expo zaragoza 2008 - Trupe Agência Criativa
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expo zaragoza 2008 - Trupe Agência Criativa
ISSN 1659-2697 ANO 4 | 2008 | N°6 EDIÇÃO ESPECIAL EXPO ZARAGOZA 2008: O MAIOR EVENTO DE ÁGUA DO PLANETA VOZES DA ÁGUA ENTREVISTAS EXCLUSIVAS Rigoberta Menchú e Rajendra Pachaurí Prêmios Nobel da Paz UM TRATADO PENDENTE O desafio da água e do saneamento. Luis Alberto Moreno, Presidente do BID PORTFÓLIO DE GRANDES PROJETOS América Latina aproveita a vitrine mundial da Expo Zaragoza Ano 4 | 2008 | Nº6 CONSELHO EDITORIAL Beneditto Braga / Vice-presidente do Conselho Mundial da Água (WWC). Diretor Agência Nacional de Águas (ANA) do Brasil. Maureen Ballestero / Vice-Presidente da Assembléia Legislativa da Costa Rica. Presidente da Global Water Partnership América Central. Claudio Osorio / Assessor Regional em Redução de Desastres, Iniciativa Água e Saneamiento UNICEF TACRO Eduardo Mestre, Diretor da Tribuna da Água, Expo Zaragoza 2008 DIRETORA GERAL / Yazmín Trejos EDITOR CHEFE / Boris Ramírez EDITORA DE ARTE / Carmen Abdo / www.carmenabdo.com JORNALISTAS Boris Ramírez Daniel Zueras Miguel Simón Yazmín Trejos COLABORADORES Luis Alberto Moreno, Presidente do BID Enrique Iglesias, Secretário Geral Ibero-Americano Danielle Mitterrand, Presidente Fundação Frances Libertés DESIGN GRÁFICO / Toni Pereira / ARETHA STUDIO FOTO DA CAPA / Carmen Abdo FOTOGRAFIAS Carmen Abdo Carlos Acín Carlos Luna Cintia Sarría David Ruiz Estefanía Abad Fabio Rodríguez María Torres-Solanot Rubén Rodríguez Sergio Rodríguez ADMINISTRAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO / Luis Alonso Ramírez TRADUÇÃO E EDIÇÃO EM PORTUGUÊS / Elisa Homem de Mello e Candeias FALE CONOSCO / [email protected] Uma publicação promovida pelo grupo AMANCO 2 AQUA VITAE CONTEÚDO PERSPECTIVA 04 BREVES DO MUNDO 42 ECONOMIA HÍDRICA 54 TECNOLOGIA 58 SITES DE INTERESSE 64 18 54 58 11 35 43 49 63 ÍCONES ARQUITETÔNICOS DA EXPO Torre da Água. Pavilhão Puente. Cidades do Futuro. Sed. Oikos… modernidade que se relaciona e fala do recurso hídrico e dos seres humanos. UM MECANISMO IBERO-AMERICANO Os dirigentes da Conferência de Diretores Gerais Ibero-Americanos da Água (CODIA) marcaram presença em Zaragoza, assumindo compromissos. Alto Perfil EXPO ZARAGOZA DEVE ENTREGAR RESULTADOS CONCRETOS PARA O MUNDO Eduardo Mestre, Diretor da Tribuna da Água, está convencido de que tanto o Legado como a Carta de Zaragoza devem ser instrumentos que promovam mudanças, evolução e alternativas. Alto Perfil AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS APORTAM DENÚNCIAS, VITALIDADE E ALTERNATIVAS Pedro Arrojo foi um dos motores do Pavilhão das Iniciativas Cidadãs, que reuniu 350 organizações sociais do mundo. Opinião UM DIREITO HUMANO E DOS POVOS Danielle Mitterrand, presidente do Frances Libertés e membro do Fórum Ético da Água escreve artigo de opinião sobre a América Latina e os recursos hídricos. AQUA VITAE 3 PERSPECTIVA Não apenas luzes e espetáculos ficarão, mas sim, sem dúvida alguma, o fato de ter-se atrevido a estabelecer um tema fundamental para a raça humana: sua relação com a água. Foto: Carmen Abdo 4 AQUA VITAE Comunicando a transformação A água não tem voz, nem tampouco sabe escrever. Mas os seres humanos acertaram em cheio ao se transformarem em seus porta-vozes, organizando a exposição internacional Expo Zaragoza 2008, a primeira do gênero, dedicada exclusivamente ao tema “Água e Desenvolvimento Sustentável”. Em 1798, a cidade de Paris foi a primeira a conjecturar o desejo humano de se aproximar, conhecer, refletir e debater sobre a água. Duzentos e setenta e cinco exposições depois , a cidade espanhola realizou a Expo 2008, dando continuidade a esta tradição humana. Ficará marcado, para sempre, que a Expo atreveu-se a estabelecer um tema fundamental para espécie humana: sua relação com a água, mas não do ponto de vista pessimista, e sim da oportunidade para a mudança, o que tornou o encontro a maior festa da água jamais celebrada no planeta. Durante 93 dias de conferências, exposições, espetáculos, apresentações e muitas visitas, a Expo esteve voltada no âmbito da diversidade cultural e setorial, para tudo o que foi realizado, o que se faz e o que há por fazer em prol da água. A Expo Zaragoza também foi crucial para marcar o acento forte e profundo da Aqua Vitae. Desde 2006, a revista estabeleceu sua ambição em se tornar um canal de comunicação de alta credibilidade e de peso sobre as decisões em torno ao manejo dos recursos hídricos, como parte de uma iniciativa única e eficiente em prol da sociedade, bem como para provocar melhores níveis de qualidade de vida. Em 2007, a revista foi reconhecida com o Prêmio Latino-Americano e do Caribe (PLACA) como sendo uma das melhores iniciativas privadas a nível latino-americano, por isso, em 2008, inspirada nesse compromisso e com apoio da companhia Amanco – Mexichem, marcamos presença ininterrupta durante os três meses de exposição, nos tornando o único meio de comunicação da América Latina a enviar todas as informações para a região, por meio do blog www.aquavitae.com, que desde já é uma base de dados dos pensamentos e propostas mais atuais em matéria hídrica em todos os seus aspectos. Desta experiência, tiramos algumas conclusões: • falta muito trabalho para que os meios de comunicação ponham em suas pautas um tema tão abrangente, com visões sociais, ambientais, culturais, educativas e econômicas; • falta muito trabalho para que os líderes, governantes e dirigentes assumam um papel mais ativo no setor; • falta vencer o medo de se abrir para uma participação coletiva e multisetorial, na qual as empresas, as pessoas, os grupos organizados, organizações sociais, governo e cientistas cheguem a propostas integradas, já que a água não tem dono e, mesmo com visões divergentes, tem um só objetivo: o ser humano. De qualquer forma, a principal lição é que a Aqua Vitae se revigora e fortalece o desafio fundamental de servir como ponte, de ser encontro, fórum, tribuna, capaz de criar consciência sobre a importância do desafio latino-americano frente à gestão do recurso hídrico dentro do contexto global. A Expo Zaragoza 2008 chegou ao fim, mas trazendo uma grande transformação já em curso pela água. A América Latina conquistou muito terreno ao ser a primeira potencia hídrica do mundo, o que a desafia a ser também a primeira potência em acesso, distribuição, qualidade, educação e nova cultura. Nós da Aqua Vitae continuaremos trabalhando para levar a informação mais atual e precisa e continuaremos comunicando esta transformação. YAZMÍN TREJOS Diretora - Aqua Vitae AQUA VITAE 5 UM TRATADO PENDENTE, MAS EM TRANSFORMAÇÃO O assunto água e saneamento no mundo e, em particular na América Latina, têm grandes desafios, mas também é um forte aliado do compromisso com as melhorias necessárias. Por: LUIS ALBERTO MORENO Presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) Foto: Carmen Abdo. 6 AQUA VITAE É preciso garantir qualidade, quantidade e a contabilidade do recurso hídrico sendo necessário fortalecer as instituições de planejamento, regulamentação e controle do setor, além de melhorias na gestão e transparência das prestadoras de serviço. Foto: Sergio Rodríguez Nos últimos 15 anos, a comunidade internacional tem feito avanços significativos para transformar o acesso a serviços de fornecimento de água potável e redes de saneamento em um bem disponível universal. Entretanto, ainda estamos muito longe de satisfazer tais necessidades básicas de todos os habitantes do planeta. Atualmente, 17% da população mundial não bebe água potável, cifra que se eleva para 40% quando consideramos o acesso a serviços de saneamento básico. Como conseqüência destas carências, a cada ano, morrem mais de 1,5 milhão crianças por diarréia causada por água contaminada e falta de rede de esgoto. América Latina e Caribe. Melhorias que precisam ser aprofundadas A América Latina e o Caribe não escapam desta realidade mundial. Embora nos últimos 20 anos a região tenha experimentado importantes melhorias, ainda são necessários grandes esforços para universalizar o acesso aos serviços básicos com qualidade, continuidade e sustentabilidade. Entre 1990 e 2004, a porcentagem de habitantes sem abastecimento de água na região diminuiu de 17% para 9% e a falta de acesso ao saneamento decresceu de 32% para 23% da população total. Estas melhorias quantitativas ocultam sérias deficiências qualitativas. No final de 2007, apenas 24% da população urbana contava com sistemas efetivos de vigilância de qualidade da água potável, enquanto que menos de 50% desta população contava com redes de encanamento. As cifras de acesso escondem importantes desigualdades entre populações de distintos níveis sociais e entre setores urbanos e rurais. A população mais carente sofre mais com a falta de água potável: 70% das pessoas que não têm acesso a estes serviços encontram-se dentro das 20% mais pobres da região. Quando se fala em serviços de saneamento, a cifra alcança 84%. As zonas rurais também são as mais afetadas, cerca de 30% da população não conta com água potável, enquanto que na região urbana o índice é de 4%. Para 2015, as Metas do Milênio (ODM) esperam reduzir pela metade o número de pessoas que, no final do milênio passado, não contavam com os serviços de água e saneamento. Atingir este objetivo na América Latina e no Caribe equivale a estender o acesso à água para aproximadamente 40 milhões de cidadãos, além de expandir o acesso à saneamento para cerca de 60 milhões de pessoas, nos próximos 7 anos. A região conta, no entanto, com suficiente estrutura física que torna possível o cumprimento das Metas do Milênio em 2015. Mas é necessário um investimento adicional de aproximadamente US$ 30 bilhões. Se o objetivo fosse alcançar uma cobertura de serviços a nível universal, o montante passaria para US$ 50 bilhões, e chegaria a US$ 75 bilhões se incluíssemos o tratamento de águas residuais. Os indicadores mencionados dão uma idéia tangível da magnitude do desafio que enfrentamos, mas também é preciso melhorar a capacidade de gestão das empresas provedoras de serviços, bem como o ambiente regulador do setor. As deficiências nestes campos contribuem, a cada dia, para que mais de 200 milhões de habitantes da região recebam serviços em condições deficientes de potabilidade e continuidade e, em geral, de baixa qualidade. AQUA VITAE 7 O desafio da região É preciso garantir qualidade, quantidade e a confiabilidade do recurso hídrico, sendo necessário fortalecer as instituições de planejamento, regulamentação e controle do setor, além de melhorias na gestão e transparência das prestadoras de serviço. As ferramentas que darão ao nosso país o êxito esperado nesta agenda de atividades são a disponibilidade de recursos financeiros que facilitem o financiamento do investimento e o acesso a cooperação técnica que permita difundir e coordenar as melhores práticas internacionais na provisão de serviços de água e saneamento. A Espanha é um provedor natural de ambos os recursos. Ao tradicional apetite espanhol de investir na América Latina, agregase agora o Fundo de Acesso a Água Potável e Saneamento, anunciado pelo Presidente José Luis Rodríguez Zapatero, durante a XVII Cúpula Ibero-Americana, realizada no Chile, em 2007. A Espanha deverá aportar US$ 1,5 bilhão neste Fundo para financiar projetos ligados à água potável. Por sua vez, a vasta experiência das empresas espanholas no setor trará um valor agregado significativo na hora de buscar modelos de referência na gestão e na transparência de operadores. Estes modelos poderão ser somados aos casos de comprovada eficácia, existentes na região. A gestão das empresas Na América Latina, coexistem uma variedade de modelos bem sucedidos com participação ativa do setor público e privado. Refiro-me, por exemplo, à experiência de Puerto Cortés, uma pequena cidade na costa Atlântica de Honduras. Há apenas 10 anos, as pessoas daí viviam uma grave crise sanitária. Mas graças ao compromisso sustentável dos prefeitos, ao longo de quatro mandatos, foi possível gerar um consenso social sobre a importância de investir não apenas em água potável como também em redes de esgoto e tratamento de águas servidas. No Brasil, temos o caso da SABESP, uma empresa pública que fornece o serviço de água e esgoto para 22 milhões de pessoas no Estado de São Paulo. Após uma profunda reforma nos anos 90, a SABESP obteve resultados operacionais tão impressionantes, que pôde lançar ações na Bolsa de Nova York para financiar centenas de milhões de dólares em obras de expansão. Também temos o exemplo de Medellin, onde uma ambiciosa estratégia sanitária foi elaborada há quase 25 anos, contando com o respaldo do profissionalismo das Empresas Públicas de Medellin e com o apoio de sucessivas prefeituras. Em breve, a cidade deverá construir uma segunda usina com capacidade para tratar 100% das águas residuais. No Chile, os investimentos privados nas plantas de tratamento permitirão que, em poucos anos, o país se converta no único da região a ter tratamento universal de águas servidas. O que estes exemplos tão diferentes têm em comum? O fio condutor são os resultados. Sejam públicas ou parcialmente privadas, estas entidades funcionam como verdadeiras empresas. 8 AQUA VITAE Ou seja, são autônomas e transparentes, e têm diretórios que exigem resultados específicos. São empresas que geram lucro suficiente para cobrir os custos de operação, manutenção e, pelo menos, parte do serviço da dívida para sua expansão. Mas o mais importante é que estas empresas estão diminuindo a lacuna que separa ricos e pobres no que se refere à cobertura dos serviços básicos. Porque, como aprendemos, só as empresas com solidez em sua gestão e em seus balanços financeiros são capazes de executar, de maneira sustentável, as obras de expansão. No BID estamos convencidos de que estes exemplos bem sucedidos podem ser reaplicados no resto da América. Hoje, existem milhares de governos municipais em nossa região que estão dispostos a explorar novas maneiras de resolver os desafios do setor. A descentralização, combinada com a estabilidade econômica dos anos recentes, oferece oportunidades incríveis para se avançar no cumprimento das Metas do Milênio e nos aproximar mais rapidamente da universalização dos serviços de qualidade. A contribuição do BID Desde sua fundação, o BID teve como uma de suas prioridades estratégicas os serviços de água e saneamento. O primeiro projeto do Banco, aprovado em 1960, foi para financiar uma usina de tratamento de água em Arequipa, no Peru. O Banco está completando 50 anos em 2009. Ao longo de sua existência, manteve uma presença ativa nestes setores da América Latina e do Caribe, por meio de uma carteira ativa de empréstimos com e sem garantias soberana, além de apoios que se concretizaram através de produtos financeiros, sob a forma de assistência técnica a entidades reguladoras ou empresas do setor. A Iniciativa Água e Saneamento é desenvolvida por meio de Planos Setoriais para cada país. Cada plano se inicia com uma análise específica sobre a situação do país, seus desafios e alternativas de solução para os problemas que impedem o desenvolvimento do setor e o cumprimento das Metas do Milênio. Para consolidar e potencializar esta presença, lançamos durante nossa Assembléia Anual de Governadores – realizada em 2007, na Guatemala - a Iniciativa Água e Saneamento. O objetivo desta Iniciativa é apoiar os países da região para que alcancem acesso universal aos serviços sanitários, de forma sustentável, com qualidade, confiabilidade e levando em conta a capacidade de pagamento da população para cada um deles. Por meio dela, impusemos a nós mesmos quatro metas para 2012: Para se atingir os ODM, é preciso estender o acesso à água para aproximadamente 40 milhões de cidadãos, além de expandir o acesso ao saneamento para cerca de 60 milhões de pessoas, nos próximos 7 anos. Foto: BID As ferramentas que darão ao nosso país o êxito esperado nesta agenda de atividades são a disponibilidade de recursos financeiros que facilitem o financiamento do investimento e o acesso à cooperação técnica que permita difundir e coordenar as melhores práticas internacionais na provisão de serviços de água e saneamento. 1)Apoiar 100 cidades de médio porte que queiram estender a cobertura e melhorar a qualidade de seus serviços de abastecimento de água e saneamento. 2)Prover financiamento e assistência técnica a, pelo menos, 3 mil comunidades rurais que tenham os mesmos objetivos. 3)Financiar programas de proteção integral de fontes de água em, no mínimo, 20 micro bacias hidrográficas prioritárias. 4)Financiar atividades de capacitação e fortalecimento institucional para operadores do serviço. Nossa Iniciativa será desenvolvida por meio de Planos Setoriais para cada país. Cada plano será iniciado com uma análise específica sobre a situação do país, seus desafios e alternativas de solução para os problemas que impedem o desenvolvimento do setor, bem como o cumprimento das Metas do Milênio. Neste momento, posso informar que, desde seu lançamento, já estamos atuando em projetos que apóiam 44 das 100 cidades objetivo, com programas de melhoria de qualidade, cobertura e gestão das prestadoras de serviços, além de programas que deverão beneficiar 720 das 3 mil comunidades rurais e projetos para 10 das 20 micro bacias hidrográficas. Um exemplo emblemático da Iniciativa é o Programa de Água e Rede de Saneamento da Periferia da Bolívia. O projeto dotará de infra-estrutura necessária para prestar serviços contínuos e sustentáveis no setor hídrico e para recolher e tratar as águas residuais no perímetro urbano de três regiões metropolitanas do país, beneficiando 1 milhão de novos usuários. Trata-se de um empreendimento liderado pelo BID, com um custo total de US$ 150 milhões e aportes em contrapartida da Bolívia. Empresas como KFW, CIDA, SIDA e GTZ expressaram seu interesse em participar. Neste ano, o volume de financiamento que o BID deverá outorgar ao setor deve alcançar mais de US$ 1 bilhão, quase o triplo da média de aprovações anuais dos últimos 5 anos. Estamos AQUA VITAE 9 cooperação entre prestadoras de serviço e melhorar a eficiência dos mesmos. O programa já conta com três casos pilotos de cooperação, que estão em andamento: EPM (Colômbia) e ENACAL (Nicarágua); SABESP (Brasil) e SEDAPAL (Peru) e; Águas Andinas (Chile). Levando-se em conta que o consumo de energia nos sistemas de água, pode sofrer uma redução de, pelo menos, 25% foi desenvolvido um esquema de assistência técnica para incrementar a eficiência energética em empresas prestadoras de serviços sanitários. O objetivo é reduzir o consumo de energia (e a emissão de gases do efeito estufa) no setor de água e saneamento. O programa já está sendo executado com excelentes resultados nas seguintes empresas e organizações: ANDA em El Salvador www.anda.gob.sv; ENACAL na Nicarágua www.enacal.com.ni; ANDESCO www.andesco.com e um Ministério do Meio Ambiente da Colômbia. www.minambiente.gov.co Estamos na etapa final da preparação de dois fundos: - AquaFund: um fundo com multi-doadores de Assistência Técnica voltado para os setores com recursos não reembolsáveis para o fortalecimento institucional e de prestadoras de serviços, preparação de projetos, financiamento de programas pilotos e financiamento de expansão em áreas marginalizadas. O AquaFund se alimenta de contribuições do BID, de doadores bilaterais e do setor privado. www.iadb.org - AquaExpress: uma linha de crédito para empresas que cumprem com certos critérios de eficiência, transparência e solidez financeira, com acesso desembaraçado e flexibilidade no uso dos recursos. www.iadb.org Presença na Expo Zaragoza Na América Latina, coexistem uma variedade de modelos bem sucedidos com participação ativa do setor público e privado. Foto: BID trabalhando com as autoridades de 14 países para levar a cabo planos setoriais e esperamos concluir na segunda metade de 2008 o processo de seleção e contratação de pessoal, que deverá duplicar o número de funcionários que atuam diretamente neste setor, em todos os países da região. É claro que isto é apenas o começo e que ainda falta muito para ser fazer. Por isso, demos impulso a um profundo realinhamento no BID e introduzimos mudanças e novas ferramentas que nos permitirão oferecer um serviço muito mais ágil e flexível para nossos clientes em geral e para o setor hídrico e de saneamento, em específico. Novos instrumentos Dentre os novos instrumentos cabe mencionar os empréstimos – em moeda local - que permitem eliminar o risco de câmbio existente no endividamento da moeda estrangeira. Tal modalidade de crédito já foi utilizada em empréstimos de risco soberano para o setor no México, no Chile e no Peru. O Programa de Rede de Empresas Irmãs, patrocinado pelo BID e pela UN-Habitat, foi criado com o objetivo de promover a 10 AQUA VITAE Este espetacular recinto da Expo Zaragoza, somado ao profissionalismo de seus organizadores, à sua paixão e ao senso de solidariedade do povo aragonês, foi o cenário ideal para transmitir alguns exemplos do trabalho recente do BID neste setor vital para a região. Por isso, marcamos presença patrocinando a participação de representantes de 8 países da América Latina e exibindo 6 experiências bem sucedidas, das quais o Banco participou ativamente, a saber: - Programa social e ambiental Igarapés de Manaus, Brasil - Programa de saneamento de Montevidéu, Uruguai - Estratégia e Plano Nacional para a gestão integrada de recursos hídricos, Costa Rica - Projeto de tubulação de Puerto Cortés, Honduras - Projeto Montero, Cooperativa COSMOL, na Bolívia - Programa de saneamento do Rio Medellin, Colômbia Nosso objetivo, durante a visita à Expo, foi ter a oportunidade de falar com o Gover no Espanhol sobre a situação do setor hídrico na América Latina e nos colocarmos à disposição para colaborar com o Fundo Ibero-Americano para o Acesso à Água Potável e Saneamento. O Banco conta com as capacidades técnicas e financeiras para acompanhar esta excelente iniciativa que evidencia, mais uma vez, a permanente preocupação da Espanha em ajudar a América Ibérica e aprofundar os laços que nos unem há mais de 500 anos. ÍCONES ARQUITETÔNICOS DA EXPO Pavilhão Puente. Cidades do Futuro. Sed. Oikos… modernidade que se relaciona e fala de água, tendo como símbolo do ser humano a escultura de uma Torre, capaz de transformar sua convivência com o recurso hídrico. Por Boris Ramírez Foto: Carmen Abdo A Expo Zaragoza foi caracterizada por uma decolagem arquitetônica impressionante. E não se trata de arquitetura posta em função da estética, e sim de um recurso comunicativo para atrair a mensagem hídrica e o desenvolvimento sustentável em praças temáticas que formam, em cada material construtivo, em cada linha de desenho e em cada espaço, um plano de confronto entre o visitante e a realidade da água. Os ícones arquitetônicos da Expo são verdadeiras peças de uma confecção pensada e construída para serem os oráculos que convidam as pessoas a ter um espaço onde possam desfrutar de um pouco de prazer e de aprendizagem. Arquitetos renomados mundialmente fundiram desenho-linha-mensagem em obras. AQUA VITAE 11 Fotos: Carmen Abdo A Torre da Água é um edifício-escultura em forma de uma gota d’água. É a ambiciosa proposta do arquiteto Enrique de Teresa e do engenheiro Julio Martínez Calzón para se tornar o símbolo da Expo, com seus 76 metros de altura. A obra, chamada Splash, reproduz o respingo de uma gota d’água suspensa no ar, no interior do edifício, medindo 21 metros de altura. 12 AQUA VITAE Fotos: Carmen Abdo O Pavilhão Puente é um espaço pelo qual ninguém passa indiferente. Não se trata de um edifício, mas tampouco é apenas uma ponte. Na verdade, é um artifício da arquiteta iraquiana Zaha Hadid, a única mulher no mundo a conseguir obter um Prêmio Pritzker, o mais importante da arquitetura. A ponte foi, sem dúvida, o acesso peatonal mais importante para a Expo. Desenhada com uma forma orgânica e curvilínea de 270 metros de longitude e 7 mil m2, trata-se da única ponte habitável na Espanha e uma das poucas existentes no mundo. AQUA VITAE 13 Fotos: Carmen Abdo Palácio de Congressos. A obra dos arquitetos Enrique Sobejano e Fuensanta Nieto é um edifício composto de três partes: um auditório, um pavilhão multiuso e salas modulares, distribuídas em uma área de 22.850 m2 e nove andares. 14 AQUA VITAE AS PRAÇAS TEMÁTICAS Constituem um espaço de reflexão e descanso. Foram desenhadas pelos arquitetos Batlle Roig, Juan Gayarre e Ricardo Marco e fazem parte de um bulevar ecológico de 370 metros de comprimento e 20 metros de largura. Fotos: Carmen Abdo Foto: Carlos Luna Cidades de Água trata-se de uma praça aberta sem paredes, simulando os espaços abertos de uma cidade, cujo conteúdo principal se refere ao recurso hídrico como um recurso urbano. Propõe uma viagem ao longo de diferentes cidades, relacionadas de alguma forma com a água. Água compartilhada. Em uma área de 900 m2 de superfície, várias plataformas com diferentes níveis interconectados por escadas mecânicas alcançam uma altura máxima de 15 metros acima do chão. A idéia foi conectar o visitante ao desafio de repensar a gestão de uma bacia hidrográfica comunitária. AQUA VITAE 15 Foto: Carlos Luna Fotos: Carmen Abdo 16 AQUA VITAE Sed é um gigantesco iglu de sal de 12 metros de altura, que serviu de espaço para todo o tipo de soluções tradicionais e de última geração no combate à sede existe no mundo. Ao caminhar por ele, podia-se ver o uso desmedido de água nas cidades, a utilização racionada no deserto, conhecer as migrações causadas pela busca do recurso hídrico e os artefatos criados para a captação de água. Águas extremas. Por dentro, o espaço simula o momento em que uma grande onda quebra sobre a praia. Foi construído com materiais em tons de azul e texturizados, a fim de dar idéia da força da água, onde o visitante podia viver a experiência de um tsunami e um furacão. Fotos: Cintia Sarría Oikos é ambientalmente sustentável, pois conta com vários dispositivos de captação de energia, tais como aero-geradores e placas solares. Um rio percorre o recinto, que conta com 845 m2 de superfície e com um pátio central, coberto por um jardim de aproximadamente 300 metros. O local tenta provar a possibilidade de transformar e armazenar energia utilizando tecnologia de maneira sustentável. Foto: Carmen Abdo AQUA VITAE 17 VOZES DA ÁGUA: GRANDES PRESENÇAS NA EXPO A Expo Zaragoza foi vitrine ideal para que muitos líderes, cientistas, intelectuais e artistas ligados à água aproveitassem para lançar suas idéias e propostas. Dando continuidade, registramos um extrato de muitas destas vozes que, em grande parte, falaram com exclusividade a Aqua Vitae sob perspectivas transformadoras. Rigoberta Menchú. Foto: Sergio Rodríguez 18 AQUA VITAE CHEIA DE ORGULHO MAIA RIGOBERTA MENCHÚ está certa de que parte de sua missão é compartilhar a cosmovisão de seus antepassados e continuar em busca do equilíbrio entre os seres humanos, a Natureza e a água. por Boris Ramírez Sobre suas costas está a herança de 5.124 anos de ensinamentos de seu povo. E, mesmo sendo a mais famosa das vozes dos atuais netos dos maias, Rigoberta Menchú caminha devagar e segura, de seus olhos negros saem olhares que transmitem sossêgo, de sua boca brotam palavras que trazem acentos ancestrais do Livro Sagrado: o Popol Vuh. Caminhava pelas ruas da cidade de Huesca (a 70 km de Zaragoza) com a simplicidade característica de um vencedor de um Prêmio Nobel pela Paz. Huesca parou para recebê-la e ouvir sua mensagem, a primeira a constar no documento Palavras da Água, realizado no marco da Expo Zaragoza 2008. No Teatro Olímpia, Menchú apresentou seu livro “Água e Humanidade - uma existência recíproca”, o qual dedicou a ca çã o di reta c om el a, em s uas mai s variadas manifestações”. Mas esta re l a ç ã o mudou. Após uma coletiva para imprensa, realizada no Palácio de Villahermosa, a ganhadora do Prêmio Nobel pela Paz conversou com a Equipe Aqua Vitae sobre os desafios e a urgência de arregaçarmos as mangas para restaurar o equilíbrio com a Mãe Natureza. Como devemos interpretar os ensinamentos dos maias em uma perspectiva atual com relação à água? Não podemos fazer uma nova interpretação, já que a mensagem de nossos ancestrais é bastante simples e nos obriga a viver em equilíbrio. Não pode haver nenhuma interpretação em relação a isso. A cosmogonia maia fala sobre respeito e isso não se trata de uma forma de vida, é algo que se pratica desde os níveis espiritual e material. da água e dos filhos da Mãe Terra. O que o povo latino-americano deve aprender e ensinar em relação ao manejo adequado da água? Não temos o conhecimento suficiente de tudo o que devemos fazer, nem sequer nas comunidades indígenas, onde muitas práticas e circunstâncias afetam a relação que devemos ter com a Natureza. O que sabemos é que é preciso levar em conta três aspectos importantes: 1- Educação para todos, para se aprender a conviver com a Natureza. 2- Investimento público para a preservação das bacias hidrográficas na América Latina, onde há um grande abuso no uso da água, principalmente na agricultura. 3- Uso eficiente dos recursos econômicos que sejam voltados para cuidar e usar o líquido sagrado. Quais os ensinamentos que devemos resgatar desta visão maia para cuidarmos da água nos dias de hoje? Por onde começam estas responsabilidades? O respeito por ela. Sabemos que no seio da Mãe Terra há um ser líquido que chamamos Água. Os maias cuidam e Pelas famílias, que devem aprender como consumir água; pelas comunidades, que devem cuidar das fontes d’água; pelos “Sabemos que no seio da Mãe Terra há um ser líquido chamamos Água. Os maias cuidam e protegem a água, mas ainda assim existem muitas ameaças a serem enfrentadas.” todo o mundo, especialmente ao Continente latino-americano. “Ser planta, ser vento, ser natureza é ser água”. Os Povos Primitivos nos ensinam que a vida, vista da cosmogonia maia, é prática e simples de se entender. “Ser natural é ser água”, não há por onde enredar-se. Em seu livro, Menchú tenta ser clara com sua mensagem: “para recordarmos a grandeza da Mãe Água, o povo maia criou e transmitiu de geração em geração uma ampla variedade de práticas culturais, relatos, histórias, contos e lendas que cultivam uma relação de respeito, de alimentação e de comuni- p ro t e g e m a á g u a , m a s a i n d a a s s i m e x i s t e m m u i t a s a m e a ç a s a s e re m e n fre n t adas . O que é preciso mudar imediatamente na administração dos recursos hídricos? As mudanças mais urgentes devem garantir uma legislação nacional e internacional que ajude a proteger a água, nelas deve ficar claro que a água é um bem universal e geral da Humanidade. Neste ponto, há polêmicas com o tema da privatização das fontes e dos aqüíferos, mas ainda bem que existem espaços como a Expo Zaragoza, para discutirmos e buscarmos soluções que, necessariamente, precisam ser em favor governos, que devem se comprometer com obras; pelas ONGs, que têm grande responsabilidade e experiência na luta pelos valores dos direitos humanos e cuja missão é buscar melhores condições para o acesso à água e soluções para os problemas sanitários. Qual deve ser o papel das empresas? Devem aprender a ser responsáveis com projetos ou com programas que gerem sensibilidade. Sei que existem muitos esforços neste sentido, mas deve haver cada vez mais, porque há outras empresas que ainda deixam muito a desejar e precisam aprender a respeitar e a conviver. AQUA VITAE 19 MARINA SILVA, A POTENTE VOZ DA AMAZÔNIA Seringueira, professora do ensino primário, senadora e ministra do Meio Ambiente. Uma das mulheres mais influentes do mundo no compromisso ambiental. por Yazmín Trejos À primeira vista, trata-se de uma pessoa de aparência simples e tímida, mas quando fala se transforma em uma potente voz com peculiaridade não para metralhar e ofender, e sim ensinar e convencer. Marina Silva conhece profundamente a natureza. Cresceu na espetacular selva amazônica do Brasil. Dela se nutriu, com ela aprendeu, viveu e ainda vive, para honrá-la. É deste patamar que pede aos “governos, comunidades e empresas que trabalhem juntos em temas tão importantes como a água”. Quando pequena, trabalhava com a extração da borracha. Em sua casa, lhe contavam muitas histórias e lhe ensinaram a somar, mas foi aos 16 anos que entrou na escola. Utilizando o que havia aprendido, não só com os números mas também com as letras, tornou-se professora e, em seguida, ativista ao lado Chico Mendes e Leonardo Boff. A vida a levou ao Senado e a ser Ministra do Meio Ambiente do Brasil. Até hoje, se julga entregue às causas ambientalistas, não por meio da luta, mas sim da palavra, garantindo aos que a ouvem conhecimento e aprendizagem. “O importante é buscar soluções que levem a tomar medidas políticas para um “Este é o recado para as empresas: mudem não apenas a maneira de fazer, mudem a maneira de ser. Quando nós mudarmos a nossa forma de ser, teremos um novo fazer. Isso é valido para políticos, cientistas e todos nós.” 20 AQUA VITAE Marina Silva. Foto: Carmen Abdo país, porque os governos passam, mas os países ficam”. O que significa a Expo 2008 para você, o que a trouxe aqui? Tem certeza de muitos assuntos, mas sobretudo de que algo deve ser feito para resolver a questão da dialética entre desenvolvimento e proteção ambiental, levando em conta a natureza e as comunidades. Primeiramente porque acredito ser um espaço privilegiado de divulgação, de comunicação, de boas práticas, de boas experiências. Sobretudo um espaço em que se podem trazer diferentes setores, diferentes segmentos para um comprometimento, ainda que seja um comprometimento difuso, com algumas questões importantes para a proteção dos recursos hídricos e uso sustentável deles, mas ainda assim, é um espaço muito valioso. E outro aspecto é o fato de ser um terreno privilegiado, pois une investimento com conhecimento, o lúdico com as denúncias de realidades dramáticas. Acho que esses movimentos Esteve na Expo Zaragoza 2008 para entregar seu livro “Novas estratégias para frear a devastação na Floresta Amazônica” e concedeu uma entrevista exclusiva a Aqua Vitae, ampliando nossos horizontes sobre um tema que a apaixona, tanto que se tornou uma das 100 mulheres mais influentes no mundo, segundo a Revista Times. colaboram, cada vez mais, para que pessoas e instituições criem laços. Há de se ter o cuidado de não nos transformarmos em participadores de eventos, e sim participadores de processos que constituem redes que sejam feitas por laços, que se fazem e desfazem, e não nós que nos deixam presos. Ter a clareza de que é possível, em cima de princípios éticos e valores morais duradouros, fazer alianças pontuais para se alcançar determinados objetivos comuns. Isso é válido para política, empresas e pessoas e é altamente positivo. Quais seriam os principais desafios para a América Latina na questão ambiental? Primeiro, de continuar buscando um caminho próprio, pois no nosso desafio está posta uma equação que é única: não há como separar meio ambiente de desenvolvimento e vice-versa. Pois ainda não atendemos as necessidades básicas e fundamentais do nosso povo. Os países que já atenderam estas necessidades podem estabilizar suas economias, não é o nosso caso. Fazer isso, seria condenar milhões de pessoas a viver em pobreza. Temos que buscar uma nova forma de caminhar que possibilite crescer, gerar empregos, inclusão social, sem repetir os mesmos erros gerados em outras regiões do mundo. Ou seja: para eles é “descarbonizar” suas economias, para nós, é não carbonizar a nossa. E para isso só existe um caminho: o desenvolvimento sustentável. Quais seriam os principais atores desta mudança? São agentes diversificados. Existe um momento em que os governos ocupam a posição de arco que impulsiona a flecha, mas em outros momentos, eles ocupam a posição de flecha impulsionada pelo arco da sociedade. Acho que estamos vivendo um momento em que a sociedade se colocou na posição de arco, querendo uma resposta, tencionando os governos para que induzam processos de gestão dos recursos naturais, que não comprometam estes recursos para as futuras gerações, até porque uma parte deles já está comprometida para as gerações presentes. E este movimento de arco também começa a influenciar a vida das empresas, que começam a pautar determinados assuntos e questões, pois percebem que seus usuários/clientes querem ser parceiros na viabilização de valores, não querem comprar coisas, querem adquirir valores. Ninguém quer levar uma mesa para casa que tem trabalho escravo, injustiça social e ambiental. Você pode levar uma mesa e sentar-se em volta dela e imaginar: esta mesa ajudou as pessoas a melhorarem suas vidas, ajudou a melhorar as florestas, a proteger a biodiversidade. Este é o recado para as empresas: mudem não apenas a maneira de fazer, mudem a maneira de ser. Quando nós mudarmos a nossa forma de ser, teremos um novo fazer. Isso é valido para políticos, cientistas e todos nós. O que você acha que o Brasil pode fazer para ajudar na mudança em relação à água na AL? Como o Brasil pode se tornar um líder para AL neste sentido? O Brasil pode manter esse exercício pelo exemplo e pela liderança frater na. Transferir os conhecimentos que temos, nossas experiências. Buscar o apoio junto aos países desenvolvidos para que possamos repassar esta experiência para países em desenvolvimento. E não entrar na lógica de levarmos as coisas prontas para nossos parceiros, pois eles têm de se tornar auto-suficientes, toda e qualquer ajuda na agricultura, na gestão das águas, das florestas, da biodiversidade, dos conflitos sociais que não possam ser endogenamente resignificadas por aquela cultura, por aquela sociedade, são artificiais. Isso foi o que levou à crise alimentar que vivemos hoje: toda ajuda dada para a África, sobretudo, foram ajudas artificiais dos europeus. Não foi um processo com os africanos. Nós temos de deixar de fazer as coisas para as pessoas e fazermos com as pessoas. Acho que o Brasil precisa liderar pelo exemplo, inclusive nesta nova atitude. Você se julga uma mulher de fé. Qual a relação entre espiritualidade e água? Uma das relações mais radicais entre espiritualidade e água está na Bíblia: “no princípio o Espírito de Deus pairava por sobre a água...” Deus disse: “Faça-se a luz, faça-se as plantas, os animais, faça o homem”... Mas Ele não disse: “Faça-se a água”. Logo, se existe uma coisa que não temos como fazer é a água, pois ela já estava feita. RISOS A Revista Times disse que você é uma das 100 mulheres mais influentes do milênio. O que acha disso? Acho que são escolhas simbólicas. Recentemente, foi escolhida uma lista com cinqüenta pessoas, dentre elas cientistas, políticos, pessoas do mundo das artes etc. Isto para mostrar que elas representam determinados segmentos da sociedade. Eu sempre digo que o representante não substitui o representado. Assim, me sinto honrada de fazer parte deste grupo, mas sempre com a consciência e o sentido de que sou representante de algo e não que substituo aquilo que estou representando. COMO DAR SUSTENTABILIDADE HÍDRICA A UMA DAS MAIORES CIDADES DO MUNDO JOSÉ LUIS LUEGE, diretor da CONAGUA México, apresentou o desafio para se alcançar o equilíbrio para matar a sede de 20 milhões de pessoas. por Daniel Zueras O diretor geral da Comissão Nacional de Água (CONAGUA) do México, José Luis Luege, Explicou na Tribuna da Água a necessidade do “Programa de sustentabilidade hídrica do Vale do México”. O Programa espera trazer segurança hídrica para a Cidade do México, cuja população duplicou nas últimas três décadas, chegando a 20 milhões de habitantes, e com os problemas de infraestrutura resultantes. Este Programa, que segundo Luege, “é o maior do país e um dos mais importantes do mundo”, pretende reverter o enfoque atual para uma visão de sustentabilidade no país, tratando 100% de suas águas residuais. Um dos objetivos do programa é reutilizar as águas tratadas “e tornar potável alguns reservatórios que ainda faltam”. Todas as águas residuais do Distrito Federal devem ser tratadas, “pois ainda não são”, afirmou Luege. A condição para os próximos quatro anos é a criação de seis grandes u s i n as de tratamento. Numa primeira eta p a , d e v e r ã o s e r e c o n o m i z a d o s AQUA VITAE 21 15 metros cúbicos por segundo de água do aqüífero do Vale do México. O investimento total é de quase US$ 4,5 bilhões. Para isso, Luege conta com “o apoio técnico, científico e financeiro do exterior”. O caso do Vale do México é bastante especial, já que o Distrito Federal foi aterrado num local onde, antes, havia um lago de dois mil km2. A ação do ser humano, “uma luta fratricida para remover a água superficial e poder construir nos melhores terrenos”, fez com que a cidade passasse a enfrentar uma crise hídrica. E, embora chova bastante, o ecossistema dos lagos foi destruído e a água passou a escorrer de maneira acelerada. Estima-se que o consumo de água na capital asteca seja de 80 metros cúbicos por segundo, dos quais quase 60 metros cúbicos são extraídos do lençol freático, “quando a quantidade máxima deveria ser de 15 metros cúbicos por segundo”. Para acabar com este problema, a CONAGUA iniciou o “Programa 15”, com o objetivo de diminuir a extração de 60 metros cúbicos para os 15 metros cúbicos aceitáveis. Em uma primeira etapa, a quantidade será de 45 metros cúbicos, reduzindo, à princípio, 15 m3 de água por segundo. “Esperávamos alcançar este objetivos até 2015, mas por exigências do presidente Calderón, a data fixada foi 2012”. De todos os rios que abasteciam o vale antigamente, hoje resta apenas um pequeno córrego, chamado Magdalena, “que deve ser cuidado como uma relíquia”. O restante foi canalizado ou transformado pelo homem em drenagens. Desta forma, a reposição dos lençóis freáticos está quase destruída e sofre uma exploração brutal, sendo que o mais explorado do mundo é o lago Texcoco, cerca de 800% acima de sua capacidade. Tudo isso provoca um grave problema na Cidade do México: ela está afundando, literalmente. Luege assinala: “foram provocadas inundações catastróficas”. A cidade afunda 10 centímetros por ano, 10 metros por século, destruindo a infraestrutura civil, pontes, ecossistemas…”. O México tem uma participação ativa na Expo Zaragoza. Quais os objetivos que buscam aqui? Participar e compartilhar nossas experiências, bem como aprender com a expe22 AQUA VITAE José Luis Luege. Foto: Carmen Abdo O consumo de água na capital asteca chega a 80m3/s, dos quais, cerca de 60 são extraídos do lençol freático, "quando o máximo deveria ser de 15m3/s" riência de outros países e empresas. Nosso programa estratégico, determinado pelo Plano Nacional Hídrico 2007-2012, é ambicioso e precisamos de recursos financeiros e transferência de tecnologias. Estamos aqui apresentando projetos federais e estatais que necessitam de fortes investimentos. Estão buscando financiamento? O México tem investimentos em quantidade e os recursos financeiros são fundamentais. O Presidente do BID, Luis Alberto Moreno, esteve conosco e advertiu para o fato de que a AL requer US$ 150 bilhões em investimentos em água e saneamento. Mas não buscamos só financiamento, também queremos que companhias internacionais se interessem por nossos projetos, conheçam nosso Por ser um dos maiores consumidores de água, o país precisa conseguir incrementar tecnologicamente o uso da mesma, pois estaremos assim liberando importantes quantidades de água para o consumo humano e deixaríamos de super explorar as fontes. Se o setor investir em tecnologia, então haverá água. Sendo um dos maiores consumidores de água, será que este setor está pagando corretamente por ela? O setor agrícola é quem recebe os subsídios mais altos, além do setor de geração de energia, por isso consideramos importante implantar processos de tecnologia para que consumam menos água ou que incorporem os processos produtivos da água. ESQUECEMOS DA VISÃO RURAL QUANDO FALAMOS DE ÁGUA INÉS RESTREPO, pesquisadora da Universidade do Vale da Colômbia, fez um amplo estudo dos desafios que os países da AL têm com relação ao manejo, uso e aplicação de tecnologias para aproveitar os recursos hídricos. por Boris Ramírez Inés Restrepo. Foto: Carlos Luna trabalho e participem deles. Nossa meta é tratar 100% das águas poluídas do Vale do México, para isso precisamos de US$ 2 bilhões. Quais são as obras mais urgentes? A construção de seis usinas de tratamento: a de Guadalupe, a de Berriozábal, Nextlalpan, Chiconauatla, Zumpango e a de Atotonilc, considerada uma das maiores do mundo, já que deverá ter capacidade para despoluir 23 metros cúbicos por segundo. Este nível de investimento também requer auxílio técnico e aplicações tecnológicas? Os investimentos privados que buscamos também têm um objetivo de colaboração internacional no âmbito científico e tecnológico. Aqui na Espanha existe muita tecnologia em tratamento de água. Com o investimento privado, conseguiremos também a construção das usinas de despoluição. Um dos principais componentes do Plano Hídrico é o incremento tecnológico do setor agrícola. Por que isto tem tanta importância? “A sustentabilidade hídrica em comunidades rurais: avanços, experiências e lições”, este é o título do novo livro da coleção Palavras da Água. Sua apresentação veio acompanhada de uma lição magistral de Inés Restrepo, do Instituto de Pesquisas e Desenvolvimentos em Abastecimento de Água, Saneamento Básico e Conservação do Recurso Hídrico da Universidade do Vale, na Colômbia. “A maioria dos tecnocratas que propõem soluções para as regiões rurais nunca nem viveram lá”. A própria Restrepo se inclui, ao indicar que os engenheiros, assim como ela, buscam soluções que, muitas vezes, nem ao menos tiveram a opinião das pessoas que poderiam se beneficiar delas. A especialista conta que existem muitos aspectos sobre o uso da água no mundo AQUA VITAE 23 rural, os agricultores acabam sendo classificados como desperdiçadores, quando na realidade, os estudos demonstram totalmente o contrário. “Foram realizados alguns estudos junto às famílias que se dedicam a pequenas produções agrícolas na Colômbia. Nestes estudos, pudemos constatar que uma família do campo usa cerca de 210 litros por dia, enquanto que uma pessoa que vive na cidade chega a usar aproximadamente 300 litros/dia”. Restrepo apresenta uma realidade diferente. “As pessoas da zona rural sabem que a água é fundamental, pois são conscientes de que sem água teriam de vender a terra”, por isso cuidam da água e sabem usá-la. “Na maior parte de nossos países, ser uma pequena comunidade significa não existir”. Esta frase faz parte do ensaio de Restrepo, que a explica: “os órgãos internacionais revisam os indicadores referentes à infra-estrutura construída, sem se importarem se as obras foram bem feitas ou se o capital foi bem gasto, sem se importarem com as pessoas. Os indicadores deveriam incluir mais as pessoas”. Seu discurso está voltado para o fato de que “a opinião das pessoas que vivem nas regiões rurais deve ser levada em conta, dado que suas necessidades são diferentes”. Para isso, considera fundamental responder às seguintes questões: O que é uma família campestre? Como esta família usa a água? Para quais atividades usam a água? Quanto e qual a qualidade da água que necessitam? Quem são os mais vulneráveis? No caso da Colômbia, todas as perguntas já têm uma resposta, graças a um estudo feito em 2005, junto às comunidades rurais: uma família formada por 4 pessoas, 1 cachorro, 10 galinhas, 5 porcos e 5 vacas, com um espaço de 400 metros quadrados de terra cultivada e um jardim em volta da casa, gasta 191 litros de água por pessoa/dia em usos domésticos e produtivos; nos finais de semana irrigam a terra e durante a época de seca, a regam a cada três dias. Quando consomem café, o consumo de água aumenta em 58 litros por pessoa/dia e se tiverem um tanque com peixes, o número sobe para 420 litros d'água por pessoa/dia. 24 AQUA VITAE Segundo Restrepo, esta informação é importante, pois ajuda a determinar as ações que devem ser empreendidas para o uso e consumo da água em “setores da população que têm produções em pequena escala que, embora não cheguem a representar nem 1% do PIB da Colômbia, representam a vida inteira de uma família”. Sem isso, esta família teria de se mudar para a cidade e continuaria criando círculos de pobreza. “Foram realizados alguns estudos junto às famílias que se dedicam a pequenas produções agrícolas na Colômbia. Nestes estudos, pudemos constatar que uma família do campo usa cerca de 210 litros de água/dia, enquanto que uma pessoa que vive na cidade chega a usar aproximadamente 300 litros d'água/dia”. Restrepo foi ampla em vários temas que se resumem em desafios/ações que devem ser postos em práticas na AL. Fazer um melhor uso da água da chuva. Esta é uma região com alto nível pluviométrico (a costa pacifica da Colômbia é a segunda mais chuvosa do mundo), mas muito mal usada. Não sabemos aproveitar, só se desperdiça. Tratamento de água para reuso. A água deve ser tratada para que possa ser reutilizada em sistemas de irrigação, e com tecnologia adequada, pode servir até para consumo humano. Os sistemas de fornecimento de água potável e de irrigação estão mal planejados. Só existem gestões para a oferta, não para a demanda. Tecnologia com parâmetros rurais. A tecnologia não pode ser transferida de maneira igual de um país para o outro, deve haver um estudo de investigação prévio, que permita incorporar, de maneira efetiva, as aplicações tecnológicas. “É uma pena que milhões de dólares sejam jogados fora em aplicações que, em seguida, ficam obsoletas ou que ninguém sabe usar”. Produtos contaminados. Muitos setores com pequenos e médios produtores usam água para irrigação vinda de fontes de águas superficiais contaminadas. “Tivemos um caso na Guatemala, assim como em outras regiões da América Central, em que a irrigação era feita com água não potável, fazendo com que os produtos do Tratado de Livre Comércio, produzidos com estas águas fossem impedidos de entrar nos EUA, já que não cumpriam com os controles de qualidade fito-sanitários”. Planejar o uso da água para comunidades rurais. Já que estas representam unidades econômicas de pequena escala que são sustento para milhões de pessoas. “Na Colômbia – relata Restrepo – o camponês é proibido de gastar mais de 100 litros de água, enquanto que nas regiões urbanas o seu uso é indeterminado”. Controle de contaminação de fontes. As grandes contaminações das fontes de água são causadas por usos indevidos de pesticidas, fertilizantes e atividades de mineração. “Há casos comprovados de contaminação de pessoas por substâncias químicas, isto é um sinal de alerta”. A mudança climática e a qualidade da água. Os fenômenos climatológicos associados ao aquecimento global estão fazendo com que muitas das fontes usadas para o consumo humano se tornem vulneráveis, dado que inundações depositam nelas grande quantidade de sedimentos. Para Restrepo, as soluções devem ser dadas “em uma nova relação entre sociedade e natureza, que deve ser mediada pela tecnologia, em um contexto que determine a sustentabilidade”. Nesta nova relação, para a Natureza deve-se levar em conta a biodiversidade, a energia e o solo; para a sociedade, o ambiente humano, cultural e econômico; e para a tecnologia, a investigação, o desenvolvimento e a inovação. Apenas desta forma “a gestão integrada do recurso hídrico verá a água como um conector e aglutinador, onde aprenderemos a incluir no ciclo da água a participação dos seres humanos, para entender qual nosso papel dentro deste ciclo”. falhas do sistema antes da catástrofe”. Fala com conhecimento de causa. “Hoje, 1,5 bilhão de pessoas vivem em regiões com problemas relacionados à água. Essa quantidade deverá aumentar para 5,5 bilhões até 2050”. Pachaurí destaca que a solução está em “envolver o capital social para proteger a saúde; incrementar programas de informação e educação, promover boas ações nos governos, bem como mudanças nos sistemas de segurança sanitária”. O ganhador do Prêmio Nobel tem informações suficientes para apresentar cifras, mas, acima de tudo, para propôr o caminho da segunda opção, que deve ser o escolhido para que possamos promover mudanças positivas e mitigar os efeitos do aquecimento global. No caso de América Latina (AL), reconhece os esforços positivos realizados na cidade de São Paulo (Brasil) e na Costa Rica. Ao ser consultado sobre as tarefas pendentes da AL, no que diz respeito às mudanças climáticas, ele diz que “há muito trabalho a ser feito, existem regiões onde a degradação dos recursos naturais é crítica”. Reconhece, entretanto, os esforços importantes realizados na região, como é o caso de São Paulo. “Encontrei boas iniciativas nesse tema, durante uma viagem que fiz”, mas deu mais ênfase ao caso dos países da América Central. Rajendra Pachaurí. Foto: Carmen Abdo PRÊMIO NOBEL DA PAZ RECONHECE ESFORÇOS NA AMÉRICA LATINA RAJENDRA PACHAURÍ, O Prêmio Nobel da Paz 2007 junto com Al Gore, reconhece os esforços positivos empreendidos em São Paulo e na Costa Rica para enfrentar as mudanças climáticas. por Boris Ramírez Seu aspecto taciturno lhe concede uma áurea especial, que combina muito bem com seus traços hindus. O Dr. Rajendra Pachaurí, presidente do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Clima e Prêmio Nobel da Paz 2007, o qual divide com o vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, fala de maneira pausada, mas profunda. “O mundo tem duas opções: ou esperar por uma catástrofe, proveniente das falhas do sistema, das dificuldades, da distorção e da auto-decepção, ou criar uma cultura que proporcione esquemas e equilíbrios sociais que possam corrigir as “A Costa Rica é um bom exemplo de compromisso para com as mudanças climáticas, por seus programas ambientais, como é o caso do carbono zero, sobre o qual todos os países da AL e do mundo deveriam saber”, comentou Pachaurí. Convidado para participar da Expo Zaragoza 2008, Pachaurí deu um amplo panorama dos efeitos do aquecimento global, do degelo das regiões polares, bem como do aumento dos níveis do mar e seus impactos na água. Para o especialista, em matéria de água, é necessário estabelecer regulamentaçõ e s e p a d rõ e s , b u s c a r f o n t e s d e energi a apropri adas , mu danças nos estilos, práticas sustentáveis, além de AQUA VITAE 25 regulamentar e pagar pelas emissões de carbono na atmosfera. Insiste no fato de que para acabar com os impactos nos recursos hídricos são necessárias ações fundamentais como produção de fertilizantes, pesticidas que tenham menos impacto nas fontes de águas; controle dos impactos nos ecossistemas a fim de proteger estas fontes; programas de reflorestamento; mudanças nos sistemas de irrigação e de tratamento das águas residuais. Eis algumas das mudanças apresentadas e compartilhadas pelo Dr. Pachaurí durante sua conferência: - De 1900 a 2000, a temperatura aumentou 0,074°C; - Nos últimos 50 anos a temperatura aumentou 0,128°C; - As emissões de gás carbônico (CO2) sofreram um incremento de 70% entre 1970 e 2004; - Caso as emissões de CO2 continuem causando impacto no aquecimento global, este poderá atingir uma variação entre 1,8 a 4°C neste século; - O mundo está experimentando a mais intensa e longa seca dos últimos anos, em várias regiões. É PRECISO FALAR MAIS DE ENCANAMENTOS E ESGOTOS BLANCA MORENO-DODSON, assessora do Banco Mundial (BIRD) recorda que a ONU estabelece que “para cada dólar investido em água e saneamento, nove dólares são gerados em benefícios sociais e econômicos. por Boris Ramírez O acesso à água e aos serviços de saneamento básico têm impactos no crescimento econômico dos países, pois oferecem condições produtivas, sanitárias, educativas e sociais, que incidem em indicadores de melhoria na qualidade de vida das pessoas. Este é o argumento central exposto por Blanca MorenoDodson, assessora indicada pelo BIRD no tema relacionado à redução da pobreza e administração econômica, para a Tribuna da Água, realizada na Expo Zaragoza 2008. “Antes de investir em computadores e 26 AQUA VITAE Blanca Moreno-Dodson. Foto: Carmen Abdo tecnologia, deveríamos pensar em rede de esgotos e banheiros nos países em desenvolvimento, embora seja menos glamuroso do que falar de fibra ótica, ainda assim é preciso que haja boas condições sanitárias para se gerar bemestar social”, afirma a especialista. Em sua apresentação, Moreno-Dodson menciona uma frase escrita por Vitor Hugo, em 1862: “o bem-estar de uma sociedade é conhecido pelo estado de seus esgotos”. Com isso quis deixar mais evidente a necessidade de investimento no setor sanitário e dos governos priorizarem programas sociais em função da água e da rede de saneamento básico. “A tecnologia é mais bem absorvida em sociedades que contam com o acesso à água e ao saneamento”, já que do contrário – insiste ela – tudo o que for feito neste sentido não será suficiente se não houver melhoria nas condições de vida das pessoas. Desta forma, Moreno-Dodson explica que, faltando pouco tempo para o cumprimento das Metas do Milênio (ODM), uma série de fatores estão acentuando a pressão sobre a água, incidindo diretamente no alcance dos objetivos estabelecidos, quais sejam: - Maior demanda de água em economias emergentes como China e Índia. - Aumento na expectativa de vida. - Melhorias na qualidade de vida das pessoas. - Processos de crescimento urbanístico acelerados. - Crise do mercado alimentício. - Efeitos da mudança climática. - Aumento no preço do barril de petróleo. A Equipe Aqua Vitae falou com MorenoDodson sobre a relação da água como sendo um recurso econômico, social e sanitário. Qual a verdadeira importância da água no setor econômico? Há quatro efeitos fundamentais, que medem a água como sendo um valor econômico, bem como seus impactos relacionados: 1- Efeito direto na produtividade, receita e no trabalho. A água possibilita os setores produtivos gerarem valor econômico a partir da produtividade. 2- Complemento que se deve dar entre os capitais públicos e privados para a geração de projetos. Exemplo: quando o setor público investe em projetos voltados para água e saneamento, propicia investimentos privados que, por sua vez, geram empregos e atividade produtiva. O setor privado pode ainda participar de projetos voltados para estes serviços básicos. 3- Ajustes de custos em épocas de secas ou escassez, que permitam um controle efetivo do consumo de água, bem como do uso da mesma em irrigações, produções e indústrias. 4- Melhorias fundamentais nos setores de saúde e educação, produzindo variáveis sócio-econômicas vitais. Exemplo: se não há água, de que adianta construir um hospital? Por que a água vem sendo mencionada como uma contribuição para o desenvolvimento econômico? O tema já vem sendo tratado há muito tempo, mas agora está mais em voga porque é preciso deixar claro que investimentos em água e esgoto são vitais, já que uma população saudável é mais produtiva; crianças sãs aprendem mais e melhor e não abandonam os estudos. Isto favorece a capacidade econômica dos países. A ONU já estabeleceu que para cada dólar investido em água e esgoto, US$ 9,00 são gerados em benefícios sócio-econômicos. "Antes de investir em computadores e tecnologia, deveríamos pensar em rede de esgotos e banheiros nos países em desenvolvimento, embora seja menos glamuroso do que falar de fibra ótica, ainda assim é preciso que haja boas condições sanitárias para se gerar bem-estar social", afirma a especialista. Quais os países que dão maior relevância para este assunto, e desde quando? É difícil estabelecer uma data, mas não creio que exista algum governo que ache que o tema não é importante. No entanto, quando analisamos os orçamentos das Uniões é possível ver que este não é um assunto prioritário. Os governos devem ver o tema como sendo um fator de desenvolvimento sócio-econômico. Qual sua visão futura com relação ao tema e o que ainda falta ser feito dentro deste contexto? Considero importante continuarmos reforçando o assunto como sendo um bem público e básico, que deve ser levado em conta nos investimentos em infraestruturas, já que tudo o que for desenvolvido neste aspecto contribuirá para o crescimento das pessoas e dos países. Quando visitei o Pavilhão da América Latina , pude ver que um dos objetivos da Expo Zaragoza é conscientizar as pessoas sobre o bom uso da água e isso é importante. Todos os países trazem mensagens neste sentido, mas é importante também discutir a responsabilidade dos governos de investir em água e saneamento, para que a população tenha melhores condições de vida. Es tes s ão al guns dos as pec tos que devem ser priorizados na AL e n o m undo. O que é mais importante: a água como recurso econômico ou como recurso social? A água tem um papel fundamental na saúde e, portanto, na vida das pessoas. Sendo assim, acredito que, como bem público, deva ser algo garantido à população. A discussão é clara: em relação à saúde e ao desenvolvimento, a água é básica, só assim deixaremos de ter que contabilizar as mortes de milhares de crianças por consumo de água poluída. Mas trata-se também de um recurso econômico, por ser capaz de gerar bem-estar, quando a sociedade decide investir no recurso. ATERCIOPELADOS: MÚSICA FANTÁSTICA, MENSAGEM DE COMPROMISSO “Isto foi só um ensaio, nos vemos daqui a pouco”, disse, com a maior simplicidade, Andrea Echeverry, enquanto a platéia ovacionava a presença do grupo colombiano Aterciopelados. por Yazmín Trejos e Boris Ramírez Ela estava plena, cheia de vida… a sua e a do filho que carregava na barriga. Héctor Buitrago, em conversa com a equipe Aqua Vitae, contou-nos sobre seu compromisso com a causa pela Água na Colômbia. De fato, estão há poucos passos de conseguir que um referendo sobre a água no país se torne realidade www.aguayreferendo.blogspot.com e cantam em conjunto com outros artistas para recuperar o Rio Bogotá, um dos mais contaminados do planeta. www.encolombia.com/medioambiente/ hume-plantatratamientorio.htm Este compromisso não é apenas da boca pra fora, é também uma realidade. A tal ponto de sua nova proposta musical se chamar “Rio”, lançada entre setembro e outubro simultaneamente na América Latina e nos Estados Unidos. O concerto foi único e intimista com um calor que já brota em muitos cantos da América Latina. A platéia não parava de brincar, gritar e cantar junto com o grupo que, com sua arte, cobria todos com amor. Héctor concedeu uma entrevista exclusiva em nome do grupo, onde deixou claro estarem cantando pela Natureza e pela água. AQUA VITAE 27 O que um grupo como o Aterciopelados pretende passar em prol da natureza e da água? Mais que denunciar, queremos levar uma mensagem, sobre tudo aos jovens, que são nosso público alvo, para que saibam o que está acontecendo. Estamos prestes a lançar nosso próximo CD, que deverá se chamar “Rio”, em homenagem a esta consciência que temos desenvolvido. O que os leva a se comprometerem com a causa da água? Nosso compromisso com o meio ambiente já vem de longe. Em nosso CD “Caribe Atómico”, estabelecemos um tema com os oceanos. Existe uma visão apocalíptica sobre o tema e escrevemos sobre isso há dez anos. O tema água é um dos que mexe com todos os cidadãos. Mas vocês conseguiriam levar mensagens, sem deixar de denunciar, com uma visão mais positiva do tema? As guerras pela água já começaram. Embor a nã o se ja m n e ce s s a ri a me n te conflitos armados, afetam como um t i ro a s c o m u n i d a d e s q u e a re i v i n d i c a m , a s o r g a n i z a ç õ e s n ã o g o v e rname nt a is que e x i g e m re s p e i to a o s di rei tos hum a nos e o s p o l í ti co s i n s ti gad os a a pre se nta re m s o l u çõ e s . O que fazer para que as pessoas se envolvam mais? 1- Denunciar para que haja mais consciência. 2- Sensibilizar os jovens. 3- Ter maior participação política. O Aterciopelados está vinculado ao tema do referendo pela água na Colômbia. O que pretendem com essa participação? Necessitamos de 1,5 milhão de assinaturas antes de setembro deste ano, para que possamos pressionar os senadores colombianos a reconhecerem a água como um direito humano. Temos nos envolvido muito com o tema, bem como com a campanha pela recuperação do Rio Bogotá, um dos mais contaminados do planeta. O Estado é responsável pelos ecossistemas e por sua recuperação. Houve avanços em algumas áreas, mas ainda faltam políticas claras. 28 AQUA VITAE Aterciopelados. Foto: David Ruiz O que envolve a recuperação do Rio Bogotá? Nossa idéia é incutir, sobre tudo nos jovens, o pensamento de que rio é vida, recordar que o rio é a conexão entre as pessoas e que ele é parte de nossa existência. Com o lançamento de nosso novo CD estaremos organizando atividades para criar consciência. Como o público vê um conjunto musical ser tão ativista em um assunto de grande conteúdo político? Com surpresa por parte das autoridades, com estranheza para alguns, mas queremos conectar aqueles que não têm nenhum tipo de conhecimento à respeito do tema. Convidamos outros grupos de artistas para lançar outro CD chamado “Água, cantos para que flua”. Doamos uma canção, assim como os outros grupos, e o portal foi doado por Benjamín Jacanamijoy, filho de um famoso Xamã colombiano. Como vocês se vêem unidos à Expo Zaragoza 2008 e qual a mensagem que trazem? Nosso representante aqui na Espanha nos contou sobre o evento e nos interessamos muito mais quando soubemos que tudo estava relacionado com o tema água. Todos nós devemos trabalhar em prol da água e temos de estar conectados com este tema. AMÉRICA LATINA PORTFÓLIO DE GRANDES PROJETOS por Boris Ramírez A América Latina aproveitou a vitrine mundial da Expo Zaragoza para mostrar seus grandes planos ligados à água: inovação para conservar o recurso hídrico; cooperação conjunta para aproveitar bacias hidrográficas; programa para reconstruir sustentabilidade hídrica e o maior projeto hidráulico da região. Foto: Carmen Abdo AQUA VITAE 29 O bras são amores e não boas razões, reza o dito popular. Mas a presença da América Latina na Expo Zaragoza 2008 tem obras, amores e boas razões. Basta rever as grandes iniciativas apresentadas para comprovar que ainda há muito para ser feito, mas que também há muita vontade para fazê-lo. Quando se fala de água é preciso fazê-lo do ponto de vista da governabilidade, entendida como o mecanismo que deve permitir uma visão e participação multisetorial no manejo integral do recurso hídrico, no qual os governos, as comunidades e as instituições devem debater de maneira aberta e transparente a construção de legislações modernas, sistemas de informação, mecanismos de transparência na administração de fundos que sejam usados para os projetos e iniciativas de cobertura dos serviços de água e saneamento. Existe governabilidade quando: 1- Existe uma autoridade que regulamente água no mais alto nível nacional. Foto: Carmen Abdo 30 AQUA VITAE 2- A formação de uma lei moderna que permita a participação multi-setorial. 3- Disposição de recursos humanos idôneos para cumprir tarefas. 4- Disposição de recursos financeiros adequados. 5- Informação confiável, de livre acesso e transparente. É desta forma que os grandes projetos em andamento e na agenda da América Latina respondem a esta incumbência. “No que se refere à água, devemos pensar em projetos em longo prazo e sermos ambiciosos, como pretendemos com nosso Plano Nacional Hídrico, que nos indicará o rumo de maneira geral”, afirmou o Engenheiro Marco Velasco, coordenador dos Assessores da Comissão Nacional da Água (CONAGUA) do México. Maria Emilia Freire, consultora em finanças e economia do Departamento Urbano de Desenvolvimento Sustentável do Banco Mundial (BIRD) tem uma visão bastante semelhante, indicando que é preciso reforçar “a coordenação dos setores públicos e privados, a fim de se gerar planos responsáveis em gestão ambiental. O desenvolvimento urbano requer enfoques multi-setoriais que permitam uma transformação de políticas em coordenação com os países, visando a procura de um sistema integrado que leve em conta os desafios e também as necessidades dos setores usuários de serviços públicos como a água”. A America Latina, partindo de uma iniciativa inovadora do Equador, apresentou um projeto para preservar a água nas regiões com grande riqueza petrolífera, em troca de obter recursos internacionais; exemplos de manejo de bacias hidrográficas compartilhadas, que geram grandes benefícios sociais e ambientais; o programa de reconstrução da sustentabilidade hídrica do Vale do México e o maior projeto hidráulico da região, no Rio São Francisco (Brasil). A riqueza de Yasuní Trata-se de um projeto inovador e considerado prioridade pelo governo do Equador, por ser um modelo de obtenção de recursos que vêm da comunidade internacional em troca da conservação do petróleo localizado abaixo da terra, na bacia de Ishpingo – Tambococha – Tiputini (ITT), no Parque Nacional Yasuní. Ou seja, conservar a riqueza natural e as fontes de água aí localizadas. Segundo dados oficiais, o Equador pode receber US$ 350 milhões por ano como produto da não exploração petrolífera da bacia ITT, preservando tal reserva aqüífera, reduzindo as emissões de dióxido de carbono, conservando a biodiversidade e contribuindo para com a minimização dos efeitos negativos da mudança climática. O projeto enquadra-se nas linhas previstas pelo governo do país, de acordo com o Plano de Desenvolvimento 2007-2010, cujo objetivo é proteger o meio ambiente e melhorar a qualidade de vida da população equatoriana. Além de viável, o projeto é uma inovação na área de captação de recursos por proteção do recurso hídrico, através das seguintes formas: substituição da divida, formação do Fundo Yasuní-ITT, construção do Vale Y-TT, avaliação financeira e econômica dos lucros alcançados com a preservação das reservas extraíveis de óleo cru do campo ITT, localizadas abaixo da terra. Existe um compromisso de preservar a integridade física e cultural das populações dos tagaeri e dos taromeanani, localizadas dentro da reserva. O Parque Nacional Yasuní está situado nas províncias de Orellana e Pastaza e, atualmente, possui 982 mil hectares. Em julho de 1979, foi nomeado como parque nacional e em 1999, a UNESCO o declarou Reserva da Biosfera. Em 1999, a parte sul do parque e a reserva étnica Huaoraní foram declaradas zonas intangíveis. d Plano Trifinio Há 11 anos, El Salvador, Guatemala e Honduras criaram a Comissão Tri-nacional de Plano Trifinio www.sica.int/trifinio. Este é um dos exemplos de integração, para administrar bacia hidrográfica trinacional do rio Lempa, cuja extensão é de aproximadamente 7,6 km2, sendo uma unidade ecológica presente em 45 municípios dos três países. Julián Muñoz Jiménez, Secretário Executivo Tri-nacional, coloca o projeto como sendo uma lição para os governos fomentarem estes processos de integração, além de lhes permitir reconhecer a água como sendo um bem ambiental, social, econômico e regional, do qual se valem para combater a pobreza e a degradação ambiental de regiões sob impacto; proteger a área tri-nacional de Montecristo, uma região de alto valor ecológico; inovar a cadeia de valor sustentável na produção eficiente de hortaliças, o que levou a população a criar uma marca com denominação de origem Trifinio e, por fim, promover a administração da água como um bem público regional. AQUA VITAE 31 Catamayo-Chira Quando há vontade, há possibilidades. Essa é a lição que o manejo integrado da bacia hidrográfica Catamayo-Chira www.catamayochira.org aporta para as bacias binacionais da América Latina. A Catamayo-Chira passa por territórios do Equador e Peru, cuja população chega a 600 mil pessoas. O projeto estabelece formular um “Plano de Acordos para Gestão Integral e Compartilhada da bacia, que permita um uso racional dos recursos hídricos e possibilite o desenvolvimento sócio-econômico e sustentável em beneficio da população vinculada”, afirmou José Hermoza, assessor técnico do projeto, que conta ainda com o apoio internacional da Agência Espanhola de Cooperação Internacional (AECI). Os responsáveis pela bacia hidrográfica Catamayo-Chira sustentam que o programa propiciou uma gestão integrada dos recursos hídricos, que implica num manejo de recursos naturais, vistos ambos dentro de um ecossistema da bacia hidrográfica, cuja superfície é de 17 mil km². Do lado equatoriano, a bacia ocupa 14 dos 16 cantões da província de Loja, que equivalem a 66,82% do território da província. Já no lado peruano, ocupa parte das províncias de Sullana, Ayabaca, Huancabamba, Morropón, Paita, Talara e Piura, ou seja, 27,91% do território da Região Piura. Nesta região, existem 17 zonas de proteção natural. De fato, há um total de 1.479 Km2 oficialmente protegidos, o que representa mais de 8,5% do território da Bacia Hidrográfica, sendo que quase 60% da população economicamente ativa (PEA) trabalha no setor primário: agricultura, pecuária, silvicultura, caça e pesca. Pilcomayo Esta bacia une a Argentina, o Paraguai e a Bolívia em trabalhos conjuntos e sua extensão é de mais de 96mil km2, abastecendo uma população de 1,3 milhões de pessoas www.mopc.gov.py/www2004/web_pilcomayo/comision.html. Arturo Liebers explica que é preciso encontrar balanços importantes entre os países que compartilham a bacia hidrográfica, lenvando-se em conta, acima de tudo, as bacias alta e baixa. O manejo tri-nacional foi iniciado em 1994 e, em fevereiro de 1995, foi criada uma comissão na província de Formosa (Argentina). O manejo integral da bacia trabalha com o aproveitamento múltiplo, racional e harmônico dos recursos da bacia hidrográfica, mediante um plano de gestão integral. Estudos de impacto ambiental são realizados e a qualidade da água é verificada sistematicamente, criando-se um banco de dados hidrológico, meteorológico e geotécnico. Para o manejo, foram criados um Conselho de Delegados e Secretário Geral, um Conselho de Coordenação Trinacional e uma Agência de Bacia Hidrográfica a nível técnico, estes são os responsáveis pelas decisões, pelos programas e pela busca de alternativas para o aproveitamento da bacia hidrográfica. - 32 AQUA VITAE Reconstruir a sustentabilidade hídrica O Programa de Sustentabilidade Hídrica da bacia Hidrográfica do Vale do México é outro dos grandes projetos apresentados pela América Latina, a cargo da Comissão Nacional da Água do México (CONAGUA) www.cna.gob.mx. Há mais de 25 anos não são realizadas obras importantes, por isso algumas decisões estão suspensas, como a solução para as condições de vulnerabilidade ocasionadas pelo esgotamento acelerado dos lençóis freáticos do Vale, de onde se extraem 60 m3 de água/s, enquanto que a reposição é de apenas 28 m3 de água/s. Outro risco sanitário é a possibilidade de fraturas sistêmicas na drenagem da Cidade do México. Atualmente, o deslocamento é de 165 m3 de água/s, sendo necessário deslocar ainda o dobro do fluxo de águas para se evitar inundações. Outro desafio pendente é a construção de segundo túnel de drenagem profunda, que seja capaz de conter o volume de águas na Cidade do México, cujos riscos aumentam com as crescentes temporadas de chuva. Some-se a isso o fato de apenas 6% das águas residuais serem tratadas. O Programa de Sustentabilidade espera: - Diminuir a super exploração dos lençóis freáticos, mediante a substituição de água de poços artesianos por água tratada, utilizada na indústria ou na agricultura. Fortalecer e ampliar o Sistema Cutzamala e regulamentar novos assentamentos humanitários para conservar as zonas de reposição. - Proteger e incrementar, mediante ações integrais, toda a extensão das regiões florestais do Vale do México, além do Bosque de Água, como é conhecida a confluência do Distrito Federal com o Estado de Morelos e o Estado do México. - Ampliar a capacidade do sistema de drenagem da Região Metropolitana, mediante a construção do Emissário Oriente. - Tratamento de 100% das águas residuais do Vale do México, por meio de seis grandes usinas de tratamento. AQUA VITAE 33 Projeto de gigantes dimensões Em todo o Brasil se pensa grande e desta forma o Ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, apresentou o maior projeto hidráulico de seu país e da região. O projeto da bacia do Rio São Francisco www.integracao.gov.br/saofrancisco prevê abastecer de água cerca de 13 milhões de pessoas, bem como gerar uma série de obras de recuperação e de usos eficientes da água. O Projeto é considerado estratégico para que o país ofereça segurança hídrica às pessoas e para que se possam desenvolver outros projetos empresariais, cujos impactos sejam positivo na sociedade. Segundo Vieira Lima, está bem claro quais as pretensões deste Projeto: “o governo brasileiro considera a água como sendo um bem e um direito humano fundamental”, e parte para explicar que o “objetivo número um é abastecer e prover de água a população da região e os animais, além de dar segurança às empresas que queiram investir no local”. A bacia hidrográfica do Rio São Francisco tem quase três mil km de extensão e irriga 636.920 km2, incluindo os Estados de Minas Gerais (MG), Bahia (BA), Pernambuco (PE), Sergipe (SE), Alagoas (AL), Goiás (GO) e o Distrito Federal (DF), ao longo da qual estão 503 municípios, com quase 15 milhões de habitantes. O rio São Francisco atravessa regiões com condições naturais das mais diversas. As partes extremas superior e inferior da bacia apresentam bons índices pluviométricos, enquanto os seus cursos médio e sub-médio atravessam áreas de clima bastante seco. O projeto, realizado em conjunto com a coordenação do Ministério do Meio Ambiente e o Ministério de Integração, conta com os seguintes programas: - Revitalização do Rio São Francisco. Visa recuperar a bacia hidrográfica, afetada por situações de vulnerabilidade e degra34 AQUA VITAE dação ambiental, a partir de programas de saneamento básico, reflorestamento, tratamento de resíduos sólidos, controle de processos erosivos e gestão integrada de micro bacias hidrográficas, com a participação de comunidades tradicionais, pescadores, artesãos, agricultores e colonos da reforma agrária. - Integração das bacias hidrográficas do São Francisco com as bacias do Nordeste setentrional, a fim de assegurar a oferta de água, até 2025, para aproximadamente 13 milhões de pessoas habitantes de pequenas, médias e grandes cidades da região semiárida dos Estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, que padecem da seca. A água retirada do Rio São Francisco deverá ser equivalente a 1,4% da água que corre em seu leito e que desemboca no Oceano Atlântico. Ou seja, de cada 1,1 mil litros das águas do São Francisco que chegam ao mar, serão retirados apenas 14 litros para as bacias hidrográficas do Nordeste setentrional. - Hidrovia. Com o objetivo de promover ações de melhoria na navegabilidade do rio, no trecho de Ibotirama (BA) a Petrolina (PE) e Juazeiro (BA) a estrutura fluvial está sendo adequada às operações de modificação do leito do rio dragando, reflorestando e protegendo as margens do mesmo. Num levantamento de pontos críticos a serem revitalizados, verificou-se que a extensão é de 12 km, dos quais 100% da margem esquerda já estão concluídos. - Água para Todos é um programa para implantar sistemas simplificados de abastecimento de água a população rural, priorizando as regiões semi-áridas. UM MECANISMO IBERO-AMERICANO OS INTEGRANTES DA CONFERÊNCIA DE DIRETORES GERAIS IBERO-AMERICANOS DA ÁGUA (CODIA) ESTIVERAM EM ZARAGOZA CONSOLIDANDO COMPROMISSOS PARA ALCANÇAREM OS OBJETIVOS DO MILÊNIO. Foto: Carmen Abdo. P POR ENRIQUE IGLESIAS Secretário Geral Ibero-Americano ara a comunidade ibero-americana, pensar em água é pensar nas grandes bacias do Orinoco, do Paraná, do Amazonas; no grande lago nicaragüense Cocibolca; ou no Aqüífero Guarani, um imenso rio formado por águas da chuva, que supera as superfícies da Espanha, França e Portugal juntas. É pensar também nesse grande Oceano Atlântico que une a América Latina à Península Ibérica: nossa Comunidade Ibero-Americana. Esta iniciativa, da qual participam ativamente Chile, Espanha, Peru e Uruguai, é um plano de trabalho que deverá ter duração de 36 meses e que se concentrará em programas de formação e de transferência de tecnologia para melhor administrar os recursos hídricos da comunidade ibero-americana, além de facilitar o acesso e o saneamento a milhares de pessoas na região. A mesma poderá ser aplicada em outros países da região. Por isso, a idéia central do pavilhão da Secretaria Geral IberoAmericana (SEGIB), na Expo Zaragoza, foi "A água que nos une". As Nações Unidas, a União Européia e a SEGIB foram as únicas organizações internacionais que participaram da Expo Zaragoza, a grande festa da água e uma ocasião única para transmitir o potencial e as conquistas da região nos temas hídricos. A gestão da água, um recurso vital em todo o mundo e particularmente na América Ibérica, é um assunto que os governos têm assumido com firmeza no marco das Cúpulas Ibero-Americanas. Tem-se estimulado uma cooperação mais estreita entre os países, que resulte num melhor aproveitamento e em assegurar o acesso à água potável e ao saneamento de toda a população. A gestão da água na América Ibérica Com este espírito, a SEGIB convocou, no último dia 20 de junho, a Conferência de Diretores Gerais Ibero-Americanos da Água (CODIA) - juntamente com o Ministério do Meio Ambiente, Rural e Marinho da Espanha-, ocorrida no recinto da Expo Zaragoza e que contou com a participação dos 22 países ibero-americanos que se ocupam, por meio de instâncias, da gestão hídrica em cada país. Além de outros temas associados com as diversas facetas da gestão da água na região, os dirigentes analisaram a evolução da Iniciativa IberoAmericana "Formação e Transferência Tecnológica em matéria de Gestão Integrada de Recursos Hídricos", aprovada na XVII Cúpula Ibero-Americana, ocorrida em 2007, na cidade de Santiago do Chile. Neste sentido, o presidente do Governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, anunciou durante a XVII Cúpula IberoAmericana a criação de um "Fundo para a água" e se comprometeu a realizar um aporte de, no mínimo, US$ 1,5 bilhão para os próximos quatro anos. Em sua intervenção ante o plenário da Cúpula, e com a presença do Rei Juan Carlos de Espanha, o Presidente disse ter certeza de que outros países e organizações se unirão a este Fundo, cujo objetivo será o cumprimento das Metas do Milênio (ODM) na região ibero-americana e reduzir pela metade, até 2015, o número de pessoas sem acesso à água potável na região. AQUA VITAE 35 Foto: SEGIB. Trabalhar pelo bem-estar A Equipe Aqua Vitae encontrou Enrique Iglesias caminhando pela Avenida 2008, no recinto onde ocorreu a Expo Zaragoza. Apurado, ia para uma das reuniões da CODIA, mas aproveitamos para conversar com ele, a fim de aprofundar o tema sobre o Fundo para a Água e conhecer os caminhos para se tirar proveito desta iniciativa. De que maneira os projetos estão sendo articulados para que os Objetivos do Milênio na América Ibérica sejam cumpridos? É importante que espaços como este realizado em Zaragoza nos ajudem a complementar as Cúpulas Ibero-Americanas, já que ajudam a articular trabalhos e determinações comuns. O importante é criar a sinergia necessária para trabalharmos juntos pelo bem-estar. No caso da Expo Zaragoza, é fundamental, já que o tema água e desenvolvimento sustentável está na agenda da SEGIB e, acima de tudo, da Conferência de Diretores Gerais IberoAmericanos da Água (CODIA). Como surgiu a idéia de reunir a CODIA na Expo Zaragoza? De maneira natural. Este é um espaço propício, que soubemos aproveitar para nos encontrarmos e discutir, refletir e analisar especificamente o tema água e saneamento, objetivando o cumprimento dos Objetivos do Milênio. A Espanha está muito envolvida com o assunto na América Latina, motivo pelo qual aproveitamos a vinda de todos os diretores para apresentarmos conclusões acerca do tema. 36 AQUA VITAE Quais as conclusões tiradas? Tiraremos conclusões importantes, que, em seguida, tornaremos públicas e constarão de todos os documentos oficiais realizados dentro da Expo Zaragoza, como parte desta dinâmica de buscar soluções e ações de proposta que visem melhorar as condições de acesso à água potável e saneamento de milhares de ibero-americanos. Para que estes resultados sejam alcançados são necessários recursos econômicos. Além do Fundo para a Água – compromisso assumido pelo governo espanhol, durante a última Cúpula Ibero-Americana – quais outros recursos a SEGIB está buscando? O capital nunca é suficiente, principalmente quando se trata de saúde e bem-estar. O Fundo para a Água deve destinar US$ 1,5 bilhão para programas e ações nos próximos quatro anos. É para isto que servirá esta nova reunião da CODIA, para conhecer, em primeira instância, o que tem sido feito pelos diretores, o que devemos aproveitar qual o próximo passo. A SEGIB é um órgão técnico e de acompanhamento das decisões das Cúpulas Ibero-Americanas, por isso, com entusiasmo e responsabilidade, participa destes eventos. Mas cabe aos dirigentes articular todo o trabalho e tirar o melhor proveito dos mesmos. Como os países fazem, ou mesmo as comunidades, para terem acesso a estes fundos e dar continuidade aos projetos? A quem é preciso recorrer para se encontrar financiamento? ENRIQUE IGLESIAS Secretário Geral-Iberoamericano Foto: David Ruiz Devem recorrer à CODIA e à própria SEGIB. O importante é divulgar tais iniciativas para que as pessoas, a comunidade e os países possam apresentar projetos e possam ter acesso aos fundos. O que mais a SEGIB aporta com relação a estes temas? Parte importante de nosso trabalho é incrementar o conhecimento, a fim de fomentar uma cultura positiva de cooperação, de transferência de know-how, que permita aos países e aos governos se vincular a setores profissionais das áreas de educação, cultura e coesão social, e nos meios de comunicação, para que se interem sobre o que vem sendo feito, sobre os projetos, os programas e as possibilidades de financiamento. (veja matéria: Iniciativa de Formação de Recursos Hídricos). Pelo recurso hídrico A SEGIB, com sede em Madri, atua como órgão de apoio institucional e técnico na Conferência Ibero-Americana e na Cúpula de Chefes de Estado e do Governo. É formada por 22 países ibero-americanos: 19 na América Latina e 3 na península Ibérica: Espanha, Portugal e Andorra. As reuniões de Cúpula são o ponto máximo da Conferência Ibero-Americana. Nelas, os chefes de Estado e de Governo tomam, em conjunto, decisões políticas, estabelecem prioridades e traçam as diretrizes para as ações que deverão ser desenvolvidas pelos Governos durante o ano seguinte. Os compromissos assumidos nestes encontros, reunidos nas declarações finais, são resultantes de ações concretas de cooperação, em benefício de nossas sociedades. Parte de nosso trabalho é incrementar o conhecimento, a fim de fomentar uma cultura positiva de cooperação e transferência de conhecimento, que permita aos governos vincular-se a setores profissionais das áreas de educação, cultura e coesão social, além dos meios de comunicação que se refiram ao tema água. Como prova inequívoca da confluência de interesses e como motor político de uma cooperação dinâmica e crescente, as reuniões de Cúpula expressam e reforçam a unidade iberoamericana ao mais alto nível. Os países participantes são Chile, Espanha, Panamá, Peru e Uruguai. A iniciativa deverá durar 36 meses após seu início, em 2007, com um investimento de US$ 1,5 milhão e tem as seguintes linhas de ação: Uma destas iniciativas é o Programa de Formação e Transferência Tecnológica em matéria de Gestão Integrada de Recursos Hídricos www.segib.org/iniciativas. 1- Oferecer capacitação e formação em matéria de gestão integral relacionada à água em toda a América Ibérica, tanto no âmbito político como gerencial e técnico, a partir do desenvolvimento de um programa de formação ativo, flexível e adaptado à época. 2- Dar ênfase especial à área de saneamento e depuração em pequena escala, mediante implantação de uma planta experimental, que deverá ser instalada no Uruguai. 3- Atuar de maneira reforçada junto às autoridades locais, regionais e nacionais para facilitar um melhor planejamento e governabilidade hídrica. Entre os objetivos desta iniciativa estão a formação, capacitação e transferência tecnológica em matéria de gestão de recursos hídricos, com especial ênfase para a área de abastecimento e saneamento, para que, desta forma, possa incrementar o fornecimento de água e o acesso a rede de esgotos da população mais vulnerável da América Ibérica. 4- Apoiar a CODIA e os trabalhos de sua secretaria técnica. Os destinatários da iniciativa serão os governos locais das áreas rurais, as comunidades carentes de serviço básico de saneamento em toda América Latina, especialmente mulheres e crianças destas comunidades, bem como os grupos técnicos e de pesquisa em matéria de água e saneamento. AQUA VITAE 37 ÁGUA SAGRADA… A EXTRAORDINÁRIA VISÃO DAS CULTURAS PRÉ-COLOMBIANAS Uma mostra de qualidade com artigos de museu deu dimensão especial ao Pavilhão da América Latina Chalchiuhtlicue, Deusa da Água Foto: Carmen Abdo. 38 AQUA VITAE C om um imenso espaço verde, o local foi dedicado, com respeito e devoção, ao reconhecimento do vínculo sagrado entre os povos pré-colombianos e a água. O Pavilhão da América Latina não apenas acolheu todos os desafios, oportunidades e dádivas regaladas pela Mãe Natureza, como foi também o palco para uma exposição que mostrou a cosmovisão dos ancestrais dos povos latino-americanos e sua relação com a água. “A mostra refletiu a relação dos indígenas com a água, a partir da visão de seu mundo natural e sobrenatural. No âmbito natural, por meio da relação com os costumes agrícolas, e no sobrenatural, pela relação ritualística de vida e morte, na qual a água representava um papel importante”, contou o arquiteto Francisco López Guerra, um dos responsáveis pela montagem do Museotec. A realização do projeto contou com o apoio do Museu da América, de onde vieram as peças que estiveram na mostra, bem como com o Ministério da Cultura da Espanha, com a organização da Expo Zaragoza e com o patrocínio da empresa Amanco - Mexichem. Ali, imponentes, estavam algumas peças únicas. No cen t ro , i r r a d i a n d o f o r ç a e c o m u m o l h a r d e s a f i a d or, Chalchiuhtlicue dominou toda a cena. A Deusa da Água exerceu uma espécie de fascínio. “Veja, os detalhes da peça foram conservados em excelente estado, é uma maravilha!”, exclamou López Guerra. “A mostra contou ainda com objetos das culturas Nazca, Inca e Chimu (Peru), Chorotegas (Costa Rica), Coclé e Veraguas (Panamá), Astecas, Colima e Maias (México)e Piaroa (Amazônia Venezuelana)” Para todos os astecas, Chalchiuhtlicue era a deusa da chuva e da água. Possuía o dom da purificação e era conhecida também como a manifestação da ondulação das marés. Juntamente com o companheiro Tlaloc, deus da água, possuíam poder sobre este elemento e o controle das chuvas. A mostra contou ainda com objetos das culturas Nazca, Inca e Chimu (Peru), Chorotegas (Costa Rica), Coclé e Veraguas (Panamá), Astecas, Colima e Maias (México) e Piaroa (Amazônia Venezuelana). E foi baseada em sete conceitos relacionando a cosmovisão indígena com a água. • Origem. Em muitas culturas andinas os lagos, lagoas e mananciais são lugares primitivos. O próprio sol, a lua e as estrelas emergiram, segundo os incas, das profundezas do Lago Titicaca. Para os Astecas, no mito da origem dos cinco sóis, que narra as sucessivas criações e destruições do cosmos, a água é fundamental. O quarto destes sóis foi iluminado por Chalchiuhtlicue. • Sustento. Por ser um elemento escasso, muitas culturas idealizaram processos tecnológicos para obtenção de água, como os sistemas de irrigação dos chinampas astecas; ou, como no caso dos nascas, no Peru - habitantes do deserto -, que acabaram criando um sistema de canais e galerias subterrâneas para aproveitar a água dos lençóis freáticos. Esta tecnologia, denominada “puquios”, foi a base do desenvolvimento agrícola e, graças a ela, foi possível combater o longos períodos de seca que assolaram seu espaço vital. • Busca. Para muitas culturas pré-colombianas, a água foi uma das vias de locomoção e contato entre culturas. A água foi também a busca do conhecimento e para os povos andinos da costa, sua sobrevivência dependeu fundamentalmente da observação das correntes marinhas e dos ventos do litoral. A análise do comportamento de determinados animais marinhos, como o Spondylus, permitiu à elite sacerdotal andina desenvolver complexos calendários, que reduziam riscos agrícolas graças à previsão das chuvas ou das secas. • Equilíbrio. A chuva está vinculada às boas colheitas e a ordem do cosmos a uma forma de vida, se esta se rompia, poderia ser a causa de enfermidades, fome ou desgraça. Para voltar a recuperar o equilíbrio, o homem deveria voltar às boas com a Natureza. O princípio do equilíbrio mantém-se vigente na cosmovisão de numerosos grupos indígenas, especialmente das culturas amazônicas. Para elas, a realidade material é uma máscara que oculta a verdadeira realidade existente, com mundos invisíveis habitados por seres espirituais e essências primordiais. • Morte. Para alguns grupos aborígenes, o destino final dos seres humanos estava vinculado ao mundo aquático. O local dos sepultamentos deveria ser úmido e frio, como lagoas, ilhas ou covas. No caso das culturas meso-americanas, o além-mundo apresenta também um caráter líquido definido. Os astecas consideravam que as rãs possuíam poderes mágicos para conjurar as chuvas e estavam estreitamente ligadas aos deuses da água, dos quais eram ajudantes. • Regeneração. Para a maioria das culturas pré-hispânicas, a água era a essência sagrada, capaz de dar a vida e sustentá-la, mas ao mesmo tempo, e dentro da visão da qual estas culturas tiveram do mundo, a água também foi temida, devido sua capacidade destruidora. Vida e morte - como parte de um mesmo ciclo - se faziam, desta forma, presentes no mundo por meio da água. A maioria das culturas pré-colombianas considerava o tempo como algo recorrente e cíclico, como um movimento carregado de uma força infinita, na qual se sucediam diferentes etapas. Nas cosmovisões, o mundo - tal como o conhecemos - foi criado e destruído várias vezes, pois nada é estático, tudo precisa ser regenerado e a água era essencial neste processo. De cada destruição nascia sempre um mundo novo. • Reciprocidade. Os rituais e cerimônias em torno aos deuses da água tinham como objetivo principal o agradecimento, a oferenda e os pedidos de chuvas constantes - elemento fecundador e criador. Era obrigação dos seres humanos satisfazer constantemente os deuses e espíritos tutelares, que lhes proviam o princípio da vida. Entre as culturas pré-colombianas, especialmente a inca, esta visão ficou claramente evidenciada por meio do princípio de reciprocidade, segundo o qual, todas as coisas possuem um poder espiritual. A aceitação de qualquer dom ou presente obriga a devolver algo em troca. Este principio afetava não apenas as pessoas, como também o mundo espiritual e a natureza. AQUA VITAE 39 RESULTADOS EXPO ZARAGOZA CARTA DE ZARAGOZA POR: BORIS RAMÍREZ Como resultado final desta jornada mundial, se lança aos governos do mundo um documento que deverá contribuir para a realização das propostas que milhares de homens e mulheres, seres da água, fizeram para transformar a relação dos seres humanos com o recurso hídrico. A Carta de Zaragoza é um instrumento que promove mudanças, evolução e alternativas para enfrentar os desafios ligados à água e ao saneamento. É a parte mais concreta da herança da Expo Zaragoza 2008 e foi pensada como um instrumento de políticas públicas, de conceitos e princípios claros, de valores que devem ser colocados sobre a mesa para se entender as mudanças que devem ser relaizadas em relação à água. Este documento será submetido à Organização das Nações Unidas (ONU), para que seja uma referência mundial acerca dos compromissos e propostas em matéria hídrica. A Tribuna da Água RECOMENDA: A. COM CARÁTER UNIVERSAL B. AOS PODERES PÚBLICOS, USUÁRIOS DA ÁGUA E CIDADÃOS A1 Que o desenvolvimento das sociedades se dê a partir de critérios de sustentabilidade e de maneira respeitosa com a natureza. A2 Que se estabeleçam prioridades e compromissos de interesse geral para a humanidade em torno da água, fundados nos princípios éticos de sustentabilidade, transparência e equidade intra e intergeracional. A3 Que se incentive uma gestão hídrica participativa, eficiente e solidária, de modo que fomente a responsabilidade individual e coletiva, mediante o desenvolvimento compartilhado de conhecimentos e experiências. A4 Que se estabeleçam compromissos e normas para minimizar os efeitos negativos causados pela mudança climática e pelos fenômenos extremos, e para a adaptação dessas situações. A5 Que as soluções e os modelos de gestão hídrica se adaptem aos níveis de desenvolvimento, cultura e capacidades sociais e econômicas de cada território e sociedade. A6 Que as unidades básicas de gestão dos recursos hídricos sejam a bacia hidrográfica e o lençol freático, inclusive em casos de caráter supranacional. A7 Que haja em todo o mundo água potável segura e saneamento eficaz, em regiões tanto urbanas como rurais, mediante o comprometimento global, o estabelecimento de metas realistas e a adoção de soluções concretas. A8 Que o abastecimento de água potável e o armazenamento e tratamento das águas residuais sejam prioritários. As administrações públicas devem garantilos com tarifas justas e que assegurem a cobertura dos custos. A9 Que a gestão da demanda seja, no mínimo, tão importante quanto à gestão da oferta nas decisões políticas, estratégicas, de planos, programas e orçamentos. A10 Que a pesquisa seja incentivada, assim como o desenvolvimento e a inovação no que concerne a água e que a transferência dos resultados e benefícios para a sociedade seja acelerada. A11 Que seja criada uma Agência Hídrica Mundial, cujas principais missões sejam: a Preparar e apresentar diante da Organização da Nações Unidas a Carta de Direitos e Responsabilidades dos Seres Humanos para com a Água. b Articular um marco normativo mundial sobre a água, em um contexto de desenvolvimento sustentável que seja reconhecido pelos países. c Em matéria de recursos hídricos, preparar e incentivar o desenvolvimento da Convenção Internacional sobre Mudança Climática, Fenômenos Climáticos Extremos e Controle de Riscos. d Impelir à aprovação do Protocolo Internacional para a Gestão Pacífica e Produtiva das Bacias Hidrográficas transfonteiriças do mundo. e Assistir aos países que demandem apoio em relação a gestão integrada da água. f Impelir à educação, aos princípios e valores que, de acordo com o exposto, suscitem uma ética hídrica adequada. g Promover a difusão e o intercâmbio eficaz e global de boas práticas, lições aprendidas, modelos e processos reproduzíveis, experiências que apresentem sucesso e recomendações, por meio de um centro próprio de documentação e transferência de dados sobre a água e o desenvolvimento sustentável. h Promover alianças público-privadas que permitam unir esforços para se conseguir que o abastecimento e o saneamento universais sejam uma realidade. B1 Que os ecossistemas sejam protegidos de maneira eficaz, por seu valor intrínseco e para se garantir as fontes de água. B2 Que seja levada a cabo a provisão de serviços básicos de saneamento e depuração de águas residuais e seus lodos, de acordo com as realidades locais, e que se incorporem níveis sanitários de referência mundial, capazes de assegurar a saúde, a higiene e o bemestar. B3 Que se adotem medidas que garantam provisões básicas de água potável no interior das moradias ou tão próximo quanto seja possível. Em situações de pobreza, os governos devem garantir provisões mínimas de água. B4 Que no ordenamento jurídico e no desenvolvimento normativo sejam considerados os hábitos culturais não prejudiciais e os direitos da população. B5 Que a gestão dos serviços públicos de água e saneamento seja submetida ao controle público. B6 Que a demanda de água seja ajustada e controlada, recorrendo-se ao mesmo tempo a critérios educativos, informativos, participativos e tarifários. B7 Que sejam reduzidos os atrasos nos sistemas de abastecimento rurais, mediante intercâmbios de experiências e de modelos de gestão participativa, adaptados e assumidos pela população usuária. B8 Que se promova e apliquem tecnologias capazes de permitir o desenvolvimento, a dessalinização e o aproveitamento das águas do mar, da captação de nuvens e de chuvas, da depuração, da regeneração e da reutilização da água, com elevada eficiência no consumo energético de baixo impacto ambiental, potencializando as energias sustentáveis. B9 Que, tendo em vista a previsão do crescimento demográfico, os países considerem a agricultura não apenas como um setor econômico, e sim como um setor estratégico. B10 Que se estimulem e difundam medidas para melhorar os sistemas de irrigação, gerando maior eficiência hídrica energética. B11 Que se definam modelos financeiros capazes de satisfazer e de garantir, entre países e instituições, de forma que permitam captar no mercado o aporte necessário para investimentos em infra-estruturas hidráulicas necessárias para a prestação dos serviços públicos de abastecimento e saneamento, bem como para a capacitação dos recursos humanos necessários. B12 Que se apliquem critérios de racionalidade econômica capazes de promover a eficiência e a sustentabilidade, ao mesmo tempo que incorporem princípios de justiça social e ambiental na gestão hídrica. B13 Que se estabeleçam políticas integradas para designar a água em seus diversos usos, sempre que, com isso, se favoreça a eficiência econômica e a qualidade ambiental. B.14 Que os cidadãos participem como co-responsáveis na gestão integrada da água e da sustentabilidade. B.15 Que os cidadãos assumam que a água é, mais que um recurso de uso humano, um patrimônio de todos os seres vivos. 40 AQUA VITAE ZARAGOZA 2008: UMA EXPO SEM DATA DE VALIDADE Esta Carta de Zaragoza 2008 será recomendada à Secretaria Geral da Organização das Nações Unidas, ao Bureau International des Expositions e ao Governo da Espanha, para que impilam suas recomendações. A totalidade da documentação na qual esta Carta for baseada - informes, debates, sínteses e conclusões – será recolhida, como acervo a ser compartilhado, em diversos anexos que formam o Legado e a Caixa Azul, e ficará sob custódia da Espanha, como país anfitrião da Exposição Internacional do ano 2008. Zaragoza, 14 de Setembro de 2008. Dia da Conclusão da Exposição Internacional Zaragoza 2008. CARTA DE ZARAGOZA 2008 A Exposição Internacional Zaragoza 2008 foi a primeira na história a tratar, como tema exclusivo, a Água e o Desenvolvimento Sustentável. A Expo 2008 constituiu um grande encontro internacional, com a presença de cento e quatro (104) países e três órgãos internacionais, junto a todas as comunidades e cidades autônomas espanholas. A Exposição, de acordo com os critérios do Bureau International des Expositions (BIE), operou vinculada, em todas as suas fases, com o trabalho das Nações Unidas em temas ligados à água. As Exposições, concebidas segundo o espírito do BIE, constituem, atualmente, os acontecimentos internacionais que obtêm mais participação direta dos cidadãos e constituem um grande exercício de educação cívica. Na Exposição Internacional de Zaragoza, milhares de visitantes conheceram, com maior profundidade, os problemas hídricos e de desenvolvimento sustentável existentes no Planeta Terra. A Tribuna da Água, como suporte científico e técnico da Expo Zaragoza 2008, acolheu e propiciou a transferência de conhecimentos, debates e elaborações de propostas para resolver os principais desafios hídricos presentes, e futuros, da Humanidade. Ao longo de seções desenvolvidas durante noventa e três (93) dias, a Tribuna foi o acontecimento internacional mais amplo e global sobre Água e Desenvolvimento Sustentável já existente. A Tribuna da Água concluiu sua intensa atividade no dia 12 de setembro de 2008, com a apresentação de suas conclusões. Hoje, dia 14 de setembro do mesmo ano, apresenta nesta conclusão a síntese das mesmas, denominada Carta de Zaragoza 2008. Preâmbulo. Uma nova visão integrada da água Os participantes da Tribuna da Água reconhecem que a água é essencial para a vida no Planeta. Os novos paradigmas sobre água e sustentabilidade pretendem superar a visão meramente antropocêntrica por entender que, mediante uma gestão integrada dos recursos hídricos, se protegem ao mesmo tempo a sobrevivência do ser humano e do Planeta. Considerando: 1 Que a água e os ecossistemas da Terra devem ser preservados e protegidos. 2 Que o acesso à água potável e ao saneamento é um direito humano que deve ser garantindo pelos poderes públicos. 3 Que os povos da Terra assumem, por meio dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), um sério compromisso em relação à água. 4 Que o acesso à água é um potente vetor de desenvolvimento. 5 Que a água desempenha uma função fundamental na produção e transferência de energia. 6 Que a demanda de água continuará crescendo, principalmente pelos incrementos demográfico e da economia, o que pode implicar um aumento da ‘marca hídrica’. 7 Que os prognósticos indicam que a mudança climática é capaz de modificar a disponibilidade e as necessidades de água em todo o Planeta. 8 Que as tecnologias disponíveis permitem produzir água doce a partir da água salgada e das nuvens, além de regenerar e reutilizar a água a preços razoáveis e com menores impactos ambientais. 9 Que sobrevivência e transformação do meio rural estão diretamente ligadas à disponibilidade e ao uso sustentável da água. 10 Que a sustentabilidade da produção de alimentos está diretamente ligada ao uso eficiente da água. 11 Que a educação, a cultura, a comunicação e a participação hão de ser eixos de transformação da gestão dos recursos hídricos em todo o mundo. 12 Que é básico para a gestão integrada da água e da sustentabilidade o fortalecimento de sua governança em todos os níveis, o que implica a maior participação e co-responsabilidade da sociedade. 13 Que a unidade de bacia hidrográfica é o âmbito territorial mais eficiente para aproveitar a água e o que melhor permite resolver os conflitos entre países, regiões ou usuários. 14 Que assegurar vias de financiamento e formas de compartilhar o risco econômico, sob critérios de sustentabilidade, são indispensável para o êxito das iniciativas e atuações no âmbito hídrico. 15 Que o investimento em infra-estruturas hídricas nos países em desenvolvimento seja indispensável para a redução da pobreza e para o crescimento econômico, sendo os níveis de investimento atuais insuficientes para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. 16 Que a intervenção pública deve tomar a iniciativa para promover a legislação e a estruturação adequadas dos direitos hídricos. 17 Que a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação são pilares fundamentais que sustentam o conhecimento, o encontro de soluções, o bem-estar e a sustentabilidade em matéria hídrica. © Expoagua Zaragoza 2008 S.A. “Fica proibida qualquer forma de reprodução, distribuição, comunicação pública e transformação desta obra sem contar com autorização prévia dos titulares da propriedade intelectual da mesma”. AQUA VITAE 41 BREVES DO MUNDO O Maior do Mundo Diamer Basha projetou a maior represa de cimento do mundo. A mega construção, de 212 metros de altura, é uma das prioridades do governo paquistanês para solucionar a carência de água para consumo humano e para uso agrícola e industrial. Com um custo estimado de US$ 8,5 bilhões, a represa deverá se alimentar das águas do rio Indú, o mais volumoso do Paquistão. As autoridades tomaram a decisão de construir a represa diante da necessidade de sustentar a nas usinas de dessalinização uma opção. A maior da Europa está sendo construída em Torrevieja, Alicante (Espanha). Trata-se de um projeto da empresa espanhola Acciona, cuja conclusão está prevista para o início de 2009 e deverá ter uma capacidade de produção de 240 mil metros cúbicos. Uma vez em funcionamento, a dessalinizadora será a segunda maior do mundo em capacidade, graças à instalação de 24.416 membranas encarregadas de tirar o sal da água do mar por meio da tecnologia de osmose inversa, a melhor técnica aplicada nos últimos tempos, já que gera menos impactos no meio ambiente. demanda de consumo humano, bem como o abastecimento de 74 mil hectares de zonas férteis que tiveram de ser irrigadas artificialmente por conta da falta d’água. Grupos de oposição V Fórum Mundial da Água em Preparação solicitam que o deslocamento de 27 mil pessoas se dê em condições de melhorias para a qualidade de vida destes habitantes. O comitê organizador do V Fórum Mundial da Água e os representantes do Conselho Mundial da Água aproveitaram a Expo Zaragoza 2008 para fazer o primeiro anúncio mundial de Sabedoria e Técnica O Japão enfrenta os desafios hídricos a partir dos aspectos mais tradicionais de sua história até a tecnologia de inovação, que lhe permite apresentar-se como um exemplo mundial. Os estudos mais atuais sobre a situação do recurso são convocação para o novo fórum, cujo tema será “Conciliar as divisões (causadas) pela água”. De 16 a 22 de março de 2009, a histórica cidade de Istambul (Turquia) será o cenário ideal para este novo encontro, que já conta com o apoio do governo turco, que espera a presença de 15 governantes, 196 países e 39 órgãos internacionais. realizados com imagens e vídeos obtidos através da sonda Kayuga, adaptada com câmaras de alta definição e que permite obter melhores informações para os cientistas. Além disso, na Expo Zaragoza, o país apresentou o Simulador Global, um sofisticado sistema que permite prever as mudanças que ocorrerão por conta do aquecimento global. Este mecanismo, criado por pesquisadores, fornece dados das O vice-secretário geral do V Fórum Mundial da Água, Ahmet Mete Saatçi, explicou que o encontro tem “algumas diferenças com relação aos anteriores, entre os quais destaca uma maior participação de distintos setores, entre eles a sociedade civil”, que foi chamada durante sua participação no Farol da Expo Zaragoza a se encarregar deste evento. mudanças climáticas, bem como dos movimentos telúricos, uma constante no país. O V Fórum Mundial da Água será dividido em três processos: um temático, outro regional e outro político. O primeiro deverá sentar as bases, o segundo aposta nas soluções Um Projeto de Envergadura A busca de novas opções diante da falta d’água ou como medidas para preservar fontes de água potável encontrou 42 AQUA VITAE locais e o terceiro, no alto da cúspide, deverá ser um lugar para a tomada de decisões e para a adoção de medidas concretas. ALTO PERFIL A EXPO ZARAGOZA TEM QUE ENTREGAR RESULTADOS CONCRETOS PARA O MUNDO Entrevista Exclusiva com Eduardo Mestre, Diretor da Tribuna da Água EDUARDO MESTRE, DIRETOR DA TRIBUNA DA ÁGUA, ESTÁ CONVENCIDO QUE TANTO O LEGADO COMO A CARTA DE ZARAGOZA DEVEM SER INSTRUMENTOS QUE PROMOVAM MUDANÇAS, EVOLUÇÃO E ALTERNATIVAS PARA ENFRENTAR OS DESAFIOS LIGADOS À ÁGUA E AO SANEAMENTO. ALÉM DISSO, PRECISAM SER REALIZADOS JUNTO A UMA AGÊNCIA MUNDIAL DA ÁGUA E A UMA FUNDAÇÃO QUE ARTICULEM AS PROPOSTAS QUE, DURANTE 93 DIAS, SE CONCENTRARAM NA EXPO DA ÁGUA E DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. Por Yazmin Trejos e Boris Ramírez “Se separarmos água e meio ambiente sai sangue, já que são a mesma coisa” Foto: Carmen Abdo “Não é ético descansar enquanto crianças morrem por doenças causadas pela água”. Com essa frase é possível conhecer Eduardo Mestre, um ser humano metido até o pescoço com os temas ligados à água e ao saneamento. Mas diferentemente de outra pessoa que sentiria a sensação de se afogar, o Engenheiro mexicano tem a convicção de que este é o momento de arregaçar as mangas e trabalhar nas propostas, em soluções, em realidades. Não é hora de mais diagnósticos e trabalhos elaborados sobre o tema. Este é o tempo de, literalmente, mergulhar para corrigir, transformar e criar uma nova consciência humana do recurso hídrico, onde as fronteiras, as divisões, os diferentes pontos de vista, as opiniões contrárias, o público e o privado, o nacional e o municipal, o acadêmico e o pragmático se unam em um só porto: a Humanidade. Convencido de que esta é a fórmula para se continuar neste processo de mudança e revolução, aceitou ser o Diretor da Tribuna da Água, o fórum que reuniu 2.800 especialistas do mundo todo e de todas as AQUA VITAE 43 A Tribuna da Água se transformou em uma enorme aula para disseminar conhecimentos e experiências. Foto: María Torres-Solanot correntes em Zaragoza, com um único propósito: propor soluções concretas e se comprometerem com o mundo de usar a riqueza azul a partir da diversidade. Como surgiu e de quem veio a idéia de criar a Tribuna da Água como um fórum de discussão e análise dentro de uma Expo? Eduardo Mestre dedicou várias horas a Aqua Vitae. Primeiro, para conhecer profundamente este projeto, bem como para dar uma entrevista exclusiva sobre o que foi, é e será a Tribuna da Água, um fórum sem data de vencimento, que se tornou, sem dúvida alguma, o dínamo da Expo Zaragoza 2008 devido a seus conteúdos, discussões e propostas que daí surgiram. Essa idéia é de Jerónimo Blasco, diretor de Operações. Quando levaram a idéia para a Expo, em Paris - eu não estava aqui, e nem sonhava que estaria - tinham em mente um espaço de reflexão. Com o passar do tempo, transformamos em algo concreto, algo mais que discutir e falar sobre água. Foi quando várias coisas à favor aconteceram: o Bureau Internacional des Expositions (BIE) achou estupendo adicionar algo semelhante à fórmula de uma Expo. Acharam que agregaria algum valor à exposição internacional, embora vissem o projeto como um valor marginal, já que o grosso da operação são as pessoas que vêm visitar os pavilhões e os espetáculos. Mas a Tribuna da Água passou a ter um valor residual ou marginal ao se tornar o centro das discussões, pois está claro que o que “Finalizaremos com três instrumentos fundamentais: O Legado de Zaragoza, que terá todos os temas, documentos e propostas a disposição do mundo; a Carta de Zaragoza, que é um documento de políticas públicas para que os políticos tomem decisões; uma Agência Mundial para Água e uma Fundação, capazes de articularem os trabalhos por realizar”. 44 AQUA VITAE re s t a r á d a E x p o Z a r a g o z a é a Tr i buna da Água. Quais os objetivos que o senhor estabeleceu quando soube que seria o diretor da Tribuna da Água? Cheguei aqui como membro do Comitê Científico da Expo. Cheguei com uma visão crítica, sem ser destrutiva, mas consciente de que todas as atenções estavam bem mais voltadas para o supérfluo, para o “chamariz” de um instante e que, depois, desapareceriam. Eu continuava achando que o importante não estava sendo abordado. Como crítico, me puseram para trabalhar nos temas da Tribuna da Água. Eu estava na China e teria de ficar por mais seis meses, sem minha família. Pedi respaldo para fazer uma Tribuna da Água de acordo com minha maneira de ver as coisas, nem tanto sob o critério que prevalecia na Expo – com mais temas voltados para o meio ambiente e menos para a água -, embora eu não tenha problemas com temas ligados ao meio ambiente, mas se separarmos um do outro sai sangue, já que são a mesma coisa. O fato é que eu queria que houvesse uma atenção maior, mais importante, dedicada, profissional e científica para a água. Não queria que fosse um espaço de reflexão, mas sim de propostas, mas não ligadas à “o que fazer”, e sim à “como fazer”. Começar a falar de água, de propor algo mais forte para o mundo, não qualquer coisa já massificada como salvar a água, mas conseguir realizar algumas mudanças que seriam possíveis de serem feitas. Enfim, algo como o que eu estava trabalhando antes, com a idéia de criar uma agência mundial da água, que servisse de caminho em termos de água para todo o mundo, eu tinha que aproveitar o fato de que teríamos 93 dias para falar de água. Isso não voltará a se repetir. Foi isso que levou o senhor a organizar a Tribuna da Água em Semanas Temáticas? Exato. E de transformar as semanas temáticas, que eram em forma de discursos, para uma com espaços para reflexão, debates e propostas. Semanas temáticas sim, mas que também houvesse eventos especiais dos países. Hoje vemos que isso foi um “plus” importantíssimo, pois os países que têm algo para dizer tiveram espaço para fazê-lo. Nem todos compareceriam, mas 89 países tiveram a possibilidade de apresentar suas propostas. Também percebemos que era importante abrir espaço para organizações ligadas ao tema, por isso criamos os eventos paralelos. Abrimos espaços para grupos farmacêuticos, hidrobiologia médica, paisagistas, até para gastronomia. Os temas dos eventos paralelos me deixaram boquiaberto. Era importante também ter uma espécie de Ágora para as pessoas menos familiarizadas com o tema, mas que pudessem ter espaço para vir. Em seguida, surgiu a idéia dos filmes ligados à água, que também foi uma boa idéia. Os objetivos iniciais de convocar dois mil especialistas para falarem sobre água foi ultrapassado? espanhóis, o projeto teria ficado bastante reduzido. Claro que, mesmo só com a Espanha, seria muito rico também, mas foi criado um comitê científico de pessoas de todo o mundo e nos encarregamos de convidar os mais importantes com muita antecipação, para que ficassem impossibilitados de declinar. Também nos unimos a sócios muito fortes, começamos a selecionar as instituições que poderiam nos apoiar. Neste âmbito, a parceria entre Expo e Tribuna com parte do Estado Espanhol, que conta com recursos como o Ministério da Economia e da Fazenda, abriu uma porta importante. Em seguida, criamos uma parceria com o Ministério dos Assuntos Exteriores e Cooperação, a fim de entramos em contato com as chancelarias; depois fizemos contato com o Banco Mundial (BIRD), com quem foi assinado um convênio específico para um Devemos ultrapassar a fase de decidir quais são os problemas, e descobrir como fazer para resolvê-los, caso contrário, serão muitas reuniões e voltaremos para os diagnósticos e, portanto, não estaremos avançando. Esta fase já acabou, agora é preciso dizer como fazer as coisas, isto significa uma mudança de pensamento nas pessoas. evento com muitos países envolvidos. O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) percebeu a movimentação e aderiu ao projeto; a União Européia (UE) e as Nações Unidas (ONU) também estiveram tão engajadas, que a Expo e a Tribuna foram três vezes para Nova York durante a exposição e mais uma (em 17 de setembro) por conta do encerramento da Expo, para lhes prestar contas. Ter bons sócios foi parte fundamental e, por isso, tivemos tanto êxito nas convocatórias. E como foi convocá-los? Com o final da Tribuna da Água, como está prevista a sistematização de toda a informação, propostas, documentos e programas surgidos nas semanas temáticas? Este é o ponto mais importante da Tribuna. Se tivéssemos convidado apenas os Existem três instrumentos muito importantes. Dois foram concluídos no final da Chegamos a 2,8 mil. Expo (e estão sendo compilados) e um terceiro pacote de instrumentos será entregue após a Expo: 1- Legado de Zaragoza, onde teremos todos os documentos, apresentações, conferências, vídeos (por ordem de tema, subtema e contextualizados em termos geográficos). O Legado é da Espanha para o mundo com todas as conclusões. De que forma são enviados estes documentos? Hoje, quando falamos de documentos, não falamos mais da forma escrita, mesmo porque, temos horas e horas de vídeo que se ficarem neste formato não servirão para nada, por isso, estamos empacotando este material e o colocaremos num formato que, embora perca um pouco de resolução, será disponibilizado na Internet. Queremos que esta documentação se difunda por todo o mundo, bem como os manuscritos, por meio de arquivos em PDF. Não queremos que a informação seja vetada do público, isto é de todos e para todos. Haverá livros, vídeos, documentos etc. Faremos um livro para cada semana temática. 2- A Carta de Zaragoza é um documento necessário para que os tomadores de decisões saibam o que há para ser feito. Ficamos impactados com a Reunião de Dublin porque, em poucas palavras, foi dito o que fazer. Assim como no II Fórum Mundial da Água, realizado em Haia, sucintamente foram ditos os sete desafios a serem vencidos. Estamos cientes de que os políticos não dispõem de muito tempo para ler. (veja Carta de Zaragoza completa nesta edição). Sem ofendê-los intelectualmente, mas a título de facilitar o trabalho, a Carta de Zaragoza é um instrumento político, de políticas públicas, de conceitos e princípios bastante claros, de valores que queremos pôr sobre a mesa, para entender as mudanças que devem ser feitas em matéria de água. Queremos que seja uma carta curta para poder “vendêla” aos políticos. 3- Como venderemos a Carta aos políticos? Esse é o terceiro instrumento. Tratase de um pacote, que inclui dois órgãos, que contribuirão para fazer com que as coisas aconteçam: uma Agência Mundial da Água que tenha força, sem burocracia, que não seja mais um órgão da ONU. Não estou criticando, mas a verdade é que precisamos que o pensamento plural de um hindu una-se com o de um brasileiro, por exemplo. Queremos evitar que seja AQUA VITAE 45 um pontinho, e sim um grupo plural que tenha como fortaleza os equilíbrios. Queremos uma Agência que seja séria e esteja bem estruturada e na qual os países confiem que terá capacidade de realizar as coisas. O outro órgão será uma espécie de Fundação. Ainda não sabemos que formato jurídico poderá ter, em termos espanhóis, mas será espanhola, já que a Espanha tem muito a oferecer ao mundo com as coisas que aprendeu com a história e, no caso da América Ibérica, está obrigatoriamente ligada por muitas razões, cada uma com suas distintas visões. Esperamos que esta estrutura não precise se preocupar com as divisões políticas. Como o espírito de Simón Bolívar, estas idéias, às vezes, parecem não ter nada de novo, mas sempre dão certo. Para o bem de todos, precisamos que estas posturas que dividem – de maneira nada respeitosa -, mudem. É preciso um espaço para compartilhar. Temos que trabalhar muito nesta direção. “A Tribuna da Água passou a ter um valor residual ao se tornar o centro da Exposição, pois está claro que é o que restará” Foto: Carmen Abdo Como tudo isso será levado para a população, que é quem pode ajudar a concretizar estes processos? Queremos atingir as bases sociais a partir de seus brios, há muitas organizações de base em todo o mundo. Onde não há, devemos apoiar para haja, como ocorre em alguns países da África. Onde há uma manifestação social de uma ONG, é preciso privilegiá-la, pois atuam como um meio de transporte muito mais dúctil e eficaz que o da palavra pública ou de uma instituição. O governo tem muito para dizer, mas se a sociedade não tomar para si o tema hídrico e o transformar em programa de governo, as coisas não funcionarão. Precisamos que a sociedade fale, é isto que falta. Neste sentido, O Farol, também localizado dentro da Expo, se converte em um espaço que completa a Tribuna da Água? Claro. Podemos ter diferenças, mas trabalhamos em um tema fundamental. O Farol é dono de uma semente que não pode se perder, é um acerto enorme por parte da Expo e das próprias organizações, que souberam criar um espaço onde há governabilidade dentro de sua pluralidade. O Farol é um importante contendor de assuntos de grandes conseqüências. (veja entrevista com Pedro Arrojo). Em alguns momentos, os participantes da Tribuna coincidiram com os do 46 AQUA VITAE Tinha que aproveitar o fato de que teríamos 93 dias para falar de água. Isso não voltará a se repetir. Farol e vice-versa. Qual o espaço que será dado ao Farol na Carta de Zaragoza? Enorme. Todos os temas sociais primeiro, depois as pessoas e, em seguida, a voz oficial que será a terceira parte da Carta de Zaragoza, com certeza. Porque se não apostarmos nisso, ficaremos capengas. Prefiro apostar no aspecto da participação social e na mudança da sociedade para que mude a conduta dos governos, do que no desenvolvimento da tecnologia. E estou me expondo com esta afirmação, pois estou convencido de que é preciso continuar com a tecnologia, mas a sociedade vem em p r i m e i ro l u g a r. N o e n t a n t o , s e n ã o re s o l v e r m o s e s t e i m p a s s e , s e re m o s tecnologicamente desenvolvidos e a tra s a d os s oc i almente e esta fórmula não funciona. Parafraseando Blanca Moreno (consultora do BIRD) é preciso falar mais de esgotos e encanamentos do que de tecnologia? Claro que sim. E está muito bem dito, temos que mudar muito. Inclusive em países como na Europa, os injustiçados são a sociedade. Uma coisa é uma sociedade desenvolvida e outra é concretizar as propostas que a sociedade deseja que sejam concretizadas…sempre há brechas. Foi complicado reunir setores tão distintos para virem discutir sobre um tema como a água? Ô! E como. Esta casa estava preocupada com o fato de termos começado, em junho do ano passado, a montar pacotes das semanas temáticas, mas nos deu até PERFIL EM SOLO AQUÁTICO Eduardo Mestre Rodríguez nasceu no México. É Engenheiro civil pela Universidade Nacional Autônoma, com pós-graduação em Engenharia de sistemas e em Gestão de Recursos Hídricos. Dedicou sua vida a discussões, mudança de pensamento nas pessoas. Os conferencistas de alto escalão tinham dificuldades em proferir soluções para como fazer as coisas, quando eram solicitados. É preciso exigir que os órgãos ligados à água não produzam outro documento bonito, que nos aculture, mas que não resolve nada. propostas e ações em matéria de água e saneamento. Entre seus muitos cargos, destacam-se: • Secretário Técnico Permanente da Rede Latino-Americana de Órgãos de Bacias Hídricas. • Membro da Associação Mundial da Água. A segunda lição é que não precisamos falar de todos os problemas para resolvê-los. Parece-me mais apropriado estudar os temas hídricos por nichos de oportunidade, sendo este um tema fundamental diagnosticado na Tribuna da Água. • Consultor para vários projetos do Banco Mundial, do Banco Interamericano de Desenvolvimento, da União Européia, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, do Programa das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura e do Instituto Mexicano de Tecnologia da Água. • Ocupou cargos de diretoria no Plano Nacional Hidráulico e na Comissão Nacional da Água no México. É líder técnico e negociador da Lei de Águas Nacionais do México. • Presidente da Rede Internacional de Órgãos de Bacias Hidrográficas. • Membro do Conselho Executivo da Rede Interamericana de Recursos Hídricos da OEA. • Secretário do Sistema Aqüífero Guarani. Há quatro coisas que devem ser muito bem feitas: - água potável e saneamento. Pois enquanto estivermos falando de sustentabilidade de rios e crianças estiverem morrendo por contaminações oriundas de águas poluídas, estaremos perdendo tempo e a batalha. Eticamente, não podemos descansar enquanto crianças estiverem morrendo. Água e saneamento são primordiais, sem dúvida. • Consultor especializado em serviços hídricos e de saneamento para 13 países de América Latina, quatro da África e três da Ásia. • Assessor do Projeto Três Gargantas, na China. • Diretor da Tribuna da Água na Expo Zaragoza 2008. março deste ano, ordenando temas. Por que a semana de Água e Sociedade demorou tanto para ser construída? Porque é difícil juntar diferentes vozes discordantes. Foi preciso fazer um processo de negociação e, como sempre acontece, se cede um pouco para se ganhar um pouco. A Semana de Água e Saneamento foi complicada, porque foi onde estavam entronizadas as posições públicoprivadas. Por exemplo, durante a semana em que se debateu sobre as “bacias hidrográficas compartilhadas” nos envolvemos com temas geopolíticos: bacias compartilhadas entre Espanha e Portugal, Argentina e Brasil, Peru e Equador, o Aqüífero Guarani. Mas no final deu tudo certo. Como tudo foi resolvido? Fizemos pactos com todos os grupos. Tanto que, se prestarem atenção no cronograma da semana, verão que demos espaços a todos, com a idéia de que suas participações seriam muito importantes. Os empresários receberão a documentação e as incumbências que lhe competem? Claro que sim, porque eles têm responsabilidades. Se eles não fizerem sua parte, estamos perdidos. Por isso, a Fundação deve compreender o setor empresarial, o acadêmico, as organizações sociais bem representadas e o portavoz oficial. A Agência não deve ser pública, pois órgãos públicos são governo e sociedade. - antes de continuar apostando em tecnologia, é preciso investir em educação, cultura e comunicação, porque é aí que tudo se concentra, precisamos enfiar isto nas nossas cabeças. Se investirmos estes US$ 1,5 bilhão oferecidos pela Espanha a América Ibérica em educação e cultura, logo teremos projetos de desenvolvimento na região. - as instituições estão se tornando velhas e algumas bem antiquadas; os países ibero-americanos precisam começar a discutir o que fazer com instituições tão arcaicas, pois as economias estão crescendo e as instituições públicas que não avançam vão ficando para trás. Quais as lições que a Tribuna da Água deixa para as futuras Expos? - estamos deixando as boas oportunidades passarem. Por exemplo, é fato que avançamos em fontes não convencionais de energia, mas onde elas estão? Hoje, vemos uma Espanha que olha para frente, caso contrário irá patinar. De qualquer forma, ainda há muito há ser feito. A primeira, é que devemos ultrapassar a fase de decidir quais são os problemas e descobrir como fazer para resolvê-los, caso contrário, serão muitas reuniões e voltaremos para os diagnósticos e, portanto, não estaremos avançando. Esta fase já acabou, agora é preciso dizer como fazer as coisas, isto significa uma Roque Gistau (presidente da Expo Água) fez um comentário duro, mas real: se resolvermos o problema da água potável e as pessoas continuarem passando fome, não teremos feito nada. Realizamos estes estudos durante as semanas temáticas e obtivemos uma série de resultados. AQUA VITAE 47 A Carta de Zaragoza é o principal legado dos aportes de 2.800 especialistas que passaram pela Tribuna da Água. Foto: María Torres-Solanot Não precisamos falar de todos os problemas para resolvê-los. Parece-me mais apropriado estudar os temas hídricos por nichos de oportunidade, sendo este um tema fundamental diagnosticado na Tribuna da Água. De que maneira esta grande discussão será vinculada ao próximo Fórum Mundial da Água, que deve ocorrer em março de 2009, seis meses após a finalização da Expo Zaragoza? Estamos tentando dar uma função para a Tribuna da Água, para que ela seja útil ao comitê organizador da Turquia e ao Conselho Mundial da Água. Estaremos a disposição e oferecendo detalhes que possam ser usados. Estou preocupado que pensem que porque os dados foram concluídos em Zaragoza não poderão ser usados em Istambul. Isto seria péssi m o . Te m o s d e c o n t i n u a r c o n struindo o futuro, e juntos. Como era o Eduardo Mestre antes, durante e como está agora, depois de ter sido o diretor da Tribuna da Água? 48 AQUA VITAE Ah! Foi uma metamorfose. Fazia muito tempo que não participava de um evento como este. Estive no Fórum Mundial de Kyoto e no de Haia, mas atuei em coisas pontuais. Entretanto, aqui mudei meu pensamento, estava trabalhando em projetos e soluções e aqui vim pensar em pensar, para que tudo isso criasse forma. Fiquei com a cabeça transformada, pois agora trago idéias do que devemos fazer e como. Não foi como fazer funcionar a represa de Três Gargantas, na China, onde estive atuando no último ano e meio. Foram tantas coisas que vi, que minha mente está profundamente transformada. O que farei depois? Agora estou frito, pois tanta coisa mudou em mim, que não será fácil. Eu gostaria de me dedicar a pôr em prática tudo o que foi feito aqui para, em seguida, me dedicar ao projeto. Deixar passá-lo seria como não fazer nada, não quero que seja meu, já não tenho mais idade para tanto egocentrismo, não tenho interesse em encabeçá-lo, nem aparecer no filme. Meu amigo Mario Alberto Barrios me disse: “Eduardo, temos que perceber que em nossa idade já não precisamos provar mais nada para ninguém, nem para nós mesmos”. Não tenho que demonstrar nada. Tenho é que me dedicar a ir fazendo o que posso e o que sei. Estou livre para poder fazer o que quiser, só não quero é me enganar, mas estou mudado para sempre, com certeza. ALTO PERFIL "O mundo dos movimentos sociais nasce da denúncia, nasce da dor, nasce do atropelo" Foto: Carlos Acín AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS APORTAM DENÚNCIA, VITALIDADE E ALTERNATIVAS Entrevista exclusiva com Pedro Arrojo, Coordenador do Fórum Ético da Água PEDRO ARROJO, COORDENADOR DO FÓRUM ÉTICO DA ÁGUA, FORMADO POR 20 PERSONALIDADES MUNDIAIS, ESPERA QUE ONU, BIRD E OMC INCORPOREM 12 RECOMENDAÇÕES NO DEBATE E REFLEXÃO QUE MARCARÃO O MODELO DE GLOBALIZAÇÃO E DO MUNDO QUE AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS PRETENDEM CONSTRUIR. “Há dez anos, eu era o professor aficionado pelos noticiários espanhóis. Hoje, sou o professor Arrojo, Prêmio Goldman (considerado por muitos como o Prêmio Nobel do Meio Ambiente) e tal e coisa...”. Assim é Pedro Arrojo, coordenador do Fórum Ético da Água, um dos fundadores da Fundação Nova Cultura da Água e uma pessoa em constante transformação, para si, para os outros e pela água. Ele é um dos motores das organizações sociais que estão em constante discussão e denúncia em torno da água e do saneamento básico. Do total delas, 350 estiveram presentes no Farol, o pavilhão das Iniciativas Cidadãs da Expo Zaragoza 2008. Ele tem a ousadia de se vangloriar do trabalho realizado, mas também de destacar que “muitas vezes nos fechamos em nossos grupos, em nossas confrarias e o que está de fora não se encaixa a nós e isso nos limita na capacidade de projeção de nossas idéias”. Ele sabe que o combustível para os movimentos sociais são as denúncias, a capacidade de encontrar alternativas também deve se r m a i s f o r t e , p o i s a l u t a s e r á n a p ro p o rç ã o e m q ue “estivermos a postos para que as pessoas não morram de sede ou de algum problema relacionado ao saneamento básico”. AQUA VITAE 49 Arrojo aproveitou o marco da Exposição e convocou 20 personalidades mundiais para que realizassem um manifesto capaz de chegar aos principais fóruns mundiais públicos, e que com 12 recomendações passem a ter realmente incidência mundial nessa busca por soluções. PERFIL MESTRE DA ÁGUA Pedro Arrojo Agudo nasceu em Madri, em 1951. Durante sua juventude viveu em Granada e, em 1969, se mudou para Zaragoza para seguir os estudos em Física, no qual se formou em 1973. Há 15 anos, sua pesquisa está centrada na Convencido de que o Farol iluminou o caminho de uma nova rede de organizações sociais, que vão em direção da construção de um novo mundo possível, não apenas pelas possibilidades de assim o torná-lo, como também pela necessidade de criá-lo, Arrojo conversou com a Aqua Vitae, em meio a seu trabalho e convencido de que, quando o ser humano é o objetivo primordial da construção da cidadania, estamos todos no mesmo barco, não importando que tal construção seja proveniente de um órgão público, comunitário ou privado. Refletir vitalidade, diversidade e capacidade de inovação da sociedade civil para enfrentar os desafios hídricos, com soluções alternativas e promovendo reflexão crítica. Este grande objetivo, estabelecido dentro do Farol, foi cumprido? E denúncia… como dissemos num determinado momento, infelizmente – não porque gostemos – o mundo dos movimentos sociais nasce da denúncia, nasce da dor, nasce do atropelo. Mas a denúncia vem em primeiro lugar, ou seja, ser capaz de dizer que determinada coisa não pode ficar como está. Mas também a vitalidade de denunciar, a coragem, a valentia para lutar sem meios ou pelo interesse próprio ou pelos dos outros, em prol da dignidade, ter a capacidade de promover alternativas. Essa combinação entre denúncia, luta e alternativas foi o que este pavilhão intencionou ser e, em grande parte, conseguimos. Por aqui passaram centenas de pessoas que não tinham muito tempo para parar e ler nossas mensagens, mas que encontraram aqui um contraste com o restante da Expo e isto fará com que eles parem para pensar. Ficar só na denúncia não pode impedir as soluções? Insisto no fato de que por detrás de cada denúncia existem alternativas, algumas já em prática. Outras ainda como propostas que não dependem de nós, mas sim dos governos ou de instituições. Trata-se de uma norma generalizada entre os movimentos sociais, ecologistas, contrários à 50 AQUA VITAE economia da água. • Foi vice-reitor da Faculdade de Econômicas e Empresariais. Vice-reitor e professor da Universidade de Zaragoza. • É fundador da Fundação Nova Cultura da Água, cujo objetivo é fomentar a pesquisa, o desenvolvimento, a educação e a cooperação para o crescimento e defesa do meio ambiente relacionados à água. • Em 2003, recebeu o Prêmio Goldman, considerado o Prêmio Nobel do Meio Ambiente, por ter tido a capacidade de unir seu currículo profissional a seu compromisso social, a partir da não violência e em favor do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável. • Atualmente, é coordenador do Fórum Ético da Água. Ver tantos grupos de tão distintos aspectos, nível e maneira de confrontação política foi interessante. Estivemos juntos para dizer as mesmas coisas, isto nos dá forças, é uma ótima lição. Quase 350 organizações trabalhando em comum é uma experiência pedagógica e social bastante positiva e motivadora. privatização, que amadureceram muito, e por trás das denúncias existem equipes técnicas, professores de universidade, especialistas no assunto que assessoram estes movimentos e que geram propostas positivas para encontrar soluções e saídas. Este pavilhão não foi de queixa “light e cor-de-rosa”, onde o mundo é possível e não se sabe como. Foi de denúncia dura, com alternativas que nos custam e aí estão e mostram esse outro mundo possível e necessário. A sociedade civil está realmente inteirada, motivada e sensibilizada para enfrentar os desafios e encontrar soluções para os problemas ligados à água e saneamento? Esta pergunta tão absoluta, terá uma resposta nada satisfatória. Como tudo na vida, é relativo. Se compararmos o nível de consciência social sobre os problemas ligados à sociedade, ao meio-ambiente, à sustentabilidade no mundo, com o que havia cinco ou dez anos atrás, hoje teremos um filme onde antes havia uma foto. Em 2003, havia um movimento de centenas de milhares de pessoas cujo nível de consciência era insuficiente, mas suficiente para sair às ruas e exigirem uma nova cultura hídrica, para se oporem às grandes transposições. Estamos num processo de evolução, mas para algumas coisas o processo chega tarde e as pessoas, infelizmente, continuam morrendo, sendo injustiçadas, há flagrantes de injustiça e covardia política, mas nunca é tarde quando o destino é bom... será a tempo para os que vêm atrás. Não tenho uma visão catastrófica das crises, acho que a Humanidade é capaz de viver em piores condições e unirse e tentar, ainda assim, sobreviver e ser feliz, como puder. Mas no âmbito hídrico, a convergência das crises de sustentabilidade dos ecossistemas aquáticos, de pobreza e iniqüidade e a do desgoverno ou falta de democracia produz alguns impactos trágicos e impressionantes. Quando se diz que 1,1 bilhão de pessoas não tem acesso à água significa que morrem de sede ou que morrem por falta de saneamento básico. Para aquele que Personalidades mundiais fizeram parte do Fórum Ético da Água, cujo principal objetivo é penetrar, com mensagens em prol dos recursos hídricos, em organismos internacionais. Foto: Carmen Abdo morreu e seus entes, chegamos tarde, mas para o que ainda tenta sobreviver, estamos sempre servindo de respaldo e a luta sempre terá um sentido. Qual a força da diversidade das organizações participantes na hora de criar um espaço crítico e participativo? Acho que foi imprescindível, deu muita força e credibilidade. Muitas vezes nos fechamos em nossos grupos, em nossas confrarias e o que está de fora não se encaixa a nós e isso nos limita na capacidade de projeção de nossas idéias. Ver tantos grupos de tão distintos aspectos, nível e maneira de confrontação política foi interessante. Estivemos juntos para dizer as mesmas coisas, isto nos dá forças, é uma ótima lição. Quase 350 organizações trabalhando em comum é uma experiência pedagógica e social bastante positiva e motivadora. Temas como os direitos humanos ligados à água potável e ao saneamento, conflitos gerados pela água e, acima de tudo, por grandes represas e infraestruturas resultaram polêmicos. É suficiente criar polêmica para encontrar resultados? Estas polêmicas não apenas aconteceram aqui, elas já estão no mundo e vêm de muito tempo atrás. Os conflitos hídricos são a conseqüência da convergência negativa de três falhas: de insustentabilidade dos ecossistemas, ...pois público corrupto não vale, público burocrático não vale, público obscuro não vale. Uma gestão pública participativa, com atores sociais é algo novo, ninguém sabe como fazer e aí estão os movimentos sociais discutindo como fazer. iniqüidade e de governabilidade. Tudo tem nos levado, a partir das grandes instituições mundiais, a errar no modelo de globalização. Pensar que atrás do problema de falta d’água estão as privatizações não é correto. Tais falhas soaram o alarme e a luta dos mais afetados, que são sempre os mais carentes, atrás das comunidades e as pessoas mais invisíveis, mas capazes de entender novos valores e uma nova ética. No pavilhão pudemos contribuir para com certo avanço. No que se refere à privatização, as pessoas conseguiram dar o primeiro passo, deixando claro que o modelo fracassou. Até as grandes empresas reconheceram que fracassaram na América Latina e voltaram-se aos mercados confiáveis da antiga União Soviética, onde não há tecido social que se oponha… curioso. Isto deve ser analisado do âmbito positivo, onde os movimentos que lutam contra a privatização estão buscando reorganizar uma administração pública diferente, pois a que tinham não vale mais. Isto não é apenas público ou privado, pois público corrupto não vale, público burocrático não vale, público obscuro não vale. Uma gestão pública participativa, com atores sociais é algo novo, ninguém sabe como fazer e aí estão os movimentos sociais discutindo como fazer. O que aconteceu com as grandes represas? “Há dez anos, eu era o professor aficionado pelos noticiários espanhóis. Hoje, sou o professor Arrojo, Prêmio Goldman... no final dos anos 90, esta discussão levou os grandes motores destas represas a pedirem um debate mundial (Comissão Mundial de Represas, presidida por Kader Asmal, ministro do governo de Mandela), que entregou a Londres, em 2000, um relatório pedindo para que os valores, os direitos em questão, as populações beneficiadas e afetadas fossem reconhecidos, propondo ainda recomendações interessantes. Existe uma enorme diferença. A comunidade científica, da qual faço parte, reconhece que a forma de sair dos problemas hídricos não é afogando os rios, nem as pessoas que vivem às suas margens, em nome de um desenvolvimento para terceiros. Na Espanha, se reconhece que não se deve inundar os AQUA VITAE 51 Uma enorme moringa de barro serviu de refúgio para as organizações dentro da Expo Zaragoza 2008. Foto: Carmen Abdo povos, sob nenhum tipo de pretexto, são direitos humanos básicos. Mas isto ainda não foi conquistado no Brasil, nem na China e nem na Índia. Já se fala de governabilidade hídrica por todas as partes com gestão participativa. Houve avanço nestas falhas, insuficientes, mas houve. Após esta enorme participação, como a informação será sistematizada e compartilhada com a sociedade civil? Muitas conclusões serão registradas e muitas coisas serão armazenadas nos corações e nas consciências. A possibilidade desta rede – como acontece ultimamente com as redes, onde o 52 AQUA VITAE cidadão não é obrigada a nada mais a não ser estar em contato e ter disponibilidade -, de estar pronta para ser utilizada ou para entrar em ação é muito alta, além da enorme flexibilidade das organizações em rede, onde a internet contribuirá significativamente. Com o apoio dos grupos participantes do Farol nascerá essa exposição itinerante, que deverá percorrer todo o mundo, durante cinco anos, sobre Água, Rios e Povoados. Isto não é exatamente o que fizemos aqui, mas uma inspiração do que houve aqui, empurrada por prêmios Nobel da paz, ex-ministros e intelectuais. Como fazer, dada a linearidade das organizações sociais, para se chegar aos acordos necessários? A linearidade permite a qualquer um propôr soluções e a amplitude do acordo é proporcional ao nível de entusiasmo e de paixão que se possa suscitar. Ninguém a imporá, nem mesmo alguém que não está de acordo será motivado por um acordo majoritário. O trabalho em rede faz com que as iniciativas fluam e cresçam com maior vigor. O Farol foi um concorrente da Tribuna da Água no que se refere aos temas, conteúdos e participantes? Não ouvi, em momento algum, nem na Tribuna, nem no Farol, um comentário neste sentido. O que talvez tenha acontecido foi insuficiente colaboração para aproveitar o que trouxemos, devido ao stress organizacional, que nos levou, entre outras coisas, a ter pouco tempo para organizar, para ter mais possibilidades. Mas não foi por falta de vontade, houve sinergias positivas e cooperação. Quais aspectos as organizações sociais querem que sejam incluídos na Carta de Zaragoza? Temo que, ao serem tão amplos em cem propostas, nos deparemos com o ditado que diz que “aquilo que muito abrange, pouco constrói”. Na Carta Ética sobre gestão da água, existem doze propostas bastante concretas, as quais farão parte das cem feitas pelas ONGs. Neste documento do Fórum Ético está o compêndio essencial do que pensam as organizações sociais. O Fórum Ético da Água resultou ser um luxo ao reunir tantas personalidades mundiais para incorporar a visão ética no manejo hídrico. Outros que não puderam vir, como Leonardo Boff, Samuel Ruiz, Adolfo Pérez Esquivel, mas deram suporte à distância e deverão participar de outros eventos que venham a ocorrer. Contamos com a presença de 20 pessoas de um nível intelectual e de uma moral tremenda. Será difícil ignorar o que pessoas com este nível disseram. Isto dará permeabilidade social e política a propostas que já estão feitas e ditas pelos movimentos sociais. Muitas vezes, não importa o que foi dito, mas sim como foi dito e por quem. Será possível conseguir que as 12 recomendações resultantes do Fórum Ético sejam incorporadas na agenda das Nações Unidas? Federico Mayor Zaragoza, cuja capacidade de chegar a este tipo de instituição é enorme, as leva como uma bandeira. Ele deverá se dedicar to ta lm e nt e a ist o . E s ta re i à s u a d i s p o s i ç ã o p a r a i r e v i r c o m o c o o rden a dor da inic ia ti va . M a s ta m b é m c o n t a m o s c o m Va n d a n a S h i v a , M a rina Silva, Cristina Carbona, que t r a b a l h a r ã o e m p ro l d i s t o e e rguerão a bandeira para penetrar nos órgãos internacionais com as mensa ge ns da C a rta É ti c a . Qual o principal objetivo do Fórum Ético? É disso que nos esquecemos no pragmatismo. Por conta da exuberância deste tipo de evento, vivemos no circo mediático e nos preocupamos com quem vem e não com o que dirão. O Fórum Ético, do ponto de vista dos valores, espera imbuirse de alma social e ambiental. Ser pragmático com objetivos, para saber para onde vamos. Nem tudo vale a pena para se chegar a algum lugar, nem todos os fins justificam os meios. Falta uma reflexão ética acerca da água, acerca de Contamos com a presença água é o modelo de globalização em questão. O BIRD não é um banco privado, é público; a OMC não é privada, é pública; a ONU é o resultado do que soubemos fazer entre todos a nível público. A governabilidade mundial é o desafio de construir uma cidadania global, isso corresponde a todos nós. Talvez tenhamos nos enganado com o caminho por pressões de interesses de terceiros. Desta força moral dada pelas pessoas que participaram do Fórum, aspiro algo tão ambicioso, mas por sua vez tão mínimo, que estas recomendações serão debatidas e serão referência de reflexão. São fóruns públicos assim que marcarão o modelo de globalização e de mundo que queremos construir. de 20 pessoas de um nível intelectual e de uma moral tremenda. Será difícil ignorar o que pessoas com este nível disseram. Isto dará permeabilidade social e política a propostas que já estão feitas e ditas pelos movimentos sociais. Muitas vezes, não importa o que foi dito, mas sim como foi dito e por quem. onde estamos e para onde vamos. Os participantes disseram que temos que fazer uma declaração radical, já que estamos num momento onde não cabe mais prazo para o que urge e isso passa por entender os valores prioritários, no caso da água: água vida, água cidadã e, conseqüentemente, água economia. Não pode ser o contrário. Quais seriam os resultados ideais esperados do Fórum Ético e que nos permita dizer que funcionaram? Em uma primeira fase, me conformaria com o fato dos grandes fóruns públicos e políticos, Organização das Nações Unidas (ONU), Banco Mundial (BIRD) e Organização Mundial do Comércio (OMC) entrarem em uma agenda de reflexões, porque o que questionamos por meio da Como o Farol espera transformar a participação dos cidadãos no que se refere à água e ao saneamento? O Farol como tal, não é um partido, não tem um programa, nem recursos para dizer de que maneira as coisas serão feitas, é um conjunto de grupos. É um “englobador” e não um programa de ação; engloba lutas, propostas e alternativas. O Farol irá apoiar os milhares de programas de ação já em andamento. Será uma vitrine para aprender com o melhor e apoiar os que estão pior. Dará visibilidade e materialidade. Emocionarmos diante da mensagem humana é muito importante, porque, caso contrário, viveríamos numa sociedade que não se espanta. O pavilhão e a atividade dos grupos s oc i ai s têm função de acerc a r, a p ro x i m a r, t a n t o a s d e n ú n c i a s c omo as s ol uç ões . Qual a mensagem para os grupos sociais? Mensagem prática de dizer que a união faz a força, unidos jamais serão vencidos é algo bastante evidente, mas que esquecemos. Serem capazes de recuperar o diálogo e a colaboração. Nossa capacidade é enorme, mas é preciso romper com os dogmas, principalmente aquele que diz que se um grupo não está 100% com o outro , então, é um inimigo. Essa espécie de rigidez dogmática e sectária precisa ser superada, pois, para tornar o mundo possível por necessidade, requer a força de todos os que se encontram nesta linha de trabalho, mas com muito res pei to. Para f azer f rent e s de luta, frentes de prática e frente de al ter nati v as . AQUA VITAE 53 ECONOMIA HÍDRICA Esta nova seção da Aqua Vitae foi idealizada a partir da Expo Zaragoza 2008. Foto: Carmen Abdo MERCADOS HÍDRICOS: UM TEMA PARA ENTENDER E RESOLVER Por Boris Ramírez Não se trata apenas de um tema financeiro, muito menos de preços, nem só de meio ambiente, nem de gestão de bacias hidrográficas, também não é apenas um tema legal ou de uso durante períodos de seca ou escassez. Os mercados hídricos são instrumentos que envolvem todos estes aspectos e muito mais. O tema mercados hídricos gera posições contrárias, já que os critérios para poder se entender seu mecanismo são divergentes. Isto porque o debate está sempre centrado no fato de que ninguém põe em dúvida que a água é indispensável para a vida, mas isso não deveria eximir o cumprimento das regras financeiras, econômicas, ambientais e legais, que imprimem à água não apenas um valor, mas também uma forma de gestão integral ao recurso hídrico. Para entender a complexidade do assunto, nos apropriaremos das variáveis que definem o que vem a ser um mercado hídrico, com base em um estudo realizado por Laura Riesgo e José Gómez-Limón da Universidade de Valladolid, na Espanha. Elas são: 54 AQUA VITAE Definição inicial de direitos transferíveis. Estão relacionadas à adequação do sistema de direitos adquiridos, dos termos dos leilões de água e dos mecanismos que devem ser levados em conta no sistema misto de administração (públicas e privadas) Tratamento da informação de mercado. Refere-se aos critérios de manejo e homogeneização da informação, para que sejam transparentes e eficientes. Duração dos direitos do uso da água. Para determinar se são permanentes ou temporárias. Tratamento de fatores externos. Objetiva controlar os efeitos sobre o volume de retorno hídrico, os efeitos sobre o próprio volume e os efeitos sobre a região de origem do volume. Forma de transferência de direitos. Determina se trata-se de venda, arrendamento, contrato de opção ou aporte de capital. Considerações dos custos de transporte hídrico. Para determinar se é público ou privado. Sistemas de fornecimento de água em períodos de escassez. Para determinar se deve ser fornecida de maneira prioritária ou proporcional. Instrumentos para solucionar as imperfeições de mercado. Para determinar as normas de posse, doutrina do uso e tarifas. Num mercado hídrico, não é apenas a remuneração econômica dos usuários que deve ser levada em conta, mas também a compensação de riscos assumidos pelas partes envolvidas na administração do recurso. Devido aos diferentes aspectos dos mercados hídricos, os organizadores da Tribuna da Água contribuíram com informações para entender tais segmentos como mecanismos de fornecimento de água, onde se deve levar em conta: • As secas e as temporadas de escassez, que obrigam a pensar em aspectos de inovação contínua nos instrumentos de gestão, incluindo este setor, a fim de desenvolver ferramentas e fazer frente constante à incerteza provocada pelos efeitos da mudança climática. Determina-se que os mercados hídricos são um instrumento para administrar a água em épocas de secas e escassez. • O papel dos mercados hídricos na melhoria da eficiência do fornecimento de água, dado que a eficiência no fornecimento por si só não é o único objetivo da política • Melhoria na transparência e flexibilidade dos mercados hídricos, por meio de uma reforma dos direitos sobre a água, contribuindo para facilitar as transações que costumam envolver temas tão polêmicos como volume, sazonalidade, qualidade e prazos. • Melhoria na qualidade da água por meio dos intercâmbios da mesma, já que é preciso trabalhar na redução da contaminação e fomentar o uso das tecnologias para processos de limpeza e reutilização. • O preço da água nas operações de mercado, já que quando os compradores em potencial revelam a disponibilidade de preço a ser pago, bem como o mínimo necessário de compensação dos vendedores em potencial, tal valor seria, em uma transação, um sinal do valor da escassez, que deveria ser acrescido quando a água fosse utilizada por estes usuários. econômica. Trata-se de um bem de serviço público, que não pode ser comprado nem vendido”. O mercado espanhol está bem regulamentado. Para começar, trata-se de um mercado bastante reduzido, já que as transações ocorrem sempre entre os usuários. “Está muito controlado. É preciso entender o que significou na Espanha a concepção da água como um bem de domínio público, submetido a um alto nível de intervenções administrativas”. Depois, o mercado é sempre usado para renomear um uso preferencial, “a legislação é coerente” e com ela se evita “a água de papel e uma provável especulação”. Caminho percorrido O mito ou a realidade dos mercados hídricos. O professor de Direito da Universidade de Villanova (EUA), Joseph Dellapenna, critica o critério exclusivamente economicista, com o qual muitos vêm defendendo a água, sem levar em conta outras considerações que fazem com que o tema não seja compreendido por muitos. Espanha, Austrália, Chile e o estado da Califórnia, nos Estados Unidos, já caminham Referiu-se, em específico, às diretrizes estabelecidas no Consenso de Washington, O debate dos mercados hídricos está baseado no fato de que ninguém põe em dúvida que a água é indispensável para a vida, mas isto não deveria eximir o cumprimento de regras financeiras, econômicas, ambientais e legais. de água, que deve atender aspectos tais como: preservação das atividades rurais e serviços ambientais proporcionados pelas mesmas. • O papel do setor público na regulamentação dos mercados hídricos, pois se considera que a intervenção do governo é necessária para garantir o abastecimento sustentável de água e evitar práticas de monopólio. Os mercados hídricos devem se caracterizar por um monopólio bilateral, que atua em um marco de concorrência transparente. • Um marco jurídico e institucional que facilite outorgar, por meio de acordos voluntários, garantindo que um intercâmbio de água seja feito dentro de um marco jurídico, que leve em conta a natureza complexa deste recurso. Este marco legal deve incluir cenários de incerteza e risco. dentro dos termos e condições dos mercados hídricos. Com retrocessos algumas vezes, avanços em outras, mas dentro desta transformação que supõe um tema tão complexo e atual. Aspectos jurídicos dos mercados hídricos na Espanha. O advogado espanhol Antonio Embid explicou o marco jurídico no mercado hídrico da Espanha. Tal debate teve início na década de 90, quando economistas como Alberto Garrido, postularam a introdução de fatores econômicos na gestão da água e de outros recursos. Com a Lei 46/1999, se instaurou uma nova forma de se realizar as concessões. “Atualmente, se fala de direitos particulares, suscetíveis de serem transmitidos”, afirmou Embid, deixando claro que “na lei espanhola não há um mercado hídrico pois o mesmo não é passível de transação onde as mesmas são normas provenientes de órgãos financeiros internacionais na aplicação de programas econômicos. Para ele, tais aplicações deixam de lado outros critérios que devem ser levados em conta na hora de atribuir um valor econômico à água. Segundo o professor, é preciso fazer uma reforma legislativa equilibrada, com uma maior flexibilidade. Não uma reforma que tenda exclusivamente a um modelo público ou privado, mas “com a segurança necessária e que torne o investimento possível”. As legislações hídricas, em quase todos os países, estão ultrapassadas, já que foram estabelecidas no século XIX e, portanto, “não visam questões como a proteção do Meio Ambiente”. Dellapenna citou o caso do Chile, onde “dizem que os mercados funcionam, mas estudos empíricos mostram que o mercado AQUA VITAE 55 Para se entender os mercados hídricos é preciso incluir variáveis ambientais, sociais, financeiras e econômicas. Foto: Carmen Abdo hídrico neste país é um mito e não um sucesso”. Falou também de Cochabamba (Bolívia), onde um grande número de empresas privadas, fornecedoras de água, prometem melhores serviços e preços mais competitivos, o que nem sempre é obtido, chegando a desencadear conflitos de grandes dimensões. A experiência da Austrália. Os mercados hídricos são usados de maneira crescente para resolver conflitos gerados pelos recursos hídricos - especialmente em situações de escassez -, para usos economicamente mais eficientes e também 56 AQUA VITAE Espanha, Austrália, Chile e o estado da Califórnia, nos Estados Unidos, já caminham dentro dos termos e condições dos mercados hídricos. Com retrocessos algumas vezes, avanços em outras, mas já dentro desta transformação que supõe um tema complexo e atual. para satisfazer novas demandas. O professor Henning Bjourding, da Universidade do Sul, considera que muitos dos mercados hídricos não surgem por falta de capacidade institucional, social ou econômica, ou ainda por conta das preocupações associadas à água, geradas pelas extremidades sociais e ambientais. No oeste da Austrália, as companhias estão desenvolvendo um processo de compensação de contribuições, que inclui pagamentos por novos usos da água e pagamentos por seu uso nas cidades e nos campos, que devem financiar trabalhos e programas compensatórios. Estudos da Universidade de Adelaida e do professor Mike Young destacam que tais mercados ALGUNS POR QUÊS… OS ESPECIALISTAS REUNIDOS NA TRIBUNA DA ÁGUA APORTARAM RAZÕES PARA AS QUAIS FAZ-SE NECESSÁRIO ANALISAR OS MERCADOS HÍDRICOS, A PARTIR DOS SEGUINTES PONTOS DE VISTA: a) Por que falar de mercados hídricos se há escassez de água, se há seca e cenários futuros? b) Por que falar de mercados hídricos para melhorar a importância da água? 1.Porque é preciso levar em conta a disponibilidade dos recursos hídricos que sofrerão impactos com as mudanças de padrões de precipitação e evaporação dada a mudança climática. 1.Porque, historicamente, a importância dos direitos ligados à água não foi determinada por critérios de eficiência, motivo pelo qual no novo cenário de escassez e secas os direitos sob a água devem ser acordos voluntários, acompanhados de formas de compensação. 2.Porque a mudança climática, assim como um processo de mudança global, pode aumentar, no futuro, os conflitos causados pela água. 3.Porque é preciso consolidar mecanismos de resolução de conflitos diante da possibilidade de suas ocorrências. 2.Porque a eficiência na importância do uso da água não é o único objetivo das políticas hídricas. Devem, além disso, levar em conta temas como manutenção de balanço hídrico, vínculo de comunidades e serviços ambientais. 4.Porque a progressiva escassez de água e o aumento das secas em diferentes regiões do planeta devem gerar maior consciência acerca da necessidade de planejar, de maneira eficaz, a gestão da falta d’água. 3.Porque se os mercados hídricos se tornarem uma opção real, estas transações voluntárias podem se converter em um instrumento importante para melhorar o uso eficiente da água. 5.Porque organizações e programas internacionais proporcionam mecanismos de coordenação importantes, que advogam pela redução do risco por meio de um planejamento mais pró-ativo e uma melhor gestão dos recursos hídricos. 4.Porque os mercados hídricos podem ser desenhados para outorgar água e também irrigação de maneira eficiente. 5.Porque continua sendo complicado, em termos práticos, implementar as políticas e mecanismos de mercados hídricos. 6.Porque os novos cenários de mudança climática requerem tecnologia e inovação, e que sejam experimentados em várias áreas de sua gestão. deveriam incluir mais a visão ambiental que a econômica, mas que suas origens servirão para dar um manejo adequado aos recursos hídricos. As secas impuseram o tema na Califórnia. O sistema de infraestruturas de água neste estado norte-americano inclui represas, lençóis freáticos e esgotos. Há uma grande variedade na demanda de água, já que os cultivos permanentes são de alto valor agregado e os cultivos anuais, de baixo valor agregado. Sem falar das demandas residenciais, industriais, comerciais e urbanas. Este complexo sistema é administrado dentro do mercado, por uma rede de instituições interdependentes, incluindo tanto agências estatais como federais e locais, que contam com concorrentes em gestão e controle. Num mercado hídrico, não é apenas a remuneração econômica dos usuários que deve ser levada em conta, mas também a compensação de riscos assumidos pelas partes envolvidas na administração do recurso. Foto: Carmen Abdo As agências locais e os fornecedores chegam a aproximadamente 3 mil e seus gerentes são eleitos localmente, bem como os outros milhares de contratados que trabalham para estas entidades, coordenando as operações de gestão hídrica. Em regiões dos Estados Unidos com um crescimento rápido, os gestores hídricos enfrentam difíceis desafios para conseguirem abastecer as novas demandas. Ellen Hanak, do Instituto de Políticas Públicas da Califórnia apresentou o progresso considerável alcançado para expandir as fontes não convencionais de água, por conta da seca de 1990 e 1992 ocorridas neste estado, além da série de normas californianas que restringiam o uso de fontes tradicionais. AQUA VITAE 57 AVANÇOS TECNOLÓGICOS A Dinamarca interpretou seus projetos com círculos para envolver os visitantes. Foto: Carmen Abdo. NOVAS TECNOLOGIAS TRANSBORDAM DA ÁGUA “EXISTEM INOVAÇÕES FANTÁSTICAS COMO DESSALINIZAÇÃO, REGENERAÇÃO, MEMBRANAS, BIOTECNOLOGIAS. EU APOSTO NISSO”, PAUL REITER, DIRETOR EXECUTIVO DO INSTITUTO INTERNACIONAL DA ÁGUA Por Boris Ramírez O tema parece ter o consenso mundial. O atual modelo energético contamina, é caro e os combustíveis não são perenes, motivo pelo qual o grande desafio do mundo é garantir novas opções para o fornecimento de água e geração de energia que sejam mais baratas e não causem tanto impacto nas fontes hídricas. A discussão em relação ao presente e ao futuro da água transcorreu na Expo Zaragoza 2008 como um rio: por vezes tranqüilo, por outras como uma torrente urgente e impetuosa. Mas, talvez, o Diretor Executivo do Instituto Internacional da Água (IWA por suas siglas em inglês) tenha sido quem melhor definiu: “Existem tecnologias fantásticas como dessalinização, regeneração, membranas, biotecnologias. Eu aposto nisso”. 58 AQUA VITAE A vantagem é que ele não está sozinho. Autoridades como a ex-ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, afirmam que “não é possível pensar na sustentabilidade de um, sem pensar na do outro”, mostrando que os desafios mundiais relativos à água não implicam apenas no manejo das fontes das mesmas, e sim na gestão do ecossistema total. Foi por isso que muitos aproveitaram esta exposição internacional para trazer novas respostas, no âmbito tecnológico, que possam ser incluídas na nova corrente de pensamento daqueles que se preocupam, de maneira integral, com as novas energias que devem ajudar a proteger os ecossistemas e resguardar o abastecimento de água. As possibilidades tecnológicas vão desde os projetos de dessalinização de grandes quantidades de água salgada, passando por investimentos em novas usinas de tratamento que possibilitem a reutilização hídrica em sistemas de irrigação, até grandes obras hidráulicas que permitam levar água de um lugar a outro, ou ainda, de novas tecnologias como as da Suécia ou da Dinamarca, que aproveitam outras energias com menor impacto no meio ambiente. Research, investiga a criação artificial de tormentas na região de Queensland (Austrália) e explica que “não é uma resposta à mudança climática, mas sim uma técnica iniciada no país”, conhecida como semeação de nuvens e que ainda está em fase experimental: “é uma pesquisa nova, ainda não temos conclusões definitivas”. (www.usq.edu.au/newsevents/news/cloudsee d.htm, www.bom.gov.au/bmrc/basic/events/ cloudseeding). DO MAR Como uma nova forma de obtenção de água, a chamada dessalinização apresenta-se como sendo uma alternativa para setores que não contam com recursos de água doce. Trata-se de um processo de tratamento, no qual são extraídos os sais dissolvidos na água do mar ou das águas salobras produzindo-se água potável. Desta forma, foram desenvolvidas tecnologias que permitem, de maneira eficiente, baixar de 38 mil mg/l (água salobra) dos sais dissolvidos para menos de 500 mg/l (água potável). • Antonio Rodríguez Perea, especialista em estratigrafia pela Universidade das Ilhas Baleares (Espanha), considera que os sistemas naturais foram degredados e confiados à tecnologia, “nos fazendo viver um espelhismo no século XX, para o qual apenas despertamos no século XXI”. Perea aposta ainda na mudança de hábitos da sociedade, aplicando ao máximo "a tecnologia de dessalinização ou transposição, evitando fugas futuras, que só transferem o problema para a energia e a mudança climática, ou seja, coloca o problema debaixo do tapete”. (www.uib.es/es). Exi s t e m n o m u n d o 7 . 5 0 0 u s i n a s d e dessalinização, segundo a Associação Internacional de Dessalinização, das quais dois terços estão no Oriente Médio. No caso da América Latina, as plantas lo c a l i z a m - s e n o C h i l e e n o M é x i c o. (www.idadesal.org) •Inés Restrepo, pesquisadora do CINARA pela Universidade do Valle, na Colômbia, defende os testes antes das aplicações de soluções tecnológicas, para que não haja perda de recursos valiosos. “Por que usamos água potável na privada, quando, na realidade, utilizamos apenas cerca de A empresa espanhola Acciona, com projetos nos Estados Unidos e no Chile, apresentou nesta exposição suas linhas de pesquisa sobre despoluição da água do mar, mediante novas técnicas alternativas frente aos tratamentos convencionais que utilizam compostos clorados. A Acciona mostrou ainda seu sistema Sepafloc, voltado para os pré-tratamentos de dessalinização e tratamentos de reaproveitamento hídrico. Para demonstrar todo esse trabalho, a companhia entregou aos visitantes garrafas com água potável proveniente do mar. (www.acciona.es) seis litros de água potável por dia? Além disso, o caso concreto dos assentos sanitários são um exemplo de tecnologia que não funcionaram na América Latina. As tecnologias têm o DNA das sociedades que as criam e não o DNA de onde são aplicadas”. (www.cinara.univalle.edu.co) • Dilma Pena, secretária de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Brasil), apresentou o projeto PRODES levado a cabo pela Agência Nacional de Águas deste país, que consiste em investir nas empresas provedoras de recursos hídricos a fim de “incentivar o tratamento de água e o abandono do costume de vertê-la nos rios sem nenhum tipo de purificação”. (www.ana.gov.br/prodes). • Rafael Mujeriego, presidente da Associação Espanhola de Reutilização Sustentável da Água estabeleceu a possibilidade da água regenerada, reciclando a água proveniente da cidade, ou das próprias indústrias, para outros usos, tais como: limpeza de vias e calçadas, vasos sanitários, em torres de refrigeração de ar condicionado de indústrias, lavagem de automóveis e trens, entre outros. (www.canagua.com/es/pdf/reutilizacion.pdf) COM SELO NÓRDICO No entanto, os países do norte da Europa estão integralmente voltados para os temas relacionados à energia limpa, com o objetivo de evitar impactos nos recursos naturais. Houve de tudo na mostra. A Suécia trouxe carros com baixo impacto para o meio ambiente. Foto: Carmen Abdo APLICAÇÕES FRENTE ÀS SECAS As secas extremas, cada vez mais freqüentes, são algumas das conseqüências das mudanças climáticas, o que leva a buscar, por sua vez, novas aplicações tecnológicas para que o recurso hídrico não falte. Estes são alguns dos pensamentos atuais frente ao tema. • Roger Stone, presidente do National Task Group for Precipitation Enhancement AQUA VITAE 59 A água potável dessalinilizada é uma das respostas para os países que padecem da falta de água doce. Especialistas insistem que a tecnologia deve ser aplicada em prol das pessoas. Fotos: Carmen Abdo O hidrogênio tem sido considerado uma fonte de abastecimento de energia de baixo uso dos recursos hídricos. Foto: David Ruiz A Suécia acompanhou um importante número de empresas no país, as quais passaram a ser classificadas como “comprometidas com a água e a natureza”. Dentre elas estão: • Volvo. Seu automóvel recarregável utiliza uma bateria capaz de se recarregar com corrente elétrica normal. Quando a bateria acaba, o carro passa a funcionar com um motor “flexfuel” de 1,6 litros e 4 cilindros. • A ClimateWell apresenta um sistema capaz de garantir uma temperatura constante durante todo o ano com energia solar térmica. A tecnologia “Frio Solar” armazena energia em sais minerais que, ao serem dissolvidos com água, transformam60 AQUA VITAE se em ar frio ou quente. Entre os benefícios, está uma economia de 85% no consumo energético de uma casa, além da redução das emissões de CO2 (Gás Carbônico) em até 15 toneladas por moradia e funciona com energia solar, renovável e infinita. • Galluvare PhotoVoltgaic. A companhia cria módulos com células solares que podem ser usados em casas, prédios, fachadas ou telhados. Por meio destes módulos é possível transformar a luz do sol em energia elétrica. • Centro Sueco para a Conversão Elétrica de Energias Renováveis. Localizado em Uppsala, especialistas desenvolveram uma tecnologia para produzir energia elétrica a partir das ondas, já que os estudos determinam que esta energia tem capacidade de disposição de até 4 mil horas por ano, em contraposição às 2,2 mil horas de sol. Esta eletricidade produzida pelas ondas não produz emissões, nem deixa resíduos nocivos na atmosfera. Durante a Expo Zaragoza, o pavilhão da Dinamarca, chamado de “Círculos de Água”, mostrou as possibilidades do uso da energia eólica, da iluminação natural e dos biocombustíveis. Tudo isso em função da busca por novas energias que deixem de causar impacto nas fontes hídricas. LEGISLAÇÃO A ÁGUA CABE SIM DENTRO DE UM MARCO A experiência do Conselho Marco da Água, não é apenas ambiciosa, mas também acorda responsabilidades, gera compromissos e abre portas para a transformação da legislação hídrica. POR BORIS RAMÍREZ Foi um presente de natal adiantado. Alguns o esperavam com certa ansiedade, outros nem tanto e outros ainda nem esperavam. O fato é que no dia 22 de dezembro de 2000, foram publicadas as Diretrizes 2000/60/CE do Parlamento Europeu, conhecidas como Conselho Marco da Água (DMA, por suas siglas em espanhol) http://europa.eu/ scadplus/leg/es/lvb/l28002b.htm. O pacote é valioso. A DMA estabelece um marco comunitário para a proteção das águas superficiais continentais, de transição, costeiras e subterrâneas, a fim de prevenir ou reduzir sua contaminação, promover seu uso sustentável, proteger o meio ambiente, melhorar o estado dos ecossistemas aquáticos e atenuar os efeitos das inundações e das secas. de que se trata de um bem público e de que a relação entre Direito e Água é um instrumento para garantir nosso futuro”. Desta forma, a DMA busca essa segurança jurídica que, pressupõe-se, a água deva ter, mas não apenas como sendo um recurso natural, e sim como um fator fundamental para o desenvolvimento que deve abordar os problemas com clareza e contribuir com a conservação destes recursos para as futuras gerações. Para isso, o estatuto foi ampliado também para a proteção de todas as águas, estabelecendo o objetivo claro de que, em 2015, é preciso atingir um “bom estado ecológico” para todas as águas européias, bem como o uso sustentável do recurso. “Desde que a grande discussão sobre água começou a ser organizada na Europa estava claro que era preciso fazê-la do ponto de vista de um plano integral, não por partes, mas sim como sendo um recurso que, além de valioso, tem total relação com a Natureza”, afirmou Domingo Jiménez Beltrán, ex-diretor da Agência Européia da União Européia (UE), hoje membro do Fórum Ético da Água, formado por personalidades mundiais. O conjunto de normas representa “um planejamento ambicioso e inovador, de olho na gestão hídrica”, disse Pedro Arrojo, economista e fundador da Fundação Nova Cultura Hídrica, indicando que “o importante do Conselho Marco da Água está no fato de reunir e priorizar a água a partir da discussão agregadora”. A discussão dos europeus teve início devido às numerosas pressões em cima dos recursos hídricos comunitários, motivo pelo qual era importante criar “instrumentos legislativos efetivos”, disse Antonio Garrigues, jurista espanhol, explicando que “o papel do (sistema) jurídico, no que se refere ao tema água, deve partir do pressuposto Com um marco de discussão bastante claro, aqueles que aprovaram a DMA incluíram aquilo que consideram a coluna vertebral da normativa: MÃOS À ÁGUA • Proteção de todas as águas: rios, lagos, mares e lençóis freáticos. • Restauração do bom estado ecológico de todas as águas para 2015. • Estabelecimento de programas de cooperação trans-fronteiriços. • Participação ativa de todos os interessados, incluindo ONGs e comunidades, em atividades para a gestão hídrica. •Políticas de fixação de preços da água e garantias de responsabilidades em caso de contaminações. • Equilíbrio entre os interesses do meio ambiente e dos que dependem dele. A DMA é de grande complexidade jurídica e técnica, tanto em sua concepção quanto em seu conteúdo, aplicação e desenvolvimento. Mas o Velho Continente entendeu que tinha que trabalhar em prol deste elemento fundamental para a vida humana. “As situações em torno da água serão de suma importância para a maioria da humanidade num futuro bastante próximo”, comentou Joseph Borrell, presidente da Comissão de Desenvolvimento do Parlamento Europeu. Para adiantar o processo e dada a formação política, social e econômica européia, a DMA fixou um caminho bastante claro de atuação: estabelecer um marco para a proteção das águas continentais, de transição, marítimas e subterrâneas. Tal estrutura - para muitos ambiciosa, para outros revolucionária – marca uma nova etapa da legislação mundial em prol da água e do processo de transformação. Pedro Arrojo sustenta que a importância e o aporte do Conselho Marco da Água da União Européia incorporam idéias revolucionárias sobre o tema. De acordo com sua AQUA VITAE 61 PROTEGER TUDO COMO O LEITO DE UM RIO A DMA afirma em seu conteúdo que é preciso entender todas as águas que estão dentro do conjunto de normas e, para que não reste dúvida, define: O Conselho Marco da Água europeu é como o leito de um rio: já passou por regiões com grandes torrentes de idéias e discussões, já enfrentou cataratas e obstáculos e encontrou caminhos tranqüilos também. Este é o calendário do que já foi feito e do que ainda falta fazer. Águas continentais: são as águas que correm ou se acumulam na superfície da Terra, desde a linha que serve de base para medir a largura das águas territoriais. Águas superficiais: são as águas continentais - com exceção das águas subterrâneas –, as águas de transição e as águas costeiras, e, no que se refere ao estado químico, são também as águas territoriais. ANO AÇÕES 2000 Aprovação e vigência do Conselho Marco da Água Águas subterrâneas: todas as águas que correm abaixo da superfície da Terra, na região de saturação e em contato direto com o solo ou com o subsolo. 2003 Transposição à legislação dos estados membros 2004 Demarcações Hidrográficas de acordo com o art. 5: análise das características, pressões e impactos. 2005 Revisão dos informes de demarcações (art. 5) Início da definição de objetivos para os planos de medidas. 2006 Estabelecimento da rede de controle (art. 8). Identificação de partes interessadas (atores), apresentação do calendário para a consulta pública e o programa para a redação dos planos de gestão das bacias hidrográficas (art. 14). 2007 Informe provisório sobre aspectos chave da gestão hídrica em cada demarcação (art. 14). 2008 Consulta pública sobre os rascunhos dos planos de gestão. 2009 Aprovação dos planos de gestão (art. 13). 2010 Aplicação dos valores que introduzirão incentivos para o uso eficiente da água (art. 9) 2012 Os planos de gestão já devem estar funcionando (art. 11) 2015 Alcance do bom estado ecológico de todas as águas (art. 4) Águas de transição: massas de água superficiais próximas à foz dos rios. Porquê estão próximas às águas da costa são parcialmente salinas, mas recebem notável influência de fluxos de água doce. Águas costeiras: são as águas superficiais situadas sobre a Terra, a partir de uma linha cuja totalidade de pontos encontra-se a uma distância de uma milha náutica (mar adentro) do ponto mais próximo da linha de base, que serve para medir a largura das águas territoriais e que se estendem, conforme o caso, até o limite exterior das águas de transição. Bacias hidrográficas: é a superfície de terreno, cuja escorrentía superficial flui em sua totalidade através de uma série de correntes, rios e, eventualmente, lagos em direção ao mar, por uma única foz, estuário ou delta. Demarcação hidrográfica: trata-se da região marinha e terrestre formada por uma ou várias bacias hidrográficas vizinhas e as águas subterrâneas e costeiras associadas, designada como principal unidade para efeito de legislação da gestão das bacias hidrográficas. Fonte: Informe da Interwies e Dworak para as Jornadas sobre Conselho Fonte: Conselho Marco da Água da União Européia. análise, trata-se do bloco legal mais completo do mundo. O mais importante, segundo ele, é que “muda o conceito (dentre outras coisas), passando de uma gestão de um recurso para uma gestão ecossistêmica. Entendemos que para se ter água no futuro devemos cuidar da fábrica da água”. Arrojo encontra embasamento para tal pensamento ecológico no pragmatismo economicista anglo-saxão, refletido na legislação, ao entender que “é preciso cuidar dos recursos não apenas para cuidar do meio ambiente, mas também por causa do desenvolvimento econômico. É um mau negócio contaminar lençóis freáticos ou destruir rios”. 62 AQUA VITAE Marco da Água e multifuncionalidade da agricultura - 2006. A visão integral leva os países europeus a trabalharem na prevenção do deterioramento adicional, bem como na proteção e melhoria dos ecossistemas aquáticos e terrestres, na promoção dos usos sustentáveis da água, na proteção e na melhoria do meio aquático, na redução da contaminação hídrica subterrânea e nos mecanismos para minimizar os efeitos de inundações e secas. A experiência pode ser aplicada em outros lugares, como no caso da América Latina. Os especialistas estão bem certos disso, como o argentino Víctor Pochat, consultor da Organização das Nações Unidas, que considera “iniciativas como o Conselho Marco da Água da União Européia um exemplo notável de como vários países com diversidades tão amplas na cultura, por exemplo, podem chegar a acordos positivos”. O êxito do esforço comunitário está em resolver, de maneira homogênea e coordenada, os obstáculos que possam vir a surgir aos estados membros da UE deste desafio tão complexo, de forma que os estados membros e a própria UE interpretem da mesma forma seus conceitos. Só assim será possível dizer que a água cabem sim dentro de um marco, mas um marco amplo, claro, agregador e transformador. OPINIÃO DANIELLE MITTERRAND É ativista social. Foi fundadora e, atualmente, preside a Fundação France Libertés. De 1981 a 1995, foi Primeira Dama da França, cargo para o qual impôs um papel diferente, trabalhando mais em causas sociais, tanto a nível nacional como mundial. Danielle também é membro do Fórum Ético da Água Um Direito Humano e dos Cidadãos: Foto: Carmen Abdo Uma missão me levou a viajar para Argentina, Chile, Bolívia, Brasil e Uruguai. Estive com chefes de Estado, trabalhadores, sindicatos e associações mobilizadas em torno à situação da água, tanto local como mundial. D urante várias décadas, a France Libertés, fundação que presido, vem denunciando as violações dos direitos humanos, as opressões dos povos marginalizados e aporta sua contribuição para as iniciativas em prol das populações em risco a fim de dar uma vida melhor para suas crianças e suas famílias. Durante todos estes anos, os membros da France Libertés também percorreram o mundo, recolhendo testemunhos, exibindo incoerências e enganos causados por um sistema econômico absoluto, inspirador das políticas de nossos governantes. Isto significa que continuaremos sofrendo as conseqüências desta política, apesar de denunciarmos estes estragos há muitos anos. A France Libertés, assim como milhares de homens e mulheres, vê e ouve os testemunhos das vítimas destes atores privilegiados de uma classe política que busca o “benefício financeiro”. firmado desta maneira, sem contemplar aspectos de saneamento. Durante esta viagem, conhecemos e apoiamos a decisão do Uruguai de rechaçar a privatização da água, que foi conquistada por meio de um referendo. Na Bolívia, participamos dos trabalhos em busca da nova gestão pública hídrica em Cochabamba, na região de El Alto. Mais tarde, aplaudimos e apoiamos a política social do presidente. Este ano, no Congresso Nacional Brasileiro, atendendo à solicitação dos defensores da Lei de saneamento, nos associamos à Associação das Empresas Públicas Municipais (ASSEMAE) e a sua rede de mais de 200 organizações sociais, a fim de reforçar a voz dos brasileiros. Desta forma, os partidários da privatização se depararam com uma verdadeira oposição democrática. O Fórum Ético da Água Em defesa do elemento líquido A France Libertés se posicionou pela defesa do estatuto da água e pela defesa do mesmo como um direito humano e dos cidadãos. Hoje posso evocar para seus leitores a longa e instrutiva viagem que fiz em 2005, pela América Latina, acompanhada de franceses e militantes associados a nossa organização. Foi uma missão que me levou ao Brasil, à Argentina, terminando no Uruguai e na Bolívia. Nestes locais, me reuni não apenas com chefes de Estado, como também com trabalhadores, sindicalistas e associações interessadas na situação da água, tanto a nível local como mundial. Afinal, somos todos solidários! Na ocasião, fui convidada a ir a casa de uma mulher. Quando entrei em sua linda casa – construída com o esforço de longos anos de trabalho -, instintivamente tampei meu nariz com as mãos. A mulher, aflita, pediu desculpas, explicando que durante a maior parte do tempo ela também vivia com uma máscara, tal era a agressão dos cheiros nauseantes, que não haviam sido eliminados pela multinacional do setor hídrico que ali atuava. Tudo isso acontecia, simplesmente, porque o contrato não previa os trabalhos necessários para o escoamento e o saneamento, pela simples razão de que os mesmos não eram rentáveis e de que a companhia privada (com ações na Bolsa) necessitava “criar valor agregado ao acionista”. Informaram que o contrato havia sido Neste ano ainda, participei da formação do Fórum Ético da Água, em Zaragoza (Espanha). Durante longas jornadas em volta de uma mesa, organizada por Pedro Arrrojo, trabalhamos na obtenção de um acordo entre nossos diferentes pontos de vista, com o objetivo de redigir um “Chamado de Zaragoza”. Logo percebi que nem todos os participantes falavam a mesma língua. A água não é uma mercadoria, não deve responder a esses mesmos imperativos. A noção ética e moral da água deve ser a de uma riqueza fora do comércio, mesmo quando se considera que o serviço tem um custo. Então, propus aos participantes um desafio pela mudança da sociedade. Desafio este desejado por todos aqueles que entendem: considerar os elementos constitutivos da vida, ou seja, a água, o ar, a terra e o fogo são bens comuns da Humanidade e do ser humano, à parte de toda e qualquer forma de comercialização. Iniciamos com a água. E tudo o que pretendemos é defender a causa hídrica e reafirmar seu estatuto vital, contribuindo para com uma aproximação da realização de nosso desafio. Tradução: Myriam Hoffmann. A Aqua Vitae não emite opinião sobre os critérios expressados nesta seção de opinião, mas estamos abertos a diferentes perspectivas em torno do manejo do recurso hídrico. AQUA VITAE 63 SITES DE INTERESSE www.aquavitae.com blog latino-americano especializado no tema água Foto: Carlos Acín A qua Vitae, cumprindo com seu objetivo de se consolidar como uma tribuna relevante e especializada no tema hídrico, decidiu marcar presença no maior evento ligado à água do planeta: a Expo Zaragoza 2008, convicta de estar respondendo ao imperativo de levar para a América Latina tudo o que aconteceu durante a exposição e resgatar todo o conteúdo para, em seguida, dispô-lo a serviço de nossa sociedade latino-americana. O blog www.aquavitae.com foi o único meio de comunicação presente durante todos os 93 dias da Expo Zaragoza 2008, com um enfoque 100% latino-americano e assegurando a visão multisetorial. No site, é possível encontrar os aportes realizados durante os 93 dias de Expo, com informações relevantes para nossa região, que eram escritas diariamente e em tempo real, além de fotografias e imagens belíssimas, disponibilizadas gratuitamente para a imprensa e o público em geral de toda América Latina. Dentro do blog estão registrados pensamentos de prêmios Nobel da Paz como Mikhail Gorbachev, Rajendra Pachurí e Rigoberta Menchú, além das propostas de vários humanistas entre eles Vandana Shiva, Danielle Mitterrnad, Susan George, Federico Mayor Zaragoza, Ban Ki-moon, Jeremy Rifkin, Javier Solana, Ricardo Petrella e Antonio Garrigues. Estão registrados também o pensamento latino-americano de Marina da Silva, Inés Restrepo, Víctor Pochat, Raymundo Garrido, José Luis Luege, Luis Alberto Moreno, Enrique Iglesias, Dilma Pena, entre muitos outros. O leitor poderá entrar em contato com iniciativas de todos os países da América Latina e do mundo, bem como com a visão de muitas das 350 organizações sociais que participaram da Expo Zaragoza. Os jogos interativos, instalados pelas empresas Amanco-Mexichem durante a Expo, prenderam a atenção do público em geral, especialmente das crianças. Foto: Carmen Abdo 64 AQUA VITAE Trata-se de uma fonte de informação atual que reúne as vozes de cidadãos, políticos, empresários, instituições internacionais, órgãos da sociedade civil, pesquisadores, cientistas e pensadores ligados aos temas hídricos. Tudo isto, torna o blog uma resposta oportuna ao chamado mundial, lançado pela Organização das Nações Unidas (ONU), de difundir e sensibilizar um tema de fundamental importância para a humanidade. fe Tacvba Ca foto: Cintia Sarría A água também foi homenageada pela música, pela dança, pelo teatro... lanis Morissette A foto: Carmen Abdo eil uenSAobl do d e u Cirtqo: Carm Hombre Vertiente fo foto: David Ruiz M ita, . Men foto: ªRR ubén RodM riguez ezes, G. Gil, G. Cos ta del Norte Tigres foto: David Ruiz C fotoo:ti Fabio Rubén Blades foto: Rubén Rodriguez Rodr íguez Gieco León foto: Carmen Abdo Horacio Franco foto: Rubén Rodríguez ayumana riguez M foto: Rubén Rod E sa mble OsnD Al Dav erviches Kindi id R de e uiz Dam asco foto: e Toumani Diabate Bjork foto: Cintia Sarría aría Dolores M foto: David Ruiz Pradera Luis Guerra Juan foto: Rubén Rodríguez Mer foto: CacermdeensASbdosa o AQUA VITAE 65 www.aquavitae.com
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