investigacoes - Universidade Federal de Pernambuco
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Angela Dionisio Acervo Pessoal INVESTIGACOES , Lingiiistica e Teoria Literaria VOL. 3 PROGRAMA DE POS-GRADUACAO EM LETRAS E L1NGOiSTICA Universidade Federal de Pernambuco REITOR Prof Efrem de Aguiar Maranhiio PRo..REITOR PARA ASSUNTOS DE PESQUISA E P6S-GRADUA~AO Prof Yony de Sa Barreto Sampaio PRo..REITOR PARA ASSUNTOS CULTURAIS E INTERCAMBIO CIENTtFICO Prof. Margarida de Oliveira Cantarelli DIRE TOR DA EDITORA UNIVERSIT ARIA Prof Washington Luiz Martins da Silva COORDENADOR, LlNGUiSTICA PROGRAMA DE P6S-GRADUA~AO EM LETRAS Prof Francisco Gomes de Matos VICE-COORDENADOR, PPGLL Pro;UGilda Maria Lins de Araujo SECRETARIO Marcos Motta da Silva CONSELHO EDITORIAL Ataliba T. de Castilho (USP) Francisco Gomes de Matos (UFPE), Presidente /delette Fonseca dos Santos (UFPB) /ngedore V.Koch (UN/CAMP) /valdo Bittencourt (UFPE) Jose Fernandes (UFGO) Luiz A. Marcuschi (UFPE) Marigia Viana (UFPE) Regina Zilberman (PUC-RS) Sebastien Joachim (UFPE) INVESTlGA~OES - LingOistica e Teoria Liteniria ISSN 0104-1320 Vol. 3, dezembro de 1993 Publicaltao anual do Programa de P6s-Gradualtao em Letras e Linguistica da Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Letras, Centro de Artes e Comunica~ao, 1 andar, 50670-901 Recife, Pernambuco. Telefone (081) 271.8312. 0 E NOTA EDITORIAL Francisco Gomes de Matos DA INTERPRETAC;AO SEGUNDO JEAN GREISCH E ALGUNS OUTROS Sebastien Joachim 5 '" 7 A LiNGUA COMO HUMANIZADORA NA INTERA9AO INTERPESSOAL Gilda Maria Lins de Araujo 21 LEMBRANDO FERNANDO TARALLO: OS DIREITOS DE APRENDIZES DE SOCIOLINGUiSTICA Francisco Gomes de Matos 29 EM BUSCA DOS SABIAs Antonio Viana 37 A INSUFICIENCIA DOS ELEMENTOS LINGUiSTICOS DO TEXTO: UM DESAFIO PARA OS INTERLOCUtORES Irande Costa Antunes 41 L'HETEROGENElTE DISCURSIVE DANS UN ARTICLE DE PRESSE • UNE PERSPECTIVE D' APPROCHE Doris de Arruda C. da Cunha " 53 A PARTICIPA9AO DO FALANTE SECUNDAAIO NA CONSTRU9AO DA NARRATIVA Angela Paiva Dionisio 73 o PADRAO ENTOACIONAL DOS REPORTERES DA GLOBO Adriana Tigre Lacerda, Isabella Jarocki e Isaltina Mello Gomes 85 o IMPLiClTO CULTURAL: UM OBST ACULO PARA A COMUNICA9AO JteraLucia Teixeira Carneiro 101 A FOR9A DA PALAVRA Nelly Carva lho 119 A RELA9AO FALANTE/TEXTO NA EXPLICA9AO ACADEMIC A DE UNIVERSIT ARIos Maria Augusta de Macedo Reinaldo 135 L' APPORT DE LA PUBLICITE A L'ENSEIGNEMENT DU FRAN9AIS LANGUE DE SPECIALITE Yaracylda O. Farias 157 DEPOIMENTOS JUDICIAIS: TRANSFORMA90ES ORGANIZACIONAIS E TRANSFORMA90ES INTERPRETATIVAS NO NtVEL DA TEXTUALIDADE Virginia Colares Soares Figueiredo Alves 181 REGIONALISMO E UNIVERSALISMO 0 TEATRO DE LOURDES BARBALHO Sabine Moller-Zeidler 197 CONTRATO, LITERATURA, SIGNO E IMAGEM Iva!do Bittencourt 207 NOTAS SOBRE A INTERJE19AO Luiz Antonio Marcuschi 221 o conteudo deste numero reflete uma recomendayao do Colegiado do Programa de P6s-Gradua~ao em Letras e Linguistica, aceita pela Comissao Editorial desta Revista: abrir espa~o para contribui~oes baseadas em teses e disserta~oes nestas duas Areas, Lingiiistica e Teoria da Literatura, a fim de propiciar-se uma percep~ao abrangente do que esta sendo pesquisado por nossos alunos. Continua, nosso Colegiado, a apresentar suas investiga¢es, atraves de artigos sobre Lingiiistica e Teoria da Literatura. Tematicamente, esses textos representam linhas de pesquisa do Programa, principalmente Estudos Interdisciplinares de Literatura, Pragmatica, Lingiiistica Aplicada, 0 Discurso Literario na Fi~ao Contemporanea, e OrganizayaoLingilistica da Produ~ao Oral e Escrita. No pr6ximo numero dar-se-a aten~ao especial a participa~ao de alunos de Teoria da Literatura e de colegas de outros Programas. FRANCISCO GOMES DE MATOS Presidente da Comissao Editorial Jean Greisch e urn pesquisador do CNRS (Fran~a), autor entre outros de Hemu!neutique et Grammatologie (CNRS, 1977), onde sac postos em confronto H. G. Gadamer e Jacques Derrida. Nosso objetivo e buscar, na companhia desse pesquisador, 0 questionamento que the levanta a obra dos dois fil6sofos, "urna certa defini~ao da tarefa hermeneutica". Nesta tarefa, segundo 0 conselho do comentarista, importa nunca esquecer 0 carater filos6fico das considera~5es dos autores de que nao nos inspiramos, mesmo se, por exemplo, no caso de Derrida, 0 material sobre 0 qual ele reflete e literano (Mallarme, Rousseau, Roussel), e na tradi~ao de textos ditos deruptura. A questao hermeneutica aqui se coloca de chofre, pois a priori o fil6sofo sempre procura urn sentido. Essa orienta.yao conflita de certo modo com a semi6tica energetica de Gilles Deleuze e Felix Guatari(2), com a Poetica Comparada e a Poetica do Imaginario do Professor Jean Burgos, das Universites de Savoie e de Grenoble, Fran~a(3). Para eles, a opera~ao hermeneutica enquanto tentativa de estabelecer uma rela~ao semi6tica ou de significante para significado e uma empresa irrelevante. Particularmente quando se trata do fazer criador, da poiesis encarnada em qualquer texto artistico. 0 sentido e algo metafisico da ordem do possivel, de urn horizonte. Entendemos por "horizonte", na acep~ao p6s-husserliana e poetica que ressaltou na sua tese Michel Collot (La Poesie Moderne et la Structure d'horizon. Paris, PUP, 1989, p.l 03), "urn invisivel absoluto", algo supra-fenomenal, revelador de uma "certa ordem no mundo", algo a experimentar como uma transcendencia ontol6gica em vez de ser objeto de uma percep~ao ontica, especifica, e que comporta tres momentos: apelo,expectativa, "errance" (deriva.yaopermanente). Essa irrelevanciahermeneutica, a qual acabamos de fazer alusao, merece ser aproximada com urn certo cuidado. Vista de perto e provavel que a irrelevanciaconceme uma certa orienta~aointerpretativa. Convem enta~ se informar sobre as estrategias interpretativas dos dois fi16sofos aqui convocados, a fim de esclarecer esse debate entre o modelo dito hermeneutico e 0 modelo dito gramatol6gico(4) e tirar as consequencias para a leitura de Kafka (feita por De1euze-Gualtari) e para a poesia (feita por Jean Burgos). o texto essencial da problem<itica gramatol6gica se encontra no livro de Derrida, La Dissemination (Seuil, 1972, p.71-72). Jean Greisch parece aqui se situar no ambiente conceitual de outros dois fi16sofos que intersectam as categorias derrideanas: Jacques Garelli e Raymond Tschumi('j. Vamos acompanhar 0 texto de Derrida nos seus pontos fortes, que Greisch divide em quatros assuntos: 1) 2) 3) 4) a textura do texto; a eclipse do autor; a eliminal(ao da referencia e a interpretayao como reinterpretayao. Podemos avanyar desde ja a respeito do ultimo assunto. Ele nos remete a uma posiyao de Freud que, nalntelpreta~ao dos Sonhos considera a analise como uma interpretal(aode interpretayao, a primeira sendo 0 pr6prio arranjo fantasioso do sonho, de que devemos descobrir a razao de ser, pulando dos enunciados it enuncial(ao. A analise em quatro pontos de Greisch vai sofrer alguma alteral(ao. Porque, alem de confrontar ocasionalmente declarayoes gramat6logicas e tomadas de posil(ao gadamerianas (promovidas de verdade e metodo, L 'art de Comprendre, Ecrits I) Hermeneutique et Tradition Philosophique. Paris. Aubier/Montaigne, 1982) interviremos maciyamente com as nossas percepyoes de liten'trio para confirmar, deslocar, rasurar ou alargar as vers6es dos fil6sofos. Para comel(ar: a teoria do texto. Nao se pode interpretar sem ter implicita ou explicitamente uma conc~pyao sobre 0 que e urn texto. Neste capitulo, nem Derrida, nem Gadamer, nem Greisch chegou, em 1977, it sofisticayao a que nos levara respectivamente o traba1ho de Teun Van Dijk (1981) da Universidade Livre de Amsterdam, de Robert de Beaugrande (Ablex, 1982) da Universidade da Florida em Gainesville(6), 0 dos estudiosos da Revista Degres (Bruxelles) no seu numero do outono de 1986 sobre a ciencia do texto. Mas achamos que Derrida e 0 filosofo que oferece mais subsidios para uma teoria do texto. Assinalamos, em primeiro lugar, uma dupla assimetria, entre 0 pensador frances e 0 pensador alemao. Trata-se de uma divergencia de ponto de emergencia, de ponto de partida. Jit dissemos que Derrida parte cio chao-texto, textos de Rousseau ou Mallarme. Consulte-se a esse respeito De la Grammatologie (Paris, Minuit, 1976 ou a tradw;ao da editora Perspectiva) alem de La Dissemination jit citado (0 estudo intitulado "La Double Seance"). Leia-se, em particular, as passagens onde 0 £losofo se expressa sobre 0 titulo, a nota, a citayao, 0 prefitcio. Dispomos aqui de um protocolo de investigayaoanalogo aos elementos literariamente trabalhados pelo narratologo frances Gerard Genette em dois de seus livros: Palimpsestes, Seuils. o ponto de partida de Gadamer e dedutivo, mais abstrato, mais global. 0 movimento de elaborayao de sua obra segue na direyao contraria de Denida e da "demarche" poetica de Burgos e de Garelli, - especialmente ao formidavel percurso cinetico proposto pelo poeta-filosofo do Colegio Internacional de Filosofia de Paris, 0 fenomenologo Jacques Garelli,no seu ultimo livro de 400 p. intitulado RythmesetMondes(Grenoble, Jer6meMillon ed., 1991). Estavamos dizendo que Gadamer, em vez de decolar a partir de um texto, aterriza num texto. Mas quando ele aterriza, as perspectivas sobre a textualidade que ele oferece sao de grande interesse, embora, de modo geral, pouco operacionais. Assim 0 mostra Jean Greisch na sua explicayao da nOyao de compreensao tal como Gadamer 0 entende (Verite etMethode). Acompreensao implicitauma teoriado discurso. Essa teoria esta ligada it otica yon Humboldt do discurso como ergon, materia e energia, atividade (vide Ruth Menahen a esse respeito )<7). No entanto, existe algo essencialmente perverso para uma interpretayao do discurso literario na hermeneutica de Gadamer. E essa perversao que aponta Jean Greisch na sua leitura de Verdade e Metodo quando sublinha 0 equivoco de nOyoes como: idealidade do sentido, tradic;ao, autonomia do sentido. Enganosamente, essas noy5es no contexto gadameriano, nos empurram longe da materialidade textual, do ergon, e que, ao olhar de um gramatologo, uma importante parte do trabalho hermeneutico se apoia. A compreensao gadameriana e sobremaneira fascinada por um significado puro e soberano. Seria 6timo, como na estrutura de horizonte de Michel COU0t, se esse significado pudesse se converter em sentido, e assim se dirigir a jusante do texto, em vez de olhar para tras, a montante, em direc;ao de uma fala originaria. Aqui, os te610gos provavelmente estao em urn pais conhecido. E Heidegger (segundo AllenThiher,em UVrdsin reflection. Chicago, The University of Chicago Press, 1984) nem sempre evita confirmar essa posic;ao,ao encarar 0 discurso como irremediavelmente condenado a uma especie de degradac;ao, salvo na poesia. Vemos dificilmente a escrita artistica como urn lugar dessacralizado onde seria alienada uma fala originaria. No fundo e 0 logos platonico, sua antecendencia 16gica e sua transcendencia, que vigora na mistica gadameriana. Dai a inc1inac;aode Gadamer para uma certa escuta pr6xima da escuta psicanalitica que re-encontra 0 mesmo no outro. Pulamos aqui sobre urn texto citado por Jean Greisch que nos parece muito ambiguo. Nele Gadamer veicula 0 pensamento de urn logos prisioneiro do tempo e, ao mesmo tempo, nos brinda com referencias que sac acidentais no fil6sofo alemao, estao no cerne da poetica do Imaginario de GilbertDurand e de seu discipuloJean Burgos. Em resumo, no tocante it teoria do texto, a hermeneutica de Gadamer esterilizaa prospectiva, dificultaa decolagempara urn Alhures. o texto e discurso de verdade, ele prop5e urn significado, ele e uma etapa de verdade (Verite et Methode). Desde ponto de vista, Gadamer entra em choque violento com a gramatologia. Para a gramatologia, a interpretac;ao e uma derivac;aoinfinita. Para Durand e Burgos, ela se apresenta, antes de mais nada, na acepc;ao espacial da palavra sentido. 0 sentido e uma direc;ao, uma vetorizac;ao. 0 texto sempre orienta 0 interprete na direc;aode urn sentido; 0 sentido esta sempre direcionado, sempre para nascer. Greisch, no termino das suas considerac;5es sobre a textualidade, tentou reconciliar a Gramatologia de Derrida e a Hermeneutica de Gadamer. E uma aproximac;ao que se justifica, sobretudo se tivessemos a oportunidade de ler a bela analise do fil6sofo alemao sobre 0 poetaPaul Celan no livro Qui-suis-ie? (Actes Sud. Diffusion PUF, 1987). Mas tal aproximac;ao, - eo mesmo pode se dizer da aproximayao de Derrida e dos especialistas do Imaginario - restara sempre, superficial, em razao da erradica<;aodo sujeito, no Deconstrucionismo como em todas as linhas de pensamento encarnadas por Nietzsche, Heidegger, Foucault. Com esses pensadores, estamos longe de Schleirmacher que acreditava na individualidade como qualidade do ser consciente de si mesmo e fundador de sentido, fundador de uma hermeneutica de autocompreensao. Com a Gramatologia, somos entregues a imanencia do signa, ao absurdo e a uma "linguagem aporetica" (cf Manfred Frank, L 'u/time raison du sujet, ultimo capitulo: une conception hermeneutique de l'individualite". Actes sud. Diffusion. Pur, 1988). Estamos ainda na primeira ordem de consideracyoes sobre a teoria do texto. Mas Greischja inferiu aqui observacyoes referentes ao segundo assunto que e a morte do autor: a morte do sujeito, leva a morte do sentido, da polissemia, tern relacyaocom a prioridade do sintatico sobre 0 semantico, mas proporciona a definicyaoda produrao de texto e mexe com a nocyaode pertencya(appartenance). E porque a priori nao tern enunciador, pai ou mae, que Derrida vem insistindo sobre a materialidade significante, a letra, a "remarcacyao" dos signos, sobre 0 "excesso irredutivel do sintatico em relayaoao semantico". A hermeneuticase encontra automaticamente posta em xeque. E se a sintaxe sobrepuja 0 semantico, a analise vai brincar com as estruturas, 0 arranjo do material verbal. Nessa primazia do sintatico, a polissemia, a metafora, a conotacyao, a evocacyao, se tornam nOyoes suspeitas. A poetica de Bachelard, de Durand, de Burgos adere discretamente a essas condenacyoes derrideanas, sem porem partilhar os seus pressupostos gramatol6gicos. Esses estudiosos apostam no dinamismo inerente dos schemes, imagens e simbolos, na estruturayao ritmica do imaginario. Para Burgos, principalmente, a leitura do texto nao pode remeter a algo situado atras, como e de praxe numa certa hermeneutica antropo-arqueoI6gica. A analogia, a metafora, privilegiam a mem6ria em detrimento da Imaginayao; a teologia privilegia dogmas, revelacyao,em detrimento da liberdade de criar 0 diferente. Partindo assim de base diferente acabam sendo solidarias na sua causa: poetica do Imaginario e Gr(imatologia, e tambem a hermeneutica instauradora de Paul Ricoeur (ver G. Durand, A Imaginavao simb6lica e as numerosas alusoes de Burgos a esse fil6sofo cristao, igualmente a epistemologia genetica de Jean Piaget). Vma metafisica da presencya(Deus ou a revelacyaoou 0 sujeito ou urn sentido pre-existente) e realmente subjacente a certos modos de interpretar. E como nao podemos fazer a economia de urn ou de outro desses antecedentes (ficara sempre, pelo menos, as proje<;5es e a cultura do leitor), temos que ficar bem conscientes deles a fim de discemir as interferencias e as distor<;5es,e evitar de passar gate por lebre, de oferecer idiossincrasias como verdades, de propor a nossa verdade como a verdade. Nesse sentido, a potencializa<;ao do sujeito na analise e mais uma questao de estrategia do que uma posi<;ao filos6fica. Assim 0 entendeu, a nosso ver, Jacques Lacan. Falamos antes da suspeita que paira sobre a metafora. Pela mesma razao, polissemia e um termo tabu. Para 0 substituir, Derrida sugere 0 termo dissemina<;ao; esta integra a no<;aode espa<;amento,de "difJerance", que faz a economia da similitude de sentidos. 0 sentido e sempre unico, absoluto. Carninhando na sua dire<;ao,encontramos s6 engodos, mentiras, falsas aparencias. As similitudes sac erros de sentido. No entanto, 0 radicalismo de Derrida e de Burgos deixa uma porta aberta para a reabilita<;ao da metafora. Essa porta, Ricoeur ja a havia empurrado quando publicou ern 1975 seu belo livro parcialmente inspirado em Max Black: A Metafora viva. Ern urn numero de homenagem da revista Esprit Gulho/agosto, 1988) dedicado a Paul Ricoeur, Alain Pierrot, 0 autor do artigo "la reference des enonces metaphoriques" demostrou 0 carater criativo prospectivo, poetico e a capacidade fundadora de realidades novas da metafora ricoeuriana. A metafora e epoche, i.e. parentetiza<;ao da realidade empirica, suspensao da cren<;a,adiamento da verdade, referencia<;ao inedita, tensao para 0 porvir, media<;aoern dire<;aodo Alhures ( ver Pierrot, principalmente nas p.284-294 ). Admiramos Derrida sem ousar segui-Io quando prop5e a palavra seminal no lugar da palavra semantica. Conceito sedutor, seminal apresenta 0 sentido como vestigio (ou trace), proliferando em rizoma, sem ancestral, sem identidade, sem passaporte mas atravessando todas as fronteiras, sempre outro anti-linear, sem logicidade, anti-inferencial. Na 6tica de uma poetica (preferimos esse termo it Hermeneutica, quando se trata da leitura literaria ), em uma poetica que adota essa visao seminal ou semantica, nilo cabem certas aquisi<;5esrecentes da Pragmatica lingLilsticae de uma certa filosofia analitica. Remetemos os inter~£sados ao texto de Derrida (La Dissemination, p. 390; ou Jean Greisch p.187-188 ). Sem ter a ultima palavra em materia de textualidade, Derrida merece ser ouvido. Chegamos agora it novao de Produr;:ao de texto (Greisch: 187,204). E urn termo tornado por emprestimo do marxismo e que popularizaram Rossi-Landi, Kristeva, 0 grupo Tel Quel(8). Henri Meschonnic ( 1982 ) e Derrida desconfiam desse termo, embora reconhevam, como logo veremos, a dificuldade de rejeita-Io. Diz Greisch: "La production ou plutot Ie texte comme production apparait des qu' on s' ecarte de l' idealite du sens" (Greisch : 187 - 188 ). Convem lembrar que idealidade do sentido ( sublinhado no texto de Greisch) e uma interpretavao feita da Hermeneutica gadameriana por Derrida. Resgatado 0 termo produr;:iiodo terreno do idealismo, ele entra em COl~UnVaO na Gramatologia com os termos de differance e trabalho. Com efeito, apesar de sua ambigilidade nocional, dentro da remarcaQao derrideana, esses termos differance, prodw;ao, trabalho, espayamento - ajudam a entender a virtude ativa, 0 dinamismo protensivo da escrita artistica, desde que nao os usemos para absolutizar 0 espavo textual (como por vezes tende a fazer Garelli: Le Recel et la Dispersion. Gallimard, 1978) nem para essencializar a busca de sentido. Pois,justamente, a teologia negativa de Derrida e de MichelBlanchot inclinama essa essencializavao da procura, a ponto de esquecer ou de descartar toda tensao, qualquer passo em direvao de urn encontro com 0 sentido, por assintotico ou diferido que seja. Dizendo isso estamos delimitando 0 territorio da Gramatologia e alguns paises fronteirivos,em beneficio da singularidade da Poetica do Imaginario. A evacuavao do sentido em nome da "differance" infinita pode fazer girar no vazio a empresa da leitura e barrar ao processo de leitura, 0 caminho de uma esperanr;a, a vereda, ou de uma invenyao do futuro au de certo amanhecer ao termino da travessia. Depois da nOyao de produyao, neste setor onde se decide a viabilidade de uma anti-hermeneutica, aparece a nOyao de pertenr;:a (apartenance). Na teoria do texto de Derrida isso corresponderia it nOyao de intertextualidade bakhtiniana e Kristeviana, que alias, e uma n~ao que comeya a ser controvertida por Marc Angenot em Revue des Sciences Humaines N° 189.(9) A pertenya / I'appartenance, tal como a entende Derrida, e inseparavel do texto como labirinto, e do leitor como urn novo Ulisses errando sem fim desde sempre e para sempre (Greisch, 188). Falta aqui, como ja disse, uma luzinha de esperanya. Deus nos livre de ser adeptos de urn tal estoicismo, de nos dedicar a uma tal circulayao esquizotrenica. A nossa viagem iniciatica atraves de urn texto exige uma saida, porque outras tarefas nos chamam. 0 que denominamos pragmatica da ficcionalidade tern como escopo essa saida de texto como discurso para a sociedade como outro texto onde caminhar (vide Ricoeur: Du texte ar action. Seuil,1986) Concluimos esse primeiro assunto com algumas anotayoes sugeridas pelo'resto desta seyao em Jean Greisch (p. 189-191). A Gramatologia oferece uma teoria do texto mais elaborada do que a Hermeneutica emblematizada por Gadamer. Gramatologia e Hermeneutica correspondem a duas politicas textuais, duas reivindica95es hem diferenciadas, dois modos de leitura corn padroeiros distintos. Para 0 melhor e pior, os Henneneutas referem-se a Heidegger, buscam confirmayoes de suas teses na obra de Holderlin, Rilke, Trakl, de sorte que a Hermeneutica literarla e caracterizadamente germ3nica. Os gramat610gos, mesmo citando Heidegger (polemicamente no caso de Derrida, com uma evidente ambigiiidade no caso de seus seguidores) preferem se remeter a Nietzsche e procurar 0 seu comprovante em Rousseau, Mallarme e por vezes em Lacan, os surrealistas, Francis Ponge. A Gramatologia, essa anti-hermeneutica, e predominantemente trancesa, com uma versao americana chamada Deconstrucionismo ou Deconstrw;ao. Em que medida, pergunta Jean Greisch, podemos manter 0 equilibrio entre as duas linhas de pensamento? Com efeito, nao e preciso opo-Ias. Analistas do texto, como Garelli, sabem tirar proveito tanto de Heidegger, de Nietzsche e de Derrida, mesmo se as suas leituras favoritas sao Rimbaud, a familia surrealista e Antonin Artaud. E muito dificil saber se a teoria do texto respectiva dos grarnat6logos generaliza a especi£icidadede Mallarrne ou de Holderlin, universaliza urn caso-limite. A epoca p6s-guerra abusivamente chamada de p6s-modema, exige uma teoria de texto que incorpora diversos sistemas de signos, inclusive os meios de informayao que, eles tambem, constituem 0 nosso ambiente cultural. Assim, alias, 0 exigem obras como as dos concretistas, romances como Zero de Loyola Brandao, Speedball de Pepe Escobar, Cobra de Severo Sarduy, Jia Julia e 0 escrivinhador de Vargas Leosa, A volta do dia em oUenta mundos de Julio Cortazar, etc. As obras de Mallarme e de Holderlin, filhas de sua epoca, podiam apenas incluir as virtualidades da pintura e da musica e uma permeabilidade dos generos de discurso. E muito, mas nao basta para as nossas conjunturas hermeneuticas ou antihermeneuticas. Antes de uma recente reabilitayao, costumavam manifestar urn certo desprezo para a leitura temMica no circulo dos estudiosos mais sofisticados da Literatura alegando parentesco da tematologia com a Hermeneutica. A Hermeneutica passava entao ora por urn processo de leitura reducionista ora por urn jogo de prestidigitayao sobre 0 sentido, sem fundamentayao na materialidade do texio. No primeiro caso, 0 sentido decaia para a monovalencia de urn significado que descartava a riqueza das contradiyoes e ambigtiidades essenciaispor meio de extrapolayao e violencia efetuadas sobre 0 tecido textual. No segundo caso, 0 estudioso sempre "descobriu", na saida da prestidigitayao interpretativa, aquilo que introduziu no comeyo, de tal modo que fingiu surpreender-se com uma conclusao queja trazia nas suas mangas desde 0 principio. Hoje, 0 conceito de" cientificidade" dura e pura que assolava nossa area desapareceu sob a influencia de uma nova epistemologia. E aprendemos, como ja dissemos, que a verdade e relativa e a subjetividade incontornavel. Foi assim que surgiu uma reayao pr6tematica (cfCorps ecrU. N° 23,1987 Poetique, N° 64,1985, Communications, N° 41, 1988). Assistimos a uma "dualitude" (Durand) ou convivencia dos contrarios, ou perda de oposiyao polar da Hermeneutica e da Epistemologia dentro da "semiologia da leitura" (cf Michel Otten, in De1croix et Hallyn, Introduction aux etudes litteraires, Gembloux, 1987).0 leitor especializado de hoje e ecletico. Ele lanya mao de todas as ferramentas a seu a1cance,inclusive,a ontologia husserliana.(IO) o segundo assunto, 0 eclipse do aut or, continua a alimentar as polemicas entre os estudiosos, segundo a sua percepyao linear ou ciclica do tempo hist6rico ou da hist6ria litera-ria, ou segundo a sua inc1inat;aopara 0 velho e desusado dualismo c1assicismox romantismo, realisrno x p6s-modemismo. Derrida n1ioescapa a essa tendencia na sua oposit;ao Logocentrismo x Deconstrut;ao. Mas parece-nos que trata-se aflnal, no caso dele, de uma pura dialetica apreendida it escola de Hegel. A carga de agressividade da Gramatologia contra a tradit;ao romantica perdeu muito de sua fort;a e de sua pertinencia ja que 0 romantismo e eterno. Do "mito da expressao", tao atacado pelo estruturalismo e pelo p6s-estruturalismo, se fala cada vez menos, desde que fora redefinida a poesia lirica, que foram reconhecidos os direitos do sujeito, e esclarecida a natureza transpessoal e multipia da identidade artistica. Derrida pode, se quiser, continuar a suspeitar as not;oes gadamerianas e fenomenol6gicas de "participat;ao", "mundo", "preconceito", "pre-compreensao", ele pode, se quiser acusar 0 fil6sofo alemao de ter uma pacto secreto com 0 Logos, e de acreditar "numa present;a etema do sentindo", numa temporalidade especifica do texto" (Verite et Methode: 193); a onda hermeneutica se alastra, e as acusa<;oes nao suscitarn interesse. 0 fil6sofo frances tern mais sucesso, numa epoca em que floresce 0 memorialismo, quando ele cunhou 0 termo de "suplemento" a respeito de Jean-Jacques Rousseau. Vale se informar sobre esse termo no Glossario de Den-ida de Silviano Santiago (PUe, Rio de Janeiro). Limitaremos nosso informe a duas advertencias: 1°)Evitar de ler como urn documento sobre 0 autor 0 relato litenirio autobiografico (v.g. As confissoes de Rousseu). 2°) No entanto, certas passagens do texto autobiografico exigem urn suplernento. Esse suplemento nao corresponde a tal ou tal passagem do texto, ele tern que ser procurado sem uma "saida vertical para 0 significado ultimo" (Greisch: 195) e sem regressao para 0 "vecu psychobiographique" como faria uma psicanalise improcedente que trata 0 texto como urn "sintoma". o suplernento de Derrida, mesmo sendo definido pela negativa, desloca a atent;ao da analise do autor para a analise da escrita. Michele Raimond, no seu belo livro sobre Federico Garcia Lorca, soube concretizar magnificante esses nebulosos conselhos. Para Derrida (e Roland Barthes) 0 autor se esconde na lingua. Analisar a lingua, 0 estilo, a fon;a que pulsa na escrita, e outra coisa que analisar 0 aut or. A argumentat;aO para no meio do caminho, por medo de reabilitar 0 sujeito. Mas Henri Meschonnic (La critique du Rythme, 1982) retruca: a literatura nao se preocupa com a lingua,como 0 pretendem Heidegger e os Heideggerianos, a literatura se preocupa com discurso, e no entanto com 0 sujeito de enuncia~ao, urn sujeito historicamente situado, e que atravessa a sua lingua para medir-se com ela e se afirmar. 0 ritmo, result a da posi~ao enunciativa sempre em desloca~ao do sujeito e do interlocutor que aceita acompanha-Io. Em suma, Meschonnic oferece ao suplemento de Derrida 0 complemento teorico que the faltava, e aproxima assim Gramatologia e Hermeneutica. o terceiro assunto concerne 0 desterro da Referencia. Abre 0 fogo Jean Greisch (197) quando diz: 0 texto parece apontar em dire~ao de algo que po de ser considerado como sendo seu referente". Depois ele antecede nossa preocupa~ao, perguntando-se que sentido e que referencia atribuir ao texto? Sobre esse assunto dispomos de preciosas indica~5es bibliognificas que ofere cernos aqui em nota. * A "suspension of belief' invocada por lR. Searle, Barthes, Eco poderia levar a pensar que esse problema do referente, da realidade, e acessorio. Mas e uma questao de suma importancia para a Poetica do Imagimirio(1982), para J.Garelli (1983), para Ricoeur (1975). Ao falar da metafora ricoeuriana, a resposta ja foi dada. Reafirmamos porem que 0 texto literano, 0 texto artistico aponta para urn referente possivel em vez de urn referente estabelecido ou confirmado. No ultimo panigrafo desse setor de seu estudo, lGreisch enfrenta a problematica da representa~ao, tao intimamenteligada a da referencia. No dizer de FDagognet (Ecriture et Iconographie. Paris, Vrin, 1973), de Jean Bessiere (L 'ordre du Descriptij, P.UF, 1988; La Theorie Litteraire. PUF, 1981),e de lGreisch - e apesar dos corifeus da anti-representa~ao (0 grupo Tel Quel) - nao se sai da Representa~ao. Podemos, no melhor dos casos a jusante da escrita, deixar de falar de evoca~ao, de aludir a urn mundo e preferir falar em "ilumina~ao", "epoche" - mitos em instancia de cria~ao, preludio ao que advem em advento ou, como Lyotard, em figural (Derive a partir de Marx et FreudUG. E.1976) . • Fabula, n° 3, 1993 (P.D. Litlle): Referents et Roman. Danon-Bolieau. Produire Ie Fietif Paris, Meridiens • Klincksieck, Claire Lejeune. L'Irreference en poesie. C.I.S., nO 24-30 1984 Estamos agora no derradeiro marco colocado por Greisch na sua glose de Derrida (pois Gadamer esta sobrando, faz tempo, nas suas observac;;oes). Relembramos 0 subtitulo: "Reinterpretar a interpretac;;ao". Dito de passagem, esse titulo equivale a urn programa de abordagem da metaficc;iioque inscreve nos abissos de sua constrw;ao sua pr6pria interpretac;;aotornando esse material a ser reinterpretado pelo leitor. Em conclusao a esse capitulo de Greisch, a Hermeneutica em lugar de ser a ciencia da atribuic;;ao de significados ou de adjudic;;ao normativa de valores - acaba sendo uma relac;;ao extremamente complexa do texto com 0 seu leitor e com os possiveis da individualidade desse leitor e da configurac;;ao da comunidade a qual ele pertence. Examinada do lado do leitor, a Hermeneutica e uma experiencia onto-epistemoI6gica. No decorrer dessa experiencia, n6s nos medimos como urn saber e almejamos urn saber-se e urn saber-fazer. Essa posic;;aoque inferimos de Derrida e de Gadamer, para alem de suas pr6prias colocac;;oes e dos comentarios de Jean Greisch, encontra a sua melhor expressao nos livros de Raymond Tschumi (Theorie de la Culture, 1975; A la recherche du sens, 1987, L' Age d'Homme, Lausanne), de J. Garelli, de Paul Ricoeur Oa citados).<ll)0 leiter investe existencialmente na obra. Mas em vez do pendor filos6fico de uma busca, no sentido liberal, da verdade, 0 ideal e, armado de uma semiologia da leitura(Otten),de uma informac;;ao fenomenol6gica (Iser, Garelli)trilhar 0 caminho do Imaginario na esteira de Durand e Burgos. Com esse conjunto de estudiosos, nosso empreendimento superara as falsas dicotomias, (fora/dentro, legibilidade/hermetismo, sujeit%bjeto). Efetuaremos uma travessia do corpo escriptural em direc;;aoa uma compreensao cada vez mais ampla, da descoberta de realidades outras, geradoras por sua vez de transformac;;oes, de escalas individuais e comunitarias. (12) 1 - Jean Greisch, pesquisador do CNRS, Paris, Fran9a, nos fomece apenas urn quadro de reflexao. 2 - Gilles Deleuze e Felix Guattari escreveram em parceria, alem de Kafka: pour une litterature mineure, L 'Anti-Dedipe, Mille Plateaux (Minuit, 1970, 1972 ). 3 - Jean Burgos e diretor do centro sobre Imaginario e Cria9ao e da Revista Circe. Aluno e sucessor de Gilbert Durand. Atualmente e presidente da Universidade de Savoie que outrora foi administrada tambem por Gilbert Durand. 4 - Em geral quando falamos de Hermeneutica, falamos de seu ilustre representante alemao: Derrida representa a Deconstru9ao e a Gramatologia, esta sendo a vertente filosofia da" estetica" deconstrucionista. 5 - Jacques Garelli publicou alem dos livros citados, muitas colabora90es em revistas cientificas: La Gravitation Poetique, Mercure de France, 1966; Le Reeel et la Dispersion, Gallimard, 1978; Artaud et la question du Lieu. Corti, 1982. Da sua obras poetica destacamos: Breehe, Mercure de France, 1966; Lieux precaire, Mercure de France, 1972, L' ubiquite d 'etre, suivi de Diffieile Sejour, Corti, 1986. Apresentamos urn sobrevoo dessa obra nas atas do III encontro da ANPOLL, 1989; "A ontologia poetica de Jacques Garelli. 6 - Consultar esses dois autores em Aron Kibedi - Varga Theorie de la litterature. Paris/Lisboa, 1982. 7 - Ruth Menahem. Langage et Folie. Paris, SEDES, 1988. 3a parte: L' activite du langage. 8 - Revue Tel Quel: Theorie d'ensemble Seuil, 1968. Julia Kristeva. Le langage poetique. Seuil, 1974 e tambem P. Macherey. Para uma teoria da prodw;t1o literaria. Maspero/Estampa, 1968 ,1978. 9 - Marc Angenot. Revue des Sciences Humaines, N° 189 (1983): 121 -135. 10 - Consultar Michel Collot e J. C. Matthieu, cole9ao Rencontres sur la poesie moderne. Presses de L'Ecole Normale Superieure. Olivro de homenagem consagrado a Jean Starobinski ( Cahiers du Centre Georges Pompidou, 1986) e a J.P. Richard (Territoires de L'Imaginaire. Seuil, 1986). 11- Ver tambem : - P. Ricouer. Temps et Recit 1. II e III Seuil, 1984, 1985, du texte a l'action Seuil, 1986. - J. Bessiere e outros: La Theorie litteraire. Paris, PUF, 1989. - 1. Bessiere - Dire Ie litteraire. Bruxelles/Paris, P. Mardaga, 1989. 12- David Bleisch. Subjective criticism. Jolm Hopkins University Press. Baltimore 1978. Norman Holland. "The New Paradigm: subjective transaction". New Literary History, 1976, 7: -335 - 346 . A LiNGUA COMO HUMANIZADORA INTERACAO INTERPESSOAL NA (1) A pnltica de estudo do texto e mais abrangente do que a pnitica tradicional de estudar os fatos lingi.iisticosisoladamente. Isto porque a dimensao textual da conta de importantes questoes de ordem social, cultural e politica, esclarecendo a diversidade de conceituayao dos fatos sociais e culturais de urn povo para outro; preve para os alunosusuarios atividades que os ajudam a tornarem-se observadoresanalistas de seus pr6prios usos de portugues, fazendo entao lingi.iistica aplicada ao ensino-apredizagem dosusosdo portugues; incentiva 0 espirito investigador, reflexivo e critico do serhuman04iante de si mesmo, dos outros, da comunidade onde vive e convive; leva 0 falante a empenhar-se em fazer com que seu parceiro comunicacional compreenda 0 que ELE, 0 falante, esta dizendo e empenhar-se em interpretar a intenyao comunicativa do receptor. Com isso, evita-se 0 colapso comunicativo, pois a competencia da comunica<;ao exige habilidade para 0 falante se re1acionarefetivamente com outras pessoas no processo, cujo componente importante e a habilidade da expressao, do respeito e da considerayao positiva por outra pessoa, vendo-a no seu contexto s6cio-cultural. Portanto, n6s precisamos de urn manejo reflexivo e auto-critico de nossas pr6prias imagens e estere6tipos, como tambem daquelas imagens dos outros: cada pessoa se ve diferente de como outro ave. 0 entendimento intercultural, entao, ajuda-nos a ficarmos conscientes da relatividade de nossos conhecimentos, tanto quanta da nossa cultura. E preciso portanto unir esforyos com os colegas de to do pais (louvavel este Encontro), no sentido de contribuir para a analise (l) - Texto de palestra no "Encontro de Professores de Portugues", prol11ovido pelo Colegio das Damas de Instrw;ao Crista - 1992; com a insen;ao, agora, da Homenagem a Professora Doutora Cilia Coelho Pereira Leite ( Madre Olivia), da PUC-SP da situayao do ensino de portugues, no Brasil, para que se respeite a identidade linguistica de cada falante na certeza de que, e aqui concordamos com Luiz Antonio Marcuschi: "Saber sobre a linguagem e saber sobre costumes, tradiy6es, atividades, instrumentos e muito mais". (2) Situando, pois, 0 tema deste ensaio no ambito da temMica - "A Lingua como manifestayaocultural"- a expressao interac;aointerpessoal deve ser entendida no sentido amplo de ensino da organizayao e dos usos da lingua numa perspectiva intercultural. Nao cremos que seja necessario demonstrar a urn publico de professores de portugues (com formayao lingt1isticaou sobretudo com pritticapedagogica) que 0 ensino da Gramatica tern razao de ser. Lembramos, todavia, que 0 termo e uma abstrayao, pois se e possivel dizer que 0 sistema da lingua nao e urn so, na pratica esse sistema se realiza na fala por mediayao de tantas normas objetivas quantos SaDos dialetos sociais e regionais e tantas subnormas quantas saDas situayoesde comunicayao ou registros. Por tudo isso, as sugest6es de propostas prioritarias de investigayao da lingua numa perspectiva de interayao interpessoal e intercultural, valem elas mais pe1atroca de experiencias eo desejo de servir it causa da educayao. Nossa hipotese e a de que a ciencia, 0 saber tecnico-cientifico, a literacia cientifica estao, cada vez menos, isentos dos embates socio-politicos, no mundo inteiro. A escola, dentro desse contexto, na medida que incorpora individuos de divers as classes e de origens sociais, cada vez mais incorpora tamhem as chamadas contradiy6es sociais que, por sua vez, se cristalizam no mundo inteiro. Na escola, ainda hoje, ha professores que cometem 0 erro de entender como "lingua" aquela modalidade culta-literaria ou nao - refletida no codigo escrito ou na prittica oral que the segue 0 modelo, repudiando de todo aquele saber linguistico aprendido em casa, intuitivamente, transmitido de pais para filhos; outros, por urn exagero de interpretayao de "liberdade" e por urn equivoco em supor que uma lingua ou uma modalidade e "imposta" ao ser humano, chegam ao abuso inverso de repudiar qualquer outra lingua funcional que nao (2) "Lilguagem: 0 aspecto regional como valor". In: Allilis do 1 ellcoll/ro de lingiiisticil e li/eralura, Serra Talhada, PE, 1981 - Recife, Secreta ria de EducayaolPE, 1982, p. 28 seja aquela informal, de uso espontaneo na comunicayao cotidiana. Basicamente, a grande missao do professor de lingua materna e transformar seu aluno, e aqui concordamos com 0 gramMico Evanildo Bechara, em urn poliglota dentro de sua propria lingua, possibilitandolhe escolher a variedade funcional adequada a cada momenta de criayao e, ate, no texto em que isso se exigir ou for possivel, entremear diversas variedades funcionais para distinguir, por exemplo, a modalidade lingiiistica do narrador e a(s) modalidade( s) de seu(s) personagem( s). o padrao culto (norma culta) visto como unico uso viavel no que se refere a estrutura da lingua portuguesa traz, ao nosso ver, duas conseqij(~nciasbem marcantes: 1- Professor e aluno assumem uma atitude discriminat6ria quanta a realidade lingiiistica brasileira. S6 e prestigiado socialmente aquele que domine as regras gramaticais, como se lingua fosse urn aglomerado de preceitos rigidos e impostos. Onde fica, entao, a capacidade criativa dos usuilrios ? E 0 idioleto ou variedade individual de cada falante? Isto advem do quase completo alheamento aos aspectos s6cioculturais e lingilisticosdo aprendizna prciticado ensino da linguamaterna. As consequencias, repetimos, tern sido gravissimas. Atitude discriminatoria na sala de aula e uma constante, por se desconhecer indicadores da cultura de cada aluno ou, sejamos mais realistas, do grupo social por si e que 0 diferenciam entre outros. Mora tudo isso, convem lembraruma situayao de fato e bem real: impondo 0 seu padrao linguistico, a classe dominante rejeita as expressoes nao-gramaticais. A saida pnitica que cabe ao professor e a de ter presente que as atividades de ensino deveriam oportunizar a seus alunos 0 dominio de uma outra forma de falar, sem que isto signifique a depreciayao da forma de falar de seu grupo social. Que lingua ensinar na escola? Eis a pergunta-chave. Ensinar portugues e ensinar os usos da lingua e nao s6 0 padrao considerado culto e pelo qual 0 poder se manifesta com toda sua forya. A relayao interpessoal inexiste. Faz-se necessario, pois, estabelecer uma politica de ensino coerente com a realidade que prepondera nas diversas regioes do pais. Acreditamos que a soluyao esta numa postura, da parte dos professores-educadores, que encare os aspectos da educayao e do ensino como questoes de carMer politico-social e nao como questoes de natureza apenas pedagogica e de tecnicas de ensino, a fim de descaracterizar a escola como mantenedora das desigualdades sociais. Estas sac as preocupayoes que, de urn modo geral, devem orientar e serem exigidas dos professores - educadores. Neste sentido, atraves de uma LINGU!STlCA CRiTlCA, objetiva-se descobrir -revelar as relacoes de poder e os processos ideologicos que permeiam os diversos textos (escritos, falados). Do mesmo modo, uma PEDAGOGIA Critica se volta para analise das ayoes e interayoes na sala de aula, it luz de sistemas de crenyas e valores (sociais, culturais, politicos) de educandos e educadores. Em ambas, ressalta-se a dimensao socio-cultural e politica. 2. A educar;ao formal atrawc?sdos meios de comllnicar;ao de massa solidifica os preconceitos e as distorr;oes inicialmente recebidas na escola. Os significados e as mensagens recebidas atraves desses meios de comunicayao tambem nao correspondem it imagem do falante nativo (da crianyae do adulto ) e da sua realidade, estimulando a atitude que enfatiza os preconceitos e as distoryoes existentes sobre a realidade lingiiistica brasileira. A guerra primeira, entao, e contra a granuitica, a gramatica definida como normativa, retrograda, naocientifica, autoritaria, irrealista. Assim, 0 caminho adequado e 0 de proceder a urn levantamento dos fatos da lingua entre nos e estabelecer uma politica de ensino coerente com a realidade ali delineada, alem de que isso forya 0 falante a agir, uma vez que ele vai decidir usar seu portugues de acordo com 0 que achar (e ai eletern que pensar) coerente. Isso tira 0 falante, e mais particularmente 0 aluno, do papel passive que vem desempenhando no ate da fala e do caos em que se mostra envolvido pois nao sabe bem (seja qual for sua classe social) para que estudar portugues. Esta na hora de rejeitar a concepyao de norma padrao (superior) em nome da qual se pratica todo tipo de discriminayao. A existencia de variedades em grandes areas territoriais com uma unica lingua nacional, como e 0 caso do Brasil, e realidade objetiva e inelutavel. Quem a desconsidera e a c1assedorninante culta e conservadora. Seus elementos mais retrogrados talvez nem cheguem a falar em "variantes" para referir-se as formas usadas pelo povo; este simplesmente nao sabe "falar corretamente", esta "destruindo 0 portugues". Qutros mais sutilmente falarao em dialetos, mas tambem formularao pianos para a educayao lingiifsticado povo, para a "salvayao da lingua nacional", condenando os meios de comunicayao de massa, principalmente a televisao, como elementos propagadores da lingua portuguesa. Finalmente, os mais liberais, nao ousando confessar 0 elitismo profundo de suas convicyoes de serem os donos da lingua, falam de "dialetos sociais ou regionais", em oposiyao it "lingua culta" - que e a deles, naturalmente -, ou, sem adjetivos, it "lingua". E, corroborando a tese de que, em toda sociedade, a ideologia dominante e a da classe dominante, 0 proprio povo explorado dec1ara, como seus dominadores mais retrogrados, que "nao sabe falar direito". Diante da confirmayao de que pode haver equivalencia funcional entre a capacidade comunicativa de cada falante (independente de idade, de c1asse social, de respeito ou nao it norma gramatical), devese discutir e aprofundar a questao dos direitos individuaise das minorias; e ainda, uma forma de repensar, criticamente, a gramMica e 0 livro didatiea, numa tentativade minimizara influenciada gramaticatradicional no ensino escolar. Tudo isso tern como pressuposto 0 educar de acordo com os direitos humanos e lingiiisticos, 0 que, no nosso tema em discussao, e ter a lingua como instrumenta de interac;aointerpessoal. Poucas tern sido as alterayoes registradas nas gramaticas prescritivas brasileiras ao longo dos tempos. A maioria delas nao leva em considerayao os diversos usos, tornando impossivel a harmonia entre estes e as normas e os conceitos gramaticais. Q en sino do portugues nas escolas esta restrito ao ensino das normas. Esse padrao e ensinado como 0 tinico lingiiisticamente correto, a tinica linguagem representante de uma cultura. Ja nao se usa conscientemente a linguagem, decoram-se esses preceitos gramaticais, sem se considerar a experiencia particular que urn falante tern da propria lingua - ao bloquear as suas eventuais intuiyoes - procedimento que nao favorece nem mesmo 0 aprendizado da propria norma cult a, pois esse aprendizado se torna abstrato, irreal, sem utilidade propria ou pelo menos enfadonho. Qual entao poderia ser a postura do professor de portugues frente it gramatica da Lingua Portuguesa? Como ensina-la adequadamente? Nesta perspectiva, cabe uma reflexao sobre a Lingidstica Aplicada it Pesquisa e ao Ensino da Lingua Materna, no Brasil, e com ela, uma homenagem. Impossivel falar de lingilistica aplicada ao portugues e mais precisamente Semdntica da Lingua Portuguesa, em Sao Paulo sobretudo, e nao associar de imediato estas palavras a Cilia Coelho Pereira Leite, a nossa querida MADRE OLIVIA. Dona de uma versatilidade impar no oficio de pensar, Madre Olivia produziu uma obra significativa no universo semantico da linguagem, urn verdadeiro passeio poeticd3) nos caminhos, sem !imites, do repensar 0 ensino da gramitica priorizando 0 carninho da reflexao, do pensar e do educar criticamente. Urn born exemplo de.ssa ousada versatilidade e a participac;ao desta grande educadora no movimento da pesquisa paulista que deu origem ao IP (Instituto de Pesquisas Lingilisticasda PontificiaUniversidade Cat6lica de Sao Paulo - IP/PUC-SP). Madre Olivia foi, sem nenhuma duvida, uma figura de frente do gropo de pesquisadores (muitos seus ex-alunos) que ousou romper a barreira preconceituosa entre a Iingliisticaaplicadae 0 ensino gramatical, o que valeu a consolidac;ao da pesquisa semantica na vanguard a do movimento lingiiistico brasileiro contemporaneo. Naquele grupo, alem da mestra, estavam professores e alunos da PUC/SP e outros, tentando, a partir de uma linha te6rica de pesquisa, dar forma a essa nova gramatica que surgia. 0 livro Semantica, publicado em uma segunda edic;aopelaUniversidadeFederal de Alagoas (UFAL), em 1979, fruto de sua tese de doutorado, e urn exemplo tipico deste trabalho. Aqui, temas e metodologia aliados a uma harmonia bem caracteristica da cultura lingiiistica, reunem-se na forma operacional construindo urn peculiar acervo linguistico com unidade estilistica. E irnportante ressaltarum fato de maior relevancia. 0 movirnento deflagrado com a criac;ao do Curso de P6s-Graduac;ao em Lingua Portuguesa da PUC/SP; e com a criac;ao do IP-PUC/SP, onde (3) A prop6sito, a homenageada publicou um livro de poemas ( LIBERTAC;:J..O Ed. presenca, RJ, 1988, 71 paginas), cuja resenha de minha autoria [oi divulgada na Edir;1io do dia 01/12/1989 do Jornal do Commercia, p.10, sob 0 titulo "A Libertar;ao da Madre Olivia". pesquisadores como Madre Olivia - sua primeira coordenadorapuderam contribuir para radicalmente transformar a pnitica do ensino de Portugues. Posso dizer, com certeza, que esta homenagem de hoje (Madre Olivia esta com seus 80 anos ) e mais que devida, e merecida. Madre Olivia e urn marco na hist6ria da cultura da PUC/SP, do Estado de Sao Paulo e deste Pais (inumeros trabalhos de orientandos sac prova disso). Como colega, e sua ex-aluna, eu me sinto honrada de ter partilhado com ela urn momento hist6rico, de mudanc;as e conquistas culturais da P6s-Graduac;ao da PUC/SP. Como uma representante de seus ex-alunos, agradec;o a Madre Olivia par toda sua obra e pela emoc;ao que sinto em te-Ia aqui, cheia de vida, alimentando 0 nosso argulho e 0 nosso sentimento de estudiosa da semantica da sintaxe na perpectiva de uma Gramatica de Texto. Esperamos, por fim, que as nossa indicac;5es possam ser uteis, estimulem as discuss5es na busca de propostas alternativas que possam contribuir para efetivas mudanc;asde atitudes dos responsaveis pela educac;aoatraves da elabarac;aode objetivos,metodos e conteudos em fun9ao de uma pedagogia intercultural "na busca incessante de MELHORES ENCONTROS, para atenuar a dureza da vida humana e conduzi-Ia a mais felicidade". (4) (4) MADRE OLIVlA, Semdntica e a Natureza da Lingua. p.81. Petr6polis: Vozes, 1979, LEMBRANDO FERNANDO TARALLO: os DIREITOS DE APRENDIZES DE SOCIOLINGOiSTICA Como surgiu seu interesse por Direitos Linguisticos? perguntam-me colegas de profissao e pessoas interessadas nessa problematica. Em grande parte, respondo, por causa de uma formar;ao interdisciplinar: Letras, Direito e Lingi.iistica. Dentre os fat ores que contribuiram, durante a gestar;ao da ideia, destacaria a busca de uma humanizar;ao mais profunda do processo de educar;ao linguistica (Gomes de Matos, 1982, 1983 ) 0 contato com especialistas em educar;ao e direitos humanos na Unesco, Paris (a partir de 1975), participar;ao nas Diretorias da AILA - Associay30 Internacional de Linguistica Aplicada (ate 1981) e da AlMA V - Associar;ao Internacional para 0 Desenvolvimento da Comunicar;ao Intercultural (desde 1978), influencia do modelo te6rico emancipat6rio de Paulo Freire e a leitura de artigos sobre Direitos Humanos na Revista de Cultura Vozes na decada de 70. A essa enumerar;ao devo acrescentar o fato de ter feito uma iniciar;ao it Sociolinguistica no verao estadunidense de 1964, como bolsista da Fundar;ao Ford e do Programa Interamericano de Linguistica, Ensefianza de Idiomas (PILEI), em Indiana University. Tive, por isso, 0 privilegio de cursar uma disciplina ministrada por John Gumperz e outra, orientada por M.A.K. Halliday. Todos esses fatores viriam a integrar-se em uma firme vontade de propor algo novo it comunidade linguisticainternacional. 0 "estalo" ocorreu em 1983, ao comer;ar a formular 0 que em marr;o do ana seguinte seria publicado pela Revista de Cultura Vozes (Gomes de Matos, 1984 a) e pelo boletim FIPLV WORLD NEWS (letter), da Federar;ao Internacional de Professores de Linguas, editado sob os auspicios do Programa ALSED - Anthropology and Language Science For Educational Development da UNES~O (Gomes de Matos, 1984 b). Em ambos os casos, a inspirar;ao-mor foi a Biblia. Significativamente para 0 que anos mais tarde iria chamar "direitos linguisticos do cientista brasileiro", 0 primeiro artigo sobre Direitos linguisticosde minha autoria foipublicadoprimeiramenteem portugues. Essa caracterizayao de uma nova categoria de direitos humanos foi explicitada atraves de uma lista de 20 tipos de direitos, dentre os quais 0 de aprender-se uma ou mais linguas (cf Gomes de Matos, 1984 a). Em suma, uma formayao em Letras-LingUistica-Direito(com uma forte inclinayao para 0 Direito Internacional)e uma incessante busca por abordagens educacionais verdadeiramente humanizadoras, convergiriam para a criayao de uma ideia - traduzida atraves de urn Apelo em favor de uma Declarac;iio Universal dos Direitos Lingi1isticos - que iria germinar mediante conceitos-chave e derivados. o envio do texto do Apelo (ing. A plea) a linguistas, sociolingu.istas, psic610gos, educadores, cientistas politicos resultou em abundante e expressiva documentayao epistolar, verdadeiro feeedback de interdisciplinaristas tambem preocupados com a problematica do conquistar-se urn lugar ao sol para uma categoria de direitos humanos ainda nao reconhecida pela ONU: os direitos lingiiisticos. Veja-setais depoimentos no vo1.2desta revista, dezembro de 1992,p.171-172, no relato deste autor sobreLingUistica no Brasil: o papel da UFPE. A inclusao, entre os 20 tipos de direitos linguisticos exemplificados em Gomes de Matos( 1984 a), dos direitos lingi1isticos de aprendizes e meu interesse em fazer sociolinguistica aplicada ao ensino-aprendizagem de linguas (materna e estrangeira), levaram-me, durante uma permanencia de quase urn ano nos Estados Unidos - Professor Visitante Fulbright no Department of Romance Languages da University of Georgia, Athens, USA no periodo letivo americano de 1985 a 1986 - a aprofundar uma ideia potencialmente fertil: os direitos lingUisticos de aprendizes de lingua materna (0 Portugues) e linguas estrangeiras (mais especificamente 0 ingles: cf. Gomes de Matos, 1976, para uma perspectiva anterior). Assim, sucederam-se varios escritos sobre essa problematica "derivada": em portugues (antes de recorrer it lingua inglesa), urn artigo sobre a importancia desse novo tipo de direitos para os aprendizes de linguas. (Gomes de Matos, 1984 c) e, em ingles, urn balanyo-critico sobre a ausencia, na literatura sociolinguistica, de escritos sobre os direitos lingtiisticos de aprendizes de linguas (Gomes de Matos, 1985). No ano seguinte, apesar de impossibilitadode comparecer ao XI Congresso Mundial de Sociologia em Nova Delhi, India (agosto, 1986), tive uma comunicayao aceita e apresentada "in absentia" pelos colegas Tove Skuttnab-Kangas e Robert Phillipson, dois dos mais atuantes especialistas mundiais na area de direitos linguisticos e, atualmente, coordenadores da Rede Mundial que, atrav6s do Correio Eletronico, intercambia id6ias e resultados de pesquisas sobre direitos humanos lingii£sticos. A intenyao de contextualizar minha pesquisa nesta nova area de direitos linguisticos de aprendizes de linguas motivou a publicayao de urn texto apresentado no I ERPULI, Primeiro Encontro Regional de Professores Universitarios de Ingles, realizado na PUCRJ, sob os auspicios do British Council e da comissao Fulbright( cf. Gomes de Matos, 1988 a). Dutra id6ia "derivada", correlata, comec;aria a ser explorada a partir de 1986: os direitos lingtiisticosdo professor (Gomes de Matos, 1986 ). Esse aspecto da problematica viria a transformar-se em uma breve Carta de Principios para profess ores de linguas em paises em desenvolvimento ( Gomes de Matos, 1988 b ). Mais uma dimensao foi introduzida, atrav6s de urn artigo em que argumento em favor do direito, que deveria ter 0 aprendiz de linguas (segundas, estrangeiras) de traduzir (Gomes de Matos, 1991). Ainda sobre direitos de aprendizes de portugues como lingua materna, registre-se a publicac;ao de urn texto sobre direitos dos alfabetizandos (Gomes de Matos, 1990) e, com referencia ao ensino de nossa lingua a falantes de outros idiomas, examine-se uma listagem dos direitos e deveres de professores de portugues a estrangeiros (Gomes de Matos, 1992 a). Evidencia adicional de que 0 macroconceito de direitos lingtiisticos e extremamente fertil, especialmente se considerar-se que todo ser humano e aprendiz-construtor-usuario de pelo menos um sistema lingiiistico (lingua falada, lingua escrita, lingua de sinais...) e a quesHio, levantada por este linguista, dos direitos linguisticos dos cientistas, particularmente de lingua portuguesa (Gomes de Matos, 1992 b; 1993). o desenvolvimento da id6ia dos direitos linguisticos dos aprendizes vem frutificando, tendo motivado este pesquisador a elaborar urn Projeto a transformar-se em Fudamentos para uma Teoria e Praxis dos Direitos Linguisticos de Aprendizes de portugues e de linguas estrangeiras no Brasil . A seguir, uma pequena amostra de depoimentos de alunos de Portugues sobre seus direitos linguisticos. A documentayao que esta sendo coletada visa a revelar percepyoes de pre-adolescentes e adolecentes - no contexte escolar local- sobre direitos lingiiisticos. Aos leitores cabeni fazer as infererencias sobre atitudes de estudantes (do Colegio SantaMaria, Recife). Perguntou-se: "Como aluno(a) de portugues, neste Colegio, que direito voce gostaria de ter7 Por que 7". Cum pre esclarecer que, antes de pedir-se aos alunos que escrevessem a resposta, houve uma discussao bem informal a respeitos de direitos humanos, sem, entretando, mencionar-se essa nova categoria de direitos lingiiisticos. A seguir, 10 depoimentos de alunos do 10 Grau maior : 1. "Falar livremente, durante a aula, sem inibiyao ou medo de estar errada" 2. "De nao ler livros que nao gosto" 3. "De ter gramaticas dadas pelo govemo" 4. "De discutir com 0 professor diferentes maneira de falar a me sma coisa com outras palavras" 5. "De poder falar girias e ao mesmo tempo ser cult a" 6. "De opinar tambem sobre livros extraclasse para que fossem lidos com mais empolgayao" 7. "De poder falar da me sma maneira que falo em casa" 8. "De questionar a escrita das palavras, pois muitas palavras, para mim sao complicadas" 9. "De questionar 0 professor ate que entenda e acredite na integra as mensagens transmitidas" 1O."De me expressar de urn modo correto, mas simples" Eis mais cinco depoimentos, de alunos do 2° grau (mesma Escola; 0 continuum socioecon6mico dos pais se estende da classe media it classe media-aha): A questao submetida aos alunos foi: "0 que entende por direitos lingUisticos?" ( PARA MIM, DlREITO LINGuISTICO DlREITO DE .... ) SIGNIFICA TER 0 1. "Falar do jeito que eu quiser " 2. "Se sou fanho, ou gaga ou falo nipido demafs, tenho direito de falar assim" 3. "Expandir cada vez mais meu vocabulario" 4. "Falar girias" 5. "Diante dos fatos , poder debater e criticar" De conceitos sociolinguiticos aprendizes a direitos sociolinguisticos de Vma estrategia para explicar direitos de aprendizes e a de tomar-se conceitos-chave da Sociolinguisticae, a partir deles, formularse os direitos correspondentes. Apenas para ilustrar, seguem-se dois exemplos: o direito de ser exposto a variedades da lingua de fazer 0P90es quanto a variantes ( lexicais, sintaticas, pragmaticas) direito de manifestar rea90es sobre variedades da lingua ( e aos usos destas) e sobre usuarios e comunidades linguisticas. direito de receber orienta93o sobre atitudes linguisticas, para poder ser urn usuario esclarecido, confiante ( lembre-se 0 pioneirismo do grande mentor de Fernando Taral1o, WiJliam Labov, quanto a constru93o e aplica9ao de teste sobre inseguran<;a linguistica). o direito o o Inspirado na obra do saudoso colega Fernando Tarallo, posso afirmar que estivesse ele ainda entre nos - fisicamente, pois espiritual e intelectualmente continuaremos a sentir sua presenva e a muito positiva influenciade suas ideias- certamente aceitaria 0 desafio de formular uma lista dos direitos dos aprendizes de Sociolingtiistica. Como homenagem aquele criativissimo colega, apresento uma lista, a ser complementada pelos colegas e por alunos de pos-graduavao e graduavao: (COMO APRENDIZ DE SOCIOLINGUISTICA 0 ALUNO TEM DIREITO DE ..... ) 1. Aprender a compreender as" fotografias sociolinguisticas" de sua realidade nacional, regional, estadual, municipal 2. aprender afotografar sociolinguisticamente aspectos de sua realidade, atraves dos diversos modelos teoricos existentes, sejam variacionistas, interacionistas, quantitativos, eclcticos ", 3. Aprender a fazer sociolinguistica de modo relevante e agradavel (0 livro Tempos Linguisticos, Itinerario Historico da Lingua Portuguesa, que Tarallo nos deixou, atraves de edivao pela Atica, SP, 1990, e modelar tambem como demonstravao de que e possivel sastifazer ao direito de fazer SociolinguisticaHistorica - trabalhar os principios da variavao e da mudanva lingUistica - de modo atraente, atraves da problematizavao"agradavelmente legivel",como insiste Tarallo na Introduvao aquele volume). Para concluir, recordo 0 senso de empatia - de elevadissima responsabilidade profissional- que Tarallo manisfestou, ao enviar seu manuscrito (devidamente corrigido) para inc1usaono numero 89 da revistalnternational Journal of the Sociology of Langauge (Berlin, Mouton de Gruyter, 1991 ), que tivemos a prazer e 0 privilegio de organizar, Stella Bortoni e 0 autor deste texto. Ao perceber que a referida revista so sairia em 1991 e que tinha redigido sua contribuivao ( Sociolinguistic Patterns in Brazilian Portuguese) em 1988, Tarallo fez questao que a data de criavao do texto ficasse registrada na revista dirigida por Joshua Fishman. Assim, le-se: UNICAMP, May 1988. Que 0 dignificante,sociolingiiisticamenteconstrutivo e motivador exemplo de Tarallo tenha continuidade em nossa comunidade cientifica brasileira: apos escrever sobre direitos, cumpre lembrar ooutro aspecto da questao - os deveres. Urn de nossos deveres 0 de saber homar a seriedade e a edequa9ao com que Tarallo pas seu notavel conhecimento de sociolingUistica a servi90 dos que continuam ou irao prosseguir nesse maravilhoso tUnel sociolingUistico que atravessamos com entusiasmo e espirito de aventura, no sentido Taralliano. Que a paz comunicativa eterna esteja com voce, Fernando Tarallo. e Gomes de Matos, Francisco ( 1976) Lingiiistica Aplicada ao Ensino de Ingles. Sao Paulo, MGraw-Hill (1982) Toward a human-improving applied linguistics Washington, D.C. Center for Applied Linguistics Newsletter, September. (1893) Amor ao proximo linguistico. Petr6polis, Revista de Cultura Vozes, novembro. (1984 a) Por uma Declarayao Universal dos Direitos Linguisticos Individuais, Revista Vozes, maryo. (1984 b) A plea for a language rights declaration. Marburg Germany. FIPLV WORLD NEWSLETTER, April. (1984 c) A impormncia dos direitos lingiiisticos dos aprendizes de linguas. Sao Paulo, Revista Interayao. Centro de Lingiiistica Aplicada Yazigi, junho -julho. (1985) The linguistic rights oflanguage learners. Hawaii, Language Planning Newsletter, August. (1986) E os direitos lingiiisticos do professor? Interayao, agosto. SP, Revista (1988 a)The linguistic rights of English language learners in Brazil, PUC-RJ, ANAIS DO I ERPULI. (1988 b) Principles for teachers in developing countries. Marburg, Germany, FIPLV WORLD NEWS, September. 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"Urn sabia Na palmeira, longe" Carlos DrulJIlJlond de Andrade A "Canyao do Exilio" de Gonyalves Dias, escrita em Coimbra ernjulho de 1834 chegou ao Brasil pouco tempo depois, e se afirmou como urn hino it natureza e it beleza da "pMria amada". Convern lembrar que, naquela epoca, as vozes romanticas daEuropa ja haviam chegado ao pais tropical via Paris, atraves dos "Suspiros Poeticos e Saudades" de Gonyalves de Magalhaes que, seguindo 0 rnodelo romantico frances, exaltava 0 seu amor pela "terra saudosa" e pelo "sol arnericano". Mas os versos de Magalhaes nao VaGbrilhar eternarnente no firmamento da poesia brasileiracomo os de Gonyalves Dias, e a hist6ria literaria vai desloca-los ao longo do tempo. Manuel Bandeira, nurn estudo critico sobre 0 poeta declara: " Magalhaes estava longe de ser 0 genio que julgavam ver alguns dos seus contemporaneos, (...) A religiao, a patria, 0 amor, os aspectos da velha civilizayao europeia, temas inspiradores da poesia dos Suspiros, nunca the arrancaram acentos verdadeiramente profundos" yl Contrariamente aos versos de Magalhaes, os de Gonyalves Dias vaGse tomar cada vez mais conhecidos e apreciados das gerayoes futuras. Comprovando 0 seu valor e a sua forya de integrayao no sentirnentalismo e no espirito de urn povo que ainda estava it procura de uma identidade e de modelos. Quantas gerayoes viveram a sombra das palrneiras, escutando os sabias, enquanto os ventos romanticos sopravam cada vez rnais forte, embalando paixoes, desejos, desespero e morte! 1 - Manuel Bandeira, Ensaios Literarios in Poesia Completa e Prosa, Rio de Janeiro, Jose Aguilar Editora, 1974, pp 555-557. Parece-me interessante confrontar a critica que Manuel Bandeira fez aos versos de Magalhaes it sua apreciayao da poesia de Gonr;alves Dias: " Nao hi na poesia brasileira versos que tenham alcanr;ado mais larga popularidade (...) na "Canr;ao do ExOio" 0 sentimento de nostalgia da patria esta expresso com uma serenidade que se respira em Wanderers Nachtlied Ein Gleiches de Goethe". (2) Convem salientar que 0 poema de Gonyalves Dias foi inspirado numa balada de Goethe, da qual 0 romantico brasileiro estraiu a epigrafe da sua Canr;ao; epigrafe esta, traduzida assim por Manuel Bandeira: "Conheces 0 pais onde florescem as laranjeiras? Ardem na escura fronde os frutos de ouro ... Conhece-lo? - Para Ia quisera eu ir". (3) Poderiamos afirmar que "A Canr;ao do ExiIio" e na Iiteratura brasileira 0 texto de referencia do nosso romantismo, pois sempre esteve presente na memoria do povo, dos poetas e artistas brasileiros. Os diversos movimentos literarios se inspiraram desta Can<;aocomo uma especie de texto matriz. Nos a veremos assim sob as mais variadas formas e utilizada para os mais diversos fins. Ainda na fase romantica, 0 poeta Casimiro de Abreu vai intertextualiza-Ia, escrevendo a sua propria "Canyao do ExiIio"; assim tambem procedera Sousandrade com a sua "Harpa XLV". Os poetas modemistas e pos-modemistas vao dar aos versos de Gonyalves Dias urn novo tom e uma nova roupagem; assim a velha "Canyao do ExiIio" voltara it atualidade literaria: Carlos Drummond de Andrade a evocara no poema "Europa, Fran<;ae Bahia" e criara tambem a sua "Nova Car.yao do ExiIio"; Oswald de Andrade nas suas andanr;as pela Europa escrevera 0 seu "Canto de Regresso it Patria" inspirado na velha Canr;ao sempre presente; Cassiano Ricardo imaginando-se num exilioromantico, arfimara 0 seu desej0 de evasao no poema "Ainda irei a Portugal", e como outros, Murilo Mendes, em exilio cultural na Europa, homenageara 0 "texto fundador", com a sua "Canr;ao Exilio". 2 - Idem, p.562 3 - Gonc;alves Dias, Literatura Comentada, Abril Educac;ao, Sao Paulo, 1982. P.ll Mas, a "Canc;ao" de Gonc;alves Dias nao ficara somente no reino da poesia, ela chegani as ruas e a boca do povo pela musica de Gilberto Gil e Torquato Neto, "Marginalia If'. Poderiamos ainda citar outras intertextualizac;oes, mas isto nos levaria muito longe, e talvez, amanha surgira mais uma recriac;ao como prova de "amar a plitria". Hoje, tambem em exiliocultural em Paris, recebo tristes noticias da realidade brasileira. Parece que tudo vai mal e que ate os sabias que outrora cantavam nas palmeiras da nossa terra, amedrontados pela fome e pela miseria, partiram a procura de novas palmeiras, pois as nossas morreram queimadas ou foram cortadas, em nome do progresso. Mas para onde teriam ido os nossos sabias? Soube tambem que no pais onde havia "mais estrelas, mais flores, mais vidas e mais amores" tudo mudou: que as constelac;oes tambem migraram, temendo que prometeus desesperados viessem roubar s suas luzes para iluminar os seus obscuros caminhos. E as flares? sera que se esqueceram de desabrochar, ou estao a espera de uma nova primavera? Quanto as vidas, parece que esHio cada vez menos vivas. Mas como viver numa terra violada, onde reinam a inseguranc;a e 0 medo, a fome e a desesperanc;a? Mas felizmente restam os amores - razao maior para viver - s6estes sobreviveram ao vendaval que assolou 0 nosso pais ... Um dia, Antonio Maria afirmou que a profissao do brasileiro era a esperanc;a. Parece que isto e bem verdadeiro. Assim e precise crer que outras palmeiras nascerao e que os sabias vao voltar. Sozinho, a noite, penso na minha terra e digo para mim mesmo: "nao permita Deus que eu morra", sem que eu veja de retorno os sabias ... "CAN<;Ao DO ExILIO Kennst du das Land, wo die Cietronen bltihen, 1m dunkeln Laub die Gold-Orange gltihen ? Kennst du es wohl ? - Dahin, dahin ! Mocht ieh ...ziehn. Minha terra tern palmeiras, Onde canta 0 Sabia; As aves, que aqui gorjeiam, Nao gorjeiam como la. Nosso ceu tern mais estrelas, Nossas varzeas tern mais flores, Nossos bosques tern mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, it noite Mais prazer encontro eu la; Minha terra tern palmeiras, Onde canta 0 Sabia. Nao permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lit; Sem que desfrute os primores Que nao encontro por ca; Sem qu 'inda aviste as palmeiras Onde canta 0 sabia." Gon9alves Dias Coimbra 1843 A INSUFICIENCIA DOS ELEMENTOS LINGiHSTICOS DO TEXTO: Ul\1 DESAFIO PARA OS INTERLOCUTORES A interayao lingUistica,uma atividade necessariamente textual, nao se esgota pelo contingente dos elementos verbais que a constituem. Conta, entre outros fatores, com a intervenyao dos sujeitos participantes que, it partida, se predisp5em a produzir e interpretar, de forma coesa e coerente, os eventos linguisticos comunicativos. 0 ensino da produyao e compreensyao da atividade textual ganharia maior relevancia e se tomaria mais produtivo se se ultrapassasse a abardagem puramente linguistica que 0 tern, de forma geral, caracterizado. 1 - 0 principio de que a atividade verbal, sob qualquer condiyao, se exerce sob 0 modo da textualidade esta bastante consoli dado nos meios da pesquisa linguistica e tern, sob muito aspectos, centralizado o interesse dos investigadores, principalmentedaqueles que promovem o desenvolvimento e a aplicayao de teorias sobre 0 texto. Nos desdobramentos deste principio ganha relevo a nOyao de que existem propriedades que regulam 0 exercicio da textualidade e especificam os modos de sua relevancia lingiiistica e social. Tais propriedades constituem uma rede de relay5es, ou seja, assumem urn carater inteiramente relacional, de modo que a aplicayao de qualquer propriedade revela-se dependente da aplicayao das outras do conjunto. A compreensao das habilidades de produzir e interpretar texto pode receber urn tratamento mais consistente e mais produtivo se as implicayoes deste principio e de seus desdobramentos forem, mais amplamente, tornados em considerayao, mais ainda, na atividade de en sino destas habilidades. E em direyao a este ponto que oriento a presente reflexao. Tenho em mente a urgente e sempre oportuna necessidade de se questionar os procedimentos com que se ensina a pratica da composiyao e da leitura de textos. Os parametros de uma lingua demasiadamente abstrata e, par vezes, inteiramente descontextualizada parece estar na base de uma ineficiencia do ensino, a qual tern sido, por muitos meios, atestada e denunciada. Neste sentido, se pode referir, tambem, a perspectiva reducionista das teorias que veem 0 texto como objeto meramente linguistico, dorninado, apenas, por regras gramaticais, que, embora legitimas, nao preenchem as exigencias de prodw;ao e interpretayao de textos apropriados e relevantes. Comeyo, pois, por advogar nao apenas uma ampliayao do objeto linguistico ate 0 dominio do texto, mas, e principalmente, a aceitayao de que os elementos linguisticos do texto formam apenas parte do conjunto dos fatores que the confere sentido e relevancia. Mais especificamente, proponho que 0 estudo do texto, tao pertinente para a compreensao da interayao verbal, seja feito tendo-se em conta a inter-relar;ao que existe entre 0 lingtiisticoeo extralinguistico do texto. No momento, trago como ponto de reflexao 0 layo entre a coesao e a coerencia do texto-elementos de seus aparatos linguisticos (cf.Beaugrande e Dressler, 1981) - e a intencionalidade e a aceitabilidade do texto-elementos ligados aos interlocutores da interayao. 2. A coesao tern sido definida como urn conjunto de recursos lexico-gramaticais destinados a prover e a assinalar a interligayao semantica entre os diferentes segmentos que compoem a superficie do texto. A afirmayao de que uma sequencia aleat6ria de palavras nao constitui urn texto encantra urn de seus fundamentos na propriedade da coesao. Com efeito, uma caracteristica distintiva das realizayoes textuais e a inter-relayao existente entre seus componentes ou , a propriedade de que os elementos lingtiisticosdo texto estao vinculados entre si de modo que cada unidade esti , de alguma maneira, presa a uma outra antecendente ou subsequente. Desta vinculayao resulta a continuidade e a unidade semantica necessarias para que a superficie do texto seja apropriada e relevante. E evidente que nao se trata, aqui, de uma ligayao meramente superficial. Nao basta, por exemplo, que numa sequencia de frases haja unidades que duma forma ou outra se retomem. A superticie do texto nao e, por si mesma, decisiva na deterrninar;ao da sua pertinencia textual. Construir urn texto nao implica, simplesmente, justapor uma serie de frases, ou outro tipo de segmento, por mais bem formados que estejam. Como disse, a rede de rela~5es que se estabelece pela coesao e de natureza semantica. Deste modo, os nexos atestaveis na linhada superficietextual sinalizamas rela~5esque, no myelda estrutura profunda do texto, garantem a sua legitima continuidade e unidade semanticas. 0 que se pretende pelas marcas da coesao superficial e prover e assinalar a continuidade e a unidade conceptual do texto. Por estas considera~5es fica ja evidente a correla~ao entre a coesao e a coerencia do texto .Se urn texto se faz com palavras, postas nao aleatoriamente na sequencia de sua superficie, ou, ainda, se 0 aparato lingUistico do texto deve interligar-se, outra razao nao existe, senao assegurar e indicar a continuidade de conceitos e rela~5es subjacentes aquela superficie. Ou seja, a condi~ao de que urn texto deve constituir uma umdade semantica fundamenta 0 recurso aos vanos expedientes coesivos.Do ponto de vista do interpret ante, a expectativa de que 0 texto " faz sentido" encaminha a busca das possiveis liga~5es entre as palavras, entre as senten~as, entre os paragrafos ou ,ainda, entre blocos supraparagr:mcos .Um texto falho em elementos coesivos " do qual 0 locutor parece ter perdido 0 contrale ", "induz a urn julgamento de incoerencia" (cfAdam, 1990.65). Coesao e coerencia constituem, assim, duas propriedades da materia linguistica do texto as quais, para serem relevantes, devem estar em inteira harmonia e consonancia. A superficie do texto, que, como se viu, deve estar coesivamente organizada, preenche a fun~ao de garantir e assinalar a interliga~ao semantica requisitada pela unidade textual. 3. Sabe-se, contudo, que a dimensao linguistica do texto e insuficiente na determina~ao de sua relevancia sociocomunicativa. Se urn texto se faz com palavras, se estas constituem suas instru~5es mais 6bvias, e igualmente verdade que os elementos linguisticos do texto nao preenchem a totalidade dos requisitos necessarios it sua realizayao. Urn texto e cria~ao de dois ou mais sujeitos que, numa determinada situayao social, interagem. As irnplicay5esresultantes das inten~5es e expectativas desses sujeitos constituem, tambem, elementos do sentido configurado pelo texto . Dai que, como adiantei atds, cuidar da adequada organizavao dos constituintes linguisticos do texto nao esgota as providencias necessarias para uma apropriada e relevante interavao verbal. Perder de vista outras dimens5es textuais pode desvirtuar a compreensao das legitimas condic5es da atividade comunicativa. Parece oportuno, pois, que se ultrapasse a materia lingilistica do texto e se apreenda a intervenvao, tambem decisiva, de outros fatores. A abordagem das regularidades lingilisticas do texto e necessaria, sem duvida, mas nao esgota os criterios de sua relevancia. Se a coesao e a coerencia, enquanto propriedades linguisticas do texto, se harmonizam, ambas, por sua vez, se prendem a propriedades extralinguisticas que, de certa forma, condicionam e regulam a sua adequada realizavao . as interlocutores, enquanto sujeito "que intentam " e que "aceitam" a interavao relevante, constituem elementos desse dominio extralinguistico do texto e sao, em grande medida, parametro para as decis5es exigidas. Proponho, assim, que se levante, aqui, a inter-relavao entre a dimensao linguistica do texto e a intencionalidade e a aceitabilidade dos interlocutores. Meu prop6sito maior e estimular uma pnitica pedag6gica de ensino do texto, que tenha em vista a intervenvao dos sujeitos em interavao. S6 assim, me parece, e possivel ultrapassar 0 reducionismo de urn texto apenas linguistico, sem enunciador e sem destinatario,"um produto ", somente ,desvinculado e solto da interavao social de que e inevitavelmente parte relevante. 4. A intencionalidade conceme it atitude do produtOr<lldotexto de, em principio, pretender que sua construvao linguistica seja coesa e coerente e, enquanto tal; possibilite 0 cumprimento de suas intenvoes e dos fins previstos (cf.Beaugrande e Dressler 1981 :113). Ou seja, os usuarios da lingua em interavao admit em que suas produv5es sao, it partida, coesas e coerentes. Assim 0 admitem, porque desta forma tencionaram e porque, para isto, diligenciaram a utilizavao dos recursos necessarios. A intencionalidade abrange, portanto, nao apenas 0 prop6sito previo dos interlorcutores de construiremuma atividadelingilisticacoesa e coerente, como abrange, tambem a providencia de manutenvao deste proposito, no decorrer de toda a interayao . Por estas considerayoes evidencia-se , sem duvida , a relayao da textualidade com a concepyao da linguagem enquanto atividade comunicativa, ou seja, enquanto a';3o empreendida por sujeitos em contextos de comunicayao .Compor urn texto, nesta perspectiva, e mais do que organizar na linha do tempo ou sobre 0 papel uma sequencia de palavras, ainda que sob 0 cumprimento dos padroes da gramatica da lingua. Compor urn texto e, na verdade, uma "intera';30" linguistica e social. Inclui, por urn lado,a intromissao de urn sujeito, com propositos previos e empenhos sucessivos para que nao se perca 0 carater interativo da produyao linguistica.Nega -se , assim, qualquer hipotese de passividade ou de alheamento de quem prop5e a troca comunicativa, por mais que se considere 0 teor tacito de seu empenho e de seu envolvimento. Pela admissao da intencionalidade patenteia-se, portanto, a visao ampliada do exercicio linguistico, no sentido de que as condiyoes de eficiencia de sua realiza<;ao implicam mais do.que aquilo que seus elementos lingilisticos deixam perceber; par outras palavras, 0 apelo it intencionalidade abre urn espayo onde se pode surpreender a presenya de quem produz 0 texto e, mais ainda, 0 pressuposto de que quem 0 produz 0 faz coesa e coerentemente. Como base neste pressuposto e que 0 parceiro da interayao vai empreendendo 0 resgate da dimensao semantica do texto. Como observa Morgan (1979, apud Brown e Yule 1983 :25) quando, num texto, alguem faz a liga<;aoentre urn pronome e urn sintagma nominal previamente apresentado e porque presume, antes de tudo, que 0 texto e coerente. Tern sentido, portanto, empreender as buscas interpretativas .Ou seja, se 0 receptor empenha-se por encontrar 0 sentindo pretendido, e nao desiste deste empenho, e porque acredita que algum sentindo foi atualizado : "Textos sac aquilo que ouvintes e leitores tratam como textos " (cfBrown e Yule, 1983: 199) . Procede, inclusive, deste ponto a tolerancia com que se comport am face it concreta realiza<;ao dos eventos linguisticos e as eventuais quebras da continuidade do texto . A propriedade da intencionalidade tern, assim, a sua contrapartida na outra da aceitabilidade, como veremos, mais detidamente, a seguir. 5. Centrada no destinatario da intera<;ao linguistica, a aceitabilidade concerne a atitude do interlocutor de aceitar como coesa e coerente a atividade verbal de seu parceiro ( cfBeaugrande e Dressler, 1981: 129). Como se tem salientado, a inclusao deste dois criterios no conjunto da textualidade representa a intromissao dos interlocutores ( enquanto "inten<;ao" e "capta<;ao"desta "inten<;ao"), no que diz respeito it institui<;ao da coesao e da coerencia de suas produ<;5es linguisticas. Em termos diretamente ligados as situa<;5es de comunica<;ao, representa, ainda, a disposi<;ao de enfrentarem e resolverem as previsiveis quebras ou flutua<;5esno estabelecimento da dupla continuidade de texto. Indica, noutros termos, que a decisao sobre a forma da coesao e da coerencia do texto radica, tambem na forma como os interlocutores 0 encaram. Neste particular, cabe evocar a colabora<;ao de Grice (1975), no que se refere it proposi<;aodo principio que ficou conhecido como o "principio de coopera<;ao", a partir do que e proposto um conjunto de "maximas" e a no<;aode "implicaturas conversacionais". o estudo de Grice, apesar de aplicar-se diretamente as situac5es de conversa<;ao, oferece elementos gerais acerca de como as pessoas, normalmente, se comportam na constru<;ao e interpreta<;ao sucessivas do sentindo de qualquer tipo de texto . Em ultima instancia, 0 que pretendem e que sua intera<;aoobtenha o maior sucesso possivel . Este objetivo, em principio, presente a todo e qualquer evento comunicativo, sup5e 0 cumprimento de determinadas regularidades, como sup5e, ainda, pela natureza contingente dos sujeitos participantes, a eventual quebra ou, ate mesmo, a propositada viola<;ao destas regularidades sem que se dilua inteiramente 0 teor comunicativo da intera<;ao . Pelo referido principio de coopera<;ao, cuja manuten<;aoe dada pelos interlocutores como tacitamente posta, tanto quanta 0 exigem os termos da situa<;ao, produtor e receptor estao como que "contratualmente" empenhados .Objetivam 0 bom termo de sua troca comunicativa, inclusive pelo discernimento da eventualidade ou dos propositos daquelas viola<;5es. Providenciam estrategias de estabelecimento e recupera<;ao do sentido global do texto, pois acreditam na pretensao comunicativa de sua atividade. Hallidy e Hasan (1976), sem chegarem it explicita denominayao de aceitabilidade, formulam um ponto de vista coincidente quando dizem que nos insistimos "em interpretar qualquer passagem de texto,desde que haja a mais remota possibilidade de faze-Io" (cfp.23). Brown e Yule (1983) admit em, por outnis vias, que 0 ouvinte ou 0 leitor sao conduzidos na sua tarefa de interpretayao de textos pela suposiyao de que as configurayoes linguisticas que recebem sao coesas e coerentes.Invocam os principios da "interpretayao local" e da "analogia" como recursos que viabilizam a seleyao interpretativa que cabe ao receptor realizar, frente it imensa possibilidade de sentidos alternativos. Pelo principio da intelpreta~ao local, 0 ouvinte ou leitor agem na buca do contexto relevante para a interpi'eta~ao, com base, contudo, em expansoes suficientemente limitadas ao que e exigi do por tal interpretayao. Restringem-se, pois, aos dados contextuais que apenas sao decisivos para 0 calculo do sentido pretendido e operam dentro destes limites , sem expansoes desnecessarias. a fundamento para este principio reside, por um lado, nos dados presentes ao texto, 0 qual, por si so, ja constitui urn limite para a interpretayao do que e dito. A propria unidade semantica requerida para a caracterizayao de textos coerentes conduz 0 interpret ante it busca da interpretayao adequada dentro dos marcos desta unidade. As marcas formais da coesao fornecem indicayoes para 0 estabelecimento local do contexto de interpretayao . au seja, por elas sao dados sinais para que 0 destinatario da interayao nao construa um contexto mais ample do que e necessario ( cf p. 59).Dai que deixar de ter em conta, explicitamente, os sujeitos que atuam na atividade comunicativa e par em risco e, ate mesmo, falsear as reais condiyoes do exercicio da textualidade. a principio da interpretayao local relaciona-se com 0 outro da analogia, mencionado atras. Como pretendem Brown e Yule, a constituiyao deste contexto, apenas 0 suficientemente largo, apoia-se nas generalizayoes e anteriores tipificayoes em que os individuos organizam seu conhecimento de mundo . a carater de analogia emprestado a este principio esta subjacente it propria habilidade das pessoas para estabelecerem tipos de event os .au seja, a analogia e admissivel porque subsiste, geralmente, a expectativa de que os acontecimentos se conformam a uma certa regularidade e guardam uma presumida constancia. Estes autores destacam , ainda, que as generalizac;5escom que os individuos ordenam a realidade nao apenas lhes permitem reconhecer uma experiencia como sendo de urn determinado tipo, como tambem lhes possibilitam 0 discernimento sobre 0 conjunto de fatores realmente relevantes para urn determinado tipo de evento comunicativo. A aceitabilidade, nos moldes aqui propostos, inc1ui outros elementos para alem daqueles previstos pelo conceito hom610go da GramMica Gerativa, 0 qual, por sua vez, complementa 0 outro da "gramaticalidade" de frases "bem formadas" (cf. Chomsky, 1965). Aplicada ao dominio das realizac;5estextuais, a propriedade em questao ultrapassa os limites sintatico-semanticos da lingua "idealizada", para incorporar, como base decisiva de sua legitimidade, 0 recurso ao contexto de uso. Neste dominio, e que os interlocutores ponderam e decidem sobre a forma apropriada-e, portanto, aceitavel-de selec;aodo material lingiiistico disponivel, cabendo-lhes, inclusive, ajustar este material as condic;5es subjetivas, espacio-temporais e culturais pressupostos e presentes a atividade verbal que empreedem. Por forc;adestas condic;5es, conforme salientam Beaugrande e Dressler (1981), "a atualizac;ao lingiiistica pode neutralizar alguma regularidade da organizac;ao virtual do sistema , quando uma motivayao apropriada esta presente"( cf.p.130). Desta forma a "gramaticalidade" das " frases bem formadas " converte-se, apenas, em urn dos fatores que definem as condic;5es de aceitabilidade no plano textual. Ainda assim, entram em dimensao limitada, uma vez que a ordenac;ao das sentenc;asconstitutivas do texto pode intervir na organizac;ao interna destas mesma sentenc;as. Em sintese, no ambito do texto, os criterios da gramaticalidade tern em conta as regras sentenciais inscritas no interior do sistema, mas nao as esgota, ultrapassa-as (cf.Halllidday e Hasan 1976:28). Por esta razao e que a gramaticalidade, no julgamento das realizay5es textuais aceitaveis, deve ser considerada em conjunc;ao com outros fatores e em termos de probabilidade e predominancia, como sugerem Beaugrande e Dressler( 1981.131). Julgo, portanto, haver razao suficiente para que 0 ensino das regularidades textuais ultrapasse a dimensao puramente gramatical de seu aparato linguistico,muito mais ainda, no caso da escrita, a dimensao superficial de sua realizac;ao ortognifica . A propriedade de aceitabilidade do texto pode-se vincular, ainda, 0 conceito de signa lingDisticocomo "instruc;ao" apresentado, entre outros, por Weinrich( 1981). Esta concepc;ao insere-se na visao de uma Linguistica orientada para a ativiadade comunicativa e, obviamente, centrada no texto. Supoe que, no exercicio verbal, produtor e receptor interagem atraves da emissao e captac;ao de "instruc;oes" que devem ser dadas e seguidas no percurso da interac;ao. Tais instruc;oes funcionam como indicac;oes de diversas ordens sintaticas, semanticas, pragmaticas-que 0 produtor do texto fornece ao seu parceiro de comunicac;ao, de forma a conduzi-Io na ordenac;ao e seleyao dos dados disponiveis. 0 receptor do texto deve, portanto, ter em conta estas instruyoes, consoantes elas foram dadas, a fim de que 0 texto possa ser interpretado, 0 mais possivel, conforme foi pretendido. Tambem por este aspecto instauram-se a intersubjetividade e a mutua cooperayao implicadas na pnitica interativa (cf. Van Dijk 1984:266). Tais instruyoes servem ainda como passos indicativos que orientam e ativam, numa direc;aopretendida e adequada i situayao, a habilidade interpretativa do sujeito receptor, de maneira que, como diz 0 proprio Weinrich "0 texto mesmo inclui multiplas ajudas para sua propria decodificayao"(cf.op.cit.p.ll). Considero imensamente relevante esta perspectiva instrucional do signa linguistico tendo em conta que, por estes termos, 0 texto assoma como atuayao de sujeitos cooperativamente em parceriasujeitos que "intentam" e que "aceitam" produyoes coesas e coerentes. A esses sujeitos compete gerir a dosagem dos tipos e quantidades intrucionais, a fim de que 0 sentido do texto possa ser calculado com exito.O receptor do texto nao age, assim, sozinho na operayao deste calculo. 13 admissivel que a questao da ambigDidade das expressoes linguisticas fique atenuada no ambito destas considerayoes e seja, mais propriamente, remetida para unidade linguisticas fora dos paramteros textuais (cf.Beaugrande e Dressler, 1981:84). Tenho em conta que as unidades lingtiisticas, potencialmente, comportam diferentes significados. Num determinado texto, grayas ao conjunto de fatores "cotextuais" e "contextuais" envolvidos, tais unidades atualizam urn destes siginificados e tern, portanto, urn sentindo (cf.idem, ibidem). Ejustamente visando a identificayao do sentido que 0 produtor do texto quer privilegiar que concorrem as instruyoes de diferentes ordens. A arbitrariedade dos sistemas lingiiisticos, no sentido de sua nao prevalecente iconicidade e interpretada, tambem, como fundamento para a comprovada "versatilidade eadaptabilidade serni6ticas da lingua" (Lyons, 1980:66). Contudo, nas atuayoes sociocomunicativas cotidianas, a realidade complexa dos sistemas lingtiisticos, em condiyoes normais, nao suscita dificuldades relevantes. Como se viu, subsiste entre os parceiros da comunicayao urn empenho cooperativo pelo qual se VaGfornecendo os dados instrucionais das seleyoes a serem feitas. Se as indicayoes postas nao sac suficientes, procede-se a demanda de novas instruyoes .Os sentindos pretendidos vaGemergindo, assim, na dinfunica deste fluxo interpretativo e, conseqiientemente, as possiveis ambigtiidades vao-se resolvendo. Todavia, neste particular, parece-me utillembrar as condiyoes de vantagem que, de uma maneira geral, goza a fala em relayao it escrita. Na intera~ao face a face, 0 falante tern aces so mais imediato as reayoes doseu parceiro, e desta forma, pode orientar-se na conduyao da atividade que empreedem. A aceitayao destas condiyoes nao significa que, em algum momento, muito ideal e simplistamente, ponha de parte as condiyoes de limitayao que toda atividade comunicativa acarreta e pelas quais esta sujeita,inexoramente a incompletude, a faha de total transparencia e, portanto, it imperfeiyao. Contudo, a certeza destas contingencias nao anula 0 principio fundamental de que ate mesmo a inerente imperfeiyao da interayao lingiiistica e cooperativamente atenuada e contomada pela ayao conjunta dos interlocutores. As propriedades da intencionalidade e da aceitabilidade estao, como se pode deprender do exposto, ancoradas nas perspectivas pragmiticas e psicolingiiisticas com que se pode conceber a atuayao dos interlocutores envolvidos em urn evento comunicativo. 6. 0 ensino da composi~ao e da interpreta~ao textual deve privilegiar este aspecto global da textualidade. Aprender a escrever textos sem se ter em conta, ainda que implicitamente, as interven~5es dos sujeitos em intera~ao e desvirtuar as naturais condi~5es em que ocorre a pnitica verbal e, portanto, urn exercicio ineficaz. Certamente a escrita de texto, na escola, suscitaria mais interesse e teria mais proveito se tal atividade cuidasse em incluir urn sujeito destinador da intera~ao, intencionalmente cooperante e, por outro lado, urn sujeito destinatario, nao menos cooperante einteressado no sucesso da troca pretendida.Reda~5es escritas para "ninguem", numa mutila~ao ostensiva do outro sujeito que integra a atividade comunicativa, s6 podem resultar no desinteresse e na ineficacia de que somos testemunhas, na maioria dos casos. Como exercitar as tomadas de decisao que a produ~ao de textos requer se nao se sabe para "quem se escreve"? Como supor os conhecimentos partilhados e em fun~ao disso discernir sobre a forma adequada de providenciar as marcas coesivas do texto ? Como decidir sobre a condi~5es da coerencia se nab ha panlmetros de avalia~ao da aceitabilidade pressuposta do outro lado da linha ? A simula~ao a que a priltica escolar do ensino de textos nem sempre pode fugir poderia ser atenuada se se projetasse, para cada exercicio, urn leitor que nao 0 professor, interessado, quase sempre, na ca~a aos deslizes ortograficos ou outros semelhantes. A pessoa do emitente e, por vezes ,tambem obscurecida. Naturalmente, se se anula 0 outro com quem se estabelece a troca, se esvazia tambem a natureza interativa do exercicio verbal. Nao admira, pois, que as produ~5es que resultam dessas circunstancias pare~am tao estranhamente fragmentadas e cheias de incoerencia. Enfim, nao basta ,como simplistamente se tern feito, cuidar para que se cumpram as regras da gramatica da lingua. E evidente que sem isso nao se fazem textos. Contudo, a relevancia desta mesma gramiltica s6 aparece inteiramente afirmada quando se ultrapassa 0 escopo meramente linguistico do texto, ou melhor ainda, 0 escopo meramente superficial do texto. ADAM. Jean Michel (1990) Elements de Linguistique Textuelle . Theorie et Pratique de 1 'Analyse, Mardaga , Liege. BEAUGRANDE, Robert Alain de e DRESSLER, Wolfgang ( 1981), London. Introducion to Text Linguistics , Longman, BROW, Gillian; YULE, George ( 1983 ), Discourse Analysis, Cambridge University Press, Cambridge. CHOMSKY, Noam (1965), Aspects of the Theory of Syntax , Institute of Technology, Cambridge, Mass. COLE, Peter e MORGAN, eds (1975), Syntax and Semantics, Speech Acts, Vol. III, Academic Presse, New York. DICK, Teun Adrianus van (1981), Studies Discourse, The Hague, Mouton. in the Pragmatics of DICK, Teun Adrianus van; KINTSCH, Walter (1975), "Comment on se Rappelle et on Resume des Histoires", Langage, 40, 98-116 GRICE, H. Paul (1975), "Logic and Conversation", in COLE e MORGAN, eds. (1975) Syntax and Semantics, Speech Acts, vol. III, Academic Press, New York, 41,58. HALLIDAY, Michael A. K.; HASAN Ruqaiya (1876), Cohesion in English, Longman, London L'HETEROGENEITE DISCURSIVE DANS UN ARTICLE DE PRESSE - UNE PERSPECTIVE D'APPROCHE Dans ce travail, nous presentons une analyse de l'heterogeneite discursive dans un article publie par Ie journal franr;ais Liberation, intituleMitterrand: "ils ont raison". Liberation resume et reproduit une interview radiophonique donnee par IePresident Franr;ais, Franr;ois Mitterrand (FM, dorenavant) it la station de radio Europe 1, Ie 09 decembre 1986. 1. L'HETEROGENEITE MONTREE ET L'HETEROGENEITE CONSTITUTIVE(l) Le debut des annees quatre-vingts a vu les linguistes developper des recherches qui tiennent compte de la dimension dialogique de I'enonce, des formes d' alterite. Dans cette perspective, il ne s'agit plus d'envisager Ie texte en tant qu'objet homogene produit par un seul sujet (qui serait lui aussi homogene) mais en tant qu'objet heterogene, d'abord au niveau enonciatif, comme les manifestations d'une diversitede sources (marquees ou non) l'attestent, ensuite au niveau constitutif, en tant que produit d'un sujet lui aussi heterogene. La linguistique s'interessera particulierement it l' heterogeneite montree (Authier-Revuz, 1982) ou I'on introduit explicitement I 'autre dans Ie discours: 1. Les formes marquees de connotation autonymique OU Ie locuteur fait usage des mots tout en les montrant, categorie qui inclut toutes les formes de metadiscours ordinaire par lesque1s Ie locuteur brise la linearite du discours en specifiant et expliquant Ie statut particulier de I'element conceme (on montre un fragment comme etant de I' autre): -introduction dans Ie discours d'un mot faisant partie d'un autre code (regional, familier,technique, etc.) ou d'une autre langue; -formules d' adequation du mot it la chose et it la situation, marquant Ie doute,la reserve l'he5itation, la rectification, Ie besoin d'accord de l'autre, etc.:" en quelque sarte", "a proprement parler", "si I 'on veut" ... ; -formule indiquant lafayon dont un element doit etre interprete: "au sens x", "dans taus les sens du terme", etc,; -renvoi it un discours tenu, depuis la citation integree jusqu'a l'allusion, en passant par les formes ou un fragment est designe comme venant d' ailleurs. Les formes de discours indirect libre, de l'ironie, de ['imitation, de la reminiscense, moins explicitees au niveau de la phrase que celles qui precedent mais qui peuvent etre reperees au niveau du discours, .. 2. 3. De meme que lorsque d'autres mots sont sous et/ou dans les mots, cas d'homonymie, de paronymie, de polysemie, figures, etc. Quant it I 'heterogeneite constitutive, concept elabore it partir de la semiologie du cercle de Bakhtin et de la psychanalyse lacanienne(2), elle ne laisse pas de marques visibles: les mots d'autrui - y compris de "l'autre de nous-meme" ne peuvent pas etre apprehendes par une approche linguistique stricto sensu, Les resultats de I'appropriation par la linSlUistiquedes propositions bakhtiniennes sont incontestablement positifs: on ne peut plus ignorer la presence de l'autre dans tout discours, qu' elle soit montree formellement ou decelable dans l'interdiscours. Par cor,tre, un concept abstrait comme celui de l'Autre ne nous semble pas operatoire. En raison de la complexite de notre texte, nous avons prefere esquisser une grille d'analyse qui puisse rendre compte des deux modes de (2) Du eerele de Bakhtine, Alithier-Revuz fctient Ie dialogisme, !aeaniennc, Ie concept de 1'Autre, dll sujet divise ct, eomme tel, dans Ie discours, objet de !'ceoule psychanalilique, eellii qui mais qui se manifeste dans les al:tcs manqucs, dans les n3ves, et dans Ie diseollfs ordinaire, Dc la psyehanalyse exprimant ce clivage a clc oublic, rcfoule dans ks symptom<:s presence de l' autre dans Ie discoursdeFM, a. savoir l'heterogeneite montree et constitutive reperees aux niveaux suivants: 1. enonciatif: il s' agit du niveau d' attribution des prises de paroles, qu'elles soient marquees par des repliques successives (comme dans une piece de theatre) ou qu' e1lessoient diffuses it l'interieur meme de chaque prise de parole - par des marques explicites (le "il a dit" des discours direct et indirect, par exemple) ou ambigiies (l' appropriation du discours de 1' autre). 2. prolepsique: ce niveau concerne l'introduction du discours suppose de l' autre (e.g. "je sais ce que tu penses it ce propos, mais moi, je dis que ...") dans Ie discours propre(3). 3. des genres: il s' agit lit de genre discursif, etant entendu qu' aucun discours n' appartient a. un genre qu' on pourrait identifier itune matrice (archi-genre). Nous n'envisageons pas Ie recit uniquement comme succession d' evenements, mais aussi comme melange de discours differents. 4. topique: nous entendons par la. la (les) place(s) occupee(s) par un locuteur dans Ie deroulement du texte par rapport a. l' interlocution, c' est-a-·dire les differentes fayons de se placer par rapport au discours de I' autre (interroger, confirmer, ajouter, rectifier, expliquer, etc.) Le support de notre texte est done une interview radiophonique, c' est-a.-dire un dialogue entre FM et unjournaliste, qui n'a pas les caracteristiques d'un dialogue ordinaire dans la me sure ou les interlocuteurs savent ne pas etre les destinataires essentiels des messages echanges. Dans !'interview radiophonique, Ie dialogue a lieu entre deux poles ou roles hierarchises. II y a un questionneur et un repondeur, et Ie repondeur sait que Ie questionneur n' est qu 'un intermediaire. Le journaliste qui interroge exprime une vox populi it (3). Nous reprenons de fayon tres libre la notion reth6rique de prolepse, figure par laquelle on previent une objection en la rMutant d'avance. laquelle il faut repondre pour s'adresser, it travers lui, it une foule anonyme ou it une cible, en l'occurrence les citeyens auditeurs d'une station de radio et les lecteurs des medias qui reprendront l' emission. D'ou des positions qui tranchent avec l'apparente immobilitedes places discursives ou l'un interroge etl'autre repond, oul'unestobjetde curio site et I' autre joue Ie role de curieux. Lejeune (1980: 129) a bien decrit Ie caract ere particulier de ce type de dialogue: Chacun des interlocuteurs (de la situation d'interview) a sait que (cette situation) sera communique(e) un vaste public, qui est Ie destinataire ultime. Du coup tous les actes de parole sont 'au figure'. X n 'interroge pas pour son propre compte mais sert de mediateur la curiosile supposee du public, et c 'est comme cela que Y re90it ses questions; et quand il repond aX; il repond en meme temps au public". Par ailleurs, l'interviewe a est souvent - surement dans notre cas - quelqu'un qui a donne et donne 'de sa vie une image it laquelle l'interviewer se rHere sans cesse. Une autre raison de penser que, meme s'agissant d'un entretien entre deux interlocuteurs, la production verbale tend au texte elabore, it une coherence interne, tissee de references stables et d' autocitations qui chargent la parole de l'un et de l'autre locuteur de traits propres a l'ecrit. L'interview a ete diversement reprise par la presse ecrite. Liberation met en scene, dramatise, fond les propos rapportes dans des commentaires et des syntheses, impose a la matiere un traitement qui se rap proche davantage de la presse magazine que de la presse quotidienne traditionnelle, en interpretant l'evenement de fayon plus historique (antecedents et perspectives)que conjoncturelle. Le dialogue subit une adaptation - selon les termes de Lejeune - c' est-a-dire une transposition d'un message d'un media dans l'autre, par Ie troncage et Ie decoupage, par selection lineaire et complete: les questions du journaliste ont disparu en tant que telles. II s'agit donc d'un texte particulier et assez complexe. Comment l'approcher? Selon Franyois (1981: 275), "comprendre un text~., c 'est toujours f 'ee/airer par ce qu 'on sail de fa situation de communication, soil reconstruire cette situation de communication et son ou plutot ses codes, ses messages de reference, it partir du message lui-meme. IIfaut alors commencer par Ie replacer dans Ie double contexte de sa production et reproduction. Ce texte a pour referent principal une confrontation politique qui Ie precede de plusieurs mois. Dans les elections parlementaires de mars 1986, les socialistes n' ont plus la majorite au Parlement et les Fran~ais se trouvent en face d'une situation inedite: un President de la Republique socialiste et un Gouvemement de -droite qui se hate de faire une serie de reformes. En decembre 1986, ec1ate un conflit entre les etudiants et Ie Gouvernement, celui-ci voulant faire voter un projet de reforme de I' enseignement superieur, la "Ioi Devaquef' '(du nom du Ministre de la Recherche et de l'Enseignement Superieur), A la suite d'une serie de manifestations dans toute la France, un jeune homme, Malik Oussekine, meurt apres avoir ete frappe par la police. C' est alors que Ie gouvemement annonce Ie retraii du projet. Ce n' est que Ie lendemain que Ie President de la Republique est intervenu, dans cet entretient, sollicite et confirme plusieurs mois a l' avance. Sa non-intervention pendant les vingtsjours de confrontation entre Ie gouvemement Jacques Chirac et les etudiants ayant suscite des critiques, il a profite de cette interview pour y n~pondre. Notre texte fourmille d' allusions a des faits politiques, institutionnels et sociaux anterieurs aux evenements de reference. Pour mettre de l'ordre dans les "couches textuelles" correspondantes, nous avons d' abord cherche Ie definir. Bronckart et al.(1985) proposent de ramenener plusieurs centaines d' ouvrages it trois architypes: Ie discours en situation, Ie discours theorique et la narration partir desquels se definissent des genres intermediaires, parmi lesquels Ie discours politi que dont le but est "d 'intervenir dans un debat public sur unprobleme d 'actualite en vue de convaincre un groupe precis de personnes, d 'une certaine position politique" et qui est produit par "un acteur politi que" (Bronckart, 1985 : 102). Notre texte s' adapte en apparence a cette definition:FM est un "acteur politique", il "intervient dans un debat public" et traite d'un probleme d'actualite, il veut "convaincre un groupe precis de personnes d'une certaine position politique. Mais la "remise en scene" par Liberation en fait aussi autre chose. Pour reprendre les criteres a a proposes par Bronckart et a1., notre texte est bien un "discours en je" mais les temps verbaux posent de serieux problemes: il n'y a pas dominance d'un temps mais distribution assez equilibree de present (21occurrences) et de passe compose (22) avec une legere dominance de l'imparfait (27), et contrairement it la prediction de Bronckart, aucune occurrence de futuro Meme si Bronkart se propose d' analyser les textes en tenant compte de leur ancrage dans la situation de production, il semble sous-estimer Ie role de l'interlocuteur. En outre, tous les textes - meme ceux qui facilitent leur propre ~lassement a priori (cf Ie discours scientifique, Ie discours politique, journal de voyage) - ne sortent pas du meme moule. Cette typologie des discours ne permet pas d' aller plus loin et aurait laisse passer ce que notre texte a de specifique, it savoir I'exploitation argumentative, sur Ie mode discursif, d'enonces narratifs dans un contexte petrid' actes de parole narrativises (j 'aifait, j 'ai dit, j 'ai conseille). C'est pourquoi nous preferons etudier notre texte selon l' optique dialogique, partant plutot de F. Fran90is (1980 : 276) pour qui "la reconstitution de la nature dialogique des textes (...) semble mieux manifester leurfonctionnement qu 'une analyse structurale interne ou qu 'une analyse 'en exteriorite' a partir (...) du moment, du milieu et des sources". N ous decrirons les discours en presence et leur intrication (niveau de I' enonciation), les themes et les micro-genres (niveau de I'enonce), les places des interlocuteurs (niveau topique). On peut isoler dans notre texte trois sources enonciatives: Ie discours dujournaliste de Liberation, celui de J-P. Elkabbach et celui de F. Mitterrand. Le discours du journaliste de Liberation est nettement separe des deux autres dans sa fonction de presentation (qui, quai, quand, OU, comment et pourquoi §§ 1 et2). Mais il est difficilede I'isoler dans la mesure ou il s'agit, d'erribIee, d'un discours hybride: Fran90is Mitterrand a approuve hier Ie retrait du projet Devaquet "un acte de sagesse" - et la decision de marquer une ''pause'' dans les reformes de societe engagees depuis Ie 16 mars. Apres la "rude experience" qu' a ete Ie conflit entre Ie gouvemement et les etudiants, Ie chef de l'Etat, interroge en direct depuis I'Elysee par Jean-Pierre Elkabbach sur Europe 1, a rendu hommage it "Ia sagesse profonde" des etudiants qui defendaient sans violence "une cause juste". Des Ie premier paragraphe, Ie passage d'une source it l'autre est marque typographiquement (it la fois entre guill~mets et en italiques). Neanmoins, Ie joumaliste s'approprie les mots du president de la Republique de sorte qu' on ne peut pas tracer une frontiere definitive entre les deux. Sont rapportes des actes de parole, ce qui implique une interpretation. Imprimer "un acte de sages.se", ''pause'', "rude experience", "sage sse profonde" et "une cause juste" implique que ces expressions ont ete prononcees par Ie chef d'Etat, alors que "rude experience" ne se retrouve pas dans la suite de l'article, ce qui empeche de savoir avec certitude si FM a prononce ces mots et, s'il l'a fait, s'il a voulu exprimer une appreciation personnelle ou n' a fait qu' exprimer les sentiments des parties concemees par Ie conflit, auquel cas Ie discours meme de FM est composite et procede partiellement par citations: - rendre hommage est une reprise d'acte de parole, c'est une interpretation dujoumaliste; - fa sagesse profonde est une reprise formelle des mots d' autrui; - defendaient sans violence 'une cause juste' est une condensation: il y a it la fois reprise (une cause juste, § 15) et paraphrase (defendaient pour se battaient, § 15, sans violence pour it n 'y apas eu de violence desjeunes § 14). Lejoumaliste deLiberation intervient d'autre part en supprimant les questions et en operant des coupures, selon les procedes normalement utilises par la presse ecrite, comme dans Ie § 3: A la question de savoir s'il y aurait un avant et un apres-decembre 86 FM a repondu: "ll y a un avant Ie 16 mars et un apres Ie 16 mars. Le probh~mequi est pose est d'abord celuide la majorite parlementaire, elue par notre peuple, par Ie suffrage universel qui a elu un president de la Republique en ma personne sur des options differentes." Ii faut remarquer Ie melange des discours des deux journalistes (de Liberation et d'Europe 1); ils ne semblent plus former qu'une seule personne; les coupures effectuees (it la fin du § 7 et dans les §§ 9, 11, 12, 15,16,19) font partie du discours dujournaliste deliberation. Par son travail de manipulation il construit ses propos. Les §§ 5 et 6 sont ambigus itcause de cette interference permanente: Ii s' agit en principe du discours de FM et non de celui du journaliste mais raison est rnis entre guillemets, par un glissement remarquable du discours au metadiscours - il s'agit des propos de l'interviewe traverses par ceux dujoumaliste, qui accentue Iemot. Ces guillemets valent comme sic (c'est FM qui l'a dit) et ensuite comme un soulignerhent (un hommage itJacques Chirac) ce que confirme la fayon dont Ie § 6 est construit: Cet "acte de sagesse" doit "etre suivi d'un comportement conforme a cette attitude". "Mieux vaut apaiser les passions, afin de faciliter Ie retour a la cohesion nationale, que j'appelais de tous mes voeux." Nous avons iciune construction hybride, c'est-it-dire une reconstruction faite par Iejournaliste des propos tenus itl'interieur du discours de FM, procede courant dans la presse ou, I'exces de partialite etant apriori condamne, lesjournalistes restituent la parole d' autrui en la designant mais apres se I' etre appropriee. C'est ce qui se passe a partir du § 7, quand tous les propos sont censes appartenir itFM et sont presentes de la meme fayon: guillemets ouvrants, discours tenu, guillemets fermants. Le discours de I-P. E1kabbach n'est rapporte que dans Ie § 3 et en discours indirect. Mais on peut "entendre sa voix" tout au long de l'article dans les propos de FM qui sont des reponses itses questions. Ii s'agit de reperer les marques qui, dans Ie discours de l'interviewe, indiquent qu'il est organiquementlie a celuide 1'intelViewer,en reprenant l'idee de Ducrot (1980: 45) qu'il y a des morphemes polyphoniques (a ce que dit X, if pal-ait que, puisque, Ie conditionnel, les enonces negatifs, les presuppositions, etc.); qu' on peut isoler Ie locuteur (auteur des paroles) et les enonciateurs (agents des actes illocutoires) et l'allocutaire (auditeurimmediat) des destinataires (les patients des actes de parole). Notre texte amalgame Ie discours du journaliste d'Europe 1 a celui de FM au sein d'unjeu de questions-reponses. Dans Ie § 3 deja cite, FM reprend la question en la reformulant par une pre-reponse qui fait la transition entre l'intention de J.-P. Elkabbach et sa contre-proposition. La construction des §§ 8, 9 et 10, avec d'autres procedes -litote, question rhetorique, repetition, gradation - ainsi que les arguments utilises (des rappels de faits) indiquent I' orientation des questions posees, it savoir une "accusation" it FM de non-intervention aupres du gouvernement pendant Ie conflit. On peut suivre les questions de J.-P. E1kabbach it travers d'autres marques linguistiques. Dans les §§ 12 et 13, FM evoque ses sentiments envers les etudiants. Le choix du verbe savoir ("ils savaient pouvoir compter sur la comprehension du president de la Republique ...", § 13) Iui permet de presenter son opinion comme "objectivement vraie" (Kerbrat-Orecchioni, 1980: 113) et irrefutable dans la mesure ou elle est donnee sous la forme du presuppose. Or, selon Ducrot, un presuppose evoque deux enonciateurs, Ie premier prenant la responsabilite du presuppose et Ie deuxieme celle du pose. Cette formulation laisse entendre la voix qui l' interroge. Le § 14 commence par un enonce negatif ("il n y a pas eu de violence des jeunes") qui dessine une question du type: "les jeunes n' ont-ils pas fait preuve de violences condamnables?" De meme que la presupposition, la negation est une marque de polyphonie. Deux enonciateurs s' affrontent, I' enonce est ala fois assertion et rejet de l'assertion. Deux marques linguistiques dans 1es §§ 15 et 16 signalent que la source du paralleIe entre 1a visite de FM it la famille Oussekine et celle de C. Pasqua, ministre de l'!nterieur, aux policiers blesses doit etre attribuee aJ.-P. Elkabach: Ie demonstratif, reprise anaphorique d'une mention faite (,Tai ete Ie seul representant des pouvoirs publics it faire cette visite"). L'emploi du present et du participe present (M. Pasqua remplit son role en all ant visiter Ie personnel blesse atteint. ..") indiquent que FM ne fait pas Ie recit de ces vi sites mais commente les propos d'une question. Dire que Ie discours de FM est polyphonique parce qu'il integre celui de J.-P. Elkabbach serait reduire l'heterogeneite au niveau prolepsique. D' autres niveaux apparaissent notamment dans Iediscours rapporte. Un seul cas de discours rapporte explicitement marque correspond a une reprise de parole en discours indirect dont on peut cependant remarquer que FM n'en indique pas la source, se contentant d'affirmer "it m' a ete indique ..." ( § 7). L'absence de complement d'agent marque certainement 1'importance du dialogisme entre FM et Jacques Chirac. Les reprises des discours anterieurs (dans les §§ 7, 8 et 9) ne sont pas tant reperables par les structures syntaxiques que par les verbes et expressions qui les introduisent: "j 'ai demande des explications", ces explications tendaient ( ...) a savoir ce qu 'if en etait de ...", "comment 11 'aurais-je pas rappele que", "comment n 'aurais-je passuggere (...) recommande, conseille ( ..) demande". Ces trois paragraphes reprennent des discours premiers sous forme d'actes de parole. D'autres - fragments des §§ 6, 7, 11, 12 et 13 montrent des discours rapportes exprimant pensees et sentiments, a l'imparfait, a l'epoque critique du conflit. Ces sentiments et pensees ne sont pas toujours donnes comme tels, mais diffus. Nous avons emprunte ala theorie bakhtinienne de l'enonce l'idee d'une relation entre les themes evoques dans notre article et ce que nous avons appele Ies micro-genres. Bakhtine (1979 :263-308) decrit cinq particularites de I'enonce: il est deIimite, acheve, marque par I'expression du Iocuteur, est en rapport avec ceux qui Ie precedent et ceux de l' avenir sur Ie memeobjet et a un destinataire, est tourne vers l' allocutaire. Ses reflexions n' ont pas pour but de faire une typologie des discours mais une theorie de l' enonce - I'unite de l' echange verbal. Elles montrent d'ailleurs qu'il n'est pas possible de definir un genre a priori: "ce choix (d 'un genre) se determine en lone/ion de la specificite d'une sphere donnee de l'echange verbal, des besoins d 'une thematique (de I 'objet du sens), de I 'ensemble conslitue des partenaires, etc." (Bakhtine 1979:284). Cette theorie permet de comprendre l'heterogeneite de notre texte et fournit des elements pour approcher Ie probleme des genres mais ne resout pas tout. 11y a d'autres difficultes: par exemple, des glissements successifs d'un genre it I' autre. On passe insensiblement de I' explication aujugement, dujugement it lajustification, etc. par des glissements dont les frontieres sont souvent floues, ce qui fait que les genres sont rarement purs(4). 11existe des orientations - ce que nous appellerons micro-genres, "differentes modali tes de la relation du discours a ce dont if parle" (Franyois, 1981 : 259). Les §§ 1 et 2, on l'a vu, forment l'introduction. Le § 3 fait transition entre Ie discours du journaliste de Liberation et celui de FM, par Ie biais d'une question rapportee de J. P. Elkabbach et de sa reponse. Quant au discours de FM, il fonctionne grosso modo sur trois modes: -Ie mode du commentaire; -Ie mode du recit; -Ie mode de l'appreciation. Naus appelons commentaire les passages du texte qui s'opposent au recit. 11s'agit d' enonces it base de present de verite generale, avec effacement du sujet enonciateur, presentatifs, passifs it la 3eme personne sans complement d'agent, indetermination, nominalisation des proces en position de sujet. Sont concernes les §§ 3, 4, 18 et 19, ou FM evite Ie conflit pour n'evoquer que Ie choix fait par les eIecteurs d'une majorite parlementaire et d'un president de bords opposes ou pour rappeler son attachement aux valeurs de la Republique. Les §§ 7 it 11 forment un recit des interventions successives de FM aupres du gouvernement pour se renseigner sur Ie projet de loi et demander son retrait. Notons l'alternance des "recits d'actes" (j'ai demande; Ie texte nous a ete remis; il m'a ete indique; j'ai demande; j'ai suggere, recommande, conseiIle; j'ai observe) et "recits des circonstances" (ce qui'i! en etait, c'etait, la loi (...) que I'on reformait, la concertation continuait,je n'avais pas de raison, etc): "Pour ce projet de loi, j'ai demande des explications au mois de juilIet, au moment OU Ie texte nous a ete remis." "Ces explications (4)"Tout texte (tant oral qu'ecrit) comporte, bien entendu, une grande quantite d'6!ements heterogenes, nature!s, primaires, etranges au signe et qui echappent au domaine des sciences humaines (a l'analyse linguistique, philologique ou autre) et (...). Des textes purs, il n'y en a pas et il ne saurait y en avoir." (Bakhtine, 1979 : 313) tendaient tout simplementa savoir ce qu' il en etait de ce qu' on appelie la selection, les diplomes nationaux, des droits d'inscription, de l'organisation de 1'universite. C'etait d'autant plus legitime dansmon esprit, que j' etais en somme Ie co-auteur, comme president de la Republique de la loiprecedente, celieprecisementque l' on reformait. 11m'a ete indique que la concertation continuait sur ce sujet et je n'avais pas de raison d'intervenir avant que Ie debat soit clos." "Comment, au cours de nos multiples rencontres de cette semaine, de mercredi matin avant Ie Conseil des ministres, au sommet europeen de Londres, et samedi soir, pendant Ie rendez-vous que j'ai demande au Premier ministre, comment n'aurais-je rappele que dans une situation de ce type - encore qu 'il n'y ait eu, en 1984, ni morts, ni blesses, ni provocations, ni casseurs - j' avais juge de retirer un projet qui rencontrait une vaste opposition?" "Comment n' aurais-je pas suggere (...) recommande, conseille, et finalement - peu importe Ie verbe - demande que, puisque Ie gouvernement dans Ie courant de la semaine avait deja retire l' essentiel des revendications, a partir du moment ou la loi tombait en morceaux, pourquoi en garder une, celle de I'organisation des universites?" "Comment imaginer que j' aurais pu etre Ie seul Fran~ais a ne pas souhaiter, et dans mon cas demander, Ie retrait du projet?" "Si vous aviez eu l'impression que je pouvais etre mele aux manifestants, vous vous seriez trompes. (...) J' ai pendanttous ces j ours observe avec une grande patience, pour saisir Ie moment, dans l'interet du pays, OU il me faudrait dire ce qu'il convenait de faire pour tirer Ie pays de l' omiere ou il se trouvait." Les descriptions de Labov (1978) et Adam (1984) s'appliquent a ce recit ou l' on observe la permanence de l' acteur Ge, en l' occurrence FM), des balises temporelles (au mois de juillet, cette semaine, mercredi matin, samedi soir), des successions d'evenements ("j'ai demande des explications", "il m'a ete indique que la concertation continuait", "comment n'aurais-je rappele que dans une situation de ce type (...) j'avais juge de retirer un projet qui rencontrait une vaste opposition?" L' appreciation est difficile a isoler dans la mesure ou il n'y a pas de discours neutre. Beacco et Darot (1984), etudiant une serie d' articles de pre sse, definissent I'appreciation comme "unjugement personnel relatif un 'objet' qui s 'effectue par indexation de celui-ci par rapport un systeme de valeurs eehelonnees. " Distinguant un discours appreciatif, nous ne pretendons pas rendre plus "objectifs" les recits et les cornmentaires, mais nous ne pouvons pas ne pas nornmer "discours appreciatifs" les passages dans lesquels FM s' exprime sur les parties prenantes du conflit, par des jugements de valeur. Ce micro-genre se distingue par I'emploi des marques suivantes: a a 1. Termes axiologiques: - "avoir raison" qui exprime Iejugement de FM surla decision du gouvernement de faire une pause dans les reformes; il designe ensuite cette pause comme un "acte de sagesse" ( §§ 5 et 6); - "etonnante maturite" et "sagesse profonde" decrivent Ie comportement des etudiants pendant les manifestations ( §§ 14 et 15); - "noble fami lie", juge celle de M. Oussekine ( § 16). 2. Verbes d'opinionet de sentiments: - on rei eve savoir et sentir dans les § 12 et 13 ou FM exprime ses sentiments envers les etudiants. 3. Modalisations: - "e 'est bien clair", ''je dirais meme que", "i! peut y avoir des aetes", ''je erois que I 'on doit distinguer", toutes dans Ie § 14, dont Ie theme (la violence des jeunes) est dans la logique des paragraphes precedents ou FM manifeste des sentiments positifs envers les etudiants. Pour F. Flahault (1978), il y a un systeme de places it l'interieur duquel tout locuteur produit sa parole, systeme constitue de quatre elements: - l'inconscient (Ie sujet parlant a ete marque d'une empreinte inalterable par ces rapports de place); - la formation sociale it laquelle il appartient; - la situation discursive presente; - la circulation d'insignes dans Ie tissu discursif Nous retiendrons de cette grille ce qui concerne l'impact de la place attribuable a chaque interlocuteur sur son discours observable dans les enchainements qui indiquent la place du locuteur par rapport a l' autre mais aussi dans la relation entre genres et contenus. Fran90is (1982: 38) distingue la notion de place de celle de role: "Parler de place signifie (...) autre chose qu 'un role social assigne: if s 'agit du fait que dans I 'echange les sujets sont it la fois sujets generiques qui cherchent it avoir raison et sujets qui parlent d'un point de vue particulier". En effet, les positions des interlocuteurs ne sont pas predeterminees, elles se construisent au fil de l' entretien. Meme dans les situations ou les positions sont institutionnellement determinees, les interlocuteurs peuvent echanger leurs places. Par exemple, lorsque l' interviewe se met a interroger l' interviewer. L'interview de presse est une situation ou les positions sont plutot stables, mais notre texte ne comporte pas les questions posees par Ie journaliste, ce qui ne permet pas d' observer les enchainements questions-reponse ou les places se manifestent Ieplus nettement (dans les rectifications, les deplacements thematiques, les ruptures, etc). Mais ces places sont partiellement revelees par les micro-genres. C'est ainsi que les enonces qui fonctionnent sur Ie mode du commentaire apparaissent surtout quand FM refuse d'entrer dans Ie debat ou Ie journaliste tente de l'entrainer. Dans Ie § 3, par exemple, il repond it une question particuliere par un enonce general: A la question de savoir s'il y aurait un avant et un apres-decembre 86 FM a repondu: "II y a un avant Ie 16 mars et un apres Ie 16 mars. Le probleme qui est pose est d'abord celui de la majorite parlementaire, elue par notre peuple, par Ie suffrage universel qui a elu un president de la Republique en ma personne sur des options differentes." IIy a aussi changement de place quand FM passe a I 'appreciation. Par exemple les §§ 5 et 6: Le gouvernement a eu "raison" de pratiquer une pause dans son action. Cet "acte de sagesse" doh "etre suivi d'un comportement conforme a cette attitude". "Mieux vaut apaiser les passions, afin de faciliter Ie retour it la cohesion nationale, que j' appe1ais de tous mes voeux." Un autre changement de place peut etre releve avec Ie recit qui va du § 7 au § 11 ou FM s' oppose nettement aux propos de son interlocuteur: la sa place se confond avec son role institutionnel, il peut se pennettre de conseiller, demander, recommander, suggerer, etc., mais non de dire de faire (ce qui reieve de l' autorite du Premier Ministre). L'analyse de ces niveaux d'heterogeneite montre Ie caractere foncierement dialogique de tout discours et l'impossibilite d'ignorer I'interaction des discours tout comme les glissements d'un niveau it l'autre d'enonciation. Les fonnes d'heterogeneite montree renvoient, comme Ie propose Authier-Revuz, it "une forme de 11I?gociation (...) du sujet parlant avec l 'heterogeneite constitutive". FM evite tant qu'il peut de porter des jugements directs sur ses adversaires mais cette posture discursive ne I'empeche pas de critiquer indirectement Ie gouvernement. Ainsi, I'eloge du comportement des etudiants pendant les evenements de rue signifie une con damnation du gouvernement en ce qui concerne sa capacite it gerer Ie conflit. En faisant allusion aux propos des autres - il ne designe pas par leur nom les personnes avec lesquelles il dit avoir discute - il dessine en creux un certain nombre de "textes", les discours premiers (chronologiquement) constitutifs du discours actuel. (§ 1) Franyois Mitterrand a approuve hier Ie retrait du projet Devaquet - "un acte de sagesse" - et Ia decision de marquer une "pause" dans les reformes de societe engagees depuis Ie 16 mars. (§2) Apres la "rude experience" qu'a ete Ie conflit entre Ie gouvernement et Ies etudiants, Ie chef de I'Etat, interroge en direct depuis I'Elysee par Jean-Pierre Elkabbach sur Europe 1, a rendu hommage a "Ia sagesse profonde" des etudiants qui defendaient sans violence "une cause juste". (§3) Ala question de savoir s'il y aurait un avant et un apres-decembre 86 FM a repondu: "II y a un avant Ie 16 mars et un apres Ie 16 mars. Le probleme qui est pose est d'abord celui de Ia majorite parlementaire, elue par notre peuple, par Ie suffrage universe! qui a elu un president de la Republique en ma personne sur des options differentes." (§4) "Le probleme est pose, au-dela du mois de decembre 1986. L'evolution a terme de Ia situation due aux evenements qui se sont deroules, notamment les evenements de ces derniers jours, conduit naturellement a penser que la fayon d'aborder les problemes peut changer, j'ai presque envie de Ie dire, doit changer." (§5)"Le gouvernement a eu "raison" de pratiquer une pause dans son action". (§6) Cet "acte de sagesse" doit "etre suivi d'un comportement conforme a cette attitude". "Mieux vaut apaiser Ies passions, afin de faciliter Ie retour a la cohesion nationale, que j' appelais de tous mes voeux." (§7)"Pour ce projet de loi, j'ai demande des explications au mois de juillet, au moment ou Ie texte nous a ete remis." "Ces explications tendaient tout simplement it savoir ce qu'il en etait de ce qu' on appelle la selection, les dipl6mes nationaux, des droits d'inscription, de I'organisation de l'universite. C' etait d' autant plus legitime dans mon esprit, que j' etais en somme Ie co-auteur, comme president de la Republique de la loi precedente, celle precisement que l' on reformait. II m' a ete indique que la concertation continuait sur ce sujet et je n' avais pas de raison d'intervenir avant que Ie debat soit dos." (§ 8)"Comment, au caurs de nos multiplesrencontres de cetie semaine, de mercredi matin avant Ie Conseil des ministres, au sommet europeen de Londres, et samedi soir, pendant Ie rendezvous que j'ai demande au Premierministre, comment n'auraisje rappele que dans une situation de ce type - encore qu'il n'y ait eu, en 1984, ni morts, ni blesses, ni provocations, ni casseurs - j'avais jug de retirer un projet qui rencontrait une vaste opposition?" (§ 9)"Comment n'aurais-je pas suggere (Oo.) recommande, conseille, et finalement - peu importe Ie verbe - demande que, puisque Ie gouvernement dans Ie courant de la semaine avait deja retire l' essentiel des revendications, a partir du moment ou la loi tombait en morceaux, pourquoi en garder une, celle de I'organisation des universites?" (§ lO)"Comment imaginer que j' aurais pu etre Ie seul Fran<;ais a ne pas souhaiter, et dans mon cas demander, Ieretrait du projet?" (§ ll)"Si vous aviez eu l'impression que je pouvais etre mele aux manifestants, vous vous seriez trompes. (Oo.) J' ai pendant tous ces jours observe avec une grande patience, pour saisir Ie moment, dans I'interet du pays, ou il me faudrait dire ce qu'il convenait de faire pour tirer Ie pays de I'orniere ou il se trouvait." (§ 12)"Les etudiants et les lyceens savaient que j' etais sur la meme longueur d'onde (...)je me sentais bien en phase avec eux, mais je ne pouvais et je ne voulais pas aller au-dela (...)" (§ 13)"lIs ne defilaient pas pour moi mais pour la cause pour laquelle ils etaient rassembles. Si, bien entendu, ils savaient pouvoir compter sur la comprehension du president de la Republique, pourquoi les aurais-je prive de ce qui n' etait pas un renfort, mais I'affirmation d'une presence?" (§ 14)"Il n'y a pas eu de violence des jeunes. C'est bien clair. Je dirais meme que les jeunes ont fait preuve d 'une etonnante maturite. Il peut y avoir des actes individuels tout a fait reprehensibles, mais je crois que l' on doit distinguer les jeunes etudiants et les lyceens d'un cote, et les casseurs de I'autre, c' est-a-dire les eternels agents de trouble et de la violence." (§ 15)"Moi, de l'endroit ou j'etais, j'ai constate pour les en remercier, la sagesse profonde des etudiants, des Iyceens qui se battaient pour une cause qui leur paraissait juste et qui est .Juste. "()... (§ 16)"La famille de Malik Oussekine est une noble famille impregnee du respect du pays dans lequel elle se trouve, ne voulant rien ajouter au trouble des esprits. Je ne sais pour quelle raison j' ai ete Ie seul representant des pouvoirs publics a faire cette visite que tout imposait." (...) (§ 17)"M. Pasqua remplit son role en allant visiter Ie personnel atteint dans l' execution de ses ordres." (§ 18)"Tout enfant de France doit pouvoir disposer des moyens d'etre premiera. Polytechnique, s'il en a lui-meme par son caractere et son intelligence. Tout enfant doit avoir une situation par Ie savoir". . (§19)"Il Y a derriere ceia des valeurs simples (...) Pour moi les valeurs nobles, ya s'appelle Ia Iiberte, l' egalite, Ia fraternite, Ia solidarite, Ie respect de I'environnement humain et naturel, Ie gout de l' effort, Ie gout de I' ouvrage bien fait, Ie sens des responsabilites." ADAM l-M. (1984) Le n~cit. Que sais-je? Paris, PUF. AUTHIER - REVUZ, J. (1982) "Heterogeneite montree et heterogeneite constitutive:elementspour une approche de l' autre dans Ie discours", in DRLAV 26, pp. 91-151. BEACCO, l-C., DAROT, M. (1984) Analyses de discours. Lecture et expression. Paris, Hachette-Larousse. BAKHTIN, M. (1989) "Les genres du discours", inEsthetique de lacreation verbale. Paris, Gallimard, 1979. BRONCKART, l - P. et al. (1985) Le fonctionnement des discours. Un modele psychologique' et une methode d 'analyse. Neufchatel-Paris, Delachaux Niestle. DUCROT, O. 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POl'ocorrer numa situayao social, 0 discurso narrativo possibilita ( e ate exige) urn certo grau de envolvimento entre os interlocutores, na medida ern que a audiencia se manifesta atraves de estrategias variadas de apoio ao narrador. Considera-se que a audiencia pode assumir dois papeis no processo de construyao de uma narrativa conversacional: 0 de falante secundario, realizando pequenas contribuiyoes para 0 desenrolar do episodio narrado e 0 de ouvinte, manifestando interesse pelo desenvolvimento da estoria, estimulando 0 narrador a prosseguir e monitorando 0 seu discurso. Este trabalho visa a investigar algumas estrategias de apoio ao narrador utilizadas pelo falante secundario. Serao analisadas 14 narrativas produzidas pOl'falantes analfabetos, cuja faixa etaria varia entre 35 e 76 anos, moradores da comunidade semi-isolada de Pedra D'agua (PB).(J) A denominayao narrativa conversacional, na literatura especializada,corresponde aos termos reprodU9lio (Gulich e Quasthoff,1986), narrativas ou est6rias (Labov,1972; Jefferson, 1978 e Polanyi, 1985). A narrativa conversacional consiste numa modalidade discursiva que retoma experiencias vivenciadas no passado pelo narrador ou pOl' ele conhecidas, as quais passam a ser revividas durante uma conversayao espontanea. 0 surgimento dessas narrativas e esponHlneo, mas decorrente de algum estimulo oriundo do contexto discursivo ou do situacional (Gulich e Quasthoff, 1986; Jefferson, 1978 e Labov, 1972). 0 episodio e recriado pelo narrador que passa a representa10, recriando os diaIogos entre os personagens, possivelmente ocorridos (l) Este artigo retoma com algumas modificayoes um dos capitulos da dissertayao A Interayoes em Narrativas Orais, defendida em 1992, na UFPE, sob orientayiio da Prain. Dr" Judith C. HoffiJagel. quando da realiza<yaodo epis6dio (Tannen, 1989). 0 narrador, alem de autor, assume a fun<yaode ator, ao se auto-representar e ao representar os demais personagens da est6ria, atraves das falas de tais personagens. OS INTERLOCUTORES NA CONSTRU<;AO TIVA CONVERSACIONAL DA NARRA- A constru<yaoda est6ria, definidacomo urn processo interacional, e uma tarefa complexa, pois todos os participantes sac responsaveis pela montagem do texto e nao apenas 0 narrador. A fala do narrador se altera com a audiencia, it medida que encoraja 0 narrador atraves do seu comportamento, ou seja, dos atos de fala proferidos ou dos sinais de ouvintes realizados durante a intera<yao. Bublitz (1988) c1assificaos participantes deuma intera<yaoface a face de acordo com as a<yoescomunicativas e t6picas desempenhadas por eles na forma<yaoe expansao do t6pico discursivo. Sao tres os papeis: (a) 0 de falante primario (FP), aquele que domina e controla a progressao da conversa; (b) 0 de falante secundario (FS), aquele que faz contribui<yoesatraves de solicita<yoesde informa<yao,pequenos comentarios e outros atos de fala; e (c) 0 de ouvinte (0), aquele que faz contribui<yoes,demonstrando que esta acompanhando 0 que esta sendo dito e incentivando 0 FP a prosseguir. o PAPEL DO FALANTE SECUNDARIO NO PROCESSO DE CONSTRU<;AO DA NARRATIVA Segundo Bublitz (1988), 0 FS e aquele que realiza contribui<yoes menores do que 0 FP para 0 desenvolvimento do t6pico discursivo corrente na conversa, atraves de atos de fala como concordancia, questionamento, bem como atraves de manifesta<yoesde atitudes ou enuncia<yaode posi<yoes. As contribui<yoes do FS podem apoiar ou nao a fala de FP. Quando hit divergencia, esta se manifesta atraves de contradi~ao, obje~ao , duvida e outras formas que revel am oposi<yaoao FP. No caso das narrativas, 0 narrador podeni ter vetada a sua liberdade de contar a est6ria se a audiencia manifestar-se contra. Por outro lado, quando hit convergencia entre os falantes, 0 FS recorre a padroes de atos de fala que demonstram apoio como: (a) apoio pelo endosso e pela repeti~ao; (b) apoio pela avalia~ao e (c) apoio pela complementa~ao, pela suplementa~ao e pela parafrase. o padrao endosso se caracteriza pelas contribuic;oes que revelam concordancia com a fala do FP, manifestadas por meio de expressoes afirmativas, tais como: sim, eu concordo, esta certo, etc. Ja 0 padrao repeti~ao compreende nao apenas a reproduc;ao do conteudo semantico do enunciado repetido mas tambem a forma gramatical que 0 expressa. Bublitz (1988:232) defende dois tipos de avalia~ao. 0 primeiro diz respeito aos julgamentos positivos (weighing up) numa escala de avaliac;ao. "Esses julgamentos de estados, ac;oes,eventos, atitudes e formas de comportamento que formam 0 objeto da contribuic;ao precedente sac semelhantes aquelas que sac ditas, expressas ou meramente subentendidas pelo falante primario". No segundo tipo, 0 FS expressa valores emocionais nos atos de fala por ele proferidos, atraves de exc1amac;oes ou expressoes lingilisticas que revelam admirac;ao, espanto. E 6bvio que ao fazer uso desses recursos avaliativos, 0 FS esta anunciando suas atitudes em relac;ao ao desempenho do FP. A complementa~ao se define como a contribuic;ao que 0 FS faz para completar 0 enunciado incompleto, realizado anteriormente pelo FP. A ac;ao do FS, na realidade, nao s6 completa 0 conteudo como tambem 0 padrao de ac;ao comunicativa introduzida pelo FP. As vezes, 0 FS antecipa informac;oesque se encaixam apropriadamente ao enunciado antecedente realizado por FP, as quais sac do interesse deste, atraves de mecanismos de coordenac;ao vocabular e oracional, ou ainda orac;oes subordinadas. Da-se entao 0 apoio por suplementa~ao. A terceira forma - a parafrase - apresenta uma especie de resumo da contribuic;ao (ou contribuic;oes) precedentes ao FP pelo FS. A panifrase serve para refletir, de maneira generalizada, o ponto de vista do FP, atraves de proverbios, aforismos e frases vazias, visando a condensar 0 que deduz ser as pressuposic;oes e atitudes de seu interlocutor. Bublitz (1988:247/250) salient a que todos estes padroes de apoio servem como guias para os participantes de uma conversa em que as ac;oes de FS apoiam as ac;oes do FP. Estes principios sac basicamente a reproduc;ao e a antecipac;ao. Estas contribuic;oes "tem consequencias tanto ao nivel do conteudo como nas relayoes sociais (...). Por urn lado, as contribuiyoes do Falante Secundario nao contem nenhuma informayao que seja nova, inesperada ou surpreendente para o Falante Primario. (. ..) Pode-se dizer que a liberdade para 0 Falante Secundario escolher e muito restrita; nem muitas opyoes the sac propostas como escolher 0 t6pico, a mensagem e 0 padrao de ate de fala". 0 autor acrescenta ainda que 0 "empenho dos participantes em todos os padroes de apoio quando e1es adotam 0 papel de Falante Secundario contribui decisivamente para 0 estabelecimento e a manutenyao satisfat6ria das relayoes sociais". Os turnos de fala produzidos pelo FS sac os identificados como turn os inseridos, cuja classificayao depend era da funyao dos atos de fala que eles realizam. Houtkoop e Mazeland (1985: 599), observando as reayoes dos receptores - FS e 0 - dizem que "0 lugar das reayoes dos receptores e 0 mesmo de uma tomada de turno normal, isto e, elas sac posicionadas ao redor dos finais das unidades construcionais de turno. Embora os limites dessas unidades sejam marcados como pontos de incompletude de turno, e entao urn lugar para a transiyao de turno, mas como sentido restrito". Porem e necessario salientar que nem sempre a conclusao de Unidade Discursiva Fechada, ou de urn turno narrativo na denominayao de Preti (1991), e reconhecida pelos receptores, dai ser preciso haver uma negociayao entre os interlocutores, a fim de propiciar-se a complementayao da mesma. Polanyi (1985 :200) nao estabelece uma distinyao entre os tipos de receptores, no entanto as tarefas que ela aponta para a audiencia de uma narrativa conversacional abrangem tanto as desempenhadas pelo FS como pelo O. De formageral, elas se resumem em tres tipos: a. concordar em ouvir a est6ria ou apresentar uma razao pela qual ela nao pode ser contada; b. abster-se de tomar 0 turno, exceto para fazer apartes, demonstrando que a est6ria esta sendo seguida e entendida ou para levantar questOes relacionadas diretamente com 0 que esta sendo dito sobre 0 mundo da est6ria; c. demonstrar, no final da est6ria, entendimento, fazendo comentarios que indiquem a apreensao do objetivo da narrayao. Assim, 0 sucesso da narrativa conversacional depende das estrategias do FP bem como das participal;oes da audiencia. Juntos, desempenham seus papeis, buscando urn maior envolvimento, a fim de estruturarem a narrativa e assegurarem a narrativa. A PARTICIPACAO DO FALANTE SECUNDARIO NA CONSTRUCAO DA NARRATIVA ORAL NA COMUNIDADE DE PEDRA D' AGUA Ao contar uma est6ria, 0 tumo de urn falante apresenta sempre uma extensao maior do que normalmente acontece numa conversa. Nos dados em analise, a troca de falantes, a exemplo do que acontece na conversal;ao, deram-se, em maior fraquencia, em lugares relevantes para a transil;ao (LRT). Cerca de 78% das contribuil;oes dos FSs foram registradas mediante a presenl;a de LRT e 22% na ausencia destas pistas. No primeiro caso, encontram-se as passagens de tumo consentidas (84%) e as requeridas (16%) pe10narrador. As primeiras consistem em entregas implicitas do turno e se realizam na presenl;a de tres tipos de pistas de LRT: (a) finalde unidades sintatico-semanticopragmaticas, (b) pausas e (c) risos. Ja as passagens requeridas revelam uma entrega explicitado tumo pelo narrador, pois este(a) faz indagavoes ao(s) interlocutor( es) e (b) usa marcadores cbnversacionais p6sposicionados. Destas duas formas de transil;ao de turno, 0 numero maior de participal;oes do FS foi registrado ap6s 0 final de unidades sintatico-semantico- pragmatic as. Estas intervenl;oes sac decorrentes de urn dos principios basicos da conversal;ao que e alternancia de falantes. Nos casos das narrativas orais, este direito de tomar a palavra esta associado ao dever de fazer contribuil;oes relacionadas ao desenrolar do epis6dio narrado. Estes sac os turnos inseridos com fins interacionais, que podem ser intervenl;ao de falante unico (exemplo 01, L: 04)(2) ou num trecho onde F Ss entram em interal;aO entre si, evocando urn aspecto da narrativa, como se observa no exemplo (02), das linhas 04 a 08. Neste trecho, os FSs e 0 narrador discutem sobre o tempo transcorrido entre a ocorrencia do episodio e a narra9ao do (2) As normas de transcriyao usadas foram as propostas pelo NURC - Recife e por Marcushi (1986). As auto e heterocitayoes esrno entre aspas. (01) 01 M17: ( ...) ai os defunto que morre no interie os povo usa rezane? 02 M2: com esse senhe de engenho (.) todinha (( continua a conversa entre M2 e parte das pessoas presentes, mas fica impossivel compreender por causa do barulho das criancas» 04 PI: reza ne 05 M17: e (.) ai os povo comecaro a reza ne? (02) 01 H3: esperei urn carro de BEM cedo ate quatro hora da 02 tarde (.) num passe urn pa entra pa Lagoa Grande 03H9: ai joge nas costa 04Pl: isso foi quando? faz tempo? 05H3: faizano 06M6: fai munto zano 07H3: fai munto zano 08H9: naquele tempo ele era novo 09H3: ai eu peguei elaejoguei nas costa(.) Quanto as contribuicoes em sobreposicao, na sua maioria, nao provocam interrupcao na fala do FP. As contribuicoes do FS realizadas durante as pausas sac mais frequentes do que as intervencoes em lugares onde nao h8.pist~s de LRT. Numa conversa, as intervencoes na ausencia de LRT resultam num assalto ao tumo do outro, ou pelo menos numa tentativa de assalto. No processo de construyaO da est6ria, das ocorrencias em sobreposicao, apenas 25% provocaram interrupyao do tumo do narrador, principalmente nos apoios por indaga~ao e por explica~ao (estes dois tipos de apoio nao sac apontados por Bublitz (1988». Poder -se-ia dizer que, geralrnente, instaura-se uma das situayoes possiveis de serem consideradas ap6s urn assaito: 0 interlocutor assaltado nao abandona 0 tumo e continua a comandar a interayao. Como a intenyao do FS nao e a de assumir 0 comando da interayao, tais participayoes, embora do ponto de vista formal possam constituir urn assalto (ou tentativa de assalto), do ponto de vista funcional, sac de natureza interacional. Quanto as contribuiyoes realizadas durante as pausas, apenas 4% implicaram interrupyoes na fala do narrador e todas foram localizadas na categoria apoio por indaga~ao. Atitude plenamente compreensivel, uma vez que 0 narrador deveria suspender 0 seu planejamento discursivo para atender as necessidades de seu interlocutor. Saliento que 0 mais importante nesta analise nao a classificayao das contribuiy5es do FS em seu aspecto formal, mas, numa perspectiva interacional, verificar qual a forma de apoio veiculada em cada intervenyao. Por isso, recorri tanto as contribuiyoes em sobreposiyao como as em nao sobreposiyao a fala do FP nas analises dos padroes de apoio. Dentre os padroes de apoio utilizados pelos FSs, propostos por Bublitz, nao foi constatada a panifrase nas 144 ocorrencias encontradas nos dados. Por outro lado, encontrei tres outros tipos de apoio, que foram (a) apoio pela indaga~ao (b) apoio pela resposta e (c) apoio pela explica~ao. Dos oito padroes existentes, os de maior incidencia foram 0 apoio pelo endosso (21 ocorrencias), apoio pela avalia~ao (45 ocorrencias) e 0 apoio pela indaga~ao (46 ocorrencias). Este artigo limitar-se-a a apresentayao apenas destes tres padroes. e No apoio pelo endosso, 0 FS deixa transparecer ao narrador que concorda com as informayoes por ele anunciadas. Das 21 ocorrencias, 12 foram em sobreposiyao ao turno de FP, mas sem interrompe-Io e apenas 3 ap6s 0 uso de marcadores conversacionais ne? e sabe? As formas linguisticas mais usadas foram as expressoes afirmativas: e, mai e merma, era issa merma, sim e sei. Vejamos alguns exemplos: (03) 01 M17: (...) eu tinha certeza que se su: abrisse os soiu (.) 02 eu via sabe? [ (.) ..] ai aquilo ali eu 03 PI [sim] 04 M17 fiquei a noitetodinha (.) (04) 01 H3: (...) morreu dento da casa dela (.) sortera mindingada 02 dento sem ninguem que quii trata dela (.) puque 03 ninguem queria i subi esse morro ((aponta em direyao a uma serra» [pa i ta (.) hora la 05 M6 [mai e mesmo Este tipo de apoio ocorreu quase que 50% em sobreposiyao ao FP, sem interromper 0 turno deste. Verifica-se que 0 FS externa seujulgamento em relayao ao desempenho do narrador, atraves da enunciayao dos fatos que comp5em a narrativa, das atitudes do pr6prio narrador face ao epis6dio e das formas de comportamento dos personagens. LingOisticamente, 0 FS se utiliza dos mais variados tipos de construyao frasal: frases de situayao, frases nominais, frases declarativas e interrogativas. Vejamos alguns exemplos: 0 1M2: (..)aiumdiaeutava113 fila(.)boiinhavivinha[(.) 02 PI [vivinha «sorrir» 03 M2 «todos riem» (06) 0 I H3: deixei ela Ii intemada e fiquei dano viage pra Ii e pra ci 02 [de pei 03 PI: [eu pensei que 0 senho tinha se intern ado de cansa~o 04 [ tambem «fala sorrindo» 05 P2 [eu tambem (05) (07) 01 H3: enadanada113daofejaoomiiquanoeuvortei[ja tinha 02 PI: [essafoi«dirige-se a P2, emvozbaixa 03 fazendo urn gesto com as maos para demonstrar a 04 satisfa~ao pela coleta da narrativa» 05 [meu Deus do ceu 06 H3: [quano eu vortei ((P2 sorrir» reparu tudo (.) No exemplo (05),0 FS (L:02), por meio de uma repetiyao de uma palavra empregada pela narradora -vivinha-, descrevendo 0 estado em que se encontrava, quando da ocorrencia do epis6dio, faz tambem uma avaliayao, admirando-se da forma linguistica empregada. la. no (06), as FSs (P 1 e P2) comentam 0 estado fisico do narrador/ personagem apos ter conduzido nas costas uma senhora doente da comunidade ate a cidade de Alagoa Grande, num percurso de aproximadamente 20km. PI se sobrep5e ao FP, toma-lhe 0 turno e numa frase declarativa brinca com 0 cansa<;odo mesmo. E interessante observar ainda que a avalia<;aode P2 (L:04) ocorre numa postura de endosso a fala de PI. Finalmente, em (07), PI mais uma vez provoca a suspensao da fala de H3, ao dirigir-se a P2, salientando a alegria pela coleta da narrativa (L: 02/03). 0 narrador, numa postura de quem pretende, logicamente, concluir sua narrativa, reintroduz a estoria, repetindo 0 final de seu enunciado anterior e prossegue com a narra<;ao. Nos exemplos (08) e (09) podemos encontrar outras estrategias avaliativas. No primeiro (L:02), a FS atraves da frase de situa<;aoave maria - externa'seu espanto diante do fato apresentado pela narradora ( uma mulher gravida que morreu sem conseguir dar a luz). No outro exemplo (L02), a FS M4 avalia a exigencia feita por urn dos personagens ao narrador - ave: maria -. Esta frase de situa<;ao e seguida de uma nominal- mai de Inga -. Transcreveremos abaixo os referidos exemplos: (08) 01 M2: fui enfeita ota mulhe do buchao que morreu com 0 menino dento [ (.) Ii no Purgato 02 PI: [ aye maria (09) 01 M2: ele disse "nao s6 se f6 de peis daqui a:TE em casa" 02 M4: aye: maria (.) mai de Inga o apoio pela indagac;ao foi realizado basicamente pelas pesquisadoras. Das 46 ocorrencias, apenas 1 foi de uma informante. Tal indice sejustifica pelo desconhecimento, por parte daquelas, dos episodios narrados. A grande maio ria das estorias contadas faz parte do repertorio de epis6dios dignos de serem transmitidos com freqiH~ncia aos visitantes. Consequentemente, nao hi para os moradores aspectos a serem questionados, enquanto que os defora necessitam de algumas informa<;5esrelacionadas (1) a contextualiza9ao, como identifica<;ao de personagens (exemplo 10), determina<;ao do tempo (exemplo 11) e identificac;ao de local (exemplo 12); (2) it solicitac;tio de esclarecimentos sobre ac;f5esdesempenhadas pe/os personagens (exemplo 13). A seguir transcreveremos os exemplos mencionados: (10) 01 M17: num gostei nao (.) «PI sorrir» disse menno a Tutu 02 PI: quem (11) e Tutu? 01 PI: no dia que tu sonhasse foi? 02 M17: nao (.) depoi (.) (12) 01 PI: 02 M3: ai voces traziam 0 capito pra cil? PRA\ cornia Ii (.) na barraca (.) (13) 01 M17: eu digo "eu vo aprumi aqui no cruzero porque foi 0 02 03 PI defunto que Ievanto [ «sorrir» ele num me pega (.) [e 0 que tinha sido? De acordo com 0 que se pode observar nestes padr5es de apoio, 0 FS tambem se constitui autor da narrativa apresentada durante a conversac;ao. A participac;ao do FS se caracteriza essencialmente pela sua postura de cooperaC;ao,no desenvolvimento do episodio apresentado pelo FP para ser narrado e aceito por aquele como pertinente para ser ouvido. As intevenc;5es dos FSs nao visavam, desta forma, a tomada do turno no narrador, mas sim ajudit-lo a tecer a estoria. BUBLITZ, W. 1988. Supportive fellow-speakers and cooperative conversatiOns: discourse topics and topical actions, participant roles and "recipient action "in a particular type of everday conversation. Amsterdam, John Benjamins. GALEMBECK, P. et al. 1990.0 tumo conversacional. In D. PRETI e H. URBANO. A linguagemfalada culta na cidade de Silo Paulo. V.iv. Sao Paulo, T. A. Queiroz/FASESP, pp. 59-98. GOLlCH, E. e QUASTHOFF, U. 1986. Story-telling in conversation: cognitive and interactive aspects. Poetics 15: 217-241. 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Cambndge, Cambridge University Press. o PADRAo ENTOACIONAL DOS REPORTERES DA GLOBO o campo de investigayao que abrange a fonetica e a fonologia tern apresentado contribuiyoes significativas em diversas areas da pesquisa lingilistica tais como: a descriyao de linguas de minorias etnicas, a aquisiyao da linguagem e, ainda,varios temas correlacionados lingilistica aplicada voltados para a abordagem de metodologias de ensino. E neste contexto que tern crescido 0 interesse pelos estudos sobre a entoayao como uma caracteristica - dentro dos chamados aspectos pros6dicos - capaz de evidenciar tanto as formas da fala na interayao verbal (a myel de significant e), como tambem interferir no conteudo do enunciado (a nivel de significado). A partir desta constatacao, achamos relevante 0 procedimento de uma amilise da entoayao dos rep6rteres de televisao por acreditarmos haver alguma relayao entre 0 padrao entoacional e as informayoes veiculadas pelos meios de comunicac;ao de massa. Ha algum tempo temos percebido, de maneira intuitiva, uma certa padronizac;ao na fala dos rep6rteres de TV. Essa percepc;ao, sentida inicialmente apenas entre os rep6rteres da Rede Globo, e atualmente observada em todas as redes nacionais de televisao. Delimitamos como universo da nossa amostra os telej ornais da Rede Globo de Televisao pelo fato de esta emissora veicular 0 maior numero de telejornais diarios interligados por rede nacional e, ainda, por registrar os maiores indices de audiencia da televisao brasileira, de acordo com 0 caderno de midia da revista Imprensa (maryo, 1992). Partimos do principio que os rep6rteres desta rede nao recebem qualquer tipo de treinamento ao entrar para a emissora. De a * As autoras SaD jornalistas e mestrandas em Lingliistica e, neste estudo, tiveram a orientayao da prof" Dra. Marfgia Viana, do Programa de P6s-graduayao em Letras e LingUisticalUFPE .. acordo com a rep6rter Delis Ortis, na Globo desde fevereiro de 1992, nao ha qualquer tipo de treinamento com os rep6rteres direcionado para a aquisivao de urn padrao entoacional. Existe apenas 0 acompanhamento clinicode uma equipe de fonoaudi610gosque trabalha individualmente com cada urn dos reporteres de rede, ou seja, aqueles que aparecem nos te1ejomais - Jomal Hoje, Jomal Nacional, Jomal .da Globo - e tambem no Fantastico. Este acompanhamento, contudo, nao feito periodicamente e tern como unico objetivo ajudar os reporteres a pronunciar melhor as palavras. Delis Ortis acredita que os rep6rteres falam de forma semelhante por imitarem os colegas mais experientes. Neste estudo pretendemos, portanto, verificar se existe urn padrao entoaciofiQl de fala entre os reporteres da Rede Globo, oriundos de diferentes regioes do pais. e o corpus analisado neste trabalho e composto por falas de quatro reporteres, sen~e dois (urn homem e uma mulher) originarios do Nordeste e.dois (urn hornem e uma mulher) do Centro-suI. Para chegarmos a este corpus, estabelecemos que 0 mesmo seria coletado nos diversos telejomais veiculados pela Rede Globo. Assim, no perfodo de 15 de abril a 25 de maio de 1992, foram gravadas 106 reportagens oriundas de varias edic;;oes do NETV e DFTV (noticiarios locais veiculados de segunda a sabado as 12h45 e as 19h45), Jomal Nacional (veiculado de segunda a sabado as 20h) e Jomal Hoje (veiculado de segunda a sabado as 13h). o material gravado ja era suficiente para a selec;;aodo corpus. Instituimos, entao, alguns criterios para facilitar a selevao das reportagens que seriam analisadas: - equivalencia entre 0 numero de reporteres do sexo masculino e feminino, - equivalencia entre 0 numero de reporteres nordestinos e sulistas, - escolha de reportagens nas quais os profissionais aparecessem na tela, evitando os recursos do off(utilizayao apenas da voz do reporter comentando as imagens veiculadas). Vale ressaltar que para a sele9ao, nao foram considerados aspectos como conteudo temMico ou dura9ao das reportagens. Obedecendo a estes criterios, fizemos a primeira sele9ao em que foram escolhidas doze reportagens que, por questoes metodol6gicas, ficaram reduzidas a quatro. Seguindo a, esse respeito, observa90es feitas por Milroy (1987), acreditamos que a quantidade de dados obtidos com a transcri9ao das falas de 12informantes tornaria a analise e a manipula9ao dos dados mais complicada, e nem por isso mais significativa. As quatro reportagens foram transcritas segundo os preceitos ditados pelo modelo entoacional de David Brazil. De acordo com Brazil (in: COULTHARD, 1985), as divisoes entoacionais feitas pelos falantes nos enunciados nao sac gramaticalmente motivadas, mas geradas pela participa9ao do falante em urn contexte situacional e informativo. o universo da amostra para esta analise e justamente urn material produzido dentro de urn contexto situacional e, sobretudo, informativo. Partimos, entao, para a verifica9ao da fala de cada rep6rter a fim de identificar as unidades tonais, citadas por Brazil como sendo uma das caracteristicas fundamentais no estudo da entoa9ao. Para Brazil (1981 e 1985), a unidade tonal e 0 segmento da fala ao qual estao associadas as variaveis significativas. "Ela e definida, nao pela referencia aos seus limites, mas pela sua organiza9ao interna, i.e., ela e caracterizada como 0 local de opera9ao de urn conjunto de 0P90es do falante" (BRAZIL, 1981: 40). E na unidade tonal que se realizam alguns aspectos suprasegmentais utilizados pre-planejadamente pe10sfalantes, como proeminencia, tom, pista e termina9ao. Brazil considera que cada urn destes aspectos acrescenta urn diferente tipo de informa9ao durante a intera9ao. Sabemos que, no momento de realiza9ao da fala, todos esses elementos interagem simultaneamente. Mas para efeito de anaJise, destacamos neste trabalho apenas dois aspectos: proeminencia e tom. Cada unidade tonal e demarcada pela presen9a de uma ou duas proeminencias. Por proeminencia entende-se a escolha pelo falante de palavras com enfase em determinada silaba. Esta escolha lingiiisticatern por objetivo selecionar informa90es que 0 falante deseja ressaltar com base no conhecimento partilhado. Em geral estas silabas coincidem com 0 acento tonico das palavras, mas nao necessariamente (BRAZIL, 1985a e VIANA, 1992). Para efeito de identificac;ao;as silabas proeminentes sac sempre transcritas em letras maiusculas, e em caso de ocorrerem duas proeminencias em uma mesma unidade tonal, a silaba tonica (ultima silaba proeminente na unidade tonal) apareceni sublinhada. A identificavao das unidades tonais e proeminencias em cada uma das quatro reportagens, nos possibilitou dar mais urn passo em busca de nosso objetivo. Prosseguimos, entao, verificando 0 tom imposto pelos rep6rteres a partir das silabas contidas nas unidades tonais. Segundo Brazil (1985 b), os tons classificam-se em: descendente, ascendente, ascendente-descendente, descendente-ascendente e nivel. Os tons ascendente e descendenteascendente, chamados referring tones ( r ) sac utilizados pelo falante para emitir para 0 ouvinte mensagens no ambito do conhecimento partilhado. Ja, os tons 'descendente e ascendente-descendente, chamados de proclaiming tones ( p ) sac empregados como geradores de expectativas para 0 aumento do campo de conhecimento partilhado, atraves da transmissao de novas informac;oes, e tambem como indicadores de divergencias e separac;ao (COULTHARD, 1985). Brazil ainda classifica mais dois tons, utilizados na orientac;ao obliqua, que nao serao abordaclos neste estudo por estarem diretamente relacionados com a lingua e I}.aOcom os participantes da interac;ao. Ainda dentro do modelo entoacional utilizado, 0 falante pode ter 0 papel de dominante ou de nao-dominante. Ou seja, quando ele desempenha urn papel em que da informayoes ou instruyoes e considerado controlador do discurso e, portanto, tern uma posiyao de dominante. E 0 caso do reporter ao veicular sua reportagem ou do professor em sala de aula. Assim, ao verificar os tons nas reportagens escolhidas, observamos a incidencia de tons ascendentes e descendentes em urn contexto de dominancia do falante. 0 ultimo passo da analise foi identificar as caracteristicas individuais e coincidentes entre os quatrorep6rteres, que serao denominados rep6rter A (homeml Centro-suI), rep6rter B (mulherlNordeste), rep6rter C (homernl Nordeste) eD (mulher/Centro-sul). 88 As caracteristicas de cada urn dos rep6rteres indicaram tendencias marcantes entre os profissionais. Primeiramente, constatamos que os rep6rteres enfatizam, ou seja, tornam proeminentes os substantivos comuns e pr6prios indicativos de lugar, os verbos no participio e noinfinitivo e, tambem, os adverbios. Assinale-se que os dados aqui apresentados correspondem a totalidade das ocorrencias verificadas em cada uma das quatro reportagens analisadas. Reporter A 11 a ciDAdel1 11 no aeroPORtol1 IIRUASII Ilos TUneis do RIOII II RIO CENtro11 II ORIa .. ./1 11 hoTEISII II. ..caiCAda/ I 11 PIStasll II MARII 11...esPAc;oll 11...quarTELII Reporter C lido MUNdo11 11... em pernamBUcol1 Ilem washingTON/I 11 na SEde// // no braSIL// Reporter B 11 aparta:MENtoll 11 BOa viAgem/l II SAO PAUlol1 11 hoTEISII II Acrell /I. ..FLATII II. ..reCIfe/ / 11... pernamBUcol1 11...esTAdo/1 II...secretaRIal I Reporter D 11 de jeQUIe // em sao PAUlol1 Reporter A Reporter B Ilvao mobiliZAR/1 Ilvao fiCAR/1 Ilvao PROtegerl1 11...vao hospeDAR/1 Ilvao transmiTIRII 11... assalTAR/1 Reporter C Reporter D Ilao responDERII I/. .. se apresenTAR/1 Ilpara eviTAR/I Reporter A Reporter B IlpatruLHAdol1 IIBLOqueadasl1 lIe VIgiadasl1 II consideRAdosll II reforCAdol I 11 PROibidail 11 BLOqueadoll 11 e proteGIdol1 11 11 lIe II 11 ReporterC Reporter D Ilfoi FEIto .. ./1 lIe ciTAdol1 IldecreTAda .../1 IlesTA sendo procuRAdol1 PREsail aponTAdail TIdail acuSAda .../1 procuRAdall Reporter A Reporter B IIJA. ../1 IIMAlS .. .I1 Ilao LARgo11 Ilao VIvo11 IldiREto ...I1 1/...ONtem/l IlpossiVELmentel IIMUItal1 I/DENtro11 Reporter C Reporter D IIJAmaisl1 1/...HOjell l/aGOraJl lie AQUL..I1 I/PRAticamentel I I Notamos tambem, com certa surpresa, a incidencia de proeminencias nao coincidentes com a silaba tonica. Quando isto ocorre, a enfase, na maioria das vezes, cai na primeira silaba. Reporter A Reporter B 11...mobiliZAR/I IIBLOqueadasl1 II VIgiadasl I II FU zileirosl I 11 PROtegerll II PROibidaJ I I/. ..Aereol I 11 SAbendoll II Operayaol I Reporter C Reporter D IIJAmaisl1 Ilem washingTONII //NEnhum/l IICONfiavel/1 IITErial1 IIPRAticamentel I /ICOMbinaram/l //PERnambuco// Percebemos que 0 tom descendente ( p ) coincide com 0 final de gropos de informa~6es. Entendemos que 0 tom descendente, em geral, parece representar 0 que gramaticalmente seria 0 ponto ou a virgula. Por outro lade, os tons ascendentes aparecem sempre no inicio de uma nova informa~aocomo que preparando 0 ouvinte, atraves da enuncia~ao do conhecimento partilhado, para 0 recebimento de uina nova informa~ao que esta por vir. Esta caracteristica, entretanto, parece ser comum a todo falante. De qualquer forma, demonstraremos, a seguir, as coincidencias entre os tons descendentes e os sinais de pontua~ao (que serao identificados entre parenteses) observadas no corpus analisado. Reporter A Ilr as TRESII Reporter B Ilr auroZItai I IIr FOR~asll Ilr arMAdasl1 Ilr vaG mobiliZAR/1 Ilr QUINz ell Ilr MILII IIHOmensl1 Ilr para a seguRAN~a de Ilr REgiall Ilr da SILva/I lip foi PREsa ONtem/l (,) Ilr num apartaMENtol1 Ilr possivelmentell lip emBOA viAGEM/I (,) Ilr por policiAISl1 Ilr da diviSAOII IIr de homiCIdiosl1 IIr e prote<;AOII Ilr a pesSOA/I Ilr da policia ciVIL/I II p de SAO PAUlol1 (.) CEMII IICHEfes de esTAdol1 (.) Reporter C Ilr 0 go VERno ameriCAnol1 Ilr JAmaisl1 lip DIssel1 Ilr que a maior planta<;AO de maCOnha/l IIr do MUNdoll lip fica em pernamBUcoll(.) Ilr 0 desmenTIdol1 Reporter D Ilr 0 ROmeml1 Ilr que a poLIcia identifiCOUII Ilr como seGUNdol1 Ilr particiPANte do CRIme11 Ilr e joMILdol1 Ilr RAmosll lip barBOsa/I (.) foi FEIto HOje11 em washingTONII (,) ao responDERII a uma perGUNtal1 durante uma entreVISta coleTIva/l IIr diante de jornaLIStas// Ilr de VINte11 Ilr lip Ilr IIr Ilr Ilr e QUAtrol1 lip paIsesl I (,) Ilr na SEde11 Ilr da VOZ da aMErica/I lip em WAShington/I (.) Ilr ele e baiAnol1 IIr da cidade de jeQUlel1 IIr e AQUI em sac PAUlol1 l/r nao TEria/ I lip anteceDENtes crimiNAISII (.) Ilr JOmildol1 Ilr esTA/I IIr com prisao proviSOrial1 lip decreTAda pela jusTI<ra/l(,) IIr e esTA sendo procuRAdol1 lip pela poLlcia/l (.) Observamos, tambem, que a segmentac;ao em unidades tonais ocorre com os nomes de pessoas sempre que as mesmas desempenham urn papel fundamental no fato reportado. Este e 0 caso de Aurozita Regia da Silva que, segundo a informac;ao da reporter B, esta sendo procurada pela policia. 0 nome de Aurozita foi enfatizado porque como ela era uma das suspeitas do assassinato, seria precise deixar claro seu nome completo. Esta tendencia so nao p6de ser comprovada no texto do reporter A, por nao ter citado nomes de pessoas. Vale ressaltar, tambem, que todos os nomes proprios sac proeminentes mesmo quando nao sac sujeitos da aC;ao, como no caso de Ari Toledo e Edmundo Pinto, citados pela reporter B. Reporter A Nao utilizou nomes de pessoas Reporter B II auroZItal I llREgiall Iida SILval1 IledMUNdo PINto11 liaR! toLEdol1 //auroZIta/1 Reporter C IlmelVlM/1 //leviTSK/I Reporter D IljoMILdol1 IIRAmos/1 lib arB 0 sa/I IleDILson/l IIALvesl/ IIGAgol1 o ultimo aspecto coincidente e observado nas falas dos rep6rteres A e C, onde foram encontradas proeminencias em numerais. Com rela~ao a este ponto, nao podemos generalizar a tendencia pelo fato de os rep6rteres BeD nao haverem mencionado numerais em suas reportagens. Reporter A II as TRESII II QUINzel1 II MILII Reporter C II VINtel/ 1/...QU Atrol I Para resumir nossa analise, podemos dizer que os dados revelam varias coincidencias entoacionais nas falas dos rep6rteres, marcadas pela divisao dos enunciados em unidades tonais e proeminencias. Percebemos, inclusive, que no processo de planejamento das unidades -tonais, os rep6rteres procedem a segmenta~ao e marcam as proeminencias de acordo com pontos ressaltados pela estrutura jornalistica de apresenta~ao da noticia. Ou seja, ao transmitir a noticia, 0 rep6rter precisa deixar claro 0 que aconteceu; onde, quando, como e quem sac os envolvidos no acontecimento. E isto pede ser comprovado neste estudo com a ocorrencia de proeminencias - nos substantivos indicativos de lugar (onde), nos nomes de pessoas (quem), nos adverbios de tempo (quando) e de modo (como) e nos verbos (0 que) - descritas anteriormente. A analisedo corpus selecionadonos possibilitouatingir 0 objetivo do estudo: verificar se existe urn padrao entoacional entre os reporteres da Rede Globo de Televisao, oriundos de diferentes regi6es do pais. A partir da constata'tao de coincidencias na segmenta'tao dos enunciados e proeminencias nas falas dos profissionais, podemos afirmar que, independentemente da regiao de origem dos reporteres, existe urn padrao entoacional. Em outras palavras, nao ha caracteristicas entoacionais proprias de cada reporter durante a transmissao de noticias, mas urn padrao uniforme querele seja do Centro-suI ou do Nordeste. o curioso e que essa uniformidade de entoa'tao provoca no telespectador a sensa'tao de que todos os reporteres falam -igual. Na realidade, eles apresentam 0 mesmo padrao entoacional, 0 que nao significa que eles tenham a mesma pronuncia. Assim, concluimos que 0 padrao entoacional dos reporteres da Rede Globo e marcado pelas seguintes tendencias: I -Tomar proeminentes os substantivos comuns ou proprios indicativos de lugar, os verbos no infinitivo e participio, e, tambem, os adverbios. II - Tomar proeminentes silabas tonicas nao coincidentes com a tonica da palavra. III - Segmentar nomes de pessoas quando sac sujeitos de a'tao do fato noticiado. BRAZIL, David. 1981. Intonation. In Malcolm Coulthard e Martin Montgomery (ed.). Studies in Discourse Analysis. London, Routledge & Paul Ltd, pp. 39 - 50. BRAZIL, David. 1985a. The communicative value of intonation in English. Birmingham: English Laguage Research and Black House Books. BRAZIL, David. 1985b. Phonology: Intonation in Discourse. In Teun van Dijk (ed.). Handbook of Discourse Analysis. Vol. 2. Dimensions of Discourse. 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Ilr as TRESII IlrFORyasl1 Ilr arMAdas/I Ilrvao mobiliZAR/1 Ilr QUINze11 IlrWLII lip HOmensl1 Ilr para a seguRANya de CEM/I lip CHEfesde esTAdol1 IIr 0 moviMENto das TROpas/l lip JA cqmeCOUII Ilr heliCOPterosl1 IlrmiliTAres/l lip sobreVOam a ciDAdel1 Ilr 0 esquema coMEya no aeroPORtol I IlrpatruLHAdol1 lip pela aeroNAUticail Ilr as princiPAlS RUASII Ilr e aveNIdasl I Ilrvao fiCAR/1 Ilr BLOqueadasl1 Ilr e VIgiadasl1 lip pelo exERcitol1 Ilr que VAl usar AIN dal I Ilr TANques/ I lip e CArro.; de comB At ell Ilros TUneis do RIOII Ilr sao consideRAdos/l lip PONtos CRIticosl1 Ilr os FUzileiros na VAISII vao PROteger a area da confeRENcial1 lip no RIO CENtrol1 Ilr a ORla maRItimai I Ilr onde FIcam os ho TEIS/, Ilr quevao hospeDAR/I Ilr Ilr os CHEfesl1 Ilr de esTAdol1 Ilr tera 0 esQUEma de seguRANyail lip MAIS reforCAd911 Ilr DENtro dos hoTEISl1 lip fican't a poLlcia fedeRALII Ilr na calCAdail lip a poLlcia miliTAR/I Ilr nas PIStas11 lip 0 exERcitol1 IlrnoMAR/1 Ilr anavegaCAO ciVILII lip sera PROibidai I Ilr hayed LANchas/l lip e mergulhaDOresl1 Ilr e ao LARgol I lip uma fraGAta da maRINhail 0 esPAyo AEreoll tambem seni BLOqueadol I Ilr e proteGldol I Ilr por heliCOpterosl1 Ilr lip Ilr de GUErra/I lip do exERcitol1 Reporter A Ilr arMAdos/1 Ilr e com CAmeras de televiSAOl1 Ilr que VaGtransmiTIRII Ilr AO VIvo II Ilr TUdo 0 que acontecer aQUI/I Ilr AuroZIta II Ilr REgia II Ilr da SILva II lip foi PREsa ONtem II Ilr num apart aMEN to II Ilr possivelMENtel1 lip em BOA viAgem II IIr por policiAIS II Ilr da diviSAo II Ilr de homiCIdios II Ilr e prote<;AO II Ilr a pesSOAII IIr da policia ciVIL II lip de sAo PAUlo II lip ela e aponTAda II Ilr como CHEfe II Ilr DE umaquaDRllha/1 Ilr especialiZAda II lip em assaltar hoTElS II Ilr e Tlda II Ilr como uma das pesSOas II Ilr que particiPAram do assassiNAto II Ilr do governaDOR do Acre II lip edMUNdo PINto II Ilr diREto para 0 quarTEL general// Ilr das TROpas de seguRANya/l Ilr daRlOII lip noVENta e DOISII Ilr ela e acuSAda AINda II Ilr de assaltar 0 FLAT II lip do comediante aRI toLEdo II Ilr auroZIta/1 Ilr e pernambuCAna II Ilr e teria VINdo II lip PRO reClfe II IIr depois que perceBEU II IIr que estava SENdo procuRAda II lip pela poLlcia de SaD PAUlo II lir em neNHUM momenta II IIr a poLIcia de PernamBUco II Ilr ficou SAbendo II Ilr da OperayaO II Ilr da policia pauLISta II lip aQUI no esTAdo II Ilr isto criou urn CLlma II Ilr DE MUIta II Ilr insatisfaCAO II Ilr aqui DENtro da secretaRla II lip de seguRANya PUblica II Ilr 0 go VERno ameriCAno Ii Ilr JAmais/1 lip DIsse II Ilr que a maior plantaCAO de maCONha II IIr do MUNdo II lip fica em PernamBUco II Ilr 0 desmen TIdo II Ilr foi FEIto HOje II lip em washingTON II IIr ao responDER II Ilr a uma perGUNta/1 Ilr durante uma entreVISta coleTIva II Ilr diante de jornaLIStas II Ilr de VINte II Ilr e QUAtro II lip paIses II Ilr na SEde II Ilr da VOZ da aMErica II lip em WAShington II Ilr 0 secreTArio de esTAdol1 Ilr assisTENte II Ilr para assuntos relacioNAdos/1 IlrcomaDROgail IlrMELvim/1 IlrLeviTSKII Ilr esclareCEU II lip a quesTAOII Ilr urn docuMENto libeRAdol1 Ilr aGOra II lip pelo departamento de esTAdo II Ilr diz que nao HAil Ilr NEnhum II Ilr levantaMENto II lip confiAvell1 Ilr sobre a Area II Ilr uSAda no braSIL II Ilr para a plantaCAO II lip de maCOnha II fir se nao eXISte neNHUMl1 Ilr levantaMENto II Ilr confiAvell1 Ilr ninGuEM pode dizer II Ilr onde Flea II lip a maior plantaCAO II Ilr PERnambuco II IlrNEM sequer II Ilr e ciTAdo II lip no docuMENto II Ilr 0 HOmem/l Ilr que a poLlcia identifiCOUI I Ilr como seGUNdol1 IIr particiPANte do CRImel1 IIr ejoMILdol1 IlrRAmosl1 IIp barBOsall Ilr ele e baiAnol1 Ilr da cidade de jeQUlel1 Ilr e aQUI em sac PAUlol1 Ilr nao TEria/l IIp anteceDENtes crimiNAlSII Ilr JOmildo// Ilr esTAlI Ilr com prisao proviSOriall IIp decreTAda pela jusTlvall Ilr e esTA sendo procuRAdol1 IIp pela poLicial I Ilr 0 terceiro CUMplicel1 Ilr no CRIme11 Ilr seRIall Ilr eDILson/l IIr ALvesll IIp GAg011 Ilr eleja esT All Ilr com prisao proviSOriall Ilr decreTAdall Ilr e pode se apresenTAR/I Ilr a qualQUER moMENtol1 IIp na poLIcial I Ilr os deleGAdosl1 Ilr que cuidam do CAsol1 Ilr ja fizeram conTAtol1 Ilr com a faMIlial I IIr e 0 advoGAdol1 IIp DEle11 Ilr e PRAticamentel1 Ilr COMbinaram/l IIr essa apresenta<;AOII IIp esponTAnea/l IIr para eviTAR/ I IIp uma caCAda poliClal// o IMPLICITO CULTURAL: UM OBSTAcULO PARA A COMUNICACAO* Vera Lucia Teixeira Carneiro Colegio de AplicG9i1o - UFPE A no<;aode competencia comunicativa, inicialmente proposta para explicar a eficacia dos desempenhos de urn locutor e de urn ouvinte, demonstra que essa eficacia depende de urn saber que ultrapassa a fonologia, 0 lexico e a estrutura gramatical abstrata. as estudos sobre competencia comunicativa mostram que 0 uso da lingua esta intimamente ligado a cultura e as normas especificas do contexto em que ocorre a intera<;ao. . as etn6grafos da comunica<;ao, sobretudo Hymes (1962, 1964, 1984), passam entao a estudar a linguagem como urn ate cultural e social, e nao simplesmente linguistico. Para 0 ensino de linguas, este e urn ponto fundamental, uma vez que 0 dominio dessas regras de cunho cultural e social e condi<;ao previa para uma comunicayao eficaz. A vida em sociedade esta baseada no principio segundo 0 qual qualquer pessoa que possua determinadas caracteristicas socioculturais esta moralmente no direito de esperar que seus interlocutores a tratem de maneira compativel com essas caracteristicas, com seu estatuto. Definindo 0 papel social como a atualiza<;ao de direitos e deveres ligados a urn estatuto, Goffman (l973a:24-5) chama a aten<;ao para 0 fato de que urn papel social cobre urn ou varios papeis e que 0 "ator" pode apresentar cada urn desses papeis, numa serie de ocasi5es. A existencia e a transmissao de informa<;5essao realidades da vida social e, para ficar a vontade numa situa<;ao, 0 individuo necessita de dados quanta as inten<;5es daque1es que 0 rodeiam e com os quais interage. Geralmente, isto e obtido atraves de "sinais de liga<;ao" (Goffman, 1973b:286). • Eate trabalho reproduz, com algumas modifica90cs, parte do cap. 4 da Di~~erlllyao de Mestrado, defendida no Programa de P6s-Gradua9ao em Letras e Lingiiistica da UFPE em dezembro de 1992, sob 0 titulo: "A Abordagem Intercultural no Ensino-Aprendizagem de Linguas Estrangeiras". A nOyao de situayao de comunicayao (Gschwind-Holtzer, 1981) e complexa e importante para a realizayao dos atos de fala e a consequente escolha das variantes linguisticas apropriadas a boa realizayao das intenyoes comunicativas dos interlocutores. E neste contexto que se pode examinar a fala como uma atividade social e, pedagogicamente, avaliar a competencia comunicativa dos aprendizes, uma vez que os atos de enunciayao saDimposslveis de interpretar quando apenas se conhece 0 enunciado e se ignora o contexto em que eles ocorrem. Dai ser coerente a proposiyao de Galisson (1980: 109) de que possuir a competencia e sobretudo ser capaz de "compreender e de produzir enunciados adequados as situa<;oespsico-socio-culturais que os subentendem". E importante lembrar que os conceitos teoricos empregados na analise dos textos aqui citados tratam originalmente de interayoes espontaneas e naturais. Neste trabalho, porem, foi feita uma adaptayao na tentativa de explicar 12 produyoes escritas de aprendizes de lingua francesa apos 220 horas de aula do Metodo Archipel, e que saD na realidade interayoes simuladas nas quais 0 mesmo sujeito compoe todo 0 dialogo. Embora nao haja interlocutor, 0 aprendiz age como se houvesse, e a analise e tambem efetuada como se as interayoes fossem naturais e espontaneas. Estamos, sem duvida, diante de simulayoes; mas nao e a simulayao parte integrante do proprio processo de ensino-aprendizagem? Nao e tambem atraves des sa tecnica que buscamos preparar 0 aprendiz para enfrentar as futuras e provaveis intera90es reais? Nao podemos esquecer que uma das caracteristicas das abordagens de terceira gerayao e 0 desenvolvimento do ludico e da criatividade como instrumentos para a aquisiyao da competencia comunicativa. Como parte do seu aprendizado, 0 aluno entra em contato com a lingua estrangeira sempre em situayoes de comunicayao e frequentemente the saD apresentadas personagens estereotipadas, tais como 0 trabalhador imigrante, 0 estrangeiro, os estudantes etc. Assim, constantemente, ele e levado a imaginar situayoes comunicativas, em que desempenha varios papeis numa interayao 102 simulada; ele e regularmente chamado a desempenhar, em sala de aula, uma enorme diversidade de papeis sociais que, de outro modo, nao teria oportunidade de representar em seu quotidiano. Por outro lado, embora escritas, essas produyoes se aproximam de uma interayao oral. as aprendizes, tal qual os participantes de urn processo interativo, assumem estatutos, desempenham seus papeis sociais e cooperam; utilizam-se de perguntas e respostas, afirmayoes e contestayoes, e tentam, desta maneira, estabelecer condiyoes que tornem possivel a compreensao mutua, a fim de atingir 0 objetivo a que visam. Foi proposto ao aprendizum enunciado contendo urn numero minimo de informayoes para que, a partir dai, imaginass~ todo 0 contexto situacional: voce quer comprar ou alugar Imagine 0 uma casa ou um apartamento. dialogo. A fim de explicar as prodw;:oes que formam 0 corpus deste estudo, alem das noc5es vistas anteriormente, foram igualmente adaptadas as ideias de Van Dijk (1992) sobre modelo de contexto ou de situa<;Cio,uma vez que esta nOyao responde, de maneira satisfat6ria, a esse tipo de imaginayao criativa que 0 aprendiz desenvolve ao elaborar 0 seu dialogo. A principal tarefa do aprendiz e a construyao de urn modelo de contexto. Essa representacao e elaborada a partir dos seus conhecimentos de mundo organizados na sua mem6ria, herdados de situayoes similares anteriormente vividas, tanto no plano de sua experiencia pessoal quanta do seu aprendizado em sala de aula. E interessante verificar que, como 0 enunciado deixa em aberto 0 cenario da interayao, alguns aprendizes optam por situ ala no Recife ou em Jaboatao, e outros, em Paris. Esta variayao reforya a importancia da nao-diretividade para a expressao criativa, caracteristica das abordagens de 33 gerayao. Embora se perceba, nos dialogos elaborados, a similaridade entre os conhecimentos de mundo do receptor e do emissor, est a e uma con sequencia 16gica, visto que cada aprendiz faz os do is papeis, transferindo, desta maneira, a sua cultura estereotipada 103 para os diillogos, 0 que nao quer dizer que haja sempre co"incidencia com os valores culturais da sociedade france sa. Exemplos disto sao 0 grande numero de filhos das familias (7-8), 0 numero de quartos (4-5-6), de banheiros, a suposi<;:ao de que banheiros e cozinha sac considerados comodos para os franceses. o Metodo Archipel, principal suporte para as produ<;:oes aqui analisadas, tern na noc;{iode cognic;{io social urn dos seus principios norteadores. Ora, essa cogni<;:aosocial corresponde aos valores da sociedade francesa que, embora muito pr6ximos dos padroes brasileiros, diferem - como e natural- em alguns aspectos. Globalmente, e possivel antecipar que a analise de algumas produ<;:oessalienta inconvenientes oriundos da pouca aten<;:aoque, tradicionalmente, a Pedagogia das Linguas tern atribuido as diferen<;:asculturais. Ao trilhar 0 caminho do etnocentrismo cultural, a orienta<;:ao metodol6gica (nao seria filos6fica ou ideol6gica?) refor<;:aa ideia de uma uniformidade, de uma universalidade - e ate mesmo de uma superioridade cultural -, incompativeis com as multiplas e diversas realidades culturais. Para Gumperz (1989:28), assim como para Van Dijk (1992:32), e possivel detectar, linguisticamente, certos indicios que intervem na caracteriza<;:ao Jas rela<;:oesentre 0 discurso e os contextos pessoal e social da fala; sac exemplos desses "indicios contextuais"os processos de comuta<;:aode c6digo, 0 dialeto ou 0 estilo, uma parte dos elementos pros6dicos, assim como a escolha entre op<;:oeslexicais e sintaticas, as expressoes estereotipadas, as aberturas e os fechamentos conversacionais, as estrategias de sequencia<;:ao. o sentido dos indicios de contextualiza<;:ao e, contudo, implicito; 0 seu alcance na comunica<;:aodepende da consciencia tacita que deles tern os participantes de uma conversa<;:ao.Quando estes os percebem e os compreendem, a intera<;:ao se processa espontaneamente. Mas, quando urn interlocutor nao reage a urn indicio ou ignora a sua fun<;:ao,as interpreta<;:oes podem diferir e os mal-entendidos podem surgir; 0 problema, em geral, e encarado em termos de atitude. Dir-se-a que 0 locutor e antipatico, 104 impertinente, que the faha espirito de cooperayao etc. Uma ma comunicayao desse tipo e considerada como urn mau desempenho social, dando lugar a falsas avaliay5es e favorecendo a criayao de estere6tipos. Urn exemplo tipico e a reac;ao de urn frances comum quando urn desconhecido se dirige a ele na segunda pessoa do singular (tu): ele se contrai constrangido e, em geral, a sua reayao imediata e corrigir 0 interlocutor com urn sonoro - Vous s'il vous pla'itl E bem verdade que variantes podem sempre surgir, como por exemplo, se os interlocutores sao urn rapaz e uma bela j ovem brasileira ... Inumeros sac os brasileiros que, ap6s uma viagem em geral tUrlstica a Franc;a, relatam experiencias desagradaveis e passam a classificar "os franceses" como antipaticos, rispidos ou pouco cooperativos; nao percebem que, com sua conduta desinibida e lingilisticamente inadequada, infringem uma das maximas de polidez formuladas por Lakoff (Preserve sua disHlncia, 1969), e a qual a sociedade francesa atribui grande importancia dentro de sua escala de valores sociais; uma conduta dessa ordem e sentida, na sociedade francesa, como uma "invasao de territorio" (Goff man, 1973b:62). Em geral, na sociedade francesa, cabe ao nativo a iniciativa de urn tratamento mais intimo; ele pod era faze-Io explicitamente ou, entao, de maneira implicit a, como sugere 0 seguinte dialogo citado por Kerbrat-Orecchioni (1986b:284): L1 - Vous savez ce qui me ferait plaisir? L2 - Non? L1 - Que vous m'appeliez Robert. L2 - Je vous avais demande de me tutoyer. L 1 - Mais non, vous m' avez juste demande de vous appeler Robert. L2 - C'etait sous-entendu. Urn pedido e 0 tipo de ate que pode ser considerado por alguns interlocutores, em determinadas situac;5es, ate como uma ofensa, como no desejo expresso pelo ate de fala direto "Je veux acheter une maison avenue Boa Viagem" (texto 10). Embora gramaticalrnente correta, sua formulayao excessivamente literal viola as regras da polidez vigentes na sociedade francesa; ela imp5e a vontade do locutor e nao deixa opyao de escolha ao interlocutor, senao a recusa em cooperar. Esta maneira, rispida e autoritaria, acarretaria, via de regra, na sociedade francesa, uma resposta negativa, uma certa ma vontade, geradora de conflitos. Nao e, todavia, nesta direyao que o dialogo se processa, pois hit uma perfeita sintonia interativa. Isto e sintomatico, porque revela a ausencia de interlocutor real; nao e dernais lembrar que 0 mesrno aprendiz desempenha ambos os papeis. Para evitar uma eventual interpretayao desagradavel, 0 locutor-aprendiz poderia transformar essa significayao negativa em urn enunciado aceitavel, ou, nos termos de Goffinan (l973b: 113155), "neutralizar as via/ac;oes incursivas". As formas indiretas dos atos de fala utilizadas por outros aprendizes, como, por exemplo: "Je cherche un appartement it louer" (texto 11), "Cette maison est deja libre?" (texto 6), assim como as formas modalizadas "Ie voudrais louer un appartement pour ma famille" (texto 3), "Ie desire louer une maison; vous pouvez m'aider?" (texto 5), "Mais, vous ne pouvez pas me conseiller?" (texto 9) sac express5es linguisticas desses procedimentos, capazes de contornar as dificuldades inerentes aos encontros interculturais. Dentro de uma abordagem -comunicativa, professores e aprendizes nao podem esquecer que 0 saber gramatical eo saber lexical sac apenas dois fatores dentre outros presentes no processo de interayao. 0 contexto, 0 conhecimento de mundo de cada participante, suas atitudes para com os outros participantes, os postulados socioculturais que dizem respeito aos papeis e aos estatutos, os valores sociais inerentes a diversos cornponentes da mensagem tern, igualmente, urn papel decisivo na comunicayao. Por isso, em exercicios desta natureza, os aprendizes deveriam ser sempre levados a identificar psico-socialmente suas personagens; o professor teria padimetros mais concretos para avaliar a adequayao do texto it situayao geral. A produ~ao e a compreensao do discurso advem de uma competencia especifica do falante e do ouvinte - a compeh~ncia textual-, da qual fazem parte elementos que ultrapassam 0 dominio estritamente lingiiistico. Neste sentido, Marcuschi (1983 :27) chama a aten~ao para 0 fato de que "as categorias textuais devem abranger tanto os aspectos sintilticos como os semdnticos e pragmaticos, ja que 0 texto deve ser visto como uma seqiie,lcia de atos de linguagem (escritos ou falados) e nao uma seqiiencia de frases de algum modo coesas". A aten~ao esta, assim, voltada para como a linguagem funciona dentro de urn sistema coerente de comunica~ao. Como ha certa concordancia entre a maioria dos estudiosos Canale (1983), Marcuschi (1983), Koch & Travaglia (1989), van Dijk (1992) quanta ao fate de que a coesao e a coerencia estao intimamente relacionados no processo de prodw;ao e compreensao do texto, e com vistas a uma analise mais didatica das produ~5es dos aprendizes, parece mais adequado proceder-se ao estudo da coesao ao nivel dos constituintes linguisticos, e a analise da coerencia ao nivel semantico - cognitivo - pragmatico. A analise das produ~5es leva a crer que, para aprendizes brasileiros, em nivel inicial, a coesao nao parece configurar urn entrave a aprendizagem da lingua francesa, pois trata-se, simplesmente, da transposi~ao de urn dos elementos da competencia ja adquiridos na lingua materna e que nao difere daqueles da lingua francesa; ha, nestes casos, evidencia de transferencia positiva. Contudo, necessario nao esquecer que, se a coesao ajuda a estabelecer a coerencia, ela nao a garante. A coerencia textual depende, principalmente, dos usuarios do texto (seu conhecimento de mundo, seus conhecimentos partilhados etc.) e do contexto da situa~ao comunicativa. Como salientam Koch & Travaglia (1989: 11), "A coerencia tem a vel' com a boaforma~iio do te.xto, mas num sentido que nao tem nada a vel' com qualquer ideia assemelhada a no<;aodegramaticalidade usada no nivel dafrase, sendo mais ligada a uma boaforma<;ao em term os da interlocw:;tio comunicativa. POl'tanto, a coerhlcia algo que se estabelece na e e 107 interac;fio, na interlocuc;fio, numa situac;fio comunicativa entre dois usuarios" (grifo dos autores). Como lembra Marcuschi (1983 :46-7), "a coerencia estabelece-se dentro de um universo textual que abrange toda a produc;fio e recepc;fio, de modo que 0 texto contem mais que a (simples) soma das expressoes lingiiisticas que 0 compoem, incOlporando os conhecimentos e a experiencia do dia-a-dia". Koch & Travaglia (1989:47-95) elencam, alem do conhecimento linguistico, uma serie de fatores que contribuem para 0 estabelecimento da coerencia e que influenciam diretamente o processamento de urn discurso, a saber: conhecimento de mundo, conhecimento partilhado, inferencias, fatores pragmaticos, intencionalidade e aceitabilidade, informatividade, situacionalidade, focalizayao, intertextualidade e relevancia. Visando sobretudo a proposta desenvolvida neste trabalho, sera dada mais enfase a alguns destes fatores, tais como: 0 conhecimento de mundo e 0 conhecimento partilhado, a intencionalidade e as inferencias. A aceitabilidade e a situacionalidade estao integrados a nOyao de competencia sociolinguistica desenvolvida na seyao anterior. A compreensao do mundo nao depende apenas da existencia de estruturas racionais; ela esta vinculada a interpretayao da realidade pelos atores sociais que tern urn papel ativo na "construyao do mundo". A compreensao de urn discurso esta necessariamente ligada a interpretayao que faz 0 ouvinte das estruturas verbais das quais se serve 0 locutor. Ora, esta interpretayao depende em grande parte das circunstancias imediatas da situayao, assim como de uma infinidade de pressupostos de natureza individual ou sociocultural. Locutor e ouvinte devem saber ou ter suposiyoes sobre 0 que relevante e importante num determinado contexto comunicativo; devem saber tambem como agrupar individuos e propriedades, e como certos aspectos socioculturais estereotipicos sac envolvidos em eventos e ayoes globais. E, como diz van Dijk (1992:45), "entender um discurso pressupoe en tender 0 mundo". Como cada individuo armazena os conhecimentos na memoria e a partir de suas experiencias pessoais, e impossive! que duas pessoas partilhem exatamente 0 mesmo conhecimento de mundo; no entanto, elas possuem, ao menos, uma boa parcela de conhecimentos comuns. E neles que 0 locutor se ap6ia ao fonnular hip6tesesquanto ao que 0 interlocutor pode deduzir do seu discuryY. se seu julgamento e suas hip6teses esHio corretos, 0 interlocutor podera reconstituir 0 que ele quis dizer, baseando-se nos indicios fornecidos e no conhecimento comum existente entre ambos. Assim, ele emite hip6teses sobre a capacidade de 0 interlocutor inferir 0 conteudo proposicional nao formulado explicitamente e 0 valor ilocucional nao indicado explicitamente. Marcuschi (1983: 77) chama a atenyao para 0 fato de que a conversayao·parece ser comandada pelo principio da parcimonia, que diz nao ser conveniente falar aquilo que se sup5e sabido pelo parceiro. A consequencia e que, quanta maior for a parcela dos conhecimentos partilhados, menor sera a necessidade de explicitude de urn texto ou discurso. Os conhecimentos partilhados tern, portanto, a ver com a nOyaO de pertinencia e funcionam, no dizer de Charaudeau (1983:24), como "filtros construtores de sentidos", presentes no dialogo que se segue: Texto 1: 1 Ll - Bonjour, Monsieur. 2 L2 - Bonjour. Que voulez-vous? 3 'Ll - Je desire Iouer un appartement de preference pres du 4 Quartier Latin. 5 L2 - Asseyez-vous, s'il vous plaIt. II yen a plusieurs mais 6 il faut savoir combien vous pouvez y mettre. 7 Ll - Dh! pas trop cher. C'est pour un etudiant. Sa famille 8 habite en province et il va etre seu!. 9 L2 - Ah, oui. Trois pieces, c' est bon? 10 Ll - Oui, mais avec salle de bain et w.e. 11 L2 - Ie peux vous Ie montrer demain. II y en a plusieurs 12 comme ya; avec ou sans chauffage? 13 L 1 - <;a depend du prix. 14 L2 - Deux cents francs a peu pres. 15 Ll - Merci beaucoup. A demain. 16 L2 - A demain. Ao mesmo tempo em que a aprendiz demonstra, em sua prodw;ao, urn indice elevado de conhecimento da cultura-,alvo, expresso atraves de "frames" culturais que fornecem as relcic;oes conceituais definidoras de parte da coerencia semantica do discurso - (Ie Quartier Latin / la province/ un trois pieces/ Ie chauffage) -, revel a igualmente certo grau de desconhecimento dessa mesma realidade cultural; sac exemplos 0 pre~o do apartamento (em torno de 5.000 francos, e nao 200) e ainda 0 fato de que nao ha tanta possibilidade de escolha, como a sugerida pela frase "11 y en a plusieurs comme ~a". Percebe-se, ainda, na sua produ~ao, a transferencia dos valores da sua cultura materna e, talvez, ate mesmo da sua situa~ao socioecon6mica. E quase impensavel, para os padroes da sociedade francesa, que urn unico estudante tenha sua disposi~ao e para seu uso pessoal e exclusivo urn apartamento com tres comodos, banheiro e mais lavabo. Esses principios nao seriam reveladores da pertenya a uma pequena camada da popula~ao brasileira, a chamada "c1asse media alta"? Numa intera~ao natural, 0 fato de nao haver "ruidos" na compreensao entre os falantes revela urn verdadeiro partilhamento tanto cognitivo, quanta sociocultural e interativo, tipico de quem pertence it mesma comunidade, 0 que nao e 0 caso dos encontros interculturais. No dialogo emquestao, entretanto, como se trata de uma intera~ao ficticia em que a aprendiz desempenha os papeis de ambos os falantes, essa ausencia" de ruidos parece decorrer sobretudo do fato de nao existir a figura do interlocutor. a Dutro fator importante para a compreensao e 0 estabelecimento da coerencia de urn texto, ligado ao conhecimento de mundo e aos conhecimentos partilhados, sac as inferencias. o universo pragmatico do discurso e urn campo aberto, dinamico e nao universal, podendo gerar conflitos, como por exemplo, as provocados pelas expressoes "pais sim" - "pais nao", cujo emprego e uso contradizem as formas linguisticas, ou ainda ascausadas pelo nosso "Apare~a!", que culturalmente funciona rnais como uma marca de polidez do que como urn verdadeiro convite. A inferencia conversacional faz parte integrante do proprio ate de conversar. Todo locutor indica, de modo direto ou implicito, a maneira pela qual urn enunciado deve ser interpretado e mostra, por suas respostas verbais ou nao-verbais, como ele interpreta 0 enunciado de urn locutor. E principalmente a natureza dessas respostas, e nao 0 sentido como tal ou 0 valor de verdade dos enunciados particulares, que orienta a avaliar;ao da intenr;ao. As interpretar;6es dos participantes, em determinada situar;ao, se exprimem, assim, sob forma de avaliar;6es da intenr;ao. Se bem que nao se enunciem com frequencia e de maneira explicita, todas essas interpretar;6es implicam urn saber sociocultural compartilhado e uma experiencia comunicativa partilhada. Nesta linha de raciocinio e na perspectiva desenvolvida neste trabalho, torna-se mais coerente trabalhar a inferencia como "a opera~ao que consiste em suprir conceitos e rela~8es razoaveis para preencher lacunas (vazios) e descontinuidades em um mundo textual" (Beaugrande & Dressler, 1981, apud Koch & Travaglia, 1990:70); trata-se, pois, de uma busca de continuidade para 0 sentido. Nesta perspectiva, tanto para Charolles (1988) quanta para Kerbrat-Orecchioni (1986: 169), 0 processo de interpretar;ao e reinterpretar;ao e comandado pelo principio da coerencia, que leva aquele que interpreta 0 texto a construir relar;6es que nao estao expressas nos dados do texto. No exemplo que segue, os falantes passam da convenr;ao lingUistica para a convenr;ao de uso cultural atraves do implicito, havendo, inclusive, a intenr;ao de duplicidade de sentidos. Percebese uma especie de estrategia de clecodificar;ao por parte dos interlocutores, os quais, a partir de\um dJculo estimativo das referencias supostamente comuns, estabe1ecem, de acordo com as indicar;6es dadas pela situar;ao, aquilo que pertence it experiencia partilhada: ha uma especie de calculo por antecipar;ao, uma adaptar;ao ao outro: 1 L1 - Bonjour,Madame,je voudrais louer un appartementpour 2 3 4 ma famille. L2 - Asseyez-vous. Combien de personnes vont l'habiter? L 1 - Mon ami, sept enfants, deux chiennes, trois chats et 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 mol. L2 - C'est une famille nombreuse! Ll - ... nous n'avons pas la "t616". L2 - Bien, pour votre famille il faut un appartement de quatre chambres. J'en ai un en banlieue. Ll - Mais je Ie prefere a Paris. L2 - Cet appartement est situe pres de Paris. Ii a un grand sejour, une salle it manger, une cuisine equipee, deux salles de bains, trois toilettes et quatre chambres. C' est au troisieme etage et l'arrondissement est agreable. Ll - Et Ie prix Madame, C'est agreable aussi? L2 - Bien, ya coGte huit mille francs par mois mais les charges sont comprises. Ll - Ie vais reflechir. Merci beaucoup. Com sua maneira de falar, a cliente (L 1) faz diretamente alusao a urn conjunto de tradiyoes e de associayoes especificas it cultura brasileira. Aparentemente, procura estabelecer uma certa cumplicidade com seu suposto interlocutor (L2), chamar sua atenyao, como se dissesse: "Se voce compreende 0 que quero dizer, deve partilhar minha cultura e, neste caso, entende pOl'que me comporto desta maneira". Seu interlocutor ficticio (L2) passa a jogar 0 jogo interativo proposto exatamente porque a propria aprendiz desempenha os dois papeis. Como visto anteriormente, a sintonia interativa requer urn certo grau de previsibilidade e de rotina, que se toma possivel quando os interlocutores pertencem a mesrna cultura e tern urna experiencia interativa semelhante. E exatamente pelo elevado grau de familiaridade ou intirnidade entre os interlocutores que esse diaIogo possui uma grande quantidade de informayoes culturais implicitadas (cf. Marcuschi, 1983,0 principio da parcirnonia). No texto da aprendiz nao faltou, inclusive, urn toque de humor tfpico da nossa cultura; ha uma duplicidade de sentidos que permeia toda a sua prodw;ao: ora Ll aparenta realmente tratar de negocios e assume 0 comportamento esperado e desejado, ora brinca com as palavras, com seu interlocutor, com a situa<;ao, ao fazer associa<;5es culturalmente estereotipadas: marido-crian<;as-cadelasgatos (apenas 0 papagaio nao e nomeado!), a enorme quantidade de filhos (7) devido ao fato de nao possuir urn aparelho de televisao. Este aspecto e curioso e merecedor de uma breve reflexao: as vezes, esquecemos que 0 humor nao tern formas de manifesta<;ao universal. Cad a povo, cad a grupo sociocultural tern caracterfsticas so suas e, como 0 humor depende da situa<;ao como urn todo, 0 seu conteudo difere de sociedade para sociedade e de urn perfodo historico para outro. A condi<;aobasica para a exisH~nciade humor e que aquele que 0 produz e seu(s) interlocutor( es) tenha(m) urn conhecimento de mundo partilhado; esta condi<;ao, porem, dificilmente e preenchida nos encontros interculturais e interetnicos. No ensino-aprendizagem de linguas estrangeiras, a estrategia da simulacao de intera<;ao espontanea e import ante e adequada, a fim de que os aprendizes cheguem a adquirir condi<;5es de diaJogo em situa<;5es reais. Ora, a analise desta produ<;ao chama claramente a aten<;ao para 0 fato de que, se a aprendiz foi bem sucedida na sua elabora<;ao, ela 0 foi exatamente porque nao se trata de uma interlocu<;ao real, mas sim de uma simula<;ao de interIocu<;ao, e que nestas condi<;5es nao haveria - como nao houve - interrup<;ao da interayao. Mas se aceitarmos 0 que parece ter sido a inten<;aoda aprendiz - uma interlocu<;ao intercultural real-, constataremos uma enorme inadequa<;ao cultural, pois os valores culturais e 0 tipo de humor expressos por Ll nao seriam absolutamente partilhados por urn interlocutor nativo. A proposito, em tres ocasi5es,este dialogo foi submetido informalmente it compreensao de nativos naofamiliarizados com a cultura brasileira, e a rea<;ao foi sempre a mesma, sobretudo a frase "nous n'avons pas la tele", que soa estranha, deslocada, pois 0 falante nativo consegue captar unicamente 0 seu sentido literal. E provavel que, se a aprendiz tivesse tido informa<;5es mais claras sobre 0 que significa comunicar intercultural mente, nao teria cometido esses equivocos, mesmo numa simulayao de interayao. Este tipo de "erro" ou de inadequayao cultural, porem, parece ser ainda mal percebido ou nao-merecedor de uma maior atenyao no ensino-aprendizagem de linguas. 4. A guisa de conclusao No seu conjunto, as produyoes analisadas, neste trabalho, apresentam urn nivel razoavel de adequayao sociolinguistica, demonstrado pelo uso da forma de tratamento, da modalizayao, de alguns atos indiretos etc. Nao e possivel, contudo, afirmar 0 mesmo a respeito do aspecto estritamente cultural da competencia comunicativa. Este e, na realidade, urn dos poucos pontos negativos observados, mas que nao deixa de ter sua importancia. Dois aspectos chamam mais a atenyao; 0 primeiro compreensivel e desculpavel, tern urn carater sobretudo informacional - vai do pouco-conhecimento ao desconhecimento total da cultura-alvo; 0 segundo diz respeito it transferencia da cultura materna para a lingua estrangeira. Nao seria exagero afirmar que, em particular no exemplo 2, a aprendiz se expressa numa especie de "frantugues" cultural, ou seja, ela se utiliza da lingua estrangeira apenas como urn instrumento para efetuar uma traduyao literal da sua cultura materna. Nao estaria nesse etnocentrismo cultural uma das razoes de queixas mutuas feitas com bastante frequencia, como, por exemplo: - Esses Francesesl Esses Brasileiros saD muito mal-educados! E cad a urn enumera os motivos para essa representayao: - "Eles" (os franceses) saD antipaticos, rispidos, frios, ... - "Eles" (os brasileiros) falam, riem muito alto, nao aprenderam a respeitar os outros, ... Na Pedagogia das Linguas, 0 conceito de competencia comunicativa de Dell Hymes aparece simplificado. Como consequencia, as abordagens de terceira gerayao concentram seu enfoque principalmente no conhecimento das regras de uso dos enunciados e na sua utilizayao em situayoes de comunicayao. Nao ha preocupayao com 0 reconhecimento do outro e, ademais, segundo Galisson (1980: 112), "transfere-se para 0 aprendiz, ou para 0 contexto sociocultural, ou ... para 0 acaso a preocupac;ao de complementar as lacunas do sistema de aprendizagem construido em tomo de uma noc;ao de competencia comunicativa empobrecida" . Poder-se-ia crer que os metod610gos nao deixaram de ter razao ao simplificar essa no~ao fundamental, visto que ela e, por natureza, urn modelo nativo, construido atraves do "infinitamente pequeno das relac;oes sociais" (Zarate, 1986: 12-23). Contudo, parece importante, para 0 desenvolvimento da Pedagogia das Linguas, que a competencia cultural seja realmente incluida numa competencia comunicativa, tal qual a definiu Hymes, para que nao se caia na tenta~ao de desenvolver uma outra competencia - cultural - distinta da competencia comunicativa. Dentro de uma abordagem comunicativa de linguas estrangeiras, nao seria chegado 0 momenta de se dar efetivamente aten~ao ao como tentar minimizar a cria~ao de estere6tipos, ou como relativiliza-Ios? A relevancia desse questionamento e demonstrada pelos trabalhos de 1. e 1. Gumperz (1982, 1989 ed. fr.), Deborah Tannen (1986), Zarate (1992, 1986), dentre outros. o mal-entendido cultural e urn tema pouco analisado dentro da Pedagogia das Linguas, mas sua importancia na comunica<;;ao nao po de ser subestimada. Ele pode se manifestar atraves da falta de aten<;;aoe do desconhecimento (confundir banheiro e cozinha com c6modos, ou 0 pre<;;odos alugueis em Paris). Em alguns casos, quando 0 mal-entendido e identificado pelos interlocutores, e possivel pedir desculpas, mas ele po de tambem se to mar urn verdadeiro "dialogo de surdos" e colocar em risco 0 sucesso da intera<;;aoou, ainda acarretar serios inconvenientes. E ut6pico pretender ensinar 0 conjunto das situa<;;oes geradoras de mal-entendidos culturais, e a criatividade dos aprendizes aqui demonstrada bem 0 comprova. "Mas e possivel fazer ver aos aprendizes que a passagem de um sistema cultural para outro pode ser, de certa maneira, assemelhada a uma operaC;Gode conversGo, e assim ensina-Ios a antecipar os riscos de mal-entendimentos" (Zarate, 1986: 129). E preciso igualmente fazer compreender que 0 erro cultural existe tanto quanta 0 erro gramatical e que ele pode acarretar san<;;oessociais mais, ou menos 115 graves. Conhecimentos, valores e crenyas estao profundamente envolvidos nos processos de produyao e compreensao dos discursos intra- e interculcultrais. Os conceitos de competencia cultural e intercultural possuem uma relevancia bem maior do que aquela que tradicionalmente as metodologias de linguas estrangeiras lhes tem reservado, sobretudo a abordagem comunicativa. BESSE, Henri & GALISSON, R. (1980), Polemique en didactique. 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Entre os modernos midia, destaca-se a publicidade como aquele que ajuda a imobilizar os c6digos sociais e contribui para instalar os individuos em seu exato lugar, dando contudo a impressao de dirigir-se a uma sociedade sem classes. Controle social de tipo novo, e a publicidade a arte de persuadir e incitar sobretudo pela linguagem. 0 discurso publicitario e 0 grande aliado desse instrumento da sociedade de consumo e atraves de seus estudos, podemos descobrir os caminhos de ac;ao da lingua na sociedade. o discurso propagandistico tern suas origens remotas no discurso religioso. A pr6pria palavra propaganda tern seu etimo em propagare (semear) no sentido de semear a fe entre pagaos (nao- iniciados). o discurso que se usava para tal fim, que fazia "propaganda" da fe religiosa (crista - cat6lica) era urn discurso que,apelando para 0 genero narrativo (parabolas) descritivo (descric;ao das penas do inferno ou da gl6ria do ceu) ou suas6rio (argumentac;ao convincente embora falaciosa) buscava convencer 0 ouvinte a adotar nova fe,prometendo "ceus e terras". Na organizac;ao destas mensagens, 0 vocabulario desempenhava urn papel muito importante: as palavras eram escolhidas de acordo com a intenc;ao do aut or, com 0 tema abordado e com 0 audit6rio a que era direcionado. Foi este tipo de discurso que deu origem ao atual discurso propagandistico ou publicitario. - Neste tipo de discurso, as mensagens nao seguem urn modelo universal,pois testemunham os imaginarios sociais e sac produtos do contexto cultural. - Ha uma subdivisao do discurso propagandistico em propaganda e publicidade. Enquanto a primeira pode referir-se a propaganda politica e comercial, a segunda, publicidade,remete apenas as mensagens comerciais. A delimitac;ao do corpus da pesquisa foi a seguinte: Mensagens publicitarias em revistas de circulac;ao geral (2 numeros). Revistas femininas (10 numeros) de circulac;ao nacional no ana de 1991-junho/dezembra. Estas mensagens tern a mulher como publico-alvo;por isso, foram escolhidos os campos semanticos de alimentac;ao, vestuario, cosmetica, todos em sentido amplo. Alem disso, "outdoors"surgidos no segundo semestre de 91, nas mas do Recife,versando sobre os referidos temas foram tambem incluidos. A seguir, para testar a tese de imbricac;ao lexico/cultura na publici dade, foi coletado urn corpus de cotejo no portugues europeu,na imprensa lisboeta, nos mesmos campos semanticos e nos mesmos tipos de publicac;ao do corpus do portugues do Brasil: revistas de interesse geral e para 0 publico feminino. Alem disso, alguns outdoors sobre os bancos fizeram parte da pesquisa realizado no trimestre setembr%utubro/novembra de 1991 em Lisboa. Para Charaudeau (1984: 101) 0 que marca a diferenc;a entre a propaganda politica e a comercial e que, enquanto a primeira se baseia em valores eticos,a segunda explora 0 universo dos desejos. Esta segunda e considerada pelo autor como a genera publicitario; faz parte do genero discursivo propagandistico (Charaudeau 1983: 118) Para ele sac caracteristicas linguisticas e situacionais 120 que constituem um genero discursivo. Assim uma publicidade comercial, uma dec1aravao politica ou uma oferta de emprego sac do genero dicursivo propagandistico. Mas, s6 0 primeiro pertence ao genero publicitario ou discurso publicitario. o discurso publicitario tem as caracteristicas especificas da sociedade na qual se insere e e 0 testemunho autorizado dos imaginarios sociais do contexto envolvente, revelando 0 funcionamento cultural. Isto, porque, segundo Charaudeau (83: 105) observar 0 aspecto linguistico da mensagem publicitaria e aceitar a hip6tese que todo ato de fala e um ato relacional onde 0 eu (emissor) que fala, coloca-se no mundo da significavao,em funvao do outro,o tu (receptor). Disto advem as caracteristicas manipulat6rias desde discurso. Nele, 0 emissor tem por objetivo fazer 0 receptor executar/ realizar um ate do qual ele (0 sujeito) sera 0 beneficiario: fazer comprar (finalidade ultima do genero publicitario). Como ele, emissor, nao tem autoridade para mandar, incita,criando uma insatisfavao sugerindo ao receptor 0 ato de comprar, porem de forma disfarvada como modo de eliminar esta insatisfavao: adquirir um produto para resolver um problema pessoal. Toda mensagem publicitaria fica no limite do engano:o que seria 0 objetivo do sujeito (emissor) e relegado na representa9ao linguistica ao pape1 de auxiliar do tu (receptor) na eliminavao da insatisfavao. o discurso publicitario nao e 0 texto, mas 0 conjunto de caracteriscas linguisticas que contribuem para construir este texto. Estas caracteristicas dependem da situa9ao na qual e ele produzido. o que sera estudado sera 0 produto, 0 texto publicitario, que tem como uma das caracteristicas basicas 0 lexico escolhido e suas funvoes. Os substantivos e adjetivos (categoria nome) tem um peso e uma presenva consideravel na estrutura do texto publicitario: nomeiam, qualificam, descrevem e sugerem. A fun9aO suas6ria do substantivo se da atraves da imposivao em primeiro lugar da presenva do objeto pelo generico e pe10particular: cadeiras Gerdau. A seguir, nomeiam aqueles a quem se destina 0 produto e descrevem as circunstancias it. sua volta. Os adjetivos de funv:lo 121 valorativa, alem da descric;ao, prestam-se a caracterizac;ao do substantivo expressando a suposta opiniao do emissor (que nao coincide com a fonte) sobre 0 produto. Os verbos tern func;ao eminentemente suasoria. Quando usados no imperativo equivalem sempre a "comprar:" - Venha e veja nosso sortimento - Nao gaste mais. Visite-nos; Use produtos x. Segundo Behar (1977:33) estes verbos significam sempre eompre. As palavras plenas sao, portanto,elementos basilares, na estruturac;ao do texto publicitario, sendo densas de significado e escolhidas com precisao,pe1a exiguidade de espac;o e condic;oes de brevidade do texto. A nomeac;ao leva a uma conexao como conceito de Perelman de presen.;a, considerada por este como a capacidade de manter vivos para a consciencia, certos elementos (objetos, pessoas, emoyoes, reais ou nao) mesmo que nao haja qualquer base calcada em demonstrac;oes formais ou provas. A presenya e plasmada pela nomeac;ao verbal, consciente e calculada. Chegamos entao aquilo que 0 texto publicitario tern como ponto de partida: a imposic;ao de urn nome. 0 texto publicitario e antes de tudo,um grande batisterio onae as mais dispares produc;oes, oriundas de inumeraveis paternidades, esperam obter 0 reconhecimento e a identidade. o nome (marca) nao e uma criayao aleatoria; 0 discurso ou mensagem baseado na marca ou "griffe" como e chamada atualmente e muito eficaz. A escolha do nome tern como finalidade pratica, tornar-se 0 suporte do objeto, dando-I he identidade psicologica e social para que os receptores memorizem. 0 exito supremo da imposiyao de urn nome e a conquista do publico receptor (por conseguinte, do mercado) excIusivamente peio nome ou marca, substantivo proprio, que a seguir metonimicamente, denominara 0 proprio objeto, tornando-se substantivo comum. Acima de tudo a marca dignifica e personaliza Quando, lamina e Gilette, esferografica e Bie e Bombril a, palha de avo, a especie investiu 0 genero e 0 nome foi consolidado na mem6ria do publico. Em fevereiro de 1992, a publicidade da geladeira Prod6scimo mostrou a importancia do nome. Em duas revistas de circulayao nacional (lsto e/ Senhor - 19/02/92) e (Veja 19/02/92) em tres paginas consecutivas,a mensagem dec1arava: M George Parker colocou 0 proprio nome em suas canetas - 0 comendador Enzo Ferrari colocou 0 proprio nome em seus carras. M William Boeing colocou 0 proprio nome em seus avioes. Para conc1uir (na publicidade da Prod6scimo) Quem tem orgulho e responde pelo que faz assina em baixo. as textos acima mostram que a funyao publicitaria primordial, tanto na cronologia de seus esforyos quanta na perenidade de seus resultados visa it imposiyao de urn nome. Em geral, a publicidade dos nomes pr6prios sempre foi mais satisfat6ria e eficaz que a publicidade dos nomes comuns,menos aparente que a primeira. E urn selo de propriedade que preside 0 momenta da troca. a texto publicitario e tambem quem preenche de significado o significante que nomeia 0 produto e contribui com isso,para 0 conhecimento dos objetos do cotidiano, sobretudo os introduzidos pelas novas tecnologias ou os que se constituem em novidades da industria. Nomeado 0 objeto, pelo substantivo pr6prio ou marca, resta imprimir-lhe urn carater, impor sua "imagem publica". Como etapa seguinte, situa-se a ligayao do nome pr6prio ao atributo, do sujeito ao predicado, do suporte do ser aoportador do valor. o carater ou caracteres do produto sac impostos recorrendose a trayos de virtu de (reconhecimento da qualidade) de forya (reconhecimento da autoridade )ou de singularidade, (reconhecimento da originalidade). Todos estes sac construidos por adjetivos ou substantivos abstratos, como apostos, adjuntos atributivos ou predicativos e os valores por eles atribuidos sac manipulados em funyao da visao de murido que se tern ou se deseja transmitir. Dando-Ihes personalidade e vida pelo nome pr6prio e carater pelos adjetivos e substantivos comuns, os produtos it nossa volta passam a fazer parte do universo cotidiano, com reconhecimento obtido atraves do discurso publicitario. Implicita ou explicitamente os JU1ZOS de proveniencia publicitaria sac incorporados pelo publico - receptor como informa'rao sobre 0 objeto. verbo completa 0 quadro linguistico incitando, seduzindo, ou ordenando (veladamente ou nao) a executar a a'rao tlnal de aquisi'rao do objeto. Segundo Gerard Lagneau, estudioso frances da linguagem verbal publicitaria, tres caminhos explicam 0 seu funcionamento. Todos os tres buscam ser cientificos,procurando as raz5es pelas quais a linguagem publicitaria extrai seu sucesso do jogo de palavras. Enfim buscam 0 porque da for<;:acomurucativa do discurso publicitario por tres vias: o - A via psicol6gica, reconhecida a partir de Freud,revela que a eficacia publicitaria do jogo de palavras resulta do fato de que esse jogo, para 0 receptor do anuncio, e propriamente erotico (no sentido psicanalitico do termo). Notava Freud (1969:222) que o ouvinte obtem com muito pouco gasto 0 prazer que Ihe proporciona a palavra. Ele recebe por assim dizer 0 dom gratuito. - A via antropol6gica parte da proclama<;:ao da irracionalidade do receptor. 0 jogo simbolico dos signos reaviva arquetipos coletivos ocultos mas fundamentais, de tal modo, que urn verboaparentemente insignificante condllza compra, escamoteando a barreira da consciencia. - A via soci6/ogica parte do fato que, nao se dirigindo a ningllem especialmente, da a cada llm a ilusao de que a mesma que Ihe e dirigida e fa-Io ter consciencia de membro de uma"polis". Na tipologia das mensagens publicitarias,duas se destacam, o anuncio e o"outdoor", selecionados para constituir ocorpus da pesquisa,por serem ambos, lugar onde a palavra escrita exerce funyao de importancia, direcionando 0 sentido da imagem. o "outdoor" e 0 anuncio, dois canais relevantes da comunicayao de massa, definem-se por sua fun'rao fulcra!: a vontade de transmitir. Embora inclllam a funs;ao ludica, nao sac sistemas gratuitos visando apenas· divertir como a historia em quadrinhos ou os 124 programas humoristicos. Buscam a eficacia e 0 rendimento. Sao meios que nao se interrogam sobre os tins pretendidos: numero de outdoors ou de anuncios x numero de pessoas convencidas e a medida de seu valor. o anuncio constitui 0 meio de publicidade por excelencia, estabe1ecendo uma ligac;aodireta entre a oferta e a procura. Segundo o canal (revista oujornal) a tecnica sera diferente, pois 0 papel da revista permite reproduc;oes e fotos superiores as do jornal. As revistas favorecem procedimentos graficos mais sutis e eficazes, como nuances de cor, tipos de letra e detalhes de foto. Alem do mais, 0 jornal tern urn publico mais generalizado, enquanto a revista dirige-se a urn publico-alvo diferenciado e especifico. Ja 0 outdoor e dirigido ao publico em aberto, sem possibilidade de formar segmentos determinados de receptores. o outdoor tornou-se elemento do mecanismo social integrando a paisagem no circuito s6cio-econ6rnico de venda,tomando-a como contexto,onde se informa sobre 0 produto e suas caracteristicas e ate os locais de comercializac;ao. Para Baudrillard (1968:229) a linguagem publicitaria e conotac;ao pura, sendo 0 discurso sempre aleg6rico. Na verdade,as palavras plenas ou lexemas, ampliam seu campo significativo, desenvolvendo ao lado do senti do literal, denotado,o sentido figurado ou conotado. Enquanto a denotac;ao transmite a informac;ao, a conotac;ao permite uma abertura em leque do significado. Pode ser privilegiado um ou outro aspecto da palavra;escolhendo-se 0 denotativo,a mensagem apoiar-se-a no referencial, dando enfase ao objeto, ao nome,ao anal6gico e it informac;ao. Escolhendo-se 0 conotativo, a mesma apoiar-se-a no implicativo, dando-se enfase ao carater, ao anag6gico, ao sintetico,a conivencia (mais do que a informac;ao) (Peninou-1972 :210). Passar do p610 denotativo de uma palavra para seu p610 conotativo, e pois passar de uma ret6rica 16gica,apoiadano referente,com argumentac;ao baseada no conjunto de provas intrinsecas ao objeto, para uma ret6rica implicativa, apoiada no receptor com argumenta<;ao baseada nos processos de persuasao, extrinsecos ao objeto. No primeiro caso, teriamos: "Omo lava mais branco" No segundo caso: "Usando Seiva de Alfazema voce tera todos os homens do mundo aos seus pes". Ainda quanta aos processos da denota<;ao e conota<;ao, na mensagem publicitilria, teriamos um terceiro tipo de exemplo: "A Ericsson fez um telefone com tudo em cima" Neste caso, como a conota<;ao da expressao esta bastante difundida e partilhada por uma comunidade, ha uma volta ao senti do literal denotado, resgatando a originalidade. o discurso dimens5es: publicitario funciona ideologicamente em tres 1) Na constru<;ao das rela<;5es entre 0 produtor/anunciante e0 publico. 2) Na constru<;ao da imagem do produto. 3) Na constru<;ao do consumidor como membro de uma comunidade. Esta ultima e a maior tarefa ideol6gica da publicidade. Mas, como a imagem do consumidor do produto contribui para posicionar 0 receptor como consumidor? A resposta que a posi<;ao e definida em termos de aceitar como natural 0 esquema ideol6gico necessario para entender e . interpretar a mensagem publicitaria. 0 receptor ideal (imaginado) pertence a uma comunidade cujos valores, necessidades e gostos esHio contidos neste esquema: uma comunidade de consumidores. A publicidade constr6i 0 tipo ideal do consumidor pela mudan<;a operada no cotidiano, e na visao de mundo, pelos modclos persistentes e coerentes de necessidades e comportamentos consumistas divulgados e baseados no senso comum. Fairclough considera a publicidade como um clcmcnto e "colonizador". 0 crescimento de volume dos anuncios nas ultimas tres decadas facilitou a penetra~ao da mensagem, inclusive modificando aspectos nao-economicos. A familia, como institui~ao, ea vida familiar cotidiana foram "colonizadas" pelo fator economico e pela for~a das classes dominantes. Esta "coloniza~ao" modificou-lhe a estrutura e a escala de valores. Baseado nestes pressupostos,a mulher teve construida sua imagem como receptoraJconsumidora, calcada nos papeis que, segundo 0 senso comum, ela desempenha na sociedade mulher, mae, dona de casa. No primeiro caso, ela e a mulher-sedu~ao que visa sempre,atraves de qualquer produto,conquistar 0 homem. Nos dois ultimos ela e a protetoraJprovedora que busca 0 melhor para os seus. Partindo desta constru~ao, funciona 0 discurso publicitario para 0 publico feminino. 0 lexico veiculador sera escolhido com: - Denota~oes dentro dos campos de significado que reforcem esta constru~ao. - Conota~oes que possam ser inferidas,ampliando e fortalecendo 0 esquema adotado. Reafirmando a proje~ao desta imagem feminina no universo da publicidade ocidental, Behar (1977: 16) considera: "Se pensarmos na dona de casa como receptor por excelencia da mensagem publicitaria, observaremos que a unica atividade que lhe e permitida e "ir fazer compras". Assim realizaria suas rela~oes intersubjectivas com a comunidade,porem no que concerne a sua esfera propriamente pessoal, s6 deve consumir ou pensar em consumir" . A mensagem publicitaria linguistica manifesla-se par atos fundamentais: nomear: conferir uma identidade atraves de um nome IreS qualificar: estabelecer uma personalidade atraves de atributos. exaltar: garantir uma promoc;ao atraves da ce1ebrac;ao do nome e seus atributos. Ao qualificar e exaltar, 0 emissor pode ou nao usar denotac;ao. Nomear, no entanto, requer 0 use obrigatorio da denotac;ao como forma de ancorar 0 texto a realidade de seu fim ultimo. Po de acontecer que 0 nome proprio (marca) traga sugestoes e ambiguidades como Sadia, L. S, Pinho sol, mas ele revel a a identidade do objeto com 0 sintagma nome comum + nome proprio. Ex: Meias Monizac - Malhas Tip-Top - Tecidos Ferreira Guimaraes. o verbo principal do texto convida it apropriayao atraves de uma ordem. Nem sempre, contudo, esta ordem est a em forma clara. Apublicidade de servic;o explicita esta ordem: Com pre no Bompreyo, De urn presente Shopping. A publicidade de produtos traz a ordem de forma velada. 0 verbo que nomeia a ayaode comprar e substituido por uma alusao: Pare. Olhe. Use. Triumph. Wellaton, ponha isso na sua cabeya. Ou a ordem esta ausente, ficando encoberta pela sugestao do trocadilho intencional: A mod a agora vai pegar no seu pe. Meias Monizac. A selec;ao e 0 recurso atraves do qual se estabelecem as oposiyoes, os jogos de palavras,as metaforas e os paralelismos ritmicos. Ha palavras que, colocadas estrategicamente no texto, trazem consigo uma poderosa carga de implicitos. A escolha de termos raramente se apresenta despida de carga argumentativa, sobretudo no discurso publicitario. A sinonimia, contudo so pode ser observada na situa<;ao de contexto no qual esta inserido 0 texto e 0 tipo de receptor a que se dirige. Outra forma de perceber a selec;ao vocabular nas mensagens publicitarias, seria atraves das substituiyoes eufemisticas. Eufemismo e 0 modo de disfaryar palavra ou expressao que parec;a desagradavel: homem de cor=negro. Ha casos de eufemismo 12R em que a forma atenuada expressa 0 contnirio que se objetiva (antifrase) . o eufemismo, pela frequencia de emprego, deixa de se-Io exatamente porque acaba por identificar-se semanticamente com o nome que procura disfaryar. 0 frances "solltien" foi um eufemismo para porta-seios. as eufemismos encontrados na pesquisa relacionam-se em primeiro lugar com 0 tabu de decencia (com sexo, atos fisiol6gicos e partes do corpo )mas tambem com 0 de delicadeza: idade, gordura, doenya. A antonimia e expressa por palavras, expressoes ou grupos de pala vras cujos sentidos saGopostos. Esta oposiyao pode reve1arse atraves de uma incompatibilidade total ou parcial de semas. Pode ainda ser binitria (vivo # morto); fazer parte de uma taxonomia (vermelho # preto, azul, amarelo); ser gradual (frio, morno, quente); ou apresentar a forma de pares conversos - comprar e vender,aluno e professor, marido e mulher, sacar e depositar. A mensagem publicititria recorre com frequencia a pares de antonimos para causar impacto e ressaltar ovalor do objeto. Mais saude, menos Cole sterol - Aveia Quaker. Ambiguidade e imprecisao na linguagem saG mais regra do que exceyao. Mas hit uma diferenya: quando algo e ambiguo hit dois ou mais modos possiveis de interpretayao. Quando algo e impreciso ou vago,o receptor naopensa em nenhuma interpretayao definitiva, mas pode ficar inseguro e confuso sobre 0 significado. A ambiguidade tambem, diferentemente da imprecisao, nao eacidental. Na maioria dos casos e result ado de um cuidadoso planejamento. Grande parte das anedotas ou situayoes comicas baseia-se na ambiguidade intencional. 0 mesmo se diga para a publicidade. Caminhando com a polissemia e a homonimia, os sentidos multiplos de uma mensagem e sua decodificayao adequada alcanyam a repetic;tio. A Repetic;tio de um termo distancia-se da parafrase porque enquanto esta desenvolve a mesma ideia com palavras diferentes, a repetiyao tece outros significados com 0 mesmo termo.Este tecer 129 novos significados pode acarretar uma ideia de intensifica~ao ou de acrescimo de novos semas ao lexema repetido. Muitas vezes a repetiyao e urn caso de homonimia como em: "A/godfzo Cedl'Obrim -Brim de todasas cores, Cedro Leve. Brim/eve de todas as cores", onde 0 segundo leve pode ser tornado nao como adjetivo (em oposiyao a pesado) mas como imperativo do verbo levar. A intensifica~ao linguistica e urn processo semantico manifesto por meio de adverbios, adjetivos e locuyoes adverbiais, como tambem pela gradayao de nomes e sua repetiyao. Este processo nao esta estudado de forma sistematica nas gramaticas tradicionais. Apesar disso, e largamente utilizado na lingua corrente, escrita ou falada, em especial em alguns tipos de discurso onde 0 juizo de valor se faz presente ou quando se quer influenciar oreceptor. Dentro deste tipo de discurso, que aciona a funyao conativa, esta a publicidade. Por conseguinte, este recurso sera amplamente empregado nas mensagens publicitarias. o uso de recursos estilisticos nas mensagens publicitarias - grosse modo - corresponde aos usos ret6ricos. Na primeira parte - figuras ret6ricas ou tropos - 0 estudo foi feito recorrendo-se ao esquema proposto por Catherine Kerbrak Orecchioni com a contribuir;ao de alguns elementos da teoria de Jean Dubois. Deu-se enfase a esse tipo de analise, pelo interesse especial que desperta em relayao ao uso e escolha de itens lexicais. o modelo te6rico da Ret6rica Geral, de Dubois, baseia-se na ret6rica classica embora apresente uma esquematiza~ao inovadora em relayao aos estudos anteriores, com a introdw;ao da nOyao de metaboles. Orecchioni avanr;a com seu estudo, porque ja inclui elementos da Pragmiltica, reformulando a teoria dos Tropos, com a introdu~ao dos tropos comunicacionais ao lado dos literarios. A segunda parte, frases feitas e cliches, trouxe a contribuiyao te6rica de Riffaterre (1973) Maingueneau (1984) Behar( 1973) e Grunig 1990). 130 Concluindo a analise, constatou-se que a publicidade utiliza as figuras de retorica classica, em especial a hiperbole, a metafora, a metonimia,como tambem os tropos nao-classicos com 0 uso da pressuposiyao, do implicito e do dialogo forjado, quando o tropocomunicacional e acionado. As figuras de retorica ou tropos sac coopt ados pela publicidade como forma deargumentayao suasoria,embora sua funyao sejamais apologetica do que polemica. As formulas fixas da lingua como citayoes,cliches e frases feitas sac elementos considerados abominaveis na literatura, condenados pelos teoricos da Estilistica.Michael Riffaterre (1973), contudo,afirma que os mesmos podem se tomar elementos de valorizayao de urn texto, despertando a adesao do leitor atraves de algo ja conhecido, que estimula a memoria. A alusao ou citayao ultrapassa estes limites. Reserva ao leitor a satisfac;ao de urn conhecimento partilhado de algo que se torna comum entre este e o autor. Cria urn especie de c~mplicidade entre ambos. Nem sempre 0 seu uso e literal: a introduyao de urn elemento npvo cria urn jogo de palavras tornando a frase contrafeita ou a citayao modificada, urn modo de desmontar estereotipos. Na integra ou modificados, estesjogos de palavras facilitam a comunicayao, estabelecendo uma certa familiaridade com 0 leitor e por isto tern seu uso difundido na linguagem dos "mass media", sobretudo no jornalismo e na publicidade. As palavras como lugares de observayao de fatos culturais levam ao estudo simultaneo da lingua e da cultura. A cOl11petencia cOl11unicativa inc1ui a cOl11petencia cultural que e a capacidade de perceber os sistemas de classificayao que funcionam numa comunidade e a capacidade daqueles nela inseridos,compreenderem e anteciparem condutas convenientes para manter a comunicayao no nivel desejado. o texto publicitario, qualquer que seja a mensagem que traz 111 explicita,e 0 testemunho de uma sociedade de consumo e conduz a uma representa~ao da cultura a que pertence, permitindo estabelecer rela~ao pessoal com a realidade particular. Ele tern como mensagem primeira e explicita 0 consumo de urn produto, pondo porem em destaque determinado aspecto de uma cultura, tal como urn projetor poderoso, criando contudo em torno de si, algumas zonas de sombra. A publicidade usa conota~5es culturais, iconicas e linguisticas, sobretudo aquelas que veiculam estere6tipos, mais facilmente codifictlveis e compreensiveis. Diz Baudrillard (1988: 230) que a publicidade institui uma nova linguagem porque as variantes combinat6rias recortam as significa~5es, instauram urn repert6rio e criam urn lexico onde podem inscrever as modalidades recorrentes da palavra. Para provar a hip6tese levantada - diferen~as interculturais no lexico de mensagens publicitarias em uma lingua comum, a pesquisa tomou corpus de cotejo as publicidades veiculadas pela imprensa lisboeta e em menor escala,nos outdoors, estudando as no seu aspecto lexical: palavras novas - neologismos - e variantes lexicais. A fundamenta~ao te6rica para a analise linguistica partiu da defini~ao de cultura - campo bastante rninado e dificilde ser limitado - para 0 aspecto linguistico, privilegiando 0 dominio do lexico. Estes aspectos, cultura e lexico, foram os que levaram ao estudo da publicidade onde se situou 0 corpus. as aspectos escolhidos para a analise do corpus lexical da publicidade portuguesa foram as variantes lexicais e os neologismos. Sao as variantes lexicais,os exemplos tipicos dos efeitos provocados pela sociedade na lingua. No seu estudo sobre 0 vocabulario do Portugues Fundamental, sac listadas 2.217 palavras escolhidas por criterio de frequencia no Portugues Europeu. Muitas das palavras brasileiras mais usuais nao fazem parte do vocabulario do PF, 0 que leva a crer que as diferenc;as maiores se dao a nive1 do falar cotidiano. la os neologismos que surgiram no corpus foram, na sua maioria, resultantes da banaliza~ao au vulgariza~ao cientifica. A primeira sup5e a expansao do dominio de emprego de urn termo com com ou sem modifica9ao da realidade referencial. A segunda consiste no emprestimo de urn termo cientifico it lingua corrente. o paradoxa da propaganda (e nao apenas da publicidade) e que, sem outro objetivo que 0 de fazer agir, ela atinge seus fins, utilizando 0 que a linguagem tern de mais gratuito e gratificante: o jogo, a imagina9ao, a poesia. A fun9ao poetica fixa a aten9ao na forma da mensagem, desviando-a do que e dito. A fun9ao da publicidade e 0 oposto. Se nos fixarmos na forma, nao compraremos 0 produto. Dai ser ela urn achado verb ai,mas nao uma poesia, achado verbal que consiste em usar algo de extraordinario para falar de coisas banais. A cria9ao,em vez de serum ate livre,e urn "auxiliar de vendas" onde 0 artista tern consciencia de sua sujei9ao it sociedade de consumo. o estudo da linguagem publicitaria mostra-se revelador de val ores e atitudes culturais e modos de expressao da epoca; cria condi90es de aprender a reconhecer falacias e sofismas em propagandas que usam 0 "doublespeak", que falseiam fatos e falsificam argumentos. Favorece tamhem condi90es de reconhecer a riqueza de recursos da lingua, usadas nas mensagens: eufemismos, redundancias, hiperboles, polissemias. Os consumidores "processam" 0 acervo e 0 manejo da lingua, o que os toma aptos a tomar decisoes,sem se deixar envolver em jogos publicitarios; exercitam a capacidade de pensar sobre 0 concreto, junto com 0 aprendizado das formas de verbaliza9ao. Se a pesquisa teve como corpus a mensagem publicitaria escrita, seu interesse central,foi no entanto, a Lingua Portuguesa nos seus usos da atualidade, foram os processos lexicais de uma lingua que muda e se adapta para acompanhar a pressa e a novidade que caracterizam a era da informa9ao. A analise nao foi exaustiva. Escolhemos 0 que foi julgado mais importante, qualitativa e quantitativamente. ALGEO, John. 1989. Britsh/American: lexical differences in English Across Cultures/Cultures across English Communicacion. Mouton de Gruyter, New York. Edited by Ofelia Garcia and Ricardo Otheguy BAUDRILLARD,Jean.1968.Les Gallimard. systeme des objects. Paris. BEHAR, Lisa Block. 1977. Ellenguaje de lapublicidad. Madrid. 3a. ed. Siglo XXI. CHARAUDEAU, Hachette. Patrick. 1983. Langage et discours.Paris. GALISSON,R. 1987. AccedeI' a la culture partagee in Etudes de linguistique Appliquee NO.67. Paris. Didier Erudition. pp.119-127. GRUNIG, Blanche. 1990. Les mots de la publicite: du slogan. Paris. Presses du CNRS. I 'architeture VESTEGAARD, T. e SCHRODER, K. 1988. A Linguagem da Propaganda. Trad. Joao Alves dos Santos. Sao Paulo. Martins Fontes. ZARATE, Genevieve. 1986. Enseigner Paris. Hachette. une Culture Etrangere. A RELACAO FALANTE/TEXTO NA EXPLICACAO ACADEMICA DE UNIVERSITARIOS •. A situayao de fala instrucional denominada exposh;Jo em sala de aula representa urn tipo de evento comunicativo que, dada a sua freqi.it~nciano ensino universitario, tem-se tornado umaforma padrao de reproduyao do conhecimento produzido pelos membros da comunidade cientifica(professores pesquisadores, quando se trata da exposiyao de textos extraidos de publicay5es especializadas como as dissertay5es e teses publicadas em forma de livros, ou de artigos publicados em revistas de divulgayao cientifica; e autores de manuais academicos, quando se trata da exposiyao de textos extraidos de obras que reunem, de forma mais didatica, urn conjunto de conhecimentos de uma area especifica) para a comunidade uruversitaria dos cursos de graduayao - alunos e professores. Ambos os tipos de publicay5es, pressupondo urn receptor, constituido pela figura do aluno universitario, como possuidor de conhecimento previo no assunto objeto da discussao, permitem a leitura com menor ou nenhuma intervenyao do professor. Esse fato explica a instituiyao da exposiyao em sala de aula como uma tarefa escolar a ser cumprida pelo aluno de terceiro grau, numa situayao de dimensao explicativa, cujo objetivo institucional e proporcionar a compreensao de urn t6pico academico a uma audiencia constituida pelo professor e demais alunos da classe. o presente estudo se situa, portanto, no ambito da interayao face-a-face em contexto instrucional de nivel universitario. A motivayao para a sua realizayao, em primeiro lugar, e de carater te6rico e esta relacionada com a atual tendencia dos estudos lingiiisticos no Brasil, que vem adotando uma visao sistemica e ---- * Texto apresentado em forma de comulliclll,:UO orlll, par ocasi1io cia 45" RClIl1i1io Anual da SBPC, realizada no Recife, no periodo de 11 a 16 de jlliho de 1993. funcional, a fim de dar conta de fatos linguisticos e interacionais, responsaveis pela forma~ao de estilos do falante manifestados em rela~ao a oralidade. Em segundo lugar, a fala academica constitui uma import ante institui~ao da sociedade, dada a sua fun~ao de veiculadora do conhecimento cientifico na forma~ao de profissionais de nivel superior. Dai a nossa cren~a de que esfor~os para entender as condi~oes de produ~ao da intera~ao na sala de aula de nivel universitario podem vir a contribuir para 0 entendimento dos processos de constru~ao do texto falado de carater instrucional ou academico. Nesta perspectiva, este artigo pretende discutir: a) as formas de rela~ao do falante-expositor com 0 texto produzido em situa~oes de dimensao explicativa, desenvolvidas na exposi~ao em sala de aula; b) as implica~oes do estilo de exposi~ao adotado para a oralidade academica. Os dados provem de urn evento tipo exposi~ao em sala de aula, com a dura~ao de 43 minutos, realizado por urn grupo de quatro alunas do curso de Pedagogia da UFPb/Campina Grande. o t6pico academico previamente determinado, com uma referencia bibliografica, pelo professor da disciplina Sociologia da Educayao, foi rendimento escolar e condi90es sociais Os resultados apresentados neste trabalho constituem as primeiras analises realizadas sobre os processos de formula~ao textual utilizados na explica~ao de textos por universitarios, numa perspectiva em que se contrapoem duas situayoes de fala em contexto de discussao academica - a discussao preparat6ria entre alunos e a exposiyao em sala de aula. 1. Estilos de exposi.;ao e sua rela.;ao com 0 continuo oralidade/ escrita A interayao em contextos institucionais tern despertado a atenyao da etnometodologia e da sociolinguistica interacional por apresentar caracteristicas organizacionais diversas daquelas encontradas na conversayao cotidiana. Autores como Goffman(1983), Tannen(1988) e mais recentemente Pereira(1993), tratando de pronunciamentos em publico, estudaram, entre outros aspectos, as condiyoes de produ~ao do genero institucional, 136 focalizando os travos de escrita e oralidade. Pode-se afirmar que a situavao de exposivao em sala de aula caracteriza urn contexto de oralidade, uma vez que 0 alunoexpositor fala para uma audiencia constituida pelo professor e pelos demais colegas de curso. Essa oralidade, no entanto, envolve influencias da escrita absorvidas pelo aluno atraves das atividades de leitura e resumo ou roteiro de apresentavao, a partir do textobase, indicado pelo professor. Essas condivoes de produvao conferem ao texto produzido pelo expositor travos que estao associados as atividades de leitura, por urn lado, e as atividades de fala espontanea, por outro(Tannen, 1988). No primeiro caso, 0 falante-expositor tende a situar-se no extremo do continuo oraVescrito, reproduzindo verbalmente b texto escrito, com formulavoes que permitem 0 fluir da informavao sem descontinuidade na superficie textual, dada a ausencia quase absoluta de hesitavoes, pausas ou rupturas, garantindo densidade informacional ao texto produzido. No segundo caso, 0 falanteexpositor, veiculando a impressao de formulavao pessoal, tende a situar-se em varios pontos do continuo, que VaG desde a fala relativamente planejada, com influencias marcantes da escrita, ate a fala marcada pela presenva acentuada dos mecanismos conversacionais. Assim, 0 que aqui estamos denominando de fala marcada pela formulavao pessoal apresenta diferentes graus de planejamento, por resultar das atividades de elaboravao de esbovos ou not as, que reproduzem, de forma mais ou menos aproximada, atraves da memorizavao, 0 texto original, e da atividade de improvisavao, manifestada nos comentarios considerados de carater ilustrativo. Este estudo esta centrado no segundo tipo de fala, ou seja, aquela em que 0 falante-expositor veicula a impressao de formulavao pessoal em seqilencias explicativas, numa tentativa de assumir a condi9ao de autor (Goff man, 1983b;Tannen, 1988). Esse tipo de situavao mostra, de forma mais evidente, a naturalidade da fala produzida durante a exposi9ao, permitindo ao analista uma caracterizacao mais precisa does) registro(s) presentees) na oralidade desse mesmo falante. Marcuschi (1992a) acentua que a oralidade deve ser vista como uma modalidade do uso do sistema lingilistico, evidenciada na cristalizayao de formas mais ou menos estereotipadas que dao origem a tipos textuais especificos. Esses tipos, por sua vez, exibem diferenyas sensiveis que os situam na faixa do continuo falaJescrita. Tais diferenyas podem ser de natureza essencialmente lingilistica ou de processamento, em funyao do tempo, das condiyoes e dos meios de produyao, alem das diferenyas especificas do tipo realizado. Essa forma de conceber a oralidade explica a posiyao defendida por esse autor, em outro artigo (Marcuschi,1988:42), onde lembra que 0 dominio da modalidade oral da lingua nilo significa 0 dominio de todos os tipos de textos orais, uma vez que as inumeras e diferenciadas situayoes comunicativas enfrentadas pelos falantes exigirao deles aptidoes especificas de acordo com a natureza do evento e 0 tipo de texto. Isso quer dizer que no interior da pr6pria oralidade as diferenc;as se acentuam num continuo tipol6gico. Essa visao te6rica, que se propoe tratar as diferenyas entre fala e escrita como diferenyas re1ativasaos tipos textuais especificos de cada uma dessas modalidades de uso da lingua, traz como conseqilencia uma metodologia de analise da relayao falaJescrita, a partir das categorias especificas de cada modalidade. Para isso, o analista deve levar em considerayao a estreita relayao existente entre 0 carater tipol6gico e 0 contexto de uso, com a observayao da adequayao do tipo textual it situayao especifica de fala analisada. A hip6tese que orienta esse procedimento metodol6gico e a de que dominamos uma tipologia de textos intuitiva e adequada as situayoes dentro de urn continuo linguistico(BlancheBenveniste, 1989; Marcuschi,1992a). Essa tipologia representa graus diferentes de formalidade, compreendendo desde 0 registro informal, tipico da conversayao espontanea, ate 0 registro formal, presente na exposiyao academica, de carater institucional. Outra quesHio considerada relevante para a analise do desempenho oral, nos dados coletados, e a questao da sobreposiyao de oralidade e escrita, estudada a partir da nOyao de foco relativo ao envolvimento (Tannen, 1985; Chafe & Danielewicz, 1987). Chafe 138 (1982; 1985), ao tratar das diferenyas linguistico-interacionais entre fala e escrita, define 0 envolvimento como urn estado psicol6gico interno ao falante, manifestado em fenomenos linguisticos observaveis, e que ocorre em relayao tres instancias do processo interativo - 0 falante, 0 ouvinte e 0 assunto. Cada uma dessas formas de envolvimento imprime uma orientayao diferente ao texto produzido. Retomando 0 trabalho de Chafe, Tannen(1989) sistematizou o emprego da expressao estrategias de envolvimento, descrevendoas como formas sistematicas de uso da linguagem, que favorecem uma experiencia emocional de compreensao do texto e de ligayao do falante com o(s) interlocutor(es), com a linguagem e com 0 mundo. Tais estrategias caracterizam assim uma forma peculiar de organizayao da fala, nas narrativas conversacionais, atraves de procedimentos expressivos como a repetiyao de palavras e frases, a citayao de falas e as imagens ret6ricas. Em estudo anterior(Tannen, 1985), a autora salientou 0 papel de tais estrategias utilizadas na conversayao, durante a atividade de narrar, como elemento definidor de urn foco centrado no envolvimento interpessoal, marcado por trayos paralinguisticos exagerados, como mudanyas bruscas de velocidade e altura da fala, result an do em urn texto com teor de dramaticidade superior ao teor de informayao relatada. 0 usa desse foco, com frequencia, caracterizaria, segundo a autora, 0 desempenho do falante como ligado a aspectos culturai~ da tradiyao oral, em oposiyao ao foco centrado no conteudo ou informayao como caracterizador de urn desempenho linguistico influenciado pela tradiyao escrita. o pressuposto de que a fala academica subjazem as influencias da cultura da escrita aponta para a manutenyao do foco centrado no conteudo como urn trayo superficial saliente desse tipo defala, o que a define como representativa da oralidade letrada. Estudos mais recentes desenvolvidos em contextos instrucionais (Kleiman, 1991; 1993; Bortoni eLopes, 1991), orientados por essa hip6tese da influencia da escrita sobre a oralidade, tern mostrado a dificuldade que alunos e professores experienciam para serem ratitlcados como falantes primarios dentro da situayao de sala de aula. Uma das dificuldades mais salientes apontada por esses estudos e a manutenyao do foco no conteudo as 139 ou informac;ao por parte dos falantes, que orient am sua fala para o contexto interacional imediato, organizando uma taret~l concreta em func;ao dos elementos superficiais, sem a utilizac;ao da abstrac;ao do contexto (Kleiman, 1993). Essa hip6tese da reversibilidade da escrita sobrea Hl1aparece constituir uma fonte de explicac;ao para os procedimentos utilizados pe10s informantes na exposic;ao academica, onde a citac;ao de falas se sobressai como uma estrategia de envolvimento que permite, com bastante frequencia, a mudanc;a de orientac;ao do carater monol6gico da exposic;ao centrad a no assunto, para uma orientac;ao de carMer dial6gico, centrada no interlocutor. 0 que corresponde, via de regra, mudanc;a de um estilo formal, de natureza academica, inf1uenciado pela tradic;ao escrita, para urn estilo informal, com tendencia a situar-se no extremo do continuo tipol6gico da oralidade - a conversac;ao. a Considerando que a situac;ao de exposic;ao em sala de aula tern uma dimensao explicativa, julgamos necessaria uma detinic;ao das atividades de explicac;ao que podem estar presentes nesse tipo de evento de natureza academica. Para isso, recorremos a uma linha de ref1exao, aqui representada especificamente pelos estudos de Borel (1981 a; 1981 b), MiEwille (1981), e, mais recentemente, pelos trabalhos de Signorini (1991; 1992), que tratam as atividades discursivas de explicar a partir de duas dimens5es da significac;ao: a dimensao cognitiva e a dimensao interacional. A primeira situa-se no eixo da racionalidade( explicac;ao de) e compreende atividades como explicitar, no senti do de desenvolver e de interpretar, e explicar no sentido restrito de restituir as raz5es de ser, as causas. As atividades desse grupo podem ser descritas pelos seguintes esquemas: X explica Y e X se explica. Nesse tipo de atividade, sac apagadas as referencias ao ate da enunciac;ao e 0 discurso produzido e considerado como "universalmente verdadeiro, objetivo, necessario, independentes da instancia que 0 formulou"(Signorini, 1991: 134). A dimensao interacional situa-se no eixo da comu- nicavao( explicavao para) e esta realvada em atividades como comunicar, ensinar e justificar. As atividades explicativas dessa dimensao podem ser descritas pelo esquema L 1 explica Y a L2( 0 locutor 1 explica isto ao locutor 2). Ou seja, a novao de explicavao esta vinculada it de fazer saber 0 que ja e, e as atividades discursivas estao centradas no modo de "comunicar/ensinar a alguem 0 que e, para que serve, como se usa, etc, e justificar para alguem porque fazer" (Signorini,idem:ibidem ). Segundo os autores, essas duas dimens5es da explicavao funcionam como duas tendencias que se alternam, muitas vezes, ao longo de urn mesmo evento. Desse modo, para que urn discurso produzido com 0 objetivo de comunicar/ensinar a alguem alguma coisa seja uma explicavao, necessario que a dimensao cognitiva nao seja eliminada. Nesse sentido, 0 discurso assume urn cunho essencialmente informativo, diz respeito mais a urn objeto de conhecimento do que a urn objeto de avao e se contrap5e aos discursos voltados para a avaliavao, 0 juizo e a deliberac;:ao. Essas duas perspectivas da explicavao foram descritas por Mieville (1981), em contexto de ensino da matemMica. Neste tipo de contexto, 0 autor descreve a dimensao cognitiva ou ideacional da explicavao como a de urn discurso que e a representavao de urn saber, faz-se reconhecer como tal. Esta relacionada com a atividade explicativa em que nao hit uma modificavao do saber de quem explica ou reconhece 0 carMer explicativo do que est a sendo dito. Hi a dimensao interacional da explicavao e caracterizada como a de urn percurso de apropriavao ou de acesso possivel ao saber. Esta relacionada com a atividade de compreensao e de organizavao progressiva de construvao desse mesmo saber, em que hit uma transformavao, por assimilavao de raz5es e argumentos por parte daquele a quem se explica. Nesse senti do, apenasdo ponto de vista da segunda dimensao po de haver a descoberta do novo, ou a revelavao do desconhecido, a partir de uma explicayao. Do exposto acima, pode-se afirmar que a explicayao ocupa urn lugar relevante, enquanto exemplo de oralidade influenciada pela escrita, pois a enfase da atividade explicativa de carMer academico esta essencialmente voltada para 0 conteudo ou referente, que e nao apenas 0 objeto do discurso, mas tambem 0 objeto abstrato do conhecimento a ser transformado atraves de e formulac;oes, que devem ser marcadas pelo apagamento das relac;oes entre os participantes e 0 conseqilente centramento no conteudo da explicac;ao. Quanto as operac;oes de formulac;ao constitutivas do processo global de explicac;ao do discurso te6rico, de cunho cientifico, e do discurso didatico de divulgac;ao cientifica, Borel (1981 a e 1981 b) descreve tres etapas ordenadas: a) formulac;ao do problema: introduc;ao do objeto da explicac;ao sob a forma de uma classe-objeto. No caso da compreensao de textos, oobjeto da explicac;ao constituido pela leitura do texto, que fornece 0 contexto imediato para a problematizac;ao; b) selec;ao de urn aspecto do objeto da explicac;ao a partir do qual se desenvolverao as atividades explicativas, tendo em vista as necessidades e expectativas dos interlocutores. Esta selec;ao do aspecto do objeto esta condicionada ao horizonte de conhecimento do falante; c) desenvolvimento das atividades explicativas em func;ao do aspecto selecionado, 0 que feito com base no ca1culo do conhecimento do interlocutor, fator de escolha dos tipos de atividade explicativa a serem utilizados. A etapa c constitui 0 aspecto ret6rico da explicac;ao. Acentua Mieville( op.cit: 134) que essas atividades revelam os tipos de raciocinio natural do falante, seu modo de organizac;ao do pensamento discursivo. Representam 0 nivel discursivo tipico da dimensao interacional da explicac;ao e podem apresentar-se sob divers as formas como: uma descric;ao, uma demonstrac;ao, uma verificac;ao, uma justificac;ao, uma argumentac;ao, uma exemplificac;ao, uma analogia, entre outras. Ainda sob 0 aspecto ret6rico, lembra Borel(l981 a)que a explicac;ao esta vinculada a argumentac;ao de duas formas: a) a explicac;ao como urn meio para se atingir um fim num contexto que nao em si explicativo. Nesse caso, ela nada mais do que um componente do discurso, e pode contribuir para acarretar uma decisao, sustentar uma posiyao, Ou servir de base a uma avaliayao. b) a explicac;ao como urn fim em si mesmo. Nesse caso, ela constitui urn genero especifico e a sua identificac;ao se opera em e e e e diversos niveis: 0 da autoridade, 0 do saber do locutor, 0 da intenyao de neutralidade e objetividade, 0 da existencia do objeto a ser explicado, bem como 0 da presen9a no texto deformas lingiiisticas e metalingiiisticas que imprimem uma retorica especifica. Acentua ainda a autora que, para que a intenyao comunicativa da explicayao seja bem sucedida, ela nao deve estar presa a urn outro tipo de discurso. A situayao de fala explicativa aqui estudada parece enquadrarse no segundo tipo descrito por Borel, ou seja, a explicayao tern urn fim em si mesma, uma vez que 0 falante-expositor, num contexto de tarefa academica, tern como objetivo central 0 repasse das informayoes lidas. 4. Algumas evidencias da mudan~a de estilo na explica~ao academica: 0 caso da cita~ao de falas o ato de citar falas durante a interayao verbal e COllum e natural e tern a narrativa como contexto discursivo mais favonlvel ao seu surgimento, conforme demonstrado em Tannen(l989). Pode manifestar-se sob a forma de auto-citayao e hetero-citayao, dependendo da relayao verificada entre a fonte e a reproduyao da fala. Chafe(l985), ao tratar do estilo conversacional, descreve a citayao de falas como uma das evidencias linguisticas do envolvimento do falante com 0 assunto tratado, traduzindo 0 comprometimento pessoal com 0 que esta sendo dito. Apoiando-se na perspectiva bakhtiniana de que toda conversayao esta repleta de transmissoes e interpretac;oes das palavras de outras pessoas, Tannen(1989) considera 0 ate de transformar as palavras dos outros no proprio discurso como urn ate de animizac;ao e criac;ao, e critica a denominac;ao de "discurso ou citayao direta". Para a aut ora, a citac;ao de falas constitui uma estrategia de envolvimento que funciona como reforc;o de autenticidade e permite 0 enquadramento de informac;ao atraves da atribuic;ao de ideias em forma de fala ou pensamento, constituindo import ante fonte de emoc;ao no discurso. o carater de ficcionalidade da citac;ao de falas, durante a conversac;ao, foi demonstrado pela aut ora, ao mencionar os tipos de fala citada: fala sumarizadora, fala como discurso interior, fala 143 com referentes vazios, fala de seres nao-humanos. Esse trayo marca a espontaneidade do estilo conversacional, em oposiyao ao carater real da citayao utilizada no estilo formal da exposiyao academica, situayao em que 0 falante esta obrigado a mencionar 0 autor, a obra com 0 ana de sua publicayao e, as vezes, a pagina de onde foi extraida a citayao. Em recente estudo, Marcuschi( 1992b), analisando 0 comportamento linguistico da citayao de falas, defende a hip6tese de que este fenomeno e responsavel pela mudanya de estilo no texto, na medida em que se operam aiterayoes de urn novo estilo, tais como a pros6dia, a organizayao sintcitica, as opyoes lexicais. Nesta seyao, procuraremos descrever algumas situayoes de dimensao explicativa em que a citayao de falas se apresenta como urn procedimento utilizado pelo falante-expositor que aproxima 0 estilo formal da exposiyao em sala de aula do estilo informal da conversa. Defendemos a ideia de que 0 uso da citayao de falas nos materiais analisados representa uma estrategia utilizada pelos informantes para resolver as dificuldades de relacionar-se com 0 padrao assertivo, monol6gico, de influencia letrada, que caracteriza a exposiyao academica. 0 grau de escolarizayao avanyado dos informantes aqui referidos e a situayao de fala exposiyao em sala de aula como urn contexto que leva 0 falante ao exercicio de busca da forma mais adequada de expressar a informayao previamente planejada sac fatores que nos levam a esperar a utilizayao de uma oralidade de carat~r monol6gico centrada no conteudo. Ha evidencias, no entanto, a partir da audio gravayao realizada, de que a fala utilizada pelos informantes, na exposiyao, nao corresponde ao modelo letrado de oralidade visado pela instituiyao universitaria. Os dados aqui apresentados revel am a preferencia acentuada dos informantes pelo foco centrado no envolvimento interpessoal, manifestado aqui no elevado uso da citayao de falas, trayo saliente da tradiyao oral, marcada pelo estilo conversacionai. Com 0 objetivo de demonstrar essa dificuldade dos informantes em manter 0 estilo formal academico, observou-se a classificayao da citayao de falas em dois grupos, segundo a forma discursiva da fala citada - a citayao de falas como dialogo entre personagens e a citayao de falas como discurso interior. Essas duas formas de citayao foram analisadas 4.1. A mudan~a de estilo atraves da cita~ao de falas como dialogo entre personagens: a encena~ao em sequencias narrativas de caniter ilustrativo. A mudan~a de estilo atraves da cita~ao de falas como diaIogo entre personagens esta associada a contextos narrativos constituidos de fatos da experiencia pessoal dos informantes, com a fun~ao de ilustrar conceitos ou, afirma~5es de natureza teorica apresentados no texto-base. Esse tipo de sequencia de caniter bastante interativo, indica, na exposi~ao em sala de aula, a mudan~a de orienta~ao do falante em rela~ao ao interlocutor, instaurando a narrativa conversacional, que consiste na encena~ao de determinadas-partes de urn episodio ou de urn episodio inteiro. A narra~ao de eventos ou episodios evocados pelo topico, em nossos dados, parece estar associada it estrategia da diversificac;eto epis6dica (Kleiman, 1991: 14), ja referida por Cazden (1989), como urn fenomeno tipico da tradi~ao oral. Nota-se, no evento observado, uma tendencia dos participantes do gropo expositor a utilizar 0 topico apenas como elemento detonador para inser~ao de casos pessoais por ele evocados. Uma evidencia dessa tendencia se encontra na sequencia( I): (I)A3 493 essas crian~as sac eh exclusivos ne ... existem tambem 494 departamentos proprio para salas especiais A2 495 neto J ta pedino pra eu cita um exemplo aqui ...meu 496 mi... particulit ... quando eufui na escola...((rindo))isso e 497 6timo()quando eufui pra escola ... quando eu cheguei 498 de cara na escola assim ... a diretora da escola disse ... 499 pra mainha disse "leve ela lit pra 0:... cace" 500 0 cace ne «dirigindo-se it colega expositora)) Al 501 e A2 502 "leve ela pro cace pOl'que aqui na es na a a 503 acho que eta num vai acompanha mio 504 num sei 0 que "...llum tinha nada a 505 ve ne? minha deficienciaffsica com a deficencia mental 506 ... af eu disse "mainha"/af a gente foi minha mete muito 145 507 assim ... coitada nem Al 508 ingenua A2 509 e... ingenua chegou na escola ai... coitada de mim 510 ai eu qui quando cheguei 51] liT. no cace mei mundo de pi 5] 2 de menino cum problema sabe 513 aquela coisa totalmente diferente ...eu disse 514 "oxe mainha que que eu voufaze aqui?" Haimainha 515 disse He mermo Vania vamo pra liT. vamo volta liT.... 516 ai eu voltei 1../ Na sequencia acima, 0 fen6meno da diversificac;ao episodica e exemplificado por A2, que introduz uma narrativa conversacional com 0 objetivo de ilustrar a afirmac;ao apresentada por A3 (1.493,494) sobre a existencia de salas especiais para as crianc;as excepcionais. Para isso, A2 assume 0 papel de ator, autorepresenta-se atraves da auto-citac;ao (1.505 e 514) e representa os demais personagens envolvidos-mainha e a diretora da escola - atraves da hetero-citac;ao (1.499,502,515). A mudanc;a de estilo introduzida por A2 esta evidenciada sobretudo nas escolhas lexicais (marcador conversacional - "oxe") e sintaticas (expressao vaga"num sei 0 que") realizadas nas falas citadas; na introduc;ao do comentario avaliativo com solicitac;ao de apoio do ouvinte ( "num tinha nada a ve ne? minha deficiencia fisica com a deficiencia mental"). 4.2. A mudanc;a de estilo atraves da citac;ao de falas como discurso interior: a encenac;ao avaliativa em sequencias assertivas de carater explicativo. A mudanc;a de estilo atraves da citac;ao como discurso interior esta associada a sequencias assertivas de feic;ao monologica. Nesses momentos ocorre a verbalizac;ao de uma fala hipotetica, que se processa por hetero-imitac;ao, cuja sinalizac;ao se da pela presenc;a de trac;os prosodicos supostamente utilizados pelos personagens representados pelo falante-expositor, que assume 0 papel de imitador. 0 desempenho desse papel instaura 0 estilo conversacional, em seu aspecto teatralizador, situac;ao em que a relac;ao do falante-expositor com a audiencia parece predominar sobre a informac;ao aser apresentada. 146 A encenayao atraves da imitayao da prosodia, com ausencia da sinalizayao linguistica do verbo de fala, foi amplamente registrada nos dados de Dionisio(1992),ao analisar a interayao em narrativas orais numa comunidade negra nao letrada. Urn exemplo ilustrativo de sse procedimento pode ser encontrado em (2), extraido dos referidos dados: (2) H3 e ela doente dentro de casa ... eu fui busca truce na na preguiyosa ... butei la em casa ... fii um/ butei uma cama .... urn purgante a ela to do dia "va mimbora ... va sai daqui" «falava movimentando os brayos para os lados demonstrando agitayao do personagem)) A ocorrencia desse procedimento, em nossos dad os, parece realyar a dificuldade dos informantes em manter urn discurso centrado na enumerayao progressiva de raz5es explicativas de carater assertivo, neutro, como exige 0 padrao academico de exposiyao. Esse processo de encenayao assume maior dramaticidade nas sequencias em que prevalece a imital(ao da pros6dia com supressao do verbo de elocuyao, como ocorre em (3), onde a fala citada e sinalizada pela mudanya de voz (1. 61 a 63): (3)A2 57 / .. .1 eh a gente leu no na introduyao desse livro que:: 58 Luis Antonio Cunha acha isso essas pessoas que acreditam 59 num nua em crianyas pobres que vai te 60 uma educayao boa uma generosidade ne? ... 61 ai T. tambem acha que:: a gente/ 62 ate isso que: essas crianyas da favela! ar menina(voz 62 diferente))"na:o ... mas tem condi~ao de chega aonde 63 um medico chega" «voz normal)) ... 64 ai nos mostrano mostrano 65 a ela que num Tlnha condiyoes de jeito nenhum ... e ai ele 66 acha que essas pessoas sac generosas em acredita que os 67 brasileiros de favela ainda podem te:r urn urn desempenho 68 igual a uma pessoa dua cla da classe dominante Aqui a imitac;ao ocorre num contexto explicativo em que 0 falante apresenta a descriyao de urn ponto de vista do autor do texto-base. Ao recorrer Ii descriyao do ponto de vista dos participantes do grupo, 0 falante 0 faz atraves da fala citada ("na:o ... mas tern condic;ao de chega aonde urn medico chega"), sinalizando, em seguida, elementos de urn contexto narrativo(ai nos mostrano a ela que num TInha condh;oes de jeito nenhum ...). Outra situayao que, a nosso ver, constitui evidencia das dificuldades dos universitarios em desenvolver urn estilo formal durante a explicac;ao de fatos, conceitos, posir;6es te6ricas apresentados no texto-base, e a experienciada na seqilencia (4), transcrita a seguir: (4) A4 590 / .../((lendo anotac;6es))"se sup6e ... que Al A4 Al A4 Al A4 A2 A4 A3 estado esta 591 acima das classes sociais e que seu objetivo promover 592 0 bem-estar e a harmonia de todas as pessoas 593 independentemente da sua classe social"(( encerra a 594 leitura)) 595 foi 0 que a gente fal6 ne? agora 596 [anhan 597 [( ) ate colocou ne que ainda por cima as pessoas 598 ainda acham que ah que 0 estado ele num tern obrigac;ao 599 de nada [de da 600 [de nada 601 ((voz diferente)) "ele ainda e bom demais meu Deus 602 inda me dil essa merenda 603 po meu filho come inda olhe que coisa boa 604 inda me eM isso ne? ... eu que num tenho nada 605 inda ganho isso ai do estado ne" ...((voz nonllal))is cria 606 essas coisas na cabeya 607 ((ironizando)) ganham 608 609 acham que ... s6 a merenda ja muita coisa que 0 610 estado ta dando ...entao ... 611 muitas delas s6 freqilenta s6 freqilenta a escola pela 612 merenda/ .../ e e 0 e e Aqui 0 falante Al se prop6e explicar a passagem lida, a partir da alusao a uma situac;ao focalizada anteriormente, sinalizando elementos de contexto narrativo (1.595, 597), que, conforme ressaltado em 4.1, se apresenta como 0 mais favoravel it citayao de falas. Essa tendencia se confirma com a introduyao de uma longa fala citada (1.601 a 605), procedimento responsavel pelo enquadramento de urn julgamento do falante, transformando a asseryao com uma razao explicativa iniciada (1.597 a 599), em uma avaliayao subjacente a fala citada. Nesse tipo de ocorrencia, a informayao cede lugar a dramaticidade de uma cena auditiva, salientada pela ausencia da sinalizayao linguistica do verbo de elocuyao epelamudanyana velocidade da voz (1.601 a605). Nesse sentido, a citayao de falas tende a representar uma saida eStrategica do falante para 0 desenvolvimento habil de uma conversa que esta marcada sobretudo pela avaliay~o interna presente na fala citada (Labove Waletzky, 1967). A neuttalidade e a objetividade tambem cedem lugar para 0 julgamento pessoa1. Dutro aspecto a ser focalizado e 0 efeito, do ponto de vista interacional, que esse tipo de mudanya de orientayao do falante pode acarretar sobre 0 tipo de contribuiyao dos demais participantes do grupo expositor e, as vezes, da propria audiencia, acarretando uma mudanya nas regras das estruturas de troca do estilo expositivo, que, habitualmente confiado a apenas urn falante, passa a ser desenvolvido por varios participantes do evento. Assim, na sequencia acima, a mudanya de foco introduzida por Al acarreta ~ontribuiy5es de A4, A2 e A3, que prosseguem 0 tom avaliativo da conversa. Ainda sob este aspecto, e bem expressivo 0 exemplo seguinte: (5) A3'"474 / .../ai para es esses alunos existem varias etapas ne . 475 elessao divididos em dois grupos ... sao separados . 476 dos outros num e? .. na primeira serie anafabeta essas 477 crianyas sao consi consideradas imaturas ... ai elas sao 478 submetidas a urn teste de inteligencia ... 479 devido a esse teste elas sao: :o(2.0)consideradas normais 4800u [anormais A2 481 [excepcionais Al 482 e e tern dizeno no livro ne que nao sao todas as escolas 483 que fazem esse teste ... ALGU:MAS A3 484 algumas Al 485 eles escolhem assim a dedo ne ... 486 "esse e normal esse num e"... A3 487 488 489 490 «rindo ))e e "esse tem cara de inteligente esse num tem" ... af quando quando acontece ... esse teste de inteligencia ... se ele eh tern a deficiencia ... af sao separados em salas ... diferentes dos outrosl. . .1 Nesta sequencia, 0 paddio assertivo de explicayao, adotado no trecho lido par A3, e interrompido com a inseryao, por Al(1.485) e por A3 (1.487), de urn contexto de fala de carMer hipotetico. Esse novo contexto deixa de ser 0 contexto da informayao transmit ida, para ser 0 contexto do envolvimento interpessoal, marcado pela avaliayao contida na fala citada, que sugere a instaurayao da conversa. A orientayao ou foco de envolvimento interpessoal acarreta uma mudanya na estrutura de participayao. Com a adoc;ao do novo contexto, A3 e Al se alinham, de forma partilhada na imitayao de uma fala hipotetica (1.484 a 487), realizando uma locuyao coletiva (Loufrani, 1981), num estilo informal de interayao. A volta a estrutura de participayao da exposiyao e registrada a partir da linha 488, quando 0 foco centrado na informac;ao e retomado por A3. A mudanya de orientayao do falante em relayao a audiencia em sequencias explicativas pode manifestar-se tambem no uso combinado da citayao de falas e da pergunta ret6rica, fenomeno que esta presente na sequencia (6), em que 0 falante-expositor tenta a explicayao de uma. passagem lida: (6) A2 378 ((lendo anotayoes))"a politica economica reforya os 379 380 381 382 383 384 385 386 387 388 389 390 391 mecanismos ... economicos esponHineos ... pr6prios do tipo de sociedade existente no Brasil"«fim da leitura)) como J. falou ne que produzem ou intensifica a situayao de fome ... essa medida paliativa INTENSIFICA a a situayao de fome ... porque eles vaol "nao a gente ja da merendaja ta responsavel pOl' eles" e cade a a cesta basica? 0 que 0 que precisa mermo pra:: /cade 00 os empregosas coisa que precisa? "nao ... ta bom demais a gente num ja da merenda? numja da um liJpis e um caderno e a merenda pra enche a barriga dol' menino? nao ... a gente ja tit fazeno DEMAIS' e cade 0 que precisa de empre:go de mudar essa situaryao que ta ai ne? A mudan<ra de estilo, na sequencia acirna, ocorre com a interrup<rao de uma razao explicativa sinalizada na conjun<rao "porque", que inicia 0 enunciado corrigido pela inser<rao da fala atribuida a urn referente vago "eles" (1.383). A partir da linha 384, a continuidade da exposi<rao e garantida por urna serie de questoes retoricas, que se sucedem repetidamente, e tern sua resposta em forma de cita<rao de fala (1.386 a 389), instalando-se assim urn verdadeiro dialogo entre 0 falante-expositor e urn interlocutor simulado. A avalia<rao se apresenta assim como 0 destino final das tentativas de explica<rao ate aqui apresentadas. A sequencia (7), a seguir, constitui rnais uma evidencia da dificuldade do informante A2 em sustentar a exposi<rao em tom de assertivo monologico, iniciado par A3. (7) A3 435 a gente ... foi it escola polivalente ne ... viu que os 436 recursos internos da escola nao ofere cia muito aos . 437 entao tr eh... esses termos esta em recursos humanos . 438 que SaDprofessores mal preparados 439 e tarnbem em recursos 440 materiais que e falta de livros eh: auxiliares de eh ... 441 material didatico ... nada disso tern para esses alunos 442 ne ...entao a propria escola e quem faz essa 443 discrimina<rao social(2.0) isso aconte:ce ... como euja 444 falei ... quando essas crian<ras chegarn a ingressa na 445 escola A2 446 ((rapido)) eh licen<raT. so interrornpendo urn pouquim 447 essa discrirnina<rao ne ... a escola acha assirn "e uns 448 pobre coitado pra que a gente oferece tanta coisa boa 449 a eies? pra que a gente oferece reciclagem pra professor 450 se: 0 aiuno acha isso otimo? nao ... ta bom" ele ele 451 acha que 0 que a [professora ta A3 452 [eler nurn entende ( ) A2 453 dano excelente ne? .. em cornpara<rao as escolas 454 particularesl. ../ Aqui, a contribui<rao de A2 se insere mais urna vez no tom da avalia<rao, do juizo de valor, manifestado na fala atribuida metonimicamente a urn referente inanimado - a escola-(l. 447) desprezando-se assim a enumerar;ao de razoes que explicariam objetivamente a discriminar;ao social praticada pela escola. A observar;ao dos dados aqui apresentados fornece elementos para a discussao da hipotese da reversibilidade da escrita sobre a oralidade. 0 grau avanr;ado de escolarizar;ao dos informantes e a situac;ao de fala previamente planejada deveria pressupor, em principio, 0 dominio de uma oralidade transformada pe10 efeito reversivo da escrita academica. No entanto, somos levados a admitir com Tannen (1985) que a questao da preferencia pelo foco centrado no envolvimento interpessoal, manifestado aqui no elevado uso da citac;ao de falas, durante a exposic;ao, constitui urn indicio bastante forte de que a tradic;ao oral de caniter conversacional permeia a pnitica comunicativa dos informantes pesquisados. Constatou-se que esses informantes conseguem desenvolver de forma habil urn diillogo com todos os trar;os essenciais, mas, ao desenvolverem urn tema de forma progressiva, nao conseguem manter 0 estilo formal de carMer monologico. Nao se reconhecem, nas seqilencias aqui transcritas, as atividades explicativas que asseguram a existencia de uma retorica peculiar a exposir;ao academica. Nos termos de Borel(1981 a), registra-se a mistura de discursos, fator que compromete a atividade explicativa de natureza teorica ou de divulgac;ao cientifiGa. BLANCHE-BENVENISTE, Claire.(1989). A Escrita da linguagem domingueira. FERREIRO, E. e PALACIO, M. G.(Coord). Os processos de leitura e escrita. Porto Alegre: Artes Medicas, p. 182-194. BOREL, Marie-Jeanne(1981a). Donner des raisons: un genre de discours I' explication. Revue europeene des sciences sociales 56, IX, Geneva, Librairie DROZ, p. 37-68. ________ ( 1981b) L' explication dans I' argumentation. Approche semiologique. Langue frmu;aise 50 , p. 20 - 38 . BORTONI e LOPES(1991). A interayao professora x aluno x livro didatico. Trabalhos em lingiiistica aplicada 18. Campinas: UNICAMP/IEL, p.39-60. CAZDEN, Courtney B. ( 1988). Classroom discourse. 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L'APPORT DE LA PUBLICITE A L'ENSEIGNEMENT DU FRAN<;AIS LANGUE DE SPECIALITE* Resume: Ce travail pn}sente une recherche menee au Departement de Lettres de I 'Universite Federale du Pernambouc (UFPE), en vue de I 'utilisation du texte publicitaire comme preambule I 'acces aux textes scientifiques et techniques dans les cours dejranrais langue de specialite. II comprend une etude sur des publicites extraites de periodiques jranrais et une reflexion sur les lecteurs de publicite. Mots-des: texte publicitaire, discours, lecteur, pedagogie, texte theorique. a Publicidade, narra~ao e publico alvo A CONTRIBUICAO DA PUBLICIDADE PARA 0 ENSINO DO FRANCES INSTRUMENTAL (FI) Resumo: Este trabalho apresenta uma pesquisa realizada no Departamento de Letras da UFPE, para a utiliza9ao de textos publicitarios como introduyao leitura de textos cientificos e tecnicos nos cursos de Lingua Francesa Instrumental. Contem tambem urn estudo sobre algumas publicidades extraidas de revistas francesas assim como uma reflexao sobre os leitores de publicidade. a Palavras-chave: * Este texto publicitario, texto teorico. discurso, leitor, pedagogia, trabalho retoma com algumas modifica90es e acrescimos 0 artigo publicado em Les cahiers de l'apliut, volume XIII, 2 (n° 51) dezembro de 1993. Ce travail presente Ie rapport d'une experience developpee au Departement de Lettres de l'Universite federale du Pernambouc, au Bresil. Notre experience s'est effectuee en deux etapes differentes. Dans un premier temps nous avons repere un certain nombre de publicites a dominante narrative et avons eu I'idee d'en constituer un corpus en vue d'une analyse pedagogique et linguistique de leur contenu. Lors de l'elaboration de ce corpus d'autres idees ont surgi et quelques problemes se sont poses. Ce qui nous a obligee a repartir de zero et a commencer par etudier plus generalement Ie sujet. Voila pourquoi notre recherche contient une partie qui concerne Ie statut du lecteur de pub dans Ie monde reel et dans Ie monde simule de la classe de langue etrangere. Dans un deuxieme temps nous avons pro cede it un classement des sequences narratives analysees et nous sommes arrives it I'amorce d'une typologie de la "pub-recit"; en effet, notre corpus est encore reduit et pour l'instant nous ne sommes pas en mesure d' etablir une typologie de la publicite. Afin d'elargir les horizons de la recherche, it partir de mars 93, une equipe interdisciplinaire composee de professeurs de langues et de Communication Sociale de l'UFPE a mis en route un nouveau projet sur Ie disc ours publicitaire, Ie PRODIP: groupe d' etude sur I' analyse du discours publicitaire. Ce groupe a ete ensuite integre it un projet international de cooperation linguistique entre I'UFMG et Paris XIII dans Ie cadre des accords CAPES/COFECUB. II s'agit d'une equipe compo see de chercheurs bresiliens et franvais qui visent it etudier les mecanismes du discours de la persuasion et de la seduction dans differentes societes et domaines, sous la coordination generale de Patrick Charaudeau (Paris XIII). Nous concluons ce travail par une proposition pedagogique en presentant des suggestions aux professeurs qui souhaiteraient eventuellement travailler sur ce genre de publicite. Les bases theoriques de notre recherche ont ete constituees a partir des travaux de Bronckart et de Charaudeau, concernant l'analyse des disc ours (AD) et la typologie de textes. Vne publicite reussie est tres engag~ante; elle touche nos sensations et sentiments car elle a ete faite pour seduire. Comparee au texte theorique, elle offre l' avant age d' Stre plus courte que ce dernier et peut donner l'impression a I'etudiant d' Stre plus facile, ce qui n' est pas toujours vrai. Mais il est indeniable qu' elle va plus droit au but, l'immediatete etant l'une de ses caracteristiques. D' autre part, elle est plus proche du Iecteur car elle vehicule Ie quotidien qui est absent des textes theoriques. Lorsque l' on "impose" une lecture pedagogique a I' apprenant peut-on Ie considerer comme un lecteur ordinaire? Lui-mSme se considere-t-il ou se comporte-t-il comme tel? Les lecteurs de pub Iicite (annonce a but Iucratif) se placent, a notre avis, dans trois categories differentes: Ie Iecteur "conquis" ("victime" d'une seduction psychosensorielle) Ie Iecteur "motive" (l'acheteur potentiel) Ie lecteur "spontane" (celui qui a Ie gout de lire) Ace classement des lecteurs, on peut ajouter un autre parametre: la finalite commerciale de la publicite. Le simple fait d'Stre lue n'assure pas son succes. Autrement dit, elle a deux objectifs: run plus urgent, qui est celui de se faire lire; l'autre, moins immediat, qui vise a faire acheter Ie produit. Seduire et persuader sont Ies mots d'ordre des strategies publicitaires. L'on ne s'etonnera pas de voir nombre de publicites ou predomine Ie discours argumentatif et ou l' on exploite Ies mecanismes de seduction. Parmi ces derniers, on ales appels sensoriels au niveau de Ia perception visuelle et de Ia memoire iconique a travers des procedes Iinguistiques empruntes au Iangage Iitteraire. Le result at en est que certains slogans publicitaires chantent aux oreilles des Iecteurs tant iis sont doux et poetiques. Dans Ie cas du Iecteur "conquis", Ie sujet n' a aucune intention de lire des annonces publicitaires, mais en feuilletant un periodique par exemple, il se sent soudain attire par une publicite. La, ce sont Ies efIets icono-chromatiques qui servent de stimuli sensoriels a la perception visuelle. Ayant declenche une sensation agreable et cree une image mentale positive, favorable au produit en question, cette publicite est deja a mi-chemin de sa reussite. Mais l' achat dependra d'autres facteurs qui ne sont pas forcement enjeu dans la publicite: prix, besoin effectif, etat d' esprit, connaissance de la bonne ou de la mauvaise qualite du produit, prestige social, effets de modes, etc. Le lecteur "motive" est celui qui a l'intention d'acheter et qui s'interesse d'emblee a toute publicite concernant l'objet de son desir. Dans ce cas, la premiere mission de la publicite est accomplie sans grande peine car elle sera lue. Reste en incognito les repercussions de cette lecture. Mais, plus la publicite est objective plus elle a des chances d' etre lue car les lecteurs motives "consultent" les publicites afin d'y trouver Ie plus grand nombre de details possibles et toutes les references au prix, aux fonctions et a la composition du produit les interessent passionnement. Ce sont donc les publicites it dominante descriptive qui leur plaisent Ie plus. Nous sommes convaincue que la persuasion et la description sont plus importantes que la seduction quand on fait appel au caract ere informatif de la publicite. Le lecteur "spontane" s' interesse a tout, il est volontairement lecteur. Illit les publicites par plaisir, pour les critiquer, les admirer, s'informer, passer Ie temps ... Mais s'interessera-t-il au produit? Ceci ne depend pas que de la public.ite (voir supra). En tout cas, la lecture pourra eveiller chez lui l' esprit de consommateur, par un processus de seduction ou de persuasion. Mais ceci ne nous concerne pas directement en tant que professeurs de langues. En quoi ces profils des lecteurs definis plus haut nous interessent-ils en tant que professeurs? Or, si l'on s'arrete un peu sur la question et que l' on observe ce qui se passe en salle de classe, on se rendra bien compte de l' absence des marques distinctives dans Ie profil des lecteurs "eleves". D' emblee ils doivent tout lire, la publicite ne les incitera pas a la lecture. Elle pourra les seduire mais non pas de la meme fayon que dans les cas cites auparavant. Toutefois les professeurs peuvent jouer sur d'autres mecanismes de seduction qui ne seront plus ceux du "guet-apens" pour les contraindre it lire. On constate que les etudiants en situation de salle de c1asse ne se situent pas dans les categories des lecteurs du monde reel, mais dans une categorie differenciee, que I' on nommera lecteurs "convies". Nous tenons a rappeler que meme si on enleve a la publicite sa mission de se faire lire, la seduction continue it exister dans d'autres termes et conditions. C'est grace quoi les professeurs parviendront motiver leurs apprenants pour la lecture de textes publicitaires. Mais on ne saura jamais si les etudiants, en tant que lecteurs autonomes, feuilletant un periodique quelconque, auraient choisi spontanement la meme pubIicite que Ie professeur. Autrement dit l'autonomie du lecteur n'y est plus car en situation didactique Ie professeur est l'intermediaire entre Ie monde reel et la salle de c1asse. Ce qu'il apporte en cours c'est une "tranche" du monde. Grande responsabilite que de choisir cette tranche! Ne serait-il pas preferable de faire feuilleter des periodiques en classe pour que les etudiants eux-memes choisissent les publicites? C'est une experience a tenter, tout en sachant qu' on risquerait toujours de privilegier un lecteur au detriment des autres vu qu'il est difficile de plaire a vingt ou trente individus a la fois. En tout cas, si Ie professeur continue a choisir lui-meme les publicites il a interet it Ie faire tres soigneusement et a contraler "I' instinct de grammairien" qui parfois peut nuire it la reussite pedagogique. La deuxieme difference entre les autres lecteurs et Ie lecteur "convie" cone erne Ie choix du texte publicitaire. Le texte it dominante descriptive qui serait susceptible d'attirer Ie lecteur "motive", engagerait moins Ie lecteur "convie" moins qu'il n'y ait cOIncidence entre Ie choix du professeur et la motivation intrinseque de I' apprenant. Nous avons fait, plus haut, reference au caract ere informatif de la publicite. Parfois elle semble viser uniquement a informer en masquant son objectif majeur, qui est de faire acheter. Ceci est frequent dans les publicites de marque (pour divulguer une marque et non Ie produit) ou il s'agit plutat de faire connaltre un nom, un embleme, etc. Un autre phenomene observable est I' engendrement d'un reseau publicitaire consequent, c' est-a-dire qui depasse la pub Iicite en elle-meme, lorsqu'un lecteur devient it son tour "I'annonceur" a a a inconscient d'un produit ou d'une marque. Apres avoir lu la publicite, il peut la commenter avec d'autres personnes et meme conseiller Ie produit en question. Dans ce cas, il ne sera pas l'acheteur mais pourra eveiller chez quelqu'un d'autre Ie desir de s'informer sur Ie produit, et done d'acheter. Nous pourrons egalement exploiter ce phenomene en didactique des langues, en demandant a un etudiant de devenir "lecteur-annonceur". Bien sur, ceci se fera plus aisement dans les cours de conversation et dans l'enseignement du Fran~ais langue de communication. Les professeurs essaient de seduire leurs eleves avec des publicites qui sont a leur tour construites dans ce but, ainsi les annonceurs facilitent la tache selective des maitres. Cependant, les professeurs doivent analyser et choisir les publicites avec rigueur car il y en a de bonnes et de mauvaises. II faut aussi tenir compte de leur rentabilite en tant qu'outil pedagogique. A cet egard, les bonnes publicites-recits sont tres utiles car elles font appel a une formule consacree dans la litterature mondiale. Grace a sa structure discursive universaliste Ie recit constitue un moyen pratique d' atteindre tout public car depuis toujours on aime raconter et ecouter des histoires. La pub-recit s' oppose ala "publicite allegee", qui se compose d'un bref slogan et d'une image. La premiere etant moins directe que la seconde, nous l'avions crue, au depart, moins efficace et moins utilisee. Pourtant, en lisant des periodiques fran~ais nous avons remarque que son occurrence etait assez frequente. C'est pourquoi nous nous sommes interessee a ce genre de publicite et avons decide d' en constituer un petit corpus en vue d'une application pedagogique dans les cours du fran~ais langue de specialite (FLS). Ainsi, nous avons recueilli les quatre-vingts publicites qui compo sent Ie corpus de ce travail dans Le Nouvel Observateur et Le Point. Soucieux de plaire aux etudiants et de les motiver, nous avons soumis ce corpus a leur appreciation par un questionnaire de sondage, qui prevoyait Ie choix de deux publicites au moins par personne (CF. annexes). Ceci naus a permis de faire un tri des annonces retenues pour l' elaboration du materiel didactique des cours du FLS. Cependant, ces publicites n' ont pas ete les seules qui ont ete etudiees en classe car nous aviQns prevu au depart de travailler aussi des textes publicitaires a dominante descriptive et argumentative. Ce materiel a ete utilise dans les Cours de Lettres de l'UFPE avec les etudiants de FLS au premier semestre 1992, et les premiers resultats ont ete tres satisfaisants etant donne que: - au bout de quatre mois les etudiants ont ete capables de passer du texte publicitaire au texte de specialite; - d'autres professeurs ont voulu tenter l'experience introduisant, eux aussi, Ie texte publicitaire dans leurs classes. - et pour en conclure, un groupe d'etudes s'est forme a partir de . . ces premIers eSSaIs. Dans les pages qui suivent on trouvera l' esquisse d'une typologie de la pub-recit dont les exemples tiennent compte du choix des etudiants car ils ont ete extraits de leurs reponses au questionnaire de sondage. D'autre part, cet echantillonnage ne tient compte que d'un critere de classement du discours narratif: la nature de l'histore racontee. Les modes d' organisation de ce discours (composantes de la logique narrative, les pro cedes de la configuration de la logique narrative) feront l'objet d'un autre travail. Selon CHARAUDEAU (1992: 712/13) "raconter represente une quete constante et infinie ... c'est aussi construire un univers de representation des actions humaines travers un double imaginaire qui repose sur deux types de croyances concernant Ie monde, I' etre humain et la verite". Les publicites etudiees racontent justement Ie moment de la rencontre entre l'objet magique d'une quete (produit/services) et Ie protagoniste (qui represente Ie consommateur/lecteur). Les croyances et les actions humaines rencontrees dans les recits publicitaires ont ete classees dans notre travail en huit categories inspirees de BRONCKART (1985: 138-144): recit d'aventures, recit de vie, recit historique/culturel, recit technique, recit setimental, recit d' actualite, recit oralise ou discours en situation, recit temoignage/voyages. a ECHANTILLONNAGE* DU CORPUS RECUEILLI DANS LE NOUVEL OBSERVATEUR, LE POINT, entre 1987-1991. Le fantastique et Ie merveilleux y sont mis en evidence. Le heros est engendre par Ie produit, il en est Ie beneficiaire; au alors, Ie heros est Ie produit lui-meme. Ce type de texte est apparu dans une sene de publicites Rolex, Rothamns et Basic Homme de Vichy, etc. "A la recherche du temps perdu". "L'aquanaute Sylvia Earle 5000 h. sous les mers". " L'aventure it fleur de peau" - la seduction - l' aventure - Ie combat "La haute securite sous taus les soleils - Quand un ecran anti-solaire affronte I'Everest." * Pour simplifier eet eehantilionnage, nous ne donnons que les titres des publicites ( entre guilhemets), e'est it dire les slogans d'afiiehe et les slogans de marque. Focalise les grands personnages du monde artistique, litteraire, politi que, historique, sportif, des affaires, etc. Parfois on trouve d'''illustres inconnus" jouant Ie role d'un grand personnage qui conseille Ie produit. "Le futur en mouvement. realiste" . "I:e futur en mouvement. hedoniste" . "Le futur en mouvement. specialiste" . Auto portrait d'un Auto portrait d'un Auto portrait d'un L'Histoire d'un peuple y est mise en valeur pour montrer que Ie produit, ainsi que l'histoire, est eternel. II y a l'appel it la tradition, aux valeurs culturelles. L'aventure vient parfois s'y meler. _ Office du Tourisme du Canton de Vaud : LeNouvel Observateur: "Au pays des horloges, Ie temps s'est arrete." "Grece l'elue des Dieux.- Le souffle d'Eole" "Grece l'elue des Dieux.- Ulysse rei d'Ithaque" Le produit y est Ie catalyseur des evenements. Mais c'est sans doute l'appel aux sentiments de l'interlocuteur qui predomine. "Conyu pour affronter les tempetes de sable, Ie blizzard et meme les coups de foudre." "Ce n' est pas parce qu' on a des enfants que l' on doit avoir une voiture de pere et mere." "Ii y a des hommes vivent." qui friment d' autres qUI C' est Ie recit de la creation ou de l' evolution d'un produit dont on vante les performances. Parfois, Ie recit d'une autre technique sert de pretexte au recit du produit (Cf. Jack Daniel's). Dans d' autres cas, Ie romantisme y est mele, mais Ie recit sentimental se fait tout de suite suivre de la description technique. -" Notre barbier est inlassable au sujet de notre Whiskey. Mais attention, il taille en parlant." -"Le temps a adouci nos montagnes. Imaginez ce qu'il fait pour notre whiskey." "Experts en la matiere." _ Wolkswagen - Corrado :Le Nouvel Observateur: 1990 Cornrne dans Ie modele precedent, il y a de la description, mais Ii tres faible pourcentage. On y fait appel a l' actualite et a l'engagement du lecteur vis-a.-vis des problemes qui Ie touchent ou qui pourraient Ie toucher. Observateur: 1990 "Le vent d'Est" _ Le Monde - Bilan economique et social 1990.: Le Nouvel Observateur : 1991 Le Monde - Dossiers Observateur: 1991 et documents II s'agit souvent d'un dialogue OUl'interlocuteur qui parle Ie plus est ce1ui qui est charge de narrer lees) evenement(s). En realite, c' est une publicite qui cherche it engager Ie public comme personnage de la conversation. Ce qui est vraiment bien fait dans ce genre de publicite, c'est la cohesion/coherence entre Ie linguistique et Ie pictographique. L'image (la photo) a une place preponderante, illui ressortit la conclusion ou la cloture du recit. Ceci va de pair avec Ie produit annonce: un appareil de photo. Le produit joue Ie role du catalyseur ou mediateur car c~est grace it lui que l' agent peut combler un besoin, en OCCurrC'"lcecelui d'eterniser (representer) tine tranche de vie, une situatIOn, un moment, etc. "Voir et emouvoir: Un ange passe ..." _ Canon - EOS 1000 : Le Nouvel Observateur: 1991 En guise d' orientation, la publicite presente un petit resume culturel touchant les sujets engages dans Ie recit. Elle se presente sous forme de lettre. "Vos meilleurs souvenirs vous yattendent". (Florence) "Vos meilleurs (Sandrine) souvenirs vous y attendent" "Vos meilleurs (Charles) souvenirs vous y attendent" a Nous ajouterons ce bref expose quelques details importants. Tout d'abord, nous n'avons pas commence les cours avec Ie materiel choisi par les etudiants. Au depart, nous avons travaille cinq publicites descriptives faciles, que nous avions choisies nous-memes et dont Ie texte etait redondant par rapport it l'image. D' autre part, Ie materiel de l' etudiant a ete classe selon les difficultes des textes publicitaires retenus. Autrement dit, il y a eu une progression textuelle (non pas grammaticale) en partant du texte plus transparent pour arriver au plus complexe. Dans cette demarche l'iconique jouait un role decisif dans la selection des annonces d'autant plus que la plupart des etudiants les avait choisies d'apres leurs photos, dessins, couleurs, etc. Enthousiasmes avec les bons resultats de l'experience quelques collegues ont decide de continuer la recherche et de faire une etude sociolinguistique contrastive de la publicite dans sept pays groupes paridiomes differents: anglais (Angleterre/Etats-Unis), espagnol (Espagne/Argentine), franc;ais(France/Canada), portugais (Bresil). Cette nouvelle analyse vise it mettre en relief les aspects ideologiques de la publicite. Nous avons forme un groupe de recherche compose de huit professeurs de langues de l'VER DE LETTRES et un professeur de Communication sociale (publicite et propagande) de notre Universite. Les etudiants y participent activement dans la formation du corpus et dans certaines phases de l'analyse linguistique du materiel selectionne. Les premieres demarches pour cetravail de recherche interdisciplinaire ont ete effectuees en juin 1992. Chaque professeur de langue de specialite travaille dans ses cours les textes publicitaires choisis et analyses par Ie groupe de chercheurs (les etudiants y compris). CHARAUDEAU, P. Grammaire du sens et de l'expression, Paris: Hachette, 1992. BRONCKART, J.-P., Le jonctionnement des discours, Neuchatel, Paris: De1achaux & Niestle, 1985. QUESTIONNAIRE DE SONDAGE PROPOSITIONS PEDAGOGIQUES: L'UTILISATION D'UNE PUBLICITE EN FLS Le nouvel Observateur Le Point nO 13--' date: n° --' date: / / /19 /19 . . 2-Produit: ( ) un objet: ( ) un immeuble: ( ) des services: ( ) une institution: ( ) un etablissement: ( ) un evenement: ( ) un personnage: ( ) un aliment: () autre: 3-La marque: a)connue ( ); b)pas connue ( ) 5-Raisons de votre choix: () la photo; ( ) les images; ( ) Ie produit; ( ) la marque; ( ) la qualite de la pub; ( ) Ie sujet; ( ) les couleurs; ( ) Ie message; ( )inten:;t personnel (vous avez l'intention d' acheter produit, vous faites un sondage de prix, marques, etc) () autre: 6-Le texte de cette publicite est: ( ) facile; Ie ( ( ( ( ( ( ( ( ( ) ) ) ) ) ) ) ) ) 7-Le () () () () () () () () () pas facile; tres facile; drole; ennuyeux; engageant; redondant; superflu; complementaire (par rapport aux images); autre: slogan de cette publicite est: facile it comprendre; difficile it comprendre; tres facile it comprendre; drole; ennuyeux; mauvais; bon; engageant; autre: 8-Les images visuelles (photos, tableaux, etc) de cette pub sont: ( ) tres significatives; ( ) attirantes; ( ) indispensables; ( ) superflues mais belles; ( ) superflues et laides; ( ) complementaires (par rapport au texte); ( ) redondantes; ( ) inutiles; ( ) autre: 9-Ce type de publicite vous est familier, ( ) oui; ( ) non; ( ) plus au moins; ( ) autre: 10-Qui parle dans cette pub? ( ) un (des) personnage(s) ( ) Ie produit; ( ) Ie publicitaire; ( ) la marque; ( ) Ie producteur; ( ) autre: CONDUITE PEDAGOGIQUE La conduite pedagogique est sans doute ce qu'il y a de plus important pour Ie succes de toute pedagogie. Dans notre cas, nous considerons qu'il faut proceder a une lecture interactive des publicites. Les professeurs doivent offrir aux etudiants l'occasion de s'exprimer a propos des documents publicitaires choisis. Nous conseillons de commencer par distribuer les photocopies de la publicite. Si elles sont en noir et blanc, l' enseignant montrera l' original (en couleur) aux etudiants. Ensuite les eleves s' expriment librement a propos de ce qu' ils voient en formulant des phrases qui peuvent etre aussi bien en langue cible qu' en langue matemelle. Le professeur ecrit les phrases au tableau et les traduit en franc;:aisau besoin. C'est la phase de preparation de la lecture ou I' etudiant peuple Ie texte de son vecu. II collabore a Ia formulation d'hypotheses de lecture en donnant son avis qui est construit avec ses experience et ses connaissances, se posant ainsi en tant qu'individu au sein d'une petite communaute. D'une maniere generale, ce que la c1asse dit propos du texte est plus au moins confirme lors d'une lecture minutieuse. C' est I'interaction des etudiants et du professeur avec Ie texte qui aboutit a la formulation du sens. a MITSUBISHI PAJERO Con~u pour affronter les tempetes de sable, Ie blizzard et meme les coups de foudre. ), MITSUBISHI MOTORS I-Source Publicitaire: ( ) revue, periodique: ( ) journal: ( ) television: ( ) autre: 2-Produit: ( ) un objet: ( ) un immeuble: ( ) des services: ( ) une institution: ( ) un etablissement: ( ) un evenement: ( ) un personnage: ( ) un aliment: ( ) autre: Combien de fois apparalt-il dans la pub? ( ( ( ( ) ) ) ) () () () () la couche moyenne de la societe; les riches; les pauvres; I' aristocratie ( ( ( ( les les les les () () () () intellectuels; etudiants; travailleurs; politiciens; ) ) ) ) les enfants; les jeunes; les adultes; Ie troisieme age; les sportifs; Ies religieux; les voyageurs; autre: IO-Identifiez Ie cadre spatio-geographique: a) paysage d'interieur ( );Ie plein air, Ia nature ( ). b) la mer( ); la montagne( ); la route;( ) Ie desert; autre: 10) Observez Ie commencement des phrases et clites quels pronoms representent les personnages de cette histoire. ( ) cela, ils; ( )iI, lui, elle; ( ) Iui, elle; ( )il, eIle; ils, iI, Iui, elle O. 12-Leurs actions sont: ( ) successives; alternees( ); croisees( ) 13-Qui parle dans cette pub? a)Forme grammaticale: ( ) Je ( ) nous ( ) Locuteur efface b)Representations du locuteur: ( ) un (des) personnage( s) ( ) Ie produit; ( ) Ie publicitaire-narrateur( ) la marque; ( ) Ie producteur; ( ) autre: 14-Numerotez la premiere colonne selon la deuxieme: ( )Un homme attendait une femme; ( )Elle etait en retard; ( )Et puis elle etait arrivee; ( )Il se sentait fragile; ( )Il est confronte a la passion (Ie coup de foudre); ( )Elle s' assit a cote de lui; ()Il sent it que cette histoire-Ia ne serait, enfin, plus une aventure 1234- Presence de la femme; Absence de la femme ; Action de la femme; Permanence future de la femme. 15-Le texte de cette publicite est a dominante: ( ) descriptive ( ) narrative ( ) argumentative DEPOIMENTOS JUDICIAIS: TRANSFORMACOES ORGANIZACIONAIS E TRANSFORMACOES INTERPRETATIVAS NO NIVEL DA TEXTUALIDADE Este artigo pretende estabelecer distinyoes e exemplificar transformayoes organizacionais e transformayoes interpretativas. Essas transformayoes sac processadas na passagem do oral para escrito, durante a tomada de depoimento, na justiya brasileira. Os exemplos aqui apresentados foram coletados durante audiencias de instruyaO e julgamento autenticas, na justiya pernambucana. A aSSeryaO da justiya de que "0 documento da audiencia nao registar a totalidade do depoimento prestado mas apenas 0 essencial, e tern par lei 0 dever de ser fiel a tudo que foi dito" permite a inferencia de que 0 principio de fidelidade e 0 principio de essencialidade orientam 0 registro no documento da audiencia. Portanto, os dois principios devem ser adotados como criterios para a analise da textualiadade no registro dos depoimentos judiciais. Sera denominado "texto-depoimento" a produyao verbal decorrente da interayao verbal entre 0 juiz e 0 depoente durante a tomada de depoimento e "texto-documento" 0 ditado que 0 juiz faz para que 0 escrevente transforme em documento 0 depoimento prestado. Na tomada de depoimentos, do ponto de vista interativo, o juiz atua como figura central - mediador de todos os atos de fala praticados. o principio de fidelidade supoe que haja equivalencia entre o texto-depoimenlQ e 0 texto-documento, por essa razao os criterios que orientam a observancia de tal principio devem respeitar as 181 condiyoes de: itens lexicais identicos, mesmo referente, sin6nimos, palavras afins e mesmo campo semantico. Quanto ao principia de essencialidade, a observancia e bem mais complexa. Por se tratar de relayoes de equivalencia entre textos, nao se pode perder de vista que uma das propriedades do texto e 0 fato de esse apresentar possibilidades de parafrase diferentes da frase. Com isso, 0 texto tern a possibilidade de reduyao ate 0 resume minimo, consequentemente 0 principia de essencialidade assume caniter subjetivo ao juiz e a seus processos de percepc;ao, no papel de mediador. Para LURIA (1990:37), a percepyao envolve complexas atividades de orientayao, uma estrutura probalistica, uma analise e sintese dos aspectos percebidos e urn processo de tomada de decisao. A percepc;ao e urn processo complexo que depende de prilticas humanas historicamente estabelecidas. o texto-documento, do ponto de vista da asserc;ao dajustiya, e uma mera panifrase do texto-depoimento. Sao func;oes da parafrase, entre outras, selecionar, enfatizar ou relegar urn ou outro aspecto dos enunciados a segundo plano (atividade interpretativa); mas, no caso da tessitura do texto-documento, hit urn redimensionamento do depoimento prestado. Por essa razao, preferimos adotar 0 conceito de tradu~ao intralingual ou reformula~ao proposto por JAKOBSON (1988:63-72) pela abrangencia das interferencias praticadas no texto. Pelo fato de haver mediac;ao, num contexto altamente institucionalizado, 0 processamento do texto-documento extrapola a nOyao de parafrase e a tradu~ao da linguagem coloquial cotidiana para 0 jargao juridico passa a ser irrelevante, diante da possibilidade de alterac;oes no conteudo das mensagens. No plano do conteudo, os fen6menos possiveis de ocorrer, na passagem do texto-depoimento para 0 texto-documento, integram urn continuo que estende-se da equivalencia ao contraste. Tais fen6menos manifestam-se, no nivel textual, em: repetiyao, quase-repetic;ao, panifrase, circunl6quio, reformulayao, ratificacao, infirmayao ou tradu~ao intralingual. As relayoes estabelecidas entre os textos, observando 0 nivel interfrastico e intertextual , foram analisadas a partir da unidade consignada. Institui-se 0 termo unidade consignada para 182 denominar a parcela do evento tomada de depoimento que culmina com a consigna.;ao - ato do juiz ditar ao escrevente 0 que deve constar nos autos. A demarca~ao da unidade de analise (unidade consignada) e decorrente de altera<;5es na intera~ao pragmatica dos individuos que produzem ou recebem 0 texto. Cada vez que o juiz interrompe a estrutura discursiva dialogada, algumas vezes produzindo cortes sintaticos, e inicia a consigna<;ao do depoimento, deve indicar que a intera~ao propiciou uma quantidade de informa~ao significativa para ser documentada. o registro dos dados seguiu 0 modelo de transcri~ao proposto pela Analise da Conversa<;ao - uma sequencia cronol6gica (MARCDSCill, 1986). Mas, como a finalidade da analise e 0 cotejo entre dois textos imbricados na estrutura do evento tomada de depoimento e as possiveis transforma<;5es processadas, 0 textodepoimento e 0 texto-documento fcram colocados em disposiyao paralela no construto denominado unidade consignada. Considerando 0 axioma da justiya "0 que nao consta nos autos, nao exjste no nlundo", 0 ponto de partida da analise teria que ser 0 texto-documento. Outro fator que orienta tal decisao metodol6gica e que as analises linguisticas de textos empiricos devem proceder retroativamente, visto que sac urn processo emergente, onde, na oralidade, a maioria dos referentes se situa anaforicamente. A classifica<;ao das transformay5es processadas na passagem do texto-depoimento para 0 texto-documento deve considerar a observancia ou inobservancia dos principios de fidelidade e essencialidade, fornecidos pela instituiyao juridica. Em principio, em toda transforma<;ao esta implicito 0 processo de interpretayao, de reformulayao de urn texto original mente produzido. 0 textodocumento e a editora<;ao monologada - uma versao em segunda gerayao - de urn texto dialogado produzido coletivamente (TAI'>JNEN, 1989). A analise dos dados evidenciou duas categorias basicas de transforma<;5es. 0 primeiro conjunto de transfcrmayoes, do ponto de vista da equivalencia semantica, preserva 0 principio de 183 fidelidade. Sao referencias ou substituic;oes lexicas que observam o mesmo campo semantico, 0 mesmo referente, sac sinonimos o'u palavras afins. Sao transformac;oes fundadas nos processos de organiza~iio da textualidade. a segundo conjunto de transformac;oes refere-se ao principio de essencialidade. Esse tipo de transformac;ao nao permite parametros de equivalencia entre os enunciados manifestos. Sao transformac;oes que dependem dos processos de percepC;ao do juiz, que envolvem estruturas cognitivas: complexas atividades de orientac;ao (estilos de processamento, organizac;ao da memoria, estruturac;ao lexica), estrutura probalistica, analise e sintese dos aspectos percebidos e urn processo de tomada de decisao. Sao transformac;oes fundadas nos processos de administra~iio da textualidade e decorrem de decisoes interpretativas. As transformac;oes do primeiro conjunto foram denominadas organizacionais. Via de regra, ocorrem por efeito ou conseqi.H~ncia das condic;oes de produc;ao - fat ores constitutivos do evento "tomada de depoimento". As alterac;oes processadas no textodepoimento permitem parametros de equivalencia com 0 textodocumento, a partir do cotejo dos enunciados manifestos. Na sua maioria, as transformac;oes decorrem da mediac;ao e nao modificam o depoimento prestado em seu conteudo informacional. As transformac;oes organizacionais podem ser agrupadas em tres subcategorias, tomando-se'como criterio as condic;oes de produC;ao textual. a primeiro subconjunto reune fenomenos que dizem respeito do estilo conversacional oral para 0 estilo escrito, em decorrencia da mudanc;a na modalidade da lingua. A seguir: a amissao de caracteristicas da fala - eliminaC;ao de marcas estritamente interacionais (marcadores conversacionais e hesitac;oes), apagamento de repetiyoes, redundancias e autocorrec;oes. Exs: 1. (oo) 2. ah: eh: a passagem ne b - Especificavoes de referentes - substituivao de itens lexicais esclarecidos pela situavao interativa face a face por itens lexicais que especificam os referentes em relava9 ao processo juridico, sem deixar duvidas quanta a individuos envolvidos (pro nome passa a nome) e deiticos de lugar e tempo. Exs: 1. eu estava - que 0 depoente estava 2. Ili - nas proximidades do local da ocorrencia 3. que ele nao estava armado nao - 0 acusado fulano.estava desarmado 4. ele chegou mais cedo (.) na faxa de sete e meia pra oito hora - chegou por volta das dezenove e trinta c - 0 texto-documento recebe tratamento estilistico com selevao de lexico e da estrutura sintatica, num percurso do menos para 0 mais formal. Em alguns casos, 0 juiz preserva expressoes e palavras do jargao do depoente, recorrendo as aspas. Exs: 1. na (.) naquela agitavao toda (.) eu me sai -> retirando-se dali quando viu a confusao 2. texto-depoimento ai foi ele quem disse assim "que isso rapaz vai atira no caba (.) 0 cara ta no chao quase morto (.) antes de atira nele voce tern que vim me mata" ai foi quando pegou na mao dele levantou( ...) 3. texto-documento: que interferiu dizendo (..) interferiu dizendo (oo) "que e isso rapaz? Vai atirar em urn homem que esta quase morto? antes de atirar nele (..) tern de atirar em mim primeiro" Outro subconjunto das transforma~oes organizacionais reune fenomenos que dizem respeito a passagem de estrutura~ao discursiva dialogada para a estrutura monologada, relativos aos processos de interavao. d - Dialogo passa a mon610go - na estruturayao do textodocumento, M 0 apagamento sistematico das perguntas feitas pelo juiz ao depoente. Na interayao estabelecida no texto-depoimento, a pergunta que orienta a resposta e a tessitura textual. Algumas vezes, na pergunta do juiz que encontra-se a equivalencia para informayoes inseridas no texto-documento. e e Exs: J - qual 0 tipo de amizade que 0 senhor tern com 0 acusado fulano? D - vizinho texto-documento que (.) a amizade (.) do depoente com 0 acusado fulano( ...) e porque 0 mesmo acusado e seu vizinho. e - Estrutura conversacional passa a estrutura narrativa/relato - a interayao it distancia, estabelecida pelo texto-documento, exige que 0 texto receba urn tratamento estilistico no qual as construyoes sintaticas em discurso direto passem para discurso indireto. 0 fenomeno ocorre em todas as unidades consignadas. A estruturayao da coesao e mais condensada para a escrita; conseqiientemente, 0 texto-documento recebe diferenciayao no encadeamento sintatico dos t6picos. Os fenomenos que dizem respeito it reordenayao t6pica integram urn subconjunto que estabelece 0 limiar entre as transformayoes organizacionais e as transformayoes interpretativas. Sua inseryao no conjunto das transformayoes organizacionais decorre da presenya de evidencias textuais no depoimento que propiciam sua realizayao. f - Enunciados justapostos, parataticos ou na9s'passam a enunciados coordenados ou subordinados - esse fenomeno decorre, algumas vezes, do apagamento das perguntas; os enunciados produzidos pelo depoente tern referencia na adjacencia pergunta-resposta. Alem disso, a inseryao dos conectores no texto-documento estabelece relayoes entre os conteudos que produzem urn sentido na totalidade textual, tais como: causa e efeito que nao haviam sido registrados na fala do depoente, no texto-depoimento. g - A1tera~ao na ordern das informa~oes - e urn fenorneno que pertence ao conjunto das transforrna~oes organizacionais, considerando que os enunciados reordenados estao presentes no texto produzido pelo depoente; por outro lado, po de representar urna interferencia interpretativa se a altera9ao na ordern dos t6picos irnplicar altera~ao no sentido da totalidade textual. A uc 1, a seguir, traz exs. de transforrna~oes organizacionais do tipo (f) e (g). 1. - J - 0 senhor assistiu a esse crime? 2. - D - nao 3. eu estava que 4. hi nas proximidadcs 5. 6. ne (.) 0 depocnte cstava do local da ocorrencia mas nao VIU (.) quando 0 CRIme foi praticado (... ) 7. assisti ah: eh: s6 0 tumulto «pigarro» 8.• J -como e? 9. - D - vi s6a:: 10.• J - viu s6 11. - D -s6 0 0 tumulto tumuito? * que 0 dcpocntc (.) viu apcnas 0 tumulto A inforrna~ao da linha 6 (nao) tem item lexical identico na linha 2. Realiza-se uma reordena~ao t6pica do depoimento prestado. o operador argumentativo - "mas" - em seu campo semantico, contem a ideia de contraste. E uma estrategia de rela~ao (GUIMARAES. 1987) que orienta a argumenta~ao para a interpreta~ao de que 0 enunciado que a antepoe e incompativel com a assertiva que 0 pospoe ou vice-versa. SegundQDUBOIS (apud: ROBIN, 1977: 186- 187), quando a ordem das proposieoes e transformada ou suprimida, constitui-se um novo discurso, visto que a ordem das proposic;oes e considerada essencial para evidenciar o modele l6gico subjacente ao discurso. A informac;ao da linha 6, introguzida pelo "mas", e uma reiteraeao do item lexical identico da linha 2 (nao), que e responsive a linha 1 - pergunta do juiz. E na pergunta que encontraremos a equivalencia para 0 conteudo informacional da linha 6, 0 "nao" assinala apenas 0 tipo de declarativa. A enfase entoacional dada ao VIU (.) e indicador de perspectivas conflitantes. Corrobora 0 contraste introduzido na estrutura sintatica adversativa. Pode-se supor que 0 modelo l6gico subjacente ao enunciado do juiz e diverso daquele do depoente. Talvez, do ponto de vista do juiz, na perspectiva da l6gica das aeoes, nao seja possivel que 0 individuo esteja presente ao local de urn crime e nao tenha assistido a ele. Para entender a complexidade das construc;oes sintaticosemanticas no processo de progressao textual da consignac;ao, sera necessario recorrer a referencia extratextual, sendo 0 depoimento analisado produzido por uma testemunha de defesa, e usual que os advogados instruam as testemunhas a prestar informae6es convenientes a causa que advogam. Os juizes tem que ter a habilidade de, mesmo tendo outras informae6es acerca dos conflitos, restringirem-se as informaeoes prestadas de viva-voz pelos depoentes. Para tal, recorrem a estrategias discursivas diversas. Ainda na linha 6, a estrutura argumentativa e integrada pela introdueao de "quando ...foi praticado", uma circunstancia temporal. E uma refen§ncia situacional (extratextual). A referencia tem a funeao de construir a progressao textual na me sma orientac;ao argumentativa, visto que sup6e valores cognitivos subjacentes. A substituieao do verbo "assistir" (linha 1) pelo verbo "ver", na sucessao de enunciados do texto 1, foi produzida pelo depoente na linha 9. Aderir ao mesmo item lexical e incorporar it sua fala 0 termo introduzido pelo depoente e uma estrategia discursiva que observa a principia de fidelidade. Mas os sinonimos, segundo COLLINSON (1939), tem diferencas. Ha uma gradacao semantica entre "assistir" e "ver". A elevayao da voz, ao proferir VIU, denota maior tensao no discurso do juiz e estabelece a marca dada pelo falante a seu enunciado. Na escala semantica, assistir e urn verbo de abrangencia mais geral que ver. 0 verbo "ver" subentende 0 uso da faculdade sensitiva do falante. No contexto juridico, assistir e urn termo mais profissional que ver, e utilizado sistematicamente na pergunta generica. o segundo conjunto de transformayoes recebeu a denominayao interpretativas pela ausencia de evidencias textuais no seu processamento-sao subjetivas. Estas transformayoes decorrem da percepyao e interpretayao do juiz, a partir do que e considerado "essencial". Alem da seleyao do materiallinguistico produzido pelo depoente, essa categoria de transformayao produz a tessitura da unidade textual na medida que introduz elementos conectores, tais como juntores temporais e operadores argumentativos. Mesmo que haja equivalencia (no plano conteudo) dos enunciados do texto-depoimento com os do texto-documento, a inseryao de uma serie de climsulas narrativas ordenadas numa sequencia temporal, dependentes de urn indicador da ac;ao mais reportilVel encadeando os outros epis6dios narrados, realiza operayoes argumentativas. Nessa categoria foram incluidos processamentos no texto que alteram 0 depoimento prestado, tais como: supressao e inserc;ao de informac;ao, inferencias, induc;ao e organizac;ao da argumentac;ao. Ex.: 21. D - e voltou e pediu desculpas 45. entao quando ele bateu () ele voltou e pediu desculpa (.) se a medida que a testemunha de defesa tenta introduzir informa90es que dao uma imagem positiva do acusado, como as apresentadas no exemplo acima. A omissao dessas informa90es e urna estrategia utilizada pelo juiz, talvez para "neutralizar" as instruyoes dadas pelos advogados as testemunhas arroladas. Para exemplifica-Ia sera necessario observar toda a unidade consignada (ue 4) em que ocorre, assim como remeter a analise na totalidade textual. A seguir: 50.·J • 51. 52. 53.·D· Fulano ((acusado)) ja estava armado com 0 gargalo de garrafa quando come~u a apanhar dos/da vitima e dos companheiros dela? nao (0) assim me falaram que (0) segundo informaram ainda ao depoenle (0) 54. que ele nao estava armado nao 55.· J. sim 56 .• D· juslamenle quando comec;aram a espancar 58. 59. a::: unica coisa que ele tinha em maos foi 01 realmenle foi a garrafa que ja tinha se 60. 61. quebrado 62.·J • quanlos golpes Fulano deu na vilima (0) Cicrano? 63.·D· eu nao cheguei a va a cena nao quando foi esPANcado pela Vitima e seus companheiros (..oj que 0 acusado (0) anle a ac;ao dos seus agressores (0) armou·se com urn gargalo de garrafa . feriu a vitima. item lexical "garrafa" introduzido pelo depoente na uc2 - "entao bateram numa garrafa" como urn objeto que havia se quebrada e causado 0 desentendimento entre vitima e acusado. Na uc 4, "garrafa" configura-se como arma do crime na pergunta do juiz (linha 51). Na perspectiva das ayoes possiveis, a parte da "garrafa" que pode ser apreendida por uma pessoa e 0 "gargalo" e nao outro pedayo de vidro qualquer. Os autos do processo registram 0 "gargalo da garrafa" como arma utilizada peIo-acusado. Na falta do depoente (linhas 59 e 60) hil.:"garrafa que ja tinha se quebrado" . A equivalencia decorre de referencia extratextual, processo de inf~rencia a partir ayoes possiveis, e nao no nivel de textualidade. No item anterior (a) das transformayoes interpretativas, foi tratada a questao da supressao de informayao da seqUencia: "voltou e pediu desculpas", vinculada a praticas historicamente estabelecidas. Os juizes sabem que os advogados instruem suas testemunhas corn a finalidade de introduzir nos autos evidencias que favoreyam a causa que advogam. Urn indicio de textos memorizados e a repetiyao de duas informayoes na mesma sequencia: "voltou e pediu desculpas" "comeyaram a espancar". "espancamento" enunciado pelo depoente como uma ayao sofrida pelo acusado, apes 0 pedido de desculpas. Na perspectiva da argumentayao que vem sendo construida no texto-documento, o espancamento", que havia side registrado na uc 3 corn a expressao "agredir fisicamente", propocia a inseryao da ayao praticada pelo acusado: "0 acusado (.) ante a ayao dos seus agressores (.) armouse corn urn gargalo de garrafa e feriu a vitima". A conclusao da estrutura argumentativa que vem sendo tecida desde a uc 1 - uma imagem negativa do acusado, na perspectiva do texto-documento - e posta na linha 61. No nivel do implicito, a conclusao de que 0 acusado "feriu a vitima" uma inferencia permitida a partir da fala do depoente. Mas, no nivel explicito, e uma nao observancia do principio de fidelidade. E uma inseryao de informayao nao proferida de viva-voz pelo depoente. Tanto e que 0 depoente reage it pergunta da linha 62, negando 0 que acabara de ser consignado. Mas 0 registro no documento permaneceu. o e de o e e Do ponto de vista das estrategias discursivas do evento tomada de depoimento, a pergunta da linha 62 e urn exemplo de "cilada dialetica". Tal estrategia consiste em tentar obter informay5es que estao sendo insistentemente negadas. Nesse caso, a cilada nao atingiu 0 objetivo. Considerando a natureza subjetiva das transformay5es interpretativas, a deduyao pelo raciocinio e inerente a todos os tipos. Entretanto, distingue-se supressao e inseryao de informayao pela natureza da inter±encia processada no nivel da textualidade. Denominou-se "processo de inferencia" ao tipo de transformayao que ahera 0 conteudo da informayao a partir da reduyao ou ampliayao do campo semantico em decorrencia de substituiyao lexica. Observe, a seguir: 12. - J - ((virando-se para D)) 13. depois do crime passado (.) 14. depois do crime 15. qual foi 0 comenmrio feito na localidade? 16. - D - bem assim me falaram quel 17. eu nem sei (.) 18. eu nem lava lei ne 19. enlSo bateram numa garrafa 20. ele ((olhando para 0 acusado presente)) 21. e voltou e pediu desculpas 22. enlSo (.) tres ou lalvez ate mais 23. ai comec;aram a espancar 24. - J - espancar quem? 25. - D - Fulano ((acusado)) que segundo informa¢es dadas ao depoente (.) atraves de terceiros (...) por ter 0 acusado Fulano (.) batido em uma garrafa 26. - J -sim 27. - D - enlSO ele tentou correr (.) 28. mas 56 que tinha muila gente aquela agilac;ao toda (.) 561 • 29. - J - ((virando-se para D)) num e isso? 30. - D - foi sim Tudo "come90u"(.) por ter "0 acusadofulano" {.)"batido em uma garrafa" (1) (2) (3) inexiste na fala do depoente. A utiliza~ao do hiperonimo "tudo" constitui-se em outro tipo de estrategia, visto que se observa, no universo de enunciados, a tendencia a substituir hiponimos por hiperonimos, nunca 0 processo inverso. A utilizar;ao de urn item lexical com a abrangencia semantica de "tudo" contradiz 0 principio de fidelidade, visto que, na produyao do depoente, nao se encontra elemento lexico co~respondente, pelo menos literalmente. O.item lexico e a atualiza~ao dos itens "tumulto", "crime", "ocorrencia", referencia textual anaforicamente situada. As rela~5es de coesao sac estabelecidas intratextualmente no texto-documento. A construyao sintatica acima e decorrente de reordena~ao t6pica. Os elementos assinalados podem ser encontrados no textodepoimento, em contextos com conteudo semantico diverso: (1) linha 23 - D - ai comeyaram a espancar (2) linha 25 fulano ((acusado)) (3) linha 19 entao bateram numa garrafa Alem de reordena~ao t6pica, ocorre urn deslocamento de ambiente semantico. 0 verbo "comeyar", no texto-depoimento, tern valor de inicio de a~ao, a a~ao de espancar. Os agentes da a~ao sac identificados quantitativamente (linha 22 - entao (.) tres ou talvez ate mais) e 0 paciente da a~ao eo acusado fulano (linha 25). No texto-documento, 0 verba assume 0 valor de acontecimento. Na fala do depoente, hi a tentativa de introduzir a a~ao sofrida pelo acusado - "ser espancado por tres ou talvez ate mais". 0 episodio caracteriza urn linchamento. No textodocumento, transforma-se numa ayao praticada pelo acusado. 0 acusado ·fulano bateu em uma garrafa, e isso e a causa de "tudo"(tumulto, crime, ocorrencia) - urn acontecimento. Na fala do depoente, a informayao da ayao de "bater em uma garrafa" e estruturada sintaticamente na terceira pessoa do plural, impossibilitando determina~ao do agente da ayao, exemplo 193 tipico de sujeito indeterminado. o nome do acusado (linha 25) e proferido pelo depoente numa a<;ao responsiva acerca do ato de espancar ("espancar quem?"). A decisao de colocar 0 nome do acusado como agente da a<;ao de bater na garrafa e uma interpreta<;ao entre duas possibilidades. Observe-se: linha 19 - D - entao bateram numa garrafa linha 20 ele (olhando para 0 acusado presente) linha 21 e voltou e pediu desculpas o pronome "ele" (quase inaudivel na fita magnetica) da linha 20, tanto pode autorizar a inferencia de agente da a<;ao da linha 19 referencia anaf6rica; como pode ser 0 agente da a<;aode "voltar e pedir desculpas" (linha 21) - referencia cataf6rica. Textualmente, as duas referencias sac possiveis. Sao transforma<;oes efetuadas no texto-depoimento a partir de transforma<;oes processadas anteriormente no texto-documento. Na uc 3, posterior a transforma<;ao analisada e classificada como "processo de inferencia" (acif!la), 0 depoente incorpora a sua fala estruturas sintaticas registradas na fala do juiz. Observe-se: linha 37 - D - nao assim 0 comentario surgiu que linha 38 - J sim sim linha 39 - D - aconteceu por causa dessa garrafa linha 40 - J sim o imbricamento entre 0 texto-depoimento e 0 textodocumento e bem evidente nas linhas 37 e 39. 0 cotej 0 entre os dois textos tern sido feito na dire<;ao retroativa, ou seja, do textodocumento para 0 texto depoimento. Mas, as linhas 37 e 39 revelam interferencia do juiz na fala do depoente, uma especie de indu<;ao pela assimetria interativa. A utiliza<;aodo item lexical "comentario" pelo depoente e uma recorrencia ao vocabulario do juiz. Na linha 194 39, 0 depoente repete 0 conteudo semantico-argumentativo do enunciado consignado anteriormente. 0 principio de coerencia conversacional baseia-se nas adesoes mutuas. 0 depoente produz transformayoes na sua fala em funyao do que havia sido consignado - uma transformayao "regressiva". e) Organiza~ao da argumenta~ao operadores argumentativos atraves da inser~ao dos Ex.: mas, quando, apenas, segundo, atraves, tudo, por ter, 0 que, por isto, ante a ayao dos seus agressores, quando, que, para, quando da ocorrencia, quando, ainda, porque, que. Texto escrito da TD analisada: 0201 (F02 a 100-242) que 0 depoente estava nas proximidades do local da ocorrencia mas nao viu quando 0 crime foi praticado que 0 depoente viu apenas 0 tumulto que, segundo informayoes dadas ao depoente atraves de terceiros tudo comeyou por ter 0 acusado (nome) batido em uma garrafa 0 que desagradou a vitima e 0 grupo de pessoas que com ela estavam que, por isso a vitima e os demais acompanhantes da mesma passaram a agredir fisicamente (nome do acusado) que, segundo informaram ainda ao depoente, 0 acusado (nome) estava desarmado quando foi espancado pela vitima e seus companheiros que 0 acusado ante a a~ao dos seus agressores armou-se com urn gargalo de garrafa e feriu a vitima: que 0 depoente nao compareceu ao local da ocorrencia retirandose dali quando viu a confusao que 0 depoente nao conhecia a vitima (nome) que 0 depoente e amigo do acusado (nome completo) QUE foi 0 pai do acusado (nome) que chamou 0 depoente para prestar depoimento nos autos. Dada a palavra it defesa, a seu requerimento respondeu a testemunha: que 0 depoente, quando da ocorrencia estava no interior do clube; que os comentarios acerca do crime foram dados ao depoente quando ainda se encontrava no interior do c1ube; que a amizade do depoente com 0 acusado (nome) e porque 0 mesmo acusado e seu vizinho; que 0 depoente tern conhecimento que 0 acusado, na localidade, e considerado uma boa pessoa, pois nunca viu 0 mesmo se envolver em confus6es; que 0 depoente mantem com 0 acusado apenas amizade de colega. Dada a palavra ao Dr. Promotor Publico, nada requereu. Como nada mais disse nem the foi perguntado, mandou 0 Dr. Juiz encerrar 0 presente termo que depois de lido e achado conforme, vai devidamente assinado. Eu, subscrevi. , Escriva, 0 COLLINSON, W.E. 1939 - "Comparative synonymies: some principles and ilustrations". In: Transactions of philological society. [s.n.[pp. 54-77. GUIMARAES, E. 1987 - texto e mgumentaC;Go: um estudo das conjunc;oes do Portugues. Campinas: Pontes. JAKOBSON, A.R. 1990 - Desenvolvimento Cognitivo: fundamentos culturais e sociais. Sao Paulo: incone. seus MARCUSCHI, L.A. 1986 - Analise da Conversac;Go. Sao Paulo: Atica TANNEN, D. 1989 - "On talking voice that is so sweet": constructing dialogue in conversation. In: Talking voices: repetitions, dialogue and imagery in conversational discourse. Cambridge University Press. 4:98-133 REGIONALISMO E UNIVERSALISMO. o Teatro de Lourdes Ramalho A produyao literaria no Brasil tern seu foco, desde sempre, no suI, notadamente no eixo Sao Paulo - Rio de Janeiro. A literatura produzida no norte e nordeste do pais pouco interessa aos sulistas e, geralmente, sorre uma desqualificayao imediata pOl' ser regionalista. Se esta preposiyao geral e certa, principalmente vale para 0 genero de teatro. Nem do pernambucano Ariano Suassuna, cujas peyas como 0 Santo e a Porca e Auto da Compadecida foram traduzidas e tornaram-se conhecidas ate na Alemanha, dentro da onda de revalorizayao do teatro popular nos anos 60, e somente Marcio de Souza com As Folias do Latex, natural de Manaus, que chegou a tel' renome internacional. Observamas po rem, que tanta ele quanto 0 tambem pernambucano Luiz Marinho (Um Sabado em 30) obtiveram seu rename maior pela estadia permanente no Rio de Janeiro. Neste quadro de situayao da dramaturgia nacional aparece Maria de Lourdes Nunes Ramalho fora do parimetro. Radicada no interior da Paraiba, em Campina Grande, ela vive em uma das regioes mais tradicionais do pais. Descendente de uma familia de artistas populares, bisneta de urn cordelista famoso, ela interessavase desde pequena pe1as manifestayoes populares do nordeste e, aos 48 anos de idade, resolveu escrever peyas teatrais. De 1973 para ca produziu mais de trinta textos que contribuiram para que ela ocupe, hoje, uma cadeira como imortal da Academia de Letras da Paraiba. Com exeyao de algumas, todas as tramas sac ambientadas no sertao nordestino, pautadas na mesma linguagem singela e pOl' vezes m:aliciosa recheada de expressoes peculiares ao pova. Neste sentido, a obra ramalhana nao foge da classificayao como regionalista. 0 tema central e 0 homem do nordeste e sua luta diaria dificil pela sobrevivencia. As vezes revel a a tragicidade, as vezes leva para 0 lado comico, apontando a uma mentalidade peculiar ao povo nordestino que marca tambem todas as pec;as de Ariano Suassuna. Mas, diferente do mesmo, Lourdes nao limit ase ao retratar do nordeste. A maioria de suas pec;as implicam uma mensagem universal, onde a tragedia nordestina serve de exemplo para evidenciar a condic;ao humana em geral. Presumivelmente, 0 sucesso da obra primaria deve-se a este fato: Fogo-Fatuo, de 1974, conquistou 0 primeiro lugar no I Concurso da Federac;ao Nacional de Teatro (FENAT), quando, ainda em plena ditadura militar, a autora mostra seu posicionamento firme e anticolonialista no trama: Mostra a penetrac;ao de estrangeiros numa area de minerac;ao e a consequente mudanc;a do modus-vivendi como dos valores morais nos habitantes das brenhas sertanejas. Urn forte tom politico-social marca tambem As Velhas que segue urn ana depois e e vencedora do concurso da Federac;ao Nacional do Teatro Amador (FENATA), em Curitiba. Este premio e urn dos mais concorridos do pais e esta sempre disputado entre os grandes autores nacionais. A conquista em 1975 abre para Lourdes Ramalho uma brecha como dramaturga nacionalmente conhecida. Durante sua primeira fase de criac;ao de textos, que dura quatro anos, quase todos saem premiados: A F eira foi julgado o melhor texto em 1976 pelo Servic;o Nacional de Teatro (SNT). Talvez fosse a pec;a mais regionalista, ambientada numa feira nordestina que, por sinal, apresenta-se como pano de fundo tambem em outras pe<;as. Mas neste enredo Lourdes Ramalho procura esboc;ar 0 retratro mais fiel do dia-a-dia sertanejo. A feira, encontro dos mais diversos tipos entre habitantes das zonas rurais e das zonas urbanas, eo campo de choques sociais. No entanto, onde se conta com 0 desespero, se encontra 0 riso ao lado do choro mentalidade marcante desse povo flagelado. A montagem da pec;a, em 1978, pelo campinense Hermano Jose, foi a primeira realizada que chegou a representar a autora em festivais no suI do pais. Enquanto a denuncia politica emA Feira aparece de maneira implicita, 0 tema principal da Elei9Go, de 1977, gira em tome da pratica corrupta dos politicos na luta pelo voto. Em pleno c1ima de abertura politica, em 1978, este texto tambem foi premiado, e naturalmente na epoca, tornou-se urn dos mais privilegiados pelos grupos de teatro estudantil. Curiosamente, com esta pe<;a, ainda sob 0 regime militar e o Ato Institucional nO 5 em vigor, 0 cielo dos textos politicos alcan<;ou seu auge e, ao mesmo tempo, chegou ao fim. Seguem , entre 1978 e 1990, textos bem menos significativos. Aparentemente Lourdes Ramalho tambem sentiu a perplexidade perante a abertura politic a, fenomeno geral do teatro brasileiro pos-ditatorial observado por varios teatrologos(l). Verifica-se, na obra da nossa aut ora, a me sma tendencia para 0 escapismo e a volta a uma visao mais intimista. Serve de exemplo desta fase 0 Psicanalista, escrito em 1981,onde a autora entrela<;a os caminhos de personagens com suas deficien<;asmentais num consultorio de urn medico que, afinal de contas, reune em si mesmo todos os possiveis po<;osda condi<;ao humana que ele esta querendo curar. Contemplando os dois primeiros cielos, entao,constatamos a primeira fase bem mais expressiva. Dentro daquela destaca-se As Velhas que tornou-se a obra mais conhecida da autora, gra<;as a uma serie de montagens que excursionaram dentro e fora do Brasil. Alem da sua estreia em 1975 duas encena<;5es fizeram-se falar: a do recifense Didha Pereira no Teatro Popular dos Coelhos, em 1988, e, urn ana mais tarde, a do espanhol Moncho Rodriguez dentro do seu projeto no Centro Cultural Paschoal Carlos Magno, em Campina Grande. Esta ultima montagem ganhou 0 titulo «Melhor Pe<;a do Ano» pelo CENACEN, qualificayao muito disputada nacionalmente, e teve sucesso nos palcos de Rio de Janeiro, Sao Paulo e Brasilia por ocasiao do Festival Mambembao. As duas protagonistas da pe<;a de urn lado representam ambas a vida tipica de familias no interior, abandonadas pelos homens. De outro lado apresentam-se, antagonicamente, como rivais num ajuste de contas. Mariana e Vina sao duas sertanejas quarentonas. A conceitua<;ao de 'velhas' nos parece estranha, mas ela e intencional e reflete tanto as personagens da pe<;a quanto 0 propriouso no alto sertao, onde 0 desgaste fisico ocorre rapidamente por circunstancias tipicas da regiao: Mariana casa com 20 anos e perde 0 marido logo para outra mulher, ainda com "urn filho se arrastando e outro no bucho "(2). Com isto a vida resumese it luta isolada onde ela preenche os papeis do homem e da mulher 199 da cas a criando seus dois filhos Chico e Branca. Ela deixa a terra herdada tornando-se itinerante. Com 42 anos de idade e uma mulher seca, dura e amarga "como as planta da terra [...] Elas e assim para resistir it secura do serHio. Como podem ser macia, delicada, se teem de viver no chao esturricado, sem agua que amoleya 0 barro de onde tiram seu sustento?-Mesmo assim sou eu - enfrento . a secura de meus dias, [ ...] sem ajuda de urn ombro ou mao que me sustenta nas fraqueza, que me acarinhe a cabeya cansada de pensar, [...] de viver so 0 resto de meus dias [... ]"(3). Urn dos conflitos tragicos consiste na relayao entre mae e filha. Na medida em que a velha tenta passar sua experiencia it mais nova, para que ela nao caia na cilada do homem que "so vive para judiar com as mulher''(4), a filha recusa as "besteiras" da mae. A rixa invencivel entre as gerayoes conduz, conseqiientemente, it tragica repetiyao do destino feminino: Branca, apaixonada pelo jovem Jose, cre no amor eterno e sonha com 0 casamento para poder escapar do controle matriarcal. A gravidez , no entanto, poe a fim seus sonhos de maneira brusca. Ela reconhece tarde demais:"Vai-se 0 marido [...],fica as mulher, na espera [... ]. Agora, Dona Branca, e mostrar que e bem filha de Mariana, e levantar a cabeya e receber nos peito toda a desgraya que possa acontecer"(5). A tragedia cotidiana do sertao brasileiro multiplica-se quando Mariana, na busca do responsavel pela gravidez da filha, encontra Vina reconhecendo nela aquela mulher que fugiu com seu marido. Numa construyao de personagem invertida a velhice de Vina e marcada fisicamente: Paraplegica, de cadeira de rodas, a sua energia limita-se ao dominio de uma lingua viperina. A rivalidade entre as duas mulheres, alimentada pelo odio de vinte anos, se reduz a urn destino em comum - a solidao: A cigana Vina perdera logo 0 parceiro pela morte, 0 que the obrigou tambem a criar sozinha seu filho tinico 0 qual defende como fera igual a Mariana. Esses dois filhos, num terceiro plano da trajetoria re1acionado it realidade social, casualmente juntam-se na Iuta politica para contrariar a cormpyao governamental. No momento crucial do conflito sao fuzilados, fato que leva as duas mulheres de repente a urn sentimento comum, na preocupayao pelos tilhos. A forte Vina, triunfadora na disputa pelo marido e no discurso, enfraquecida fisicamente, torna-se, na hora de busca do filho morto, dependente de Mariana que, por sua vez, precisa de orientayao para acertar 0 caminho. 0 destino fatal das duas mulheres completa-se assim numa solidariedade foryada. Chama aten9ao, em toda sua a obra, a maneira com que Lourdes Ramalho trata suas personagens. Enquanto no teatro como tambem na literatura em geral - 0 papel da mulher se reduz a atuayoes menos relevantes, as mulheres descritas por ela sac sempre marcantes e ocupam urn lugar de destaque dentro da trama. Sao mulheres batalhadoras, solitarias, lucidas, fortes e independentes. Porem, continuam culturalmente fmcadas na propria condiyao do sexo, 0 que aparece ate paradoxal. Mas Lourdes Ramalho desenha urn retrato fiel dentro do contexto real do meio social nordestino, onde e comum uma mulher sustentar sozinha a familia, sem que ela aponte otimisticamente uma possivel mudan9a deste papel tradicional. Os desabafos de Mariana: "Mulher nasceu para ser sujeita mesmo" e "Mae e bicho pra sofrer"(6) remetem it aceita9ao final da condi9ao tradicional, como sina da estirpe em que a postma ganha sua dimensao tnigica. Segundo Lourdes Ramalho e justamente nesta condiyao social que a obra tern uma abragencia universal, ja que "em todas as epocas e em todos lugares as mulheres foram sempre tratadas como objetos, propriedade do homem"(7). Este pronunciamento comprometido pode ser considerado radical-feminista, 0 que apoiaria a opiniao de Elza Vincenzo. Segundo ela todas as obras das dramaturgas brasileiras teem carMer feminista(8). Discordando desta qualificayao afirmamos sim que a dramaturgia feminina brasileira da carioca Leilah Assunyao (Fala Baixo, Senao Eu Grito) e das paulistas Renata Pallottini, Maria Adelaide Amaral (Salvese Quem Puder) e Isabel Camara tern tra90s comuns na medida em que enfoca a realidade social percebida c1aramento pelo angulo feminino. E neste sentido que Lourdes Ramalho encaixa-se plenamente no caniter da prodw;ao nacional das dramaturgas que comeyaram a surgir no Brasil a partir dos anos 60. 0 seu reconhecimento, no entanto, ainda nao ocorre devidamente. A propria autora de Um Teatro da Mulher, de 1992, Elza Vincenzo nao menciona a paraibana. N ota-se tambem no pronunciamento do tambem aut or teatral carioca Joao Siqueira a recaida no velho preconceito. Elogiando o texto de As Velhas qualifica Lourdes Ramalho como "autora nacional se nao tivesse a infelicidade de ter nascido na Paraiba"(9). A tendencia universalist a que foi atestada pelo critico teatral Macksen Luiz que julga ja "As Velhas [... ] urn espetaculo de qualidade, independente da regiao ou da realidade cultural" (10) sobressai ainda mais na obra de Lourdes Ramalho, a partir de 1990. Passado 0 impasse dos anos 80 a nova decada leva para outros rumos: As pe~as procuram as raizes tradicionais e mostram a mistura da cultura propria com a cultura europeia, mantendo como cena preferida 0 sertao onde 0 misticismo, as cren~as populares e as vivencias remetem diretamente Iberia medieval. Essa interferencia revela-se no poema dramatico As Femeas, criado em 1990 junto ao pesquisador de literatura de cordel Atila Almeida. Tradicional na forma de urn cordel 0 espetaculo tematiza a visao masculina sobre 0 misterio antagonico da mulher, onde mistura-se todo tipo de meia-verdades com supersti~5es transmitidas desde a Idade Media, ainda vivas no dia-a-dia do interior brasileiro, que apresenta-se como celeiro fantastico de todos os temas e mitos ibericos. A ponte cultural entre 0 nordeste e a Iberia ganha ainda mais destaque na penultima pe~a de Lourdes Ramalho, de 1991: o Romance do Conquistador. Diferente dAs Velhas, 0 Romance trata a essencia humana com toda fon;a tipica it poesia popular, onde esta levada ao palco a revisita~ao do mito latino de Don Juan, recriado com a cor e a musicalidade das caatingas do nordeste. Fruto de urn projeto de incentivo it dramaturgia de corde1 no Centro Cultural Paschoal Carlos Magnos, em Campina Grande, 0 Romance retoma as formulas cordelisticas para descrever as aventuras de urn" [...] Dom Joao/Conquistador do Agreste/Homem sexo de ferro/ o macho cabra da peste"(ll). Urn vendedor de cordeis numa feira do interior decide assumir o papel de Dom Joao, personalidade principal de urn de seus folhetos, e torna-se assim Joaozinho, machao nordestino, que percorre as feiras tradicionais da regiao it cata de amores. Seguindo a trajetoria c1assica do mito medieval Joao se envolve nas mais a absurdas situayoes er6ticas, com rnuita sede de vida e urna forne fogo sa de comer (rnulher):"Ai, ai, ai, nao aguento / cuidado que estou desrnaiado: / 0 comer no pensarnento / mas 0 bolso esta furado"(12)0 rnalandro safado disfarya-se de medico e politico a sacerdote, ate assurnir 0 papel de ajudante de urn suicida que paga com a heranya que e sua rnulher Guiornar, esta torna-se 0 sonho rnaior da sua obsessao sexual. Finalrnente a encontra, e, nurn delirio desastroso, explode" a bornba at6rnica em £lor/[ ...]/ Arrna quimica de arnor" (13). Guiornar e 0 diabo rnoderno disfaryado na forma de tres rnulheres: Inocencia, Decencia e Previdencia, nornes ironizando as virtudes exigidas da rnulher. Nao e urn '~inferninho" - eufernisrno para urn vestibulo de prostituiyao - que Joao "conhece de rnuita curtiyao [onde] transase nurna boa "(14), mas sirn urn "infernao" parecido a urna guerra nuclear. As tres rnulheres diab6licas acabarn com 0 anti-her6i roubando-Ihe 0 unico objeto de valor, 0 penis. o texto retorna a poesia popular tradicional com toda autenticidade tanto em relayao a sua forma quanta it linguagern. A peya, toda escrita em cordel, poerna heptasilabo em sextilhas, desencadeia, nurn ritrno acelerado, urna fala desbocada, agressiva e rnaliciosa onde toda pronunciayao ganha urn segundo sentido. Alern das palavras "comer" e "trepar" que tern sua conotayao sexual ja consolidada no linguajar popular, saD inurneras as referencias sexuais, todas falas de dorninio do povo nordestino. Quando, por exernplo, urn cliente na procura do doutor - por sinal 0 charlatao Joao - se queixa que "Ra anos que sou furnante / e furnante inveterado! / Masco, chupo, larnbo, trago / rnuito ernbora ache errado! " recebe como resposta lac6nica: "viva em abstinencia / deixe o tabaco de lado"(l5). Em outro rnornento 0 povo reclarna, nurn discurso serio, a carestia: "Subiu 0 gas da cozinha / Nao tern agua pra beber / Rernedio e s6 para os ricos / Aos pobres resta rnorrer". Ja a contribuiyao de urn hornern deixa notar, novarnente, a inclusao arnbigua: "Ate galeto ou galinha / s6 gala pode comer "(16). Esta rnalicia culmina nas conversas blasfernicas das tres Guiornares vestidas de freiras, e terrnina nurna verbosidade infernal de expressoes chulas. Nos cordeis tradicionais, sobretudo nos ciclos tematicos do diabo e da igreja, ou do homem cifrado, encontra-se este modo de falar. Contudo, e surpreendente, como - diferente dos cordelistas todos masculinos - uma mulher de meia idade, da classe media no interior do nordeste, e capaz de criar esse texto. Apesar deste fato e interessante observar que a critica nordestina reconhece a linguagem adotada naturalmente como "maliciosa", inerente ao pr6prio genera, enquanto alienado do ambiente cultural, e qualificada como "obscena", pela critica em Portugal, onde a montagem de Moncho Rodriguez excursou em 1992 (17). Alem das falas do povo, Lourdes Ramalho trata, sempre de maneira polemica, a realidade brasileira misturada com as crenyas populares. Este misticismo faz parte da mem6ria hist6rica do povo que transfigura um bandido Lampiao num her6i safado adminivel e cai ainda nas pramessas messianicas, de assim chamados salvadores. Esta mistura entre 0 bem e 0 mal, 0 universo real e 0 sobrenatural, a sabedoria e 0 sortih~giopertencem a visao do mundo sertanejo ainda hoje, heranya guardada desde a Idade Media. Lourdes Ramalho confirma: "Quanto mais no interior mais se constata a presenc;:a iberica em nossa cultura. No linguajar, nos gestos, nos costumes. "(18). Assim, na opiniao do carioca Armindo Blanco, os textos " teem a estrutura das grandes obras do teatro medieval, sem em momenta nenhum, parecer simples imitayao. E urn dos segredos do Nordeste, rever antigos trayos culturais com uma pnl.tica reverifickadora, que os moderniza sem prejuizo da nobreza cl<issica."(19). Nessas linhas principais apresenta-se urn teatra colorido, variado, entico e divertido ao mesmo tempo. Com sua dramaturgia que ja foi comparada a ousadia linguistica da obra de Ariano Suassuna e com a forc;:apoetica deMorte e Vida Severina de Joao Cabral de Melo Neto, Lourdes Ramalho delinea urn retrato grotesco e provocante de urn Brasil petrificado. (1) Sabine Moller-Zeidler: Sozialkritisches Volkstheater in Brasilien in den siebziger Jahren. Berlin (Phil.Diss.) 1986 p. 276 (2) Maria Lourdes Nunes Ramalho: Teatro Nordestino, s/l,s/d, p. 92 (3) (4) (5) (6) (7) (8) ibid. p.76 ibid. p.73 ibid. p.85 ibid. p.90 id.:Os Maf.:Amados. Manuscrito inedito, p.83 Elza Cunha de Vincenzo: Um Teatro da Mulher. Sao Paulo (Perspectiva) 1992 (9) Jomal do Brasil,22.1.1976 (10) Folha de sao Paulo 13.1.1989 (11) id. 0 Romance do Conquistador. Manuscrito inedito, p.15 (12) ibid. p.6 (13) ibid. p.27 (14) ibid. p.28 (15) ibid. p.16 (16) ibid. p.18 (17) Cultura 19.6.1992 (18) Lourdes Ramalho. Entrevista Correio 25.9.1992 (19) ODia 21.1.1989 CONTRATO, LITERATURA, SIGNO E IMAGEM Quando tentamos analisar 0 texto litenlrio experimental em relac;ao com a recepc;ao do destinatario no momenta da recepc;ao, percebemos que as estrategias de leituras; por varias vezes, sac estabelecidas pelo Autor e nao pelo receptor ou destinatario da recepc;ao. Na verdade, nem Stierle, Iser, Jauss ou Eco se preocupam, devidamente, com a instancia do emissor. A leitura de F. Schuerewegen, sobre a recepc;ad1), publicada em 1986, retoma de forma pertinente as posic;oes dos te6ricos mencionados acima, no entanto, elas nao superam a questao, na sua base, 0 que e feito por A. Billaz (2), sem, no entanto dirimir o que achamos ser uma aporia. Para Billaz tanto a recepc;ao quanta a produc;ao sac dois modos de produc;ao do texto e nao dois niveis opostos em que 0 receptor se opoe ao emissor. Na realidade, a estetica da recepc;ao levanta questoes interessantes, mas, rio fundo, estas quest5es passam atraves de omissoes fundamentais. A escola de Tartu, assim como Sartre, Barthes entre outros, ja levantaram questoes pertinentes it. recepc;ao. Parece-nos que se * Por falta de termo mais apropriado, utilizamos 0 significante-experimental para representar iconicamente os textos que apresentam fonnas ou conteudos divergentes das pniticas dominantes de composi~ao liteniria. Os tex10s litenirios em fi.ll1~aodos quais tentamos teorizar sao os seguintes ANGELO, 1. A Festa. (5' edi~ao) Sao Paulo, SUlllmus Editorial, 1978. BRANDAo, 1. de L. Zero. (6' edi~ao) Rio, Codecri, 1979. DRUMMOND, R. Sangue de Coca-Cola. (5' edi~ao), Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 1985. FONSECA, R. 0 Caso Morel. Rio de Janeiro. Editora Artcnova S/A, 1973. LINS, O. A Rainha dos Carceres da Grecia. Sao Paulo, Editora Melhoramentos, 1977. LISPECTOR, C. Agua Viva. (5" edi~ao) Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1980. SANT'ANNA, S. Confissoes de Ralfo. Rio de Janeiro, Civiliza~ao Brasiliense, 1975. SOUZA, M. de. Galvez Imperador do Acre. (9' edi9ao), Rio de Janeiro, Civiliza9ao Brasileira,1981. TREV1SAN, 1. S. Vagas Noticias de Melinha Marchiotti. Sao Paulo, Global Editora, 1984. HILST, H. Com os Meus Olhos de Cao. Rio de Janeiro, Brasiliense, 1988. 1 Schuerewegcn, F. Theories de Ia reception. In Methodes du Texte, Paris - Gembloux, 1987, pp.323-339. 2 Billaz, A Le point de vue de la reception: prestiges et problemes d 'une perspective. In Revue des Sciences Humaines. Tome LX, nO 189, Janvier-Mars, 1983, pp. 21-36. descentraliza a quesHio da produ9ao para 0 eixo da recep9ao sem primeiro atentar-se aos seguintes fatores: 1) a produ9ao ja e uma recep9ao e e misto que se funda 0 objeto que chamamos de texto literario; 2) todo emissor ja e receptor e nunca poderemos delimitar , a nao ser generalidades, ou artificios pressupostos na recep9ao, 0 que, evidentemente, e muito pouco, pois a recep9ao e muito mais uma questao de pragmMica, de dimensao do imaginario e inconsciente do leitor do que propriamente uma questao da textualidade em si. Alias 0 receptor Modelo nao e urn receptor, na sua identidade. Para que eu leia enquanto autor e precise 0 impossivel, ou seja, e precise que eu negue 0 grama, a diferen9a, contidos na identidade. S6 artificialmente poderiamos admitir que a nossa leitura atinja 0 objetivo textual do autor, 0 que alias e tentado no dominio do fascinio da leitura e da produ9ao, se 0 outro me conclama a decifrar os pontos de indeterminayao, a manter a "good continuation", a desvendar os "no-things" do texto e articular satisfatoriamente 0 "horizonte interno" do texto.Fayo-o com prop6sitos que ultrapassam 0 texto; fayo-o por uma questao de interrelayao subjetiva, de pacto altruista e nao, em funyao da textualidade, que, por si s6, nao justifica aqilo que 0 texto sustem, conforme pensa Barthes, em funyao de urn estilo, uma moral da forma. 0 texto e lido enquanto urn ritual que sincroniza 0 eu emissor com 0 receptor e este com aquele. Autores como Osman Lins, Clarice Lispector, Joao Silverio Trevisan, Sergio Sant' Anna, Ivan Angelo, explicitam as estrategias da recepyao e poem em pratica, isto e, nas suas ficyoes (termo impr6prio), a regulagem a que 0 receptor tera que se submeter, se quiser entrar no jogo de uma recepyao critica e nao somente passiva, ou ativa, que excedam o texto, descaracterizando-o. Ao se receber esses textos, se recebe algo mais, a saber, a moral da escrita, moral que nao e a dominante, o que e facil de perceber se confrontarmos tais textos com a maioria da literatura que se submete a injunyoes das formayoes discursivas. Se 0 texto exige uma recepyao critica que leve em conta 0 teor meta-te6rico que regula a recepyao, 0 que, efetivamente, ocorre com os textos que estudamos nesse trabalho, desta ocorrencia assegura-se a dependencia do receptor ao c6digo do texto, conforme ja estabelecia Mallarme, a quem tanto Stierle (3) quanta Schuerewegen(4) atribuem a posiyao que corresponde a uma distancia maximal que ultrapassa a recepyao simples e direta e a produyao receptiva passiva. Nao se determina, contudo, a partir da formulac;:ao de Mallarme, a implicac;:ao do emissor-receptor, que a nosso ver e sempre sobredeterminado por destinadores que, na relayao da recepc;:ao enquanto discurso, ultrapassam as dimensoes puramente reguladoras da recep'yao, nem tampouco se anexa nenhum dispositivo te6rico novo que poderia aprofundar e abalisar a recepyao; simplesmente se diz 0 que e 6bvio na teoria da comunicac;:ao, isto e, que 0 receptor deve entrar num pacto de competencia, a saber, sair da sua contingencia de leitor de ficyao para a condiyao de leitor da teoria ou meta-ficyao. De qlialquer maneira, a relayao entre receptor e emissor se desvia e muito, de urn pacto baseado no principio de cooperayao que, segundo Grice, norteia uma informayao. As observayoes a respeito deste principio feitas por F. Hallyn (5) se completam com a observayao de que ele e insuficiente para integrar 0 nivel perlocut6rio do texto literario necessitando-se de posturas que tanto Pratt como Van Dijk(6) pressupoem para superar os impasses de uma recepyao da perlocuyao literaria. Tais posturas pressupoem que 0 principio de cooperayao esta superprotegido ou sobredeterminado por urn "principio de construyao"(7). A literatura contemporanea brasileira experimental nao se reduz ao_discurso literario pelo fato de remeter nao ao discurso iconico tao so mente, mas tambem de funcionar como discurso pragmatico, pois a condiyao da presentabilidade de que nos fala F. Hallyn (8\ a "reaction evaluative"de que nos fala T. Van Dijk (9) em 3 cStierle, K. Que significa a recep9ao dos textos Leitor (arg. L. C. Lima). Rio de Janeiro, Paz 4 Schuerewegen, F. ibidem, p. 332. 5 Hallyn, F. Pragmatique. In MethOdes du Texte. 6 Ibidem, p. 71. 7 Ibidem, p. 71. 8 Hallyn, F. Pragmatique. In Methodes du Texte. 9 Hallyn, F. ibidem, p. 71. ficcionais? In A Literatura e e Terra, 1979, pp. 133-181. Paris-Gemblollx, pp. 65-71. Paris/Gcmbloux, p. 67. nada desfaz 0 caniter de militancia que todo texto apresenta, seja ele parnasiano ou modernista. Na contemporaneidade, falar em literatura iconica, como 0 faz F. Hallyn, e Hio sumario quanta falar em arte pela arte, no entanto, 0 proprio Hallyn situa, de forma pertinente, a quesHio, quando retomando Bange e Peirce, diz que 0 lcone sempre ultrapassa a dimensao de presentabilidade. Se a literatura nao e perlocutoria, a primeira vista, ela sempre 0 sera numa etapa conseqiiente ou concomitante a sua presentabilidade. Por isso, julgamos que a poetica sempre se completa por uma pragmatica, razao porque Jakobson foi tao criticado e razao tambem porque ele se defendeu explicitamente. o texto experimental que se funda numa poetica da diferenc;a, tern sua base de produc;ao manifesta atraves dos contextos de enunciac;ao, muitas vezes, indecifraveis atraves dos enunciados, mas, muitas vezes, pressupostos a partir de contextos genericos como correntes, escolas, grupos, eventos, estruturas politicas de poder e infra-estruturas sobredeterminantes. Tais prciticas posmodernistas evidenciam que a literatura (a narrac;ao, a ficc;ao) e urn dos discursos que compoem 0 texto experimental, mas de forma alguma 0 unico ou 0 mais importante. 0 discurso experimental e antes de tudo 0 espac;o dos discurso e nao 0 lugar de privilegio do discurso ficcional. Alias, a posic;ao de F. Hallyn, no tocante a impossibilidade da literatura ser urn meta-discurso nos parece bastante pertinente. Por sua vez, Kristeva (10) em La Revolution du Langage Poetique, mostra, alem de uma tipologia textual, a existencia de urn discurso a parte que ultrapassaria a dimensao poetica da literatura dominante. A tentativa de caracterizar a literatura, em questao, isto e, a produc;ao dita literaria, por razoes prciticas, atraves de denominac;oes como literatura posmodernista, como urn novo tipo de ficc;ao, nao resolve os impasses que sac: 1) a literatura e urn, mas nao 0 unico, dos modelos do discurso literario; 2) a literatura e uma questao de valor, por isso so atraves da translingUistica se a1canc;a0 processo litenirio; 3) a realidade na qual a literatura se baseia nao e puramente exterior (a fenomenologia atraves da nC-yaode horizonte nos faz perceber 10 Kristeva, J. La Revolution du Langage Poetique. Paris, Editions du Seuil, 1974, pp. 86-100. de forma convincente, quando fala de horizonte externo, latente, subjacente mas possivelmente consciente, atraves da "consciencia de" husserJiana, conforme nos explica muito bem M. Collot(J1) tentando superar os impasses existentes entre a critica psicanalitica e a critica tematica, denominada por ele de fenomenol6gica) nem tampouco somente real como a primeira vista 0 termo nos leva inconscientemente a inferir. Julgamos que a ficyao nao e de forma alguma uma caracteristica da literatura e sim da realidade. Tudo que na realidade e futuro, e possivel, e hipotetico, e suspeito, enquanto nao se averigua, e de ordem da ficyao. A literatura nao e original porque e ficyao, mas sim porque modela tanto os discursos de realidade quanta os de ficyao sem 0 pre-conceito que, na realidade, perfaz e subordina 0 real. Greimas citado, por Tritsmans, tern toda razao quando diz que nada no discurso literario the e privativdl2). A literatura dos textos experimentais e metaficcional, mas nao e urn meta-discurso (13). Ela e 0 leone do proprio discurso e numa perspectiva psicanalitica e1ae 0 proprio discurso barrado, mas nem assim discurso de uma voz individual, mas coletiva tambem, onde a ayao devera mostrar que a literatura desvela as faltas, as barras que impedem 0 Sujeito de se modalizar enquanto Senhor do seu discurso. Sujeito temeroso sempre da imersao do Escravo (Hegel que 0 diga) nas aguas do Poder, para sempre perdido, mas nem por isso, menos desejado. A identidade do discurso literario e froto da fantasia positivista ou da filosofia da identidade. A psicanalise deforma, com razao, a identidade do discurso literario, esquecendo-se inclusive, que ela, a literatura ja e urn dispositivo analitico, como 0 estabelece Lacan, citado por G. Michaux (14), criticando a utilizayao da Psicanalise aplicada a Literatura. 11 Collot, M. Thematique et Psychanalyse. In Territoires de !'Imaginaire. Paris, Seui!, 1986, pp.213-233. 12 Trilsmans, B. Impasses et Perspectives. In Methodes du Texte. Paris Gembloux, 1987, p. 26. 13z Hallyn, F. Litterature et Histoire des Idees. In Methodes du Texte, Paris Gembloux, 1987, p.251. 14 G. Michaux. Introduction it l'orientation lacanienne. In Methoc!es du Texte, op. cit., p. 280. . Num estagio historicamente datado, a poetica se vincula a praticas literarias que tentam ser autotelicas como se pode inferir das experiencias esteticas de Maiakovski e Klebnikov. A vincula9ao da poetica ao conceito de literariedade, de fun9ao poetica da linguagem, avan9a definitivamente em rela9ao a uma analise redutora que vincule a literatura atraves de conteudos s6cioideol6gicos, tematicos, psicanaliticos, etc., que nao atribuem ao texto a sua potencialidade para gerar, a partir do significante dos procedimentos ou tecnicas textuais, sentidos que nascem em concomitante rela9ao de nega9ao ou afirma9ao, com os sentidos decorrentes dos significados e tern as que surgem do texto. A linguagem ao mesmo tempo que e instrumental do significado tambem proporciona osurgimento de significados, a partir da forma que atua nao s6 por si, mas tambem, a partir da sua energia potencializada enquanto signo. Toda forma e investida semioticamente ora como instrumento de passagem, ora como manifesta9ao de poder de sentido. Contudo e preciso evitar, 0 "abus de significance" dos lacanianos. 0 podt\f da linguagem nao nos e dado de forma interativa, facil, pois as formayoes discursivas privilegiam 0 lado logocentricD do dito em detrimento da materialidade do significante. A tecnologia, por sua vez, atraves das utiliza90es dos signos que sao leones ou simbolos, escamoteiam o sentido, 0 indice a que todo discurso remete. Na realidade e a permanente querela entre 0 dentro eo fora, postura bem ocidental que atraves das categorias como sujeito, identidade, objetividade, forma, conteudo, escamoteia 0 espayamento, (0 gram a, a diferen9a), em suma, que em tudo esta, mas, que, a bem de interesses discursivos, e omitida. E a enuncia9aO silenciosa e oprimida que nao permite se ver como exterior e interior. Elide-se a metamorfose, pois a identidade e 0 pre90 que a servidao hist6rica nos cobra. A poetica do exterior interdita a sua negayao da identidade, po is ela e partidaria da filosofia do Mesmo e nao da Alteridade, da Intertextualidade, da Poetica da diferenya. Esta solapa os pressupostos epistemol6gicos da totalidade, estrutura, significados transcedentais que a literatura brasileira experimental desfaz a bem de uma visao simb6lica da perda, da opressao que as 212 formayoes discursivas atraves de stias pniticas discriminat6rias efetivarn. A estrutura nega a incorporayaO, nega 0 ethos eo nivel timico que uma semi6tica sincr6tica percebe nos enunciados litenirios. As id6ias de Klinkenberg, Bakhtin, Geninasca, Tritsmans, Greimas, Todorov, mostram que 0 discurso litenirio e 0 espayO de modelos de discursos, de encontros de fronteiras discursivas, como 0 percebe tambem K. Boullart (15).Alias todo discurso e fronteiriyo e invasor. As ideias de Maingueneau (16)nos esclarecem a respeito do lado fronteiriyo dos discursos que, a bem de uma performance 'exigida por questoes praticas se· tornam ideologicamente ontol6gicos. Se a literatura e percebivel enquanto leone, corn as implicayoes de disseme1hanya que sempre the sac acrescidas, como bem 0 ve ern Peirce e F. Hallyn (17), e porque a identidade discursiva e somente urn momento, operat6rio por sinal, mas nao 0 unico momento, nem 0 definitivo. Metodologicamente a poetica e valida, ela nao 0 e, numa perspectiva mais critica, mais profunda ou filos6fica, pois 0 interior, a estrutura exigem urn estruturalismo "aberto", termo usado por G. Genette (18)onde 0 interdiscurso tera sempre a sua vez. A poetica do discurso literario sera complementada pela poetica da enunciayao, ou teoria do discurso, que, por meio de uma semi6tica literaria vera que 0 discurso nao e s6 urn modo de produyao, mas tambem urn processo de realizayao que tern a ver corn as condiyoes de produyao. A semi6tica sincretica, termo usado por 1. Geninasca(19), podera ser visto como 0 correlato, ern termos de critica literaria, da semi6tica literaria que, por sua vez, tenta suprir as lacunas da poetica formalista. Nao se restringindo ao campo 15 Boullart, K. Ouvertures sur les autres arts. In Methodes du Texte. Paris Gembloux, 1987, pp.72-84. 16 Cf. Maingueneau, D. Novas Tendencias em Amilise do Discurso. Campinas SP, Pontes Editores, 1989. ~Initiation aux methodes de l'analyse du discours. Paris, Hachette Universite, 1976. 17 Cf. Hallyn, F. Pragmatique, op. cit. p. 69. A observayao sobre 0 conceito de leone a partir de Peirce, encontra-se na p. 69. 0 conceito de leone e retomado no artigo "Litterature et histoire des idees, op. cit., especialmente, it p. 251. 18 0 termo estruturalismo aberto e usado par G. Genette e 0 comentario da sua conceituayao encontra-se em Smekens, W. Thematique. In Methodes du Texte. Paris - Gembloux, 1987, p. 110-111. 19 Cf. Geninasca, 1. Semiotique. In Methodes du Texte. Paris - Gembloux, 1987, p. 52. dos enunciados considerados como compartimentos diferenciados, estanques, a semiotica so sera eficaz se alem de considerar a poetica dentro de contexto de enunciac;ao, levar, tambem, em conta 0 fato de que os enunciados nao sao identidades, a nao ser, provisorla ou metodologicamente. A Socio-critica talvez seja uma das tentativas mais elaboradas sob 0 ponto de vista de integrac;ao da relac;ao enunciado-enunciac;ao, conforme nos mostram as formulac;5es conceituais, as estrategias metodologicas que articulam o nivel poetico com 0 nivel socio-litenirio, empregadas por P. Zima, no artigo "Por uma Semiotica Socio-Critica"(20). Falta, no entanto, a esta interessante proposta do Zima, que avanc;ade forma definitiva, em relac;ao it abordagem sociologica, de cunho marxista retomada por Lukacs, mas re-pensadas por Kosik, Krauss e Garaudy (21), a considerac;ao da socio-critica diante de textos experimentais em que a poetica teria que ser situada. 0 corpus literario que Zima utiliza, tais como os textos de Camus, Moravia e Musil, atende a implicac;5es semioticas diferentes das que os textos de Loyola, Trevisan, Fonseca, Angelo, Hilst indicam. Vma das diferenc;as que seriam apontaveis na literatura em questao diz respeito it qualidade dos processos que se repetem, pois 0 fundamental da poetica, tanto segundo Hopkins quanta segundo 0 proprio Jakobson, se mantem na literatura contemporanea, a saber, 0 artificio dos retornos periodicos (sic), segundo Jakobson, assim como 0 "principio de paralelismo" (sic) segundo Hopkins, conforme nos mostra Todorov (22).Tornase, no entanto, problemittico re-assegurar na contemporaneidade experimental a coerencia interna que possibilita a tese romantica da intransitividade retomada por Jakobson. 20 Cf. Lima, P. Por uma Semi6tica S6cio-Critica. (Trad. M. Bagno). In Revue des Sciences Humaines.Tomo LXXII, n° 201, 1986. 21 Cf. as interessantes observayoes de H. R. Jauss, sobre as posiyoes de Krauss, Kosik e Garaudy que atentam para a questao da poetica textual, diferente da perspectiva mimetica dos marxistas, em geral. Tais observayoes se encontram em Jauss, G. R. La Historia Literaria como desafio a Ia Ciencia Liteniria. In La Actual Ciencia Literaria. Salamanca, Ed. A. Naya, S. A., 1971, pp. 37- 114. 22 Cf. Todorov, 1. Teorias do Simboio. Lisboa, Ediyoes 70, 1979, p. 304. Os retornos peri6dicos nao podem se resumir it retomada dos processos, mesmo que estes adquiram a dimensao semantica, conforme estipula 0 pr6prio J akobson. Na literatura contemporanea, 0 leitor se defronta tanto com 0 retorno das dissemelhanc;as, quanta com 0 retorno das semelhanc;as ou paralelismos convencionais. Nao ha 0 privilegio do eixo paradigmitico sobre 0 sintagmitico, pois muitos dos processos verificados se encontram, tambem, no nivel da contiguidade. A poetica, que e um passo importante para a analise do discurso literario, nao deveria se limitar ao enunciado, pois se este remete it enunciac;ao, nao e a partir daquele que esta emanaria, como se a partir do jogo ret6rico, das configuraC;6es semantic as ou narrativas se pudesse depreender a biografia poetica em oposic;ao it biografia aned6tica, 0 que sugere Jakobson, a partir da leitura comentada de Todorov(23).0 que e uma biografia poetica? Porque, em sendo poetica, nao sera ela tambem aned6tica? Trata-se, no caso, de ver a literatura como arte dissociada da enunciac;ao, termo ainda semanticamente vago. Na pritica experimental, a biografia poetica e tambem aned6tica e nao 0 seu oposto. 0 poetico se funda na extra-literariedade e esta s6 funciona em razao dele. Dissemos que 0 termo enunciac;ao e semanticamente vago pois ha discordancias fundamentais entra a enunciac;ao da pragmatica e a enunciac;ao psicanalitica, por exemplo. Com uma base enunciante de cunho psiquico, encontramos divergencias basicas entre a critica de cunho junguiano que se especializa na Teoria do Imaginario e as divergentes criticas freudianas, estas, em conflito, quando assoladas por significantes, de um lado, e as outras restritas a um tematismo redutor. Alias a irmandade esdruxula entre 0 tematismo ou fenomenologismd24)e a psicanalise, faz do campo da critica um complexo de reducionismos e teorias criticas que tentam supera-los. Algumas vezes, os pr6prios te6ricos divulgam posic;6es te6ricas que invadem 0 terreno alheio conforme aconteceu com Bachelard, Sartre, que perfazem a teona psicanalitica de forma nao ortodoxa e, no campo dos estudos literarios de 23 Ibidem, pp. 300-301. 24 0 artigo de M. Collot, cilado antcrionncnlc pOl' nos, nos parccc cxcclcnlc anillise sobre as divergcncias e conllucncias cnlrc a crilica lemillica e a crilica psicanali- tica. ponta, com Barthes, Kristeva, Foucault, que perfazem dominios como a filosofia, psicanalise e sociologia, por exemplo. Na realidade, existem pontos de confluencia metodologica nitidos entre a teoria das formalYoesdiscursivas utilizada por Maingueneau, a partir de Foucault e a Teoria da Ideologia, nos termos em que e pensada por P. Zima, quando propoe a Socio-Critica. Por sua vez, as formalYoes discursivas, as representalYoes ideologicas apresentam pontos de contato com a Teoria do Principio da Realidade, de cunho freudiano. 0 "Simbolico" de que fala Lacan remete tambem a aqueIas formalYoes discursivas. Gostariamos de observarque, em toda literatura, e, especialmente, na literatura pos-modernista experimental, as formalizalYoes visuais, os desvios metataxicos, as irregularidades metaplasmaticas nao somente sac significantes mas tambem significados, tese defendida ja pelos formalistas russos, 0 que evidencia que a dimensao tematica na contemporaneidade e sobredeterminada por urn super-tema que hierarquicamente se sobrepoe aos temas ou motivos que aparecem. Alias, a critica tematica, hoje em dia, nao se configura isoladamente. E impossivel uma analise tematica pura, pois 0 proprio conceito de tema ate 0 momento e aberto. Ora remete a ideia, ponto de vista, ora remete a moral da forma. As sugestoes de Carlos Reis(25)para que a analise tematica esteja vinculada a analise semiotica e pertinente e, achamos que e impossivel, a bem de uma analise realistica, se desvincular do sentido comunicativo interpessoal e historico do tema. Julgamos tambem que a forma e urn tema, pois 0 signo da forma nao somente reforlYaurn sentido mas sempre diz, por si, urn tema. 5. Sintaxes na literatura brasileira experimental a partir da Teoria Poetica de J. Burgos Se nos partirmos dos seguintes principios: 1 - que a poetica nao se vincula a determinalYao de imagens a partir de uma base culturalista, antropologica; 2 - que a genese poetica nao se 25 Cf. Reis, C. Tccnicas de An{tlise Textual. Lisboa, Livraria Almcdil1a, 1981, pp. 400-409. vincula it historia cuja memoria esta, para sempre, presa ao passado de urn inconsciente que exclui as possibilidades que a Poetica do Imaginario percebe no desencadeamento das imagens; 3 - que a genese poetica nao se restringe it origem da imagem estipulada pela epistemologia poetica; 4 - que a poeticidade nao se restringe a simples manifesta<;ao arquetipica, onde as marcas textuais nao sac precisamente delineadas; 5 - que as estruturas textuais nao sac capazes de mostrarem a dinamica das imagens, pois 0 ambito linguistico a que elas se condicionam nao permite transcender a materialidade da lingua; 6 - que as opera<;oes imagologicas transcendem 0 campo da lingua, pois e da fala que se gera a imagem; 7 - que a imagem e mais que urn espa<;o semiotico; 8 - que a imagem e urn simbolo transcendendo a particularidade semiotica do signa; 9 - que a poetica do Imaginario e urn paradoxa epistemologico necessario e, nem por isso, a sua pertinencia e menos consistente. (26) Partindo de uma sintese do funcionamento possivel das imagens atraves dos schemes ou estrutura<;oes dinamicas da imagem que se materializam atraves das sintaxes que perfazem 0 texto, tentaremos indiciar, mais que indicar, 0 aparecimento de certos schemes (trajetos encamados nas representa<;oes concretas precisas, apud Durand) que num texto nao sac percebidos de forma pura, mas convergente. No entanto, podemos detectar, sem a preocupa<;ao de aplicar as estruturas simbolicas do Imaginario de forma convencional, onde 0 modelo pre-molda a textualidade. As sintaxes que observamos nos textos experimentais coincidem, em varios momentos, com as estrutura<;oes imagisticas, mas a leitura do Imaginario e mais do que a catalogagem dos mecanismos textuais, ao ponto de percebermos que uma mesma imagem po de apresentar significa<;oes radicalmente diversas. No entanto, nao e ilimitada a significa<;ao, pois 0 seu contexto, determina as singularidades do sentido potencialmente aberto. A leitura da Imagem, que retoma e ultrapassa a evoca<;ao e restaura<;ao dos Mitos, so podera ser percebida, no caso da literatura, atraves das sintaxes textuais, que sac uma maneira privilegiada de retomar e evocar os conteudos miticos, sem, no entanto, condicionar-se it mera repetiyao nao criadora de novas realidades. Tentemos verificar as sintaxes de alguns textos experimentais da literatura contemporanea. Achamos que a pertinencia da tripartiyao apresentada por burgos s6 se justifica a partir da verificayao inical da textualidade que vai ou nao evidenciar as formulayoes modeladoras que se apresentam na Poetica burgosiana. Gostariamos de assinalar que a determinayao das sintaxes parte de uma tentativa de captar a imagem que diferentemente da metafora, corresponde a urn movimento e momenta de criayao, onde a analogia fica postergada it visao reaciomlria da imagem. A imagem, como nos diz Burgos (27), retomando Jung, e uma realidade diferente, realidade interna e nao se restringe a uma representayao da realidade exterior. A imagem nao e uma figura de ret6rica.Ela e visao, como ajulga Rimbaud. Segundo Jung, como diz Burgos, ela e uma expressao concentrada da situayao psiquica global (28). Tentaremos agora mostrar alguns exemplos de convergen_ cia sintatica na ficyao contemporanea, partindo do principio de que a genese sintatica da conquista nao existe isoladamente mas em convergencia com outras sintaxes. 10 Exemplo de convergencia das sintaxes da conquista e recusa em Agua Viva de Clarice Lispector. "Preste atenyao e e urn favor: estou convidando voce para mudar-se para reino novo". (p. 58) "Renuncio a ter urn significado, entao 0 doce e doloroso quebranto me toma. Formas redondas e redondas se entrecruzam no ar. Faz calor de vedio. Navego na minha galera que arrosta os ventos de urn verao enfeitiyado. Folhas esmagadas me lembram o chao da inmncia".. (p. 26) "Sou urn ser concomitante: reuno em mim 0 tempo passado, o presente e 0 futuro, 0 tempo que lateja no tique-taque dos reI6gios". (p. 22) "0 que escrevo 27. Ibidem, p.76 28. Ibidem, p.77 e urn 'isto'. Nao vai parar: continua". (p. 97) "Se eu ou90 e porque existo antes da forma9ao do tempo". (p. 38) ":8 de uma pureza tal esse contato co'm 0 invisivel nucleo da realidade". (p. 22) Seria interessante articularmos estas passagens acima, que indiciam a sintaxe da recusa, com as seguintes, que evidenciam a sintaxe da conquista: "Quero a profunda desordem organica que no entanto da a pressentir umaordem subjacente". (p.27) "Vou te falando e me arriscando it desconexao: sou subterraneamente inatingivel pelo meu conhecimento". (p. 28) Processo interessante de convergencia e altera9ao sintatica se observam em A Festa, onde 0 texto exibe 0 Antes da Festa e 0 Depois da Festa, mas elide a Festa, 0 intervalo temporal entre 0 passado e 0 futuro. Alem do mais 0 Antes da Festa e 0 Depois da Festa sac refugios ou recusas do presente real, cruel e a omissao do capitulo a Festa, titulo do livro, simbolo e recusa da repressao politica, se materializa nessa omissao, imagem da violencia, hipocrisia, mentira existentes no tempo presente que nao e aceito como tal. Porque ha a violencia, a sintaxe da conquista atraves do regime antitetico materializado no tecido literario, atraves da quebra da linearidade, da subversao da sintaxe da astucia, da pertinencia da progressao linear, podemos ler as imagens da conquista em convergencia com as imagens do refugio. Em A Festa, assim como em Caso Morel e Zero, os schemes de expansao, multiplica9ao, rapto, substitui9ao e usurpa9ao podem ser percebidos de forma bem explicit a atraves da presen9a de polidiscursividade mais presente em Zero, no entanto, evidenciada em A Festa, Caso Morel, A Rainha dos Carceres da Grecia, Agua Viva onde a apresenta~ao de modelos de discurso alem do discurso ficcional, se mostra de forma mais reduzida. A expansao se materializa, nesses textos, atraves da presen9a macir;a de estruturas discursivas que se expand em e se multiplicam, atraves do rapto dessas mesmas estruturas que deveriam estar no seu contexto discursivo. So como exemplo, em A Festa, embora se mantenha a sintaxe da astucia, 0 texto intitulado Documentario, e todo ele formado de rapto de recortes de jomal, textos de Sociologia, musica do cancioneiro popular. Desta forma 0 rapto implica nestes textos a substituir;ao do ficcional, pelo jomalistico, musical, religioso, juridico, etc. A intertextualidade flagrante, nestes textos, evidencia, na pos-modemidade, a tentativa de superar 0 tempo, de condensa-Io e no caso dos textos supra-mencionados 0 tempo deixa de ser 0 percurso linear tao caracteristico dos textos narrativos convencionais. Nao se trata de elidir este tempo linear, mas de usa-Io em convergencia com a sua coagulac;ao ou condensac;ao, 0 que pode ser verificado nas justaposic;6es frequentes de estruturas discursivas, temas, significantes, que simplesmente se aglomeram, sem materializarem a linearidade logica que justifica a disposic;ao progressiva dessas mesmas estruturas, temas e significantes. Vamos atraves do texto Com Os Meus Olhos de Cao de H.Hilst mostrar dois exemplos que, a nosso ver, remetem, tambem, it convergencia das sintaxes: a da conquista e a do refugio. "Engolia 0 corpo de Deus a cada mes, nao como quem engole ervilhas ou roscas ou sabres, engolia 0 corpo de Deus, como quem sabe que engole 0 Mais, 0 Todo, 0 Incomensuravel, por nao acreditar na finitude me perdia no absoluto infinito". (A obscena senhora D, p. 62). Em urn outro conto de Hilda Hilst - em Tu Nao Te Moves de Ti (p. 135), encontramos 0 seguinte exemplo: "Em todos hi uns ares de pequeno disfarce, alisam simultaneos o dorso do cao, sera porque a pergunta traz no corpo, mergulhadas, as palavras Tempo e Durac;ao? Etemidade e seu corpo de pedra e dentro desse corpo 0 tempo procraz, insolencia soterrada na carne, ai Ru~e, se 0 tempo no teu rosto te cobrisse de rugas, se tivesse a ddra e adocicada comunhao com as coisas, talvez sim tu serias mais bela porque 0 rosto adquire refulgencia se dor e maravilha e materia de tudo 0 que te rodeia te penetra, ...". NOTAS SOBRE A INTERJEI<;AO A interjei~ao e 0 unico fenomeno linguistico exclusivo da lingua falada1• Assim, mesmo quando ocorre na escrita, geralmente em contexto de diiilogo, representa uma situa~ao de fala. Nao obstante essa peculiaridade, ou talvez por isso, a interjei~ao tern recebido pouca aten~ao por parte dos gramaticos e dos linguistas. Para os gramaticos a interjei~ao e desinteressante porque nao obedyce a algum preceito normativo; para os linguistas, ela e de pouca importancia porque nao se situ a na estrutura sintatica. Motivado por essa dupla desconfian~a, 0 presente trabalho busca observar a interjei~ao em seu contexto especifico, ou seja, na pnitica discursiva. A primeira constata~ao a fazer e a falta de consenso entre os diversos autores quanto ao que possa ser tornado como interjeiyao. Em certos casos, ha fenomenos que foram tratados como inteIjei~ao (cf Ehlich, 1986:31-35; James, 1972 e 1973), que sac tidos por outros autores como marcadores conversacionais ou ate mesmo como hesita~ao. Alem disso, a interjeiyao foi vista pelos gramaticos apenas como urn recurso para expressar a emotividade e nao mais do que isso. A seguir sera feito urn levantamento de algumas dessas posi~5es com a anresenta~ao de uma alternativa teorica.2 t Fenomenos tais co; JS Marcadores conversacionais, Repeti~1ies, Truncamentos e Hesita~1ies. _Jtre outros, sac caracteristicos da fala, mas nao exclusivos, isto e, a escrita tem marcadores, repeti<;oes, etc. tipicos que nao ocorrem na fala. E neste sentido que a interjei<;ao e vista aqui como tfpica e exclusiva da fala, nao !- -,vendo interjei<;oes que sac usadas s6 na escrita. 2 Os materiais utilizados nesta analise foram extraidos de dois COl'pOJ'a diversos. Um deles e 0 conhecido COJ"PUSdo Pmjcto NURC (aqui foram us ados os de Recife e Sao Paulo), 0 outro provcm dos dados coletados pelos bolsistas do Pt'ojeto sobt'e Hesita~ao em andamento no LALIN-PE (Laborat6rio de Linguistica) da UFPE, desenvolvido pela cquipc coordenada por Judith HotTIllagcl, It:ndo como mcmbros Marigia Viana e L.A. Marcuschi, com financiamento do CNPq. Estes dados pertencem ao corpus designado Conesp (conversa~ocs espontancas), Assim, a seguir, cito dllas fontes: (a) NURC e (b) CONESP. Maiores detalhes sobre esses dados podem ser vistos em Marcllschi (em prepara<;ao). E, em geral, sucinto e pouco esc1arecedor 0 tratamento dado it interjeir;ao pelas gram<iticas. 0 mais comum e uma descrir;ao com urn elenco de exemplos classificados pela funr;ao discursiva agrupada dentro da linha da "emocionalidade". Veja-se, por exemplo, 0 que the destina a Nova Gramatica do Portugues Contempodineo, de Cunha e Cintra (1985:77). Ap6s introduzirem as classes de palavras, subdivididas em "morfemas lexicais" (substantivos, adjetivos, verbos e adverbios de modo) e os "morfemas gramaticais" (artigos, pronomes, numerais, preposir;oes, conjunr;oes, outros adverbios), os autores acrescentam uma frase final dizendo: "A interjeir;ao, voca.bulofrase, fica exc1uida de qualquer das c1assificar;oes. Mais adiante, os autores dedicam urn capitulo inteiro (cap. 17) de uma {mica pagina (p.577) a interjeir;ao definindo-a como "uma especie de grito com que traduzimos de modo vivo nossas emor;oes". Quanto ao valor da interjeir;ao, e informado que ele "depende fundamentalmente do contexto e da entoar;ao". Com esta assertiva os autores colocam, implicitamente, a interjeir;ao no contexto de fala. A c1assificar;ao das interjeir;oes, tal como sugerida, segue uma simples relar;ao empirica de dados, ou seja: II Tipos de alegria de animar;ao de aplauso de desejo de dor de espanto de impaciencia de invocar;ao de silencio de suspensao de terror Exemplos ah! oh! oba! opal avante! coragem! eia! vamos! bis! bem! bravo! viva! oh! oxa16! ai! ui! ah! chi! ih! oh! wi! puxa! hum! hem! al6! 6! 6! ola.!psiu! psit! psiu! silencio! alto! basta! ui! uhf Alem dessas ainda sac apontadas as "Iocu~oes interjeitivas", tais como "ai de mim"! "ora, bolas!" "raios te partam!" "valha-me Deus!". Isto e tudo 0 que a gramMica mais conceituada de lingua portuguesa de que dispomos na atualidade nos ensina a respeito da interjei~ao. Melhor sorte e mais espa~o mereceu 0 tema na A Comprehensive Grammar of the English Language, de Quirk, Greenbaum, Leech e Svartvik (1985). Num primeiro momento (p.67), os autores distribuem as classes de palavras (classes fechadas e classes abertas), acrescentando uma "marginal and anomalous class of interjections" (grifo meu). Na verdade, tudo indica que a interjei~ao nao se situa em classe alguma e a rigor nao pertence ao sistema lingilistico. Mais adiante (p. 74)( quando os autores analisam as propriedades de cada classe, retornam ao tema observando que" as interjei~6es costumam ser consideradas uma classe fechada com base no fato de que as que sac totalmente institucionalizadas formam urn numero pequeno". Contudo, em oposi~ao as demais palavras das classes fechadas, tal como as preposi~6es e as conjun~6es, as interjei~6es sac "gramaticalmente perifericas no sentido de que mio en tram em construr;oes com outras classes de palavras e s{io apenasfrolL'Camente conectadas as frases com as quais elas parecem estar ortogrftfica ou fonologicamente associadas." (grifo meu). Parece que os autores oscilam entre considerar ou nao as interjei~6es como uma c1asse de palavras. Na p. 441, eles situam as interjei~6es nitidamentre numa classe de palavras fechada tal como as conjun~6es e as preposi~6es. A expressao usada acima, "ortogrMica e fonologicamente associadas", sugere que as interjei~6es nao sejam parte integrante do sistema linguistico. Isto vem de fato afirmado explicitamente pelos autores quando prop6em tomar as interjeiv6es como "perifericas ao sistema lingiiistico como tal pelo fato de frequentemente envolverem 0 uso de sons que de outro modo nao ocorrem nas palavras inglesas" (grifo meu). Ha, pois, duas raz6es para exclui-las da analise linguistica: (a) nao se integram a sintaxe das frases e (b) nao sac palavras da lingua. Em nota sobre a questao, os auto res (p.74) lembram que as interjeiv6es "formam uma classe relativamente aberta porque elas podem ser criadas 223 1ivremente por onomatopeias". Isto refletiria uma "liberdade inestruturada" para urn "uso expressive de vocalizac;oes na conversac;ao". Com isto a interjeic;ao recebe seu lugar especifico na conversac;ao e tanto e tida como classe aberta como fechada. Aprofundando a questao, podemos observar, nos mesmos autores (p.88), 0 espaC;odiscursivo em que a interjeic;ao e situada. Este lugar e a pragmatica da comunicac;:ao.Definindo a pragmatica como "urn estudo da linguagem com as func;oes comunicativas", os autores frisam que os atos diretivos e as exc1amac;oesevidenciam uma certa "divisao de trabalho entre a gramatica e a pragmitica" de maneira que "quanto mais 0 contexte contribui para a forc;a comunicativa de urn enunciado, menor a necessidade de 0 enunciado ser gramaticalmente explicito". Os atos diretivos e as exc1amac;5es estariam, neste caso, no final da escala pragmatica, 0 que toma a gramatica "ociosa". Em nota final os autores retomam a interjeic;ao para afirmar que no caso das "meras interjeic;:oes" "a contribuic;ao da gramitica para 0 processo comunicativo atinge 0 seu minimo". Na verdade, as interjeic;:oessac reduzidas a "quasi linguistic noises", nao obstante sua relativa frequencia na conversac;:ao. A ultima observac;ao dos autores encontra-se it p. 853, quando dizem que "as interjeic;oes sac palavras puramente emotivas que nao entram nas relac;:oes sintaticas" e algumas delas apresentam trac;os fonol6gicos que as situam a margem do sistema linguistico. Estas posic;oes parecem refletir 0 consenso dos gramiticos a respeito da interjeic;ao e por esse caminho nada haveria de relevante sobre a questao. Seria ocioso continuar com a analise das posic;oes das gramaticas a esse respeito. Apenas a titulo de contraposic;ao ao afirmado acima e para mostrar uma visao oposta a essa, lembro aqui a posic;ao de Ehlich (1986:31) ao tratar do "hm": "0 tratamento linguistico das interjeic;oes exige uma analise formal e funcional combinada. Deveria ser realizada em expressoes individuais. A fim de nao fazer da interpretac;ao tradicionalligada a emoc;ao urn ponto de partida prejudicial, t~ato aqui uma interjeic;ao que por longo tempo sequer foi reconhecida como tal: hm." De fato, parece que 0 ponto de partida ever a interjeic;ao como a expressao grafica da expressao emotiva. 0 criterio foi a func;ao emocional. Ehlich propoe uma mudanc;a nessa perspectiva de 224 abordagem. E 0 que se tentara aqui. A Gramil.tica de referencia da lingua alema DUDEN (vol. 4: 1973) tambem situa a interjeiyao como uma classe de palavras (p. 62). Observa (p.339) que as interjeiyoes sao, segundo a forma, uma classe nao univoca de palavras, mas sao invariaveis e em oposiyao as demais palavras nao sao membros da frase nem atributos das frases em que se situam, permancendo sintaticamente isoladas. A Gramil.tica DUDEN (p.339) afirma que "as interjeiyoes sao palavras da conVerSayaO" (Worter des Gespdichs) particularmente apreciadas na linguagem afetiva, na giria e na linguagem infantil, nas fabulas, nas canyoes populares e nos "comics". Com base nisto ela se afigura urn fenomeno da fala informal, sendo que no caso da literatura ela s6 aparece em contextos que lembram a fala. De urn modo geral, a Gramlitica DUDEN tambem apresenta a interjeiyao como adequada a expressar os mais diversos tipos de emoyoes. Acresenta, porem, alguns casos mais, como chamadas do tipo "oi" ou "ei" e imitayoes de sons, sendo que neste caso teriamos as interjeiyoes onomatopaicas como: "pum", "psiu". A gramatica DUDEN faz uma longa analise da interjeiyao sob 0 ponto de vista de sua insen;ao sintatica no contexto linguistico (p.342-345), observando que: 1) sintaticamente, as interjeiyoes podem aparecer isoladas de qualquer contexto linguistico mais amplo, como no caso de: "Ai meu Deusl "; "Ai!" 2) podem aparecer relacionadas a urn enunciado, se ele for exclamativo, imperativo ou indagativo: "Ahl quem me dera estar ki hoje"; "Eil Saia dail"; "Oil vai hoje?" 3)em determinadas condiyoes as interjeiyoes podem ser membros de uma frase como elemento mencionado: "0 primeiro "uau" vai receber um premio" ou no caso de cita~oes como em: " Nossal'disse ele ao ver a confusao" 4) ha casos em que as interjeiyoes fazem parte de uma locuyao fixa como em: "dizer aiai"; "fazer miau" e outras desse tipo. A rigor, a gramatica DUDEN e uma das poucas que trata a interjeiyao em seu contexto especifico (formal e funcional), sem pretender analisa-Ia do ponto de vista das demais classes de palavras. Como result ado dessa breve incursao, restam quatro questoe~ as quais me dedicarei a seguir: 1. 2. 3. 4. a interjeiyao forma ou nao uma classe de palavras? qual 0 status sintatico da interjeiyao? qual 0 papel da interjeiyao no contexto discursivo? qual a relayao da interjeiyao com outros fen6menos da fala, tais como os Marcadores Conversacionais e as Hesitayoes? Inicialmente, serao tratados os tres primeiros itens, sendo que a quart a questao s6 ~eni vista em conjunto com a analise dos dados. a) Se as interjei~oes formam uma c1asse de palavras: Urn texto bastante ilustrativo a respeito do conjunto de problemas que poderiam interessar ao linguista no caso da interjeiyao eo de Trabant (1983) situado no contexto de urn livro editado por Weydt (1983) sobre as particulas da intera~ao. 0 texto de Trabant responde a questao: "as interjeir;iJesfazem parte da lingua?". E precisamente aresposta de Trabant (1983:75) que pretendo adotar aqui como ponto de partida: as interjeiyoes sac urn fen6meno linguistico universal, seja do ponto de vista de sua materialidade, seja do ponto de vista de sua funcionalidade comunicativa (nao do ponto de vista semantico ou informacional e sim do ponto de vista ilocut6rio). Alem disso, a interjeiyao e urn signa linguistico "arbitrario" que se torna convencional mediante seu uso intencional. Nao e uma simples imitayao onomatopaica da natureza nem urn arnontoado de sons. Do ponto de vista fonol6gico situa-se no contexto da lingua de que faz parte, de tal modo que os fonemas de que se constituem as interjeiyoes sac em geral os mais comuns daquela lingua particular. Contudo, as interjeiyoes prototipicas, tais como "ah!", "oh!", "ih!", "po! etc. nao obedecem ao principia da dupla articulayao e s6 se articulam fonologicamente, mas nao rnorfologicamente e sintaticamente, ja que neste caso sao holofrasticas e permanecem isoladas do ponto de vista rnorfossintatico. 226 Em suma, respondendo a primeira das indaga~5es feitas acima, diria que se por urn lado a interjei~ao parece formar uma classe de palavras, por outro, serve-se de elementos ljngtiisticos pre-existentes e pertencentes a outras classes de palavras. Assim, parece correto admitir que a interjei~ao, tal como os marcadores conversacionais e as hesita~5es, nao formam classes de palavras e sim classes de fun~5es discursivas bastante caracteristicas. Certamente, a questao relativa a serem ou nao uma classe de palavras e uma das menos relevantes no tratamento das interjei~5es, pois essa visao situaria a interjei~ao no mesmo plano que os demais itens lexicais, quando suas caracteristicas nao residem na sua classe gramatical e sim na sua fun~ao discursiva. b) se as interjei~oes tern urn status sintatico Os gramaticos e os linguist as observam que as interjei~5es sempre vem isoladas em rela~ao ao contexto sintatico em que ocorrem. No geral, formam uma especie de estrutura hoiofra.stica independente. Talvez por isso nao ocorrem em qualquer ponto da estrutura oracional e isto as faz diferentes dos demais fen6menos linguisticos. Diria que as inteJjei~5es nao formam sempre holofrases e muitas vezes sac urn elemento de puro efeito discursivo sem urn status sintatico definido. Por isso, nao se pode falar de urn modo categ6rico em rela~ao ao status sintatico das interjei~5es. Vejamos este caso extraido de uma Conesp: (1) Ah! mas perai ... entCia ela vat JaM Nada impede que se comece com "mas perai ... entao ela vai fala", po is e comum que na fala se inicie urn tumo com 0 marcador "mas". Portanto, mesmo neste caso, 0 Ah! seguido de uma conjun~ao nao se integra no seu contexto sintatico. Tambem nao se pode tomar aquele ah! como se fosse uma frase. o mesmo se da no caso de inser~ao em final de ora~ao como neste exemplo de uma Conesp: (2) born rnesmo que Br. nGOpossa ... a gente ensaia sem Br. pO! A ausencia daquele po! nao causaria dificuldade algurna. Parece que esse po t tern urn papel rnuito semelhante ao dos marcadores nessa posi~ao, tal como 0 viu?, certo?, entendeu? Mais complexo e 0 caso em que as interjeiyoes sac objeto de referencia de urn enunciado, como em (3) abaixo, extraida de ourra Conesp. Ali temos uma especie de integrayaO da interjeiyao no contexto sintatico: (3) ai pronto! ... eu disse "Deus me livre" ... hoje:: ((risos)) Everaldo e doido Everaldo me bota em TANta jria que eufico assim ... eu disse "mais meu Deus do ceu" ... ai quando eu vou reclamar ele:: acha ruim "Deus me livre" e" mais meu Deus do ceu" sac duas locuyoes interjeitivas citadas ou referidas e tern 0 status de complemento do verba dizer. Por outro lado, parece que as interjeiyoes, quando operam em suas funyoes especificas, nao aparecem em qualquer ponto da estrutura, como observou James (1972,1973). Seria pouco provavel que alguem dissesse: (4) * esqueci puxa! de novo meu guarda-chuva no onibus No entanto, encontramos, alguns casos muito interessantes nas Conesp analisadas, tais como: (5) tu pega oche! pega um Rio Branco num sei 0 que joga com 0 Nautico 0 Sporte 0 Santa Cruz aqui dali goleada 1../ (6) e 0 pior e e e e:: ... voce tit em casa ... assim porra! doido pra toca num sei 0 que ... neguinho telefona pra voce 1../ Ai temos dois casos diversos. Em (5) a interjeiyao naquele ponto intermediario (nao-canonico) levou a uma retomada da estrutura com a repetiyao do verbo. Ja em (6) se da uma inseryao da inteIjeiyao num ponto que a maioria dos autores nao julga possive!. Para efeitos deste estudo, vou admitir que 0 lugar canonico da interjeiyao eo inicio eo final de orayoes ou estruturas sintaticas. Embora nao excluido, seu aparecimento em outros pontos e raro ou problemiltico. Tambem vou admitir que a interjeiyao vem sempre isolada em termos estruturais, mesmo quando citada ou em inicio de citayoes. Por fim, ela nao apresenta a forma ou estrutura de frase mas sim a fun~ao ilocucional de uma fl'ase. c) se as interjei~oes tern fun~oes discursivas tipicas Parece (cf. Trabant, 1983: 71) que a interj ei9ao teria apenas urn valor pragmatico (com fortes caracteristicas discursivas) e nao realizaria uma dimensao semantica. Para Searle (1965) expressoes como "urra", "au!", teriam apenas urn conteudo ilocut6rio e nao urn conteudo proposicional. Isto quer dizer que as interjei90es nao teriam mais do que urn valor pragmatico. Segundo observa Trabant (1983: 71), tambem Trubetzkoy teria defendido esta posi9ao. A proposta de Trabant (1983 :72) e tratar a interjei9ao como urn esquema textual i1ocut6rio, a que leva a toma-la como uma macro-unidade em si me sma. Esta visao refor9aria as observa90es sintaticas acima e justificaria porque ela nao aparece em qualquer ponto aleat6rio da estrutura linguistica. Par outro lado, a maioria dos autores concordam num ponto: as interjeiyoes nem sempre constituem unidades lexicais pre-existentes na lingua. Vejam-se expressoes como: - pfui, po, oba, epa, ih, 6h, chi, ith, 0 ,pit, bit, pi, buh, eita e outras deste tipo. Isto seria urn tema de interesse aos lexic6grafos, ja que se trata de urn fenomeno muito particular e presente em todas as linguas com as mesmas caracteristicas. Sao sons adequados para expressar inten90es de forma imediata, criando assim a tipicidade funcional do fenomeno. Discursivamente, a interjei9ao situa-se sempre em contextos de maior vivacidade e reproduz momentos em que uma posiyao pessoal e tomada au manifestada. Vincula-se aos generos textuais mais espontaneos de modo mais saliente e em geral tern mais aver com a envolvimento do que com a informayao. Portanto, as interjei90es sao fenomenos essencialmente discursivos e nesta perspectiva acham-se perfeitamente integradas na estrutura ilocucional do texto. Veja-se esta sequencia de uma Conesp: (7) Ml- oxem! a meninajit sabe faze molho? M-I - O! ... ela sabe faze tudo M7 - flit! essas e.'.': que n/lm sabe menina Eram sete mulheres falando mais au menos ao mesmo tempo e acaloradamente. Nesse ponto comentavam sabre as virtu des de uma empregada domestica. Os turnos, todos curtos, sac iniciados com uma interjeiyao que revela a posiyao pessoal da falante e enquadra a interpretayao que deve ser dada a observayao. Veja-se agora este caso de interesse sob 0 ponto de vista discursivo, ao mostrar de forma muito viva como as interjeiy5es tern urn papel decisivo na montagem do clima, seja ele de tensao ou hilario. (8) M4oia! Everaldo ... eh :: como e 0:: homem vei virado nas caneca quando foi ... sexta - feira ... porque ... Everaldo chegou 16 disse "olhe va diga a sel a:: Ernesto que pague lIIinha bebida pOl"que se ele nUIIIpaGAR ... ai sabado eu venho aqui e levo ne ... minIm 11lercadoria" ... ai a lIIulher inventou lIIil e Ulna coisa ai quando 0 hOlllem chegou ta disse ... "ele foi virado nas caneca eu soul eu oil ele e muito call1lo ... e eu sou Plor ainda ai que deulas coisa num vai prestaI' nao " eu disse assi11l... "oil eu nUIIIt6 acreditano nao que Everaldo nao" fez isso .0. ai ele disse "apois! foi lIIinha esposa" disse "apois! eu nUIIInU11lacredito [ nao" M2 [ eu tinha dito "apois! e mentira dela" ... M4 eu num quis dizer assim ne MJ 0 homem jar tava ... [eul oxem! dizia "e mentira sua mulher e uma mentirosa e olhe se ela nUIIIfaz nisso" M4 ei::ta! ((riso)) [perai::! M7 [ eita perai danada!. ... [ ( M5 [() Ml e que e pra ele sai [ ( M3 ) ) [ e olhe se ela num poe ullla peruca de touro (( ri )) no senhor (( risos)) e assim oil uma peruca de tou:: ro Neste segmento as interjeiy5es revelam sobretudo uma postura pessoal e os trayos de decisao dos interlocutores quanta as suas inteny5es. Nao e uma simples questao de emotividade como frisam os gramaticos. 4.1. Identifica~ao do Fenomeno Em trabalho sobre a sintaxe e semantica das interjeit;oes, James (1972) situa nessa classe certas expressoes que outros colocam nitidamente entre os Marcadores Conversacionais, tal como "well" e "scry" que correspondem ao nosso "bem". Por outro lado, a mesma autora trata como inteIjeit;ao fenomenos que outros trataram como hesitat;ao. Na verdade, temos que identificar, dcntro do corpus, 0 que contara como interjeit;ao, distinguindo-a desses outros dois fenomenos. Tomemos, para inicio de analise, 0 exemplos abaixo (NURCSP-Inq. 234) e vejamos como identificar os fenomenos ali presentes: (8) In! Roda Viva voce assistiu? ... palavroes escritos falados e distribuidos ((ri)) de todo jeito ((rtsos)) mas fot bom tambem viu? sei ld eu acho que 0 teatro esta ..esta tc70 nao set eu vou de vez em quando eu vou mas .... nao vou muito a cinema prefiro 0 teatro Certamente, todos concordamos que viu? e urn marcador conversaciona:I em final de unidade. Mas a expressao grifada sei hi poderia ser tida como uma interjeit;ao? Alias, essa expressao vem quase sempre em posit;ao final e ali e indiscutivelmente urn marcador conversacional, mas quando vem em posit;ao inicial, parece ter as caracteristicas funcionais da interjeit;ao. A propria entoat;ao e mais marcada e em tom levemente mais alto. Tomemos este outro caso em que as posit;oes se invertem (NURC-SPInq.234): (9) fUme assim de de amor fUme ... que me prenda a atenr;ao eu tenho ido pouco ao cinema porque eh:: set lG eu:: 0 pessoal que vai "ah!" diz que tal filme nao e bom eu prefiro ficar em casa e nao ir a cinema mas tenho assistido filme bons ... olha eu estive:: 0 mes passado em Poros de Caldas estava passando umjilme que eu achei /indo aqui em Sao Paulo A Filha de (Ryan) Aqui temos a sequencia eh:: se i 16 eu:: em que possivelmente se da 0 seguinte: (a) eh:: (hesitac;ao em corte de unidade) (b) sei 16 (marcador conversacional em final de unidade) (c) eu:: ( hesitac;ao em inicio de unidade) Parece muito dificil querer tomar esse sei 16 como interjeic;ao. Ali cabiam outras express6es, tal como sabe? ou entao ate mesmo uma pausa silenciosa. Urn criterio bastante claro (mas nao categorico) que permite uma decisao geralmente clara quanta a nao to mar uma expressao como interjeic;ao e a marca prosodica em tom indagativo que nunca e usada em interjeic;6es. Isso porque a interjeic;ao nao se volta para 0 ouvinte e sim para 0 falante ou, no maximo, para 0 conteudo de sua proposic;ao. 4.2. Estrutura e posi~ao Com base nas observac;6es de James (1972 e 1973), bem como de Trabant (1983) e Ehlich (1986), entre outros, podemos dizer que a interjeic;ao nao se situa no interior da estrutura dos sintagmas, mas forma uma especie de orac;ao isolada. Esta foi uma das conclus6es basicas ja defendidas acima. Portanto, do ponto de vista da posi~ao da interjeic;ao na estrutura sintatica, notamos que ela vem no inicio de urn sitagma ou orac;ao e raramente no interior, sendo que as vezes ocorre no final. A hesitac;ao, por sua vez, e urn fenomeno cuja posic;ao canonica se da no interior do sintagma em formac;ao. Ja os marcadores conversacionais aparecem no inicio, no final e por vezes no meio. Urn diagrama poderia aqui mostrar isso: inicial interjeic;ao final xxx xxx hesitac;ao marcador c. medial xxx xxx (10) Interjei9ao:6 meu Deus! ele na crise-inda vai compra bicie/eta. .. (11) Hesita9ao: deve ser como na televisao eles preparam 000:: ••• o a per;a... e:: devem dividir (12) Marcador: bom bom voce nao falar! a gente falar pouco porque a sua mulher ta ai junto vou la chamar ela viu? e Estas sac as posilYoes ditas can6nicas e mais comuns desses fen6menos. A interjei~ao encabe~a uma estrutura sintatica com a qual nao mantem relalYao. A hesita~ao rompe uma estrutura sintatica. 0 marcador emoldura a construtyao sintatica, mas nao se insere nela. A tabela a seguir da uma nOlYaObastante clara da posityao da interjeityao nos dados trabalhados. conesp quant. nurc % quant. % infcio 56 70 26 84 meio 4 5 3 10 final 7 9 2 6 13 16 80 100 31 100 isolada totais Algumas observalYoessac aqui imprescindiveis para entender esses dados. No caso das Conesp, foram analisados 4 dialogos num total de 60 minutos e eles apresentaram 80 ocorrencias (sendo que cerca de 20 ocorrencias duvidosas foram deixadas de lado). Quanto aos materiais do NURC, foram vistos 3 dialogos e uma aula, num total de 190 minutos tendo apresentado apenas 3 1 interjeiyoes, mas muitos problemas, ja que casos como 0 sei hi, certo! e outros desse tipo nao foram contabilizados neste levantamento. Isso comprova que a interjeilYao ocorre com mais frequencia em textos espontaneos e e bem menos comum em textos 233 formais do tipo aula e conferencia ou em textos em que a atenc;:ao se volta mais para 0 conteudo que para a interac;:aoe 0 envolvimento. Tambem convem lembrar que os dados contabilizados em inicio de unidade contem os inicios de citac;:5esde fala, tais como: (13) um dos medicos ficou com uma dor nCiosei do que ... de est6mago e tal ... falou "alt! vamos chamar os pajes nO" Estes casos chegarm a urn total de 20 nas Conesp e 8 no NURC. Alem disso, e interessante que nas Conesp aparecem 13 casos de interjeic;:5es isoladas, tal como no exemplo a seguir e no NURC nenhuma interjeic;:aoisolada foi encontrada. (14) Br - quando eu cheguei la que eu olhei so tinha FRANgo Nd - eita! Br - so tinhafrango ... os cara sabe Bl tudo se beijando assim (( risadas enquanto simula os beijos)) sabe? num papo Bl - ei:ta! o certo e que com urn percentual entre 70 e 80% na posic;:ao inicial, a interjeic;:aotern neste ponto sua posic;:aocanonica. Quanto a forma estrutural das interjeic;:5es e interessante observar que e muito comum ela vir acompanhada do nome do interlocutor, tal como em: Tambem vem, tal como observado, em inicio de cita95es ou entao isolada. Algumas das formas que apareceram foram: - po!, porra!, 0 que!, ue!, ah!, t~idoida!, oxe!, oxente!, ai meu Deus!, aimeu doutor!, vem ca!, o!, 6ia!, perai!, eita!, apois!, pronto!,rapaz! e varias outras nessa linha. A maior variedade ocorreu nos textos das Conesp. 4.3. Ponto de vista interacional: Sob este aspecto a interjei~ao situa-se, diferentemente das hesita~5es, sempre em inicios (ou as vezes em finais) de unidades por raz5es comunicativas. Sua vincula~ao frequente com 0 nome do interlocutor e um aspecto que mostra essa aten~ao para a explicita~ao do envolvimento e da inten~ao. Tambem 0 fato de boa parte das cita~5es de fala virem encabeyadas por uma inteIjei~ao urn indicio de seu alto valor cornunicativo. Discursivamente, as interjei~5es sac importantes por criarem um clima de maior naturalidade e espontaneidade. Tanto assim que as interjei~5es decrescem na propor~ao direta do aumento da formalidade. Observe-se que na Literatura romanesca em geral os escritores introduzem mais interjei~5es em momentos aos quais desejarn emprestar um alto indice de naturalidade. As hesita~5es, por sua vez, nao tem um trabalho interacional, nem uma decisao itencional e sim servem sobretudo ao processamento Iingiiistico. Elas se volt am preferencialmente para as atividades de formula~ao do falante. As interjei~5es, ao contnirio, sac intencionais, nao se situam na esfera do processamento e sim da intera~ao e do envolvimento (talvez mais um autoenvolvirnento) e voltam-se especialmente para a expressao das inten~5es do falante. Ja os marcadores conversacionais, por seu carater de envolvimento interpessoal mais acentuado, voltam-se preponderantemente para para as rela~oes interpessoais e sac mais ricos em fun~5es e posi~5es, relacionando-se tanto aos falantes como aos ouvintes e ao proprio conteudo. Os marcadores tem uma presen~a muito alta e fun~5es bem mais variadas que as interjei~5es e as hesita~5es. e CUNHA, Celso&LuisF. LindleyCINTRA. 1985. Nova Granuitica do Portugues Contempordneo. Rio de Janeiro, Nova Fronteira. DUDEN. Grammatik del' deutschen Gegenwartsprache. Mannheim, Dudenverlag, 1973, 33 ed. ERLICH, Konrad. 1986. Inteljektionen. Tilbingen, Max Niemeyer. JAMES, Deborah. 1972. Some Aspects of the Syntax and Semantics of Interjections. Papers from the Eighth Regional Meeting - Chicago Linguistic Society. 1972: 162-172. JAMES, Deborah. 1973. Another Look at, say, Some Grammatical Constraints, on oh, Interjections and Hesitations. 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