A visibilidade no processo de recrutamento e - grupo
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A visibilidade no processo de recrutamento e - grupo
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES PÓS-GRADUAÇÃO EM GESTÃO INTEGRADA DA COMUNICAÇÃO DIGITAL EM AMBIENTES CORPORATIVOS - DIGICORP NATHALIE PEREIRA LIMA A visibilidade no processo de recrutamento e seleção de pessoal em redes digitais: características e consequências São Paulo 2014 NATHALIE PEREIRA LIMA A visibilidade no processo de recrutamento e seleção de pessoal em redes digitais: características e consequências Monografia apresentada ao curso de Pós-graduação em Gestão Integrada da Comunicação Digital em Ambientes Corporativos da Universidade de São Paulo como requisito final para obtenção do título de especialista. Área de concentração: Comunicação Orientador: Prof. Ms. Ivan Paganotti São Paulo 2014 Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte. Lima, Nathalie Pereira A visibilidade no processo de recrutamento e seleção de pessoal em redes digitais: características e consequências. Nathalie Pereira Lima: orientador Ivan Paganotti. São Paulo – 2014. 71 fls. Monografia (Especialização Lato Sensu) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, 2014. 1. visibilidade. 2. redes sociais digitais. 3. recrutamento e seleção. 5. relações sociais NATHALIE PEREIRA LIMA A visibilidade no processo de recrutamento e seleção de pessoal em redes digitais: características e consequências Trabalho de conclusão do curso de Pós-Graduação em Gestão Integrada da Comunicação Digital em Ambientes Corporativos, pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. Aprovado em: Banca examinadora Prof. ______________________________ Instituição: ___________________________ Julgamento: ________________________ Assinatura: __________________________ Prof. ______________________________ Instituição: ___________________________ Julgamento: ________________________ Assinatura: __________________________ Prof. ______________________________ Instituição: ___________________________ Julgamento: ________________________ Assinatura: __________________________ AGRADECIMENTOS Agradeço, primeiramente, a todas as pessoas que convivo diariamente, principalmente meus pais, que foram muito pacientes e compreensivos comigo durante essa última fase do curso do DIGICORP. Ao meu orientador e professor, Prof. Ms. Ivan Paganotti que me ajudou desde o começo, antes mesmo de tê-lo como orientador. Obrigado por seus conselhos, dicas preciosas e por ter sido tão prestativo em todos os momentos que precisei. Ao pessoal que trabalha comigo, que teve muita paciência para me ouvir todas as vezes que eu comentava sobre o andamento deste estudo. Aos meus colegas de classe, Carlos e Clarissa, pelos momentos de alegria e de trabalho duro que tivemos no decorrer do curso. À Lívia, que conheci rapidamente em minha viagem de férias, mas que me emprestou um dos livros fundamentais para este trabalho. E por último, mas não menos importante, minha gratidão a todos os profissionais de Recrutamento e Seleção que participaram das entrevistas e contribuíram com seus conhecimentos e vivências. RESUMO A visibilidade no processo de recrutamento e seleção de pessoal em redes digitais estuda as características e consequências advindas com a popularização das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC’s) sob a ótica dos recrutadores que estão à procura de candidatos para as suas vagas. Analisando as percepções e comportamentos dos recrutadores entrevistados e aplicando conceitos teóricos, buscamos compreender como é o cenário de recrutamento e seleção de candidatos para o profissional brasileiro diante da exposição provida pelas redes sociais digitais. Procuramos entender se a visibilidade dos perfis dos candidatos é suficiente para os recrutadores e se o conteúdo publicado nas redes interfere na seleção dos profissionais assim como vem acontecendo nos Estados Unidos, segundo uma pesquisa realizada pelo site CareerBuilder. Palavras-chave: visibilidade – redes sociais digitais – recrutamento e seleção – relações sociais ABSTRACT The visibility, in digital networks, of recruitment and selection processes, studies the characteristics and consequences of the popularization of Information and Communication Technology (ICT) from the perspective of recruiters in search of candidates for new oportunities. Analyzing the perceptions and behaviors of interviewed recruiters and applying theoretical concepts, we seek to comprehend the recruiting and selection environment of the Brazilian market against the exposal provided by social networks. We seek also to understand whether the information obtained from candidate profiles is enough for the recruiters, and if the content published in networks interferes with the selection of professional, as we see happen in the United States according to researches made by the CareerBuilder website. Keywords: visibility – digital social networks – recruitment and selection – social relationships SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 8 1.1 QUESTÕES QUE MOTIVARAM ESTE ESTUDO........................................................ 8 1.2 PROBLEMAS E OBJETIVOS ....................................................................................... 10 1.3 EMBASAMENTO TEÓRICO METODOLÓGICO ...................................................... 10 1.3.1 Elaboração do roteiro de pesquisa ........................................................................... 12 1.3.2 Como foi Recrutar e Selecionar os profissionais para a pesquisa? ....................... 16 2. O HISTÓRICO E O DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO E DOS RECURSOS HUMANOS....................................................................................................... 18 2.1 O FINAL DO SÉCULO XIX E A I GUERRA MUNDIAL........................................... 21 2.2 O PERÍODO ENTRE A I GUERRA MUNDIAL E A II GUERRA MUNDIAL .......... 22 2.3 O PERÍODO DO PÓS-GUERRA ATÉ A DÉCADA DE 1980 ..................................... 23 2.4 A DÉCADA DE 1990 ATÉ O PRESENTE MOMENTO.............................................. 26 3. AS INTERAÇÕES E AS RELAÇÕES, AS REDES SOCIAIS E A VISIBILIDADE DO INDIVÍDUO CONTEMPORÂNEO .............................................................................. 29 3.1 A VISIBILIDADE E A REPUTAÇÃO DO INDIVÍDUO NO DIGITAL ..................... 29 3.2 O PASSADO E O PRESENTE DAS RELAÇÕES SOCIAIS ....................................... 35 4. OS RESULTADOS OBTIDOS E AS RELAÇÕES ENCONTRADAS COM A PESQUISA APLICADA ........................................................................................................ 40 4.1 SOBRE O PROCESSO DE RECRUTAMENTO E SELEÇÃO DOS CANDIDATOS 42 4.2 SOBRE OS USOS DAS FERRAMENTAS DE RECRUTAMENTO ON-LINE: UTILIZAÇÕES, CARACTERÍSTICAS, VANTAGENS E DESVANTAGENS ................... 45 4.3 SOBRE A VISIBILIDADE NAS REDES SOCIAIS DIGITAIS: AS EMPRESAS E OS CANDIDATOS ........................................................................................................................ 51 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 64 REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 69 8 1. INTRODUÇÃO 1.1 QUESTÕES QUE MOTIVARAM ESTE ESTUDO Pudemos acompanhar nos últimos anos o aumento significativo da parcela da população com acesso à internet no Brasil. Em 2008, por exemplo, apenas 34% da população brasileira tinha acesso à rede mundial de computadores, segundo a pesquisa e principal indicador TIC Domicílios, que é realizada pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (CETIC.br). Atualmente, (dados obtidos em 2013) essa realidade mudou bastante, pois 50% da pessoas no país têm acesso à internet, ou seja, 85,9 milhões de usuários de internet (com 10 anos ou mais que utilizaram ao menos uma vez a internet no período da pesquisa), sendo que elas não mais acessam apenas de seus computadores, mas sim também por meio de seus telefones celulares (que em 2008 representava apenas 4% dos acessos, e que em 2013 saltou para 31%) e tablets com conexão à rede, possibilitando desta forma a desterritorialização dos acessos e das comunicações de fato envolvidas. As comunidades virtuais e as redes sociais, que serão melhores explanadas nos próximos capítulos, são hoje amplamente divulgadas e desfrutadas por nós. No entanto, elas não foram originadas com o advento das novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC’s), mas sim, como explica Lemos e Lévy (2010), datam de vinte anos antes da chegada da web e "Hoje, constituem o fundamento social do ciberespaço e uma das chaves para a futura ciberdemocracia." (p. 101). As mesmas redes sociais e comunidades virtuais, sejam elas de caráter relacional pessoal ou até mesmo profissional, têm sido cada dia mais utilizadas. Tomemos como exemplo o Facebook: ele foi criado em fevereiro de 2004 com a finalidade de manter conectados os alunos da Universidade de Harvard, onde Mark Zuckerberg e seus três colegas de quarto da faculdade estudavam. No decorrer de um curto período de tempo, em menos de 3 anos após seu lançamento, os cadastros que antes eram abertos apenas em parceria com algumas universidades no mundo, passaram a ficar disponíveis para qualquer indivíduo que desejasse utilizá-los. Assim, juntamente com a evolução dos dispositivos que permitem o acesso constante à internet, estamos vivendo uma realidade sócio-comunicacional digital, representada tanto pelo meio de expressão mais conhecido e tradicional - o website, como também por novas 9 ferramentas que geram novas formas de comunicação e de expressão e que estão proporcionando a participação dos usuários no ciberespaço, seja a partir de geração de conteúdos ou mesmo avaliações e comentários, possibilitando desta forma a expressão de suas opiniões. A interação dos usuários dentro do ciberespaço nessa nova realidade comunicacional pode ser presenciada em comunidades, blogues, microblogues, entre outras diversas inovações (CORRÊA, 2014, p. 218). Para Corrêa, o usuário engajado do ciberespaço "se vê diante de uma sucessão de ambiências que, além de trocas, diálogos e interações, colocam em campo público a exposição do indivíduo e trazem questões como individualidade, identidade e subjetividade, tradicionalmente consideradas como de ordem da esfera privada". Entretanto, ao mesmo tempo que as informações são disponibilizadas com transparência e agilidade, é bastante perceptível que estamos presenciando o "surgimento de uma nova visibilidade" (THOMPSON, 2008), que advém dessas novas formas de agir e interagir. No contexto do processo de Recrutamento e Seleção (R&S), que será o recorte abordado nesse estudo, essa visibilidade mediada será analisada a partir das características das ferramentas utilizadas no processo (sejam elas redes sociais ou até mesmo websites com banco de dados de currículos) e a utilização das redes sociais pelos profissionais de Recursos Humanos (RH) no momento em que estão à procura dos candidatos para as vagas de suas respectivas corporações. Partindo do ponto de vista que essas redes deixam as informações do indivíduo (candidato) mais transparentes e acessíveis a todos, nos faz presumir também a preocupação com o que é privado e o que é público no mercado de trabalho nessas duas esferas, pois provavelmente os recrutadores estão tendo problemas ao lidar com informações privadas ou particulares das pessoas, mas que acabam se tornando públicas, ao serem expostas pelos "indivíduos-candidatos" que estão em busca de uma colocação no mercado de trabalho e o próprio empregador se utiliza justamente dessa ferramenta e passa por essa tensão: ele é tanto privado, pois é a forma de o indivíduo ganhar dinheiro, e ao mesmo tempo público porque tem uma visibilidade perante os outros, uma vez que o produto do trabalho do indivíduo é negociado socialmente, além de termos que conviver com outras pessoas em um ambiente aberto. 10 1.2 PROBLEMAS E OBJETIVOS A partir das inquietações apresentadas, sua complexidade e a ausência de estudos específicos na área, encontramos a motivação de explorar mais o tema analisando as ferramentas que os recrutadores utilizam no processo de Recrutamento e Seleção (R&S), bem como suas percepções sobre as mesmas, e também como essa "nova visibilidade" vem impactando no momento da escolha de um candidato. Devido à dificuldade de consolidação de tantas dúvidas envolvidas nesse complexo tema, que será abordado no discorrer desse trabalho, em apenas uma indagação, decidimos então apontar em três questionamentos centrais: em primeiro lugar, quais são as características desse novo ambiente e que consequências ele traz para o mercado de trabalho e para o processo de recrutamento? Em segundo, como essas ferramentas de recrutamento estão evoluindo, em que sentido o ambiente proporcionou o surgimento dessas ferramentas e como elas estão impactando o próprio ambiente? E em terceiro, quais as características desse novo ambiente de R&S e como os regimes de visibilidade afetam esse cenário? O objetivo principal do trabalho é identificar as características e as influências das ferramentas e/ou redes sociais em processos de R&S. Mais especificamente o objetivo prático é fazer um levantamento das plataformas de recrutamento e identificar características que são novas em relação ao processo de R&S tradicional a partir de uma pesquisa de natureza qualitativa com recrutadores de corporações, para compreender o que de fato está mudando, uma vez que o "indivíduo-candidato" tem seu currículo na internet e não faz ideia do impacto que isto pode gerar para sua imagem profissional e para as corporações. 1.3 EMBASAMENTO TEÓRICO METODOLÓGICO Para conseguirmos elucidar os questionamentos expostos acima, faremos um estudo exploratório de natureza bibliográfica para entender como foi que historicamente as mídias eletrônicas começaram a fazer parte de nossas vidas, seja tanto para os assuntos pessoais quanto para os profissionais. Para isso, utilizaremos os autores Manuel Castells e Lemos e Lévy que explanam bastante em suas obras conceitos sobre a sociedade que vive hoje conectada em rede. As interações dos indivíduos com as novas mídias e também com as redes sociais digitais serão bastante discutidas no decorrer desse estudo tendo como base os conceitos das pesquisadoras Corrêa e Recuero, que têm esses temas como áreas de principal 11 interesse. Para contextualizarmos o desenvolvimento do setor de gestão de recursos humanos, utilizaremos como embasamento as concepções adotadas por Tonelli, Lacombe e Caldas, devido às suas vivências acadêmicas e profissionais relacionadas a administração e gestão de pessoas. Por último, Thompson será o autor destaque deste estudo para definirmos e compreendermos a visibilidade dos indivíduos que existia no passado e também a "nova visibilidade" pelo qual estamos expostos diariamente, seja como "indivíduo-pessoa" ou seja como um "indivíduo-candidato" a uma oportunidade de emprego. Realizamos em paralelo ao estudo bibliográfico uma pesquisa qualitativa, com profissionais de R&S previamente selecionados, que nos dará suporte na elaboração desse trabalho para a descoberta das práticas utilizadas por eles em seus processos de R&S. Decidimos utilizar uma pesquisa qualitativa nesse estudo, pois a partir dela conseguimos coletar dados (objetivos e subjetivos) e informações que não seriam possíveis apenas utilizando pesquisas bibliográficas, uma vez que ainda não existem autores escrevendo sobre o tema. A técnica escolhida para a elaboração da pesquisa qualitativa foi a técnica da entrevista semiestruturada que se utiliza da combinação de questões abertas e fechadas, dando a possibilidade ao entrevistado de discorrer mais sobre os temas ali apresentados. Apesar de o entrevistador ter que seguir o roteiro previamente definido, a entrevista acaba fluindo em um contexto muito próximo ao de um diálogo informal, propiciando assim a coleta de dados subjetivos (como por exemplo, valores, opiniões e as atitudes) dos indivíduos entrevistados (BONI; QUARESMA, 2005, p. 72 e 75). A principal vantagem da entrevista semiestruturada e também da entrevista aberta é que "quase sempre produzem uma melhor amostra da população de interesse", além de fornecerem taxas de respostas muito mais abrangentes e muito mais altas se compararmos com os questionários pré-estabelecidos enviados por correio ou distribuídos pela internet (SELLTIZ, 1987 apud BONI; QUARESMA). Ainda segundo Boni e Quaresma "esses dois tipos de entrevistas possibilitam a correção de enganos dos informantes, enganos que muitas vezes não poderão ser corrigidos no caso da utilização do questionário escrito". As autoras destacam também: a flexibilidade na duração desses tipos de entrevistas, proporcionando ao entrevistador a possibilidade de aprofundar-se em determinados assuntos; o aumento das interações entre o entrevistado e entrevistador, favorecendo desta forma uma aproximação mais afetiva entre as partes e colaborando para que o entrevistador possa abordar assuntos mais delicados e/ou complexos. A existência dessa proximidade ou familiaridade social entre 12 entrevistado e entrevistador, segundo Bourdieu (1999 apud BONI; QUARESMA), ajuda as pessoas a ficarem mais à vontade e mais seguras para colaborar. As autoras então concluem que: Desse modo, estes tipos de entrevista colaboram muito na investigação dos aspectos afetivos e valorativos dos informantes que determinam significados pessoais de suas atitudes e comportamentos. As respostas espontâneas dos entrevistados e a maior liberdade que estes têm podem fazer surgir questões inesperadas ao entrevistador que poderão ser de grande utilidade em sua pesquisa. (Ibid. p. 75) Neste trabalho as entrevistas foram feitas on-line, por meio de comunicadores instantâneos (Skype e Google Hangouts) para que houvesse a observação do indivíduo no seu próprio meio. Entretanto, houve apenas uma exceção entre os entrevistados, que preferiu que a entrevista fosse feita presencialmente. Após a definição da técnica de entrevista, optamos por entrevistar de 10 a 12 pessoas para este trabalho. Esse número foi escolhido baseado na ideia de conseguir uma quantidade ampla o suficiente de entrevistados para que obtivéssemos diversidade nas respostas, e ao mesmo tempo que estivesse contida no tempo e tamanho disponíveis para este trabalho. O processo da pesquisa qualitativa envolveu três momentos básicos: inicialmente construímos um roteiro de entrevista que contivesse questões centrais do tema e os problemas que esse estudo busca responder. Em seguida fomos em busca de fontes que poderiam colaborar com as entrevistas. Finalmente, com todas as entrevistas realizadas, procuramos sistematizar as informações coletadas e consolidamos as conversas para que fizessem sentido. A seguir descreveremos as etapas da elaboração do roteiro de pesquisa desde a criação do questionário até as devidas modificações que foram feitas nele após a primeira entrevista realizada. 1.3.1 Elaboração do roteiro de pesquisa O roteiro de perguntas foi elaborado levando em consideração a discussão sobre visibilidade, mercado de trabalho e redes sociais digitais conforme explicado anteriormente ao apresentar os problemas centrais desse estudo. Dado que o trabalho tem como caráter principal analisar as características presentes no método de R&S no contexto digital e não tendo a área de recursos humanos como seu principal objetivo, preocupamo-nos primeiramente em saber do entrevistado se ele utilizava alguma ferramenta ou rede social virtual e para isso iniciávamos a entrevista pedindo que os entrevistados descrevessem o 13 processo de R&S que ocorre nas empresas em que trabalham. Diante das informações anunciadas, verificávamos se a descrição passada continha algum dado que caracterizasse o uso de alguma ferramenta digital para então prosseguir com as demais questões. No caso em que nenhuma ferramenta ou rede digital fosse citada, perguntaríamos o porquê de não as utilizarem. A seguir apresentaremos as questões da entrevista semiestruturada aplicada com os profissionais de R&S, bem como comentários explicando o motivo de a pergunta estar no roteiro. Questões aplicadas nas entrevistas A. A empresa divulga as vagas disponíveis na web? Se sim, onde elas são divulgadas e como é o controle das mesmas, caso alguma posição já tenha sido ocupada ou simplesmente encerrada? B. Quais ferramentas você usa? Caso não mencione o LinkedIn, perguntar se usa. Caso o LinkedIn seja mencionado, perguntar: 1) Com relação às demais, você poderia compará-las? 2) Esta estrutura do LinkedIn tem lhe atendido? Se não, por que não tem atendido? C. Descreva como é o seu dia-a-dia com o uso dessas ferramentas? Conte a sua experiência ao utilizá-las. D. Do seu ponto de vista, você poderia qualificar se a utilização dessas ferramentas melhorou ou piorou o seu processo pela busca por profissionais (desde que você começou a trabalhar)? O que lhe ajuda, o que lhe atrapalha? Como você tem usado as ferramentas para selecionar os candidatos? Com que critérios você tem utilizado? (extremamente importante no processo, parcialmente, muito confiável, etc.) E. Você tem incorporado essas informações de perfil/currículo digital aos seus processos seletivos? Como que você faz? F. A visibilidade sobre os candidatos que as ferramentas lhe proporcionam é suficiente para a tomada de decisão, para o conhecimento das competências da pessoa? G. O fato de a pessoa não ter perfis nas redes sociais, sejam elas profissionais ou não, interfere na sua percepção daquele candidato? H. Utilizando outras redes sociais: 14 1. Você costuma procurar o perfil do usuário em outras redes (ou mecanismos de busca)? Se sim, quais são estas redes? 2. O que pretende buscar sobre o candidato? 3. As informações (sejam textos, fotos, vídeos e compartilhamentos) encontradas nesses outros perfis interferem na sua seleção? Tem algum caso para relatar, tendo ajudado o candidato a se destacar ou mesmo a ser eliminado do processo? 4. Que tipo de informação você encontrou e que é passível de desconsideração do candidato? (postar informações e/ou fotos provocativas, falou mal do ex-empregador, comentários discriminatórios, mentiu sobre qualificações, etc.) 5. O quão profunda (para trás - 1 ano atrás, 3 anos atrás, procura o perfil no Orkut) é essa pesquisa de informações em outras redes? I. O que você analisa nas redes sociais (seja ela profissional ou não) até então citadas (informações contidas, veracidade dos dados, imagens, conteúdo postado, indicações, etc.)? A primeira questão foi incluída no roteiro devido ao estudo elaborado pelas pesquisadoras Gomes, Scherer e Löbler (2012), que procuravam analisar o uso das redes sociais digitais no processo de R&S. Neste estudo, dentre destacar as vantagens e desvantagens dos usos de redes sociais digitais no processo, foi abordado um aspecto interessante no que se refere à abrangência das informações fornecidas também por parte da empresa e como tais informações podem suscitar opiniões ou comentários ruins, contribuindo assim para negativar a imagem da organização. Foi então, a partir de um trecho da fala de um dos gestores entrevistados por elas (p. 9-10), sobre como a disseminação das vagas pela web, sua falta de controle após o fechamento das mesmas e a possibilidade da imagem da organização ser denegrida, que decidimos também abordar este assunto no nosso roteiro, olhando também sob o recorte da visibilidade da empresa e não somente do candidato. Na questão B, pedimos que os entrevistados relacionassem as ferramentas que normalmente utilizam e também os incitamos para descobrir se eles fazem uso do LinkedIn (ferramenta que talvez seja hoje a única e mais utilizada rede social virtual voltada para a área profissional) e se sua estrutura atende suas necessidades no momento de buscar ou entrar em contato com o candidato. A questão C foi inserida na entrevista com intuito exploratório, para 15 que os entrevistados nos contem mais a fundo sua convivência com as ferramentas enunciadas por eles. Já a questão D fica sendo complementar à C, pois é nela que os entrevistados têm a oportunidade de descrever como essas ferramentas tem colaborado ou não com seu trabalho, desde que suas carreiras iniciaram, e como elas têm evoluído desde então. A questão E tem como propósito elucidar se os dados encontrados sobre os candidatos, seja em websites de banco de currículos, redes sociais profissionais ou até mesmo em perfis em outras redes, têm sido incorporados nos processos adotados pelos entrevistados. A partir da questão F até o final do roteiro, as perguntas referem-se à visibilidade dos candidatos disponibilizados na rede e é o ponto principal desta pesquisa qualitativa. Nelas procuramos enunciar diversos tópicos como: se os dados encontrados são suficientes para a escolha do candidato; se os dados interferem no processo; e se o fato de o profissional não estar presente no meio digital interfere na percepção do recrutador. E é na penúltima questão que procuramos saber dos entrevistados se eles buscam os perfis dos candidatos prospectados em outras redes (se sim, quais são as redes), o que eles pretendem buscar, quanto tempo para trás eles buscam as informações e até quais informações encontradas são passíveis de desconsideração do candidato. Tendo essas questões base em mãos, em um primeiro momento foram procurados profissionais por contato pessoal para que fosse verificado com os mesmos se o roteiro estava compreensível, e também para identificar se não foi elaborada nenhuma pergunta absurda, ambígua, deslocada ou tendenciosa. Posteriormente a essa primeira entrevista, foram revistas as descrições de algumas perguntas e também foi formulado um novo sub tópico na questão H, pois foi ainda nessa primeira conversa que houve um relato sobre certa vez o entrevistado ter encontrado uma informação sobre um candidato que acabou proporcionando destaque no momento da seleção, mostrando dessa maneira que a internet e a visibilidade podem trazer também informações que colaborem no momento da seleção. Para finalizar o roteiro, acrescentamos a questão I tendo como base os resultados obtidos em uma pesquisa realizada pelo site americano de recrutamento CareerBuilder, que elencou as razões mais comuns de desconsideração do candidato. O propósito ao incluir essa pergunta foi descobrir se os recrutadores relacionam os mesmos itens da versão americana ou se para eles existem outros pontos a serem levados em consideração. Após a realização dessas duas modificações, decidimos prosseguir com as entrevistas seguintes. 16 1.3.2 Como foi Recrutar e Selecionar os profissionais para a pesquisa? O processo de encontrar os profissionais que trabalhassem no seguimento de Recrutamento e Seleção (R&S) e que estavam dispostos a participar da pesquisa teve início a partir das próprias redes sociais digitais, sendo elas profissionais ou mesmo apenas com o propósito de relacionamento entre indivíduos. Primeiramente, foram contatados profissionais por aproximação pessoal que trabalham nesta área (Situação 1); passando para o contato com outros conhecidos que poderiam indicar pessoas responsáveis pelo setor de R&S das respectivas empresas em que eles trabalham (Situação 2); e por último, foi iniciada uma busca por profissionais no LinkedIn, essa uma rede social profissional, baseada na "rede de conexões" pessoal (Situação 3). De acordo com cada situação, abordamos os conhecidos e profissionais da área com um texto explicativo e padrão, mas que fora personalizado com os nomes e informações caso a caso. De maneira genérica, todos os textos explicavam o motivo do contato, o seu propósito e o pedido para sua participação. Entramos em contato com vinte profissionais durante o período de 9 a 25 de junho de 2014 e obtivemos treze retornos aceitando participar das entrevistas, no entanto, conseguimos apenas entrevistar de fato nove profissionais de R&S. Descreveremos a seguir os processos utilizados para conseguir os contatos dos profissionais, bem como a abordagem realizada em cada um dos casos: na Situação 1 (profissional de R&S conhecido pelo autor) tivemos uma abordagem mais informal e feita diretamente pelo recurso de mensagens do site de relacionamento Facebook. A partir desta conversa foi introduzido o motivo do contato e a explicação de porquê seria necessária a colaboração. E após a aceitação, foram coletados os endereços de e-mail e usuário do Skype para posterior entrevista; na Situação 2 (conhecido que pudesse indicar um profissional de R&S que trabalhe na mesma empresa que ele) foi realizada também uma abordagem mais informal, assim como descrita na Situação 1 e a partir desta conversa foi introduzido o motivo do contato, a explicação de porquê seria necessária a colaboração do profissional e a solicitação de pelo menos um contato responsável por R&S na empresa que o conhecido trabalha. No decorrer da aceitação dos contatos, foram sendo enviados os endereços de e-mail dos profissionais de R&S utilizando o mesmo recurso de mensagens do Facebook. Assim que os e-mails foram recebidos, iniciamos o contato com cada um dos profissionais de R&S e foi explicado quem havia lhe recomendado bem como o motivo. Após a aceitação dos mesmos, coletamos os dados de contato de cada um para a posterior entrevista; na Situação 3 (profissional de R&S que faça parte da "rede de conexões" do autor no LinkedIn - seja ele 17 conhecido pessoalmente ou não pelo autor) foi realizada uma abordagem mais formal através do sistema de mensagens fornecido pelo website LinkedIn. Foram elaborados textos distintos para o envio caso aquele profissional fosse ou não conhecido pessoalmente pelo autor. A maioria dos retornos foram realizados também por meio do mesmo sistema de mensagens do LinkedIn e após a aceitação, também coletamos os dados de contato de cada um dos profissionais para a posterior entrevista. Os profissionais de recursos humanos responsáveis pelo setor de R&S entrevistados das nove organizações representam os segmentos de negócio de tecnologia da informação, varejo, internet (serviços), internet, seguros e o último que é lazer, viagens e turismo. Foram escolhidas empresas com portes variados (distinguidos a partir do número total de funcionários) e data de criação abrangendo diferentes épocas. Apesar de todas as organizações aqui representadas por seus profissionais de R&S possuírem algum vínculo com o meio digital, vale salientar que esse estudo torna-se representativo para as empresas desse setor, podendo não representar os mesmos pontos de vista e características caso fosse aplicado em outras áreas de atuação de negócios. Após a obtenção dos recrutadores interessados em participar deste estudo, marcamos as entrevistas e na introdução da conversa, avisamos aos participantes que a mesma seria gravada para posterior análise, e que caso quisessem que a sua identidade, da empresa e as informações providas fossem mantidas em sigilo, que poderíamos, sim, proceder desta forma. Os motivos principais apresentados pelas fontes ao requererem o sigilo foram: necessidade de aprovação por instâncias superiores, necessidades contratuais para não divulgação dos dados / processos da empresa e sigilo de concorrência. Como a maioria dos entrevistados sentiu-se mais à vontade caso o sigilo fosse mantido, ficou definido então manter um padrão na categorização de cada um dos entrevistados a partir do ramo de atuação das organizações. Portanto, temos as seguintes definições dos entrevistados que utilizaremos no desenrolar deste estudo: 1) Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação (TI); 2) Entrevistado de empresa de varejo; 3) Entrevistado de classificados on-line gratuitos; 4) Entrevistado de agência de viagens on-line; 5) Entrevistado de site de carreiras; 6) Entrevistado de empresa do setor de internet; 7) Entrevistado de seguradora; 8) Entrevistado de aplicativo de táxi; 9) Entrevistado de empresa de programa de milhagem. 18 2. O HISTÓRICO E O DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO E DOS RECURSOS HUMANOS Historicamente, o mundo e a humanidade sempre passaram por constantes mudanças, entretanto, atualmente podemos perceber que as mudanças estão ocorrendo com maior rapidez e intensidade. Diversos fatores estão colaborando para que hajam mudanças sociais, culturais, legais, tecnológicas, econômicas, políticas, demográficas e ecológicas e, para Chiavenato (2004), essas mudanças "atuam de maneira conjugada e sistêmica, em um campo dinâmico de forças que produz resultados inimagináveis, trazendo imprevisibilidade e incerteza para organizações" (p. 2). Apesar do objetivo principal desse trabalho não ser um estudo aprofundado no tema de Recursos Humanos (RH), identificamos a necessidade de contextualizar o tema e o desenvolvimento histórico do RH, para que possamos compreender como que esse setor das empresas foi se desenvolvendo e ganhando cada vez mais destaque e importância, principalmente no que diz respeito ao processo de recrutamento e seleção de pessoas e os seus respectivos valores dentro de uma empresa. Dentro do contexto das mudanças, Chiavenato (2004) considera a área de RH como uma das áreas que mais vêm sofrendo mudanças, tanto é que até sua denominação vem ganhando novos termos como gestão de talentos humanos, gestão do capital humano, gestão de parceiros ou colaboradores, administração do capital humano e até gestão de pessoas. A história do desenvolvimento do RH será um recorte do que aconteceu ao longo do século XX, pois apesar de ser o mesmo recorte utilizado pelos autores consultados, é também nesse período que identificamos mudanças significativas nos modelos de negócios e a criação de organizações mais complexas, que por sua vez demandaram a consolidação de uma área para fazer a gestão de seus funcionários. Segundo Tonelli, Lacombe e Caldas (2002) a área de gestão de pessoas não é uma área que foi evoluindo com o tempo, mas sim foi se adaptando às condições dos contextos vivenciados que a cercava e, portanto, vai contra as explicações de alguns autores que simplificam os fatores que propiciaram o surgimento da função de recursos humanos. Os autores (Ibidem, p. 59-60) defendem que a área de RH não emergiu da "descoberta" dos seres humanos que trabalhavam nas organizações, porque antes mesmo dessa ideia, já existiam autores e práticos organizacionais que vivenciavam elementos do RH até antes da função ter se estruturado nas organizações. Os autores salientam também que a gestão organizacional 19 não se transpôs da mecanicista para a humanista1 com o despontar das funções e práticas de RH, porque para eles, até nas organizações atuais presenciamos essa contraposição dessas duas vertentes teóricas que continuam em processo de evolução com o passar dos anos. E, por último, os autores ressaltam a importância de entender que a criação das práticas e funções de RH não surgiram a partir de um evento ou experiência particular, mas sim "eles só puderam ser popularizados em virtude do contexto histórico mais abrangente em que surgiram" (p. 60). Esses fatores contextuais que aconteceram no final do século XIX e princípio do século XX por eles mencionados, foram: o crescente desenvolvimento econômico e tecnológico, as experiências e pensamentos humanistas iniciados no final do século XIX até 1930, a exasperação das relações de trabalho e o reformismo decorrente para acalmar essas relações conturbadas, e por último, a evolução das ciências comportamentais. Foi no final do século XIX e nas duas décadas seguintes que ocorreu um rápido desenvolvimento econômico nos países mais industrializados do hemisfério norte. Esse enorme progresso econômico aconteceu juntamente com o desenvolvimento da tecnologia produtiva, a partir das máquinas a vapor que foram aplicadas para diversos tipos de manufatura. Essas manufaturas, que antes tinham um processo de fabricação manual e com pouca escala, passaram por uma mecanização dos processos de fabricação dando origem à indústria seriada que, devido à sua sofisticação, demandava dos trabalhadores habilidades variadas. A seleção de trabalhadores, que antes era realizada diariamente por um capataz que escolhia visualmente e subjetivamente quem iria trabalhar, a partir das pessoas que formavam fila em frente às fábricas, passou a ser realizada de acordo com a seleção científica taylorista2, pois a sofisticação industrial tornou elevado o custo da rotatividade de pessoal e, consequentemente, iniciou-se a preocupação em manter e treinar os trabalhadores adequados e cuidadosamente selecionados. Portanto, a humanização do trabalho aconteceu não devido ao espírito humanista, mas sim devido à necessidade de atrair e manter pessoas qualificadas em 1 O conceito de humanismo nesse trabalho será conceituado como um conjunto de ideias e princípios que valorizam as ações humanas e os valores morais. Enquanto a gestão organizacional mecanicista preocupava-se apenas em treinar os indivíduos para executar tarefas específicas pré-estabelecidas, dando maior importância ao valor material, a gestão humanista procurava desenvolver o intelectual e a capacidade das pessoas, sendo seus funcionários os bens de maior valor dentro da empresa. 2 O modelo taylorista é caracterizado pela ênfase nas tarefas com a meta de aumentar a eficiência operacional por meio da racionalização do trabalho, ou seja, Taylor propõe que a administração de uma empresa deve ser tida como uma ciência. Para que essa eficiência no trabalho ocorresse, era necessário que os funcionários fossem devidamente selecionados e treinados para as funções que fossem desenvolver. 20 um mercado que estava se tornando cada vez mais competitivo e diversificado de produtos e de tecnologia. Ainda no mesmo período do final do século XIX e início do XX, houve o aparecimento e difusão dos valores humanistas especificamente relacionados ao trabalho. Os ideais socialistas foram propulsores de movimentos de reforma social, principalmente dentro das organizações produtivas. Esses ideais juntamente com as ideias dos governantes e pensadores da época proporcionaram o repúdio às precárias condições de trabalho encontradas das fábricas e oficinas e espalharam-se rapidamente no início da industrialização de massa. Com o crescimento do mercado e o emprego da tecnologia na indústria, as indústrias foram ficando maiores e o trabalho mais complexo. A supervisão direta (um a um) antes existente nas fábricas e oficinas já não era mais eficiente diante dessa rápida expansão e um número de trabalhadores cada vez maior. Com isso as relações de trabalho passaram a ser mais difíceis e conflituosas, os sindicatos ganharam força e as greves começaram a acontecer. Diante desse cenário, surgiram reformistas preocupados em modificar as condições de trabalho e as formas de gestão até então utilizados, para evitar a ameaça constante de revolta dos trabalhadores perante os ideias socialistas. Foi a partir desse contexto que foram introduzidos os primeiros departamentos de pessoal para serem defensores dos trabalhadores dentro das empresas. Mais uma vez os autores (Ibidem, p. 62) ressaltam a ausência de altruísmo dos empresários para a introdução do humanismo nas organizações. Por último, a evolução das ciências comportamentais é apontada por alguns autores, segundo Tonelli, Lacombe e Caldas, como uma característica histórica fundamental para a introdução da abordagem humanista. Ainda de acordo com os autores, o crescente interesse pelas ciências sociais aconteceu nas décadas de 1920 e 1930 e "seria a manifestação de um processo mais amplo, que procurava valorizar os seres humanos e as relações sociais, a despeito do cientificismo e do materialismo tecnológico vigentes". Para possibilitar a convivência em sociedade, esse movimento acreditava que era necessário compreender as necessidades sociais, psicológicas e materiais das pessoas, além de zelar pelo contato entre elas (Ibidem, p. 63). Assim sendo, Tonelli, Lacombe e Caldas acreditam que a administração de recursos humanos originou-se a partir de quatro vetores básicos: o desenvolvimento do capital e da industrialização, da organização do trabalho, da teoria organizacional e das configurações organizacionais, constituídas de formas distintas no decorrer desses quatro momentos. Da 21 mesma maneira que os autores, descreveremos esses momentos separados em períodos que compreendem: o final do século XIX e a I Guerra Mundial, o período entre as guerras mundiais, o período do pós-guerra até a década de 1980 e o último período que abrange a década de 1990 até o presente momento. Essas descrições contextualizarão as transformações que estavam acontecendo no mundo e também no Brasil nos períodos em questão. 2.1 O FINAL DO SÉCULO XIX E A I GUERRA MUNDIAL Foi nesse período que a economia teve um rápido aceleramento devido à Revolução Industrial e o denominado "recursos humanos" foi surgindo. Como dissemos anteriormente, o capataz das fábricas e oficinas foi a figura que representava o princípio da gestão de recursos humanos, responsável pelas contratações, demissões, supervisões e o pagamento dos trabalhadores. Com o advento da instauração da indústria, houve uma reorganização social e econômica constituída a partir das indústrias têxteis, e ao mesmo tempo ocorreram também debates que criticavam o novo modelo econômico-industrial que vinha se tornando hegemônico. A partir da consolidação do modelo da Revolução Industrial, começaram a ficar ainda mais evidentes os descontentamentos dos trabalhadores com as condições de trabalho. Para Tonelli, Lacombe e Caldas (2002, p. 64) a Revolução Industrial possibilitou o surgimento de aspectos3 que interviram na administração dos recursos humanos. Nessa época também surgiram as primeiras leis regulamentadoras do trabalho, que estipulavam os dias de trabalho e a carga horária, as condições de segurança e o trabalho infantil. Foi na década de 1910 que o taylorismo, e a gestão de controle burocrático, começou a assumir destaque e consolidou-se na esfera dos negócios. No Brasil, entretanto, as condições de trabalho ainda eram muito rudimentares, o processo de industrialização incipiente, a economia baseada principalmente na produção agrícola e as relações de trabalho mantidas ainda sob o modelo escravocrata. Apesar dessa desigualdade entre o Brasil e os países industrializados, nessa época ainda não havia nenhuma atenção especial para a gestão de recursos humanos. 3 A formação das cidades e a consequente mão de obra em excesso contribuíram para que ocorresse o descarte das pessoas nas indústrias. 22 2.2 O PERÍODO ENTRE A I GUERRA MUNDIAL E A II GUERRA MUNDIAL O período entre guerras marca a preocupação das organizações com a gestão das pessoas dentro de uma organização. Para isso as organizações passaram a tratar de modo distinto os recursos humanos dos demais tipos de recursos (financeiros, materiais, etc.) e a estruturação passou a ser realizada a partir da criação do Departamento de Pessoal (DP), baseada nas ideias tayloristas de seleção científica de pessoal. Foi a partir da década de 1930, com a publicação dos experimentos de Hawthorne, que o DP passou a abordar também questões mais complexas que envolviam as "relações humanas" (SCHULTZ; SCHULTZ, 1994 apud TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2002, p. 66)4. A disseminação da "Escola de Relações Humanas" citada por Tonelli, Lacombe e Caldas foi essencial para os recursos humanos por dois motivos: em primeiro lugar porque estimulou as organizações a perceberem a necessidade de atenção para a gestão de pessoas de forma distinta à gestão dos demais recursos, aumentando assim a estruturação do DP nas empresas e regulando as relações entre as organizações e seus funcionários; e em segundo lugar, porque essas mudanças fomentaram um processo denominado pelos autores como "enriquecimento de tarefa" tanto por parte da função do DP quanto por parte do gestor de pessoal, que deveria motivar e liderar seus funcionários. O Estado passou a propor regulamentos e leis para regrar as relações capital-trabalho, tornando-se desta maneira um mediador dessas ações. Nessa época, houve além do crescimento das legislações das atividades de trabalho, um crescimento também das sindicalizações e das práticas burocráticas de controle de pessoal. No Brasil um fator que agilizou o processo de industrialização em algumas regiões (eixo Rio de Janeiro - São Paulo) foi a crise do café provocada pela depressão de 1929 nos Estados Unidos. Ainda nessa época, o estágio de estruturação das relações de trabalho ainda reproduzia as relações e o modelo encontrados na economia agrícola fundamentalmente paternalista e escravocrata. Mesmo já existindo algumas funções do processo de recursos humanos que hoje conhecemos, como o recrutamento e a remuneração, as condições de trabalho ainda eram precárias, a remuneração era baixa e os treinamentos e gestão de pessoas 4 SCHULTZ, D. D.; SCHULTZ, S. E.. História da psicologia moderna. 6. ed. São Paulo: Cultrix, 1994. 23 quase não existiam. Entretanto, foi nessa época que a necessidade de se ter mão de obra mais especializada começou a ser identificada. O rápido crescimento das indústrias no período entre guerras no Brasil trouxe mudanças nas condições de trabalho e na gestão de pessoas. Apesar da conduta ainda burocrática e limitada, o DP passou a ser o setor responsável pelas atividades de recrutamento, seleção, remuneração e demissão, além de ficar à frente das responsabilidades legais exigidas pela legislação. Assim sendo, Tonelli, Lacombe e Caldas afirmam que a área de RH não foi valorizada nas organizações brasileiras desse período, deixando "profundas marcas no arquétipo brasileiro da figura do DP legalista, secundário e pouco contributivo na estruturação e melhoria da gestão de pessoas em nossas organizações (2002, p. 69). 2.3 O PERÍODO DO PÓS-GUERRA ATÉ A DÉCADA DE 1980 Para Tonelli, Lacombe e Caldas (2002), foi nesse extenso período que aconteceram diversos avanços na gestão de pessoas, no qual o clássico DP teve seu nome e atividades alterados. Já nos anos 1980, grande parte das empresas já fazia uso do nome Departamento de Recursos Humanos e a área estendeu suas atividades desenvolvidas para abranger também o treinamento, o desenvolvimento e a avaliação de desempenho dos funcionários, além de manter as atividades típicas que já eram aplicadas até então como: recrutamento, seleção, remuneração e demissão. Essas novas atividades, que passaram a ser de responsabilidade do Departamento de Recursos Humanos, começaram a ganhar destaque, pois as tarefas começaram a ficar mais complexas e o custo para substituição de funcionários ficou mais caro, colaborando, desta forma, para que houvesse a retenção das pessoas nas empresas. Tonelli, Lacombe e Caldas enfatizam que esse segundo motivo foi na época o grande incentivador para que a área de recursos humanos nas empresas ganhasse importância e propósito, ou seja, os fatores sociais e econômicos do período ajudaram a esclarecer o surgimento dessa área, tornando suas atividades mais importantes se compararmos com o período anterior. O autor Hobsbawn5 (1996, apud TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2002, p. 70) descreveu essa época como a "Era de Ouro" devido à caracterização de um enorme crescimento econômico na maioria dos países, proporcionado pela revolução tecnológica, que 5 HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos - o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Scharcz, 1996. 24 acabou também modificando os padrões de vida das pessoas ricas e pobres e intensificou os investimentos de capital em pesquisa e desenvolvimento. Diante desse contexto de produção e consumo em massa, as organizações começaram uma internacionalização, em consequência à implantação de filiais em outros países. Essa expansão das organizações as deixou mais complexas, estruturalmente falando, fazendo com que a profissionalização da administração de pessoas passasse a ser imprescindível. É nesse período que Tonelli, Lacombe e Caldas (2002, p. 70) acreditam que "as políticas de gestão de pessoas tomam como base o coletivo dos trabalhadores e se tornam sistematizadas." Os métodos de recrutamento e seleção passam a ser baseados em testes e procedimentos formalizados, começam a ser criadas políticas salariais estruturadas em cima das descrições de cargos, que descrevem os deveres e responsabilidades de cada indivíduo, e o regime de meritocracia foi implantado e especificado a partir do desempenho da pessoa, sendo a meta pessoal ou coletiva. As estruturas hierarquizadas tornaram-se predominantes e os treinamentos direcionados para que acontecessem as movimentações necessárias entre os cargos. É a partir da década de 1950 que o comportamental do ser humano começa a ser levado em consideração, pois supunha-se que manter os funcionários motivados e satisfeitos trariam como retorno uma maior produtividade e eficiência. Essa característica comportamentalista foi inserida no contexto porque era preciso saber o que faria as pessoas trabalharem e também porque acreditava-se que era responsabilidade do líder ou do gerente fazer com que esse trabalho acontecesse. A ideia de que uma pessoa já nascia sendo um líder nato mudou a partir de estudos feitos sobre liderança, nos quais acreditava-se que os líderes podiam ser formados dentro das empresas a partir de treinamentos. Os setores de RH, por sua vez, tiveram que mudar seu foco para o treinamento e desenvolvimento de "gestores mais atentos ao 'lado humano da empresa'" (TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2002, p. 71). Já na década de 1960, o modelo fordista começa a apresentar indícios de problemas e os pensadores e teóricos introduzem o conceito de modelos mais "orgânicos" e com "flexibilização organizacional" em substituição ao modelo fordista/taylorista6 (HARVEY, 1992 apud TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2002, p. 71). Esse contexto de transformação e flexibilização produtiva evidencia a necessidade de se buscar, na realidade, políticas e práticas de gestão de pessoas diferentes daquelas até então vigentes, o que leva ao desenvolvimento de uma área de recursos humanos voltada para a retenção de pessoas cada vez mais capacitadas para 6 HARVEY, D.. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Loyola, 1992. 25 trabalhar em ambientes de incerteza e de tecnologias sofisticadas. (TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2002, p. 72) Nas décadas de 1960 e 1970, verificou-se uma tendência à mudanças devido às incertezas econômicas e políticas e a proliferação de princípios de gestão de organizações, principalmente no que se trata à área de gestão de pessoas dentro delas. Tonelli, Lacombe e Caldas referem-se ao autor Famularo7 (1972 apud TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2002, p. 73) e ao conceito de que foi nesse período que a área de gestão de pessoas deveria se preocupar também com os fatores comportamentais (como encorajamento à criatividade, cooperação entre as pessoas, atenção à qualidade e desencorajamento de outros comportamentos como falta de cooperação, negligência e diminuição do ritmo de trabalho) e não somente com a contratação e preservação de pessoas qualificadas. A formação de estruturas organizacionais mais reduzidas e planas, ocorrida nos anos 1980 devido às formas mais flexíveis de organizar o trabalho e os processos de reestruturação organizacional, ocasionou a supressão de empregos e trouxe desafios para a área de gestão de pessoas, confirmando ainda mais sua caraterística de ser uma área de apoio nas empresas. No Brasil, a fase entre 1945 e 1964 foi marcada pela vinda das indústrias multinacionais, pelo crescimento de obras de infraestrutura e intensificação da urbanização, crescimento de estatais e o grande número de empresas privadas nacionais. Essas empresas nacionais absorveram um bom número de trabalhadores sem qualificação, normalmente advindos do meio rural, para trabalhar nas indústrias. Os padrões de gestão norte-americanos de industrialização, baseados no modelo fordista/taylorista, foram rapidamente incorporados a essas indústrias e o Departamento de Pessoal tinha apenas um papel burocrático, no qual era o responsável pelo cumprimento da legislação trabalhista, sendo incipiente ou informal a prática de outras atividades relacionadas ao RH. Segundo Fleury e Fisher8 (1992, p. 111 apud TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2002, p. 74) "Este modelo pautou a estruturação das áreas de Recursos Humanos e o desenvolvimento das práticas e instrumentos gerenciais na maioria das grandes empresas brasileiras, até os dias atuais". Ao longo do período do regime militar até cerca de 1979, o Estado ficava atento aos movimentos sindicalistas e aos candidatos que pudessem representar alguma ameaça caso exercessem uma liderança muito forte. Vários deles foram impedidos de assumir seus postos. 7 FAMULARO, Joseph J. Handbook of modern personnel administration. New York: Mcgraw-hill, 1972. FLEURY, M. T., FISHER, R.M. Relações de Trabalho e Políticas de Gestão – uma História das Questões Atuais. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 16º, 1992, Canela. Anais...v.8, p.106-120. Canela: Anpad, 1992. 8 26 A criação do FGTS pelo Estado, que possibilitava a demissão e a abundância de mão de obra, apenas estimulou os empresários a firmar políticas de baixos salários e de colaborar com a alta rotatividade de funcionários nas empresas. Foi dado algum destaque para a formação das funções gerenciais que já existiam nos outros países, entretanto o propósito era apenas para suprir a necessidade de se ter uma chefia competente para a mão de obra com pouca qualificação. Boa parte das funções de RH foram "terceirizadas para o Estado", pois é ele quem regulamenta as relações de capital-trabalho, limitando as organizações desta maneira a apenas cumprir os regulamentos determinados. De acordo com Tonelli, Lacombe e Caldas (2002, p. 76) "boa parte da herança do RH nacional, visto e confundido com DP, se deve às marcas deixadas por esse período nas empresas brasileiras". A indústria de manufatura e as importações de bens da indústria metalúrgica, elétrica e mecânica aumentam a partir do ano de 1968, entretanto essas mudanças tecnológicas e a inevitável competitividade nacional e internacional esbarram com uma gestão de recursos humanos bastante despreparada, pois a grande maioria ainda era mantida sob o modelo de gestão próximas ao fordismo/taylorismo. Com a crise do regime militar, os movimentos sindicalistas liderados pelos metalúrgicos do ABC paulista foram manifestando-se e aparentavam ter condições de transformar as características dos padrões de desenvolvimento econômicos que vigoravam até então. Para Tonelli, Lacombe e Caldas (2002, p. 77), até o final da década de 1970 a área de gestão de recursos humanos, na maioria das empresas brasileiras, ainda mantinha a forma de organizar as pessoas baseadas no modelo do Departamento de Pessoal que para os autores tratava-se de um formato bastante legalista, retrógrado e incipiente. 2.4 A DÉCADA DE 1990 ATÉ O PRESENTE MOMENTO Como vimos anteriormente, o período entre 1970 até o final da década de 1980 foi marcado por muitas mudanças significativas na área de RH, principalmente após as reestruturações dos anos 1980, época na qual ocorreram as supressões de cargos nas organizações. Foi nessa época que a área passou a ter o objetivo de auxiliar a alta administração e as gerências, no momento de atrair e reter profissionais que contenham as qualificações essenciais em um ambiente de constante mudança. Foi na década de 1990 que a área de gestão de recursos humanos passou a receber diversas denominações. A década de 1990 também vivenciou a intensificação das tecnologias informacionais no trabalho, a 27 internacionalização da economia, a maior distinção entre os países ricos e pobres, a flexibilização das relações de trabalho, o crescimento do individualismo, o aumento do consumo, e por último, a ênfase passou dos produtores para os consumidores. Mesmo que a década de 1990 tenha sido caracterizada pelo aumento do individualismo, Tonelli, Lacombe e Caldas acreditam que "nunca o indivíduo esteve tão preso aos modelos de conduta difundidos pelos ideais de consumo e pela mídia", pois ao mesmo tempo que as pessoas procuram expressar-se com mais subjetividade e criatividade dentro das organizações, elas sempre estão sob a ameaça dos processos de demissão (2002, p. 77-78). Esse comportamento indicado pelos autores apenas ratifica o ponto de vista de Thompson (2008) ao descrever como a visibilidade proporcionada pelas novas mídias vem afetando o indivíduo, seja em sua vida particular ou profissional9. O modelo taylorista vem cada vez mais perdendo espaço nas organizações do mundo pós-moderno e com a difusão do uso da internet, a partir da metade dos anos 1990, o fluxo e a troca de informações impulsionaram o aceleramento das mudanças em curso. Nesse contexto de transformações, a gestão de recursos humanos passa a ter como propósito o conceito de competência baseado no desempenho individual, e não mais no estabelecimento de políticas gerais que abrangiam todos na empresa. No Brasil, o Plano Real e a abertura econômica ocasionaram grandes mudanças e forçaram as empresas a reverem suas práticas administrativas e de gestão de recursos humanos, para que conseguissem condições mínimas de competitividade. Apesar da tentativa, muitas das organizações não conseguiram se adequar às mudanças e acabaram por serem adquiridas por empresas estrangeiras. Com a estabilidade econômica alcançada em meados dos anos 1990, as empresas foram obrigadas a "adotar políticas e práticas de recursos humanos voltadas à gestão de competências" (TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2002, p. 79) para que pudessem enfrentar uma maior concorrência no mercado. Apesar de terem ocorrido todas essas mudanças, Tonelli, Lacombe e Caldas (2002) acreditam que no Brasil ainda existe uma disparidade na estrutura e na abrangência das áreas de RH nas organizações, pois algumas continuam mantendo o modelo de DP, outras já ampliaram sua atuação e possuem departamentos de recursos humanos, e um grupo limitado de empresas já começaram a exercer "modelos com estrutura enxuta e papel estratégico e 9 A ideia será melhor desenvolvida no próximo capítulo. 28 consultivo" (p. 80). Mesmo com essa diversidade, os autores acreditam que a prática de RH no País ainda é "tipicamente retrógrada". *** Pudemos observar até aqui que historicamente o Brasil adotou por algumas vezes, mesmo que de forma retrógrada, os modelos de gestão de pessoal implantados nos Estados Unidos. A partir desses fatos históricos podemos sugerir que talvez exista a possibilidade de os setores de gestão de pessoal das organizações brasileiras adotarem também a preocupação dos norte-americanos em fazer uso das redes sociais digitais para investigar a vida dos potenciais candidatos às vagas. Esse comportamento citado e identificado a partir da pesquisa feita pelo site americano CareerBuilder e a discussão de como as novas tecnologias vêm afetando essa dinâmica profissional da área de gestão de recursos humanos são temas que trataremos mais detalhadamente nos capítulos seguintes. 29 3. AS INTERAÇÕES E AS RELAÇÕES, AS REDES SOCIAIS E A VISIBILIDADE DO INDIVÍDUO CONTEMPORÂNEO Após termos contextualizado o papel e a evolução do setor de Recursos Humanos no desenvolvimento histórico do homem moderno, identificamos a necessidade de compreender também como a humanidade foi progredindo no aspecto das interações e dos relacionamentos sociais conforme foram surgindo os primeiros agrupamentos de indivíduos (comunidades) e, então com o tempo, os grandes agrupamentos advindos da revolução industrial. Julgamos esse entendimento como necessário pois, é através desse histórico e dessas mudanças, que poderemos compreender os comportamentos hoje presenciados no ciberespaço. Iniciaremos essa seção apresentando os conceitos abordados por Thompson (2008) sobre os tipos de interações existentes e como a evolução tecnológica humana foi complementando os primeiros tipos de interação. Entretanto, a ênfase principal será na discussão sobre a visibilidade concebida a partir da exposição do indivíduo, bem como as prováveis consequências (benéficas ou maléficas) advindas. Em um segundo momento, abordaremos mais a fundo a evolução das relações sociais entre as pessoas, a sua transposição para os meios digitais e a concepção e presença do "eu" do indivíduo no ciberespaço. 3.1 A VISIBILIDADE E A REPUTAÇÃO DO INDIVÍDUO NO DIGITAL Um dos primeiros pontos que devem ser considerados ao introduzirmos essa seção do estudo são as definições básicas e dicionarizadas sobre o que é visível. Segundo o dicionário Michaelis10, visível é algo 1 Que pode ser visto; que se vê; perceptível. 2 Claro, evidente, manifesto, patente. 3 Aparente. Tomando como base essa definição clássica e literal da palavra, partimos para a análise das interações e maneiras de agir que passaram a estar efetivamente relacionadas com "a nova visibilidade" proposta por Thompson (2008) apresentadas com a mídia. O autor considera que, para entender esse conceito de "nova visibilidade", é necessário que entendamos "os caminhos pelos quais o avanço das mídias comunicacionais transformou a natureza da interação social" (p. 17). Ainda segundo ele, as mídias comunicacionais não se limitam à utilização dos equipamentos tecnológicos apenas 10 VISÍVEL. In: DICIONÁRIO Michaelis. Disponível em: <www.uol.com.br/michaelis>. Acesso em: 16 ago. 2014. 30 para o envio de informações de um indivíduo para outro mantendo a relação entre eles sem alterações, mas sim muito pelo contrário, Thompson acredita que essas novas mídias comunicacionais trazem consigo também novas formas de agir e interagir devido às suas particularidades inerentes. A princípio discorreremos sobre a definição da interação face a face, dado que ela é o tipo essencial de interação. É nesse tipo de interação que os indivíduos encontram-se presentes, de forma imediata, compartilhando um espaço comum (acontecendo essa interação num contexto de copresença) e gerando um fluxo comunicativo entre eles. A interação face a face tem como sua principal característica a pluralidade das referências simbólicas, sejam elas entonações, palavras completadas pelos gestos e as expressões faciais. Já o segundo tipo definida pelo autor são as interações mediadas. Elas são moldadas pelo seu contexto espaçotemporal distintos, ou seja, os emissores e os receptores geralmente não compartilham do mesmo espaço e nem sempre do mesmo tempo e podem ser ilustradas por conversas pelo telefone e ao escrever uma carta. O terceiro e último tipo de interação descrita por Thompson é justamente a estabelecida pelos jornais, revistas, rádios, filmes, vídeos e programas de televisão. Ela é explicada como sendo a "quase-interação mediada", onde também ocorre a distensão espaço-temporal, mas que possui duas características que a distingue das demais: a primeira delas é que as referências simbólicas são emitidas para um número indefinido de receptores; e a segunda é que o seu emissor não emite (e geralmente não recebe) uma resposta direta para seu receptor. Para o autor "ela cria um certo tipo de situação social em que os indivíduos se conectam num processo de comunicação e troca simbólica. Ela cria também diversos tipos de relacionamentos interpessoais, vínculos sociais e intimidade (o que chamo de «intimidade não-recíproca à distância»)." (p. 19) . A chegada das TIC’s trazem consigo uma enorme variedade de interações com características próprias. Claro que existem interações que assemelham-se muito com as já existentes, como é o caso do e-mail que Thompson toma como exemplo. Apesar de algumas interações serem semelhantes, "a compreensão temporal é muito maior e, ainda, as instituições mediadoras e as condições de uso (incluindo recursos culturais e materiais) são completamente diferentes" (Ibidem, p. 19). Se formos pensar nessas interações no perpassar da história, a troca de conteúdos simbólicos e informações ainda continuou sendo por meio da interação face a face, pois mesmo com a imprensa implementada no final da Idade Média e início da era moderna, grande parte da população ainda continuava sem acesso. Entretanto, quando surge a indústria gráfica na Europa (nos séculos XV e XVI) e alguns séculos depois começam a eclodir 31 inúmeros tipos de mídia eletrônica (isso já entre os séculos XIX e XX). As interações face a face passaram a ser complementadas por outros tipos de interação, crescendo progressivamente e proporcionando aos indivíduos a captação de um conhecimento denominado por Thompson como "conhecimento não-local", ou seja, a assimilação de informações e conteúdos simbólicos de fontes que não estejam presentes diretamente. Para o autor: "O desenvolvimento dos meios cria novos campos de ação e interação que envolvem diferentes formas de visualidade e nos quais as relações de poder podem alterar-se rapidamente, dramaticamente e tomando caminhos imprevisíveis." (Ibidem, p. 20) Como já explicado, visível é aquilo que pode ser visto e a visibilidade tem a ver com a potencialidade humana de conseguir enxergar algo que esteja em seu campo de visão, definidos por suas limitações espaciais (o local) e temporais (o presente). Com a prosperação da comunicação mediática, a visibilidade passa a ser liberta dessa limitação espaço-temporal antes existente, uma vez que o indivíduo não precisa estar presente fisicamente no mesmo local e momento para acompanhar um evento, ou seja, o campo de visão encontrado nessa nova forma de visibilidade é unidirecional, ou seja, o indivíduo pode ver (aqui entende-se "ver" também como a palavra falada e/ou escrita) e observar o outro que foi gravado e transmitido em locais distantes, no entanto, esse outro não consegue enxergar seus observadores. E foi com o advento dessas novas mídias comunicacionais que surgiram também novas formas de interação e a nova visibilidade (Ibidem, p. 20). Atualmente, todos nós estamos vivenciando esses novos formatos de interação e sujeitos a participarmos também da "nova visibilidade" mediada, diferentemente do passado em que apenas os líderes políticos tinham a oportunidade de estarem visíveis. Antes do surgimento da mídia impressa e dos outros tipos de mídia, até a visibilidade dos líderes políticos dependia da sua aparição física para os outros. Quando essas aparições ocorriam (alguns mandantes raramente foram vistos), elas restringiam-se apenas a um número limitado de pessoas, normalmente membros da corte, e dependiam das interações face a face num contexto de copresença. Contudo, após o incremento da imprensa e dos outros tipos de mídia, os líderes políticos passaram a ter uma visibilidade muito maior e desatrelaram-se da necessidade de sua aparição diante de um público. Eles passaram então a utilizar essas mídias para ajudar a construir imagens de si próprios para alcançar lugares mais distantes e assim tornando esses políticos mais visíveis para um número maior de pessoas que talvez não poderiam encontrá-los pessoalmente, desvinculando-se desta maneira da característica espaço-temporal (Ibidem, p. 21). 32 As mídias eletrônicas, como o rádio e a televisão, só intensificaram a visibilidade que surgiu com o advento da imprensa. Elas foram as responsáveis por compartilhar produtos mediáticos em larga escala e com alcance longínquo, com pouco ou nenhum atraso. Essas mudanças na visibilidade, propiciadas pelas mídias eletrônicas, interferiram muito nas vidas das pessoas e essa mesma visibilidade para Thompson foi caracterizada como "simultaneidade desespacializada", que ainda segundo ele, significa que "pessoas distantes poderiam fazer-se visíveis praticamente no mesmo instante; poderiam ser ouvidas no exato momento em que falavam [...] embora não compartilhassem a mesma esfera espacial com os indivíduos para quem se faziam visíveis" (Ibidem, p. 23). Para ele as mídias eletrônicas permitiram que as referências simbólicas, antes apenas presentes na interação face a face e na quase-interação mediada, fossem transpostas também para esse novo meio, entretanto, de formas drasticamente distintas. Com o desvencilhamento da copresença proporcionado pelas novas mídias, a nova visibilidade conforme sugere Thompson, passou a motivar uma "sociedade da auto-promoção" na qual tornou-se cada vez mais banal "que líderes políticos e outros indivíduos aparecessem diante de públicos distantes e desnudassem algum aspecto de si mesmos ou de sua vida pessoal" (Ibidem, p. 24). Essas visibilidades fomentadas pela mídia ficaram ainda mais expandidas e complexas a partir do surgimento da internet e de outras tecnologias devido ao fluxo de conteúdo gerado pelo crescente número de indivíduos que passaram então a ter acesso, a produzir e a disseminar esse conteúdo pelas redes comunicacionais. Com esse aumento no fluxo de conteúdo simbólico, as possibilidades de controlar passam a ficar muito mais complicadas para quem está no poder e deseja se certificar que o que está sendo distribuído aos indivíduos é o que de fato ele deseja. Ao mesmo tempo que a visibilidade mediada colaborou para a promoção da imagem e dos objetivos do indivíduo, ela também passou a ser usada como um meio para denúncias e manifestos contra, desmantelando as imagens bem idealizadas dos líderes políticos e de outras pessoas. Cada vez mais eles estão envolvidos num sistema de poder em que a visibilidade é uma forma de controle. Não são mais testemunhas de um espetáculo que acontece diante de si, mas objetos de olhares múltiplos e cruzados que, com o exercício da vigilância, dispensa a necessidade do espetáculo. [...] Essa nova visibilidade é muito diferente do tipo de espetáculo que Foucault identificou no mundo antigo ancién régime, pois a visibilidade mediada de indivíduos, ações e acontecimentos está agora separada da necessidade de compartilhar um domínio comum e desvinculada das condições e restrições da interação face-a-face. (THOMPSON, 2008, p. 26-27, grifo do autor) Devido a essa complexidade no controle dos conteúdos circulados nas novas mídias, a visibilidade por elas proporcionada acabou sendo o que Thompson nomeia de "dupla face", 33 ou seja, uma vez que algo torna-se visível para os demais, não existe mais o caminho da volta. Anteriormente os líderes políticos conseguiam controlar o que queriam que fosse exibido e para um número limitado de pessoas, mas hoje já não existe uma forma inibir essa proliferação dos conteúdos, que passaram a ser de origem descentralizada. Desta forma, Thompson (2008) acrescenta que "a visibilidade criada pela mídia pode se tornar a fonte de um novo tipo de «fragilidade»" (p. 28), deixando os indivíduos desta forma mais expostos aos riscos de terem suas imagens e declarações manipuladas, além de estarem mais suscetíveis a episódios de revelações, escândalos e vazamentos de informações. A possibilidade de gravações e transmissão de informações disponibilizadas aos indivíduos como consequência da evolução dos aparatos tecnológicos a partir do século XX, somente dificultou ainda mais o fato de alguém, seja ele figura pública ou não, querer acobertar seu comportamento privado. Thompson cita em seu artigo (Ibidem, p. 31) que alguns pesquisadores sugerem até que houve o "fim da privacidade" por causa dessas novas tecnologias, mas que para ele acaba sendo uma afirmação um pouco ousada. Para ele, estão acontecendo sim mudanças na privacidade devido às condições sociais providas pelas novas tecnologias, sendo elas meios poderosos para "bisbilhotar" a vida alheia. Os conteúdos que antes tinham o propósito privado, podem de uma hora para outra tornarem-se públicos, trazendo assim para o indivíduo situações de constrangimento, embaraços e até situações passíveis de incriminação, sendo praticamente impossíveis de prever suas consequências a partir do momento que essas divulgações e/ou aparições acontecem. Quando a imprensa foi criada, os alvos da visibilidade foram apenas os líderes políticos, mas com o passar das décadas e a criação e massificação dos meios de "quaseinteração mediada", outros indivíduos passaram a compor esse grupo alvo da nova visibilidade. A partir do firmamento da imprensa no século XV, com a familiarização da sociedade pela "intimidade não-recíproca à distância" e com o forte desenvolvimento da indústria cultural, a criação e o culto às celebridades foi potencializada e fazendo com que elas também fizessem parte desse grupo sempre observado e nem sempre visto na vida cotidiana. Esse fenômeno de culto às celebridades aumentou ainda mais com a presença das mídias comunicacionais digitais e a internet, entretanto hoje vivenciamos uma realidade diferenciada já que não mais somente os líderes políticos e celebridades são suscetíveis às complicações trazidas juntamente com a "nova visibilidade", mas sim qualquer indivíduo 34 esteja ele ativo ou não na rede mundial de computadores. Assim sendo, atualmente esse limite difuso entre o privado e o público é enfrentado por todos. Se fizermos um recorte na visibilidade midiática enfrentada pelo indivíduo em sua vida profissional, podemos perceber que hoje é extremamente importante que ele se faça visível seja nas redes sociais profissionais, pessoais ou simplesmente na internet, pois conforme os relatos dos profissionais de Recrutamento e Seleção (R&S) entrevistados para esse estudo, a internet passou a ser essencial e também a principal fonte utilizada por eles no momento de encontrar candidatos para as suas vagas. Os currículos que antes eram deixados pelos profissionais nas recepções dos prédios empresariais e setores de Recursos Humanos das organizações, atualmente quase não mais acontecem, exceto para vagas muito operacionais e que não implicam muita instrução por parte do candidato. A visibilidade midiática proporcionou a esses profissionais especializados em R&S um ambiente muito mais rico e variado para suas buscas como podemos confirmar no trecho da entrevista abaixo: Quando eu comecei não tinha nada disso na verdade e hoje melhorou muito. Antigamente as pessoas deixavam os currículos nas portas. Eu, por exemplo, trabalhei em agência de emprego no centro da cidade e ainda hoje existe o que a gente chamava de homens-sanduíche, que são pessoas que ficavam segurando plaquinhas com anúncios, ou então os anúncios ficavam colados nas portas das empresas com o perfil da vaga. Então assim, mudou muito e imagina você ter que fazer uma contratação no nível de coordenador, gerente de setor e/ou gerente geral dessa maneira? Não tem nem comparação! E então gradativamente os processos vão se utilizando da tecnologia existente e das ferramentas. (Entrevistado de seguradora) Por outro lado, essa visibilidade, assim como já aconteceu e continua acontecendo com os políticos, também pode trazer riscos para os potenciais candidatos à vaga caso o recrutador tenha a curiosidade de buscar algo sobre eles e encontre algo que não o agrade, é o que apontou uma pesquisa realizada pelo site americano CareerBuilder, no qual 51% dos empregadores dos Estados Unidos desistiram de contratar o candidato após verem conteúdos relacionados a ele na internet. Como pudemos relacionar nesse trecho do estudo, com o decorrer dos séculos as interações e a visibilidade foram ganhando outros formatos na sociedade e deixando de ser exclusividade apenas para algumas figuras públicas. Estamos vivendo em um tempo de alta visibilidade midiática, com uma quantidade de fluxos comunicacionais cada vez maior e no qual qualquer um pode tornar-se evidente nas mídias e cair em domínio público sem que haja controle sobre o que é visto e transmitido. 35 3.2 O PASSADO E O PRESENTE DAS RELAÇÕES SOCIAIS A sinergia entre a sociedade, a cultura e as novas tecnologias digitais vêm emergindo desde a metade dos anos 1970 (com o nascimento da microinformática). Juntamente com essa sinergia foi possível surgir a cibercultura, que para Lemos (2003) é consequência da evolução técnica. Segundo definição de Corrêa (2010), "a cibercultura pode ser entendida como uma agregação de conhecimentos de diferentes origens e ordens, buscando traduzir um ponto de inflexão marcante da sociedade contemporânea" reforçando o conceito da característica transdisciplinar. A cibercultura não pode ser compreendida sem levarmos em conta as perspectivas históricas e os vários desdobramentos sociais, econômicos e culturais da relação entre o homem e a técnica, pois sua origem aconteceu a partir da multiplicação da correlação da tecnologia e a modernidade (LEMOS, 2003). Com a evolução da tecnologia computacional (cada dia mais conectada e móvel) e sua massificação, pela primeira vez na história, muitos indivíduos podem emitir e receber informações em tempo real numa rede onipresente de conexões entre pessoas. É de conhecimento geral que a relação social é da natureza humana e a expansão das interações sociais já acontecia antes mesmo da chegada da internet, com o surgimento dos meios de transporte e de comunicação, como aponta McLuhan11 (1964 apud RECUERO, 2009, p. 135). Essas trocas comunicacionais mediadas que não dependem do cenário presencial dos indivíduos podem ser exemplificadas pelo surgimento das cartas, do telefone e de outros meios de comunicação mediados. Entretanto, a relação social realizada por intermédio da internet poderá ter diferenças se comparada com uma relação face a face, uma vez que ela não possui limitações contextuais de mediação, proporcionando desta forma, aspectos importantes como o relacionamento social entre pessoas mesmo que elas estejam distantes entre si e iniciando desta forma a desterritorialização dos laços sociais. Sendo assim, Lemos e Lévy afirmam que esses novos vínculos sociais virtuais são complementares aos antigos e contribuem para que as interações humanas aumentem ainda mais, podendo-se dizer "[...] que sobre o novo território virtual, as proximidades são semânticas e não mais necessariamente e unicamente geográficas ou institucionais"12 (2010, p. 104-105). 11 12 McLUHAN, M. Os Meios de Comunicação como Extensões do Homem. São Paulo: Cultrix, 1964. Grifo do autor 36 Para Recuero (2009), o surgimento da internet trouxe consigo mudanças para a sociedade e dentre elas a mais significativa "é a possibilidade de expressão e sociabilização através das ferramentas de comunicação mediadas pelo computador (CMC)" (p. 24). Nas interações sociais que acontecem no ciberespaço, por meio das ferramentas comunicacionais, tudo é mediado pelo computador e os atores das interações não necessariamente vêm a se conhecer. Segundo a autora, essa pluralidade de ferramentas que suporta as interações permite que a interação permaneça, até mesmo quando o ator está desconectado do ciberespaço, ocasionando assim o aparecimento de interações assíncronas (p. 32). Lemos acredita que essas tecnologias marcaram profundamente as maneiras de produção e de consumo da sociedade, bem como as formas de comunicação de normalização da vida social (2003, p. 113), mas apesar de todo o acréscimo nas relações sociais oportunizadas a partir do desenvolvimento das TIC’s e da digitalização, o professor Grenoble (apud CORRÊA, 2014, p. 222) afirma que o contexto contemporâneo da rede continua repercutindo apenas a evolução da sociedade, ou seja, um sociedade dedicada em transformações que influenciam não somente as práticas comunicacionais, como também a configuração da esfera pública. As primeiras formas de agregação eletrônica de pessoas no mundo apareceram na década de 1970 nos Estados Unidos e foram formadas a partir do momento que universidades, alunos e pesquisadores começaram a utilizar a internet para se comunicarem através de emails e listas de discussão. A partir de então, começam a aparecer as comunidades virtuais, ou seja, um local onde é possível realizar a troca de experiências profissionais e pessoais por meio de computadores ligados em rede. No entanto, Lemos baseado no debate sobre comunidades virtuais popularizado no livro Virtual Communities (1993) do jornalista americano Howard Rheingold13 (apud LEMOS; LÉVY, 2010, p. 103), utiliza-se da definição do jornalista de que a construção das comunidades virtuais apenas acontece se existirem interações entre seus participantes (em torno de valores e interesses compartilhados), uma vez que a tecnologia atua em segundo plano, de forma auxiliar. Não basta apenas colocar à disposição uma série de ferramentas; é necessário que haja interesses compartilhados, intimidade, perenidade nas relações. É isso que vai diferenciar uma comunidade mediada por computadores de uma simples agregação eletrônica. (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 103) 13 RHEINGOLD, Howard. The Virtual Community: Homesteading on the Eletronic Frontier. Cambridge, MA: MIT Press, 1993. 37 Tendo em vista essa definição, Lemos e Lévy afirmam que no ciberespaço existem as agregações eletrônicas comunitárias e as não comunitárias, sendo o primeiro tipo uma agregação "onde existe, por parte de seus membros, o sentimento expresso de uma afinidade subjetiva delimitada por um território simbólico, cujo compartilhamento de emoções e troca de experiências pessoais são fundamentais para a coesão do grupo". Já o segundo tipo de agregação não engloba qualquer tipo de envolvimento coeso e constante por parte dos seus participantes, sendo assim, passa a ser um espaço de encontro e compartilhamento de informações e experiências desterritorializado e momentâneo (2010, p. 103). Essas definições apresentadas por Lemos e Lévy nos faz confrontar com os tipos de ferramentas citadas pelos recrutadores entrevistados no momento de encontrarem e selecionarem candidatos para suas vagas. A partir dos resultados das entrevistas, pudemos destacar o uso do LinkedIn e dos websites de banco de dados de currículos. Ambos são ferramentas de comunicação pertencentes ao ciberespaço, entretanto, os websites de banco de dados de currículos podem ser encaixados na definição de agregação eletrônica não comunitária, enquanto o LinkedIn já nasceu com o propósito de ser um ambiente de troca de experiências e conhecimentos, ou seja, é uma agregação comunitária14. A internet, segundo Castells, passa a ser "[...] uma extensão da vida como ela é, em todas as suas dimensões e sob todas as suas modalidades", contrariando as alegações de que ela poderia alienar do mundo real os indivíduos que a usassem (2003, p. 100-101). Essa ideia de Castells pode ser complementada ainda por Mark Smith15, outro estudioso do assunto, quando firma que "o ciberespaço está mudando a física social da vida humana, ampliando os tamanhos e poderes da interação social" (1999, p. 195 apud RECUERO, 2009, p. 136). As relações encontradas na internet têm disposição para serem mais variadas, isto é, as interações entre os indivíduos espalham-se por diversas ferramentas de comunicação e as informações trocadas podem ser referentes à esfera pessoal, profissional e outros assuntos (GARTON; HAYTHORNTHWAITE; WELLMAN, 1997, apud RECUERO, 2009, p. 36)16. Os indivíduos engajados no ciberespaço, diante de tantas possibilidades de interação, diálogos e trocas, podem acabar expondo em campo público conteúdos relacionados à sua intimidade e 14 No capítulo seguinte entraremos mais detalhadamente sobre os usos do LinkedIn e o que o fez ser classificado como agregação virtual comunitária. 15 SMITH, M. Invisible Crowds in cyberspace: mapping the social structure of Usenet. In: KOLLOCK, P.; SMITH, M. A. Communities in Cyberspace. (orgs) (p.195- 219) London: Routledge, 1999. 16 GARTON, L.; HAYTHORNTHWAITE, C. e WELLMAN, B. Studying Online Social Networks. Journal of Computer Mediated Communication, n. 3, vol 1, 1997. Disponível em <http://www.ascusc.org/jcmc/vol3/issue1/garton.html> 38 identidade, antes considerados da ordem da esfera privada. Corrêa propõe uma discussão para que sejam repensadas as limitações habitualmente aceitas entre as esferas pública e privada, uma vez que as mídias sociais vêm impactando a esfera pública e "levando à configuração de um espaço híbrido, que flutua por entre as esferas pública e privada" (2014, p. 219). Esses mecanismos de sociabilização, segundo Corrêa, facilitam novas visibilidades e representações de seus usuários. Assim como Corrêa, Lemos e Lévy (2010, p. 106) complementam a compreensão da autora, pois para eles esses mecanismos de sociabilização ampliam as maneiras de relação entre as pessoas, modificando a esfera pública. São nesses mecanismos que os indivíduos expõem suas vidas e suas informações e, simultaneamente, relacionam-se com amigos ou outros indivíduos de mesmo interesse. O desenvolvimento das comunidades e redes sociais on-line é considerado por Lemos (2010) como um dos acontecimentos de maior importância dos últimos anos, pois para ele elas são as grandes responsáveis pela nova maneira de "fazer sociedade" (p. 101). Para Watts17 (2003, apud RECUERO, 2009, p. 79) as redes têm um caráter dinâmico e estão sempre em transformação, pois para ele não existem redes "paradas" já que as interações influenciam diretamente essas transformações. Segundo a definição de Wasserman e Faust (1994) e Degenne e Forse (1999) (apud. RECUERO, 2009, p. 25) as redes sociais são caracterizadas como um conjunto de dois elementos que são os atores (pessoas, instituições ou grupos) e suas conexões (interações ou laços sociais). Os atores dessas redes do ciberespaço estão sempre em um processo de construção e expressão da identidade, segundo as percepções de Döring, Lemos e Sibilia (apud RECUERO, 2009, p. 26). Esse processo de construção de identidade acontece para a maioria dos indivíduos como uma recriação de suas personalidades existentes no mundo offline (CASTELLS, 2003, p. 100), e marcam desta forma, a presença e a expressão do "eu" no ciberespaço, espaço este que é privado e, ao mesmo tempo, público. Assim para Recuero, os perfis criados nessas redes sociais "[...] são pistas de um 'eu' que poderá ser percebido pelos demais. São construções plurais de um sujeito, representando múltiplas facetas de sua identidade." (2009, p. 27-30). 17 WATTS, D. J. Six Degrees. The Science of a Connected Age. New York: W. W. Norton &Company, 2003. 39 Ainda analisando o aspecto do indivíduo que se relaciona no ciberespaço, Sibilia18 (2003, apud RECUERO, 2009, p. 27) denomina a necessidade de exposição pessoal da sociedade atual como "imperativo da visibilidade", subsequente da interseção entre o privado e o público, passando a ser o efeito direto de um fenômeno global que intensifica o individualismo. Para a autora, existe a necessidade de ser "visto" para existir no ciberespaço. A autora Judith Donath19 (1999 apud RECUERO, 2009, p. 27) defende que a percepção do outro é indispensável para a interação humana. No ciberespaço a interação acontece por intermédio das palavras, ausentando assim outras informações que possam permear em uma comunicação face a face. Essas palavras acabam sendo constituídas como expressões de alguém e podem ser consideradas e legitimadas na construção das percepções que os indivíduos têm dos atores sociais, ou seja, as pessoas são julgadas e percebidas por suas palavras. Por isso, a autora vê a necessidade de serem incluídas informações sobre o indivíduo que gerem individualidade e empatia em um ambiente que normalmente as informações são anônimas. Recuero (2009, p. 28) conclui então que essas ferramentas que propiciam a interação no ciberespaço "[...] são apropriadas como formas de expressão do self, espaços do ator social e percebidas pelos demais como tal. É unicamente por conta dessa percepção que as redes sociais vão emergir nesses espaços.". Essa percepção (e possível julgamento) do indivíduo presente no ciberespaço e, consequentemente nas redes sociais, por intermédio do conteúdo existente em seus perfis, pôde ser confirmada também no contexto desse trabalho a partir dos resultados obtidos nas entrevistas realizadas com os profissionais de Recrutamento e Seleção. Para a maioria dos recrutadores entrevistados, é a partir desse perfil do candidato que eles tiram as primeiras impressões sobre o candidato, para somente então efetuar um contato pessoal e lhe apresentar a oportunidade de emprego. Levando em consideração os resultados da pesquisa do site americano CareerBuilder, essas primeiras percepções são ainda mais relevantes no processo de seleção de potenciais candidatos, principalmente no que se refere aos prejulgamentos que acontecem ao serem identificados conteúdos e/ou valores considerados pelos recrutadores como inadequados ou impróprios. 18 SIBILIA, P. Os diários íntimos na internet e a crise da interioridade psicológica. do sujeito. Grupo de Tecnologias Informacionais da Comunicação e Sociedade, XII Congresso da Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Comunicação COMPOS, Niterói/ RJ, 2003. 19 DONATH, J. S. Identity and Deception in the Virtual Community. In: KOLLOCK Peter. e Marc Smith. (orgs.) Communities in Cyberspace. New York: Routledge, 1999. 40 4. OS RESULTADOS OBTIDOS E AS RELAÇÕES ENCONTRADAS COM A PESQUISA APLICADA Conforme informado na introdução deste estudo, houve a necessidade de buscar e analisar as percepções dos profissionais de Recrutamento e Seleção (R&S) por meio de uma pesquisa qualitativa de caráter exploratório para conseguirmos então coletar dados, sejam eles objetivos e/ou subjetivos, e informações que não seriam possíveis somente com pesquisas bibliográficas, uma vez que ainda não existem muitos autores no Brasil que escrevam sobre o tema. Nesta pesquisa foi decidido optar pela técnica da entrevista semiestruturada, utilizandose de uma combinação de questões abertas e fechadas, elaboradas com o intuito de possibilitar aos entrevistados discorrer de forma mais abrangente sobre os tópicos então apresentados a eles, e também de instigá-los a relatar situações vivenciadas durante o uso das redes sociais digitais no processo de recrutamento e seleção de pessoal na atual empresa em que trabalham ou até mesmo casos que tenham ocorrido em seus empregos anteriores. Conseguimos, então, determinar a partir dessas entrevistas as principais etapas no processo de recrutamento e seleção dos candidatos nesse novo contexto contemporâneo, no qual se faz um grande uso das TIC’s. Identificamos também quais são as plataformas digitais e redes sociais digitais utilizadas atualmente pelos profissionais de R&S, descrevendo suas utilizações, suas características, vantagens e desvantagens. E o tópico que certamente foi o mais valioso encontrado durante a aplicação da pesquisa foi o que discute sobre os elementos avaliados nos perfis dos candidatos, e também como sua visibilidade é avaliada pelos recrutadores, pois pudemos apurar em um estudo realizado este ano nos Estados Unidos pelo site CareerBuilder, que os conteúdos relacionados aos candidatos encontrados nas redes sociais estão fazendo com que as empresas os eliminem. Tomamos essa pesquisa como base de resultados relacionados à visibilidade para então correlacionarmos os resultados existentes no exterior com as respostas fornecidas pelos nossos entrevistados que estão trabalhando no mercado brasileiro. As unidades de análise das entrevistas foram profissionais de recursos humanos responsáveis pelo setor de R&S de nove organizações pesquisadas, representadas e referenciadas nesse estudo por seu segmento de negócio. Dentre os segmentos que as empresas fazem parte temos: tecnologia da informação, varejo, internet (serviços), internet, seguros e o último que é lazer, viagens e turismo. Essas mesmas organizações apresentam portes variados (distinguidos a partir do número total de funcionários) e tiveram sua criação 41 em diferentes épocas, no entanto todas elas possuem algum vínculo com o meio digital. À medida que as entrevistas foram ocorrendo, os diálogos gravados foram transcritos para poderem ser utilizados na análise dos dados fazendo uso da técnica de Análise de Conteúdo na qual Bardin descreve como sendo "um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens"20 (BARDIN, 1977, p. 42 apud GOMES; SCHERER; LÖBLER , 2012, p. 6). Elaboramos a tabela abaixo (Tabela 1) com o propósito de demonstrar o perfil das organizações e identificar os entrevistados que serão referenciados nas apresentações dos resultados obtidos com a realização das entrevistas. Esses entrevistados, conforme havíamos explanado na introdução desse trabalho, demandaram sigilo para poderem participar da pesquisa, e é por este motivo também que as empresas não puderam ser identificadas. Segmento da empresa Período de Fundação Nº de funcionários Referência ao profissional entrevistado Tecnologia da Informação 1994 51-200 Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação (TI) Varejo 1929 12.396 Entrevistado de empresa de varejo Internet - Serviços 2006 501-1.000 Entrevistado de classificados on-line gratuitos Lazer, viagens e turismo 1999 3.000 Entrevistado de agência de viagens on-line Internet - Serviços 1999 51-200 Entrevistado de site de carreiras Internet 2007 201-500 Entrevistado de empresa do setor de internet Seguros 1959 1.001-5.000 Entrevistado de seguradora Internet - Serviços 2012 11-50 Entrevistado de aplicativo de táxi Lazer, viagens e turismo 1994 51-200 Entrevistado de empresa de programa de milhagem Tabela 1 - Síntese dos perfis das empresas pesquisadas elaborada com base nos resultados da pesquisa. 20 BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. 42 4.1 SOBRE O PROCESSO DE RECRUTAMENTO E SELEÇÃO DOS CANDIDATOS Ao questionar os profissionais nas entrevistas sobre as etapas do processo de recrutamento e seleção na empresa onde trabalham, foram descritas diversas etapas no desenrolar do processo. Dentre elas, as mais partilhadas segundo a visão dos profissionais são a demanda da vaga vinda pelo gestor, a definição do perfil da vaga ou utilização de um perfil preestabelecido, por algumas vezes os profissionais necessitam entender onde estão as pessoas para essa vaga para então divulgá-la, recebimento dos currículos e a triagem dos mesmos, contato com os candidatos para agendamento da entrevista, entrevistas pessoais e individuais com o responsável do RH e/ou com gestores da área, análise e parecer das entrevistas e escolha do candidato para então admiti-lo. Tendo de modo geral as etapas descritas acima, o Entrevistado de empresa de agência de viagens on-line, o Entrevistado de empresa de programa de milhagem e o Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação (TI) declararam que dependendo da vaga possuem parcerias com consultorias de RH. O Entrevistado de empresa do setor de internet comunicou que, dependendo da localização do candidato, a entrevista individual pessoal era substituída por uma entrevista muito aprofundada realizada por meio de comunicadores instantâneos de voz e/ou telefone como podemos verificar na declaração abaixo: Tem que ser uma entrevista muito mais elaborada, muito mais estudada e com câmera de preferência, pra você ver de certa forma a pessoa. Tem muita gente que eu contrato que é de fora do Brasil, então a única forma de falar com eles de certa forma é via Skype, mas tem que falar seja por telefone ou Skype, porque você tem que sentir se a pessoa tem um "fit" com a empresa e não somente suas competências. A pessoa tem que ter um "fit" cultural com a empresa, com o que ela propõe, com as missões e valores, se o ambiente é super dinâmico e a pessoa não é. Temos então que tentar o máximo possível conseguir ter esse feeling pra saber se a pessoa vai ter um "fit" ou não. Depois de um tempo você consegue até pegar o jeito e por telefone mesmo você consegue de certa forma até filtrar dependendo das perguntas que você faz, do jeito que as pessoas estruturam as respostas, se ela é analítica, se ela é consistente ou contundente nas respostas, mas o mais importante é que não dá pra fazer uma contratação só por telefone, tem que ter no mínimo um Skype mais demorado e de preferência, sempre que possível, entrevistar pessoalmente. (Entrevistado de empresa do setor de internet) O Entrevistado de classificados on-line gratuitos informou que faz um processo de recrutamento com os profissionais internos da empresa, e no caso de não encontrarem um candidato no perfil desejado, aí sim partem para a busca de candidatos externos. Esse resultado sugere o favorecimento das pessoas que estão inseridas na empresa e, que por sua vez já estão adaptados à cultura da empresa, em um processo de R&S segundo o que foi 43 apontado por Vieira e Garcia21 (2001 apud GOMES; SCHERER; LÖBLER , 2012, p. 7). Entretanto, assim como os resultados obtidos por Gomes, Scherer e Löbler (2012, p. 7), a maioria dos profissionais entrevistados comentaram que recrutam profissionais externos a partir da divulgação das vagas em websites de empregos, rede de contatos e redes sociais digitais. Com relação ao processo de seleção, muitos profissionais de R&S alegaram utilizar as redes sociais digitais profissionais para realizar atividades de hunting22 e até mesmo aumentar sua rede de conexões ao adicionar profissionais de seus interesses para um futuro contato, ou seja, os perfis dos recrutadores nas redes sociais digitais profissionais tornam-se um banco de dados de profissionais. Diferentemente do que Gomes, Scherer e Löbler (2012, p. 8) auferiram em sua pesquisa, não houve nenhuma empresa que não incluísse o uso de pelo menos uma rede social virtual, seja ela de cunho profissional ou pessoal, em seus processos. Mesmo o Entrevistado de site de carreiras, mencionou que utiliza somente seu software no processo, mas que divulga suas vagas nos perfis da empresa em redes como Twitter e Facebook. Com a questão do roteiro que requeria aos entrevistados a descrição detalhada do processo de R&S que acontece na empresa, conseguimos identificar as principais redes sociais digitais e plataformas digitais de divulgação de vagas e banco de currículos utilizados, bem como também pudemos detectar que os entrevistados usam no processo em média três ferramentas. As ferramentas utilizadas para anunciar vagas ou procurar por candidatos seguem listadas a seguir em ordem decrescente por número de vezes mencionadas. São elas: LinkedIn em primeiro lugar, Catho e indicações em segundo, Vagas.com e parcerias com universidades aparecem empatadas em terceiro lugar e Facebook, Apinfo e Infojobs ocupam o quarto lugar. As ferramentas mencionadas pelos entrevistados receberam uma classificação a partir de suas percepções de uso quanto ao tipo de perfil de candidato que se pode encontrar nas 21 VIEIRA, A.; GARCIA, F.C. Novos Requisitos de Seleção e Treinamento de Pessoal na Linha Automatizada da Fábrica de Motores Fire da Fiat Automóveis/Betim: entre o mito e a realidade. In: XV Encontro Nacional dos Programas de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração, 2001, Campinas, Anais... São Paulo: ANPAD, 2001. 22 Segundo o dicionário Cambridge, o verbo hunt além de ter o significado caçar, ele também significa "procurar com afinco", ou seja, os profissionais de R&S utilizam as redes sociais para procurar com afinco seus candidatos. 44 mesmas. Para eles, o LinkedIn é um lugar muito bom para encontrar profissionais que possuam no mínimo formação superior e também para cargos que demandam mais experiência, no entanto, o Entrevistado de empresa do setor de internet informou que quando precisa de profissionais para cargos de CEO, e portanto possuem cargos de alto nível e com mais de três décadas de experiência, não é possível encontrá-los no LinkedIn, porque não possuem perfis nessa rede social virtual. Já a Catho e o Vagas.com são sites de empregos caracterizados pelos entrevistados por possuírem um maior número de profissionais, mas que em contrapartida apresentam perfis melhores para cargos administrativos, financeiros, operacionais, assistentes de nível júnior e telemarketing. As parcerias realizadas com as universidades proporcionam aos recrutadores candidatos mais de acordo com a descrição do perfil da vaga, no entanto, mais para vagas de estágio. O site Apinfo é mais utilizado para cargos da área de tecnologia da informação. Já o Facebook não foi atrelado a nenhum cargo específico, mas teve como propósito principal a publicação do anúncio da vaga. Com os resultados acima descritos e a declaração abaixo sobre como eram os processos de quase uma década atrás, podemos ratificar o que Capelli23 (2001 apud GOMES; SCHERER; LÖBLER , 2012, p. 5) afirmava já em 2001 sobre o departamento de Recursos Humanos também ser um dos consumidores das vantagens propiciadas pela tecnologia em prol do negócio das organizações. Eu acho que a busca por profissionais melhorou, principalmente para o pessoal que trabalha atrás do programa, enfim, ajudando a gente que coloca as palavras-chave a buscar melhor nos perfis e trazendo também uma agilidade muito maior. Os sites estão melhores e eu acho que há uma maior divulgação das pessoas, então hoje não tem como você buscar um trabalho se o seu currículo não estiver divulgado em algum lugar. Hoje não tem mais a entrega do currículo em algum local. Eu lembro que na época em que eu trabalhei na Consultoria (2008) isso era muito comum. A gente recebia currículos por carta e em um ano que eu já estava trabalhando lá, foi determinado pela empresa (pela diretoria) que não iríamos mais recebê-los, porque não tinha onde colocar e não fazia mais sentido. Então, quer dizer que eu acho que isso mudou e mudou para melhor. (Entrevistado de empresa de varejo) São extremamente importantes, porque é através das ferramentas que nós anunciamos nossas vagas e onde temos contato com eles. Então é de extrema importância, são ferramentas vitais mesmo, não tem como ficar sem elas. (Entrevistado de agência de viagens on-line) Outro ponto que pudemos validar foi o custo envolvendo essas ferramentas. Enquanto no estudo de Gomes, Scherer e Löbler (2012, p. 9) seus entrevistados apontaram a inexistência de custos ao utilizar as redes sociais digitais, os entrevistados deste estudo 23 CAPELLI, P. Making the Most of On-Line Recruiting – How the Web Changes Recruiting. Harvard Business Review. v.79, n.3, March, 2001. 45 citaram que existem sim muitos serviços e com bons recursos disponibilizados de forma gratuita para os recrutadores, entretanto ao obter-se a versão paga de alguns deles, o número de funcionalidades e facilidades aumentam bastante. Todavia, a maioria dos entrevistados afirmou que utiliza essas ferramentas no modo gratuito, e que mesmo assim conseguem fazêlas trabalharem a seu favor. Eu faço muita busca utilizando a pesquisa avançada clássica: usando muito filtro de palavra-chave, cargo, empresa e localização (que são os que eu mais acabo usando). Quando eu vou para algo muito específico tirando esses que eu te falei, eu vou para o recruiter, que é a versão paga do LinkedIn. Nela eu consigo colocar tempo de experiência, eu consigo colocar tamanho da empresa que a pessoa trabalha e, se eu estou buscando uma pessoa que tem experiência em empresas de médio porte ou quando eu quero alguém mais corporativo e etc., eu consigo filtrar também. Eu consigo filtrar pelo tipo "interessados em" e então eu consigo ver se a pessoa está interessada em empreendedorismo ou em startups de internet e quando eu acabo filtrando desta maneira é mais fácil de abordar essas pessoas pelos interesses deles. (Entrevistado de empresa do setor de internet) 4.2 SOBRE OS USOS DAS FERRAMENTAS DE RECRUTAMENTO ONLINE: UTILIZAÇÕES, CARACTERÍSTICAS, VANTAGENS E DESVANTAGENS Para Barnes e Barnes24 (2009 apud GOMES; SCHERER; LÖBLER , 2012, p. 4) as redes sociais digitais se destacam pelas características de pontualidade, espontaneidade e base de usuários cada vez maior e mais diversificada, sendo essas características imprescindíveis em um mercado onde a velocidade é primordial. Tendo em vista essa afirmação, pudemos comprovar que todos os recrutadores se lembraram de citar como as ferramentas que eles usam, sejam elas redes sociais ou não, os ajudam no seu dia a dia. Muitos deles descreveram como é sua rotina de trabalho e a seleção de pessoal a partir de tantos currículos recebidos para cada vaga anunciada, conforme podemos verificar na descrição feita pelo Entrevistado de site de carreiras: Absolutamente tudo! Desde receber os currículos e essa é uma historinha que eu conto para os meus candidatos. Antigamente as pessoas passavam nas recepções e nas portarias dos prédios comerciais para deixar os currículos e a gente recebia no RH aquela pilha de currículos. Esse já é o começo de tudo: receber uma pilha de currículos em papel é uma coisa que não existe mais na minha vida há muito tempo, porque ainda que hoje eu anuncie uma vaga e no dia seguinte eu já tenha entre duzentas e trezentas candidaturas, eu não vou pegar trezentos currículos um por um e olhar quais são os currículos que têm o que eu preciso, que era o que eu fazia antigamente. Essa ferramenta funciona de forma muito dinâmica: a gente recebe as 24 BARNES, N. D. e BARNES, F. R. Equipping your organization for the social networking game. Information Management Journal. v. 43, n.6, p. 28-33, 2009. 46 candidaturas e aí a ferramenta tem uma possibilidade de fazer um rankeamento desses currículos. [...] A partir daí eu vou passando os currículos de fase. Se eu achei que cinquenta currículos estão no perfil, eu então compartilho eles com a equipe. Antigamente o que eu faria: eu imprimiria esses currículos ou eles já estariam impressos porque eu os teria recebido da fonte que for e eu teria que ir compartilhando eles com as equipes ou com o gestor, tudo em papel. [...] Hoje não existe mais nada que eu faça na mão, nem o currículo eu imprimo mais. (Entrevistado de site de carreiras) O dia a dia do profissional de recrutamento e seleção de pessoal envolve a utilização de diversas ferramentas digitais e até analógicas indiretamente, como é o caso das indicações. Diariamente é uma busca eterna. Você tem várias telas abertas, dentre elas estão todos esses sites e ai eu começo por onde eu vejo que a estratégia está mais adequada. Então, se é um profissional de mais alta complexidade, eu vou direto no LinkedIn que tem um foco maior. Obviamente se eu zerei aquilo e não encontrei, então vou abrir o Vagas.com. Zerei e não encontrei? Vou para o último que eu acredito que esteja na Catho. Caso eu não encontre, vou abrir meu leque e ir atrás do candidato através de grupos e de universidades, ou então faço esse tipo de abordagem em paralelo, quando já estou recebendo e-mails. Ou então vou para o meu networking que também é uma forma de encontrar. (Entrevistado de empresa de varejo) O Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação ressalta que não basta a ferramenta agradar apenas pelo fator estético, mas sim precisa ser eficiente e de fácil utilização: [...] Não é simplesmente pelo fato de ser bonitinho que agrada. Para o recrutador a questão visual é essencial, porque imagina uma pessoa durante oito horas do dia no mínimo, que é tempo que você trabalha, fazendo a mesma batida de olho, porque quando a gente procura currículos não tem como a gente ler cada um dos currículos de ponta a ponta, o que a gente faz é uma batida de olho buscando palavras-chaves. [...] Tem até pesquisa de quanto tempo o recrutador leva para selecionar o seu currículo, mas eu acho que é algo em torno de dez segundos no máximo, então ele tem que bater seu olho nesse currículo e sabe se tem o que está procurando e se não tiver, vou para o próximo. Isso na Apinfo é horrível e por isso cansa muito. O visual é muito importante para quem é dessa área que vai ficar olhando o tempo todo para o computador e batendo olho nas coisas para identificar essas palavras. A Catho ajuda muito nisso pois ela faz com que seu trabalho não seja tão cansativo durante o dia, já a Apinfo era bem cansativo mesmo. (Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação) Mais um ponto relevante levantado por alguns entrevistados, foi de que as redes sociais profissionais abriram a possibilidade para o recrutador ir em busca dos candidatos que se encaixem no perfil de suas vagas mesmo que eles não estejam almejando mudar de emprego, ou seja, as redes sociais profissionais, comunidades ou grupos virtuais propiciam prospectar os chamados "candidatos passivos", corroborando desta forma a visão tida por Capelli (2001 apud GOMES; SCHERER; LÖBLER, 2012, p. 5). Essa facilidade e abundância do recrutamento on-line permite que os profissionais tenham a oportunidade de receber e aceitar outras propostas de emprego. 47 São ferramentas simples de se trabalhar, me atendem pro que eu preciso, o que eu falo que gosto do LinkedIn é que ele tem o que a gente chama da profissionais passivos, que não estão procurando emprego, mas que em algum momento podem aceitar avaliar sua proposta e então é isso que permite que eu tenha um número maior de pessoas ali dentro. (Entrevistado de agência de viagens on-line) As pessoas que estão lá [no LinkedIn] não necessariamente são pessoas que estão procurando emprego, diferente dos outros sites como Catho e Vagas, então você acaba tendo uma base dados muito maior, mais rica e com uma atualização bem mais em tempo real. (Entrevistado de empresa de programa de milhagem) A abundância alcançada por meio dos serviços on-line de emprego e também por meio das redes sociais profissionais é um fator positivo para os recrutadores, mas que ao mesmo tempo pode ocasionar fatores negativos como o recebimento de diversos currículos de profissionais que não contemplam o perfil da vaga. Essa grande quantidade de currículos fora do perfil, multiplicados pelo número de vagas que cada recrutador fica responsável, ocasiona uma série de candidatos a serem avaliados (seja de forma manual ou automatizada) pelos profissionais. O erro que eu falo no recebimento de currículos é o mesmo que acontece para os outros sites. As pessoas estão desempregadas, aí ela é assistente e sai se candidatando para vaga de gerente. No entanto, eu acho que esse não é o erro do site, mas sim é um erro dos candidatos brasileiros que perdem um pouco o bom senso no momento da candidatura da vaga. Eles saem atirando para todos os lados, então não jogo a culpa no site, mas sim nos candidatos. [...] Eu recebo um número bom de currículos para as vagas e o problema é esse que te falei: muitos currículos fora do perfil. As vezes eu tenho que olhar vinte currículos para achar um no perfil. As pessoas realmente não leem as vagas e são os próprios candidatos que muitas vezes acabam dificultando a nossa vida. (Entrevistado de agência de viagens online) Apesar de os recrutadores terem essa abundância de currículos enviados para os processos de candidatura às vagas, as plataformas digitais têm se atualizado e aperfeiçoado seus recursos a cada dia para melhorar a vida deles. Todos os entrevistados citaram que as ferramentas utilizadas diariamente possuem recursos de filtragem. Algumas têm em suas versões gratuitas filtros mais genéricos e na versão paga possuem filtros e recursos mais completos e específicos. Já outras ferramentas são pagas pelos candidatos que estão à procura do emprego e então são gratuitas para o recrutador, que se utiliza também dos filtros e da área dedicada às empresas. Os filtros mencionados pelos entrevistados foram: palavra-chave, nome do candidato, empresa, cargo, distância ou localização, idiomas, idade, cargo, formação, tamanho da empresa (que as pessoas trabalham) e tempo de experiência. [Sobre a estrutura do LinkedIn] Atende muito, principalmente na parte paga eu acho que você tem um "up" muito grande na busca por profissionais, você consegue chegar exatamente onde você quer e onde você precisa enfim, é sensacional! (Entrevistado de empresa de varejo) 48 As ferramentas melhoraram. Elas foram mudando aos poucos, então sempre tenho novas atualizações e novas abas, novas opções de triagem de anúncio que facilita, mas eu acho que eles vão sentindo isso do mercado "Ah, eles estão exigindo muito mais de localidade.", então eles começaram a colocar esse recurso na ferramenta. Então, a distância que a pessoa mora em relação ao local de trabalho e idiomas, são os tipos de coisas que eles acabam colocando. (Entrevistado de agência de viagens on-line) Segundo os estudos realizados pelos autores Kluemper e Rosen25 (2009 apud GOMES; SCHERER; LÖBLER, 2012, p. 5), por meio de avaliações realizadas nas redes sociais digitais é possível extrair uma quantidade numerosa de informações pessoais sobre o candidato, devido ao reflexo de seus comportamentos e interações com outros usuários das redes, podendo fornecer aos recrutadores informações que talvez não sejam encontradas em outros métodos de seleção. Entretanto, esta afirmação obtida no estudo dos autores Kluemper e Rosen mostra-se contraditória segundo os relatos do Entrevistado de agência de viagens online e do Entrevistado de empresa de varejo: No LinkedIn tem como você pesquisar muitas coisas, ver as atualizações, eu vou adicionando as pessoas e no dia a dia vão aparecendo as atualizações delas, então umas ficam marcadas como muito “reclamonas” ou que colocam muitas piadinhas, e outras nem atualizam. Mas não tem muito como avaliar quando eles se candidatam porque não tem muitas opções. (Entrevistado de agência de viagens on-line) A partir do momento que você conhece aquela pessoa, estando frente a frente, você vê realmente como aquela pessoa se comporta. Muitas vezes a pessoa tem uma habilidade ótima pra se comunicar através do computador e falar contigo, já quando ela está pessoalmente, ela deixa o nervosismo tomar um pouco conta. Enfim esse nervosismo faz parte do amadurecimento de cada um, não que isso seja ruim ou bom. (Entrevistado de empresa de varejo) A única rede social virtual com finalidade profissional apontada pelos profissionais de R&S entrevistados foi o LinkedIn. Essa rede para eles é mais utilizada para efetuar abordagens aos candidatos e não tanto para publicar vagas, possui também uma abrangência de profissionais de diversos setores ainda muito maior no exterior do que no Brasil, segundo o que relatou o Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação. Para a maioria dos entrevistados, o LinkedIn, conforme descrito na seção anterior a essa, possui mais profissionais com perfis de vagas denominadas por eles como "estratégicas", ou seja, o candidato deve possuir ensino superior e experiência e/ou conhecimento prévio na área de atuação. Dentre as vantagens identificadas neste estudo e também no estudo realizado por Gomes, Scherer e Löbler (2012) a possibilidade de efetuar conexões entre o recrutador e os 25 KLUEMPER, D.H.; ROSEN, P.A. Future employment selection methods: evaluating social networking web sites. Journal of Managerial Psychology. v.24, n.6, p.567-580, 2009. 49 candidatos é uma característica muito importante para eles. Desta forma, o recrutador cria em seu perfil no LinkedIn, um banco de dados de profissionais para acesso aos candidatos que lhe venham a interessar em algum momento oportuno, e também para a divulgação de suas vagas. [...] quando vê que um recruiter o está adicionando, muitas vezes é para montar um banco de dados e aumentar o seu número de conexões, ou então é realmente é porque essa pessoa tem uma posição e quer muito falar com o profissional. (Entrevistado de empresa do setor de internet) Gomes, Scherer e Löbler (2012, p. 9) obtiveram na pesquisa com os gestores de RH resultados indicando vantagens sobre o uso das redes sociais digitais no que diz respeito à abrangência e rapidez propiciadas pelas mesmas. No entanto, essa rapidez pode variar de acordo com o tipo de ferramenta que está sendo analisada. Se a ferramenta for um serviço de recrutamento on-line, podendo ser representadas pelas então citadas Catho e Vagas.com, o processo de recrutamento e também de seleção é mais ágil. Nas outras ferramentas me ajuda o fato de ter todos os contatos lá e me ajuda também o fato da pessoa já estar disposta, pois ela está muitas vezes pagando pelo serviço, então ela já está procurando recolocação ou procurando emprego ou saindo do lugar que ela está e isso facilita até o interesse dela na vaga. Por ter os contatos dela lá, geralmente no mesmo dia eu já ligo e marco uma entrevista, quando que no LinkedIn eu demoro uma semana pra conseguir marcar uma entrevista. (Entrevistado de empresa de programa de milhagem) O mesmo não acontece segundo os relatos adquiridos a partir da pesquisa desenvolvida para este estudo. Para os entrevistados em geral, o LinkedIn é uma ferramenta que demanda um gasto muito maior de tempo, que vai desde o processo de encontrar os candidatos com os perfis certos para cada tipo de vaga, como também o tempo demasiadamente grande para que seja efetuado o contato com o profissional e a divulgação da oportunidade. Entretanto, pudemos observar diante os relatos que o "problema" não está na ferramenta, mas sim no usuário do LinkedIn que ainda não a utiliza e a acessa constantemente. Pra falar a verdade, tem muita gente que ainda não usa muito bem o LinkedIn apesar de ter perfil nele. As pessoas as vezes acabam até perdendo oportunidades porque retornam meu contato depois de três semanas e então acontece de já até ter fechado a posição. (Entrevistado de empresa do setor de internet) Quando os entrevistados eram questionados sobre a estrutura do LinkedIn e se ela os estava atendendo de acordo com suas necessidades, muitos acabavam respondendo que sim, mas com algumas ressalvas. Sem dúvidas todos concordavam que o LinkedIn é uma rede social virtual crucial nos dias atuais e para o Entrevistado de empresa do setor de internet, o LinkedIn é responsável por 80% de suas contratações. Contudo, alguns recursos oferecidos para um melhor conhecimento do profissional, são por diversas vezes ignorados por parte dos 50 recrutadores, como é o caso das recomendações e as competências. Quando questionados sobre esses recursos de recomendações e competências bem como sua confiabilidade, a maioria dos entrevistados informou que normalmente não as leva em consideração, devido à inconsistência dos dados neles apresentados e também devido à facilidade de manipulação de conteúdos a pedido do dono do perfil. As recomendações eu acho bem interessantes, mas eu também acho um pouco de banalização. Você pode perceber assim: quando elas são mandadas embora do emprego ou elas estão começando a procurar emprego, elas fazem recomendações pra todo mundo pra todo mundo indicar ela também. Então eu acho que acaba banalizando e virar troca de favores. Já essa parte de competências pra mim não serve de nada. Eu posso colocar lá um monte de competências, mas quero ver provar isso no dia a dia. Acaba meio que virando “puxação” de saco. Mas as recomendações eu acho que é uma ideia bem interessante, só que precisa saber se aquelas pessoas que têm muitas recomendações se são trocas, porque a gente consegue ver quem te recomendou e se você recomendou a pessoa e então conseguimos identificar esse tipo. E eu acho que tirar referências (por telefone) é uma ideia muito boa no processo seletivo. Engana-se quem pensa que ao tirar referências só virão coisas boas, a gente houve muita coisa ruim em referências. (Entrevistado de agência de viagens on-line) A gente desconsidera. A gente acha que não pode ter muita segurança naquilo. Não sei que relacionamento a pessoa tinha com a que a recomendou, mas claro que eu passo a considerar quando eu vejo que foi gestor da pessoa ou se tinha uma posição hierarquicamente acima. Aí você percebe que pode servir para uma avaliação e uma recomendação, mas muitas vezes é um amigo que entra lá e recomenda, alguém que foi par e então você não tem certeza se pode confiar naquilo. As competências a gente também não leva em consideração, pois somos nós que fazemos uma avaliação de competências e não acreditamos no que está lá e no que a pessoa colocou. (Entrevistado de empresa de programa de milhagem) Outro ponto interessante ressaltado pelos entrevistados, ainda tendo como referência o LinkedIn, é o baixo empenho e cuidado por parte do indivíduo dono do perfil em inserir suas informações de forma completa e detalhada, para desta maneira facilitar e agilizar o trabalho do recrutador no momento de seleção de prováveis candidatos. Essa insatisfação declarada pelos entrevistados nesse estudo apenas ratifica o que Gomes, Scherer e Löbler (2012, p.10) encontraram em sua pesquisa. A única coisa diferente da Catho ou do Vagas.com é que quando a pessoa se cadastra no site ela já está procurando emprego e então ela preenche o currículo dela de forma completa: com todas as experiências, onde é que ela trabalhou, o que fazia, quais eram as atividades, qual era o escopo. No LinkedIn, não necessariamente. Eu entro, me cadastro e só coloco lá que eu sou analista de RH em tal empresa e eu não descrevo, eu não tenho o currículo de forma completa. Então, as vezes as dificuldades que a gente encontra é nesse sentido, encontra a pessoa mas não sei se ela tem as habilidades e conhecimento que eu preciso, então eu precisaria entrar em contato com ela pra fazer uma abordagem e entender se de fato ela tem aquilo que eu preciso. Outro ponto também é justamente essa questão do contato. Lá não é todo mundo que deixa os telefones e e-mail de contato, então muitas vezes você tem que adicionar a pessoa na sua rede, esperar a pessoa aceitar, mandar uma mensagem pedindo para que ela envie os contatos dela e então acaba que o tempo que você leva para falar com o candidato é muito maior do que você gastaria na Catho, por 51 exemplo, que já tem os contatos preenchidos. (Entrevistado de empresa de programa de milhagem) Para concluirmos a análise das características das ferramentas para R&S on-line, bem como suas utilizações, pudemos interpretar por meio das entrevistas efetuadas, que as ferramentas denominadas como websites de emprego são bastante utilizadas como meio difusor das oportunidades de trabalho das empresas. Em sua maioria, têm a função de um "painel de controle" para os recrutadores, painel este que é utilizado para controlar as vagas anunciadas, controlar os inúmeros currículos recebidos, e também é o mesmo ambiente onde algumas das possíveis interações com os candidatos das vagas acontece. Já nas redes sociais digitais, o propósito acaba diferindo um pouco. Apesar de as redes sociais profissionais também serem em teoria um site de empregos, elas possuem características e recursos únicos que propiciam a interação entre os indivíduos cadastrados nessa rede. As interações podem ocorrer entre candidatos e recrutadores, recrutadores com recrutadores e candidatos com candidatos, propiciando desta forma um ambiente com constantes e frequentes interações, sejam elas ocorridas a partir de mensagens entre os usuários, ou a partir de publicações de conteúdo para a rede de conexões do usuário ou até mesmo sejam por meio dos grupos de interesses surgidos nesse ambiente, para que haja o compartilhamento de informação e de conhecimento entre os membros. Por ter essas características únicas, as redes sociais digitais têm as interações como seu principal foco. Sendo assim, o Entrevistado de empresa de programa de milhagem se beneficia dessas formas de interação entre os profissionais de uma área e/ou interesse dentro dos grupos, como forma de divulgar suas vagas para um público de profissionais mais dentro do perfil pelo qual ele procura. No LinkedIn é um pouco diferente, porque a gente não tem o costume de utilizar a área que é paga e exclusiva para a divulgação das vagas. Eu divulgo muito mais dentro dos grupos do LinkedIn. (Entrevistado de empresa de programa de milhagem) 4.3 SOBRE A VISIBILIDADE NAS REDES SOCIAIS DIGITAIS: AS EMPRESAS E OS CANDIDATOS Ao nos candidatarmos para alguma vaga de interesse não recebemos, em grande parte das vezes, um retorno da empresa pretendida informando que nosso currículo não foi selecionado, ou mesmo que a vaga prospectada teve seu processo encerrado. Ao mesmo tempo que o recrutamento on-line tem seu lado positivo, essa característica de abundância e excesso de conteúdos acaba ocasionando também um aspecto negativo, pois uma vez que as 52 vagas anunciadas, por exemplo, são publicadas nesse meio digital, elas correm o risco de ficarem esquecidas pelos recrutadores mesmo após terem sido encerradas pelo motivo que for, podendo gerar uma insatisfação por parte dos candidatos que não estão obtendo retorno, contribuindo assim para que a imagem da organização seja negativada e visível e acessível a todos a qualquer momento. Foi sob o contexto da disseminação das vagas pela web e a sua falta de controle após o fechamento, que decidimos abordar brevemente sobre a visibilidade das empresas, para a seguir nos aprofundarmos mais na perspectiva da visibilidade proporcionada aos candidatos perante os profissionais de R&S. Quando nossos entrevistados foram questionados, logo no início do diálogo, sobre como é o controle das vagas publicadas em diversos canais após o encerramento de alguma posição, muitos responderam que têm esse cuidado de removê-las do local publicado. Entretanto, houve um relato no qual o Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação comentou que sempre deixava suas vagas abertas, pois como a empresa tinha uma alta rotatividade de pessoal, ele ia constituindo um banco de currículos que se encaixavam nos perfis contidos na empresa para que fossem chamados posteriormente para uma oportunidade que viesse a existir na organização. As vezes eu deixava porque sempre que fechava uma vaga abria outra e, principalmente em empresa de tecnologia, sempre aparecem vagas por ser um mercado muito aquecido e você [como empresa] está sempre competindo com outras justamente porque as pessoas conseguem salários mais altos e mudam de emprego. Então, eu deixava aberta por um tempo indeterminado porque, mesmo que eu já tivesse preenchido aquela vaga, podia ser que algum outro profissional se desligasse ou o que fossem abertas mais vagas, já que a empresa em que eu trabalho abre vaga todos os meses. (Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação) Essa preocupação em finalizar os anúncios de vagas criados após a escolha do candidato, de fato prevalece nos depoimentos colhidos nas entrevistas e firma o fato de que os recrutadores têm o cuidado de finalizar as vagas que lhes são incumbidas, seja para evitar que eles continuem recebendo currículos desnecessariamente, ou seja, para evitar também que a empresa seja malvista por algum indivíduo que tentou se candidatar à vaga mesmo após o seu encerramento. A minha vaga obviamente abriu um processo e quando é finalizado eu fecho essa vaga e consequentemente onde ela está, até porque enfim, outras pessoas não acharem que tem aquela posição e gerar dúvidas, podendo ocasionar problemas como um todo, pois a pessoa que está interna pode achar que está sendo substituída. Então a partir do momento que a vaga está fechada, eu fecho também nos sites e nas publicações. (Entrevistado de empresa de varejo) Quando você abre um site como o Vagas.com e a Catho, que são os mais utilizados, você consegue incluir a vaga e excluir com o fechamento ao informar o nome do candidato que foi selecionado. Quando é um banco de dados, normalmente a gente 53 trabalha de três a cinco candidatos por vaga. Eu particularmente tenho como postura entrar em contato com meus candidatos e falar "Olha, agradeço você por ter aceito participar do nosso processo, mas a vaga já foi fechada com outro. Se tiver alguma outra oportunidade a gente volta a conversar.", daí dou esse retorno. Eu tenho o trabalho de fechar as vagas porque senão fico recebendo currículos de muitos candidatos. (Entrevistado de seguradora) Quando a gente usa por exemplo a Catho e o Vagas.com, os próprios sites já têm um processo de checar periodicamente com a gente quais posições ainda estão abertas. Aquelas que a gente fechou, eles mesmos removem o anúncio do site. No LinkedIn é um pouco diferente, porque a gente não tem o costume de utilizar a área que é paga e exclusiva para a divulgação das vagas. Eu divulgo muito mais dentro dos grupos do LinkedIn e então eu não tenho essa ferramenta de excluir depois. O que eu faço é estabelecer um prazo máximo para envio de currículos e já deixo claro que depois daquela data a gente não vai mais considerar. É dessa forma que a gente deixa claro o período de inscrição. (Entrevistado de empresa de programa de milhagem) Partindo agora para o ponto de vista da visibilidade dos candidatos, estamos presenciando um tempo de alta visibilidade midiática, no qual qualquer indivíduo está sujeito a tornar-se evidente nas mídias e cair em domínio público. Mesmo que hoje se julgue necessário e extremamente importante que o indivíduo-profissional se faça visível nas redes sociais profissionais e/ou pessoais ou simplesmente na internet, é preciso antes de tudo muita cautela, já que o limite entre privado e público26 é muito tênue. Para os entrevistados, dependendo da área de atuação do profissional, é muito importante que o profissional seja encontrado facilmente nas redes sociais profissionais, entretanto, é perfeitamente compreensível o indivíduo-profissional não possuir perfil nas redes sociais digitais para casos de vagas muito operacionais, início de carreira (os estagiários, por exemplo) e vagas para nível de presidência, no qual o candidato prospectado tenha mais de trinta anos de experiência. No parecer geral dos entrevistados, o fato de um profissional não ter um perfil em uma rede social virtual, seja ela profissional ou pessoal, causa no mínimo estranheza, principalmente quando a vaga ou a empresa do entrevistado em questão é de algum setor de negócio que tem ligação direta com a internet. Apesar da estranheza, nenhum dos recrutadores entrevistados consideraram descartar o candidato por não ter um perfil nas redes sociais. Para os recrutadores, as redes sociais profissionais não são vinculadas apenas à busca de oportunidades, mas servem também como um meio onde pode acontecer a troca de conhecimento profissional e experiências. 26 Para fins de esclarecimento e entendimento o sentido do emprego das palavras "público" e "privado" será a partir do sentido básico desta dicotomia emergido do discurso sociopolítico ocidental, onde temos: "Público neste sentido é o que é visível ou observável, o que é realizado na frente de espectadores, o que está aberto para que todos ou muitos vejam e ouçam. Privado é, ao contrário, o que se esconde da vista dos outros, o que é dito ou feito em privacidade ou segredo ou entre um círculo restrito de pessoas." (THOMPSON, 2014, p. 165) 54 Não chega a interferir na minha percepção, mas eu acho que se a pessoa não tiver perfil em nenhuma rede social será para mim no mínimo curioso, então com certeza eu vou investigar um pouco mais essa percepção dela e o porquê que ela não tem perfil em nenhuma rede social. Eu acho que no mínimo surgiria alguma coisa bastante interessante para a pessoa não ter perfil em nenhuma rede social. (Entrevistado de site de carreiras) É muito difícil, por exemplo, uma pessoa que não tenha o perfil no LinkedIn que é uma rede social profissional. A gente não vai achar o cara provavelmente pelo perfil, a não ser que ele seja indicado de alguém, mas é uma coisa preocupante. Porque uma pessoa que vai trabalhar no mercado de internet e não tem perfil na rede social, então me parece que é uma pessoa que não está antenada no segmento de internet. Como que ela vai trabalhar numa empresa que ela não se identifica e não tem interesse no segmento? Então aí já é um problema. (Entrevistado de classificados on-line gratuitos) É muito relativo a pessoa não ter perfis em outras redes sociais. Hoje a gente tem profissionais que a gente pergunta "Por que você não faz um perfil no LinkedIn?" pois ele serve não só para buscar profissionais, mas pelo contrário, eu o utilizo dessa maneira, mas ele serve como uma ferramenta pra você trocar experiências, lançar temas que de repente você viu num livro ou numa palestra. Ele é a troca de conhecimento profissional e não é só vinculado à busca de oportunidades. Então assim, eu acho que as pessoas acabam perdendo de não estar vinculado a uma rede como esta. (Entrevistado de seguradora) Diante de tantos relatos informando que não existe interferência na percepção do candidato por ele não possuir perfil das redes sociais, colhemos um motivo interessante apresentado pelo Entrevistado de aplicativo de táxi. Alguns colegas dele de outros departamentos da empresa relataram não possuir redes sociais por considerá-las perda de tempo, e também porque eles acabam sendo importunados diversas vezes com propostas de emprego. Diante dos benefícios citados pelos entrevistados de R&S até aqui, como a troca de conhecimento e possibilidade de encontrar vagas interessantes em outras empresas, pudemos perceber que dependendo do perfil do indivíduo o ponto de vista sobre as redes sociais muda, podendo a rede social se tornar até mesmo inoportuna devido à exposição do candidato para os outros, sejam eles do meio de R&S ou não. Não interfere, pois a gente tem alguns programadores aqui que não tem Facebook e alguns deles não tem LinkedIn, existindo outras formas dele mostrar seu potencial. Eles trabalham aqui, se dão muito bem e são muito qualificados. Alguns acham que o Facebook é perder tempo e outros não querem ser atormentados no LinkedIn, já que muitos reclamam que os headhunters ficam no pé deles e aí muitos deles decidem não ter. (Entrevistado de aplicativo de táxi) Os perfis dos candidatos nas redes sociais, pelo que pudemos observar até agora, têm bastante relevância para os recrutadores em geral que se utilizam das redes sociais profissionais como uma de suas principais fontes (ou talvez a principal fonte) para ir ao encontro com os candidatos ideais. Essa conclusão obtida com as entrevistas confirma a afirmação de que as informações do perfil dos candidatos servem para os profissionais de 55 R&S como base para a contratação desses candidatos (KLUEMPER e ROSEN, 2009 apud GOMES; SCHERER; LÖBLER , 2012, p. 1). Assim como nos estudos de Gomes et. al. (Ibidem, p. 10), os perfis oferecem a vantagem de fornecer uma diversidade de dados e informações adicionais, podendo auxiliar o profissional de R&S a identificar o candidato que melhor se encaixa na vaga. Contudo, nossos entrevistados alertam que os dados e informações fornecidos nos perfis não são suficientes o bastante para a tomada de decisão. Para eles é necessário sempre ter um contato pessoal e uma interação face a face, pois é em uma conversa presencial que o recrutador consegue ter percepções mais profundas sobre o candidato, para então tomar uma decisão acerca do mesmo. Realmente para você conseguir conhecer uma pessoa ao ponto de tomar uma decisão, você precisa de conversas muito profundas e é por isso que o nosso processo é longo e as nossas entrevistas duram em média uma hora e meia a duas horas. O candidato que vem participar de um processo com a gente é inclusive comunicado com antecedência para se programar, pois vai passar metade do dia com a gente. Eu acho que nenhuma ferramenta te proporciona informações suficientes para tomada de decisão. (Entrevistado de site de carreiras) Todas as vezes é preciso conversar. O currículo pra mim não fala muito sobre a pessoa, porque você pode ter um ótimo currículo e não ser um ótimo profissional. Eu falo isso até por uma experiência que eu tive com um candidato estudante da Poli. Eu lembro que era um currículo que você até chegava a chorar de alegria e pensar: "Nossa, é exatamente essa pessoa que eu quero!" e aí quando eu o chamei para uma conversa, eu percebi que o menino tinha problemas psicológicos sérios, até de relacionamento, comportamentos muito estranhos, tendências até psicopatas e essas são coisas que você nunca vai achar no currículo. É necessário e é essencial que você conheça essa pessoa. Assim, a tecnologia ajuda? Muito, muito mesmo, mas muitas coisas você só consegue fazer presencialmente [...] eu acho que tem diferença com o presencial porque até no jeito de apertar a mão você sente algumas coisas do candidato, algumas pendências, coisas que você não vê no Skype como, por exemplo, eu estou vendo o seu rosto, mas eu não sei se você está balançando a perna de nervoso, eu não sei se você está estalando os dedos. Então pela internet você acaba me escondendo alguns aspectos que presencialmente não tem como esconder. (Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação) Tendo em mente os conceitos da visibilidade diante das novas mídias comunicacionais discutidos por Thompson, compreendemos que é possível realizar um paralelo entre o candidato a uma vaga de emprego (nosso foco) e os candidatos políticos nas eleições (ponto de vista da esfera política que é o foco do autor). Para Thompson (2014, p. 162), "Enquanto a transformação na natureza da esfera pública criou novas oportunidades para os líderes políticos, ela também fez surgir novos riscos." e esse mesmo comportamento encontrado nessa afirmação pode ser percebido se analisado no contexto de um candidato a uma vaga de emprego. Ambos os indivíduos (políticos e candidatos à vaga) estão sujeitos a terem seus comportamentos e ações avaliados por algum público que os esteja observando. Mesmo que 56 os políticos procurem administrar a própria visibilidade diante dos outros, e não somente durante os períodos eleitorais, existe sempre um processo recorrente de decisões sobre o que, a quem e como pode se tornar público (Ibidem, p. 181). Já com a maioria dos indivíduosprofissionais a incapacidade de controle da visibilidade é a mesma, contudo essa exposição existente pode ter uma escala menor, se comparado com um líder político, por exemplo. Entretanto, os possíveis danos à imagem que venham a ocorrer são os mesmos que os políticos e celebridades estão submetidos. Segundo Thompson (Ibidem, p. 184), os problemas que podem acontecer são distinguidos em quatro tipos de ocorrências: a gafe e o acesso explosivo; o desempenho de efeito contrário; o vazamento; e o escândalo. As gafes e acessos explosivos são para Thompson (Ibidem, p. 185) as formas mais comuns de problemas enfrentados pelos líderes políticos. Para ele "representam o fracasso do indivíduo em controlar completamente o próprio comportamento, e revelam que ele não possui um completo domínio da situação, de seus sentimentos, de suas ações ou expressões." e, por mais que eles façam parte do contexto diário, é através dos meios eletrônicos de comunicação que as gafes e os acessos explosivos são transmitidos para milhões de pessoas e repetidos inúmeras vezes para uma audiência cada vez maior. Se analisarmos pelo ponto do vista do candidato à vaga de emprego, as gafes e os acessos explosivos também podem ser identificados tanto nas redes sociais, quanto em uma entrevista presencial. As gafes podem ocorrer no dia a dia do uso das redes sociais pessoais e/ou profissionais e podem ser exemplificadas por postagens de conteúdos inapropriados, postagens que venham a caracterizar o indivíduo como uma pessoa que reclama muito e sobre tudo, mentir sobre suas qualificações e até fotos de perfil ou endereços de e-mails inadequados. Todos esses itens podem passar uma má impressão para as pessoas que veem o perfil em questão, principalmente se ele estiver em uma rede social profissional, local este onde espera-se um comportamento mais sério e profissional. Já os acessos explosivos talvez não se encaixem bem em um ambiente virtual representado mais por imagens e textos, mas sim podem porventura acontecer em alguma entrevista presencial ou mesmo esse comportamento ser identificado pelo recrutador durante o diálogo. Aqui no Brasil o problema da gafe com um indivíduo desconhecido pode ser exemplificado com um fato ocorrido em 2010, que se tornou nacionalmente famoso e difundido nos meios comunicacionais digitais. Esse exemplo não ocorreu com um indivíduocandidato como estivemos analisando até então, mas ele pode demonstrar que até mesmo um profissional já empregado está sujeito às consequências geradas a partir de uma gafe cometida 57 nas redes sociais digitais. O caso famoso ao qual estamos nos referindo é o do executivo da empresa de serviços de hospedagem Locaweb27. O executivo da companhia, que aparentemente é um torcedor fanático do time de futebol Corinthians, publicou em sua conta do Twitter mensagens contra o time São Paulo Futebol Clube durante uma partida entre os dois times. No entanto, o maior agravante da situação foi que a Locaweb era a patrocinadora do São Paulo naquele jogo e, como decorrência à atitude do executivo, alguns torcedores do São Paulo irritados com a declaração começaram uma campanha na internet, especialmente no Twitter, contra a empresa Locaweb. A empresa comunicou alguns dias depois do ocorrido o desligamento do executivo envolvido na confusão. O desempenho de efeito contrário é definido por Thompson (Ibidem, p. 187) como um problema que não provém da incompetência ou falta de controle do indivíduo, muito pelo contrário, é quando alguma mensagem produzida pelo indivíduo ocasiona um efeito inverso ao esperado por ele e, como seus receptores não estão presentes fisicamente no mesmo local da produção da mensagem, incapacitam o produtor de acompanhar as respostas geradas por seu receptores e então atenuar os resultados negativos. Para o caso dos candidatos às vagas de emprego, podemos fazer duas associações: a primeira é quando o candidato comparece à entrevista presencial com o recrutador e, durante a conversa, o candidato como resposta a alguma pergunta realizada, começa a falar mal do seu empregador atual, ex-empregador ou também dos colegas de empresa. Para os candidatos que têm essa atitude talvez represente algo inofensivo, e até mesmo pode justificar a sua procura por um novo emprego. A segunda associação é a mentira contada durante a entrevista presencial e/ou informações inverídicas encontradas no currículo ou nos perfis das redes sociais sobre a vida profissional do candidato. Entretanto, ao mesmo tempo que para os candidatos essas atitudes possam ser consideradas como inofensivas, para os recrutadores entrevistados esses tipos de atitudes são consideradas muito graves e até passíveis de eliminação do candidato. Mesmo assim, os recrutadores não têm o costume de comentar com os candidatos que tais atitudes podem transmitir um aspecto negativo para a sua imagem. Essa questão de falar mal do antigo empregador já é uma questão importante a ser considerada, que pode até tirar alguém do processo. Eu nunca encontrei na rede social alguém que eu estivesse prestes a contratar difamando a antiga empresa ou compartilhando com os outros experiências negativas na última empresa, mas já aconteceu de na entrevista eles me contarem e falarem mal do antigo empregador. 27 BALIEIRO, Silvia. Mensagem no Twitter causa demissão de executivo da Locaweb. 2010. Disponível em: <http://epocanegocios.globo.com/Revista/Common/0,,EMI130181-16349,00MENSAGEM+NO+TWITTER+CAUSA+DEMISSAO+DE+EXECUTIVO+DA+LOCAWEB.html>. Acesso em: 29 ago. 2014. 58 Eu já vi outras vezes pessoas com essas atitudes em redes sociais e aí eu já desconsideraria essa pessoa do processo. As vezes a gente faz a entrevista e pergunta "Ah, você tem conhecimento de XY ou de uma ferramenta XY? Você já participou de um projeto de tal jeito?" e a pessoa confirma dando até nomes. Comigo já aconteceu do candidato passar o nome do seu gestor na empresa e também informações sobre quais eram suas responsabilidades dentro da empresa e na hora que a gente começa a investigar nas redes sociais, como o LinkedIn, para ver se de fato a pessoa trabalhava na empresa que ela falou e quem que era o gestor daquela pessoa, e a gente descobriu que não era quem ele tinha falado. Coincidentemente houve um caso de uma pessoa daqui da empresa conhecer o suposto gestor do candidato e, ao entrarmos em contato com esse gestor, vimos que o candidato tinha mentido na entrevista. Então essa questão da mentira também é uma coisa que a gente já descarta o candidato do processo. (Entrevistado de empresa de programa de milhagem) Os vazamentos são revelações de informações e/ou condutas, que os indivíduos querem negar ou esconder, feitas de forma intencional por alguém que julga necessário tornar público algo privado sobre o outro, mesmo que essa ação cause problemas futuros para os indivíduos denunciados. "Vazamentos podem provocar escândalos ou contribuir para a sua formação, mas escândalos podem surgir de outras maneiras.". Para Thompson, atualmente os escândalos recebem mais ênfase e recebem uma grande repercussão. Geralmente estão ligados à "falhas na administração da visibilidade através da mídia" (Ibidem, p. 188-189). Para representar os vazamentos no contexto do profissional, também tomaremos como exemplos, assim como no caso da gafe, casos que envolveram profissionais já empregados e que não estavam sob um processo de seleção para uma vaga de emprego. O primeiro caso, e talvez o que teve mais repercussão mundial devido à sua complexidade e fragilidade, foi o caso do WikiLeaks28. Esse caso culminou em 2010 quando uma grande quantidade de documentos confidenciais do governo dos Estados Unidos foram divulgados e vieram a tona no site do WikiLeaks. No decorrer do mesmo ano foi publicado também um vídeo que mostra um ataque aéreo ocorrido em Bagdá no ano de 2007 e que matou pelo menos 12 pessoas, incluindo dois jornalistas. Muitos outros arquivos secretos do exército norte-americano também foram publicados no site, incluindo documentos polêmicos que reportavam a morte de milhares de civis na guerra do Afeganistão como consequência das ações militares e um manual com instruções de tratamento de prisioneiros de uma prisão militar norte-americana situada em Cuba. O Analista de Inteligência do exército americano no Afeganistão e Iraque, Bradley Manning, acabou sendo acusado de ser o responsável pelos vazamentos. Em agosto de 2013 foi condenado a 35 anos de prisão e está sendo processado por acesso e divulgação de informações sigilosas. 28 WIKILEAKS. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/WikiLeaks> Acesso em: 31 ago. 2014 59 No Brasil temos um caso recente, porém com menor complexidade se comparado com o do WikiLeaks, mas que também custou o emprego do responsável pelo vazamento. Esse caso aconteceu durante a Copa do Mundo do Brasil, no dia em que o jogador de futebol Neymar Júnior machucou-se durante uma partida da competição e foi levado às pressas para um hospital de Fortaleza para ter os primeiros atendimentos29. Uma enfermeira que trabalhava no hospital fez um vídeo, com duração de vinte e oito segundos, da chegada do jogador ao local. Após a porta da sala que o jogador foi atendido ter sido fechada, a enfermeira concluiu a gravação mostrando seu rosto, sorrindo e fazendo um sinal de "v" com os dedos. A administração do hospital justificou que houve a "exposição de paciente" e o breve vídeo filmado pela enfermeira lhe custou o emprego. Nos dois casos acima assinalados pudemos comprovar o evidente vazamento de informações sigilosas das organizações, uma pública e a outra privada, por parte dos seus empregados e, como medida de controle, ambas as organizações decidiram demitir os envolvidos por supostamente não terem seguido o código de conduta de suas carreiras. Comprovamos então, que mais uma vez a conduta do indivíduo, seja no ramo político ou seja na vida de um empregado governamental ou privado, é sempre observada e sujeita a ser julgada (e muitas vezes punida) pelos demais caso algum(ns) dos seus comportamentos sejam considerados como impróprios. Vista a relação feita acima sobre a visibilidade dos candidatos políticos e a dos candidatos às vagas de emprego, seguiremos nossa análise abordando a questão dos recrutadores olharem os perfis dos candidatos prospectados também em outras redes sociais digitais, uma vez que a superexposição na internet de fato vem acontecendo não somente no Brasil, como em outras partes do mundo. A intenção de nossas perguntas era descobrir se os profissionais de recrutamento e seleção de pessoal tem esse hábito durante seus processos e, se possuem, que tipo de informações eles estão à procura e o porquê. A primeira pergunta com foco em visibilidade realizada era justamente para identificar quais buscavam os candidatos em outras redes sociais e/ou mecanismos de busca. Dentre os nove entrevistados, cinco revelaram que buscam sim o candidato em lugares diferentes ao que o candidato inscreveu-se ou foi encontrado para a vaga. Porém, a busca em outros perfis 29 R7 ESPORTES. Após dar risada de Neymar em vídeo, enfermeira é demitida de hospital em Fortaleza. Disponível em: <http://esportes.r7.com/futebol/copa-do-mundo-2014/apos-dar-risada-de-neymar-em-videoenfermeira-e-demitida-de-hospital-em-fortaleza-06072014>. Acesso em: 01 set. 2014. 60 acontece apenas em casos pontuais, até porque a grande maioria deles relatou que não há tempo hábil de fazer esse procedimento para todos os candidatos às vagas. Os motivos enunciados pelos recrutadores que costumam "bisbilhotar" os candidatos em outros lugares, sejam redes sociais ou até mesmo os mecanismos de busca foram: o candidato deixou alguma impressão ruim após realizar a entrevista pessoal, o candidato transpareceu ser pouco comprometido e curiosidade por parte do recrutador ao acreditar que já havia visto o candidato em alguma outra oportunidade. Já os quatro recrutadores que não possuem esse hábito justificaram não achar correto esse comportamento, pois preferem não misturar a vida profissional do candidato com sua vida particular. Eu não avalio o Facebook, pois o que eu avalio é o perfil do LinkedIn. Normalmente os profissionais que eu trabalho em vagas de analista, gerentes e coordenadores já têm um perfil no LinkedIn, mas eu nunca gosto de pesquisar no Facebook porque eu acho assim: você é uma pessoa na sua vida pessoal e na sua vida profissional você é uma outra pessoa. Eu não quero um candidato como um amigo, mas como um profissional, seja lá qual for o seu cargo. Então o que eu tenho que levar em consideração é o seu perfil profissional em uma rede social profissional. O que você faz ou deixa de fazer na sua vida pessoal, eu acho que não vale a pena a gente avaliar porque a gente não vai perguntar na sua entrevista o que você fez ontem, mas sim o que você fez no seu trabalho. Eu sou contra ficar olhando o Facebook e essas coisas porque eu acho que você é uma outra pessoa lá e são dois perfis diferentes. Se fossem a mesma coisa, não existiria o LinkedIn e eu criaria currículo no Facebook. (Entrevistado de agência de viagens on-line) Entretanto, houveram relatos entre os recrutadores que não buscam o perfil do candidato em outras redes, de que alguns gestores solicitantes das vagas têm esse costume, conforme pode ser constatado no depoimento abaixo: Eu já trabalhei em uma empresa [de portal de internet] que a gestora fazia uma pesquisa própria no Facebook. Ela procurava e até chegou a reprovar candidatos pelo que viu no Facebook, mas ela buscava porque gostava. Nessa empresa é recomendado que você não fique emitindo opiniões particulares (opiniões políticas), até por ser uma empresa do meio jornalístico, então você tem que ser um pouco mais na sua, e essa pessoa falava muita bobagem, criticava todo mundo, "eu odeio a segunda-feira", falava mal da política, uma pessoa muito “reclamona”. Aí, essa gestora em questão era muito alto-astral e falava que não gostava de gente assim reclamando de tudo. Então eu acho que era uma percepção dela. (Entrevistado de agência de viagens on-line) Um outro motivo levantado pelos entrevistados para que não haja interesse em buscar os candidatos em outras redes foi de que as redes sociais atualmente possuem restrições para a visualização do conteúdo postado. Apenas o que o usuário determina como divulgação de domínio público é o que o recrutador irá visualizar mesmo não sendo um "amigo" ou "conexão" desse mesmo candidato. Assim sendo, os recrutadores ficam à mercê do pouco de dados que o candidato deseja que seja visualizado em modo público. 61 Depende [sobre buscar o perfil em outras plataformas], pelo menos na última empresa que trabalhei eu fazia isso somente em cargos de confiança ou em cargos maiores como analista sênior e tal, mas também quando eu tinha tempo, porque como eram muitas vagas e muitos candidatos, não tinha tempo de procurar. E é aquele negócio, depois que o Orkut ou o Facebook mudaram a questão de privacidade dos usuários, a pessoa passou a poder optar por não publicar várias coisas para todos, mas sim só para amigos e tal. Eu meio que desisti da ferramenta porque no começo do Facebook todo mundo podia ver tudo e então era uma ótima maneira de você conhecer um pouco a pessoa, mas depois que mudou o nível de privacidade, não faz mais sentido. Você perde tempo procurando o fulano, principalmente quando é um nome comum como "da Silva" ou "dos Santos", e quando acha a pessoa está tudo bloqueado, só aparecendo algumas informações e quem não falam muitas coisas sobre a pessoa. Desde então desisti um pouco de procurar no Facebook sim. (Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação) Pudemos perceber entre os recrutadores que têm o costume de buscar os candidatos em outras redes sociais que elas podem ajudá-los no momento de fazer contato com os mesmos. Conforme dito anteriormente, o LinkedIn (hoje a principal rede social profissional utilizada pelos entrevistados) tem um ponto importante que é a taxa de visitação não ser constante, prejudicando os recrutadores no momento de contatar o candidato, por isso eles fazem uso de outras redes mais frequentemente visitadas para entrar em contato com esse candidato em vista, ou seja, as redes sociais pessoais acabam sendo utilizadas como uma forma de contato entre o recrutador e o profissional. Olha, eu nunca tive uma decepção com perfil de candidato em Facebook ou em redes mais próximas como o LinkedIn, mas muito pelo contrário, houve um caso de uma mulher com foco em Trade Marketing que eu não conseguia falar pelo LinkedIn porque ela não respondia meus e-mails e nem os recados que eu deixava e aí eu pensei: "Vou partir para outra!". Mas foi quando eu decidi procurá-la no Facebook e consegui o contato dela que eu entendi porque que ela não estava no LinkedIn. Pelo Facebook ela me respondeu que estava numa imersão de trabalho muito grande, não estava morando no Brasil e que estava difícil até de acessar suas redes, mas que acessava o Facebook regularmente para manter contato com sua família. Foi a partir desse contato que eu comecei a conversar com ela. O lado ruim foi só que ela não tinha interesse na minha oportunidade, mas eu achei ótimo ter encontrado outro jeito de poder pelo menos ter um bom motivo para ter descartado um bom profissional. (Entrevistado de empresa de varejo) Já os mecanismos de busca, também mencionados nas entrevistas, são meios eficientes utilizados para encontrar candidatos nos quais o recrutador tem poucas informações (nome incompleto, por exemplo) e precisa encontrá-los de alguma forma para uma posterior abordagem, ou seja, os mecanismos de busca atuam de forma complementar na captura de informações sobre o candidato. Por exemplo, em uma das buscas realizadas pelo Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação, ele relatou que decidiu buscar mais informações sobre o candidato na internet, ainda que o candidato tivesse se saído bem na entrevista pessoal, pois para o recrutador ainda havia ficado uma má impressão. Ao buscar pelo nome do candidato, o recrutador encontrou diversos processos jurídicos abertos pelo candidato contra 62 as empresas pelas quais ele havia trabalhado no passado. Mesmo tendo ocorrido esse caso que acabou sendo decisivo para a eliminação do candidato, o mesmo entrevistado mencionou na conversa que já houve um caso que as informações encontradas beneficiaram o candidato, demonstrando, desta forma, que nem sempre as buscas são feitas com o intuito de encontrar informações danosas acerca do candidato. Houve uma vez com um candidato que após entrevistá-lo fui colocar o nome dele, por curiosidade e não porque ele havia despertado em mim alguma estranheza, no Google. Dos resultados dessa busca, apareceu que ele tinha feito uma apresentação de um trabalho em Paris e eu acho que ele acabou esquecendo de mencionar isso na entrevista. Então, eu acho que essas ferramentas servem também para encontrar coisas boas das pessoas. (Entrevistado de empresa de Tecnologia da Informação) O Entrevistado de agência de viagens on-line explicou que as buscas em mecanismos de busca são realizadas apenas para alguns cargos específicos, como os da área financeira, pois o nome do candidato é buscado para averiguar se o candidato não possui alguma restrição financeira (dívidas), já que é um preceito da organização não contratar um indivíduo para trabalhar no departamento financeiro possuindo esse tipo de perfil. Os mecanismos de busca são úteis também quando os recrutadores necessitam encontrar gestores de outras empresas para atuarem em suas organizações. É dessa forma que eles conseguem descobrir quem são esses profissionais e então encontrar seus contatos, sejam números de telefone ou até mesmo o perfil do indivíduo em alguma rede social virtual. Ainda que o foco desse estudo sejam as características e os comportamentos dos processos de R&S diante do advento das TIC’s, pudemos apurar que algumas condutas dos candidatos ainda podem gerar impacto negativo perante os recrutadores, como por exemplo, mensagens em e-mails e currículos enviados com erros de ortografia (problema esse que mais comumente acontece), endereços de e-mail inapropriados e até mesmo fotos inadequadas enviadas juntamente com o currículo. Esses dois últimos itens citados foram até utilizados como forma de desconsideração do candidato. Eu acho que os currículos vêm melhorando aos poucos. Antigamente o pessoal não tinha muito hábito de fazer um bom currículo. Hoje eles estão tentando melhorar, mas eu acho que ainda tem bastante falha, por exemplo, eu pego muitos erros de português em currículo e até erros grosseiros. Quando os candidatos encaminham um e-mail com o currículo anexo, até na própria mensagem já tem erros grosseiros de português. (Entrevistado de agência de viagens on-line) Uma coisa que dá uma desanimada e que a gente costuma tirar do processo é quando a pessoa usa um e-mail inadequado, por exemplo, a gente pegou um caso de uma candidata pra uma vaga de marketing no qual o e-mail dela era potranquinha2011@algumacoisa. Está claro que não vai rolar pra uma pessoa potranquinha e você já sabe que o nível da pessoa é de potranquinha. Você já sabe logo de início que não vai dar pra ter um assunto com o dono da empresa, pois você já sabe que ela é uma potranquinha pelo e-mail que ela manda o currículo dela. Isso 63 é uma coisa que a gente observa muito e é eliminatório sim. (Entrevistado de classificados on-line gratuitos) Mas assim, algumas pessoas costumam colocar alguma fotos bizarras em currículo impresso, e eu já tive casos de pessoas que só de olhar a postura na foto eu descartei. Você não tem noção do que já apareceu! Não tem condições, até porque a gente entende que a pessoa está buscando uma oportunidade profissional e não alguma outra coisa. (Entrevistado de seguradora) Após a observação e análise de todas as características, comportamentos e percepções dos entrevistados deste estudo, pudemos identificar que hoje os meios comunicacionais digitais e as redes sociais digitais são imprescindíveis para que o setor de recrutamento e seleção de pessoal de uma organização funcione. Os recrutadores passam o dia todo utilizando essas plataformas digitais para encontrar os profissionais que mais se adequam às necessidades requeridas, e atualmente quem não possui alguma presença virtual é praticamente invisível aos os olhos dos recrutadores de empresas que possuem alguma relação com a rede mundial de computadores. A percepção geral que tivemos depois das entrevistas é de que os perfis dos candidatos são uma espécie de cartão de visitas nas redes sociais, que apresentam o candidato para os recrutadores, mas que contém alguns dados, como as competências pessoais, que são descartados quando lidos, mas que acabam sendo comprovados durante uma entrevista pessoal. Para os nossos entrevistados, a atitude de falar mal de algum ex-empregador (seja verbal ou via escrita) foi a mais citada entre eles, e tem uma relevância até maior se comparada com alguma imagem inapropriada postada nas redes sociais. Contudo, para a grande maioria dos entrevistados, realizar uma conversa pessoal face a face é sem sombra de dúvida o artifício mais importante durante um processo de recrutamento e seleção. 64 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Pudemos ver até este momento que o ser humano tem a necessidade de se relacionar com outros indivíduos e grupos de afinidades, pois faz parte da sua natureza. As TIC’s, particularmente as que viabilizam a realização das redes sociais na internet, tiveram o papel de fomentar essa interconexão das relações sociais a níveis jamais previstos (BARBOSA, 2012). O pesquisador da área de educação e consultor pedagógico sobre educação corporativa Marcos Cardiolli (2012, apud. BARBOSA, 2012) explica que "O tempo das pessoas está se comprimindo. Isso implica no fato de que as pessoas estão misturando suas vidas, no trabalho, nas socializações e nas horas de lazer". O encontro dessas relações na internet acabou ocasionando um transbordamento para o mundo real, fazendo com que os papéis sociais já não tenham divisões claras (BARBOSA, 2012). A ausência desse limite possui um lado positivo e um negativo para Barbosa. O lado positivo proporciona o desenvolvimento da capacidade de socialização do indivíduo, tendo a possibilidade de uma interação mais refinada e respeitando as diferenças existentes entre cada indivíduo. Por outro lado, Barbosa atenta para o fato negativo que possa vir a surgir, para alguns, em forma de uma crise de identidade. A partir desse lado negativo apontado, Cardiolli recorda que existem papéis sociais para cada ocasião e espaços de convívio social distintos, mas que "quando se está em uma rede social na internet, de forma pública, todos veem nossas diversas facetas. Uma pessoa que é intransigente no dia a dia e que, antes do advento dos perfis públicos na internet, conseguia se equilibrar na hora de lidar com as pessoas no ambiente de trabalho, agora não consegue mais ser esses dois personagens tão diferentes." (2012, apud. BARBOSA, 2012). Com base nas pesquisas aplicadas com os profissionais de Recrutamento e Seleção (R&S) desse estudo, foi possível verificar que a evolução da gestão de pessoas abordada por Rosa (2002) de fato é a realidade que estamos presenciando. Os comportamentos encontrados nos processos de R&S de antigamente eram mais "mecanizados", ou seja, os candidatos selecionados passavam por testes e entrevistas padronizados, e então eram repassados para a escolha final do gestor requisitante. No currículo os aspectos mais importantes observados eram as experiências profissionais e escolares, e não tanto as atitudes e valores do candidato. Atualmente, tanto a definição de Rosa (2012, p. 191) quanto a percepção que tivemos ao entrevistar os profissionais, foi de que, na maioria dos casos o processo de seleção acontece por meio de entrevistas e/ou dinâmicas de grupo levando-se em consideração o perfil de 65 competências requeridas para a vaga. Os valores e planos de fundo do candidato foram outros aspectos bastante considerados pelos recrutadores entrevistados. Talvez essas mudanças descritas acima possam ser explicadas de duas maneiras. A primeira seria a mudança que vem ocorrendo nas empresas diante de um cenário de permanentes transformações. Esse cenário, provavelmente, vem corroborando para que exista uma grande preocupação com a criação de valor, que nas últimas décadas passou por uma ampla alteração em como as empresas o definem e o mensuram. O foco que antes era contábil (centrado em custos e receitas), agora passa a ser um foco de um valor mais amplo, evidenciando desta forma que "os valores intangíveis adquirem uma importância cada vez maior" (MACUCCI; MATIAS, 2002, p. 384-385). A segunda explicação pode ser a impossibilidade de distinguirmos nos dias atuais nossa vida individual e pessoal da vida profissional, hoje cada vez mais miscigenadas por meio das redes sociais digitais. Para o pesquisador José Krein, "Antes se trabalhava para viver, hoje se vive para trabalhar; e os mecanismos de controle sobre os trabalhadores/colaboradores estão ficando mais sofisticados, a ponto dos patrões saberem como seus contratados agem ou pensam, apenas observando sua vida nas redes sociais." (KREIN apud. BARBOSA, 2012, p. 20). Assumindo esse contexto da decorrente miscigenação dos perfis profissionais e pessoais dos indivíduos nas redes digitais, bem como as possíveis crises de identidade e a ausência de diferenciação dos papéis sociais do indivíduo de acordo com cada ocasião, iremos relacionar os nossos resultados obtidos com os encontrados pelo site americano de recrutamento, o CareerBuilder. Portanto, iremos relacionar o cenário de recrutamento de pessoal encontrado aqui no Brasil (a partir da nossa amostra de segmentos de empresas) com um estudo estrangeiro, realizado nos Estados Unidos e que abrangeu um número bem maior de entrevistados, mais precisamente 2.138 gestores contratantes. Em nossa pesquisa, o número de recrutadores que procuram informações adicionais sobre os candidatos em outras redes e o número dos que não procuram estão bem equiparados. Na pesquisa americana, o número de recrutadores que usam as redes sociais para buscar os candidatos vem aumentando a cada ano, passando de 36% em 2012 para mais de 40% no ano de 2014. Ainda segundo o estudo, a tendência é de que esse número aumente ainda mais, uma vez que 12% dos entrevistados alegaram não ter esse costume, mas pretendem começar a utilizar esse artifício. Entretanto, apesar de metade da nossa amostra fazer o uso de outras redes sociais e mecanismos de busca para encontrar mais informações sobre os candidatos, a maioria apresenta esse comportamento apenas em alguns casos 66 específicos e para fins diferentes dos abordados pela pesquisa do CareerBuilder. Os fatores que motivam os recrutadores a terem esse comportamento foram os seguintes: poder entrar em contato com o candidato mais rapidamente, por meio de uma rede social que seja frequentemente acessada; nos casos de "estranheza" do comportamento e/ou esclarecimento de dúvidas sobre o candidato mesmo após uma entrevista pessoal; quando o candidato não foi encontrado na rede social profissional, o recrutador vai então buscá-lo de alguma outra maneira; e para vagas estratégicas o recrutador busca em outras redes para tentar conhecer um pouco mais sobre a pessoa, sendo assim um complemento do perfil do candidato. Diferente do estudo da CareerBuilder, nossos entrevistados não têm a intenção de ir buscar o candidato para encontrar alguma informação que o desabone e mesmo o elimine do processo. O que pudemos identificar com nossas entrevistas foi que mesmo que seja encontrado algo duvidoso nas redes, nossos recrutadores têm a postura de conversar sempre com o candidato e não somente acreditar em tudo o que está no perfil (profissional e pessoal). A maioria deles fez questão de frisar que consideram os perfis pessoais de forma separada do perfil profissional, pois para eles a empresa está contratando o "indivíduo-profissional" e os interesses particulares dele não os convém saber. Salientaram também que mesmo olhando o perfil do candidato em outras redes sociais, não tem a intenção de ir a fundo no passado digital do indivíduo, até porque alguns consideraram como uma invasão de privacidade, e até mesmo porque o conteúdo postado nas redes pode ser um recorte daquele momento no qual o candidato estava passando e talvez não mais o represente na situação atual. Na pesquisa do site americano, as razões mais comuns encontradas para desconsideração dos candidatos foram: o candidato postou informações ou fotografias provocativas ou inapropriadas, o candidato postou informações sobre estar bebendo ou usando drogas, falou mal de ex-empregador, tem poucas habilidades de comunicação, fez comentários discriminatórios relacionados a raça, gênero, religião etc., mentiu sobre qualificações, compartilhou informações confidenciais de ex-empregadores, esteve ligado à prática criminosa, adotou um apelido não profissional na rede e mentiu sobre uma ausência. Contudo, em nossa pesquisa aplicada apenas duas dessas razões de desconsideração foram lembradas e fortemente ponderadas pelos recrutadores. Quando um "indivíduo-candidato" fala mal do seu ex-empregador e quando ele mente sobre suas qualificações, seja nas redes sociais digitais ou seja durante a entrevista presencial, o recrutador já o desconsidera por não julgar um comportamento ético. Das demais razões encontradas nos resultados da CareerBuilder, apenas tivemos um caso curioso descrito pelo Entrevistado de agência de 67 viagens on-line. Esse caso (já citado no capítulo anterior) era de uma pessoa que era gestora da sua antiga empresa e que possuía o costume de buscar os candidatos apresentados pelo entrevistado em questão e eliminá-los se eventualmente encontrasse itens que não lhe agradasse. [...] roupas, bebidas, lembro que teve um candidato que ela não gostou porque ele participava de campeonatos de cerveja e ela ficava "Ah, mas se ele participar de um campeonato desses no domingo, como que ele vai vir trabalhar na segunda?" (Entrevistado de agência de viagens on-line) Dadas as informações aqui apresentadas e discutidas, acreditamos que pelo jeito no Brasil o costume de "bisbilhotar" os candidatos em outras redes sociais digitais ainda não é uma forte tendência. Apresentamos a seguir algumas explicações possíveis que talvez justifiquem essa ausência de interesse dos recrutadores brasileiros. A primeira explicação seria que os departamentos de RH e os profissionais dedicados a R&S estejam muito sobrecarregados de trabalho e não exista tempo hábil para eles realizarem esse tipo trabalho. A segunda explicação é de que o volume de entrevistados por vaga nos EUA (país onde foi aplicada a pesquisa mencionada) seja menor e possibilite ao recrutador a realização desse tipo de busca ou, mesmo que a demanda seja grande, talvez o recrutador possua alguma ferramenta que o auxilie nessa tarefa. A terceira e mais pitoresca das explicações seria a paranoia do povo norte-americano de querer ir atrás de tudo que puder encontrar acerca de um indivíduo e monitorá-lo de todos os pontos de vista, considerando-o culpado até que seja provado o contrário. Após termos conhecido e entendido essa nova realidade dos processos de R&S e como os recrutadores têm encarado e ponderado o que encontram nos perfis dos candidatos, continuamos a nos questionar do porquê essa busca dos candidatos em outras redes sociais digitais não é uma prioridade no Brasil. Será que algum dia será? Arriscamo-nos a respondêla não com certeza absoluta, mas sim de forma empírica, uma vez que ainda não exista um estudo teórico para embasar nossas afirmações. Para nós, a cultura brasileira é caracterizada pela sua informalidade e é essa informalidade que talvez possa levar os candidatos a terem uma postura inadequada com o entrevistador do processo seletivo, atrapalhando consequentemente, o processo do recrutador ao analisar mais friamente o candidato. Outra possível resposta seria de que no Brasil os recrutadores não têm considerado o conteúdo dos perfis digitais, porque como já foi dito no capítulo anterior, muitos dos currículos digitais não possuem todas as informações do candidato de forma completa e nem sempre os conteúdos nele publicados são considerados 68 por eles como verdade absoluta. E a nossa terceira e última resposta seria que no Brasil as redes sociais profissionais, principalmente o LinkedIn que foi a única rede mencionada pelos recrutadores entrevistados, ainda não são totalmente difundidas e a internet tem um alcance somente da metade da população brasileira, segundo os dados da CETIC.br que foram informados na introdução desse estudo. Nos Estados Unidos, país que a pesquisa foi realizada, a realidade é bem diferente pois mais de 74% da população30 tem acesso à internet e o LinkedIn tem 100 milhões de usuários ativos31, ou seja, a presença e talvez a participação dos indivíduos seja maior e mais frequente lá se comparado ao Brasil. Em uma reflexão geral, compreendemos que a ética nos processos de recrutamento e seleção é essencial e, tanto as empresas como os candidatos, possuem expectativas mútuas a serem levadas em consideração como, por exemplo, respeito, confidencialidade e transparência. Percebemos a dificuldade encontrada ao avaliar os limites quanto à invasão de privacidade dos candidatos, principalmente no caso das organizações investigarem os perfis e as interações dos "indivíduos-candidatos" nas redes sociais. Essa ação é muito questionada, mas pelo que pudemos analisar a partir da pesquisa americana, essa atitude é uma tendência que vem aumentando, contudo, consideramos que seja necessário estabelecer limites para que os assuntos da esfera pessoal do candidato, que não são relacionados ao trabalho, venham a interferir na avaliação das suas competências. Os recrutadores também precisam estar muito atentos a esse limite tênue para que não sejam feitas avaliações de caráter subjetivo, comprometendo, desta forma, o processo e abrindo portas para que exista preconceito e favoritismo. UNITED STATES CENSUS BUREAU. Computer & Internet Trends in America. Estados Unidos. 2012. Disponível em: <http://www.census.gov/hhes/computer/files/2012/Computer_Use_Infographic_FINAL.pdf>. Acesso em: 05 set. 2014. 31 LINKEDIN. About LinkedIn. Disponível em: <http://press.linkedin.com/about>. Acesso em: 05 set. 2014. 30 69 REFERÊNCIAS BARBOSA, Enio Rodrigo. Redes sociais conectam vida pessoal a profissional. 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