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O que está em jogo em Honduras
Marco Aurélio Garcia
The coup that threw President Manuel Zelaya out of his office and country in June may have a dangerous demonstration effect that threatens the still fragile democracy building in Central America and perhaps the whole Latin
America. The Brazilian government reacted to it strongly but discreetly at first. It decided to concentrate efforts
on the multilateral forum of the OAS and on the agreement negotiated by president Arias of Costa Rica. But
Brazil could not deny support to president Zelaya when he went back to his country and sought refuge in the
Brazilian embassy in Tegucigalpa. Brazil cannot refuse an universalist stand in its foreign policy, especially when
events such those in Honduras constitute a risk to democracy in the continent.
A proximidade excessiva de um acontecimento histórico quase sempre dificulta
sua análise. Essa dificuldade é maior
quando se está diante de um processo inconcluso. A situação de Honduras ilustra
bem esse impasse analítico.
Quando estas notas foram escritas persistia, sem solução, a crise política hondurenha. As esperanças de um acordo entre
Zelaya e o governo golpista, a partir dos
esforços da OEA e da missão do embaixador Thomas Shanon, não se confirmaram.
Micheletti mantinha, no começo de novembro, sua estratégia de realizar eleições
sem devolver, ainda que por pouco tempo, a Presidência a Manuel Zelaya.
Sua aposta era de que o pleito de novembro teria condições de tirar Honduras
do isolamento internacional em que se
encontrou depois do golpe. Esperava
uma volta do país à “normalidade”, apesar das muitas advertências internacionais – dentre elas a do Brasil – de que um
processo eleitoral organizado pelos golpistas careceria de legitimidade e não seria reconhecido.
É bom não esquecer que Honduras viveu, de forma intermitente, nos últimos
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meses em estado de sítio, o que lança mais
sombras sobre a lisura do pleito.
A posição brasileira e de tantos outros
governos expressou preocupações sobre o
futuro de Honduras, da região e das relações internacionais de uma maneira geral.
Nestas breves notas serão analisadas
algumas dessas preocupações e os problemas que daí poderão decorrer.
Os fatos
Manuel Zelaya foi deposto de forma
violenta. Retirado manu militare de sua residência, de madrugada, foi colocado em
um avião que o conduziu, ainda vestindo
pijama, para a Costa Rica. Antes de chegar
a San José, o aparelho deteve-se em uma
base militar norte-americana em Honduras. Seguramente não terá sido para abastecer o avião. Tegucigalpa fica muito próximo da Costa Rica.
Marco Aurélio Garcia é professor licenciado do Departamento de História da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp) e assessor especial de Política
Externa do presidente da República.
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As razões invocadas para a deposição
de Zelaya procuram inovar a teoria dos
golpes de Estado na região. A ação, segundo seus autores, foi “um golpe legal” e
“preventivo”.
Zelaya foi acusado de tentar mudar a
Constituição em beneficio próprio para
conseguir um segundo mandato, o que é
expressamente proibido pela Carta hondurenha, aí figurando como cláusula pétrea. A “legalidade” do golpe teria sido
dada pelo Congresso e pela Corte Suprema. Sua “legitimidade” teria sido confirmada pelo apoio ao “pronunciamiento”
dado por empresários e pelo cardeal.
Ao lado desses “argumentos” apareciam razões mais tangíveis. O presidente
deposto se havia transformado em perigoso esquerdista, aliado de Hugo Chávez.
Mas a realidade era bem distinta. O
presidente Zelaya não propôs mudar a
Constituição, mas realizar uma consulta –
sequer um plebiscito – sobre a possibilidade de convocar uma Constituinte. A chamada “quarta urna” seria colocada ao lado
das urnas tradicionais para que os eleitores opinassem sobre um conjunto de problemas que transcendiam o tema específico da reeleição, ainda que essa questão
pudesse seguramente vir a ser discutida
em caso de uma refundação institucional
do país. O fato desta consulta estar prevista para se realizar no mesmo dia da eleição presidencial, e de não ter caráter vinculante, já eliminava o alegado risco de
continuísmo.
A convocação de Assembleias Constituintes vem se afirmando com muita força
na América Latina. Para alguns, essa tendência aparece como um casuísmo autoritário impulsionado por caudilhos que
buscam perpetuar-se no poder.
Olhando sem parti pris ideológico, o
fenômeno pode ter outra explicação. A
emergência de novos atores na cena política de muitos países provocou uma am124
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pliação do espaço público que não encontrou correspondência nas instituições
existentes. Estreitas e conservadoras elas
se constituíam em verdadeira camisa de
força que impedia a construção de novos
direitos na sociedade. A não resolução
dessa contradição empurrava a sociedade
ou para alternativas violentas, ou para
uma perigosa estagnação política.
Manuel Zelaya foi eleito presidente como candidato de um partido conservador.
Fazendeiro, ele pertence a uma das grandes famílias que controlam o poder econômico e político de Honduras há décadas.
À frente do governo de um dos países
mais pobres da América Latina, desenvolveu programas sociais e buscou enfrentar
as dificuldades energéticas de Honduras.
Para tanto, aproximou-se da Venezuela
com o intuito de beneficiar-se da associação com a Petro Caribe, que oferecia condições muito vantajosas para a compra de
combustíveis aos países da região. Com os
mesmos propósitos pragmáticos, ingressou na Alba (Aliança Bolivariana das
Américas) e buscou apoio do Brasil para
projetos energéticos em seu país.
Todos esses fatores transformaram este
político originariamente conservador em
um dissidente das elites tradicionais, que
assistiam inquietas uma mudança na correlação de forças em Honduras.
Disso surgiu e se alimentou a tese do
“golpe preventivo”, logo abraçada pela
direita latino-americana, inclusive a do
Brasil. Mas essa não é uma tese original,
ainda que seja grave seu reaparecimento
hoje.
O “golpe preventivo” tem sido apresentado como “solução” para outras situações políticas que desagradam às oposições conservadoras em todo o continente.
A democracia estaria enfrentando graves
riscos na América Latina. Não bastariam,
assim, apenas eleições, mesmo quando
limpas, para resolver essas ameaças e legi-
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timar um governo como democrático. Seria necessário também proteger-se dos
“regimes plebiscitários”, do “populismo”
da manipulação de massas despreparadas
por governantes ambiciosos.
Raciocínios semelhantes foram utilizados para desencadear o golpe de Estado
contra Hugo Chávez em abril de 2002, e a
segunda tentativa de derrubá-lo em dezembro do mesmo ano.
Argumentos análogos foram empregados para derrocar o presidente João Goulart, em 1964. Tratava-se, segundo seus
autores, de uma ação preventiva para impedir o estabelecimento de uma “república sindicalista”, conceito que surpreendentemente reaparece nos dias de hoje
aqui no Brasil.
A deposição de Goulart também foi
legitimada por decisão da Câmara dos
Deputados, que aceitou a tese do seu então presidente, Rainieri Mazzili, sobre a
“vacância de poder” criada por uma suposta fuga do presidente constitucional. A
fuga verdadeira de Jango para o Uruguai
só ocorreu depois de sua deposição.
Goulart já havia sofrido uma tentativa
de golpe quando os militares tentaram
impedir que ele, na condição de vice-presidente, ascendesse à Presidência em consequência da renúncia de Jânio Quadros.
Os golpistas também invocaram a
ameaça do advento de uma “república
sindicalista”, risco que foi minorado com
a adoção da emenda parlamentarista, que
reduzia os poderes do novo presidente.
Efeito de demonstração na
América Central
A enfática condenação do golpe por
todos os países das Américas, especialmente pelo Brasil, traz embutida uma
preocupação central. Depois de mais de
uma década de transição para a democra-
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cia na América Latina haveria o risco de
abertura de um novo ciclo autoritário como aquele que se abateu sobre a região
nos anos 1960-70.
Essa recaída autoritária é preocupante
para todo o continente e particularmente
ameaçadora para a América Central, região que vem tentando a duras penas
construir regimes democráticos.
Fora a Costa Rica – um oásis de estabilidade em uma zona altamente conturbada – todos os demais países da América
Central viveram profundas crises em períodos relativamente recentes.
O Panamá sofreu a intervenção norteamericana. Transitou lentamente para a
democracia. Em 2003 elegeu Martin Torrijos para a Presidência, um candidato de
centro-esquerda, sucedido por Ricardo
Martinelli, identificado como homem de
direita. A sucessão não afetou, no entanto,
a estabilidade institucional do país.
A Nicarágua passou pela revolução
sandinista nos anos de 1970, enfrentou a
intervenção dos “contra” nos anos de 1980
e finalmente se estabilizou. Daniel Ortega,
que chegou ao governo pela força de uma
insurreição popular, cedeu o poder a Violeta Chamorro, após perder as eleições, e
retornou recentemente ao governo pelo
voto.
Em El Salvador, depois de anos de luta
armada, logrou-se um acordo de paz entre
a guerrilha e a direita, na década passada.
As eleições gerais deste ano deram ao candidato da Frente de Libertação Nacional
Farabundo Martí (FMLN), Mauricio Funes, a Presidência da República.
Na Guatemala, também nos de 1990, as
organizações guerrilheiras reunidas na
UNRG chegaram a um acordo com o governo depois de anos de cruenta guerra
civil e de incontáveis violações dos direitos humanos. Mais recentemente, o país
acabou por eleger Álvaro Colón, um candidato de centro-esquerda.
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Honduras, onde não houve movimentos insurgentes relevantes, superou o regime ditatorial e conseguiu também construir um caminho democrático, apenas
agora interrompido.
O temor de um efeito dominó na América Central, a partir dos acontecimentos
de Tegucigalpa, não é desprovido de fundamento.
Pouco antes do golpe hondurenho, a
direita guatemalteca desencadeou uma
operação de grande envergadura contra o
presidente Colón, tentando envolvê-lo no
assassinato de um advogado. A ofensiva
somente amainou quando uma investigação independente da Justiça inocentou
completamente o presidente da República.
Em El Salvador, a mobilização dos conservadores para impedir a eleição de Funes foi considerável e não são poucos os
que, entre os conservadores de direita daquele país, gostariam de reverter por
meios antidemocráticos o resultado das
urnas.
Por todos esses antecedentes, o êxito
da estratégia de Micheletti em Honduras
seria entendido como um sinal de encorajamento a novas aventuras.
A posição brasileira
O governo brasileiro, apesar de sua
enfática condenação ao golpe de Honduras, manteve baixo perfil nas primeiras
semanas após o acontecimento. Nem o
presidente Lula nem seu ministro de Relações Exteriores estiveram na reunião do
Grupo do Rio, em Manágua, à qual assistiram vários chefes de governo.
Lula tampouco acompanhou Zelaya
em sua tentativa de retornar por avião a
Tegucigalpa, como fizeram outros presidentes latino-americanos. Não havia diplomatas brasileiros acompanhando o
presidente deposto quando ele tentou voltar a seu país pela fronteira terrestre.
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O Brasil sancionou o golpe com a retirada formal de seu embaixador em Tegucigalpa, cortando toda a cooperação econômica e militar com Honduras e passando
a exigir visto para os cidadãos desse país.
Concentrou suas iniciativas na Organização dos Estados Americanos (OEA)
buscando constituir uma ampla coalizão
de países que revertesse a situação, devolvendo o poder ao presidente deposto.
O Brasil apoiou a moderada proposta
do presidente da Costa Rica, Óscar Arias,
sobretudo depois de Zelaya haver manifestado sua concordância com a fórmula
apresentada pelo Prêmio Nobel da Paz.
O presidente deposto visitou Brasília
– no marco de uma viagem a vários países
da América do Sul – tendo sido recebido
pelo presidente Lula, que lhe reiterou seu
apoio e solidariedade.
A visibilidade maior que o Brasil passou a ter na crise hondurenha decorreu do
fato de Manuel Zelaya ter ingressado clandestinamente no território hondurenho
buscando abrigo na embaixada do Brasil.
Não faltaram especulações sobre a conivência do governo brasileiro com esta
operação de retorno. Não foi apresentada
nenhuma evidência desse envolvimento.
O presidente Lula foi informado do fato
no avião que o transportava para Nova
York, onde participaria da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Não teria por que negar apoio ao presidente deposto em sua volta a Honduras. A
decisão de Zelaya foi legítima e correta
sob o ponto de vista político. Legítima
porque ele estava retornando ao seu país,
do qual fora ilegalmente expulso. Correta
porque, com sua presença, ele buscou mudar – como efetivamente mudou – o ritmo
das negociações sobre a crise. A escolha da
embaixada do Brasil se deveu à respeitabilidade que possui a política externa brasileira no mundo atual e ao fato de que a
conduta de nossa diplomacia havia sido
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marcada pela discrição e pela busca de
uma saída negociada.
A presença do presidente deposto na
embaixada brasileira contribui para que o
governo golpista – sintomaticamente chamado por alguns de “interino” – mostrasse sua verdadeira face. Decretou estado de
sítio, suprimindo direitos e garantias individuais, reprimiu violentamente as manifestações pró Zelaya e estabeleceu a censura sobre os meios de comunicação com
o fechamento violento de emissoras de
rádio e televisão. Com isso tornou mais
problemática ainda a realização das eleições presidenciais.
Veladas ameaças de Micheletti à soberania da embaixada brasileira receberam
resposta adequada do presidente Lula. O
Conselho de Segurança das Nações Unidas expressou seu apoio ao Brasil.
Os pronunciamentos de Manuel Zelaya durante sua permanência na embaixada sempre foram moderados. Não obstante, houve os que criticaram o fato de o
presidente deposto ter transformado a legação brasileira em “seu escritório político”, ao mesmo tempo em que se multiplicavam comentários sobre o bigode ou o
chapéu do governante. Sobre o golpe, nenhuma palavra.
As considerações estéticas dos que
defenderam o “golpe preventivo” de Micheletti não fazem mais do que dar seguimento a tentativas de desqualificar pessoalmente todos os governantes que na
América Latina desenvolvem projetos políticos opostos a suas convicções.
Evo Morales foi transformado em “índio cocalero”. Hugo Chávez no “tenente
coronel cafuzo” (“zambo”). Rafael Correa
em um “canastrão”. Fernando Lugo no
“padre com muitos filhos”. Sem esquecer,
obviamente, o comentário de um dos ministros de Micheletti para quem o presidente Obama não passava de um “negrinho ignorante”.
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Estados Unidos, Honduras e
a América Latina
A crise hondurenha constituiu-se em
mais um desafio para o presidente Barack
Obama. A complexa transição que Obama
vem realizando na política externa norteamericana tem produzido até agora resultados desiguais e, não raro, contraditórios.
Obteve avanços significativos em matéria de desarmamento a partir de seu
entendimento com a Rússia e da decisão
de não implantar mísseis na Europa do
leste. Mostrou disposição de diálogo com
o Irã. No discurso do Cairo e em outras
iniciativas parecia estar inaugurando uma
nova postura vis-à-vis o Oriente Médio,
em particular sobre a questão palestina.
Atitudes a posteriori não confirmaram o
que parecia um novo impulso para enfrentar o problema de maior complexidade das relações internacionais.
O relacionamento com a América Latina obedece também esta mesma trajetória
errática. A nova sensibilidade para os problemas da região, anunciada nos encontros Obama-Lula e na conversa com os
presidentes sul-americanos em Trinidad e
Tobago, encontrou fortes resistências nos
conservadores que mantêm posições não
só no Congresso dos Estados Unidos como na própria administração.
Se foi positivo o apoio dos EUA à anulação da exclusão de Cuba da OEA e à
atenuação de algumas medidas restritivas
ao regime de Havana, decepcionou a renovação do embargo por mais um ano.
Medida que recebe há anos a condenação
quase unânime da comunidade internacional – reiterada recentemente pela Assembleia Geral da ONU – o embargo é
visto na América Latina como símbolo de
uma política com sabor de “guerra fria”,
além de ineficaz.
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A policefalia da política externa norteamericana para a América Latina explica o
desastrado e contraditório anúncio sobre
as bases na Colômbia. Se o Departamento
de Estado apresenta as bases aéreas naquele país como restritas ao combate interno do narcotráfico, os papéis do Pentágono (incluindo os oficiais e não apenas os
“estudos”) mostram que elas fazem parte
de uma “projeção de poder” dos Estados
Unidos em toda a região. Com isso alimentam situações de tensão regional.
No caso da crise hondurenha a situação não foi diferente. Foi muito positiva a
condenação do golpe por parte do governo norte-americano. Foram positivas as
primeiras medidas de retaliação contra os
golpistas. Mais positivo, ainda, o envio de
Tom Shanon – experimentado diplomata
– para lograr uma saída ao impasse hondurenho.
Mas é evidente que certa ambiguidade
em relação ao reconhecimento de eleições
presididas pelos golpistas e o fato de os
Estados Unidos não terem realizado mais
pressões sobre Micheletti permitiram que
os golpistas se sentissem respaldados para
prosseguir em sua estratégia.
Não é segredo para ninguém que a
atitude a ser adotada pelos Estados Unidos em relação a Honduras se transformou no cavalo de batalha dos conservadores no Congresso, na mídia e, de forma
mais sinuosa, na própria administração.
Pronunciamentos de Otto Reich e de outros, mais recentemente convertidos ao
neoconservadorismo, são claros indicadores dessa realidade.
É sabido que a aprovação de Thomas
Shanon como embaixador dos EUA em
Brasília e de Arturo Valenzuela para subsecretário para a América Latina sofre restrições de parlamentares republicanos que
advogam uma atitude “compreensiva” de
Washington em relação aos golpistas de
Tegucigalpa.
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Obama tentou sair do desconforto que
os acontecimentos de Honduras provocaram na diplomacia de seu país, ironizando
os que hoje pedem maior pressão dos
EUA e ontem criticavam a ingerência desse país na vida do continente.
O efeito retórico da boutade presidencial não encobre a realidade. Os Estados
Unidos têm dificuldade em assumir mais
rápida e corajosamente uma nova política
para uma região do mundo que acumulou, por décadas, justificados ressentimentos e resistências ao vizinho do norte.
O governo brasileiro, que mantém excelentes relações com Washington, desde
a administração Bush, tem autoridade para fazer essa advertência. É certo que a
América Latina não ocupa lugar prioritário nas preocupações globais dos EUA.
Isso pode ser visto como algo positivo.
Expressa uma realidade: a região atravessa uma situação favorável de crescimento
econômico, melhoria social e consolidação
democrática.
Para a América Latina, uma presença
mais discreta dos Estados Unidos também
significa menor ingerência, menores tensões. Um descolamento muito grande dos
EUA em relação ao continente ou sua presença apenas militar – bases, Quarta Frota,
por exemplo – poderá implicar em um
estranhamento mais profundo e duradouro que comprometa relações equilibradas
e transparentes.
Conclusão
Um pequeno e pouco conhecido país
da América Latina se transformou em
centro de atenção da política internacional nos últimos meses. Por que essa visibilidade de Honduras na cena internacional? Perguntou-se também por que o
Brasil deu tanta importância a uma situação que ficava “fora de sua área de influência”.
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As duas perguntas talvez possam ser
respondidas com um mesmo argumento.
Ressalvado o fato de o Brasil não pretender ter “áreas de influência”, mas não renunciar uma postura universalista em sua
política externa, cabe reiterar o que estas
notas procuraram explicitar ainda que resumidamente.
A construção da democracia na América Latina é um processo em curso, marcado por seu caráter embrionário e desigual.
Entender esse processo é fundamental para garantir não só sua continuidade como
seu aperfeiçoamento.
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Os acontecimentos de Tegucigalpa vão
na contramão da evolução do continente.
Mais que isso: fizeram velhos fantasmas
voltarem a rondar o debate político latinoamericano. A desinibição com que se manifestaram os adeptos das soluções “preventivas” não pode ser creditada apenas
ao fanatismo de renitentes conservadores.
Ela expressa também a incapacidade de
alguns que – aqui e lá fora – pregam a alternância, mas não suportam viver seus
efeitos.
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