O PENSAMENTO E A LÁGRIMA Coniunctio, Alquimia e Arte

Transcrição

O PENSAMENTO E A LÁGRIMA Coniunctio, Alquimia e Arte
 Mini-currículo
Clara Rossana Ferraro de Sá é formada em PSICOLOGIA pela UTPR(1990);
pós-graduada em PSICOLOGIA ANALÍTICA pela PUC-PR(1996). Obteve o título
de ANALISTA JUNGUIANA pela ASSOCIAÇÃO JUNGUIANA DO BRASIL filiada
à International Association for Analythical Psychology de Zurique/Suiça
(Full Member of IAAP since 2005). É membro do Instituto Junguiano do Paraná,
ocupou a Diretoria de Cursos de Extensão, ministra os módulos de Mitologia e
Técnicas da Prática Analítica-Sandplay, realiza Supervisão Clínica no curso de
Formação de Analistas Junguianos. Cursou Psicopedagogia com
o Prof.Jorge Visca da Argentina (1991/1992). Cursou Licenciatura Plena em
Artes Plásticas na FEMP (1980). Realiza esculturas em mármore,
bronze e resina. Realizou reciclagem/escultura em pedra na cidade de
Carrara/Itália por dois meses em 1998. Participa de Congressos a nível nacional
e internacional como coordenadora e palestrante/publicação de textos.
Organizou,com o apoio do CRP-PR o I ENCONTRO DE PSICOLOGIA
JUNGUIANA DO PARANÁ(2000), tema: O Tempo e suas Conexões.
Foi presidente do I SIMPÓSIO DE PSICOLOGIA ANALÍTICA DO INSTITUTO
JUNGUIANO DO PARANÁ-IJPR(2008),tema: Psicologia Analítica:
Teoria ePrática. Atua na Clinica de Adulto, adolescente e criança. Co-autora do
Livro didático: Ensino de Arte : Eis a Questão, Edit. Módulo, 1993. Autoras:
Andrade, R.F., Sá, C.R.F.- Samways, E. Capítulo A Criatividade em Psicologia
Analítica - Contribuições para uma Mudança de Paradigma. In Ensaios sobre a
ClínicaJunguiana. Instituto Junguiano do Rio G. do Sul. Org. Werres, J.L. Porto
Alegre, RS : Edit. Imprensa Livre, 2005
Telefone: 41-92707787
E-mail:[email protected]
Clara Rossana Ferraro de Sá, ANALISTA JUNGUIANA. AJB/ IAAP, full
member since 2005.
Escultora de Curitiba/Brasil
Linguagem: portugues
Proposta: apresentação de caso clínico
Título:O PENSAMENTO E A LÁGRIMA
Ao longo de 4 anos de análise utilizando técnicas expressivas:
desenho,aquarela,argila e Sandplay pode-se visualizar o caminho de resgate do
feminino ferido. No primeiro sandplay tem-se o prognóstico,visualiza-se os
complexos .M.S. tem a rocha dentro dela,um patriarca internalizado,uma rigidez.
Uma ordem: PENSE.E seu corpo sofre.O pensamento se torna a
Medusa,seco,preto,cortante. Com grafite ela dá o tom deste afeto. Faz uma
cabeça em argila,um filósofo....a corda,a serpente enrolada no
pescoço........aprender a serpentear,descer até a função inferior. ANANKÈ,a
necessidade,ordena a transformação. A integração vem com as
aquarelas.Aparece a árvore como Temenos,o espaço terapêutico,o vaso.É a
terapeuta na transferência,o abraço e a continência. As raízes. A entrega
possível e a regeneração,o renascimento,a renovação.Surge a lágrima, a luz da
lua toca a coluna vertebral,a água....o sentimento podendo ser expresso. M.S.
resgata a força do feminino entra na floresta da alma,encontra o xamã e a mulher
selvagem,recupera o instinto de vida.A natureza feminina rejubila.Nova
vida.
Clara Rossana Ferraro de Sá, JUNGIAN ANALIST. AJB/ IAAP, full member
since 2005.
Sculptor. From Curitiba/Brasil
language: english
Proposal: Clinical case presentation.
Title: THE THOUGHT AND THE TEAR.
During four years of analysis utilizing expressive techniques: drawing, watercolor
painting, clay and Sandplay, came to surface a pathway to rescue the hurt
feminine. In the first sandplay is the prognostic, observing the complexes .M.S.
have the stone within her, an internalized patriarch, a rigidness. One demand:
THINK. And your body suffers. The thought becomes the Medusa, dry, dark,
cutting. With graphite she gives the tone of this affection. Sculpts a head in clay,
a philosopher the rope, a snake wraped around the neck learn to move, to
go down to it's inferior function. ANANKÈ, the need, demands transformation.
The integration comes with the watercolor. The tree appears as Temenos, the
therapeutic space, the vase. It is the transference's therapist, the embrace and
the continence. The roots. The possible delivery and the regeneration, the
rebirth, the renewal. A tear arises, the moon light touches the spine, the water
the feeling is able to be expressed. M.S. rescues the strength of the feminine,
enters the forest of the soul, and there finds the shaman and the savage woman,
recovers the instinct of life. The feminine nature jubilates again. New life.
O PENSAMENTO E A LÁGRIMA
Coniunctio, Alquimia e Arte
Clara Rossana Ferraro de Sá
É possível que a heroína, como mulher, personifique
uma possibilidade da tão buscada coniunctio
oppositorum alquímica, a união dos opostos, a última
e mais difícil das operações, pois representa a união
do inconsciente e do consciente, objetivo final do
processo de individuação. A heroína estrutura a
consciência, pois perfaz o ato heróico; ao mesmo
tempo, seus valores são do inconsciente, pois pertence
ao domínio do feminino, da emoção. (BOECHAT
2008, p. 68).
Nascida em São Miguel dos Açores (1970), filha de mãe portuguesa e pai brasileiro, M. F.
atravessou o oceano aos três meses de idade. Tal como seus ancestrais navegadores, fez a
migração transcontinental, chegando ao novo mundo: Terra Brasilis.
Raízes portuguesas, raízes brasileiras. Cultura e natureza novamente colocam seus
desafios. A criatividade da psique humana atualiza-se em cada alma que nasce. É possível
transcender as oposições, vencer os obstáculos e gerar novas respostas frente ao desconhecido.
A imagética do mar traz consigo as dimensões do risco, do medo, da imensidão e do
desconhecido, bem como da aventura, das conquistas, das riquezas, da nova vida.
Ao longo dos séculos, o domínio dos mares representou a chave para a sobrevivência. Da
mesma forma, no campo simbólico, o mar do inconsciente desafia-nos a traduzi-lo da melhor
forma possível, em busca do equilíbrio energético da totalidade psíquica.
Na dialética, Mar e Rocha, a força da plasticidade aquosa surge para decompor a
mineralização secular. Encontramos aqui a Velha Europa e a solidez de sua cultura. Anos e anos
de trabalho contra a natureza sedimentaram conhecimentos, fixaram normas, enrijeceram
sistemas. A exigência de perfeição tornou-se lei. O mito cristão é um imperativo.
A necessidade torna-se um desafio, exige mudança. Sacrificium Intellectus. Humildade
para descer e resgatar as outras funções da consciência.
M. F. inicia sua análise em março de 2007; prontamente, o inconsciente contribui com este
sonho inicial:
Com uma estrada, era um paredão; lado esquerdo, bem alto, de pedra, rocha.
Estava no trânsito, mas não estava dirigindo, estava a pé. Do lado direito, era
um precipício. Não era água de rio. Vejo um caminhão parado; tinha um pedaço
de rocha (vulcânica) antes de chegar à água, bloqueando o caminhão. Estrada
estreita de asfalto. Estava à pé, com a mãe e o irmão. Precisava passar o
caminhão, precisava passar pela rocha, entrar na água para continuar. Era uma
água assim... Não dava medo de entrar, a gente vai ter que ir mesmo. Tenho que
ajudar minha mãe e meu irmão. A gente vai ter que continuar; então, vamos
mergulhar e passar. Tinha que ajudar os dois, tinha que ir: dar mão para um, dar
mão para o outro, como se fosse responsável por eles. Lembro que mergulho e
ajudo.
06/03/2007
Entre o mar e a rocha, a analisanda percorre seu caminho de religação. Através da
consciência, desafia suas defesas, seu status quo; guiada pelo desejo de uma alteridade
psíquica, tendo o amor como princípio fundamental, lança-se nas entranhas do desconhecido.
Escolhe o carvão e desenha o percurso da sua libido. Circunda o conflito, a dissociação mente e
corpo.
Sua fala espontânea revela o desafio:
Tem coisas para as quais a nossa razão quer explicações. Por que eu estava ali
com a minha mãe e meu irmão, e não o meu pai? Normalmente, é a mãe que
cuida da filha…
Água como princípio materno – mãe e criança, envolvente, protetora da heroína/criança na
sua exposição ao desconhecido – permeia o processo, a travessia. A transformação daquilo que
está sem vida para ganhar nova vida. A filha, em busca de renovação de valores culturais, traz o
potencial de unir cultura e natureza, dentro e fora, individual e coletivo, refazendo os laços entre
Brasil e Portugal.
A coniunctio significa consciência […] no entanto, preciso acrescentar que a
consciência é tanto causa quanto efeito da coniunctio. Precisa ser definida dessa
forma paradoxal porque é um produto de ambos os centros da psique: o ego e o
Self. Por um lado, os esforços do ego criam a coniunctio; por outro, o destino
decide, e o ego é a vítima de uma decisão feita “por cima da (sua) cabeça ou em
desacato ao (seu) coração”. (NEUMANN, 2008, p. 23).
Já nesse início, aceita aprofundar e refletir sobre o que sente. Mergulha. Escolhe a angústia
e o medo:
São esses sentimentos que me dominam e paralisam. Sinto que as outras
pessoas têm poder sobre mim quando usam a agressividade, com a qual não sei
lidar. Nasce uma vontade de chorar... Raiva de mim por ser incapaz de me
defender; medo de magoar os outros e ficar sem o carinho (ou a atenção, ou a
aprovação) deles. Tenho a percepção de quanto essas coisas me abatem e de
quanto sou vítima da minha própria imaginação, que é carrasca (imagino que
sou culpada, imagino motivos da culpa, imagino discussões etc.).
Constata que isso a afeta fisicamente:
Fico abatida, com dor de cabeça. Emocionalmente, fico depressiva, sem energia
intelectual, isolada, como se tivesse cometido um crime, com medo, assustada;
tenho tendência a chorar, a ter raiva da minha impotência.
Ao final do diálogo com sua verdade interior, decide o que pode dar a si mesma:
A minha capacidade de ver o problema, a emoção, de percebê-la e lutar contra
essa morte lenta com todas as minhas forças.
03/05/2007
Estamos em maio, e o sonho constela a questão principal:
Acordei com aquele cabelo de negra (armado e muito farto), olhei no espelho e
tentei dar um jeito, amassar o cabelo... Sinto como o excesso do pensamento;
quero a resposta imediata e nem sempre tenho.
Metáforas são uma catalização dos níveis mais profundos da alma humana. Elas pedem
uma tradução simbólica, uma atualização mítica de sua sabedoria em favor do crescimento
individual. As imagens produzidas pela psique da analisanda revelam o drama mítico, as
imagens atemporais e o seu dinamismo arquetípico.
Precisa aprender a serpentear, a descer até a função inferior, a função sentimento. As raízes
aéreas petrificaram seu corpo, e a necessidade impõe a nova ordem: descer ao reino da terra. A
serpente leva-nos ao interior da Terra, seu movimento é capaz de furar o solo, ir para as
entranhas.
A cabeça como Medusa, um olhar petrificante para o corpo, guarda o desejo humano de
Ser. Voltar a sentir. Os sentimentos enrolados em uma infinidades de ideias, racionalizados. O
polo da visão desconectado do todo expressa a morte nos olhos.
Os sonhos de pedra procuram forças íntimas. O sonhador apossa-se dessas
forças e, quando as dominou, sente brotar nele um devaneio da vontade de
poder que apresentamos como um verdadeiro complexo de Medusa.
(BACHELARD, 1991, p. 09).
O pensamento torna-se a Medusa: seco, preto, cortante. Vai estrangulá-la.
O uso do grafite transmite-nos a carga emocional do excesso, do incessante. Ela tem a
rocha dentro de si, um patriarca internalizado, uma rigidez. Uma ordem: pense. Seu corpo sofre.
A psique é constituída pelo consciente e inconsciente e pela interação entre eles. Como
um sistema auto-regulador teologicamente determinado, contém um impulso em direção à
totalidade e tem a tendência a equilibrar-se através da função compensatória do inconsciente.
O processo simbólico – a vivência da imagem e na imagem – permeia esse caminho. Entre o
escuro e o claro, temos o início como um desafio criativo num confronto, um beco sem saída,
uma não compreensão do sofrimento, que implora por significado até a situação inicial ser
superada.
Para percorrer esse caminho com segurança, a análise junguiana acolhe a alma num espaço
sagrado, um Temenos, onde o encontro estrutura-se no tempo e no espaço de acolhimento. O
ritual semanal promove a consolidação da consciência e protege contra os perigos da imensidão
do mar do inconsciente, com suas possíveis ondas incontroláveis de afeto.
O tempo do encontro analítico, como arquétipo estruturante, percorre todo o processo
mostrando suas faces. Saturno, ainda devorador da criação, não permite que ela venha para a
tridimensionalidade e concretize-se, mantendo-a mais tempo no inconsciente até sua plena
maturação; então, ele mostra-se como aquele que seifa e auxilia a colheita, permitindo o retorno
das possibilidades criativas. Também aparece como tempo Kairòs, o tempo de Deus; enquanto o
Self revela-se nas sicronicidades, deixando visíveis as forças espirituais que acompanham a alma
no seu processo de evolução e aperfeiçoamento.
Mobilizado, o inconsciente responde com mais representações, e o conflito entre o
intelecto e o sentimento começa a ceder. O controle rígido, negativo, institucionalizado em sua
ordem absoluta, onipotente, onipresente, onisciente, permite ser visto. No sonho, a rocha
metamorfoseou-se, e surgem construções de pedra:
É uma cidade. Eu morava lá, fazia pouco tempo. Tinha um ponto turístico, tipo
cidade medieval, e tinha um túnel bem escuro (só que não era noite, era dia).
Isso aqui é uma ponte, e tinha uma abertura. Fui visitar o lugar turístico, mas era
um manicômio.
A força da imagem produzida em carvão pede a observação do que foi instituído em sua
vida pessoal. Ela vê a universidade para a qual se dedicou durante grande parte de sua vida.
Observa que sua rotina rígida não permite deslizes, mas esses acabam acontecendo. O tempo
cronometra a sua vida e debate-se em repetições. O lado esquerdo do cérebro, lugar da cidade
medieval com suas leis patriarcais, também se apresenta em suas associações como um hospital
psiquiátrico.
Temos uma polarização do racional, ameaçando-a, impedindo-a de abandonar suas defesas
organizadas no pragmatismo alienante. Essas defesas racionais fizeram parte de seu
desenvolvimento psicológico. A educação cristã utiliza-as com maestria, assim impedindo a
espontaneidade dos afetos.
A unilateralidade é o excesso; a velocidade cortical é a patologia.
É a nigredo alquímica, trazendo as repetições enfadonhas que lhe retiram a vitalidade.
É próprio dessa fase a densidade do processo alquimico, mas ela carrega consigo as
possibilidades de renovação. “Na noite escura da nigredo (negrura), atua o espírito vivificante,
como sabe o adepto.” (MUS HERM, citado por JUNG, 1985, p. 272).
No sonho seguinte, está em uma praia:
[...] ela tava cheia e, depois, foi ficando vazia, vazia... Tinha uma moça deitada
tomando sol. Eu estava na praia, e não tinha ninguém. Só eu e a moça
(aparecem seu filho e um homem que devia ser seu marido). Ela não estava
respirando. Passei por ela e vi os olhos, a boca, meio cerrados. Ela estava morta.
Peguei meu filho para ele não perceber aquela tragédia: “Vamos, vamos
embora”.
Nesse dia, acordou com uma sensação ruim: “Meu Deus, nunca estive tão próxima da morte”.
“Morrer é ser iniciado nos grandes mistérios.” (PLUTARCO, citado por WRIGHT, 2004,
p. 86).
31/05/2007
Permite-se relembrar o sofrimento. Sente tristeza quando vai embora do trabalho, quando o
dia vai escurecendo. À noite, chora muito, e a espera passiva invade sua alma. Sabe que ainda
alimenta um amor impossível. A solidão invade sua alma e anuncia o encontro consigo mesma.
Começa a perceber o quanto esteve distante de si mesma, o quanto permaneceu sonhando com
um amor.
31/05/2007
Sua psique faz aparecer a angina; o pensamento furando o peito. Relembra os momentos
felizes que viveu e sente:
Vontade de ir no e-mail e conversar. Não sobre o fim. “E aí, como está você?
Existe chance para a gente?” Dele, não tenho raiva; do meu pai, sim. Nunca vou
encontrar um defeito horrível; se ficasse dez dias, teria assunto para dez dias.
Ele tem aceitação das diferenças, e não vê coisas insuportáveis.
A dor do desejo não realizado e a impotência diante da impossibilidade de constituir uma
família nos moldes tradicionais amedrontaram-na durante os primeiros anos da vida de seu filho.
Nessa imagem, ela expressa tudo o que sentiu durante todo esse tempo. A asfixia
emocional. Sua dificuldade de fluir no prazer de viver, de simplesmente estar em acordo com o
que sente e realizar sua escolha.
O movimento afetivo que contém a possibilidade de resgate da religação aparece
novamente na cor do orifício. Estão lá o mar e a rocha. Eles comprovam o ritmo dual: inspiração
e expiração, entrada e saída.
O sentimento aparece para contrabalançar o Logos. Considerado consciência masculina,
pode-se entender o Logos como o julgar, o reconhecer. Eros, como consciência feminina, seria o
relacionar-se.
Ela também tem o mar e a rocha no peito. A mente lógica e sua cadeia infinita de opostos
irão sempre gerar uma compulsão ao pensamento, sendo ele a função principal ou fruto de uma
tipologia invertida, forçada pela cultura que privilegia o pensamento em detrimento do
sentimento, da intuição e da sensação.
Aqui ela sai da Medusa e entra, propriamente, em análise. O conflito aparece e, com ele, o
colorido, seus cabelos desgrenhados expressam a emoção, e seus braços para trás parecem dizer:
“Está aí, e agora?”.
A alma ligada ao thymos, ao coração, é a alma que atingiu o estado erótico. Em
sua função divina, Eros é um meio de penetrar em qualquer padrão e dar o
colorido; é a função que estreita as distâncias e faz as ligações. (SÁ, 2007).
Pode-se constatar a relação transferencial proporcionando o amparo, a receptividade da
mãe brasileira, que recebe nos braços a filha portuguesa, embalando-a com histórias que são
bálsamos, dão segurança, garantem a permanência nas raízes nutridoras, fonte de vida. O Amor
na Alma é a base para a transformação.
Ao superar a prisão na tensão dos opostos e ultrapassá-la, surge o templo do coração. Seu
portal abre caminho para a conciliação, permite investigar e penetrar o desconhecido, suportar a
tensão das forças que querem arrancar as raízes, tirá-las do corpo e fazê-las aéreas. Permite
encontrar o chão psíquico e suas raízes subterrâneas, para firmar, fixar, gerar lugar, espaço e
tempo, permanência. Gerar corpo.
A possibilidade de resgatar o sentimento através da arte acorda os sentidos. O Temenos
como um lugar sagrado, um templo para a orientação interior, proporciona o lugar livre e
protegido para a expressão dos conteúdos inconscientes. A bússola é o próprio coração,
produzindo o amálgama da vida, o amor. O medo do feminino é superado e dá passagem ao
caminho do coração, com seu colorido emocional.
A provocação do conflito é uma virtude luciferina, no sentido próprio da
palavra. O conflito gera o fogo dos afetos, ou seja, o da convulsão e o da
geração da luz. A emoção é, por um lado, o fogo alquímico, cujo calor traz tudo
à existência e queima todo o supérfluo (omnes superfluitates comburit). Por
outro lado, a emoção é aquele momento em que o aço, ao golpear a pedra,
produz a faísca; emoção é fonte principal de toda tomada de consciência. Não
há transformação de escuridão em luz, nem de inércia em movimento, sem
emoção. (JUNG, 1976, p. 105, § 179).
31/05/2007
Segue-se uma explosão rosa, ela traz o sentimento para a cabeça. A chama que vem do
coração tem sua fonte no diafragma, músculo responsável pela inspiração. Ele separa o tórax do
abdomen. Agora, o corpo quer pulsar seu ritmo natural, o ir e vir de seus humores, de seus
afetos, e perceber o movimento, a libido represada no corpo e sua reação de vida.
No processo de transformação, as emoções reprimidas, destituídas de valor,
entendidas como negativas e prejudiciais são revisitadas em seu significado
alquímico. No corpo, como um vaso alquímico, um Hystera, útero sagrado, as
sensações passam para o campo dos sentimentos. A raiva sadia descasca a
inércia da preguiça, desnuda a essência! É fogo ativo, correndo em liberdade;
ele quer forjar a beleza, a expressão em si. (SÁ, 2007).
Decide e expressa: “Quero trabalhar com meu lado negro”.
Volta a falar da família, de sua indignação com as pessoas que se sentem no direito de falar
o que pensam, sem se preocupar com a forma, se vai magoar a outra pessoa... A cunhada agride
gratuitamente e é direta: “Sua lesma, tartaruga, lesa das ideias.” Indignada, afirma que a agressão
e o limite não precisam ser tão destruidores e também que tem medo de perder o controle.
Percebe a divisão entre o afeto e o intelecto, entre o prazer e o dever. Reporta-se ao seu pai e à
forma como castiga e retira todo o afeto. Conta que sua mãe só trabalha, trabalha, e ela estuda,
estuda: “Se não estivesse estudando, o que estaria fazendo?” O irmão pode fazer o que quiser.
Diante do pai, pergunta-se o que tem de tão repugnante e afirma:
Ele não me quer tão bem; está muito mais preocupado com o que os outros vão
pensar. Eu queria ser aceita. É mais uma sensação de abandono. Ele não está
interessado em minhas histórias; nunca quis saber o que sou. Eu tinha
envergonhado a família. O que eu estava sentindo nunca contou. Ele é
extremamente diplomático, político e apaziguador.
20/08/2007
Desiste de enfrentar fora. O trabalho é interior. Terá de ultrapassar o guardião do umbral, o
monstro que anuncia outro nível de consciência, outra dinâmica, com outras leis. Precisará do
discernimento para vencer a depressão diante do agressor – aquele que impede sua plenitude de
ser inteira e poder fazer escolhas próprias. Os raios de sua racionalidade fuzilam seus desejos e
deixam-na apática e impotente diante do crítico internalizado. Pessoas reais intimidadoras,
devoradoras ou abusivas acionam o complexo, ativam memórias e exigem respostas.
A luta com o dragão da inconsciência pode torná-lo nosso colaborador; seus aspectos
criativos vencem o medo e a paralisia asfixiante. Não precisamos temer, e sim respeitar para
poder vincular e encontrar as chaves das portas do conhecimento. Vencer o apego, passar pela
regressão, aprender com a depressão para, então, superar o complexo destrutivo,
despotencializando-o e promovendo crescimento.
Herdeiro do Complexo do Tirano e do Complexo do Grande Inquisidor, o feminino em
nós (homens e mulheres) é desafiado a achar os bálsamos para curar sua unidade dilacerada.
Amor, beleza e sensibilidade são facilmente devorados pelo desejo de mais poder. Precisamos
recuperar a sensibilidade e bordar o ponto sombra, intuir o Tirano em nós, o qual nos faz
competir e querer eliminar o outro. Sempre divididos, seguimos reclamando das insatisfações...
A culpa sempre é de algum erro.
Neste momento do desenvolvimento da Consciência Humana, estamos ultrapassando o
Uroboros Patriarcal, o movimento que luta contra os Arquétipos – a força do coletivo –, para
nos impormos como individualidade. No limite bioético, confirma-se a necessidade do resgate da
feminilidade perdida. Através da análise mítica, buscam-se as metáforas que funcionam como
antídoto contra a Hybris Solar, o excesso, a polarização do masculino.
Cuidar da corrente do feminino no nível coletivo confronta-nos com o desafio de curar
nossos ancestrais e recuperar valores genuínos do feminino.
No nível pessoal, a analisanda precisará encontrar a coragem e prosseguir; combater a
destrutividade reconhecendo e transformando o agressor interiorizado; acabar com o fascinio e a
atração que esse complexo exerce sobre si mesma. O desafio será libertar algo de grande valor, o
qual vai trazer o novo e o positivo relacionamento com seu feminino interior e com a mulher
real.
Jean Shinoda Bolen, M. D., em seu livro O Anel do Poder – a criança abandonada, o pai
autoritário e o feminino subjugado, faz uma análise profunda e guia-nos para uma consciência de
alteridade, com a qual podemos reestruturar novas formas de relações, tendo o respeito pelas
diferenças e o olhar para o outro como dignos de respeito.
Não há bons casamentos nem famílias felizes na mitologia clássica. Há, em toda
parte, uma hierarquia. Uma figura paterna autoritária manda em todos. O deus
principal age por interesse próprio, impondo sua vontade e seus desejos;
considerado em termos psicológicos, ele é o modelo de uma personalidade
autoritária e narcisista. As mulheres – quer como mortais, como deusas ou como
símbolos femininos – são, com raras exceções, oprimidas, sacrificadas ou
humilhadas. O estupro é a norma, e o poder, em vez do amor, é o princípio
predominante. Filhos e filhas ou sujeitam-se em busca de aprovação, quando
são extensões obedientes da vontade do pai, ou são sacrificados, rejeitados,
raptados, punidos, ignorados.
[…] Em qualquer família, cujos valores sejam as aparências e a produtividade,
as emoções e a capacidade de sentir, na melhor das hipóteses, não recebem
atenção, sendo muitas vezes suprimidas. Se a inclinação inata – a tipologia
psicológica da pessoa – for para o pensamento em vez de para o sentimento, o
domínio deste último permanece não desenvolvido. Essa tendência é alimentada
pelas expectativas colocadas nas pessoas do sexo masculino, numa sociedade
competitiva em que o sucesso é a medida do homem. No campo militar, no
campo da política e dos negócios, a ternura é uma limitação, sendo a empatia,
por conseguinte, algo que se deve esconder […] (BOLEN, 1992, p. 97).
O destino da analisanda é ser a protagonista do drama familiar. Liberar a persona de uma
boa menina e encarnar a nova mulher, portadora da reestruturação. Deixar a passividade, herança
milenar, para, através da integração da sombra, do instinto agressivo, tornar-se a tecelã de uma
nova consciência, a consciência que inclui as diferenças. Identidade e alteridade dialogam, e
surge respeito e reconhecimento.
Chega setembro, e ela apresenta sua monografia de Mestrado em Comunicação e
Linguagem, cujo tema é: Fotografia das Cidades: imagens de Curitiba. Mais uma etapa de sua
vida academica foi cumprida, com todo mérito.
A autenticidade é alcançada quando se honram as necessidades emocionais e os
desejos pessoais. A necessidade é a ânsia básica de uma satisfação biológica,
emocional e espiritual. Funciona a serviço da sobrevivência, da identidade,
grupal ou pessoal, ou da autovalidação. (WHITMONT, 1991, p. 29).
Em busca dessa autenticidade característica da personalidade Self centrada, cuja meta é a
integridade psíquica, torna-se visível o caminho de individuação.
Sua alma quer vencer os obstáculos e viver a plenitude de ser mulher, profissional e mãe.
Durante o primeiro ano de análise, as repetições – próprias do inconsciente que gera os
sintomas – constituem os desafios e a intenção de tornar consciente as unilateralidades da psique.
A analisanda entra nas questões sobre sua mãe:
Ela é dona de si, parece um leão e eu uma coelhinha. Ela corresponde a todos os
padrões de sucesso; parece segura, sabe dizer não e tem discernimento.
M. F. tem sempre a sensação de que está errada e sente culpa. Acha que o pai e o irmão são
cúmplices em sua fidelidade masculina; ele não é castigado e tem prazer em subjugar e ver o
outro mal. Diante dos olhos do irmão, ela é a queridinha, mas ela acha que o irmão é
superprotegido. Também fala de seu filho:
Meu pai e minha mãe cuidam bem de meu filho; ele é bom, mas não é bobo. Ele
não julga, é verdadeiro e interage muito bem com o avô.
Reclama que já falou do pai, do irmão, do pai de seu filho e de seu filho:
O que vou falar agora? […] da agressividade, do prazer de agredir, agredir
para submeter, agredir para se sentir superior, sempre falando mal do outro […]
a invasão, o abuso, o medo, a solidão, o desamparo […] e minha cunhada, dona
da razão: a rainha!
Estamos diante do masculino e da inconsciência que o torna um obstáculo.
O animus auxilia a mulher no mundo do pensamento, bem como na sua relação
com o mundo interno. É como se ele fosse capaz de apurar esse pensamento
ligado ao sentimento e à natureza, dando-lhe mais clareza. O animus pode ser
tanto um valioso companheiro como, em sua forma negativa, um cruel
dominador. O aspecto positivo do animus é que ele pode se tornar um guia na
estruturação da vida da mulher, auxiliando-a em sua feminilidade. Quando
possuída negativamente pelo animus, a mulher torna-se uma paródia de
masculinidade, ficando o seu pensamento divorciado do sentimento. (ROBELL,
1997, p. 118).
O masculino em si está ligado à morte. O poder de separar dá a ele identidade: a lei da
espada. O feminino em si está ligado ao amor. O amor dá a ele identidade: a lei da vida.
O intelecto, em seu poder analítico, distancia e separa, compartimentalizando os conteúdos
para compreendê-los e construir uma lógica, sequencial, com causa e efeito. A linearidade pode
encapsular esses conteúdos, retirando as possibilidades, impedindo novas inter-relações,
objetivando o processo… Com isso, sem sombra de dúvida, produz a secura, fruto do fogo
intelectual, do Spiritus Intellectus.
A abstração em si seria uma atitude masculina. Por outro lado, a atitude feminina busca, na
empatia e no envolvimento, a compreensão do que se apresenta.
Consciência feminina é receptiva em relação ao que sente, seja o impulso ou
mesmo a invasão do espirito. Essa sensação é mais forte do que a sensação de si
mesma como fonte. Os insights precisam amadurecer, ser assimilados numa
experiência orgânica sensorial total, para que sejam reais. A vivência feminina é
propensa – ou está entremeada aos processos de crescimento e decadência, aos
ciclos naturais de vida, ao amadurecimento e morte, e aos ritmos e períodos de
natureza, espirito e tempo. Vincula-se à Lua. Vivencia o tempo como qualidade.
Por isso, o tempo está sintonizado com os estados de ânimo, com os
significados, com a qualidade favorável ou desfavorável do momento. Espera
com mais paciência. (WHITMONT, 1991, p. 152).
25/10/2007
O tempo é o grande escultor, que permite a revelação de todo o trabalho oculto pela
natureza, e o sandplay presenteia-nos, tornando-a visível.
A gata preta, ao mesmo tempo que está guardando, sabe. A águia domina o vôo
preciso, enxerga muito longe. As pedras formam uma parede lateral, abaixo,
como se essas pedras tivessem afundado e vêm para cima para mostrar algo
bonito. Aqui um cara tipo tirando sarro, observando de longe (máscara). As
joaninhas estão indo embora. O galo tá ciscando lá na casa dele, e ele é
pequeno, tá indo embora…
A gata é um símbolo do feminino; ela representa os humores ligados aos ciclos de
fertilização da natureza. Os egípcios conheciam muito bem esses ciclos e ritmos, os quais
representavam como Bastet, a gata, e Sekmet, a leoa. O instinto selvagem era reconhecido e
integrado.
“A anima divina, Bastet, é o estímulo, a magia da vida.” (VON FRANZ, 2000, p. 151).
Pode-se dizer que a natureza feminina quer ser fecundada. Vemos a terra arada, campo de
Deméter, bem aventurança, graça, abundância, fartura. Um retorno aos mistérios de Eleusias, à
sacralidade do útero da terra, ao amor entre mãe e filha, Deméter e Core/Perséfone.
De acordo com Taylor, o platonista, a lenda de Deméter representa a evolução
da parte de autoavaliação de nossa natureza, a que, propriamente, denominamos
intelecto, e Perséfone é aquela parte vital e animada, a que chamamos alma.
Plutão significa o papel da natureza material e, segundo Pitágoras, o império
desse Deus inicia-se nas profundezas da galáxia e vai até a Via Láctea. Salustio
diz que, entre as divindades humanas, Ceres é a divindade do planeta Saturno.
(WRIGHT, 2004, p. 90).
O objetivo da iniciação (nos Mistérios de Eleusias), de acordo com Platão, era
restaurar a alma ao estado do qual ela se se desligou, e. Prócles afirma que a
iniciação nos Mistérios afastava a alma do homem de uma vida material,
sensual, e meramente humana e a unia em comunhão com os deuses.
(WRIGHT, 2004, p. 64).
No meio, à direita, temos uma máscara que nos alerta sobre o outro olhar que acompanha o
percurso. Aquele olhar sem vida da Medusa está ganhando nova vida. A relação flui de um
campo ao outro, transformando as barreiras.
A águia e seu poder de foco não têm tanta visibilidade quanto a multiplicidade das
sementes e seu potencial de fertilidade. Pura riqueza interior.
Segundo Vernant, Medusa, Ártemis, Dionisio, são os poderes, ritualisticamente,
configurados como mascarados.
A máscara, com sua característica plana e perfurada, separa o Um do Outro, a
Identidade da Alteridade. A alteridade elaborada por Platão, com seu conceito
de tó tó teron, representa o outro, imaginário ou real, necessário para a
existência mesma do pensamento. (BOECHAT, 2008, p. 80).
O complexo de Medusa continua presente; porém, visivelmente desconstruído. Mais uma
vez, retorna o conflito, e o sofrimento reveste-se de indignação diante do agressor que subjuga,
mas também diante do desejo de receber aprovação de sua mãe. Conta que ela nunca abraçou ou
beijou e sempre controlou para afirmar sua própria vontade. Ela é muito séria, sem alegria na
vida. Relembra o avô e a avó, o olhar da tradição que julga e não abre, não aceita o outro,
ninguém fora daquele meio. O avô sentia a vida como um fardo e ficava só na escrivaninha.
Aparece o olhar da mãe crítica e as raízes européias. A avó não compareceu no casamento
de sua mãe, pois seu pai era brasileiro. Ele foi fazer doutorado em Portugal e provou ser capaz de
constituir família, superando qualquer preconceito. O meio universitário tornou-se sua fortaleza.
Em sua fala espontânea, desabafa:
Ele quis me dominar, castrar, conduzir meus sentimentos. Minha mãe, para ele,
é uma deusa, é européia, íntima e confidente.
02/11/2007
Sob o signo do masculino, o velho continente vigia. Rege as leis, observa as regras e
normas de conduta, exige perfeição. Uma escrivaninha contém as forças do instinto, o mundo
perde o colorido. Utilizando o grafite, ela delimita a castração. O olhar volta-se para o controle
do outro.
A avó materna parece falar: “Eu sei o que vocês estão fazendo” (soberana). É
uma alma velha. Tá achando ruim. E o que está fazendo... Sempre tenho a
impressão de que estou com alguém. É ruim…
Sua avó impunha hierarquia, falava de nobreza: “Os filhos tinham nascido para ser nobres,
e não súditos.” Falava de forma depreciativa de seu pai, que era do país das cobras, do país dos
esquecidos; era um tupiniquin.
Diante dessa herança pétrea, a psique inconsciente produz imagens para impressionar e
provocar a consciência, desafiando-a a participar, a envolver-se em busca de significados para
esses conteúdos. Somos seres criativos em busca de realização.
08/11/2007
Apresenta-se o descontrole, é inevitável. Desenha o irmão e ela, diante do pai:
incontinência. Não se sente capaz frente à autoridade e força do outro, que constitui assim um
impedimento ao crescimento e à fluidez da comunicação.
Na nigredo (negrura) o cérebro se obscurece. Assim diz uma receita de Hermes, citada pelo
Rosarium:
Toma o cérebro, tritura-o com vinagre forte ou com urina de menino, até que ele
se torne escuro. Esse escurecimento é, ao mesmo tempo, um estado psíquico
que, como já vimos, é designado melancolia. (JUNG, 1990, p. 271, § 390).
28/11/2007
Pouco tempo depois, consegue dar mais ênfase ao sentimento de perda:
Aqui, urubus... Coisa meio que come carniça, fica sobrevoando. Nuvens negras
que não deixam ver o sol, o azul. Tudo sombrio, pesado… Moça com Arminho,
de Leonardo da Vinci. Vivo, bichinho doce…
A obra de Leonardo, Moça com Arminho, retrata uma mulher de boa família, admirada
pelos seus dons artísticos. M. F. traz à forma toda a negatividade ligada ao absolutismo da razão,
que é grotesca, que intimida e anula a beleza, a suavidade e a doçura. A brutalidade dessa
imagem denuncia a falta total de sensibilidade.
Através de forte carga expressiva, sua alma continua a denunciar seu estado de abandono e
escolhe uma imagem submersa nas profundezas do silêncio inerte.
12/12/2007
Representa:
O “nó”, o muito que não consigo digerir… Como se só olhasse, não
expressasse, estivesse escondida…
Seguindo ludicamente as imagens, vemos agora a Medusa invertida com muitas pernas, tal
como raízes ainda fora do habitat natural; mesmo mergulhadas, continuam seduzindo e
provocando o deslocamento para o local próprio de sua natureza feminina, para a intimidade de
todas as coisas.
Orígenes: Entende que és um outro mundo em miniatura, e que o sol, a lua e as
estrelas estão dentro de ti. Da mesma forma que o mundo não é uma
multiplicidade de elementos incoerentes, mas repousa inteiramente na unidade
do seio de Deus, o homem não deve dissolver-se na multiplicidade contraditória
das possibilidades e tendências que o inconsciente lhe aponta, mas sim tornar-se
a unidade que abrange toda essa diversidade. (JUNG, 1988, p. 186, § 397).
O movimento de retorno às raízes em busca da fonte…
Através da análise, torna-se possível o confronto com o inconsciente. As ferramentas são
diversas. A escuta, a análise dos sonhos, as técnicas expressivas e a experiência da analista
oferecem o campo fértil para a realização da meta proposta pelo Self. Em sua história de vida, a
analista forjou suas emoções em barro, bronze, pedra e resina. Recuperou a feminilidade
aprisionada, expressando-a, organizando o caos, forjando as emoções, tornando o feminino
digno, consistente, presente em sua capacidade de perceber o outro e acolher na alma com amor.
A transferência e a contra-transferência asseguraram a continência e a consolidação do
processo criativo. A analisanda possui um padrão de agressividade introvertido, assim como a
analista, que abre sua ferida e sente a dor novamente. Empatia e desejo de reparação são
ingredientes fundamentais para a transformação.
A elaboração da prima-matéria do conteúdo do inconsciente exige do médico
uma paciência infinita, perseverança, equanimidade, saber e competência; e do
paciente, o uso de todas as suas forças e de toda sua capacidade de sofrer, o que
também não poupa o médico. (JUNG, 1988, p. 179, § 385).
31/01/2008
Estamos no início de 2008, e a analisanda traz a imagem que veio durante a semana. Sem
palavras. Estas nem se fazem necessárias! Nasceu com o dom da expressão, através do desenho.
O grito surdo e ensurdecedor é, ao mesmo tempo, passivo e agressivo, carregando o tom
emocional do desespero, o qual a deixa sem saída, sob a ordem da obediência. Transgredir,
compreendendo e reagindo de acordo com seu próprio ponto de vista, traz a agressividade para o
campo do dominio de si, tornando-a forte e resistente.
Comenta que existe um romantismo sem fim com o pai; porém, “Quando ele é estúpido,
gostaria que ele morresse… Tô com 37 anos e com um pai atrapalhando.”
Sonha que está em Veneza, numa gondola, passeando com seu pai. Lembra-se de que, aos
9 anos, não queria fazer fotos para publicidade, e o pai a obrigou, não a respeitou e a expôs. Aos
11 anos, ele publicou seus contos.
19/02/2008
Sua alma feminina grita por ajuda, pede resgate, precisa retornar à natureza:
Em cima: é o que o ar pode me dar, sensação de leveza, ter liberdade, me
locomover, não estar amarrada. Estar mais junto da natureza, da essência. Não
precisar provar nada para ninguém. Essa coisa meio adolescente; vontade de ser
alguém. Autenticidade. É aquela coisa dos 9 anos, de ter ficado presa em algum
lugar, algum momento, de não ser mais capaz de sentir. Perdeu a coisa da
criança, a espontaneidade, parece que começou a se sentir vigiada. Medo de
magoar. Parece que eu nunca vou alcançar. Tô tentando sair de uma coisa de
afogamento, prendendo, não tô conseguindo respirar; parece que está debaixo
d'água. O que prende... Coisas de fora... Sei que tenho potência presa.
Recorda que teve uma educação esmerada, não podia contradizer a autoridade – obediência
sempre –, e nem podia chorar.
Eu nunca vou alcançar… Minha mãe dizia que ser mulher é uma merda… A
mulher tem uma carga biológica muito grande… Ela era feminista ao extremo.
Recontamos a história do feminino, ao longo dos últimos dois mil e quinhentos anos, e
enxergamos que um passo para além do feminismo é um retorno ao feminino. Relacionamos
intuição e intelecto, trazendo à consciência o campo das possibilidades, e reconhecemos ser uma
realidade que se pode atingir. Contornar o buraco do abandono, sentir a raiva e conseguir
expressá-la para, então, compreender os anos e anos de repressão e contê-los para transformá-los
na mais genuína potência criativa, é possível nesse momento do desenvolvimento da consciência
humana.
26/02/2008
Novamente, o conflito resurge. Pode-se dimensionar o poder do complexo autônomo no
seu núcleo destrutivo e a revolta causada pelo desrespeito:
É uma cratera, é rocha, é lava. São pessoas. Essa falta de afeto lembra a
cunhada. É vontade de matar, de destruir, esganar. Eu acho que é uma sensação
boa… destruir minha passividade, coisas que me fazem mal, que me dão
vontade de matar. Todos esses monstros, a agressão, essa coisa que dá dor no
peito, na perna… O outro no comando? O outro definindo? O outro julgando?
A representação mental em imagens tem ligação com o corpo; ela é produzida pelo lado
direito do cérebro, ela tem movimento. Uma capacidade imaginativa restaurada pode trazer para
a mente reflexiva, associada ao lado esquerdo do cérebro e à sua formulação em palavras, o
núcleo traumático. Colocar em imagem, e em palavras, as emoções reprimidas é a chave para a
redenção do espírito pessoal. A eficácia curativa nos é presenteada pelo inconsciente mobilizado
no processo terapêutico.
Emoções vulcânicas falam da dor profunda da dissociação mente/corpo. A natureza da
ansiedade está ligada a essa cisão. A memória da situação traumática implica numa
descontinuidade da vida, numa interrupção da fluidez, e mobiliza defesas primitivas contra a
repetição dessa ansiedade. Esse mecanismo faz parte de nosso sistema de autocuidado, o qual
permite a continuidade da vida; porém, continuamente, fragmenta a experiência insuportável
ligada ao complexo traumático. Aparece o tirano interno.
“O trauma externo, por si só, não divide a psique. Uma entidade psicológica interna –
ocasionada pelo trauma – executa a cisão.” (KALSCHED, 2013, p. 33).
13/03/2008
Uma lucidez ilumina a essência de seu drama:
Me sinto uma aberração. Mãos e braços, incapacidade de realizar as coisas,
como se o cérebro tivesse crescido, mas com um conhecimento intelectual
inútil. Excesso ruim, falta para outras partes uma completude, um ser, mais
equilíbrio! Uma perna esmagando e a flecha. Parece uma relação sexual... Entra,
vai rasgando, machucando, e entra no coração, que é sentimento. Como se fosse
um estupro da filha. O pai está mais preocupado com o show, a plateia, e está
cagando e andando para quem está embaixo dele.
A personalidade desse pai tiraniza sua alma. A libido presa na figura paterna deforma sua
autoimagem. Configura a sua prisão tanto no nível pessoal, quanto coletivo, na exigência de uma
perfeição absoluta. Como tem dentro de si um padrão introvertido de agressividade, esse
impossibilita a reação imediata e exige um tempo para elaboração. A agressividade pela
agressividade é o mal em si. Extremamente prejudicial.
Com efeito, muitas vezes, é a imagem química, a imagem material, que dá vida
a expressões animalizadas. Assim, as mágoas “corrosivas” jamais teriam
recebido esse nome se a ferrugem não tivesse “corroído” o ferro, se a ferrugem
não tivesse aplicado, incansavelmente, seus pequenos dentes de rato sobre o
ferro dos machados. (BACHELARD, 1990, p. 49).
M. F. precisa confrontar esse masculino interiorizado e, para tal, necessita do animus
positivo, ativo.
O animus, como função de integração, está sendo preparado nesses retornos da energia
recalcada. Passo a passo, a força de integração vai trazendo para a consciência as emoções que
amarram e drenam sua energia, impedindo seu crescimento psíquico.
01/04/2008
Totalmente à vontade no espaço terapêutico, ela escolhe novamente o sandplay para
expressar-se:
Cidade mais rural, lembra São Miguel, cidade onde eu nasci, super religiosa,
moralista; é bonita, mas as pessoas têm como acordo o princípio do julgamento;
as pessoas tentam excluir…
Nessa paisagem da alma, vemos Isis com asas abertas, protegendo os ciclos de
transformação da matéria inerte para ganhar vida. Ela está no final do caminho das pedras,
acolhendo a chegada para o interior da casa. O vaso, o fogão, o ninho estão ali aguardando.O
pastor e as ovelhas também aparecem abrindo passagem para a renovação. Ele conhece a
natureza e seus dons curativos. Masculino e feminino arquetípicos divinizados amparam o
processo. A rigidez dos valores mineralizados sob o jugo da lei da espada decompõe-se. O
quatérnio masculino:
rei de espadas, gladiador, guerreiro com armadura e homem com
escafrando são capturados nessa cena reveladora. A intimidade está ali, bem próxima, e a
serpente de pedras nos traz Hermes e suas pedras (as Hermas), que conduzem a alma no caminho
das virtudes, vigiando os vícios, as compulsões, os excessos. Ele é o deus das fronteiras, aquele
que interliga os mundos da transcendência espiritual, da imanência terrena e das profundezas do
Inferos, o interior das aparências, a essência em si.
A alquimia francesa do século XVIII conhecia o rei, isto é, o enxofre (quente),
vermelho do ouro, e o denominou Osíris, e o úmido (aquosum) Ísis. Osíris era
“o fogo escondido da natureza, o princípio ígneo, que tudo anima”; Ísis, “o
princípio material e passivo de tudo”. O despedaçamento de Osíris corresponde
à solucio, putrefactio (solução, putrefação) etc. Da última, diz Dom Pernety, de
quem provém esta citação: “Solucio corporis est coagulatio spiritus” (a
dissolução do corpo é a coagulação do espírito). A negrura pertence a Ísis.
Sobre sua vestimenta, diz Apuleio: “Palla nigérrima splendescens atro nitore”
(uma pala nigérrima brilhando em negro esplendor). Quando o céu ou o Sol
inclinar para ela, serão todos envolvidos pela negrura dela. (JUNG, 1990, p.
272, § 391.)
O
Nessa difícil elaboração de suas dificuldades relacionais, M. F. encontra novos caminhos e
deseja contribuir com uma postura de respeito pelo ser humano:
Existem outras formas de conquista se você se dispõe a ouvir, abrir o caminho
para a relação, para um ser humano que sente.
13/05/2008
Novamente, reporta-se ao mal estar da brutalidade:
Um ataque, uma coisa meio sem rosto, parece gratuita. Às vezes, o irmão e a
cunhada... Sente que é uma batalha, e não uma confraternização… O irmão e a
cunhada vêm com a baioneta, arma perigosa. Se a pessoa não morre, acaba de
matar (extermínio). O homem de braços abertos... o coração... diante das armas!
Falta de respeito pela vida. Esta é uma pintura de Goya: O Massacre de 13 de
Maio de 1808. As tropas de Napoleão invadiram a Espanha, e o povo rebelou-se
contra. Enfrentaram e foram massacrados. Foram um dia e uma noite de
massacre.
Em sua intimidade, sente-se como se não tivesse o direito de ter luz, como se tivesse que se
esconder. Sente vergonha e, diante do julgamento público, está destinada a uma condenação.
Estamos no segundo ano de análise, maio de 2008. M. F.sonhou que estava na faculdade,
onde era o colégio Divina Providência, na quadra coberta e na descoberta. Tinha um cara mal
encarado, sentado, meio abaixado num cantinho. Passou o olho: “Virgem Maria, acho que não
vou continuar”. Passou, desconfiada, mas foi pela quadra aberta. Começou a fazer uma dança,
com gritos do homem das cavernas, a céu aberto, como se fosse um ritual, exorcizando: “Ah,
baixinha”. Pegou uma metralhadora e comecou a metralhar, mas não a atingia. Chegou à Rua do
Rosário, e ele metralhando. Ficou na calçada. Se viu correndo, e ele continuava metralhando.
Volta para o Divina, e a casa coberta estava pegando fogo, como se tivesse sido bombardeada.
Sente-se retalhada quando a criticam. Prefere a discussão viva, participativa. Acha que o
cara no sonho era uma encarnação do mal, um criminoso; passou por ele e foi fazer o que sempre
quis fazer: “O meu grito selvagem, de liberdade.” Aquela dança tinha alma! Coloca que o grito e
o espaço da dança são uma coisa natural: “A minha agressividade, quando quero colocar uma
posição; não sinto necessidade de atacar, de destruir; quando a gente entra com argumentos
certos e não se descontrola.” Lembra-se das vezes em que perdeu o controle e não gostou.
Dentro do campo transferencial, é interessante trazer as memórias da analista, que
trabalhou nesse colégio como professora de Artes, entre seus 19 e 24 anos. Na casa coberta,
ficava a Sala de Artes, e os páteos eram usados para Feira de Artes, uma atividade interativa com
alunos do pré ao segundo grau. Cerca 1.300 alunos expunham suas criações nas diversas formas
de expressão: verbal, musical, plástica, como também no teatro e na dança. O movimento
artístico foi muito intenso na época, cujo relato resultou, anos depois, num livro didático que
trouxe o conhecimento de volta para as aulas de Arte.
Se, como diz Fayga Ostrower (1987, p. 159), “é no nível de valores internalizados que se
dá a criação”; então, o entrelaçamento da Arte com a Psicologia também se dá no nível do
autoconhecimento, do aprofundamento e da conscientização de si.
10/06/2008
Neste outro sonho, aparece a sobrinha duplicada:
Estamos num quarto daquelas casas antigas de madeira. É um lugar pequeno,
mas não é escuro, frio. De manhã, bate um solzinho, é um lugar tranquilo. Aí,
aparece minha sobrinha em decomposição, aquele rosto chupado, aquela boca
roxa, lábios bem roxos. Está num lugar alto, uma maca. A outra que está viva
quer ver o corpo em decomposição. Ela faz força, insiste para entrar no lugar.
Não sabe quem a impede... será seu lado impressionável? Ela entra. Vê como se
visse da sala (é seu lado super-sensível, que vai impedi-la de ver esta coisa
terrível que é a morte concreta do corpo, que é horrível). Acorda,
impressionada.
Reconhece o sensível e impressionável versus o insensível (dissecar, saber) e também o
padrão passivo/agressivo instituido:
Meu irmão não levanta a voz, ele vai argumentando, argumentando, vai
destruindo, destruindo, devagarinho. Tenta humilhar, reduzir o outro a nada. Aí,
o outro não tem voz, sentimento, coração, nem palavra. Se a pessoa vacila uma
vez, ele retira o afeto, despreza, ignora, passa reto, não fala. É onipotente.
Indiferença! Ele sai que nem um leão, e eu que nem um ratinho.
Visualiza-se, aqui, a onipotência da criança, a onipotência do pai, o jogo com a arma
verbal, e o silêncio amedrontador próprio da ameaça e do subjugo. A tirania dos afetos e a guerra
entram em ação na intimidade devastada pela agressividade. A vítima e o dominador dançam ao
som do medo da rejeição. Não há amor onde o poder e a hierarquia têm que se estabelecer.
A casa do sonho lembra a casa do avô paterno. Lembra-se das tias, uma em especial que é
a matriarca: “Ela é ruim, uma cobrinha, é mesquinha, fala mal.” Todas as cunhadas têm que ser
eliminadas; são rejeitados os que não são do sangue. “Os estrangeiros têm que ser eliminados.”
Enfatiza que falta bondade, humildade, e que a família não é unida: “Como se fosse um monte de
tiranos; não aceitam as pessoas de fora.”
Alimentar a onipotência torna-se um vício. Todos têm razão. A divisão é estabelecida. O
corpo decompõe-se. Não há unidade.
09/09/2008
“Retorno a um tempo onde tinha tempo, espaço para a expressão. Fluir.”
M. F. organiza-se e permite-se voltar a dedicar tempo e espaço para criar em sua própria
casa. Lembra-se de Lisboa, onde terminou o curso de arquitetura aos 22 anos de idade.
Durante três horas, desenha em simetria, sem tirar o lápis do papel. Domínio absoluto,
concentração profunda, traço impecável. Muitos olhos. Controle total. Essa seria também a
imagem que corresponde a sua obediência à ordem, enquanto a executa. Doação. Perfeição.
Morte. O amo (intelecto) ordena, e o escravo (corpo) executa.
A diversidade aparece como uma figura com múltiplos olhos, que parecem a tudo
controlar. Não pode errar! Seria uma outra versão daquela imagem da avó e a escrivaninha.
Por outro lado, este momento marca o início da permissão para um novo tempo, uma
sistematização inicial do traço, para depois permitir soltá-lo.
O processo analítico, com suas sessões de escuta, análise de sonhos e técnicas expressivas,
proporciona uma verdadeira Intimizade (termo forjado por uma analisanda) e tem como
pressuposto a confiança em todos os sentidos. A entrega para a liberdade de criar conecta com a
fonte inconsciente e seu potencial de gerar imagens.
A utilização das técnicas expressivas, incluindo a caixa de areia, exige do terapeuta o
desenvolvimento das raízes em si próprio. Inclui o conhecimento do simbolismo arquetípico e da
psicologia complexa, fortalecidos por um competente treinamento clínico e, sem dúvida, por sua
experiência de vida e sua própria análise pessoal.
Resulta dessa experiência um tipo de processo de crescimento que inclui a compreensão
das forças que permeiam a aquisição deste saber de si para além do conhecimento mental. Uma
atividade feminina da aceitação da concepção permite a assimilação e o amadurecimento no
tempo da necessidade. Temos o espaço materno, útero psicológico, como metáfora emocional
para a unidade urobórica mãe e filho; é neste espaço livre e protegido que o Self pode ser
constelado, trazendo o caminho de cura da ferida psicológica interna. Criatividade e renovação
são agraciados após o percurso. Essa vivência interna pode ser apenas verbalizada parcialmente,
assim constituindo uma abordagem não verbal, com sua qualidade contemplativa que traz de
volta o feminino em si, um conhecimento do outro sem palavras.
Sustentar a máxima do feminino – o conhecimento do outro sem palavras –,
proporcionar intimidade e proximidade e estar em comum união é o próprio
Húmus gerador da criatividade no nível do feminino. (SÁ, 2005, p. 174).
Num continuum, matéria e espírito dialogam, a analisanda escolhe modelar uma cabeça em
argila, um filósofo com a corda, a serpente enrolada no pescoço. Filosofar, pensar a existência
humana. E a rocha e a água reaparecem.
A argila, como matéria mole, dá plasticidade à psique, contém em doses homeopáticas as
águas emocionais, permite a justa expressão do conflito e já é ela mesma uma solução. As mãos
brincam a feminilidade aprisionada da matéria, e o movimento céfalo-caudal serpenteia
contornos, dança a sabedoria.
14/10/2008
Limites que criam obrigações estão na simbologia do laço, da corda, do nó. São modos de
falar dos limites de Ananké, o direito inelutável da necessidade. Não há saída. A necessidade
impõe-se como um limite que cria obrigações, como um direito. Inelutável, ela subjuga e faz
cumprir o destino.
Temos aqui uma sisígia, um par arquetípico, o Tempo e a Necessidade.
É necessário estrangular o Senex e seu pensamento linear, matá-lo de alguma forma,
estreitá-lo, assim diminuindo sua velocidade cortical.
A problemática do corpo como lugar do sagrado exige uma nova atitude. O pensamento já
foi longe demais.
Ananké, a necessidade, é a cobra, a serpente enrolada no pescoço, que asfixia.
É o seu destino; não pode fugir dele. Ela é o nó, a coação da necessidade que produz a
ansiedade de sufocamento. O vínculo estreito é uma metáfora do estreitamento. As necessidades
não atendidas geram as compulsões.
A serpente é um símbolo motor por excelência. Um arquétipo em si, com sua potência de
gerar imagens. Imagens de penetração. Estamos diante de um princípio de deslocamento, a
espontaneidade do movimento...
Espontaneidade é o que propõe Bachelard em seus devaneios da intimidade das matérias,
que fundamentam uma psicanálise natural, um resgate das raízes no corpo, o corpo e suas
diversas expressões para além das palavras. As mãos entram em ação, serpenteiam as
necessidades espontâneas da psique em busca de equilíbrio entre as forças que a ameaçam de
petrificação ou dissolução.
A dialética do duro e do mole rege todas as imagens que nós fazemos da
matéria íntima das coisas. Essa dialética anima – pois só tem seu verdadeiro
sentido numa animação – todas as imagens, mediante as quais participamos
ativamente, ardentemente, da intimidade das substâncias. Duro e mole são os
primeiros qualificativos recebidos pela resistência da matéria, a primeira
existência dinâmica no mundo resistente [...] na ordem da matéria, o sim e o
não se dizem mole e duro. (BACHELARD, 1991, p. 15).
11/11/2008
Um novo momento. Ousa mais e arrisca. Desliza o pincel na água colorida, aprende a
girar, a segurar a totalidade. É possível ser inteira. Sentir, perceber e deixar a intuição fluir.
“Quero ouvir a música das esferas, o som do universo, o amor…”
Enquanto pinta, fala da intimidade cuidada, preservada e não colocada em julgamento
público. Permite-se o prazer de ser, simplesmente.
Ouvir música é entrar no campo das vibrações ligadas à construção de um corpo de luz, um
corpo sensível, um corpo que sabe. Música é sentimento, é emoção e coloca-nos em relação com
o mais íntimo de nosso ser.
Ouvir a música das esferas seria um retorno à harmonia original, uma vibração em perfeita
hamonia, cores e tons, em um corpo uno, divinizado.
.
Em Elêusis, foi mostrado o caminho para assegurar o melhor dos destinos
possíveis para a alma depois da morte. O milagre da regeneração, em lugar da
eternidade do ser, foi ensinado […] Os nove dias do Festival significam o
declínio da alma. A alma, caindo de sua morada divina e original no céu, passa
através de oito esferas, a saber: a esfera constante e os sete planetas, assumindo
um corpo diferente e empregando diferentes energias em cada uma, tornando-se
finalmente conectada com o mundo sublunar e um corpo terreno na nona esfera.
Acredita-se que Deméter e a fundação da arte da lavoura significam a descida
do intelecto aos reinos da criação, o maior benefício e ornamento que a natureza
material é capaz de receber. Sem a possibilidade de participação do intelecto na
esfera inferior da matéria, nada além de uma vida irracional e brutal subsistiria.
(WRIGHT, 2004, p. 87-92).
Para a psicologia analítica, o resgate da metáfora alquímica permite-nos encontrar, na
relação com a matéria, imagens nascidas do interior do homem e que nos trazem um paralelo do
processo de análise com um processo químico de transmutação da materia. Isso começa pela
nigredo, um estado caótico da condição primeira do estado da matéria ou, no nível psicológico,
um estado de dissociação das energias, no qual nos deparamos com nossa própria sombra, e a
consequente dor psíquica do reconhecimento do lado desconecto que precisa de integração. Num
segundo momento, temos a albedo, estágio de purificação e embranquecimento da matéria, ou a
catarse, clarificação e conexões psíquicas necessárias à ampliação da consciência, bem como ao
confronto com a contra-sexualidade (anima-animus). O terceiro estágio, ou de amarelecimento –
citrinitas –, é considerado como uma passagem ao estágio seguinte, o qual, para a psique, seria o
momento de educação e autoeducação, o compromisso ético de transportar para a vida o
conhecimento adquirido. A personalidade madura é consequência do trabalho realizado, o opus
alquímico, com o nascimento do Homem e da Mulher Interior, ou seja, o reino do Deus e da
Deusa dentro de nós. A iluminação possível na unidade corpo-alma-espírito; o surgimento do
ouro puro para os alquimistas ou o estágio da rubedo, no qual ocorre a integração
masculino/feminino, indivíduo e coletividade, espírito e matéria, micro e macrocosmos.
Estamos no terceiro ano de análise. O prazer de viver a maturidade é visível.
Na virada do ano, M. F. permite-se ir para a Ilha do Cardoso com o namorado e o filho.
Eles já conviveram tempo suficiente, e foram sete dias de realização de um sonho que parecia
impossível de acontecer. Está amando novamente e respeitando esse sentimento. Sabe conduzi-lo
com mais segurança. A natureza faz seu trabalho silencioso de renovação. Sente-se mulher, mãe
e profissional; feliz por se permitir cuidar de suas escolhas.
07/05/2009
Em maio de 2009, volta o sintoma da enxaqueca, vai ao iridologista, e ele diz que é
intoxicação. Está pesquisando imagens pré-colombianas e constata que uma boca aberta e uma
cara serviam para afugentar maus espíritos. Resolve representar e, no seu desenho, coloca garras,
corôa e as ondas saindo da boca. A aquarela auxilia a purgar. Eu digo que um jeito de
desintoxicar é vomitar. Conversamos sobre estar intoxicado, enquanto ela aquarela a obra. Diz:
Uma fera que está atacando, mas não é agressiva, não é em direção a alguém.
Tá equilibrando as forças dele para usar no momento certo. É como se estivesse
fluindo as coisas dentro. Ele tá preparando para um ritual, tá pintando, é de uma
tribo primitiva. Deve ser um encontro para a espiritualidade. O azul, a água, as
bolhas de ar misturadas; depois, sairiam e explodiriam, como se estivessem se
purificando, pois dentro do liquido estão meio carregadas. É um olho meio de
fera brava; lembra aqueles negros tão negros que têm o olho amarelo. Se fossem
palavras mágicas, seriam de sabedoria. Não tem perfeição, está se livrando de
algo.
Com as patas no chão, o animal xamânico mostra seu poder. Vemos a coroação da Grande
Mãe-Terra, e o retorno de suas potencialidades criativas ao nivel do feminino, do corpo que
fala.
Na arqueologia das imagens, essas são repetidas ao longo das épocas e trocam suas
vestimentas, mas sua essência continua a gerar possibilidades. No mito grego da criação, o
cosmos de luz nasce do caos primordial, um abismo insondável, e é ameaçado de devoramento
pelas forças titânicas originais que tentam impedir sua libertação.
Atingida a idade adulta, o futuro senhor do Olimpo iniciou uma longa e terrível
refrega contra seu pai, Crono. Tendo-se aconselhado com Métis, a Prudência,
essa lhe deu uma droga maravilhosa, graças à qual Crono foi obrigado a vomitar
os filhos que havia engolido. (BRANDÃO, 1986, p. 332).
Um cosmo como uma unidade de luz relaciona-se com a multiplicidade de possibilidades,
harmoniosamente criando infinitas melodias ímpares.
Segundo Walter Boechat,
[A] mitopoese da psique [...] é a capacidade da psique de produzir mitos [...] a
psique tem a capacidade natural de produzir imagens mitológicas, que são
imagens arquetípicas, nas mais variadas situações do cotidiano. (2008, p. 13).
Nessa mesma época, o pai aposenta-se e propõe uma viagem em família. As raízes
portuguesas podem mais uma vez serem revisitadas.
18/06/2009
Conversamos sobre o ódio e o medo dos valores femininos emergentes, da revalorização e
dos cuidados que requer. Tocada pela emoção, faz um cenário na areia e usa elementos naturais,
madeira, metal, pedra.
Não estou sozinha nesse mundo. Essas coisas me ajudam a viver. Cortar lenha
para o fogo, pescar, tirar água, enquanto o companheiro vai fazer as coisas dele.
A mulher inteira e seus símbolos preenchem a cena. Vemos a natureza, a casa, o barco, os
potes, as flores e a gatinha. Essa gata seria uma humanização de Bastet, a gata negra, símbolo de
Ísis no antigo Egito. Sim, os ciclos de agressividade estão mais conscientes, bem como o poder
cortante de seu intelecto, fonte de suas enxaquecas. Na diagonal espiritual da cena, em oposição
ao machado e ao toco de árvore, vemos a mulher dentro de um círculo apotropaico, aquele que
protege sua integridade contra as forças arrebatadoras das compulsões intelectuais. No cavalo, a
força e a sensualidade.
Verdadeiras Hermas fazem o caminho de integração de seu animus positivo. Hermes,
Deus da comunicação e das fronteiras entre os mundos, aparece também no símbolo do poço.
Saber dosar, relacionar internamente os conteúdos que transitam entre a consciência e a
inconsciência caracterizam essa imagem. Raízes arquetípicas estão consteladas. A certeza de
uma permanência faz-se presente, curando a alma das possessões do espírito.
Existe uma relação indubitável entre o símbolo do lápis (pedra) e o conceito
empírico do si-mesmo [...] Mercurius é espirito e matéria; o si-mesmo, como
indica sua simbólica, abrange tanto a esfera psíquica como a corporal. Esse fato
exprime-se de modo particularmente evidente nas mandalas. Porém, Mercurius
é também a água, que [...] ocupa uma posição intermediária entre o volátil (ar e
fogo) e o fixo ou sólido (terra), por aparecer tanto no estado de agregação,
liquido, como gasoso, e até mesmo na forma sólida do gelo. O Mercurius tem
em comum com a água a aquaeositas (aquosidade) por ser, de uma parte, um
metal e amalgamar-se com metais na forma sólida e, de outra parte, líquido
vaporizável. O fato de ele ser frequentemente comparado com a água tem sua
razão mais profunda no fato de ele reunir em si todas as propriedades
numinosas que ela possui, em virtude de sua semelhança com ela. Assim,
acontece que a ideia da água divina ou sulfurosa e da aqua permanens (água
eterna) domina a alquimia como o Arcanum (arcano) central, desde o tempo
distante em que ela era ainda a água sagrada e rica em bênçãos do Nilo, até
atingir parte do século XVIII. No decorrer dos séculos cristãos, ela, primeiro,
por influência hermético-gnóstica, assumiu a significação do Nous (espírito do
universo), do qual estava cheio aquele vaso divino para que os homens que
quisessem adquirir a consciência pudessem renovar-se nesse banho baptismal;
depois, a significação da aqua doutrinae (água da doutrina), como também a de
uma água mágica capaz de realizar milagres. A identificação com o
Hydrargyrum ou, respectivamente, com Mercurius, ocorrida já muito cedo,
trouxe consigo toda a tradição de Hermes Trimegistus para a esfera do
significado da água, que era, de qualquer modo, numinosa desde tempos
antiquíssimos. Isso pôde ocorrer tanto mais facilmente porque seu aspecto
materno primordial, como Matrix et Nutrix (matriz e nutriz de tudo), representa
uma analogia para com o inconsciente que dificilmente será superada. (JUNG,
1990, p. 258, § 374).
Em julho de 2009, retorna aos Açores; é a primeira vez que seu filho viaja para lá.
Em São Miguel, a casa da cidade era numa rua muito tranquila, a vida muito regrada e,
após quinze anos de economia, resolveram mudar para São Vicente, para uma casa que era de
férias nos anos 1970. Descendo um quilômetro, estava o mar.
Seu corpo emocional sensível reage intensamente aos excessos e, quando chega nas
Furnas, tem enxaqueca. Vomita e sente raiva, pois sabe que o dia está perdido. Desrespeita o
corpo, come para agradar, come sem fome e condena-se: “Quando eu vou aprender? Decerto,
quando tiver 80 anos.”
Confessa o quanto ama sua terra natal e sente falta daquela natureza quase intacta. A
saudade é imensa. Algo inexplicável; só na intimidade do ser pode haver uma compreensão.
Sim, é uma viagem de resgate das raízes. Elas precisavam ser revisitadas para alimentar a
cura interior e tornarem-se psíquicas. Uma consciência de raíz. Estar enraizada em seu próprio
ser para não se perder na imensidão de possibilidades.
De volta ao Brasil, retoma as reflexões. Várias conversas com sua máe sobre seu
relacionamento atual resultaram em indignação e comparação com o irmão e a cunhada. Nesse
momento de sua vida, encontra argumentos em defesa própria e dos valores que acredita.
Defende seu território.
06/08/2009
Atendendo à necessidade interna de reconexão, volta para a aquarela. Surge um quatérnio
formado por três peixes bem definidos e outro pouco definido; tal qual as quatro funções da
consciência, uma delas estará sempre muito próxima da inconsciência. São necessários quatro
pontos de vista para temos uma visão de totalidade, o Quatro torna-se o Um consciente,
constatando-se a alquimia secular.
A função sentimento aparece em todo o seu esplendor nas águas férteis do inconsciente.
Surge mais uma metamorfose do tema da Medusa. Em vez de cobras e sua poética da terra,
temos peixes e suas metáforas espirituais. O resgate da função inferior torna possível a vivência
espiritual e a manifestação do Uno.
Recupera, aqui, o que sua alma tem de mais valioso: sua fonte de vida e renovação!
O sacrificium intellectus [...] é ter humildade de se descer com as outras funções
para aquele nível inferior. Essa conduta produz um estágio entre as duas
camadas, mais ou menos no nível em que nada é pensamento, sentimento,
percepção ou intuição. Surge algo novo, isto é, uma atitude completamente
diferente e inédita em relação à vida, na qual se usam todas e nenhuma das
funções o tempo todo. (VON FRANZ; HILLMAN, 1995, p. 34).
É uma energia saindo daqui, é energia etérea, ela se transforma em onda. É uma
mulher, mas não é um ser estranho. Ela se transforma em onda, em peixe; ela se
transforma nessa água salgada. Cuidando dessa baleia, ela participa desse
mundo. Ela é o próprio mar. Aqui é um pedaço de baleia. A lua está lá em cima,
participa dessa vida aqui na água. Não é um mundo dividido em céu e terra.
Noite clara de lua. A baleia lembra os Açores, um dos símbolos do arquipélago.
Antes caçavam baleias, hoje não. É como se eu estivesse cuidando de toda essa
vida. Aquarela, a gente vai fazendo; e o resultado não é o que a gente espera.
Ela vai se moldando.
Também fala da mutação: o sexto dedo na mão que toca a baleia. No processo evolutivo,
as mutações genéticas estão ligadas às adaptações, e os genes permanecem como um código,
caso essa adaptação seja realmente necessária. Poderia ser, nessa imagem, um símbolo para a
nova consciência nascente, a consciência de alteridade, a fluidez entre mente e corpo, masculino
e feminino, uma vez que o número seis tem implicações com estas duas naturezas: a do feminino
e a do masculino.
O tempo cíclico vem agraciá-la com sua sabedoria. É tempo de vida nova.
20/08/2009
As tensões do mundo academico, durante o segundo semestre letivo, exigem do professor
dedicação quase exclusiva, e M. F. reclama que não aguenta mais o ritmo imposto: “Essa
rapidez; não aguento mais dar aulas, nunca está bem, não vou chegar lá.” Reconhece a voz
interior que cobra, como um homem que exige a perfeição inatingível.
Pede lápis preto duro e lápis aquarela, risca com força, rasga o papel e fala:
O cara com a foice, ele vai atacá-la pelas costas. Ela está alheia, está virando as
costas. Não é corpóreo, é como se fosse espiritial.
Aparece o olhar da cobiça. A perda do humus. Consumir, seifar secretamente, vorazmente.
A beleza queimada na negatividade da raiva! Nenhuma fertilidade possível. Esta é a imagem da
morte fria característica do Spiritus Intellectus.
Seria uma reapresentação do sonho com aquele homem mal encarado no páteo da
faculdade, mas aqui a imagem está bem definida; é a imagem da exigência de perfeição que
retira a vida ligada ao corpo, exaurindo-a, matando a beleza e impossibilitando a manifestação
do sentimento estético.
Subjugar as próprias emoções e os desejos espontâneos significa subjugar o
âmbito do feminino em prol do ideal masculino do autocontrole. (WHITMONT,
1991, p. 83).
Sístole e diástole são movimentos próprios da libido de reconexão. Introversão e
extroversão compõem e comunicam as forças do espírito e do instinto. O conflito é
continuamente reapresentado e vai se tornado consciente; na consciência, ganha a força da
possibilidade de mudar e dar uma nova resposta.
Devemos percorrer repetidamente o circuito dos nossos próprios complexos no decorrer de
sua transformação. As “forças de cima e de baixo” combinam-se na medida em que se cria a
personalidade unificada que une a psique pessoal (embaixo) com a psique arquetípica (em cima).
(EDINGER, 1995, p. 161).
24/09/2009
Destrutividade e criatividade são inseparáveis. Decompor e compor formam o constante
devir das forças criativas.
Reapresenta-se o quatérnio que precisa ser transformado em seu excesso de civilização
patriarcal, com sua negação e racionalização das forças do instinto. Uma releitura do gladiador,
do rei, do guerreiro e do mergulhador. As garras da mulher selvagem vingam os anos de subjugo.
A analisanda pensa nas máscaras africanas:
A primeira da esquerda é a raiva. Coisas que estão me incomodando. Quando
sobe à cabeça, a raiva mesmo… A segunda é o bonzinho, é também medo, só
que não é tão apaziguante como esse, mas tem um sorriso que não está com
vontade de dar. A terceira lembra Amadeus Mozart. O pai morre, e o retrato do
pai… Ele é a cara do pai, como se tivesse vigiando, até que ele faz careta, como
se não tivesse olhos, não enxergasse. É como se fosse o medo. Aquele da direita
lembra o professor da administracão e diretor: bagre ensaboado, nojento, tanço,
bobo, mas, no fundo, tem veneno. É como eu ficar possuída ou jogarem contra
mim essa raiva. Ao mesmo tempo, são máscaras, são meio fantasmas, assim.
Decide não ficar mais cem por cento do tempo na universidade. Reclama das enxaquecas.
Sabe que precisa de mais contato com a natureza.
No corpo, reside a sabedoria. A vida que vem do instinto e pulsa renovação. Estamos
diante da beleza do poder que purga o mal, aquilo que nos desenergiza e tira a vida. A raiva sem
expressão foi despotencializada e ganhou corpo
03/12/2009
Com a habilidade da artesã, continua seguindo sua sensibilidade e ampara, assim, seu dom,
alimenta-o com satisfação. Nasceu para produzir o belo através da experiência estética.
Estou limpando algo para depois refazer. Estou vomitando sangue. Não está se
desmanchando, não é indigestão da comida; é indigestão da emoção, do ódio
das outras pessoas quando a gente se depara com a raiva que jogam em cima da
gente, da opressão, da falta de liberdade, daquelas coisas das pessoas
prepotentes que não têm canal de comunicação, da frieza, sabe?
Com a clareza da sabedoria adquirida quando a psique consciente ouve o inconsciente,
M. F. firma-se nas próprias percepções, entra no campo da certeza de quem aprendeu a
compreender o processo de integração das forças que se apresentam no devir criativo.
Aqua permanens, cuius vis est spiritualis sangues id est tinctura. Nam corpus
incorporat spiritum per sanguinis tincturam quia omne quod habet Spiritum
habet et sanguinem (Água eterna, cuja força é o sangue espiritual, isto é, a
tintura. Pois o corpo torna corpóreo o espírito pela tintura do sangue, porque
tudo o que tem espírito também tem sangue). (JUNG, 1985, p. 12, nota de
rodapé 52).
O ciclo de quatro anos de análise, tendo a femininidade consciente como continente para as
metamorfoses da libido, proporciona o encontro com a tão desejada coniunctio oppositorum
alquímica, a união dos opostos, a última e mais difícil das operações.
Seguimos para o quarto ano de análise, e a plenitude da capacidade criativa do
inconsciente surpreende-nos outra vez.
M. F. produz com intensidade e cria uma história para esse momento tão significativo
05/03/2010
O nome dela é Minéia. Ela está se sentindo bem fisicamente, é jovem, forte,
saudável, mas há algo espiritual, emocional a ser transformado e que lhe dará
forças para continuar. Essa transformação a ajudará a um maior
autoconhecimento, o que irá dar solidez ao seu eu, tornando seus passos mais
firmes. Minéia chegou na floresta no fim do dia, depois que as energias da
produção, do trabalho, da força, da “lida” começaram seu repouso. Os animais
prepararam-se para dormir. O vento acalmava. Um vento fresco e puro soprava.
A lua já apontava. No local combinado, todas já estavam à espera. Receberam
Minéia amorosamente, com suas mãos sábias preparadas para começar o ritual.
Despiram Minéia, deram banho com água perfumada e, com a energia que saía
de suas mãos e seus peitos despidos (plexo solar), formaram uma corrente de
energia que acolhia e curava, sem palavras; com isso, preparavam Minéia para o
próximo ritual.
Chegada a lua cheia, as mulheres retiraram-se para local abrigado, mas não
muito distante dali. Minéia sentiu o sal da água do mar e deixou que seus
cabelos ficassem molhados, sentindo a água fria refrescar o couro cabeludo e,
depois, seus braços, pernas e todo o seu corpo. A luz da lua era tão forte que
quase dava para sentir seu toque.
A metamorfose começou. Minéia começou a se transformar em peixes, conchas,
algas, e todos os seres do mar chegaram para formar aquele cenário, porque
todos estavam em comunhão naquele momento. As águas faziam um leve
movimento, suave, as ondas estavam vivas e sabiam que era um momento
especial. A atmosfera tinha uma névoa cinzenta, liberada pela metamorfose, que
iria desaparecer conforme subisse no céu. Tudo se acalmou, a noite já tinha
caído. Fez-se muito silêncio, nada mais se via. Nem peixes, nem conchas, nem
Minéia. Chegados os primeiros raios de sol, as mulheres vestiram-se e foram
embora, tranquilas e felizes com o acontecido. Minéia iria renascer em algum
lugar da floresta e dentro do mar, preparada para a nova vida, para um novo
olhar sobre o mundo, até o próximo ritual das próximas etapas de sua vida. O
dia havia nascido. A natureza, com seus sons, cheiros e cores, oferecia o
alimento mais fundamental.
Para os gregos, a criatividade era o phármacon, o remédio que tudo cura. Conceber o novo
é participar dos mistérios da natureza; ela traz a morte fértil, ela decompõe para compor
novamente, gerando mais vida, a vida indestrutível do imaginário de Dioniso, o deus do êxtase e
do entusiasmo.
Na primeira imagem da série de três, colocadas juntas pela analisanda, salta aos olhos o
círculo de mulheres em seu habitat natural; no centro, a iniciada nos mistérios do feminino, o
mistério da semente, vida-morte-vida. No contorno, a árvore; ela não está contida no papel. A
árvore, que é o Temenos, o espaço terapêutico, o vaso contenedor desse processo criativo. É
também a terapeuta na transferência, o abraço e a continência. As raízes. Uma entrega possível e
a regeneração, o renascimento, a renovação.
A lua tocando a coluna vertebral, a água... A lágrima. O sentimento podendo ser expresso!
É o poder regenerador que, na escuridão da noite ou à luz da lua, desenvolve o
seu trabalho; um mistério, dentro de um mistério, a partir de si mesmo, da
natureza, sem nenhuma ajuda do ego mental. [...] é na escuridão que ocorre a
recuperação e também aqueles eventos na alma, os quais, na obscuridade, por
processos que só o coração conhece, permitem que as pessoas “superem” suas
crises insolúveis. (NEUMANN, 1954)
25/03/2010
Está cuidando melhor de sua saúde, uma nutricionista está ajudando-a a achar a causa da
intoxicação e das enxaquecas. Conhece o Centro de Ilustração Botânica e decide fazer uma pausa
no meio da semana, para se reequilibrar. A mulher selvagem como iniciadora e guia mostra
ludicamente o caminho que conduz até a árvore da vida e sua eternal capacidade de dar frutos.
08/04/2010
Confirma‐se a direção do resgate das raízes nutridoras, da sacralidade da base.
Surge, novamente, a divinização da Mater, a terra‐mãe. Nasce, nas entranhas
do corpo, a sede da sabedoria. Retorno ao útero! Uma busca da respiração
embrionária, o vínculo esquecido com a mãe-terra. O renascer do corpo e de
seus ciclos criativos. Uma forma de conhecimento muito íntimo. Você sabe
sem ver, sem escutar e sem tocar. No fundo de si mesmo, ter a extensão de uma
casa, o ventre criativo, a morada eterna do desejo, o desejo de Ser no Tempo e
expandi‐lo na Eternidade. O ventre libidinal deseja consciência, uma nova
consciência que reequilibre as forças arrebatadoras espirituais. (SÁ, 2009).
Realiza, em aquarela, a “mulher galho”:
Às vezes, a gente sofre de excesso de civilização e deixa de obedecer os ciclos
naturais, de ouvir a fala de algo maior… Ali tem mangue, e é aquela raíz que
não está encravada na terra… É uma coisa mais solta que dá a impressão que
pode sair caminhando…
Cada vez mais, sente a necessidade de entrar em contato com a natureza; precisa lentificar
para refazer as energias. Questiona o trabalho, está estressada. Termina o semestre esgotada.
Precisa mudar. Conseguiu conversar e pedir para não dar aulas no segundo semestre; vai assumir
outro cargo com menos estresse.
Gerard Dorn fala de modo semelhante de uma “veritas” que está oculta nas
coisas naturais – o remédio que melhora e transforma aquilo que é menos
naquilo que era antes da corrupção e até em algo melhor, e aquilo que não é,
naquilo que tem que ser. Esta “verdade” é uma “substância metafísica” que está
oculta não somente nas coisas, mas também no corpo humano. “In corpore
humano latet quaedam substancia metaphysica, paucissimis nota, quae nullo
[...] Indiget medicamento, sed ipsa est medicamentum incorruptum...” (No
corpo humano, acha-se oculta uma certa substância metafísica, conhecida por
pouquíssimos[ ...] Não necessita nenhum remédio, sendo ela mesma remédio
incorrupto...). (JUNG, 1990, p. 182, § 104).
10/06/2010
Sonho:
Numa chácara, casa… Tava subindo num Alfeneiro, mas não era, parecia.
Sensação de liberdade, tronco flexível. Tava bem alta, agarrando os galhos e,
quando percebi que a mãe estava olhando, comecei a descer. Tinha mais uma
parte que não sei se vem antes ou depois. Era uma pintura mais escura, e eu
fazia parte dessa pintura, como se as coisas começassem a pular do quadro,
como se fossem realidade. A natureza viva.
Da esquerda para a direita vemos surgir uma multidão. Seria o retorno das possibilidades
para o campo da conciência. A psique plural dialoga a fluidez. A unidade corpo – alma – espirito
rejubila.
M. F. percebe o reencantamento do mundo. Conta que iniciou um curso de ilustração
botânica com pessoas mais sensíveis.
Começa a buscar, conscientemente, uma alimentação viva em todos os sentidos, com
estruturas vivas que possam transformar seu corpo e sua vida, de forma a integrar outras formas
de vida mais gratificantes.
17/06/2010
Os sonhos com sua mãe perseguindo-a repetem-se. Sabe que ela não abre para os modelos
alternativos e acha a idade um problema para ter mais um filho.
Sonha que:
[…] estava no aeroporto com ela e queria fazer o teste de gravidez. Tava lendo
as instruções do teste, e a mãe chega, aí tem que esconder. Tento uma estratégia
para olhar, sem ela ficar olhando… Agora é muito mais ela me controlando, e é
a parte do não.
02/07/10
Sonho: M. F. estava grávida de três meses e estava escondendo de sua mãe. Com um
casaco, escondia a barriga para ela não ver.
Desabafa que ela é a imagem da cobrança, da conduta moral e da tradição. Porém, deseja
sua liberdade de ser o que é. Está muito feliz nesse seu relacionamento.
08/07/10
Minha mãe estava no meu quarto, estava escuro, não tinha amanhecido. Olho
para ela, e meu namorado estava ali. Ela levantou o lençol da minha cama,
questionando sobre o que era aquilo que tinha no lençol.
01/08/2010
Sonho:
Era de noite, tava mexendo na terra, tinha mais gente… não sei se meu filho
estava junto. Tinha um buraco na terra, de mais ou menos um metro, e tava
cheio de morango, cheio de terra. Tava colhendo morango e tava me
deliciando…
Pura fertilidade, realização no amor, na alma, na vida…
05/08/2010
Está grávida de seis semanas, e decidem contar para seus pais no fim de semana seguinte.
Trabalhamos os laços positivos com a mãe interna, o quanto é bom ser mulher e ter seu
próprio lar. Buscar se fortalecer e fechar seu campo e seu espaço pessoal. Para deixar de ser filha
e passar a ser plenamente mãe, precisa vencer o medo que ainda ronda sua relação com a mãe.
12/08/2010
Sonho:
Com o meu filho numa casa, a casa nova (mas não correspondia). Entrava uma
brisa. Dentro, cheia de folhas, animais, bichos, plantas. Tava descendo a escada,
cheia de folhas também. Meu filho está lá embaixo e desviou de um bicho
cabeludo marrom… é uma lagarta, de pé, parada; quando desviou, ela seguia,
foi descendo, ela alisava sua mão, como se pegasse a mão inteira. Meu filho
ficou com medo e disse: “Ela não tá queimando?”.
Psique é alma, interioridade que tem como metáfora as etapas de transformação – ovo,
lagarta, crisálida, borboleta. Liberdade construída passo a passo. O tão desejado ser espontâneo
aproxima-se, vai tornando-se visível. É ela mulher inteira, está ali, observando a criação.
Segundo Fayga Ostrower,
[...] a espontaneidade corresponde à possível coerência na pessoa […] a ideia da
espontaneidade como abrangendo uma forma de autonomia interior e um grau
mais alto de liberdade de ação ante possibilidades de viver e criar. (1987, p.
150).
Conversamos sobre o processo de integração. A vida nova que foi sendo forjada passo a
passo incluindo a libertação das mãos, como canal de expressão para moldar a materia. Elas
trazem o feminino arquetípico de volta, o limite necessário para fixar as imagens na concretude e
atualizar o drama mítico, humanizando a experiência, livrando-nos da velocidade cortical
geradora de perigosas cisões. A inclusão dos dedos faz dançar o sangue, acordar as células,
despertar o corpo para percorrer o mundo sentindo a vida, desfrutando cada instante no tempo e
no espaço, recuperando os mistérios da matéria.
23/09/2010
Sonha como se fosse um zoom:
Meu pai e minha mãe entram com uma criança bem bonitinha e bem
pequenininha, só aparecia a cabecinha, tava com um cobertorzinho. Eles estão
vindo apresentar a criança. Tava distraída, de repente eles chegam.
Acordou com uma sensação de tranquilidade, “como se aquele nenenzinho fosse o meu, e
eles tivessem acolhido”.
30/09/2010
Sonha:
Tinha uma bolinha na barriga, a barriga tava mais redondinha. O neném mexia
muito, tanto que, de repente, passa para debaixo do coração. Aí esticava-se,
colocava a mão na barriga e sentia os pezinhos, os dedinhos, as mãozinhas e
tocava a mãozinha […] até que uma hora sentiu a mãozinha, e ele tinha
nascido… tava fora.
28/10/2010
Está no quinto mês de gravidez; o neném é para 20 de março. Reclama do estresse e das
mudanças no seu trabalho na universidade. Paralelamente, busca fazer as mudanças necessárias
para se equilibrar.
11/11/2010
É um período de bonanza, depois de uma tempestade. Os pássaros, quando vão
fazer seu ninho, vão pegando uma coisa ou outra. A árvore tem relação com a
natureza. Semente que brota, cresce, dá fruto, tem um ciclo, mas tá sempre ali
(estabilidade), absorvendo. As coisas caminham com calma, têm seu tempo. As
coisas vão se incrustrando umas nas outras; não exigem aquela perfeição
absoluta que a gente tenta perseguir. O hipopótamo traz muita tranquilidade. A
natureza selvagem está aí. Trabalhou, comeu, fez o que tinha que fazer.
Conchas, caramujos, pedras, fóssil de algas, pedras brasileiras e pérolas ao longo do
caminho entre o hipopótamo e Ísis. Árvore com flores brancas compõem a paisagem de sua
interioridade. Outro diálogo entre mar e rocha, totalmente transformado ao som das asas. As
pérolas sabem disso. Feminilidade plena!
A coniunctio é a operação alquímica realizada após o percurso pela totalidade
(psíquica) e produz a união dos opostos. Dorneus enfatiza que esse processo
deveria ser feito para que se produzisse uma correspondência corpórea da
substância celeste, que é inata ao homem como imago Dei, imagem de Deus, e é
reconhecida pelo espírito como a Verdade. [...] ela era sempre uma substância
celeste, isto é, algo de transcendente, incorruptível, em oposição à
decomponibilidade de todas as substâncias conhecidas, mortas como o metal ou
a pedra, mas, ao mesmo tempo, dotada de vida, como um ser orgânico, e
também um remédio universal. (JUNG, 1990, p. 282, § 403).
Nesses quarto anos, M. F. realizou o sacro-ofício da análise e recebe a graça, a realização
de seu desejo de ser livre para escolher e assumir suas escolhas. Senhora de si, continua a
cultivar o aprendizado adquirido em nossa intimizade.
Para surpresa minha, no início deste ano de 2014, quando resolvi mergulhar na produção
deste texto, ela entrou em contato pelo Facebook. Conta que sente saudades e que sua vida
mudou muito desde a primeira vez que nos encontramos. Conseguiu sair da faculdade e está
mais feliz com isso; abriu uma loja virtual de presentes e decoração. Continua pintado aquarelas;
acha a arte libertadora, que alimenta a alma e o corpo. Está participando de exposições, vende
sua produção e está ilustrando um livro de poemas. Sente-se muito mais próxima de “si mesma”
de verdade; hoje, consegue se reconhecer. Conta que seu filho (com 14 anos), pediu para ser
adotado pelo seu novo pai, com o consentimento de seu pai, e este concordou. Sua filhinha está
com três anos. Estão morando numa casa, e está muito feliz com sua família que construiu.
“Claro que temos ajustes o tempo todo. Família, né? Mas acho que estamos saudáveis” Agradece
por minha energia, meu conhecimento e acolhimento.
Recebi e acolhi esse retorno como uma benção, o deo concedente, do qual nos fala o velhosábio Jung. Agradeço à vida pela beleza de nos agraciar com alma e amor.
[...] se o que se quer são metáforas, o corpo sentido e o corpo que sente são
como [...] dois segmentos de um único percurso circular que, do alto, vai da
esquerda para a direita e, de baixo, da direita para a esquerda, constituindo,
todavia, um único movimento em suas duas fases. Ora, tudo o que se diz do
corpo sentido repercute sobre todo o sensível de que faz parte e sobre o mundo.
Se o corpo é um único corpo em duas fases, incorpora todo o sensível e, graças
ao mesmo movimento, incorpora-se a si mesmo num “sensível em si”.
(PONTY, citado por PEREIRA, 2006, p. 176).
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