CNUCD

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CNUCD
CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O COMÉRCIO E
DESENVOLVIMENTO
Prezados Delegados,
Em um mundo em que tudo parece girar em torno de poder e habilidade
política, os que se recusam a enxergar a brutalidade da política internacional praticada hoje,
com sua violência extrema, suas paixões e ódios, próprios da maneira como construímos as
relações de poder ao longo dos anos, parecem não perceber o papel designado na sociedade
para cada um de nós, jovens. O poder parece estar do lado de quem domina a dissimulação e
assegura seu próprio poder de forma mais gentil. É sensato ser polido, como afirmava Arthur
Schopenhauer. A sensação de que viver neste mundo é impossível pode ser substituída se
passarmos a perceber que tudo que acontece também é nossa responsabilidade.
Tomando parte desta simulação estaremos mostrando que, ao invés de nos
incomodarmos com a política, de desdenhá-la e de cobri-la com um sentido pejorativo, somos
seres atuantes e preocupados com a condução de nossa sociedade. Não devemos, portanto,
identificar política com dominação.
Depois de séculos e séculos, finalmente construímos um sistema que impede
que todos os desentendimentos entre Estados terminem em guerra. Tomar parte desta
simulação significa depositar um voto de confiança nas Nações Unidas. O mundo mudou e o
sistema das Nações Unidas precisa mudar. Mas é nosso trabalho garantir que ele seja pautado
na diplomacia, no multilateralismo e na igualdade jurídica entre Estados. Afirmar que a ONU
se caracteriza como sendo irrelevante para a comunidade internacional é mostrar total
desconhecimento da história e atividades desta instituição. É desconhecer que a ONU vai
além das questões de Paz e Segurança.
Não é a primeira vez que se fala no fim da ONU, em uma nova geração de
organismos internacionais e na redefinição da função central das Nações Unidas. Ainda
assim, a ONU sempre continuou trabalhando para construir as utopias que permeiam nossos
sonhos. Um mundo sem guerras e sem fome, em que todos os seres humanos tenham
oportunidades de uma vida digna. Isso é que estaremos ajudando a construir se, após a SOI
2003, formos capazes de nos posicionarmos como verdadeiros cidadãos do mundo.
A nossa diretoria é composta por Isabel Costa, que é estudante de direito da
UFRN, e possui como áreas de interesse a diplomacia e relações internacionais, bem como o
comércio internacional e desenvolvimento. Participou da SOI 2002, na condição de delegada,
e da AMUN 2003, no ECOFIN, representando a Noruega. Temos, ainda, Rodrigo Moura,
aluno de Administração da UFRN, que possui como experiência em Modelos a AMUN 2002,
onde representou a Colômbia no ECOFIN, além da SOI 2002, ocasião em que participou na
condição de delegado, representando os Estados Unidos da América. Além disso, participou
da AMUN 2003, onde representou os EUA no ECOFIN, tendo estudando dois anos de
Comércio Exterior, pretendendo se especializar em comércio exterior e negociação
internacional. Por fim, temos Andrew Patrício, estudante de direito da UFRN. O seu interesse
na seara do Direito Internacional converge para as áreas do desenvolvimento, direitos
humanos e direito internacional ambiental. Sua experiência em Modelos da ONU teve início
no ano de 2001, quando participou, na condição de delegado, da SOI 2001. Participou, ainda,
da Harvard WorldMUN 2002, no comitê UNDP (Programa das Nações Unidas para o
1
Desenvolvimento). Além disso, participou da AMUN 2002, no UNCTAD, onde representou a
Colômbia. Representou, ainda, o Brasil na SOI 2002. Em 2003, fez parte do Comitê Jurídico
da AMUN, ocasião em que representou a Noruega.
Agradecemos por terem se juntado a nós nessa jornada. Não se esqueçam de se
inscrever no nosso e-group (http://br.groups.yahoo.com/group/CNUCD2003). Dessa forma,
vocês poderão se comunicar mais facilmente com a diretoria e com os demais delegados.
Estaremos prontos para dirimir qualquer dúvida, e receptivos em relação a eventuais
sugestões. Até novembro!
Andrew Patrício, Isabel Costa, Rodrigo Moura
Diretoria- CNUCD/SOI 2003
HISTÓRICO DO COMITÊ
A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento
(CNUCD) foi criada no ano de 1964, objetivando-se a integração dos países em
desenvolvimento na economia mundial, sendo considerada o local exato, no âmbito das
Nações Unidas, para o tratamento do comércio e desenvolvimento em relação aos mais
diversos campos, desde a área tecnológica ao desenvolvimento sustentável. É, portanto, um
foro intergovernamental de discussões e deliberações, apoiado por discussões com
especialistas e trocas de experiências, pautando-se na busca pela construção do consenso,
sendo responsável por pesquisas, análises de políticas e armazenamento de informações, com
o objetivo de oferecer fontes significativas às discussões dos especialistas e dos representantes
governamentais.
A Conferência em epígrafe trabalha em estreita relação com o Departamento
de Assuntos Econômico e Sociais (DAES) das Nações Unidas, com o Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com o Centro de Comércio Internacional, com a
Organização Mundial do Comércio (OMC), assim como outras organizações multilaterais,
tais como o Banco Mundial, FMI e as comissões econômicas regionais. Colabora, igualmente,
com uma grande quantidade de organizações de cooperação econômica, como a Organização
para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e muitas outras organizações
nacionais e internacionais.
O Secretário-Geral da CNUCD é o brasileiro Rubens Ricúpero. A SecretariaGeral trabalha juntamente com os Governos-membros e interage com organizações do sistema
das Nações Unidas e comissões regionais, assim como instituições governamentais,
organizações não-governamentais, com o setor privado, incluindo associações de comércio e
de indústrias, institutos de pesquisa e universidades do mundo inteiro.
A estrutura1 da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o
Desenvolvimento se caracteriza pelo seu caráter tripartite, dividindo-se em esferas distintas:
a) a Conferência, que se configura como o principal órgão normativo da CNUCD, sendo
composta por mais de 185 Estados-membros; estes últimos se reúnem de quatro em quatro
anos com o intuito de examinar problemáticas relativas ao comércio e desenvolvimento. A
próxima conferência será realizada no Brasil, na cidade de São Paulo, em junho de 2004; b) a
1
Para maiores informações, visite: http://www.unctad.org/Templates/Page.asp?intItemID=1651&lang=1.
2
Junta de Comércio e Desenvolvimento, órgão em que todos os Estados-membros da CNUCD
podem fazer parte, sendo responsável por funções como o estudo da interdependência e das
tendências econômicas mundiais no âmbito do comércio e desenvolvimento, além de
assegurar a coerência geral das atividades da CNUCD e examinar as prioridades de trabalho
do secretariado e as atividades de cooperação técnica; c) as Comissões Especiais, que se
reúnem uma vez por ano para discutir políticas em áreas específicas, proporcionando um
suporte para o trabalho do secretariado. São elas: 1) a Comissão do Comércio de Bens e
Serviços e dos Produtos Básicos; 2) a Comissão de Investimento, Tecnologia e Questões
Financeiras Correlatas; 3) Comissão de Empresas, Auxílio à Atividade Empresarial e
Desenvolvimento.
Tópico A
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E MEIO AMBIENTE: MEDIDAS
EFETIVAS PARA O USO SUSTENTÁVEL DA BIODIVERSIDADE NO ÂMBITO DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO.
“A biodiversidade é, juntamente com a água, a energia, a
saúde e a agricultura, uma das cinco áreas prioritárias das
Nações Unidas" (Kofi Annan, secretário geral da ONU).
1 - Introdução
Podemos considerar que as temáticas do Meio Ambiente e do
Desenvolvimento Sustentável ensejam, constantemente, interessantes discussões em âmbito
global.
Com o passar dos anos, como poderemos constatar detalhadamente no decorrer
do presente guia de estudos, passou-se a considerar que a humanidade era capaz de influir
decisivamente nos rumos da questão ambiental. Percebeu-se que os processos de crescimento
a qualquer custo e a degradação dos recursos naturais estavam intrinsecamente relacionados,
tornando-se imperativo para a conquista da sustentabilidade dos recursos biológicos uma nova
forma de pensar o desenvolvimento humano.
Nesse diapasão, a partir dos esforços de organismos internacionais das Nações
Unidas, de organizações intergovernamentais e não-governamentais, assim como ações
concretas da iniciativa privada, desponta globalmente uma nova concepção para o
desenvolvimento, o denominado “desenvolvimento sustentável”.
Esse novo entendimento é responsável por ressaltar a necessidade de o Ser
Humano utilizar sustentavelmente e preservar os recursos da natureza, não devendo ostentar
um pensamento imediatista, conservando as possibilidades das gerações futuras, evitando,
para estas últimas, um legado de devastação e esgotamento.
O Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, por ocasião do Dia Internacional da
Diversidade Biológica, no dia 22 de maio de 2001, emitiu uma mensagem bastante
elucidativa, que resume basicamente os anseios atuais da comunidade internacional acerca da
problemática da preservação e utilização sustentável da diversidade biológica:
3
"A biodiversidade é um dos tesouros mais preciosos da humanidade. Cabe a cada
geração a pesada responsabilidade de salvaguardar as espécies e ecossistemas do
mundo - de tratá-los e usá-los da uma maneira sustentável e de guardá-los para as
gerações futuras. Contudo, os cientistas confirmaram um declínio generalizado do
estado deste legado da natureza. As necessidades crescentes de recursos, exacerbadas
por uma multiplicidade de fatores políticos e econômicos que nos incentivam a
explorar sistemas com vista a obter benefícios a curto prazo, estão a prejudicar o
mundo a longo prazo, podendo vir a ter efeitos devastadores no desenvolvimento
humano"2
A partir das palavras de Annan, não restam dúvidas sobre a
possibilidade concreta de utilização sustentável da biodiversidade em concomitância com a
sua conservação. O que pode parecer um paradoxo, à primeira vista, far-se-á mais claro e
tangível após o estudo da questão em epígrafe. A conciliação entre o uso consciente e
sustentável da diversidade biológica e a sua efetiva preservação é perfeitamente possível,
proporcionando-se um processo de desenvolvimento aos indivíduos que diretamente utilizam
esses recursos, garantindo-lhes maiores expectativas e dignidade, provenientes de um modelo
de desenvolvimento, de fato, sustentável.
2 - Definição do problema
2.1- O Valor da Diversidade Biológica: Papel Imprescindível no Desenvolvimento SócioEconômico dos Estados
Inicialmente, faz-se indispensável a conceituação de “biodiversidade” (ou
“diversidade biológica) para que possamos ter uma compreensão global acerca da
problemática. De acordo com o artigo 2º da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB),
aquela é conceituada como sendo “a variabilidade entre os organismos vivos de todas as
origens, incluindo, inter alia, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas
aquáticos e os complexos ecológicos dos quais fazem parte; compreende a diversidade dentro
de cada espécie, entre as espécies e dos ecossistemas”3.
A diversidade biológica se caracteriza por ser uma das propriedades
fundamentais do nosso planeta, sendo, de fato, a grande responsável pelo equilíbrio e
estabilidade dos ecossistemas, possuindo, além de seu valor intrínseco, enorme potencial de
utilização econômica, já que dela a humanidade retira todo o seu alimento - sendo a fundação
de atividades florestais, agrícolas, pecuárias e pesqueiras - bem como diversos remédios e
produtos industrializados de seus recursos naturais.
Ressalte-se, igualmente, o seu valor turístico, que oferece enorme potencial de
benefícios econômicos por meio, v.g., do turismo ecológico (ou “eco-turismo”), bem como o
seu valor genético e científico, através das importantes reservas de material genético para o
desenvolvimento, por exemplo, de futuros medicamentos que poderiam alcançar a cura de
diversas doenças.
Devemos enfatizar, ainda, o seu valor social e educacional. Podemos
considerar, além disso, a biodiversidade como sendo a base para a importante indústria da
2
Mensagem disponível na íntegra no site: http://www.onuportugal.pt/sg20010522biologica.pdf.
A íntegra da Convenção sobre Diversidade Biológica pode ser encontrada
http://www.diramb.gov.pt/data/basedoc/TXT_LI_6171_1_0001.htm
3
em:
4
biotecnologia, desempenhando, portanto, um decisivo papel no que concerne ao
desenvolvimento social, tecnológico e econômico de nações que convivem com o difícil
paradoxo de serem ricas em recursos naturais e apresentarem padrões tão preocupantes de
miséria e subdesenvolvimento.
Reconhece-se, dessa forma, que a utilização dos recursos naturais provenientes
da biodiversidade, bem como a sua conservação, serão responsáveis por conciliar o
desenvolvimento social e econômico com a preservação ambiental, entregando às próximas
gerações um planeta repleto de possibilidades.
Calestous Juma, do Centro Africano de Estudos Tecnológicos, Quênia, certa
vez afirmara: “a biodiversidade é tão importante em nível nacional que os países em
desenvolvimento precisam formular políticas que reconheçam sua importância econômica.
(...) constitui-se também em um recurso renovável, se tratado como tal, e, portanto, mais
confiável do que o petróleo ou diamantes”4.
De fato, o potencial dos genes, espécies e ecossistemas é inestimável para a
humanidade. Nesse sentido, a sua conservação se faz necessária, mas a sua utilização
sustentável pode ser de grande valia em relação às comunidades locais e indígenas dos países
em desenvolvimento. Dessa forma, o fator conservacionista da diversidade biológica requer
uma alteração do enfoque meramente defensivo (preservação a todo custo da natureza, em
detrimento ao desenvolvimento) para um enfoque de menor passividade, objetivando-se a
satisfação da demanda humana por recursos da biodiversidade, e, ao mesmo tempo,
garantindo-se a sustentabilidade posterior da riqueza biótica do mundo.
2.2- Perda da Biodiversidade: Preocupante Conseqüência do Uso Insustentável de seus
Recursos
Podemos considerar que a perda da biodiversidade possui fatores que agem
direta ou indiretamente na natureza. Tais fatores correspondem: à destruição e fragmentação
do habitat; à invasão de espécies introduzidas; à superexploração dos recursos vivos; à
poluição; às mudanças climáticas globais; à agricultura; e, por fim, ao reflorestamento com
intuito industrial. Podemos citar, ainda, fatores como: a insustentável alta taxa do crescimento
demográfico e do consumo de recursos naturais; a existência de sistemas econômicos e
políticas que não atribuem o devido valor ao ambiente e seus componentes; a desigualdade na
distribuição de propriedade, na gestão e no fluxo de benefícios oriundos do uso e da
conservação da biodiversidade; e, por último, a existência de sistemas jurídicos e
institucionais que promovem a exploração insustentável dos recursos naturais5.
No que concerne à iminência na questão da conservação biótica, temos que ela
deve estar pautada em uma benéfica tríade: salvar a biodiversidade, estudá-la e usá-la de
modo sustentável e eqüitativo6. Salvar a diversidade biológica corresponde à concretização de
ações que objetivem a proteção de genes, espécies, habitats e ecossistemas. Estudar a
biodiversidade refere-se à documentação de sua composição, distribuição, estrutura e funções,
4
World Resources Institute (WRI), World Conservation Union (IUCN), e United Nations Environment
Programme (UNEP) 1992. A estratégia global da biodiversidade: diretrizes de ação para estudar, salvar e usar de
maneira sustentável e justa a riqueza biótica da Terra. Traduzido por P.P. Distéfano e M.D. Schlemm. Curitiba:
Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, 1992. p. 37.
5
Idem Ibidem. pp. 11-18.
6
Idem Ibidem, p. 19.
5
entendendo o seu papel e inter-relações, utilizando esses conhecimentos para respaldar o
desenvolvimento sustentável. Por fim, usá-la não corresponde necessariamente ao seu
consumo, significando o manejo prudente dos recursos biológicos, para que durem
indefinidamente, certificando-se acerca do fato de que a biodiversidade seja utilizada para
melhorar as condições humanas, promovendo-se o desenvolvimento, e sendo garantida a justa
distribuição desses recursos. Vejamos o quadro a seguir:
Quadro 01:
FATORES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE
A) Para desacelerar o ritmo de deterioração da biodiversidade é necessário compreender
melhor sua função nos ecossistemas e sua importância para a vida humana. Por outro lado,
para melhor compreender a biodiversidade, há que se manter amostras representativas e
viáveis de ecossistemas, espécies e populações.
B) Contar-se-á com melhores incentivos para desacelerar o ritmo de deterioração da
biodiversidade quando for aumentado seu valor imediato para a humanidade. Por outro lado,
os principais benefícios atuais e potencias que a biodiversidade pode oferecer à humanidade
não podem ser mantidos a menos que se conserve a base de recursos biológicos.
C) Para determinar usos sustentáveis da biodiversidade é necessária a aplicação do
conhecimento tradicional e moderno sobre a biodiversidade e os recursos biológicos. Por outro
lado, as necessidades dos usuários ajudam a estabelecer prioridades para a investigação da
biodiversidade.
FONTE: Adaptado da Obra "A Estratégia Global da Biodiversidade"- 1992
2.3- A Questão da Biodiversidade e a Redução da Pobreza: Desafio para o Novo Milênio
Um dos maiores expoentes da atualidade em assuntos como desenvolvimento e
pobreza, o indiano Amartya Sen7, Nobel de economia no ano de 1998, defende que a pobreza
deve ser encarada enquanto elemento de privação de capacidades básicas, ao invés de
meramente como baixo nível de renda, critério usual de sua identificação, considerando,
entretanto, que a falta de renda pode ser uma razão determinante da privação de capacidade de
um indivíduo, sendo uma forte predisposição para uma vida tomada pela miséria.
A problemática da inter-relação entre a pobreza e a preservação e uso
sustentável da diversidade biológica se caracteriza como sendo de difícil compreensão,
merecendo, portanto, total atenção da comunidade internacional, principalmente porque a
redução da pobreza é uma das metas dos conhecidos “Millennium Development Goals”-
7
SEN, Amartya Kumar. Desenvolvimento como liberdade. Tradução Laura Teixeira Motta; revisão técnica
Ricardo Doniselli Mendes. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. pp. 109-117.
6
MDGs8 (“Metas de Desenvolvimento do Milênio”), tendo sido estas últimas estabelecidas por
mais de 150 chefes de Estado e de governo na Cúpula do Milênio das Nações Unidas em
2000.
Podemos considerar que o sustento de milhões de pessoas, que vivem na linha
de pobreza, depende dos recursos naturais provenientes da biodiversidade. Todavia, a forma
insustentável como os recursos naturais, por vezes, são extraídos e consumidos, consubstancia
uma realidade que, infelizmente, pode muito mais atrapalhar do que melhorar a vida dessas
pessoas. A pobreza, portanto, caracterizar-se-ia como sendo um fator de ameaça à preservação
da biodiversidade, já que os indivíduos poderiam estar utilizando os recursos naturais de uma
forma não-sustentável.
Dessa maneira, um dos maiores questionamentos nos fóruns e encontros
globais acerca da biodiversidade e desenvolvimento sustentável é exatamente o de como
estariam interligadas as questões da conservação e utilização sustentável da biodiversidade e a
pobreza.
Izabella Koziell e Charles I. McNeill9 defendem que a diversidade biológica
contribui para a redução da pobreza em pelo menos cinco áreas chaves: 1) Segurança
alimentar, na medida em que fatores como a caça e a pesca podem ser alternativas às
comunidades necessitadas em tempos de escassez; 2) Melhorias na área da saúde, já que a
biodiversidade é uma fonte de inestimável valor de informações e componentes medicinais
naturais, que são de extrema valia a essas comunidades mais pobres; 3) Geração de renda,
tendo em vista que as pessoas pobres tendem a ser mais dependentes da utilização direta da
biodiversidade para o seu sustento, sendo as primeiras a sentirem a degradação ou perda
desses recursos; 4) Vulnerabilidade reduzida, já que as pessoas pobres são mais
freqüentemente expostas e menos preparadas para lidar com acontecimentos imprevisíveis,
como flutuações em relação ao acesso à comida e outros recursos, e a choques e riscos
ambientais; 5) Serviços de ecossistema, levando-se em consideração os serviços essenciais
que contribuem de várias formas às atividades produtivas de pessoas pobres rurais e urbanas.
Um claro exemplo de que a biodiversidade pode ser utilizada de forma
sustentável e, sobretudo, responsável, no que concerne ao desenvolvimento econômicos das
pessoas, é uma iniciativa chamada “AmazonLife” que gera opções de desenvolvimento
econômico sustentável para as populações tradicionais no Amazonas, opções estas que são
compatíveis com a cultura daquela comunidade e que protege a diversidade biológica de seus
territórios. Koziell e McNeill assim dispõem acerca dessa iniciativa amazônica que ostenta
um modelo sustentável de desenvolvimento:
“Através dessa iniciativa, comunidades indígenas locais e as famílias dos
seringueiros, na Amazônia brasileira, produzem lâminas de borracha vulcanizada,
através de um processo exclusivo, para serem empregadas como um substituto do
couro, sendo utilizadas em bolsas manufaturadas, mochilas, maletas, tênis, etc.
Nichos de mercado foram criados fora do Brasil e esses produtos possuem alta
demanda. Cada família envolvida no processo de coletar a borracha natural e fazer as
8
Maiores informações sobre as MDGs em: www.undp.org/mdg/
KOZIELL, Izabella e McNEILL, Charles I. Poverty Reduction through Conservation and Sustainable Use of
Biodiversity. Disponível em: <http://www.undp.org/equatorinitiative/docs/mdg_biodiversity.doc>. Tradução
livre do autor.
9
7
lâminas de tecido similar ao couro é parte de uma rede informal que se caracteriza por
ser responsável pela proteção de milhares de hectares na Amazônia”10.
Exemplos como esse nos deixam a certeza de que a utilização sustentável dos
recursos naturais pode ser aliada a um processo efetivo de defesa e proteção do meio
ambiente, proporcionando, ainda, benefícios econômicos para as comunidades indígenas e
locais necessitadas, ensejando o desenvolvimento econômico desses indivíduos sem,
necessariamente, agredir a sua cultura e o seu habitat.
Destarte, vale salientar que existem vários exemplos de iniciativas no âmbito
internacional que apóiam ações voltadas à promoção da conservação e uso sustentável da
biodiversidade contra a miséria. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD), por exemplo, possui um projeto denominado “Equator Initiative”, que tem como
objetivo a redução da pobreza através da conservação e da utilização sustentável da
biodiversidade nos países do cinturão equatorial, através do fomento, apoio e fortalecimento
de parcerias comunitárias11.
3 - Histórico do Problema
Podemos considerar que a discussão acerca da preservação e utilização
sustentável dos recursos naturais renováveis, dentre eles a biodiversidade, não é um processo
recente; intensificou-se, principalmente, nas duas últimas décadas, sobretudo graças aos
importantes esforços da Organização das Nações Unidas em relação ao debate sobre a
conciliação do desenvolvimento econômico e o meio ambiente. Esses verdadeiros marcos
serão expostos de forma detalhada posteriormente, no tópico “Ações Prévias da ONU”.
De fato, a origem da utilização insustentável do meio ambiente não se
caracteriza como sendo nada recente, estando relacionada ao longínquo século XVIII, tempo
em que foi deflagrado um dos mais marcantes acontecimentos da humanidade: a Revolução
Industrial.
Os processos de degradação ambiental e consumo dos recursos naturais, àquela
época, ocorreram de forma intensa e devastadora. A problemática ambiental fora agravada,
tendo sido tal agravamento acarretado tanto pela industrialização descontrolada, quanto pelo
crescimento desenfreado da aglomeração urbana, fato resultante do intenso êxodo rural,
surgido graças ao padrão de desenvolvimento que surgia à época.
O meio ambiente, nesse diapasão, caracterizava-se apenas como um mero
provedor de benefícios às pessoas, que não possuíam qualquer preocupação em relação à
utilização insustentável dos recursos naturais, maravilhadas que estavam com aquele
surpreendente mundo novo de grandes possibilidades tecnológicas.
Vale salientar que a esmagadora maioria daquelas indústrias estava muito
ocupada com a acumulação de capital e geração de lucro para se preocupar com a preservação
do meio ambiente. Os Estados, nesse contexto, não desempenhavam um procedimento de
desenvolvimento econômico sustentável, inexistindo qualquer consciência em relação ao
10
Idem Ibidem. Tradução livre do autor.
Para saber mais sobre a ação desenvolvida pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, visite:
http://www.undp.org/equatorinitiative/
11
8
malefício de determinados atos para as gerações futuras, deixando para estas um legado de
problemas ambientais muito preocupante.
Infelizmente, o processo de conscientização ambiental foi consubstanciado
tardiamente, em meados do século XX, na fase do pós-guerra, exatamente devido a
acontecimentos bastante reprováveis, como o advento dos ataques nucleares e de
determinadas catástrofes ambientais, como a poluição eventual de oceanos por
derramamentos de óleo, dentre outros desastres que afetaram decisivamente o meio ambiente.
Após Hiroshima, a humanidade foi capaz de perceber o alarmante potencial de destruição e
degradação ambiental que imperara àquele período.
O autor Renato Santos de Souza12 divide o processo conscientização em
relação à questão ambiental em quatro fases essenciais: 1) a fase seminal, em que se realçava
a conservação dos recursos e a natureza existencial e estética ambiental; 2) a fase de
massificação, onde a degradação ambiental passa a ser percebida como um elemento de
comprometimento do bem-estar dos indivíduos; 3) a fase da globalização I, em que a
problemática ambiental é vista como limite ao crescimento; e, por fim, 4) a fase da
globalização II, em que o problema ambiental é percebido enquanto risco à humanidade.
Discorreremos sobre cada fase a seguir.
3.1- A Fase Seminal: Período de descompromisso em relação à preservação ambiental
Na fase seminal, que vai até aproximadamente a metade do século XX, de
acordo com o autor, diversas idéias acerca da interação homem-natureza surgem no âmbito
internacional, sem se dispor, entretanto, de um ambiente social e econômico estruturado para
a plena discussão sobre elas.
De fato, à época, a problemática da conservação ambiental e utilização
sustentável de seus recursos não se caracterizava como uma preocupação generalizada, sendo
pensada apenas por políticos e alguns intelectuais.
A maioria das pessoas ostentava apenas uma preocupação “estética e
existencial” em relação ao meio ambiente, com apenas alguma ênfase em relação à
conservação dos recursos, ora por razões utilitaristas, ora por razões meramente éticas e
morais.
Assim, a maioria da população estava mais preocupada em desfrutar das
promessas de consumo que a sociedade “fordista” proporcionava, não existindo ainda a direta
vinculação entre a degradação ambiental, a saúde humana e o bem-estar social.
Dessa forma, considera-se que, nessa fase, os problemas ambientais não
possuíam qualquer grau de prioridade na percepção da grande maioria dos indivíduos,
cientistas e governos.
12
SOUZA, Renato Santos de. Entendendo a questão ambiental: temas de economia, política e gestão do meio
ambiente. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000. pp. 51-69.
9
3.2- Fase de Massificação: Percepção acerca dos danos ambientais em relação ao bem-estar
dos indivíduos
Em um segundo momento, na fase de massificação, de meados do século XX
até os anos 70, tem-se que fatores como a concentração industrial, a urbanização, o
crescimento econômico e populacional, bem como o aumento no consumo e renda das
pessoas, foram responsáveis por fazer com que os problemas ambientais relacionados às ações
produtivas, como as indústrias, fizessem-se sentir generalizadamente sobre o bem-estar dos
indivíduos.
Os avanços na ciência, e o aumento do tempo em relação ao lazer na vida das
pessoas, ensejaram um processo de melhor conhecimento em relação aos problemas
ambientais. Estes deixam de ter caráter meramente existencial ou estético para serem
percebidos como fatores que afetam diretamente o bem-estar das pessoas e da saúde humana
como um todo.
Esse período é marcante em relação ao entendimento da inter-relação entre o
desenvolvimento e o meio ambiente, emergindo, a partir daí, o problema ambiental como um
elemento de restrição ao crescimento econômico e de possível insustentabilidade do modelo
vigente de desenvolvimento em relação ao meio ambiente.
Podemos citar como sendo um importante marco desse período, exatamente no
ano de 1962, a publicação da obra “Silent Spring” (Primavera Silenciosa), de Rachel Carson,
que, posteriormente, tivera a sua adaptação para o cinema. O livro em questão se transformou
prontamente em um clássico da contestação ambiental à época, graças ao fato de ter
desvendado e exposto os malefícios em relação às aplicações de agrotóxicos, desenfreadas até
então.
Dessa maneira, surgiram articulações em todo os Estados Unidos da América,
tendo sido responsável por desencadear várias discussões em diversas áreas da sociedade.
Houve um engajamento maciço nas instituições acadêmicas, além da presença de
mobilizações entre naturalistas, bem como a concretização de manifestações na seara do
jornalismo, e, até mesmo, no meio político.
3.3- Fase de Globalização I - Preservação ambiental x Crescimento econômico
Já a fase de globalização I, que vai do início da década de 70 até a década de
80, é marcada por eventos significantes, que simbolizam o pontapé inicial em relação a uma
construção global de uma percepção hegemônica e oficial acerca da natureza dos problemas
de conservação e utilização sustentável dos recursos naturais, começando-se a construção do
ideal de que o tratamento da problemática ambiental deve ser parte integrante do
planejamento do próprio desenvolvimento econômico.
A idéia que imperara à época foi a de que a economia não poderia continuar a
crescer desenfreadamente, sob risco de um colapso ambiental global. Dessa forma,
preservação ambiental e crescimento econômico eram vistos como antagônicos. Os
organismos internacionais da Organização das Nações Unidas tiveram um papel decisivo
nessa fase, como ficará claro no tópico referente às ações passadas da ONU.
10
Nessa época, consagraram-se os trabalhos do conhecido “Clube de Roma”, um
órgão privado, sem fins lucrativos, fundado por iniciativa de Alberto Pecei.
Com financiamento através de iniciativas privadas, a entidade em questão foi
capaz de estabelecer um grupo de estudos interdisciplinar (profissionais de vários países), que
possuía como escopo precípuo, entre outras atividades, avaliar as limitações que o meio
ambiente infligia ao crescimento econômico.
Debatia-se, à época, acerca dos processos consumistas, do crescimento da
população global e suas implicações em relação aos recursos naturais. Um dos mais
importantes trabalhos do clube, denominado “A Humanidade na Encruzilhada”, de acordo
com Renato S. de Souza,
“(...) ressalta que é inútil dentro do nacionalismo tentar resolver os problemas globais,
e que é preciso um marco internacional de cooperação, é necessário o
desenvolvimento de uma consciência mundial e uma nova ética baseada na harmonia
e não na conquista, em que seja motivo de orgulho conservar e poupar, e não gastar e
desperdiçar.13”
3.4- A Fase da Globalização II - A reconciliação entre o desenvolvimento e a preservação do
meio ambiente
Por fim, a fase da globalização II, de acordo com o autor supramencionado,
inicia-se no final da década de 70, início da década de 80, havendo um processo de
reconciliação entre desenvolvimento e preservação ambiental e utilização sustentável dos
recursos naturais, conceitos antagônicos até então, desenvolvendo-se uma concepção mais
elaborada de desenvolvimento, o chamado “desenvolvimento sustentável”, oriundo da
“Comissão Brundtland”, que será detalhadamente estudada no tópico “Ações Prévias da
ONU”. Nessa época, a ênfase à importância da preservação e uso sustentável da
biodiversidade se faz presente, sendo aquela não mais vista apenas como uma reserva de
espécies diversas, mas como um fator de equilíbrio dos ecossistemas, pressuposto básico para
a sustentabilidade da humanidade e do planeta, buscando-se alternativas de conciliação entre
o desenvolvimento e a preservação ambiental. Nesse período, há o surgimento de diversas
iniciativas internacionais concernentes ao estabelecimento de tratados e convenções, visandose erigir as bases para implementação dos princípios do efetivo “desenvolvimento
sustentável”.
Destarte, caracteriza-se como sendo consolidado, na fase em epígrafe, um
processo de estabelecimento das primeiras diretrizes em relação à problemática da
conservação e utilização sustentável da diversidade biológica, propriamente dita, no âmbito
internacional.
Em 1980, duas entidades internacionais voltadas à proteção ambiental, a World
Conservation Union (IUCN)14- União Mundial para a Natureza - uma entidade que reúne
Estados, organismos públicos e um grande leque de organizações não governamentais, que
possui como objetivo encorajar e ajudar a comunidade internacional em relação à conservação
e à diversidade da natureza, avaliando atentamente o uso justo e ecologicamente sustentável
dos recursos naturais; além do World Wildlife Fund (WWF)- Fundo Mundial para a Natureza13
14
Idem Ibidem.
Outras informações disponíveis no site: http://www.iucn.org/
11
foram responsáveis pela elaboração de uma “Estratégia Mundial para a Conservação”,
ressaltando que a existência da humanidade possuía como pressuposto a plena conservação do
meio ambiente, já que aquela não é capaz de subsistir sem este último, sendo elementos
intrínsecos, verdadeiramente indissociáveis. O projeto em questão enfatizara que, caso não
houvesse a conservação e uso sustentável dos elementos da natureza, a humanidade poderia
certamente passar por um processo de extinção.
A partir de meados da década de 80 em diante, o papel de organismos
internacionais, entidades não governamentais e ecologistas engajados, foi cada vez mais
determinante, sendo espalhada mundialmente uma maior conscientização acerca da
preservação e utilização sustentável dos recursos naturais, principalmente nos países
desenvolvidos. ONGs como o Greenpeace e figuras importantes como Jacques Cousteau se
faziam presentes constantemente nesse processo de conscientização, adquirindo o respeito e o
apoio de muitos em relação à questão ambiental.
3.5- A Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB
Nesse diapasão, apenas no ano de 1992 temos o advento de um verdadeiro
marco histórico em relação à problemática do uso sustentável e preservação da
biodiversidade: a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), que foi assinada por mais
de 155 países durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento Humano – CNUMAD, igualmente conhecida como Eco 92 ou Rio 92,
sendo responsável por consubstanciar a idéia de utilização sustentável dos componentes da
biodiversidade, objetivando-se o alcance do desenvolvimento social, tecnológico e econômico
dos países em desenvolvimento. Dessa forma, a CDB ostentou três objetivos distintos: 1) a
conservação da biodiversidade; 2) o uso sustentável de seus componentes; 3) a justa e
eqüitativa distribuição dos benefícios resultantes da utilização dos recursos genéticos,
adotando, ainda, um princípio de grande relevância: a soberania dos Estados na exploração de
seus próprios recursos naturais de acordo com suas políticas ambientais.
A Convenção em epígrafe foi responsável por estabelecer objetivos, sendo o
modo de sua implementação de inteira responsabilidade das Partes (países que ratificaram a
Convenção), que, de acordo com o art. 6º da CDB, devem desenvolver estratégias, planos e
programas nacionais para a conservação e a utilização sustentável da biodiversidade. O art. 10
da CDB dispõe especificamente acerca da utilização sustentável dos componentes da
diversidade biológica, incentivando as partes a proteger e encorajar o uso habitual da
biodiversidade, em consonância com as práticas culturais tradicionais que sejam compatíveis
com as exigências da conservação e da utilização sustentável.
As deliberações acerca da Convenção sobre Diversidade Biológica se
caracterizam por seguir um rito pré-determinado, havendo alguns órgãos e mecanismos de
suporte à implementação da CDB. São eles:
a) A Conferência das Partes (COP), tendo sido instituída pelo art. 23 da
Convenção, sendo o órgão supremo da CDB. Durante a COP se concretizam deliberações que
especificam ainda mais a própria Convenção. Tais decisões possuem o condão de estabelecer
programas de trabalho ou, ainda, metas específicas. Delegações de todas as Partes da CDB
participam dessas conferências, podendo, ainda, Estados que não sejam Parte ou qualquer
outro órgão ou organismo, governamental ou não-governamental, ligado à conservação e
utilização sustentável da diversidade biológica, estarem presentes como observadores no
12
evento. Desde o ano de 1994, já foram realizadas seis conferências, tendo a última delas,
realizada em Haia em 2002, discutido acerca de fatores como a distribuição dos benefícios
provenientes da utilização sustentável da biodiversidade e a implementação de planos de ação.
b) O Secretariado, tendo sido sua criação efetuada para executar as atividades
estabelecidas no art. 24 da CDB, como a organização e apoio das Conferências das Partes
(COP), além da preparação de relatórios, e coordenação de outros órgãos internacionais
referentes à CDB;
c) O Órgão Subsidiário de Assessoramento Científico, Técnico e Tecnológico
(SBSTTA), que fora criado com o intuito de realizar os objetivos dispostos no art. 25 da
CDB, sendo esse órgão multidisciplinar, não se caracterizando por ser uma entidade restrita,
sendo acessível a todas as Partes. Sua formação se dá através da presença de representantes
governamentais, que devem entregar relatórios constantemente à Conferência das Partes
(COP) acerca de suas atividades.
Ainda no ano de 1992, através da iniciativa do Instituto de Recursos Mundiais
- WRI, bem como da União Mundial para a Natureza - IUCN e do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), com a consultoria da Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO e da Organização das Nações
Unidas para a Agricultura e a Alimentação - FAO, foi desenvolvido o Relatório “A estratégia
global da biodiversidade: diretrizes de ação para estudar, salvar e usar de maneira sustentável
e justa a riqueza biótica da Terra15”. Tal relatório adveio de um árduo processo de pesquisa e
consulta iniciado no ano de 1989, envolvendo seis consultas, seis seminários e mais de 500
pessoas, e foi decisivo na discussão da natureza e valor da biodiversidade, da perda desta
última e respectivas implicações, abordando os principais mecanismos de deterioração da
diversidade biológica, além de estratégias de conservação e utilização sustentável dos
recursos naturais, traçando diversas metas e planos de ação em relação à questão em pauta.
Como pôde ser observado, a problemática da biodiversidade é bastante rica na
cronologia da humanidade, com precedentes históricos bastante relevantes em relação à
utilização e conservação dos recursos naturais. A Organização das Nações Unidas, nesse
contexto, exerceu um papel de suma importância, como veremos a seguir.
4 - Ações Prévias da ONU
A problemática do meio ambiente e desenvolvimento tem sido amplamente
abordada pela Organização das Nações Unidas há mais de três décadas. A temática está
presente em diversos programas de desenvolvimento e em órgãos com mandatos específicos
em relação ao meio ambiente e desenvolvimento social e econômico.
A UNESCO, em 1971, estabeleceu o programa “O Homem e a Biosfera”16,
conhecido pela sigla em inglês “MAB”, tratando-se de um programa de conservação e manejo
do patrimônio natural, mediante o estudo e aquisição de dados sobre reservas da biosfera,
15
World Resources Institute (WRI), World Conservation Union (IUCN), e United Nations Environment
Programme (UNEP) 1992. A estratégia global da biodiversidade: diretrizes de ação para estudar, salvar e usar de
maneira sustentável e justa a riqueza biótica da Terra. Traduzido por P.P. Distéfano e M.D. Schlemm. Curitiba:
Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, 1992.
16
Para
maiores
detalhes
acerca
do
programa
“O
Homem
e
a
Biosfera”,
http://www.unesco.org.br/programas/meioamb/ma_homem.asp
13
consolidando-se ações efetivas para a conciliação entre desenvolvimento e conservação da
biodiversidade, promovendo-se o desenvolvimento sustentável, bem como a manutenção de
valores culturais associados ao uso de recursos biológicos. As Reservas se caracterizam por
ser zonas delimitadas no interior dos países, sendo internacionalmente reconhecidas pelo
programa MAB. Possuem como objetivos a conservação dos recursos genéticos, espécies,
ecossistemas e paisagens, fomentando o desenvolvimento sustentável, social e econômico,
bem como projetos de pesquisa e educação ambiental e centros de informação e
desenvolvimento profissional dos técnicos em seu manejo. O gerenciamento das reservas é
uma iniciativa conjunta de instituições governamentais, não governamentais e centros de
pesquisa, almejando-se a satisfação dos anseios das comunidades locais e a interação dessas
últimas com a natureza e seus componentes.
Em 1972 ocorreu a primeira Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento e Meio Ambiente, realizada na Suécia, em Estocolmo, igualmente
conhecida como “Conferência de Estocolmo”. O evento em tela representou o primeiro
esforço internacional no que diz respeito à conexão entre a problemática do desenvolvimento
econômico e social e a proteção ambiental.
Dentre os princípios acordados em Estocolmo podemos citar o da “preservação
do meio ambiente para as gerações presentes e futuras”, sendo a primeira oportunidade em
que se abordou uma concepção de desenvolvimento sustentável (ainda que embrionária), bem
como o da importância da conservação da natureza ao se planejar o desenvolvimento
econômico. O autor Renato S. de Souza ensina que, na conferência em epígrafe, “a pressão
dos países subdesenvolvidos permitiu que se incluísse dentro do conceito de meio ambiente,
junto com questões ecológicas, também problemas como a fome, enfermidades e o conjunto
de temas vinculados ao subdesenvolvimento”.17
Podemos considerar que o primeiro grande esforço, após Estocolmo, para
continuar com as discussões acerca da temática do desenvolvimento econômico em relação ao
meio ambiente foi o “Simpósio sobre Padrões de Utilização de Recursos, Meio Ambiente e
Estratégias de Desenvolvimento”, realizado em outubro de 1974 no México, em Cocoyoc. Tal
evento contribuiu decisivamente em relação aos relevos conferidos ao binômio meio ambiente
e desenvolvimento. O simpósio em Cocoyoc foi uma realização conjunta da Conferência das
Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (CNUCD) e do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Discussões acerca da degradação ambiental e
pobreza se fizeram presentes, figurando os países em desenvolvimento como
responsabilizadores dos países desenvolvidos, argumentando que estes últimos se
caracterizam como sendo os que mais contribuem para o agravamento dessas questões, com
os seus níveis elevados de consumo e altas taxas de poluição ambiental. Vale salientar que a
idéia de desenvolvimento sustentável figurou no texto da Declaração de Cocoyoc de uma
forma mais bem elaborada do que na Declaração de Estocolmo, sendo consubstanciada a
concepção de “desenvolvimento sem destruição” que serviu de base para a evolução do
conceito efetivo de desenvolvimento sustentável que apareceria anos mais tarde.
A Assembléia Geral da ONU, tentando se dedicar a possíveis falhas em relação
às temáticas do desenvolvimento e do meio ambiente, estabeleceu uma comissão especial para
estabelecer uma agenda para ação a longo-prazo. Tal iniciativa resultou na “World
Commission on Environment and Development” (Comissão Mundial Sobre Meio Ambiente e
17
SOUZA, Renato Santos de. Entendendo a questão ambiental: temas de economia, política e gestão do meio
ambiente. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000. p. 60.
14
Desenvolvimento- CMMAD), conhecida como Comissão Brundtland, atuante de 1983 a
1986, tendo esse nome em função do nome da presidente da comissão (Gro Harlem
Brundtland). Essa entidade foi responsável pela elaboração do relatório “Nosso Futuro
Comum”, ou mais conhecido como “Relatório Brundtland”, publicado em 1987. A expressão
“desenvolvimento sustentável”, utilizada no âmbito internacional a partir do simpósio
realizado em Cocoyoc para denominar a conciliação entre o desenvolvimento econômico e a
preservação do meio ambiente, converte-se em conceito-chave do Relatório Brundtland,
consagrando-se definitivamente o desenvolvimento sustentável como sendo aquele que
“atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras de
atenderem às suas próprias necessidades”.18
Em 1991, o “Global Environment Facility” (GEF) foi instituído, objetivando
ajudar no financiamento de projetos e programas nos países em desenvolvimento que
protejam o meio ambiente. O GEF se caracteriza como sendo administrado por organismos
internacionais, como o PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente),
PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e pelo Banco Mundial, cofinanciando e apoiando mais de mil projetos em 140 nações em desenvolvimento19.
No que concerne à problemática da Biodiversidade, o GEF financia um
programa implementado pelo PNUD e PNUMA denominado “Biodiversity Planning Support
Programme”, co-financiado, ainda, pelos Governos da Noruega e da Suíça. O programa em
tela foi estabelecido para responder às necessidades reconhecidas pelas partes da Convenção
sobre Diversidade Biológica das Nações Unidas, para o fortalecimento das capacidades
nacionais em preparar e implementar as estratégias nacionais referentes à biodiversidade e
planos de ação, em consonância com o artigo 6º da CDB20. O programa possui três
componentes a serem implementados nos âmbitos global e regional, como a coleta e
disseminação de informação em relação à biodiversidade e assuntos relacionados à CDB,
além do estabelecimento de diretrizes e compartilhamento de experiências em relação à
questão da diversidade biológica, bem como a realização de workshops acerca da matéria.
Podemos considerar a Resolução 44/22821, da Assembléia Geral da ONU, de
22 de dezembro de 1989, responsável por convocar a conferência posteriormente denominada
“Cúpula da Terra” (Earth Summit) - mais conhecida como RIO 92 - reconhecendo
solenemente o relatório da Comissão Brundtland, referindo-se à relação entre pobreza e
degradação do meio ambiente e busca por novos padrões de consumo e produção.
No ano de 1992, duas décadas após Estocolmo, realizou-se na cidade do Rio
de Janeiro a Conferência das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Eco
92 (também denominada Rio 92, ou Cúpula da Terra), que já era prevista na resolução citada
anteriormente. Nessa conferência, foram aprovados cinco documentos (dentre eles a
Convenção sobre Diversidade Biológica- CDB, a qual nos referimos anteriormente) mais a
Agenda 21, um abrangente programa global com metas estabelecidas em relação a algumas
das principais problemáticas ambientais do mundo, propondo-se a ser um guia para os
governos e sociedades na implementação de um modelo de desenvolvimento sustentável.
18
BARBIERI, José Carlos. Desenvolvimento e Meio Ambiente: As Estratégias de Mudanças da Agenda 21. 3ª
ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 23.
19
Maiores informações disponíveis em: http://gefweb.org/What_is_the_GEF/what_is_the_gef.html
20
http://www.undp.org/bpsp/about/desc.htm
21
(A/RES/44/228) disponível em: http://www.un.org/documents/ga/res/44/ares44-228.htm
15
Após a Eco 92, diversos países implementaram agendas 21 nacionais, buscando-se alcançar
internamente um novo modelo de desenvolvimento.
Em junho de 1997, o Secretário Geral da Conferência das Nações Unidas para
o Comércio e Desenvolvimento, o brasileiro Rubens Ricúpero, proferiu declaração acerca do
desenvolvimento sustentável e utilização dos recursos naturais, que assim dispunha:
“(...) Temos também desenvolvido idéias práticas para ajudar a fazer com que as
convenções de mudança climática e da biodiversidade [CDB] sejam operacionais em
termos econômicos. No primeiro caso, através da criação de mecanismos de mercado
para reduzir os níveis de dióxido de carbono e gerar novos recursos financeiros para
os países em desenvolvimento. No segundo caso, trabalhando com governos,
iniciativa privada e comunidades locais e indígenas para ajudar a criar um mercado
viável através do qual os países em desenvolvimento serão capazes de angariar
rendimentos justos dos seus recursos genéticos”22.
No período de 3 a 5 de novembro de 1997, a “Trade and Development Board
Comission on Trade in goods and Services and Commodities” (Comissão do Comércio de
Bens e Serviços e dos Produtos Básicos) - sendo esta parte da Conferência das Nações Unidas
para o Comércio e Desenvolvimento - realizara a “Reunião de Especialistas em Medidas
Positivas para Promover o Desenvolvimento Sustentável e, em especial, para alcançar os
objetivos dos acordos multilaterais sobre o meio ambiente”. O Secretariado do CNUCD foi
responsável pela elaboração de um relatório que, entre outros temas, tratou do
estabelecimento de incentivos para a conservação da biodiversidade como uma ferramenta
para a promoção do desenvolvimento sustentável. De fato, o relatório em questão declarou
que o alcance do desenvolvimento sustentável envolve necessariamente o reconhecimento
cada vez maior do valor do meio ambiente, tanto no âmbito mundial quanto nacional ou local,
dispondo, ainda, que as medidas positivas incorporadas à Convenção sobre Diversidade
Biológica quanto ao acesso à tecnologia e sua transferência, aos incentivos e ao financiamento
são provavelmente mais eficazes se forem levadas em conta as forças de mercado, além de
reconhecer que, em outros fóruns internacionais, como PNUMA e OCDE, também está sendo
desenvolvido um trabalho nesse sentido.
Outrossim, o relatório aborda também ações concernentes ao setor privado
como, v.g, em relação ao acesso à tecnologia por parte dos países em desenvolvimento,
havendo transferência de know-how, concessão de equipamentos e licenciamento de
tecnologias. Além disso, cita outras medidas importantes, como a disponibilização de
informações, metodologias, apoio científico e logístico, treinamento financeiro para
estudantes e instrutores, bem como a promoção de workshops. As indústrias poderiam
contribuir, ainda, financeiramente, patrocinando os cientistas e pesquisadores locais, além de
fornecer apoio financeiro aos laboratórios e hospitais locais, incentivando a manutenção de
centros de pesquisa e promovendo fundos de pesquisa e conservação da biodiversidade. Em
seguida, transcreveremos exertos do referido relatório que consideramos ser imprescindíveis
para a discussão da problemática em nosso comitê:
“58. Esforços internacionais poderiam ser empreendidos para examinar a série de
medidas integradas para facilitar a implementação dos objetivos da CDB, em
22
(TAD/INF/PR/9709), disponível na íntegra em:
http://www.unctad.org/Templates/Webflyer.asp?docID=3310&intItemID=2068&lang=1
autor.
Tradução
livre
do
16
particular através da utilização das oportunidades de mercado e desenvolvendo
vínculos entre as economias da diversidade biológica e o desenvolvimento
sustentável. Nesse contexto, podem ser examinadas as seguintes questões: a) as
possibilidades para os países em desenvolvimento de aproveitar o valor econômico da
diversidade biológica; b) a função do setor privado; e c) os meios de se alcançar um
enfoque de participação, em que colaborem os principais interessados.
59. (...) Com o tempo, os países em desenvolvimento que utilizam recursos biológicos
como base para o desenvolvimento necessitarão promover o desenvolvimento de uma
indústria de recursos biológicos, estabelecendo uma grande quantidade de
conhecimentos técnicos e empresariais sobre investigação, desenvolvimento e
comercialização na esfera bioquímica. Isto poderia aumentar o potencial da
bioexploração como incentivo da conservação e do desenvolvimento sustentável.
60. (...) A promoção de iniciativas de cooperação entre países em desenvolvimento e
países desenvolvidos, em particular no que diz respeito ao acesso à tecnologia e sua
distribuição, assim como a criação de capacitação, pode ajudar a quem atua nos
setores privado e público, bem como às comunidades indígenas e locais, a encontrar
um consenso em relação à obtenção de benefícios da diversidade biológica.
61. (...) O desenvolvimento sustentável dos recursos biológicos pode apenas ser
alcançado quando as comunidades locais tiverem um interesse econômico em proteger
a diversidade biológica. Por motivos de igualdade, é fundamental que a informação
proporcionada [por aquelas comunidades] (...) seja obtida através de um
consentimento informado e com a devida compensação [monetária].
62. Um exemplo dos esforços para individualizar uma série de medidas em que se
intenta utilizar a conservação como meio de valorar os recursos biológicos e
contribuir com o desenvolvimento sustentável é a iniciativa BIOTRADE da
Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (CNUCD)
(...).”23
O programa denominado BIOTRADE, ao qual se refere o art. 62
retromencionado, caracteriza-se por ter sido criado em 1996, pelo CNUCD, na terceira
reunião da Conferência das Partes (COP). Esta iniciativa é um esforço conjunto do
secretariado da CDB, além dos governos, das organizações intergovernamentais e nãogovernamentais, da comunidade acadêmica, do setor privado e das comunidades locais.
Existem programas desenvolvidos pelo BIOTRADE em diversos locais como Brasil,
Colômbia, Equador, Venezuela e Peru, países considerados "megadiversos", sendo
responsáveis pelo aumento da capacidade desses países em gerar produtos e serviços valiosos,
derivados da biodiversidade, tanto para o mercado local quanto para o nacional e
internacional, promovendo-se o desenvolvimento econômico sustentável dessas nações. São
providos, destarte, fatores como o treinamento e programas de pesquisa para o uso sustentável
dos recursos da diversidade biológica, além de informação sobre os mercados e outros
serviços relacionados à melhoria do comércio, bem como o desenvolvimento dos negócios e
assistência técnica nos processos de tomada de decisão e desenvolvimento da comunidade.
Dessa forma, fica claro que o objetivo precípuo do programa em questão é
estimular o investimento e o comércio dos recursos biológicos (componentes da
biodiversidade) como meio de promover os três objetivos da CDB (conservação e uso
sustentável da biodiversidade, além da justa distribuição dos benefícios oriundos da utilização
dos recursos genéticos), concretizando-se um patamar de desenvolvimento econômico aliado
à conservação e utilização sustentável dos recursos naturais, garantindo-se as possibilidades
das gerações futuras. Esses objetivos seriam alcançados através do fomento aos países em
23
(TD/B/COM.1/EM.3/2) Disponível em: http://www.unctad.org/en/docs//c1em3d2.en.pdf. Tradução livre do
autor.
17
desenvolvimento com recursos biológicos abundantes para competir mais eficazmente nos
mercados emergentes de produtos da biodiversidade. Fatores fundamentais a esse respeito
são: a difusão da informação, a capacitação e transferência de tecnologia, além do fomento da
capacidade e a promoção de uma divisão equânime dos benefícios. Assim dispõem os arts. 63
e 64 do relatório da Comissão do Comércio de Bens e Serviços e dos Produtos Básicos do
CNUCD:
“63. Uma das questões fundamentais que o BIOTRADE enfrenta é de como traduzir
os benefícios futuros incertos da conservação da diversidade biológica em alianças
com o setor privado para a realização de iniciativas comerciais na esfera biológica e
para o alcance do desenvolvimento. A iniciativa terá êxito se puder gerar benefícios
para os países em desenvolvimento, inclusive suas comunidades locais e indígenas,
em particular as que possuem recursos biológicos e conhecimentos deles derivado,
assim como o setor privado dos países em desenvolvimento.
64. O BIOTRADE foi concebido como um programa integrado que tem três
componentes: a) investigação de mercado e análise de políticas; b) comunicações e
serviços através da Internet; e c) programas para países. Os primeiros 2 componentes
são designados para sistematicamente compilar e analisar informações de mercado e
questões de política. A informação reunida a esse respeito se difundirá através da
Internet, publicações e conferências. Isso deveria contribuir a um maior entendimento
das dinâmicas e das tendências de mercado, os obstáculos de acesso, as correntes
comerciais e de investimento e as opções e incentivos em relação ao desenvolvimento
do comércio biológico.”.24
Além dessas medidas, em 18 de fevereiro de 2000, o CNUCD implementou
um Plano de Ação25, acordado na décima sessão do mesmo (“UNCTAD X”). No art. 147 do
Plano em tela foram examinadas diversas questões referentes à temática da biodiversidade,
bem como acerca da Convenção sobre Diversidade Biológica, dentre elas a promoção do
desenvolvimento indígena e a transferência de tecnologia para os países em desenvolvimento,
bem como a proteção do conhecimento tradicional das comunidades indígenas, estimulandose a cooperação em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias associadas ao uso dos recursos
biológicos, além de formas para a promoção e apoio ao investimento e comércio, contribuindo
para o crescimento econômico e desenvolvimento sustentável, inclusive em relação aos
recursos biológicos, como na iniciativa do BIOTRADE. Verificou-se, além disso, a
imprescindibilidade em relação ao fortalecimento da importância em se valorar
economicamente os recursos naturais, de forma adequada e justa, visando-se ao aumento na
competitividade de mercadorias e serviços gerados pelos recursos oriundos da biodiversidade,
além da ajuda aos países em desenvolvimento em aumentar o conhecimento em relação ao
comércio desses recursos, bem como as implicações relativas ao desenvolvimento da
biotecnologia.
Finalmente, em 2002, foi realizada a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento
Sustentável (Rio+10), em Joanesburgo, na África do Sul. A Rio +10 se caracterizou como
sendo um esforço das Nações Unidas em relação à reavaliação e implementação das
conclusões e rumos oriundos da Rio 92, objetivando-se o avanço nas discussões de diversos
problemas globais do meio ambiente, dentre os quais destacamos a conservação da
biodiversidade e o uso racional e sustentável dos recursos naturais. Objetivou-se, em suma, a
colocação em prática do conceito de “desenvolvimento sustentável”, conhecido desde a
década de 80, graças ao relatório da Comissão Brundtland.
24
25
Idem Ibidem.
(TD/386) Plano de Ação, disponível em: http://www.unctad.org/en/docs/ux_td386.en.pdf
18
Nem todas as problemáticas postas em discussão na Rio+10 foram bem
sucedidas, tendo sido a biodiversidade, entretanto, um dos temas que mais obtiveram êxito,
como a aprovação, no âmbito da diversidade biológica, da implementação de um sistema para
divisão dos lucros angariados pelas nações mais ricas com o uso dos recursos naturais com os
países detentores da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais.
O art. 42 do Plano de Implementação26 da Rio+10 reconheceu que a
biodiversidade possui um papel imprescindível no que concerne ao desenvolvimento
sustentável e erradicação da pobreza, sendo essencial ao nosso planeta. Reconheceu, ainda,
que está ocorrendo um perigoso processo de devastação da biodiversidade, podendo ser
apenas revertido se as populações locais se beneficiarem da conservação e uso sustentável da
diversidade biológica, em particular as nações que abrigam tais recursos naturais, estando tal
orientação em total consonância com o art. 15 da Convenção da Diversidade Biológica. Por
fim, defende que a CDB é o instrumento-chave para a conservação e uso sustentável da
diversidade biológica e para a justa e eqüitativa distribuição dos benefícios oriundos dos
recursos energéticos. Foi estabelecido, ainda, que uma implementação mais eficiente e
coerente dos três objetivos da CDB, bem como o alcance, por volta de 2010, de uma redução
significativa das taxas de perda de diversidade biológica, serão processos que demandarão
apoio financeiro efetivo por parte dos países desenvolvidos, bem como recursos tecnológicos
aos países em desenvolvimento.
5 - Posições dos Blocos
A problemática da conservação e uso sustentável da diversidade biológica se
caracteriza como sendo uma preocupação comum da comunidade internacional. É fato,
entretanto, que, hodiernamente, a biodiversidade se encontra distribuída de forma desigual no
nosso mundo. Dentre os 200 países formadores da comunidade internacional, apenas 17
possuem, em seus territórios, aproximadamente 70% de toda a biodiversidade global.
Dessa maneira, ao longo dos anos, os países do Norte passaram por um
prejudicial processo de degradação dos recursos da biodiversidade, ocasionado pela vigência
de um modelo de desenvolvimento econômico equivocado. Entretanto, também é fato que,
graças a isso, os países do Norte foram responsáveis por efetuar um salto tecnológico
qualitativo sem precedentes, bem como um incremento de suas economias, formando, dessa
forma, o grupo de países mais desenvolvidos do globo.
Os países do Sul, como um todo, apesar de menos desenvolvidos
economicamente, caracterizam-se por serem ricos em biodiversidade, sendo, todavia, pobres
em tecnologia, e imersos em um nível elevado de pobreza e miséria, estando pautados em um
paradoxo sem tamanho. Vejamos a formação dos blocos a seguir:
- Países “Megadiversos”, demais países da América Latina, Caribe e Ásia.
Esse será o bloco das nações biologicamente mais ricas do mundo,
denominadas “megadiversas”. O “Ranking da Biodiversidade” pode ser assim disposto: 1º
Brasil, 2º Colômbia, 3º Indonésia, 4º China, 5º México, 6º África do Sul, 7º Venezuela, 9º
Peru, 12º Índia, 14º Malásia27.
26
27
Disponível em: http://www.unchs.org/wssd/implementation/plan_final1009-03.htm#TopOfPage
Para maiores informações, visite: <http://www.institutoaqualung.com.br/info_biodiversidade23.html>.
19
O papel desses países em nosso debate será crucial, na medida em que serão
eles os responsáveis pela reivindicação e estabelecimento de parcerias com os países
desenvolvidos para a concretização da conciliação entre a conservação e utilização sustentável
da diversidade biológica e do desenvolvimento econômico, social e tecnológico dos mesmos,
incentivados através da ajuda financeira, tecnológica e logística que os países mais
desenvolvidos podem disponibilizar para a consolidação desse processo, valendo salientar,
ainda, fatores como a equânime distribuição dos benefícios obtidos através do uso sustentável
da biodiversidade para ajudar a minorar o problema da pobreza nesses países.
Os demais países da América Latina e Caribe, não considerados
“megadiversos”, não apresentam uma realidade muito diferente, na medida em que ostentam
patamares de pobreza e subdesenvolvimento bastante preocupantes, não dispondo de
capacidade científico-tecnológica para a melhoria da questão em epígrafe.
No que concerne ao continente asiático, podemos considerar que
aproximadamente 20% de sua fauna e flora do Sudeste, uma das regiões com maior
biodiversidade do planeta, poderiam se extinguir ainda no final deste século, de acordo com
dados da revista britânica Nature28. A taxa de extinção durante o século XXI se situará entre
13% e 42%, podendo a perda total representar dois quintos de sua biodiversidade29. A maioria
dos países asiáticos necessita da ajuda dos países mais desenvolvidos no que concerne à
questão do uso sustentável da diversidade biológica e desenvolvimento.
Já a Rússia possui uma relevante diversidade biológica em seu território, e
defende que os países desenvolvidos efetuem uma cooperação científica e técnica concreta,
principalmente no que concerne à transferência de tecnologias ecologicamente importantes
aos países em desenvolvimento. É Estado-Parte da Convenção sobre Diversidade Biológica
desde 1995.
- Estados Unidos da América
Apesar de estarem presentes em décimo lugar no Ranking da Biodiversidade,
os EUA possuem uma política peculiar em relação às problemáticas de meio-ambiente do
globo, principalmente no que concerne à biodiversidade, em questões como transferência de
tecnologia e propriedade intelectual da diversidade biológica.
O país em questão não ratificou a Convenção sobre Diversidade Biológica CDB, graças a assuntos relacionados à propriedade intelectual. Detém a maior parte dos
centros de pesquisas, universidades, ONGs e corporações responsáveis por uma enorme
capacitação científico-tecnológica referente à diversidade biológica, caracterizando-se por ser
reticente em relação à aceitação da idéia de cerceamento do uso dessa capacitação para
finalidades econômicas30.
28
Para maiores informações, visite: < http://noticias.terra.com.br/ciencia/interna/0,6752,OI123413EI299,00.html>.
29
Idem Ibidem.
30
Nesse sentido, SOUZA, Renato Santos de. Entendendo a questão ambiental: temas de economia, política e
gestão do meio ambiente. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000. p. 81.
20
- União Européia, Canadá, Japão e Austrália.
Esse será o bloco dos países mais desenvolvidos e detentores de recursos
científico-tecnológicos, que possuem um histórico de ajuda e cooperação em relação ao
mundo em desenvolvimento. Todavia, podemos considerar que questões como transferência
de tecnologias ecologicamente necessárias aos países em desenvolvimento não são unânimes
nesse bloco.
A Europa se caracteriza por ter sido o primeiro continente a se preocupar com
a devastação ambiental. Esta preocupação é totalmente compreensível, já que desde a
Revolução Industrial, processo desencadeado na Inglaterra, os índices de degradação do meio
ambiente são alarmantes. O Tratado da Comunidade Econômica Européia, hodiernamente
União Européia, consolidara alguns princípios tendentes à proteção do meio ambiente.
Ressalte-se, ainda, a importância de países desenvolvidos como a França,
Reino Unido e Alemanha, bem como de outros países europeus, na consecução de ações
voltadas ao incentivo dos países menos desenvolvidos na área do desenvolvimento
sustentável e meio ambiente.
Podemos citar a consolidação da Declaração do Rio31, em que os Chefes de
Estado e de Governo da América Latina, do Caribe e da União Européia, reunidos na cidade
do Rio de Janeiro, em 28 e 29 de junho de 1999, decidiram avançar na consolidação de uma
parceria estratégica entre essas regiões, de caráter político, econômico, sócio-cultural e de
cooperação, objetivando-se o desenvolvimento e a melhoria nos níveis de bem-estar
econômico e social entre esses povos. A Declaração em questão foi responsável por reafirmar
os compromissos em relação à implementação da Convenção sobre Diversidade Biológica,
enfatizando a necessidade de cooperação e permuta de experiências na área da preservação
dos recursos biológicos. Entretanto, não menciona nenhuma ação efetiva em relação à
transferência de capacidade científico-tecnológica àqueles países “megadiversos” e em
desenvolvimento.
O Canadá possui 20% das áreas selvagens e 10% das florestas do planeta,
sendo consideravelmente complexo no que concerne à biodiversidade. Configura-se como
detentor de grande capacidade científico-tecnológica, sendo Parte da Convenção sobre
Diversidade Biológica desde 1992, configurando-se como um grande apoiador de ações
voltadas ao mundo em desenvolvimento no que concerne à problemática ambiental.
Já o Japão possui 67% de sua área com cobertura florestal (27% da qual com
florestas nativas), sendo um dos países com maior percentual de extensão de florestas,
possuindo uma considerável diversidade biológica. Por outro lado, boa parte dos vertebrados
e 20% de certos tipos de plantas estão ameaçados. Vale salientar que os japoneses dispõem de
recursos financeiros e de capacidade científico-tecnológica em relação à questão da
diversidade biológica.
Por fim, temos a Austrália, que se encontra em 13º lugar no “Ranking da
Biodiversidade”. Apesar de ser um país “megadiverso”, possui maiores condições científicotecnológicas do que os países em desenvolvimento, sendo um país rico biologicamente e
desenvolvido, assim como os Estados Unidos da América.
31
Declaração na íntegra: < http://www.mct.gov.br/alcue/rio.htm>.
21
6 - Soluções Propostas
A problemática da conservação e utilização sustentável da biodiversidade,
como fomos capazes de constatar, felizmente é amplamente discutida no âmbito da
Organização das Nações Unidas, em organismos como o PNUD, PNUMA e CNUCD,
contando, ainda, com a preciosa ajuda de governos, além de organizações
intergovernamentais e não-governamentais, como a União Mundial para a Natureza (IUCN),
o Fundo Mundial para a Natureza (WWF), o Instituto de Recursos Mundiais, o Greenpeace,
dentre muitos outros, além de ações da iniciativa privada e de estudiosos e cientistas de todo o
mundo. Nesse diapasão, podemos considerar que o relatório “A estratégia global da
biodiversidade: diretrizes de ação para estudar, salvar e usar de maneira sustentável e justa a
riqueza biótica da Terra”, ao qual já nos referimos anteriormente, é um verdadeiro oásis de
propostas e estratégias em relação à questão da diversidade biológica.
Dessa forma, citaremos, no quadro abaixo, um apanhado geral das mais
relevantes soluções propostas, no âmbito internacional, em relação à problemática da
conservação e uso sustentável da biodiversidade, valendo salientar que não são excludentes
entre si, podendo complementar-se umas às outras:
QUADRO 2: SÍNTESE DAS SOLUÇÕES PROPOSTAS INTERNACIONALMENTE À
PROBLEMÁTICA DA CONSERVAÇÃO E USO SUSTENTÁVEL DA
BIODIVERSIDADE
- Desenvolvimento efetivo de diretrizes de - Fortalecimento da eficácia das Convenções e
políticas nacionais e internacionais para a Tratados Internacionais existentes, acerca da
conservação e uso sustentável da conservação de ecossistemas, espécies e
biodiversidade;
genes;
- Transformação dos processos de auxílio ao - Elaboração de métodos inovadores,
desenvolvimento em uma força pró- descentralizados e responsáveis por angariar
conservação da biodiversidade;
recursos financeiros, aplicando-os eficazmente
no uso sustentável e conservação biológica ;
- Estabelecimento de métodos de garantia da - Concretização de ações de incentivo voltadas
distribuição eqüitativa dos benefícios para uma conservação biológica efetiva, por
provenientes do uso de recursos genéticos, parte das comunidades locais, assumindo estas
em relação ao beneficiamento concreto últimas um papel maior na administração de
daqueles que detêm os recursos naturais seus recursos bióticos;
provenientes da biodiversidade;
- Promoção de iniciativas de cooperação - Fortalecimento do marco jurídico
entre países em desenvolvimento e países internacional para a conservação, com o
desenvolvidos, em especial em relação ao intuito de complementar a Convenção sobre
acesso à tecnologia e sua distribuição;
Diversidade Biológica;
- Incremento do financiamento para a - Estabelecimento de associações entre os
conservação e uso sustentável dos recursos governos e as comunidades locais para a
biológicos;
administração de recursos;
- Estímulo a iniciativas que visem ao apoio - Consolidação de esforços em relação ao
das comunidades locais em relação à investimento e ao comércio dos recursos
adequada valoração dos recursos naturais, biológicos como meio de promover os três
visando-se ao aumento na competitividade objetivos da CDB (conservação e uso
de mercadorias e serviços gerados pelos sustentável da biodiversidade, e justa
recursos oriundos da biodiversidade;
distribuição dos benefícios angariados);
22
- Promoção do apoio por parte da iniciativa
privada em relação ao incentivo de ações
efetivas
no
que
concerne
ao
desenvolvimento das comunidades locais e
indígenas, detentoras dos recursos naturais,
bem como o estabelecimento de centros de
pesquisa e educação ambiental.
- Implementação de mecanismos de
fiscalização do consumo de recursos
biológicos, garantindo-se, assim, o seu uso
sustentável;
- Reconhecimento dos domínios ancestrais
de populações tribais e indígenas, e apoio
aos seus esforços em manter suas práticas
tradicionais e adaptá-las às pressões e
condições modernas;
- Utilização efetiva de mecanismos como o
BIOTRADE e o “Global Environment
Facility” (GEF) como forma de financiamento
e promoção de programas que desempenhem
um papel decisivo em relação à conservação e
utilização sustentável da biodiversidade;
- Concretização cada vez maior de ações que
envolvam governos, órgãos multilaterais de
desenvolvimento e ONGs, para juntos
trabalharem em favor da questão biológica;
- Ações para o aumento dos benefícios locais
provenientes do turismo ecológico em áreas
naturais, garantindo que o desenvolvimento
turístico não resulte em perda da
biodiversidade ou conflitos culturais.
7 - Documentos de Posição
Essencialmente, os documentos de posição se caracterizam por disponibilizar o
posicionamento diplomático básico do país a ser representando em relação à problemática a
ser discutida. São de extrema importância, na medida em que permitem à diretoria do comitê
uma visão prévia do posicionamento a ser defendido por cada delegado nas discussões, bem
como as propostas a serem trazidas ao debate.
Dessa forma, a confecção dos documentos de posição é uma das fases mais
importantes na preparação do delegado, na medida em que ele efetuará uma pesquisa
detalhada acerca do posicionamento do seu país em relação ao tema.
No que concerne ao Tópico A, o documento deve ser redigido da forma mais
concisa possível, em uma lauda apenas, devendo ser ressaltada a imprescindibilidade no que
concerne ao poder de síntese do delegado. Os delegados deverão ficar atentos para a
disponibilização, em termos gerais, dos seguintes elementos:
1) A posição do seu país acerca da problemática da conservação e utilização sustentável dos
recursos provenientes da diversidade biológica;
2) Informação acerca do fato de ser o seu país signatário/parte ou não da Convenção sobre a
Diversidade Biológica- (CDB);
3) Dados acerca do desenvolvimento, por parte do seu país, de estratégias, planos e programas
para a conservação e o uso sustentável da biodiversidade;
4) Comunicar se o seu país recebe algum apoio ou apóia financeiramente ou logisticamente
alguma iniciativa voltada para o uso sustentável e conservação da diversidade biológica;
5) Dizer até que ponto a plena implementação do art. 16 da Convenção sobre Diversidade
Biológica, no que diz respeito ao fornecimento e/ou facilitação ao acesso e à transferência de
tecnologias relevantes para a conservação e utilização sustentável da diversidade biológica,
influiria na economia de seu país.
Vale salientar que essas são os elementos principais, não sendo restritivos.
Informações complementares do seu país em relação à problemática podem ser
disponibilizadas.
23
8 - Questões que a Resolução deve Responder
¾
Como estabelecer mecanismos de incentivo para a conservação da biodiversidade
como uma ferramenta para a promoção do desenvolvimento sustentável?
¾
De que maneira pode ser aperfeiçoado o comércio entre as nações consumidoras de
produtos oriundos da biodiversidade e os países detentores daquela?
¾
Como assegurar que os benefícios econômicos percebidos a partir do comércio de
produtos advindos da diversidade biológica serão distribuídos de forma eficaz às comunidades
locais?
¾
Como proporcionar o treinamento técnico necessário para que as populações locais e
indígenas sejam capazes de exercer uma justa valoração econômica em relação aos recursos e
serviços referentes à diversidade biológica?
¾
Como garantir medidas eficazes de fornecimento e/ou facilitação ao acesso e à
transferência de tecnologias necessárias no que concerne à preservação e uso sustentável da
biodiversidade por parte dos países desenvolvidos em relação aos países em
desenvolvimento?
¾
Que papel deve desempenhar o setor privado em relação ao acesso à tecnologia por
parte dos países em desenvolvimento, bem como no que se refere à transferência de knowhow?
¾
De que formas podem ser aperfeiçoadas ações como o patrocínio e fomento à pesquisa
e estudo da biodiversidade, além de apoio financeiro a ações que ensejariam o
desenvolvimento das comunidades locais, assim como o estabelecimento de laboratórios e
centros de pesquisa para conservação da diversidade biológica?
¾
Que papel deve desempenhar a sociedade civil e as organizações não-governamentais
em relação às iniciativas voltadas ao uso sustentável dos recursos da biodiversidade?
¾
Que ações podem ser tomadas pelos membros do CNUCD para facilitar a
implementação das orientações presentes no relatório obtido na “Reunião de Especialistas em
Medidas Positivas para Promover o Desenvolvimento Sustentável”, realizada em 1997 pela
“Comissão do Comércio de Bens e Serviços e dos Produtos Básicos”, bem como em relação
ao Plano de Ação obtido em 2000, pelo CNUCD, na Conferência “UNCTAD X”?
9 - Considerações Finais
Tem-se que um dos principais objetivos da Conferência das Nações Unidas
para o Comércio e Desenvolvimento é exatamente a promoção de ações efetivas, tanto nos
âmbitos internacional, regional e nacional, que contribuam para o crescimento econômico
estável e para o desenvolvimento sustentável32. Dessa forma, acreditamos que a discussão
acerca de medidas efetivas para o uso sustentável da biodiversidade no âmbito do
desenvolvimento humano é imperativa para a concretização do desenvolvimento econômico,
social e tecnológico de diversos países em desenvolvimento, que amargam os terríveis efeitos
que a pobreza proporciona.
O maior desafio dos participantes do CNUCD será, portanto, a conciliação
entre a preservação e utilização sustentável dos recursos biológicos, que, como já observamos,
é um processo razoável e tangível, procurando encontrar medidas práticas e efetivas para a
solução da problemática.
32
http://www.unctad.org/Templates/Page.asp?intItemID=1535&lang=1
24
O multilateralismo, assim, caracterizar-se-á como sendo determinante,
devendo ser estabelecidos esforços conjuntos e coordenados para reverter os processos que
colocam em risco o bem-estar dos integrantes da comunidade internacional atuais e futuros.
10 - Bibliografia
10.1 - Livros/Artigos on-line
BARBIERI, José Carlos. Desenvolvimento e Meio Ambiente: As Estratégias de Mudanças
da Agenda 21. 3ª ed. Petrópolis: Vozes, 2000.
BARROS, Felipe Luiz Machado. Biodiversidade e desenvolvimento sustentável. Aspectos
teóricos da proteção legal brasileira ao patrimônio genético. Jus Navigandi. Disponível
em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=1691>. Acesso em: 19 ago. 2003.
BLENCH, Roger. Biodiversity Conservation and Its Opponents. Disponível em:
<http://www.odi.org.uk/nrp/32.html>. Acesso em: 29 jul. 2003.
COUTINHO, Sérgio. É sustentável o desenvolvimento sustentável?. Jus Navigandi.
Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=1690>. Acesso em: 20 ago.
2003.
IMBIRIBA, Nazaré. Biodiversidade e pobreza: uma questão de decisão política.
Disponível
em:
<http://www.mdic.gov.br/tecnologia/revistas/artigos/Coletanea5/09NazareImbiriba.pdf>.
Acesso em: 28 jul. 2003.
KISS,
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Direito
Internacional
do
Ambiente.
Disponível
em:
<http://www.diramb.gov.pt/data/basedoc/TXT_D_9211_1_0001.htm>. Acesso em: 24 ago.
2003.
KOZIELL, Izabella e McNEILL, Charles I. Poverty Reduction through Conservation and
Sustainable
Use
of
Biodiversity.
Disponível
em:
<http://www.undp.org/equatorinitiative/docs/mdg_biodiversity.doc>. Acesso em: 01 ago.
2003.
LEWINSOHN, Thomas Michael. A evolução do conceito de biodiversidade. Disponível
em: <http://www.comciencia.br/reportagens/biodiversidade/bio09.htm>. Acesso em: 09 ago.
2003.
___________________________. Razões e ficções do desenvolvimento/ organizadores
Glauco Arbix, Mauro Zilbovicius, Ricardo Abramovay. São Paulo: Editora UNESP; Edusp,
2001.
SEN, Amartya Kumar. Desenvolvimento como liberdade. Tradução Laura Teixeira Motta;
revisão técnica Ricardo Doniselli Mendes. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
SANTOS, Antônio Silveira R. dos. Biodiversidade, Bioprospecção, Conhecimento
Tradicional e o Futuro da Vida. Revista de Informação e Tecnologia- UNICAMP.
25
Disponível em: <http://www.revista.unicamp.br/infotec/artigos/silveira.html>. Acesso em: 22
ago 2003.
SILVA, Marina. Biodiversidade: oportunidade e dilema. Disponível em:
<http://www.amazonlink.org/gd/diversidade/SenadoraMarinaPORT.doc>. Acesso em: 13 ago
2003.
SOUZA, Renato Santos de. Entendendo a questão ambiental: temas de economia, política e
gestão do meio ambiente. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000.
TANEJA, Bansuri e KOZIELL, Izabella. Diversidade Biológica- Mais debate que ação?
Disponível em: <http://www.iied.org/docs/wssd/bp_biodiv_por.pdf>. Acesso em: 10 ago.
2003.
VOGT, Carlos. Biodiversidade: a vida e seus semelhantes. Disponível em:
<http://www.comciencia.br/reportagens/biodiversidade/bio01.htm>. Acesso em: 11 ago.
2003.
World Resources Institute (WRI), World Conservation Union (IUCN), e United Nations
Environment Programme (UNEP) 1992. A estratégia global da biodiversidade: diretrizes
de ação para estudar, salvar e usar de maneira sustentável e justa a riqueza biótica da
Terra. Traduzido por P.P. Distéfano e M.D. Schlemm. Curitiba: Fundação O Boticário de
Proteção à Natureza, 1992.
10.2 - Sites Essenciais
www.un.org (Site da Organização das Nações Unidas).
www.unctad.org (Site da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e
Desenvolvimento).
http://www.unep.org/ (Site do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente).
http://www.pnud.org.br/ (Site do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).
http://www.un.org/esa/sustdev/ (United Nations Division for Sustainable Development).
www.biodiv.org (Site acerca da Convenção sobre Diversidade Biológica).
http://www.johannesburgsummit.org/ (Site da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento
Sustentável -Rio +10).
10.3 - Sites de Organizações Não-Governamentais / Programas Ambientais de Instituições de
Ensino Internacionais/ Notícias
http://www.wwf.org.br (Site do Fundo Mundial para a Natureza- WWF).
http://www.greenpeace.org.br/ (Site do Greenpeace).
http://www.pace.edu/lawschool/env/icelsite/icelhome.html (Site do Conselho Internacional de
Direito Ambiental).
http://www.earth.columbia.edu/ (Site do Instituto Terra- Universidade de Columbia).
http://environment.harvard.edu/envath/sust.html (Site do Guia da Universidade de Harvard
para o Meio Ambiente).
http://www.cbcs.yale.edu/ (Site do Centro para a Conservação da Biodiversidade e Ciência da
Universidade de Yale).
http://busca.estadao.com.br/ciencia/noticias/2002/ago/05/22.htm (Notícia: “ONU alerta para
destruição da biodiversidade”).
26
http://www.expressodanoticia.com.br/conteudo.asp?Codigo=618 (Notícia: “Convenção da
ONU debaterá biodiversidade em Haia”).
Tópico B
AS INSTITUIÇÕES DE BRETTON WOODS E O SEU PAPEL NO
DESENVOLVIMENTO DOS ESTADOS
"Toda época se caracteriza por suas formas de opressão
e por suas lutas pela liberdade33” (Norberto Bobbio)
1 - Introdução: Crescer ou dividir?
A interdependência entre economia e política é secular. A Divisão
Internacional do Trabalho, fruto de decisões políticas, determina a forma como cada um
viverá seu dia-a-dia em todo o mundo. As teorias políticas refletem seu tempo e procuram
orientar os governantes sobre como conduzir os Estados, trazendo clara relação com a
economia. Não é nosso objetivo valorar esta ou aquela posição frente à constantemente
mutável economia mundial. Mas é fato que a política econômica praticada tradicionalmente
criou uma sociedade com graves distorções e sujeita a crises intermitentes.
Estamos vivendo uma nova etapa do desenvolvimento do capitalismo marcada
pela multiplicação da produção de mercadorias complexas que exigem a utilização de elevada
qualificação profissional nas áreas de gestão empresarial, de materiais e de tecnologias
sofisticadas. Segundo Peter Drucker, o recurso econômico básico – os “meios de produção”,
para usar uma expressão dos economistas – não é mais o capital, nem os recursos naturais (a
“terra” dos economistas fisiocratas), e nem a “mão-de-obra” – os dois pólos da teoria
econômica dos séculos dezenove e vinte, quer ela seja clássica, marxista, keynesiana ou
neoclássica. Hoje o valor é criado pela produtividade, pela inovação, que são aplicações do
conhecimento ao trabalho (O Homem, Drucker, P., 1993, p.XVI). Neste novo contexto,
apenas o trabalhador detentor de conhecimento é capaz de elevar os níveis de produção e
inovar.
Um fato marcante da era contemporânea é o domínio das economias nacionais
e das sociedades humanas pelas esferas monetária e financeira, as quais tendem a se tornar
autônomas em relação ao funcionamento das economias produtivas e mercantis. A economia,
por sua vez, está cada vez mais tributária das tensões de uma esfera monetária e financeira
mundial incapaz de dominar as dinâmicas ou de impedir a espiral de uma crise. Com os
valores erodidos, e as coerências fragilizadas, as sociedades contemporâneas não têm mais
projetos globais. O crescimento econômico se tornou sua principal finalidade.
Finalmente, ressalta-se a ameaça que paira sobre a humanidade, representada
pelo apharteid social que resulta de um crescimento econômico sem elevar o nível de
emprego, da modernização dos processos produtivos que promove o desemprego, da
exposição dos mercados de países periféricos à concorrência internacional predatória e da
institucionalização do Estado Mínimo. Enquanto o processo de globalização tende a integrar a
33
Norberto Bobbio. Igualdade e liberdade (5.ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002).
27
economia mundial, ele próprio pode gerar também situações que levam a emergência de
fragmentações e rupturas.
As principais metas econômicas são manter um alto nível de emprego,
estabilidade dos preços, eficiência técnica na alocação de recursos, distribuição eqüitativa de
renda e crescimento econômico. Mas aqui nos deparamos com um problema de escolha,
eficiência ou eqüidade? Políticas que buscam a justa distribuição da prosperidade econômica
(como o imposto de renda e políticas de seguridade social) têm custos para a eficiência e o
crescimento econômico. A política econômica global focaliza o crescimento, e, ao mesmo
tempo, argumenta que essa é a solução para o problema do desenvolvimento.
As empresas multinacionais têm grande flexibilidade de manipulação de
preços entre suas subsidiárias de vários países, aproveitando-se das vantagens que as leis
tributárias dos países onde operam lhes oferecem. Isso causou o surgimento de oligopólios de
multinacionais e, com isso surgiu o fenômeno da “estagflação”, que consiste na ocorrência
simultânea da inflação e da recessão. Isso demonstra a eminência dessas empresas no mundo
globalizado.
Além disso, as práticas adotadas pelas empresas multinacionais, de
subfaturamento nas exportações e de sobrefaturamento nas importações têm criado sérios
problemas na balança comercial de vários países, apesar dos esforços desenvolvidos pelos
governos nacionais no equacionamento adequado do seu comércio exterior. Conclui-se desta
forma que nos países que não puderam alcançar o desenvolvimento tão rápido, a atuação das
multinacionais, que no início é vista como fonte de investimento para o país, provoca o
declínio do poder dos governos nacionais no controle de seus sistemas econômicos.
Também os grandes investidores financeiros detêm um poder sem precedentes
em todo o mundo – talvez mesmo um direito de veto – até mesmo sobre a política econômica
do país mais poderoso do planeta, os Estados Unidos. Na maior parte dos grandes mercados, a
tendência irresistível nos vinte últimos anos é a mundialização e a concentração do capital na
base de uma concorrência feroz entre um número restrito de grandes operadores.
A crise estrutural do sistema econômico mundial traz a exigência de
reestruturar as economias dos países líderes e, também, dos países periféricos. A tese
defendida pelas empresas transnacionais, pelos governos dos principais países desenvolvidos,
pela ONU, pelo FMI e pelo Banco Mundial é a da integração econômica mundial através da
liberalização dos mercados segundo os princípios neoliberais. A tese da globalização está
sendo colocada como um imperativo para a superação da crise estrutural do sistema
econômico mundial. Sem a globalização, o sistema econômico mundial seria levado à
bancarrota, o fato que torna tal fenômeno irreversível.
O livre comércio pressupõe fim dos subsídios agrícolas e a concorrência
baseada em vantagens competitivas. Na agricultura, tais vantagens estão nitidamente no
campo dos países desenvolvidos. O que os países pobres estão pedindo é o direito de uma
maior e mais ativa participação no mercado global. Eles não estão solicitando tratamento
especial, mas condições justas de concorrência. Acreditam ser esta iniciativa muito mais
eficaz do que programas de assistência, sendo o comércio muito mais importante que ajuda
financeira.
28
Mas, como se sabe, os ganhos com a globalização têm sido distribuídos
injustamente entre as nações. A maior interdependência mundial trouxe também maior
volatilidade macroeconômica, resultando nas crises financeiras da segunda metade dos anos
90. O desafio está em compatibilizar a ação estatal disciplinadora dos fluxos monetários e
financeiros com o processo de globalização, assim como crescer e dividir ao mesmo tempo.
Desenvolvido é o país ou região em etapa avançada de crescimento, de
progresso econômico, com sistema produtivo diversificado e nível relativamente alto de renda
per capita. O desenvolvimento é um processo a longo prazo que, em última análise, requer a
transformação das sociedades, além de políticas econômicas e financeiras corretas. Entretanto
também requer dar voz às pessoas, construir as estradas, elaborar as leis, reconhecer as
mulheres, educar as crianças, eliminar a corrupção, proteger o meio ambiente, diminuir a
mortalidade infantil, melhorar as condições de habitação, saneamento e serviços médicos - e
muito, muito mais. Pode-se dizer que é uma situação almejada que tende para a completa
satisfação do homem. O estágio que a nossa civilização alcançou traz a obrigação moral de
que as necessidades humanas entendidas como básicas sejam universais.
Quer se examine a situação da perspectiva social, econômica ou moral, o
desenvolvimento é um desafio que não se pode ignorar, afinal só há um mundo, respiramos o
mesmo ar, compartilhamos o mesmo ambiente, a AIDS não é um problema que desaparece na
fronteira, o crime nem sempre pára nas fronteiras, As drogas não param nas fronteiras, o
terrorismo, a guerra e a fome não param nas fronteiras, a luta contra a pobreza é a luta pela
paz, segurança e crescimento de todos nós. Para problemas sem fronteiras são necessárias
soluções pautadas no multilateralismo. Todos percebem a necessidade de se construir uma
ponte entre desenvolvimento, comércio e finanças para lutar contra a pobreza e garantir
melhores perspectivas para a humanidade.
A economia mundial, nos últimos trinta anos, passou por três revoluções que
estão mudando a face do mundo, não apenas nas suas estruturas produtivas, mas
principalmente no campo social e nas relações internacionais. As três grandes revoluções são
a tecnológica, a gerencial e a institucional.
Assim, mudanças sensíveis nos campos das relações internacionais ocorreram.
Nos centros urbanos do mundo desenvolvido, sinais de uma nova cultura internacional estão
quase por toda parte. “Estamos intercambiando hábitos alimentares, música e moda com tanto
entusiasmo que um novo estilo de vida, internacional e universal, reina em centros como
Osaka, Madri e Seatle” (Naisbitt, J. e Aburdene P., 1990, p.141). Neste plano, a característica
marcante do momento é a tendência à constituição de blocos econômicos. O Estado-Nação
permanecerá por muito tempo como órgão político mais poderoso. No entanto,
progressivamente, dividirá cada vez mais seu poder com outros órgãos, outras instituições,
outras entidades políticas. Uma grande revolução no plano institucional terá lugar objetivando
regular as relações entre as nações do futuro.
É em um contexto de grandes mudanças engendradas pelas revoluções
tecnológica, gerencial e institucional em nível global que devemos formular as estratégias
mais compatíveis para a ascensão dos países em desenvolvimento no futuro para seu conflito
de inserção na economia mundial. O grande desafio que se coloca hoje para os dirigentes
destas nações é o de modernizar a economia nacional em condições de torná-la competitiva
no mercado mundial, qualificar sua mão-de-obra no mais alto grau, gerar os empregos
necessários e lutar para a criação de instituições internacionais capazes de regular as relações
29
entre nações, povos e empresas transnacionais. O insucesso na implementação dessas medidas
tende a produzir nestes países um verdadeiro caos social.
Será necessário um forte crescimento nas partes mais pobres do mundo para
sustentar o crescimento no Ocidente, para manter os níveis adequados de emprego e para
permitir que os governos ocidentais lidem com seus grandes problemas sociais. Para assegurar
este crescimento nos países em desenvolvimento, segundo dados do OCDE, seriam
necessários recursos anuais da ordem de US$300 bilhões acima dos níveis de investimento.
O atual cenário de lenta recuperação da recessão experimentada pela economia
mundial em 2001, com o desaquecimento das três maiores economias do planeta – EUA,
Japão e União Européia –, reflete a instabilidade que assola a humanidade. Os EUA, maior
potência global, pautam sua política externa na luta contra o terrorismo desde os atentados
terroristas de 11 de setembro de 2001. As guerras do Iraque, em 2003, e no Afeganistão, em
2002, corroboram essa afirmação. Embora se espere que o PIB global cresça 2,5% em 200334,
como resultado da melhora da saúde das empresas e políticas estimuladoras dos EUA e
Europa, as chances da economia mundial entrar novamente em recessão são bastante reais.
Esse panorama dantesco deixa os investidores cautelosos e prejudica os investimentos,
principalmente nos países em desenvolvimento.
Não vivemos mais na época da guerra fria, porém estamos tão vulneráveis
como antes. O fosso entre ricos e pobres está deixando o mundo mais inseguro. Questõeschave para a comunidade internacional pedem respostas globais, pautadas no multilateralismo
e na soberania dos Estados. A questão do desenvolvimento é tão profunda e tão
intrinsecamente relacionada à condição humana que o direito ao desenvolvimento urge por
uma forte parceria entre os diversos setores da sociedade civil, governos, instituições
internacionais e empresas privadas. Enquanto isso, milhões morrem diariamente na mais
absoluta miséria. São pessoas doentes, famintas, arrasadas pelo flagelo da guerra, sem
perspectiva de vida. E tudo em detrimento de uma renda global que chega a U$ 31 trilhões ao
ano.
A globalização tornou os mercados mais próximos, aumentou a interconexão
entre eles e acima de tudo trouxe grandes riscos e oportunidades para os países. Para
aproveitar essas oportunidades e minimizar os riscos associados a elas, é importante a adoção
de medidas domésticas para aumentar os investimentos e a produtividade. A comunidade
internacional deve e vem ajudando os países em desenvolvimento a melhorar sua atratividade
a investimentos.
A pobreza, mesmo diante de uma perspectiva de crescimento da economia
mundial, nos próximos 50 anos pode sofrer significante redução somente se os governos
agirem agora para evitar danos maiores ao meio ambiente e inquietação social. Desastres
ambientais, distribuição injusta de renda e guerras civis têm como uma de suas causas,
políticas errôneas. Lutar contra a pobreza implica conhecer suas causas e as causas do
subdesenvolvimento.
34
Global Economic Prospects and the Developing Countries 2003
30
2 - Histórico do Problema
Após o desastre econômico de 1930, John Maynard Keynes, em sua obra The
General Theory of Employment, recomenda que o governo deveria interferir no nível geral da
atividade econômica ajustando, de forma dinâmica, a sua política fiscal, isto é, processando
mudanças no nível dos dispêndios governamentais ou alternando os impostos, assim
controlando a inflação e mantendo o pleno emprego.
Com a ampliação do conhecimento econômico chegou-se a conclusão que o
governo deveria exercer também o controle da oferta da moeda e do crédito, a fim de que, dos
seus efeitos sobre as taxas de juros e os preços resultasse um estímulo maior ou menor sobre o
nível geral da atividade econômica. Desta forma, quando o desempenho da economia se
deteriorasse e a taxa de desemprego se elevasse, o governo deveria aumentar a quantidade de
moeda em circulação e o crédito. Quando o nível do dispêndio se tornasse excessivo, com os
preços aumentando e a taxa de desemprego reduzida, o governo deveria retirar moeda de
circulação e diminuir o crédito. É baseada nessas premissas que se desenvolve a política
monetária governamental.
A revolução tecnológica em curso soma-se a revolução gerencial, que surge
como resposta à necessidade de elevar os níveis de produtividade do capital cujo declínio vem
se acentuando nas três últimas décadas. Segundo Peter Drucker, “desde que Taylor começou,
a produtividade aumentou cerca de cinqüenta vezes em todos os países avançados. E essa
expansão sem precedentes foi a origem de todas as elevações do padrão e da qualidade de
vida nos países desenvolvidos (O Homem, Drucker, P. São Paulo, 1993, p.18). Mesmo que
alguns digam que a Revolução Gerencial se estendeu por todo o planeta, foram necessários
cem anos, da metade do século dezoito até a metade do século dezenove, para que a
Revolução Industrial dominasse o mundo. Foram necessários cerca de setenta anos, de 1880
até o fim da Segunda Guerra Mundial, para que a Revolução da Produtividade fizesse o
mesmo. E menos de cinqüenta anos – 1945 a 1990 – para que a Revolução Gerencial também
dominasse o mundo.
Existe uma enorme diferença entre os níveis de desenvolvimento de vários
países. Desde a primeira Revolução Industrial, são pouquíssimos os países que podem ser
considerados industrializados, embora o número destes esteja crescendo. A maioria da
população mundial está inserida nas chamadas economias em desenvolvimento, as “late
comers”, ou de industrialização tardia. Muitos deles alcançaram certo grau de
desenvolvimento, como o Brasil, a China e Hong Kong, ao passo que outros sequer
começaram, como Serra Leoa e a maioria dos países africanos.
Economias em desenvolvimento surgiram no fim de 1940 e início de 1950,
durante a ascensão do neoliberalismo. A falha do Consenso de Washington determinou
mudanças e reestruturação nas instituições de Bretton Woods. Hoje, se reconhece as
limitações do livre mercado e se admite intervenção estatal em algum grau na economia. As
modernas economias de mercado mostram variados graus de intervenção estatal. Diferentes
países apresentam problemas bastante singulares de subdesenvolvimento, por isso que são
necessárias soluções locais.
Consenso de Washington hoje é um termo pejorativo. Entendido como o
conjunto de políticas neoliberais impostas pelas instituições financeiras internacionais de
Washington aos países pobres, deixando-os em crise e mergulhados na miséria. O consenso
31
de Washington foi um conjunto de políticas receitadas aos países latino-americanos para
persuadi-los a iniciar reformas econômicas sérias durante a administração de George Bush. As
principais idéias eram, e ainda são, disciplina macroeconômica, economia de mercado e
abertura comercial. Pregava disciplina fiscal, reordenamento e avaliação dos gastos públicos,
principalmente com educação e saúde, reforma tributária, estabelecimento de uma taxa de
câmbio competitiva, liberalização comercial, privatizações etc. A partir dessas ações, esses
países poderiam se beneficiar dos investimentos internacionais e substituição de importações.
Mesmo assim os países que procuraram seguir o consenso de Washington continuam pobres
ou até aumentaram a miséria alegando que aquele só serviu para torná-los mais dependentes
dos países mais desenvolvidos.
A redução paulatina dos investimentos e, sobretudo da Formação Bruta de
Capital Fixo, de 1970 até os dias atuais em todo os sistema capitalista mundial produziu
impactos de grande monta nos níveis de produção e emprego. A recessão generalizada afetou
também, todos os países em desenvolvimento, sobretudo os da África e América Latina que
acumularam uma enorme dívida externa em toda a década de 80. Neste período, o PIB dos
países latino-americanos praticamente estagnou enquanto a população aumentou. Esta
estagnação se mantém até os dias de hoje, o que faz com que se torne uma exigência a
reestruturação em suas economias e instituições.
É em um contexto de grandes mudanças engendradas pelas revoluções
tecnológica, gerencial e institucional em níveis globais, que devemos formular as estratégias
mais compatíveis para a ascensão dos países em desenvolvimento na economia mundial. O
grande desafio que se coloca hoje para os dirigentes destas nações é o de modernizar a
economia nacional em condições de torná-la competitiva no mercado mundial, qualificar sua
mão-de-obra no mais alto grau, gerar os empregos necessários e lutar para a criação de
instituições internacionais capazes de regular as relações entre nações, povos e empresas
transnacionais. O insucesso na implementação dessas medidas tende a produzir nestes países
um verdadeiro caos social.
2.1. - Do Padrão-ouro à crise de Bretton Woods
Até antes da Primeira Guerra Mundial, a emissão de moeda de um país era
lastreada pelo seu estoque de outro, e esse estoque também determinava a taxa de câmbio. Os
pagamentos internacionais eram feitos com ouro. Um fluxo internacional de ouro era gerado,
havendo uma adaptação da oferta monetária, o que provocaria uma reação dos preços internos
e o correspondente ajuste da competitividade internacional do país, corrigindo desequilíbrios
na balança de pagamentos. Mas, devido à preponderância britânica, o que existiu de fato, foi
um padrão libra-ouro.
Em razão disso, a Conferência de Bretton Woods, ocorrida no Estado de New
Hampshire nos Estados Unidos, em 1944, decidiu criar instituições e normas com o intuito de
gerir a economia mundial. Entre as instituições estavam o Fundo Monetário Internacional
(FMI) e o Banco Mundial, e dentre as normas, as taxas cambiais fixas e o mecanismo para
alterá-las, em casos extremos. Os EUA impuseram o dólar como a moeda internacional. Para
que isto se sustentasse, era necessário que este país assumisse a responsabilidade de prover a
liquidez internacional adequada e garantisse a confiança com uma baixa taxa de inflação
interna, além de assumir o risco do sistema, como emprestador internacional de última
instância.
32
Um problema que Bretton Woods enfrentou foi o de como garantir a liquidez
internacional em dólares. Considerando-se que a Europa estava sem condições de realizar
exportações substanciais para os EUA, não existia este mecanismo de geração de liquidez.
Foram criados então o BIRD (Banco Mundial) e posteriormente, o plano Marshall, assim
como instalação de multinacionais e bases militares.
Os acordos de Bretton Woods determinaram a existência de taxas fixas de
câmbio, com base no ouro. Alterações nas taxas só poderiam ocorrer em caso de mudanças
estruturais em uma economia. Desta forma, a taxa de câmbio seria alterada por acordo e não
através de iniciativa individual de um país.
Se as intervenções dos bancos centrais não fossem suficientes para manter a
estabilidade das taxas de câmbio, recorria-se ao FMI. Este órgão foi criado com o papel de
possibilitar a estabilização das taxas de câmbio, estimulando, desta forma, o desenvolvimento
do comércio internacional. O FMI, em caso de necessidade, forneceria empréstimos em
dólares, para que as reservas de um país fossem aumentadas, fortalecendo sua moeda. Se isto
não fosse suficiente, o FMI poderia exigir mudanças (as condicionalidades) na economia do
país. Por fim, se, mesmo assim a taxa não se estabilizasse, consultas internacionais via FMI
poderiam alterar oficialmente a taxa de câmbio.
Esta flexibilidade existia para todos os países menos para os EUA. A taxa de
US$ 35,00 por onça de ouro não poderia ser alterada, pois, caso contrário, a confiança na
moeda-base internacional seria afetada. Isto não poderia ocorrer porque os outros países
acumulariam dólares como reservas e para transações. A garantia de que a cotação do dólar
em ouro permaneceria fixa era dada pela promessa dos EUA de trocar por ouro todo dólar
devolvido. Portanto, o único preço efetivamente fixado em ouro em Bretton Woods foi o do
dólar, sendo as outras moedas, na prática, cotadas em dólares. No final da Segunda Guerra
Mundial, os estoques de ouro dos EUA eram muito grandes, o que garantiu seu apoio a este
sistema e sua estabilidade na sua primeira fase.
Nos primeiros anos (aproximadamente até 1960), o padrão de Bretton Woods
foi amplamente benéfico para a economia dos EUA. A transferência de dólares para a Europa
permitiu compras de bens e serviços dos EUA, gerando saldos comerciais favoráveis e baixo
desemprego, quase sem inflação. As empresas multinacionais aumentaram o poderio
econômico dos EUA, e sua capacidade bélica cresceu muito com a instalação de bases
militares por todo o mundo. Portanto, houve uma conjugação de hegemonia econômica,
militar e política, que pode ser chamada de Pax Americana.
Contudo o sistema de Bretton Woods entrou em crise. Porém, durante os anos
1960 foram sentidos os sintomas que prenunciavam seu desmoronamento, mas a política
adotada foi a de administrar as crises, sem chegar-se a um acordo que solucionasse os
problemas. Os investimentos externos, a ajuda financeira a outros países e os gastos militares
no exterior afetavam negativamente a balança de pagamentos dos EUA, o que era
compensado pelo saldo positivo da balança comercial. No entanto, desde o final dos anos
1950, este último saldo reduzira-se, pois se completava a reconstrução da Europa e do Japão,
que construíram uma estrutura industrial nova, com alta produtividade, podendo agora
competir com os EUA. Sem os excedentes comerciais, os EUA teriam que garantir a paridade
do dólar vendendo ouro. Esta evolução econômica fez a escassez inicial de dólares em termos
internacionais ser substituída por seu excesso, o que aumentou o risco de movimentos
especulativos contra o dólar.
33
Em 1959, houve uma corrida especulativa contra o dólar, tendo os EUA
perdido 10% de seu estoque de ouro. Eles adotaram medidas como aumentar a taxa de juros
de curto prazo e criar um imposto para tornar mais cara a saída de dólares. Em termos
multilaterais, foi criado no início dos anos 1960 o Fundo Comum do Ouro, para estabilizar o
preço do metal no mercado livre. Em 1968, os EUA anunciaram medidas contra a saída de
dólares, como restrições aos investimentos externos e à concessão de empréstimos externos
por parte de bancos norte-americanos.
Diante da instabilidade do dólar e das divergências com os EUA, os países
europeus tentavam chegar a um acordo para diminuir sua dependência em relação a esta
moeda. O fluxo de dólares ao exterior continuou a multiplicar-se, gerando maior instabilidade
e, em agosto de 1971, as reservas dos EUA caíram abaixo do nível crítico de US$ 10 bilhões.
Neste momento, Nixon anunciou uma série de medidas, entre elas a suspensão da
conversibilidade do dólar em ouro.
As tentativas de manter as taxas de câmbio fixas duraram até 1973, quando o
sistema acordado em Bretton Woods ruiu completamente. Um dos problemas de taxas de
câmbio fixas é que elas exigem preços internos relativamente estáveis, ou pelo menos taxas de
inflação semelhantes entre os países. Além disso, evoluções diferenciadas de custos e
produtividades também impedem câmbios fixos. Desta forma, a estabilidade monetária
internacional dependia da existência de economias nacionais estáveis e de uma evolução
econômica estrutural homogênea, condições estas dificilmente encontráveis.
3 - Definição do Problema
O novo século foi marcado por uma declaração de solidariedade sem
precedentes na história. A adoção da Declaração do Milênio em 2000 e de suas metas mostrou
o comprometimento dos líderes mundiais em erradicar a pobreza, promover a dignidade
humana e o desenvolvimento sustentável, além de obrigar os governos a atacar a má
distribuição de renda, fome, preconceitos e desigualdades de gênero, deterioração ambiental e
falta de educação, saúde e água limpa. A declaração inclui ações para reduzir as dívidas
externas e aumentar as contribuições e assistência internacional, o comércio e a transferência
de tecnologia para países em desenvolvimento.
Atingir as Metas do Milênio para o Desenvolvimento (MDG) representa um
desafio enorme para a humanidade. Todos os participantes do processo de desenvolvimento os governos, as instituições, a sociedade civil e o setor privado - precisam trabalham em
parceria íntima para definir as necessidades e implementar programas. Isto significa
reestruturar em grande medida a forma como conduzimos a economia. A busca pela eficiência
na alocação de recursos escassos pela primeira vez foi confrontada numa reunião de cúpula,
ou pelo menos relativizada em nome do desenvolvimento global.
Nos últimos anos, o Human Development Report, publicado pelo Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), vem salientando o papel da governança
corporativa e de instituições fortes para fomentar o crescimento econômico. Em 2002, alguns
países da África apresentaram números decepcionantes mesmo após reformas políticas feitas
para assegurar o fortalecimento da democracia. Destacou também a necessidade de cada país
se responsabilizar pelo seu próprio progresso, reduzindo a sua dependência em investimentos
externos e encorajando a poupança interna, além de diversificar sua economia em vez de
contar apenas com poucas commodities. Ressaltou a necessidade de investimentos públicos na
34
área social para atender a demanda das áreas mais carentes da sociedade, e clamou por novas
parcerias nos âmbitos local, nacional e global, para solucionar esse problema.
O relatório expõe ainda a queda da renda per capita em 54 países em
desenvolvimento durante a década de 1990. O Índice de Desenvolvimento Humano, que
sumariza estatísticas sobre saúde, longevidade, educação de padrões de vida etc., caiu em 21
países. As maiores quedas foram na África Subsaariana, países com economias em transição e
na Ásia central.
Obviamente, a concretização dessas medidas passa por questões delicadas
como liberalização econômica e queda de subsídios, principalmente na agricultura, como
demonstraram as negociações durante a Rodada de Doha. Mas para isso servem os fóruns
promovidos pelas diversas organizações internacionais, entre elas a ONU e as instituições de
Bretton Woods.
4 - As Instituições de Bretton Woods
A matriz global de Bretton Woods e suas instituições foram formadas sob
outra configuração de poder, num mundo em que as taxas de câmbio eram fixas e o capital
tinha mobilidade limitada. Instituições financeiras regionais também se desenvolveram,
devido a maior autonomia das diferentes regiões do planeta e às crescentes necessidades
financeiras do desenvolvimento.
Diferentes estratégias para reformas e mudanças foram propostas, com
diferentes implicações. É necessário destacar a eminência das decisões e a imensa
responsabilidade das instituições de Bretton Woods. Por isso mesmo, evidencia-se a
necessidade de reavaliar essas responsabilidades, assim como desenvolver mecanismos mais
eficientes para coordenação entre essas instituições. No entanto, deve-se considerar a essência
coorporativa desse tipo de instituição, o tipo de conhecimento que disseminam e geram os
parâmetros de interação com países clientes e os mecanismos para representação dos mesmos.
As instituições financeiras internacionais também são bancos com responsabilidades frente à
comunidade financeira internacional e investidores.
As três irmãs – o Banco Mundial, O Fundo Monetário Internacional (FMI) e a
Organização Mundial do Comércio (OMC) – são responsáveis pela feitura da política
econômica global. O FMI e o Banco Mundial foram concebidos na Conferência de Bretton
Woods. Nela 44 países aliados na II Guerra Mundial assinaram os artigos do acordo do FMI.
Tentaram estabelecer um sistema monetário internacional que propagaria o pleno emprego, a
estabilidade de preços e permitiria que os países alcançassem balanços externos sem impor
restrições ao comércio internacional.
A idéia de harmonizar as políticas internacionais para melhor lutar pelo
desenvolvimento não é nova e inclui coerência também das políticas de doação. Em 2001, na
conferência ministerial em Doha, uma declaração de coerência foi adotada pelo FMI e OMC.
Mas essa estratégia, apesar de bem aceita, também apresenta riscos. O principal deles é o de
ignorar as particularidades de cada país.
Para muitos, harmonização entre os órgãos pode significar manipulação,
enquanto para outros é sinônimo de cooperação. O medo dos países em desenvolvimento é
que essa aliança seja usada em prol de negociações que abordem temas referentes à legislação
35
trabalhista na OMC, por exemplo, ou que a aliança monopolize todo o trabalho no FMI,
impedindo a criação de fundos monetários regionais, por exemplo.
4.1 Fundo Monetário Internacional
O FMI é a instituição predominante no sistema financeiro global, a tal ponto
que o Banco Mundial se tornou um dos financiadores dos seus programas de ajuste. Ao
contrário do Banco Mundial, o FMI não é um banco de desenvolvimento e não financia
projetos.
Os 184 membros do FMI (2003) possuem direitos e deveres baseados em
“quotas” que devem refletir a posição econômica e financeira dos membros, e que também
deve determinar o nível de contribuição feita ao fundo. No FMI, as decisões estão sempre
condicionadas à concordância dos maiores doadores. São eles: EUA, Reino Unido, França,
China e Alemanha. Os votos com peso, contrários ao sistema one-country-one-vote, gera
bastante polêmica em torno do fundo.
Esse fundo coordena o sistema de pagamentos internacional e as taxas de
câmbio entre moedas nacionais – permitindo a ocorrência de comércio entre países. Suas
principais funções dizem respeito às atividades regulatórias e de supervisão em relação às
taxas de cambio, a regulação e coordenação do sistema internacional de pagamentos e
transferências de transações internacionais correntes, incluindo um bom número de atividades
financeiras.
Objetiva, deste modo, prevenir crises encorajando os países a adotar políticas
econômicas que considera saudáveis, sendo também um fundo que pode ser usado
temporariamente para cobri r déficits na balança de pagamentos dos países, desde que eles
sigam as suas políticas. Trabalha para a expansão do comércio mundial, pregando a
estabilidade das taxas de câmbio, evitando desvalorizações competitivas e corrigindo
problemas com a balança de pagamentos dos países. Para tanto, monitora políticas de
desenvolvimentos econômicos e financeiros, aconselha sobre políticas baseado em sua
experiência, empresta dinheiro (tem cerca de USD 46 bi ou SDR 34 bi - paper gold. Fonte:
IMF Annual Report 1999.), não apenas para resolver problemas imediatos, mas também para
apoiar reformas e políticas que objetivem corrigir os problemas apontados, e dá aos bancos
centrais assistência técnica e treino em diversas áreas do conhecimento. Analisa a
performance macroeconômica dos países e busca dotá-los de altas taxas de emprego, inflação
baixa e crescimento econômico sustentado.
Os chamados “direitos especiais de saque” - DES (Special Drawing Rights –
SDRs) têm um papel particular ao promover a liquidez requerida. O DES é um recurso
alocado aos membros pelo Fundo como um recurso reserva ou para ser usado com a
finalidade de sustentar a moeda. Ele é feito através de “pacotes” de quantias específicas das
moedas mais importantes (Dólar americano, Euro, Yene e a Libra esterlina) e por referência
às suas taxas de câmbio, permitindo aos membros adquirirem moedas “fortes” em relação às
moedas nacionais.
Um ponto que gera controvérsias é a “condicionalidade” dos empréstimos
oferecidos pelo FMI e o Banco Mundial para países em desenvolvimento com dívidas tão
grandes. Sob os chamados “Acordos de Auxílio” (Stand-by agreements) entre o FMI e o país
devedor, este deve formalmente declarar que aceita certas medidas através de reformas
36
econômicas para conter seu déficit na balança de pagamentos. Esta é a condição para o FMI
efetuar o empréstimo, mas não resulta em uma obrigação de tratado. Logo, se o país devedor
não está de acordo com a condição, legalmente ele não está cometendo ato internacional
ilícito. Porém, haverá dificuldade em obter qualquer novo empréstimo das instituições
internacionais, o que de fato torna difícil que um país não concorde com os termos redigidos
pelo fundo.
Esta política de ajustes estruturais requerida, muitas vezes tem conseqüências
dolorosas para a população dos países em desenvolvimento. Se elas são realmente eficazes é
assunto para ser debatido. O que ocorre é que muitos países do Sul sentem que estão sendo
postos sob tutela, e consideram isto uma violação da sua soberania.
4.2 Grupo Banco Mundial
O Banco Mundial é uma das maiores fontes de assistência ao desenvolvimento
do mundo. É uma agencia especializada da ONU, assim com o FMI, com 184 membros (a
sociedade no FMI implica sociedade no Banco), que hoje enfoca primeiramente a redução da
pobreza mediante a promoção do crescimento econômico sustentável nos seus países clientes.
Inicialmente, logo após sua criação, ajudou a reconstruir a Europa depois da Segunda Guerra
Mundial, tendo tal trabalho permanecido como um enfoque importante do Banco Mundial
devido aos desastres naturais, emergências humanitárias e necessidades de reabilitação pósconflitos.
O Grupo do Banco Mundial é constituído por cinco instituições estreitamente
relacionadas e sob uma única presidência. São elas: o BIRD - Banco Internacional para a
Reconstrução e o Desenvolvimento, a AID - Associação Internacional de Desenvolvimento, a
AMGI - Agência Multilateral de Garantia de Investimentos e o CIADI - Centro Internacional
para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos.
Segundo o Banco Mundial, em 2002 foram destinados U$ 19,5 bilhões à
assistência para os paises mais pobres e, em média, cerca de US$ 30 bilhões anuais em
empréstimos para os seus países clientes. Além de financiar projetos, o Banco Mundial
também oferece sua grande experiência internacional em diversas áreas de desenvolvimento,
angaria fundos nos mercados financeiros internacionais para combater a pobreza através do
financiamento de projetos nos países em desenvolvimento, ajuda a atrair investimentos
privados através de co-investimentos, garantias e seguros de risco político e oferece
aconselhamento econômico e técnico aos países membros.
4.3 Organização Mundial do Comércio
No coração do sistema multilateral de comércio estão os tratados e acordos
negociados no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), que garantem aos
signatários certos direitos. Cerca de 97% do comércio mundial passa pela OMC. Ela tem
atualmente 146 membros (dado atualizado pela OMC em 4 de Abril de 2003) e seu principal
objetivo é promover o comércio, ambicionando através deles melhorar o bem-estar da
população mundial.
A OMC tem como funções: administrar e aplicar os acordos comerciais
multilaterais que em conjunto configuram o novo sistema de comércio; servir de foro para as
negociações multilaterais; administrar o entendimento relativo às normas e procedimentos que
37
regulam as soluções de controvérsias; supervisionar as políticas comerciais nacionais. A
autoridade máxima da OMC é a Conferência Ministerial, formada por representantes de todos
os seus Membros e que se reúne pelo menos a cada dois anos.
Seguindo a Conferência de Bretton Woods e a criação das Nações Unidas, uma
carta complementar foi elaborada criando a Organização Internacional do Comércio. Essa
idéia foi rejeitada pelo Congresso norte-americano, temendo a limitação dos Estados Unidos
nas negociações internacionais. Ao invés disso, foi criado então, o Tratado Multilateral sobre
a Liberação de Tarifas – GATT (do inglês General Agreement on Trade Tariffs), com o
propósito de estabelecer princípios gerais e regras para a liberação do comercio internacional
nas bases de um acordo multilateral, através da redução de barreiras alfandegárias e outras
barreiras ao comercio internacional.
O GATT foi complementado por uma dúzia de acordos paralelos, tendo ele
mesmo sido emendado várias vezes em vários protocolos. Após alguns anos o GATT e seus
acordos complementares não podiam mais lidar com questões tão complexas como as
barreiras não-tarifárias ao comércio, levando a criação da Rodada do Uruguai que, através da
“Declaração do Uruguai” criou uma ambiciosa agenda que objetivava a reestruturação do
GATT, incluindo a redução das barreiras não-tarifárias ao comércio, e aumentando a
eficiência do sistema legal para reduzir a falta de cooperação com as suas regras.
A Rodada do Uruguai também pretendia ampliar a área de atuação do GATT
para o comércio de serviços, comércio de propriedade intelectual (TRIPS – Traded Related
Intellectual Property Rights) e investimentos relacionados ao comércio (TRIMS – Trade
Related Investment Measures). A Rodada do Uruguai foi finalmente completada e o
documento final foi aprovado em Abril de 1994, entrando em vigor em 1 de Janeiro de 1995.
O acordo final criou uma nova Organização Mundial do Comércio (OMC).
Depois foram criados acordos importantes como: o acordo sobre serviços de
telecomunicações; acordo de eliminação de tarifas em produtos de tecnologia da informação;
e acordo sobre serviços financeiros. Em 2000 novas negociações começaram na área de
agricultura e serviços, incorporados na Agenda de Desenvolvimento de Doha, Qatar, em
Novembro de 2001. A agenda adiciona negociações e novos trabalhos sobre tarifas a produtos
agrícolas, comércio e meio ambiente, regras da OMC como as que tratam do anti-dumping e
dos subsídios, investimento, política de competição, facilitação do comércio, transparência
nos procedimentos dos governos, propriedade intelectual, e uma gama de assuntos levantados
por países em desenvolvimento como as dificuldades que enfrentam na implementação dos
atuais acordos da OMC.
Todos os acordos da OMC contêm salvaguardas especiais para os países em
desenvolvimento e os menos desenvolvidos, incluindo períodos mais longos para
implementar acordos e compromissos, maneiras de aumentar suas oportunidades de comércio,
e apoio na construção de uma infra-estrutura que possibilite o trabalho da OMC na mediação
de disputas, e na implementação de padrões técnicos, além do envio de missões de
cooperação àqueles países, da promoção de seminários regionais, e de cursos de treinamento.
4.4 Críticas
Os críticos, principalmente os países em desenvolvimento enxergam profundas
falhas no mercado e desequilíbrios na sua regulação, por isso confiam na regulamentação,
pelo menos nos casos de sistemas com governança e transparência. Eles rejeitam a
38
globalização da maneira que é definida e aplicada hoje por acreditarem que sua força esmaga
a diversidade cultural e a autonomia política.
Uma vez que os investidores internacionais e as Instituições de Bretton Woods
muitas vezes presumem que as causas das crises são falhas macroeconômicas e fraqueza
institucional dos países devedores, pouca atenção é prestada ao papel desempenhado pelas
instituições e as políticas nos países credores que influenciaram no desencadeamento de crises
financeiras.
Eles acreditam que, para haver uma globalização justa, é necessário solucionar
o déficit democrático no processo decisório e torná-lo mais inclusivo. Portanto, rogam pela
inclusão dos países em desenvolvimento e das economias em transição no processo de decisão
das Instituições Financeiras Internacionais. Dentro das Instituições de Bretton Woods, o valor
do voto de cada membro é determinado pelas contribuições financeiras feitas. Sendo os países
em desenvolvimento contam hoje com 38% dos votos no FMI e 39% no Banco Mundial35.
Para responder às inúmeras críticas levantadas por todos os lados, as
Instituições de Bretton Woods adotaram medidas para aumentar a transparência, divulgando
os documentos dos projetos e informativos ao público, apesar de serem difíceis de se
encontrar e sempre muito técnicos e escritos apenas em inglês. No entanto, as decisões dos
Conselhos Executivos continuam sofrendo com a falta de transparência, o presidente do
Banco e o diretor do FMI são indicados sem qualquer processo democrático.
Grupos e Organizações Não-Governamentais (ONGs) anteriormente
preocupados com direitos humanos e meio ambiente nos países em desenvolvimento
passaram a focalizar as instituições financeiras internacionais nos anos 1980, criticando o
Banco Mundial por ignorar as conseqüências para o meio ambiente e para população dos
programas de infra-estrutura por ele financiados sem qualquer consulta às pessoas afetadas. O
FMI só passou a ser objeto de críticas quando as políticas desenvolvidas para solucionar as
crises de débito, principalmente após a crise de 1982 no México, falharam. Mas a partir daí
cresceram rapidamente, mormente quando economistas passaram a questionar a liberalização
de mercados que embocaram na Crise da Ásia, no fim dos anos 1990.
O Conselho Executivo do FMI e o do Banco Mundial contam com 24
membros cada, sendo que 8 deles são representantes de 8 países individualmente (EUA,
Reino Unido, França, Japão, Arábia Saudita, Rússia, China e Alemanha) e o restante
representando os 176 demais países. Assim, o continente africano, por exemplo, possui
apenas dois votos.
Os Conselhos Executivos tomam decisões por consenso, sem voto formal.
Poucas agendas detalhando seus programas de trabalho estão disponíveis, mas nada sobre
quem apoiou ou se opôs às decisões tomadas.
O FMI é muito criticado por falhar em prevenir crises, responsabilidade que
está no centro de suas atividades. Os maiores instrumentos para responder à essa função são o
World Economic Outlook (WEO) e os Early Warning Systems (EWS). O primeiro é uma
publicação semestral que descreve as tendências da economia mundial, incluindo previsões de
crescimento para os países membros. O último examina uma série de indicadores de
35
Frank Schroeder. Reform Proposals For The Governance Structures Of The International Financial
Institutions.
39
vulnerabilidade para determinar a probabilidade de um país entrar em crise nos 12-14 meses
seguintes. No período de 1991-2001, das 134 recessões que ocorreram nos países em
desenvolvimento, o WEO e os EWS conseguiram prever apenas 15, e ainda previram o
crescimento do PIB de outras 119 economias que, no entanto, também entraram em crise,
entre elas a do México e a dos países asiáticos.
A política de condicionalidade do FMI, que exige a adoção de políticas
apoiadas pelo fundo com reordenação dos investimentos do país devedor, também é alvo de
desconfiança por parte dos críticos por comprometer a já frágil rede de seguridade social dos
países em desenvolvimento.
Também é requerido o aumento dos empréstimos aos países de renda mediana,
bem como o acesso a empréstimos do fundo em época de crise de liquidez. Parece insensato
que quando se precise do crédito ele não esteja disponível, enquanto é oferecido quando não é
necessário.
O Banco Mundial é criticado por sua agenda, por ser pró-privatização,
liberalização e desregulamentação política. Ele tem ajudado a aumentar o investimento
estrangeiro em países em desenvolvimento, mas basicamente através de corporações
internacionais envolvidas em atividades como mineração e extração de petróleo e gás. Essas
atividades têm profundas conseqüências ambientais e não trazem o desenvolvimento
adequado a população. A crítica observa também a impotência do Banco na aplicação de
sanções em companhias e governos que não atinjam as diretrizes acordadas, não contribuindo
com o desenvolvimento sustentável ou diminuição da pobreza.
Quanto ao acompanhamento dos recursos investidos nos projetos, critica-se a
ausência de um monitoramento da eficácia dos projetos e seu impacto no desenvolvimento. A
ajuda dada pelo Banco é medida em dólares gastos por doador e não por taxas de crescimento
e redução de pobreza alcançada pelos beneficiados.
Outro ponto de intenso descontentamento é o tratamento diferenciado dado a
credores e doadores. O Development Report 2001, do CNUCD, apresenta 4 propostas para um
tratamento mais simétrico entre esses dois sujeitos. Entre elas: maior condicionalidade
instrutiva, acompanhamento das políticas macro-econômicas dos países desenvolvidos e
ações mais ousadas para estabilizar os regimes monetários.
De acordo com o relatório grande parte do problema está nos pacotes feitos
para proteger as moedas dos ataques especulativos ou das importações financeiras para
alcançar as demandas dos credores e manter abertas as contas de financiamento. O fardo cai
sobre os pagadores de impostos dos países devedores, já que os governos acabam assumindo
as dívidas das empresas privadas. Daí a importância de envolver o setor privado na resolução
das crises, atribuindo-lhes a responsabilidade que lhes é devida.
A OMC parece ser o organismo para o qual todos as outras instituições que
tratam do desenvolvimento atribuem as decisões sobre questões concernentes ao comércio,
mais particularmente o crescimento do comércio nos países em desenvolvimento. Estes
alegam que a OMC é apenas um meio de institucionalizar o poder dos países desenvolvidos
sobre eles e que as questões relativas ao comércio que realmente os interessam são sempre
postergadas, enquanto as decisões efetivamente tomadas são de interesse dos desenvolvidos.
Isso foi muito criticado depois da rodada de Doha.
40
Neste diapasão, os países em desenvolvimento estão se unindo em torno de
uma estratégia comum para negociar com os países desenvolvidos e com as organizações
internacionais. Um exemplo disso foi a atuação do G-22, grupo de países em
desenvolvimento liderado por Argentina, Brasil, México, África do Sul, Índia e China, na V
Conferencia Ministerial da Organização Mundial do Comércio realizada em Cancun-México
em Setembro deste ano, quando rejeitaram a resolução elaborada pela União Européia e pelos
Estados Unidos que tratava a questão da agricultura dentro do comércio internacional.
Segundo discurso do próprio Secretário Geral da CNUCD, Rubens Ricupero, "os discursos
foram enfáticos ao estabelecer a prioridade absoluta para a negociação agrícola. Ficou
claro que sem a agricultura, os demais setores não avançarão".
Este grupo de países em desenvolvimento, incluindo muitos países da África,
sentiu que muitos dos países desenvolvidos não estavam dispostos a liberalizar o comércio
agrícola, especialmente os subsídios à agricultura. Eles também estavam preocupados com as
propostas para ampliar as negociações para os investimentos, políticas de competição,
transparência governamental e facilitação do comércio. Os países desenvolvidos, por sua vez,
argumentam que os países em desenvolvimento devem estar dispostos a abrir mais seus
próprios mercados. Eles alegam que a abertura repentina do comércio internacional e o fim de
todos os subsídios e medidas protecionistas prejudicará, sobretudo, os países em
desenvolvimento, devido a fragilidade de seus mercados.
As criticas aos países em desenvolvimento vão mais além. Segundo o próprio
James Wolfensohn, presidente do Banco Mundial, eles querem transformar o Banco Mundial
e o FMI em uma instituição financeira onde o devedor é a parte que dita ao credor como
pagará o dinheiro que tomou emprestado. A União Européia e os Estados Unidos se
perguntam como se pode exigir que um país como o Cambodja, por exemplo, que tem 0,05%
dos votos nas decisões da Diretoria do FMI, tenha mesmo direito de voto que os Estados
Unidos, que exporta aproximadamente 350 vezes mais bens e contribui mais que qualquer
outro país.
Muitos reconhecem a capacidade do FMI em ajudar os países a sair da crise,
através de programas de assistência, dando espaço para os governantes poderem procurar uma
saída para a crise. O ex-ministro da Fazenda do Brasil, Armínio Fraga, afirmou que: “o Brasil
só conseguiu escapar da crise com ajuda internacional, dando oportunidade para o capital
privado se regenerar”.
5 - Ações Prévias da ONU
Um dos princípios da ONU, desde a sua criação, é a promoção de melhores
padrões de vida e de condições para o progresso econômico e social das nações. As Nações
Unidas têm incrível força na promoção do desenvolvimento e vêm desempenhando um papel
fundamental no estabelecimento de um consenso em termos de prioridades e metas. Fez isso
inicialmente em 1960, com uma política baseada em estratégias de 10 anos assinaladas pela
Assembléia Geral, e hoje com as MDGs.
O sistema das Nações Unidas tem diversos instrumentos para promoção dessas
ações, entre eles as agências especializadas que cobrem praticamente todas as áreas de
41
empreendimento econômico e social. Em cooperação com a ONU, elas ajudam a formular
políticas, estabelecer padrões e mobilizar fundos para a promoção do desenvolvimento.
Os programas de assistência ao desenvolvimento são considerados
catalisadores para mudanças, criando condições para o aumento da renda das pessoas.
Também ajudam a criar um ambiente favorável para os investimentos privados e criação de
empregos. Porém, não são as únicas formas de se atingir o problema.
A cooperação entre a ONU e as agências especializadas é feita pelo Conselho
Executivo de Coordenação, que é composto pelo Secretário-Geral, pelos chefes das agências
especializadas, fundos e programas, a Agência Internacional de Energia Atômica e a OMC.
6 - Soluções Propostas
Como já foi dito, as crises internacionais dos anos 90 forçaram a reflexão sobre
o Sistema Monetário Internacional. Parece haver consenso quanto à necessidade de reforma,
porém tanto a matéria quanto a forma provocam grandes discussões. É perceptível a
existência de três correntes: as chamadas liberais, as keynesianas e as mais profundas, que
desejam um novo modelo de desenvolvimento. Os países membros do G-8, adeptos à via
liberal, não vêem problemas com a atual arquitetura do sistema, apenas detecta o seu mau
funcionamento. Portanto, não acreditam que existam problemas com o modelo do
desenvolvimento. Asseveram que a liberalização financeira é um meio de permitir a poupança
necessária ao desenvolvimento e, por isso, defendem o livre fluxo de capitais.
Os adeptos desse ponto de vista liberal propõem medidas visando aumentar a
transparência na gestão de instituições financeiras: a criação de leis mais duras para evitar o
risco moral; um maior influxo de capitais nos “mercados emergentes”, não somente para
recapitalizar bancos em dificuldades, mas para promover a própria incorporação do sistema
financeiro local aos bancos internacionais, em princípio mais eficazes; a criação de linhas de
crédito de precaução no âmbito do FMI; e uma expansão dos poderes do FMI, principalmente
em relação aos países não desenvolvidos, no sentido de maior ingerência (supervisão) nas
políticas internas desses países36.
A visão keynesiana entende que a globalização está gerando desigualdade
social. Algumas propostas apresentadas podem ser interpretadas como uma volta ao sistema
de Bretton Woods, como a restrição à volatilidade do capital e a criação de um banco central
mundial, enquanto outras são mais abrangentes. A taxa Tobin é bastante conhecida e deseja
tributar os fluxos internacionais de capital e assim frear a especulação. Essa medida, no
entanto, exige complemento de políticas nacionais e instrumentos regionais (como fundos de
estabilização) além da instituição de outros impostos visando a justiça tributária incidindo nos
investimentos diretos no exterior e nos lucros das multinacionais.
Essa visão acredita também na necessidade de reforma dos organismos
financeiros internacionais (IFI), de forma que passem a ter uma postura mais compromissada
com o desenvolvimento e, ao mesmo tempo, deixe espaço para diferenças e peculiaridades
nacionais. Assim, ao invés de imporem um modelo de comércio e investimentos comum a
todos os países, deveriam funcionar como instrumentos de cooperação internacional.
36
Ricardo Dathein. De Bretton Woods à Globalização Financeira: Evolução, Crise e Perspectivas do
Sistema Monetário Internacional.
42
Entre as propostas mais profundas, os keynesianos pregam a imposição de
maiores controles aos paraísos fiscais, mais rigidez na supervisão do sistema monetário
internacional, inclusive pela responsabilização das multinacionais pelos prejuízos causados
aos países com as crises financeiras.
Quanto à reforma das IFIs, ao mesmo tempo que assertam sobre a redução do
seu excessivo poder do FMI, Banco Mundial e OMC, sugerem um fundo global para o
desenvolvimento e um fundo de estabilização mundial. Esses fundos seriam financiados pelos
novos impostos.
A terceira modalidade, ainda mais polêmica, quer a mudança do modelo do
desenvolvimento, rompendo com a integração indiscriminada do capital global especulativo
que tornou os países dependentes.
Eles dizem que os fluxos de capital especulativo são realmente um problema,
mas não o principal tema da questão do desenvolvimento. Acreditam que a expansão do
capital especulativo em detrimento do capital produtivo seria resultado da desregulamentação
financeira preconizada pelo FMI e Banco Mundial, deixando os países mais dependentes.
Para eles, o modelo de desenvolvimento atual prega a desregulamentação dos mercados. Eles
criticam esse modelo e ensinam a importância de políticas nacionais de comércio e
industrialização como estratégia a longo-prazo para o desenvolvimento, assim como políticas
de substituição de importações.
7 - Posição dos Blocos
O Consenso de Monterrey, de Março 2002, reafirmou a Declaração de
Johanesburgo em Desenvolvimento sustentável e proporcionou um ambiente para parcerias
entre os ricos e pobres.
A comunidade internacional tem a obrigação de contribuir para que os países
em desenvolvimento melhorem as condições de vida de seu povo, e já que os países têm
capacidades diferentes de contribuir, uns mais, outros menos, é natural que os países ricos
contribuam para o desenvolvimento dos demais. Um dos pressupostos da justiça é tratar
desigualmente os desiguais, pois tratar igualmente os desiguais é aumentar a desigualdade
existente.
7.1 - EUA e G7
A existência de uma só grande potência tem profunda influência na economia
global. Se no plano diplomático e militar a situação dos EUA aponta para um sistema
unipolar, por outro lado, a dimensão econômico-tecnológica configura traços de
multipolaridade. Mesmo considerando as teorias de declínio do Império americano,
Washington continuará a deter uma margem de ação invejável por um bom tempo.
Não há dúvida que é necessário que exista uma instituição internacional
supervisionadora do sistema financeiro mundial. O FMI atualmente não cumpre bem este
papel. Ele perdeu muito da sua relevância para os países desenvolvidos. Nenhum país
industrializado utilizou os empréstimos do FMI desde a metade da década de setenta. Portanto
o seu foco mudou para os países em desenvolvimento, tornando-se um veículo emergencial
43
para as crises econômicas e também um meio de imposição das políticas econômicas
preconizadas pelos seus acionistas majoritários.
Os Estados Unidos continuam sendo o maior beneficiário do sistema
implantado em 1944. Apesar da permissão do FMI de criar os Special Drawing Rights
(SDRs) em 1970, o que viria ao encontro da idéia de Keynes, a economia mundial vive sob os
auspícios do dólar norte-americano. Os SDRs correspondem a três por cento da liquidez
global. Os Estados Unidos continuam sendo informalmente o banco central do mundo.
Sem uma política de cooperação entre as principais potências econômicas, não
haveria funcionamento do atual sistema de taxas de câmbio flutuantes. A cooperação
internacional não é algo incomum e pode ser exemplificada nas rodadas de negociação que
deram ensejo à atual OMC. O G-7 com este objetivo criou um fórum de estabilidade
financeira.
É natural que os Estados Unidos, que designam o presidente do Banco
Mundial, sugiram mudanças na atuação dessa instituição. Há anos que o Congresso norteamericano vem criando obstáculos à atuação do FMI, que considera excessiva. Na sua visão, a
função do Banco Mundial seria apenas a de ajudar na solução dos problemas sociais dos
países pobres e não a de apoiar países emergentes que tenham acesso direto ao mercado
financeiro internacional. E o FMI, na sua opinião, deveria limitar-se apenas a intervenções de
emergência. Transformar o BIRD numa agência de combate à pobreza, exclusivamente, é, de
certo modo, impedir que a pobreza seja eliminada pelo desenvolvimento econômico.
Os membros do G7 acreditam que as políticas nacionais representam grande
parte da possibilidade do sucesso dos programas de desenvolvimento. Assim como apóiam a
maior integração e cooperação dessas instituições e acreditam que o problema está na máaplicação dos recursos direcionados aos países subdesenvolvidos. Por isso propõem maior
transparência na aplicação dos recursos assim como nas próprias instituições. Quanto à
publicidade de votos e relatórios e documentos, o Reino Unido defende o sigilo, enquanto a
França divulga seus votos e participações nas discussões e pede que os outros países do G7
façam o mesmo.
7.2 - Países em Desenvolvimento
Os países em desenvolvimento atestam a limitação das instituições financeiras
internacionais em prever e resolver crises e lutar contra o subdesenvolvimento. Buscam
maneiras de maior integração no mercado global contra os subsídios, barreiras tarifárias e
sanitárias.
Além disso, destacam a necessidade de aumento dos recursos e projetos,
principalmente no âmbito da ONU. Criticam as políticas do FMI, Banco Mundial e OMC por
acharem que são muito generalistas e que não se adequam às particularidades de cada país.
Lutam para que os países desenvolvidos reconheçam sua parcela de culpa pelo
seu subdesenvolvimento e buscam maior democratização e participação nos processos de
decisão em assuntos concernentes a comércio e desenvolvimento.
44
Afirmam que não estão se beneficiando como deveriam da globalização, pois
algumas nações estão impondo certas condições que impedem que todos os países dividam o
trabalho econômico como iguais.
8 - Questões que a Resolução deve Responder e Documento de Posição
A CNUCD tem um papel definido na ordem global. É a única instituição que
lida com o comércio sob a perspectiva do desenvolvimento. Consideramos essencial que os
seguintes assuntos estejam na resolução:
•
O papel atual das instituições de Bretton Woods no sistema monetário e financeiro
mundial para o desenvolvimento das nações;
•
Mudanças estruturais nas instituições financeiras internacionais que favoreçam o
desenvolvimento;
o Participação dos países no processo decisório
o Transparência
o Maneiras de aumentar a eficiência na utilização dos recursos
o Critério de Condicionalidade do FMI
•
De que maneira os países podem contribuir para o trabalho das instituições;
•
A importância das políticas nacionais como apoio das políticas de assistência;
•
Criação de fundos monetários regionais.
Os delegados devem entregar um documento de uma página, para cada tópico antes do início
das sessões. Quanto ao tópico B, deve constar do documento de posição:
•
•
•
Posição do país quanto à reforma das instituições de Bretton Woods (IBW);
Experiência e relacionamento do seu país com as IBW;
Objetivo do seu país nesta conferência.
9 - Conclusão
Houve mais mudanças na humanidade nos últimos 50 anos do que desde a
Idade da Pedra37. Essa velocidade não permite que tenhamos uma orientação, um discurso
ético consistente. Mas linhas-mestras vêm sendo traçadas desde o início das revoluções
burguesas do Século XVIII. O que se busca são condições capazes de manter unida uma
sociedade internacional repleta de contradições. Essa ética se estrutura ao redor dos valores
fundamentais ligados à vida, ao seu cuidado, ao trabalho, às relações cooperativas e à cultura
da não-violência e da paz38.
Ninguém contesta a afirmação de que há algo errado com o modo que
conduzimos a economia do planeta, do contrário não haveria tantas distorções sociais e
desigualdade entre países.
O conflito de interesses entre os desenvolvidos e os subdesenvolvidos é
patente. Como conciliá-los? Em quais pontos as três irmãs devem ser reformadas? Essas
reformas vão privilegiar a quem? Essas e outras questões devem ser respondidas no debate.
37
38
Eric Hobsbawm. Era dos Extremos (Cia. das Letras)
Leonardo Boff. Como fundar a ética hoje? Folha de São Paulo. 15 de junho de 2003.
45
O assunto em foco é bastante rico e extenso, mas também intelectualmente
desafiador. O futuro da humanidade está na estabilização dos conflitos internacionais e no
equilíbrio ambiental, ambos temas tratados dentro da questão do desenvolvimento.
9 - Sugestões para Pesquisa
www.un.org (Site das Nações Unidas)
www.unctad.org (Site oficial da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e
Desenvolvimento)
www.bis.org (Site do Bank for International Settlements)
www.brettonwoodsproject.org (Site da Central de Noticias sobre as Instituições de Bretton
Woods)
www.bancomundial.org (Site do Banco Mundial)
www.undp.org (Site do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento)
www.imf.org (Site do Fundo Monetário Internacional – FMI)
www.wto.org (Site da Organização Mundial do Comérico – OMC)
www.oecd.org (Site da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico)
www.economist.com (Site da Revista “The Economist”)
www.cfr.org (Site útil para pesquisa da posição dos países)
www.developmentgateway.org (Site do Development Gateway)
www.mofa.org (Site com links para Ministérios de Relações Exteriores)
10. Referências Bibliográficas
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BOBBIO, Norberto. Igualdade e liberdade. 5.ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002.
BOFF, Leonardo. Como fundar a ética hoje? Folha de São Paulo. São Paulo, 15 de junho
de 2003.
DATHEIN, Ricardo. De Bretton Woods à Globalização Financeira: Evolução, Crise e
Perspectivas
do
Sistema
Monetário
Internacional. Disponível em:
http://www3.ufrgs.br/decon/hp/publionline/textosdiscussao/texto052003.doc. Acesso em:
14/09/2003.
DRUCKER, Peter. O homem. São Paulo: Exame, 1993.
HAKURA, Dalia S. NSOULI, Saleh. The Millenium Development Goals, the emerging
framework for capacity Building, and the role of the IMF. IMF Institute. Washington: 2003.
HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos. São Paulo: Cia. das Letras, 1995.
IBRD. Global Economic Prospects and the Developing Countries 2003. World Bank.
Washington. Disponível em: http://worldbank.org/prospects/gep2003/front.pdf. Acesso em:
14/09/2003.
MACHADO, Luis Fernando Corrêa da Silva. A reforma das Instituições de Bretton Woods:
recentes reformas no âmbito do Fundo Monetário Internacional. Curso de Direito da UFSM.
46
Santa Maria/RS. Disponível em http://www.ufsm.br/direito/artigos/internacional/reforma.htm.
Acesso em: 09/09/2003.
PINHO, Diva B; Marco Antônio S. (org.). Manual de Economia. 2.ed. São Paulo: Saraiva,
1992.
SENE, Eustáquio. Moreira, João Carlos. Geografia Geral e do Brasil. São Paulo: Scipione,
1998
SCHROEDER, Frank et al. Reform Proposals For The Governance Structures Of The
International Financial Institutions. New rules for global finance. Disponível em:
http://www.un.org/esa/coordination/ecosoc/Schroeder.pdf. Acesso em: 13/09/2003.
UNDP. Human Development Report. UNDP. New York: Oxford University press.2003.
Keynes, John Maynard. The General Theory of Employment. New York: Columbia Univ.
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Disponível em: www.cnuced.org/templates/webflyer.asp. Acesso em 10/09/2003.
UNESCO. An agenda for the future: Americas Model United Nations. Brasília: UNESCO,
2003.
WONNACOTT, P. WONNACOTT, R. Economia. 2.ed. São Paulo: Makron,1994.
47

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