Solicitação de revisão de diretriz de utilização (DUT)

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Solicitação de revisão de diretriz de utilização (DUT)
Solicitação de revisão de diretriz de utilização
(DUT) para o procedimento ‘Rizotomia
percutânea com ou sem radiofrequência’
Parecer da Sociedade Brasileira de Coluna
Agosto de 2015
1
CONFIDENCIAL
Não deve ser usado, divulgado, publicado ou propagado de outras formas sem o consentimento expresso da Sociedade
Brasileira de Coluna.
REVISÃO DE DUT
TÍTULO: Rizotomia percutânea com ou sem radiofrequência
ÓRGÃO FINANCIADOR: Sociedade Brasileira de Coluna
AUTORES: Roberta Arinelli Fernandes1, Laura Murta Amaral2, Bethania Garcia Beraldo
de Almeida3
REVISORES: Lina Herval4, Aluízio Augusto Arantes Junior5, João Luiz Pinheiro-Franco6,
Mauro Volpi7, Alexandre Fogaça8, Marcelo Wajchenberg9, Carlos Henrique Ribeiro10,
Cristiano Menezes11, Edson Pudles12.
1
Médica, diretora médica da SENSE Company;
Biomédica, analista de projetos da SENSE Company;
3 Biomédica, analista de projetos da SENSE Company;
4 Médica, neurocirurgiã, membro da Comissão de Avaliação de Novas Tecnologias da Sociedade Brasileira de Coluna;
5 Médico, neurocirurgião, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Coluna;
6 Médico, neurocirurgião, Membro Titular da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, Membro Titular da Sociedade
Brasileira de Coluna, Membro da Sociedade Norte-Americana de Coluna, Membro do Comitê de Coluna Vertebral da
Federação Mundial de Neurocirurgia (World Federation of Neurosurgical Societies-WFNS), Revisor científico do jornal
norte-americano de coluna SPINE e do jornal europeu de coluna European Spine Journal, Editor da divisão coluna
vertebral do jornal World Neurosurgery, jornal oficial da World Federation (WFNS), Presidente do Capítulo São Paulo
da Academia Brasileira de Neurocirurgia (2008-2012);
7 Médico, neurocirurgião, presidente da Sociedade Brasileira de Coluna;
8 Médico, ortopedista, membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Coluna;
9 Médico, ortopedista, membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Coluna;
10 Médico, neurocirurgião, membro e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Coluna (2013-2014);
11 Médico, ortopedista, membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Coluna;
12 Médico, ortopedista, membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Coluna.
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Não deve ser usado, divulgado, publicado ou propagado de outras formas sem o consentimento expresso da
Sociedade Brasileira de Coluna.
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RIZOTOMIA PERCUTÂNEA COM OU SEM RADIOFREQUÊNCIA
1. Introdução
Síndrome facetária
As dores lombares, dorsais ou cervicais crônicas possuem alta prevalência na população mundial
e acarretam um grande impacto para a sociedade ao cursar com elevados custos diretos
(consultas, exames de imagens e tratamentos) e indiretos (custos relacionados à perda de
produtividade). (1)
A lombalgia ocasiona uma alta procura por assistência médica, sendo a segunda causa em
decorrência de doenças crônicas com maior procura. Após lombalgias agudas, 40% a 44% dos
indivíduos apresentam cronificação da dor. (2) Pacientes com dor na região lombar podem
apresentar dificuldades em pegar objetos no chão, subir e descer escadas e caminhar. (3) A
limitação funcional é importante, sendo a principal causa de incapacidade em indivíduos com
menos de 45 anos em países industrializados. Segundo Imamura (2), a lombalgia é a principal
causa de absenteísmo ao trabalho. Cerca de 10 milhões de brasileiros ficam incapacitados
devido à lombalgia. (4) Em 2010, a lombalgia alcançou a 6ª posição no ranking global das
principais causas de anos de vida ajustados por incapacidade. (5) A lombalgia gera um alto custo
para o sistema de saúde. Custos sociais incluem assistência médica, absenteísmo no trabalho,
redução de produtividade e afastamento temporário ou definitivo do trabalho. A maior parte
dos custos (75%-90%) é relacionada aos pacientes com lombalgia crônica. (2)
Segundo a Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED) (6), a cervicalgia afeta de 30 a 50%
da população geral, anualmente. As mulheres são mais afetadas e a maior prevalência é entre
indivíduos de meia idade. As dores na região cervical ocorrem em algum momento da vida em
cerca de 55% das pessoas, e destes, 12% das mulheres e 9% dos homens terão cervicalgia
crônica. (7) A cervicalgia é causa importante de incapacidade e absenteísmo. Anualmente, entre
11% e 14% da população economicamente ativa sofre alguma limitação devido à dor cervical.
(6)
Várias causas podem estar associadas às dores na coluna, entre as principais, os discos
intervertebrais e as articulações facetárias.
A articulação facetária é uma articulação sinovial, envolvida por uma cápsula ricamente
vascularizada e inervada pelo ramo medial do ramo dorsal do nervo espinhal, que vem sendo
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suspeitada como fonte de dor lombar desde o início do século XX (8) e em cerca de 17 a 20%
dos casos de dor lombar crônica. (9) A etiologia da dor facetaria ainda não está clara, e hipóteses
compreendem alterações mecânicas, vasculares e moleculares. (10) A artrose facetária pode
levar a alterações patológicas, como esclerose do osso subcondral, hipertrofia articular,
estreitamento do espaço articular e formação de osteófitos (Figura 1 e Figura 2). (10)
Figura 1. Articulações facetárias normais e articulações facetárias após doença degenerativa.
Figura 2. Redução do espaço foraminal normal, com compressão de raiz nervosa, associada a
síndrome facetária.
O diagnóstico de dor lombar relacionada à síndrome facetaria é clínico, através da exclusão de
outras causas de dor lombar. O sintoma típico é a dor lombar crônica que pode ser uni ou
bilateral, pode irradiar para os membros inferiores sem um padrão radicular, geralmente não
ultrapassando os joelhos. O paciente normalmente refere alívio da dor com a flexão do tronco
e relata piora com a extensão do tronco, movimentos rotatórios e atividades físicas. (8)
Vários métodos de tratamento vêm sendo propostos, desde os não invasivos como repouso
relativo, fisioterapia, acupuntura, analgésicos e corticoides, até métodos mais agressivos, como
a denervação por cirurgia aberta, a artrodese com parafuso pedicular, a fixação traslaminar e a
facetária, que podem trazer complicações associadas. Atualmente muitas técnicas
minimamente invasivas vêm ganhando espaço e se demonstrando efetivas no tratamento da
dor lombar crônica, como é o caso da infiltração intra articular, bloqueio do ramo nervoso que
supre a articulação facetária, e a neurotomia por radiofrequência. (8)
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Como exames físicos ou radiográficos não são capazes de diagnosticar a síndrome facetaria, o
bloqueio do ramo medial e a injeção facetaria são utilizados como indicações para a rizotomia.
(9) Para que o bloqueio seja utilizado como diagnóstico, é necessário que pelo menos 70% da
dor seja aliviada. (9)
Para que haja denervação de uma faceta articular, é necessário que 2 níveis adjacentes sejam
tratados. (9) O tratamento mais utilizado envolve o uso de eletrodos percutâneos de
radiofrequência. (9)
Rizotomia por radiofrequência: procedimento
É utilizada uma agulha de calibre 20 com uma ponta de 10mm. Paralelamente, outras agulhas
são posicionadas em outro(s) nível(is). (9) Após o posicionamento de todas as agulhas, para
assegurar que nenhuma das agulhas está posicionada muito próxima de uma fibra motora do
ramo primário anterior, uma estimulação é feita. (9) O procedimento de rizotomia inicia-se uma
vez que a estimulação é feita até 2,5 V. Lentamente, a temperatura é elevada à 85º e mantida
por 60 segundos pelo gerador de radiofrequência. (9)
Para que haja uma transição confortável do centro cirúrgico para casa, 2 ml de uma solução de
30ml de xilocaína 1%, 30ml de marcaína 0,25% , ambas com epinefrina, e 2ml de betametasona,
é injetada. (9) A agulha é removida e o paciente é levado a uma sala de recuperação após o fim
do procedimento. A Figura 3, Figura 4 e Figura 5 ilustram o procedimento de rizotomia
percutânea por radiofrequência.
Figura 3. Esquema que ilustra o procedimento de rizotomia percutânea por radiofrequência.
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Figura 4. Imagens de tomografia 3D e fluoroscopia que ilustram o procedimento de rizotomia
percutânea por radiofrequência.
Figura 5. Imagens de fluoroscopia que ilustram o procedimento de rizotomia percutânea por
radiofrequência.
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2. Diretriz de utilização (DUT) atual
1. Cobertura obrigatória para pacientes com dor facetária (lombalgia, dorsalgia ou
cervicalgia), quando forem preenchidos todos os critérios do Grupo I e nenhum dos critérios
do Grupo II:
Grupo I
a. limitação das Atividades da Vida Diária (AVDs) por pelo menos seis semanas;
b. redução >50% da dor referida medida pela VAS após infiltração facetária utilizando
anestésico local;
c. falha no tratamento conservador adequado.
Grupo II
a. cirurgia espinhal prévia no segmento analisado;
b. hérnia discal;
c. sinais de estenose ou instabilidade potencialmente cirúrgicas.
2. Cobertura obrigatória para pacientes com espasticidade focal, intensa e com sintomas
incapacitantes, mesmo após a realização de tratamento medicamentoso e fisioterápico.
3. Pacientes portadores de nevralgia de nervo trigêmio, glossofaríngeo, occipital ou
intermédio, refratários ou intolerantes ao tratamento clínico contínuo por no mínimo 3
meses.
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3. Solicitação de alteração
1. Definição de que esta DUT aplica-se somente para os casos em que se utiliza o
método por radiofrequência, e não se aplica para a rizotomia percutânea química.
2. Retirada do Grupo II que cita os critérios de exclusão para a realização do
procedimento.
3. Inclusão das considerações elaboradas pela Sociedade Brasileira de Neurocirurgia
relacionadas ao uso de radiofrequência no tratamento das enfermidades de coluna
publicadas em junho de 2014. (ANEXO 1)
4. Motivação
4.1. Definição de que esta DUT aplica-se somente para os casos em que se utiliza o método por
radiofrequência, e não se aplica para a rizotomia percutânea química.
Esta DUT deve ser aplicada somente para rizotomia percutânea por radiofrequência
e não para as infiltrações facetárias e perirradiculares.
A rizotomia percutânea química é tratamento consagrado e, pela introdução do
método radiofrequência que exige DUT, passou a ser não autorizada pelas
operadoras.
A rizotomia percutânea química é tratamento consagrado e clássico em nosso país há mais de
20 anos e, pela introdução do método radiofrequência que exige uma DUT, passou, mais do que
erroneamente, a ser não autorizada pelas operadoras de planos de saúde em alguns casos.
Esta revisão de DUT se faz necessária para evitar novos erros de interpretação que vêm
ocorrendo pelas operadoras de planos de saúde, prejudicando tratamentos já consagrados dos
pacientes.
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Desta forma, é necessário que fique esclarecido que a DUT de rizotomia de aplica somente para
rizotomia percutânea por radiofrequência e não para as infiltrações facetárias e perirradiculares
(leia-se: rizotomia percutânea química, conforme item 1 do parecer 89 – 2014 da Sociedade
Brasileira de Neurocirurgia, Anexo 1).
4.2. Retirada do Grupo II que cita os critérios de exclusão para a realização do procedimento.
4.2.1. Cirurgia espinhal prévia no segmento analisado.
O critério de não indicação para a radiofrequência deve ser apenas no segmento
analisado, ou seja, “cirurgia espinhal prévia em outro segmento não é uma
contraindicação para rizotomia por radiofrequência" pois a artrodese pode, sim,
levar à sobrecarga mecânica do segmento superior ou inferior da coluna.
Como sugestão, o trecho “cirurgia espinhal prévia no segmento analisado” deveria
ser alterado para “artrodese espinhal por via posterior no segmento analisado”.
A artrodese da coluna, é um processo que resulta na fusão de duas ou mais vértebras e
determina, portanto, a perda de um ou mais unidades funcionais segmentares (UFS, em inglês:
FSU ou functional segment unit), onde cada UFS é um tripode formado pelo disco vertebral, as
articulações facetarias, os ligamentos e a cápsula articular. Desta forma, a artrodese poderá,
sim, acarretar uma sobrecarga mecânica nos tripodes (UFS) adjacentes. Assim, é sugerido que
deva-se deixar claro que:
O critério de não indicação para a radiofrequência é no segmento analisado, ou seja,
“cirurgia espinhal prévia em outro segmento não é uma contraindicação para rizotomia
por radiofrequência" pois a artrodese de coluna pode, sim, levar à sobrecarga mecânica
do segmento superior ou inferior da coluna.
Não cabe fazer rizotomia por radiofrequência em segmento vertebral artrodesado pela via
posterior, entretanto:
É possível realizar rizotomia por radiofrequência no segmento submetido a cirurgia
espinhal se pela via anterior (por exemplo se o paciente for submetido a artrodese
cervical ou lombar por via anterior, o que inclusive pode desencadear síndrome
facetaria por sobrecarga aplicada sobre as facetas);
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É possível realizar rizotomia por radiofrequência nos segmentos adjacentes a um
segmento artrodesado seja pela via posterior ou anterior.
Em paciente que já foi submetido a uma cirurgia de coluna sem artrodese, por exemplo: para
hérnia de disco, como a clássica discectomia, neste caso, há a possibilidade de que este paciente
desenvolva sobrecarga mecânica neste segmento onde se fez a remoção da hérnia, assim, há a
possibilidade de se ter necessidade de fazer a rizotomia por radiofrequência neste nível, pois as
facetas não estão artrodesadas e pode haver sobrecarga mecânica destas facetas articulares. O
disco intervertebral após uma discectomia não é mais o disco intervertebral normal, ele já sofreu
um processo de degeneração, havendo, sim, portanto a possibilidade de sobrecarga das
articulações facetárias posteriores. Em resumo:
É sugerido que a frase “cirurgia espinhal prévia no segmento analisado” seja alterada
para a frase “artrodese espinhal por via posterior no segmento analisado” que definiria
melhor o “contra requisito” para se fazer a rizotomia por radiofrequência, no contexto
do processo fisiopatológico da cascata da degeneração discal.
A síndrome do insucesso da cirurgia vertebral (SICV) ocorre quando pacientes submetidos a uma
ou mais intervenções cirúrgicas para o tratamento de doença da coluna lombossacral obtém um
resultado insatisfatório com persistência dos sintomas a longo prazo, como lombalgia
recorrente ou persistente. (11) A ablação dos neurônios aferentes primários pode proporcionar
o alívio da dor quando a origem está no disco, no ligamento ou na articulação. (11)
A rizotomia dorsal pode ser indicada para a redução da dor radicular persistente após a cirurgia
lombossacral. (11)
Muitos pacientes submetidos à artrodese experimentam dor pós-operatória mínima após uma
artrodese posterolateral dos processos transversos e das articulações facetarias. (11) Mesmo
que a fusão seja completa, problemas com a estabilidade e função do paciente podem ser
causados por um alinhamento ineficiente. (12) Quando ocorre uma falha na fusão e a
imobilização, o tratamento conservador e a estimulação óssea falham, é necessário o
tratamento cirúrgico. (12)
É possível que pacientes que realizaram artrodese cervical ou lombar por via anterior,
desenvolvam síndrome facetária no pós-operatório. Isto ocorre devido à sobrecarga gerada pela
osteossíntese anterior nos elementos posteriores, especialmente nas facetas articulares. A
rizotomia por radiofrequência é especialmente indicada nesses casos.
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O segmento artrodesado/fixado pode desenvolver uma sobrecarga dos elementos facetários
nos segmentos adjacentes. Nestes casos, a rizotomia é indicada para o tratamento dos
segmentos acima ou abaixo.
4.2.2. Hérnia discal.
A dor de origem facetária ocorre pelos processos degenerativos que também podem
ser observados em outras articulações do corpo, como parte do envelhecimento.
As alterações degenerativas na coluna lombar ocorrem com o seu processo de
envelhecimento e diferentes componentes vertebrais estão envolvidos.
Desta forma, entende-se que o processo de degeneração discal, que culmina com a
hérnia de disco ocorre como parte da degeneração que também envolve as
articulações facetarias e, desta forma, um não poderia ser critério de exclusão do
outro, pois são parte do mesmo processo.
A anatomia da coluna vertebral é constituída de 33 vértebras, 23 discos intervertebrais,
articulações facetarias, placas terminais cartilaginosas e ligamentos vertebrais. O disco
intervertebral é o principal elo estrutural entre os corpos das vértebras adjacentes. (13) Cada
disco é composto por um núcleo pulposo gelatinoso circundado por um anel fibroso laminado.
Evidências sugerem que o anel é o principal estabilizador da coluna vertebral, desempenhando
um papel mais crítico na estabilização do movimento comparado às articulações facetarias, aos
ligamentos posteriores, ou até mesmo o ligamento amarelo. (14,15)
A degeneração discal implica um declínio das propriedades físicas e clínicas de todo anel fibroso
e do núcleo pulposo, com mudanças patológicas evidentes nos níveis celular e molecular. As
modificações normais associadas ao envelhecimento que ocorrem no disco intervertebral
podem resultar clinicamente em lombalgia, instabilidade mecânica, hérnia de disco e
compressão nervosa. (16)
Mecanismos das alterações do disco que estão relacionadas à idade incluem um declínio na
nutrição celular, um menor número de células viáveis, a senescência celular, acúmulo de
macromoléculas da matriz degradada, falência por fadiga da matriz e uma modificação póstranslacional das proteínas da matriz. (17) Essas alterações citadas ocorrem gradualmente com
o tempo, e não necessariamente resultam em sintomas na maioria dos pacientes. Comumente,
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as anormalidades do disco são observadas em indivíduos assintomáticos. A degeneração em um
ou mais níveis lombares foi observada em 35% dos pacientes entre 20 e 39 anos e em quase
todos com mais de 60 anos. (11,18)
Em relação à hérnia de disco, conforme o disco intervertebral envelhece, o anel fibroso começa
a fibrilar e surgem fissuras radiais, que se estendem na direção de sua periferia, o núcleo
pulposo, não contido mais pelo anel, pode herniar e penetrar nessas fendas radiais. (19)
Independentemente de ocorrer ou não uma hérnia de disco, as alterações degenerativas, como
conteúdo hídrico reduzido e maior quantidade de colágeno, progridem normalmente. As
manifestações clínicas da hérnia de disco irão depender da protusão discal e sua direção. São
comuns dores, fraquezas, ou alterações sensoriais ou reflexas. A região do ligamento
longitudinal posterior altamente inervado é o local mais comum da hérnia de disco, o que pode
explicar a produção de lombalgia. (11)
As articulações facetárias apofisárias da coluna vertebral estão sujeitas aos mesmos processos
degenerativos observados nas outras articulações do corpo. (11,20) Há uma relação entre a
artropatia articular facetária e sua contribuição para a geração da dor na coluna em fase de
envelhecimento. As articulações facetarias das vértebras resultam da junção dos pedículos com
as lâminas. Sua função consiste em limitar a mobilidade excessiva do segmento móvel, como
também facilitar a distribuição das cargas axiais sobre uma área mais extensa. O disco vertebral,
as articulações facetarias, os ligamentos e a cápsula articular são comparados a um trípode. Essa
configuração é capaz de acomodar os vários movimentos do segmento móvel vertebral. (19–21)
A deterioração da cartilagem articular pode resultar osteoartrite. Algumas alterações da
cartilagem são responsáveis pela patologia como a degradação da matriz cartilaginosa, que
resulta em erosões focais e fissuras até o osso subcondral e resposta proliferativa da cartilagem
que forma esporões osteocondrofíticos, com formações de cistos ósseos e esclerose do osso
subcondral. (19) Foi evidenciado que a síndrome facetaria também é decorrente da
deterioração histológica da cartilagem articular. (22,23)
Com isso conclui-se que:
O processo de envelhecimento da coluna vertebral não ocorre separadamente e sim
com envolvimento de toda sua estrutura. Sendo assim, o processo discal que resulta em
hérnia de disco também envolve as articulações facetarias e, desta forma, um não
poderia ser critério de exclusão do outro, pois são parte do mesmo processo.
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4.2.3. Sinais de estenose ou instabilidade potencialmente cirúrgicas.
Há pacientes com estenose de canal que podem se beneficiar da rizotomia por
radiofrequência, quando sua queixa clínica é dor lombar.
Há pacientes com estenose de canal que sofrem de claudicação neurogênica e
também têm dor lombar. Esses pacientes podem se beneficiar da rizotomia por
radiofrequência para tratar o componente “dor lombar” de sua queixa clínica.
Não há consenso na literatura médica acerca de qual é a perfeita definição de
instabilidade.
O canal vertebral circunda a medula espinhal da porção cervical até a lombar alta. (24) Quando
sofre estreitamento, ocorre a estenose de canal, que pode decorrer tanto de causa congênita
quanto adquirida (entre elas, consequência do envelhecimento). (24)
A cascata da degeneração discal pode incluir uma série de eventos que podem levar a uma
estenose parcial ou absoluta do canal vertebral (a saber: hipertrofia das articulações facetárias
posteriores, hipertrofia do ligamento amarelo, protrusão discal, hérnia discal). (25)
Além disso, o paciente que apresenta estenose parcial ou absoluta do canal vertebral e
hipertrofia das articulações facetárias pode apresentar quadros clínicos diferentes, como: (24)
Quadro de claudicação neurogênica causado pela estenose do canal vertebral, devido à
compressão das raízes nervosas;
Quadro de dor lombar, pelo processo de artrose e artrite das articulações facetárias
E, como é bem compreendido que a rizotomia por radiofrequência destina-se a tratar a dor de
origem facetária (item 3.b), compreende-se que:
Há pacientes que, sim, têm estenose de canal e que podem se beneficiar da rizotomia
por radiofrequência, quando sua queixa clínica é dor lombar.
Há pacientes com estenose de canal que têm apenas claudicação neurogênica e, assim,
não devem se submeter à rizotomia por radiofrequência
Há pacientes com estenose de canal que sofrem de claudicação neurogênica e que
também têm dor lombar. Esses pacientes podem se beneficiar da rizotomia por
radiofrequência para tratar o componente “dor lombar” de sua queixa clínica.
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Em relação aos sinais de instabilidade potencialmente cirúrgicas, inicialmente deve ficar claro
que não há consenso na literatura médica acerca de qual é a perfeita definição de instabilidade.
(26,27)
Há pacientes que apresentam os requerimentos do grupo 1 da DUT, e que se beneficiam da
rizotomia por radiofrequência e que apresentam, no laudo de sua ressonância, os seguintes
dizeres: “lâmina líquida nas articulações interapofisárias sugerindo instabilidade”. Este
“sugerindo instabilidade” que radiologistas têm escrito pode gerar diferentes interpretações,
pois pode levar o paciente e médicos a acreditarem que a artrodese é necessária em todos os
casos que têm essa inflamação facetária. (28) Deixar a palavra “instabilidade” pode levar as
operadoras de saúde a ter uma enorme brecha para negar a radiofrequência exatamente nos
casos em que ela se aplica muito bem, que são casos de doença facetária comprovada. É
observado por especialistas que os planos de saúde aproveitam-se de detalhes como esse para
deixar de autorizar procedimentos.
Estudos sobre rizotomia percutânea por radiofrequência para denervação de facetas articulares
têm incluído uma considerável população de idosos. (29,30) A estenose de canal
frequentemente acomete a população idosa e é considerada indicação cirúrgica para este grupo.
Estima-se que entre 3 e 12 pacientes a cada 100 mil habitantes com mais de 65 anos sejam
afetados por esta patologia. (31)
O tratamento conservador não é capaz de alterar a evolução da estenose degenerativa e quando
os sintomas são refratários ao tratamento, o procedimento cirúrgico é indicado para melhorar
a qualidade de vida do paciente. (31) A rizotomia por radiofrequência é capaz de evitar
desfechos cirúrgicos com custos mais elevados e maior risco, especialmente para a população
de idosos.
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Sociedade Brasileira de Coluna.
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CONFIDENCIAL
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ANEXO 1. CONSIDERAÇÕES RELACIONADAS AO USO DE RADIOFREQUÊNCIA NO
TRATAMENTO DAS ENFERMIDADES DE COLUNA
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