4 Vol XIV 2005 - Revista Nascer e Crescer

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4 Vol XIV 2005 - Revista Nascer e Crescer
Revista do Hospital de Crianças Maria Pia
Ano | 2005 Volume | XIV Número | 04
Directora | Sílvia Álvares; Directora Adjunta | Inês Moreira;
Directora do Hospital de Crianças Maria Pia | Manuela Machado
Corpo Redactorial | Amélia José; Ana Cristina Cunha;
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Conselho Técnico | Gama de Sousa; Lígia Carvalho; Rui Nogueira
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Design Gráfico | bmais comunicação
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Vila Nova de Famalicão
ISSN | 0872-0754
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SOMOS O SUPORTE
DE HUMANIZAÇÃO
DO HOSPITAL
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
índice
ano 2005, vol XIV, n.º 4
número4.vol.XIV
275
Editorial
Sílvia Álvares
277
Artigos Originais
Investigação Molecular em 20 doentes com Citopatia Mitocondrial
Célia Nogueira, Manuel Santos, Laura Vilarinho
286
Artigos de Revisão
Abordagem Diagnostica e Terapêutica das Bronquiolites – revisão bibliográfica
Anabela Bandeira, Clara Vieira, Lúcia Gomes, Guilhermina Reis, Margarida Guedes
292
Intersexo I. Genes envolvidos na determinação do sexo masculino
Rosália Sá, Mário Sousa, Alberto Barros
300
Casos Clínicos
Eritema Induratum de Bazin – a propósito de caso clínico
Telma Barbosa, Ana Ramos, Virgílio Senra, Silva Caspurro,
Conceição Rosário, Miguel Taveira
304
Artigo Recomendado
Tojal Monteiro
307
Considerações éticas sobre a selecção de sexo
através do diagnóstico genético pré-implantação
Natália Oliva Teles
Perspectivas Actuais em Bioética
NASCER E CRESCER
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
311
Qual o seu Diagnóstico?
Caso Endoscópico
Fernando Pereira
313
Caso Estomatológico
José M. S. Amorim
315
Genes, Crianças e Pediatras
Gabriela Soares, João Silva, Miguel Rocha, Cristina Dias, Jorge Pinto-Basto,
Márcia Martins, Ana Fortuna, Esmeralda Martins, Margarida Reis Lima
317
Imagens
Filipe Macedo
319
Pequenas Histórias
A negativa…
M. Guilhermina Reis
320
A Criança, A Família e a Comunidade
Carta a um Compatriota
Arêlo Manso
321
Índice de Autores 2005
322
Índice de Assuntos 2005
324
Agradecimentos
NASCER E CRESCER
summary
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
number4.vol.XIV
275
Editorial
Sílvia Álvares
277
Original Articles
Molecular Investigation in 20 Patients with Mitochondrial Cytopathies
Célia Nogueira, Manuel Santos, Laura Vilarinho
286
Review Articles
Diagnostic and Therapeutic Approach of Bronchiolits – literature review
Anabela Bandeira, Clara Vieira, Lúcia Gomes, Guilhermina Reis, Margarida Guedes
292
Intersex I. Genes envolved in male sex determination
Rosália Sá, Mário Sousa, Alberto Barros
300
Clinical Cases
Bazin’s Erithema Induratum – a case report
Telma Barbosa, Ana Ramos, Virgílio Senra, Silva Caspurro,
Conceição Rosário, Miguel Taveira
304
Recommended Article
Tojal Monteiro
307
Ethical considerations on sex selection
following pre-implantation genetic diagnosis
Natália Oliva Teles
Current Perspectives in Bioethics
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
311
What is your diagnosis?
Endoscopic case
Fernando Pereira
313
Oral Pathology case
José M. S. Amorim
315
Genes, Children and Paediatricians
Gabriela Soares, João Silva, Miguel Rocha, Cristina Dias, Jorge Pinto-Basto,
Márcia Martins, Ana Fortuna, Esmeralda Martins, Margarida Reis Lima
317
Images
Filipe Macedo
319
Short Stories
The failure…
M. Guilhermina Reis
320
The Child, the Family and the Community
Message to a Compatriot
Arêlo Manso
321
Author Index 2005
322
Subject Index 2005
324
Acknowledgements
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
editorial
Desde 1940 que os progresso da medicina e cirurgia, da bioquímica, vacinação
(especialmente a vacina antidiftérica, sarampo e tosse convulsa) e a educação das populações foram factores importantes na redução da taxa de mortalidade infantil. A neonatologia desenvolveu-se na década 60, iniciando-se uma nova era de assistência ao
recém-nascido – a era dos cuidados especiais. Em 1970 surgem as primeiras unidades
de cuidados intensivos neonatais, com equipas de médicos e enfermeiros especializados. Paralelamente desenvolvem-se a cirurgia neonatal, a cardiologia e cirurgia cardíaca, os cuidados intensivos pediátricos, bem como os sistemas de transporte da grávida
(o transporte in utero) e do recém-nascido em ambulâncias especialmente concebidas
para tratamento intensivo. São implementados os rastreio de doenças congénitas, nomeadamente o hipotiroidismo e a fenilcetonúria, a prevenção de doenças crónicas como
a fibrose quística e a homocistinúria, o diagnóstico pré-natal, a introdução de novas
vacinas, a investigação genética.
Também actualmente se reconhece a importância dos factores sócio económicos
no estado de saúde das populações. O “Relatório Black” (1980) veio demonstrar que as
diferenças do estado de saúde são consequência, em grande parte, das condições de
vida e trabalho. Já em 1974 Marc Lelond, Ministro da Saúde do Canadá, apresentara
no Parlamento um documento sobre uma nova política de saúde: “A New Perspective
on the Health of Canadians: a Working paper Document”, que pela primeira vez incluiu
a importância do “ambiente externo”, físico e social e as áreas do comportamento como
determinantes da saúde. Sabe-se pois que os comportamentos e estilos de vida são
fundamentais para o estado de saúde e que estes se desenvolvem durante a infância
e adolescência. Calcula-se que cerca de 600 000 pessoas com idades compreendidas
entre os 35 e 64 anos morram todos os anos, especialmente por doenças relacionadas
com os estilos de vida: quatro em cada dez devido ao cancro, três em cada dez por doença cardiovascular e quase uma em dez por acidente e suicídio. Os principais factores
de risco destas doenças devem-se aos novos padrões de comportamento dos quais
salientamos o sedentarismo, os erros alimentares, o tabagismo.
Em 2004 foi publicado pela Organização Mundial de Saúde, o resultado de um estudo internacional sobre comportamentos, estilos de vida, relação com o meio envolvente
(família, pares e escola) e bem-estar dos adolescentes, que contou com a participação da
maioria dos países europeus, o Canadá e os Estados Unidos da América (Young people’s
health in context. Health Behaviour in School-aged Children (HBSC) study: international
report from the 2001/2002 survey). Este estudo incluiu 162.000 adolescentes (de 11, 13 e
15 anos de idade), oriundos de 35 países e regiões. Considerando só a actividade física,
hábitos alimentares e tabágicos, salientamos alguns dos resultados obtidos:
- Menos de 50% dos jovens praticam a actividade física recomendada (uma hora ou
mais de exercício físico moderado durante cinco dias ou mais da semana), sendo
editorial
275
NASCER E CRESCER
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
as raparigas menos activas do que os rapazes, diferença essa que se acentua com
a idade.
- Embora exista grande variabilidade nos diferentes países e regiões, menos de dois
quintos dos jovens comem fruta diariamente e só um terço legumes e vegetais.
Cerca de 20 a 50% dos inquiridos (variável de região para região) consumiam diariamente doces e refrigerantes. A percentagem de jovens (aos 13 e 15 anos) com
excesso de peso variou entre 3 % e 35%
- Relativamente aos hábitos tabágicos verifica-se uma grande variação nos diferentes grupos etários. Aos 15 anos, 11-57% dos rapazes e 12-67% são fumadores (a
maioria dos quais com hábitos tabágicos diários).
Este relatório é um marco importante na compreensão dos estilos de vida adoptados pelos jovens e mostra a necessidade de intervenção durante esta fase da vida do
indivíduo de modo a prevenir os novos padrões de doença da civilização actual. Tanto
mais que existe evidência crescente de que a promoção da saúde e de estilos de vida
saudável podem ser mais importantes na redução da morbilidade e mortalidade do que
as intervenções terapêuticas.
Daí que se revista da maior importância que o pediatra e o médico de família, em
todas as consultas, reservem alguns minutos para a prevenção e promoção da saúde:
é nesta faixa etária que a educação poderá ter repercussões importantes no comportamento do futuro adulto.
276
editorial
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
Investigação molecular em 20 doentes
com citopatia mitocondrial
Célia Nogueira1, Manuel Santos2, Laura Vilarinho1
RESUMO
Nos últimos 30 anos, um largo espectro de doenças multissistémicas associadas a disfunções da mitocôndria,
designando-se globalmente de citopatias
mitocondriais, têm sido referenciadas,
com sintomatologia desde o período neonatal até à idade adulta. Estas disfunções
podem afectar qualquer órgão ou tecido
do organismo, embora os músculos esquelético e cardíaco, e o SNC sejam os
mais afectados, devido à sua elevada
dependência do metabolismo energético.
Há mais de uma década que a investigação molecular em patologias humanas
relacionadas com disfunções da mitocôndria, tem sido centralizada no DNA mitocondrial (mtDNA) embora nos últimos
anos, o foco da atenção se tenha voltado
para a pesquisa de mutações no DNA nuclear (nDNA).
Objectivos: O principal objectivo deste estudo foi investigar ao nível
molecular (mtDNA e nDNA), indivíduos
clínica, histológica e/ou bioquimicamente reconhecidos com patologia mitocondrial.
Pacientes e Métodos: Foram estudados 20 doentes provenientes de
hospitais de todo o país com alterações
sugestivas de citopatia mitocondrial. Foram pesquisadas: i) alterações mais frequentes do mtDNA descritas na literatura, nomeadamente mutações pontuais e
delecções. ii) novas mutações nos genes
codificantes dos tRNAs mitocondriais e
genes estruturais do mtDNA codificantes
de subunidades da cadeia respiratória
mitocondrial (CRM). iii) mutações nos
genes nucleares que codificam subuni_______________
1
Unidade de Biologia Clínica, Instituto de Genética
Médica Jacinto Magalhães – Porto
Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro
2
dades da CRM ou estejam envolvidos no
assembly das mesmas.
Resultados: Dez dos 20 doentes
investigados apresentaram mutações
pontuais patogénicas já descritas na literatura e delecções ao nível do mtDNA.
Em quatro pacientes foram encontradas
cinco novas mutações nos genes dos
tRNAs. Três pacientes apresentaram um
possível défice da ubiquinona. Em dois
pacientes com síndrome de Leigh, foram encontrados duas novas mutações
no gene de assembly (SURF1) da Citocromo c oxidase (COX), e por último no
paciente com défice do complexo III da
CRM, estão a ser efectuados estudos de
linkage ao nível do cromossoma X.
Conclusões: Neste estudo partiuse de vários fenótipos clínicos e bioquímicos, sugestivos de patologia mitocondrial, para a caracterização dos genótipos
associados, de modo a estabelecer um
diagnóstico preciso destas patologias. A
caracterização molecular dos 20 doentes com citopatia mitocondrial propostos
para este estudo foi realizada com êxito
em 14/20 (70%) dos pacientes.
Palavras-Chave: Cadeia respiratória mitocondrial, OXPHOS, tRNAs, mtDNA, nDNA.
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 277-285
INTRODUÇÃO
A mitocôndria tem um papel fundamental na produção de energia e uma
alteração do metabolismo mitocondrial
pode consequentemente originar uma
doença. A natureza ubiquitária da mitocôndria, os dois tipos de controlo genético
(mitocondrial e nuclear) da cadeia respiratória mitocondrial (CRM) e os conceitos
característicos da genética mitocondrial,
são os factores que contribuem para um
largo espectro de manifestações clínicas
associados a disfunções numa área restrita mas vital do metabolismo mitocondrial: a fosforilação oxidativa (OXPHOS),
que representa a etapa final do metabolismo oxidativo, onde a maior parte do
ATP celular é gerado(1).
Os défices da OXPHOS podem
afectar qualquer órgão ou tecido do organismo, sendo os músculos esquelético
e cardíaco e o SNC os mais afectados,
devido à sua elevada dependência do
metabolismo energético. Assim se compreende que as formas de apresentação
mais frequentes incluam: o quadro miopático, a encefalo(mio)patia e a oftalmoplegia externa progressiva (PEO)(2). É a
associação de sintomas e sinais neurológicos, não explicáveis em termos de
topografia de lesões ou de atingimento
preferencial de sistemas específicos, que
pode evocar este diagnóstico, não existindo, um quadro clínico específico de
Citopatia Mitocondrial.
Um recente estudo epidemiológico
demonstrou que aproximadamente 1 em
10.000 indivíduos na população adulta e
infantil possuem doenças mitocondriais
ou correm o risco de as virem a desenvolver, o que indica que estas doenças
constituem o maior grupo de erros inatos
do metabolismo. Estes resultados reflectem que estas doenças são uma causa
comum de morbilidade crónica, não estando disponível, até ao momento, nenhuma terapia eficaz(3).
Wallace e colaboradores (1988),
descreveram pela primeira vez uma
mutação no DNA mitocondrial (mtDNA)
como causa de doença, abrindo um
novo capítulo na Medicina, a Medicina
Mitocondrial. Desde então, cerca de uma
centena de mutações pontuais patogéni-
artigos originais
277
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
cas diferentes e de delecções foram identificadas(4).
Estas mutações podem ser agrupadas em quatro grandes grupos: i) rearranjos de grandes dimensões (delecções e
duplicações); ii) mutações pontuais nos
genes mitocondriais codificantes de proteínas; iii) mutações pontuais nos genes
dos rRNAs; iv) mutações pontuais nos
genes dos tRNAs(5).
Nos últimos anos, o foco da atenção
voltou-se para a pesquisa de mutações
no DNA nuclear (nDNA), em genes que
codificam subunidades estruturais da
CRM / OXPHOS, genes necessários ao
assembly das mesmas, ou envolvidos na
comunicação intergenómica(6).
Os genomas nuclear e mitocondrial
estão separados, mas funcionam em coordenação aparentemente sob o controlo
do genoma nuclear. A replicação, transcrição e tradução do genoma mitocondrial dependem de factores codificados
pelo nDNA.
Algumas doenças têm sido associadas a defeitos na comunicação intergenómica, e podem ser caracterizadas
quer pela presença de delecções múltiplas do mtDNA, como é o caso da PEO
de transmissão autossómica dominante
e recessiva e da encefalomiopatia neurogastrointestinal mitocondrial (MNGIE),
quer por deplecção ao nível da molécula
de mtDNA, que está presente nos casos
de deplecção infantil fatal de mtDNA(7).
Nos últimos cinco anos, foram encontradas várias mutações nos genes
nucleares que codificam inúmeras proteínas envolvidas na biogénese mitocondrial e na OXPHOS. Cada vez mais, as
mutações no nDNA estão a ser apontadas como causa de encefalomiopatias
mitocondriais, contribuindo, assim, para
a abertura de uma nova era “nuclear” na
genética mitocondrial humana(8).
É de realçar que apenas uma diminuta percentagem das necessidades
proteicas mitocondriais é satisfeita pela
própria mitocôndria. Noventa e cinco por
cento das proteínas mitocondriais são codificadas por genes nucleares, produzidas
como percursores nos polissomas citoplasmáticos, importadas para a mitocôndria e
aí processadas e agrupadas nos compartimentos mitocondriais adequados.
278
artigos originais
Devido ao complexo controlo genético da mitocôndria, as proteínas codificadas pelos dois genomas têm que coexistir estequeométricamente de modo a
formarem cinco complexos funcionais.
Assim, as alterações ao nível das subunidades codificadas pelos dois genomas, quer o incorrecto enrolamento e/ou
assembly dessas subunidades provocado por mutações nos genes envolvidos,
podem causar doenças da OXPHOS(9).
MATERIAL E MÉTODOS
Os pacientes incluídos neste estudo
eram provenientes de hospitais de todo
o país e seleccionados com base: i) no
fenótipo clínico apresentado. ii) no défice
isolado ou combinado dos complexos da
CRM detectados no estudo bioquímico
da biópsia muscular. iii) na observação
de RRFs (ragged-red fibers) ou de outras
alterações sugestivas de citopatia mitocondrial detectadas no exame miopatoló-
Quadro I - Dados clínicos, morfológicos e bioquímicos dos 20 pacientes deste estudo.
Idade de
Paciente diagnóstico
(anos)
Fenótipo clínico
Histologia*
Distrofia escapulo humeral; cifoescoliose; Fibras atrofiadas;
parésia facial; tetraparésia; falta de forças
COX(-) +
Ptose palpebral;
RRFs +
Atrofia dos músculos proximais dos
COX(-) ++
membros superiores
Actividade
enzimática residual
dos complexos da
CRM*
1
5
2
44
3
56
D. mitocondrial
RRFs +++
Normal
4
45
Hx familiar de atingimento neurologico
Normal
III (35%)
5
27
D. mitocondrial; AVCs
6
57
7
5
8
65
9
29
10
22
11
33
12
43
IV (26%)
IV (20%)
Miopatia metabólica;
Défice da CPT (secundário)
Sobrecarga
lipídica
Sobrecarga
lipídica
I(21%); II(19%);
IV(27%)
Miopatia
RRFs +
Normal
IV(19%)
KSS
--
Normal
Encefalopatia mioclónica progressiva;
atraso mental; surdez
Hx epilepsia mioclónica e diabetes;
AVC isquémico; baixa estatura;
hipertricose; polineuropatia periférica;
hiperlactacidemia
Tetraparésia flácida com atrofia muscular;
MERRF
Sobrecarga
lipídica
Normal
RRFs +
Normal
Atrofia óptica; LHON (?)
--
--
RRFs +++
IV (35%)
13
66
PEO
--
I(32%); III(39%);
IV(25%)
14
35
Perda bilateral da visão s/ causa
aparente; LHON (?)
--
--
15
39
MERRF; Hx familiar
RRFs +++
Normal
16
65
Miopatia mitocondrial
RRFs ++
Normal
17
25
LHON
--
--
18
17
MNGIE;
Polineuropatia axonal
--
Normal
19
2
Síndrome de Leigh
--
--
20
7
Síndrome de Leigh
--
--
Abreviaturas: (*) biópsia de músculo; (+) pouco frequente; (++) frequente; (+++) abundante; RRFs
(red ragged fibers); COX (-) (fibras citocromo c oxidase negativas); (--) não determinado; MNGIE
(encefalomiopatia neurogastrointestinal mitocondrial); KSS (Síndrome de Kearns-Sayre); ADPM
(atraso do desenvolvimento psicomotor); AVC (acidente vascular cerebral); CPT (carnitina palmitoíl- transferase); MERRF (epilepsia mioclónica com fibras rotas e vermelhas); LHON (neuropatia
óptica hereditária de Leber).
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
gico da biópsia muscular, nomeadamente, fibras COX negativas (-) ou inclusões
paracristalinas (Quadro I).
A investigação molecular do mtDNA
e do nDNA foi efectuada em DNAs dos
20 doentes previamente seleccionados,
através das técnicas de: 1) Polymerase
Chain Reaction - Restriction Fragment
Lenght Polymorphism (PCR - RFLP); 2)
sequenciação directa dos produtos da
PCR; 3) análise de fragmentos; e 4) Southern-blot, para a detecção de rearranjos
(delecções, duplicações) e quantificação
do mtDNA presente num determinado
tecido.
A extracção de DNA foi feita a partir
de sangue total, buffy coat ou leucócitos,
utilizando um kit comercial da Qiagen®, e
da fracção insolúvel dos homogeneizados das biópsias musculares obtida após
centrifugação, pelo método do fenol/clorofórmio e precipitação com isopropanol.
1. Todos os estudos de análise directa do DNA efectuaram-se em produtos
de PCR. Os fragmentos amplificados foram digeridos pela respectiva enzima de
restrição durante 2h a 37ºC e submetidos
a electroforese horizontal em géis de poliacrilamida (T=12%, C=3%). O sistema
utilizado foi o Multiphor (Pharmacia) acoplado a um sistema de refrigeração. Após
a separação electroforética, as bandas
Quadro II - Mutações pontuais do
mtDNA, já descritas na literatura,
pesquisadas por PCR-RFLP.
Mutação pontual
no mtDNA
Referência
bibliográfica
A3243G - (tRNALeu)
T3271C - (tRNALeu)
[17]
[18]
MERRF
A8344G - (tRNALys)
T8356C - (tRNALys)
[19]
[20]
NARP/
MILS
T8993G - (ATPase6)
T8993C - (ATPase6)
T8851C - (ATPase6)
T9176C - (ATPase6)
T9176G - (ATPase6)
[21]
[22]
[23]
[24]
[25]
LHON
G3460A - (ND1)
G11778A - (ND4)
T14484C - (ND6)
A14495G - (ND6)
[26]
[27]
[28]
[29]
Patologia
MELAS
correspondentes aos fragmentos de DNA
foram visualizadas por coloração com nitrato de prata. As mutações pesquisadas
por rotina estão referidas no Quadro II.
Esta metodologia também foi utilizada na
análise filogenética de novas mutações
ao nível do mtDNA, para determinar o
grau de conservação dos nucleótidos envolvidos de modo a estabelecer a possível patogenicidade.
Nos casos positivos procedeu-se à
marcação radioactiva dos amplificados
com 32P através da adição de 10μCi de
[α32P]-dATP e execução de apenas dois
ciclos adicionais no termociclador para
evitar a formação de heteroduplexes. Os
produtos de amplificação foram digeridos com a enzima de restrição adequada à mutação a quantificar e migraram
em gel vertical de poliacrilamida, a 12%
ou 8%, não desnaturante. Obtiveram-se
autoradiografias por exposição do gel
a um filme fotográfico (XAR-Kodak) à
temperatura ambiente durante uma noite. A percentagem de mtDNA mutado
foi determinada por densitometria num
densitómetro (GS-700 - BioRad) e os resultados analisados pelo software MultiAnalyst (BioRad).
2. A sequenciação automática
de alguns genes mitocondriais, de
assembly e nucleares, foi efectuada num
Quadro III – Genes pesquisados por
sequenciação automática.
ABI PRISM 310 (Applied Biosystems)
(Quadro III). A preparação da amostra
para sequenciação automática inicia-se
pela realização de uma PCR simétrica
e purificação do amplificado (remoção
de dNTPs e excesso de oligonucleotídeos) através de uma electroforese do
amplificado num gel de agarose a 2%
em 1xTAE com brometo de etídio. As
amostras purificadas foram submetidas
a sequenciação cíclica, utilizando-se
uma mistura comercial (Perkin-Elmer,
Applied Biosystems) que possui dNTPs,
ddNTPs marcados com 4 fluorocromos
distintos, tampão e uma DNA-polimerase. Os fragmentos sintetizados (produtos
da PCR assimétrica) foram purificados.
A preparação final para injecção no ABI
PRISM envolveu a recuperação do precipitado com 30μl de uma mistura (TSR)
com características desnaturantes e elevada viscosidade (Perkin-Elmer, Applied
Biosystems).
3. A análise de fragmentos foi utilizada neste trabalho na realização de
estudos de linkage, numa família com
défice do complexo III da CRM. Foi utilizado um kit de linkage para o cromossoma X (Linkage Mapping set version
2 - painel 28 - Applied Biosystems), o
qual possui 18 marcadores bastante polimórficos (CA-repeats), marcados com
fluorescência e distanciados de 10cM.
A separação e análise dos fragmentos
foi realizada num ABI PRISM 310
(Applied Biosystems) com o programa
Gene Scan 2.1.
Genes
Mitocondriais
Assembly
(complexo IV)
tRNAs (Phe,Val, Leu(UUR), Ile,
Gln, Met, Trp, Ala, Asn, Cys, Tyr,
Ser(UCN), Asp, Lys, Gly, Arg, His,
Ser(AGY), Leu(CUN) , Glu, Thr, Pro).
Cit b
COX I, II, III
SURF1
SCO2
SCO1
COX 10
Assembly
(complexo III)
BCS1L
Nucleares
(complexo III)
CyC1
UQCRB
UQCRC1
UQCRC2
UQCRFS1
UQCRH
4. Para o Southern-blot utilizou-se o
método de marcação por quimiofluorescência. O DNA total muscular foi digerido por endonucleases de restrição. Os
fragmentos obtidos foram submetidos a
uma electroforese em gel de agarose a
0,8%. Posteriormente, o gel foi desnaturado e neutralizado, fez-se a transferência durante a noite para uma membrana
de nylon (Zeta-probe BioRad), fixando-se
de seguida o DNA à membrana. Procedeu-se à hibridização durante a noite
com uma sonda de mtDNA total humano,
previamente desnaturada, marcada com
Fluoresceína-11-dUTP (Fl-dUTP) (Gene
Images Random Prime Labelling Modu-
artigos originais
279
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
le - Amersham Pharmacia Biotech). A
revelação da membrana foi feita com o
substrato estável, dioxetano. Por último a
membrana foi exposta a um filme fotográfico durante cerca de 30 minutos e as determinações densitométricas dos sinais
de hibridização nas autorradiografias foram efectuadas usando um densitómetro
(GS-700 – BioRad).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Neste estudo fez-se a investigação
molecular, ao nível do mtDNA e nDNA,
em 20 doentes portugueses, sendo 12
do sexo masculino e 8 do sexo feminino,
com idades compreendidas entre os dois
e os 66 anos. Partiu-se da análise de vários fenótipos clínicos e bioquímicos, sugestivos de patologia mitocondrial, para
Quadro IV – Dados clínicos e moleculares dos doentes estudados.
Idade de
Paciente diagnóstico Sexo
(anos)
1
5
Fenótipo clínico
História Mutações/ Localização
%
familiar delecções mtDNA nDNA mutado
M
Tetraparésia; falta de forças
HM
A12172G
tRNAHis
------
100%
--
T5775C
tRNACys
------
100%
2*
44
M
Ptose palpebral bilateral;
atrofia muscular
3
56
F
D. mitocondrial
--
C4375T
T14728C
tRNAGln
tRNAGlu
-----------
100%
97%
4
45
M
D. neurológica
X
--
------
CrX
--
5*
27
M
D. mitocondrial; AVCs
--
--
------
------
--
6*
57
F
Miopatia metabólica
--
--
------
------
--
Asn
7
5
F
Miopatia
--
A5711G
tRNA
------
100%
8
65
M
KSS
--
∆ comum
(1)
------
--
9
29
F
Encefalomiopatia progressiva
--
T8993G
10
22
F
AVCs
HM
A3243G
ATPase6
------
86%
Leu
------
90%
Lys
tRNA
11
33
F
Tetraparésia; MERRF
HM
A8344G
tRNA
------
92%
12
43
M
Atrofia óptica; LHON (?)
HM
G15257A
G13708A
G15812A
cit b
ND5
Cit b
----------------
100%
13
66
M
PEO
--
∆
múltiplas
(2)
------
--
14
35
M
Perda bilateral da visão;
LHON (?)
--
T14484C
ND6
------
100%
15
39
M
MERRF
HM
A8344G
tRNALys
------
92%
16
65
F
Miopatia mitocondrial
--
∆ simples
(3)
------
--
17
25
M
LHON
--
G11778A
ND4
------
100%
18
17
M
MNGIE
--
--
------
------
--
19
2
F
Síndrome de Leigh
--
A745G/N
------
SURF1
--
20
7
M
Síndrome de Leigh
--
G551C/N
------
SURF1
--
Abreviaturas: (F) feminino; (M) masculino; (%) % mtDNA mutado no músculo esquelético; (A) anos; (∆ )
delecção; (--) não identificado; (1) ∆ 4997pb: ATPase8-ND5; (2) ∆ 8025pb: tRNAAsp-cit b, ∆3901pb: ATPase8-tRNALeu e ∆ 4977 pb: ATPase8-ND5; (3) ∆ 3977pb: ATPase8-ND5; (AVC) acidente vascular cerebral);
(KSS) síndrome de Kears-Sayre; (PEO) oftalmoplégia externa progressiva; (MERRF) epilepsia mioclónica
com fibras rotas e vermelhas; (LHON) neuropatia óptica hereditária de Leber; (MNGIE) encefalomiopatia
neurogastrointestinal mitocondrial); (HM) hereditariedade materna; (X) hereditariedade ligada ao X; (CrX)
cromossoma X; (*) Défice da ubiquinona.
280
artigos originais
a caracterização dos genótipos associados, de modo a estabelecer um diagnóstico preciso destas patologias. A caracterização molecular dos 20 doentes com citopatia mitocondrial propostos para este
estudo foi realizada com êxito em 14/20
(70%) dos pacientes (Quadro IV).
1. Mutações no mtDNA
Foi encontrada positividade, em 10
dos 20 pacientes estudados, quer para
mutações pontuais patogénicas já descritas na literatura, quer para delecções
ao nível da molécula de mtDNA. Num paciente com fenótipo de MELAS e RRFs
detectou-se a mutação pontual patogénica A3243G no tRNALeu(UUR). Noutros dois
com fenótipo de MERRF, o genótipo associado foi a mutação pontual patogénica
presente no tRNALys, a A8344G. Em três
pacientes com fenótipo de LHON, foram
encontradas três mutações pontuais patogénicas diferentes, a G11778A, T14484C
e G15257A, presentes nos genes ND4,
ND6 e citocromo b, respectivamente. O
paciente portador da mutação G15257A,
possuía associadas mais duas mutações
secundárias, a G13708A e a G15812A.
Uma outra mutação, T8993G, presente
no gene ATPase 6, estava presente num
paciente que não apresentava um fenótipo típico de NARP, mas sim uma encefalopatia mioclónica progressiva.
Três pacientes possuíam delecções
ao nível do mtDNA. Um deles com KSS,
era portador da delecção mais comum do
mtDNA, de 4977pb, que se estende desde o gene da ATPase 8 até ao gene ND5.
Os outros dois apresentavam delecções
múltiplas de vários tamanhos: 3901pb,
3977pb, 4977pb e 8025pb, um deles com
miopatia mitocondrial e RRFs e outro
com fenótipo de PEO (Figura 1).
Em quatro pacientes foram encontradas cinco novas mutações nos genes
dos tRNAs com relevância patogénica
ainda a esclarecer (Figura 2). Os critérios
utilizados neste estudo para estabelecer
a possível patogenicidade de mutações
ao nível do mtDNA foram:, i) heteroplasmia, ii) ausência de positividade, para a
respectiva mutação pontual, em 100 controlos normais, iii) conservação filogenética do nucleótido afectado, iv) défice
de um ou vários complexos da CRM,
NASCER E CRESCER
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
possuindo os restantes uma actividade
normal dos complexos da CRM.
Nos estudos histológicos, foi detectada a presença de RRFs em três pacientes, e fibras COX negativas nos pacientes que revelaram défice do complexo IV
da CRM.
Os fenótipos clínicos de todos os
pacientes eram sugestivos de patologia
mitocondrial, e variavam desde a miopatia, ptose palpebral bilateral, atrofia dos
músculos proximais dos membros superiores, à tetraparésia e falta de forças.
Figura 1. i) – Secção de autorradiografias representativa de delecções no mtDNA de
diferentes tamanhos. (A) controlo negativo; (B) delecção de 4977pb; (C) delecção de
3977 pb.
Figura 1. ii) – Secção de autorradiografias representativa de delecções múltiplas no
mtDNA. (A) P13 - caso positivo; (B) controlo negativo.
v) alterações na histologia e vi) fenótipo
clínico sugestivo de doença mitocondrial.
A patogenicidade das mutações homoplásmicas pode ser nula, se for observada a presença da mesma mutação homoplásmica em familiares saudáveis da
linha materna.
Apenas uma das novas mutações
encontrada no tRNAGlu (T14728C), ocorreu em heteroplasmia (97% de mtDNA
mutado). Todas as outras eram homoplásmicas, embora tivesse sido encontrada positividade em duas destas
mutações homoplásmicas (A12172G e
T5775C, presentes nos tRNAs His e Cys,
respectivamente), em dois irmãos com
fenótipo semelhante ao dos pacientes
que as expressavam. Após pesquisa das
cinco novas mutações, em 100 controlos
normais, não foi detectada positividade
em qualquer das mutações.
Os nucleótidos afectados apresentavam elevado grau de conservação (90100%), apenas em três das cinco mutações encontradas (A12172G, C4375T e
T14728C, presentes nos tRNAs His, Gln
e Glu, respectivamente), nas restante
duas (A5711G e T5775C) mutações não
foi possível averiguar o grau de conservação dos nucleótidos afectados. Só dois
dos quatro pacientes portadores das mutações (A12172G e T5775C, dos tRNAs
His e Cys, respectivamente) apresentavam défice do complexo IV da CRM,
2. Mutações no nDNA
A maioria dos pacientes estudados, apresentavam défices isolados da
COX. Como, até ao momento, só foram
descritas mutações nas quatro proteínas envolvidas no correcto assembly da
COX: SURF1, SCO2, SCO1 e COX10,
não tendo sido ainda descritas quaisquer
mutações nas subunidades da COX codificadas pelo nDNA, procedeu-se em primeiro lugar à investigação de possíveis
alterações nas proteínas envolvidas na
assembly da COX.
Os dois doentes incluídos neste
estudo com apresentação clínica compatível com síndrome de Leigh (SL), revelaram-se heterozigóticos para duas mutações presentes no gene do assembly da
COX, SURF1. Estas mutações, G551C
e A745G encontravam-se nos exões 6 e
7, respectivamente. A primeira mutação
origina a substituição de um resíduo de
arginina por um de treonina, enquanto
que na segunda ocorre a substituição de
um resíduo de asparagina por um de ácido aspártico. Embora as duas mutações
sejam sugestivas de causar a patologia,
devido à sua localização exónica, ainda
não foi encontrada a segunda mutação
responsável por este fenótipo. O défice
da COX, é o défice bioquímico mais frequentemente associado ao SL, contudo
não foi possível a determinação da
actividade dos complexos enzimáticos da
CRM, nestes dois pacientes, devido ao
facto de não dispormos de biópsia muscular para efectuar este estudo.
3. Défice da ubiquinona ou CoQ10
O diagnóstico de défice da ubiquinona ou CoQ10, foi efectuado em dois
artigos originais
281
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
Figura 2. i) – Estrutura em folha de trevo do tRNAGlu (localizado na cadeia leve do mtDNA, pelo que possui uma sequência complementar à sequência de Cambridge
do mtDNA). Representação da nova mutação (T14728C) detectada neste estudo. Abreviaturas: nt – nucleótido. ii) – Estrutura em folha de trevo do tRNAAsn (localizado na cadeia leve do mtDNA, pelo que possui uma sequência complementar à sequência de Cambridge do mtDNA). Representação da nova mutação (A5711G)
detectada neste estudo. iii) – Estrutura em folha de trevo do tRNACys (localizado na cadeia leve do mtDNA, pelo que possui uma sequência complementar à sequência de Cambridge do mtDNA). Representação da nova mutação (T5775C) detectada neste estudo. iv) – Estrutura em folha de trevo do tRNAHis. Representação da
nova mutação (A12172G) detectada neste estudo. v) – Estrutura em folha de trevo do tRNAGln (localizado na cadeia leve do mtDNA, pelo que possui uma sequência
complementar à sequência de Cambridge do mtDNA). Representação da nova mutação (C4375T) detectada neste estudo.
282
artigos originais
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
pacientes (P2 e P6) que reagiram com
sucesso à terapêutica com ubiquinona,
encontrando-se em curso os ensaios terapêuticos no terceiro paciente (P5). Esta
deficiência, a nível muscular, reflecte-se
numa baixa actividade do complexo II+III
da CRM, o que foi comprovado nestes
três pacientes. Fenotipicamente todos
eles apresentavam uma forma miopática
característica destes défices, e no estudo miopatológico, dois deles revelaram a
presença de acumulações lipídicas, tendo sido detectadas, apenas num deles,
RRFs.
Não foi possível caracterizar molecularmente estes pacientes, devido ao
gene envolvido nesta doença ainda não
ter sido identificado. Por este motivo, o
método mais indicado para a confirmação bioquímica deste diagnóstico, será a
quantificação da CoQ10 por HPLC, o que
está actualmente em curso.
4. Estudos familiares
Qualquer tipo de hereditariedade
pode estar associada às citopatias mitocondriais, mas a hereditariedade materna
é particular do genoma mitocondrial e é
um dado muito importante na investigação destas patologias, sendo por vezes
difícil de comprovar devido à grande heterogeneidade fenotípica destes doentes,
em particular dos oligossintomáticos.
Houve suspeita de uma hereditariedade materna em 25% dos doentes presentes neste estudo, mas só foi possível
o estudo em nove indivíduos, familiares
de cinco pacientes com mutações pontuais no mtDNA.
Num dos pacientes com a mutação A8344G ao nível do tRNALys e no
que apresentava a mutação G15257A
no gene mitocondrial do citocromo b, foram estudadas a mãe e o irmão, tendo
sido positivos para ambas as mutações,
o que confirma a transmissão materna.
No outro paciente também com a mutação A8344G no tRNALys, assim como
noutros dois, com novas mutações nos
genes dos mt tRNAs de relevância patogénica ainda desconhecida (A121721G e
T5775C, presentes nos tRNAs His e Cys,
respectivamente), apenas os irmãos foram estudados, revelando-se todos eles
positivos para as mutações pesquisadas,
sugerindo também uma possível hereditariedade materna.
Por último numa família de três irmãos do sexo masculino com défice do
CIII da CRM, semelhante em termos de
actividade residual, outro tipo de hereditariedade parece estar associada. Após
exclusão de positividade nos genes nucleares e de assembly deste complexo, e
por não haver consanguinidade entre os
progenitores, a hipótese de se tratar de
uma doença autossómica recessiva não
foi totalmente posta de parte, mas o facto
de não haver nenhum indivíduo do sexo
feminino afectado e dos irmãos afectados
apresentarem alterações psiquiátricas,
pareceu indicativo de se tratar de uma hereditariedade ligada ao cromossoma X.
Procedeu-se por este motivo ao
estudo de linkage ao nível do cromossoma X, com o objectivo de se encontrar o
gene envolvido na patologia.
Até ao momento, a análise automática de fragmentos resultante da amplificação de 18 marcadores do cromossoma
X, foi informativa para os marcadores
DXS987 e DXS1226. O estudo revelou
que a mãe e a irmã do caso índex são
portadoras dos alelos 214 e 295 dos
locus DXS987 e DXS1226, respectivamente, enquanto que os três irmãos
afectados são hemizigóticos para estes
dois alelos. Embora as portadoras dos
alelos mutantes não revelem a patologia,
transmitem-na aos seus descendentes,
sendo os indivíduos do sexo masculino
severamente afectados. Isto torna possível prever que estaremos perante uma
doença autossómica recessiva ligada ao
cromossoma X.
Estudos mais aprofundados terão de ser realizados no futuro, de modo
a descobrir qual o gene envolvido nesta
patologia, o que traria grandes avanços
quer ao nível da investigação clínica
(uma vez que os défices dos complexos
enzimáticos da CRM ligados ao cromossoma X são extremamente raros), quer
ao nível do diagnóstico, podendo este ser
oferecido às famílias afectadas.
CONCLUSÃO
As citopatias mitocondriais constituem um grupo de doenças com um largo
espectro de sintomas e sinais, devidas
ao anormal funcionamento metabólico da
mitocôndria, em larga escala atribuídos a
alterações do mtDNA.
A diversidade na expressão fenotípica associada às mutações no mtDNA,
não se encontra presente nas patologias
mitocondriais de hereditariedade mendeliana, pois estas causam fenótipos clínicos distintos, tais como: SL ou cardioencefalomiopatia fatal infantil.
Mutações pontuais e delecções
ao nível do mtDNA são encontradas em
aproximadamente 1/3 das citopatias mitocondriais, quer em adultos, quer em
crianças, devendo por este motivo, ser
feito em primeiro lugar, um estudo a este
nível. Pelo contrário, mutações no nDNA,
são a principal causa de deficiências da
CRM em recém-nascidos e em crianças.
A descoberta de genes nucleares
relacionados com doenças mitocondriais, pode explicar a raridade (10%)
de mutações do mtDNA encontradas na
população infantil, e a possibilidade de
um diagnóstico molecular preciso, nestas
idades.
i) Estratégias terapêuticas
Actualmente não existe uma terapia
eficaz para as doenças mitocondriais(10),
à excepção do défice da ubiquinona, que
é a única doença mitocondrial tratável,
uma vez que este défice primário responde à terapêutica com CoQ10 com regressão dos sintomas. Isto deve-se quer
à falta de animais modelo, quer à heterogeneidade destas doenças. Contudo,
inúmeras medidas, tais como melhorias
na alimentação, implantação de pacemakers, correcções cirúrgicas de ptose,
tratamento de convulsões, correcção da
acidose láctica, etc, foram tomadas com
vista a melhorar a qualidade de vida destes doentes(11).
A terapia metabólica é a mais utilizada, tendo sido a creatina um dos últimos
compostos indicados para o tratamento destas doenças, pois funciona como
substrato na síntese de fosfocreatina,
o componente energético armazenado
mais abundante no músculo, cérebro e
coração. Esta substância, é eficaz em
algumas, mas não em todas as doenças
mitocondriais. Tem como finalidade o au-
artigos originais
283
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
mento da força muscular, e está isenta de
efeitos secundários(12).
A CoQ10 ou ubiquinona tem sido administrada em doentes com grande heterogeneidade fenotípica, podendo actuar
como i) transportador de electrões para
o complexo III, a partir dos complexos I e
II assim como da β-oxidação dos ácidos
gordos e dos aminoácidos ramificados
via FADH2, ii) estabilizador membranar e
iii) antioxidante(13).
A idebenona, é um análogo da
CoQ10 de cadeia curta, tem função antioxidante e protege a mitocôndria da acção
dos radicais livres. Tem sido eficaz no
tratamento da ataxia de Friedreich, uma
vez que a frataxina participa na utilização
do ferro para construir os complexos da
CRM, levando a sua deficiência à acumulação de ferro, e consequentemente
à formação de radicais livres, que resultaria numa destruição dos complexos da
CRM(14).
A terapia vitamínica apesar de na
maioria dos casos, não ser muito eficaz,
é também bastante utilizada, nomeadamente as vitaminas do complexo B
(Tiamina - vitamina B1, Riboflavina - vitamina B2 e Niacinamida - vitamina B3)
e as do complexo E. Trata-se de uma
terapia muito económica, sendo as vitaminas do complexo B, componentes
essenciais para a função de inúmeras
enzimas relacionadas com a produção
de energia, enquanto que as do complexo E funcionam como antioxidantes,
evitando que os radicais livres danifiquem os lípidos membranares, como
por exemplo os da membrana mitocondrial interna(15).
ii) Aconselhamento genético e
diagnóstico pré-natal
O diagnóstico pré-natal destas patologias raramente é efectuado(16), se envolve mutações no genoma mitocondrial,
porque a percentagem de mtDNA mutado
nos amniócitos pode não ser idêntica à
dos outros tecidos fetais, pode variar ao
longo da gravidez e pode ainda aumentar
após o nascimento, devido à segregação mitótica. Esta característica explica
a falta de fiabilidade deste diagnóstico
e a importância de um aconselhamento
genético a estas famílias.
284
artigos originais
Contudo, quando a mutação causal
é conhecida e está localizada ao nível
dos genes nucleares que codificam subunidades da CRM, pode oferecer-se um
diagnóstico pré-natal ao casal de risco.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao Dr. António Guimarães e ao Dr. Melo Pires da
Neuropatologia do HGSA pela disponibilidade dos dados miopatológicos referentes aos doentes estudados. A todos os
clínicos que enviaram as amostras para
serem estudadas no nosso laboratório.
MOLECULAR INVESTIGATION IN 20
PATIENTS WITH MITOCHONDRIAL
CYTOPATHIES
ABSTRAT
Dysfunction of the mitochondrial
respiratory chain has been recognized as
a cause of a large, and diverse group of
multisystemic disorders for over 30 years.
Respiratory chain diseases may develop
at any time from the neonatal period to
late adult life. Although tissues with a high
demand for oxidative phosphorylation
such as brain and skeletal muscle are frequently affected, virtually any tissue can
be involved. Because of that, multisystemic mitochondrial diseases are often
referred to as mitochondrial encephalomyopathies, or in a larger concept, as
mitochondrial cytopathies.
For more than a decade, the search
for pathogenic mutations in human diseases due to respiratory chain dysfunction
has been focused on the mitochondrial
genome (mtDNA). In the past few years,
the focus of attention has shifted to the
search for mutations within the nuclear
DNA (nDNA).
Objectives: The scope of this project was to study at a molecular level
patients who had clinical presentations
or laboratory features suggestive of mitochondrial cytopathies.
Patients and Methods: We studied
20 patients from all the country with mitochondrial dysfunctions. We investigated: i)
the most frequent mutations in the mtDNA
already described in the literature, pontual
mutations and deletions. ii) mutations in
mt-tRNAs genes and in structural mtDNA
genes. iii) mutations in nuclear genes that
encode structural subunits of respiratory
chain and that are needed for the assembly of these subunits.
Results: Ten of these 20 patients
revealed pathogenic mtDNA point mutations (in tRNA and structural genes), large-scale and multiple mtDNA deletions,
already described in the literature. Other
four showed five new mutations in the
tRNA genes, whose pathogenesis is still
unknown. Ubiquinone deficiency was
suspected in three of these 20 patients,
confirmed by therapeutical tests in two
of them. In two patients with Leigh syndrome two new mutations were detected
in the COX assembly gene (SURF1).
Linkage analysis around the X chromosome has been performed in a patient’s
family who presented a deficiency of
complex III of the respiratory chain, aiming to identify the pathological involved
gene.
Conclusions: In this study we started from different clinic and biochemic
phenotypes suggestive of mitochondrial
disease, to characterize the associated
genotypes, with the aim to establish the
molecular cause of these disorders. The
molecular characterization of the 20 patients with mitochondrial cytopathies included in this study was done with success in 14/20 (70%) of them.
Key-words: mitochondrial respiratory chain, OXPHOS, tRNAs, mtDNA,
nDNA.
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 277-285
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Correspondência:
Doutora Laura Vilarinho
Instituto de Genética Médica Jacinto de
Magalhães
Praça Pedro Nunes, 88
4099-028 Porto
Tel: 226 070 306 Fax: 226 070 399
[email protected]
artigos originais
285
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Abordagem diagnóstica e terapêutica
das bronquiolites - revisão bibliográfica
Anabela Bandeira1, Clara Vieira1, Lúcia Gomes2, Guilhermina Reis2, Margarida Guedes3
RESUMO
As bronquiolites são um problema
de saúde frequente e potencialmente grave nos lactentes. Representam uma das
principais causas de internamento hospitalar nos meses de Outono e Inverno.
Até à data não existem estudos
controlados e randomizados a provar a
eficácia da maioria das atitudes terapêuticas. Os broncodilatadores, a adrenalina
e os corticóides têm sido usados no tratamento, sem evidência comprovada da
sua eficácia.
Os autores fazem uma revisão dos
conceitos de bronquiolite e dos níveis
de evidência das várias atitudes terapêuticas, apresentando uma proposta
de abordagem diagnóstica e terapêutica
de acordo com a gravidade da situação
clínica.
Palavras-chave: bronquiolite; broncodilatadores, adrenalina, corticóides
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 286-291
INTRODUÇÃO
As bronquiolites representam uma
das patologias mais frequentes na criança, principalmente nos meses de Outono
e Inverno. A percentagem de internamentos aumentou cerca de 200%, entre 1980
e 1996, nos EUA(1). Mesmo sendo uma
patologia muito frequente, a abordagem
terapêutica é muito controversa e não
existem, para a maioria dos fármacos
___________
1
Interna Complementar de Pediatria do
HGSA SA
2
Assistente Hospitalar de Pediatria do
HGSA SA
3
Assistente Hospitalar Graduada de
Pediatria do HGSA SA
286
artigos de revisão
utilizados, estudos controlados e randomizados a provar a sua eficácia(2). Entende-se por bronquiolite um episódio agudo
de sibilância, no contexto de um quadro
respiratório de origem virusal, que afecta
a criança com menos de 2 anos.
Os agentes etiológicos mais frequentes(3) são o vírus Sincicial Respiratório (VSR) em 60-90% dos casos; o vírus
Influenza e o Parainfluenza em 5-20%
dos casos; o Adenovírus, o Rhinovírus e
o Metapneumovirus em 20-60% dos casos.
A clínica mais habitual, frequentemente associada à infecção por VSR,
caracteriza-se por um pródromo de 2-3
dias de sintomas das vias aéreas superiores (rinorreia anterior sero-mucosa
e obstrução nasal), tosse, febre (acima
dos 38,5ºC em 50% dos casos(4)) e recusa alimentar. Segue-se uma fase aguda
caracterizada por sinais de dificuldade
respiratória: taquipneia, tiragem, adejo
nasal. No ex-pré termo e/ou no lactente
com menos de 6 meses podem surgir cianose e apneias.
De acordo com o agente etiológico,
existem algumas particularidades clínicas (quadro I).
Dependendo da apresentação clínica, o diagnóstico diferencial poderá
ser feito com: asma do lactente, refluxo
gastro-esofágico, fibrose quística, pneumonia de aspiração ou infecciosa, tosse
convulsa, aspiração de corpo estranho,
anomalia congénita pulmonar ou cardíaca ou imonudeficiência.
AVALIAÇÃO DA GRAVIDADE
A avaliação da gravidade(4) é baseada em critérios clínicos (frequência respiratória, aspecto geral da criança, presença de sinais de dificuldade respiratória)
e no registo das saturações de oxigénio
em ar ambiente por oximetria de pulso
(quadro II).
São factores de risco(3,4,5) para uma
maior gravidade clínica a prematuridade
(idade gestacional inferior a 34 semanas),
idade cronológica inferior a 6 semanas, a
existência de doença cardíaca, doença
pulmonar crónica, doença neurológica ou
neuromuscular; imunodeficiência, baixas
condições socio-económicas ou aglomerados populacionais, história familiar de
asma ou atopia e criança não amamentada. Os critérios de internamento(3,4,6)
incluem factores de risco clínico, a gravidade da apresentação clínica e factores
sociais (quadro III).
A identificação do agente etiológico
tem importância epidemiológica, clínica
Quadro I – Bronquiolite: particularidades da apresentação clínica
dos vários agentes etiológicos
Agente
Influenza A e B
Parainfluenza 1, 2, 3
Adenovirus
Rhinovirus
Metapneumovirus
* vírus sincicial respiratório
Particularidades da apresentação clínica
Sinais sistémicos: febre alta e aspecto tóxico
Sem febre, mais sintomas das vias aéreas superiores
Otite média aguda em 50% dos casos e diarreia
Lactentes mais pequenos
Semelhante ao VSR* (clínica mais habitual)
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Quadro II - Bronquiolite: avaliação da gravidade da apresentação clínica
Gravidade da
apresentação clínica
Frequência
Respiratória
Leve
Moderada
Grave
Normal
Taquipneia
Apneias recorrentes
Aspecto geral
Boa hidratação
Boa tolerância oral
Sinais de dificuldade
respiratória
Tiragem discreta
Saturação de oxigénio
> 95 %
Toxicidade sistémica
Má perfusão periférica
Factores de gravidade
Tiragem ligeira a moderada
Tiragem global
Dificuldade respiratória
Adejo nasal
com a alimentação
Uso dos músculos acessórios
90-94 %
< 90%
Recusa alimentar parcial
Sinais de desidratação
Quadro III - Bronquiolite: critérios de internamento
1) Presença de factores de risco:
a) Lactente < 2 meses (pretermo com idade corrigida < 3 meses)
b) Doença cardíaca e/ou pulmonar crónica
c) Imunodeficiência
d) Doença neurológica ou neuro-muscular
2) Presença de compromisso respiratório ou hemodinâmico:
a) Apneias / Dificuldade respiratória severa
b) Hipoxémia (saturação menor que 94 % em ar ambiente)
c) Desidratação / recusa alimentar
3) Impossibilidade de tratamento no domicílio
a) Más condições sócio-económicas
b) Má acessibilidade aos cuidados médicos
Quadro IV - Níveis de evidência das atitudes terapêuticas
Atitudes terapêuticas
Aspiração nasal melhora o score clínico 8 a 10
Nebulização com solução salina não é recomendada 3
Nebulização com salbutamol melhora o score clínico 11, 12
Prova terapêutica com salbutamol e/ou adrenalina 13 a 15
Nebulização com salbutamol em grupos específicos de doentes (definidos no texto) 5
Nebulização com adrenalina aumenta a oxigenação e aumenta o score clínico 16 a 19
Nebulização com brometo de ipratrópio tem um efeito semelhante ao efeito placebo 3
Corticóides em nebulização não são recomendados 20, 21
Corticóides sistémicos diminuem a duração do internamento 22
Percussão, vibração e drenagem postural não é recomendada 25
Expiração prolongada e tosse provocada são recomendadas 3
Antibióticos não têm benefício clínico 1
Ribavirina em aerossol não é recomendada 26
Imunoglobulinas inespecíficas não têm benefício clínico 4
Profilaxia com palivizumab ou imunoglobulina específica para VSR nos grupos de risco 30
Nível de
evidência
B
A
D
D
B
B
B
B
B
D
C
B
B
B
A
Quadro V - Definição dos níveis de evidência
Nível de evidência
A
B
C
D
Tipo de estudo realizado
Revisões sistemáticas ou meta-análises de todos
os ensaios controlados e randomizados
Ensaios controlados e randomizados bem desenhados
Estudos caso-controlo ou cohorte bem desenhados
Opinião de consenso dos autores
Fonte: National Health and Medical Research Council. How to use evidence: assessment and
application of scientific evidence. Canberra: NHMRC, 2000
e para a aplicação de medidas de isolamento de prevenção secundária, nomeadamente de isolamento de contacto,
aos lactentes e crianças internadas com
bronquiolite. A identificação do vírus VSR
no lavado nasofaríngeo pode ser realizada através de testes rápidos, ou seja, técnicas de enzyme-linked immunosorbent
assay (ELISA), com uma sensibilidade
de cerca de 90% e/ou por imunofluorescência, técnica mais demorada mas mais
específica. A pesquisa dos outros vírus
respiratórios é feita por técnicas de imunofuorescência.
A telerradiografia torácica pode ser
realizada no caso de dúvidas no diagnóstico clínico, se existir diminuição localizada dos sons respiratórios ou sinais clínicos de insuficiência cardíaca congestiva.
As imagens de hiperinsuflação pulmonar;
espessamento brônquico, consolidação
segmentar ou colapso pulmonar são as
mais frequentemente encontradas. O
hemograma e a proteína C reactiva são
exames inespecíficos que podem ser realizados na presença de imagem de hipotransparência no Rx de tórax e/ou na
suspeita de sobre infecção bacteriana.
A gasimetria deverá ser reservada para
situações graves quando se pondera a
necessidade de tratamento em cuidados
intensivos.
ATITUDES TERAPÊUTICAS: NÍVEIS
DE EVIDÊNCIA
Vários estudos foram realizados
no sentido de verificar a eficácia clínica
das atitudes terapêuticas utilizadas nas
bronquiolites. Foram definidos níveis de
evidência(7) para cada um dos fármacos
usados (quadro IV e V).
A aspiração nasal melhora o score
clínico da criança, diminui a necessidade
de broncodilatadores e diminui a necessidade de oxigénio(8,9,10).
O uso de agonistas beta-adrenérgicos (salbutamol) melhora a pontuação clínica(11,12) mas não diminui a necessidade de oxigénio, nem o número
de internamentos ou duração do internamento(4,11,12). Vários artigos aconselham a realização de uma prova terapêutica(13,14,15), pela existência de grupos de
doentes nos quais possa existir melhoria
clínica. Estes grupos específicos(5), que
artigos de revisão
287
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
têm uma maior probabilidade de obter
uma resposta positiva à nebulização com
salbutamol e à corticoterapia, incluem o
lactente ou a criança com história familiar
de atopia; a criança com história pessoal
de hiper-reactividade brônquica ou com
outros factores de risco para o desenvolvimento de asma.
Alguns estudos demonstram que
a nebulização com adrenalina(16,17,18,19)
aumenta a oxigenação, melhora a pontuação clínica e diminui a percentagem
de internamentos em ambulatório. Mas
não existe evidência de melhoria clínica
em internamento: não diminui a duração
de internamento, nem a necessidade de
oxigénio.
Os anticolinérgicos (brometo de
ipratrópio)(3,12) não parecem ter qualquer
utilidade clínica, sendo o seu efeito semelhante ao efeito placebo.
Os corticóides em nebulização(20,21)
não apresentam benefício, tanto na fase
aguda como na prevenção da hiperreactividade brônquica. O uso de corticóides
sistémicos mantém-se controverso (21).
Uma meta-análise(22) demonstra que o
seu uso está associado a uma melhoria dos sintomas e a uma diminuição da
duração do internamento. Os corticóides
sistémicos poderão estar associados a
algum benefício clínico em ambulatório(23,24). Como já foi mencionado, os
corticóides são benéficos em grupos específicos, nomeadamente naqueles com
hiper-reactividade brônquica ou factores de risco para o desenvolvimento de
asma(3).
Nos países Anglo-saxónicos, a cinesiterapia respiratória não apresenta
evidência de benefício clínico, pelo que
não é recomendada(25). Nestes países
são utilizadas técnicas de percussão,
vibração e drenagem postural. A cinesiterapia está recomendada na presença
de atelectasias. Nos países francófonos, que utilizam técnicas de expiração
lenta prolongada e tosse provocada,
existe evidência de benefício clínico,
pelo que estas técnicas têm sido recomendadas(4).
O uso de ribavirina(26) não é aconselhado por rotina, pelo risco de teratogenicidade na administração em aerossol e
pelo seu elevado custo económico.
288
artigos de revisão
ABORDAGEM TERAPÊUTICA
A abordagem terapêutica no primeiro episódio de bronquiolite (figura 1)
depende da classificação da gravidade
(quadro II).
Se estamos perante um episódio
leve, o tratamento será feito no domicílio
com hidratação e alimentação fraccionada por via oral, elevação da cabeceira
da cama a 30º e administração de antipiréticos, se necessário. A medida mais
eficaz consiste na desobstrução das vias
aéreas por lavagem nasal frequente com
soro fisiológico e aspiração de secreções. A reavaliação clínica pelo médico
assistente deverá ser efectuada em 24 a
48 horas.
Devem ser dados conselhos aos
pais ou prestadores de cuidados sobre
medidas gerais de tratamento sintomático (quadro V) e alertar para a necessidade de vigilância do aparecimento de
sinais de agravamento como dificuldade
respiratória, agitação, mau aspecto geral,
apneias, recusa alimentar ou vómitos.
A abordagem terapêutica na forma
moderada exige observação médica durante algumas horas, no serviço de urgência ou internamento de curta duração,
com revisão dos critérios de internamento. Deve ser assegurada uma hidratação
e alimentação fraccionadas conforme tolerância ou, se necessário, fluidoterapia
endovenosa. As medidas gerais de tratamento sintomático: elevação da cabeceira da cama a 30º, desobstrução das vias
aéreas por lavagem nasal frequente com
soro fisiológico e aspiração de secreções
devem ser mantidas. Oxigénio suplementar será fornecido se saturações, em ar
ambiente, inferiores a 94%.
O benefício clínico da utilização do
broncodilatador (β2 agonista) em nebulização pode ser testado com uma prova
terapêutica, em lactente de idade superior a 3 meses. Se se verificar uma melhoria clínica em 30 a 60 minutos, mantêm-se as nebulizações com β2 agonista
de 6/6 horas. Devem ser considerados
os critérios de internamento, podendo ou
não a criança ser orientada para o domicílio, com nebulizações com β2 agonista
(6/6 horas, 3 a 5 dias) e ponderando a
administração de prednisolona via oral
(1-2 mg/kg/dia, 1 a 3 dias). Não esquecer
os conselhos aos pais sobre as medidas
gerais de tratamento sintomático.
Se não se verificar melhoria clínica
com a prova terapêutica com salbutamol,
pode ser efectuada uma prova terapêutica
com L-adrenalina nebulizada. Se houver
melhoria em 60 minutos, a criança poderá
ser orientada para o domicílio, fornecendo as mesmas recomendações referidas
para a forma leve. Ponderar a prednisolona via oral como descrito acima.
A forma grave exige sempre internamento hospitalar, necessidade de pausa
alimentar e hidratação endovenosa. As
medidas gerais devem ser asseguradas.
Ponderar a administração de prednisolona endovenosa, 1-2 mg/kg/dia durante 1
a 3 dias.
Considerar a transferência para
uma Unidade de Cuidados Intensivos(2)
se hipoxia e/ou hipercápnia refractárias
com Fi O2 de 40 a 50% com Pa O2 < 60
mmHg; Pa CO2 > 50 mmHg e pH <7,25;
ou na presença de episódios de apneias
recorrentes.
COMPLICAÇÕES E SEQUELAS
Na fase aguda, as bronquiolites
podem ter complicações(27) respiratórias
(as mais frequentes), hemodinâmicas,
metabólicas ou infecciosas. As complicações respiratórias compreendem as atelectasias, a hiperinsuflação pulmonar, a
insuficiência respiratória, as apneias ou o
pneumotórax. Podem surgir hipotensão,
choque, arritmias, hipocaliémia ou hipercaliémia, anemia ou hiperglicemia. A otite
média aguda e a pneumonia bacteriana
são as intercorrências infecciosas mais
frequentes.
As principais sequelas(28,29) consistem na sibilância recorrente, na sensibilização alérgica e nas anormalidades da
função pulmonar a longo prazo (nomeadamente a bronquiolite obliterante).
PROFILAXIA
Em relação à prevenção primária é
consensual que pode ser obtida através
de medidas muito simples. O ensino aos
pais ou prestadores de cuidados ajuda a
diminuir o número de crianças internadas
por bronquiolite. Algumas destas medidas
são: lavar as mãos antes de prestar qualquer cuidado ao lactente (o vírus sincicial
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Quadro VI - Conselhos aos pais ou prestadores de cuidados
Conselhos aos pais ou prestadores de cuidados:
i.
ii.
iii.
iv.
v.
Registar a temperatura corporal duas vezes por dia
Assegurar uma hidratação oral adequada.
Evicção da exposição ao fumo passivo.
Não frequentar o infantário até ao desaparecimento completo dos sintomas.
Oferecer um ambiente tranquilo e não sobreaquecer o bebé
Colocar o bebé em decúbito dorsal, com uma inclinação do leito a 30º, com ligeira
hiperextensão
Quadro VII - Indicações do palivizumab
Indicações do palivizumab:
i. Ex pré-termo com idade gestacional inferior a 28 semanas durante o primeiro ano
de vida
ii. Ex pré-termo com idade gestacional entre as 28 e as 30 semanas que não tenham
completado os 6 meses de idade pós-natal até ao início da época de risco
iii. Crianças com displasia broncopulmonar
Durante o primeiro ano de vida
Durante o segundo ano de vida se, nos 6 meses anteriores necessitaram
de terapêutica com oxigénio suplementar, diuréticos, corticóides ou
broncodilatadores durante mais que uma semanas consecutiva.
Fonte: Administração do Anticorpo monoclonal anti-virus sincicial respiratório (Palivizumab).
Disponível em http:// www.spp.pt; secção de Neonatologia. Consultado em Setembro de 2005.
respiratório sobrevive 30 minutos na pele
e 6 a 7 horas nos objectos); não deixar
partilhar chupetas e brinquedos; evitar o
contacto entre o lactente e familiares e
amigos constipados; evitar lugares com
grande concentração de pessoas e /ou
locais poluídos com fumo e incentivar o
aleitamento materno. Para os profissionais de saúde evitar internamentos electivos de lactentes com doença pulmonar
e/ou cardíaca crónica (hipertensão pulmonar) durante a época de epidemia. No
internamento, assinalar a necessidade
de descontaminação de objectos e superfícies de trabalho (nomeadamente os
estetoscópios), assim como medidas de
isolamento de contacto. Quando for possível, proceder ao isolamento em quarto
ou cohorte.
Nos ex-pretermos, a utilização de
anticorpos monoclonais (palivizumab)
para o VSR tem mostrado eficácia na diminuição do número de hospitalizações
e internamentos nos Cuidados Intensi-
vos, sem diminuição da necessidade de
ventilação mecânica. O palivizumab foi
aprovado pela Food and Drug Administration em 1998, na dose de 15 mg/kg,
administração mensal intra-muscular,
nos 5 meses de maior prevalência do
VSR (quadro VII). Em 2003, após uma
revisão das indicações do palivizumab,
a Associação Americana de Pediatria
(AAP)(30) recomenda a sua administração a crianças com idade inferior a 24
meses com doença pulmonar crónica,
com necessidade de tratamento médico
nos últimos 6 meses que antecipam a
época do VSR e a todos os prematuros
com idade gestacional igual ou inferior
a 32 semanas, mesmo sem doença pulmonar crónica.
Lactentes com idade gestacional inferior a 28 semanas beneficiam de profilaxia no primeiro ano de vida e os lactentes com idade gestacional entre as 29 a
32 semanas beneficiam de profilaxia nos
primeiros 6 meses de vida. Mantém-se
controversa a administração de palivizumab a lactentes com idade gestacional
entre as 32 e as 35 semanas de gestação. Pode ser feita profilaxia aos prematuros com doença cardíaca congénita,
cianótica ou não, hemodinamicamente
significativa, deixando esta de ser uma
contra-indicação. Nenhuma recomendação foi feita em relação à prevenção da
infecção nosocomial por VSR, à excepção das medidas de isolamento de contacto, especialmente a higiene das mãos
e a rápida identificação do vírus.
A imunoglobulina específica para o
VSR também foi aprovada, no entanto, é
menos usada devido ao seu maior custo,
dificuldade na administração (perfusão
endovenosa durante 4 horas), interferência com o calendário vacinal e estar
contra-indicada nos lactentes e crianças
com doença cardíaca congénita hemodinamicamente significativa.
CONCLUSÃO
As bronquiolites podem, na maioria dos casos, ser tratadas no domicílio.
Uma minoria de lactentes com doenças
subjacentes ou factores de risco apresenta um maior risco de doença grave,
pelo que devem ser internados para receber hidratação, oxigenação e tratamento
de suporte adequado.
Continua a surpreender a falta de
consenso no que respeita ao tratamento
inicial mais apropriado. Vários estudos
randomizados e controlados, meta-análises ou revisões sistemáticas falham em
demonstrar um benefício consistente no
tratamento com broncodilatadores, adrenalina ou corticóides.
O uso rotineiro dos broncodilatadores, da adrenalina ou dos corticóides
para tratar as bronquiolites, na ausência
de benefício clínico demonstrado, pode
não ser justificado. A prova terapêutica
com broncodilatador e/ou adrenalina é,
no entanto, recomendada. A corticoterapia sistémica é considerada como uma
medida terapêutica benéfica, tanto em
internamento como no ambulatório mas,
não é consensual a sua utilização. Só a
adopção de protocolos de actuação permitirá avaliar de modo mais seguro a eficácia das diferentes atitudes terapêuticas
(fármacos, doses e indicações).
artigos de revisão
289
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
1º episódio
de bronquiolite no SU / OBS
LEVE
MODERADO e GRAVE
Medidas gerais
Prova terapêutica com salbutamol
Hidratação
Alimentação fraccionada
Desobstrução nasal
Domicílio
Recomendações
Reavaliar em 24-48 horas
0,03 ml/kg/dose diluído em 50% de SF com oxigénio a 6 L/min
Dose mínima: 0,25 ml (7 gotas)/dose
Dose máxima: 0,5 ml/dose.
Sem melhoria clínica
Melhoria clínica
Prova terapêutica com adrenalina nebulizada
L-adrenalina (1/1000) 0,05 a 0,1 ml/kg/dose,
diluída em SF até completar 5 ml com
oxigénio a 6 L/min, máximo de 4/4 horas.
Reavaliação clínica em 1-2 horas
Internamento
Medidas gerais e Oxigenoterapia
Neb. com salbutamol se houver resposta clínica
Corticoterapia sistémica, ev
Ponderar Cuidados Intensivos
Ver critérios de internamento
Domicílio
Recomendações
Neb. com salbutamol 6/6 h
Corticoterapia sistémica, vo
Figura 1 – Algoritmo da abordagem do 1º episódio da bronquiolite no SU / OBS
Para concluir, recordar que medidas
simples de profilaxia da infecção e medidas gerais de tratamento sintomático
apresentam benefício clínico inquestionável.
DIAGNOSTIC AND THERAPEUTIC
APPROACH OF BRONCHIOLITIS –
LITERATURE REVIEW
ABSTRAT
Bronchiolitis is a very common and
potentially serious respiratory disease of
young children. It’s the leading cause of
hospitalization in infants in Autumn and
Winter.
290
artigos de revisão
Bronchodilators, epinephrine and
corticosteroids have all been used in the
treatment of bronchiolitis. As with older
studies, most recently published randomized clinical trials have failed to demonstrate clinical efficacy in the use of these
medications.
This article summarizes the concepts of bronchiolitis and the level of evidence of each treatment.
The authors present a proposal of
diagnostic and therapeutic approach of
bronchiolitis based on the severity of the
clinical presentation.
Keywords: bronchiolitis; bronchodilatadors, epinephrine, corticosteroids
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 286-291
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Correspondência
Anabela Bandeira
Serviço de Pediatria
Hospital Geral de Santo António, SA
Largo do Prof. Abel Salazar
4099-001 PORTO
Telefone: 222 077 500
artigos de revisão
291
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Intersexo. I - Genes envolvidos na determinação
do sexo masculino*
Rosália Sá1, Mário Sousa2, Alberto Barros3
RESUMO
Neste artigo actualizamos a embriologia do sistema reprodutor masculino e apresentamos a cascata de genes que controlam a determinação do
sexo (sexo gonádico) e a diferenciação
sexual (sexo genital). Em artigos subsequentes, explicaremos o mecanismo
pelo qual as lesões destes genes condicionam intersexo. Na gónada embrionária bipotente os genes NR5A1(SF1)
e WT1(-KTS) activam o gene SRY, enquanto que os genes WNT4 e WT1(KTS) activam os genes feminizantes
NROB1(DAX1) e SOX3. O SRY dispara a determinação da gónada bipotente
em testículo ao induzir a diferenciação
em células de Sertoli e ao inibir os genes DAX1 e SOX3. A diferenciação
do sexo é uma consequência da interacção entre os genes SOX8, SOX9,
NR5A1, GATA4 e WT1(+KTS), após
potenciação pelo SRY. Neste mecanismo, as células de Sertoli segregam
a hormona anti-mulleriana (AMH) e induzem a diferenciação das células de
Leydig. A AMH induz a atrofia do canal
de Muller, inviabilizando o fenotipo feminino. Sob influência da gonadotrofina coriónica (HCG), as células de
Leydig segregam testosterona, a qual
é então parcialmente metabolizada em
5-dehidro-testosterona. Sob mediação
__________
1
Bióloga, Aluna de Doutoramento, Lab Biologia Celular, ICBAS-UP
2
MD, PhD, Prof Catedrático, Director, Lab
Biologia Celular, ICBAS-UP
3
MD, PhD, Prof Catedrático, Director, Centro de Genética da Reprodução Alberto Barros, Porto
* Trabalho financiado pela FCT (POCTI/
SAU-MMO/60709/04, 60555/04, 59997/04,
UMIB).
292
artigos de revisão
do gene CFTR, a testosterona promove a diferenciação do canal de Wolff na
metade reprodutora (canais eferentes,
epidídimos, canais deferentes, vesículas seminais, canais ejaculadores),
enquanto que a 5-dehidro-testosterona
induz a diferenciação do canal de Wolff na metade urinária (próstata, uretra,
pénis, escroto).
Palavras-chave: Embriologia, testículo, determinação do sexo, diferenciação sexual, mecanismos genéticos.
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 292-299
1. Embriologia do Sistema Reprodutor Masculino
O intersexo existe quando não se
pode estabelecer com total garantia o
sexo de um indivíduo por haver falta de
concordância entre os critérios: sexo
cromossómico ou genotípico (46,XY
ou 46,XX), sexo gonádico (formação
das gónadas: testículo ou ovário), sexo
genital (formação dos canais genitais e
dos genitais externos), sexo somático
ou fenotípico (características sexuais
secundárias), sexo psíquico (conceito
de si mesmo), sexo social (atribuído
pela sociedade) e sexo civil (genital).(1)
O sexo genético é uma consequência
da fecundação de um ovócito (23,X)
por um espermatozóide (23,Y ou 23,X),
que origina um embrião 46,XY ou
46,XX.(2,3)
A gonadogénese inicia-se pela
formação do sistema urogenital a partir da mesoderme intermediária. O sistema urogenital é composto por três
segmentos: pronefro (primórdio da suprarenal), mesonefro (rim embrionário,
destinado à regressão espontânea) e
metanefro (primórdio do rim definitivo).
O canal de Wolff (canal mesonéfrico)
origina-se da mesoderme lateral e percorre o sistema urogenital, enquanto
que o canal de Muller (canal paramesonéfrico) deriva de uma invaginação
do epitélio superficial do mesonefro e
corre paralelo ao canal de Wolff. Nas
mulheres, o canal de Wolff regride e
o canal de Muller origina o oviducto, o
útero e o terço superior da vagina. No
sexo masculino, o canal de Muller sofre
regressão por acção da hormona antimulleriana (AMH; ou substância mulleriana inibidora, MIS), secretada pelas
células de Sertoli, e o canal de Wolff
diferencia-se no epidídimo, canal deferente e vesícula seminal sob acção da
testosterona, secretada pelas células
de Leydig (Figs. 1-3).(4-10)
A gónada bipotencial surge na
superfície da crista genital. As células
germinais primordiais (primordial germ
cells, PGC), diferenciadas das células
da endoderme da parede do saco vitelino (3ª semana), junto à alantóide,
migram, independentemente do sexo
cromossómico, ao longo da parede
posterior do intestino primitivo. Na 5ª
semana chegam à gónada primitiva e
invadem-na na 6ª semana de gestação
(Fig. 1). Se as PGC não atingirem as
gónadas primitivas, não é possível a
formação do testículo (nem do ovário).
Uma vez na proximidade da gónada
primitiva, e sobretudo depois de a invadirem, as PGC segregam factores que
induzem a proliferação das células do
tecido conjuntivo e das células do epitélio celómico da crista genital. Após a
fase de proliferação epitelial, a lâmina
basal do epitélio celómico fragmentase e as células epiteliais proliferantes
invadem o estroma. No sexo masculi-
NASCER E CRESCER
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Figura 1. Embriologia do sistema reprodutor masculino. (*) Origem e trajecto de migração das células germinais
primordiais.
artigos de revisão
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Figura 2. Determinação e diferenciação do testículo. As células germinais primordiais (PGC) evoluem para espermatogónias (SG). Da proliferação do epitélio celómico da crista genital (A) originam-se as células pré-Sertoli (pSC), que depois
se transformam em células de Sertoli (SC), e as células pré-Leydig (pLC), que mais tarde se diferenciam em células de
Leydig (LC). Da proliferação do estroma da crista genital (B) resultam as células e a matriz de tecido conjuntivo intersticial
do testículo. Da proliferação do epitélio do canal de Wolff (C) originam-se as células pré-peritubulares (pPTC), que depois
se transformam em células peritubulares (PTC), e as células pré-endoteliais (pEC), que mais tarde originam os vasos sanguíneos (BV) testiculares. As PTC e as SC sintetizam a lâmina basal (BL) que delimita os túbulos seminíferos.
294
artigos de revisão
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Figura 3. Sequência de activação de genes envolvidos na determinação do sexo (testículo) e na diferenciação sexual (genitais)
masculina. Genes estimuladores
e genes inibidores
. Proteínas
.
artigos de revisão
295
NASCER E CRESCER
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
no, devido à presença do cromossoma
Y (e independentemente do número
de cromossomas X), estas células irão
originar as células de Sertoli, as células de Leydig e as células intersticiais
do tecido conjuntivo do testículo. No
sexo feminino, irão originar as células
da granulosa (células foliculares). Em
simultâneo, sob a acção do FGF9 (fibroblast growth factor 9), as células do
epitélio do canal mesonéfrico também
proliferam, destacam-se e migram para
a crista genital, dando origem às células peritubulares (mioepiteliais) e às células endoteliais dos vasos sanguíneos
do testículo (Fig. 2). Neste processo, o
gene FGF9 promove a prostaglandinaD-sintase que leva à síntese de prostaglandina-D2 (PGD2).(8,9)
Até à 5-6ª semanas de gestação,
a gónada embrionária é bipotencial,
não havendo diferenças entre os sexos
(cromossómicos). Nas cristas genitais
do sexo masculino, as PGC diferenciam-se em pro-espermatogónias-M
e depois em pro-espermatogónias-T
(espermatogónias fetais). Numa primeira fase, as células pré-Sertoli (células de Sertoli fetais) proliferam para,
de seguida, sob a acção do gene SRY
(localizado no braço curto do cromossoma Y, Yp), se agregarem em volta
das pro-espermatogónias-T. As células
pré-Sertoli são depois rodeadas pelas células peritubulares, formando-se
uma lâmina basal entre ambas. Deste
conjunto, formam-se então os cordões
sexuais primitivos, sólidos, de forma
irregular, que permanecem ligados ao
epitélio celómico (Fig. 2). Nestes cordões, as células pré-Sertoli inibem a
proliferacão e a entrada em meiose
das pro-espermatogónias-T, causando
uma paragem em mitose na fase G1/
G0. Uma vez diferenciadas em células
de Sertoli, inicia-se a secreção da AMH
que provoca a atrofia do canal de Muller, assim inviabilizando a diferenciação
dos genitais femininos. A activação em
células de Sertoli também condiciona
a diferenciação das células de Leydig
fetais a partir das células epiteliais
presentes no estroma da crista genital
(Fig. 3). Sob influência da gonadotrofina coriónica (HCG, human coriogona-
296
artigos de revisão
dotrophin) secretada pela placenta, as
células de Leydig fetais passam então
a produzir testosterona e dehidro-testosterona (início: 8 semanas; máximo:
12-14 semanas). A testosterona induz
o desenvolvimento dos genitais masculinos internos a partir da estabilização
do canal de Wolff, diferenciando-o nos
canais eferentes, epidídimos, canais
deferentes, vesículas seminais e canais ejaculadores. A 5-dehidro-testosterona, produto de acção da enzima
sobre a testosterona, induz a formação
da próstata, da uretra e dos genitais externos (pénis e escroto). Nas mulheres,
as células germinais primordiais permanecem no córtex da crista genital,
entram em meiose e param em diacinese da profase I, sendo elas a influenciar a diferenciação das células da granulosa. Enquanto que a diferenciação
em testículo se inicia pela 8ª semana, a
indução ovárica decorre a partir das 12
semanas de gestação.(4-10)
Os cordões sexuais primitivos
continuam a proliferar em direcção ao
hilo da glândula, transformando-se em
cordões testiculares. Na região hilar, as
extremidades distais dos cordões testiculares tornam-se finas, ramificam-se
e fragmentam-se para formar uma rede
que mais tarde se diferencia nos túbulos da rete testis. Do tecido conjuntivo
que envolve os cordões testiculares,
diferenciam-se as células de Leydig
(equivalentes às células da teca), as
quais começam a segregar testosterona desde a 8ª semana de gestação.
Por esta altura, a região mais superficial do estroma diferencia-se numa
camada fibrosa, a túnica albugínea,
que então separa definitivamente os
cordões testiculares do epitélio superficial. A partir da 16ª semana, os cordões
testiculares adquirem a forma de ferradura e as suas extremidades distais,
mais finas, fundem-se com os túbulos
da rete testis. Por sua vez, os túbulos
da rete testis ligam-se aos túbulos excretores do canal mesonéfrico (Fig. 2).
Os cordões testiculares permanecem
sólidos até à puberdade, altura em que
adquirem um lúmen e se transformam
em túbulos seminíferos. Uma vez canalizados, as extremidades distais for-
mam os túbulos rectos, que se abrem
na rete testis. Os túbulos excretores do
canal mesonéfrico transformam-se nos
canais eferentes e na porção cefálica
do epidídimo (Fig. 2). À medida que o
testículo desce para o escroto, a inserção do canal mesonéfrico vai também
descendo até se tornar contíguo com
a uretra prostática (Fig. 1). Do canal
mesonéfrico derivam, por isso, o canal
ejaculador, a vesícula seminal, o canal
deferente, e o corpo e cauda do epidídimo. Pelo contrário, a próstata diferencia-se da invaginação da uretra. Os
genitais externos formam-se a partir do
tubérculo, das pregas e das protusões
genitais. A fusão e o elongamento das
pregas genitais origina a uretra e o pénis, e da fusão das protusões genitais
resulta o escroto (Fig. 1).(4-10)
Depois do nascimento, os túbulos seminíferos apresentam células de
Sertoli, pro-espermatogónias e espermatogónias-A (de dois tipos: Ap, de núcleo claro e Ad, de núcleo denso). Por
volta dos quatro anos de idade, já não
se observam pro-espermatogónias,
havendo apenas espermatogónias-A,
espermatogónias-B e espermatócitos
primários. Antes da puberdade existem dois momentos em que o testículo
tenta iniciar a espermatogénese, por
volta dos 3-4 anos e dos 8-9 anos de
idade. Porém, só raramente os espermatócitos primários terminam a meiose
e originam espermatídeos redondos.
Por volta dos 13 anos, observa-se um
aumento drástico do número de espermatócitos, e a espermatogénese finalmente é completada com a meiose e
a espermiogénese (diferenciação dos
espermatídeos redondos a espermatozóides). Em simultâneo, verifica-se
um aumento do volume testicular por
proliferação das células de Sertoli e
das células germinais. O tempo que
medeia entre as espermatogónias Ap
a espermatozóide é de cerca de 6064 dias, e de espermatídeo redondo a
espermatozóide cerca de 14-21 dias.
Nesta fase da puberdade, as células de
Sertoli terminam a sua diferenciação e
deixam de se dividir. Estabelecem-se
entre elas junções ocludentes que originam a barreira hemato-testicular e
NASCER E CRESCER
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que divide o epitélio germinal em duas
regiões distintas. A região basal contém as espermatogónias-A, as espermatogónias-B e os estadios iniciais de
espermatócito primário (pré-leptóteno
e leptóteno: replicação do DNA, células
germinais diplóides, 2N4C). A região
apical contém os espermatócitos primários em meiose I (emparelhamento
dos homólogos e crossing over: zigóteno e paquíteno), espermatócitos secundários (produto da primeira divisão
meiótica: segregação dos homólogos,
células germinais diplóides, 1N2C), os
espermatídeos redondos (produto da
2ª divisão meiótica: células germinais
haplóides, 1N1C), os espermatídeos
em alongamento, os espermatídeos
alongados e os espermatozóides.(2-10)
2. Bases Genéticas da Determinação do Sexo Masculino
Em termos filogenéticos, o cromossoma X surgiu a partir da perda
de material genético oriundo dos cromossomas autossómicos. Mais tarde,
da perda de material genético do cromossoma X formou-se o cromossoma
Y. Assim sendo, a determinação da gónada masculina, em termos evolutivos
e genéticos, é uma luta contra a diferenciação natural e espontânea (constitucional) da gónada feminina. Devido
a inversões múltiplas, o cromossoma
Y foi perdendo a capacidade de se
emparelhar com o cromossoma X e,
actualmente, o emparelhamento entre
ambos praticamente só ocorre nas regiões pseudoautossómicas (PAR) dos
telómeros (extremidades) dos braços
curtos. Por este motivo, enquanto o cromossoma X se manteve relativamente
conservado devido à presença de outro
cromossoma X no sexo feminino, com
o qual emparelha, o cromossoma Y foi
variando a sua estrutura, complicandoa com múltiplos pseudogenes e cópias
de genes numa tentativa de proteger
contra as mutações os genes determinantes do sexo (SRY) e da espermatogénese (região AZF em Yq11.2).(11-14)
A determinação do sexo gonádico depende de uma cascata de activação e
interacção entre genes contidos nos
cromossomas X e nos cromossomas
autossómicos. O gene SRY actua
como agente de decisão nessa cascata. O gene SOX3 (no braço longo do
cromossoma X, Xq) tornou-se a origem
do gene SRY ao ser translocado para
o cromossoma Y, apesar da função do
SRY ter sido efectuada ainda mais ancestralmente pelo gene SOX9.(15)
Nas células precursoras da crista
genital indiferenciada (gónada embrionária bipotente) são activos os genes
NR5A1 (9q33.3: nuclear receptor subfamily type 5, group A, member 1 gene,
ou NR5A1; a proteína do NR5A1 é
denominada steroidogenic factor 1, ou
SF1; o SF1 é um receptor nuclear órfão
que se liga ao promotor dos genes das
hidroxilases esteróides), WT1 (11p13:
Wilms Tumor suppressor gene 1),
GATA4, FOG2, SOX9 (17q24.3-q25.1),
DMRT1 e DMRT2 (SRA; 9p24.3), SRA
(10q), ATRX (Xq13), SLOS (7q32,
9p24-pter, 10q25-pter), ? (1p) e FGF9
(Fig. 3). A activação destes genes induz a proliferação do epitélio celómico
mesodérmico, o destacar das células
desse epitélio, a sua invasão para o
estroma e a sua diferenciação em células pré-Sertoli. Nesse momento, as
células pré-Sertoli são ainda bipotentes, ie, também têm a capacidade de
se diferenciarem em células foliculares,
pelo que, na realidade, são células préSertoli / células pré-granulosa.(11,12,15)
Nas células pré-Sertoli, os genes
NR5A1(SF1) e WT1 (isoforma –KTS
do mRNA do WT1, derivado de splicing
alternativo do exão 9, com perda dos
aminoácidos lisina-treonina-serina, ou
KTS) activam o gene SRY, enquanto
que o gene WNT4 (1p) activa os genes
NROB1(DAX1) (DSS, AHC, X-linked,
gene 1 em Xp21.3: Dosage Sensitive
Sex reversal locus-Adrenal Hypoplasia Congenital-critical region on the X
chromosome; o nome actual do gene
é NROB1, Nuclear Receptor subfamily
O, group B, member 1) e SOX3 (Xq2627). Os genes DAX1 e SOX3 recrutam o repressor N-CoR que silencia o
NR5A1, pelo que são genes que tendem a impedir a determinação do testículo na gónada bipotente e a favorecer
a determinação em ovário (Fig. 3). Porém, o gene SRY consegue contrariar
totalmente a acção feminizante dos genes NROB1 e SOX3.(11,12)
A activação do gene SRY nas células pré-Sertoli leva à potenciação dos
genes SOX8, SOX9 (que mimetizam
o SRY), NR5A1e WT1. Nesta fase, o
gene NR5A1actua sinergicamente com
o gene WT1 e interage com os genes
SOX9, SOX8 e GATA4. Por seu lado, o
gene WT1 transcreve a isoforma +KTS
(mRNA de splicing alternativo do exão
9, com os aminoácidos KTS). Destas
acções, resulta a transformação das
células pré-Sertoli em células de Sertoli.(11,12,15)
Nas células de Sertoli, o NR5A1em
conjunto com o GATA4 e SOX8 activam a transcrição do gene AMH e
dos genes envolvidos na síntese das
hormonas esteróides (gonadotrofinas,
testosterona, aromatase/estrogénios).
Uma vez secretada pelas células de
Sertoli, a proteína AMH liga-se ao receptor de tipo II (AMHRII) presente nas
células mesenquimatosas que envolvem o canal de Muller. Esta ligação
desencadeia a expressão da metaloproteinase proMMP2. O gene WNT7,
expresso no epitélio do canal de Muller,
induz a expressão do receptor AMHRII
e da metaloproteinase MMMP14 nas
células mesenquimatosas que envolvem o canal de Muller. Por seu lado,
o epitélio do canal de Muller é mantido
pela acção do gene WNT4, expresso
nas células mesenquimatosas. Neste
esquema, a regressão do canal mesonéfrico é induzido pela AMH, uma vez
que as metaloproteinases secretadas
pelas células mesenquimatosas digerem a lâmina basal e induzem a apoptose das células epiteliais do canal de
Muller (Fig. 3).(8)
A célula de Sertoli também induz,
directa ou indirectamente por via de
factores de crescimento (GF, growth
factors), a diferenciação das células
de Leydig. Uma vez diferenciadas, as
células de Leydig sintetizam testosterona numa sequência de cinco passos enzimáticos, cujas enzimas são
controladas por genes autossómicos.
Depois de secretada, a testosterona
é convertida pela 5α-redutase-2 (gene
SRDA5A2 no cromosoma 2) a dehidro-
artigos de revisão
297
NASCER E CRESCER
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ano 2005, vol XIV, n.º 4
testosterona. Ambas as hormonas se ligam ao receptor de androgénios (gene
AR em Xq11-q12). Para além da sua
acção no desenvolvimento do testículo
e na espermatogénese, ambas as hormonas actuam sobre o canal de Wolff, originando a sua diferenciação em
duas metades distintas, reprodutora,
por acção da testosterona, e urinária,
por acção da dehidrotestosterona (Fig.
3).(11-15)
De seguida, o gene CFTR (7q32)
medeia a diferenciação da metade reprodutora do canal de Wolff nos canais
genitais excretores masculinos (canais
eferentes, epidídimos, canais deferentes, vesículas seminais, canal ejaculador). Pensa-se que o CFTR também
controla a diferenciação da metade
urinária (próstata, uretra, pénis, escroto) (Fig. 3). A diferenciação do canal
de Wolff também depende de outros
genes, como o DMPK (19q13.3) para
a metade reprodutora, e BBS (BBS1
em 11q13, BBS2 em 16q21, BBS3 em
3p12, BBS4 em 15q22.3-q23) para a
metade urinária.(8,11,16-18)
A secreção de testosterona pela
célula de Leydig é inicialmente independente das gonadotrofinas mas encontra-se na dependência da HCG.
Após o nascimento e na puberdade,
a proliferação e maturação das células de Leydig depende da LH (LHβ em
19q13.32) e do seu receptor (LHR em
2p21). Nessa fase, a proliferação e a diferenciação das células de Sertoli e das
células germinais também são controladas pelas gonadotrofinas (GnRH em
Xp22; KALX e KAL1 em Xp22.3).(11)
Existem duas etapas na migração
do testículo da cavidade abdominal
para o escroto, transabdominal e inguino-escrotal. Em ambas as etapas, o
processo parece ser comandado pelo
mesentério genital que liga as gónadas e os canais genitais excretores à
parede abdominal. Neste processo, o
ligamento genital caudal (gubernaculum) sofre uma intensa diferenciação
enquanto que o ligamento suspensório
cranial regride progressivamente. O
primeiro estadio da etapa transabdominal ocorre entre as 10-15 semanas
de gestação, ficando os testículos na
298
artigos de revisão
região inguinal. A fase inguino-escrotal termina com o nascimento. Durante
esta etapa, os testículos migram para
o escroto, ao mesmo tempo que o cordão do gubernaculum encurta, o bolbo
do gubernaculum expande e o músculo cremaster se everte. A descida testicular é controlada hormonalmente.
Neste processo, a testosterona inibe o
crescimento do ligamento suspensório
cranial (via SRDA5A2). O gene GREAT (13q12-13) controla a diferenciação
do gubernaculum e o seu produto é
um receptor ao qual se liga a relaxina,
o produto do gene ILF3. Vários outros
genes têm sido implicados nesta descida, como o BBS (11q, 16q, 3p, 15q),
NS (12q22qter), FDG1 (Xp11.21) e P57
(11p15.5).(8,11)
Finalmente, a espermatogénese
é controlada por inúmeras hormonas,
factores de crescimento e interleucinas,(19,20) bem como por inúmeros factores que controlam o ciclo celular,(21-23)
o ciclo mitocondrial e a apoptose.(24) No
entanto, é na região AZF (Yq11.2) do
cromosoma Y que se posicionam as
sequências de maior importância no
controle do epitélio germinativo. Sabese que a delecção da região AZFa provoca a ausência de células germinais
nos túbulos seminíferos (originando o
síndrome de células de Sertoli),(25) a
delecção da região AZFb provoca paragem em meiose, e as delecções da
região AZFc ou as microdelecções das
cópias 1+2 do gene DAZ, situado em
AZFc, destroiem a espermiogénese,
originando hipo-espermatogénese ou
oligozoospermia severa.(26,27)
INTERSEX. I. GENES INVOLVED IN
MALE SEX DETERMINATION
ABSTRACT
In this article we update the embryology of the male reproductive system and present the genes that control sex determination (gonadal sex)
and sex differentiation (genital sex).
In the embryonic bipotent gonad, the
NR5A1(SF1) and WT1(-KTS) genes
interact to activate the SRY gene,
whereas the interaction between the
WNT4 and WT1(-KTS) genes activate
the feminizing genes NROB1(DAX1)
and SOX3. SRY then causes the determination of the bipotent gonad into
the testicle, by inducing Sertoli cell differentiation and by inhibitting DAX1/
SOX3. Sex differentiation is thereafter a consequence of SOX8, SOX9,
NR5A1, GATA4 and WT1(+KTS) gene
interaction under SRY potentiation. In
this mechanism, Sertoli cells secrete
the anti-mullerian hormone (AMH) and
cause Leydig cell differentiation. AMH
declanches the atrophy of the Muller
ducts and therein impedes development of the female phenotype. Under
the control of corionic gonadotrofin
(HCG), Leydig cells secrete testosterone, which is then partially metabolized
into 5-dihydro-testosterone. Under the
control of the CFTR gene, testosterone
promotes the differentiation of the Wolff
ducts into a reproductive half (efferent
ducts, epididymis, vasa deferens, seminal vesicles, ejaculatory ducts), whereas 5-dihydro-testosterone induces the
differentiation of the Wolff ducts into
a urinary half (prostate, uretra, penis,
scrotum).
Key-words: Embriology, testicle,
sex determination, sexual differentiation, genetic mechanisms.
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 292-299
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CORRESPONDÊNCIA
Mário Sousa
Laboratório de Biologia Celular
Instituto de Ciências Biomédicas de
Abel Salazar
Universidade do Porto
Largo do Prof. Abel Salazar 2
4099-003 PORTO, Portugal
Tel: 222 062 217
Fax: 222 062 232
[email protected]
artigos de revisão
299
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Eritema Induratum de Bazin
a propósito de caso clínico
Telma Barbosa1, Ana Ramos2, Virgílio Senra3, Silva Caspurro4, Conceição Rosário5, Miguel Taveira6
RESUMO
Os autores apresentam um caso clínico
de uma entidade rara em idade pediátrica,
eritema induratum de Bazin, acerca da qual
ainda existe muita indefinição e controvérsia.
Trata-se de uma patologia que pertence a
um dos tipos de tuberculose cutânea e que
se caracteriza essencialmente por lesões
nodulares persistentes ou recorrentes, atingindo preferencialmente a face posterior das
pernas de indivíduos do sexo feminino, com
desaparecimento após terapêutica anti-tuberculosa.
O caso clínico refere-se a uma criança
de 7 anos com lesões cutâneas nodulares
crónicas, sem melhoria após terapêutica tópica e sistémica (antibióticos, anti-inflamatórios, corticóides). Contacto prévio com familiar com tuberculose pulmonar activa. Desaparecimento após terapêutica específica para
a tuberculose.
Palavras chave: eritema induratum de
Bazin; tuberculose cutânea; criança; paniculites
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 300-303
INTRODUÇÃO
Eritema induratum é um tipo de paniculite caracterizada por lesões nodulares persistentes ou recorrentes, não dolorosas, que por
vezes ulceram, localizadas habitualmente na
face posterior das pernas, podendo aparecer
noutras regiões, associadas a circulação eritrocianótica(1,2,3,4,5). A resolução é lenta, mesmo com terapêutica adequada e geralmente
__________
1
Interna Complementar Pediatria;
Assistente Hospitalar Graduado de Pediatria;
3
Chefe de Serviço de Pediatria;
4
Chefe de Serviço de Anatomia Patológica;
5
Chefe de Serviço de Dermatologia;
6
Assistente Hospitalar de Dermatologia.
2
300
casos clínicos
a cicatrização faz-se com atrofia central(1,6). O
mecanismo fisiopatológico provavelmente envolvido é uma reacção de hipersensibilidade
do tipo retardado(1,7). O estado imunológico do
hospedeiro pode perpetuar a doença mesmo
depois da eliminação da infecção(8). As características histológicas relacionam-se com a
duração das lesões e as alterações inflamatórias localizam-se à hipoderme e derme profunda, com paniculite lobular ou septolobular,
geralmente difusa, com várias combinações
de inflamação granulomatosa, vasculite, necrose focal e fibrose septal(3,6,7,8).
Inicialmente descrita por Bazin (1861)
como “erythème indure des scrofuleux”, eritema induratum era considerado uma tuberculide, isto é, uma erupção cutânea provocada
por reacção de hipersensibilidade secundária a tuberculose. Na ausência de evidência
clínica de tuberculose surgiu o conceito de
vasculite nodular, entidade que cursava com
alterações clínicas e histológicas semelhantes
ao eritema induratum(1,6,9).
Recentemente, 2 factores contribuíram
para ressurgimento do conceito inicial de eritema induratum: a) desenvolvimento da técnica de PCR (“polymerase chain reaction”); b)
reaparecimento de tuberculose associada ao
HIV, muitas vezes com estirpes de BK multiresistentes(10,11).
O diagnóstico da doença de Bazin e a
sua associação com a etiologia tuberculosa
baseia-se na correlação entre os aspectos
clínicos e os elementos histopatológicos das
lesões, nas provas tuberculínicas positivas,
na presença de tuberculose activa em outros
órgãos (em alguns casos) e na resposta favorável das lesões cutâneas à terapêutica antituberculosa(1,2,3).
Todas as entidades directa ou indirectamente relacionadas com a tuberculose
assumem uma maior importância num país
com uma elevada prevalência desta patologia
como é o caso de Portugal(12).
CASO CLÍNICO
J.P.T.M., 7 anos e 10 meses de idade,
sexo feminino, raça caucasiana, natural e residente na Póvoa de Varzim.
Pais jovens, não consanguíneos, sem
patologias de relevo excepto asma atópica
no pai, irmão de 11 anos de idade saudável.
Contacto esporádico com familiar (tio paterno)
com tuberculose pulmonar activa em tratamento. O agregado familiar enquadra-se em
índice de Graffar III.
GII, PII, gestação de termo, vigiada,
parto eutócico, hospitalar, Apgar 9/10, somatometria adequada à idade gestacional, período neonatal sem intercorrências. Evolução
estaturo-ponderal e desenvolvimento psicomotor adequados. Plano nacional de vacinação cumprido.
A doença actual inicia-se cerca de 4
meses antes da criança ser observada no
nosso hospital, com aparecimento de lesões
cutâneas eritemato-papulares, que aumentaram progressivamente de tamanho e de
número, localizadas na face, membros superiores, inferiores e nádegas, mais numerosas
nas pernas. Algumas das lesões ulceravam e
apresentavam exsudado purulento, com cicatrização e reactivação posteriores, não havendo prurido ou queixas álgicas. Sem melhoria
após terapêutica tópica e sistémica (antibióticos, anti-inflamatórios, corticóides). Tosse
irritativa com cerca de 15 dias de evolução,
sem outros sintomas, nomeadamente astenia,
anorexia, emagrecimento, sudorese nocturna,
febre ou adenomegalias. Referenciada à Consulta de Dermatologia e Pediatria Médica do
H.C.M. Pia.
Na observação inicial, a criança tinha um
bom estado geral, com peso e altura adequados, apirética, hemodinamicamente estável. A
nível cutâneo, existência de lesões eritemato-violáceas, com centro atrófico nas pernas;
lesões papulo-nodulares com exsudado purulento localizadas nos membros superiores
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
e inferiores, mais numerosas e de maiores
dimensões nas pernas (3x3 cm; 3.5x3.5 cm;
5x3 cm), com distribuição simétrica; lesões cicatriciais no couro cabeludo e na região nadegueira. Sem adenomegalias palpáveis e sem
alterações osteo-articulares (fig. 1).
Orofaringe com hipertrofia amigdalina,
auscultação cardio-pulmonar sem alterações,
abdómen sem organomegalias ou outras alterações, sem edemas periféricos.
Dado o contexto clínico foram realizados exames complementares de diagnóstico
para avaliação do estado geral do doente e
repercussão sistémica da patologia:
- Hemograma sem alterações; VS (1º h)
50 mm; bioquímica com TGO 138 U/L,
TGP 450 U/L, FA 343 U/L, γ-GT, glicose, ionograma e função renal normais;
urina II e urocultura não revelaram alterações;
- Estudo imunológico: TASO aumentado
(623 UI/ml); imunoglobulinas, C3, C4,
CH50, α-1 antitripsina normais; ANA
negativo;
- Serologias hepatite B e C, sífilis, HIV 1
e 2: negativas;
- Radiografia pulmonar: reforço hilar bilateral, sem outras alterações;
- Ecografia abdominal e reno-pélvica:
sem alterações;
- Prova Tuberculínica (2U RT23): positiva (17 mm de induração);
- Pesquisa de BK no suco gástrico (3
amostras): exames directo e cultural
negativos;
- Exame histológico da pele e tecido
celular subcutâneo revelou processo inflamatório de comprometimento
hipodérmico, embora estendendo-se
à derme, que evolui com formação
de granulomas de tipo tuberculóide,
lesões de vasculite com imagens de
poeira nuclear e raros focos de necrose gorda. A pesquisa de bacilos
A/A- resistentes foi negativa. Quadro
morfológico de paniculite, com aspectos que favorecem a hipótese clínica
de eritema induratum (figs. 2 a 5).
Iniciou terapêutica com Isoniazida
(5 mg/kg/dia), Rifampicina (10 mg/kg/dia),
Pirazinamida (30 mg/kg/dia) durante os dois
meses, seguida de tratamento duplo com
Isoniazida e Rifampicina durante mais 7
meses. Boa resposta clínica, com regressão
progressiva das alterações cutâneas, não
se verificando lesões activas após 15 dias
do início do tratamento anti-tuberculoso,
apresentando actualmente lesões cicatriciais (fig. 6). Efectuou-se controlo analítico
com normalização da V.S. e transaminases,
mantendo TASO aumentado.
É contactado C.D.P. no sentido de se
proceder ao rastreio de tuberculose nos res-
Fig. 1 - Nódulos eritematosos com exsudado purulento.
tantes elementos familiares, que se revelou
negativo.
DISCUSSÃO
Portugal possui das mais elevadas taxas incidência e prevalência a nível europeu
e, consequentemente, patologias raras como
o Eritema induratum de Bazin têm uma maior
probabilidade de se tornarem mais frequentes, relativamente a outros países. A tuberculose nas crianças é indicativa de transmissão
recente, traduzindo uma falência do sistema
de Saúde Pública no controlo da patologia(12).
Além da raridade e das características específicas deste caso na idade pediátrica, os
autores salientam a importância da suspeita
clínica no contexto epidemiológico do país.
A tuberculose cutânea é mais frequente
em crianças e adultos e tem uma apresentação variável, dependendo do estado imunológico do doente e da via de atingimento
cutâneo (as vias linfática e hematogénea são
as mais comuns)(1,2,6). Existem várias classificações da tuberculose cutânea mas uma das
mais simples será a indicada no quadro I.
Eritema induratum é uma patologia pouco frequente de maior incidência em algumas
áreas da Ásia e África do sul. Caracteriza-se
por lesões nodulares persistentes ou recorrentes secundárias a foco de tuberculose não
cutâneo, localizadas preferencialmente na
face posterior das pernas, podendo no entanto aparecer em outros locais(1,5,6,7,12,14). A nível
histopatológico é constituído por um processo
de paniculite septal e lobular com vasculite
neutrofílica, áreas de granulomas tuberculóides, necrose gorda e reacção de células gigantes, com necrose caseosa rara(2,3,6,11).
Clinicamente possui características comuns com outras patologias como a vasculite
nodular, poliarterite nodosa, eritema nodoso,
sarcoidose(2,4,6). O diagnóstico faz-se pela clínica, prova tuberculínica positiva, elementos
histológicos, isolamento de BK noutros órgãos,
resposta à terapêutica anti-tuberculosa(3,8,11).
Nem sempre é possível estabelecer a relação
entre eritema induratum e mycobacterium tuberculosis devido à ausência de microorganismos demonstráveis nas lesões cutâneas(3,9).
No caso descrito, a existência de lesões
nodulares crónicas, algumas com carácter
ulcerativo, com localização essencialmente
nas pernas e a ausência de resposta a várias
terapêuticas (antibióticos e corticóides sistémicos), associados a história de contacto com
casos clínicos
301
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Fig. 2 - Infiltrado inflamatório de predomínio hipodérmico,
com extensão à derme (H&E)
Fig. 3 - Granuloma de tipo tuberculóide; uma célula gigante
multinucleada (H&E)
Fig. 4 - Processo inflamatório peri-vascular, com extensão à parede
do vaso- vasculite (H&E).
Fig. 5 - Necrose gorda e infiltrado inflamatório (H&E).
Fig. 6 - Ausência de lesões activas; cicatrização com hiperpigmentação e atrofia cutânea.
302
casos clínicos
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Quadro I - Classificação da tuberculose cutânea
I Tuberculose por inoculação exógena
II Tuberculose secundária a dça endógena
A) Contiguidade
B) Auto-inoculação
Cancro tuberculoso
Tuberculose cutânea verrucosa
Lupus Vulgaris (alguns casos)
Escrofuloderma
Tuberculose orificial
III Tuberculose hematogénea
Tuberculose miliar aguda
Lupus Vulgaris (alguns casos)
Gumma
IV Tuberculides
(i) micropapular
(ii) papular
(iii) nodular
Liquen escrofuloroso
Tuberculides papulares ou papulonecróticas
Eritema induratum (Bazin)
? Vasculite nodular (alguns casos)
familiar com tuberculose pulmonar activa ajudaram a estabelecer uma suspeita clínica. A
prova tuberculínica positiva, apesar de não se
ter isolado o agente em nenhum dos órgãos,
veio reforçar a hipótese diagnóstica elaborada(2,6,9,15,16).
Diagnóstico diferencial com outras patologias, nomeadamente: vasculite nodular,
que se caracteriza por lesões não ulceradas,
prova tuberculínica negativa e com resposta à
corticoterapia; ectima, infecção cutânea provocada principalmente por stafilococus aureus e streptococus pyogenes, que atinge a
derme e que se prolonga por semanas a meses e que, entre outras características (como
existência de adenomegalias), melhora com
a administração de antibióticos β-lactâmicos;
eritema nodoso, entidade relacionada com
inúmeras patologias, nomeadamente tuberculose, além de se manifestar com dor e sinais
inflamatórios exuberantes (que não existiram
nesta criança), as lesões nodulares em geral também não ulceram e a sua distribuição
afecta preferencialmente a face anterior das
pernas e regiões maleolares; doenças autoimunes, que além de cursarem com algum
atingimento geral e das alterações serológicas, deveriam responder de alguma forma à
corticoterapia instituída(2,6,9). A resposta clínica
aos anti-tuberculosos viria a apontar definitivamente para o diagnóstico, no caso clínico
descrito.
Apesar da raridade desta patologia e
da controvérsia em relação à causa e à patogénese, existem evidências circunstanciais
suficientes para suportar a hipótese de que
a origem da doença, neste caso, esteve relacionada com mycobacterium tuberculosis(2,3).
A tuberculose continua a ser uma patologia
endémica em Portugal, não diagnosticada
atempadamente nas crianças, provavelmente
pela falta de rastreio perante um adulto infectado(12).
A CASE OF BAZIN ERITEMA INDURATUM
ABSTRAT
The authors present a case of a rare entity, Bazin’s erithema induratum, which is still
subject of controversy and discussion. This
disease is one type of cutaneous tuberculosis,
clinically with recurrent or persistent nodules
that occur mainly on the calves of young women, with lesions remission after anti-tuberculous therapy.
The case is related to a 7 years old child
with cronic indurated cutaneous lesions, without response to topical and sistemic therapy
(antibiotics, anti-inflammatory, corticosteroids).
Previous contact with familiar with active pulmonar tuberculosis. Clinical improvement after
introduction of anti-tuberculous therapy.
Key-words: Bazin’s erithema induratum; cutaneous tuberculosis; childhood; panniculitis
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 300-303
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casos clínicos
303
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Resurgence of pertussis in Europe
Celentano LP, Massari M, Paramatti D, Salmaso S, Tozzi AE.
Pediatr Infect Dis J 2005;24: 761 – 765
Background: A resurgence of pertussis has been observed in Canada,
the United States and Australia since the
1980s, but inconsistent data are currently
available for Europe. The objective of this
paper is to describe the epidemiology of
pertussis in Western European countries
to discuss future vaccination strategies.
Methods: The European Community
funded a network for the epidemiological
surveillance of measles and pertussis in
1998. Sixteen European countries provided national surveillance data for pertussis
for the period 1998 – 2002 in a standard
format. Data were pooled and analyzed
to describe incidence rates by age group,
seasonality, proportion of hospitalized patients and deaths among notified cases.
Results: Children young than 1 year
had the highest incidence during the entire period. Rates in the older than 14 years
age group increased by 115% during the
study period. Northern countries showed
the highest incidence figures in all age
groups. Among children younger than 1
year, 70% were admitted into hospital.
Children younger than 6 months of age
and those not vaccinated were most likely to be hospitalised. Thirty – two deaths
were reported, 87% of each were in children younger than 6 months age.
Conclusions: Pertussis is far from
being controlled in Europe. Whereas the
incidence in children younger than 1 year
was high but remained stable, rates in
adults doubled in 5 years.
COMENTÁRIOS
Os autores do artigo fazem parte do
projecto europeu EUVAC – NET, destinado à vigilância de doenças infecciosas
prevenidas por vacinas, sarampo e tosse
convulsa, em que Portugal está representado (Teresa Fernandes).
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artigo recomendado
Começam o artigo com dados epidemiológicos impressionantes: em todo
o Mundo há entre 20 a 40 milhões de
casos de tosse convulsa, com 200 a 400
mil mortes, sendo os casos mais graves
e com consequente maior mortalidade na
primeira infância. E este estudo confirma:
os casos mais graves registaram-se em
crianças de idade inferior a 6 meses bem
como a grande maioria (87%) dos casos
mortais.
O estudo reuniu dados epidemiológicos de 16 países, entre 1998 e 2002. O
recorde é batido pela Suiça, 123.9 casos
por 100.000 habitantes, seguido pela Noruega (57.1) e Holanda (32.7). Portugal
ocupa o último lugar: 1 caso por milhão.
Porquê tão baixa incidência? É que Portugal só comunicou os casos que tiveram confirmação laboratorial (serologia
e PCR), enquanto outros países utilizaram critérios clínicos. E mesmo utilizando
critérios clínicos, teríamos certamente
números baixos pois sabemos dos nossos maus hábitos de comunicação. Não
há razão alguma para termos menos casos que outros países da Comunidade,
pelo menos nos que têm um calendário
de vacinas igual ao nosso. Com efeito, a
maior incidência encontrada nos países
do norte, sobretudo depois dos 4 anos,
é explicada quer por uma menor cobertura populacional, quer pela ausência de
reforço nestas idades. Em todos os países, com excepção da Holanda, a maior
incidência, por grupos etários, ainda que
estabilizada ao longo dos anos, registouse nos lactentes. Mas acima dos 14 anos,
os números duplicaram. Assim, adolescentes e adultos estão a constituir um
reservatório crescente da doença, significando isto que o esquema de imunização
contra a tosse convulsa não ocasionou
uma imunidade de grupo, devido a perda
progressiva da imunidade, ao contrário
de outras doenças preveníveis por vacinação, como o sarampo.
Os dados epidemiológicos da tosse
convulsa nos Estados Unidos são algo
diferentes, assistindo-se desde 1976 a
um aumento dos casos comunicados.
Depois de 1980, os números subiram em
lactentes com menos de 7 meses, em
crianças com idade inferior a 7 anos e
sobretudo nos adolescentes e adultos.
Vejamos alguns números absolutos: antes da vacinação havia por ano cerca de
270.000 casos com 10.000 mortes; nos
anos 40 começou a vacinação e registou-se um decréscimo de 99%, havendo
um nadir de 1010 casos em 1976; em
2003 comunicaram-se 11647; de 1997
a 2000 registaram-se 8273 em adolescentes e 5745 em adultos e em 2002,
na população em geral, 9771, 3.4 por
100.000. Mas se atendermos que nos
adolescentes e adultos o quadro clínico
pode ser diferente do clássico, não indo
muito além de uma tosse crónica, os números alteram-se radicalmente. Em 13
estudos realizados nos Estados Unidos,
Alemanha, França e Coreia, citados por
Cherry, sobre tosse prolongada (>1 semana), a infecção por B. pertussis estava
presente em 13 a 30% dos casos. Estes
dados apontam para uma infecção endémica, cerca de 2% ano, independente do
carácter cíclico característico da tosse
convulsa (picos cada 2 a 5 anos), com
uma taxa de infecção entre 370 e 1500
por 100.000(1). A incidência por grupos
etários também se alterou radicalmente:
antes da vacina, 93% dos casos registavam-se em crianças abaixo de 10 anos
e no final da década de 90, 50 % acima
dos 10(2).
As razões apontadas para o ressurgimento da infecção pela B. pertussis
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
são variadas: alterações genéticas que
tornem a vacina menos eficaz, vacinas
com menor capacidade imunogénica,
resposta imunitária evanescente ao longo dos anos, para alem de mais e melhores conhecimentos sobre a doença e
possibilidade de diagnóstico(3).
Recordemos que a tosse convulsa
é uma doença altamente contagiosa. A
transmissão dá-se por via aérea (em pequenas gotículas) e por contacto directo
pessoa a pessoa. O ciclo de contágio
tem-se modificado com a introdução da
vacina. Antes, e como já vimos, a maioria
dos casos ocorria em crianças. Os adultos que já tinham tido a doença, quando
crianças, iam sofrendo reforços naturais
pelas constantes exposições e as mães
protegiam os filhos recém nascidos através da passagem placentar de anticorpos. Actualmente a vacinação protege
as crianças, mas como a imunidade se
vai atenuando, vamos encontrar uma população de adolescentes e adultos susceptíveis, aumentando assim os casos
nestas faixas etárias, assim como nos recém nascidos e pequenos lactentes que
recebem poucos anticorpos maternos e
ainda sem idade para iniciarem ou já estarem vacinados(2). Este novo ciclo explica que a mortalidade (actualmente e nos
Estados Unidos de 2.4 por milhão) atinja
particularmente os pequenos lactentes
(90% de todas as mortes) e exija novas
medidas de protecção(2).
A tosse convulsa caracteriza-se
por episódios paroxísticos de tosse não
acompanhados de febre e seguidos pelo
característico uivo inspiratório e vómito.
A doença começa com a aparência de
um simples catarro respiratório traduzido por rinorreia, congestão conjuntival e
por vezes uma discreta tosse. Esta fase,
catarral, tem a duração de uma ou duas
semanas. Segue-se a característica fase
de tosse paroxística e emetizante que
poderá durar várias semanas e depois
a fase de convalescença, em que há um
abrandamento progressivo da frequência
e gravidade dos acessos de tosse, mas
com possíveis exacerbações despertadas por outras infecções respiratórias
víricas e que pode demorar meses(4). É
uma tosse de 100 dias, como dizem os
chineses. Este quadro clássico pode não
se observar em todos os grupos etários.
Nos pequenos lactentes pode não haver
tosse, antes episódios de apneia e cianose e nas crianças vacinadas, nos adolescentes e adultos, apenas uma tosse
prolongada. Nos adolescentes, o quadro
pincela-se ainda com tosse nocturna
e diurna e exacerbada com a comida e
bebida. Este quadro de tosse prolongada
obriga à colocação de variados diagnósticos diferenciais: asma, hiperreactividade
a infecções por vírus como o parainfluenza, influenza, adenovirus, enterovirus e
syncial respiratório, refluxo gastro-esofágico, sinusite crónica, tuberculose, infecções por chlamydia e mycoplasma,
entre outros. A suspeita de infecção por
B. pertussis deve então colocar – se num
quadro de tosse de duração superior a
5–6 dias e não acompanhado de febre,
mialgia, exantema ou enantema, dor de
garganta, rouquidão, taquipneia, sarridos
e sibilos(2,6). Em caso de surto, o diagnóstico pode ser feito clinicamente quanto a
tosse dura já há duas semanas e acompanhada de um ou mais dos seguintes
sintomas: paroxismos de tosse, uivo inspiratório ou vómito pós tosse(5).
A confirmação laboratorial obtém
– se com o isolamento da bactéria, o
que é difícil, ou com a positividade da
PCR (polymerase chain reation) ou da
serologia, (provas ainda não estandardizadas), com a sequência seguinte:
nas primeiras 3 semanas cultura e PCR,
esta e serologia na 4ª e 5ª semanas e
serologia depois.
O tratamento é pobre. Recorre-se,
como sabemos, aos macrólidos e, quando não tolerados, ao cotrimoxazol. Os
objectivos são modestos: reduzir a exuberância do quadro e a infecciosidade.
O primeiro é difícil de ser conseguido e
só o poderá ser se o tratamento se iniciar
na primeira semana. O segundo pode ser
conseguido, administrando o antibiótico
nas primeiras 4 semanas. Este período
pode ser alargado até às 6 – 8 semanas
se os contactos do doente forem de alto
risco, como recém – nascidos, lactentes
ainda não imunizados, grávidas no terceiro trimestre e pessoal de saúde. A profilaxia pós contacto faz – se com os mesmos
agentes e regime e quando o contacto se
deu nas primeiras 3 semanas de doen-
ça, excepto para os contactos de alto risco, ou que podem vir a contactar outros
igualmente de risco, em que o período de
contacto pode ser alargado às 6 – 8 semanas(2,4,6).
Quanto à prevenção, o mais importante, há que considerar novas estratégias e que se podem deduzir do que temos vindo a dizer. Como a imunidade vai
diminuindo com a idade, vamos deparar
com reservatórios e doença nos adolescentes e adultos. Há assim que estender
a vacinação a estes grupos etários, bem
como a grávidas no terceiro trimestre
para protecção do recém - nascido. Entretanto, seria de iniciar a vacinação pelas 6 semanas em vez das 8 – 9 actuais.
No Canadá, Alemanha e França já se dá
um reforço na adolescência (DTPa)(2,7,8).
Recentemente foi provada a eficácia de
uma vacina acelular em adolescentes e
adultos(9).
Em resumo, a tosse convulsa está
de volta e há novas manifestações da B.
pertussis, factos que estão a merecer a
atenção de peritos(10). E em jeito de conclusão podemos dizer que:
- Não se conseguiu uma imunidade
de grupo como seria de esperar.
- Esta perda de imunidade mudou
a epidemiologia: 50% dos casos
registam-se agora acima dos 10
anos e os pequenos lactentes começam a ficar desprotegidos.
- É preciso modificar o tradicional esquema de vacinação: iniciar mais cedo e dar reforços na
adolescência e mesmo na idade
adulta para se poder erradicar a
bactéria.
- A epidemiologia da tosse convulsa é diferente da epidemiologia
pela infecção por B. pertussis.
- Esta tem vindo a tornar-se endémica em alguns países e provavelmente entre nós.
- Há necessidade de incluir a infecção por B. pertussis no diagnóstico diferencial de um quadro
de tosse prolongada no adolescente.
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 304-306
artigo recomendado
305
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
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Tojal Monteiro1
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Considerações éticas sobre a selecção de sexo
através do diagnóstico genético pré-implantação
Natália Oliva Teles1
RESUMO
O uso de novos testes genéticos,
como o diagnóstico genético pré-implantação (DGPI), para a selecção de sexo,
levanta problemas éticos que devem ser
abordados e discutidos pela sociedade
na qual eles se tornam disponíveis. Embora estes testes não levantem problemas quando são realizados por razões
médicas, o seu uso por razões “sociais”
levanta questões, nomeadamente de beneficência ou justiça social. As escolhas
actuais, feitas pela sociedade vigente,
deverão ser tomadas após apreciação
criteriosa das implicações que elas
poderão vir a ter nas gerações futuras
sem, no entanto, prejudicar o avanço
técnico-científico e os benefícios dele
decorrentes.
Palavras-chave: selecção de sexo;
diagnóstico genético pré-implantação
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 307-310
Desde as mais antigas culturas de
que há conhecimento que a Humanidade
se tem interessado pela escolha de sexo
dos nascituros. Os métodos de selecção
têm sido os mais variados, desde o coito
interrompido e as dietas com “bases mais
ou menos científicas” (frequentemente
“cientificamente falíveis”) até ao infanticídio mas, actualmente, a ciência dispõe
de métodos mais sofisticados.
Assim, a escolha de sexo pode ser
realizada antes de haver uma fertilização
ou sequer ocorrer uma gravidez, pelo
designado diagnóstico pré-fertilização(1),
__________
através da separação dos espermatozóides que contenham um cromossoma X
ou um cromossoma Y, com subsequente
selecção para inseminação artificial ou
fertilização in vitro (FIV); ou, após fertilização, por meio de diagnóstico genético
pré-implantação (DGPI), em que é feita a
selecção dos embriões a transferir(2).
O diagnóstico genético pré-implantação pode ser definido como “uma
forma bastante precoce de realizar um
“diagnóstico pré-natal” in vitro e em que,
após investigação genética, os embriões
não afectados de doença genética são
transferidos para o útero materno”(3). As
razões que, até à data, mais têm motivado os casais a optar pelo diagnóstico
pré-implantação, por ordem decrescente
de preferência, segundo os dados publicados em 2002 pela European Society
of Human Reproduction, traduzidos e
adaptados por nós, estão apresentados
no Quadro I(2).
Da análise da tabela anterior, pode
ver-se que a principal razão que motivou os casais a pedirem um DGPI foi a
combinação da existência de determinado risco genético com razões de ordem
moral, emocional ou religiosa contra o
abortamento - o DGPI foi por eles con-
siderado o único meio aceitável de virem
a ter um filho saudável. A segunda razão
foi o risco aumentado para determinada
doença genética para casais em que se
verifiquem, simultaneamente, problemas
de sub- ou infertilidade. A terceira razão
foi haver uma história pessoal anterior de
execução de diagnóstico pré-natal, cujo
resultado desfavorável resultou em interrupção de gravidez; estes casais podem,
compreensivelmente, sentir incapacidade
em contemplar nova gravidez e, se necessário, nova interrupção, a qual poderá
ser evitada por técnicas de FIV ou injecção intra citoplasmática (ICSI). A razão
invocada seguidamente foi a patologia
cromossómica relacionada com aneuploidias, como por exemplo o Síndrome
de Down. Dos 1561 DGPIs realizados,
apenas 1% representou um risco aumentado para determinada doença genética
para casais em que um dos membros
tenha feito esterilização. Finalmente, as
razões não claramente especificadas ou
diferentes das anteriores foram 191/1561
(12.2%), podendo aqui estar incluídas as
de determinação de sexo.
Do aqui exposto, podemos concluir
que o facto de não ser necessário efectuar um abortamento em caso de diagnós-
Quadro I - Razões invocadas para execução de DGPI
Risco genético e contra interrupção de gravidez
565/1561 (36.2%)
Risco genético e sub- ou infertilidade
400/1561 (25.6%)
Risco genético e interrupção de gravidez prévia
330/1561 (21.1%)
Rastreio de aneuploidias
222/1561 (14.2%)
Outros
100/1561 (6.4%)
Desconhecida
91/1561 (5.8%)
Risco genético e esterilização
16/1561 (1%)
1
Assessor, ramo de Genética; Mestre em
Bioética e Ética Médica
2
(sg. ESHRE PGD Consortium Steering Committee, 2002) .
perspectivas actuais em bioética
307
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
tico pré-natal desfavorável constitui um
factor importantíssimo na preferência por
este tipo de diagnóstico. Então, pode talvez inferir-se que é moralmente preferível
seleccionar os embriões “bons” in vitro
antes de os transferir, do que seleccionar
fetos numa altura posterior da gravidez.
Tanto numa situação como noutra, a justificação moral dessa escolha é a prevenção de doenças graves que irão provocar
sofrimento, não só aos seres que se irão
desenvolver a partir desse embrião, como
aos seus pais e restante família (princípio
da beneficência). A selecção de sexo por
razões médicas é, assim, plenamente
justificada em termos éticos embora, no
entanto, a escolha por razões não-médicas tenha vindo a ter cada vez mais
“defensores”. Por este motivo se inclui
aqui o Quadro II, traduzido e adaptado da
Comissão de Ética da American Society
of Reproductive Medicine (ASRM), que
contém os motivos não-médicos através
dos quais é possível fazer a determinação do sexo(2).
Para os centros que realizam diagnóstico pré-natal, não é novidade que a
pergunta inevitável dos casais, ao saberem que a análise está pronta e é normal,
é “E qual é o sexo do bebé?”. A partir do
momento em que são informados, através da consulta de aconselhamento genético, que vão poder saber qual o sexo
do feto através da análise a efectuar, a
curiosidade sobre o assunto aumenta e
passa a ser uma informação de importância quase vital. Seguramente, por este ou
qualquer dos motivos acima apontados,
a determinação de sexo é bastante atraente, sobretudo para os casos em que o
tratamento da infertilidade requeira FIV
e, embora a procura de DGPI não seja
ainda muito frequente, a tendência inevitável é que venha a aumentar.
Parece-nos que um dos pontos éticos fulcrais da determinação de sexo por
razões não médicas é a discriminação
social; é por demais conhecido o problema do desrespeito dos direitos humanos
na China, em que há leis muito rígidas
sobre o número de filhos de cada casal,
provocando anualmente o abandono de
milhares de recém-nascidos do sexo feminino; ou, ainda como exemplo, nos países islâmicos, particularmente os mais
308
radicais, a supremacia total e absoluta
dos elementos do sexo masculino, relegando a mulher para níveis inaceitáveis
de degradação humana.
Nas sociedades acima referidas, a
falta de planeamento e visão social a longo prazo poderão trazer-lhes problemas.
Não é a selecção de sexo que vai diminuir
a população e, nos termos matemáticos
mais simplistas possíveis, havendo poucas mulheres agora, haverá certamente
cada vez menos homens num futuro próximo, o que será uma desvantagem para
as sociedades onde impera a supremacia
masculina. Nesta linha de pensamento,
refira-se que o artigo 14 da Convenção
dos Direitos do Homem e da Biomedicina, relativo à não-selecção de sexo, diz
o seguinte(4).
“A utilização de técnicas de assistência médica à procriação não deverá ser
permitida para fins de escolha de sexo de
uma criança a nascer, salvo quando se
pretenda evitar uma doença hereditária
grave relacionada com o sexo”.
Outro ponto de discórdia é a discussão de a escolha de sexo ser um “direito”
do ser humano, como que uma extensão
do direito de escolha reprodutiva(5). Sem
voltar a mencionar a discriminação social,
os argumentos invocados são os mais
diversos, desde haver igual distribuição
de sexos numa família a, inversamente,
preferir só elementos de um sexo para
“fazerem mais companhia (?) uns aos
outros”. Com certeza haverá muitas ou-
tras razões, inclusivamente psicológicas,
para preferir elementos de um sexo ou
outro, mas é certamente recomendável
que haja limites “razoáveis” e, particularmente, bom-senso, na satisfação ou não
destas vontades(2).
No momento actual, em que não
é totalmente claro nem universalmente
aceite que a procriação seja um “direito”
humano, o “direito” à escolha de sexo parece-nos ter pouco fundamento. Se forem
respeitados todos os caprichos humanos,
corre-se o risco de, quando já for tarde
demais, o arrependimento não ser suficiente para o mal causado à sociedade,
no seu conjunto. A realidade científica é
que, ao escolher um sexo ou determinada combinação de genes, quase certamente que o resultado final não vai ser
o daquela pessoa cuja morte tanto custa
ainda a superar e, em muitos outros casos, nem sequer será uma mera imagem
do que o imaginário social quase impõe.
Pior ainda, quando se escolhem com tanto cuidado as características desejadas e
o resultado final não é o esperado, o desajuste pessoal e social poderá ser ainda
maior, podendo até ser depressivo, por
não se aceitar o que não se escolheu.
Como exemplos de aspectos negativos da selecção de sexo podemos ainda considerar o perigo potencial de tentar
controlar outras características que não
são essenciais às crianças ou à vida humana - porque, se se autorizar a escolha
de sexo, não haverá razão para não permitir a escolha de outras características,
tais como a inteligência, a cor dos olhos
Quadro II - Determinação de sexo embrionário através do diagnóstico genético
pré-implantação por razões não médicas
Doente a fazer FIV ou DGPI
Doente a fazer FIV ou DGPI
Doente a fazer FIV sem necessitar de DGPI
Doente não está a fazer FIV nem DGPI
(visto não serem medicamente necessários)
(sg. ASRM, adapt.)(2).
perspectivas actuais em bioética
Doente fica a saber qual o sexo do embrião
ao fazer DGPI, visto esta informação ser
disponibilizada indirectamente quando o DGPI é
realizado por outras razões médicas.
Doente pede que a determinação de sexo seja
também realizada ao fazer DGPI por outras
razões médicas.
Doente pede que a determinação de sexo seja
também realizada ao fazer DGPI por outras
razões médicas.
Doente pede a realização de FIV e DGPI com o
objectivo de determinação de sexo.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
ou a altura, mencionando apenas exemplos simples. O custo efectivo e real de
recursos humanos e sociais, para execução de testes baseados apenas na escolha de sexo, pagos pelo Estado ou pelos
próprios progenitores, deve ser correctamente avaliado antes que essa escolha
seja permitida, para não criar precedentes incontornáveis, pois haverá, com toda
a certeza, necessidades médicas e de
carácter urgente mais prementes e justificáveis(2). Este último argumento tornase mais difícil de refutar em países como
os da Europa ocidental mas em países
como os Estados Unidos da América, em
que os cuidados médicos são, em grande
parte, suportados pelos próprios doentes
ou utentes, não é tão fácil, pois a pressão
social e, até, de certos grupos económicos ou farmacêuticos, apresenta-se de
difícil contorno.
A escolha de sexo por razões médicas parece ser a única que colhe um
consenso mais generalizado, em nosso
entender por ser a mais sensata, visto
ser eticamente defensável a prevenção
da transmissão de doenças genéticas
tais como a hemofilia A e B, o síndrome
de Lesch-Nyan, a distrofia muscular de
Duchenne-Becker ou o síndrome de Hunter(2). E, como não há nenhum interesse
médico em desequilibrar os sexos, o potencial para que tal fenómeno venha a
ocorrer pode considerar-se desprezível.
Saliente-se ainda que há autores que vão
ainda mais longe, afirmando claramente
que a selecção de sexo por razões sociais
não deverá fazer parte das indicações de
DGPI, visto que não deve pertencer nem
ao campo da ciência, nem da medicina(5).
Devido às dificuldades expressas,
junto se anexa a lista das recomendações propostas em 1999 pela Comissão
de Ética da ASRM, adaptada e traduzida
por nós do original, escrito em inglês(2).
“1. O DGPI usado para selecção de sexo,
que permita prevenir a transmissão
de doenças genéticas graves, é eticamente aceitável. Não é condicionado
pelo sexo, comporta pequenos riscos
quanto a malefícios individuais ou sociais e representa uma utilização de
recursos médicos baseada numa melhoria da saúde humana.
2. Se se executar DGPI por razões não
médicas, em doentes que necessitem
de FIV, corre-se um certo risco de criar
um desvio na distribuição de sexo,
que poderá trazer malefícios para os
indivíduos e a sociedade, e representar um uso indevido de recursos
médicos. Embora estes riscos sejam
mais baixos quando a identificação de
sexo é uma parte inerente do DGPI,
eles aumentam quando o DGPI se basear apenas nessa escolha e quando
o DGPI for feito só para selecção de
sexo. Estes dois pontos permanecem
uma preocupação ética, pois aquela
não é feita segundo critérios médicos.
Por isso, este uso de DGPI não deve
ser encorajado.
3. A execução de FIV e de DGPI apenas
para selecção de sexo corre um risco
maior de criar desvios na distribuição
de sexo, provocar malefícios sociais
e desviar a utilização genuína de recursos médicos. Por isso, este uso de
DGPI deve ser desencorajado.
4. A precaução ética relativa à execução
de DGPI para escolha de sexo requer
o estudo das consequências da sua
prática. Este estudo deverá incluir padrões intra e inter-culturais, avaliação
das reclamações relativas ao uso dos
recursos médicos e devem ser feitos
esforços razoáveis para avaliar as
mudanças no nível da responsabilidade social e respeito pelas gerações
futuras.”
Apesar do descrito anteriormente, foram publicados pelo ESHRE PGD
Consortium Steering Committee (comité
científico formado em 1997 para recolher dados e fazer estudos a longo prazo
acerca da eficácia clínica e resultados
de DGPI, a nível mundial), em 2002, os
primeiros dados oficiais da selecção de
sexo em DGPI por “motivos sociais” obtidos em 2001: 78 ciclos de RMA e 28
batimentos cardíacos positivos(6). Houve
um diagnóstico errado, que resultou no
abortamento de um feto feminino saudável(5). Podemos daqui talvez concluir
que, neste contexto, a designação de
“sexo genético” estará a evoluir para a
de “sexo social”, encontrando-se a sua
selecção numa fase intermédia de acei-
tação pela comunidade científica e sociedade em geral. Nesta acepção mais
“social”, aspectos como padrões de
agressão, aprendizagem e orientação
espacial foram já utilizados por casais
para justificar a preferência por um ou
outro sexo, havendo filhos anteriores,
embora para primeiros filhos estes argumentos tenham sido considerados
fracos e, como tal, devam ser desencorajados(7). Parece-nos, pois, que a posição actual (e, possivelmente, utilização
futura) da selecção embrionária de acordo com preferência por um sexo a favor
de outro poderá vir a ter cada vez maior
expressão à medida que se for dando
maior relevância à autonomia parental
e, consequentemente, menor relevo à
beneficência embrionária.
ETHICAL CONSIDERATIONS ON SEX
SELECTION FOLLOWING PRE-IMPLANTATION GENETIC DIAGNOSIS
ABSTRACT
The use of new genetic tests such
as preimplantation genetic diagnosis
(PGD) for sex selection raises ethical
problems that need to be addressed
and discussed by the society in which
they become available. Although these
tests do not raise any problems when
they are indicated for medical reasons,
questions such as beneficence or social
justice are ethically relevant when they
are demanded for “social” reasons. The
current choices that are made by the
present society should be based on attentive appreciation of the implications
that they may have in future generations
without compromising the scientific and
technological advances and the consequent benefits.
Key-words: sex selection; pre-implantation genetic diagnosis
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III. Hum Reprod, 2002, 17: 233-46.
7. Robertson, JA, Extending preimplantation genetic diagnosis: medical and
non-medical uses. J Med Ethics 2003;
29:213-6.
perspectivas actuais em bioética
Correspondência
Instituto de Genética Médica Jacinto de
Magalhães
Unidade de Citogenética
Praça Pedro Nunes, 88
4099-028 PORTO, Portugal
Tel. 226 070 308
Fax: 226 070 399
[email protected]
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Caso endoscópico
Fernando Pereira1
Neste número da revista vamos
apresentar o caso clínico de uma doente
do sexo feminino de 14 anos de idade natural e residente na região do Alto Minho
que foi enviada à consulta de Gastrenterologia por quadro de anorexia intensa,
cansaço fácil, náuseas e vómitos esporádicos, dores abdominais mais frequentemente localizadas na região periumbilical
e metade direita do abdómen por vezes
desencadeadas pela ingestão alimentar,
com emagrecimento muito acentuado
e palidez da pele e mucosas. A doente
referia o início dos sintomas cerca de
3 anos antes, sendo as queixas acima
referidas por vezes acompanhadas de
períodos de febre (38ºc) e alterações do
trânsito intestinal, com fezes diarreicas
de coloração escura alternando com dejecções normais e instalação de quadro
de amenorreia.
Nos seus antecedentes pessoais
ou familiares não há dados relevantes a
referir.
O diagnóstico inicial da sua doença
foi anorexia nervosa para a qual foi alvo
de tratamento pedopsiquiátrico sem sucesso durante cerca de três anos.
A doente apresentava-se com ar
triste, emagrecida, com palidez da pele
e mucosas, apirética, com peso de 40Kg
(>percentil 3) e altura 1,59m(percentil
25-50), com sinais vitais normais, com
auscultação pulmonar e cardíaca normais, abdómen emagrecido sem deformidades e doloroso à palpação do epigastro, flanco e fossa ilíaca direita, sem
tumefações palpáveis e sem organomegalias. Não apresentava adenopatias
em qualquer das cadeias ganglionares.
Os membros não apresentavam alterações da pele ou das articulações e as
massas musculares estavam pouco desenvolvidas.
No estudo analítico efectuado salientava-se uma anemia hipocrómica e
microcítica (Hg 8,6gr) com ferro baixo
1,3umol/ml e ferritina de 56g/l, plaquetas
586000, leucócitos 10700 com fórmula
leucocittária normal; a velocidade de sedimentação era de 55mm na 1ªhora e
96mm na segunda e a proteina C reactiva 15,57mg/dl e o orosomucoide 271mg/
dl. Proteinas totais 56gr/l com 22gr/l de
albumina, ligeira elevação da alfa-2 globulina e gamaglobulina normal. A função
hepática e a renal estavam normais bem
como cálcio, fósforo, CPK, LDH, colesterol, triglicerídeos, função tiroideia e urina
tipo II. Apresentava pesquisa de sangue
oculto nas fezes positiva numa de três
amostras.
O estudo radiológico do tórax era
normal e a prova da tuberculina negativa.
A doente realizou em seguida endoscopia digestiva alta e baixa, tendo
sido observada ao nível do colon transverso a imagem que mostramos (figura 1)
local onde se fizeram múltiplas biópsias.
A endoscopia alta revelou a presença de
gastrite crónica do corpo e antro e com
algumas erosões superficiais que foram
biopsiadas.
Tendo em conta o quadro clínico,
laboratorial e endoscópico apresentado
qual dos seguintes lhe parece o diagnóstico mais adequado:
1 – Doença celíaca de apresentação
atípica.
2 – Neoplasia do colon transverso ulcerada.
3 – Doença inflamatória intestinal
4 – Colite pseudomembranosa
Figura 1
__________
1
Serviço de Gastroenterologia do Hospital
de Crianças Maria Pia
qual o seu diagnóstico
311
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
COMENTÁRIOS
A situação que descrevemos pode
sintetizar-se dizendo que se trata de
uma adolescente com quadro de anorexia intensa, emagrecimento acentuado,
cansaço fácil, dores abdominais, vómitos esporádicos e com amenorreia, que
apresentava anemia hipocrómica e microcítica com ferro baixo, elevação dos
índices de actividade inflamatória (VSG,
PCR e orosomucoide) com trombocitose e sangue oculto positivo nas fezes,
com radiografia de torax normal. Este
conjunto obriga-nos à exclusão de uma
Doença Inflamatória Intestinal pelo que
se impunha a realização dos exames
endoscópicos que lhe foram efectuados.
A imagem do colon que mostramos evidencia marcada inflamação da mucosa
intestinal com congestão, edema, ulceração e estenose, que não permitiu a
progressão do endoscópio até ao cego;
estes aspectos são compatíveis com
o diagnóstico de Doença de Crohn do
colon. As biópsias efectuadas confirmaram o intenso processo inflamatório da
mucosa intestinal mas não mostraram a
presença de granulomas. Era indispensável nesta situação saber como se en-
Figura 2
312
qual o seu diagnóstico
contrava o intestino delgado pelo que a
doente efectuou de seguida o seu estudo radiológico por trânsito baritado que
permitiu obter a imagem que mostramos
(figura 2). É evidente a acentuada irregularidade do íleum terminal e do cólon
direito e parte do transverso, que apresenta marcada diminuição do calibre do
órgão. Estes aspectos são também muito sugestivos de Doença de Crohn com
longa evolução.
Em relação às outras hipóteses de
diagnóstico apresentadas podemos dizer
que o quadro clínico poderia ser de uma
doença celíaca atípica mas os achados
endoscópicos ao nível do cólon não existem nessa entidade, a neoplasia é uma
situação extremamente rara neste grupo
etário que poderia apresentar-se com
quadro clínico e laboratorial semelhante,
mas que a radiologia torna pouco provável pelas suas características e por atingir simultaneamente o cólon e o intestino
delgado e que as biópsias afastam. A colite pseudomembranosa tem uma história
clínica, aspecto endoscópico e evolução
muito diferentes.
Concluímos tratar-se de Doença de
Crohn em fase avançada de evolução
que se apresentou sob a forma de acentuada anorexia pelo que foi interpretada
e tratada como anorexia nervosa. A este
propósito é importante reter que embora
pouco frequente, está descrita a apresentação da doença inflamatória intestinal sob a forma de anorexia nervosa pelo
que perante este diagnóstico e sempre
que ele se acompanhe de alterações digestivas, ainda que pouco acentuadas e
de sinais laboratoriais de anemia e actividade inflamatória não especifica, deverá
proceder-se ao estudo do tubo digestivo
para exclusão de Doença Inflamatória Intestinal.
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 311-312
BIBLIOGRAFIA
1. Gryboski JD, Katz J, Sangree MH,
Herskovec T.” Eleven Adolescent girls
with severe anorexia.”Clin.Pediatr.
7:684-689, 1968
2. Qian Yuan and Harland S Winter, “Crohn Disease”. Textebook of Pediatric
Gastroenteroloy and Nutrition, Taylor
and Francis 2004, capt 23 pag 353.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Caso Estomatológico
José M. S. Amorim1
Criança de 13 anos de idade, portadora de sindroma de Down, que foi enviada à consulta de Estomatologia devido a
mobilidade dentária difusa, com sangramento gengival fácil e recusa em fazer
higiene oral.
Ao exame objectivo a criança apresenta bom desenvolvimento estato-pon-
deral, com os traços físicos típicos da
sindroma.
A nível dentário apresenta mobilidade dentária difusa e marcada, retracção gengival grave, hemorragia fácil,
mordida aberta anterior (fig. 1). Ausência de cárie dentária. Oclusão em classe
III de Angle.
Antecedentes pessoais e familiares
irrelevantes.
Face ao descrito:
Qual o seu diagnóstico?
Qual a sua atitude?
Figura 1
__________
1
Serviço de Estomatologia do Hospital de
Crianças Maria Pia
qual o seu diagnóstico
313
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
No breve caso clínico atrás exposto
temos várias das alterações que podem
surgir em portadores do sindroma de
Down.
As lesões referidas enquadram-se
num quadro de periodontite grave (mobilidade dentária, retracção gengival
marcada, hemorragia fácil, exuberante
depósito de placa dentária), bem como
mordida aberta anterior por interposição
lingual.
A mordida aberta é provocada por
interposição lingual, por verdadeira macroglossia.
A mobilidade dentária tem basicamente 3 causas:
- à doença periodontal, por maior
susceptibilidade a infecções;
- ao facto de os dentes terem raízes
curtas;
- à placa dentária exuberante.
Também encontramos nestes pacientes os lábios finos, evertidos e secos.
314
qual o seu diagnóstico
A língua para além de volumosa apresenta-se protusiva e fissurada, que leva a
dores intensas por acumulação de restos
alimentares no fundo das fendas. Apresentam atraso na erupção dentária e os dentes apresentam defeitos hipoplásicos do
esmalte a par de raízes curtas, oligodontia
(ausência de vários dentes) e lesões dentárias de bruxismo. Raramente têm cáries.
A nível ósseo apresentam um falso
prognatismo da mandíbula, uma vez que
o que está mal a nível da relação maxilo-mandibular é a marcada hipoplasia do
maxilar.
A intervenção do profissional de
saúde oral deve incidir na sensibilização
precoce dos pais para uma dieta rigorosa
e uma eficaz higienização oral afim de se
evitarem perdas de peças dentárias, uma
vez que estas crianças raramente toleram (devido à macroglossia, à fraca tonicidade muscular e a pouca colaboração)
as próteses dentárias que se podem usar
para realizar a reabilitação oral.
Os portadores desta patologia perdem precocemente muitas peças dentárias devido aos condicionamentos dentários congénitos e à má higiene oral.
As manipulações dentárias devem
ter em conta que estas crianças, geralmente, são também portadoras de cardiopatias, com indicação para realização de
profilaxia da endocardite bacteriana, bem
como instabilidade da articulação do atlas
com o crânio (cuidado com as acções realizadas com imobilização forçada do doente ou durante as anestesias gerais).
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 313-314
BIBLIOGRAFIA
Cawson´s Essentials of Oral Pathology
and Oral Medicine – R.A. Cawson
– seventh edition – Churchill Livingstone, 2002 - Pag.363-365
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Genes, Crianças e Pediatras
Gabriela Soares1, João Silva1, Miguel Rocha1, Cristina Dias1, Jorge Pinto-Basto1,
Márcia Martins1, Ana Fortuna1, Esmeralda Martins2, Margarida Reis Lima1
CASO CLÍNICO
CSDM, sexo feminino.
Enviada ao IGM aos 6 anos, por
atraso de desenvolvimento psicomotor.
Primeira e única filha de casal não
consanguíneo, história familiar irrelevante.
Antecedentes pessoais: gestação
sem intercorrências excepto ACIU detectado no 3º trimestre.
Parto eutócico às 39 semanas, IA:
8/10. Somatometria ao nascimento: peso:
2680 g; comprimento: 46 cm; perímetro
cefálico: 33 cm.
Período neonatal: icterícia com necessidade de fototerapia durante dois
dias e dificuldades de alimentação.
Desenvolvimento psicomotor: sentar só: 1 ano; andar apoiada: 2 anos; pri-
meiras palavras: 15 meses; QI global aos
6 anos: 50.
Antecedentes patológicos: GEA
aos 10 meses com necessidade de internamento; adenoidectomia e amigdalectomia aos 2 anos e meio; alterações
do comportamento com agressividade e
agitação.
Exame objectivo na primeira consulta: peso: p25; estatura: p5; perímetro cefálico: p5. Agitação psicomotora, hipotonia, linguagem escassa sem construção
de frases.
Face triangular com fronte alta;
proptose ligeira, fendas palpebrais com
inclinação para baixo e para fora; nariz
de base larga e achatada, ponta pequena
e narinas antevertidas; boca com cantos
Figura 1 - Fronte quadrada, base do nariz achatada,
narinas antevertidas, cantos da boca virados para baixo,
microretrognatia.
virados para baixo, úvula hipoplásica; microretrognatia.
Clinodactilia dos dedos das mãos;
hipoplasia dos polegares, sindactilia
cutânea do 2º e 3º dedos dos pés.
Hipoplasia grandes lábios.
Em resumo: trata-se de uma criança do sexo feminino, com 6 anos de idade
que apresenta atraso de desenvolvimento psicomotor e alterações do comportamento com estatura e perímetro cefálico
no limite inferior do normal, dismorfia facial e dos membros.
Qual é o seu diagnóstico?
Figura 2 - Clinodactilia, hipoplasia dos polegares
__________
1
2
Instituto de Genética Médica
Hospital de Crianças Maria Pia
qual o seu diagnóstico
315
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
SÍNDROME DE SMITH-LEMLI-OPITZ
A investigação realizada nesta
criança incluiu: cariótipo com pesquisa
de quebras induzidas com DEB: 46,XX,
sem quebras; estudo metabólico (aminoácidos, ácidos orgânicos, lactato, piruvato, amónia): normal; colesterol total: 2,9
mmol/l (N: 4,6-6,0); hemograma e restante bioquímica: normais; pesquisa de
7-dehidrocolesterol no soro: positiva.
O estudo molecular gene DHCR7
mostrou uma mutação (T93M) aparentemente em homozigotia; aguarda estudo
dos progenitores.
DISCUSSÃO
O Síndrome de Smith-Lemli-Opitz
(SLOS; MIM: 270400) é um síndrome
polimalformativo de hereditariedade autossómica recessiva com prevalência estimada de cerca de 1/22 000.
Apresenta como principais características clínicas a microcefalia, dismorfia
facial, anomalias genitais, cardíacas e
dos membros, atraso de desenvolvimento estaturo-ponderal e psicomotor com
alterações do comportamento.
Classicamente descreviam-se dois
tipos, I e II, sendo o tipo II uma forma grave com letalidade precoce.
A partir de 1993 foi relatada a existência de uma alteração no metabolismo
do colesterol nos doentes com SLOS, levando a uma baixa concentração sérica de
colesterol total no plasma e a uma concen-
316
qual o seu diagnóstico
tração elevada de um precursor, 7-dehidrocolesterol. Esta alteração deve-se a
uma deficiência enzimática, pelo que este
síndrome passou a ser classificado como
uma doença hereditária do metabolismo.
A ocorrência de colesterol sérico
baixo em casos clinicamente suspeitos
aponta fortemente para este diagnóstico
mas há outras doenças que cursam com
colesterol baixo (beta-sitosterolemia, síndrome CHILD, desmosterolosis, acidúria
mevalónica e condrodisplasia punctata
ligada ao X). Em cerca de 10% dos doentes ele pode ter concentração normal,
o que não exclui o diagnóstico.
A presença do precursor 7-dehidrocolesterol em concentrações elevadas no
plasma destes doentes tem sido utilizada
com sucesso como teste de confirmação
de diagnóstico nos doentes com manifestações clínicas de SLOS. A enzima deficitária, 7-dehidrocolesterol-redutase, é codificada pelo gene DHCR7, localizado em
11q12-13, onde têm sido descritas várias
mutações causadoras deste síndrome.
O tratamento com suplementos de
colesterol permite nalguns casos uma
melhoria das alterações do comportamento, devendo haver uma referenciação a uma consulta de doenças metabólicas. A abordagem destes casos deverá
ser necessariamente multidisciplinar e
antecipatória.
O risco de recorrência é de 25%,
sendo possível realizar um diagnóstico
pré-natal seguro através do doseamento
do 7-dehidrocolesterol no líquido amniótico, ou alternativamente através da pesquisa de mutações no DNA fetal nos casos em que a família esteja caracterizada
previamente do ponto de vista molecular.
A detecção de anomalias ecográficas
características deste síndrome (SNC,
genitais, cardíacas e dos membros) permite nalguns casos realizar o diagnóstico
pré-natal mesmo na ausência de história
familiar. A detecção de níveis baixos de
estriol não conjugado parece estar relacionado com a presença de um feto afectado de SLOS, podendo tornar-se um
teste de rastreio eficaz em gestações de
baixo risco.
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 315-316
BIBLIOGRAFIA
V. Cormier-Daire et al. Abnormal cholesterol biosynthesis in the Smith-LemliOpitz and the lethal acrodysgenital
syndromes. Eur J Pediatr 1996; 155:
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Mira Irons et al. Treatment of Smith–Lemli–Opitz Syndrome: Results of a
Multicenter Trial. Am J Med Genet
1997; 68:311–314.
H Yu, SB Patel. Recent insights into the
Smith–Lemli–Opitz syndrome. Clin
Genet 2005; 68: 383–391.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Imagens
Filipe Macedo1
Adulto jovem do sexo feminino, enviado ao S.U. do Hospital da área, com
informação do Centro de Saúde de cólica
renal. Sem hematúria, Nega gravidez.
Figura 1 - Rx da coluna lombo-sagrada, face
No S.U. perante lombalgia que não cede à medicação, são pedidas radiografias.
Figura 2 - Rx da coluna lombo-sagrada, perfil
__________
1
Especialista em Radiodiagnóstico – SMIC
Porto
qual o seu diagnóstico
317
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
DIAGNÓSTICO
Gravidez de termo em trabalho de
parto, ocultada pela examinada. Nas radiografias observa-se o esqueleto fetal,
em apresentação cefálica.
NOTAS SOBRE RADIAÇÃO IONIZANTE
NO EMBRIÃO, NO FETO E NA CRIANÇA
A radiação ionizante causa ionização das moléculas de água das células,
levando à produção de radicais livres
muito reactivos, que condicionam perturbações no comportamento, organização
e comunicação entre as células.
A expressão da radiação ionizante
pode fazer-se de duas formas principais:
- dose absorvida: grandeza que
mede a dose de radiação depositada nos tecidos e cuja unidade é
o Gray (Gy)
- dose equivalente: grandeza que
estima o efeito biológico da radiação e cuja unidade é o Sievert
(Sv)
O efeito da radiação depende da
dose de radiação e do tipo de radiação.
Abordaremos essencialmente os
efeitos da radiação X.
1- Na gestação
O potencial teratogénico da radiação X depende da fase de desenvolvimento em que se encontra a gestação
bem como da quantidade de radiação.
Nas primeiras duas semanas (fase
de pré-diferenciação) o efeito é letal.
Da terceira à oitava semanas (organogénese) ocorrem manifestações congénitas que podem ser embriotóxicas,
teratogénicas e mesmo letais. No caso
de alguns órgãos estes efeitos podem
estender-se até às dez semanas.
Depois das oito semanas (período fetal), geralmente não há alterações
anatómicas muito marcadas, mas doses
318
qual o seu diagnóstico
elevadas podem condicionar atraso de
crescimento e atraso mental. Há ainda
a considerar o risco de indução de certos tumores sobretudo no período fetal
tardio.
A exposição a doses de menos de
0,1Gy não parece aumentar a taxa de
malformações congénitas(1), mas o risco
carcinogénico parece ocorrer com um limiar mais baixo(2).
2 - Na criança
Há a considerar essencialmente o
risco de indução de tumores (sólidos e
leucemias). A doutrina divide-se entre os
que defendem que não há limiar de radiação para o risco carcinogénico e aqueles
que defendem que só acima de um determinado patamar de radiação é que esse
risco se torna significativo.
Para além das precauções gerais
necessárias no adulto, a criança tem
duas particularidades a ter em conta. É
mais radiossensível que o adulto(3) o que
decorre nomeadamente das diferenças
na distribuição dos tecidos – por exemplo, os membros têm essencialmente medula vermelha, enquanto que no adulto a
medula castanha predomina. A tiróide e
a mama pediátrica são também mais radiossensíveis(4). Por outro lado a criança
tem maior esperança de vida tendo por
isso, à partida, mais tempo para que as
consequências tardias da radiação se
manifestem. Por conseguinte, a mesma
dose efectiva na criança tem maior efeito
biológico e maior risco de neoplasia que
no adulto(5).
As reflexões relativamente à utilização de radiação ionizante na criança,
enquadram-se no conceito ALARA, sigla
que significa “as low as reasonably achievable” - a radiação aplicada deve ser tão
baixa quanto possível para obtenção do
resultado pretendido.
A optimização dos procedimentos
que envolvem radiação ionizante implica
que se executem apenas os que forem
medicamente necessários (indicação
correcta) e que esses sejam realizados com o mínimo de radiação possível
(parâmetros de exposição adequados e
radioproteção eficaz). Esse objectivo requer o envolvimento e colaboração dos
clínicos tanto quanto o dos técnicos de
diagnóstico.
Nascer e Crescer 2005; 14(4): 317-318
BIBLIOGRAFIA
1. Brent R.L. Utilization of Development
Basic Science Principles in the Evaluation of Reproductive Risks from Preand Pos-conception Environmental
Exposure. Teratology 1999; 59:182204
2. Arnon J, Meirow D , Lewis-Roness
H, Ornoy A. Genetic and Teratogenic Effects of Cancer Treatments on
Gametas and Embryos. Human Reproductive Update 2001 vol 7; 4: 394403
3. International Commission on Radiological Protection. Risks associated
with ionizing radiation. Annals of The
International Commission on Radiological Protection 1991; 22:9-102
4. Brenner DJ, Elliston CD, Hall EJ, Berdon WE. Estimated risks of radiation
induced fatal cancer from paediatric
CT 2001. AJR Am J Roentegol 2001;
176:289-296
5. International Commission on Radiological Protection – 1990 recommendation on radiological protection. ICRP
publication 60 1990 Pergamon Press.
Oxford
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
A negativa...
M. Guilhermina Reis
É o primeiro dia das férias de Natal e a minha filha faz onze anos. Para a festa de
aniversário convidou colegas e amigos, alguns que a acompanharam desde o primeiro
ano de escola. Mudou há menos de dois meses de escola e mantém-se “fiel” á sua
turma anterior.
Já são sete horas, a noite está agradável (não chove), e decidimos ir a pé acompanhar o Rui até casa. Aos outros colegas, vieram-nos buscar os pais. É um menino
de onze anos, com ar tímido e pouco conversador, a frequentar o 6º ano. É educado e
vai-me respondendo quando o interpelo.
– Então Rui, a escola está a correr bem?
– Está.
– E as notas, vão ser boas?
– Não sei, mais ou menos.
– Mais p’ra mais ou mais p’ra menos? É tudo 3 e 4?
– Não sei. Se calhar tenho nega a EVT!
– A EVT, porquê? Não gostas ou não tens jeito?
– É o trabalho.
– Foi chato? Não gostaste do tema?
– O professor mandou-nos fazer um anjo. Mas era uma construção...
– Um modelo tridimensional?
– Sim, isso... e tinha-se que fazer a cabeça com uma bola de ténis!....
– Não gostaste do trabalho?
– Não.
O diálogo demorou quase todo o caminho, entrecortado com perguntas e respostas a propósito do que se ia encontrando pelo caminho, de quem estava à espera do Rui
em casa,...parecia, de facto, que o Rui quereria esquecer o trabalho. A sua voz denotava
um caracter desprezível do projecto de EVT.
O Rui deixou de ter mãe em casa aos cinco anos, quando ela desistiu de viver,
junto a ele. A sua mãe estará concerteza no céu, tal como a mãe do Menino Jesus.
O Rui e dois irmãos ficaram com o pai e uma família cheia de tios e primos. É uma
criança bem adaptada na vida social e escolar. Concerteza, os professores não esperam
que tenha necessidades especiais. Talvez tenha, porém, emoções especiais em algumas épocas do ano.
O nosso “Anjo da guarda” não pode ser materializado. Não se ultraja a divindade
de um Anjo, comparando a sua cabeça a uma bola de ténis.
pequenas histórias
319
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Carta a um Compatriota
J. Arêlo Manso
Meu Caro Compatriota
que andas entristecido
com a tua vivência
às vezes, muito aborrecido
liberta-te da tua sonolência
pois, se continuas adormecido
depressa chegará a insolvência
e o País dos Avós recebido
podes vê-lo sem independência
por um dia ter desaparecido
Para a grande Europa
pelas nossas fronteiras
já passaram inovações
Seda, pó das pimenteiras
Hoje passam ou ficam cá
Muitas outras poeiras
Precisamos dela os milhões
Mas, se muito rapidamente
não aprendermos as lições
então, sério risco corremos
de mais e graves desilusões.
Aquele que se agastou
Porque dele se afastou
a ambicionada reforma
que miragem se tornou
demonstrai a Vossos Filhos
quem a Pátria paralisou
e quase a delapidou
que vossa não foi a culpa
antes de quem governou
do País, bem não cuidou.
A iminência do afogamento
Trás ao quase naufrago
Fôlego e empenhamento
Se, pela vida tiver encantamento
320
Assim, se quisermos que a Nação
Não seja uma futura efabulação
O eminente desmoronamento
Já não permite mais alheamento
Ou irresponsavel acomodação
Só com todos a trabalhar
se pode com gosto sorrir
depois aprender a partilhar
sabe bem melhor o fruir
Se quem tiver que exercer
poder, bem o souber fazer
poderá renascer a felicidade
e uma salutar solidariedade
de novo ao mundo irá trazer
Quem seja acomodado
pela sua inacção
ou falta de motivação
e se fizer desleixado
pode ver-se acabado
na mais dura inanição
O vaqueiro das pastagens
vai aprendendo a cuidar
armazena as forragens
evita os desperdícios
a manada sabe resguardar
dos perigos e precipícios
Só o peixe vê no isco
Uma atracção sem risco
Através da linha ou rede
Acaba por virar petisco
Hoje, com armas obsoletas
Sem barões nem brasões
Abundam as más razões
Para continuarmos pobres
mas muito pedinchões
para alguns só restam
caminhos de emigrações
Usamos muito os pulmões
Para enfáticas vocalizações
Desviamos as boas ideias
Que exijam penosas acções
a criança, a família e a comunidade
Mas se todos com empenho diário
formos capazes de mais produzir
na vez do fácil, que é pedir
um brilho novo poderia reluzir
eliminando rugas à nossa gente
tornando tudo mais sorridente
Não seria mais necessário
continuar a realizar
tão frequentes plenários
apenas para se culpabilizar
entre tantos malandros
apenas os reaccionários
Abril, águas mil
diz o nosso povão
que num recente abrilão
colectivamente despertou
com esperança na revolução
O Mundo muito que já pulou
O País em tudo não avançou
Nalgumas, para atrás mal ficou
Portugal, estado de direito
qual floresta legislativa
serpenteada por lasciva
corrente de rio, cujo leito
recortado por vale tortuoso
quase sempre estreito
vai levando uns ao deleite
a poucos aponta o despeito
pela vergonhosa, repetida
e pública falta de respeito
pela nossa ordem colectiva
na rua ou praça exibida
mesmo que seja repetitiva
Meu sincero voto, compatriota
é de que o novo timoneiro
que ao Palácio de Belém
chegar, com o voto de Janeiro
Promova sábia renovação
em nome da recuperação
não só económica e cultural
mas também educacional
que ponha Portugal, primeiro
com mérito em lugar cimeiro
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Índice de Autores
Afanas M S235
Aguiar AP S206
Aguillar A S237, S238
Aires Pereira S S243
Alegria A 114
Alexandrino AM 31
Almeida Santos M 53
Álvares S 7, 53, 71, 159, S240, 275
Alves L 53
Amorim JMS 47, 128,178,313
Amorim R 53
Anjos R S222
Antunes H S235
Azevedo M 164
Bandeira A 286
Barbosa T S237, S238, 300
Barbot C 15,26
Barbot J S206, S240
Barca M S238
Bardají C 9
Barros A 292
Barroso Pinto C 38
Batista-Foguet JM S199
Borges AC 73, S237, S238
Borges E 123
Braga Tavares H S243
Bragança G 89
Brandão G 59, 141
Cândido C S236
Cardoso ML 15,26, S234
Carrapato MR 80
Carrilho I 132
Carvalho C S206
Carvalho F S240
Carvalho F S247
Carvalho S 240
Caspurro S 300
Caturra L 23
Chorão R S234, S236
Coelho R 89
Correia C S237
Correia Z S246
Costa E 73 S237, S238
Costa M 73
Costa T S236, S240, S243
Cunha O S233
Dias C 51, 132, 182, 315
Dias F S234, S236
Duarte C S240
Duarte JA S227
Encarnação A 53
Enes C 161
Fernandes S S235
Ferreira AM S244
Ferreira de Sousa J 161
Ferreira H S187, S239
Ferreira M 102
Ferreira N S234
Figueiredo A 172
Figueiredo C S235
Figueiredo M S233, S240, S242
Figueiredo R 84
Fonseca F 80
Fonseca MJ 23
Fonseca P S233, S242, S245
Fortuna AM 51, 132, 182, 315
Freitas S 80
Gabriel JP S234
Garcia M 161
Garrido A S233
Cálix MJ S233
Gaspar EJ S245
Gaspar M 23
Gaspar Matos M S199
Gomes L 286
Gonçalves J S208
Gonçalves M S233
Gonçalves S 132
Graça T 84
Guedes A 114
Guedes M 248, 286
Guedes R S233
Guerra I S239, S241
Guimarães A S234
Guimarães MJ S246
Hermida L S240
Hernández T 80, S242
Jardim H 134
Lima C. S 114
Lima R S241
Lira S 247
Lisboa L S236
Lopes I 53, S244
Loureiro M S240
Macedo F 49, 130,180, 317
Machado S 102
Maciel I S246
Madureira N S242
Maia I S239, S246
Manso JA 139, 251, 320
Marques L 110, S239, S247
Marques M S206
Martinho I S246
Martins E 15, 26, 315
Martins M 51, 114, 132, S235, 315
Martins T 51
Martins V S234, S236, S245
Mesquita S 31, 110
Miranda Veiga F 38
Moleiro P S242
Monteiro C S243
Monteiro T 35, 92, 119,169,304
Morais L 53,110
Moreia R S193
Moreno A 57, 249
Mota C S236, S239, S240, S243
Neves G S234
Neves J S206
Nogueira C 277
Nogueira PC S247
Nogueira VM S247
Norton L S244, S246
Nunes S S235
Oliva T S246, 307
Oliveira A 53
Oliveira T S185
Pereira A S235
Pereira E S236, S240, S243
Pereira F 45, 126, 161, 176,311
Pereira L S234
Pereira L S245
Pessoa B S238
Pilar C 161
Pinto AC S244
Pinto Basto J 51, 132, 182, S235, 315
Pinto Coelho P S238
Pinto F 55, S237, S238, S239
Pinto ML 73
Proença E 31, 114
Quaresma M S234
Ramada J S246
Ramos A 110, S241, 300
Rebelo Gomes E 96, S244
Reis G 286, 319
Reis Lima M 51, 132, 182, S235, 315
Rios J S246
Rocha H S241
Rocha M 51, 132,182, S235, 315
Rocha P S240
Rodrigues AC S193
Rodrigues C S218
Rodrigues L S233
Rodrigues S S236, S238
Rosário C 300
Ruivo I 164
Sá R 292
Sales Marques J S244
Sameiro Faria M S236, S239, S240,
S243
Sampaio V S237
Santos G 114
Santos H S243
Santos M 277
Santos MC S220
Santos P 114
Santos R S242
Sarmento A 15, 26, S240
Seabra J 53
Selores M 102
Senra V 110, 300
Silva H S235
Silva J 315
Silva MJ 164
Silva MR S234, 315
Simões D S221
Soares G 51, 132, 182, 315
Sousa M 292
Sousa S S234
Tavares L S235
Taveira M 300
Teixeira A S222
Teixeira F 26
Teixeira MC 164
Teles A 84
Teles A S233, S246
Tomé S S240, S242, S245
Vale I S246
Vale L S206
Veiga E 23
Vieira C S247, 286
Vila Real M S244
Vilarinho L 277
índice de autores
321
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Indice de Assuntos
Vol. 14
Abcesso Mediastínico
- Abcesso retrofaríngeo com extensão
mediastínica: caso clínico. 110
Abcesso Retrofaríngeo
- Abcesso retrofaríngeo com extensão
mediastínica: caso clínico
Acidúria Glutárica
- Vómitos Cíclicos / Acidúria Glutárica
tipo II – caso clínico. 26
Adenopatias
- Adenopatias recorrentes por EBV: À
Espera de um Linfoma. S240
- Quando as Adenomegalias Cervicais
não são o que parecem. S247
Adenovirus
- Infecções por Adenovírus. S241
Adolescentes
- Adolescentes em Vila Nova de Famalicão, a confirmação de uma realidade.
S242
- Adolescentes no Hospital de Santo André – Leiria: Que Necessidades de Saúde? S242
- Consulta de Adolescentes: É preciso
ver tudo. S245
- Desvios do comportamento. S193
- Espaço Jovem. S185
- Fisiologia do Pesadelo. S247
- O Quotidiano dos Adolescentes Portugueses e Satisfação com a Vida: risco e
protecção. S199
- O Risco de ser Adolescente. S233
- Os Adolescentes na Consulta de Desenvolvimento do Centro Hospitalar no
Alto Minho. S237
- Perturbações do Comportamento Alimentar. S187
- Surpresas ou Nem Tanto! Análise Retrospectiva de 2 Anos da Consulta de
Adolescentes do Hospital S. João de
Deus de V.N.Famalicão S233
- Transplante Renal na Adolescência
– experiência do Hospital Maria Pia.
S243
Alergias
- Alergia a Fármacos. 6
- As Crianças, os Cães e os Gatos.
S244
- Bactérias e Aumento da Prevalência
das Doenças Atópicas e Auto-imunes.
92
Alterações de Comportamento
- Antibiomania: a propósito de um caso
clínico. S246
- Desvios de Comportamento. S193
- Perturbações do Comportamento Alimentar. S187
322
índice de assuntos
Apraxia Óculo motora
- Ataxia – telangiectasia – Caso Clínico.
23
Ataxia Telangiectasia
- Ataxia – telangiectasia – Caso Clínico.
23
Atrofia Espinhal
- Os 10 anos da Consulta de Neuromusculares do Hospital Maria Pia. 53
Bronquiolites
- Abordagem Diagnostica e Terapêutica
das Bronquiolites - revisão bibliográfica.
286
Bulimia
- Perturbações do Comportamento Alimentar. S187
Cáries
- Caso Estomatológico. 128
Cateter
- Cateteres Epicutâneos em RN: estudo
retrospectivo. 80
Citomegalovirus
- Imagens. 49
Citopatia Mitocondrial
- Investigação Molecular em 20 Doentes
com Citopatia Mitocondrial. 277
Corpo Estranho
- Caso Endoscópico. 45
- Caso endoscópico. 126
Cuidados Paliativos
- A Morte no Início da Vida. 38
Defeitos Parede Abdominal
- Genes, Crianças e Pediatras. 51
Deformidades Torácicas
- Nuestra Experiência en el Tratamiento
del Pectus Excavatum Severo Mediante
Toracoplastia Percutânea Videoassistida. 9
Diagnóstico Genético
- Considerações éticas sobre a selecção
de sexo através do diagnóstico genético
pré-implantação. 307
Diagnóstico Pré-natal
- Ataxia – telangiectasia – Caso Clínico.
23
- Imagens. 180
- Genes, Crianças e Pediatras. 51
- Por detrás da borbulha ou, o dilema do
diagnóstico pré-natal de anomalia nefro-urológica. 134
Displasias Ósseas
- Acondroplasia e Hipocondroplasia: Novas Perspectivas de Diagnóstico Molecular. S235
Distrofias Musculares
- Os 10 anos da Consulta de Neuromusculares do Hospital Maria Pia. 53
Doenças Auto-imunes
- Bactérias e Aumento da Prevalência
das Doenças Atópicas e Auto-imunes.
92
- Neutropenia Auto-imune – caso clínico.
S239
Doenças Cardíacas
- Morte Súbita em Crianças e Adolescentes sem Doença Cardíaca. S222
- Morte Súbita de Origem Cardíaca em
Jovens Atletas. S227
Doença de Castleman
- Quando as Adenomegalias Cervicais
não são o que parecem. S247
Doença de Crohn
- Caso Endoscópico. 311
- Nem tudo o que parece é… Um Caso
Clínico. S246
Doença de Hodgkin
- Adenopatias Cervicais Recorrentes por
EBV: à Espera de um Linfoma…. S240
Doenças Metabólicas
- Defeitos da b-Oxidação Mitocondrial dos
Ácidos Gordos – artigo de revisão. 15
- Investigação Molecular em 20 Doentes
com Citopatia Mitocondrial. 277
- Rabdomiólise Maciça Após Crise Convulsiva num Adolescente. S234
- Vómitos Cíclicos / Acidúria Glutárica
tipo II – caso clínico. 26
Doenças Neuromusculares
- Os 10 anos da Consulta de Neuromusculares do Hospital Maria Pia. 53
Endocardite
- Endocardite Bacteriana Associada a
Positividade para Anticorpos Citoplasmáticos Anti Neutrófilo (ANCA). S240
Fluorose Dentária
- Caso Estomatológico. 178
Fotoprotecção
- Fotoprotecção na Criança. 102
Gastrite
- Caso Endoscópico. 176
Glicogenose tipo V
- Rabdomiólise Maciça Após Crise Convulsiva num Adolescente. S234
Gravidez
- Fisiologia do Pesadelo. S247
Hemoglobinuria Paroxistica
- Um caso de Insuficiência Renal Aguda.
S240
Hidrocefalia
- Hidrocefalia – Formas de apresentação
pouco frequentes. S221
Hipertenção Arterial
- Hipertenção Arterial no Recém Nascido.
S245
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2005, vol XIV, n.º 4
Hipertenção Intracraniana
- Uma Causa Incomum de Parésia do VI
Nervo Craniano na Criança. S236
Hipoglicemia
- Defeitos da b-Oxidação Mitocondrial dos
Ácidos Gordos – artigo de revisão. 15
- Genes, Crianças e Pediatras. 51
Hospital de Dia
- Hospital de Dia – Análise Retrospectiva
de 8 anos de actividade. 84
Humanização
- A Morte no Início da Vida. 38
Infecções
- Bactérias e Aumento da Prevalência das
Doenças Atópicas e Auto-imunes. 92
- Ressurgimento do Pertussis na Europa.
304
Insuficiência Renal
- Um Caso de Insuficiência Renal Aguda.
S240
Intersexo
- A Genética no Intersexo. S208
- Conduta Cirúrgica nas Anomalias da Diferenciação Sexual. S218
- Intersexo. I – Genes Envolvidos na determinação do sexo masculino. 292
- Vulnerabilidades e Defesas no Intersexo. S220
Intoxicações
- Intoxicações Agudas em Adolescentes.
S234
- Intoxicação Medicamentosa em Pediatria: Duas Faces do Mesmo Problema.
S243
- Intoxicações na Urgência Pediátrica:
Prevenir é Melhor que Remediar! S235
- O Código da Criança. 55
Isoimunização RH
- Isoimunização Rh a Múltiplos Antigénios. 31
Leucemia
- Dismorfia Facial – Um Caso Clínico de
LAL. S246
Macroglosia
- Genes, Crianças e Pediatras. 51
Macrossomia
- Genes, Crianças e Pediatras. 51
Malnutrição
- Edema e Renutrição de Malnutrição
Grave – Caso Clínico. S239
Miastenias
- Os 10 anos da Consulta de Neuromusculares do Hospital Maria Pia. 53
Miopatias
- Os 10 anos da Consulta de Neuromusculares do Hospital Maria Pia. 53
Morte
- A Morte no Início da Vida. 38
Morte Súbita
- Epidemiologia e Prevenção. S222
- O Exame Cardiovascular na Prática do
Desporto. S227
Neuroblastoma
- Neuroblastoma de Apresentação Cutânea. S244
Neutropenia
- Neutropenia Auto-Imune – Caso Clínico. S239
Obesidade
- Complicações e Tratamento da Obesidade na Criança. 89
- Surpresas ou Nem Tanto! Análise Retrospectiva de 2 Anos da Consulta de
Adolescentes do Hospital S. João de
Deus de V.N.Famalicão S233
Oxidação dos Ácidos Gordos
- Defeitos da b-Oxidação Mitocondrial
dos Ácidos Gordos – artigo de revisão.
15
Pectus Excavatum
- Nuestra Experiência en el Tratamiento
del Pectus Excavatum Severo Mediante
Toracoplastia Percutânea Videoassistida. 9
Pediatria Ambulatória
- As nossas crianças merecem o melhor.
S237
- Avaliação da qualidade dos registos.
S238
Pedopsiquiatria
- Hospital de Dia – Análise Retrospectiva
de 8 anos de Actividade. 84
PEG
- Gastrostomia Endoscópica Percutânea
na Criança. 161
Pneumonia
- Imagem. 130
PTI
- Púrpura Trombocitopénica Idiopática
– revisão de quatro anos. S206
Rabdomiólise
- Rabdomiólise Maciça Após Crise Convulsiva num Adolescente. S234
Radiação Ionizante
- Caso Clínico - Radiológico. 313
Rastreio Oftalmológico
- Rastreio Oftalmológico Infantil – Estudo
Piloto S238
Recém Nascido
- Cateteres Epicutâneos em RN: estudo
retrospectivo. 80
- Hipertensão Arterial Neonatal. S245
Selecção de Sexo
- Considerações Éticas sobre a Selecção
de Sexo através do Diagnóstico Genético Pré-Implantação. 307
Síndrome de Alstrom
- Genes, Crianças e Pediatras. 132
Síndrome de Beckith - Wideman
- Genes, Crianças e Pediatras. 51
Síndrome de Holt Oram
- Síndrome de Holt-Oram: Caso Clínico e
Actualização. 114
Síndrome Nefrótico
- Síndrome Nefrótico Congénito e Infantil
– Experiência dos Últimos 5 Anos. S236
Síndrome de Smith-Lemli-Opitz
- Genes, Crianças e Pediatras. 315
Síndrome de Williams-Beuren
- Genes, Crianças e Pediatras. 182
Teratoma
- Imagens. 180
Toracospia
- Nuestra Experiência en el Tratamiento del
Pectus Excavatum Severo Mediante Toracoplastia Percutânea Videoassistida. 9
Toxaplasmose
- Toxaplasmose Congénita: a propósito
de um caso grave. 164
Transporte em Veículos
- Como Transporta os seus filhos? 73
Traumatismo Dentário
- Caso Estomatológico.47
Trissomia 21
- Imagens. 49
Vasculopatia Lenticuloestriada
- Imagens. 49
Vómitos Cíclicos
- Vómitos Cíclicos / Acidúria Glutárica
Tipo II – Caso Clínico. 26
índice de assuntos
323
AGRADECIMENTOS
A Revista Nascer e Crescer agradece aos colaboradores, que fizeram a revisão
dos manuscritos submetidos para publicação no ano de 2005. Esta intervenção é
essencial para a qualidade científica dos artigos e representa horas de trabalho,
experiência e esforço dedicados a esta actividade. Sentimo-nos honrados com a
sua colaboração e disponibilidade.
Abílio Oliveira – Porto
António Oliveira – Porto
António Vieira – Porto
Carmen Carvalho – Porto
Cidade Rodrigues - Porto
Clara Barbot - Porto
Conceição Rosário – Porto
Conceição Trigo – Lisboa
Dora Simões – Porto
Helena Ferreira – Porto
Inês Lopes – Porto
José Manuel Pavão – Porto
José Valter Ferreira Alves – Porto
Laura Marques – Porto
Lopes dos Santos – Porto
Lúcia Gomes – Porto
Luísa Monteiro – Lisboa
Márcia Martins – Porto
Margarida Guedes – Porto
Marília Loureiro – Porto
Miguel Taveira – Porto
Natália Teles – Porto
A Revista Nascer e Crescer agradece o apoio publicitário concedido ao longo
do ano 2005, pelas instituições abaixo indicadas:
Associação do Hospital de Crianças Maria Pia
Dermoteca
Janssen-Cilag
Laboratórios Bial
Merck Sharp & Dohme
NeoFarmacêutica

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