DIREITO E BIOÉTICA EM FOCO Uma Análise

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DIREITO E BIOÉTICA EM FOCO Uma Análise
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DIREITO E BIOÉTICA EM FOCO
Uma Análise Multidisciplinar
3
CAPA: http://pixabay.com/static/uploads/photo/2013/07/18/10/55/microbiology163470_640.jpg
4
Juliana Rui Fernandes dos Reis Gonçalves
(Organizadora)
DIREITO E BIOÉTICA EM FOCO
Uma Análise Multidisciplinar
Autores:
Agatha Yuri Sonohara - Allana Marieli Mazaro Zarelli
Andressa Satie Ito Fujiwara - Caio Fábio Camargo
Dayze Camila Peres - Elian Sobreira - Fernanda Andrade Ré
Fernanda Caraçato Vettorazzo - Fernanda Trevisan
Giovana Primon - Gislaine Kremer do Couto
Helber Ribeiro Araújo - Jéssica Rodrigues Cardoso
Karoliny Pavesi - Kríssley Ribeiro dos Santos
Lais Caroline Moreira - Leliane Krauspenhar
Maiana Kelmer Araújo - Mariuci Roberta Barrreto da Costa
Paula Barbosa Biasão - Patrícia Bastos
Rafael Walsh Crestani - Ricardo Baccaro
Simara Cristina de Souza Molina - Simone Cristina de Sá
Soeli Alves Brito - Veridiane Merlos
Sob a Orientação da:
Profa. Ms. Juliana Rui Fernandes dos Reis Gonçalves
II Edição
Editora Vivens
O Conhecimento a serviço da Vida!
Maringá – PR
2014
5
Copyright 2014 by Humanitas Vivens Ltda
EDITORES:
Daniela Valentini
José Francisco de Assis Dias
CONSELHO EDITORIAL:
Prof. Dr. Daniel Eduardo dos Santos [UNICESUMAR]
Prof. Dr. José Beluci Caporalini [UEM-Maringá]
Prof. Dra. Lorella Congiunti [PUU-Roma]
REVISÃO ORTOGRÁFICA:
Prof. Antonio Eduardo Gabriel
CAPA, DIAGRAMAÇÃO E DESIGN:
Rogerio Dimas Grejanim
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
D598
Direito e bioética em foco: uma análise
multidisciplinar / Juliana Rui Fernandes
dos Reis Gonçalves, organizadora. -2 ed. Maringá, PR : Vivens, 2014.
161p.
ISBN 978-85-8401-021-9
Disponível em: www.vens.com.br
1. Direito – Bioética. 2. Eutanásia –
Direito. 3. Pedofilia. 4. Aborto.
CDD-DIR
4.ed.
341.27
Ivani Baptista –Bibliotecária CRB-9/331
Todos os direitos reservados com exclusividade para o
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6
Sumário
Prefácio .................................................................................11
CAPÍTULO I:
ANÁLISE SOBRE A DISCUSSÃO
ACERCA DA EUTANÁSIA..................................................12
1 Introdução......................................................................... 14
2 Bioética.............................................................................14
2.1 Origem e Conceito de Bioética..................................... 14
2.2 Princípios da Bioética.................................................. 16
2.2.1 Princípio da Autonomia....................................... 17
2.2.2 Princípio da Beneficência ....................................19
2.2.3 Princípio da não-maleficência...............................19
2.2.4 Princípio da Justiça..............................................20
3 Considerações históricas.....................................................21
4 Eutanásia no Brasil.............................................................24
5 Eutanásia, Mistanásia, Distanásia e Ortotanásia...................26
6 Países que permitem a prática da Eutanásia.........................28
7 Eutanásia, Religião e divergências.......................................32
7.1 Religião Católica..........................................................32
7.2 Religião Judaica............................................................34
7.3 Religião Islâmica..........................................................34
7.4 Religião Hindu..............................................................35
7.5 Religião Budista...........................................................35
7.6 Religiões Novas............................................................36
7.7 Instituições defensoras da Eutanásia..............................36
8 Conclusão...........................................................................37
9 Referências.........................................................................39
CAPÍTULO II:
COBAIAS HUMANAS..........................................................41
1 Introdução...........................................................................42
2 Breve histórico da Bioética.................................................42
3 Bioética: conceito e princípios............................................44
4 Conceito de Cobaias Humanas.............................................46
7
5 As Cobaias Humanas: sua análise frente
aos princípios bioéticos e da dignidade
48
da pessoa humana.............................................................
6 Termo de consentimento informado e
protocolo de pesquisa............................................................. 51
7 Conclusão............................................................................59
8 Referências.........................................................................61
CAPÍTULO III:
ABORTO ANENCEFÁLICO.................................................63
1 Introdução..........................................................................64
2 Aborto................................................................................64
2.1 Aspectos históricos...................................................... 66
3 Países que autorizam o aborto de anencéfalos...................... 69
4 Princípios Constitucionais relacionados ao tema .................. 71
4.1 Princípio da dignidade da pessoa humana...................... 71
4.2 Princípio da Harmonização dos bens jurídicos .............. 72
5 Anencefalia........................................................................ 73
5.1 Conceito de feto anencefálico...................................... 73
5.2 Prognósticos................................................................ 74
5.3 Prevenção.................................................................... 76
6 Aborto por anencefalia....................................................... 77
6.1 Prós e contras do aborto anencefálico........................... 77
7 Como têm decidido os juízes no caso do
aborto anencefálico............................................................ 87
7.1 ADPF 54.......................................................................90
8 Conclusão...........................................................................91
9 Referências.........................................................................92
CAPÍTULO IV:
PEDOFILIA NA INTERNET:
UM CRIME CARENTE DE PUNIÇÃO.................................97
1 Introdução..........................................................................99
2 Conceitos...........................................................................100
3 Panorama histórico da pedofilia..........................................103
4 Pedofilia na Internet...........................................................109
5 Bioética e Biodireito relacionado com a pedofilia ................114
8
120
6 Pedofilia na legislação brasileira.........................................
122
6.1 Comissão Parlamentar de Inquérito da Pedofilia............
125
7 Conclusão...........................................................................
126
8 Referências.........................................................................
CAPÍTULO V:
133
PEDOFILIA: OS DOIS LADOS DO TRAUMA....................
134
1 Introdução.........................................................................
134
2 Pedofilia............................................................................
134
2.1 Conceitos e considerações gerais..................................
136
2.2 Soluções da Medicina...................................................
138
3 Pedófilo..............................................................................
138
3.1 Os abusadores usuais.....................................................
139
3.2 Transtornos..................................................................
142
3.3 Justificativas.................................................................
146
4 Vítimas..............................................................................
146
4.1 Quem são as vítimas.....................................................
149
4.2 Tipos de abusos............................................................
150
4.3 Consequências nas vítimas dos pedófilos......................
5 Enfoque contemporâneo sobre a pedofilia
151
e o que a lei traz sobre o assunto.............................................
155
6 Conclusão...........................................................................
156
7 Referências...................................................... ...................
9
10
PREFÁCIO
É possível que se questione ao ler o índice desta obra o
porque tratamos de temas tão diferenciados em um único livro.
Contudo, apesar de diferentes, todos os assuntos tratados são
de igual importância quando se fala em dignidade da pessoa
humana. Tendo como base o estudo deste assunto, desenvolve se na Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR –
Câmpus Maringá, mais especificamente na disciplina
intitulada Filosofia Jurídica, o estudo de vários temas ligados
ao Direito e a Bioética, tendo-se como enfoque principal a
análise da dignidade da pessoa humana, protegida pela
Constituição Federal de 1988 em seu artigo 1°, inciso III.
Cabe ressaltar que o estudo de tema tão relevante a
seara jurídica é de suma importância face aos vários
acontecimentos que tem violado esse direito, buscando -se
demonstrar nesta que, apesar das situações tratadas serem
muito diferenciadas, sempre tem em comum a violação a este
princípio básico a todo ser humano.
Ressalta-se ainda a importância de cada tema em sua
singularidade, posto que cada um dos assuntos, traz em si
várias controvérsias que inquietam e preocupam os operadores
do Direito e, porque não dizer, a sociedade como um todo,
posto que todos são de grande relevância e interesse social.
Não deixando de tratar da Bioética, destaca-se que a
mesma é aqui trazida, posto que esta, mesmo que inicialmente
tenha sido criada para analisar as questões referentes ao
equilíbrio e a preservação das relações humanas com o
ecossistema e tudo que o envolve, foi tomando contornos
voltados ao estudo sistemático da conduta humana no campo
das ciências da vida e da saúde, quando estas se voltam a
realizar essa análise sob a ótica dos valores e princípios
morais 1, acrescentando que, seus estudiosos, cada vez mais,
tem estendido sua análise a temas que envolvam o bem estar e
1
Encyclopedia of bioethics, New York, Macmillan Ed. Reich, 1995, v.
1.
11
o futuro da humanidade, preocupando-se dessa forma, com a
qualidade de vida destes, o que está diretamente ligado à
dignidade da pessoa humana.
Como se acredita que a discussão pode despertar
mudanças, traz-se uma singela colaboração acerca dos temas
aqui tratados, realizada por estudantes de Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná – PUCPR – Câmpus Maringá,
os quais, sendo despertados ao interesse pelo estudo dos temas
em questão, buscaram refletir sobre as necessidades atuais de
mudanças legislativas e sociais, para que realmente se
implemente o principio da dignidade da pessoa humana.
12
CAPÍTULO I:
ANÁLISE SOBRE A DISCUSSÃO
ACERCA DA EUTANÁSIA
Allana Marieli Mazaro Zarelli
Andressa Satie Ito Fujiwara
Dayze Camila Peres
Fernanda Trevisan
Lais Caroline Moreira
Ricardo Baccaro 2
Resumo
A presente pesquisa tem como fim analisar a prática da
eutanásia, fazendo um paralelo entre os conceitos de
distanásia, mistanásia e ortotanásia, traçando para tanto um
parâmetro histórico acerca da evolução do entendimento da
primeira e abordando-a em conjunto com os princípios da
bioética, os quais são denominados de princípio da
autonomia, da beneficência, da não-maleficência e da justiça.
Buscar-se-á, ainda, versar sobre os diversos vieses religiosos
acerca do tema e, também, sobre o posicionamento legal em
diferentes lugares que aderem ou não a tal prática.
Palavras-chave: Eutanásia. Bioética. Dignidade da pessoa
humana.
2
Acadêmicos do quinto período do Curso de Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná – Campus Maringá.
13
1 INTRODUÇÃO
Levando em consideração a base principiológica que
envolve a bioética e os preceitos constantes no ordenamento
jurídico pátrio, percebe-se uma grande discussão no tocante a
prática da eutanásia como ato legal ou não, questionando ainda
o fato de esta ser considerada uma conduta ética e se está ou
não preservando a dignidade daquele que é sujeito passivo de
tal prática.
Na antiguidade, a prática da eutanásia era considerada
algo natural e era aplicada com o intuito de eliminar aqueles
que para eles eram tidos como “desnecessário”, posto que
tanto os idosos como as crianças que nasciam com problemas
genéticos não contribuíam para o desenvolvimento das
cidades, podendo também ser precursores de prole defeituosa.
Dessa forma, nesse período nem se cogitava analisar os
direitos daquelas pessoas.
Atualmente, com a evolução da sociedade, da ciência e
dos valores éticos e morais, este tema passou a ser muito
discutido, justamente, porque o princípio que prepondera é o
da dignidade da pessoa humana.
Em alguns países esta prática é tolerada, todavia, não é
legalizada. Enquanto que no Brasil, por exemplo, o
entendimento é taxativo no sentido da inaplicabilidade da
eutanásia, sendo aquele que a pratica responsabilizado por
homicídio qualificado.
2 BIOÉTICA
Este tópico propõe-se a resgatar, por meio da revisão
bibliográfica, a origem, o conceito e os princípios da bioética.
2.1 ORIGEM E CONCEITO DE BIOÉTICA
A palavra bioética foi utilizada pela primeira vem em
1927, em um artigo publicado no periódico alemão Kosmos,
por Fritz Jahr, que a caracterizou como “o reconhecimento de
14
obrigações éticas, não apenas em relação ao ser humano, mas
para com todos os seres vivos”. Mas, foi somente em 1970,
que Van Rensselaer Potter a descreveu como a “ciência da
sobrevivência”, visando com o seu estudo estabelecer uma
interface entre as ciências e as humanidades 3.
A expressão bioética, de origem grega (bios, vida, e
ethos, ética), é formada pela junção de “bio”, que significa o
conhecimento biológico, a ciência dos sistemas vivos,
enquanto “ética” representa o conhecimento dos valores
humanos 4.
O conteúdo do que hoje se entende como bioética vem
sendo desenvolvido desde as primeiras décadas do século XX,
uma vez que os princípios da bioética, como a beneficência e
não-maleficência buscam sua fonte em Hipócrates, refletindo
também o repúdio aos abusos cometidos por profissionais da
saúde durante a Segunda Guerra Mundial 5.
Mas, devem-se ao oncologista americano Van
Renseelaer Potter as primeiras noções de bioética 6, posto que
este a entendia como uma combinação de conhecimento
científico e filosófico, o que posteriormente denominou de
“bioética global”, com o qual tinha a pretensão de que se
tornasse um conhecimento voltado a estabelecer os padrões
éticos necessários à própria subsistência do homem e não
apenas um ramo da ética aplicada à medicina. Dessa forma, em
1998, afirmou:
A teoria original da bioética era a intuição da
sobrevivência da espécie humana, numa
forma decente e sustentável de civilização,
exigindo o desenvolvimento e manutenção de
um sistema de ética. Tal sistema [...] é a
3
GOLDIM, José Roberto. Bioética: origens e complexidade. Revista
HCPA, v. 26, n. 2, p. 86-92, 2006. p. 86.
4
PESSINI, Leo. Bioética: das origens à prospecção de alguns desafios
contemporâneos. O Mundo da Saúde, v. 29, n. 3, p. 305-324, jul./set.
2005. p. 308.
5
FROEHLICH, Charles Andrade. Bioética e direitos além de “humanos”:
um enfoque filosófico jurídico contemporâneo. Revista Brasileira de
Bioética, v. 2, n. 1, p. 87-106, 2006. p. 90.
6
Ibid.
15
bioética
global,
fundamentada
em
instituições e reflexões fundamentadas no
conhecimento empírico proveniente de todas
as ciências, em especial, porém, do
conhecimento biológico. [...] Na atualidade,
este sistema ético proposto segue sendo o
núcleo da bioética, ponte com sua extensão
para a bioética global, o que exigiu o
encontro da ética médica com a ética do
meio
ambiente
para
preservar
a
sobrevivência humana 7.
Explica Heloísa Helena Barboza que após Potter ter
colocado em circulação como uma nova disciplina, esse termo
se difundiu rapidamente, adquirindo o significado específico e
científico de nova dimensão da pesquisa no campo dos estudos
acadêmicos, surgindo, em menos de uma década, como
disciplina autônoma na Universidade Católica do Sagrado
Coração, em Roma, assim como institutos dedicados a sua
investigação 8.
2.2 PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA
O aparecimento da bioética concretiza a aspiração
secular de estabelecimento de uma ética global para as
ciências biomédicas e da promoção de uma racionalidade
abrangente voltada para a criação de uma consciência
ambiental 9.
Os princípios da bioética foram estabelecidos a partir da
criação pelo Congresso dos Estados Unidos, de uma Comissão
Nacional que se encarregou de identificar os princípios éticos
básicos que deveriam guiar a investigação em seres humanos
7
PESSINI, Leo. Bioética: das origens à prospecção de alguns desafios
contemporâneos. O Mundo da Saúde, Op. cit., 2005. p. 309.
8
BARBOZA, Heloísa Helena. Princípios da bioética e do biodireito.
Revista de Bioética e Ética Médica publicada pelo Conselho Federal
de Medicina, v. 8, n. 2, p. 209-216, 2000. p. 209-210.
9
HECK, José. Principialismo bioético: a posição de R. Dworkin sobre
aborto e eutanásia. Ethic@, v. 6, n. 2, p. 217-237, dez. 2007. p. 218.
16
realizado pelas ciências do comportamento e pela
Biomedicina. Os trabalhos tiveram início em 1974 e, quatro
anos depois, foi publicado o Relatório Belmonte, contendo três
princípios: a) da autonomia ou do respeito às pessoas por suas
opiniões e escolhas, segundo valores e crenças pessoais; b) da
beneficência, que se traduz na obrigação de não causar dano e
de extremar os benefícios e minimizar os riscos; c) o da justiça
ou imparcialidade na distribuição dos riscos e dos benefícios,
não podendo uma pessoa ser tratada de maneira distinta de
outra, salvo haja entre ambas alguma diferença relevante 10.
A esta proposta, Beauchamp e James Childress
acrescentaram, em 1979, o princípio da não maleficência,
segundo o qual não se deve causar mal a outro 11.
2.2.1 Princípio da autonomia
O princípio bioético da autonomia da bioética foi
desenvolvido de forma diferente da noção kantiana de
autonomia, ressaltando o livre-arbítrio como expressão da
capacidade humana adquirida para deliberar e exercer escolha
de ações e separar a congruência estabelecida por Kant entre
moralidade e autonomia 12.
Na abordagem da bioética, uma conduta deve ser vista
como autônoma quando é submetida ao consentimento livre,
ou seja, autonomia consiste em discernir acerca de seu próprio
bem e tomar decisões isentas de paternalismo, amparadas pelo
consentimento informado. Em outras palavras, a autonomia
principialista limita-se a incorporar na bioética o direito moral
do paciente de tomar suas próprias decisões, mesmo que com
isto o indivíduo neutralize orientações benéficas prescritas
pelo médico 13.
O princípio da autonomia tem por base os pressupostos
de que a sociedade democrática e a igualdade de condiç ões
10
BARBOZA, Heloísa Helena. Op. cit., 2000. p. 211.
DINIZ, Débora; GUILHEMM, Dirce. O que é bioética. São Paulo:
Brasiliense, 2002. p. 38.
12
HECK, José. Op. cit., 2007. p. 219.
13
Id
11
17
entre os indivíduos constituem pré-requisitos para a
coexistência das diferentes morais. Assim, a existência da
noção moral de respeito à autonomia significa que a
autodeterminação do agente moral só pode ser considerada se
não ocasionar danos ou sofrimentos a outros indivíduos 14.
Por outro lado, é indispensável diferenciar a autonomia
do respeito à autonomia dos indivíduos. As pessoas que são
consideradas dependentes e/ou vulneráveis, como por
exemplo, as crianças, os deficientes mentais, os idosos e
pacientes dentro de uma hierarquia rígida e de estruturas
fechadas dos serviços de saúde, devem ter sua integridade e
desejos protegidos, embora não sejam capazes de exercer
plenamente a autonomia 15.
Em consequência, tornou-se imprescindível encontrar
uma solução eticamente aceitável para que os indivíduos
social e fisicamente vulneráveis fossem respeitados em suas
escolhas morais. No entanto, apenas uma tênue linha separa a
proteção da autoridade, uma vez que em nome dessa proteção
de vulneráveis é possível justificar o silenciamento de certas
opções discordantes, por exemplo. Assim, a incapacidade,
temporária ou permanente, justificava a sobreposição entre
autoridade médica e autoridade ética. A saída formal
encontrada foi a introdução de consentimento infor mado para
que se pudesse garantir os interesses e a proteção dos
pacientes em situação de pesquisa e de atendimento clínico 16.
Mas, ainda assim, o consentimento livre e esclarecido
para ter validade requeria que o indivíduo demonstrasse
competência para decidir, domínio de informações detalhadas
a respeito do seu caso e das diferentes possibilidades
terapêuticas a ele relacionadas, capacidade para compreender
as informações recebidas para que tivessem condições de
embasar o processo de tomada de decisões e oportunidade de
escolher livre e voluntariamente a opção mais adequada ao seu
caso, sem submeter-se à coerção de outras pessoas ou
14
DINIZ, Débora; GUILHEMM, Dirce. O que é bioética. São Paulo:
Brasiliense, 2002. p. 45.
15
Ibid. 2002, p. 46.
16
Ibid. 2002, p. 47.
18
instituições. Assim, tem-se que os pré-requisitos que validam
um consentimento livre e esclarecido não são para todos,
atingindo apenas uma reduzida parcela de indivíduos que se
enquadram como socialmente privilegiados 17.
2.2.2 Princípio da beneficência
A beneficência encontra-se associada a excelência
profissional desde a medicina praticada na Grécia Antiga,
estando expressa no Juramento de Hipócrates: “Usarei o
tratamento para ajudar os doentes, de acordo com minha
habilidade e julgamento e nunca o utilizarei para prejudicá los” 18.
Este princípio significa, em termos práticos, que se tem
a obrigação moral de agir para o benefício do outro, obrigando
o profissional de saúde a ir além da não-maleficência, ou seja,
de não causar danos intencionalmente, e exige que ele
contribua para o bem-estar dos pacientes, promovendo ações
para prevenir e remover o mal que se configura como a doe nça
e incapacidade, e para fazer o bem entendido como saúde
física, emocional e mental 19.
2.2.3 Princípio da não-maleficência
Este princípio configura-se como herdeiro da tradição
deontológica hipocrática e se associa à máxima “acima de
tudo, não cause danos” 20. Este preceito, “mais conhecido em
sua versão para o latim, primum non nocere”, é utilizado como
uma exigência moral da profissão médica. Portanto, trata -se de
um dever profissional que, se não cumprido, coloca o
profissional de saúde em uma situação de má-prática ou
17
DINIZ, Débora; GUILHEMM, Dirce. Op. cit., 2002, p. 47.
LOCH, Jussara de Azambuja. Princípios da bioética. Disponível em:
<http://www.pucrs.br/
bioetica/conr/joao/principiosdebioetica.pdf> .
Acesso em: 3 mar. 2010. p. 3.
19
Id.
20
DINIZ, Débora; GUILHEMM, Dirce. Op. cit., 2002, p. 49.
18
19
prática negligente da medicina ou demais profissões das áreas
da saúde 21.
O princípio adquire relevância pelo fato de que, muitas
vezes, o risco de causar danos é inseparável de uma ação ou
procedimento que é moralmente indicado. Deve-se observar
que no exercício da medicina este é um fato comum,
considerando que quase toda intervenção diagnóstica ou
terapêutica envolve algum risco de dano, mas, do ponto de
vista ético, este dano se justifica se o benefício esperado com
o resultado do exame ou do método terapêutico empregado for
maior que o risco da doença 22.
2.2.4 Princípio da justiça
Diferentemente
dos
princípios
mencionados
anteriormente, o princípio da justiça está associado,
preferencialmente, com as relações entre os grupos sociais,
preocupando-se com a eqüidade na distribuição de bens e
recursos considerados comuns, como uma tentativa de igualar
as oportunidades de acesso a estes bens 23.
Esta teoria dos quatro princípios, segundo Volnei
Garrafa, apesar de sua reconhecida praticidade e utilidade para
a análise de situações clínicas e em pesquisa, é ainda
insuficiente para se realizar uma análise contextualizada de
conflitos que exijam flexibilidade para uma determinada
adequação cultural, assim como para enfrentar problemas
bioéticos persistentes encontrados por grande parte da
população de países com índices de exclusão social como o
Brasil e outros da América Latina e Caribe 24.
21
LOCH, Jussara de Azambuja. op. cit. p. 2.
Id.
23
Ibid., p. 5.
24
GARRAFA, Volnei. De uma bioética de princípios a uma bioética
interventiva, crítica e socialmente comprometida. Revista Argentina de
Cirurgia
Cardiovascular,
2005.
Disponível
em:
<http://www.anvisa.gov.br>. Acesso em: 3 mar. 2010. p. 7.
22
20
3 CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS
Na Grécia Antiga, já se discutia a questão da Eutanásia
englobando valores sociais, religiosos e culturais. A partir
desta discussão surgiram correntes de pensadores que
adotaram uma posição a favor da eutanásia, bem como uma
corrente contrariando esta linha de pensamento.
Alguns estudiosos como Platão, Sócrates, Epicuro, por
exemplo, entendiam que o sofrimento como conseqüência de
uma doença dolorosa era uma justificativa ao suicídio. Esse
pensamento era convergente ao entendimento de Thomas
Morus, na obra “Utopia”, na qual apoiava o homicídio dos
idosos, dos incuráveis e dos enfermos com a finalidade de
conscientizar os educadores a transmitir a ideia de suicídio a
essa categoria de pessoas. Esses pensadores entendiam que
aquelas pessoas que se mostrassem infrutíferas a sociedade
deveriam autodestruir-se 25.
Em contrapartida, outros filósofos, tais como
Aristóteles, Pitágoras e Hipócrates, mostravam-se contrários a
idéia do suicídio. Observa-se isso, quando Hipócrates disse em
seu juramento que não daria qualquer droga fatal a uma pessoa
e não sugeriria o uso de qualquer uma daquele tip o. Com isso,
a escola hipocrática já se posicionava contra o que atualmente,
são denominados eutanásia e suicídio assistido 26.
A prática da eutanásia foi muito usual anteriormente,
entre vários povos e sob diversas modalidades, dentre eles, na
Índia, havia o costume de se atirar as pessoas doentes ao Rio
Ganges. Enquanto que em Esparta, a prática se configurava
por meio do arremesso de crianças, menos saudáveis, de cima
do monte “Taigeto”. A justificativa utilizada pelos espartanos
era o fato de evitar que tais crianças sofressem e se tornassem
um “problema” aos respectivos familiares e também ao
25
BIZATTO, José Ildefonso. Eutanásia e responsabilidade médica . 2.
ed. rev. au. Atual. São Paulo: Direito, 2000. p. 44.
26
GOLDIM,
José
Roberto.
Bioética.
Disponível
em:<http://www.bioetica.ufrgs.b r/euthist.htm> Acesso em: 1 de mar. de
2010.
21
Estado. 27 Para eles o homicídio não era tido como crime, desde
que o praticasse em honra aos deuses. Enquanto que, a
eliminação dos idosos, pedido muitas vezes por eles mesmos,
era uma atitude de piedade filial 28.
Ao passo que os romanos não eram tão rudes, com
relação àqueles que eram condenados à crucificação, estes
recebiam uma bebida que acarretava em sono profundo,
eliminando, assim, as dores dos castigos. 29
Na realidade, as pessoas tidas como inúteis, doentes e
velhas não contribuíam em nada, tanto para a sociedade quanto
para os olhos da divindade. De forma análoga a eutanásia era
praticada pelos Celtas, os quais além de matarem as crianças
com problemas genéticos eliminavam também os idosos por
reputá-los desnecessários a sociedade 30.
A partir disso, sedimentou-se a idéia de que a prática da
eutanásia fosse aplicada nos casos de dores insuportáveis,
doenças incuráveis, ônus econômico e pesares sociais
resultantes de moléstia, sendo, portanto, nesses casos,
plenamente aceita.
A questão da eutanásia foi muito discutida no decorrer
da história, mas o seu auge ocorreu em 1895, na Prússia,
durante um debate sobre o plano nacional de saúde, em que foi
decidido que o Estado fomentasse meios para a prática da
eutanásia às pessoas que não tinham condições de solicitá -la. 31
Na Europa, em meados do século XX, a eutanásia foi
discutida relacionada com a eugenia, entendendo-se esta como
o conjunto de métodos que visam melhorar o patrimônio
genético de grupos humanos. 32 Por isto, o objetivo da
eutanásia eugênica seria preservar a raça humana dos
problemas biológicos, levando em consideração que o
27
BIZATTO, op. cit., 2000, p. 43.
Ibid.,2000, p.51.
29
BIZATTO, op. cit., 2000, p.50.
30
Ibid.,2000, p.46
31
GOLDIM, José Roberto. Bioética. op., cit.
32
DICIONÁRIO priberam da língua portuguesa. Disponível em:
<http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=eugenia > Acesso em: 1
mar. de 2010.
28
22
suprimento dos seres mórbidos incuráveis iria propor mais paz
social minimizando a miséria e o desespero de lares
deformados. 33
Nestes casos, a eutanásia justificava-se por reputar um
instrumento de “higienização social”, com o objetivo
aperfeiçoar uma determinada “raça”, desprendendo da idéia de
suprir a vida por compaixão ou piedade. 34
Em 1931, na Inglaterra, foi proposta uma lei para a
legalização da eutanásia voluntária, a qual foi discutida por
cinco anos, mas foi rejeitada pela Câmara dos Lordes. Tal
proposta foi utilizada como base para o modelo holandês. 35
Em 1934, o Uruguai implantou a possibilidade da
prática da eutanásia em seu Código Penal, utilizando o tipo
penal “homicídio piedoso”. Esse fato, possivelmente, deu
início a regulamentação nacional sobre o assunto. 36
Em, 1956, a posição da Igreja Católica mostrou -se de
maneira antagônica a realização da eutanásia, uma vez que
esta feria as leis divinas. Todavia, em 1957, o Papa Pio XII se
conformou com a possibilidade da abreviação da vida como
efeito secundário a utilização de drogas para atenuar o
sofrimento as pessoas que sofriam com dores insuportáveis,
por exemplo. Com isto, surgiu o Princípio do Duplo Efeito,
cuja intenção era aliviar a dor, todavia, o efeito, sem nexo
causal, poderia ser a morte do paciente. 37
Em 1968, a Associação Mundial de Medicina adotou
uma resolução contrária a eutanásia 38.
No Brasil, em 1996, o Senado Federal iniciou uma
proposta permitindo a prática de procedimentos para a
realização da eutanásia, contudo esse projeto (Lei 125/96)
demonstrou-se infrutífero. 39
33
34
35
36
37
38
39
GOLDIM, José Roberto. Bioética. op.,cit.
Id.
Id.
GOLDIM, José Roberto. Bioética. Op. cit.
Id.
Id.
Id..
23
4 EUTANÁSIA NO BRASIL
Para que se entenda melhor o posicionamento do Direito
Brasileiro em relação à eutanásia, é necessário criar um
parâmetro desta com os Direitos Fundamentais do homem.
A Constituição Federal estabelece em seu artigo 5º
caput, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.” 40
Os direitos fundamentais têm como escopo uma
convivência social, digna e livre de privações, ou seja, tem a
finalidade de assegurar prerrogativas importantes e
fundamentais entre todos os seres humanos.
O Brasil adota a linha de pensamento a qual defende
que o direito à vida é um direito supremo e inviolável,
inerente à pessoa humana e que ninguém pode se privar dele.
Portanto, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro e
seus princípios, a eutanásia é configurada como a antecipação
do contraposto da vida, a morte, e isso se caracteriza como um
ato ilícito e inconstitucional.
Diante desse contexto, a eutanásia é considerada como
crime de homicídio, para o ordenamento jurídico. Porém, gera
muita discussão e controvérsias observando correntes em
relação à religião, à sociedade e a opiniões médicas.
A eutanásia, além de configurar ilícito penal, contraria
também os princípios médicos éticos. O Código de Ética
Médica resguarda que o médico deve atuar sempre em
benefício do paciente, contudo, há que se falar no que
realmente seria esse beneficio, em relação à estado vegetativo
e coma irreversível, por exemplo.
Há grande discussão em face do que seria melhor para
aquele, para atenuar o sofrimento do mesmo e dos familiares,
visto que essa situação poderá ser por tempo indeterminado e
sem a mínima perspectiva de progresso.
40
PRESIDÊNCIA da república federativa do Brasil. Disponível em: <
http://www.presidencia.gov.br/legislacao/ > Acesso em: 22 de mar. 2010
24
Há um projeto de lei elaborado desde 1995, que está
tramitando no Senado Federal, tendo como critério “a morte
sem dor”, a qual é conhecida como lei 125/96.
Esse é o único projeto de lei acerca do assunto, o qual
prevê que o próprio paciente com sofrimento físico ou
psíquico, pode solicitar o desligamento dos aparelhos.
Se por algum motivo o paciente for considerado
impedido de realizar a solicitação, essa função ficaria à cargo
da família, ou seja, a mesma teria que autorizar o
desligamento dos aparelhos.
Para que isso aconteça, é necessária a autorização de
uma comissão envolvendo cinco médicos, sendo dois deles
especialistas no problema do paciente. Essa junta médica tem
o encargo de atestar a inutilidade do sofrimento do doente,
caso a mesma não seja revelada, não se teria a autorização.
A grande falha desse projeto é referente a algumas
lacunas que propiciou em relação ao tempo que o paciente tem
para tomar sua decisão, o critério para escolha do médico
responsável, entre outros aspectos.
Além deste projeto de lei, está tramitando o anteprojeto
de Lei que altera os dispositivos do Código Penal e promove
outras providências, legislando sobre a questão da eutanásia
em dois itens do artigo 121. Supostamente, esse dispositivo
ficaria da seguinte forma:
Homicídio
Art. 121. Matar alguém:
Pena - Reclusão, de seis a vinte anos.
...
Eutanásia
Parágrafo 3 o . Se o autor do crime agiu por
compaixão, a pedido da vítima, imputável e
maior, para abreviar-lhe o sofrimento físico
insuportável, em razão de doença grave:
Pena - Reclusão, de três a seis anos.
Exclusão de Ilicitude
Parágrafo 4 o . Não constitui crime deixar de
manter a vida de alguém por meio artificial,
se previamente atestada por dois médicos, a
25
morte como iminente e inevitável, e desde
que haja consentimento do paciente, ou na
sua
impossibilidade,
de
ascendente,
descendente, cônjuge, companheiro ou
irmão. 41
No entanto, no início desse ano, foi eticamente liberado
para os médicos a prática da ortotanásia, a qual permite que os
profissionais evitem tratamentos desnecessários, já que o
paciente está em estado terminal, se utilizando de cuidados
paliativos, os quais reduzem o sofrimento do doente. 42
A inclusão da redação dessa prática no Código de Ética
Médica, foi bastante cuidadosa para que a ortotanásia não seja
confundida com nenhuma outra prática. 43
5 EUTANÁSIA, MISTANÁSIA, DISTANÁSIA E
ORTOTANÁSIA
Eutanásia é uma palavra que vem do grego, tendo como
tradução “boa” morte ou até mesmo morte “feliz”. No entanto
eutanásia atualmente significa produção e aceleração
intencional da morte 44.
Na discussão sobre eutanásia, geralmente o que une as
pessoas é a preocupação de defender a dignidade da vida
humana em sua fase terminal. Um fator que complica o debate
sobre a prática ou não da eutanásia é a confusão terminológica
que, muitas vezes, não deixa claro aquilo que se condena
aquilo e aquilo que se aprova, pois muitos tratam eutanásia,
41
GOLDIM, José Roberto. Eutanásia no Brasil. Disponível em:
http://www.ufrgs.br/bioetica/eutanbra.htm. Acesso e m: 22 de mar. 2010.
42
Disponível em:
http://jc.uol.com.br/canal/cotidiano/saude/noticia/2010/04/12/novo codigo-de-etica-medica-libera-ortotanasia-218995.php. Acesso em: 31 de
maio, 2010.
43
Disponível em: http://routenews.com.br/index/?p=1777. Acesso em: 31
de maio, 2010.
44
HOLLAND, Stephen. Bioética: Enfoque Filosófico. São Paulo: Loyola.
2009.p 120.
26
distanásia, mistanásia e ortotanásia como se fossem o mesmo
procedimento e tivessem a mesma finalidade 45.
Inaceitável é que se confunda mistanásia com eutanásia,
pois temos que entender eutanásia como um método que tem
como finalidade proporcionar o fim da dor com a morte
prematura do portador de doença terminal, diferente da prática
da mistanásia que consiste na ceifa da vida para fins soci ais e
mesquinhos.
Portanto enquanto a primeira tem como grande
preocupação acabar com a dor e o sofrimento através da morte,
segundo seus defensores, a segunda também conhecida,
erroneamente, como eutanásia social tem em vista eliminar o
sobre peso do sistema de saúde com a eliminação precoce,
cruel, de doentes, deficientes, vítimas de erro médico que não
correm risco de vida, mas apenas necessitam de cuidados
paliativos, sendo ela uma categoria que demonstra com
lealdade o fenômeno da maldade humana. 46
Tratando-se da distanásia não há uma preocupação
restrita a morte, mas com todas as conseqüências que
acompanham a mesma, como as fortes dores sem o sofrimento
psíquico e espiritual. A diferença existente entre distanásia e
eutanásia é que enquanto a distanásia se dedica a prolongar o
máximo à quantidade de vida humana, combatendo a morte
como o grande e último inimigo, já a eutanásia elimina a vida
como o único modo de acabar como sofrimento do doente.
Portanto, tem-se dois métodos distintos de enfrentar o
momento morte, um pecando ao ceifar a vida antes do tempo e
o outro usando todos os métodos terapêuticos para evitar o
alcance do descanso, esquecendo, no entanto, que prolongar a
vida torna-se inútil e sacrificante para o próprio ser humano.
A última vertente que liga com o evento morte,
procurando lidar da melhor maneira com as suas
conseqüências é a ortotanásia que diferente das demais
vertentes dispensa a medicina predominantemente curativa
para dedicar-se a promoção do bem estar do doente crônico e
45
PESSINI, Leo. Eutanásia: Por que abreviar a vida? São Paulo: Centro
Universitário São Camilo. 2004.p 201.
46
Ibid., 2004.p 210 et seq.
27
terminal, desenvolvendo a arte de bem morrer, que não adere à
política da mistanásia, mas não se deixa envolver nas questões
obscuras tanto da eutanásia como da distanásia. A prática da
ortotanásia integra o conhecimento científico com a habilidade
técnica e a sensibilidade ética, deixando a perspectiva de
morte como uma doença a ser curada e passando a lidar com
ela como algo que faz parte da vida, passando a trabalhar a
distinção entre curar e cuidar, mantendo a vida, mas também
permitindo que a pessoa morra quando a hora chegou,
permitindo ao paciente e suas familiares enfrentarem a morte
da melhor maneira possível. 47
Na ortotanásia 48 respeita-se a autonomia do paciente
terminal respeitando seu direito de saber, o direito de não se
ver abandonado, o direito de ter seu sofrimento e sua dor
amenizados através de tratamentos paliativos, e o direito de
não ser tratado como objeto tendo sua vida encurtada ou
prolongada segundo a consciência e conveniência de suas
familiares e da equipe médica. Desta maneira a ortotanás ia
nada mais é que proporcionar ao doente uma morte tranqüila,
cercada de amor e carinho 49.
6 PAÍSES QUE
EUTANÁSIA
PERMITEM
A
PRÁTICA
DA
Somente alguns países permitem a prática da eutanásia
sem considerá-la como crime, são eles: a Holanda, alguns
estados dos Estados Unidos da América e a Colômbia.
Na Holanda a eutanásia é legalizada. Essa questão da
eutanásia vem sendo debatida desde a década de 1970,
ganhando destaque em 1973 com o caso conhecido como
Postma, onde uma médica geral, Dra. Geertruida Postma, foi
julgada por eutanásia, praticada em sua mãe, com uma dose
47
PESSINI, Leo. Eutanásia: Por que abreviar a vida? Op. cit., 2004, p
218 et seq.
48
GODIM,
José
Roberto.
Eutanásia.
Disponível
em:
<
HTTP://www.ufrgs.br/bioetica/eutanasia.htm >. Acesso em: 22 mar. 2010
49
PESSINI, Leo. Eutanásia: Por que abreviar a vida? Op. cit., 2004.p
224 et seq.
28
letal de morfina. Foi em 1990 que o Ministério da Justiça e a
Real Associação Médica Holandesa (RDMA) concordaram em
um procedimento de notificação de eutanásia, onde, o médico
ficaria imune de ser acusado, apesar de ter realizado um ato
ilegal.
Os cinco critérios estabelecidos pela Corte de
Rotterdam, em 1981, para a ajuda à morte não penalizável, por
um médico, são os seguintes:
1) A solicitação para morrer deve ser uma decisão
voluntária feita por um paciente informado;
2) A solicitação deve ser bem considerada por uma
pessoa que tenha uma compreensão clara e correta de sua
condição e de outras possibilidades. A pessoa deve ser capaz
de ponderar estas opções, e deve ter feito tal pondera ção;
3) O desejo de morrer deve ter alguma duração;
4) Deve haver sofrimento físico ou mental que seja
inaceitável ou insuportável;
5) A consultoria com um colega é obrigatória. 50
O acordo entre o Ministério da Justiça e a Real
Associação Médica da Holanda, estabelece 3 elementos para
notificação:
I) O médico que realizar a eutanásia ou suicídio
assistido não deve dar um atestado de óbito por morte natural.
Ele deve informar a autoridade médica local utilizando um
extenso questionário;
II) A autoridade médica local relatará a morte ao
promotor do distrito;
III) O promotor do distrito decidirá se haverá ou não
acusação contra o médico. 51
Se o médico seguir as 5 recomendações o promotor não
fará a acusação.
Em 11 de abril de 2001, por 46 votos a favor e 28 contra, o
Senado aprovou a lei que permitirá aos médicos abreviar a vida de
doentes terminais. Do lado de fora do parlamento, com sede em Haia,
50
GOLDIM, José Roberto. Eutanásia na Holanda. Disponível em:
<http://www.ufrgs.br/bioetica/eutanhol.htm >. Acesso em: 01 de
mar.2010.
51
Id.
29
cerca de 10 mil manifestantes protestaram contra a aprovação da lei,
que já havia passado pela Câmara dos Deputados em novembro de
2000. Eles cantavam hinos religiosos e liam passagens da Bíblia.
Apesar dos protestos, pesquisas indicam que cerca de 90% dos
holandeses apóiam a eutanásia. A nova legislação, que deverá entrar
em vigor em meados do ano, formalizará uma prática que já vinha
sendo adotada há décadas em hospitais holandeses. Os médicos terão
que obedecer regras rigorosas para praticar a eutanásia. O caso
também deve ser submetido ao controle de comissões regionais
encarregadas de fiscalizar se os requisitos foram cumpridos. As
comissões serão integradas por um médico, um jurista e um
especialista em ética.
Os menores de idade, entre 12 e 16 anos, também poderão
recorrer à eutanásia, desde que tenham o consentimento de seus pais.
Segundo a nova lei, a prática só poderá ser realizada por médicos que
acompanhem de perto, e há muito tempo, a saúde de seus pacientes.
A nova lei também permite que pacientes deixem um pedido
por escrito. Isso dará aos médicos o direito de usar seus próprios
critérios quando seus pacientes não puderem mais decidir por eles
mesmos por conta de doenças.
O texto da lei foi aprovado oficialmente dia 11 de abril de
2001, mas, na prática, a eutanásia já era tolerada sob condições
especiais desde 1997. A eutanásia será permitida na Holanda se forem
cumpridos os seguintes requisitos: Quando o paciente tiver uma
doença incurável e estiver com dores insuportáveis; o paciente deve
ter pedido, voluntariamente, para morrer; depois que um segundo
médico tiver emitido sua opinião sobre o caso. 52
Na Colômbia somente é permitida a prática da
Eutanásia em casos de doentes terminais e com o
consentimento prévio do envolvido. A noticia acerca da
matéria foi publicada no jornal “A Folha de São Paulo” em
22.05.97, ressaltando que mesmo sendo permitida a eutanásia,
ainda não esta legalizada a sua prática. 53
52
GOLDIM, José Roberto. Holanda legaliza a eutanásia . Disponível em:
<http://www.ufrgs.br/bioetica/eut2001.htm>. Acesso em: 22 mar. 2010
53
CARNEIRO, Antonio Soares et al. Eutanásia e distanásia, a
problemática
da
bioética.
Disponível
em:
30
Nos Estados Unidos, o Estado de Oregon é o único que
permite a prática da eutanásia, ou seja é permitido que o
médico receite uma dose letal de drogas a pedido do paciente
com doença terminal. Entretanto, este medicamento em
nenhuma hipótese, poderá ser aplicado pelo médico, sendo que
a expectativa de vida do paciente tem que ser inferior a seis
meses. Isso porque em 1994 foi elaborado um plebiscito, no
qual a eutanásia foi aprovado, porem somente em 1996 é que
houve a sua regulamentação. 54
No território do norte da Austrália, por um curto
período de tempo, (1 de julho de 1996 a 24 de março de 1997),
foi legalizada, a prática da Eutanásia. 55
Além desses países e estados citados, é importante
registrar que a Bélgica em 28 de maio de 2002 promulgou sua
lei da eutanásia. Segunda esta lei, o médico que executa uma
eutanásia não está praticando um ato ilegal se tiver assegurado
que
(...) o paciente é adulto ou menor
emancipado e tem plena capacidade e
consciência na época de seu pedido; o pedido
é feito voluntariamente, é ponderado e
reiterado e não resulta de pressão externa; o
paciente se encontra numa condição médica
irremediável e se queixa de sofrimento físico
ou mental constante e insuportável que n ão
pode ser minorado e que resulta de uma
condição acidental ou patológica grave e
incurável. 56
Ademais, não há legislação que apóie ou aceite a
eutanásia nos demais países, senda a prática proibida na
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1862&p=2 >. Acesso em: 22
mar. 2010.
54
Id.
55
ROBERTI, Maura. Eutanásia e Direito penal. Disponível em:
<http://www.ibap.org/defensoriapublica/penal/doutrina/mr eutanasia.htm>. acesso em: 18 mar. 2010.
56
PESSINI, Leo. Eutanásia: Por que abreviar a vida? Op. cit., 2004,
p.125.
31
maioria deles.
7 EUTANÁSIA, RELIGIÃO E DIVERGÊNCIAS
A morte não é um mero evento técnico-científico, sendo
por tido um acontecimento, moral e religioso. As diferentes
visões da morte nos dão uma compreensão e também apontam
para comportamentos e compromissos, posto que reside neste
pluralismo as controvérsias em torno da morte e do processo
do morrer.
Diferentes comunidades morais, religiões ou culturas
têm diferentes critérios da morte, diferentes visões do que
constitui uma boa vida, e estes referenciais influenciam na
forma como a morte é compreendida e vivida. Como pode-se
notar, o mundo é irrigado por diversas religiões, que pregam
as suas normas e princípios em relação a morte. 57
7.1 RELIGIÃO CATÓLICA
A posição da Igreja Católica em relação à eutanásia têm
sido expressa, mostrando-se desde os primórdios com o
surgimento dos dez mandamentos "não matarás", e com os
pronunciamentos feitos diretamente por Papas, como na
situação a seguir do Papa Pio XII, em 1956:
Toda forma de eutanásia direta, isto é, a
subministração
de
narcóticos
para
provocarem ou causarem a morte, é ilícita
porque se pretende dispor diretamente da
vida. Um dos princípios fundamentais da
moral natural e cristã é que o homem não é
senhor
e
proprietário,
mas
apenas
usufrutuário de disposição direta que visa à
abreviação da vida como fim e como meio.
Nas hipóteses que vou considerar, trata -se
57
PESSINI, Léo. A Eutanásia na Visão das Grandes Religiões
Mundiais.
Disponível
em:
<http://boards4.melodysoft.com/app?ID=vetuycorresponsales&msg=2&D
OC=21>. Acesso em: 26 abr. 2010.
32
unicamente de evitar ao paciente dores
insuportáveis, por exemplo, no caso de
câncer inoperável ou doenças semelhantes.
Se entre o narcótico e a abreviação da vida
não existe nenhum nexo causal direto, e se
ao contrário a administração de narcóticos
ocasiona dois efeitos distintos: de um lado
aliviando as dores e de outro abreviando a
vida, serão lícitos. Precisamos, porém,
verificar se entre os dois efeitos há uma
proporção razoável, e se as vantagens de um
compensam as desvantagens do outro.
Precisamos, também, primeiramente verificar
se o estado atual da ciência não permite
obter o mesmo resultado com o uso de outros
meios, não podendo ultrapassar, no uso dos
narcóticos, os limites do que for estritamente
necessário. 58
O Papa Paulo VI, também se mostra contra a pratica da
eutanásia como pode-se notar pela frase utilizada por ele: “A
vida humana deve ser absolutamente respeitada: como no
aborto, eutanásia e homicídio.” 59
Segundo o Padre Paulo Dione Quintão, Pároco da Igreja
Nossa Senhora da Piedade, na concepção da Igreja, o Estado
não pode atribuir o direito de legalizar a eutanásia, porque
como prega a igreja a vida é um bem que prevalece sobre o
poder. A eutanásia é um crime contra a vida humana e a lei
divina. 60
Pode-se observar,portanto que a posição da Igreja
Católica é de que o dever de um médico é tratar do paciente,
58
CARNEIRO, Antonio Soares Carneiro et al. Eutanásia e Distanásia. A
problemática
da
Bioética.
Disponível
em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1862&p=3 > .Acesso:
26
abr. 2010.
59
Id.
60
QUINTÃO. Paulo Dione.A Igreja Católica x Eutanásia .2009.
Disponível em: <http://jornale.com.br/wicca/?p=338> . Acesso em: 20
abr. 2010.
33
aliviando a dor e o sofrimento e acima de tudo respeitando sua
dignidade como pessoa humana. 61
7.2 RELIGIÃO JUDAICA
Na visão do judaísmo, o homem não é dono de si, nem
mesmo do seu próprio corpo, ele pertence a Deus. A vida é
considerada um dom de valor infinito e indivisível, onde o
direito de morrer não é reconhecido. 62
A tradição legal hebraica é contrária à eutanásia. O
médico é como um instrumento de Deus, assim não cabe a ele
decidir entre a vida e a morte. A morte não é apenas um
evento cientifico, mas é uma questão ética e legal, da mesma
forma que a fixação do tempo do óbito é questão moral e
teológico. Porem a uma diferença entre o prolongamento da
vida do paciente, que é obrigatório, e o prolongamento da
agonia, que não o é. Assim, se o estado da pessoa for terminal,
o medico não é obrigado a prolongar a vida em sofrimento,
mais também não pode ter o seu fim apresado, mes mo quando
isto evitaria a dor. O argumento freqüentemente utilizado é
que o moribundo é, de qualquer maneira, uma pessoa viva, e
deve ser tratado com a mesma consideração de qualquer outra
pessoa viva.mesmo diante de uma pessoa com muita dor,
sofrimento e solicitando o fim de tudo isso, o medico ou
qualquer outro que agir dessa maneira é considerado
assassino. 63
7.3 RELIGIÃO ISLÂMICA
É ilícita a eutanásia, para a unanimidade das quatro
grandes escolas islâmicas, respectivamente fundadas por Abou
Hassifa, Malek, Chaffei e Ahmed Ibm Handibal. Que
61
CARNEIRO, Op. cit.
CARNEIRO, Op. cit.
63
PESSINI, Léo. A Eutanásia na Visão das Grandes Religiões
Mundiais. Op. cit.
62
34
consideram como função dos médicos a melhoria da vida e não
o trajeto da morte, mesmo quando solicitada. 64
7.4 RELIGIÃO HINDU
A Escritura Hindu não faz nenhuma referência expressa
à eutanásia, contudo pode-se extrair de seus textos a proibição
da eutanásia, pois seus ensinamentos pregam que a alma deve
sustentar todos os prazeres e dores do corpo em que reside,
embora na índia antiga tenha ocorrido a aplicação de
medicamentos para cessar a dor de pessoas com doenças
incuráveis. 65
7.5 RELIGIÃO BUDISTA
A nossa personalidade, para o budismo, deriva da
interação de cinco atividades: a atividade corporal, as
sensações, as percepções, a vontade e a consciência. De todas,
a vontade é a mais importante, porquanto representa a
capacidade de escolha, de orientar a consciência: a morte de
alguém, assim, ocorre quando alguém não mais possa exercer
uma vontade consciente, quando seu encéfalo perdeu
definitivamente a capacidade de viver, quando o último traço
de atividade elétrica o abandonou. 66
O sofrimento tem grande importância no pensamento de
Buda: as Quatro Verdades Nobres para obter a Iluminação são
sua verdadeira causa. A eutanásia ativa e a passiva podem ser
aplicadas em numerosos casos, admitindo o budismo que a
vida vegetativa seja abreviada ou facilitada. Assunto atual e
inerente a condição de ser humano na medida em que o direito
a vida, ou a morte, se põe sob a ótica de bens indisponíveis. 67
64
65
66
67
Id.
CARNEIRO, Antonio Soares Carneiro et al.. Op. cit.
CARNEIRO, Antonio Soares Carneiro et al.. Op. cit.
Id.
35
7.6 RELIGIÕES NOVAS
Na Igreja Adventista do Sétimo Dia em um consenso
informal, coloca-se a favor da eutanásia passiva (deixar
morrer), mas em relação a eutanásia ativa é contra qualquer
prática que levaria uma pessoa a morte. 68
A Igreja Batista defende o direito do indivíduo tomar
providencias e decisões em relação a medidas que prolonguem
a vida, porém a eutanásia é vista como uma violação da
santidade da vida humana. 69
Para os Testemunhas de Jeová quando a morte é
inevitável, esta igreja, não exige que sejam utilizados meios
onerosos para prolongar o processo de morrer, mais prov ocar a
morte em qualquer situação é considerado assassinato. 70
As Igrejas Luteranas aprovam a descontinuação de
medicamentos extraordinários ou heróicos que prolongam a
vida, e permitem a administração de medicamentos contra a
dor, mesmo que estes ofereçam risco a vida. Porem a eutanásia
é sinônimo de morte piedosa, que envolve suicídio ou
assassinato, e é contrária à Lei de Deus. 71
7.7 INSTITUIÇÕES DEFENSORAS DA EUTANÁSIA
A Organização não-governamental (ONG) Católicas
pelo Direito de Decidir (CDD), é oriunda da Igreja Católica e
formada por militantes feministas cristãs. Em 2008, ano em
que a campanha da fraternidade da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil (CNBB) falou sobre a eutanásia e o aborto,
esta ONG elaborou um manifesto, questionando: “É pos sível
afirmar a defesa da vida e condenar as pessoas a sofrer
indefinidamente num leito de morte, condenando o acesso
68
Conselho Executivo da Conferência Geral dos Adventistas do Sétimo
Dia.Assistência
aos
Moribundo
1992.
Disponível
em:
<
http://www.adventistas.org.pt/Artigos.asp?ID=31> Acesso em: 20 abr.
2010.
69
CARNEIRO, Antonio Soares Carneiro et al.. Op. cit.
70
Id.
71
CARNEIRO, Antonio Soares Carneiro et al.. Op. cit..
36
livre e consentido a uma morte digna, pelo recurso à
eutanásia?”. 72
8 CONCLUSÃO
Diante do exposto acima se observa que a questão da
eutanásia encontra-se fundamentada em vários princípios
importantes, haja vista que o que prepondera é o princípio da
dignidade humana, o qual visa garantir o direito à vida e o
direito de permanecer vivo. Partindo dessa premissa a
eutanásia, que em suma é a abreviação da vida, torna-se uma
retaliação ao referido princípio, sendo incoerente com a vida
em sociedade.
Fazendo um retrocesso observa-se que no tempo em que
tal prática era usual, tendo como justificativa a enfermidade
dos indivíduos considerados infrutíferos à sociedade, tais
princípios se quer eram levados em consideração.
Analisando essa questão no contexto do ordenamento
brasileiro, esta conduta é reprovável, uma vez que aquele que
antecede a morte de outrem é reputado como assassino.
Embora, muitas pessoas entendam que em casos excepcionais,
para aliviar o sofrimento do paciente, seja cabível a
abreviação da vida, tal fato não é legalizado.
Diante das opiniões abordadas de diversas religiões e
ordenamento jurídico de diferentes países, percebe -se que a
maioria das religiões tradicionais demonstram uma postura
totalmente contrária à prática da eutanásia, com exceção da
Religião Budista que admite sua prática para abreviação da
vida.
Ao passo que as religiões contemporâneas estão
aceitando a prática da ortotanásia no sentido de aceitar a
prática de atos que passam a trabalhar a distinção entre curar e
cuidar, entre manter a vida quando é leal ao ser humano e
permitir que a pessoa morra quando sua hora chegou,
72
VEJA.Eutanásia.2009.Disponível em:
<http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/perguntas_respostas/eutanasia/
morte-pacientes-etica-religiao-ortotanasia.shtml>. Acesso em: 21 abr.
2010.
37
permitindo ao paciente e a aqueles que o cercam enfrentar a
morte com certa tranqüilidade.
Já que preponderando todas as vertentes religiosas,
sociais, políticas e legais conclui-se que a eutanásia, apesar de
condenada pela sociedade, é vista ainda como uma
possibilidade, mesmo que remota, para aqueles em sofrimento
extremo.
Com o progresso da medicina, a eutanásia como mero
alivio de sofrimento, não pode ser admissível, já que existem
métodos eficazes para promover o fim de uma vida digna sem
ser necessária a abreviação da mesma.
Destarte, destaca-se que assim como o ordenamento se
reflete , entende-se, pois que a prática da abreviação da vida
ou melhor dizendo antecipação da morte é reputada como uma
conduta inadmissível, tendo em vista que tal atitude diverge
dos valores morais, éticos e dos princípios valorados pela
sociedade brasileira.
Ademais, o Estado não pode atribuir o direito de
legalizar a eutanásia, porque como prega a igreja, a vida é um
bem que prevalece sobre o poder. Ademais, no caso concreto
deve se atentar ao princípio da dignididade humana e ao
princípio da autonomia, uma vez que a autonomia
principialista limita-se a incorporar na bioética o direito moral
do paciente de tomar suas próprias decisões, mesmo que com
isto o indivíduo neutralize orientações benéficas prescritas
pelo médico, isso significa que a autodeterminação do agente
moral só pode ser considerada se não ocasionar danos ou
sofrimentos a outros indivíduos, pois ninguém tem o direito de
antecipar a morte de outrem.
38
9 REFERÊNCIAS
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biodireito. Revista de Bioética e Ética Médica
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eutanasia/morte-pacientes-etica-religiaoortotanasia.shtml>. Acesso em: 21 abr. 2010.
40
CAPÍTULO II:
COBAIAS HUMANAS
Elian Sobreira
Giovana Primon
Karoliny Pavesi
Paula Barbosa Biasão
Patrícia Bastos
Veridiane Merlos 73
RESUMO
Esse artigo abrange assuntos relacionados às grandes
mudanças ocorridas nas áreas sociais, científicas e políticas
referentes à experimentos feitos em seres humanos, neste ato
chamados de cobaias humanas, focado na vulnerabilidade de
países em desenvolvimento e nos abusos cometidos com
pessoas das camadas inferiores da população mundial. Cita a
importância do surgimento da bioética, que traz uma nova
imagem da ética médico-científica, seu histórico, seu conceito
e os princípios relacionados ao uso de seres humanos em
pesquisas, além de seus direitos e garantias frente ao
princípio da dignidade da pessoa humana. Por fim, apresenta se o conceito de cobaias humanas, sua legalidade de acordo
com o consentimento informado e o protocolo de pesquisa,
apontando os documentos necessários para tal e
exemplificando com um caso ocorrido na sociedade.
Palavras-chave: Cobaias Humanas – Bioética – Princípios –
Consentimento Informado.
73
Acadêmicas do 5º período do curso de Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná – Campus Maringá.
41
1 INTRODUÇÃO
Nas ciências biomédicas, a observação e o experimento
são os canais fundamentais para o conhecimento. Com a
evolução da ciência e da tecnologia biomédica surgiram novos
conflitos na sociedade, fazendo com que a população se
confrontasse com novos problemas éticos, principalmente no
que tange ao objeto de estudo do presente artigo: as cobaias
humanas.
A sociedade recebeu bem todo o processo científico que
foi iniciado nos laboratórios, os quais, para serem
clinicamente úteis, precisam ser testados em seres humanos.
Apesar de serem experimentos cuidadosos, tais pesquisas
acarretam algum grau de risco para os participantes, o qual se
justifica pela contribuição que o resultado trará ao
conhecimento humano ou ao prolongamento da vida.
Após a Segunda Guerra Mundial, com os experimentos
insensatos realizados por médicos nazistas, houve a
necessidade de se regulamentar esse campo, surgindo, assim, o
"Código de Nuremberg" (1946), um documento para limitar as
experimentações médicas em seres humanos. Desde então, a
sociedade vem tentando se adaptar ao progresso nas ciências
biomédicas, buscando um equilíbrio, entre a pesquisa
biomédica e o beneficio para seus participantes e a sociedade.
Tais questões serão abordadas com maior clareza no deco rrer
deste artigo, assim como o histórico da bioética, seu conceito
e seus princípios, o conceito de cobaias humanas, as cobaias
humanas frente aos princípios bioéticos e da dignidade da
pessoa humana, além da utilização do termo de consentimento
informado e do protocolo de pesquisa, trazendo por fim uma
exemplificação por meio de um caso concreto.
2 BREVE HISTÓRICO DA BIOÉTICA
A nova realidade tem demonstrado que grandes
mudanças vêm ocorrendo na área social, científica e política,
acompanhadas das outras matérias em si, de forma que uma
42
onda ética avança sobre os países 74, buscando estabelecer uma
convivência menos conflituosa entre as nações, entre a ciência
e a sociedade.
A ética tem sido colocada em posição privilegiada, no
qual abre vários caminhos em meio à esta construção
sociocultural e na reconquista da saúde, de modo que faz parte
integrante da formação humanística dos profissionais da saúde
em suas decisões 75.
A Bioética tem por volta de trinta anos de sucesso,
tendo inicio na década de 60, iniciada pelos pioneiros Van
Resselaer Potter, oncololista norte-americano, da Universidade
de Wisconsin e Andre Hellegers, pesquisador do Instituto
Kennedy de Bioética em Washington, nos célebres
acontecimentos relacionados ao inicio da hemodiálise nos
Estados Unidos. Na década de 70, existem opiniões
discordantes e complementares 76, afirmando que seu
nascimento foi com a promulgação do Código de Nuremberg
(1948), após a Segunda Guerra Mundial, o qual seria a
certidão de nascimento da bioética, porém a base sólid a
continua sendo a iniciada com Potter.
Cabe acrescentar que a Bioética se estabeleceu nos
Estados Unidos na década de 70, na Europa na década de 80,
no inicio dos anos 90 na Ásia e em meados da década de 90
nos outros países em desenvolvimento 77. Nasceu nos meios de
pesquisa, em laboratórios experimentais, com cientistas se
perguntando sobre a viabilidade ética de determinados
procedimentos tecnocientíficos.
74
OLIVEIRA, Fátima. Bioética: uma face da cidadania. 2 .São Paulo:
Moderna, 1997. p.6.
75
SPINSANTI, Sandro. Ética Biomédica. Trad. Benôni Lemos. rev. vol.
2. São Paulo: Paulinas, 1990. p. 8.
76
BARCHIFONTAINE, Christian de Paul. PESSINI, Leo. Problemas
atuais de Bioética. 5. rev. e amp. São Paulo: Loyola, 2000. p. 11.
77
Ibidem.
43
3 BIOÉTICA: CONCEITO E PRINCÍPIOS
Foi inicialmente definida por Van Rensselder Potter
como sendo uma ciência da sobrevivência humana,
promovendo e defendendo a dignidade humana dentro das
possíveis qualidades de vida. Trata-se de um novo estudo, de
uma nova reflexão, de um nova perfil de pesquisa, em
evolução acelerada, em processo constante de descob erta de
novos métodos e em afrontamento contínuo com problemas
inesperados. A bioética seria uma resposta da ética às novas
situações oriundas da ciência no âmbito da saúde, ocupando -se
não só aos problemas éticos, mas também aos problemas
provocados pelas tecnociencias biomédicas e alusivos ao
início da vida humana.
Já nos dias atuais, a discussão está em torno de seu
estatuto estudado profundamente, qual sua abrangência, sua
fundamentação e seus princípios.
Ao se falar nestes, a bioética se pauta em quatr o
princípios básicos 78 enaltecedores da pessoa humana, estando
eles consignados no Belmont Report, publicado em 1978 pela
Comissão Nacional para a Proteção dos Seres Humanos em
Pesquisa Biomédica e Comportamental, constituída pelo
governo norte-americano.
Tais princípios refletem a racionalização dos valores e
das necessidades individuais da pessoa humana:
Pelo princípio da autonomia, o profissional da saúde
deve respeitar a vontade do paciente ou seu representante,
levando em conta seus valores morais e crenças religiosas, isto
é, em certa medida.
Já o princípio da beneficência 79, requer o atendimento
por parte do médico ou do geneticista às partes envolvidas nas
práticas biomédicas ou médicas para que promovam o bem estar, evitando, na medida do possível, qu aisquer danos. Só
poderá ser usado o tratamento para o bem do enfermo,
78
DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito . 2. aum. e
atual.São Paulo: Saraiva, 2002, p. 14.
79
Ibid, 2002, p. 15 .
44
segundo a sua capacidade e justiça, de modo a não fazer o mal
ou praticar a injustiça.
O princípio da não-maleficência 80 é um desdobramento
do da beneficência, o qual prega a obrigação de não acarretar
dano intencional e deriva da máxima da ética médica.
O princípio da justiça 81 presa que todo cuidado e todo
sistema de saúde sejam justos, ou seja, deve haver
imparcialidade na distribuição dos riscos e benefícios
referente à pratica médica pelos profissionais de saúde.
Tais princípios foram sendo aprimorados e outros mais
atuais foram agregados, de acordo com Christian de Paul
Barchifontaine e Léo Pessini 82.
O princípio da defesa da vida física, como o próprio
nome já diz, refere-se ao respeito pela vida, isto é, respeito à
vida promovendo sua defesa e promoção, de modo que
representa o primeiro imperativo ético do homem para consigo
mesmo e para com os outros.
O princípio da liberdade e da responsabilidade prega
que a vida deve ser condição indispensável para o exercício da
liberdade, no qual há uma necessidade da colaboração do
paciente, dentro de sua autonomia, exercer a sua
responsabilidade, dando ou não seu consentimento, sempre
indispensável.
O princípio da totalidade ou princípio terapêutico rege
toda liceidade e obrigatoriedade da terapia médica e cirúrgica,
levando-se em conta não apenas a integridade física do
paciente, mas também seu valor pessoal integral, ou seja,
espiritual e moral da pessoa.
De acordo com os princípios da sociabilidade e da
subsidiariedade, o primeiro compromete cada pessoa a realizar
a si mesma na participação da realização do bem dos próprios
semelhantes, enquanto o segundo está ligado ao primeiro,
porém impele a comunidade a ajudar os mais necessitados e a
garantir as livres iniciativas.
80
Ibid., 2002, p. 16.
Id.
82
BARCHIFONTAINE, Christian de Paul. PESSINI, Leo. op. cit., 2000,
p. 43.
81
45
O paradigma da “ética dos princípios” 83 é o mais
empregado para resolver os problemas de justiça, da qual a
modernidade se mostra mais sensível, ajudando enormemente
na solução dos problemas-fronteira das novas tecnologias
biomédicas que pressupõe experiências, intuição e
sensibilidade moral.
4 CONCEITO DE COBAIAS HUMANAS
Pode-se dizer que foi através de pesquisas feitas no
mundo animal e vegetal, incluindo seres humanos que o
mundo teve a chave para o desenvolvimento da maioria dos
remédios e outros produtos importantes que trazem tantos
benefícios à humanidade 84.
O termo “pesquisa” significa neste meio, uma classe de
atividades que têm por objetivo desenvolver ou contribuir para
o conhecimento generalizável, que por sua vez, cons iste em
teorias, princípios ou relações, ou ainda, no acúmulo de
informações sobre os quais estão baseados 85.
A pesquisa em si inclui estudos médicos e
comportamentais relacionados à saúde humana, buscando
entender o progresso na assistência médica e na pre venção de
doenças, além de trazer uma compreensão dos processos
fisiológicos e patológicos, o que em algum momento exigirá
maiores pesquisas, desta vez envolvendo seres humanos. 86
A experimentação em humanos é uma prática muito
antiga que ajudou muito o desenvolver da medicina na
sociedade, sendo muito utilizada até os dias atuais. Abdicar
das experimentações humanas pode acarretar ricos
incalculáveis, pois nem sempre o que funciona in vitro,
funcionará como o esperado in vivo 87. Para se por em prática
83
DINIZ, op. cit., 2002, p. 17.
OLIVEIRA, op. cit., 1997. p.88.
85
BARCHIFONTAINE, Christian de Paul. PESSINI, Leo. op. cit., 2000.
p. 139.
86
. BARCHIFONTAINE, Christian de Paul. PESSINI, Leo. op. cit., 2000,
p. 140.
87
OLIVEIRA, op. cit., 1997. p.89.
84
46
as diversas maneiras de se trabalhar com pesquisas em seres
humanos, é necessário que haja um prévio planejamento de
caráter social, educacional e técnico, de forma que se
proporcione uma busca de alternativas ao padrão de pesquisa
convencional 88.
Nos dias atuais, embora haja muitas pesquisas em
diversas áreas do conhecimento aplicado, há uma falta de
maior segurança no que se trata de matéria de metodologia,
onde os países em desenvolvimento acabam sendo alvo
destinado a tais pesquisas. Estimativas mundiais revelam que
pelo menos um quarto da população em tais países sobrevive
com menos de um dólar ao dia 89. No Brasil, vinte por cento da
população vivem em extrema pobreza, havendo uma maior
probabilidade de essas pessoas serem incluídas em pesquisas
de ensaio clínico, genéticas ou não.
Em qualquer país, incluindo o Brasil, a inclusão de
qualquer pessoa em projetos de pesquisa depende de uma
consulta esclarecedora seguida de aceitação livre, consciente e
autônoma, permitida através de um documento específico,
denominado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE).
Através do Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
(CONEP) 90, o pesquisador deve informar para o sujeito de
pesquisa sobre o direito de escolha, os possíveis desconfortos,
os riscos e benefícios à pesquisa e todas as informações
pertinentes à pesquisa.
É através da CONEP que há o ato ilícito do pagamento,
portanto o sujeito não poderá pagar para que participe da
pesquisa. “No entanto, poderá haver ressarcimento de despesas
88
BARTILOTTI, Márcia Mirra Barone et al. A ética na saúde.São Paulo:
Thomson Pioneira, 2002, p. 40.
89
GARRAFA, Volnei. PESSINI, Leo. Bioética: poder e injustiça. São
Paulo: Loyola, 2006. p.323.
90
ARTIGO de Opinião/opinion article. Ética e pesquisa médica:
princípios, diretrizes e regulamentações. Revista da Sociedade
Brasileira de medicina Tropical, São Paulo, jul-ago, 2005. p. 346
47
ou de interrupção de ganhos advindos do trabalho. Estas
questões têm que estar claramente delineadas.” 91
Para a maioria das famílias pobres, a percepção de estar
doente e o limiar da decisão de procurar ajuda de um médico
diferem, fundamentalmente, daquelas entre os que possuem
uma posição social melhor.
Assim, quando atingem o nível cultural de percepção de
estar doente, a busca por tratamento médico inclui muitas
barreiras a serem enfrentadas, desde recurso para o transporte
até reserva financeira para a compra dos remédios 92.
Nesta situação, quando o paciente
consegue
atendimento médico que lhe proporcione além de
acompanhamento médico, exames laboratoriais regulares e
gratuitos, além de remédios de graça, ainda que só por um
tempo, a racionalidade do paciente submete-se pelas
facilidades oferecidas, onde qualquer explicação adicional
torna-se irrelevante 93.
Assim, de modo geral, qualquer oferta que no momento
lhe facilite sua sobrevivência, tem prioridade absoluta de
aceitação, de modo que para o paciente pobre, necessidades
vitais não podem esperar e, para o médico-pesquisador, o
conflito ético é óbvio, pois nele o princípio da beneficência
adquire um sentido truncado, e o princípio da justiça torna -se
ampliado.
5
AS COBAIAS HUMANAS: SUA ANÁLISE
FRENTE AOS PRINCÍPIOS BIOÉTICOS E DA
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
Com os progressos da ciência e tecnologia biomédicas e
sua aplicação na prática da medicina, várias inquietações na
população fazem com que a sociedade se confronte com vários
problemas éticos, assim vários documentos e diret rizes foram
criados para proteger a integridade dessas pessoas. 94
91
92
93
94
ARTIGO de Opinião/opinion article. op. cit., 2005, p. 346.
GARRAFA, op. cit., 2006, p. 325.
Ibid., 2006, p. 32.
GARRAFA, op. cit., 2006, p. 142.
48
O primeiro documento internacional foi o Código de
Nuremberg, promulgado em 1947, seguido da Declaração de
Helsinque em 1964 e, em seguida para conferir força legal e
moral à Declaração Universal dos Direitos do Homem, em
1966 o artigo 7 do Acordo Internacional sobre Direitos Civis e
Políticos declara que “Ninguém será submetido a tortura ou a
tratamento ou punição cruel, desumana e ou degradante. Em
particular ninguém será submetido sem seu livre
consentimento, a experiências médicas ou científicas”. 95
Em 1982 a publicação da Proposta de diretrizes
internacionais para pesquisas biomédicas envolvendo seres
humanos foi um desdobramento lógico da Declaração de
Helsinque, o propósito dessas diretrizes era que toda pesquisa
envolvendo seres humanos deve ser conduzida frente aos
princípios éticos básicos 96, sendo três:
Princípio da Autonomia que requer o respeito sobre as
escolhas pessoais dos pacientes ou dos seus representantes por
sua capacidade de autodeterminação.
Princípio da Beneficência refere–se à obrigação ética de
maximizar os benefícios e minimizar danos ou prejuízos, isto
é, os riscos da pesquisa devem ser razoáveis à luz dos
benefícios esperados. Alguns autores defendem um
desdobramento deste, sendo o Princípio da não-maleficência,
por conter a obrigação de não acarretar dano intencional e
derivar da máxima da ética médica: primum non nocere.
Princípio da Justiça, refere-se à obrigação ética de tratar
cada pessoa de acordo com o que é moralmente certo e
adequado, de dar a cada pessoa o que lhe é devido, sendo ma
expressão da justiça distributiva.
Diante do exposto, os bioeticistas além dos princípios
éticos básicos devem ter como paradigma o respeito à
dignidade da pessoa humana 97, que por sua vez é fundamento
do Estado Democrático de Direito, estando cravado no artigo
95
96
97
Ibid., 2006, p. 141.
Ibid., 2006, p. 142.
DINIZ, op. cit., 2002, p. 17.
49
1°, III, da Constituição Federal de 1988, sendo o cerne de todo
ordenamento jurídico 98.
A pessoa humana e sua dignidade prevaleceram sobre
qualquer tipo de avanço científico e tecnológico, de modo que
a bioética e o biodireito não poderão admitir conduta que
reduza à pessoa humana a condição de coisa, logo, nem tudo o
que é cientificamente possível é moral e juridicamente
admissível 99.
Pode-se dizer que todos esses princípios, inclusive o
Princípio da Dignidade da Pessoa Humana impõe limites à
moderna medicina, reconhecendo que o respeito ao ser
humano em todas as suas fases evolutivas só é alcançado se
estiver atento a dignidade humana.
Ao reconhecer e respeitar a dignidade humana, a
bioética e o biodireito passam a ter um sentido humanista 100,
estabelecendo um vínculo com a justiça, sendo que se em
alguma lugar houver qualquer ato que não assegure a
dignidade humana, este deverá ser repudiado e punido, por
contrariar as exigências ético-jurídicas dos direitos humanos.
Pode-se dizer que todos os seres humanos, os
aplicadores do direito e em especial os médicos, os biólogos,
os geneticistas e os bioeticistas devem intensificar sua luta em
favor do respeito à dignidade humana para que haja
efetividade dos direitos humanos, pois a consciência destes é
uma grande conquista da humanidade, por ser o único caminho
para uma era de justiça, solidariedade e respeito pela liberdade
e dignidade de todos os seres humanos. A bioética e o
biodireito estão inseridos nessa conquista, sendo instrumentos
valiosos para recuperação dos valores humanos 101.
98
DINIZ, op. cit., 2002, p. 17.
Ibid., 2002, p. 19.
100
Id.
101
Ibid., 2002, p. 20.
99
50
6 TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO E
PROTOCOLO DE PESQUISA
Para a evolução da sociedade é necessário que as
técnicas médicas se aperfeiçoem, para isso necessário a
pesquisa. Desse modo, elas se iniciam com a construção de
uma hipótese, sendo posteriormente testadas em laboratórios,
mais especificamente com técnicas in vitro, passando – se para
testes em animais finalizando com o teste em seres humanos
sendo este, portanto, indispensável para que se saiba
exatamente os resultados do item pesquisado 102.
O Conselho para Organizações Internacionais de
Ciências Médicas (CIOMS) publicou já em 1982, uma
proposta de diretrizes internacionais para pesquisas
biomédicas envolvendo seres humanos, as quais foram
distribuídas para o Ministério da Saúde dos países, conselhos
de pesquisa médica, faculdades de medicina, organização -não
governamentais, companhias farmacêuticas e revistas
médicas 103.
Mesmo com as diretrizes apresentadas, a necessidade de
realizar testes de vacinas e medicamentos trouxe a luz novas
questões éticas que não haviam sido previstas quando o
Conselho para Organizações Internacionais de Ciências
Médicas publicou aquelas diretrizes. Sendo assim, em 1993, a
OMS (Organização Mundial da Saúde) e o Conselho para
Organizações Internacionais de Ciências Médicas, revisaram
as Diretrizes visando bem–estar aos participantes desse tipo de
pesquisas, publicando novos parâmetros éticos internacionais
para as pesquisas biomédicas envolvendo seres humanos.
Contudo, mesmo assim certas áreas de pesquisa, como a
pesquisa genética humana, a pesquisa em fetos e embriões e a
pesquisa em tecidos fetais, não receberam atenção especial
nessas diretrizes o que tem gerado diversos problemas, posto
que esses estão evoluindo rapidamente gerando controvérsias
em muitos aspectos.
102
BARCHIFONTAINE, Christian de Paul. PESSINI, Leo. op. cit., 2000,
p. 137-138.
103
Id.
51
De acordo com os autores anteriormente citados essa
nova diretriz é composta por uma declaração de Princípios
Éticos Gerais, um preâmbulo e 15 diretrizes, onde determinase que para iniciar uma pesquisa, faz-se necessário o protocolo
de pesquisa e o termo de consentimento informado 104.
O protocolo de pesquisa é o conjunto de documentos
que o pesquisador prepara como parte do processo de
elaboração de seu projeto de pesquisa, onde organiza a
proposta de trabalho o que permite que o Comitê de Ética
desempenhe seu papel de controle social, posto que tem a seu
dispor um texto e um conjunto de documentos claros,
organizados e avaliáveis. Apesar de burocrático esse
procedimento é legitimado quando está a serviço da
cientificidade e da eticidade da pesquisa.
Cada pesquisa deve ser formulada num protocolo de
pesquisa e submetida a um Comitê de Ética. Não importa o
nível da pesquisa podendo variar desde trabalhos de conclus ão
de graduação até pesquisas em seres humanos de interesse
acadêmico ou operacional. Todas estas requerem a elaboração
de um protocolo de pesquisa, como medida de proteção para
os seres humanos.
Para se fazer um protocolo de pesquisa, é necessário
seguir alguns itens indispensáveis, os quais são:
Primeiramente, a folha de rosto que deve conter a
identificação do projeto, identificação do pesquisador
responsável, da instituição onde se realizará o projeto, do
patrocinador e do Comitê de Ética responsável pela avaliação
do protocolo, incluindo ainda o termo de compromisso do
pesquisador e da instituição em cumprir a Resolução 196/96
do Conselho Nacional de Saúde (esse termo de compromisso é
essencial para compor o banco de dados dos projetos);
Em segundo lugar apresenta-se o Projeto de Pesquisa, o
qual deve ser feito em língua portuguesa descrevendo
propósitos e hipóteses a serem testadas, e apresentando
antecedentes científicos e dados que justifiquem a pesquisa. E
104
Ibid, 2000, p. 139.
52
através disso que será feita a avaliação da proposta pelos
membros do Comitê de Ética.
O Projeto de Pesquisa deverá conter descrição detalhada
do projeto (material e métodos, casuística, resultados
esperados, bibliografia), análise crítica de riscos e benefícios,
cronograma,
explicitação
das
responsabilidades
do
pesquisador, da instituição, do promotor e do patrocinador,
explicitação dos critérios de suspender ou encerrar a pesquisa,
local e detalhamento das instalações de onde se realizará cada
etapa da pesquisa, demonstrativo da existência de infraestrutura necessária ao desenvolvimento da pesquisa e para
atender eventuais problemas dela resultantes, orçamento
financeiro detalhado (recursos, fontes e destinação, forma e
valor da remuneração do pesquisador) a apresentação do
orçamento permite transparência e justiça no uso de recursos,
explicitação de acordo preexistente quanto à propriedade das
informações geradas, declaração da existência de seguros,
declaração de que os resultados serão tornados públicos,
declaração sobre o uso e destinação do material e/ou dados
coletados 105.
Além das descrições já detalhadas, no Projeto de
Pesquisa será necessário algumas informações relativas ao
sujeito da pesquisa, tais como: caracterizar a população alvo
(tamanho da amostra, faixa etária, sexo, e outras
características necessárias), expor as razões para a utilização
de grupos vulneráveis, descrever os métodos que afetem
diretamente os sujeitos da pesquisa, identificar as fontes de
materiais de pesquisa (registros, dados), descrever planos de
recrutamento, fornecer critérios de inclusão e de exclusão,
descrever medidas de proteção ou minimização de riscos,
apresentar previsão de ressarcimento de gastos aos sujeitos da
pesquisa (esta importância não deve ser de tal monta que possa
interferir na autonomia da decisão do indivíduo ou seu
responsável em participar da pesquisa).
105
BARCHIFONTAINE, Christian de Paul. PESSINI, Leo. op. cit., 2000.
p. 143-148.
53
Das descrições dos sujeitos ainda será necessário
apresentar qualificação dos pesquisadores com o Curriculum
vitae do pesquisador responsável e demais participantes.
O terceiro e último item é o Termo de Consentimento
Informado. Este representa uma manifestação voluntária e
expressa da autonomia da vontade de uma pessoa, a qual deve
ser capaz e estar ciente do processo informativo e deliberativo
visando
à
aceitação
de
tratamento
específico
ou
experimentação, sabendo a natureza do mesmo, das suas
conseqüências e dos seus riscos 106. É de suma importância a
fundamentação ética da pesquisa nesse documento, posto que
o mesmo é um dever legal do médico que deve apresentá -lo o
mesmo de forma minuciosa para evitar maiores discussões
acerca do fato de ter sido ou não consentido e explicado e se
esta foi de modo suficiente ou não.
O exercício do consentimento informado efetiva-se após
a junção da autonomia, capacidade, voluntariedade,
informação, esclarecimento (onde o médico clínico ou
cirurgião deve indicar as vantagens e os inconvenientes, ou os
riscos do tratamento ou da intervenção) e o próprio
consentimento. Entre os elementos de validade do
consentimento informado talvez a informação seja um dos
mais importantes, e por isso deve ser clara, objetiva e em
linguagem compatível com o entendimento individual de cada
paciente 107.
A capacidade esta ligada com a voluntariedade, sendo
que a primeira é para entender e decidir, não tem uma
dependência direta com a idade da pessoa. A voluntariedade é
a possibilidade que a pessoa tem de tomar decisões sem ser
constrangida ou até mesmo coagida para que decida se irá ou
não participar da pesquisa. Esta situação coercitiva pode estar
presente em grupos onde existe uma clara dependência
hierárquica, como em militares, funcionários, membros de
organizações religiosas, estudantes, ou com outros tipos de
106
SAUNDERS, Jr WL. Principles of health care ethics. New York:
John Wiley & Sons, 1994. p. 457 -70.
107
DICKENS BM, Cook RJ. Dimensions of informed consent to
treatment. Int J Gyneacol Obstet. 2004, p. 309 -14.
54
vulnerabilidade, tipo a verificada em pacientes, comunidades
carentes e presidiários 108.
A autonomia é utilizada quando o indivíduo pode
perguntar e obter respostas às suas dúvidas, dando a
autorização com base na sua vontade individual.
O consentimento propriamente dito ocorre quando o
participante ou paciente toma a decisão por uma das
alternativas apresentadas (aderindo ou não a participar da
pesquisa). A assinatura do Termo de Consentimento é a última
etapa do processo, quando a pessoa documenta a sua
autorização para a realização dos procedimentos propostos.
Assim sendo, o consentimento informado é um elemento
necessário ao atual exercício da medicina, posto que é um
direito de saber do paciente e um dever de explanação do
médico.
O termo permite que uma pessoa possa tomar decisões
sobre os procedimentos propostos a ela, através de um
documento assinado, consentindo ao médico/pesquisador a
realização de determinado procedimento, após o recebimento
das informações pertinentes. A informação deve ser a mais
minuciosa possível, com linguagem acessível e informação
adequada ao indivíduo, o qual deve estar ciente da finalidade e
do método da pesquisa, sua duração, benefícios esperados e
possíveis riscos, além dos tratamentos alternativos, do grau de
confidencialidade quanto ao anonimato, e da responsabilidade
do pesquisador. Ademais deverá ser propiciado ao individuo
que esta de “cobaia” a possibilidade de terapia gratuita no
caso de danos ou resultados negativos, tipo de compensação,
ainda, a liberdade de deixar a pesquisa 109. Ressalta-se que se
for necessário o uso de alguma imagem do participante, deverá
ser requisitado a sua autorização.
108
GOLDIM, José Roberto. Simpósio sobre ética : o consentimento
informado numa perspectiva além da autonomia. Porto Alegre: Revista
Amrigs, 2000. p. 110.
109
Council for International Organizations of Medical Sciences (CIOMS),
World Health Organization (WHO). International ethical guidelines for
biomedical research involving human subjects. Genebra: CIOMS,
OMS. 1993.
55
Contudo mesmo com todos esses requisitos ainda não se
pode ter a certeza de que está realmente completo, posto que
para ser realmente ético, o protocolo deverá conter o máximo
de informações, de modo a permitir decisão livre de coerção.
A forma de apresentar esse consentimento é variável,
podendo ser oral ou escrito, sendo o mais importante levar em
consideração a diversidade dos indivíduos, quanto ao grau de
entendimento, para se ter certeza de que todas as informações
contidas naquele documento foram absorvidas pelas pessoas.
Cabe ressaltar que todos esses itens acima mencionados ainda
passam por uma aprovação de um Comitê de Ética, pois eles
fazem parte de uma lista de diretrizes, no total de 15, que
devem ser cumpridas, estando o Comitê de Ética enquadrando
na diretriz de número 14.
Dentro dessas 15 diretrizes, há algumas específicas,
como em caso de pesquisas envolvendo pessoas com distúrbios
comportamentais ou mentais, crianças e prisioneiros. Nesses
casos, deve-se observar alguns requisitos:
- Segundo a diretriz 5, que é a que trata da pesquisa
envolvendo crianças, elas só podem ser envolvidas em
pesquisa se não puder desenvolve-las em adultos e se as
informações que serão coletadas vão ser relevantes as
necessidades infantis, devendo para tanto, buscar o
consentimento livre e informado dos pais e da própria criança
(cada uma segundo a sua capacidade);
- Assim como em crianças, as pesquisas não poderão ser
desenvolvidas em pessoas com distúrbios mentais e
comportamentais, de acordo com o disposto na diretriz 6, se
elas puderem ser desenvolvidas em pessoas sem esses
distúrbios, sendo também aqui necessário o consentimento
livre e informado obtido de cada um de acordo com a sua
capacidade mental, destacando-se no tocante essas pessoas,
necessariamente deverá haver benefícios para os mesmos com
essa pesquisa;
- Em prisioneiros, de acordo com a diretriz 7, os que
possuem doenças graves ou em risco de adquiri-las, não devem
ter arbitrariamente negado seu acesso a drogas, vacinas ou
56
outros agentes em investigação que mostrem promessa de
benefício terapêutico ou preventivo;
- Na diretriz 11 que as gestantes não devem participar
de pesquisas não clínicas (é aquela desenvolvida em pacientes
ou outros participantes, ou com dados relativos a eles, apenas
para contribuir para o conhecimento generalizável), a não ser
que elas representem riscos mínimos para seus fetos, e que
tenham o cunho de obter novos conhecimentos sobre a
gravidez ou lactação.
- De acordo com a diretriz 13, os participantes que
sofreram danos físicos resultantes de sua participação, terão
que ter direito a assistência financeira ou de qualquer outro
tipo que precisar, podendo ser temporária ou permanente.
Essa é uma das principais regras da norma ética
aplicado ao profissional da medicina, sendo garantido ao
paciente o direito de decidir em relação ao que lhe é colocado
como forma de tratamento e respeitando a sua capacidade de
autodeterminação.
O termo de Consentimento não existe apenas para a
experimentação de pesquisas médicas nas pessoas,
enquadradas como “cobaias humanas”, mas existe para muitos
tipos de tratamento hospitalares, nos quais os procedimentos
de autorização serão praticamente os mesmos. Dessa forma
permite-se que o paciente possa tomar decisões sobre os
tratamentos e procedimentos propostos de forma consciente e
com total segurança da decisão tomada. Para isso, o médico
assistente ou cirurgião-dentista deve fornecer ao seu paciente
todas as orientações pertinentes.
Cabe acrescentar que além das diretrizes gerais e
específicas já notadas, na última é determinado o país que irá
patrocinar a pesquisa devendo submeter o protocolo de
pesquisa a revisão ética e científica, de acordo com os padrões
do seu país de origem, enquanto o país hospedeiro é onde a
pesquisa irá ser realizada, deverá verificar se ela atende as
suas próprias exigências ético-legais.
No Brasil, o Conselho Nacional de Saúde tem diretrizes
e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres
humanos, que estão na Resolução 196/96 e no Código de Ética
57
Médica 4 . Tais regramentos, quando realizadas pesquisas em
seres humanos, deverão ser respeitados. Contudo, na prática,
nem sempre todos os seus requisitos são necessariamente
preenchidos, e muitas pessoas, desconhecendo essas
informações complementares, se submetem a situações ilegais
e constrangedoras.
Podemos citar como explicativo, os testes de
medicamentos e esterilização forçados praticados em países
pobres, a partir de alguns fatos levantados sobre a utilização
de cobaias humanas em experimentos e incursões da indústria
farmacêutica dos Estados Unidos, pela América Latina e em
outras partes do mundo.
Qualquer iniciativa que necessita de seres humanos para
pesquisas científicas e medicamentos incorre em graves
infrações aos direitos universais da pessoa humana, e somente
se mantém por interesses econômicos escusos.
Conforme relatado por Sonia Shah, em 1998, as
pesquisas realizadas com seres humanos nos países de terceiro
mundo, de forma irregular, não são conhecidas nem no próprio
país. O relatório do Conselho Nacional de Segurança dos EUA
relata - 110A assistência para o controle populacional deve ser
empregada principalmente nos países em desenvolvimento de
maior e mais rápido crescimento onde os EUA têm interesses
políticos e estratégicos especiais. A forma como são
empregados os testes não tem nenhuma importância para os
Estados Unidos, apenas interessa o resultado a ser alcançado.
O relatório dos EUA fala claramente que é preciso criar
um controle populacional no Brasil e em outros países em
desenvolvimento, para isso fomentou a criação nestes países
de fundações, com o objetivo de assistir e medicar mulheres
pobres, mas com o verdadeiro intuito de esterilizá -las sem sua
autorização.
Um exemplo deste caso é a Associação Bem Estar
Familiar (BEMFAM), implantada no Brasil e mantida
principalmente com doações americana, cuja única função é a
110
http://www.providaanapolis.org.br/kissinger.htm
58
esterilização de mulheres entre 15 e 49 anos. O processo
utilizado é muito simples, o medicamento é aplicado na veia
como um anticoncepcional, mas lentamente a paciente vai
ficando estéril. Procedimento similar foi realizado no Peru
com maios de 320 mil camponesas, na década de 80.
O medicamento mais utilizado é o Deprovera, fabricado
pelo laboratório Norplante, que foi motivo de vários
escândalos nas décadas de 70/80 por provocar câncer e
esterilização de mulheres. Na Europa, este medicamento não
pode mais ser comercializado, em virtude da comprovação de
danos irreversíveis à saúde da mulher.
Como exemplo, temos o caso de Wilson, um jovem
mecânico, que ao se propor voluntário em um experimento
com uma nova droga para a evolução das pesquisas da
leucemia, acabou ficando 16 dias em coma e teve parte da sua
mão amputada 111.
Quando pessoas são vistas como simples cobaias,
coloca-se em risco o respeito e a própria liberdade do ser
humano, que são direitos inalienáveis, em nome da falsa
pesquisa, da ambição e da ganância das grandes corporações.
7 CONCLUSÃO
Após a realização deste trabalho chegou -se à conclusão
de que devido as grandes mudanças que têm ocorrido na
sociedade com relação na área social, científica e política, uma
onda ética avança sobre os países, buscando estabelecer uma
convivência menos conflituosa entre as nações, entre a ciência
e a sociedade.
A grande problemática ocorrida na sociedade se deu
com o término da Segunda Guerra Mundial, a qual revelou ao
mundo a matança de milhares de seres humanos na Alemanha,
os quais foram sacrificados e serviram de cobaias para
experimentos científicos, que deram origem ao Código de
Nuremberg em 1948.
111
Revista Super Interessante, Edição 278, Maio de 2010.
59
Isto ocorreu em vista da necessidade de aplicar os
conhecimentos obtidos em pesquisas científicas para obter a
aplicabilidade desses resultados científicos em seres humanos.
Assim, surge a Bioética, que antes de tornar-se uma disciplina
na década de l980, já era um movimento que tentava responder
aos conflitos éticos relacionados com o avanço tecnológico no
campo da biomedicina.
Sendo assim, ela é um pólo de luta pelos direitos
humanos e tem como objetivo regulamentar, promover e
defender a dignidade humana dentro das possíveis qualidade s
de vida, delegando responsabilidade e poder à sociedade para
direcionar o caminho que interessa para si e para as gerações
futuras, relacionando as manipulações genéticas, aos temas do
direito reprodutivo, dentre outras questões relativas à Saúde
Pública, as Cobaias Humanas, que foi o tema do presente
estudo.
Surge então uma questão, por que usar pessoas para
entender doenças e testar remédios cujos efeitos nem se
conhecem ou tem ciência de que são seguros?
Apesar de cada vez mais avançada, nossa tecnologia
ainda não é suficiente, por isso, usam-se, além de animais,
pessoas, pois os testes existentes ainda são incapazes de dizer
com precisão como agirá uma droga no corpo humano. Dessa
forma, somente sabe- se um remédio tem eficácia ou não e
quais seus efeitos colaterais, depois de testá-lo em centenas de
animais e seres humanos. E aí está o grande problema, garantir
saúde a essas pessoas.
Sendo assim, é de fundamental importância à
participação de cobaias humanas no desenvolvimento de
pesquisas, desde que respeitados os direitos dispostos pela
Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), entre eles:
decidir se quer participar; receber informações sobre os
objetivos, métodos e riscos da pesquisa e dos tratamentos
alternativos; manter sua privacidade e anon imato; abandonar a
pesquisa quando quiser; tratamento gratuito caso surjam
complicações de saúde por causa da pesquisa; receber o
melhor tratamento já existente para sua doença ou o novo
tratamento em teste, que deve ter potencial para se tornar o
60
melhor
existente;
comunicar-se
facilmente
com
os
pesquisadores; receber informações que surgirem no estudo,
como problemas ocorridos com outros voluntários;
indenização, caso a pesquisa cause alguma dano;
exclusividade nas informações que prestar e nas amostras
retiradas de seu corpo e depois de terminada a pesquisa,
continuar recebendo o tratamento em pesquisa que tiver
experimentado, se o considerar benéfico.
7 REFERÊNCIAS
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médica: princípios, diretrizes e regulamentações.
Revista da Sociedade Brasileira de medicina Tropical,
São Paulo, jul-ago, 2005.
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em 12/04/2010 em
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BARTILOTTI, Márcia Mirra Barone et al. A ética na saúde.
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BRASIL. Resolução n° 1.246 de 08 de janeiro de 1988. Dispõe
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República Federativa do Brasil, Brasília. 26 Jan 1988,
seção 1.
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Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas
envolvendo seres humanos. Diário Oficial. República
Federativa do Brasil, Brasília.
CLOTET, Joaquim. Bioética: uma aproximação. Porto Alegre:
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//www.cfm.org.br.
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(CIOMS), World Health Organization (WHO).
61
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GARRAFA, Volnei. PESSINI, Leo. Bioética: poder e
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GOLDIM, José Roberto. Simpósio sobre ética: o
consentimento informado numa perspectiva além da
autonomia. Porto Alegre: Revista Amrigs, 2000
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humanos como instrumentos de controle social . In:
Fortes PAC, Zoboli ELCP (eds) Bioética e Saúde
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OLIVEIRA, Fátima. Bioética: uma face da cidadania. 2 ed.São
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SAUNDERS, Jr WL. Principles of health care ethics. New
York: John Wiley & Sons, 1994.
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2008.
SPINSANTI, Sandro. Ética Biomédica. Traduzida por Benôni
Lemos, rev. vol. 2. São Paulo: Paulinas, 1990.
62
CAPÍTULO III:
ABORTO ANENCEFÁLICO
Agatha Yuri Sonohara
Fernanda Andrade Ré
Fernanda Caraçato Vettorazzo
Leliane Krauspenhar
Maiana Kelmer Araújo
Mariuci Roberta Barrreto da Costa 112
RESUMO
O presente artigo visa analisar brevemente o tema aborto anencefálico,
analisando desde os fatores que podem gerar uma gravidez de feto
anencefálico até a apresentação de opiniões divergentes acerca da
possibilidade de se permitir ou não, em lei, o aborto nesses casos. Tratarse-á ainda, de seus prognósticos, de como realizar a prevenção para se
evitar a formação de fetos anencéfalos pelo tratamento com Ácido Fólico, e
casos reais.
Palavras-chave:
Aborto,
Constitucionais, Anencefalia,
Anencefalia.
112
Legalização,
Ácido Fólico,
Princípios
Aborto por
Acadêmicas do 5º período do curso de Direito d a Pontifícia
Universidade Católica do Paraná – Campus Maringá.
63
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo descrever e passar
conhecimento sobre aborto de fetos anencéfalos, sob a ótica do
ordenamento jurídico, tomando como partida os conceitos de
aborto, anencefalia e aborto por anencefalia, adentrando ainda,
estas questões relacionadas aos princípios constitucionais,
alem de relacionar essas questões em países que autorizam o
aborto, os prós e contra do aborto anencefálico e o
posicionamento de magistrados em relação ao tema.
O aborto de anencéfalo é um tema muito discutido no
Brasil, pelo fato de divergentes opiniões sobre o assunto serem
formadas por várias áreas de estudos, como as religiões, os
tribunais, a medicina. A lei brasileira autoriza apenas dois
tipos de aborto, o aborto necessário e o aborto sentimental,
fazendo assim com que os outros tipos de aborto sejam
considerados crime, portanto, não permitidos no País.
O relacionado tema ofende vários princípios disposto s
na Constituição Federal de 1988, sendo o principal, o
Princípio da Dignidade Humana, que defende o direito a vida,
independente dos fatores físicos e psíquicos do feto, gerando
discussões a cerca da dignidade deste e da gestante.
Todas essas questões serão devidamente ponderadas ao
longo deste estudo, levando dúvidas sobre a legalização do
aborto anencefálico no Brasil.
2 ABORTO
O aborto é um delito de conceito uniforme entre os
doutrinadores, pois a grande maioria entende que, é um ato
provocado pela própria mãe ou terceiro que interrompe a
gravidez, causando morte do feto, independente de sua
expulsão. Isso devido ao fato de que o embrião em formação
poderá ser destruído pelo próprio organismo da mãe.
Portanto, para a consumação delitiva é necessário que
haja a morte do produto da concepção, mesmo sendo ela
posterior as condutas abortivas, como pode ocorrer que o feto
não tenha óbito dentro do organismo da mãe, mas fora, sendo
64
que a causas que causou sua morte foram as condutas
praticadas para o fim de abortar.
Tem –se assim que “o aborto é a interrupção da
gravidez com a conseqüente morte do feto (produto da
concepção)” 113, sendo este um conceito básico e direto do que
é o aborto. Porém pode ser conceituado de forma mais
completa, como sendo:
Aborto a interrupção da gravidez, com a
conseqüente destruição do produto da
concepção. Consiste na eliminação da vida
intra-uterina. Não faz parte do conceito de
aborto a posterior expulsão do feto, pois
pode ocorrer que o embrião seja dissolvido e
depois reabsorvido pelo organismo materno
em virtude de um processo de autólise, ou
então pode suceder que ele sofra processo de
mumificação ou maceração, de modo que
continue no útero materno. 114
Para tipificar a prática do crime de aborto a lei não diz
qual é o período de gestação que o feto tem que estar, ou seja,
este pode estar em qualquer período de sua formação, poden do
estar no primeiro mês ou no último, que em ambos os casos
vão ser aborto. Desde que, ressaltando, a mort e do feto seja
causada pelas práticas realizadas para obter resultado morte
deste.
Este crime fere a vida humana e encontra-se tipificado
no Código Penal Brasileiro, estando junto com o crime de
homicídio, como exemplo, por ser crime contra a vida. Este
Código traz cinco artigos, sendo o artigo 124 até o artigo 128,
os que relatam os possíveis agentes ativos, que pode ser a
própria mãe ou terceiro, que poderá provocar o aborto com o
consentimento ou sem esse, sendo que quando praticado por
terceiro este pode ser responsabilizado pela forma qualificada ,
113
JESUS, Damásio de. Direito Penal: parte especial. 30. ed. São Paulo:
Saraiva, 2010, v.2. p. 151.
114
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte especial. 3. ed. rev.
e atual. São Paulo: Saraiva, 2004. p.108.
65
quando resultar lesão grave ou morte da mãe, e ainda traz as
possibilidades de aborto legal.
Concluindo assim que “o aborto é o crime consistente
na dolosa interrupção, vedada pela lei, da vida intra -uterina
normal, em qualquer de suas fases evolutivas, haja ou não
expulsão do produto da concepção do ventre materno.” 115
2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS
O aborto foi muito praticado entre os povos,
principalmente entre gregos e romanos, pois estes acreditavam
que o feto era parte integrante da mãe, integrando o seu corpo,
podendo assim, dispor. Como o passar de alguns anos o aborto
foi considerado, quando praticado por mulher casada uma
ofensa o marido, ferindo o direito de ser pai e dar
continuidade a família. Quando praticado por mulher solteira,
esta prática era liberada.
A reprovação ao ato de abortar foi dada com o
surgimento do cristianismo, de modo que:
O aborto surgiu pela primeira vez na
Constitutio Bamberguensis de 1507 e na
Constitutio Criminalis Carolina de 1532,
que distinguiam entra a morte do feto
animado e inanimado, punindo a primeira
com a pena capital e a segunda com um
castigo aplicado segundo o arbítrio dos
peritos versados em direito.” 116 Aqui, neste
período o aborto foi igualado ao homicídio.
No século XVIII, foi abolida a pena capital,
substituindo-a pela pena de prisão ou multa. Em pleno século
XXI, há duas situações, tendo em vista aqueles tem como idéia
a continuidade do aborto como crime, punindo rigorosamente
a pessoa que pratica, principalmente a mãe, e aqueles que são
115
DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do direito. 2. ed. aum. e atual.
São Paulo: Saraiva, 2002. p. 41.
116
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., 2002. p. 36.
66
a favor do aborto, com fundamento na vontade da mãe de ter
um filho, podendo ela escolher o destino de uma vida.
São várias as espécies de aborto de acordo com o
disposto na legislação penal:
A) Auto-aborto: está previsto no artigo 124, primeira
parte, “provocar aborto em si mesma”. Tratando-se, portanto
de crime especial, podendo ser praticado apenas pela mãe. “É
a própria mãe que quem executa a ação material do crime, ou
seja, ela própria emprega os meios ou manobras abortivas em
si mesma.” 117 Assim, é um delito que a própria mãe,
dolosamente, e sozinha comete.
B) Aborto consentido: aquele em que terceiro pratica,
mas que a mãe permite que o faça. “No caso a gestante não
pratica aborto em si mesma, mas consente que o agente o
realize”. 118 Esse terceiro que pratica o aborto vai responder
pelo artigo 124, segunda parte do Código Penal.
C) Aborto provocado por terceiro: disposto nos artigos
125 e 126 do Código Penal, cujo primeiro está relacionado
com o aborto sem o consentimento da gestante, e o segundo do
aborto com o consentimento da gestante. “Em se tratando de
aborto provocado sem o consentimento da gestante, o agente
emprega a força física, a ameaça ou a fraude para a realização
das manobras abortivas.” 119 Neste tipo não só o feto é vítima,
mas a mãe também. E no aborto provocado por terceiro com o
consentimento da gestante é aquele que a mãe autoriza que
aquele realize condutas com a finalidade de abortar. Mas este
consentimento tem que ser válido, isto é, a grávida tem que ter
discernimento mental, não podendo ela ser menor de quatorze
anos de idade, alienada ou débil, e se o consentimento foi
obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.
117
CAPEZ, Fernando. Op. cit., 2004. p. 115.
FABBRINI, Renato N. MIRABETE, Julio Fabbr ini. Manual de
Direito Penal: parte especial. 25. ed. ver. e atual. São Paulo: Atlas,
2008. p. 65.
119
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 7. ed. atual e
ampli.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. v. 2. p. 112.
118
67
D) Aborto qualificado pelo resultado: quando em razão
das condutas abortivas a mãe sofre lesão corporal grave ou a
morte, sendo em ambos os casos as penas aumentadas. “É
evidente que o resultado mais grave (lesão corporal grave ou
morte), condição de maior punibilidade, não deve ter sido
querido, nem mesmo eventualmente, pelo agente, pois nesses
casos deverá ele responder pelos crimes de lesão corporal
grave ou homicídio, e concurso com o aborto.” 120
E) Aborto necessário: pode ocorrer em duas
possibilidades. A primeira quando a vida da grávida esta em
risco, e a segunda quando a gravidez foi resultado de estupro.
“Em síntese, parte-se de uma esquema de regra-exceção: a
regra é a punição do aborto; a exceção, permitir o aborto em
determinadas hipóteses expressamente previstas (indicações),
além das eximentes comuns de responsabilidade disciplinadas
pelo Código Penal.” 121 É um tipo permitido pela lei, dando
mais importância para as vontades da gestantes do que a vida
humana, que está sendo formada.
F) Aborto sentimental: que também pode ser chamado
de humanitário e ético, é aquele realizado por médico, quando
a gravidez foi resultado de estupro, sendo assim um aborto
legal, como está disposto no artigo 128, inciso II, do Código
Penal Brasileiro. Sendo que para a realização desta prática o
estupro precisa ser provado e ter o consentimento expresso da
vontade da gestante, não precisando de autorização judicial.
G) Aborto econômico: é aquele praticado geralmente em
famílias numerosas e com dificuldades financeiras, sendo que
o nascimento de mais uma pessoa nesta família acarretaria
maiores crises econômicas. Esta conduta não é permitida pela
legislação nacional.
H) Aborto eugenésico: este "permite o aborto quando
existam riscos fundados de que o embrião ou o feto sejam
portadores de graves anomalias ou o feto sejam portadores de
graves anomalias genéticas de qualquer natureza ou de outros
120
FABBRINI, Renato N. MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. cit. 2008, p.
67.
121
PRADO, Luiz Regis. Op. cit., 2008, p.114.
68
defeitos físicos ou psíquicos decorrentes da gravidez”. 122 Para
a legislação atual esta prática é considerada crime, embora o
Poder Judiciário tem autorizado a prática quando houver prova
legítima de que o feto fora do útero materno não tiver meios
de sobreviver.
3 PAÍSES QUE AUTORIZAM O ABORTO DE
ANECÉFALOS
Enquanto o Brasil discute a permissão para o aborto de fetos
anencéfalos, quase metade dos países membros da Organização das
Nações Unidas (ONU) reconhecem a interrupção da gravidez nesses
casos como um direito da mulher. O levantamento, realizado pela
professora Débora Diniz da Universidade de Brasília, revela que das
192 nações, 94 permitem o aborto de fetos com ausência parcial ou
total do cérebro, ressaltando ainda que a pesquisa indica uma
tendência mundial na permissão desse tipo de aborto.123
É o caso de Austrália, Estados Unidos, Alemanha, Bélgica,
Canadá, África do Sul, França e de mais 87 países, inclusive
democráticos e majoritariamente católicos, como México, Portugal e
Itália.
A América Latina fica isolada no mapa de legislações
favoráveis a interrupção da gestação de anencéfalos, posto que nesta
apenas a Guiana e a Colômbia reconhecem esse direito.124
Para Débora Diniz, o Brasil ainda não autoriza esse tipo de
aborto porque a influência católica está atrelada à estrutura legal do
país. “Muito embora a população portuguesa se declare
majoritariamente católica, essa moral não está imbricada na estrutura
de poder como acontece no Brasil”, afirma Débora, que desenvolveu a
pesquisa pelo Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero
122
PRADO, Luiz Regis. Op. cit., 2008, p. 117.
METADE DOS PAÍSES AUTORIZAM ABORTO DE ANENCÉFALOS.
Disponível
em<http://www.observatoriodegenero.gov.br/menu/noticias/ metade-dospaises-autorizam-aborto-de-anencefalos>. Acesso em: 11 de junho de
2010.
124
Id.
123
69
(Anis), organização não-governamental dedicada à pesquisa em
Bioética. 125
Caso a autorização de aborto de fetos anencéfalos siga um
fluxo contínuo nas legislações internacionais, o Brasil pode despontar,
ainda este ano, como um dos únicos países latinoamericano a
reconhecer esse direito em função de uma ação movida pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), que se
arrasta desde 2004 no Supremo Tribunal Federal, sob forte embate
entre religiosos e movimentos sociais. Recentemente, a AdvocaciaGeral da União (AGU) concedeu parecer favorável ao Supremo
Tribunal Federal para o caso, o que expressa a posição oficial do
governo brasileiro na matéria. O relator da ação, ministro Marco
Aurélio Mello, deve levar ainda neste semestre seu voto sobre aborto
de fetos anencéfalos. 126
Um dos motivos de o Brasil não autorizar o aborto de
anencéfalos pode ser explicado pelo surgimento “tardio” de
movimentos sociais defensores da causa, posto que em comparação a
outros países, a mobilização feminista no Brasil é jovem, iniciando-se
por volta dos anos 70, enquanto outras localidades já existe há mais
tempo.127
Por um lado, o constitucionalista Ronaldo Poletti, professor da
Faculdade de Direito da UnB, dá outra explicação para o fenômeno,
afirmando que no país, além de criminal, o aborto também está em
matéria constitucional e em legislações do Direito Civil., surgindo em
função disso a argumentação jurídica contrária.128
Como assevera o professor, nos direitos fundamentais, a
Constituição estabelece o direito à vida, e no código civil brasileiro,
125
Id.
126
SUPREMO
TRIBUNAL
FEDERAL.
Disponível
em:<
http://www.stf.jus.br >. DJ 02/08/2004 PP-00064 RTJ VOL-00200-03 PP01399.
127
Como afirma a professora Soraya Fleisher, do Departamento de
Antropologia da UnB: “Aqui começou após a ditadura, por volta dos anos
70. Na Europa e nos Estados Unidos, essa luta já dura décadas”.
Referencia disponível em: METADE DOS PAÍSES AUTORIZAM
ABORTO DE ANENCÉFALOS. Op. cit.
128
METADE
DOS
PAÍSES
AUTORIZAM
ABORTO
DE
ANENCÉFALOS. Op. cit.
70
diz que os direitos do nascituro são protegidos desde a concepção,
ensejando muitas discussões a cerca do tema.
O direito à vida, no entanto, não pode ser atribuído ao caso de
fetos anencéfalos, defende Luís Roberto Barroso129, advogado que
representa a ação da CNTS. De acordo com ele, o aborto pressupõe a
potencialidade de vida do feto, o que não ocorre nesses casos.130
Por outro lado, o Presidente da Associação Nacional Pró-Vida
e Pró-Família, Humberto Leal Vieira contesta o argumento do
advogado, afirmando que o bebê anencéfalo tem vida e que, fazer o
aborto nesse caso é antecipar a morte de um ser humano.131
No mesmo sentido, Cláudio Bernardo Pedrosa de Freitas,
médico e professor da Faculdade de Medicina da UnB, diz que o nãonascido não deve ser discriminado, uma vez que mesmo dentro do
útero materno, já pertence à comunidade dos seres humanos. Segundo
ele, o argumento de que o aborto de anencéfalos deve ser um direito
da mulher é distorcivo, uma vez que o feto e ela são dois indivíduos
diferentes.132
4
PRINCÍPIOS
RELACIONADOS AO TEMA
4.1 PRINCÍPIO
HUMANA
DA
CONSTITUCIONAIS
DIGNIDADE
DA
PESSOA
O direito à vida é a fonte primária de todos os outros
bens jurídicos e em seu conteúdo está presente o direito à
dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da
“Há certeza médica de que ele irá morrer ou no útero ou muito pouco
tempo após o parto. Além disso, jamais chegará a ter vida cerebral”,
explica. “ Como o critério para definir a morte no direito brasileiro é a
morte encefálica, o feto anencéfalo, tragicamente, não chega a ser uma
vida”. Referencia disponível em : METADE DOS PAÍSES AUTORIZAM
ABORTO DE ANENCÉFALOS. Op. cit.
130
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Op. cit.
131
METADE
DOS
PAÍSES
AUTORIZAM
ABORTO
DE
ANENCÉFALOS. Op. cit.
132
METADE
DOS
PAÍSES
AUTORIZAM
ABORTO
DE
ANENCÉFALOS. Op. cit.
129
71
República Federativa do Brasil, que se expressa por meio das
condições econômicas, sociais e culturais dignas de existência.
Segundo Alexandre de Moraes o Princípio da dignidade
humana se conceitua da seguinte forma:
A dignidade da pessoa humana é um valor
espiritual e moral inerente à pessoa, que se
manifesta
singularmente
na
autodeterminação consciente e responsável
da própria vida e que traz consigo a
pretensão ao respeito por parte das demais
pessoas, constituindo-se em um mínimo
invulnerável que todo estatuto jurídico deve
assegurar,
de
modo
que
apenas
excepcionalmente
possam
ser
feitas
limitações ao exercício dos direitos
fundamentais, mas sempre sem menosprezar
a necessária estima que merecem todas as
pessoas enquanto seres humanos. 133
A dignidade da pessoa humana, valor fundamental e
expressão do direito à vida, estaria sendo violada quando da
submissão da gestante a sofrimento prolongado, durante toda a
gestação, ocasionado pela certeza de que esta se
desenvolvendo em seu ventre ser que natural e inevitavelmente
morrerá logo após o parto.
4.2 PRINCÍPIO DA HARMONIZAÇÃO DOS BENS
JURÍDICOS
O Princípio da Harmonização impõe a coordenação e
combinação dos bens jurídicos, quando verificado conflito ou
concorrência entre eles, de forma a evitar o sacrifício total de
uns em relação aos outros. Fundamenta-se na idéia de
igualdade de valor dos bens constitucionais que, no caso de
conflito, impede como solução, a aniquilação de uns pela
133
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e
Legislação Constitucional. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 128.
72
aplicação de outros, e impõe o estabelecimento de limites e
condicionamentos recíprocos de forma a conseguir uma
harmonização ou concordância prática entre esses dispositivos.
Assim, no caso de feto anencefálico, há duas normas
aparentemente conflitantes, ou seja, os tipos pen ais que punem
o aborto e a dignidade da pessoa humana tratada na Carta
Magna. Em outras palavras, há a gestante, a qual teoricamente
deverá levar a gravidez até o final, suportando toda a dor e
sofrimento que este estado lhe causara com a inevitável morte
do feto que esta gerando, o que fere sua dignidade, e de outro
lado, a vida intrauterina protegida especificamente nos arts.
124 e 126 do Código Penal, e também no caput do art. 5º da
CF/88 e no art. 2º do CC/02. 134
5
ANENCEFALIA
5.1 CONCEITO DE FETO ANENCEFÁLICO
Conforme Santos 135, os defeitos do fechamento do tubo
neural (DFTN) são malformações que ocorrem na fase inicial
do desenvolvimento fetal, entre a terceira e a quinta semana de
gestação, envolvendo a estrutura primitiva que dará origem ao
cérebro e à medula espinhal, tendo sido constatado que os
casos de anencefalia e espinha bífida respondem por cerca de
90% de todos os casos de defeitos do tubo neural, enquanto os
casos restantes (10%) consistem principalmente em
encefalocele 136. Ou seja, os defeitos do fechamento do tubo
134
LOUREIRO, Ythalo Frota. Princípios da hierarquia e da disciplina aplicados às
instituições militares: uma abordagem hermenêutica. Jus Navigandi, Teresina, ano
8,
n.
470,
20
out.
2004.
Disponível
em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5867>. Acesso em: 04 out. 2010.
135
SANTOS, Leonor Maria Pacheco. PEREIRA, Michelle Zanon. Efeito
da Fortificação com ácido fólico na redução dos defeitos do tubo neural.
Cadernos
de
Saúde
Pública.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102 311X2007000100003&lang=pt>. Acesso em: 19 de maio de 2010.
136
Encefalocele é um defeito congênito do osso do crânio e da dura -máter
com hérnia extracranial de qualquer estrutura intracraniana. Pode ser
encontrada com uma variação geográfica e com diferentes oc orrências. A
73
neural (DFTN) são malformações congênitas freqüentes que
ocorrem devido a uma falha no fechamento adequado do tubo
neural embrionário 137.
Quando o feto sofre de anencefalia há ausência
completa ou parcial do cérebro e do crânio. E a es pinha bífida
é um defeito de fechamento ósseo posterior da coluna
vertebral 138. A gestação de feto anencefálico em geral resulta
em aborto e os que nascem vivos morrem poucas horas, ou
dias, após o parto 139.
5.2 PROGNÓSTICOS
As causas dos defeitos do tubo neural 140 não são
completamente conhecidas, mas as evidencias indicam que,
pelo menos em parte, se devem à nutrição deficiente,
particularmente de ácido fólico, por causas genéticas ou uso
de drogas. Certos medicamentos (como alguns usados para
controlar convulsões) podem também causar defeitos de tubo
neural 141. Outros fatores de risco maternos para esta anomalia
dura-máter é uma membrana constituída por tecido conjuntivo denso.
MINOTTO, Ivanete et al. Basal encephalocele associated with mornig
glory syndrome: case report. Arquivos de Neuro-Psiquiatria. Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?s cript=sci_arttext&pid=S0004282X2007000600013&lang=pt>. Acesso em: 09 de junho de 2010.
137
AGUIAR, Marcos J. B. et al. Defeito de fechamento do tubo neural e
fatores associados em recém-nascidos vivos e natimortos. Jornal de
Pediatria.
Disponível
em:
<
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021 75572003000200007&lang=pt >. Acesso em: 19 de maio de 2010.
138
Id.
139
SANTOS. Leonor Maria Pacheco. PEREIRA. Michelle Zanon. Op. cit..
140
Os defeitos do fechamento do tubo neural (DFTN) são malformaçõ es
congênitas resultantes do fechamento incorreto ou incompleto do tubo
neural entre a terceira e quarta semana do desenvolvimento embrionário e
englobam a anencefalia, encefalocele e espinha bífida. PACHECO.
Sâmya Silva. et al. Efeito da fortificação ali mentar com ácido fólico na
prevenção de defeitos do tubo neural. Revista de Saúde Pública.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex t&pid=S003489102009000400001&lang=pt>. Acesso em 21 de maio de 2010.
141
Ibidem
74
é ter diabetes mellitus 142, uso de ácido valpróico 143 durante a
gestação, obesidade materna, hipertemia 144, dieta inadequada,
hemodiluição
fisiológica
gestacional
e
influências
145
hormonais , entre outros.
Devido à gravidade dos DFTN e sua alta
morbimortalidade,
tornam-se
muito
importantes
o
aconselhamento genético, a suplementação dietética com ácido
fólico e o diagnóstico pré-natal das malformações do tubo
neural 146. A ultra-sonografia é a modalidade primeira de
avaliação do feto de imagem por causa de sua ampla
disponibilidade. Pode ser determinado o tamanho da placenta e
do feto, os nascimentos múltiplos, as anormalidades da forma
da placenta e as apresentações anormais 147. Este pode ser feito
através do ultra-som durante a gestação e dosagem de alfa-feto
proteína, no líquido amniótico, cujos valores estarão
142
Diabetes mellitus gestacional (DMG) é definido como qualquer nível
de intolerância a carboidratos, resultando em hiperglicemia de gravidade
variável, com início ou diagnóstic o durante a gestação. Sua fisiopatologia
é explicada pela elevação de hormônios contra -reguladores da insulina,
pelo estresse fisiológico imposto pela gravidez e a fatores
predeterminantes (genéticos ou ambientais). MIRANDA PAC, Reis R.
Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Diabetes mellitus
gestacional. Revista da Associação Médica Brasileira. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104 42302008000600006&lang=pt>. Acesso em: 05 de junho de 2010.
143
O ácido valpróico representa uma das principais drogas no tratamento
da epilepsia, sendo eficaz tanto para crises generalizadas como parciais.
Além disto, vem tendo crescente utilização em outras afecções,
principalmente transtornos psiquiátricos. TURCATO. Marlene d e Fátima.
et al. Hiperamonemia secundária ao uso terapêutico de ácido valpróico:
relato de caso. Arquivos de Nero-Psiquiatria. Disponível em: <
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004 282X2005000200034&lang=pt >. Acesso em: 05 de jun ho de 2010.
144
PACHECO. Sâmya Silva. et al. Efeito da fortificação alimentar com
ácido fólico na prevenção de defeitos do tubo neural. Revista de Saúde
Pública.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034 89102009000400001&lang=pt>. Acesso em 21 de maio de 2010.
145
SANTOS. Leonor Maria Pacheco. PEREIRA. Michelle Zanon. Op. cit.
146
AGUIAR. Marcos J. B. et al. Op. cit.
147
MOORE. Keith L. Embriologia Básica. 5 ed., Ed Guanabara Koogan.
Rio de Janeiro, 2000. p.103.
75
aumentados, através da amniocentese, entre a 14ª e 16ª
semanas de gestação 148.
5.3 PREVENÇÃO
O ácido fólico é o mais importante fator de risco para os
defeitos do tubo neural identificado até hoje 149, apesar do seu
mecanismo de autuação ainda ser pouco compreendido 150. Há
estudos que comprovam a redução, em torno de 50% a 70%, na
ocorrência de tais defeitos congênitos, após a suplementação a
ocorrência de tais defeitos congênitos periconcepcional deste
nutriente, várias organizações de saúde passaram a recomendar
a sua utilização 151.
O ácido fólico tem um papel fundamental no processo
da multiplicação celular, sendo, portanto, imprescindível
durante a gravidez. O folato interfere com o aumento dos
eritócitos, o alargamento do útero e o crescimento da placenta
e do feto. O ácido fólico é requisito para o crescimento
normal, na fase reprodutiva (gestação e lactação) e n a
formação de anticorpos 152. O Institute of Medicine of the
National Academies, nos Estados Unidos estabeleceu a dose de
0,4 mg/dia para mulheres adultas não gestantes e 0,6 mg/dia
para gestantes. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) em sua publicação mais recente elevou as
recomendações nutricionais de ingestão diária de ácido fólico
conforme o proposto pelo Institute
of Medicine of the
National Academies 153.
Para garantir a ampla cobertura da estratégia de
suplementação de ácido fólico à população de gestantes de 40
países instituíram a medida da fortificação de alimentos
consumidos em larga escala com ácido fólico para a prevenção
da ocorrência de DFTN. Em pesquisa realizada em 45 estados
148
149
150
151
152
153
Op. cit.
SANTOS. Leonor Maria Pacheco. PEREIRA. Michelle Zanon. Op. cit.
PACHECO. Sâmya Silva. et al. Op. cit.
Id.
SANTOS. Leonor Maria Pacheco. PEREIRA. Michelle Zanon. Op. cit.
PACHECO. Sâmya Silva. et al. Op. cit.
76
dos Estados Unidos, incluindo ainda a capital estadunidense,
ou seja, a cidade de Washington constatou -se redução de 19%
na ocorrência de defeitos de fechamento do tubo neural após a
implantação dessa medida 154.
6 ABORTO POR ANENCEFALIA
6.1
PRÓS
E
ANENCEFÁLICO
CONTRAS
DO
ABORTO
Antes de posicionar-se a favor ou contra o aborto de
fetos anencéfalos, devem-se analisar os pontos positivos e
negativos dessa prática, sendo esta muito discutida no meio
social, posto que envolve questões filosóficas, morais, éticas,
religiosas, científicas e inclusive jurídicas, dificultando assim
a tomada de uma postura a respeito do tema. Em face do
disposto, apresentar-se-ão alguns posicionamentos a seguir.
154
Id.
O que é o ácido fólico? O ácido fólico, também conhecido como vitamina
B9 ou vitamina M, é uma vitamina hidrossolúvel pertencente ao
complexo B necessária para a formação de proteínas estrutura is e
hemoglobinas. Ela tem como benefícios ser efetivo no tratamento de
certas anemias, mantém os espermatozóides saudáveis, é indispensável
para uma gravidez saudável, reduz o risco de mal de Alzheimer, evita
certos tipos de doenças e derrames e pode ajud ar a controlar a
hipertensão. Esse componente pode ser encontrado em vísceras de
animais, verduras de folhas verdes, legumes, frutos secos, grãos integrais,
leveduras de cerveja e no cogumelo shitake. Contudo, o mesmo se perde
nos alimentos conservados em temperatura ambiente e durante o
cozimento. Ao contrário de outras vitaminas hidrossolúveis, é
armazenado no fígado e sua ingestão diária não é necessária. Sua
insuficiência nos seres humanos é muito rara. No Brasil, há uma lei que
determina que a farinha de trigo seja enriquecida com ferro e ácido fólico
(e produtos derivados, como pão) para diminuir a ocorrência de anemia
principalmente em crianças. Ademais, o mesmo é distribuído para as
gestantes nos postos de saúde da rede pública. Se a mulher tem ácido
fólico suficiente durante gravidez, essa vitamina pode prevenir defeitos
de nascença no cérebro e na coluna vertebral do bebê, como a espinha
bífida, posto que o mesmo é importantíssimo para a formação do tubo
neural do feto. Wikipédia, a enciclopédia liv re. Disponível em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/anencefalia. Acesso em: 11 de maio de 2010.
77
Para os adeptos da teoria que o feto anencéfalo
equipara-se a morte cerebral, a acrania, apesar de permitir
algumas atividades motoras, não pode ser considerado como
uma deformação qualquer onde continuava a existir um feto
com vida, posto que para estes:
Anencefalia, ou ausência de cérebro,
equivale à morte cerebral, situação que
permite não só o desligamento de aparelhos
médicos, como a própria doação de órgãos.
Não se trata, neste caso, de interrupção de
vida por defeito de formação, ou para
prevenirem sofrimentos, refere-se o caso à
interrupção da gravidez de concepto sem
vida. 155
Tal pensamento apesar de parecer correto apresenta um
pequeno erro, mas que gera uma terrível conseqüência, posto
que a Lei 9.434/97 (Lei de Doação de Órgãos) instituiu o
conceito legal de morte em seu artigo 3º como sendo a
ausência de atividade encefálica: “A retirada post mortem de
tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a
transplante ou tratamento deverão ser precedidos de
diagnóstico de morte encefálica [...]” 156 (grifou-se).
Seguindo nesse raciocínio, os critérios para a
constatação de morte encefálica foram definidos pela Portaria
1.480/97 do Conselho Federal de Medicina: “Art. 4º. Os
parâmetros clínicos a serem observados para constatação de
morte encefálica são: coma aperceptivo com ausência de
atividade motora supra-espinal e apnéia.” 157 (grifou-se).
155
REZENDE, Poliana Guimarães. Anencefalia: estudo sobre a
legalização do aborto e a doação de órgãos . Jus Navigandi, Teresina,
ano
13,
n.
2119,
20
abr.
2009.
Dispo nível
em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12651>. Acesso em: 27
mar. 2010.
156
Ibidem. (grifou-se).
157
RESOLUÇÃO
CFM
nº
1.480/97.
Disponível
em:
<http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/1997/1480_1997.htm>.
Acesso em: 03de junho de 2010.
78
Ainda em seu art. 6º dispõe que:
Os exames complementares a serem
observados para constatação de morte
encefálica deverão demonstrar de forma
inequívoca:
a) ausência de atividade elétrica cerebral ou,
b) ausência de atividade metabólica cerebral
ou,
c)
ausência
de
perfusão
sangüínea
cerebral. 158
Agora com uma visão profissional do assunto tem -se
como anencefalia, pelos doutores Carlos Gherardi e Isabel
Kurlat:
Anencefalia é uma das alterações na
formação do cérebro, resultante da falha nos
estágios
iniciais
do
desenvolvimento
embrionário do mecanismo de fechamento do
tubo neural chamado de indução dorsal. A
gravidade na anencefalia é caracterizada pela
falta de ossos cranianos (frontal, occipital e
parietal), do hemisfério e do córtex cerebral.
O tronco cerebral e a medula espinhal são
frequentemente conservados embora em
defeitos em anencefalia seja acompanhado
pelo fechamento da coluna vertebral . [...].
Em anencefalia, a ausência de estruturas
cerebrais (hemisférios e córtex) com a
simples presença do tronco cerebral, causado
pela ausência de todas as funções superiores
do sistema nervoso central, que para com a
existência da consciência e da cognição que
envolve a vida relacionamento, comunicação,
afeto, emoção com a preservação apenas, e
as funções motoras dependentes da medula
espinhal. [...]. Anencefalia é o equivalente
do PVS em crianças e em ambos os casos
158
Id.
79
não satisfaçam as condições de morte
cerebral por falta de prejuízo para o sistema
de ativação reticular do tronco cerebral.
159
(tradução livre)
Por fim, Eduardo Gomes de Queiroz constata que:
O feto anencefálico possui atividade
motora supra-espinal, uma vez que, apesar
de não possuir o cérebro, possui tronco
cerebral, de maneira que há a preservação
das funções vegetativas que controlam
parcialmente a respiração, as funções
vasomotoras e as dependentes da medula
espinal. 160 (grifo do autor)
Assim, o feto anencefálico possui atividade encefálica,
não estando incluso nos termos dos artigos 4º e 6º da portaria
1.480/97.
O feto não está morto quando nasce e mesmo diante do
fato de que ele viverá apenas alguns minutos, horas, dias
(muito raramente passam de um ano 161), é fato que nasce vivo,
159
QUEIROZ, Eduardo Gomes de. Abortamento de feto anencefálico e a
inexigibilidade de conduta diversa. A influência das circunstâncias
concomitantes no comportamento humano. Jus Navigandi, Teresina, a.
10,
n.
943,
2006.
(grifo
do
autor).
Disponível
em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7770>. Acesso em: 03 jun.
2010.
160
Id.
161
Marcela de Jesus Ferreira, filha de Dionísio Justino Ferreira e Cacilda
Galante Ferreira nasceu no dia 20 de novembro de 2006, em Patrocínio
Paulista, interior de São Paulo, no hospital Santa Casa de Misericórdia de
Patrocínio Paulista. Respirava normalmente, quase não dependendo do
concentrador de oxigênio, muito risonha. CID PEREIRA. Anencéfalos.
Disponível
em:
<
http://www.anencefalos.com.br/RelacaoAnencefalos.html>. Acesso em:
02de junho. 2010. O bebê anencéfalo, superou as expectativas dos
médicos porque deveria viver
algumas horas e sobreviveu por um ano, oito meses e doze dias, e veio a
falecer
no
dia
1º
de
agosto
de
2008.
Disponível
em:
<http://www.tudoagora.com.br/noticia/4667/Com -1-ano-e-8-mesesmorre-menina-sem-cerebro.html>.
80
sendo objeto de proteção do direito. Viverá pouco tempo, da
mesma maneira que vive um paciente em estado terminal, mas
ainda assim, no Brasil não se permite a eutanásia.
Para aqueles que consideram que deve haver a
possibilidade de se fazer o aborto quando constatado a
anencefalia, aquele seria terapêutico, porque teria a função de
salvar a vida da mãe. Contudo para muitos a denomin ação
“terapêutico” tem sido muito banalizada, usando -a como se
tivesse qualquer relação simples com saúde, posto que a
gravidez de feto anencéfalo pode ou não ser de risco como
qualquer gravidez de feto ‘normal’, sendo certo que as
complicações poderão ser diminuídas com um bom
acompanhamento do pré-natal, não sendo as complicações,
portanto, colocadas como risco a vida da mãe. 162
Sobre isso diz o prof. Humberto Vieira, que a gestação
de feto anencéfalo não trás risco algum a mãe:
Além dos riscos normais de uma gravidez de
feto sem anomalias. Essa é uma afirmação de
ginecologistas, de associações médicas e de
especialistas. Pelo contrário, todo aborto traz
seqüelas físicas e psicológicas para a mulher.
Afirma o Dr. Dernival da Silva Brandão,
Especialista
em
Ginecologia,
ginecoobstetra, laureado pela Academia Fluminense
de Medicina: O polidrâmnio é uma
intercorrência em várias patologias da
gestação e o tratamento preconizado é a
amniocentese a retirada do excesso de
líquido,
amniótico,
procedimento
rotineiramente realizado com os devidos
cuidados. A hipertensão arterial é uma
intercorrência muito comum em obstetrícia.
A doença hipertensiva específica da gestação
(DHEG) não é exclusiva da anencefalia, tem
tratamento próprio como muitas outras
intercorrências obstétricas. Vasculopatia
periférica de estase é outra intercorrência
162
REZENDE, Poliana Guimarães. Op., cit., 2009.
81
que pode ocorrer em qualquer gestação, com
certa
freqüência,
e
tem
tratamento
preconizado. As dificuldades obstétricas e
complicações no desfecho do parto de
anencéfalos de termo podem ocorrer, não são
de grande monta e como em qualquer
dificuldade pode-se optar pela cesariana, sem
maiores problemas. 163
Outra linha de pensamento próxima a essa é de que no
caso não ocorreria o aborto, mas sim a interrupção antecipada
do parto. Esta utiliza-se de palavras que trazem eufemismo ao
tema para que essa prática não seja vista de maneira rui m,
como uma interrupção da vida. Diante do exposto Sérgio
Habib esclarece:
A supressão da vida do feto que apresenta
anencefalia é, não se pode negar abort amento
e não antecipação de parto. Na figura do
abortamento, interrompe-se a gravidez,
atingindo-se o ser em sua fase embrionária
ou fetal. Na aceleração de parto, o que
significa interferir no processo de gestação,
o ser nasce com vida, isto é, vem ao mun do
exterior com capacidade de viver, isto é, de
ter vida extra-uterina. 164
Segundo os adeptos da idéia de que a gestante deve ter
autonomia reprodutiva ou liberdade de escolha, defende -se o
exercício do direito à liberdade, que é garantia constitucional,
posto que limita a liberdade e autonomia da vontade, impor a
mulher que carregue por nove meses um feto que sabe que não
163
VIEIRA, Humberto. Presidente da Associação Pró-Vida e PróFamília comenta decisão judicial no Brasil que permite aborto em
caso
de
anencefalia
fetal.
Disponível
em:
<http://www.portaldafamilia.org.br/scnews/news039.shtml >. Acesso em:
03de junho 2010.
164
HABIB, Sérgio. Aborto por anencefalia e a cassação da liminar do
Ministro Marco Aurélio. Revista Jurídica Consulex, v. 8, nº 188, Nov.
2004. p. 7-10. p. 9
82
sobreviverá. Tal corrente pretende garantir a autonomia das
pessoas para deliberar sobre suas próprias vidas. 165
No entanto, muitos doutrinadores defendem que essa
liberdade deve ser exercida de modo que não atinja os direitos
de terceiros, pois o feto é um ser individualizado, com carga
genética própria. Sendo que na gravidez o agente ativo é o
feto, e o passivo é a mãe:
Numa demonstração de vigor fisiológico
interrompe o ciclo menstrual de sua mãe,
desenvolve uma placenta e um envoltório
protetor com o líquido amniótico, não
constituindo essas, portanto, parcelas do
organismo
materno.
Determina,
unilateralmente, a data de seu nasciment o,
sente dor, pressão externa, frio e percebe
som e luz. 166
Ainda, o direito de liberdade concedido à gestante é
anterior a concepção, ela pode decidir por ficar ou não
grávida, pois após a concepção o direito fundamental
preservado é a vida. 167
Dessa forma, a doutrinadora Maria Helena Diniz
questiona como poderia a gestante “reivindicar o direito de
dispor do que não é seu? Pois a mulher pode ser tida como
dona do próprio corpo, mas não da sua vida e muito menos da
do nascituro”. 168
Com isso, para a corrente contrária a prática do aborto
de uma forma geral, aceitá-lo seria uma violência a um ser
humano indefeso, em favor de outro mais forte.
Por outro lado, Sérgio Habib trás que se o nascimento
do feto trouxer sofrimento para a gestante (assim por ela
considerado), o Estado não tem o direito de impor-lhe tal
165
166
167
168
REZENDE, Poliana Guimarães. Op. cit. 2009.
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., 2002 , p. 57.
REZENDE, Poliana Guimarães. Op. cit., 2009.
DINIZ, Maria Helena. Op. cit. , 2002, p. 59.
83
sofrimento, porque estará sendo algoz, inquisidor, insensível e
moralista. 169
Ainda, trata de uma incongruência que diz existir no
Direito brasileiro:
[...] Aqueles que dizem que são contra o
abortamento em casos de anencefalia, em
nome da vida, na verdade, defendem que
esses fetos possam morrer [...] o Direito
Pátrio permite o abortamento quando a
gravidez resultar de estupro e não permite
quando se trata de anencéfalo. Na primeira
hipótese, a interrupção da gravidez se dará
em relação a um ser com todas as condições
de vida, legitimada por uma gestação não
desejada. Na segunda hipótese, mesmo que a
gravidez não seja desejada, obriga-se a
mulher a dar à luz a um ser despessoado, sem
caracteres humanos, sem a mínima condição
de sobreviver, mas se faz isso em nome da
vida. 170
Trata-se de dois direitos fundamentais inerentes a todo
ser humano, o direito à vida, e o direito à liberdade. Mas
diante de tal circunstância qual deve prevalecer? Uma
pergunta que se encontra em discussão, sem uma resposta
concreta.
Há ainda quem alegue que não se pode exigir que a
mulher persista numa gravidez em que o feto não sobreviverá
causando-lhe dor, angústia e frustração, posto que isto importa
à violação de ambas as vertentes de sua dignidade humana,
sendo evidentes os danos psicológicos e morais, como a
ameaça a sua integridade física. Assim, “parte da doutrina e
jurisprudência tem classificado o aborto de anencéfalo como
caso de inexigibilidade de conduta diversa, dada a evidente
169
170
HABIB, Sérgio. Op cit., 2004, p. 8.
Id.
84
angústia da mãe e, no que tange ao médico, ao fato de que não
se pode abster de ampará-la”. 171
Apesar de todos esses argumentos que acatam o aborto
anencefálico, existe ainda uma parcela da população que não
aceita esse fato, que luta pelo direito inerente e indisponível
que é a vida humana, tanto intra como extra-uterina.
Têm-se ainda dados que mostram o abalo psicológico de
mulheres que abortaram em relação a outras que não optaram
por essa prática. Em uma pesquisa - relatada por Wilma Lúcia
Castro Diniz Cardoso - realizada com 239 universitárias, de
idade entre 18 a 23 anos, encontraram-se quinze casos de
abortamento (não especificamente de fetos anencéfalos), então
se relacionou estes com outros quinze de mulheres que não
realizaram aborto. Foi aplicado a elas três tipos de testes
psicológicos: no “Z-Test” evidenciou-se a depressão, foram 15
casos do grupo que realizou o aborto, contra 5 do grupo que
não o fez; teste “Karen Machover” a psicossomatização ficou
evidente em 13 casos do grupo que abortou, contra 2 do outro
grupo; além desses sinais de condição psicológica, outros
foram constatados, como: imaturidade sexual, desequilíbrio
emocional, egocentrismo, auto-estima rebaixada, tristeza,
flutuações de humor, introversão, entre outras. 172
Além dessas conseqüências há também os riscos para a
saúde física da gestante, muitas delas não sabem dos perigos a
que se submetem, pois não têm e não procuram ter uma
orientação a esse respeito, entre os riscos do aborto poderá
ocorrer: infecção crônica e traumatismo, que resultam em
obstruções nas trompas; problemas no útero causados por
hemorragia, infecção ou endometriose, podendo acarretar a sua
perda, a esterilidade ou até a morte; incompetência istmocervical, dificultando uma nova gravidez; grave infecção
vaginal; morte por embolia (se o líquido amniótico, pedaços
de tecidos e coágulos entrarem em seu aparelho circulatório ou
pulmões, ocasionando o efeito letal); aderência da placenta à
171
REZENDE, Poliana Guimarães. Op. cit., 2009.
CARDOSO, Wilma Lúcia Castro Diniz. Abortamento Provocado:
aspectos psicológicos. Caesura: revista crítica de ciências sociais e
humanas. Canoas, n. 1, julho/dezembro, 1992. p. 77 -80.
172
85
parede do útero; surgimento de pólipos; tétano; anemia;
irregularidade nos períodos menstruais, acompan hados de
fortes cólicas; processos cancerígenos; inflamação nos
ovários; entre outros. 173
As conseqüências físicas podem ocorrer em qualquer
tipo de aborto, pois os meios utilizados para a sua realização
são os mesmos. Já o psicológico não se sabe ao certo dizer,
pois como exposto a cima, a pesquisa foi realizada com
mulheres que realizaram o aborto de fetos normais, não
especificamente de anencéfalos. Sendo que, por saber que o
bebê nascerá e logo morrerá talvez as conseqüências
psicológicas sejam diferentes e menos graves, mas
provavelmente ainda existirão, posto que enquanto está
grávida, a mãe tem uma interação muito grande com o feto,
para aqueles que são contrários a interrupção da gravidez, com
base em pesquisas com mulheres que fizeram o abortamento
de forma geral como a citada, os danos psicológicos causados
pela gravidez ainda são menores do que aqueles causados pelo
abortamento, o qual já se viu, deixa sequelas tanto físicas
quanto psicológicas, o que com a vivência da gravidez,
nascimento e morte, há possibilidade de ser trabalhado
psicologicamente, restando a mãe lembranças boas de seu filho
o que a auxilia a lidar com o luto, da mesma forma como
quando falece um parente, tem seu momento doloroso, mas
depois restarão lembranças doces de sua passagem.
Por outro lado, deve-se também esclarecer que só
realmente quem vive uma situação como essa, de estar
gestando um feto anencéfalo é que pode dizer como se sente.
“O feto adquire valor a partir do amor e do interesse que a mãe
e as pessoas mais próximas lhe dispensam.” 174
Opina-se, portanto, que o Estado deveria deixar a
critério da mãe se enfrentará a gravidez para ver o seu bebê
nascer, sabendo que ele não resistirá por muito tempo ou
preferirá acabar com toda a expectativa e esperança de um
nascimento, optando pelo aborto.
173
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., 2002, p. 65.
AZAMBUJA, Maria Regina Fay de. O aborto sob a perspectiva da
bioética. Revista dos Tribunais. v.807, janeiro 2003, p. 473 -485. p. 481.
174
86
7 COMO TÊM DECIDIDO OS JUÍZES NO CASO
DO ABORTO ANENCEFÁLICO
Há muito tempo vem repercutindo a problemática no
âmbito jurídico e suscitando questionamentos éticos na
sociedade brasileira sobre a interrupção voluntária de gravidez
de feto anencefálico. Mesmo o aborto sendo proibido no Brasil
e constituindo crime, assim previsto nos artigos 124 e 126 do
Código Penal, nos últimos anos surgiram várias autorizações
de aborto para esses casos.
O primeiro caso de autorização judicial para a prática
de interrupção de feto anencefálico ocorreu em 1991, no Mato
Grosso do Sul.
Os profissionais de saúde, por intermédio da
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS),
aliada ao Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gêneros,
propôs em 17 de junho de 2004, uma Argüição de
Descumprimento de Preceito Fundamental de número 54,
(ADPF 54), na qual na petição inicial aponta-se os
dispositivos que prevêem o crime de aborto com o
consentimento da gestante e suas excludentes de ilicitude
como violadores dos seguintes preceitos fundamentais da
Constituição da República do Brasil: dignidade da pessoa
humana; princípio da legalidade, liberdade e autonomia da
vontade; e o direito à saúde. 175
Em 1º de Julho de 2004, o ministro Marco Aurélio
Mello, concedeu liminar 176, autorizando que mulheres grávidas
de fetos anencefálicos fizessem a interrupção da gravidez, sem
que médicos obtivessem a autorização da justiça para a
realização de tal procedimento. Tal decisão permaneceu
175
ALBUQUERQUE, Aline. SupremoTribunal Federal do Brasil e o
aborto do anencéfalo. Revista de Bioética, v. 13, nº 13, 2005. P. 79 -92.
176
A LIMINAR DO MINISTRO MARCO AURÉLIO QUE PERMITIU O
ABORTO DE FETOS ANENCEFÁLICOS. Jus Navigandi, Teresina, ano
8,
n.
413,
24
ago.
2004.
Disponível
em:
<http://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=605>. Acesso em: 25 maio
2010.
87
vigente por muito tempo, pois em Outubro do mesmo ano o
STF cassou a liminar.
Os magistrados, em sua grande maioria, têm autorizado
a interrupção da gravidez, invocando para tanto a excludente
da culpabilidade, a inexigibilidade de conduta diversa, ou
mesmo a atipicidade da conduta, quando não equiparam ao
aborto necessário e desde que observados os seguintes
pressupostos:
a) Somente as anomalias que inviabilizarem a
vida
extra-uterina
poderão
motivar
a
autorização;
b) Deve à anomalia estar devidamente
atestada por perícia médica;
c) E que haja prova do dano psicológico da
gestante. 177
Em Goiás, no dia 9/9/2009, o juiz Silvio José Rabuske,
que é titular da primeira vara Criminal de Aparecida de
Goiânia, concedeu liminar em favor de uma dona de casa e de
seu companheiro, autorizando a interrupção da gravidez. Na
época, a dona de casa estava grávida de sete meses e
protocolou seu pedido no final de agosto, depois de saber que
o feto apresentava anencefalia. Além da chance de vida da
criança ser mínima, a continuidade da gestação poderia gerar
danos à saúde da mãe.
Mesmo que o caso em questão não se enquadre nas
situações em que o aborto é previsto legalmente, ou seja, não é
resultante de estupro nem oferece risco à vida da gestante, o
juiz levou em conta que obrigar a dona de casa a continuar
gerando feto anencefálico afronta substancialmente o Principio
da Dignidade Humana. Segundo o magistrado citado:
O s inconvenientes inerentes a este tipo de
gravidez
afetam
não
só
a
mãe
177
BEZERRA, Marcelle Andrízia. Aborto anencefálico e o ordenamento
jurídico brasileiro. Revista de Direito. v. 12, nº 15, 2009. Disponível em:
<http://sare.unianhanguera.edu.br/index.php/rdire/article/viewFile/901/62
8>. Acesso em: 24 de maio 2010.
88
desesperançosa, como também o pai, que, da
mesma forma, postula a autorização para o
parto antecipado, as famílias envolvidas e
todos aqueles que esperam o nascimento de
uma
criança
com
vida,
o
que,
comprovadamente, não vai ocorrer. 178
Em outra decisão, mas agora no TJ/RS, uma liminar
também foi concedida para que os médicos que acompanhavam
a mãe pudessem fazer a interrupção da gravidez.
Neste caso o Desembargador Marcel Esquivel Hoppe
afirma:
A mulher, em casos de gravidez de
anencéfalos, não carrega a vida, mas a morte,
por inviabilidade do feto como pessoa O
anencéfalo, conforme conceito do Conselho
Federal de Medicina é um natimorto e, como
a Lei dos transplantes autoriza a extração
dos órgãos de pessoas com morte encefálica
inexistir possibilidade de vida, não haveria
diferença jurídica com o feto anencéfalo que
comprovadamente é incompatível com a vida
pós-parto. 179
Há também aqueles que negam a liminar, versando
sobre aspectos religiosos, pessoais ou pelo fato de não haver
previsão legal no Ordenamento Jurídico.
Em geral os processos brasileiros que negaram os
pedidos de autorização de aborto por anomalia fetal
incompatível com a vida amparam-se em três argumentos:
a) O aborto voluntário no Brasil é crime e os
permissivos legais do Código Penal não conhecem a
178
LIMINAR AUTORIZA ABORTO DE FETO ANENCÉFALO.
Disponível em:< http://www.tjgo.jus.br/bw/?p=18969 >. Acesso em: 08 de
junho de 2010.
179
Id.
89
anomalia fetal incompatível com a vida como
excludente de penalidade;
b) O reconhecimento do status moral do feto
humano como pessoa e, conseqüentemente, a
inalienabilidade do direito à vida;
c) A classificação do aborto por anomalia fetal
incompatível com a vida uma forma de Aborto
Eugênio. 180
Religiosos, como o Padre Luiz Antonio Bento, da
Comissão de Bioética da CNBB, defende o início da vida na
concepção e o direito à dignidade humana do feto anencéfalo.
Argumenta-se que “a criança, mesmo com anencefalia, não
perde a sua dignidade, é um ser humano, é como se fosse um
paciente que precisa de cuidados,” acrescentando ainda que,
sobre a previsão dos cientistas de que crianças que sofrem
dessa doença têm uma expectativa mínima de vida, o padre
salientou que “não significa que ela deva ser assassinada antes
do tempo”. 181
7.1 ADPF 54
A Argüição de Descumprimento de Preceito
Fundamental 54 182, de autoria do advogado Luis Roberto
Barroso, foi proposta em 17/06/2004, pela Confederação
Nacional dos Trabalhadores na Saúde, visando exatamente
abreviar o processo de autorização para a antecipação de parto
de feto anencefálico.
O
pedido
é
para
que
seja
declarada
a
inconstitucionalidade com eficácia erga omnes e efeitos
180
DINIZ, Débora. Aborto Anencefálico e o Ordenamento Brasileiro .
Disponível
em:
<http://sare.unianhanguera.edu.br/index.php/rdire/article/viewFile/901/62
8>. Acesso em: 25 de maio 2010.
181
LIMINAR AUTORIZA ABORTO DE FETO ANENCÉFALO. Op. cit.
182
ARGÜIÇÃO
DE
DESCUMPRIMENTO
DE
PRECEITO
FUNDAMENTAL.
Disponível
em:
<http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=TP&docID=33909
1>. Acesso em: 7 de junho 2010.
90
vinculantes da interpretação dos dispositivos do CP como
impeditivos da antecipação do parto nesses casos,
diagnosticados por médico habilitado, reconhecendo -se o
direito subjetivo da gestante
de se submeter a tal
procedimento sem a necessidade de apresentação prévia de
autorização judicial ou qualquer forma de permissão especifica
do Estado. 183
Os argumentos defendidos na ADPF 54 são:
a) A permanência do feto anômalo no útero da mãe é
potencialmente perigosa, podendo gerar danos à saúde
da gestante e até perigo de vida;
b) A antecipação do parto neste caso não concretiza
aborto, uma vez que a morte deve ser resultado direto
dos meios abortivos e a morte do anencefálico é
decorrente da má-formação congênita, sendo certa e
inevitável ainda que decorridos dos nove meses de
gestação. 184
8 CONCLUSÃO
De acordo com o exposto e sustentado nos itens
anteriores resultam as seguintes conclusões: a anencefalia
pode ser detectada de modo precoce, em virtude do
desenvolvimento tecnológico das ciências biomédicas e no
exame pré-natal.
A anencefalia é em altíssimo percentual, incompatível
com os estágios mais avançados da vida intra-uterina e de total
incompatibilidade com a vida extra-uterina. Não se aplica à
anencefalia o critério da morte cerebral ou encefálica porque o
feto anencéfalo não dispõe do equipamento cerebral necessário
a dar suporte a esse critério.
183
BEZERRA, Marcelle Andrízia. Aborto anencefálico e o ordenamento
jurídico brasileiro. Revista de Direito. v. 12, nº 15, 2009. Disponível em:
<http://sare.unianhanguera.edu.br/index.php/rdire/article/viewFile/901/62
8>. Acesso em: 24 de maio 2010.
184
Id.
91
O anencéfalo constitui um projeto embriológico falido,
não sendo um processo de vida, mas um processo de morte,
contudo não tem como considerá-lo tecnicamente vivo, pois
ele é carente de toda capacidade biológica para concretização
de uma vida humana viável.
Outro ponto relevante apresentado neste artigo é a
utilização do ácido fólico antes e durante a gravidez,
reduzindo assim o número de grávidas com estes problemas de
fetos anencéfalos. O ácido fólico tem um papel fundamental
no processo de multiplicação celular, sendo assim
recomendado pelas organizações de saúde.
Destarte, fica evidente que o grande dilema acerca do
assunto em pauta é a diferenciação médica e jurídica em
relação aos conceitos de aborto por anencefalia, fazendo
referência a incapacidade do ordenamento jurídico em
acompanhar as mudanças na sociedade e os avanços
científicos.
Ressalta-se que o Código Penal Brasileiro é de 1940 e
no decorrer das décadas é possível perceber que ocorreram
mudanças na sociedade e nos pensamentos, fato em que se
torna oportuno levantar tal discussão, pois já existem
discussões e jurisprudências no sentido de dar tutela a casos
específicos, e assim acompanhar os avanços da medicina atual,
pois o direito não pode ser inerte e sim adequar-se a realidade.
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http:// www.stf.jus.br >. DJ 02/08/2004 PP-00064 RTJ
VOL-00200-03 PP-01399.
TURCATO. Marlene de Fátima. et al. Hiperamonemia
secundária ao uso terapêutico de ácido valpróico: relato
de caso. Arquivos de Nero-Psiquiatria. Disponível
em: <
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=
S0004-282X2005000200034&lang=pt >. Acesso em: 05
de junho de 2010.
VIEIRA, Humberto. Presidente da Associação Pró-Vida e
Pró-Família comenta decisão judicial no Brasil que
permite aborto em caso de anencefalia fetal.
Disponível em:
95
<http://www.portaldafamilia.org.br/scnews/news0 39.sht
ml>. Acesso em: 03/06/2010.
WIKIPÉDIA, A ENCICLOPÉDIA LIVRE. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/anencefalia>. Acesso em:
11 de maio de 2010.
96
CAPÍTULO IV:
PEDOFILIA NA INTERNET: UM CRIME
CARENTE DE PUNIÇÃO
Helber Ribeiro Araújo
Kríssley Ribeiro dos Santos
Rafael Walsh Crestani
Simara Cristina de Souza Molina
Soeli Alves Brito 185
RESUMO
O presente trabalho tem por escopo analisar os casos de
exploração sexual, cometidos contra crianças e adolescentes,
apresentando o meio mais utilizado, nos dias atuais – a
Internet – para se chegar ao fim precípuo da prática pedófila.
Mostrando, também, a ausência de tipificação penal no
tocante aos crimes cometidos por meio da rede mundial de
computadores. Expondo, a relação da pedofilia com a bioética
e o biodireito. Para tal, será utilizado o método dedutivo, por
meio da coleta de dados retirados de artigos da Internet, de
jornais, livros e legislação.
Palavras-chave: Pedofilia. Internet. Crianças. Legislação.
185
Acadêmicos do 8º período do curso de Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná – Campus Maringá.
97
Pirulito, carrinho, boneca, foto com a cara
suja de chocolate. Isso lembra criança.
Prostituição infantil, foto de meninos e
meninas nus em posições eróticas ou fazendo
sexo com adultos e outras crianças. Isso é
crime. A questão é que esse crime é difícil
de ser punido quando o cenário é a
Internet 186.
Os sites de conteúdo pornográfico são os que
têm o maior público na web, e neles estão
incluídos os sites onde se cometem crimes
sexuais contra crianças. A web facilita a
prática do crime de pedofilia, já que é um
espaço onde pessoas das mais diversas
nacionalidades trocam informações sem que
haja uma legislação específica em vigor para
regulamentar essas trocas. Assim, acabam
prevalecendo as leis específicas de cada
nação, o que gera conflito e impunidade 187.
REVISTA Terceiro Setor. Pedofilia na Internet – um crime grotesco,
de
autores
quase
invisíveis.
Disponível
em:
<http://www.denunciar.org.br/twiki/bin/view/SaferNet/Noticia200101191
93123>. Acesso em: 2 jul. 2008.
187
Ibidem.
186
98
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por objetivo externar um problema
que persiste em existir desde os primórdios da humanidade e
que ao invés de ser dilacerado do mundo contemporâneo, vem
expandindo com muita veemência. Este problema utiliza -se de
meios ilícitos, escusos e se beneficiam das facilid ades
tecnológicas e dos meios de comunicações, os quais os tornam
cada vez mais fortes. Mas este vilão não se vale somente dos
meios de comunicação ou tecnológicos para se perpetuar no
seio social, mas também da confiança da vítima e de seus
familiares. Esses são os pedófilos que, geralmente, possuem
estreita consangüinidade com a vítima, e na maioria das vezes
são pessoas do meio familiar.
A pedofilia, do ponto de vista da ciência é tida como
uma doença, pois o pedófilo sente atração ou desejos sexuais
por indivíduos com idade até treze anos. Este mal se encontra
presente em todos os níveis sociais, dos ateus aos religiosos,
deixando um rastro de espanto e horror por seu caminho.
Atualmente, a pedofilia esta saindo da obscuridade e
dos padrões conservadores da sociedade, abrindo espaço para
que se possa buscar o esclarecimento e a solução para este
problema que até então era um tabu.
O caso de abusos sexuais com crianças causa repulsa
pela forma violenta aplicada contra seres tão indefesos e
frágeis que muitas vezes são mortas com alto requinte de
crueldade. O que traz mais indignação é a impunidade dos
autores, que, por ineficácia na aplicação das normas ou por
influência financeira do réu, continuam livres para praticar
novos atos.
O Brasil vem apresentando significativo progresso no
combate a pedofilia, como tratados assinados com países
estrangeiros, os quais buscam a garantia dos direitos das
crianças e dos adolescentes elencados no artigo 227 da CF/88,
que busca a proteção total à criança e ao adolescent e; na
abertura de site de relacionamento para a apreciação da
justiça, na facilitação da investigação dos casos de pedofilia
pela Internet; e ainda, com o disposto no ECA (Estatuto da
99
Criança e do Adolescente), que reza nos seus artigos 240 e
241-E a proibição de divulgação e publicação de imagens
pornográficas que envolvam infantes, além disso nos arts. 244 A e 244-B que estipulam como crime a exposição da criança
ou adolescente a prostituição ou a exploração sexual, e a
corrupção e indução de menor quanto aos meios eletrônicos,
inclusive salas de bate-papo, respectivamente.
Tudo isso é uma tentativa de combater o lucrativo
mercado da pornografia infantil, pois por existir lacunas na lei
é que se possibilita a posse desses materiais, tornando as
medidas de combate tão difíceis devido aos meios ardilosos e
das pessoas que se envolvem nesses crimes. Contudo, em
março/2008 foi criada uma Comissão Parlamentar de Inquérito
com o escopo de apurar esses crimes que estão se proliferando
rapidamente na rede mundial de computadores. Por meio desta
já se originou duas Leis (Leis 11.829/2008 e 12.015/2009) que
modificam artigos que previam crimes sexuais contra criança.
E também houve diversas diligências, prisões e processos
instaurados, no entanto, esta ainda não teve suas atividades
finalizadas.
2 CONCEITOS
A pedofilia possui diversos conceitos conforme a área
de estudo. Contudo, no presente trabalho, será abordado o
conceito usual para a psiquiatria e para o direito (medicina
legal), sendo necessária, em um primeiro momento, a análise
etimológica da palavra.
Tal termo tem origem greco-latina, sendo esta junção do
vocábulo “filo” (oriundo do grego philo, phílos) – amigo, e de
“pedo” (do latim científico paedo, proveniente do grego paido,
de pâis, paidós) – criança; ou seja, o significado de pedofilia é
aquele que gosta de crianças 188. Devido a isto, surgem
questionamentos sobre o uso correto da expressão, como
188
FURLANETO NETO, Mário. Pedofilia: das bases etimológicas,
médico-legal e psiquiátrica aos reflexo s no direito penal. Boletim
IBCCRIM. São Paulo, v. 12, n. 145, p. 6 -7, dez. 2004.
100
identificador de um ilícito cometido contra crianças, ao dizer
que:
Pedofilia é a “qualidade ou sentimento de
quem é pedófilo”, e este adjetivo designa a
pessoa que “gosta de crianças”. Assim, todo
pai, toda mãe, os avós, os tios e quantos mais
gostem de crianças são pedófilos, mas não
são criminosos. Porém, o substantivo
pedofilia e o adjetivo pedófilo, por uso
irregular dos meios de comunicação, vêm se
tornando costumeiros na acepção de
infrações
penais
contra
crianças,
particularmente, ligadas a questões de sexo e
outros abusos nessa área 189.
Todavia, com uma interpretação menos literal da
expressão, conclui-se, a existência de diversas palavras
finalizadas com o prefixo filia, que a etimologia, atribui
relação à atração sexual, amiúde compulsiva e doentia,
estando pedofilia inclusa nestas 190.
Portanto, o ato de gostar, sentir afeição por crianças,
não é ilícito, tornando-se assim, somente, no caso de exceder,
transgredir os limites plausíveis de comportamentos. Neste
instante, estende-se o assunto aos conceitos do direito
(medicina legal) e da psiquiatria 191. Para o direito, pedofilia
seria uma perversão sexual que se mostra como uma
preferência erótica por crianças, podendo envolver desde atos
obscenos até o exercício de manifestações libidinosas,
ocasionando sérios comprometimentos psíquicos e morais para
quem a pratica 192.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), na
Classificação Internacional de Doenças (CID-10, item F65.4),
189
MORAES, Bismael B. Pedofilia não é crime. Boletim IBCCRIM. São
Paulo, v. 12, n. 143, p. 3, out. 2004.
190
ALMEIDA, Marco Aurélio C. de. Sobre o significado de pedofilia .
Disponível em: http://www.ibccrim.org.br. Acesso em: 25 abr. 2005.
191
FURLANETO NETO, Mário, Op. cit. p. 6 -7.
192
Id.
101
conceitua tal doença como: “preferência sexual por crianças,
quer se trate de meninos, meninas ou de crianças de um ou do
outro sexo, geralmente pré-púberes ou não” 193.
No entanto, o Diagnostic and Statistical Manual of
Mental Disorders, 4 th edition (DIM-IV), feito pela
Associação de Psiquiatras Americanos, estabelece três
requisitos para considerar alguém pedófilo, sendo eles 194:
- apresentar, por no mínimo, seis meses impetuosa
atração ou atitudes sexuais relacionadas a indivíduos com no
máximo treze anos de idade;
- esta atração, atitude ou desejo devem provocar
estresse, anormalidades intra e/ou interpessoais, ou se
concretizarem;
- por último, este necessita possuir no mínimo dezesseis
anos de idade, e ser ao menos cinco anos mais velho que a
vítima (excluem-se os relacionamentos entre adolescentes
entrando na puberdade com pessoas entre dezessete e vinte
anos, uma vez que o envolvimento entre adolescentes e jovens
não é visto como pedofilia).
Uma observação faz-se necessária, a definição da idade
de limite entre a infância e a adolescência, modifica -se em
casos individuais, entre os países e os aspectos analisados 195.
A pedofilia é uma espécie do gênero parafilia. No que
se refere ao direito esta espécie é a mais usual, entretanto,
observa-se a presença de mais de uma parafilia, em regra, nos
indivíduos, sendo dominante no sexo masculino 196. A pedofilia
pode apresentar-se como: exclusiva (atração somente por
infantes), e não-exclusiva (além da atração por infantes, este
tem também por adultos). Via de regra, esta surge na
adolescência, diversificando conforme o estresse psicossocial,
contudo, de forma ampla, é crônica 197.
193
PEDOFILIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org./wiki/Pedofilia>.
Acesso em: 24 abr. 2008.
194
Id.
195
Id.
196
FURLANETO NETO, Mário, Op. cit. p. 6 -7.
197
Id.
102
3 PANORAMA HISTÓRICO DA PEDOFILIA
A pedofilia se demonstra por meio de condutas e
comportamentos manifestados por uma espécie de transgressão
sexual, na qual alguns adultos passam a manifestar desejo
sexual
em
relação
a
crianças
na
pré-puberdade.
Etimologicamente a palavra pedofilia causa certa confusão em
relação a seu entendimento. Segundo o dicionário, “o pedófilo
é aquele que é amigo de criança”. Mas o que será tratado é o
que a pedofilia representa para a sociedade no decorrer da
história da humanidade 198.
Esta transgressão sexual não é uma prática
contemporânea, ela acompanha a sociedade ao longo dos
séculos, tendo sido esse impulso sexual codificado como um
tabu que reprime esta ação considerada inadmissível em
relação às regras impostas pelo seio social. A pedofilia ao
longo de sua história, nunca estabeleceu preconceitos sócio culturais, pois ela esta disseminada por todos os meios sociais,
ou seja, pode ser encontrado junto a pessoas abastadas, pobres,
religiosos ou não 199.
Para o ponto de vista histórico, a prática da pedofilia
está intimamente relacionada com o incesto e, o siste ma de
parentesco.
O lugar da criança foi estabelecido, em
tempos passados, por sua incorporação a um
sistema de parentesco baseado na proibição
do incesto, princípio que constitui a base da
ordem da cultura. A proibição de relações
sexuais entre pessoas com uma estreita
consangüinidade ou da mesma “classe”, no
sentido antropológico estrutural, forma a
identidade da criança dentro de uma
estrutura rigorosamente codificada – e assim,
pode-se dizer, representar o começo de um
198
DUNAIGRE, Patrice. O ato pedófilo na história da sexualidade
humana. In: Inocência em perigo: abuso sexual de crianças, pornografia
infantil e pedofilia na internet. Rio de Janeiro: Garamond, 1999. p . 9.
199
Ibid., p. 9-15.
103
direito de
criança 200.
status
social
específico
da
A codificação de regras, isto é, a formulação de tabus,
passou a ter o escopo de reprimir as transgressões incestuosas,
ou seja, fez nascer um fato social absoluto, que ritualiza
normas muito severas, com fim de disciplinar a relação e ntre
indivíduo para com o grupo social em que está inserido. Estes
conjuntos de proibição têm a função de impedir a repetição de
atos declarados pela sociedade como proibidos e antiéticos.
Nesta perspectiva, o sistema de parentesco exerce relevante
contribuição, no que diz respeito à preservação do tabu do
incesto como uma lei que não pode ser transgredida 201.
A pedofilia sob o ponto de vista contemporâneo, deixa
de ser um tema apenas inserido na obscuridade, aos porões de
uma sociedade conservadora, passando a ser analisado com
maior afinco por parte dos entes sociais. Isto foi possível,
principalmente após a expansão da modernidade, com a
massificação da mídia, posto que os veículos de comunicação
passaram a debater, com freqüência, sobre este problema que
esta cravado no coração da sociedade desde os primórdios da
humanidade 202.
A partir da codificação de tabus, e a conseqüente
proibição do incesto, do fortalecimento do sistema de
parentesco, e principalmente com a modernização da mídia
que possibilitou um freqüente debate sobre a prática de
pedofilia, se fez possível dentro de sociedade colocar a criança
como centro do debate social 203.
A criança torna-se “naturalmente” o foco de
qualquer análise das questões no debate
social, incluindo não apenas a crise na
autoridade dos pais, a transmissão de
conhecimento,
famílias
reconstituídas,
200
201
202
203
Ibid., p.10.
Ibid., p. 10-12.
DUNAIGRE, Patrice. Op. cit., p. 9 -12.
Ibid., p. 12.
104
“novos casais”, temores em torno de técnicas
de procriação assistida por médicos,
reconhecimento da homossexualidade como
elemento social aceito e direito ao aborto,
mas também a possibilidade das crianças
terem acesso a educação sexual e à
informação sobre a propagação da AIDS.
Estas questões que, fazendo da criança seu
foco central, exacerbam os debates que
afetam especificamente as crianças 204.
Com o impulso da modernidade, passaram a surgir
dúvidas de como se figura a pessoa que pratica atos de
pedofilia, ou seja, o pedófilo. Por essa pessoa ser uma espécie
de catalisador do medo social, surge sempre à incerteza a
respeito de quem ou de que exatamente se está falando. É
certo, que com o intenso debate sobre a pedofilia e da pessoa
de quem a pratica fez surgir o entendimento que o pedófilo
pode estar presente em todo o meio social. “Diz que o pedófilo
seria do tipo que não tem namorada, podendo estar oculto no
instrutor dos escoteiros ou no professor de educação física.” 205
Contudo constatou-se que na verdade, o pedófilo e a
pedofilia sempre existiram em todo tipo de sociedade, sendo
esta transgressão, no decorrer da história, tolerada ou ignorada
pela maioria dos países e de suas respectivas legislações. Por
outro lado, a história da sociedade humana, permite que sejam
catalogados alguns períodos em que relação sexual entre
adultos e crianças eram considerados normais 206.
Tivemos os efebos do amor grego, de
vocação homossexual, e as tolerâncias
sumeriana e judaica, onde há permissão para
o casamento de homens adultos com
meninas. Isto, sem levarmos em conta nossas
ninfetas e lolitas, bem mais modernas,
204
Ibid., p. 12-13.
CRUZ, Anselmo Firmo de Oliveira. Pedofilia: até onde está o crime?
Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em: 29 jun. 2002.
206
Id.
205
105
estereotipadas pela literatura na obra do
russo Vladimir Nabakov, em meados do
século passado 207.
Como já foi dito, a prática de pedofilia está presente em
todo meio social, e a classe religiosa não foge a esta regra. A
Igreja Católica, por exemplo, durante a sua longa história se
manteve inerte em relação às constantes acusações e, os
sucessivos escândalos que envolvem supostos padres
“abusadores” de crianças e adolescentes. Porém, a partir de
múltiplas denúncias por parte da sociedade e da mídia, fez
com que essa Instituição se posicionasse e, combatesse este
fantasma que assombra os corredores do Vaticano 208.
O intenso debate sobre a pedofilia, fez com que a
comunidade internacional, intensificasse o combate a esta
transgressão sexual, com a aprovação de tratados
internacionais, sobre direitos da criança. Em 1989, a ONU
(Organização das Nações Unidas) aprovou a criação da
Convenção Internacional sobre direitos da criança. A qual
expressa em seu artigo 1º a imposição aos Estados de medidas
de proteção a infância e a adolescência do abuso, ameaça ou
lesão a sua integridade sexual 209.
O combate à prática da pedofilia não ficou restrito a
essa ação, e sua qualificação como crime, tendo sido o tema
recepcionado também pela ciência. A Organização Mundial de
Saúde passou a catalogar a pedofilia como uma doença, um
transtorno mental e comportamental 210.
O Brasil, no decorrer de sua história não ficou isento de
práticas de pedofilia, por parte de abusadores de crianças e
adolescentes. O caso mais famoso de abuso sexual contra
criança foi o da menina Araceli, que no dia 18 de maio de
207
CRUZ, Anselmo Firmo de Oliveira. Op. cit..
FERRARI, Dalka Chaves de Almeida. Pedofilia: uma das faces da
violência sexual contra a criança. Revista Brasileira de Psicodrama ,
São Paulo, v. 12, n. 2, p. 59 -84, 2004.
209
PEDOFILIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org./wiki/Pedofilia>.
Acesso em: 24 abr. 2008.
210
Id.
208
106
1973, na cidade de Vitória, Espírito Santo, foi espancada,
estuprada e morta por dois homens. A autoria deste crime foi
atribuída a Brito Micheline e Paulo Constarteen Helal, ambos
de famílias abastadas. Eles foram julgados e absolvidos, não
por não serem culpados, mas sim pela forte influência que
possuíam no Estado 211.
O caso Araceli até hoje é uma ferida que nunca
cicatrizou por completo, pois o assunto ainda desperta revolta,
medo e incredulidade na cidade de Vitória. Este triste
acontecimento fez surgir no Brasil, o Dia Naciona l de
Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e
Adolescentes, cuja data é 18 de maio, dia em que a menina
desapareceu 212.
211
ARGEMIRO, Pedro. Araceli: símbolo da violência. Disponível em:
<http://orbita.starmedia.com/~dossiepedofilia/abusomain.htm>.
Acesso
em: 26 abr. 2008.
212
CASO ARACELI – Dante de Brito Michelini e Paulo Constanteen
Helal, costumavam se divertir rondando colégios na cidade de Vitória no
Espírito Santo, provavelmente em busca de alguma vítima.
Apostando na impunidade que o dinheiro de suas famílias poderia
comprar, Dantinho e Paulinho Helal, como eram chamados, elaboravam
festas para promover orgias, regadas a LSD, cocaína e álcool, onde
drogavam e violentavam crianças e adolescentes do sexo feminino.
Araceli Cabrera Crespo, uma menina de apenas oito anos, que vivia com
o pai Gabriel Sanches Crespo, com a mãe Lola e com o irmão Carlinhos,
fazia parte de uma família simples do porto de Vitória. Ela estudava perto
de sua casa e mantinha uma rotina dificilmente quebrada (saia de escola e
ia para um ponto de ônibus ali perto, para voltar para casa), até o dia 18
de maio de 1973, em que Araceli saiu mais cedo da escola, a mando de
Lola – sua mãe, e foi levar um envelope no Edifício Apoio, no centro de
Vitória. A menina não sabia, mas o envelope continha drogas e seria
entregue em um dos apartamentos onde Paulinho Helal e Dantinho se
drogavam.
Alguns dias depois, o corpo da menina foi encontrado em um terreno
baldio, localizado atrás do Hospital Menino Jesus, na praia Comprida.
Araceli havia sido espancada, estuprada, drogada e morta; sua vagina, seu
peito e sua barriga tinham marcas de dentes; seu queixo foi deslocado
com um golpe; e finalmente o seu rosto, principalmente, foi desfigurado
com ácido.
O superintendente da polícia civil do Espírito Santo, Gilberto Barros
Faria, dois meses, aproximadamente, após o trágico acontecimento,
anunciou que no dia seguinte revelaria os nomes dos criminosos. Porém,
107
O ordenamento jurídico brasileiro, não tipifica nenhuma
espécie de crime, intitulado pedofilia, sendo considerado
crime pela legislação nacional, apenas os atos e as
conseqüências praticadas pelos pedófilos. 213
Portanto, estes podem ser enquadrados pela prática de
estupro de vulnerável, satisfação da lascívia mediante
presença de criança e adolescente e favorecimento da
prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável
(previstas, respectivamente, no Código Penal em seus artigos
217-A, 218, 218-A e 218-B, sendo que estes foram criados
pela Lei 12.015/2009 que modificou o Capítulo II do CP),
definidos, simultaneamente, como: ter conjunção carnal ou
praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos; induzir
alguém menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem;
praticar na presença de menor de 14 anos; ou induzir a
presenciar conjunção carnal ou ato libidinoso, afim de
satisfazer a lascívia própria ou de outrem; e submeter, induzir
ou atrair a prostituição ou outra forma de exploração sexual
alguém menor de 18 anos ou que, por enfermidade ou
deficiência mental, não tenha o necessário discernimento para
a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a
abandone. 214
depois de um encontro com Dante Michelini, pai de Dantinho, Barros
Faria, mudou de opinião, apontando como assassino um senhor negro que
tinha problema mental, que perambulava pela Praia do Suá. Desse fato em
diante começou a escalada de medo e suborno, pelo menos treze pessoas
morreram de formas misteriosas por se envolverem com o assunto.
Dantinho e Paulinho Helal chegaram a serem presos no ano de 1977, mas
foram liberados aproximadamente dois meses depois. Em 1980, foram
julgados e condenados, porém a sentença foi anulada. No ano de 1991,
em novo julgamento os réus foram absolvidos. O crime já prescreveu,
mas o caso Araceli é uma ferida que nunca cicatrizou completamente.
Mexer no assunto em Vitória ainda desperta medo, revolta e
incredulidade (ARGEMIRO, Pedro., op. cit.)
213
PEDOFILIA.
Disponível
em:
<http://www.mscontraapedofilia.ufms.br/índex.php?inside=1&comp=&sh
ow=62>. Acesso em: 24 abr. 2008.
214
PINHEIRO, Lucas Corrêa Abrantes. Breves reflexões sobre a Lei nº
12.015/2009.
Disponível
em:
<
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13358>. Acesso em: 10 abr. 2010.
108
Portanto, mesmo o Brasil não tendo uma norma penal
que tipifique a palavra pedofilia, há no país, como já foi dito,
algumas normas que incriminam os atos e conseqüências
praticadas pelos pedófilos. Além das condutas anteriormente
especificadas, o Estatuto da Criança e do Adolescente, que tem
por escopo a proteção do menor tipifica outras que visam o
bem estar das crianças e adolescentes. Todavia, mesmo com
tais dispositivos, há a necessidade de uma norma específica
para agilizar o processo de investigação e denúncia dos
pedófilos, principalmente, na internet onde se torna ainda mais
difícil a punição a estes criminosos. 215
4 PEDOFILIA NA INTERNET
Com o avanço da tecnologia, a Internet tornou -se um
dos principais meios de informação e comunicação existente
na sociedade, atraindo cada vez mais a atenção dos infantes,
no entanto, seus protetores não conseguem acompanhar esse
avanço, 216 surgindo assim, um novo grupo de criminosos,
denominados “cibercriminosos”. Tais indivíduos trouxeram
para a rede mundial de computadores um ato repugnante, mas
já praticado na comunidade, a pedofilia via internet 217.
Segundo Sandro D’Amato Nogueira: “A Internet está
sendo utilizada pelos pedófilos para realizarem suas fantasias
sexuais, trocarem e comercializarem fotos, filmes, cd -rom,
entre outros” 218.
Todavia, neste ambiente a luta contra a pedofilia torna se ainda mais árdua devido à disparidade entre o virtual e o
215
PEDOFILIA. op. cit.
COMO
proteger
nossas
crianças.
Disponível
em:
<http://www.pedofilia-nao.inf.br/pedofilia.html>. Acesso em: 26 abr.
2008.
217
SILVA, Anna Paula Costa e. Pedofilia na Internet – inocência
roubada
virtualmente.
Disponível
em:
<http://www.direitonet.com.br/artigos/x/16/38/1638>. Acesso em: 1 jul.
2008.
218
NOGUEIRA, Sandro D’Amato. Pedofilia e o tráfico de menores pela
internet:
o
lado
negro
da
web.
Disponível
em:
<http://www.ibccrim.org.br>. Acesso em: 29 set. 2001.
216
109
real, porém, as conversas que os praticantes desse crime têm
em salas de bate papo passaram a ser ilegais com a edição da
Lei 12015 de 7 de agosto de 2009. 219 Ademais, quem pratica
estes atos, ainda consideram-se injustiçados quando igualados
a delinqüentes violentos, ou senão, acusam as vítimas de
instigarem o ato sexual com suas brincadeiras 220.
Os infantes estão em constante perigo, real e imediato,
de sofrer assédio por meio da internet, ou ainda, de serem
seqüestrados para contracenar em filmes, que usarão suas
dores, angústias e sofrimento pelo abuso sexual do qual est ão
sendo vítimas, abuso este que muitos adultos não agüentariam
passar, como diversão para determinados grupos.
Isso ocorre devido à existência de “Clubes de
Pedofilia”, onde pedófilos do mundo se unem, para mais
facilmente ter acesso a fotos ou vídeos mostrando pornografia
infantil. Além desse tipo de serviço, tais clubes oferecem
ainda, formas de obter crianças para a prática de abuso sexual,
turismo sexual, ou então, agilizar o tráfico de menores, sendo
estes os responsáveis pelo desaparecimento de cria nças em
todo o mundo. 221
A pedofilia na rede mundial de computadores é um
acontecimento grave e complexo que demanda uma ação de
toda a sociedade para solucioná-la. Especialmente a de
autoridades brasileiras, visto que para fazer uma oposição
forte contra estes abusos, é necessário paciência, vontade e
determinação, pois as redes de pedofilia disseminam seu teor
lesivo pela internet, mudando de site em site. A Senadora
Patrícia Saboya do Ceará afirma que, os abusadores estão
219
PINHEIRO, op. cit.
MAXIMIANO, Ana. Pedofilia na internet: números no Brasil são
assustadores.
Disponível
em:
<http://diganaoaerotizacaoinfantil.com/2007/08/11/pedofilia -na-internetnumeros-no-brasil-são-assustadores/>. Acesso em: 2 jul. 2008.
221
MIRANDA, Anderson; MIRANDA, Roseane. Campanha Nacional de
combate
à
pedofilia
na
Internet.
Disponível
em:
<http://www.censura.com.br>. Acesso em: 2 jul. 2008.
220
110
procurando tornar tal crime banal, sendo o resultado desses
atos que: 222
Imagens e mensagens de violência e sexo
pedagogicamente não recomendadas às
faixas etárias mais baixas chegam às crianças
e adolescentes descontextualizadas e em
qualquer horário. Muitas vezes fora de casa,
longe do olhar e da orientação dos pais e
movidos pela curiosidade natural à idade,
eles acessam sites, lêem e-mails, alimentam
perfis no Orkut, recebem e enviam
fotografias, inclusive deles mesmos 223.
A rede mundial de computadores, atualmente, já é vista
como a maior responsável pelo comércio, divulgação e
exploração sexual de infantes pelo mundo 224. Este é um ramo
de lucros exorbitantes, planejado por organizações, que
possuem home pages acessíveis o tempo todo aos seus
clientes, e estes, por sua vez, são os grandes i ncentivadores a
continuidade dos trabalhos. O material para manter esses sites
é obtido através de crianças que são iludidas ou forçadas a
praticar sexo, e as imagens, podem ainda ser capturadas sem
que as vítimas percebam. Após isso, o conteúdo é distribu ído,
trocado ou vendido na rede. E as fotos são utilizadas também
como forma de forçar a criança a consentir com novas fotos,
através de chantagem. 225
A pedofilia, antes da proliferação da Internet, era
dificultada devido a maiores empecilhos em obter o mate rial
capaz de satisfazer seus desejos. Contudo, isso se tornou mais
rápido com a internet, uma vez que através dessa, o contato do
pedófilo com o infante é simplificado pelo fato de ele ter o
222
SABOYA, Patrícia. Opinião: Pedofilia na Internet. Disponível em:
<http://www.denunciar.org.br/twiki/Bin/view/SaferNet/Noticia200608122
02510>. Acesso em: 2 jul. 2008.
223
Id.
224
NOGUEIRA, Sandro D’Amato, Op. cit.
225
SABOYA, Patrícia, Op. cit.
111
poder de se esconder através de uma personalidade e
linguagem falsa, mais condizente com a da vítima. 226
Em função disto os pais, professores e familiares devem
dar orientações às crianças e estar atentos para possíveis
investidas desses criminosos, inclusive acompanhando e
monitorando as ações das crianças na frente de um
computador. Alguns procedimentos por parte dos responsáveis
podem ser feitos para evitar tal assédio, tais como: manter uma
boa relação com a criança para que esta lhe mantenha
informada sobre os sites que entra e as amizades que mantém
nesse meio; deixar o computador em um local comum onde ela
não esteja sozinha na utilização; averiguar o e-mail da criança,
quando possível; ou seja, desenvolver um ambiente seguro
para estes utilizarem a internet e as informarem sobre os riscos
que correm, até mesmo explicando lhes sobre o que é pedofilia
e o mal causado por pessoas más intencionadas neste
espaço. 227
Os meios mais empregados pelos pedófilos para ter
acesso às vítimas são: os mensageiros instantâneos (programas
pelos quais é possível comunicar-se por meio de texto ou voz,
de maneira rápida e individual), chat (ambiente onde se
conversa com pessoas desconhecidas), blog ou fotolog (um
diário virtual), e-mail (correio eletrônico) e redes de
relacionamento (ambiente destinado a reunião de pessoas com
interesses em comum). 228
A Associação Italiana de Defesa da Infância fez uma
pesquisa e descobriu que o Brasil está no quarto lugar na lista
de sites relacionados à pornografia infantil 229, isto demonstra a
226
CAMPANHA MS contra a pedofilia. Pedofilia na Internet.
Disponível
em:
<http://www.mscontraapedofilia.ufms.br/index.php?inside=1&tp=3&com
p=&show=64>. Acesso em: 2 jul. 2008.
227
CAMPANHA MS contra a pedofilia. Pedofilia na Internet, Op. cit.
228
Id.
229
CAMPANHA MS contra a pedofilia. Dados alarmantes. Disponível
em:
<http://www.mscontraapedofilia.ufms.br/index.php?inside=1&tp=3&com
p=&show=66>. Acesso em: 2 jul. 2008.
112
ausência de uma punição rígida, comprometendo o combate a
esse crime 230.
Portanto, revela-se importantíssimo a mudança na
legislação penal existente que regula tal ato e a elaboração de
uma lei sobre crimes cibernéticos, para desse modo, agilizar e
tornar mais eficaz o trabalho da justiça, e assim as
investigações poderiam alcançar todos os responsáveis pelo
delito, posto que com a tipificação penal adequada os
provedores seriam punidos como co-autores do crime 231. É
fundamental destacar que a penalidade alcance a todos os
envolvidos e os que tornam esse delito possível. 232 Enfim, é
imprescindível a existência de uma nova lei que possa dominar
essa liberdade sem limites no ciberespaço, fazendo, dessa
forma, com que a distância entre a sociedade e o direito torne se menor 233.
Contudo, a edição da Lei 12015 de 2008, originada na
CPI da pedofilia, veio a contribuir para a punição das práticas
de crimes sexuais praticadas contra menores. Com a aprovação
desta e com as modificações trazidas ao Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA), as autoridades policiais e o judiciário
passaram a possuir melhores meios de confrontar a ocorrência
desse delito na rede mundial de computadores 234; porém,
devido a dinâmica tecnológica poderá surgir novos problemas,
pois há dificuldade da legislação em acompanhar os avanços
ocorridos na tecnologia empenhada para tornar esse crime
possível. 235
SILVA, Anna Paula Costa e. Pedofilia na Internet – inocência
roubada
virtualmente.
Disponível
em:
<http://www.direitonet.com.br/artigos/x/16/38/1638>. Acesso em: 1 jul.
2008.
231
SILVA, Anna Paula Costa e. Op. cit.
232
SABOYA, Patrícia. Opinião: Pedofilia na Internet. Disponível em:
<http://www.denunciar.org.br/twiki/Bin/view/SaferNet/Noticia200608122
02510>. Acesso em: 2 jul. 2008.
233
SILVA, Anna Paula Costa e, Op. Cit.
234
CPI já elaborou leis e firmou acordos inéditos. Disponível em: <
http://www.magnomalta.com/site/index.php?option=com_content&task=v
iew&id=994&Itemid=39>. Acesso em: 10 abr. 2010.
235
SABOYA, Patrícia. Op. cit.
230
113
Entretanto, as dificuldades não se limitam a este
impasse, haja vista que outro empecilho é a territorialidade,
pois para haver punição é necessário descobrir de onde se
origina o crime 236, e neste aspecto, “o que mais preocupa são
os sites chamados ‘ponto.com’, já que seu domínio está
registrado no órgão oficial internacional da Internet, sem
associação a nenhum país de origem, o que dificulta a ação da
policia” 237.
Enfim, além da necessidade de lei específica para
regular o assunto, será fundamental o investimento em agentes
treinados e especializados, que deverão ter um profundo
conhecimento em informática, com equipamentos da melhor
qualidade e tecnologia avançada, para que seja possível o
rastreamento e localização de maneira rápida. Ou seja,
demanda-se tempo, recurso e pessoal capacitado, para que
tenha a capacidade de realizar um trabalho investigativo
rígido 238.
5 BIOÉTICA E BIODIREITO
COM A PEDOFILIA
RELACIONADO
Partindo de fatos como o crescente avanço da biologia
molecular e da biotecnologia aplicada à medicina, das
denúncias dos abusos efetuados pela experimentação
biomédica em seres humanos e das declarações das
instituições religiosas sobre temas relativamente importantes
para a humanidade, nasceu a bioética, que busca o sentido
ético das novas biotecnologias. Ela se ocupa do que é bom ou
correto e do que é mau ou incorreto no agir humano. 239
NOGUEIRA, Sandro D’Amato. Op. cit.
REVISTA Terceiro Setor. Pedofilia na Internet – um crime grotesco,
de
autores
quase
invisíveis.
Disponível
em:
<http://www.denunciar.org.br/twiki/bin/v iew/SaferNet/Noticia200101191
93123>. Acesso em: 2 jul. 2008.
238
NOGUEIRA, Sandro D’Amato. Op. cit.
239
CLOTET, Joaquim. Bioética: uma aproximação. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2003. p. 103-106.
236
237
114
(...) com a bioética busca-se um consenso,
ainda que transitório, para determinadas
questões
polêmicas
discutidas
pelos
tradicionalistas e pelos vanguardistas. No
centro da discussão está o ser humano, a
vida, a saúde. Com esta integração objetiva se o equilíbrio, embora cada caso possa
comportar uma solução. 240
A bioética possui um caráter reflexivo, pois as novas
questões relacionadas a saúde, a vida e as novas
biotecnologias, vem carregadas de dúvidas que devem ser
solucionadas através do estudo conjunto de diversas ciências.
Devendo, contudo, respeitar a dignidade da pessoa humana, ou
seja, em cada situação vivenciada, o bioeticista deve buscar
soluções mais justas e adequadas para os problemas,
praticando sempre o respeito ao ser humano. 241
Os avanços científicos, portanto, devem estar pautados
nos limites éticos para que os seres humanos não passem a ser
meras mercadorias para os estudos avançados das ciências e
tecnologias, devendo, os biocientistas, respeitarem a vida e a
dignidade da pessoa humana. 242
O homem, porém, vem se tornando um objeto diante de
uma espécie de comércio, que foge dos padrões convencionais,
pois, neste o que está sendo comercializado é o corpo humano,
onde se obtém elevadíssimos lucros, colocando a disposição
das pessoas interessadas em obter órgãos para fins libidinosos.
243
E, quando uma criança e/ou adolescente é abusado
sexualmente, está sendo ferido um de seus direitos
fundamentais garantidos pela Constituição Federal (artigo 1º,
III), que é a dignidade da pessoa humana. Assim sendo, a
prática
de
atos
pedófilos
devem
ser
punidos,
independentemente de quem seja o abusador, ou qual o meio
240
VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética: temas atuais e seus aspectos
jurídicos. Brasília: Consulex, 2006. p. 32.
241
Ibid., p. 17-19.
242
IACOMINI, Vanessa. Biodireitos X Direitos humanos. O Estado do
Paraná, Curitiba, 6 jul. 2008. Direito e Justiça, caderno p. 4.
243
CLOTET, Joaquim. Op. cit., p. 197 -199.
115
utilizado por este para chegar à finalidade precípua de abusar
de um infante. 244
Estudos apontam que a maioria dos casos de
abuso sexual denunciados ocorre entre
pessoas próximas e com vínculo de confiança
que não foi respeitado. Atualmente, a mídia
tem trazido à tona os casos de abuso sexual
que extrapolam as relações familiares, como
as denúncias contra padres e médicos.
Considerando que a principal violência deste
tipo de abuso sexual é justamente a
perversão das funções institucionais na
relação, e esta é cabível tanto nas relações
familiares como nas relações profissionais.
Foram denominadas “incesto polimorfo” as
situações de abuso sexual extra familiares
ocorridas em relações nas quais a assimetria
de funções é utilizada, consciente ou
inconscientemente,
para
este
fim.
Entendemos que o que torna o indivíduo
humano e ético é justamente lidar com as
pulsões e os desejos presentes em todos,
confrontando-os com a realidade. A
impossibilidade de ser ético pode ser
conseqüência de uma falha na estruturação
mental do indivíduo, que não percebe a
importância do respeito às funções sociais. 245
Os infantes que são expostos a atos libidinosos, podem
vir a sofrer transtornos psicológicos, passando a se considerar
inferior as demais crianças e/ ou adolescentes. Esta situação
fará com, que eles passem para a fase adulta frustrados e até
244
VIEIRA, Tereza Rodrigues. Pedofilia: Atentado contra a dignidade da
criança. Revista Jurídica Consulex, Brasília, n. 187, ano VIII, p. 17, 31
out. 2004.
245
COHEN, Cláudio; GOBBETTI, Gisele J. Bioética e incesto polimorfo.
In: GARRAFA, Volnei (org); PESSINI, Leo (org). VI Congres so Mundial
de Bioética. Brasília: Loyola, 2003. p. 517.
116
mesmo com transtornos sexuais, o que os fará praticar atos tão
cruéis quanto os que sofreram. 246
O pedófilo, por sua vez, é aquele que sofre de uma
parafilia, que pode ter sido causada por atos li bidinosos a que
foram expostos na infância. Porém, isso não é um fator
preponderante, tendo em vista que há muitos pedófilos que
nunca sofreram abuso algum. Neste sentido, afirma a
psicóloga e professora adjunta do Instituto Multidisciplinar da
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Leila Ribeiro:
O adulto que tem atração sexual por crianças
não necessariamente viveu um situação de
envolvimento sexual com um adulto na
criança. Sendo assim, o que leva um adulto a
ter este desejo deve ser buscado não só em
sua história, mas também no contento social,
familiar ou individual em que ele vive e na
relação que mantém com a criança, pois
ambos estão envolvidos. 247
O pedófilo, portanto, por sentirem-se inseguros com
mulheres adultas, praticam atos sexuais e adolescentes,
geralmente para provarem a sua potencia sexual. 248
o ministério da justiça registra, por ano,
cerca de 50 mil casos de violência sexual
contra crianças e adolescentes. A associação
brasileira multiprofissional de proteção a
infância e adolescência (ABRAPIA) afirma
que, a cada hora, no país, sete crianças ou
adolescentes sofrem abuso sexual. Diante
dos números, a “castração química” passa a
ser discutida como uma possível solução
para o problema. O tratamento a base de
246
CLOTET, Joaquim. Op. Cit. P. 129 -130.
AGÊNCIA Notisa de Jornalismo Científico. Pedofilia: monstro ou
doente? Revista Ciência e vida: Psique, São Paulo, ano III, n. 27, p. 32 39, data da publicação.
248
Vieira, Tereza Rodrigues. Bioética: temas atuais e seus aspectos
jurídicos. Brasília: Consulex, 2006. p. 59 -61.
247
117
hormônios femininos que levariam à
diminuição do desejo sexual em pessoas com
histórico de pedofilia, hoje muito discutido
na Europa, especialmente na Itália, onde é
uma alternativa à prisão ou desconto da
pena, começa a ser alvo de polêmica no
Brasil. 249
A castração química, portanto, é uma forma temporária
de inibição do desejo sexual, sendo assim, têm efeitos
reversíveis. Este tratamento pode ser usado para ajudar os
pedófilos que querem se livrar desse mal, do qual não
conseguirão sozinhos, ou até mesmo como medida de punição
aos indivíduos que cometeram crimes sexuais contra infantes.
250
Há um projeto sendo analisado pela Comissão de
Direitos Humanos do Senado que prevê este tipo de castração
química para pedófilos condenados pela justiça, mas a
aplicação só poderia ser feita mediante anuência do criminoso,
sendo indicado apenas nos casos em que o médico dissesse que
não existe outra opção. Em troca ele teria redução de um terço
da pena. 251Posição esta que entra em choque com o
entendimento da OAB:
(...) A nossa posição é contrária, apesar de
reconhecermos a gravidade desse ilícito
penal que envolve a pedofilia, envolve
pessoas inocentes, indefesas, que são vítimas
desse crime. Apesar desse quadro, nós
entendemos que o melhor tratamento jurídico
e o tratamento punitivo não é o da castração
249
CASTRAÇÂO química em pedófilos gera polêmicas entre
especialistas.
Disponível
em:
http://diganaoaerotizacaoinfantil wordpress.com/2008/04/08/castracao -quimica-de-pedofilos-gerapolemica-entre-especialista/...31/07. Acesso em: 4 ago. 2008.
250
Id.
251
Vai dar o que falar: projeto de castração de pedófilos. Disponível em:
<
http://g1.globo.com/jornalhoje/0,,MUL1550885 -16022,00VAI+DAR+O+QUE+FALAR+PROJETO+DE+CASTRACAO+DE+PEDO
FILOS.html>. Acesso em: 10 abr. 2010.
118
química. Nós estamos num estágio do direito
muito mais avançado e o que mais a
sociedade reclama é a efetividade da justiça,
a certeza da pena. Muito mais importante do
que ficarmos editando novas leis, prevendo
novos tipos penais, novas modalidades de
punição, é importante que tenhamos a
certeza de que aquele infrator será
efetivamente punido”, defende Alberto de
Paula Machado, vice-presidente da OAB 252.
A contrario sensu, o Senador Gerson Camata, autor do
projeto defende que:
O principal argumento de defesa é, primeiro:
ele foi apresentado em 2007. Se já tivesse
sido aprovado, quantas crianças não teriam
passado por essa humilhação? Quantos
pedófilos já teriam sido recuperados?
Entretanto, não foram. Eu tirei o projeto de
uma lei francesa, que tem em vigor na
Inglaterra e também na Itália que são
democracias berço dos direitos humanos no
mundo. Depois que apresentei meu projeto,
ele foi aprovado no Canadá, aprovado na
República Tcheca por plebiscito, inclusive
aquele que é reincidente é castração
cirúrgica. Depois na província de Barcelona
e em oito estados norte-americanos. Esses
países que respeitam os direitos humanos,
todos tem esse tipo de punição para
recuperar o pedófilo (...) 253
Com a presença crescente de novos temas, como a
“castração química” se faz necessário a regulamentação de
normas morais, para que não haja excesso no uso das novas
biociências. 254 O campo que regula estes novos temas é o
252
253
254
Id.
Vai dar o que falar: projeto de c astração de pedófilos. Op. cit...
IACOMINI, Vanessa. Op. cit., p. 4.
119
biodireito que é o estudo sistemático das novas biociências e
tem a vida como objeto principal. 255 O direito, portanto, possui
uma posição primordial na contribuição com a bioética, pois,
enquanto esta examina as possibilidades, as respostas morais
para os questionamentos, o direito, quando for o caso, faz a
tradução dos temas examinados para as normas jurídicas, por
serem estas gerais e de obrigatório cumprimento. 256
6 PEDOFILIA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Até meados de 1989, não havia em nenhum Estado,
legislação que visasse à proteção de crianças e adolescentes.
Porém, com o transcorrer do tempo isso foi modificado através
da aprovação de vários tratados internacionais, assim como, a
aprovação pela ONU, da Convenção Internacional sobre os
Direitos das Crianças e dos Adolescentes, em que impõem aos
Estados a elaboração de leis para a proteção destes contra
qualquer espécie de lesão sexual. 257
A lei brasileira, no entanto, apesar de ter adotado na
Constituição em seu art. 227, a proteção integral da criança e
do adolescente 258, não possui em sua legislação, o tipo penal
“pedofilia” 259, tendo os operadores do direito, na ocorrência
deste tipo de crime, enquadrá-lo nos tipos penais descritos nos
artigos 217 (estupro de vulnerável), 218 (indução), 218 -A
(satisfação da lascívia mediante presença de criança ou
adolescente), e 218-B (favorecimento da prostituição ou outra
255
VIEIRA, Tereza Rodrigues. O chamado biodireito. Revista Jurídica
Consulex, Brasília, n. 197, ano IX, p. 14, 31 mar. 2005.
256
VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética: temas atuais e seus as pectos
jurídicos. Op. cit., p. 29-32.
257
PEDOFILIA. Disponível em: http://www.mscontrapedofilia.usms.br .
Acesso em: 15 jun. 2008.
258
BARBOSA, Hélia. Abuso e exploração sexual de crianças: origens,
causas, prevenção e atendimento no Brasil. In: Inocência em perigo:
abuso sexual de crianças, pornografia infantil e pedofilia na internet, Rio
de Janeiro: Garamond, 1999. p. 24 -41.
259
JESUS, Damásio Evangelista de. Pedofilia na legislação brasileira.
Revista jurídica Consulex. Brasília, ano XI, n. 240, p. 28 -29, 15 jan.
2007.
120
forma de exploração sexual de vulnerável), contudo,
anteriormente a 2009 aplicava-se os artigos: 213 (estupro) e
214 (atentado violento ao pudor), que foram, revogados pela
Lei 12.015/2009 260.
Procurando adaptar suas leis para amparar de maneira
mais coerente as crianças e os adolescentes, vítimas de abuso
sexual, o Brasil elaborou o Estatuto da Criança e do
Adolescente – ECA (lei nº 8069/90) - que em seus artigos 240
a 241-E, incriminam qualquer exposição do menor a prática de
atos sexuais ou pornografia envolvendo infantes, por exemplo,
fotografias, vídeos ou qualquer outro registro; além destes, os
artigos 244-A e 244-B, imputam como crime a submissão ou
corrupção do menor a praticar a prostituição ou exploração
sexual 261.
A redação dos artigos 240, §§ 1º e 2º, inciso I e II e
artigo 241 foi determinada pela Lei 11.829/2008, sendo que
esta, ainda, acrescentou o inciso III do § 2º do artigo 241, 241 A a 241-E; e o artigo 244-B foi acrescentado ao Estatuto pela
Lei 12.015/2009. Pois anteriormente a estas Leis o estatuto
incriminava, somente, a divulgação e publicação de fotografias
ou imagens pornográficas, bem como, o sexo explícito
envolvendo infantes, artigos 240 e 241 262.
Todavia, com o avanço da informática, o “mercado
pedófilo” se tornou ainda mais avassalador. Pois com a
facilidade de informações rápidas de negociação de produtos
pela web, e ainda a possibilidade de atrair crianças e
adolescentes através de sites de bate papo, com o direito
inclusive a bloqueio de suas páginas - o que dificulta ainda
mais a ação policial no combate a pedofilia - tem o comércio
desta natureza se transformado em uma ação cada vez mais
lucrativa e devastadora. 263
260
PINHEIRO. op. cit.
Id.
262
Id.
263
Revista
brasileira
de
psicodrama.
Disponível
em:
http://www.febrap.org.br/produtos/revista/revista_atual.php. >. Acesso
em: 2 jul. 2008.
261
121
Portanto, ainda há muito que fazer para acabar com a
pedofilia no Brasil, ou ao menos amenizar a atuação destes
criminosos, através da atribuição de penas aos mesmos, e é
com esse intuito que o Congresso Nacional está trabalhando. 264
6.1 COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DA
PEDOFILIA
O terrível cenário de abuso sexual sofrido por crianças e
adolescentes foi agravado com o avanço da internet, pois este
é o meio mais rápido e “seguro” para esses criminosos
cibernéticos atraírem suas vítimas 265. Para tentar combater
esses crimes, foram criados sites como o Safernet, que
fiscaliza crimes na rede mundial de computadores. 266
A internet se tornou o meio mais atraente para a prática
de crimes de pedofilia, porque, além de ser um espaço onde
pessoas de várias nacionalidades trocam informações, não há
legislação vigente que regulamente essa espécie de crime,
tornando os atos praticados pela web, impunes 267. Por esses
motivos, todo ano são expostas milhares de crianças indefesas
a abusos sexuais que nem mesmo um adulto suportaria 268.
Além do mais, no dia 04 de março de 2008, através do
requerimento de nº 200, foi criada pelo Senado, tendo por
Presidente da Comissão o Senador Magno Malta, uma
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com o objetivo de
264
BRASIL,
Senado
Federal.
Disponível
em:
<http://www.senado.gov.br/sf/>. Acesso em: 2 jul. 2008.
265
MIRANDA, Anderson; MIRANDA, Roseane. Campanha Nacional de
combate
à
pedofilia
na
Internet.
Disponível
em:
<http://www.censura.com. br>. Acesso em: 2 jul. 2008.
266
MAIA, Felipe. CPI aprova quebra de sigilo de 18 mil páginas no
Orkut.
Disponível
em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u418514.shtml>.
Acesso em: 2 jul. 2008.
267
REVISTA Terceiro Setor. Pedofilia na Internet – um crime grotesco,
de
autores
quase
invisíveis.
Disponível
em:
<http://www.denunciar.org.br/twiki/bin/view/SaferNet/Noticia200101191
93123>. Acesso em: 2 jul. 2008.
268
MIRANDA, Anderson; MIRANDA, Rosane. Op. Cit.
122
apurar fatos relacionados à utilização da Internet para prática
de ilícitos contra crianças e adolescentes, assim como, a
relação deste com o crime organizado. Desde que esta CPI foi
instalada, houve grandes avanços no combate à pedofilia na
Internet, tendo os Senadores, inclusive conseguido uma
autorização judicial para que várias páginas do site de
relacionamentos “Orkut” fossem abertas. 269
Segundo a ONG Safernet:
O site de relacionamentos é utilizado por
pedófilos porque permite compartilhar fotos
de
pornografia
infantil
sem
serem
identificados por outros usuários e pelas
autoridades – uma vez que as fotos são
protegidas por um sistema de privacidade do
Orkut onde os usuários podem “trancar” seu
álbum e a página de recados, deixando o
acesso restrito a amigos adicionados no
perfil 270.
Assim sendo, foi garantido à empresa Google a
imunidade civil e criminal, nos casos em que houver erro no
envio de provas, ou ainda, no caso de serem enviadas as
autoridades judiciais informações falsas (salvo comprovada
má-fé), Para que esta assinasse um termo de responsabilidade
com o Ministério Público. 271
No dia 02 de julho de 2008, o Google Brasil assin ou
junto ao Ministério Público Federal, o Termo de Ajustamento
de Conduta (TAC), se comprometendo a controlar o sistema,
com o objetivo de combater a pedofilia na internet. De acordo
com o TAC, o Google deverá desenvolver tecnologia eficiente
para filtrar e impedir a publicação de pornografia infantil no
269
BRASIL,
Senado
Federal.
Disponível
em:
http://www.senado.gov.br/sf/ Acesso em: 2 jul. 2008
270
GUERREIRO, Gabriela. CPI da Pedofilia recebe em DVDs perfis
“lacrados”
do
Orkut.
Disponível
em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u39651 2.shtml>.
Acesso em: 2 jul. 2008.
271
MAIA, Felipe. Op. Cit.
123
site de relacionamentos Orkut. Além de ter como obrigação, a
retirada de conteúdos ilícitos de comunidades virtuais, a
preservação de dados necessários para a identificação dos
autores e conteúdos, e a distribuição de cartilhas que versem
sobre como usar a internet com segurança. Se a empresa
descumprir qualquer cláusula do acordo estará sujeita ao
pagamento de uma multa diária de vinte e cinco mil reais 272.
A Safernet, somente no primeiro semestre de 2008,
recebeu em média 92,8% a mais de denúncias com relação ao
mesmo período de 2007. Este aumento tão significativo nas
denúncias colaborou para que a CPI da pedofilia aprovasse um
projeto, onde exigia a quebra do sigilo de mais de 18 mil
páginas diferentes do Orkut 273. Devido a isto, “O google
encaminhou a CPI da pedofilia sete DVD’s com os dados
referentes a 3.261 álbuns privados do Orkut que podem reunir
conteúdos e imagens de pornografia infantil” 274. Os referidos
álbuns tiveram o sigilo quebrado e foram analisados por
técnicos do Senado, peritos da Polícia Federal e integrantes do
Ministério Público Federal. 275
Por meio dos trabalhos da CPI, obteve-se a aprovação
das Leis 11.829/2008 e 12.015/2009, anteriormente
explicitadas:
Foi gerado na CPI o texto da Lei 11.829/08, que
aumentou de seis para oito anos a pena máxima de
crimes de pornografia infantil na internet. A lei é
considerada pelo presidente da ONG Safernet
Brasil, Thiago Tavares, uma das mais avançadas
do mundo. Além de aumentar a punição, tornou
crime comprar, manter ou divulgar material
pornográfico.
272
GIRALDI, Renata. Google e Ministério Público assinam acordo para
combater
a
pedofilia
no
Orkut.
Disponível
em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u418420.shtml>.
Acesso em: 2 jul. 2008.
273
MAIA, Felipe. Op. Cit.
274
GUERREIRO, Gabriela. Op. Cit.
275
Id.
124
Já a Lei 12.015/08, originada na CPI,
fixa punições maiores para crimes sexuais
como pedofilia, assédio sexual contra
menores e estupro seguido de morte. A pena
para qualquer crime sexual que resulte em
gravidez terá aumento de 50%. A nova lei
considera crime todo ato libidinoso contra
menores de 14 anos e portadores de
deficiência. Estuprar jovens entre 14 e 18
anos passou a valer até 12 anos de reclusão.
O estupro seguido de morte, hoje punido
com até 25 anos de prisão, passou para até
30 anos. 276
Apesar do grande progresso no combate a pedofilia,
ainda há muito que fazer, pois apesar de a Constituição
Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a
Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança , já
darem uma base jurídica para que haja punição quando houver
violação da lei, “o desafio seguinte, provavelmente mais
complexo, será atualizar a legislação na mesma velocidade
permitida pela tecnologia usada por esses criminosos
cibernéticos”. 277
7 CONCLUSÃO
A pedofilia é um distúrbio na conduta humana, que é
expressada pelo desejo compulsivo de um adulto por uma
criança ou um adolescente. Esta pode ter caráter tanto
heterossexual, quanto homossexual.
A internet tem sido um ambiente extremamente
favorável à proliferação da pedofilia, pois os pedófilos
utilizam-se desse meio de comunicação em massa, para trocar
ou vender imagens pornográficas envolvendo infantes. Tais
criminosos, também, utilizam a internet para atrair crianças e
276
CPI já elaborou leis e firmou acordos inéditos. Disponível em: <
http://www.magnomalta.com/site/index.php?option=com_content&task=v
iew&id=994&Itemid=39>. Acesso em: 10 abr. 2010.
277
SABOYA, Patrícia. Op. Cit.
125
adolescentes, com o intuito de chegar ao fim libidinoso de
abusar sexualmente deles.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (lei nº.
8.069/90), em seus artigos 240 a 241-E, 244-A e 244-B,
incriminam qualquer exposição de imagens pornográficas ou
atos sexuais envolvendo infantes. Contudo, na legislação
brasileira não há tipificação penal específica para os crimes de
pedofilia, tendo os operadores do Direito, na ocorrência de tais
casos, que recorrerem aos princípios da hermenêutica.
Para tentar combater os crimes de pedofilia,
especialmente na internet, foram criados vários sites de
investigação, que buscam fiscalizar os crimes de pedofilia na
rede mundial de computadores, como é o caso da safernet.com.
Também, foi instalado uma Comissão Parlamentar de Inquérito
da pedofilia, que conseguiu a aprovação de leis que protegem
as crianças e os adolescentes e, punem os criminosos que
abusarem destes.
Contudo, é necessário que os pais não abandonem seus
filhos em frente a um computador, e explique a eles o que é
correto e o que é errado entre pessoas de faixas etárias
diferentes, pois uma criança bem informada não dará espaço
para abusos.
Está em discussão uma possível solução para os casos
de pedofilia, a Castração Química, ou seja, um tratamento a
base de hormônios femininos que levariam à diminuição do
desejo sexual. Este tratamento poderia ser utilizado para
ajudar aqueles que quisessem se livrar do distúrbio que
possuem, e que muitas vezes os fazem sofrer.
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1999.
132
CAPÍTULO V:
PEDOFILIA: OS DOIS LADOS DO
TRAUMA
Caio Fábio Camargo
Gislaine Kremer do Couto
Jéssica Rodrigues Cardoso
Simone Cristina de Sá 278
RESUMO
Os pedófilos podem apresentar transtorno de personalidade,
de conduta, orgânicos ou psicóticos, sendo estes atos
avaliados a todo o momento por especialistas de todas as
áreas - criminais, terapêuticas e médicas - para que juntos
possam chegar a um consenso do que provoca esses distúrbios
e de que forma devem ser tratados.
Palavras-chave: Pedofilia. Abuso sexual. Transtornos. Vítimas.
278
Acadêmicos do 8º período do Curso de Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná – Campus Maringá
133
1 INTRODUÇÃO
A sociedade deve ser estudada para que se possa
acompanhar seu desenvolvimento e modificações, e garantir o
aperfeiçoamento das leis partindo desses estudos. Tendo em
vista essa necessidade de entender o todo para resolver os
problemas, chega-se a conclusão que só após entender a mente
do pedófilo, ou os transtornos causados em seu organismo, é
que se pode partir para a tentativa de solucionar este
problema, que afeta cada vez mais a sociedade.
Para facilitar o desenvolvimento deste artigo, procurou se entender a vida do pedófilo desde a infância, seus traumas
psicológicos, físicos e dramas que enfrentou após a descoberta
de seu desvio de conduta e, até as justificativas encontradas,
algumas que partiram de uma convicção de estarem praticando
um ato bom e, outras, usadas como subterfúgios para encobrir
sua culpa e evitar maiores sofrimentos no tocante aos seus
atos.
Com a pesquisa, tem-se a intenção de delinear uma
breve análise do perfil do pedófilo, a fim de definir o que vem
a provocar esses distúrbios para que a lei possa criar normas
para tratar e evitar a incidência dos mesmos.
Ademais, diante da grande mobilização da sociedade no
sentido de evitar que esses atos venham a se repetir, foi
instaurada uma CPI da pedofilia a qual, buscar-se-á também
realizar a análise neste artigo.
2 PEDOFILIA
2.1 CONCEITO E CONSIDERAÇÕES GERAIS
Considerada como uma perversão, a pedofilia é
basicamente a atração de adultos por crianças pré -púberes, ou
seja, crianças com idade inferior a 12 anos. Segundo
estatísticas realizadas sobre o tema pedofilia, a maior parte
dos agressores são homens. Os pedófilos, na maioria das
vezes, são pessoas conhecidas das vítimas e até mesmo dos
pais da criança, podendo ser um vizinho, um amigo, ou até
134
mesmo um parente, onde, grande parte dos casos conhecidos e
relatados são de abusadores da própria família, inclusive o pai
da criança (nesses casos é considerado como incesto) 279.
Com relação ao perfil psicológico do pedófilo, via de
regra, ele possui dupla personalidade; se constitui,
basicamente de homens adultos entre trinta e setenta ano s,
casados, os quais podem até ter filhos e ainda estar, de certa
forma, “acima de qualquer suspeita”, ou seja, ao contrário do
que muitos pensam, nem sempre são homossexuais. Portanto,
um comportamento um pouco estranho se comparado à
personalidade de uma pessoa normal. Mas é claro que nada
justifica um ato de tamanha crueldade diante da sociedade,
sendo um crime inadmissível 280.
Outra característica interessante e repugnante dessas
pessoas, é que embora muitos acreditem que não estão fazendo
mal para a criança, querem garantir que a vítima não irá contar
para os seus pais ou para quem quer que seja, tentando, em
alguns momentos, molestar ou comprar as crianças dando -lhes,
doces e brinquedos ou dinheiro 281.
O abuso, na maior parte das vezes, perdura até que a
vítima consiga se libertar deles ao atingir sua fase adulta, mas
mesmo assim lhes trazem muitos danos os quais causarão
conseqüências psicológicas sérias, quase que irreversíveis,
podendo causar ilusão à criança no sentido de que ela pode
confundir a realidade com o que é mera ficção psicológica 282.
279
VIAGEM A UMA MENTE DOENTE. Disponível em:
<http://wwwto.blogs.sapo.pt/45150.html> Acesso em: 16 ago 2008.
280
MIRACELLY, Karenine. Agressor é lobo em pele de cordeiro .
Disponível
em:
<http://www.folhadaregiao.com.br/hotsites/abusose xual/reportagem6.htm
l> Acesso em: 16 ago 2008.
281
COSTA, Fernando Gomes da. Abuso sexual infantil (pedofilia) .
Disponível
em:
<http://www.violencia.online.pt/script s/cv.dll?sec=crianca&pass=abuso_s
exual> Acesso em: 16 ago 2008.
282
PEQUIN, Bernadete. Cordeiro ou lobo? Disponível em:
<http://www.brasilcontraapedofilia.org/2008/06/01/cord eiro-ou-lobo/>
Acesso em: 16 ago 2008.
135
A pedofilia em si é uma anomalia da sexualidade do
indivíduo, e de acordo com o CID 10, é caracterizada como
transtorno, um desvio psicológico, onde a preferência sexual
do indivíduo se desvirtua do caminho natural, passando a
sentir interesse por crianças que podem ser tanto do sexo
masculino quanto feminino 283. Portanto, o portador do
transtorno da pedofilia é considerado um doente e não um
criminoso passível de pena 284.
2.2 SOLUÇÕES DA MEDICINA
A medicina legal tem estudado uma forma de inibir a
atuação desses doentes, que é a chamada castração química,
que consiste em um tratamento com uso de inibidores de
libido, para o qual seria aplicado nos pedófilos, injeções de
antiandrógeno, que têm a função de inibir a pro dução de
testosterona nos testículos do indivíduo, o que causaria a
perda da agressividade, e conseqüentemente diminuiriam os
ataques sexuais 285.
Embora os estudos ainda estejam em andamento, há
profissionais que admitem que já fizeram uso desses métodos,
como é o caso do professor de psiquiatria da Faculdade de
Medicina do ABC (Grande São Paulo), e doutor da USP,
Danilo Baltieri, que chegou a declarar ao jornal “Estado do
Paraná”, que em casos de consentimento por escrito da
família, ele fazia uso de tratamentos com hormônios, e o
procedia sob o seguinte argumento:“Tenho de fazer isso para
283
ROLIM, Marcos. Pedofilia: até onde está o crime? Disponível em:
<http://www.rolim.com.br/2002/modules.php?name=News&file=print&s i
d=234> Acesso em: 16 ago 2008.
284
FELD, Eduardo. Pedofilia: crime, pecado e doença . Disponível em:
<http://www.amb.com.br/index.asp?secao=artigo_detalhe&art_id=1021 >
Acesso em: 16 ago 2008.
285
CASTRAÇÃO QUÍMICA É TEMA DE PESQUISA E PROJETO DE
LEI.
Disponível
em:
<http://www.maracaju.news.com.br/SAUDE/view.htm?id=98860&ca_id=
25> Acesso em: 16 ago 2008.
136
evitar que os pacientes voltem a fazer sexo com crianças” 286.
Essa decisão resultou em muitas criticas e discussões sobre
esse tipo de procedimento, tendo em vista que o mesm o ainda
não possui uma regulamentação legal 287.
As soluções apresentadas pela medicina e sua efetiva
aplicação em outros paises, como a França, impulsionou o
deputado federal, Mendonça Prado, a apresentação de um
projeto de lei que abarcasse esses métodos, no qual fazia uso
dos seguintes argumentos para a defesa do mesmo 288:
Entendo que esse crime hediondo, deve ser
repelido e punido com toda a energia do
direito. Assim, gostaria de modernizar a
penalidade,
objetivando
rechaçar
categoricamente o delito. Estuprador é um
cafajeste, canalha, que deve ser punido sem
clemência 289.
Porém, seu ímpeto de renovação do ordenamento não
chegou muito longe, sendo barrado pela consultoria jurídica da
Câmara dos Deputados, tendo em vista a colisão com as
normas constitucionais que impedem a instituição de pena
cruel no país 290. A pedofilia, ainda é algo que intriga os ramos
da Medicina, da Psicologia e do Direito, pois não se chega a
um resultado preciso e concreto para tratar o problema em
razão da complexidade da mente de um doente como o
pedófilo 291.
286
PEDOFILIA: CASTRAÇÃO QUÍMICA COMO SOLUÇÃO. Disponível
em:
<http://palavrassussurradas.wordpress.com/2008/04/02/pedofilia castracao-quimica-como-solucao/> Acesso em 16 ago 2008.
287
PEDOFILIA: CASTRAÇÃO QUÍMICA COMO SOLUÇÃO. Op. cit.
288
MENDONÇA PRADO PROPÕE CASDATRAÇÃO QUÍMICA PARA
ESTUPRADORES
NO
BRASIL.
Disponível
em:
<http://brasilcontraapedofilia.wordpress.com/2007/09/11/mendonca-prado-propoecastracao-quimica-para-estupradores-no-brasil/> Acesso em 16 ago 2008.
289
Id.
290
Id.
291
Id.
137
3 PEDÓFILO
3.1 OS ABUSADORES USUAIS
Médicos e psicólogos afirmam que não é possível
reconhecer um pedófilo no meio da multidão, posto que,
geralmente, são pessoas que estão sempre em convívio com as
crianças.
Os abusadores, podem ser quaisquer pessoas, as quais
tenham a possibilidade de ter um contato maior com as
crianças, sem despertar maiores desconfianças, podendo ser
médicos, professores, babás, colegas de escolas, amigos da
família e vizinhos 292. Segundo pesquisa realizada pela
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), a
partir de dados recolhidos no IML entre os anos de 1994 a
2004, revelou-se que o próprio pai é responsável por 45% dos
casos e, o padrasto, o responsável, por 6% dos abusos; e
quando os abusadores são do exterior da família, em 65% dos
casos o abuso é cometido por uma pessoa conhecida
daquela 293. Normalmente, as vítimas são abusadas por um
longo período de tempo, e só denunciam a pessoa envolvida
quando já são adultas.
O jornal The Irish Times, em 1993, trouxe diversas
matérias sobre chamado Kilkenny Incest Case, o caso em que o
pai morava com sua filha em uma fazenda e a violentou
durante 16 anos – dos 11 aos 26 anos – o que resultou na
gravidez de um filho com seu próprio pai, e na perda da visão
de um olho decorrente de agressões praticadas pelo mesmo 294.
Em São Paulo, há relatos de um caso em que o pai
confessou ter engravidado a própria filha de apenas 13 anos,
292
ABUSO SEXUAL MITOS E REALIDADE. Disponível em:
<htt\p://www.observatoriodainfancia.com.br/> Acesso em: 16 ago 2008.
293
ABUSO SEXUAL: PAI É O PRINCIPAL AGRESSOR DE MENORES
NO
SEIO
DA
FAMÍLIA.
Disponível
em:
<http://quiosque.aeiou.pt/gen.pl?p=stories&op=view&fokey=ae.stories/10
039>. Acesso em 16 ago 2008.
294
LANDINI, Tatiana Savoia . Horror, honra e direitos. Disponível em:
<http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8132/tde -11012006194947/> Acesso em: 16 ago 2008. p. 170.
138
tendo sido o mesmo preso pela Polícia Militar após esta ter
recebido a denúncia da mãe 295.
No tocante aos clientes das produções de filmes e fotos
de crianças sendo violentadas, os maiores índices estão entre
os solteiros, com mais ou menos 40 anos, os quais, geralmente
são profissionais liberais 296.
Os homossexuais também têm um destaque muito
grande nos abusos e buscam a normatização legal de suas
atitudes, participando de organizações mundiais com esse fim.
No entanto, se faz necessário deixar claro que essas ligações
afetivas entre pedofilia e homossexualismo não são
conseqüentes, ou seja, nem todo homossexual é pedófilo ou
vice-versa, apesar dessas práticas estarem, por várias vezes,
intimamente ligadas 297.
3.2 TRANSTORNOS
Os pedófilos podem apresentar transtorno de
personalidade, de conduta, orgânicos ou psicóticos 298. Os
transtornos de personalidade decorrem de uma falha provocada
durante o desenvolvimento da sexualidade dos pedófilos, que
mesmo depois de adultos, buscam o prazer na figura ingênua e
passiva de uma criança, sem conseguir se satisfazer com um
indivíduo que não possua essas características 299. Sua
sexualidade é caracterizada como infantil e desenvolvida, na
295
HOMEM CONFESSA NA TEVÊ TER ENGRAVIDADO FILHA DE 13 ANOS.
Disponível em: <www.oglobo.com> Acesso em: 16 ago 2008.
296
CAMPANHA MS CONTRA A PEDOFILIA. Disponível em:
<http://www.mscontraapedofilia.ufms.br/> Acesso em: 16 ago 2008.
297
YOURK, Frank; KNIGHT, Robert H. Comportamento homossexual
&
pedofilia.
Disponível
em:
<http://br.geocities.com/amigosdafamiliabr/co mportamento.doc> Acesso
em: 16 ago 2008.
298
BARBOSA, Hélia. Perspectiva familiar, social e econômica .
Disponível
em:
<http://www.cedeca.org.br/PDF/perspectiva_familiar_heli a_barbosa.pdf>
Acesso em: 16 ago 2008.
299
FONTES, Leandro. Crime sem castigo. Cartacapital. Ano XIV. n.
488. 26 mar 2008.
139
maioria das vezes, como jogos infantis, sem necessariamente
ocorrer o ato sexual com penetração 300. Há vários estudos que
apontam que crianças que sofreram abusos, quando adultos,
passaram a ser abusadores, devido a sua sexualidade e
fantasias sexuais terem sido desenvolvidas precocemente;
ficam, assim, presas a prática sexual infantil, mesmo após
atingirem a vida adulta 301.
Há vários fatores ligados ao relacionamento do
pedófilo, que no decorrer de sua vida tornam-se determinantes
no seu desvio de conduta, como a dificuldade de
relacionamento social e interpessoal, a impulsividade,
dificuldades acadêmicas, violência na família, bullying na
escola (que seriam atos de violência física ou psíquica com
intuito de agredir ou intimidar o indivíduo) 302.
Crianças que viveram em um ambiente familiar sem
estrutura, promíscuo, e que foram vítimas de violência e
autoritarismo, também podem se tornar futuros abusadores,
por não saberem a forma adequada de tratar as pessoas, não
conseguindo discernir o certo do errado 303.
Alguns homens buscam a realização dos seus desejos
em crianças, por não conseguirem ter um relacionamento
adequado com adultos, com os quais se sentem inibidos,
inseguros na relação sexual ou até frustrados e, em
decorrência desses fatores, acabam por encontrar nas crianças
a confiança, pelo poder de controle que exercem sobre elas,
pelo medo provocado ou pela própria vergonha de se
manifestarem e reclamarem de suas atitudes 304. Essas
características são dos pedófilos abusadores.
Contudo, há uma outra categoria de pedófilos,
conhecidos como molestadores, os quais são perversos, tem
total consciência do mal que causam as suas vítimas, se
utilizam de instrumentos de tortura, violência e a inten sidade
300
ABUSO SEXUAL MITOS E REALIDADE, op. cit.
Id.
302
MONSTRO OU DOENTE? Psique ciência&vida. p. 37.
303
Ibid., p. 35.
304
FELIPE, Jane. Afinal quem é mesmo pedófilo? Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/cpa/n26/30391.pdf > Acesso em 17 ago 2008.
301
140
de suas agressões tendem a aumentar e ter uma freqüência
cada vez maior e, em geral, não se arrependem de suas
atitudes.
Cabe ressaltar que, os abusadores em função das suas
atitudes, desencadeiam problemas de depressão, alcoolismo,
sofrimento e debilidade no âmbito social. Por outro lado os
molestadores, não possuem qualquer remorso e suas condutas
podem ser despertadas por alcoolismo, drogas, situações de
estresse, sensação de abandono, rejeição, retardo mental, entre
outros 305.
Alguns indivíduos possuem desejos incontroláveis,
fantasias e manifestações incomuns que são geralmente
acompanhadas de outros transtornos como:
a) travestismo fetichista (heterosexual que
para obter maior satisfação sexual vestem
roupas femininas durante suas relações);
b) fetichismo (uso de objetos inanimados
durante a relação sexual);
c) voyerismo (observação de pessoas
despindo-se ou em relação sexual sem o
consentimento, seguido de masturbação);
d) exibicionismo (heterosexual que expõe
sua genitália à estranhos);
e) sadomasoquismo (a realização sexual
diante de sofrimento, dor ou humilhação sua
ou da vítima);
f) zoofilia (atração por animais);
g) necrofilia (atração por cadáveres); e
frotteorismo (tocar ou esfregar-se em uma
pessoa sem seu consentimento) 306.
Dentre várias possibilidades estão as diferenças nos
próprios organismos dos pedófilos. Para alguns estudiosos da
área médica, o nível elevado de hormônios masculinos
androgênicos, seriam os responsáveis pelo aumento da
agressividade, como a testosterona; para outros, a menor
305
306
MONSTRO OU DOENTE. op. cit. p. 35.
Ibid., p. 37.
141
quantidade de substância branca no cérebro acarretaria a
desconexão de algumas partes cerebrais que se relacionam
com a sexualidade, impossibilitando o discernimento entre
objetos apropriados ou não 307.
Segundo relatos de um neurologista da Universidade de
Virginia, um homem de 40 anos, após desenvolver um tumor
cerebral, apresentou obsessão por crianças e somente após a
retirada do mesmo é que esse distúrbio comportamental
desapareceu 308.
Para Antonio de Pádua Serafim, os estímulos externos,
são responsáveis pelos estímulos cerebrais, sendo assim, o
cérebro só se desenvolve nas partes estimuladas no decorrer da
vida 309.
Muitas são as tentativas de encontrar os transtornos que
causam esse tipo de atitude, tão lastimável, porém, nenhuma
delas pode ser tida como precisa.
3.3 JUSTIFICATIVAS
A história de violência sexual contra crianças está longe
de ser um mal do século XXI. Analisando os costumes de
povos antigos como os Incas, vê-se que estes primavam pela
raça pura, e por meio de casamentos entre irmãos mantiveram
seus costumes por 14 gerações 310; entre os gregos e romanos
era como comum à prática sexual com crianças e, ainda, a
utilização pelos “marquesans” na Polinésia, de crianças em
rituais sexuais, demonstra que, nem sempre, o incesto ou
abuso sexual, na história da humanidade, foi visto como um
ultraje ao pudor 311.
307
Ibid., p. 38.
VIEIRA, Tereza Rodrigues. Pedofilia atentado contra a dignidade da
criança. Revista Jurídica Consulex. Ano VIII. n. 187. 31 out 2004.
309
MONSTRO OU DOENTE. op. cit. p. 37.
310
VIEIRA, Tereza Rodrigues. op. cit.
311
CAPELETTO, Raquel Emília. Pedofilia no Brasil – doença ou
crime. 2005. p. 8.
308
142
Para os habitantes da ilha de Pitcairn, a prática de sexo
com crianças é considerado um fato natural, inerente aos
costumes sem ter nenhuma relação com violência 312.
Baseados em fatos históricos e culturais, foi que muitas
organizações, visando à legitimação da pedofilia, foram
criadas no mundo todo, estando dentre elas o grupo “Enclave
Kring” criado em 1950 pelo neozelandês Frits Bernard; outras
organizações, também de origem neozelandesa, são os grupos
MARTIJM e NVSH. Há ainda o grupo dinamarquês DPA, o
inglês PIE, o americano NAMBLA e o alemão KRUMME 13
313
, todos defensores de que haja permissão legal para a prática
da pedofilia.
Essas organizações são formadas por ativistas
homossexuais que caminham o mundo defendendo suas idéias,
defendendo a abolição de idades estipuladas em lei para a
prática do sexo e que as crianças devem ter o direito de
escolherem se desejam entrar em uma relação sexual precoce e
aprender com esses relacionamentos e, ainda, que o incesto é a
melhor maneira para essa iniciação, pois a criança se sentiria
mais confortável, na relação com os pais 314.
O Instituto Internacional dos Homofílicos (organização
homossexual que produz biografias homossexuais e materiais
eróticos) em 1982, apoiou a idade de consenso para o início da
sexualidade, sendo para as meninas na primeira menstruação e,
meninos, na primeira ejaculação 315.
Os defensores da pedofilia justificam que a não
liberação é fruto de constrangimento sofrido por cria nças
vindas de uma sociedade patriarcal. Para eles, isso não passa
de opressão, afirmando que as crianças são ensinadas mentiras
destrutivas a respeito de sexo e que elas merecem expressar o
que desejam, pois as mesmas são naturalmente sexuais, sendo
a defesa desses direitos a mais alta prova de amor. Dessa
312
VIEIRA, Tereza Rodrigues. op. cit.
PEDOFILIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedofilia >
Acesso em: 17 ago 2008.
314
PEDOFILIA. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedofilia >
Acesso em: 17 ago 2008.
315
YOURK, Frank; KNIGHT, Robert H. op. cit.
313
143
forma, a pedofilia não deve ser vista como um desvio sexual,
mas como uma orientação; alegam que as crianças desejam
isso, que pedem por que tem curiosidade, que isso não é um
desejo só do adulto. Essas pessoas acreditam que eles estão
sendo muito melhores para as crianças que os pais, e que os
mesmos deveriam ficar tranqüilos nos casos de atração sexual,
o qual não estaria produzindo nenhum dano 316.
Para os defensores, não cabe a sociedade definir o que a
criança deve desejar, dizendo que a erotização está evidente,
em propagandas, músicas e programas de televisão, e que as
crianças já procuram ser desejadas imitando cantores e atrizes
que são símbolos sexuais (procurando parecem com elas), e
porque não se falar em intimidade, amizade, respeito,
admiração, carinho, atenção, compartilhamento, paixão e amor
nessas relações 317.
Fora do contexto dos homossexuais, o incesto para
alguns pais é encarado como algo normal, que o pai, por ser o
chefe da família, tem direito sobre as “crias” como se fossem
suas propriedades 318. Outros colocam a culpa toda nas
crianças, dizem que elas que provocam, ou ainda, que elas
gostam, que eles não estão fazendo mal algum a elas. Esse tipo
de argumento é utilizado, muitas vezes, como subterfúgio para
diminuir a culpa que eles mesmos sentem após a prática.
Nesse sentido, relata-se a história de um pedófilo. A
seguir:
A juventude precisa discutir mais sobre
pedofilia, escreveu Brian Oliver, Ph.D em
Criminologia
e
Justiça
Penal
pela
Universidade de Missouri, em seu artigo
“Pensamentos para combater a pedofilia em
316
SEVERO, Julio. Padres, pedofilia e homossexualismo : a verdade que
ainda
não
saiu
do
armário.
Disponível
em
<juliosevero.blogspot.com/2006/04/padres -pedofilia-ehomossexualismo.html> Acesso em: 17 ago 2008.
317
LOPES, Denílson. Amando garotos: pedofilia e a intolerância
contemporânea.
Disponível
em:
<http://www.paroutudo.com/colunas/denilson/041208_denilson_amandog
arotos_22.htm> Acesso em 17 ago 2008.
318
FELIPE, Jane. op. cit. p. 211.
144
adolescentes não criminosos”, endereçado ao
editor da revista Archives of Sexual
Behavior, em 2005. No texto Oliver diz não
saber por que virou pedófilo. Entre as
possíveis causas, estão baixa auto-estima,
bullying na escola (atos de violência física
ou psicológicas intencionais e repetitivos
praticado por um grupo ou indivíduo, com o
objetivo de intimidar ou agredir outro,
incapaz de se defender) e o fato de quase não
ter amigos.
“Comecei a me masturbar freqüentemente
como mecanismo de fuga. Fantasiava
pensando em um garoto de 6 anos que
morava na rua atrás da minha. Não estou
certo porque minhas fantasias era ligadas a
ele, mas acredito que era por ser a pessoa
menos ameaçadora que eu conhecia. Apesar
de eu ter 12 anos, não tinha a menor noção
de que havia qualquer coisa errada em me
sentir atraído sexualmente por um menino. A
masturbação fazia bem, era tudo que
importava”, escreve.
Com o desenrolar da puberdade o problema
se agravou e fez com que Brian Oliver
suspeitasse que era gay. Aos 15, percebeu
que era diferente de outros homossexuais.
“Eu me sentia sexualmente atraído por
meninos bem mais jovens que eu. Depois de
verificar
que
meu
comportamento
enquadrava-se em um termo utilizado em um
livro do ensino médio, percebi que, de fato,
era um pedófilo”, lembra. Depois da
constatação Oliver ficou aflito por não
conseguir mais por fim às fantasias. “Queria
desesperadamente ajuda, porém não tinha
idéia de onde ir para conseguir auxílio”,
conta. Procurou a professora de educação
sexual da escola – o que não ajudou muito.
“A reação inicial dela foi de total
atordoamento. Assim como a maioria dos
adultos da época (1986), ela não sabia o que
145
fazer com a ‘confissão’. Recomendou a
minha mãe que eu passasse a freqüentar a
Growing American Youth, que oferece
suporte a adolescentes gays e lésbicas,
porém esta orientação não me ensinou como
poderia viver sem molestar crianças”, diz.
Entretanto, a parte mais efetiva do
tratamento, segundo Oliver, foi a criação de
empatia pelas vítimas e a compreensão da
dor que havia causado. Para ele, o
adolescente de hoje tem mais chances de se
recuperar devido à Internet e a maior
abertura sexual, mas ainda é necessário
investir em informação. “Existem centenas
de panfletos e livros disponíveis que falam
sobre vício em drogas, alcoolismo, divórcio,
depressão, orientação sexual, porém não há
praticamente fontes para quem luta contra a
pedofilia. Tê-las disponíveis daria a estes
jovens a certeza de que não são ruins por
terem pensamentos sexuais não-apropriados,
que o contato sexual com as crianças não é
legal, que há ajuda disponível e que não é
bom manter o problema em segredo” 319.
Como se pode notar no depoimento retro, os argumentos
dos pedófilos nem sempre são direcionados a permissão da
prática, mas também a criação de meios e tratamentos
adequados aos que lutam contra ela.
4 VÍTIMAS
4.1 QUEM SÃO AS VÍTIMAS
As vítimas são as crianças entre 0 e 18 anos, porém as
mais atingidas são as meninas 320. Hoje em dia, o número de
319
MONSTRO OU DOENTE. op. cit. p. 39.
SALTER, Anna. O que é a pedofilia. Disponível
<http://agostinhocosta.blogspot.com/2007/11/o -que-pedofilia.html>
Acesso em 17 ago 2008.
320
146
em:
meninos agredidos também cresceu muito e a faixa etária
atingida pelos pedófilos também diminuiu, havendo possíveis
casos de bebês de 30 dias que se tornaram alvos de
pedófilos 321.
Segundo os dados do Centro Regional de Atenção aos
Maus-Tratos na Infância de Campinas, SP, afirma-se acerca da
matéria que:
Estimam que, 1251 crianças atendidas no
Instituto Médico Legal de Campinas, foram
vítimas de abuso sexual 67,3% entre 7 e 14
anos; 31,7% entre 2 e 7 anos e 1% abaixo de
2 anos de idade; 14,4% dos adolescentes
atendidos no Serviço de Assistência Integral
a Adolescência (SAIA) de São Paulo
demonstraram ter sido alvo de vitimização
sexual; estudo no ABC paulista registrou que
90% das gestações em jovens com até 14
anos foram fruto de incesto, sendo o autor na
sua maioria o pai, o tio ou o padastro.
Em cada 100 denúncias de maus -tratos
contra a criança e o adolescente feitas à
ABRAPIA, 9 são de abuso sexual. A vítima é
do sexo feminino em 80% dos casos, sendo
que 49% tem entre 2 e 5 anos e 33% entre 6
e 10 anos.
Pesquisas nos EUA indicam que:
 1 criança é sexualmente abusada a cada 4
segundos.
 1 em cada 3 garotas e 1 em cada 4 garotos
são abusados sexualmente antes dos 18 anos.
 90% das vítimas são abusadas por pessoas
que elas conhecem, confiam e amam.

Somente 1 em 4 garotas e 1 em
cada 100 garotos tem o abuso sexual sofrido
denunciado.
321
GOMES, Vagner. CPI da Pedofilia determina prisão de dois
suspeitos.
Disponível
em:
<http://oglobo.globo.com/sp/mat/2008/06/12/cpi_da_pedofilia_determina
_prisao_de_dois_suspeitos-546780396.asp> Acesso em: 17 ago 2008.
147
 50% das vítimas se tornam abusadores.
 Durante uma vida, um pedófilo ativo em
média
abusa
de
260
crianças
ou
adolescentes.
Apesar das diferenças sexuais e econômicas,
da
maior
ou
menor
sensibilização,
informação e mobilização da sociedade para
o tema (e para denunciar), na maior ou
menor eficiência e eficácia das ações
governamentais e não governamentais,
visando a proteção das vítimas e a punição
dos agressores, é possível afirmar que a
situação no Brasil não difere das outras
sociedades ocidentais.
Outras pesquisas feitas nos EUA demonstram
que 1% da população infanto-juvenil
americana é vítima de violência doméstica
todos os anos e que cerca de 10% das
denúncias correspondem a abuso sexual, por
analogia, podemos afirmar que: no Brasil,
165 crianças ou adolescentes sofrem abuso
sexual por dia ou 7 a cada hora 322.
As crianças que sofrem o abuso geralmente têm medo
de denunciar seus abusadores, podem sentir culpa ou vergonha
entre outros fatores que levam a criança a não denunciar, até
mesmo porque, quando acontece dentro de casa, por incrível
que pareça, a família, muitas vezes, duvida da criança, e não
acredita tendo que chegar ao ponto de ver o que ocorre para
acreditar 323.
Alguns depoimentos das vítimas:
O banho me faz sentir mais aliviada, tenho
nojo toda vez que me lembro do que
aconteceu. (A. 17 anos).
Por que foi comigo que aconteceu isso?
Minha mãe sabia e não fez nada para me
proteger, chegou até a me bater quando eu
322
323
ABUSO SEXUAL MITOS E REALIDADE, op. cit.
Id.
148
disse o que ele fazia comigo. Me sinto muito
sozinha. (A. 17 anos).
Mamãe, eu tenho uma coisa nojenta para te
falar. O papai mandou eu pegar no piru dele.
(C. 4 anos).
Meu pai é um doente. É como se ele fosse
dependente de drogas. Ele abusou da minha
irmã e vai continuar abusando de outras. (P.
18 anos, irmão de uma menina abusada
sexualmente pelo pai) 324.
Em face dessa descrença da família é que, em boa parte
dos casos, as vítimas acabam sendo abusadas por um longo
período de tempo, somente vindo a relatar tais atos, quando já
se encontram na vida adulta e com grandes traumas que as
perseguirão pela vida toda.
4.2 TIPOS DE ABUSOS
Atualmente existem diversos casos em que o sinônimo
do abuso sexual cometido com crianças é a pedofilia, dentre
esses casos, os mais comuns são a nível familiar, comunitário
e internacional.
Cabe ressaltar que o abuso pode ser definido como uma
situação em que uma criança ou adolescente é usado para:
Gratificação sexual de um adulto ou mesmo
de um adolescente mais velho, baseada em
uma situação de poder, que inclui desde
carícias, manipulação da genitália, mama,
ânus, o voyeurismo, o exibicionismo, e até o
ato sexual (com ou sem penetração, com ou
sem violência) 325.
324
Id.
KOSHIMA, Karin. Violência sexual contra crianças e adolescentes:
Danos
Secundários,
Caminhos.br,
Disponível
em
<http://www.caminhos.ufms.br/publicacoes/view.htm?a=1133>.
Acesso
em 04 set .2008. p. 3.
325
149
Diante do exposto, constata-se que são varias as
maneiras de agressões utilizadas contras as crianças, não
sendo necessário a conjunção canal para que seja considerado
um ato de pedofilia.
4.3
CONSEQÜÊNCIAS
PEDÓFILOS
NAS
VÍTIMAS
DOS
Indubitavelmente, existem conseqüências nas vítimas de
pedofilia que perduram ao longo de suas vidas.
Seqüelas que podem ser vistas pelas atitudes das
vítimas, já que uma vez não foram tratadas. A maioria das
seqüelas é psicológica, assim, os prejuízos físicos
conseqüentes do abuso sexual, são muito raros. O que se deve
considerar é que cada tipo de conseqüência sucede do tipo de
abuso sofrido, bem como da intensidade deste e também da
personalidade de cada vítima 326.
Pelos fatores psicológicos, a criança que sofreu abuso
poderá desenvolver transtornos como: dificuldades de
socialização, dificuldade de aprendizagem 327, aversão ao sexo
oposto, sentimentos de traição, desconfiança, sensação de
vergonha, culpa, auto-desvalorização e baixa auto-estima 328.
Porém a Dr. Olga Tessari afirma que se a criança for
acompanhada psicologicamente, terá condições de ter uma
vida social e sexual normal; ela diz que a criança pode ir
superando o trauma e se desvinculando das lembranças do
passado 329.
326
CONSEQÜÊNCIAS PSICOFÍSICAS DO ABUSO SEXUAL NA
CRIANÇA.
Disponível
em:
<http://luxuriante.wordpress.com/2008/02/14/blogagem -coletiva-contraa-pedofilia/> Acesso em: 15 set 2008.
327
Cf. BERTOLINO, Pedro. A pedofilia e suas conseqüências. Disponível
em: <http://existencialismosartreano.blogspot.com/2008/ 08/pedofilia-esuas-conseqncias.html> Acesso em: 15 set 2008.
328
Cf. CONSEQÜÊNCIAS PSICOFÍSICAS DO ABUSO SEXUAL NA
CRIANÇA. op. cit.
329
Cf. PEDOFILIA AGRIDE SER HUMANO. Disponível em:
<http://ajudaemocional.tripod.com/rep/id103.html > Acesso em: 15 set
2008.
150
5
ENFOQUE
CONTEMPORÂNEO
SOBRE
PEDOFILIA E O QUE A LEI TRAZ SOBRE O
ASSUNTO
As estatísticas mostram que, só do começo do ano de
2008 até o presente momento, constatou-se 30 mil novos casos
de pedofilia 330.
O que a lei diz sobre esses casos é que seria um estupro
(art. 213 do Código Penal) ou atentado violento ao pudor (art.
214 do Código Penal) e, no art. 241 do Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA), dispõe que é crime a divulgação de
fotos pornográficas de crianças, cabendo por analogia, as
mesmas sansões, para exposição das mesmas na internet.
Entretanto, a maioria dos agressores ou aqueles que
comercializam materiais de pornografia infantil, acabam por
não serem presos, pelo fato de haver uma lacuna no
ordenamento jurídico que não considera a pedofilia um crime,
(como pode ser visto nas tabelas abaixo).
Leis que protegem a criança e o adolescente:
Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988
Art. 277. É dever da família, da sociedade e
do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade
e à convivência familiar e comunitária, além
de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência,
discriminação,
exploração,
violência, crueldade e opressão.
§ 4º - A lei punirá severamente o abuso, a
violência e a exploração sexual da criança e
do adolescente.
330
Cf.
CPI.
Jornal
hoje.
Disponível
em:
<http://video.globo.com/Videos/Player/Notic ias/0,,GIM850834-7823CHAMADA+JORNAL+HOJE,00.html> Acesso em 17 ago 2008.
151
Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção
integral à criança e ao adolescente.
Art. 4º É dever da família, da comunidade,
da sociedade em geral e do poder público
assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao esporte,
ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária.
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será
objeto de qualquer forma de negligência,
discriminação,
exploração,
violência,
crueldade e opressão, punido na forma da lei
qualquer atentado, por ação ou omissão, aos
seus direitos fundamentais.
Art. 240. Produzir ou dirigir representação
teatral, televisiva, cinematográfica, atividade
fotográfica ou qualquer outro meio visual,
utilizando-se de criança ou adolescente em
cena pornográfica de sexo explícito ou
vexatória. (Mudanças introduzidas em 2003
pela Lei nº 10.764).
Art. 241. Apresentar, produzir, vender,
fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer
meio de comunicação, inclusive rede
mundial de computadores ou internet,
fotografias ou imagens com pornografia ou
cenas de sexo explícito envolvendo criança
ou adolescente.
Art. 244-A. A submeter criança ou
adolescente à prostituição ou à exploração
sexual. (Artigo acrescentado pela Lei nº
9.975/00.
Lei nº 8.072 de 25 de Julho de 1990
Dispõe sobre crimes hediondos
Art. 1º São considerados hediondos
crimes
V – estupro
152
os
Código Penal
Art. 61. São circunstâncias que sempre
agravam a pena, quando não constituem ou
qualificam o crime:
h) contra criança, velho, enfermo ou mulher
grávida. (Redação determinada pela lei nº
9.318 de Dezembro de 1996).
Porém, segundo o Dr. Michael de Andrade (Presidente
da Comissão de Direito Eletrônico da OAB-MS), a pedofilia já
está inserida no rol de crimes hediondos, por isso alguns
abusadores tentam se esquivar de seus desejos para não serem
presos, porque, como sabemos, os próprios presos abominam
esse tipo de conduta e fariam a “justiça dos internos” 331.
Pesquisas também mostram que, o Brasil, está em
primeiro lugar no ranking dos países com maior índice de
pornografia infantil na internet. Por este motivo, é que se há
de considerar que o Brasil não possui estrutura, ainda, para o
combate a pedofilia e a investigação de pornografia infantil
pela internet.
Segundo a advogada Ana Maria Rota, o portal que
pretendia combater esses crimes pela internet, após três meses,
teve de ser fechado por falta de compromisso do governo que
não manteve os 160 mil reais anuais para o funcionamento 332.
Dentro do círculo de pornografia na internet, o site de
relacionamentos ORKUT lidera com 90% de denúncias feitas
ao Safernet (ONG que promove e defende os direitos humanos
na internet brasileira) e, destas, 39,65% são de pornografia
infantil. Calcula-se que, mais de 40 mil imagens de crianças e
331
PROJETOS CONTRA PEDOFILIA NA INTERNET E CÓDIGO PARA
“LAN HOUSES” SÃO ENTREGUES À CÂMARA DA C APITAL
PELA CODE-OAB/MS.
Disponível
em:
<http://brasilcontraapedofilia.wordpress.com/2007/09/06/projetos -contrapedofilia-na-internet-e-codigo-para-%E2%80%9Clanhouses%E2%80%9D-sao-entregues-a-camara-da-capital-pela-codeoabms/> Acesso em: 17 ago 2008.
332
PEDOFILIA NA INTERNET NO BRASIL. Disponível em:
<http://www.safernet.org.br/twiki/bin/view/SaferNet/Noticia2006030820
5944> Acesso em: 17 ago 2008.
153
pedófilos foram divulgadas desde o começo deste ano, no
site 333.
Devido ao número crescente de abusos de crianças, em
2008, o Congresso instalou uma CPI, cujo presidente é o
Senador Magno Malta, que procura investigar os abusadores e
crime organizado (redes de pedofilia na internet).
Também com essa CPI, busca-se preencher a lacuna
deixada pelas leis com uma pena mais severa para os
abusadores e a tipificação de pedofilia como crime e, ainda,
buscar junto a Polícia Federal e Ministério Público a
investigação já realizada para combater a pedofilia no país 334.
A CPI acatou ao pedido do Ministério Público de São
Paulo, para quebrar o sigilo de mais de 3 mil álbuns do site
ORKUT, para a investigação de pedófilos na rede. O site
também deverá desenvolver novas tecnologias para filtrar a
postagem de pornografia infantil e deverá comunicar as
autoridades competentes quando estas forem encontradas 335.
Pelo poder de investigação da CPI, foram presos:
Márcio Aurélio Toledo (pai de santo que mantinha uma rede
de pedofilia na internet e tinha uma sala de bate-papo com o
nome de “incesto” no site da UOL), o qual é apontado como
mentor de uma rede de pedofilia; em conjunto com ele foram
presos David Melero Junior e Valter José Ferreira 336; Lidiane
do Nascimento Foo (acusada de chefiar a suposta rede de
333
ORKUT LIDERA DENÚNCIAS RECEBIDAS POR ONG. Disponível
em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u20485.shtml >
Acesso em: 17 ago 2008.
334
NACIONAL: CPI DA PEDOFILIA COMEÇOU MAL, CRITICA
ESPECIALISTA.
Disponível
em:
<http://www.diariopopular.com.br/30_03_08/p34%20e%2035.html >
Acesso em: 17 ago 2008.
335
ROCHA, Murilo; LOPES, Flávia. CPI da pedofilia exige quebra de
sigilo
em
álbuns
do
Orkut.
Disponível
em:
<
http://www.safernet.org.br/twiki/bin/view/SaferNet/Noticia200804100615
09> Acesso em: 17 ago 2008.
336
CPI DA PEDOFILIA PRENDE DOIS SUSPEITOS DE PARTICIPAR
DE REDE. Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/clipping/junho 2008/cpi-da-pedofilia-prende-dois-suspeitos-de-participar-de-rede/>
Acesso em 16 set 2008.
154
pedofilia em Roraima), Givanildo Santos Castro (marido de
Lidiane) e Bárbara do Nascimento Foo (irmã de Lidiane) e
esposa de Raimundo Ferreira Gomes (major da Polícia Militar
que também participava da rede); Luciano Alves de Queiroz
(ex-procurador), Jackson Ferreira (empresário), Hebron Silva
Vilhena (funcionário do TRE) 337.
Todos os esforços giram em torno da não divulgação
desses materiais na Internet, procurando suprimir todas as
tentativas que venham fazer apologia a pedofilia.
6 CONCLUSÃO
Em análise de um contesto histórico e social, chega -se a
um quadro cada vez mais preocupante, tendo em vista o
crescente aumento de casos de pedofilia em todo o mundo e
poucos meios eficazes para resolver os problemas causados
por eles.
Enquanto se faz CPIs para procurar os criadores de
redes de pedofilia, se tem esquecido das vítimas que depois de
abusadas não possuem apoio social para voltarem a viver
tranquilamente.
Os pedófilos são os filhos de uma sociedade capitalista,
que deixa para traz os valores sociais e, investem em uma área
altamente
rentável
financeiramente,
para
delas
se
beneficiarem.
As estatísticas são alarmantes, e o mais triste é saber
que elas não englobam nem a metade dos casos, pois a maioria
das vítimas, fica presa em seus sentimentos de vergonha e
descrença na justiça feita pelo nosso país.
Há vários estudos na área de pedofilia, é verdade,
porém a grande verdade é que na maioria das vezes esses
estudos não são colocados em prática, pois na ânsia de criar
leis para satisfazer o clamor social, aplicam as mesmas penas
para situações tão singulares.
337
ALICIADORA CONFIRMA ESQUEMA E CONFRONTA OS DEMAIS
ACUSADOS.
Disponível
em:
<http://www.magnomalta.com/site/index.php?option=com_content&t ask=
view&id=154&Itemid=1> Acesso em 16 set 2008.
155
A busca de soluções, em massa, dos problemas trazidos
pela pedofilia, tornam-se cada vez mais ineficazes, e por sua
vez, aumenta o sofrimento das vítimas e também de seus
agressores, que não tem um apoio psicológico necessário para
o tratamento de transtornos e, nem clínico se o mais indicado.
Os legisladores se esquecem de que os envolvidos são
seres humanos, e como tais complexos demais para serem
analisados superficialmente, que aqueles que não se
preocupam em entender realmente o funcionamento da
sociedade, jamais alcançarão seus anseios e estarão fadados ao
fracasso.
7 REFERÊNCIAS
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<http://www.observatoriodainfancia.com.br/> Acesso em: 16
ago 2008.
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ALICIADORA CONFIRMA ESQUEMA E CONFRONTA OS
DEMAIS ACUSADOS. Disponível em:
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PARTICIPAR DE REDE. Disponível em:
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<http://br.geocities.com/amigosdafamiliabr/comportamento.do
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160
A ORGANIZADORA:
Juliana Rui Fernandes dos
Reis Gonçalves, brasileira,
casada, advogada;
atualmente é professora
universitária da Pontifícia
Universidade Católica do
Paraná - PUCPR.
Tem experiência na área da
Bioética e do Direito, com
ênfase em Direito de
Família
e
Sucessões,
Biodireito, Direitos Difusos,
Filosofia Jurídica, Ética na
Advocacia, Sociologia e
Antropologia
Jurídica,
Ciência Política e Teoria Geral do Direito.
2003 – 2005: Mestrado em Direito; Universidade
Estadual de Maringá, UEM, Brasil.
Título: O Direito à vida e o direito de um viver melhor
um conflito de direitos fundamentais, Ano de
Obtenção: 2005.
Orientador: Wanderlei de Paula Barreto.
Bolsista da: Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior.
Palavras-chave: vida humana; embriões excedentes;
células-tronco; qualidade de vida; direito à vida.
Grande área: Ciências Sociais Aplicadas / Área:
Direito / Subárea: Direito Privado / Especialidade:
Direito Civil.
161
Grande área: Ciências Sociais Aplicadas / Área:
Direito / Subárea: Direito Privado / Especialidade:
Biodireito.
Grande área: Ciências Sociais Aplicadas / Área:
Direito / Subárea: Direito Público.
Setores de atividade: Educação superior.
2006 – 2007: Especialização em Bioética.
na Universidade Estadual de Londrina, UEL, Brasil.
Título: Uma visão bioética das pesquisas com célulastronco.
Orientador: Dr. Lourenço Zancanaro.
2000 – 2000: Especialização em Direito Tributário.
(Carga Horária: 440h); no Instituto de Ciências
Sociais do Paraná - IBEJ Cursos Jurídicos Ltda.
1999 – 1999: Especialização em Direito. (Carga
Horária: 882h); na Escola da Magistratura do Paraná Coordenadoria de Maringá.
1998 – 1998: Especialização em Direito. (Carga
Horária: 640h); na Fundação Escola Superior do
Ministério Público do Estado do Paraná.
1994 – 1998: Graduação em Bacharelado em Direito;
na Universidade Estadual de Maringá, UEM, Brasil.
PUBLICOU TAMBÉM:
Direito à Vida e Direito a Viver Melhor, Um Conflito de
Direitos Fundamentais, Humanitas Vivens: Sarandi (PR),
2010, 438 p. ISBN: 978-85-61837-23-5
162
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