Edição 25 O Voo de Galinha da PPP da Saúde

Transcrição

Edição 25 O Voo de Galinha da PPP da Saúde
Impresso Especial
9912247598/2009-DR/BA
a Revista dos Líderes da saúde do brasil
CRIARMED
O VOO DE
GALINHA
DA PPP DA
SAÚDE
PROIBIDA
VENDA
aNO V | n º 25 | mar/abri 2014 | r$ 50,00
E X E M P L A R
ASSINATURA
D E
Os percalços que estão fazendo o PAÍS jogar pela janela
a chance de tornar a saúde pública mais COMPETITIVA e
ACESSÍVEL PARA MILHÕES DE BRASILEIROS
SUMÁRIO
Ricardo Benichio
08 ENTREVISTA
Catherine Mohr
Para diretora médica da Intuitive
Surgical, os robôs não vão substituir
a expertise humana em cirurgias
16 ARTIGO
Economia da saúde
Hospitais norte-americanos não são
incentivados a adotar estratégias
para redução de erros médicos
24 ENSAIO
Anahp
Francisco Balestrin fala sobre a
importância do Livro Branco:
Brasil Saúde 2015
26 ARTIGO
Eduardo Najjar
Articulista pontua os diversos
desafios que os líderes de empresas
familiares precisam enfrentar
28 ENTREVISTA
Ricardo Izar
Deputado que propôs CPI de órtese
e prótese fala sobre irregularidades
no segmento de OPME
30 ENSAIO
Robert Pearl
Monitoramento doméstico por
smartphones tem futuro, mas é
preciso explorá-lo de forma eficiente
IDADE
32 TERCEIRA
Tecnologia
Franceses inauguram o Silver Valley,
versão do Vale do Silício focada em
pesquisa e tecnologias para idosos
37 ARTIGO
Daniela Artico
STJ reduz a base de cálculo do ISS
devido pelos planos de saúde, mas
discussão está pendente
28
38 ENTREVISTA
Patrick Figgis
DEPUTADO RICARDO IZAR (psd-sp):
regulação dos preços de órteses e próteses
é necessária para a própria sustentabilidade
do mercado de saúde
Líder mundial da divisão de saúde
da PwC acredita que a redução dos
custos não é uma guerra perdida
42 POLÍTICA
Ascensão nordestina
Crescimento da participação de
líderes do Norte-Nordeste nas
entidades tem sido representativo
46 ARTIGO
Adriana Gasparian
Efetividade do ciclo de auditoria
interna em saúde depende do
envolvimento da alta governança
48
Para o presidente mundial da Agfa
Healthcare, o Brasil continua sendo
um mercado importante
CARO GESTOR
Osvino Souza
66 EMPREENDEDORISMO
Magdala Novaes
GESTÃO
PPP da saúde
ARQUITETURA
70 Tendências
Articulista fala sobre a importância
do acompanhamento financeiro de
hospitais e da governança clínica
53
AO PONTO
65 DIRETO
Luc Thjis
Burocracia pública e ideologia são
obstáculos para a implantação das
PPPs na saúde no país
58 ARTIGO
Paulo Lopes
Articulista ressalta a importância
do planejamento, do orçamento
empresarial e da gestão de custos
Acadêmica da UFPE é a
personalidade mais influente em
saúde digital da América Latina
Hospitais mais bonitos do mundo
são referências em sustentabilidade,
acolhimento e saúde-paisagem
76 ARTIGO
Maisa Domenech
A padronização da cadeia de
suprimentos nas unidades tem um
papel fundamental nas finanças
PRÁTICAS
60 BOAS
Smartphones
78 BENCHMARKING
Prêmio
64 ARTIGO
Fernando Machado
84 RESENHA
Liderança
O setor de saúde deverá enfrentar
cinco questões para implantar a
estratégia Byod
Articulista apresenta os desafios para
a rápida construção nas empresas de
uma gestão da inovação
08
Divulgação
CATHERINE MOHR:
Brasil é um dos top 6
no mercado de robôs
cirúrgicos no mundo
Conheça os vencedores do
prêmio que escolheu as melhores
instituições baianas do setor
Livro ensina conceitos de gestão
para a alta cúpula das instituições
de saúde
Divulgação
70
Henry Ford West
Bloomfield Hospital
(EUA): a instituição
possui um shopping de
alto luxo e spa em suas
instalações
EDITORIAL
O mundo é vermelho
A
Roberto Abreu
Transparência Internacional, referência global quando o assunto é estimulo a práticas de compliance, divulga todos os anos
o índice de percepção da corrupção – um estudo amplo, que
envolve praticamente todas as nações do planeta, com a nobre
missão de parametrizar o desvio de conduta nos cinco continentes. Em 2013, o ranking, que vai de zero a 100, ratificou a Dinamarca e a Nova Zelândia (ambos com índice 91) como as nações mais éticas do planeta. Brasil (40) e China (42) estão praticamente empatados, à
frente de Argentina (34) e Rússia (28). Na América Latina, Chile (71) e Uruguai (73)
são as nações mais “limpas” do continente. EUA (73) e Canadá (81) seguem isolados
como os países mais éticos das Américas. Curiosamente, o estudo, que não traz mudanças significativas em relação a 2012, usa uma escala de matizes que vai do amarelo intenso ao vermelho. Quanto mais vermelho, mais corrupto. Vistas de cima, as cores revelam uma realidade desoladora, com mais de 80% das nações do planeta entre
o laranja – primeiro degrau do non-compliance – e o vermelho. Mas há progressos.
A China, por exemplo, acaba de implementar uma lei severa para punir empresas que
comentem atos de corrupção. Inspirada na FCPO (Foreign Corrupt Practices Act)
– legislação americana anticorrupção –, a iniciativa chinesa mostra como a vontade
política de um país historicamente atrelado à pouca transparência e a um ambiente de
corrupção endêmico pode se tornar modelo de transformação. O caso mais recente
foi a punição do governo de Pequim à multinacional britânica GlaxoSmithkline,
flagrada em um escandaloso caso de suborno a médicos e autoridades do ministério
da saúde chinês. A empresa forjava anualmente o patrocínio de eventos médicos para
repassar recursos indevidos a seus corruptores. O esquema foi descoberto após autoridades chinesas constatarem que a documentação comprobatória mostrava registros
fotográficos idênticos, do mesmo ângulo e com mesma cenografia, de encontros
científicos que jamais foram realizados. Um descuido singelo, certamente motivado
pela aposta na impunidade. No Brasil, a aprovação da lei anticorrupção, no início do
ano, é um alento na busca de se criar no país um ambiente mais civilizado quando o
assunto é compliance.
Muito ainda precisa ser feito. E, claro, com o perdão do clichê, cada um precisa
fazer a sua parte. O Movimento pela Ética na Saúde – uma iniciativa conjunta da Revista Diagnóstico, da Anahp e da CNS, como o apoio do Instituto Ethos e do Conselho Federal de Medicina – já pode ser considerado um exemplo de como a sociedade
organizada pode contribuir na construção de um país melhor. A campanha, que teve
início em março, vem mobilizando alguns dos principais atores do mercado de saúde
brasileiro em torno da bandeira de mais ética na saúde. A iniciativa vai culminar em
um evento histórico, em novembro, na capital paulista, quando será realizada a primeira edição do Brasil Healthcare Compliance. Apartidário, o encontro tem como
principal objetivo lançar uma agenda positiva para o setor, com uma programação
de palestras sobre o tema com o presidente do Instituto Ethos, Jorge Abrahão, a americana Rosemary Gibson (autora do livro a A Armadilha do Tratamento), Roberto
D’Ávila (CFM), o ministro da saúde, Arthur Chioro, o presidente da Anahp, Francisco Balestrin, e do presidente da Comissão Ética da Câmara Federal, Ricardo Izar,
entre outros nomes.
Para muitos, as mudanças necessárias para tornar a saúde brasileira mais ética
demandará anos, até mesmo décadas, para surtir efeito significativo. Que tal começarmos o quanto antes?
Reinaldo Braga
CEO/Publisher
Diretor Executivo
Publisher
Reinaldo Braga
[email protected]
Repórteres
Brasil
Eduardo César – [email protected]
Gilson Jorge – [email protected]
Adalton dos Anjos – [email protected]
Regiane Oliveira – [email protected]
Estados Unidos
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Inglaterra
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Financeiro
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Ricardo Benichio
Roberto Abreu
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Revisão
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Vox - São Paulo
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CEP: 40155-150 | Salvador-BA
Tel: 71 3183-0360
Realização
A Revista Diagnóstico não se responsabiliza pelo conteúdo
dos artigos assinados, que não refletem necessariamente a
opinião do veículo.
CORREIO
[email protected]
Infelizmente, a falta de ética é um realidade
endêmica em nosso país. Surgiu com Cabral, como
bem frisou o presidente do Ethos, Sergio Mindlin. Mas
não precisamos viver sob a síndrome de Gabriela: eu
nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim...
Olavo Patrick, Porto Alegre-RS
Capa
Falta ética
Mais uma vez a Diagnóstico
está de parabéns ao colocar na
capa de sua última edição um
assunto que interessa a todo o
mercado de saúde, apesar da
insistência de muitos em não
querer falar do assunto. Em
um cenário de recursos cada
vez mais escassos, é mais do
que urgente discutir a corrupção no setor.
T. Q., São Paulo-SP
Não concordo com a tese de
que boa parte dos males que
assolam a nossa nação – a
exemplo da corrupção desenfreada do Brasil – tenha sido
perpetuada pelos portugueses.
Afinal, Portugal não aparece
em nenhuma lista que se
propõe a ranquear os países
mais indecentes do mundo.
E, mesmo que assim fosse,
500 anos é tempo suficiente
para qualquer nação se tornar
grande, até mesmo sob o
ponto de vista da moral e dos
bons costumes.
Manoel Aquino, Rio de
Janeiro-RJ
Quantos tomógrafos a mais
teríamos na rede de saúde
pública brasileira não fosse a
corrupção? Quantas cirurgias a mais seriam feitas se
médicos não éticos deixassem
de ganham dinheiro ajudando
a superfaturar os preços de
órteses e próteses? Quantas
pessoas teriam deixado de
morrer ao serem vítimas de
tratamentos desnecessários,
provocados por médicos que
indicam procedimentos apenas para ser comissionados?
Esses são, caros senhores,
o maior exemplo do custo
Brasil.
Joseci Araújo,
Belo Horizonte-MG
Louvável a iniciativa da Diagnóstico, Anahp e CNS em
prol da ética na saúde. Que
esse vírus do bem se espalhe
em um mercado cada vez
mais prostituído. Precisamos
de bons exemplos.
Altamirando Bonfim,
São Paulo-SP
Entrevista
melhor
hospital para
se morrer
Foi incrível saber sobre a
experiência de pacientes
terminais do Hospital Gundersen Health, de Lacrosse,
Winconsin (EUA). Além da
questão econômica, que faz o
custo do tratamento ser 30%
menor, quando comparado a
instituições convencionais, o
muitos empresários perdem
muito tempo criticando o
ganho das operadoras, em vez
de ser mais competentes para
rentabilizar seus negócios.
exemplo americano mostra
como nós profissionais da
saúde precisamos encarar de
uma forma mais realística o
trato como pacientes em condições irreversíveis. Atender
seus últimos desejos é um
bom começo.
W.B., São Paulo-SP
Direto ao ponto
renato sernik
Cristóvão Menendez,
Florianópolis-SC
Dar ao paciente o desejo de
não querer prolongar sua vida
é uma discussão que precisa
ser encarada sem hipocrisia
em nosso país.
Antônio Faria, Sete Lagoas-MG
Entrevista
marcio
coriolano
Interessante a entrevista com
o médico radiologista e “doutor” em mercado financeiro
Renato Sernik. Acho que todo
médico deveria tomar um
curso de finanças com esse
senhor. Em geral, entendemos
pouco de negócios e menos
ainda de como chegar à velhice sem precisar depender de
plantões.
Amanda Malheiros, Recife-PE
O senhor Marcio Coriolano
me pareceu assertivo
em sua entrevista a esse
prestigioso veículo. De
fato, as operadoras não são
vilãs do mercado de saúde,
contribuem de forma decisiva
para a sustentação da saúde
suplementar e têm papel
importante na melhoria do
acesso à saúde para quem
se dispõe a pagar para ter
serviços melhores. Acho até
que os planos de saúde devem
ser cada vez mais rentáveis,
pois, assim, também terei
minhas contas pagas como
dono de hospital. Acho que
Artigo
adriana
gasparian
Muito oportuno o artigo da
senhora Adriana Gasparian
sobre sustentabilidade na saúde. De tudo que eu li, o que
mais me chamou a atenção
foi a necessidade de estimular
o paciente para que ele seja o
gestor de sua própria saúde. Não me parece possível
ampliar as discussões sobre
o assunto sem que o usuário
também seja visto como ator
no processo. Gustavo Siano-Brasília-DF
Diagnóstico | mar/abr 2014
09
ENTREVISTA
Catherine Mohr
os robôs não vão
SUBSTITUIR O CIRURGIÃO
Para a médica Catherine Mohr, diretora de pesquisa da Intuitive Surgical, líder
global em cirurgias assistidas, o futuro da robótica não exclui o expertise humano
Fotos: Divulgação
Catherine Mohr,
ao lado do da
vinci: Brasil é o
maior comprador de
tecnologia assistida
para cirurgias na
América Latina
10
Diagnóstico | mar/abr 2014
A
s interversões assistidas por robôs,
que representam a
segunda geração de
cirurgias minimamente invasivas, enfrentam o seu maior
dilema desde que foram criadas, há quase
duas décadas: ganhar escala e, ao mesmo
tempo, ter os efeitos adversos dessa expansão sob controle. Em 2013, cresceu
o número de reclamações sobre mortes,
lesões e problemas gerados pelo uso de
robôs em cirurgias nos EUA, segundo o
FDA. Foram 3.697 eventos adversos contra 1.595 no ano anterior. Todo ano, mais
de dois milhões de procedimentos são realizados ao redor do mundo. No Brasil, 12
hospitais – entre eles Samaritano, Sírio-Libanês e Oswaldo Cruz – utilizam esse
tipo de equipamento. “Nossa tecnologia
ajuda a tornar a performance das cirurgias
mais segura, mais eficiente e muitas vezes
com procedimentos mais efetivos”, defende a americana Catherine Mohr, diretora
médica da Intuitive Surgical – líder em cirurgias robóticas no mundo. A companhia,
com sede na Califórnia, na costa oeste
americana, chegou a figurar no top 100 da
revista Fortune entre as empresas que mais
lucram no mundo. No último trimestre de
2013, contudo, a Intuitive registrou queda
de 23% em sua receita. “Acreditamos que
a cirurgia robótica continuará crescendo
no Brasil e no mundo, assim como seus
benefícios econômicos e médicos se tornarão mais evidentes”, aposta a executiva.
O Da Vinci, principal produto da multinacional, é comercializado por valores
entre US$ 1,5 milhão e US$ 3 milhões.
Procedimentos com o uso da tecnologia, a
exemplo de uma cirurgia de próstata, chegam a custar mais de R$ 25 mil no Brasil.
“Operadoras de saúde têm percebido que
o custo-benefício no pagamento de cirurgias assistidas por robôs é mais efetivo,
já que a técnica promove redução dos índices de complicações, readmissões e no
tempo de internação”, defende Catherine.
Questionada sobre a futuro da tecnologia
e o uso da inteligência artificial, a médica,
que também é formada em engenharia mecânica pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), é lacônica. “O cirurgião
está sempre no controle do Da Vinci”, sentencia. “Mesmo assim, é difícil dizer se no
futuro teremos este tipo de recurso, como
nos filmes”. De São Francisco, na Califórnia, onde vive, Catherine, concedeu a seguinte entrevista à Diagnóstico.
Revista Diagnóstico – As cirurgias robóticas ainda enfrentam preconceito por
parte de médicos e pacientes?
Catherine Mohr – Ele já foi maior. Esse
tipo de procedimento está se tornando
mais comum, tanto para pacientes como
para cirurgiões, que estão se conscientizando dos benefícios da cirurgia minimamente invasiva. A cirurgia “robótica”,
aliás, deveria ser pensada estritamente
como cirurgia assistida por robôs. Afinal,
é o cirurgião que realiza a cirurgia através extensores mecânicos, que têm como
principal função propiciar mais destreza
à operação. O benefícios são enormes,
como a redução de complicações, readmissões e o tempo de permanência em
relação a cirurgias abertas. Existe um número crescente de publicações clínicas
que demonstram de forma irrefutável os
benefícios substanciais da técnica de cirurgia assistida pelo robô Da Vinci, em
comparação a cirurgias abertas. Os próprios pacientes que já passaram pelo procedimento têm sido propagadores desse
tipo de tecnologia.
Ao redor do
mundo os
sistemas de saúde
estão evoluindo seus
pensamentos sobre a
cirurgia assistida por
robôs. Operadoras
têm percebido que
o custo benefício no
pagamento desse
tipo de inovação é
mais efetivo, já que
a técnica promove
redução dos índices
de complicações,
readmissões e no
tempo de internação
Diagnóstico – No Brasil, os custos com
cirurgias assistidas por robôs têm sido
repassados, com raras exceções, integralmente para o consumidor final. Esta
é uma tendência em outros sistemas de
saúde privados?
Catherine – Adicionar um novo procedimento de saúde na lista de serviços oferecidos pelas operadoras demanda um
tempo considerável, independentemente
do mercado ou país. No Brasil, alguns
planos de saúde cobrem integralmente
os custos dos procedimentos assistidos
por robôs. Já outros custeiam uma porção, e o custo acaba sendo dividido com
o paciente. O mesmo acontece para muitos tipos de laparoscopias. Ao redor do
mundo, contudo, os sistemas de saúde
estão evoluindo seus pensamentos sobre
a cirurgia assistida por robôs. Em alguns
países, ela está mais estabelecida. Operadoras de saúde têm percebido que o custo-benefício no pagamento de cirurgias assistidas por robôs é mais efetivo, já que a
técnica promove redução dos índices de
complicações, readmissões e no tempo de
internação.
Diagnóstico – O mercado brasileiro detém 1/3 dos robôs em uso na América
Latina, com 12 sistemas. Qual a expectativa de crescimento de vendas para os
próximos dez anos?
Catherine – O Brasil é um dos top 6 no
mercado global de compradores desse
tipo de tecnologia. Na medida em que este
crescimento continua, o Brasil melhora
sua posição global. Por isto, esperamos
oportunidades adicionais para o Sistema
Cirúrgico da Vinci. Os pacientes e os hospitais do sistema público que desejam ter
resultados similares ou melhores do que
a cirurgia aberta, mas com menores complicações e um mais rápido retorno à vida
normal, continuarão a conduzir o crescimento das opções de cirurgias minimamente invasivas.
Diagnóstico – O que China e Índia representam para o avanço da Intuitive no
mundo?
Catherine – O rápido crescimento de economias como China e Índia – bem como
o Brasil – representa oportunidades substanciais para qualquer companhia que
busca uma penetração global. Na Intuitive, desenvolvemos estratégias para cada
um destes mercados. Cada um destes
players, entretanto, apresenta um conjunto único de desafios e oportunidades que
exigem abordagem personalizada.
Diagnóstico – Os custos dos robôs (entre
US$ 1,5 mi e US$ 3 mi) e das cirurgias são
os maiores gargalos para o crescimento
deste mercado. Como ganhar escala em
um cenário tão adverso?
Catherine – No mundo repleto de sistemas de saúde que tentam reduzir os
custos, enquanto aumentam a qualidade,
acreditamos que a cirurgia com Da Vinci pode ajudar a alcançar este objetivo. O
custo do tratamento cirúrgico para qualquer paciente inclui o equipamento na sala
de cirurgia (onde os custos da cirurgia assistida por robôs são mais altos), além do
pós-cirúrgico, complicações, readmissões
e cuidados em longo prazo, cujos estudos
têm mostrado que são menores para cirurgias assistidas por robôs, em comparação
com a cirurgia aberta. Essas economias de
custos tornam o Da Vinci rentável quando
o sistema de utilização é otimizado.
Diagnóstico – Os nanobots continuam
sendo a principal ameaça aos negócios
da Intuitive?
Diagnóstico | mar/abr 2014
11
ENTREVISTA
Catherine Mohr
Catherine – Os nanobots, máquinas que
são tão pequenas que não podem ser vistas a olho nu, são assuntos de pesquisas
acadêmicas consideráveis, mas, ainda,
não têm sido apresentadas com um alvo
clínico claro ou aplicação na medicina.
Para uma tecnologia ser usada em humanos, ela deve se mostrar segura e efetiva.
A pesquisa da Intuitive está concentrada
na área de mecanismos em larga escala
que são mais prováveis de ter valor clínico em curto prazo.
Diagnóstico – Quais os maiores entraves
enfrentados pela Intuitive na área de
P&D?
Catherine – Podemos experimentar qualquer coisa que gostaríamos dentro do laboratório, mas existe uma diferença entre
ser capaz de fazer algo no laboratório e
a transferência de forma segura e efetiva
para terapias clínicas. Alcançar esta transição é um dos maiores desafios de qualquer companhia de dispositivos médicos
inovadores.
Diagnóstico – Os avanços na terapia
celular também podem ser encarados
como desafio competitivo para a robótica médica?
Catherine – Vemos muitas dessas novas
tecnologias biológicas mais como sinérgicas com cirurgias robóticas do que competitivas. Os novos diagnósticos, para a
imunoterapia baseada em células e medicina regenerativa, tecnologias biológicas
no desenvolvimento atual, têm o potencial de algum dia melhorar os resultados
de pacientes. A robótica é uma plataforma
ideal de integração para muitas dessas
tecnologias porque a implantação cirúrgica precisa e minimamente invasiva de novos materiais, como células terapêuticas
para corrigir uma região do corpo, dará ao
paciente o benefício integral da tecnologia biológica, sem grandes incisões.
Diagnóstico – Depois de quase duas décadas de fundação, a Intuitive está perto de perder suas primeiras patentes.
Quem serão esses novos competidores?
Catherine – A Intuitive detém mais de 2,5
mil patentes americanas e internacionais.
Apesar de cada uma destas patentes ter
uma vida finita, continuamos a evoluir e
ampliar nossa tecnologia e apresentar pedidos de patentes com regularidade. Os
competidores potenciais estão emergindo
em muitos mercados, mas eles não têm
compartilhado um cronograma exato em
seus lançamentos.
12
Diagnóstico | mar/abr 2014
Diagnóstico – A queda da receita da Intuitive no quarto trimestre do ano passado poderá se repetir em 2014?
Catherine – Nossos funcionários estão
profundamente comprometidos a aumen-
tar o conhecimento e o sucesso dos programas de cirurgias assistidas por robôs.
Com um foco contínuo na inovação e o
crescimento dos mercados internacionais,
acreditamos que o Da Vinci tem um futuro promissor.
Diagnóstico – Em 2013, cresceu o número de reclamações sobre mortes, lesões e problemas gerados pelo uso de
robôs em cirurgias nos EUA, segundo
a FDA. Foram 3.697 eventos adversos
contra 1.595 no ano anterior. Poderia
comentar?
Catherine – Existem dois fatores específicos para se ter em mente. O primeiro é que
o grande número de procedimentos cirúrgicos sendo realizados a cada ano com o
sistema cirúrgico Da Vinci cresceu substancialmente, portanto o índice de lesões e
problemas segue este mesmo movimento.
Mais de dois milhões de procedimentos foram realizados no mundo. O segundo, que
é importante ser enfatizado, é que tão logo
os incidentes são conhecidos pela companhia, eles são relatados. As lesões causadas por falhas de funcionamento do robô
têm sido sempre comunicadas imediatamente. Apesar de existir um crescente número de reclamações em um ano, o índice
de eventos adversos por cirurgia realizada
tem caído constantemente. Além disso,
devemos ter em mente que a cirurgia por
si só tem riscos inerentes que devem ser
sempre explicados e acordados pelos pacientes. Acreditamos que nossa tecnologia
ajuda a tornar a performance das cirurgias
mais segura, mais eficiente e muitas vezes
com procedimentos mais efetivos, mas os
riscos ainda se aplicam em cada caso e
devem ser devidamente considerados pelo
paciente e pelo seu médico.
Diagnóstico – Mesmo com as diversas
vantagens do uso de robôs cirúrgicos –
períodos de internação mais curtos, menos riscos de infecção hospitalar, mais
precisão no tratamento, entre outros –,
os hospitais brasileiros ainda não conseguem compensar o investimento na
aquisição dos equipamentos e manutenção. Como é esta realidade nos EUA?
Catherine – O sistema de saúde brasileiro é muito diferente do americano, com
considerações únicas. Na Intuitive, continuamos a tentar entender e discutir essas
considerações no desenvolvimento de
nossas estratégias de negócios. Realmente acreditamos que a cirurgia robótica cotinuará crescendo no Brasil e no mundo,
assim como seus benefícios econômicos
e médicos se tornarão mais evidentes no
sistema de saúde.
Diagnóstico – Na contramão das tendências tecnológicas, o Da Vinci, um
dos mais famosos robôs cirúrgicos da
Intuitive, é grande e de difícil transporte. A próxima geração do Da Vinci será
menor, mais barata e com maior portabilidade?
Catherine – Enquanto a tecnologia avança, ela prepara o caminho para arquiteturas menores. Contudo, existem alguns
requisitos de tamanho fundamentais e
necessários para dar flexibilidade na configuração para alcançar qualquer parte da
anatomia dos pacientes, então nós não
antecipamos uma redução significativa
do tamanho. Contudo, isto não significa
que não podemos melhorar a maneabilidade dos sistemas. A última versão do
sistema, o Da Vinci Xi, é autoalimentalinha de montagem do robô
da vinci, NA CALIFÓRNIA,
COSTA OESTE DOS EUA: em
2013, cresceu o número de
reclamações sobre mortes, lesões
e problemas gerados pelo uso de
robôs em cirurgias nos Estados
Unidos, segundo o FDA
As lesões
causadas por
falhas de
funcionamento
do robô têm sido
sempre comunicadas
imediatamente.
Apesar de existir um
crescente número
de reclamações em
um ano, o índice de
eventos adversos por
cirurgia realizada tem
caído. Acreditamos que
nossa tecnologia ajuda
a tornar as cirurgias
mais seguras
da e pode ser conduzida facilmente de
uma sala cirúrgica para outra. Ninguém
pode prever o futuro com certeza, mas
não é irrealista esperar que o Da Vinci
diminuirá e a funcionalidade aumentará,
como acontece normalmente na maioria
das tecnologias assistidas por computador.
Diagnóstico – Quando estes equipamentos serão usados em larga escala
em cirurgias remotas? Quais os principais entraves para que este avanço
ocorra?
Catherine – É tecnicamente possível a
performance de cirurgias remotas com
sistemas como o Da Vinci, e, em alguns
casos, elas têm sido realizadas para demonstrações. Contudo, os principais
obstáculos para ampliar a adoção deste
conceito são as infraestruturas de telecomunicações e os atrasos que poderiam
interferir negativamente na execução
da cirurgia. Também deve ser reconhecido que este tipo de cirurgia requer
treinamentos intensivos de pessoal para
preparar o paciente antes e dar suporte
depois da operação e responder em qualquer emergência. O telemonitoramento é
útil e já foi implantado. Ele permite que
cirurgiões mais experientes, localizados
em grandes distâncias da sala de cirurgia,
guiem os menos experientes que estão
realizando o procedimento. O orientador
pode ver tudo o que acontece no ambiente e ao mesmo tempo, em uma tela ilustra
sugestões e orientações anatômicas.
Diagnóstico – Como foi sua primeira vez
operando com o Da Vinci?
Catherine – Minha primeira experiência
com o Da Vinci na sala de cirurgia foi
quando estava na faculdade de medicina.
Foi a primeira vez que tinha uma cirurgia
sob a minha responsabilidade e tive que
realizá-la com a assistência de um robô.
A cirurgia inédita que realizei foi de redução de estômago, indicada para tratar a
obesidade mórbida. Isto nunca tinha sido
feito desta forma em um paciente, somente algumas vezes no laboratório, e existe
uma grande diferença entre o mundo real
e as simulações. Este procedimento foi
extremamente bem-sucedido e o paciente
não poderia ter ficado mais feliz.
Diagnóstico – É verdade que o uso deste equipamento torna a vida de mulheres cirurgiãs mais fácil?
Catherine – Existem benefícios ergonômicos no uso do Da Vinci para homens
e mulheres. A laparoscopia é desgastante
fisicamente e muitos dispositivos, como
grampeadores, tem manípulos que são
difíceis para ser manuseados por pessoas que têm mãos pequenas. A redução de
tremor, a posição ergonômica do corpo, a
redução da fadiga e os controles com menos força beneficiam todos os cirurgiões
usando o dispositivo. Os cirurgiões habilidosos de muitas especialidades podem
performar clinicamente excelentes procedimentos na maneira mais minimamente
invasiva.
Diagnóstico – Um dia será possível o Da
Vinci operar sozinho?
Catherine – O Da Vinci não é equipado
ou programado para ter inteligência artificial. O cirurgião está sempre no controle. É difícil dizer, contudo, se no futuro
teremos este tipo de recurso, como nos
filmes. O julgamento e a tomada de decisão pelo profissional treinado não pode
ser subestimado na promoção da segurança e nos efeitos dos resultados clínicos. Vamos manter o cirurgião “no laço”
por muito tempo.
Diagnóstico | mar/abr 2014
13
LUIZ DE LUCA
SUPERINTENDENTE DO
HOSPITAL SAMARITANO
14
Diagnóstico | mar/abr 2014
Ricardo Benichio
Mais ética na Saúde.
O mercado precisa.
A sociedade exige.
Movimento pela
Ética na Saúde
UMA INICIATIVA
APOIO
Revista
Diagnóstico | mar/abr 2014
15
16
Diagnóstico | mar/abr 2014
Brasil
Healthcare
Compliance
O maior evento
de compliance
do mercado de
saúde brasileiro.
Novembro | 2014
São Paulo
FRANCISCO BALESTRIN
PRESIDENTE DA AsSOcIAÇÃO
NACIONAL DOS HOSPITAIS
PRIVADOS (anaHp)
ARTHUR CHIORO
MINISTRO DA SAÚDE
roberto dávila
presidente do conselho
federal de medicina (CFM)
Jorge Abrahão
PRESIDENTE do instituto
ethos
Rosemary gibson
escritora americana, autora do
livro The Treatment Trap
(A aRMADILHA DO TRATAMENTO)
RICARDO IZAR
DEPUTADO FEDERAL (psd/sp),
AUTOR DO PROJETO DE cpi
SOBRE ÓRTESE E PRÓTESE NA
cÂMARA FEDERAL
Hospital seguro e com qualidade é também ético
em todos os seus relacionamentos.
FRANCISCO BALESTRIN - PRESIDENTE DA AsSOcIAÇÃO NACIONAL DOS
HOSPITAIS PRIVADOS (anaHp)
Luiz Aramicy
Presidente da Federação
Brasileira de Hospitais (FBH)
Yussif Ali Mere Jr
Presidente do SINDHOSP
paulo fraccaro
presidente da abimo
carlos goulart
PRESIDENTE DA abimed
UMA INICIATIVA
Revista
Movimento pela
Ética na Saúde
APOIO
Diagnóstico | mar/abr 2014
17
ECONOMIA DA SAÚDE
ASSISTÊNCIA
O impacto dos erros médicos
nos custos da saúde
Sem incentivos para adoção de estratégias que reduzam os erros médicos,
hospitais norte-americanos ainda não investem substancialmente na melhoria da
qualidade. Falhas em tratamentos são a quinta maior causa de mortes nos EUA
Shutterstock/Editoria de Arte
O
Charles Andel, Stephen Davidow, Mark Hollander e David Moreno
s hospitais têm buscado formas de melhorar a qualidade e a
eficiência operacional, além de cortar
custos, nas últimas
três décadas, usando
diversas estratégias. A Joint Commission
implementou sua Agenda for Change
(espécie de calendário para mudanças),
em 1986, para melhorar os sistemas, os
processos e, finalmente, os resultados dos
tratamentos. Contudo, não houve ampla
adoção desses princípios, em parte porque os incentivos não foram substancialmente suficientes para superar a inércia
18
Diagnóstico | mar/abr 2014
de muitos hospitais e do sistema de pagamento americano. Todavia, os hospitais
e os sistemas de saúde, que de alguma
forma se movimentaram, apresentavam
excelentes experiências de melhoria da
qualidade, performance financeira, segurança e satisfação dos pacientes. Em uma
entrevista recente, o presidente e CEO da
Joint Commission, Mark Chassin, disse
que somente um quarto dos seis mil hospitais do país realiza algum esforço em
busca da melhoria da qualidade.
Em uma distorção do modelo de tarifação dos serviços, os hospitais se saíam
melhor financeiramente quando os pacientes precisavam de acompanhamento
depois que um erro aconteceu. Desta forma, havia um incentivo através do sistema de pagamento para que a instituição
prejudicasse um paciente o suficiente,
sem matá-lo, para posteriormente oferecer serviços adicionais e poder cobrar
mais por isso. Não há muitos incentivos
para melhoria da qualidade ou economia
de recursos no Medicare. Certamente,
nenhum grande hospital conscientemente decidiu prejudicar pacientes para obter
mais dinheiro, mas o sistema não encoraja nem recompensa o melhor e mais eficiente tratamento.
Uma reforma recente na legislação
nacional de saúde (The Patient Protection
and Accountable Care Act or PPACA)
promoveu diversas provisões para a melhoria da qualidade, incluindo a reestruturação da forma como a saúde é ofertada
nos Estados Unidos através da Accountable Care Organizations (ACOs) [conjunto de prestadores de saúde que trabalham
de forma colaborativa para melhorar a
qualidade e os custos dos serviços aos pacientes] e a compra baseada em valor. O
Centers for Medicare & Medicaid Services (CMS) afirmou pela primeira vez que
interromperá o reembolso dos hospitais
para os dois maiores problemas de custos para o governo, e por extensão para
os contribuintes, (1) readmissões preventivas e (2) instalações de saúde – condições adquiridas como infecções. Antes de
discutirmos o novo sistema de incentivo,
vamos explorar a extensão dos erros médicos e quanto eles custam.
Qualidade e segurança Em 1999, o US Institute of Medicine
(IOM) publicou o esclarecedor relatório
To Err Is Human (Errar é humano), que
contabilizou 98 mil mortes de pacientes
americanos como resultado de erros
médicos evitáveis e quase um milhão de
casos deste tipo. Um erro é definido como
o ato que produz um resultado adverso
que pode ser prevenido em comparação
com a progressão natural da doença que
leva à morte ou a lesões.
O CDC recentemente contabilizou
que outros 100 mil americanos morreram de infecções. Um quarto dos beneficiários do Medicare admitiu ser vítimas
de erros médicos, segundo um relatório
publicado em dezembro de 2010 do Office of the Inspector General (Gabinete de
Inspeção Geral) somente pacientes com
mais de 65 anos ou com alguma deficiência participaram da pesquisa. Cerca de
cinco mil beneficiários por mês sofrem
uma ocorrência imperdoável, e 180 mil
morrem por erros médicos anualmente.
Estudos realizados pela Health Affairs,
em abril de 2011, sugerem que a média
de lesões que poderiam ser evitadas pode
ser até dez vezes mais alta do que as estimativas do IOM. Apesar de 12 anos terem se passado desde que o relatório do
IOM foi publicado, especialistas continuam tendo dificuldades em desenvolver
um cenário concreto do problema, mas é
evidente que o número de vítimas é elevado em termos de mortes, ferimentos e
perdas.
Desafio ainda maior pode ser estimar
os impactos econômicos da má qualidade
e da insegurança nos cuidados nos EUA
porque existem tantos fatores envolvidos
– perda da vida ou funcionalidades, salários perdidos, impactos nos dependentes
da família, ações judiciais, etc.
A maioria das discussões nacionais
sobre a qualidade e segurança dos pacientes se concentra diretamente nos custos médicos associados ao atendimento
deficiente. Os estudos que exploramos
neste artigo fazem justamente isto e parecem estar seguindo a linha das produções
sobre este assunto. No entanto, existe um
custo humano significativo para perdas
de vida ou impactos em pacientes que
foram lesionados e passam a ter que viver com alguma deficiência pelo resto de
suas vidas. O foco da legislação da reforma de saúde é na economia de custos
para o governo por meio da melhoraria
do cuidado. Consequentemente, o benefício é o menor número de pacientes prejudicados.
É fácil esquecer que quando revisitamos os diversos estudos, estamos falando
sobre pacientes – pessoas reais – e seus
familiares. Qual o custo da má qualidade
de atendimento no nível humano? Qual o
valor da vida humana e das relações das
pessoas com seus familiares e, mais amplamente, a relação com a comunidade
de pacientes? Pergunte aos membros da
família e a resposta será incalculável.
Apesar da dificuldade neste tipo de
mensuração, porque o valor da vida individual não é exato, aplicamos uma abordagem econômica usando os anos de vida
ajustados pela qualidade (Qaly – Quality-Adjusted Life Years), em uma tentativa
de desenvolver uma resposta. Baseado no
dado da IOM sobre as 98 mil mortes por
ano com uma estimativa de dez anos de
vida perdidos, entre US$ 75 mil e US$
100 mil por ano, há uma perda de entre
US$ 73,5 bilhões e US$ 98 bilhões em
Qaly por estas mortes – se formos conservadores. Estes números são muitos
maiores que aqueles que citamos de um
estudo que explora os custos diretos dos
erros médicos. E se a estimativa do artigo
recente do Health Affairs estiver correta
– mortes evitáveis sendo dez vezes mais
caras do que as estimativas da IOM – o
custo variaria entre US$ 735 bilhões e
US$ 980 bilhões.
As várias estimativas dos erros médicos apontam falhas do sistema de saúde
norte-americano. A recente reforma na
legislação tem muitas disposições para
melhorar a qualidade e a eficiência dos
serviços prestados pelo Medicare aos
seus beneficiários. Neste artigo, exploraremos diversos estudos e estimativas dos
impactos econômicos dos erros médicos
no sistema de saúde na nação. Embora
não exista uma estimativa específica de
quanto pode ser economizado, é possível
alcançar este objetivo através de um melhor cuidado por meio de mudanças descritas no PPACA. Discutiremos a importância desses estudos e alguns exemplos
anedóticos de hospitais e seus sistemas
de saúde que têm melhorado o tratamento e experimentado significativa redução
de custos.
Discutiremos diferentes caminhos
para ajudar a melhorar a qualidade, que
pode reduzir custos. Um serviço melhor
é um fator importante para os esforços da
legislação PPACA reinar em custos nos
gastos federais para a saúde. Também exploraremos os incentivos e desincentivos
PrincipaIS causaS de morte Nos ESTADOS UNIDOS
Infarto599.413
Câncer567.628
Doenças respiratórias crônicas137.353
Mal súbito128.842
Erros médicos 98.000*
Alzheimer 79.003
Diabetes 68.705
Gripe/Pneumonia
53.692
Nefrose/Nefrite
48.935
Suicídio
36.909
Fontes: Sites da CDC (Centers for Disease Control and Prevention), FastStats: Leading Causes of Death - Principais
causas de morte (Jan.2012); National Vital Statistics Report, Deaths Final Data for 2009, vol.60, nº3; e sobre a estatística
dos *erros médicos, IOM Report, To Err is Human (1998)
Diagnóstico | mar/abr 2014
19
ECONOMIA DA SAÚDE
ASSISTÊNCIA
para a melhor qualidade do cuidado e que
mudanças de comportamento entre prestadores podem ser esperadas, tanto para
as instalações quanto para os profissionais com o objetivo de se alcançar uma
melhor qualidade.
Por meio do PPACA, os hospitais e
outros prestadores que oferecem uma má
assistência, ou abaixo de um padrão, não
serão capazes de participar dos programas do Medicare e do Medicaid. O Medicare é uma fonte substancial de renda
para quase todos os hospitais, serviços de
homecare e médicos, portanto, os impactos poderiam ser significativos.
Não encontramos análises específicas
do impacto econômico das disposições
de qualidade propostas no CBO (Congressional Budget Office) registradas
pela legislação do PPACA, ou análises da
Kaiser Family Foundation, da Alliance
for Health Reform, ou da Heritage Foundation. Ninguém questiona o fato de que
os cuidados em saúde podem ser promovidos de forma mais eficiente operacionalmente e com uma maior qualidade.
No entanto, o desenvolvimento de uma
estimativa significativa para economias
esperadas através de todo o sistema de
saúde americano pode ser bem difícil –
e certamente não é uma estimativa que
qualquer um pode orçar. Se o PPACA
está tendo sucesso em promover o acesso
aos planos de saúde para mais 32 milhões
de americanos, invariavelmente existirá
um crescimento no número de erros médicos se nada for feito para melhorar a
qualidade de atendimento.
QUANTO CUSTA UMA VIDA
PERDIDA COM ERRO MÉDICO?:
segundo estatísticas americanas,
levando em conta uma estimativa
de dez anos de vida perdidos,
esse valor varia entre US$ 75 mil e
US$ 100mil/ano por indivíduo
erros médicos E economia
- Em 2008, os erros médicos custaram
aos Estados Unidos US$ 19,5 bilhões.
Quase 87%, ou US$ 17 bilhões,
estiveram diretamente associados com
algum gasto médico adicional, incluindo
serviços auxiliares, prescrição de drogas
hospitalares e ambulatoriais, de acordo
com um estudo patrocinado pela Society
Actuaries (associação de atuários) e
conduzido pela Milliman (prestadora
de serviços atuariais), em 2010. Custos
adicionais de US$ 1,4 bilhão foram
atribuídos ao crescimento dos índices
de mortalidade com US$ 1,1 bilhão ou
dez milhões de dias de produtividade
perdidos por conta da perda da força de
Shutterstock
20
Diagnóstico | mar/abr 2014
trabalho baseada em benefícios em curto
prazo por conta de deficiências.
O relatório analisou dados de reclamações para extrapolar uma estimativa
de 6,3 milhões de lesões médicas. Destas,
ele aponta que, no mínimo, 1,5 milhão de
casos seriam evitáveis. O estudo conclui
que os erros mais significativos podiam
facilmente ser prevenidos se melhores
políticas e práticas fossem seguidas. A
oportunidade de economia de US$ 19,5
bilhões estaria disponível.
Para os erros médicos estarem no top
10 das causas de morte, devemos refletir
o valor que pomos na vida, já que estes
casos são facilmente evitáveis e causados
por negligências simples.
A Milliman também reviu dois estudos maiores anteriores, que tentaram
estimar o impacto econômico dos erros
médicos. O primeiro deles foi Harvard
Medical Practice Study, que estimou que
todos os tipos de lesões médicas somaram aproximadamente US$ 3,8 bilhões
em Nova York em 1984, US$ 50 bilhões
nacionalmente.
Um segundo estudo, Costs of Medical Injuries in Utah and Colorado, revisou
uma amostra representativa de 14.732 altas selecionadas aleatoriamente de 1992
e a estimativa de custos total pelos erros
de US$ 662 milhões, em 1996 – US$ 308
milhões estiveram relacionados a erros
médicos evitáveis. Nacionalmente, foram
US$ 37,6 bilhões por todos os tipos de
erros médicos e US$ 17 bilhões por casos
que poderiam ser evitados. O estudo dos
autores categorizou os erros médicos em
cinco áreas:
1. operativo;
2. relacionado aos medicamentos;
3. diagnóstico ou terapias;
4. relacionado aos procedimentos;
5. outros.
As complicações do pós-operação
foram as mais caras, contabilizando 35%
dos custos de erros médicos e 39% dos
gastos em casos que poderiam ser prevenidos. Existem muitas formas de mensurar os erros e os impactos econômicos.
A National Quality Forum e a National
Priorities Partnership falam em algo em
torno de US$ 21 bilhões de despesas
com medicamentos por conta de falhas.
Segundo o New England Healthcare Institute, os casos evitáveis que envolveram
pacientes internados somaram US$ 16,4
bilhões, enquanto os relacionados à medicação foram de US$ 4,2 bilhões.
impacto econômico - Apesar
de não existirem evidências definitivas
de que a recente recessão está trazendo
impactos na qualidade do setor de saúde
e na segurança dos pacientes, ela pode
estar tendo efeitos. Um estudo recente
com mais de 800 enfermeiros, gestores e
médicos revelou que 20% acreditam em
um grande impacto para pacientes e para
a segurança da equipe por conta da recessão. Além disso, 21% acreditam que um
impacto negativo moderado ocorreu. Os
entrevistados transmitiram a preocupação sobre segurança dos medicamentos,
novos procedimentos de compra, equipe
qualificada e insuficiente.
Os participantes da pesquisa explicaram que a segurança dos medicamentos continuou a ser o problema número
um. Primeiro, a eliminação ou redução
do tempo gasto pelos principais responsáveis pela segurança de medicamentos,
como farmacêuticos, foi relatada por
42%. Depois, 33% deles apontaram um
menor envolvimento destes profissionais
nas unidades. As UTIs e um novo nível
de comportamento de riscos adversos
começam a aparecer. A redução também
tem afetado o tempo alocado para a formação do enfermeiro, uma área importante de preocupação. Isto levou a cortes
de custos na administração de drogas e
na supressão de etapas de segurança, aumentando o risco de dano ou morte dos
pacientes.
Os novos procedimentos de compras
se referem à aquisição de multidoses de
medicamentos ao invés da dose simples
de frascos e seringas. Sim, Sam’s Club e
Costco têm seus lugares no mercado de
produtos médicos assim como as instituições de saúde buscam cortar custos com
medicamentos a granel. Isto aumentou
em cinco vezes o número de erros com
medicamentos. O efeito oposto, escassez de medicamentos, está acontecendo
quando as instalações tentam limitar o
custo de medicamentos que expiram rápido, que normalmente são caros e não
são sempre usados.
O próximo investimento é em equipamentos médicos e tecnologias. O ciclo de
vida destes aparelhos tem sido expandido
ao mesmo tempo que as instituições tentam limitar ou cancelar planos de compras
de novas tecnologias mais caras. Este se
tornou um dos maiores problemas: a estagnação na compra de novas tecnologias
retarda ou interrompe o desenvolvimento
Qual o custo da
má qualidade de
atendimento no
nível humano?
Qual o valor
da vida humana
e das relações
das pessoas com
seus familiares e,
mais amplamente,
a relação com
a comunidade
de pacientes?
Pergunte aos
membros da
família e a
resposta será
incalculável
e a pesquisa. Os lucros dos hospitais não
estão sendo adequadamente reinvestidos
nas áreas de tecnologias que não estão
cobertas pelo PPACA. Os novos hospitais, as remodelações e as melhorias no
design têm chegado a um impasse, pois o
crédito e o fluxo de caixa têm estado mais
lentos. Os hospitais rurais são antiquados
e estão em um ponto de contenção, já que
eles não são adequados para as melhores
práticas de cuidado e estão em um estado
de má qualidade.
design para A qualidade - Alterar o foco da reforma na saúde em readmissões evitáveis e condições adquiridas
em instalações torna a qualidade um campo muito mais amplo ao incorporar o projeto de segurança de instalações médicas.
De acordo com a Agency for Healthcare
Research and Quality, existe uma correlação entre como um hospital é projetado e
a qualidade do cuidado e resultados. A expectativa é que as novas construções em
saúde dos próximos dez anos alcancem a
marca dos US$ 250 bilhões.
O design baseado em evidência e a
incorporação deste modelo nas práticas
de hospitais são esperados para reduzir os desperdícios médicos, melhorar a
qualidade dos resultados, diminuir erros
e melhorar a satisfação de pacientes e coDiagnóstico | mar/abr 2014
21
ECONOMIA DA SAÚDE
ASSISTÊNCIA
laboradores enquanto se instala uma cultura da segurança. Os progressos incluem
supressão de ruídos, iluminação artificial
(luz solar quando possível), áreas naturais e música. Recursos adicionais de
US$ 12 milhões em atualizações por instalação devem ser recuperados dentro de
12 meses por conta de economias operacionais e crescimento dos lucros. Dado o
estado da economia e da falta de pessoal,
a informação que promove transparência
sobre a performance e a ligação dela ao
reembolso do hospital terão um impacto
significante na sua habilidade de sobrevivência.
Qualidade: Soluções - A qualidade e a segurança do paciente tem sido
historicamente uma questão secundária
para a maioria dos cerca de seis mil hospitais americanos. Certamente, existiram
líderes visionários que perceberam que
a qualidade, a excelência operacional
e o atendimento aos pacientes são um
link inextricável. Eles foram exemplos
para todo o resto do país. Em 1986, a
Joint Commission lançou sua Agenda for
Change – iniciativa para introduzir uma
filosofia da melhoria da qualidade no processo de acreditação. Isto também era um
caminho para incentivar os hospitais dos
EUA a adotar estes princípios com o objetivo de melhorar os procedimentos em
saúde, qualidade e, em última instância, a
segurança dos pacientes. A legislação do
PPACA e as penalidades financeiras associadas com o mau atendimento tornam a
qualidade “Job One” – tomando emprestado o slogan da Ford Motor Company
nos anos 90.
Além de promover um melhor atendimento, a melhoria da qualidade nos termos da legislação deverá ser uma grande
força para “dobrar a curva de custo” para
o Medicare, bem como para operadoras
de saúde. Dado o tamanho do programa
da Medicare, o foco na qualidade terá um
significante efeito cascata através do sistema de saúde americano como um todo.
Mas quanto dinheiro está em jogo?
Em vez de tentar determinar o número
exato, reveremos um número de relatórios
que exploram os impactos econômicos
da qualidade do atendimento e discutem
o trabalho e conquistas dos três maiores
hospitais e do sistema de saúde que tem
implementado significantes esforços para
a melhoria. Duas instituições receberam
o prestigioso título da Malcolm Baldrige
Award for Quality (reconhecimento que
premia as melhores instituições americanas de diversos setores por performances
de excelência) com apenas outros dez
hospitais nos EUA – sendo o primeiro
o SSM Healthcare (instituição de saúde
vinculada ao catolicismo), em St. Louis,
em 2002.
Incentivos e penalidades Historicamente, o programa Medicare
paga por qualquer serviço de saúde realizado, incluindo os erros médicos. Isto
tem sido modificado nos últimos anos e
nos esforço para melhorar a qualidade
do cuidado e reduzir custos do programa
Medicare, a CMS não irá mais reembolsar prestadores por readmissões hospitalares evitáveis. O foco inicial será em
ataques cardíacos, insuficiência cardíaca
e pneumonia. Os hospitais verão suas taxas de reembolsos serem diminuídas para
Divulgação
CENTRO MÉDICO DA
UNIVERSIDADE DE ILLINOIS, EM
CHICAGO: pesquisa mostrou que
pagamento por desempenho fez
os médicos produzirem mais,
com mais assertividade
22
Diagnóstico | mar/abr 2014
altas taxas de readmissões. Multas e penalidades começarão em 1% e alcançarão
3% nos próximos três anos. Reconhecendo que os hospitais precisam fazer um
melhor trabalho na redução de condições
adquiridas neste tipo de ambiente, como
uma infecção, o governo multará as instituições com os mais altos índices. Dada
a baixa margem operacional médica de
5% dos hospitais americanos, aqueles
que promoverem um atendimento de má
qualidade terão dificuldade de permanecer nos negócios.
Na verdade, aqueles que não melhorarem e alcançarem os requisitos nacionais perderão as suas capacidades de
cuidar dos pacientes do Medicare. Para
aumentar um pouco mais a pressão, o
Medicare afirmou que irá tornar público
quais hospitais estão apresentando boas
performances e aqueles que não estão.
Dependendo do que aconteça, má qualidade e a notificação pública do governo
podem prejudicar a reputação institucional e ser a força dominante para modificar
a posição no mercado e a liderança.
Apesar de o Medicare não reembolsar no mesmo nível que a maioria das
operadoras de saúde privadas, ele ocupa
uma porção significante da maioria das
receitas dos hospitais, portanto sua perda
seria desastrosa. Aqueles hospitais que
oferecem um serviço de qualidade continuarão a ser elegíveis para os tratamentos
dos pacientes do Medicare e assumirão a
responsabilidade pelos pacientes de hospitais que não atingem os padrões. Esta
situação tem um potencial para alterar a
liderança do mercado rapidamente.
Brad Bowman, ex-diretor da área de
saúde da PwC e atualmente na Core Finance Team, consultoria especializada no
setor, afirmou que os dados detalhados
de performance da qualidade que identifica um mau desempenho em três ou quatro hospitais de uma cidade colocariam a
instituição em significativa desvantagem
especialmente quando a mídia local divulgasse a informação.
Em 2017, até 6% dos pagamentos do
grupo de diagnósticos homogêneo dos
hospitais será de risco, baseado na qualidade dos indicadores de desempenho de
qualidade. Um relatório de qualidade voluntário foi iniciado em 2011, algo inteiramente novo para médicos que aceitam
pacientes do Medicare. Os profissionais
receberam 1% de bônus e o índice cairá
para 0,5% este ano. Em 2015, existirão
Divulgação
diretor do Instituto de
Pesquisa da Intermountain
Healthcare, Brent James:
melhoria da qualidade em
hospitais americanos provocou
uma economia de US$ 3,5
bilhões/ano, com a redução de
partos induzidos, cesarianas não
planejadas e admissões de recémnascidos em UTIs
1,5% de penalidades e em 2016, serão
de 2%. E, pela primeira vez, a partir do
próximo ano, os médicos verão relatórios
individuais publicados no site da CMS,
assim como tem sido feito para hospitais
e enfermeiros.
Embora os planos do governo pareçam lógicos, a dúvida continua: o incentivo/penalidade funcionará? A abordagem
não é baseada em algum projeto atual ou
passado. Mas existem evidências de que
os médicos são suscetíveis quando suas
compensações pessoais estão aliadas à
performance.
Um estudo realizado pela Universidade de Illinois, em Chicago, usou como
amostra um grupo formado por 59 médicos e 1,1 milhão de consultas em quatro
anos, em uma rede de clínicas de atenção
primária que modificou o salário por um
plano de compensação com baixos salários e taxas para consultas e procedimentos. Os médicos aumentaram o número
de pacientes atendidos entre 11% e 61%.
Eles recebiam como pagamento entre
US$ 22 e US$ 30 por cada paciente. Os
autores também notaram que os médicos
de todas as especialidades aumentaram
o número de procedimentos feitos em
cada visita – reembolsado por US$ 5 por
procedimento. Eles descobriram que os
médicos respondem fortemente até mesmo para incentivos marginais quando não
estão ligados a sua remuneração global.
Segundo um estudo publicado na
Medical Care Review, a Blue Cross e a
Blue Shield de Michigan implementaram
um programa de pagamento por desempenho composto de pouco mais de US$
22 milhões de incentivo de pagamentos
para hospitais com custos administrativos
de mais de 5%. Quase 25 mil pacientes
tiveram um melhor atendimento e teve de
733 até 1.701 Qalys dependendo da eficácia do cuidado oferecido. Baseado nos resultados do estudo, um Qaly foi estimado
entre US$ 12.967 até US$ 30.081, muito
menos do que a maioria.
Claramente, os incentivos podem ter
um impacto em como os médicos e hospitais oferecem atendimentos e o que tipo
de cuidado eles promovem. As penalidades serão a motivação correta para a melhoria na saúde? Podem existir outras formas provadas de melhorar o cuidado que
possam ser replicadas ao redor do mundo.
Medicare e Medicaid - Se objetivo da legislação PPACA é reduzir custos e melhorar a eficiência e qualidade,
o Centro de Inovação para o Medicare e
Medicaid foi estabelecido em 2011 para
testar modelos de pagamentos e oferta de
serviços inovadores. Vinte modelos estão
incluídos no estatuto, mas permitem possibilidades ilimitadas. Para suportar esses
tipos de iniciativa, US$ 10 bilhões estarão previstos para dez anos. Sob o Centro,
um novo escritório do Coordinated Health Care foi estabelecido para melhorar a
coordenação de cuidados para beneficiários que estão elegíveis para o Medicare
e Medicaid (conhecido como duplamente
elegível).
Principais exemplos de melhorias em qualidade no Intermountain
Healthcare
Desde 1988, o Intermountain
Healthcare, sediado em Salt Lake City,
Utah, tem aderido a novas técnicas de
melhoria de qualidade dos serviços de
saúde, que foram desenvolvidas por W.
Edwards Deming, no final da Segunda
Guerra Mundial, e adotada na indústria
japonesa.
O diretor do instituto de pesquisa da
instituição, Brent James, escreveu na revista Health Affairs que os métodos de
Diagnóstico | mar/abr 2014
23
ECONOMIA DA SAÚDE
ASSISTÊNCIA
melhoria da qualidade foram aplicados
para reduzir os índices de partos induzidos, cesarianas não planejadas e admissões de recém-nascidos em UTIs. Ele
estimou que a iniciativa promoveu uma
economia de US$ 50 milhões anualmente. Nacionalmente, o valor seria de US$
3,5 bilhões.
Outra iniciativa foi focada na melhoria da operação dos ventiladores mecânicos, que eram usados para tratar a síndrome do desconforto respiratório aguda.
Como um resultado, eles melhoraram
a aderência à diretriz e reduziram a variação de 59% para 6% dentro de quatro
meses. Os índices de sobrevivência dos
pacientes subiram de 9,5% para 44%. O
tempo que os médicos estiveram envolvidos caiu para metade e o total de custos
sofreu um corte de 25%.
Em 1995, a Intermountain analisou
suas economias com custos de 65 iniciativas e chegou aos US$ 30 milhões - aproximadamente 2% do total de operações
clínicas. Essas intervenções foram aplicadas apenas em um local. A instituição
estimou que se a iniciativa fosse adotada
no sistema inteiro, as economias totais seriam entre US$ 100 milhões e US$ 150
milhões, aproximadamente entre 6% e
10% dos custos clínicos anuais. Como
resultados dessas descobertas, a Intermountain desenvolveu um plano estratégico para aplicar esses métodos por todo
o sistema de saúde.
Em um White Paper, o CEO da Intermountain Healthcare, Charles Sorenson,
notou que os EUA poderiam reduzir os
gastos nacionais de saúde em 40% se o
processo operacional e clínico fosse usado como um benchmarking e adotado
nacionalmente. Isto é baseado em uma
pesquisa do Dartmouth’s Paul Wennberg,
que focou na variação médica das práticas de cuidados nacionalmente.
MODELO INTERNACIONAL
Historicamente, os médicos têm se
incomodado com a ideia de admitir que
um erro aconteceu ou uma lesão foi causada por uma ação que eles tomaram.
Eles temem o crescimento dos custos da
responsabilidade médica, dando munição
aos advogados. Contra esta forma tradicional de pensar está o Centro Médico
da Universidade de Illinois, em Chicago
(UIC). Ele focou no desenvolvimento de
uma cultura da segurança do paciente. De
fato, através do seu Instituto de Excelên24
Diagnóstico | mar/abr 2014
cia para Segurança do Paciente, sua filosofia se tornou um modelo internacional.
Os erros são rapidamente identificados, divulgados para os pacientes e seus
familiares, as análises dos casos são realizadas e os resultados compartilhados com
aqueles que foram afetados, e liquidações
financeiras são feitas quando apropriado
para ajudar os pacientes e seus familiares
a começarem o processo de cura. Essas
análises também são usadas para mudar
os sistemas, e os caminhos dos procedimentos são feitos com o objetivo de prevenir recorrências.
Além de ser a coisa correta a fazer e
ajudar aqueles afetados, um subproduto
dessa abordagem é que os custos do seguro de responsabilidade médica da UIC
caíram 53%. Esta abordagem foi avaliada
em mais de US$ 3 milhões pelo projeto
administrado pela instituição em dez unidades hospitalares em Chicago. Alguns
especialistas em direitos e segurança do
paciente acreditam que esta abordagem
pode ser uma alternativa para a reforma
das leis, que foi derrubada por duas vezes
pela Suprema Corte do estado de Illinois.
A qualidade do cuidado é o menor dos
gastos em saúde. É melhor, mais eficiente, e por definição, com menos desper-
Embora os planos
do governo
pareçam lógicos,
A DÚVIDA continua:
o incentivo/
penalidade
funcionará? A
abordagem não é
baseada em algum
projeto atual
ou passado. mas,
existem evidÊncias
que os médicos
são suscetíveis
quando suas
compensações
pessoais estão
aliadas a
performance.
dícios. É o atendimento correto, na hora
certa, todo o tempo. Deve significar que
muito menos pacientes são prejudicados
ou feridos. Obviamente, a qualidade dos
cuidados não está sendo entregue consistentemente pelos hospitais americanos.
Apesar da recém-promulgada legislação
da reforma da saúde não exigir que os
hospitais implementem a melhoria da
qualidade dos problemas de segurança
dos pacientes, a incorporação de programas de qualidade envolvendo a Lean ou
Six Sigma tem tido um impacto significativo na Intermountain Healthcare e no
Centro Médico da Universidade de Illinois.
Interessantemente, o desenvolvimento de uma cultura de qualidade e segurança também melhora os custos do seguro
de responsabilidade, apesar de que não
é o motivador primário para melhoria
do atendimento. Um relatório da Sociedade de Atuariais/Milliman mostrou que
os custos de erros médicos nos EUA é
de US$ 19,5 bilhões em custos médicos
diretos.
Outros estudos mostram que o custo
pode ser mais alto. Olhando para a vida
humana totalmente, nosso próprio cálculo
conservador mostra que os erros médicos
custam entre US$ 73,5 bilhões até US$
98 bilhões em Qalys e se aplicadas na
mais recente estimativa da Health Affairs
que diz que o impacto de lesões evitáveis
é dez vezes maior do que o apontado pelo
relatório da IOM, então os custos seriam
de quase US$ 1 trilhão anualmente.
Qualquer que seja a média, a má qualidade é custosa para os pagadores e a sociedade em geral. O tempo irá dizer se o
programa de incentivo do Medicare fará
a diferença. Contudo, os líderes do setor
de saúde e os profissionais estão focando
na qualidade e na segurança dos pacientes
como nunca o fizeram porque a economia
da qualidade tem mudado substancialmente.
*Artigo publicado no Journal of Health Care
Finance, Vol.39, nº 1. Charles Andel é gerente
de radiologia da qualidade e conformidade na
Loyola University Chicago; Stephen Davidow
é gestor dos programas de implementação da
qualidade na Society Critical Care Medicine;
Mark Hollander é gestor financeiro do
Department of Veterans Affairs e David
Moreno é analista de relatórios na Takeda
Pharmaceuticals. Os autores possuem MBA na
Loyola University Chicago.
Diagnóstico | mar/abr 2014
25
Ensaios
Francisco Balestrin
Livro Branco: Brasil Saúde 2015 Contribuição cidadã para a saúde
brasileira
Q
uando a Anahp foi fundada, promover a
qualidade da assistência médico-hospitalar no Brasil, por meio de iniciativas
inovadoras e modelos de excelência,
foi uma das missões definidas. Desde
então, a Associação iniciou um longo
trabalho para que pudesse ser reconhecida como entidade representativa do setor. A participação e
dedicação de seus hospitais-membros, em especial daqueles
que lideraram o processo de amadurecimento da Anahp, certamente foram fundamentais para a conquista de seu espaço
no setor.
A saúde é uma das atividades econômicas mais importantes no Brasil e no mundo, representando aproximadamente
9% do Produto Interno Bruto do país (PIB), segundo estatística da Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2011, e
gerando mais de 4,3 milhões de empregos diretos, de acordo
com informações de 2009 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além disso, a saúde é o bem maior
de todo indivíduo, o que eleva a sua prioridade nas agendas
pública e privada.
A partir dessa premissa, e assumindo a sua posição de
vanguarda no setor, o Livro Branco: Brasil Saúde 2015 | A
sustentabilidade do sistema de saúde brasileiro foi construído a partir de uma visão macropolítica, econômica e social,
buscando a essência de um modelo de saúde que pudesse
contribuir para a sociedade brasileira. Com foco no cidadão
usuário do sistema de saúde, o documento surgiu do desejo da instituição de participar do fortalecimento do Sistema
Único de Saúde e estreitar o diálogo entre os setores público
e privado, sem as barreiras ideológicas e institucionais.
O que buscamos é a parceria, a união e a integração entre
os setores, para que sejam bem-sucedidos, articulados, seja
do ponto de vista do modelo, da estrutura, da organização,
como também do financiamento. O fortalecimento da saúde
pública, ao contrário do que se pensa, traz ganhos relevantes
para o sistema como um todo. Além disso, temos certeza de
que o SUS é bem concebido, mas faltam recursos, investimentos e gestão profissional. O sistema privado, por outro
26
Diagnóstico | mar/abr 2014
lado, possui recursos e investimentos, tem gestão, mas falta
o modelo assistencial. O SUS pode dar as respostas que o
cidadão brasileiro tanto almeja.
Os atores do sistema de saúde atuam de forma complementar, cada um com funções e pontos fortes específicos. O
setor privado estabeleceu um modelo ágil e participativo de
gestão, voltado à busca da qualidade e da segurança assistencial e responde pela maior parte dos recursos aplicados em
saúde, com uma participação de 53%. Carece, no entanto, de
um modelo de organização que o setor público – que participa com os demais 47% – poderia compartilhar.
Nesse sentido, o Livro Branco: Brasil Saúde 2015 foi
construído a partir de um modelo esquemático composto por
eixos interligados e divididos em três níveis: do menos ao
mais distante e visível do usuário. Assim, foram analisados
desde as políticas públicas, a regulação e o financiamento
geral, até a infraestrutura e o sistema de comunicação, passando pelos modelos - assistencial, remuneração, gestão e organizacional. Todos os eixos e variáveis do sistema de saúde
brasileiro foram minuciosamente estudados.
Constituído por dois volumes – Caderno de Propostas e
Caderno Conceitual –, o documento contou em seu desenvolvimento com o apoio dos dirigentes dos hospitais-membros e
a colaboração de lideranças nacionais, que compartilharam a
sua visão do sistema de saúde no Brasil, a fim de consolidar
os pontos críticos e oportunidades de melhoria para o setor.
Durante um ano de intenso trabalho, foram realizadas
mais de 60 entrevistas, 25 profissionais envolvidos em pesquisas, estudos e desenvolvimento do conteúdo, mais de 180
encontros e reuniões, visitas a vários estados brasileiros para
identificar as diferentes realidades e captar opiniões e perspectivas sobre a saúde no país.
No esforço de contribuir para o sistema de saúde brasileiros, em fevereiro a Anahp deu início a uma série de encontros
estratégicos para a entrega do documento aos candidatos à
Presidência da República, entre outros políticos e personalidades. O objetivo dessa iniciativa da Associação é estabelecer o diálogo com as autoridades e a sociedade em geral em
benefício da população brasileira.
Shutterstock/Editoria de Arte
Shutterstock/Editoria de Arte
Propostas Anahp
• Fortalecer o Sistema Único de Saúde, estimulando a coordenação e a integração entre os setores público e privado.
• Fomentar a inovação científica e tecnológica em saúde.
• Desenvolver um modelo assistencial integrado com foco no
paciente e na continuidade dos cuidados.
• Desenvolver redes assistenciais integradas entre os setores
público e privado.
• Melhorar a formação, a distribuição e a produtividade dos
recursos humanos.
• Investir em infraestrutura e tecnologia adequadas à evolução da medicina e aos novos perfis de pacientes.
• Ampliar a participação do setor privado na formulação e
implantação das Políticas Nacionais de Saúde.
• Incentivar o investimento privado na área da saúde.
• Aumentar o volume e a eficiência na aplicação de recursos
públicos para a saúde.
• Estimular políticas justas de remuneração de serviços de
saúde e vinculadas à qualidade e ao desempenho assistencial.
• Criar um sistema nacional de avaliação da qualidade em
saúde.
• Desenvolver um plano de ação público-privado para a informatização, integração e interoperabilidade dos sistemas
de informação.
Para conhecer o conteúdo completo do Livro Branco: Brasil
Saúde 2015, acesse o site da Anahp:
www.anahp.com.br
“
O que buscamos é
a parceria, a união e
a integração entre
os setores, para que
sejam bem-sucedidos,
articulados, seja do
ponto de vista do
modelo, da estrutura,
da organização,
como também do
financiamento
Francisco Balestrin
Presidente do Conselho de Administração da Anahp
Diagnóstico | mar/abr 2014
27
ARTIGO
Eduardo Najjar
Divulgação
Empresas familiares: futuro brilhante
A
maior parte das empresas familiares atinge
grande sucesso em todo o mundo. Esse cenário não é diferente no Brasil.
Conflitos fazem parte intrínseca do negócio e sua resolução deve ser entendida
como um processo de crescimento para a
delicada relação entre os membros das fa-
mílias empresárias.
Algumas das fontes desses conflitos podem receber tratamento precoce, para que não venham a se originar processos
mais complexos dentro dos negócios familiares.
O crescimento da empresa depende do fundador
Quase sempre, o crescimento e a importância da empresa da família depende da capacidade de gestão do fundador
ao mercado, atributo que a levou a ser um negócio rentável e
em expansão. Deve-se sempre pensar na aplicação dos princípios da meritocracia, para atendimento às expectativas dos
familiares-gestores.
Falta de espaço para crescimento profissional
A gestão de muitos negócios familiares comete uma falha, colocando nas mãos de membros da família empresária
as áreas e os processos mais importantes. Não consideram a
possibilidade da existência de competências importantes, em
funcionários não-familiares. Essa atitude pode fazer com que
o escopo do negócio torne-se limitado e que profissionais com
perfil mais alto prefiram não trabalhar em estruturas dessa natureza. A empresa passa a não ter a capacidade de atrair e reter
talentos, o que, hoje em dia, não é um aspecto positivo para
nenhum negócio.
Paternalismo
O fundador, na maioria
dos
negócios familiacomete uma falha, colocando nas mãos de membros
res, está sempre presente
da família empresária, as áreas e os processos mais no dia a dia, em contato
com toda a estrutura,
importantes
funcionários e principais
clientes. Para os funcioou, na falta deste, do dirigente familiar. Se este for extrema- nários, torna-se quase que uma figura paternal. Muitas vezes
mente conservador, o negócio terá uma velocidade baixa de sente a obrigação de resolver os principais problemas de
crescimento, apesar de financeiramente sólido. Se visionário, funcionários – sejam de natureza profissional ou pessoal –,
aceitando uma taxa mais elevada de risco, o negócio crescerá gerando a possibilidade do aparecimento de conflitos desnerapidamente, mas a possibilidade de que ocorram erros poderá cessários na estrutura da empresa, bem como falta de profissionalismo em alguns desses trabalhadores.
aumentar.
A gestão de muitos negócios familiares
Clientes privilegiados
Em muitos casos, o negócio da família elege clientes que
passam a desfrutar de certos privilégios, como descontos especiais ou adicionais. Para eles, as políticas de concessão de
crédito são muito mais flexíveis, com condições preferenciais.
Essa situação faz com que a empresa passe a correr riscos desnecessários e é um gatilho para o aparecimento de conflitos
desnecessários na gestão da empresa e na família empresária.
Remuneração de familiares que trabalham na empresa
Um erro comum verificado nestes anos de contato com
centenas de empresas familiares ocorre quando membros da
família empresária passam a fazer parte da estrutura da empresa, sejam necessários – ou não – à gestão, geralmente com
altos salários. Com o tempo, se não forem tomadas medidas
de revisão dessa situação, a empresa torna-se uma “panela de
pressão” para a família empresária e perde eficiência frente
28
Diagnóstico | mar/abr 2014
Profissionalização do negócio
Para atender à expectativa de que seu negócio transcenda
várias gerações da família, o fundador terá que decidir e colocar em prática sua profissionalização, no sentido de desenvolver uma equipe de alta performance na gestão da empresa,
formada por profissionais altamente qualificados, processos
eficientes e eficazes e um nível avançado de governança.
Deve-se reconhecer que são diversos e complexos os desafios do líder da empresa familiar. O mais importante é a definição de uma visão compartilhada que permita unificar, da
melhor maneira, a perspectiva da família com a empresa e os
membros da equipe de gestão.
Eduardo Najjar é expert brasileiro em family business, consultor e palestrante
associado da Empreenda, coordenador do GrandTour Family Business International, professor na ESPM e, além da Diagnóstico, é colunista do Blog do
Management (Exame.com).
Diagnóstico | mar/abr 2014
29
Ricardo Benichio
ENTREVISTA
RICARDO IZAR
deputado federal, ricardo
izar (PSD-SP), autor do pedido
de cpi sobre opme na câmara
federal: investigação pode
culminar em uma proposta de
regulação dos preços de órtese e
prótese no Brasil
“A CPI sobre órtese e prótese
pode e deve ser ampliada”
Autor da proposta de CPI para investigar práticas irregulares no mercado de OPME,
o deputado federal Ricardo Izar (PSD-SP) diz que apuração vai atingir, além dos
fornecedores, operadoras, profissionais de saúde e hospitais não-éticos envolvidos
Adalton dos Anjos
Revista Diagnóstico – Por que o senhor
decidiu abrir uma investigação para apurar denúncias de superfaturamento no
mercado de órtese e prótese?
Ricardo Izar – Descobri, através de levantamentos e denúncias, que o mercado de
órtese e prótese é um caso de polícia no
Brasil. A disparidade dos preços é enorme.
Em um dos relatos, um hospital público
do Rio de Janeiro pagou por uma prótese R$ 15 mil, enquanto a Unimed pagava
por este mesmo dispositivo R$ 1,5 mil.
Trata-se de uma prática abusiva, prejudicial ao paciente (consumidor final), que
é atendido no SUS, às próprias operadoras, que são obrigadas a repassar esse
custo para o usuário, além de prejudicar
hospitais e médicos éticos. Se a sociedade
brasileira está reclamando tanto da saúde
pública e dos preços dos planos de saúde,
é preciso verificar onde está o erro, o que
está tornando os recursos cada vez mais
insuficientes. A partir dessas constatações,
realizamos uma audiência pública, que resultou em uma Proposta de Fiscalização e
Controle (PFC), em coautoria com o deputado federal Rogério Carvalho (PT-SE).
O documento está tramitando na Comissão de Defesa do Direito do Consumidor
– fase inicial do rito. Concomitantemente,
foi aberta uma CPI para investigar o comércio de prótese e órtese no Brasil e suas
implicações, especificamente, relacionadas ao SUS. Obviamente, essa investigação deve ser ampliada, atingindo profissionais de saúde, operadoras e hospitais
não éticos envolvidos no que para muitos
é uma grande máfia operando dentro da
saúde brasileira.
Quando as investigações terão início?
Izar – A CPI só deve acontecer na próxima
legislatura, porque regimentalmente há
uma fila a ser obedecida. Mas a PFC, que
também tem poder de investigação, já foi
instaurada, aguardando apenas a nomeação do relator para que os trabalhos tenham início, o que deve ocorrer ainda este
ano. A PFC não tem prazo para terminar,
o que traz como vantagem a continuidade
das investigações na próxima legislatura.
Diagnóstico – Qual o resultado efetivo
que a Proposta de Fiscalização e Controle pode alcançar?
Izar – Os deputados que conduzirão as
investigações da PFC podem ter acesso a
números que envolvem todo o mercado,
comparativos de margens de lucro, precificação, custos, além de ter acesso a dados
e informações privilegiadas. Poderemos
ter resultados mais amplos até do que a
própria CPI. Ambos têm o mesmo poder
investigatório, mas a PFC é mais ampla,
porque não vai tratar apenas do SUS. Vamos analisar também os planos de saúde,
hospitais privados e públicos.
Diagnóstico – O senhor vem sofrendo
pressão da indústria para não levar à
frente esta investigação?
Izar – Até agora, não. Acredito, inclusive,
que existem empresas sérias atuando no
mercado. Algumas multinacionais, outras
grandes e pequenas corporações locais
que atuam no segmento chegaram a nos
procurar para dizer que são contrárias a
este tipo de prática ilícita. Alguns setores
da indústria se dizem reféns deste comissionamento, repassado para médicos não
éticos. O próprio Conselho Federal de
Medicina (CFM) vem condenando veementemente esse tipo de prática.
Diagnóstico – Onde está a falha que permite que este tipo de distorção se perenize no sistema de saúde brasileiro?
Izar – Ela começa na intermediação indústria/médico/hospital até chegar à fonte pagadora. Mas o desvio de conduta
acontece, principalmente, no lobby sobre
os médicos. O problema maior está justamente nos profissionais que aceitam receber por fora para indicar a prótese X ou Y,
mesmo havendo outras opções no mercado com a mesma função e qualidade, além
de preços infinitamente inferiores.
Diagnóstico – O senhor defende a regulação dos preços de órteses e próteses,
como acontece com os medicamentos?
Izar – A regulação, com uma política de
preços máximos e mínimos, é necessária
para a própria sustentabilidade do setor.
Acho possível implementar no segmento
de órtese e prótese algo parecido com o
mercado de medicamentos, cujos preços
são controlados pelo governo. É preciso
uma legislação específica para balizar o
mercado. Não sou técnico no assunto, mas
há pessoas capacitadas nos assessorando.
Diagnóstico – É possível mensurar as
perdas que a sociedade brasileira sofre
com a prática de preços abusivos?
Izar – A estimativa, baseada em informações das fontes pagadoras, é de que uma
regulamentação acarretaria numa diminuição de 15% nos valores das mensalidades pagas pelos usuários de planos de
saúde. Para os cofres públicos, essa conta
representaria uma economia de centenas
de milhões de reais.
Diagnóstico – Em sua opinião, os órgãos
reguladores e entidades falham ao não
cumprir seu papel?
Izar – Há falha nas agências reguladoras,
nos órgãos fiscalizadores, no controle dos
próprios planos de saúde, dos hospitais –
alguns deles intermedeiam essas negociações de forma nada ética –, e dos médicos.
Do outro lado, estão as empresas que utilizam o pagamento de propina e comissões
indevidas.
Diagnóstico | mar/abr 2014
31
ENSAIO
saúde mobile
onde está o tesouro?:
monitoramento doméstico dos
equipamentos pode ter um futuro
brilhante, mas algumas companhias
estão garimpando no lugar errado
Shutterstock/Editoria de Arte
O monitoramento doméstico
da saúde e o falso ouro
S
Robert Pearl
e a saúde tornou-se uma nova corrida do ouro,
então não é surpresa que as companhias high-tech do Vale do Silício, as empresas e os recentes MBAs torçam para enriquecer na esteira das reformas do setor nos EUA.
Um número crescente de garimpeiros
tecnológicos quer ajudar os pacientes a administrar doenças crônicas. Especificamente, eles estão
interessados em aparelhos de monitoramento domésticos –
rastreadores wireless que podem enviar milhares de traços
do eletrocardiograma, níveis de açúcar no sangue e outros
conjuntos de estatísticas diretamente para os profissionais de
saúde.
Enquanto o monitoramento doméstico dos equipamentos
pode ter um futuro brilhante, algumas companhias de tecnologia da atualidade estão perseguindo o falso ouro.
Isto porque alguns promotores das tecnologias de monitoramento doméstico acreditam que médicos examinarão cuidadosamente cada eletrocardiograma ou leitura de açúcar no
sangue e usar essa informação para personalizar perfeitamente a dieta dos pacientes. Isto não é como a medicina funciona.
Deixe-me explicar o problema usando uma analogia.
Imagine um habilidoso esquiador nas encostas, pronto para
fazer o máximo do seu dia. Como ele determina a correta
engrenagem e os esquis para vestir?
32
Diagnóstico | mar/abr 2014
Conhecer a forma de cada floco de neve na montanha não
ajuda muito. Em vez disso, precisa saber qual das várias condições de neve possíveis ele deve esperar. A neve profunda
requer esquis mais largos. O esqui de estilo livre exige bordas
afiadas. Descobrir qual dos vários padrões de gelo está presente dá ao esquiador a informação de que precisa.
O mesmo é verdade para o monitoramento doméstico.
Procurar por milhares de traços de eletrocardiogramas não
adicionará muito valor também. De fato, colocar toda aquela
informação dentro do prontuário eletrônico apenas torna mais
difícil para médicos identificar mais peças vitais de informação. Em vez disso, os médicos precisam entender alguns
padrões possíveis que estão acontecendo para determinar o
curso apropriado da ação.
Mas, além das questões de logística, também existem as
regulatórias. Quando a informação médica é enviada diretamente para o médico ou importada para o prontuário eletrônico do paciente, o rastreador torna-se um “dispositivo médico”
e deve ser aprovado pela FDA e demais órgãos equivalentes,
mundo afora.
Imagine essas regulações aplicadas em uma balança de
banheiro. Certamente, não existe a necessidade de supervisão reguladora se um médico instrui um paciente a monitorar
seu próprio peso. Mas se aquele o peso do paciente é enviado diretamente para o seu médico, a balança necessitaria ser
aprovada pela FDA – adicionando custo significativo para os
fabricantes, consumidores e o sistema de saúde.
Então, dados estes obstáculos, existe algum ouro real aqui
para as companhias high-tech?
Sim, acredito que as condições estão maduras para o mercado multibilionário. Cerca de metade de todos os adultos
americanos tem uma condição crônica e mais que a metade
de todos os adultos usam smartphones. Ambos os números
estão crescendo rapidamente. Portanto, o conceito de mensuração de pacientes e as estatísticas psicológicas rastreadas via
smartphone são promissores.
Já existe o iBGStar Blood Glucose Monitoring System
(sistema de monitoramento de glicose no sangue da iBGStar), que custa entre US$ 71,99 e US$ 99,99 e é conectado ao
iPhone. Há o AliveCor Heart Monitor (monitor cardíaco que
custa US$ 199), um dispositivo que também se encaixa no
smartphone da Apple. Outros anexos do telefone têm propostas similares para indivíduos com doenças crônicas.
Mas a maioria dos pacientes não comprará ou usará múltiplos anexos de monitoramento doméstico, especialmente
quando os custos para cada gadget ficam entre US$ 100 e
US$ 200. Por outro lado, as operadoras de saúde provavelmente cobririam os custos apenas para uma pequena parte
dos pacientes que têm a maior probabilidade de ser internado
em um hospital.
Talvez o melhor lugar para buscar uma saúde de ouro seja
dentro do próprio smartphone.
Existe um horizonte de oportunidades para as companhias
tecnológicas desenvolverem e lançarem um dispositivo que
tenha todas as capacidades necessárias de monitoramento
construídas nele e com média de preço semelhante a um telefone “regular”.
Agora, imagine um aplicativo para este dispositivo que
coleta e analisa os dados de saúde recolhidos. Em vez de enviar os dados diretamente para o médico ou prontuário eletrônico, o aparelho avisa ao paciente para notificar um médico quando padrões previamente estabelecidos estão fora dos
parâmetros.
Um médico poderia querer ser avisado por um paciente
quando as leituras de pressão arterial excedessem algumas
vezes por dia o valor 160/100. E para outro paciente, o gatilho seria os níveis de glicose superiores a um determinado
valor por dois testes consecutivos.
O ponto é: médicos não precisam de milhares de dados
para oferecer o melhor cuidado. Eles simplesmente querem
saber quando certos limites predeterminados são violados ou
quando uma nova tendência preocupante se desenvolve.
Os juristas precisariam descobrir se esta abordagem controlada do consumidor poderia eliminar o rótulo de “equipamentos médicos” e reduzir os custos de aprovação junto ao
FDA. Independentemente disso, a incorporação de aparelhos
de monitoramento doméstico em smartphones ajuda a personalizar a medicina e representa o futuro da administração
de doenças crônicas. É conveniente, os dados pertencem aos
pacientes e o processo analítico pode ajudar continuamente.
Uma vez que as universais ferramentas de monitoramento
doméstico tornem-se acessíveis, elas serão uma prática padrão para que médicos administrem pacientes com doenças
crônicas. O desafio do preço para qualquer nova tecnologia
é ganhar escala. Quando as fabricantes de smartphones estão
convencidas de que um número suficiente de pessoas comprará seus produtos, elas vão precificá-los.
Se, no Vale do Silício, os “mineiros” puderem resolver os
desafios logísticos e regulatórios da incorporação dos equipamentos de monitoramento doméstico no smartphone, eles
melhorarão o engajamento de pacientes e os resultados clínicos. A corrida do ouro está no “mode on” e o espólio pode ir
para qualquer um que chegar lá primeiro.
Se, no Vale do Silício,
os “mineiros” puderem
resolver os desafios
logísticos e regulatórios
da incorporação
dos equipamentos de
monitoramento doméstico
no smartphone, eles
melhorarão o engajamento
de pacientes e os resultados
clínicos. A corrida do
ouro está no “mode on”
e o espólio pode ir para
qualquer um que chegar lá
primeiro
Cerca de metade de todos
os adultos americanos tem
uma condição crônica e
mais da metade de todos os
adultos usam smartphones.
Ambos os números estão
crescendo rapidamente.
Portanto, o conceito de
mensuração de pacientes e
as estatísticas psicológicas
rastreadas via smartphone
são promissores
Robert Pearl é médico formado pela Escola de Medicina da Universidade de
Yale, com residência em cirurgia plástica e reconstrutiva na Universidade de
Stanford, onde ensina estratégia, liderança e tecnologia. É colunista da revista
Forbes. Publicado com autorização.
Diagnóstico | mar/abr 2014
33
TERCEIRA IDADE
TECNOLOGIA
O Vale da
juventude
Franceses dizem “oui” para a próxima transição demográfica ao criar o Silver
Valley, uma versão do Vale do Silício focada em pesquisa e novas tecnologias
exclusivas para a terceira idade
Divulgação
diretor da Silver
Valley, Benjamin
Zimmer: 50
corporações, entre elas
gigantes da tecnologia
como Microsoft,
Technicolor e Toshiba,
já fazem parte do Silver
Valley
P
Adalton dos Anjos
ara enfrentar um problema que vem deixando
autoridades europeias
de cabelos brancos – o
envelhecimento populacional –, a França está
inaugurando seu próprio Vale do Silício. Enquanto os portugueses e espanhóis debatem um novo
baby boom para rejuvenescer a Penín34
Diagnóstico | mar/abr 2014
sula Ibérica e os ingleses estão sendo
obrigados a promover reformas em seu
sistema de saúde, os executivos e o governo da terra de Napoleão resolveram
criar o Silver Valley (Vale da Prata, em
tradução literal). Sediado na plataforma
imobiliária Charles Foix, localizada no
sudeste parisiense, e com um orçamento anual previsto de 700 mil € (mais de
R$ 2,1 milhões), o espaço de 5 mil m²
é um centro de produção de inovações
em serviços e produtos que promovem o
bem-estar e dão autonomia ao público da
terceira idade. “Nossa filosofia é empreender em um território dinâmico que tem
um bom conhecimento do problema da
transição demográfica ligada ao envelhecimento da nossa população”, explicou
à Diagnóstico o diretor da Silver Valley,
Benjamin Zimmer.
Os inventores de um dos slogans
mais conhecidos na história da humanidade – Liberté, Igualité e Fraternité – querem reunir pequenas e médias
empresas, além de startups dedicadas a
explorar um mercado promissor – 1/3
da população francesa terá mais de 65
anos em 2020. Os resultados das pesquisas sobre este público só incentivam
os empresários. A expectativa de vida
na França alcançou a marca dos 81,67
anos em 2011, quase cinco anos a mais
do que em 1991, deixando o país entre
o top 10 das nações onde mais se vive
no mundo. Em 2015, os anciãos serão
os principais consumidores em diversos
mercados (64% na saúde, 60% na alimentação, 57% no lazer). Além disso,
82% dos franceses desejam envelhecer
em suas casas, mesmo em casos de perda de autonomia. Os dados contundentes ajudaram a atrair mais de 50 organizações para fazer parte da Silver Valley,
entre elas gigantes de tecnologia como
Microsoft, Technicolor e Toshiba; a
Essilor, multinacional francesa que
produz lentes oftálmicas; a Orange, do
setor de telecomunicações; a Assystel,
maratona da terceira idade,
em LAHTI, sul da FINLândia:
Europa quer liderar os avanços na
melhoria da qualidade de vida, no
continente com maior longevidade
do planeta
especializada em teleassistência; a École Centrale Paris e o Hospital Charles
Foix, da área de pesquisas; entre outras.
“Temos um ecossistema estruturado
de orientações, investimentos, além de
clientes ligados diretamente a compradores, distribuidores e exportadores”,
defende Zimmer, sem temer a ameaça
do recém-lançado projeto do Google,
denominado Calico, que também tem
por objetivo desenvolver soluções para
o envelhecimento populacional. “Nosso projeto em sua escala é líder neste
mercado”. Ao comparar a iniciativa
repleta de segredos da companhia sediada no Vale do Silício, na Califórnia,
o executivo aponta que a Silver Valley
vai além da bolha da internet ou das
tecnologias da informação e comunicação. Isto porque o modelo instalado em
Paris tem apoio do governo através do
Silver Economie – acordo interministerial assinado em abril de 2013, pelo
ministro da Recuperação Produtiva,
Arnaud Montebourg, e Michèle Delaunay, ministra responsável pelos idosos
no Ministério dos Assuntos Sociais e
Saúde – que tem o objetivo de fomen-
Shutterstock
Diagnóstico | mar/abr 2014
35
TERCEIRA IDADE
TECNOLOGIA
tar a economia a serviço dos idosos em
todos os setores industriais. No entanto, ele não descarta a possibilidade de
trabalhar junto com a Google no futuro.
Os investimentos da Silver Valley
são divididos igualmente entre os setores público e privado. Os recursos do
governo saem dos cofres de departamentos de duas das 26 regiões administrativas da França, Île de France e Val
de Marne. Os outros 50% são financiados por dezenas de companhias como
a Reunica e a AG2R La Mondiale,
que oferecem serviços de previdência
complementar, e o Institut Silver Life,
centro de pesquisa sobre a economia do
envelhecimento.
Os resultados, já em curso, são a
criação de mais de 600 novos empregos, além de startups destinadas a criar
soluções que interfiram em todos os
domínios do cotidiano dos idosos. A
expectativa é que nos próximos cinco
anos, cinco mil empregos sejam gerados por meio da Silver Valley e que o
número de associados chegue a 300. Os
projetos vão desde lazer e segurança até
comunicação, vida social, mobilidade,
saúde e arquitetura. Espera-se que a iniciativa antecipe as tendências de mercado e estimule o crescimento do setor
através de parcerias e pesquisas, inclusive com instituições em outros países.
“Nosso objetivo é promover intercâmbios frutíferos entre membros e acelerar a inovação”, afirma o presidente da
Silver Valley, Jérôme Arnaud.
PARALELO COM O TURISMO – O primeiro membro a se instalar no Silver
Valley foi a Microsoft. No último mês
de fevereiro, a gigante do setor de informática, através de um comunicado
de imprensa, informou que sua divisão
francesa passaria a fazer parte do projeto. A multinacional, que possui 1500
funcionários no país, justificou sua
adesão ao ressaltar o seu envolvimento
em diversas soluções em telemedicina,
educação a distância, além de tecnologias no setor de saúde pública e privado
ao longo dos últimos 15 anos em que
esteve em terras francesas. “Os novos
desafios criados pelo envelhecimento
da população nos obrigam a trabalhar
juntos”, disse em nota a diretora da divisão do setor público da Microsoft na
França, Laurence Lafont-Galligo. Para
a Silver Valley, a companhia é um im36
Diagnóstico | mar/abr 2014
Garden Age, da francesa
verdurable, é umA dAs
startups presentes no silver
Valley: solução permite o cultivo
de um jardim terapêutico por
pessoas com mobilidade limitada
portante parceiro, já que pode atrair outros players e dar mais credibilidade à
iniciativa, que ainda carece de grandes
companhias, sobretudo no estímulo às
startups.
O grande desafio dos gestores da
Silver Valley é montar um modelo de
negócio tão sólido quanto a economia
do turismo francês, maior destino de
viajantes do mundo desde 1990. Para
isto, além dos financiamentos público-privados, a receita originária das empresas associadas deverá ajudar a fechar as contas. Empresas com menos de
cem empregados, associações, centros
hospitalares e escolas pagam uma taxa
mensal de 250€; empresas entre cem e
mil colaboradores pagam 500€; grandes
companhas com mais de mil funcionários e estruturas públicas contribuem
com 2000€. Fazer parte da iniciativa,
ainda exige do candidato a aprovação
do seu projeto ou ação por um comitê.
Após a aprovação, os membros assinam
uma carta que, segundo Zimmer, “implica um engajamento dentro de uma
ação coletiva e um ambiente de trabalho
ético e de colaboração”. Para o executivo, o modelo organizacional tem sido
um ativo forte para convencer empresários regionais, nacionais e até de fora da
França.
Divulgação
A Assystel, empresa francesa que
há 35 anos desenvolve soluções em teleassistência para idosos, foi seduzida
pelo projeto em 2013 e já comemora
os primeiros resultados, após a filiação
junto à Silver Valley. O volume de negócios da companhia cresceu 10% no
ano passado, alcançando a marca dos
3,5 milhões €. “Passamos a manter
parcerias com um grande número de
atores da Silver Economie e desenvolvemos sinergias em comum”, explica o
diretor geral da Assystel, Alexis Roche.
Mais de 20 mil idosos ou pessoas com
deficiência física são assinantes do serviço de acompanhamento a distância
que funciona 24 horas por dia e custa
mensalmente 19,90€. As chamadas realizadas a partir de simples aparelhos
fixos ou móveis – que têm formato de
uma joia – podem servir para que o
usuário peça socorro após um acidente
doméstico (cerca de cinco mil quedas
são registradas por ano) ou até mesmo
quando ele se sente sozinho. Os atendentes também entram em contato com
os clientes para lembrá-los sobre a hora
de tomar um medicamento. O mercado
de teleassistência na França representa 500 mil usuários, 15% da população
com mais de 80 anos, e a expectativa
da companhia é ampliar sua receita em
10% em 2014.
As soluções mais simples, criadas
por pequenas empresas, também são incentivadas pelo projeto. A Bourse Silver
Valley, que até o ano passado era chamada de Bourse Charles Foix, tornou-se uma importante recompensa para
as ideias mais inovadoras apresentadas
anualmente. Ao longo dos últimos dez
anos, 34 iniciativas foram premiadas.
“É uma ferramenta de detecção de material bruto. Estes projetos são a vitrine
do mercado futuro”, explica Zimmer. As
candidaturas são recebidas e avaliadas
por um júri internacional, que escolhe
as três melhores a partir dos critérios de
pertinência, inovação, valor agregado e
potencial de transformação. A láurea resulta em um financiamento de 15 mil €
(R$ 45,7 mil), acompanhamento individual por um ano e promoção do projeto
entre os clientes. Os produtos/serviços
eleitos entram no mercado em cerca de
três anos. “Graças ao prêmio, pude conhecer o setor e fundar a Verdurable”,
afirma à Diagnóstico Qi Wu, fundador
da empresa que iniciou a operação em
O Silver Valley é
um lugar
simbólico para a
inovação, onde
pensamos no
envelhecimento como
uma oportunidade
econômica e social em
nosso país
diretor da Silver Valley,
Benjamin Zimmer
2011, dois anos depois que o projeto
Garden Age foi um dos premiados pela
Bourse Silver Valley.
HOSPITAL Charles-Foix – A solução criada por Wu, um designer formado na École Nationale de Arts Décoratif, e sua esposa, Luchun Chen, doutora
em sociologia, permite o cultivo de um
jardim terapêutico por pessoas com mobilidade limitada, através de um equipamento adaptado. Segundo os fundadores, a filosofia por trás do produto, que
custa entre 340€ e 700€, “é fazer idosos
encontrarem a felicidade em viver”.
A invenção promove aos usuários um
alívio com dificuldades físicas como
vertigens, perda de equilíbrio e dores
nas articulações, além de uma atividade motivadora, que os coloca em um
ambiente de convivência. A empresa
também promove e participa de cursos
práticos de hortoterapia, ainda pouco
explorada no Brasil.
“Este é um lugar simbólico para a
inovação, onde pensamos no envelhecimento como uma oportunidade econômica e social em nosso país”, explica
Zimmer ao justificar a proximidade entre a sede da Silver Valley e o Hospital
Charles-Foix, reconhecido em toda a
Europa como referência em gerontologia. Para o executivo, o projeto aproveitará a expertise em pesquisa e ensino da
instituição pública, que foi um hospício
para incuráveis entre 1873 e 1976, para
estimular novas empresas e startups,
como a Verdurable, a se destacar e se
estabelecer no mercado. “Em três anos,
devemos chegar a um ponto de equilíbrio e a empresa será rentável”, prevê
Wu.
Apesar de o futuro ser visto com
muito otimismo pelos participantes do
Silver Valley, é preciso ter cautela quanto à evolução deste mercado. Mudanças de hábito e novos tratamentos em
saúde devem resultar em um tempo de
vida saudável maior. Uma criança entre três será centenária, mas os clientes
consumirão determinados produtos e
serviços como os da Assystel cada vez
mais tarde. “Eles se sentirão jovens e
em boa saúde por mais tempo”, prevê
Roche, que aponta diversas estratégias
como a criação de novos aparelhos – o
MamyBox, primeira joia conectada que
permite a teleassistência também para as
crianças.
A sustentabilidade dos negócios entre públicos diversificados também é
uma preocupação da startup Verdurable. Os criadores da tecnologia esperam
que os jardins terapêuticos não fiquem
restritos às casas dos aposentados e se
tornem um fenômeno entre crianças e
adultos. Eles também desenvolveram
novas ferramentas ergonômicas, com
acessórios para jardinagem, que estarão
no mercado em dois meses. Além disso,
Wu e sua equipe estão projetando um
dispositivo culinário destinado às pessoas que sofrem de dores nas mãos.
A expertise em promover revoluções fez a França encarar a transição
demográfica de forma diferente das outras nações europeias ao visualizar este
momento como um novo eldorado. Um
grande desafio se mostra para executivos e pesquisadores da Silver Valley,
que precisarão enfrentar várias décadas
de história dominada por uma cultura jovem construída em cima de linguagens,
gostos artísticos e comportamentos próprios. Portanto, estes atores ainda precisarão inserir em seu ecossistema técnico-econômico estratégias para construir
um discurso positivo em torno da terceira idade, sobretudo na convivência com
aspectos que mais cedo ou (cada vez)
mais tarde fazem parte do curso natural da vida, como a deterioração física
e mental.
Diagnóstico | mar/abr 2014
37
questões indiretas à constituição federal, o que de certa forma
trazia uma segurança de que a análise do Superior Tribunal de
Justiça estaria sedimentada. Com isso, o entendimento supra viDivulgação
nha sendo aplicado pelos tribunais de segunda instância, e até
mesmo alguns municípios alteraram suas leis municipais nesse
sentido. Mas, em 07/09/2012, o plenário do Supremo Tribunal
Federal, analisou o recurso extraordinário 651.703/PR, e mudou
totalmente o que antes vinha sendo decidido pela Suprema CorISS (Imposto sobre Serviços), está entre os te, ao reconhecer a repercussão geral do tema.
Através do voto do ministro Luiz Fux (sobre o qual o miimpostos que contribuem para a elevada carga tributária imposta aos planos de saúde e nistro Joaquim Barbosa não se manifestou), restou decidida a
sua incidência possui amplo debate no meio competência do Supremo Tribunal Federal, sob o seguinte funjurídico. O assunto foi tema de inúmeros damento: “A meu juízo, o recurso merece ter reconhecida a reartigos publicados pelos principais juristas percussão geral, haja vista que o tema constitucional versado
do Brasil, motivando ações judiciais: de um nestes autos é questão relevante do ponto de vista econômico,
lado as operadoras e cooperativas lutando pela não incidência, e político, social e jurídico, e ultrapassa os interesses subjetivos
do outro os municípios insistindo na manutenção do ISS calcula- da causa.” A partir dessa decisão, não existe mais a segurança
jurídica até então definida pelo Superior Tribunal de Justiça, podo sobre o faturamento bruto dessas empresas.
O tema foi enfrentado no Superior Tribunal de Justiça, onde dendo haver mudanças após o julgamento do mérito do citado
se encontram julgados de diferentes resultados, contudo, mais re- recurso extraordinário.
A inconstitucionalidade da cobrança, está fundamentada no
centemente, prevalece o entendimento da redução da base de cálculo, da seguinte forma: as despesas com os sinistros devem ser fato de que a intermediação propiciada pelas operadoras, através
abatidas da base de cálculo, e a alíquota aplicada sobre a comis- do acesso aos serviços de saúde, não caracteriza serviço, o que
são auferida pela empresa, uma vez que quem presta os serviços afrontaria o artigo 156, III da Constituição Federal. Isso porque,
são na realidade os profissionais da saúde, que já recolhem o ISS, a atividade das operadoras é uma espécie da obrigação de dar
coisa fungível, fato não compatível com o conceito de tributação
o que representa uma bitributação.
A seguir, trecho do voto proferido no Recurso Especial do Imposto sobre Serviços.
O Supremo Tribunal Federal também analisará a ofensa ao
1.137.234, relatado pelo ministro Mauro Campbell Marques:
“Os valores decorrentes da venda de ‘planos’ ou ‘contratos de artigo 153, V da Constituição Federal, pois, segundo a tese em
seguro-saúde’ não se sujeitam ao Imposto sobre Serviços de debate, as operadoras possuem a mesma natureza jurídica securitária. Embora não se confundam com contratos de seguro-saúde, os contratos de plano
de saúde possuem natureza
securitária, por terem a mesindevidamente tributadas busquem o Judiciário
ma função de garantia inerente
para afastar a incidência do ISS, sendo prudente o
aos contratos de seguro e, portanto, caberia exclusivamente
depósito judicial dos valores exigidos
à União tributar a atividade.
Essa natureza securitária é reforçada pelo artigo 1º da Lei
Qualquer Natureza (ISS) pelo valor bruto recebido, mas pelo seu 9.656/98, que atribui às Operadoras a qualidade de mera admivalor líquido, assim entendido o que se obtém após deduzidos os nistradora de um fundo comum, e não prestadora de serviços,
pagamentos efetuados aos médicos, dentistas, enfermeiros, labo- tendo em vista que os serviços são prestados pelos médicos,
ratórios, hospitais e outros que prestarem os serviços de saúde co- hospitais e clínicas, que pagam o ISS sobre os valores recebidos
bertos pelos planos, valor (líquido) esse que, no fundo, representa das operadoras, o que acarreta uma bitributação. Mas, ainda que
a comissão auferida pela empresa que os coloca no mercado. A todos os argumentos sejam favoráveis às operadoras, há que se
admitir-se a tributação dos referidos planos pelo seu valor inte- lembrar na história da jurisdição nacional a existência de opinigral (bruto), haverá induvidosamente um duplo pagamento do ões antagônicas entre o STJ e o STF.
Diante desse panorama, é recomendável que as empresas
imposto, o que é vedado sobre as parcelas pagas aos terceiros pela
execução dos serviços de saúde: um pela empresa captadora dos busquem o Judiciário para afastar a incidência do ISS, sendo
planos e, o outro, pelos terceiros, contribuintes que são do mesmo prudente o depósito judicial dos valores exigidos, podendo ainda
imposto, por prestarem os serviços por eles cobertos. Precedente, ser pleiteada a devolução corrigida dos cinco anos que antecenesse sentido, do Egrégio STJ, nos EDcl no REsp nº 227.293/RJ, derem a propositura da demanda, até que o Supremo Tribunal
Federal coloque fim a esses debates.
julgados em 09/08/2005.”
Já o Supremo Tribunal Federal entendia que a competência
em julgar essa matéria era exclusiva do Superior Tribunal de Jus- Daniela Artico é advogada, pós-graduada em direito tributário material e
tiça, e portanto não julgava os recursos que ali chegavam com processual, especialista em direito contratual e atuante nas áreas de direito
esse tema, entendendo se tratar de ofensa infraconstitucional ou médico e saúde suplementar em Curitiba.
ARTIGO
Daniela Artico
ISS devido pelas operadoras
O
É recomendável que as empresas
Diagnóstico | mar/abr 2014
39
Divulgação
ENTREVISTA
patrick Figgis
PATRICK FIGGIS, da PWC:
tecnologias e análise de
cenários são ferramentas
essenciais para possibilitar
mais eficiência e equilíbrio aos
sistemas de saúde
‘a redução
dos custos na
saúde não é uma
guerra perdida’
Para a Patrick Figgis, global leader for health industries da PwC, mercados
importantes estão alcançando um novo despertar na saúde, com foco em soluções
de sustentabilidade, sem sacrificar o acesso e a qualidade do atendimento
A
Adalton dos Anjos
fórmula mágica de
um modelo de negócios rentável e
que reduza os custos na saúde é um
desafio
possível,
na opinião do global leader for health industries da PwC,
Patrick Figgis. Para o executivo, que
comanda uma equipe de oito mil profissionais, em 158 países, governos e setor
privado, em diversos continentes, vêm
se esforçando para deter o aumento dos
custos, sem sacrificar o acesso e a qualidade do atendimento.“O sistema de saúde global, no ponto em que se encontra,
é simplesmente insustentável”, pondera
Figgis, que fez carreira na Price, onde ingressou como consultor em 1990. “Mas
não se trata de uma guerra perdida”. Um
dos elos da cadeia que poderia ser aperfeiçoado, em sua opinião, é justamente o
uso da tecnologia – aliado que costuma
ser mal utilizado na luta contra os gastos
na saúde. “Deveria ser sustentável, integrada com soluções tradicionais, além de
Especialmente
em países
emergentes, os
líderes precisarão
se perguntar se
os modelos de
atendimento são
suficientes para
assistir as demandas
das mudanças
populacionais e um
consumidor mais
informado e exigente
promover benefícios em longo prazo para
todos os stakeholders dentro do ecossistema de saúde”, critica o executivo. “No
entanto, o retrato atual reflete atrasos nas
estratégias em saúde digital das empresas
e equívocos como a falta de interoperabilidade entre as soluções e o próprio overuse”. Ações simples, como a utilização
de medicamentos genéricos ou o melhor
uso das ambulâncias, continuam a ser a
melhor receita para a diminuição das despesas, sobretudo aquelas aplicadas em
nações em desenvolvimento, onde, segundo Figgis, “a necessidade é a mãe da
invenção”. Altruísta – o executivo costuma participar de mobilizações para angariar recursos destinados a instituições de
caridade –, Figgis acredita que os mercados maduros são arrogantes quando se
negam a adotar experiências valiosas dos
emergentes em cortes de custos culpando
as diferenças culturais. “Temos muito a
aprender com os mercados emergentes”,
declara o consultor. Direto de Nova York,
o number one da Pwc para a saúde concedeu a seguinte entrevista à Diagnóstico.
Diagnóstico | mar/abr 2014
41
ENTREVISTA
patrick Figgis
Revista Diagnóstico – A busca pela redução dos custos de saúde já pode ser
considerada uma guerra perdida?
Patrick Figgis – Acho que existe uma
maior consciência ao redor do mundo,
em governos e no setor privado, de que
algo deve ser feito para conter a escalada
dos custos em saúde. O sistema de saúde
global, no ponto em que se encontra, é
simplesmente insustentável. Mas há saídas e, sob esse ponto de vista, a guerra
pode ser vencida. Acredito que estamos
alcançando um novo despertar na saúde,
onde todos os stakeholders estão abertos
para novas ações que ajudem a solucionar esta questão importante. As organizações estão reexaminando seus modelos
de negócios e o governo e órgãos reguladores transformando suas políticas com
a esperança de que podemos vencer a
guerra contra o aumento dos custos sem
sacrificar o acesso e a qualidade do atendimento.
Diagnóstico – A PwC criou o conceito
“bending the cost curve” (alterando a
curva de custo, em tradução literal) –
uma série de simpósios globais em que
os líderes compartilharam suas melhores práticas. As soluções simples continuam sendo a melhor receita? Poderia
citar um exemplo?
Figgis – Existem alguns exemplos que
posso citar em termos gerais. Temos
visto governos locais implementar soluções práticas para melhorar os custos,
por exemplo ampliando o índice de uso
de medicamentos genéricos ou readequando a utilização das ambulâncias
ao incentivar os pacientes a usar outros
meios de transporte. Essas soluções
simples não impactam na qualidade
do cuidado, mas elas podem economizar milhões de dólares para os contribuintes. Algumas empresas privadas e
agências do governo estão adotando o
mhealth e as mídias sociais como ferramentas para proteger a cadeia de abastecimento global de produtos farmacêuticos. Em algumas nações emergentes, a
falsificação de remédios é um sério problema que pode significar menos receita
para as companhias e maior dano para
a sociedade. Um sistema pode permitir
ao paciente e aos prestadores de serviço
médico checar a autenticidade dos medicamentos através da digitação de um
número inscrito na embalagem de um
remédio nos seus aparelhos celulares.
42
Diagnóstico | mar/abr 2014
midores, que estão tendo uma maior responsabilidade por seu cuidado.
Após o envio de um SMS gratuito ao
servidor, uma resposta é encaminhada
em tempo real para verificar se o produto é real ou não.
Diagnóstico – Quais os questionamentos que os líderes de empresas do setor
de saúde em países em desenvolvimento, como o Brasil, devem se fazer ao tentar definir estratégias de sustentabilidade para os seus negócios?
Figgis – Especialmente em países emergentes, os líderes precisarão se perguntar
se os modelos de atendimento são suficientes para assistir às demandas das mudanças populacionais e um consumidor
mais informado e exigente. Por exemplo,
eles podem resolver as necessidades de
cuidados primários da sua população não
através do treinamento de mais médicos
generalistas, mas criando um acesso aos
prestadores e um cuidado através da telemedicina e mhealth. Nossos clientes em
países emergentes estão buscando caminhos para melhorar a qualidade e expandir o acesso ao cuidado, tudo ao mesmo
tempo e mantendo os custos sustentáveis.
O emprego de tecnologias que aumentem
a eficiência e o devido suporte de análise
e proficiência na gestão são ferramentas
essenciais para possibilitar melhoria de
performance e a consequente sustentabilidade aos sistemas de saúde.
Diagnóstico – O que leva uma empresa
do segmento de saúde a buscar uma
consultoria atualmente?
Figgis – As grandes tendências, aliadas
ao desenvolvimento social significativo,
que está modelando o mundo, revolucionam a indústria da saúde nos dias atuais.
Avanços tecnológicos, mudanças demográficas e o crescimento da influência
de mercados emergentes, como o Brasil,
estão promovendo um tremendo impacto
na maneira como os nossos clientes estão se posicionando no mercado. Aliado
a tudo isso, os governos estão cada vez
mais sob pressão para produzir mais valor. E é justamente a partir desse cenário
que as companhias de saúde estão solicitando nossa ajuda para dar um sentido
às mudanças em curso, identificar oportunidades de colaboração com organizações fora da saúde – e vice-versa – e
para codesenvolver modelos de negócios
e novos serviços. Estas questões tem sido
predominantes, mas elas têm se tornado
mais pronunciadas devido às forças econômicas e geopolíticas. Sem mencionar,
é claro, a influência crescente dos consu-
Diagnóstico – Em recente pesquisa da
PwC, 86% dos CEOs da área de saúde
acreditam que o avanço tecnológico
transformará seus negócios nos próximos cinco anos. No entanto, há um gap
entre a situação atual e o que eles querem ser – somente 33% dos entrevistados aumentaram os investimentos em
tecnologia. Poderia comentar?
Figgis – O estudo mostra que uma das
razões de eles não terem feito muito
progresso é porque os CEOs acreditam
que as funções de pesquisa e desenvolvimento em TI estavam mal preparadas
para capitalizar. A tecnologia promoveu
uma disrupção em muitos setores e a
saúde não é uma exceção. Para ter sucesso, a tecnologia deveria ser sustentável, integrada com soluções tradicionais,
além de promover benefícios em longo
prazo para todos os stakeholders dentro
do ecossistema de saúde. Além disso,
muitas companhias do setor estão atrasadas em suas estratégias de saúde digital.
As barreiras podem ser devido à falta de
interoperabilidade entre soluções tecnológicas, de privacidade e de eficácia das
O emprego de
tecnologias
que aumentem a
eficiência e o devido
suporte de análise
e proeficiência
na gestão são
ferramentas
essenciais para
possibilitar melhoria
de performance
e a consequente
sustentabilidade aos
sistemas de saúde
questões sobre regulamentações e a falta
de incentivos na adoção das novas ferramentas. Apesar de estas barreiras serem
significantes, elas não são intransponíveis e as organizações podem trabalhar
com seus pares em outros setores para
aprender como eles podem aproveitar a
tecnologia como uma vantagem competitiva.
Diagnóstico – O senhor é a favor do
consumer-driven health care?
Figgis – O consumer-driven health care
já está se tornando uma realidade. Portanto, não é uma questão de se colocar
a favor ou contra esta tendência, mas de
como podemos efetivamente capitalizar
esta influência crescente no consumidor. Os pacientes estão se tornando mais
empoderados, administrando melhor
seus gastos em saúde, influenciando
nos resultados devido ao uso crescente
de ferramentas tecnológicas como os
smartphones e mídias sociais. As organizações de saúde que colocam seus
consumidores no centro do cuidado podem colher os frutos no novo mercado
de saúde.
Diagnóstico – De que forma o overuse
– que já compromete quase 1/3 das receitas com saúde nos EUA – vem sendo
tratado na Europa?
Figgis – O overuse, o underuse (subutilização) ou misuse (uso indevido) são
as três maiores variações que vemos na
saúde. Eles representam uma falha na
adoção de protocolos e procedimentos
padrões, e não levam as preferências
dos pacientes e objetivos em consideração de forma suficiente. O overuse é
um fenômeno reconhecido na Europa,
apesar de ser menos recorrente do que
na América do Norte. Existem três abordagens amplas no sentido de minimizar
a prática na Europa. O primeiro envolve
órgãos nacionais, como o National Institute of Health e Clinical Excellence no
Reino Unido, fazendo recomendações
sobre a qualidade e o valor do cuidado.
Eles geralmente usam evidências científicas e aplicam análises econômicas baseadas na efetividade e custos do desenvolvimento de suas diretrizes. Outras
formas de reduzir os gastos são através
do incentivo financeiro aos programas
focados na redução do overuse e nas
abordagens acadêmicas que conscientizam os públicos, prestadores e pagado-
O consumerdriven health care
já está se tornando
uma realidade.
Portanto, não é uma
questão de se colocar
a favor ou contra
esta tendência, mas
de como podemos
efetivamente
capitalizar esta
influência crescente de
um consumidor cada
vez mais empoderado
res a entrarem em um consenso sobre o
uso eficiente dos recursos de saúde.
Diagnóstico – O que os países mais ricos podem aprender com a experiência
de nações emergentes, como Brasil e
Índia?
Figgis – A velha máxima de “a necessidade é a mãe da invenção” é confirmada quando se trata de olhar a forma que
alguns mercados emergentes resolvem
seus problemas antigos nos seus respectivos sistemas de saúde. Uma vez que
os mercados em crescimento não têm o
mesmo nível de recursos que os países
desenvolvidos, eles acabam desafiando
o pensamento convencional e adotando princípios de outras indústrias para
desenvolver soluções criativas que melhoram o desempenho e reduzam custos.
Mercados maduros tendem a ter certa
arrogância com estas práticas, citando
diferenças culturais, regulações e demografia, como razões do porquê estas
experiências não podem ser transferidas.
Mas temos muito a aprender com mercados emergentes, principalmente com
suas abordagens para a industrialização
de procedimentos e aplicações no mercado de saúde.
Diagnóstico – Qual a importância estra-
tégica do mercado brasileiro de saúde
na operação global da PwC?
Figgis – O Brasil é um mercado em crescimento prioritário para a empresa. Na
área de saúde, nós já estamos fazendo
grandes trabalhos e a rede de oportunidades é intrigante.
Diagnóstico – Se a PwC fosse montar
um ranking dos dez maiores países para
se investir em saúde, incluindo todos os
Brics, em qual posição estaria o Brasil?
Figgis – Normalmente não ranqueamos
países, já que existe um grande número
de fatores que determinam a viabilidade
para o investimento. Diria que o Brasil
continua sendo uma opção atrativa. O
país tem um crescimento rápido entre os
setores farmacêuticos e de saúde, registra um aumento do poder de compra do
consumidor e possui condições demográficas favoráveis.
Diagnóstico – Ao assumir o cargo de líder global da divisão de saúde da PwC,
em julho de 2013, o senhor afirmou
que os clientes teriam novas oportunidades nos próximos anos. O que o senhor quis dizer com isso?
Figgis – Estamos enfrentando um grande número de desafios que ameaçam um
preço acessível, a qualidade e a sustentabilidade do sistema de saúde, mas ainda
acredito que estamos na vanguarda da
formação de um novo sistema que serve aos clientes. Com uma crise, vêm as
oportunidades. Os avanços na tecnologia
fornecem ferramentas interessantes para
os provedores, pagadores e o governo
tornarem-se mais precisos na detecção
e diagnóstico de doenças e prevendo o
comportamento do paciente, permitindo
assim tratamentos mais eficazes. Novos
participantes comerciais – aqueles fora
do mercado tradicional de saúde – estão revolucionando o setor, introduzindo
novos produtos, serviços e sistemas de
atendimento que promovem opções de
tratamento mais convenientes e acessíveis. Finalmente, a crescente influência
dos mercados emergentes e seus ganhos
econômicos estão desafiando o domínio
do mundo desenvolvido e nos forçando a
repensar a forma como estamos servindo
nossos consumidores na atualidade. Todas estas forças estão contribuindo para
um modelo de saúde mais dinâmico que
beneficiará tanto os negócios quanto a
sociedade.
Diagnóstico | mar/abr 2014
43
POLÍTICA
norte/nordeste
café com
rapadura
Ascensão de dirigentes nordestinos no comando de entidades representativas do
setor mudou a geopolítica da saúde brasileira, historicamente centrada no eixo Sul/
Sudeste e cujo domínio republicano já foi conhecido como política do café com leite
44
Diagnóstico | mar/abr 2014
H
MARA ROCHA
Ricardo Benichio
Benichio
Ricardo
O cearense LuIZ ARAMICY,
presidente da Federação
brasileira dos hospitais
(FBH): liderança nordestina na
ANS (André Longo – Penambuco),
Fenaess (Humberto Gomes –
Alagoas) e na AMB (Florentino
Cardoso – Ceará)
á um século, os governantes do Brasil
eram
escolhidos
pelas oligarquias de
São Paulo e Minas
Gerais, na conhecida “política do café
com leite”. No período, que durou 36 anos
e terminou com a ascensão do gaúcho Getúlio Vargas ao poder, em 1930, o comando da política nacional se alternava entre
paulistas e mineiros – maiores produtores
de café e leite da época, respectivamente
–, concentrando o desenvolvimento socioeconômico no Sudeste e acirrando as
diferenças regionais existentes no país.
Muito tempo se passou até que regiões
historicamente excluídas conseguissem
representatividade nacional e levassem
suas pautas de reivindicação para as discussões no Parlamento. No âmbito da
saúde, não foi diferente. A última década
assistiu a um notável crescimento da participação de líderes do Norte e Nordeste
no topo decisório da saúde brasileira, em
cargos antes ocupados principalmente por
representantes do eixo SP – RJ – MG.
Atualmente, algumas das maiores organizações representativas do setor, a exemplo da Federação Brasileira de Hospitais
(FBH), da Associação Médica Brasileira
(AMB) e da Fenaess, além da ANS, são
presididas por nordestinos.
O “levante nordestino”, visto de longe, pode ser definido como a ascensão
natural de uma região historicamente preterida nas políticas públicas. Com mais
acuidade, esse movimento – pacato, ao
contrário do fervor pelo poder do início
do século passado – representou também
a superação de um discurso vazio que
durou décadas e que se resumia a um
coro de mais verbas para a saúde, sem
liderança constituída. “A participação do
Norte e Nordeste na representatividade da
saúde brasileira se deu por uma questão
de necessidade”, define o paraense e vice-presidente da Federação Nacional dos
Estabelecimentos e Serviços de Saúde
(Fenaess), Breno de Figueiredo. Virtual
presidente da entidade, na vaga ocupada
até o final do ano pelo médico Humberto Gomes, o dirigente começou a carreira
de gestor em 2000, quando abandonou a
residência médica em otorrinolaringologia para se dedicar exclusivamente à atividade política e administrativa. Filho de
médico militante, aos 36 anos Figueiredo
é considerado uma das mais promissoras
lideranças da nova geração de políticos
engajados com a causa da saúde. “Nos
meus anos de estudante, dizia-se no Pará
que o melhor médico era o hospital da extinta Varig, que levava os pacientes para
serem tratatos em outras regiões”, ironiza,
referindo-se aos problemas que a população local enfrentava no passado. “Esse
quadro melhorou na última década, e atualmente possuímos unidades de saúde de
excelência no nosso estado, inclusive com
acreditação internacional”, afirma.
PIONEIRISMO – No comando da Federação Brasileira dos Hospitais (FBH),
desde 2010 – após 21 anos de alternância
entre dirigentes do Sul e Sudeste –, o cerarense Luiz Aramicy sabe como poucos
a trajetória que o Nordeste seguiu até conquistar uma posição relevante na política
da saúde brasileira “Tínhamos que profissionalizar a gestão das nossas instituições
e atrair financiamentos que impulssionassem o desenvolvimento do mercado local”, recorda ele, um dos pioneiros da militância na saúde da região, nos anos 70.
Com sede em Brasília, a FBH foi criada em 1965 para congregar proprietários
e gestores de aproximadamente três mil
hospitais em todo o Brasil. Desde sua fundação, apenas dois nordestinos chegaram
ao comando da entidade. “À medida que
participávamos ativamente dos encontros
nacionais com outros líderes, conseguíamos espaço e estabelecíamos laços importantes para a nossa trajetória”, lembra
Aramicy, bioquímico de formação e natural da pacata Maranguape, localizada a 30
km de Fortaleza. Segundo ele, os números da distribuição de recursos da saúde,
ainda hoje, mostram como o pendor da
balança sempre criou um país de contrastes, principalmrnte quando o assunto é a
saúde pública. De acordo com dados do
Ministério da Saúde, em 2004 – há exatos
dez anos – , os repasses de verba do SUS
para custeio dos serviços ambulatoriais e
hospitalares do Norte e Nordeste somavam R$ 3,5 bilhões. No mesmo período,
a região Sudeste foi contemplada com R$
6 bilhlões (diferença de 70%). No orçamendo deste ano, a vantagem do Sudeste
se mantém – R$ 6,3 bilhões contra R$ 8,3
bilhões, apesar de uma redução significativa (25%) no comparativo inter-regional.
Um agravante histórico, contudo, ainda
perdura, já que a região de maior investimento acolhe os três estados brasileiros
com maior número de usuários de plano
Diagnóstico | mar/abr 2014
45
POLÍTICA
norte/nordeste
de saúde do país, São Paulo (44%), Rio
de Janeiro (37%) e Espírito Santo (32%)
– dados de 2011. No Acre, Maranhão, Roraima, Tocantins, Piauí e Amapá, menos
de 10% da população é beneficiária da
saúde suplementar.
“A origem de quem comanda, na representação do poder, tem relação direta
com o perfil do seu legado político”, defende o consultor Cícero Andrade, que,
além de integrar os quadros da Fenaess, é
um estudioso do assunto. “Se você é paulistano vai defender sua cidade, por mais
isento que seja seu mandato. Abrir espaço
na base do cotovelo é algo sempre mais
contundente para quem sente o calo apertar no seu sapato”. Segundo ele, é verdade que a liderança nordestina vem sendo
protagonista na condução das políticas
públicas na saúde brasileira. Mas, em sua
opinião, trata-se de um movimento que,
em sua essência, não se deu de forma estratégica. “Em muitas circunstâncias, a
escolha de um baiano, pernambucano ou
sergipano para ocupar determinado cargo
ocorria por questões prosaicas, como assegurar uma terceira via, em uma disputa
acirrada de sulistas pelo poder, por exemplo”, compara ele.
Em outros casos, contudo, a competência foi determinante. É o caso do
atual presidente da Associação Médica
Brasileira (AMB), o cearense Florentino
Cardoso. Natural de Crateús – alto sertão
nordestino –, o médico teve rápida ascensão desde que iniciou a carreira de gestor
como presidente da Associação Médica
do Ceará, há 15 anos. Cirurgião geral de
formação e eleito para um mandato de
quatro anos à frente da AMB, o dirigente
ganhou destaque no Brasil inteiro ao criticar de forma ferrenha o programa Mais
Médicos, do governo federal. A oposição
o tornou, ao lado do presidente do CFM,
Roberto d’Ávila, persona non grata junto ao sttaff do então ministro da saúde,
Alexandre Padilha. Na última cartada de
artilharia da AMB contra o programa, definido por Cardoso como eleitoreiro, o dirigente apareceu em pleno Jornal Nacional,
ao lado de um médico cubano dissidente
do Mais Médicos que se dizia perseguido
pelo Governo Federal. A AMB organizou
uma coletiva de imprensa exclusivamente
para amplificar as denúncias. “Não gosto
de política partidária. E não tenho pretensão de me candidatar a nenhum cargo público”, fez questão de avisar o dirigente,
em entrevista recente à Diagnóstico.
46
Diagnóstico | mar/abr 2014
Nos meus anos
de estudante,
dizia-se no Pará que
o melhor médico era
o hospital da extinta
Varig, que levava os
pacientes para serem
tratatos em outras
regiões
Breno de Figueiredo, vicepresidente da Fenaess
Para interlocutores próximos, o médico alçou a AMB a um status político sem
precedente na história da entidade. Desde que a AMB foi criada, em 1951, pelo
então presidente da Academia Paulista
de Medicina, Jairo de Almeida Ramos,
os pilares da associação sempre foram o
apoio ao desenvolvimento científico e, de
forma moderada, à luta pela dignidade no
exercício profissional. “Os médicos estão
mais politizados e muito mais unidos no
momento”, atenua Cardoso. Segundo ele,
que não esconde de ninguém o interesse
em se candidatar à reeleição no comando da AMB, ao fim de seu mandato, não
existe resistência no Sudeste contra as
lideranças nordestinas, “mas um olhar
curioso sobre como será a nossa gestão”.
Em sua opinião, o maior legado que os
líderes do Norte e Nordeste têm deixado
para as entidades representativas do setor
é a visão integral da saúde, com atenção
para as diferenças regionais, que antes
não eram discutidas.
“Falamos a mesma língua do restante
do país, mas vivemos realidades completamente diferentes”, sentencia o médico manaura Álvaro Nogueira, diretor da
CNS e considerado outra liderança nortista em ascensão. Segundo ele, em um país
continental como o Brasil, as diferenças
se dão até mesmo inter-regionalmente.
No Amazonas, por exemplo, só existe
um centro econômico, que é a capital, enquanto no Pará, três municípios cumprem
essa função. Mas o que todos esses esta-
dos têm em comum é a dependência do
SUS como praticamente único provedor
do sistema. “Sem a nossa participação
na luta das entidades de classe, as deficiências regionais não seriam notadas e os
problemas locais só persistiriam”, garante
Nogueira.
TOP FIVE – Outro expoente da políti-
ca nordestina é também um visionário.
Atual presidente da Fenaess, Humberto
Gomes foi um dos precursores da profissionalização da gestão nas Santas Casas
no Nordeste. Provedor da Santa Casa de
Misericórdia de Maceió, sua liderança fez
da instituição um case de sucesso nacional. Ano passado, a instituição integrou
o top five das melhores organizações de
saúde do país, eleitas pela revista Istoé
Dinheiro. No ranking, que leva em conta
critérios como sustentabilidade financeira, governança corporativa e inovação, a
Santa Casa ficou atrás apenas do Fleury,
do Dasa e dos hospitais Oswaldo Cruz e
Samaritano. É também a única Santa Casa
do Brasil integrante da Anahp, na categoria “associado titular”. Até o fim do ano, a
instituição, fundada em 1851, será a primeira do país a ser certificada pela Accreditation Canada. “Ninguém faz nada sozinho. Todo trabalho é fruto de um esforço
de equipe”, costuma justificar Gomes. Em
seu segundo mandato à frente da Fenaess,
que representa os 21 estados filiados à entidade junto à CNS, o dirigente conseguiu
um feito e tanto: criar convergência política em uma entidade que durante anos foi
desacreditada pelos seus próprios associados. “Humberto resgatou a autoestima
de uma instituição que se encontrava sem
prestígio político”, salienta o presidente
do Sindicado dos Hospitais de Minas Gerais, Castinaldo Bastos Santos.
Em Brasília, onde tem livre trânsito
no Congresso e no Executivo, o presidente da Fenaess é uma das principais vozes
em favor da implantação do “fator amazônico” – um índice compensatório que
seria aplicado a tabela nacional do SUS
para hospitais que atuam em regiões desfavorecidas do norte do país. A proposta,
formalizada em 2012, junto ao Conselho
Nacional de Secretários Municipais de
Saúde e ainda em tramitação, parte de
uma lógica distante dos olhos de quem
vive em grandes centros urbanos. “Não
temos escala para sustentar a realização
de tomografias via SUS como um grande
centro urbano de outras regiões”, exem-
Tadeu Miranda
o baiano
Marcelo Britto,
vice-presidente
da CNS: próximo
passo é levar
representatividade
ao Congresso
Nacional
plifica Figueiredo. Além disso, a compra
de um tomógrafo, que muitas vezes precisa chegar de barco ao seu destino, faz
do investimento em tecnologia na região
o mais oneroso do país. “Não há como garantir o acesso universal à saúde sem levar
em conta as peculiaridades do Norte”, defende o dirigente, que, como bom político, prefere a tangência quando o assunto
é a sucessão na Fenaess. “A indicação do
futuro presidente se dará por consenso.
Mas, ao contrário do que se especula, nenhum nome foi definido”, despista. A interlocutores próximos, Humberto Gomes,
que não esconde a preferência por Figueiredo, já revelou o desejo de não continuar
no cargo, após o segundo mandado consecutivo. Aos 76 anos, o dirigente vem
manifestando o desejo de se dedicar mais
à família e à provedoria, em Maceió.
“Devemos persistir nessa integração.
Mas o próximo passo é levar representatividade ao Congresso Nacional”, sugere
o atual vice-presidente da CNS, o baiano
Marcelo Britto. De perfil questionador, o
dirigente foi durante dois mandatos seguidos presidente da Associação dos Hospitais da Bahia (Ahseb), onde fez história.
Em seis anos como dirigente, foi ovacionado pelos empresários do setor, criticado
por uma minoria pelo estilo “bateu levou”,
e visto com ressalvas pelos executivos das
principais operadoras da região. “Sentar à
mesa de negociações com Marcelo é um
embate que requer preparo. Ele conhece
todos os números e a legislação brasileira do setor como poucos”, confidenciou
o executivo local de uma operadora, que
preferiu o anonimato. “Certa vez, quando
nos demos conta, ele já estava negociando reajuste de tabela diretamente com a
matriz”.
O ímpeto, que fez Britto comandar paralizações históricas de atendimento contra planos de saúde, tornou Feira de Santana – sua base política no estado – uma
referência nacional quando o assunto é
valores pagos por procedimentos médico-hospitalares acima da média nacional.“Já
o vi colocar todos os congressitas baianos
dentro da Câmara Federal para discutir
reivindicações do setor”, lembra o ortopedista Ricardo Costa, que o sucedeu no
comando da Ahseb. “Quero continuar
contribuindo com o setor, através da minha atuação política institucional”, resume o dirigente, que, para muitos, pode se
tornar, no futuro, o primeiro nordestino a
presidir a CNS. Alguém duvida?
Diagnóstico | mar/abr 2014
47
ARTIGO
Adriana Gasparian
Divulgação
A auditoria interna em saúde
A
hospitais e demais players. Este processo, antes tratado pela área de
auditoria de qualidade, tornou-se foco importante de ciclos de auditoria
interna devido aos riscos que, se materializados, podem trazer impactos
deletérios às instituições. Tal observação é válida também para os prontuários eletrônicos, considerando a questão de perfil de acesso como de
importância inquestionável.
A terceira consideração a ser feita em relação ao desenvolvimento de um ciclo de auditoria interna que agregue valor está relacionada
com o engajamento dos colaboradores e a otimização do tempo quando
há profissionais técnicos em saúde envolvidos. A receptividade na área
auditada é extremamente positiva por parte dos colaboradores, uma
vez que ele se sente mais próximo e ao mesmo tempo à vontade para
falar com auditores que entendam profundamente sua operação. Consequentemente, o tempo de auditoria é menor e os pontos identificados
relevantes.
Entretanto é essencial que os pré-requisitos formais de uma auditoria sejam cumpridos. Para tanto, uma equipe de alto desempenho em
auditoria deve ser formada
com um mix de profissionais
com formação multiprofissional e com competências
policialesca definitivamente faz parte do passado e não variadas.
As melhores práticas de
deve ser considerada uma opção para as instituições de auditoria interna mostram
que o caminho a ser percorsaúde que buscam o amadurecimento de governança rido rumo à excelência necessariamente passa por três
fases sequenciais de amadurecimento:
nevrálgico: o sigilo médico.
I. estrutura de monitoramento dos controles e compliance;
Os processos a serem auditados em hospitais, centros de diagnóstiII. visão de negócios;
cos, seguradoras de saúde, assistências médicas e demais empresas de
III. consultor estratégico.
saúde são diferentes das outras indústrias. Caso o ciclo de auditoria seja
A concepção de uma auditoria interna policialesca definitivamente
conduzido de forma tradicional, importantes riscos deixarão de ser mapeados ou corretamente analisados. Cita-se, como um exemplo simples, faz parte do passado e não deve ser considerada uma opção para as
o processo de suprimentos. Inúmeras vezes, as compras efetuadas em instituições de saúde que buscam o amadurecimento de governança e
caráter de urgência são erroneamente tratadas como mal conduzidas por o aprimoramento de suas operações. Outrossim, a alta direção deve
apresentarem preços acima daquelas realizadas planejadamente sem que rotineiramente fazer uma autoavaliação e refletir sobre algumas questões relacionadas ao desenvolvimento de um plano de auditoria interna:
seja realizada uma análise documental da causa-raiz.
• Nossos riscos são gerenciados adequadamente?
Este ponto leva, algumas vezes, a uma falsa interpretação de que
• Possuímos uma estrutura otimizada e atuamos de forma eficiente?
há possibilidade grande de incremento na margem quando na verdade
• Estamos agregando valor ao negócio?
a conclusão só pode ser feita caso os prontuários médicos sejam analiO desenvolvimento de um ciclo de auditoria será tão mais efetivo e
sados por amostragem para correlacionar tais compras à veracidade da
urgência. Nas operadoras, o mesmo acontece nos casos das compras eficiente se as expectativas da alta direção sobre a função de auditoria
de órteses com preços mais elevados, porém com custo-efetividade em interna direcionarem para sua efetiva otimização, buscando o equilíbrio
entre os pilares risco – através do conhecimento e monitoramento de
longo prazo positivo.
Por outro lado, algumas áreas somente deveriam ser auditadas por seus principais riscos; custos – buscando a automação de seus controles
equipe técnica, preferentemente enfermeiras e médicos a fim de se ob- mitigatórios; e Valor – construindo um modelo de auditoria alinhado
servar a ética de sigilo médico. Isto ocorre no levantamento de pontos com as estratégias e objetivos sob sua responsabilidade.
no processo de documentação clínica, com mapeamento de gaps existentes no caminho percorrido pelo prontuário físico dentro do hospital. Adriana Gasparian é mestre em pediatria e MBA em economia e gestão da
Este processo hoje requer atenção especial, levando em conta, entre saúde, diretora executiva da EY para a área de saúde e atuou na Amil e Porto
outros aspectos, a indústria de liminares que atinge fontes pagadoras, Seguro na área de contas médicas.
origem da auditoria interna remonta aos mais antigos conceitos de controle e de desempenho das
empresas. Portanto, não é um tema recente. Entretanto, repaginou-se, sem deixar de lado a sua
função primordial de monitoramento dos controles internos e, mitigação dos riscos e compliance.
Conceitualmente pode ser definida como “uma
abordagem sistemática e disciplinada à avaliação e aprimoramento da
eficiência dos processos, de gestão de risco, controle e governança corporativa para ajudar uma organização a atingir seus objetivos”, segundo
o Instituto de Auditores Internos do Brasil (Audibra). Este conceito, se
tratado na profundidade que merece, deixa claro que a auditoria interna
não deve ser encarada como uma commodity para as empresas que buscam a excelência em seus processos.
Em instituições de saúde, sejam prestadores, provedores ou intermediadores, o exercício da auditoria interna requer precauções específicas,
levando em conta as particularidades do setor acrescidas de um ponto
A concepção de uma auditoria interna
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Diagnóstico | mar/abr 2014
Ricardo Benichio
Quem lê
decide.
Quem
decide lê.
HENRIQUE MORAES
SALVADOR – PRESIDENTE
DA REDE MATER DEI DE
SAÚDE
a Revista dos Líderes da saúde do brasil
Diagnóstico | mar/abr 2014
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OSVINO SOUZA
Carogestor
Fui aluno seu há cerca de cinco anos e lembro
a ênfase que o senhor sempre deu à necessidade
de os hospitais acompanharem, com cada vez
mais rigor, seus números. O senhor chegou a dizer que muitas instituições de saúde sequer sabem que eles existem. O que mudou de lá para
cá?
ANÔNIMO
É sempre um prazer rever um aluno, mesmo sem poder
reconhecê-lo, o que quase sempre acontece comigo, seja porque são muitos, seja por conta de minha memória que já não
é tão boa assim. “Não se gerencia o que não se mede, ... e
não há sucesso no que não se gerencia”, trecho de uma frase
atribuída a William Edwards Deming, um mestre em gestão
da qualidade, que sustenta meu alerta do ponto de vista teórico. Mas, mais do que a teoria, o que me levou a fazer aquela afirmação na época foi a vivência junto às organizações,
particularmente às organizações do setor da saúde, que comparativamente às dos outros setores mantinham controles,
não só financeiros, muito precários sobre seus indicadores de
desempenho. Algumas, que conheci pessoalmente, sequer tinham indicadores de desempenho gerencial de nível estratégico, quando muito tinham indicadores de nível operacional.
50
Diagnóstico
Diagnóstico || mar/abr
mar/abr 2014
2014
O que mudou de lá para cá, não posso afirmar com informações estatísticas, infelizmente, mas posso supor que, considerando o aumento crescente da competição no setor, algumas
dessas organizações devem ter fechado as portas, algumas
devem ter sido vendidas ou fundidas com outras mais poderosas, outras devem ainda estar passando por dificuldades e
tentando sobreviver. São aquelas que não aprenderam a lição.
É fácil e óbvio chegar a esta conclusão. Já as que amadureceram e aprenderam, mesmo que a duras penas, devem ter
implantado sistemas para a gestão do seu desempenho, pelo
menos financeiro. As mais conscientes da complexidade do
novo ambiente de “negócios” da saúde devem ter caminhado
para sistemas mais completos, até mesmo alguns utilizados
em outras indústrias ou setores, como o Balanced Scorecard,
utilizando o Mapa Estratégico e o Painel de Bordo e tudo o
mais. Falei genericamente, mas testemunhei os esforços de
algumas e conheço outras que já têm sistemas muito bons
desta natureza e estão aí firmes e enfrentando este mercado
competitivo.
Por que a governança clínica se tornou, somente agora, obsessão dos gestores?
ANÔNIMO
Não sou um profissional da saúde, nem um especialista
em gestão da saúde, portanto minha posição é de observador externo. Sou professor de comportamento e desenvolvimento organizacional que há alguns anos passou a dedicar uma atenção especial ao setor da saúde e a estudar a
aplicação dos conhecimentos de gestão ao setor, o que eu
chamo de gestão “em ou na” saúde. Deste ponto de vista,
creio que as respostas anterior e posterior a esta já dizem
respeito à sua pergunta. Mas as complemento com algumas
considerações. Vou lançar mão de uma palavra em inglês
para a qual não temos uma tradução perfeita em português,
accountability, que traduzimos como responsabilidade, mas
que significa muito mais que isso, remetendo-nos a uma
responsabilização muito mais ampla, nos moldes da velha
qualidade total. Creio que podemos ir por aí. A governança
clínica seria algo assim, que remete os gestores da saúde a
se responsabilizar pela qualidade da assistência não apenas no nível da qualidade individual do profissional, mas no
âmbito organizacional e gerencial. Assim, todos os profissionais de saúde, particularmente os gestores, devem continuar prezando pela qualidade de seu conhecimento e prática
clínica, mas não podem deixar de considerar as boas práticas de assistência como políticas organizacionais. Disso
derivam novos aprendizados e novas práticas de liderança,
trabalho em equipe e gestão de pessoas, programas de educação e treinamento contínuos, gestão da qualidade, gestão
de riscos, gestão de processos e projetos, entre outros conceitos que não faziam parte do currículo dos profissionais
da saúde até pouco tempo. Assim, como nas outras indústrias, descobriu-se que também na saúde uma boa gestão e
o trabalho em equipe fazem a diferença e são cada vez mais
indispensáveis para a sobrevivência e o desenvolvimento de
uma organização hoje em dia.
Há um consenso de que o país vive uma fase
de instabilidade em sua economia. E ela acontece em um momento em que a competição nunca foi tão acirrada, em todos os setores. O que
os hospitais podem aprender com essa realidade? Sinto que preciso reinventar meu negócio a
cada dia. Isso é normal?
ANÔNIMO
Independentemente de o país estar passando ou não por
um período de instabilidade econômica, o fato é que o mundo
mudou de tal forma nas últimas décadas, levado por fatores
como globalização e tecnologias diversas, que não podemos
mais deixar de considerar as mudanças como parte de nosso
dia a dia. A competição chegou para ficar no setor da saúde
também e, se considerarmos o turismo de saúde e a crescente
mobilidade das pessoas, essa competição tende a ser global,
mesmo que seja para uma pequena fatia da sociedade, por
enquanto. Os hospitais têm muito a aprender com esta realidade. Antes de mais nada precisam a aprender que têm que
ser tão eficientes, eficazes e efetivos como qualquer outra organização para sobreviver num ambiente competitivo. Tem
que ter foco no cliente/paciente/familiares/comunidade. Tem
que inovar e focar na saúde, não na doença, já que esta é a
principal expectativa do cliente. Aprender a trabalhar com
competição, mas simultaneamente com colaboração, em redes, otimizando assim seus recursos, que serão cada vez mais
escassos e caros. Os gestores hospitalares não podem perder
de vista que, ao mesmo tempo que têm sob sua responsabilidade a saúde e a vida de seus pacientes, também têm em
suas mãos a sobrevivência e o desenvolvimento de suas organizações e que sem elas o primeiro objetivo não se realiza.
O velho conflito entre qualidade e produtividade continua e
continuará presente, e nos desafiando sempre, pois os recursos são finitos, ou seja, temos que fazer sempre o máximo
possível com o mínimo de recursos disponíveis. O que é normal? Cada vez mais é normal mudar intensa e velozmente.
Muda o macroambiente em que estamos inseridos, e, como
dissemos, em uma dimensão global. Muda o microambiente,
por exemplo as pessoas com quem lidamos diariamente (colaboradores, clientes, fornecedores, prestadores de serviços),
que estão mais conscientes de seus direitos e mais exigentes.
Temos que saber lidar com isso - é normal.
Osvino Souza é professor da Fundação Dom Cabral (FDC) nas áreas de
comportamento e desenvolvimento organizacional.
Diagnóstico | mar/abr 2014
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Diagnóstico | mar/abr 2014
Diagnóstico | mar/abr 2014
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GESTÃO
ppp DA SAÚDE
jorge oliveira,
presidente executivo
da prodal, que
administra o hospital
do subúrbio: prejuízo de
R$ 1 milhão/mês no único
hospital em regime de PPP
no Brasil
Os (des)caminhos
da PPP na saúde
Principal aposta para disseminar a melhoria da performance da gestão pública no
país, o avanço das Parcerias Público-Privadas na saúde continua no papel, graças à
burocracia brasileira e à ideologia – ainda imperante – de um estado onipresente
A
Regiane Oliveira e Reinaldo Braga
adoção da PPP na saúde brasileira, três anos
após a inauguração na
Bahia do Hospital do
Subúrbio – primeira
unidade de assistência
pública do país a adotar o modelo integral de gestão privada – é
um caso típico de voo de galinha, como
diz o jargão popular. Sobe rápido – o interesse pelo projeto atraiu praticamente
todos os grandes estados do país –, cria
expectativa, mas não vai longe. Segundo
dados do Observatório das Parcerias Público-Privadas (PPP Brasil), desde 2010,
quando o hospital baiano passou a operar,
foram lançados 13 Procedimentos de Manifestação de Interesse (PMI) – primeiro
degrau para a implantação de uma PPP.
Desse total, apenas três contratos foram
assinados. No âmbito municipal, à parte a
fracassada tentativa da mega PPP da Prefeitura de São Paulo, de R$ 6 bilhões em
quase 20 anos, nada avançou. Lançado em
2011 pelo ex-prefeito da capital paulista,
Gilberto Kassab, o projeto previa reformular a estrutura hospitalar da cidade. À
época, uma consulta e uma audiência pública foram realizadas e os investimentos
de R$ 800 milhões seriam revertidos para
a construção de três novos hospitais, a reforma e ampliação de outras nove unidades de saúde, além da implantação de quatro centros de diagnóstico por imagem.
No entanto, as dificuldades financeiras da
prefeitura paulistana e as incertezas com o
tamanho da PPP – 16 unidades divididas
em três lotes – contribuíram para que o
interesse da iniciativa privada arrefecesse.
Ainda assim, os editais foram publicados,
mas não houve interessados. Com a pro-
ximidade do fim do mandato do prefeito Kassab, o Tribunal de Contas de São
Paulo (TCM-SP) resolveu interromper o
processo e a nova administração cancelou
o projeto. O governo do estado do Rio
de Janeiro também viu naufragar, há três
anos, o projeto de concessão à iniciativa
privada de parte de sua rede de hospitais.
O objetivo era lançar duas PPPs na área
da saúde, com valor estimado de R$ 200
milhões, para a construção de uma unidade tratamento intensivo (UTI) na Baixada
Fluminense e outra para a construção de
um hospital de transplantes em Niterói.
Por enquanto, nada saiu do papel. Em Belo
Horizonte, uma nova consulta pública foi
lançada depois que um edital para obras
de reconstrução, reforma, ampliação, revitalização e construção de novas unidades
da rede de atenção primária à saúde não
atraiu o interesse da iniciativa privada. O
novo projeto prevê a prestação de serviços
não-assistenciais com contraprestações da
ordem de R$ 101 milhões por ano.
Na esfera estadual, o governo Alckmin pretende construir dois novos hospitais em regime de PPP, em Sorocaba e São
José dos Campos, no interior do estado. A
intenção é adicionar 646 leitos à rede, em
um investimento de R$ 772,2 milhões. A
licitação, que excluiu a assistência no edital, está prevista para ocorrer no início de
julho.
Mas por que os projetos dão “vazio”
– no jargão do mercado? “Porque muitas vezes faltam garantias e ninguém quer
ficar 20 anos perdendo dinheiro, brigando com o governo, pedindo correção de
valores”, afirma Daniel Figueiredo, diretor comercial da Vivante – antiga Dalkia
–, uma das sócias do consórcio Prodal,
que administra o Hospital do Subúrbio.
Mesmo com o êxito na assistência – foi
o primeiro hospital público do Norte e
Nordeste a conquistar a acreditação hospitalar –, o pioneirismo baiano não livrou
a operação do revés. Vítima de seu próprio sucesso, desde a sua inauguração, em
setembro de 2010, o hospital opera acima
de sua capacidade. “Se tivéssemos incorporado na contraprestação o excesso de
demanda, o negócio estaria equilibrado”,
revela o presidente executivo da Prodal,
Jorge Oliveira. “Registramos prejuízo de
R$ 1 milhão por mês”. Segundo o governo baiano, que admite sobrecarga pontual
no atendimento do Hospital do Subúrbio,
“todas as compensações contratuais previstas na PPP vêm sendo cumpridas rigorosamente”.
Para muitos analistas, o pífio desempenho financeiro da unidade, que recebe
anualmente do erário R$ 151 milhões,
acabou reverberando na confiabilidade do
modelo, que nasceu como benchmarking
nacional. Após anunciar o maior projeto
de PPP do Brasil na área de diagnóstico
por imagem, o governo baiano foi obrigado a cancelar, em fevereiro passado,
o pregão na Bovespa para a abertura das
propostas. Uma liminar, impetrada pelo
consórcio formado pela MV e Grupo
Delfin, concedida pela Justiça, obrigou o
Estado a revelar os estudos técnicos que
definiram o preço máximo do certame em
R$ 81 milhões. Na época, o consórcio reclamante afirmou que a medida visava garantir o equilíbrio da operação. “Sabemos
que sempre podem haver ajustes”, reconheceu o então secretário de saúde Bahia
e mentor da PPP, Jorge Solla. “A ação na
Justiça foi encarada com maturidade”.
Diagnóstico | mar/abr 2014
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GESTÃO
ppp DA SAÚDE
Segundo ele, que chegou a viajar para a
Espanha para conhecer de perto a experiência europeia em PPP, a formatação do
contrato de concessão e todas as suas variáveis é a parte mais sensível e desafiadora
para o proponente. Mesmo assim, em sua
opinião, o episódio não pode ser encarado
como uma derrota no modelo de parceria
público-privado na saúde brasileira. Com
a PPP de diagnóstico por imagem, que
pretende tirar das mãos do governo a complexa gestão do seu parque de imagem, 12
unidades hospitalares integrantes da rede
própria do estado teriam os serviços prestados por meio de uma central. Gerida
integralmente pelo consórcio vencedor,
que será responsável por contratar os médicos, realizar os atendimentos, além de
administrar todas as instalações, o modelo
de contratação permitiria ao parceiro privado, entre outras vantagens, a módica
prerrogativa de não precisar fazer uma licitação internacional para a compra de um
simples nobreak. Um novo leilão, com os
devidos ajustes, foi marcado para o dia 15
de julho deste ano.
“O sucesso de uma PPP, especialmente na saúde, depende do perfeito entrosamento entre o Estado e o consórcio
vencedor que será prestador dos serviços
Divulgação
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Diagnóstico | mar/abr 2014
assistenciais”, ratifica o advogado Pietro
de Sidoti, especialista em parceria público
privada. “É como formar um time vencedor, que tem como base um contrato”.
FIM DE MANDATO – Visto pelo número
de projetos, o desenvolvimento das PPPs
na saúde, aparentemente, parece ser prioridade dos governantes brasileiros. Mas, na
prática, não é o que acontece. As PMIs se
tornaram uma forma barata para os governos de alavancar projetos de PPP. Formalmente, os procedimentos de manifestação
de interesse integram um rito obrigatório
para os estudos necessários à modelagem
de uma Parceria Público-Privada – executados sob encomenda pelo poder público.
E é aqui que reside a angústia do mercado.
Os governos pedem estudos, que custam
caro – entre R$ 1 milhão e R$ 2 milhões
–, mas nem sempre levam à frente os pro-
Hospital Metropolitano do
Barreiro, em belo horizonte:
apesar da retomada das obras,
após três anos de interrupção,
a unidade, que surgiu pública e
se transformou em PPP, só está
pronta na maquete
jetos. “Isso aconteceu no Ceará, em Natal,
São Paulo e no Distrito Federal”, revela
Bruno Pereira, coordenador do observatório PPP Brasil – uma organização sem
fins lucrativos que se tornou a maior referência do país no assunto. Segundo ele, à
medida em que os mandatos se encerram,
a chance desses projetos saírem do papel é
ainda menor, como aconteceu com a moribunda PPP da saúde da prefeitura paulistana. “Temos um estoque de projetos de
PPP ainda na pauta dos estados. Podemos
ter todos os editais sendo desovados até o
final do mandato”, torce Pereira. Sem as
garantias, contudo, de que os contratos sejam concretizados. “O poder público não
pode gastar de modo irresponsável, ele
tem que tomar decisões. E é exatamente
isso que falta”, avalia.
A equação tempo versus prazo para
decisão é outro obstáculo para os grandes
projetos de PPP. Que o digam os percalços que o país passou com a construção
dos estádios para a Copa em regime de
Parceria público-privada. Além da entrega
tardia, em metade dos 12 equipamentos,
todos os estádios foram construídos com
orçamento final acima do previsto. “Não
dá para gerar um contrato de um dia para
o outro”, critica o consultor Mauricio Por-
tugal, responsável pela implantação do
Hospital do Subúrbio. “Lá fora, projetos
de oito meses a dois anos não são comuns.
Na Inglaterra, que tem em torno de 900
contratos assinados, se falarmos em PPP
sendo estruturada em menos de 18 meses,
eles vão rir”. De acordo com o consultor,
a sociedade acaba não percebendo a mentira, mas projetos elaborados a toque de
caixa, com estudos de viabilidade ruim,
correm sérios riscos de nunca saírem do
papel. “E exemplos de projetos que ficam
pelo caminho são o que mais se vê no
país”, salienta Portugal.
Ricardo Benichio
O ESTADO NA GESTÃO – Não bastasse
a baixa implementação da PPP na saúde
brasileira, nenhum dos projetos em execução no país foi fiel ao modelo original.
Com exceção do Hospital do Subúrbio,
todas as três unidades em vias de operação no país – Hospital Metropolitano de
Barreiro, em Minas Gerais, Hospital da
Zona Norte de Manaus (AM) e o Hospital Couto Maia (BA) repassaram apenas
parcialmente a gestão das unidades à iniciativa privada. No projeto mineiro, continua nas mãos da prefeitura não apenas
a gestão, mas todos os demais serviços
de assistência à saúde, do corpo clínico
ao fornecimento de medicamentos. Com
um investimento privado de R$180 milhões na parte civil e contrato de 20 anos,
a licitação do Hospital Metropolitano do
Barreiro foi vencida por empreiteiras, reunidas no consórcio Tratenge e Planova. A
obra, que ficou três anos paralisada e começou como um projeto 100% público, só
deve ser entregue totalmente em 2016.
Em Manaus, no Hospital da Zona
Norte, que terá 300 leitos e cuja inauguração estava prevista para junho deste ano, o
modelo de gestão também excluiu a assistência. No Couto Maia, que será especializado em doenças infecciosas, o consórcio
formado pela MRM Construções e pela
SM Gestão Hospitalar será responsável
apenas pela construção do prédio, compra e manutenção dos equipamentos médicos – a gestão clínica e administrativa
será inteiramente assumida pelo poder
público. O hospital, que já teve as obras
iniciadas, contará com 155 leitos – sendo
30 de UTIs.
“O modelo de PPP na saúde adotado
no Brasil é mais uma jabuticaba brasileira”, critica o presidente da Anahp, Francisco Balestrin, parafraseando o pensador
carioca Roberto Campos. “Trata-se de
uma alternativa que só existe no Brasil”.
De acordo com a International Finance
Corporation (IFC), braço financeiro do
Banco Mundial e um dos principais agentes de fomento da PPP no Brasil, a inclusão da gestão médica e administrativa no
contrato de concessão é um dos pontos
cruciais para o êxito da parceria públicoprivada na saúde. “Não dá para gerenciar
uma organização que tem a dinâmica de
um hospital, sem poder demitir imotivadamente”, defende o superintendente corporativo do Hospital Sírio Libanês e um
defensor contumaz da participação privada na gestão da saúde pública, Gonzalo
Vecina Neto. “O Estado tem que garantir
a entrega e não gerir. A iniciativa privada
está melhor aparelhada para administrar
de forma mais eficiente”. No caso específico do Hospital do Subúrbio, encravado
na região de menor IDH de Salvador, os
números de desempenho tornaram a unidade uma referência de eficiência na rede
pública do Nordeste.
O hospital, que possui 313 leitos, tem
os melhores escores de desempenho entres seus pares, a exemplo do tempo máximo de internamento (4,38 dias), infecção
hospitalar (5,1/1000) e taxa de mortalidade institucional (3,28). Estima-se que
o custo para manter a unidade, cerca de
Não dá para
gerenciar uma
organização que
tem a dinâmica
de um hospital,
sem poder demitir
imotivadamente.
O Estado tem que
garantir a entrega e
não gerir. A iniciativa
privada está melhor
aparelhada para
administrar de forma
mais eficiente
Gonzalo Vecina Neto,
superintendente
corporativo do Hospital
Sírio Libanês
Diagnóstico | mar/abr 2014
57
GESTÃO
ppp DA SAÚDE
R$12,5 milhões/mês, é 30% menor quando comparado a uma unidade do mesmo
porte com gestão plena do Estado.
A unidade baiana usou como inspiração modelos bem-sucedidos de oferta de
serviços públicos, com comando privado,
da Inglaterra – país pioneiro nessa modalidade de contratação – e da Espanha. A
nação ibérica escolheu a PPP, em 2008,
como forma de ampliar em um prazo recorde a estrutura hospitalar de Madri e seu
entorno. Foram construídos, de uma só
vez, oito grandes hospitais (2.400 leitos,
no total), com investimento de 171 milhões de euros. “Oito em cada dez usuários
de nossas unidades hospitalares sob regime de PPP aprovam o atendimento”, disse
à Diagnóstico a diretora de infraestrutura
de Madri, Elena Bolde, que preferiu não
comparar o desempenho das novas unidades com os hospitais geridos pelo governo
madrilenho. “Há um preconceito ideológico e um certo corporativismo com o setor
de infraestrutura social”, acredita Mauricio Portugal, ex-IFC. “A área de educação
também tem dificuldade em fazer arranjos
que envolvam a participação privada de
longo prazo, justamente pelas acusações
de privatização – o que é uma completa
58
Diagnóstico | mar/abr 2014
falácia”. Mesmo na Inglaterra, a defesa
do Estado de mais participação privada no
badalado NHS – o SUS inglês – não é consenso. Uma das medidas que vêm sendo
adotadas pelo atual governo para amenizar
o rombo crescente nas contas públicas é
a modernização do sistema, com a construção e reforma de hospitais, através de
parcerias público-privadas. O modelo escolhido prevê que os compradores públicos sejam organizados na forma de trusts
autônomos e independentes da saúde
britânica, formados por grupos regionais
de clínicas e hospitais administrados por
conselhos. “David Cameron está prestes a
realizar o sonho de Margaret Thatcher de
acabar com o NHS como uma organização
financiada com dinheiro público”, polemiFILA DE IDOSOS EM BUSCA DE
ATENDIMENTO NA REDE PÚBLICA
DE SÃO PAULO: natimorta, PPP da
saúde do município – orçada em
R$ 6 bilhões – previa a construção
de três novos hospitais, reforma
e ampliação de outras nove
unidades de saúde, além da
implantação de quatro centros de
diagnóstico por imagem
zou o vice-presidente da Associação Médica Britânica (BMA), Kailash Chand em
artigo publicado no jornal The Guardian,
acusando o governo de avançar no projeto
conservador de privatização da saúde inglesa. A iniciativa tem sido contestada por
diversas entidades ligadas à saúde inglesa. Para o UKs Faculty of Public Health
(FPH) – principal órgão dedicado a especialistas em saúde pública do Reino Unido
–, a qualidade dos serviços será reduzida,
uma vez que em um mercado competitivo
não há incentivos para a colaboração entre
os prestadores concorrentes. “A integração
é essencial para melhorar a qualidade de
atendimento aos pacientes, principalmente
para aqueles com doenças crônicas, que
precisam da atenção de uma ampla gama
de organizações e setores”, disse à revista
Diagnóstico a presidente da FPH, Lindsey
Davies. “O Brasil precisa escolher que
caminho deseja seguir para modernizar
sua saúde pública”, defende Vecina Neto.
“Nos dias de hoje a defesa do fazer estatal só se explica por corporativismo ou
por uma visão arcaica”. Enquanto isso, a
modernização da saúde pública brasileira
segue voo solitário, curto e, o mais grave,
sem saber onde quer chegar.
Diagnóstico | mar/abr 2014
59
ARTIGO
Paulo Lopes
Roberto Abreu
Planejamento e controle
na gestão dos negócios
A
informações gerenciais, que permita com agilidade e confiabilidade realizar análises e definir estratégias para tomada de
decisões eficazes.
Estes sistemas de informações gerenciais exigem que as
empresas adotem algumas práticas de gestão que lhe permitam assegurar melhor governança dos seus negócios. As principais práticas que julgamos fundamentais são: orçamento
empresarial, gestão de custos, planejamento financeiro e planejamento estratégico.
O orçamento empresarial tem como objetivo alinhar a estratégia da empresa ao desempenho operacional. É um trabalho que contempla a análise de toda a estrutura da empresa na
busca da geração de resultados. É uma das ferramentas vitais
no gerenciamento de empresas.
A gestão de custos é uma atividade vital para a fixação de
preços dos produtos e/ou serviços. É necessário conhecer todos os processos envolvidos na fabricação do seu produto e/
ou na realização de serviços. Sem essa preocupação fica difícil uma melhor apuração dos
custos da empresa, o que pode
contribuir para levar ao prejuízo um projeto empresarial. O
planejamento financeiro conta
conhecer com clareza seus próprios resultados
com a valiosa ferramenta denoe, para tal, é fundamental possuir ferramentas de minada de fluxo de caixa. Esta
ferramenta permite que o gestor
gestão eficazes que ajudem o executivo na
avalie a geração de caixa e a necessidade de captação e ou aplitomada de decisões
cações de recursos no mercado
financeiro. Um fluxo de caixa
Na formulação do planejamento estratégico devemos ana- bem estruturado pode fornecer respostas para todas as dúvidas
lisar e responder eficientemente as seguintes perguntas estra- da administração de um negócio. De onde veio e para onde foi
o dinheiro? Os produtos e/ou serviço geram resultados? Onde
tégicas.
gastamos mais? Que produto ou serviço terá mais resultado?
1. O que queremos ser? (visão de futuro)
Dentro do planejamento estratégico, o fluxo de caixa é uma
2. O que somos? (nosso negócio e nossa missão)
3. Onde estamos? (diagnóstico do ambiente interno e ex- das principais ferramentas e, por isso, merece muito foco nesta
atividade.
terno)
Contudo, não adianta ter todos estes controles se não sou4. Em que acreditamos? (nossos valores)
ber interpretar os dados gerados. Vale ressaltar que os rela5. Para onde vamos? (objetivos e longo prazo)
tórios gerenciais bem elaborados são de extrema importância
6. Como vamos? (estratégias)
7. Como estou indo? (análise de indicadores de resultados) para que o gestor saiba a verdadeira situação da sua empresa.
Por tudo isso, “planejar e controlar” é a chave mestra de
8. Como posso melhorar? (linhas de ação)
Para que possamos controlar os objetivos, metas, planos e qualquer negócio de sucesso”, e que precisa ser fixada como
projetos definidos pelo planejamento estratégico, é indispen- prioridade na gestão dos negócios.
sável que seja implantada nas organizações a área de controladoria. Na realidade não é a implantação isolada da contabilidade como muitos enxergam.
Paulo Lopes é CEO do Grupo Organiza, headhunter, coach, palestrante e
De fato, o que é importante é dispor de um sistema de autor do livro Segredos de um Headhunter.
missão mais difícil de um empresário
não é conquistar o mercado, como muitos podem pensar. Na verdade a verdadeira missão é permanecer na atividade.
Suscetíveis a diversos fatores mutáveis
que precisam ser enfrentados, tais como
situação econômica do país, a concorrência, a gestão de pessoas e outros pontos passíveis de análise, os gestores precisam estar preparados para definir o que
deve ser feito e como fazê-lo.
Logo, um ponto importante da gestão é conhecer com clareza seus próprios resultados e, para tal, é fundamental possuir ferramentas de gestão eficazes que ajudem o executivo na
tomada de decisões.
Inicialmente, a mais importante de todas é o planejamento
estratégico, pois esta ferramenta gerencial irá possibilitar para
os empresários e executivos uma melhor clareza na direção
estratégica dos negócios.
Um ponto importante da gestão é
60
Diagnóstico | mar/abr 2014
Diagnóstico | mar/abr 2014
61
BOASPRÁTICAS
5
A
questões sobre
BYOD que o setor
de saúde deverá
enfrentar
Chris Crowell*
taxa de médicos que está escolhendo levar
dispositivos móveis para trabalhar continua aumentando em um ritmo alarmante.
Na verdade, um recente estudo da Jackson
Coker, agência de empregos especializada
em setor médico, descobriu que quatro entre cinco profissionais usam regularmente
seus dispositivos móveis com motivos médicos.
Concomitantemente, os pacientes e clientes também estão
ampliando os seus usos dos dispositivos sem fio em hospitais e
centros de saúde. Ao mesmo tempo em que existem benefícios
provados nestas situações, como um mais rápido acesso às informações dos pacientes, o influxo destes equipamentos também
tem algumas questões sérias.
Aqueles que olham para o lado negativo são rápidos ao apontar as questões de privacidade e o fato de que a informação dos
pacientes poderia ser comprometida. Mas uma série de outras
preocupações também está associada a este movimento, como a
enorme carga que se coloca na rede e nos recursos em TI.
Para ajudar a aliviar os efeitos da transição para o mobile,
as organizações de TI que realizam serviços para hospitais ao
redor do mundo estão começando a implantar estratégias Byod,
sigla para bring your own device, que em tradução livre significa: traga seu próprio dispositivo. Com o objetivo de proporcionar
recursos flexíveis necessários para administrar uma estratégia
Byod que mantenha os custos, o controle e a segurança, o setor
de TI deve estar preparado para enfrentar as seguintes questões:
1
SUPORTE DE REDE
Um recente relatório da consultoria Spyglass Consulting
Group descobriu que 69% das enfermeiras entrevistadas em um
hospital usam seus smartphones para comunicações pessoais e
clínicas enquanto trabalham. Isto, acrescido à estatística sobre
os médicos, equivale a uma enorme pressão sobre a rede do hospital.
Com o influxo dos dispositivos dos usuários finais, a demanda por uma conectividade consistente, confiável e continuamente
disponível, especialmente na rede wi-fi do hospital, torna-se cada
vez mais exigente. Normas federais americanas solicitam que as
instituições implantem uma rede única para atender as necessidades de uso de dispositivos médicos, bem como fornecer um padrão de interoperabilidade para proteger todos os dados clínicos
na rede sem fio. Além disso, os profissionais de TI dos hospitais
devem explorar a próxima geração de soluções de rede que são
altamente disponíveis, dimensionáveis e ubíquas.
62
Diagnóstico | mar/abr 2014
2
DISPOSITIVOS PERDIDOS
Se você trabalha em uma companhia e usa um celular corporativo, o pressuposto é que a TI assuma a responsabilidade pelo
rastreamento e substituição dos aparelhos que forem perdidos.
As organizações de saúde devem repensar este modelo tradicional, já que cada vez mais os equipamentos trazidos para o ambiente de trabalho são pessoais e não pertencem à companhia.
O gerenciamento de dispositivos móveis (mobile device
management – MDM) que pertencem ao funcionário é algo que
historicamente tem chamado a atenção dos profissionais de TI.
No entanto, a maioria deles está fazendo o mínimo no desenvolvimento de um melhor controle. Deveria haver um equilíbrio na
estratégia que leva em conta a necessidade de ser não-invasivo,
mas cumpridores da lei. Ao lidar com a informação do paciente,
tudo que contém os dados abrangidos pela Health Insurance Portability and Accountability Act (HIPAA) – lei norte-americana
sobre a segurança de informações médicas – precisa estar protegido, e os equipamentos necessitam estar seguros contra invasões.
3
uso profissional e pessoal
No futuro próximo, os equipamentos de computação móveis
no ambiente clínico serão tão comuns quanto são na vida real. Os
dispositivos servirão a um duplo propósito: os médicos e outros
profissionais usarão o mesmo smartphone para acessar informações do paciente e se comunicar com alguém em sua casa.
Já estamos ouvindo preocupações de médicos sobre o Byod
no que diz respeito à perda de privacidade em comunicações pessoais, o comprometimento do comportamento profissional e um
alerta sobre uma falta de esclarecimento de como deve ser o uso
dos equipamentos pessoal e profissional. A estratégia Byod neste ambiente requer uma mudança na cultura da organização que
gira em torno da transparência. Sem isto, os gestores e usuários
vão entrar em choque e nenhum dos lados conseguirá entrar em
acordo.
4
implantação de dispositivos
Atualmente, mais de 20 mil aplicativos mHealth estão disponíveis no mercado, e este número está crescendo em todas as
plataformas móveis. A maioria dos hospitais está usando aplicativos firewall e um gerenciamento unificado de ameaças a fim de
implementar e monitorar os softwares de forma segura e manter-se em conformidade com a HIPAA.
Estas estratégias têm se provado benéficas quando se trata
de equipamentos pessoais. Contudo, elas também criam preocupações sobre uma pior performance e escalabilidade. A implantação e o apoio a diversas aplicações podem ser problemáticos,
especialmente com a magnitude dos equipamentos envolvidos. O
setor de TI e a equipe de trabalho móvel devem ter o mesmo objetivo em mente – a segurança e proteção dos pacientes. A partir daí,
eles podem estabelecer de forma mais clara as políticas de uso.
3
Shutterstock/Editoria de Arte
5
equipamentos robustos
Os hospitais não são os locais mais seguros para equipamentos móveis. Existem fluidos e outras condições operacionais severas que podem ser desafiadoras. As condições são
drasticamente diferentes daquelas de um escritório padrão.
Ao mesmo tempo, é improvável que os médicos tomem medidas de segurança para proteger seus equipamentos de contaminação entre hospitais. A questão é: a responsabilidade
do saneamento do dispositivo pessoal deve ser da TI, ou o
médico deve assumir esta tarefa quando decidir usar seu próprio equipamento durante o tratamento dos pacientes? O fator não pode ser ignorado na implantação da estratégia Byod.
O Byod não é uma novidade passageira. Está aí para ficar e
as organizações precisam estabelecer estratégias e as melhores práticas para lidar com este cenário em constante mudança. As organizações que obtiverem sucesso na implantação
destas iniciativas têm a habilidade de transformar o fluxo
de trabalho clínico, simplificar processos, facilitar o acesso
dos médicos às informações e consequentemente melhorar o
atendimento dos pacientes.
Os hospitais não são os
locais mais seguros para
equipamentos móveis. Existem
fluidos e outras condições
operacionais severas que
podem ser desafiadoras. As
condições são drasticamente
diferentes daquelas de um
escritório padrão. Ao mesmo
tempo, é improvável que
médicos tomem medidas para
proteger seus equipamentos
de contaminação
*Chris Crowell é CEO da Extreme Networks, companhia que oferece
soluções em rede para empresas. Texto publicado no portal Venture Beat.
Diagnóstico | mar/abr 2014
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64
Diagnóstico | mar/abr 2014
Divulgação
ARTIGO
Fernando M. Machado
A competitividade dos serviços privados de saúde
no Brasil - ameaças e oportunidades na porta da
frente - Final
R
ecentemente, a Folha de S. Paulo, destacou
que numa palestra pública de uma alta autoridade da indústria farmacêutica, o mesmo
fez sucesso ao dizer que a inovação no setor
saúde, no Brasil, é como Pilates, todos falam
bem, mas poucos fazem. Risos, mas trágico.
Nas três últimas edições da revista
Diagnostico, com este mesmo título, mostrei exemplos de inúmeras inovações tecnológicas que estão transformando o setor saúde
no mundo, os possíveis riscos econômicos e de sobrevivência para
as empresas privadas do setor no Brasil e a contínua aceleração das
inovações de ruptura, o que ressalta a urgência do tema.
Nesta ultima parte, se apresenta a natureza do desafio para a rápida construção, nessas empresas, de uma capacidade adequada de
gestão da inovação, necessária para fazer frente às ameaças e oportunidades mencionadas.
permita inovar continuamente com sucesso, para garantir aumentos
progressivos de sua competitividade e lucratividade.
A Clinica Mayo, nos EUA, estabeleceu há muito um centro para
a inovação em ação, o qual tem mais de 100 projetos de inovação
realizados, centrados no Redesenho da Prática Médica, Instalações e
equipamentos, registros médicos, na transformação da saúde comunitária, nos serviços de saúde à distância e na segurança de pacientes
em UTIs. O recente anúncio do licenciamento da base de dados de
toda a prática médica da Mayo é resultado da ação do centro
As funções típicas da gestão da inovação na empresa, que incluem ativos tangíveis e intangíveis incluem, entre outras:
- A definição da estratégia de inovação da empresa e sua integração com a estratégia competitiva e de cooperação da mesma, incluindo a analise de tendências, gestão da inteligência tecnológica e
competitiva e a mineração em bases de dados de patentes.
- A identificação e conformação da carteira de projetos de inovação, seu financiamento, sua implementação e avaliação, incluindo
medidas e critérios de avaliação dos
resultados.
- A gestão das atividades de inuma função organizacional dedicada somente
fluência no desenho de políticas
publicas e obtenção de recursos fipara a gestão da inovação
nanceiros propiciados por incentivos
Para começar, como se trata de um tema complexo e novo, se re- fiscais e financeiros de governos.
- A gestão dos riscos da inovação na empresa.
quer uma compreensão uniforme do mesmo ao interior da empresa,
o que pode ser feito com apresentações conceituais e metodológicas
- A valoração dos aspectos propícios à inovação na cultura da orfocadas na realidade específica de cada empresa. Entretanto, há em- ganização e a eliminação das resistências organizacionais à mudança,
- A gestão das ideias, criatividade e atividades de pesquisa e depresas nas quais não existem as mínimas condições para se investir na inovação, sem uma profunda transformação organizacional. senvolvimento tecnológico, internas ou externas`a empresa, incluinAssim, para seguir adiante, se recomenda realizar um diagnóstico do a gestão eficiente de redes sociais.
- A gestão da integração entre as mudanças tecnológicas, organiorganizacional específico, com o fim de avaliar a magnitude do esforço requerido para construir uma capacidade interna de gestão da zacionais, estratégicas e de outra natureza na empresa.
inovação na empresa. Por sua importância para a sobrevivência da
- A negociação e implementação de contratos de transferência de
organização e complexidade, esta capacidade deve corresponder a tecnologia ou aquisições de outras empresas com ativos tecnológicos
uma função organizacional de importância semelhante ou superior às de interesse, e a gestão de sua absorção e melhora.
- A gestão do conhecimento e dos ativos tecnológicos da emprefunções financeiras, mercadológicas ou operacionais. Deve ser confisa, incluindo sua comercialização.
ável para responder, entre outras questões, a:
- A incorporação seletiva de tecnologias como big data e analytic
-Porque inovar? O que acontece se não inovamos?
-Quais inovações são críticas para nossa sobrevivência, competi- software, internet das coisas e outras nos sistemas, processos e ativitividade, crescimento e lucratividade?
dades da empresa, incluindo suas próprias metodologias.
- Para quem inovar, em quais segmentos do nosso mercado?
E importante notar que algumas das empresas privadas do setor
-Quanto investir em inovação?
saúde já apresentam um embrião destas funções, relacionado com
a implementação de tecnologias de informação e comunicação nos
-Com quem inovar, dentro e fora da cadeia de fornecimento?
-Quando nossas inovações devem estar no mercado?
seus processos e sistemas de decisão e controle, que facilitaria a rápi-Como levar a cabo essas inovações?
da construção de uma capacidade adequada de gestão de inovação na
-Como avaliar o retorno no investimento e o sucesso das inovações? empresa. Nada parece ser mais urgente.
Poucas empresas no país apresentam uma função organizacional
Fernando M. Machado é mestre em administração pela Universidade de
dedicada somente para a gestão da inovação, com recursos humanos, Aston (Inglaterra) e presidente da Focototal Ltda. Foi diretor de tecnologia
orçamento e medidas de avaliação de desempenho próprios, que lhes das Nações Unidas entre os anos de 1981 e 2006.
Poucas empresas no país apresentam
66
Diagnóstico | mar/abr 2014
Diretoaoponto
Luc Thjis
Divulgação
“O Brasil continua sendo um
mercado fundamental para a
Agfa Healthcare”
Presidente mundial da Agfa Healthcare, o belga Luc Thjis continua apostando no
futuro do Brasil, mesmo diante de um cenário cujas tendências apontam para um
crescimento arrefecido. De passagem pelo país – onde viveu entre 1999 e 2001 –,
o executivo falou à Diagnóstico sobre a importância do mercado brasileiro para
os negócios da multinacional, sediada na Bélgica. “Manteremos os investimentos
aqui, ampliando clientes, expandindo o portfólio e nossa organização”, garante.
Segundo ele, a matriz belga tem entendido de modo mais profundo os desafios,
necessidades e prioridades do sistema de saúde brasileiro. Obstáculos como o
ambiente regulatório e as dificuldades em transformar a unidade brasileira no
maior polo de P&D da América Latina, três anos depois da aquisição da WPD,
foram minimizadas pelo executivo, que se disse impressionado com o progresso
feito nas instalações da sede localizada no Recife. “Estamos em um bom caminho”,
sentencia. Thjis também falou sobre os desafios para o uso do big data na saúde e
o futuro da tecnologia digital no setor.
Em setembro de 2012, quando
o Brasil estava em alta no cenário econômico, o senhor
afirmou à revista norte-americana Global Healthcare
que acreditava bastante no
mercado e no futuro do país.
Dois anos depois, a realidade
é outra. pode comentar?
Continuo acreditando no Brasil. O país é
e continua sendo um mercado fundamental para a Agfa Healthcare. Manteremos
os investimentos aqui, ampliando o alcance de clientes, expandindo o portfólio
e nossa organização. Além disso, manteremos o desenvolvimento de produtos
junto com este mercado, como a nova
plataforma de gerenciamento de imagens,
Agility Image Management, que teve o
primeiro projeto-piloto aplicado no país.
Do ponto de vista do ambiente regulatório, qual a posição do Brasil em relação aos
Brics?
O ambiente regulatório faz parte de nossos negócios. A Agfa Healthcare está em
mais de 100 países e em cada um deles temos pessoas especializadas em assuntos
regulatórios. Algumas agências têm processos mais sofisticados e em outras eles
são mais simples. Acredito que o Brasil se
encontra na média mundial.
Três anos depois de transformar a unidade brasileira no
maior polo de P&D da América
Latina, já é possível fazer um
balanço dos resultados?
Quando visitei nossas instalações em Recife, fiquei muito impressionado com o
progresso feito. A equipe de P&D adotou
o processo de desenvolvimento ‘agile’ e os
codestreams foram racionalizados. Estas
foram bases necessárias para possibilitar o
avanço e a inovação. Um progresso similar aconteceu no nível da implementação
e equipes de suporte, bem como na gestão
das soluções.
O que a matriz da Agfa na Bélgica tem aprendido com as
experiências da divisão brasileira?
Estamos tão próximos dos maiores provedores de saúde brasileiros, com os quais
trabalhamos e temos um profundo entendimento de seus desafios, necessidades e
prioridades. Acreditamos poder ajudá-los
cada vez mais a obter sucesso em seus
negócios, provendo inteligência direta
em busca do cuidado integrado. Tudo isso
acaba se convertendo em um aprendizado contínuo e mútuo entre a Agfa e seus
clientes.
Por que a aquisição da WPD
belga Luc Thjis, presidente
mundial da divisão de saúde
da Agfa: atuação em mais de 100
países e escolha do Brasil como
maior polo de P&D da América Latina
não trouxe a performance
esperada pela matriz?
Estamos em um bom caminho. Os fundamentos para o crescimento e a inovação
têm sido estabelecidos. Nosso portfólio
Medview está sendo expandido com
novas funcionalidades inovadoras, enquanto o Orbis está em fase piloto.
O mercado de saúde está
pronto para a big data?
O desafio para a mineração da big data
na saúde é que a informação está sempre desestruturada e é disseminada por
meio de muitos sistemas de informações díspares. Em nossa opinião, os
investimentos em clinical intelligence
technology são a saída.
A Agfa migrou dos filmes
para a tecnologia digital e
reinventou um negócio secular. Qual será a próxima
grande virada da empresa?
Acreditamos que o uso mais eficiente
dos recursos digitais continuará sendo
um tendência. Orientamos CEOs, CIOs
e CMOs para usar menos o papel dentro
de seus hospitais, desenvolvendo soluções para que a imagem fosse para os
seus prontuários eletrônicos e complementamos o mesmo recurso provendo a
gestão de conteúdo inteligente.
Diagnóstico | mar/abr 2014
67
Ascom/UFPe
EMPREENDEDORISMO
Magdala Novaes
doutora em Bioinformática
pela Université D’Aix
Marseille II, na França,
maGDALA coordena o
Núcleo de Telessaúde da
ufPe
uma brasileira fora
da curva
Mais influente personalidade da saúde digital da América Latina, a pesquisadora
Magdala Novaes é um exemplo de país que parece dar certo. Não fosse por um
detalhe: seu feito é quase uma subversão à política pública de TI em vigor no Brasil
E
leita a personalidade
mais influente em saúde digital da América
Latina, a pernambucana
Magdala Novaes, fundadora e coordenadora
do Núcleo de Telessaúde da Universidade Federal de Pernambuco (Nutes-UFPE), precisou vencer muito
mais do que os outros nove indicados à
láurea concedida pela HealthXL South
America Award – prêmio realizado pela
HealthXL, uma aceleradora de saúde da
IBM Venture Capital. Por conta do seu
perfil empreendedor, amplamente reconhecido entre seus pares, ela acabou
sendo uma das primeiras profissionais da
área de saúde digital do país e, ao longo
dos últimos 18 anos, convive diariamente
com os desafios e fragilidades das políticas de produção de conhecimento em
instituições públicas de saúde. “Há uma
descontinuidade das ações em saúde digital porque a política de TI é baseada em
práticas de governo e de Estado”, critica
a doutora em Bioinformática pela Université D’Aix Marseille II, na França. “É
preciso, ao contrário, privilegiar a criação
de um planejamento adequado e alinhado entre as três esferas – União, estados
e municípios – em detrimento de ações
emergenciais”.
Não por acaso, a rotina de dedicação
exclusiva à universidade e ao comando
do Nutes se tornou aprendizado valioso
não apenas em sua carreira, mas em como
enfrentar as dificuldades na construção de
um modelo de gestão pública para o setor. Um caso exemplar foram os atrasos
Há uma
descontinuidade
das ações em saúde
digital porque a
política de TI é
baseada em práticas
de governo e não
de Estado. É preciso
privilegiar a criação
de um planejamento
adequado e alinhado
entre União, estados
e municípios, em
detrimento de ações
emergenciais
sucessivos no desenvolvimento da Rede
Rhemo – um projeto ambicioso para a
colaboração a distância entre unidades
públicas de hemoterapia e hematologia.
“O contigenciamento ocorreu devido a
processos licitatórios e a burocracia existente na gestão de recursos públicos”,
lamenta Magdala. “Houve uma licitação
cuja espera durou 12 meses”. Em 2012
– dois anos após o previsto – a equipe
do Nutes conseguiu finalmente completar o ciclo de implantação da rede, com
a capacitação da equipe do Sinasan e o
desenvolvimento de protocolos. A Rede
Rhemo atualmente é composta por 31
salas de videoconferência espalhadas por
todos os estados brasileiros – integrantes
da hemorrede virtual.
Outro gargalo sensível na gestão pública da telessaúde brasileira, segundo
Magdala, está relacionado à fraca estabilidade e qualificação dos funcionários das
unidades de modo geral. “A alta rotatividade resulta em retrabalho e mais gastos
com treinamentos e capacitações realizados pelos núcleos de telessaúde”, salienta
a pesquisadora. Ao mesmo tempo, há uma
carência de profissionais que dominem o
uso e a manutenção dos recursos da saúde
online, já que grande parte dos especialistas não foi formada neste contexto de
inserção da TI. “Um dos maiores obstáculos para o avanço da saúde digital é a
resistência de médicos. Temos uma geração com hábitos bem antigos”, reitera o
professor Fernando Sales, doutor em cardiologia pela USP e integrante do Nutes-UFPE.
CELEIRO DE PROFISSIONAIS – A experiência brasileira em saúde digital, no
entanto, se mostra contraditória, já que,
diante de todos estes problemas, a Organização Pan-Americana de Saúde reconheceu, em janeiro de 2014, o Programa
de Telessaúde Brasil Redes como referência global. O projeto é o maior do mundo
em execução e permite serviços como a
segunda opinião de médicos e o diagnóstico com a emissão de laudos à distância.
A rede também promove a interação entre
Diagnóstico | mar/abr 2014
69
EMPREENDEDORISMO
Magdala Novaes
cerca de 100 hospitais públicos que atuam
na formação de profissionais. Somente o
núcleo liderado por Magdala já desenvolveu diversas ferramentas colaborativas
como o Healthnet, uma plataforma que
possibilita aos médicos e enfermeiros
discutir casos clínicos, e o PACS, um
gerenciador de imagens médicas utilizado para emissão de laudos e implantado
com uma plataforma de educação para o
curso de medicina. “Temos grandes celeiros de profissionais trabalhando em TI
no Brasil, mas ainda falta que estes atores
constituam redes”, destaca a coordenadora do Nutes-UFPE, ao criticar a desconexão entre os setores público e privado. A
corrida em paralelo entre as iniciativas é
reflexo do aparato burocrático, que afasta
as empresas interessadas em desenvolver e validar suas tecnologias. A legislação de modo geral não tem efeitos no
incentivo sobre a produção e até mesmo
na formação de centros tecnológicos que
integrem a academia e as empresas, como
acontece em outros países. Desta forma,
as parcerias com as universidades são tão
escassas que colocam os dois setores de
lados opostos.
Os pesquisadores também reclamam
do tempo do setor público para que as
parcerias sejam reconhecidas e o produto seja disponibilizado no mercado. São
meses e dezenas de documentos e contratos solicitados. A Lei nº 8666/93, que
regulamenta as normas para contratos e
licitações em toda administração pública,
passou por vários ajustes recentemente,
mas continua afastando as empresas. “A
iniciativa privada procura a universidade
para executar projetos, mas esbarra nos
estraves jurídicos e burocráticos”, reconhece a vice-coordenadora do Nutes-UFPE, Paula Diniz, doutora em neurociência pela USP. Sem citar nomes, a
docente lembrou-se de casos em que seus
colegas deixaram de ganhar royalties – e
a universidade também – porque a burocracia é muito grande. “Ou damos continuidade às atividades acadêmicas, que
já são muitas, ou paramos por um ano ou
dois para cumprir os requisitos para registro de patentes”.
Este cenário se mostra mais desolador
porque a crença na produção de pesquisas pelas universidades já foi maior, na
opinião de Magdala. “Isto foi se perdendo por conta dos entraves burocráticos
e da falta de segurança para a iniciativa
privada”. Outro argumento apontado
70
Diagnóstico | mar/abr 2014
Os Ministérios
da Saúde, da
Educação e das
Comunicações
precisam estar
integrados para
termos uma boa
atuação na ponta. A
ausência de um plano
em longo prazo influi
inclusive na iniciativa
privada, que muitas
vezes não se considera
SUS, mas é SUS
pela especialista como sintoma de que a
solução do problema ainda está distante
é o exemplo do Porto Digital, no Recife, que surgiu em 2000, e reúne mais de
200 empresas especializadas no desenvolvimento de TI. O parque tecnológico
fortificou o setor, mas não aproveitou o
potencial pernambucano no segmento
médico-hospitalar – segundo maior polo
do Brasil – para ter uma produção em
saúde digital suficientemente representativa. Além disso, a UFPE, que teve um
papel importante no surgimento do Porto
Digital, acabou sendo colocada de escanteio com o decorrer do tempo. “Ao invés
de levarmos os incentivos para a criação
do empreendedorismo na universidade,
tiramos isto de lá”, protesta.
A dissociação também ocorre dentro
da área de saúde digital. Sem informações precisas sobre como são utilizados
os recursos tecnológicos no setor, não é
possível a formação de um planejamento estratégico mais sustentável. Em um
tom professoral, a docente, cuja gestão é
marcada por regras como a determinação
de metas e prazos de cumprimento dos
projetos que coordena, explica que nem
mesmo as interações interministeriais
acontecem de modo efetivo. “Os ministérios da Saúde, da Educação e das Comu-
nicações precisam estar integrados para
termos uma boa atuação na ponta”, critica Magdala. “A ausência de um plano em
longo prazo influi inclusive na iniciativa
privada, que muitas vezes não se considera SUS, mas é SUS”.
perfil empreendedor – Mesmo
com tantos entraves, o Nutes pernambucano continua “ensaiando” várias parcerias. “Temos buscado, na medida do
possível, trocar ideias com o setor privado e executar algumas atividades em comum”, conta Paula, que destaca também
um movimento dentro da universidade
em busca de uma solução mais eficiente para atender à demanda que surge das
empresas. Contudo, se alguma posição
não for tomada, a detentora do título de
personalidade mais influente na América Latina alerta: “Vamos começar a ver
o movimento que aconteceu nos EUA.
Grandes universidades privadas são protagonistas na questão da pesquisa e desenvolvimento, em detrimento das instituições públicas”.
Com o perfil empreendedor, liderança e atuação ativa – características que
deveriam ser praxe no serviço público
brasileiro – Magdala se dedica agora a
um outro grande desafio: a implantação
de um módulo de imagens médicas desenvolvido na UFPE no sistema AGHU
– um aplicativo de gestão de informação
hospitalar que vai operar em hospitais
federais.
Na opinião de seus pares, o reconhecimento feito pelo HealthXL South America Award, fez jus ao seu empenho de anos
de dedicação em prol do avanço da TI na
saúde brasileira. “Nossa formação é voltada para a pesquisa e, apesar de todos os
entraves, temos sede por novos conhecimentos”, comenta Paula.
Para o futuro próximo da telemedicina
pública no Brasil, Magdala vislumbra uma
integração cada vez maior entre tecnologia e saúde, que deve continuar se refletindo na redução de custos e na melhoria
do atendimento, sobretudo a partir de soluções em medicina preventiva. “Sou revoltada com esta história de que servidor
público não trabalha”, desabafa a pesquisadora. Divorciada, além das inúmeras
atividades acadêmicas, ela ainda encontra tempo para se desdobrar como mãe de
Camile, 19 anos, candidata a uma vaga no
curso de medicina da UFPE. Pelo visto, a
cobrança em casa vai ser grande.
Diagnóstico | mar/abr 2014
71
ARQUITETURA HOSPITALAR
TENDÊNCIAS
Funcionais e
deslumbrantes
Eleitos os hospitais mais bonitos do mundo, eles são considerados benchmarking
também quando o assunto é sustentabilidade, acolhimento e saúde-paisagem
P
MARA ROCHA
aredes de vidro, jacuzzis, sauna, espelhos d’água, bancadas de granito, paisagismo exuberante, efeitos de luz privilegiando o design, apartamentos elegantemente decorados e até casa de hóspedes. Não é de hoje que as instituições de
saúde vêm investindo em infraestrutura e estética, sem deixar a desejar a nenhum hotel cinco estrelas mundo afora.
Para alguns prestadores, inclusive, beleza é tão fundamental quanto a qualidade dos serviços prestados. É o caso dos
hospitais eleitos os “mais bonitos do mundo”, de acordo com o portal americano Health Care Business Tech. A Revista Diagnóstico foi ouvir essas organizações – quase todas integrantes da elite do trade de turismo médico mundial,
– para entender o que as torna tão especial.
72
Diagnóstico | mar/abr 2014
Henry Ford West Bloomfield
Hospital (EUA)
a pacata Bloomfield, cidade com
menos de quatro mil habitantes
em Michigan, Estados Unidos,
está o Henry Ford West Bloomfield Hospital, especializado em ortopedia, neurologia, cardiologia, urologia, doenças
do aparelho digestivo e tratamentos de
câncer. Com uma área de 650 mil m², a
instituição possui um centro comercial de
alto luxo no saguão do hospital, com lojas
e serviços de spa, massagem terapêutica,
acupuntura, e aulas de ioga. Entre os frequentadores, estão moradores da região
que vão ao espaço sem razões médicas,
como almoçar no café onde toda a comida é feita a partir de ingredientes frescos e
produtos cultivados na estufa orgânica do
local. “Eles vêm para fazer compras, receber uma massagem, ou apenas jogar cartas com os amigos”, disse à Diagnóstico a
N
Fotos: Divulgação
O AMERICANO St. Rose
Dominican Hospitals,
localizado Na cidade dos
cassinos mais imponentes do
mundo, Las Vegas: arquitetura
inspirada nas construções das
missões católicas do início do
século XX
relações-públicas do Bloomfield Hospital,
Sally Ann Brown. O hospital, construído
em 2009, possui 191 leitos e já planeja
estendê-los para 300. “Todos os nossos
apartamentos têm vista para o verde, com
direito a lagoa e floresta”, informa ela. No
átrio de três andares, muitas plantas dão o
clima ecológico da estadia no local. “Estudos apontam que visualizações da natureza têm efeito calmante sobre os pacientes,
ajudando a curá-los mais rapidamente”,
salienta Sally. A instituição possui o certificado de Liderança em Energia e Design
Ambiental, devido ao emprego de luz natural para aquecimento e arrefecimento,
coleta de água da chuva e sistema de filtração, além dos programas de reciclagem
adotados. Em 2013, o hospital registrou
13 mil internações e 41 mil atendimentos na Emergência, além da realização de
dois mil partos. O Bloomfield Hospital
faz parte do Ford Medical Group Henry,
que também conta com uma unidade em
Detroit. Juntos, os dois empregam mais de
1.200 médicos de 40 especialidades.
Matilda International Hospital
(China)
o alto da histórica Victoria Peak,
área residencial onde moram os
milionários de Hong Kong, na
China, desponta o Matilda International
Hospital, construção clássica e charmosa
de 1907, com vista para o Mar do Sul do
país. Patrimônio chinês, o Matilda possui uma arquitetura tradicional por fora
e ultramoderna por dentro, com o centro
cirúrgico dotado de paredes de vidro e
iluminação azul LED, tecnologia alemã
empregada em cirurgias de alta precisão,
e que ajuda a manter a serenidade dos pacientes durante os procedimentos. Além
de cirurgia geral, a instituição, que possui
99 leitos, também oferece serviços ambulatoriais de atenção à saúde da mulher,
otorrino e ortopedia, com profissionais
especializados em intervenção na coluna
vertebral. Na China, o hospital foi pioneiro em alguns procedimentos ortopédicos,
como o AxiaLIF, cirurgia minimamente
invasiva para pacientes com dores nas
costas, além de substituições no ombro
e tornozelo. Primeiro hospital do país a
obter o ISO 9001, o MIH é credenciado
pelo Australian Council on Healthcare
Standards (ACHS) e pelo Hong Kong
College of Obstetricians and Gynaecology (HKCOG), além de ter o certificado do
OHSAS 18001 para saúde ocupacional.
D
Todos os nossos
apartamentos
têm vista para o
verde, com direito
a lagoa e floresta.
Estudos apontam
que visualizações da
natureza têm efeito
calmante sobre os
pacientes, ajudando
a curá-los mais
rapidamente
Sally Ann Brown, relaçõespúblicas do Bloomfield
Hospital (EUA)
E
Mediclinic City Hospital (EAU)
m Dubai, nos Emirados Árabes
Unidos, o Mediclinic City Hospital pode ser facilmente confundido com um hotel de alto luxo. Criada em
2008, a instituição oferece aos pacientes e
acompanhantes acesso a piscina aquecida
e infraestrutura dotada de spa, sauna, jacuzzi e ginásio. Uma entrada separada, com
elevadores exclusivos, serviço de valet e
estacionamento de limousine, dá acesso ao andar VIP com seis suítes de luxo,
cinco presidenciais e uma real. A estrutura também permite que os pacientes desfrutem dos serviços do seu próprio mordomo para servir refeições selecionadas
a partir de um menu sob medida. “Sem
dúvida, Mediclinic City Hospital domina
o conceito de saúde-paisagem de Dubai,
levando-se em conta também a qualidade
dos serviços prestados”, avalia, orgulhoso,
o diretor do hospital, Tarek Fathey. Com
229 leitos no total, a instituição recebe
mais de 200 mil pacientes por ano no ambulatório de atendimentos e tem cerca de
20 mil internações anuais. Referência em
cirurgia cardíaca, ortopedia, cirurgia geral, nefrologia, diálise, obstetrícia e ginecologia, o City Hospital faz parte do Mediclinic International, grupo de iniciativa
privada com uma média de 24% de cresciDiagnóstico | mar/abr 2014
73
Carilion Roanoke Memorial
Hospital, localizado na Virgínia
(acima), Henry Ford West
Bloomfield Hospital, sediado
em MIchigan (abaixo) e o libanÊs
Clemenceau Medical Center:
busca do equilíbrio entre modernidade
e acolhimento é um dos maiores
desafios da arquitetura moderna
74
Diagnóstico | mar/abr 2014
mento anual. Criada em 1983, a organização também possui hospitais na África do
Sul, seu país sede, Namíbia e Suíça.
St. Rose Dominican Hospitals
(EUA)
a cidade dos cassinos mais imponentes do mundo, Las Vegas,
nos Estados Unidos, está o Siena
Campus do St. Rose Dominican Hospitals. A instituição, que em 2013 faturou
US$ 38 milhões, foi construída em 2000
e teve o projeto desenvolvido pela arquiteta Mary Jean Thompson, sumidade
nos EUA quando o assunto é arquitetura hospitalar, diversas vezes premiada
no país. Mary, que também é musicista,
concebeu o projeto do hospital como se
estivesse compondo uma música. “Como
em uma partitura musical, é possível incorporar variações harmônicas em todo o
design do empreendimento, dando uma
sensação de previsibilidade e conforto
aos pacientes e visitantes”, explica. Seguindo um estilo que reflete as missões
católicas históricas ao longo da Califórnia e do México, muito popular nas construções do início do século XX, o projeto
arquitetônico incorpora paredes brancas,
N
Como em uma
partitura musical,
é possível incorporar
variações harmônicas
em todo o design do
empreendimento,
dando uma sensação
de previsibilidade e
conforto aos pacientes
e visitantes
Mary Jean Thompson,
uma das mais premiadas
arquitetas do setor de
saúde americano
azulejos históricos pintados à mão com
cores vivas, arcos suaves e superfícies
lisas, que dão ao ambiente um tom mais
clean e transmitem mais segurança e serenidade para os pacientes. “A beleza do
Siena Campus do St. Rose Dominican
Hospitals é frequentemente elogiada pelos nossos visitantes”, comenta, satisfeito, o vice-presidente sênior de operações,
dignidade e saúde em Nevada, Rod A.
Davis. O hospital possui 230 leitos e recebeu mais de 160 mil pacientes no ano
passado.
Dixie Regional Medical Center
(EUA)
om uma vista privilegiada para o
sudoeste do Deserto de Utah, na
cidade que abriga duas montanhas
de rocha magnética, a histórica St. George, nos Estados Unidos, está o Dixie Regional Medical Center. Especializado em
cirurgia cardiológica, cuidados neonatais
intensivos, sequenciamento genômico e
neurocirurgia – especialidade incorporada no ano passado –, o hospital possui
275 leitos. Construída em 1975 e ampliado em 2003, a estrutura foi projetada inspirando-se na geografia local. No interior
do edifício, estão os corredores princi-
C
Diagnóstico | mar/abr 2014
75
FACHADA EXTERNA DO Henry
Ford West Bloomfield
Hospital (ESQ) E Providence
Alaska Medical Center (EUA):
vista para as montanhas e muito
verde valorizam o conceito de
saúde-paisagem
pais, projetados para interligar os diversos cômodos da estrutura
na forma de “garganta de entalhe”, muito comum nos Canyons
próximos a Utah. A luz natural, captada pelas claraboias situadas no terceiro andar do edifício, iluminam até o saguão principal, no primeiro piso. Destaque para o paisagismo, com flores
desérticas compondo os jardins que circundam a instituição. O
Dixie Regional Medical Center registrou no ano passado mais
de 19 mil internamentos e cerca de 43.321 atendimentos de
emergência, além de 275 mil procedimentos ambulatoriais.
S
Clemenceau Medical Center (Líbano)
ituado na capital do Líbano, a linda Beirute, também conhecida como “Paris do Oriente”, o Clemenceau Medical
Center foi construído em 2005 e é uma das unidades de
saúde mais luxuosas da região. Com tetos altos e ambientes erguidos com materiais como vidro, madeira e granito, a moderna arquitetura do local permite o aproveitamento da luz natu-
76
Diagnóstico | mar/abr 2014
ral em espaços comuns, como no saguão do empreendimento.
Quadros coloridos e flores da estação ornamentam o hospital,
que também disponibiliza um piano para os visitantes com dotes musicais. Além da estética, o Clemenceau, que possui 101
leitos, investe em tecnologia e foi o primeiro no país a realizar
cirurgias com robôs. “Utilizamos o que há de mais moderno
nos serviços de imagem e radiologia, e vamos introduzir em
breve a primeira ressonância magnética silenciosa da região”,
garante a coordenadora de marketing, Dina Malas. Entre os
planos da instituição, está a construção, até 2015, de um prédio
anexo com mais 40 leitos e cinco salas de cirurgias, além de
centros de tratamento do câncer, de neurociências e de transplante de medula óssea. Para o mesmo período, a instituição
também prevê a construção de um complexo com 35 clínicas.
Carilion Roanoke Memorial Hospital (EUA)
Quem vê a moderna fachada do Carilion Roanoke Memorial
Hospital (CRMH) talvez não imagine que a organização sem
fins lucrativos completa, em 2014, 115 anos. É que o hospital
– um dos maiores do estado de Virgínia, nos Estados Unidos
– passou por diversas reformas ao longo das décadas. Circundada pelas belezas do Vale Roanoke, a construção é um misto
entre a arquitetura clássica do final do século XIX, com tijolo
e concreto nas janelas dos quartos dos pacientes, além de moderna. “A beleza do hospital se deve ao seu design luminoso
e acolhedor, com uma linda vista para a natureza”, acredita
a relações-públicas da instituição, Allison Buth. O CRMH
possui 1.247 leitos, sendo 60 pertencentes à UTI neonatal.
Recentemente, a unidade de saúde, que em 2011 teve uma
receita líquida de $ 1,4 bilhão, ganhou um novo departamento de emergência, trabalho e unidade de fornecimento e um
hospital pediátrico completo. A estrutura, com 600 médicos,
também oferece programas de residência médica em dez especialidades.
S
Providence Alaska Medical Center (EUA)
ituado no centro da cidade mais populosa do Alaska,
Anchorage, no norte dos Estados Unidos, o Providence
Alaska Medical Center é circundado pela beleza natural
da região, com trilhas arborizadas e um pequeno riacho dentro
do campus hospitalar. A vista para as montanhas de Chugach
complementa o cenário, que pode ser apreciado de alguns dos
quartos da estrutura construída em 1936. O empreendimento
dispõe de biblioteca e casa de hóspedes para os acompanhantes de pacientes de localidades mais distantes.
Maior unidade de saúde do estado, o hospital recebe mais
de 18 mil pacientes anualmente e conta com 326 leitos que,
até dezembro próximo, serão ampliados para 335. Para este
ano também estão previstas reformas na UTI neonatal, atualmente com 66 leitos, além de remodelação na área de serviços cirúrgicos e implantação de um programa de cirurgia
cardíaca.
Diagnóstico | mar/abr 2014
77
ARTIGO
Maisa Domenech
tencializar a redução de custos e aumentar a rentabilidade, diversas
empresas têm investido em centrais de negócios. Na área de saúde,
em particular, para fins de aquisição de materiais e medicamentos.
A integração e organização de unidades de saúde para a realização de compras conjuntas através de centrais de negócios
fortalece o sistema de prestação de serviços em saúde, gerando
a obtenção de melhores negociações e aumento da capacidade
de barganha, em função da ampliação de escala no volume de
compras e alinhamento de ações estratégicas. Tal processo não
deverá em hipótese alguma competir com os setores de compras
das unidades de saúde envolvidas, mas tão somente organizar,
facilitar e, até mesmo, contribuir para minimizar a perda de autonomia dos prestadores de serviços na aquisição de insumos. A
uando falamos em cadeia de suprimen- exemplo, já estamos vivenciando tal cenário, no caso das Órteses,
tos, passamos por diversos conceitos que Próteses e Materiais Especiais (OPME), seja através de compras
permeiam seu gerenciamento: design, pla- realizadas pelas operadoras de planos de saúde (OPS), seja atranejamento, execução, controle e monito- vés de marcas de produtos impostas pelas mesmas. (vide assunto
ramento das atividades da cadeia, com o comentado em artigo na Revista Diagnóstico (Ano IV /nº 20 /
objetivo de criar valor líquido, sincronizar mar/abr 2013). Para a obtenção de resultados promissores e funa oferta e a demanda, construir uma in- cionamento harmônico, é imprescindível, na implantação de um
fraestrutura competitiva. Da cadeia de suprimentos, faz parte a processo de compras conjuntas, formar uma equipe de trabalho
gestão das compras (padronização, planejamento, cotação, nego- entre as unidades de saúde, em que autonomia, conhecimento e
ciação e compra), a gestão do estoque (recebimento, estocagem, comprometimento sejam pilares fundamentais. Não menos imdistribuição e controle) e a gestão do faturamento (rentabilidade, portantes são as diretrizes, processos bem definidos e tecnologia
checagem, faturamento e recebimento).
robusta, que tragam confiança ao processo.
Quando tratamos de saúde, além dos desafios específicos
Faz-se necessário, para total transparência, que as diversas
etapas do processo, assim como as negociações, sejam vivenciadas e conduzidas por
um comitê. Este comitê deve ser formado
por um coordenador, que possa contribuir
para o fortalecimento do grupo e equilíbrio
relacionamento entre prestadores de
entre os diferentes interesses, e por represenserviços e operadoras de planos de saúde,
tantes das diversas instituições integrantes
precisamos reformar drasticamente o sistema do projeto. Fundamental, também, para que
o processo seja cristalino, a utilização de um
portal eletrônico como plataforma de come inerentes à área, além da falta de interligação lógica entre os pras conjuntas, através do qual ocorrerão as cotações, negociadiversos processos nas instituições de saúde – o que tem contri- ções e compras, ainda que se façam negociações focadas, com
buído de forma determinante para a elevação dos custos – agre- fabricantes, laboratórios e distribuidores.
gamos, também, diversas dificuldades na área de suprimentos,
Para início do processo de compras conjuntas, a padronização
tais como: variedade de categorias de produtos (elevado número tem papel fundamental, quando serão definidos os itens (SKUs)
de SKUs); pressão constante para redução dos níveis de estoque; que farão parte; marcas aceitáveis; as condições de pagamento;
restrição de área de armazenagem; baixa previsibilidade de de- prazos de entrega e faturamento mínimo para, em seguida, a parmanda ainda que tenhamos itens previsíveis e sazonais; compras tir de um cronograma de implantação e criação de cadastro, ser
emergenciais; lead-time incerto dos fornecedores; inventários iniciada a abertura da cotação. A previsão de demanda (volume
com baixo nível de acurácia, além da baixa tolerância à falta, e frequência de compras) também é essencial para início do provariável esta bastante delicada quando falamos de saúde.
cesso. Os pedidos de compras são emitidos em nome de cada uniExtrapolando ainda os diversos desafios impostos pela logís- dade de saúde, com informações dos endereços de faturamento,
tica dos processos, na área de saúde, os insumos hospitalares ocu- entrega e cobrança. Portanto, os participantes do projeto deverão
pam a segunda posição na distribuição das despesas totais, sendo cumprir, obrigatoriamente, seus compromissos financeiros assua primeira despesa com pessoal. Soma-se a tudo isto a importante midos perante o grupo e os fornecedores, e caso tenham ou venão conformidade no modelo de cobrança das contas médico- nham a ter problemas econômico-financeiros, devem comunicar
-hospitalares ainda vigente: os valores de diárias e taxas distam ao grupo, premissa esta para garantir credibilidade. A busca de
de forma expressiva do custo das estruturas hospitalares, e são os soluções conjuntas com cronogramas de atuação e planos de ação
materiais e medicamentos que minimizam o déficit das primeiras. bem definidos atrairão benefícios a toda a cadeia envolvida.
A distorção é tão significativa que as diárias e taxas correspondem em média a 27% da receita, enquanto os insumos hospita- Maisa Domenech é engenheira civil, pós-graduada em administração hospitalar,
lares correspondem em média a 54% da mesma, o que justifica a consultora da ADM Consultoria em Saúde e representante técnica da Febase no
necessidade da efetiva gestão destes itens. Com o objetivo de po- Departamento de Saúde Suplementar da CNS.
Roberto Abreu
O poder das centrais
de negócios frente aos
desafios da cadeia de
suprimentos nas unidades
de saúde
Q
Para viabilizar a mudança no
78
Diagnóstico | mar/abr 2014
Diagnóstico | mar/abr 2014
79
**
*
Legendas |
*
**
inovação
r. mercado
novos investimentos
visibilidade de mercado
escore de desempenho
relevância para sociedade
inovação
novos investimentos
assistência
visibilidade de mercado
Os gráficos apresentam o somatório da pontuação obtida em cada categoria
Os concorrentes que não enviaram o case tiveram deduzidos 20% de suas pontuações finais.
80
Diagnóstico | mar/abr 2014
*
Legendas |
*
realizações
inovação
curriculum
assistência
novos investimentos
visibilidade de mercado
Os gráficos
apresentam
o somatório
da pontuação
obtida
em cada
categoria
Os gráficos
apresentam
o somatório
da pontuação
obtida
em cada
categoria
Os concorrentes
queque
não não
enviaram
o case
tiveram
deduzidos
20%20%
de suas
pontuações
finais.
Os concorrentes
enviaram
o case
tiveram
deduzidos
de suas
pontuações
finais.
Diagnóstico | mar/abr 2014
81
*
Legendas |
inovação
assistência
novos investimentos
*
inovação
relação com o mercado
visibilidade de mercado
novos investimentos
visibilidade de mercado
Os gráficos apresentam o somatório da pontuação obtida em cada categoria
Os concorrentes que não enviaram o case tiveram deduzidos 20% de suas pontuações finais.
82
Diagnóstico | mar/abr 2014
*
Legendas |
inovação
relação com o mercado
*
inovação
assistência
novos investimentos
novos investimentos
visibilidade de mercado
visibilidade de mercado
OsOs
gráficos
apresentam
oo
somatório
dada
pontuação
obtida
em
cada
categoria
gráficos
apresentam
somatório
pontuação
obtida
em
cada
categoria
OsOs
concorrentes
que
não
enviaram
oo
case
tiveram
deduzidos
20%
dede
suas
pontuações
finais.
concorrentes
que
não
enviaram
case
tiveram
deduzidos
20%
suas
pontuações
finais.
Diagnóstico | mar/abr 2014
83
Legendas |
inovação
assistência
novos investimentos
visibilidade de mercado
Os gráficos apresentam o somatório da pontuação obtida em cada categoria
Os concorrentes que não enviaram o case tiveram deduzidos 20% de suas pontuações finais.
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Diagnóstico | mar/abr 2014
*
Legendas |
*
inovação
relação com o mercado
escore de desempenho
novos investimentos
visibilidade
retorno para o negócio
Os gráficos apresentam o somatório da pontuação obtida em cada categoria
Os concorrentes que não enviaram o case tiveram deduzidos 20% de suas pontuações finais.
Diagnóstico | mar/abr 2014
85
RESENHA
formação
De jaleco, com gravata
Livro dos autores ingleses Neil Gopee e Jo Galloway defende a teoria de que
profissionais de saúde conhecedores de gestão – mesmo focados na assistência –
tornam os hospitais mais eficientes e oferecem serviços de melhor qualidade
S
Mara Rocha
aber aplicar os conceitos
de liderança e gestão não
é importante só para a alta
cúpula das instituições de
saúde. Hospitais que empregam médicos e enfermeiros
conhecedores dessas teorias
tendem a ser mais eficientes e a oferecer
serviços de melhor qualidade, segundo
especialistas. O problema é que são raros
os programas de formação desses profissionais que incluem disciplinas ligadas
à administração na grade curricular. Para
sanar esse déficit, Neil Gopee e Jo Galloway – ingleses com larga experiência em
gestão hospitalar e com obras respeitadas
publicadas sobre o assunto –, escreveram
juntos Leadership and Management in
Healthcare. Ainda sem tradução no Brasil,
o livro analisa os papéis de liderança e de
gestão dos profissionais de saúde, com o
louvável objetivo de auxiliá-los nas tomadas de decisões durante a rotina diária de
um hospital.
Em sua segunda edição – a primeira
foi lançada em 2009 –, a obra foi publicado pela Sage, conceituada editora britânica independente com 50 anos de mercado.
Dividido em 11 capítulos, Leadership and
Management in Healthcare se debruça na
importância do desenvolvimento de certas
habilidades administrativas de médicos e
enfermeiros que, segundo os autores, deveriam ser estimuladas ainda no início de suas
carreiras. “Liderança e gestão são conceitos
importantes para todos os profissionais de
saúde, independentemente da posição que
ocupam”, defendem. Assim, a proposta
do livro é passar um conhecimento que,
embora não seja ensinado nos cursos universitários, pode ser imprescindível para a
administração de questões que certamente
surgirão na rotina das instituições de saúde. A começar pelas diversas teorias da
administração, apresentadas nos capítulos
86
Diagnóstico | mar/abr 2014
introdutórios. No contexto da já conhecida
organização britânica, a publicação apresenta, de forma bastante didática, as principais ferramentas de gestão, indicando qual
seria mais aplicável para cada situação. Na
forma de bê-á-bá, explica como proceder
em funções mais burocráticas como produção de papelada, balanceando as ações administrativas com as funções dos cuidados
de saúde. “Não é fácil equilibrar as tarefas
de gerenciamento com o papel de médico,
por exemplo. Uma boa noção de administração pode ajudar a encontrar esse equilíbrio”, ressalta o livro que ensina, inclusive,
a avaliar quando as atividades podem ser
realizadas em pequenos grupos, duplas ou
individualmente.
Leadership and Management in
Healthcare também aborda um ponto-chave para qualquer administração: a diferença entre liderança e gerenciamento. Se
saber gerir os procedimentos é importante
para manter o sistema em ordem, com planejamento, organização e coordenação, ser
um bom líder é imprescindível para manter
a equipe do hospital motivada e encorajada.
GESTÃO DE CONFLITOS – Isso porque
os conceitos de liderança ajudam o profissional a estimular inovação, originalidade
e progresso, assim como incentivam a humanização dos cuidados prestados e a confiança nas tomadas de decisão. “O líder vai
inspirar seguidores e provocar a melhoria
nos diversos serviços, fazendo com que a
instituição se mantenha em constante evolução”, argumenta o livro.
Resolução de problemas, tomada de
decisão e gestão de conflitos: quais instrumentos darão suporte nessas práticas?
Leadership and Management in Healthcare responde, analisando a natureza dos
acontecimentos e contextualizando-os.
As sugestões se referem, por exemplo, a
como proceder com a equipe quando surgi-
rem fatos inusitados envolvendo pacientes
suicidas, da ala psiquiátrica, e até mesmo
grávidas em situações de risco. “Óbvio que
as ocorrências nem sempre são previsíveis
a ponto de serem resolvidas com um guia
publicado, mas nesses casos o livro pode
servir como orientador nas ações, que ao
final dependerão do próprio indivíduo”, reconhecem os autores.
Um reforço também para as contas do
sistema de saúde público britânico, o NHS.
O livro dedica um capítulo inteiro à importância da união entre eficácia e eficiência
na prestação dos serviços. “Sem um olhar
acurado para esses dois conceitos, não
existiria nenhum serviço de saúde”, lembra
a publicação, ressaltando a necessidade da
economia de recursos para a preservação
do SUS inglês.
Aliás, os procedimentos e numerosos protocolos do sistema britânico estão presentes em todo o livro, descritos e
contextualizados de forma detalhada. São
analisadas, por exemplo, as mudanças demográficas que influenciam constantemente a estruturação dos diversos serviços do
NHS, bem como a política governamental
que regula esses atendimentos. Para o leitor
brasileiro, essa característica pode pesar,
tornando a obra maçante. Ao mesmo tempo, é uma oportunidade para conhecer de
perto a rotina do sistema de saúde referência para o mundo e, por que não, utilizá-la
como inspiração para novos mecanismos
de organização nas instituições locais.
Por tudo isso, Leadership and Management in Healthcare é uma leitura interessante para quem sempre achou que liderança e gestão não combinam com jaleco.
Leadership and Management in
Healthcare: Neil Gopee e Jo Galloway |
Editora Sage | 312 páginas | £ 23.99
Reprodução
“Por tudo isso, Leadership and Management
in Healthcare é uma leitura interessante para
quem sempre achou que liderança e gestão não
combinam com jaleco”
mara rocha
“Não é fácil
equilibrar as
tarefas de
gerenciamento com
o papel de médico,
por exemplo. Uma
boa noção de
administração
pode ajudar a
encontrar esse
equilíbrio”
Editoria de Arte
cuidar e gerir: conceitos de
liderança ajudam o profissional
a estimular inovação, além de
incentivar a humanização dos
cuidados prestados e a confiança
na tomada de decisões
“Liderança e
gestão são
conceitos
importantes
para todos os
profissionais
de saúde,
independentemente
da posição que
ocupam”
“o líder vai inspirar
seguidores e
provocar a
melhoria nos
diversos serviços,
fazendo com
que a instituição
se mantenha
em constante
evolução”
Diagnóstico | mar/abr 2014
87
Estante&Resenhas
Divulgação
Divulgação
Leia também
Cirurgião experiente e colunista da
revista The New Yorker, Atul Gawande se destacou ao escrever sobre os
problemas e desafios da medicina moderna. Nesta obra, ele parte de relatos
de cirurgias de risco para refletir sobre
a forma como os profissionais lidam
com a complexidade crescente de suas
funções.
Dalton Freitas, diretor
comercial da eWave Medical
do Brasil (SP)
Leonardo Faleiros, gerente de
vendas, da Imaging (SP)
Os autores, com muita criatividade,
escrevem um romance-negócio abordando o desafiador tema de gestão da
produção de uma fábrica. O enredo é
apoiado em fundamentos para identificar e resolver problemas decorrentes
de restrições ou gargalos que ocorrem
numa cadeia produtiva. O subtítulo do
livro - “um processo de melhoria contínua” - bem retrata seu objetivo final de
aumento na rentabilidade do negócio,
podendo, então, ser aplicado com sucesso em qualquer tipo de organização.
A historiadora Doris Kearns
Goodwin traz à luz a genialidade política e a capacidade de liderança de Lincoln ao narrar como o ex-congressista
de um único mandato e advogado pouco conhecido fora do seu estado deixou
a obscuridade para prevalecer sobre os
rivais de maior reputação e se tornar
presidente. Sua humildade e capacidade
de buscar convergência entre pessoas
e grupos antagônicos servem com reflexão para qualquer um que aspire a
liderança.
Um romance
abordando o
desafiador tema de
gestão da produção
de uma fábrica
O livro serve como
reflexão para qualquer
um que aspire ser um
líder
Checklist - Como Fazer as Coisas Benfeitas
Autor: Atul Gawande
Editora: Sextante
Número de Páginas: 224
Preço sugerido: R$ 24,90
Peter Drucker é considerado o
inventor da administração moderna
e um dos maiores especialistas em
gestão de negócios. O livro resume as
lições essenciais desse pensador extraordinário, mostrando o impacto de
suas ideias sobre a produtividade e a
liderança de qualquer empresa.
A Cabeça de Peter Drucker
Autor: Jeffrey A. Krames
Editora: Sextante
Número de Páginas: 224
Preço sugerido: R$ 29,90
O livro é considerado um dos
mais influentes do século XX no
mundo dos negócios, está completando 15 milhões de exemplares em
todo o mundo e ocupou as listas de
mais vendidos durante oito anos consecutivos.
Livro: A Meta – Um Processo de Melhoria
Contínua
Autores: Jeff Cox e Eliyahu M. Goldratt
Editora: Nobel
Número de páginas: 360
Preço sugerido: R$ 71,80
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Diagnóstico | mar/abr 2014
Livro: Team of Rivals - The Political Genius of
Abraham Lincoln
Autor: Goodwin, Doris Kearns
Editora: Simon & Schuster
Número de páginas: 836
Preço sugerido: R$ 57,90
Os 7 Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes
Autor: Stephen R. Covey
Editora: Best Seller
Número de Páginas: 448
Preço sugerido: R$ 52,00
Diagnóstico | mar/abr 2014
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Diagnóstico | mar/abr 2014

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