Leia - Epagri/Ciram
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UNIVERSIDADE REGIONAL DE BLUMENAU CENTRO DE CIÊNCIAS TECNOLÓGICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA FLORESTAL O CONCEITO DE NATURALIDADE APLICADO AOS REMANESCENTES DE FLORESTA MISTA LATI-ACICULIFOLIADA DE SANTA CATARINA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO LAIO ZIMERMANN OLIVEIRA BLUMENAU 2015 LAIO ZIMERMANN OLIVEIRA O CONCEITO DE NATURALIDADE APLICADO AOS REMANESCENTES DE FLORESTA MISTA LATI-ACICULIFOLIADA DE SANTA CATARINA Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Engenharia Florestal do Centro de Ciências Tecnológicas da Universidade Regional de Blumenau - FURB, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Engenharia Florestal, área de concentração Conservação e Restauração de Ecossistemas Florestais. Orientador: Alexander Christian Vibrans Coorientadora: Lúcia Sevegnani BLUMENAU 2015 Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da FURB ______________________________________________________________________ Oliveira, Laio Zimermann, 1989O49c O conceito de naturalidade aplicado aos remanescentes de Floresta Mista latiaciculifoliada de Santa Catarina / Laio Zimermann Oliveira. - 2015. 154 f.: il. Orientador: Alexander Christian Vibrans. Coorientador: Lúcia Sevegnani. Dissertação (mestrado) - Universidade Regional de Blumenau, Centro de Ciências Tecnológicas, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Florestal. Inclui bibliografia. 1. Floresta - Conservação. 2. Inventários Florestais Nacionais. 3. Biomassa. 4. Vegetação - Mapeamento. I. Vibrans, Alexander Christian. II. Sevegnani, Lúcia. II. Universidade Regional de Blumenau. Programa de PósGraduação em Engenharia Florestal. III. Título. CDD 634.9 ______________________________________________________________________ “Louvado seja Ele, que é tal que, quando nossas mentes tentam vislumbrar Sua essência, nossa inteligência se converte em imbecilidade; quando estudamos a conexão entre Sua ação e Sua vontade, nosso conhecimento se converte em ignorância, e quando nossas línguas desejam declarar Sua grandeza por meio de termos descritivos, toda a eloquência torna-se impotência e imbecibilidade.” Rabi Moshe ben Maimon (de abençoada memória) AGRADECIMENTOS A Hashem, O Criador do Universo, por toda a benevolência para com a minha alma. À minha querida família, Vilson, Estela e Caio e Vó Maria, por todo o amor, suporte e incentivo. Aos demais membros da família, tios e primos, os quais também me suportaram nessa caminhada. Ao amigo e grande incentivador desse meu início de carreira acadêmica: Alexander Christian Vibrans. Chefe, obrigado pelas oportunidades, confiança e por todas as discussões. À Lúcia Sevegnani; sempre admirei-a, desde a graduação. O ato de ter corrigido o manustrito da qualificação com tanto carinho me fez convidá-la para ser minha coorientadora. Ao amigo Paolo Moser (Paulus) pela grande participação no meu crescimento intelectual (extensions) nesses últimos dois anos. Mais importante que o conhecimento acadêmico é a amizade verdadeira. Ao amigo João Paulo de Maçaneiro por toda ajuda, amizade e companheirismo no infinito caminho do conhecimento sobre (nossas) florestas. À amiga Débora Lingner pela amizade e prestatividade no que fosse preciso. Ao amigo Gustavo Piazza pelas ajudas e pelas parcerias acadêmicas. Ao amigo Lucas Vedana pelo incentivo que sempre me dá na vida acadêmica e na vida musical. Ao amigo Airton Sutil, por toda a constante caminhada. Aos amigos Kanda Kuppa, Guilherme Treis, Ana Treis, Nashschon Kalala Kuppa, Plamedi Lusembo, por todo amor e incentivo nesse período. Aos amigos Átila Costa e Ricardo de Pauli e aos amigos Rafael da Costa, Gabriel Ugarte e Raphael Fogagnoli, pelo incentivo e irmandade. Ao amigo André Luis de Gasper por todo o conhecimento compartilhado. Ao amigo Ronald McRoberts por toda ajuda e aprendizado. Ao amigo Pedro V. Eisenlohr, por todo conhecimento compartilhado nesse período. Aos colegas da turma de mestrado. Aos professores Ary T. Oliveira-Filho, Joberto V. de Freitas e Eduardo Adeneski Filho pela participação na banca avaliadora. SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ................................................................................................................... 8 OBJETIVOS ........................................................................................................................... 10 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO ..................................................................................... 10 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 11 CAPÍTULO 1: O CONCEITO DE NATURALIDADE, SUA APLICAÇÃO E QUANTIFICAÇÃO EM REMANESCENTES FLORESTAIS: É POSSÍVEL APLICÁLO À REALIDADE DA FLORESTA MISTA COM ARAUCÁRIA DE SANTA CATARINA? ........................................................................................................................... 14 RESUMO................................................................................................................................. 14 ABSTRACT ............................................................................................................................ 15 1.1. INTRODUÇÃO........................................................................................................... 16 1.2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .................................................................................. 17 1.2.1. A NATURALIDADE DE ECOSSISTEMAS FLORESTAIS ................................ 17 1.2.1.1. A biodiversidade e a humanidade ............................................................................ 18 1.2.1.2. O conceito de naturalidade....................................................................................... 20 1.2.1.3. Estudos que adotaram o conceito de naturalidade ................................................... 25 1.2.1.4. Indicadores de naturalidade ..................................................................................... 28 1.2.1.5. Florestas referência de naturalidade......................................................................... 30 1.2.2. FITOFISIONOMIA ALVO: FLORESTA MISTA COM ARAUCÁRIA .............. 33 1.2.2.1 Caracterização geral ................................................................................................. 33 1.2.2.2 Histórico de degradação da Floresta Mista com Araucária ..................................... 38 1.2.2.3 Atual estado de conservação da Floresta Mista com Araucária .............................. 40 1.3. A PROPOSTA: A APLICAÇÃO DO CONCEITO DE NATURALIDADE COMO MEIO DE ACESSAR O ESTADO DE CONSERVAÇÃO DOS REMANESCENTES DE FLORESTA MISTA COM ARAUCÁRIA DE SANTA CATARINA............................................................................................................................. 43 1.3.1. APRESENTAÇÃO .................................................................................................. 43 1.3.2. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 43 1.3.3. A DEFINIÇÃO DE NATURALIDADE ................................................................. 47 1.3.4. METODOLOGIA DE ACESSO À NATURALDADE .......................................... 53 1.3.4.1 Área de estudo ......................................................................................................... 53 1.3.4.2 Dados do Inventário Florístico-Florestal de Santa Catarina .................................... 55 1.3.4.3 Indicadores potenciais de naturalidade .................................................................... 57 1.3.4.4 Escolha dos indicadores de naturalidade ................................................................. 67 1.3.4.5 Considerações finais acerca dos indicadores de naturalidade.................................. 90 1.3.4.6 Quantificação da naturalidade ................................................................................. 92 1.3.4.7 Definição e escolha das florestas de referência ....................................................... 94 1.4. CONCLUSÕES ........................................................................................................... 99 1.5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................... 99 CAPÍTULO 2: QUANTIFICAÇÃO DA NATURALIDADE DOS REMANESCENTES DE FLORESTA MISTA COM ARAUCÁRIA DE SANTA CATARINA ...................... 122 RESUMO............................................................................................................................... 122 ABSTRACT .......................................................................................................................... 123 2.1. INTRODUÇÃO......................................................................................................... 124 2.2. MATERIAL E MÉTODOS ..................................................................................... 125 2.2.1. ESCALAMENTO DA MEDIDA DE NATURALIDADE ................................... 125 2.2.1.1 Índice de naturalidade I.......................................................................................... 125 2.2.1.2 Índice de naturalidade II ........................................................................................ 126 2.2.2. PADRÕES ESPACIAIS DE NATURALIDADE ................................................. 126 2.3. RESULTADOS ......................................................................................................... 128 2.3.1. INDICADORES DE NATURALIDADE ............................................................. 128 2.3.2. FLORESTAS DE REFERÊNCIA ......................................................................... 130 2.3.3. A NATURALIDADE QUANTIFICADA ............................................................. 132 2.3.3.1 Mapas temáticos de naturalidade ................................................................................ 135 2.4. DISCUSSÃO ............................................................................................................. 137 2.4.1 OS ÍNDICES DE NATURALIDADE ................................................................... 137 2.4.2 UMA NOVA VISÃO SOBRE AS FLORESTAS NATIVAS .............................. 138 2.4.2.1 Observações acerca da naturalidade da Floresta Mista com Araucária ................. 138 2.4.2.2 Alternativa para a análise de remanescentes florestais .......................................... 142 2.4.3 PERSPECTIVAS PARA O USO DO CONCEITO DE NATURALIDADE ....... 143 2.5. CONCLUSÕES ......................................................................................................... 144 2.6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................... 144 APÊNDICE ........................................................................................................................... 146 8 APRESENTAÇÃO A dependência do ser humano pelas florestas é conhecida há muito tempo, pois desde os primórdios ele mantém uma estreita relação com elas. As florestas desempenham muitos serviços e funções ambientais, além de abrigar grande porção da biodiversidade da Terra (COSTANZA et al., 1997; HOLDRIDGE, 1967; REIS et al., 2014; RICKETTS et al., 2005). Vivenciamos uma drástica mudança do uso do solo nos últimos 50 anos e, consequentemente, os ecossistemas foram afetados (MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT, 2005; WRIGHT, 2005). Tal mudança foi, e continua sendo, regida pelo crescimento demográfico e econômico e pelo desenvolvimento da ciência e tecnologia, que são os principais fatores atuantes nas alterações dos ecossistemas florestais e na perda de habitats, afetando diretamente a biodiversidade (FOLEY et al., 2005; GIBSON et al., 2011; NELSON, 2005; PFEIFER et al., 2014). O crescimento populacional é, muitas vezes, acompanhado por atividades degradadoras, tais como a exploração madeireira indiscriminada e a transformação de florestas em áreas agrícolas e centros urbanos. A conservação dos ecossistemas florestais tornou-se uma preocupação no decorrer das últimas décadas, e esta preocupação induziu o desenvolvimento de pesquisas que objetivam identificar os agentes causadores, os impactos e as consequências da degradação, tanto na esfera biológica como na social (CHAZDON, 2008; GARDNER et al., 2009; ASWANI e LAUER, 2014; HUNTER JR. et al., 2014). Os Inventários Florestais Nacionais (IFNs) são uma fonte primária importante de informações sobre as florestas, em uma escala geográfica mais ampla; eles apresentam uma imagem do estado das florestas, constituindo as bases para a criação de políticas e programas florestais, tanto em escala regional como nacional (TOMPPO et al., 2010). Em uma perspectiva histórica, os IFNs evoluíram em direção ao levantamento e monitoramento da biodiversidade, de modo que no passado eram restritamente conduzidos com base na necessidade da obtenção de informações sobre a produtividade de madeira das florestas (CHIRICI et al., 2012). Este passo dado em direção à biodiversidade é justificado pelo incremento da exploração e degradação dos ecossistemas florestais, a ponto de medidas conservacionistas terem sido tomadas em várias regiões do planeta, através de ações internas ou acordos internacionais (CHIRICI et al., 2012; McROBERTS et al., 2008; VIBRANS et al., 2013a). Desta maneira, os IFNs nas últimas décadas vêm desempenhando a função de prover uma ampla gama de informações que possam retratar não só o estoque de madeira disponível, como também, os aspectos estruturais, florísticos, dinâmicos, os estoques de biomassa 9 disponíveis, dentre outros, podendo melhor embasar a gestão das florestas (CHIRICI et al., 2011; McROBERTS et al., 2010). Perante esse contexto, surge uma questão importante: Como monitorar o estado de conservação das florestas nativas em larga escala utilizando dados de IFNs? O acesso e a coleta de dados que contemplem todos os componentes de um dado ecossistema florestal não podem ser atingidos (RONDEUX, 2012), assim, todos esses componentes dificilmente poderão ser precisamente medidos (BOUTIN et al., 2009). Uma saída para este obstáculo é selecionar variáveis indicadoras que podem relacionar e sintetizar tais componentes (NOSS, 1990; CHIRICI et al., 2011; CHIRICI et al., 2012; MARCHETTI, 2004). Os dados gerados pelos IFNs da América do Norte, Europa e, recentemente, na América do Sul e Ásia, possibilitam verificar o estado de conservação das florestas através da quantificação e/ou monitoramento da naturalidade destes ecossistemas (CHIRICI et al., 2011; EEA, 2014; McROBERTS et al., 2008; McROBERTS et al., 2012; WINTER, 2012). O conceito de naturalidade refere-se ao quanto algo é livre de influência antropogênica, especialmente a tecnológica. Assim, ela pode ser representada por um gradiente contínuo que estende-se entre dois extremos, o totalmente artificial (ou alterado) e o totalmente natural (ANGERMEIER, 2000; SJÖRS, 1986; WINTER, 2012). Poucos métodos objetivos de quantificação da naturalidade foram desenvolvidos (MCROBERTS et al., 2012; WINTER, 2012). Dentro do universo dos dados coletados pelos IFNs, é importante determinar quais variáveis (ou indicadores) têm o potencial de expressar a naturalidade de ecossistemas florestais de uma forma quantitativa? E ainda, quais destas variáveis são coletadas pela maioria dos IFNs? Por exemplo, segundo Winter et al. (2011), os IFNs europeus preferem coletar variáveis relacionadas à estrutura da floresta como a composição de espécies, estrutura horizontal e vertical e necromassa do que variáveis de outros componentes da diversidade biológica, como espécies de pássaros, invertebrados, briófitas, fungos, dentre outras; estas variáveis são ecologicamente relevantes, mas seu acesso torna-se trabalhoso, demorado e dispendioso. Onde se enquadra o estado de Santa Catarina nesta proposta de monitoramento do estado de conservação através de um estimador quantitativo de naturalidade? A conclusão do primeiro ciclo do Inventário Florístico-Florestal de Santa Catarina (IFFSC) gerou um precioso banco de informações sobre as florestas nativas do estado e 10 possibilitou a execução de diversas análises sobre a atual situação das florestas (VIBRANS et al. 2012a; VIBRANS et al., 2012b; VIBRANS et al., 2013b; VIBRANS et al., 2013c). A conformidade metodológica do IFFSC com o IFN-Brasil constitui um incentivo a mais para o início da aplicação de estimadores de naturalidade dos remanescentes florestais, pois outros estados podem utilizar o mesmo estimador, possibilitando resultados comparáveis (EEA, 2014; KÖHL et al., 2000; McROBERTS et al., 2012; TOMPPO e SCHADAUER, 2012). Em florestas tropicais ou subtropicais, o conceito de naturalidade ainda não foi utilizado como um meio de determinar o estado de conservação de ecossistemas florestais (WINTER, 2012). Tal fato motiva o presente trabalho a investigar a viabilidade da aplicação de uma metodologia de determinação da naturalidade para a Floresta Mista Latiaciculifoliada (OLIVEIRA-FILHO, 2009) de Santa Catarina, a partir dos dados coletados pelo IFFSC. OBJETIVOS Diante do contexto apresentado, os objetivos deste trabalho são: (i) apresentar e discutir o conceito de naturalidade e conceitos associados; (ii) propor uma metodologia de quantificação da naturalidade para os remanescentes de Floresta Mista Lati-aciculifoliada de Santa Catarina, com base nos dados levantados pelo IFFSC; (iii) aplicar a metodologia de quantificação com o intuito de criar um índice de naturalidade para os remanescentes de Floresta Mista Lati-aciculifoliada amostrados pelo IFFSC. ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO Este manuscrito está divido em dois capítulos. O primeiro capítulo é dedicado ao cumprimento dos dois primeiros objetivos propostos, e é constituído de: uma revisão da literatura sobre o conceito de naturalidade, sua definição e sua aplicação no acesso do estado conservação de ecossistemas florestais naturais, e sobre a Floresta Mista Lati-aciculifoliada, sua descrição, histórico de exploração e atual situação de conservação; uma proposta para a quantificação da naturalidade. A proposta é constituída por uma fundamentação teórica introdutória, pela estruturação de princípios fundamentais e pela descrição geral da abordagem metodológica a ser adotada no processo de quantificação da naturalidade dos remanescentes de Floresta Mista Lati-aciculifoliada de Santa Catarina. 11 O segundo capítulo é dedicado à aplicação da metodologia desenvolvida no capítulo anterior e a criação de um índice numérico de naturalidade, de fácil interpretação. São apresentados os resultados obtidos e a discussão dos mesmos, seguidos de recomendações para a conservação dos remanescentes de Floresta Mista Lati-aciculifoliada de Santa Catarina. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANGERMEIER, P.L. The natural imperative for biological conservation. Conservation Biology, v.14: p.373-381, 2000. ASWANI, S.; LAUER, M. Indigenous people‟s detection of rapid ecological change. Conservation Biology, v.28, p.820-828, 2014. BOUTIN, S.; HAUGHLAND, D.L.; SCHIECK, J.; HERBERS, J.; BAYNE, E. A new approach to forest biodiversity monitoring in Canada. Forest Ecology and Management, v.258, p.168-175, 2009. CHAZDON, R.L. Beyond deforestation: Restoring forests and ecosystem services on degradated lands. Science, v. 320, p.1458-1460, 2008. CHIRICI, G.; MCROBERTS, R.E.; WINTER, S.; BERTINI, R.; BRÄNDLI, U.; ASENSIO, I.A.; BASTRUP-BIRK, A.; RONDEUX, J.; BARSOUM, N.; MARCHETTI, M. National Forest Inventory Contributions to Forest Biodiversity Monitoring. 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GIBSON, L., LEE, T.M., KOH, L.P., BROOK, B.W., GARDNER, T.A., BARLOW, J., PERES, C.A., BRADSHAW, C.J.A., LAURANCE, W.F., LOVEJOY, T.E.; SODHI, N.S. Primary forests are irreplaceable for sustaining tropical biodiversity. Nature, v.478, p.378381, 2011. 12 HOLDRIDGE, L.R. Life zone ecology. San Jose: Tropical Science Center, 1967. HUNTER JR., M.L.; REDFORD, K.H.; LINDENMAYER, D.B. The complementary niches of anthropocentric and biocentric conservationists. Conservation Biology, v.28, n.3, p.641645, 2014. KÖHL, M.; TRAUB, B.; PÄIVINEN, R. Harmonization and standardization in multi-national environmental statistics - Mission impossible? Environmental Monitoring and Assessment, v.63, p.361-380, 2000. MARCHETTI, M. Monitoring and Indicators of Forest Biodiversity in Europe - From Ideas to Operationality. EFI Proceedings, n.51, 2004. McROBERTS, R.E.; TOMPPO, E.O; NAESSET, E. Advances and emerging issues in national forest inventories. 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Em resposta a esta demanda, o Inventário Florístico-Florestal de Santa Catarina (IFFSC), inserido no programa IFN-Brasil, foi conduzido com o intuito de gerar informações sobre as florestas nativas do estado. A partir do contexto social e histórico do estado de Santa Catarina, e de dados qualitativos e quantitativos provenientes de 155 Unidades Amostrais levantadas na Floresta Mista com Araucária pelo IFFSC, adaptamos e aplicamos o conceito de naturalidade, amplamente utilizado na Europa. Esse conceito está relacionado ao grau em que algo é alterado do seu estado original. Assim, a naturalidade pode ser quantificada através de um gradiente que estentede-se do menos ao mais natural. Buscamos por indicadores quantitativos de naturalidade que têm o poder de sintetizar processos e aspectos ecológicos importantes. Dos 16 indicadores potenciais elencados foram escolhidos seis. De posse dos indicadores, definimos “florestas de referência” (Unidades Amostrais), as quais foram consideradas como mais naturais e serviram de base para a criação da medida quantitativa de naturalidade. A medida foi gerada a partir de duas abordagens: (i) da distância euclidiana do vetor gerado pelos seis indicadores (das Unidades Amostrais ordinárias) até o vetor gerado para dada floresta de referência (Unidades Amostrais de referência); (ii) da distância euclidiana do vetor gerado pelos seis indicadores (das Unidades Amostrais ordinárias) até o vetor gerado para a floresta de referência teórica, 100% natural. 15 ABSTRACT The ongoing Brazilian National Forest Inventory (NFI) is being performed as a tool for providing wide-range information, reporting not only the available timber stock, but also information about forest ecosystem components, conservation status and biomass stock. In response to this demand, the Forest and Floristic Inventory of Santa Catarina (IFFSC), inserted in IFN-Brazil program, was conducted in order to gather information about native forests. Based on the social and historical aspects of Santa Catarina state and also on qualitative and quantitative data from 155 sample plots measured by the IFFSC in Mixed Needle-broadleaved Forest, we adapted and applied the concept of naturalness which is widely used in Europe. This concept is related to the degree to which something is changed from its original state. Thus, naturalness can be quantified through a gradient that goes from least to most natural. We searched for quantitative naturalness indicators which have power to synthesize important ecological aspects and processes. We chosed six out of the 16 listed indicators. After the calculation of the indicadors, we defined "reference forests" (sample plots), which were considered to be closest to natural. These references were estabilished as the basis for creation of a naturalness quantitative measure. The measure was generated based on two approaches: (i) the Euclidean distance of the vector generated by the six indicators (of an ordinary sample plot) to the vector generated for an observed reference forest (reference sample plot); (ii) the Euclidean distance of the vector generated by the six indicators (of an ordinary sample plot) to the vector generated for a teorethical 100% natural reference forest. 16 1.1. INTRODUÇÃO Após um recente processo de intensa exploração e degradação dos ecossistemas naturais (FOLEY et al., 2005; SALA et al., 2000), a humanidade começa a perceber a magnitude e as consequências de seus atos destrutivos, muitas vezes motivados pela força de mercado e falta de conhecimento. Dentre os muitos ecossistemas, os florestais vêm despertando a atenção, talvez por sua biodiversidade e extensão (FAO, 2012; RICKETTS et al., 2005), e por serem provedores diretos, ou indiretos, de tantos recursos necessários à vida humana (GONZALEZ et al., 2005). Adicionamente, as florestas nos chamam atenção por sua exuberância e complexidade, que nos intriga e leva a refletir sobre suas origens, sejam através de princípios criacionistas ou evolucionistas (LOURENÇO, 2012). A conservação dos remanescentes florestais e a restauração de áreas anteriormente cobertas por vegetação florestal vêm sendo comentada pela mídia, e as instituições ligadas ao meio ambiente, sejam acadêmicas ou não, têm se ocupado no desenvolvimento de técnicas de levantamento e análises de dados ecológicos, de conservação, restauração e monitoramento dos elementos bióticos e abióticos que integram um sistema ecológico. Apesar deste movimento em prol da conservação, a atual política e as ações de conservação ainda são insuficientes. Um exemplo desse fato é a biodiversa Floresta Atlântica sensu lato (OLIVEIRA-FILHO e FONTES, 2000), a qual se encontra intensamente fragmentada, com remanescentes de pequeno tamanho e afetada por diversos efeitos causados pela fragmentação (RIBEIRO et al., 2009; TABARELLI et al., 2010). Perante este contexto, os Inventários Florestais Nacionais (IFNs, ou IFN, no singular) tornam-se os principais instrumentos de geração de informações em larga escala sobre as florestas, tanto informações quantitativas como qualitativas (McROBERTS et al., 2010b). Muitos países já possuem programas de IFN implantados, como, por exemplo, a Alemanha, República da Coréia do Sul, Estados Unidos da América, Finlândia, França, Grã-Bretanha, México, entre outros (TOMPPO et al., 2010). As informações coletadas pelos IFNs possibilitam determinar parâmetros e indicadores do estado de conservação das florestas, entretanto, por questões operacionais, uma coleta de dados que contempla todos os componentes do ecossistema florestal não pode ser realizada (RONDEUX, 2012). Logo, uma alternativa a esta limitação é identificar e selecionar variáveis (ou indicadores) que podem relacionar e sintetizar os componentes do ecossistema florestal (CHIRICI, et al., 2012; MARCHETTI, 2004; NOSS, 1990, 1999; WINTER et al., 2011). 17 A determinação e o monitoramento da biodiversidade e do estado de conservação das florestas nativas podem ser realizados através do emprego do conceito de naturalidade (McROBERTS et al., 2012; WINTER, 2012). Angermeier (2000) e Hunter (1996) definem o conceito de naturalidade baseado em quanto algo é livre de influência antrópica, especialmente a tecnológica. A naturalidade pode ser vista como uma medida de biodiversidade, mas também como um descritor do estado de conservação de um ecossistema (MACHADO, 2004), e pode ser representada por um gradiente contínuo que estende-se entre dois extremos, o totalmente artificial (ou alterado) e o totalmente natural (ANGERMEIER, 2000). Apesar dos muitos trabalhos que abordam o conceito (WINTER, 2012), existe a carência de uma definição comum do conceito e de métodos de determinação/quantificação da naturalidade (MACHADO, 2004; McROBERTS et al., 2012; WINTER, 2012). Poucos métodos explícitos de quantificação foram propostos até o momento (McROBERTS et al., 2012; WINTER, 2012), de forma que estes autores incentivam a realização de estudos que tratem da naturalidade e de formas de quantificá-la. McRoberts et al. (2012) justificam a importância de determinar a naturalidade de florestas por três razões: (i) estimar adequadamente e reportar a sanidade ecológica das florestas para fins de avaliação da conservação e manejo florestal, (ii) para desenvolver metas e padrões para a conservação de florestas e (iii) identificar florestas primárias ou em estágio avançado de regeneração que poderão ser designadas como áreas de conservação. Diante do contexto apresentado, os objetivos deste capítulo são: (i) apresentar e discutir o conceito de naturalidade e conceitos associados; ii) propor uma abordagem metodológica para a utilização da naturalidade visando avaliar o estado de conservação dos remanescentes florestais de Floresta Mista Lati-aciculifoliada de Santa Catarina. 1.2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 1.2.1. A NATURALIDADE DE ECOSSISTEMAS FLORESTAIS O processo envolvido na determinação da naturalidade de florestas requer um forte embasamento teórico do próprio conceito de naturalidade, e de conceitos relacionados. Diante desta premissa, serão abordadas definições importantes que fundamentarão a proposta de determinação da naturalidade de remanescentes de Floresta Mista Lati-aciculifoliada de Santa Catarina. Este tópico está estruturado em subtópicos que contemplarão o conjunto de temas que se fazem necessários para o desenvolvimento de um pensamento sistêmico em relação à 18 naturalidade, sua utilização e aplicação dentro do contexto apresentado. Ainda, os subtópicos trazem um panorama da biodiversidade florestal no mundo, definições de conceitos fundamentais, revisão de estudos que de alguma forma, sejam com uma abordagem qualitativa ou quantitativa, adotaram a naturalidade como um princípio fundamental. 1.2.1.1. A biodiversidade e a humanidade A Terra possui cerca de 3,8 bilhões de hectares de florestas, correspondendo a 30% da superfície total (FAO, 2012). Seis dos 12 grandes biomas da Terra são caracterizados como floresta e dois terços de todas as ecorregiões do planeta estão contidos nestes seis biomas (MATTHEWS et al., 2000). Sabe-se que os ecossistemas florestais prestam grandes contribuições para a biodiversidade existente no planeta, estando entre os mais ricos nos aspectos biológicos e genéticos - 70% das espécies animais e de plantas conhecidas estão contidas nas florestas (MATTHEWS et al., 2000). De acordo com The Plant List (2014) existem cerca de 350.000 espécies de plantas no planeta. O que vem ser a tão comentada biodiversidade? A definição de biodiversidade pode variar, dependendo de cada área do conhecimento e, ou, de cada pessoa ou especialista (NOSS, 1990). A definição de biodiversidade dada pela Convenção de Diversidade Biológica (CBD, 1992) refere-se à: "[...] variedade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas." Tratando-se de florestas, o termo biodiversidade florestal, de acordo com Hunter (1990), refere-se à “diversidade de vida em todas as suas formas e níveis de organização dentro de áreas florestadas”. Tratando-se de definições mais específicas, algumas se destacam. Whittaker (1972) propôs três subdivisões para a diversidade em escalas espaciais: alpha (α) se refere à diversidade de um ecossistema ou remanescente; beta (β) se refere à mudança na diversidade entre ecossistemas ou remanescentes; gamma (γ) se refere à diversidade geral entre os diferentes ecossistemas ou remanescentes presentes em uma região. A CBD (1992) aponta três níveis de biodiversidade: o nível de ecossistema, o de espécie e o de diversidade genéticas das espécies. Noss (1990) define biodiversidade em três classes: composição (relativo à identificação e à variedade de componentes), funcional (refere-se aos 19 processos ecológicos e evolutivos) e estrutural (refere-se à organização espacial dos componentes). Gaston e Spier (2004) também caracterizam a biodiversidade em três níveis: genética, espécies e ecossistêmica. A mobilização em prol da conservação dos ecossistemas naturais tomou proporções globais através de acordos, encontros e convenções, os quais passaram a exigir que os países signatários apresentassem estimativas nacionais de parâmetros relacionados à área florestada e o estoque de madeira, principalmente (McROBERTS et al., 2010a; VIBRANS et al., 2012a). Em relação às medidas de conservação dos ecossistemas naturais, muitos acordos e conferências passaram a exigir o monitoramento dos componentes da biodiversidade para fins conservacionistas e de uso sustentável; entre estes acordos e conferências se destacam: Conventionon Biological Diversity (CBD) em 1992 e 2009, Protocolo de Kioto em 1998, Montreal Process em 2005, United Nations Framework Conventionon Climate Change (UNFCCC) em 1994, Ministerial Conference on the Protection of Forests in Europe (MCPFE) em 2009 e Global Forest Resources Assessment (FAO, 2010). Os ecossistemas florestais são particularmente vulneráveis à perda de integridade ecológica dada a complexidade intrínseca de sua estrutura e função (KARNOSKY et al., 2001). Logo, as ações do homem nos ecossistemas florestais, tais como, o desflorestamento, a exploração madeireira, a introdução de espécies exóticas (as quais podem tornar-se invasoras, sensu Richardson et al. [2000]), assim como a poluição, representam ameaças à biodiversidade florestal (GIBSON et al., 2011; McROBERTS et al., 2012). Com o crescimento da dimensão do cenário ambiental, a biologia da conservação emergiu com o enfoque de aplicar princípios científicos para solucionar problemas relativos às perturbações feitas pelos homens nos ecossistemas naturais (SOULÉ, 1985). Gaston e Spicer (2004) subdividiram as ameaças à biodiversidade em quarto causas principais: (i) exploração direta, (ii) perda de habitats e degradação, (iii) espécies introduzidas, e (iv) processos de extinção de espécies. Sendo assim, a conservação baseia-se fortemente na observação e no estudo do estado da integridade ecológica dos ecossistemas e diversas definições deste conceito são sugeridas pela literatura (FISCHMAN, 2004). A primeira menção do termo integridade ecológica foi feita por Aldo Leopold (1949 apud DORREN et al., 2004), o qual propôs que um ecossistema está saudável quando este tende a preservar a integridade e estabilidade da comunidade biótica (ODUM, 2004); quando esta tendência se mostra inversa, a integridade ecológica está afetada. 20 Karr e Dudley (1981) definem integridade ecológica, de forma semelhante a Frey (1975), como o poder de um ecossistema suportar e manter as comunidades de organismos que têm composição de espécies, diversidade e organização (funcional) comparáveis à habitats conservados presentes em uma região. Segundo Tierney et al. (2009), a integridade ecológica avalia a composição, estrutura e função de um ecossistema, em comparação com o seu natural potencial ou ao longo de uma série temporal de variação. Noss (1990) apresenta sua definição de integridade ecológica de uma maneira exemplificada, afirmando que uma comunidade tem integridade se esta é dominada por espécies nativas e possui estabilidade (ODUM, 2004) e potencial de resiliência (CARPENTER et al., 2001). Para Angermeier e Karr (1994) a integridade ecológica refere-se à totalidade do sistema, onde todos os elementos interagem em um nível espacial e temporal. Segundo Steedman (1995), a integridade biológica é definida, especificamente e operacionalmente, como o estado de um ecossistema exposto ao mínimo de influência antrópica possível. Estes conceitos de biodiversidade e integridade ecólogica estão relacionados ao conceito de naturalidade (McROBERTS et al., 2012) que será apresentado e discutido no tópico seguinte. 1.2.1.2. O conceito de naturalidade A definição de natural pode diferir entre autores, embora sempre esteja intimamente ligada a princípios filosóficos e semânticos (MACHADO, 2004); Williams (2002) acrescenta que a definição pode variar também conforme o contexto social considerado. Winter (2012) aponta a inconsistência observada na literatura em relação à definição do termo. A definição de natural dada por Angermeier (2000) e Hunter (1996) reside na premissa de que pouca influência foi aplicada em alguma coisa para que esta seja considerada natural, especialmente a tecnologia desenvolvida pelos humanos. Angermeier (2000) cita wild como sinônimo e artificial, ou antropogênico, como antônimos de natural. O autor fundamenta seu argumento na ideia de que o ser humano não somente vive em ecossistemas, mas altera sua estrutura física, seus componentes bióticos e seus processos de organização. Diegues (2001) discorda da visão do movimento preservacionista brasileiro, de que a natureza em seu estado "puro" (ou natural) seja intocada e intocável, e não se possa admitir que uma área de conservação, ou seja, uma unidade de conservação proteja também a diversidade cultural, além da diversidade biológica. 21 Do termo natural, deriva-se um conceito denominado naturalidade, o qual Winter (2012), em uma ampla revisão sobre o tema, aponta duas definições principais observadas na literatura. A primeira definição está relacionada ao grau em que algo é alterado do seu estado original, logo, pode ser representada por um gradiente contínuo que vai entre extremos, do totalmente natural ao artificial (ANGERMEIER, 2000; HUNTER, 1996; MACHADO, 2004; SJÖRS, 1986; WINTER et al., 2010). Winter et al. (2010) define a naturalidade como a distância entre o estado atual de um ecossistema e seu estado natural potencial. Para o Global Forest Resources Assessment (FRA, 2000) a naturalidade é expressa pela ausência de distúrbios antrópicos. Para Angermeier (2000), a naturalidade não é uma qualidade que só existe em seus extremos, ou seja, “tudo ou nada”; mesmo ecossistemas intensamente manejados podem conter alguma naturalidade. O autor salienta que a complexidade dos ecossistemas não permite que todas as ações do homem sejam precisamente mensuradas, de forma que a classificação de um ecossistema num gradiente de naturalidade pode ser imperfeita; apesar disso, o autor defende o uso do conceito para fins de conservação de ecossistemas. A segunda definição, segundo Winter (2012), refere-se ao estado (de conservação, ou similar) de um ecossistema sem a influência ou ações perturbadoras aplicadas pelos humanos. Tratando-se de ecossistemas florestais, algumas definições para este estado são adotadas (Tabela 1.1 e 1.2), como o termo "floresta primária" e “floresta virgem”, por exemplo. Segundo a autora, esta definição não é tão adequada quanto a primeira definição (exposta anteriormente), pois o conceito de naturalidade engloba toda a amplitude entre o artificial ou alterado (antropizado) e o estado natural de um dado ecossistema. De acordo com Winter (2012), a ideia de comparar o estado atual de um ecossistema com um equivalente em um estado natural foi desenvolvido nos países ligados ao idioma alemão da Europa Central durante o último século. Segundo a autora, a palavra alemã Naturnähe refere-se à comparação entre o estado atual e um estado natural de referência e Natürlichkeit refere-se ao estado atual de conservação de uma floresta. Os níveis (ou categorias) de naturalidade variam conforme o autor. Por exemplo, para Angermeier (2000) e Šaudytè et al. (2005) a naturalidade das florestas pode ser determinada através dos seguintes termos/níveis: floresta primitiva, floresta natural, floresta semi-natural, floresta cultural e floresta artificial. Já a Conferência Ministerial sobre a Proteção das Florestas na Europa (MCPFE, 2002) definiu três níveis de naturalidade para as florestas europeias: i) florestas sem distúrbios antrópicos - os processos naturais e a composição de 22 espécies se mantiveram naturais a um nível considerável ou se regeneraram; ii) florestas seminaturais - podem conter algumas características ecológicas que possibilitam a manutenção da dinâmica e da biodiversidade, semelhante ao esperado em um estado original; iii) reflorestamentos - florestas artificiais, distintas do ecossistema original. Na Tabela 1.1 sintetizamos as categorias observadas na literatura e na Tabela 1.2 constam as descrições delas. Segundo McRoberts et al. (2012) os limites que separam estas categorias são difíceis de serem definidos, e dependem das caracteristicas locais e da abordagem que se faz em relação à categorização. Tal fato torna-se crucial neste estudo – vamos abordá-lo no tópico 1.3.3. Tabela 1.1. Categorias de naturalidade encontradas na literatura e categorias equivalentes adotadas no Brasil. Informações extraídas e adaptadas de McRoberts et al. (2011). Referência Lindenmayer e Franklin (1997), Angermeier (2000), Šaudytè et al. (2005), Liira et al. (2007), Reitz (1965) Montford (2002) Categoria de floresta Primitiva (Primeval), Pristina (Pristine), Virgem (Virgin), Primária Categoria equivalente Floresta primária, Floresta virgem, Floresta climácica Quase-natural (Near Floresta primária alterada, natural) Floresta secundária Floresta virgem, Anderson (1991) Intacta (Intact) Floresta primária, Floresta climácica Angermeier (2000), Uotila et al. (2002), Semi-natural (Semi- Šaudytè et al. (2005), natural) MCPFE (2007) Convencionalmente Liira et al. (2007) manejada (Conventionally managed) Angermeier (2000), Šaudytè et al. (2005) Plantada (Plantation) Floresta alterada, Floresta secundária, Floresta secundária alterada Floresta alterada, Floresta manejada Reflorestamentos, Floresta artificial 23 Tabela 1.2. Complementação da Tabela 1.1 Descrição das categorias de naturalidade utilizadas por países europeus. Informações extraídas e adaptadas de McRoberts et al. (2011). Categoria de floresta Primitiva (Primeval), Pristina (Pristine), Virgem (Virgin) Descrição Floresta nativa que evoluiu sem a intervenção de humanos e que apresenta estruturas semelhantes a uma floresta climácica Quase-natural (Near Floresta nativa que regenerou naturalmente, que por um longo natural) período está exposta a um baixo nível de influencias antrópicas Intacta (Intact) Floresta que apresenta todos os componentes, funções e estruturas inerentes ao ecossistema Floresta que se desenvolveu influenciada por atividades Semi-natural (Semi-natural) humanas fundamentadas em princípios ecológicos, resultando em uma floresta com composição e estrutura semelhantes a uma floresta natural Convencionalmente manejada (Conventionally Floresta que apresenta certo nível de intensidade de manejo managed) Plantada (Plantation) Floresta plantada artificialmente e com espaçamento regular, composta por espécies nativas ou exóticas Qual a serventia do conceito de naturalidade? McRoberts et al. (2012), em sua revisão sobre o conceito, sintetizam, baseados em muitos estudos, que o conceito é empregado por três propósitos: (i) para descrever o valor ecológico, visando elaboração de propostas e ações de manejo para manter ou aumentar este valor; (ii) para avaliar ações de manejo da conservação da biodiversidade; (iii) para identificar áreas com florestas conservadas para fins de estabelecimento de áreas destinadas à conservação. Dentro dos propósitos citados, muitos estudos focaram em avaliar a naturalidade do ecossistema florestal como um todo. Entretanto, Šaudytè et al. (2005) afirmam que existe a possibilidade de avaliar a naturalidade de componentes específicos do ecossistema, como por exemplo, da composição de espécies e da estrutura. Para determinar a naturalidade, existem duas maneiras (MCROBERTS et al., 2012): a primeira tem como fundamento o acesso aos processos ecossistêmicos (PETERKEN, 1996), e a segunda fundamenta-se no grau de influência humana, a qual é a propulsora das perturbações em um dado ecossistema (ANDERSON, 1991; ANGERMEIER, 2000; WINTER, 2012). Assim, a naturalidade tem 24 como hemerobia o seu conceito oposto (WINTER, 2012). A palavra hemerobia tem origem no idioma grego e significa cultivado, domesticado, refinado. Jalas (1955 apud SUKKOP, 1976; MACHADO, 2004; MCROBERTS et al., 2012; REIF e WALENTOWSKY, 2008; TROPPMAAIR, 1995) foi o primeiro a propor o conceito. Os graus de naturalidade e hemerobia podem ser expressos em níveis hierárquicos para paisagens, espécies ou ecossistemas (JALAS, 1955 apud WINTER, 2012). Jalas propôs quatro níveis de hemerobia: i) ahemeorobio – refere-se às paisagens naturais ou que sofreram pequena interferência antrópica, por exemplo, florestas primárias que sofreram influência de emissões de poluentes; ii) oligohemeorobio – refere-se às paisagens mais naturais do que artificiais, por exemplo, florestas manejadas por povos tradicionais; iii) mesohemeorobio – refere-se às paisagens mais artificiais do que naturais, por exemplo, pastagens plantadas; iv) euhemeorobio – refere-se às paisagens artificiais, como plantios florestais monoespecíficos, ou monoculturas agrícolas. Para Sukkop (1972) a hemerobia consiste nos efeitos das intervenções antrópicas diretas ou indiretas nas paisagens ou ecossistemas. O autor adota uma classificação baseada nos graus de naturalidade e de hemerobia: (i) natural (ahemerobio), (ii) quase-natural (oligohemerobio), (iii) semi-natural (mesohemerobio), (iv) agricultural (euhemerobio), (v) quase-cultural (polihemerobio) e (vi) cultural (metahemerobio). O autor leva em consideração as mudanças na cobertura do solo (uso do solo) e as mudanças na vegetação. Winter (2012) conclui que o conceito de hemerobia possui menos inconsistências nas definições adotadas em estudos do que o conceito de naturalidade, provavelmente porque uma definição concreta foi proposta desde o início. Winter (2012) conclui ainda que existe uma tendência dos estudos enfatizarem o lado natural do gradiente ou escala, sendo que a hemerobia enfatiza o lado oposto do gradiente, ou seja, das influências antrópicas em um dado ecossistema. As Figuras 1.1 e 1.2 trazem uma representação gráfica de um gradiente teórico de naturalidade/hemerobia: 25 0% Natureza 100% Naturalidade Hemerobia 100% Influência antrópica 0% Figura 1.1. Representação de um gradiente de naturalidade, considerando as influências antrópicas e os processos ecológicos naturais. Adaptado de Winter et al. (2010). Figura 1.2. Representação em três dimensões de um gradiente de naturalidade (representado pela linha cinza). Os componentes e processos ecológicos de um ecossistema florestal são representados pelos “Elementos e processos naturais”, os quais são expostos às ações antrópicas perturbadoras (“Elementos antrópicos e “Ações antrópicas”). Adaptado de Machado (2004). 1.2.1.3. Estudos que adotaram o conceito de naturalidade De acordo com Winter et al. (2010), a maioria dos estudos que contemplaram o conceito de naturalidade focaram na detecção de indicadores confiáveis e em descrever florestas em seu estado (mais) natural, as quais tornaram-se florestas de referência; os autores afirmam que ambos os procedimentos são necessários antes de desenvolver uma abordagem aplicável de avaliação da naturalidade de florestas. 26 Anderson (1991) desenvolveu uma classificação categórica de naturalidade para o Parque Nacional Yellowstone. Ele propôs três critérios para avaliar a naturalidade: (i) o grau de alteração esperado se os seres humanos fossem removidos; (ii) o custo de manutenção da paisagem para sustentar o sistema em seu estado atual; e (iii) a proporção de espécies nativas que ainda estão presentes. Para Loidi (1994) a naturalidade pode ser expressa por uma distância conceitual de uma floresta alterada até uma climácica, de máxima expressão ecológica. Fisher e Young (2007) afirmaram, categoricamente, que no caso da Europa, as florestas intocadas não existem, de modo que a naturalidade só pode ser construída de forma hipotética. Esta questão levantada sobre ecossistemas que serviriam de referência, ou seja, apresentariam maior naturalidade, é discutida por muitos autores que julgam que não é possível definir a naturalidade, pois, segundo eles, não existem mais ecossistemas intocados pelo ser humano (LANDRES et al., 1998). Segundo Landres et al. (1998) é possível definir a naturalidade sem ter como base ecossistemas intocados; os ambientes naturais de referência, nos dias atuais, são a base para o entendimento do sistema ecológico que se deseja estudar ou avaliar o estado de conservação. Edarra (1997) propôs uma escala (0 – 10) para estimar a naturalidade de formações vegetacionais, levando em consideração o grau de influência antrópica. Áreas muito alteradas pelo meio urbano, onde se observava a ausência de espécies de plantas, receberam o valor 0. As florestas primárias não exploradas ou outras manifestações de comunidades de plantas em seu estado natural ganharam o valor 10. As classes intermediárias não foram contempladas pelo autor. Para Angermeier (2000) e Šaudytè et al. (2005) a naturalidade das florestas pode ser determinada através dos seguintes termos/níveis: floresta primitiva; floresta natural; floresta semi-natural; floresta cultural e floresta artificial. Uma classificação de naturalidade de florestas reconhecida internacionalmente foi proposta pela UM-ECE/FAO (2000), a qual foi constituída por três classes categóricas de naturalidade; Šaudytè et al. (2005) fazem uma observação em relação a esta classificação, argumentando que esta não se adéqua à todas as situações observadas nos vários países, pois cada um possui suas particularidades. Uotila et al. (2002) estudaram o grau de naturalidade de florestas boreais protegidas e não manejadas na Finlândia, concentrando nos efeitos das práticas de manejo na estrutura da floresta; os autores definiram as florestas como naturais ou seminaturais, de acordo com a ausência ou presença de sinais históricos de manejo. 27 Machado (2004) elaborou uma escala qualitativa de naturalidade com o intuito de ser um método de aplicação prático. A escala partiu do valor mínimo de “0” (totalmente artificial) até “10” (máxima naturalidade), definindo os parâmetros que devem ser levados em consideração para cada um dos níveis da escala. O autor afirma que seu método pode ser aplicado de forma consideravelmente rápida se informações como mapas de vegetação, mapas cartográficos e fotografias aéreas estiverem disponíveis. Liira e Sepp (2009) investigaram 50 variáveis (qualitativas e quantitativas) relacionadas à floresta, sub-bosque e chão da floresta. Após uma rotina de modelagens matemáticas, os autores chegaram a uma lista de indicadores estatisticamente significativos que podem estimar a naturalidade de Florestas Boreais da Finlândia. Moravčík et al. (2010) adotaram sete classes de naturalidade para avaliação de florestas de coníferas na Eslováquia a partir de 25 indicadores, sendo 15 deles ligados à estrutura e dez ligados à composição de espécies. Os autores ajustaram uma função discriminante para classificar remanescentes em uma das sete classes de naturalidade, utilizando os indicadores quantitativos como variáveis preditoras. Winter et al. (2010) apresentaram um método de acesso a naturalidade baseado no que denominaram de Relative Quantitative Reference. Este método foi criado para superar a falta de florestas virgens para comparação; os autores definiram florestas de referência e diversos indicadores importantes como quantidade de necromassa, conectividade dos remanescentes, variedade de microhabitats, dentre outros. Merganič et al. (2012) avaliaram a naturalidade na Reserva Natural Babia Hora na Eslováquia utilizando uma classificação objetiva baseada em um modelo preditivo gerado através de uma análise discriminante. Os indicadores utilizados estavam relacionados à estrutura da floresta, cobertura de gramíneas e líquens, agregação espacial das espécies arbóreas e necromassa. McRoberts et al. (2012) criaram um estimador de naturalidade baseado em três indicadores (diversidade de espécies arbóreas, desvio-padrão dos diâmetros e assimetria da distribuição de diâmetros) os quais foram eleitos de um conjunto de indicadores considerados ecologicamente relevantes e aplicáveis pelos IFNs europeus. Como a naturalidade é expressa por um gradiente que estende-se entre dois extremos (o alterado e o natural), os autores basearam-se na proposta de Loidi (1994), de que o grau de naturalidade pode ser expresso pela distância conceitual entre condições observadas em uma dada área (ou unidade amostral), até uma área referência, considerada como mais próxima do natural. Assim, o estimador baseou-se na distância euclidiana entre os indicadores de uma floresta que se deseja acessar a 28 naturalidade até os de uma floresta de referência que expressa as características mais próximas das originais. Bartha et al. (2006) investigaram se a riqueza de espécies, a estrutura (vertical, etária e dossel) e a heterogeneidade dos estratos da floresta estão relacionados com critérios de naturalidade individual (para remanescentes), e naturalidade geral (para o conjunto de remanescentes). Para as florestas da Lituânia, Šaudytè et al. (2005) criaram seis classes de naturalidade que vão desde as florestas primárias até as florestas artificiais. Os indicadores adotados possuem um caráter qualitativo e estão ligados a componentes estruturais da floresta e a perturbações antrópicas. Smelko e Fabrika (2007) desenvolveram uma abordagem sobre a conversão numérica de indicadores categóricos dentro do programa computacional Natura 2000, o qual foi desenvolvido para avaliar a naturalidade de florestas da Eslováquia, a princípio. Tierney et al. (2009) avaliaram a integridade ecológica de área protegidas e criaram um sistema de caracterização da naturalidade baseado em três classes. Grabherr et al. (1998) avaliaram a naturalidade de florestas da Áustria baseados no conceito de hemerobia. Nesta abordagem os autores não utilizaram florestas de referência, pois se dedicaram em avaliar o impacto antrópico sobre as florestas. No entanto, os autores consideraram uma floresta natural potencial como um referencial teórico. 1.2.1.4. Indicadores de naturalidade Segundo McRoberts et al. (2012) muitos critérios são considerados para determinar a utilidade e relevância de variáveis que podem ser consideradas indicadores de naturalidade, embora muitas vezes o discernimento dos critérios naturais e antropogênicos não tenham sido expressos de forma explicita pelos pesquisadores (MACHADO, 2004). Uma única variável não é suficiente para expressar a naturalidade, assim como todas as possíveis variáveis não são capazes de serem mensuradas, ainda mais dentro do contexto de um IFN (McROBERTS et al., 2012). Então, resta selecionar variáveis que podem relacionar e sintetizar a biodiversidade florestal e o estado de conservação do ecossistema, através da utilização de indicadores (CHIRICI et al., 2011; CHIRICI et al., 2012; McROBERTS et al., 2012; NOSS, 1990; WINTER et al., 2010). Seguindo as indicações feitas por Winter et al. (2010), os indicadores candidatos precisam atender as seguintes premissas: 29 i) os indicadores têm de ser ecologicamente relevantes e indicadores importantes da naturalidade; ii) os indicadores têm de ser representativos para a área - por exemplo, a presença de epífitos em uma floresta pluvial pode expressar maior naturalidade; iii) os indicadores têm ser passíveis de serem acomodados no contexto de um programa de monitoramento cíclico. A abordagem ecossistêmica de acesso à naturalidade (McROBERTS et al., 2012; PETERKEN, 1996) requer a determinação de poucos indicadores que descrevam os principais aspectos e processos inerentes ao ecossistema. McRoberts et al. (2012) afirmam que tal procedimento é difícil e tem de ser cuidadosamente realizado de modo a encontrar indicadores realmente representativos. Já na abordagem ligada à hemerobia, os indicadores estão geralmente associados a sinais de intervenção e exploração realizados pelos humanos (FRA, 2000; UOTILA et al., 2002). Os estudos que trataram da naturalidade utilizaram uma gama de variáveis indicadoras. Na Tabela 1.3 condensamos um pacote de indicadores adotados nos estudos mais recentes. Para exemplificar como os indicadores são determinados, citamos McRoberts et al. (2012), os quais avaliaram dez variáveis (diversidade de espécies, número de estratos de altura, número de árvores de grande porte, idade das árvores (dendrocronologia), número de microhabitats, necromassa, volume, sinais de exploração de madeira e sinais de manejo silvicultural) com o intuito de avaliar seus potenciais e praticabilidade para estimar a naturalidade utilizando dados provenientes de IFNs participantes da Ação COST E43 1. Os autores realizaram uma triagem dos indicadores baseados na aplicabilidade e relevância ecológica destes. Winter et al. (2010) selecionaram os indicadores candidatos baseados em informações de várias fontes, incluindo a Convenção sobre Diversidade Biológica de 1992, os indicadores de manejo florestal sustentável da Europa (MCPFE, 1997, 2003ab), dentre outros. Os autores também consultaram a literatura especializada em ecologia florestal e o conhecimento especializado de cientistas ligados à Bavarian Forest National Park. 1 European CoOperation in Science and Technology (COST). A Ação COST E43 (Harmonisation of National Forest Inventories in Europe: Techniques for Reporting) está ligada a harmonização dos IFNs da Europa. 30 Tabela 1.3. Síntese dos indicadores utilizados em estudos de naturalidade. Qt: variável quantitativa; Ql: variável qualitativa; E: ligada a processos ecossistêmicos; H: ligada a processos hemeróbicos. Referência McRoberts et al. (2012) Winter et al. (2010) Liira e Sepp (2009) Moravčík et al. (2010) Machado (2004) Šaudytè et al. (2005) Uotila et al. (2002) Indicador adotado Assimetria da distribuição diamétrica (gdap) Desvio padrão dos diâmetros (Sdap) Diversidade - Índice de Shannon (H') Estrutura vertical Necromassa Conectividade dos remanscentes Sanidade das árvores Microhábitats Árvores bifurcadas Comparação com uma floresta potencial Presença e ausência de distúrbios antrópicos Índice de intensidade de manejo Variáveis estruturais Variáveis estruturais Composição (riqueza e uniformidade) Aspectos e propriedades ecológicas Influência antrópica Aspectos estruturais Composição de espécies Influência de elementos antrópicos Dados históricos sobre manejo Dados históricos sobre incêndios Sinais de manejo Idade da floresta (dendrocronologia) Estoque de volume Distribuição diamétrica Natureza Fonte Qt E Qt E Qt E E Qt Qt E Qt E Ql E Qt E Qt E Qt E Qt E Ql H Qt H Qt E Qt Qt Ql Ql Qt Ql Ql E E E H E E H Ql Ql Ql Ql Qt Qt H H H E E E 1.2.1.5. Florestas referência de naturalidade As florestas de referência são o marco para as comparações entre florestas mais alteradas e florestas naturais (McROBERTS et al., 2012; LANDRES et al., 1998; LOIDI, 1994; WINTER et al., 2010). Porém, em toda a Terra, sabemos que poucas áreas florestadas estão em seu estado natural; no caso da Floresta Atlântica sensu strictu, as florestas são, em sua maioria, resultantes da sucessão secundária (RIBEIRO et al., 2011). Ellen (1989) afirma que a natureza em estado puro já não existe, e Winter et al. (2010) são rigorosos e afirmam que não existem mais habitats intocados pelas emissões de gases; consequentemente, uma 31 floresta 100% natural não pode mais ser encontrada para servir de referência em estudos de naturalidade (WINTER et al., 2010). Além das emissões, outros estresses têm atingido os processos naturais dos ecossistemas (FREEDMAN, 1989), como, por exemplo, a contaminação por defensivos agrícolas (CDB, 2010). Segundo Landres et al. (1998), é possível definir a naturalidade sem ter como base ecossistemas intocados; os ambientes de referência, nos dias atuais, são a base para o entendimento do sistema ecológico e que se deseja estudar ou avaliar o estado de conservação. Entretanto, Winter (2012) afirma que, antes de conduzir um estudo de determinação da naturalidade de um ecossistema florestal, é necessário definir concretamente o conceito de floresta de referência. Winter et al. (2010) propôs que, mesmo não existindo florestas de referência (100% naturais), é possível considerar remanescentes florestais mais naturais (mais próximos do seu estado natural) como referências. Tal procedimento também foi adotado por McRoberts et al. (2012) em florestas temperadas do norte do Estados Unidos. O diagrama abaixo representa essa ideia: Ecossistema não alterado: 100% 0% Natureza Hemerobia Naturalidade 0% Influência antrópica 100% Ecossistema alterado A: 100% Natureza 0% Hemerobia Naturalidade 0% Influência antrópica 100% 32 Ecossistema alterado B: 100% Natureza 0% Hemerobia Naturalidade 0% Influência antrópica 100% Figura 1.3. Diagrama referente aos remanescentes de referência considerados como 100% naturais no gradiente de naturalidade. Adaptado de Winter et al. (2010). Gibbons et al. (2008) e McRoberts et al. (2012) apresentaram métodos para identificação de parcelas com maior naturalidade (referências) sem o uso de classes préestabelecidas. Winter et al. (2010) realizaram um estudo de avaliação da naturalidade das florestas do Bavarian Florest National Park na Alemanha e determinaram áreas de florestas primárias como sendo as referências para comparações com áreas manejadas, áreas de borda, áreas core e áreas de recreação do parque. Para Gibbons et al. (2008), o estado de referência está relacionado à variação na vegetação nativa que demonstra pouca evidência de modificação por humanos desde a colonização européia na Austrália. A partir de dados de 462 locais de vegetação nativa em uma paisagem fragmentada no sudeste da Austrália, os autores propuseram um método objetivo de determinar condições de referência de variáveis utilizadas como indicadoras de biodiversidade (por exemplo, densidade de árvores por classe de diâmetro, árvores ocas, regeneração de espécies arbóreas, necromassa, cobertura vegetal por estrato vertical, cobertura de serapilheira, cobertura de criptógamas e riqueza de espécies nativas). Os autores utilizaram modelos aditivos generalizados (GAM) calibrados com indicadores que representam as medidas de modificação humana desde a colonização européia (cobertura de plantas exóticas, número de tocos, evidências de extração de lenha, evidência da presença de coelhos, evidências de pastoreio recente de gado e uso do solo no entorno) e dados de variação ambiental (precipitação anual média, temperatura anual média, insolação e inclinação). Para estes autores, a determinação das referências baseia-se nos valores mínimos das variáveis explicativas e significativas previstas pelo modelo, as quais representam as modificações desde a colonização. 33 McRoberts et al. (2012) determinaram referências através da avaliação de Unidades Amostrais do IFN dos Estados Unidos que apresentaram maior naturalidade. Foi utilizado um processo de triagem das Unidades Amostrais, de acordo com o cumprimento de critérios condicionais como ausência de espécies exóticas, ausência de sinais de atividade humana, diversidade da estrutura vertical, dentre outros. Bartha et al. (2006) definiram florestas referenciais hipotéticas e, baseados nelas, por meio de um processo hierárquico de três níveis, determinaram indicadores quantitativos e qualitativos de naturalidade. Os autores não deixaram explicita a definição destas florestas de referencia e como as determinaram. 1.2.2. FITOFISIONOMIA ALVO: FLORESTA MISTA COM ARAUCÁRIA 1.2.2.1 Caracterização geral A Floresta Mista Lati-aciculifoliada (OLIVEIRA-FILHO, 2009), também classificada como, Floresta com Araucária (KLEIN, 1978) e Floresta Ombrófila Mista (LEITE e KLEIN, 1990; IBGE, 2012), é uma fitofisionomia florestal que tem maior expressão territorial nos planaltos do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Ela também ocorre na forma de pequenos relictos em pontos altos das serras da Mantiqueira, dos Órgaos, do Caparaó, Paranapiacaba e Paranapanema nos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, São Paulo, e em países vizinhos como Argentina e Paraguai (BACKES, 2009). No estado de Santa Catarina (Figura 1.4) ela é principalmente encontrada entre as altitudes de 500 e 1000 m (BACKES, 2009), ocorrendo também em áreas com altitude superior a 1000 m (UHLMANN et al., 2013). No oeste do estado, entre os paralelos 25°30‟ e 27°27‟ S, ela adentra o território da Argentina, na província de Missiones e, em direção ao litoral brasileiro, chega até os municípios de Sombrio e Lauro Muller, e em certos municípios situados na Serra do Tabuleiro em Santa Catarina (BACKES, 2009). No sistema de classificação de Oliveira-Filho (2009) a concepção do termo Floresta Mista Lati-aciculifoliada, que daqui em diante será referida como Floresta Mista com Araucária, está vinculada à mistura de angiospermas e gimnospemas. O sistema também considera os aspectos topológicos das espécies arbóreas, neste caso das folhas - as acículas são vistas em espécies características desta tipologia florestal, que coexistem com espécies latifoliadas. Mais especificamente, o termo “mista” vem da fusão de elementos provenientes da flora afro-brasileira, a qual exerce maior participação na composição florística, e de elementos da flora austral-andino-antártica, que, em certas regiões, podem contribuir significativamente para o aspecto fisionômico da vegetação (REITZ e KLEIN, 1966; LEITE, 34 2002; IBGE, 2012). Dentro do conjunto de espécies de origem austral-andino-antártica, a conífera Araucaria angustifolia Bert. O.Kuntze imprime grande importância ao aspecto fisionômico e estrutural da floresta, podendo constituir agrupamentos densos e quase puros. Em formações florestais multiestratificadas esta espécie apresenta-se como elemento emergente (KLEIN, 1960) ao dossel, composto, predominantemente, por espécies de Lauraceae (KLEIN, 1966). Outras espécies de origem austral-andino-antártica frequentemente encontradas são Dicksonia sellowiana Hook., Drimys brasiliensis Miers., Lamanonia ternata Vell., Podocarpus lambertii Klotzsch ex Endl., Prunus sellowii Koehne, Weinmania humilis Engl. e espécies do gênero Roupala (KLEIN, 1978; LEITE, 2002). Figura 1.4. Mapa fitogeogrpafico de Santa Catarina (KLEIN, 1978). Fitofisionomias classificadas segundo o sistema de Oliveira-Filho (2009), exceto “Vegetação litorânea” (KLEIN, 1978). De acordo com Leite (2002), as variações climáticas parecem determinar uma tendência dos elementos florísticos temperados ocuparem as regiões mais altas do planalto meridional; enquanto isso, os elementos da flora tropical tendem a expandir-se através dos vales e das encostas das serras, sobre os flancos planaltinos. A Floresta Mista com Araucária, segundo Klein (1960), divide-se em associações que retratam os diferentes estágios temporais de desenvolvimento, do menos para o mais desenvolvido. Klein (1978) definiu dois grandes grupos de formações para esta fitofisionomia no estado de Santa Catarina: 35 a) Floresta de Araucária, caracterizada por indivíduos de A. angustifolia emergentes e de grande porte, dossel denso, composto por angiospermas bem desenvolvidas, com predomínio da família Lauraceae; b) Florestas dos Faxinais, caracterizada por indivíduos de A. angustifolia de menor porte e dossel menos denso formado, predominantemente, por espécies de Myrtaceae e Aquifoliaceae, entremeadas de taquarais e carazais (Merostachys spp. e Chusquea spp.). Dentro destes grupos, Klein (1978) prossegue com a descrição das formações e subdivide os grandes grupos de forma mais específica. Na região norte de Santa Catarina (município de Canoinhas), na bacia dos Rios Iguaçu e Negro, bem como na parte superior das bacias dos afluentes do Rio Uruguai, existiam grandes formações contínuas de A. angustifolia, correspondendo ao estrado das megafanerófitas, com o denso estrato das macrofanerófitas dominado por Ocotea porosa (Nees) Barroso (canela-imbuia) e Sloanea lasiocoma K. Schum. (sapopema). No estrato das mesofanerófitas ocorria (predominantemente) Ilex paraguariensis A. St.-Hil. (erva-mate). Na bacia drenada pelo Rio Canoas, a floresta caracterizava-se pelos agrupamentos densos e em manchas de A. angustifolia (pinhais), por vezes interrompidos por campos com capões. Nos pinhais densos, o estrato das macrofanerófitas era dominado por Ocotea pulchella (Nees) Mez (canela-lageana), com a presença representativa de outras Lauraceae como Nectandra lanceolata Ness (canela-amarela), Ocotea puberula (Rich.) Nees (canelaguaicá), Cryptocaria aschersoniana Mez (canela-fogo) e Nectandra grandifolia Nees (canelafedida). Espécies seletivas como Capsicodendron dinisii Schwanke (pimenteira), Matayba elaeagnoides Radlk. (camboatá-branco), Myrcianthes gigantea (D. Legrand) D. Legrand (araçazeiro), dentre outras, possuiam afinidade com o ambiente formado por O. pulchella. A floresta no extremo oeste do estado apresentava agrupamentos de A. angustifolia com o estrato das macrofanerófitas com abundância de espécies de Fabaceae, como Apuleia leiocarpa (Vogel) J.F.Macbr. (grápia), Parapitadenia rigida (Benth.) Brenan (angicovermelho), Cordia americana (L.) Gottshling & J.E.Mill. (guajuvira), Diatenopteryx sorbifolia Radik. (maria-preta) e Lonchocarpus campestris Mart. ex Benth. (rabo-de-mico). Outras espécies como Cedrela fissilis Vell. (cedro), Cordia trichotoma (Vell.) Arrab. ex Steud. (louro-pardo), Myrocarpus frondosus Allemão (cabreúna), dentre outras, eram expressivas no estrato das macrofanerófitas. Na zona da Floresta Latifoliada Pluvial (OLIVEIRA-FILHO, 2009), ocorriam os núcleos de pinhais formados por indivíduos antigos e elementos da Floresta Mista com Araucária e da Floresta Latifoliada Pluvial compondo o estrato das macrofanerófitas. 36 As Florestas de Faxinais são consideradas por Klein (1978) áreas de transição entre a Floresta Latifoliada Pluvial e a Floresta Mista com Araucária, sendo esta formação composta por espécies que ocorrem em solos pouco profundos e encostas declivosas. As Florestas de Faxinais ocorrem nas encostas da Serra do Mar e Serra Geral e podem ser encontradas em áreas de pinhais das outras formações citadas anteriormente. O autor divide esta formação em quatro subgrupos de regiões, argumentando que existem semelhanças sensíveis na composição florística, entretanto, são notadas diferenças na distribuição e abundância das espécies. São estes subgrupos: Serra do Tabuleiro, Serra Geral, Campo Erê (Serra da Fartura e Serra do Capanema) e Guedes (Serra do Tigre). O Manual Técnico da Vegetação Brasileira (IBGE, 2012) reconhece quatro formações distintas2 para a Floresta Mista com Araucária, as quais foram determinadas pela faixa altitudinal: Aluvial: ocorre em planícies aluviais, onde a espécie A. angustifolia associa-se com diferentes espécies, conforme os aspectos geomorfológicos e topográficos. Em altitudes mais elevadas são encontradas Podocarpus lambertii e Drimys brasiliensis. Em altitudes menos elevadas a A. angustifolia associa-se com espécies de Lauraceae, Luehea divaricata Mart. ex Zucc, Blepharocalyx salicifolius (Kunt) O. Berg e Sebastiania commersoniana (Baill.) L. B. Sm. ex Dows; Submontana: essa formação ocorre em altitudes inferiores a 400 m e consiste em pequenas disjunções localizadas nas bordas da Serra Geral. Tais disjunções são vistas no município de Lauro Muller (Santa Catarina), onde, na década de 1950, havia 12.000 indivíduos de A. Angustifolia. Atualmente, restam no local poucos indivíduos desta espécie associados às culturas agrícolas e às florestas secundárias; Montana: ocorre entre 400 e 1000 m de altitude e é caracterizada pela associação de A. angustifolia e Ocotea pulchella, Cryptocarya aschersoniana, Ilex paraguariensis e Nectandra megapotamica (Spreng.) Mez na bacia do Rio Canoas; no planalto norte de Santa Catarina, observa-se A. angustifolia associada a Ocotea porosa; Altomontana: ela ocorre em altitudes superiores a 1000 m nas encostas das colinas diabásicas em mistura com arenitos que constituem a Formação Serra Geral. Espécies características do estrato arbóreo são: Podocarpus lambertii, Drimys brasiliensis, Cedrela 2 Para uma representação gráfica das formações, ver IBGE (2012, p.83). 37 fissilis, e espécies de Lauraceae e Myrtaceae. Famílias características do estrato arbustivo: Rubiaceae, Myrtaceaee, Winteraceae, Lauraceae e Meliaceae. Saint-Hilare (1978, p.49) e Leite (2002) salientam que a Floresta Mista com Araucária coexiste com a Campina (OLIVEIRA-FILHO, 2009), Campos Naturais (KLEIN, 1978) ou Estepe Ombrófila (LEITE, 2002), de forma que a A. angustifolia, e outras espécies pioneiras, invadem esta fitofisionomia campestre (DUARTE et al., 2009; KLEIN, 1960; REITZ e KLEIN, 1966). Este fato dificulta o estabelecimento preciso dos limites florísticos entre as formações florestais e campestres. Pesquisadores afirmam (baseados em métodos de datação3) que a expansão da Floresta Mista com Araucária pela Campina, a qual (supostamente) ocorria abundantemente no último glacial máximo, se deu através de formações florestais que ocorriam ao longo de corpos d‟água lóticos, seguindo uma mudança climática, de um clima mais seco para um clima mais úmido (BAUERMANN e BEHLING, 2009; BEHLING et al., 2004; BEHLING et al., 2001). A ocorrência da Campina nos dias atuais, diante de um clima quente e úmido, é alvo de pesquisas (citadas em PILLAR et al., 2009). Este fato está, provavelmente, ligado à utilização histórica do fogo pelos povos pré-Colombianos e pela ação de animais pastadores (BEHLING et al., 2004; GALVÃO e AUGUSTIN, 2011; PILLAR et al., 2009). Nas escarpas rochosas dos Aparados da Serra Geral, geralmente em altitudes acima de 1000 m (IBGE, 2012), ocorre uma fitofisionomia florestal peculiar denominada Nanofloresta Latifoliada Nebular (OLIVEIRA-FILHO, 2009), a qual frequentemente encontra-se encoberta por neblina. A Nanofloresta Latifoliada Nebular apresenta dossel de no máximo 8 m, formado por árvores tortuosas devido às condições climáticas e edáficas adversas. São espécies características: Drimys brasiliensis e D. angustifolia; Myrceugenia euosma (O. Berg) D. Legrand, Ilex microdonta Reissek, Euplassa nebularis Rambo & Sleumer, Podocarpus lambertii e Weinmannia humilis (MMA/IBAMA, 2004). Falkenberg (2003) caracteriza a Nanofloresta Latifoliada Nebular como uma vegetação florestal em posição intermediária entre a Floresta Latifoliada Pluvial Superomontana e a Floresta Mista com Araucária, ou como um ecótono das vegetações florestais desenvolvidas (Floresta Latifoliada Pluvial nas encostas altas e Floresta Mista com Araucária no planalto) com formações de Campina. Oliveira-Filho et al. (2013) constataram que a Nanofloresta Latifoliada Nebular compartilha espécies das formações superomontanas da Floresta Latifoliada Pluvial e da Floresta Mista com Araucária. 3 Para uma exposição sobre métodos de datação e questionamentos sobre a acurácia dos mesmos, veja o capítulo 6 em Lourenço (2012). 38 A segregação da Nanofloresta Latifoliada Nebular como uma fitofisionomia particular é motivo de discussão (FALKENBERG e VOLTOLINI, 1995). Oliveira-Filho (2009) a considera uma fitofisionomia distinta, assim como Klein (1978). Entretanto, Leite (2002) a considera como uma formação da Floresta Mista com Araucária. Tais divergências de opiniões não reduzem a importância desta vegetação - Falkenberg (2003) registrou uma enorme riqueza de espécies e mostrou que pelo menos 10% das espécies vasculares encontradas na Nanofloresta Latifoliada Nebular são endêmicas, o que reforça sua peculiaridade. 1.2.2.2 Histórico de degradação da Floresta Mista com Araucária O processo de degradação da Floresta Mista com Araucária iniciou-se com a colonização européia e intensificou-se no decorrer da ocupação progressiva das terras, a qual foi impulsionada pela atratividade do desenvolvimento da economia na região sul (MÄHLER JÚNIOR e LAROCCA, 2009). Esta fitofisionomia, no inicio do processo de colonização do Brasil, cobria, estimadamente, cerca de 200.000 km² (BAUERMANN e BEHLING, 2009); desta área total, cerca de 60% ocorriam no Paraná (INOUE et al, 1984 apud BACKES, 2009), 30% em Santa Catarina e 10% no Rio Grande do Sul (REITZ et al., 1983 apud BACKES, 2009). Certamente, os primeiros visitantes "estrangeiros" que chegaram aos planaltos do sul do Brasil impressionaram-se com a exuberância das associações de A. angustifolia. Observando as descrições feitas pelos primeiros botânicos e naturalistas que contemplaram o planalto sul do Brasil, é possível imaginar a floresta antes de ser intensamente explorada. A seguinte descrição, feita pelo botânico francês Saint-Hilaire4, nos permite ter uma visão da beleza da vegetação (SAINT-HILARE, 1978): “É a Araucaria brasiliensis que, por sua altura, pela imponência e elegância de suas formas, por sua imobilidade e pelo verde-escuro de suas folhas contribui, mais do que qualquer outra coisa, para dar uma fisionomia característica aos Campos Gerais. Em alguns trechos essa pitoresca árvore, elevando-se isolada ao meio das pastagens, expõe à nossa admiração toda a beleza do seu talhe e faz ressaltar, pelos matizes sombrios de suas folhas, o verde tenro de relva que cresce sobre ela.” 4 Augustin François César Prouvençal de Saint-Hilaire (1779-1853). 39 Com um sentimento não diferente dos primeiros visitantes, diante das belas formações florestais, estudiosos se dedicaram em analisar e compreender a composição e os aspectos ecológicos da Floresta Mista com Araucária (KLEIN, 1960, 1978, 1984; LINDMAN, 1906; MAACK, 1953; RAMBO, 1951, 1953, 1956; REITZ e KLEIN, 1966). Estes traçaram as bases do conhecimento sobre a composição, estrutura e dinâmica do ecossistema florestal em questão. Infelizmente, apesar do conhecimento desenvolvido, Schaaf et al. (2006b) apontaram um fato verdadeiro que pouco é comentado entre os autores que estudam esta floresta e revisam a história de sua exploração. Os autores afirmam que a floresta não foi conhecida adequadamente antes de ser explorada intensivamente. A maior parte dos remanescentes existentes de hoje encontra-se descaracterizada e simplificada. Eduardo (1974) fez uma busca ampla em relação aos aspectos históricos da exploração e da economia madeireira em Santa Catarina no período de 1930 a 1972 e Cabral e Cesco (2008) relatam interessantes informações históricas e recentes sobre a exploração madeireira do Sul e Sudeste do Brasil. A Floresta Mista com Araucária foi a mais significante para a indústria madeireira do Sul do país, pelo menos por 150 anos de exploração, quando a araucária e a canela-imbúia foram as espécies de destaque durante este período exploratório (REIS et al., 2007). O setor madeireiro de Santa Catarina foi um dos impulsionadores do crescimento econômico do estado no início do século XX até a década de 1970 (EDUARDO, 1974; GOULARTI FILHO, 2002, 2008; MÄHLER JÚNIOR e LARROCA, 2009): entre os anos de 1915 e 1929 o valor de madeira exportada aumentou 22 vezes, principalmente devido à colonização do oeste do vale do Rio do Peixe; aumentaram as quantias exportadas para Argentina (via Rio Uruguai) e para o Rio de Janeiro, no decorrer da construção de ferrovias integrando a Região Sul à Sudeste e ligando o interior catarinense aos portos (EDUARDO, 1974; GOULARTI FILHO, 2002). Uma preocupação com a intensa e frenética exploração foi expressa pelo Instituto Nacional do Pinho (fundado em 1941), o qual já via a necessidade de promover e subsidiar o reflorestamento (INSTITUTO NACIONAL DO PINHO, 1948). Os benefícios fiscais oferecidos pelo governo entre as décadas de 1960 e 1980, regulamentados pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), criado pelo decreto-lei nº 289 de 1967, foram, sem dúvida, outro fator que impulsionou a derrubada de florestas nativas para a implantaçao de reflorestamentos monoespecíficos, que em sua maioria foram de espécies exóticas, como as do gênero Pinus. Por exemplo, no estado do Paraná, entre os anos de 1966 e 40 1976 a área reflorestada com Pinus spp., fruto desses incentivos fiscais, passou de 221,30 ha para 655.545,82 ha (BREPOHL, 1980). Alguns dados históricos são assombrosos e nos mostram a intensidade da exploração madeireira ocorrida no Sul do Brasil (EDUARDO, 1974; GOULARTI FILHO, 2008). Mähler Júnior e Larroca (2009) citam, em uma revisão sobre o tema, dados estimados da exploração de araucárias. Segundo os autores, entre 1930 e 1940 a Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina era responsável por mais da metade da exportação de madeira do país; no Estado havia mais de 381 serrarias que produziam cerca de quatro milhões de dúzias de tábuas ao ano. Mähler Júnior e Larroca (2009) citam ainda outro dado espantador: no ano de 1968 o Brasil exportou mais de um bilhão de metros cúbicos de madeira, e 45% destes foram retirados das florestas de Santa Catarina. O fogo foi outro agente degradador. Após a exploração madeireira, o fogo era uma prática comum aplicada com o intuito de “limpar” a área, uma espécie de preparo para outros usos do solo, como cultivos agrícolas e pastagens (BORGES, 2005). Após a exploração das araucárias no vale do rio do Peixe pela empresa Lumber5, os pinhais do município de Lages (Santa Catarina) e região atraíram olhares na década de 1950, quando ocorreu um surto migratório de colonos vindos do Rio Grande do Sul, os quais alavancaram o processo de exploração madeireira na região (MARTENDAL, 1980). Este mesmo autor relata que além de inúmeras serrarias, a região de Lages sediava grandes depósitos que armazenavam as madeiras exploradas na região. Tais depósitos tinham a finalidade de armazenar a madeira explorada que seria transportada e comercializada em outras regiões, e até mesmo exportada via porto de Itajaí (Santa Catarina). Do ponto de vista social, Moretto (2010) aponta a importância da exploração da Floresta Mista com Araucária no desenvolvimento da região do planalto de Santa Catarina, devido ao surgimento de um novo grupo social ascendente formado pelos donos das madeireiras. Segundo Martendal (1980), entre 1950 e 1970, no pico da atividade madeireira, a população da região do município de Lages quadruplicou, de 20.000 para 80.000 habitantes. 1.2.2.3 Atual estado de conservação da Floresta Mista com Araucária Qual a atual situação dos remanescentes de Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina? 5 A Lumber era uma empresa (americana) madeireira e colonizadora que subsidiou a empresa construtora da ferrovia do Sul do Brasil, a São Paulo – Rio Grande do Sul. 41 Esta questão torna-se fundamental para o desenvolvimento deste estudo, pois a história do ciclo de exploração madeireira em Santa Catarina é conhecida e temos uma base de conhecimento sobre a floresta, a começar pelos estudos pioneiros de Klein6 e Reitz7, além dos estudos de outros autores. Destacam-se os trabalhos de Jarenkow e Baptista (1987), Longhi et al. (2006), Schaaf et al. (2006ab), Canalez et al. (2006), Ribeiro et al. (2007), Vibrans et al. (2008), Bauermann e Behling (2009), Jarenkow e Budke (2009), Fonseca et al. (2009), Klauberg et al. (2010) e Vibrans et al. (2011). Apesar dos estudos de Klein e Reitz terem sido desenvolvidos no final do ciclo da exploração madeireira, eles foram realizados em florestas conservadas, ou seja, com composição e estrutura características do ecossistema florestal em questão. Não obstante, eles servem como referência para os estudos mais recentes relacionados à fitofisionomia. Existe um número considerável de trabalhos que estudaram a Floresta Mista com Araucária, entretanto, estes estão restritos a níveis locais, e possuem metodologias de amostragem diferentes entre si, o que dificulta a integração e comparação dos dados entre as regiões. O IFFSC trouxe uma nova dimensão ao entendimento da atual situação das florestas do estado, devido à sua amostragem sistemática que cobriu todo o estado e à sua dedicação em amostrar e levantar muitos dados. Sevegnani et al. (2013a) discorrem sobre a atual situação da Floresta Mista com Araucária no estado de Santa Catarina com base nos dados obtidos pelo IFFSC. Primeiramente, apontaram uma diminuição da cobertura desta tipologia florestal, de uma área de aproximadamente 42.851 km² (KLEIN, 1978) para 13.741 km² (VIBRANS et al., 2013). Esta cobertura florestal remanescente é, em sua quase totalidade, resultado da sucessão vegetal secundária e encontra-se altamente fragmentada e degradada. Os levantamentos de campo realizados pelo IFFSC registraram 1.107 espécies de plantas vasculares, o que aponta a alta biodiversidade contida nestes remanescentes florestais (GASPER et al., 2013). Entretanto, esta riqueza de espécies está exposta ao declínio perante as muitas pressões antrópicas; muitas das espécies arbóreas são singletons ou doubletons (representadas por um e dois indivíduos na amostra, respectivamente) (OLIVEIRA et al., submetido). Rezende et al. (2014) encontraram que aproxidamente 72% das espécies arbóreas presentes em Santa Catarina possuem distribuição geográfica restrita. Tal fato é preocupante, pois, mesmo que tais espécies sejam naturalmente raras (sensu Rabinowitz et al. [1986]), a questão da necessidade de medidas conservacionistas não se altera. 6 7 Roberto Miguel Klein (1923-1992) Raulino Reitz (1919-1990) 42 Em toda amostragem da Floresta Mista com Araucária, o IFFSC encontrou 368 espécies (com DAP ≥ 10,0 cm) de 176 gêneros, distribuídos em 69 famílias. Cinco das 368 espécies são pteridófitas (Dicksonia sellowiana, Alsophila setosa Kaulf., Cyathea corcovadensis (Raddi) Domin, Cyathea phalerata Mart. e Cyathea degaldii Sternb.), três são gimnospermas (A. angustifolia, Podocarpus lambertii e P. sellowii Klotzsch ex Endl.) e 360 são angiospermas (MEYER et al., 2013). Uhlmann et al. (2013) investigaram a existência das formações descritas por Klein (1978) nos dias atuais; os autores aplicaram uma técnica multivariada de ordenação (DCA) em dados florísticos do IFFSC e concluíram que as formações descritas por Klein (1978) parecem emergir dos dados; entretanto, foi constatada uma grande homogeneização estrutural da floresta, a qual encontra-se floristica e estruturalmente simplificada. A diversidade genética é muitas vezes esquecida pelos ecólogos conservacionistas, porém detém grande importância na conservação da biodiversidade em longo prazo. Reis et al. (2012), dentro do projeto IFFSC, estudaram a diversidade genética de algumas espécies e constataram que são claras as evidências de limitações de fluxo gênico entre os fragmentos. Apesar de tais conclusões, os autores afirmam que a diversidade genética ainda é passível de ser resgatada; eles sugerem a identificação de áreas com grande diversidade genética para conservação e futuras coletas de sementes para fins de restauração da diversidade genética das florestas. A atual fragilidade deste ecossistema, causada pelas pressões antrópicas, reflete não somente na redução da biodiversidade e dos outrora definidos padrões estruturais da vegetação. Atributos como a produtividade primária e secundária, e a eficiência de ciclagem de nutrientes também são afetados, e a dominância de espécies exóticas e oportunistas é facilitada (RAPPORT e WHITFORD, 1999). Sabemos que ambos os conjuntos de processos (perturbações e consequências) tornam-se cumulativos, aumentando a vulnerabilidade do ecossistema e da sociedade, principalmente as partes que possuem relação mais estreita com a floresta (KASPERSON et al., 1995) O conjunto de informações apresentados neste tópico, e nos dois anteriores a este, serve como um panorama do ecossistema alvo deste estudo sobre naturalidade. Apresentamos as riquezas, as pressões contrárias à biodiversidade e o status de conservação. Por fim, este parágrafo assume um carácter de desfecho e “prelúdio” para a proposta que nos comprometemos a elaborar. 43 1.3. A PROPOSTA: A APLICAÇÃO DO CONCEITO DE NATURALIDADE COMO MEIO DE ACESSAR O ESTADO DE CONSERVAÇÃO DOS REMANESCENTES DE FLORESTA MISTA COM ARAUCÁRIA DE SANTA CATARINA 1.3.1. APRESENTAÇÃO O presente capítulo tem o objetivo de responder a pergunta inicial: É possível adaptar o conceito de naturalidade e a sua determinação aos remanescentes de Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina? E mais: Qual é a importância desta pesquisa para nossa realidade? Além de esclarecer estas questões, uma proposta para a quantificação da naturalidade será redigida, seguindo uma disposição lógica e progressiva, conforme sugestões observadas na literatura. Na introdução são abordados o contexto do estado de Santa Catarina e o IFFSC, assim como proposições iniciais. No decorrer deste capítulo serão apresentados: nos tópicos 1.3.2 e 1.3.3 - definições de princípios e conceitos básicos que fundamentam a quantificação da naturalidade, adaptados à realidade histórica, social e ecológica de Santa Catarina e da Floresta Mista com Araucária; nos tópicos 1.3.4 a 1.3.7 - propostas metodológicas em relação à escolha dos indicadores, das florestas de referência e desenvolvimento da medida de naturalidade. 1.3.2. INTRODUÇÃO Informações qualitativas e quantitavias sobre as florestas, em um contexto geográfico amplo, são geradas e fornecidas por programas de inventário florestal. O estado de Santa Catarina saiu na frente e foi o primeiro estado do Brasil a finalizar seu inventário florestal, de acordo com a metodologia do IFN-Brasil (FREITAS et al., 2010). Podemos afirmar que Santa Catarina tem uma grade adensada de pontos amostrais medidos em campo, o que viabiliza a visualização do estado de conservação das florestas nativas. Na região fitoecológica da Floresta Mista com Araucária foram implantadas 155 Unidades Amostrais de área nominal de 4.000 m² (VIBRANS et al., 2010), de acordo com a seguinte definição de floresta: áreas contínuas de vegetação arbórea com um dossel de no mínimo 10,0 m de altura e área basal de no mínimo 10,0 m².ha-1 (VIBRANS et al., 2013). Posto que os ecossistemas florestais do Domínio Atlântico do Brasil foram e continuam sendo explorados, degradados e fragmentados (como o exemplo da Floresta Mista com Araucária, descrito anteriormente), estudos mostram que a conservação e a restauração 44 de fragmentos são de grande importância (BRASIL, 2003; RIBEIRO et al., 2009 e PFEIFER et al., 2014). O patrimônio biológico remanescente possui valor inestimável: 15.782 espécies de plantas foram catalogadas por Stehmann et al. (2009) para o Domínio Atlântico, e cerca de 2.341 espécies de plantas vasculares e 800 espécies arbóreas foram identificadas no estado de Santa Catarina (GASPER et al., 2012). Na Floresta Mista com Araucária o IFFSC catalogou 1.107 espécies vasculares (GASPER et al., 2013). A importância biológica vai além da flora; Fonseca et al. (2009) realizaram estudos que contemplam a biodiversidade da fauna silvestre, de fungos e líquens. As florestas, além de conter grande biodiversidade, nos propiciam inúmeros benefícios (CHOMITZ e KUMARI, 1998; COSTANZA et al., 1997; CREPALDI e PEIXOTO, 2010; HUNTER, 1999); num sentido mais amplo, elas estão fortemente aliadas à manutenção da esfera social e de suas ramificações (ARCHER et al., 2005; DIEGUES, 2001). A riqueza de espécies é a medida de biodiversidade mais difundida e comumente utilizada (BROOK et al., 2003; BROSE et al., 2003; WILSEY et al., 2005), porém, ela não é um componente isolado, de forma que a estrutura da comunidade, a estrutura da paisagem, a diversidade funcional e a genética também possuem participação relevante e equivalente (GASTON e SPIER, 2004; NOSS, 1990). Esses elementos que constituem um ecossistema estão esquematizados na Figura 1.5, juntamente com elementos ativos que influenciam os processos ecológicos de formação, retroalimentação e manutenção (elementos preditores), e, os que, a um dado nível, perturbam algum componente do ecossistema (elementos perturbadores). Um método de avaliação do estado de conservação de um ecossistema florestal deve considerar o complexo de interações entre seus componentes (PETERKEN, 1996; ŠAUDYTÈ et al., 2005). Dentro do sistema que propomos e do contexto ecológico de uma floresta, temos de focar em condensar informações sobre os elementos do ecossistema (“elementos do ecossistema florestal”, Figura 1.5), ou seja, precisamos encontrar os componentes essenciais, os quais podem ser expressos através de indicadores majoritários, altamente representativos do todo. Desta forma, a identificação do grau de conservação de um dado remanescente florestal, pode ser atingido através das respostas que os elementos do ecossistema demonstram (BARTHA et al., 2006), assim como, através dos sinais de perturbação antrópica (“elementos perturbadores” na Figura 1.5) presentes nesse remanescente (ANGERMEIER, 2000). Os conceitos de naturalidade e hemerobia (WINTER, 2012) podem ser utilizados complementarmente como ferramentas de diagnóstico para a detecção desses sinais supracitados. Os efeitos dos “elementos preditores” (Figura 1.5) influenciam os componentes do ecossistema (BALDEK et al., 2013; DINIZ-FILHO et al., 2012; COTTENIE, 2005), logo, 45 precisam ser controlados na quantificação da naturalidade (LIIRA e SEPP, 2009; WINTER et al., 2010), de forma que não venham a adicionar tendências aos resultados. Figura 1.5. Esboço do (eco)sistema (objeto de estudo), seus componentes e interações. Modificado de Tierney et al. (2009). Em um âmbito global, a aplicação do conceito de naturalidade ainda é restrita às florestas temperadas e boreais do hemisfério Norte. Sua utilização em florestas subtropicais do hemisfério Sul, as quais possuem características ecológicas, históricas e sociais diferentes será um feito pioneiro. Além deste fato, a falta de estudos que abordam a quantificação da naturalidade nos incentiva a desenvolver um método de quantificação através de um algoritmo específico (McROBERTS et al., 2012; WINTER, 2012). O conceito de naturalidade incorporado ao pensamento e às ações conservacionistas pode ser considerado uma ferramenta para planos de manutenção, monitoramento e utilização/manejo de ecossistemas florestais (BARTHA et al., 2006), podendo adequar-se a diferentes contextos ambientais, políticos e sociais. Winter (2012) afirma que poucos são os estudos que utilizam esta ferramenta para fins de conservação e monitoramento da 46 biodiversidade e de processos ecológicos. Dentro da proposta do IFN-Brasil e do escopo do IFFSC, tal ferramenta pode expandir as concepções sobre a análise de florestas nativas, podendo envolver várias dimensões do ecossistema em si, da sociedade e das políticas públicas acerca dos recursos naturais. As justificativas apresentadas por McRoberts et al. (2012) acerca da relevância da determinação da naturalidade de florestas nativas podem ser adaptadas à realidade do contexto sócio-ambiental e econômico da Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina: (i) ela pode ser empregada para reportar o estado ecológico das florestas nativas visando a avaliação da conservação e da exploração dos recursos florestais; (ii) ela pode servir para identificar áreas de grande expressão ecológica e, consequentemente, para delinear metas de conservação e utilização das mesmas. Nossa perspectiva para este estudo tende a observar as alterações e descaracterizações mais explícitas observadas nas florestas do planalto de Santa Catarina. Na revisão anteriormente apresentada salientamos pontos preocupantes como a baixa riqueza de espécies, baixa regeneração natural, pequeno tamanho e baixa conectividade dos fragmentos, reduzida área basal, entre outros. Tais aspectos serão priorizados na metodologia de determinação da naturalidade, diante da vital importância destes para a manutenção dos remanescentes florestais. Ao revisarmos a literatura, identificamos princípios e recomendações para a elaboração de um estudo de naturalidade (McROBERTS et al., 2012; WINTER et al., 2011; WINTER et al., 2010; WINTER, 2012). Seguindo o processo ilustrado na Figura 1.6, partimos do propósito inicial que é ter conhecimento sobre o estado de conservação das florestas, o que foi proporcionado pelo IFFSC, a partir de todo seu esforço amostral. Ao escolhermos a naturalidade como o fundamento que expressa o estado de conservação de um remanescente florestal, precisamos: i) definir concretamente o conceito de naturalidade a ser adotado; ii) detectar indicadores (variáveis) potenciais de naturalidade; iii) definir o conceito de florestas referências e identificá-las; iv) determinar um método de quantificação da naturalidade e sumarizar as diferenças entre os remanescentes de referência e os demais. Ao definirmos essa direção ao estudo, dedicaremos os próximos tópicos deste capítulo ao desenvolvimento de cada um dos passos essenciais citados acima. 47 Figura 1.6. Processo envolvido na determinação da naturalidade de remanescentes florestais de Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina, a partir dos dados coletados pelo IFFSC. 1.3.3. A DEFINIÇÃO DE NATURALIDADE A definição de naturalidade adotada neste estudo é a proposta por Winter (2012): Um ecossistema possui maior naturalidade se o seu estado atual é mais próximo ao seu estado conservado, ou seja, sem influências antrópicas perturbadoras e degradadoras. Após uma intensa revisão sobre o assunto, a autora sugere esta definição por vias de padronização, evitando inconsistências entre estudos. Em nossa abordagem, damos ênfase na visão de Peterken (1996), de que, em um ecossistema natural, existe o predomínio de processos naturais, juntamente com 48 características e recursos modelados por eles. Assim, a naturalidade não equivale à originalidade, a qual exclui a interferência humana de qualquer remanescente; logo, só pode ser considerada dentro de um contexto histórico e inatingível para as florestas brasileiras, como para outras regiões do planeta, como a Europa Central (KOWARIK, 1999), por exemplo. De acordo com McRoberts et al. (2012) e Chirici et al. (2012), existem duas maneiras de determinar a naturalidade: a primeira tem como fundamento o acesso aos processos ecossistêmicos (PETERKEN, 1996) - essa abordagem requer a determinação de poucos indicadores que descrevam os principais aspectos e processos ecológicos em um ecossistema florestal. A segunda maneira fundamenta-se no grau de influência humana, a qual é a propulsora das perturbações em um dado ecossistema (ANDERSON, 1991; ANGERMEIER, 2000; WINTER, 2012). Indicadores ligados à hemerobia estão geralmente associados a sinais de intervenção e exploração humana (FRA, 2000; LIIRA e SEPP, 2009; MACHADO, 2004; UOTILA et al., 2002); logo, podem ser utilizados como uma ferramenta para identificar florestas mais impactadas pelos humanos (WINTER, 2012). Utilizaremos as duas maneiras de determinação, ou seja, a determinação do grau de hemerobia será utilizada em conjunto com a naturalidade. Assim, estes dois conceitos antagônicos serão utilizados de forma complementar neste estudo. Ao se trazer à luz o conceito de hemerobia ligado à naturalidade, surge uma questão intrigante e delicada: Qual a influência dos humanos nas florestas? Eles fazem parte da natureza ou não? Os critérios que definem o que é um ecossistema natural não são fixos e podem variar conforme o contexto social; a educação e a experiência ambiental de cada indivíduo, ou de um grupo, influenciam na formação da concepção do que é uma floresta dita natural (WILLIAMS, 2002). Para exemplificar, citamos Lamb e Purcell (1990), os quais realizaram um estudo com o objetivo de coletar diversas percepções sobre a naturalidade de vegetações, expondo fotografias para colaboradores. Os participantes entrevistados consideraram uma vegetação alta e densa como mais natural do que uma vegetação mais aberta e baixa. Nota-se que houve uma tendência de os aspectos estruturais serem captados em detrimento de outros componentes do ecossistema que não foram considerados. A inclusão ou não do ser humano aos ecossistemas é tema de discussão. No enfoque da Antropologia Ecológica a sociedade é um subsistema (ou um componente) de uma totalidade maior, onde os seres humanos, animais e plantas mantêm relações bioenergéticas (DIEGUES, 2001). Logo, os humanos não diferem dos demais seres vivos em relação ao 49 equilíbrio homeostático com o ambiente. Para Vibrans (2003), a premissa epistemológica de que as sociedades humanas e a natureza integram-se de forma recíproca formando um todo supera a visão ocidental antropocêntrica, de que a sociedade e a natureza vivem à parte uma da outra. Diegues (2001) cita as sociedades tradicionais do Brasil, a saber, índios e camponeses (definição conforme Queiroz [1973]), como um exemplo da relação entre o homem e a natureza em oposição ao modelo de colonização predatório realizado pelos europeus. GomezPompa et al. (1972) lançaram a hipótese de que atividades do homem dito "primitivo", como, por exemplo, a agricultura itinerante, tem favorecido a diversidade de espécies em florestas tropicais do México. Entretanto, os mesmos autores afirmam que as atividades contemporâneas ligadas ao uso do solo são extremamente perigosas no que diz respeito à intensa perturbação dos ecossistemas florestais, causando então, a perda de habitats e espécies, como aferido também por Mähler Júnior e Larocca (2009) para a Floresta Mista com Araucária. Na visão de Luztemberger (1976, p.6) vemos a participação e até a contribuição das sociedades tradicionais nas florestas: "O índio, muitos milênios antes da chegada do homem branco, já havia alcançado situações de equilíbrio estável em seu ambiente. No mar da Natureza intata, as derrubadas do índio, pequenas e a grande distância uma das outras, constituíam até vantagem ecológica, pois acrescentavam diversidade ao sistema. Nestas clareiras vingavam os organismos pioneiros, as plantas e os animais das comunidades de recuperação, que são os tecidos cicatrizantes dos ecossistemas." Reis et al. (2014) discorrem sobre a influência das sociedades pré-Colombianas na formação da Floresta Mista com Araucária, as quais coexistiam há, pelo menos, 3.000 anos. Os autores afirmam que são muitas as evidências (etno)botânicas e etnohistóricas que apontam a participação desses povos (Kaigang e Xokleng) na ampliação da floresta, envolvendo predominantemente uma estreita relação de dependência deles com os pinhões de A. angustifolia. Nesse sentido, a Floresta Mista com Araucária poderia ser classificada como uma paisagem cultural. Schmitz (2009) discute brevemente tais evidências; porém conclui que estas não são confirmatórias da interferência dos povos citados na ampliação da Floresta Mista com Araucária. Os “faxinais” e as “caívas” são exemplos de paisagens culturais que foram criadas pelos colonos europeus e caboclos em Santa Catarina e nos outros estados da Região Sul, 50 onde a vegetação florestal é mantida para o manejo de espécies de interesse como a ervamate, além da criação de animais pastejadores (CHANG, 1998; HANISCH et al., 2010; MELLO, 2013). Apesar das inegáveis evidências da participação do homem na formação de certas fitofisionomias, de forma semelhante a Angermeier (2000), vemos Luztemberger (1976, p.3) denunciando a posição tomada pelo homem moderno em suas atividades predatórias e geograficamente abrangentes: "A continuar a atual cegueira ambiental e exploração irresponsável de nosso outrora pródigo meio natural, serão inevitáveis calamidades de magnitude nunca vista. Somente uma transição rápida a atitudes fundamentalmente novas, atitudes de respeito e integração ecológica poderão ainda evitar o desastre. Encontramo-nos num divisor de águas." Hoehne (1930, p.5), numa visão biocêntrica, presenciando a devastação das florestas com Araucária no Sul do Brasil, a qual denominou de “Araucarilândia”, expressa seus pensamentos: “As selvas naturais e virgens encerram vidas e riquezas, cujo verdadeiro valor e importância real ainda se não podem avaliar devidamente. Protege-las é defender um patrimônio, que, uma vez perdido, jamais pode ser adquirido, quer pela força, quer pelo dinheiro.” “O homem precisa entender que é parte colaborante, elemento do conjunto de vidas sobre a face da terra e saber que, se se excede, deixando de respeitar o direito alheio, as consequências serão sentidas, não somente pelos oprimidos e prejudicados, mas mesmo por ele e por todo o conjunto. O direito de viver assiste a cada ser; mas, o de abusar, a nenhum deles.” Estas exposições nos incentivam a considerar que existiu, ou, ainda existe um manejo/exploração dito "consciente" ou "equilibrado" feito por pessoas que mantêm contato com a floresta. Ao lado deste modo de utilização dos recursos naturais, observamos a exploração predatória a e degradação dos ecossistemas, visando benefícios econômicos, sem a preocupação com a conservação e preservação. Embora essas duas modalidades pareçam ser 51 claramente distinguíveis, encontrar o limiar entre a exploração (e/ou manejo) ditos "conscientes" ou "predatórios" é uma tarefa complexa, assim como é complicado avaliar os efeitos de cada uma dentro de um contexto geográfico mais amplo, como um estado. Estamos de acordo com Oliver e Larson (1990) de que existe um gradiente contínuo que vai desde pequenas até grandes explorações de recursos florestais ou de distúrbios no ecossistema. Um exemplo interessante da percepção entre o limiar do considerado natural e não natural foi apresentado por Dunk (1994 apud WILLIAMS, 2002). O autor entrevistou pessoas da área rural no Canadá acerca de suas opiniões sobre o corte de árvores: "Eu acho a coisa mais natural do mundo cortar uma árvore." Em contrapartida, o mesmo entrevistado declarou: "O corte raso da floresta não me parece natural." Trazendo o foco da discussão para a realidade do Sul do Brasil, analisamos o comportamento cultural dos colonizadores do planalto de Santa Catarina, dentro de um contexto histórico, e observamos a estreita relação das atividades de pecuária e as florestas. Uma prática comum era a conversão de florestas em pastagens para criação de gado (BORGES, 2005). Esta prática foi de certa forma perpetuada, incluindo, atualmente, outros motivos para a derrubada de florestas, como culturas agrícolas extensivas e plantios de florestas artificiais. O levantamento sócio-ambiental-histórico de Siminski (2004), que teve como alvo os agricultores (idade média de 50 anos) residentes na região da Floresta Pluvial Latifoliada de Santa Catarina (Figura 1.4), apontou diversas maneiras e intensidades de utilização dos recursos naturais, desde a coleta de plantas ornamentais até a intensa extração de lenha para engenhos de açúcar e extração de madeiras nobres para fins de construção civil. Atualmente, de uma forma geral, a relação do pequeno agricultor, ou proprietário rural, com a floresta em Santa Catarina, resume-se ao uso de recursos florestais para lenha e o consumo esporádico de frutas e plantas medicinais. Na Floresta Mista com Araucária, a ervamate e o pinhão desempenham um papel importante, onde muitas vezes sua exploração e comercialização são utilizadas como complemento para a renda de famílias que vivem no meio rural (SIMINSKI, 2009). Siminski (2009), entrevistando proprietários de áreas rurais, elencou alguns motivos pelos quais as florestas nativas de Santa Catarina estão sendo convertidas em outros usos; dentre eles foram citados a baixa rentabilidade econômica e as barreiras e complicações impostas pela legislação ambiental. Ao analisarmos alguns relatos presenciados em nossa vivência pela região do planalto de Santa Catarina, vemos o espírito deliberadamente explorador dos homens: 52 "... encurralei e matei a última paca da região." "...até os pinheiros das grotas eram arrastados com cabos de aço." "...na repartição das terras, os pinheiros com mais de 30 cm de diâmetro foram cortados." "...daqui de casa até a casa do pai só tinha um carreiro, era só pinheiro e taquara." Enfim, diante desta breve exposição, novamente mencionando e considerando a dificuldade de decretar um limiar entre níveis "conscientes" e "displicentes" de exploração dos recursos florestais e afins, tomamos uma posição conservadora e propomos que: Os seres humanos são, sem dúvida, integrantes históricos dos ecossistemas florestais, porém não estão adaptados aos mesmos. As populações tradicionais, que outrora habitavam o Sul do Brasil, geravam baixo impacto sobre os ecossistemas. Atualmente, os seres humanos (em um sentido global) convertem os ecossistemas florestais em outros tipos, alterando sua composição, estrutura e funcionalidade. (Axioma 1) Desta forma, consideramos as ações (de uma maneira geral) dos humanos (póscolonização) nas florestas de Santa Catarina, como sendo opostas aos processos ecossistêmicos naturais. Deixamos claro que a discussão filosófica sobre os humanos e a natureza não é o foco principal deste estudo. Diante das divergências de opiniões sobre o tema, direcionamos nosso enfoque ao Axioma 1, de forma que nossa abordagem de naturalidade tem um caráter conservador, porém não biocêntrico em sua essência. Esperamos contribuir no que diz respeito à abordagem metodológica de acesso à naturalidade, a qual poderá ser adaptada para outras perspectivas relacionadas à interação humano-natureza. 53 1.3.4. METODOLOGIA DE ACESSO À NATURALDADE 1.3.4.1 Área de estudo O Estado de Santa Catarina (Figura 1.7) encontra-se nas latitudes 26° e 29° S e entre as longitudes 48° e 53°W e possui área total de 95.346 km². São descritos por Klein (1978) três regiões fitoecológicas para o Estado (Figura 1.4): Floresta Mista com Araucária, Floresta Latifoliada Pluvial e Floresta Latifoliada Estacional (classificação segundo Oliveira-Filho [2009]), as quais possuem área de ocorrência de 56,39 km², 31,28 km² e 7,67 km² (VIBRANS et al., 2013), respectivamente. Brasil Figura 1.7. Estado de Santa Catarina, Brasil, com preto indicando a cobertura florestal (SAR, 2005). 54 De acordo com a classificação climática de Köppen (KOTTEK et al., 2006), Santa Catarina tem dois tipos climáticos: Cfa - clima temperado úmido, com verão quente e Cfb clima temperado úmido, com verão fresco. Esses tipos climáticos sao definidos principalmente por diferenças de temperatura devido a gradientes de altitude. A temperatura média anual varia de 10 a 22 °C, com precipitação média anual de 1.100 a 2.900 mm bem distribuídos durante o ano e umidade relativa média anual entre 74 e 88% (EPAGRI, 2002). No diagrama de Walter elaborado para o município de Curitibanos, localizado no planalto central de Santa Catarina, não existem períodos de déficit hídrico (Figura 1.8). Figura 1.8. Diagrama de Walter gerado a partir de dados climáticos (série histórica de 50 anos) do município de Curitibanos, situado na região de ocorrência da Floresta Mista com Araucária em Santa Catarina. Quanto aos aspectos geológicos, o Planalto Ocidental de Santa Catarina pertence às formações geológicas Botucatu e Serra Geral, constituindo a área mais extensa do estado, sendo caracterizado pela presença de altitudes superiores a 800 m na área limite com a serra litorânea. Conforme avança em sentido sudoeste ao vale do rio Uruguai, nos limites com a Argentina e Rio Grande do Sul, vai reduzindo gradativamente a altitude, até cotas de 200 m. 55 O planalto de Santa Catarina, devido à suas características geológicas e geomorfológicas, foi subdividido em Zona Basáltica, Planalto de Canoinhas e Planalto de Lages (NETTO, 1984). Na Zona Basáltica, a qual constitui a maior parte do planalto, é observada uma maior variação da altitude. Entre as cotas de 200 a 800 m observa-se uma topografia movimentada que forma vales em “V”; entre as cotas de 900 a 1000 m a topografia ondulada com longos declives predomina. O Planalto de Lages é constituído por rochas sedimentares e ígneas alcalinas localizadas na escarpa, adentrando de forma suave na Zona Basáltica. A altitude varia, em média, na faixa dos 900 m, sendo o relevo ondulado com a presença de campos de altitude. O Planalto de Canoinhas localiza-se ao norte do Planalto Ocidental e apresenta relevo suave ondulado formado por rochas sedimentares; as altitudes médias oscilam entre 800 a 900 m (NETTO, 1984). 1.3.4.2 Dados do Inventário Florístico-Florestal de Santa Catarina As equipes de campo do IFFSC coletaram os dados referentes à Floresta Mista com Araucária entre o período de 2007 a 2010, adotando a metodologia do Inventário Florestal Nacional do Brasil (FREITAS et al., 2010). A metodologia de amostragem utilizada baseouse na amostragem de múltiplas ocasiões com possibilidade de repetição total da amostragem. As Unidades Amostrais foram distribuídas sistematicamente a partir de uma grade de pontos com distância de aproximadamente 10 km x 10 km, cobrindo todo o território do estado (VIBRANS et al., 2010; VIRABNS et al., 2012a). Para a região de ocorrência da Floresta Mista com Araucária, a grade gerou 202 pontos amostrais dos quais 143 foram efetivamente amostrados (Figura 1.10). Os pontos amostrais foram previamente analisados através da interpretação de imagens orbitais multiespectrais de média resolução advindos dos sensores LandSat-5, LandSat-7 e Spot-4 (SAR, 2005; GEOAMBIENTE, 2008), e classificados como “floresta” e “não floresta”. A definição de “floresta” adotada pelo IFFSC baseou-se nos seguintes critérios: áreas cobertas por vegetação arbórea contínua, com altura do dossel maior que 10 m e área basal maior que 10m².ha-1 (VIBRANS et al., 2013). Serão incluídas neste estudo as 12 Unidades Amostrais complementares alocadas em florestas consideradas mais conservadas, instaladas fora da grade de pontos amostrais. Dessas 12, quatro delas se encontram no município de Três Barras (FLONA de Três barras), uma no município de Caçador (Reserva Florestal EMBRAPA/EPAGRI), uma no município de Anita Garibaldi (em uma propriedade 56 particular), quatro no município de Palma Sola (em uma propriedade particular) e duas no município de São Domingos (Parque Estadual das Araucárias). A Unidade Amostral do IFFSC é composta por um conglomerado com área nominal total de 4.000 m², formado por quatro subunidades com área de 1.000 m², com as dimensões de 20 m x 50 m (orientadas na direção dos pontos cardeais: norte, sul, leste e oeste), com área de inclusão de 2,56 ha (Figura 1.9). Cada subunidade foi estabelecida a uma distância de 30 m do centro do conglomerado e divida em dez subparcelas de 10 m x 10 m (100 m²), onde foram levantados todos os indivíduos com DAP ≥ 10,0 cm. As variáveis levantadas foram espécie, número de fustes, DAP, altura do fuste, altura total, qualidade do fuste, sanidade da árvore e posição sociológica. Em cada subunidade foi destinada uma subparcela de 5 m x 5 m (25 m²), localizada na extremidade da subunidade, destinada ao levantamento da regeneração natural; foram registradas a espécie e a altura dos indivíduos com DAP < 10 cm e altura ≥ 1,5 m. Figura 1.9. Unidade Amostral em forma de conglomerado adotada pelo IFFSC para o levantamento do componente arbustivo-arbóreo da Floresta Mista com Araucária. 57 Figura 1.10. Distribuição das 155 Unidades Amostrais do IFFSC nas regiões fitoecológicas da Floresta Mista com Araucária e Campina. 1.3.4.3 Indicadores potenciais de naturalidade Dentro da concepção de ecossistema de Noss (1990) os indicadores têm de contemplar três componentes básicos: composição, estrutura e funcionalidade. Šaudytè et al. (2005) propõe que ao avaliar a naturalidade temos que estar cientes dos principais componentes de uma floresta. Além destas premissas iniciais, segundo a revisão de McRoberts et al. (2012), os indicadores devem produzir resultados consistentes, precisos e objetivos (SMITH e THEBERGE 1987; LIIRA et al. 2007; UOTILA et al., 2012). Devem ser facilmente e prontamente calculáveis a partir de dados disponíveis (BARTHA et al. 2006; LIIRA et al. 2007) e devem ser adequados para variadas escalas espaciais (BARTHA et al., 2006). Devemos ainda considerar os diferentes fatores climáticos, geológicos e tradições regionais de manejo nos quais as Unidades Amostrais do IFFSC estão inseridas; tais fatores podem ser um empecilho na adoção ou criação de indicadores de naturalidade (LIIRA e SEPP, 2009). Estes apontamentos remetem a um questionamento: O que se espera, em relação às características e propriedades de uma floresta mais próxima do seu estado natural? Elencando alguns pontos observados na literatura: 58 A diversidade de espécies em áreas conservadas pode ser superior quando comparada com áreas menos conservadas (GIBSON et al., 2011; SEVEGNANI et al., 2013b). Santos et al. (2008) observou que áreas bem conservadas da Floresta Atlântica apresentaram o dobro da diversidade de espécies que fragmentos florestais com idade de regeneração entre 5 e 65 anos; Em relação à riqueza de espécies, Sevegnani et al. (2013a), baseados em levantamentos históricos, afirmam que, para um remanescente de Floresta Mista com Araucária conservado, o valor estaria em torno de 60 espécies arbóreas; Leite (2002) aponta a A. angustifolia como uma espécie que imprime a fisionomia da Floresta Mista com Araucária e Klein (1978) aponta espécies características como D. sellowiana e indicadoras de formações mais específicas, como O. pulchella, O. porosa e P. rigida. Segundo Klein (1978), a estrutura vertical de uma Floresta Mista com Araucária conservada apresenta um estrato emergente composto por A. angustifolia, um estrato abaixo formado por angiospermas (geralmente lauráceas) e um estrato médio; A distribuição de árvores em classes diamétricas de florestas conservadas apresenta uma tendência em assumir uma distribuição exponencial negativa, ou J-invertido, onde a frequência de árvores é alta para o lado esquerdo da média e baixa para o lado direito da média (KUULUVAINEN et al., 1996; UOTILA et al., 2002); A distribuição de frequências em classes diamétricas de A. angustifolia tende a possuir assimetria à esquerda, segundo o modelo Losango de Ogden e Stewart (1995); Florestas conservadas apresentam espécies de vários grupos ecológicos, com predomínio de espécies mais exigentes em recursos ecológicos e tolerantes à sombra espécies caracterizadas como secundárias tardias e climácicas (FINEGAN, 1992); A área basal e o estoque de biomassa em florestas mais conservadas tende a ser maior do que em florestas perturbadas (D‟OLIVEIRA, et al., 2011; HUGHES et al., 1999); A regeneração natural em florestas maduras e conservadas deve ocorrer abundantemente, com a presença de espécies características de florestas desenvolvidas (CHAZDON et al., 1998); A necromassa é um componente importante da biodiversidade florestal, fornecendo habitats para muitas espécies de fungos, briófitas e invertebrados (CHRISTENSEN et al., 2005; ÓDOR et al., 2006), e também pode representar a história recente da 59 dinâmica florestal (STOKLAND, 2001). Logo, a presença deste componente em ecossistemas florestais conservados é importante e é um indicador de biodiversidade; A estrutura da paisagem é considerada muito importante nos diversos estudos que contemplam a fragmentação de habitats. Ou seja, variáveis como relação perímetro/área, heterogeneidade e conectividade estão relacionadas a componentes e processos ecológicos como composição de espécies, abundância ou vitalidade (NOSS, 1990; PFEIFER et al., 2014). Seguindo a busca por indicadores, realizamos uma revisão da literatura a respeito dos indicadores de naturalidade utilizados. A tabela a seguir condensa as informações coletadas: Tabela 1.4. Variáveis indicadoras de naturalidade descritas na literatura e sua disponibilidade no conjunto de dados do IFFSC. Onde: S=disponível; N=não disponível. Referência McRoberts et al. (2012) Natureza do indicador Quantitativa Winter et al. Quantitativa, (2010) Qualitativa Moravčík et al. (2010) Quantitativa Liira e Sepp (2009) Quantitativa Machado (2004) Qualitativa Šaudytè et al. (2005) Qualitativa, Quantitativa Uotila et al. (2002) Quantitativa, Qualitativa Indicador Assimetria da distribuição diamétrica (gdap) Desvio padrão dos diâmetros (Sdap) Diversidade - Índice de Shannon (H') Estrutura vertical Necromassa Conectividade dos remanescentes Sanidade das árvores Microhabitats Árvores bifurcadas Variáveis estruturais Composição (riqueza e uniformidade) Presença e ausência de distúrbios antrópicos Índice de intensidade de manejo Variáveis estruturais Aspectos e propriedades ecológicas Influência antrópica Aspectos estruturais Composição de espécies Influência de elementos antrópicos Dados históricos sobre manejo Dados históricos sobre incêndios Sinais de manejo Idade da floresta (dendrocronologia) Estoque de volume Distribuição diamétrica Disponível no IFFSC S S S S S S S N S S S S N S N S S S S S N S N S S 60 A partir dos indicadores apresentados na tabela anterior realizamos uma triagem, de acordo com a disponibilidade destes indicadores, ou seja, quais foram levantados ou podem ser calculados a partir do banco de dados do IFFSC. Adicionamos a estes indicadores os que julgamos como importantes e que não constam na literatura; os indicadores estão expressos na Tabela 1.5. Criamos duas categorias de indicadores: os descartados e os potenciais. Expomos e discutimos as propriedades e características de cada um, e por fim, concluímos sobre a sua relevância ou irrelevância ecológica, de acordo com os conhecimentos sobre ecologia florestal e sobre a Floresta Mista com Araucária. Os indicadores descartados foram excluídos (a priori) do repertório de alternativas. Nessa primeira apresentação dos indicadores potenciais focamos apenas em descrever suas propriedades e potencialidades, e em sintetizar os que estão ligados a elementos fundamentais do ecossistema. Tabela 1.5. Indicadores de naturalidade potenciais acessados pelo IFFSC. * = Indicador sugerido pelos autores do presente estudo. Indicador de naturalidade Árvores bifurcadas Assimetria da distribuição diamétrica (gdap) Composição de espécies Desvio padrão dos diâmetros (Sdap) Diversidade de espécies Estoque de volume Estrutura de população de espécies* Estrutura vertical (estratos) Necromassa Número de árvores velhas e (ou) grossas Regeneração natural Riqueza de espécies Sanidade das árvores Métricas de paisagem de remanescentes Presença e ausência de distúrbios antrópicos Histórico de manejo/exploração Natureza Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Ecossistêmica Hemerobia Hemerobia Hemerobia Presente na literatura Sim Sim Sim Sim Sim Sim Não Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Indicadores de naturalidade descartados: Estoque de volume: Esta variável tem potencial para ser um bom indicador de naturalidade, porém, a obtenção de dados do volume individual de árvores em um inventário em larga escala é 61 realizada através de modelos estatísticos, os quais adicionam um grau de incerteza nas predições (McROBERTS e WESTFALL, 2014). No IFFSC as estimativas de volume foram feitas através de modelos estatísticos (VIBRANS et al., em revisão), logo, a incerteza nos valores estimados torna-se um obstáculo para a utilização desta variável como um indicador (BREIDENBACH et al., 2014; McROBERTS et al., 2012). Sanidade das árvores e árvores bifurcadas: Esses dois indicadores estão estreitamente relacionados com o indicador microhabitat. Segundo Winter e Möller (2008) e Michel e Winter (2009), as árvores vivas bifurcadas e a perda de vitalidade das árvores são pré-requisitos para a formação de troncos mortos, os quais podem formar importantes microhabitats. Apesar de o IFFSC ter coletado tais informações sobre sanidade e bifurcação das árvores, não existem estudos relacionados a microhabitats para a Floresta Mista com Araucária, dificultando a adoção destes indicadores em nosso estudo. Histórico de manejo/exploração: Os indicadores relacionados ao histórico de manejo florestal, como os adotados nos estudos citados, estão ligados à Europa, que há decênios pratica o manejo florestal (CHIRICI et al., 2011; TOMPPO et al., 2010, LIIRA et al., 2007). No Brasil, a exploração teve um caráter indiscriminado e descontrolado (DEAN, 1996); logo, possuímos poucas informações precisas e fidedignas sobre o histórico de exploração de remanescentes florestais, o que torna este indicador impossibilitado de ser utilizado. Indicadores de naturalidade não descartados: Assimetria da distribuição de diâmetros: A assimetria (g) de uma distribuição de frequências é obtida pela raiz cúbica do terceiro momento central da distribuição das observações (GOTELLI e ELLISON, 2011). Na área florestal a assimetria pode descrever se a distribuição de frequências em classes diâmétricas (gdap) de uma floresta é simétrica, ou não. Uma distribuição normal apresenta gdap = 0. Já uma distribuição com gdap > 0 apresenta assimetria à direita; ou seja, possui uma cauda de observações à direta da média. Um valor de gdap < 0 aponta assimetria à esquerda, 62 indicando uma cauda de observações à esquerda da média (BENDEL et al., 1989; SOUZA, 2009; WRIGHT et al., 2003). Souza (2009) usou esse parâmetro com o intuito analisar a estrutura de populações de A. angustifolia; McRoberts et al. (2008) utilizaram-o como uma medida de diversidade estrutural e McRoberts et al. (2012) adotoram-o como um indicador de naturalidade para florestas nativas dos Estados Unidos. Adaptando este indicador ao nosso contexto, as florestas com maior naturalidade tendem a apresentar distribuições de diâmetros com assimetria à direita (J-invertido, seguindo a distribuição convencional de uma floresta climácica), sendo expressas por gdap > 0. A distribuição diamétrica da floresta pode apresentar um panorama do processo dinâmico de sucessão ou de mortes, egressos e ingressos, visto que está relacionada com o crescimento dos indivíduos em seus diversos estágios de vida, como observado por Schaff et al. (2006a) em um período de 21 anos na Floresta Mista com Araucária. Composição de espécies do estrato arbóreo: A composição de espécies pode revelar o estágio de sucessão ecológica, o grau de conservação, ou ainda o histórico de distúrbios ocorrentes em uma floresta, mediante a avaliação dos hábitos e funções das espécies (CHAZDON et al., 1998; CHAZDON et al., 2007; FINEGAN, 1996; IMAI et al., 2014; SIMINSKI, 2004). Estrutura de população de espécies: A distribuição de tamanho dos indivíduos de uma população é uma síntese dos processos dinâmicos ao longo do tempo e, para a Floresta Mista com Araucária, remanescentes que se encontram conservados podem ser caracterizados pela abundância de A. angustifolia (BACKES, 2009). Pode-se considerar que a presença desta espécie é um indicador do estado de conservação de remanescentes. As florestas mistas são caracterizadas pela coexistência de angiospermas e gimnospermas e a estratégia de regeneração natural das coníferas de grande porte é motivo de discussão, não estando a A. angustifolia à parte. Klein (1960) considerou-a pioneira; outros autores (por exemplo, Soares [1979]) afirmaram que esta depende de perturbações para se regenerar e outros afirmaram que ela regenera sem maiores limitações em florestas fechadas (por exemplo, Seitz [1982]). Apesar do comportamento de uma espécie poder variar conforme o processo sucessional (DILLENBURG et al., 2009), nota-se que a A. angustifolia parece adequar-se ao modelo Losango (OGDEN e STEWART, 1995), o qual foi proposto a partir de observações 63 da regeneração natural de coníferas de grande porte em florestas mistas da Nova Zelândia; este modelo, é baseado em indícios que mostram que o recrutamento destas coníferas dentro da floresta é reduzido, pois as angiospermas possuem vantagens competitivas. O modelo sugere que as coníferas caracterizadas como pioneiras longevas dependem de perturbações na floresta (por exemplo, clareiras) para se regenerarem, formando coortes que são seguidas por coortes de angiospermas. Consequentemente, as coníferas acabam por imprimir a fisionomia da vegetação, sendo grandes contribuintes nos componentes estruturais, porém, sua regeneração é reduzida devido ao domínio das angiospermas nos estratos inferiores. Souza (2009) estudou a estrutura de populações de A. angustifolia em remanescentes de Floresta Mista com Araucária do estado do Rio Grande do Sul e confirmou as proposições do modelo Losango. A assimetria da distribuição de diâmetros à esquerda, ou seja, gdap < 0 aponta, segundo o modelo Losango, que a população de A. angustifolia se encontra em um estágio climácico, portanto, pode ser considerada um indicador de naturalidade para a Floresta Mista com Araucária. Desvio padrão dos diâmetros (Sdap): As florestas do hemisfério Norte foram manejadas conscientemente por decênios, e as práticas de manejo foram utilizadas para modelar a estrutura da floresta (BARTHA et al., 2006). Como resultado, tais florestas tornaram-se estruturalmente homogêneas - maiores valores de Sdap para estas florestas podem indicar uma maior naturalidade (McROBERTS et al., 2012). Este indicador é utilizado pelos IFNs da Europa participantes da Ação COST E43 e foi utilizado por McRoberts et al. (2008) e McRoberts et al. (2012) nos Estados Unidos. Este indicador aplicado nas florestas subtropicais também pode gerar resultados ecologicamente interpretáveis, porque a variabilidade de diâmetros remete à complexidade da estrutura da vegação, a qual está intimamente relacionada com microhábitats e a biodiversidade (BOUNGIORNO et al. 1994; McROBERTS et al. 2012; MICHEL e WINTER, 2009; NOSS, 1990; WINTER e MÖLLER, 2008). Diversidade de espécies do estrato arbóreo: A diversidade de espécies leva em consideração dois atributos: riqueza e equabilidade (HILL, 1978; MELO, 2008). Por décadas, este aspecto vem sendo estudado (LANDE, 1996), pois duas comunidades podem ter a mesma riqueza e o mesmo número de indivíduos, mas podem possuir estruturas diferentes. Portanto, a combinação da riqueza e da distribuição 64 relativa das espécies (em um índice) torna-se mais interessante do que conhecer somente a riqueza (HURLBERT, 1971). Buckland et al. (2011) assumem que a diversidade de espécies é um atributo escencial para o monitoramento da biodiversidade, e tal atributo vem sendo utilizado em estudos sobre naturalidade (CHIRICI et al., 2011; McROBERTS et al., 2012). Gibson et al. (2011) e Sevegnani et al. (2013b) afirmam que florestas mais conservadas possuem maior diversidade de espécies, embora, Imai et al. (2014) e Maçaneiro et al. (manuscrito em preparação) não concordam com os apontamentos dos autores citados anteriormente, diante da evidência que florestas conservadas (que possuem espécies com alta abundância relativa) podem apresentar menor diversidade que florestas alteradas que não possuem tais espécies, como, por exemplo, Euterpe edulis Martius para Floresta Latifoliada Pluvial de Santa Catarina, ou Dicksonia sellowiana para Floresta Mista com Araucária. Estrutura vertical (estratos): Florestas conservadas possuem uma organização estrutural vertical definida por estratos de altura. Klein (1960, 1978) cita que o estrato superior da Floresta Mista com Araucária (formado por A. angustifolia) atingia até 35 m de altura. A partir dos dados atuais do IFFSC, Vibrans et al. (2013) afirmaram que a altura média do dossel é de 15 m e a altura total média das árvores é de 10 m. Souza (2009) encontrou evidências estatísticas significativas em relação aos apontamentos de Reitz e Klein (1966) e Klein (1978) em relação ao comportamento emergente da A. angustifolia. Métricas de paisagem de remanescentes: A literatura aponta vários impactos causados pela área reduzida e a fragmentação de florestas (BROADBENT et al., 2008; HADLEY e BETTS, 2012; PFEIFER et al., 2014). Winter et al. (2010) segregaram áreas de florestas manejadas, áreas de borda e áreas core como tendo diferentes graus de naturalidade. As bordas impõem condições ambientais e biológicas diferentes das encontradas no interior de um fragmento; o efeito de borda pode afetar a fenologia das espécies, interferindo nas interações planta-dispersor e reprodutivas (REZNIK et al., 2012, LAURANCE et al., 2003; TABARELLI e PERES, 1999). A grande variação em um gradiente pode alterar as propriedades microclimáticas do sub-bosque próximas às bordas (POHLMAN et al., 2007), pode alterar a incidência de luz, temperatura, 65 umidade, taxa de decomposição da necromassa, riqueza de espécies e interações bióticas borda-interior (MURCIA, 1995; SCHAADT, 2012). Engel et al. (1998) e Jordão (2009) expõem o problema do desequilíbrio de populações de lianas, as quais são muito beneficiadas pelas condições criadas por bordas. Jordão (2009) apresenta o problema das lianas nas bordas das florestas do estado de São Paulo. Santos et al. (2008) apresentam a erosão funcional em fragmentos de Floresta Pluvial Latifoliada na região nordeste do Brasil. Necromassa: A necromassa é um importante componente da biodiversidade florestal (HARMON et al., 1986; SAMUELSSON et al., 1994); diferentes quantidades de necromassa estão relacionadas a diferentes graus de naturalidade (LAARMAN et al., 2009). Uotila et al. (2002) adotou o critério presença/ausência para avaliar a naturalidade de florestas boreais na Finlândia; Nilsson et al. (2002) se referem à proporções de árvores mortas e vivas. Outros estudos que abordaram a necromassa podem ser encontrados em McRoberts et al. (2012). Estudos sobre valores de referência de necromassa em florestas primárias ou com pouca intervenção antrópica são numerosos na Europa (VANDEKERKHOVE et al., 2009), por exemplo. Entretanto, no Brasil, são escassos os estudos que determinaram quantidades de necromassa em florestas mais e menos conservadas. As variáveis levantadas pelo IFFSC referentes a este componente são: volume (m³.ha-1), peso (Mg.ha-1), carbono (Mg.ha-1) e nível de decomposição (três classes: material novo; decomposição inicial; decomposição avançada). Mediante essa exposição, observamos que este componente apresenta relevância ecológica e potencial de ser um indicador de naturalidade. Número de árvores velhas e/ou grossas: O número de árvores velhas e/ou grossas pode retratar o estado de conservação do ecossistema; ele pode sugerir a magnitude de possíveis explorações feitas na floresta, além de árvores de grande porte contribuirem para a diversidade estrutural e serem importantes fontes de microhábits para diversos organismos (GUSTAFSSON, 2002; McCOMB et al., 2003; MICHEL e WINTER, 2009; NILSSON et al., 2002; von OHEIMB et al., 2007). 66 Presença e ausência de distúrbios antrópicos: Este indicador está relacionado à hemerobia e pode ser útil para indicar influências antrópicas na floresta. O IFFSC levantou (em nível de Unidade Amostral) a ausência e a presença de distúrbios antrópicos como roçada, exploração, presença de gado, entre outros (Tabela 1.9). Apesar da discussão da utilização de tais variáveis como indicadores de naturalidade em florestas do hemisfério Norte (CHIRICI et al., 2011; McROBERTS et al., 2012), nós as consideramos potenciais para o contexto do Brasil, e mais especificamente para Santa Catarina (de acordo com o Axioma 1 – tópico 1.3.3). Regeneração natural: A manutenção da composição de espécies de uma floresta, ou especificamente do dossel, com o desenrolar da sucessão ecológica ou do tempo, depende dos indivíduos que regeneram abaixo do dossel (RICHARDS, 1996; SWAINE e HALL, 1988). Meyer et al. (2013), baseados nos dados coletados pelo IFFSC, concluíram que a regeneração natural da Floresta Mista com Araucária abriga uma diversidade significativa e que metade das espécies encontradas no estrato arbóreo foram encontradas na regeneração natural. Entretanto, a regeneração natural encontra-se altamente perturbada em muitos remanescentes. O pastoreio, certamente, é o maior perturbador da regeneração natural em Santa Catarina - Sampaio e Guarino (2007) observaram que a densidade de plântulas de espécies arbóreas é menor em remanescentes com maior intensidade de pastoreio quando comparado a remanescentes expostos a uma menor intensidade de pastoreio. Riqueza de espécies do estrato arbóreo: É uma variável muito importante e utilizada dentro em investigações de biodiversidade e conservação (BROOK et al., 2003; BROSE et al., 2003; MAY, 1988), porém sofre com diferentes tamanhos amostrais, devido à não linearidade do aumento de indivíduos, além da abundância relativa das espécies ser diferente (CHAO et al., 2014; COLWELL et al., 2012; COLWELL e CODDINGTON, 1994). Por muitas vezes, a amostragem não reflete a real riqueza, por conseguinte, a utilização de métodos de estimação da riqueza torna-se necessária (CHAO et al., 2014; COLWELL e CODDINGTON, 1994; COLWELL et al., 2012; MAGURRAM, 2004). Ainda, a riqueza de espécies não incorpora informações sobre a abundância relativa das espécies, visto que considera todas as espécies da mesma forma (raras e comuns). Apesar destas desvantagens é um indicador importante e passível de ser adotado. 67 1.3.4.4 Escolha dos indicadores de naturalidade Este tópico tem uma característica peculiar, pois mesclamos aspectos metodológicos, resultados e discussões acerca da escolha dos indicadores de naturalidade. Cada indicador é tratado de maneira independente e, por fim, é apresentado um diagnóstico individual final sobre a aceitação dos mesmos para a quantificação da naturalidade. Julgamos que nem todas as Unidades Amostrais são passíveis de serem incluídas nas análises apresentadas a seguir. Optamos por excluir as quatro Unidades Amostrais (UA165, UA167, UA188 e UA214) implantadas em Nanofloresta Latitifoliada Nebular devido às discussões em relação à sua independência das demais fitofisionomias florestais (FALKENBERG e VOLTOLINI, 1995), além de ter sido pouco amostrada pelo IFFSC (VIBRANS et al., 2012a). Algumas das Unidades Amostrais complementares foram implantadas no mesmo remanescente (fragmento) (Figura 1.11). Nesses casos, sorteamos uma Unidade Amostral para representar o remanescente; foram excluídas seis delas (UA2001, UA3001, UA6002, UA6003, UA7001 e UA7002). Assim, das 155 Unidades Amostrais, serão consideradas 145 para as futuras análises. A B C D 68 E Figura 1.11. Unidades Amostarais complementares (UA) implantadas em um mesmo remanescente. (A) UA – 7001, 7002 e 926; (B) UA – 3001 e 3002; (C) UA – 2001 e 2002; (D) UA – 6003 e 6004; (E) UA – 6001 e 6002. A partir dos apontamentos citados no primeiro e segundo parágrafos do tópico 1.3.4.3, acerca das premissas para a escolha dos indicadores de naturalidade, definimos três critérios a serem cumpridos na escolha: critério A: relevância ecológica (estrutura, composição e função); critério B: objetividade e consistência dos resultados; critério C: passível de ser prontamente calculável. Adicionamos, ainda, três níveis de cumprimento dos critérios: i) totalmente satisfeito; ii) parcialmente satisfeito; iii) não satisfeito. Consideramos que a premissa de Winter et al. (2010), de que os indicadores têm ser passíveis de serem acomodados no contexto de um programa de monitoramento cíclico, já está cumprida, visto que em futuros ciclos do IFFSC as informações coletadas serão as mesmas, ou adicionais, conforme os requisitos do IFN-Brasil. Para ser aceito, o indicador precisa satisfazer os três critérios na totalidade, ou um deles apenas parcialmente. Reforçamos que a naturalidade possui diferentes dimensões, e que indicadores utilizados de forma combinada podem exprimir estas dimensões, gerando resultados expressivos (McROBERTS et al., 2012; ŠAUDYTÈ et al., 2005; WINTER et al., 2010). Na sequência, trataremos de cada um dos indicadores. 69 Composição de espécies do estrato arbóreo: A composição de espécies pode ser um bom indicador de naturalidade; por exemplo, Liira et al. (2007) associou a presença de determinadas espécies com a presença de ações hemeróbicas na floresta. Do ponto de vista ecológico, cada espécie representa uma função para a comunidade (por exemplo, Almeida-neto et al. [2008]; Munguía-Rosas et al. [2014]). Um método de avaliar este componente é pelo grupo ecológico, ou tolerância à intensidade de radiação solar (por exemplo, Imai et al. [2014]; Silva et al. [2003]). Porém, a falta de informações quantitativas de referência para florestas conservadas, como, por exemplo, a proporção de espécies pioneiras e tolerantes à sombra, torna este indicador limitado para nossa aplicação. Outro fator limitante é a inconsistência das informações sobre a classificação das espécies em grupos ecológicos, visto que esta classificação varia entre autores (por exemplo, Reitz [1965]; Reitz et al. [1979]; Swaine e Withmore [1988]; Sevegnani [não publicado]). Diagnóstico final: - critério A: satisfeito - critério B: satisfeito - critério C: não satisfeito Diversidade e riqueza de espécies do estrato arbóreo: Trataremos desses dois indicadores de forma conjunta, porque são intimamente relacionados. Devido ao fato de que comparar a riqueza de espécies observada, ou seja, somente a contagem das espécies encontradas em uma comunidade, pode gerar resultados ilusórios (COLWELL et al., 2012; GOTELLI e COLWELL, 2001), geramos uma curva de acumulação de espécies extrapolada baseada em amostras para cada Unidade Amostral, utilizando o modelo-produto de Bernoulli (COLWELL et al., 2012), considerando as subparcelas (10 x 10 m) como amostras. Adotamos o método de extrapolação para contornar o fato de que algumas Unidades Amostrais apresentaram um número baixo de árvores, o que reduz demasiadamente o número comum de indivíduos no qual será extraída a riqueza estimada, para fins de padronização de diferentes intensidades amostrais (COLWELL et al., 2004; GOTELLI e COLWELL, 2001, 2011). 70 ~ A riqueza estimada na amostra extrapolada, denotada como S amostra(T t*) onde T é a amostra de referência (ou original) e t* é a porção extrapolada da amostra original (t* > 0), é obtida pelo algoritmo: t * Q1 ~ S amostra(T t*) S obs Qˆ 0 1 exp ˆ Q Q 0 1 onde, Q1 é o número de espécies dectectadas em somente uma amostra (unique) e Q̂0 é o número de espécies que não foram dectectadas na amostra T. Para Q2 (número de espécies dectectadas em somente duas amostras - duplicates) > 0, Qˆ 0 T 1 T Q1 ² 1 2Q2 . Para Q2 = 0, Qˆ 0 T 1 T Q1 Q1 1 2Q2 1 . Adotamos um fator de extrapolação de dois, ou seja, o dobro da amostra de referência (t*=T), segundo as recomendações de Chao et al. (2014). O número mínimo de indivíduos encontrado foi de 58 (UA 301), logo, tornou-se o número comum da extração dos valores de riqueza para as Unidades Amostrais. Nessa perspectiva, correlacionamos a riqueza com a diversidade de espécies obtida pelos índices de Simpson (1-D), calculado através do algoritmo não enviesado proposto por Lande (1996), e o índice de Shannon (H’, MAGURRAM, 2004) para as 145 Unidades Amostrais. O primeiro índice dá menor peso à riqueza de espécies e maior peso às espécies dominantes e o segundo dá maior peso à riqueza e dá maior peso para as espécies comuns (BUCKLAND et al., 2005; CHAO et al., 2014). Encontramos uma correlação alta e significativa entre a riqueza e 1-D (r de Spearman=-0,87; p <0,001) e H‟ (r de Pearson=-0,94; p <0,001); ambas as significâncias foram obtidas pelo teste de Dutilleul (1993). Estas relações estão apresentadas na Figura 1.12. A riqueza estimada para um número comum de indivíduos amostrados, se analisada em outra pespectiva, pode ser considerada uma métrica de diversidade, pois, para dado número de indivíduos amostrados obtem-se um número n de espécies; Imai et al. (2014) adotaram essa ideia para determinar a diversidade de comunidades florestais. Esse fato é mais um que explica a alta correlação entre diversidade e riqueza. 71 3.50 Índice de Shannon (H') 1.00 y = -0.0009x2 + 0.0497x + 0.2862 p < 0.05 r = 0.60 p < 0.001 0.90 0.80 y = 0.0954x + 0.9009 p < 0.05 R² = 0.87 r = 0.78 p < 0.001 3.00 0.70 2.50 0.60 2.00 0.50 H' 1.50 Índice de Simpson (1-D) 4.00 0.40 1-D 1.00 0.0 5.0 10.0 15.0 20.0 25.0 30.0 0.30 35.0 Riqueza de espécies Figura 1.12. Relação entre os índices de diverside H‟ e 1-D com a riqueza de espécies, calculados para as 145 Unidades Amostrais do IFFSC na Floresta Mista com Araucária. A utilização da diversidade de espécies como um indicador traz à tona um questionamento fundamental. Há um conflito entre naturalidade e diversidade que necessita ser esclarecido. Tal conflito está relacionado a aspectos inerentes às comunidades florestais que contêm uma espécie (ou mais de uma) que possuem alta abundância relativa. Ao se aplicar um índice de diversidade tal como o 1-D ou o H’ para uma comunidade florestal dominada por uma ou poucas espécies, se obteria um valor baixo para dado índice. Entretanto, comunidades dominadas por poucas espécies podem ser resultado de processos naturais de dispersão e ocupação (HUBBELL, 2001), de adaptações que essas espécies possuem (PITMAN et al., 2001), de fatores ambientais (BAUERMANN e BEHLING, 2009; KLEIN, 1984), da sucessão ecológica (CHAZDON, 2009; KLEIN, 1960; VOLKOV et al., 2007) e da competição interespecífica e por recursos (GOTELLI, 1999; McGILL et al., 2007). Considerando tais comunidades, seria errôneo afirmar que por apresentarem baixa diversidade são menos naturais que comunidades que apresentam valores altos em um índice de diversidade. Na Floresta Mista com Araucária, esse fato mostra-se presente nas diversas formações descritas por Klein (1978). Klein (1960, 1966, 1978) descreve suas observações referentes aos densos agrupamentos de A. angustifolia e Dicksonia sellowiana (GASPER et al., 2011; 72 MANTOVANI, 2004), e de espécies do gênero Ocotea, como O. porosa e O. pulchella (KLEIN, 1966, 1978). Este conflito entre naturalidade e diversidade foi observado nos dados coletados pelo IFFSC. Para investigar essa hipótese, aplicamos dois procedimentos: i) calculamos a abundância relativa (AR%) e a área basal relativa (AB%) das espécies A. angustifolia, D. sellowiana, O. pulchella e O. porosa das 145 Unidade Amostrais; ii) correlacionamos a soma da abundância e a área basal relativa (das quatro espécies) com os valores obtidos para os índices de diversidade (1-D e H’). A correlação entre AR% das quatro espécies e H’ foi de -0,74 (r de Pearson, p < 0,001), e para AB% foi de -0,74 (r de Pearson, p < 0,001). A correlação entre AR% das quatro espécies e 1-D foi de -0,56 (r de Spearman, p < 0,001), e para AB% foi de -0,56 (r de Spearman, p < 0,001). Como densos agrupamentos das espécies citadas, principalmente de D. sellowiana, podem estar relacionados a remanescentes conservados, descartamos a possibilidade da utilização desses indicadores, corroborando as observações de Imai et al. (2014), os quais consideraram que riqueza e diversidade não são bons indicadores do estado de conservação de florestas mistas de dipterocarpáceas na Ásia. Diagnóstico final: - critério A: parcialmente satisfeito - critério B: parcialmente satisfeito - critério C: satisfeito 73 100.0 100.0 y = -30.05x + 107.23 p < 0.01 R² = 0.52 r = - 0.74 p < 0.01 90.0 Área basal Relativa (%) 80.0 80.0 70.0 70.0 60.0 60.0 50.0 50.0 40.0 40.0 30.0 30.0 20.0 20.0 10.0 A 0.0 0.50 10.0 1.00 1.50 2.00 2.50 3.00 3.50 4.00 90.0 y = -166.17x2 + 96.78x + 70.52 p < 0.01 R² = 0.55 r = -0.56 p < 0.001 0.0 0.30 0.40 0.50 0.60 0.70 0.80 0.90 1.00 0.80 0.90 1.00 90.0 y = -26.25x + 91.69 p < 0.01 R² = 0.54 r = - 0.74 p < 0.01 80.0 Abundância Relativa (%) 90.0 70.0 80.0 70.0 60.0 60.0 50.0 50.0 40.0 40.0 30.0 30.0 20.0 20.0 10.0 10.0 B 0.0 0.50 1.00 1.50 2.00 2.50 3.00 3.50 Índice de Shannon (H') 4.00 y = -80.81x2 - 23.00x + 103.73 p < 0.01 R² = 0.63 r = -0.56 p < 0.001 0.0 0.30 0.40 0.50 0.60 0.70 Índice de Simpson (1-D) Figura 1.13. Correlação negativa entre a soma da área basal relativa (A), e soma da abundância relativa (B), de Araucaria angustifolia, Dicksonia sellowiana, Ocotea porosa e Ocotea pulchella com os índices de diversidade Simpson e Shannon. Estrutura de população de A. angustifolia: Esse indicador mostra-se, teoricamente, muito interessante, entretanto, ao analisarmos os dados do IFFSC, verificamos que sua aplicabilidade é limitada neste estudo. Das 145 Unidades Amostrais consideradas, 94 apresentaram indivíduos de A. angustifolia e 47,9% apresentaram uma abundância maior que 10 indivíduos por Unidade Amostral. Julgamos que 10 indivíduos (na melhor hipótese) não são suficientes para a análise da estrutura da população, de forma que Wright et al. (2003) e Souza (2009) sugerem que ao menos 25 indivíduos sejam considerados. Diante desses fatos, ficamos limitados para fazer inferências 74 sobre a estrutura de população da espécie para os remanescentes amostrados; por estas razões, este indicador foi desconsiderado. Diagnóstico final: - critério A: parcialmente satisfeito - critério B: não satisfeito - critério C: satisfeito Estrutura vertical (estratos): A estrutura vertical expressa uma dimensão da diversidade estrutural de uma comunidade florestal, logo, torna-se um indicador importante (BUONGIORNO et al. 1994; McROBERTS et al., 2008; POMMERENING, 2002; LÄHDE et al., 1999, VARGA e KLINKA, 2001). O primeiro obstáculo no uso deste indicador está no fato de que a altura total (ht) das árvores amostradas pelo IFFSC foi estimada pelas equipes de campo, mediante medições prévias com hipsômetro como referência. Não obstante esse fato, as médias de ht estimadas mostraram-se estatisticamente equivalente às médias de ht medidas com hipsômetro (para construção de modelos hipsométricos) pelo teste z (VIBRANS et al., no prelo). O primeiro obstáculo pode ser considerado negligivel, porém, a dificuldade em adotar este estimador está em como manipulá-lo numericamente, devido à falta de dados de florestas de referência. Por ser frequentemente levantado por IFNs (CHIRICI et al., 2011), utilizamos a Estrutura vertical como um critério na escolha das florestas de referência, adotando a proposta de McRoberts et al. (2012). Estabelecemos três estratos de altura para cada Unidade Amostral, seguindo os seguintes passos: i) calculamos a altura média de 5% dos indivíduos mais altos e dividimos o valor obtido em terços; ii) cada indivíduo da Unidade Amostral é atribuído a um dos três estratos. Segundo a proposta de McRoberts et al. (2012), as Unidades Amostrais que representam as florestas mais naturais apresentam os três estratos, e consequentemente, indivíduos nos três estratos. No tópico 1.3.4.7 (Determinação e escolha das florestas de referência) consta a aplicação deste indicador. Diagnóstico final: - critério A: satisfeito - critério B: satisfeito - critério C: satisfeito 75 Estrutura diamétrica: Devido às várias formas de como abordar esse indicador (Estrutura diamétrica), subdividimos-o em quatro indicadores, os quais serão tratados de forma independente: a) Assimetria da distribuição de diâmetros Nossas investigações acerca deste indicador mostraram resultados interessantes. Calculamos o gdap para seis Unidades Amostrais com número de indivíduos amostrados variando de 296 a 308, e seis variando de 177 a 189 indivíduos amostrados. Chegamos à conclusão de que não é possível utilizá-lo tal como McRorterts et al. (2012), os quais relacionaram florestas mais naturais com maiores valores positivos de gdap. Percebemos que os maiores valores de gdap nem sempre significam distribuições que reportam florestas (tropicais ou subtropicais) mais conservadas, as quais tendem a apresentar uma distribuição exponencial negativa. Mesmo em valores mais elevados de gdap notamos descontinuidades na função exponencial negativa (por exemplo, Figura 1.14: UA 843 e UA 1056 e Figura 1.15: UA 551), o que significa que alguma perturbação está sendo aplicada à comunidade florestal, ou esta se encontra em estágios de sucessão marcados por espécies heliófitas, as quais são caracterizadas por conter menos indivíduos nas classes menores de DAP (FINGEGAN, 1996). A comunidade também pode estar em processo de substituição de espécies heliófitas para espécies tolerantes à sombra (CHAZDON, 2008), como observado por Klein (1980, 1984) para a Floresta Latifoliada Pluvial de Santa Catarina. Comparamos, para exemplicar nossos apontamentos, a Unidade Amostral 843 e a 7002 (Figura 1.14); notamos que a 7002 apresenta uma característica esperada em uma floresta subtropical mais natural, embora, possua menor valor de gdap que a 843. Diagnóstico final: - critério A: parcialmente satisfeito - critério B: parcialmente satisfeito - critério C: satisfeito 76 UA 843; g = 2,83 150 100 0 30 40 50 60 70 80 10 40 50 60 UA 5000; g = 1,59 UA 732; g = 1,39 40 50 60 70 80 70 80 70 80 60 N° indivíduos 60 30 70 100 DAP (cm) 0 20 20 30 80 10 20 30 40 50 60 DAP (cm) DAP (cm) UA 1056; g = 2,80 UA 456; g = 1,50 10 20 30 40 50 DAP (cm) 60 70 80 100 60 0 20 N° indivíduos 100 50 0 N° indivíduos 150 10 20 DAP (cm) 0 20 20 100 10 N° indivíduos 50 N° indivíduos 100 50 0 N° indivíduos 150 UA 7002; g = 2,18 10 20 30 40 50 60 DAP (cm) Figura 1.14. Distribuições de diâmetros de seis Unidades Amostrais da Floresta Mista com Araucária, com número de indivíduos amostrados variando de 296 a 308. Onde, g é o coeficiente de assimetria da distribuição, significantemente diferente (p<0,01) da distribuição normal pelo teste de D‟Agostino. 77 N° indivíduos 20 40 60 0 0 N° indivíduos 20 40 60 80 UA 894; g = 1,64 80 UA 673; g = 0,84 10 20 30 40 50 DAP (cm) 60 70 80 10 20 40 50 DAP (cm) 60 70 80 70 80 70 80 N° indivíduos 20 40 60 0 0 N° indivíduos 20 40 60 80 UA 856; g = 1,45 80 UA 3002; g = 1,29 30 10 20 30 40 50 DAP (cm) 60 70 80 10 20 40 50 DAP (cm) 60 N° indivíduos 20 40 60 0 0 N° indivíduos 20 40 60 80 UA 87; g = 0,91 80 UA 551; g = 2,12 30 10 20 30 40 50 DAP (cm) 60 70 80 10 20 30 40 50 DAP (cm) 60 Figura 1.15. Distribuições de diâmetros de seis Unidades Amostrais da Floresta Mista com Araucária, com número de indivíduos amostrados variando de 177 a 189. Onde, g é o coeficiente de assimetria da distribuição, significantemente diferente (p<0,01) da distribuição normal pelo teste de D‟Agostino. 78 b) Ajuste à função exponencial negativa A partir das constatações não favoráveis sobre o gdap, propomos avaliar o ajuste da distribuição de diâmetros observada e a estimada pela função exponencial negativa (ZAR, 2010), através do modelo de Meyer (SCHNEIDER, 1993). A modelo é expresso por: N i 0 .e 1.x i onde Ni é a frequência observada para a i-ésima classe de diâmetro, xi é o centro da i-ésima classe de diâmetro (cm) e ε é o resíduo aleatório com média 0. Para o ajuste do modelo pelo método de mínimos quadrados, aplicamos a transformação logarítmica (ln) na variável resposta e na preditora, logo, o modelo foi reformulado (ou linearizado) para: ln( Ni ) ln( 0 ) 1.xi onde n são os parâmetros a serem estimados. Voltando à escala original, temos: ˆ Nˆ i exp ˆ 0 ˆ1.x i res 2 onde N̂ i é número de indivíduos estimado para a i-ésima classe de diâmetro, ̂ res é o erro ˆ padrão residual calculado na escala ln-ln, e o termo res compensa o viés da transformação 2 ln-ln para a escala original (BASKERVILLE, 1972). Para avaliar o ajuste do modelo às distribuições observadas (Figura, 1.16) calculamos a raiz do erro padrão residual (RMSE) na escala original, que é calculado por: RMSE 1 n ˆ (Yi Yi ) 2 n i 1 onde Yˆi é o valor predito, Yi é o valor observado e n é o número de observações (ou de classes de DAP). Diagnóstico final: - critério A: satisfeito - critério B: satisfeito - critério C: satisfeito 79 UA 673; RMSE = 13,78 60 UA 87; RMSE = 4,78 80 70 50 60 Frequência 40 50 30 40 30 20 20 10 10 0 0 12.5 17.5 22.5 27.5 32.5 37.5 42.5 47.5 52.5 12.5 17.5 22.5 27.5 32.5 37.5 42.5 47.5 52.5 57.5 140 UA 894; RMSE = 13,39 100 UA 856; RMSE = 23,07 90 120 80 Frequência 100 70 60 80 50 60 40 30 40 20 20 10 0 0 12.5 70 17.5 22.5 27.5 32.5 UA 3002; RMSE = 3,07 60 120 UA 69; RMSE = 18,78 100 50 Frequência 12.5 17.5 22.5 27.5 32.5 37.5 42.5 47.5 52.5 37.5 80 40 60 30 40 20 20 10 0 0 12.5 17.5 22.5 27.5 32.5 37.5 42.5 47.5 52.5 57.5 12.5 17.5 22.5 27.5 32.5 37.5 42.5 47.5 52.5 57.5 62.5 Centro da classe de DAP (cm) Centro da classe de DAP (cm) Figura 1.16. Distribuições de árvores em classes de DAP (cm) observada e a predita pelo modelo de Meyer. Os valores de RMSE representam o ajuste do modelo aos dados observados. 80 c) Desvio padrão dos diâmetros (Sdap) O ajuste à função exponencial negativa por si só não é capaz de estimar toda a naturalidade do componente estrutural relacionado à diversidade estrutural (neste caso a estrutra horizontal - distribuição de diâmetros das árvores). O Desvio padrão dos diâmetros (Sdap) leva em conta outra dimensão da diversidade estrutural, ou seja, da variabilidade de tamanhos das árvores (estreita relação com a biodiversidade - Buongiorno et al. [1994]; COST [2006]; McRoberts et al. [2008]; Michel e Winer [2009]; Uotila et al. [2002]). O Sdap é calculado por: _____ n S dap ( DAPi DAP )² i 1 n 1 _____ onde, DAPi é o diâmetro à altura do peito da i-ésima árvore, DAP é a média da Unidade Amostral e n é o número de árvores medidas na Unidade Amostral. A Unidade Amostral 894 (Figura 1.16) apresenta uma situação interessante para exemplificar o argumento recém lançado: possui um baixo valor para o RMSE, embora apresente um valor baixo para o Sdap (4,86), indicando baixa variabilidade de DAP das árvores e, consequentemente, menor diversidade estrutural, obviamente, quando comparada com outras Unidades Amostrais. Ao calcularmos o Sdap para as 145 Unidades Amostrais, observamos uma relação deste com o DAP médio das mesmas (Figura 1.17), com correlação de Pearson forte e altamente significativa (r=0,81; p<0,001 - obtido do teste t de Dutilleul [1993]), semelhante ao encontrado por McRoberts et al. (2008). Empiricamente, sabemos que pode existir uma tendência de florestas mais conservadas, com árvores mais velhas, apresentarem DAP médio maior do que florestas menos conservadas. Sendo assim, existem evidências significativas de que o Sdap possa expressar esta outra dimensão da naturalidade. Diagnóstico final: - critério A: satisfeito - critério B: satisfeito - critério C: satisfeito 81 25.0 Sdap das Unidades Amostrais y = 0.745x - 5.5027 r = 0.81 p <0.001 20.0 15.0 10.0 5.0 0.0 10.0 15.0 20.0 25.0 30.0 35.0 DAP médio (cm) das Unidades Amostrais Figura 1.17. Desvio padrão do DAP (Sdap) vs. dap médio para as 145 Unidades Amostrais consideradas. Crrelação de Pearson entre as variáveis: r=0,81 com p<0,001. d) Número de árvores grossas Propomos ainda, avaliar outra dimensão da estrutura horizontal, através da quantificação de indivíduos mais “grossos” que a média. Para isso, transformamos o DAP de cada árvore em um escore padronizado (ZAR, 2010), o qual é calculado por: ____ ( DAPi DAP ) zi S dap onde, zi é o escore padronizado para a i-ésima árvore, DAPi é o diâmetro à altura do peito da i_____ ésima árvore, DAP é diâmetro à altura do peito médio da Unidade amostral, e Sdap é o desvio padrão do diâmetro à altura do peito da Unidade amostral. Definimos uma árvore grossa como um indivíduo que possui DAP igual ou superior a três desvios-padrões da média da Unidade Amostral, ou seja, zi ≥ 3,0. Suspeitávamos que o número de árvores grossas e o Sdap por Unidade Amostral apresentassem uma correlação forte e positiva (Figura 1.18), entretanto, a correlação entre esses dois indicadores mostrou-se negativa (correlação de Pearson, r=-0,25, p=0,002 - obtido do teste t de Dutilleul [1993]). Tal fato aponta que esses indicadores estão relacionados com dimensões diferentes da naturalidade. 82 Diagnóstico final: - critério A: satisfeito - critério B: satisfeito - critério C: satisfeito 25 Sdap (cm) por Unidade Amostral y = -0.1627x + 11.774 p = 0.002 20 15 10 5 0 0 5 10 15 20 N° de arvores grossas por Unidade Amostral 25 30 Figura 1.18. Relação entre Sdap e número de árvores grossas para as 145 Unidades Amostrais consideradas. Correlação de Pearson entre as variáveis: r=-0,25 (p=0,002). Métricas de paisagem: Apesar de que métricas de paisagem não são variáveis coletadas por equipes de campo de IFNs, já mencionamos a importância deste atributo para as funções ecossistêmicas. Temos acesso às métricas de paisagem dos remanescentes de Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina amostrados pelo IFFSC, calculados por Schaadt (2012), a saber, área do remanescente (ha), área núcleo do remanescente (ha) (LANG e BLASCHKE, 2009) e razão perímetro-área, dentre outras ligadas à forma e remanescentes vizinhos. Essas métricas foram obtidas dentro de um buffer com raio de 2.800 m. Com base na literatura já citada, consideraremos que quanto maior a área do remanescente e a área núcleo, e menor a razão perímetro-área mais natural é o remanescente. A razão perímetro-área funciona como um medidor de borda, ou seja, quanto menor o valor deste atributo, menor a área de borda. Construímos uma matriz contendo as Unidades Amostrais e suas respectivas métricas e, visando sintetizar as três métricas em um componente, aplicamos uma Análise de Componentes Principais baseada em transformação (tb-PCA). Aplicamos a transformação 83 Box-Cox nos dados (OSBORNE, 2010), a fim de maximizar a relação linear entre as variáveis. Testamos a significância dos eixos da tb-PCA por meio de 999 permutações de Monte Carlo, sendo que o primeiro eixo se mostrou altamente significativo (p=0,001). O processo de sintetização das três variáveis mostrou-se eficiente; o eixo 1 explicou grande parte da variação dos dados (88,84%, Tabela 1.6), logo, temos uma componente confiável. O indicador de naturalidade relacionado às métricas de paisagem é o escore extraído do eixo 1 para cada Unidade Amostral. Para exemplificar, consideramos as Unidades Amostrais 1013 e 336, as quais estão posicionadas nos extremos do diagrama de ordenação da tb-PCA (Figura 1.19). Vemos que a 1013 possui maior área que a 336, em contrapartida, a 336 possui maior valor para a razão perímetro-área (Figura 1.20); os escores destas são 1,84 e -5.31, respectivamente. Observando a Tabela 1.7 e o diagrama de ordenação, vemos que as variáveis área do remanescente (ha) e área núcleo do remanescente (ha) possuem peso positivo e a razão perímetro-área peso negativo no componente criada (eixo 1). Logo, quanto menor o escore da Unidade amostral menor sua área e maior a razão perímetro-área. Diagnóstico final: - critério A: satisfeito - critério B: satisfeito - critério C: satisfeito Tabela 1.6. Autovalores e variância explicada (%) de cada eixo da tb-PCA.*valor-p significativo (α=0,05) após 999 permutações de Monte Carlo. Eixo Autovalor 1 2 3 2,66 0,25 0,08 Variância explicada (%) 88,84 8,50 2,65 p 0,001* 1,000 1,000 Tabela 1.7. Autovetores correspondentes a cada variável, somente para o eixo 1 da tb-PCA. Variável Área do remanescente (ha) Área núcleo do remanescente (ha) Razão perímetro-área Autovetor 0,574 0,596 -0,562 84 Figura 1.19. Análise de componentes principais (tb-PCA) das métricas de paisagem, visando a sintetização das mesmas em um único componente (eixo 1 da tb-PCA). RPA = razão perímetro-área. A B Figura 1.20. Remanescentes correspondentes às Unidades Amostrais 1013 (A) e a 336 (B) com escores de 1,85 e -5,32 no eixo 1 da tb-PCA. Representação das métricas de paisagem adotadas. Necromassa: O IFFSC levantou a necromassa por meio de dois transectos de 10 m de comprimento, localizados no ponto central do conglomerado e dispostos em forma de cruz. Foi medido o material com diâmetro maior que 1 cm (CARDOSO et al., 2012; VIBRANS et al., 2010). Com o intuito de avaliar este indicador, observamos a variável peso (Mg.ha-1) de necromassa levantada pelo IFFSC. As demais variáveis (volume [m³.ha-1], carbono [Mg.ha-1] e nível de decomposição [três classes: material novo; decomposição inicial; decomposição 85 avançada]) não foram avaliadas pois, por serem derivadas do volume (equações em Cardoso et al. [2012]), mostraram alta correlação com este (r de Spearman, p<0,05). Ao correlacionarmos (r de Spearman, α=0,05) a variável peso de necromassa por Unidade Amostral (dados representados na Figura 1.21) com suas respectivas variáveis estruturais do estrato arbóreo, a saber, densidade (n.ha-1), área basal (m².ha-1), DAP médio (cm) e Riqueza de espécies, observamos que esta possui correlação nula com as mesmas, exceto com a última variável, que apesar de ser fraca, mostrou-se significativa (Tabela 1.8). Esses resultados nos mostram evidências da estocasticidade dos pesos de necromassa nos remanescentes avaliados. Tabela 1.8. Correlação de Spearman entre o peso de necromassa (Mg.ha-1) observado por Unidade Amostral e variáveis estruturais. *correlação significativa, adotando α=0,05. Densidade Área basal DAP médio (n.ha-1) (m².ha-1) (cm) -0,01 0,05 -0,01 0,25* 0 20 N° de Unidades Amostrais 80 60 40 100 120 Necromassa (Mg.ha-1) Riqueza de espécies 0 100 200 300 400 Peso (Mg/ha) 500 600 700 Figura 1.21. Histograma dos pesos (Mg.ha-1) de necromassa (diâmetro > 1 cm) obtidos nas Unidades Amostrais levantadas pelo IFFSC na Floresta Mista com Araucária. 86 Apesar da importância ecológica da necromassa e da relação desta com a naturalidade (CHIRICI et al., 2011; LAARMANN et al., 2009; WINTER et al., 2010), McRoberts et al. (2012), observaram que os critérios adotados em relação à quantidade ou forma de necromassa (por exemplo, troncos caídos, galhos, etc.) diferem entre estudos, tornando obscuros os valores de referência. Ainda, de acordo com von Oheimb et al. (2007), a produção de necromassa é influenciada por questões climáticas e de sítio. No Brasil, levantamentos de necromassa ainda são raros e pouco explorados. Consequentemente, são escassos os estudos que determinaram quantidades de necromassa em florestas mais conservadas e não conservadas do Brasil. Os resultados obtidos, descritos anteriormente, não nos fornecem embasamento para inferir sobre quais fatores predizem a produção de necromassa, ou se esta tem ligação direta com a naturalidade dos remanescentes avaliados. Embora o IFFSC tenha sido o primeiro a conduzir este levantamento no IFN do Brasil, Cardoso et al. (2012) afirmam que a metodologia utilizada pelo IFFSC ainda precisa ser aprimorada. Descartamos, também, a possibilidade levantada anteriormente de utilizar este indicador na forma de presença e ausência. Diagnóstico final: - critério A: parcialmente satisfeito - critério B: não satisfeito - critério C: satisfeito Regeneração natural: Propomos avaliar a regeneração natural dos remanescentes (Unidades Amostrais) através de sua diversidade (sensu Hurlbert [1971]), já que a riqueza de espécies é correlacionada com a diversidade. Consideramos os mesmos índices de diversidade avaliados anteriormente, 1-D e H‟. Constatamos uma resposta interessante do H‟ aplicado à regeneração natural. Em comparação ao 1-D, o H‟ respondeu de forma mais eficiente à variação da riqueza de espécies, conforme apresentamos na Figura 1.22. Nesta mesma figura, nota-se o caráter do 1D, o qual dá mais peso à uniformidade das abundâncias das espécies dominantes (CHAO et al., 2014). Esse comportamento apresentado pelo H‟ nos assegura que ambas as dimensões da diversidade serão bem relatadas. Sendo a regeneração natural um componente fundamental e bastante afetado na Floresta Mista com Araucária, principalmente pelo pastoreio do gado, consideramos este um indicador de naturalidade escencial. 87 Como certas Unidades Amostrais (UA456, UA673, UA723, UA845, UA887, UA939, UA946 e UA4000) não apresentaram regeneração natural, atribuiremos a estas valor zero para este indicador. Diagnóstico final: - critério A: satisfeito - critério B: satisfeito - critério C: satisfeito 4.00 y = 0.8963ln(x) - 0.1045 R² = 0.8987 p < 0.05 3.50 Índice de Shannon 3.00 2.50 2.00 1.50 1.00 0.50 A 0.00 0 10 20 30 40 50 1.00 0.90 Índice de Simpson (1-D) 0.80 y = 0.1713ln(x) + 0.4105 R² = 0.542 p < 0.05 0.70 0.60 0.50 0.40 0.30 0.20 0.10 B 0.00 0 10 20 30 40 50 Riqueza de espécies Figura 1.22. Compotamento dos índices de Shannon (A) e Simpson (B) em relação à riqueza de espécies da regeneração da Floresta Mista com Araucária amostrada pelo IFFSC. 88 Presença e ausência de distúrbios antrópicos: Chirici et al. (2011) e McRoberts et al. (2012) fazem um apontamento interessante. Eles afirmam que variáveis ligadas à hemerobia podem ser indicadoras de florestas manejadas/alteradas, porém, podem não ser indicadoras de florestas mais naturais. Como já apresentamos nossas reflexões sobre as influências antrópicas nas florestas de Santa Catarina (sintetizadas no Axioma 1, presente no tópico 1.3.3 deste capítulo), consideramos que perturbações antrópicas podem ser incluídas no processo de acesso à naturalidade. Propomos um Índice Quantitativo de Hemerobia, tratado daqui em diante como IQH, baseado na avaliação de variáveis qualitativas (ausência e presença) ligadas à hemerobia levantadas pelo IFFSC em nível de Unidade Amostral (VIBRANS et al., 2009). Em campo, as variáveis foram avaliadas de acordo com sua ausência e presença dentro dos limites da Unidade Amostral. Iniciando a explanação do índice, consideramos, de forma arbitrária, baseados em considerações já feitas sobre as principais ações perturbadoras/degradadoras aplicadas à Floresta Mista com Araucária, pesos que vão de um a cinco para cada perturbação (Tabela 1.9). Apesar da exploração da erva-mate ser uma atividade cultural e econômica, e que incentiva proprietários rurais a manter a floresta nativa em pé, consideramos que as atividades ligadas à exploração, como priorização da espécie (I. paraguariensis) no subbosque, as roçadas, aberturas de estradas para acessar os remanescentes, dentre outras ações, podem prejudicar processos ecossistêmicos importantes. Tabela 1.9. Variáveis ligadas à hemerobia coletadas em campo pelo IFFSC e seus respectivos pesos arbitrários. Perturbação Roçada de sub-bosque Corte seletivo Corte raso Exploração de erva-mate Pastejo Caça Espécie exótica Estradas Sinais de fogo Ausência ou presença 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 0 ou 1 Peso 5 5 5 3 5 2 4 2 3 Quando todas as perturbações mostram-se presentes, temos uma hemerobia máxima (algoritimo i), e quando todas as perturbações mostraram-se ausentes, temos uma hemerobia mínima (algoritmo ii) (Figura 1.23). 89 Matematicamente, podemos expressar isto como: np H máx vp pres 34 (i) p 1 np H mín vpaus 0 (ii) p 1 onde Hmáx é o valor assumido pela hemerobia máxima, Hmín é o valor assumido pela hemerobia mínima, p é a perturbação, np é o número total de perturbações, vppres é o valor obtido pela presença de todas as perturbações multiplicadas pelo seus respectivos pesos e vpaus é o valor obtido pela ausência de todas as perturbações multiplicadas pelo seus respectivos pesos. Para chegar no IQH escalado para o intervalo [0,1], aonde 0 represanta uma hemerobia máxima (algoritmo iii) e 1 uma hemerobia mínima (algoritmo iv), temos: H IQH máx 1 máx 0 H máx (iii) H IQH mín 1 mín 1 H máx (iv) Índice Quantitativo de Hemerobia 0 Alta hemerobia 1 Baixa hemerobia Figura 1.23. Representação do Índice de quantitativo de hemerobia (IQH) baseado em variáveis qualitativas levantadas em campo pelo IFFSC. Na Tabela 1.10 apresentamos o caso de uma Unidade Amostral hipotética, com seus respectivos valores para presença ou ausência de perturbações, onde o IQH apresenta valor mínimo (0). Na Tabela 1.11 apresentamos outro caso hipotético, onde a Unidade Amostral possui um valor de IQH intermediário. 90 Tabela 1.10. Representação do valor mínimo obtido para o Índice Quantitativo de Hemerobia. Onde: P é o resultado da multiplicação do peso atribuído à perturbação por sua ausência ou presença (0 ou 1); IQH* é o Índice Quantitativo de Hemerobia escalado para o intervalo [0,1]. Perturbação Ausência ou presença 1 1 1 1 1 1 1 1 1 IQH* Peso Roçada de sub-bosque Corte seletivo Corte raso Exploração de erva-mate Pastejo Caça Espécie exótica Estradas Sinais de fogo ∑ 5 5 5 3 5 2 4 2 3 - P 5 5 5 3 5 2 4 2 3 34 0,0 Tabela 1.11. Situação hipotética para representação do Índice Quantitativo de Hemerobia. Onde: P é o resultado da multiplicação do peso atribuído à perturbação por sua ausência ou presença (0 ou 1); IQH* é o Índice Quantitativo de Hemerobia escalado para o intervalo [0,1]. Perturbação Roçada de sub-bosque Corte seletivo Corte raso Exploração de erva-mate Pastejo Caça Espécie exótica Estradas Sinais de fogo ∑ Peso 5 5 5 3 5 2 4 2 3 34 Ausência ou presença 0 1 1 0 0 0 1 0 1 IQH* P 0 5 5 0 0 0 4 0 3 17 0,48 1.3.4.5 Considerações finais acerca dos indicadores de naturalidade Na Tabela 1.12 trazemos um resumo sobre os indicadores aceitos e não aceitos; dos 13 indicadores considerados após a primeira triagem, seis foram aceitos. Como os indicadores lidam com diferentes dimensões da naturalidade, McRoberts et al. (2012) sugerem que a 91 independência dos mesmos deve ser assegurada, para que, quando combinados em um estimador único, este venha gerar resultadados robustos. Calculamos a correlação entre os indicadores (Tabela 1.13), com significância avaliada pelo teste t corrigido proposto por Dutilleul (1993). As correlações entre os indicadores mostraram-se fracas, com valores que variaram de -0,35 até 0,24. Esse resultado nos mostra evidências de que os indicadores são independentes e retratam diferentes dimensões da naturalidade. Em futuras referências os indicadores aceitos serão tratados pela sua abreviação (Tabela 1.12). Tabela 1.12. Resumo final dos indicadores de naturalidade descartados e adotados; *adotado somente na triagem das florestas de referência. Indicador de naturalidade Ajuste à função exponencial negativa Assimetria da distribuição de diâmetros Composição de espécies Desvio-padrão dos diâmetros Estrutura de população A. angustifolia Estrutura vertical Diversidade do estrato arbóreo Método Diagnóstico final Abreviação Modelo de Meyer Aceito J-invertido gdap Não aceito - Grupo ecológico Não aceito - Sdap Aceito Sdap gdap Não aceito - Estratificação Aceito* Estrutura vertical H‟ e 1-D Não aceito - Métricas de paisagem Escores tb-PCA Aceito Métricas de paisagem Necromassa Peso (Mg) Não aceito - Árvores grossas Escore-z (dap) Aceito Árvores grossas IQH Aceito IQH Índice de Shannon Aceito H‟ reg. natural Rarefação Extrapolação Não aceito - Pres./aus. de distúrbios antrópicos Regeneração natural Riqueza de espécies do estrato arbóreo 92 Tabela 1.13. Correlação de Spearman entre os indicadores de naturalidade. Valor da correlação na diagonal inferior e significância corrigida pelo teste t de Dutilleul (1993) na diagonal superior, com α=0,05. *correlação significativa; **correlação altamente significativa; ns = correlação não significativa. IQH H‟ reg. natural 0.01 0.77 0.9 0.14 0.14 0.06 0.32 0.07ns 1 0.93 0.09 0.21 0.20** 0.07ns -0.04ns 1 0.02 0.16 IQH -0.02ns -0.17ns -0.12ns -0.13* 1 0.92 H‟ reg. natural 0.01ns -0.15ns 0.24ns -0.11ns 0.05ns 1 Árvores Métricas de grossas paisagem Indicador J-invertido Sdap J-invertido 1 < 0.001 0.01 Sdap -0.35** 1 Árvores grossas Métricas de paisagem 0.24** 1.3.4.6 Quantificação da naturalidade A quantificação da naturalidade será baseada na distância conceitual entre uma dada floresta mais alterada e uma floresta mais conservada, de maior (ou “máxima”) expressão ecológica (LOIDI, 1994). Utilizaremos a distância euclidiana, conforme McRoberts et al. (2012) e Chirici et al. (2011). A medida de distância irá determinar o grau de naturalidade dos remanescentes florestais de Floresta Mista com Araucária em comparação com florestas referenciais consideradas mais naturais. A construção da medida de distância consiste nos seguintes processos: (I) transformação dos indicadores de naturalidade; (II) determinação de Florestas de referência teórica e de Florestas de referência observadas; (III) aplicação da medida de distância a todos os remanescentes amostrados pelo IFFSC. A seguir serão descritos os três processos: I) Transformação dos indicadores: os indicadores de naturalidade serão escalados para o intervalo [0,1] com o intuito de assumirem o mesmo peso, possibilitando a utilização deles em conjunto. O valor “1” ou próximo a este expressa alta naturalidade na dimensão considerada 93 (sintetizada pelo indicador). Os passos a seguir trazem o processo de escalamento dos indicadores: Serão agrupadas as Unidades Amostrais com seus respectivos valores já calculados para cada um dos seis indicadores; Será calculada a média da proporção p=0,05 dos maiores valores para dado indicador; Para cada Unidade Amostral serão geradas seis razões Rk, onde k é o indicador (k = 1, 2, ..., 6), obtidas pelo valor do indicador k divido pela média da proporção pk = 0,05 dos maiores valores obtidos. Tal procedimento pode ser expresso por Rk xi , onde xp Rk ≤ 1, xi é o valor do indicador obtido para a i-ésima Unidade Amostral e ̅ é a média dos maiores valores da proporção pk da i-ésima Unidade Amostral. II) Determinação das Florestas de referência: dois tipos de Florestas de referência serão considerados: Floresta de referência teórica: é uma referência teórica (100% natural), a qual apresenta valores máximos em todos os indicadores de naturalidade; é expressa pelo vetor de valor máximo N (1, 1, 1, 1, 1, 1); Floresta de referência observada: é uma referência real de naturalidade, a qual não apresenta (necessariamente) indicadores com valores máximos. O processo de quantificação da naturalidade deste tipo de referência consiste em: A distância euclidiana (Nref) em um espaço multidimensional será calculada, com número de dimensões definido pelo número de indicadores; considerando os indicadores eleitos, temos um espaço com seis dimensões (R6). A distância do vetor gerado pelas seis razões (Rk) até o vetor N (1, 1, 1, 1, 1, 1), será calculada pelo algoritmo: N ref ( R1 1) 2 ( R2 1) 2 ( R3 1) 2 .... ( R6 1) 2 onde Nref é a medida adimensional de naturalidade, Rk (k = 1, 2, ..., 6) é o indicador escalado para o intervalo [0,1]. A distância euclidiana (Nref) do vetor (das razões) até o vetor de valor máximo indica o grau de naturalidade das Florestas de referência observadas. Quanto menor o valor de Nref, maior a naturalidade. 94 III) Aplicação da medida de distância aos remanescentes ordinários: este procedimento consiste na aplicação da medida de distância euclidiana aos demais remanescentes. A naturalidade de cada um dos remanescentes florestais ordinários será quantificada de duas maneiras: Abordagem A: Através da distância euclidiana dos indicadores até os indicadores obtidos para a Floresta de referência teórica: N A ( R1 1) 2 ( R2 1) 2 ( R3 1) 2 .... ( R6 1)2 Abordagem B: Através da distância euclidiana dos indicadores até os indicadores obtidos para as Florestas de referência observadas: N B ( R1 Ro1 ) 2 ( R2 Ro2 ) 2 ( R3 Ro3 ) 2 .... ( R6 Ro6 ) 2 onde Rk é o indicador escalado calculado para a i-ésima Unidade Amostral e Rok (k = 1, 2, ..., 6) é o indicador escalado, obtido para a Floresta de referência observada. 1.3.4.7 Definição e escolha das florestas de referência Definimos o conceito de floresta de referência como: remanescente florestal com alta expressão ecológica localizado numa região pré-determinada, o qual apresenta características esperadas numa floresta conservada sem influências antrópicas degradadoras. Como temos poucas florestas que atendem a definição acima e, numa perspectiva mais rigorosa, não temos mais florestas completamente naturais e inafetadas por elementos perturbadores, temos que considerar os remanescentes florestais mais naturais existentes como se estivessem posicionados no extremo do gradiente de naturalidade. Em outras palavras, estas florestas serão, teoricamente, consideradas 100% naturais (mediante uma criteriosa triagem), mesmo podendo ser originárias da sucessão vegetal secundária8 (GIBBONS et al., 2008; LANDRES et al., 1998; McROBERTS et al., 2012; WINTER et al., 2010). Os esquemas das Figuras 1.24 e 1.25 exemplificam graficamente a ideia. Na Figura 1.24, na situação "A", temos uma floresta 100% natural, sem distúrbios antrópicos; na 8 sensu Chokkalingam e De Jong (2001) 95 situação "B" temos uma floresta primária ou secundária que já sofreu alguma forma de perturbação, porém, será considerada uma referência, com 100% de naturalidade. A 100% Natureza 0% Hemerobia Naturalidade 0% B Influência antrópica 100% Natureza 100% 0% Hemerobia Naturalidade 0% Influência antrópica 100% Figura 1.24. Florestas de referência considerados 100% naturais dentro do gradiente de naturalidade. Adaptado de Winter et al. (2010). Figura 1.25. Floresta de referência situada no gradiente de naturalidade. O ponto sobre a linha cinza representa uma floresta remanescente a qual se considera que seja “100% natural”. Adaptado de Machado (2004). 96 Na literatura encontramos uma abordagem comum em relação às florestas de referência – esta deve representar a floresta mais natural em relação às condições de crescimento (elementos preditores), tais como clima, solo, elevação, aspectos florísticos, dentre outros (WINTER, 2012). Em florestas tropicais e subtropicais, um dos principais fatores que atuam nas mudanças dos padrões de riqueza/composição de espécies é a heterogeneidade ambiental, cujos efeitos podem estar relacionados às características climáticas, edáficas e espaciais (BALDECK et al., 2013; EISENLOHR et al., 2013; JONES et al., 2011; OLIVEIRA-FILHO et al., 2013; PENÃ-CLAROS et al., 2012; SANCHEZ et al., 2013; THUILLER, 2013). Sabemos que o clima e o espaço influenciam na distribuição espécies em Santa Catarina (GASPER et al., 2013; REZENDE, 2013; REZENDE et al., 2014), embora, o clima do sul do Brasil, de uma maneira geral, é homogêneo (LEITE e KLEIN, 1990). Uhlmann et al. (2013) levantaram uma hipótese de que os remanescentes de Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina são (atualmente) homogêneos floristicamente e estruturamente, em resposta à exploração e degradação. Para contornarmos o efeito das influências ambientais em nossas análises, seguimos alguns procedimentos. Primeiramente, classificamos as Unidades Amostrais segundo o sistema de classificação de Oliveira-Filho (2009), o qual permite a agregação de até cinco atributos hierárquicos: regime climático (a), regime de renovação foliar (b), domínio térmico (c), faixa altitudinal (d) e substrato (e). Conseguimos classificar os remanescentes nos atributos b, c, e d. Os atributos b e c são os mesmos para os remanescentes - perenifólias e subtropical, respectivamente; para o atributo d, 71 Unidades Amostrais foram classificadas como inferomontanas e 74 como superomontanas. Não foi possível usar os atributos a e e devido à falta de informações precisas. Em busca de evidências estatísticas sobre a segregação dos grupos inferomontana e superomontana, no que diz respeito a padrões estruturais da vegetação, aplicamos uma análise de similaridade (ANOSIM; LEGENDRE e LEGENDRE, 1998) em uma matriz de abundância de 354 espécies presentes nas Unidades Amostrais classificadas em um dos grupos. Adotamos a medida de distância de Bray-Curtis, com 9999 permutações e α=0,05. O teste mostrou-se significativo (R=0,099; p=0,0001), mostrando evidências para a segregação das faixas altitudinais. 97 De forma complementar, visando ainda minimizar influências do ambiente, agrupamos as Unidades Amostrais por bacias hidrográficas (Figura 1.26). Algumas bacias hidrográficas apresentaram poucas Unidades Amostrais (de uma até duas): Rio Irani, Rio Itapocu, Rio Peperi-Guaçú, Rio Tubarão e Rio Jacutinga. Devido a este fato, essas bacias hidrográficas e, consequentemente, suas respectivas Unidades Amostrais serão agregadas às bacias mais próximas (Tabela 1.14 e Figura 1.26 e 1.27). Assim, será eleita uma Unidade Amostral referência para cada faixa altitudinal dentro de cada bacia hidrográfica considerada. Tabela 1.14. Bacias hidrográficas consideradas na quantificação de naturalidade e seus respectivos números de Unidades Amostrais, classificadas conforme o atributo faixa altitudinal de Oliveira-Filho (2009). As bacias com número pequeno de Unidades Amostrais foram agregadas à bacia mais próxima. Bacia hidrográfica Rio Canoas Rio Canoinhas Rio Chapecó Rio das Antas Rio do Peixe Rio Irani Rio Itajaí-açu Rio Itapocú Rio Jacutinga Rio Negro Rio Pelotas Rio Peperi-Guaçú Rio Tijucas Rio Timbó Rio Tubarão Σ Faixa altitudinal N° total Inferomontana Superomontana de UA 15 5 2 3 5 1 11 0 1 9 9 1 3 5 1 71 22 3 6 0 11 1 6 1 0 4 10 0 1 8 1 74 37 8 8 3 16 2 17 1 1 13 19 1 4 13 2 145 Agregada à bacia Rio Chapecó Rio Chapecó Rio Negro Rio Chapecó Rio Chapecó Rio Itajaí-açu Rio Canoas - 98 Figura 1.26. Unidades Amostrais (145) do IFFSC consideradas na quantificação da naturalidade, classificadas conforme o sistema de Oliveira-Filho (2009) em relação à faixa altitudinal, e segregadas por bacia hidrográfica. Figura 1.27. Unidades Amostrais (145) do IFFSC consideradas na quantificação da naturalidade, classificadas conforme o sistema de Oliveira-Filho (2009) em relação à faixa altitudinal, e segregadas por bacia hidrográfica ou junção delas, conforme a Tabela 1.14. 99 A determinação final das florestas de referência observadas (Unidades Amostrais) utilizará de parâmetros condicionais, os quais estão relacionados a aspectos inerentes à naturalidade, e à hemerobia aplicada à floresta. O processo de determinação consistirá em etapas de triagem das Unidades Amostrais, inspiradas em McRoberts et al. (2012): Serão eliminadas as Unidades Amostrais com um ou mais indivíduos de espécie(s) exótica(s); Será avaliada a diversidade da estrutura vertical através do indicador Estrutura vertical (descrito no tópico 1.3.4.4); a Unidade Amostral canditada deve conter pelo menos 10% do número total de indivíduos em cada um dos três estratos de altura; Será feito um ranking das Unidades Amostrais com as menores distâncias Euclidianas (Nref) ao vetor máximo (ou Floresta de referência teórica - tópico 1.3.4.6.); Para ser selecionada, a Unidade Amostral terá de passar pelos dois primeiros critérios de seleção; então, para a seleção final, será avaliada a Nref - as Unidades Amostrais com menor valor serão selecionadas como referências; Em casos de empate (Unidades Amostrais com mesmos valores para Nref) o valor final da naturalidade (Nref*) será o resultado da soma de Nref com peso de 80% e do IQH com peso de 20%: Nref* = Nref . (0,80) + IQH . (0,20). 1.4. CONCLUSÕES Quatro conclusões podem ser tiradas desse capítulo: (i) o conceito de naturalidade pôde ser coerentemente adaptado ao contexto histórico, social e ambiental da Floresta Mista com Araucária do estado de Santa Catarina; (ii) os dados coletados pelo IFFSC são capazes de fornecer informações para o desenvolvimento de vários indicadores de naturalidade; (iii) nem todos os indicadores aparentemente relevantes estão relacionados com a naturalidade, ou por questões “operacionais” não puderam ser adotados; (iv) a metodologia proposta para a quantificação da naturalidade integrou várias dimensões desta em uma só medida. 1.5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA-NETO, M.; CAMPASSI, F.; GALETTI, M.; JORDANO, P.; OLIVEIRA-FILHO, A.T. Vertebrate dispersal syndromes along the Atlantic forest: broad-scale patterns and macroecological correlates. Global Ecology and Biogeography, v.17, p.503–513, 2008. ANDERSON, J.E. A conceptual framework for evaluating and quantifying naturalness. 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New Jersey: Pearson Prentice Hall, 2010. 122 CAPÍTULO 2: QUANTIFICAÇÃO DA NATURALIDADE DOS REMANESCENTES DE FLORESTA MISTA COM ARAUCÁRIA DE SANTA CATARINA RESUMO A naturalidade é um atributo que está relacionado ao grau em que algo é alterado do seu estado original; ela pode ser quantificada através de um gradiente, que estende-se do menos ao mais natural. A partir das duas abordagens de quantificação baseadas em distância euclidiana (floresta de referência teórica e observada) propostas no primeiro capítulo deste manuscrito, criamos dois Índices de naturalidade que vão do valor zero até um (naturalidade mínima e máxima, respectivamente). Os Índices foram calculados para 145 remanescentes (Unidade Amostrais) de Floresta Mista com Araucária amostrados pelo Inventário FlorísticoFlorestal de Santa Catarina (IFFSC). A maioria dos remanescentes avaliados possui naturalidade média (~0,50), levando em consideração a referência teórica (100% natural). Quando comparados às florestas de referência observadas, os remanescentes apresentaram valores em torno de 0,60. Ambos os Índices apresentaram resultados coerentes e que corroboraram o conhecimento já existente sobre o estado de conservação (prejudicado) da Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina. Algumas das bacias hidrográficas avaliadas mostraram-se menos naturais que a média e merecem atenção em futuras ações e políticas ligadas à conservação, restauração e manejo. Diante dos resultados satisfatórios gerados pelos Índices, a abordagem proposta tem potencial para ser adaptada aos diversos contextos (ecológicos e sociais) das florestas nativas do Brasil. Os dados provenientes do Inventário Florestal Nacional do Brasil (IFN-Brasil) são uma rica matéria prima para o desenvolvimento de novos índices quantitativos de naturalidade. Assim, tais índices podem ser ferramentas úteis para avaliação de remanescentes e, por conseguinte, podem ser utilizados em análises multitemporais dentro do programa IFN-Brasil. 123 ABSTRACT The naturalness is an atribute related to the degree to which something is changed from its original state and it can be quantified through a gradient that range from the least to the most natural. From the two quantification approaches based on Euclidean distance (theoretical and observed reference forests) proposed in the first chapter of this manuscript, we created two indexes of naturalness ranging from zero to one (minimal and maximum naturalness, respectively). The indexes were calculated for 145 sample plots of the Forest and Floristic Inventory of Santa Catarina in Mixed Needle-broadleaved Forest. Most forest remnants presented an average naturalness (~0.50) when considering the theoretical reference (100% natural). When forest remnants were compared to the observed reference forests they presented naturalness values around 0.60. Both indexes showed consistent results that corroborated the existing knowledge about the (degraded) condition of the Mixed Needlebroadleaved Forest on Santa Catarina state. Some of the evaluated watersheds are less natural than the average; therefore, they deserve attention in future actions and policies related to the conservation, restoration and management. Given the satisfactory results generated by the indexes, the proposed approach has potential for being adapted to different contexts (ecological and social) Brazil‟s native forests. Data from Brazilian National Forest Inventory (NFI-Brazil) are a rich resourse for the development of new quantitative naturalness indexes. Thus, these indexes may be useful tools for assessing ecological integrity of native forests; they can also be used for multi-temporal analysis on the NFI-Brazil program. 124 2.1. INTRODUÇÃO A partir de dados coletados por Inventários Florestais Nacionais (IFNs, ou IFN, no singular) pode-se quantificar a naturalidade de remanescentes florestais (CHIRICI et al. 2011, 2012; MARCHETTI, 2004; McROBERTS et al., 2012; EEA, 2014). Este atributo está relacionado ao grau em que algo é alterado do seu estado original, e pode ser quantificado através indicadores que sintetizam informações acerca de um eco(sistema) e das pressões contrárias (antrópicas) aplicadas nele (LIRA e SEPP, 2009; WINTER et al., 2010; WINTER, 2012). Diante desses fatos e da qualidade e abrangência dos dados coletados pelo Inventário Florístico-Florestal de Santa Catarina (IFFSC) (VIBRANS et al., 2010), um estimador quantitativo de naturalidade pode se tornar uma ferramenta inovadora, prática e efetiva na identificação de remanescentes de alta relevância para a conservação (McROBERTS et al., 2012). Não só áreas potenciais para conservação são relevantes - áreas com baixo grau de conservação devem ser identificadas e tratadas (TABARELLI et al., 2010). Ainda, os resultados obtidos em estudos de naturalidade podem auxiliar na formação de diretrizes para políticas públicas envolvendo a conservação e o manejo das florestas nativas. Sabemos sobre as peculiaridades ecológícas e sobre o grande potencial de uso das florestas nativas brasileiras - a Floresta Mista com Araucária (OLIVEIRA-FILHO, 2009) de Santa Catarina, que é a fitofisionomia considerada no presente estudo, possui espécies com grande potencial de uso e contém alta biodiversidade (FONSECA et al., 2009). Apesar dos muitos trabalhos que abordam esse atributo, existe a carência de uma definição comum do conceito e de métodos de determinação/quantificação da naturalidade (MACHADO, 2004; McROBERTS et al., 2012; WINTER, 2012). Poucos métodos explícitos de quantificação foram propostos até o momento (McROBERTS et al., 2012; WINTER, 2012; EEA, 2014), de forma que estes autores incentivam a realização de estudos que tratem da naturalidade e de formas de quantificá-la. A ausência de estudos que tratam do conceito na América do Sul é outro fator que impulsiona a realização do presente estudo. Diante deste contexto, os objetivos deste capítulo são: (i) aplicar a metodologia de quantificação da naturalidade apresentada no primeiro capítulo desse manuscrito; (ii) escalar a medida de naturalidade com o intuito de torná-la um índice de interpretação facilitada; (iii) discutir sobre a metodologia e os resultados obtidos acerca dos Índices de naturalidade. 125 2.2. MATERIAL E MÉTODOS A metodologia proposta no primeiro capítulo desse manuscrito foi utilizada para quantificar a naturalidade dos remanescentes de Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina amostrados pelo IFFSC. A partir da medida baseada em distância euclidiana criamos dois Índices de naturalidade, que são basicamente a medida escalada para o intervalo [0,1]. Os próximos tópicos tratam dos procedimentos adotados para o escalamento da medida. 2.2.1. ESCALAMENTO DA MEDIDA DE NATURALIDADE O procedimento de escalamento da medida de naturalidade tem a finalidade de tornála um índice de fácil interpretação. Conforme as duas abordagens propostas (tópico 1.3.4.6 do capítulo 1), temos dois índices: (i) Índice de naturalidade, baseado na floresta de referência teórica e (ii) Índice de naturalidade, baseado na floresta de referência observada. Daqui em diante, tais índices serão chamados de Índice de naturalidade I e Índice de naturalidade II, respectivamente. 2.2.1.1 Índice de naturalidade I Ao aplicarmos a medida de quantificação da naturalidade apresentada no capítulo anterior, verificamos que a distância Euclidiana máxima ao vetor máximo (1, 1, 1, 1, 1, 1) é de 2,45. Logo, este valor representa um remanescente florestal com naturalidade mínima, quando comparado à floresta de referência teórica. O primeiro procedimento de escalamento das medidas para um intervalo [0,1] consiste na aplicação do algoritmo: N (b a )( xi mín ) a máx mín (i) onde N é a medida de naturalidade escalada para o intervalo [0,1], a é o limite inferior do intervalo (0), b é o limite superior do intervalo (1), xi é o valor de naturalidade para a i-ésima Unidade Amostral, mín é a distância Euclidiana mínima (0) até a referência e máx é a distância Euclidiana máxima (2,45) até a referência. Finalizando o processo, a medida N será submetida à transformação: N final 1 N onde Nfinal é a medida escalada, conforme a Figura 2.1. (ii) 126 Agora, a medida mínima de naturalidade torna-se “0” e a máxima “1”, facilitanto a interpretação. edidadedenaturalidade naturalidade Índice 0 1 Baixa naturalidade Alta naturalidade Figura 2.1. Representação do Índice de naturalidade (gradiente) em sua forma final. 2.2.1.2 Índice de naturalidade II O escalamento do Índice de naturalidade II para o intervalo [0,1] segue os mesmos procedimentos do Índice I, porém, a distância máxima até a floresta de referência observada varia, conforme a Tabela 2.1. Tabela 2.1. Distâncias máximas até as florestas de referência de cada bacia hidrográfica, utilizadas para o escalamento do Ìndice de naturalidade II para o intervalo [0,1]. Bacia hidrográfica Rio Pelotas Rio Canoas Rio Itajaí Rio do Peixe Rio Chapecó Rio Canoinhas Rio Timbó Rio Negro Dist. máx. até a referência Inferomontana Superomontana 1,77 1,63 1,64 1,77 1,76 1,72 1,49 1,72 1,83 1,76 1,51 1,80 1,65 1,66 1,70 1,78 2.2.2. PADRÕES ESPACIAIS DE NATURALIDADE Buscamos por padrões espaciais de naturalidade através de correlogramas expressando o coeficiente I de Moran em classes de distância; avaliamos esses correlogramas com base no nível de significância corrigido pelo método sequencial de Bonferroni (FORTIN e DALE, 2005). O Índice de naturalidade I não apresentou autocorrelação espacial, ou seja, não existem padrões espaciais significativos (correlograma não significativo [Figura 2.2 - A]; 127 p≥0,05). Apesar do correlograma gerado para o Índice de naturalidade II ter se mostrado significativo (p<0,05), a autocorrelação espacial mostrou-se baixa, com I de Moran variando entre -0,054 e 0,079 (Figura 2.2 - B). Figura 2.2. Correlogramas espaciais relativos aos Índices de naturalidade aplicados à Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina. Onde: (A) Índice de naturalidade I – correlograma não significativo (p≥0,05; corrigido pelo método sequencial de Bonferroni) e (B) Índice de naturalidade II - correlograma significativo (p<0,05; corrigido pelo método sequencial de Bonferroni). 128 2.3. RESULTADOS 2.3.1. INDICADORES DE NATURALIDADE Considerando as 145 Unidades Amotrais do IFFSC na Floresta Mista com Araucária, os indicadores de naturalidade com menor valor médio foram Árvores grossas (0,35) e IQH (0,32), e os com maior valor foram J-invertido (0,65) e Métricas de paisagem (0,68) (Tabela 2.2). As distribuições de frequência dos valores dos indicadores mostraram-se diferenciadas (Figura 2.3) - somente o Sdap e IQH apresentaram uma distribuição normal, de acordo com o teste de Shapiro-Wilk (α=0,05). Os indicadores com distribuição de frequência mais assimétrica à esquerda foram J-invertido (g=-1,54) e H‟ regeneração natural (g=-0,88). O indicador H‟ regeneração natural apresentou a maior dispersão dos valores em torno da média (desvio-padrao de 0,29), enquanto o Sdap mostrou a menor dispersão (desvio-padrao de 0,17). A Tabela 2.3 e a Figura 2.4 apresentam os valores médios dos indicadores para as bacias hidrográficas. A Tabela A, presente no apêndice desse manuscrito, traz o valor de cada indicador para cada Unidade Amostral. Tabela 2.2. Indicadores de naturalidade e seus valores médios obtidos para as 145 Unidades Amostrais do IFFSC na Floresta Mista com Araucária. Onde: g = assimetria da distribuição de frequências; p = valor-p associado ao teste de normalidade de Shapiro-Wilk (α=0,05). Média Desvio-padrão g p Sdap 0,53 0,17 0,38 0,205 Árvores grossas 0,35 0,22 0,75 0,020 H' – Regeneração natural 0,61 0,29 -0,88 0,008 IQH 0,32 0,19 0,28 0,353 J-invertido 0,65 0,25 -1,54 < 0,001 Métricas de paisagem 0,68 0,21 -0,66 0,038 Indicador 129 Tabela 2.3. Indicadores de naturalidade e seus valores médios para as bacias hidrográficas consideradas. Bacia hidrográfica Rio Canoas Rio Canoinhas Rio Chapecó Rio do Peixe Rio Itajaí Rio Negro Rio Pelotas Rio Timbó Sdap 0,46 0,50 0,61 0,57 0,46 0,64 0,56 0,55 Árvores H' - Reg. grossas natural 0,34 0,66 0,34 0,46 0,51 0,65 0,38 0,58 0,35 0,69 0,28 0,57 0,31 0,64 0,32 0,36 IQH J-invertido 0,38 0,25 0,25 0,29 0,25 0,31 0,38 0,37 0,65 0,79 0,79 0,82 0,77 0,79 0,84 0,77 S dap 0 10 20 30 40 50 N°de Unidades Amostrais 0 10 20 30 40 50 Árvores grossas Métricas paisagem 0,62 0,74 0,61 0,65 0,75 0,66 0,69 0,79 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 0.0 0.2 0.6 0.8 1.0 0.8 1.0 J-invertido 0 10 20 30 40 50 N°de Unidades Amostrais 0 10 20 30 40 50 H' - regeneração natural 0.4 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 0.0 0.4 0.6 Métricas de paisagem IQH 0 10 20 30 40 50 N°de Unidades Amostrais 0 10 20 30 40 50 0.2 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 Valor do indicador 1.0 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 Valor do indicador 1.0 Figura 2.3 Histograma dos valores de cada indicador de naturalidade considerando 145 Unidades Amostrais do IFFSC na Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina. 130 Valor médio do indicador Árvores grossas S dap 0.90 0.90 0.80 0.80 0.70 0.70 0.60 0.60 0.50 0.50 0.40 0.40 0.30 0.30 0.20 0.20 0.10 0.10 0.00 0.00 J-invertido Valor médio do indicador H’ regeneração natural 1.00 0.90 0.80 0.70 0.60 0.50 0.40 0.30 0.20 0.10 0.00 1.00 0.90 0.80 0.70 0.60 0.50 0.40 0.30 0.20 0.10 0.00 Valor do médio do indicador IQH Métricas de paisagem 1.00 1.00 0.90 0.90 0.80 0.80 0.70 0.70 0.60 0.60 0.50 0.50 0.40 0.40 0.30 0.30 0.20 0.20 0.10 0.10 0.00 0.00 Figura 2.4. Valores médios dos indicadores de naturalidade por bacia hidrográfica. As barras de erro expressam o desvio-padrão. 2.3.2. FLORESTAS DE REFERÊNCIA Os remanescentes florestais mais naturais, segundo os critérios de triagem estabelecidos, estão apresentados na Tabela 2.4, e suas localizações geográficas na Figura 2.5. Seguindo a triagem proposta, duas Unidades Amostrais foram escolhidas para cada uma das 131 oito bacias hidrográficas, totalizando 16 florestas de referência. Das 145 Unidades Amostrais consideradas, 134 passaram pelo primeiro critério da triagem (ausência de espécies exóticas), e 133 passaram pelo segundo (pelo menos 10% das árvores em cada um dos três estratos de altura). Os valores do Índice de naturalidade I das florestas de referência variaram de 0,48 a 0,63, com média de 0,58 e desvio-padrão de 0,04. As bacias do Rio Canoinhas e Rio Timbó apresentaram as florestas de referência com os menores valores para o Índice I: 0,50 e 0,48, respectivamente (para a faixa altitudinal inferomontana). Das seis Unidades Amostrais complementares consideradas, que supostamente foram alocadas em florestas mais conservadas, somente duas tornaram-se florestas de referência. Tabela 2.4. Florestas de referência e seus respectivos valores para os indicadores de naturalidade. As faixas altududinais inferomontana e superomontana estão expressas, respectivamente, como I e S sobrescritos ao número da Unidade Amostral; as Unidades Amostrais complementares estão marcadas com asterisco (*). UA 886I 113S 415I 218S 312I 856S 1063I 901S 2002I* 847S 976I 934S 395I 555S 6001I* 717S Bacia hidrográfica Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Canoas Rio Canoas Rio Itajaí Rio Itajaí Rio Negro Rio Negro Rio Canoinhas Rio Canoinhas Rio Timbó Rio Timbó Rio do Peixe Rio do Peixe Rio Chapecó Rio Chapecó Média Desvio-padrão Sdap 0,41 0,54 0,62 0,43 0,58 0,43 0,62 0,75 0,72 1,00 0,41 0,47 0,46 0,49 0,77 0,50 0,57 0,17 Árvores H' - Reg. grossas natural 0,37 0,95 0,37 0,66 0,47 0,71 0,47 0,92 0,56 0,94 0,28 0,99 0,56 0,91 0,84 0,74 0,65 0,58 0,19 0,82 0,56 0,82 0,56 0,90 0,47 0,76 0,65 0,98 0,93 0,75 1,00 0,70 0,56 0,22 0,82 0,13 IQH J-invertido 0,59 0,65 0,44 0,50 0,29 0,59 0,44 0,06 0,15 0,44 0,00 0,35 0,44 0,15 0,24 0,35 0,80 0,93 0,92 0,80 0,93 0,77 0,87 0,88 0,91 0,77 0,92 0,72 0,82 0,90 0,90 0,72 0,35 0,19 0,85 0,08 Métricas Índic. paisagem de nat. I 0,97 0,60 0,71 0,61 0,75 0,61 0,99 0,61 0,78 0,61 0,88 0,57 0,64 0,63 0,74 0,57 0,39 0,50 0,87 0,58 0,84 0,48 0,88 0,59 0,57 0,56 0,71 0,55 0,67 0,63 0,84 0,62 0,58 0,76 0,04 0,15 132 Figura 2.5. Localização geográfica das 16 Unidades Amostrais consideradas como florestas referência de naturalidade para a Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina. 2.3.3. A NATURALIDADE QUANTIFICADA Levando em consideração todos os remanescentes florestais considerados, o Índice de naturalidade I (referência teórica) apresentou um valor médio de 0,47 com desvio-padrão de 0,09. De forma diferente da maioria dos indicadores, o Índice I apresentou uma distribuição normal (p>0,05; Shapiro-Wilk), conforme a Figura 2.6 (A). O Índice de naturalidade II (referência observada) apresentou um valor médio de 0,59 com desvio-padrão de 0,14; diferentemente do Índice I, esse não apresentou uma distribuição normal (p<0,05; ShapiroWilk), sendo esta assimétrica à esquerda com g=-0,30 (Figura 2.6, B). Apesar da aparente diferença nas distribuições dos valores dos dois Índices, elas se mostraram equivalanentes de acordo com o teste de Kolmogorov-Smirnov (D=0,30; p=0,67), adotando α=0,05. Os valores dos Índices para cada uma das 145 Unidades Amostrais estão presentes na Tabela A, que se encontra no apêndice desse manuscrito. Ao analisarmos os valores de forma pontual, os do Índice II superaram os do Índice I, pois as referências observadas são, obviamente, menos naturais que a referência teórica (100% natural), diminuindo o valor da medida de distância. Essa tendência pôde ser observada no gráfico de dispersão dos Índices (Figura 2.7), onde a maioria dos pontos 133 (Unidade Amostrais) ficou acima à reta identidade. Os poucos pontos abaixo da reta identidade são explicados pelo fato de que, em poucos casos (7,6%), alguns dos indicadores 40 40 40 40 40 40 florestas de referência, influenciando no cômputo do valor da distância Euclidiana. B 10 0 0 0 0 0 10 0 0 0 10 10 20 20 20 30 30 30 Amostrais Unidades Amostrais de Unidades N° de N° 30 20 10 30 20 10 30 20 20 10 N° de Unidades Amostrais 30 20 N° de Unidades Amostrais 30 A 10 40 40 de naturalidade das Unidades Amostrais ordinárias aprensentaram valores maiores que os das 0.0 0.20.2 0.4 0.6 0.4 0.6 0.8 0.81.0 Índice de Naturalidade Índice de naturalidade I 1.0 0.0 0.0 0.2 0.0 0.4 0.6 0.4 0.8 0.6 1.0 0.8 0.4 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 0.81.0 1.0 0.20.2 0.6 Índice de Naturalidade Índice de naturalidade II Índice II Índice de de naturalidade naturalidade 1.0 40 0.0 0 N° de Unidades Amostrais 30 20 10 C 0.0 0.2 0.4 0.6 Índice de Naturalidade 0.8 1.0 Figura 2.6. Distribuição de frequências dos valores para os Índices de naturalidade das Unidades Amostrais consideradas – (A) Índice I; (B) Índice II; (C) Distribuição de frequências dos Índices I e II consideramdo 129 Unidades Amostrais (sem florestas de referências), com barras sobrepostas; as barras brancas representam o Índice I, as pretas o Índice II e as cinzas a sobreposição das barras. 0.0 0.0 0.2 0.2 Índice Índice 134 0.90 Índice de naturalidade II 0.80 y = 1.359x - 0.031 R² = 0.56 r = 0.75 p < 0.001 0.70 0.60 0.50 0.40 0.30 0.20 0.20 0.30 0.40 0.50 0.60 0.70 0.80 0.90 Índice de naturalidade I Figura 2.7. Índice de naturalidade I vs. Índice de naturalidade I. A linha mais espessa representa a reta identidade. Mudando o enfoque para as bacias hidrográficas, as com maior média de naturalidade (Índice I) são as do Rio Pelotas (0,51) e Rio Chapecó (0,50); as demais variaram entre 0,44 e 0,48 (Tabela 2.5). Não houve evidências estatísticas de que as médias do Índice I (das bacias hidrográficas) diferem entre si, pois os intervalos de confiança (IC), gerados pelo método bootstrap com 9999 permutações e α=0,05, se sobrepuseram (Figura 2.8, A). Para o Índice II, o IC gerado para bacia do Rio Canoinhas não se sobrepôs aos das demais bacias, exceto ao da bacia do Rio Timbó; o IC gerado para a bacia do Rio Pelotas não se sobrepôs aos das bacias do Rio Canoinhas e Rio Timbó (Figura 2.8, B). Tabela 2.5. Valores médios por bacia hidrigráfica para os Índices de naturalidade I e II. Bacia hidrográfica Rio Canoas Rio Canoinhas Rio Chapecó Rio do Peixe Rio Itajaí Rio Negro Rio Pelotas Rio Timbó Média Índice de DesvioÍndice de naturalidade I padrão naturalidade II 0,46 0,09 0,62 0,44 0,08 0,47 0,50 0,08 0,57 0,48 0,08 0,60 0,46 0,09 0,62 0,48 0,08 0,59 0,51 0,09 0,66 0,44 0,08 0,46 0,47 0,09 0,59 Desviopadrão 0,13 0,05 0,11 0,18 0,17 0,14 0,10 0,14 0.14 135 0.55 Valor médio dos Índices de naturalidade I ± I.C. A 0.50 0.45 0.40 Índice de naturalidade I 0.35 Rio Rio Rio Canoas Canoinhas Chapecó Rio do Peixe Rio Itajaí Rio Negro Rio Rio Timbó Pelotas 0.75 Valor médio dos Índices de naturalidade II ± I.C 0.70 B 0.65 0.60 0.55 0.50 0.45 0.40 0.35 Índice de naturalidade II 0.30 Rio Rio Rio Canoas Canoinhas Chapecó Rio do Peixe Rio Itajaí Rio Negro Rio Rio Timbó Pelotas Figura 2.8. Valores médios por bacia hidrográfica dos Índices de naturalidade I (A) e II (B). As barras de erros expressam o intervalo de confiança gerado pelo método bootstrap com 9999 permutações e α=0,05. 2.3.3.1 Mapas temáticos de naturalidade Dois mapas temáticos de naturalidade (Figuras 2.9 e 2.10) foram gerados, um para cada Índice. Eles foram gerados pelo método de interpolação kriging, através do modelo exponencial (semivariograma); a interpolação foi gerada utilizando 12 pontos amostrais mais próximos. Os mapas gerados para ambos os Índices concordam com os resultados já aprensentados, onde as florestas menos naturais estão concentradas nas bacias do Rio Canoinhas e Rio Timbó. Já as florestas mais naturais, considerando o Índice I estão concentradas na bacia do Rio Pelotas e Chapecó. As florestais mais naturais de acordo com o Índice II estão concentradas nas bacias do Rio Pelotas e Rio Canoas. 136 Figura 2.9. Mapa temático do Índice de naturalidade I (referência teórica) para a Floresta Mista com Araucária, gerado a partir de interpolação (kriging), utilizando os valores de naturalidade calculados para 145 Unidades Amostrais do IFFSC. Figura 2.10. Mapa temático do Índice de naturalidade II (referência observada) para a Floresta Mista com Araucária, gerado a partir de interpolação (kriging), utilizando os valores de naturalidade calculados para 145 Unidades Amostrais do IFFSC. 137 2.4. DISCUSSÃO 2.4.1 OS ÍNDICES DE NATURALIDADE A partir de dados coletados por IFNs, eleger indicadores quantitativos da naturalidade de um sistema complexo como um ecossistema florestal constitui um grande desafio. Com base na ilustração apresentada no presente estudo, alguns desses indicadores possuem restrições no que diz respeito à metodologia de coleta (por exemplo, necromassa), outros em relação à subjetividade das estimativas (por exemplo, estoque de volume). Além desses, existem os que, à primeira vista, podem parecer indispensáveis (por exemplo, diversidade de espécies), mas podem não estar relacionados à naturalidade. O fato de não possuírmos florestas de referência (dados de referência) pré-estabelecidas dificulta a utilização de certos indicadores (por exemplo, composição de espécies). Dos indicadores que restam, eles devem satisfazer os pressupostos propostos pelos pesquisadores com experiência no tema (McROBERTS et al., 2012; WINTER el al., 2010; WINTER, 2012). Apesar da simplicidade da concepção dos Índices propostos, concretizamos uma previsão de Chirici et al. (2011), os quais desenvoveram uma medida de naturalidade de forma semelhante a nossa, adotando a distância Euclidiana, porém utilizando poucos indicadores: “Even if the number and particular subindicators used change, the general approach and the manner in which the data are aggregated to derive a complex naturalness index have future potential for operational applications.” Em termos operacionais, os procedimentos de cálculo dos indicadores e dos Índices requeriram certo esforço computacional, entretanto, são totalmente passíveis de serem calculados para dados de novos ciclos do IFFSC, com a finalidade de monitorar as florestas. Os dados utilizados para a geração do indicador Métricas de paisagem não estão na lista básica do IFN-Brasil (IFN-BRASIL, 2014), embora este possa ser facilmente calculado mediante interpretação de imagens de sensoriamento remoto e das ferramentas de geoprocessamento disponíveis atualmente. Os resultados obtidos apontam que a medida de distância euclidiana sintetizou os indicadores em um único valor de forma satisfatória, pois a distribuição normal dos valores dos Índices I, com média em torno de 0,5, aponta um fato esperado – grande parte dos remanescentes de Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina apresenta naturalidade mediana quando comparados a uma referência teórica (100% natural). Essa afirmação, embora tenha traduzido o grau de conservação de uma maneira diferente dos métodos 138 habituais, concorda com conclusões já encontradas pelo IFFSC (SEVEGNANI et al., 2013; VIBRANS et al., 2011). De fato, os resultados obtidos através dos Índices propostos remetem à intensa exploração e alteração que outrora foram conduzidas (e continuam sendo conduzidas) nessa fitofisionomia caracterizada pela Araucaria angustifolia (MÄHLER JÚNIOR e LAROCCA, 2009; THOMÉ, 2010). Segundo o Índice I, as florestas consideradas como referências mostraram-se com naturalidade mediana (0,58), não muito acima da média geral (0,47). Esse resultado mostra que os “melhores” remanescentes de hoje podem ser considerados descaracterizados e simplificados quando comparados a uma referência 100% natural. Nessa perspectiva, considerando agora o Índice II, observamos que em média os remanescentes ordinários são mais próximos às florestas de referêcia observadas, como o esperado. Ambas as abordagens de quantificação são úteis para o monitoramento e análises multitemporais, pois refletem dois “padrões de qualidade” das florestas nativas. 2.4.2 UMA NOVA VISÃO SOBRE AS FLORESTAS NATIVAS 2.4.2.1 Observações acerca da naturalidade da Floresta Mista com Araucária Das seis Unidades Amostrais complementares consideradas, três estão em unidades de conservação (UC) - duas na FLONA de Três Barras e uma na Reserva Florestal EMBRAPA/EPAGRI de Caçador. Somente uma destas Unidades Amostrais foi eleita como floresta de referência, de acordo com nossa proposta de triagem. Nossa expectativa era de que outras Unidades Amostrais em UC fossem eleitas como mais naturais. Algumas hipóteses são levantadas: (i) que ocorreu exploração madeireira e de outros produtos nas UC, logo, essas apresentam naturalidade não muito superior aos remanescentes fora de UC; (ii) as florestas das UC estão em estágios de sucessão intermediários ou avançados; (iii) as UC ainda sofrem exploração clandestina de madeira (e/ou outros produtos florestais) ou outras perturbações antrópicas; (vi) os índices criados não representaram fielmente a naturalidade. Chamamos a atenção para algumas bacias hidrográficas analisadas. As bacias dos Rios Canoinhas e Timbó (planalto norte de Santa Catarina) apresentaram as menores médias para os dois Índices de naturalidade. Isso mostra que estas bacias possuem florestas mais alteradas e, assim, merecem atenção em políticas ligadas à conservação, restauração e manejo. Em concordância com os resultados obtidos, o Projeto Microbacias 2, conduzido pela Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (FATMA), observou que essas bacias apresentam 139 florestas consideravelmente degradadas pela influência de atividades como a pecuária, agricultura e silvicultura. Diante deste cenário, ações conservacionistas, fundamentadas em um mecanismo de pagamento por serviços ambientais (PSA), foram formuladas e implementadas. No ano de 2010 foram criados Corredores Ecológicos (CE) no estado: o CE Chapecó e o CE Timbó (detalhes e histórico dos CE e do PSA em Alarcon et al. [2013]). Levando em consideração certos fatos históricos, observamos que estes podem ter contribuído para a atual situação concernente à menor naturalidade das florestas do planalto norte e de partes da bacia do Rio Canoas. Os “tropeiros” conduziam as manadas de gado e mulas dos campos do Rio Grande do Sul para o comércio em Sorocaba (THOMÉ, 2012). O principal caminho das tropas passava pela região do planalto norte de Santa Catarina, assim como nos campos da região de Lages (Figura 2.11). Em consequência da atividade, realizada por pelo menos 200 anos, Thomé (2012) afirma: “Nas invernadas, durante os descansos das tropas, a paisagem natural do Espaço Livre do Contestado reteve muitos tropeiros paulistas e paranaenses, que aqui se estabeleceram ao longo dos caminhos, os pousos foram dando origem a currais, fazendas e povoados”. “Fixando-se, promoviam o aparecimento de núcleos populacionais e, assim, no decorrer do tempo, fizeram surgir as primeiras povoações, mais tarde vilas, no Espaço Livre do Contestado. [...] Muitos dos extropeiros, agora novos fazendeiros, seguindo tradições familiares, lançaram-se à criação de gado bovino, oportunizando emprego para outros tipos de homens: o peão, especializado nas lidas campeiras com o gado vacum; o mateiro, profundo conhecedor das matas e explorador dos ervais; e, o roceiro, o plantador de cereais [...]” A construção da ferrovia que liga a região Sudeste a Sul (do Brasil), de Itararé (SP) até Santa Maria (RS) (Figura 2.11), entre os anos de 1907 e 1910 e.c., desempenhou um papel fundamental na colonização e exploração das florestas nativas de Santa Catarina. A empresa Southern Brazil Lumber and Colonization Company, conhecida popularmente como Lumber, subsidiou a Brazil Railway Company (construtora da ferrovia) e recebeu uma concessão para explorar a madeira (e a erva-mate) dos terrenos que margeavam a linha principal da estrada de ferro. Esta concessão, juntamente com a inovadora tecnologia de exploração e processamento da madeira, tornou a Lumber a maior madeireira da América do Sul (GOULARTI FIHLO, 140 2009; TOMPOROSKI, 2006). Goularti Filho (2009) acrescenta que não só a Lumber extraia a madeira das florestas catarinenses: “As primeiras pequenas serrarias, de propriedade dos colonos imigrantes, que inicialmente se instalaram como comerciantes, transformaram-se mais tarde em industriais”. A construção da linha São Francisco que segue até Porto União (Ramal Porto União São Francisco do Sul), construída entre 1906 e 1917 e.c., e sua integração com Tronco Sul da Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (Figura 2.11), que segue de Mafra até Lages, construída entre 1961 a 1968, também acelerou o processo de crescimento econômico/populacional e a exploração dos recursos naturais (GOULARTI FIHLO, 2009). Sorocaba Itararé Lapa Três Barras S. Fco. do Sul Lages Vacaria Santa Maria Figura 2.11. Representação das ferrovias construídas no início e meados do século XX e do caminho dos tropeiros. Onde, tracejado amarelo: ferrovia São Paulo-Rio Grande do Sul; tracejado vermelho: Ramal Porto União-São Francisco e Tronco Sul; tracejado azul: caminho dos tropeiros. Outro fator pode estar ligado à naturalidade; existem evidências de que a quantidade (e o tipo) de rodovias estão relacionados ao grau de alteração das florestas nativas, inclusive 141 em UC (FREITAS et al., 2013). Duas importantes rodovias passam pelo planalto norte de Santa Catarina: a BR 116 e a BR 280. Três rodovias consideravelmente trafegadas passam pela bacia do Rio Canoas: a BR 470, a BR 282 e a BR 116. Segundo Goularti Filho (2009), a partir da década de 1960 (já na “era rodoviária”), a pavimentação dessas rodovias auxiliou a distribuição dos produtos provenientes da agricultura e da pecuária para diversas regiões (e para os portos) do estado. Atividades (em ascenção) na bacia do Rio Canoas devem ser consideradas e, possivelmente, são inversamente correlacionadas à naturalidade dos remanescentes de Floresta Mista com Araucária: a agricultura mecanizada de grãos na primavera/verão aliada à pecuária no outono/inverno. Estas atividades estão tornando-se lucrativas e vem substituindo os investimentos em plantios florestais de espécies do gênero Pinus e Eucalyptus, que outrora foram incentivados pelo governo do país (BREPOHL, 1980). Não obstante a este fato (esfriamento do setor florestal), os plantios florestais ainda cobrem grande porção da bacia, devido à alta demanda das empresas de papel e celulose, aliado a alta taxa de incremento (em volume de madeira) das espécies de Pinus e Eucalyptus na região. Resultados que despertam atenção são, também, os referentes aos indicadores Árvores grossas e IQH. Ambos apresentaram valores médios baixos (~0,30), mostrando que grande parte dos remanescentes avaliados possui poucas árvores velhas, o que é, provavelmente, consequência da exploração madeireira intensiva (décadas passadas) e seletiva (dias atuais). Além dessa “marca” deixada pela exploração, observamos que muitas atividades antrópicas estão atualmente presentes nas florestas. Apesar de não podermos quantificar precisamente as influências das atividades antrópicas na vegetação, ao adotarmos uma posição conservadora em relação a tais atividades, alertamos sobre esse fato. Como procederemos diante destas situações? Sabemos da burocracia do sistema político e legislativo do Brasil, sendo que informações preciosas sobre as florestas, as quais são levantadas com recursos públicos (em sua maioria), retornam vagarosamente de forma concreta à sociedade e à própria floresta. Entretanto, respostas a essa indagação foram apresentadas nas Diretrizes para a Política Florestal Catarinense9, a qual propõe diversas medidas para conservação e utilização dos recursos florestais nativos de Santa Catarina, como o incentivo ao manejo de florestas secundárias e a implantação de um serviço de extensão florestal. Embora tal documento tenha sido elaborado antes da publicação da abordagem do 9 Dispoível em: <http://ciram.epagri.sc.gov.br/ciram_arquivos/arquivos/iff/pdf/diretrizes_gt_pefsc_dez_2013. pdf> 142 conceito de naturalidade para a Floresta Mista com Araucária catarinense, acreditamos que esta irá contribuir para a manutenção das propostas e na parte de monitoramento multitemporal dos remanescentes florestais. 2.4.2.2 Alternativa para a análise de remanescentes florestais É certo que o conceito de naturalidade traz uma nova maneira de lidar com o espectro ecológico e ambiental concernente às florestas nativas do Brasil. Ela pode ser uma ferramenta alternativa em situações que, por vezes, certos métodos ou abordagens podem não gerar resultados satisfatórios. Inspirados pelos apontamentos de Magurram e Queiroz (2010), apresentamos três situações onde o conceito pode contribuir ou vir a ser um método alternativo: (i) A classificação de remanescentes florestais em estágios de sucessão é um dos paradigmas atuais acerca das florestas nativas (SIMINSKI et al., 2013). Existem estudos que trazem novas abordagens para a classificação (ZANINI et al., 2014), porém, o problema está na aplicação de resoluções (como a do CONAMA) para classificação de estágios de sucessão. Empiricamente, sabemos que os parâmetros sugeridos por essas resoluções podem não ser adequados para classificar coerentemente remanescentes florestais em estágios de sucessão ecológica. Existe a possibilidade, por exemplo, de: (a) criar informações de referência de naturalidade e relacioná-los com estágios de sucessão ecológica; (b) criar classes de naturalidade compatíveis com os estágios de sucessão ecológica; (c) usar uma medida de distância (como a utilizada nesse estudo) entre dada vegetação que se deseja classificar em um estágio de sucessão até uma vegetação climácica – assim, criariam-se classes de distância, as quais seriam relacionadas com estágios de sucessão ecológica. (ii) Mostramos evidências de que a diversidade de espécies pode gerar resultados precipitados quando é adotada como descritor do estado de conservação de remanescentes; Maçaneiro et al. (manuscrito em preparação) e Imai et al. (2014) chegaram à conclusões semelhantes. A utilização deste parâmetro não deveria ser aplicada sem ser justificada. Portanto, é prudente utilizar métodos mais abrangentes quando o objetivo é retratar o estado de conservação de florestas que possuem espécies dominantes. (iii) A utilização do conceito de naturalidade tem serventia e potencial para auxiliar na compreensão da interação homem-natureza, pelo fato de poder incluir o fator hemerobia 143 (WINTER, 2012). As visões acerca dessa interação estão ligadas a uma perspectiva biocêntrica e antropocêntrica (HUNTER et al., 2014). Na ilustração do presente estudo concatenaram-se as duas perspectivas. Como o conceito de hemerobia pode ser adotado em diversas escalas espaciais (BARTHA et al., 2006), existe a possibilidade da criação de índices (ou estimadores) específicos, respondendo a demanda atual de informações e respostas sobre as florestas nativas. 2.4.3 PERSPECTIVAS PARA O USO DO CONCEITO DE NATURALIDADE A naturalidade é um atributo considerado por muitos IFNs da Europa como descritor do estado de conservação, resiliência e estabilidade de ecossistemas florestais (CHIRICI et al. 2011; EEA, 2014). Diante da novidade do conceito no Brasil, e também por Santa Catarina ser o primeiro estado a realizar o primeiro ciclo de levantamento de dados dentro do programa IFN-Brasil, esperamos que nossa abordagem ecológica e filosófica do conceito (adaptada para a realidade histórica, social e ambiental do Brasil) abra novas perspectivas para a análise integrada de dados dendrométricos e de perturbações antrópicas. Tomando por base o exemplo europeu, o qual vem desenvolvendo metodologias de acesso à naturalidade a partir de dados de IFNs e de sensores remotos (EEA, 2014), existe a possibilidade de nosso estudo ser um piloto, para que futuramente, o conceito seja integrado ao programa IFN-Brasil. Apostamos na utilização da arborgem proposta em variadas escalas espaciais e para outras fitofisionomias do Brasil, utilizando dados do IFN-Brasil, com o intuito de aprofundar as análises e diagnósticos sobre o estado de conservação das florestas. Uma das vantagens dessa abordagem é a possibilidade da harmonização dos Índices (ou estimadores) gerados, objetivando comparações entre estados, dentro dum programa de IFN, por exemplo. A compatibilidade entre definições, conceitos e estimativas geradas por um IFN pode ser atingida pela harmonização. O processo de harmonização busca por um acordo sobre como os dados podem ser convertidos para atender a uma definição harmonizada, tornando possível a geração de estimativas harmonizadas de variáveis dendrométricas, por exemplo (EEA, 2014; KÖHL et al., 2000; McROBERTS et al., 2009, 2012). Outro exemplo de abordagem muitidimensional quantitativa é o Índice de Sustentabilidade Florestal (Forest Sustainability Index) criado pelo Serviço Florestal da Coréia do Sul (KOREA FOREST SERVICE, 2009). Esse índice tem um caráter quantitativo e funciona como um estimador (global) da sustentabilidade florestal, levando em conta aspectos físicos, ecológicos, sociais e econômicos, em nível local e nacional. Dezenove indicadores são 144 utilizados em conjunto para o cálculo do valor final. Certas ações contidas na política florestal da Coréia do Sul estão voltadas para recuperar florestas que apresentam valores baixos para o Índice de Sustentabilidade Florestal. Quando ocorre um declínio nos valores dos índices, a politica florestal também prevê o desenvolvimento de contraplanos que visam recuperar o índice. Na área científica, relacionada às florestas, esperamos contribuir com a vertente de pesquisadores que se dedicam ao conceito (naturalidade), pois, em nosso conhecimento, não existem estudos referentes à aplicação do conceito em florestas subtropicais com propriedades ecológicas muito diferentes das florestas temperadas e boreais do hemisfério Norte. 2.5. CONCLUSÕES A partir da ilustração apresentada neste capítulo, cinco conclusões podem ser tiradas: (i) os Índices de naturalidade apresentaram resultados coerentes e que corroboraram o conhecimento prévio sobre o estado de conservação da Floresta Mista com Araucária de Santa Catarina; (ii) a maior parte dos remanescentes avaliados possui naturalidade média, levando em consideração a referência teórica (100% natural); (iii) os dois Índices desenvolvidos trazem duas abordagens de quantificação da naturalidade (referências teóricas e observadas), as quais podem ser úteis para questões relativas ao monitoramento de remanescentes florestais em larga escala; (iv) a abordagem proposta para a quantificação da naturalidade tem potencial para ser aplicada no contexto do IFN-Brasil; (v) existem possibilidades da criação de Índices de naturalidade harmonizados para fitofisinomias inteiras ou regiões específicas do Brasil. 2.6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALARCON, G.G.; DA-RÉ, M.A.; FUKAHORI, S.T.I. 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As Unidades Amostrais marcadas com asterisco (*) foram eleitas como florestas de referência. UA 69 70 85 87 89 104 113* 114 134 137 139 140 166 177 191 192 193 206 208 211 Bacia hidrográfica Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Pelotas Rio Canoas Rio Pelotas Rio Canoas Rio Canoas Rio Canoas Rio Canoas Rio Canoas Rio Canoas Faixa altitudinal S dap Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Superomontana 0,60 0,38 0,61 0,52 0,62 0,45 0,54 0,65 0,54 0,56 0,58 0,65 0,52 0,58 0,57 0,45 0,44 0,43 0,30 0,44 Árvores grossas 0,28 0,37 0,37 0,19 0,65 0,28 0,37 0,00 0,19 0,75 0,00 0,00 0,28 0,56 0,37 0,47 0,47 0,19 0,65 0,75 H' - Reg. JIQH natural invertido 0,51 0,29 0,81 0,54 0,41 0,81 0,62 0,15 0,76 0,39 0,35 0,95 0,86 0,50 0,86 0,90 0,21 0,31 0,66 0,65 0,93 0,81 0,44 0,93 0,54 0,29 0,93 0,51 0,15 0,89 0,22 0,15 0,97 0,39 0,21 0,97 0,72 0,35 0,70 0,81 0,44 0,76 0,27 0,35 0,32 0,70 0,35 0,18 0,94 0,29 0,38 0,55 0,29 0,85 0,94 0,44 0,92 0,85 0,44 0,91 Métricas paisagem 0,80 0,65 0,62 0,18 0,39 0,74 0,71 0,78 0,36 0,51 0,83 0,73 0,93 0,34 0,87 0,88 0,83 0,50 0,26 0,56 Índice de Índice de naturalidade I naturalidade II 0,50 0,74 0,50 0,80 0,48 0,67 0,37 0,41 0,61 0,69 0,42 0,62 0,61 0,50 0,71 0,42 0,67 0,50 0,59 0,35 0,52 0,40 0,60 0,53 0,81 0,55 0,60 0,42 0,52 0,46 0,61 0,50 0,72 0,43 0,60 0,50 0,60 0,61 0,70 Continua... 147 Continuação... Bacia UA hidrográfica 217 Rio Canoas 218* Rio Canoas 225 Rio Canoas 242 Rio Canoas 246 Rio Canoas 249 Rio Itajaí 260 Rio Canoas 261 Rio Canoas 279 Rio Itajaí 297 Rio Canoas 301 Rio Canoas 304 Rio Canoas 308 Rio Itajaí 310 Rio Itajaí 311 Rio Itajaí 312* Rio Itajaí 313 Rio Itajaí 321 Rio Canoas 328 Rio Canoas 336 Rio Canoas 337 Rio Canoas 345 Rio Itajaí 346 Rio Itajaí 365 Rio Canoas Faixa altitudinal S dap Superomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana 0,46 0,43 0,32 0,34 0,61 1,00 0,54 0,07 0,37 0,38 0,49 0,60 0,29 0,31 0,25 0,58 0,27 0,58 0,48 0,34 0,39 0,27 0,33 0,56 Árvores grossas 0,56 0,47 0,47 0,09 0,00 0,19 0,28 0,09 0,47 0,65 0,00 0,00 0,37 0,37 0,28 0,56 0,75 0,28 0,65 0,28 0,47 0,28 0,56 0,28 H' - Reg. JIQH natural invertido 0,79 0,24 0,00 0,92 0,50 0,80 0,80 0,35 0,21 0,60 0,47 0,43 0,00 0,38 0,94 0,77 0,06 0,78 0,54 0,15 0,49 0,50 0,44 0,00 0,71 0,29 0,94 0,88 0,44 0,56 0,75 0,56 0,95 0,44 0,29 0,94 0,47 0,15 0,00 1,00 0,29 0,87 1,00 0,35 0,92 0,94 0,29 0,93 0,68 0,15 0,98 0,85 0,15 0,88 0,24 0,44 0,47 0,68 0,71 0,90 0,65 0,65 0,72 0,89 0,41 0,84 0,78 0,29 0,96 0,60 0,44 0,92 Métricas paisagem 0,99 0,99 0,99 0,85 0,80 0,89 0,59 0,46 0,76 0,56 0,48 0,55 0,80 0,61 0,37 0,78 0,63 0,74 0,24 0,00 0,60 0,74 0,70 0,75 Índice de Índice de naturalidade I naturalidade II 0,41 0,51 0,61 0,45 0,50 0,42 0,64 0,34 0,39 0,47 0,53 0,41 0,57 0,23 0,28 0,53 0,82 0,55 0,69 0,45 0,66 0,40 0,64 0,30 0,37 0,49 0,79 0,44 0,65 0,61 0,49 0,54 0,49 0,77 0,40 0,48 0,40 0,47 0,56 0,76 0,50 0,75 0,54 0,83 0,54 0,73 Continua... 148 Continuação... Bacia UA hidrográfica 367 Rio Canoas 369 Rio Canoas 395* Rio do Peixe 409 Rio Canoas 413 Rio Canoas 415* Rio Canoas 419 Rio Itajaí 442 Rio do Peixe 450 Rio Canoas 453 Rio Canoas 455 Rio Canoas 456 Rio Itajaí 483 Rio Pelotas 495 Rio do Peixe 529 Rio Pelotas 551 Rio do Peixe 555* Rio do Peixe 561 Rio Canoas 562 Rio Canoas 565 Rio Itajaí 566 Rio Itajaí 602 Rio Chapecó 605 Rio Chapecó Faixa altitudinal S dap Inferomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana 0,35 0,41 0,46 0,41 0,81 0,62 0,35 0,50 0,54 0,48 0,33 0,62 0,51 0,39 0,57 0,58 0,49 0,66 0,46 0,75 0,53 0,69 0,40 Árvores grossas 0,47 0,28 0,47 0,19 0,19 0,47 0,37 0,19 0,28 0,47 0,28 0,47 0,84 0,28 0,19 0,37 0,65 0,47 0,19 0,56 0,19 0,47 0,65 H' - Reg. JIQH natural invertido 0,90 0,44 0,88 0,68 0,35 0,98 0,76 0,44 0,82 0,62 0,15 0,48 0,50 0,00 0,87 0,71 0,44 0,92 0,82 0,21 0,76 0,94 0,71 0,94 0,57 0,15 0,78 0,87 0,59 0,48 0,20 0,15 0,16 0,00 0,00 0,68 0,79 0,71 0,83 0,64 0,35 0,91 0,92 0,50 0,73 0,73 0,00 0,91 0,98 0,15 0,90 0,57 0,59 0,95 0,70 0,15 0,89 0,62 0,06 0,95 0,40 0,29 0,87 0,79 0,00 0,92 0,00 0,41 0,43 Métricas paisagem 0,45 0,70 0,57 0,38 0,88 0,75 0,32 0,55 0,51 0,73 0,88 1,00 0,88 0,70 0,98 0,65 0,71 0,45 0,27 0,99 0,98 0,60 0,70 Índice de Índice de naturalidade I naturalidade II 0,53 0,73 0,50 0,82 0,56 0,35 0,50 0,43 0,54 0,61 0,42 0,66 0,55 0,70 0,43 0,59 0,58 0,76 0,29 0,40 0,35 0,31 0,73 0,70 0,49 0,80 0,56 0,85 0,46 0,76 0,55 0,58 0,78 0,38 0,50 0,54 0,53 0,46 0,61 0,48 0,71 0,39 0,44 Continua... 149 Continuação... Bacia UA hidrográfica 615 Rio do Peixe 619 Rio Canoas 623 Rio Itajaí 660 Rio Chapecó 668 Rio do Peixe 669 Rio do Peixe 672 Rio do Peixe 673 Rio do Peixe 677 Rio Pelotas 714 Rio Chapecó 717* Rio Chapecó 718 Rio Chapecó 723 Rio do Peixe 725 Rio do Peixe 727 Rio Pelotas 728 Rio do Peixe 732 Rio Canoas 736 Rio Canoinhas 739 Rio Itajaí 784 Rio do Peixe 789 Rio Timbó 793 Rio Canoinhas 794 Rio Itajaí Faixa altitudinal S dap Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana 0,53 0,44 0,46 0,60 0,54 0,24 0,38 0,60 0,48 0,77 0,50 0,77 0,63 0,80 0,86 0,59 0,37 0,35 0,38 0,64 0,36 0,27 0,61 Árvores grossas 0,00 0,28 0,28 0,37 0,28 0,37 0,56 0,00 0,19 0,19 1,00 0,37 0,37 0,65 0,19 0,19 0,47 0,47 0,19 0,37 0,19 0,28 0,19 H' - Reg. JIQH natural invertido 0,64 0,21 0,95 0,78 0,44 0,70 0,00 0,29 0,23 0,76 0,15 0,95 0,45 0,35 0,95 0,84 0,44 0,73 0,71 0,29 0,94 0,00 0,50 0,86 0,68 0,29 0,84 0,94 0,35 0,97 0,70 0,35 0,72 0,80 0,15 0,76 0,00 0,29 0,67 0,93 0,06 0,93 0,73 0,29 0,92 0,60 0,00 0,73 0,67 0,15 0,00 0,45 0,29 0,78 0,88 0,15 0,28 0,26 0,21 0,37 0,68 0,59 0,94 0,33 0,26 0,86 0,58 0,35 0,87 Métricas paisagem 0,62 0,85 0,86 0,47 0,65 0,80 0,51 0,50 0,97 0,26 0,84 0,93 0,78 0,61 0,91 0,70 0,76 0,70 0,29 0,78 0,77 0,87 0,93 Índice de Índice de naturalidade I naturalidade II 0,41 0,57 0,53 0,83 0,30 0,32 0,48 0,54 0,49 0,60 0,51 0,69 0,52 0,77 0,33 0,27 0,49 0,75 0,47 0,52 0,62 0,54 0,59 0,40 0,38 0,55 0,80 0,54 0,65 0,40 0,61 0,34 0,47 0,48 0,54 0,31 0,47 0,40 0,45 0,52 0,66 0,41 0,50 0,51 0,69 Continua... 150 Continuação... Bacia UA hidrográfica 797 Rio Itajaí 830 Rio Pelotas 832 Rio Chapecó 836 Rio Chapecó 837 Rio Chapecó 843 Rio Timbó 845 Rio Timbó 847* Rio Canoinhas 850 Rio Itajaí 852 Rio Itajaí 856* Rio Itajaí 884 Rio Chapecó 886* Rio Pelotas 887 Rio Timbó 894 Rio Canoinhas 895 Rio Canoinhas 901* Rio Negro 902 Rio Negro 926 Rio Chapecó 933 Rio Timbó 934* Rio Timbó 939 Rio Timbó 945 Rio Itajaí 946 Rio Negro Faixa altitudinal S dap Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana 0,47 0,50 0,61 0,69 0,54 0,54 0,74 1,00 0,50 0,66 0,43 0,57 0,41 0,63 0,26 0,33 0,75 1,00 0,79 0,29 0,47 0,67 0,33 0,42 Árvores grossas 0,37 0,19 0,56 0,37 0,37 0,56 0,28 0,19 0,19 0,19 0,28 0,09 0,37 0,56 0,28 0,37 0,84 0,19 0,47 0,19 0,56 0,19 0,19 0,28 H' - Reg. JIQH natural invertido 1,00 0,21 0,90 0,38 0,59 0,96 0,57 0,35 0,95 0,82 0,21 0,79 0,62 0,29 0,52 0,00 0,44 0,39 0,00 0,44 0,97 0,82 0,44 0,77 0,39 0,59 0,87 0,90 0,21 0,92 0,99 0,59 0,77 0,79 0,24 0,86 0,95 0,59 0,80 0,00 0,29 0,93 0,00 0,15 0,93 0,81 0,00 0,30 0,74 0,06 0,88 0,57 0,21 0,92 0,91 0,15 0,93 0,56 0,50 0,00 0,90 0,35 0,72 0,00 0,00 0,87 0,75 0,00 0,95 0,00 0,44 0,33 Métricas paisagem 0,93 0,84 0,53 0,52 0,44 0,83 0,74 0,87 0,68 0,85 0,88 0,80 0,97 0,93 0,77 0,68 0,74 0,73 0,76 0,92 0,88 0,84 0,82 0,76 Índice de Índice de naturalidade I naturalidade II 0,53 0,84 0,50 0,64 0,56 0,65 0,51 0,57 0,45 0,56 0,41 0,42 0,43 0,38 0,58 0,49 0,58 0,51 0,77 0,57 0,47 0,47 0,60 0,45 0,43 0,31 0,40 0,36 0,42 0,57 0,49 0,59 0,57 0,72 0,34 0,45 0,59 0,32 0,43 0,39 0,67 0,33 0,33 Continua... 151 Continuação... Bacia UA hidrográfica 949 Rio Negro 974 Rio Timbó 976* Rio Timbó 978 Rio Timbó 979 Rio Timbó 982 Rio Negro 984 Rio Negro 1001 Rio Chapecó 1003 Rio Chapecó 1010 Rio Timbó 1013 Rio Negro 1016 Rio Negro 1019 Rio Negro 1024 Rio Negro 1034 Rio Timbó 1042 Rio Negro 1055 Rio Canoinhas 1059 Rio Negro 1061 Rio Negro 1062 Rio Canoas 1063* Rio Negro 1190 Rio Canoas 1191 Rio Canoas Faixa altitudinal S dap Inferomontana Superomontana Inferomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana 0.44 0.69 0.41 0.60 0.46 0.77 0.66 0.58 0.23 0.53 0.80 0.75 0.62 0.31 0.75 0.74 0.50 0.53 0.62 0.39 0.62 0.39 0.50 Árvores grossas 0,19 0,28 0,56 0,37 0,19 0,09 0,00 0,37 0,37 0,09 0,00 0,19 0,28 0,37 0,09 0,28 0,09 0,28 0,37 0,37 0,56 0,28 0,47 H' - Reg. JIQH natural invertido 0,44 0,21 0,65 0,67 0,29 0,96 0,82 0,00 0,92 0,00 0,15 0,61 0,89 0,29 0,92 0,56 0,53 0,97 0,16 0,59 0,95 0,00 0,71 0,91 0,65 0,09 0,73 0,12 0,68 0,80 0,42 0,29 0,98 0,57 0,38 0,81 0,42 0,29 0,72 0,91 0,29 0,27 0,00 0,74 0,97 0,78 0,29 0,97 0,47 0,59 0,80 0,71 0,15 0,87 0,80 0,21 0,91 0,52 0,26 0,96 0,91 0,44 0,87 0,78 0,71 0,39 0,86 0,50 0,88 Métricas paisagem 0,78 0,75 0,84 0,82 0,50 0,60 0,65 0,12 0,60 0,78 0,91 0,65 0,60 0,60 0,65 0,51 0,61 0,58 0,44 0,24 0,64 0,38 0,41 Índice de Índice de naturalidade I naturalidade II 0,41 0,58 0,54 0,70 0,48 0,36 0,42 0,46 0,64 0,51 0,63 0,41 0,44 0,36 0,34 0,40 0,55 0,42 0,34 0,44 0,51 0,51 0,69 0,46 0,59 0,41 0,47 0,41 0,24 0,52 0,77 0,47 0,48 0,46 0,73 0,50 0,78 0,41 0,62 0,63 0,46 0,54 0,56 0,76 Continua... 152 Continuação... Bacia UA hidrográfica 1195 Rio Canoas 1980 Rio do Peixe 2002* Rio Canoinhas 3002 Rio Canoinhas 4000 Rio do Peixe 5000 Rio Canoas 6001* Rio Chapecó 6004 Rio Chapecó Faixa altitudinal S dap Superomontana Inferomontana Inferomontana Inferomontana Superomontana Superomontana Inferomontana Inferomontana 0,38 0,89 0,72 0,56 0,89 0,57 0,77 0,58 Árvores grossas 0,19 0,28 0,65 0,37 1,00 0,37 0,93 1,00 H' - Reg. JIQH natural invertido 0,81 0,65 0,91 0,77 0,71 0,95 0,58 0,15 0,91 0,20 0,15 0,97 0,00 0,00 0,59 0,89 0,35 0,69 0,75 0,24 0,90 0,57 0,15 0,44 Métricas paisagem 0,44 0,58 0,39 0,98 0,77 0,51 0,67 0,82 Índice de Índice de naturalidade I naturalidade II 0,50 0,63 0,62 0,63 0,50 0,43 0,49 0,39 0,32 0,53 0,69 0,63 0,51 0,69