EPIDEMIA URBANA DE Tityus serrulatus NO MUNICIPIO DE
Transcrição
EPIDEMIA URBANA DE Tityus serrulatus NO MUNICIPIO DE
EPIDEMIA URBANA DE Tityus serrulatus NO MUNICIPIO DE TRINDADE-GO Hélio Pinheiro de Andrade1 Antônio Pasqualetto2 RESUMO Ao estudar espécies sinantrópicas de importância médico-sanitária no município de Trindade-GO, encontrou-se epidemia da espécie de escorpião Tityus serrulatus. Destacaram-se dois setores com maior ocorrência e possíveis focos disseminadores: o cemitério e a ETA-Saneago. Sugerem-se urgentes medidas preventivas e de controle. Palavras-chave: Tityus serrulatus, epidemia ABSTRACT When stud ying species important sinantrópicas doctor-sanitary in the city Trinity- GO, observated scorpion species epidemic Tityus serrulatus. Highlighted two sectors with larger occurrence and possible focuses circulators: the cemetery and ETA-saneago. Suggest urge nt preventive measures and of control. Key-Words: Tityus serrulatus, epidemic ____________________ 1 Biólogo, Especialista em Educação Ambiental pela Universidade Católica de Goiás. 2 Engenheiro Agrônomo, Doutor, Professor da Universidade Católica de Goiás. [email protected] 1 1 INTRODUÇÃO O município de Trindade, localizado a 18 Km da capital do Estado de Goiás – Goiânia, recebeu sua maioridade no ano de 1920, através da lei 662 do dia 16 de julho, passando de distrito para Município. Entre setores, vilas, bairros, chácaras, jardins e conjuntos, somam se 44 ao total. É uma cidade que possui grande extensão, em relação ao seu tamanho. Trindade possui a tradição religiosa, conhecida como a Festa do Divino Pai Eterno ou Festa de Trindade, que começou no ano de 1840, no qual Trindade era conhecida como Arraial Barro Preto, festa essa, que atrai atualmente para cidade, no mês de junho, um número elevadíssimo de romeiros, uma das hipóteses de transporte do animal conhecido como “exótico regionalmente”. Entre os romeiros encontra-se um grupo especial, conhecido como “Carreiros”, onde os quais chegam de diferentes e distantes locais, Santa Bárbara de Goiás, Morrinhos, Anicuns, Damolândia, Itaberai, Palmeiras de Goiás, Goiás Velho, Avelinópolis, Inhumas e outras cidades. Que contribuíram para o transporte de animais dentre os quais os escorpiões. Há muito tempo, Trindade apresenta surto de infestação por escorpiões. Em 2001, registrou-se no município um acidente causado pelo animal, onde a vítima era uma criança, levada a óbito. Em abril de 2002, notou-se que em menos de cinco meses, outras duas crianças tiveram óbito, vitimadas pela picada do animal. A morte por envenenamento escorpiônico ocorre como resultante de falência cardio-respiratória algumas horas após o acidente (este período é variável podendo ocorrer entre 1 a 6 horas em média - mortes tardias também podem ocorrer). A situação é tão grave que tem obrigado o poder público a definir estratégias de controle da epidemia para proteger seus habitantes, inc lusive as crianças. Mostrando a situação da cidade, tanto no tamanho físico como o número de habitantes, percebe-se as dimensões do problema, além de registrar a provável chegada do escorpião na região os riscos a multidão durante a festa religiosa, a qua l também gera desequilíbrio ambiental, piorando a higiene urbana, propiciando acúmulos de lixos e presença de alimento favoráveis a sua disseminação. Tais fatos nos levam a preocupar, pois de acordo com estudos realizados no município de Aparecida no Estado de São Paulo, por Elieth Floret Spirandeli Cruz, Clóvis R. Winther Yassuda, Jorge Jim e Benedito Barraviera – Programa de controle de surto de escorpião Tityus serrulatus, Lutz e Mello 1922, no município de Aparecida, (SP), (Scorpiones, Buthidae) em 1991, os órgãos de Saúde Pública do Vale do Paraíba registraram no município cerca de 15 casos de acidentes. Como a população do município era cerca de 35.000 habitantes, este número equivale a um índice de incidência de 43 casos por 100.000 habitantes. Este índice foi o maior registrado para a microrregião administrativa do Vale do Paraíba, perdendo apenas para o de Belo Horizonte (MG), o maior do país. No Censo de 1996, Trindade possuía 69.838 habitantes, em 2000 aumentou para 82.131 (Tabela 1). 2 Tabela 1: Número de habitantes no município de Trindade: Número de habitantes Homens Zona urbana 32.048 Zona rural 2.538 Número total de habitantes Fonte: IBGE, 2000. Mulheres 33.095 2.157 Total 65.143 4.695 82.131 Em junho de 2000, realizou-se uma pesquisa no município de Santa Bárbara de Goiás, onde a população passava pelo mesmo problema que Trindade passa hoje, tal pesquisa mostrou que os hábitos da população influenciaram muito na presença do animal na cidade, alem de notar, que os escorpiões se dispersaram passivamente, ou seja transportados em toras de madeira, dentro de caixas e caixotes, caminhões ou outro meio de transporte. Forma pela qual o animal chegou naquela região e da mesma forma chegou no município de Trindade. A pesquisa trouxe benefícios para ambas partes, o município da diminuição do foco do animal e a equipe pela nova experiência em epidemiologia de escorpiões. Segundo William Henrique Stutz, Médico Veterinário Sanitarista, são raros os profissionais aracnólogos ou não no Brasil envolvidos com nossa linha de trabalho. O que se nota, é uma preocupação em simplesmente exterminar escorpiões através do uso de qualquer veneno que surja no mercado e que, mesmo sem terem sido testados dentro de uma metodologia realmente científica, traga a enganosa sensação de estar "contribuindo para a Saúde Coletiva" (STUTZ, 2000). Justifica-se a atuação no monitoramento a espécie, apresentando alternativas viáveis que possibilitem a tomada de decisões pela população e poder público. Neste sentido, o realizou-se o pesquisa de espécies sinantrópicas de importância médico-sanitária no município de Trindade-GO, destacando-se: a)localização e identificação do escorpião na cidade; b)estudo estatístico da freqüência do animal na região; c) avaliação das condições propícias à infestação na região; d) avaliação das condições sócio-econômicas e educacionais da população sujeita ao escorpionismo e e) Identificação e divulgação de medidas de controle epidemiológico do escorpião no município. 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 DESCRIÇÃO Os escorpionídeos, conhecidos popularmente como escorpiões, pertencem à classe dos aracnídeos. Segundo William Henrique Stutz, não são insetos, basta observar que este animal tem 4 (quatro) pares de patas ao invés de 3 (três), como pensam erradamente algumas pessoas. Juntamente com as aranhas, os carrapatos e os ácaros, que são seus companheiros de classe, os escorpiões pertencem ao filo dos artrópodes, que inclui, além dos aracnídeos, a classe dos insetos, dos crustáceos e outras (STUTZ, 1990). 3 Os escorpiões, internamente possuem sistema nervoso, circulatório, respiratório, reprodutivo e digestivo. Como todos os artrópodes os escorpiões tem o corpo revestido por fino e resistente exoesqueleto de quintina que carrega e protege as estruturas internas. É a base de sustentação também de vários receptores sensitivos, espiráculos (ou opérculos respiratórios) e outras estruturas de comunicação com o meio exterior de grande importância biológica. A obra Biology of Scorpions - Gary A.Polis, uma das primeiras dedicada ou estudo dos escorpiões, ainda é utilizada. Para nível de entendimento de suas estruturas orgânicas externas, esse trabalho utilizará esquemas contidos no livro acima referido. (Figura 1) Figura 1. Desenho original de Biology of Scorpions - Gary A.Polis 4.1.1 Prosoma O corpo é dividido em duas partes principais o prosoma (cefalotórax) e o opistosoma (abdome). Dorsalmente, o prosoma é coberto por uma carapaça. As quelíceras são parcialmente cobertas pela carapaça e projetadas para frente. As quelíceras são órgãos pré-bucais e são usadas para rasgar e triturar alimento, todos os aracnídeos as possuem. 4 Um par de olhos medianos e outros laterais, menores (ao todo cinco pares) estão localizados na carapaça. Os olhos medianos são órgãos muito primitivos, com capacidade de percepção de profundidade e espacial produzindo assim imagens visuais distorcidas. São muito sensíveis a luz. Seu propósito parece ser permitir orientação e para diferenciar luz e escuridão. Os olhos laterais são até três vezes menores do que os olhos medianos e parecem reagir a estímulos mais rapidamente no escuro. Aparentemente são os responsáveis pelo ciclo luz-escuridão e parecem serem reguladores do relógio biológico dos escorpiões. Uma área foto sensível no metasoma foi descoberta recentemente em diferentes escorpiões. Sua função não foi ainda esclarecida (POLIS, 1990). 4.1.2 Opistosoma O opistosoma é composto pelo mesosoma (pré abdome) e metasoma, erroneamente chamado de cauda, (pós abdome). Sete tergítos se combinam para formar a parte dorsal do mesosoma. Os tecido flexíveis que unem as partes rígidas do exoesqueleto são denominadas membranas (pleura) intersegmental. O Metasoma é formado por cinco segmentos arredondados que terminam com um bulbo chamado telson. O telson não é considerado parte do metasoma. O aguilhão ou a parte inoculadora de veneno é chamada de acúleo (ferrão) e em sua porção arrendada estão as glândulas produtoras de veneno. (figura 2) Figura 2. Desenho do Telson do escorpião. Neste desenho pode-se observar o “ferrão” do escorpião assim como onde se alojam as glândulas que produzem veneno, e a abertura anal do Animal. Os escorpiões usam o ferrão para diversos fins. O mais óbvio é para dominar suas presas, que antes são agarradas firmemente pelas pinças dos palpos. Os escorpiõ es fazem uso do ferrão quando não conseguem matar a presa por esmagamento com as pinças. 5 Devido ao veneno que inoculam, pequenos escorpiões com pinças fracas conseguem dominar presas até do seu próprio tamanho. Um segundo uso do ferrão é na defesa. Através de um ferrão bem posicionado, os escorpiões podem manter afastados potenciais predadores. Apesar disso, eles são presas fácil para muitos animais, para os quais seu ferrão parece ser inócuo. Um terceiro uso do ferrão é durante o acasalamento. Observam-se freqüentemente machos aguilhoando as fêmeas ou golpeando-as com o telson. Parece provável que alguns escorpiões possuam ferormônios que possam aumentar a receptividade da fêmea ou permitam reconhecimento de espécies durante o ritual de acasalamento (MELLO, 1922). Na ferroada o musculoso metasoma é suspenso e o telson posicionado, para a introdução rápida e certeira do aguilhão no exoesqueleto ou pele do seu alvo. O escorpião deve perceber que foi certeiro, pois se o aguilhão não penetrar adequadamente o animal fará novas tentativas repetidamente até obter sucesso na inoculação do veneno. O metasoma é um órgão musculoso e além de ser usado para ferroar também é usado para cavar, higienização, equilíbrio e sustentação do animal (POLIS, 1945). As cerdas próximas ao ferrão são importantes sensores durante o ataque. Presas relutantes, que se debatem, serão ferroadas seguidamente enquanto estiverem seguras pelas pinças. A quantidade de veneno injetada é controlada pelo escorpião; doses maiores para grandes animais e menos para as presas menores. Algumas vezes o veneno não é injetado apesar da ferroada, este fenômeno é conhecido como "ferroada seca". O ferrão pode se manter introduzido na presa por alguns segundos ou simplesmente ser espetado e retirado imediatamente, retornado a sua posição de ataque. Independentemente da forma como é utilizado o veneno faz do escorpião um predador extraordinário e eficiente, capaz de capturar presas maiores e mais perigosas do que o próprio. Uma pequena protuberância esta presente em algumas espécies e são usadas por taxonomistas como uma característica quando da classificação de espécies. O metasoma não é uma cauda no sentido da palavra, mas uma continuação do abdome. Contém partes do intestino, nervos, artérias, veias e músculos além de sustentar o telson. A abertura anal esta localizada no tecido mole do quinto segmento, onde este se conecta com o telson. 4.1.3 Apêndices Quatro pares de patas articuladas (todas inseridas no cefalotórax) permitem locomoção e também são usadas para escavar o solo. A porção que de cada pata que se 6 conecta com o corpo é denominada coxa, e segue nesta ordem o trocanter, fêmur, patela, tíbia, basitarso, tarso e apotele. Garras laterais e medianas estão ligadas à apotele. Segundo o livro “Biology of scorpions”, os pedipalpos são análogos ao braço e mãos humanas. Cada pedipalpo possui seis segmentos. Começando a partir do corpo temos: O trocanter, o fêmur, a patela, a tíbia, e o tarso. Os dois últimos segmentos apresentam o formato de pinças (mãos) a tíbia modificada representa a palma e um dedo fixo, e o tarso é o dedo móvel da pinça (POLIS, 1945). Apesar das estruturas anatômicas dos pedipalpos possuírem a mesma nomenclatura daquelas das pernas, os pedipalpos não são pernas. Estes são usados para capturar, conter e esmagar presas, para proteção como uma poderosa arma e escudo e para escavar. Também possuem órgãos sensitivos excepcionais. A superfície interna das pinças possui uma série de granulações dentadas e pontiagudas, que possibilita segurar firmemente e esmagar suas presas. Algumas estruturas dos pedipalpos são presentes apenas nos machos, fornecendo base segura quanto ao dimorfismo sexual (a abertura ou vão encontrado no Tityus bahiensis utilizado para segurar a fêmea quando acasalamento é um bom exemplo) (BÜCHERL, 1979). Escorpiões com pinças maiores e robustas são capazes de esmagar o exoesqueleto de qualquer invertebrado por mais rígido que este seja. 4.1.4 A porção ventral As formas das estruturas da porção ventral entre as pernas (coxoesterno) dos escorpiões são as mais utilizadas para diferenciar famílias. Os dois opéculos genitais (fundidos cobrindo a abertura genital) podem ser observados no centro do dorso imediatamente atrás e posteriormente ao externo. Oito pequenas aberturas (espiráculos) localizadas na parte ventral do mesosoma, transportam ar para os pulmões (orgânulos respiratórios). Uma vez que podem ser "fechados" em momentos de stress, estes espiráculos são extremamente eficientes e minimizam a entrada de partículas de pó no organismo. 4.1.5 Órgãos sensitivos Apesar dos escorpiões possuírem pouca visão eles são dotados de um arsenal de potentes receptores sensitivos. Captando movimentos de ar, vibrações, e tato são capazes de perceber a presença de predadores, presa, água, temperatura e luz, assim como uma gama de outros estímulos. 7 4.1.5.1 Pectíneas As pectíneas são um par de apêndices com aparência de pentes localizados na porção ventral imediatamente após o último par de patas. Apenas os escorpiões as possuem. Estes órgãos sensitivos estão permanentemente em contato com o solo e são capazes de captar vibrações mínimas no mesmo e são ainda utilizados pelos machos para perceber a presença de ferormônios durante o período reprodutivo. 4.1.5.2 Cerdas As cerdas são estruturas com aparência de pelos distribuídas por quase todo o corpo dos escorpiões, nas patas, e nos pedipalpos, dando a algumas espécies a aparência "peluda". Algumas destas cerdas não são visíveis a olho nu. Pelo menos três tipos diferentes de cerdas já foram descritas. As Cerdas captam sensações radiculares, térmicas, químicas e variações de umidade. As mais importantes são as longas e finas tricobótrias encontradas apenas nos pedipalpos. Estas são incrivelmente sensíveis e a movimentos de ar e a vibrações e pode perceber o menor movimento de suas presas, de outros escorpiões e situações de perigo. A quantidade, localização e disposição das tricobótrias são importantes na identificação de espécies. As cerdas do tarso captam vibrações do substrato e muitas ainda percebem variações e presença de água e umidade além de mudanças químicas no ambiente. Tufos de cerdas localizados no tarso e basitarso aumentam a área de contato com o solo facilitando a locomoção de terrenos arenosos e macios. Apesar de muito importantes para se determinar o habitat de espécies de escorpiões, estes tufos de cerdas não são facilmente observados sem a utilização de instrumentos ópticos (lupa entomológica). 4.1.5.3 Outros receptores Outros sensores microscópios chamados de “filetes” sens itivos são encontrados nos pés e no metasoma. Quando algum tipo de pressão é feito sobre o exoesqueleto estes "filetes" se abrem rapidamente. Dependendo da duração e da intensidade desta pressão os escorpiões fazem ajustes nos movimentos e na postura de seu corpo. Outros "filetes" sensitivos localizados no basitarso em todas as oito patas parecem perceber vibrações no terreno, como aqueles produzidos por movimentos de insetos. Os escorpiões se utilizam das sensações recebidas por patas opostas para se aproximar de suas presas e determinar a localização e distância da mesma (STUTZ, 1990). 8 4.1.6 Produção de sons Aproximadamente 150 espécies de escorpiões são capazes de produzir sons ou esfregando partes do corpo uma contra a outra ou vibrando estruturas anatômicas. Alguns Opistotamus esfregam suas quelíceras e o cefalotorax e produzem um som sibilante. Algumas espécies friccionam o telson no metasoma, pectíneas ao externo, e os pedipalpos ao primeiro par de patas. Em laboratório temos a rara oportunidade de observar um Tityus brazilae que a qualquer toque em seu terráreo, o mesmo vibra suas pectíneas produzindo um som que em muito lembrava o de uma cascavel. Outros escorpiões literalmente batem o telson no solo. Estes sons produzidos parecem ter a função de intimidar agressores (STUTZ, 1990). 4.2 REPRODUÇÃO Os escorpiões se destacam entre os aracnídeos por terem uma duração de vida que vai além de uma estação. Chegam à maturidade em 1-3 anos, e atingem normalmente um período de vida de 2-6 anos. O maior tempo de vida registrado para um escorpião chega até 8 anos. Aparentemente as espécies menores têm um período de vida mais curto, entre 3 ou 4 anos. Existem relatos de grandes escorpiões cujo período de vida poderia ser de 20 anos ou mais. Os escorpiões não põem ovos. São vivíparos e seus filhotes nascem por meio de parto, após uma gestação longa. Em Tityus bahiensis e Tityus serrulatus a gestação dura de 2 meses e meio a 3 meses. Algumas espécies, inclusive Tityus Bahiensis, podem gerar mais de uma ninhada a partir do mesmo acasalamento, decorrendo vários meses entre dois partos consecutivos. Entre estes escorpiões, cada ninhada pode ter mais de 20 filhotes, mas outras espécies podem produzir até 90 ou mais filhotes (MATTHIESEN, 1962). Tityus serrulatus se reproduz de maneira peculiar através de um complexo processo denominado partenogênese, isto é, os óvulos desenvolvem-se no organismo materno sem a fertilização pelo macho, o qual inexiste na natureza. As fêmeas sozinhas gestam e parem durante todo o ano, ninhadas de até 24 filhotes. (Figuras 3 e 4) 9 Figura 3. Tityus serrulatus com filhotes 2 dias após nascimento Figura 4. Tityus serrulatus com filhotes 13 dias após nascimento Fotos: Thogo Lemos dos Santos Enquanto se verifica o crescimento e até atingir a maturidade sexual, os escorpiões sofrem ecdises, ou seja, trocam periodicamente de cutícula. Ao chegar a ocasião da ecdise, a cutícula antiga parte-se horizontalmente acima das quelíceras. Pela fenda aberta, sai o corpo do escorpião, revestido pela nova e ainda tenra cutícula. A cutícula velha costuma sair inteira, conservando a forma do escorpião. Segundo observação de Matthiesen, espécimens de Tityus serrulatus em cativeiro atingiram a maturidade sexual após um ano de idade, tendo passado por 5 ecdises (MATTHIESEN, 1962). 10 Figura 5. Tityus serrulatus efetuando muda. Foto: Thogo Lemos dos Santos 4.3 EVOLUÇÃO Como linhagem, os escorpiões provêm de eras remotas. Seus mais antigos fósseis ocorrem em rochas formadas no Período Siluriano, cerca de 420 milhões de anos atrás. Ou seja, cerca de 200 milhões de anos antes que os dinossauros aparecessem. A linhagem à qual os escorpiões modernos pertencem surgiu no Período Carbonífero mais recente, há cerca de 300 milhões de anos. De lá para cá, os escorpiões pouco mudaram. sobrevivendo a todos os grandes cataclismos que destruíram milhares de espécies vivas. Portanto o escorpião foi um observador privilegiado tanto do fim dos dinossauros assim como do surgimento do homem na face da terra. Apesar da existência de poucos exemplares, evidências fósseis indicam que os primeiros escorpiões eram de vida aquática possuindo guelras e patas, e se pareciam em muito com os escorpiões atuais. Além do mais os escorpiões são considerados os aracnídeos mais antigos encontrados até o momento (KJELLESVIG, 1986). 4.4 HABITAT E ADAPTAÇÃO Sua notória capacidade evolutiva e de adaptação permitiu que sobrevivessem na superfície da terra por aproximadamente 300 a 350 milhões de anos após saíram do ambiente aquático. Alguns dos primeiros escorpiões a viverem a maior parte do tempo em terra firme eram muitos pequenos, mas pelo menos uma espécie - Praearcturus Gigas - assumia maiores proporções chegando a medir 1 metro de comprimento sendo pois um notório predador (SCHULTZ, 1990). Os escorpiões modernos se adaptaram aos mais variados tipos de habitat, dos desertos às florestas tropicais e do nível do mar a grandes altitudes em montanhas. Uma espécie foi encontrada vivendo a 4.200 metros de altitude nos Andes. 11 São encontrados nos mais variados habitats tais como florestas tropicais, cerrados, campos, e em áreas intermediarias às descritas. A grande maioria destes aracnídeos tem preferência por climas tropicais e subtropicais. Todavia algumas espécies de adaptaram a regiões pouco comuns, algumas surpreendentes (STUTZ, 1990). Em várias regiões do planeta algumas espécies de pequenos escorpiões (menos de 1 mm), vivem em zonas intermediárias. Conhecidos como escorpiões do litoral, se alimentam de minúsculos invertebrados marinhos trazidos pelas marés. Algumas espécies vivem em altitudes acima de 4.200 metros no Himalaia asiático, uma em particular - Orobothriurus altola - vive a 4.400 metros de altitude na cordilheira dos Andes aqui na América do sul. Estes muito pequenos, passam meses sob pedras e em abrigos cobertos por neve e gelo. Experimentos já demonstraram que muitos escorpiões podem resistir a temperaturas abaixo do ponto de congelamento. A influência de microclimas específicos, assim como composição de solo, tipos de rochas, sazonalidade de temperaturas extremas e disponibilidade alimento são fatores limitantes na distribuição destes animais (SPIRANDELI, 1994). Atualmente as pesquisas nos mostram o sucesso nos criadouros para estudos do Tityus serrulatus. (figura 6) Figura 6. Criadouro coletivo de Tityus serrulatus. Os escorpiões das areias (psammophiles) possuem numerosas cerdas, que aumentam a área de superfície de contato com o solo, as patas são adaptadas para melhor locomoção na areia fofa. Os escorpiões de regiões rochosas (lithophiles) são mais achatados e alongados com cerdas mais espessas e pontudas mas patas o que facilita se 12 mover livremente sobre o terreno e em seus abrigos. Seus metasomas são longos e finos e mais elevados em relação à maioria das espécies (SPIRANDELI, 1994). Um corpo desenvolvido, robusto com patas curtas e pedipalpos grandes e poderosos, caracteriza os escorpiões que constroem abrigos (fossorial). Alguns escorpiões (troglobites) vivem em cavernas profundas. Como não há nenhuma necessidade enxergar na escuridão, a maioria deles são cegos e em alguns a ausência total de olhos é observada. Geralmente seus corpos, patas, e pedipalpos são extremamente delgados, incolores - todas estas adaptações foram desenvolvidas para viver em fendas, sob a rocha, e nas profundezas das cavernas. Escorpiões adaptados às proximidades das entradas das cavernas são conhecidos como troglophiles, não perderam os olhos e não adquiriram outras características dos troglobites. Os escorpiões arbóreos são pequenos, leves, ágeis em escaladas. Alguns sobem em árvores, vivendo dentro dos buracos e das rachaduras dos troncos, outros preferem as parte basal de bromélias. Uma vez que as pesquisas para explorar as copas das árvores das florestas tropicais estão em estágio inicial, acredita-se que muitas espécies novas de escorpiões ainda serão descobertas e descritas (STUTZ, 1990). Cada uma destas variações físicas, são acompanhadas de inconvenientes, algumas espécies são tão especificas de certo ecossistema que encontram sérias dificultadas em se adaptar a outros com características diferentes, mesmo que estas variações sejam mínimas. Esta é uma consideração importante quando avaliamos a necessidade de se manter estes animais em cativeiro, seja para fins médicos-sanitários seja para estudo de comportamento. Algumas espécies simplesmente não são passíveis de se manter em laboratório (BÜCHERL, 1953). Além da sustentação, o exoesqueleto rígido do escorpião age como um revestimento rígido, protetor cuja coloração geralmente condiz com o seu habitat. Isto fornece ao escorpião a capacidade de se camuflar. A forma achatada dos escorpiões os permite esgueirar por entre locais muito pequenos e apertados. Sua capacidade de inocular veneno e seus fortes pedipalpos combinados com sua velocidade de reação a estímulos fazem do escorpião um predador formidável e perigoso. Os escorpiões do deserto são os artrópodes mais especializados em conservação de água. O revestimento de seu exoesqueleto os torna impermeáveis evitando perda de líquido corpóreo. A necessidade de água da maioria dos escorpiões do deserto é adquirida através de suas presas ou seja, através de seu alimento. Seus dejetos são extremamente secos devido ao elevado teor de nitrogênio e uma porção mínima de água. Respirar através de espiráculos minimiza substancialmente a perda de água através da respiração. Algumas espécies possuem membranas que cobrem as entradas dos 13 espiráculos podendo fecha- las voluntariamente diminuindo ainda mais quaisquer perda de líquido (POLIS, 1990). Ao se refugiarem dentro de tocas, sob as pedras ou se enterrando no solo os escorpiões do deserto evitam os períodos mais quentes do dia este procedimento também minimiza a perda de umidade. Todos os escorpiões captam calor de fontes externas e são incapazes de gerar seu próprio calor. Em ambientes muito quentes eles possuem hábitos noturnos. Alguma espécie de regiões temperada e de florestas tropical, tem atividade durante parte do dia, uma vez que a vegetação densa impede que o calor excessivo do sol atinja o solo. A espécie de escorpião encontrada em Trindade é o Tityus serrulatus, Lutz e Mello, 1922. Esta espécie embora primitivamente habitante de cerrado e campos abertos, tornouse bem adaptada à vida domiciliar urbana, possivelmente em decorrência da rápida e desenfreada colonização pelo homem das regiões sul e sudeste, originalmente ocupadas pelo artrópode. Além disso, esses animais adaptaram-se facilmente às condições oferecidas pelas moradias humanas, tais como grande número de abrigos (lixo, entulho, pilhas de tijolos e telhas, etc.), e alimentação farta (baratas). Na década de 40 não havia registros da presença do animal em demais regiões alem das citadas acima, hoje encontramos registros de focos do Tityus serrulatus em todo território brasileiro. Sucesso tal, devido ser um grande predador e possuir uma grande capacidade de se adaptar em diferentes regiões. 4.5 PECULIARIDADES Uma das peculiaridades do escorpião e a capacidade de ser fluorescente no escuro à luz dos raios ultravioleta e refletir o azul. (Figura 7) Figura 7. Fluorescência do escorpião Fonte: Globo Ciência/Abril 1992. Fotos de Gamma/Sigla 14 4.6 SISTEMÁTICA Infelizmente são pouquíssimos os pesquisadores trabalhando com escorpiões no mundo, no Brasil não seria possível enumerar uma dezena mesmo sabendo que no passado contávamos com os maiores expoentes da arcnologia mundial tais como Lutz, Wolfgang Burchel, Campos Mello, além do "pai" da terapia anti-escorpiônica Vital Brasil. O resultado deste desinteresse é a lentidão do processo evolutivo da sistemática atual (STUTZ, 1990). Muitas delas são divididas em sub- famílias, que por sua vez se dividem em gênero, espécies, e em alguns casos subespécies. Existe muita discordância entre os pesquisadores sobre a validade ou não das subespécies; alguns afirmam que a classificação atual de muitas subespécies esta pouco definida e muito subjetiva. Uma vez que as características físicas utilizadas para tal definição são muito pequenas e só podem ser observadas através de dissecação microscópica. A separação de gênero em espécie deve ser motivo de investigações cuidadosas que requerem muita paciência e determinação. É sabido que a coloração e o tamanho de indivíduos de uma mesma espécie podem variar de acordo com os seus respectivos micro habitats e estas peculiaridades deve ser cuidadosamente avaliadas quando da classificação das espécies. Uma diferença única e isolada não é suficiente para elevar um certo tipo de escorpião à condição de espécie. Se houver aumento de interesse por parte de pesquisadores e principalmente fontes de financiamento para pesquisa, seguramente novas espécies de escorpiões serão descritas. A biologia molecular através do uso de PCR, ou análise de DNA tornou-se uma ferramenta de suma importância nesta tarefa. 4.7 ALIMENTAÇÃO Apesar de pequenos em tamanho, escorpiões exercem papel fundamental na cadeia alimentar. Não é incomum encontrarmos três ou quatro espécies diferentes convivendo no mesmo habitat, ou em grupos numerosos. Eles são animais carnívoros, predando grande quantidade de invertebrados e ocasionalmente pequenos vertebrados cont ribuindo sobre maneira para o equilíbrio ecológico (STUTZ, 1990). O Tityus serrulatus como os de mais escorpiões se alimentam principalmente de insetos , portanto um ambiente livre destes dificulta a sua presença. Os escorpiões fazem parte de uma parte significativa da cadeia alimentar. Além do canibalismo interespecies, seus predadores incluem centipedes, aranhas, formigas, lagartos, serpentes, rãs e sapos, pássaros e alguns mamíferos de grande porte. 15 Os escorpiões possuem uma das taxas metabólicas mais baixas do reino animal. Podem permanecer longos períodos sem se alimentar, pois ao final de uma única refeição (na qual ingeriu grande quantidade de alimento), conservam ao máximo, energia evitando ao extremo se locomoverem, poupando assim energia para sua anutenção (SPIRANDELI, 1994). Ingerindo o alimento lentamente, trituram fragmentos de alimento, umedecendo-os na boca (o que propicia já a digestão), sugando-os depois e eliminando os restos, como pequenas bolas de detritos. "Um escorpião da espécie Tityus bahiensis, mantido em cativeiro, demorou 20 horas para comer uma barata comum (MATTHIESEN, 1962). 4.8 TOXICOLOGIA Todas as espécies de escorpião são venenosas. Para os insetos, que são alimento potencial de escorpiões, todos os escorpiões são mortalmente venenosos. Entretanto, entre as cerca de 1500 espécies conhecidas, apenas um pequeno número é perigoso para os seres humanos. A maioria produz uma reação semelhante à da ferroada da abelha, que é muito dolorosa, embora geralmente não ofereça perigo de morte (STUTZ, 1990). Estudos mais recentes procuram descobrir se os escorpiões seriam sensíveis às suas próprias toxinas. 4.8.1 Veneno e envenenamento O veneno é uma mistura química complexa (peptídeos de baixo peso molecular) que destroem as células quando as penetram. Mais 100 destes peptídeos já foram isolados em veneno de escorpiões. A função básica do veneno é de capturar e imobilizar presas: sua função defensiva é secundária. O veneno dos escorpiões tem sido largamente estudado, particularmente em como é sua ação no corpo humano. A toxicidade dos venenos varia de gênero para gênero e de espécie para espécie, e muitas vezes dentro de uma mesma espécie a ação do veneno pode variar. Também, por razões ainda desconhecidas, parece ter variações de acordo com regiões. Talvez em função da variação dos componentes químicos de cada tipo de veneno, aliados a variações genéticas, condições ambientais, tipo de alimentação disponível, ou simplesmente variações fisiológicas entre espécies podem ser a causa destas diferenças (BÜCHERL, 1979). Os escorpiões do gênero Tityus são os causadores de acidentes de interesse médico. As principais espécies são o Tytius bahiensis (escorpião marrom) e Tytius serrulatus (escorpião amarelo). Este último é atualmente o causador do maior número de mortes, principalmente quando acomete crianças abaixo de 7 anos de idade. O quadro 1 resume a classificação e o tratamento do escorpionismo. 16 Tabela 2. Classificação e tratamento do acidente com escorpiões. Classificação do escorpionismo Manifestações clínicas Leve Somente presentes as manifestações locais, dor em 100% dos casos. Ocasionalmente vômitos, taquicardia e agitação de pequena intensidade. Moderado Grave Tratamento Geral Específico Combate à dor: analgésicos e/ou anestésicos locais (Lidocaína à 2%). Observação em ambiente hospitalar durante pelo menos 6 a 12 horas, especialmente crianças abaixo de 7 anos. _____ Manifestações locais e alguma Combate à dor com Em crianças abaixo de 7 sintomalogia sistêmica como Lidocaína a 2%. Observação anos está indicado o soro agitação, sonolência, sudorese, clínica em ambiente antiescorpiônico 2 a 4 náuseas, alguns vômitos, hospitalar durante pelo ampolas pela via menos 24 horas. intravenosa. hipertensão arterial, taquicardia e taquipnéia Manifestações sistêmicas: vômitos, náuseas, sudorese, agitação, taquicardia, hipertensão arterial, alterações do ECG, tremores, espasmos, edema agudo de pulmão, choque, coma e morte. Combate à dor com Utilizar soro Lidocaína a 2%. Internação antiescorpiônico na dose hospitalar. Cuidados de 5 a 10 ampolas pela intensivos, monitorização via intravenosa tanto para das funções vitais. Cuidados adultos quanto crianças em Unidade de Terapia Intensiva. Fonte: Instituto Butantan, 1997. 4.8.2 Sintomatologia • Dor (especialidade do veneno dos escorpiões) • A maior parte dos sintomas que surgem na pessoa picada por um escorpião, é decorrente da liberação de mediadores químicos na corrente circulatória da vítima,como: 4.8.2.1 Acetilcolina Causa aumento das secreções lacrimal, nasal, salivar, brônquica, sudorípara e gástrica, tremores, espasmos musculares, mioses e diminuição de rítmo cardíaco. 4.8.2.2 Adrenalina e noradrenalina Aumento da pressão arterial, arritmias cardíacas, vasoconstrição periférica e eventualmente insuficiência cardíaca, edema agudo do pulmão e choque. 17 A toxidade do veneno do escorpião está relacionada com a espécie envolvida no acidente, sendo os casos mais graves no Brasil, ocasionados pelo escorpião amarelo Tityus serrulatus. Há casos onde o escorpião pode picar pessoas e não incolar veneno, gerando os acidentes assintomáticos (INSTITUTO BUTANTAN, 1997). 4.8.2.3 O veneno Segundo relatos clínicos, parece existirem diversos fatores que modulam a toxicidade do veneno do escorpião para humanos. Os principais fatores são: 1) a toxidez do veneno do tipo de escorpião envolvido; 2) a quantidade de veneno injetada pelo escorpião; 3) o tamanho do corpo da vítima; 4) a condição médica geral da vítima. Devido a seu pequeno tamanho, as crianças sofrem maior risco de envenenamento grave do que os adultos. A maior parte das mortes resultantes de picadas de escorpião ocorre em crianças pequenas. Tal fato revela os casos ocorridos no município em questão. Algumas pessoas são alérgicas ao veneno dos escorpiões, da mesma forma que outras podem ser ao veneno das abelhas. Nestes casos, conseqüências muito graves, inclusive a morte, podem ocorrer rapidamente, mas não têm relação à toxicidade do veneno. Mortes ocorridas por envenenamento causado por espécies de escorpião sem importância médica resultam de choque anafilático induzido por alergia. O veneno do escorpião compreende uma variedade de substâncias, nem todas completamente investigadas. O veneno de um único escorpião pode incluir diversas neurotoxinas, histimina, seratonina, enzimas, inibidores de enzimas, e outros compostos não identificados. O veneno pode conter, ainda, sais diversos, muco, peptídeos, nucleotídeos e aminoácidos. Foram as neurotoxinas que receberam a maior atenção dos pesquisadores. As numerosas toxinas do veneno do escorpião são geralmente consideradas como sendo específicas. Cada uma visa atingir a célula nervosa de uma determinada espécie animal. Algumas neurotoxinas podem ter sua maior atividade contra insetos, outras pode ser mais letal para moluscos, e outras, ainda, podem ser dirigidas contra células nervosas de mamíferos. Além disso, toxinas diferentes podem visar locais diferentes na célula nervosa. Segundo a divisão de venenos e antivenenos do instituto Vital Brazil, o veneno de escorpiões, tipo o Tityus serrulatus, age sobre o sistema nervoso periférico. Causa dor muito intensa, com pontadas intermitentes, provoca abaixamento de temperatura do corpo e acelera a pulsação. Comumente a vítima fica prostada. O sinal da picada às vezes não se percebe, porém a dor forte e imediata que ela provoca faz com que a vítima possa ver o animal causador. É importante saber se a picada foi produzida por escorpião ou aranha, uma vez que os sintomas das picadas de escorpião são semelhantes aos das picadas de aranhas com veneno neurotóxico. O escorpião Tityus serrulatus é mais importante sob o ponto de vista médico que o Tityus bahiensis, por provocar mais ocorrências graves. O veneno do Tityus serrulatus 18 pode não ser mais tóxico, mas este escorpião injeta, em cada picada, praticamente o dobro de peçonha injetada pelo Tityus bahiensis. O tratamento na maioria dos casos consiste na infiltração local de 2 a 4 ml de anestésico do tipo lidocaína a 2% sem vasoconstritor. Repetir este procedimento mais duas vezes se necessário, com intervalo de uma hora. Caso a dor persista, está indicada a soroterapia específica com soro antiescorpiônico ou antiaracnídico, na doses de 2 a 4 ampolas para os casos moderados e 5 a 10 ampolas para os casos graves. A soroterapia está sempre indicada em crianças menores de sete anos e em adultos com dor persistente (INSTITUTO VITAL BRAZIL, 1995). Nos períodos de 1988 a 1998 no Estado de São Paulo, houve um grande aumento dos casos de acidentes com picadas de escorpiões, onde vários desses casos tiveram como resultados óbitos. (Tabela 3) Tabela 3. Incidência por 100.000 habitantes de acidentes por escorpiões nos períodos de 1988 a 1998 no Estado de São Paulo. Ano Nº de casos Coeficiente incidência de óbitos Letalidade % 1988 738 2,50 5 0,68 1989 790 2,62 1 0,13 1990 806 2,62 1 0,12 1991 1078 3,43 3 0,28 1992 1417 4,43 5 0,35 1993 1608 4,94 2 0,12 1994 1569 4,75 2 0,13 1995 1954 5,82 3 0,15 1996 1688 4,95 3 0,18 1997 1630 4,71 5 0,31 1998 1979 5,63 1 0,05 TOTAL 15257 ___ 31 0,20 Fonte: São Paulo, 1998. 4.9 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS Quando usa-se neste trabalho o termo epidemia, estamos nos referindo a um animal que é endêmico na região sudeste, ou seja, a presença do Tityus serrulatus na região Centro-Oeste, em grande escala, classifica-o como um animal invasor. 19 São acidentes menos notificados que os ofídicos. Sua gravidade está relacionada à proporção entre quantidade de veneno injetado e massa corporal do indivíduo picado. Entre os agentes causais estão as espécies do gênero Tityus responsáveis por acidentes. (Tabela 4) O Tityus serrulatus, espécie partenogenética, em expansão nas regiões CentroOeste, Sudeste e Sul. Responsável pelos acidentes de maior gravidade registrados no país, incluindo óbitos. Segundo o Ministério de Saúde, são notificados anualmente, cerca de 8.000 acidentes, com uma letalidade variando em torno de 0,51%. Os acidentes por escorpiões são mais freqüentes no período de setembro a dezembro. Ocorre uma discreta predominância no sexo masculino e a faixa etária de 25 a 49 anos é a mais acometida. A maioria das picadas atinge os membros, havendo predominância do membro superior (mãos e dedos) (CENEPI, 1990). Tabela 4. Agentes causadores de acidentes e distribuição geográfica. Nome científico Nomes populares Distribuição geográfica T. bahiensis escorpião marrom MG, SP, PR, SC, RS, GO, MS T. cambridgei escorpião preto AP, PA T. costatus Escorpião MG, ES, RJ, SP, PR, SC, RS T. fasciolatus Escorpião GO, DF T. metuendus Escorpião AC, AM, PA, RO T. serrulatus escorpião amarelo BA, MG, ES, RJ, SP, DF, GO, PR T. silvestris Escorpião AC, AM, AP, PA T. stigmurus Escorpião BA, SE, AL, PE, PB, RN, CE, PI Fonte: CENEPI - Ministério da Saúde 4.10 CRENDICES Ao contrário do que as pessoas acreditam o escorpião não suicida quando preso entre o fogo, ele desidrata e na agonia da morte dá a imprensão que se ferroa ( Matthiesen, 1971). 20 4.11 CONTROLE Em alguns locais do planeta os escorpiões assumem grande importância na dieta de aranhas, lagartos, louva-a-deus, corujas, seriemas, macacos, pássaros, ratos e gafanhotos. A serpente da areia, Chionactis sp. , não somente é imune ao veneno do escorpião, como parece alimentar-se quase exclusivamente deles. Alguns outros predadores são resistentes ao veneno do escorpião. Na África e na Ásia os babuínos escavam sistematicamente a superfície da terra para encontrar escorpiões, removem o telson ou o metasoma inteiro para evitar ferroadas, antes de comê-los. Galinhas, formigas e sapos também comem escorpiões. Sendo os sapos e os escorpiões ambos de hábitos noturnos, as probabilidades de encontro são grandes e cada sapo pode comer vários escorpiões em seguida. As galinhas, porém, por serem diurnas, encontram os escorpiões eventualmente, quando ciscam os terrenos. (figura 8) Figura 8. Formigas se alimentando de Tityus serrulatus em um terrário do laboratório de animais peçonhentos em Uberlândia. A adaptação da espécie às condições urbanas, aliada ao seu modo de reprodução e às precárias condições de higiene e saneamento básico encontradas principalmente em bairros de periferia, facilitou a disseminação destes artrópodes em grandes aglomerados urbanos. 3 METODOLOGIA Visitou-se a área urbana do município para um estabelecimento dos locais onde seriam feitas coletas de espécimes para identificação e estudos estatísticos da epidemia. Tomou-se por base para essa pré visita, notificações e reclamações feitas pelos próprios moradores. Foram analisados os focos de escorpiões no perímetro urbano, em diversos bairros, inclusive àqueles com registros de acidentes, em locais como entulhos, residências, 21 cupinzeiros. Os setores municipais são: Cemitério, SANEAGO-ETE, Conjunto Marize, Jardim Imperial, Setor Santo Onofre, Vila Padre Renato, Setor Cristina, Setor Ana Rosa, Bairro Santuário, Setor Sol Dourado, Vila dos Sonhos e Conjunto Arco Íris. A visita para coleta de espécimes nos locais pré-estabelecidos, teve início no dia 01 de outubro de 2001 e término no dia 28 de fevereiro de 2002. Para cada setor e região, realizou-se o mesmo número de visitas (tabela 5). Tabela 5. Nº de visitas feitas nas seguintes regiões em 2001/2002. Região Conjunto Marize Jardim Imperial Santo Onofre Vila Padre Renato Cristina Ana Rosa Bairro Santuário Sol Dourado Vila dos Sonhos Conjunto Arco Íris Cemitério SANEAGO-ETE 2001 2002 Out Nov Dez jan Fev 3 3 3 3 3 3 3 2 2 3 7 2 3 3 3 3 3 3 3 2 2 3 7 2 3 3 3 3 3 3 3 2 2 3 ___ ___ 3 3 3 3 3 3 3 2 2 3 7 2 3 3 3 3 3 3 3 2 2 3 7 2 22 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Em cada local fora feitas identificações e coletas de espécimes totalizandoas por mês. (Tabela 6) Tabela 6. Número de espécimes coletados por regiões nos meses de outubro de 2001 a fevereiro de 2002. variação REGIÃO Cemitério SANEAGO – ETA Conjunto Marize Jardim Imperial Setor Santo Onofre Vila Padre Renato Setor Cristina Setor Ana Rosa Bairro Santuário Setor Sol Dourado Vila dos Sonhos Conjunto Arco Íris TOTAL diária 7 a11 7a9 2a3 2a3 1a4 1a4 1a3 1a3 0a3 0a1 1a2 1a2 ---- OUT 56 16 5 7 7 3 4 2 3 1 3 3 110 NOV 63 18 9 12 8 4 5 6 4 2 2 5 138 DEZ 8 9 6 8 4 6 5 2 3 4 55 JAN 59 17 8 7 6 5 4 6 5 2 2 3 124 FEV 55 16 5 6 5 4 4 4 4 2 3 3 111 Obs.: por motivos técnicos não foram realizados levantamentos em dezembro na região do cemitério e saneago-ETA No município de Trindade, localizado na Região Centro-Oeste do país, o clima tem como característica, uma estação fria seca e uma quente úmida. Os períodos mais chuvosos compreendem os meses de novembro, dezembro e janeiro (podendo normalmente anteceder e ultrapassar dois meses), onde ambos os citados, são marcados por temperatura e umidade elevada. Os demais meses tem como característica, temperatura e umidade baixa (sendo os meses de maio e junho picos dessas características). Foram registrados 3 acidentes escorpiônicos com conseqüência o óbito, no período compreendido entre 2001 e 2002 . Quanto ao sexo e idade dos pacientes: meninas entre 7 e 11 anos. Quanto ao local da agressão houve predominância das mãos e nos pés. Quanto a sazonalidade dos acidentes notou-se que, como no observado em Uberlândia por Stutz 1990, onde os acidentes ocorreram predominantes nos meses de maior precipitações pluviométricas (dezembro a maio), em Trindade também foram mais freqüentes nos meses considerados úmidos quentes (STUTZ, 1990). Quanto aos bairros próximos ao cemitério e Estação de Tratamento de Água da SANEAGO, contribuíram com o maior número de acidentes. Lembrando que os acidentes aqui citados são somente os seguidos de morte, onde os que não resultaram no mesmo, são de maior número e não serão citados. Observando os dados da Tabela 5, notamos que no cemitério e na Estação de Tratamento de Água da SANEAGO, o índice da presença do Tityus serrulatus é grande. 23 Em relação a saneamento básico a cidade possui vias com pavimentação asfáltica, observando que parte da periferia, ainda carente. Inclusive setores pólos da presença do escorpião. Parte da malha urbana possui esgoto instalado e água tratada, onde parte da perife ria também carente desses direitos, propiciando o uso de fossas sanitárias e cisternas. Nota-se que os meses de índice pluviométrico e calor elevado, foram os de maior coleta do escorpião, onde segundo Stutz,1990, é hábito do animal se adaptar e reproduzir em ambiente de temperatura e umidade alta. (STUTZ, 1990) É bom ressaltar que nos meses de estação seca fria, o animal em questão, não desaparece por completo, apenas diminui suas atividades. Analisando o mapa do município (figura 9), percebe-se que os setores afetados são “vizinhos” do cemitério e da SANEAGO-ETE, ensejando a migração a partir destes focos de maior ocorrência. 24 Goiânia GO 060 B. SANTUÁRIO VL Pa. RENATO S. ANA ROSA ST.S.ONOFRE S. CRISTINA CEMITÉRIO C. ARCO ÍRIS SOL DOURADO VL. SONHOS CJ.MARIZE J. IMPERIAL SANEAGO-ETE Figura 9. Esquema do município de Trindade mostrando a migração do escorpião, partindo dos principais focos – SANEAGO-ETE e CEMITÉRIO. 25 Daí, percebe-se que as duas regiões de maior freqüência, disseminam o animal para os setores que colaboram com a presença do mesmo, onde as casas visitadas têm como características errôneas, o acondicionamento do lixo doméstico, o seu destino e o estado em que se encontram os terrenos baldios em relação à presença de muros e calçadas, além da presença de entulhos e lixo doméstico. Verificou-se que a maioria da população não tem o hábito de colocar o lixo em sacos plásticos entregando-o à Prefeitura em latões abertos e permitindo assim o acesso ao lixo de animais que dele se alimentam, principalmente as baratas. Os terrenos urbanos, principalmente àqueles sem qualquer construção, encontram-se sujos, cheios de entulho e lixo e raramente são murados, facilitando o refúgio e a procriação de escorpiões e outros animais. Outro fato observado é o tipo das habitações, onde as paredes são de tijolos a vista, ou seja, sem reboco. O acúmulo de xaxins e plantas em geral, também se mostrou eficaz para o escorpião, onde a umidade propicia a presença de alimento e do animal em questão, uma vez que é característica da sua propagação, a presença de alimento, temperatura e umidade alta. Já nas residências mais higiênicas dos setores acima referidos, notou-se a presença do animal. Tal fato deve-se a antiga rede sanitária das casas, muitas das quais, feitas com manilhas, que podem estar rompidas. No cemitério municipal, o aparecimento do animal associa-se à presença da grama (ambiente propicio para proliferação de grilos e demais insetos) e a alta temperatura e umidade do interior dos túmulos, onde também se encontram baratas. Segundo o diretor atual (2002) do cemitério, após o cultivo da grama no local ho uve um grande aumento na reprodução do escorpião. Da mesma forma, na SANEAGO – Estação de Tratamento de Esgoto, a quantidade de alimento e ambientes propícios para seu esconderijo, como entulho de cerâmicas, foram favoráveis. O desmatamento da região pode ter causado a diminuição dos inimigos naturais ou até o desaparecimento destes que ocupariam o mesmo nível ou superior do escorpião na cadeia alimentar. No perímetro urbano a formação de novos loteamentos é fator de destruição do habitat natural dos escorpiões, como é o caso de cupinzeiros, barrancos, pedras e touceiras de capim, acarretando, em última análise, o deslocamento desses artrópodes à procura de novos abrigos. Durante as visitas de casa a casa, avaliou-se através de entrevista, a real importância que a população dá ao escorpionismo. Constatou-se que a mesma convive com o problema sem no entanto conhecer sua verdadeira gravidade. 26 5 PROGRAMA DE PREVENÇÃO E CONTROLE 5.1 ESTRUTURAR E CAPACITAR EQUIPE DE PREVENÇÃO Recrutar uma equipe capacitada para o conjunto de medidas a serem tomadas no decorrer da prevenção a presença do escorpião Tityus serrulatus. A equipe precisa estar ciente da atual situação da epidemia, dos pólos e a radiação do animal em questão, os níveis sóciocultural das populações visitadas nos vários setores afetados, conhecer o escorpião no sentido de seu nicho, habitat, perigo de interesse médico e manuseio. Os cursos para capacitação serão ministrados por profissionais especialistas em epidemia urbana com aracnídeos, CIT, NUROG-UCG, IQUEGO, BUTANTAN E INSTITUTO VITAL BRAZIL. 5.2 ELABORAÇÃO DE FOLDERS INFORMATIVOS PARA A POPULAÇÃO As informações devem mostrar ao individuo como identificar o animal, seus perigos, porque de sua presença nas áreas urbanas e quais as medidas a serem tomadas pelos moradores dos bairros afetados. As informações deveram ser claras e objetivas com uma linguagem popular de fácil entendimento e esquemas com gravuras para compreensão dos indivíduos ainda não alfabetizados, reforçar o esclarecimento de todos e chamar a atenção das crianças e ate mesmo dos adultos. O folheto deve conter explicações sobre a espécie do escorpião registrada na região e os seus hábitos, os cuidados com as crianças acidentadas e a urgência no atendimento médico, os primeiros socorros a serem tomados, as medidas preventivas básicas e por fim a captura dos animais e o seu encaminhamento aos órgãos competentes. Distribuir parte dos folhetos à população, junto com a conta de luz, parte entre professores e alunos das escolas e o restante deles na operação "casa a casa". 5.3 MEDIDAS EDUCATIVAS Estas possivelmente sejam as mais importantes e mais difíceis de serem implantadas na população. Assim a campanha educativa envolve a confecção e a distribuição dos folhetos citados, visitas domiciliares, mutirões de limpeza, cursos, palestras, entrevistas nos principais meios de comunicação da cidade, exposições didáticas e a participação das escolas na elaboração de material educativo. Sugere-se também, palestras aos seguintes órgãos: • Conselho de Saúde • Presidentes de Bairros • Nos Bairros • Profissionais da área de saúde • Escolas Municipais, Estaduais e Particulares. (professores e alunos) • E demais instituições que se interessarem. 27 5.4 CRIAÇÃO DO DISQUE INFORMAÇÃO: “DISK ESCORPIÃO” Um telefone para atender e registrar denuncias, dar informações gerais, agendar palestras e visitas. Diminuindo o intervalo que separa a população do esclarecimento de duvidas e mostrar o interesse do Governo Municipal com sua população. Os moradores informarão sobre os acúmulos de lixo e entulhos nos quintais de vizinhos ou terrenos baldios, onde o departamento de limpeza pública e/ou vigilância sanitária serão notificado para realização de trabalho em equipe. 5.5 EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS ESCOLAS O tema Educação Ambiental é de grande importância na grade curricular dos cursos de ensino fundamental e médio, pois forma o indivíduo com uma consciência critica sobre o ambiente onde vive, suas transformações, os pontos favoráveis dessas mudanças, a importância de cuidar de seu habitat e a socialização no sentido de se unir para discutir e resolver problemas ambientais. 5.6 PARCERIAS Buscar apoio do Núcleo Regional de Ofiologia de Goiânia – Ministério da Saúde/Universidade Católica de Goiás, para apoio nas palestras, andamento da pesquisa e fornecimento de materiais e estagiários voluntários do curso de Biologia, durante o trabalho de prevenção. Procurar também apoio na Universidade Federal de Goiás no fornecimento de estagiários voluntários do curso de Biologia. Solicitar ao Instituto Butantan e Instituto Vital Brazil, cursos para os profissionais do departamento em formação. 5.7 EQUIPE DE PESQUISA Um constante trabalho voltado para dados estatísticos nos objetivos alcançados pelo projeto, proporcionando a todos, informações do desenvolvimento do trabalho, tendo sempre argumentos e respostas para a comunidade e mídia. A pesquisa no decorrer do trabalho gera disciplina em conseqüência gera sucesso na meta em questão – Combater a presença do Tityus serrulatus no município de Trindade – alem de tornar Trindade, referencia nacional pela comunidade cientifica, por ter alcançado o objetivo de eliminação da presença urbana do escorpião amarelo causador de óbitos, por valorizar sua população e seus profissionais. 5.8 ACONDICIONAMENTO ADEQUADO DO LIXO DOMÉSTICO O acondicionamento adequado do lixo em sacos plásticos, que devem ser mantidos fechados, pode evitar que este se torne foco de atração de artrópodes, entre eles, as baratas. 28 Entretanto, como a coleta em saco plástico não é hábito da população e tendo em vista o seu grau de importância, sugerimos à Prefeitura Municipal que tome a iniciativa de normatizar o assunto. 5.9 REGULAMENTAÇÃO SOBRE TERRENOS BALDIOS Sugere-se à Prefeitura a legislação e a fiscalização da limpeza dos terrenos baldios, seus calçamentos e a colocação de muros quando necessário. 5.10 USO DE PREDADORES NATURAIS O uso de inimigos naturais no combate ao escorpião (sapos, corujas, macacos, etc.) é pouco divulgado pela literatura científica. Por outro lado, as galinhas, predadoras em potencial destes aracnídeos poderiam em determinadas condições ser utilizadas como método de controle. Apesar dos escorpiões serem de hábitos noturnos e as galinhas diurnas, estas últimas no ato de ciscar podem remover e devorar os animais escondidos em frestas, debaixo de folhas e entulhos. Dessa forma, nas residências com quintais grandes, a criação de galinhas poderia ajudar no combate a estes artrópodes, obedecidas as normas sanitárias para a criação de animais domésticos nas cidades. No ano de 1991, no município de Aparecida em São Paulo, diante do grave problema do escorpionismo, a Prefeitura, por iniciativa própria, distribuiu à população de alguns bairros aproximadamente 800 galinhas caipiras. O fato, na época revestido de grande sensacionalismo jornalístico, não pode ter sua eficácia avaliada. Os pesquisadores do CEVAP avaliaram a distribuição das galinhas como sendo mais uma medida educativa, quando reforçou à população o conceito de "cadeia alimentar", conscientizando-a da importância dos inimigos naturais no equilíbrio da população de artrópodes. 5.11 OPERAÇÃO “CASA A CASA” Aproveitando a campanha contra a dengue, equipes da Prefeitura e parcerias, previamente treinadas, trabalharam os estabelecimentos. Esta operação individualizada, adaptara a linguagem, motivara a população, apresentara sugestões de melhoria ao folheto, reforçara o comportamento e orientara àqueles que desconheciam o problema. 5.12 MULTIRÃO DE LIMPEZA Prefeitura em conjunto com age ntes sanitaristas e equipe aqui proposta, auxiliara os moradores na identificação de criadouros de escorpiões, que serão eliminados pela própria população. A Prefeitura colocara à disposição da população caminhões basculantes, caminhão tanque, retroescavadeira e auxilio na utilização destes, quando necessário. Com o desenvolvimento do trabalho em alguns pontos da cidade, diversos bairros tomarão a iniciativa de realizar seus próprios mutirões de limpeza, que serão imediatamente apoiados pela comissão executora do projeto. 29 5.13 ENCONTRO EDUCACIONAL Este encontro será intitulado de "1° Encontro Educacional sobre Escorpionismo de Trindade (GO)" e duraram três dias. O objetivo será de movimentar toda rede municipal e estadual de ensino, com todos alunos, promovendo atividades extra-classe, levando principalmente às crianças informações gerais sobre o assunto, com o intuito final destas influenciarem os familiares adultos em casa. O programa do encontro constara das seguintes atividades: No primeiro dia, treiname nto dos professores em anfiteatro ministrando-se as seguintes aulas: "Epidemiologia do escorpionismo no Brasil"; "Biologia e ecologia dos escorpiões"; "Métodos de prevenção e controle do escorpionismo". Ao final do encontro educacional e de comum acordo com os professores, sera sugerido a introdução do tema "Escorpionismo" como matéria obrigatória para todos os alunos de primeiro e segundo graus do município, inclusive com cobrança do aprendizado em avaliações. Além disso, será fornecido à Secretaria Munic ipal de Educação e Cultura de Trindade, material didático, slides e filmes, sobre o tema em questão, para uso das escolas interessadas. Alem dos planos de ações sugeridos acima é também viável citar as seguintes medidas eficazes para o controle e prevenção de acidentes: • manter limpos quintais, jardins e terrenos baldios, não acumulando entulho e lixo doméstico; • aparar a grama dos jardins e recolher as folhas caídas; • vedar soleiras de portas com saquinhos de areia ou friso de borracha, colocar telas nas janelas, vedar ralos de pia, tanque e de chão com tela ou válvula apropriada; colocar o lixo em sacos plásticos, que devem ser mantidos fechados para evitar o aparecimento de baratas, moscas e outros insetos, que são o alimento predileto de aranhas e escorpiões; • examinar roupas, calçados, toalhas e roupas de cama antes de usá-las; • andar sempre calçado e usar luvas de raspa de couro ao trabalhar com material de construção, lenha, etc. 5.14 PESQUISA DE PRODUTOS QUÍMICOS EFICIENTES Para evitar aranhas e escorpiões, o uso periódico de inseticidas não é a melhor solução. Além do alto custo, a aplicação desses produtos tem efeito apenas temporário e pode provocar intoxicações em seres humanos e animais domésticos. O ideal é coletar aranhas e escorpiões e remover o material acumulado onde estavam alojados, o que evitará a reinfestação Não existe nenhum veneno comprovadamente eficaz contra este animal. O CCZ já testou e continua testando vários sem resultados satisfatórios. O uso de venenos tem provocado até aumento de aparecimento de escorpiões, pois estes os irritam e os desalojam. 30 6 CONCLUSÕES Após o levantamento epidemiológico, foi constatada a presença dos escorpiões Tityus serrulatus na zona urbana do município. Deve-se salientar que esta foi a única espécie de escorpião encontrada na região. Sugere-se de maneira integrada, medidas preventivas, medidas corretivas do ambiente e medidas educacionais com o objetivo de controlar o problema do escorpionismo, proporcionando níveis de infestação aceitáveis do ponto de vista epidemiológico. É necessário lembrar que não existem medidas de controle específicas para o escorpionismo, pois elas se constituem nos mesmos princípios básicos de Saúde Pública, a serem respeitados em sociedades modernas. O controle preconizado para o escorpionismo na região, deve ser monitorado ao longo do ano todo, devendo ser mais intenso nos períodos que antecedem, ou mesmo durante as épocas em que se têm demonstrado um maior risco para a população, em geral na estação chuvosa do ano. O autor entende que o problema é basicamente sócio-cultural e os programas de controle deverão ser aplicados continuadamente ano após ano e só apresentarão resultados positivos quando a população apresentar mudanças comportamentais que se refletirão na diminuição dos índices de acidentes e de infestação. Deve ser salientado que as ações propostas de controle devem ser integradas e continuadas de forma ininterrupta por vários anos, até que possam ser verificados índices aceitáveis de infestação. É possível, no município, a integração entre as campanhas de combate ao escorpionismo com os de controle à dengue. As situações epidemiológicas destas duas endemias se sobrepõem em diversas oportunidades e pode-se utilizar a mesma equipe treinada para ambas as funções. No município onde o problema ocorre, poder-se instituir a semana do escorpião, objetivando relembrar a população, ano após ano, da necessidade de manter-se vigilante para o problema. Esta semana deve anteceder os meses de maior ocorrência dos escorpiões. Além disso, o trabalho dos professores de primeiro e segundo graus, mantendo e cobrando o tema em apreço anualmente dos alunos, contribuiria sobremaneira para a prevenção dos acidentes e o combate aos artrópodes. 31 7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bücherl W. Acúleos que matam. Editora da Revista dos Tribunais, São Paulo, p.1-153, 1979. Bücherl W. Escorpiões e escorpionismo no Brasil. I. Manutenção de escorpiões em viveiros e extração do veneno. Memórias do Instituto Butantan 25:53-82, 1953. Banco de Dados Integrados de Uberlândia - Secretaria Municipal de Planejamento, Prefeitura Municipal de Uberlândia, 1997 Kjellesvig-Waering, E.N. A restudy of the fossil Scorpionida of the world. Organised for publication by A. S. and K. E. Caster. Palaeontographica Americana, No. 55, 287 pp. 1986 Lourenço W.R. Sur la systématique des scorpions appartenant an complexe Tityus stigmurus (Thorell, 1877) (Buthidae). Revista Brasileira de Biologia, 41:351-362, 1981. Instituto Butantan. Aranhas e escorpiões. Secretaria da ciência, tecnologia e desenvolvimento econômico. Matthiesen FA. Partenogenesis in scorpions. Evolution 16:255-256, 1962. Matthiesen FA. The breeding of Tityus serrulatus, Lutz e Mello 1922. Revista Brasileira de Pesquisas Médicas e Biológicas, 4:299-300, 1971. Polis A.G - Biology of Scorpions - Stanford University Press – 1990 Schulz, J.W. 1990. Evolutionary morphology and phylogeny of Arachnida. Cladistics, 6:1-38. Spirandeli-Cruz EF. Biologia dos escorpiões. In: Barraviera B. (ed.) Venenos animais: uma visão integrada, Editora de Publicações Científicas, 1a. edição, Rio de Janeiro p.1035-150, 1994. Stutz W.H. - Ocorrência de Escorpionídeos em Uberlândia Minas Gerais - Monografia apresentada ao Curos de Saúde Coletiva para obtenção do título de Especialista , 1990 . Disponível em: <www.geocities.com/whstutz/criadouro.html> acesso em: 06 fev. 2002. Selden, P.A. 1993. Arthropoda (Aglaspidida, Pycnogonida, and Chelicerata), pp. 297320. In: The Fossil Record 2 (M. J. Benton, ed.). Chapman and Hall, London. Stockwell, S.A. 1989. Revision of the Phylogeny and Higher Classification of Scorpions (Chelicerata). Ph.D. Dissertation, University of California, Berkeley. 413 pp. 32