parecer-conjur-0490-2008 - ajuda de custo - Conlegis

Transcrição

parecer-conjur-0490-2008 - ajuda de custo - Conlegis
ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA DO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO
PARECER/MP/CONJUR/SMM/Nº 0490 - 3.13/2008
PROCESSO nº: 04500.002316/2008-11
EMENTA:
PEDIDO
REVISÃO
DE
DO
PARECER/MP/CONJUR/RA/Nº 0860-2.9/2005. CONSULTA
SOBRE
A
POSSIBILIDADE
DE
EFETIVAÇÃO
DE
PAGAMENTO DE AJUDA DE CUSTO A SERVIDOR
EXONERADO,
NA
HIPÓTESE
EM
QUE
ESTA
EXONERAÇÃO IMPLICAR EM MUDANÇA DE DOMICÍLIO
PARA LOCALIDADE DISTINTA DAQUELA DE ORIGEM.
MUDANÇA DE ENTENDIMENTO. PELA REVISÃO DO
PARECER/MP/CONJUR/RA/Nº 0860-2.9/2005.
1.
A Coordenação Geral de Elaboração, Sistematização e Aplicação de Normas
COGES/SRH, por meio da NOTA TÉCNICA Nº 32/2008/COGES/SRH/MP (fls. 01/02) submete
ao exame desta Consultoria Jurídica – CONJUR/MP, estudos realizados visando à revisão do
PARECER/MP/CONJUR/Nº 0860-2.9/2005, ao argumento de que “o legislador não objetivou
extinguir o direito à indenização na hipótese do retorno do servidor ocorrer para localidade
diversa, razão porque não consta do ato legal expressa vedação ou restrição, o que se consumaria
com expressões próprias, tais como exclusivamente, somente, apenas, dentre outras”.
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2.
Segundo
a
Secretaria
de
Recursos
Humanos
–
SRH/MP,
o
PARECER/MP/CONJUR/Nº 0860-2.9/2005 “ faz uma interpretação meramente declarativa de
preceito restritivo do art. 9.º, inciso II e § 2º do Decreto nº 4.004, de 08 de novembro de 2001,
sem levar em conta que o reconhecimento do direito no caso, exige que seja observado como limite
de pagamento os valores que seriam recebidos na volta à localidade de origem, mesmo que o
servidor exonerado fosse para outra localidade que não a de origem.”
3.
No âmbito federal, o pagamento da ajuda de custo é disciplinado pela Lei nº
8.112, de 11 de dezembro de 1990, pelo Decreto nº 4.004/01, e Orientação Normativa/SRH nº 1, de
29 de abril de 2005.
4.
A Lei nº 8.112/90, estabelece no art. 51 que a ajuda de custo constitui uma
das espécies de indenizações devidas ao servidor público. As outras espécies de indenizações são as
diárias, o transporte e o auxílio-moradia. Segue transcrição do dispositivo:
Art. 51. Constituem indenizações ao servidor:
I – ajuda de custo;
II – diárias;
III – transporte;
IV – auxílio-moradia.
5.
Com relação às indenizações é relevante esclarecer que, em geral, constituem
uma vantagem pecuniária que se insere na esfera de direitos do servidor cujo pagamento é
esporádico e ocasional, em razão da ocorrência de um fato específico.
6.
No caso da ajuda de custo, o fato específico que provoca seu pagamento é a
alteração de sede de exercício do servidor, no interesse do serviço, com mudança de domicílio em
caráter permanente.
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7.
A modificação da sede de exercício do servidor para outro lugar, em caráter
permanente, pode ocorrer por meio dos institutos da remoção e da cessão para ocupar cargo em
comissão.
8.
A própria Lei nº 8.112/90, em seu art. 53, indica a finalidade da ajuda de
custo, qual seja, compensar as despesas de instalação do servidor na nova sede. Portanto, o que se
procura indenizar com a ajuda de custo são os dispêndios comuns e inevitáveis que o servidor tem
para se instalar, sem planejamento prévio e com rapidez necessária, na nova sede.
9.
Embora a legislação titule a ajuda de custo como uma indenização, ao
verificar sua natureza e forma de concessão, percebe-se que se trata de um auxílio financeiro, haja
vista que não é concedida mediante a apresentação de contra-recibo e, por possuir valor variável,
pode cobrir ou não integralmente as despesas de instalação do servidor.
10.
Consciente de que todas as pessoas que alteram seu domicílio, para exercer
uma atividade no interesse da administração pública federal terão despesas ocasionadas pela
necessária instalação na nova sede, a Lei nº 8.112/90, em seu art. 56, estendeu o direito à percepção
de ajuda de custo para aquelas outras pessoas, que mesmo não detendo a condição de servidores
efetivos da União, forem nomeadas para cargos em comissão, nos seguintes termos:
Art. 56. Será concedida ajuda de custo àquele que, não sendo servidor da União,
for nomeado para cargo em comissão, com mudança de domicílio.
11.
Com o propósito de regulamentar os dispositivos da Lei nº 8.112/90, que
prevêem o direito ao recebimento da indenização de ajuda de custo e da indenização de transporte,
tanto pessoal quanto de mobiliários residenciais, em primeiro lugar, foi editado o Decreto nº 1.445,
de 05 de abril de 1995, o qual foi posteriormente alterado pelo Decreto nº 1.637, de 15 de setembro
de 1995.
12.
Em seguida, foi editado o Decreto nº 4.004/01, que revogou o Decreto nº
1.445/95 e atualmente encontra-se em vigor.
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13.
Pois bem, o Decreto nº 4.004/01, na sua função de norma regulamentar,
especifica que o servidor que, no interesse da administração, for servir em outra sede, com mudança
de domicílio em caráter permanente, tanto no momento de ida quanto no da volta fará jus à ajuda
de custo, veja-se a propósito:
Art. 9º As disposições deste Decreto aplicam-se:
...
§ 2º No caso do inciso II, a ajuda de custo e o transporte de que tratam os incisos II e
III do art. 1º somente serão devidos no caso de retorno da sede onde serviu para a
sua localidade de origem.
14.
Além de esse dispositivo especificar que, “... somente serão devidos no caso
de retorno da sede onde serviu para a sua localidade de origem”, há outro dispositivo, no mesmo
sentido, no caso, previsto no Decreto nº 1.445/95 - com as alterações que lhe foram introduzidas
pelo Decreto nº 1.637/95 -, segundo o qual:
Art. 4º...
§ 1º Serão concedidos ajuda de custo ao servidor exonerado no interesse da
Administração, que tenha exercido cargo por mais de doze meses, que não faça
jus a auxílio da mesma espécie pago por outro órgão ou entidade, e transporte de
que tratam os incisos II e III do art. 1º da sede onde serviu para a sua origem.
15.
Note-se pela redação dos dispositivos acima transcritos que, aparentemente, a
intenção da norma seria restringir a concessão de ajuda de custo para os servidores exonerados,
quando essa exoneração implicasse em retorno à sede de origem, o que levou, inclusive, o ilustre
subscritor do PARECER/MP/CONJUR/Nº 0860-2.9/2005 a entender “não serem necessárias
maiores digressões para fixar o alcance do preceito, pois os termos empregados
(somente/retorno/localidade de origem), são convergentes e reiterados no sentido de não se
admitir outras hipóteses, além da prescrita (in claris non fit interpretatio)”.
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16.
Tal axioma, segundo o qual a “lei clara não carece de interpretação”, ou “em
sendo claro o texto, não se admite a pesquisa da vontade”, foi objeto de percuciente análise do
Mestre Carlos Maximiliano1:
“O mal de argumentar somente com adágios redunda nisto: tomam-nos a esmo,
isolados do repositório em que regiam muitas vezes casos particulares, e,
descuidadamente, generalizam disposição especial. Quem abra o Digesto, logo
observa que a máxima de Paulo só se refere a testamentos, revela um respeito,
talvez exagerado, pela última vontade; evita que lhe modifiquem a essência, a
pretexto de descobrir o verdadeiro sentido da fórmula verbal”. (...) no campo
legislativo embora perfeita a forma, cumpre descer ao fundo, à idéia. Prevalece
ali o ensinamento de Celso: Scire leges non hoc este, verba earurm tenere, sed
vim ac potestatem – “saber as leis, não é conhecer-lhes as palavras, porém a sua
forma e poder, isto é, o sentido e o alcance respectivos”. (grifo nosso)
17.
Como visto, para o autor, o brocardo surgiu como remédio contra abusos e
resultou no abuso oposto. Segundo ele cumpre evitar, não só o demasiado apego à letra dos
dispositivos como também o excesso contrário. Assim, a interpretação deve ser objetiva,
desapaixonada, equilibrada, às vezes audaciosa, porém não revolucionária, aguda, mas sempre
atenta respeitadora da lei.2
18.
E é, justamente, para as disposições da Lei nº 8.112/90, que devemos nos
reportar. Como exaustivamente referido acima, o Regime Jurídico Único estabelece que a
concessão da ajuda de custo requer a mudança de domicílio no interesse da Administração. Ora, as
normas regulamentadoras jamais poderão dispor diferentemente dos requisitos previstos em lei, seja
ampliando-os, seja restringindo-os.
1
2
Hermenêutica e Aplicação do Direito – Editora Forense, Rio de Janeiro, 19ªEdição, 2001, pág.27
idem, pág. 84/85
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19.
O próprio parecerista, aliás, admite, no item 7 do PARECER/MP/CONJUR/Nº
0860-2.9/2005, que o Decreto nº 4.004/01, ao estabelecer novas hipóteses de concessão, não
previstas originariamente na Lei nº 8.112/90, estaria transcendendo o seu caráter meramente
regulamentar. Senão vejamos:
“7.
Por outro lado, há que se considerar que as hipóteses de
concessão de ajuda de custo, quando do retorno, nos termos dos diplomas
supratranscritos,
especialmente
na
Lei
nº
8.112/90,
são
efetivamente
excepcionais, não comportando a interpretação extensiva, cabendo considerar,
ademais, que o Decreto nº
4.004/001, ao estabelecer novas hipóteses de
concessão não previstas, originariamente, na Lei nº 8.112/90, transcende o
caráter meramente regulamentar (vide, aqui, o art. 54 da Lei nº 8.112/90),
situação na qual sua regular edição pauta-se pelas limitações do art. 84, inciso
VI da Constituição Federal, de sorte que, interpretá-lo de modo a ampliar as
despesas
nele
taxativamente
admitidas,
importaria
em
interpretá-lo
contrariamente ao texto constitucional, que não o concebe, a princípio, como
ato normativo idôneo à instituição originária de despesas, quando dispõe sobre
a organização e funcionamento da Administração Federal. Por fim,
posicionamento diverso importaria em vulneração frontal aos dispositivos do
Decreto em questão, o que não é de se admitir, ante o princípio da legalidade
(art. 37, caput, da Constituição Federal). ” (o grifo é nosso )
20.
Com a devida vênia, não nos parece ser esta a linha interpretativa que melhor se
aplica à situação fática de que ora se trata. De fato, para Carlos Maximiliano3:
“É antes de crer que o legislador haja querido exprimir o conseqüente e
adequado à espécie do que o evidentemente injusto, descabido, inaplicável, sem
efeito. Portanto, dentro da letra expressa, procure-se a interpretação que
conduza a melhor conseqüência para a coletividade .
3
obra citada, pág.135 e 137
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Deve o direito ser interpretado inteligentemente: não de modo que a ordem legal
envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões
inconsistentes ou impossíveis. Também se prefere a exegese de que resulte
eficiente a providência legal ou válido o ato, à que tome aquela sem efeito,
inócua, o sete, juridicamente nulo.” (grifamos)
21.
Efetivamente, ao limitar a concessão da ajuda de custo ao servidor exonerado no
interesse da Administração às hipóteses de retorno somente para a sede de origem, o intérprete
restringiu onde o legislador não o fez.
22.
É que para o legislador a concessão de ajuda de custo é devida sempre que a
exoneração do servidor implicar em nova alteração de seu domicílio, independentemente desse
deslocamento ocorrer para a sede de origem ou para outra localidade distinta.
23.
Assim sendo, queremos crer que, quando o parecerista concluiu que
a
Administração extrapolou sua atribuição regulamentadora, ao disciplinar o pagamento da ajuda de
custo quando do retorno do servidor4, a sua exegese não obteve o resultado mais razoável, tal como
lecionado pelo Mestre Maximiliano.
24.
A nosso ver, quando o Decreto nº 4.004/01, exige que para fazer jus à concessão
de ajuda de custo, o servidor exonerado retorne à sede de origem, o que se quer efetivamente dizer é
que, somente será devida a indenização quando essa exoneração acarretar, necessariamente,
mudança de domicílio.
25.
Outra não pode ser a interpretação a ser dada ao dispositivo: sempre que
houver mudança de domicílio no interesse da Administração o servidor fará jus ao benefício.
Assim, para que a exoneração acarrete o pagamento do auxílio, ela deverá implicar em nova
alteração do domicílio, que já havia sido modificado anteriormente, quando da “ida” do
servidor.
4
vide item 7 do PARECER/MP/CONJUR/RA/Nº 0860-2.9/2005
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26.
Vale dizer que, se o servidor, ao ser exonerado no interesse da Administração,
tiver que alterar o seu domicílio para qualquer outra Unidade da Federação, não necessariamente
retornando à sede de origem, fará jus à indenização por seu deslocamento, nos termos da Lei nº
8.112/90, ainda que o Decreto nº 4.004/01, somente faça referência “ao retorno à origem”.
27.
Não é pelo fato de ser mais incomum a ocorrência dessa circunstância
(exoneração com mudança de domicílio para outra localidade distinta daquela de origem) que haja
amparo legal para que a Administração venha a subtrair o direito do servidor exonerado de receber
o pagamento de ajuda de custo, a fim de compensá-lo pelas despesas com a nova instalação.
28.
Eventuais dificuldades práticas, eventualmente advindas da adoção deste
entendimento, não se revestirão de matéria jurídica, mas de matéria de prova. Para tais casos deverá
a Administração munir-se de mecanismos de controle próprios tais que permitam a real aferição da
aludida mudança. É exatamente neste sentido que caminha o entendimento da Egrégia Corte de
Contas.5
29.
Finalmente, quanto ao entendimento da SRH no sentido de que deveria ser
estabelecido um limite para pagamento de ajuda de custo, de maneira que este valor se limite aos
gastos com o retorno para a origem, essa proposta, da mesma forma que a restrição quanto ao
pagamento devido pelo retorno à sede originária, não encontra guarida nas disposições contidas na
Lei nº 8.112/90.
30.
Assim sendo, a evolução no entendimento desta Consultoria, acerca da interpretação
do § 2º do art. 9º, do Decreto nº 4.004/01, que consideramos mais consentânea com o ordenamento
jurídico, especialmente com os ditames da Lei nº 8.112/90 pode ser sintetizada da seguinte forma:
a) o servidor exonerado, no interesse da Administração que tiver alterado o seu domicílio,
ainda que não seja para a sua anterior origem, fará jus ao pagamento de ajuda de custo, em
havendo seu efetivo deslocamento;
5
vejam-se os seguintes Acórdãos nº413/2005, 819/2006,1194/206 e 1876/2006.
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b) carece de amparo legal o estabelecimento de limites ao pagamento de ajuda de custo,
relativamente aos valores devidos quando do retorno do servidor, na hipótese da exoneração
acarretar a mudança de domicílio para localidade distinta da sede originária do servidor;
c) deve ser revisto o PARECER/MP/CONJUR/RA/Nº 0860-2.9/2005, cabendo à Coordenação
Geral de Elaboração, Sistematização e Aplicação de Normas - COGES/SRH promover as
adequações que venham a decorrer do atual entendimento desta unidade jurídica.
À consideração superior.
Brasília (DF), 10 de junho de 2008.
SUELI MARTINS DE MACEDO
Coordenadora-Geral Jurídica de Recursos Humanos
I.
Aprovo.
II.
À Coordenação Administrativa desta CONJUR/MP para que proceda às devidas anotações
relativas
a
alteração
do
entendimento
anteriormente
consubstanciado
no
PARECER/MP/CONJUR/RA/Nº 0860-2.9/2005.
III. Após, restitua-se à ciência e eventuais providências a cargo da
Coordenação Geral de
Elaboração, Sistematização e Aplicação de Normas - COGES/SRH.
Em 10.06.2008.
WILSON DE CASTRO JUNIOR
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