desinteligências em audiência

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desinteligências em audiência
Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 15ª. Região
DESINTELIGÊNCIAS EM AUDIÊNCIA:
ORIENTAÇÕES
Da mesma forma, a Comissão de Prerrogativas da AMATRA XV tem
examinado rotineiramente casos lastimáveis em que partes e/ou advogados desbordam de sua
posição natural, sujeitos que estão ao poder de organização e polícia do Magistrado no curso
das audiências, e passam a atuar de modo desafiador, não raro perpetrando ilícitos penais
conhecidos do enfrentamento diuturno do juiz do Trabalho, como o desacato (art. 331 do CP),
a desobediência (art. 330 do CP), a resistência (art. 329 do CP) ou mesmo a coação no curso do
processo (art. 344 do CP).
Em circunstâncias de tal gravidade, exsurge dúvida natural sobre como
deve o Magistrado proceder. Obviamente, não há um roteiro orgânico para o que é
teratológico. Nada obstante, diante da repetição de tais ensejos, a Presidência e a Comissão de
Prerrogativas da AMATRA XV tomam a liberdade de sugerir e esclarecer como segue.
a. Uma vez deflagrado o contexto de confronto, agressão verbal ou
ameaça, o juiz deve sempre agir com fleuma e serenidade, demonstrando preparo e controle
da situação. Mesmo que altere o tom de voz, à vista das circunstâncias e de suas necessidades,
deve fazê-lo de modo refletido e controlado.
b. O juiz deve ter em mente, ademais, que qualquer medida de força
acaso tomada deve ser preparada e preordenada para o momento do comando, evitando-se
arroubos de auto-execução e prevenindo-se contextos incontornáveis de resistência ou
desobediência. Assim, antes de qualquer medida de força (e.g., detenção ou expulsão), convirá
requisitar, por meio dos serventuários, a presença de força policial.
c. A polícia judiciária que serve a Justiça do Trabalho é, por natureza e
destinação, a Polícia Federal; logo, deve-se sempre preferir, quando possível, o recurso aos
corpos de polícia federal (que realizam, ao lado das polícias civis estaduais, a chamada polícia
repressiva). Seus quadros são, todavia, sabidamente reduzidos e pouco capilarizados. Assim,
exceto nas cidades em que a Polícia Federal já esteja instalada fisicamente, convirá ao juiz
requisitar os corpos de polícia preventiva (i.e., os efetivos da Polícia Militar). Corpos de guarda
municipal ou metropolitana destinam-se tão-só à preservação dos próprios públicos
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municipais, sem funções judiciárias ou de segurança pública preventiva (art. 144, §8º, da
CRFB). Logo, em via de regra, não devem ser requisitados para esse efeito.
d. Outrossim, convirá sempre manter relações institucionais próximas
com as chefias locais das polícias militar, civil e/ou federal. Da mesma forma, recomenda-se
apurar e ter acesso a contatos telefônicos mais reservados, que permitam acionar níveis
superiores em cada corporação. A Comissão de Segurança Institucional da AMATRA XV,
formada pelos oito representantes de circunscrição para a segurança institucional, está
atualmente empenhada em consegui-los, especialmente nas sedes de circunscrição. Mas o
colega pode e deve fazê-lo pessoalmente, de acordo com a peculiaridade da sua jurisdição.
e. A prisão em flagrante em audiência é medida absolutamente
excepcional. O juiz não deve dar voz de prisão em audiência, se não quando impraticável
qualquer outro encaminhamento e observados rigorosamente os pressupostos legais. Sujeitase, de outro modo, às penas da Lei 4.898/65 (Lei do Abuso de Autoridade ─ art. 4º, “a”).
f. Nessa linha, é importante ter em mente que, à vista do que dispõe o
artigo 61 da Lei n. 9.099/95 (na redação da Lei n. 11.313/2006), são crimes de menor potencial
ofensivo — em que aprioristicamente não cabe a prisão em flagrante — quaisquer delitos cuja
pena máxima cominada em lei não seja superior a dois anos. Assim, por exemplo, não cabe a
prisão em flagrante em delitos como desobediência (pena máxima cominada de seis meses),
desacato (pena máxima cominada de dois anos) ou resistência simples (pena máxima
cominada de dois anos); tampouco cabe prisão em flagrante nos crimes contra a honra (a
figura mais grave — calúnia — tem pena máxima cominada de dois anos). Em todos esses
casos, após a lavratura do termo circunstanciado (TCO), se o acusado “for imediatamente
encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão
em flagrante, nem se exigirá fiança” (art. 69, par. único, da Lei n. 9.099/95).
g. Registre-se, ainda, existir forte corrente jurisprudencial a entender que
o juiz não-criminal (cível, trabalhista etc.) não prende em flagrante como autoridade, mas
como “qualquer do povo” (cfr. artigo 301 do CPP; v., e.g., TRF 1ª Reg., Incidente de
Uniformização n. 92.01.24139-9/DF, 2ª S., rel. EUSTÁQUIO NUNES SILVEIRA) ─ apesar do que
dispõe textualmente o artigo 307 do CPP.
h. Nada obstante, ainda que não possa proceder à prisão em flagrante,
dá-se ao juiz, em todo caso, o poder de retirar da sala de audiências quem se comporte
inconvenientemente (assim, p.ex., aquele que contra si assacar ofensas ou fizer ameaças),
inclusive mediante força policial (art. 445, II e III, do CPC c.c. art. 769 da CLT). No limite, poderá
determinar a sua condução à presença da autoridade policial, para a lavratura do termo
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circunstanciado e a assunção do compromisso de comparecimento perante a autoridade
judiciária criminal. Recomenda-se, em todo caso, registrar em ata a íntegra da ocorrência, com
o detalhamento possível; e, havendo condução, que se faça pelo sr. oficial de justiça, que de
tudo lavrará certidão.
i. Quanto ao falso testemunho, em que a pena máxima cominada é de
três anos (art. 342 do CP), admite-se em tese a prisão em flagrante delito. Geralmente, porém,
tal prisão não é conveniente, diante da imediata extinção da punibilidade em caso de
retratação pronunciada até a data da prolação da sentença (art. 342, §2º, do CP), o que pode
comprometer o sentido de autoridade e a própria seriedade do ato. Nesse sentido é que os
próprios membros do Ministério Público Federal ─ “dominus liƟs” em todos esses expedientes
─ sugerem que não se proceda à prisão em flagrante de testemunha mendaz ou lacunosa. Em
casos especiais, querendo realizar o flagrante sem maiores contratempos (o que, insista-se,
deve ser excepcional), deverá o juiz prolatar a sentença em audiência e, logo na sequência (art.
302, II, do CPP), dar a voz de prisão; nessa hipótese, porque já prolatado o julgamento, não
haverá ensejo legal para retratações.
j. Em relação ao instituto da prisão, importa ainda observar o seguinte:
(j.1) em se tratando de advogado, é direito do detido ter a presença de
representante da OAB, quando preso em flagrante por motivo ligado ao exercício da
advocacia, para lavratura do auto respectivo (sob pena de nulidade); e, nos demais casos, é
seu direito a necessária e expressa comunicação à seccional da OAB (art. 7º, IV, da Lei n.
8.906/94), com a brevidade possível;
(j.2) hodiernamente, mesmo quando caiba a prisão em flagrante delito,
de regra o detido livrar-se-á mediante fiança arbitrada diretamente pela autoridade policial,
sem o escrutínio do juiz penal, desde que se trate de crime cuja pena privativa de liberdade
máxima cominada não ultrapasse quatro anos (art. 322, caput, do CPP, na redação da recente
Lei n. 12.403/2011), como é o caso do falso testemunho ou da coação no curso do processo
(observadas, porém, as exceções do art. 323 do CPP, como, p.ex., nos crimes de racismo ─ Lei
n. 7.716/89);
(j.3) não há hipótese juridicamente possível de prisão penal ou processual
penal decretada por juiz não-penal por mandado judicial (logo, há apenas a possibilidade da
prisão em flagrante, nos casos legais);
(j.4) todo juiz tem o direito de somente ser preso mediante ordem escrita
do tribunal competente (i.e., por mandado judicial), salvo em caso de flagrante de crime
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inafiançável (e não é esse o caso, p.ex., dos crimes da Lei n. 4.898/65), caso em que “a
autoridade fará imediata comunicação e apresentação do magistrado ao Presidente do
Tribunal a que esteja vinculado” (art. 33, II, da LOMAN).
k. Nos casos de ilícitos penais perpetrados em audiência contra a honra
do magistrado (calúnia, difamação, injúria ─ arƟgos 138, 139 e 140 do CP), abre-se ao juiz,
ulteriormente aos fatos, o ensejo para o ajuizamento de queixa-crime ou a representação
penal ao Ministério Público Federal (competência penal concorrente do Parquet e do
ofendido), por se tratar de delitos cometidos em razão do exercício das funções (art. 141, II,
c.c. art. 145, par. único, do CP). Para esse efeito, a AMATRA XV possui contrato de partido com
advogados criminalistas de nomeada, acionados logo após o parecer positivo da Comissão
Disciplinar e de Prerrogativas da Associação. Releva pontuar, entretanto, que frequentemente
prescrevem retroativamente (art. 110, §1º, do CP), em segundo grau de jurisdição, todos os
delitos com prazo prescricional não superior a quatro anos, como são os crimes contra a honra
(art. 109, V e VI, do CP); a única diferença, a partir da Lei n. 12.234/2010, é que a contagem da
prescrição pela pena “in concreto” agora só pode ser feita a partir do recebimento da
denúncia ou queixa (e não mais da data do fato à do recebimento da denúncia ou queixa,
como ocorria anteriormente). Assim, para melhores efeitos, convirá valer-se, nos casos mais
graves, de ações civis de reparação por danos morais, que não se sujeitam ao fenômeno da
prescrição intercorrente ou retroativa.
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