PROCURADORIA GERAL DO ESTADO

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PROCURADORIA ADMINISTRATIVA
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Ofício n°:
COAP-SP n° 31/2008 (SF 23752-233845/2008)
Parecer:
PA n° 225/2008
Interessado:
Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado
de São Paulo
Assunto:
PISO SALARIAL. MÉDICOS VETERINÁRIOS.
SERVIDORES CELETISTAS. FUNDAÇÃO.
A Lei Federal 4.950-A, de 22/4/1966, que prevê um piso salarial
para diversas categorias profissionais, entre as quais se incluem os
médicos veterinários, aplica-se também aos servidores públicos
das administrações direta e indireta regidos pela CLT, segundo
reiterada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Todavia, a
vinculação desse piso ao salário mínimo, consoante o previsto no
artigo 5o da lei em causa, não foi recepcionada pela atual
Constituição da República, por força de seu art. 7o, IV, com o que
surgiu uma lacuna no ordenamento quanto ao parâmetro a ser
seguido para a fixação do piso ou sua devida atualização. Como
se trata de uma lacuna que apenas o Poder Legislativo competente
pode suprir, por ora o piso salarial em questão equivale, na
prática, a um só salário mínimo (art. 7o, IV e art. 39, Par. 3o da
CF), tendo em vista a absoluta ausência de um parâmetro que
possa ser aplicado uniformemente a todos os profissionais,
servidores públicos ou não. Análise das decisões proferidas nos
RREE 235.643 e 565.714. Proposta de revisão parcial do
entendimento aprovado no Parecer PA-3 n° 411/94.
1 - 0 ofício inaugural (fl. 1-A), de 12/3/2008, foi encaminhado
pelo Sr. Presidente do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São
Paulo ao Sr. Secretário-Chefe da Casa Civil do Governo do Estado, solicitando "que a
Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo atenda o disposto na Lei 4950-A
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de 22 de abril de 1966, com relação ao piso salarial dos profissionais médicos
veterinários ". Foi-lhe anexada cópia da referida lei federal (fls. 2/3).
2 - Encaminhado o pleito ao CODEC, este último, à fl. 9, o
remeteu à Fundação ITESP, para conhecimento e manifestação, passando, após, à
Consultoria Jurídica da Secretaria da Justiça, com idêntica finalidade.
3 - A Assessoria Jurídica do ITESP manifesta-se à fl. 27, e junta
cópia de um parecer prolatado anteriormente pelo órgão (Parecer ACJ n° 185/2004, às
fls. 11/26), que concluiu pela inaplicabilidade da Lei 4.950-A/66 aos empregados
públicos da Fundação. A citada peça opinativa, com efeito, parte do pressuposto de que
a Fundação ITESP tem personalidade de direito público - segundo reza o art. 1o da Lei
Estadual 10.207/99 -, e assim, embora contrate os seus servidores pelo regime da CLT
(art. 18), não tem por que submeter-se integralmente ao direito privado. Ora argumenta o parecer -, o art. 169, Par. 1o, I e II, da CF/88 determina que "a concessão
de qualquer vantagem ou aumento de remuneração... a qualquer título por órgãos ou
entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas ou
mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas... se houver prévia dotação
orçamentária " e "se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias ",
valendo acrescentar, por outro lado, que o art. 21, I da Lei de Responsabilidade Fiscal
reputa "nulo de pleno direito o ato que provoque aumento de despesa com pessoal que
não atenda... o disposto no inciso XIII do art. 37 e no Par. 1o do art. 169 da
Constituição". Como a Lei Federal 4.950/66 impõe a correção automática do salário
mínimo profissional vinculando-o ao salário mínimo geral, segue-se que, se tal
legislação fosse aplicada no âmbito do Poder Público, as vantagens representadas pelo
aumento de seu valor seriam concedidas ao arrepio das citadas normas constitucionais e
da Lei de Responsabilidade Fiscal. O parecer invoca a Orientação Jurisprudencial n° 71
da SDI-2 do Tribunal Superior do Trabalho, firmada a partir de inúmeros precedentes
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daquela Corte, conforme transcreve às fls. 16/21, desacolhendo a aplicação da Lei
4.950-A/66 ao servidor público celetista. E termina ressaltando que o Supremo Tribunal
Federal fulminou, por vício formal ou substancial, leis estaduais que previam piso
atrelado ao salário mínimo para determinados cargos ou empregos (ADIs 290 MC, 840
MC, 668 MC e 1064 MC).
4 - Em cumprimento à solicitação de fl. 9, a d. CJ da Pasta da
Justiça, à qual se vincula a Fundação ITESP, pronuncia-se às fls. 83/94. De início,
procura individualizar a hipótese dos autos, extremando-a de outras similares, e que já
foram objeto de análise pela Procuradoria Administrativa, a qual, em algumas ocasiões,
teve oportunidade de tratar da Lei Estadual 729/2003, cujo art. 2o dispôs sobre como
haveria de ser enquadrada vantagem percebida, com base na Lei Federal 4950-A/66, por
engenheiros, arquitetos, agrônomos e assistentes agropecuários, quando houvessem
obtido decisão judicial a seu favor. Como os veterinários não foram contemplados na
Lei 729/2003, a questão dos autos é diferente: para a mesma, valeria o Parecer PA-3 n°
411/94, acerca da situação salarial dos servidores celetistas das autarquias, em cuja
ementa consignou-se a "inexistência de obrigatoriedade da observância do piso da
categoria profissional previsto na legislação federal, uma vez que contraria a
autonomia administrativa dos Estados ".
5 - Contudo, observa a d. parecerista a prolação, no Supremo
Tribunal Federal, de acórdãos que se inclinam pela solução oposta. Com efeito, no RE
235.643 (Rel. Min. Sepúlveda Pertence) - cópia acostada às fls. 42/54 - a 1a Turma
entendeu aplicável aos empregados celetistas dos Estados a legislação federal relativa
ao salário mínimo profissional, "dada a competência privativa da União para legislar
sobre Direito do Trabalho". Por sua vez, no RE 189.256 (Rel. Min. Moreira Alves) cópia anexada às fls. 29/41 -, restou igualmente reconhecida a "incidência da
legislação federal que estabelece no âmbito da legislação trabalhista salário mínimo
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profissional para engenheiros e arquitetos, sobre os servidores estaduais regidos pela
CLT". Nota a d. integrante da CJ da Pasta que, embora os dois julgados versem sobre
situações fáticas anteriores à Carta de 1988, pode-se razoavelmente sustentar que "a
argumentação que os embasa e, principalmente, a fundamentação do precedente
comum, o RE 164.715-9 (recorrente o Estado de Minas Gerais), sobrevivem na nova
ordem constitucional, s.m.j." Este último (RE 164.715, reproduzido às fls. 55/82),
relatado pelo Min. Sepúlveda Pertence, cuidou da legislação federal sobre "gatilho", e
veio a ser apreciado pelo Pleno da Suprema Corte à luz de um importante precedente
(julgado na Rep. 745 em 13/3/68, in RTJ 45/1), concluindo-se que "no âmbito da
competência privativa da União para legislar sobre Direito do Trabalho - que abrange
as normas de reajuste salarial compulsório - a lei federal incide diretamente sobre as
relações contratuais dos servidores dos Estados, dos Municípios e das respectivas
autarquias: uma coisa ê repelir - por força da autonomia do Estado ou da vedação de
vinculações remuneratórias - que a legislação local possa atrelar os ganhos dos
servidores estaduais, estatutários ou não, a vencimentos da União ou índices federais
de qualquer sorte. Outra coisa bem diversa é afirmar a incidência direta sobre os
salários de servidores locais, regidos pelo Direito do Trabalho, de lei federal sobre
reajustes salariais: aqui, o problema não é de vinculação; nem de usurpação ou
renúncia indevida à autonomia do Estado; é sim, de competência da União para
legislar sobre Direito do Trabalho. "
6 - Em conclusão, é assinalado que, a manter-se a orientação do
Parecer PA-3 n° 411/94, o reclamo do interessado em epígrafe haveria de ser indeferido.
Todavia, tendo em vista as recentes decisões do STF consagrando, ao que tudo indica, a
tese contrária, torna-se conveniente a oitiva desta Especializada, conforme sugere, a
final, a d. parecerista de fls. 83/94.
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7 - Aprovada a peça opinativa à fl. 97, o feito foi remetido à d.
Subprocuradoria para a Consultoria, que o encaminhou a esta Especializada, para
análise e parecer (fl. 88).
É o relatório. Opino.
8 - É o seguinte o texto da Lei Federal 4.950-A, de 22/4/1966:
Art. 1° - O salário-mínimo dos diplomados pelos cursos regulares
superiores mantidos pelas Escolas de Engenharia, de Química, de
Arquitetura, de Agronomia e de Veterinária é o fixado pela presente Lei.
Art. 2o - O salário-mínimo fixado pela presente Lei é a
remuneração mínima obrigatória por serviços prestados pelos
profissionais definidos no art. 1o, com relação de emprego ou função,
qualquer que seja a fonte pagadora.
Art. 3° - Para os efeitos desta Lei as atividades ou tarefas
desempenhadas pelos profissionais enumerados no art. 1° são
classificadas em:
a) atividades ou tarefas com exigência de 6 (seis) horas diárias de
serviço;
b) atividades ou tarefas com exigência de mais de 6 (seis) horas
diárias de serviço.
Parágrafo único. A jornada de trabalho é a fixada no contrato de
trabalho ou determinação legal vigente.
Art. 4o - Para os efeitos desta Lei os profissionais citados no art. 1o
são classificados em:
a) diplomados pelos cursos regulares superiores mantidos pelas
Escolas de Engenharia, de Química, de Arquitetura, de Agronomia e de
Veterinária com curso universitário de 4 (quatro) anos ou mais;
b) diplomados pelos cursos regulares superiores mantidos pelas
Escolas de Engenharia, de Química, de Arquitetura, de Agronomia e de
Veterinária com curso universitário de menos de 4 (quatro) anos.
Art. 5° - Para a execução das atividades e tarefas classificadas na
alínea a do art. 3°, fica fixado o salário-base mínimo de 6 (seis) vezes o
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maior salário-mínimo comum vigente no País, para os profissionais
relacionados na alínea a do art. 4°, e de 5 (cinco) vezes o maior saláriomínimo comum vigente no País, para os profissionais da alínea b do art.
4o.
Art. 6o - Para a execução de atividades e tarefas classificadas na
alínea b do art. 3°, a fixação do salàrio-base mínimo será feito tomandose por base o custo da hora fixado no art. 5° desta Lei, acrescidas de
25% as horas excedentes das 6 (seis) diárias de serviços.
Art. 1° - A remuneração do trabalho noturno será feita na base da
remuneração do trabalho diurno, acrescida de 25% (vinte e cinco por
cento).
Art. 8° - Esta Lei entrará em vigor na data da sua publicação,
revogadas as disposições em contrário.
9 - A questão posta nos autos cinge-se à aplicabilidade, ou não,
das normas salariais da lei acima transcrita aos veterinários contratados conforme o
regime trabalhista pela fundação de direito público "Instituto de Terras do Estado de
São Paulo" (ITESP). Ora, afigura-se-me de modo algum despropositada a ideia de que
em nosso sistema positivo vigente as disposições da legislação federal sobre piso
salarial para certas categorias - dentre as quais os veterinários, a teor da Lei 4.950-A/66
- foram recepcionadas pela Carta de 1988, e mais, aplicam-se às relações de emprego
firmadas entre esses profissionais e o Estado, suas autarquias e fundações de direito
público. O que não se recepcionou foi a vinculação do piso ao salário mínimo geral, por
força do art. 7o, IV da Lei Maior, que a veda peremptoriamente. No caso, a Lei 4.950A/66 foi recepcionada, à exceção do artigo 5o, supra-transcrito. Ou seja, a orientação
consagrada, entre outros, no julgamento do RE 235.643, parece sólida o bastante para
justificar a presente assertiva, inclusive se apreciada à luz de decisões mais recentes do
Pretório Excelso, como a advinda com o RE 565.714. Em pesquisa efetuada por mim,
constatei que o próprio TST (largamente citado no parecer de fls. 11/26) prolatou
inúmeras decisões no mesmo sentido, reconhecendo que a sujeição dos Estados às
regras trabalhistas em matéria de piso salarial para os seus empregados não afronta a
autonomia estadual nem as regras orçamentárias advindas da Carta de 1988.
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10 - A d. parecerista de fls. 83/94 argutamente trouxe à colação o
aresto proferido no RE 235.643 (fls. 42/54). É bom frisar que antes desse julgado, a
Corte Suprema, vendo-se confrontada com a questão de leis que estabeleciam
parâmetros mínimos de remuneração atrelados ao salário mínimo geral, houve por bem
declarar sua inconstitucionalidade, sob o pálio do art. 7o, IV da Carta Federal, que
qualifica como direito social dos trabalhadores urbanos e rurais o "salário mínimo,
fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais
básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer,
vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe
preservem o poder aquisitivo, sendo vedada a sua vinculação para qualquer fim".
Neste diapasão, seria cabível, em tese, argumentar que a regra do art. 5o da Lei 4.950-A,
por manifestamente determinar a vinculação vedada pela nova Carta, não podendo ser
aplicada desde o advento da nova ordem constitucional, acarretaria o fim - enquanto
não editada legislação condizente com o texto da atual Lei Maior - do indigitado piso
salarial para as categorias ali contempladas. E tal conclusão seria aceitável tanto para os
celetistas servidores públicos como para aqueles que integram a iniciativa privada.
Desta forma, restaria finda a controvérsia, sem que fosse preciso, sequer, abordar-se a
questão da autonomia dos entes públicos e suas especificidades (entre as quais a
exigência de previsão de aumentos remuneratórios na lei orçamentária, por força do art.
169, Par. 1o, II da CF), base da argumentação alinhavada no parecer da Fundação ITESP
(fls. 83/94).
11 - Daí o interesse singular que apresenta para a hipótese dos
autos o teor do que se decidiu no RE 235.643: a Corte não apenas reiterou o
entendimento de que o Poder Público, não importa de qual esfera, ao contratar um
servidor pelo regime trabalhista deverá submeter-se às regras - entre as quais
sobressaem as que se referem a salários - que a legislação federal competente vier a
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estabelecer, como ainda deixou assente a ideia de que as normas sobre piso salarial
ainda se encontram em vigor - vale dizer, os profissionais elencados na Lei 4.950-A
têm direito a um salário mínimo específico -, só não tendo sido recepcionado o antigo
parâmetro para a sua fixação, atrelado que estava ao salário mínimo geral. Isto quer
dizer que haverá, certamente, um piso, mas ele não poderá ser estabelecido em termos
de "salários mínimos": o julgado no RE 235.643, e, principalmente, o dos Embargos de
Declaração neste mesmo RE procuraram esclarecer qual haveria de ser esse parâmetro,
para o caso concreto ali debatido, na ausência de nova legislação federal que harmonize
a Lei 4.950-A com o art. 7o, IV da CF/88. Sobre essa decisão e os problemas que suscita
a partir da lacuna na legislação laboral quanto a um critério para estabelecer-se
objetivamente o valor do piso, voltarei mais à frente.
12 - Neste passo, cumpre notar que, na esteira de decisões
anteriores (RE 189.256 e 164.715), a 1a Turma do Supremo Tribunal, ao julgar o RE
235.643, voltou a encarecer que, em matéria de salário mínimo profissional (piso
salarial), aplica-se a "lei federal que o estabelece aos empregados 'celetistas' dos
Estados, dada a competência privativa da União para legislar sobre Direito do
Trabalho." Como lembrou o parecer da CJ da Pasta, essa orientação é antiga na
Suprema Corte, desde, ao menos, a apreciação da Representação 745 (RTJ 45/1). Vale,
nesse particular, colacionar-se o seguinte trecho do voto do Min. Néri da Silveira no RE
164.715 (que cuidou do tema do "gatilho salarial"), bem característico da posição
triunfante na Suprema Corte:
"Quaestio júris diversa põe-se, entretanto, quando adota
o Estado-membro, na relação jurídica de emprego de seus
servidores, o regime federal definido na Consolidação das Leis do
Trabalho. Eleita a CLT como disciplina da relação de emprego,
incidem, no plano estadual, as normas do direito federal, para cuja
edição privativa era e continua sendo a competência da União. Se
o Estado opta, no exercício da sua autonomia, pelo sistema
celetista, o direito federal regula a relação de emprego em toda
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sua extensão, ipso jure. Não cabe, em consequência disso, ao
Estado-membro, invocar o principio da autonomia para disciplinar
direitos e obrigações de seus servidores ou a proibição de vincular
vencimentos ou salários a determinados paradigmas de outro
âmbito administrativo.
"O precedente bem invocado no voto do ilustre Ministro
Sepúlveda Pertence dá exata medida da doutrina que se veio a
adotar a esse respeito. Eleito o direito federal do trabalho a
regular o regime jurídico de emprego de servidores estaduais, não
cabe ao Estado-membro, enquanto a ele submetido, criar normas
específicas locais regentes dessa relação de emprego sujeita à
CLT, restritivas dos direitos dela originários. Na espécie, ad
exemplum, pretende-se que os gatilhos salariais previstos na
política salarial definida pela União Federal, que atinge os
empregados regidos pela CLT, não incida no Estado, senão
quando este a tal regramento houver por bem submeter-se. Seria
admitir, como bem anotou o saudoso Ministro Victor Nunes, no
julgamento da Representação n° 745, a existência de dois regimes
trabalhistas: um, para os empregados das empresas privadas, e
outro, para os empregados do serviço público, sujeitos à CLT (RTJ
45, p. 4). Daí, na conclusão do julgamento, quanto à validade do
art. 82, da Lei federal n° 5194, de 24.12.1966, fazer-se a distinção
segundo a qual era a regra inválida, quanto ao piso salarial dos
engenheiros, no tocante aos servidores sujeitos ao regime
estatutário, mas constitucional a previsão da norma federal, e
assim não abrangidos pela declaração de inconstitucionalidade, os
que têm sua relação de emprego regida pela CLT, quer sejam
empregados de empresas privadas, quer sejam servidores da
Administração Pública, direta ou indireta. Bem de ver é, destarte,
que, se se cuida de normas federais cogentes, instituidoras de
garantias salariais mínimas do trabalhador, sua incidência sobre
as relações de trabalho com o Estado-membro independe de lei
local, à qual não cabe dispor, em virtude da competência privativa
da União Federal.
"Não tenho, pois, como deixar de reconhecer, no caso, a
incidência das normas de reajuste salarial compulsório previsto na
lei federal, também no âmbito dos Estados e Municípios e
respectivas autarquias, no que concerne a seus servidores sujeitos
à CLT.
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"Não há ver, desse modo, ofensa aos dispositivos
indicados no recurso extraordinário, razão por que dele não
conheço, seguindo, assim, os votos que acompanham o do ilustre
relator, Ministro Sepúlveda Pertence, pedindo vênia ao Senhor
Ministro Sydney Sanches, quando entende que o Estado se submete
à legislação trabalhista, 'mas não pode abrir mão de sua autonomia de
regular vencimentos e salários dos seus servidores'".
13 - Observe-se que, logo em seguida, o próprio Min. Sydney
Sanches (que até então restara isolado em sua posição) modificou o seu voto com os
seguintes e expressivos dizeres:
"Sr. Presidente, convenci-me, agora, do acerto da
posição de V. Exa. O argumento do ilustre e saudoso Ministro
VICTOR NUNES LEAL parece-me irrespondível e não me havia
ocorrido na ocasião, em que proferi meu voto quando me pareceu
que ninguém, em nome do Estado, pode abrir mão de sua
autonomia, mesmo mediante contrato. Na verdade, há uma razão
maior para solução diversa, no caso: à União é que compete
regular as relações de trabalho. O Estado não pode substituir-se à
União, estabelecendo regras diversas para seus empregados
celetistas
"Não consigo vencer esse argumento. Por isso reajusto
meu voto e acompanho V. Exa., não conhecendo o recurso. "
14 - Não obstante as reiteradas manifestações da Suprema Corte
preconizando a aplicabilidade da legislação federal às relações de emprego mantidas
entre os Estados e suas autarquias, de um lado, e uma parte significativa de seus
servidores (os celetistas), de outro, não se afigura incorreto sustentar-se que as
peculiaridades advindas do fato de o empregador ser pessoa jurídica de direito público
impõem o reconhecimento da incidência de certas normas constitucionais que terão de
ser observadas em face de tais relações. O Parecer PA-3 n° 348/94, aprovado
superiormente, embora reconhecendo que o Estado abre mão de sua autonomia (art. 18
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da CF/88) quando contrata servidores sob o regime da legislação trabalhista, admite que
estas relações laborais sofram algumas alterações, por força de o contratante ser o Poder
Público. Tais alterações decorrem exclusivamente da própria Constituição, e a d.
prolatora da citada peça opinativa chega a enumerar diversas delas (valendo notar que o
texto constitucional ao qual se refere é o anterior à Emenda 19/98):
"Inegavelmente, a contratação, pelo Estado, de
servidores sob o regime laboral, determina algumas alterações
nesse regime, por força de o contratante ser o Poder Público.
"Entretanto, as particularidades no regime trabalhista
dos empregados do Poder Público - quer da Administração Direta,
quer das entidades governamentais - são, apenas aquelas revistas
na Constituição.
"De início, a sua remuneração está balizada por uma
série de preceitos relativos à contenção de despesas aplicáveis aos
servidores públicos em geral, a saber: o art. 169, que estatui que a
despesa com pessoal ativo e inativo não poderá exceder os limites
a serem estabelecidos em lei complementar; o § único do art. 169
que faz depender de lei e a prévia dotação a criação de cargos,
vantagens alteração de carreira, admissão, e aumentos de
remuneração; o art. 37 XI, que estabelece relação entre a
remuneração máxima e a mínima; o art. 37 XII, que prevê os
vencimentos do Executivo como paradigmas para o Legislativo e o
Judiciário; o inciso XIII do art. 37, que veda a vinculação ou
equiparação de vencimentos no serviço público; o inciso XIV do
art. 37 que proíbe que os acréscimos percebidos por servidor
público sejam computados ou acumulados para fins de concessão
de créditos ulteriores sob o mesmo título ou fundamento; o inciso X
do art. 37, que estatui que a revisão geral da remuneração dos
servidores públicos, far-se-á sempre na mesma data, sem distinção
entre os servidores civis e militares; o art. 63, S1°, II "a" segundo
o qual a lei que aumenta remunerações ou cria cargos é de
iniciativa do Chefe do Executivo.
"Além dessas regras, de ordem financeira, outras há
como a do art. 37, I, que regula acessibilidade a cargos, funções e
empregos; a do inciso IX do art. 37, que dispõe sobre as hipóteses
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de dispensa de concursos nas hipóteses excepcionais; o direito de
greve e de sindicalização nos limites da lei complementar; a
proibição de acumulação remunerada prevista nos incisos XVI e
XVII do art. 37, as sanções por improbidade administrativas
previstas nos parágrafos 4 e 5o do art. 37.
"Tirante essas particularidades, previstas no texto
constitucional, o regime trabalhista se aplica por inteiro, ainda
quando o contratante seja o Estado, sem que isso implique em
perda de autonomia."
15 - Não me parece que esse entendimento deva ser alterado,
inclusive a referência ao art. 169, Par. 1o, com sua exigência de lei e prévia dotação
orçamentária: a urna, porque a possibilidade de autorização legal de crédito suplementar
sempre que se torne necessário satisfazer despesas estipendiarias representa um
mecanismo perfeitamente compatível com a dinâmica das relações trabalhistas; a duas,
porque, conforme em seguida se observará, a impossibilidade de vincular-se verba
remuneratória ao salário mínimo (art. 7o, IV da CF/88) tornou prejudicado este
argumento, já que os acréscimos do valor do mínimo não poderão servir de lastro para
elevar-se o do piso salarial especificado na Lei 4950-A/66. Ou seja, do Parecer PA n°
348/94 não deflui a conclusão de que o Estado não está obrigado a respeitar limites
mínimos de remuneração estabelecidos pela legislação laboral. Ao contrário, ele
recomenda que as leis federais que regem o Direito do Trabalho devem ser
rigorosamente observadas, "sendo tal regime afetado pelos dispositivos constitucionais
aplicáveis aos servidores em geral", e nada autoriza inferir, s.m.j., que esses
dispositivos, mormente o art. 169, Par. 1o, impeçam a incidência das regras sobre piso
salarial de algumas categorias, entre as quais as dos engenheiros e dos veterinários.
16 - Outro tanto, porém, não se pode dizer do Parecer PA-3 n°
411/94. Consta de sua ementa, com todas as letras, não haver obrigatoriedade para as
autarquias estaduais observarem o piso da categoria profissional na legislação federal
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"uma vez que contraria a autonomia administrativa dos Estados ". Em resposta a uma
das indagações formuladas na consulta - "Leis federais editadas para regulamentar
salário de categorias profissionais podem abranger servidores públicos estaduais?" argumentou-se no seguinte sentido:
"... não se pode tolerar que apolítica de remuneração
do pessoal das demais esferas de poder - que deve estar
necessariamente adequada às suas possibilidades orçamentárias e
financeiras - fique à mercê das injunções típicas do setor privado
disciplinado por lei federal. Aliás, quando entra em causa a
fixação de salários mínimos de grupos específicos de
trabalhadores alinhados em função de suas qualidades pessoais, a
matéria refoge ao campo das relações laborais propriamente ditas.
Em outras palavras, não mais se trata da aplicação do regime de
trabalho tipicamente celetista, porém de questão estipendiária com
conotação preponderantemente corporativista.
"Sustentar o contrário levaria ao absurdo de suprimir a
autonomia administrativa prevista no art. 25 da Carta Política, e
que assegura aos Estados a possibilidade de auto-organização,
consoante as Constituições e Leis que adotarem, como corolário
do sistema federativo proclamado no art. 1o.
"Portanto, somos de opinião que a legislação federal
editada para regulamentar salário de categorias profissionais não
abrange os servidores estaduais autárquicos contratados sob a
égide da Consolidação das Leis do Trabalho. "
17 - Do que precede, resulta manifesto que a orientação
agasalhada pelo Parecer PA-3 n° 411/94, no tocante ao tema ora em discussão, choca-se
frontalmente com a tese que veio a triunfar no seio do Supremo Tribunal Federal, qual
seja, a de que em matéria de piso salarial para certas categorias profissionais, a
legislação federal é de observância obrigatória pelos Estados e sua Administração
Indireta quanto aos contratos de emprego por eles celebrados, o que não abala nem a
autonomia das unidades federadas nem as regras orçamentárias do art. 169, Par. 1o da
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Carta da República. Sugiro, pois, seja reformado pelo Sr. Procurador Geral do Estado o
entendimento fixado no Parecer PA-3 n° 411/94, neste particular.
18 - Uma vez estabelecido que os Estados, aos contratarem pelo
regime da CLT, devem subordinar-se às normas federais atinentes ao chamado salário
mínimo profissional (que é a hipótese dos autos), uma outra questão terá de ser
enfrentada, a saber: a recepção, pela ordem constitucional inaugurada em 1988 - e até
que ponto o foi -, da Lei 4.950-A/66. Com efeito, há um fator que complica
sobremaneira a análise da hipótese. Trata-se da circunstância de o valor mínimo
determinado pela Lei 4.950-A, em seu art. 5o, haver sido fixado em termos de salários
mínimos (gerais). Confira-se, novamente:
"Art. 5° - Para a execução das atividades e tarefas classificadas na
alínea a do art. 3°, fica fixado o salârio-base mínimo de 6 (seis) vezes o
maior salário-mínimo comum vigente no País, para os profissionais
relacionados na alínea a do art. 4°, e de 5 (cinco) vezes o maior
salário-mínimo comum vigente no País, para os profissionais da alínea
b do art. 4o."
19 - Ora, o art. 7o, IV da Constituição Federal veda a vinculação
do salário mínimo comum "para qualquer fim". Sobre a referida vinculação, a Corte
Suprema teve oportunidade de se pronunciar diversas vezes, formulando o seu alcance
preciso a partir duma consideração nitidamente finalística. Vale por todos o julgado no
RE 217.700, Rel Min. Moreira Alves, cuja ementa proclama que "a vedação constante
da parte final do art 7o, IV, da Constituição, que diz respeito à vinculação do salário
mínimo para qualquer fim, visa precipuamente a que ele não seja usado como fator
de indexação, para que, com essa utilização, não crie empecilho ao aumento dele em
face da cadeia de aumentos que daí decorrerão se admitida essa vinculação". Mais
direto, o Min. Sepúlveda Pertence, em voto proferido no exame da ADIN 1425-GO,
observou:
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"... a inspiração dessa vedação constitucional vai
mais longe. A experiência mostra, por exemplo, que hoje o maior
obstáculo à elevação real do salário mínimo tem sido menos o
empregador privado do que os Estados e Municípios, uma vez que,
como era inevitável pelo próprio significado do salário mínimo, a
Constituição expressamente o assegurou a qualquer trabalhador,
incluídos os servidores públicos das diversas esferas.
"Por isso, a preocupação subjacente à vedação
do art. 7o, IV, é a de evitar mecanismos de pressão de outros
interesses, que sofreriam o reflexo do aumento do salário mínimo,
contra esse aumento em si mesmo."
20 - E, nesta mesma linha de considerações, o Min. Marco
Aurélio, no julgamento do RE 198.982, aduziu:
"O Constituinte de 1988 teve um cuidado
especial e lançou, na parte derradeira do inciso IV do artigo 7o,
cláusula vedadora que tem uma razão de ser, a de tomar-se o
salário-mínimo para o efeito de vinculação; vinculação a qualquer
título, não importa. Qual teria sido o objetivo? Qual é realmente o
alcance dessa cláusula que proíbe a adoção do salário-mínimo
como um verdadeiro fator de indexação? O Plenário acompanhoume quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade
n° 1.425. Na oportunidade, fiz ver que essa norma tem como
escopo maior evitar que interesses estranhos aos versados nela
própria, quanto à finalidade do salário-mínimo, possam de alguma
forma inibir a iniciativa do legislador no sentido da preservação
do poder aquisitivo do salário-mínimo.
"Ora, Senhor presidente, mesmo diante do
afastamento da vinculação, do uso limitado do salário mínimo,
percebemos que não ocorre essa atualização, em vista da espiral
inflacionária. O que acontecerá se o salário-mínimo for adotado
em outros segmentos da vida econômica, financeira e gregária a
ponto de se ter alcançando situações múltiplas? Aí é que não
haverá mesmo, diante dos interesses envolvidos, das repercussões
na própria dívida pública, a atualização do salário-mínimo. E foi
isso que se quis obstaculizar quando se vedou, na parte final do
inciso IV, vinculação do salário-mínimo para qualquer fim. "
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21 - Bem por isso, não são inconstitucionais as regras da
legislação ordinária que estabelecem limites atrelados ao salário mínimo para a
celebração por escritura pública de contratos de constituição de direitos reais sobre
imóveis (art. 108 do Código Civil: trinta salários mínimos) ou para o conhecimento de
pedido de falência com base em impontualidade injustificada do devedor (art. 94, I da
Lei 11.101/2005: quarenta salários mínimos). O STF não entreviu ofensa à regra
proibitiva de vinculação em diversas hipóteses nas quais o legislador ordinário ou
decisão judicial fixara em um salário ou em múltiplo de salários mínimos o parâmetro
para a definição da hipossuficiência econômica para fins de inscrição gratuita em
concurso público (ADIN 2672-ES), o valor mínimo de alçada (RE 201.297), ou mesmo
a indenização a ser paga pelo condenado por perdas e danos (RE 338.760), neste último
caso desde que o valor alcançado (expresso em salários mínimos) seja o inicial, a ser
posteriormente atualizado não pela variação do mínimo, mas por índices oficiais de
indexação (precisamente porque a finalidade precípua da vedação do art. 7o, IV é a de se
evitar que o salário mínimo seja usado como indexador). Confira-se, a propósito, a
ementa desse último julgado:
"Vinculação ao salário mínimo: incidência da
vedação do art. 7o, IV, da Constituição, restrita à hipótese em que
se pretenda fazer das elevações futuras do salário mínimo índice
de atualização da indenização fixada; não, qual se deu no acórdão,
se o múltiplo do salário mínimo é utilizado apenas para expressar
o valor inicial da condenação, a ser atualizado, se for o caso,
conforme os índices oficiais da correção monetária "
22 - Com tais temperamentos, o certo é que a Corte Suprema tem
sido rigorosa em rechaçar a utilização do mínimo como parâmetro, especialmente se o
for para salários, vencimentos ou vantagens remuneratórias de qualquer natureza e
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finalidade. A Min. Carmen Lúcia, relatora do RE 565.714 (que tratou do salárioinsalubridade a favor dos policiais militares instituído por lei do Estado de São Paulo
anterior à atual Constituição Federal), menciona diversos acórdãos a respeito, inclusive
sobre o tema dos autos - o piso salarial de algumas categorias profissionais. Ou seja,
também em matéria de piso, prevaleceu o entendimento de que a sua fixação em
número de salários mínimos não se afeiçoa ao texto constitucional, por chocar-se com o
art. 7o, IV da Lei Maior: RREE 235.643-PA (Rel. Sepúlveda Pertence), 197.072-SC
(Rel. Marco Aurélio, julgado no Pleno), 199.098-SC (Rel. limar Galvão), 247.208-SC
(Rel. Moreira Alves), 288.189-PR (Rel. Moreira Alves), 247.656-PR (Rel. limar
Galvão), 294.221-PR (Rel. Moreira Alves), e 273.205-PR (Rel. Moreira Alves), além do
Agr. Reg. Em RE n° 270.888-PR (Rel. Maurício Correa).
23 - Dos julgados retro-mencionados, digno de nota é que, à
exceção do primeiro, todos tratam da remuneração de servidores públicos estatutários, o
que torna estas hipóteses não exatamente similares à dos autos, que versam sobre piso
de celetistas: para os estatutários, sem dúvida, procede também o argumento da
autonomia estadual, que restaria malferida caso os vencimentos dos servidores
estivessem atrelados a um valor fixado pela União. Ainda assim, é válido trazê-los à
colação, pois enfatizam com firmeza a impossibilidade de servir o salário mínimo, em
qualquer caso, como fator de indexação: por esse motivo, a Constituição do Estado do
Paraná, ao determinar que os servidores não perceberiam menos que três mínimos, foi
tida por inconstitucional, e regra da Carta de Santa Catarina que dispunha que nenhum
servidor poderia receber vencimentos de menos de um salário mínimo sofreu
interpretação conforme os artigos 7o, IV e 39, Par. 2o (atual Par. 3o) da CF/88, no
sentido de que os "vencimentos" incluem o básico e todas as vantagens, vedada em
qualquer hipótese a indexação automática pela variação do mínimo. Também em
relação ao piso nacional dos professores, a Corte Suprema (no Agr. Reg. no RE
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270.888, em ação promovida por servidores da rede estadual de ensino do Estado do
PR) salientou que, se indexado ao salário mínimo, não poderá ser aplicado.
24 - A propósito, esse último julgado merece destaque à parte,
pois também cuidou de um tema fundamental ao deslinde da espécie, qual seja, o da
ausência de parâmetro para se estabelecer o piso dos professores na ordem
constitucional vigente. Em seu voto, o Relator obtemperou, invocando precedente
daquela Corte:
"O que o Supremo Tribunal Federal tem
proclamado não é a inexistência de direito a piso salarial por
parte das categorias profissionais às quais ele é atribuído, mas,
sim, a impossibilidade de atrelar-se esse piso salarial profissional
ao salário-mínimo ou a seus múltiplos. Neste sentido os
precedentes que citei na decisão agravada — ADI n° 120/AM,
Moreira Alves, DJ 26/04/96, ADI n° 668/AL, Celso de Mello, DJ
19/06/92, RE n° 204.645, limar Galvão, DJ 23/04/99 -,
salientando-se, deste último, o seguinte trecho:
'Conquanto o salário mínimo seja
constitucionalmente previsto como piso remuneratório do
servidor público, a teor da norma do art. 39, Par. 2° c/c o
art. 7o, IV, da Constituição, disso não resulta que a
remuneração do pessoal da Administração Pública possa
ser fixada em múltiplos do referido índice, sem ofensa aos
princípios constitucionais acima apontados'
"Desta forma, as garantias decorrentes da
valorização dos profissionais do ensino, prevista no artigo 206, V,
e ainda no artigo 7o, V, da Constituição, são preceitos dirigidos ao
legislador, dentro da política salarial promovida pelo Poder
Público, não cabendo ao Judiciário, que não tem tal função, a
integração de eventual lacuna legislativa. " (grifos meus)
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25 - Vale dizer, a lacuna que decorreu do fato de não haver
norma sobre piso salarial editada em conformidade com as regras constitucionais, sendo
do tipo de lacuna que apenas o legislador pode colmatar, não rende ensejo a que o
Judiciário o faça, ainda que a pretexto de garantir a valorização dos profissionais do
ensino diretamente enaltecida pelo art. 206, V da Carta de 1988 {"valorização dos
profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o
magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por
concurso público de provas e títulos", segundo a redação da EC-19/98, alterada pela
EC-53/2006, que excluiu do texto a referência ao piso), e indiretamente sugerida por seu
art. 7o, V ("piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho ").
26 - Ora, consoante adiantei no item 11, "supra", ao julgar o RE
a
235.643-PR, a 1 Turma do STF, já aqui considerando especificamente o piso salarial de
engenheiros, agrônomos e veterinários, contemplado na Lei 4.950-A/66, reconheceu sua
recepção pela Carta de 1988, e também sua aplicabilidade, embora admitindo a
existência de uma lacuna e a inidoneidade do salário mínimo como fator de indexação,
por força do art. 7o, IV da Lei Maior. Sobre a quantia mínima correspondente a tal
salário, argumentou o relator do recurso, Min. Sepúlveda Pertence, que o art. 5o da lei
(fixando em cinco ou seis salários mínimos o piso dos profissionais ali mencionados,
conforme o grau de formação acadêmica), antes mesmo da atual Carta republicana já
havia sido revogado pelo art. 2o do DL 2.351/87, conforme o qual as vinculações ao
salário mínimo até então existentes deveriam ser tidas, doravante, como relativas ao
"salário mínimo de referência". Como o "salário mínimo de referência" foi extinto pela
Lei 7.789/89, já sob a vigência da atual Constituição - valendo notar que dos dizeres do
Julgador restou implícito que a vinculação ao "salário mínimo de referência" foi
recepcionada pela Constituição, por constituir fator de indexação distinto do salário
mínimo propriamente dito, não incorrendo, destarte, na vedação do art. 7o, IV -, com
essa revogação, adveio um vazio normativo, já que a norma do art. 5o da Lei 4950-A/66
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não poderia ser repristinada. Ou seja, a Lei 4.950-A/66 continua em vigor no que tange
às normas sobre o piso; o que não mais se encontra em vigor é o seu art. 5o, com a
(inconstitucional) vinculação do piso ao salário mínimo. E, contrariamente ao decidido
no Agr. Reg. no RE 270.888, o Min. Sepúlveda Pertence, nisto também acompanhado
pelos demais Julgadores da 1a Turma, entendeu que essa lacuna pode ser preenchida
judicialmente, nos termos do art. 4o da Lei de Introdução ao Código Civil, concluindo:
"Assim, o valor do salário dos autores
diplomados em Agronomia deve corresponder, até o advento do
DL 2.351/87, a seis salários mínimos (L. 4.950-A/66, art. 5o); desse
decreto-lei até a L. 7.789/89, a seis salários mínimos de referência
(DL 2.351/87, art. 2o, Par. 1o), e daí para a frente, ao que vier a
ser fixado neste feito, vedada, em qualquer hipótese, a redução do
valor nominal da remuneração "
27 - Confrontado com os embargos de declaração interpostos pela
Fazenda do Estado do Pará, o d. Relator esclareceu que "os limites quantitativos do
salário dos autores engenheiros agrônomos a ser fixado pelo Juízo são obviamente os
do pedido, isto é, a quantia em moeda corrente igual ou inferior (sic) aos oito e meio
salários mínimos postulados na reclamação". Observe-se que a referência aos 8,5
salários mínimos, pelo que se pode inferir do relatório do RE em questão (fls. 43/47 dos
autos), deve-se ao fato de os reclamantes terem recebido um salário com esse indicativo,
com base na legislação local, até meados de 1987, quando tiveram início as reduções, as
quais culminaram num valor equivalente a pouco mais que um salário mínimo. Como a
Embargante houvesse suscitado ofensa à Súmula 339 do próprio Supremo Tribunal
("Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos
de servidores públicos, sob fundamento de isonomia"), o Min. Pertence respondeu que
"não há falar, por outro lado, em contrariedade à Súmula 339, pois não se trata de
equiparação por isonomia, mas de colmatar lacuna da lei do piso de salário
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profissional, que, mantido embora o direito, teve revogado o seu critério de cálculo,
por força do direito superveniente. "
28 - Com o devido respeito e acatamento que sempre se devem às
decisões da mais alta Corte do país, ouso sustentar que o entendimento firmado no RE
235.643-PA não constitui sinalização alguma quanto ao parâmetro objetivo que poderia
ser adotado pelos operadores jurídicos enquanto não houver norma legal que o fixe
segundo os ditames da nova ordem constitucional. Repare-se que ao relegar para o Juiz
de origem o múnus da fixação do valor do piso, escolheu-se um critério calcado na
legislação local, e o de que estamos tratando é uma lei federal de aplicação a todos os
profissionais por ela alcançados em todo o território nacional, celetistas do Poder
Público ou da iniciativa privada. Tem-se a nítida impressão de que as especificidades do
caso imperaram na decisão, em particular - "chi lo sa?" - a circunstância estapafúrdia
de o mínimo dos agrônomos paraenses ter chegado a valer pouco mais que um salário
mínimo comum. Embora, ao que parece, realmente não tenha sido contrariada a Súmula
339 do STF - o que torna a hipótese substancialmente diversa da apreciada no RE
242.948-PA (Rel. limar Galvão), quando a Corte deu provimento ao recurso do Estado
do Pará contra acórdão do TJ local que estendera por isonomia aos agrônomos
estatutários o piso de 8,5 salários mínimos obtidos na Justiça do Trabalho pelos
agrónomos celetistas -, ainda assim força é convir que a completa falta de um
parâmetro claro advinda da revogação do art. 5o da Lei 4.950-A/66 torna impossível
aplicar a regra do piso salarial prevista na mesma lei. E a pretensão de generalidade que
toda interpretação da lei traz implícita repele soluções que se entrevejam como
adequadas apenas para esse ou aquele caso. Em suma, se estamos perante uma lacuna
legislativa, cabe tão-somente ao próprio legislador integrá-la.
29 - Um problema semelhante foi examinado mais recentemente
quando do julgamento do RE 565.714-SP, que tratou do adicional de insalubridade dos
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policiais militares paulistas. A Lei Complementar Estadual n° 432/85, questionada no
RE, dispôs a respeito o seguinte em seu art. 3o e Parágrafo Único:
"O adicional de insalubridade será pago ao
funcionário ou servidor de acordo com a classificação nos graus
máximo, médio e mínimo, em percentuais de, respectivamente, 40%
(quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento),
que incidirão sobre o valor correspondente a 2 (dois) salários
mínimos.
"Par. 1o - O valor do adicional de que trata este
artigo será reajustado sempre que ocorrer a alteração no valor do
salário mínimo."
30 - Quer a d. Relatora, Min. Cármen Lúcia, quer os demais
Julgadores que, em sessão plenária, apreciaram o recurso, dissertaram longamente sobre
a incidência à hipótese do art. 7o, IV da Constituição Federal. A ementa do aresto, após
farto debate, reafirmou a rigorosa orientação do Supremo a respeito, nos seguintes
dizeres:
"O sentido da vedação constante na parte final
do inc. IV do art. 7o da Constituição impede que o salário-mínimo
possa ser aproveitado como fator de indexação; essa utilização
tolheria eventual aumento do salário-mínimo pela cadeia de
aumentos que ensejaria se admitida essa vinculação (RE 217.700,
Ministro Moreira Alves).
"A norma constitucional tem o objetivo de
impedir que aumento do salário-mínimo gere, indiretamente, peso
maior do que aquele diretamente relacionado com o acréscimo.
Essa circunstância pressionaria reajuste menor do salário-mínimo,
o que significaria obstaculizar a implementação da política
salarial prevista no art. 7o, inciso IV, da Constituição da
República.
"O aproveitamento do salário mínimo para a
formação da base de cálculo de qualquer parcela remuneratória
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ou com qualquer outro objetivo pecuniário (indenizações, pensões,
etc.) esbarra na vinculação vedada pela Constituição do Brasil. "
3 1 - Sucede, porém, que a d. Relatora viu-se na contingência de
resolver o principal impasse decorrente de tais assertivas: qual seria o valor do adicional
de insalubridade? Em seu voto restou claro (e isso constou também da ementa), ser
impossível modificar-se base de cálculo por decisão judicial. Entendeu a Min. Cármen
Lúcia, outrossim, não haver parâmetro infra-constitucional válido (conclusão a que
chegara o tribunal "a quo" no caso), donde asseverar: "Pior do que as duas hipóteses
acima seria concluir que os policiais militares não têm direito ao adicional de
insalubridade, por ausência de base de cálculo, uma vez que há lei a lhes assegurar tal
parcela remuneratória e que a sua só previsão não agride à Constituição. Ao contrário,
atende-a. A desconformidade restringe-se ao critério indexador fixado e que a vinculou
ao salário mínimo". Foi por essa razão que a Relatora, levando em conta as
peculiaridades do caso (inclusive a circunstância de que os recorrentes não poderiam
sair prejudicados após o recurso que interpuseram), determinou que a base de cálculo
desse adicional deverá ser "o equivalente ao total do valor de dois salários-mínimos
segundo o valor vigente na data do trânsito em julgado deste recurso extraordinário,
atualizando-o na forma da legislação estabelecida para a categoria, até que seja
editada lei fixando nova base de cálculo, respeitada a garantia constitucional da
irredutibilidade da remuneração."
32 - Esse último ponto foi objeto de uma grande discussão que se
travou em seguida, sobretudo com o Min. Marco Aurélio, para quem haveria
"reformatio in pejus" na solução alvitrada. Acrescente-se, ainda, que no enunciado da
ementa, por sugestão do Min. César Peluso, constou a não recepção, apenas, do Par. 1o
do art. 3o da LCE 432/85, eis que o problema adveio da automática indexação pela
variação do salário mínimo prevista no Parágrafo Único, e a referência ao mesmo no
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"caput" do art. 3o poderia ser interpretada, com a entrada em vigor da Carta de 1988,
como um valor fixado naquele momento, a ser corrigido daí em diante pelos critérios
utilizados para a atualização dos vencimentos em geral da categoria - ou seja, uma
solução, "mutatis mutandis", similar à encontrada no julgamento do RE 338.760,
conforme esclarecido no item 21, "supra" - até que uma lei disponha objetivamente
qual o parâmetro a ser empregado. Como, todavia, a questão da "reformatio in pejus"
tinha de ser enfrentada, chegou-se, ao que parece, ao consenso de que a solução da
Relatora era a melhor, e por isso os Ministros a acompanharam, pois na declaração do
acórdão se diz que negaram provimento ao recurso por unanimidade e o fizeram nos
termos de seu voto.
33 - Seria possível, no caso dos autos, adotar-se uma solução
como a sugerida pelo Min. Peluso? Seria viável declarar-se que o piso salarial dos
engenheiros, agrônomos e veterinários, após a revogação do DL 2.351/87 pela Lei
7.789/89, seria o equivalente a 6 ou 5 salários mínimos no momento da revogação,
atualizando-se doravante esse valor não mais, de forma automática, pela variação do
mínimo, mas por outro índice de correção? Penso que sim, que seria possível, desde
que houvesse um índice de correção preciso e uniforme, a ser aplicado
independentemente da variação do mínimo a todos os celetistas, da esfera pública e
da esfera privada. Note-se que a atualização da base de cálculo do adicional de
insalubridade, tanto a proposta no voto da Relatora do RE 565.714, como a sugerida
pelo Min. Peluso, pôde-se ali justificar a partir do pressuposto de que os recorrentes
eram estatutários, e tinham os seus vencimentos corrigidos de um modo objetivamente
determinado, não atrelado ao salário mínimo. Não é o que sucede com o piso salarial
dos celetistas: aqui não se trata de uma parcela da remuneração que possa ser corrigida
em conjunto com o mesmo critério estabelecido para a correção do principal. O que se
corrige por lei (jurídica) é o salário mínimo, e o que se paga além desse valor corrige-se
conforme as leis do mercado e as convenções coletivas, vedada, igualmente, qualquer
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vinculação ao mínimo. Deveras, se estamos falando de celetistas, a atualização do piso,
a que têm direito incontestavelmente os engenheiros, agrônomos e veterinários, ou se
pode fazer uniformemente para todos, ou não se pode fazer para nenhum. Seria
absolutamente inapropriado que, na ausência de um parâmetro uniforme, cada tipo de
profissional (a serviço desta ou daquela pessoa de direito público, desta ou daquela
empresa privada) fosse contemplado com um piso conforme os critérios livremente
estipulados pelo empregador a partir da interpretação que subjetivamente faça da
legislação: isso equivaleria a não existir piso algum. Ao menos, este seguramente não
seria o piso nacional uniforme segundo a Lei 4.950-A/66.
34 - Segue-se que, se o piso previsto na Lei 4.950-A/66 foi
recepcionado pela Carta de 1988 - e não há por que dizer que não o tenha sido, visto
que sua instituição, longe de contrariá-la, atende ao disposto em seu art. 7o, V -, ele só
poderá tê-lo sido desta maneira: um valor congelado no momento da revogação do DL
2.351/87, o que se deu no dia inicial de vigência da Lei 7.789/89, não corrigido desde
então por absoluta falta de parâmetro, mas apenas convertido em reais a partir da
medida provisória que criou o Plano Real, atual Lei 9.069/95. O resultado, somos
obrigados a reconhecer, será um valor irrisório, dada a espiral inflacionária do período,
muito inferior ao próprio salário mínimo atualmente em vigor, razão pela qual o piso
dos profissionais em questão reduziu-se ao equivalente a um único salário mínimo geral
(valor abaixo do qual, por exigência da própria Constituição, artigo 39, Par. 3 o , nenhum
servidor poderá receber). Mas isto deve debitar-se à ausência da providência legislativa
pertinente, a ser tomada pelo Congresso Nacional. Reitere-se: se a lacuna quanto ao
critério de indexação é legislativa, apenas o legislador pode integrá-la. Não tem o
Judiciário competência para fazê-lo. Por maioria de razão, não a têm os operadores
jurídicos em geral.
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35 - Por óbvio, a solução ora apresentada não é a ideal, mas creio
seja a única que o direito positivo atualmente comporta. Nem se alegue haver na mesma
a contradição de se admitir a existência de um direito, e não se admitir que se possa
concretizá-lo de modo adequado, com um valor à altura do que poderia ser chamado um
autêntico piso salarial, um verdadeiro salário mínimo profissional: o piso persiste, mas a
sua diferenciação em face do salário mínimo geral continuará ineficaz até o advento de
lei que preveja um modo de calcular-se ou estabelecer-se o seu valor de modo
consentâneo com a vigente Constituição da República.
É o parecer, sub censura.
São Paulo, 30 de novembro de 2008
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Processo:
OFICIO-COAP-SP N° 31/2008 - EXP. PB N° 4595/2008
SF 23752-233845/2008.
Interessado:
CONSELHO
REGIONAL
DE
MEDICINA
VETERINÁRIA ESTADO DE SÃO PAULO.
PARECER PA n° 225/2008.
O i. prolator do Parecer PA n° 225/2008 conclui que (i) a lei
federal n° 4.950-A/66 aplica-se aos veterinários contratados pelo Estado de São
Paulo sob regime celetista; (ii) é inaplicável a regra do artigo 5o da mencionada lei,
em razão de veicular valor vinculado ao salário mínimo; (iii) merece ser revista a
orientação administrativa firmada a partir da aprovação do precedente Parecer PA-3
n° 411/94.
Coloco-me de acordo com tais conclusões.
Acerca da sugerida alteração do entendimento adotado na
Administração a partir do precedente Parecer PA n° 411/94, anoto, em acréscimo,
que a linha então ali sustentada - de ferimento da autonomia estadual, na hipótese parece que não encontrava eco no Judiciário . Esta a conclusão que se extrai do texto
da Exposição de Motivos firmada pelo Governador do Estado quando remeteu, em
23 de abril de 1993, à Assembléia Legislativa, projeto de Lei Complementar
Estadual para regularizar situação salarial de outras categorias referidas no artigo 1o
da lei federal n° 4.950-A/66 (vale dizer profissionais diplomados em Engenharia,
Química, Arquitetura e Agronomia - só não foram beneficiados, na ocasião, os
diplomados em Veterinária e Química). Reza o referido texto governamental:
"Senhor Presidente.
Tenho a honra de encaminhar, por intermédio de Vossa Excelência, à elevada deliberação
dessa egrégia Assembléia, o incluso projeto de lei complementar que dispõe sobre a
retribuição dos Engenheiros, Arquitetos,
Engenheiros Agrônomos e Assistentes
Agropecuários.
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O projeto, elaborado a partir de estudos desenvolvidos pela Secretaria da Administração e
Modernização do Serviço Público, institui novas Escalas de Vencimentos para esses
servidores e disciplina o pagamento de valor decorrente de decisões judiciais proferidas
com fundamento na Lei Federal nº 4950-A, de 22 de abril de 1966, dando-lhe a
denominação de "salário-complemento".
Para corrigir disparidades verificadas no tratamento salarial dos integrantes das referidas
séries de classes, cuidou-se, também, de estender o "salário-complemento" aos servidores
não alcançados pelos efeitos da decisão judicial.
(...)
São esses os lineamentos da presente medida, com a qual espero contribuir para que se dê
tratamento adequado à referida categoria de servidores públicos.
(...)"
(DOE - Legislativo, sexta-feira, 23 de abril de 1993 - Seção I, pag. 84; destaquei).
O projeto encaminhado veio de se converter na Lei
Complementar n° 729, de 30 de setembro de 1993.
De outra banda, anote-se que em 2002, tema específico
relativo à aplicação da Lei Complementar n° 729/93 foi objeto de análise nesta
Especializada, ocasião em que o Dr. Carlos Ari Sundfeld, prolator do precedente
22/2002, deixou assentado:
(...)
Com o advento da Lei Complementar n° 729/93, do Estado de São Paulo, a vantagem
referente ao 'salário mínimo profissional' foi incorporada de maneira geral à categoria dos
servidores ocupantes da classe de Engenheiro, Arquiteto, Engenheiro-agrônomo e
Assistente agropecuário, sob o título de 'salário complemento' (independentemente de
haverem ingressado na Justiça).
(...)
Tais argumentos não invalidam a orientação já emanada desta
Procuradoria (Parecer PA-3 nº 101/97, aprovado pela Procuradoria Geral do Estado -fls.
119 a 124). Deveras, conforme analisado na referida ,manifestação da PA-3, a nova
sistemática adotada por intermédio da Lei Complementar nº 729/93, com a criação do
'salário complemento', estende normativamente os efeitos do chamado 'salário mínimo
profissional', que já vinha sendo reconhecido como direito dos servidores enquadrados na
categoria de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro agrônomo em diversas decisões judiciais.
Na verdade, como se percebe, o que se fez foi ampliar, através de lei, os efeitos da coisa
julgada para toda a categoria dos servidores estaduais, independentemente de terem
promovido ações judiciais.
Portanto, o 'salário mínimo profissional' - o benefício criado por Lei
Federal e estendido a alguns servidores estaduais por meio de decisões da Justiça - produz
efeitos idênticos ao 'salário complemento' — criado por Lei Complementar estadual para
estender tais benefícios a todos os servidores do Estado. São fontes remuneratórias
idênticas, que buscam o mesmo fim e, por isso mesmo, são inacumuláveis "
(...)" (destaquei)
Com estas considerações de acréscimo, coloco-me de acordo
com as conclusões do Parecer PA n° 225/2008, sugerindo a expressa revisão do
posicionamento firmado a partir do precedente Parecer PA n° 411/94, salientando
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO
PROCURADORIA ADMINISTRATIVA
porém, que se não vier a ser revisto aquele entendimento, o pleito inaugural haverá
de ser indeferido em homenagem à orientação jurídica hoje prevalecente na
Administração.
Transmitam-se os autos à consideração da d. Subprocuradora
Geral do Estado da área da Consultoria.
PA, 19 de janeiro de 2008.
3
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO
PROCESSO
COAP-SP n° 31/2008 (SF 23.752-223845/2008)
INTERESSADO
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA VETERINÁRIA
DO ESTADO DE SÃO PAULO
ASSUNTO
PISO
SALARIAL.
MÉDICOS
VETERINÁRIOS.
SERVIDORES CELETISTAS. FUNDAÇÃO.
Analisa-se neste expediente a aplicabilidade da Lei
1
Federal n° 4.950-A/66 aos veterinários do Instituto de Terras do Estado de São Paulo
(ITESP), contratados sob a égide da Consolidação das Leis do Trabalho (C.L.T.).
Acolho os fundamentos do Parecer PA n° 225/2008,
com o adendo aposto pela Chefia da Procuradoria Administrativa, que podem ser
consubstanciados nos seguintes tópicos: (i) o Estado ao contratar sob o regime
trabalhista, submete-se às disposições da Consolidação das Leis do Trabalho, com as
imposições de que cuida a Constituição Federal, quando trata dos servidores públicos2;
(ii) o piso salarial imposto por lei federal para determinadas categorias profissionais
deve ser observado pela Administração Pública nos contratos de emprego por ela
celebrados3; (iii) é inconstitucional o dispositivo legal que utiliza o valor do salário
mínimo como indexador (CF. art. 7o, IV); (iv) neste contexto, a Lei Federal n° 4.950A/66 foi recepcionada pela Constituição Federal, mas tem em suas disposições uma
lacuna, considerando que o salário mínimo não pode ser utilizado como fator de
indexação, não podendo ser substituído por decisão judicial; (v) na hipótese vertente, é
forçoso determinar que "a completa falta de um parâmetro claro advinda da revogação
imprensaoficial
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO
do art. 5o da Lei 4.950-A/66 torna impossível aplicar a regra do piso salarial prevista
na mesma lei" (fl. 119).
Em complemento as razões expostas no parecer em
comento, trazemos a colação a Súmula Vinculante n° 04: "Salvo nos casos previstos na
Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo
de vantagem de servidor público ou empregado, nem ser substituído por decisão
judicial."
Com estas considerações submeto a matéria ao Sr.
Procurador Geral do Estado, a quem compete a decisão.
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PROCURADORIA GERAL DO ESTADO
PROCESSO
COAP-SP nº 31/2008 (SF 23.752-223845/2008)
INTERESSADO
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA VETERINÁRIA
DO ESTADO DE SÃO PAULO
ASSUNTO
PISO
SALARIAL.
MÉDICOS
VETERINÁRIOS.
SERVIDORES CELETISTAS. FUNDAÇÃO.
Nos termos da manifestação da Subprocuradoria
Geral do Estado da Área da Consultoria, aprovo o Parecer PA n°
225/2008, com o adendo aposto pela Chefia da Procuradoria
Administrativa e altero a diretriz firmada no Parecer PA n°
411/94.
Expeçam-se ofícios encaminhando cópia deste
parecer as Consultorias Jurídicas das Secretarias da Fazenda, da
Justiça e da Defesa da Cidadania, da Agricultura e Abastecimento
e da Gestão Pública, à Diretoria Executiva da Fundação ITESP e
ao Conselho de Defesa dos Capitais do Estado (CODEC).
Devolva-se este expediente à Assessoria Técnica do
Governo.