Artigo Técnico - Tractebel Energia
Transcrição
Artigo Técnico - Tractebel Energia
Influência do Controle da Qualidade da Água na Ocorrência de Falhas em Palhetas de Turbinas a Vapor: Estudo de Caso D. S. Pacheco, UFSC; C. V. Franco, UFSC; M. M. Medeiros, UFSC; L. A. de M. Torres, TRACTEBEL ENERGIA e A. R. F. Ellwanger, TRACTEBEL ENERGIA Resumo - A ocorrência de falhas em componentes de turbinas a vapor se deve ao acoplamento de fatores como, carregamentos cíclicos e controle da qualidade da água no sistema de geração térmica. A presença de impurezas, como cloreto e sódio se depositam na superfície da palheta e rotor da turbina após sucessivos ciclos e associado a concentradores de tensão provocam trincas, chegando à fratura devido ao processo de corrosão-fadiga. Essas ocorrências geram aumento nos custos de manutenção, interrupção de produção, prejuízos por lucro cessante e redução da confiabilidade e disponibilidade da planta. Neste estudo relatamos uma estratégia usada para correlacionar os resultados do monitoramento sistemático da qualidade da água e os efeitos corrosivos em um ciclo de vapor, visando fornecer subsídios futuros para um melhor controle da corrosão, além de possibilitar a redução de paradas para inspeção e aumento da confiabilidade operacional da turbina a vapor. Palavras-chave - corrosão, palhetas de turbinas a vapor, qualidade da água. I. Introdução Níveis relativamente baixos das impurezas no vapor podem causar sérios danos na forma de corrosão por compostos químicos prejudiciais ou por erosão devido às partículas sólidas. Mais de 15% da perda da capacidade de geração de energia elétrica pode ser causada pela erosão e acúmulo de depósitos de corrosão nas palhetas de turbinas a vapor. Processos corrosivos e erosivos conduzem ao aumento dos custos de manutenção, podendo levar à interrupção de produção, causando prejuízos e reduzindo a confiabilidade e disponibilidade da planta [1]. Esta proposta visa dar continuidade às melhorias implementadas no sistema e aumentar a base do conhecimento sobre as causas e efeitos da corrosão nas palhetas e rotor de turbina, em função dos parâmetros físico-químicos do condensado e vapor do sistema de geração de energia termoelétrica. II. Preparação do Trabalho A. Descrição do Problema Este trabalho é baseado em um estudo de corrosão e confiabilidade uma turbina a vapor em uma Usina de ___________________________ Este trabalho foi financiado pela Tractebel Energia - processo ANEEL 0403 008/2005, com apoio da Universidade Federal de Santa Catarina. Denise S. Pacheco agradece ao CNPq pela concessão da bolsa de estudos. C. V. Franco é professor titular do Departamento de Química da Universidade Federal de Santa Catarina ([email protected]). L. A. de M. Torres é engenheiro mecânico da Tractebel Energia – Unidade C - Jorge Lacerda ([email protected]). Geração Termelétrica, que opera com combustível fóssil. A turbina a vapor, modelo TCDF, 3600 rpm, sete estágios HP (Alta Pressão), cinco estágios IP (Pressão Intermediária) e 2x6 estágios LP (Baixa Pressão) e possui 1x363 MW de potência elétrica instalada. O CTJL pertence à Tractebel Energia, uma companhia do grupo Suez. A Tractebel Energia possui atualmente 1,213 MW de potência instalada em plantas de geração termoelétrica e 5,779 MW em plantas hidroelétricas. No ano de 2002, essa unidade geradora teve uma parada forçada de longa duração, devido ao trincamento e ruptura (fig. 1 e 2) de uma única palheta da turbina de baixa pressão, após 43.000 horas de operação. Além dessa falha, foram detectadas 39 trincas em outras palhetas. As palhetas do estágio L-1 (penúltimo estágio) foram substituídas, todavia com o mesmo projeto, e a unidade retornou à operação. A causa da falha nas palhetas foi a presença de pites de corrosão na sua superfície e que pelo mecanismo de corrosão-fadiga levaram a trincamentos e ruptura. Este tipo de falha por corrosão-fadiga na palheta L-1, na região do aro de consolidação que une as palhetas, não é incomum. A palheta L-1 é mais susceptível a corrosão fadiga, porque ela está localizada na região de transição de vapor seco para úmido e, portanto, com forte tendência a precipitação de sais. A geometria desenho da palheta também contribuiu para a falha por alguns detalhes peculiares que agem conjuntamente: a palheta possui na parte superior, um furo por onde passa um aro de consolidação, usado para manter unidas as palhetas. A alta concentração de tensão nos furos de passagem do aro, que associada ao aparecimento de pequenos pites (fig. 3 e 4) causados por corrosão, podem nuclear e propagar trincas, causando o dano final diagnosticado por corrosão-fadiga. Finalmente, devido a problemas de projeto no polidor de condensado, houve desvios significantes na qualidade da água utilizada na caldeira, agravando o problema. Análises do condensado indicaram que a qualidade da água na saída do polidor de condensados estava fora dos padrões mínimos requeridos para a operação do sistema. No primeiro ano de operação da usina, a condutividade do condensado era de 2 µS/cm, muito alta em relação ao recomendado (menor que 0,3 µS/cm). Após a correção da falha no projeto da estação polidora de condensado, onde foi corrigida a distribuição de fluxo no vaso polidor, a condutividade foi ajustada para menos de 0,2 µS/cm, estando dentro das recomendações. Os danos por corrosão-fadiga foram oriundos da concentração elevada de tensão no local por onde passa o aro que une as palhetas e também desvios na qualidade da água utilizada no sistema. Em setembro de 2005, após 21.000 horas de operação, desde a ruptura da palheta em 2002, foi executada uma inspeção da turbina de baixa pressão, com o objetivo de verificar a integridade das palhetas. Foram coletados e analisados depósitos de impurezas em diversos pontos ao longo das palhetas da turbina, para determinar a extensão da contaminação. Fig. 1. Estágio onde ocorreu fratura e trincamento de palhetas. Fig. 2. Detalhe da palheta fraturada. Fig. 3. Palheta da turbina. Fig. 4. Detalhe dos pites que geraram a corrosão-fadiga. Após a parada da Unidade, foi instalado no sistema um coletor/simulador de depósito de impurezas, para determinar as concentrações das impurezas no vapor. As análises dos depósitos das palhetas indicaram presença de cloreto e sódio, que são conhecidos por causar corrosão e, conseqüentemente, o trincamento do material [1]. O procedimento para tratamento do condensado foi melhorado, de forma a haver uma diminuição na concentração de sais, com conseqüente redução na condutividade do condensado. Além disso, foi estabelecida uma metodologia para monitoramento da qualidade da água e vapor na turbina. B. Metodologia Análises do Vapor e Condensado da Turbina de Baixa Pressão Foram coletadas amostras do vapor que entra na turbina de baixa pressão e do condensado que sai da estação polidora de condensado. Essas amostras foram analisadas por espectrometria de massa com plasma indutivamente acoplado (ICP-MS). As análises forneceram informações sobre a qualidade da água tratada utilizada no sistema. Coleta e análise das amostras As amostras foram coletadas em dois pontos: 1) crossover: onde foi coletado o vapor (condensado) que entra na turbina de baixa pressão, após a passagem e expansão pela turbina de alta e média pressão.. A figura 5 mostra a tubulação feita para a coleta do vapor no crossover. 2) da estação polidora de condensado: onde foi coletado o condensado que sofreu polimento. As amostras do vapor e condensado foram coletadas e armazenadas em frascos de polietileno, refrigeradas e posteriormente encaminhadas para análise em ICP-MS, onde pode-se verificar a presença de íons sódio, em níveis de detecção abaixo de 3 ppb. Planejamento de coletas de condensado e vapor As amostras foram coletadas simultaneamente na saída da estação polidora de condensado e na tomada de amostra no crossover da turbina, quando da colocação em operação da polidora com carga de resina regenerada, durante a operação normal e no final, quando as resinas estavam exauridas. A amostragem seguiu o seguinte planejamento: - Condensado: Ao total serão coletadas 8 amostras por campanha, onde: a) 2 amostras foram coletadas após entrada da estação polidora de condensado em operação: - 1ª amostra: nos primeiros 30 minutos de operação. - 2ª amostra: nos 60 minutos após primeira amostra. b) 2 amostras coletadas durante operação normal do estação polidora de condensado: - 3ª amostra: nos primeiros 5 dias. - 4ª amostra: nos 5 dias seguintes. c) 4 amostras coletadas após atingir condutividade de 0,07 µS/cm até 0,10 µS/cm: - 5ª, 6ª, 7ª e 8ª amostras: espaçadas de 3 a 4 horas entre as mesmas. -Vapor: Acompanha a mesma freqüência de coleta do condensado. Tabela 1. Dados da operação da polidora no período de coleta das amostras e resultados das análises por ICP-MS. Dados da polidora Amostra Análises dos Filtros Coletores de Depósitos Os filtros coletores são confeccionados em aço inoxidável AISI 316L e são utilizados com o objetivo de simular a deposição das impurezas do vapor na turbina. O teste foi conduzido utilizando o vapor que passa pelo crossover e entra na turbina de baixa pressão. A figura 5 ilustra como foram instalados os filtros. A instalação e retirada dos filtros acompanhou o período de coletas do vapor e condensado. Análises químicas e microscópicas dos filtros coletores de depósitos Os filtros foram pesados antes da instalação e após a retirada, de forma que fosse possível verificar o acúmulo de impurezas pela diferença de massa inicial e final. Foram realizadas análises para identificação qualitativa e quantitativa das impurezas. As análises realizadas foram as seguintes: - microscopia eletrônica de varredura (MEV), - ICP-MS, para detectar presença de sódio - pH Os íons sódio foram analisados embebendo os filtros em 50 mL de água deionizada, com temperatura de aproximadamente 21ºC, por 12 horas. 1V 1P 2V 2P 3V 3P 4V 4P 5V 5P 6V 6P 7V 7P 8V 8P µ saída µ saída Produção polidora catiônica polidora (µs/cm-1) (µs/cm-1) (m3) 0,059 0,064 200 0,059 0,064 200 0,059 0,062 467 0,059 0,062 467 0,058 0,056 75.600 0,058 0,056 75.600 0,058 0,057 123.700 0,058 0,057 123.700 0,066 0,066 144.668 0,066 0,066 144.668 0,087 0,068 145.748 0,087 0,068 145.748 0,096 0,069 146.512 0,096 0,069 146.512 0,107 0,069 146.833 0,107 0,069 146.833 Análise de sódio em ICPMS <LD <LD <LD <LD <LD <LD <LD <LD <LD 2,8ppb <LD <LD <LD <LD <LD <LD <LD= menor que o limite de detecção. Análise dos filtros coletores de depósitos Antes e após o término do teste, os filtros foram pesados. Através dos dados da tabela 2, pode-se perceber o ganho de massa das amostras. Isto se deve ao acúmulo de impurezas e formação da camada óxida. Tabela 2. Dados coletados após término do teste. Filtro Grande Fig. 5. Instalação dos filtros coletores de depósitos [2]. III. Resultados e Discussões Análise do vapor e condensado por ICP-MS As análises de sódio realizadas por ICP-MS indicaram que as concentrações deste íon estão abaixo do limite de detecção do equipamento para praticamente todas as amostras, com exceção da amostra 5P (condensado da estação polidora de condensado), que apresentou concentração de sódio igual a 2,8 ppb, como mostra a tabela 1. De qualquer forma, este valor ainda está abaixo do limite máximo recomendado de sódio, que é de 3 ppb. A amostra 5P foi coletada no período intermediário da campanha da estação polidora de condensado, posterior a esta foram coletadas as amostras 6, 7 e 8P que, segundo as análises por ICPMS, apresentaram concentração de sódio abaixo do limite de detecção do equipamento que é de 0,23 ppb. Pequeno Taxa de Massa Ganho deposição Massa Inicial (g) Final (g) de Massa (g) (mg/h) 13,8814 13,9371 0,0557 0,0263 6,1678 6,2854 0,0551 0,1167 Análise por MEV/ EDX A análise indicou na amostra do conjunto de filtros (pequeno e grande), presença de elementos em maior quantidade: Cr, Fe, Ni, O e elementos traço: S, Al, Mo e Si (< 3%). O conjunto de filtros é fabricado em aço inoxidável AISI 316L e a composição da liga inclui níquel, cromo e molibdênio [2]. Portanto, os elementos Cr, Ni e Mo, presentes no resultado das análises, são provenientes do próprio material do filtro. Pode-se comprovar pela análise do branco. Fe e O, indicam a formação de magnetita, sendo que o oxigênio é proveniente do meio. S e Si, estão em quantidades bastante pequenas, consideradas traços. A tabela 3 apresenta os resultados das análises, incluindo análise dos filtros instalados (coletado) e branco. As figuras 6 e 7 ilustram os resultados obtidos através das análises por MEV/EDX. Tabela 3. Resultados da análise química feita em EDX das amostras de filtros coletores. Identifcação das amostras Filtro AM1 pequeno 01 topo Filtro AM1 pequeno 02 centro Filtro AM1 pequeno 03 base Filtro AM2 grande 01 centro Filtro AM2 grande 02 base Filtro AM2 grande 03 topo Elementos (%) Mo Ni O 1,10 17,10 Al - Cr 4,26 Fe 77,54 S - Si - - 16,91 69,15 - 11,65 - 0,96 1,33 - 4,46 80,90 - - 14,64 - - - 15,35 67,18 - 9,82 6,18 0,81 0,67 - 16,32 63,78 - 11,51 6,64 0,91 0,84 - 12,59 65,86 1,72 8,80 9,92 - 1,11 Fig. 6. Foto retirada no MEV com ampliação de 200x e resultado da EDX referente à amostra AM1_01 (topo do filtro pequeno). Fig. 7. Foto retirada no MEV com ampliação de 200x e resultado da EDX referente à amostra AM2_03 (topo do filtro grande). Análise por ICP-MS As análises por ICP-MS não indicaram presença de sódio dentro dos limites de detecção do equipamento (0,23 ppb). Os resultados das análises referentes à estas amostras: filtro pequeno e filtro grande, são apresentadas na tabela 4. Tabela 4. Resultados da análise por ICPMS dos filtros coletores. Filtro Grande Pequeno [Na] ppb <LD <LD Os dados de operação apresentados na figura 1, confirmam a baixa concentração de sódio (Na) durante o período de 19/12/2005 a 22/03/2006, ou seja, está dentro dos padrões recomendados pelo EPRI [2, 3]. Análise do pH Ambas as amostras apresentaram pH neutro, igual a 7,0. C. Conclusões A metodologia aplicada neste projeto serve, não só como um procedimento padrão de prevenção contra a ocorrência de falhas por corrosão na turbina a vapor, como também para ajudar na definição de planos de inspeção e manutenção da mesma. Através do monitoramento sistemático de todos os parâmetros que induzem os problemas de corrosão, pretende-se também diminuir as paradas para inspeção e aumentar a confiabilidade operacional da turbina a vapor. IV. Referências Bibliográficas [1] O. JONAS and J. M. MANCINI, “Plant life extension – Design steam cycles to avoid corrosion”, Power Magazine, 2004. [2] O. JONAS and L. M. MACHEMER, “Jorge Lacerda C – LP Turbine Inspection and Deposit Analysis”, Tractebel Energia S. A., Santa Catarina, BR, 2006. [3] “Cycle Chemistry Guidelines for Fossil Plants: AllVolatile Treatment”, EPRI, Palo Alto, CA. TR105041, April 1996.