PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
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PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Registro: 2014.0000483973 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ANDRÉ LUIS FRACCAROLLI, é apelado ANA PAULA VIEIRA DUARTE. ACORDAM, em 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento em parte ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores CHRISTINE SANTINI (Presidente sem voto), LUIZ ANTONIO DE GODOY E PAULO EDUARDO RAZUK. São Paulo, 12 de agosto de 2014. Claudio Godoy RELATOR Assinatura Eletrônica PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO APELAÇÃO CÍVEL Processo n. 0229123-44.2009.8.26.0002 Comarca: São Paulo Apelante: ANDRÉ LUIS FRACCAROLLI Apelada: ANA PAULA VIEIRA DUARTE Juiz: Dr. Alexandre Batista Alves Voto n. 7.532 Responsabilidade civil. Danos mor ais. Réu que vinha ameaçando a ex-mulher , inclusive com a divulgação de fotos e vídeos íntimos na internet. Real causa de assédio, mais que mer o dissabor . Ausência de cer ceamento. Pr ova suficiente das ameaças do r éu, inclusive levadas a demanda cr iminal. I ndenização devida, ainda que não no impor te ar bitr ado. Busca e apr eensão das fotos e vídeos em poder do r éu. I mposição de multa cominatór ia. M atér ia j á decidida em agr avo de instr umento inter posto. Redução, por ém, de seu valor . Sentença r evista. Recur so par cialmente pr ovido. Cuida-se de recurso de apelação interposto contra sentença (fls. 402/405) que julgou procedente a ação, para o fim de: a) determinar que o réu se abstenha de praticar violência psicológica e moral em desfavor da autora, ficando proibido de telefonar ou manter qualquer tipo de contato com ela que fuja da normalidade, sob pena de multa, a ser oportunamente arbitrada; b) condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 25.000,00, quantia que será atualizada desde a sentença e acrescida de juros de mora de 1% a contar da citação; c) reduzir a multa cominatória e imputá-la à conversão da obrigação de fazer em perdas e danos no importe de R$ 25.000,00, quantia que será atualizada desde a Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 2/10 PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO sentença e acrescida de juros de mora de 1% a contar da citação. Sustenta o réu, em sua irresignação, preliminar de cerceamento de defesa, obviada a prova pericial e oral. Defende, no mais, que a gravação não contém qualquer referência à existência de fotos ou vídeos da ex-mulher, muito mais animada pelo propósito de criar prova para indenização. Afirma que a gravação é ilícita e que a transcrição pode ter sido manipulada. Impugna a multa aplicada, afirmando não haver provas da existência das fotos, bem como do risco de exposição, ademais de a condenação contrariar a Súmula 372 do STJ, além da afronta, com a conversão, ao disposto no art. 461, §1º, do CPC. Subsidiariamente, pugna pela redução do valor da multa para no máximo 05 salários mínimos e por que os juros mensais relacionados à condenação derivada das astreintes sejam excluídos ou, quando menos, incidentes apenas a partir do transito em julgado da sentença. Afirma que não há que se falar em danos morais, pedido, este, baseado unicamente na existência não comprovada das fotos e no teor da conversa gravada. Subsidiariamente, pugna pela redução do quantum indenizatório para no máximo 05 salários mínimos, com a aplicação de juros de mora a partir da fixação do valor pecuniário e não da citação. Ressalta ainda que a proibição de telefonar ou manter contato telefônico é inexequível, já que o casal possui um filho comum. Pugna, finalmente, pelo sobrestamento do presente feito para se aguardar o desfecho da ação criminal, além da inversão da sucumbência ou sua repartição, compensados os honorários. Recurso regularmente processado e Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 3/10 PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO respondido. É o relatório. Em primeiro lugar, não se considera havido cerceamento. A autora reclama de fatos específicos que constaram de mídia com a gravação das ameaças imputadas ao réu. Trata-se de gravar a própria conversa e sem que em momento algum se tenha, concretamente, arguido adulteração do conteúdo, portanto sem ilicitude a determinar dilação, mais se pondo a discussão na interpretação do conteúdo da fala das partes. Menos ainda de se cogitar de prova pericial necessária para demonstrar se as reações pessoais eram compatíveis com o quanto afirmado na petição inicial, defendendo-se que a autora aparentava estar calma. A questão envolve a consideração do que se falou, efetivamente, e de modo bem audível na mídia. Neste sentido, seja como for, ouvida a gravação, bem se percebe que, no início da conversa, a autora se manteve passiva diante das afirmações do réu. Nada a indicar, porém, que não se tenha afetado, tanto que inclusive levou os fatos também à esfera penal. E claro que de antemão pretendia gravar a conversa, o que não afasta a ofensa, tanto mais em meio ao contexto em que então se encontrava envolvida, em litígio com o réu, logo antes dele separada. De outro lado, igualmente descabida a Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 4/10 PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO prova pericial para demonstrar a ausência de participação do réu na criação de perfil em rede social em nome da apelada, fato estranho a este processo. Em suma, a conversa gravada é facilmente compreendida, tendo o réu, de forma inequívoca, e depois de tê-la xingado, ameaçado a autora, em diversos momentos, não havendo que se falar em mera reação a provocações indevidas. Nota-se que o réu visava permanecer com o filho do casal em sua companhia por mais dias do que o combinado, ocasião em que ameaçou a autora com a divulgação de fotos e íntimas, e de maneira pensada, longe, portanto, de se tratar de um mero desabafo (“ Faça alguma coisa contra mim, alguma coisa...pense bem. Vou esperar mais uma semana. Ele vai ficar comigo até dia nove. Pense bem se você vai fazer alguma coisa. Tem um monte de fotos suas. Você vai ver o que vai acontecer com você. Já tô avisando. É só um simples aviso... É um simples avisinho....você não me conhece..você sabe que eu não tenho medo. Eu só tô te avisando...pra depois falar que eu sou ruim...que eu não te avisei...Ó...eu tô esperando a hora certa pra usar. Pode ficar tranquila que a hora certa você vai ter uma surpresa...tem um monte de gente que vai gostar de ver o que eu tenho...Principalmente o seu amantezinho aí...Faça alguma coisa que eu tenho mesmo. Tá prontinha no email já pra mandar pro monte de gente... o jeito que você é piranha.”) Os fatos superaram o âmbito da mera desavença. Não por outro motivo a condenação penal havida, em 1º Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 5/10 PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Grau, ainda que sem causa à suspensão deste feito, ante à prova também aqui produzida. Mais que mero dissabor, havida real afronta a direito essencial da autora, a justificar o dano moral a ser indenizado. Mas não, respeitada a convicção do MM. Juiz a quo, no importe arbitrado. Certo que a indenização, além da função compensatória, cumpra também um papel dissuasório. A propósito, lembra Fernando Noronha que a própria responsabilidade civil ganha, hoje, novas funções, além daquela reparatória, dentre as quais, justamente, a dissuasória, que também quer preventiva (in Desenvolvimentos Contempor âneos da Responsabilidade Civil. I n: Revista dos Tr ibunais. Ano 88. v. 761. mar ço 1999. p. 31-44). Na mesma esteira, ainda que à luz de sistema diverso, acentuam G.L. Williams e B.A. Hepple que a indenização, em casos como o presente, nos quais havidos danos que chamam de exemplares, serve a preservar a força do direito e a constituir um sistema de prevenção (in I fondamenti del diritto dei “ torts” . Tr ad. M ar io Ser io. Ed. Scientifiche I taliane. Camer ino. 1983. p. 52-53). Porém, mesmo assim, a indenização não pode ser de molde a, mais que compensar, representar lucro, indevido enriquecimento ao ofendido, monetarizando-se situações existenciais, assim mercantilizadas e, por isso, apequenadas. (cf. Ander son Schr eiber , Novos paradigmas da responsabilidade civil, Atlas, p. 187-190). Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 6/10 PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Por isso que, atento a estes critérios, reduz-se a indenização a R$ 12.500,00, atualizados a partir do presente julgamento (Súmula 362 do STJ), mantidos os juros como fixados, aqui, na realidade, porque ausente recurso da autora, diante do que está no enunciado da Súmula 54 do STJ. No tocante à multa cominatória, a questão já foi objeto decisão em agravo de instrumento anterior (308/310), negado seguimento ao recurso especial contra ele interposto. E, seja como for, no caso presente em momento algum a autora requereu a simples apresentação de documentos que fossem comuns ou que o réu tivesse a obrigação de exibir, para fins probatórios ou avaliação acerca do ajuizamento de outra demanda (art. 845, c/c o art. 358 do CPC). Antes, o que pretendeu a autora foi reaver fotos e vídeos que expusessem sua intimidade. Na justa lição de Humberto Theodoro, que bem se colhe de aresto deste Tribunal que efetua esta exata distinção (TJSP, Ap. civ. N. 9078382-73.20908.8.26.0000, j . 04.12.2012), a busca e apreensão envolve medida que vai além da simples exibição ou apresentação, porque se quer o apossamento do documento ou coisa (Curso, For ense, 46ª ed., p. 595). No caso, verificado que o suporte material em que se continha a imagem da autora se encontrava com o réu, que se aproveitou da situação para ameaçar a ex-mulher, determinou-se a entrega diretamente para a autora Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 7/10 PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (cf. fls. 29), pelo que era cabível a multa cominatória, a rigor para deliberação que, então, passou a ser de entrega. E não em diverso sentido o sistema permite a multa cominatória relativa a obrigações desta espécie (v.g. art. 461-A e 621, parágrafo único, do CPC). Note-se que, quando o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 372, e a tanto basta conferir os respectivos precedentes (v.g. Resp. n. 433.711, 981.706, 633.056, 204.807, AgRg no AI n. 828.342), teve em conta que, na hipótese de exibição, e desatendida a ordem, havia, como há, remédio próprio a tornar desnecessárias as astreintes, quer, conforme o caso, a consequência do art. 359 do CPC, quer, justamente, a busca e apreensão. Daí justificar-se a fixação. Mas, se cabe a multa, não se autorizava mesmo sua manutenção em patamar extremamente elevado, razão pela qual o MM. Juiz a quo já a reduziu para R$ 25.000,00, porém impondo-se ainda maior redução, posto que mantidos os consectários, como deliberados. A propósito, não há dúvida de que a multa cominatória seja medida de apoio a um comando judicial. Serve a torná-lo efetivo, forçando mesmo o seu cumprimento. Por isso, não se estabelece em função do valor da obrigação, ao contrário da cláusula penal, de que se diferencia justamente pela sua função. Seu Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 8/10 PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO arbitramento obedece a critério diverso, na essência a situação econômica do réu, assim dimensionando-se sua força intimidatória. A reversão do seu importe em favor da parte foi opção discricionária do legislador, ainda que talvez não a melhor. Poderia, por exemplo, reverter a um fundo público, quando não se cogitaria de benefício ao adverso. Mas, repita-se, antes que propriamente uma vantagem indevida, a priori, sua causa é legal, vale dizer, decorre de uma escolha do legislador. Porém, ainda assim, justamente por esta opção legislativa se vem entendendo deva ser reduzido o importe final da multa quando, revertida à parte, acabe sendo para ela foco de indevido enriquecimento. Ou seja, a despeito da função que desempenha, e exatamente para ela não se desvirtue, tem-se decidido pela minoração quando o montante da multa atinja patamares desarrazoados, consideradas as circunstâncias do caso (v.g. STJ, Resp. n. 793.491, ED no AgRg no Resp. 737.828 e, neste Tribunal, JTJ 339/202). Nestes termos é que se tem ainda de reduzir a multa, para a quantia de R$ 12.500,00. E sem prejuízo ao réu, pelo contrário, em que este montante se tenha convertido em perdas e danos, substitutivas da obrigação de entrega das mídias, ausente recurso da autora. Por fim, a proibição de telefonar ou Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 9/10 PODER JUDI CI ÁRI O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO manter qualquer tipo de contato com a apelada já se ressalvou condicionado apenas ao que fuja da normalidade. Daí que, evidentemente, não se aplica ao que interesse ao filho comum. Não se impediu qualquer contato. O mais impende à execução aferir. A imposição sucumbencial se mantém, acolhidos os pedidos da autora e, quanto ao valor do dano moral, incidindo à espécie o enunciado da Súmula 326 do STJ. Ante o exposto, DÁ-SE PARCI AL PROVI M ENTO ao recurso. CLAUDIO GODOY Relator Apelação nº 0229123-44.2009.8.26.0002 10/10
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