fevereiro 2010 - Hotel Fraiburgo

Pecado
é não
por
Carlos Eduardo Oliveira
Jair Magri
Fotos
comer
De Fraiburgo, Santa Catarina,
onde os pomares estão carregados
nesta época do ano, surge a verdade
incontestável na região: é daqui “a
melhor torta de maçã do Brasil”.
Gula vai conferir
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GULA fevereiro 2010
Todos os dias,
D. Ivete,
dona de uma
pensão para os
lavradores que
trabalham nas
colheitas,
tira uma dessas
do forno
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O
s 400 quilômetros de boa estrada a partir
das praias de fama internacional de
Florianópolis revelam o quão “injustiçado”
é o pouco conhecido oeste catarinense. Belas
paisagens, encantos rurais e a oportunidade de
adquirir, ao longo do caminho, os aclamados queijos
e salames serranos produzidos na região. Fundada
por imigrantes italianos e da Alsácia-Lorena (hoje
pertencente à França) há apenas 49 anos, Fraiburgo,
a Capital Nacional da Maçã, faz jus ao título. Sob ar
europeu por causa da profusão de araucárias e maple
trees (árvore símbolo do Canadá), tudo aqui remete à
fruta (souvenirs, orelhões, nomes de praças, parques,
padarias, lanchonetes, estrada e até motel) desde
que, em 1963, a cidade recebeu o primeiro plantio
comercial de maçãs no país. Antes disso, variedades
nativas, extremamente ácidas, não agradavam aos
consumidores, fazendo com que a fruta cultivada na
Argentina alcançasse enorme status no mercado.
Em Fraiburgo, em meio a geleias e compotas, geniais
apfelstrudels e até bons pratos salgados, uma verdade
macieira reina, absoluta: a torta de maçã do lugar “é a
melhor do Brasil”, ouve-se com frequência. O orgulho
baseia-se em raízes históricas: quase todo mundo tem a
sua receita, que era da tia ou da avó e que, como tesouro
guardado a sete chaves, está há tempos no seio da família.
Fácil de detectar, paira sobre a cidade um divertido
inconsciente coletivo ao estilo “lá em casa é melhor”, no
qual muitos afirmam deter a fórmula definitiva da torta
de maçã suprema. Em 2005, o assunto chegou até
a produção do Fantástico, da TV Globo, que na época
fazia reportagem sobre a região. Criou-se então um
concurso para eleger a melhor torta da cidade.
A batalha das tortas
O número de inscrições surpreendeu, e, no final, um
júri teria de escolher a vencedora entre as cinco últimas
candidatas. E é aí que a coisa fica mais divertida –
diversas versões sobre a vencedora circulam na cidade,
com cada um puxando a brasa para determinada
sardinha. Caso de Celina Vígolo, sócia do restaurante
Marques e Vígolo. Com a receita da avó materna, ela
conta que, na verdade, tirou quarto lugar, “por causa da
aparência simples, sem acabamento, da minha torta”.
Mas o sabor é nota mil, garante. “Olha, as pessoas
começaram a dizer que a minha era melhor que a
vencedora”, diz. Os comentários teriam chegado à
produção do programa – e, no fim das contas, é
a torta de Celina que aparece na televisão.
Hoje, o doce global é uma das estrelas de seu
cardápio. Mas as diferentes versões para
o episódio ainda persistem.
herança de família, Cada habitante da cidade
afirma ter a receita para a torta de maçã suprema
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Fraiburgo nasceu
das mãos de
imigrantes da
Alsácia-Lorena, e
mistura o charme
europeu, de onde
saem receitas
como a maçã
ao vinho, com a
simplicidade da
zona rural – lugar
no qual as tortas
ainda esfriam
na janela
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Ao todo são
9 milhões de pés
de maçã: cena
rara no Brasil –
e muito, muito
comum
por aqui
Coincidência ou não, seja em docerias, padarias ou
delicatessens, difícil achar receita que não agrade.
Caso da delícia feita por dona Ivonete de Oliveira,
proprietária de pequena e modesta pensão, que alimenta
parte dos trabalhadores braçais vindos de Mato Grosso,
Paraná e até Maranhão para engrossar a colheita da maçã
(mão de obra fundamental para que a safra seja colhida
no prazo certo). Sabe aquela torta de maçã clássica, que
permeia o universo literário (e cinematográfico)? Pois ela
está aqui esfriando na janela de dona Ivonete, enquanto
o perfume doce impregna a humilde cozinha. Por cima
da massa, pedaços inteiros da fruta brilham como pedras
preciosas. Pouco depois, a faca nas mãos da autora parece
atravessar uma barra de manteiga ao penetrar o doce.
Ela corta fatias generosas e as serve com café recémcoado. A química é perfeita, balanceada: massa leve e
crocante; recheio úmido, cremoso, farto; as lascas de maçã
são firmes, consistentes; há um retrogosto que remete
à fruta colhida e consumida no pomar. Fruta colhida e
consumida no pomar?
A colheita nos cinco mil hectares plantados em
Fraiburgo [veja quadro ao lado] começa em fevereiro
e termina no final de abril. Nesse período, a cidade é
visitada por turistas ansiosos por passear nos pomares e
provar receitas e produtos derivados da fruta.Vinagre,
chips, compota, geleia, doces, purês, chás, aguardente
e até uma inusitada farinha para shakes – o arsenal é
extenso. Colher maçã no pé – e levá-la para casa – é
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Santos pomares
Fraiburgo assina 45%
da produção nacional de maçãs
A quantidade alimenta não apenas Ceasas,
varejões e feiras-livres Brasil afora, mas também
os estoques de gigantes como Nestlé, McDonald’s
e Nutrimental, além de ser em parte exportada
para EUA, Ásia e até Oriente Médio. São números
maiúsculos. Os cerca de 5 mil hectares plantados
(9 milhões de pés de maçã) geram safras de
220 mil toneladas por ano e dividendos anuais
da ordem de R$ 400 milhões. Quatro grandes
indústrias processadoras empregam 1/3 dos
40 mil habitantes, enquanto os 1.048 metros acima
do nível do mar propiciam temperaturas baixas em
boa parte do ano, ideais para a qualidade das galas
e fujis (respectivamente, 70% e 25% das espécies
plantadas) que brotam nos pomares da região.
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programa obrigatório. Pomares podem ser visitados nos
quatro pontos cardeais da região, mas uma esticada à
Floresta René Frey é imperativa. São 220 mil metros
quadrados de mata primária com árvores de mais de três
séculos, bosques de araucárias onde a luz diurna penetra
suavemente e acesso a pomares, trilhas, cachoeiras e até um
fascinante minizoológico. Impossível não se deixar fascinar
ante o infinito de macieiras carregadas até onde
a vista alcança. Pare e pense: quantas vezes você já
esteve frente a frente com um cenário assim?
No Brasil, sejamos francos, difícil, até porque somente
o sul do país propicia tal cenografia. Comer a maçã que
se acaba de apanhar? É o suprassumo – experiência muito
diversa de, por exemplo, enveredar por um laranjal, onde
a fruta ainda precisa ser descascada. Aqui é esticar o braço,
pegar e colocar na boca. O movimento é rápido, e a
consequência, inesquecível.
O segredo está no creme
Assim como participar de verdadeiros banquetes
onde, claro, a maçã é a estrela principal. Um deles é oferecido
no Restaurante das Estações, do hotel Renar. Situado no
alto de uma colina, é aberto a não hóspedes e oferece como
brinde uma visão monumental do belo Lago das Araucárias,
cartão-postal do município. Aos finais de semana, é palco para
concorridos almoços e jantares, com gente de municípios
vizinhos dividindo mesas com hóspedes e turistas-de-um-diasó.“Aqui em Fraiburgo, todo mundo tem suas receitas
de doces e salgados de maçã. O que fazemos em nossa cozinha
é tentar estender um pouco os limites do uso da fruta”, avisa o
chef Márcio Selau, antes de abrir os trabalhos com inusitadas
rodelas de maçã à milanesa.“Empanamos a fruta no leite, não
em ovos. Depois, quando ela é frita, fica mais para salgada
do que para doce.”
De fato, a experiência é inusitada: mais do que meros chips,
as rodelas lembram, em consistência, tomates empanados –
um primor. Antecedem a venerável truta ao molho de maçã
com amêndoas, acompanhada de risoto de... maçã. O peixe
apresenta ótima consistência também, com uma leve casca
crocante e toques agridoces do molho.“Praticamos essa
mesma receita usando medalhões ou aves. E os pratos
são muito apreciados”, diz o chef.
Já o risoto, levemente puxado no curry, vem amarelado e
úmido por causa dos pedaços da fruta. No quesito sobremesas,
um dos trunfos da carta é a torta que leva
o nome do hotel, há décadas no clã dos Frey, fundadores da
cidade. Orgulho da casa, e com uma legião de entusiastas,
esconde um segredo no creme de maçã que ninguém
consegue reproduzir, dizem.
Comeu demais? O chá de maçã está disponível,
gratuito, 24 horas por dia, em todos os restaurantes
e hotéis de Fraiburgo.
do pomar, a fruta protagoniza os pratos mais
variados. e há verdadeiros banquetes com eles
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Até na caipirinha
Destilado da fruta substitui
a pinga no drinque
No recheio do
pastel folhado,
ao forno com mel
e até no molho
da truta: as
receitas vão muito
além das tortas,
cada uma com
características
únicas
Em 1985, o senhor Bogomil Ziolkowski,
de um dos clãs fundadores do município,
adquiriu um alambique e fundou a
destilaria que o lugar ainda não tinha.
Era o início da produção de um elixir à
base de maçã que marcaria época em
Fraiburgo: o Calvados, bebida de alta
graduação alcoólica extraída da sidra,
após esta ser fermentada e destilada.
De produção artesanal, as safras
atendiam à demanda interna, mas
a maior parte das garrafas de 300
ml acabava na mão de turistas.
Curiosamente, a história conta que muita
gente passou a preferir o Calvados à
cachaça para fazer caipirinhas.
A produção durou até 2007, ano em que
Ziolkowski faleceu. Nenhum parente
continuou a empreitada, e somente
agora um de seus netos planeja retomar
a produção. No momento, ainda há
algum estoque – limitadíssimo.
À venda na loja de souvenirs do hotel
Renar, cada garrafa custa R$ 17,50.
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Risoto de maçã
(4 porções)
Truta ao molho
de maçã com
amêndoas
Ingredientes
(2 porções)
2 maçãs cortadas
em cubos, sem casca
4 colheres de sopa de nata
2 colheres de Catupiry
1 colher de chá de curry
3 colheres de sopa de manteiga
1 cebola grande picada
2 colheres de chá de alho picado
1 colher de chá de caldo de galinha
2 xícaras de arroz tipo 1
Preparo
Cozinhe o arroz à parte e separe
Em outra panela, refogue a
manteiga, o alho, a cebola e o curry
Acrescente a esse refogado as
maçãs, a nata, o Catupiry e
o caldo de galinha
Quando o molho estiver pronto,
acrescente aos poucos o arroz,
misturando bem e procurando deixar
o risoto bem úmido
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Ingredientes
2 filés de trutas limpos e sem
espinhaço
Suco de 1 limão
100 g de amêndoas sem casca
200 ml de suco de maçã concentrado
200 ml de vinho cabernet sauvignon
2 gengibres médios ralados
2 colheres de sopa de alho ralado
8 colheres de sopa de manteiga
2 cebolas raladas
4 maçãs picadas sem casca
Sal a gosto
Preparo
Tempere o peixe com limão e sal
Para o molho, refogue a manteiga,
o alho, o gengibre, a cebola e as
amêndoas
Acrescente as maçãs e o suco e
deixe ferver; a seguir, adicione o vinho
e deixe reduzir até surgir um
caldo mais grosso
Coloque o peixe em uma travessa e
regue com o molho
Pastel folhado
com maçã
(10 porções)
Ingredientes
6 maçãs
500 g de açúcar
50 g de canela
Massa folhada pronta
Preparo
Cozinhe as maçãs com açúcar
e canela. Deixe esfriar
Estique a massa folhada
e faça cortes redondos nela
Recheie com as maçãs,
e feche como um pastel
Asse por 40 minutos no forno
bem quente e já preaquecido
Salpique uma mistura de açúcar
com canela em pó por cima dos
pastéis, depois de prontos
Maçã assada no mel
Torta Renar
(10 porções)
(1 torta de 1,7 kg)
Ingredientes
Ingredientes
6 maçãs inteiras com casca
500 g de mel
100 g de canela em pó
Preparo
Tire o caroço das maçãs
sem parti-las
Coloque tudo numa forma
e regue com mel
Leve ao forno por meia hora
Sirva quente ou gelada
2 gemas
250 g de margarina
100 g de farinha de trigo
2 colheres de sopa de açúcar
5 maçãs
Suco de 1 limão
1 disco de pão de ló
500 g de nata
Preparo
Maçã empanada
Misture as gemas, a margarina,
a farinha de trigo e 1 colher
de sopa de açúcar
Forre uma forma com fundo
removível com essa mistura e asse
a 180o, por cerca de 10 minutos
Cozinhe as maçãs sem casca
com água e o suco de limão
Bata a nata com 1 colher de
sopa de açúcar
1 maçã inteira, sem caroço
e sem casca
200 g de farinha de trigo
200 g de farinha de rosca
500 ml de leite integral
Óleo para a fritura
Montagem
Preparo
Dentro da massa assada, coloque
primeiro a metade do creme feito com
a nata e o açúcar, e depois o disco de
pão de ló, que deve ser umedecido
com a calda das maçãs cozidas
A seguir, coloque o restante do
creme de nata
Cubra com as maçãs, decorando
de forma uniforme
Passe geleia de maçã dissolvida em
um pouco de água por cima com um
pincel, para dar brilho
(4 fatias)
Ingredientes
Tire o caroço (miolo) sem
partir a fruta
Descasque-a, cortando
em fatias não muito grossas
Passe a maçã na farinha de trigo,
e depois no leite; logo a seguir, passe
também na farinha de rosca
Aqueça o óleo e frite as maçãs,
cuidando para não queimá-las – elas
devem ficar douradas
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