimming learning. ADAMS, J. Jogos, esportes, exercícios para o deficiente físico. São Paulo: Manole, 1985. DIAZ BORDENAVE, J., PEREIRA, A. M. Estratégias de ensinoaprendizagem. 14 ed. Petrópolis: Vozes, 1994. 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