Artigo Completo - Saúde em Movimento
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Artigo Completo - Saúde em Movimento
ARTIGO ORIGINAL Detecção do Risco de Sobrepeso em Servidoras Universitárias: Um Estudo Exploratório Geraldo de Albuquerque Maranhão Neto 1,2,3 e Cristiano José Martins de Miranda4 Resumo O sobrepeso em mulheres é associado com o desenvolvimento de doença arterial coronariana, acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca congestiva, e com um maior risco de mortalidade. A identificação das variáveis causais poderia ajudar na orientação dos cuidados a serem tomados por elas para se protegerem do sobrepeso e/ ou emagrecer. Participaram deste estudo 131 mulheres servidoras universitárias, com idade variando de 20 a 65 anos (34±9,5[média±dp]). A análise dos dados se deu aplicando regressão logística (p<0,05), utilizando-se o software estatístico Stata 5.0. O maior risco de sobrepeso foi detectado de acordo com as Razões de Chances (RC) significativas nas variáveis idade (RC-1,11;p< 0,001); menopausa (RC-4,84; p=0,01) e estresse ocupacional (RC-1,49;p=0,03). Não foi encontrada associação significativa com a atividade física de lazer (RC-0,74; p=0,40) e com o sedentarismo no trabalho (RC=1,40; p=0,34). Novos estudos exploratórios devem ser realizados, coletando-se variáveis de fácil aplicação (por meio de questionários simples), o que permite a inclusão de um maior número amostral, e um maior auxílio para a prevenção do sobrepeso/ obesidade em mulheres universitárias. Palavras-Chaves: Sobrepeso, Mulheres, Saúde Ocupacional Introdução Os profissionais de saúde pública têm se mostrado cada vez mais preocupados com o aumento da massa corporal da população, não apenas nos países industrializados, mas também nos países em desenvolvimento, aonde a adoção de um estilo de vida ina- 1 Instituto de Medicina Social - Departamento de Epidemiologia - Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) 2 Escola de Educação Física do Centro Universitário da Cidade (Univercidade) 3 Departamento de Educação Física da Escola de Reabilitação da Universidade Católica de Petrópolis (UCP) 4 PROCIMH – Universidade Castelo Branco – RJ – Brasil Submetido em 16/06/2003 Aceito em 27/07/2003 dequado vem favorecendo este acontecimento, sobretudo no que se refere aos baixos níveis de atividade física e aos hábitos alimentares. Essa preocupação se justifica na medida em que uma massa corporal acima de determinados valores encontra-se, na maioria dos ca- Endereço para Correspondência: Rua Cândido Benício 1201 bl.B ap.502 CEP 21321-800 • Jacarepaguá • Rio de Janeiro e-mail: [email protected] 166 Revista Brasileira de Fisiologia do Exercício Volume 2 sos, relacionada a uma série de problemas de saúde. A massa corporal excessiva é, geralmente, acompanhada por níveis pressóricos altos, taxa de colesterol sangüíneo elevada, diabetes do tipo 2, doença arterial coronariana e outros problemas1,2. No Brasil, estima-se que aproximadamente 32 % da população adulta apresente algum grau de sobrepeso. Sendo os dados mais alarmantes em relação às mulheres, que apresentam 55 % de prevalência de sobrepeso e obesidade, contra 37 % dos homens, quando analisamos a população entre 45 e 55 anos de idade3. Como a obesidade é, claramente, associada a um elevado nível de morbidade e de mortalidade4 e o sobrepeso é o estado inicial para a instalação desse quadro, a identificação de variáveis que interfiram neste processo, se mostra relevante. Estudos demonstram que são inúmeras as variáveis que afetam o estado ponderal das mulheres2,5. Sua identificação pode ajudar na orientação dos cuidados a serem tomados por elas para prevenção do sobrepeso e/ ou emagrecimento. No Brasil, dados de morbidade de trabalhadores ainda parecem ser escassos, principalmente relacionados à massa corporal excessiva6. Informações a esse respeito, principalmente relacionadas às mulheres, poderiam subsidiar a formulação de programas de intervenção para a melhoria das condições de trabalho e de saúde desse grupo populacional. Sendo assim, o objetivo do presente estudo foi detectar o risco de sobrepeso em servidoras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em relação a variáveis auto-referidas que pudessem estar presentes no cotidiano das avaliadas. Metodologia Esse estudo de formato exploratório investigou as variáveis dicotômicas relacionadas ao trabalho, sobrepeso e saúde da mulher7,8, a saber: estresse ocupacional, atividade física de lazer, sedentarismo no trabalho e menopausa. Participaram do estudo 131 mulheres, com idade variando de 20 a 65 anos (34±9,5[média±dp]). A coleta de dados foi realizada durante o “Primeiro Congresso de Saúde do Trabalhador”, realizado entre os dias 28 de junho e 2 de julho de 1999 na UERJ. Todas as participantes assinaram termo de consentimento pós-informado,conforme sugerido pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, após aprovação pelo Comitê de Ética da instituição. Utilizou-se um questionário objetivo, de simples aplicação, em que as participantes relatavam se possuíam ou não as variáveis do estudo (daí a característica dicotômica) e informavam a idade. A aferição da estatura e da massa corporal foi feita por meio de um estadiômetro e de uma balança da marca Filizola, com leituras de 0,1 centímetro e 0,1 quilograma, respectivamente. As medidas foram realizadas de acordo com o Manual de Padronização Antropométrica9. Para o cálculo do sobrepeso, utilizou-se o Índice de Massa Corporal (IMC) medido pela relação entre massa corporal e altura (kg/m2), que apresenta alta correlação com as medidas de gordura corpórea e tem sido o método mais utilizado nos estudos populacionais, por ser o de mais fácil aplicação e de baixo custo10. Aquelas com IMC ≥ 25 foram consideradas com a presença ao menos de sobrepeso e portanto como possuidoras do fator de risco. Para a caracterização da amostra, a estatística descritiva foi utilizada, já para a análise do risco de sobrepeso de acordo com algum fator de risco, aplicou-se a regressão logística, para um nível de significância de p > 0,05. Para os dois tipos de análise, utilizou-se o software estatístico Stata 5.0. 167 Revista Brasileira de Fisiologia do Exercício Volume 2 Resultados e Discussão Os valores relativos aos IMCs das participantes variaram de 17,70 a 40,43 kg/m 2 (24,90 ± 4,6 [média±dp]). Dessas, 42% apresentaram sobrepeso ou obesidade, 49% eram ativas no tempo de lazer, 57 % apresentando sedentarismo no trabalho, 67 % sujeitas ao estresse ocupacional e 12 % na menopausa. Na tabela 1, pode-se observar a proporção de mulheres com IMC ≥ 25, possuindo uma determinada variável auto-relatada e dicotômica. Após a caracterização da amostra, aplicouse a regressão logística a fim de verificar quais variáveis estariam associadas ao risco de sobrepeso e conseqüentemente de obesidade. Para essa análise considerou-se não só as variáveis dicotômicas, mas também a idade como variáveis independentes. Para a variável dependente dicotomizou-se o IMC da seguinte forma: possuidores de fator de risco, no caso sobrepeso ao menos, (IMC ≥ 25) recebendo o valor 1 (um) e não possuidores do fator de risco (IMC < 25), recebendo o valor 0 (zero). Após esse processo a regressão logística foi aplicada (Tabela 2). Todas as variáveis estudadas fizeram parte da análise com o objetivo de selecionar quais se associavam estatisticamente com o sobrepeso (p<0,05). Após a análise, cada variável independente apresenta uma razão de chances (odds-ratio) que equivale ao risco de desenvolver o sobrepeso. Para uma razão de chances igual a 1,0 consideramos um efeito nulo da variável; acima de 1,0 representa uma associação de risco, ou um efeito causador, e um odds-ratio abaixo desse valor, representa um efeito protetor. Para ratificar se houve o risco ou proteção contra o sobrepeso, o intervalo de confiança (IC) foi calculado, e caso o valor 1,0 estivesse dentro desse intervalo, a associação não seria considerada significativa11. Os dados deste estudo (Tabela 2), apontam a idade, o estresse ocupacional e a menopausa como sendo variáveis de risco para o sobrepeso na população em estudo. Já as variáveis sedentarismo no trabalho e atividade física de lazer mostraram-se, respectivamente, como de risco e de proteção para o sobrepeso. No entanto, esta relação não foi estatisticamente significativa para um p < 0,05 e pelos valores apresentados pelos intervalos de confiança. O maior risco de sobrepeso referente às variáveis idade e menopausa estão de acordo com o dados encontrados na literatura7,12, sendo que o risco aumentou para quatro ve- Tabela 1 Valores percentuais de mulheres com IMC ≥ 25 possuindo uma variável dicotômica auto-relatada. Variável dicotômica IMC ³ 25 Sedentarismo no trabalho Atividade física de lazer Estresse ocupacional Menopausa 47,4 % 39,1 % 43,9 % 75,0 % 168 Revista Brasileira de Fisiologia do Exercício Volume 2 Tabela 2 - Associação das variáveis auto-referidas com risco de ter ao menos sobrepeso. Variáveis Auto-Referidas Razão de Chances IC*95% Valor de p Idade 1,11 1,05-1,24 0,001 Sedentarismo no trabalho 1,40 0,56-3,30 0,34 Atividade física de lazer 0,74 0,58-1,48 0,40 Estresse ocupacional 1,49 1,17-2,96 0,03 Menopausa 4,84 2,05-5,73 0,01 *Intervalo de Confiança zes quando a participante encontrava-se na menopausa. A menopausa parece estar relacionada a um aumento da gordura corporal, principalmente com a abdominal, aumentando com isso o risco de desenvolvimento de doença arterial coronariana13. Neste estudo, foi utilizado, para estabelecer que a mulher já estava na menopausa, o período de doze meses ou mais de amenorréia, conforme definição proposta pela Organização Mundial de Saúde14. No entanto, uma das limitações do presente estudo foi não permitir avaliar em que momento próximo da menopausa tenha ocorrido o aumento de massa corporal. O risco ligado ao estresse ocupacional reforça indícios de que esta variável pode ser desencadeadora de manifestações psicológicas, como depressão e ansiedade. Acredita-se que, principalmente nas mulheres, a ansiedade estaria relacionada a uma maior ingestão calórica, podendo chegar, em alguns casos, à compulsão alimentar ou “binge eating”, extremamente relacionada com o início do processo de aumento da massa corporal em mulheres15,16. O fato de a variável atividade física de lazer ter apresentado um efeito protetor, mas sem demonstrar valores estatisticamente sig- nificativos, talvez possa ter ocorrido por não termos mensurado, com precisão, o nível de atividade física da população do estudo, tratando-se sem dúvida de mais uma limitação do estudo. O dado coletado consistia em saber apenas se a servidora praticava ou não atividade física, mostrando-se insuficiente para a associação com o sobrepeso, e reforçando o que há na literatura sobre a importância do volume de atividades físicas praticadas no combate ao sobrepeso e obesidade 17. Com relação ao sedentarismo no trabalho, essa informação acabou não obtendo associação com o risco de sobrepeso. Pesquisa feita por Ball et al.18 sobre a relação entre níveis de atividade física e ganhos na massa corporal, contando com 1302 homens e mulheres australianos reforça esse achado, pois também não foi verificada associação quando a variável estudada limitava-se às atividades ocupacionais e domésticas. Já King et al.19 demonstraram associação entre a atividade física ocupacional coletada de maneira dicotômica e o risco de um IMC ≥ 30 em 4839 norte-americanos. No entanto, um ponto extremamente importante deve ser citado: a associação foi encontrada com obe- 169 Revista Brasileira de Fisiologia do Exercício Volume 2 sidade (IMC ≥ 30) e não sobrepeso (IMC ≥ 25), sugerindo que a variável talvez não seja sensível para detectar pequenos aumentos da massa corporal e não tendo tanta utilidade em um estudo exploratório. Por isso, apenas um número amostral maior poderá fazer essa comparação com mais exatidão. Conclusão e Perspectivas de Aplicação Encontra-se na literatura a sugestão de que a prevenção primária da obesidade deva incluir estratégias enfocando a maioria dos contribuintes sociais para o alto consumo de calorias e para uma prática de atividade física inadequada, como a propaganda de produtos alimentares, os padrões de transporte e a falta de oportunidades para a atividade física durante o dia de trabalho 4. Parece, contudo, que pouca importância tem sido dada para o controle do estresse durante o trabalho, com atenção especial em mulheres de idades mais avançadas. O presente estudo reforça a necessidade de um maior número de pesquisas em torno desses temas. A idéia que se fortalece é a de que variáveis como menopausa e estresse ocupacional podem ser coletadas apenas como dicotômicas e mesmo assim ainda serem informativas no que diz respeito ao risco de sobrepeso. O mesmo, no entanto, parece ser insuficiente no caso da atividade física de lazer e do sedentarismo no trabalho. Acreditamos, com isso, que novos estudos exploratórios devam ser realizados, coletando-se variáveis de fácil aplicação (por meio de questionários simples), o que permite a inclusão de um maior número amostral, para que mais informações possam enriquecer estratégias de combate ao sobrepeso e conseqüentemente à obesidade nos mais diversos grupos sociais. Agradecimentos Estudo parcialmente financiado pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Processo E-26/151.802/1999). Referências Bibliográficas 1-Brown C, Higgins M, Donato KA, Rohde FC, Garrison R, Obarzanek E, Ernst ND, Horan, M. Body Mass Index and the Prevalence of Hypertension and Dyslipidemia. Obes Res 2000; 8(9):617-619. 2-Rexrode KM, Hennekens CH, Willett WC, Colditz GA, Stampfer MJ, Rich-edwards JW, Speizer FE, Manson JE. A prospective study of bodymass index, weight change, and risk of stroke in women. JAMA 1997; 277:1539-1545. 3-Guedes DP, Guedes JERP. Controle do peso corporal, atividade física e nutrição. Londrina: Midiograf, 1998. 4-National Institutes Of Health, Clinical Guidelines On The Identification, Evaluation, And Treatment Of Overweight And Obesity In Adults The Evidence Report, 1998. 5-Stampfer MJ, Maclure KM, Colditz GA, Manson JE, Willett WC. Risk of symptomatic gallstones in women with severe obesity. 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