Vol. 19 | N.º 3 | 2010-ISSN 0871-6099. Revista da Sociedade
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Vol. 19 | N.º 3 | 2010-ISSN 0871-6099. Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia FICHA TÉCNICA EDITOR Lucindo Ormonde EDITORES ASSOCIADOS Isabel Aragão, Rosário Orfão CONSELHO EDITORIAL Jorge Tavares, Rui Araújo, Jorge Reis, Cristina Granja, Pedro Amorim, Fernando Vale, Joaquim Viana, José Manuel Caseiro, Manuel Seabra, Figueiredo Lima, Pedro Branca, Carlos Bento DIRECÇÃO DA S.P.A. Presidente Lucindo Palminha do Couto Ormonde Vice Presidente Isabel Maria Marques de Aragão Fesch Secretariado Maria do Rosário Lopes Garcia Matos Orfão Tesoureiro Maria de Fátima da Silva Dias Costa Gonçalves Vogal Rui Nuno Machado Guimarães ASSEMBLEIA GERAL Presidente José António Bismarck de Melo 1º Secretário Maria do Rosário Santos Rocha Tavares Fortuna 2º Secretário António Manuel Coelho Marques Costa CONSELHO FISCAL Presidente Maria Manuela Marques Proença 1º Vogal Pedro Augusto da Conceição Santos Garcia 2º Vogal Maria Luísa Graça Teixeira Almeida Gomes S.P.A. World Trade Center Av. do Brasil, 1, 5º, Sala 6 1749-008 Lisboa Tlm. 913 609 330 E.mail: [email protected] PUBLICIDADE Media Style, Publicidade e MArketing, Lda Rua Palmira Bastos, 7, 7ºA 2810-262 Almada Tel. (00351) 212 500 347 Fax. (00351) 309 992 878 Tlm. (00351) 969 230 224 E.mail: [email protected] Geral: [email protected] ISSN 0871-6099 Tiragem: 2500 exemplares - Publicação Periódica Propriedade e Administração da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia Depósito Legal nº 65830/93 Preço avulso: 7,5¤ / número Assinatura: 6 edições / 35¤ Distribuição Gratuita aos Sócios da S.P.A. Vol. 19 | N.º 3 | 2010-ISSN 0871-6099. Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia ÍNDICE 03 FICHA TÉCNICA 04 EDITORIAL, Dr. José Martins Nunes 06 ERRO MÉDICO E SEGURANÇA, José Fragata 07 EVENTOS CRÍTICOS - TREINO DE EVENTOS NA EMERGÊNCIA, Humberto Machado 09 BIOGRAFIA DA SIMULAÇÃO BIOMÉDICA NO MUNDO E EM PORTUGAL, Viana Jorge 12 A SIMULAÇÃO BIOMÉDICA COMO INSTRUMENTO DE ENSINO, Francisco Matos, A. Augusto Martins, Mafalda Martins 15 INTEGRAÇÃO CURRICULAR DA SIMULAÇÃO MÉDICA - EXPERIÊNCIA DINAMARQUESA, Doris Østergaard, Anne Lippert, Peter Dieckmann 18 GESTÃO DE EVENTOS CRÍTICOS EM ANESTESIA (ACRM), Luciane Pereira, Joana Carvalhas 20 PODEMOS TREINAR CATÁSTROFES BIOLÓGICAS, QUÍMICAS E RADIOLÓGICAS COM SIMULAÇÃO? Ângela Garcia, Carlos Seco 23 PARCERIA ENTRE ESPECIALIDADES, UMA EXPERIÊNCIA - PROGRAMA EMERGÊNCIAS OBSTÉTRICAS DO CSB, Joana Carvalhas, Isabel Santos Silva, Fernando J. Costa 25 ASPECTOS ÉTICOS / MÉDICO-LEGAIS, Guilherme de Oliveira 27 NORMAS DE PUBLICAÇÃO Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 03 EDITORIAL J. Martins Nunes ( Director do Centro de Simulação Biomédica Hospitais da Universidade de Coimbra ) Segurança do doente A segurança dos doentes e o prevenir da face negativa da realidade - o erro em Medicina são hoje, uma e outra, exigências de cidadania e preocupações dos Governos modernos. São temas actuais e relevantes, que preocupam as pessoas e as entidades com intervenção na Saúde. Foram trazidos para o centro das preocupações das partes interessadas em políticas e resultados de Saúde, através de dois relatórios publicados na década passada pelo Institute of Medicine (IOM, componente da Academia Nacional de Ciências dos EUA). Mais recentemente (2000) foi publicado um relatório “To Err is Human: Building a safer Health System” onde se afirma “Health care in the United States is not as safe as it should be and can be. At least 44,000 people, and perhaps as many as 98,000 people, die in hospitals each year as a result of medical errors that could have been prevented, according to estimates from two major studies”. Em Fevereiro de 2009 a União Europeia recomendou aos países membros um enfoque muito especial nos programas de Segurança do Doente, e em Portugal a Direcção Geral de Saúde criou em 2009 uma Divisão de Qualidade e Segurança do Doente. As equipas e as lideranças O sucesso do trabalho clínico está cada vez, mais dependente das equipas e da sua liderança, do que, individualmente, de cada um dos seus membros. Daí que urge, para além da formação individual, concentrar o ensino e o treino nesta nova perspectiva; o 04 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 desempenho das equipas e da sua liderança são cruciais, suplantando a soma das competências individuais dos seus membros. A Simulação Médica é um moderno instrumento de treino, simultaneamente ético e compreensivo, que procura nas melhores práticas e nas melhores atitudes, a linha condutora desta moderna “alavanca” para o conhecimento. A Anestesiologia e a Simulação Médica Porque a Anestesiologia é a área médica que mais frequentemente lida com eventos críticos, e onde o treino de equipa e das lideranças têm maior exigência, tem sido em todo o mundo o berço do desenvolvimento do ensino através da simulação. Os Anestesiologistas detêm mais do que quaisquer outros especialistas um intervenção abrangente sobre eventos críticos, quer estes se situem na Emergência, na Medicina Perioperatória ou nos Cuidados Intensivos. As competências técnicas adquiridas pelos Anestesiologistas, têm obviamente uma notável repercussão clínica nas mais diversificadas áreas de intervenção e a Simulação Médica é a única ferramenta pedagógica que possibilita um treino de equipa inter e pluridisciplinar, incluindo os eventos críticos raros. A evolução da confiança perante um evento crítico, o tempo de retenção cognitiva e as atitudes terapêuticas, são determinantes no sucesso da intervenção. A Simulação como Instrumento de ensino O treino em ambiente de simulação é um treino ético e sem risco, quer para o formando quer para o doente. Países Europeus e Americanos estão a traçar um caminho seguro e com resultados visíveis, na utilização da simulação médica nos programas de internatos médicos e na certificação de competências. A experiência dinamarquesa, é um excelente exemplo de como fazer a integração do treino através da simulação, no programa de internatos complementares de Anestesiologia e na actualização periódica dos especialistas. No momento em que o acesso a armas de destruição maciça constitui um risco até para os pequenos países como Portugal, há que adaptar a formação contínua aos biodesastres. Também aqui, a Simulação Biomédica é um excelente meio de formação de equipas e de lideranças. Os cuidados críticos e as emergências em Obstetrícia, Pneumologia e Cardiologia, entre outros, conquistaram neste tipo de formação, um papel muito especial e simultaneamente uma oportunidade invejável. A simulação biomédica evolui para outras áreas de especial interesse - gestão de crises, gestão de conflitos e gestão de equipas - com inegável valor acrescentado. A Anestesiologia, pelas competências que detém na “Emergência Médica”, nos “Cuidados Intensivos” e na “Medicina Perioperatória”, dá um contributo indiscutível em todo o mundo moderno ao desenvolvimento de Centros de Simulação Biomédica. O Centro de Simulação dos Hospitais da Universidade de Coimbra O Centro de Simulação Biomédica dos Hospitais da Universidade de Coimbra nasceu por uma iniciativa da Anestesiologia e com uma particularidade: não tem capitais públicos. Todo o investimento foi proveniente de Fundações; inicialmente das Fundações Calouste Gulbenkian e EDP. Posteriormente da Fundação Luso-americana para o Desenvolvimento e da Fundação Bissaya Barreto. Os seus parceiros estratégicos foram crescendo, sendo hoje o CSB uma unidade com capacidade formativa nas áreas da Anestesiologia, Cuidados Intensivos e Emergência, assim como em cuidados críticos de Obstetrícia, Pneumologia e Cardiologia. Os parceiros científicos e a colaboração com outros Centros de Simulação Europeus e Americanos têm vindo a aumentar e o CSB dos Hospitais da Universidade de Coimbra poderam formar os seus instrutores nas melhores escolas mundiais, como são os casos de Harvard Medical School Simulation Center e do Instituto Dinamarquês de Simulação Médica. Isto é uma demonstração clara e inequívoca de como os hospitais públicos não estão esgotados na sua capacidade de atrair investimentos da Sociedade Civil dentro da sua responsabilidade social e de criar “Clusters” simultaneamente de excelência e de dimensão Europeia, como é o caso. A Sociedade Portuguesa de Anestesiologia e o Colégio da Especialidade têm estado presentes com o seu importantíssimo patrocínio científico, em alguns dos cursos aí desenvolvidos. Os Hospitais da Universidade de Coimbra podem estar orgulhosos do contributo que estão a dar ao País e ao desenvolvimento da formação através do conhecimento, pela simulação médica. Mas a Anestesiologia Portuguesa também tem que se orgulhar por ter aqui uma área de grande inovação e diferenciação técnica, que pode utilizar aliando as melhores práticas ao treino ético e à simulação de alta-fidelidade. Com os cumprimentos J. Martins Nunes Coimbra 12.04.10 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 05 SEGURANÇA DO DOENTE “PATIENT SAFETY” * * Fragata, José Director CRI - CCT - Hospital de Santa Marta. Professor Catedrático de Cirurgia FCM - UNL A segurança dos doentes que recorrem aos cuidados médicos entrou na ordem do dia, sendo hoje uma das facetas da dimensão da Qualidade na Saúde. Herdada de Hipócrates, no seu “primum non nocere”, a dimensão da Segurança estaria contudo esquecida numa actividade que sempre se tomou como benfazeja, atribuindo ao mau destino da doença e nunca por nunca aos profissionais, a causa para os desfechos menos felizes. Uma maior consciência dos direitos dos cidadãos, a par com a extensão dos cuidados, numa dimensão de massas, a dimensão industrial da Saúde, agora também negócio, criaram uma cultura de exigência por parte de doentes e famílias, dos pagadores e prestadores e, bem entendido, da Sociedade - os Media e a Justiça passariam a tomar parte neste universo de actividade, que passava do recato intimo da cabeceira dos doentes para as primeiras páginas da opinião, e nem sempre pelos melhores motivos... Tudo isto enquanto a Medicina evoluía de uma prática a solo, pouco eficaz, pouco cara e pouco perigosa, para uma c o m p l e x a a c t i v i d a d e , e x e rc i d a e m e q u i p a s pluridisciplinares, com elevada eficácia e enorme dispêndio, mas um enorme potencial para induzir danos colaterais. Desse risco trata hoje a gestão da Segurança dos Doentes. A “Patient Safety” está intimamente ligada à redução dos erros (desvios do resultado esperado) no Sistema de Saúde, com o intuito de minimizar as consequências sobre os doentes, melhorar a confiança e a reputação nos profissionais e nas instituições e, last but not least, reduzir custos e ineficiências. É que, tratar com complicações sai muito mais caro... Por todas estas razões a segurança dos doentes interessa a todos os interventores na Saúde e deve ser preocupação primeira dos seus profissionais, a quem a liderança desse controle deverá caber, como imperativo hipocrático e necessidade absoluta de controlo de performance. A ocorrência de danos colaterais ocorre em cerca de 10 em cada 100 internamentos, felizmente a maior parte das vezes sem consequências sérias, mas estima-se que cerca de metade dos efeitos adversos em Medicina poderiam ter sido evitados. A ocorrência de danos é transversal a todas as especialidades mas mais provável e potencialmente danosa nas de alto domínio tecnológico. A ocorrência de eventos adversos em Medicina tem, do lado do prestador, causas humanas (factores humanos) em cerca de 60 % dos casos, facilitadas por defeitos da 06 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 organização (factores do sistema) em 30 % dos casos, e causas indeterminadas, que poderemos atribuir à natureza incerta da Medicina na sua dimensão de “Complexidade” e que atribuiremos ao acaso; A dimensão equipa, ponte entre os factores humanos e a organização, contribui para a segurança ou insegurança dos cuidados, num momento em que cada vez mais os resultados se atribuem ao desempenho das equipas e o treino na Saúde se vai movendo cada vez mais dos indivíduos para os grupos actuantes ou equipas. Na vertente da tarefa, a dificuldade dos doentes (comorbilidades, avanço das doenças), o tipo de intervenção e as condicionantes locais e do momento (staff, pressões, etc.) desempenham um papel fundamental para o resultado final (complicações). Para uma melhor promoção da segurança parece fundamental promover uma verdadeira consciência de risco, nos profissionais e nas instituições, que nos leve a reportar erros sem a tradicional atmosfera de culpa, antes como consequências de um mau desenho organizacional que, numa perspectiva de aprendizagem e de responsabilidade, todos queremos melhorar. Em resumo uma Cultura de Segurança (cultura “Just”) Que aos doentes seja dada total revelação do que com eles se passa de Bem e, sobretudo, de Mal, com verdade e responsabilidade, para que a confiança prevaleça no Sistema e nos Actores. Isto em muito reduziria o agastamento e litigação que frequentemente rodeia os insucessos da Medicina. Se mudarmos a cultura e a prática conduziremos o exercício da Medicina a uma fiabilidade que existe, por exemplo, na aviação civil, onde desde cedo a gestão de erros foi colectivamente assumida como oportunidade de aprendizagem e mecanismo de promoção de maior segurança. Não tenho dúvidas de que a dimensão de Segurança dos Doentes e a boa gestão do seu Risco se transformará no grande desafio diferenciador da Qualidade e Eficiência entre práticas médicas no século XXI - um desafio que cumpre a nós pessoal de Saúde liderar, interpretando mais do que o clássico mandato hipocrático, um moderno dever de Auto-Regulação e a dimensão lata de Profissionalismo, com que garantiremos os superiores interesses dos doentes que nos são confiados e, também, a independência desta nobre profissão de Esculápio. SEGURANÇA, EVENTOS CRÍTICOS E LIDERANÇA EM ANESTESIOLOGIA * * Machado, Humberto Presidente do Colégio de Especialidade de Anestesiologia A Anestesiologia é provavelmente a especialidade que mais frequentemente lida com problemas ou potenciais problemas críticos. Este facto coloca os Anestesiologistas numa posição tal, que a sua cultura de segurança poderá fazer a diferença entre a vida e a morte de um doente. A aquisição de competências na área da segurança técnica deve ser uma das áreas estruturantes na formação dos futuros especialistas. A responsabilização durante o internato de especialidade, e a forma sistemática com que os médicos internos devem ser instados a pronunciarse e evidenciar as suas aquisições formativas nesta área, deverá constituir uma prioridade e preocupação constante para quem tem à sua responsabilidade, médicos em formação. A cultura de segurança inerente ao Anestesiologista não se esgota no cumprimento das normas preconizadas para encetar determinado acto ou prática. Os conhecimentos adquiridos, simulados, e praticados devem constituir uma base para que em novas situações, o especialista em Anestesiologia possa antever eventuais eventos críticos. No fundo, não será possível antever que algo poderá correr mal, se nunca se esteve exposto a uma situação idêntica ou afim. A capacidade de um médico poder prever que algo poderá acontecer traduz experiência, maturidade clínica e acima de tudo cultura de segurança. Aliar estes conceitos a um especial bom senso configurará a excelência do desempenho do Anestesiologista. Será possível enumerar vários exemplos de eventos críticos que, de forma muito útil, deveriam ser exaustivamente simulados, treinados e subsequentemente avaliados do ponto de vista do desempenho por parte do médico. O facto de a Anestesiologia ser uma especialidade tão abrangente quanto o efectivamente é, com áreas de intervenção tão diferentes como o bloco operatório, a medicina da dor, a emergência médica, a medicina intensiva e a medicina peri-operatória, fazem dela uma especialidade com um terreno muito amplo para que ocorram eventos adversos. Em concreto, poderá ser útil, por razões de sistematização, pensar em eventos clínicos (por exemplo seguindo o ABCDE da ressuscitação ou do trauma), eventos relacionados com fármacos, ou com equipamentos. Por vezes, no âmbito da grande diversidade de possibilidades poderia ocorrer uma qualquer dispersão de atenção sobre o que realmente é essencial. Assim, considera-se haver lugar a um especial enfoque nestas áreas, sendo manifesta a mais-valia que se conseguiria atingir, se fosse possível transmitir aos futuros especialistas a necessidade de atentarem a eventuais problemas nos pontos que se enumeraram: via aérea, ventilação, circulação, disfunção, exposição, problemas com fármacos, problemas com equipamento. Apesar do anteriormente referido relativamente ao essencial dos eventos críticos, parece ser prudente adicionar uma preocupação acrescida a determinados tipos de doentes. Do ponto de vista de impacto psicológico sobre o profissional, apesar do discutível e arbitrário que tem este conceito (uma vez que todos os doentes são importantes), a ocorrência de eventos críticos é mais difícil de gerir em doentes que expectavelmente não deveriam ocorrer; ou seja, o doente ASA 1, não deverá ter complicações, sendo que se estas ocorrerem, terão claramente um impacto quantitativamente mais manifesto, que por si só poderá agravar o próprio evento. A título de exemplo poderia colocar-se a seguinte pergunta: Será que vou conseguir tratar um broncospamo com hipoxémia grave, de forma tão efectiva e expedita num doente saudável sem qualquer patologia prévia que está a ser intervencionado a uma situação cirurgicamente simples, quando comparada com um evento idêntico num doente com patologia respiratória conhecida a ser intervencionado a uma patologia especialmente complicada ou grave? Parece ser exactamente a aproximação destas práticas que materializa o que se denomina como cultura de segurança; ou seja, apesar de em ambos os doentes os meios necessários à intervenção deverem estar ampla e consistentemente preparados, o pensamento de que o improvável poderá sempre acontecer, deve estar presente na mente do Anestesiologista. Não se trata de não dar um passo com receio constante do improvável, trata-se apenas acautelar o espírito para que as surpresas não nos surpreendam. A formação pós-graduada constitui-se como um período em que o médico adquire competências, modifica comportamentos e acima de tudo interioriza uma cultura inerente à sua especialidade. Para este percurso concorrem diversos tipos de ensino; em concreto, o médico aprende muito observando os colegas mais diferenciados, e, por imitação, replica práticas que vê executadas por outros. Nas últimas décadas têm crescido os modelos de aprendizagem que se socorrem da simulação para atingir os vários objectivos de aprendizagem. Como exemplo Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 07 Segurança, Eventos Críticos e Liderança em Anestesiologia poderíamos lembrar os cursos de suporte avançado de vida, de trauma, entre outros. A utilização de manequins cada vez mais sofisticados e com capacidade para cada vez mais mimetizar situações reais permite, por um lado, o treino em situações críticas muito próximas do real, aliando-o à importância da necessidade de liderança, dinâmica de equipa e comunicação nestas situações. Por outro lado, estamos a treinar actuações em situações não reais, portanto sem causar dano a doentes. De resto, uma das características mais importantes da aprendizagem dos adultos é o facto de estes aprenderem e apreenderem primordialmente aquilo que lhes interessa, ou seja aquilo que sabem vir a ser-lhes útil. A simulação de eventos críticos, com características claramente de emergência médica, incorpora também um outro factor manifestamente importante para o Anestesiologista; ou seja, ensina também a gerir a potencial incapacidade de não conseguir manter a calma, num evento crítico, com o subsequente desfecho negativo, neste caso a morte do doente. É claramente mais difícil coordenar uma equipa de ressuscitação, se em nenhum momento anterior ao caso real, este papel não foi cabalmente treinado, desempenhado e ensinado. A gestão pessoal do stress em caso de ocorrência de um evento crítico deve ser obrigatoriamente treinada, a formação dos médicos Anestesiologistas deve incluir formalmente este ponto. Existe evidência, em vários países europeus, de que em alguns hospitais, mesmo os Anestesiologistas mais experientes são consistentemente expostos a formação que inclui esta vertente. Não deve existir a tentação de enveredar pelo juízo de valor, perante uma eventual obrigatoriedade de atender, com uma certa periodicidade, a uma qualquer acção de formação/actualização de gestão de eventos críticos; ou seja, existem claras vantagens em dotar o capital humano de um determinado serviço ou departamento de capacidades e atitudes que vão no sentido da excelência na resolução e abordagem de eventos críticos. Um dos exemplos que é largamente aceite na Anestesiologia prende-se com a gestão da via aérea; ou seja, se forem atendidos os números existentes sobre a causa mais frequente de mortalidade de causa anestésica (deficiente gestão global da via aérea), rapidamente se conclui que é particularmente vantajoso que a maioria ou totalidade dos Anestesiologistas de um serviço ou departamento tenham formação, experiência e proficiência com as várias técnicas actualmente existentes e uma cultura de abordagem do problema actualizada e segura. A Anestesiologia, como Especialidade especialmente abrangente, tanto clínica como de intervenção, consubstancia o treino para a liderança de equipas médicas. Este conceito é tanto mais importante quanto 08 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 mais críticos forem os eventos. Em situações de emergência não existe margem de manobra, nem tempo, para idealizar uma actuação; as acções devem estar treinadas e interiorizadas, especialmente as acções de liderança que devem ser observadas pelo Anestesiologista, no pleno da sua actividade clínica. Consensualmente considera-se que um líder é uma pessoa que tem a preocupação de manter a atenção no resultado final de uma determinada acção. Tenta reunir os esforços do grupo para que o desfecho cumpra determinados objectivos, muitas vezes os objectivos a que se propuseram. Acresce que na maioria das vezes, o verdadeiro líder tem a capacidade de antever ocorrências que o grupo não vislumbra; é uma certa capacidade de observação de um ângulo mais abrangente, que lhe possibilita ver mais e ver mais além. O grupo respeita tanto mais o líder quanto mais este conseguir transmitir estes conceitos e aptidões. A liderança é uma relação entre líder e liderados, pelo que existem “papeis” a desempenhar, com especial importância para aquele que pugna para que a soma das partes seja superior ao seu valor individual. Numa equipa de profissionais de saúde, cuja acção se destina a um determinado doente/resultado, e que tal passa por uma intervenção potencialmente adversa, parece ser claro que deverá haver uma consciência, uma liderança, alguém com a capacidade de prever um eventual evento crítico que poderá desembocar num desfecho adverso. Nas especialidades que habitualmente intervêm considera-se que a Anestesiologia é a que está melhor posicionada para assumir esta função. A formação, a maturidade clínica, a abrangência dos conhecimentos, das atitudes e dos comportamentos, são dos principais factores que consubstanciam esta liderança clínica. O grande objectivo do treino do Anestesiologista é a integração global dos conhecimentos e actuações perante situações especialmente adversas, tentado antever e evitar o erro potencial que poderá sempre surgir; a cultura de segurança que, de forma inerente, se treina ao longo do internato constitui uma enorme mais-valia para o doente, existindo plena consciência do valor que se acrescenta, ao desfecho de um eventual evento crítico que possa ocorrer. Dezembro 2009 UM OLHAR SOBRE A SIMULAÇÃO BIOMÉDICA * Jorge, João Huet Viana* Engenheiro químico (FEUP) Doutor em Psicologia (FPCEUP), membro do CPUP (Centro de Psicologia da UP) Nascimento na Anestesiologia A visão que se apresenta é centrada na simulação dinâmica, geralmente considerada a mais significativa dos pontos de vista didáctico e cognitivo, entendida como a representação de um sistema que evolui por si próprio mas também em função das acções do operador que sobre ele actua. Um antecessor precoce (quintain ou quintaine provavelmente com origem no quintana latino) destes dispositivos foi usado pelos romanos para treino de guerra: era um alvo rotativo que quando golpeado erradamente ou em desacordo com as indicações do instrutor, pela lança do guerreiro, devolvia a este uma pancada no dorso (Petit Larousse, 1926). Foi na aviação (civil e de guerra) que apareceram os primeiros simuladores (de voo) incluindo essa funcionalidade dinâmica, no decurso da segunda década do séc. XX. No que à Medicina se refere a simulação dinâmica nasceu na Anestesiologia em 1967, em Los Angeles. O primeiro simulador médico, (SIM 1) foi desenvolvido e apresentado, pelos seus criadores (Judson Denson e Stephen Abrahanson), como auxiliar na aprendizagem na indução da anestesia e entubação, provavelmente por prevalecer na altura a convicção de que os incidentes tendiam a 1 ocorrer naquele início. Consistia em um manequim, construído com tecnologia de ponta para a época e incluia uma via aérea, a parte superior do torax e braços. Suportava injecções intravenosas, permitia a medição da pressão arterial, a auscultação de batimentos e sons cardíacos, pulso carotídeo e temporal; exibia movimentos respiratórios, abria e fechava a boca, piscava os olhos, “respondia” a quatro drogas endovenosas e a dois gases (O2 e N2O) administrados por entubação ou máscara. Comandava o manequim um computador de enormes dimensões, e, como o manequim, de tão elevado custo que esse conjunto de características limitou fortemente o seu uso, impediu a difusão e posteriores 2 desenvolvimentos. Em 1968, na Florida (Miami), foi desenvolvido um simulador (“Harvey”), destinado à cardiologia com inovações cruciais para o desenvolvimento posterior desse tipo de simuladores, pôde ser comercializado e difundido e despoletou a publicação de trabalhos de investigação sobre a simulação dinâmica no domínio dos cuidados de saúde. Evolução Na década de 40 do séc. XX as mortes atribuídas ao acto anestésico cifravam-se, nos EUA, em 1 para 2500 1 operações tendo descido e estabilizado na década de 60 em 1 ou 2 para cada 10000 operações. Estes dados não impediram um forte incremento dos custos dos seguros dos anestesistas nem a percepção, por eminentes e dedicados especialistas, de se estar perante números injustificadamente elevados. Em virtude dessas constatações a unidade de bioengenharia do Massachussets General Hospital contratou em 1972 um então jovem engenheiro químico (Jeffrey Cooper, hoje professor de Anestesiologia) com o propósito de criar máquinas destinadas aos investigadores daquela especialidade. O trabalho de Cooper, baseado numa técnica usada na aviação desde os anos 50 e designada de “análise de incidentes críticos” foi o primeiro olhar 3 aprofundado e científico para o erro em Medicina. Concluiu, entre outras coisas, que a tendência ao aparecimento de incidentes anestésicos graves se acentuava durante a manutenção da anestesia quando a vigilância tendia a desvanecer-se e que a principal estratégia para a detecção e protecção de incidentes consistia na melhor formação complementar dos anestesistas, o que o levou a procurar dispositivos que aperfeiçoassem essa formação. Com o ambiente assim criado e o seu próprio interesse no desenvolvimento da performance humana, em especial na “pesquisa sobre a cognição clínica em domínios dinâmicos” , como é o caso do acto anestésico, Gaba, professor de Anestesiologia em Stanford, criou em 1986 o primeiro simulador com manequim de alta-fidelidade que pôde ser difundido. As características físicas do manequim (Compreensive Anesthesia Simulation Environnment - CASE) representando um humano em tamanho natural, incluíam as do SIM 1 e apresentavam outras novas como anatomia da via aérea podendo simular vários graus de dificuldade na entubação, pulmões que Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 09 Jorge et al. imitavam o comportamento na ventilação espontânea e controlada, olhos a abrir e fechar, movimentos do polegar tal como usados na monitorização do bloqueio neuro4 muscular durante a anestesia… Os modelos fisiológicos, entretanto estabelecidos por Howard Schwid na Universidade da Califórnia - San Diego, foram introduzidos também em modelos e numa simulação correndo apenas em ecrã de computador (screen-based), o Anesthesia Simulator Consultant - ASC - posteriormente Anesthesia Simulator. Incluíam esses modelos (fisiológicos) as funções respiratória e cardiovascular, o equilíbrio ácido/base e a farmacocinética e farmacodinâmica em diversos estados patológicos. A utilidade do modelo de simulador de Gaba (e o mérito do autor) não residiu apenas nas características técnicas do simulador criado. Baseado nas suas pesquisas em 3 simulador e no real, Gaba estabeleceu um modelo dos processos cognitivos e das suas ligações, desenvolvido a partir dos níveis de desempenho SRK (skills, rules, knowledge) de Rasmussen. Posteriormente, reconhecendo que, como na aviação, incidentes fatais ocorriam mesmo com especialistas que dominavam os conhecimentos adequados para os evitar ou reverter, residindo a falha no sistema ou na dinâmica de grupo, adaptou o método de treino em simulador “Crew Resource Management” da aviação, aos cuidados de saúde, com o nome de “Crisis Resource Management” - CRM, actualmente em uso em diversos domínios da medicina e centros de simulação biomédica; e prosseguiu com o estudo da melhor forma de explorar o instrumento que criara, incluindo o debriefing actualmente aceite como uma fase das sessões de simulação mais produtiva, em termos de aprendizagens, do que a condução das operações simuladas. Pouco depois do simulador de Gaba, Michael Good e Joachim Gravenstein da Universidade da Florida criaram o Gainsville Anesthesia Simulator (GAS) que veio a originar o bem conhecido HPS (Human Patient Simulator) da METI Inc. A partir da invenção ou reinvenção de Gaba, o número de centros de simulação usando simuladores de alto nível disparou: contavam-se 9 em 1994, 122 em 1998, 507 em 2005 dos quais 356 nos EUA. Na página do Bristol Medical Simulation Center podiam contar-se em 2008, 107 na Europa, 82 criados depois de 2000 e verificar que não há continentes sem centros de simulação. É a um cirurgião, já nomeado (Atul Gawande), que se deve muito do que fica dito no que se considera a mais impressiva e até comovente descrição do pioneirismo e liderança dos anestesiologistas na reversão de incidentes críticos, no estudo do erro médico na perspectiva da sua prevenção, na criação, desenvolvimento e exploração da simulação dinâmica com vista a potenciar a formação individual e colectiva, de modo a reduzir incidentes e ou 1,5 revertê-los. Em Portugal Tanto quanto foi possível saber o aparecimento da simulação dinâmica, quer manequin-based quer screenbased, no país, ocorreu em 1999, via apresentação verbal ao Serviço de Anestesiologia do H. S. João, do manequim de alta-fidelidade da METI Inc. por Willem Van Meurs e da aquisição que fizemos do Anesthesia Simulator version 3.0 que proporcionou que dois internos e dois especialistas se dispusessem a conduzir, com esse software, anestesias simuladas. Até ao início da actividade do Centro de Simulação dos HUC, se exceptuarmos a ligada à obstetrícia, na qual se centra muito o CSB da FMUP, as iniciativas envolvendo a simulação dinâmica mereceram dos anestesistas uma adesão muito limitada e podem ser assim sumariadas: Data Entidade promotora / Local Actividade 2002 - Fevereiro H. São Marcos (Braga) Simulação screen-based para anestesia 2002 - Novembro FMUP Seminário “Ensino-Treino-Aprendizagem de Gestos Clínicos dos fundamentos aos simuladores” FEUP Workshop “Mathematical and Mental Models of Human Physiology and the future of medical educational simulation 2003 - Dezembro FMUP Fundado o CSB da FMUP 2004 - Março Revista CAR, nº 35 Autora - Marta Guinot 6 “Papel dos Simuladores em Anestesia” 2006 - Junho Porto - CSB da FMUP e INEB da FEUP XII Encontro Anual da SESAM (Sociedade Europeia de Simulação 2007 - Outubro Coimbra X Congresso Nacional de Educação Médica 2008 - Novembro CSB de Coimbra “Curso Zero ACRM” Aplicada à Medicina) 10 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 Um Olhar Sobre a Simulação Biomédica O Centro de Simulação Biomédica de Coimbra iniciou, a 22 de Novembro de 2008, a actividade, com uma antestreia designada “Curso Zero ACRM”. Ficou nessa altura patente que o panorama nacional da simulação biomédica tinha mudado com um salto de (mais de) 20 anos para a plena modernidade. Instalações, equipamentos directos e indirectamente ligados à simulação dinâmica, recursos técnicos e humanos, indiciavam um projecto de dimensão única no país, bem estruturado e cuidadosamente seguido na sua implementação; o funcionamento do curso não fez mais do que enraizar essa visão, e a abertura e início oficiais da actividade, logo a seguir, a 9 de Dezembro, tornou-a ainda mais nítida. No decurso de 2009 o Centro de Simulação de Coimbra prosseguiu a actividade com a realização de diversos cursos - (ACRM, Emergências obstétricas, VAD, Doente respiratório crítico, Cursos de Instrutores - EUSIM)) - enquanto no H. Pedro Hispano se realizava, em Junho, a 1ª Conferência Nacional sobre Simulação Biomédica que incluiu uma palestra sobre simulação screen-based - revalorização e papel específico e complementar desses simuladores - e Departamentos de Hospitais do Porto incluíam no Congresso “O Norte da Anestesia” um workshop também sobre esse tipo de simulação em que uma dezena de internos de anestesia conduziram casos clínicos simulados em ecrã de computador. na procura desse consenso o CSB de Coimbra se empenhar com boa parte das suas capacidades. Seria bom que as instituições militares que projectam ou desenvolvem actividade ligada à simulação dinâmica biomédica pudessem integrar esse objectivo que se considera de interesse nacional. Os passos dados nesse sentido aceleram o avanço da anestesia portuguesa para um novo período da sua história, que se desenha demarcado pela adopção, estudo e desenvolvimento da simulação dinâmica com vista à formação dos seus profissionais e dos de áreas afins, à prevenção do erro e à salvaguarda do doente crítico, ganhando a especialidade um novo relevo na história mais geral da medicina e cuidados de saúde. Bibliografia 1. Gawande A. When Doctors Make Mistakes. New York: The New Yorker, 1999. 40-55. 2. Wong C. 3. Cooper J, Newbower R, Long C et al. Preventable anesthesia mishaps: a study of human factors. Anesthesiology. 1978; 49:399406. 4. Gaba D. Cognitive Issues in Dynamic Medical Domains. Proceedings of the Workshop on Mathematical and Mental Models of Human No fim do ano, em Novembro, o CSB de Coimbra reforçou as suas relações e importância internacionais ao organizar e acolher o “1st European-Latin American Meeting on Healthcare Simulation and Patient Safety” que contou com a participação das organizações transnacionais SESAM, ALASIC e SSH. Physiology and The future of Medical Educational Simulation, Porto: INEB, 2002. 5. Cumin D, Merry A. Simulators for use in anaesthesia. Anaesthesia, 2007; 62, 2, 151-162. 6. Guinot M. Papel dos simuladores em anestesia. Revista do Clube de Anestesia Regional. 2004, 35:29-30. Um Olhar para a Frente À visão menos de relance do que pode supor-se a partir do que sucintamente se expos parece, agora olhando em frente, natural o surgir de anseios de reproduzir noutros pontos do país um projecto similar ao do CSB de Coimbra mas essa mesma visão não o vislumbra nem possível nem necessário nem mesmo, quando possível, vantajoso. A capitalidade Coimbrã implica porém, e tanto mais quanto mais acentuada for, um dever acrescentado, com contradições difíceis (mas não impossíveis) de superar: o de potenciar no território nacional as acções alheias, pessoais ou institucionais, em prol da simulação dinâmica, mas tentando evitar ao mesmo tempo que recursos materiais e humanos sejam desperdiçados por socialmente inúteis. Que isso implique a criação de uma nova entidade, a integração noutra já existente ainda que com redefinição de objectivos, que a capitalidade Coimbrã se acentue ou se dilua pelo estabelecimento de parcerias, parecem questões que só podem resolver-se por consenso e se Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 11 A SIMULAÇÃO MÉDICA COMO INSTRUMENTO DE ENSINO Matos, Francisco Maio; Martins, António Augusto; Martins, Mafalda Segurança em Anestesiologia A Anestesiologia tem liderado a procura de novas soluções que permitam elevar a segurança do doente e a qualidade nos serviços de saúde. Como resultado desse esforço, e considerando apenas as mortes relacionadas com o acto anestésico, a Comissão de Qualidade nos Cuidados de Saúde dos EUA estima uma redução nesta mortalidade 1 de 2/100.000 em 1980 para 1/200.000-300.000 em 2002. Apesar desta evolução, a frequência de acidentes evitáveis associados a lesão grave ou mortal do paciente permanece 2,3 elevada, - 29 mortes associadas ao acto anestésico no 4 Reino Unido entre 1996 e 2004. A maioria destes acidentes não estão relacionados com a experiência ou conhecimento pessoais, nem são evitados unicamente pelo esforço individual. São necessárias alterações sistemáticas que evitem o erro médico, minimizando a frequência do evento adverso e da gravidade da sua 5 ocorrência. Simultaneamente a este esforço de implementação de barreiras defensivas e correcção de 6 deficiências de sistemas, torna-se pertinente uma mudança no ensino da Anestesiologia em Portugal, que possibilite uma resposta mais preparada e atenta a eventos críticos. Objectivos da educação médica Tradicionalmente, o ensino de ciências da saúde destaca o desempenho individual. No entanto, perante situações clínicas críticas, o trabalho de equipa é um factor central 7 no sucesso terapêutico. Em 2003, o Conselho de Acreditação para Ensino Médico Graduado dos EUA (ACGME), definiu que a competência médica deve ser avaliada segundo 6 domínios: cuidados clínicos, conhecimento médico, conceitos práticos, capacidade comunicativa e de relacionamento interpessoal, 8 profissionalismo e integração no sistema de saúde. Estes componentes estão compreendidos nos objectivos gerais da educação médica: aquisição de conhecimento teórico com evidência científica e de competências técnicas 9 (realização de procedimentos) e comportamentais. Todavia, o número crescente de internos, a redução de horas de trabalho semanais e o aumento do volume de trabalho dos formadores, poderão ter uma repercussão negativa 10 no ganho experiencial adquirido. No contexto da Anestesiologia, em que a equipa médico- 12 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 cirúrgica é composta por elementos com instrução, experiência e competências díspares que trabalham em ambiente com elevada complexidade tecnológica, em 11 muitos casos sem conhecimento mútuo prévio, o trabalho em equipa adquire particular importância. Neste sentido, em áreas em que o tratamento médico requer coordenação e cooperação entre múltiplos elementos, a integração curricular do treino de equipa é fundamental. A simulação médica como instrumento de ensino A simulação médica - definida como a representação de situações clínicas com o objectivo de melhorar, testar ou 12 avaliar o conhecimento dos sistemas e acções humanas - resulta de uma tendência para a educação médica por aprendizagem interactiva. O desenvolvimento da simulação médica - com novos 13 modelos educacionais (Figura 1) e a melhoria progressiva dos simuladores utilizados - possibilita o treino da componente teórica, técnica e comportamental (capacidade de avaliação clínica, liderança, decisão e 14 comunicação) sem colocar em risco o paciente. Simulação em realidade virtual • Recria tridimensionalmente o ambiente clínico. Simulação com manequins de alta-fidelidade • Treino de equipa com recurso a modelos robotizados de tamanho real que recriam as respostas fisiológicas e patológicas à monitorização, procedimentos técnicos e administração de terapêutica; • A simulação in-situ transporta a simulação com manequins de altafidelidade para a realidade clínica, sendo determinante na detecção de lacunas estruturais.13 Simulação de procedimentos • Recorre a modelos de regiões anatómicas desenhados para a realização de gestos técnicos específico (como a cateterização venosa central). Microsimulação ( simulação screen-based ) • Utiliza uma interface (computador) para interagir com ambiente virtual. Figura 1. Modalidades de simulação. Validação da Simulação Médica Por associar a vertente emotiva ao processo de retenção cognitiva, a simulação médica possibilita uma melhoria na curva de aprendizagem com aumento do período de 15 retenção dos objectivos pedagógicos propostos. A Simulação Médica como Instrumento de Ensino O treino com simulação é superior aos métodos de treino tradicionais porque: - Aumenta a segurança do ensino de procedimentos potencialmente lesivos; - Possibilita o treino de equipa e a prática repetida de situações de elevado risco e baixa incidência; 16 - Permite adaptar o treino ao plano formativo. Existe evidência que este treino melhora o desempenho pessoal e de equipa em simuladores, mas poucos estudos demonstraram métodos eficazes para aferir a sua validação 17 clínica. Em 2005, Barry Issenberg conclui que a simulação é um recurso importante da formação médica por complementar os métodos de ensino tradicionais. Nesta revisão sistemática, 47% dos trabalhos demonstraram existir repercussão cognitiva nos participantes e 3% tradução 8 na prática clínica. Americana de Anestesistas (ASA) está a desenvolver programas de creditação com simulação, de forma a assegurar que os anestesistas e os seus pacientes beneficiam de treino experiencial e inovador que permita 20 elevar os cuidados e aumentar a segurança. Parece-nos também indispensável iniciar em Portugal, a exemplo de diversos países europeus14, a integração do treino com simulação no programa de internato complementar de Anestesiologia (Portaria nº616/96 de 30 de Outubro) e na actualização periódica para especialistas. Neste sentido, sugerimos as orientações gerais de um plano educacional adicional ao programa referido, que acompanha os quatro anos formativos, complementando as suas exigências curriculares - Tabela 1. Ano do internato Técnicas básicas em Anestesiologia 1º Ano Abordagem da via aérea Suporte Avançado de Vida Em revisão sistemática de 2006, William McGaghie evidencia de forma clara que a prática repetitiva com simulação está associada a melhoria do desempenho dos participantes. Esta associação assemelha-se a uma 18 relação dose-resposta - mais prática, melhores resultados. Esta evidência é constante para todas as fases formativas (estudantes, internos, especialistas) e áreas médicas associadas a eventos críticos (Anestesiologia, Medicina de Emergência, Medicina Intensiva, Obstetrícia, Pediatria e Cirurgia). A melhoria da prática clínica após treino com simulação é também verificada por Diane Wayne (2007). Neste trabalho, o treino com simulação melhorou significativamente o desempenho no decorrer de situações críticas. Após a formação, o desempenho melhorou 38% em relação ao grupo controlo, com maior tempo de retenção. A participação em casos simulados com recriação do ambiente clínico provou ser um complemento importante à formação tradicional e experiência clínica, 19 no ensino médico pré e pós-graduado. Módulos de treino com simulação Via Aérea Difícil 2º Ano Técnicas loco-regionais Anestesia pediátrica Suporte avançado de vida pediátrico Anestesiologia obstétrica 3º Ano* Cuidados Intensivos Suporte avançado de vida em trauma 4º Ano* Emergências em Anestesiologia Gestão de eventos críticos * Nestes anos, os módulos podem ser clendarizados de acordo com os interesses curriculares. Tabela 1. No que respeita à educação médica após o internato, o plano que propomos pretende afirmar o papel do anestesiologista como especialista de medicina peri21 -operatória pela consistência do seu desempenho clínico no decorrer de eventos críticos - Tabela 2. Módulos de actualização periódica para especialistas Via Aérea Difícil Em 2006, Tim Draycott demonstra que a introdução de um programa de treino com simulação (regular e obrigatório) de toda a equipa médica em emergências obstétricas, está associado uma redução significativa do número de recém-nascidos com índice de Apgar d 6 aos 5 minutos. Este é o primeiro trabalho que relaciona uma intervenção educacional com a melhoria significativa da 19 evolução clínica dos pacientes. Integração do treino com simulação no ensino da Anestesiologia Suporte avançado de vida Emergências em anestesia Gestão de eventos críticos Questões éticas e médico-legais Tabela 2. No seguimento desta estratégia, a importância da simulação deve ser enquadrada num plano pedagógico global que possibilite uma evolução consistente dos cuidados prestados pela melhoria do desempenho individual e da equipa. Apesar da dificuldade em comprovar a eficácia comparativa deste instrumento de ensino, a Sociedade Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 13 Matos et al. Bibliografia 1. Lagasse R. Anesthesia safety: model or myth? Anesthesiology, 2002; 97:1609-17. 2. Rosenstock C, Moller J, Hauberg A. Complaints related to respiratory events in anesthesia and IC from 1994 to 1998 in Denmark. Acta Anaesthesiol Scand, 2001; 45:53-58. 3. Dahlgaard L, Moen V, Irestedt L. Analysis of Deaths Related to Anesthesia in the Period 1996-2004 from Closed Claims Registered by the Danish Patient Insurance Association. Anesthesiology, 2007; 106:675-80. 4. Catchpole K. Safety in Anestesiology: a study of 12606 reported incidents from the UK National Reporting and Learning System. Anaesthesia, 2008; 63:340-346. 5. Kohn L, Corrigan J, Donaldson S. To err is human: building a safer health system. Washington DC: National Academy Press, 1999. 6. Gluck P, Medical error theory. Obstet Gynecol Clin N Am, 2008; 35:11-17. 7. Rosen M, Salas E, Wu T. Promoting Teamwork: An Event-based Approach to Simulation-based Teamwork Training for Emergency Medicine Residents. Academic Emergency Medicine, November 2008; 15(11). 8. Issenberg B, Mcgaghie W, Petrusa E. The effectiveness of using human patient simulation manikins in the teaching of clinical reasoning skills to undergraduate nursing students: a systematic review. Medical teacher, 2005; 27(1):10-28. 9. Patel V, Yoskowitz N, Arocha J. Towards effective evaluation and reform in medical education: a cognitive and learning sciences perspective. Adv in Health Sci Educ, 2009; 14:791-812. 10. Rosenstock C, Moller J, Hauberg A. Residents lack knowledge and practical skills in handling the difficult airway. Acta Anaesthesiol Scand, 2004; 48(8):1014-1018. 11. Rall M, Dieckmann P. Best Practice & Research Clinical Anaesthesiology, 2005; 19(4): 539-557. 12. Greeno, J. Learning in activity. The Cambridge handbook of the learning sciences, 2006; 79-96. New York: Cambridge University Press. 13. Rall M, Gaba. Human Performance and Patient Safety. In R.D. Miller (Ed.), Anaestesiology, Baltimore: Lippincott, 2005. 14. Ostergaard D. National Medical Simulation training program in Denmark. Crit Care Med, 2004; 32(2):58-60. 15. Dunn W, Murphy J. Simulation About Safety, Not Fantasy. Chest, 2008; 133:6-9. 16. Gaba D, Howard S, Flanagan B. Assessment of clinical performance during simulated crisis using both technical and behavioral ratings. Anesthesiology, 1998; 89:8-18. 17. Nishisaki A, Jarrah R, Biagas K. Does Simulation Improve Patient Safety?: Self-Efficacy, Competence, Operational Performance, and 14 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 Patient Safety, Anesthesiology, 2007; 25:225-236. 18. McGaghie W, Siddall V, Mazmanian P. Effect of practice on standardised learning outcomes in simulation-based medical education. Medical Education, 2006; 40:792-797. 19. Wayne D, Fudala M, Butter J. Simulation-Based Education Improves Quality of Care During Cardiac Arrest Team Responses at an Academic Teaching Hospital. Chest, 2008; 133:56-61. 20. Draycott T, Sibanda T, Owen L. Does training in obstetric emergencies improve neonatal outcome? BJOG, 2006; 113:177-82. 21. Steadman R. The American Society of Anesthesiologists national endorsement program for simulation centers. Journal of Critical Care, 2008; 23: 203-206. 22. Coursin D, Maccioli G, Murray M. Critical care and peri-operative medicine: How Goes the Flow? Anesthesiology Clinics of North America. September 2000, 18(3): 527-538. Version 14.01.2010 INTEGRATION OF SIMULATION BASED-TRAINING IN COMPULSORY SPECIALIST PROGRAMS FOR PHYSICIANS - THE DANISH EXPERIENCE Østergaard, Doris; Lippert, Anne; Dieckmann, Peter The Danish Institute for Medical Simulation, Herlev Hospital, Capital Region of Denmark and University of Copenhagen. Background The development In post graduate education the teaching and learning focus has primarily been on medical expert knowledge and skills. Recognising that competent treatment of patients involves more than knowledge, internationally, several countries have now adapted new models to describe the role of physicians and learning objectives within other areas. An analysis of sentinel events indicates that communication is a major root cause in more than 1 2 70% of the analysis. The Canadian Model consisting of 7 roles was introduced in Denmark in 2001 when a new curriculum and in-training assessment was introduced for all specialties. The 7 roles are the medical expert, communicator, professional, scholar, manager, collaborator and health advocate. Hence in medical education there is a tendency to broaden our view of the necessary skills needed to function as a health professional in the high risk environment of a hospital. Nationally, compulsory theoretical courses for all specialties were introduced in specialist education of physicians in Denmark in 1967. These courses were mainly based on lectures and without any evaluation of the effect on learning. The content of the courses varied and to some extent depended on the lecturers´ special interest. The existing programs consisted of up to 30 days over a 4 year period. In anaesthesia, a course in clinical decisionmaking was first introduced in 1999. The main training method used in the course was full scale simulation, with a manikin placed in different simulated clinical environments, the OR, the intensive care ward and the emergency room. The course was a tremendous success based on evaluations from the course participants and the educators references. Based on this experience a national working group was established with reference to the Danish Society for Anaesthesia and Intensive Care Medicine. The working group consisted of simulation enthusiasts, educators with content expertise and junior physicians, who had participated in the program. The purpose was to develop a new course program with focus on the 7 CanMed roles, based on new knowledge on 7,8,9 learning and evaluation. 3 The IOM (Institute of Medicine) report pointed the focus on patient safety in 1999. Following studies from all over the world demonstrated that adverse events happened to around 3% of all patients and that patients died as result of human errors. In order to improve safety, domains such as aviation have implemented strategies to change working conditions and introduced human factors topics in the education. One of these strategies is the implementation of training of teams in crisis resource 4 management Gaba et al were the first to implement this type of simulation-based training in anaesthesia under 5 the name of anaesthesia crisis resource management Flin et al have developed a behavioural marker system 6 for what they call non-technical skills. The IOM report recommends the integration of simulation-based training in health care. The overall aim of this paper is to describe the Danish experiences with the implementation of simulation-based training in the compulsory post graduate programs for anaesthesiologists. The existing courses 10 In a recent review, Issenberg et al. describe the most important factor for effect of simulation - based training to be feedback. The paper also stresses the importance of implementation of training into existing programs and curricula. Educators using simulation need to change their role from that of a teacher to that of a facilitator. Many new facilitators were recruited and trained in establishing a safe learning environment and to master the different phases in simulation-based training described by 11 Dieckmann. Many papers describing how to run the 12,13,14,15 debriefing session have been published. The courses are now based on interactive learning methods including case-based discussions, skills training and simulation-based training followed by debriefing. In those CORRESPONDING AUTHOR Doris Østergaard • The Danish Institute for Medical Simulation • Herlev Hospital • 2730 Herlev, Denmark • [email protected] Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 15 Østergaard et al. sessions participants can reflect on the learning experience from the simulation scenarios and discuss with team members and the facilitator. To ensure optimal learning, the physicians prepare themselves by reading papers, solving cases or bringing interesting cases to the course. An overview of the courses is seen in table 1. Skills training or simulations are introduced in the courses, where this seemed to be useful. The first course is a 3 day long airway management course developed based on a needs assessment. Evaluation forms and oral evaluations are used in all the courses. The evaluations show that the physicians are very satisfied with the content of the courses and the chosen methods. In the first phase, we decided not to evaluate the effect on learning after the courses as intraining assessment in clinical practice using a log book (port folio) had been introduced. Several studies describe 16,17,18,19 this development. At present several pre- and post course initiatives are being evaluated, such as theoretical tests, questionnaires and objective structured clinical examinations (OSCE). The positive experiences with the training program for anaesthesiologists are being shared by other professions. Currently, courses for anaesthesia nurses in their specialist program are implemented in the eastern part of Denmark and these courses are also compulsory. Also surgeons and internal medicine physicians are pilot testing the use of full scale simulation-based training in their programs. continuously to improve the courses. Bibliografia 1. Joint Commission on Accreditation of Health Care Organizations, Sentinel Event Alert, July 21, 2004:30. 2. CanMEDS 2000: Extract from the CanMEDS 2000 Project Societal Needs Working Group Report. Med Teach 2000;22:549-554. 3. Kohn LT, Corrigan JM, Donaldson MS. To Error is Human - Building a Safer Health System. Washington, DC: National Academy Press 1999. 4. Helmreich RL, Merritt AC, Wilhelm JA. The evolution of Crew Resource Management training in commercial aviation. Int J Aviat Psychol 1999;(9):19-32. 5. Gaba DM, Howard SK, Fish KJ, Smith BE, Sowb YA. Simulationbased training in anesthesia crisis resource management (ACRM): A decade of experience. Simulation & Gaming, 2001;32:175-193. 6. Fletcher G, Flin R, McGeorge P, Glavin R, Maran N, Patey R. Anaesthetists´ Non Technical Skills (ANTS): evaluation of a behavioural marker system. Br J Anaesth 2003;90(5):580-8. 7. Knowles M. The adult learner: A neglected species. 4th Edition Gulf Publishing Company. Houston, TX, 1990. 8. Kolb DA. Experiental learning: Experience as the source of learning and development. Prentice Hall, Englewood Cliffs, NJ 1984. 9. Østergaard D. National Medical Simulation training program in Future perspectives Denmark. Crit Care Med 2004;32(2 Suppl):S58-S60. The established national collaboration is essential to continuously develop and refine the courses. Including new tools such as e-learning before and after the courses is necessary to make this type of training more effective and to overcome the problem of providing the course at the right time for the individual doctor. Timing of, for instance, the paediatric anaesthesia course at the time, when the doctor is actually working in the paediatric clinic is impossible. Validated tools for assessing the effect on learning need to be developed and implemented. Structured educational programs for the facilitators are needed and the link to the supervisors in the clinical departments needs to be strengthened. One of the major challenges is to continuously improve the courses according to the needs of the patients and implement new knowledge. Last but not least the biggest challenge is yet to convince other specialties of the need to establish inter-professional courses in order to train together, those who work together. 10. Issenberg, S. B., McGaghie, W. C., Petrusa, E. R., Lee, G. D., & In conclusion, simulation-based training has successfully been implemented in existing programs for anaesthesiologist in Denmark. This has been possible due to a strong national collaboration and a vision of of assessment in residency training. An assessment programme for 16 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 Scalese, R. J. (2005). Features and uses of high-fidelity medical simulations that lead to effective learning: a BEME systematic review. Medical Teacher, 27, 10-28. 11. Dieckmann, P. (Ed) (2009). Using Simulations for Education, Training and Research. Lengerich: Pabst. 12. Steinwachs, B. (1992). How to facilitate a debriefing. Simulation and Gaming, 23, 186-195. 13. Rudolph JW, Simon R, Dufresne RL, Raemer DB. There´s no such thing as “nonjudgemental” debriefing: A theory and method for debriefing with good judgement. Sim Healthcare 2006;1:49-55. 14. Rudolph JW, Simon R, Raemer DB, Eppich WJ. Debriefing as formative assessment: Closing the performance gaps in medical education. Acad Emerg Med 2008;15:1-7. 15. Fanning RM, Gaba DM. The role of debriefing in simulation-based learning. Sim Healthcare 2007;2:115-125. 16. Ringsted C, Østergaard D, Scherpbier A. Embracing the new paradigm 1st year residency training in anaesthesiology. Medical Teacher 2003;25:54-62. 17. Ringsted C, Østergaard D, Ravn L, Pedersen JA, Berlac P, Van der Integration of Simulation Based-Training in Compulsory Specialist Programs for Physicians - The Danish Experience Vleuten CPM. A feasibility study comparing checklists and global and preliminary results of acceptability. Acta Anaesthesiol Scand rating forms to assess resident performance in clinical skills. Medical 2003;47:1196-1203 Teacher 2003;25:654-658. 19. Ringsted C, Pallisgaard J, Østergaard D, Scherpbier A. The effect 18. Ringsted C, Østergaard D, Van der Vleuten CPM. Implementation of a formal in-training assessment programme in anaesthesiology of in-training assessment on clinical confidence in postgraduate education. Medical Education 2004;38:1261-1269. Name of the course Length of the course Educational methods Introduction to the programme 1 Day Mini lectures Group discussions Team building exercises Dinner Airway management 3 Days Lectures Case discussions Educational videos Skill stations Full scale simulation and debriefing OSCE stations Intensive Care Medicine - module 1 - 2 2 Days Skill stations Case discussions Simulation based training Patient safety 1 Day Mini lectures Inter - professional communication 1 Day Case discussions Anaesthesia related patient communication 1 Day Full scale simulation and debriefing Educational videos Simulated patients Obstetric anaesthesia and the new born 2 Days Mini lectures Case discussions Skill stations Full scale simulation and debriefing Pediatric anaesthesia 3 Days Mini lectures Case discussions Full scale simulation and debriefing Pharmacology 2 Days Mini lectures Acute pain 1 Day Case discussions Intensive Care Medicine - module 3 4 Days Mini lectures Advanced anaesthesia 2 Days Mini lectures Chronic pain 1 Day Case discussions Neuro anaesthesia, trauma and 3 Days Mini lectures Case discussions prehospital care Case discussions Skills station Clinical decision-making 3 Days Mini lectures Case discussions Full scale simulation and debriefing Tabela 1. The individual courses in the compulsory training programme for anaesthesiologists in Denmark. Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 17 ACRM - “ANESTHESIA CRISIS RESOURCE MANAGEMENT” Pereira, Luciane; Carvalhas, Joana Serviço de Anestesiologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra. Centro de Simulação Biomédica dos Hospitais da Universidade de Coimbra. CRM - “Crew Resource Management” O conceito de “cockpit resource management” (CRM) teve início no complexo mundo da aviação comercial, onde os pilotos são sujeitos a treinos em simulação desde os anos 70. Estudos sistemáticos demonstraram que grande parte dos acidentes aéreos era devido a erro humano, nomeadamente a falhas na comunicação, troca 1 de informação e inexistência de planos de contingência. A noção de que os factores humanos são determinantes para um bom desempenho, fez com que o conceito fosse transportado do cockpit para a tripulação da cabine e torre de controlo, dando origem ao termo “crew resource management”. Actualmente o treino de simulação da tripulação incide sobre competências não técnicas, com cenários que testam o trabalho de equipa, comunicação e tomada de decisões. Com este tipo de prática, os comportamentos podem ser aprendidos, treinados e 2 posteriormente analisados. A partir dos anos 90, a administração da Federação Americana de Aviação começou a exigir a integração regular do CRM nos treinos de aviação, bem como nos processos de certificação dos pilotos ao longo das suas carreiras. A introdução do CRM nas actividades diárias da aviação comercial surge como resposta a um problema publicamente visível - a responsabilidade do erro humano na origem de acidentes. Evolução do conceito de CRM para ACRM (Anesthesia Crisis Resource Management) O CRM foi introduzido nos sistemas de saúde por David Gaba e colaboradores no final dos anos 80. Como anestesista e seguidor dos programas espaciais e de aviação, rapidamente reconheceu o paralelismo com os acidentes ocorridos em anestesia. Nos dois casos, os maus resultados eram devidos a deficiências não técnicas. A noção de CRM é, deste modo, transportada para uma área menos visível no domínio público, o bloco operatório. Surge assim o conceito de segurança do doente e o aparecimento de instituições como o Anesthesia Patinet Safety Foundation nos EUA, o Australian Patient Safety Foundation bem como o Australian Incident Monitoring Study. A anestesia, só por si, não oferece benefícios directos ao doente, acrescentando apenas riscos. Esta aversão ao risco tornou a Anestesiologia a área ideal para o surgimento 18 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 de estudos sobre erro humano e segurança do doente, 3,4 transformando-a num modelo para Medicina de hoje. Na introdução do CRM ao exigente ambiente do bloco operatório, integrando equipas multidisciplinares (anestesia, cirurgia, enfermagem), o termo “crew” é substituído por “crisis”. A aplicação desta filosofia baseia-se no treino de princípios chave que foram adaptados às necessidades dos clínicos e introduzidos como Anesthesia Crisis 5 Resource Management (ACRM) por Howard e col. Estes princípios envolvem por um lado aspectos cognitivos e de capacidade de decisão e por outro, aspectos relacionados com o trabalho de equipa e com a gestão de recursos. Os princípios de CRM foram recentemente actualizados sendo apresentados na tabela seguinte. 1. Conhecer o ambiente 9. Prevenir erros de fixação 2. Antecipar e planear 10. Verificar e confirmar 3. Pedir ajuda precoce 11. Usar apoios cognitivos 4. Liderança 12. Reavaliar continuamente 5. Distribuir tarefas 13. Bom trabalho de equipa 6. Mobilizar todos os recursos 14. Focar a atenção criteriosamente 7. Comunicar eficazmente 15. Estabelecer prioridades de forma 8. Utilizar toda a informação dinâmica (adaptado de Rall M. et al: Human performance and Patient Safety, in Miller7th edition 2010)6 Treino de ACRM Cada área profissional dentro dos cuidados de saúde é formada por um grupo de indivíduos. Frequentemente quando trabalham lado a lado, os grupos não formam uma equipa. O treino de ACRM consiste em “treinar 7 grupos para constituírem equipas”. Este treino permite integrar competências técnicas, cognitivas e comportamentais, na resolução de eventos críticos, bem como a avaliação inter-disciplinar sobre o mesmo evento. A eficácia do treino é maior quando o grupo trabalha regularmente em conjunto na sua actividade diária. O ACRM tem sido formalmente adoptado como um ponto central em várias instituições com carácter formativo, não só nos primeiros anos da formação em Anestesiologia bem como na formação pós-graduada. Actualmente nos EUA existem diferentes taxas de seguros para profissionais com e sem treino em simulação. Na Dinamarca, por exemplo, existe um curriculum similar ao ACRM que é ACRM - “Anesthesia Crisis Resource Management” obrigatório para todos os anestesistas e enfermeiros de anestesia que pretendam a certificação. Outras variantes existem na Bélgica, e no Reino Unido. O cerne do treino de ACRM consiste em cenários de simulação que reproduzem, o mais real possível, o ambiente peri-operatório, recriando situações críticas com simuladores de alta-fidelidade. Deve também cumprir 8 os seguintes critérios : • ênfase nos comportamentos/atitudes em ambiente de crise, em vez de conhecimentos técnicos ou teóricos; • a formação é baseada em simulações e sessões de debriefing, que podem ser complementadas com discussões didácticas; • as simulações devem ser realistas e requerem interacção entre os participantes; • o debriefing deve ser feito por instrutores treinados; • o treino requer um ratio formador/participante muito elevado; • a certificação em ACRM apenas por observação não é possível. Deve requerer sempre participação activa nos cenários e no debriefing. O debriefing surge imediatamente a seguir a um cenário de simulação. Trata-se de uma discussão estruturada, onde todos os participantes descrevem a sua experiência, explicando os seus pontos de vista sobre o caso clínico vivenciado. Com ajuda do instrutor é criada uma atmosfera de crítica construtiva, facultando respostas às questões levantadas, com o máximo envolvimento possível de todos os participantes. No caso do ACRM pretende-se discutir quais os princípios que foram aplicados e os que foram esquecidos. O debriefing, geralmente apontado como o ponto alto do ACRM, é o momento em que se faz a aprendizagem. Actualmente o treino baseado em ACRM tem sido introduzido em vários domínios para além da anestesiologia. Estas incluem: unidade de cuidados intensivos, sala de emergência ou trauma, sala de partos, emergência pré-hospitalar, para além de contextos mais diversos, nomeadamente o militar. Embora o treino intra e interdisciplinar em equipa tenha benefícios óbvios, a sua implementação na área médica não tem sido mais significativa, dado que, o investimento económico no treino de equipas não tem um resultado monetário facilmente mensurável. Por outro lado o treino de equipas interdisciplinares torna-se um grande desafio, devido às barreiras tradicionalmente instaladas entre 9 especialidades. Que futuro? O Centro de Simulação Biomédica de Coimbra realizou já vários cursos de ACRM para equipas multidisciplinares. O curso desenvolve-se de maneira fiel às linhas anteriormente aqui descritas. É curioso verificar o interesse nesta área não só de jovens internos, como de especialistas com reconhecimento à longa data pelos seus pares. A avaliação final dos cursos, feita pelos formandos, foca sempre a vontade de realizar um maior número de cenários de simulação, pois o treino de situações críticas é uma necessidade muito presente no âmbito da Anestesiologia. Por outro lado os participantes percebem que a Simulação oferece a possibilidade de treinar as competências nãotécnicas, o que não é possível em nenhum outro contexto ao longo da sua formação. Desde longa data os profissionais reconhecem que as lacunas no trabalho de equipa são responsáveis por mau desempenho. No entanto, as organizações de saúde continuam a não apostar na formação neste domínio, provavelmente porque o investimento financeiro não tem retorno imediato. É nossa convicção que o treino de ACRM deveria, num futuro próximo, fazer parte da formação dos profissionais de saúde, o que contribuiria, também, para promover a mudança (tão urgente) da “Cultura de Segurança”. As potencialidades da simulação como ferramenta para promover a “Segurança do Doente” são tão evidentes que a comunidade científica não deve ficar à espera de provas inequívocas dos seus benefícios. Bibliografia 1. Cooper G, 1980. Resource management on the flight deck: Proceedings of a NASA industry workshop. 2. Helmreich RL, 1997. Managing human error in aviation. Sci Am. 3. Stolting RK, 2006. Past accomplishments and future directions: risk prevention in anesthesia and surgery. Anesthesiol Clin. 4. Gaba DM, 1988. Anesthesiology as a model for patient safety in healthcare .BMJ 5. Howard SK, Gaba DM, Fish KJ et al, 1992. Anesthesia Crisis Resource Management: teaching anesthesiologists to handle critical incidents. 6. Rall M.,Gaba DM, Howard S, Dieckmann P: Humam Performance and Patient Safety,2010. Millers Anesthesia 2010. 7. Gaba DM, et Col,2001. Simulation-based training in anesthesia crisis resource managent (ACRM): A decade of experience 8. http://pkpd. icon.palo-alto.med.va.gov/simulator/ACRM-Criteria.htm. 9. Pierre MS, Hofinger G, Buerschaper C,2008. Crisis Management in Acute Care Settings. Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 19 PODEMOS TREINAR CATÁSTROFES BIOLÓGICAS, QUÍMICAS E RADIOLÓGICAS COM SIMULAÇÃO? Garcia, Ângela; Seco, Carlos Até recentemente, a utilização de armas químicas ou biológicas pelos países, inclusivé nações sob o comando de ditadores e regimes totalitaristas, estava proibída. Contudo, acontecimentos recentes aumentaram, de forma significativa, a nossa preocupação acerca da utilização de armas de destruição maciça (ADM) porque se verificou que estas podem ser facilmente usadas por fanáticos e grupos terroristas. O conhecimento individual bem como as capacidades de uma equipa necessárias a uma resposta com sucesso a uma situação de desastre são passíveis de aprendizagem, mas ambas tendem a “desaparecer” na ausência de utilização. Simulações específicas podem ser construídas e ministradas para ir ao encontro de necessidades únicas dos diferentes tipos de elementos que respondem a um biodesastre. Decorre, assim, a necessidade de adaptar a respectiva formação curricular e a formação contínua em biodesastres, o que tem sido sustentado por pareceres de entidades várias (ex. JCHAO; 2008 Academic Emergency Medicine Consensus Conference on the Science of Simulation). Na última década, e face aos progressos tecnológicos e informáticos, a simulação médica evidenciou um crescimento, aplicação e validação inquestionáveis. Os tipos de simulação e simuladores, com as respectivas características, permitem aplicações potenciais diversas (ex., do treino básico individual e de equipa, competências clínicas e de comunicação, treino de gestão de crise ("CRM"), intervenção em situações planeadas, novas ou 1 não-frequentes. Assim, e no que respeita à Medicina de Catástrofe, a simulação tem-se centrado em actividades práticas para testar e treinar aspectos de organização, coordenação, comunicação e cooperação. Proporciona um largo espectro de interacções nomeadamente, vítima-médico, interfaces de equipas multidisciplinares, interagências e intersistemas. Permite treinar os profissionais nos desempenhos esperados perante um evento real, melhorar individualmente esse desempenho, reconhecer vulnerabilidades ou déficits relativos a recursos, capacidades ou comunicações. Este envolvimento proporciona não só a melhoria dos 20 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 conhecimentos, mas também é de extrema utilidade para o aprender a lidar com o caos e a frustração que muitas vezes acompanham a situação de catástrofe. Na actualidade, várias questões-chave se colocam neste âmbito e das respectivas áreas de investigação podem 2 salientar-se para a MC : Como pode o treino em simulador ser usado para identificar o risco de catástrofe e melhorar a resposta à catástrofe? Como pode a simulação avaliar e aumentar a capacidade de expansão do hospital? Que métodos e resultados poderão ser usados para demonstrar que a simulação de trabalho em equipa melhora a resposta à catástrofe? Como pode o interface dos sistemas ser simulado? Recordar que, o envolvimento e actividades dos formandos e profissionais na simulação completa a tradicional abordagem baseada no conhecimento, e deverá ser conforme o seu nível de formação e competências, podendo ser optimizada pela aglutinação de diferentes profissionais (médicos, enfermeiros, administrativos, bombeiros, etc) permitindo o exercício do pensamento e tomada de decisões críticas, bem como a vivência do impacto que a decisão de um grupo tem nos outros. Preparar um sistema de formação e treino em MC é complicado pelo cenário, pelas condições físicas e pela situação médica não-comum. A informação disponível é muitas vezes limitada, oriunda de relatos na literatura médica, obtida a partir de ataques terroristas ou de conflitos/guerras ou de catástrofes naturais ou tecnológicas prévios, ou de alguns estudos animais. Os desafios principais são organizar a cena, orientar e 3 tratar as vítimas. Os tipos de simulação em MC mais utilizados, até à data, são exercícios à escala, funcional e tabletop. A "simulação funcional" é mais económica e permite mais economia de tempo. Esta forma de simulação envolve de modo interactivo aspectos logísticos e de coordenação e o pessoal das operações, sem recurso a equipamento, viaturas ou vítimas. Aos formandos vão sendo reveladas mensagens de acordo com um guião (tal como poderá suceder num evento real), solicitando-se a tomada de decisões, respostas e actuação. Assim, poderão perceber e treinar onde e quando e porque é importante o seu papel, bem como conhecer o que se espera dos outros intervenientes. Como ex. simular a Podemos Treinar Catástrofes Biológicas, Químicas e Radiológicas com Simulação? evacuação dos doentes de um sector hospitalar. Os “tabletop exercises” têm vindo a ser utilizados com cada vez mais frequência. Estes, dão enfase aos aspectos cognitivos da preparação. O formato típico envolve um número limitado de participantes que, liderados por um facilitador ou moderador, são confrontados com cenários, e individual ou colectivamente, respondem a questões e desenvolvem estratégias de reacção. Os “tabletop exercises” são particularmente úteis no planeamento em bioterrorismo porque a realidade dos nossos hospitais, muitas vezes trabalhando no limite das suas capacidades, obriga a estratégias e actividades educacionais facilmente acessíveis, ”standardizadas” e validadas. A organização dos exercícios deverá ser com uma complexidade crescente, dos tabletop aos exercícios em larga escala. A simulação em MC com recurso a "Simuladores de AltaFidelidade” (ex. Human Patient Simulator, SimMan, AirMan) e "Tecnologias de Realidade Virtual" foi já adoptada em vários centros de formação médica, permitindo aos formandos gerir situações clínicas complexas e de alto risco num contexto similar aos eventos reais, bem como a prática de procedimentos clínicos. Os "Simuladores de Alta-Fidelidade" apresentam um acopolamento dinâmico de modelos cardiovasculares, pulmonares, farmacológicos, e por vezes de interacção verbal, conjuntamente com o manequim físico, permitindo a caracterização completa de vítimas reais adultas e pediátricas. O uso de "Tecnologias de Realidade Virtual" (simulações online baseadas em computadores; ambientes virtuais tridimensionais 3D) permite a participação simultânea de formandos a partir de localizações várias e/ou distantes (desempenhando o respectivo papel de avatar). Neste ambiente os manequins são substituídos por vítimas virtuais modelados por computador, e os elementos de cada equipa desempenham o seu papel a partir de computadores individuais. Esta tecnologia tem como suporte uma plataforma de sofwtare (ex. Olive®) na qual é elaborada uma aplicação, e usa a Internet para comunicação e interface, permitindo a simulação médica com equipas virtuais. Podem também ser utilizadas em conjunto com a simuladores de alta-fidelidade (“cave automatic virtual environment - CAVE® integarada com HPS®), gerando uma ilusão de completa “imersão” num mundo tridimensional elaborado por computador (i.e., “immersive 4 simulation”). Para além do treino de situações de emergência, esta metodologia de "mundo virtual" permite a formação e treino de situações multivítimas e incidentes NRBQ no 5 pré-hospitalar e hospitalar. Como complemento dos outros métodos, apresenta vantagens distintas de permitir replicar espaços e recursos disponíveis, conceber uma variedade de cenários e condições para simular vítimas individuais ou multivítimas em situações complexas (perigosas ou infrequentes), repetir cenários permitindo aos formandos aprender com os seus erros, gravação do desempenho durante a simulação e posterior apreciação, e avaliação do desempenho da equipa. O recurso a tais ferramentas permite que os profissionais aumentem os seus conhecimentos, reforcem a sua autoconfiança, adoptem as atitudes necessárias e desenvolvam as suas competências para estes acontecimentos de elevado-impacto e de baixa-frequência. Os estudos demonstram que se os profissionais não estão expostos a eventos críticos de modo regular, o seu conhecimento e competências na resposta declinam em 6-12 meses 6 após o treino inicial. Na realidade, os benefícios de "praticar sem risco" tem conduzido vários autores a considerar o treino com a 7,8 simulação médica um imperativo ético. A preparação médica deve incluir conhecimento e treino de todo o espectro de actuação médica, não se limitando à triagem, logística e abordagem de primeira linha de 3 incidentes de massa. No âmbito do ensino, acresce que a simulação também pode recorrer aos "Pacientes-simulados normalizados" (“Role-playing actors”; inseridos num conjunto de cenários possíveis, e evidenciando ansiedade extrema, pânico, falsa injecção de antídotos ou deâmbulando aleatóriamente pelo cenário) e ser um meio para a Investigação e Desenvolvimento (I&D). Assim, na I&D a configuração de vários tipos de manequins e simuladores para simular vítimas NRBQE, mediante alterações de parâmetros fisiológicos (respiratórios, cardiovasculares, neurológicos), ou do aparecimento de sinais e/ou sintomas (fasciculações, tremores, convulsões, secreções, vómito), só é possível num Centro de Simulação dotado de simuladores de alta-fidelidade e/ou as plataformas virtuais (e também de outro tipo de simuladores). Só a existência de um centro de simulação médica, multimodal e multidisciplinar permitirá promover a formação médica do tipo “hands-on”, avaliar o desempenho, promover a segurança da vítima e os cuidados com qualidade mediante a melhoria de competências clínicas e de comunicação. Proporciona a regular exposição pró-activa controlada dos formandos a cenários complexos e não comuns. O “evento/ataque químico” é a ocorrência médica que pelas suas características o torna a escolha natural para a formação médica baseada na simulação (vítimas nãofrequentes, apresentação clínica complexa e confusa, Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 21 Garcia et al. 3 incluído lesões de trauma e toxicológicas). Protocolos terapêuticos, a evolução das vítimas, os procedimentos com equipamento de protecção individual, a gestão e a interacção dentro de cada equipa e entre equipas são itens-chave da prestação de cuidados em tais cenários, que apenas o treino baseado na simulação realística tem 9 demonstrado a sua eficácia. Para além da avaliação formativa (“debriefing”; feedback oral e/ou video-assistido), a simulação pode servir de base para que a uma avaliação de “know-how” se junte uma avaliação de “show-how”, conforme se considera 10 9 útil em Anestesiologia e em Medicina de Emergência. A avaliação das competências dos profissionais de saúde em ambiente de simulação poderão também fundamentar decisões sobre políticas de formação e treino em MC, ao ultrapassar algumas das dificuldades assinaladas. Perante situações de crise e de tomada de decisão os profissionais de saúde podem evidenciar uma capacidade limitada de gerir a informação. A simulação médica perrmite não só o estudo de factores humanos perante esses eventos, bem como treino e suporte em novas ferramentas 12 (ex. ajudas cognitivas e ajuda electrónica online) capazes de trazer um grande contributo para a MC. Embora toda a evidência disponível permita concluir que a simulação médica pode melhorar o desempenho, prossegue a investigação na obtenção de evidências de que melhora a resposta, facilita a comunicação entre os 2 intervenientes e melhora o outcome dos doentes. Assim, a simulação multi-modal poderá ser uma ferramenta que melhor permite responder aos desafios da formação e treino em MC face às ameaças nucleares, radiológicas, biológicas e químicas. Sabendo que estes métodos de formação e treino tem 13 um custo económico e de tempo, é de realçar que estas metodologias, uma vez perspectivadas no tempo, devem ser consideradas um investimento no ciclo da catástrofe/ situação de excepção visando diminuir o impacto sanitário, social e económico dessas ocorrências. Anestesiologia e MC Nas situações de excepção e catástrofe o papel dos Anestesiologistas é fundamental, atendendo à sua formação académica relativa a fisiologia / fisiopatologia, farmacologia e competências, pelo que também conhecedores da abordagem das ocorrências NRBQ e 14 trauma. O seu contributo é vital, participando na triagem (primária ou secudária, e reavaliação), na ressuscitação inicial e a abordagem da via aérea, na descontaminação, na terapêutica das vítimas no perioperatório (com lesões decorrentes do incidente NRBQ ou combinadas), ou no envolvimento nos cuidados intensivos. 22 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 É então, uma vertente onde a Anestesiologia tem de apostar na formação e treino, para os quais a simulação médica é uma metodologia ímpar, de futuro mas disponível na actualidade. Bibliografia 1. Bradley P. A history of simulation in medical education and possible future directions. Med Ed, 2006; 40:254-62. 2. Kaji A, Bair A, Okuda Y, Kobayashi L. Defining systems expertise: effective simulation at the organizational level - implications for the patient safety, disaster surge capacity, and facilitating the systems interface. Acad Emerg Med, 2008; 15:1098-103. 3. Vardi A, Levin I, Berkenstadt H, Hourvitz A. Simulation-based training of medical teams to manage chemical warfare casualties. IMAJ, 2002; 4:540-44. 4. Wilkerson W, Avstreich D, Gruppen L. Using immersive simulation for training first responders for mass casualty incidents. Acad Emerg Med, 2008; 15:1152-59. 5. Heinrichs L, Youngblood P, Harter P. Simulation for team training and assessment: case studies of online training with virtual worlds. World J Surg, 2008; 32:161-170. 6. Wik L, Myklebust H, Auestad BH, Steen PA. Retention of basic life support skills 6 months after training with an automated voice advisory manikin system without instructor involvement. Resuscitation, 2002; 52(3):273-9. 7. Ziv A, Erez D, Munz Y. The Israel Center for medical simulation: a paradigm for cultural change in medical education. Acad Med, 2006; 81:1091-97. 8. Gordon J, Billings J, Asplin B, Rhodes K. Safety net research in emergency medicine: proceedings of the Academic Emergency Medicine Consensus Conference on "The Unraveling Safety Net". Acad Emerg Med, 2001; 8(11):1024-9. 9. Issenberg B, Mcgaghie W, Petrusa E. The effectiveness of using human patient simulation manikins in the teaching of clinical reasoning skills to undergraduate nursing students: a systematic review. Medical teacher, 2005; 27(1):10-28. 10. Savodelli G et al. Evaluation of patient simulator performance as an adjunct to the oral examination for senior anesthesia residents. Anesthesiology, 2006;104(3):475-81. 11. Binstadt E, Walls R, White B, Nadel E, Takayesu J, Barker T, Nelson S, Pozner C. A comprehensive medical simulation education curriculum for emergency medicine residents. Ann Emerg Med, 2007; 49(4):495-504. 12. Berkenstadt H, Ziv A, Gafni N, Sidi A. The validation process of incorporating simulation-based accreditation into the anesthesiology Israeli national board exams. Isr Med Assoc J, 2006; 8(10):728-33. 13. Lammers R. Simulation: the new teaching tool. Ann Emerg Med, 2007; 49:505-07. 14. White SM. Chemical and biological weapons. Implications for anaesthesia and intensive care. Br J Anaesth, 2002; 89:306-24. SIMULAÇÃO DE ALTA-FIDELIDADE PARA TREINO DE EMERGÊNCIAS EM OBSTETRÍCIA Carvalhas, Joana*º; Silva, Isabel Santos; Costa, Fernando Jorge**º * Serviço de Anestesiologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra ** Serviço de Obstetrícia do Centro Hospitalar de Coimbra - Maternidade Bissaia Barreto *** Serviço de Obstetrícia dos Hospitais da Universidade de Coimbra - Maternidade Daniel de Matos º Centro de Simulação Biomédica dos Hospitais da Universidade de Coimbra Em Obstetrícia, a multidisciplinaridade é constante e os ambientes podem tornar-se altamente complexos e exigentes. Frequentemente existem situações que evoluem de forma grave e repentina pondo em risco a segurança materno-fetal. Nestas circunstâncias, os comportamentos individuais e colectivos tornam-se críticos podendo determinar o outcome perinatal. Para além da preparação teórica e da experiência clínica individuais, a gestão de eventos críticos em Obstetrícia, requer aptidões não clínicas. A capacidade de liderar, a eficácia da comunicação, a prioritização das acções e das decisões são competências que, entre outras, as equipas multidisciplinares devem apresentar. Classicamente, não se faz formação nestes domínios e os profissionais de saúde apresentam lacunas no trabalho de equipa, que têm sido apontadas como responsáveis por morbilidade 1,2 e mortalidade acrescidas. O Centro de Simulação Biomédica dos Hospitais da Universidade de Coimbra tem um interesse particular no treino de gestão de eventos críticos em Obstetrícia, dedicando especial atenção à preparação da formação nesta área. Neste âmbito, realizaram-se dois tipos diferentes de acções formativas. Desenhámos um curso multidisciplinar designado Emergências em Obstetrícia, tendo como objectivo o treino de equipas de cuidados perinatais. Realizámos dois cursos em 2009. Em parceria com a empresa Crioestaminal, desenvolvemos um Programa Nacional de Segurança Periparto, realizando um curso de Gestão de eventos críticos em Obstetrícia. Foram englobados neste programa mais de uma centena de médicos especialistas e internos de Obstetrícia das maternidades de todo o país. Devido à enorme adesão, este projecto terá continuidade em 2010, estando já agendados os próximos cursos. Para ambas acções de formação identificámos e seleccionámos situações clínicas de risco (já tradicionalmente reconhecidas) tais como: distócia de ombros, parto em pélvica, rotura uterina, pré-eclâmpsia e eclâmpsia e tromboembolia pulmonar. Arquitectando uma maternidade virtual com as respectivas áreas (sala de partos, puerpério, bloco operatório etc.) recriámos as referidas situações clínicas utilizando simuladores de alta-fidelidade à escala humana, actores, equipamento, fármacos e todos os recursos próprios de cada local. Os diferentes profissionais foram integrados nestes ambientes de forma a estarem habilitados a actuarem da mesma forma que a sua prática clínica real. Todo o desenrolar do caso clínico é monitorizado e controlado por dois instrutores - Anestesista e Obstetra, que com apoio de vídeo orientam seguidamente uma discussão estruturada (debriefing). Os instrutores são os facilitadores do debriefing, pois nessa acção pretendese que todos os intervenientes, participem, analisando as decisões e as actuações individuais e da equipa, de uma forma construtiva e positiva. Considerada a fase mais importante da experiência de simulação é, neste momento, que ocorre a assimilação de conceitos visando a melhoria efectiva da prática clínica diária. Previamente e após o curso, os participantes recebem bibliografia para a preparação e consolidação das matérias abordadas. Em cada acção de formação realizaram-se questionários pré e pós curso com diferentes objectivos: caracterização da amostra dos formandos; análise dos objectivos pedagógicos, controlo de qualidade, entre outros. Um dos itens dos questionários foi a análise da evolução dos formandos acerca do nível de confiança individual para a gestão de eventos críticos em Obstetrícia. Analisando o pré e o pós-teste verificou-se um aumento significativo do nível de confiança dos participantes. Perante a pergunta «Como considera a sua experiência em eventos críticos em Obstetrícia» e com base numa escala de 1 a 10 os participantes evoluíram de 4,14 ± Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 23 Carvalhas et al. 2,12 no pré teste para 5,21 ± 2,26 no pós-teste (p = 0,01). Estes e outros dados provenientes das respostas dos inquéritos, reflectem claramente o reconhecimento, por parte dos profissionais, da importância da simulação de alta-fidelidade no processo da formação médica contínua. Nos últimos anos tem surgido alguma evidência científica sobre a Simulação na área Obstétrica demonstrando a evolução positiva das equipas multidisciplinares 3,4 Obstétricas após treino de simulação. Existem estudos publicados em que se verificou melhoria do outcome 5 perinatal, tornando mensurável a melhoria do desempenho das equipas obstétricas e provando que o treino através da simulação é uma técnica de aprendizagem eficaz. Ainda que não muito vasta, a nossa experiência tem sido muito gratificante e reveladora. Para além de necessária é inquestionável o poder da Simulação de alta-fidelidade como instrumento formativo. Bibliografia 1. Kohn L, Corrigan J, Donaldson S. To err is human: building a safer health system. Washington DC: National Academy Press, 1999. 2. Saving Mothers' Lives: Confidential Enquiry into Maternal and Child Health 2003-5. 3. Crofts J, Ellis D, Draycott T, Winter C, Hunt L, Akande V. Change in Knowledge of Midwives and Obstetricians Following Obstetric Emergency Training: A Randomized Controlled Trial of Local Hospital, Simulation Centre and Teamwork Training. BJOG. 2007; 114:15341541. 4. Draycott T, Sibanda T, Owen L. Does training in obstetric emergencies improve neonatal outcome? BJOG, 2006; 113:177-82. 5. Draycott T, Crofts J, Ash J. Observations From 450 Shoulder Dystocia Simulations: Lessons for Skills Training. Obstet Gynecol. 2008; 112:14-20. 24 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 A “SEGURANÇA DO DOENTE” E O PAPEL DO DIREITO Oliveira, Guilherme de Director do Centro de Direito Biomédico. Faculdade de Direito UC. I. A “comunidade jurídica” dos países mais desenvolvidos começa a tomar consciência da dimensão estatística do “erro médico” e do movimento no sentido da sua redução. Na verdade, é possível que o número de mortes e de incapacidades graves evitáveis seja maior do que alguma vez se pensou; e já estão em curso experiências de grande dimensão no sentido de melhorar a qualidade da prestação 1 dos cuidados médicos. Tanto quanto posso entender esta nova preocupação da prática médica, creio que ela assenta na consciência de que o exercício da medicina envolve uma organização 2 complexa, onde os erros podem ser mais induzidos pelo desenho do sistema do que pela negligência dos agentes; e creio que se procura organizar um meio de conhecer totalmente as deficiências, através da notificação sistemática dos eventos adversos. A questão que se deve pôr aos juristas é a seguinte: o Direito pode ficar alheio a este novo movimento global? Ou deve tomar parte nele? E se puder tomar parte, qual é o papel que lhe cabe? Penso que o Direito deve desempenhar um papel essencial - que, aliás, já está em prática, de uma maneira ou de 3 outra, em alguns países. Em primeiro lugar, o Direito pode reflectir sobre o sistema vigente de Responsabilidade Profissional. Talvez possa vir a concluir-se que o sistema de responsabilidade profissional exclusivamente baseado na procura de um culpado foi adequado para um exercício tradicional de uma Medicina “cara a cara”, mas talvez não se ajuste à Medicina de técnicas intensivas, em equipas e em grandes unidades. Sabe-se como é difícil para os tribunais lidar com a sofisticação dos cuidados, com as hesitações dos peritos, com o risco próprio das intervenções modernas. Se assim for, pode pensar-se em desjudicializar a responsabilização, de modo a conseguir meios tecnicamente mais capazes de apurar a verdade, mais rápidos para a compensação dos doentes que sofreram danos, e mais eficazes para garantir que os erros não se repitam. Vários países iniciaram a mudança para sistema chamados de “no fault”, em que o processo de compensação das vítimas de erros decorre em Comissões Técnicas, em vez do tradicional recurso aos tribunais. Em segundo lugar, o Direito pode contribuir para a organização de sistemas de notificação de eventos adversos. De um ponto de vista técnico, trata-se de sistemas informáticos que permitem aos profissionais comunicar os erros ou quase-erros a uma agência de controlo da qualidade; esta agência agrupa e estuda os casos, com o propósito de formular as alterações que há-de evitá-los no futuro. O Direito pode intervir para garantir que as comunicações feitas pelos profissionais não se viram contra eles - não poderão ser usadas contra eles em processos judiciais. Não é fácil dar este passo, na medida em que ele comprime o direito fundamental à utilização de todas as provas para a descoberta da verdade; e é necessário saber se esta compressão deve ser aceite em todos os casos. Mas percebe-se facilmente que os profissionais não vão colaborar se o seu gesto puder “incriminá-los...”; alguns países já evoluíram neste sentido e têm leis novas que fomentam a prática da notificação, para obter reduções significativas do erro médico. II. Vejo a Simulação Biomédica como uma prática que se inscreve no movimento no sentido da segurança do doente, para melhorar a formação - tanto as aptidões básicas como as mais diferenciadas. Na prática médica contemporânea, há certos aspectos que são “menos técnicos” e que, talvez por isso, têm sido relativamente menosprezados pelos profissionais e pelas organizações. Com efeito, há poucos anos, participando no esforço de acreditação de alguns hospitais, fui expressamente instigado pelos responsáveis a ocuparme da documentação clínica, que me foi apresentada como um “ponto negro” da prática hospitalar. Nessa altura, aproveitei as acções de formação para encarar a documentação clínica como uma obrigação jurídica cuja falta de cumprimento pode fundamentar casos de “negligência médica”. Passados alguns anos, a lei portuguesa tornou-se mais exigente com os profissionais; e os documentos estrangeiros confirmam que a “boa 4 documentação” é uma “boa prática médica”. Não há dúvida de que um processo clínico rigoroso e completo fomenta a segurança do doente; atrevo-me a sugerir que a Simulação Biomédica inclua este aspecto na sua formação de base. Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 25 Oliveira Um segundo aspecto em que ainda não se atingiu um nível satisfatório é o do consentimento informado. Na verdade, um estudo recente da Entidade Reguladora da Saúde mostra que os progressos neste domínio podem 5 ser ampliados. O consentimento informado começou por ser considerado apenas como um modo de respeitar o direito dos doentes à sua autodeterminação; hoje, porém, começa a ser visto também como um elemento das boas práticas técnicas, uma lex artis. A prática do consentimento informado envolve o doente no processo de diagnóstico e de terapêutica; e esta participação pode ser decisiva para a segurança do doente na medida em que o interessado pode ser o primeiro a dar sinal de qualquer efeito secundário imprevisto ou de uma dosagem 6 inapropriada. Talvez possa considerar-se o treino do consentimento informado na actividade da Simulação Biomédica. Bibliografia 1. Veja-se, por todos, Linda T Kohn; Janet M. Corrigan; Molla S. Donaldson, eds., To err is human. Washington, D.C., National Academy Press, 2000; e José Fragata; Luís Martins, O Erro em Medicina, Coimbra, Almedina, 2004. 2. Perrow, Normal Accidents. Princeton, Princeton University Press, 1999, p. 62 e segs.. 3. Por exemplo nos USA, Austrália, Nova Zelândia, Dinamarca; e , em parte, na Áustria e França. 4. Incluindo a boa identificação do doente; cfr., para o Reino Unido, http://www.nrls.npsa.nhs.uk/resources/patient-safety-topics 5. http://www.ers.pt/actividades/estudos/estudo-sobre-oconsentimento-informado 6. Linda T Kohn; Janet M. Corrigan; Molla S. Donaldson, eds., To err is human.... cit., p. 196. 26 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 NORMAS DE PUBLICAÇÃO A Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia publica manuscritos considerados de importância para a Anestesiologia, Cuidados Intensivos, Terapêutica da Dor e Ciências Básicas, dando prioridade a Artigos Originais, Artigos de Revisão e Casos Clínicos. Publica ainda, temas de interesse noutras áreas, tais como: Ensino, Ética ou História da Anestesia. Os Editoriais são normalmente reservados aos Editores e à Direcção da S.P.A., podendo contudo, serem aceites os escritos de outros sócios, a pedido ou por iniciativa própria. Os manuscritos enviados para publicação, não devem ter sido publicados ou simultaneamente presentes para publicação, em qualquer outra parte (exceptuamse os artigos publicados com a designação de “Intercâmbio”). Quando aceites, ficam propriedade da Revista, só podendo ser reproduzidos com autorização desta. As opiniões e metodologias neles expressas são da inteira responsabilidade dos autores, mesmo quando sujeitos a revisão editorial. Por artigo original, entende-se todo aquele que, baseado em material clínico e/ou experimental, pela sua originalidade, objectivo e qualidade de metodologia, representa um esforço de contribuição concreto na esfera do conhecimento científico. Quando pressuponha uma anterior investigação ou tratamento dos dados colhidos, para esclarecimento das conclusões, deve ser referenciado com o subtítulo “comunicação prévia”. O artigo de revisão é todo aquele que resulta de uma síntese crítica de informação contida em publicações existentes, apoiando-se fundamentalmente as afirmações nele referidas em citações bibliográficas recentes (últimos cinco anos). O caso clínico consiste na apresentação de uma história clínica, cuja evolução apresenta particularidades dignas de registo. CONSIDERAÇÕES LEGAIS Os artigos baseados em investigação clínica no Homem, devem deixar bem explícito que os ensaios foram conduzidos de acordo com as normas éticas da Declaração de Helsínquia. Se se tratar de investigação animal, os autores devem estar atentos ao Decreto-lei 129/72, de 6/7/92 e à Portaria 1005/92, de 23/10/92. Nos casos clínicos, os autores, devem evitar quaisquer dados que identifiquem o doente, tais como o nome ou iniciais deste, fotografias que permitam a sua identificação (salvo com consentimento expresso) ou ainda referências hospitalares. A inclusão de material já publicado, como ilustrações ou quadros, implica a autorização do seu autor e editor. Preparação de manuscrito e suporte informático Devem ser enviadas três cópias de cada, em formato A4, escritos em língua portuguesa. As folhas devem ser dactilografadas de um só lado, a dois espaços, com margens não inferiores a 2,5 cm e paginadas. A primeira página deve conter o título e uma abreviação deste, não ultrapassando os 50 caracteres e espaços. Nesta página, deve ainda constar o nome próprio e o apelido dos autores, categoria profissional, local de trabalho, direcção e telefone do autor, a contactar para troca de correspondência. Na página que se lhe segue deve constar o resumo e as palavras-chave em português, seguindo-se-lhe o título, o resumo e as palavras-chave em inglês. Estas deverão basear-se, sempre que possível, na terminologia do Index Medicus e não exceder o número de 10 (os editores, reservamse o direito de revisão destas, quando justificada). Deverá ser entregue, um CD com a cópia do manuscrito, em formato de documento Word (Windows XP ou outra versão anterior) ou de texto (.txt) ambos para PC. Os autores devem guardar uma cópia do material enviado, para a eventualidade da sua revisão ou extravio. Os manuscritos dividem-se consoante o tipo: ARTIGO ORIGINAL Subdivide-se, regra geral em: Sumário: Deve conter informação sucinta sobre o objectivo, metodologia, resultados e conclusões e ser elaborado de modo a permitir a compreensão do trabalho, sem necessidade de recorrer ao texto. Introdução: Não deve ser referenciada com título. Deve ser concisa e conter as razões e objectivos do trabalho, podendo incluir referências sucintas e informação Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 27 considerada pertinente para o tema tratado e com bibliografia devidamente referenciada. Metodologia: Devem ser descritos os métodos utilizados, de modo claro e objectivo, de forma a que a experiência possa ser devidamente interpretada e reproduzida pelo leitor. Igualmente, no que se refere a análise estatística, deve ser referido, neste capítulo, o método usado. Resultados: A apresentação de resultados deve ser feita de forma clara, reportando a significância a níveis de probabilidade e evitando repetições desnecessárias do texto, quadros e gráficos. Discussão: Devem ser relacionados e interpretados os factos observados, assim como o seu significado em relação a estudos já publicados. Os dados considerados de interesse para as conclusões devem também ser discutidos. Os artigos originais não devem ultrapassar quinze páginas. ARTIGO DE REVISÃO Para além do título, pode subdividir-se em sub-capítulos e alíneas, segundo o critério dos autores. Os artigos de revisão não podem ultrapassar quinze páginas. CASO CLÍNICO Para além do título e resumo, deve conter uma introdução sucinta, sem título, focando a razão de ser do relato clínico, podendo conter referências bibliográficas pertinentes. A esta introdução, seguese a descrição do caso, sob o título “Caso Clínico”, em que se relatam os dados relevantes da doença actual, antecedentes pessoais e familiares, exames auxiliares, terapêutica e técnicas. Relatando o caso segue-se a Discussão, em que se analisam as características especiais do caso e se aprecia o seu significado, à luz da bibliografia existente. os casos clínicos não devem ultrapassar as seis páginas. QUADROS Os quadros representam uma relação de dados em linhas horizontais. Se neles figurarem unidades (referentes aos resultados), devem ser colocadas no topo das colunas (não as repetindo nas linhas horizontais). Devem numerar-se com algarismos romanos, segundo a ordem de citação no texto, identificados com legendas na parte superior e apresentados em páginas separadas. ILUSTRAÇÕES Por ilustrações, consideram-se os esquemas, gráficos e fotografias. Numeram-se com algarismos árabes, pela ordem de citação no texto. Os esquemas e gráficos devem ser executados em papel branco e a sua 28 Revista SPA ‘ vol. 19 ‘ nº 3 ‘ 2010 identificação, com número de citação, autor e título do artigo, deve ser feita no reverso, a lápis. As legendas devem ser apresentadas em páginas separadas. AGRADECIMENTOS Se existem, devem ser curtos. BIBLIOGRAFIA As referências bibliográficas devem ser numeradas pela ordem em que são mencionadas no texto e identificadas neste por algarismos árabes. Os títulos das revistas ou jornais devem ser abreviados de acordo com o modelo utilizado no Index Medicus. As referências de manuscritos ainda não publicados não devem ser consideradas como fontes bibliográficas. Exemplos de referências bibliográficas correctas: Revista: Jaeger MJ, Scheultetus RR. The effect of Brain circuit on gas exchange. Can J Anaesth 1897; 34:2634. Livro: Greene NM. Key words in anaesthesiology, 3rd ed. New York, Elsevier, 1988. Capítulo de Livro: Hull CJ. Opioid Infusions for the management of post-operative pain. In: Smith G, Covino BG, eds. Acute pain. Butterworths, 1985:155179. CARTAS AO EDITOR Poderão ou não referir-se a material publicado na revista. Será, no entanto, dada prioridade de publicação às relacionadas com material já editado. NOTA Estas normas de publicação representam apenas uma orientação para os Autores que pretendam dar o seu contibuto para a edição desta Revista. Para informação mais detalhada do modo de elaboração de um artigo científico, poderão ser consultados diversos textos dedicados a este tema, dos quais se destacam: Bailar JC, Mosteller F. Guidelines for statistical reporting in articles for medical Journals. Annals of Internal Medicine 1988: 266-273 Baron DN. Units, symbols and abbreviations: a guide for biological and medical editors and authors. 4th ed. London: Royal Society of Medicine Services, 1988:64 Dudley H. The presentation of original work in Medicine and Biology. Churchill Livingstone, 1977. Huth EH, Kinning K, Lock SP et al. eds. Uniform requirements of manuscripts submmited to Biomedical Journals. Annal of Internal Medicine, 1988; 108: 258265. Smith G. ed. Extended guide to contributors. British Journal of Anaesthesia, 1990; 64: 129-136.
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