Revista Cient fica EXPRESS O - UNIFEG, Guaxup
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Revista Cient fica EXPRESS O - UNIFEG, Guaxup
1 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 2 Ficha Catalográfica Expressão : Revista Científica da Fundação Educacional Guaxupé. – Guaxupé, MG, v.1, n.1 (2000). n.22, junho de 2015 Semestral Resumo em Português e Inglês ISSN 1519-7069 1. Ciências sociais, aplicadas e humanas - Periódicos, 2. Ciências exatas, 3. Ciências biológicas. I. Fundação Educacional Guaxupé. Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé. CDD 21 – 050 - 056.9 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 3 UNIFEG – Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé CORPO DIRETIVO: José Renato de Souza Vianna Almeida Presidente da FUNDEG, mantenedora do UNIFEG REITORIA: Prof. Dr. Reginaldo Arthus Reitor Prof. Me. Antonio Carlos Pereira Pró-reitor Acadêmico Prof. Me. André Luis de Andrade Melo Pró-reitor Administrativo e de Recursos Humanos Denise Sampaio Pinto Secretária Geral CONSELHO EDITORIAL: Alexandre Marchi Dra. Ana Cláudia Pinto Corrêa Aurélio Miguel José Caetano Minus Lúcia Donizetti Modesto Dra. Marly de Souza Almeida Talita Andréa Bordini Malaman REVISÃO DE TEXTO: Profª. Marly de Souza Almeida EDITORES: Prof. Aurélio Miguel Profª Ana Cláudia Pinto Corrêa EXPRESSÃO REVISTA CIENTÍFICA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DA FUNDAÇÃO EDUCACIONAL GUAXUPÉ - UNIFEG ISSN 1519-7069 EXPRESSÃO, Guaxupé/MG Ano XVII. nº 22 - pág. 01 a 188 Junho de 2015 ADMINISTRAÇÃO TÉCNICA: Prof. Aurélio Miguel FICHA CATALOGRÁFICA: Rubens Torres PROJETO GRÁFICO E EDITORIAL: Eloadir Filho - Diagramação Agência Ilha - Capa UNIFEG: Avenida Dona Floriana, 463 – Centro Guaxupé/MG – CEP 37 800-000 Fone: (35) 3551-5267 Fax: (35) 3551-6137 Site: www.unifeg.edu.br Os trabalhos propostos à publicação são submetidos ao Conselho Editorial da Revista Expressão. Estes trabalhos deverão obedecer rigorosamente às normas e critérios de publicação constantes da resolução que os institui. Esta Resolução está disponível no site deste Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé: www.unifeg.edu.br Todos os direitos autorais são reservados. Reproduções, total ou parcial, devem constar créditos de referência, em consonância com a lei de direitos autorais vigente no país. O conteúdo dos trabalhos publicados pela Revista Expressão é de inteira responsabilidade de seu(s) autor(es). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 4 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 5 APRESENTAÇÃO A Revista Expressão, coletânea de artigos científicos elaborados pelos professores do Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé e também de profissionais liberais ou professores de outras instituições, publica a sua edição de número 21, neste décimo quinto ano consecutivo. Esta edição traz 11 artigos. Por ser multidisciplinar, sua publicação aborda diversas temáticas. No primeiro artigo, alunos e professores de fisioterapia avaliam a qualidade de vida e funcionalidade em pacientes assistidos pela clínica do UNIFEG; O perfil do idoso freqüentador do programa FATI – Faculdade da Terceira Idade, também do UNIFEG é tema de estudo do grupo de enfermagem; a área de engenharia civil preocupou-se com a qualidade ao medir a condição acústica do laboratório de materiais do UNIFEG. Num outro artigo – também de engenharia - avaliou-se a segurança no canteiro de obras aos trabalhadores da construção civil. Utilizando o método de janela parzen, um estudo de física mediu o comportamento do preço de ações em bolsa de valores. Também em física, estudou-se o fator-g em pontos quânticos esféricos e a capacidade de manipulação dos parâmetros capaz de controlar o sinal fator-g. Ainda em física, outro artigo trata da força das marés sob influência do sol e da lua. Sob tema das ciências jurídicas foram apresentados dois trabalhos: sobre crime de lavagem de dinheiro e sobre a decidibilidade com relação ao artigo 1829 do código civil. Na temática de educação e filosofia, dois interessantes artigos. Um deles tratando da importância da neurociência como forma de conhecer as limitações apresentadas por certos estudantes. Outro artigo de cunho crítico denuncia a ainda baixíssima presença da mulher na história da filosofia. Esperamos sempre que os leitores desfrutem de um espaço de reflexão do pensamento produzido neste UNIFEG e que sempre possamos seguir produzindo relevantes trabalhos à comunidade acadêmica. Desejamos a todos uma boa leitura! Aurélio Miguel Editor Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 6 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 7 SUMÁRIO A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size .................................................. pág.9 José Amélio de Miranda; Juliana Aparecida Pedretti Furlan Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação............................................................... pág.23 Eliene Maria da Silva; Priscila Lopes Santamarina da Silva; Talita Andrea Bordini Malaman Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil........................................................................................ pág.35 Poliana Alves Campos; Lúcia Alves Campos; André de Paiva Bonillo Fernandes Avaliação dos efeitos da corrente russa na reabilitação da musculatura respiratória em idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica............................................................................ pág.51 Pâmela de Rezende Santos ; Miriangrei Letieri; Isabela Scali Lourenço Simon Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos à artroplastia............................ pág.61 Priscila Souza Batista; Luís Henrique Sales Oliveira; Luiz Henrique Gomes Santos Disciplina de Educação ambiental?............................................................. pág.73 Cássio Murilo Monteiro Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar....................................................................................................................... pág.83 Felipe Vittig Ghiraldelli Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã........................... pág.99 Juliano Vasconcelos; Nilza Franchi Impacto da implantação do protocolo assistencial na diminuição de ocorrência de úlceras por pressão em uma unidade de terapia intensiva........................................................................................................................ pág.113 Maria Helena Silva Macedo; Wanderci Marys Oliveira Abrão O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto.......... pág.121 Marília Aparecida dos Santos; Daniela Aparecida Salgado Targino O milagre no contexto da “religião” em Kant.................................... pág.131 José Caetano Minus; Luisa Emília Lima de Moraes Minus Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 8 Prevenção de erros e fraudes e a credibilidade das informações – um estudo teórico sobre a eficiência do controle interno........... pág.143 Aline de Fátima Coelho; Ana Cristina Campos Prado Teixeira; Thaís Aparecida da Silva Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente........................................................... pág.153 Antonio Vilas Boas Quintiliano Junior; Denise Osiro Responsabilidade civil subjetiva e responsabilidade civil objetiva ............................................................................................................................................. pág.163 Laura Charallo Grisolia Elias; Maurício Martins Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde, na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível........... pág.173 Humberto Luíz Versola Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 9 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size José Amélio de Miranda1 [email protected] Juliana Aparecida Pedretti Furlan2 [email protected] RESUMO Diante do que se pode observar, este artigo buscou trazer ao conhecimento da comunidade acadêmica um tema, que cresce vertiginosamente no mercado brasileiro e no mundo da moda, quer pela importância de entender o comportamento desse público consumidor, quer pela importância em relação aos produtores de moda, ao comércio da moda e à produção da moda. Por parte das consumidoras tamanho GG (Plus Size), há um reconhecido benefício, bem como para a produção, divulgação e comercialização desses produtos, levando para um lado a satisfação e a segurança de “não estar na moda” e para o outro lado uma diversificação de nichos de mercado a serem altamente explorados trazendo consequentemente a satisfação para as consumidoras GG (Plus Size). Palavras-chave Nicho de Mercado. Plus Size. Comportamento do Consumidor. Mercado. ABSTRACT At what can be seen, this article sought to bring to the attention of the academic community a topic that grows sharply in the Brazilian market and in the fashion world, either by the importance of understanding the behavior of this consumer audience, either by importance for producers of fashion, fashion trade and production of fashion. By the consumer size XL (Plus Size), there is a recognized benefit as well as for the production, distribution and marketing of these products, leading to one side the satisfaction and security “not be fashionable” and across a diversification of market niches to be highly exploited consequently bringing satisfaction to the consumers GG (Plus Size). 1 José Amélio Miranda. Especialização em Administração Contábil e Financeira pela Faculdade de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis de Guaxupé (FACEG). Docente dos cursos de Administração e Ciências Contábeis do UNIFEG. 2 Juliana Aparecida Pedretti Furlan - Mestrado em Linguística pela Universidade de Franca (UNIFRAN). Docente do curso de Administração do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size 10 1. INTRODUÇÃO O Brasil está mais gordo, o mercado da moda está cada vez mais se preparando para essa nova realidade, surgindo o conceito de Plus Size, nova modalidade da moda voltada para o público tamanho GG. Uma pesquisa realizada pelo IBGE em 2013 revelou que o Brasil é um país em que a população está engordando. Entre o público feminino a “lógica” da moda, não é tarefa fácil de tentar entender, principalmente por que ela conta com dois fatores constantemente mutantes: a velocidade e a renovação. Considerando que os meios de comunicação são fortes propagadores da moda, verifica-se o surgimento de um novo conceito de beleza, a categoria Plus Size. O presente estudo tem como objetivo investigar o comportamento do consumidor feminino, como as mulheres se tornam reféns da “beleza social”, porque a ditadura da beleza é tão dura com elas que estão acima do seu peso ideal e como a moda Plus Size está ganhando mercado entre as mulheres brasileiras. Cada mulher, ou melhor, cada grupo de consumidoras, se identifica com um segmento existente hoje no mercado. Cada grupo de potenciais consumidoras escolhe um segmento dito por elas como o padrão da moda, essa escolha se faz por meio da relação de beleza e culto ao corpo, portanto, agora as consumidoras que estão acima do seu peso ideal podem se beneficiar da exploração do mercado atual: a moda Plus Size. A metodologia adotada foi a revisão bibliográfica, baseada em autores que tratam sobre os assuntos: beleza, moda, culto ao corpo e também autores que falam sobre consumo, a fim de cruzar informações para responder as questões acima propostas. Foi levantado também uma análise composta por relatos das campanhas publicitárias da renomada marca Dove. 2. A CONSTRUÇÃO DO CORPO: DA HISTÓRIA À BUSCA PELA BELEZA Foi na pré-história que surgiram os primeiros sinais de vaidade. O homem passou a se reunir em grupos e se fixou em um local, surgindo assim a diferenciação hierárquica. Os chefes, em geral os mais fortes do grupo, enfeitavam-se com as garras e dentes dos animais ferozes que caçavam. Surgiram também as primeiras pinturas de guerra que dariam mais força ao guerreiro, além de intimidarem, assustarem o adversário. Para compreender o que é tido como corpo desejável, aceitável, bonito é necessário mergulhar no passado, procurar mediações entre passado e presente, identificar tendências, identificar os diferentes discursos que foram moldados em diferentes épocas. Vivemos numa época em que a tendência, a ditadura da moda passa ser um significado cultural. No livro A Sociedade Contra o Estado de 1986, o autor deixa claro que o corpo para diversos povos é um aparelho de comunicação, uma vez que para determinados povos é muito importante o culto do corpo. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size 11 A busca pela beleza tornou-se um fenômeno nos dias de hoje, uma relação direta entre natureza – sociedade. Para entender melhor esta visão deste fenômeno natureza – sociedade pegar-se-á o exemplo da atriz hollywoodiana Marilyn Monroe: na década de 50/60 ela era tida a musa do cinema, considerada a mulher mais sexy do século XX, seus cabelos loiros viraram febre ente todas as mulheres, sua sensualidade marcada nos estilos de suas vestimentas, com cavas e decotes generosos e ousados para a época, o seu corpo era tido como o ideal sendo seu manequim de número 42, sua cintura de 72/74 centímetros e seu quadril em torno de 98 centímetros. Hoje as mulheres não querem mais se espelhar na atriz Marilyn Monroe, hoje elas se inspiram e se espelham nas top model, que possuem geralmente manequim de número 36, cintura com50/60 centímetros e quadril em torno de 80 centímetros, travando uma guerra ainda maior com os fatores físicos e psicológicos, que em muitas vezes ocasionam sérios distúrbios tais como anorexia e bulimia. Outro exemplo que podemos destacar é a Afrodite de Botticelli. Na Renascença, as mulheres volumosas e avantajadas eram o paradigma do que era belo e feminino. Todas as pessoas que fogem do conceito de ser uma pessoa magra, encontram dificuldades na hora de compor até mesmo seu guarda roupas, pois os modelos das roupas, os cortes, os tecidos, os tons e as cores em geral são pensados e produzidos para atender quase que exclusivamente o mercado de pessoas magras. A cobrança social em estabelecer um tipo físico perfeito começa desde cedo, no ambiente familiar, quando se afirma que ser gordo é ser feio. Esse conceito em que ser gordo é ser feio não é geral nem muito menos definitivo, sabemos que grande parte da população não se encontra adequada aos padrões de beleza tidos como atuais. Existe um público fora do manequim 36 e esse público fora do padrão estabelecido quer e necessita se vestir bem (VALENÇA, 2009). Muitas vezes, as pessoas com sobrepeso são julgadas como desleixadas e culpadas por sua condição. E com isso, os aspectos genéticos e fisiológicos que podem caracterizar o sobrepeso não são levados em consideração. Os estigmas e preconceitos atribuídos à aparência física da pessoa muito gorda são revelados através de olhares que constrangem, de insultos e agressões. Uma grande parte da população com sobrepeso (obesidade) tem algum tipo de distúrbio com a sua autoimagem, porém, muitas delas são psicologicamente influenciadas pelo já citado fato de que a mídia e a sociedade são as maiores incentivadoras dos padrões de beleza perfeitos. 2.1 A construção do corpo: na globalização A sociedade contemporânea tem sido testemunha de um crescente interesse em torno do culto ao corpo, com destaque para a exposição do que antes era escondido e, aparentemente, controlado (GOLDENBERG; RAMOS, 2002). A fotografia passou a ser apenas mais um instrumento influenciador decorrente dos meios de comunicação. Jogos de luzes, maquiagens, programas de computador vieram para facilitar a “correção” do corpo, buscando uma exposição melhorada do corpo real a ser exibido. A imagem do indivíduo é capaz de revelar a personalidade, o estilo Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size 12 de vida atribuído a essa pessoa, o corpo é tido como um objeto personalizado, estilizado, um “cenário” individual. A pessoa em muitas vezes atribui a responsabilidade de redesenhar seu próprio corpo, acredita que com este ato irá definir uma identidade. Os indivíduos ajustam de algum modo tanto a aparência como o comportamento de acordo com as exigências do cenário em causa. Na panóplia do consumo, o mais belo, precioso e resplandecente de todos os objetos – ainda mais carregado de conotações que o automóvel que, no entanto, os resume a todos é o CORPO. A sua “redescoberta”, após um milênio de puritanismo, sob o signo da libertação física e sexual, a sua onipresença (em especial do corpo feminino...) na publicidade, na moda e na cultura das massas – o culto higiênico, dietético e terapêutico com que se rodeia, a obsessão pela juventude, elegância, virilidade/feminilidade, cuidados, regimes, práticas sacrificiais que com ele se conectam, o Mito do Prazer que o circunda – tudo hoje testemunha que o corpo se tornou objeto de salvação. Substitui literalmente a alma, nesta função moral e ideológica. (BAUDRILLARD, 2005, p. 136). A globalização ou modernidade afeta diversas esferas socioculturais que constroem o indivíduo, interfere, por exemplo, na vida urbana, social, cultural, política e até mesmo histórica. Podemos dizer que a moda no sentido de vestimenta só se realiza depois do culto ao corpo. Beleza e moda não são um par tão constante quanto moda e status, razão pela qual as discussões acerca de padrões de beleza na moda são assombradas pelo gosto duvidoso, o grotesco e o sublime. O tipo físico em geral de hoje é diferente do de trinta anos atrás, assim como o de cem anos antes, a alimentação e a forma de vida eram responsáveis por criar as formas anatômicas consideradas padrões para cada época. As roupas, e o conceito do belo também sofreram mudanças, no século XVII o peso significava status, corpos volumosos indicavam que seu dono possuía mais do que precisava para alimentar o corpo, eram vistos com mais simpatia e prestigio aqueles que tivessem formas mais avantajadas. Foi no século XX que surge a lipofobia. As formas redondas deixam de ser associadas à prosperidade. A magreza adentra o século XX como fator crucial nas relações sociais. Hoje, a sociedade adotou que o padrão de magreza é o que significa status, sendo almejada e idealizada por muitas das pessoas e os que não aderem ao padrão de beleza são humilhados. Para Novaes (2006), o corpo expressa a busca pela felicidade, em compensação, o mesmo quer ser único. É através das roupas que se cria uma extensão corporal moldadas nos anseios e desejos de cada pessoa. 2.2 Moda e beleza A palavra moda vem do latim modus, que significa modo, maneira, em Inglês o termo equivalente é Fashion que do francês façon também sigRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size 13 nifica modo, maneira. (PALOMINO, 2003). Segundo o autor, moda é um sistema que acompanha o vestuário e o tempo, que integra o simples uso das roupas no dia-a-dia a um contexto maior, chegando ao cenário político, social ou sociológico. É bom traçar a diferença entre moda e roupa, o primeiro é um fenômeno moderno e a roupa existe desde o homem primitivo. Sant’Anna nos diz que: Mais que uma nuança da sociedade global, a Moda é entendida como a própria dinâmica de construção da sociabilidade moderna e, como tal, a aparência pode ser entendida como a própria essência desse universo. Na dinâmica da Moda, o sujeito moderno adquiriu a legitimidade de viver na aparência, de abandonar a religião, os ideais revolucionários e políticos, de buscar mais o prazer de viver do que sua compreensão. É na aparência que o sujeito moderno encontra o porquê de viver. (SANT’ANNA, 2007, p. 88). A moda se desenvolve sempre em busca de inovação, novidade, é capaz de desenvolver ritmos na produção para o consumo, construindo assim uma das estratégias mais bem sucedidas da sociedade de consumo. “Por meio de um processo de difusão de um conceito, a Moda estimula o consumo e interpõe um incentivo oculto para levar as pessoas a comprar. Compreender por que isso ocorre é fundamental para a gestão do negócio da moda” (COBRA, 2007, p. 12). As roupas ou qualquer outro objeto de consumo tem valor não apenas pelas suas funcionalidades, mas principalmente pelo que elas representam para o usuário. “A roupa integra o físico, que é o corpo, e o sentimento, que é o espírito. As pessoas gostam de ser notadas e admiradas, em um misto de orgulho e vaidade” (COBRA, 2007, p. 71). Sem o corpo, a roupa que passa a ser um produto da moda, perderia o sentido da sua existência, podemos assim dizer que o corpo é atualmente um veículo repleto de sentido, narrando à individualidade do sujeito. A roupa carrega consigo necessidades muitas além do simples ato de vestir, elas devem satisfazer o usuário em todas as suas necessidades anatômicas, fisiológicas e emocionais. A imagem corporal para o ser humano desempenha um papel importante na consciência da autoimagem; se a percepção do seu corpo for positiva a autoimagem será positiva, por isso se faz tão importante a aceitação em relação ao seu próprio corpo. A pessoa consegue manter uma autoimagem positiva em relação ao corpo mesmo estando obesa, a moda contribui com essa aceitação no sentido de criar roupas que promovam o bem estar e prazer de quem as veste. É perfeitamente possível buscar esta linha de conforto mesmo estando fora dos padrões impostos pela sociedade. “A roupa desempenha um papel importante na mudança desses mapas, complementando os sentimentos de autoestima e admiração e direcionando a sexualidade para a busca de afeto e atenção” (COBRA, 2007, p.72). As roupas seguem tendências da moda, porém devem estar atentas ao estilo de vida do consumidor e ao seu perfil corporal. A moda neste estudo deve ser entendida como uma importante dimensão de estilo de vida, um fator que compõe o comportamento de compra do consumidor e não somente como roupas, sapatos ou qualquer outro tipo de adereços que uma pessoa é capaz de usar. Outro ponto importante de se destacar é o de que a exposição pública Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 14 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size do corpo vem ganhando cada vez mais espaço nas ruas, nas mídias e em outras formas de demonstrações. Seguindo este pensamento, a velocidade destas mudanças foi aumentando. Na sociedade democrática do século XIX, apareceram necessidades mais profundas de diferenciação. Assim a moda passou a ser mais utilizada, passou a ter poder de afirmação pessoal, passou a expressar ideias e sentimentos (PALOMINO, 2003). Podemos dizer ainda que a moda é uma imagem refletida do sistema social. Dinamiza-se por receber forte influência do contexto em que se insere, modificam-se a partir do momento em que a cultura, a política, a economia e a sociedade sofrem as suas transformações. Miranda (2008, p.67) afirma que a moda é uma “forma de comportamento, temporariamente adotada por alguma proporção perceptível de membros do grupo social, porque essa mudança de comportamento é percebida como apropriada socialmente para o tempo e a situação”. Desta maneira podemos definir ainda a moda como sendo uma forma de expressão pessoal e individual, o indivíduo fazendo suas escolhas não apenas por seus gostos, mas também pela realidade na qual está inserida e vivenciando, tornando assim a moda um elemento dinâmico, já que sempre que surgem novidades e modificações vai deixando alguma coisa para trás. 2.3 Obesidade e moda plus size Obesidade é um termo utilizado para designar uma pessoa que está acima do seu peso ideal. Em uma pesquisa, desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1997, revela que uma pessoa é julgada obesa, quando apresenta índice de massa corporal igual ou superior a 30 kg/m². Para Almeida (2005, p.28) a obesidade “tem sido considerada uma condição estigmatizada pela sociedade e associada a características negativas, favorecendo discriminações e sentimentos de insatisfação”. Historicamente houve mudanças na noção do corpo perfeito, houve um tempo em que as modelos que estampam as capas de revistas na atualidade não serviam de moldes de beleza. A moda sempre foi construída baseada diretamente na construção do corpo, sendo redefinida de acordo com a estética de cada época, como se fosse um espelho do seu tempo e da cultura que a produziu. No Brasil, a proporção de adultos com índices de obesidade é superior a 50,5% (Organização Mundial da Saúde, 1997), o país ocupa 88° lugar entre os mais obesos do mundo. Cenário este promissor para a moda Plus Size, já que os pretensos compradores representam uma grande fatia de mercado. No mundo, esse índice alcança 10% da população adulta, que é obesa. Esses Números corresponde a 500 milhões de pessoas. Hoje há uma discriminação social contra as pessoas obesas. O assunto desenvolve-se em várias áreas, desde a produção e comercialização de produtos alimentícios como para a definição de padrões estéticos corporais. Um ramo que vem se destacando, e justamente é o foco do trabalho proposto, é a visibilidade crescente na indústria de confecções, que cada vez mais vem se destacando pela presença de modelos tidas pela sociedade como “gordinhas”, e profissionalmente chamadas de modelos Plus Size, que se beneficiam do corpo fora dos tidos como “padrões” para emplacar um novo conceito de comunicação e consequentemente alavancar as venRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size 15 das em um “novo” segmento de mercado: produtos em tamanhos especiais. Atualmente o universo feminino das mulheres mais cheinhas, ou seja, acima do seu peso dito como ideal, contam com muito mais opções de roupas e acessórios do que há alguns anos. O segmento chamado de Plus Size tem se especializado e vem ganhando cada vez mais espaço no mercado concorrido da moda. As grifes Plus Size pensaram nesse obstáculo e ganham força a cada dia, mostrando e oferecendo coleções cheias de charme e estilo para todas as mulheres cheinhas. Conseguem atingir os mais variados estilos, tais como: as clássicas, as modernas, as sofisticadas e as básicas. As marcas priorizam além da beleza das peças o caimento do tecido, para que suas consumidoras e seguidoras se sintam cada vez melhor com seu corpo. As peças são elaboradas estrategicamente para o corpo gordinho. As coleções das marcas Plus Size de algum tempo atrás era compostas por roupas que não tinham um perfil muito jovem. Fato observado também por Thatiany Garcia, proprietária da marca Bem Ditta, e que foi um dos motivos pelos quais ela resolveu criar uma grife Plus Size voltado ao público jovem. (BORGES, on line). No entanto, podemos observar que algumas mudanças começam a acontecer, pois algumas confecções – renomeadas ou não – e algumas campanhas publicitárias voltadas para moda já estão solicitando modelos com formas mais curvilíneas para representar sua marca. São atitudes come estas que começam a mudar aos poucos o conceito de toda uma população, sinalizam que é perfeitamente possível existir beleza fora do atual padrão estabelecido. 2.4 Padrão de beleza para o universo feminino Um fator propagador que interferiu diretamente ditando algumas regras de beleza, sem dúvida nenhuma, foram às revistas que abordam assuntos femininos e veem nesse público o seu potencial de mercado. O fato de elas explorarem modelos tidas como “perfeitas” com seus corpos esculturais, cabelos e rostos sempre bonitos e bem preparados para uma exposição fotográfica, ajuda na propagação e disseminação das novas regras que vão ditar o padrão de beleza da atualidade. Para Wolf (1992) a questão da beleza, ou melhor, da busca incansável pela beleza – pela autora até chamada de ditadura da beleza – é uma ideologia feminina que detém o poder de controlar as mulheres e até mesmo de desviá-las de algumas questões sociais importantes. Para a autora, a busca para atingir a perfeição humana acontece como que um ritual, as pessoas utilizam-se de técnicas de lavagem cerebral e “cultos” para cuidar da idade e do peso. Quase que “de imediato, as indústrias da dieta e dos cosméticos tornaram-se os novos censores culturais do espaço intelectual das mulheres” (WOLF, 1992, p. 13). A busca da beleza, até mesmo o “mito da beleza simplesmente assumiu as funções da religião” (WOLF, 1992, p. 87). A sociedade atualmente supervaloriza a magreza, o corpo tido como “belo”, com “ideal” produzido nas academias, ou ainda “confeccionado”, “esRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 16 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size truturado”, “produzido” pela modelagem terapêutica, através de implantes de silicone, cirurgias plásticas, entre tantos outros processos, revelando o culto ao corpo belo (GOLDENBERG; RAMOS, 2002). Ao mesmo tempo, promove julgamentos sociais negativos em relação ao corpo obeso. Adjetivos pejorativos, grotescos como “feio”, “relaxado”, “preguiçoso” e “incompetente”, são direcionados à pessoa obesa deste a infância, sugerindo a ideia de que a pessoa obesa é a única responsável por seu estado devido à falta de vontade de se exercitar ou de se disciplinar no que diz respeito seus hábitos alimentares. Na França em 1974, foi feita uma pesquisa em que 40% das mulheres e 24% dos homens se achavam gordos, desta forma 1/4 e 1/5 da população estava de regime. Desde os anos 70 até a atualidade, nos países desenvolvidos, a maior parte da população sonha em ser magra, utilizando de cirurgias estéticas, remédios, e mesmo assim vive com o excesso de peso e aparentemente sofre com essa contradição. A moda é um fator que desfavorece a pessoa obesa em suas tendências e conceitos, tendo como salvação algumas marcas e estilistas que arriscam a fazer roupas para este público, visando um nicho com grande mercado e com grande carência, nessa busca pela moda, os obesos buscam moda e ficam dispostos até a pagar valores altos por peças que a façam se sentir bem. (VALENÇA, 2009). Para o autor: (...) uma vez que, de posse desses produtos e consequentemente, com seu uso, permeado de conceito e tendência de moda, estas consumidoras podem estar inseridas, em iguais condições, tanto no mercado de trabalho, quanto na vida social. (VALENÇA, 2009, p. 48). 3. MODA, MÍDIA E REALIDADE DO TAMANHO GRANDE Valença (2009) afirma que alguns estilistas do mundo da moda atual, já estão cada vez mais, fazendo suas coleções e desfiles com mulheres “reais”. A estilista italiana Elena Miró no ano de 2005, mostrou suas coleções em Milão, com modelos que vestem tamanhos maiores que o nº 44, outra estilista que teve grande ousadia foi Cássia Bufolin, que vestindo o manequim 48, e tendo grande dificuldade em achar lingeries para seu corpo, resolveu montar sua própria marca de lingerie sexy especializada em tamanhos grandes e assim vem obtendo grande aceitação no seu público-alvo, que além dos produtos personalizados, recebem também personalização no atendimento, os provadores da loja são adaptados para o seu público alvo (VALENÇA, 2009). Com o mesmo intuito, algumas marcas estão surgindo com a proposta de atender esse novo mercado em crescimento. A marca Dove que fabrica produtos de higiene pessoal lançou no ano de 2005 a campanha intitulada “Real Beleza”. As peças publicitárias foram veiculadas em revistas femininas, mídia eletrônica e na televisão através do making off da campanha. Esta campanha mostrou mulheres felizes, diferentes do padrão de beleza atual, e satisfeitas com o próprio corpo. A campanha e a marca foram Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size 17 muito bem quistas pela sociedade, e desde o sucesso da campanha a marca Dove que foi pioneira no Brasil em quebrar a ditadura da beleza, até hoje utiliza como slogan a “Real Beleza” (ARAÚJO; SANFELICE, 2005). A Dove quis mostrar as brasileiras que elas podem ser bonitas mesmo não estando nos padrões de beleza tão glorificados pela mídia, que cada corpo, cada identidade é diferente, sem padronização de estilos e corpos. A campanha da marca Dove foi vinculada em outros 10 países. Após essa campanha a Dove continuou lançando campanhas nesse mesmo estilo, como “Minhas Curvas”, “Minha História”, mostrando corpos e mulheres reais (ARAÚJO; SANFELICE, 2005). Após a ideia propagada, algumas revistas partiram para trabalhos semelhantes, como fotografar famosos e não utilizar o tão chamado programa para corrigir imperfeições Photoshop. Tivemos celebridades como o ator Brad Pitt na revista W Internacional seguindo esta nova tendência. Com este mesmo conceito de naturalidade, ser real, a revista Glamour resolveu partir para a divulgação de modelos Plus Size, inclusive uma delas foi fotografada nua, detectou o sucesso no processo e na edição seguinte ousou ainda mais colocando sete (7) modelos da modalidade Plus Size nuas. O autor ainda traz como destaque a Revista Visionare, que quando em janeiro de 2012 contemplou em toda a sua edição somente modelos tamanho grande. As fotos foram feitas por fotógrafos de moda conceituados como Bruce Weber e Karl Langarfeld, as modelos utilizavam nos looks marcas conceituadas como Guess e Dolce&Gabana. Dentro deste contexto, entre as modelos Plus Size, que são as mulheres que têm proporções maiores se comparadas às modelos tradicionais, pois busto, cintura e quadril exigem medições mínimas, regras essas que são básicas também para as modelos magras, as modelos Plus Size também devem ter a pele bem cuidada, uma boa estrutura óssea e um corpo harmônico. A modelo desta categoria Carla Manso, em uma entrevista para o site IG, revela que existem modelos Plus Size de manequim que varia do 44 ao 52. Conforme a mesma, o IMC e o peso acusado na balança não são os principais pré-requisitos na seleção de uma modelo para tamanhos grandes, e observa que o essencial é ter um rosto bonito, ser vaidosa, fotogênica e medir no mínimo 1,60m. É importante ter cintura marcada ou o corpo mais redondo. Contudo, na maioria das vezes, eventos de moda e revistas optam pelos manequins 44, 46 e 48, com altura mínima de 1,70m, enquanto as lojas especializadas preferem manequins 50 e 52 para criar catálogos e peças de divulgação. 3.1 Mídia e corpo A mídia sempre foi tendenciosa. Fato constatado já há algum tempo é a insatisfação da mulher com as representações na televisão, nos outdoors e revistas. Na sociedade contemporânea existe cada vez mais uma midiatização da cultura moderna, uma produção de significados, modos de vida, de pensamento e comportamento pelos meios de comunicação de massa modificando, de forma significativa, a base das inter-relações das sociedades modernas, tornando a mídia a principal fonte de coleta de dados sociais, econômicos, políticos e culturais Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 18 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size de várias sociedades, inclusive na que estão inseridas. Desta forma, é correto dizer que a mídia pode ser sim a responsável pela imagem de homens e mulheres que passa, influenciando escolhas, comportamentos, opiniões e pensamentos. O corpo na mídia aparece como sendo um objeto perfeito, como sendo algo fundamental para uma nova vida, a mídia adquiriu um forte poder de influência, evidenciou a paixão pela moda retratando a aparência como um fator imprescindível na sociedade. O tema corpo ganhou mais importância a partir dos anos 80, quando surgiram as primeiras revistas sobre a questão. Devido aos padrões de beleza impostos pela nossa sociedade, as campanhas publicitárias destinadas ao universo da moda são voltadas, principalmente, para aquelas pessoas com peso considerado adequado, dentro dos padrões, e assim causando frustração e vergonha nas demais pessoas. Apenas 1% da população brasileira, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), se encaixa nesse padrão tido como o “normal”. Com esta diferença percebe-se que a ditadura da beleza e da moda incomoda a quem não se encaixa nesses padrões pré-determinados pela sociedade. A ditadura da beleza é tida um fenômeno social e comercial – com a promessa da beleza perfeita - o mercado estético junto com a indústria da beleza, acabam movimentando milhões de reais por ano. Essa movimentação gira em torno das academias de ginástica, clínicas estéticas e indústria de cosméticos e isto tudo é reforçado pela mídia. “[...] este corpo magro vem da mídia, de toda a indústria cultural, que determina padrões de comportamento e estéticos [...]” (NOVAES, 2006). 4. PLUS SIZE E O MERCADO Mercado segundo a fala de Viceconti e Neves (2002) é um local onde há a atuação de vendedores e compradores de determinados bens ou serviços. Com o advento da globalização e os sucintos avanços tecnológicos este local não está mais limitado a uma composição física e/ou territorial. A facilidade negociação seja por telefone, internet ou presença física na loja estão sempre em busca de novos mercados a ser explorados. Esta busca por novos mercados vem da natureza humana, Viceconti e Neves (2002) destacam que o sistema econômico sempre está preocupado de que forma a sociedade está organizada a fim de alcançar determinados objetivos a fim de atender uma determinada atividade econômica. Dentre essa conjuntura da atividade economia as atividades de produção, circulação, distribuição e consumo de bens e de serviço são os pontos a ser pensados e discutidos estando intrinsecamente ligados à oferta e a demanda de um bem e/ou produto. Existe uma divisão na moda entre duas linhas: normal e Plus Size. Essa divisão coloca dois lados opostos, as pessoas fora do peso, não seriam normais e esse conceito errôneo, colocaria a moda plus size fora do normal. Considerando basicamente que demanda pode ser exemplificada como procura, mas não necessariamente como consumo, uma vez que é possível querer e não consumir um bem ou serviço, por diversos motivos e oferta sendo a quantidade de produção que se consegue colocar no mercado. (VICECONTI; NEVES, 2002) Mediante de tais conceitos econômicos temos subsídios teóricos básicos para melhor analisar a presença crescente do Plus Size no mercado. Uma Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size 19 vez que a atividade econômica esta atenta a sociedade em geral, a indústria da moda fica sempre atenta a dados relacionados à qualidade de vida e mudanças no comportamento social. Contrariando todo o pensamento, o site Terra em sua coluna de comportamento trouxe uma notícia (baseada em dados de uma pesquisa britânica – realizada em 2013 – da empresa da área de inteligência de mercado Mintel), relatando que: 44% das mulheres não gostam de sair para comprar roupas [...]O problema que faz com que temam o momento é a dificuldade de encontrar peças modernas e adequadas ao seu tipo físico e idade. Quase metade das entrevistadas não gosta de provar os modelitos e acredita que as lojas têm como alvo apenas as clientes jovens. Mais de um quarto (27%) reclama da dificuldade de encontrar estabelecimentos que vendam looks da moda para sua faixa etária. As novas mães também não ficam contentes com o passeio. Até 47% das com crianças menores de 5 anos disseram que lutam para achar algo moderno e que caia bem. Segundo o levantamento divulgado pelo jornal Daily Mail, houve um aumento significativo de pessoas do sexo feminino que adquirem peças de qualidade, representando 23% em 2011, em comparação com 13% no ano anterior. Compras on-line podem impulsionar um crescimento no setor de moda feminina, já que 17% das consumidoras comparam preços pela internet antes de ir à loja. (TERRA, 2013). Com isso é possível ver o amplo mercado a ser explorada uma vez que há muitos tipos físicos que ficam a margem do padrão de beleza ditado pela moda e obcecadamente seguido por nossa sociedade. Uma forma de cativar esse novo mercado é através do maciço investimento em propaganda, como a da campanha da Dove já citada, por isso principalmente na mídia impressa, estão realizando uma grande difusão do Plus Size. Acima de tudo, não há apenas uma inversão cultural mas também econômica. O mercado cada vez mais investe nesse segmento. Segatto et al (2012) destacam que grandes empresas como a C&A apostaram em coleção para esse público assim como o mundo do design vem apostando em artefatos como cadeiras de escritório nas versões P, M e G, mouses de computador e anéis e alianças. Não só no mercado brasileiro o puls size vem ganhando importância. No mundo, marcas famosas como Vogue Curvy e Saks investem em roupa de grife plus size. Nesse cenário, vemos uma quebra de paradigma imposto pela mídia e vemos a realidade cada vez presente desse segmento. Mas Segatto et al. (2012) apontou outro comportamento que vem se alterando ao longo dos anos, a convicção que existe beleza gorda. Para exemplo os autores estacam a Miss Brasil Plus Size, Cleo Fernandes que pesa 98 quilos. Dessa maneira vemos que: As brasileiras aprenderam a valorizar o padrão de beleza da mulher real. Essa tendência foi captada pelo Instituto Data Popular, especializado em pesquisa e consultoria em estratégias de negócio. [...] Foram entrevistadas 15 mil Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 20 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size mulheres acima de 16 anos, de todas as classes sociais. As voluntárias receberam fotos de três mulheres famosas (sem identificação do rosto), vestidas apenas de lingerie. Na página de ÉPOCA no Facebook e no Google+, você pode ver essas fotos e também opinar: qual o corpo mais atraente? Qual o deles você gostaria de ter? Para 72%, o corpo mais atraente era o mais curvilíneo. A maioria (59%) gostaria de ter aquela silhueta. “O padrão de beleza deixou de ser o das passarelas. Ele é considerado pelas mulheres, e até pelos homens, pouco atraente, nada sensual e até feio”, diz Renato Meirelles, sócio diretor do Instituto Data Popular. (SEGATTO et al, 2012). Toda essa ascensão gera um círculo onde atraído pelo poder aquisitivo desse novo grupo de consumidores há uma abertura tanto para novos empregos quanto para novos produtos relacionados aos adeptos do tamanho plus size. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após o término deste estudo, percebe-se que o corpo possui destaque na sociedade, pois, além de ser um elemento de autoafirmação, ele ainda expressa diferentes questões, como poder e status na vida cotidiana. Apesar disso, o excesso de peso das mulheres vem aumentando gradativamente no mundo todo, fazendo com que os padrões de beleza, estabelecidos pela mídia, já não seja tão popular e aceito. Isso faz com que o comportamento humano siga outras direções que não são aquelas impostas pela mídia, pois as pessoas precisam se adaptar aos novos tempos de tecnologia, em que as informações são rápidas demais e também efêmeras. Ficou claro, que moda e corpo nunca estiveram tão ligados, fazendo com que a roupa se unificasse ao corpo de tal forma que se resumisse numa espécie de segunda pele. O corpo sofre as influências da moda, essas chegam ao indivíduo de várias formas, mas a forma visual influência diretamente no estereótipo do mesmo. E a moda, por consequência, é estruturada em valores estéticos. Em contrapartida, a cultura exerce relação com a moda através de valores morais, assim influenciando nos padrões que a sociedade impõe. Analisando o estudo do comportamento do consumidor, ou seja, das consumidoras tamanho GG, ficou evidente que, apesar de ser pouco divulgado, o universo Plus Size tem um público muito promissor e que só tende a crescer. Verificou-se inclusive, que as mulheres com sobrepeso estão muito insatisfeitas com o que lhes é oferecido no mercado do vestuário, visto que, inclusive a mídia plus size ainda é bem pouco divulgada, ou ainda, quando divulgada, é feita de uma maneira feia ou ruim. Apesar da deficiência de divulgação para o público Plus Size existe sim um nicho de mercado que começou a ser explorado através principalmente da fotografia, mostrando a ascensão econômica crescente desse grupo de consumidoras na indústria da moda. O aumento de peso das pessoas do mundo inteiro fez com que o padrão de beleza e a sociedade tivessem algumas mudanças diante do comportamento das pessoas, conforme abordado durante a revisão bibliográfica. Esta característica presente nestes novos tempos fez com que a população mudasse o modo Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 A ditadura da beleza no comportamento do consumidor: nicho de mercado para a moda Plus Size 21 de consumir. Com o aumento de peso surgiu a insatisfação do público plus size com as marcas de vestuário, que na sua maioria, trabalham somente com tamanhos pequenos. As empresas brasileiras de moda deveriam inspirar-se nas marcas internacionais, por exemplo, as mundialmente conhecidas H&M, GUESS, ZARA, que trabalham com tamanhos maiores em todas as suas coleções. Aumentando a abrangência das suas grades, bem como criando uma marca própria que contemple a mesma cartela de cores, tendência e estilo das coleções principais. Este estudo auxiliou na construção do conhecimento sobre o assunto proposto: o plus size no mercado, através dele, pode-se afirmar que o mercado da moda deveria estar mais atento às necessidades geradas pela mudança de corpo, podendo proporcionar roupa com tendência e estilo de moda, gerando uma plena satisfação das mulheres com excesso de peso. Sempre existiram e sempre existirão pessoas gordas, felizes, satisfeitas com seu peso e esse segmento de moda tamanho grande – Plus Size - esta atendo a desbravadora oportunidade de crescimento de mercado. 6. REFERÊNCIAS ALMEIDA, et al. Percepção de tamanho e forma corporal de mulheres: estudo exploratório. Psicologia em Estudo, v. 10, n. 1, Maringá. 2005. Disponível em: <http://www. scielo.br/pdf/pe/v10n1/v10n1a04.pdf>. Acesso em: 15 de abril de 2015. ARAÚJO, Denise Castilhos; SANFELICE, Gustavo Roese. Real Beleza Dove. Disponível em: <http://vsites.unb.br/fef/midia/downloads/real_beleza_dove.pdf>. Acessado em: 2 de maio de 2015. BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Lisboa: Edições 70, 2005. BORGES, Cláudia. Conheça mais sobre as grifes Plus Size. Disponível em: <http//:www.todaela.uol.com.br/moda/conheça-mais-sobre-as-grifes-plus-size>. Acessado em: 07 de março de 2015. CASTILHO, K. Galvão, D. A moda do corpo, o corpo da moda. São Paulo: Esfera, 2002. COBRA, Marcos Henrique Nogueira. Marketing e moda. São Paulo: SENAC São Paulo, 2007. GOLDENBERG, M; RAMOS, M. S. A civilização das formas: o corpo como valor. Rio de Janeiro: Record, 2002. MIRANDA, Ana Paula. Consumo de moda: a relação pessoa-objeto. 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Foram selecionados 12 pacientes com o diagnóstico de AVE que aceitaram participar da pesquisa, e que não apresentavam déficit cognitivo, e se encontravam em tratamento de reabilitação. As variáveis utilizadas foram: sexo, raça, idade, tipo de AVE, estado civil, escolaridade e ocupação. A escala EQVE-AVE, foi aplicada para avaliar a qualidade de vida dos pacientes e o Índice de Barthel foi utilizado com o intuito de avaliar a funcionalidade destes pacientes. Resultados: 83,33% dos pacientes acometidos por AVE são independentes, 16,66% dos mesmos necessitavam de supervisão ou assistência para desenvolver suas atividades de vida diária. Com um valor médio de 112±26,65 em relação à pontuação total pela EQVE-AVE, considerando todos os domínios, com uma maioria (90%) apresentando escore total < 147, o nível da qualidade de vida da amostra apresentada é baixo, mostrando como principais pontos afetados: a energia, a memória, a vida social e as condições para o trabalho. Conclusão: Concluímos com este estudo que a grande maioria dos pacientes pós-AVE, em processo de reabilitação, é independente em suas atividades cotidianas, possuem um comprometimento maior em sua qualidade de vida e que a reabilitação deve ser estimulada para obter uma maior funcionalidade e melhor qualidade de vida destes pacientes. Palavras-chave Acidente Vascular encefálico, Qualidade de vida, Reabilitação. 1 Eliene Maria da Silva – Discente do curso de Fisioterapia do UNIFEG. 2 Priscila Lopes Santamarina da Silva – Especialização em Fisioterapia Aplicada à Neurologia Infantil pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Docente do curso de Fisioterapia do UNIFEG. 3 Talita Andréa Bordini Malaman - Mestrado em Bioengenharia pela Universidade de São Paulo (USP). Docente do curso de Fisioterapia do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 24 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação ABSTRACT Introduction: Stroke is a complex neurological syndrome involving abnormality brain function due to vascular impairment. Objective: To analyze and correlate the quality of life and level of independence and function of patients with stroke in rehabilitation in a clinical school of physiotherapy. Methods. We selected 12 patients with a diagnosis of stroke who agreed to participate, and who had no cognitive impairment, and were in rehabilitation treatment. The variables used were sex, race, age, type of stroke, marital status, education and occupation. The EQVE-stroke scale was applied to assess the quality of life of patients and the Barthel Index was used in order to assess the functionality of these patients. Results: 83.33% of patients affected by stroke are independent, 16.66% of them needed supervision or assistance to develop their activities of daily living. With a mean value of 112 ± 26.65 in the total score by EQVE-stroke considering all areas, with a majority (90%) presenting a complete <147 scores, the level of the quality of life of the sample is present below, showing how main points affected: energy, memory, social life and conditions for the job. Conclusion: We conclude from this study that the vast majority of post-stroke patients in the rehabilitation process, is independent in their daily activities, have greater impairment in their quality of life and rehabilitation should be encouraged to achieve greater functionality and better quality of life for these patients. Keywords Stroke, Quality of life, Rehabilitation. 1. INTRODUÇÃO O Acidente Vascular Encefálico (AVE) pode ser definido como déficit neurológico focal súbito, devido ao extravasamento (AVE hemorrágico) ou obstrução (AVE isquêmico) do fluxo sanguíneo arterial em alguma região encefálica com mais de 24 horas de duração (AMERICAN STROKE ASSOCIATION, 2012). De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) 15 milhões de pessoas são acometidas por esta síndrome neurológica complexa a cada ano, sendo que destas 5 milhões exibirão deficiências neurológicas e incapacidades permanentes (ANDRÉ, 2006; MONTAGNA et al., 2014), levando a necessidade de reabilitação contínua para amenizar as sequelas desta patologia (CAPPELARI, GRAVE, 2012). Esta patologia de origem multifatorial é um importante problema de saúde pública, sendo atualmente, uma das causas mais comuns de disfunções neurológicas na população adulta de meia idade e idosos (ROWLAND, 2007; HAMZA et al., 2014). É a segunda principal causa de morte no mundo (ENWEREJI et al., 2014) e primeira causa de incapacidade funcional, gerando grande impacto econômico, familiar e social (MONTAGNA et al., 2014), interferindo diretamente na qualidade de vida (QV) do indivíduo afetado (DOI, TURCHIARI, Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação 25 STOPIGLIA, 2007). Dependendo da localização da artéria acometida, da extensão da lesão encefálica, assim como a presença de irrigação colateral, diversas deficiências neurológicas e incapacidades funcionais podem ser geradas por esta condição como: comprometimento motor - hemiplegia ou quadriplegia, hemiparesia, comprometimento sensorial unilateral ou bilateral, afasia/disfasia, alterações práxicas, viso-espaciais (hemianopsia); deficiências mentais, perceptivas e da linguagem (ANDRÉ, 2006; LEWIS, 2002). Diante do exposto é fundamental o desenvolvimento de estudos que busquem caracterizar os fatores que interferem na qualidade de vida e funcionalidade dos sujeitos com comprometimentos neurológicos, especificamente pós-acidente vascular encefálico (pós-AVE), já que esses necessitam de tratamentos fisioterapêuticos e cuidados a longo prazo. As avaliações de funcionalidade e qualidade de vida pode auxiliar no tratamento fisioterapêutico dando subsídios para evolução do programa terapêutico. Portanto, o objetivo deste estudo será avaliar e correlacionar a qualidade de vida e o desenvolvimento funcional de pacientes pós AVE em reabilitação na Clínica de Fisioterapia Maria Almeida Santos, no município de Guaxupé MG. 2. METODOLOGIA Trata-se de um estudo exploratório-descritivo transversal onde serão aplicados testes para verificar a qualidade de vida e a funcionalidade de pacientes com diagnóstico clínico de AVE em reabilitação na Clínica de Fisioterapia Maria de Almeida Santos, situada na cidade de Guaxupé/MG, no período de setembro à novembro de 2014. O projeto em questão foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) do Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé (UNIFEG), protocolo n° 391/14. Cada participante assinou um termo de consentimento livre e esclarecido conforme determinado na lei 196/96 do CNS/MS, em seu artigo IV parágrafo 3. Participaram da pesquisa 12 pacientes, de ambos os sexos, com idade média de 50 a 70 anos, que não apresentassem alterações cognitivas ou verbais que impedissem a aplicação dos testes propostos no estudo. Inicialmente foi realizado um questionário sócio-demográfico destes pacientes por meio de uma ficha de avaliação contendo: dados pessoais (nome, sexo, idade, escolaridade, estado civil e dado sobre a patologia em questão). Logo após foi aplicado o teste EQVE-AVE, versão brasileira do teste strokeSpecific Quality of Life Scale (SSQOL) composta por 49 itens, subdividida em energia, papel familiar, linguagem, mobilidade, humor, personalidade, auto-cuidado, papéis sociais, memória, função de membro superior, visão, trabalho. Três possibilidades de respostas foram desenvolvidas em uma escala LIKERT com escore de um a cinco: (1) grau de concordância com afirmações sobre sua funcionalidade; (2) dificuldade na realização de uma tarefa; (3) quantidade de ajuda necessária para realizar tarefas específicas (LIMA, 2008). Neste formato, a EQVE-AVE apresenta como possibilidade de resultado o escore máximo de 245 pontos e o escore mínimo de 49 pontos, sendo que quanto menor o escore, maior Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 26 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação a dependência e a dificuldade para a realização de tarefas. Em seguida foi aplicado o teste Índice de Barthel que avalia o grau de assistência exigido por um indivíduo em 10 itens de AVD’s, envolvendo desde funcionalidade e mobilidade aos cuidados pessoais. São eles: alimentação, banho, higiene pessoal, vestimenta, controle esfincteriano intestinal, controle miccional, transferências na cama e banheiro, deambulação e subir escadas (MAHONEY, BARTHEL, 1965). A pontuação global varia de 0 a 100 (somatória dos itens classificados em 5, 10 e 15 pontos, conforme independência ou necessidade de ajuda para executar a atividade). Quando o paciente tem escore menor que 60 ele é considerado dependente, e quando é maior que 80 pontos, ele é independente. Isto é, de modo que zero equivale à completa dependência em todas as 10 AVDs, e 100, equivale à completa independência em todas as atividades (PAIXÃO, RECHENHEIM, 2005). Para a análise estatística, será utilizado o programa GraphPadInStat®, sendo os dados tabulados e transformados em planilhas para melhor visualização e entendimento dos resultados. 3. RESULTADOS O presente estudo avaliou uma amostra de 12 (doze) pacientes que sofreram AVE, sendo que 10 (83,33%) sofreram AVE isquêmico e 02 (16,66%) AVE hemorrágico. Com relação ao padrão patológico, 09 (75%) tiveram como sequela neurológica hipotonia, 02 (16,66%) espasticidade e 01 (8,33%) não apresentou nenhum padrão patológico após o AVE. Quanto ao diagnóstico funcional 11 (91,66%) dos pacientes avaliados apresentaram hemiparesia, no qual 11(91, 66%) o acometimento foi unilateral e 6 (50%) tiveram a dominância do lado direito e 05 do lado esquerdo. Em relação ao perfil demográfico, os pacientes selecionados para o estudo, os quais já se encontravam em tratamento na clínica a no mínimo 1 (um) mês, são 75% do sexo masculino e 25% feminino. Em relação à faixa etária: 41,67% correspondem à faixa etária de 50 a 60 anos e 58,33% têm entre 61 e 70 anos. Quanto ao estado civil, 75% dos pacientes referiram ser casados, 16,66% solteiros e 8,33% divorciados. Em relação à raça, 83,33% são da raça branca, 8,33% da raça parda e 8,33% da raça negra. Quanto à escolaridade observou-se que 41,67% eram analfabetos e 58,33% estudaram até o ensino fundamental. E, 58,33% eram aposentados, 16,66% desempregados, 8,33% doméstica, e 8,33% estavam afastados do trabalho devido à atual condição patológica. Tabela 01. Perfil demográfico da população avaliada CARACTERÍSTICA NÚMERO % (PERCENTUAL) 9 75 3 25 Gênero: - Masculino - Feminino Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 27 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação Raça: - Branca - Negra - Parda 10 83,33 1 8,33 1 8,33 5 41,67 7 58,33 2 16,66 Faixa Etária: - 50 a 60 anos - 61 a 70 anos Estado Civil: - Solteiro - Casado - Divorciado 9 75 1 8,33 5 41,67 7 58,33 8 58,33 2 16,66 1 8,33 1 8,33 Escolaridade: - Analfabetos - Ensino Fundamental Ocupação: - Aposentados - Desempregados - Afastados do trabalho - Doméstica Fonte: elaboração própria Os acidentes vasculares encefálicos prevaleceram em maior incidência com o sexo masculino, em pessoas da raça branca, cuja idade de maior incidência foi entre 61 e 70 anos e a maior parte dos indivíduos eram casados, possuíam em maioria o Ensino Fundamental e a maior parte já se encontrava aposentada, sendo que os que estavam em fase laboral ou estavam desempregados ou precisaram se afastar do trabalho devido ao AVE. A escala EQVEAVE foi aplicada para avaliar a qualidade de vida dos pacientes da amostra. Os pacientes foram pontuados pelos testes de energia, papéis familiares, fala, mobilidade, humor, personalidade, autocuidado, papel social, memória, função dos membros superiores, visão e trabalho. (Tabela 02) Tabela 02 – Pontuação Média da QV pela Escala EQVEAVE Teste Média DP Mín-Máx. EQVEAVE total (245) 112 26,65 73-171 EQVE AVE energia (15) 7,08 5,10 3-15 EQVE AVE papéis familiares (15) 5,58 4,05 3-15 EQVE AVE fala (25) 14,33 7,87 5-25 EQVE AVE mobilidade (30) 12,5 5,94 6-22 EQVE AVE humor (25) 12,5 5,14 5-21 EQVE AVE personalidade (15) 6,83 4,21 3-15 EQVE AVE autocuidado (25) 9,16 7,54 5-25 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 28 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação EQVE AVE papel social (25) 6,16 2,44 5-13 EQVE AVE memória (15) 8,66 3,93 4-15 EQVE AVE função MS (25) 10,66 6,70 5-25 EQVE AVE visão (15) 13,16 3,83 3-15 6 3,30 3-13 EQVE AVE trabalho (15) DP = Desvio Padrão EQVEAVE= Escala de Qualidade de Vida do AVE; MS=membro superior Fonte: elaboração própria A avaliação da QV (EQVE-AVE) apresentou um valor médio de 112±26,65 em relação à pontuação total considerando todos os domínios, sendo caracterizado como baixa a QV, já que a maioria (90%) apresentou um escore total < 147. O que é possível identificar é que o AVE sofrido afetou significativamente a energia, os papéis familiares dos pacientes, a personalidade, o papel junto à sociedade, a memória e o trabalho. Posteriormente, o Índice de Barthel foi aplicado aos 12 pacientes para avaliar o nível de dependência dos mesmos, considerando que a amostra já fora selecionada de pacientes que não apresentaram comprometimento da fala, para que fosse possível obter as respostas necessárias na constituição deste estudo. A identidade dos pacientes é preservada, razão pela qual eles são numerados de 1 a 12. (Tabela 03) Tabela 03 – Resultado dos pontos obtidos pela aplicação do Índice de Barthel PONTUAÇÃO ÍNDICE DE BARTHEL 1.Refeições 2.Banho 3.Vestir-se 4.Asseios 5.Evacuação Continentes Independente Semi-independente 6 (50 %) 9(75%) 9(75%) 10 (83,33%) 11 (91,66%) 4 (33,33%) 0 2 (16,66%) 0 -Incontinente Dependente 2 (16,66%) 6.Micção 3(25%) 1 (8,33%) 2 (16,66%) 1 (8,33%) 7.Banheiro 8.Transferência 9.Deambulação 10.Escadas 10 (83,33%) 10 (83,33%) 10 (83,33%) 10 (83,33%) 2 (16,66%) 0 2 (16,66%) 2 (16,66%) 2 (16,66%) 8 (66,66%) 0 0 Continentes Independente Semi-independente Incontinentes Dependente 2 (16,66%) 0 2 (16,66%) Fonte: elaboração própria Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação 29 Nota-se que a dependência dos pacientes analisados é relativamente baixa nos itens classificados. Pelos dados obtidos na amostra pelo Índice de Barthel em relação a cada um dos itens (Tabelas 1 e 4), 50% dos pacientes dão independentes para suas refeições, 33,33% semi-independentes e 16,66% são dependentes. No Banho, 75% são independentes e 25% dependentes, na hora de vestirem-se 75% são independentes, 16,66% semi-independentes e 8,33% dependentes. Nos asseios, 83,33% são independentes e 16,66% são dependentes. 91,66% são continentes na evacuação e somente 8,33% é incontinente, na micção, 83,33% são continentes e 16,66% incontinentes. 83,33% são independentes no uso do banheiro enquanto 16,66% são semi-independente. Nas transferências, 83,33% são independentes e 16,66% semi-independentes, na deambulação, 83,33% são independentes e 16,66% semi-independentes. A utilização de escadas é o único item que apresentou maio nível de dependência, sendo que somente 16,66% deles são independentes, 66,66% são semi-independentes, ou seja, depende de algum apoio para subir e descer escadas e 16,66% são totalmente dependentes neste item. Este resultado pode ser visualizado com maior clareza no Gráfico 01: Gráfico 01 – Comportamento da amostra pelo Índice de Barthel Fonte: elaboração própria Aplicando-se a pontuação de Barthel, considerando 5 para a dependência, 10 para a semi-dependência e 15 para a independência, os resultados totais de cada paciente são apresentados na tabela 4, onde os pacientes são numerados de 1 a 12 para preservar suas identidades. Tabela 04 – Total pontuação de cada paciente pelo Índice de Barthel Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 30 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação PACIENTE SEXO IDADE PONTOS 1 Feminino 64 25 2 Feminino 70 90 3 Masculino 62 90 4 Masculino 51 95 5 Masculino 65 95 6 Masculino 60 95 7 Masculino 60 95 8 Masculino 64 95 9 Masculino 63 80 10 Masculino 61 100 11 Feminino 54 85 12 Masculino 51 55 Fonte: elaboração própria Somente os pacientes 1 e 12, sendo um do sexo masculino e um feminino, representando 16,66% da amostra, apresentaram escore inferior a 60, cuja dependência é então considerada significativa, aos demais, ou seja, 83,33% dos pacientes analisados possuem um bom nível de independência com escores variando de 80 a 100 pontos pelo índice de Barthel. Ao correlacionarmos o índice de Barthel com a escala EQVE-AVE obtivemos uma correlação negativa e fraca (r = -0.1231, não significativo), com relação a qualidade de vida e a funcionalidade dos pacientes. 4. DISCUSSÃO Participaram da pesquisa 12 pacientes pós AVE com idade de 60,5± 5,77 anos, sendo 75% do sexo masculino e 25% do sexo feminino, indo de encontro com os achados epidemiológicos que mostram que há uma predominância deste acometimento em pacientes do sexo masculino (ANDRÉ,2006; RODRIGUES et al., 2004) e com faixa etária entre 50 a 70 anos (SAPONISK, DEL BRUTTO, 2003; PITTELLA, DUARTE, 2002). Verificou-se neste estudo uma precocidade do primeiro episódio de AVE, já que 5 pacientes têm menos de 60 anos. Considerando o objetivo da pesquisa, de avaliar e correlacionar a qualidade de vida e o desenvolvimento funcional de pacientes após o AVE, que se encontram em reabilitação na Clínica de Fisioterapia Maria Almeida Santos, no município de Guaxupé-MG, pelo resultado da QV (EQVEAVE) e do Índice de Barthel é possível afirmar que a maior parte dos pacientes avaliados possuem bom nível de independência, porém, uma baixa qualidade de vida e que, portanto, a qualidade de vida não está necessariamente relacionada ao nível de independência mas sim a outros fatores importantes do cotidiano do paciente, como sua disposição (energia), sua vida social, suas condições para trabalhar, sua memória, etc. Enquanto que a dependência ou independência está relacionada às Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação 31 condições de vida básica, no atendimento de suas necessidades básicas. Dentre estes pacientes avaliados, pode-se observar que 75% deles eram casados, tais dados seguem os resultados de estudo já existentes (FALCÃO, 2004) relatando que o estado civil prevalente em casos de AVE é o casado. Com relação à raça, 83,33% da amostra se caracterizaram por pacientes de raça branca, se opondo aos dados demonstrados na literatura, os quais citam uma maior incidência de AVE na raça afrodescendente (O’SULLIVAN, SCHIMITZ, 2005). Esta divergência do resultado deste estudo, em relação à literatura, pode ser explicada pela maior representatividade da raça branca (70 para 19%) na cidade de Guaxupé (INFORMAÇÕES DO BRASIL, 2014). O nível de escolaridade da amostra é baixo, a maioria, 58,33% são analfabetos e os demais 41,67% cursaram somente até o Ensino Fundamental, evidenciando uma correlação da baixa escolaridade com a incidência do AVE, possivelmente em razão de faltas de informação e constituição de hábitos de vida não saudáveis, por falta de acesso à educação e informação (CHAGAS, MONTEIRO, 2004). Considerando as características profissionais, 58,33% dos pacientes avaliados eram aposentados, 16,66% desempregados, 8,33% era doméstica, e 8,33% estava afastado pelo trabalho devido a condição patológica, indo de encontro com estudos que identificam que o AVE interfere nas condições de desenvolver as atividades profissionais, o que pode acarretar diversas preocupações e prejuízos no âmbito familiar dos pacientes (ANDRADE et al., 2009). A aplicação da Escala EQVE-AVE (LIMA, 2008), em sua versão brasileira, para avaliar a qualidade de vida dos pacientes apresentou um valor médio de 112±26,65 em relação à pontuação total considerando todos os domínios, sendo, portanto, caracterizada como baixa a QV, já que a maioria (90%) apresentou um escore total < 147, tendo o AVE afetado significativamente a energia, os papéis familiares dos pacientes, a personalidade, o papel junto à sociedade, a memória e o trabalho (MONTEIRO et al., 2013; RANGEL, BELASCO, DICCINI, 2013). O Índice de Barthel, utilizado para mensurar a dependência dos pacientes com incapacidades crônicas durante atividades diárias, após sofrerem AVE (SHAH, VANCLAY, COOPER, 1989), identificou um valor médio total do índice de 83,33± 21,88 pontos, demonstrando que os pacientes avaliados podem ser considerados independentes (POLESE et al., 2008), uma vez que apresentaram escore superior a 60 (ARAÚJO et al., 2007) pontos, somente dois, um do sexo masculino e outro feminino tiveram, respectivamente, 55 e 25 pontos, considerados então dependentes. O estudo corrobora com a literatura SHAH, VANCLAY, COOPER, 1989; ARAÚJO et al., 2007, POLESE et al., 2008; SEDREZ, FARIAS, BRAIDA, 2012) onde há estudos concluindo que os indivíduos acometidos por AVE, em sua maioria são independentes na realização de suas atividades diárias. Portanto, embora os pacientes após o AVE apresentem boas condições de independência em suas atividades básicas do cotidiano, eles têm consideravelmente afetada a sua qualidade de vida. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 32 Análise da qualidade de vida e funcionalidade de pacientes pós AVE em reabilitação 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo demonstrou que o Acidente Vascular Encefálico vem acometendo não somente pessoas idosas, mas já aparece com predominância em adultos de menos idade, comum na faixa etária de 50 a 70 anos, e que tanto na Escala EQVE-AVE, quanto no teste Índice de Barthel, foi possível observar em que aspecto mais foi afetado entre os pacientes no que se diz qualidade de vida e funcionalidade. Portanto, este estudo sugere que para se obter um o processo de reabilitação fisioterapêutico com boas evoluções, deve-se realizar teste específicos, uma vez que, as avaliações de qualidade de vida e funcionalidade podem auxiliar no direcionamento do tratamento fisioterapêutico, dando subsídios para a evolução do programa terapêutico. Como o estudo demonstrou, a qualidade de vida é consideravelmente afetada e a fisioterapia contribui para melhorar a independência e a qualidade de vida dos pacientes após o AVE. 6. REFERÊNCIAS American Stroke Association. Effects of Stroke. Dallas; 2012. Disponível em: <http:// www.strokeassociation.org/Strokeorg/AboutStroke/EffectsofStroke/Effects>. Acesso em: 10 set. 2014 Andrade, LM; Costa, MFM; Caetano, AJ; Soares, E; Beserra, EP; A problemática do cuidador familiar portador de acidente vascular cerebral. Rer Esc USP 2009; 43(1):37-43 André, C. Manual de AVC. 2ªed. Rio de Janeiro: Revinter, 2006, 250p. Araújo, F; Ribeiro, JLP; Oliveira, A; Pinto C. 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Soma-se a isso uma sensação generalizada, que não se restringe a esse campo, de total falência e ineficácia das instituições sociais e estatais incumbidas, de um lado, da implementação de políticas públicas e, de outro, da repressão/reeducação. Nesse cenário, diversas propostas são levantadas na tentativa de resolver tais problemas, indo desde cobranças para a efetiva implementação das medidas já previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, passando por aumentar a proteção dos jovens, considerados vítimas da negligência estatal, culminando, e estas têm mais atenção pelo apelo retribucionista imediato, no recrudescimento do tratamento, geralmente materializadas na diminuição da maioridade penal, buscando tutelá-los não mais pela legislação especial, mas pelo Direito Penal. Grande parte dessas propostas, porém, em especial estas últimas, se abstêm da análise histórica do tratamento jurídico de crianças e adolescentes no Brasil. O próprio apontamento histórico já contribui para fornecer subsídios a uma melhor decisão sobre o tema. Para tanto, serão feitos comentários gerais sobre os primórdios de um tratamento jurídico diferenciado de crianças e adolescentes e, em seguida, alguns apontamentos sobre as legislações brasileiras, incluindo as Ordenações do Reino, os Códigos Criminais do Império e da República, o Código Penal de 1940 e o projeto do Código Penal de 1969, além da Constituição Federal de 1988 e do Estatuto da Criança e do adolescente, sugerindo a leitura de que a definição constitucional da imputabilidade penal é direito fundamental, no sentido das denominadas liberdades negativas, proteção do indivíduo frente a atuação do Estado em sua vida e liberdade. 1 Poliana Alves Campos – Especialização em Direito Penal e Processual Penal. Advogada. 2 Lúcia Alves Campos – Especialização em Direito Penal e Processual Penal. Advogada. 3 André de Paiva Bonillo Fernandes - Mestrado em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP). Docente do curso de Direito do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 36 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil Palavras-chave Criança e adolescente; Maioridade penal; Desenvolvimento histórico; legislação brasileira. ABSTRACT The current juridical discipline about children and teenagers have experienced a series of questionings in the social and political milieu, especially when there are news about juvenile participation in barbaric crimes. Adds to it a general feeling, not restricted to this field, of total failure and inefficacy of the social and government institutions responsible, on the one hand, for public policy implementations and, on the other hand, for the repression/reeducation. In this set, several propositions are made in the attempt to solve these problems, such as the effective implementation of the already prescribed measures in the Child and Teenage Statute, an increase in the youth’s protection, regarded as victims of the State’s negligence, and, with more immediate attention due to the retribucionist appeal, hardening their treatment, usually materialized in lowering the age for criminal responsibility, submitting them not to the special legislation, but to Criminal Law in general. A great part of these propositions, especially the latter, abstains from a historical analysis about children and adolescents juridical treatment in Brazil. The very historical investigation already contribute with subsidies to a better decision on the subject. With this in mind, it shall be made some general commentaries about the first occurrences of a differentiated juridical treatment for child and adolescents and, next, a few appointments on the Brazilian legislation, including the Kingdom’s Ordinances, the Empire and the Republic Criminal Codes, the Criminal Code of 1940 and Criminal Code’s 1969 project, without forgetting the Federal Constitution of 1988 and the Child and Teenage Statute, suggesting a reading that understands the constitutional definition of the criminal responsibility is a fundamental right, in the sense of the so called negative liberties, the individual’s protection against the State’s acts on life and liberty. 1. O TRATAMENTO JURÍDICO ESPECIAL À CRIANÇAS E ADOLESCENTES Em um determinado período da história já se permitiu a disposição de filhos que fossem considerados aberrantes e débeis, bem como se aceitou que se asfixiasse recém-nascido do sexo feminino. No Velho Testamento pode-se encontrar várias práticas contra os filhos, independentemente de sua idade. Por exemplo, “aquele que ferir seu pai ou sua mãe, será morto” (Ex 21:15), “quem amaldiçoar seu pai ou sua mãe, será punido de morte” (Ex 21:17) e: Se um homem tiver um filho indócil e rebelde, que não atenda às ordens de seu pai nem de sua mãe, permanecendo insensível às suas correções, seu pai e sua mãe tomá-lo-ão e o levarão aos anciãos da cidade à porta da localidade onde habitam, e lhes dirão: este nosso filho é indócil e rebelde; não nos ouve, e vive na embriaguez e na dissolução. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil 37 Então, todos os homens da cidade o apedrejarão até que ele morra. Assim, tirarás o mal do meio de ti, e de todo o Israel, ao sabê-lo, será possuído de temor” (Dt 21:18-21). O Código de Manu4, nos artigos 698 e 699, também continha previsões especiais quanto às crianças. Tais artigos tratam do ilícito de fazer suas dejeções na estrada real, impondo-se-lhes multa e obrigação de limpar o local, ficando desobrigados da multa o doente, o ancião, a mulher grávida e a criança: Art. 698. Aquele que faz suas dejeções na estrada real, sem uma necessidade urgente, deve pagar dois karshapanas e limpar imediatamente o local que ele emporcalhou. Art. 699. Um doente, um ancião, uma mulher grávida e uma criança devem somente ser repreendidos e limpar o local; tal é a ordem5. O primeiro registro de tratamento expressamente diferenciado sobre a imputabilidade de crianças e adolescentes está em Roma, na Lei das XII Tábuas, em que se distinguiam infantes, púberes e impúberes. Conforme Goulart (1983, p. 230): A Lei das XII Tábuas já fazia distinção entre os púberes e impúberes, fixando-se, posteriormente, três categorias de menores: os infantes, até 7 anos, período em que se considerava a criança completamente irresponsável; e os próximos à infância, até 10 anos e meio para os meninos, e 9 anos e meio para as meninas. A partir daí até a fase da puberdade, fixando-se as idades e m 14 e 12 anos, respectivamente, entendia-se que a incapacidade decorrente da idade podia ser suprida ou avivada pela malícia e, por isso, a irresponsabilidade só podia ser declarada provando-se a ausência do discernimento de acordo com o arbítrio do juiz. Assim, a idade era um fator a ser computado para a fixação das penas, que deveriam guardar, no entanto, certa proporcionalidade entre esta e aquela. O Direito Canônico procurou seguir, até certo ponto, os critérios estabelecidos pelo direito romano, mas buscando um maior aprofundamento no tema do discernimento, conforme o diz Muccilo (apud GOULART, 1983, p. 230): O Direito Canônico, por sua vez, procurou estabelecer com maior exatidão o critério da responsabilidade dos menores, aprofundando, segundo JORGE MUCCILO, a questão do discernimento: irresponsáveis eram os menores até 7 anos, período em que não se poderia falar em malícia; dos 7 aos 14 anos, ficavam sujeitos à investigação do discernimento, aceitando-se o critério de que a malícia supre a idade, com aplicação, conforme o caso, de pena diminuída; a partir da puberdade, ou 14 anos, entravam para a fase da responsabilidade penal. 4 Segundo Pierangeli e Zaffaroni (2011, p. 165), “as leis, livro ou código de Manu é o texto penal mais elaborado da Índia, de idade sumamente controvertida, sendo por alguns situado no século XIII a.C. e por outros no século V a.C”. 5 Disponível em http://www.ufra.edu.br/legislacao/CODIGO%20DE%20MANU.pdf. Acesso em 11 jun 2015. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 38 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil Nos séculos XVI a XVIII pode-se destacar uma alternância no tratamento dos jovens infratores, ora havendo disposições mais benéficas, na medida do possível, ora disposições que demonstravam certa crueldade. Nos estudos criminológicos, a denominada escola clássica procurou fundamentar a imputabilidade penal do jovem de acordo com o seu desenvolvimento físico e mental, em que a pena deveria ser proporcional a sua idade, desde que ele soubesse discernir o bom do mau, o justo do injusto. Com isso, o grau de imputabilidade deveria corresponder ao seu desenvolvimento físico-psíquico: Período de irresponsabilidade absoluta, até os 12 anos; a adolescência, de responsabilidade condicional, de 12 a 18 anos, devendo o juiz examinar se o menor agiu ou não com discernimento; a maior idade, a partir dos 18 anos, de responsabilidade plena; e a velhice, de responsabilidade modificável em seus resultados, devendo-se considerar a imputabilidade atenuada (GOULART, 1983, p. 231). Portanto, a escola clássica procurou fundamentar que a responsabilidade do jovem deveria estar subordinada ao seu discernimento. Contudo, considerava que as crianças não o possuíam, ao contrário dos adolescentes. Com isso, as legislações que a tomaram por base passaram, então, a fixar um período de irresponsabilidade absoluta e outro condicionado ao discernimento. 2. A MAIORIDADE PENAL NO BRASIL-COLÔNIA A fixação da idade penal na legislação brasileira sofreu variações ao longo do tempo, e a idade limite de 18 anos nem sempre foi adotada. Quando da chegada dos portugueses no Brasil, em 1500, os indígenas que aqui estavam não apresentavam, aparentemente, um grau de desenvolvimento cultural parecido com incas, maias e astecas, mas ainda assim havia alguma noção de imputabilidade e responsabilidade, encontradas nas tradições e costumes indígenas, ainda que não positivadas (PIERANGELI, 2004, p. 42). Não há, entretanto, notícia de uma relação mais profunda entre a punição e a idade. Estabelecidos os lusíadas nas terras recém aportadas, implantaram o seu Direito Nacional, consolidado nas Ordenações do Reino. Primeiramente as Ordenações Afonsinas e, em seguida, as Ordenações Manuelinas, mas que não tiveram grande aplicação no Brasil, pois aquelas vigeram até 1521 e não se havia nenhum núcleo colonizador no Brasil, sendo revogadas por estas, que perduraram até 1603, vigendo conjuntamente com as determinações régias e as Cartas de Doação. O resultado foi que o direito empregado estava mais subordinado ao arbítrio dos donatários das capitanias hereditárias do que à própria ordenação6 (PIERANGELI, 2004, p. 60-61). 6 Um exemplo disso, como cita Magalhães Noronha (apud PIERANGELI, 2004, p. 61), fundado na narrativa de Taunay: “Para se ter uma ideia de como iam as coisas referentes à justiça naquela época, basta lembrar o episódio ocorrido em Piratininga, em 13 de junho de 1587, de que o almotacel (magistrado de categoria inferior ao juiz ordinário) João Maciel pediu aos vereadores que lhe dessem as Ordenações, pois não podia, sem elas, exercer suas funções. Taunay, que nos narra esse episódio, acrescenta não se ter encontrado um só exemplar!” Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil 39 De 1603 até 1830 vigoraram as Ordenações Filipinas que, mesmo com o advento da Proclamação da Independência do Brasil em 1822, “foram elas que, por mais de dois séculos, quanto à parte criminal, vigeram em nosso país, e cuja vigência apenas se encerrou com o advento do Código Criminal do Império de 1830” (PIERANGELI, 2004, p. 55). Nesse período das Ordenações Filipinas, “o menor de 17 anos, tendo praticado ato cuja pena era a de morte, ficava ao arbítrio do julgador, que poderia impor-lhe pena menos grave, enquanto para outros delitos seguia-se a disposição do direito comum” (GOULART, 1983, p. 245). Assim é o teor do Livro V das Ordenações do Reino – Código Filipino, Título CXXXV – “Quando os menores serão punidos por os delictos, que fizerem”: Quando algum homem, ou mulher, que passar de vinte annos, commetter qualquer delicto, dar-se-lhe-há a pena total, que lhe seria dada, se vinte e cinco annos passasse. E se for de idade de dezasete annos até vinte, ficará em arbítrio dos julgadores dar-lhe a pena total, ou diminuir-lha. E em este caso olhará o julgador o modo, com que o delicto foi commettido, e as circunstâncias delle, e a pessôa do menor; e se achar em tanta malícia, que lhe pareça que merece total pena, dar-lhe-há, posto que seja de morte natural. E parecendo-lhe que a não merece, poder-lha-há diminuir, segundo a qualidade, ou simpleza, com que achar, que o delicto foi commettido. E quando o delinquente fôr menor de dezasete annos cumpridos, posto que o delicto mereça morte natural, em nenhum caso lhe será dada, mas ficará em arbítrio do julgador dar-lhe outra menor pena (PIERANGELI, 2004, p. 208-209). Vê-se então que àquele que tivesse mais de 20 anos seria aplicada a pena total imposta, como se 25 anos tivesse, e se o indivíduo tivesse entre 17 e 20 anos, ficaria o julgador livre para determinar a pena total ou sua redução. Aos menores de 17 anos não poderia ser aplicada a pena de morte, podendo o julgador substitui-la por outra sanção. De acordo com Maciel (2011, p. 3-4), nesse período a responsabilidade penal era alcançada aos 7 anos de idade. Isto porque o Estado era fortemente influenciado pela doutrina da Igreja Católica, que pregava que o homem atingia sua razão nessa idade. Assim, dos 7 aos 17 anos de idade o tratamento era similar ao do adulto, não se aplicando apenas a pena de morte. Dos 17 aos 21 anos de idade, o chamado jovem adulto, os infratores já eram passíveis de sofrer a pena de morte por enforcamento. Havia ainda a exceção do delito de falsificação de moeda, para o qual se permitia a pena de morte natural para maiores de 14 anos. É possível observar que praticamente não houve medidas de proteção às crianças e adolescentes nesse período e, não obstante o regramento diferenciado, a finalidade fundamental da pena era apenas a retribuição do mal cometido que, modernamente, será conhecida como função retributiva da pena. No campo não infracional, a primeira norma específica a proteger o meRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 40 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil nor de 18 anos foi criada em 12 de dezembro de 1693, com a chamada Carta Régia, em que, conforme Goulart (1983, p. 245), “[...] o rei determinava ao governador da capitania do Rio de Janeiro que as crianças enjeitadas ou desamparadas ficassem aos cuidados da Câmara e à conta dos bens do Conselho. Somente em 1738 foram fundadas a Roda e a Casa dos Expostos”. Além disso, tem-se notícia que antes desse período o Estado agia em favor desse menor através da Igreja Católica, tanto que em 1551 foi fundada a primeira casa de recolhimento de crianças do Brasil, na qual os jesuítas pretendiam proteger as crianças indígenas e negras da barbárie de seus pais retirando-as de seu convívio e isolando-as (MACIEL, 2011 p. 4). 3. O CÓDIGO PENAL DO IMPÉRIO DE 1830 Alguns anos após a Independência do Brasil foi criado, em 16 de dezembro de 1830, o primeiro código penal brasileiro, sancionado pelo Imperador D. Pedro I, de nome Código Criminal do Império, que introduziu a capacidade de discernimento para aplicação da pena. Os menores de 14 anos eram inimputáveis, mas, se tivessem discernimento, eram encaminhados para as denominadas casas de correção e lá poderiam ficar até os 17 anos de idade. Eis o que diziam os arts. 10, 13 e 18, §10, todos do Código Criminal do Império: Art. 10. Também não se julgarão criminosos: 1º Os menores de quatorze annos; Art. 13. Se se provar que os menores de quatorze annos, que tiverem commettido crimes, obrarão com discernimento, deverão ser recolhidos às casas de correcção, pelo tempo que ao Juiz parecer, com tanto que o recolhimento não exceda a idade de dezasete anos; Art. 18. São circumstancias attenuantes dos crimes: §10. Ser o delinquente menor de 21 annos. Quando o réo fôr menor de dezasete annos, e maior de quatorze, poderá o Juiz, parecendo-lhe justo, impor-lhe as penas da cumplicidade (PIERANGELI, 2004, p. 238-240). Carvalho (1977, p. 312) complementa que: O nosso Código Criminal de 1830 distinguia os menores em quatro classes, quanto a responsabilidade criminal: a) os menores de 14 anos seriam presumidamente irresponsáveis, salvo se se provasse terem agido com discernimento; b) os menores de 14 anos que tivessem agido com discernimento seriam recolhidos a casas de correção pelo tempo que o juiz parecesse, contanto que o recolhimento não excedesse a idade de 17 anos; c) os maiores de 14 e menores de 17 anos estariam sujeitos às penas de cumplicidade (isto é, caberia dois terços da que caberia ao adulto) e se ao juiz parecesse justo; d) o maior de 17 e menor de 21 anos gozaria da atenuante da menoridade. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil 41 A fixação do limite de 14 anos, no artigo 10, §1º, demonstrou que até essa idade, a princípio, não existiria consciência ou maturidade para a prática de um ato delituoso, mas, ao analisá-lo em conjunto com o artigo 13, nota-se que esse limite poderia ser combatido por uma prova em contrário, a prova do discernimento. Nesse sentido criticou Barreto (1926, p. 14): “É, porém, para lastimar que, [...] no artigo 13, consagrada a singular theoria do discernimento, que póde abrir caminho a muito abuso e dar lugar a mais um espectaculo doloroso”. O próprio autor continua dizendo que é vaga a questão do discernimento, já que pode, “na falta de restricção legal, ser descoberto pelo juiz até em uma criança de cinco annos” (BARRETO, 1926, p. 21). Assim, nesse período foi adotada uma presunção iuris tantum de que os menores de 14 anos seriam inimputáveis, deixando o legislador ao magistrado a responsabilidade de decidir sobre o discernimento, assim como no caso dos maiores de 14 e menores de 17 anos, que não tinham tratamento especial, a de aplicar 2/3 da pena que caberia a um adulto. 4. O CÓDIGO PENAL REPUBLICANO DE 1890 O primeiro código da república, o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil7, manteve praticamente a linha do Código do Império, com poucas modificações. Os menores de 9 anos eram considerados inimputáveis. Entre os 9 e 14 anos era necessária a verificação do discernimento. Dos 14 até os 17 anos, os infratores eram apenados com aplicação de 2/3 da pena dos adultos, o que significa dizer que se tornara obrigatória a aplicação da pena da cumplicidade, e não mais facultativa, como o era no código anterior. Eis a redação dos dispositivos do código republicano acerca do tema: Art. 27. Não são criminosos: § 1º Os menores de 9 annos completos; § 2º Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem sem discernimento. Art. 30. Os maiores de 9 anos e menores de 14, que tiverem obrado com discernimento, serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriais, pelo tempo que ao juiz parecer, contanto que o recolhimento não exceda à idade de 17 anos. Art. 42. São circumstancias attenuantes: § 11. Ser o delinquente menor de 21 annos. Art. 65. Quando o delinquente fôr maior de 14 e menor de 17 annos, o juiz lhe applicará as penas da cumplicidade (PIERANGELI, 2004, p. 275-279). Fora adotado, assim, como critério para determinação da imputabilidade 7 Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 42 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil penal o biopsicológico8 para os maiores de 9 e menores de 14 anos de idade, e o critério biológico para os menores de 9 anos. Apesar de ter abolido a pena de morte, fato lembrado por Noronha (1999, p. 59), perante a crítica este código foi considerado “o pior de todos os Códigos conhecidos”, conforme o afirmava João Monteiro (apud PIERANGELI e ZAFFARONI, 2011, p. 197). Isto porque teria sido feito às pressas e, como se vê, manteve ainda uma concepção bastante rigorosa nessa questão, além de ter nascido da inspiração da escola clássica, que via na pena somente o aspecto retribucionista da vingança. Para Bruno (1978, p. 180): O primeiro Código Penal da República foi menos feliz do que o seu antecessor. A pressa com que foi concluído prejudicou-o em mais de um ponto, e nele a crítica pode assinalar, fundadamente, graves defeitos, embora muitas vezes com excesso de severidade. Não tardou a impor-se a ideia da sua reforma, e menos de três anos depois da sua entrada em vigor já aparecia o primeiro projeto de Código para substituí-lo. Assim, mesmo com décadas de diferença de um código para outro, não parece que foi razoável a responsabilidade penal vigorar a partir dos tão poucos 9 anos de idade e ainda persistir a subjetiva questão da capacidade de discernimento, justamente os motivos pelos quais fora tão criticado. No ponto específico da necessidade de verificação de discernimento dos maiores de 9 e menores de 14 anos, tal regramento “vigorou até 1921, quando foi derrogado pela Lei 4.242, de 5 de janeiro, ao dispor que o menor de 14 anos não seria submetido a processo algum, impondo ainda procedimento especial para os menores entre 14 e 18 anos” (GOULART, 1983 p. 247). Com isso, a imputabilidade penal começaria aos 14 anos de idade e estaria afastado o critério biopsicológico de aferição da responsabilidade nesse período de idade. No campo não infracional, em 1926 foi publicado o Decreto nº 5.083, conhecido como o primeiro código de menores, que cuidava dos infantes expostos e menores abandonados. Disciplinou também, no capítulo V, art. 45, acerca dos menores delinquentes, sendo que o menor de 14 anos não poderia ser preso mas, sim, colocado em asilo, casa de educação, escola de preservação ou confiado a pessoa idônea até que completasse 18 anos. Após um ano, em 12 de outubro de 1927, veio a ser substituído pelo De8 A doutrina costuma apontar três critérios que buscam definir a imputabilidade penal: o biológico, o psicológico e o biopsicológico. O critério biológico, sob o fundamento cronológico, ocorre pela simples verificação da idade do autor na data do fato. A menoridade, assim, constitui-se um caso de desenvolvimento mental incompleto presumido (MIRABETE e FABBRINI, 2013, p. 196), pois o menor de 18 anos ainda não teria alcançado um estágio de maturidade psicológica coerente, não tendo condição intelectual para avaliar os seus atos adequadamente, uma vez que também lhe falta a necessária vivência no meio social. Pelo critério biológico, analisado enquanto inimputabilidade sob a chave de uma patologia mental, “aquele que apresenta uma anomalia psíquica é sempre inimputável, não se indagando se essa anomalia causou qualquer perturbação que retirou do agente a inteligência e a vontade do momento do fato” (MIRABETE e FABBRINI, 2013, p. 196). Ao contrário do critério biológico, no psicológico a verificação da inimputabilidade não se determina pela deficiência mental ou distúrbio psíquico que o indivíduo apresenta, não importando o seu estado de saúde habitual. De acordo com Damásio (2005, p. 500), “o que importa é o efeito e não à causa. Leva em conta se o sujeito, no momento da prática do fato, tinha condição de compreender o seu caráter ilícito e de determinar-se de acordo com essa compreensão ou não”. Já pelo critério biopsicológico “só é inimputável o sujeito que, em consequência da anomalia mental, não possui capacidade de compreender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com essa compreensão” (DAMÁSIO, 2005, p. 500). Por esse critério analisa-se se o agente apresenta higidez mental combinada com a capacidade de compreender a ilicitude do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento, sendo possível dizer, em verdade, que se trata de uma junção dos critérios biológico e psicológico, sendo também chamado, com certa frequência, de critério misto ou “biopsicológico normativo” (MIRABETE e FABBRINI, 2013, p. 196). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil 43 creto nº 17.943-A, conhecido por Código Mello Mattos, que tinha como alvo específico os abandonados e os delinquentes, utilizando-se do termo “menor” não para toda e qualquer criança, mas apenas a abandonada, a delinquente, aquela em situação de rua. Por esse motivo, o próprio vocábulo “menor” adquiriu um significado pejorativo ao longo do tempo. Nos dias atuais, inclusive, é considerado atécnico, e as normas brasileiras pós-Constituição de 1988, que se refiram à criança e ao adolescente, procuram não utilizá-lo. Apesar disso, subsistem algumas com essa nomenclatura inadequada como, por exemplo, o Código Civil que, a despeito de ter sido promulgado em 2002, tem como base o Código Civil de 1977, sem ter dado muita atenção à atualização da terminologia. Também o Código Penal passou por algumas alterações, mas é oriundo de 1940, sofrendo de problemas ainda mais graves. Mais impressionante, porém, são as menções ao termo em algumas decisões do Supremo Tribunal Federal, como este exemplo: HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PRÁTICA DE ATO INFRACIONAIL EQUIPARADO AO TRÁFICO DE DROGAS. REITERAÇÃO NO COMETIMENTO DE ATOS INFRACIONAIS GRAVES. IMPOSIÇÃO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. ORDEM DENEGADA. [...] II – Hipótese na qual a medida de internação está devidamente lastreada no art. 122, II, do ECA e mostra-se a mais adequada, uma vez que, como consignado, o menor vem reiteradamente praticando atos infracionais de natureza grave e as medidas socioeducativas até então aplicadas não foram eficazes em possibilitar a sua ressocialização [...]. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 113.758/MG) (grifo nosso) A melhor técnica legislativa e teórica, hoje, no Brasil, determina que, quando se referir a criança e adolescente, não se utilize esse termo. Nesse sentido dizem Rossato, Lépore e Cunha (2013, p. 92): Apesar de adotado pelo Código Civil e Código Penal, e ser largamente utilizado pela doutrina, o termo “menor” é considerado pejorativo, pois remete ao antigo Código de Menores, que tratava crianças e adolescentes como pessoas em situação irregular, e as fazia carregar o estigma de marginalização, delinquência e abandono, o que não se coaduna com os novos paradigmas invocados e trabalhados pelo Estatuto, que prima pela proteção constante e integral das pessoas em desenvolvimento. No campo infracional do Código Mello Mattos as crianças e adolescentes até os 14 anos eram objeto de medidas punitivas com finalidade educacional, enquanto os de idade entre 14 e 18 anos eram punidos, porém com responsabilização atenuada. Foi instituído pelo Estado tribunais e juízes especializados na menoridade. Havia, no código, um grande foco de assistencialismo, manifestado Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil 44 no fato de que a infância pobre, considerada potencialmente perigosa, era controlada e criminalizada por meio da assistência e da justiça, o que acarretou a designação desse viés como doutrina da situação irregular (MACIEL, 2011, p. 5). Entretanto, foi somente a partir desse código que se despertou a necessidade de romper com o tratamento eminentemente penal, sendo que os magistrados passaram a decidir com vistas à assistência dos menores, desempenhando uma função voltada mais para o aspecto social das disposições. Após, com a Constituição da República do Brasil de 1937, permeada pelas lutas de direitos sociais, além do aspecto jurídico, ampliou-se o aspecto social da infância e juventude com a integração do Serviço Social como programa de bem-estar. A tutela da infância passou a se caracterizar pelo regime de internações com a quebra dos vínculos familiares, substituídos pelos institucionais, cuja finalidade era recuperar o menor, adequando-o ao comportamento considerado correto pelo Estado, mesmo que isso implicasse o afastamento de sua família. Para Maciel (2013, p. 6), a preocupação era, primariamente, correcional e não afetiva. 5. O CÓDIGO PENAL DE 1940 O Código Penal de 19409, que se encontra vigente até os dias atuais, com algumas reformas em sua parte geral10, em sua redação original estipulava no art. 23 que “os menores de dezoito anos são penalmente irresponsáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial” (PIERANGELI, 2004, p. 444). Com a alteração legislativa, por meio do art. 27 da Lei nº 7.209/84, a terminologia foi modificada para dispor que “os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”. Antes, era chamado de “irresponsável” o infrator menor de 18 anos e, após, inimputável. Portanto, o critério adotado pelo código para determinação da imputabilidade penal do menor de 18 anos foi o puramente biológico, já que considerou somente a idade, excluindo a prova do discernimento e, dessa forma, o menor de 18 anos seria irresponsável por absoluta presunção legal. Mirabete e Fabbrini (2013, p. 196) discorrem que: Adotando um critério puramente biológico, de idade do autor do fato, dispõe a lei que os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis. Não se leva em conta o desenvolvimento mental do menor que, embora possa ser penalmente capaz de entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento, não poderá ser responsabilizado penalmente por suas ações. Trata-se de um caso de presunção absoluta de inimputabilidade. Terra (2004, p. 37), por sua vez, não considera que a estipulação da inimputabilidade aos 18 anos de idade possa ser considerada um critério puramente biológico: 9 Decreto Lei nº 2.848, de 7 de setembro. 10 Por exemplo, Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil 45 Também não se pode falar na adoção, pelo Constituinte, de um critério puramente biológico. A decisão foi no sentido de valorização da dignidade humana de todas as pessoas menores de dezoito anos, de acordo com a tendência internacional de reconhecimento jurídico da doutrina da proteção integral, que acabou consubstanciada na Convenção Internacional dos Direitos da Criança. Em outras palavras, sendo o Estado Democrático de Direito presidido, entre outros, pelo princípio da dignidade da pessoa humana, a fixação da imputabilidade penal aos dezoito anos representa o seu compromisso com a valorização da adolescência, por reconhecer tratar-se de uma fase especial do desenvolvimento do ser humano. Além do mais, também não seria justificável o tratamento do menor pelo Direito Penal, pois já estava em vigor o Código Mello Mattos. Por isso, o Código Penal de 1940 apenas declarou no art. 23 que seriam os menores de 18 anos penalmente irresponsáveis, sujeitando-se à legislação especial (GOULART, 1983, p. 250). 6. O PROJETO DO CÓDIGO PENAL DE 1969 Em 1969 houve a tentativa de substituição do Código Penal de 1940. Em 1961 Nelson Hungria elaborou um novo projeto de Código Penal. Depois dos trâmites legais, chegara-se a um novo Código Penal, que fora sancionado em 21 de outubro de 1969 por meio do Decreto-Lei nº 1.004/6911, pelo então governo militar, em que as penas eram mais graves e se alterava a inimputabilidade pela idade. Dizia o art. 33 que o menor de 18 anos seria inimputável, salvo se já tivesse completado 16 anos e revelasse suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acordo com este entendimento. Nesse caso, a pena aplicável seria diminuída de um terço até a metade (PIERANGELI, 2004, p. 543). Além das inúmeras críticas geradas por esse dispositivo acerca de que quem teria a responsabilidade de aferir o nível da capacidade de discernimento, já que seria necessário um exame criminológico do maior de 16 e menor de 18 anos, ele acabou por diminuir a idade da imputabilidade penal, inserindo novamente a prova do discernimento como possibilidade para criminalização. Segundo Pierangeli (2004, p. 200), felizmente a entrada em vigor desse Código de 1969 foi sucessivamente prorrogada até que, sem ter estado vigente, foi derrogado. E como resposta mínima a um clamor generalizado da opinião jurídica do país, materializou-se a Lei 6.416, de 24 de maio de 1977. A opinião de Goulart (1983, p. 253) também é nesse sentido: A Lei 6.016, de 31 de Dezembro de 1973, modificando numerosos artigos daquele Código, voltou à linha do Es11 Disponível em http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1960-1969/decreto-lei-1004-21-outubro-1969-351762-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em 10 maio 2015. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 46 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil tatuto de 1940, que até hoje permanece em vigor, pois as críticas, intensas e contínuas, a numerosas disposições do Código de 1969 fizeram com que sua vigência fosse sendo adiada para novos estudos até hoje sem solução. Por fim, a Lei n° 6.416, de 24 de Maio de 1977 trouxe ao Código de 1940 as modificações mais necessárias quanto ao cumprimento das penas, especialmente em meio aberto, proporcionando ao condenado novas oportunidades de contato social e de profissionalização, o que vem, sem dúvida, em benefício dos jovens adultos delinquentes. Assim, continuaram sendo inimputáveis os menores de 18 anos, ficando sem respaldo a questão do discernimento, e se voltou, então, à linha do Código de 1940. Em novembro de 1980 foi instituída uma comissão para a reforma da parte geral do Código Penal, integrada, dentre outros, por Francisco de Assis Toledo, Miguel Reale Júnior e René Ariel Dotti. Após os trâmites legais, foi aprovada em 11 de julho de 1984 a Lei nº 7.209, que alterava a parte geral do Código de 1940 (PIERANGELI, 2004, p. 201), conforme já citado anteriormente. Dispõe o item 23 da exposição de motivos da Lei nº 7.209/84: Manteve o Projeto a inimputabilidade penal ao menor de 18 (dezoito) anos. Trata-se de opção apoiada em critérios de Política Criminal. Os que preconizavam a redução do limite sob a justificativa da criminalidade crescente, que a cada dia recruta maior número de menores, não consideram a circunstância de que o menor, ser ainda incompleto, é naturalmente antissocial na medida em que não é socializado ou instruído. O reajustamento do processo de formação do caráter deve ser cometido à educação, não à pena criminal. De resto, com a legislação de menores recentemente editada, dispõe o Estado dos instrumentos necessários ao afastamento do jovem delinquente, menor de 18 (dezoito) anos, do convívio social, sem sua necessária submissão ao tratamento do delinquente adulto, expondo-o à contaminação carcerária (BRASIL, Código Penal, 2010, p. 236). Assim, também conforme o art. 27 da Lei nº 7.209/84, serão penalmente imputáveis apenas os que possuírem, no mínimo, 18 anos. Além disso, segundo esse item da exposição de motivos, o fundamento da inimputabilidade até os 18 anos incompletos é a condição de maturidade do indivíduo, ou seja, há a presunção jure et de jure de sua imaturidade, ficando sujeito à legislação especial que, à época, era o Código de Menores publicado pela Lei nº 6.697 de 1979. Este Código de Menores de 1979 teve por escopo principal o estabelecimento de normas visando a assistência, a proteção e a vigilância de menores compreendidos em situação irregular12 e instituiu rol de medidas a serem apli12 Art. 2º da Lei nº 6.697/79: Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: I – privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de: a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável; b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las; II – vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável; III – em perigo moral, devido a: a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil 47 cadas pelo juiz por meio de procedimento específico: pedido de providência, advertência, colocação em lar substituto e internação em estabelecimento educacional, ocupacional, psicopedagógico, hospitalar, psiquiátrico ou outro adequado. 7. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Com o passar dos anos, a intensa mobilização de organizações populares no Brasil, acrescida da pressão de organismos internacionais, como o UNICEF, foram fundamentais para que o legislador constituinte abraçasse uma causa reconhecida por vários documentos internacionais, como a Declaração de Genebra de 1924, a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, de 1948, a Convenção Americana Sobre os Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 1969, e as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude – Regras Mínimas de Beijing, de 1985, rompendo com o já consolidado modelo da situação irregular e adotando a doutrina da proteção integral (MACIEL, 2011, p. 7-8). O empenho foi recompensado com a aprovação dos arts. 227 e 228 na Constituição Federal. Este último estabeleceu que são penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial, ou seja, não são punidos no âmbito do Código Penal, mas, sim, no âmbito das sanções previstas, atualmente, no Estatuto da Criança e Adolescente13. Assim, ao adolescente são aplicadas as medidas protetivas e/ou socioeducativas e às crianças as medidas protetivas, medidas estas que tem natureza diferente daquelas aplicadas aos adultos. Além disso, a idade da imputabilidade penal foi elevada a nível constitucional e, pela primeira vez, pode, não sem controvérsias, ser computada dentre as garantias e direitos fundamentais. Já o outro dispositivo constitucional consolidou os direitos e garantias da criança e do adolescente, adotando a absoluta prioridade na proteção de seus interesses, que corresponde ao sistema de garantias da doutrina da proteção integral. Pela doutrina da proteção integral significa dizer que as crianças e adolescentes são titulares de direitos, sujeitos, e não objetos, de direitos e, mais que isso, caracterizam-se pela condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, pela absoluta prioridade com que devem ser tratados em face aos demais e em todas as áreas de atuação do Estado. Maciel (2011, p. 396) salienta que “crianças e adolescentes possuem o status de sujeitos de direitos, dignos de proteção especial, em razão da sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, independentemente de sua situação socioeconômica”, ao contrário de outras normas que se destinavam quase que exclusivamente à camada mais pobre da população. Para Rossato (2013, p. 74): bons costumes; b) exploração em atividade contrária aos bons costumes; IV – privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável; V – com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária; VI – autor de infração penal. Parágrafo único. Entende-se por responsável aquele que, não sendo pai ou mãe, exerce, a qualquer título, vigilância, direção ou educação de menor, ou voluntariamente o traz em seu poder ou companhia, independentemente de ato judicial. 13 Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 48 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil Em verdade, o art. 227 representa o metaprincípio da prioridade absoluta dos direitos da criança e do adolescente, tendo como destinatários da norma a família, a sociedade e o Estado pelo constante incentivo à criação de políticas públicas. Trata-se de uma responsabilidade que, para ser realizada, necessita de uma integração, de um conjunto devidamente articulado de políticas públicas. Essa competência difusa, que responsabiliza uma diversidade de agentes pela promoção da política de atendimento à criança e ao adolescente, tem por objetivo ampliar a próprio alcance da proteção dos direitos infanto-juvenis. Note-se que a fundamentalidade desses dispositivos é tamanha que contou com reprodução praticamente integral no art. 4º do ECA. Desse modo, a doutrina da proteção integral busca garantir direitos às crianças e adolescentes, indivíduos em estágio de desenvolvimento e, em contrapartida, estabelecer deveres para a família, a sociedade e o Estado, responsáveis pela implementação das condições necessárias ao seu saudável crescimento. 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com base nos textos e períodos selecionados durante o estudo, é possível notar um movimento progressivo, apesar de alguns retrocessos, no sentido de se aumentar a idade limite da imputabilidade, bem como uma mudança do regime jurídico de crianças e adolescentes, com o abandono do sistema penal, passando por uma política assistencialista e culminando em um conjunto de doutrinas e princípios protetivos que garantam as condições adequadas para o desenvolvimento de crianças e adolescentes, respeitando sua condição peculiar. Tanto é que nas Ordenações Filipinas o menor de 17 anos poderia ser condenado à morte, no Código Criminal do Império o menor de 14 anos, apesar de inimputável, poderia ser encaminhado às casas de correção, no Código Penal Republicano o menor de 9 anos era considerado inimputável, dos 9 aos 14 anos havia a análise do discernimento e dos 14 aos 17 anos aplicava-se uma pena atenuada. No Código Mello Mattos, destinado aos menores abandonados e delinquentes, com ênfase assistencialista e na quebra dos vínculos familiares, o menor entre os 14 e 18 anos era punido com pena atenuada e, finalmente, no ainda vigente Código Penal de 1940, a imputabilidade é adquirida aos 18 anos completos, não se olvidando que o Código de Menores se destinava aos menores em situação irregular. Foi lembrada ainda a tentativa frustrada de um novo Código Penal, em 1969, que previa uma análise de discernimento do maior de 16 anos. Por fim, a Constituição Federal de 1988, ao ser promulgada, textualmente afirmou a inimputabilidade dos menores de 18 anos, o que pode ser considerado um direito fundamental, no sentido das denominadas liberdades negativas, que limitam a atuação estatal nos âmbitos da vida e liberdade do cidadão, ainda que crianças e adolescentes, e determinou também um sistema de proteção esRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Anotações sobre a imputabilidade penal de crianças e adolescentes no Brasil 49 pecial consubstanciado no Estatuto da Criança e do Adolescente, que adotou a doutrina da proteção integral, consistindo em um conjunto de princípios destinados à proteger toda as dimensões peculiares que envolvem a infância e a juventude, assinalando à família, à sociedade e ao Estado o dever de garantir-lhes o sadio desenvolvimento. 9. REFERÊNCIAS BARRETTO, Tobias. Menores e loucos e fundamento do direito de punir. Rio de Janeiro: De Paulo, Pongetti, 1926. BRASIL. 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A EENM com corrente Russa tem grande resultado no fortalecimento muscular. O objetivo desse estudo foi avaliar os efeitos da corrente Russa na musculatura respiratória, na sintomatologia e na qualidade de vida dos pacientes com DPOC. Participaram 4 pacientes com idades entre 65 e 86 anos, que foram submetidos ao tratamento com corrente Russa, três vezes por semana, totalizando 15 sessões. Obtiveram-se resultados positivos nos valores de Pimáx, PEmáx, melhora na qualidade de vida e diminuição da dispneia. Conclui-se que o uso da corrente Russa no tratamento da DPOC é eficaz, propiciando maior independência para os pacientes em suas AVD’s e fortalecendo a musculatura respiratória. Palavras-chave Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, Reabilitação Pulmonar, Corrente Russa, Fortalecimento da Musculatura Respiratória, Fisioterapia.1 ABSTRACT The Chronic Obstructive Pulmonary Disease is an irreversible and progressive disease. Most patients have respiratory muscle weakness and decreased quality of life . NMES with Russian current has great result in muscle strengthening. The aim of this study was to evaluate the effects of Russian 1 Pâmela de Rezende Santos – Bacharel em Fisioterapia pelo UNIFEG. 2 Miriangrei Letieri - Especialização em Reabilitação Aplicada à Neurologia Infantil pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Docente do curso de Fisioterapia do UNIFEG. 3 Isabela Scali Lourenço Simon – Mestrado em Morfologia e Medicina Experimental pela Universidade de São Paulo (USP). Docente do curso de Fisioterapia do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 52 Avaliação dos efeitos da corrente russa na reabilitação da musculatura respiratória em idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica current in respiratory muscles in symptoms and quality of life of patients with COPD. Participated in 4 patients aged 65 to 86 years , who underwent treatment with Russian current , three times a week , totaling 15 sessions . Positive results were obtained in MIP values , MEP , improved quality of life and decreased dyspnea . We conclude that the use of Russian current in the treatment of COPD is effective , providing greater independence for patients in their ADLs and strengthening the respiratory muscles. 1. INTRODUÇÃO A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) é uma doença irreversível e progressiva, que acomete os pulmões. As principais características são a destruição de vários alvéolos e o comprometimento do sistema respiratório Ocorre também um processo inflamatório que produz alterações nos brônquios, bronquíolos e parênquima pulmonar. Os sinais e sintomas mais frequentes são: a limitação do fluxo das trocas dos gases, hiperinsuflação dinâmica que encurta as fibras musculares do diafragma, a fadiga muscular e a insuficiência respiratória (SBPT, 2004). Caracteriza-se como DPOC a Bronquite Crônica, que é caracterizada pela excessiva produção de muco na árvore brônquica e o Enfisema Pulmonar, que tem como característica a dilatação anormal dos espaços aéreos distais aos bronquíolos terminais, acompanhada pela destruição de suas paredes (CARVALHO, 2005). A DPOC é uma das principais causas de mortalidade e morbidade no mundo. No Brasil estima-se que cerca de 5,5 milhões de pessoas tenham DPOC, ocupando entre a 4ª e a 7ª posição entre as principais causas de morte no país e é a principal causa de internações por problemas respiratórios,essa é uma taxa sempre crescente (JEZLER et al, 2007). Seu diagnóstico é feito a partir dos sintomas, como tosse, secreção, dispneia e sibilos, exposição aos fatores de risco, espirometria (pré e pós-broncodilatador) e outros exames, como radiografia de tórax e gasometria (SBPT, 2004). De acordo com SBPT/ II Consenso Brasileiro de DPOC os principais fatores de risco para a patologia são: tabagismo, poeira ocupacional, irritantes químicos, fumaça de lenha, infecções respiratórias graves na infância e condição socioeconômica (fatores externos), deficiência de alfa- 1 antitripsina e de glutatinona transferase e hiperresponsividade brônquica. Hoje em dia há várias terapias para o tratamento da doença. Algumas são a oxigenoterapia, fisioterapia respiratória (exercícios de tosse, drenagem postural, desobstrução da árvore brônquica, entre outros), os exercícios resistidos para musculatura respiratória, a suplementação de esteroides anabolizantes, creatina e a Estimulação Elétrica Neuromuscular (EENM) (VASCONCELOS et al, 2005). Com essas intervenções haverá uma melhora da sobrevida do paciente, um aumento da capacidade de ventilação/perfusão, reeducação postural e da musculatura inspiratória e expiratória e maior independência do paciente. A Corrente Russa é um aparelho de EENM muito utilizado na fisioterapia, que demonstra grande resultado para o crescente ganho de força muscular, podendo produzir ganho de força 30 a 40% maiores que a máxima contração voRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação dos efeitos da corrente russa na reabilitação da musculatura respiratória em idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica 53 luntária, mesmo em pessoas sadias, pois atua no ventre muscular fortalecendo e aumentando o volume da musculatura. É uma corrente de média frequência portadora 2.500 a 5.000Hz, com uma modulação para produzir 50 bursts por segundo (bps) (OLIVEIRA et al, 2009). Esse estudo teve como objetivo avaliar os efeitos da eletroestimulação com Corrente Russa na musculatura respiratória, que se torna comprometida em pacientes com DPOC, através da avaliação dos valores de Pressão Inspiratória máxima (PImáx), Pressão Expiratória máxima (PEmáx), dos sintomas da patologia e da análise da qualidade de vida dos participantes da pesquisa. 2. MATERIAIS E MÉTODOS Esse estudo caracterizou-se como uma pesquisa clínica experimental, realizado nas dependências da Clínica de Fisioterapia Maria de Almeida Santos do Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé (UNIFEG), no setor Cardiopulmonar e Metabólicos. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, sob protocolo nº 365/14, e os participantes manifestaram-se de acordo, por meio de assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Participaram da pesquisa idosos portadores de DPOC com idades entre 65 e 86 anos e os critérios de exclusão foram: ter realizado cirurgias recentes, ter déficit cognitivo, usar marca-passo, apresentar tumor, estar em tratamento fisioterápico para a patologia e possuir algum outro tipo de contraindicação para eletroterapia. Primeiramente foram selecionados 4 pacientes (3 do sexo feminino e 1 do sexo masculino) portadores de DPOC e foi realizado a avaliação respiratória, mensurando a Pressão Inspiratória máxima (PImáx) e Pressão Expiratória máxima (PEmáx) com manovacuômetro analógico da marca Comercial Médica. Foi também mensurada a cirtometria de tórax e abdômen, com uma fita métrica, e a ausculta pulmonar com estetoscópio da marca Littman. Verificou-se os sinais vitais, como pressão arterial (PA), com esfigmomanômetro da marca Bic, frequência cardíaca (FC) por meio da contagem do pulso radial esquerdo durante 1 minutos, saturação periférica de oxigênio (SpO2), com oxímetro de pulso da marca IMFTec e aplicada a escala de BORG. Os pacientes também responderam ao Questionário de Vias Aéreas 20 (“Airways questionnaire 20”) e ao Perfil do Estilo de Vida Individual (PEVI). O tratamento proposto foi a EENM com Corrente Russa, da marca Ibramed, para fortalecer a musculatura abdominal, que auxilia na respiração. Os eletrodos foram colocados em região do diafragma e reto abdominal, com a utilização de gel clínica (para uma maior condutibilidade) e fixada com fita adesiva, por 15 minutos (fig.1). Quando a corrente ligava, os pacientes realizavam a respiração diafragmática, contraindo a musculatura abdominal. Os parâmetros utilizados na corrente foram: Sync, frequência de 50Hz, 3 rise, 20 on, 3 decay e 10 off. Foram realizadas três sessões semanais intervaladas de um dia, durante cinco semanas, totalizando 15 sessões. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação dos efeitos da corrente russa na reabilitação da musculatura respiratória em idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica 54 FIGURA 1- Posicionamento dos eletrodos Fonte: Arquivo do próprio autor, out/2014. Ao final do tratamento a avaliação respiratória foi novamente mensurada e os pacientes responderam aos mesmos questionários. Para análise da estatística foi utilizado o programa GraphPad InStat®, sendo realizada a análise de dados de forma descritiva. 3. RESULTADOS A análise dos resultados demonstra que houve mudanças em todos os dados mensurados, conforme tabela 1. Porém, estatisticamente, não houve uma diferença significativa nas comparações iniciais e finais dos dados nos pacientes, abaixo demonstrados. INÍCIO DADOS AVALIADOS FINAL MÉDIA ± DP MÉDIA ± DP PRESSÃO ARTERIAL SISTÓLICA 132,5 ± 34,03 122,5 ± 17,08 PRESSÃO ARTERIAL DIASTÓLICA 77,5 ± 15 77,7 ± 17,08 FREQUÊNCIA CARDÍACA 71,25 ± 7,5 68,25 ± 6,4 BORG 4,25 ± 3,5 4,25 ± 2,06 SpO2 95,25 ± 3,77 96,25 ± 1,5 TABELA 1: Análise estatística descritiva dos dados avaliados nos pacientes no início e no final do tratamento. *p>0,05 – diferença não significativa nas comparações inicias e finais. Os dados de PImáx e PEmáx também obtiveram diferença pré e pós tratamento. Os valores de PImáx inicial atingiram uma média de -27,5 cmH20 com desvio padrão (DP) de ± 18,11cmH20 e os valores finais foram média de -56,25 cmH20 com DP ± 11,09, com um p=0,05, ou seja, houve diferença significativa entre as avaliações iniciais e finais. A figura 2, mostra o aumento dos valores de PImáx de cada participante do estudo. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação dos efeitos da corrente russa na reabilitação da musculatura respiratória em idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica 55 FIGURA 2: Valores de PImáx pré e pós em cada paciente. Já os dados de PEmáx inicial obteve média de 33,75cmH20 ± 20,56 e os de PEmáx final média de 52,5 cmH20 ± 5. O valor de p foi de 0,1, constando, assim, que as avaliações iniciais e finais não apresentaram diferença estaticamente significativa, ainda que seja possível observar mudança nos valores de PEmáx em cada paciente, conforme está descrito na figura 3. FIGURA 3: Valores de PEmáx pré e pós em cada paciente. No questionário aplicado PEVI, houve uma mudança da média de 33,25 pontos ±7,41 para média de 43 pontos ±10,07, de um total de 60 pontos, com valor p=0,05. Os resultados do questionário Aéreas 20 estão descrito na tabela 2. Obteve-se uma média de respostas “SIM” de 9 ±3,83 no início e de 11,25 ±4,35 no final do tratamento, com um resultado de p=0,44. A média de respostas “NÃO” foi de 9,5 ±3,11 no início e de 8,25 ±3,30 no final, com valor de p=0,56. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação dos efeitos da corrente russa na reabilitação da musculatura respiratória em idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica 56 PARTICIPANTES INÍCIO FINAL SIM NÃO N/A SIM NÃO 1 4 13 2 12 8 2 12 8 0 17 4 3 8 11 1 7 12 4 12 6 2 9 9 TABELA 2: Descrição dos resultados do questionário Aéreas 20. SIM: o sintoma da doença pulmonar causa efeito na sua vida diária. NÃO: o sintoma da doença não causa efeito na sua vida diária. N/A: não se aplica. 4. DISCUSSÃO A DPOC, geralmente, é uma doença progressiva nos seus sintomas, principalmente a dispneia, que vai interferir em vários aspectos na vida dos pacientes, sejam eles profissionais, sociais, familiares e nas atividades de vida diária (AVD’s). Outro fator que causa prejuízo na qualidade de vida desses pacientes é a fraqueza da musculatura periférica e respiratória e a deterioração da função pulmonar, que irá acarretar a piora da dispneia e intolerância aos esforços. Esses fatores podem proporcionar o aparecimento de quadros de ansiedade e depressão (KOENIG, DINIZ, NASCIMENTO, 2010). Antes de iniciar o tratamento proposto nesse estudo, os pacientes apresentavam-se muito dispneicos e com a qualidade de vida diminuída, avaliados pelos questionários PEVI, Aéreas 20 e pela escala de BORG modificada. Observou-se que essas alterações ocorreram devido à interferência da doença na vida desses pacientes, conforme descrito por KOENIG, DINIZ e NASCIMENTO (2010). Após o tratamento, os pacientes relataram uma melhora na dispneia, avaliada pela escala de BORG modificada, e uma maior independência para realizar suas AVD’s, avaliada pelos questionários. Esses fatos podem ser justificados pelo aumento da PImáx e PEmáx que estão diretamente relacionadas com o aumento da força e da resistência da musculatura respiratória. A PImáx é um índice da força dos músculos inspiratórios (diafragma e intercostais) e é denominada pela maior pressão possível de ser gerada durante a inspiração forçada contra uma via aérea ocluída, enquanto a PEmáx mede a força dos músculos expiratórios (abdominais e intercostais), que é a maior pressão gerada numa expiração forçada contra uma via aérea ocluída (RIBEIRO, 2007). A avaliação da força muscular respiratória (FMR) pelas pressões respiratórias máximas (PImáx e PEmáx) é muito utilizada por ter importante papel no diagnóstico e prognóstico de doenças neuromusculares, pulmonares e cardiovasculares, sendo um método simples, com baixo custo, prático e não invasivo, além de estar associada ao estado de saúde de um indivíduo. Essas pressões são avaliadas pela boca e refletem a pressão que é produzida nos alvéolos pela ação dos músculos da respiração (FOLIO et al, 1994). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação dos efeitos da corrente russa na reabilitação da musculatura respiratória em idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica 57 Participaram do estudo proposto 3 mulheres (pacientes 1, 3 e 4) e 1 homem (paciente 2) e pode-se observar que as mulheres apresentaram valores de pressões respiratórias inferiores ao do homem participante do estudo, como observado por outros investigadores (SARMENTO, 2009). Outro fator importante que se observou foram as idades dos pacientes, todos acima de 68 anos, sendo dessa forma, considerados indivíduos idosos em países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, conforme descrição da Organização Mundial de Saúde ( INAGAKI et al). Alguns estudos comprovam que há diferença na FMR entre jovens e idosos, como descreve KIM e SAPIENZA (2005) onde relatam que uma das principais modificações no sistema respiratório com o avançar da idade é a diminuição do recolhimento elástico dos pulmões e da complacência da caixa torácica. A própria fisiopatologia da DPOC vem também justificar a diminuição da força da musculatura respiratória desses pacientes. Portadores de DPOC apresentam efeitos sistêmicos, com ênfase na disfunção muscular esquelética, que inclui perda progressiva da massa muscular esquelética e presença de anomalias bioenergéticas. Esses efeitos resultam em consequências clínicas importantes, contribuindo para a limitação da capacidade física e acarretando em um declínio da condição de saúde desses pacientes (KUNIKOSHITA et al, 2006) Todos esses fatores citados acima (idade e sexo dos pacientes e a própria patologia) justificam os sinais e sintomas apresentados pelos participantes desse presente estudo antes do tratamento proposto, onde apresentaram diminuição da FMR, com baixos valores da PImáx e da PEmáx, e a importância de se fortalecer os músculos da respiração nos pacientes portadores da patologia em questão. A corrente Russa foi contemplada nesse estudo por ser uma corrente de média frequência (2.500 Hz) com alta tolerabilidade, porque além de não promover fadiga muscular, é mais agradável quando comparada a corrente de baixa frequência, e capacidade de recrutamento gerando força e hipertrofia muscular (OLIVEIRA et al, 2009). Foi escolhido a frequência de 50Hz pelas características das fibras (mistas) dos músculos diafragma e reto abdominal (MEIRELES et al, 2012). Em relação ao tempo de aplicação da corrente, foi escolhido 15 minutos porque se ultrapassar 20 minutos, a corrente se torna desagradável e poderá ocorrer fadiga da musculatura (OLIVEIRA et al, 2009). BAFILLE e ANDRADE realizaram um estudo de recrutamento do diafragma com estimulação elétrica transcutânea em pacientes com bronquite e enfisema pulmonar. No estudo participaram três pacientes com idades entre 21 e 70 anos, onde foram submetidos à EE transcutânea com o ECOR (aparelho que produz corrente excitomotoras) três vezes por semana durante 30 minutos, por 45 dias. Em seus resultados, os participantes demonstraram um aumento em sua capacidade expiratória máxima e uma diferença significativa na qualidade de vida. O único estudo encontrado de fortalecimento da musculatura respiratória com corrente russa foi um relato de caso com um paciente do sexo masculino, 66 anos, ex-fumante, diagnosticado com DPOC grave. O programa de tratamento constou de três sessões semanais durante 15 minutos, totalizando 30 aplicações. Foi utilizada a corrente de média frequência (2.500 Hz modulada 50 Hz) Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 58 Avaliação dos efeitos da corrente russa na reabilitação da musculatura respiratória em idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica em região de transverso do abdômen e reto abdominal com quatro canais. Os resultados da pesquisa foram satisfatórios, havendo incremento de 33% na PImáx e de 39% na PEmáx (OLIVEIRA et al, 2009). Assim como nos estudos acima citados, foram encontrados resultados satisfatórios nas forças das musculaturas inspiratória e expiratória dos pacientes. Houve um incremento de 23,9% na PImáx, demonstrando assim uma diferença significativa pré e pós tratamento (p<0,05), e de 15,6% na PEmáx, não demonstrando uma diferença significativa, mas evidenciando um aumento na força da musculatura expiratória. Esses resultados são justificados pela hipertrofia causada pelas contrações da corrente Russa, como demonstra um estudo realizado em São José dos Campos por SANTOS; NICOLAU; PACHECO (2006), onde comparou o antes e depois de um tratamento com o fortalecimento do músculo reto abdominal com corrente Russa em nove mulheres que tenham tido duas gestações completas. Eles utilizaram oito canais da corrente no abdômen, sendo apenas dois canais colocados em região de reto abdominal. Como resultado, obtiveram um fortalecimento da musculatura reto abdominal (p<0,001) e aumento de 13,6% na espessura transversal da musculatura, mensurada por meio de ultrassonografia, o que resultou numa hipertrofia muscular. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esse estudo demonstrou ser eficaz a EENM com corrente Russa em pacientes diagnosticados com DPOC, havendo um incremento nos valores de PImáx, com diferença estatisticamente significativa, e PEmáx, não apresentando diferença estatisticamente significativa, e apresentando uma melhora na qualidade de vida desses pacientes. Embora tendo resultados benéficos, outros estudos devem ser realizados, pois essa é uma área bem escassa de pesquisas, e estudos com números maiores de pacientes e sessões podem evidenciar melhor os benefícios do tratamento com a eletroestimulação diafragmática em pacientes com DPOC. 6. REFERÊNCIAS Bafille JS, Andrade R. Recrutamento do diafragma com estimulação elétrica transcutânea em pacientes com bronquite e enfisema pulmonar (em ambulatório). Acesso em 06 nov. 2014. Disponível em: http://www.wgate.com.br/conteudo/medicinaesaude/fisioterapia/respiratoria/estiestimul_transcutanea.htm Carvalho CRR. Fisiopatologia respiratória. 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Para isso, o presente trabalho, verificou os efeitos desta intervenção na qualidade de vida e funcionalidade (por meio de escalas de avaliação (SF36 e Hip Harris Score) de pacientes pós operatórios de Artroplastia e posteriormente submetidos ao programa de Fisioterapia. No período pré-operatório, 4 pacientes apresentaram muita dor e claudicação moderada, 3 incapacidade de amarrar os sapatos e permanecerem sentados por muito tempo. No pós-operatório 5 pacientes apresentaram ausência de dor, capazes de amarrar os sapatos permanecerem sentados por muito tempo e claudicação moderada. 3 deles realizaram hidroterapia após a fisioterapia e tiveram uma melhora considerável. Conclui-se que, artroplastia total de quadril proporciona melhora na amplitude de movimento articular, ausência de dor e agilidade para realizar as atividades funcionais diárias, porém o programa de Fisioterapia se torna recurso primordial para acelerar o retorno. Palavras-Chave Quadril, Osteoartrose, Artroplastia, Reabilitação. ABSTRACT The hip arthroplasty has been output to orthopedic surgeons have found for the improvement of functionality patterns in patients with osteoarthritis of the hip even before assessing the efficacy of a conservative treatment. For this, the present study examined the effects of this intervention on quality of life and functionality of postoperative patients arthroplasty and subsequently submitted to Physical Therapy program. In the preoperative period, 4 patients experienced much pain and moderate lameness, 3 inability to tie his shoes and re1 Priscila Souza Batista. Bacharel em Fisioterapia pelo UNIFEG. 2 Luiz Henrique Sales de Oliveira. Doutorado em Ciências da Saúde (Cirurgia Plástica) pela UNIFESP. 3 Luiz Henrique Gomes Santos. Mestrado em Biotecnologia pela Universidade de Ribeirão Preto. Docente e Coordenador do curso de Fisioterapia do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia 62 main seated for long. Postoperatively 5 patients had no pain, able to tie your shoes remain seated for long and moderate claudication. 3 of them underwent hydrotherapy after physiotherapy and had a considerable improvement. In conclusion, total hip arthroplasty provides improved joint range of motion, no pain and agility to perform daily functional activities, but physical therapy program becomes paramount feature to speed up the return. 1. INTRODUÇÃO A Osteoartrose é uma doença de origem reumática, caracterizada pela degeneração das articulações sinoviais, apresentando alterações na cartilagem articular, microfraturas no osso subcondral e formação de osteófitos nas bordas articulares1,2. Está relativamente associada com rigidez articular, dor, perda progressiva da função e deformidade, podendo causar diminuição da qualidade de vida do indivíduo e aumento progressivo da doença 3. Sendo assim, Buckwalter e Martin, afirma que o tratamento da doença na fase inicial contribui na qualidade de vida reduzindo a progressão da doença4. Portanto, o tratamento visa à melhora clínica, mecânica e funcional do indivíduo. A fisioterapia desempenha um grande papel no que se refere à melhora dos sintomas, Contribuindo para a reabilitação, facilitando a melhora da função, coordenação, relaxamento muscular, postura e autoestima do mesmo5. A hidroterapia é usada como um complemento da fisioterapia, a relação entre as duas modalidades é perfeita desde que possa ser tolerada pelo paciente, tem como objetivo a progressão de exercícios para manter e melhorar a capacidade física e as atividades de intervenção de vida diária dos pacientes6. O tratamento farmacológico inclui antiinflamatórios e analgésicos, já o não farmacológico incluem exercícios terapêuticos e programas educativos, além de outros recursos como o uso de órteses e a hidroterapia5,7. Quando a osteoartrose se mostra em uma fase avançada, apresentando perda da função, deformidade física, ou até mesmo quando o tratamento conservador se torna ineficiente, existem os tratamentos cirúrgicos que incluem desbridamentos artroscópicos, osteotomias e artroplastias, tendo como objetivo melhorar a função e a qualidade de vida do indivíduo2,8. No progresso das novas técnicas cirúrgicas está relacionada com a substituição da articulação do quadril, melhorando a função e a qualidade de vida9. O objetivo do presente estudo é avaliar a funcionalidade e a qualidade de vida dos indivíduos sujeitos á artroplastia total de quadril. 2. METODOLOGIA O estudo foi realizado com seis pacientes de ambos os sexos, portadores de osteoartrose sujeitos á artroplastia total de quadril, com exame radiográfico e diagnóstico médico com indicação cirúrgica. Foram excluídos do estudo os que não apresentam o diagnóstico médico com a indicação cirúrgica. A Tabela 1 apresenta o número de pacientes em relação ao sexo, idade e o lado operado, sendo três do sexo masculino e três do sexo feminino. Dos seis, Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia 63 quatro apresentaram osteoartrose idiopática do lado direito e os outros dois apresentam necrose asséptica da cabeça femoral do lado esquerdo. A idade é entre 42 e 80 anos, com idade média de 66,33 anos. Tabela 1 Dados dos seis indivíduos submetidos á artroplastia total de quadril. (M) Masculino; (F) Feminino; (D) Direito; (E) Esquerdo. N Sexo Idade Lado 1 F 68 D 2 M 42 D 3 M 71 D 4 F 80 E 5 M 72 E 6 F 65 D Os pacientes foram submetidos aos questionários e escalas específicos da patologia, no período pré-operatório e pós-operatório. O questionário sobre dor e atividade de intervenção de vida diária (AIVD) - Harris Hip Score (1969) modificado, que constitui em uma escala que avalia os parâmetros de dor, função, amplitude de movimento articular e deformidades. A pontuação varia de 0 á 100, sendo que a menor pontuação indica maior comprometimento da doença9. ANEXO 01 O questionário de Índice de Woman para osteoartose construiu em um questionário que avalia a intensidade da dor, intensidade da rigidez, e atividade de vida diária, sabendo que a maior pontuação indica maior comprometimento da doença10, 11,12. ANEXO 02 O questionário Algofuncional Lequesne, constitui em um questionário que avalia a dor ou desconforto, a máxima distância percorrida com dor e atividades de vida diária, sendo que a maior pontuação indica maior grau de acometimento da doença13,14,15. ANEXO 03 Após o período de pós-operatório, foram realizadas trinta e seis sessões de fisioterapia com os seis pacientes, sendo três vezes por semana durante três meses. Tabela 2 – Protocolo de atendimento fisioterapêutico proposto Semana 1º, 2º e 3º Fisioterapia Eletroestimulação em glúteo médio por 10’; Alongamento de isquiotibiais, quadríceps e glúteo médio; Fortalecimento de quadríceps, isquiotibiais, abdutores de quadril, com 0,5kg em 3x10 repetições; Miniagachamento em 3x10. Treino de Marcha. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia 64 4º, 5º e 6º 7º, 8º e 9º 10º, 11º e 12º Eletroestimulação por 10’ associado ao fortalecimento de glúteo médio (fibras posteriores), com 1kg; Alongamento de isquiotibiais, quadríceps e glúteo médio; Fortalecimento de quadríceps, isquiotibiais, abdutores de quadril, com 1kg em 3x15 repetições; Agachamento em 3x10; Esteira por 12’ (velocidade 3) Eletroestimulação por 10’ associado ao fortalecimento de glúteo médio (fibras posteriores),com 1kg; Alongamento de isquiotibiais, quadríceps e glúteo médio; Fortalecimento de quadríceps, isquiotibiais, abdutores de quadril, com 1kg em 3x20 repetições; Agachamento em 3x10 com 1kg. Esteira por 15’ (velocidade 4) Eletroestimulação por 10’ associado ao fortalecimento de glúteo médio (fibras posteriores), com 1kg; Alongamento de isquiotibiais, quadríceps e glúteo médio; Fortalecimento de quadríceps, isquiotibiais, abdutores de quadril, com 1,5kg em 3x20 repetições; Agachamento em 3x10 com 1kg. Esteira por 20’ (velocidade 4) Três deles realizavam fisioterapia e também a hidroterapia duas vezes por semana durante os três meses. Tabela 3. Tabela 3 – Protocolo de intervenção na Hidroterapia Semana Hidroterapia 1º, 2º e 3º Caminhada multidirecional por 10’; Alongamento de isquiotibias e quadríceps; Fortalecimento de abdutores de quadril, quadríceps, com caneleira flutuadora em 3x15; Subir e descer do step em 3x15. 4º, 5º e 6º 7º, 8º e 9º Caminhada multidirecional por 10’; Alongamento de isquiotibias e quadríceps; Fortalecimento de abdutores de quadril, quadríceps, com caneleira flutuadora em 3x20; Subir e descer do step em 3x20; Exercício de bicicleta com espaguete. Caminhada multidirecional por 10’; Alongamento de isquiotibias e quadríceps; Fortalecimento de abdutores de quadril, quadríceps, com caneleira flutuadora em 3x15; Subir e descer do step em 3x20; Exercício de bicicleta com espaguete. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia 10º, 11º e 12º 65 Caminhada multidirecional por 10’; Alongamento de isquiotibias e quadríceps; Fortalecimento de abdutores de quadril, quadríceps, com caneleira flutuadora em 3x15; Subir e descer do step em 3x20; Pular na cama elástica por 5’; Propriocepção na cama elástica com apoio unipodal; Exercício de bicicleta com espaguete. 3. RESULTADOS Foi observado que na fase pré-operatória, 4 pacientes apresentaram dores consideravelmente fortes, incapacidade para subir escadas, realizar caminhadas, rigidez e desconforto noturno. Na avaliação realizada no período pós-operatório 5 pacientes declararam ausência de dor e desconforto noturno, além de apresentar melhora na capacidade funcional a ponto de subir escadas e fazer caminhada. Foi observado também que 1 paciente apresentava dificuldade em subir escadas tanto no pré como no pós-operatório, e a limitação psicológica foi um fato relacionado a esta, como a informação encontrada no relato de ter medo de cair, portanto refere ausência de dor. Foi observado que na fase pré-operatória, 3 pacientes relataram ser incapazes de amarrar os sapatos, e permanecer sentados por uma hora em uma cadeira qualquer. Fato este, que não foi encontrado na fase pós-operatória, pois 5 pacientes conseguiram realizar essas atividades e apenas um 1 paciente relatou apresentar maior dificuldade. Em relação ao uso de dispositivos auxiliares, foi observado que na fase pré-operatória, 3 pacientes apresentavam claudicação grave, e faziam uso de dispositivos de marcha (bengala) e os outros 3 pacientes, apresentavam padrão de claudicação moderada. Na avaliação destes na fase pós-operatória, 5 apresentaram claudicação discreta e apenas 1 paciente necessita de dispositivo de auxilio á marcha. Os pacientes que foram submetidos à intervenções com recursos aquáticos, todos relataram melhoras excelentes no ponto de vista funcional, fato que aumentaram os índices de qualidade de vida. 4. DISCUSSÃO Uma vez que se trata de uma doença crônica, que causa dor, incapacidade articular e comprometimento da qualidade de vida, diversos estudos são realizados com o intuito de proporcionar a melhor qualidade de vida para os pacientes que apresentam osteoartrose de quadril. Segundo Cecin, Galati e Ribeiro16 o tratamento de osteoartrose é baseado em diminuir sintomas e prevenir sua evolução. De acordo com Greve17 no que diz respeito á melhora da função e dos sintomas, o tratamento fisioterapêutico aliado á hidroterapia são importantes recursos para a qualidade de vida e consequente melhora da expectativa de vida dos pacientes. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia 66 Marques e Kondo18 concluíram que a fisioterapia é de ação benéfica e auxilia no controle de sintomas, quanto á melhora da qualidade de vida, sendo assim, para o paciente com osteoartrose grave, é de grande importância à substituição da área lesada. Para isso, o tratamento cirúrgico se torna um dos principais recursos, servindo para proporcionar principalmente, ausência de dor e consequentemente, maior mobilidade. Coimbra et al19 informa que a atuação da fisioterapia no período de pré-operatório e pós-operatório é de grande importância, proporcionando melhorias quanto á recuperação e qualidade de vida do paciente. Conclui-se então que o paciente portador de osteoartrose submetido à artroplastia total de quadril tem melhora na amplitude de movimento articular, ausência de dor e agilidade para realizar as atividades, e que se submetido à programas de recuperação funcional com Fisioterapia e hidroterapia terá melhora nas expectativas de vida diária. 5. REFERÊNCIAS Chitnavis J, Sinsheimer JS, Suchard MA, Clipsham K, Carr AJ: Endstages coxartrhosis. Aetiology, clinical patterns and radiological features of idiopathic osteoarthritis. Rheumatol 39: 612-9, 2000. Moreira C, Carvalho MAP: Noções Práticas de Reumatologia, Belo Horizonte, Editora Health, 1996. Skare TL: Reumatologia/Princípios e Prática, Rio de Janeiro, Editora Guanabara Koogan, 1999. Buckwalter AJ, Martin J: Doença Articular Degenerativa. 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Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 68 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia ANEXO 01 HARRIS HIP SCORE DOR: ( ) Não tem , ou é ignorada. (44) ( ) Discreta, ocasionalmente (40) ( ) Ligeira. (30) ( ) Moderada, tolerável.(20) ( ) Marcada. (10) ( ) Incapacitante.(0) TOTAL:_______ FUNÇÃO MARCHA – CLAUDICAÇÃO: ( ) Não tem. (11) ( ) Ligeira. (8) ( ) Moderada.(5) ( ) Severa ou com incapacidade de marcha.(0) AUXILIARES DE MARCHA: ( ) Nenhum.(11) ( ) 1 Bengala em caminhadas longas.(7) ( ) 1 Bengala a maior parte do tempo.(5) ( ) 1 Canadense.(3) ( ) 2 Bengalas.(2) ( ) 2 Canadenses ou incapacidade de marcha. (0) PERÍMETRO DE MARCHA: ( ) Limitado.(11) ( ) 1.000 metros.(8) ( ) 250-500 metros. (5) ( ) Deambula só em casa.(2) ( ) Só cama e cadeira.(0) TOTAL:_______ ATIVIDADE FUNCIONAL – ESCADAS: ( ) Normalmente sem corrimão.(4) ( ) Normalmente, mas apoiado no corrimão.(2) ( ) Com grande dificuldade.(1) ( ) Incapaz de usar escadas.(0) ATAR OS SAPATOS/ CALÇAR MEIAS: ( ) Facilmente.(4) ( ) Com dificuldade.(2) ( ) Incapaz.(0) SENTAR-SE: ( ) Em cadeira normal (1hr ou mais).(5) ( ) Cadeira alta (ate 30 min).(3) ( ) Incapaz de sentar-se em cadeira (30 min).(0) TRANSPORTES PÚBLICOS/AUTOCARRO: ( ) Pode utilizar.(1) ( ) Não consegue utilizar.(0) MOBILIDADE: ( ) Flexão (0-140)._______ se somatório >210 (5) ( ) Abdução (0-50)._______ se somatório >160 e <209 (4) Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 69 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia 70 ( ) Adução (0-50)._______ se somatório >100 e <159 (3) ( ) Rot. Externa (0-50)._______ se somatório >60 e <99 (2) ( ) Rot. Interna(0-50)._______ se somatório >30 e<59 (1) Somatório: _______se somatório >0 e <29 (1) TOTAL:_______ DEFORMIDADE: Contratura em flexão <30º ou ausente ( ) Sim ( ) Não Contratura em adução,<10º ou ausente ( ) Sim ( ) Não Contratura em rot. Interna( em extensão) <10º ou ausente ( ) Sim ( ) Não Dismetria <3cm ou ausente ( ) Sim ( ) Não (se 4x sim +4; Qualquer outra combinação=0) TOTAL:_______ Assinale um só valor em cada uma das questões. Faça o somatório dos valores totais de dor e função. Em mobilidade, faça o somatório das mobilidades e assinale a pontuação no intervalo correspondente. Em deformidade marque sim ou não nas varias opções. Assinale o total de 4 só se houver 4 respostas SIM, ou assinale 0 em todas as outras combinações. Calcule o score de harris total, com a soma dos valores totais de dor, função,mobilidade e deformidade. ANEXO 02 WOMAC PARA OSTEOARTROSE Qual a intensidade da sua dor? Caminhando em um lugar plano: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Subindo e descendo escadas: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( A noite deitado na cama: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Sentando-se ou deitando-se: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Ficando em pé; ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( TOTAL:_________ ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. Qual a intensidade da rigidez? Qual é a intensidade da sua rigidez logo após ao acordar de manha? ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( ) Intensa. ( ) Muito intensa. Qual é a intensidade da sua rigidez após se sentar, se deitar ou repousar no decorrer do dia? ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( ) Intensa. ( ) Muito intensa. TOTAL:_________ Qual é o grau de dificuldade que vc tem ao: Descer escadas: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( ) Intensa. ( Subir escadas: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( ) Intensa. ( Levantar-se estando sentada: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( ) Intensa. ( Ficar em pé: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Muito intensa. ) Muito intensa. ) Muito intensa. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Avaliação pré e pós-operatória de pacientes portadores de osteoartrose de quadril submetidos á artroplastia Abaixar-se para pegar algo: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Andar no plano: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Entrar e sair do carro: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Ir fazer compras: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Colocar meias: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Levanta-se da cama: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Tirar as meias: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Ficar deitado na cama: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Entrar e sair do banho: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Se sentar: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Sentar e levantar do vaso sanitário: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( Fazer tarefas domésticas leves: ( ) Nenhuma. ( ) Pouca ( ) Moderada. ( TOTAL:_______ ANEXO 03 ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. ) Intensa. ( ) Muito intensa. QUESTIONÁRIO DE LEQUESNE DOR OU DESCONFORTO Durante o descanso noturno: ( ) Nenhum ou insignificante. (0) ( ) Somente em movimento ou em certas posições. (1) ( ) Mesmo sem movimentos. (2) Rigidez matinal ou dor que diminui após se levantar: ( ) 1 minuto ou menos. (0) ( ) Mais de 1 minuto porem menos de 15 minutos. (1) ( ) Mais de 15 minutos. (2) Depois de andar por 30 minutos: (0-1) Enquanto anda. ( )Nenhuma. (0) ( ) Somente depois de andar alguma distancia. (1) ( ) Logo depois de começar a andar aumenta se continuar a andar. (2) ( ) Depois de começar a andar, não aumentando. (1) Ao ficar sentado por muito tempo (2 horas). (0-1) MÁXIMA DISTÂNCIA CAMINHADA/ANDADA (PODE CAMINHAR COM DOR) ( )Sem limite. (0) ( )Mais de 1 km, porem com alguma dificuldade. (1) ( )Aproximadamente 1 km (em + ou_ 15 minutos). (2) ( ) De 500 a 900 metros (aprox.. 8 a 15 minutos). (3) ( ) De 300 a 500 metros. (4) ( ) De 100 a 300 metros..(5) Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 71 72 ( ) Menos de 100 metros. (6) ( ) Com uma bengala ou muleta. (1) ( ) Com 2 muletas ou 2 bengalas. (2) ATIVIDADES DO DIA-A-DIA/VIDA DIÁRIA ( ) Colocar as meias inclinando-se para frente. (0-2) ( ) Pegar um objeto no chão. (0-2) ( ) Subir e descer um andar de escadas. (0-2) ( ) Pode entrar e sair de um carro. (0-2) Sem dificuldade: 0 Com pouca dificuldade: 0,5 Com dificuldade:1 Com muita dificuldade: 1,5 Incapaz:2 Soma da pontuação: Extremamamente grave: igual ou maior que 14 pontos Muito grave: 11 a 13 pontos. Grave: 8 a 10 pontos. Moderada: 5 a 7 pontos. Pouco acometimento: 1 a 4 pontos. TOTAL:_______ Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 73 Disciplina de Educação Ambiental? Cássio Murilo Monteiro1 [email protected] RESUMO Muito se tem escrito e falado sobre os grandes problemas da humanidade, causados pela superpopulação e por prejuízos advindos de uma era industrial muito desenvolvida, mas cada indivíduo tem uma visão diferente do que acontece com o ambiente. Este artigo se propôs a estudar a “educação ambiental na escola. Constatou-se que educação ambiental na escola é hoje o instrumento muito eficaz para se conseguir criar e aplicar formas sustentáveis de interação sociedade-natureza. Este é o caminho para que cada indivíduo mude de hábitos e assuma novas atitudes que levem à diminuição da degradação ambiental, promovam a melhoria da qualidade de vida e reduzam a pressão sobre os recursos ambientais. Palavras-chave Educação Ambiental; Degradação ambiental; Interdisciplinaridade. ABSTRACT Much has been written and said about the big problems of humanity, caused by overpopulation and arising losses from a developed industrial era, but each individual has a different view of what happens to the environment. This article proposed to study the “environmental education at school”. It was found that nowadays the environmental education at school is very effective tool to be able to create and apply sustainable forms of society and nature interaction. This is the way for each one changes they habits and take new attitudes to decreased environmental degradation , promote improvements in the quality of life and reduce the pressure on environmental resources. 1. INTRODUÇÃO Este artigo tem como temática a Educação Ambiental na escola e sua conscientização. A escola educa e por sua vez também é responsável pela sociedade. A educação ambiental é uma forma abarcante de educação, através de um processo pedagógico participativo que procura infiltrar no aluno uma consciência crítica sobre os problemas do ambiente. É indiscutível a necessidade de conservação e defesa do meio ambiente. Para tanto, os indivíduos precisam ser 1 Cássio Murilo Monteiro. Mestrado em Educação pelo Centro Universitário Moura Lacerda. Docente do curso de Administração do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 74 Disciplina de educação ambiental? conscientizados e, para que esta tomada de consciência se alastre entre presentes e futuras gerações, é importante que se trabalhe a educação ambiental dentro e fora da escola, incluindo projetos e conteúdos que envolvam os alunos e todas as disciplinas. A humanidade evoluiu. A população humana cresceu. A natureza já não tem mais pontos de referência na sociedade atual. As pessoas são arrastadas pelas novas tecnologias e cenários urbanos, e existe pouco da relação natural que havia com a cultura da terra. Para que a situação não piore, é preciso agir, proteger o ambiente. Uma das formas que pode ser utilizada para o estudo dos problemas relacionados ao meio ambiente é através de uma disciplina específica a ser introduzida nos currículos das Escolas, podendo assim alcançar a mudança de comportamento de um grande número de alunos, tornando-os influentes na defesa do meio ambiente para que se tornem ecologicamente equilibrados e saudáveis. Porém, estes projetos precisam ter uma proposta de aplicação, tratando de um tema específico de interesse dos alunos, e não longe da proposta pedagógica da escola. A ação direta do professor na sala de aula é uma das formas de levar a Educação Ambiental à comunidade, pois um dos elementos fundamentais no processo de conscientização da sociedade dos problemas ambientais é o educador. 2. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL Conforme VARINE (2000), “a natureza é um grande patrimônio da sociedade. Conseqüentemente, a Educação Ambiental se torna uma prática social, com a preocupação da preservação dessa sua riqueza”. Para o autor, se o meio ambiente está sendo atacado, agredido, violentado, devendo-se isso ao veloz crescimento da população humana, que provoca decadência de sua qualidade e de sua capacidade para sustentar a vida, não basta apenas denunciar os estragos feitos pelo homem na natureza, é necessário um processo educativo, com atitudes pró-ambientais e sociais. De acordo com a Lei 9.795/99: Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (LEI 9.795, 1999, art. 1º). A Humanidade irmana-se perante o universo, então deve lutar unida e sensível à conservação do meio ambiente. Para BRANDÃO (1995), “a sensibilidade traz esperanças de novas relações com afetos de responsabilidade para com o presente e o futuro, não só das gerações humanas, mas de outras gerações de seres vivos”. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Disciplina de educação ambiental? 75 3. EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO DISCIPLINA A Educação Ambiental como disciplina, além de ser um processo educacional das questões ambientais, alcança também os problemas socioeconômicos, políticos, culturais e históricos pela interação de uma forma ou de outra destes campos com o meio ambiente. Sua aplicação tem a extensão de auxiliar na formação da cidadania, de maneira que extrapola o aprendizado tradicional, fomentando o crescimento do cidadão e conseqüentemente da Nação, daí a sua importância. Pela sua plenitude e abrangência, a Educação Ambiental como disciplina incrementa a participação comunitária, conscientizando todos os participantes, professores, alunos e a comunidade estudada, ante a interação necessária para o seu desenvolvimento. A natureza já não tem mais pontos de referência na sociedade atual. As pessoas são arrastadas pelas novas tecnologias e cenários urbanos, e existe pouco da relação natural que havia com a cultura da terra. Para que a situação não piore, é preciso agir, proteger o ambiente. Certamente, a aprendizagem será mais eficaz se a atividade envolver as situações da vida real, do meio em que vivem os alunos, sempre com o objetivo de demonstrar que, se bem aproveitados e preservados, os recursos do meio ambiente só trazem benefícios para todos. Uma das formas que pode ser utilizada para o estudo dos problemas do meio ambiente é através de uma disciplina específica, podendo alcançar a mudança de comportamento de inúmeros alunos, tornando-os influentes na defesa do meio ambiente para que se tornem ecologicamente equilibrados e saudáveis. Porém, essa disciplina precisa ter uma proposta de aplicação, tratando de temas específicos de interesse dos alunos, e não dissociada da proposta pedagógica da escola. A Educação Ambiental é um processo educacional criado ao longo dos anos através de estudos de especialistas, com visão das necessidades do homem e da natureza entrelaçadas em um objetivo comum que é a manutenção da qualidade de vida de todos os seres do planeta. Em vista da existência de problemas ambientais em quase todas as regiões do país, torna-se importantíssimo o desenvolvimento e implantação de programas educacionais ambientais, os quais são de suma importância na tentativa de se reverter ou minimizar os danos ambientais (DIAS, 2006) A lei 9.795/99, em seu art. 10, § 1o diz que “A educação ambiental não deve ser implantada como disciplina específica no currículo de ensino”. Porém, a educação é sempre mais efetiva se começada pela criança. A mente humana em formação é mais receptiva aos ensinamentos, razão da importância de um livro didático e os conceitos que ele descortina aos seus leitores e da importância do professor bem formado, passando mensagens irrepreensivelmente corretas. Juridicamente, no Brasil, o parágrafo 1º, VI, do art. 255 da Constituição Federal, determina ao Poder Público a promoção da Educação Ambiental em todos os níveis de ensino. Mas, apesar desta previsão constitucional, bem como o fato da Educação Ambiental já ser reconhecida mundialmente como ciência educacional e também recomendada pela UNESCO e a Agenda 21, pouco foi Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 76 Disciplina de educação ambiental? feito no Brasil para a sua implantação concreta no ensino. O que existia era fruto dos esforços de alguns abnegados professores e educadores, não havendo a atenção que merece o tema pelo Poder Público e as entidades particulares de ensino. Porém, com a publicação da Lei 9.795, de 27/4/99, que dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências, a questão tomou força, pois a implantação e aplicação da Educação Ambiental como disciplina passou a ser obrigatória. A citada lei define juridicamente Educação Ambiental como “o processo por meio do qual o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade” (art.1º). O surgimento e desenvolvimento da Educação Ambiental como método de ensino está diretamente relacionado ao movimento ambientalista, pois é fruto da conscientização da problemática ambiental. A ecologia, como ciência global, trouxe a preocupação com os problemas ambientais, surgindo a necessidade de se educar no sentido de preservar o meio ambiente. Na questão da educação ambiental para crianças, segundo PORTUGAL (1997), existem três vertentes de opiniões visando afirmar as melhores formas de se proceder essa educação, no caso específico voltada aos alunos do primeiro grau. A primeira vertente defende que deve haver uma disciplina específica para tratar do assunto, a ser incluída no currículo escolar, tal qual a Matemática, o Português etc. Há, nesta vertente, aqueles que defendem extensões diferenciadas nos assuntos e no tempo de duração da disciplina. A segunda vertente defende que a educação ambiental deva fazer parte do conteúdo programático da disciplina de Ciências. Já a terceira vertente defende que a educação ambiental deva ser passada aos alunos sem pré estabelecimentos de disciplinas e de professores específicos, isto é, a educação ambiental deve ser ministrada por todos os professores indistintamente, de forma natural e em doses homeopáticas, encaixando o assunto, onde puder caber em suas disciplinas, no desenrolar das aulas, como pílulas de informações. Para PORTUGAL (1997), a desvantagem na adoção do critério defendido pela primeira vertente é que uma disciplina fixada num espaço-tempo poderá acarretar esquecimento, os ensinamentos transmitidos, e a educação ambiental é algo para ser reciclada. A desvantagem na adoção do critério defendido pela segunda vertente é a exclusividade que se daria ao professor de Ciências de ensinar, ao seu modo, as ciências ambientais tão multifacetadas, além do que a educação viria como uma obrigação, podendo levar alguns alunos a se desgostarem do assunto para o resto da vida. A desvantagem na adoção do critério defendido pela terceira vertente (disciplina livre) é que muitos professores rejeitariam intimamente a idéia ou não iriam se esforçar para buscar encaixes apropriados dos tópicos das ciências ambientais em suas disciplinas. A própria Lei 9.795/99, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, diz que a Educação Ambiental “deve estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal” (art. 2º). Cabe às instituições educativas, portanto, “promover a educação ambiental de maneira integrada aos programas educacionais que deRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Disciplina de educação ambiental? 77 senvolvem” (Lei 9.795/99, art. 3º). Conforme FREIRE (1975), muito se discute em torno de uma melhor definição para a introdução da dimensão ambiental na educação escolar. Propõem-se objetivos, princípios, estratégias e recomendações acerca do desenvolvimento da Educação Ambiental, considerando aspectos sociais, culturais, históricos e políticos que conduzem à destruição do meio ambiente em que vivemos e fazemos parte. A educação, sendo trabalhada a partir da realidade concreta dos alunos envolvidos, viabiliza e resgata a dimensão contextualizada dos conteúdos, pois os alunos são desafiados a superarem situações cotidianas problematizadas ao se perceberem como ser do mundo e como mundo, uma vez que “só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, como mundo e com os outros” (p. 93). A Carta da Terra (2000, princípio 14) indica que se deve “integrar na educação formal e aprendizagem ao longo da vida, os conhecimentos, valores e habilidades necessárias para um modo de vida sustentável”, oferecendo a todos, especialmente crianças e jovens, oportunidades educativas que possibilitem contribuir ativamente para o desenvolvimento sustentável. Se trabalhadas em uma disciplina específica, ações educativas junto aos alunos, sobre os problemas ambientais, podem representar além de uma conscientização, uma multiplicação de informações a respeito do tema, onde as próprias crianças envolvidas podem agir como multiplicadores. Ao divulgar os resultados do último Censo Escolar, o INEP deu destaque ao fato de que 65% das escolas de ensino fundamental inseriram a questão ambiental em suas práticas pedagógicas. Cumprem sua obrigação, já que se trata de um dos temas transversais ao currículo obrigatório. [...] No entanto, sabemos que, devido à precariedade da infra-estrutura de nossos estabelecimentos, torna-se difícil para os professores abordar a questão de maneira adequada e com conhecimento de causa. Por isso temos que aplaudir aquelas escolas que se empenham em formar cidadãos e futuros profissionais segundo a ótica do desenvolvimento sustentável. É pouco e os poderes públicos precisam não só fornecer mais recursos humanos e financeiros a fim de que essas ações sejam multiplicadas, mas avaliar sua eficácia (MARANHÃO, 2005). A ação direta do professor na sala de aula é uma das formas de levar a Educação Ambiental à comunidade, pois um dos elementos fundamentais no processo de conscientização da sociedade dos problemas ambientais é o educador, porque este pode buscar desenvolver, em seus alunos, hábitos e atitudes sadias de conservação ambiental e respeito à natureza, transformando-os em cidadãos conscientes e comprometidos com o futuro do país. Através da Educação Ambiental na escola, os alunos podem entender, por exemplo, que produtos químicos consomem o ozônio e são ameaças presentes e futuras à camada que protege a Terra dos raios ultravioleta. Essa preocupação ambiental também é de extrema importância para toda a sociedade, que pode buscar alternativas que não comprometam ainda mais a saúde do planeta. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 78 Disciplina de educação ambiental? O disposto no art. 225 da Constituição Federal Brasileira deve ser cumprido, onde diz, em poucas palavras, que o meio ambiente sadio é um direito de todos. 4. PROBLEMAS AMBIENTAIS De acordo com MARANHÃO (2005), a natureza desconhece as fronteiras que criamos e afirma: As conseqüências de sua destruição atingem todas as nações e é preciso que todas assumam o compromisso de combater o problema em seus territórios. Entretanto, após séculos de agressão, uso e abuso dos recursos naturais, não vem sendo fácil convencer os indivíduos (e seus governos) de que são apenas partes de um sistema com o qual devem viver em harmonia,sob pena de sofrerem os efeitos que tornarão sua estadia no planeta cada vez mais penosa: entre eles o aquecimento global, gerado pela concentração dos gases de efeito estufa na atmosfera, acompanhado por mudanças violentas nos fenômenos climáticos; a escassez de água; a desertificação que torna os solos estéreis a atividades agrícolas (p. 7). Segundo o autor, no Brasil, tiveram-se algumas vitórias com a promulgação da Lei 9.795/97, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, e da Lei de Crimes Ambientais (13/02/98). Lei que, infelizmente, não é cumprida com a severidade requerida. Um exemplo está na Amazônia, cuja área desmatada, segundo o Fundo Mundial para a Natureza, cresceu 44% na década de 90 (15% só entre 1999 e 2000). A extração de 80% da madeira da floresta é ilegal. Já o tráfico de animais chegou ao terceiro lugar no ranking das atividades criminosas mais lucrativas do país, depois do tráfico de armas e de drogas: 12 milhões de animais são capturados todos os anos (MARANHÃO, 2005). Ainda conforme MARANHÃO (2005), nos problemas ambientais tem-se, ainda, a desertificação, que atinge 55% do semi-árido do Nordeste e é causada pela exploração inadequada do solo. Apenas 3% da água da Terra são próprios para consumo. O Brasil possui 8% deste tesouro na bacia amazônica e em lençóis freáticos que, no entanto, são ininterruptamente contaminados pelo lixo: 63% do lixo brasileiro vão parar em cursos de água doce devido à coleta ineficiente. Os dramas que hoje a natureza enfrenta foram causados por gerações e gerações que desconheciam o delicado equilíbrio homem/ambiente e construíram um modelo de desenvolvimento predatório. A solução está em preparar as novas gerações para um modelo de desenvolvimento alternativo. Segundo BATESON (1987), foi com a Revolução Industrial que o homem começou realmente a transformar a face do planeta, a natureza de sua atmosfera e a qualidade de sua água. O impacto da espécie humana sobre o meio ambiente tem sido comparado, por alguns cientistas, às grandes catástrofes do passado geológico da Terra. A humanidade deve reconhecer que agredir o meio ambiente põe em perigo a sobrevivência de sua própria espécie. É a vida que está em jogo. Com o rápido crescimento da população, criou-se uma demanda Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Disciplina de educação ambiental? 79 sem precedentes, que o desenvolvimento tecnológico pretende satisfazer, submetendo o meio ambiente a uma agressão que está provocando o declínio cada vez mais acelerado de sua qualidade e de sua capacidade para sustentar a vida. O autor revela que um dos impactos que o uso de combustíveis fósseis tem produzido sobre o meio ambiente terrestre é o aumento da concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, dando lugar a um aumento da temperatura global da Terra. Outros males importantes causados pelo ser humano ao meio ambiente são o uso de agrotóxicos que contaminam regiões agrícolas e interferem no metabolismo do cálcio das aves; a erosão do solo; o crescente problema mundial do abastecimento de água, como conseqüência do esgotamento dos aqüíferos subterrâneos, assim como pela queda na qualidade e disponibilidade da água e a destruição da camada de ozônio. Portanto, hoje os problemas vividos no mundo são, realmente, em decorrência da intervenção humana no planeta e nos ecossistemas. A título de exemplo, o autor cita: destruição da biodiversidade ou a extinção de espécies; destruição progressiva da camada de ozônio por gases; efeito estufa ou aquecimento global; crescimento da população mundial; poluição e indisponibilidade de água potável. A questão do lixo é das mais preocupantes e diz respeito a cada ser humano. Abordar a problemática da produção e destinação do lixo no processo de educação é um desafio, cuja solução passa pela compreensão do indivíduo como parte atuante no meio em que vive. Atualmente a luta pela preservação do meio ambiente, e a própria sobrevivência do homem no planeta, está diretamente relacionada com a questão do lixo urbano. A sociedade de consumo em que vivemos tem como hábito extrair da natureza a matéria-prima e, depois de utilizada, descartá-la em lixões, caracterizando uma relação depredatória com o seu habitat. Assim, grande quantidade de produtos recicláveis que poderiam ser reaproveitados a partir dos resíduos, é inutilizada na sua forma de destino final. Isso implica em uma grande perda ambiental, devido ao potencial altamente poluidor do mau gerenciamento dos resíduos gerados, comprometendo a qualidade do ar, solo e, principalmente as águas superficiais e subterrâneas, além do desperdício de recursos, especialmente os não recicláveis, inviabilizando sua obtenção no futuro (AZEVEDO, 1996). Segundo OLIVEIRA (1973), a problemática do lixo vem sendo agravada, entre outros fatores, pelo acentuado crescimento demográfico, especialmente nos centros urbanos, resultantes do êxodo rural e da falta de um planejamento familiar. O conhecimento do problema passou a incluir no seu universo de análise, preocupações, por exemplo, com a velocidade do processo de produção de resíduos sólidos nas cidades e com os fatores que influenciam esse processo que é superior à velocidade natural dos processos de degradação. A questão dos resíduos sólidos, no meio urbano, representa impactos ambientais relevantes que afetam e degradam a qualidade de vida urbana. No entanto, conforme CORREA (2001), procura-se desenvolver atitudes Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 80 Disciplina de educação ambiental? e ações de conservação e preservação do ambiente natural, na comunidade, demonstrando que a utilização de práticas de proteção ao meio ambiente resulta no proveito próprio e comunitário, ajudando a desenvolver uma postura social e política preocupada e comprometida com a questão da vida na Terra. Assim, fica mais fácil reconhecer os prejuízos e benefícios que causa o lixo acumulado na saúde pública e a importância da redução, da reutilização e da reciclagem do lixo para a natureza. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS No presente artigo, defende-se a disciplina específica (Ensinos Fundamental e Médio) por entender-se que recebendo as informações na escola, com professor capacitado e comprometido somente em preparar ações educativas sobre os problemas ambientais, os alunos terão mais oportunidades para desenvolver hábitos de defesa e conservação do meio ambiente. Não descuidando do processo interdisciplinar que muitas vezes o conteúdo de Educação ambiental necessita. A ação do professor é fundamental, porque é ele quem vai proporcionar aos alunos as condições necessárias à mudança de comportamento que se espera deles para que se tornem cidadãos conscientes da importância das suas atitudes em relação à preservação da natureza e de atuarem como multiplicadores no ambiente em que vivem. O fato de uma escola manter uma disciplina específica não quer dizer que a educação ambiental será desenvolvida apenas dentro da disciplina, pois, como diz na sua definição, ela é um processo e, portanto, deve ser trabalhada por todos, em todas as etapas do desenvolvimento do ser humano. Essa é uma realidade trazida pela preocupação com os problemas ambientais que, devido à sua gravidade não podem mais ser ignorados. Ao longo das últimas décadas, as pressões sobre o ambiente global tornaram-se auto-evidentes, fazendo erguer uma voz comum pelo desenvolvimento sustentável. Essa estratégia requer um novo enquadramento mental e novo conjunto de valores. A educação é essencial à promoção de tais valores e para aumentar a capacidade das pessoas de enfrentar as questões ambientais e de desenvolvimento. A educação em todos os níveis, especialmente a educação universitária para a formação de gestores e professores, deve ser orientada para o desenvolvimento sustentável e para forjar atitudes, padrões de capacidade e comportamentos ambientalmente conscientes, tal como um sentido de responsabilidade ética. A Educação Ambiental é hoje o instrumento mais eficaz para se conseguir criar e aplicar formas sustentáveis de interação sociedade-natureza. Este é o caminho para que cada indivíduo mude de hábitos e assuma novas atitudes que levem à diminuição da degradação ambiental, promovam a melhoria da qualidade de vida e reduzam a pressão sobre os recursos ambientais. Estudando na escola, os alunos estarão recebendo os conteúdos de uma maneira ampla, baseados em promover a sensibilização do educando e do educador, visando a compreensão dos componentes e dos mecanismos que regem o sistema natural; com conhecimentos científicos e tecnológicos, bem como as qualidades morais necessárias, que permitam o desempenho de um papel efetivo na preparação e manejo de processos de desenvolvimento, que sejam compatíRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Disciplina de educação ambiental? 81 veis com a preservação dos processos produtivos e estéticos do meio ambiente; e se capacitando a avaliar e agir efetivamente no sistema, atuando na construção de uma nova realidade desejada. A Educação Ambiental torna-se um caminho para um ensino novo em que o intuitivo é somado ao racional e a criatividade é estimulada para aumentar a auto-estima. Somente quando as pessoas despertam para o seu valor individual podem passar a acreditar em seu potencial transformador. Valores como respeito, solidariedade, empatia e muitos outros passam a fazer parte desse novo pensar. Amplia-se o valor à vida, não só humana, mas de todos os seres. Esse senso de reverência à vida pode estimular o entusiasmo de se assumir responsabilidades novas. A Educação Ambiental torna-se chave na medida em que cada um desperte seu potencial de contribuir para um mundo mais ético e sua responsabilidade de se engajar em processos que visem a um bem maior que priorize o respeito à vida. Nesse sentido, a defesa do meio ambiente, é fundamentalmente uma defesa da qualidade de vida, da sobrevivência da humanidade. 6. REFERÊNCIAS A Carta da Terra. Última versão em português. Um programa da UNESCO. Maio 2000. Disponível em <boasaude.uol.com.br/lib/ShowDoc> Acesso em: 13 out. 2005. AZEVEDO, Cleide Jussara Cardoso de. Concepção e prática da população em relação ao lixo domiciliar na área central da cidade de Uruguaiana- RS. Uruguaiana, PUCRS- Campus II. Monografia de pós-graduação. Educação ambiental. 1996, 68p. BATESON, G. Natureza e espírito. Lisboa: Dom Quixote, 1987. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. “Outros afetos, outros olhares, outras idéias, outras relações”. A Questão Ambiental: Cenários de Pesquisa. Textos NEPAM, Campinas: Ed. da UNICAMP, n. 3, p.13-34, 1995. BRASIL. Lei 9.795, de 27 de abril de 1999. Institui a Política Nacional de Educação Ambiental. Brasília: Diário Oficial da União, 28 de abril de 1999. ______. Lei n. 9.795, de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a Educação Ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, 1999. CORREA, Saionara Escobar de Oliveira. O conhecimento da problemática ambiental do lixo na visão dos alunos de 5a a 8a séries em escolas municipais de Itaqui-RS. Monografia de pós-graduação. Educação. Uruguaiana: PUCRSCampus II, 2001. 54p. DIAS, Genebaldo F. Educação ambiental: princípios e práticas. Gaia/Global, 2006. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975. MARANHÃO, Magno de Aguiar. Educação ambiental: a única saída. Mai. 2005. Disponível em: <www.magnomaranhao.pro.br> Acesso em: 11 nov. 2006. OLIVEIRA, Walter Engracia de. Resíduos sólidos e limpeza urbana. São Paulo: USP/ MEC, 1973. PORTUGAL, Gil. Educação ambiental desde a base. Mar. 1997. Disponível em: <www.gpca.com.br/Gil/art24.html> Acesso em 20 maio 2013. VARINE, Hugues de. O Ecomuseu. Ciências e Letras, n. 27, p. 61-90, 2000. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 82 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 83 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar Felipe Vittig Ghiraldelli1 [email protected] RESUMO O artigo em apreço tem por objetivo geral apresentar diretrizes doutrinárias acerca do cumprimento do mandado de prisão em situações que ensejam a invasão domiciliar para realizar a efetiva captura de quem possui em seu desfavor o título judicial de determinação de cárcere. A regra apresentada pelo direito é que a casa é asilo inviolável, porém, isto não quer dizer que ela seja refúgio para prática ilícita ou local para se ocultar da justiça, o Estado titular da persecução penal, através do Poder Judiciário pode em determinadas situações emitir mandados de prisão que devem ser cumpridos por oficiais de justiça e policiais que utilizam todos os recursos humanos e logísticos colocados a sua disposição. Para adentrar ao domicílio os agentes públicos podem se valer instrumento de medida acautelatória de provas denominado mandado de busca e apreensão que é emitido por autoridade judiciária. O Código de Processo Penal apresenta de forma determinada as hipóteses que justificam o mandado de busca e apreensão e dentre eles encontra-se a possibilidade de prender pessoas. Entretanto, ocorre divergência doutrinária sobre a necessidade ou não da duplicidade de mandados para que ocorra a prisão de indivíduos homiziados no interior da sua própria residência ou de terceiros. O que se apresenta neste artigo são diretrizes doutrinárias sobre a necessidade ou não dos respectivos mandados. Palavras-chave Mandado de prisão; Mandado de busca e apreensão; Violação domiciliar. ABSTRACT This article in question has an objective to introduce the doutrine guidelines around fulfillment of arrest warrant in position that refer home invasion to accomplish the apprehension of who possess in its disfavor the juridicual title of determination of prison. The law showed by right is that the home is inviolable asylum, but, this does not mean that it can not be refuge of unlawful practises or a place to hide from justice, the State holder of prosecution through the Judiciary can determinate the position of issue arrest warrants that must be fullfilled by officers of justice using all human and logistic resources placed at your disposal. To enter to the home public officials can take advantage cautionary measuring instrument evidences called search warrant and seizure which is issued 1 Felipe Vittig Ghiraldelli. Especialização em Direito Penal, Processo Penal pela Escola Superior Verbo Jurídico. Docente do curso de Direito do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 84 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar by judicial authority The Criminal Procedure Code provides a certain way the assumptions that justify the warrant of search and seizure and among them is the ability to arrest people. Therefore, there is doctrinal disagreement regarding whether or not the warrants duplication to occur hidden in their own homes or outsider’s homes. What is presented in this article are doctrinal guidelines on whether or not the respective warrants. 1. INTRODUÇÃO Em linhas gerais devemos afirmar que existe uma contraposição ao direito de liberdade que se denomina: “prisão”, situações que não podem coexistir no mesmo lapso temporal e pessoal, ou seja, ou o indivíduo encontra-se preso ou encontra-se solto. A regra no nosso ordenamento jurídico e na maioria dos Estados soberanos é a liberdade dos cidadãos. A nossa lei suprema apresenta de forma inquestionável este direito como regra, e consequentemente, também, apresenta possibilidades de cerceamento da liberdade o que pode ser aferido com a leitura da Constituição Federal2. Na lei pátria, isto quer dizer que em casos extremos e desde que indivíduos estejam em conflito com normas específicas do ordenamento jurídico poderá ser aplicada a prisão para tutelar o processo ou a prisão como forma de pena. Aquela com regras mais rigorosas quanto aos pressupostos e hipóteses de admissibilidade, diferentemente desta denominada prisão pena que somente existirá se houver o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e se não puder ser substituída por pena restritiva de direitos ou pela eventual suspensão condicional da pena. Cabe ressaltar que quanto as modalidades de prisão provisória a doutrina admite a prisão preventiva e a temporária, e por outro lado há divergência quanto a prisão em flagrante, que após a reforma da lei 12.403/11 passou a ser considerada como prisão precautelar de acordo com muitos doutrinadores dentre eles Aury Lopes Júnior, Luiz Flávio Gomes, Renato Brasileiro, Nestor Távora, Rosmar Rodrigues Alencar dentre outros, em contraponto ao entendimento de Fernando da Costa Tourinho Filho que entende que a prisão em flagrante ainda possui natureza cautelar. Independentemente da corrente adotada como teoria apontada para definição da natureza jurídica, sabe-se que esta encontra limites constitucionais e legais bem delineados pela Constituição Federal3 e pelo Código de Processo Penal4. De acordo com Paulo Rangel, podemos entender a prisão em flagrante no sentido jurídico: Como o delito no momento do seu cometimento, no instante em que o sujeito percorre os elementos objetivos (descritivos e normativos) e subjetivos do tipo penal. É o 2 Art. 5º, LXVI da Constituição Federal: ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. 3 Art. 5º, LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei. 4 Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar 85 delito patente, visível, irrecusável do ponto de vista de sua ocorrência. A prisão em flagrante delito dá-se no momento em que o indivíduo é surpreendido no cometimento da infração penal, sendo ela tentada ou consumada (RANGEL,2014, p.771-772). O mesmo autor com brilhantismo ainda apresenta dois elementos essenciais, o primeiro seria imprescindível como a atualidade e visibilidade, aquela é expressa pela própria situação flagrancial, é algo que está acontecendo ou acabou de acontecer e esta é a ocorrência externa ao ato, é a situação de alguém atestar a ocorrência do fato ligando-o ao sujeito que o pratica. Portanto, somada a atualidade e a visibilidade, tem-se o flagrante delito (RANGEL,2014, p. 771). A prisão em flagrante não precisa de mandado para seu respectivo cumprimento e pode ser executada de forma facultativa por qualquer pessoa do povo ou de forma obrigatória pelos agentes policiais de acordo com o artigo 301 do Código de Processo Penal. Não há dúvidas que as prisões podem ser livremente executadas quando houver a devida justificativa amparada no ordenamento jurídico, mas, muitas vezes, aqueles que devem ser presos não encontram-se em locais públicos acessíveis a qualquer pessoa, em muitos casos estes indivíduos estão acobertados pelo manto de locais que em regra são invioláveis, como o próprio domicílio ou aquele de terceira pessoa, é neste momento que ocorre conflito entre a possibilidade ou não de se realizar a devida prisão, a Constituição Federal apresentou formas permissivas de violabilidade domiciliar, enfrentando inclusive a hipótese da prisão em flagrante, nos termos do art. 5º, XI: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”; Apesar do esforço da Assembleia Constituinte não ocorreu a devida delineação quanto a prisão que é cumprida através de mandado expedido por autoridade judiciária competente, na situação em que o “procurado pela justiça” encontra-se no interior da sua residência, afirmando tão somente que pode haver ingresso na residência durante o dia por autorização judicial. Vamos delinear no momento oportuno que esta autorização judicial refere-se ao popularmente conhecido mandado de busca e apreensão que pode ser utilizada para prender pessoas, buscar objetos e etc... Mas, será que uma autorização genérica pode ser utilizada para cercear a liberdade de indivíduos, sem que seja observado um mandado específico de busca e apreensão designando o domicílio a ser violado? Pode ocorrer que em determinados casos as autoridades policiais e seus agentes estejam cumprindo mandado de busca e apreensão para localização de objetos ilícitos e durante a realização das averiguações se depararem com um individuo foragido da justiça no interior da residência, seria possível a sua captura? Não é objetivo deste artigo cientifico aprofundar estudos sobre as prisões processuais ou penais, cabe neste momento, apenas delinear as situações que permitem o cumprimento do mandado de prisão e como este deve ser cumprido no caso de ser necessário adentrar em alguma residência ou local equiparado. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 86 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar 2. APONTAMENTOS SOBRE A FINALIDADE E REQUISITOS DO MANDADO DE PRISÃO O mandado de prisão é instrumento que materializa a ordem de prisão escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente (LIMA,2014, p.111). Cabe fazer a seguinte observação, a autoridade que pode emitir o título denominado mandado de prisão é única e somente a autoridade judicial que possui competência para o ato, autoridade policial não pode emitir mandados de prisão, pode apenas cumpri-los por exercer função de polícia judiciária. Por ser medida necessária para cerceamento da liberdade em hipóteses diversas da prisão em flagrante, o artigo 285 do Código de Processo Penal apresenta formalidades indispensáveis para que ocorra o devido cumprimento, como: a) lavratura pelo escrivão e assinatura da autoridade competente, é verdadeiro pressuposto de validade que determina sua autenticidade; b) designação da pessoa que deve ser presa por nome, alcunha ou sinais característicos, esta deve ser feita de forma clara e precisa, porém, muitas vezes não há possibilidade da autoridade judiciária dispor do nome e outros dados específicos, por este motivo ocorre permissivo legal para a prisão com a descrição de alcunha ou apelido e sinais característicos como a estatura e peculiaridades como cicatrizes e tatuagens; c) mencionar a infração penal que motivar a prisão; d) se for possível a fiança de acordo com o crime imputado, este valor deve estar descrito, permitindo que o indivíduo não permaneça no cárcere nas hipóteses permissivas da liberdade provisória com fiança, cabe ressaltar que em regra os crimes são afiançáveis, só não será admitida fiança nos crimes descritos no artigo 323 e 324 do Código de Processo Penal, aquele reproduz mandado constitucional descrito nos artigos 5º XLII, XLIII, XLIV da Constituição Federal e este hipóteses especiais aos que quebraram a fiança, prisão civil e militar; e) direcionamento a quem deve cumprir é feita ao oficial de justiça, autoridade policial ou seus agentes, somente estas autoridades podem cumprir mandado de prisão, em regra, o mandado é cumprido pelos agentes policiais. Guilherme de Souza Nucci apresenta outros dados utilizados na praxe: f) colocação da Comarca, Vara e Ofício de onde é originário; g)número do processo e/ou do inquérito, onde foi proferida a decisão decretando a prisão; h) nome da vítima do crime; i) teor da decisão que deu origem à ordem de prisão (preventiva, temporária, sentença condenatória); data da decisão; k) data do transito em julgado e pena aplicada (prisão-pena); l) prazo da validade do mandado, que equivale ao lapso prescricional. (NUCCI,2013, p.625). Em observância ao artigo 5º, LXIV da Constituição Federal, que determina o conhecimento do executor da prisão ao preso, o Código de Processo Penal5 balizou a aplicabilidade deste dispositivo constitucional. 5 Art. 286 do Código de Processo Penal: O mandado será passado em duplicata, e o executor entregará ao preso, logo depois da prisão, um dos exemplares com declaração do dia, hora e lugar da diligência. Da entrega deverá o preso passar recibo no outro exemplar; se recusar, não souber ou não puder escrever, o fato será mencionado em declaração, assinada por duas testemunhas. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar 87 O preso tem direito a obter uma cópia do mandado de prisão que o submeteu ao cárcere, para que disponha de meios legais para eventuais impugnações, quanto a legalidade da medida ou autoridade que tenha emitido e cumprido o título judicial, que poderá ser expedido em quantas cópias forem necessárias, inclusive para diversas localidades diferentes. Importante modificação legislativa da lei 12.403/11 ocorreu com a inserção do art. 289-A no Código de Processo Penal que determina inserção dos dados relativos ao mandado de prisão no banco de dados do Conselho Nacional de Justiça. É uma forma de se ter acesso utilizando sistemas virtuais ligados a rede mundial de computadores, faz com que seja ultrapassado os limites físicos da informação, expandido o acesso de dados através de computadores, celulares e similares. Não há dúvida foi um avanço para se aferir de forma eficaz a validade do mandado e para que autoridades de qualquer localidade tivessem acesso aos registros de pessoas que encontram-se com mandado de prisão válidos. O Banco Nacional de Mandados de Prisão pode ser acessado por qualquer pessoa através do sitio da internet: “http://www.cnj.jus.br/sistemas/sistema-carcerario-e-execucao-penal/banco-nacional-de-mandados-de-prisao-bnmp”. Apesar da descrição das formalidades do título de mandado de prisão, cabe ressaltar que a captura pode ser realizada sem a exibição imediata do mandado, ou até mesmo, da apresentação virtual do mandado consultado em sistema digital, ressalta-se que o preso terá direito constitucional a obter uma cópia o mais breve possível. Esta forma de cumprimento pode ser utilizada para os mandados de prisão relativos aos crimes afiançáveis e inafiançáveis, Renato Brasileiro de Lima apresenta a seguinte lição sobre o tema: O novo art. 299 do CPP não restringiu sua aplicação às infrações inafiançáveis, daí porque também pode ser aplicado aos crimes afiançáveis. Diante dessa nova redação do art. 299 do CPP, autorizando a captura sem exibição imediata do mandado de prisão, independentemente da natureza da infração penal (afiançável ou inafiançável), forçoso é concluir que o art. 287 do CPP foi objeto de revogação parcial tácita, devendo doravante ser lido nos seguintes termos: “A falta de exibição do mandado não obstará a prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado”. Evidentemente, na hipótese de infração afiançável, uma vez efetuada a captura e recolhido valor da fiança, deverão agente ser colocado em liberdade provisória. (LIMA,2014, p. 113). No entanto, esta regra não pode ser utilizada para o cometimento de arbitrariedade ou abusos, devendo ser utilizada única e exclusivamente para o bem da coletividade atendendo a supremacia do interesse público para fazer cumprir a lei e evitar que indivíduos que apresentam fundamentada determinação de prisão emanada por autoridade competente não possam circular livremente como cidadãos que não possuem nenhuma “dívida com a justiça”. O magistério de Eugênio Pacelli enfatiza que é necessário e requisito constitucional a apresentação do mandado de prisão, sob pena de eventual nulidade que será aferida no caso concreto e desde que exista ilegalidade na atuação da autoridade: Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 88 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar Dizia (e diz, porquanto não revogado expressamente) o art. 287, CPP, que, tratando-se de crime inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará a prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado. Reputamos encontrar-se tacitamente revogado semelhante dispositivo, não só pela exigência constitucional de ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária, mas por manifesta incompatibilidade com todo o sistema de garantias constitutivo do devido processo legal, cuja violação poderá alimentar abusos e atuações contrárias aos direitos por parte das autoridades policiais. A exibição do mandado é para nós, requisito essencial para a prática do ato. Observe-se, porém, que o exame de cada caso concreto poderá, eventualmente, afastar a ilegalidade e a nulidade da atuação, na hipótese em a perseguição for evidentemente pública e notória. (PACELLI, 2014, p. 575) No caso de ser o réu foragido da justiça poderá ser feito a devida prisão sem a exibição imediata do mandado de prisão e sem prévia ordem judicial e ainda sem obrigatoriedade do executor da prisão ser autoridade, há permissivo para o cumprimento de qualquer pessoa nos termos do artigo 684 do Código de Processo Penal. O Código de Processo Penal6 ainda traz a possibilidade do cumprimento do mandado de prisão por precatória no caso do acusado estar fora da jurisdição da autoridade que o expediu, como por exemplo: o individuo que está em jurisdição alheia, independentemente do Estado da Federação, admitindo-se inclusive em casos de urgência qualquer tipo de comunicação desde que hábil para a exequibilidade do instrumento, como, por exemplo, a utilização de e-mail. A autoridade que receber o mandado deve cientificar-se da autenticidade do conteúdo. Lima (2014, p.119) Apresenta a seguinte peculiaridade: Se houver mandado de prisão, a apresentação à autoridade policial do local é tida como válida, comunicando-se a autoridade judiciária local em seguida. Caso não se tenha o mandado em mãos (art. 299), o preso deve ser apresentado à autoridade judiciária local, a fim de que esta certifique a origem da ordem, conseguindo a cópia do mandado e/ou telegrama como motivo da prisão de modo a verificar a legalidade da prisão. Ainda sobre o tema cabe ressaltar que ocorre verdadeiro acordo de cooperação onde o magistrado deprecante requer ao magistrado que atua no local onde o ato deve ser cumprido que faça acontecer à diligência de prisão, não há impedimento legal para que o magistrado federal depreque ao estadual à realização da medida, neste sentido as lições de Alencar e Távora (2014, p. 706-107). Assim que efetivada a prisão fora da comarca do juiz processante, este deve providenciar a remoção do preso que encontra-se acautelado dentro do pra6 Art. 289. Quando o acusado estiver no território nacional, fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. (...) § 1o Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como o valor da fiança se arbitrada. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar 89 zo máximo de trinta dias nos termos do Código de Processo Penal7. Para exemplificar, determinado acusado está respondendo pelo crime de roubo qualificado na cidade de Guaxupé/MG e contra este existe um mandado de prisão em aberto expedido pelo juiz da vara criminal desta cidade, durante operação de policial de rotina este individuo é abordado na cidade de Salvador/BA e verifica-se em desfavor dele mandado de prisão, imediatamente os agentes policiais conduzem o preso para a vara criminal da cidade de Salvador/BA, neste momento o magistrado local, verifica-se a autenticidade do mandado e encaminha o individuo ao cárcere e imediatamente comunica a autoridade judicial de Guaxupé/MG. Em decorrência deste fato abstratamente criado cabe a esta autoridade utilizar todas as providências possíveis para a remoção do preso para sua comarca. Não podemos esquecer que as autoridades cumpridoras do mandado de prisão devem priorizar o cumprimento desta sem a utilização de nenhum tipo de força ou algemas, a verbalização é a regra e deve ser priorizada com a atitude e postura de respeito a legalidade restringindo-se apenas a fazer cumprir a ordem judicial minimizando qualquer trauma em relação a prisão. O Código de Processo Penal Militar8 expressa a excepcionalidade do uso da força de forma bem delineada, afirmando que esta só é indispensável no caso de desobediência, resistência ou caso de fuga. Lima (2014, p. 118) afirma que o Código de Processo Penal9 define de forma precisa o momento em que o capturando por mandado deve ser tido como preso, que é aquele pelo qual o executor apresenta-se ao réu e o intima para acompanha-lo é a partir deste momento que pode ocorrer outros crimes a depender da conduta deste. Com a ajuda pertinente dos ensinamentos de balizada doutrina penal escrita por Rogério Greco, faz-se necessários apontamentos sobre crimes que podem ser praticados contra a autoridade que tenta ou executa a ordem de prisão advinda de mandado. Caso o preso resista utilizando violência ou ameaça contra o executor ou eventual auxiliar ocorrerá o crime de Resistência10, que consuma-se com a simples oposição à execução do ato legal, valendo-se o agente do emprego de violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou quem lhe esteja prestando auxílio (GRECO, 2011, p.483); Pode ocorrer a intervenção de terceiro que facilita ou promove a fuga do capturando assim ocorrerá o crime de Fuga de pessoa presa ou submetida a medida de segurança11, consumando-se quando o preso efetivamente fugir (GRECO, 2011, p.638); situação semelhante ocorre quando o terceiro pretende arrebatar o preso para maltratá-lo ocasionando o crime de arrebatamento de preso12, este delito se consuma com o efetivo arrebatamento, ou seja, com a retirada do preso do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda, independentemente do fato de ter o agente conseguido maltratá-lo, uma vez que se cuida de um crime formal (GRECO, 2011, p.648); Por fim se o preso tente ou consiga evadir utilizando violência ou grave 7 Art. 289, § 3o O juiz processante deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida. 8 Art. 234. O emprego de força só é permitido quando indispensável, no caso de desobediência, resistência ou tentativa de fuga. Se houver resistência da parte de terceiros, poderão ser usados os meios necessários para vencê-la ou para defesa do executor e auxiliares seus, inclusive a prisão do ofensor. De tudo se lavrará auto subscrito pelo executor e por duas testemunhas. 9 Art. 291. A prisão em virtude de mandado entender-se-á feita desde que o executor, fazendo-se conhecer do réu, Ihe apresente o mandado e o intime a acompanhá-lo. 10 Art. 329 - Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio. 11 Art. 351 - Promover ou facilitar a fuga de pessoa legalmente presa ou submetida a medida de segurança detentiva. 12 Art. 353 - Arrebatar preso, a fim de maltratá-lo, do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 90 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar ameaça contra a pessoa ocorrerá o crime de evasão mediante violência contra a pessoa13, o fato somente passa a ter relevo para o direito penal quando, para fugir, o agente utiliza violência contra a pessoa (GRECO, p. 643), todos os crimes estão previstos no Código Penal. Dúvidas podem ocorrer em relação à diferença dos crimes de Resistência e Evasão mediante violência contra a pessoa, Rogério Sanches Cunha apresenta em sua obra este questionamento e traz os seguinte apontamentos: “Para Hungria, o recolhimento do custodiado a estabelecimento próprio deve ser encarado como pressuposto necessário. Sem a clausura, haveria crime de resistência (art. 329 do CP)”. (HUNGRIA, 1959 apud CUNHA, 2014, p. 904). O autor rebate as observações do saudoso Nelson Hungria com os seguintes argumentos: A uma, porque, como já vimos, para a caracterização do delito de resistência (art. 329 do CP) há que se observar que os atos de violência ou ameaça devem ser usados para resistir o cumprimento da ordem (durante sua execução). Se empregados antes ou após, estaremos diante de outro crime (arts. 129, 147 ou 352, todos do CP). A duas, porque na situação de tr ansporte do preso, por exemplo, além do ato desenvolvido pela autoridade estar em curso, estará o detido submetido à sua custódia, sendo perfeitamente possível sua evasão mediante a prática de violência, configurando-se, pois, o crime de evasão violenta (art. 352 do CP). (CUNHA, 2014, p. 904). O debate na esfera do direito material é pertinente tanto para o meio acadêmico como para a o cotidiano dos agentes encarregados da aplicação da lei, pois, muitas vezes as fugas ocorrem com a utilização de violência contra as autoridades que cumprem seu mister funcional. Sobre a utilização de algemas é oportuno lembrar que estas apenas poderão ser utilizadas de forma excepcional e quando realmente houver risco de fuga ou perigo a integridade física própria ou alheia, por parte de terceira pessoa ou do próprio preso e caso ocorra esta excepcionalidade esta deve ser justificada por escrito, sob pena responsabilidade civil, administrativa e penal da autoridade e eventual nulidade da prisão a que se refere, estes elementos podem ser aferidos da Súmula Vinculante n. 11, ressalta-se que anteriormente a Súmula já havia dispositivo com tratativa semelhante no Código de Processo Penal Militar14. 3. APONTAMENTOS SOBRE O MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO Legalmente o procedimento de busca e apreensão encontra-se catalogado no Título VII e Capítulo XI do Código de Processo Penal que trata Das provas e de forma específica Da Busca e Apreensão. O primeiro elemento a ser tra13 Art. 352 - Evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoa. 14 Art. 234, §1º O emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão da parte do preso, e de modo algum será permitido, nos presos a que se refere o art. 242. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar 91 tado é o conceito que reflete a distinção entre as expressões busca e apreensão, que são muito bem delineadas por Aury Lopes Júnior: Não se pode deixar de lado que a apreensão (decorra ela da busca ou não) pode ainda atender a interesse assecuratório, ou seja, indisponibilizar o bem para posteriormente ser restituído. São institutos diversos, mas que foram tratados de forma unificada. Nem sempre a busca gera a apreensão (pois pode ocorrer que nada seja encontrado) e nem sempre a apreensão decorre da busca (pode haver a entrega voluntária do bem). (LOPES JR, 2013, p.708-709). Assunto tormentoso na doutrina é a natureza jurídica desta medida, é oportuno apresentar a compilação realizada pelos membros do Ministério Público Paulista que atestam a variedade desta natureza: a) meio de prova: quando a localização de coisa ou pessoa em determinado lugar ou em poder de alguém faz prova do fato criminoso ou de circunstâncias, tal como ocorre na hipótese de apreensão da arma do crime na posse do investigado; b) meio de obtenção de prova: na hipótese em que a diligência, por si, não permite formar convicção acerca do fato probando, mas propicia o encontro de elemento útil a demonstração da infração; c) meio de assegurar direito: acaso o objeto da diligência relacione-se ao interesse reparatório do ofendido, como a busca por bens passíveis de arresto. (REIS e GONÇALVES, 2013, p. 312). A restrição domiciliar pode ser relativizada pelo consentimento válido do morador; por circunstância de flagrante delito ou desastre para prestar socorro e por fim por determinação judicial, desde que durante o período diurno, considerado o compreendido entre às 06:00h às 18:00h, neste sentido Alencar e Távora (2014, p. 602); Outros, Marcão (2014, p. 574) e Rangel (2014, p.162) fazem analogia ao Código de Processo Civil e afirmam que o período deve ser entre às 06:00h às 20:00h; Cabe ressaltar que diversos doutrinadores entendem o critério físico-astronômico seria o mais adequado afirmando que o dia pode ser compreendido do alvorecer ao anoitecer Nucci (2013 p. 421) e finalmente aqueles que entendem como o melhor critério a conciliação dos apresentados anteriormente como Moraes (2008, p. 56). Não há dúvidas de que existe um conflito de direitos, por um lado o direito da intimidade e vida privada que encontra-se na circunscrição domiciliar e por outro lado o direito do Estado de tutelar o interesse da sociedade na efetiva persecução criminal para buscar e eventualmente apreender/ prender, pessoas, objetos ilícitos ou aqueles que constituam meio de prova de crimes cometidos por pessoas que utilizam o domicílio para se ocultar ou esconder estes objetos, o Código de Processo Penal15 apresenta um rol com os elementos que podem sofrer eventual 15 Art. 240. A busca será domiciliar ou pessoal. § 1o Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para: a) prender criminosos; b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos; c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos; d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso; e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu; f) apreender cartas, abertas ou Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 92 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar busca. Em decorrência da importância do assunto e da devida ponderação entre os valores suscitados a Constituição Federal apresentou regras a serem observadas pelas autoridades que cumpram o mandado de busca e apreensão. Ocorre mesma tratativa entre o mandado de prisão e o mandado de busca e apreensão em relação a clausula de reserva jurisdicional podendo ser determinado única e exclusivamente por autoridade judiciária, jamais por qualquer autoridade administrativa, como policial, ou membros do Ministério Público. Alerta-se sobre a revogação tácita do dispositivo do Código de Processo Penal16 que prevê a possibilidade da medida ser realizada por autoridade policial sem mandado judicial por nítida afronta a Constituição Federal. Será abordado o procedimento do cumprimento do mandado de busca e apreensão de forma contundente valendo-se da preciosa lição dos professores Alencar e Távora (2014, p. 603-604): I- A diligência é executada por oficiais de justiça ou policiais (civis, federais, rodoviários federais ou militares), pode ser cumprida diretamente pelo Juiz, porém, não é recomendado sob pena de ferir a sua imparcialidade; II- Antes de adentrarem na residência, os executores mostrarão e lerão o mandado ao morador, ou representante, intimando-o na sequencia a abrir a porta, nesse caso não seja cumprido será arrombada a porta e forçada a entrada e possível enquadramento no delito de Desobediência daquele que se recusou; III- Pode haver o emprego da força contra objetos e coisas para vencer a resistência para o cumprimento do mandado; IV- Caso o morador não esteja presente à diligência será realizada na presença de testemunhas e poderá ser utilizada a força para desobstruir obstáculos; V- Descoberta a pessoa ou a coisa procurada, esta será imediatamente aprendida e ficará sob a custódia da autoridade e seus agentes, se tratar de infratores, devem ser encaminhados ao estabelecimento prisional; VI- encerra-se a diligência com a lavratura pormenorizada do auto circunstanciado, assinado pelos executores e duas testemunhas presenciais. 4. MANDADO DE PRISÃO E O CONFLITO COM O DIREITO DE INVIOLABILIDADE DOMICILIAR Os capítulos apresentados anteriormente apresentaram diretrizes relacionadas ao cumprimento de mandado de prisão e mandado de busca e apreensão, porém, faço o alerta sobre o que expressa dois dispositivos de forma bem específica no próprio Código de Processo Penal de um lado está o artigo 240, §1º, “a” com a seguinte redação: “A busca será domiciliar ou pessoal. § 1o Procederse-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para: a) prender criminosos. Esta regra é complementada pela redação do artigo 243, §1º do Código de Processo Penal: “O mandado de busca deverá: § 1o Se houver ordem de prisão, constará do próprio texto do mandado de busca”. Verifica-se que caso exista necessidade de ser realizada a prisão por mandado de qualquer pessoa que esteja protegida por seu domicílio haverá necessidade de consta-la no mannão, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato; g) apreender pessoas vítimas de crimes; h) colher qualquer elemento de convicção. 16 Art. 241: Quando a própria autoridade policial ou judiciária não a realizar pessoalmente, a busca domiciliar deverá ser precedida da expedição de mandado. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar 93 dado de busca. Diferente é a redação do artigo 293 do Código de Processo Penal afirmando que: Se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu entrou ou se encontra em alguma casa, o morador será intimado a entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não for obedecido imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão. Esta hipótese não fala em mandado de busca específico, apresenta apenas a solução que deve ser tomada pela autoridade quando houver necessidade de cumprir o mandado de prisão de pessoa que se alberga em domicílio, sem especificar que é necessário qualquer mandado de busca, ou seja, basta o mando de prisão e as cautelas apresentadas. As autoridades encarregadas de executar o mandado de prisão deparam-se constantemente com foragidos que percebem a perseguição das autoridades e ocultam-se em casa própria ou alheia acobertando-se pelo manto da restrição domiciliar. Em decorrência deste fato, aventa-se três possibilidades distintas que serão abordadas com as seguintes considerações: 1) Se o foragido estiver na própria casa durante o dia ou se perceber que o executor está em seu encalço e resolver adentrar na própria residência: A autoridade deve utilizar boas maneiras e solicitar que o foragido se apresente para que possa ser realizada a respectiva prisão, caso exista recalcitrância, o executor tomará as medidas necessárias para cercar a casa de modo a impedir eventual fuga. Sendo a noite não será possível adentrar a residência, cabe apenas aguardar o inicio do período diurno e logo que possível o executor munido do competente mandado convocará duas testemunhas e desobstruirá qualquer obstáculo utilizando a força necessária para se chegar ao capturando e assim concluir a diligência com êxito. Neste caso a doutrina diverge quanto a necessidade da simples apresentação do mandado de prisão, como o artigo 293 prescreve ou se é necessário apresentar em conjunto o mandado de prisão e o mandado específico nos termos dos artigos 243,§1º e 240, §1º. Alencar e Távora, 2014, p.600-601, afirmam que quando for necessário mandado de busca para prender criminosos se faz necessário à expedição de documento separado. Em seguida concluem de forma enfática, rechaçando a possibilidade de se descartar o mandado específico: “não bastaria a mera ordem prisional para que o domicílio pudesse ser invadido” ainda em crítica discorrem: “o mandado de prisão acabaria se transformando em algo vago, impreciso, sendo um cheque em branco autorizando o ingresso em qualquer domicílio, na suposição de que o infrator lá esteja homiziado”. Oportunamente e de forma contundente o professor Tourinho Filho, (2007, p. 720) manifesta-se sobre o cumprimento desta eventual prisão da seguinte forma: Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 94 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar Há entendimento de que o simples mandado de prisão é o quantum satis para que os executores possam adentrar o domicílio, pressupondo ele “a autorização judicial para a entrada na casa durante o dia” (apud Mirabete, Código de Processo Interpretado, cit., 4.ed., Atlas, p. 342). Sem embargo, como o mandado de prisão não contém essa autorização, que é específica, somos de parecer deva ela ser expedida também. Do contrário a entrada é ilegal, configura crime de violação a domicílio e ainda sujeita o executor às penas do art. 4º da Lei n. 4.898/65 Com todo respeito ao brilhantismo do magistério de Tourinho, data vênia, não seria possível entender que o executor do mandado seria responsável pelo crime de abuso de autoridade, pois, os executores possuem determinação judicial em mãos para cumprir ordem legal emanada de autoridade competente a interpretação de necessidade ou não da duplicidade de mandado afasta a interpretação que eventualmente os agentes estejam atuando de forma deliberada com a intenção de cometer o crime de abuso de autoridade, portanto o fato é atípico. Cabe ressaltar que o mandado de prisão autoriza apenas a efetivação da captura. Caso este se esconda em sua residência: “sua captura não mais poderá ser efetuada sem mandado judicial de busca específico, que deverá trazer expressa autorização para a entrada no domicílio (LIMA,2014, p. 114)” Pacelli, 2014, p. 574, estabelece parâmetros a serem observados para o efetivo cumprimento do mandado de prisão e diz que a prisão, por e com mandado judicial, somente poderá ser realizada durante o dia, isto é, até às 18 horas. À noite, o executor deve guardar todas às saídas do local, e, tão logo amanheça o dia, o que se pode considerar a partir das 6 horas, arrombar as portas da casa, na presença de duas testemunhas, se, intimado o morador (seja ele ou não a pessoa a ser aprisionada), este não autorizar o seu ingresso. De forma semelhante Reis e Gonçalves (2013, p.400) afirmam as mesmas cautelas já mencionadas por Pacelli e respectiva efetuação da prisão. Os doutrinadores em nenhum momento sugerem exigência da apresentação de mandado de busca específico. Por outro lado Nucci, 2013, p. 632, afirma que: “Não há necessidade de autorização judicial (mandado de busca) para o arrombamento das portas e ingresso forçado no ambiente, que guarda o procurado, pois, o mando de prisão e a própria lei dão legitimidade a tal atitude”. A opinião do doutrinador ajusta-se de forma acertada aos anseios dos executores que se deparam com esta situação e não dispõe de tempo hábil para solicitar autorização judicial, sob pena, de frustrar a diligência e o efetivo cumprimento da lei. 2) Pode ser que o foragido adentre a residência de terceira pessoa com consentimento desta, neste caso o debate relativo ao cumprimento do mandado de prisão se aplica de forma integral quanto a possibilidade de cumprimento durante o dia ou noite e eventual uso da força, pois, o morador será intimado a apresentar o procurado e neste caso poderá haver a recusa, porém, se entregar àquele que adentrou em seu domicílio as autoRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar 95 ridades estas não poderão tomar nenhuma providência em seu desfavor. Nos casos de perseguição para cumprimento do mandado de prisão: “adentrando o perseguido numa residência, dele ou de terceiro, em sendo dia, o mandado deve conter respectivamente a autorização para ingresso domiciliar, como já ressaltado anteriormente. Caso contrário, a omissão deve ser suprida pela autoridade judicial para efetivação da invasão” (ALENCAR e TAVORA, 2014, p. 706). Em casos de recusa encontramos alguns pontos a serem abordados, enfrentando a problemática de forma persuasória Lopes Junior, 2013, p.713, na sua obra aborda a finalidade de busca domiciliar e dentre elas está à hipótese de prender criminosos, afirmando que: “trata-se aqui de buscar, não para apreender, mas sim para prender pessoas cuja prisão tenha sido previamente decretada. O mando de prisão, por si só, não autoriza o ingresso na casa de terceiros onde eventualmente o agente se esconda, sendo necessária a duplicidade de mandados (de prisão e busca)”. O nobre advogado e doutrinador apresenta ponto de vista a fim de ajustar os ditames dos dispositivos do Código de Processo Penal assegurando de forma garantista o respeito à violabilidade domiciliar, ao tratar da casa de terceiros. Se a autoridade possuir em mãos o mandado de prisão e o de busca específica, o morador recusar-se a entregar o capturando este deverá ser conduzido e apresentado à autoridade policial para ser tomadas as providências previstas no Código de Processo Penal17. Lima, (2014, p.121) apresenta as medidas que serão tomadas pela autoridade contra o morador, se for durante o dia, ao morador deve ser dada voz de prisão em flagrante pelo crime de favorecimento pessoal previsto no Código Penal18, mas se for durante a noite o morador não será preso, pois, se encontra no exercício regular de direito. Perfilham do mesmo entendimento Alencar e Távora (2014, p. 705). 3) Por fim, se o foragido adentrar na residência de terceiro sem o consentimento do morador haverá possibilidade de prisão em flagrante, independentemente de ser durante o dia ou noite, pois a partir do momento que ocorre o ingresso clandestino em casa alheia ou suas dependências sem consentimento de quem de direito ocorre o crime de violação a domicilio previsto no Código Penal19 e o foragido neste caso torna-se autor do delito em situação que permite o flagrante próprio nos termos do Código de Processo Penal20. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste artigo foram abordados direitos constitucionais inerentes a natureza humana como a liberdade e a intimidade domiciliar que não podem ser tratados como direitos absolutos e, portanto, necessitam de relativização devidamente prevista na Constituição Federal e no Código de Processo Penal, pois, o 17 Art. 293, Parágrafo único. O morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa será levado à presença da autoridade, para que se proceda contra ele como for de direito. 18 Art. 348: Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão. 19 Art. 150: Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências. 20 Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 96 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar Estado assegura de forma universal e indiscriminada a segurança de seus administrados e para este ônus é necessário possuir diplomas legais aptos para a execução da persecução criminal. O mandado de prisão é necessário para a efetiva realização da justiça que se faz através do Estado-juiz que por sua vez determina os executores, oficiais de justiça e policiais o seu cumprimento, neste momento os executores são tratados como longa manus do Estado. Para cumprir de forma efetiva esta função essencial, muitas vezes, ocorrerá à necessidade de violação domiciliar permitida pela Constituição e muitas vezes as autoridades que estão em perseguição do foragido da justiça não possuem mandado de busca e apreensão específico para adentrar em determinada residência, pois, nem sempre é possível prever qual a residência que o foragido pretende ingressar, como tratamos anteriormente, caso este ingresse em residência sem o consentimento do morador ocorre hipótese de flagrante delito por crime de violação de domicílio o que autoriza aos executores ingressarem em qualquer lugar e momento utilizando inclusive todo aparato que estiver a sua disposição e efetuar a prisão. Mas, a questão é tormentosa no momento em que há o ingresso do foragido na própria casa ou de terceiro com o consentimento deste, foram apresentadas divergências doutrinárias quanto a necessidade de duplicidade de mandados: um de prisão e outro de busca e apreensão específico. Quanto ao primeiro mandado não há dúvidas que ele seja necessário em qualquer circunstância, como também não há dúvidas que o domicílio só deve ser violado durante o dia e nunca durante a noite, quanto ao segundo mandado entendo que é necessário verificar a situação em concreto. Se os executores estão no encalço de pessoa foragida que encontra-se em via pública e este percebe que está sendo perseguido e busca meios de evadir e adentra a domicílio de alguém que consente com a sua fuga, as autoridades de imediato podem utilizar o mandado de prisão para adentrar ao domicílio e efetuar a prisão do indivíduo sob pena de não ser cumprida esta medida no momento adequado e assim frustrar a diligência, assegurando-se de todos os cuidados e solicitando a entrega do foragido de forma consensual e pacífica, antes de efetivamente entrar no domicílio, utilizando a força apenas se for indispensável. Por outro lado, o ideal é prever antecipadamente o local em que o foragido encontra-se domiciliado ou hospedado e assim de forma estratégica assegurar o devido monitoramento da localidade e mediações utilizando todos recursos tecnológicos possíveis e assim que houver certeza a autoridade policial poderá fazer uma representação para o Magistrado local com fulcro na necessidade de se violar do domicilio para prender pessoa foragida conforme a previsão legal do Código de Processo Penal e consequentemente, com a posse dos dois mandados cumprir a diligência com a devida segurança e eficiência. Assim, somente se for possível e caso ocorram circunstâncias ideais se faz necessário mandado específico em conjunto com mandado de prisão para efetuar a prisão de capturando, o que em muitos casos concretos não será possível, nestes casos se a prisão no interior de domicilio ocorrer apenas com a exibiRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Execução do mandado de prisão nas hipóteses de violação domiciliar 97 ção do mandado de prisão está será considerada válida e legítima, não havendo nenhuma nulidade contra o ato. 6. REFERÊNCIAS CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal Parte Especial. bª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal Parte Especial. 6ª Ed. Niterói/RJ: Impetus, 2011, v 4. LIMA, Renato Brasileiro de. Nova Prisão Cautelar. 3ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014. LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 10ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2013. MARCÃO, Renato. Curso de Processo Penal. 1ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2014. MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 23ª Ed. São Paulo: Atlas, 2008. NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 12ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 18ª Ed. São Paulo: Atlas, 2014. RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 22ª Ed. São Paulo: Atlas, 2014. REIS, Alexandre Cebrian Araújo e GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Processual Penal Esquematizado. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2013. TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 9ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de Processo Penal Comentado. 10ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 98 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 99 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã Juliano Vasconcelos1 [email protected] Nilza Franchi2 [email protected] RESUMO O presente trabalho tem como objetivo discutir a importância e as contribuições da filosofia aos educandos das etapas do Ensino Fundamental e Médio, sobretudo aos jovens e adultos que não tiveram acesso aos estudos no tempo oportuno. Neste intuito, visa a apresentar a possibilidade de uma neorreinserção dos conteúdos filosóficos na educação, bem como seus efeitos. Traz o conceito de Educação de Adultos (EJA), seus amparos legais, destaca conhecimentos sobre os modos de ser do aluno adulto, de agir, como ocorre seu processo de aprendizagem e os conceitos de autoestima. A educação é primordial na vida do indivíduo. Por isso, considera-se que a EJA deixou de ser uma compensação e passou a ser um direito ao longo da existência, efetivando-se como uma educação permanente a serviço do pleno desenvolvimento do educando. Com isto, observa-se que a filosofia possui os instrumentos necessários à desafiante proposta da referida pesquisa por mediação do ato de filosofar. Do mesmo modo, a EJA por meio da filosofia, poderá efetivamente levar o jovem e o adulto a exercer plenamente a cidadania. Palavras-chave Filosofia. Educação de Jovens e Adultos. Cidadania. ABSTRACT The present assignment has as objective to discuss the importance and contributions of philosophy to students of the stages of primary and secondary education especially to the young and adults who have not had acess to studies in a timely manner.To his end, it aims to provide the possibility of a neo-reinsertion of the philosophical content in education as well as their effects. Brings the concept of adult education (EJA), their legal protections, highlights knowledge about models to be the adult learner, to act as their learning process and concepts occurs self-esteem. Education is paramount in one”s life. Therefore, it is considered that the EJA cease to be clearing and became a right over the existence became as a continuing edu1 Juliano Vasconcelos. Discente do curso de Filosofia (Licenciatura) do UNIFEG. 2 Nilza Franchi. Especialista em Metodologia e Didática do Ensino Superior; Especialista em Orientação em Orientação Educacional. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 100 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã cation service to the full development of the learner. Therefore we observe that philosophy has the necessary instruments to challenging proposal of this research by mediation of the act of philosophinzing.Similarly, by EJA philosophy, can effectively lead the yçoung and the aduly to fully exercise their citizenship . 1. INTRODUÇÃO A Educação é o caminho pelo qual o ser humano busca a sua realização ao longo da existência. Por sua vez, a escolarização é um direito previsto por lei, mas muitas vezes não exercido por muitos cidadãos. São jovens e adultos, senhores e senhoras que foram excluídos, privados desse direito em algum momento da sua vida, muitas vezes por motivos alheios à vontade. A Educação de Jovens e Adultos - EJA – visa a oferecer uma nova oportunidade para iniciar ou dar continuidade ao processo de escolarização dos indivíduos que pretendem inserir-se no mercado de trabalho ou ingressar em uma universidade. Assim, esses poderão exercer os seus direitos e cumprir os seus deveres de cidadãos em igualdade com os demais. A problemática do texto gira em torno de como reinserir os conteúdos filosóficos na Educação de Jovens e Adultos, não somente do ponto de vista legal, conceitual, mas procedimental e atitudinal. Mesmo se considerando que a disciplina de Filosofia seja relevante no processo ensino-aprendizagem, essa ainda não recebe suficiente atenção nas outras modalidades de ensino, ou seja, na Educação Infantil e nos Ensinos Fundamental e Médio, sendo que, neste último, tornou-se obrigatória novamente, a partir de 2008, depois de se ausentar por mais de quarenta anos. Pretende-se neste estudo apresentar a modalidade Educação de Jovens e Adultos inserida na Educação Básica, conhecer a importância da Filosofia como disciplina que instiga o ato de pensar e analisar sua aplicação no Ensino Médio, especialmente na modalidade EJA, com vistas a uma aprendizagem consciente. Esta pesquisa bibliográfica se justifica pela necessidade de questionar o pensamento, o ato de ensinar a pensar e o ato de filosofar, mesmo que na idade adulta, pois se acredita que este seja fundamental na formação da consciência cidadã. A revisão de literatura será embasada em autores como Bastos (2003), Chauí (2000), Cotrim (2002), Di Pierro (2005), Lipmam (1990), RCR (2013), dentre outros. Na primeira parte será apresentada a modalidade EJA, sua caracterização, legislação atual e concepção metodológica; na segunda, salientada a disciplina de Filosofia como fator primordial na construção do pensamento reflexivo do jovem e adulto. Será finalizada com a discussão sobre o desafio de se trabalhar os conteúdos filosóficos na EJA em busca da formação da consciência crítica do cidadão. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã 2. CARACTERIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO ATUAL E CONCEPÇÃO METODOLÓGICA DA EJA 101 No currículo escolar nacional de ensino, ao considerar o Referencial Curricular de Rondônia – RCR (2013), a Educação de Jovens e Adultos - EJA - caracteriza-se como uma modalidade inserida na Educação Básica, tendo como fases, o Ensino Fundamental e Médio, respectivamente. Ainda pode ser caracterizada como educação pública para pessoas com experiências diferenciadas de vida e de trabalho. Sendo esta uma modalidade da Educação Básica, garante a jovens e adultos (a partir de 15 anos) o direito à formação na especificidade de seu tempo humano e assegura-lhes a permanência e a continuidade dos estudos ao longo da vida. Assim sendo, a EJA tende a oferecer oportunidade estudantil às pessoas que não ingressaram e até mesmo às que não tenham concluído esses níveis de ensino no tempo oportuno. Ademais, a Educação de Jovens e Adultos busca também preparar as pessoas para que tenham acesso ao mercado de trabalho e possam exercer sua cidadania de modo íntegro. Busca, ainda, proporcionar aos jovens e adultos um aprendizado educacional apropriado, considerando os interesses, as características e a realidade existencial dos educandos. Porém, para que haja um resultado satisfatório nesse processo, deve-se observar que: A EJA orienta-se pelos princípios éticos da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum; princípios políticos dos direitos e deveres da cidadania; do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática; princípios estéticos da sensibilidade, da criatividade e da diversidade de manifestações artísticas e culturais (RCR, 2013, p.13). A Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional, LDB 9.394/96, oferece a garantia de uma Educação Básica aos Jovens e Adultos que desejam usufruir o seu direito de cidadãos ao ocuparem o seu espaço na sociedade. Neste sentido, a legislação explicita Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria. § 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames. § 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si. § 3o A educação de jovens e adultos deverá articular-se, preferencialmente, com a educação profissional, na forma do regulamento. (Incluído pela Lei nº 11.741, de 2008) Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 102 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular. § 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão: I - no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze anos; II - no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos. § 2º Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por meios informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames (BRASIL, LDB 9.394/96, online). Ressalta-se que, no ano de 1997, realizou-se na Alemanha, na cidade de Hamburgo, a V Conferência Internacional de Educação de Adultos – CONFINTEA - com a presença de 170 países, totalizando 1.500 representantes. Nessa conferência foram assumidos compromissos relevantes considerando-se o direito de todos os cidadãos no que concerne à aprendizagem ao longo da vida, concebida para além da escolarização ou da educação formal, incluindo as situações informais de aprendizagem presentes nas sociedades contemporâneas, marcadas pela forte presença da escrita, dos meios de informação e comunicação (DI PIERRO in UNESCO, MEC, RAAAB, 2005, p.17). No tocante à orientação da aprendizagem de adultos, Knowles, em RCR (2013) faz uma alusão à Andragogia (termo ainda não consensual) alegando ser esta a arte ou ciência que faz estudos das melhores práticas; que avalia a experiência como uma fonte rica que leva os adultos a aprender. Há uma motivação maior para que os mesmos sejam conduzidos à aprendizagem, isto é, partindo de suas próprias experiências de vida, bem como suas necessidades e interesses. Deste modo, esse percurso educacional busca compreender o adulto, norteando-o no processo de ensino-aprendizagem (RCR, 2013). Percebe-se que os adultos possuem sensibilidade a estímulos de natureza externa, mas constata-se que são os fatores intrínsecos como, por exemplo, a autoestima, que proporcionam a motivação para que cheguem à devida aprendizagem. O educador Paulo Freire defende que o adulto deve ser ensinado de tal maneira que aprenda a ler a realidade, para então, poder transformá-la (RCR, 2013). Imergida na contemporaneidade, a educação tem passado por diversas transformações no decorrer do tempo, isto é, sofreu mudanças em todos os seus níveis frente a um mundo marcado pelo avanço científico-tecnológico. Por isso, observa-se que: “Nessa perspectiva, a educação é um desafio constante, na qual a luta contra o insucesso escolar, as novas metodologias e técnicas de ensino, a qualificação dos professores, a integração escola- família são requisitos fundamentais no processo de educar para a vida” (RCR, 2013, p.21). No que diz respeito à formação de seres autônomos, Philippe Perrenoud, no RCR (2013), identificou algumas categorias que dão suporte para tal finalidade. Contudo, ele utiliza uma palavra-chave que enfatiza suas categorias; “saRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã 103 ber”. Não se trata aqui de um simples saber, mas daquele que carrega consigo uma diferença transparente em meio à realidade, ou seja, que identifica, avalia, constrói, transforma, analisa e sabe conviver com regras. Assim, parte-se do pressuposto de que o indivíduo terá um maior desenvolvimento de sua criatividade e potencial; capacitando-se para enfrentar a vida em suas mais variadas situações (RCR, 2013). Nesta linha de pensamento, principalmente o educador Paulo Freire contribuiu muito para a Educação de Jovens e Adultos, inspirando os principais programas de alfabetização e educação popular no Brasil. Idealizou uma proposta de educação que visava a explorar os conhecimentos intrínsecos de cada um, ou seja, os conhecimentos e experiências de vida que podem ser fonte de auxílio do professor no processo de alfabetização, principalmente dos adultos (BASTOS et al., 2003). Paulo Freire também criticou o sistema tradicional que utilizava cartilhas como ferramentas centrais da didática para o ensino da leitura e da escrita, pois ele valorizava muito a mediação do professor, o que não acontecia na aplicação do método tradicional. Para Freire, o diálogo deveria ser construído por meio de ideias entre educador e educando, para atingir a educação básica, isto é, a aquisição dos conhecimentos necessários ao exercício da cidadania (BASTOS et al., 2003). “Diferentemente dos moldes da pedagogia conservadora, o ensino da educação de Jovens e Adultos está intimamente ligado a alguns pressupostos da Andragogia de modelos pedagógicos transformadores” (RCR, 2013, p.13). Sendo assim, deve-se considerar o conceito de aprendente – responsável por sua aprendizagem, estabelecendo e delimitando o seu percurso educacional; necessidade do conhecimento – o adulto conhece a necessidade da aquisição do conhecimento; motivação para aprender – motivações externas, trabalho, salário; motivações internas; crescimento, autoestima, reconhecimento, atualização e outras; papel da experiência – experiências bastante diversas e é a partir delas que o adulto se dispõe a participar ou não de algum programa educacional; prontidão para o aprendizado – o adulto tem orientação pragmática, aprende o que decide aprender, seleção de aprendizagem é natural e realista, retenção tende a decrescer quando percebe que o conhecimento não pode ser aplicado imediatamente, experiências de aprendizagem de acordo com unidades temáticas (GIL, 2006). Ao analisar os pressupostos abordados pela Andragogia e compará-los ao modelo transformador de Paulo Freire, verificam-se pontos coincidentes, sendo que o aprendiz é a principal referência. Há, ainda, a teoria desenvolvida pelo psicólogo Vygotsky, o socioconstrutivismo ou sociointeracionismo, em comunhão com a teoria construtivista de Piaget, desenvolvida vinte e cinco anos outrora; ambas defendem a construção da inteligência do homem a partir de sua relação com o meio (BASTOS et al., 2003). Vygotsky “enfatiza que o meio influencia o homem e o homem influencia, forma e transforma o meio” (apud BASTOS et al., 2003, p.6). Portanto, o professor tem que ser um mediador em sua relação com o aluno, auxiliando-o em suas aprendizagens individuais, isto é, o desenvolvimento do sujeito é conRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 104 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã quistado a partir de sua aprendizagem, na zona de desenvolvimento proximal. Piaget “considera que o conhecimento se dá a partir da ação do sujeito sobre a realidade (sendo o sujeito considerado ativo), e que a aprendizagem depende do estágio de desenvolvimento atingido pelo sujeito” (apud BASTOS et al. 2003, p.6). Ao tomar a concepção metodológica de Vygotsky e compará-la à teoria construtivista de Piaget verificam-se pontos comuns. Ambos acreditam que todo aluno traz para a escola um grau de conhecimento adquirido em suas vivências. Enfim, pode-se considerar, por meio dos teóricos abordados, que a EJA possui metodologias diferenciadas, mas a relevância encontra-se no fato de que estas devem adequar-se à realidade existencial do jovem e adulto para que estes possam exercer plenamente a sua cidadania. 3. CONCEITUAÇÃO DA FILOSOFIA E DA IMPORTÂNCIA DO ATO DE FILOSOFAR (PENSAR) O cotidiano apresenta ao ser humano inúmeras evidências e estas o colocam frente a uma gama de afirmações, negações, desejos, aceitações ou recusas de coisas; até mesmo de pessoas e situações. Por isso, o homem se vê cercado por questionamentos que o levam a pensar o próprio pensamento, na ânsia de conhecer a existência de todas as coisas mais de perto. No entanto, as perguntas: “o quê”, “como” e “por quê”, são referências à capacidade de conhecer e de pensar do ser humano (CHAUÍ, 2000). Nesta perspectiva, as indagações e crenças silenciosas fazem parte da vida social e cultural de uma sociedade que vive na busca incessante de respostas imediatas e satisfatórias. Mas a atitude filosófica deve vir em primeira instância, para que a busca do real sentido para a vida seja coerente e promissora. Com vistas a uma compreensão mais elaborada, Chauí assim se expressa sobre a origem da Filosofia, “Os historiadores da Filosofia dizem que ela possui data e local de nascimento: final do século VII e início do século VI antes de Cristo, nas colônias gregas da Ásia Menor [...], na cidade de Mileto. E o primeiro filósofo foi Tales de Mileto” (2000, p.28). Juntamente com Tales de Mileto, filósofos como Anaximandro, Anaxímenes, entre outros, formam o grupo dos pré-socráticos; representantes como primeiros filósofos gregos. Estes foram partícipes do alvorecer da filosofia naquele momento histórico da Grécia Antiga nos séculos aqui aludidos (COTRIM, 2002, p.73-79). Afirma ainda que a filosofia, ao nascer, é também uma cosmologia, palavra formada por dois radicais: cosmos, que significa mundo ordenado e organizado; e logia, que vem de outra palavra chamada logos, que traz como significado pensamento racional, discurso racional, conhecimento. Constata-se, deste modo, que a Filosofia nasce como conhecimento racional da ordem do mundo ou da Natureza, confirmando a cosmologia como o lugar de sua origem (CHAUÍ, 2000). Salienta que a palavra filosofia é de origem grega, composta por radicais, Philo e Sophia. A primeira significa amizade, amor fraterno, enquanto a segunda quer dizer sabedoria, sábio. Conclui-se que filosofia é ser amigo da sabedoria, Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã 105 ter amor e respeito pelo saber. Assim, a pessoa sente uma forte aspiração para se achegar ao conhecimento, emanado de um estado de espírito que ama e deseja o conhecimento (CHAUÍ, 2000). Ainda conforme Chauí, a invenção da palavra Filosofia é atribuída a Pitágoras, filósofo grego que viveu antes de Cristo. Ele teria afirmado que, apesar da sabedoria plena e completa pertencer aos deuses, os homens podem chegar a se tornarem filósofos exercitando o desejo e o amor a tal sabedoria (2000). Em outras palavras, o que seria então Filosofia? Para que serve? No decorrer dos séculos, questões como estas eram tidas por enigmas a serem desvendados e, atualmente, são até desprezadas pela maioria das pessoas. Neste momento, entra em cena a postura filosófica, sendo capaz de instigar a consciência humana. Isto porque se faz necessária a transição da consciência mítica para a racional. Não obstante, como já se pode observar em relação à Filosofia, Aranha e Martins salientam que, O trabalho filosófico é essencialmente teórico. Mas isso não significa que a filosofia esteja à margem do mundo, nem que ela constitua um corpo de doutrina ou um saber acabado, com determinado conteúdo, ou que seja um conjunto de conhecimentos estabelecidos de uma vez por todas (1993, p.85). Ao voltar o olhar para os filósofos que deixaram rastros na história, percebe-se que cada um tem a sua concepção do ato de filosofar. Para Platão a virtude do filósofo parte da admiração. Esta o condiciona para a problematização do objeto em questão, abalizando a Filosofia como busca da verdade e não como sua possuidora. Para Kant, não se aprende Filosofia, mas sim a filosofar. Outro filósofo, Merleau-Ponty, articulou que a verdadeira Filosofia é reaprender a ver o mundo (ARANHA e MARTINS, 1993). Nesta perspectiva, reitera-se que a Filosofia é uma atitude, um pensar permanente, o qual questiona até mesmo o saber instituído. A partir daí, verifica-se que o filósofo tece o seu pensamento com os acontecimentos do cotidiano, revelando que a filosofia se faz presença real na própria história. Por isso, há um paradoxo que movimenta o eixo da filosofia, fazendo com que ela esteja imersa no mundo, mas também se mantém fora. É esta distância que o filósofo deve tomar para que compreenda com mais precisão os problemas existenciais da vida e do mundo em busca de possíveis transformações (ARANHA e MARTINS, 1993). Em relação à exigência filosófica, Cotrim (2002) relata que esta se arraiga na transição do senso comum para o crítico. O primeiro possui opiniões precárias e insatisfatórias. Já o senso crítico mostra um raciocínio coerente, criativo e lógico. Algo inerente à filosofia é que a mesma compreende todas as fases da vida humana, desde a idade infantil à senilidade. Houve divergências entre alguns filósofos com afinidade à questão anterior. Enquanto Cálicles diz que a filosofia é somente para crianças, Platão afirma que é somente para adultos. Mas a relevância encontra-se em Lipman, ao discorrer sobre a filosofia no processo educacional do homem. Nesse intuito ele diz que Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 106 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã [...] há muito se desconfiava que a filosofia, apesar de sua carapaça exterior, carregava dentro de si tesouros pedagógicos de grande generosidade e que esses tesouros poderiam algum dia, seguir o “método Socrático” e dar sua valiosa contribuição para a educação [...] (LIPMAN, 1990, p.19). Ademais, conforme Lipman (1990), a filosofia é uma sobrevivente em meio a tantas turbulências e, com o passar do tempo, acabou permanecendo como uma disciplina acadêmica, com acesso restrito somente aos estudantes ingressos em universidades. Nesse panorama, observa-se que aplicar filosofia é diferente de fazer filosofia. E é exatamente nesta última que se pautava o grande filósofo Sócrates. Este dizia que a filosofia não é uma profissão, mas sim um modo de vida. Contudo, se torna desafiante reconhecer que, como forma de vida, qualquer ser humano pode dedicar-se à filosofia (LIPMAN, 1990). Provavelmente você já deve ter ouvido alguém dizer a expressão “filosofia de vida”. Mas, afinal, o que ela significa? Vejamos: o ser humano em seu itinerário está sempre dando sentido às coisas e neste viés podemos verificar que há um filosofar por detrás dessa ação que o “homem comum” nem se dá conta. No entanto, ele está filosofando de maneira espontânea; ao que chamamos de filosofia de vida (ARANHA E MARTINS, 1993). Ao realizar a análise contextual de vida do homem, depara-se com diferentes filosofias de vida. Neste emaranhado de situações, sabe-se que o ser humano é naturalmente racional, um ser pensante; porque pensar é próprio dele, segundo Gramsci. Por isso, o homem há de tomar variadas decisões, porém, é preciso um reconhecimento de tais decisões. Deste modo, ele deve encontrar-se numa incessante busca para que haja abertura às possibilidades de autoconhecimento (ARANHA E MARTINS, 1993). A partir do exposto, o filósofo e teólogo Buzzi assegura que O exercício de pensar por si mesmo é a arte das artes, porque exige sensibilidade, treino intelectual, disciplina corporal. Na arte de pensar encontramos o real, achegamo-nos ao seu íntimo. Assim voltamos a habitar a terra como árvores vivas da floresta, bem enraizados, no sabor de sua profundidade (1991, p.16). Assim sendo, no próximo momento deste texto, busca-se estabelecer uma intrínseca relação entre os princípios básicos da educação frente a uma filosofia que ofereça condições ao jovem e ao adulto de exercer socialmente os seus direitos e deveres com dignidade. 4. A APLICAÇÃO DOS CONCEITOS FILOSÓFICOS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS É impressionante àquele que num determinado momento da vida para e observa a organização que a natureza demonstra ao mundo e que, não poucas vezes, passa despercebida pelo homem. Por isso, insetos como formigas e abeRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã 107 lhas possuem um comportamento avançado na busca de sobrevivência e ao mesmo tempo vão transformando a natureza à sua volta. Pode-se, assim, comparar esse fato que parece ser insignificante com o processo de educação que, por sua vez, tende a ser útil para o progresso humano (COTRIM e PARISI, 1981). Por que se iniciou esta parte do texto com esse fato? Porque há milhares de anos o homem sempre tem buscado melhores condições para sobreviver. Por isso, desde aquela época ele fazia uso do pensamento, o que fez com que perpetuasse o seu objetivo fundamental, isto é, a sua sobrevivência. Ademais, quando se faz alusão ao ato de ensinar a pensar, de forma específica aos jovens e adultos, pretende-se explicitar que o pensamento humano deva ser desafiado à medida que os problemas surgem, na busca de solucioná-los (RATHS et al., 1977). Neste intuito, vê-se a necessidade de estimular o pensamento dos alunos, isto é, levá-los a perguntar, examinar, analisar, desafiar. Porém, não pode ocorrer o pressuposto de que em todas as circunstâncias é possível ensinar a pensar. A partir desta afirmação, aponta Raths, “é importante reconhecer oportunidades para ensinar a pensar, mas é igualmente importante reconhecer quando ensinar a pensar seria inadequado” (RATHS et al., 1977, p.318). Por conseguinte, constata-se que a filosofia é necessária à vida humana, pois, eis que ela busca outra dimensão da realidade com vistas a uma reflexão consciente e favorável. Sendo assim, com relação à educação, de maneira peculiar na educação escolar dos jovens e adultos, os conceitos filosóficos fundamentam-se numa ação educativa capaz de influenciar na maneira de ser da existência humana. E, ainda, por meio da filosofia cada pessoa deve aprender a filosofar e a compreender que aquela é mais que um saber; é uma atitude diante da vida. Com base no que vimos, salienta-se, brevemente, que o PROEJA (Programa Nacional de Integração da Educação Básica com a Educação Profissional na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos), iniciou-se com o Decreto 5.478, de 24 de junho de 2005, cuja finalidade é a universalização da educação básica de qualidade, tendo em vista ainda que o que gira em torno do PROEJA é a observação do desenvolvimento da cidadania. Em conjunto ao decreto aqui aludido, a Lei de nº 11.684, de 2008, tornou obrigatório o ensino das disciplinas de Filosofia e Sociologia em todas as escolas de Ensino Médio (SANTOS e CHAGAS, 2011). Deste modo, busca-se uma formação humana não somente no âmbito profissional, mas enquanto sujeito ativo que constrói a sua própria vida, mergulhado nas incertezas do mundo. Cidadania é a participação na vida pública de maneira ativa e participativa. A partir desta afirmação, Santos e Chagas esclarecem que a forma pela qual os conteúdos de Filosofia ganham relevo, inseridos na formação de indivíduos, principalmente daqueles que são marcados por trajetórias descontínuas, como no caso dos alunos da EJA, é levar ao desenvolvimento amplo do acesso à cidadania (2011, p. 194). Neste prisma, Cotrim e Fernandes apresentam o papel da Filosofia nas escolas brasileiras por meio da interpretação do artigo 35, da LDB, que estipula as quatro finalidades do ensino médio, a saber: Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 108 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina (apud BRASIL, 1996, p.14). Há uma proposta que visa a uma educação consistente e madura, isto é, que torne possível a estruturação de uma nova filosofia da educação e, que esta realmente possa manter um relacionamento íntegro desde o espaço-escola, passando pelos professores e alunos até chegar a seus conteúdos e métodos bem como recursos mais sofisticados. Não obstante, isto só se tornará realidade quando houver uma adoção efetiva do parecer mencionado anteriormente; tanto por parte dos poderes públicos como também dos educadores e educandos. Inserem-se ainda neste contexto os diversos segmentos sociais (PILETTI; PILETTI, 1988). O Brasil tem enfrentado graves desafios com relação à educação. Por isso, a educação não pode ser vista como um atributo que desempenhe o papel de modelar a personalidade da criança e do jovem ou até mesmo do adulto, levando-se em conta que, atuando assim, seria acomodar-se passivamente e submeter-se à ordem vigente (PILETTI; PILETTI, 1988). Qual seria então o papel fundamental da Educação Básica e, mais especificamente, da EJA? Claudino Piletti e Nelson Piletti respondem a esta questão assegurando que [...] segundo a legislação vigente, é proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades. Se é verdade que tal desenvolvimento deve levar à preparação para o trabalho, é também verdade que deve propiciar a preparação para o exercício consciente da cidadania e a auto-realização (1988, p. 256). Como já aludimos, ao invés de uma modelagem da personalidade, deve-se dar um auxílio ao estudante para que seja capaz de conscientizar-se por si próprio acerca de sua real situação. Sendo assim, o estudante poderá exercer de tal forma a sua autonomia que terá condições, ainda que mínimas, para que haja a transformação da realidade que o cerca. Ademais, para que o pressuposto possa se processar, entram em cena também o desejo de aprender e a curiosidade; os quais, por sua vez, não devem ser impostos ao aluno por meio da escola. Porém, aqueles são, por sua vez, naturais e universais nos seres humanos (PILETTI e PILETTI, 1988). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã 109 No entanto, a partir do momento em que a escola busca descobrir caminhos para a realização desse desejo em conformidade com a curiosidade, “acreditamos que nela os alunos encontrem uma fonte de prazer, de satisfação, de realização pessoal. Se isso não acontece é porque algo deve estar errado” (PILETTI e PILETTI, 1988, p. 257). É notável que o ensino de Filosofia, inserido em qualquer modalidade de ensino, possui uma intrínseca relação com tudo aquilo que diz respeito ao social. A filosofia possibilita uma mudança na sociedade, envolvendo os contextos econômicos, políticos e ideológicos, por proporcionar uma melhor compreensão da transformação social do meio em que os indivíduos marcam presença. Entretanto, nessa circunstância, o aluno é motivado a passar de um estado meramente passivo para o estado do ser ativo, sendo membro integrante de uma sociedade. Considera-se que tal aluno tenha acesso aos valores e crenças em que o próprio docente venha a ministrar. Agindo, assim, “que se estabeleça um contato pleno, em que ele possa contribuir para a construção de uma cidadania eficaz e com os mesmos direitos para todos” (MOTA, 2013, p.21). Atualmente, o ensino de Filosofia tem-se deparado com grandes dificuldades em relação aos alunos da EJA. Uma dentre as várias, e que é considerada de maior grau, aponta para o desenvolvimento de uma metodologia capaz de atender o fato pelo qual essa modalidade de ensino esteja passando. Por isso, é constatada, tanto no aluno quanto no professor, uma deficiência que não poucas vezes acaba defasando a educação e, talvez por este motivo, não chegue a uma autêntica prática social (MOTA, 2013). Nesse sentido, Claudino Piletti e Nelson Piletti afirmam que “o conhecimento é tanto mais eficiente quanto se fizer na prática e levar a uma prática coerente e consciente” (1988, p. 257). Não obstante, se faz necessária uma preparação metodológica, para que ocorra a facilitação da aprendizagem dos conteúdos oferecidos ao alunado da EJA. Apesar disso, é preciso que se crie um plano de ensino que estimule a desenvoltura inerente ao aluno, para que o mesmo, ao assimilar as questões indicadas, possa derrubar os empecilhos contraídos ao longo do processo descontínuo dos estudos (MOTA, 2013). Porque o aluno da EJA tem dificuldades, é preciso que se realize um estudo mais profundo para que haja uma maior compreensão das expectativas do referido alunado. No entanto, Mota levanta um questionamento: Será um desafio para o professor de Filosofia, que leciona na modalidade EJA, fazer com que seu alunado absorva um conteúdo reflexivo, que o estimule não só ao pensamento crítico, mas à formação de sujeitos na consumação de sua cidadania (2013, p. 22). Alicerçado no exposto até o momento, é evidente a importância da Filosofia como auxílio no processo da formação cidadã. Uma vez que se tomarem os artigos 35 e 36 da LDB (Lei 9.394/96) observar-se-á que eles vêm reafirmar esta declaração. A Filosofia ainda tem como intenção a busca de uma totalidade por meio de uma interdisciplinaridade. Mas, por que interdisciplinaridade? Porque deve haver uma interação de outras disciplinas com a Filosofia dentro da grade curricular do Ensino Médio. A partir daí, pode-se proporcionar aos alunos, e de Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 110 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã modo particular aos jovens e adultos, uma formação ampla e com aquisição de conhecimentos pertinentes e eficazes (AMORIM, 2009). Compreende-se que o processo de ensino é infinito, sendo ele um conjunto de ponderações e reflexões que despertam e levam a uma melhor compreensão dos acontecimentos que imergem o ser humano na dinâmica da vida. Logo, esse processo educacional necessita de elementos de influências, tanto de condições internas como externas. Isto implica a mediação do professor ao trabalhar determinado conteúdo ao aluno. A despeito disso, o filósofo existencialista francês Jean Paul Sartre, citado por Amorim, expõe em sua conferência O existencialismo é um humanismo que [...] preparando o aluno para ‘ser humano’ (ser ‘humano’ no estrito sentido antropofilosófico), preparando o aluno a ‘encarar a vida’; a ter a plena consciência de que mesmo ‘excluído’ do sistema, deve buscar meios de sobrevivência. Deve-se preparar o ser humano a ter consciência de sua existência, a ter consciência de suas potencialidades e de que realmente é responsável por suas decisões ao referendar ou não determinado tipo de vida (AMORIM, 2009, p.139). Existe ainda outro ponto de vista para se aplicar o ensino de Filosofia na EJA. De que maneira vem até nós tal exigência? Trata-se de uma relação essencial entre educação, cidadania, somando forças com a democracia. Neste sentido, os alunos da EJA serão motivados a construir suas vidas históricas tanto no âmbito intelectual quanto no social. Por isso, se faz necessário questionar como a educação pode de forma efetiva colaborar na edificação de uma cidadania, bem como de uma democracia; donde o alunado da referida modalidade se torne pessoas suscetíveis à transformação de si e do meio (MOTA, 2013). No assunto aqui explanado, constata-se uma necessária aplicação da cidadania e da democracia, nas aulas de Filosofia na EJA, em forma de temas que façam uma reflexão sobre a realidade. Apesar de haver as diferenças em vários aspectos dentre os homens, se estes estão inseridos numa sociedade onde exista a democracia de maneira efetiva, será possível a igualdade para uma convivência comum de cidadãos. Ademais, é preciso reconhecer a identidade desses jovens e adultos para compreendê-los mais profundamente. Desse modo, Mota afirma que “[...] busca-se, assim, construir práticas reflexivas, partindo para uma ressignificação, para entender essa modalidade e suas práticas pedagógicas no âmbito do ensino de filosofia” (2013, p. 23). Portanto, acreditamos em uma educação melhor para os jovens e adultos, pois a inclusão dos conteúdos filosóficos nessa modalidade poderá viabilizar uma vida mais digna e humana para todos. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Acreditamos ser evidente considerar que existem perspectivas fundamentais para o ensino. Podemos tomar, como exemplo, o desenvolvimento das habilidades do ato de ensinar a pensar, tanto no jovem como o adulto, de maRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Filosofia na EJA: formação da consciência cidadã 111 neira que possa exercer uma leitura de mundo, capaz de atingir outras pessoas. Por isso, além de assumir a perspectiva de pensar, a filosofia traz ainda a arte de vencer a aversão à leitura, bem como da escrita, a partir de reflexões interessantes, buscando-se, assim, um senso crítico e autonomia constante ante a vida. Assim sendo, procuramos realizar alguns apontamentos acerca das possibilidades de se trabalhar a filosofia na educação de jovens e adultos. Porém, compreende-se que apenas trazer indicativos para a escolha de conteúdos apropriados ou elevar um conceito de filosofia e de educação que podem até mesmo orientar o desenvolvimento dos trabalhos é insuficiente. Não obstante, arriscamos demonstrar a necessidade de se pensar o ensino de filosofia além dos modelos do Ensino Fundamental e Médio. Queremos com este trabalho chamar a atenção dos professores, principalmente daqueles que lecionam na modalidade EJA. Apesar desta se encontrar ainda sombria e não ter recebido uma atenção merecida e significativa, não pretendemos limitar o ensino ou prestígio da filosofia na Educação de Jovens e Adultos. Entretanto, aspiramos lançar ideias capazes de transformações nesse horizonte de possibilidades, uma vez que a filosofia é necessária na vida humana. Tendo em vista que, por meio daquele “olhar de estranheza”, a filosofia possibilita outra dimensão da realidade além das necessidades de ordem prática, nas quais o ser humano encontra-se mergulhado. Constata-se que, assim como em todo processo educacional, a EJA tem o compromisso com a formação de cidadãos, haja vista que a educação e a cidadania são direitos fundamentais inerentes à condição humana. Contudo, por meio da formação para a cidadania, os indivíduos podem compreender e exercitar a participação social, comprometidos com os acontecimentos que influenciam seu modo de vida e da sua comunidade. Portanto, além do que delineamos, é perceptível que cada pessoa deve aprender a filosofar, ter o direito de refletir por si próprio. Todavia, a partir do momento em que o indivíduo torna-se capaz de superar a situação dada e repensar o pensamento e as ações que ele mesmo desencadeia, abre-se para a mudança. Assim, pretende-se afirmar que o ensino de Filosofia não deve ter a pretensão de se transmitir conteúdo filosófico, mas sim de, nesta aula, disponibilizar-se um espaço para reflexões que não devem se encerrar quando a aula acaba. Logo, trabalhar a filosofia na EJA suscita a experiência de um pensar permanente, pois, eis que a filosofia é e sempre será uma atitude diante da vida. 6. REFERÊNCIAS ARANHA, Maria Lúcia de A.; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. Revista e atualizada. São Paulo: Moderna, 1993. BASTOS, André Luis de Freitas et al.. Educação de Jovens e Adultos – Uma Abordagem Socioconstrutivista e Interdisciplinar. 1ª etapa. Coleção Nosso Mundo. São Paulo: Didática Paulista, 2003. BRASIL-MEC, Lei nº 9.394, de 20 de Dezembro de 1996, www.mec.gov.br/ 1996. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 18 set. 2014. BUZZI, Arcângelo R. Filosofia para principiantes: A existência humana no mundo. 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Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 113 Impacto da implantação do protocolo assistencial na diminuição de ocorrência de úlceras por pressão em uma unidade de terapia intensiva Maria Helena Silva Macedo1 [email protected] Wanderci Marys Oliveira Abrão2 [email protected] RESUMO As úlceras por pressão representam um grande problema de saúde determinando perda significativa na qualidade de vida nos doentes acometidos e acarretando altos custos com o tratamento e o aumento da morbidade e mortalidade. De acordo com a Literatura internacional a incidência de úlceras por pressão é de 3 a 14% e são as pessoas hospitalizadas as mais acometidas, independente da faixa etária por ser a imobilidade um fator predisponente ao surgimento da lesão. Avaliar o risco para o desenvolvimento de lesões na pele tem sido uma pratica cotidiana da enfermagem aos pacientes internados em UTI. O estudo teve como objetivo descrever a aplicabilidade do protocolo assistencial na prevenção de úlcera por pressão no gerenciamento do cuidado em pacientes internados na unidade de terapia intensiva. Trata-se de um estudo transversal, desenvolvido na UTI da Santa Casa de Misericórdia de Guaxupé, situada no sul do estado de Minas Gerais. Considerando-se como população alvo todos os pacientes internados na UTI no referido período que desenvolveram UPP durante o período de internação. O número de UPP apresenta queda significante, nos anos 2011 e 2012, após a introdução da educação continuada. Implantar protocolo assistencial em UTI é ferramenta fundamental e de impacto no controle de incidência de UPP devendo ser bem articulado para identificar e atender as reais necessidades do paciente, o que exige conhecimento teórico e prático com planejamento de ações direcionadas ao alcance das metas preestabelecidas. Palavras-chave Unidade de terapia intensiva; úlceras por pressão; prevenção de úlceras por pressão. 1 Maria Helena Silva Macedo. Especialização em Gestão de Serviços de Saúde Pública pelo Centro Universitário da Fundação Educacional Guaxupé (UNIFEG). Docente do curso de Enfermagem do UNIFEG. 2 Wanderci Marys Oliveira Abrão. Mestrado em Saúde na Comunidade pela Faculdade Medicina Ribeirão Preto (USP). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 114 Impacto da implantação do protocolo assistencial na diminuição de ocorrência de úlceras por pressão em uma unidade de terapia intensiva ABSTRACT Pressure ulcers represent a major health problem by determining significant loss in quality of life in affected patients and resulting high treatment costs and increased morbidity and mortality. According to the international literature the incidence of pressure ulcers is 3-14% and are the most affected people hospitalized, regardless of age to be immobility a predisposing factor to the onset of the injury. Assess the risk for the development of skin lesions has been an everyday practice of nursing to patient in the ICU. The study aimed to describe the applicability of the protocol in pressure ulcer prevention in care management in patients admitted to the intensive care unit. It is a cross-sectional study, conducted in the ICU of Santa Guaxupé of Mercy House, located in the southern state of Minas Gerais. Considering target population all ICU patients in that period UPP developed during the hospital stay. The number of UPP has significant fall in the years 2011 and 2012, following the introduction of continuing education. Implementing clinical protocol in the ICU is a fundamental tool and impact on the control incidence of UPP must be well articulated to identify and meet the real needs of the patient, which requires theoretical and practical knowledge to plan actions directed to the achievement of pre-established goals . 1. INTRODUÇÃO As úlceras por pressão representam um grande problema de saúde para sociedade na medida em que provocam uma redução significativa na qualidade de vida nos doentes acometidos, pois podem causar dor, desconforto e deformidades acarretando altos custos com o tratamento e o aumento da morbidade e mortalidade. (SILVA 2013). De acordo com a Literatura internacional a incidência de Úlceras por Pressão (UPP) é de 3 a 14% e são as pessoas hospitalizadas as mais acometidas, independente da faixa etária por ser a imobilidade um fator predisponente ao surgimento da lesão (MENEGON ET AL; 2007). Rodrigues et al (2008), aponta que as úlceras por pressão são lesões resultantes de uma pressão contínua na pele,e tecidos moles, principalmente em áreas de proeminências ósseas, por tempo prolongado afetando a integridade e resistência da pele causando área de necrose tissular. Somados á intensidade e duração da pressão, outros determinantes que merecem destaque são os fatores intrínsecos e extrínsecos desencadeadores das lesões como: fricção, cisalhamento, umidade, redução e ou perda da sensibilidade e força muscular e imobilidade. Menegon et al (2007) aborda a importância do trabalho de uma equipe multidisciplinar e destaca o papel dos profissionais da enfermagem que assistem diretamente os pacientes e mostram se essenciais na identificação e prevenção de riscos para lesões e apoio emocional junto aos doentes e familiares. Para Silva et al (2013) Cabe a estes profissionais a responsabilidade da sistematização da assistência de enfermagem baseado em métodos científicos e da educação continuada com elaboração de planos e medidas interventivas para o controle e redução do número de incidência de úlceras por pressão. A UTI é o local destinado ao tratamento de pacientes críticos com alteraRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Impacto da implantação do protocolo assistencial na diminuição de ocorrência de úlceras por pressão em uma unidade de terapia intensiva 115 ções em órgãos vitais, instabilidade hemodinâmica que demanda monitorização continua e realização de procedimentos invasivos e alto índice de dependência relacionado a condição clinica ( Dantas el al 2013). Nesta unidade de terapia intensiva vários fatores de risco como: alterações ou déficits nutricionais, umidade, ventilação mecânica, alterações circulatórias, mobilidade, com aumento da exposição a pressão, idade, sepses, doenças crônicas, bem como período longo de hospitalização predispõe os pacientes a ulcera de pressão ( SERPA et al 2011). A avaliação do risco para o desenvolvimento de lesões na pele tem sido uma prática cotidiana da enfermagem aos pacientes internados em UTI, por estarem em condições mórbidas e propensos ao aparecimento de lesões (MOREIRA et al. 2009). As intervenções de enfermagem relacionadas com a prevenção devem estar interligadas com os fatores de risco e abordar aspectos como: cuidados higiênicos, posicionamento no leito, avaliação nutricional, cuidados com a integridade da pele assim como a sistematização do cuidado com a implementação de protocolos enfatizando a educação em saúde e a uniformidade na prestação da assistência (DANTAS et al. 2013). O estudo tem como objetivo descrever à aplicabilidade do protocolo assistencial na prevenção de úlcera por pressão no gerenciamento do cuidado, em pacientes internados na unidade de terapia intensiva. 2. METODOLOGIA Trata-se de um estudo transversal, desenvolvido na UTI da Santa Casa de Misericórdia de Guaxupé, situada no sul do estado de Minas Gerais. A coleta de dados das hospitalizações realizada a partir do levantamento das notificações em formulário da unidade o qual é composto de identificação do paciente, descrição do evento adverso e da região afetada e grau de intensidade das lesões, ocorridas durante a internação no período compreendido entre os anos de 2011 e 2014, na Santa Casa de Misericórdia de Guaxupé. Considerando-se como população alvo todos os pacientes internados na UTI no referido período que desenvolveram UPP durante o período de internação. Caracterização da unidade de terapia intensiva A Santa Casa de Misericórdia de Guaxupé é um hospital do tipo geral, público, médio porte dispõe de 101 leitos e de natureza filantrópico que atende a microrregião composta por nove municípios, atende diversas especialidades médica, cirúrgica, obstétrica, neonatal e pediátrica, abriga unidade de terapia intensiva para adultos, que possui oito leitos atendendo às clinicas anteriormente citadas. A equipe é formada por equipe médica, cinco enfermeiros, dezesseis técnicos de enfermagem, uma psicóloga, uma assistente social, duas fisioterapeutas e uma nutricionista. Considerações éticas Autorizado o uso dos dados da instituição bem como citar sua razão soRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 116 Impacto da implantação do protocolo assistencial na diminuição de ocorrência de úlceras por pressão em uma unidade de terapia intensiva cial pelo médico coordenador da unidade de terapia intensiva da instituição. 3. RESULTADOS O estudo realizado comparou o índice de ocorrência de úlcera por pressão antes a após a introdução do protocolo de assistência na unidade de terapia intensiva na Santa Casa de Misericórdia de Guaxupé. Gráfico 1 – Número de internações x Úlcera por pressão O gráfico 1 demonstra que o número absoluto de internações é crescente na unidade de terapia intensiva da Santa Casa de Guaxupé, no entanto o numero de UPP apresenta queda significante, nos anos 2011 e 2012 apresentaram cerca de 10% de acometidos, após a introdução da educação continuada cai para 1% de pacientes que desenvolveram UPP. Gráfico 2: Internações por faixa etária. Distribuição número absoluto de internações na UTI da Santa Casa de Guaxupé que desenvolveram UPP por faixa etária no período de 2011 a 2014. A faixa etária mais acometida é de 90 anos, Wada et al. (2010) relata Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Impacto da implantação do protocolo assistencial na diminuição de ocorrência de úlceras por pressão em uma unidade de terapia intensiva 117 que devido ao aumento da expectativa de vida da população , houve também um grande aumento da incidência de úlceras por pressão, porém, diante da evolução técnica científica na área da saúde, é possível detectar os fatores de risco de acordo com o grau de comprometimento da saúde do paciente e tomar medidas preventivas a fim de garantir uma assistência qualificada . Gráfico 3: Internações por patologias na UTI da Santa Casa de Guaxupé. O Gráfico acima demonstra as patologias que mais levaram à internação de pacientes na unidade de terapia intensiva e que desenvolveram UPP, no período de 2011 a 2014. Podemos constatar que a pneumonia é a patologia de maior índice de ocorrência, seguida pelo acidente vascular cerebral e as cardiopatias. 4. DISCUSSÃO Neste estudo procedeu-se à comparação dos índices de úlceras por pressão nas internações da UTI entre os anos de 2011 e 2014, na Santa Casa de Guaxupé, cidade do interior de Minas Gerais. A comparação pretendeu avaliar variantes que ocorreram no período que compreende a fase pré e pós-introdução do protocolo de prevenção de Ulcera por pressão e conscientização da equipe pela educação continuada. Observou-se que no período pós-introdução das ações houve redução de aproximadamente 9%. Em relação à variável idade temos que a faixa etária entre 90 anos e mais são os que mais desenvolvem UPP, conforme o estudo de Rogenski e Kurcgant (2012), pesquisas apontam que até 2030 o índice da população idosa, que é a população mais vulnerável irá crescer gradualmente, requerendo a intervenção de profissionais qualificados para a elaboração e aplicação de métodos de prevenção e promoção à saúde. Para Rodrigues et al (2008) outro determinante que merece destaque são os fatores intrínsecos aqueles inerentes as condições de saúde do próprio indivíduo, e incluem situações locais e sistêmicas de risco para úlceras como: pessoas com presença de morbidades como hipertensão arterial, diabetes, inconsciência, redução e ou perda da sensibilidade e força muscular, imobilidade, incontinência urinária ou fecal, deficiências nutricionais, anemias, índice de massa corporal muito alto ou muito baixo e doenças circulatórias. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 118 Impacto da implantação do protocolo assistencial na diminuição de ocorrência de úlceras por pressão em uma unidade de terapia intensiva A patologia que mais levou a internações nesta unidade é a pneumonia. De acordo com o ministério da saúde pessoas idosas, hospitalizadas, ou que sofrem com algum tipo de doença crônica ou degenerativa são mais susceptíveis ao surgimento ou agravo do problema, devido à longa permanência no leito, como a pneumonia. (BRASIL, 2013) Segundo Wada et al (2010), prevenir este tipo de lesão constitui um desafio para o cuidado de saúde e o estabelecimento das medidas preventivas além de melhorar a qualidade de vida do paciente colabora com a redução de custos para a instituição quanto para os familiares e ao próprio sistema de saúde ,considerando que os gastos com o tratamento das úlceras por pressão são maiores do que os gastos com medidas preventivas em torno do agravo. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A implementação de protocolo assistencial em UTI é ferramenta fundamental e de impacto no controle de incidência de UPP devendo ser bem articulado para identificar e atender as reais necessidades do paciente, o que exige conhecimento teórico e prático com planejamento de ações direcionadas ao alcance das metas pré-estabelecidas. A prevenção de doenças e a promoção da saúde têm sido e deve ser sempre uma busca constante. A enfermagem é uma ciência humana cuja essência é o cuidar, onde as ações são exercidas de forma holística por profissionais que atuam no campo da prevenção, promoção e recuperação da saúde do indivíduo, família e comunidade. 6. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Saúde. Anexo 02: Protocolo para Prevenção de Úlcera por Pressão. Ministério da Saúde/ Anvisa/ Fiocruz. 09/07/2013. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/hotsite/segurancadopaciente/documentos/julho/ PROTOCOLO%20ULCERA%20POR%20PRESS%C3%83O.pdf>. Acesso em: 5 março 2015. DANTAS ALM, et al. 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Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Impacto da implantação do protocolo assistencial na diminuição de ocorrência de úlceras por pressão em uma unidade de terapia intensiva 119 ROGENSKI, Noemi Marisa Brunet; KURCGANT, Paulina. Avaliação da concordância na aplicação da Escala de Braden interobservadores. Acta Paul Enferm. V. 25, n. 1, p. 24-28. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo. php?pid=S0103-21002012000100005&script=sci_arttext>.Acesso em: 10 março 2015. SERPA, Letícia Faria, et al. Validade preditiva da Escala de Braden para o risco de desenvolvimento de úlcera por pressão em pacientes críticos. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 19(1):[08 telas]. jan-fev 2011. www.eerp.usp.br/rlae. Acesso em 02/04/2015. SILVA, Ana Julia et al. Custo econômico do tratamento das úlceras por pressão: uma abordagem teórica. Revista da Escola de Enfermagem da USP, Brasil, v. 47, n. 4, p. 971-976. 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Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 120 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 121 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto Marília Aparecida dos Santos1 [email protected] Daniela Aparecida Salgado Targino2 [email protected] RESUMO O período gestacional implica transformações no cotidiano de uma relação entre homem e mulher, no entanto, concerne a futura mãe a maior parte das responsabilidades deste processo, desde o período gravídico ao nascimento da criança, no entanto, a sociedade atual cobra mudanças no papel do pai, tornando-os participativos em todo o processo relacionado ao nascimento e educação dos filhos. Este estudo objetivou identificar como ocorre na atualidade a participação do pai na atenção ao pré-natal e na sala de parto. Embora haja legislação que possibilita e resguarda o direito participativo do pai no pré-natal e inclusive na sala de parto, ainda não é uma situação que aconteça com frequencia no dia-a-dia da assistência em saúde no período gravídico. Assim, este artigo conclui pela necessidade de difusão da nova realidade de pai e marido que a sociedade requer, e de se estabelecer medidas que visem trazer o pai para perto das questões que consernem sua vida e de sua família com a chegada de um filho ou de mais filhos. Palavras-chave Acolhimento; Enfermagem; Pré-Natal; Parto; Paternidade. ABSTRACT This article aims to identify as occurs at present, the participation of the father in prenatal care and birthing room. The method of research is the literature review. Although there is legislation that enables and safeguards the right of the father in the prenatal and participatory inclusive in the delivery room, it’s not a situation that happens frequently in day-to-day health care during pregnancy. For historical and cultural factors, neither the man nor the woman are not yet educated to this insertion, not even the medical class demonstrates the preparation necessary for the of the father in the current context. Thus, this article is concluded by the need of diffusion of the new reality of father and husband that society requires, and to establish measures aimed at bringing the pa1 Marília Aparecida dos Santos. Discente do curso de Enfermagem do UNIFEG. 2 Daniela Aparecida Salgado Targino. Mestrado em Enfermagem pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 122 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto rent to close the issues that his life and his family with the arrival of a child or more children. To identify factors of both the importance of paternal making for all family members, as well as the difficulties encountered in order to effect such participation, the study also gives suggestions for how to establish activities that include more access and monitoring possibilities and fatherly welcome, putting time flexibility, offering alternate days, direct attention in the community and community agents visitations as differentials that can give greater openness to paternal participation. 1. INTRODUÇÃO A chegada de um filho, de um modo geral ainda dirige a maior parte das responsabilidades à mãe, especialmente no que diz respeito ao período gestacional e ao nascimento da criança, no entanto, o modelo de paternidade ainda está preso a conceitos e preconceitos antigos sobre os papeis de pai e de mãe e sobre como o pai deve participar da gravidez e do parto de seus filhos (GABRIEL; DIAS, 2011). Ocorre na atualidade um forte clamor da sociedade para que as mudanças e o acolhimento do pai no período gravídico ocorram de forma efetiva, mas na prática os passos para que o pai esteja mais presente no pré-natal e no parto ainda tem características bem iniciais, exigindo maior atenção por parte da área de saúde para que propicie o acolhimento do pai nesse período tão importante da vida do casal (FREITAS et al., 2007). Segundo Silva et al (2012) a participação paterna nas questões de saúde reprodutiva ainda é muito pouco expressiva e sua necessidade no contexto dos padrões atuais de sociedade e necessidade da mulher torna-se urgente a reflexão e a tomada de medidas para oportunizar e estabelecer um maior envolvimento do pai no pré-natal, no nascimento e no pós-parto. É importante considerar que os posicionamentos assumidos pelos pais acerca da paternidade variaram em grau, natureza e intensidade. Alguns sentem a paternidade logo que recebe a notícia da gravidez, outros sentem em estágios mais avançados quando os movimentos fetais se tornam perceptíveis, e há os que só sentem a paternidade com o nascimento da criança (FREITAS et al, 2007). O sentir-se pai pode ser vivenciado como um direito e um dever. Enquanto direito, o homem pode expressar sentimentos, participar dos cuidados com a esposa e os filhos, e enquanto dever, ele deve suprir a necessidade do filho de ter um pai participativo, que também cuida afetivamente do filho, que divida tarefas com a mãe. Por meio da vivência, superando contradições e vivenciando as experiências afetivas mais profundas, este homem contemporâneo vivencia o ser pai (FREITAS et al, 2007). Este estudo objetivou identificar como ocorre, na atualidade, a participação do pai na atenção pré-natal e na sala de parto. Apesar da intensa discussão quanto à humanização do parto, na prática o acolhimento do pai durante o pré-natal e parto mostra-se ainda muito pouco humanizado, ficando o pai à margem deste processo, estudos acerca desse assunto são significativos uma vez que há um caminho necessário e urgente a ser Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto 123 percorrido pelos enfermeiros e trabalhadores de saúde no sentido de buscarem programas, projetos e atividades que contemplem maior participação paterna no pré-natal, por ser de grande importância para a mulher e para o estabelecimento da saúde integral da família. Trata se de uma pesquisa exploratório-descritiva, com abordagem qualitativa, utilizando como instrumento a Revisão de Literatura. 2. REVISÃO DA LITERATURA DIFERENÇA DE SEXO E GÊNERO: PAI E MÃE Fabbro; Montrone (2013) conceituam que o sexo é definido pelas características físicas e biológicas, que diferenciam o masculino do feminino, ou seja, os indivíduos sexuados, dentre os quais, os seres humanos, já nascem de um sexo ou de outro. Por outro lado, o gênero é um conceito que distingue o que é biológico do que é construído socialmente, e revela o que é ser homem ou mulher. Estas definições são baseadas em diferenças sexuais consideradas pela própria sociedade. Sexo é o que define as características físicas, biológicas, anatômicas e fisiológicas dos seres humanos, caracterizando o sexo masculino e o feminino. É natural, já que nascemos com ele. Gênero é um conceito das Ciências Sociais para distinguir o que é biológico do que construído socialmente. É como aprendemos, pela educação (formal e informal), o que é ser homem e como é ser mulher na sociedade. Nesse aspecto, os meios de comunicação são grandes difusores do que seria “ser um homem” ou “ser uma mulher”, criando estereótipos para ambos (FABBRO; MONTRONE, 2013) Freitas et al. (2007) explicam que a gravidez é um momento de intensas mudanças para um casal e ela também é vivenciada por cada um de acordo com as diferenças tanto de sexo como de gênero. O casal grávido passa por etapas e mudanças que exigem adaptações, dentre as quais, as transformações na rotina e as responsabilidades a serem assumidas com o novo papel de pai e mãe. Este processo, segundo os autores, representa um novo desafio e pode gerar alegrias e tristezas. Alguns homens adquirem o sentimento paterno desde a notícia da gravidez e outros somente após o nascimento do bebê, já as mulheres, em sua maioria, com a notícia já adquirem o sentimento materno. Os homens tem uma forte tendência a se preocuparem primeiramente com a responsabilidade econômica, baseada no conceito de família patriarcal. O homem sofre o impacto da mudança de papéis, sente medo diante da responsabilidade sobre aquele bebê que está sendo gerado no ventre de sua companheira, sente-se perdido diante das alterações no comportamento da mulher. Assim, o homem também vive nesse momento uma fase conflituosa. Para a mulher, a gravidez tem todo um significado mais emocional, ela passa pelas transformações do corpo, além das transformações que ocorrem na vida cotidiana. Já quanto ao homem, ele tende sempre a ser mais racional com a gestação e o nascimento de um filho para o homem são permeados por diferentes significados, mudanças e responsabilidades que antes não existiam (GABRIEL; DIAS, 2011). Ocorre que o conceito de desigualdade entre os gêneros feminino e masculino gera um sentimento de inferioridade na mulher em relação ao homem, e Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 124 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto isto, no período gravídico acaba evidenciando em uma participação menor dos homens nas questões da gestão e do parto. O homem ainda é visto neste contexto como mero provedor dos recursos materiais, detentor de força e virilidade e que por isto não precisa participar do pré- natal, ficando esta responsabilidade relegada somente às mães. Na verdade, isto é um preconceito inerente à nossa cultura, que muitas vezes causa à mulher um sentimento de tristeza e solidão nas questões de sua gestação e ao homem falta de oportunidade de estar junto e acompanhar bem de perto todo o processo que envolve a chegada do filho (FABBRO E MONTRONE, 2013). Neste contexto, o papel do pai na sociedade encontra-se em ampla transformação, é notável a exigência de uma nova postura por parte do homem, enquanto pai, não só pela etapa do ciclo vital no qual ele está ingressando, mas também, devido às novas funções que são esperadas pela sociedade. Segundo os autores, através da mídia, é possível visualizar uma cobrança para que o homem seja um pai mais próximo e envolvido com as questões da família e do filho. A mudança no exercício do papel de pai não depende unicamente do desejo intrínseco do homem em ser um “novo pai” ou um “pai contemporâneo”, é preciso considerar que as responsabilidades que a sociedade impõe ao pai como provedor também lhes trazem prejuízos no campo da subjetividade. Apesar de o homem ter mais possibilidades de ação especialmente no campo das relações familiares, estas são exercidas na sobre rígidos parâmetros. Nesse contexto, a questão da paternidade ultrapassa os limites da família, tornando-se um campo concreto de discussão no âmbito da saúde sexual e reprodutiva e da saúde coletiva (FREITAS et al.,2007). Nos dias atuais, embora haja ainda pouca participação do pai, especialmente no período da gestação e do nascimento, já não é mais aceito pela sociedade que o pai apenas pague as despesas do filho, já se percebe uma cobrança muito grande para que o homem despenda parte de seu tempo com a criança, atuando ativamente na educação e nos cuidados e estando disponível emocionalmente para as necessidades dos seus filhos. 3. ASSISTÊNCIA PRÉ-NATAL E A IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO PATERNA De acordo com Reberte; Hoga (2010) a questão da participação paterna durante o pré-natal requer bastante atenção porque os pais vivenciam a ansiedade, o nervosismo, a preocupação e os sentimentos de insegurança durante a gestação de seus filhos e no parto e pós-parto emergindo então a necessidade de se promover programas educativos voltados à construção de uma vivência mais participativa do homem enquanto marido e pai. O envolvimento ativo do pai na gravidez pode ser desenvolvido com sua participação em grupo educativo, onde seja possibilitado receber orientações que o levem ao entendimento das alterações que ocorrem durante o ciclo gravídico e puerperal, isto por si, produz reflexos positivos sobre a relação marital e na dinâmica familiar. Esta proximidade orientada faz com que ocorram diálogos a respeito das questões que afetam o casal nesta fase da vida, de forma natural e frequente. Segundo Freitas et al (2007), a percepção precoce da paternidade gera Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto 125 um maior envolvimento emocional e comportamental do pai desde os primeiros estágios da gestação e isto favorece tanto a ele, quanto à mulher que se sente mais segura e amparada, além de o filho que é recebido por ambos de forma totalmente acolhedora. Reberte; Hoga (2010) explicam que a participação efetiva do pai no acompanhamento pré-natal contribui para fortalecer as relações familiares e torna seus membros mais capacitados para cuidarem juntos de suas questões, porém, ainda há muito a se fazer para que isto se torne uma realidade comum, uma das maiores dificuldades citadas pelos autores, identificadas através de pesquisa com mulheres durante o tratamento pré-natal é a falta de disponibilidade e de interesse por parte dos homens. Para que o homem sinta-se pai antes do nascimento do filho é importante a aceitação da gravidez, a proximidade física com a gestante, um envolvimento afetivo e a construção de sua imagem como pai que deve vir de um projeto passado, ainda que tal projeto fosse para um outro momento, é importante que o considere no desenvolvimento do sentimento da paternidade, em conjunto com sua parceira (FREITAS et al., 2007). Geralmente as rotinas de saúde num pré-natal é voltada para a mulher, por isso há tanta dificuldade na inclusão dos homens-pais nos serviços e para que isso mude as instituições de saúde tem que encarar esse novo desafio para que haja a inserção desse pai nas rotinas assistenciais a gestante.A presença do pai no acompanhamento da gestação é de suma importância para sua parceira trazendo a ela mais segurança, e para que isso aconteça a equipe de profissionais de saúde (enfermeiros) tem que ter uma visão ampla sobre esse pai reconhecendo o impacto benéfico do envolvimento paterno na saúde tanto da mulher quanto da criança. Para que essa inserção do pai realmente aconteça é preciso que enfermeiros responsáveis pela sua unidade apresente sugestões para que o trabalho com sua equipe se desenvolva trazendo benefícios para o casal grávido tais como oportunidades de encontro para que os profissionais passem a esses pais uma reflexão de quanto seu papel é importante para sua companheira, incluir os pais nas rotinas do serviço da unidade e deixar claro que sua presença é bem vinda a essa unidade, incluir o pai na visita domiciliar, tentar fazer com que o pai participe dos exames de ultrassonografia porque nesse momento o pai visualiza o bebê mostrando para ele essa nova vida que esta a caminho trazendo sentimentos de alegria e amor para esse pai, incluir o pai na enfermaria pois ele não é visita e sim cuidador (BRANCO et al, 2009). A Portaria 569/2000 (BRASIL, 2002) instituiu o Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento, sendo sua proposta melhorar a qualidade da assistência e diminuir a morbimortalidade materna e perinatal, porém apesar do empenho na humanização da assistência no período gravídico-puerperal, o que se observa é que pouco se concretizou quanto a um dos objetivos da Portaria que é a participação do pai na arena da saúde reprodutiva. A portaria estabelece princípios e diretrizes para o programa de humanização no pré-natal e nascimento dentre eles toda gestante tem direito a um atendimento digno e de qualidade, toda gestante tem direito a um acompanhamento de pré-natal adequado,e para a realização de um assistência adequada a essa gestante o município devera por meio das unidades desenvolver esta modalidade. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 126 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto 4. O ACOLHIMENTO DO PAI NO PARTO E SUA PARTICIPAÇÃO NO PÓS-PARTO O Ministério da Saúde/Brasil lançou o Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento, cuja finalidade é assegurar a melhoria do acesso, da cobertura e da qualidade do acompanhamento pré-natal, da assistência ao parto e puerpério das gestantes e ao recém-nascido, na perspectiva de direitos de cidadania. O programa surgiu da necessidade de se mudar a postura dos profissionais de saúde com as gestantes e parturientes, os atendimentos antes mecanizados onde a mulher era um agente passivo das decisões médicas e de enfermagem, passam então a adotar um novo modelo que pressupõe que a mulher é um ser único, complexo, com sentimentos e autonomia, assim, os profissionais de saúde devem participá-las dos processos e dividir com elas as decisões e responsabilidades que concernem ao tratamento e o parto. O processo de humanização pode ser considerado um ponto de equilíbrio entre a técnica e o humanismo, abertos a outras práticas e voltado à prevenção. O programa nada mais é do que uma estratégia das políticas públicas de saúde para sensibilizar gestores e profissionais para tentar melhorar a assistência obstétrica no país. O objetivo do Programa é fazer uma rediscussão quanto à atenção pré-natal na assistência básica. É fundamental remeter às questões da participação paterna em um contexto de direitos e resultados, propondo um novo modelo que contemple a realidade das famílias. Partindo de um ponto de vista conceitual, com estratégias que contemplem um olhar de gênero atrelado às questões da humanização, compreendendo a assistência em sua complexidade, que não pode separar estas instâncias. Para que a assistência possa efetivamente melhorar, não se pode operar com ações separadas, a ideia do todo não pode ser perdida (BRASIL, 2002). A participação paterna no parto é uma das importantes ações que visam implementar o Programa de Humanização, porém, o programa requer uma ampla articulação interna que permita fortalecer as iniciativas e eliminar etapas burocráticas, além de outros passos realizados em cada município para a implantação de cada um dos programas, inclusive, combater a resistência de uma parcela significativa dos profissionais de saúde, e isto leva tempo e requer um processo educativo de todos os atores envolvidos. Ao participar do processo gravídico, o homem pode sentir-se parte do processo, o que refletirá positivamente na qualidade da relação do casal, eliminando e amenizando conflitos entre o homem e a mulher no desempenho de seus papeis de pai e mãe. Os pais mais conectados emocionalmente no período da gestação ficam mais propensos a reagirem adequadamente às necessidades de apoio e compreensão que suas esposas apresentam. O laço, o vínculo e a parceria se reforçam na fase mais importante da vida dos dois quando o pai está junto no processo da gestação e do parto, fortalecendo ainda sua participação no pós-parto (FREITAS et al, 2007). Perdomini; Bonilha (2011) enfatizam que a legislação no Brasil contemRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto 127 pla o acolhimento do pai no parto, quando a Lei 11.108 de 2005 estabelece à mulher, o direito de escolher um acompanhante durante o processo de nascimento. Porém, segundo as autoras, muito embora o pai possa ser considerado o acompanhante ideal para a mulher no processo de parturição, na prática ainda se vê mais mulheres sozinhas ou acompanhadas de outros familiares, preterivelmente as avós maternas. O pai do bebê pode ser considerado o acompanhante ideal na hora do parto, isto porque a formação de vínculo e a representação de laços de família favorecem sua presença. Ao acompanhar o nascimento de um filho o homem afirma sua paternidade e tem seu papel de pai mais valorizado. São muitos os estudos que comprovam os benefícios da presença paterna durante o parto, inclusive pelo nível de segurança que suas mulheres sentem, o que ajuda a eliminar sentimentos negativos. As mulheres que foram acompanhadas pelo companheiro durante o processo de nascimento, em maioria, relatam o quanto foi importante ter uma pessoa conhecida para proporcionar carinho, cuidado e atenção nesse momento de suas vidas, poder dividir com o pai o momento do nascimento do filho tornam o processo menos tenso (PERDOMINI; BONILHA, 2011). Neste contexto, o grande desafio ainda é fazer com que este acompanhante seja sempre que possível, o pai, isto, porque ao acompanhar o parto o homem afirma sua paternidade, se sente valorizado e valoriza mais o seu papel, reforçando os laços e vínculos de representatividade da família, ao comungar com sua esposa de um momento tão intenso e único em suas vidas. Mesmo com o rearranjo nas relações homem/mulher e de família trazido pelo movimento feminista, ainda é muito pouca a participação dos homens nos cuidados cotidianos com os filhos, durante a gravidez, no parto e pós-parto, esta participação deve ser mais incentivada no ambiente familiar e pelos profissionais de saúde, para que então se concretize (CAIRES; VARGENS, 2012). Assim, no pós-parto a participação do pai também é essencial, os números encontrados na literatura mostram que a mulher, de um modo geral, gostaria de ter seus parceiros mais participativos, e que esta participação é importante para elas até mesmo no aleitamento materno. Silva et al (2012) cita alguns estudos que comprovaram que de 80 a 93,3% das mulheres nas pesquisas que gostariam de receber ajuda do parceiro até mesmo no período do aleitamento materno onde se sentem muitas vezes sozinhas e inseguras com seus bebês enquanto o homem se mostra alheio e passivo ao momento em que estão vivendo, ficando a cargo da mulher o sucesso e o insucesso do processo. Portanto, para que a participação do pai seja uma realidade durante o período gravídico, parto e pós-parto, há que trabalhar a preparação das equipes de assistência médica e de enfermagem para o acolhimento do pai, inclusive, ao cumprimento da legislação em vigor, porém, falta também preparação e cobrança das próprias pacientes e seus companheiros, em exigir seus direitos (CAIRES; VARGENS, 2012). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 128 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O homem e a mulher vêm passando por um processo de mudança continua em seus papéis ao longo da história, contudo, ainda hoje, ocorre muita influência de uma cultura patriarcal, onde homem é o provedor, aquele que sai e traz o sustento à família e a mulher aquela figura passiva que se incumbe dos cuidados domésticos e com os filhos. O fato é que novos rearranjos familiares ocorrem cotidianamente, a mulher está inserida no mercado de trabalho e também contribui com as dívidas da casa, dividindo com o homem o sustento da família, e este, por sua vez, também contribui com os afazeres domésticos, os cuidados e a educação dos filhos. Porém, o homem ainda encontra-se em pleno desenvolvimento para o perfil de pai que se busca transformar. Muitos ainda presos aos conceitos patriarcais delegam somente à mulher a atenção com a saúde da família, inclusive e especialmente no período gravídico, se eximindo de seu direito de participar nesse processo. Neste sentido, a questão da participação do homem no período gravídico requer ainda muita atenção e adaptação para que possa se adequar a realidade atual. As necessidades de amparo e acolhimento na assistência a saúde nesse momento tão importante na vida do casal são diferentes em função de gênero, porém necessárias para ambos e devem ser consideradas para que haja uma assistência integral à saúde da família. O presente estudo mostra, através da literatura apresentada, que as dificuldades para que a inserção do pai no acompanhamento pré-natal, parto e pós-parto ocorra de forma efetiva ainda são muito significativas e requerem maior atenção por parte das gestões de saúde no Brasil, para que se chegue a uma realidade de Parto Humanizado que considere os aspectos familiares conforme preconiza a Organização Mundial de Saúde, onde o pai é participativo em todo o processo, e isto contribua para o fortalecimento dos laços familiares, há que se promover e implementar programas e atividades educativas que preparem o homem para esse novo papel e porque não dizer, prepare também as mulheres para receber este novo homem que a sociedade hoje requer no seio familiar. A reeducação dos profissionais de saúde, os programas de orientação e acompanhamento às famílias são os caminhos mais propícios para que ocorra a efetivação de um perfil de pai transformado e adequado à realidade atual da sociedade. Neste contexto, priorizar o tema paternidade é uma real necessidade para preencher a lacuna que ainda há nas políticas de saúde pública. Envolver o pai nas ações de cuidado com a mulher e seus filhos, desde a gravidez, é um dos recursos mais importantes no processo de humanização da saúde e que não vem sendo bem aproveitados para a promoção da saúde e estabelecimento de maiores vínculos familiares, que favoreça a todos os envolvidos, isto, porque os próprios serviços de saúde, ainda contribuem para afastar o pai durante a assistência, reforçando uma concepção errônea de que as ações de cuidado sejam de responsabilidade exclusiva das mulheres. Ademais, é preciso também, que sejam determinadas fiscalizações mais rigorosas quanto ao cumprimento das leis, portarias que visam efetivar essa parRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O acolhimento do pai na assistência ao pré-natal e parto 129 ticipação do homem desde o pré-natal até o pós-parto nas instituições de assistência à saúde, para que se vençam as resistências de uma parcela de profissionais de saúde mais tradicionalistas e haja então abertura de acesso em conjunto com a reeducação da sociedade e assim possa tornar realidade o que até então é apenas necessidade. 6. REFERÊNCIAS BRANCO, Viviane Manso Castello; CARVALHO, Maria Luiza de Mello; COUTINHO, Andreia Pereira; SICURO, Alice. Unidade de Saúde Parceira do Pai. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Saúde, 2009. 24p. BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento. Cartilha. Brasília: 2002. 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Inserido no contexto do interesse da razão (tanto especulativo quanto prático), o milagre torna-se objeto de reflexão da motivadora indagação do que, ao ser humano é permitido esperar. O tema é tratado, ainda, considerando a integral arquitetonicidade em vista de que o fim último, do qual tende a especulação da razão, no seu uso transcendental, refere-se especificamente à abordagem acerca da existência de Deus. Palavras-chave Milagre; razão pura; razão prática; fé; religião ABSTRACT This article aims to address the scope of the miracle in perspective of the use of Kantian reason. The focus is on the difficulty reconciling faith and reason, since the issue transcends category space-time. Inserted into the reason for the interest of the context (both speculative and practical), the miracle reflection object becomes the motivating the inquiry that the human being is allowed to wait. The theme is treated also considering the full architectural conjuncture in view of the ultimate end, which tends to speculation of reason in its use transcendental refers specifically to approach about the existence of God. 1. INTRODUÇÃO A concepção do milagre, como fenômeno sobrenatural, parece fugir ao domínio da razão, ou, pelos menos em partes. A constatação da limitação em tornar o milagre cognoscível numa perspectiva clara e distinta, coloca em dificuldade o poder da razão, uma vez que sua natureza reside na busca de investigar e compreender a realidade na sua totalidade. 1 José Caetano Minus. Mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Gregoriana (Itália). Docente do curso de Filosofia do UNIFEG. 2 Luísa Emília Lima de Moraes Minus. Doutorado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Docente do curso de Pedagogia e Coordenadora Pedagógica do EaD do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 132 O milagre no contexto da “religião” em Kant Cônscio da clareza do objetivo proposto, o artigo é dividido em quatro partes, tendo como escopo formar um todo unificado pela particularidade de cada momento da reflexão. Na primeira parte, assume relevo a importância do contexto no qual foi redigida a Religião nos limites da simples razão, obra na qual Kant trata do tema. Na segunda parte, a preocupação está voltada para a conceituação e divisão no modo de conceber o milagre. O terceiro momento reflete, mais especificamente, a concepção kantiana sobre esse assunto. Na última parte, na tentativa de sublinhar a contribuição de outros autores que discutem a temática em questão, confronta-se a concepção kantiana com expoentes importantes, como Agostinho e Hume dentre outros. A conclusão delineia alguns pontos relevantes frente ao tema proposto, como contributo pessoal, na tentativa de suscitar posteriores reflexões. 2. IMPOSTAÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA A religião é parte integrante da vida do humano que há no ser. A busca de uma relação sadia com um ser Absoluto que o transcende, é condição de possibilidade de realização do homem como ente livre e aberto ao “ser”. Nas várias culturas e épocas se observa a presença e prática da religião. O homem não se considera um “ser em si”. Almeja algo para além dos seus limites físicos; na verdade, busca a causa do seu existir. É impossível negar o fenômeno religioso, mas, ao mesmo tempo, corre-se o sério risco de fazer dele um álibi, que pode camuflar muitos elementos contundentes, presentes no humano, enquanto indivíduo e ser social. No sentido original, a religião deveria ser o liame entre o criador e a criatura, que, por meio da razão, busca a causa primeira do seu “ser”. A filosofia da religião é uma tentativa de refletir, com seriedade, acerca do fenômeno da religião, que pode transformar-se em fonte de alienação e opressão. O sinal irrefutável da verdadeira religião está no seu caráter libertador, caso contrário, não passará de uma ideologia escravizadora. Nesta perspectiva, insere-se a filosofia da religião como ciência crítica da teologia nos seus aspectos de palavra, evento, comunidade e mandamento, dimensão na qual se dá a manifestação mais eficaz de um Deus que se revela, que quer se comunicar com sua criatura e ser reconhecido na sua dimensão transcendental3. É no ambiente religioso, presente em todos os povos como expressão da sua própria existência, que o milagre surge, constitutivo da relação homem-transcendente. Assim sendo, é inegável a constatação de que toda interpretação filosófica da religião se encontra confrontada com a questão do milagre; esse que assume dimensões variadas de acordo com cada cultura e época. Ao considerar o milagre no contexto de uma reflexão mais em nível filosófico, deparamos com a dificuldade de Kant em tratar com autonomia o assunto, principalmente, tendo em vista o contexto do séc. XVIII. No bojo desse contexto polêmico, constata-se o cuidado do filósofo da “razão prática” de não criar maiores problemas com a ortodoxia do seu tempo4. 3 Para se ter acesso a uma reflexão mais aprofundada da questão abordada Cf. I. Mancini, Kant e la teologia, p. 5. 4 “Si l’on y ajoute l’incompatibilité du miracle avec les données propres du criticisme spéculatif, la position de Kant paraît sur ce point extrêmement dangereuse, et il n’est pas surprenant que ses embarras, ses silences et ses contradictions aient conduit certains de ses interprètes à l’accuser de mauvaise foi ou de flatterie vis-à-vis du pouvoir, lorsqu’il s’efforce dans la Religion d’éviter une réfutation pure et simple de la possibilité de tout miracle”. J. L. Bruch, La philosophie religieuse, p. 145-146. Cf. I. Kant, La religione Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O milagre no contexto da “religião” em Kant 133 De fato, o pensamento de Kant sobre o milagre não remonta a servidão imposta pela censura de um governo prusiano reacionário e ligado diretamente à defesa da ortodoxia religiosa. Esta servidão intervém certamente na redação dos textos da Religião, como confirma indiretamente a carta de Kant endereçada a Fichte em 02 de fevereiro de 1792, mas não constitui, nada mais do que um motivo subsidiário das posições defendidas na própria Religião5. Segundo Kant, quanto aos milagres em geral, existem homens decididos que não renunciam sua fé. Ou seja, (...) eles crêem, em teoria, na existência dos milagres, mas na prática é tudo diferente, pois, na realidade não reconhecem nenhum milagre; o fazem meramente em vista de interesse, ou melhor, de simples conveniência. Por isso governos sábios das várias épocas, acolheram legalmente as opiniões segundo as quais se afirmavam que antigamente aconteciam muitos milagres, mas que não admitiam novos milagres. Esta máxima relativa aos novos milagres foi também adotada por aqueles mestres de religião que conformavam, os seus artigos de fé às posições da autoridade governativa (KANT, 1996, p. 215). Os milagres antigos, gradualmente, definidos e oficializados pelas autoridades públicas, não causavam nenhuma espécie de desordem à comunidade seriam, ao invés, necessários para os governos preocuparem-se com os novos taumaturgos, considerando os efeitos que a sua ação poderia exercer sobre a população e sobre a ordem constituída. 3. CONCEITO E DIVISÃO Mas qual é o interesse de Kant frente ao milagre? Na Religião nos limites da simples razão, ele justifica o porquê do interesse autêntico sobre o milagre e o define em base a um uso racional prático; “Os milagres são acontecimentos do mundo produzidos por causas eficientes às quais as leis são por nós - e não podem não ser - absolutamente ignoradas” (KANT, 1996, p. 215). Segundo a divisão proposta por Kant, é possível falar de milagres “teísticos”, ou então de milagres “demoníacos”, pois esses últimos se diferenciam em “angélicos” (agatodemoniaco) e em “diabólicos” (cacodemoniacos). Quanto aos milagres “teísticos” é, sem dúvida, possível formar um conceito das leis que regulam a sua causa eficiente (um “Ser” onipotente). Pode-se tratar somente de um conceito geral: de fato, se pensamos Deus como criador e sustentador da ordem física e moral do mundo. Isto acontece porque podemos ter cognição imediata da qual a razão depois pode servir-se para seu próprio uso. Mas se admitimos que Deus consente à natureza também de afastar-se destas leis, então podemos perder a esperança de formar o mínimo conceito da lei, senei limiti, p. 216. 5 No que diz respeito a esta questão Cf. I. Kant, La religione nei limiti, p. 213. Cf. M. J. P. Ceboleiro, Natureza em Kant, p. 590. Ver também J. L. Bruch, La philosophie religieuse, p. 146. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 134 O milagre no contexto da “religião” em Kant gundo a qual Deus operou a produção de um tal acontecimento6. Desse modo, a razão fica paralisada, enquanto aquela adesão a impede de operar, pautado em leis por ela notadas. E portanto, não procura nenhuma nova lei que a instrua, ou que a faça esperar de ser instruída neste mundo. Em relação aos milagres “teísticos”, a razão pode empregar um critério negativo: Se uma imediata manifestação divina contém alguma coisa que, bem apresentada como comando de Deus contrasta todavia diretamente com a moralidade, então não pode tratar-se de um milagre divino, não obstante a aparência (por exemplo: se se pedisse a um pai para matar seu próprio filho inocente) (KANT, 1996, p. 217). Para um milagre tido como demoníaco, falta também esse critério. Nem a razão pode empregar o critério oposto, aquele positivo, segundo o qual não pode ser obra de um espírito maligno, o convite milagroso de cumprir uma boa ação tida por nós como um dever. Também neste caso, poderia se cometer um equívoco porque como é de costume dizer; “Satanás se veste frequentemente de anjo de luz”. Assim é quase impossível confiar nos milagres, ou considerá-los no prisma do uso da razão. Quanto aos milagres no sentido bom, eles são produzidos simplesmente como modo de dizer das pessoas, ou força de expressão, aplicada em uma determinada atividade, ou situação. Por exemplo, quando o médico, tendo consciência de que o paciente não tem mais cura e lhe diz não poder fazer mais nada, a menos que aconteça um milagre; isto implica dizer: “sua morte é certa”, e constitui uma força de expressão. 4. A CONCEPÇÃO DO MILAGRE EM KANT Para Kant, entre as atividades humanas existe a do cientista, este indaga as causas dos acontecimentos, de acordo com as leis naturais, possíveis atestar por meio da experiência. Mas o cientista, por sua vez, seria obrigado a renunciar a conhecer a coisa em si mesma, de acordo com as leis, ou então, o que poderia ser para nós estas mesmas leis se fóssemos dotados de um outro orgão de sentido7. Na Critica da razão pura, refletindo a respeito da lei natural, Kant afirma: Por natureza (em sentido empírico) entendemos o encadeamento dos fenômenos, quanto à sua existência segundo regras necessárias, isto é, segundo leis. Há pois certas leis e precisamente leis a priori, que antes de mais tornam possível uma natureza; as leis empíricas só podem acontecer e encontrar-se mediante a experiência e em consequência dessas leis originárias, pelas quais se torna possível a própria experiência (KANT, 1996, p. 236). 6 Cf. J. L. Bruch, La philosophie religieuse, p. 147. 7 Cf. Ibidem. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O milagre no contexto da “religião” em Kant 135 As leis empíricas e particulares têm características comuns, pois estão de acordo com leis originárias, sem as quais a própria experiência seria impossível. As leis empíricas as quais lhe serviram para aceitar essas leis originárias do pensamento são, por exemplo, as leis de Newton. Ora, a sua teoria permitiu identificar um cometa registado em 1066 pelos Saxões com o cometa observado por Halley em 1682; além disso ele prevê, em 1695,a volta do cometa em 1758, e a previsão se cumpre. Ao contrário dos sacerdotes egípcios que sabem de um cometa por revelação divina, agora há leis escritas diferentes das leis positivas das sociedades que admitem transgressão e das leis divinas que se opõem à graça, dom gratuito e harmônico. São leis naturais, não prescritivas, mas constativas, universais e necessárias (CEBOLEIRO, 1993, p. 590). Analogamente acontece em relação à evolução moral do homem, porque se trata de uma atividade para ele obrigatória. De fato, porquanto a influência celeste auxilia no cumprimento desta obrigação, o homem não tem condições de distinguir, com clareza, os influxos naturais. Por não saber utilizar diretamente estes influxos celestes, o homem não estabelece nenhum milagre e escuta as prescrições da razão; comporta-se como se cada conversão e aperfeiçoamento moral dependessem exclusivamente do seu compromisso pessoal: Um expediente comum daqueles que com artes mágicas presuadem os fiéis, consiste em buscar a causa do fato que os cientistas da natureza confessam a própria ignorância quando afirmam não conhecer a causa da gravidade, da força magnética. Todavia eles conhecem bem as leis, rigorosamente limitadas às condições que determinados efeitos se realizam: e isto é suficiente, seja pelo uso racional destas forças, seja pela explicação dos relativos fenômenos secundum quid, regressivamente (KANT, 1996, p. 221). Basicamente em duas reflexões da época pré-crítica8, Kant examina se existe uma direção extraordinária e se é possível reconhecê-la. Só a insuficiência demonstrada pela ordem da natureza referente à vontade divina pode justificar a priori uma direção extraordinária. Por exemplo, o fato da virtude não ser suficientemente recompensada pelos seus seguimentos naturais e inversamente pelo vício9. Na medida em que se admite que as ações livres não são inteiramente concatenadas com suas causas, segundo a ordem da natureza, o seu acordo com a vontade divina não é inteiramente possível, conforme a mesma ordem. Por isso, deve-se admitir a existência de uma direção extraordinária: “Esta direção extraordinária que precisa Kant é sempre um milagre, depende da vontade perfeita de Deus” (BRUCH, 1968, p. 147). 8 Infelizmente não foi possível obter todos os dados bibliográficos necessário, dos referidos textos, mas é possível afirmar que foram publicados em 1760 e 1763 respectivamente. 9 Cf. J. L. Bruch, La philosophie religieuse, p. 146. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 136 O milagre no contexto da “religião” em Kant Estas reflexões kantianas não se constituem numa apresentação explícita da doutrina oficial dos milagres. Porém, é possível constatar que, antes de ter constituído a teoria crítica do conhecimento da natureza e fora de cada pressão de instância político-religiosa, Kant tinha posto o problema do milagre e admitido a sua possibilidade. Em outro texto datado de 1788-1790, Kant afronta o problema das “aporias” de ordem física que suscitam o milagre. Um movimento não pode ocorrer no mundo nem como um milagre, nem por um ser espiritual, sem produzir o mesmo movimento na direção de acordo com as leis da ação e da reação da matéria, “(...) porque no caso contrário um movimento do universo surgiria num espaço vazio. Nenhuma modificação pode surgir no mundo sem ser determinada por causas, segundo as leis naturais (BRUCH, 1968, p. 148). Todas as modificações espaciais são movimentos. Um movimento ocorrido com um milagre teria uma causa a qual deveria ser buscada fora do fenômeno. Mas sob a ótica da lei da ação e da reação, a ação e a sua causa pertencem ao mundo sensível. Um movimento provocado por um milagre não estaria sob a lei da ação e reação, aquilo que modificaria o centro de gravidade do mundo; este se moveria num espaço vazio. Portanto, um movimento num espaço vazio seria uma contradição10. Esta argumentação coloca em evidência uma contradição, um absurdo lógico. É precisamente neste ponto que reside a originalidade kantiana, pois (...) formula em termos lógicos uma impossibilidade geralmente reconhecida sobre um plano metafisico (a perfeição da legislação divina exclui cada exceção ou derrogação às regras gerais), ou sobre um plano epistemológico o determinismo natural, pretendido pela ciência é universal e exclui cada exceção (BRUCH, 1968, p. 149). Como já foi mencionado anteriormente, partindo da possibilidade do milagre, para Kant este pode ser rigorosum, quando tem o seu fundamento numa coisa fora do mundo, ou comparativum, quando tem o seu fundamento numa natureza, no qual não se conhecem as leis. No primeiro caso, ele pode ser material, quando a força mesma que o produz está fora do mundo, ou formal, quando esta força estando no mundo, a sua fixação só é fora do mundo11. Neste prisma, é conveniente comparar o modo de conceber o milagre, na visão kantiana, em relação a outros filósofos estudiosos do tema. 10 “On prouve de la même façon qu’il ne peut y avoir de miracle en ce qui concerne les phénomènes temporels. Un phénomène temporel est un miracle quand sa cause ne peut être donnée dans le temps, et n’appartient pas au monde phénoménal. Un événement surnaturel nést donc pas déterminé dans le temps relatif, mais dans un temps absolu ou vide, ce qui est une contradiction”. Ibidem. Cf. M. J. P. Ceboleiro, “Natureza em Kant”, p. 593. 11 “Miracle matériel si l’assèchement de la mer Rouge est une action immédiate de la divinité, mais seulement formel si Dieu la fait assécher par un vent qu’il envoie. Kant ne précise d’ailleurs pas dans cette seconde hypothèse comment ce vent se rattacherait à l’enchaînement des causes. Mais il ajoute ce qui éclaire dans une certaine mesure ce dernier point, que le miracle est occasionale si la divinité entre en jeu immédiatement, et praestabilitum si elle produit l’événement par une série de causes et d’effets qui sont là en vue de cet unique événement. Dans ce dernier cas, le miracle ne contredirait pas plus le déterminisme que la finalité telle que Kant précisément la conçoit à la même époque” BRUCH, 1968, p. 148. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O milagre no contexto da “religião” em Kant 137 5. PARALELO ENTRE A CONCEPÇÃO KANTIANA E OUTROS PENSADORES Segundo Spinoza, o homem simples chama milagres ou obras de Deus os eventos extraordinários da natureza. Parte por zelo religioso, por mania de desprezar aqueles que cultivam a ciência da natureza, desejando ignorar as causas naturais das coisas e mostrando-se atentos em escutar somente o que lhe é de tudo obscuro e, consequentemente, provoca a sua máxima admiração. A multidão dos incultos pode adorar Deus e reconduzir cada coisa ao seu domínio e ao seu querer, assim não se admira jamais tanto a potência divina como o quanto se imagina que a potência da natureza seja dele derivada. Para Spinoza e Kant, a ordem da natureza não sofre nenhuma exceção: em primeiro lugar, para a ordem natural se confundir com a ordem divina, em segundo, para uma violação da ordem natural entre em contradição com a estrutura espaço-temporal dos fenômenos, portanto, impossível a Deus mesmo: Por meio do milagre não se pode atingir nem a essência e nem a existência e, por conseguinte, nem mesmo a providência divina; pelo contrário, tudo isso pode ser bem melhor percebido por meio da base da ordem estável e imutável da natureza (SPINOZA, 1972, p. 488). Esta concepção do milagre conciliado à ordem natural já tem suas raízes fundamentadas em Santo Agostinho; este não intencionava polemizar sua doutrina no confronto com a Sagrada Escritura. Em Agostinho, a motivação é puramente metafísica: o milagre não pode ser uma derrogação às leis da natureza, porque uma legislação que teria a Deus por autor, não saberia comportar nenhuma exceção: Acrescentamos de fato, a esta luz inextinguível todos aqueles milagres que são fruto de artes humanas e mágicas, isto é, fruto de artes diabólicas, elaboradas indiretamente por meio dos homens, ou diretamente através dos mesmos demônios, se quisermos negar, nos encontraremos em desacordo com aquela mesma verdade das Sagradas Escrituras na qual acreditamos (AGOSTINO, 1997, p. 1072). O milagre não pode, portanto, resultar senão do intervento das leis recônditas. Neste ponto, Agostinho chega à mesma conclusão de Kant, porém fundamenta sua argumentação sobre o respeito da ordem divina, identificada à vontade de Deus, enquanto Kant baseia-se nas exigências intrínsecas da estrutura espaço-temporal do mundo fenomenal. Ele, de fato, criou estas virtudes próprias das pedras e dos outros corpos, criou o engenho dos homens, que é útil de modo maravilhoso, criou a natureza angelical, mais potente de todos os outros seres animados da terra, superando com a sua maravilhosa virtude e com a sabedoria que ordena, concede todas as maravilhas, servindo-se de toda a criação (AGOSTINO, 1997, p. 1074). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 138 O milagre no contexto da “religião” em Kant Santo Agostinho reagiu rigorosamente contra uma concepção mágica e desordenada da potência divina. Identificando a ordem à vontade divina, ele contradiz brutalmente a concepção primitiva da religiosidade antiga, mas não submetia Deus ao determinismo das ciências da natureza que não são ainda definitivas. Por outro lado, na concepção de Hume, um milagre é uma violação às leis da natureza, e por ser uma experiência fixa e inalterável, estabeleceu estas leis. A prova contra um milagre trata-se da mesma natureza do fato; é tão completa quanto se possa imaginar um argumento derivado da experiência. Nada deve ser considerado um milagre, se é verificado com uma certa frequência no curso comum da natureza. Não é um milagre um homem, aparentemente em boa saúde, morrer improvisadamente. Mas é um milagre um homem morto voltar a viver, porque isto jamais foi constatado. Existe uma experiência uniforme contra cada acontecimento miraculoso; do contrário, o acontecimento não mereceria ser chamado milagre. Hume afirma ainda que: (...) não existe testemunha suficiente para estabelecer um milagre, a menos que a testemunha seja de tal gênero que a sua falsidade seria mais miraculosa do fato mesmo que ela se esforça de estabelecer; e também neste caso há uma recíproca destruição de argumentos e somente a parte superior dá uma segurança conforme aquele grau de força que permanece, uma vez que tenha sido deduzida a força da parte superior (HUME, 1992, p. 122). De acordo com Hume, uma pessoa diz que viu um homem morto restituído à vida, deve-se considerar imediatamente qual das duas coisas são prováveis: talvez esta pessoa não esteja dizendo a verdade, ou então o fato tenha realmente acontecido. Deve-se pensar num milagre contra o outro e, segundo a superioridade descoberta, pronuncia-se a decisão e rechaça sempre o milagre maior. Se a falsidade do testemunho fosse mais miraculosa que o acontecimento pela pessoa em questão, então ela poderia pretender impor-se à crença, ou opinião12. Na época de Kant, o problema do milagre assumia um tom de controvérsia, pois uma contradição aguda era ressentida entre as exigências da ciência e as narrações da Sagrada Escritura. A ortodoxia religiosa, tanto protestante quanto católica, unia-se tanto mais a uma teoria rígida do milagre, uma tentativa de defesa da religião contra os líderes de uma concepção científica do universo. As posições tornaram-se passionais e a ortodoxia dava a credibilidade aos milagres do significado de um critério de fé que ela não tinha tido jamais, sem se dar conta de que colocava, assim, o contraste da ciência e da religião sobre o terreno mais desfavorável possível13. Na época, o milagre não estava ainda maduro na concepção teológica e filosófica. A estrutura propriamente religiosa, sensível somente à fé de um dado, como a ressurreição de Jesus, não estava ainda elaborada. Não tinha sido supe12 Cf. HUME, 1992, p. 123. 13 “Il faut être attentif à cette situation historique et à ce contexte passionnel pour comprendre les méandres et les silences de la théorie du miracle exposée dans la Religion”. J. L. Bruch, La philosophie religieuse, p. 150. Cf. M. J. P. Ceboleiro, “Natureza em Kant”, p. 590. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O milagre no contexto da “religião” em Kant 139 rada a alternativa de um fisicismo incompatível com o determinismo científico. Por este motivo, precisamente o problema do milagre estava fortemente presente na discórdia entre a ortodoxia e a “razão prática”. Dando conta desse contexto, era justo e prudente da parte de Kant colocar entre parênteses o ponto de vista físico para tentar liberar o significado moral da ideia de milagre14. No início da segunda parte da obra em análise, Kant sublinha a relação entre a razão e o milagre. Procura explicar paralelamente a ideia evangélica, segundo a qual o milagre repousa sobre a fé e não vice-versa. Para eles a razão intervém para dar a sua garantia aos milagres, então a fé intervém nos escritos evangélicos como condição de possibilidade. Todavia a analogia permanece no sentido de que os milagres são, em ambos os casos, fundados sobre a fé. Nesse sentido, Kant se cobre da autoridade da Sagrada Escritura, citando o Evangelho de João15, mostrando assim que é muito mais um fazer prova da incredulidade moral do que querer fundar a sua fé sobre os milagres. Esta se constituía numa séria crítica em relação a uma ortodoxia com o intuito de fundar a fé sobre a crença no milagre. Os milagres narrados nos evangelhos tratam de cura e ressurreição, ilustrando e simbolizando mais ou menos, expressamente, o poder redentor de Jesus. Mas justamente a exclusão de cada remédio à remissão dos pecados, caracterizando a teoria kantiana da justificação deveria desviar desta elucidação moral dos escritos de milagres. Precisando assim renunciar a uma interpretação do significado moral dos milagres evangélicos que o teria levado a uma soteriologia, Kant recorre a uma argumentação histórica, usada na “razão prática”: “(...)a introdução da fé cristã exigia temporaneamente acontecimentos miraculosos” (BRUCH, 1968, p. 154). A religião cristã pode hoje manter-se por argumentos racionais, mas ela precisou, no seu tempo, introduzir-se com uma revelação sobrenatural, com a presença de milagres. Cada narração miraculosa deve ser submissa ao critério universalmente dirimente do acordo com as exigências da lei moral. Por exemplo, o sacrifício de Abrão, narrado por Kierkegaard16, é citado por Kant como o caso escandaloso de um falso mandamento e de um falso milagre. Nessa linha de raciocínio, percebe-se uma grande divergência entre os dois pensadores, um define a categoria do religioso, do seu conflito com a ética, e o outro fecha o religioso em uma ética já penetrada pela exigência religiosa absoluta, que exprime a santidade. Kant, enfim repele o milagre num passado legendário, sublinhando a sua incompatibilidade com as exigências da vida ativa. Por exemplo, o juiz não admite milagre diabólico no seu interrogatório, e o médico espera milagre só se tenha renunciado ao agir. Acontece o mesmo para a vida moral; o homem é responsável pelo seu progresso moral, e não deve esperar a influência celeste miraculosa, independente da sua possibilidade e necessidade. Portanto, a espera do milagre seria uma atitude aniquiladora tanto para a vida moral como para as ações em geral. 14 Cf. I. Kant, La religione nei limiti, p. 219. 15 “Gesù gli disse: ‘Se non vedete segni e prodigi, voi non credete’”. Gv 4,48. 16 Conferir esta reflexão feita por Kierkgaard na sua obra: Timore e tremore, onde a questão é amplamente explicitada e desenvolvida. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 140 O milagre no contexto da “religião” em Kant O juiz de um tribunal não tem noção da defesa pretensiosa de um delinquente que se diz vítima de uma tentação diabólica. Se o juíz julgasse possível essa circunstância, então o fato que um homem comum e ignorante tenha sido vítima da astúcia satânica consistiria num atenuante. O juíz não pode citar Satanás e confrontá-lo com o acusado, pois não seria possível extrair nada de racional desse confronto (KANT, 1996, p. 219). Nas suas reflexões, Kant nem sempre distingue com clareza o problema do milagre daquele da graça, esta é à primeira vista, uma espécie particular de milagre. Ele insiste sobre o problema do milagre, apresentado na sua época como atual. Mas no horizonte dos debates relativos aos milagres, é a pergunta muito mais fundamental da graça que reaparece. Em ambos os casos, constata-se em Kant certos embaraços diplomáticos, pois procedem de exigências efetivas e divergentes de seu pensamento. E dão à sua filosofia da religião uma tensão e um estilo que não satisfazem completamente nem os cristãos, nem os defensores da “razão prática”. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS A tentativa de Kant em elaborar um sistema filosófico tem como foco e se concentra, sobremaneira, em três perguntas, consideradas imprescindíveis no seu esquema filosófico: o que posso saber? O que devo fazer? O que me é permitido esperar? A primeira trata-se de uma pergunta teorética sobre o saber; a segunda prática sobre o fazer, prática e teorética juntas consistem a terceira acerca do esperar. Porém, todas remetem ao desejo mais profundo da alma e do coração humano: a busca da felicidade. A obra Religião nos limites da simples razão surge como elemento integrante desta tentativa, buscando uma resposta adequada à terceira questão. Tem como mérito refletir seriamente sobre a religião na sua relação direta com a razão. Nesse contexto surge a tentativa de abordagem do milagre enquanto proposta complexa e, por que não dizer, contundente. Em alguns escritos pré-críticos, em especial no livro em questão, percebe-se a intenção de Kant em valorizar o curso normal que assumem as leis da natureza e respeitá-las em todos os níveis. O tema do milagre é encarado na perspectiva do que vai contra a ordem da natureza e que desvia completamente o percurso das coisas. Daí decorre a dificuldade em aceitá-lo, principalmente no tocante à verificabilidade elaborada em âmbito racional. Segundo Kant, a relação a posteriori com a natureza demonstra, com clareza, a existência de leis que regulam o itinerário natural da realidade cosmológica. As leis na sua totalidade são universais e verificáveis. Ora, o milagre desestrutura a constatação da razão, pois vai contra as leis que regulamentam a natureza. É como se fosse uma exceção, paradoxo difícil de ser concebido e assimilado pela razão, a qual na busca de uma certa ordem das coisas, principalmente em nível cosmológico, não admite exceção. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 O milagre no contexto da “religião” em Kant 141 Para Kant, o milagre repousa sobre a fé e não vice-versa. Assim, a fé não é conquistada pelo fato da pessoa participar dos milagres, mas acreditando, pode-se chegar à constatação desta que é uma intervenção de Deus na ordem da natureza. Nas narrações evangélicas, quando Jesus realizava algum milagre, deixava clara a condição: “a tua fé te curou”. Ao admitir o fenômeno dos milagres, é possível afirmar que, para Kant, é realizado apenas em âmbito da fé. Reconhecê-lo no nível puramente racional, prescindindo da fé, ou invertendo o processo, é cometer um considerável equívoco na pespectiva hermenêutica e, ao mesmo tempo, afrontar uma “aporia” de extrema contundência. Por outro lado, não se pode esquecer, mesmo em contexto de religião e milagre, que a doutrina kantiana é portadora de uma forte conotação ética, diga-se de passagem a amplitude do imperativo categórico. Assim sendo, o pensador de Konigsberg contextualiza a reflexão sobre os milagres em âmbito moral. Toda ação, inserida no contexto da liberdade como condição de possibilidade, parte do homem na relação com a realidade e deve promover uma autenticidade na esfera do agir. A passiva espera pelo milagre como intervenção divina, pode provocar consequências negativas, pois enquanto o indivíduo aguarda o milagre se acomoda quanto ao agir frente a sua natureza relacional. Então sob o ponto de vista moral, o milagre se constitui num prejuízo, especialmente, no tocante ao ato volitivo, pois o indivíduo deve ser sujeito dos seus próprios atos e consciente do seu papel na sociedade. Considerando o contexto vital kantiano, é possível perceber a sua intenção de conciliar o fenômeno do milagre com a força da razão. Procura aplicar a dimensão prática da razão na reflexão acerca do milagre, presente em muitas culturas enquanto interferência extraordinária de um “Ser”, capaz de alterar o andamento da ordem da natureza. 7. REFERÊNCIAS ABBAGNANO, N., Opere filosofiche di Baruch Spinoza. Torino: UTET, 1972. AGOSTINO, La città di Dio. Milano: Rusconi, 1997. BRUCH, J. L., La philosophie religieuse de Kant. Mayenne: Aubier, 1968. CEBOLEIRO, M. J., Natureza em Kant. Revista portuguesa de filosofia, 49 (1993) 587-599. DINIS, A., A religião nos limites da simples razão. Revista portuguesa de filosofia, 49 (1993) 497-509. HUME, D., Opere filosofiche. Roma: Laterza, 1992. 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Aline de Fátima Coelho1 [email protected] Ana Cristina Campos Prado Teixeira2 [email protected] Thaís Aparecida da Silva3 [email protected] RESUMO As organizações estão sujeitas a atos errôneos e fraudulentos, que podem comprometer sua eficácia e credibilidade, existem conceitos e métodos de controles que visam organizar e proteger as empresas em seus controles internos como a controladoria, a auditoria interna e externa, que são componentes de boas práticas administrativas e de controle, ou seja de boa Governança Corporativa. O controle interno somente é capaz de evitar fraudes e erros através da criação de procedimentos precisos e com o comprometimento de seus membros, desse modo, este artigo teve como objetivo evidenciar a importância do controle interno eficiente, e de utilizar métodos de trabalho para garantir a segurança e a credibilidade das organizações. Palavras-chave Controle interno; fraude; controladoria;, Auditoria. ABSTRACT Organizations are subject to erroneous and fraudulent acts that could jeopardize its effectiveness and credibility, there are concepts and methods of controls that aim to organize and protect businesses in their internal controls as controlling, internal and external audit, that are components of good administrative practices and control, ie good corporate governance. Internal control is only able to prevent fraud and errors by establishing precise procedures and the commitment of its members, this way, this article aims to highlight the importance of internal control and using working methods to ensure the safety of company and shareholders. 1 Aline de Fátima Coelho. Discente do curso de Ciências Contábeis do UNIFEG. 2 Ana Cristina Campos Prado Teixeira. Mestrado em Ciências Contábeis e Atuariais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC). Docente do curso de Ciências Contábeis do UNIFEG. 3 Thaís Aparecida da Silva. Discente do curso de Ciências Contábeis do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 144 1. INTRODUÇÃO A busca pelas empresas em diminuir seus riscos nas tomadas de decisões propõe uma reflexão sobre a importância de um controle interno eficiente a fim de evitar atos fraudulentos ou errôneos que possam ocorrer dentro das empresas, consequentemente, gerando maior credibilidade. Para organizar este controle uma das metodologias utilizada pelas empresas é a controladoria, que foca seus esforços na otimização da empresa com um controle interno que envolva todas as áreas, gerando qualidade e transparência nas informações e gerando informações boas a tempo hábil para a tomada de decisão, esta boa organização e transparência são requisitos para a boa Governança Corporativa, quanto mais alto o grau de Governança melhor a empresa é aceita no mercado por clientes, fornecedores e acionistas, refletindo em melhores negócios. Estes controles devem ser comprovados, medidos e avaliados, isto é feito através da auditoria interna que é uma área dentro da empresa que tem como objetivo validar as informações geradas pelos seus próprios controles, fazendo com que esses controles fiquem cada vez mais eficientes, outra ferramenta é a auditoria externa é uma verificação de informações feitas por empresas externas e independentes que geram informações para usuários externos com credibilidade. A metodologia utilizada é a revisão de literatura através da apresentação de um referencial teórico contando com a opinião de autores consagrados na área contábil e administrativa. O objetivo é evidenciar a importância do controle interno eficiente na prevenção de erros e fraudes, o que assegura que a contabilidade gere informações confiáveis que possibilite a real avaliação da empresa por usuários internos como gerentes e tomadores de decisão e externos como acionistas, clientes, fornecedores, bancos. Esse trabalho se justifica na importância e atualidade do tema, uma organização com bons controles é bem vista pelo mercado, e confiança é condição para mais e melhores negócios. 2. O RISCO DE FRAUDES E ERROS E A CRIAÇÃO DA LEI SOX Existem casos recentes de fraudes milionárias que levaram muitas empresas multinacionais e grandes bancos a falência grande parte dessas fraudes foram realizada através de falsidade de dados internos e externos através de alterações de informações contábeis e muitas vezes por informações privilegiadas. Segundo Ferreira (1999) a palavra fraude significa “más artes que causam dolo, má-fé, candonga, contrabando, pia fraude: mentira ou engano para fim piedoso ou caritativo” defini-se portanto que fraude é algo malicioso, ocorre quando já se tem a intenção de dar o golpe em alguém, modificando resultados, documentos. Para Parodi (2008, p. 359) “a fraude interna entende-se como um conjunto muito amplo de atos ilícitos sofridos pelas empresas e perpetrados por funcionários, clientes ou fornecedores da mesma, ou seja, por pessoas que já mantém um relacionamento estável e normalmente de confiança com a empresa”. Crepaldi(2010, p. 377) enRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 145 fatiza que a fraude é “decorrente do enfraquecimento dos valores éticos, morais e sociais principalmente da ineficácia dos sistemas de controle interno”. É importante identificar a diferença entre erro e fraude, sendo fraude ação intencional e erro ação involuntária gerada por imperícia ou engano, é importante que o sistema de controle interno seja capaz de identificar as fraudes e erros e criar mecanismos de proteção. Na elaboração de projetos de combate as fraudes, Sá nos demonstra a realidade da situação em que se encontra o país, dizendo que: É errôneo admitir que controles sofisticados e muita burocracia sejam competentes para evitar fraude. Se assim fosse, a maquina publica tão burocrática e complicada, não seria um celeiro tão vasto de escândalos que tanto tem abalado esta nação. As fraudes são frutos de oportunidades, que por excesso de comando e por lacunas de fiscalização. (SÁ, 2008,p.27). Um dos escândalos de fraude mais conhecido no mundo é o caso a empresa Enron (KINDLEBERGER, 2009), ela era a sétima maior empresa de energia dos Estados Unidos onde suas principais atividades era comercialização de eletricidade e gás natural, suas receitas no ano 2000 ultrapassaram os US$ 60 bilhões. Pressionada em gerar lucro rápido e crescente, (SAMUELSON, 2012) a Enron contabilizou-se seus ganhos como receita corrente, ainda que as projeções estivessem baseadas em pressupostos altamente duvidosos levando a sua falência durante o ano de 2001, as ações da Enron caíram de US$ 86 para US$ 0,30. Tanto em empresas públicas quanto nas empresas privadas as fraudes e erros são evidentes demonstrando a fragilidade de seus controles internos e seus governantes. Escândalos corporativos derivaram-se da fragilidade do ambiente de controle, decorrente do baixo nível de comprometimento da média gerência com a qualidade dos controles internos contábeis utilizados na gestão de processos e dos riscos que ocasionam para a empresa, algumas leis foram criadas para extinguir esses atos ilícitos, uma das leis, mas conhecida segundo Leal (2002) é a lei SOX, sendo divisor de águas do que existia antes e depois de encarar a necessidade da excelência do controle interno, que passou de meros procedimentos de formalização a processos de exigência legal, Barbieri escreve como foi criada a lei Sox A lei SOX (Sarbanes – Oxley) é uma lei norte americana assinada em Julho de 2002, proposta pelo senador Paul Sarbanes (democrata Maryland) e pelo deputado Michael Oxley (republicano de Ohio) motivados por escândalos financeiros corporativos, dentre eles o da Enron, MCI, etc. Por afetarem drasticamente algumas empresas de auditoria e indiretamente a sociedade americana,que investia em empresas aparentemente sólidas, porém com uma fragilidade escondida através de seus controles. (BARBIERI, 2011, p.18). A lei SOX, oferece para a empresa maior confiabilidade, acarretando maior responsabilidade para o executante. Segundo Borinell (2012), a Lei Sox foca na responsabilidade corporativa no que se refere á veracidade do conteúRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 146 do dos informes contábeis produzidas e no gerenciamento e avaliação dos controles internos, a punição se dá por penas de multa ou prisão aos executivos da companhia caso sejam detectados divulgações de informações incorretas ou imprecisas. 3. CONTROLADORIA METODOLOGIA DE ORGANIZAÇÃO QUE POSSIBILITA A SEGURANÇA E QUALIDADE DAS INFORMAÇÕES Dentre as formas de organização de empresas uma que se destaca é a controladoria, esta desenvolve um papel importante ao medir a eficácia da empresa, auxiliando os gestores no processo de decisão, em busca da obtenção de excelência e organização. Cabe a controladoria organizar um eficiente controle interno e manter um constante processo de avaliação, com o objetivo de garantir a fidedignidade das informações para o processo decisório. Catelli (2001) complementa que o controle interno visa estruturar a empresa de modo que facilmente sejam identificados os pontos fortes e fracos, para que esse processo flua de forma fidedigna, sendo fundamental que as informações contidas em seus relatórios sejam transparentes e confiáveis. O controle tem objetivo de garantir que os resultados das ações planejadas, organizadas e dirigidas se adequem aos objetivos traçados, o controle é essencial para guiar um processo previamente estabelecido. (CHIAVENATO, 2003). Catelli (2001, p.61) enfatiza que o “controle visa assegurar por meio da correção de rumos que os resultados planejados sejam efetivamente realizados apoiando na avaliação dos resultados e desempenho”. Cada empresa adapta seu controle interno com seu ramo de atividade e o objetivos que a mesma deseja alcançar. Duas empresas não têm e não deveriam ter o mesmo sistema de controle interno, as necessidades das empresas e dos seus controles internos variam de um ramo de atividade para outro, e de acordo com o suporte da empresa sua cultura interna e sua filosofia gerencial, ou seja, controle interno sempre será diferente de uma empresa para outra (D`ÁVILLA, 2002. p, 25). O controle interno é monitorado pela Controladoria, através de um conjunto de investigações sobre as principais atividades da entidade, objetivando assim, o constante entendimento do fluxo das atividades, direcionando sua atenção para as possibilidades de ocorrência de fraudes causadas por falhas, o sistema de controle interno deve permitir detectar todas as irregularidades. Para eficácia desejada é necessário maior conscientização dos gestores das empresas sobre a importância do controle, conforme afirma Catelli: Somente os controles internos, constantes, adequados e eficazes podem tornar difíceis as ocorrências de fraudes Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 147 nas empresas. O fraudador sempre testa os controles internos antes de cometer a fraude programada. Um bom sistema de controle visa salvaguardar o ativo – proteger os ativos de eventuais roubos, perdas, uso indiscriminado ou danos morais. (CATELLI, 2001). Para que todas essas informações sejam analisadas sobre a sua real fidedignidade é necessário um profissional apto e treinado para que a confiabilidade das informações sejam autenticadas. Oliveira (2005) demonstra para que a controladoria flua bem dentro das empresas e necessário o auxílio de um líder para direcionar e solucionar fatos ocorridos na empresa, esta função pertence ao controller. Catelli (2001) enfatiza que o controller precisa ser um profissional altamente qualificado, que direciona todo fluxo de informações da organização, garantindo que as informações cheguem aos interessados de forma correta e confiável dentro dos prazos combinados. Um bom sistema de controle interno deve ser um conjunto de dados fornecidos através de documentos e registros contábeis.O foco é à geração de informações para a gerencia, os relatórios em vez de mostrar as transações ocorridas, passa a apontar, por meio de resumos e filtragens, indicadores-chaves para o monitoramento e análise das informações. Um modelo de informação não significa apenas possuir sistema que coordenem as atividades operacionais de uma empresa. Na verdade, possuir um modelo de informação requer adequação dos diversos sistemas existente em uma organização, os quais muitas vezes atuam de maneira isolada de modo de dar suporte ao processo decisório. Esta informação deve ser tanto de dados realizados quanto de tendências, visando proporcionar decisões para ao melhor resultado empresarial. (YOSHIKUMI, 2013, p.27) Dessa forma, entende-se que o sistema de informações gerenciais proporciona ao gestor condições de controlar as diversas rotinas administrativas e é fonte orientadora para o processo decisório, “os sistemas de informações nas empresas, exercem impactos na estrutura organizacional, influenciando a cultura, a filosofia, a política, os processos e os seus modelos de gestão”(REZENDE, 2008, p.90). Após todas as informações necessárias e confiáveis em mãos os resultados devem ser apresentados a presidência, juntamente com as alternativas de crescimento e resoluções de possíveis problemas que possam ocorrer internamente e externamente na empresa. 4. GOVERNANÇA CORPORATIVA BOAS PRÁTICAS DE GESTÃO De acordo com Cordeiro (2012) a governança corporativa é uma das ferramentas que auxilia, na concretização de maior credibilidade para as empresa que usufruem deste método e esta interligados com os métodos de controle. Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) governança corporativa é Governança Corporativa é o sistema pelo qual as organizações Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 148 são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo as práticas e os relacionamentos entre proprietários, conselho de administração, diretoria e órgãos de controle. As boas práticas de Governança Corporativa convertem princípios em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e aperfeiçoar o valor da organização, facilitando seu acesso ao capital e contribuindo para a sua longevidade. Diante da definição sobre governança corporativa a adoção de métodos que contribua para o crescimento da empresa é indispensável. As empresas que escolhem por implantar a governança em seu dia a dia, também contam com diversos benefícios que podem auxiliar no crescimento da empresa, desde que sejam seguidos com certa disciplina. O benefício que a governança corporativa proporciona às organizações está relacionado à melhoria dos negócios, transformando princípios em ações, visando preservar e aperfeiçoar o desempenho organizacional (LEAL, 2002). Adoção de boas práticas de governança tornou-se um dos requisitos básicos exigidos pelos investidores e pelas instituições do mercado. Todos estes métodos de controle interno enfatizam a importância nas informações geradas pelo controle interno. O autor Yoshitake (2009) complementa como que para transmitir mais confiabilidade no trabalho do controle interno os procedimentos devem receber um parecer da auditoria. Podendo assim demonstrar que o controle interno esta sendo eficiente em seu trabalho. 5. NECESSIDADE DE CONFERÊNCIA E COMPROVAÇÃO DE INFORMAÇÕES De acordo NBC TA 315(Normas Brasileira Contabilidade Técnica Auditoria) aprovada em 27 de novembro de 2009 pela resolução 1.212/2009 do Conselho Federal de Contabilidade - CFC item três o objetivo da auditoria é: É identificar e avaliar os riscos e distorções relevantes independente de ser causados por fraude ou erro, nos níveis da demonstração contábil e das afirmações, por meio do entendimento da entidade e do seu ambiente, inclusive do controle interno da entidade, proporcionando assim uma base para o planejamento e a implementação das respostas aos riscos identificá-los e distorções relevantes.(NBC TA 315). Por força da competitividade no mundo dos negócios, é imprescindível a utilização de métodos eficazes de controle interno para a avaliação de todas as informações e uteis utilizados a fim de reduzir e, se possível, eliminar a probabilidade de erros e fraudes, nesse sentido se faz necessária a auditoria, para que possa validar os resultados do controle interno. Por ser um campo muito abrangente, Hernandez (2004) divide a auditoria em duas partes: auditoria interna, o trabalho é executado por um funcionário da empresa o profissional responde pelos seus atos na forma trabalhista, já a Auditoria externa o trabalho é executado por um profissional sem vinculo com a empresa, o profissional responde pelos seus atos civil e criminalmente. Segundo (TOSTE, 2007)a auditoria interna é a ferramenta que avalia se Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 149 as normas e procedimentos criados pelo controle interno estão sendo eficientes e fidedignas, pois analisa documentos, livros e registros. Almeida demonstra a importância de se ter uma auditoria interna constantemente: Auditoria interna surgiu como uma ramificação da profissão de auditor externo e, consequentemente, do contador. O auditor interno é um empregado da empresa, e dentro de uma organização ele não deve ser subordinado aqueles cujo trabalho examina. Além disso, o auditor interno não deve desenvolver atividades que ele possa vir algum dia examinar, para que não interfira em sua independência (ALMEIDA, 2003, p. 29). A auditoria interna procura melhorar o desempenho da empresa em relação a os pareceres dados anteriormente por autores externos assegurando assim a eficácia do controle interno analisando se os objetivos foram alcançados e erros corrigidos. O objetivo geral da auditoria interna e assessorar a administração no desempenho eficiente de suas funções. Para Almeida (2003) uma das formas de garantir a confiabilidade das demonstrações contábeis seria se as mesmas fossem examinadas por um profissional independente da empresa e de reconhecida capacidade técnica, chamado auditor externo ou independente. A auditoria independente analisa as demonstrações financeiras de uma empresa, com a finalidade de expressar uma opinião sobre os resultados apresentados. A examinação deve ser feita de acordo com as normas de auditoria, fazendo um levantamento do que foi feito no sistema contábil da empresa e o controle interno, estabelecendo assim a profundidade do seu trabalho. (ATTIE, 1998) Pagliato (2007, p. 5) aponta que tipo de empresas tem a obrigatoriedade da contratação de auditores independentes para auditar as demonstrações contábeis são as “empresas pertencentes ao Mercado Financeiro e de Capitais, como bolsa de valores, associação de poupança, bancos de investimento/ capitais e múltiplos e etc.” Diante da função de cada uma das auditorias Attie em sua obra faz uma relação entre a auditoria independente e auditoria interna: A auditoria independente se preocupa com o controle interno, quanto aos possíveis efeitos que ele pode acarretar as demonstrações financeiras, base para a emissão de seu parecer, o auditor interno tem sua ótica voltada para que ele represente a sua organização, de forma a possibilitar o desenvolvimento harmônico, seguro e adequado de todas as ações e permitir o reflexo aos setores e pessoal interessado nas informações (ATTIE, 1998, p. 208). O fato principal da auditoria não é a detecção da fraude, mas sim o de emitir uma opinião quanto à veracidade das demonstrações contábeis “no entanto, na Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 150 execução do trabalho poderão ser detectados erros ou fraudes, cabendo ao auditor o dever de comunicar á administração da empresa, bem como seus reflexos nas demonstrações contábeis, incluindo também sugestões de correções” (ATTIE, 1998). “Com a abertura da economia brasileira e a privatização, vem atraindo cada vez mais novos investidores externos, no país consequentemente o aumento da procura de auditoria esta cada vez maior” (PAGLIATO, 2007, p. 6), com isso surge à necessidade de um controle interno eficiente dentro da empresa, pois ele proporciona segurança de que erros e irregularidades possam ser descobertos com mais rapidez, avaliando se a empresa é confiável ou não através de resultados examinados (ATTIE, 1998). Hernandez (1998) afirma que a auditoria, quando exercida com competência e seriedade, estará contribuindo para uma boa gestão empresarial, sendo fundamental que o auditor cumpra com sua obrigação e metas que deseja cumprir com extrema ética e zelo profissional. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao término deste artigo podemos verificar que considerando um ambiente suscetível a fraudes e erros, um eficiente controle interno se faz necessário, a medida que a empresa aumenta a sua estrutura, percebe-se a necessidade de um controle eficiente capaz de gerar dados confiáveis para seus usuários internos e externos de forma fidedigna, onde as metas e objetivos somente serão alcançadas quando o controle interno estruturar as informações de acordo com as suas necessidades. De acordo com o exposto por diferentes autores concluí-se que um controle interno organizado, bem planejado, eficiente e que envolva toda a organização traz benefícios as empresas, alem de diminuir os riscos de fraudes e erros, aumenta a confiança dos usuários internos e externos na organização, o que gera maior vantagem competitiva á empresa. Na busca obter resultados mais confiáveis, motivados por eventos reais, a criação da Lei Sarbanes Oxley, foi de extrema importância para que as empresas evoluíssem em termos de controles e organização, tornando os resultados das empresas mais confiáveis. É importante ressaltar que de nada vale possuir um controle interno sem manter os colaboradores envolvidos e comprometidos com objetivo e a finalidade da empresa executando suas funções de forma ética e respeitando os processos criados, de forma que as informações errôneas ou fraudulentas sejam descobertas durante o processo e que as informações geradas tenham credibilidades para que sirvam de base para a tomada de decisão. 7. REFERÊNCIAS ATTIE, William. Auditoria: Conceitos e aplicações – 3° ed. São Paulo: Atlas, 1998. BARBIERI, Carlos. B12: business intelligence, modelagem e qualidade, Rio de janeiro: Elsevier, 2011. CATELLI, Armando. Controladoria uma abordagem da gestão econômica, 2° ed., São Paulo: Atlas, 2001. 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Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 152 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 153 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente Antonio Vilas Boas Quintiliano Junior1 [email protected] Denise Osiro2 [email protected] RESUMO Neste trabalho foi feito um estudo da remoção de Cu2+ em solução utilizando como biossorvente resíduos de casca de laranja. O cobre é um elemento tóxico para os seres vivos quando em altas concentrações e contamina muitos efluentes por ser a base de muitos agrotóxicos utilizados em grande quantidade na agricultura. Biossorvente casca de laranja foi preparado da seguinte forma: secagem, trituração e classificação de acordo com a granulometria. Foram feitos ensaios que verificaram que o biossorvente com melhor adsorção de Cu2+ foi com granulometria maior que 1mm. Nos ensaios de adsorção, sempre realizadas em triplicatas, foram deixadas sob agitação constante 3,0g de biossorvente (casca de laranja com diâmetro maior que 1mm) em 25 mL de sulfato de cobre 0,1 mol/L a pH 3,5; sendo monitorada de hora em hora por 24 horas a absorbância da solução no comprimento de onda de 815nm. Os estudos de adsorção mostraram que a maior eficiência do processo ocorre nas primeiras 12 horas quando quase 80% do cobre em solução foram adsorvidos, após 24 horas a adsorção de cobre quase não alterou. Os resultados comprovam que a casca de laranja tem grande eficiência na remoção de cobre em solução. Palavras-chave Biossorvente, metal pesado, casca de laranja ABSTRACT In this work was made a study of the removal of Cu2+ in solution using as biosorbent rests of orange skin. In high concentrations the copper is a toxic element for the living beings and pollute many effluents to be used a lot in agriculture. The biosorbent orange skin was made in this way: drying, crunch and classification according to the particle size. Trials were made verifying that the biosorbent with best Cu2+ adsorption was with particle size greater than 1mm. 1 Antônio Vilas Boas Quintiliano Júnior. Discente do curso de Química Industrial do UNIFEG. 2 Denise Osiro. Doutorado em Química (Química Analítica) pela Universidade de São Paulo (USP). Docente do curso de Química Industrial e Engenharia Química do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente 154 In the adsorption trials, always done in triples, were left under constant agitation 3,0g of biosorbent (orange skins with diameter greater than 1mm) in 25ml of copper sulfate 0,1 mol/L in pH 3,5; being monitorated the solution absorbance in the wavelength of 815 nm hourly for 24 hours. The adsorption studies show that the greater efficiency of the process occurred on the first 12 hours when almost 80% of the copper in solution was adsorbed, after 24 hours the adsorption of copper not changed. The results prove that the orange skin has high efficiency on the removal of copper in solution. 1. INTRODUÇÃO A escassez crescente dos recursos hídricos tem motivado pesquisas que colaborem na preservação e descontaminação de efluentes industriais e urbanos. Dentre os diversos contaminantes químicos gerados pelo setor industrial e agroindustrial destaca-se a contaminação por metais pesados, como cobre, cádmio, mercúrio, chumbo, entre outros. Na literatura, encontram-se estudos sobre a utilização de resíduos provenientes da agroindústria como biossorventes de metais pesados, como casca de arroz e bagaço de cana de açúcar. O presente trabalho tem como objetivo propor um tratamento alternativo para a adsorção de metal pesado em efluentes contaminados. Este estudo foi motivado pela importância de utilizar a casca de laranja, que é uma biomassa na maioria das vezes desprezadas no setor agroindustrial, como adsorventes para a remoção do metal pesado (cobre II). 2. RECURSOS HÍDRICOS E CONTAMINAÇÃO A água é crucial a vida, porém, sua qualidade e disponibilidade têm sido afetadas pela decorrente necessidade de aumento na produção de alimentos e na industrialização, exigindo um crescente consumo para os mais diversos fins. A água, que através do ciclo hidrológico poderia ser considerado um recurso mineral renovável, não pode ser mais considerado assim. O despejo de dejetos nos cursos de água tem sido enorme, degradando os ecossistemas aquáticos (SCHNEIDER, 2003). Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), responsável pela regulação e gestão das águas no Brasil, nosso país possui 13% dos recursos hídricos superficiais de água doce disponíveis no planeta. No entanto, esse sistema é bastante frágil. São vários os poluentes descartados em nossos rios, incluindo óleos, pesticidas, tensoativos, corantes, metais pesados entre outros (SCHNEIDER, 2003). Os resíduos sólidos geralmente são amontoados e enterrados; os líquidos são despejados em rios e mares; os gases são lançados no ar. Assim, a saúde do ambiente, e consequentemente dos seres que nele vivem, torna-se ameaçada. O consumo habitual de água e alimentos - como peixes de água doce ou salgada contaminados com metais pesados coloca em risco a saúde, passando a um problema social (BARROS, 2010)l. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente 155 2.1 Contaminação por metais pesados Os metais pesados são elementos químicos que possuem numero atômico de 22 a 92 encontrados na tabela periódica nos grupos de 3 a 7 (FRANCISCHETTI, 2004). Eles recebem essa denominação por possuírem densidade superior a 5 g/cm3, embora essa denominação não seja apropriada do ponto de vista químico, sendo também conhecidos como metais traço (elementos traço) em função da baixa concentração em meios ambientais (BAIRD, 2002). Os metais pesados são geralmente tóxicos ao organismo por reagir com ligantes presentes em membranas, com macromoléculas e com ligantes difusores, sendo biocumulativos na cadeia alimentar, no meio ambiente e no processo metabólico de diversos seres vivos (BAIRD, 2002). A poluição por metais pesados resulta de diferentes atividades econômicas, a maioria delas industriais, mas também contribui as atividades agrícolas e rejeitos domésticos. Efluentes contendo metais como cádmio, cobre, chumbo e cromo exibem elevada biotoxicidade, em geral com efeitos acumulativos no bioma (BARROS, 2010). A remediação de efluentes contaminados pode ser feita por vários processos de tratamento alternativos, porém, as fontes de contaminação são extensas e variadas. 2.1.1. Cobre O cobre é um metal amplamente encontrado na natureza nas formas mono e bivalente, podendo ser encontrado na forma pura, porém na maioria das vezes se apresenta como mineral (FRANCISCHETTI, 2004). O cobre é utilizado em diversas aplicações industriais como manufatura de fios condutores, tubulações residuais, produção de inseticidas, baterias; em função da sua maleabilidade, ductibilidade, condutibilidade elétrica e térmica (CAMPAGNA, 2005). Apesar de ser considerado um elemento traço essencial (nos processos fisiológicos e bioquímicos) para todos os seres vivos por participar da formação de hemácias e leucócitos (componentes de muitas enzimas), pode se tornar tóxico para os seres vivos quando em altas concentrações por contato direto ou indireto em períodos prolongados de exposição (FRANCISCHETTI, 2004). De um modo geral, o contato com o cobre é ocasionado por fontes antropogênicas, na maioria das vezes provenientes de descartes industriais (FRANCISCHETTI, 2004). Assim, a concentração máxima de cobre estabelecida para águas destinadas ao abastecimento público é de 2mg/L segundo a portaria 2914/2011 do Ministério da Saúde (CETESB, 2012). Quando dissolvido em meio aquático pode conter íons livres, estar complexado por ligantes orgânicos ou inorgânicos, formar complexos com bases duras (nitratos, sulfatos, carbonatos, cloretos, amônia e hidróxidos) (CAMPAGNA, 2005). Quando depositado em sedimentos pode se associar com a matéria orgânica (se adsorve com hidróxidos, óxidos de ferro ou manganês), podendo ainda precipitar na forma de sulfatos, carbonatos ou hidróxidos (CAMPAGNA, 2005). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente 156 3. O PROCESSO DE ADSORÇÃO Entende-se por adsorção o processo que envolve a transferência de um constituinte de um fluído (gás ou líquido) para uma superfície de uma fase sólida (CASTELLAN, 1986). O método de adsorção pode ser empregado como uma forma alternativa para a remoção de metais tóxicos presentes em efluentes, no qual duas espécies coexistem: o adsorvente e o adsorbato. Sendo o primeiro, o material sólido sobre o qual ocorre a adsorção, e o último a substância fluída adsorvida (SOUZA et. al., 2012). Nesse fenômeno físico-químico de tratamento, a massa da fase fluida é transferida para a superfície sólida, acumulando-se sobre a superfície (KIELING, MORAES, BREHM, 2009). A palavra adsorção provém do termo geral sorção que também inclui a palavra absorção. A adsorção refere-se ao processo de concentração de uma substância em uma superfície ou interface, por outro lado, a absorção refere-se ao processo de acumulação pela interpenetração de uma substância em outra fase (COSTA, SCHNEIDER, RUBIO, 1999). Para que o processo de adsorção produza o efeito desejado, alguns critérios básicos devem ser obedecidos, como: estar disponível em grandes quantidades, apresentar baixo custo, alta capacidade e alta seletividade (SOUZA et. al., 2012). Assim, a busca por materiais que proporcionem um desempenho eficaz, agregado a um baixo custo tem se tornado uma alternativa potencialmente atrativa, direcionando-se o foco para as biomassas constituídas de restos de substancias naturais (COSTA, SCHNEIDER, RUBIO, 1999). Diversos são os materiais que podem atuar como adsorventes, entre esses materiais estão: os micro-organismos (fungos, bactérias e microalgas), vegetais macroscópicos (plantas aquáticas, algas e gramíneas), tecidos específicos de vegetais (casca, bagaço e semente), materiais de origem mineral (zeólitas, bentonitas e diatomita) e ainda subprodutos de origem mineral (argilas, dolomita, pirita, etc.) (COSTA, SCHNEIDER, RUBIO, 1999). 3.1 Biossorventes Os biossorventes são materiais de origem biológica que possuem a capacidade de absorver e/ou adsorver íons metálicos dissolvidos. Essa biomassa pode atuar de forma ativa (com atividade metabólica) ou inativa (sem atividade metabólica) (CARVALHO, 2013). A biossorção resulta de interações eletrostáticas e também da formação de complexos entre os íons metálicos e os grupos funcionais presentes na superfície celular, quando estes exibem alguma afinidade físico-química pelo metal. Os grupos funcionais como cetonas, aldeídos, carboxilas, presentes na parede celular desses biossorventes, são responsáveis pela captação de metais tóxicos (RODRIGUES, 2006). Diversas pesquisas apresentaram resultados satisfatórios envolvendo uso Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente 157 de biomassas para a remoção de metais e também para a remoção de outros poluentes aquosos, como por exemplo: resíduo sólido de mamona (CARVALHO, 2013), plantas aquáticas (SCHNIDER, 2003; COSSICH, 2000), argilas (MARQUES, SAN GIL, 2003), serragem (RODRIGUES, 2006), hidroxiapatita (MAVROPOULOS, 1999), cascas de diversas frutas (MONTANHER, 2009; SOUZA et. al., 2012; BATISTA, 2014), cascas de arroz (KIELING, MORAES, BREHM, 2009). 3.2 Biossorvente casca de laranja A citricultura brasileira segundo a Revista Científica Eletrônica de Agronomia (2011) lidera o ranking mundial na produção de citros, sendo o estado de São Paulo o responsável por 85% da produção do país; seguido dos estados de Rio de Janeiro, Minas Gerais, Sergipe, Rio Grande do Sul e Paraná (REZZADORI & BENEDETTI, 2009). Mesmo sabendo que o suco é o principal produto da laranja, outros subprodutos também são obtidos da polpa, casca e sementes durante o seu processo de fabricação, dentre eles: óleos essenciais, terpenos, d-limoneno, farelo de polpa cítrica e líquidos aromáticos (MARTINI, 2009). Esses subprodutos apresentam diversas funções em diferentes tipos de mercados, incluindo a produção de insumos na indústria de bebidas, cosméticos e perfumes, fabricação de tintas e solventes, complemento para a ração animal (principalmente na pecuária) entre outros (MARTINI, 2009). A casca da laranja é constituída principalmente de carboidratos, sendo aproximadamente 16,9% de açúcares solúveis (glicose frutose e sacarose) e polissacarídeos insolúveis contidos na parede celular da casca de laranja: 9,21% de celulose, 10,5% de hemicelulose, e 42,5% de pectina (REZZADORI & BENEDETTI, 2009). Na literatura podem-se encontrar diversos estudos de adsorção utilizando como biomassa adsorvente os resíduos de laranja devido a sua “grande produção renovável”, “baixo custo” e a “grande capacidade desse material em reter íons metálicos“ (MONTANHER, 2009; SOUZA et. al., 2012; BATISTA, 2014). 4. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL 4.1 Determinação da concentração de metal por UV-Visível Para determinação da concentração de Cu2+ foi utilizado à técnica de espectroscopia de Uv-Visível. A medida foi feita em um espectrofotômetro UV/ Vis de marca Femto modelo 700 plus operando no comprimento de onda de 815 nm. A curva analítica padrão para determinação da concentração de Cu2+ das amostras analisadas é mostrada na figura 1. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente 158 Absorbância 1,2 1 y = 10,561x + 0,0098 R² = 0,998 0,8 0,6 Absorbância 0,4 Linear (Absorbância) 0,2 0 0 0,02 0,04 0,06 0,08 0,1 0,12 Concentração (mol/L) Figura 1: Curva analítica padrão da solução de sulfato de cobre 0,1 mol/L obtida no comprimento de onda de 815nm. 4.2 Obtenção do biossorvente casca de laranja As amostras de cascas de laranja (biossorvente) foram inicialmente secas em estufas por 48 horas a 60°C, depois foram trituradas em um liquidificador. A amostra triturada foi separada e classificada em um agitador eletromagnético de peneiras redondas para análises granulométricas de marca Bertel (Indústria Metalúrgica Ltda.). Foram obtidas cinco frações de acordo com as peneiras utilizadas: partículas de tamanhos maiores que 1mm; entre 1mm e 0,6mm; entre 0,6mm e 0,125mm; entre 0,125 e 0,063mm; ente 0,063 e 0,045 mm. Foram realizados testes de adsorção utilizando as 5 frações de tamanhos diferentes de biossorvente, sendo essas análises realizadas em triplicatas para cada fração. Amostras de 0,25g do biossorvente foram adicionadas em erlenmeyers de 250 mL contendo 25 mL de sulfato de cobre 0,1 mol/L a pH 3,5 e ficaram por 4 horas sob agitação, sendo em seguida as soluções filtradas e analisadas por Uv-Visível. Em todas as análises de Uv-Visível para testar a adsorção do Cu2+ pelas amostras de casca de laranja teve-se o cuidado no preparo do branco para calibração do zero de absorção pelo espectrofotômetro. As soluções utilizadas como branco nas análises foram preparadas agitando massa equivalente de biossorvente em água deionizada a pH 3,5 por 4 horas e depois filtradas. Ou seja, para cada ensaio de adsorção em solução de Cu2+ foi preparado um branco utilizando a mesma amostra de biossorvente em água deionizada. Nas análises testando as diferentes granulometrias da casca de laranja observou-se que a fração que melhor adsorveu Cu2+ foi a com diâmetro maior que 1mm. As análises de Uv-Visível foram obtidas no comprimento de onda de 815nm. Os cálculos de adsorção de Cu2+ foram feitos a partir da curva de analítica padrão mostrada na figura 1 e seguindo a Lei de Lambert-Beer: A = ε ⋅l ⋅C Onde: A= Absorbância, ε= Absorvidade Molar (L/ mol.cm), l= caminho óptico (cm), C= Concentração (mol/L). Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente 159 Com as concentrações obtidas, calculou-se a porcentagem de adsorção por meio do seguinte cálculo matemático: Onde: %Ads= porcentagem de adsorção, Ci= concentração inicial da solução, Cf = concentração final da solução. Nos ensaios seguintes utilizando apenas a fração de casca de laranja com granulometria maior que 1mm determinou-se qual a concentração de biossorvente (massa de biossorvente/mL de solução de sulfato de cobre 0,1 mol/L) possuía melhor capacidade de adsorção de Cu2+. Todos os testes foram realizados sempre em triplicata. Assim para este teste, amostras de 0,25g; 1,0g; 1,5g; 2,0g; 2,5g; 3,0g; 3,5g e 4,0g de biossorvente, foram adicionadas em erlenmeyers de 250 mL contendo 25 mL de sulfato de cobre 0,1 mol/L a pH 3,5 e mantidas sob agitação por 4 horas, sendo em seguida filtradas e analisadas por Uv-Visível a 815nm. Após as medições em Uv-Visível, observou-se que a quantidade em massa de biossorvente que adsorveu a maior quantidade de Cu2+ foi a de 3g de casca de laranja/25 mL de sulfato de cobre 0,1 mol/L. Em seguida obteve-se a curva de adsorção do Cu2+ pelo biossorvente em função do tempo de contanto com a solução de Cu2+. Para este teste, amostras de 3,0g da fração com diâmetro acima de 1mm, foram adicionadas em erlenmeyers de 250 mL contendo 25 mL de sulfato de cobre 0,1 mol/L a pH 3,5 e ficaram por até 24 horas sob agitação. As medições de Uv-Visível foram feitas de hora em hora até as 12 horas e depois após 24 horas. 5. RESULTADOS E DISCUSSÕES A fração de casca de laranja com diâmetros maiores que 1mm foi a que apresentou melhor resultado nos testes de adsorção de Cu2+, portanto o melhor resultado foi obtido com a maior granulometria testada, isso deve ser justificado considerando as frações com menor granulometria, nas quais observou-se a formação de aglomerados. Segundo Montanher (2009), “a quantidade de adsorvente aumenta de forma exagerada tornado-se uma aglomeração que resulta na redução da superfície de contato diminuindo a interação dos íons com os grupos presentes nos sítios ativos”. Nas análises para determinar a melhor concentração de massa de casca de laranja nos testes de adsorção de Cu2+, também foi possível observar a formação de aglomerados em concentrações maiores de 3,0g de biossorvente/25 mL de sulfato de cobre 0,1 mol/L. A figura 2 (a) mostra a variação da concentração de Cu2+ em função do tempo, onde se pode observar a maior diminuição da concentração de cobre nas primeiras 12 horas. A figura 2 (b) mostra a porcentagem de adsorção de Cu2+ em função do tempo, pela casca de laranja com diâmetro maior que 1mm. Esses resultados foram obtidos monitorando a concentração de Cu2+ através das análises de UV/visível a 815nm. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 160 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente Figura 2: (a) Gráfico da concentração do sulfato de cobre em função do tempo. (b) Gráfico da porcentagem de adsorção de Cu2+ vs tempo (horas). No gráfico de porcentagem de adsorção em função do tempo nota-se que, após 12h, 79% do sulfato de cobre na solução tinha sido adsorvido e, após 24h, a adsorção era de 81,82%. Portanto, após 12h houve pouca variação na adsorção. Durante o contato do biossorvente com a solução de sulfato de cobre, ocorreu-se principalmente o chamado fenômeno de sorção física (fissorção), onde interações entre as moléculas de cobre e os grupos funcionais (grupos carboxílicos) dos sítios ativos da amostra se deram por meio de forças de Van der Waals que apesar de serem interações de longo alcance, são relativamente fracas (CASTELLAN, 1986). No intervalo entre 12 e 24 horas, não houve variação na adsorção, isso pode ser explicado pelo fato dos sítios ativos, que apresentam grupos com carga ou densidade de carga negativa (como COOH, C=O e NH) estar saturados com Cu2+. Uma forma de aperfeiçoar o trabalho para obter resultados mais satisfatórios em menor quantidade de tempo seria modificando o biossorvente como descrito no trabalho de doutorado de Montanher (2009), em que se alterou o pH do material por meio de tratamento com NaOH, fazendo com que os grupos carboxílicos presentes nos sítios ativos ficassem desprotonados atraindo os íons cobre (Cu2+). Assim, ocorrendo o chamado fenômeno de sorção química (quimiossorção), em que os íons unem-se por ligações químicas acoplando-se aos grupos dos sítios ativos. Neste trabalho não foi realizado este ajuste para pH neutro visto que o sulfato de cobre precipita em pH maior que 4,5 (CASTELLAN, 1986). 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir das análises foi possível observar que o biossorvente casca de laranja apresentou-se como um removedor eficiente de cobre (Cu2+), sendo que o melhor resultado de adsorção foi obtido em 12h com quase 80% de adsorção do cátion. No entanto, através do tratamento do material, como a alteração de pH, é possível chegar a resultados extremamente satisfatórios com um tempo de contato mais efetivo entre o biossorvente e o metal em menor quantidade de tempo. Com base nos resultados obtidos e em outros estudos descritos na literatura, pode-se concluir que o método de remoção de metais pesados de efluentes líquidos por adsorção utilizando a casca de laranja é uma técnica eficaz, prática, de baixo custo. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Remoção de metais pesados utilizando resíduos da casca de laranja como biossorvente 161 7. REFERÊNCIAS BAIRD, Collin. Química ambiental. 2ed. Porto Alegre: Bookman, 2002. BARROS, Willyam Róger Padilha. Modificação do Mesocarpo do coco babaçu (Orbignyaspeciosa) modificado com aminas como removedores de íons cobre em meio aquoso e em aguardentes de cana-de-açúcar. São Luís, 2010. 108f. 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Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 163 Responsabilidade civil subjetiva e responsabilidade civil objetiva Laura Charallo Grisolia Elias1 [email protected] Maurício Martins2 [email protected] RESUMO O presente artigo é fruto do resultado de pesquisa realizada pelos autores, sobre a responsabilidade civil e seus pressupostos. Alguns defendem a responsabilidade civil exclusivamente subjetiva, fundada em culpa do agente. Outros defendem a tese da responsabilidade civil alicerçada na teoria do risco, que substitui a culpa. Uma terceira corrente abraça uma posição mais eclética, em que subsistiria a convivência das duas teorias. Pretendemos com o presente trabalho conhecer um pouco mais das principais teorias que determinam a responsabilidade civil, bem como procurar definir qual corrente, hodiernamente, é tida como a mais aceita não só pela doutrina, mas também pela legislação e pela jurisprudência atual. A questão é de grande relevância acadêmica, social e profissional. Em que pese o atual estágio da discussão em torno da questão da responsabilidade objetiva, alguns juristas ainda resistem a admitir a responsabilidade sem culpa. Não resta dúvida de que a necessidade de demonstrar culpa do agente é tarefa difícil em determinados casos, o que provoca repercussão iminente na esfera social, pois é determinante na efetiva reparação do dano. Para os profissionais do direito a questão é de suma importância, na medida em que orienta e define as provas que deverão ser produzidas e aquelas que não são essenciais para o êxito da demanda. Iniciaremos a pesquisa pela análise das doutrinas acerca da responsabilidade subjetiva e da responsabilidade objetiva, quais os pressupostos da primeira e quando se torna possível a aplicação da segunda, que está estreitamente relacionada com as disposições legais e com as atividades de risco. Em seguida, faremos um estudo de casos, analisando a jurisprudência atual e a definição de responsabilidade pelos nossos tribunais. Palavras-chave Responsabilidade civil; pressupostos; teoria 1 Laura Charallo Grisolia Elias. Advogada. Graduada no curso de Direito do UNIFEG. 2 Maurício Martins. Mestrado em Direito pela Universidade de Franca (UNIFRAN). Docente do curso de Direito e Administração do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 164 1. CONCEITO DE RESPONSABILIDADE CIVIL O vocábulo “responsabilidade” tem origem no verbo latim respondere, que significa a obrigação que as pessoas tem de arcar com as consequências jurídicas provocadas por seus atos ou por sua atividade. Segundo Maria Helena Diniz3, são grandes as dificuldades que a doutrina tem enfrentado para conceituar a responsabilidade civil. Alguns a definem na culpa, ou seja, no dever de reparar os danos causados pelas consequências de suas ações. Outros vão além, e a definem como obrigação de reparar o dano causado por ação própria ou ainda de pessoas ou coisas que dele dependam. E, por fim, ainda há aqueles, com entendimento de aspecto mais amplo, para quem a responsabilidade não tem sua origem na culpa, mas na teoria do risco. Silvio Rodrigues4, citando SAVATIER, conceitua responsabilidade civil como “a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio ou por fato de pessoas ou coisas que dele dependam”. Para Maria Helena Diniz5, a responsabilidade civil é: “a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”. Para simplificar, se assim podemos dizer, a responsabilidade civil é o dever de reparar o dano causado em razão de conduta própria ou de terceiro, ou ainda em razão de dever legal. 2. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OS PRESSUPOSTOS NECESSÁRIOS À SUA CONFIGURAÇÃO A doutrina não é unânime quando apresenta os elementos indispensáveis à caracterização da responsabilidade civil. Para alguns juristas, a caracterização da responsabilidade depende da existência da culpa, e a imputabilidade; outros, ainda exigem a ocorrência do fato danoso, o dano e a antijuridicidade ou culpabilidade. Para Wladimir Valler6 e também Rui Stoco7, os requisitos essenciais que integram a responsabilidade civil são: a) o ato ou omissão violadora do direito de outrem; b) o dano produzido por esse ato ou omissão; c) a relação de causalidade entre o ato ou omissão e o dano e d) a culpa. Maria Helena Diniz8 lista três pressupostos caracterizadores da responsabilidade civil: a) existência de uma ação (comissiva ou omissiva); b) ocorrência 3 4 5 6 7 8 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 33. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 6. DINIZ, op. Cit., p. 34. VALLER, Wladimir. Responsabilidade civil e criminal nos acidentes automobilísticos. 4. Ed. São Paulo: Julex, 1993. p. 14. STOCO, op. Cit., p. 131. DINIZ, op. Cit., p. 35. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 165 de um dano; c) nexo de causalidade entre o dano e a ação. Necessário se faz, para a compreensão do tema, o estudo pormenorizado de cada um dos pressupostos, o que passaremos a verificar. 2.1 Ação A ação é o elemento primário constitutivo da responsabilidade. Caracteriza-se pela conduta humana omissiva, aquele que deixa de praticar o ato ao qual estava obrigado; ou comissiva, que se caracteriza pela prática de ato que não deveria ser praticado. Pode ser voluntária ou não, lícita ou ilícita, própria do agente ou de terceiro que dele dependa, ou ainda o fato de animais ou coisa inanimada, que cause dano moral ou patrimonial a determinada pessoa. Como pressuposto da responsabilidade subjetiva, somente o ato ilícito, contrário à ordem legal, enseja a obrigação de indenizar. O exercício regular de direito, a priori, não obriga ao ressarcimento do prejuízo causado. Evidente que essa questão será novamente abordada quando do estudo da responsabilidade objetiva, cuja teoria está associada à responsabilidade sem culpa. Por hora somente nos interessa a responsabilidade decorrente de ato ilícito. Essa responsabilidade está prevista no caput do artigo 927 do Código Civil Brasileiro, que assim dispõe: “Art. 927. Aquele que por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Por ato ilícito devemos entender aquele praticado em desacordo com nosso ordenamento jurídico ou aquele ato que deveria ser praticado e não o foi em razão da omissão do agente. O artigo 186 do CCB conceitua ato ilícito como “aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Desta forma, fácil concluir que o ato ilícito está estreitamente relacionado ao comportamento culposo ou doloso do agente. Vale ressaltar que existe culpa mesmo que a conduta do agente seja praticada sem que este tenha conhecimento da ilicitude de seu ato: o simples dano causado pela conduta culposa, ainda que inconsciente, enseja a obrigação de ressarcimento do prejuízo. 2.2 Dano O dano é elemento essencial e um dos pressupostos indispensáveis para a caracterização da responsabilidade civil. Assim o é porque não se há que falar em ressarcimento sem a existência de um prejuízo. Maria Helena Diniz9 ensina que para que haja dano indenizável, será imprescindível a ocorrência, dentre outros, dos seguintes requisitos: a) diminuição ou destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral, pertencente a uma pessoa; b) efetividade ou certeza do dano. Indubitavelmente o dano pode ser patrimonial ou moral. O primeiro caracteriza-se em razão da ocorrência de uma lesão concreta ao patrimônio da ví9 DINIZ, op. Cit., p. 58. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 166 tima, que pode ser objeto de avaliação pecuniária e ressarcimento em seu exato valor. Já o dano moral não é passível de aferição, pois não se pode atribuir um preço à dor sofrida pela vítima, mas tem a indenização o efeito de amenizar um pouco o sofrimento causado pelo ilícito praticado. O dano patrimonial comporta diversas variantes. Dentre outros, podemos citar como os mais comuns: o dano emergente (o prejuízo efetivamente sofrido); lucro cessante (aquilo que o lesado deixou de lucrar em razão do dano); dano ao corpo (caracterizado por uma lesão passível de cura e cuja indenização seria o valor do tratamento); e o dano estético (constituído pelo aleijão que deforma a vítima). Por outro lado, o dano moral seria a lesão de interesses não patrimoniais causada em razão do evento danoso. A integridade moral e a inviolabilidade dos bens inerentes à personalidade estão protegidas pela Carta Magna (artigo 5º, incisos V e X) e exigem plena reparação quando violadas. A efetividade do dano é essencial, pois não pode ser hipotética. O dano deve ser real e efetivo, dependendo de demonstração. 2.3 Nexo de causalidade O terceiro pressuposto para a caracterização de responsabilidade civil subjetiva é o nexo de causalidade entre a ação e o dano provocado. Um ato ilícito, provocado em razão de um erro na conduta do agente, por si só não é merecedor de indenização. Também a simples existência de um dano não enseja direito a ressarcimento, senão quando ligados um ao outro. Rui Stoco10 assim preleciona: “Não basta que o agente haja procedido contra jus, isto é, não se define a responsabilidade pelo fato de cometer um erro de conduta. Não basta, ainda, que a vítima sofra um dano, que é o elemento objetivo do dever de indenizar., pois se não houver um prejuízo a conduta antijurídica não gera obrigação de indenizar (...) É necessário, além da ocorrência dos dois elementos precedentes, que se estabeleça uma relação de causalidade entre a injuricidade da ação e o mal causado, ou, na feliz expressão de Demogue, ‘é preciso esteja certo que sem este fato o dano não teria acontecido’. Assim, não basta que uma pessoa tenha contravindo a certas regras, é preciso que sem esta contravenção, o dano não ocorreria”. Não podemos ainda nos olvidar que alguns motivos excluem ou amenizam a responsabilidade, tais como: a culpa exclusiva da vítima, a culpa concorrente, a culpa comum, a culpa de terceiro, a ocorrência de força maior ou caso fortuito. Portanto, vimos que a responsabilidade civil subjetiva é caracterizada pela ação culposa imputável ao agente, e que seus pressupostos são a ação, o dano e o nexo de causalidade. 10 STOCO, op. Cit., p. 89. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 167 No entanto, nosso ordenamento jurídico brasileiro prevê uma outra espécie de responsabilidade civil, que independe de culpa para a sua caracterização. Basta que a pessoa exerça certa atividade de risco ou então que a legislação determine a responsabilidade de indenizar. É a responsabilidade civil objetiva. 3. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA Conforme já mencionamos, a responsabilidade civil é determinada pela ocorrência de três pressupostos: ação culposa, dano e nexo de causalidade entre os dois primeiros. Contudo, com o desenvolvimento dos povos, a teoria subjetiva, calcada na demonstração de culpa do agente, tornou-se insuficiente para cobrir todos os casos de danos ocorridos hodiernamente. Verificou-se que nem sempre o lesado conseguia demonstrar a culpa do agente, ficando constantemente sem a devida e merecida reparação. Indignados com essa situação, grandes juristas contestaram o sistema subjetivo, e se empenharam em buscar outras técnicas hábeis a desempenhar a devida cobertura para a reparação do dano. Foi assim que surgiu a doutrina objetiva. Parte deste processo de evolução foi desempenhado pela teoria da culpa presumida, que, de certa forma, já relegava à culpa do agente uma importância secundária na reparação do dano. Maria Helena Diniz11, em seus ensinamentos, assim preleciona: “A corrente objetivista desvinculou o dever de reparação do dano da ideia de culpa, baseando-o no risco com o intuito de permitir ao lesado, ante a dificuldade da prova da culpa, a obtenção de meios para reparar os danos experimentados”. Desta forma, o dever indenizatório estabelecido por lei ocorre sempre que presente o evento danoso, independentemente da existência de infração a norma legal. Rui Stoco12, com a maestria que lhe é peculiar, esclarece os meandros da teoria objetiva: “A doutrina objetiva, ao invés de exigir que a responsabilidade civil seja a resultante dos elementos tradicionais (culpa, dano, vínculo de causalidade entre uma e outro) assenta-se na equação binária cujos polos são o dano e a autoria do evento danoso. Sem cogitar da imputabilidade ou investigar a antijuridicidade do fato danoso, o que importa para assegurar o ressarcimento é a verificação se ocorreu o evento e se dele emanou o prejuízo”. Fácil observar que essa teoria tem como fundamento a atividade exercida pelo agente, pelo perigo que pode causar a terceiro, expondo ao risco a vida, a saúde ou outros bens. 11 DINIZ, op. Cit., p. 48. 12 STOCO, op. Cit., p. 151. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 168 Para Caio Mário13, o conceito de risco que melhor se adapta às condições da vida social é: “o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade gera para os indivíduos, independentemente de determinar se em cada caso, isoladamente, o dano é devido à imprudência, à negligência, a um erro de conduta, e assim se configura a ‘teoria do risco criado’”. Nosso ordenamento jurídico, em que pese adotar o princípio geral da responsabilidade civil alicerçada em culpa, prevê também, em várias passagens, a teoria do risco, conforme se verifica na legislação sobre acidentes de trabalho; legislação sobre transportes; na legislação de proteção aos consumidores; em relação à responsabilidade do Estado e outras mais. O Código Civil de 2002 inovou, e expressamente determinou a responsabilidade independentemente de culpa. No caput do artigo 927, que inaugura o Título da Responsabilidade Civil, o legislador estabeleceu a responsabilidade decorrente do ato ilícito. Porém, no parágrafo único14 do mencionado artigo, o legislador determinou que também existe obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, quando a lei assim o determinar ou ainda quando o agente exerce atividade de risco. Realmente várias são as situações em que a lei determina a responsabilidade objetiva, conforme já mencionamos alhures. Por outro lado, o próprio estatuto civil prevê várias hipóteses que contemplam a teoria do risco, como é o caso dos artigos 931, 932, 933, 936 e 938. Lado outro, pode-se dizer que uma das virtudes do atual Código Civil está no fato de adotar e recepcionar o que a doutrina e a jurisprudência já havia consagrado, no tocante ao exercício de atividade perigosa. Essa teoria não é nova e já havia sido adotada em vários países, como, por exemplo, na Itália, onde vige desde 1865. A adoção dessa teoria pelo nosso ordenamento jurídico modificou consideravelmente a importância da culpa para a responsabilidade civil. Consequentemente, restringiu as causas de exclusão da responsabilidade em razão de quebra do nexo causal previstas no item 3.3 deste trabalho. O caso fortuito, a força maior e até mesmo o fato de terceiro deixam de ser causa excludente da responsabilidade de indenizar. Rui Stoco15 adverte que: “Como se verifica, o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil de 2002 ampliou o campo de ilicitude e redimensionou o conceito de culpa e, ainda, estabeleceu, desenganadamente, mesmo que por exceção, verdadeira hipótese de responsabilidade objetiva, mitigando e restringindo, dessa forma, as definições de caso fortuito, força 13 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 268. 14 Artigo 927, parágrafo único: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem”. 15 STOCO, op. Cit., p. 167. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 169 maior e do chamado fato de terceiro, como excludentes da responsabilidade por rompimento do nexo causal, que tem por tarefa ligar a ação ou omissão voluntária do agente ao resultado lesivo”. No entanto, com a adoção dessa teoria, uma questão muito importante se faz presente: quais são as atividades perigosas? O legislador não especificou quais são as consideradas atividades perigosas. Deixou essa definição por conta do Poder Judiciário, que deverá analisar caso a caso, e decidir aquele que deve ser assim considerado. Agiu bem o legislador, mesmo porque com o avanço tecnológico, modificações ocorrem diariamente, e uma atividade considerada perigosa hoje pode não o ser amanhã, e vice versa. Por outro lado, não podemos desconsiderar a preocupação manifestada por Silvio de Salvo Venosa16 que, em razão da existência da norma aberta, que permite à jurisprudência traçar seus limites, vislumbra uma possibilidade de alargamento das hipóteses de aplicação da teoria do risco, o que poderia ser inviável e extremamente perigoso. Porém, o julgador é que, decidindo se a atividade é ou não perigosa, aplicará a teoria subjetiva ou a teoria objetiva, dispensando, neste caso, a comprovação da culpa do agente. Carlos Alberto Bittar17 aponta como atividades perigosas: a fabricação de explosivos e de produtos químicos e a produção de energia nuclear, seja pelos meios empregados ou pelo modo de utilização. Rui Stoco18 também relaciona algumas, afirmando: “Algumas atividades são notoriamente perigosas, como as das empresas de segurança, o serviço de carro-forte no transporte de bens e valores, a geração e distribuição de energia, a exploração de minas (subsolo), a extração mineral com uso de explosivos. Também a fabricação de armas, bombas, explosivos; as empresas de demolição e outros”. Vale ressaltar que a teoria objetiva não tem aplicação nos casos de acidente de trabalho, pois, neste caso, deve ser obedecida lei especial, que disciplina a questão e determina a obrigatoriedade da existência de seguro contra acidentes de trabalho. A indenização por parte do empregador somente será devida quando o empregador incorrer em dolo ou culpa. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Pelo estudo realizado, podemos concluir que no ordenamento jurídico brasileiro atual coexistem duas teorias que regulam e fundamentam a responsabilidade civil por danos causados a terceiros. 16 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. v. 04. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 56. 17 BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade Civil nas atividades perigosas. Revista dos Tribunais. V. 590. p. 25. 18 STOCO, op. Cit., p. 168. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 170 A primeira, denominada teoria subjetiva, é estruturada na existência da culpa do agente. Assim, diante da ocorrência de um ato ilícito, ou mesmo ante a inexistência de ilícito, mas quando pudermos afirmar que o agente não agiu de forma adequada, surge o dever de indenizar a vítima. Nesta teoria, a culpa é fundamental, e sem a sua existência não há que se falar em indenização. Além da culpa, evidentemente, também se faz necessária a existência do dano e do nexo causal. A segunda teoria, denominada objetiva, independe da existência de culpa do agente, e é determinada em razão de disposição legal ou do exercício de atividade perigosa. Neste caso, não podem ser alegadas como defesa as excludentes de caso fortuito, força maior ou fato de terceiro. O agente é responsável pela indenização do dano, simplesmente porque assumiu o risco de desenvolver a atividade tida como perigosa. A culpa exclusiva da vítima exclui a responsabilidade. Concluímos também que nosso ordenamento não estabeleceu ou relacionou quais atividades devem ser consideradas perigosas. Desta forma, esta função ficou a cargo da doutrina e da jurisprudência. Se por um lado essa opção é motivo de elogios em razão das constantes mudanças causadas pelo avanço tecnológico, que transformam atividade perigosa em não perigosa e vice-versa, também é motivo de preocupação, pois se corre o risco de ampliação indevida da aplicação da teoria objetiva. Essa condição impõe cuidados, pois a generalização da responsabilidade objetiva poderia provocar distorções e prejuízos tão nefastos quanto os provocados pela impossibilidade de reparação de danos sofridos. A responsabilidade sem culpa deve ficar restrita aos casos de exercício da atividade perigosa, entendendo como tal a atividade que expõe os demais cidadãos ao risco de morte e de prejuízos à sua saúde. Talvez o melhor seria que o legislador ao menos tivesse fixado os critérios e parâmetros essenciais para determinar a periculosidade da atividade. Assim, os magistrados teriam limites para pautar sua atuação, impedindo decisões díspares e, consequentemente, a generalização da responsabilidade objetiva. Apesar das preocupações mencionadas, não restam dúvidas de que a adoção da teoria objetiva pelo Código Civil brasileiro de 2002 consolidou o entendimento doutrinário e jurisprudencial já existente, e representa grande avanço em nosso ordenamento jurídico. Tal disposição, contida no parágrafo único do artigo 927, amplia o raio de ação da responsabilidade civil, uma vez que em muitos casos a legislação existente antes da sua vigência não permitia a necessária indenização, em razão da dificuldade de produzir a prova de culpa do agente. A nova legislação atende com maior precisão os anseios da sociedade, na medida em que torna mais justa a reparação dos danos provocados a terceiros. 5. REFERÊNCIAS BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade Civil nas atividades perigosas. Revista dos Tribunais. V. 590. BRASIL. Legislação. Código Civil Brasileiro. 2002. 2. Ed. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2000. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 171 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1995. STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. VALLER, Wladimir. Responsabilidade civil e criminal nos acidentes automobilísticos. 4. Ed. São Paulo: Julex, 1993. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. v. 04. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 172 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 173 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde, na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível Humberto Luís Versola1 [email protected] RESUMO O presente artigo tem por objetivo geral realizar um breve estudo do ponto de vista jurídico sobre o alcance da dignidade da pessoa humana através da integração gradativa dos direitos sociais ao núcleo dos direitos fundamentais, exigindo do Estado uma atuação efetiva na realização de atividades típicas de fomento da igualdade e promoção dos serviços necessários àqueles que encontram-se excluídos do acesso ao direito fundamental de saúde. O tema será examinado sob a ótica da atuação do Poder Judiciário na prestação da tutela jurisdicional do direito à saúde na simplificação do rito processual, mediante concentração, supressão ou simplificação de atos processuais na distribuição de medicamentos perante a concepção da limitação da reserva do possível, uma vez que os recursos públicos condicionam, determinam e limitam a aplicação de comando normativo do respectivo direito fundamental social. Palavras-chave Direito à Saúde. Reserva do Possível. Mínimo Existencial. Antecipação de Tutela. ABSTRACT The overall aim of this paper is to carry out a brief study from the legal point of view about the achievement of human dignity through the gradual integration of social rights into the fundamental rights core, demanding an effective act of the Estate in order to perform typical activities that boost equality and promotion of necessary services to those who are left out of the access to the fundamental right of health. The theme will be examined under the perspective of the Judiciary performance on the judicial protection delivery of the right to health, on the simplification of the procedural rite by means of concentration, suppression or simplification of procedural acts concerning drugs distribution beneath the conception of limitation from the reserve of possibility, since that the public resources influence, control and restrict the application of normative command from the respective social fundamental right. 1 Humberto Luís Versola. Mestrado em Direito pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Docente do curso de Direito do UNIFEG. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 174 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível 1. INTRODUÇÃO Um dos grandes desafios do Estado contemporâneo é alcançar a aplicabilidade efetiva dos direitos sociais prestacionais estabelecidos no texto constitucional, uma vez que, por um lado, os mesmos encontram-se desprovidos de eficácia plena e autoexecutoriedade e por outro lado, constituem-se em verdadeiros direitos subjetivos. A questão da saúde apresenta-se como essencial à realização da dignidade humana, uma vez que a falta de acesso a serviços básicos de saúde limita o pleno desenvolvimento da pessoa e da cidadania. Portanto, a Administração Pública deve implementar uma política prestacional na área da saúde que proporcione condições mínimas de existência, através da infraestrutura de saneamento básico; adotando medidas preventivas e curativas de manutenção de uma vida saudável, mediante programas de vacinação e mecanismos eficientes de acesso a procedimentos médicos e medicamentos. Neste contexto, surge, no Brasil, a discussão a respeito da reserva do possível como argumento limitador e legitimador da não realização de direitos fundamentais sociais prestacionais, especialmente o direito à saúde, uma vez que as prestações positivas referentes a tratamentos e fornecimento de medicamentos implica em despesa pública. Todavia, os direitos sociais, especialmente o direito à saúde, devem gozar de plena garantia em sua concretização, uma vez que trata-se do mínimo existencial e representa a realização da dignidade da pessoa humana e garantidor das liberdades fundamentais, não permitindo assim, qualquer restrição na materialização da norma fundamental. Assim sendo, o Poder Judiciário emerge como um veículo de efetivação do direito social à saúde garantido constitucionalmente e cada dia mais distante do cidadão, atuando através de uma intervenção equilibrada sobre decisões políticas em matéria de saúde pública, amparando suas decisões na teoria da sumarização formal desde que fundamentada em evidências e rejeitando a tutela jurisdicional em pretensões por distribuição de medicamentos sem eficácia comprovada. 2. CONCEPÇÃO FORMAL E MATERIAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS Sociedades marcadas por situações de injustiça institucionalizada, através de conflitos e desigualdades estruturais, a efetividade dos direitos fundamentais torna-se urgente na construção de democracias autênticas. Por isso, a busca por uma efetiva realização da justiça social através da consagração dos direitos econômicos, sociais e culturais altera substancialmente, a partir do século XX, o paradigma de constitucionalização do Estado, onde o mesmo adota uma postura predominantemente ativa na tutela dos respectivos direitos e intervém na consolidação da igualdade material para todos os membros da sociedade, expressando os valores essenciais da sociedade. Nesse contexto, surge o Estado social de direito sob o fundamento de assegurar a realização da dignidade humana principalmente em relação aos direitos sociais, tais como a educação, saúde, moradia, trabalho, entre outros voltados para a proteção de um Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível 175 mínimo existencial, daí sua caracterização como direito fundamental . Houve assim, um reconhecimento de direitos e uma garantia da própria liberdade do homem, através da integração gradativa dos direitos sociais ao núcleo dos direitos fundamentais, exigindo do Estado uma atuação efetiva na realização de atividades típicas de fomento da igualdade e promoção dos serviços necessários àqueles que encontram-se excluídos do acesso aos direitos fundamentais frente às políticas públicas instituídas. Visto por esse ângulo, a plenitude da realização dos direitos fundamentais exige que o Estado adote e implemente ações e políticas públicas para que o beneficiário desses direitos esteja em condições de recorrer a estes procedimentos de forma que o mínimo existencial possa ser usufruído por todos. Do ponto de vista formal, o Estado passa a relacionar em sua ordem jurídico- constitucional os direitos fundamentais para a sobrevivência e a realização da pessoa humana em sociedade. Portanto, a positivação jurídico-constitucional dos direitos sociais está inserida na categoria de direitos fundamentais na medida em que constituem o conjunto de direitos e liberdades institucionalmente reconhecidos e garantidos pelo direito positivo de determinado Estado, tratando-se, portanto, de direitos delimitados espacial e temporalmente, cuja denominação se deve ao seu caráter básico e fundamentador do sistema jurídico do Estado de Direito (SARLET, 2005, p. 37). Além de especificamente nomeados no texto constitucional, deve-se agregar-lhes critérios de maior proteção pelo legislador constituinte, conferindo-lhes procedimentos mais complexos para sua abolição e alteração. Nesse diapasão, classificam-se como direitos fundamentais na Constituição de 1988 todos aqueles denominados “Direitos e Garantias Fundamentais”, relacionados no Título II, incluindo-se, portanto, os direitos sociais previstos no Capítulo II, bem como aqueles estampados no art. 60, § 4º, IV, classificados como cláusulas pétreas, as quais apresentam limitações materiais na atuação do poder constituinte reformador, ou seja, não submetem-se à deliberação pelo processo de emendas tendentes à modificação e supressão das respectivas matérias. Todavia, critérios exclusivamente formais apresentam-se insuficientes para a consolidação dos direitos fundamentais sociais, exigindo-se uma concepção material dos mesmos, informando o intérprete responsável pela aplicação da tutela jurisdicional a respeito de quais valores sociais foram utilizados pelo constituinte originário para a inclusão constitucional destes direitos. Nesse prisma, o critério material dos direitos fundamentais sociais presentes na atualidade devem ser contextualizados em um processo dialético de construção de valores e posturas políticas e jurídico-constitucional de cada país, resultado dos valores e direitos básicos da sociedade eleitos pelo constituinte na construção da base jurídica fundamentada na dignidade humana. Com efeito, na elaboração do critério material dos direitos fundamentais sociais torna-se imprescindível a conexão com a dignidade da pessoa humana. Portanto, a dignidade humana assume na Constituição brasileira o caráter de princípio fundamental, balizador das políticas públicas do Estado, uma vez Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 176 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível que adentra no âmbito normativo, assumindo o caráter de norma jurídica com função primordial de embasar os demais princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais. Nesse sentido, o entendimento esposado por Edilsom Pereira de Farias O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana cumpre um relevante papel na arquitetura constitucional: ele constitui a fonte jurídico-positiva dos direitos fundamentais. Aquele princípio é o valor que dá unidade e coerência ao conjunto dos direitos fundamentais. Dessarte, o extenso rol de direitos e garantias fundamentais consagrados no Título II da Constituição Federal de 1988 traduz uma especificação e densificação do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) (FARIAS, 2000, p. 66). Depreende-se que a fundamentalidade dos direitos sociais evolue em busca da proteção e consolidação da dignidade humana, tornando-se o critério essencial para a elaboração de um conceito material de direitos fundamentais sociais, uma vez que o homem é o valor-fonte do ordenamento jurídico e, consequentemente, merecedor de tutela no exercício dos valores fundamentais da liberdade e igualdade na luta pelos seus interesses. 3. CLASSIFICAÇÃO FUNCIONAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS No que tange à consolidação dos direitos fundamentais sociais como condições mínimas para que o homem participe do processo social e alcance o bem estar social de acordo com os padrões que prevalecem em determinada sociedade, exige-se uma abordagem jurídico-constitucional progressiva, implicando em coexistência dos direitos conquistados ao longo do processo histórico. Logo, os direitos fundamentais sociais facultam aos cidadãos diferentes posições jurídicas em seu exercício perante o Estado. Cumpre observar, que os direitos fundamentais de segunda geração, dentre os quais situam-se os direitos sociais, enquadram-se na categoria de direito de defesa, correspondente a uma abstenção do Estado, ou de direito prestacional, correspondente a uma ação positiva do Estado. Os primeiros referem-se à capacidade dos titulares do direito exigirem do Estado que este não impossibilite o exercício de direitos sociais protegidos juridicamente, como por exemplo, o direito de greve (art. 9º CF), o direito de liberdade de associação sindical (art. 8º CF); ou mesmo, não crie circunstâncias impeditivas à realização desses direitos, nesse caso, revogando normas constitutivas de direitos trabalhistas, como por exemplo, o direito às férias após o período aquisitivo. Assim sendo, as posições jurídicas relacionadas, permitem classificá-los como direitos de defesa ou direitos sociais negativos (OLSEN, 2012, p. 53 - 54). Ao tratar dos direitos fundamentais sociais que impõem uma ação positiva do Estado, pode-se subdividí-los em dois grupos, de um lado, aqueles que demanRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível 177 dam do Estado uma prestação concreta, denominando-se direitos sociais em sentido estrito, cuja efetividade se verifica quando o Estado estabelece mecanismos a fim de prover ao titular do direito o bem jurídico tutelado pela norma constitucional. Nessa toada, Ingo Sarlet ...de colocar à disposição os meios materiais e implementar as condições fáticas que possibilitem o efetivo exercício das liberdades fundamentais, os direitos fundamentais a prestações objetivam, em última análise, a garantia não apenas da liberdade-autonomia (liberdade perante o Estado), mas também da liberdade por intermédio do Estado, partindo da premissa que o indivíduo, no que concerne à conquista e manutenção de sua liberdade, depende em muito de uma postura ativa dos poderes públicos (SARLET, 2005, p. 205). Destaque-se, por outro lado, os direitos fundamentais positivos que exigem uma ação normativa, denominando-se direitos sociais em sentido amplo, exigindo do Estado a edição de regras infraconstitucionais de organização e procedimento que garantam a efetivação dos direitos fundamentais sociais. Frequentemente os direitos fundamentais sociais positivos em sentido estrito e em sentido amplo são contemplados em uma única norma jurídica, capacitando seu titular na exigência de prestações dos bens jurídicos fundamentais ao mínimo existencial, bem como na prestação normativa e regulamentar no cumprimento do mandamento constitucional (OLSEN, 2012, p. 57). Assim, cumpre esclarecer que o direito fundamental à saúde, no âmbito constitucional, estabelece um diálogo entre os direitos sociais em sentido estrito e os direitos sociais em sentido amplo, onde aqueles se consolidam através do direito ao tratamento em hospitais e acesso a medicamentos e, os últimos com a edição de leis que regulamentam o Sistema Único de Saúde2. 4. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE Os direitos fundamentais situam o ser humano como o elemento central na realização de uma justiça distributiva e social, obrigando a Administração Pública a adotar e implementar políticas públicas que promovam o desenvolvimento do indivíduo e sobretudo, preservem a dignidade humana, através da satisfação das necessidades mais elementares do homem, nomeadamente pela consagração e implementação dos direitos sociais. Para que isso se concretize é imprescindível a democratização dos direitos sociais, viabilizando a igualdade material entre as pessoas e consequentemente, a erradicação da pobreza e construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Desse modo, os direitos sociais emergem como um dos pilares das formulações jurídico-constitucionais no alcance da igualdade material, exigindo do Poder Público uma política prestacional efetiva em educação, saúde, alimentação, trabalho e moradia, assegurando a todos condições socioeconômicas mínimas de participar satisfatoriamente do processo político. 2 Lei nº 8.080, de 19.09.1990 e Lei nº 8.142, de 28.12.1990. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 178 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível Esta realidade é exposta por Carlos Alexandre Amorim Leite, visto que ...a evolução do conceito de direitos fundamentais com a aglutinação dos direitos sociais, conforme uma teoria unitária, mostra que a simples declaração de direitos não traz a felicidade do homem, pois o ideal de justiça, de acordo com a lógica do equilíbrio entre liberdade e igualdade, somente é atingido por meio da máxima realização dos direitos fundamentais, ao suprir o homem de todas as condições e meios necessários ao seu desenvolvimento individual e social (LEITE, 2014, p. 106). Juntamente com educação, moradia e alimentação, o direito à saúde apresenta-se como essencial ao mínimo existencial, uma vez que a falta de acesso a serviços básicos de saúde limita o pleno desenvolvimento da pessoa e da cidadania. Portanto, a Administração Pública deve implementar uma política prestacional na área da saúde que proporcione condições elementares de salubridade, através da infraestrutura de saneamento básico; adotando medidas preventivas e curativas de manutenção de uma vida saudável, mediante programas de vacinação e mecanismos eficientes de acesso a procedimentos médicos e medicamentos. Com efeito, a saúde é um típico direito de cidadania, uma vez que envolve um conceito com dupla dimensão, de um lado, a dimensão negativa, amparada em ausência de patologias, através da prevenção e tratamento das mesmas, de outro, a dimensão positiva, caracterizada pela busca de uma vida saudável através da plenitude física, mental e social (FIGUEIREDO, 2007, p. 81-82). Destaque-se, todavia, que a fragilização da saúde encontra-se associada à precariedade na prestação de outros direitos fundamentais elementares, como por exemplo, à falta de alimentação adequada, às condições precárias de habitação e saneamento. Assim entende Carlos Alexandre Amorim Leite De fato, não se pode falar em garantia e preservação da saúde sem que outros direitos fundamentais não sejam minimamente efetivados, pois o direito à saúde é desrespeitado quando não se oferece a alimentação básica para o estabelecimento de uma vida digna, porque não há salubridade na fome. Da mesma forma, os outros direitos sociais antes nominados, interferem na questão da saúde, a exemplo do direito à moradia digna que garante ao indivíduo e sua família um local protegido de intempéries e agentes biológicos potencialmente causadores de doenças, principalmente quando possui ligação à rede de esgotos e água encanada. Já a educação proporciona uma noção de saúde básica e de higiene necessária para evitar doenças ou sua proliferação, bem como garante ao ser humano o conhecimento elementar para poder exigir a implementação de certas políticas públicas aptas à prevenção e ao combate de doenças, dentro do salutar exercício da cidadania (LEITE, 2014, p. 119). Nesse contexto, a densificação constitucional do direito social à saúde é fundamental em sua efetivação, uma vez que declara a saúde como direito funRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível 179 damental ao mínimo existencial, bem como por estabelecer diretrizes a serem implementadas através das políticas públicas em sua efetivação, além de parâmetros dos valores mínimos a serem aplicados na saúde pública no Brasil. Depreende-se, portanto, que o sistema jurídico-constitucional nesta área fundamenta-se em princípios e mecanismos de aplicabilidade imediata para melhor atingirem os objetivos do Estado, no intuito de preservar a dignidade da pessoa humana. Por conseguinte, esses valores fundamentais vinculam o Estado na plenitude do desempenho de suas funções, uma vez que o Poder Executivo deverá adotar políticas públicas necessárias à satisfação dos direitos prestacionais. No âmbito do Poder Legislativo, a vinculação dar-se-á à medida em que o legislador deverá atuar na preservação e proteção dos direitos fundamentais, assim como, eventualmente, fiscalizando a atuação dos demais Poderes. E, por fim, o Poder Judiciário, que na prestação da tutela jurisdicional, deverá prolatar suas decisões pautadas em valores constitucionais que permitam plena realização dos direitos fundamentais, realizando, assim, a eficácia social da norma. Nesse momento, importa examinar a perspectiva objetiva assumida pelos direitos fundamentais sociais, a qual exige políticas públicas de materialização dos direitos fundamentais sociais prestacionais através do aparelhamento estrutural do Estado, bem como de procedimentos necessários direcionados à sua efetivação, minimizando os riscos de redução na aplicabilidade de seu conteúdo normativo. Sob o ângulo da perspectiva subjetiva, compreende-se os direitos sociais como autênticos direitos fundamentais subjetivos ao mínimo existencial do cidadão, especialmente os direitos à saúde, habitação, educação, dentre outros. Portanto, tratando-se de um modelo constitucional que estabelece o dever da Administração Pública em adotar políticas públicas que efetivem o exercício dos respectivos direitos e a possibilidade do cidadão exigir a tutela dos mesmos no âmbito judicial, assumem, os direitos sociais, caráter subjetivo. A vertente do Estado Social somente se concretizará se os direitos fundamentais sociais estiverem colimados como direitos subjetivos, vinculando a Administração Pública à efetivação da dimensão prestacional positiva correspondente ao respectivo objeto. Em tempo presente, defende-se a teoria da efetividade constitucional pautada no conceito de direito subjetivo (BARROSO, 2001, p. 83). Os direitos fundamentais sociais tornam-se direitos subjetivos visto que assumem uma natureza obrigacional, através de uma correlação entre o cumprimento de uma pretensão pelo titular do direito garantido pela norma jurídica e o dever prestacional daquele que é competente pelo serviço público, conferindo ao cidadão poder de exigir em relação à Administração Pública, deveres de respeito, promoção e proteção. Desse modo, os direitos sociais apresentam-se como serviços sociais para a satisfação do indivíduo, os quais assumem natureza prestacional. Nestas condições, Ricardo Lobo Torres destaca a qualificação dos direitos fundamentais sociais como direitos subjetivos A jusfundamentalidade dos direitos sociais se reduz ao míRevista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 180 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível nimo existencial, em seu duplo aspecto de proteção negativa contra a incidência de tributos sobre os direitos sociais mínimos de toda as pessoas e de proteção positiva consubstanciada na entrega de prestações estatais materiais em favor dos pobres. Os direitos sociais máximos devem ser obtidos na via do exercício da cidadania reivindicatória e da prática orçamentária, a partir do processo democrático... (TORRES, 2003, p. 1 - 2) Com efeito, o direito social à saúde, apresenta conexão com a vida digna, conferindo-lhe um parâmetro subjetivo, permitindo ao cidadão a faculdade de exigir diretamente da Administração Pública a realização da prestação material que atenda as necessidades existenciais mínimas, uma vez que existe uma certa evidência em favor do direito prestacional, o qual se relacionado à própria sobrevivência do ser humano, inviabilizando os argumentos de escassez de recursos orçamentários em detrimento da efetiva tutela do bem jurídico fundamental do direito à vida. Neste contexto, torna-se necessário o enfrentamento das restrições impostas pela reserva do possível na realização do direito fundamental social à saúde nos casos concretos, visto que a saúde é um bem jurídico legitimador do bem comum, permitindo a sobrevivência de uma sociedade livre e democrática. 5. DIMENSÃO RESTRITIVA DA RESERVA DO POSSÍVEL NA CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS PRESTACIONAIS A realização dos direitos fundamentais sociais prestacionais submete-se à discricionariedade política da disponibilidade financeira do Estado para a sua implementação, uma vez que esses direitos dependem da possibilidade e adequação do dinheiro público, exigindo do gestor público a busca pelo equilíbrio econômico na realização de todas as suas tarefas de acordo com as opções orçamentárias, acarretando a não concretização de algumas políticas públicas em detrimento de outras. A partir deste cenário, percebe-se que a limitação dos recursos públicos para a realização dos direitos fundamentais sociais emerge como uma condição da realidade com reflexos na aplicação daqueles direitos, o qual denomina-se “reserva do possível”, uma vez que condiciona, determina e limita a aplicação de comando normativo do direito fundamental social. Nesse sentido pondera, Ana Carolina Lopes Olsen A reserva do possível corresponde a um dado de realidade, um elemento do mundo dos fatos que influencia na aplicação do Direito. O Direito é um fenômeno prescritivo, ou seja, as normas jurídicas têm por fundamento uma determinada realidade fática, a partir da qual prescrevem condutas (OLSEN, 2012, p. 201). Destaque-se, todavia, que a reserva do possível tem-se apresentado como um forte argumento contra a efetividade dos direitos fundamentais sociais, uma Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível 181 vez que nenhuma ação poderá ser desenvolvida, mesmo que haja vontade política, como resultado da ausência de recursos. Depreende-se portanto, que a gestão discricionária de recursos públicos na realização dos direitos fundamentais do homem deve ser enfrentada sob a dimensão fática e jurídica. O aspecto fático situa-se na exigência de uma atuação efetiva do Estado no fornecimento de bens materiais e serviços, emergindo a questão da disponibilidade dos recursos financeiros necessários à realização dos respectivos direitos. Portanto, resume-se à exaustão orçamentária, denominando-se reserva do possível fática. A dimensão jurídica da reserva do possível envolve a discricionariedade na alocação dos recursos estatais para a manutenção do aparelhamento administrativo na concretização de políticas públicas capazes de efetivar os direitos fundamentais. Assim, a definição das políticas públicas restringem-se, inicialmente, às ações integradas dos Poderes Legislativo e Executivo, visto que a obtenção da receita tributária e aprovação do orçamento no âmbito das diretrizes propostas pelo Executivo dependem de manutenção do diálogo junto ao Legislativo. Desse modo, as dimensões da reserva do possível representam obstáculos e limitações à norma constitucional dos direitos sociais prestacionais, obrigando-se o Estado a implementar as prestações sociais se houver verbas orçamentárias alocadas e disponíveis, suficientes para a concretização da demanda pública, ou seja, o indivíduo não possuirá direito subjetivo à prestação social (LEITE, 2014, p. 36). Como exemplo, na área da saúde pública, a inexistência de previsão orçamentária para o fornecimento de medicamento produzido no exterior e não pertencente à relação do SUS, não estaria assegurada a prestação social prevista na norma constitucional, vedando-se seu pleito através do Judiciário, permitindo-se assim, deduzir a inexistência de direito subjetivo à saúde quando não houver alocação de recursos orçamentários para a sua implementação. Todavia, os direitos sociais, especialmente o direito à saúde, devem gozar de plena garantia em sua concretização, uma vez que trata-se do mínimo existencial e representa a realização da dignidade da pessoa humana e garantidor das liberdades fundamentais, não permitindo assim, qualquer restrição na materialização da norma fundamental. 6. CONSTITUCIONALIDADE DA SUMARIZAÇÃO DA COGNIÇÃO NO CUMPRIMENTO DO DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE NA POLÍTICA DE DISTRIBUIÇÃO DE MEDICAMENTOS A Constituição Federal prevê vários direitos fundamentais, enraizados no devido processo legal, a quem litiga em juízo, destacando-se no âmbito do estudo da antecipação da tutela e efetividade da jurisdição. Acerca do direito à efetividade da jurisdição, compete mencionar uma serie de direitos e garantias que são atribuídos ao indivíduo pela constituição, indivíduo esse que, impedido de fazer justiça com as próprias mãos, deve provocar a ação jurisdicional a fim de reivindicar bem ou direito do qual se considera titular, e a esse indivíduo são assegurados meios eficazes e céleres de exame da Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 182 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível demanda apresentada à apreciação do Estado. São eficazes, pois, são obrigados a proporcionar ao litigante vencedor a entrega de fato da sua vitória e, ao Estado, que é monopolizador do poder jurisdicional, compete a utilização de mecanismos processuais adequados a fim de impulsionar o feito e evitar que o dever imposto ao individuo de se submeter obrigatoriamente à jurisdição estatal represente um castigo, tal dever conta com a contrapartida necessária por parte do Estado de garantir a utilidade da sentença na materialização da tutela. Por outro lado, não basta apenas que a tutela seja eficaz, é necessário também que ela seja célere, pois é essencial no princípio da efetividade da jurisdição que o julgamento da demanda se dê em tempo hábil e razoável, a fim de evitar dilações indevidas. O direito fundamental à efetividade da jurisdição compreende o direito de provocar a atuação do Estado, mas principalmente que essa ação estatal resulte, dentro do prazo adequado, em uma decisão justa e capaz de interferir diretamente no plano dos fatos. No âmbito da concessão da tutela antecipatória, especificadamente, é necessário estarem presentes duas condições, a primeira é a prova inequívoca, de forma a convencer o juiz da verossimilhança da alegação, ou “fumus boni juris”; para preencher tal requisito não é necessário que da prova apresentada surja a certeza das alegações, basta apenas que no momento da apresentação todos os elementos convirjam no sentido de que as alegações aparentem ser verdadeiras, tratando-se de juízo provisório, e é irrelevante se com o decorrer do processo, no julgamento final, após ser exposto ao contraditório a decisão for outra. Marcus Vinicius Rios Gonçalves elucida acerca da prova inequívoca O Exame do fumus boni juris não exige uma avaliação aprofundada dos fatos, nem da relação juridica discutida. A concessão da tutela cautelar não pode constituir um prognóstico do que irá ocorrer no processo principal. É possível que o juiz a conceda, ainda que esteja pouco convencido de que o requerente possa sair vitorioso no processo principal, quando verificar que o não-deferimento inviabilizara a efetivação do direito, caso, apesar de tudo, ele venha a ser reconhecido (GONÇALVES, 2009. v.1. p. 270). Assim sendo, a antecipação da tutela precipita os efeitos da decisão de mérito, portanto, é indispensável que seja analisada a verossimilhança, ou seja, necessita apresentar aparência de verdade do pedido apresentado. O segundo requisito especifico para tornar possível a antecipação da tutela é dividido em duas partes, sendo que a primeira fundamenta-se no receio de dano irreparável ou de difícil reparação, conhecido como “periculum in mora”; fica caracterizado quando existe fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação. A segunda parte do último requisito para a concessão da tutela antecipada é o abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu, o qual ocorre quando o réu, sem necessidade, requer a produção de provas ou diligências com único intuito de Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível 183 atrasar o andamento natural do processo, causando assim prejuízo à outra parte. Destaque-se, portanto, a existência de dois requisitos para a concessão da antecipação da tutela no fornecimento de medicamentos, e conseqüente sumarização da cognição, primeiramente, a prova inequívoca que conduza a verossimilhança, sendo esse indispensável, e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. É atribuição do Estado o bem-estar social e a apresentação de solução adequada às necessidades vitais do cidadão, atuando de maneira eficiente e célere na tutela do direito à vida, uma vez que determinadas patologias que acometem o cidadão desperta angústia para toda a família, preocupando-se com a respectiva patologia e a necessidade de remédios de elevado custo, não podendo o Estado simplesmente abandoná-la à própria sorte. A Constituição Federal elegeu como um dos fundamentos a serem alcançados pelo Estado Democrático a preservação da dignidade da pessoa humana, bem como a proteção ao consumidor e aos direitos sociais, dentre eles está incluído, de forma expressa, a saúde. Com efeito, torna-se, destarte, clarividente a obrigação do Estado, através das pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) no cumprimento do respectivo direito fundamental, proporcionar e garantir os medicamentos necessários ao tratamento de saúde do cidadão. Desse modo, todo ato negativo do ente público ao fornecimento de medicamentos à pessoa desprovida de recursos, necessário para restabelecer a saúde e evitar a morte, atentam contra a dignidade da pessoa humana e incidirá em afronta à Constituição Federal. Nestas circunstâncias, a efetividade do acesso universal à saúde com a mais ampla proteção somente será conquistada se a favor do titular do direito forem dirimidas todas as dúvidas, de tal sorte que o indeferimento pelo Poder Público no fornecimento de medicamentos aos hipossuficientes não levando em consideração a necessidade de restabelecimento completo da saúde, deve ser combatido energicamente pelo Poder Judiciário. Assim, o Poder Judiciário vem consolidando o entendimento favorável aos pacientes, reafirmando e concretizando o dever do Poder Público de fornecer atendimentos e medicamentos de saúde gratuitos aos necessitados. No âmbito constitucional, as normas relativas ao direito à saúde têm sede na Seção II, do Capítulo II, do Título VIII, (“Da Ordem Social”), dispondo o artigo 196 que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”. Merece destaque ainda, o art. 194, inciso I, da Constituição Federal, impõe a universalidade da cobertura no âmbito de saúde pública, além do art. 198, inciso II, o qual garante o atendimento integral ao usuário como diretriz das ações do serviço público de saúde. Assim sendo, a Administração Pública Direta deve garantir o fornecimento dos medicamentos pleiteados, na medida em que os entes federativos são Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 184 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível irremediavelmente obrigados a amparar a população no que tange à plena garantia de sua saúde, uma vez que participam do Sistema Único de Saúde, o qual encontra-se estruturado pela Lei n. 8.080/90 – (Lei Orgânica das Saúde) dispondo sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondente3, além dos dispositivos insertos nas Constituições da República e Estaduais. É o que se depreende dos ensinamentos de Regina Maria Macedo Neri Ferrari, ao considerar o direito à saúde como um legítimo direito subjetivo. Tal entendimento não foge à reserva do possível, da efetiva disponibilidade de recursos na hora da prestação, entretanto, mesmo dentro dela, é necessário evitar que a autoridade se furte ao dever que lhe é imposto pelo comando constitucional. O que não é aceitável é que, em nome da reserva do possível, isto é, sob o argumento da impossibilidade de realizá-lo por questões financeiras, materiais ou políticas, o comando constitucional acabe destituído, completamente, de eficácia (FERRARI, 2001, p. 235). Ressalte-se que, além da ofensa à saúde e à vida, há também o dispêndio do dinheiro público em outras áreas, posto que os pacientes são obrigados a mobilizar outros serviços públicos para terem seus direitos resguardados, notadamente os prestados pelo Poder Judiciário, implicando em desnecessários e pesados gastos para o Poder Público, o que configura conduta incompatível com a moralidade e a probidade administrativas. Deve-se atentar que, sob certas condições, é plenamente possível a realização, pelo Poder Judiciário, do controle da discricionariedade política na materialização dos direitos fundamentais sociais, possibilitando a redução das consequências advindas da reserva do possível nas escolhas orçamentárias quanto ao emprego de verbas públicas para a realocação de verbas públicas para o cumprimento por decisões judiciais “ex ofício” no fornecimento de medicamentos. Nessa perspectiva, Luciano Benetti Timm Assim, os efeitos da reserva do possível são enfraquecidos através do controle das opções políticas na distribuição das receitas do Estado, inclusive tal sindicalização pode ser realizada pelo Poder Judiciário e, também, por representantes jurídicos da sociedade, em especial o Ministério Público e a Defensoria 3 Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. § 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios: I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; II - integralidade de assistência, entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema; (...) IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível 185 Pública, sempre em busca da transparência das decisões políticas e da possibilidade do controle jurídico-social do processo político (TIMM, 2010, p. 33-34). Desta forma, merece destaque o entendimento do Supremo Tribunal Federal, sobre as normas da Constituição da República e leis federais que asseguram o direito à saúde e, no caso de pacientes carentes, a garantia da total cobertura assistencial à saúde, afirmando que não se tratam de normas programáticas, mas sim de norma fundamental de eficácia direta e aplicabilidade imediata, concretizadora do princípio da dignidade humana, estampado no inciso III do artigo 3º do texto constitucional. Exemplificativamente, a lei federal nº 11.347/06, que dispõe sobre a distribuição gratuita de medicamentos e materiais necessários à sua aplicação e à monitoração da glicemia aos portadores de diabéticos, estabelece através do artigo 1º que “Os portadores de diabetes receberão gratuitamente, do Sistema Único de Saúde - SUS, os medicamentos necessários para o tratamento de sua condição e os materiais necessários à sua aplicação e à monitoração da glicemia capilar”. A cognição sumária como forma de acesso à plenitude do direito à saúde permite a antecipação dos efeitos da sentença antes de haver certeza do mérito da demanda, satisfazendo-se a pretensão do autor apoiada na verossimilhança, a qual não deixa de relacionar-se com o mérito da ação proposta. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS O propósito do presente artigo resumiu-se na demonstração do cabimento da antecipação de tutela “ex ofício” na efetivação dos direitos fundamentais sociais prestacionais, especificamente no fornecimento de medicamentos. Verificou-se preliminarmente, que os direitos fundamentais sociais presentes na atualidade devem ser contextualizados em um processo dialético de construção de valores e posturas políticas e jurídico-constitucional de cada país, resultado dos valores e direitos básicos da sociedade eleitos pelo constituinte na construção da base jurídica fundamentada na dignidade humana. Desse modo, os direitos sociais emergem como um dos pilares das formulações jurídico-constitucionais no alcance da igualdade material, exigindo do Poder Público uma política prestacional efetiva em educação, saúde, alimentação, trabalho e moradia, assegurando a todos condições socioeconômicas mínimas de participar satisfatoriamente do processo político. Em seguida, apresentou-se o conflito existente entre a realização do direito subjetivo à saúde e a reserva do possível como obstáculo real à implementação do respectivo direito, seja na dimensão fática, como uma restrição propriamente aos gastos estatais, seja na dimensão jurídica, por meio do respeito à discricionariedade política das decisões orçamentárias e de políticas públicas. Finalmente, em resposta à questão proposta, chegou-se à apreciação da tutela dos direitos fundamentais prestacionais pelo Poder Judiciário, uma vez que é impossível não reconhecer o fenômeno da judicialização dos direitos fundamentais prestacionais no Brasil, tornando indeclinável o dever de julgar da magistratura, tendo em vista a garantia do mínimo existencial e realização da Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 186 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível dignidade da pessoa humana. Com efeito, autoriza-se a sindicância jurídica sobre a discricionariedade nas decisões políticas do orçamento público na efetivação do direito à saúde no fornecimento de medicamentos, porque combate a ineficiência, o desperdício e o desvio de verbas públicas, desde que aja nos limites das diretrizes constitucionais e legais deferindo tratamentos médicos e fornecimentos de medicamentos enquadrados nos protocolos clínicos do Sistema Único de Saúde ou mesmo, tratamentos alternativos relacionados nos procedimentos do sistema público com resultados positivos. Todavia, para se alcançar uma tutela jurisdicional eficiente no âmbito dos direitos fundamentais sociais da saúde na distribuição de medicamentos, os juízes integrantes dos órgãos do Poder Judiciário devem buscar o diálogo com especialistas em saúde e com a sociedade por meio de audiências públicas promovidas com a finalidade de melhor motivar seus julgados, reduzindo, assim, os efeitos negativos do deferimento “ex ofício” de antecipação de tutela nas ações cujo objeto sejam o fornecimento de medicamentos, uma vez que para se assegurar o pleno direito à saúde, um processo demasiadamente demorado não pode ser considerado efetivo. Uma prestação jurisdicional adequada cujo objeto seja o fornecimento de medicamentos frente à reserva do possível, que está inserta no princípio constitucional do acesso à justiça, deve ser entregue em tempo hábil, de forma a garantir que a tutela não perca seu significado. Para tanto, deve-se pautar a cognição na roupagem da verossimilhança, visto ser inegável que o modelo clássico de tutela jurisdicional mostra-se inadequado às necessidades sociais no século XXI. 8. REFERÊNCIAS BARROSO, Luís Roberto. Eficácia e efetividade do direito à liberdade. In: Temas de direito constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2000. FERRARI, Regina Maria Macedo Neri. Normas constitucionais programáticas. Normatividade, Operatividade e Efetividade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Direito Fundamental à Saúde: parâmetros para sua eficácia e efetividade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil: teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte). 6.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v.1 LEITE, Carlos Alexandre Amorim. Direito fundamental à saúde: efetividade, reserva do possível e mínimo existencial. Curitiba: Juruá, 2014. OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2012. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 5.ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. TIMM, Luciano Benetti. Direitos Fundamentais: orçamento e reserva do possível. 2. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 Sumarização da cognição e efetividade do direito fundamental à saúde na distribuição de medicamentos no âmbito da dimensão restritiva da reserva do possível 187 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. TORRES, Ricardo Lobo. A metamorfose os direitos sociais em mínimo existencial. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.) Direitos Fundamentais Sociais: Estudos de Direito Constitucional, Internacional e Comparado. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015 188 Revista Científica EXPRESSÃO - UNIFEG, Guaxupé - nº 22 - Junho de 2015