MEDIDAS DE URGÊNCIA NA ARBITRAGEM E O NOVO

Transcrição

MEDIDAS DE URGÊNCIA NA ARBITRAGEM E O NOVO
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MEDIDAS DE URGÊNCIA NA ARBITRAGEM E O NOVO REGULAMENTO
DO CAM-CCBC
por Francisco José Cahali 1
Em boa hora, e medida certa, a renovação do Regulamento do Centro de Arbitragem e
Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá – CAM-CCBC, em vigor a partir de
01.01.2012, promovida sob a auspiciosa regência do Presidente Dr. Frederico Straube.
A arbitragem no Brasil já é uma experiência de sucesso. Ao lado da sua crescente
utilização nos conflitos domésticos, também nossas Instituições, como é o caso do CAMCCBC estão cada vez mais merecidamente reconhecidas como adequadas e muito bem
aparelhadas para receber procedimentos relativos à arbitragem internacional.
A instituição arbitral é naturalmente catalisadora da dinâmica da arbitragem,
acompanhando diretamente a maior utilização deste instrumento em crescente variedade de
conflitos que assim são solucionados.
Nesta medida, o regulamento de uma entidade deve acompanhar este movimento, para
corresponder às expectativas da nova realidade, pois representa a base e o elemento estrutural
de segurança de procedimento na qual a arbitragem se desenvolverá, garantindo assim os
melhores resultados na utilização desta jurisdição arbitral.
Daí serem merecedoras de aplauso as modificações introduzidas no novo regulamento
do CAM-CCBC, dentre elas: composição de tribunal em arbitragem multiparte; regramento
aperfeiçoado para indicação, aceitação e impugnação dos árbitros, inclusive para solução de
incidentes até a assinatura do termo de arbitragem; previsão de questionário de conflitos de
interesse e disponibilidade a ser respondido pelo árbitro indicado; previsão mais flexível das
hipóteses consolidação de demandas (reunião de procedimentos); possibilidade de análise de
certas questões prejudiciais antes da formação do tribunal arbitral; dispensa de indicação de
suplente; mais confortável forma de se contagem de prazos; e tudo além de melhor dinâmica
no procedimento em geral.
1
Advogado e Consultor Jurídico em São Paulo, Mestre e Doutor pela PUC/SP, onde leciona em graduação e no
programa de pós-graduação; Membro Fundador do IBDFAM; Membro da Comissão de Mediação e Arbitragem da
OAB-SP; Vice-Presidente da Comissão de Mediação e Arbitragem da OAB-DF.
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MEDIDAS CAUTELARES E A LEI DE ARBITRAGEM
Como já escrevemos, “em polêmico dispositivo, estabelece a Lei de Arbitragem que,
‘havendo necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao
órgão do Poder Judiciário que seria, originariamente, competente para julgar a causa’ (art. 22,
§ 4.º). Inúmeras críticas cabem a esta regra, não só pela sua imprópria localização (em artigo
destinado às provas orais da arbitragem), como também pela ambígua redação. Mas
poupamos o legislador de censuras para, apenas neste momento, apresentarmos o quanto de
útil se tem na lei. Assim, embora o legislador tenha sido contido a respeito das medidas
cautelares na arbitragem, a doutrina oferece a interpretação da lei na extensão esperada”. e
concluímos: “O juízo arbitral tem total autoridade para apreciar e deferir medidas cautelares
no curso da arbitragem. A jurisdição do árbitro (ou painel) é completa para o conhecimento de
todas as questões relativas ao conflito. Lembre-se apenas da ausência de poder coercitivo ou
de poderes de execução das medidas, estes privativos do Judiciário. Se não atendida
espontaneamente a determinação arbitral, ou sendo impossível o cumprimento espontâneo,
deverá ser solicitada a cooperação do juízo estatal para a efetivação forçada das medidas
determinadas pelo árbitro. Enfim, possui o árbitro o ius cognitio, mas falta-lhe o ius imperium
para realizar na prática suas decisões”.2
Ainda, em outra passagem, por nós já foi dito: “desta forma, diferentemente do quanto
pode parecer pela literalidade do texto legal, o árbitro decide a respeito da medida
(pertinência, providência e extensão). Se não atendida espontaneamente pela parte, e inviável
o cumprimento de outra forma, será necessária a cooperação do juízo estatal, para a prática
dos atos necessários à efetivação da tutela cautelar deferida”.3
Superada, pois, a dúvida inicial, hoje não mais se hesita quanto à jurisdição do árbitro
(ou painel arbitral) para o conhecimento e deferimento de medidas cautelares. Também firme
o entendimento de que previamente à instituição da arbitragem (art. 19 da Lei de Arbitragem),
estas medidas deverão ser apresentadas no juízo estatal através de processo cautelar
antecedente, indicado o procedimento arbitral como a ação principal.
2
CAHALI, Francisco José. Op. cit., capítulo 10, item 10.2.2.
Com diz Pedro Batista Martins: “É neste particular que se fraciona a jurisdição arbitral sem, contudo, anulá-la,
por lhe faltar o componente da coertio privativo do Estado” (MARTINS, Pedro Batista. Da ausência de poderes
coercitivos e cautelares do árbitro. In: CARMONA, Carlos Alberto; MARTINS, Pedro Batista; LEMES, Selma Maria
Ferreira (coords.). Aspectos fundamentais da Lei de Arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 361).
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2
DA ANÁLISE DO REGULAMENTO DO CAM-CCBC QUANTO À MATÉRIA
“Artigo 8 – Medidas de urgência
8.1 A menos que tenha sido convencionado de outra forma pelas partes, o tribunal arbitral
poderá determinar medidas cautelares, coercitivas e antecipatórias, que poderão, a critério do
tribunal, ser subordinadas à apresentação de garantias pela parte solicitante.
8.2 Havendo urgência, quando ainda não instituído o tribunal arbitral, as partes poderão
requerer medidas cautelares ou coercitivas à autoridade judicial competente, se outra forma
não houver sido expressamente estipulada por elas. Nesse caso, a parte deverá dar ciência ao
CAM/CCBC das decisões.
8.2.1 Assim que instituído o tribunal arbitral, caberá a ele manter, modificar ou revogar a
medida concedida anteriormente.
8.2.2 O requerimento feito por uma das partes a uma autoridade judicial para obter tais
medidas, ou a execução de medidas similares ordenadas por um tribunal arbitral, não serão
considerados como infração ou renúncia à convenção de arbitragem e não comprometerão a
competência do tribunal arbitral.”
I. Inicialmente, como já referido, merece registro o nosso aplauso à iniciativa de se fazer
constar no Regulamento a referência a esta matéria. E atualíssima a apresentação, adequada
não só à forma com que moderna doutrina e jurisprudência tratam do tema: medidas de
urgência, como também com a perspectiva do direito processual civil projetado, no qual o
atual regramento de medidas cautelares cede lugar à nova e adequada sistematização como
medidas de urgência.
Em seu item 8.1, trata das medidas de urgência incidentes no procedimento arbitral, e o item
8.2 (acrescido de 8.2.1 e 8.2.2), refere-se aos provimentos antecedentes à instauração da
arbitragem.
II. Igualmente merecedor de créditos a referência expressa no regulamento da preservação da
autonomia da vontade das partes, reservada a supremacia do quanto por elas eventualmente
convencionado a respeito das medidas de urgência. O Regulamento, pois, neste particular,
aplica-se na ausência de previsão diversa em convenção das partes.
Veja a íntegra do artigo na Revista de Arbitragem e Mediação n. 33, coordenação do Prof.
Arnoldo Wald, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2012.