simpósio 21 - iv simpósio mundial de estudos de língua portuguesa

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simpósio 21 - iv simpósio mundial de estudos de língua portuguesa
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SIMPÓSIO 21
O PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA:
POLÍTICAS DE FORMAÇÃO
Objetiva-se investigar a formação do acadêmico, futuro professor de Letras, por meio da análise de
práticas discursivas em diferentes dimensões da formação e manifestas nas práticas curriculares e
nas vozes de acadêmicos e professores. Estas dimensões se traduzem em processos de formação na
Universidade, na Educação Básica e em documentos norteadores da política científico-educacional
de cursos de Letras. Atenta-se para posicionamentos e imagens que se constroem dos sujeitos como
alunos e futuros professores de Língua Portuguesa e Literaturas de Expressão Portuguesa. As
análises apontam que a adoção e seleção de conhecimentos e metodologias anunciam concepções e perfis
de professores de Língua Portuguesa e Literatura, convergindo ou confrontando com as conjunturas sóciohistóricas que orientam os discursos científico-educacionais. Compreender os discursos mobilizados no
processo de formação do futuro professor deve possibilitar a construção de políticas que promovam
uma melhor qualificação do profissional de Letras no âmbito dos países lusófonos.
COORDENAÇÃO
Cláudio Abreu Fonseca
Universidade Federal do Pará
[email protected]
Émerso Di Pietro
Universidade de São Paulo
[email protected]
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ENTRE TEORIA E PRÁTICA: SENTIDOS DA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE
PORTUGUÊS
Nilsa Brito Ribeiro - UFPA
O presente trabalho discute resultados de uma pesquisa em que se investiga a formação do professor
de Língua Portuguesa, com o objetivo de analisar relações, confrontos e ‘deslizes’ produzidos na
articulação entre os conhecimentos circunscritos ao currículo de um curso de Letras e a apropriação
destes conhecimentos pelos alunos do curso. O espaço considerado privilegiado para a explicitação
desta relação são as atividades de estágio realizadas na escola básica durante o percurso de
formação; ou seja, pretende-se apreender sentidos produzidos entre saberes teorizados e saberes
praticados no espaço da docência. Admitindo que não se deve estabelecer uma relação linear e
inequívoca entre os conhecimentos concernentes à área de formação e os conhecimentos
mobilizados no espaço da prática docente, justamente porque outros saberes e sentidos interferem
neste processo, perguntamos, durante a pesquisa, pela historicização do percurso formativo do
futuro professor de Letras, na relação com o conhecimento e com a transformação deste no espaço
da docência. Perguntamos ainda por representações construídas no movimento entre teoria e prática,
sob a hipótese de que nas representações prefiguram-se imagens do professor de Português, que
remetem tanto a sentidos já estabilizados quanto a deslocamentos impulsionados pelo movimento
da história. Entrevistas orais e relatórios de estágios são os instrumentos adotados para a
composição dos dados. Uma análise preliminar já identifica um conjunto de conhecimentos
mobilizados pelo aluno durante os estágios, os quais remetem a orientações históricas, culturais,
educacionais, ideológicas etc. No entrecruzamento de discursos produzidos pela ciência, por
especialistas da área, pela tradição escolar e pelo próprio professor de Língua Portuguesa vão se
constituindo representações identitárias deste profissional.
LETRAMENTOS SOCIAIS DE PROFESSORES DO CAMPO: LEMBRANÇAS DE
LEITURA E ESCRITA
Charlene Bezerra dos Santos – UFSC
Marcos Antônio Rocha Baltar – UFSC
Este estudo busca contribuir com a formação de educadores/as do campo, formação esta que parece
ter sido relegada pelo Estado, uma vez que, ao longo da história do Brasil, o direito à educação
escolar foi negado à população, sobretudo a que vive no campo – “tratado historicamente como
zona rural – ou, quando muito, lhe foi oferecida uma educação precária”, (ARROYO, 2004, p.32).
Neste sentido investigamos os letramentos sociais de quatro professores do campo, de um
assentamento no sudeste do Pará, evidenciados em memoriais, nos quais narraram suas lembranças
de leitura e escrita, mediante o contexto de formação em que estão inseridos, enquanto
educadores/educandos, do quarto semestre do curso de Pedagogia/PARFOR da Universidade
estadual do Pará (UEPA), durante a disciplina Processos Linguísticos. Dispomo-nos a observar
como se concretizam/ram seus processos de aprendizagem de leitura e escrita. Optamos por
compreender as práticas de leitura e escrita situadas desses discentes, a fim de entender como estes
se constituem professores das séries iniciais, destacando lembranças de seus letramentos, como
asseguram Barton& Hamilton (1998) “letramento está integrado no próprio contexto social das
pessoas, por isso que se configura numa prática socialmente situada”, e se esses estão ou não
associados à escola, o que pode destoar do que a sociedade entende como sendo o processo de
alfabetizar, aquele bem próximo da concepção do modelo de letramento autônomo, discutido por
kleiman(2005), cuja referência da escrita se dá como “um produto completo em si mesmo que não
estaria preso ao contexto de sua produção para ser interpretado”. Ao passo que o modelo ideológico
de letramento considera não somente os aspectos culturais de interação, mas também “as relações
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de poder numa determinada sociedade”. Pautamos também nossa discussão em Freire(2003), onde
“aprender a ler, a escrever, alfabetizar-se é, antes de tudo, aprender a ler o mundo, compreender o
seu contexto, não numa manipulação mecânica de palavras, mas numa relação dinâmica que vincula
linguagem e realidade” (2003, p.25).Verificou-se neste trabalho a importância de discutir
concepções de ler e escrever como parte da reflexão que os professores fazem sobre o ato de
ensinar/aprender Língua materna, por aqueles que não fizeram o curso de Letras, todavia lidam com
práticas de linguagem.
PROBLEMATIZANDO FORMAÇÃO DE PROFESSORES E ENSINO DE LÍNGUA
PORTUGUESA POR MEIO DO DIÁLOGO
Morganny Ribeiro – UEG
Sandra Jardim de Menezes Ferreira – UEG
A formação inicial de professores de língua portuguesa tem, por quais sejam os motivos, dado
vazão apenas a aspectos eminentemente técnicos utilitaristas durante a formação. Quando, no
entanto, sabemos que o ensino teórico deveria estar estritamente ligado ao ensino prático, a fim de
proporcionar uma formação profissional com mais qualidade e com a verdadeira proposta que lhe
compete. Para esta sincronia perfeita (teoria e prática), tornam-se necessárias práticas discursivas
que funcionem como análise e reflexão sobre a problemática do ensino, ainda na graduação, a fim
de promover transformação e consequentemente à formação de professores críticos, que se
proponham a serem pesquisadores da sua própria prática. Pensando na formação de professores, não
podemos apenas frisar a formação inicial, pois esta é apenas um alicerce para uma formação
continuada. A formação docente não é limitada, pelo contrário, merece ser contínua devido à
complexidade da prática pedagógica a se estender além da sala de aula, com vistas à promoção de
saberes docentes alicerçados à crítica. O educador, com isso, teria a oportunidade de expor o que
aprendeu na formação inicial. Igualmente, a formação continuada não se resume em especializações
quer sejam latu senso e/ou strict senso, mas também no esforço individual de cada profissional em
planejar a aula, estudar o conteúdo tendo total domínio e confiança aliado às leituras teóricas sobre
complexidades que enfrenta. Um professor em plena formação busca maneiras diferentes para que
possa aprender de forma clara e para isso pesquisar é preciso, fazendo o uso da aprendizagem
contínua e buscando esse tipo de atualização. Este trabalho é de cunho qualitativo, feito a partir de
diálogos gravados em áudio vídeo entre professores em formação de uma universidade do interior
de Goiás, que optaram por uma formação continuada, dando ênfase, também, à sua formação
inicial. Esses professores universitários comprovam através da reflexão colaborativa que a formação
continuada se tornou essencial no seu desempenho profissional e afirmam sobre a importância de se
tornarem professores de língua portuguesa críticos reflexivos e pesquisadores. Enfim, o hábito de
pesquisar, pelo menos nesses relatos, se torna uma recorrente sinalização para uma opção
construtiva da docência, tanto para o educador quanto para o educando, a fim de multiplicar o
conhecimento sobre os processos de ensino.
ESTÁGIO SUPERVISIONADO E ENSINO DE LÍNGUA MATERNA: UM OLHAR
DISCURSIVO SOBRE RELATOS PRODUZIDOS POR PROFESSORES EM FORMAÇÃO
Fabíola Silva de Oliveira Vilas Boas – UEFS
Acreditamos ser o estágio supervisionado curricular uma das etapas mais relevantes do processo de
formação dos futuros professores de língua materna, tanto pela sua inerente propriedade formativa
como também pela oportunidade de ele vir a ser, para o graduando, a porta de entrada para os
primeiros contatos efetivos com a prática profissional e com a realidade na qual irá atuar, com todas
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as suas nuances, diversidades e especificidades. Nesse sentido, concordamos com Pimenta (2001) e
Kenski (1994), para quem o estágio é uma experiência profícua para a articulação indissociável
entre a teoria e a prática, capaz de tornar o futuro professor um agente construtor de sua própria
práxis pedagógica, a partir do exercício permanente e reflexivo de planejamento, elaboração,
avaliação e reelaboração de suas ações didáticas. O propósito deste trabalho, portanto, é socializar
as experiências formativas vivenciadas pelos alunos do curso de Licenciatura em Letras Vernáculas
da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), durante seu processo de formação
acadêmico-profissional, especificamente no decurso das disciplinas Metodologia do Ensino da
Língua Portuguesa e Estágio Supervisionado em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira,
ministradas nos dois semestres finais do curso. Para tanto, tomamos os fundamentos teóricometodológicos da Análise de Discurso de vertente francesa, configurada por Pêcheux (1969; 1975;
1983), na França. Conceitos-chave da AD, tais como Sujeito Discursivo, Posição-sujeito, Formação
Ideológica, Formação Discursiva, Interdiscurso e Condições de Produção, além dos estudos de
pesquisadores brasileiros situados nessa mesma esteira teórica, são mobilizados com o objetivo
central de analisar os efeitos de sentido em funcionamento em textos do gênero acadêmico relatório
de estágio, elaborados pelos discentes durante os dois últimos semestres. Por meio dessas
materialidades discursivas, investigamos as posições-sujeitos que atravessam o discurso dos
professores em formação acerca de questões atinentes ao ensino de língua materna. No caso dos
alunos de Metodologia, que realizam estágio na modalidade observação, são elas: a) a concepção de
língua e linguagem que orienta o fazer pedagógico do professor cuja prática foi observada, desde a
seleção de conteúdos de ensino aos mecanismos de avaliação por ele utilizados; b) a metodologia de
trabalho, isto é, o modus operandi das aulas de língua portuguesa; c) as reflexões produzidas pelo
estagiário acerca da prática docente observada. Com relação aos alunos de Estágio Supervisionado,
que realizam estágio na modalidade regência, as questões são: a) a experiência do estágio,
ressaltando sua importância para a formação acadêmico-profissional e pessoal; b) as relações entre
a contribuição teórica das disciplinas do curso e a prática da docência vivenciada no Estágio; c) o
estágio como uma atividade acadêmica obrigatória do Curso de Letras Vernáculas, situada no final
do curso; d) o que o estagiário aprendeu no curso sobre “ser professor de Língua Portuguesa e
Literatura Brasileira”. Os resultados parciais de análise do corpus já apontam a filiação do professor
em formação a duas formações discursivas: uma primeira, na qual ele se apoia e fala de um lugar
ideológico de reprovação à conduta denominada prática de ensino tradicional, exercida por
professores da educação básica, produzindo representações que revestem os docentes de efeitos de
culpabilidade pelo modo como organizam seu fazer docente; uma segunda, na qual surgem
representações de valorização às teorias da linguagem que tomam o texto como objeto de trabalho
da língua materna, lidas nas materialidades como soluções pretensamente capazes, por si mesmas,
de otimizar o ensino de língua e literatura.
LETRAMENTO ACADÊMICO E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO CONTEXTO
DA APEP – ANÁLISE DA PRÁTICA DO ESTÁGIO
Gilcinei Teodoro Carvalho – UFMG
Maria Zélia Versiani Machado – UFMG
Este trabalho tem por finalidade analisar alguns gêneros acadêmicos, elaborados e escritos por
alunos do curso de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, produzidos em fase
de estágio no Ensino Fundamental. As atividades relativas ao estágio iniciam-se com a elaboração
de um projeto de ensino e têm como culminância a escrita de artigos e da sua apresentação em
seminários. Espera-se, assim, tornar o exercício da docência e a possibilidade de inserção em escola
da Educação Básica uma experiência que leve não só à reflexão sobre o ensino de Língua
Portuguesa como também sobre o letramento acadêmico desses alunos. Diferentemente do alcance
dos relatórios, projetos e artigos conferem à experiência do estágio uma mais acentuada
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problematização das práticas escolares de ensino de língua e de literatura, além de favorecer uma
mais efetiva circulação dos textos produzidos que não se limita ao âmbito disciplinar. As temáticas
escolhidas para o projeto de ensino, os eixos contemplados, as metodologias de ensino adotadas
indiciam pressupostos teóricos contemporâneos que se articulam aos discursos oficiais presentes
nos documentos que orientam os trabalhos que levantam inúmeras questões relativas à formação de
professores. Quais as tendências de ensino de língua portuguesa acumuladas durante a formação em
Letras observadas nesses artigos? O que a produção e circulação desses gêneros acadêmicos revela
sobre o que se espera da licenciatura? Qual o perfil desses alunos quanto às práticas de letramento
acadêmico, que lhes permitem planejar e, após o período de estágio, realizar uma reflexão crítica
sobre as práticas observadas no contexto escolar? Estas e outras questões são discutidas neste
trabalho que se situa no campo de estudos do letramento acadêmico e da formação de professores e
tem como foco a compreensão de questões que permeiam a prática de ensino da leitura, da escrita e
da oralidade, em escolas públicas e particulares na região metropolitana de Belo Horizonte. A
análise dos textos acadêmicos permite, ainda, a construção de subsídios que favorecem a reflexão
sobre a produção de materiais didáticos e sobre a definição de metodologias para a prática docente
por alunos dos cursos de Letras.
A ORGANIZAÇÃO DA INTERAÇÃO EM UMA AULA DE LEITURA NO CURSO DE
LETRAS: A NEGOCIAÇÃO DE SENTIDOS NA CORREÇÃO DE UM EXERCÍCIO
Maria da Conceição Azevedo – USP
A interação em situações de ensino e aprendizagem em ambiente institucional envolve seus
participantes — professores e alunos — em atividades diferenciadas daquelas que se dão em outras
interações face a face, o que aponta para algumas particularidades da organização interacional nesse
contexto. A presente comunicação traz para discussão um estudo sobre a organização da interação
numa aula de leitura voltada à correção de questões de compreensão textual, no contexto de uma
disciplina ofertada no Curso de Letras de uma universidade pública federal. Partindo de estudos da
interação em situações de sala de aula, bem como de pressupostos bakhtinianos a respeito da
natureza interacional e dialógica da linguagem, analisamos os modos como a professora e os alunos,
por meio de comportamentos verbais e não verbais, interagem reciprocamente para dar acabamento
a uma prática discursiva singular, na qual os sentidos não estão dados, mas vão sendo construídos
conjuntamente. A análise demonstra que os sentidos são permanentemente negociados pelos
participantes durante as trocas dialogais, em função dos papeis sociais que desempenham no
ambiente de ensino formal. Descrições e análises de práticas discursivas em contextos formativos
como o de que trata este estudo são potencialmente relevantes para a compreensão dos discursos
mobilizados durante o processo de formação de professores, o que pode ser útil para a construção
de políticas de qualificação do profissional da área de Letras.
GÊNERO DISCURSIVO E AUTORIA: PROCESSOS TRADUTÓRIOS NO JOGO
INTERLOCUTIVO DE SALA DE AULA
Hadson José Gomes de Sousa – UFPA
Refletir acerca da interdiscursividade e da intradiscursividade que se configuram no “gênero
discursivo aula” (BAKHTIN 1997) e tomar como “objeto” de análise as tarefas verbais –
enunciações – produzidas/proferidas nesse espaço como tradução (JAKOBSON 1995; RICOEUR
2011; DERRIDA 2006; BURKE 2009; Et al), re-formulações, objetivações, de discursos outros (do
livro didático ou do campo científico etc.), é a motivação desta discussão. Para tanto, deve-se
considerar os trâmites e as demandas que motivam as diversas possibilidades de
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produção/construção de certas materializações dos enunciados que circulam no cotidiano das aulas,
suscitadas por um jogo de representações que o professor tem de si, enquanto suposto saber, do
aluno, enquanto sujeito suposto não-saber, e do próprio objeto de ensino (RIBEIRO 2005). Assim,
daremos relevo às aulas de língua portuguesa, nomenclatura que abrange a gramática, a literatura e
a produção textual, ou seja, ao ensino de língua/linguagem no nível final da escola básica e às reformulações daqueles discursos (MAINGUENEAU 1997; AUTHIER-REVUZ 1998) na passagem
a conteúdo de ensino. Nossa atenção se voltará, especificamente, ao trabalho do professor que no
processo de tradução, além de negritar a interdiscursividade, o que há de repetível nesse discurso,
imprime marcas de singularidade, subjetividade mostrada, que consideramos princípios de autoria
(BAKHTIN 1997; FOUCAULT 1971; POSSENTI 2002), enfim.
NO CAMPO DA IDENTIDADE: LÍNGUA PORTUGUESA E LÍNGUA MATERNA EM
DOCUMENTOS OFICAIS
Priscila da Silva Santos – USP
Neste trabalho propõe-se a análise de documentos oficiais brasileiros que dizem respeito à
normatização do ensino de Língua Portuguesa. A opção por estes materiais justifica-se pelo fato de
que, cada vez mais, eles são abordados em cursos de formação inicial e, praticamente, são o centro
das atenções em cursos de formação continuada. No decorrer da análise, procura-se problematizar a
relação Língua Portuguesa/ Língua Materna no âmbito de três instâncias interdiscursivas (oficial,
acadêmica e pedagógica), a fim de verificar de que modo se constitui o objeto de ensino da
disciplina escolar comumente denominada “Português”. Para tanto, será feita uma breve descrição
do contexto histórico-linguístico do período colonial, com especial atenção para as reformas
pombalinas da segunda metade do século XVIII, dado que a partir delas começa a se delinear uma
política de ensino propriamente dita do ponto de vista da estruturação de um currículo. Em seguida,
discutiremos a reforma curricular realizada a partir da interpretação da LDB 5692/71 e das
resoluções e pareceres que deram suporte a esta lei. No que diz respeito à década de 1980,
analisaremos as Diretrizes para o ensino/aprendizagem de Língua Portuguesa e, finalmente,
discutiremos os pressupostos presentes nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua
Portuguesa. Ao longo deste percurso histórico realizado através da análise de documentos, objetivase sustentar a hipótese de que o ensino de Língua Portuguesa e o de Língua Materna não coincidem
no âmbito do ensino, visto que tais concepções de língua advêm de diferentes formações discursivas
e estabelecem entre si uma relação de interincompreensão. A mobilização dos conceitos de
formação discursiva (Foucault, 1969), de interdiscurso e de interincompreensão (Mainguenau,
1984) será feita através do estabelecimento de um diálogo entre os autores para que seja possível
localizar as divergências e convergências teóricas existentes entre eles. Desse modo, espera-se que
o instrumental teórico oferecido pela Análise do Discurso se relacione organicamente com o
material analisado.
O LUGAR DOS SABERES LINGUÍSTICOS EM PROPOSTAS CURRICULARES PARA O
ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO BRASIL
Emerson de Pietri – FE-USP
Neste trabalho, apresentam-se resultados de investigação (apoiada pelo CNPq) sobre as relações
estabelecidas entre instâncias acadêmicas responsáveis pelo trabalho de produção de conhecimentos
sobre linguagem, e instâncias oficiais que se responsabilizam pela apropriação e circulação desses
conhecimentos com objetivos pedagógicos. Trabalha-se com a hipótese de que na segunda metade
da década de 70 do século XX compõe-se uma nova ordem de relações entre instâncias sociais que
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tomam sob sua responsabilidade o ensino de língua portuguesa no Brasil. Considerando-se os
modos de constituição dos objetos de ensino em propostas pedagógicas oficiais e sua relação com o
desenvolvimento de pesquisas acadêmicas sobre linguagem, observa-se que os saberes sobre
linguagem produzidos pelos estudos linguísticos ocupam, nesse processo, diferentes lugares ao
longo das três últimas décadas do século XX e anos iniciais do século XXI. Caracterizam-se três
momentos distintos no período em análise: um momento de emergência, em que saberes
linguísticos modernos concorreram com saberes tradicionais sobre linguagem para o
estabelecimento de diretrizes para o ensino de português na escola; um momento de consolidação,
em que saberes produzidos pela Linguística fundamentaram a elaboração de propostas curriculares
para o ensino de língua materna; um momento de deslocamentos e redefinições, em que os saberes
linguísticos respondem a perspectivas antropológicas ou sociológicas, dominantes no discurso sobre
ensino de língua portuguesa. Faz-se necessário, portanto, discutir o que representou, do ponto de
vista acadêmico, social e político, a reconfiguração do campo em que se constitui a língua
portuguesa em objeto de ensino, em que os saberes linguísticos se movimentam em direção a um
lugar de centralidade, para, num momento posterior, preencherem funções enunciativas
dependentes de campos do saber que não o dos estudos da linguagem. O recorte do corpus e a
análise dos dados foram realizados segundo perspectiva discursiva de linha francesa. A opção por
esta perspectiva teórica se justifica na medida em que a investigação dos processos de constituição
dos objetos de pesquisa e ensino se fundamentou na análise das relações entre o discurso
acadêmico, o discurso oficial e o discurso pedagógico.
EXAME VESTIBULAR: EFEITOS DE COERÊNCIA E CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM
NO “MANUAL DO CANDIDATO”
Rita de Cássia Antonia Nespoli Ramos – USP
Desde o início do século XX, o vestibular constitui-se por uma função que com o passar do tempo
naturalizou-se e imbricou-se na sociedade e no ambiente escolar: é eleito como um mecanismo que
seleciona os mais aptos a ingressarem nas universidades. Tal papel é legitimado por um conjunto de
leis que não permite o ingresso no ensino superior, pelo menos nas universidades estaduais
paulistas, por outros meios. Esse exame se confunde com uma instituição que geralmente é
encarregada de divulgar e aplicar as provas e com uma universidade a qual o evento representa.
Para a seleção de candidatos, um dos dispositivos do vestibular é apresentar um material intitulado
“manual do candidato”, no qual há o estabelecimento das regras que compõem o exame e que visam
oficializar um conjunto de práticas que regulam os saberes e os comportamentos exigidos para
aqueles que querem ingressar no ensino superior. Inseridos nos manuais, estão os programas das
disciplinas, os quais informam aos candidatos os conteúdos exigidos em relação a cada área de
conhecimento. Outra característica desse material é sua ampla circulação entre os alunos,
professores e toda uma sociedade que volta os olhos para esse exame. Diante desse contexto,
selecionamos como corpus trinta e quatro programas de português e de redação disponibilizados
anualmente pela Fundação Universitária para o Vestibular, a FUVEST, no período de 1976 a 2012.
Nosso objetivo é analisar como os documentos da FUVEST aliam certas concepções do campo da
linguagem com seu papel institucional de elaborada, aplicadora e avaliadora do exame vestibular.
Nossa hipótese é que as concepções do campo da linguagem mobilizadas nos programas de
português e de redação filiam-se a Formações Discursivas que se rejeitam: de um lado, uma
perspectiva que considera a língua como um sistema teórico e por isso enfatiza a gramática teóriconormativa; por outro, uma concepção que enfatiza a interação verbal e por isso pressupõe os
diferentes sentidos das palavras conforme os contextos de uso da linguagem. Como essas
concepções não se conciliam - uma prova disso são as listas hierarquizadas de termos gramaticais e
linguísticos apresentadas nos trinta e quatro programas, independentemente da concepção de
linguagem por eles descrita - prevalece um viés teórico nos enunciados, nos quais o uso da
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linguagem só é possível pelo domínio teórico do sistema. Esse é o pressuposto teórico que irá
determinar o que é “língua”, “texto” e “escrita”, nos programas de português e de redação. Para
sustentar nossas análises, buscamos analisar e descrever o corpus por meio das regularidades
enunciativas e por isso nos respaldamos nos estudos de Foucault. Além disso, temos a perspectiva
da Análise do Discurso de procedência Francesa, mais especificamente nos postulados de
Maingueneau sobre interdiscurso, por meio dessa instância, compreenderemos os enunciados dos
programas com um espaço discursivo em que há a interimcompreensão dos discursos postos em
concorrência.
O LUGAR DOS CONHECIMENTOS LINGUÍSTICOS E A REESTRUTURAÇÃO
CURRICULAR DO CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS
Lilian P. Palácio – USP
O objetivo dessa pesquisa, que está em andamento, é observar como os princípios de normatização
interna aos próprios processos de sistematização de fatos linguísticos produzem efeitos na
estruturação curricular, em um curso de Licenciatura em Letras de uma universidade pública.
Considerando que o processo de constituição da língua em objeto de práticas prescritivas ou mesmo
descritivo-analíticas produz efeitos sobre os modos de estruturação curricular em cursos de
Licenciatura em Letras, pretendo observar ainda de que modo a(s) concepção(es) sobre currículo
que fundamenta(m) o Projeto Político Pedagógico do curso dialoga(m) com os princípios que
normatizam e orientam a estruturação curricular. Dadas as concepções que fundamentam um curso
para formação de professores de língua portuguesa, os conhecimentos linguísticos tratados em um
currículo de Letras podem revelar qual(is) concepção(es) de linguagem orienta(m) o curso.
Entretanto, devido às transformações históricas, políticas e culturais, os valores dos saberes
linguísticos são sempre redefinidos a cada momento em que são produzidas novas perspectivas
sobre linguagem. Essas transformações não desconsideram o passado, pelo contrário, elas ordenam,
selecionam, planejam e projetam o futuro. Porém, mesmo diante dos vários entendimentos sobre
linguagem, é possível perceber que nos processos que descrevem os fatos linguísticos, há um
princípio normativo, já inscrito nesses processos no momento em que se elege uma concepção de
língua em detrimento de outra, que atua sobre as representações que se constroem sobre a
linguagem. Nesse entendimento, a hipótese que apresento é a de que no processo de constituição da
linguagem em objeto de práticas descritivas ou prescritivas, há um princípio de normatização, o
qual produz efeito sobre o processo de estruturação curricular em cursos de Licenciatura em Letras.
Outra arena de discussão diz respeito, nesse trabalho, ao discurso oficial, ao discurso pedagógico e
ao discurso acadêmico, presentes no Projeto Político Pedagógico, que sistematiza o curso. Esses
discursos são, por natureza, heterogêneos, pois as suas condições de produção partem de campos
discursivos diferentes, i.e., o Estado que trata das normas, o pedagógico que trata de questões de
ensino e o acadêmico que produz conhecimentos. Tudo isso remete a algo que pode e deve ser dito
num determinado contexto em uma conjuntura dada e, por conseguinte, pode se contrapor ou se
complementar. Para observar como os princípios de normatização interna aos próprios processos de
sistematização de fatos linguísticos produzem efeitos na estruturação curricular, pretendo realizar
um trabalho de análise documental com base nas leis oficiais publicadas pelo Estado, sobre
reestruturação curricular no ensino superior, e no Projeto Político Pedagógico de um curso de
Licenciatura em Letras de uma universidade pública. As perspectivas teóricas que embasam esta
pesquisa fundamentam-se na Análise do Discurso de vertente francesa, por fornecer subsídios que
explicam como o discurso é constituído em suas várias manifestações.
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FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE LITERATURA: ANÁLISE DOS CURSOS DE
LETRAS DAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS FEDERAIS DE MINAS GERAIS
Micheline Madureira Lage – IFG-Goiânia
Esta comunicação busca compartilhar os resultados da pesquisa intitulada Ensino, Literatura e
Formação de Professores na Educação Superior: retratos e retalhos da realidade mineira cujo
corpus de análise abarcou sete universidades federais. Os objetivos que nortearam o trabalho foram:
refletir a respeito da situação dos cursos de Letras/licenciatura, em Minas Gerais, contextualizandoos no quadro político, social e educacional brasileiro, tendo como objeto o estudo dos
direcionamentos do ensino de Literatura nas faculdades federais de Letras (licenciaturas) e suas
relações com as demandas provenientes da Educação Básica. Para a realização da análise
empregou-se as abordagens qualitativa e quantitativa. Os resultados apontaram uma relação estreita
e complexa entre universidade/literatura/sociedade. Cidades como Belo Horizonte e Juiz de Fora –
onde há predominância de uma cultura metropolitana – apresentaram cursos de Letras em que a
formação do professor de Literatura ocorre em um ambiente de pouco diálogo com a comunidade
na qual estão inseridos, bem como com a realidade da Educação Básica. O mesmo se deu em Ouro
Preto, talvez em decorrência de sua proximidade geográfica com a capital mineira. O lugar que a
literatura ocupa em tais cursos carrega consigo um traço de distinção. Os cursos de Letras
localizados em cidades interioranas voltam-se mais para questões ligadas ao ensino e há uma
preocupação maior com a formação do professor de Literatura. Observou-se também que, em tais
cidades, a comunidade acadêmica está mais próxima da população. A análise dos dados também
apontou uma fragilidade maior no repertório cultural dos alunos do interior e, nesse contexto, a
literatura apresenta maior possibilidade de ser didatizada. Embora tenham sido registradas ricas
experiências literárias em todas as faculdades de Letras, nota-se que a universidade, como
expressão da sociedade atual – pragmática, utilitarista – corre o risco de deslocar a literatura para
dois eixos: o da distinção e o da pedagogização. Algumas instituições já apontam para um diálogo
entre literatura e educação, evidenciando que uma alternativa de renovação e de ultrapassagem da
dicotomia distinção/pedagogização da literatura é possível.
LETRAMENTO, GÊNERO E REPRESENTAÇÕES NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
A DISTÂNCIA
Adilson Ribeiro de Oliveira – IFMG-Ouro Preto
Nos últimos anos, vem-se notando uma crescente preocupação de pesquisadores e professores com
a escrita universitária bem como com a inserção dos estudantes nos modos de produção, leitura e
circulação de textos ditos da esfera acadêmica (resumos, resenhas, relatórios, artigos, entre outros).
Nesse quadro, a partir de discussões advindas do campo dos “novos” estudos do letramento e suas
relações com gêneros da esfera universitária, este trabalho objetiva uma reflexão sobre a escrita (e
seus processos) no ensino superior, mais especificamente na formação de professores na
modalidade EaD (Educação a Distância). Tendo como objeto de estudo produções escritas de
estudantes de um curso de Pedagogia, pretende-se discutir, de um ponto de vista enunciativodiscursivo, as representações que são atualizadas na configuração de relatos de experiência, os quais
culminaram na produção do gênero artigo científico. Assim, o estudo focaliza a textualização
escrita, de modo a flagrar tanto as práticas quanto os discursos e as representações que circundam
os gêneros acadêmicos e sua relação com a formação docente. Deseja-se, ao fim, que as reflexões a
serem apresentadas suscitem questões de interesse tanto para o ensino quanto para a pesquisa que
possam contribuir para o entendimento do objeto de estudo; desse modo, problematizando
propostas para o ensino do gênero na formação universitária e suas implicações na especificidade da
formação de professores na modalidade EaD.
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ESCREVER NA ESCOLA... POR QUÊ? A APROXIMAÇÃO DE PRÁTICAS DE ESCRITA
SIGNIFICATIVA
Célia Regina Fialho Bortolozo – UNICAMP
Heloísa A. Matos Lins – UNICAMP
A pesquisa-ação aqui apresentada, em andamento, vincula-se ao grupo de pesquisa ALLE Alfabetização, Leitura e Escrita, da FE/Unicamp e tem como objetivo propor alternativas
pedagógicas às práticas de alfabetização e letramento que vêm sendo desenvolvidas por uma
professora da EMEF “Ruth Garrido Roque”, de Santa Bárbara d´Oeste, a partir de objetos de
aprendizagem também relativos às novas tecnologias da informação e comunicação (TICs), em que
o foco de análise será direcionado aos processos de apropriação da língua escrita pelas crianças
dessa professora. Para tanto, faz-se necessário pensar juntamente com o corpo docente da escola
sobre a concepção de escrita na perspectiva sócio-histórica, valorizando o contexto cultural
tecnológico de produção. Esse grupo de professores vem conseguindo desenvolver um trabalho
coletivo e reflexivo muito pertinente e demonstra muito empenho em promover uma aprendizagem
significativa para os alunos, de modo especial das habilidades de leitura e escrita, que aparecem
como maiores desafios. Nele encontra-se a professora (X), que durante o desenrolar da pesquisa
vem destacando-se por transformar diariamente sua prática, interagir muito bem com o grupo,
valorizar a troca de saberes e agir com seus alunos de modo muito coerente com as reflexões tecidas
no grupo. Por isso, o levantamento de propostas pedagógicas de alfabetização e letramento, bem
como as respostas às reflexões e intervenções feitas durante essa pesquisa-ação, vem acontecendo
especificamente em sua sala de aula. Acredita-se que esse movimento de reflexão e ação pode
aproximar, não só os alunos como também os professores, de práticas de alfabetização e letramento
capazes de garantir a aprendizagem dos usos e das formas da escrita.
O DISCURSO DO ACADÊMICO E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE LÍNGUA
PORTUGUESA
Cláudio Luiz Abreu Fonseca – UFPA/UFMT
O discurso do acadêmico do Curso de Letras da UFPA é o foco desta pesquisa que busca investigar
os posicionamentos e as imagens que os sujeitos constroem sobre si mesmos, como alunos e futuros
professores de Língua Portuguesa e sobre a política científico-educacional do Curso. Postula-se que
há um discurso que vem se disseminando na contemporaneidade e que vem afetando uma série de
outros discursos, como os das ciências e da educação, pertencentes a diferentes esferas sociais.
Trata-se do discurso da mudança, cujos signos parecem estar permeando diferentes discursos,
procurando conformá-los a valores da pós-modernidade. Em virtude disso, procura-se compreender
em que medida o Curso, sua proposta político-pedagógica, seu desenho curricular, seus sujeitos, se
coadunam com o discurso da mudança, por meio do qual superariam a crise no ensino de língua
materna.
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SIMPÓSIO 22
O NOME PRÓPRIO EM FOCO: ESTUDOS ONOMÁSTICOTOPONÍMICOS
Os estudos na área da Onomástica ocupam-se da análise dos nomes próprios de pessoas
(Antroponímia) e de lugares (Toponímia). A Toponímia como estudo do nome próprio em função
de topônimo (nome de lugar) representa uma face particular do léxico da língua, haja vista que o
topônimo, além de incorporar as características inerentes aos nomes próprios, configura-se como
um signo com características muito próprias em termos de motivação, haja vista que as causas
denominativas que dão origem a um novo nome de lugar são as mais diversas e normalmente estão
relacionadas a motivações pessoais e grupais. Este simpósio pretende reunir trabalhos na área dos
estudos onomásticos, em especial os de natureza toponímica, de maneira a oportunizar a
disseminação e a discussão de resultados de pesquisas toponímicas e, por extensão, funcionar como
um fórum de discussões sobre questões que afetam essa área de investigação, como o problema da
motivação toponímica, a estrutura do sintagma toponímico, a dimensão etnodialetológica dos
topônimos, a relação entre toponímia e meio ambiente, a função do topônimo como elemento
veiculador de ideologias e como reflexo de contatos interétnicos, como também, as interfaces entre
toponímia e outras áreas de investigação.
COORDENAÇÃO
Aparecida Negri Isquerdo
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
[email protected]
Maria Cândida Trindade Costa de Seabra
Universidade Federal de Minas Gerais
[email protected]
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A HISTÓRIA TOPONÍMICA DE CATALÃO E SEUS DISTRITOS: MEMÓRIA E
IDENTIDADE
Gisele Martins Siqueira – UFG
O objetivo desse artigo é evidenciar de forma breve a história toponímica de Catalão-Go e seus
distritos numa busca pela memória registrada em livros e documentos para resgatar a identidade do
povo que se constituiu como sujeitos nessas localidades. Buscaremos entender as motivações que
levaram a tais nomeações e os porquês de suas designações. O princípio mais geral da toponímia
afirma que os nomes dos lugares guardam alguma relação com sua ocupação original ou seu
processo de povoamento. Assim, é a partir dessa concepção que vamos estudar a origem do nome
da cidade de Catalão e seus distritos. No entanto, para tal estudo, nos basearemos nos recursos da
filologia, linguística e história, a fim de chegar aos porquês das verdadeiras denominações das
localidades em estudo e as motivações para tais designações, já que devemos considerar que o ato
de nomear está sempre ligado a uma motivação específica, seja ela linguística, histórica, política ou
social. Para a realização deste trabalho, nos basearemos na metodologia de estudo utilizada por Braz
(1985) e Fonseca (1997). Sabemos que a toponímia apresenta-se de elevada importância para o
estudo e conhecimento da história local. Dessa forma, os nomes das ruas testemunham a história
das cidades, das vilas e aldeias. Pois ficaram registadas nas crônicas, romances, roteiros, tradições e
lendas. É necessário, portanto, promover a elaboração de inventários da atualidade toponímica e da
que entrou em desuso ou foi substituída, justificando as razões da sua mudança ou esquecimento.
Esses estudos contribuirão para conhecer melhor a história local do nosso país, como a identificação
de lugares e de sítios. Além desses objetivos, este estudo não se limita apenas na descrição dos
nomes dos lugares, porque as propriedades e ruas, também, têm o seu próprio nome e a designação
desses lugares ou vias de comunicação refletem os valores culturais das populações, perpetuando a
importância histórica de fatos, pessoas, costumes, eventos e locais.
ASPECTOS TOPONÍMICOS DO MUNICÍPIO DE ITAQUI: O CASO DOS NOMES DAS
RUAS
Odair José Silva dos Santos – UCS
Giselle Olivia Mantovani Dal Corno – UCS
Partindo da premissa que todo sujeito enquanto ser social busca estar vinculado a uma cultura,
apresentando marcas que o identificam como pertencente a um grupo e diferente de outro, os nomes
próprios atribuídos a lugares ganham aspectos construídos culturalmente de acordo com o contexto
social. A partir das ideias de Dick (2001), pode-se inferir que os lugares, à medida que recebem
suas denominações, concretizam simbolicamente características culturais e ideológicas. Assim, os
estudos toponímicos vêm contribuir no levantamento e análise de dados que refletem os múltiplos
aspectos sociais e culturais que condicionam a nomeação de lugares, sejam eles cidades, bairros,
ruas ou cursos d'água. O texto aqui proposto tem o objetivo de analisar o caso da nomeação dos
logradouros do município de Itaqui, localizado na fronteira oeste do Rio Grande do Sul, às margens
do rio Uruguai, divisa entre Brasil e Argentina. É considerado “o portal do Rio Grande”, nasceu
sobre as marcas da missão de jesuítas espanhóis e foi emancipado em 1879. A motivação para a
escolha do município e dos respectivos topônimos dá-se a partir da construção histórico-social,
onde é possível encontrar a maioria dos nomes de logradouros atribuídos a personalidades do
cenário local e nacional (antropotopônimos), ainda se visualiza que outra grande parte faz menção a
nomes de outros lugares. Neste contexto, a pesquisa utiliza as ideias do campo da onomástica e do
discurso, à medida que se entende que a nomeação da perspectiva toponômica é dada a partir de
uma influência sócio-ideológico-discursiva; ocupa-se, assim, dos construtos de estudiosos como
Brito (2003), Dick (1992; 2001) e Orlandi (2005). Os dados são analisados e classificados de
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acordo com o modelo taxionômico adaptado por Dick (1992) para a toponímia brasileira. Pretendese, assim, refletir sobre a relação existente entre língua, cultura e sociedade e contribuir para as
discussões em torno das construções no campo da onomástica e, mais especificamente, no da
toponímia.
A TOPONÍMIA URBANA EM CAMPO GRANDE/MS: ALGUMAS TENDÊNCIAS
Letícia Alves Correa de Oliveira – UFMS
O léxico registra todo o conhecimento existente no universo, já que não é possível nomear um
objeto ou transmitir uma ideia sem fazer uso do repertório vocabular disponível na língua. O
processo de nomeação dos elementos geográficos, por exemplo, gerou a categoria dos nomes de
lugares (topônimos), que é objeto de investigação de uma área da Onomástica, ciência que se ocupa
do estudo dos nomes próprios de pessoas e de lugares. Assim, enquanto a Antroponímia estuda os
nomes de pessoas, a Toponímia ocupa-se dos nomes de lugares (elementos geográficos) rurais e
urbanos. A toponímia urbana, por exemplo, reúne os nomes de aglomerados humanos (municípios,
distritos, vilas, aldeias etc) e de logradouros públicos (bairros, ruas, avenidas, praças, travessas,
becos, pontes etc). Este trabalho atém-se à análise de nomes de ruas e de avenidas, elementos
geográficos urbanos que, de acordo com Dick (1996, p.133), representam um “um ponto singular de
atração da cidade, um verdadeiro microcosmo dentro do organismo maior do aglomerado urbano”.
As tendências da toponímia urbana são inúmeras, dentre outras: i) a nomeação de ruas e avenidas
com nomes, prenomes e apelidos de famílias, como atestou o estudo de Oliveira e Isquerdo (2012)
acerca da toponímia do Bairro Amambaí (Campo Grande/MS), que dentre 56 topônimos,
identificou 22 antropotopônimos – topônimos relativos a nomes próprios individuais (rua Alexandre
Farah, avenida Fernando Correa da Costa, avenida Joaquim Dornelas etc); ii) designação de
logradouros com nomes vinculados à determinadas áreas semânticas, como ocorre na capital
Campo Grande que possui bairros que apontam algumas particularidades relacionadas à toponímia
urbana, como o bairro Autonomista, cujas ruas são nomeadas com nomes de mulheres (rua
Marlene, rua Cláudia, rua Luciana, rua Santa Bárbara etc.); o bairro Pioneiros, que reúne ruas com
nomes de autoridades e personalidades históricas (rua Barão de Campinas, rua Barão de Limeira,
rua Baronesa de Itu, rua Joana Darc etc.); o bairro Carlota, que resgata nomes de moedas para
nomear as ruas (rua Dólar, rua Libra, rua do Cruzeiro, rua do Franco etc.); o bairro Jockey Club,
cujas ruas recebem nomes de flores (rua das Rosas, avenida das Primaveras, rua das Violetas, rua
das Margaridas etc.). Esses exemplos ilustram algumas características da toponímia urbana no
município de Campo Grande, uma cidade planejada que teve o início da sua urbanização em meio à
vegetação existente próxima aos córregos Prosa e Segredo no final do século XIX. Este estudo parte
do exame de dados da toponímia urbana de Campo Grande/MS, relacionando-os a resultados de
outros estudos sobre esse viés da toponímia, como o de Dick (1996) e de Antunes (2007), sobre a
toponímia urbana de São Paulo/SP, e de Filgueiras (2011), que analisou a influência italiana na
toponímia urbana de Belo Horizonte/MG, e tem os seguintes propósitos: i) analisar a motivação dos
topônimos catalogados e sua respectiva relação com aspectos da história social dos bairros e, por
extensão, das cidades que os abriga; ii) comparar os dados das diferentes fontes em busca de
similaridades e diferenças evidenciadas pela toponímia urbana das três capitais contempladas pelos
trabalhos consultados; iii) verificar em que proporção os diferentes recortes de nomes de
logradouros apontam para padrões toponímicos urbanos. Para tanto, os dados são analisados em
termos quantitativo e qualitativo. Para tanto, considerará o tratamento estatístico dos dados,
expressos em tabelas, gráficos acerca dos vários aspectos analisados (língua de origem,
classificação taxionômica, estrutura morfológica etc...) e a análise da motivação semântica
subjacente aos designativos e a possível relação entre as camadas toponímicas e a história social do
município. O estudo orientou-se pelos princípios teórico-metodológicos da Lexicologia e da
Toponímia, em especial o modelo concebido por Dick (1990; 1992; 1996, 2006).
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OS BAIRROS DA CIDADE DE BENTO GONÇALVES (RS): MOTIVAÇÃO E
CLASSIFICAÇÃO TOPONÍMICA
Bruno Misturini – UCS
O presente trabalho visa a apresentar os resultados – ainda que parciais – a respeito de uma
investigação sobre a motivação e a classificação dos nomes dos bairros da cidade de Bento
Gonçalves, localizada na Região de Colonização Italiana do Nordeste do Rio Grande do Sul. Os
dados apresentados são um recorte de minha participação como bolsista de iniciação científica no
projeto TOPACI (Toponímia da Antiga Colônia I), iniciado em 2010, e de estudos mais recentes
voltados à produção de minha dissertação de Mestrado. Em “A toponímia de Bento Gonçalves: um
estudo interdisciplinar sobre as ruas e os bairros da cidade e outras denominações”, desenvolvo uma
pesquisa acerca de alguns topônimos do referido município. O corpus do presente trabalho foi
levantado a partir de uma coleta de dados realizada em fontes oficiais do município, e consiste em
quarenta e seis denominações, referentes a todos os bairros de Bento Gonçalves, decretadas por
quatro leis diferentes, que foram criadas para acompanhar o crescimento da cidade. Devido ao fato
de as leis não carregarem consigo nenhum indício sobre o porquê de tais nomes terem sido
escolhidos ou até mesmo sobre suas interpretações, foram realizadas algumas entrevistas, através de
um questionário semiestruturado, com alguns moradores das áreas estudadas, e também uma
revisão bibliográfica, para uma melhor compreensão de tais nomes. Como a proposta desse trabalho
– bem como do Programa de Pós-Graduação no qual o mesmo se insere – é interdisciplinar,
buscarei levar em conta não apenas aspectos linguísticos no que diz respeito à análise de tais
topônimos, considerando também o contexto histórico-cultural em estão inseridos. Parte-se do
pressuposto de que uma análise puramente linguística não seria suficiente para revelar aspectos
culturais presentes em tais denominações. A partir disso, os topônimos serão classificados de
acordo com a taxonomia proposta por Dick (1990). Alguns resultados permitem verificar que a
maior parte das denominações dos bairros da cidade faz referência a nomes de santos
(hagiotopônimos). Há, também, nomes referentes ao trabalho e ao lazer (sociotopônimos), à história
(historiotopônimos), à mineração (litotopônimo), a topônimos já existentes (corotopônimos), entre
outros. Há, também, nomenclaturas opacas e transparentes, bem como nomes populares paralelos.
Por fim, destaca-se que tal estudo acerca desse município, juntamente com os demais já realizados
sobre outros, contribuiria para a construção de um futuro Atlas Toponímico do Estado do Rio
Grande do Sul.
ESTUDO ONOMASIOLÓGICO: ITALIANOS EM BELO HORIZONTE
Zuleide Ferreira Filgueiras – POSLIN/UFMG
Esta comunicação tem como objetivo apresentar alguns resultados da pesquisa de doutorado, que
ora desenvolvemos no Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos da Faculdade de
Letras da UFMG, sobre os nomes próprios de pessoas de origem italiana que migraram para a
cidade de Belo Horizonte / MG, no final do Século XIX e primeiras décadas do Século XX. Tal
pesquisa tem como proposta dar continuidade ao estudo toponímico desenvolvido na dissertação de
mestrado A presença italiana em nomes de ruas de Belo Horizonte: passado e presente, que arrolou
183 nomes de logradouros públicos, da capital mineira, denominados por antropônimos italianos.
Durante a realização da pesquisa de mestrado, constatamos que muitos italianos, com ativa
participação na história de Belo Horizonte, não tiveram seus nomes perpetuados na toponímia
urbana da cidade. Entretanto, observamos que a lembrança dessas pessoas continuava viva na
memória de seus descendentes e registrada em documentos antigos, muitos sob a tutela de suas
famílias e outros tantos arquivados em museus e arquivos públicos da cidade, além dos que se
encontravam registrados no mais antigo cemitério do município. Considerando tal lacuna, a atual
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pesquisa tem como pretensão ampliar o corpus, examinado na pesquisa de mestrado, por meio da
inclusão de mais 900 antropônimos italianos que ficaram relegados ao esquecimento coletivo,
apesar de muito terem realizado pela cidade. Assim, traremos à luz centenas de nomes próprios de
pessoas italianas, que viveram em Belo Horizonte em suas primeiras décadas de existência,
resgatados em arquivos históricos, em depoimentos e documentos de familiares e no Livro de
Registro de Sepultamento do Cemitério do Bonfim. Com os dados conseguidos, além do tratamento
linguístico, pretendemos elaborar um repertório biográfico que, ao contar a história pessoal de cada
personalidade arrolada, resgatará elementos significativos de um passado pouco conhecido, e
praticamente sem registros oficiais, que definiram a Belo Horizonte que conhecemos hoje.
AS REGIÕES ADMINISTRATIVAS DE CAXIAS DO SUL: UM ESTUDO ONOMÁSTICO
Vitalina Maria Frosi –UCS
Este estudo é parte do Projeto Antroponímia/Toponímia da Região de Colonização Italiana do
nordeste do Rio Grande do Sul (RCI) em execução na Universidade de Caxias do Sul (UCS).
Constitui-se num dos projetos de pesquisa do Mestrado em Letras, Cultura e Regionalidade. A
pesquisa tem como tema o estudo dos nomes das quatro regiões administrativas em que se divide o
município. O objetivo principal é o de fazer a descrição etimológica e a análise dos aspectos
interdisciplinares envolvidos na história desses signos onomásticos, originados no contexto
bilíngue, cultural e histórico-político da RCI. A categorização desses nomes próprios segue a
taxionomia proposta por Dick (1992), adaptada à realidade brasileira e seguida, em sentido amplo,
pelos estudiosos de toponomástica do Brasil. Servem de apoio os princípios teóricos de Dauzat,
1946; os estudos de Rossebastiano; Papa, 2005; Caffarelli; Marcato, 2008; Queirazza et al., 2006;
Dick (1980, 1990, 1998, 1999); Oliveira; Isquerdo, 2001; Seabra, 2007; Guérios, 1973; Andrade,
2010. A pesquisa é documental, seu desenvolvimento tem caráter qualitativo e aborda os
denominativos oficiais; eventualmente, consideram-se também nomes populares de atribuição
espontânea. A RCI é formada atualmente por 55 municípios, dentre eles, destaca-se Caxias do Sul,
um centro detentor de um parque industrial de expressão no estado e no país. É uma cidade fundada
por imigrantes italianos em 1875 e, de acordo com o último recenseamento do IBGE, de 2010,
possui uma população de 435.564 habitantes. Procuraram-se respostas a questões relacionadas à
importância do estudo dos logradouros do maior centro urbano da RCI e investigou-se a motivação
presente no ato denominativo. O tema foi considerado relevante, em particular, no que diz respeito à
produção de conhecimento novo e à sua socialização na comunidade como um todo. Além disso, os
resultados mostram sua importância na formação dos cidadãos, especificamente, no âmbito da
educação formal, como acréscimo de conhecimento em áreas interdisciplinares.
OS NOMES DAS ESCOLAS DA CIDADE DE BENTO GONÇALVES (RS)
Elis Viviana Dal Pizzol – UCS
Carmen Maria Faggion – UCS
A linguagem comunica, expressa, transmite valores e ordena o pensamento dos indivíduos de uma
comunidade. Nomear – coisas, animais, pessoas, lugares – é para o homem uma necessidade de
organização. Dessa forma, a atribuição de uma determinada denominação pode refletir e propagar
aspectos linguísticos, culturais e históricos de uma sociedade acerca das sucessivas gerações ao
longo do tempo. Nesse sentido, a Toponímia compreende o estudo dos nomes de lugares, buscando
desvendar a origem e as transformações linguísticas dessas denominações. O resgate das origens do
nome de um lugar não só contribui para o reconhecimento no item lexical presente no topônimo,
mas também para o reconhecimento dos valores culturais que ele preserva. Sob essa perspectiva,
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pretende-se apresentar, nessa comunicação, alguns dados parciais obtidos através da pesquisa para a
dissertação de Mestrado, que está sendo desenvolvida, sobre a origem dos nomes das escolas
públicas e particulares, de Ensino Fundamental e Médio, da cidade de Bento Gonçalves (RS). Temse como objetivo investigar a origem linguística e a importância histórica e cultural desses
topônimos. Justamente por ser a escola uma instituição detentora e promovedora de conhecimento,
sua construção, seu espaço, sua organização e seu nome carregam as vivências e a cultura de uma
comunidade. Assim, a pesquisa será feita a partir do levantamento dos nomes das escolas, do estudo
de fontes documentais e históricas, e, quando necessário, da realização de entrevistas. De posse dos
dados, será feita a análise qualitativa dessas informações. O embasamento teórico sustenta-se por
meio dos estudos de Dick, Biderman, Seabra, Isquerdo, Duranti, Hall, Geertz, entre outros. Dessa
forma, pretende-se contribuir com a ampliação das pesquisas de Toponímia, particularmente, na
Região de Colonização Italiana do Nordeste do Rio Grande do Sul.
A TOPONÍMIA E SUA INTERFACE COM FATORES SÓCIO-HISTÓRICOS: UMA
REFLEXÃO SOBRE O NOME DO MUNICÍPIO
Marigilda Antônio Cuba – UEL/CAPES
A Onomástica, ciência que estuda os nomes próprios de todos os gêneros, é subdividida em dois
ramos de investigação: a Antroponímia – estudo de nomes próprios de pessoas – e a Toponímia –
estudo do nome próprio dos lugares. Esta última possui uma dimensão interdisciplinar, o que
permite ao estudioso considerar no estudo dos topônimos, além das informações linguísticas, dados
históricos, geográficos, antropológicos e sociológicos relacionados ao universo dos nomes em
estudo. Embasado, pois, nos fundamentos teórico-metodológicos da Toponímia, este trabalho
discute as características toponímicas evidenciadas nos nomes dos municípios que compõem a rede
de pontos do Atlas Linguístico das Variedades do Português Falado no “território
incaracterístico” (Nascentes, 1922) – ALiTI, em desenvolvimento como projeto de tese de
doutorado, que tem como objetivo mais amplo registrar, por meio de um atlas linguístico, a língua
portuguesa falada no território considerado incaracterístico por Antenor Nascentes (1922), na sua
proposta de divisão dialetal do português brasileiro. Dada a natureza da área investigada, o critério
histórico foi fundamental para definir as localidades que compõem a rede de pontos, já que, até
meados do século XX, a área compreendida entre a fronteira boliviana com Mato Grosso e deste
com Amazonas, Pará e o então Estado de Goiás era habitada somente por ameríndios e formada por
mata fechada, fatores que motivaram Nascentes a considerá-lo como “território incaracterístico”,
em termos de variação dialetal do português. Essa região, correspondente, atualmente, ao norte de
Mato Grosso, ao Estado de Rondônia, ao Noroeste de Goiás e ao Sudoeste do Tocantins teve seu
processo populacional, primeiramente, a partir das expedições vindas de outras regiões do Brasil e
de Portugal, em sua grande maioria, via rede hidrográfica, com o objetivo de escravizar índios,
ocupar terras, explorar as minas de ouro e pedras preciosas. Posteriormente, com o garimpo em
decadência, surgiram as rodovias e com elas as novas fronteiras agrícolas, fazendo com que levas
de migrantes de todos os lugares do Brasil se instalassem na região. Consideram-se, também, nesse
período, a divisão dos Estados de Goiás e de Mato Grosso e a transformação do Território de
Rondônia a Estado. Com base nesse contexto, este trabalho centra-se no estudo toponímico dos
nomes dos seguintes municípios que compõem a rede de pontos do projeto ALiTI: Aripuanã,
Diamantino, Guarantã do Norte, Juara, Luciara, Nova Xavantina e Sinop (Mato Grosso); GuajaráMirim e Ji-Paraná (Rondônia); Formoso do Araguaia (Tocantins); Pilar de Goiás (Goiás). Visto que
os fatores da história, da política, da língua e a cultura de uma localidade influenciam na escolha
dos nomes dos lugares, o objetivo deste trabalho é investigar fatores sócio-linguístico-culturais que
motivaram a nomeação das localidades da área geográfica investigada, além de examinar o
topônimo como signo linguístico, em termos etnodialetológico e estrutural. Este trabalho também
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pretende contribuir para a ampliação dos estudos toponímicos em áreas do Norte e do Centro-Oeste
brasileiro, uma vez que tem como objeto de estudo nomes de municípios dessas regiões.
TOPONÍMIA E DIALETOLOGIA: DA OCUPAÇÃO DO ESPAÇO À VARIAÇÃO DO
PORTUGUÊS GAÚCHO FALADO EM ÁREAS DECONTATO INTERVARIETAL EM
MATO GROSSO
Carla Regina de Souza Figueiredo – UEMS/UFGD-PG
A história do Brasil está vinculada aos processos migratórios e, consequentemente, aos contatos
linguístico-sócio-culturais daqueles que .vão e vem. com os que se encontram no lugar eleito para
se viver. Este trabalho apresentará resultados parciais da pesquisa de doutorado que descreve o
português rio-grandense falado em áreas de povoamento recente no Mato Grosso considerando
diferentes níveis linguísticos (fonético, morfossintático e lexical) e dimensões de análise (diatópica,
diastrática, diageracional, diagenárica e dialingual) de variação linguística. Para averiguar as
mudanças de comportamento linguístico de origem gaúcha no que se refere ao uso (manutenção ou
perda) e a variação do português rio-grandense em contato com outras variedades regionais do
português (contato intervarietal), foi necessário observar os condicionadores sociais, políticos,
culturais e espaciais que provavelmente impulsionaram tais mudanças. A aplicação do questionário,
instrumento essencial para uma pesquisa de naturezas dialetológica e geolinguística, viabilizou
grande parte da recolha dos dados. Além da parte linguística, dos temas para discursos
semidirigidos, das narrativas livres, das perguntas metalinguísticas e do perfil sócio-cultural e dos
dados dos informantes, fez-se uma descrição do espaço geográfico, incluindo o registro
iconográfico das localidades pesquisadas. E foi, sobretudo, na elaboração da sociologia dos locais,
que se notou a intersecção entre disciplinas como a Dialetologia, a Geolinguística, a Toponímia, a
História e a Geografia. A Toponímia é um ramo da linguística capaz de estabelecer uma estreita
relação com outras áreas de conhecimento a fim de alcançar êxodo na tarefa que se propõe realizar:
estudar os nomes de lugares. Embora a análise linguística de um topônimo pareça um processo
autônomo, na busca pela motivação de um nome, perpassa-se pelas contribuições de disciplinas
como as citadas, que em algumas situações legitimam as hipóteses levantadas pelo pesquisador para
justificar a escolha e o emprego de uma denominação, em um determinado lugar, em um contexto
regional específico. Sabendo-se que o processo de ocupação, os aspectos geográficos e sócioeconômicos de uma região, uma vez confrontados com os de outras, podem delimitar áreas
toponímicas correlatas, demarcadas pela concentração de nomes de uma mesma tipologia
classificatória; constatou-se no âmbito desta pesquisa que as designações de acidentes físicos e
humanos das localidades investigadas, trouxeram à tona lembranças dos migrantes oriundos da
região sul do Brasil, materializadas na toponímia local. Assim, observou-se que os nomes carregam,
ainda que obscuramente, uma carga sugestiva capaz de imprimir uma característica própria ao local
que identificam, podendo até se assemelhar aos de outras áreas toponímicas, no entanto, com uma
valoração única na localidade em que estão imersos.
ESTUDO DA TOPONÍMIA DE TROPAS E BOIADAS, DE HUGO DE CARVALHO
RAMOS
Evanaide Alves de Souza – UFG
O objetivo deste trabalho é apresentar os resultados do estudo dos topônimos na obra Tropas e
Boiadas, de Hugo de Carvalho Ramos. Para a realização da pesquisa, fizemos a listagem dos
topônimos, que designam acidentes físicos (serras, rios, etc.) e humanos (fazendas, cidades, vilas,
etc.). Em seguida, classificamos os topônimos nas duas taxionomias toponímicas, e suas respectivas
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taxes, conforme proposta de Dick (1990a;1990b): física – aquelas que caracterizam o ambiente
físico em todos os seus traços (se divide em 11 taxes: astrotopônimos, cardiotopônimos,
cromotopônimos, dimensiotopônimos, fitotopônimos, geomorfotopônimos, hidrotopônimos,
litotopônimos, meteorotopônimos, morfotopônimos, zootopônimos,); e antropocultural – aquelas
que caracterizam as manifestações psico-socio-culturais do homem (se divide em 16 taxes:
animotopônimos,
antropotopônimos,
axiotopônimos,
corotopônimos,
cronotopônimos,
ecotopônimos,
ergotopônimos,
etnotopônimos,
dirrematotopônimos,
hierotopônimos,
historiotopônimos, hodotopônimos, numerotopônimos, poliotopônimos, sociotopônimos,
somatopônimos). Foram indicadas as origens, categorias morfológicas, motivação e iconicidade de
cada topônimo. Esse estudo revelou que, em Tropas e boiadas, de Hugo de Carvalho Ramos: i) os
topônimos de natureza antropocultural são os mais produtivos, com 63% (109/173) das
ocorrências; ii) as seis taxes mais produtivas, nas duas natureza taxionômicas, são os
sociotopônimos, relativos às atividades profissionais, aos locais de trabalho e aos pontos de
encontro da comunidade, aglomerados humanos, com 17,3%; os ergotopônimos topônimos
relativos aos elementos da cultura material, com 13,3%; etnotopônimos, relativos aos elementos
isolados ou não, as cidades, regiões, continentes ou indicativos de procedência geográfica (povos,
tribos, castas), com 12,1% os hidrotopônimos, resultantes de acidentes hidrográficos, com 8,7%; os
geomorfotopônimos, relativos às formas topográficas (elevações, depressões do terreno e formações
litorâneas), com 8,1% e os zootopônimos, topônimo de índole animal (doméstico e não doméstico),
com 6,9% dos dados; iii) a origem mais recorrente dos topônimos é a origem portuguesa, com
66,3% (114/172) das ocorrências; e iv) a estrutura morfológica simples é a mais produtiva, com
46,8% (81/173); v) a maior parte dos topônimos da obra se submetem ao princípio de iconicidade,
mostrando certa motivação entre o nome e o acidente. A base etnocultural do léxico goiano, a partir
das análises dos dados extraídos da obra, se constituiu no período que vai do ciclo do ouro ao ciclo
da agropecuária em Goiás. Por meio da análise dos dados, percebe-se que a designação dos
acidentes está intrinsecamente ligada às relações sociais desse período, confirmando que o ato de
nomear é também um ato de reprodução social.
MARCAS DA HISTÓRIA: A TOPONÍMIA NO CAMINHO DAS TROPAS (RS E SC)
Giselle Olivia Mantovani Dal Corno – UCS
Em 2008, Velho, Almeida, Santos e Favero lançaram uma singela obra intitulada Tropeirismo:
educação básica, com o intuito de “explicitar e sistematizar a trajetória do tropeiro nos Campos de
Cima da Serra e, principalmente, as rotas tropeiras que cruzaram o nosso município” (p. 5). Os
autores referem-se a Bom Jesus, cidade localizada no extremo nordeste do Rio Grande do Sul, que
foi ponto de passagem em diferentes fases da atividade tropeira, desde o início do século XVIII,
quando a Estrada das Missões cruzava a Vacaria dos Pinhais para entroncar com a Estrada Real. No
século XIX, após a descoberta de caminhos mais a oeste do Estado, iniciou a fase do tropeirismo
gaúcho regional, especialmente com tropas de mulas arreadas, responsável pelo abastecimento de
fazendas e localidades com mercadorias (alimentos, ferramentas) produzidas artesanalmente em
pontos distantes entre a serra e litoral, numa época em que os armazéns da região ficavam nos
poucos centros urbanos e a precariedade das estradas era vencida apenas pela persistência de
homens e pela resistência dos muares. O pequeno livro que serve de base para esta investigação foi
idealizado para uso nas escolas, objetivando a preservação das origens do município ligadas ao
tropeirismo, “a fim de que cada aluno descubra a importância da contribuição tropeira, bem como a
função social para o desenvolvimento econômico, cultural e social da região”. Neste trabalho,
procuramos refazer uma das rotas mencionadas pelos autores, do litoral para o alto da serra, situada
temporalmente no século XIX, observando os signos toponímicos encontrados e/ou deixados pelos
tropeiros – localidades por onde passaram, rios que cruzaram – e buscando em bibliografia
especificamente pertinente a esse fenômeno dados que possam contribuir para a compreensão da
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motivação dos topônimos. Esperamos, com isso, colaborar com o objetivo dos autores de “valorizar
o que já foi desenvolvido e repassar para as futuras gerações para que preservem e admirem como
se construiu a nossa história.”
VIAJANTES NATURALISTAS DO SÉCULO XIX NA REGIÃO DA PROVÍNCIA DE
GOIÁS: LEVANTAMENTO DOS TOPÔNIMOS INDÍGENAS
Carla Bastiani – UFT
O século XIX é marcado na história do Brasil como uma época de inúmeras visitas que a este país
fizeram eminentes personalidades, entre elas, notáveis viajantes naturalistas. Entre estes, destacamse Auguste François César Provençal de Saint-Hilaire, Johann Emmanuel Pohl, George Gardner e
Francis Castelnau, os quais, no curso de suas expedições, visitaram a Província de Goiás. Os relatos
desses viajantes são alguns dos elementos fundamentais na construção da identidade nacional. No
caso da Província de Goiás, essas narrações permitem reconstituir, além da história e geografia
regional, seu perfil etnolinguístico. Ainda que o discurso utilizado nessas fontes documentais seja
acentuadamente etnocêntrico, pelo fato de ser condicionado pelos valores da cultura europeia e
revele a falta de parâmetros na percepção da alteridade que os viajantes naturalistas adotaram diante
de suas observações, possibilitam regatar, mesmo que mediadas por suas impressões, informações
sobre o caráter sociocultural e geográfico da região. Os referidos viajantes, enquanto cientistas,
sentiram necessidade de conhecer os nomes dos lugares, da fauna, da flora, dos elementos
geomorfológicos, da cultura espiritual, dos grupos indígenas, entre outros, mas principalmente de
compreender a etimologia desses nomes. Como subsídio para tal empreendimento, contaram com
documentos oficiais e registros da tradição oral. Levando em consideração o fato de que os
topônimos de origem indígena (etnotopônimos) eram constantes nos relatos desses viajantes, em
virtude da gama de povos indígenas que povoavam a Província de Goiás no século XIX, o objetivo
deste trabalho consistiu em fazer levantamento e descrição dos etnotopônimos catalogados por eles.
Esta pesquisa apresenta-se como um recorte do Atlas Toponímico do Tocantins - ATT: descrever a
toponímia indígena dos viajantes naturalistas no século XIX na região da Província de Goiás, hoje
estado do Tocantins. Os procedimentos metodológicos utilizados foram: leitura de textos sobre a
historiografia da região da Província de Goiás; leitura dos relatos dos viajantes naturalistas europeus
do século XIX referentes à Província de Goiás; levantamento dos topônimos indígenas
(etnotopônimos) descritos nesses relatos e análise do corpus a partir dos subsídios da
etnotoponímia.
VARIAÇÃO E MUDANÇA LINGUÍSTICA DE TOPÔNIMOS NA REGIÃO DO CARMO –
MINAS GERAIS
Maria Cândida Trindade Costa de Seabra – UFMG
Ainda que os nomes de lugares constituam uma classe que, por tradição linguística, mantém-se
muitas vezes intacta enquanto sobrevive por anos e até séculos, conservando a história de um tempo
passado, codificada em um símbolo da língua, os mesmos costumam sofrer transformações,
principalmente de ordem fonética e analógica. Muitas vezes este fato surpreende os estudiosos da
língua que esperam encontrar topônimos preservados da ação do tempo. DAUZAT (1926:58)
chama atenção para esse fato. Para esse teórico, os nomes de lugares estão sujeitos, sobretudo, à
ação da analogia, fato este que afeta toda língua viva. As elipses são, também, apontadas por ele,
como responsáveis por “numerosas confusões” produzidas em uma palavra, causando “fausse
perception” do topônimo em análise. Partindo da hipótese de que os locativos, incluindo-se aqui os
nomes de montanhas e rios, muitas vezes permanecem intactos, sobrevivendo até o tempo atual,
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permitindo-nos penetrar no passado, investiga-se a toponímia dessa região – primeiro território de
Minas a ter núcleo populacional – adotando como referencial teórico– metodológico o modelo
toponímico de Dauzat (1926) e Dick (1990). Sob a luz da sociolinguística, parte-se do presente para
o passado e volta-se ao presente. Em função dos topônimos coletados em gravações orais, material
cartográfico e documentos antigos selecionados para esta pesquisa, procurou-se descrever e explicar
a permanência, a variação e a mudança dos topônimos na região. A análise dos dados reflete o
contexto histórico-cultural da formação dessa parte do território mineiro: tendo em fins do século
XVII, início do XVIII sido ocupada por bandeirantes paulistas, a região do Carmo, após o episódio
conhecido como emboabas, caracteriza-se por receber inúmeros imigrantes portugueses da região
noroeste de Portugal que aí se fixaram, mantendo-se até hoje. O caminho de comunicação aberto
com a Bahia durante o primeiro quartel do século XVIII se intensifica durante o século XIX com a
rota do gado. Nesse período, a região se torna agrícola e os nomes de lugares aí implantados
destacam o homem português como agente desse processo colonizatório. O resultado dessa
conquista pode ser vista através da permanência e variação de topônimos e de pouca mudança
linguística.
TOPONÍMIA, HISTÓRIA E CULTURA: IDENTIDADES E INTERFACES
Aparecida Negri Isquerdo – UFMS
Os topônimos (nomes de lugares), concebidos como signos linguísticos enriquecidos, congregam
tanto características próprias do léxico veicular quanto especificidades que os tornam diferentes dos
nomes comuns, pois consubstanciam a intencionalidade do denominador que, acionando as várias
circunstâncias que o rodeiam, seleciona um determinado nome para este ou aquele acidente
geográfico, que evoca em seu significado a justificativa para a sua própria existência (DICK, 1990,
p.38-39). Nesse sentido, concebe-se o léxico toponímico como o universo de topônimos de uma
língua circunscritos a diferentes espaços geográficos do território coberto por um sistema
linguístico. Assim, as unidades lexicais investidas da função de nome próprio de lugar tendem a
traduzir aspectos da visão de mundo do denominador, como também características históricogeográficas do espaço nomeado. Como produto social e cultural, o topônimo incorpora tendências
da sociedade da época do surgimento do nome do lugar, fator que justifica a estreita relação entre
toponímia e manifestações ideológicas. Este trabalho centra-se no exame da toponímia na
perspectiva da sua função sociocultural e ideológica. Como é sabido, o universo de topônimos de
uma região pode reunir formas do vocabulário comum alçadas à categoria de topônimos que, por
sua vez, traduzem tanto elementos do ambiente físico quanto particularidades da história social da
região que abriga o topônimo. A depender da realidade nomeada, a toponímia também resgata
nomes próprios de pessoas, de lugares, de crenças, de entidades sobrenaturais que são
ressemantizadas com o fim precípuo de nomear um espaço geográfico. Tomando como parâmetro
esse veio, são examinados, neste trabalho, dados toponímicos oriundos de diferentes regiões do
Brasil, que traduzem facetas distintas da relação entre toponímia e realidade linguística, étnica,
social e cultural da sociedade de determinada faixa de tempo e espaço. Para tanto, examinam-se
resultados de pesquisas acerca de recortes toponímicos de diferentes regiões do Brasil: CentroOeste: Pereira (2009) e Atlas Toponímico do Estado de Mato Grosso do Sul (ATEMS, 2011); Sul:
Moreira (2006), Zamariano (2010) e Ananias (2013); Sudeste: Figueiras (2011) e Nordeste: Ramos
(2008) e Anjos (2012). O cotejo entre os dados toponímicos tem como objetivo demonstrar que os
sistemas toponomásticos subjacentes à toponímia de uma área territorial representam, em primeira
instância, a perpetuação do léxico representativo do momento histórico em que o elemento
geográfico foi nomeado. Além disso, considera-se o fato de o léxico regional e o léxico toponímico
serem considerados subsistemas léxicos intrinsicamente relacionados, à medida que a toponímia
local tende a assimilar uma porção significativa do vocabulário regional veiculado pelos habitantes
de um espaço geográfico. A orientação teórico-metodológica do estudo pauta-se,
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fundamentalmente, nos pressupostos de Dick (1990, 1992, 1997, 1998, 1999, 2006). O trabalho
tem, enfim, como propósito mais amplo, contribuir para o delineamento de tendências da toponímia
brasileira do ponto de vista das suas interfaces com características socioculturais da realidade
brasileira.
OS NOMES DE LUGARES NOS LIVROS DIDÁTICOS DE GEOGRAFIA E HISTÓRIA:
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Karylleila dos Santos Andrade – UFT
O estudo toponímico não pode ser pensado desvinculado de outras ciências: “é uma disciplina que
se volta para a História, a Geografia, a Linguística, a Antropologia, a Psicologia Social e, até
mesmo, à Zoologia, à Botânica, à Arqueologia, de acordo com a formação intelectual do
pesquisador” (DICK, 1992: II). Deve ser pensada como um complexo línguo-cultural: um fato do
sistema das línguas humanas. Faz parte de uma ciência maior que se subdivide em toponímia,
estudo do nome de lugar, e antroponímia, estudo do nome de pessoas. Neste contexto de relações
dinâmicas e de cooperação entre as disciplinas do conhecimento, Morin (1990) afirma a
necessidade de tomar consciência da complexidade de toda a realidade — física, biológica, humana,
social, política. De um lado, observa que as ciências humanas não percebem os caracteres físicos e
biológicos dos fenômenos humanos e, de outro, que as ciências naturais não percebem sua inscrição
numa cultura, numa sociedade, numa história. Essa distância existente entre as ciências assinala a
necessidade da interdisciplinaridade e, como observa o autor, esse problema não se resolve dentro
de uma concepção simplista de adição ou acoplagem de conhecimentos. A interdisciplinaridade
possibilita ao homem o alcance de uma postura mais crítica diante dos fatos da realidade,
compreendendo-a melhor. Nesse sentido, Fazenda (2001) assegura que o homem que se deixa
perpetuar numa única abordagem do conhecimento, vai adquirindo uma visão corrompida da
realidade. Ao viver, encontra uma realidade multifacetada, produto desse mundo, e, evidentemente
mais oportunidades terá em modificá-la, na medida em que não a conhece como um todo, em seus
inúmeros aspectos. Quando delimitamos, dentro da realidade, um recorte que necessita ser
atribuído o nome, não podemos atribuir a ele uma fragmentação. Pelo contrário, as suas múltiplas
possibilidades e mediações históricas que o estruturam e determinam fazem parte da totalidade, algo
dissociável de ser destituído. Fruto de um movimento de aglutinação de aspectos sociohistóricos,
culturais, geográficos e linguísticos, os nomes de lugares revelam a origem e a dinâmica dos
lugares; tornando rica a maneira pela qual os atores sujeitos se utilizam da linguagem para imprimir
no espaço uma variedade de significados. O ato de nomear expõe como as pessoas se relacionam
com os seus lugares, pensam, vivem e experimentam o espaço em sua plenitude. A proposta deste
trabalho vincula-se ao estudo da toponímia no contexto do ensino considerando a teoria da
interdisciplinaridade. Em particular, este recorte prevê um estudo dividido em três momentos:
primeiro é identificar de que forma os topônimos estão dispostos nos livros didáticos de Geografia e
História. Na segunda etapa, está prevista a realização de uma investigação com foco na
interdisciplinaridade, considerando os PCN de História e Geografia do Ensino Fundamental, bem
com outros documentos oficiais. E, por fim, a terceira etapa visa à discussão de propostas
pedagógicas(oficinas)com o intuito de estudar os acidentes humanos e físicos pelo viés da
toponímia numa perspectiva interdisciplinar voltado às disciplinas de Geografia e História. Para
realizar essa discussão, utilizaremos como abordagem teórico-metodológica, no campo da
toponímia, os trabalhos de Dick (2004, 1999, 1990), e os estudos de Fazenda (1998), (2003) e
(2009) eMorin (1990), no campo da interdisciplinaridade.
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4ª COLÔNIA DE IMIGRAÇÃO ITALIANA DO RS: UM ESTUDO TOPONÍMICO
Aline Pegoraro – UCS
Gisele Olívia Mantovani Dall Corno – UCS
Este trabalho busca investigar a motivação e os sentidos dos nomes dos municípios da 4ª Colônia de
Imigração Italiana, localizada na região Centro-Oeste do Estado do RS. Para isso, será necessário
considerar aspectos históricos, culturais e linguísticos neles compreendidos. O projeto abrange os
12 municípios derivados da Antiga Colônia I. Por estar em desenvolvimento e constituir-se no
primeiro Módulo de um Projeto maior, propicia o desdobramento de vários outros projetos, como é
o caso deste, que busca estudar os topônimos de cada cidade que compõe a 4ª Colônia de imigração
Italiana, em sua origem, denominada Colônia Silveira Martins. Com relação à região que é objeto
deste estudo, este é o primeiro projeto a ser desenvolvido na perspectiva da Onomástica.
Considerando-se que os estudos de Onomástica/Toponímia estão apenas iniciando no Rio Grande
do Sul, e, atualmente, limitam-se àqueles que estão sendo desenvolvidos pelos pesquisadores
vinculados ao Projeto intitulado Toponímia da Antiga Colônia-1, ligado ao Mestrado em Letras,
Cultura e Regionalidade na Universidade de Caxias do Sul, entende-se relevante uma investigação
que contemple outras regiões do RS. Assim, buscar-se-ão aportes teóricos em Lognon (1920),
Dauzat (1926), Dick (1990, 1996), Carvalhinhos (2007, 2008), Frosi; Faggion; Dal Corno (2009),
entre outros. Será realizada também uma categorização dos topônimos de acordo com o modelo
apresentado por Dick, para a realidade brasileira. O enfoque será centrado no intuito de explicar a
etimologia e a motivação dos nomes dos nove municípios que compõem a 4ª Colônia de imigração
Italiana do RS (Nova Palma, Faxinal do Soturno, Ivorá, Pinhal Grande, Restinga Seca, Silveira
Martins, Dona Francisca, São João do Polêsine e Agudo), relacionando com aspectos históricos da
imigração na região. Os nomes próprios das cidades carregam consigo a história de cada lugar.
Portanto, a proposta deste trabalho é descrever e explicar elementos linguísticos, culturais e
históricos que foram determinantes na constituição dos nomes das cidades da 4ª Colônia de
Imigração Italiana do Estado do Rio Grande do Sul.
DICIONARIZAÇÃO DE REPERTÓRIOS LÉXICO-TOPONÍMICOS:ALGUMAS
CONSIDERAÇÕES
Ana Claudia Castiglioni – UFT-PG/UNESP
A Toponímia como área do conhecimento que se ocupa do estudo linguístico dos nomes próprios de
lugares tem caráter interdisciplinar, à medida que busca em outros campos do saber informações
para subsidiar o estudo do topônimo, dentre outros, a geografia, a história, a antropologia. As
informações retiradas dos vários significados de um nome fazem, pois, da toponímia uma disciplina
ampla que depende de outras disciplinas correlatas. O estudo dos topônimos permite o
conhecimento de aspectos da organização de uma região, pois as condições ambientais e sociais
refletem-se na língua, principalmente no léxico, e, consequentemente, na Toponímia. Os primeiros
estudos toponímicos ocupavam-se especialmente da descrição etimológica dos topônimos e da
investigação de línguas extintas perpetuadas por meio dos nomes de lugares. Já as pesquisas atuais,
segundo Dick (2007, p. 463), conceituam a Toponímia como um ramo do conhecimento onomástico
voltado para análises léxico-semânticas. Neste trabalho, será apresentada a pesquisa em andamento
que tem por objeto de estudo um recorte da toponímia sul-mato-grossense, sendo o espaço para a
realização da pesquisa todo o estado de Mato Grosso do Sul, dividido em setenta e oito municípios.
Deste espaço, está sendo tomado para a pesquisa o repertório das unidades léxicas que formam o
nome dos acidentes geográficos referentes a cursos de água que estão disponíveis no banco de
dados do projeto Atlas Toponímico do Estado de Mato Grosso do Sul e foram catalogados usando
como base os mapas municipais do IBGE em escala 1.100.000. Estão sendo revisados os dados
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relativos a cada topônimo, o que implica em uma análise mais apurada da etimologia, das
classificações taxionômicas, da estrutura morfológica, para uma caracterização mais completa de
cada topônimo. O trabalho que será apresentado tem como objetivo analisar os aspectos que podem
levar um nome próprio de lugar a se filiar aos estudos da Terminografia para a organização de um
vocabulário toponímico, a partir do amparo teórico de Dick (1992, 1999) para quem Toponímia e
Terminologia podem estabelecer interfaces entre si.
CAMINHOS DA CARTOGRAFAÇÃO TOPONÍMICA NO MATO GROSSO DO SUL – DE
2003 A 2013
Ana Paula Tribesse Patrício Dargel – UEMS
A Onomástica, ramo da Linguística que estuda os nomes próprios, divide-se em Toponímia, nomes
de lugares, e Antroponímia, nome de pessoas. Neste trabalho, a atenção está voltada para os
designativos de lugares. Os topônimos configuram-se como signos linguísticos enriquecidos que
refletem de maneira acentuada os aspectos culturais, sociais, econômicos, políticos, históricos,
físico-geográficos, humanos, biológicos, ou seja, todas as forças sociais atuantes no momento da
nomeação de um lugar. Nesse sentido, a Toponímia, disciplina dinâmica e interdisciplinar, tem
como um de seus princípios básicos a análise da relação do homem com o meio no que se refere à
designação dos topos. O texto principal do toponimista é o mapa do qual o pesquisador retira os
topônimos, isto é, os dados da análise toponímica. Desse modo, o objetivo deste trabalho é
apresentar os caminhos percorridos em cartografação toponímica pelos pesquisadores do projeto
ATEMS (Atlas Toponímico do Estado de Mato Grosso do Sul), a saber: Dargel (2003), CassuciTavares (2005), Pereira (2009), Isquerdo et al (2011), ou seja, do primeiro trabalho de cartografia
toponímica no Mato Grosso do Sul à elaboração dos dois volumes do ATEMS em 2011. Nesse
percurso, houve trabalhos de pesquisadores de outros lugares como, por exemplo, Zamariano
(2010) que influenciaram o processo de elaboração de cartas e/ou mapas de topônimos. Para a
elaboração das cartas do ATEMS, houve a necessidade de se contar, anteriormente, com partes
significativas à sua concretização como: elaboração de um banco de dados informatizado em forma
de um quadro geral que agrega as peculiaridades e dados de cada uma das regiões pesquisadas; a
partir desse banco de dados, foi constituída uma ficha individual, também informatizada, para cada
topônimo coletado. No trilhar desse percurso, os pesquisadores do ATEMS basearam-se,
fundamentalmente, nas recomendações teóricas a respeito da execução de um atlas toponímico de
Dick (1996 e 1999).
ASPECTOS DA TOPONÍMIA DO LITORAL SUL PAULISTA
Roseli da Silveira – USP
O objetivo desta comunicação é apresentar alguns dos topônimos mais frequentes em Iguape, litoral
sul do Estado de São Paulo, quanto à motivação que os geraram. Os topônimos têm a função de
distinguir os acidentes geográficos - eles delimitam uma área da superfície terrestre e lhes conferem
características específicas. São importantes fatores de comunicação e permitem a referência da
entidade por eles designada. A averiguação objetiva das causas motivadoras das designações foi
baseada na natureza física ou antropocultural dos fatos, segundo o modelo taxionômico idealizado
por Dick (1980). De acordo com essa metodologia, para se atingir o significado do topônimo,
recorre-se à interpretação linguística de seus elementos formadores. O primeiro elemento do
sintagma toponímico, o termo genérico, define a classe onomástica. O segundo elemento define a
procedência do campo de estudo específico, é o termo específico. As palavras só têm significado
quando se faz uso delas, quando emprestamos a elas um sentido. Assim sendo, o topônimo,
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enquanto signo linguístico, e como tal arbitrário, passa a motivado no momento da nomeação. Daí
decorre o duplo aspecto da motivação toponímica: a intencionalidade do denominador e a origem
semântica da denominação, vistas de uma perspectiva diacrônica e sincrônica, respectivamente.
Partindo do princípio de que cada agrupamento humano possui uma percepção própria do espaço
que ocupa, e que, segundo Lévi-Strauss (1962), o léxico reflete o “interesse” por determinado
aspecto do ambiente, pretendemos pinçar do levantamento toponímico da região central de Iguape,
feito com base nas cartas I, II e III do Instituto Geográfico e Cartográfico do Estado de São Paulo
(IGC), escala 1:10.000, alguns topônimos para estudo.
UM ESTUDO TOPONÍMICO NA BACIA DO RIO PARDO, REGIÃO NORTE DE MINAS
GERAIS
Vander Lúcio de Souza – UFMG
Maria Cândida Trindade Costa de Seabra – UFMG
Os nomes de acidentes humanos (vilas, povoados, cidades, fazendas) traduzem reflexos do
momento histórico em que foram nomeados, haja vista serem mais afetados por fatores
extralinguísticos, como características do processo de povoamento ocorrido na região; questões
interétnicas que individualizam o espaço geográfico – convívio de povos de diversas etnias; a
localização geográfica, interferências políticas, além de fatores ambientais. Neste trabalho,
propomos apresentar topônimos referentes a esses acidentes humanos, coletados em entrevistas
orais, realizadas em nove municípios da região Norte do estado de Minas Gerais, localizados na
Bacia do Rio Pardo – área que se destaca como uma importante via de ligação, em princípios do
século XVIII, entre a região litorânea situada ao sul da Bahia e as Comarcas de Minas Novas e
Serro Frio, situadas próximas ao Rio São Francisco, no sertão mineiro. Às margens do Rio Pardo,
foram surgindo diversos pontos de parada para descanso dos viajantes, os quais, tempos depois,
tornaram-se pequenos núcleos de povoamento, contribuindo para a ocupação definitiva da região. O
rio Pardo possibilitou, portanto, o desbravamento, a ocupação e o desenvolvimento da região norte
desse estado. Buscamos, com nossa pesquisa, contribuir para o conhecimento da toponímia mineira,
reconhecendo, catalogando e constituindo banco de dados em que se têm classificados o padrão
motivador dos nomes, suas origens resultantes das diversas tendências étnicas registradas (línguas
indígenas, africanas, hibridismos, de imigração...). Pretendemos mostrar que a dinamicidade do
sistema lexical está correlacionada à própria dinamicidade da realidade social, econômica, política,
cultural e ideológica da sociedade, manifestada nos nomes de lugares. É uma pesquisa que se insere
no Projeto ATEMIG – Atlas Toponímico do Estado de Minas Gerais – que vem sendo desenvolvido
na Faculdade de Letras da UFMG, desde março de 2005. Seguimos os princípios teóricometodológicos de Dick (1990), adaptado às necessidades do corpus estudado. Para estudos de
variação e mudança toponímica, seguimos os preceitos de Labov (1972, 1994), bem como a
perspectiva diacrônica de Bynon (1977) e (1995) e, ainda, os modelos culturais de Duranti (2000).
TRAÇOS INDÍGENAS NA ZOOTOPONÍMIA DOS PANTANAIS SUL-MATOGROSSENSES: UM ESTUDO COM BASE NOS DADOS DO ATEMS
Aparecida Negri Isquerdo – UFMS/CNPq
Priscila do Nascimento Ribeiro – UFMS/CNPq
As línguas naturais devem ser vistas como formas de linguagem, pois são instrumentos que
possibilitam aos seres humanos a comunicação com seus semelhantes, contudo, ao se pensar em
linguagem, é preciso entendê-la não só como procedimento de comunicação, mas também como
processo pelo qual se demonstram aspectos universais essencialmente humanos. Dessa forma, a
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simples ação de nomear acidentes geográficos gera na língua o topônimo, nome do lugar, que se
configura como um verdadeiro documento linguístico-histórico-cultural de uma região. Essa
categoria de nome próprio é objeto de análise da Toponímia, subárea da Onomástica, ciência mais
ampla que estuda os nomes próprios. O estudo do topônimo é orientado pelo eixo linguístico –
estudo do topônimo como signo de língua – e pelo eixo extralinguístico – relação do nome do lugar
com fatores socioculturais e ideológicos. Este trabalho focaliza topônimos rurais (nomes de rios,
vazantes, corixos, córregos, morros etc.) da mesorregião dos Pantanais Sul-mato-grossenses,
formados com termos de base indígena relacionados à fauna, os denominados, segundo a
terminologia de Dick (1992), de zootopônimos. O estudo está vinculado ao projeto de pesquisa
Atlas Toponímico do Estado de Mato Grosso do Sul (ATEMS), desenvolvido na Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul, que tem como fonte dados registrados em mapas oficiais do IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), escalas 1:250.000 e 1.100.000, relativos aos 78
municípios do Estado, e retoma resultados do estudo de Ribeiro (2011) acerca de zootopônimos de
base indígena no mesorregião Pantanais Sul-mato-grossenses, desenvolvido com bolsa de Iniciação
Científica, da FUNDECT – Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e
Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul –, ampliando o universo de topônimos a partir do
banco de dados do ATEMS. Os topônimos foram analisados em termos quantitativos e qualitativos.
A análise da base linguística dos topônimos buscou verificar possíveis influências extralinguísticas
no processo de nomeação, em especial, possíveis relações entre os grupos étnicos da população de
Mato Grosso Sul e a base linguística do topônimo. Para a identificação da etimologia dos topônimos
foram tomadas como parâmetro obras lexicográficas de línguas indígenas, como Cunha (1998),
Sampaio (1928) e Tibiriçá (1997), e de língua portuguesa Houaiss (2001) e Ferreira (2004). Por ora,
foram identificados na região investigada 124 zootopônimos, 46,77% de base indígena e 46,77% de
base portuguesa. Os 6,46% restantes estão assim distribuídos: 2% são formas híbridas e 5% de
origem obscura ou controversa. O estudo confirma a estreita relação entre o léxico toponímico e as
características do ambiente físico, uma vez que o número de nomes referentes a animais é
significativo no conjunto das 27 taxionomias propostas por Dick (1992). O recorte toponímico
estudado ratificou a tese de Sapir (1969) de que a língua dos povos primitivos é de tal modo
construída para que agrade um falante em tudo que deseje comunicar. Os dados analisados
confirmaram a forte influência indígena na zootoponímia da região pesquisada que é reconhecida
mundialmente pela riqueza da sua fauna e que originalmente era habitada por inúmeras etnias
indígenas (Guaicurus, Guatós, Paiaguás, Terenas, Bororos). Além disso, ficou evidente no estudo
realizado a influência do meio ambiente pantaneiro na zootoponímia, taxe mais produtiva nos
pantanais sul-mato-grossenses, conforme a pesquisa de Schneider (2002) acerca da toponímia dos
acidentes físicos do Pantanal Sul-mato-grossense.
TOPONÍMIA RELIGIOSA: OS NOMES DE SANTOS E SANTAS EM TERRITÓRIO
MINEIRO
Ana Paula Mendes Alves de Carvalho – IFMG
Nesta comunicação, apresentam-se resultados parciais da pesquisa que se encontra em andamento a
respeito dos topônimos (nomes de lugar) de natureza antropocultural relativos aos nomes sagrados
de diferentes crenças presentes na toponímia mineira. O estudo orienta-se pelos princípios da
ciência onomástica e está vinculado ao ATEMIG – Atlas Toponímico do Estado de Minas Gerais,
projeto em desenvolvimento, desde 2005, na Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas
Gerais. Nas etapas já concluídas do projeto, fez-se o levantamento de todos os nomes de cidades,
vilas, povoados, fazendas, rios, córregos, ribeirões, morros, serras, dentre outros acidentes
geográficos dos 853 municípios do estado, documentados em cartas topográficas – fontes do IBGE,
com escalas que variam de 1: 50.000 a 1: 250.000. Obteve-se, então, um banco de dados constituído
de 85.391 topônimos que estão classificados de acordo com a origem e o padrão motivador. Desse
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modo, com o objetivo de contribuir com o detalhamento da realidade toponímica de todo território
mineiro e cumprindo mais uma das etapas previstas do Projeto ATEMIG, empreendeu-se a análise
da parcela desses dados que integram a taxe dos hagiotopônimos, isto é, dos topônimos relativos
aos santos e santas do hagiológio romano e suas variações diatópicas que motivaram a nomeação de
acidentes físicos e acidentes humanos em Minas Gerais. Com enfoque qualitativo e quantitativo,
focalizam-se, dentre essas denominações, os itens mais recorrentes no léxico toponímico do estado.
Dentre os nomes de santos, por exemplo, destacam-se os designativos Santo Antônio, São José, São
João, São Pedro, São Sebastião, São Bento, São Domingos e São Francisco. Os nomes de santas,
por sua vez, aparecem em menor número na toponímia mineira, destacando-se os designativos
Santa Ana, Santa Rita, Santa Rosa, Santa Bárbara, Santa Luzia e Santa Clara. Observa-se, pois,
que além da análise linguística, a investigação toponímica proporciona a análise da cultura local e
da relação do homem com o meio em que vive, uma vez que é possível resgatar informações
históricas e ideológicas a respeito da organização sociocultural das regiões que compõem o estado,
bem como a maneira como foram constituídas.
ASPECTOS MORFOLÓGICOS DOS FITOTOPÔNIMOS DA MESORREGIÃO CENTROSUL MATO-GROSSENSE
Maria Aparecida de Carvalho – SEPLAN-MT
Os fitotopônimos foram, em cada uma das microrregiões que formam a mesorregião Centro-Sul
Mato-grossense, a taxionomia com maior destaque nas denominações de baías, córregos, lagoas,
localidades, ribeirões, rios, serras, etc., conforme os resultados da pesquisa de DE CARVALHO
(2005). Acreditamos que essa tendência na toponímia regional mantém estreita correlação com a
existência, no Estado, de três importantes biomas brasileiros: Floresta Amazônica, Cerrado e
Pantanal Mato-grossense e, de certa maneira, ratificam o fitotopônimo que nomeia o Estado: Mato
Grosso. As unidades lexicais que se referem aos elementos da flora, quando usadas para dar nomes
a acidentes físicos ou antrópicos, são denominadas nos estudos toponímicos, de fitotopônimos,
segundo o modelo teórico de DICK (1990). Pode-se, de certa forma, dizer que a riqueza da flora
mato-grossense está representada pela gama dos fitotopônimos que estão registrados nos
documentos cartográficos dos municípios selecionados, à medida que perfazem um total de 456
(quatrocentos e cinquenta e seis) denominações em um universo de 2.233 (dois mil, duzentos e
trinta e três) topônimos, extraídos de cartas cartográficas do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), do Departamento de Serviço Geográfico (DSG) órgão do Ministério do Exército
e de mapas oficiais da Fundação de Pesquisas Cândido Rondon (FCR), todos em escala 1:100.000,
de 17 (dezessete) municípios que compõem 04 (quatro) microrregiões mato-grossenses: Alto
Pantanal, Alto Paraguai, Cuiabá e Rosário Oeste - vinculados a mesorregião Centro-Sul
Matogrossense. Esta pesquisa representou o início da elaboração do Atlas Toponímico do Estado de
Mato Grosso. A análise dos sintagmas toponímicos foi norteada pela proposta metodológica, para a
classificação dos topônimos, desenvolvida por DICK (1980, 1992, 1996). Este estudo tem como
objetivo discutir a representatividade que os elementos da flora exercem na toponímia
matogrossense, sobretudo, nas denominações dos acidentes físicos; evidenciar os aspectos
morfológicos que se destacam nos fitotopônimos e o percentual destes no somatório geral das
denominações da Mesorregião, focalizando, no recorte específico de topônimos selecionados, as
derivações prefixais e sufixais; o percentual dos fitotopônimos que possuem afixos em relação ao
total geral de topônimos e, também, ao total dos fitotopônimos para estabelecer a representatividade
das estruturas dos fitotopônimos. Além disso, o trabalho aborda a questão da expressividade dos
fitotopônimos de etimologia indígena, como também a incidência percentual dos fitotopônimos no
total dos topônimos por município. Para manter os registros de todos os topônimos pesquisados foi
organizado um banco de dados, por meio de fichas lexicográfico-toponímicas que registram
caracteres específicos de cada topônimo estudado. Esse banco de dados possibilita fácil acesso às
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informações necessárias que subsidiariam a pesquisa toponímica. O estudo demonstra ainda a
importância que os fitotopônimos desempenham no ato de dar nomes a acidentes físicos e a
acidentes antrópicos da mesorregião Centro-Sul Mato-grossense, ou seja, destaca a contribuição da
toponímia como um meio para nortear jornadas, especificar culturas regionais e características da
flora nas microrregiões ou nos municípios e, também, manter por meio do volume expressivo das
denominações catalogadas, o registro de espécies que são ou já foram abundantes na área
investigada.
A TOPONÍMIA RURAL DA MICRORREGIÃO DE QUIRINÓPOLIS/SUL GOIANO – O
NOME DOS ACIDENTES FÍSICOS
Renato Rodrigues Pereira – UEMS
A Toponímia é uma ciência que se ocupa do estudo de nomes de lugares. Ao investigar o léxico
toponímico de uma região, o pesquisador considera aspectos sócio-linguístico-culturais do espaço
circundante, pois, no topônimo – nome do lugar - são refletidos aspectos culturais de um
determinado grupo social existente ou preexistente na área geográfica que abriga o designativo.
Fatos históricos, desilusões, ideologias do grupo denominador, aspectos de um acidente físico ou
características da flora e da fauna a que pertence o lugar são alguns dos aspectos identificáveis e
analisáveis no topônimo. Esta comunicação apresenta resultados parciais da pesquisa que
realizamos para a dissertação de mestrado sobre a toponímia da microrregião de Quirinópolis – Sul
Goiano, que foi dividida em duas etapas, a saber: i) estudo da toponímia rural da região, que teve
como objetivos inventariar os topônimos a partir de mapas oficiais do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), de escalas 1:100.000, classificando-os de acordo com as
taxionomias propostas por Dick (1992); analisar o acervo toponímico inventariado em termos de
motivação designativa, língua de origem dos topônimos e estrutura formal do sintagma toponímico;
ii) estudo comparativo entre os topônimos analisados na primeira abordagem da pesquisa com os da
região do Bolsão Sul-mato-grossense (DARGEL, 2003) que integram o Banco de Dados do Projeto
ATEMS (Atlas Toponímico de Mato Grosso do Sul) e com os de 11 municípios do Triângulo
Mineiro (Projeto ATEMIG – Atlas Toponímico de Minas Gerais). Orientaram a pesquisa duas
hipóteses: i) a toponímia do universo pesquisado incorpora particularidades sócio-linguísticoculturais, históricas e geográficas da região a que pertence e, ii) existência de uma possível
“isoglossa toponímica”, na região de fronteira de Goiás com os Estados de Minas Gerais e Mato
Grosso do Sul. Para este trabalho, selecionamos o recorte da primeira etapa da dissertação. A
análise dos dados foi orientada pelos princípios teórico-metodológicos da Toponímia e de
disciplinas afins, fundamentalmente, o modelo teórico proposto por Dick (1992). Os resultados
deste estudo proporcionaram conhecer muito sobre o estado de Goiás e, sobretudo, evidenciaram
aspectos da relação entre o homem e o ambiente que o cerca, quando nomes de natureza
fitotoponímica, hidrotoponímica, zootoponímica, antroponímica e litotoponímica foram os de maior
produtividade em termos de motivação para o designador ao nomear os lugares. Verifica-se que a
preferência por nomes de categorias de natureza física é recorrente na toponímia de um modo geral,
principalmente quando se trata de um estudo da toponímia rural de um espaço geográfico. O
homem, por meio da ação denominativa, procura evidenciar o que tem de mais valioso no local
nomeado, como a vegetação, os rios e os animais.
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PARQUE ESTADUAL TURÍSTICO DO ALTO RIBEIRA- PETAR - UMA ABORDAGEM
CONCEPTUAL DOS DENOMINATIVOS DE LUGAR
Edelsvitha Partel Murillo – USP
Ao estudarmos os topônimos objetivamos a análise da transformação do território e a compreensão
do homem que modifica e denomina esse espaço.A região do Alto Ribeira, a sudeste do Estado de
São Paulo, onde está localizado o Petar, constitui a área definida de nossa pesquisa. Inseridos nessa
área encontramos denominativos que denotam aspectos étnico-culturais da população que ocupa ou
ocupou a região.Nossa pesquisa é parte do Projeto Atesp, Atlas Toponímico do Estado de São
Paulo, integrante do Atlas Toponímico do Brasil (ATB) organizado pela Profª Drª Maria Vicentina
de Paula do Amaral Dick. O objetivo de nosso trabalho é, portanto, descrever o Petar como
integrante do Atlas, demarcar os traços étnicos toponímicos da região por meio dos aspectos
denotativos dos denominativos de lugar e, condensando esse objetivo, buscamos definir uma base
conceptual para o nome próprio de lugar, ou melhor, delinear seu sentido étnico/ cultural pautado
nos aspectos conotativos do signo toponímico.Fundamentado nos pressupostos linguísticos do nome
próprio de lugar, nosso estudo prioriza as duas modalidades de análise toponímica sugeridas por
Dick (1990), a saber: a intencionalidade que anima o denominador e a própria origem semântica da
denominação.Em nossa pesquisa, enfatizamos a origem semântica dos denominativos de lugar;
analisamos primeiramente os aspectos denotativos e estruturais do signo toponímico baseados na
proposta de Dick (1990), em que o topônimo está intimamente ligado ao acidente geográfico que
indica. Essa nomenclatura onomástica é constituída de um termo genérico, relativo a uma entidade
geográfica que receberá a nomeação e, outro, o elemento ou termo específico, ou o topônimo
propriamente dito, que particularizará a noção espacial, identificando-a e singularizando-a dentre
outras semelhantes.Os aspectos conotativos dos denominativos nos encaminham para a
compreensão de relações de significação, ou melhor, das relações semióticas. Em nossa análise,
priorizamos o caráter metafórico e metonímico desses designativos; explicitando melhor, dizemos
que enquanto marcador de lugar o topônimo, como signo linguístico, estabelece relações de
contiguidade e, ou, de similaridade com o referente ao qual está relacionado. A identidade
significativa entre nome de lugar e lugar é mais sensível nos topônimos de origem indígena , cuja
força ‘mítica’ motivadora exprime o íntimo convívio do homem indígena com a natureza, “visto
que toda a Natureza ressoa, nada mais natural , para o homem sensível , que ela viva, fale, atue”
(CASSIRER, 2006,p.106)A iconicidade presente nos hidrônimos de origem tupi é reveladora de seu
caráter metonímico , da relação externa de contiguidade: Y-chiririca> água ligeira, veloz.A
metáfora é entendida com a transposição de uma palavra que passa de um objeto a outro por
similaridade: Botujoru – ybitu > vento; juru> boca ( a boca do vento).Nesse sentido, por meio do
estudo dos denominativos de lugar nosso trabalho visa reconhecer a articulação dos diferentes
atores de grupos sociais que em diferentes épocas tem se apropriado daquele espaço e deixado ali
suas marcas. Isso se alinha à afirmação de Benveniste (2005, p. 47) de que “não é a língua que se
dilui na sociedade, é a sociedade que começa a reconhecer-se como língua.”
OCORRÊNCIA DE NOMES DE ESPÉCIES VEGETAIS TÍPICAS DA FLORESTA
TROPICAL NA TOPONÍMIA SUL-MATO-GROSSENSE
Suely Aparecida Cazarotto – UFMS
Os nomes de espécies vegetais típicas da formação vegetal Floresta Tropical alçados à categoria de
topônimos no Estado de Mato Grosso do Sul constituem o material de análise deste estudo. O
corpus foi extraído do Glossário de fitotopônimos sul-mato-grossenses: uma proposta.Cazarotto
(2010) estudou os topônimos oriundos de nomes de espécies vegetais utilizados na nomeação de
acidentes físicos e humanos extraídos do Banco de Dados do Projeto ATEMS – Atlas Toponímico
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269
do Estado de Mato Grosso do Sul. Uma vez identificados, esses nomes foram conceituados a partir
de dicionários de Botânica. Verificou-se o tipo de acidente nomeado (físico ou humano), a base
linguística desses nomes, mediante consulta a dicionários de língua indígena (Tupi e/ou Guarani), e
a localização do(s) topônimo(s) homônimo(s) dessas espécies florísticas. Foram selecionados 83
(oitenta e três) nomes, dado que esses topônimos são encontrados em vários pontos do Estado, no
entanto, uma análise mais apurada foi feita somente sobre os nomes angelim, angico, aroeira,
bambu, canafístula. canela, cedro, erva-mate, guariroba, ipê, jatobá, peroba, sucupira e timbaúva,
num total de 14 (catorze). As variações decorrentes desses catorze nomes constituem os 83 (oitenta
e três) topônimos mencionados serão relacionados, bem como a sua localização em território sulmato-grossense. Gressler e Vasconcelos (2005, p. 63-70), em estudo realizado sobre a geografia do
Estado de Mato Grosso do Sul, informam que a floresta, ou mata tropical, é composta por árvores
altas e, em seu interior, há um emaranhado de árvores menores, cipós e parasitas.Ainda de acordo
com as mesmas autoras, as espécies de árvores mais comuns encontradas nesse tipo de vegetação
são cedro, angelim, aroeira e peroba, encontrando-se, também, a erva-mate, o jacarandá, a
sibipiruna e o ipê, em suas diversas cores. Portanto, de acordo com o exposto por Gressler e
Vasconcelos (2005) e após serem verificadas as ocorrências toponímicas, este estudo ratifica a
importância da vegetação na nomeação dos acidentes físicos e/ou humanos de uma comunidade.
A DIMENSÃO ETNODIALETOLÓGICA NO LÉXICO TOPONÍMICO EM DIAMANTINA
Tatiana Martins Mendes – UFMG
Este estudo atém-se à análise das práticas sociais e linguísticas por meio do estudo toponímico
realizado em Diamantina e seus distritos, situados no Vale do Jequitinhonha, região nordeste de
Minas Gerais, no Brasil. A toponímia é uma disciplina linguística de caráter científico que faz
interface, principalmente, com a história, a antropologia e a geografia através do estudo dos nomes
de lugares e a motivação para sua aplicação. Na maior parte das vezes esse nome é marcado
ideologicamente por retratar a visão do denominador em tempo e espaço determinados. Nesse caso,
o uso da língua ultrapassa a mera função nomenclatória, refletindo o modo de viver de uma cultura
e a representação de seus valores. A toponímia, quando aplicada junto à sociolinguística, propicia
evidências de traços da história sociocultural – constituição do espaço, processos de povoamento e
cultura local – divulga características do ambiente físico – vegetação, hidrografia, geomorfologia,
fauna etc. – e colabora para a compreensão da multidimensionalidade da língua, pois os nomes de
lugares, quando relacionados à língua, cultura e sociedade costumam ser genuínos registros de fatos
pretéritos. Esta análise, portanto, objetiva a investigação de casos de variação, mudança e retenção
linguística após análise sincrônica e diacrônica envolvendo dados de língua oral contemporânea,
escrita contemporânea e escrita antiga. A pesquisa realizada na região seguiu os critérios
estabelecidos pela sociolinguística. Primeiramente, observaram-se dados de língua falada coletados
em 22 entrevistas orais, em seguida, consultaram-se mapas antigos para coletar dados da língua
escrita e, finalmente, foram comparados presente e passado, objetivando observar casos de variação,
mudança ou retenção linguísticas. Dessa abordagem resultaram aspectos etnodialetológicos
observados nos processos históricos da língua falada na região, em que atuaram índios, brancos e
negros, nesses últimos três séculos. A etmologia dos nomes estudados em que configuram as bases
pré-românica, românica (português, francês, italiano), não românica (africano, árabe, aramaico,
céltico, germânico, grego, hebraico, indígena, inglês, malaio) e formações híbridas revela o tecido
cultural construído e conservado pela comunidade linguística diamantinense.
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A MEMÓRIA TOPONÍMICA NO MUNICÍPIO DE DELMIRO GOUVEIA-AL: ESTUDOS
INTERDISCIPLINARES
Cezar Alexandre Neri Santos – UFAL
Este resumo pretende expor os resultados parciais do projeto intitulado “A Memória Toponímica no
município de Delmiro Gouveia-AL: Estudos Interdisciplinares”. O projeto, aprovado no “Programa
de Ações Interdisciplinares da UFAL”, é coordenado pelo autor deste trabalho e tem a colaboração
de dois docentes dos cursos de História e Geografia da UFAL/Campus do Sertão. As atividades
ainda estão em fase embrionária, mas quando do encontro – em julho de 2013, alguns estudos já
serão passíveis de resultados consistentes. Entre os principais objetivos deste projeto interdisciplinar
estão investigar as denominações dos lugares, urbanos e rurais do município de Delmiro GouveiaAL, considerando aspectos linguísticos, geo-históricos e culturais preservados pela toponímia local.
A escolha deste local se deu por ser esta a localidade sede do Campus do Sertão da Universidade
Federal de Alagoas. Pretende-se ainda fazer o levantamento designativo dos distritos, bairros,
povoados e logradouros em Delmiro Gouveia-AL, registrar as principais motivações presentes nos
signos toponímicos dos logradouros, bairros e estabelecimentos comerciais de Delmiro Gouveia,
descrevendo padronizações semânticas nos significados do repertório toponímico, descrever as
entidades memorializadas nas toponímias urbana e rural do município, bem como perceber
mudanças sistemáticas e espontâneas e notar a que ameaças/fenômenos estão sujeitos os nomes de
lugares delmirenses. Se possível, também serão percebidas menções a aspectos físicos da região,
como fauna, flora e cursos d’água. Como dito, foi formada uma equipe interdisciplinar (Letras,
História e Geografia) de acadêmicos da UFAL/Sertão de estudos toponímicos, visando a
desenvolver estratégias de pesquisa embasadas em publicações especializadas na área, na intenção
de promover, numa última instância, programas de “Educação Toponímica” nas escolas das redes
pública e privada, visando à conscientização desse público-alvo acerca da memorialização
toponímica. A elaboração de um banco de dados toponímico, visando à elaboração de um Atlas
Toponímico do município de Delmiro Gouveia-AL, é a atividade-fim do projeto, resgatando textos
orais a fim de catalogar e publicizar as memórias individuais e grupais da população local. Por tudo,
este estudo se torna pertinente de participação neste Simpósio, uma vez que a própria UNESCO
eleva a toponímia ao afirmar que “[...] os nomes geográficos são um importante elemento de
patrimônio linguístico e de tradições orais”. Apesar de haver um número expressivo de textos de
cunho informal sobre os nomes de lugares, dada a curiosidade que os falantes têm sobre o
significado e a origem destes, ainda podem-se considerar relativamente escassos ou mesmo nulos os
trabalhos acadêmicos acerca da toponímia no município de Delmiro Gouveia-AL. Uma vez que a
Toponímia congrega o campo da Onomástica, mas também permite estudos sob a égide de áreas
como História e Geografia, cabe a ela estudar a origem e significação dos nomes dos lugares,
levando em consideração aspectos geo-históricos, socioeconômicos e antropolinguísticos que
tenham influenciado a escolha das denominações. Para tal análise, utilizar-se-á a classificação
taxonômica de Dick (1990) e, tanto quanto possível, a tabulação em fichas lexicográficotoponímicas (DICK, 2004), que permite a tabulação de contextualizações históricas e geográficas.
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SIMPÓSIO 23
TEMPO, ESPAÇO E CULTURA NA
LITERATURA DE LÍNGUA PORTUGUESA
A linguagem, a identidade e a cultura circunscrevem fronteiras literárias no mosaico das
cosmovisões espaço-temporais da modernidade. Literaturas de língua portuguesa, do século XIX
até a contemporaneidade são o veículo de acesso a esse heterogêno mapa linguístico e cultural que
desvenda representações de condições de fala diversas, revelando tempos e espaços distintos, que
compartilham, por outro lado, uma realidade comum: a língua. Esse simpósio se propõe a investigar
as localizações literárias dessa multiplicidade temporal e espacial, com o intuito de compreender, na
medida do possível, as particularidades e/ou as coincidências dos distintos construtos linguísticos e
literários, que por sua vez, acompanham e produzem os ritmos e os sentidos dessas representações,
na complementar relação entre a língua, a cultura e a literatura.
COORDENAÇÃO
Leila Borges Dias Santos
Universidade Federal de Goiás
[email protected]
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A GEOGRAFIA DA LINGUAGEM NA BAHIA LITERÁRIA DE JORGE AMADO
Analúcia Andrade Costa – UEFS
A obra literária de Jorge Amado atravessou as fronteiras geográficas e culturais no Brasil e no
mundo. Seus romances traduzidos em mais de cinquenta idiomas descrevem a Bahia e o povo
baiano nos aspectos culturais, sociais, históricos e credos religiosos. Ao analisarmos a vida e a obra
de Jorge Amado, não encontramos uma identidade imutável e única no escritor, mas com a leitura
de suas obras encontramos múltiplos “Jorges” com diversos olhares sobre a Bahia e sua gente, que
constituem o corpus da obra do escritor Jorge Amado. A linguagem utilizada pelo escritor em seus
romances sofreu severas análises dos críticos no século XX. No século XXI, novas discussões
destacam a importância da obra literária amadiana ao analisarem sua fortuna crítica. No universo da
criação amadiana, a linguagem sempre foi destaque, pois o autor agrega em sua escrita duas
condições básicas para o entendimento do leitor e do mundo que por ele é narrado: a clareza e a
espontaneidade do discurso. A sua obra mapeia o universo sociológico da Bahia e apresenta tipos
humanos que compõem a geografia sentimental e sociológica do povo baiano e nordestino. Assim,
através da linguagem Jorge Amado toma partido dos espoliados e representa a voz desses
espoliados. Ele dota os personagens populares com voz que se transforma em expressão de
resistência, dos sonhos e da democracia. Jorge Amado elege como cenário para sua produção
literária a Bahia, mas não a Bahia das elites e oligarquias bem como os seus personagens não
correspondem aos heróis tradicionais eleitos por outros autores em suas narrativas. O herói
amadiano é o herói da narrativa moderna. Após a leitura de suas narrativas é possível imaginar o
mapa da Bahia constituído por regiões literárias que se tornam palco e cenário das narrativas. Para
tanto, ele utiliza a linguagem como ferramenta precípua, entrecruzando discursos, alargando
fronteiras discursivas, o tempo e o espaço na construção do texto ficcional, bem como “ casando”
ficção e realidade. Assim, objetiva-se nesse trabalho, a partir dos romances Seara Vermelha, Tenda
dos milages e Gabriela, cravo e canela,destacar como a linguagem empregada por Jorge Amado
corrobora para a construção imagética discursiva, identitária e cultural da literatura brasileira do
século XX.
A LINGUAGEM SUBALTERNA EM CAPITÃES DA AREIA
Bárbara Cecília dos Santos Neves – UEFS
Maria Celeste Pacheco de Andrade – UEFS
A linguagem exerce um papel importante na sociedade, pois estabelece relações entre o indivíduo e
o mundo em que está inserido, criando parâmetros que permitem reconhecer e diferenciar o sujeito
de acordo com sua cultura, condição econômica, grau de instrução, ambiente e contexto social. A
linguagem nasce da necessidade que o ser humano tem de expressar seus pensamentos por um
sistema de signos, sinais, símbolos, sons, gestos. Percebendo o romance literário como um macroato
de linguagem realizado na interação entre autor e leitor, ao representar uma dada realidade social e
humana, à luz do dialogismo bakhtiniano (1993) que afirma ser o romance o gênero que representa
artisticamente a interação entre as vozes sociais, proporcionando a representação do pensante,
transição da fala e do pensamento, é que este trabalho pretende analisar as formas de linguagens
presentes no romance Capitães da Areia (1937) do escritor baiano Jorge Amado. O tema principal
do romance é a marginalização de crianças e adolescentes, que por diversas razões se encontram em
situação de rua. Amado dá voz aos meninos abandonados dos anos 30, do século XX, ao incorporar
elementos da cultura popular. Com o caráter realista, utiliza as normas vernáculas e coloquiais, a
naturalidade, a fala espontânea para tecer a vida dos Capitães da Areia, debatendo e denunciando as
desigualdades sociais e econômicas, as formas de coerção/proteção da época. Entende-se, assim,
que na literatura de Jorge Amado é possível perceber descrições perfeitas das variações linguísticas,
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visto que a linguagem é para o autor um elemento marcante do retrato social, do ambiente e dos
personagens.Percebe, também, que a linguagem amadiana reflete o comportamento das personagens
denunciando o grau de marginalização a que as crianças abandonadas eram submetidas. Capitães da
Areia apresenta uma grande variação de linguagem popular refletida nos diálogos das crianças
abandonadas, capoeirista, mãe-de-santo, padre, saveiristas, prostitutas, marinheiros, comum ao
estilo amadiano que em seus romances deu voz aos subalternos.
O MITO DO HERÓI NA AFIRMAÇÃO DA CULTURA E DA LÍNGUA BRASILEIRA: A
VITALIDADE DO ENTRE-LUGAR EM JORGE AMADO
Hudson dos Santos Barros – FAMA
A figura de Pedro Archanjo em Tenda dos Milagres, consagrado romance de Jorge Amado, escrito
em 1969, mais do que símbolo da luta contra o racismo e a discriminação, é também a encarnação
da valorização da cultura e da língua brasileira. Na obra em questão, Amado torna a celebração
desse personagem um veículo de defesa do saber, dos modos de ser e da linguagem do povo baiano;
além disso, ironiza a subordinação da classe intelectual e da imprensa da época à aquiescência do
olhar estrangeiro, personificado na narrativa pelo estudioso James D. Levenson e pelo
comportamento altivo do professor da Faculdade de Medicina Nilo Argolo. Para a construção dessa
defesa de brasilidade, o romancista baiano traz à tona o mito do herói que consolida a identidade de
sua missão na jornada do sagrado e do profano: Archanjo é a figura do entre-lugar, é a metáfora
viva da não aceitação dos discursos e valores que impõem normas ditatoriais. Seu nome cristão é
Pedro; em nagô, seu nome é Ojuobá, isto é, os olhos de Xangô. De vida festeira e dedicada aos
prazeres da carne, ele edifica sua fama entre os excluídos, entre aqueles que sofrem o desprezo da
cultura de prestígio. Trata-se de um personagem que vive e testemunha o recriminado universo dos
pobres e negros e que também transita no mundo acadêmico devido ao seu emprego de bedel da
Faculdade de Medicina. Em vida, foi protegido pelos orixás e ignorado pelos homens de poder; sua
morte, contudo, abre caminho para uma interessante ironia: Archanjo torna-se símbolo da Bahia, de
seus costumes e conhecimentos. Consagração essa que apenas acontece quando o renomado
acadêmico norte-americano Levenson decide aprofundar seus estudos sobre os livros escritos pelo
instigante protagonista. Buscando-se explorar as especificidades do mito do herói em Tenda dos
Milagres, pode-se compreender que o conceito de mistura não se limita à questão da miscigenação,
tão bem abordada por Amado. A encarnação de um herói às avessas que transita entre dois mundos
é também a atestação de um conceito de brasilidade que mescla tanto a cultura popular quanto a
força da participação estrangeira, ainda que a subordinação perante esta seja criticada. Tendo,
portanto, como base a exploração do conceito de entre-lugar, encarnado no peculiar heroísmo de
Archanjo, pretende-se neste trabalho detalhar a relevância do conceito de mescla para a valorização
da cultura e da língua brasileira.
UM OLHAR DE DESMONTE DO SUJEITO EM A MORTE E A MORTE E A MORTE DE
QUINCAS BERRO DÁGUA
Carlos Artur Conceição – UNEB
A partir da concepção de identidade cultural desenvolvida por Stuart Hall em A Identidade cultural
na pós-modernidade(2005), a presente proposta de trabalho pretende contribuir com a crítica da
cultura através da literatura. Desse modo, objetiva-se discutir os modos de produção identitária na
novela de Jorge Amado intitulada A morte e a morte de Quincas Berro Dágua (1961) a fim de
perceber como se constroem os processos de identificação subjetivas nessa obra, como as
identidades se movimentam , quais as estratégias de desmantelamentos dessas identidades, quais
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são as formas de articulação dos sujeitos unificado, sociológico e do pós-moderno. Para tanto, o
presente estudo bibliográfico toma como base a noção derizoma, articulada por Gilles Deleuze e
Feliz Guattari (1995), bem como a concepção de não lugar da literatura teorizada por Eneida de
Souza (2007). Utilizamos também a ideia de escrita de Giogio Agamben (1993), além de tomarmos
emprestado o conceito de pós-modernidade de Lyotard (1988), uma vez que, tais concepções são
imprescindíveis para articulação teórico-metodológica de tal estudo. Tomando como base as leituras
pontuadas, percebemos que o personagem central da novela, ao se deparar com um universo seguro
e fixo em sua casa, não se identifica com um ideal de pai e de marido.A partir daí, ele tece
processos rizomáticos de identificações com figuras não quistas por sua família que, por seu turno,
performatiza uma crise de insegurança ao vê-lo morto e sorridente, ao passo que, mesmo
postumamente, Quincas responde com um riso sarcástico às demandas duma identidade imutável
rigorosamente traçada. Seu sorriso esboça nuances da incerteza pós-moderna e não propõe nada.
Como um rizoma, destrói a noção de mapa. O rir não aponta para isso nem aquilo, é outra coisa
suspensa e ao mesmo tempo sugere que, diante da pressão familiar, ele, de maneira potente,
preferiria não às formas fixadas de identidade cultural.
UM TEMPERO APIMENTADO: BAIANIDADES E O ROCK DE RAUL SEIXAS
Marijane de Oliveira Correia – IFBA
O presente trabalho busca compreender como aparecem as representações na formação da
identidade baiana nas canções de Raul Santos Seixas, no período compreendido entre os anos 60 e
80. Assim, investiga-se, compreender o que é esta baianidade apresentada na obra “Raulseixista”.
As canções de Raul diferem-se das representações circulantes de baianidade, ou seja, uma cidade
representada pelas belas praias, locais exuberantes e gente festeira, imagem apresentada, por
exemplo, nas canções de “Axé” baiano. É possível vislumbrar, pelas canções de Raulzito, a
principio, outra baianidade: uma cidade bucólica, uma sociedade preconceituosa e conservadora.
Para atingir os objetivos propostos neste trabalho serão analisadas obras e regravações do cantor e
compositor Raul Seixas que citam a Bahia de forma direta ou indireta, são elas: Nanny (1964),
interpretação de Raul e lançada em uma compacto com apenas duas músicas; Menina de Amaralina
(1967) do álbum Raulzito e Os Panteras; Sessão das dez (1971) do álbum Sociedade da Grã-Ordem
Karvenista Apresenta Sessão das Dez; Quero ir (1971) do mesmo álbum anterior; Minha viola
(1980) em Abre-te Sésamo; Capim Guiné (1983) lançado na Coletânea Raul Seixas, interpretação;
Quando acabar o maluco sou eu (1987) retirado do álbum Uah-Bao-Lu-Bap-Lah-Béin-Bum! e
Rock in Roll (1989) último disco de Raul lançado em parceria com o amigo Marcelo Nova, do
álbum A Panela do Diabo. Nesta proposta, serão realizadas análises das canções, a fim de
identificar características da sociedade local que representam o rock e que contradizem uma
imagem de homogeneidade de baianidade. Além da análise da linguagem vista nos textos
selecionados, o acervo imagético também será utilizado para substanciar a análise das canções.
Dentre eles encontram-se as capas e contra capas dos discos, materiais que o acompanhem, fotos
tiradas em shows e disponibilizadas em acervos virtuais ou em acervos particulares e entrevistas.
Esse acervo imagético servirá de auxílio para identificar características relacionadas ao modo de
vestir, pentear os cabelos, dentre outras, que simbolizavam o rock da época, o qual era influenciado
pelos estilos internacionais.
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LITERATURAS DE LÍNGUA PORTUGUESA: A CULTURA AFRICANA E BRASILEIRA
NAS VOZES DE NOÉMIA DE SOUZA E EVARISTO CONCEIÇÃO
Iza Reis Gomes Ortiz – IFRO
O estudo presente busca expor duas representações de mulher através da Literatura. As duas
poetisas que serão trabalhadas neste trabalho são sujeitos que transformam o poema em um tecido
vivo, cheio de história e vida, uma história que corrompe a do dominador e apresenta outra, a dos
marginalizados. Seguindo Octávio Paz, “a experiência pode adotar esta ou aquela forma, mas é
sempre um ir além de si, um romper os muros temporais, para ser outro. Tal como a criação poética,
a experiência do poema se dá na história, é história e, ao mesmo tempo, nega a história.” Através
destas reflexões sobre poesia e História, supomos que as autoras Noémia de Souza, moçambicana,e
Conceição Evaristo, brasileira, construíram uma Literatura que apresenta uma cultura nacional, mas
mesclada com outros espaços, outras culturas. Duas mulheres que refletiram sobre os problemas da
escravidão e do preconceito. Noémia constrói sua poesia como um espaço para ecoar as vozes de
uma identidade que foi por muito tempo sufocada, deformada e aniquilada. Em suas poesias,
ressurge a mulher negra guerreira, lutadora, cheia de cultura e vida, é redesenhado um sujeito que
foi apagado pela História e pela sociedade dominante. São outras histórias que são desenhadas e vão
redefinir os novos caminhos da História, é como se o ouvir das vozes silenciadas fosse uma rasura
na História oficial. É um campo de possibilidades que a poeta transmite as dores e o sofrimento do
povo africano ao mundo, é um constructo em que Noémia não representa apenas a mulher, mas o
contexto africano, o povo africano. Através de autores como Stuart Hall, Michel Foucault, Octávio
Paz e Homi Bhabha, tentaremos visualizar como Conceição Evaristo e Noémia de Souza
representaram a cultura em suas poesias, perpassando pela História, colonização e identidade
cultural.
A HISTÓRIA DE MOÇAMBIQUE NA FICÇÃO DE MIA COUTO: UM
ENTRELAÇAMENTO ENTRE TEMPOS E ESPAÇOS EM O OUTRO PÉ DA SEREIA
Maria de Fátima Castro de Oliveira Molina – UNIR
A relação de Mia Couto com a história da colonização da África se particulariza na obra O outro pé
da Sereia (2006)por meio da recriação de cenários e da reconstrução das vozes das personagens que
compõem a narrativa. O entrelaçamento entre os indícios históricos e os elementos da ficção dá
destaque ao romance devido à carga simbólica que traz na (re)construção ficcional de momentos
históricos da colonização portuguesa em Moçambique, por meio da atuação das personagens nos
tempos e espaços constitutivos do universo ficcional da obra. Dessa forma, é na esteira aberta pelo
diálogo entre o universo ficcional e a história que Mia Couto propõe uma recontagem da história
tecida com as vozes das personagens que estruturam o enredo. Nessa revisitação, apresenta-se uma
nova perspectiva para o fato histórico, narrado não do ponto de vista dos vencedores, mas do ponto
de vista dos que não foram ouvidos ou foram silenciados pelo sistema colonial. Com o objetivo de
dar visibilidade aos elementos lingüísticos, históricos e culturais presentes nas vozes que constituem
a narrativa, a proposta deste estudo consiste em analisar os diálogos instaurados entre as
personagens em distintos tempos e espaços marcados na ficção. A análise dos diálogos foi
fundamentada a partir da concepção de Mikhail Bakhtin sobre o dialogismo no aspecto da interação
verbal. Sob essa perspectiva, estão entrelaçados sujeitos, tempo e espaço, e é por meio do diálogo
que se revela a constituição histórica, social e cultural de cada sujeito. Também constituíram esse
referencial os princípios norteadores dos estudos Pós-coloniais em torno das noções de cultura,
hibridismo e colonização presentes nas idéias dos seus principais autores como Albert Memmi,
Edward Said, Homi Bhabha, Frantz Fanon. Nos diálogos, as personagens redimensionam suas
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relações simbólicas com a cultura em diferentes tempos e espaços e as resgatam por meio de suas
histórias de vida.
AFRICANISMOS EM TRÊS NARRATIVAS LITERÁRIAS E A CONTRIBUIÇÃO DE
BERNARDO GUIMARÃES AO PORTUGUÊS BRASILEIRO
Hugo Lenes Menezes – USP
A língua portuguesa, enquanto realidade comum a tempos e espaços diversos, da mesma maneira
que vai se modificando no país de origem, vai evoluindo em terras brasílicas, a contar da sua
introdução aqui pelos colonizadores europeus de primeira hora, a exemplo dos navegadores, dos
donatários de capitanias, dos governadores gerais, dos funcionários da Coroa, dos missionários, dos
degredados e dos comerciantes, em suma, dos primeiros lusitanos que chegam ao continente
americano. Por conseguinte, o idioma em foco tem os seus inícios no Novo Mundo sob a condição
de língua colonial, deparando-se com os falares nativos, os quais, por sua vez, deixam marcas
indeléveis na língua vinda de fora. Aliás, calculamos que, no século XVIII, de cada três
compatriotas nossos, dois ainda se expressam pelo tupi, de onde uma profusão de vocábulos
indígenas incorporados ao português. Além disso, nos primórdios da colonização lusa, aportam
africanos escravizados para o trabalho na agricultura e, posteriormente, na mineração, trazendo os
seus costumes e os seus falares. Obviamente, na composição do português de Portugal, não entram
termos de etimologia tupi, exceto bem após a “descoberta” do Brasil. O mesmo ocorre com os
termos africanos. Semelhante fenômeno só vem a enriquecer o léxico da língua de Camões, cuja
história é contada, no caso presente, mediante a proveniência do seu vocabulário em duas variantes:
o português da Europa ou lusitano e o português da América ou brasileiro. Os seus termos baseais
procedem do latim. Atentemos para as denominações das partes do corpo humano: cabeça, rosto,
braço, perna, etc., todas de étimos latinos; os verbos da existência cotidiana: andar, amar, dormir,
comer, etc.; em síntese, os vocábulos mais comumente usados. Já os germânicos nos legam termos
militares e afins (guerra, arreios, espora, etc.). Os árabes transmitem palavras com a primeira
sílaba al (artigo da língua deles): almoxarife, alfândega, alfaiate, álgebra, etc. O contato dos
portugueses com outros países resultou na adoção de vocábulos dos seus correspondentes idiomas:
espanhol (baunilha, trecho, etc.); italiano (soneto, piano, etc.); francês (restaurante, abajur, etc.);
inglês (futebol, bife, etc). Especificamente, a contribuição do Brasil encontramos nas palavras tupis
(abacaxi, cipó, capim, etc.) e nas palavras africanas (angu, caçula, senzala, etc.). Em verdade,
podemos dizer que, na qualidade de elemento essencial da identidade de um povo caracterizado
pela pluralidade étnica, historicamente o português da América, sobre uma matriz indígena
preexistente, deriva antes de tudo do contato da variante ibérica do nosso idioma oficial com falares
africanos, dos quais alguns termos e construções, desde o século XVII, já se acham documentados
entre nós pela literatura. Essa, que é a representação e transfiguração estético-verbal da realidade,
reconhecemos, em âmbito nacional, como via de acesso a uma cultura múltipla, em particular no
tocante aos seus aspectos linguísticos. Assim sendo, na comunicação que ora propomos, temos por
objetivo abordar a presença de africanismos em três narrativas do ficcionista romântico Bernardo
Guimarães, quais sejam, “Uma história de quilombolas”, integrante de Lendas e romances (1871),
A escrava Isaura (1875) e Rosaura, a enjeitada (1883), dentro da contribuição do autor de tais
obras ao português brasileiro.
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POESIA PORTUGUESA CONTEMPORÂNEA: NOTAS SOBRE DEZ POETAS
Goiandira Ortiz de Camargo – UFG
Esta comunicação apresentará um breve panorama da poesia portuguesa contemporânea a partir de
um corpus de dez poetas escolhidos e avalizados como representativos pela crítica portuguesa.
Nota-se no conjunto da produção lírica portuguesa um cenário de diversidade de vozes poéticas,
que contemplam, entre outros aspectos, a tradição portuguesa e europeia, o lirismo amoroso, a
imersão nas circunstâncias espaciais e temporais, o sentimento de nostalgia próprio do espírito
português, a ironia como tensão entre a experiência de vida e a experiência estética. Sua expressão
aproveita do que pode oferecer a memória da literatura: desde poemas em prosa, passando pelo
verso tradicional, aos fragmentos narrativos incrustados nos versos, até aos poemas que soam como
aforismas com caráter epigramático. Seus temas vão daqueles engajados no lirismo amoroso aos
mais corriqueiros e episódicos, às preocupações de ordem metafísica até a discussão em torno da
palavra articulada às experiências de subjetividades cada vez mais desconformes e afastadas da
perspectiva cartesiana. Tendo em vista o exposto, pode-se afirmar que a lírica portuguesa
contemporânea (1) redireciona a enunciação poética para os domínios da experiência de vida, (2)
valoriza o corriqueiro numa perspectiva de descobrir no imanente mais banal a transcendência, (3)
rejunta, ainda que precariamente, a subjetividade na discursividade reencontrada pelo poético e, (4)
sem meias-verdades, volta aos temas universais que afligem o homem, sem abandonar as
indagações sobre o próprio da poesia. Com base em estudos de pesquisadores português como
Fernando Pinto do Amaral (1991) e Rosa Maria Martelo (2007), que reconhecem essa poesia como
um desdobramento reflexivo da poesia moderna, porém, assinalada por uma multiplicidade de
dicção e de individualidades poéticas; na investigação realizada através de nosso Projeto de
Pesquisa “Subjetividade, lirismo e contemporaneidade. Estudos teóricos e crítica da lírica brasileira
e portuguesa contemporâneas”; e face a alguns poemas, apresentaremos a poesia de Adília Lopes,
Ana Luisa Amaral, Daniel Faria, Fernando Pinto do Amaral, José Tolentino Mendonça, Luis
Miguel Nava, Luis Quintais, Maria do Rosário Pedreira, Manuel de Freitas e Rui Pires Cabral.
DIÁLOGOS HISTÓRICOS E CULTURAIS NAS LITERATURAS DO MACROSSISTEMA
LITERÁRIO EM LÍNGUA PORTUGUESA
Marilúcia Mendes Ramos – UFG
As produções literárias do Brasil e de Angola fazem parte do que Benjamin Abdala Júnior
denominou de “macrossistema literário” (1989), argumentando serem as produções artísticas e
literárias dos países de língua portuguesa permeadas por uma tradição histórico-cultural comum, a
partir de uma linguagem modelada desde a Idade Média europeia, com permanentes aproximações e
diferenciações. O exercício de aproximação dos sistemas nacionais permite, então, o conhecimento
do macrossistema que se abastece de um passado comum, como também do diverso de cada
atualização concreta das literaturas de língua portuguesa. Há, assim, “um conjunto invariante
abstrato (o macrossistema), concretizado em cada variante nacional (sistema)” e esse conjunto
dialético é composto pela antiga metrópole portuguesa e suas ex-colônias sem imposições e sem a
falácia de padrões pretensamente superiores (1989, p.18). Inversamente às atualizações específicas
de cada nacionalidade desse macrossistema, fatores históricos de convergência mantêm
correspondência, seja de tradição ou de modelos culturais de ruptura. Assim, ao proceder a um
estudo comparativo dos textos engajados em português, procuram-se as similaridades contextuais e
as similaridades situacionais. A colonização pela mesma metrópole propiciou a escrita de uma
história nas ex-colônias que revelou preocupações similares, como o problema da identidade
nacional. A literatura constitui-se em importante instrumento para a reconstrução e preservação da
memória desse passado colonial pelos autóctones, assim como para a luta pelas independências na
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década de 1960. A opção pela representação do proprium angolano pelo conto, gênero bastante
próximo da tradição oral africana, é meio de contribuir para a construção da identidade nacional e,
portanto, modo de apresentar traços culturais próprios, outrora lidos, sem o necessário
conhecimento, pela história oficial escrita pelo colonizador. Para este estudo, cotejam-se contos
angolanos que versem sobre as representações culturais de Angola, bem como sobre o correlato
problema da construção da identidade nacional, tecendo paralelos com a literatura brasileira em
seus períodos literários de semelhante preocupação, como o Romantismo e o Modernismo, à luz de
textos críticos de paradigmáticos pesquisadores portugueses, brasileiros e angolanos.
SOB O CÉU DE LISBOA: A MODERNIDADE DE CESÁRIO VERDE
Luciana Marino do Nascimento – UFA
O título deste trabalho, “Sob o céu de Lisboa: a modernidade de Cesário Verde”, retoma a canção
francesa “Sob o céu de Paris” revelando, metaforicamente a idéia que o norteia: a presença da
imagem da capital francesa, como pólo irradiador do progresso, do cosmopolitismo; palco das
grandes revoluções histórico-sociais, literárias e culturais e ícone da modernidade do século XIX,
que ecoou em outros países e culturas, como em Portugal. Sob o céu de Lisboa Cesário Verde,
baudelairianamente, se põe a recortar o espaço da cidade em diferentes níveis e planos sobrepostos,
observando o processo de transformação no espaço urbano, que se dá sob o signo do estranhamento
de uma tradição cultural que localizava o país numa posição de centro. O ponto alto de sua obra,
sem dúvida, é o poema “O Sentimento dum Ocidental”, sua saga urbana de poeta-andarilho, que ele
publicou por ocasião das comemorações do tricentenário de morte de Camões, em 10 de junho de
1880, na Folha “Portugal a Camões”, editada pelo Jornal de Viagens. Esse poema representa o texto
nuclear da poesia verdeana, podendo ser considerado como uma expressão do projeto estéticoliterário do poeta. Em “O Sentimento dum Ocidental” entra em cena, um sujeito herdeiro da
tradição da cultura ocidental, que perafz um percurso reflexivo de um “eu” solitário em busca de
sua identidade poética. Vilma Arêas, em seu artigo “Duas leituras de Camões: Cesário Verde e
Fiama Hasse Pais Brandão”, afirma que em Camões o que era a gesta de um povo cumprindo uma
alta missão ordenada por Deus,com as grandes viagens marítimas, nos versos de Cesário Verde
torna-se um passeio solitário de um homem que evoca paradigmas literários, como as crônicas e a
epopéia –marcos de um passado glorioso. Este sujeito está em busca de um modelo poético que
represente o Portugal de seu tempo, tempo esse onde presente e passado se cruzam e se cristalizam
em monumentos literários, que sobrevivem aos séculos, tal qual a epopéia “salva a nado.”
O “EU-OUTRO”: RECIPROCIDADE SOFREDORA EM SÁ-CARNEIRO
Moisés Carlos de Amorim – UFMT
Diego Pinto de Sousa – UFMT
Ao lado de Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro é o grande representante do modernismo em
Portugal, traduzindo a angústia do homem moderno sob a ótica da despersonalização: “Perdi-me
dentro de mim/Porque eu era labirinto” (SÁ-CARNEIRO, 2006). Semelhante a Antônio Nobre, a
quem dedicou o poema “Anto”, aos poetas românticos, confessava na sua lira o sofrimento que o
acarretava. Desta forma, na criação artística, assim como na vida, ser sujeito é confessar-se para o
outro. E o poeta se constitui enquanto sujeito a partir desta relação: porque somos enredados a todo
instante da existência pelo discurso do outro. O olhar exotópico compõe o atributo humano de
significar: “Porque em qualquer situação ou proximidade que esse outro que contemplo possa estar
em relação a mim, sempre verei e saberei algo que ele, da sua posição fora e diante de mim, não
pode ver” [...] (BAKHTIN, 2010). A destreza de se considerar o outro que lhe perpassa e, por vezes,
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apropriar-se de seus elementos constitutivos é um fenômeno presente em todos os terrenos da vida.
O ser age, essencialmente, pelo outro e para outro. E não é diferente no processo artístico, pois o
artista recupera um pouco de si e de todos, por isso a arte possui um reconhecido caráter universal.
Desta maneira, arte e vida são indissociáveis, estabelecendo relações diretas, equivalentes à medida
que o real é reinventado e, portanto, refletido e refratado. Para a literatura, especificamente, o
mergulho a “outros mundos” consolida o papel do artista-criador, cuja palavra, inicialmente
subjetiva, torna-se material - de todos e dita por todos. [...] Mas a vitória fulva esvai-se logo... E
cinzas, cinzas só, em vez de fogo... – Onde existo que não existo em mim? [...] (SÁ-CARNEIRO,
2006). Por isso, não se completando consigo próprio, em várias passagens da obra, necessita criar o
outro, amenizando a dispersão total do seu indivíduo, a perene solidão. Em suma, o amigo de
Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, realiza uma obra que está ligada ao decadentismo
baudelairiano, à estética simbolista e ao próprio ambiente em que viveu (MASSAUD, 33ª
EDIÇÃO). Pode-se dizer, portanto, que tal obra é, segundo Massaud Moisés, registro vivo da
própria personalidade do seu autor. Daí sua poesia documentar um ser que se procura inutilmente
no outro dentro de si. A mensagem erigida por Sá- Carneiro em seu processo de criação se organiza
como um exercício exotópico. A busca desmesurada do ser no outro permite a reflexão de que
faltava um sentido para este sujeito poético, imerso em seu quadrante onde não se reconhecia
enquanto tal. Sua obra é um grito de sofrimento para os problemas da modernidade, sobretudo por
voltar-se ao interior, que - em certo grau - torna-se um não lugar. As fronteiras inexistem. Na
verdade, as linhas limítrofes demarcadoras do ser são volúveis, inconstantes, humanizadas... Sofre o
poeta, porque sofre o mundo. É vendo o horizonte por detrás e as especificidades pertencentes ao
outro que lhe afigura as facetas da realidade (interior e exterior), sendo este o terreno que o autor de
“Dispersão” encontra a substância fertilizante para sua obra poética.
O IMAGINÁRIO CULTURAL ACERCA DA FIGURA DO CORVO NO CONTO “A
REPÚBLICA DOS CORVOS”, DE JOSÉ CARDOSO PIRES
Bruno Silva de Oliveira – UFG/CAC/LIMES/FAPEG
Alexander Meireles da Silva – UFG/CAC/LIMES
Tanto uma palavra como uma imagem podem ter diversos significados dependendo dos contextos
ou espaços distintos que estão alocados, e muitas vezes esses significados são antitéticos ocorrendo
neste processo à difusão do sentido negativo ou marginalizado desse, fomentando a estigmatização
de algumas figuras. Uma dessas figuras que possuem significados de valoração cultural opostas é o
corvo, ave preta que pouco aparece na Literatura, mas de grande força no imaginário cultural e
literário, sendo os textos mais expressivos, e que retratam a sua oposição semântica, o poema “O
corvo” (1895), do norte-americano Edgar Allan Poe e a passagem bíblica que o profeta Elias é
alimentado por corvos (1 Reis 17: 1-6). No poema de Poe, ele é um símbolo de mau agouro, ligado
à morte e à noite, remetendo ao eu lírico de sua perda. No excerto bíblico, por sua vez, ele é um
mensageiro de Deus que alimenta o profeta. Seu simbolismo, no entanto, não se restringe apenas a
estas duas facetas. Há outras referências diferentes destas na mitologia grega, nórdica e japonesa.
Tendo em mente a polissemia de dados termos e a possível estigmatização de alguns outros ligados
a este animal, esse trabalho se pauta em discutir a figura do corvo no conto “A república dos
corvos” (1998), do escritor português José Cardoso Pires. A escolha desse conto se justifica pelo
fato de o autor trabalhar com uma figura iconográfica da cultura portuguesa, tendo um vínculo
explicitado na narrativa com a lenda de São Vicente, padroeiro da cidade de Lisboa, espaço no qual
ocorre a narrativa. Dentro deste quadro, este trabalho objetiva demonstrar a construção do corvo na
narrativa e de que modo ele é apresentado ao leitor, observando até que ponto há um resgate da
memória cultural em torno da figura e a qual sentido, positivo ou negativo, o corvo está vinculado.
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PELA GLÓRIA DE PORTUGAL: O SALAZARISMO, OS IMPERIALISMOS DE
FERNANDO PESSOA E A GUERRA COLONIAL EM LÍDIA JORGE
Hadassa dos Passos Freire – UFG
As relações entre o governo de António Oliveira Salazar e os diversos escritos de Fernando Pessoa
sobre política e nação, incluindo Mensagem (2004), têm seus efeitos além-mar encontrados em A
Costa dos Murmúrios, de Lídia Jorge (1998), e são analisados criticamente através de carta escrita
em 1959, de considerações de Raul Proença escritas entre 1921 e 1926, de Joel Serrão (1981), um
texto de Augusto de Santos Silva (1991) e outros de Luís Torgal (2008). As intenções e a
propaganda ideológica de Salazar estão expressas nos Pensamentos para inspirar a mocidade
(1932), Como se reergue um Estado (1937) e Escritos político-sociais e doutrinários (escritos entre
1908 e 1928). Porém, as bases ideológicas para o pensamento salazarista podem ser encontradas em
Mensagem e textos críticos e de reflexão, todos de Fernando Pessoa (1912, 2001, 2004, 2007). Para
justificar o Estado Novo (1933-1974) em Portugal, Salazar utilizou-se de conclamações à
nacionalidade e ao espírito coletivo do povo, com propostas de melhorias, ascensões e retomadas
dos valores e fatores da cultura portuguesa, através da fixação de pilares de sustentação de Portugal,
como família, autoridade, Pátria, Igreja e trabalho. Uma das estratégias foi os Pensamentos para
inspirar a mocidade, publicados pelo governo salazarista no Diário Oficial português. Compõem-se
de frases, máximas e ditados que contribuíssem para a educação cívica da população,
especificamente da população jovem, e estão organizadas de acordo com as categorias de ensino, do
ensino elementar ao Liceu. As frases abordam temas como patriotismo, autoridade, hierarquia,
sabedoria, família, Igreja, educação, trabalho, tradição, coletividade, sinceridade, ordem, entre
outros. Salazar tencionava construir no imaginário português meios para manter os pilares do
Estado instaurado: Pátria, Família e Igreja e decretando como deveriam ser educados os jovens, ele
estaria lançando as sementes para a formação do patriotismo português do futuro. Outra obra de
Salazar, Como se reergue um Estado, trata das idéias sobre o ato de governar que Salazar possuía,
caracteriza como caótico o ambiente político, econômico e social que antecedeu a revolução
portuguesa (1926), tendo sido ela necessária para que Portugal se mantivesse estável e pudesse
recuperar a glória do passado. Também defende o Estado baseado na nacionalidade, na autoridade,
na família, no sentimento religioso, na vida, no trabalho como obrigação, na virtude e no homem.
Se a mentalidade portuguesa do século XX encontra-se propagada nos discursos de Salazar, ela tem
origens muito mais antigas, de modo que Mensagem, de Fernando Pessoa, destaca os elementos
fundadores do povo português e exalta a glória de Portugal em tempos já idos. Ainda, nos vários
escritos de crítica e reflexão de Pessoa, causas para a decadência de Portugal são elencadas e
possíveis soluções são descritas para que Portugal retome a grandeza e o imperialismo, não somente
territorial, mas também cultural. Enquanto isso, A Costa dos Murmúrios, de Lídia Jorge, reflete os
efeitos da mentalidade portuguesa na personagem e narradora da obra em condição de
estranhamento e de imperialismo em Moçambique. Além disso, a narrativa permite entrever a
perspectiva moçambicana do governo salazarista e suas conseqüências para o povo moçambicano.
Desse modo, os escritos de Salazar, de Fernando Pessoa e de Lídia Jorge estão unidos sob a égide
da cultura e, embora estejam ambientados em tempos e espaços diversos – sejam Portugal e
Moçambique, ou primeira metade e segunda metade do século XX – buscam o que seria a nação
portuguesa e, sobre seus elementos fundadores, fazem questionamentos que constituem intersecção
de tempo e espaço.
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“ESTRELAS-CADENTES OU AVES DE GRANDE PORTE”?CONSIDERAÇÕES SOBRE
LITERATURA NO “DIÁRIO DE MACAU”
Nilma Gonçalves Lacerda – UFF
O projeto de pesquisa “Diário de navegação da palavra escrita na América Latina” realiza-se a
partir do trabalho de uma copista que há doze anos coleta escrita urbana em andanças de viagens
por países de língua portuguesa e espanhola, incluindo-se, naturalmente, as ruas de sua própria
cidade, o Rio de Janeiro. A competência crítica na avaliação desses escritos ganha corpo com o
auxílio de entrevistas, leituras literárias e estudos teóricos, visando identificar e reconhecer autorias
não oficiais e grafias heterogêneas nos territórios contemplados pelo olhar viajante, que abrangem
igualmente os textos de circulação autorizada. A realização do III SIMELP propiciou a geração do
“Diário de Macau”, organizado a partir de elementos observados nas caminhadas pela cidade, nas
discussões do próprio SIMELP, em idas a livrarias, bibliotecas, entrevistas. A visita ao Instituto
Português do Oriente gerou o maior volume de informações sobre a presença da cultura portuguesa
em Macau, com destaque para o contato com o bibliotecário Manuel de Almeida, que descortinou
para a pesquisadora algumas das páginas da literatura de língua portuguesa em Macau. Maria
Ondina Braga, Henrique de Senna Fernandes, Deolinda da Conceição partilham em seus textos as
crônicas da cidade, o multiculturalismo, a dilaceração étnica presente na mestiçagem, que Lio Chi
Heng traz de forma contundente no conto “As alucinações de Ao Ge”. Intercambiar a leitura
literária com as experiências no périplo da cidade, em que a rarefação do português como língua de
cultura na região controlada administrativamente por cerca de cinco séculos pelo governo de
Portugal expõe-se em tensão com o interesse comercial do presente, voltado diretamente ao Brasil,
abre via para algumas questões. Considerando as discussões sobre literatura de Macau e literatura
macaense, como tomar a produção mencionada? Nostalgias sobre a compreensão possível e efetiva
entre culturas muito diversas? Pegadas ancestrais na travessia de territórios e palavras? Corte
analítico e afetivo de tempo e espaço resguardados por alguns marcos culturais? E como entender a
ausência de textos literários voltados à recepção de crianças e jovens, cuja única produção a que se
teve acesso não circula comercialmente? Escolhendo para referenciais Roger Chartier, Michel
Foucault, Edward Said, Stuart Hall, Maria Antónia Espadinha e Mônica Simas, o percurso deste
trabalho não abandona o compromisso com o objetivo central do “Diário”: identificar registros da
relação da comunidade com a palavra escrita, investindo tanto nas relações contemporâneas, quanto
nas relações passadas, procurando-a pelos escritos dispersos nos muros das cidades ou encontrandoa na literatura que entre esses muros se produz. A visão do imaginário da professora Ester,
protagonista de Nocturno em Macau (Maria Ondina Braga), ao despedir-se da cidade e indagar-se
sobre a queda dos suicidas do alto do pórtico de São Paulo, desenha a indagação a nortear o
trabalho. Como perceber esta literatura: estrela-cadente ou ave de grande porte?
TESSITURAS ERÓTICAS NA OBRA DE CORA CORALINA: ENCONTROS E
CONFRONTOS ENTRE EROS E THANATOS
Iêda Vilas-Bôas – UNB
O trabalho propõe-se a apontar e deslindar a obra da poeta goiana Cora Coralina a partir de um
recorte erótico. Essa proposta se delineia de forma que o erotismo e poesia possam ser analisados a
partir dos encontros e desencontros dos mitos de Eros e Thanatos como maneira de descortinar
preconceitos e valorizar a representação do natural em situações poéticas.
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ESPAÇO, TEMPO, CULTURA E IDENTIDADE NO CONTO “A VIRGEM SANTÍSSIMA
NO QUARTO DE JOANA”,DE BERNARDO ÉLIS
Leila Borges Dias Santos – UFG
O microburgo goiano advindo da decadência do gado no início do século XX e sua cultura povoam
o tempo que engendra as relações humanas do conto A Virgem Santíssima no quarto de Joana a ser
discutido com o aporte das abordagens literária, filosófica, histórica e sociológica. A religiosidade
da personagem principal e a linguagem empregada pelo autor demonstram a especificidade de uma
identidade e de uma cultura, além da denúncia social de seu regionalismo. Espaço, tempo,
identidade e linguagem são analisados com a contribuição de autores como Afrânio Coutinho,
Modesto Gomes, Paul Ricoeur, Mircea Eliade e Denys Cuche.
MULHER: DE ANJO A SERPENTE
Edith Alves da Conceição – UNIC-Rondonópolis
Celeste Garcia Novaga – IFMT-Rondonópolis
Esta pesquisa busca traçar o percurso da mulher na literatura brasileira, num movimento que a
articula como Anjo e como Serpente, isto é, como imagem idealizada e como objeto. Para tanto,
recorta os períodos do Romantismo e do Realismo/Parnasianismo para investigar em textos de
escritores como Castro Alves, Álvares de Azevedo, Gonçalves Dias, Gonçalves Magalhães, Olavo
Bilac e Fontoura Xavier a incursão literária sobre a mulher. A pesquisa de natureza bibliográfica faz
uma radiografia sobre o corpo feminino neste espaço para apontar alguns percursos e
transformações no histórico feminino, ou seja, procura demonstrar a lógica através da qual a
literatura elabora uma representação da identidade feminina e, nesse processo, desloca a imagem da
mulher de anjo para serpente. A imagem da mulher é marcada na literatura estudada pelo lugar
diferenciado que a institui, ou seja, num primeiro momento há a mulher singela, frágil, dócil, esposa
e, num segundo momento, a mulher pérfida, perigosa, em que seu corpo será de diversos maneiros
perscrutado, detalhado. Os levantamentos deste trabalho levaram-nos a confrontar nossas análises
com a teoria literária sobre o tema, bem como apresentar o contexto histórico em que a identidade
feminina se constrói para que melhor compreendamos essa representação. Autores como Roncari
(1987), Candido e Castelo (1987/ 1979) são alguns dos estudiosos com os quais dialogamos nesta
investigação, que sustenta sua relevância na importância do exercício da investigação científica na
prática acadêmica.
A INICIAÇÃO FEMININA EM “COLHEITA”, DE NÉLIDA PIÑON
Sueli Maria de Oliveira Regino – UFG
No conto “Colheita”, de Nélida Piñon, há mitemas que conduzem a mitos relacionados ao percurso
do herói, tal como proposto por Joseph Campbell, que divide a jornada heróica em três etapas: a
partida, a iniciação e o retorno. A iniciação feminina, contudo, tem características próprias, como é
possível observar em diversos contos folclóricos, mitos e também nos contos de fadas. Em sua
jornada, a mulher segue por um caminho inverso ao do homem. A viagem feminina não irá se
configurar como uma viagem para fora, em busca do mundo exterior, mas para o interior. A partir
dessas considerações iniciais, este trabalho pretende, por meio da hermenêutica simbólica, analisar
as imagens presentes em “Colheita”, considerando, especialmente, as que conduzem ao arquétipo
da iniciação. Acontecimentos de caráter iniciático acompanham cada nova fase de desenvolvimento
da vida de uma pessoa e ao se examinar algumas particularidades desse arquétipo, observa-se que
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certos rituais permitem um retorno às camadas mais profundas da identidade original, que se
estabelece entre o ego e o self. Esse retorno irá forçar a experiência de uma morte simbólica,
seguida de um novo nascimento. O arquétipo da iniciação pode ser identificado nas várias situações
experimentadas pela mulher: o isolamento, a mudança das roupas, o corte de cabelo, a permanência
na escuridão e o desprendimento das lembranças do passado, representado pelo retrato do homem.
A seqüência desses eventos sugere os ritos de uma auto-iniciação, que levará a mulher e o homem a
completarem, cada um a seu modo, o processo de individuação, descrito por Jung. O processo de
individuação, esse percurso labiríntico que se completa quando consciente e inconsciente se
ordenam em torno do self, tem início com o despojamento dos aspectos falsos, artificiais, da
persona, ou seja, da máscara que o homem-ator usa nas suas relações com o mundo palco.
Abandonada a máscara, surge uma face desconhecida, que exige coragem para ser contemplada,
pois exibe a sombra, o lado que se procura esconder. Depois do encontro com a sombra, uma tarefa
ainda mais difícil se apresenta: a confrontação com a anima ou com o animus, no caso da mulher.
De forma semelhante, acontecimentos de caráter iniciático acompanham cada nova fase de
desenvolvimento da vida de uma pessoa. Pode-se considerar ritos de passagem: as cerimônias de
casamento, as calouradas, os exames vestibulares e o noviciato em conventos, período em que as
freiras noviças se submetem a tarefas humildes ou quando recebem os votos e têm os seus cabelos
cortados. A submissão é uma atitude essencial, necessária ao sucesso das iniciações, e isso se aplica
especialmente quando se trata de meninas ou de mulheres. Entre as situações experimentadas pela
mulher, que apontam para o arquétipo da iniciação, estão presentes, no conto de Piñon: o
isolamento, a mudança de roupas e do corte de cabelo, a permanência na escuridão e o
desprendimento das lembranças do passado.
O LABIRINTO DA NOITE CITADINA E DA PERDA DA IDENTIDADE EM “NOITE”, DE
ERICO VERÍSSIMO
Suzana Yolanda L.Machado Cánovas – UFG
Erico Veríssimo (1905-1975) nasceu na cidade de Cruz Alta, no Rio Grande do Sul. O autor
escreveu suas primeiras obras – Fantoches (1932) e Clarissa (1933) – sob a influência do espírito
neo-simbolista rio-grandense. Masé a publicação do romance Caminhos cruzados um momento de
capital importância na carreira do escritor, que define sua vocação realista e se insere na história do
romance de 30, que é quando nasce o verdadeiro romance brasileiro urbano moderno.Além disso, é
autor de O tempo e o vento, obra monumental que abarca vários séculos da história do Rio Grande
do Sul. Na época em que escrevia O Tempo e o vento, fez uma interrupção para redigir Noite,
narrativa que foi ignorada pela crítica de então e pouco compreendida pelos seus leitores, pela
singularidade que apresenta. Nessa obra, o foco principal recai sobre um homem que perdeu a
memória e encontra-se perdido na noite de umametrópole que acredita nunca ter visto. Este trabalho
tem como objetivo estudar o mito do labirinto, representado pelo duplo percurso assustador
empreendido pela personagem pelos mais recônditos e sórdidos antros citadinos, e pela sinuosidade
de sua interioridade, pois sua amnésia a obriga a percorrer os meandros de sua mente em busca do
resgate de sua identidade. Como realidade concreta ou como sugestão simbólica, o labirinto é uma
construção arquitetônica de estrutura complexa, estatuída com a finalidade de fazer com que as
pessoas se percam, pois, uma vez penetrado o seu interior, é impossível ou muito difícil encontrar a
saída. Mircea Eliade, mitólogo e historiador das religiões, assegura que o simbolismo de tal
edificação supõe a ideia de defesa de um centro, vale dizer, do acesso iniciático à sacralidade, à
imortalidade e à realidade absoluta. Por outro lado, declara que o símbolo da marcha para o centro,
traduzir-se-ia, na linguagem da metafísica contemporânea, pela marcha para o centro da própria
essência e pela saída da inautenticidade. Além da utilização de autores que estudam a problemática
da cidade, nos valeremos da hermenêutica simbólica, usando pressupostos teóricos de Mircea
Eliade,Gilbert Durand e Gaston Bachelard.
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VAMPIRISMO E QUEBRA DAS CONTINGÊNCIAS TEMPORAIS HUMANAS EM
"POTYRA", DE LYGIA FAGUNDES TELLES
Letícia Cristina Alcântara Rodrigues – UFG
O tempo que passa e uma das maiores preocupações da humanidade. O homem é atormentado por
esse colosso que a tudo devora ― personificado pelos gregos como Chronos, divindade que engole
os filhos. Assim, a morte e sua consequência mais temida. Nesse sentido, a figura do vampiro – que
povoa o imaginário humano – surge como um ser que foge à tirania do tempo e a inexorabilidade da
morte, visto que morto, ainda permanece vivo, habitando os dois mundos. Uma criatura que foi
associada por muito tempo ao horror, ao sadismo e ao grotesco, absorveu outras características que
o tornaram atrativo aos olhos da humanidade. A retomada do mito do vampiro na atualidade conduz
a uma rede de interpretações que corresponde ao desejo do homem de viver eternamente, de
manter-se intacto frente ao transcurso histórico. Mas a condição do vampiro e a de viver
eternamente ou permanecer morto eternamente? Este trabalho tem como objetivo estudar o mito do
vampiro no conto “Potyra”, de Lygia Fagundes Telles. Alimentados pelas questões que suscita,
propomos analisar a teia de imagens simbólicas que torna, no conto “Potyra”, a eternidade tão cruel
quanto a passagem do tempo, opondo-se ao medo da finitude, sobretudo nos seculos XX e XXI. Na
narrativa de Telles, e relatado o encontro de uma estudante com um viajante estrangeiro que quer
confessar, em seu último dia de existência, sua história e condição vampírica, além de relatar os
fatos que o fizeram tomar aquela decisão de contar sua passagem por diversos séculos, atormentado
por sua invulnerabilidade. Para Ars Jacobjsen, o vampiro de “Potyra”, a eternidade não é uma
dádiva, mas um castigo. Pretendemos utilizar a Teoria do Imaginário, proposta por Gilbert Durand,
buscando compreender, a partir da personagem Ars, o desejo de libertação das contingências que o
prendem à sua condição de vampiro.
O ESPAÇO DA ALTERIDADE NO CONTO “A ILHA DOS GATOS PINGADOS”, DE
JOSÉ J. VEIGA
Fabianna Simão Bellizzi Carneiro – UFG/CAC-PG
Alexander Meireles da Silva – UFG/CAC
Em se tratando de narrativas literárias, cuja tessitura traz elementos do fantástico, é o espaço que
demarca a transição entre o real e o imaginário, ainda que outros elementos estruturais apontem
para isso – esteja o narrador sinalizando outro mundo, esteja a própria narrativa oferecendo ao leitor
subsídios que confirmem a presença do fantástico, enfim, é através do espaço que o leitor adentra
no mundo do irreal (de acordo com nossos parâmetros cotidianos) ou do não-vivido. Uma vez
inserido no universo do fantástico, o leitor perceberá que o local do estranho, do irreal e do insólito
pode fornecer muitas pistas de que o mundo retratado não está tão distante de sua própria realidade,
por mais conflituosos e instáveis que os acontecimentos sejam. Afinal, que mundo teríamos, se
nosso dia a dia fosse homogêneo, linear ou carente de diferentes e inúmeras histórias que fazem
com que cada pessoa tenha sua própria inserção neste mundo tão prenhe de diversidades sob vários
aspectos (cultural, religioso, social, sexual) e, por isso mesmo, tão fascinante e rico? Sob o viés da
diversidade e da alteridade este trabalho fará considerações sobre o espaço na narrativa fantástica.
Observaremos que a questão da alteridade ocupa posição de destaque quanto às temáticas desta
expressão artística. Diante desse quadro, a seguinte questão se coloca: a quem são reservados os
espaços proibidos? Quem seriam os monstros, os extraterrestres ou os fantasmas? O que há de
assombroso ou de surreal nesses personagens cujo destino seria o espaço do descarte, do diferente e
do sofrimento? Nossas relações sociais, nossa interação com as pessoas ao nosso redor e com a
comunidade que nos abarca são substanciadas por conceitos construídos pela sociedade, ou por
governos que estão no poder, pela mídia ou pela moda, enfim. Tais construções determinam que
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aspectos como raça, religião, gênero, cultura, língua devam seguir uma ordem pré-estabelecida
pelos detentores do poder, o que nos leva a refletir sobre as formas de segregação de um grupo
social quando este traz a marca do diferente ou daquilo que esteja fora de uma determinada ordem.
Ao longo deste trabalho elaboraremos uma análise da construção da relação entre o discurso
ideológico utilizado em relação a grupos minoritários e o espaço a eles reservado na narrativa
fantástica, tendo como corpus o conto “A ilha dos gatos pingados” (1986), do escritor José J. Veiga.
A escolha pelo tema se justifica pelo fato de que o homem contemporâneo, inserido em contexto de
significativas transformações nas áreas tecnológica, social, cultural e econômica, tem na figura do
outro um agente ativo nesse processo, ou seja, o outro não pode mais ser visto como perturbador ou
como aquele que desacomoda o estado de coisas, mas como alguém que faz parte desta dinâmica,
apontando para a construção de uma cultura híbrida. Nesse percurso, chama atenção como a
Literatura vem retratando esse personagem. Daí que se objetiva, de uma maneira geral, analisar o
processo de constituição da relação entre a alteridade e o espaço na narrativa fantástica,
representada nessa proposta pela vertente romanesca do Realismo Mágico. Reforçando que se trata
de um trabalho analítico e não conclusivo, portanto, a pesquisa se sustenta em fontes bibliográficas
que serão devidamente referenciadas ao longo do texto.
IDEALIDADE DA CULTURA E IDENTIDADE BRASILEIRA A PARTIR DE
“AMERICANAS”: A POESIA MACHADIANA CUMPRINDO A FUNÇÃO
APRESENTADORA DO ETHOS BRASILEIRO NO SÉCULO XIX
Ruth Aparecida Viana da Silva – IFRO
Cynthia de Cássia Santos Barra – UNIR
A poesia machadiana e a personificação do ideal de brasileiro apresentada no livro Americanas
oferece uma perspectiva (ou variação) de leitura sócio-histórica, uma vez que os poemas desta obra
prefiguram ideais identitários que, por meio das personagens, vão tecendo o mosaico étnico e o jeito
de ser da sociedade brasileira da época na visão do poeta. O autor revela-se como um grande
tradutor do brasileiro que surge da junção da cultura indígena, portuguesa e africana. Os trejeitos de
suas personagens vão inventando simbolicamente, cultural e etnicamente o povo brasileiro. Em uma
das poesias da obra, a índia Potira prefere morrer a entregar-se a seu raptor. A personagem
incorpora os valores cristãos de tal forma que se propõe a defendê-los com coragem e altivez. Nas
atitudes de Potira, a idealização prefigurativa do ethos (jeito de ser) da nascente nação brasileira que
Machado coloca em sua poesia, mas que, de certa forma, não se realiza no tempo histórico. Não
obstante, o poeta cria um clima de apoteose étnica fundada em valores cristãos. É a poesia e suas
circunstâncias. E as circunstâncias da poesia machadiana parecem apontar ideologicamente para a
construção da identidade e da cultura brasileira, sobretudo, a partir da cultura cristã ocidental. Nesta
comunicação, a proposta inicial é a de mapear, em Americanas (1875), o ideal de construção da
ideia de nação brasileira a partir da miscigenação de três matrizes culturais – europeia, indígena e
africana. Machado de Assis, em Americanas (1875), esboça uma representação poética para a
sociedade denominada brasileira. Assim como os demais escritores de sua época, mais que
compreender a sociedade brasileira, Machado ajudou a inventar simbolicamente a sociedade
brasileira. Assim, busquemos ter olhos para ver e identificar os problemas e os impasses relativos à
idealidade da cultura e da identidade brasileira, a partir do jogo construído esteticamente por
Machado de Assis nas páginas de Americanas.
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A DIALÉTICA ENTRE A EXPRESSÃO GRUPAL E A EXPRESSÃO ARTÍSTICA. O
PÚBLICO, O AUTOR E A OBRA MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS
Vivian Bueno Cardoso – UFG
Este trabalho originou-se a partir das leituras e reflexões produzidas durante a disciplina Literatura
e Patriarcalismo em Goiás na primeira metade do século XX, ministrada pela Professora Doutora
Leila Borges Dias Santos. A partir dos textos trabalhados durante a disciplina, cujas temáticas estão
relacionadas à sociologia, à história e à crítica literária brasileira e goiana, o tema desenvolvido foi
A dialética entre a expressão grupal e a expressão artística: reflexões sobre a relação autorpúblico e a composição de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Roberto
Schwartz, em suas obras Ao vencedor as batatas e Um mestre na periferia do Capitalismo:
Machado de Assis, que analisa a sociedade brasileira do Segundo Reinado para, posteriormente,
apontar de que maneira a dinâmica social transfigura-se em expressão artística, especificamente no
romance Memórias Póstumas de Brás Cubas. Durante a leitura dos seus textos, é perceptível a
presença do pensamento de Antonio Candido acerca da abordagem da Literatura por uma
perspectiva que não a isola da sociedade, ou seja, por uma visão que relaciona a dinâmica literária
com a dinâmica social. Essa intertextualidade é confirmada por Schwartz que, no prefácio de Um
mestre na periferia do Capitalismo, afirma ter-se impregnado dos livros e pontos de vista de
Candido. No entanto, Schwartz não aponta de maneira direta e clara os pontos de vista dos quais se
impregnou e que foram basilares para as suas obras. A leitura da obra de Candido, Literatura e
sociedade, considerada a síntese de seu pensamento, possibilita encontrar os conceitos-chave que
norteiam todo o seu trabalho e, ainda, que colaboraram para a construção das obras de Schwartz.
Dessa forma, entender o pensamento de Candido proporciona, ao leitor, melhor entendimento das
raízes do pensamento de Schwartz e consequentemente de suas obras. Para a pesquisa deste
trabalho, interessou as obras Ao vencedor as batatas e Um mestre na periferia do Capitalismo:
Machado de Assis. O objetivo foi percorrer a obra de Antonio Candido para encontrar os conceitoschaves de seu pensamento, perceber a sua aplicação nas obras de Schwartz e apontar de que
maneira eles oferecem um melhor entendimento da análise de Memórias Póstumas de Brás Cubas.
O conceito de Literatura, a posição social do artista e a tríade autor-obra-público na perspectiva de
Antonio Candido colaboram para uma melhor leitura da análise do romance de Machado de Assis
feita por Schwartz.
“CLÓ” E A CULTURA POPULAR BRASILEIRA
Marília Cardoso Lício – UFG
A obra de Lima Barreto, conhecida pelo seu húmus ideológico (BOSI, 2006, p.316), aborda
constantemente a temática da cultura erudita em confronto com a popular. Em Triste Fim de
Policarpo Quaresma, por exemplo, o personagem Quaresma busca incessantemente uma cultura
genuinamente brasileira. O conto “Cló”, integrante da 1ª edição de Histórias e Sonhos, publicado
em 1920, também trata da questão cultural popular e erudita, sendo a festa do carnaval o motor e
cenário para o desenrolar da história. É importante, ainda, destacar a presença de alguns elementos
africanos nesse mesmo texto. Analisaremos o conto a partir de apontamentos sobre a música e
dança, erudita, de um lado, e popular, de outro, investigando de que modo essa separação é uma
crítica do autor à sociedade da belle époque carioca. Em “Cló”, a cultura popular, simbolizada pelo
carnaval, música e dança, demonstra a desordem do país, o momento onde as estruturas são
quebradas, as hierarquias invertidas, e o povo, de certa forma, liberto, em poucos dias, de sua
invariável condição. Acreditamos que o autor começa sua crítica quando coloca o personagem
principal, Maximiliano, pai de Clódia, como um professor de música erudita em decadência; e aqui
a ambiguidade é válida: tanto o professor está em decadência quanto a música erudita, pois o que
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agrada ao povo são as modinhas, as batucadas, a “música selvagem”. Assim, a cultura popular,
embora apareça em alguns momentos vinculadas ao que é baixo, pois essa é a visão dada por
Maximiliano, em outros será com sentido de orgulho patriótico. A música e a dança serão
indispensáveis para essa construção de sentido no conto: o embate entre a arte clássica europeia e a
cultura popular. Para Sevcenko (1983), Lima Barreto, ao lado de Euclides da Cunha, fez uma
literatura denunciante e de cunho político e social, utilizando a literatura como instrumento para
denunciar e propor soluções para uma parcela da sociedade, pobre e mestiça, muito atingida pelas
transformações culturais e políticas do final do século XIX e início do XX, com a belle époque e a
nascente república. Daí a importância de se estudar a cultura popular brasileira, porque o povo, a
massa, pouca ou nenhuma voz teve desde a colonização até nossos dias, e acreditamos que Lima
Barreto foi um dos artistas que de algum modo conseguiu resgatar e tentar elevar ao status de
brasileiro o que era tido como mais baixo e mesquinho.
O ESPAÇO DECADENTISTA EM “HISTÓRIA DE GENTE ALEGRE”, DE JOÃO DO RIO
Veridiana Mazon Barbosa da Silva – UFG/CAC
Este artigo tem como objetivo principal discutir a relação espaço x personagem no conto “História
de gente alegre” (1910), do escritor carioca João do Rio. Neste sentido, o estudo pretende relacionar
elementos do Decadentismo, abordando como uma das mulheres retratadas na obra supracitada,
publicada na coletânea Dentro da noite (1910) incorpora o espaço decadente e opressor e leva uma
jovem inocente e sem vícios, a perdição. Dessa forma, percebe-se na literatura do período, ainda
marcadamente influenciado pela estética naturalista, que somos capazes de definir a representação
de determinados personagens a partir do espaço no qual estes estão inseridos, ficando evidente o
porquê de certas atitudes e ações tomadas por eles, pois cada um associa aquele espaço em questão
a determinada lembrança armazenada na sua memória e isso pode despertar nesse sujeito devaneios
já esquecidos, mas que tal situação tem o poder de despertá-los novamente. A pesquisa pretende
compreender como o espaço, muitas vezes, corrompe e oprime o indivíduo, transformando-o em um
produto do meio. Esta é a proposta discutida a seguir ao mostrar o espaço opressor na narrativa de
João do Rio, demonstrando como o meio pode ser corruptor e como os grupos marginalizados
necessitam conviver em um espaço fechado e alienado para que se sintam menos párias. Em
segundo plano, o trabalho busca ainda compreender a representação do homoerotismo feminino
neste ambiente finissecular onde o que imperava era o preconceito e o moralismo. João do Rio
destaca através de sua obra imbuída do espírito finissecular que o preconceito contra o
homossexualismo na primeira década do século vinte, assim como se constata neste início do século
vinte e um, pode fomentar monstros, que como tais, mostram na verdade nossos temores e
inseguranças sobre um ser humano semelhante a nós.
LINGUAGEM, IDENTIDADE E CULTURA PRESENTES EM TEMPOS E ESPAÇOS
MINEIROS NA PRODUÇÃO DE ATAULFO ALVES
Rilza Rodrigues Toledo – UNIPAC-VRB/UBÁ-MG/CMRB
O texto literário é necessariamente intertextual, pois, quando se lê, estabelecem-se associações entre
o texto atual com outros já lidos. Essa associação é livre e independente do comando de consciência
do leitor, assim como pode ser independente da intenção do autor. Os textos, por isso são lidos de
diversas maneiras, consolidando um processo de produção de sentido que depende do repertório
textual de cada leitor, em seu momento de leitura. Assim, este trabalho tem como objetivo
apresentar algumas letras de canções de Ataulfo Alves, como forma de representação em que a
linguagem, a identidade e a cultura revelando tempos e espaços mineiros, permitem compartilhar
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uma realidade comum: a língua. Nascido em Miraí, Minas Gerais, Ataulfo Alves tornou-se
propagador da cultura e da identidade brasileiras, retratando em suas composições, o cenário
mineiro e brasileiro para a MPB. Ao mergulhar em suas raízes, o artista recolheu subsídios poéticos
que se tornaram temas universais para as letras de suas canções e com o seu sotaque mineiro, aos
poucos, foram assimilando o cotidiano do povo brasileiro. Canções como “Ai, que saudades da
Amélia” e “Meus tempos de criança”, ambas características de mineiridade e identidade nacionais
evidenciam as particularidades e/ou as coincidências dos distintos construtos linguísticos e
literários, que por sua vez, acompanham e produzem os ritmos e os sentidos dessas representações,
na complementar relação entre a língua, a cultura e a literatura, instigando o leitor a compreender tal
estudo a partir das citações de outros autores consolidando assim um diálogo com a Literatura
Brasileira.
GRACILIANO RAMOS E SUA OBRA VIDAS SECAS
Juliana Cristina Ferreira – UFG
Valdeci Rezende Borges – UFG
O objetivo deste trabalho é identificar como Graciliano Ramos, em Vidas Secas, elaborou as
questões da linguagem e da identidade. A obra fora escrita em 1938, período em que o autor já não
mais se encontrava na região representada, sendo, portanto, fruto de suas memórias do viver no
sertão nordestino. Nesse período histórico, o Brasil vivia sob o comando das oligarquias e o
domínio dos coronéis. E o romance mostra como sujeitos oprimidos pelas condições sociais e
naturais experimentavam um processo de desterritorialização, de perda de sua identidade e de
construção de outra, zoomorfizada, ao se deslocarem erráticos no espaço da Caatinga em busca de
um lugar melhor, de outro território e de outras condições de sobrevivência. Na análise da obra e da
maneira como o autor abordou o estado de pauperização, de derrota humana e de perda de
dignidade, utiliza-se estudos críticos que apresentam Ramos como um escritor que rompeu com os
esquemas anteriores de produção e sustentou uma narrativa em terceira pessoa, expediente até então
inédito em seus romances, conforme Mourão (2003). Sua narrativa representa o cotidiano do pobre
num ritmo pendular, num movimento circular de ir e vir, voltando sempre do último estado ao
primeiro, de acordo com Bosi (2003). A problemática que move esta pesquisa é identificar a
maneira como o autor retratou a gritante desigualdade social vivida no sertão nordestino, na
Caatinga da década de 1930, tendo por metodologia a pesquisa bibliográfica, por meio da qual
procura-se perceber sua linguagem, como elaborou a narrativa e abordou a vida miserável de uma
família de retirantes sertanejos que se viu obrigada a se deslocar de um lugar para outro em busca
de sobreviver à miséria imposta pela desigualdade social.
REPRESENTAÇÕES LITERÁRIAS DA PAISAGEM NATURAL E CULTURAL: UMA
LEITURA GEOPOÉTICA DA OBRA DE MANOEL DE BARROS
Paulo Eduardo Benites de Moraes – UFMS/UCDB
Josemar de Campos Maciel – UCDB
O presente trabalho busca examinar a categoria de geopoética na obra de Manoel de Barros. As
implicações aqui propostas buscam levar com seriedade até o fim a posição do outro na pesquisa
como um colaborador, no caso da poesia de Manoel de Barros com um olhar voltado para a
primeira pessoa do poema, ou melhor, para o "eu-poético", pois é uma voz que dialoga
incansavelmente com o leitor e o pesquisador. Trata-se, portanto, de pensar sistematicamente a
participação ativa e além da neutralidade – politicamente interessada e humanamente tematizável –
de quem pesquisa e de quem é pesquisado, em todo o processo de conhecimento. Outro objetivo é
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investigar o processo operacionalizado por Manoel de Barros na construção das escrituras poéticas,
tal problema se apresenta nessa pesquisa querendo saber se o chamado criançamento da linguagem
de Manoel de Barros ressoa ou conversa com outras formas de criançamento. Por meio de uma
exploração discursiva que irrompe com o sentido lógico das palavras, por um exercício de jogo e
montagem, o autor trabalha seu projeto literário até o limite textual. Tal projeto é mais do que
analisado, desmontado, com a finalidade de reconhecer, em sua fundação, a assinatura daquele que
o arquitetou na prática. O trabalho propõe-se à equação de abordar essa produção literária a partir
de exercícios de leitura de trechos significativos de sua obra e de comentadores, bem como
centrando nosso olhar crítico, sobretudo, em autores que se preocupam com a questão da escritura.
Em suma, os resultados do trabalho discutem como, através de aparentemente inocentes
estratagemas típicos da poesia, o poeta apresenta uma série de considerações sobre o mundo, a vida
e a cultura. Assim, o maior destaque deste trabalho é o pertencer a uma terra, a uma língua, é
explorar a categoria do “mundo vivido” como na obra de Alfred Schultz e em textos sobre o
trabalho com a fenomenologia empírica de Clark E. Moustakas, fazendo assim as devidas relações
com as metodologias participativas e com a interlocução dos estudos culturais.
A RELAÇÃO GÊNERO TEXTUAL – TEMPO NO ROMANCE O AMANUENSE
BELMIRO, DE CYRO DOS ANJOS
Renata Rocha Ribeiro – UFG
Cyro dos Anjos (1906-1994) publica, em 1937, o romance O amanuense Belmiro, que é
considerado, pela crítica especializada, como o ponto alto de sua produção literária. Emitida pela
própria personagem-título, a narrativa concretiza uma interessante abordagem do tempo vinculada
ao gênero textual em que é escrita. Antes mesmo de ser publicado, o romance apresenta outra
intersecção com a noção de tempo e gênero textual: Anjos publicara, em 1933, um conjunto de
crônicas que posteriormente originaram a redação de O amanuense Belmiro. A problemática da
personagem se revela inicialmente quanto ao gênero escolhido para a escrita: em um primeiro
momento, Belmiro, que conta com quase quarenta anos, opta pelas memórias; depois, acaba
assumindo que está escrevendo um diário. E é exatamente o entendimento ou a relação com o
tempo que distingue os dois gêneros: as memórias pressupõem certo distanciamento temporal entre
o fato e o narrado ou escrito; já o diário pressupõe uma escrita em processo, ou seja, é a escrita
cotidiana do presente. Enquanto as memórias querem fixar aquilo que ficou construído do passado,
o diário pretende cristalizar os eventos do presente. Além disso, os tempos presente e passado se
identificam com os espaços narrativos: as lembranças do passado se referem à vila onde Belmiro
nasceu e se criou, enquanto que os fatos presentes dizem respeito à vida de Belmiro na cidade
grande onde vive durante a escrita de seu diário, que é Belo Horizonte. Entretanto, mesmo
assumindo a escrita de um diário, as interferências da memória não deixam de existir, o que revela
os conflitos entre os eventos passados e os presentes, a juventude e a maturidade, o ambiente rural e
o citadino. Para a noção de literatura confessional e os gêneros diário e memória, serão utilizados os
pressupostos teóricos de Hans Rudolf Picard (1981), Béatrice Didier (1996), Phillipe Lejeune
(2008) e Sheila Dias Maciel (2011), dentre outros. Já para a problematização da categoria narrativa
de tempo, serão revistos os estudos de Paul Ricoeur (2011) e de Benedito Nunes (1988).
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OS SOBREVIVENTES DE UM TEMPO: O ETHOS DE UMA ÉPOCA, A PARTIR DO
EXISTENCIALISMO EM CAIO FERNANDO ABREU
Emmanuel Henrique Souza Rodrigues – FAFICA
As relações entre Linguística e Literatura, as duas grandes colunas dos estudos sobre a linguagem,
têm se aproximado nos últimos tempos, sobretudo em áreas como Análise de Discurso, nas suas
mais diversas vertentes. A análise da identidade dos sujeitos é de cunho interdisciplinar. A
linguagem, formadora de sociedade, é importante campo de investigação em tal empreitada. O
estudo da formação do ethos no discurso é uma possibilidade interessante para construir esse
conhecimento. O ethos, que é a construção da imagem de si através do discurso, demonstra
interditos e interdiscursividades presentes no texto, jogando com a movimentação histórica e as
ideias filosóficas atravessadas nele. A filosofia é, também, uma possibilidade rica de busca e análise
do texto literário. O existencialismo de Sartre, desde suas mais conhecidas máximas – “a existência
precede a essência”, “O homem nada é além do que se faz” e outras tantas – propõe um projeto de
homem que não seja nada além do que ele se projeta ser. Os estudos históricostambém são
importantes para compreender o que somos, bem como a produção artística de uma sociedade: a
forma com que os sujeitos constroem suas identidades, situados histórica, sócio e filosoficamente, é
parte integrante do constructo e da representação na literatura. O texto Os Sobreviventes, presente
na obra Morangos Mofados, de Caio Fernando Abreu, é uma narrativa na qual os sujeitos se situam
historicamente para tecer suas identidades, compondo-as a partir da sua filiação à angústia e tensões
de uma época. O existencialismo de Sartre é marca forte nas formas demonstradas das identidades
propostas pelas personagens: a fuga para o Sri lanka, a proposta de ficar e lutar com a angústia, o
processo de busca desesperada de sentido para a existência. O ethos formado é um ethos
existencialista em sua essência, no momento em que os sujeitos demonstram suas identidades
sofrendo a projeção do que planejaram para sua vida, desde o momento da decisão da partida para
outro lugar até a manifestação da má-fé, como apresentada por Sartre, na qual uma das personagens
se coloca como vítima das circunstâncias e não como artífice de sua vida: tudo isso é apresentado
pelo discurso e pode ser analisado sob a perspectiva do estudo do ethos. A paratopia, os Anos 80, é
exposta nua e cruelmente em sua angústia e retrato de um tempo no qual não se parece ter para onde
ir: o que resta é fugir, para bem longe, não importa onde. Os sujeitos, sendo responsáveis por aquilo
que são, constroem-se, ao som de Amor Meu Grande Amor, na voz da Ângela Rô Rô, na mais
perfeita representação em suas identidades da náusea dos Anos 80.
NOSTALGIA DO PARAÍSO: UM ESTUDO COMPARATIVO
Nery Nice Biancalana Reiner – UNISA-SP
Nostalgia do Paraíso é a busca pelo jardim paradisíaco, onde o homem encontra tudo que é
necessário para sua vida e felicidade, com total ausência de dor e sofrimento, segundo Mircea
Eliade (1993). Através de uma análise comparativa, o objetivo deste trabalho é mostrar
comoNostalgia do Paraíso inspirou escritores e poetas. Escolhemos, para a análise, fragmentos das
seguintes obras: Bíblia – Mensagem de Deus (Gênese) 1983, Odisseia de Homero, s/d, Os
Lusíadas,de Camões, s/d, Grande Sertão-Veredas de Guimarães Rosa (1985) e a narrativa A
árvore do mundo e outros feitos de Macunaíma,reescrita por Ciça Fittipaldi (1986). O aparato
teórico que norteará a pesquisa conta com obras de Gaston Bachelard (1991), Sandra Nitrini (1997),
Mircea Eliade (1993), Junito Brandão (1993) e outros.
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LÍNGUA, CULTURA E IDENTIDADE NO DISCURSO LITERÁRIO
Micheline Mattedi Tomazi – UFES
Esta comunicação, embasada em uma perspectiva teórica que procura o diálogo da análise do
discurso com a literatura, a filosofia e a antropologia, procura evidenciar a hipótese de que o
singular na literatura, ao ficcionalizar a questão do duplo, reside não propriamente neste último,
mas no desafio de superá-lo. Tomamos como objeto de análise o romance de Chico Buarque,
Budapeste, por acreditarmos que, ao ficcionalizar o duplo, ele se inscreve e encena a sua fissura
como lugar da alteridade. Ao invés de desvelar o sujeito, de fazê-lo emergir, subjetivamente, no
campo da linguagem, é o duplo que se inscreve na linguagem, sendo que é nele, ou em suas
armadilhas, que o sujeito é apanhado e assujeitado, ao invés de ser revelado, de ser protagonista
autônomo do seu desejo. Fazendo uso de conceitos tais como ideologemas, de Bakhtin (1999),
trocas impossíveis, de Baudrillard (2001), reificação, de Marx (1973), função autor, de Foucault
(2001), territorialização e desterritorialização, de Deleuze e Guattari (1977) procuramos demonstrar
que o questionamento da identidade autoral fraturada leva, concomitantemente, no romance, ao
questionamento da identidade cultural, esta última representada na obra pela imersão do narradorprotagonista em uma nova cultura e uma nova língua, cujo domínio será perseguido pelo sujeito
numa busca constante de eliminação de marcas linguísticas que possam denunciar sua
estrangeiridade e, consequentemente, seu outro.
NARRAR O PASSADO E RECRIAR O PRESENTE EM VOZES DO DESERTO, DE
NÉLIDA PIÑON
Patrícia Rufino Carvalho – UFG
A literatura tem sido tema de pesquisas em diferentes áreas do conhecimento, especialmente nas
ciências humanas que estudam a sociedade. No que diz respeito à Literatura Brasileira, o estudo da
produção literária de escritoras contemporâneas, como Nélida Piñon, tem contribuído, nos últimos
anos, para uma melhor compreensão dos processos literários, e também para ampliar a inserção da
mulher em um contexto social que nem sempre lhe foi favorável e no qual, ainda hoje, a linguagem
é um modo de sobrevivência. O narrar assume papel essencial na vida de quem faz da narrativa uma
forma de expressão. O recolhimento de histórias orais é um procedimento tão antigo quanto narrar
essas histórias. Entre as mais remotas narrativas que chegaram até os dias atuais, estão os contos
anônimos, de origem oriental, das mil e uma noites. Por meio da hermenêutica simbólica e da
mitocrítica proposta por Gilbert Durand, este trabalho tem como objetivo apresentar resultados
parciais de uma pesquisa que busca entender o processo de criação literária de Nélida Piñon,
noromance Vozes do Deserto, uma atualização dos contos do Livro das Mil e noites. Esse romance
narra história de uma mulher destemida, Scherezade. Ao saber que todas as mulheres do reino
poderiam morrer nas mãos do sultão, resolve casar-se com ele. Scherezade acredita no poder das
narrativas, e durante três anos todas as noites conta histórias, salvando não apenas a sua vida, como
também resgatando a humanidade do sultão. Por meio da compreensão dos processos míticosimbólicos, essa obra de Piñon, não só proporciona o reconhecimento da importância da literatura
na vida humana, como também estabelece estratégias de linguagem, que são usadas para persuasão
do receptor. As atualizações míticas na modernidade são pontos relevantes para nossa pesquisa,
pois, mesmo na modernidade, percebe-se uma tendência a atualização dos mitos literários.
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AS ÁGUAS E O TEMPO EM CONTOS DE MIA COUTO
Roseli da Silva Pinheiro – UFG
O escritor, jornalista e biólogo moçambicano Mia Couto, nascido António Emílio Leite Couto
(1955), é um dos principais escritores de Língua Portuguesa da atualidade, e autor de obra extensa e
diversificada que inclui poemas, contos, romances e crônicas. Seu romance Terra Sonâmbula
(2007) foi considerado um dos dez melhores livros africanos do século XX. Temos como objetivo
estudar os contos Inundação e O rio das quatro luzes, que fazem parte da antologia O Fio das
Missangas (2003), e apresentam em comum a temática da vida e da morte, associada ao elemento
água e à passagem do tempo. No conto Inundação, o protagonista recria sua lembrança, anunciada
no início da narrativa, demonstrando a ligação entre ele e sua mãe e, principalmente, entre ela e o
marido, cuja feliz vida conjugal permanecia nas cartas trocadas no tempo de namoro e nos vestidos
ofertados. Após o desaparecimento do marido, o sofrimento da mulher se acentua a cada dia e os
vestidos se desfazem em pó e a tinta das cartas desaparece. A mulher, por meio de seu canto, e,
após cumprir um ritual religioso, se integra, de maneira harmoniosa, ao esposo. Apesar das fortes
águas da inundação que engole a casa, a memória do lugar/tempo fica preservada. Utilizaremos
pressupostos teóricos de Gaston Bachelard no tocante ao simbolismo da casa ─ que consiste em
uma grande força de integração para os pensamentos, as lembranças e os sonhos do homem ─ e da
água. Em O rio das quatro luzes, um neto e seu avô se consubstanciam de tal forma que a lógica
heraclitiana é subvertida, uma vez que a corrente do rio muda de direção e as mortes do avô e do
neto são eufemizadas. Tomaremos como base a Teoria do Imaginário, proposta por Gilbert Durand,
para demonstrar as contradições do fator tempo que é subvertido.
O TEMPO: PROTAGONISTA NO DIÁRIO DE ANNE FRANK?
Rosângela Aparecida C. da Cruz – PG/UFMT
Sheila Dias Maciel – UFMT
Proposta metodológica para trabalhar aspectos temporais da obra O diário de Anne Frank (2001) no
contexto escolar do ensino público fundamental, após discutirmos a questão do gênero “diário” e a
falta de relevância e de aprofundamento com que a obra base é tratada no livro didático. Para tanto,
utilizaremos como referencial teórico os conceitos apreendidos em NUNES (1988) e BOSI (2003).
A FICÇÃO DE JOÃO UBALDO RIBEIRO: CARTOGRAFIA LITERÁRIA DA ILHA DE
ITAPARICA/BA
Maria da Conceição Pinheiro Araujo – IFBA/SSA
A narrativa da memória que sai de dentro da narrativa literária procura retratar os sentidos nem
sempre visíveis, visto que mostra o discurso do outro silenciado, textualizando-se em sua ‘memória
discursiva’. Assim, nos textos de João Ubaldo Ribeiro, palavra entre palavras, o sujeito vai
narrando-se, permitindo aflorar seu discurso, confrontando-o com o discurso circulante. Isto ajudará
a ultrapassar a ordem da descrição da discursividade do que é autorizado para atingir a compreensão
da ordem da discursividade do que não está na ordem do cânone.
A leitura das obras do autor baiano João Ubaldo Ribeiro pretende mostrar a grande contribuição de
suas obras para a literatura e cultura brasileiras, buscando-se o resgate da cultura local, focalizando
as localidades que serão identificadas a partir da leitura das obras do escritor baiano, nascido na Ilha
de Itaparica, reconhecendo que, através das suas narrativas (contos, crônicas, romances), ele trata,
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definitivamente, do linguageiro cotidiano, modos e comportamentos sociais do baiano e do
brasileiro, sem deixar de retratar o universal.
Ler a obra de João Ubaldo Ribeiro, na perspectiva da interdisciplinaridade, propondo uma Leitura
literária do Espaço Geográfico, tendo como aporte teórico o campo da Geografia Literária, é a
tentativa de estabelecer relações intrínsecas entre a literatura e a geografia pensando lugares e
localizando narrativas memorialísticas, particularmente propondo o resgate da Cultura, História e
Memória cultural e imagética das localidades dos municípios de Itaparica e Vera Cruz que
aparecem na Obra do referido escritor itaparicano.
A motivação da representação ficcional do seu lugar de enraizamento – demarcando a identidade
em tipos humanos, locais, costumes, meios de sobrevivência, atividades econômicas lícitas e
ilícitas, representativos – assim como a escrita de ensaios sociológicos, geográficos, interpretativos
daquela humanidade são a tônica intelectual de muitos autores baianos, entre eles Jorge Amado,
Adonias Filho, João Ubaldo Ribeiro, entre tantos outros desconhecidos que precisam ser
visibilizados como Wilson Lins, Eurico Alves, Euclides Neto, Raimundo Reis, Eulálio Mota,
Xavier Marques.
Perspectivas teóricas contemporâneas de resgate, cânone, literatura regional e literatura nacional
serão usadas na pretensão de oferecer suporte para uma argumentação de historiografia da literatura
baiana, apontando para vias de acesso sobre o literário, a história, identidades, configurando a
Bahia como um entre-lugar de que fala Silviano Santiago. Pretende-se nesse sentido, articular
estudo dos principais conceitos de regiões da Bahia, vinculados em área afins como História,
Geografia, Educação, Literatura, Língua, propondo, uma postura de estudo que compreenda uma
mudança de posicionamento nos olhares críticos sobre os autores baianos, desenvolvendo uma
proposta que questione o “centro” como norteador de uma identidade única e apresente as
“margens” como representantes fidedignos de uma teia de identidades múltiplas que foram
“silenciadas” por uma cultura de “apagamento”, oportunizando a construção de uma historiografia
literária a partir da eleição de uma metodologia e um aparato teórico próprios de uma regionalidade
que acabem por explicitar as possibilidades identitárias daquelas comunidades regionais.
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SIMPÓSIO 24
PROCEDIMENTOS DE ESTRUTURAÇÃO TEXTUAL
EM REDAÇÕES ESCOLARES
O objetivo deste Simpósio é viabilizar discussões acerca da organização textual-discursiva de
redações escolares, com o objetivo de investigar os mecanismos de estruturação textual, tendo em
vista a identificação de problemas de coerência provocados por transposição inadequada de traços
da oralidade e por dificuldades na textualização de relações semânticas e/ou discursivas, assim
como na operação de processos de encaixamento necessários à elaboração de períodos complexos.
Para subsidiar o trabalho do professor, voltado à ampliação da competência comunicativa dos
alunos, pretende-se apoiar as reflexões em pressupostos desenvolvidos por três linhas teóricas,
buscando um olhar complementar sobre os fenômenos a serem analisados: a gramática funcional, a
análise do discurso e a linguística textual, com destaque para a perspectiva funcional, como
propostos por Halliday (1985), Matthiessen & Thompson (1988)e Hopper & Traugott (1993). Nessa
linha, os conceitos de “continuum” e de “gramaticalização” assumem especial relevância na
abordagem que se pretende desenvolver. Neves (2006)retoma esses autores ao realizar estudo de
caráter funcionalista sobre a formação de enunciados complexos. Afirma que uma análise de base
funcionalista procura avaliar a organização dos enunciados sob diversos níveis (predicacional,
proposicional e ilocucional); sob diversos ângulos (informacional e interacional); e envolvendo
todos os componentes (sintático, semântico, pragmático). Como desdobramento das reflexões
desenvolvidas no Simpósio, pretende-se propor estratégias pedagógicas para o trabalho de leitura e
produção de textos, de modo a favorecer ao aluno a identificação e incorporação das estratégias de
organização textual que garantem sua unidade e eficiência.
COORDENAÇÃO
Maria da Aparecida Meireles de Pinilla
Universidade Federal do Rio de Janeiro
[email protected]
Maria Cristina Rigoni Costa
Universidade Federal do Rio de Janeiro
[email protected]
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PROCESSOS DE ANÁLISE LINGUÍSTICA NAS PRODUÇÕES TEXTUAIS DE
PROFESSORES DE UM CURSO DE FORMAÇÃO À DISTÂNCIA
Adriana dos Santos Prado Sadoyama – UFG/CAC
Geraldo Sadoyama – UFG/CAC
Analisar os implícitos no discurso é uma prática que consiste em identificar as verdadeiras opiniões
do indivíduo subentendidas no texto, e também um campo da linguística e da comunicação
especializado em analisar construções ideológicas presentes em um texto, midiático ou não. A
análise do discurso pode ser feita também no dia a dia, pois, de forma geral, as pessoas maquiam
suas verdadeiras vontades, opiniões, ideias, sentimentos e preconceitos, porém, as marcas
linguísticas textuais, quando percebidas podem apontar aquilo que realmente se quer dizer.
Pretendemos apresentar uma amostra de análise linguística, sem a pretensão de torná-la única ou
exclusiva nos encaminhamentos efetuados. O propósito reside em contribuir com a orientação de
possíveis olhares para o texto, compreendendo-o quanto à sua situação de produção e ao seu
conteúdo temático, quanto ao gênero que o materializa e quanto às marcas linguísticas que o
constituem. Tendo como objetivo de tornar o aluno leitor, faz-se necessário verificar em que nível
de leitura o professor está inserido. A prática da análise linguística constitui-se num instrumental
capaz de refletir a organização do texto escrito; um trabalho que perceba o texto como resultado de
opções temáticas e estruturais, feitas pelo autor, tendo em vista seu interlocutor. Convém ressaltar
que os procedimentos usuais adotados pela maioria das gramáticas demonstram a tendência em
privilegiar o estudo do sistema linguístico em si mesmo e não o seu uso, o seu funcionamento nos
mais diferentes tipos de texto. A reflexão sobre a língua e seu ensino permite analisar como está
difícil e sofrível o ensino de língua Portuguesa nas salas de aula. O grande problema está na falta de
mudança no ensino/aprendizagem em que os professores, ou não se especializam ou não realizam
suas práticas educativas com satisfação. Isto se torna um problema, pois essa insatisfação é posta
nas salas de aula e no ensino de Língua Portuguesa. O desinteresse dos alunos em aprender a língua
materna pode ser o reflexo das condutas pedagógicas dos professores. Nesta pesquisa, constatamos
que os sujeitos observados demonstraram práticas de ensino de língua para a formação gramatical.
A proposta desta pesquisa é, então, fazer uma análise linguística das produções textuais de
concluintes de um curso de extensão na modalidade EaD. Realizou-se um estudo de corte
transversal com amostra de conveniência que incluiu 23 textos produzidos analisados quanto:
conhecimento linguístico, coerência pragmática, coerência cognitiva e socioculturais. A maioria dos
participantes apresentou coerência nos aspectos dos conhecimentos linguísticos.Com relação à
coerência pragmática, coerência cognitiva e coerência nas discussões e interpretação da proposta
temática textual, apenas 35% apontaram em seus discursos estes aspectos do uso da Língua
Portuguesa. Concluímos que, mesmo com as inúmeras práticas comunicativas vivenciadas por estes
sujeitos, eles atendem apenas a um critério didático, a concepção da escrita como apropriação das
regras da língua.
A TEORIA DE PROPP NAS PRODUÇÕES DE TEXTOS NARRATIVOS DE ALUNOS DO
6º E DO 7º ANO DE UMA ESCOLA ESTADUAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
Maria de Fátima da Silva – UNESP
Pensar em “produção de textos” vem-nos à ideia “redação do passado”, em que o aluno não diz a
sua palavra e segue as normas ditadas pela escola mandatária. Desde os anos 80, a produção de
textos tem sido alvo de grandes questionamentos e discussões, pois se sabe que os alunos ao
escreverem, frequentemente, fazem narrações que não contam histórias, textos expositivos que não
expõem ideias. Desse modo, se o aluno tiver acesso a leituras diversificadas e o conhecimento sobre
a estrutura de um texto narrativo, ele escreverá realmente a sua palavra. O presente trabalho visa
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apresentar um recorte da pesquisa de mestrado realizada em uma escola estadual de São José do Rio
Preto, com o objetivo principal de investigar as relações entre leitura e produção textual e a
verificação dos instrumentos utilizados pelos professores e se esses instrumentos colaboram para a
formação eficiente de alunos leitores e escritores em uma sala de 6º ano e 7º ano. Após observações
em sala, foi oferecido aos alunos um trabalho intensivo de leituras e o ensino da estrutura do texto
narrativo baseado na teoria de Vladimir Propp, contribuindo de forma positiva na produção de
textos dos alunos envolvidos.
OS GÊNEROS TEXTUAIS: DOCENTE X LIVROS DIDÁTICOS
Catiane Oliveira Gonçalves – Escola Dez de Dezembro
Cilene Cristina Puzzi – Escola Estadual Adolfo Augusto
Edith Mazzoni – UNIC-Rondonópolis
Vanessa Rafaela Cintra – Escola Estadual Emanuel Pinheiro - Rondonópolis
Celeste Garcia Novaga – IFMT-Rondonópolis
O presente trabalho tem a finalidade de refletir sobre os aspectos teóricos e práticos dos gêneros
textuais no livro didático, bem como apontar a sua relevância, em especial, no ensino de língua
portuguesa. O estudo revela que cabe ao professor oportunizar ao aluno o contato com o maior
número possível desse leque de variedades a fim de torná-lo apto a interagir de modo autônomo e
efetivo em situação de comunicação.
PROCEDIMENTOS DE ESTRUTURAÇÃO TEXTUAL EM REDAÇÕES ESCOLARES
Maria Cristina Rigoni Costa - UNIRIO
Raphael Pellgrini - UNIRIO
Clara Taveira – UNIRIO
O foco deste estudo é a análise da organização textual-discursiva de redações escolares de base
argumentativa com o objetivo de identificar problemas de coerência provocados por transposição
inadequada de traços da oralidade e por dificuldades na textualização de relações semânticodiscursivas, assim como na operação de processos de encaixamento necessários à elaboração de
períodos complexos.Tomou-se como parâmetro a expectativa da utilização das marcas linguísticas
próprias da estruturação argumentativa, de acordo com as exigências da interação comunicativa e
do contexto situacional, com foco nos procedimentos de referenciação e nos processos de
encadeamento textual para a expressão de relações lógico-discursivas.O corpus do estudo é
composto por 137 redações de alunos do terceiro ano do ensino médio na rede pública de ensino.
Com base em pressupostos funcionalistas e sociointeracionistas, esses procedimentos de
textualização foram analisados por meio da identificação de ocorrências de ruptura das relações de
continuidade, levando em conta o encadeamento textual e os processos de referenciação.Tendo em
vista as características da oralidade, observou-se que os textos dos alunos apresentam vários traços
da simplificação evidente que se dá em relação ao padrão escrito: a) redução drástica de estruturas
subordinadas, ao lado do aumento na frequência de estruturas coordenadas e absolutas; b) redução
no uso de conectores para expressar relações lógicas essenciais à construção do texto, substituídas
pela exigência de inferência por parte do interlocutor para suprir a sua ausência; c) redução cada vez
maior do uso do subjuntivo, ao lado da ampliação do uso do indicativo combinado a estruturas
frasais coordenadas ou absolutas; d) empobrecimento do processo de referenciação, com a repetição
exaustiva de pronomes ou nomes; e) simplificação extrema da marcação da categoria tempo na
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morfologia verbal; f) falta de domínio de vocabulário mais abstrato e de maior complexidade,
essencial ao desenvolvimento do processo argumentativo; g) e, principalmente, dificuldade de
identificação da progressão temática do texto no processo de leitura ou de planejamento da
produção para garantir uma distribuição equilibrada de conteúdos.
AUTORIA, INTERTEXTUALIDADE E INTERDISCURSIVIDADE: A INSUSTENTÁVEL
LEVEZA DO SER
Ângela Cristina Rodrigues de Castro – UERJ/CMRJ
Bazerman (2007) afirma que a linguagem está diretamente ligada ao desenvolvimento do indivíduo
como ser social, à sua consciência individual e coletiva, aos seus relacionamentos, seus
sentimentos, sua proximidade e seu distanciamento em relação aos outros. A linguagem só ocorre
porque cada falante se coloca como autor ou sujeito do seu discurso e considera que o OUTRO
também participa na construção desse sujeito, antes concebido como ser único, na proporção em
que espelha uma formação cultural construída por meio do discurso de outros indivíduos, em
interações, ou seja, que reflete ideologias (BAKHTIN, 1992; MEY, 1993; CHOULIARAKI e
FAIRCLOUGH, 1999). O presente estudo propõe uma análise de um corpus de alguns textos
produzidos por alunos de 1º ano do Ensino Médio, para uma avaliação diagnóstica do nível de
letramento em Língua Portuguesa dentre os colégios do Sistema Colégio Militar do Brasil. Esta
análise está baseada na visão interacional e dialógica do texto, assim como em aspectos da
Pragmática e abarca a observação da autoria, da intertextualidade e da interdiscursividade,
elementos constitutivos e indispensáveis na estrutura de textos escritos proficientemente
construídos. A importância dessa análise decorre do fato de que, conforme afirma Oliveira
(2010:89), tradicionalmente, “os professores de português abordam os elementos linguísticosemânticos em sala de aula, mas tendem a não levar em conta os elementos pragmáticos. Entretanto,
esses elementos são fundamentais para a construção das habilidades de leitura e escrita dos
estudantes”. Entretanto, ressalta-se que: a) o reconhecimento e a utilização de estratégias como a
intertextualidade e a interdiscursividade, desde a passagem do educando pelo EF, possibilitam a
formação de leitores mais proficientes e de produtores de texto mais eficientes, visto que constituem
recursos linguístico-discursivos de largo emprego na compreensão da mensagem, seu domínio e
suas condições de produção, assim como também podem servir como recursos para sustentar a
argumentatividade e para construir e manter a coerência textual; b) na observação sobre a ação
autoral incidem os elementos sociais, históricos, ideológicos e o princípio dialógico, o qual segue a
direção do interdiscurso, da relação com o outro (SOBRAL, 2009), ou seja, do possível
reconhecimento dos interlocutores da interação, do diálogo que constitui o ato de escrever. Tendo
em vista a perspectiva da centralidade da escrita na escola e na sociedade, da necessidade do
acompanhamento do(s) processo(s) de escrever em sala de aula que se apresentam, torna-se
importante mais esta reflexão, dentre outras que sãorealizadas, para uma proposta de mudança dos
níveis de letramento e proficiência escrita de nossos alunos. É nesse contexto que se insere este
estudo.
A CONSTRUÇÃO REFLEXIVA NO GÊNERO DO DISCURSO MEMÓRIA: UM ESTUDO
DE CASO
Maria Cristina Morais de Carvalho – SEDF
Roberta Rocha Ribeiro – UNB
O presente estudo tem como objetivo analisar a construção reflexiva no Português Brasileiro
(doravante PB) como elemento sintático-semântico inovador frente ao Português Europeu
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(doravante PE) que contribui na estruturação e, consequentemente, nas imbricações discursivas do
gênero Memória. Para tanto, o locus de pesquisa escolhido foi uma escola pública do Distrito
Federal, pois, durante o ano de 2012, os alunos, ao produzirem o gênero Memória, fizeram
frequentemente uso de construções do tipo “eu/nós se + verbo” como construção reflexiva,
distanciando-se do protótipo do português padrão no qual cada pronome pessoal relaciona-se a um
pronome oblíquo específico. Nesse sentido, nossa hipótese é de que uma das possibilidades de uso
dessa estrutura ocorre como uma estratégia dos estudantes se distanciarem do discurso em que estão
inseridos, motivados pelas condições de produção e recepção do gênero estudado. Uma das
condições de produção do gênero memória é a exposição de fatos vividos pelo produtor do texto.
Muitas vezes, as experiências narradas nesse gênero revelam a intimidade ou momentos difíceis e
até traumáticos vividos pelo autor. Por isso, o uso da construção reflexiva eu/nós + se pode ser
associada às memórias por tratar-se de uma estratégia discursiva do próprio falante afastar-se dos
fatos narrados que revelam a sua intimidade ou lhe causam desconforto. Outra possibilidade
observada nos textos é o uso generalizado do pronome oblíquo “se”. Isso é um indício de que a
reflexiva no PB pode estar em processo de gramaticalização. Diante do exposto, o quadro teóricometodológico desta pesquisa é a sintaxe funcional-tipológica (HASPELMATH, 2007;
DELANCEY, 2001; COMRIE, 1981; CROFT, 1990). Esta observa, analisa e constrói tipologias
das línguas naturais conforme os usos, a interação e a intenção comunicativa dos falantes. Nessa
linha, a translinguística – a comparação das estruturas e usos entre diferentes línguas – pode ser
feita. Além desse arcabouço básico, são utilizados trabalhos funcionalistas que contemplam o
espectro sintático-semântico da construção reflexiva (CAMACHO, 2002) e da gramaticalização,
sobretudo Hopper (1987, 1991); Heine, Claudi e Hunnemeyer (1993); Hopper e Traugott (1993)
entre outros. Aliada a essas concepções, este trabalho traz referências acerca dos gêneros do
discurso (BAKHTIN, 2000; MARCUSCHI, 2005; SCHNEUWLY e DOLZ, 2004), do gênero
Memória (ALTENFELDER e CLARA, s.d; OLIVEIRA, SILVA E SILVA, 2010) e do ensino
ligado às contribuições sociolinguísticas (BORTONI-RICARDO, 2004). A partir dessas
considerações, é possível afirmar que o estudo em questão contribuirá para o ensino de língua
portuguesa por analisar os usos recorrentes da reflexiva do PB em oposição ao português padrão,
bem como por tecer a relação entre sintaxe e gêneros do discurso.
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SIMPÓSIO 25
ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E CONTEXTOS DE
APRENDIZAGEM
Pretende-se com este simpósio apresentar o papel dos diferentes contextos no ensino-aprendizagem
da língua e da cultura portuguesa(macro-contexto geo-social ao micro-contexto da sala da aula) e as
suas implicações não só na prática pedagógica, mas também na divulgação da língua e da cultura
(designadamente língua e culturas de expressão portuguesa). Esta é uma temáticaque,além da
ligação aos contextos diversificados e à identidade, está intrinsecamente relacionada com o
funcionamento da língua eassuas diferentes conceções (língua materna, língua de herança, língua de
acolhimento, língua estrangeira, língua segunda).
COORDENAÇÃO
Maria José Grosso
Universidade de Lisboa
[email protected]
Luís Gonçalves
Princeton University
[email protected]
João Caixinha
Deputy Coordinator for the Portuguese Language Programsand Education Affairs in the United
States Instituto Camões - Ministry of Foreign Affairs
[email protected]
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LÍNGUA PORTUGUESA: PERCURSOS, APRENDIZAGEM E INTEGRAÇÃO – NA VOZ
DE TRÊS ESTRANGEIRAS EM PORTUGAL
Maria Helena Ançã – UA
A partir da Revolução dos Cravos e até à primeira década do século XXI, Portugal foi um destino
para milhares de estrangeiros que escolheram este país para se instalarem e viverem. Neste âmbito,
surgiram preocupações diversificadas com a aprendizagem da língua de acolhimento (LUDY ET
PY, 1986; ANÇÃ, 2003), quer dos próprios sujeitos quer do estado, em contextos diversificados:
desde os formais (escolas, institutos…) até aos não formais e informais (da autoaprendizagem à
própria vivência em português, na sociedade de acolhimento). Neste enquadramento social e
didático, serão revisitadas as narrativas de três (jovens) mulheres estrangeiras vivendo em
Portugal2: uma cabo-verdiana, uma ucraniana e uma chinesa (ANÇÃ, 2007; 2012). Analisaremos
os seus percursos linguísticos, de aprendizagem e de integração. Trata-se de percursos distintos,
tanto na língua portuguesa e na sua aprendizagem, como na sociedade de acolhimento. As locutoras
em causa apresentam ainda posturas singulares face à(s) sua(s) LM(s) e ao lugar ocupado por
esta(s) no (re)desenho das suas identidades (socio)linguísticas. Paradoxalmente, a locutora caboverdiana é aquela que manifesta maiores dificuldades de língua e de integração, não obstante residir
em Portugal, há vários anos, e ter nascido num país de língua oficial portuguesa.
UM REFERENCIAL EM PORTUGUÊS LÍNGUA ESTRANGEIRA PARA FALANTES DE
LÍNGUA MATERNA CHINESA : UM ESTUDO PRELIMINAR
Maria José dos Reis Grosso – UMAC
Ricardo Moutinho – UMAC
O objetivo desta comunicação é apresentar o referencial em Português Língua Estrangeira (PLE)
que está sendo desenvolvido no Departamento de Estudos Portugueses na Universidade de Macau.
Esse referencial tem como público-alvo os falantes adultos, de língua materna chinesa, aprendentes
de português, que frequentam o ensino superior em Macau (primeira fase) e nas Universidades
chinesas (China Continental).
Nesta apresentação, abordaremos alguns dados provenientes da primeira fase do projeto, (resultados
dos inquéritos por questionário aplicados aos aprendentes de português da Universidade de Macau)
em que analisamos as necessidades de comunicação, as atitudes e os interesses dos aprendentes
chineses que estão frequentando cursos de Língua Portuguesa (PLE) na Universidade de Macau.
Explicitaremos as outras fases do projeto (ainda a ser desenvolvidas) que analisarão as situações de
uso (oral e escrito) da língua portuguesa em Macau e o novo interesse que esta língua vem
despertando não só na comunidade chinesa do território, mas também em todo o continente chinês.
Discutiremos, para finalizar, como esses dados poderão ser operacionalizados no futuro em termos
de tópicos de conteúdos comunicativos e de avaliação para, posteriormente, servirem de base na
elaboração de materiais didáticos e de planificações curriculares em cursos de PLE.
ENSINAR E APRENDER COM SENTIDO: A LÍNGUA PORTUGUESA PARA OS
MUNDURUKU DE SAI-CINZA
Águeda Aparecida da Cruz Borges – UFMT
Em concordância com a temática do Simpósio que faz “a ligação aos contextos diversificados e à
identidade e está intrinsecamente relacionada com o funcionamento da língua e as suas diferentes
concepções de língua materna, língua de herança, língua de acolhimento, língua estrangeira, língua
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segunda…”(grifo meu), propomos a seguinte apresentação: a proposta pedagógica do “Projeto
Ibaoebu” apresenta os chamados Eixos integradores da matriz curricular: Linguagens e
Comunicação no contexto das relações entre índios e não índios. Identidade e Diversidade na
sociedade contemporânea. O valor e uso dos etnoconhecimentos no contexto atual. O Projeto tem
como princípio metodológico a articulação da pesquisa ao ensino, buscando a construção de um
diálogo com base na intercultural idade e intercientificidade. Uma das “diferenças” e que
caracteriza a especificidade deste Projeto, no qual atuo como professora de Língua Portuguesa
(LP2) está na escolha dos materiais, na abordagem metodológica, na avaliação e, na relação com as
condições de produção em que se encontra o povo Munduruku. Ao assumir uma experiência com
Educação Escolar Indígena, nós professores não-índios precisamos deixar-nos afetar, também, pelo
modo de ser índio, é preciso significar. A atitude de abrir-se ao modo de ser do Outro possibilita um
trabalho em cooperação, num movimento contínuo que recria a vida em sua intensidade, em cada
tempo-espaço em que a educação escolar se está constituindo. Assim, o professor indígena como
interlocutor, é fundamental. Aqui, estou falando de minhas experiências no trabalho em
linguagem(ens) com povos indígenas - que se materializam como efeito de sentido de toda uma
história povoada pelo meu contato com povos de diversas etnias, desde a década de setenta, quando
saí de Minas Gerais e passei a morar no interior do Mato Grosso. Contudo, escolhi, para a discussão
nesse Simpósio, uma experiência realizada no Projeto Ibaorebu de Ensino Médio Integrado
Munduruku, na aldeia Sai-Cinza, no Pará. O Curso foi distribuído etapas e selecionei diversos
tipos de texto que circulam e regulamentam a vida numa sociedade de escrita. É importante dizer
que, além da estrutura da língua, fundamentamo-nos nas relações que ela estabelece com o sujeito, a
história, a ideologia, a política, o espaço, o mundo, ou seja, trabalhamos com a língua em
funcionamento, fazendo sentido e levando em conta que o público atendido, em certo número,
frequenta a cidade, ou seja, está em relação com o universo urbano, com o Outro. Os Munduruku,
assim como outros povos indígenas, não estão livres do conflito, na tensão do histórico e inevitável
contato, e o ensino de 2ª língua, na perspectiva adotada precisa considerar as condições de produção
apresentadas.
LÍNGUA E CULTURA PORTUGUESAS EM CONTEXTO DE APRENDIZAGEM
BILINGUE
Fernanda Maria Alves Fernandes de Sousa Bertinetti – UNL/FCSH
Esta comunicação pretende apresentar uma reflexão sobre o papel do contexto das Secções
Internacionais no ensino e aprendizagem do português em França. Importa problematizar as
componentes que enformam este ensino (enquadramento institucional, variáveis sociopolíticas,
meio educativo), os quadros concetuais de língua subjacentes (língua materna, língua de herança,
língua de acolhimento) e as suas implicações a nível curricular e de didática da língua. As Secções
Portuguesas constituem uma oferta de ensino bilingue disponibilizada pelo Ministério da Educação
francês, funcionando em diversos estabelecimentos de ensino oficial que, no ano escolar de 20092010, já envolvia cerca de 820 alunos e de 20 docentes colocados pelo Estado português. O
reconhecimento bilateral do interesse da referida oferta curricular (decorrente de negociações lusofrancesas), o seu incremento e a sua dimensão configuram-na como uma vertente significativa na
divulgação da língua e de culturas de expressão portuguesa. A génese da conceção e criação do
ensino bilingue está intrinsecamente ligada a questões de identidade e de inserção no país de
acolhimento, uma vez que traduz a vontade de acolher alunos estrangeiros (que devem representar
25% a 50% dos inscritos nas Secções) e, simultaneamente, facilitar a sua entrada no sistema
educativo francês. Também os alunos franceses têm a possibilidade de optar por este tipo de ensino
no caso de estarem motivados para a aquisição e aprendizagem do português, com o objetivo de
atingir, no final do Ensino Secundário, um nível de desempenho avançado correspondente a B2 ou a
C1 (em conformidade com os descritores do Quadro Europeu Comum de Referência). Este trabalho
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302
agora apresentado tem ainda como objetivo analisar os resultados de entrevistas semidiretivas a
finalistas do Ensino Secundário das Secções, com vista à caracterização desse público aprendente.
Tendo em conta que a maioria dos informantes é de origem portuguesa e que para muitos deles a
utilização do português circunscreve-se aos domínios educativo e familiar, interessa questionar os
conceitos de identidade, língua materna, língua de pertença e língua de afetos. Por outro lado, no
respeitante aos programas de Língua e Cultura Portuguesas para o Ensino Secundário, cuja principal
finalidade é promover o conhecimento de obras e autores representativos da tradição literária,
garantindo o acesso a um capital cultural e literário, importa averiguar quais os saberes
perspetivados como fulcrais na transmissão de patrimónios culturais de expressão portuguesa. As
orientações curriculares sublinham a importância do papel do estudo dos textos do cânone literário
para o conhecimento das culturas e das vozes em português rumo à construção de sentimentos de
partilha, de identificação e de pertença. Neste contexto, é necessário problematizar o esquema
concetual dos textos programáticos e a sua adequação ao perfil do público aprendente.
A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE LINGUÍSTICA E CULTURAL
Catarina Gaspar – Universidade de Lisboa
Propõe-se uma reflexão sobre o ensino/aprendizagem da língua portuguesa como língua de
acolhimento junto de alguns imigrantes que residem actualmente na área da grande Lisboa, onde
estabeleceram os seus próprios negócios e vivem actualmente com o seu agregado familiar.
Pretende-se analisar de que forma foi feita a aprendizagem da língua portuguesa, durante quanto
tempo e em que contexto; além destes dados, será objecto de análise a questão da forma como é que
se está a construir a identidade (linguística e cultural) do grupo familiar, atendendo às diferenças
que geralmente existem entre os pais, que estão num contexto profissional e/ou doméstico, e os
filhos que crescem num contexto escolar. Irei tratar de casos em que a integração social e
profissional foi bem sucedida e já ocorreu a reunião do agregado familiar, no país de acolhimento,
dado que o sucesso de alguns pode trazer novos dados para a dinamização de estratégias
facilitadoras da integração para outros.
LÍNGUA DE HERANÇA: POSSIBILIDADES DE ENSINO/APRENDIZAGEM EM
FUNCIONAMENTOS DISCURSIVOS DE LÍNGUA MATERNA
Nirce Aparecida Ferreira Silvério – UFU
A realização de uma prática pedagógica desenvolvida em um projeto de leitura, num microcontexto
de uma escola do município de Catalão-Goiás, mostrou-se produtiva. Nela houve a exploração de
aspectos que veiculam elementos da identidade brasileira, presente em textos literários. Este
trabalho foi uma pesquisa e ação que viabilizou a reflexão sobre o ensino/aprendizagem de língua,
de forma a se desprender de certa tradição, pois foi privilegiado um olhar sobre o funcionamento
discursivo, o encontro da língua com a história. Sob esta orientação, buscou-se a discursividade
inerente ao microcontexto supracitado, o qual foi relacionado com um macrocontexto ao se pensar a
língua e a cultura brasileira. Neste sentido, trabalhou-se ainda, a necessidade de considerar a
estrutura da língua e os valores sócio-históricos a ela interligados. A identidade brasileira foi
entendida como não fixa e não homogênea, mas constituída da e na diversidade, e que se expressa
na materialidade linguística por meio de práticas discursivas produzidas na história. Este
procedimento teórico-metodológico foi possível com a baliza dos estudos de análise do discurso
francesa empreendidos por Pêcheux e Foucault e suas derivações nas pesquisas brasileiras. Assim,
se objetiva, nesta comunicação, apresentar e analisar as contribuições deste projeto de leitura para o
ensino-aprendizagem da língua e cultura portuguesa. Neste estudo, destaca-se uma das
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problemáticas contemporâneas do ensino/aprendizagem da língua portuguesa, um dos entraves é a
diferença de realização em sua modalidade oral e escrita, o que provoca dificuldades de
compreensão principalmente da modalidade escrita. Este problema relaciona-se com elementos de
cultura e história que estão imbricados na constituição da língua portuguesa e, ao invés de se
mostrarem elididos, perduram na contemporaneidade. A partir destas considerações, esta
comunicação se propõe a relatar as atividades de apreciação de textos literários feitas por um grupo
de leitura, cujos trabalhos foram orientados para a tentativa de esquadrinhar a língua e a cultura
portuguesa relacionada a estes textos, de forma que os sujeitos leitores se constituíssem à medida
que identificavam sentidos no que liam. Indaga-se sobre as possibilidades desta experiência de
ensino-aprendizagem de língua materna, ser tomada como sugestão para o ensino de língua de
herança, uma vez que se alicerça em formas contemporâneas das problemáticas deste ensinoaprendizagem, ao apresentar uma abordagem discursiva e fugir da organização convencional das
escolas, já que as atividades do grupo foram desenvolvidas nas aulas regulares e também com
grupos menores fora do cotidiano das salas de aula.
APRENDER PORTUGUÊS COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA (PLE) EM CONTEXTO
UNIVERSITÁRIO E SUAS IMPLICAÇÕES NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE
LÍNGUAS
Alessandra Montera Rotta – UFU
A língua portuguesa já conquista hoje a posição de sexta língua materna e terceira língua europeia
mais falada no mundo, elevando sua posição no quadro de ensino e aprendizagem de línguas
estrangeiras. Um grande número de pesquisadores têm se interessado em aprofundar as dificuldades
de ensinar o portuguêscomo língua estrangeira (PLE), mas são poucas as universidades que incluem
em seu currículo disciplinas voltadas a esse fim, e menor ainda é a quantidade de docentes em
formação que se candidata a ensinar profissionalmente o Português anão nativos desse idioma. O
curso de Letras do Instituto de Letras e Linguística da Universidade Federal de Uberlândia tem
procurado preparar seus alunos através da oferta de duas disciplinas obrigatórias em sua grade
curricular: Metodologia de Ensino de PLE e Estágio Supervisionado de PLE. Desenvolve, também,
um projetodeextensão de ensino de PLE para alunos estrangeiros da Mobilidade Estudantil em
parceria com a Diretoria de Relações Internacionais. A prática profissional de intervenção deve se
basear na tradição para auxiliar o aprender. De acordo com Almeida Filho, esse ensinar é
representado teoricamente “como uma grande operação de quatro estações/fases ou dimensões:o
planejamento curricular e de cursos, a produção/avaliação de materiais, o ensinopropriamente dito
consubstanciado num método (procedimental) com experiências na novalíngua, e a avaliação de
rendimento e proficiência na língua-alvo.”(ALMEIDA FILHO, 2004). Tudo está interligado, e deve
ser orientado por uma abordagem de línguas.
GLOBALIZAÇÃO E ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: OS EFEITOS DA
MACROESTRUTURA NA MICROESTRUTURA DA SALA DE AULA
Elzira Yoko Uyeno – Unitau
Os efeitos da globalização sobre os campos políticos, econômicos e sociais são evidentes e estão
incorporados no cotidiano de qualquer grande cidade do mundo. Seus efeitos sobre as identidades
não são tão evidentes, embora sejam perceptíveis nos imigrantes contemporâneos, refugiados de
guerras étnicas, raciais, religiosas, políticas, mas, sobretudo, da recessão econômica, em uma reencenação da diáspora hebraica sob formas contemporâneas de cuja nova geografia o indivíduo não
sai incólume. As dimensões culturais do (des)enraizamento ligado à imigração, à diáspora e à
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mobilidade social como efeitos da globalização parecem se constituir domínios de saberes que
demandam investigações. Preparar jovens para lidar com as complexidades do mundo globalizado,
incentivando sua interação com outras economías e culturas, constitui uma tarefa que cabe a todo
docente, mas, inegavelmente, mais atribuído ao professor de línguas. Universidades de renome
internacional têm estimulado seus estudantes a encontrarem faculdades de qualidade no exterior,
para passarem tempos estudando disciplinas curriculares, tendo a cultura e a língua do país
hospedeiro como mediadoras. Se no âmbito escolar, sobretudo no nível superior, esse estímulo visa
a propiciar a ampliação do repertório cultural, favorecendo a formação humanística, no âmbito
profissional, visa a favorecer o desenvolvimento da competência relacional desejável, se não
imprescindível em tempos de globalização. O intercâmbio cultural bem como a cultura bilíngue são
certamente aspectos ordinários em vários países em continentes multiculturais. Em se tratando de
um país de extensão continental como o Brasil e com experiências de viagens internacionais
restritas a classes econômicamente privilegiadas, as relações interculturais e hábitos bilíngues não
fazem parte da formação da maioria dos alunos. Tendo o Brasil, na mencionada configuração
globalizada da cartografia migracional, recebido estudantes de várias origens, a menção por
estudantes estrangeiros à identificação com línguas latinoamericanas, a despeito de o inglês
constituir a língua dos intercâmbios acadêmicos internacionais, deflagrou a pesquisa a se relatar. A
hipótese para essa menção foi a transposição por esses alunos de uma identificação com a cultura
latina para as línguas latinas. Depoimentos escritos por esses alunos estrangeiros acerca da relação
que estabeleciam com a língua portuguesa e com a cultura brasileira constituíram os registros de
pesquisa dos quais se compôs o corpus que foi submetido a uma análise sob um arcabouço
interdisciplinar, convocando a Sociologia, a Linguística Aplicada e a Psicanálise lacaniana.
Resultados da pesquisa demonstraram, por um lado, que os estudantes visitantes apresentavam uma
identificação com uma característica considerada pelos brasileiros como negativa do “jeitinho
brasileiro”, sob a argumentação de que constituía uma qualidade apropriada para um momento pósmoderno que se caracteriza por uma dinâmica que requer (re)adaptações constantes; revelou, por
outro lado, casos de identificações em sua especificidade lacaniana: não se trata de A querer tornase igual a B (por identificação a B), mas, de que B é quem produz A; transpostas para a pesquisa em
relato, não se tratava de estrangeiros quererem se tornar iguais aos brasileiros, mas de que, na
relação que estabeleceram com esses novos colegas, deflagraram aspectos constitutivos de si e
desconhecidos. Como efeito dessa relação, os brasileiros enunciaram terem passado a repensar
acerca dos próprios procedimentos culturais como alunos. Se, sob o ponto de vista da aquisição de
portugués como língua estrangeira, aspectos característicos de línguas latinas como flexão de
gênero e concordância nominal foram reconhecidos como complexos pelos depoentes de línguas
que não os têm, os colegas brasileiros, futuros professores de Língua Portuguesa, revelaram
reconhecer a complexidade e a abstração desses aspectos para seus alunos em fase de aquisição da
língua materna na modalidade formal.
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UMA EXPERIÊNCIA VIVENCIADA POR UM
PROFESSOR LEIGO NO CONTEXTO DO CAMPO
Maria Eurácia Barreto de Andrade – UA
Pesquisar, analisar e registrar a história de vida de um professor leigo, adotando como fonte de
investigação relatos autobiográficos através da memória, é essencialmente importante para conhecer
os diferentes papéis e sentidos atribuídos à escola e ao processo alfabetizador. Através da história
oral é possível conhecer fatos antes desconhecidos e documentar esses fatos os quais podem servir
de importante referência para novas ações, principalmente no que concerne a formação e práticas
educativas mais sólidas e consubstanciadas em fatos reais, de pessoas simples e reais. Este trabalho
discute sobre a prática pedagógica de um professor leigo que atuou com Alfabetização de Jovens e
Adultos no município de Biritinga, interior da Bahia no Movimento Brasileiro de Alfabetização
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(Mobral), nas décadas de 1970 e 1980. Objetiva descrever a metodologia de alfabetização
empregada na sua atuação com jovens e adultos, tomando como base a memória de sua vivência ao
longo dos tempos, bem como documentos orientadores da prática pedagógica. Através da história
de vida e das memórias narradas em diálogo com o interlocutor da pesquisa, foi possível conhecer
suas práticas alfabetizadoras e perceber os sentidos atribuídos por ele ao método utilizado para a
apropriação da leitura e da escrita. Resultado de uma pesquisa qualitativa, este trabalho adotou
como fonte de investigação relatos orais através da memória do professor investigado. As
considerações aqui discutidas apontam para a grande relevância do Movimento Brasileiro de
Alfabetização para o processo de aquisição da leitura e da escrita de diversos jovens e adultos na
história da alfabetização brasileira. Apesar das novas discussões em torno da alfabetização de
jovens e adultos, representando um novo momento e uma nova concepção para a inserção das
práticas sociais no processo alfabetizador, os conceitos e processos metodológicos utilizados pelo
professor pesquisado no contexto do Mobral foram fundamentais para a história da educação
brasileira e para o fortalecimento das pesquisas e práticas pedagógicas atuais na grande busca de um
trabalho pedagógico para os jovens e adultos que transcenda a aprendizagem da codificação e
decodificação, mas também que possa garantir os usos sociais da leitura e da escrita nos mais
diversos eventos e práticas de letramento.
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SIMPÓSIO 26
DA PESQUISA SOBRE A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA À
PRÁTICA PEDAGÓGICA
Este simpósio tem como principal objetivo refletir sobre o papel das teorias de aquisição de L2 no
ensino do português (língua estrangeira/língua segunda), processo multiforme de saberes
linguísticos e não linguísticos, e consequentemente nas implicações para a prática pedagógica.
COORDENAÇÃO
Maria José Grosso
Universidade de Lisboa
[email protected]
Luís Gonçalves
Princeton University
[email protected]
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IMPLICAÇÕES DAS TEORIAS DE AQUISIÇÃO NA INTERFACE DA PRODUÇÃO
ESCRITA DE PLM/PLE
Maria D’Ajuda Alomba Ribeiro – UESC
O presente trabalho propõe uma reflexão sobre a atuação das teorias de aquisição no
ensino/aprendizagem de Português Língua Materna e Português Língua Estrangeira (doravante
PLM/PLE), a exemplo da produção textual. No cenário do ensino de línguas, a escola deve refletir
sobre as situações desse contexto, implementando práticas para o ensino de línguas, por vezes
apenas para a produção textual, sem levar em conta os aspectos linguísticos e não linguísticos, não
satisfazendo assim as indiosincrasias do multiletramento as quais requerem vivências leitoras e
escritoras, conforme discutem as Orientações curriculares. Conforme Soares (2001 e 2002),
Marcuschi (2004) Antunes (2012), Baralo (1998) e Briones, (2001) a Linguística Aplicada,
transcendendo a perspectiva teórica, à luz das discussões de Moita Lopes, Rajagopalan, destaca a
relevância do ensino aprendizagem de línguas que valorizam a natureza social das múltiplas
linguagens, considerando suas condições reais de uso. A entrada do texto no ensino de PLM/PLE,
portanto, é necessária para formação de leitores e produtores de texto competentes, e tal entrada
deve ser realizada através da abordagem dos gêneros textuais, da dimensão do funcionamento, pelo
viés da comunicação e do aperfeiçoamento dela. Nesse sentido, a Linguística Aplicada crítica ou
transgressiva tem permitido pensar o papel entre teoria e prática. No que diz respeito às pesquisas
realizadas em sala de aula, nas últimas décadas, é possível concluir que a sala de aula é um lócus de
investigação e resposta às indagações sobre o ensino e aprendizagem e sobre questões condizentes,
sendo o professor pesquisador de sua própria prática. As pesquisas realizadas com produção textual
tendem, portanto, a inserir os gêneros textuais como materialização do discurso na realidade escolar
e perceber os aspectos em sala de aula. Assim, na interface entre a produção escrita e as teorias de
aquisição, aprendizes e mediadores precisam se reconhecer como sujeito dessas linguagens podendo
ler e gerir textos com liberdade, com criticidade na perspectiva das teorias de aquisição.
A TEORIA DE PRINCÍPIOS E PARÂMETROS NA INVESTIGAÇÃO SOBRE A
AQUISIÇÃO E O ENSINO/APRENDIZAGEM DO PORTUGUÊS EUROPEU LÍNGUA
NÃO-MATERNA
Maria Francisca Xavier – UNL-Portugal
Ana Madeira – UNL-Portugal
A investigação generativa desenvolvida nos últimos anos sobre a aquisição do português europeu
língua estrangeira (segunda ou terceira) tem mostrado que determinadas propriedades linguísticas
são facilmente adquiridas, independentemente da língua materna dos falantes, enquanto outras
propriedades se revelam mais fáceis de adquirir por falantes de algumas línguas do que de outras
(MADEIRA; XAVIER; CRISPIM, 2009, 2010; MADEIRA; XAVIER, 2009). A Teoria de
Princípio e Parâmetros (CHOMSKY,1980 …) tem contribuido para compreender o processo de
aquisição de línguas não-maternas, possibilitando a identificação de propriedades lexicais e
gramaticais próprias da competência linguística e distinguindo-as de propriedades da competência
pragmática dos aprendentes de português e de outras línguas. Os resultados já obtidos indicam que
certas propriedades linguísticas precisam de uma atenção particular, devendo sertrabalhadas de
modo diferenciado no ensino/aprendizagem tendo em vista falantes de grupos linguísticos distintos
(SLABAKOVA, 2009).
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AQUISIÇÃO DO PORTUGUÊS BRASILEIRO COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA EM
CONTEXTO DE IMERSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O ENSINO DE LÍNGUAS:
ESTUDO DE CASO
Irenilza Oliveira e Oliveira – UNEB
Este trabalho apresenta o resultado alcançado por um adulto estrangeiro quando da
aquisição/aprendizagem do português brasileiro (PB) como língua estrangeira (LE). O sujeito sobre
o qual se baseia este estudo (K.) é do sexo feminino, de origem belga, tem como língua materna
(L1) o holandês e, quando se iniciou a coleta dos dados, tinha dezoito anos de idade. Além da sua
L1, K. aprendeu o alemão, como segunda língua (L2) e o inglês via instrução formal. No entanto, o
PB foi por ela adquirido informalmente, por imersão, em contexto natural. K. hospedou-se com uma
família que reside num bairro de classe média alta de Salvador. Durante as entrevistas, foi possível
perceber o ótimo relacionamento entre K. e seus pais e irmãos brasileiros e a ativa vida social da
qual desfrutava. A amostra se constitui de cinco gravações da fala de K. realizadas a cada duas
semanas, por meio de conversação livre ou semidirigida. Na realização deste trabalho, o primeiro
objetivo foi identificar o(s) mecanismo(s) utilizado(s) pelo adulto quando da
aquisição/aprendizagem de uma LE, ou seja, observar se seria o Language Acquisition Device
(LAD) chomskyano ou o Problemsolving Cognitive System (PSC) proposto por Felix (1987) que
entraria em operação ou, uma terceira alternativa, se existiria uma coatuação desses dois sistemas.
Mais especificamente, este trabalho objetivou observar se o sujeito, num período tardio do processo
de aquisição/aprendizagem de LE, que foi aqui chamado de período de acomodação, apresentaria
uma regularidade no que se refere ao uso de estruturas linguísticas conforme a gramática do PB e,
no caso de estruturas mal-formadas, analisar se a má-formação seria possível ou não nas línguas
naturais, isto é, se estaria prevista na Gramática Universal (GU) para algum tipo de língua e, caso
estivesse, se seria uma possibilidade de estrutura na L1 do sujeito. A segunda meta foi observar
como a experiência intercultural influenciaria no desenvolvimento da competência comunicativa de
K. Com base nos dados analisados, foi possível concluir que, quanto aos tipos de mecanismos
usados pelo indivíduo na aquisição de uma LE, tanto o LAD quanto o PSC são colocados em ação:
o primeiro colocando à disposição a GU e o segundo tornando possível a aprendizagem de
determinados aspectos que pertencem ao leque dos itens lexicais gramaticais e substantivos da LE.
Quanto à importância dos fatores interculturais no processo de aquisição vivido por K, as próprias
palavras de K. respondem: " ... lá ninguém fala ... falava inglês ( ... ) tinha que falar pra todo
mundo ... todos os colegas ... todas as colegas: ‘boa noite galera, vamos comer água?’ de manhã,
da tarde, da noite ... " ( 4,24 ). Este trabalho pode contribuir para o ensino do português como
LE/L2 uma vez que traz uma evidência empírica para teorias de aquisição de língua que explicam
processos de aquisição/ aprendizagem da sintaxe de uma LE/L2. Além disso, este trabalho
corrobora propostas que defendem a importância de inclusão de aspetos interculturais na sala de
aula de língua estrangeira (MENDES, 2003, 2010).
AQUISIÇÃO DO ARTIGO INDEFINIDO PORTUGUÊS POR APRENDENTES CHINESES
ADULTOS
Paula Cleto – UMAC
Zhang Jing – UMAC
O presente trabalho examina o sistema de artigo indefinido em gramática interlingue, com foco em
aprendentes chineses adultos de português como língua estrangeira. Ao comparar o chinês, língua [art], e o português, [+art], mostra-se que um dos mecanismos através dos quais se manifesta a
referencialidade indefinida dum SN em chinês é o 一 (um) + CLA (classificador), que precede o N
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e em muitos casos e equivale ao artigo indefinido português. O 一 (um) tende a ser omisso à medida
que o seu peso morfofonológico se vai atenuando. Neste contexto, parte-se do pressuposto que os
aprendentes chineses adultos, que já interiorizaram previamente o mecanismo de marcação da
indeterminação pelo一 + CLA na sua língua materna, conseguem adquirir totalmente o artigo
indefinido português. Recorrendo a uma tarefa de recontar por escrito um filme, o presente trabalho
tem como objectivo estudar a variação na aquisição do artigo indefinido português na interlíngua
dos aprendentes chineses testando a hipótese de aquisição do artigo indefinido português. Parte-se
do pressuposto que os aprendentes chineses não têm uma performance linguística idêntica aos
falantes nativos no sentido do uso do artigo indefinido português, ou seja, os aprendentes chineses
não conseguem refixar o parâmetro do artigo português.
ANÁLISE DE ERROS NA ESCRITA RELACIONADOS À APRENDIZAGEM DA
CONCORDÂNCIA DE GÊNERO POR FALANTES NATIVOS DE INGLÊS,
APRENDENTES DE PORTUGUÊS EUROPEU COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA
Elisabeta Mariotto – FLUL
Maria do Carmo Lourenço-Gomes – CLUL
Erros relacionados à concordância de gênero são observados na produção oral e escrita de falantes
nativos de inglês aprendentes de línguas latinas, como o espanhol, o italiano ou o português. A
frequência desses erros tende a diminuir com a exposição à língua e com o aumento da proficiência,
mas eles podem persistir mesmo em níveis mais avançados de proficiência (MONTRUL, FOOTE;
PERPIÑAN, 2008). Isto se deve, provavelmente, aos parâmetros que não foram automaticamente
ativados na língua materna dos aprendentes e que não estão acessíveis após o período crítico para a
aprendizagem da língua estrangeira (HAWKINS; CHAN, 1997). Neste caso, admite-se a existência
de um período crítico que afeta a aquisição de algumas propriedades gramaticais, e o uso de
determinados traços, que estão ausentes na língua materna (GODINHO, 2010), podendo-se
considerar que os falantes de línguas de morfologia pobre apóiam-se menos na morfologia para
construir significados do que os falantes de línguas com morfologia mais rica. Neste trabalho
apresentam-se dados preliminares de um estudo em andamento que tem como objetivos: (i)
descrever padrões de erros sistemáticos relacionados à concordância de gênero na escrita de
aprendentes do português como língua estrangeira (PLE) que têm o inglês como língua materna, (ii)
buscar parâmetros para análise linguística e experimentação psicolinguística que possam contribuir
para a criação de estratégias de apoio ao ensino. Foram examinados, em um primeiro momento, 15
textos semi-direcionados de falantes nativos do inglês (britânico), aprendentes do português
europeu como língua estrangeira, com o nível B1 de proficiência. Os dados foram extraídos do
"Corpus de Produções Escritas de Aprendentes de PL2" (PEAPL2) do Centro de Estudos de
Linguística Geral e Aplicada (CELGA), da Universidade de Coimbra. Os erros foram categorizados
com base na tipologia adotada em Hemchua e Schmitt (2006), acrescida de categorias propostas
para o enquadramento dos tipos concernentes ao português. Os erros relacionaram-se basicamente
às dificuldades intrínsecas à L2, como a acentuação e a marcação morfológica de gênero, ausentes
no inglês. Novos dados do mesmo corpus serão adicionados a esta primeira amostra para uma
análise mais refinada dos erros relacionados à concordância de gênero: 11 composições de falantes
nativos de inglês, seis deles ingleses, um canadense e quatro americanos com diferentes níveis de
proficiência (A1-C1). Os resultados serão discutidos com base na análise de Godinho (2010),
considerando-se as variáveis: (i) marcas precedentes de gênero, (ii) posição em relação ao núcleo do
SN, (iii) classe gramatical, e (iv) interdependência flexional no âmbito do SN. Em conjunto, as duas
análises permitirão estabelecer as primeiras diretrizes para investigação psicolinguística a ser
desenvolvida em uma terceira etapa do estudo.
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SIMPÓSIO 27
MATERIAIS E RECURSOS DIDÁTICOS ON-LINE PARA O ENSINO
DE PORTUGUÊS (LE/L2/LH) EM PERSPECTIVA INTERCULTURAL
O campo do ensino e da aprendizagem de línguas hoje tem exigido de pesquisadores, professores e
estudantes a necessária aproximação das tecnologias da informação e da comunicação (TICs), não
apenas no sentido de compreenderem e se apropriarem de seu funcionamento, mas, sobretudo, no
que diz respeito à reflexão e ao desenvolvimento de abordagens e estratégias-metodológicas que
respondam a essa necessidade. Considerando-se a amplitude e a projeção do português hoje no
mundo, e os seus variados contextos de difusão, como língua estrangeira, segunda língua, língua de
herança, língua oficial, entre outros, cresce a demanda por um ensino de qualidade e que, ao mesmo
tempo, seja capaz de atingir a um grande público, seja na perspectiva da promoção de cursos, seja
na da formação de novos professores, haja vista a diversidade cultural característica de nossas
sociedades e a dimensão intercultural que deve permear os processos de ensinar e aprender línguas
contemporâneos. Nesse sentido, os ambientes virtuais e os recursos on-line têm apresentado grande
potencial para atender, em parte, a essa demanda. Este Simpósio, desse modo, pretende reunir
reflexões e experiências situadas de pesquisadores e professores que têm desenvolvido materiais,
recursos didáticos e cursos on-line, e em ambiente digital de modo geral, para o ensino de
português, em diferentes contextos em que o público seja falante de outras línguas ou descendente
linguístico e cultural, como no caso dos falantes de herança. Os trabalhos, desse modo, devem não
apenas apresentar resultados de experiências, mas, sobretudo, discutir princípios-metodológicos,
abordagens e perspectivas interculturais para o desenvolvimento de materiais e recursos didáticos
que fomentem novos cursos e práticas de avaliação culturalmente sensíveis aos sujeitos e às
demandas de aprendizagem de nosso tempo.
COORDENAÇÃO
Edleise Mendes
Sociedade Internacional de Português Língua Estrangeira e Universidade Federal da Bahia
[email protected]
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O PORTUGUÊS COMO LÍNGUA INTERNACIONAL (PLI) E AS NOVAS TICS: POR UM
ENSINO INTERCULTURAL CRÍTICO
Sávio Siqueira – DLG/UFBA
A humanidade vive um momento peculiar em que, por conta das novas tecnologias de informação e
comunicação (TICs), não precisamos planejar grandes viagens para podermos conhecer e
compreender o mundo. Ele vem até nós pelas infovias globais e o conhecimento adquirido nos
transforma e nos atiça a querermos ir além, em busca de fontes cada vez instigantes, travando
encontros interculturais jamais imaginados. Línguas internacionais como o português, inglês,
espanhol, árabe, entre outras, terminam por ocupar posição central neste processo, uma vez que a
sua difusão, dentre outras coisas, contribui para a diluição de fronteiras, irmanando diferentes
povos, assim como passa a demandar uma pedagogia cada vez mais alinhada com tal realidade.
Infelizmente, por conta de fatores amplamente conhecidos, o professor de línguas em muitos
contextos, inclusive no Brasil, ainda carece de uma formação mais ampla e sólida para que ele/ela
seja capaz de enfrentar com segurança e criatividade os desafios que a sociedade contemporânea lhe
apresenta. Nossa comunicação pretende juntar esses fios, as TICs e o ensino línguas internacionais
como o português, desvelando alguns desafios que aguardam o docente na sua tarefa de
desconstruir práticas ultrapassadas, tanto no nível técnico quanto ideológico, chamando a atenção,
principalmente, para o fato de que ensinar línguas globais na atualidade está entre uma das tarefas
mais complexas e gratificantes para nós, professores, em especial por conta da importante função
social abrangente destes idiomas culturalmente ‘rematernizados’ e do empoderamento garantido aos
seus usuários nas trocas diárias de experiências globais.
PROFESSOR EM FORMAÇÃO, TECNOLOGIA E LETRAMENTO DIGITAL: DA SALA
PRESENCIAL PARA A VIRTUAL
Christiane Moisés – UNB/UNESP
No panorama atual de estudos sobre o ensino e aprendizagem de línguas assistidas por computador,
destacam-se atualmente os projetos telecolaborativos desenvolvidos entre dois diferentes países
cujo objetivo pressupõe algumas competências tais como a aquisição de uma língua estrangeira, o
letramento digital e a competência linguístico-cultural. O objetivo desta comunicação é relatar a
experiência de professores de Letras em serviço dos centros de línguas estrangeiras paulista (CELs)
e de professores uruguaios que ensinam Português Língua Estrangeira (PLE) em escolas privadas.
Esta apresentação objetiva, em primeiro lugar, mencionar alguns benefícios que o projeto
Teletandem Brasil – Línguas Estrangeiras para Todos propicia àqueles que desejam aprender o
PLE e praticá-lo através da colaboração em meio virtual síncrono. Para isso, consideraremos
especificamente o desenvolvimento da competência intercultural e aplicabilidade de tarefas em
meio midiático e as percepções de professores uruguaios de PLE com professores brasileiros de
língua espanhola em um curso de extensão à distância visando à capacitação de tais profissionais
para a implementação dessa modalidade nas escolas públicas e privadas de ambos os países. Em
segundo lugar, pontuaremos algumas implicações sobre o letramento digital que se
revelaram/destacaram primordiais durante a prática de uma língua estrangeira a distância.
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DIÁLOGO INTERCULTURAL EM AULA DE PLE: NOVAS TECNOLOGIAS DA SALA
DE AULA PARA AS REDES SOCIAIS
Ana Clotilde Thomé Williams – Northwestern University
Com a evolução do uso de novas tecnologias no ensino de línguas estrangeiras, nota-se também
uma mudança na visão pedagógica. Antes do advento da internet, CDs e softwares colocavam o
foco numa abordagem cognitiva para o ensino comunicativo da língua: através de multimídias em
microcomputadores de uso pessoal, o aluno era exposto a contextos audio-visuais de onde se
extraíam significados para o uso real da língua. Com a internet, o foco passou a ser sociocognitivo,
ou seja, a ênfase recai no aspecto social da aprendizagem da língua (WARSCHAUER,
M.;MESKILL, C., 2000). Nesse ambiente socio-virtual, o aluno deve usufruir de interações sociais
autênticas que o levem a refletir sobre os mecanismos da língua e os contextos de uso e de
significação da mesma (OLIVIA; POLLASTRINI, 1995; STICKLERet alii, 2007, MENDES,
2011).A partir dessa perspectiva, observa-se que as novas tecnologias proporcionam ao estudante o
desenvolvimento de não apenas uma “competência comunicativa”, mas, numa esfera que se
espande cada vez mais, o desenvolvimento de uma“competência intercultural” (SERCU, 2004), ou
porque não uma “competência comunicativa intercultural” (BYRAM, 1997).Sob o olhar do
intercultural nas interações entre estudantes da Northwestern University nos EUA e da
Universidade de São Paulo, preparei um curso de conversação em que assuntos do interesse dos
próprios alunos eram discutidos em sala de aula e, após, com parceiros brasileiros via Skype e
reforçados através de um grupo social pelo Facebook.Nesta apresentação, demonstrarei
características curriculares desse curso, atentando para as para as imagens que os jovens se fazem
um do outro; a interpretação da vivência nos Estados Unidos (Chicago e arredores) e no Brasil (São
Paulo e arredores); e a realização desse encontro atráves da língua portuguesa, que é língua
estrangeira, de um lado, e língua materna, do outro.
O PORTAL DO PROFESSOR DE PLE/PL2: CAMINHO PARA A PROMOÇÃO E A
PROJEÇÃO DO PORTUGUÊS COMO LÍNGUA(S) DE CULTURA
Edleise Mendes – UFBA
Nesta intervenção, será apresentado e discutido o Portal do Professor de Português Língua
Estrangeira/Segunda Língua (PPPLE), projeto em desenvolvimento pelo Instituto Internacional da
Língua Portuguesa (IILP), em parceria com a Sociedade Internacional de Português Língua
Estrangeira (SIPLE), o qual tem como objetivo primordial disponibilizar a professores, on-line e
gratuitamente, materiais e recursos didáticos para o ensino do português (LE/L2), em variados
contextos de seu desenvolvimento. De modo a situar o projeto entre as ações do Plano de Ação de
Brasília (2009), discutiremos a importância política e estratégica do Portal, no âmbito das políticas
mais amplas para a promoção e a projeção do português no mundo, o seu caráter inovador e
dinâmico, bem como o seu potencial como ambiente agregador das diferentes variedades do
português que conformam o espaço político e econômico da CPLP. Além disso, serão discutidos os
parâmetros e referenciais temáticos que orientam a organização pedagógica do Portal, como
também os princípios teórico-metodológicos que o sustentam, como as concepções de
língua/linguagem, de cultura e de interculturalidade e de avaliação de proficiência, entre outros.
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PRÁTICAS IDEOLÓGICAS NA ELABORAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS DE
LÍNGUA PORTUGUESA
Denise Scheyerl – UFBA
O presente estudo pretende contribuir para a construção de fios condutores que possam orientar
ética e criticamente a concepção dos materiais didáticos utilizados no ensino de língua portuguesa
como L2/LE e línguas em geral. Trata-se de uma proposta de "sensiblização intercultural" desses
materiais, em especial daqueles mediados por novas tecnologias de informação e de comunicação
(TIC), com o objetivo de ressaltar questões emergentes de nossa dependência ideológica de valores
estrangeiros que nos aprisionam com seus conceitos e visões globalizantes e unitários. Nesse
sentido, objetiva-se redimensionar o impacto causado pelo choque ético-cultural de materiais
didáticos em uso no ensino de língua portuguesa e outras línguas internacionais, para favorecer a
exploração de novos olhares contra estigmatizações e reforço de estereótipos. O trabalho a ser
empreendido, portanto, tenta ampliar o ponto de convergência com o que consideramos a tendência
da contemporaneidade: a de buscar construtos teóricos para uma travessia menos desumana pelo
nosso milênio.
A INTERCULTURALIDADE NA SALA DE AULA DE PLE: ELABORAÇÃO DE
ATIVIDADES PARA ALUNOS ESTRANGEIROS NA UFG
Lucielena Mendonça de Lima – UFG
No início de cada semestre, ao conhecer os alunos estrangeiros que vão ser meus alunos na
disciplina Português para estrangeiros, me pergunto sobre o quê eles sabem, quais imagens e
representações trazem sobre o Brasil, sobre a variante brasileira do português e, principalmente,
quais temas e materiais didáticos usar para que os alunos possam aprender o máximo que puderem
durante os quatro meses de aula. Um material didático básico que usamos é Bem-Vindo! A língua
portuguesa no mundo da comunicação (PONCE, BURIM, FLORISSI, 2007). Porém, este manual
explora muito pouco a região centro-oeste e não explica nada sobre o estado de Goiás. Por isso, nos
preocupamos em selecionar outros materiais para apresentar esta região e nosso estado. Nesta
comunicação, nosso objetivo é discutir a educação intercultural como uma perspectiva de ensino de
línguas e apresentar alguns temas, textos e materiais complementares que utilizamos com o intuito
de oferecer informações culturais e linguísticas sobre a região centro-oeste, Goiás e Goiânia,
contexto no qual vão ficar imersos durante o semestre. Nosso estudo, sob o ponto de vista teórico,
fundamenta-se nas abordagens antropológica (TYLOR, 1871) e semiótica (GEERTZ, 1989) para
conceituar cultura. Para discutir o conceito de representações nos baseamos em Jodelet (1989,
2001). No que diz respeito ao desenvolvimento da competência comunicativa intercultural, nos
apoiamos, principalmente, nos estudo de Alsina (1999), Casal (1999), Sercu (2001), Vilá (2003) e
García (2004), Mendes (2004).
O PROFESSOR INTERCULTURALISTA E ATIVIDADES COM CANÇÕES NA AULA DE
PLA: UMA QUESTÃO DE SELEÇÃO DE MATERIAIS E GÊNERO DISCURSIVO
Ricardo Gualda – UFAL
O uso de canções e textos curtos na aula de língua estrangeira tradicionalmente se dá como insumo
implícito ou, em alguns casos, explícito. Em geral, o professor escolhe os textos, apresentando-os
na sala de aula. São omitidas palavras, cabendo ao aluno ouvir a música e completar as lacunas com
os ítens lexicais em questão. Esta comunicação explorará uma nova concepção de aula de língua
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com base no conceito de professor interculturalista e na linguística cognitiva, aplicando-a à aula de
língua estrangeira. Com base em Mendes (2012), tomamos o conceito de professor interculturalista,
revendo os conceitos de língua, aquisição de língua, processo de aprendizagem e cultura,
considerando o complexo língua-cultura como objeto da aula de língua estrangeira, bem como a
relação entre os agentes do processo de aquisição como interação dialógica em um gênero
discursivo em transformação. Com base nessa visão do mundo, das interações humanas e da
linguagem, este trabalho propõe uma nova maneira de encarar a língua-cultura ea sua aquisição,
especialmente no contexto da sala de aula. As atividades de insumo e produção com base em
canções são essenciais, mas tomam nova roupagem, com base em uma mudança radical na seleção
de materiais e interação entre os participantes da aula. Por outro lado, a linguística cognitiva é um
amplo campo de investigação que conta com trabalhos fundadores como Lakoff e Johnson (1980),
Johnson (1987), Van Dijk (1989) e Pinker (1999). Entre seus conceitos fundamentais está o da
plasticidade do cérebro e da construção dos significados por redes neurais, com base na percepção
sensorial e motora. As representações mentais são construídas e reconstruídas constantemente, e os
conceitos mais abstratos são desdobramentos de caráter metafórico das categorias mais simples
adquiridas com base na interação com o mundo da maneira mais elementar: o espaço, os objetos, o
movimento, as interações familiares e sociais. Também desenvolvem-se atividades de: a)
construção de representações de caráter sensorial e exercícios de sinestesia; b) visão do diálogo
como representação social; c) análise da deixis de espaço, tempo, pessoa e suas interações na ação;
e d) análise dos elementos constitutivos da oralidade, segundo Tannen (2009), como repetição e
rimas.
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SIMPÓSIO 28
GRAMÁTICA, DISCURSO E ENUNCIAÇÃO
Este simpósio tem interesse na discussão de resultados de pesquisas que tratem da relação entre
Gramática, Discurso e Enunciação. Um pressuposto natural desse interesse é a necessidade da
consideração da língua em uso efetivo, com ênfase na observação da relação entre a gramática e a
construção de sentidos e efeitos no quadro mais amplo do discurso e da enunciação. Assumindo que
a diversidade de uso da linguagem está associada à diversidade das práticas sociais, buscamos
identificar correlações entre forma e função, colocando em evidência o condicionamento da língua
pelos propósitos de quem enuncia e por um conjunto de informações de toda ordem disponíveis no
momento da interação verbal. Na análise, as formas não devem ser vistas como meros traços, itens
ou construções, mas consideradas em relação aos processos de que participam (referenciação,
predicação, junção, modalização), de natureza dinâmica, multifuncional e estratégica na construção
dos sentidos (NOGUEIRA, 2004).São bem-vindas as propostas que, com esse pressuposto, se
voltem para a descrição e análise linguística com orientação teórica em alguma abordagem baseada
no uso, que destaque o papel do contexto em seus aspectos sociais, cognitivos, interacionais.
COORDENAÇÃO
Márcia Teixeira Nogueira
Universidade Federal do Ceará
[email protected]
Maria Auxiliadora Ferreira Lima
Universidade Federal do Piauí
[email protected]
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A APOSIÇÃO NÃO-RESTRITIVA EM ELOCUÇÕES FORMAIS
Márcia Teixeira Nogueira – UFC
As construções apositivas apresentam grande diversidade formal e uma notável multiplicidade
funcional em cada contexto específico de interação. Em Nogueira (1999), propomos uma
correspondência entre as relações semânticas assumidas como presentes em aposições nãorestritivas e as funções textual-discursivas por elas desempenhadas. Essas construções têm recebido,
recentemente, a atenção de pesquisadores ligados à nova proposta de Gramática DiscursivoFuncional (GDF), de Hengeveld; Mackenzie (2008). Trata-se de um modelo teórico que visa à
expansão de uma gramática da frase para uma gramática funcional orientada para o discurso. Com o
modelo da GDF, que toma o discurso e não a oração como unidade básica de análise linguística,
Keizer (2005; 2008) trata as aposições não-restritivas como um tipo particular de holofrase. A
autora faz uma breve discussão em torno dos critérios propostos por alguns autores, entre eles,
Quirk et al. (1985) e Meyer (1992), para avaliação do estatuto de uma dada construção em relação à
categoria das construções ditas apositivas, aponta pressupostos teóricos para identificação dessas
construções e propõe uma classificação das construções apositivas não-restritivas para o inglês, com
base nas funções que elas exercem no discurso. Embora reconheça que a GDF oferece uma base
teórica bastante promissora para o tratamento das distinções de caráter discursivo depreendidas da
análise das construções apositivas não-restritivas, Keizer (2005) chama a atenção para pontos que
ainda demandam mais atenção e futuras investigações, particularmente na análise de corpora orais.
A partir da tipologia de correspondência entre relações textual-semânticas e funções textualdiscursivas proposta em Nogueira (1999), em Nogueira (2011) esboçamos uma formalização de
exemplos prototípicos relativos às principais funções das construções apositivas não-restritivas nos
níveis Interpessoal e Representacional da GDF. No presente estudo, tratamos, especificamente, de
aposições não-restritivas na fala, em inquéritos do tipo EF (Elocução Formal), do português culto de
Fortaleza, com a descrição e análise dos aspectos formais e funcionais dessas construções na
modalidade oral e o aprofundamento das reflexões que vêm sendo feitas no âmbito da GDF.
FUNÇÕES ARGUMENTATIVAS DAS EXPRESSÕES MODALIZADORAS DEÔNTICAS –
UM EXERCÍCIO DE ANÁLISE RETÓRICO-FUNCIONAL
Léia Cruz de Menezes – UNILAB
Objetivando compreender os modos de atuação de expressões modalizadoras deônticas na
construção do discurso argumentativo, empreendemos pesquisa, em âmbito de doutorado, na qual
propusemos interlocução entre duas perspectivas metodológicas: a Nova Retórica e a Linguística de
base funcional [com ênfase nos estudos empreendidos por Verstraete (2004), Hengeveld;
Mackenzie (2008)] e a Nova Retórica [com ênfase nos estudos empreendidos por Perelman &
Tyteca [1958], 1996]. Enquanto o arcabouço da Linguística funcionalista, como teoria gramatical,
dá-nos suporte para a descrição e análise linguística da categoria modalidade em uso, o arcabouço
da Nova Retórica dá-nos suporte para a compreensão das expressões linguísticas da modalidade em
função da construção do discurso argumentativo. O corpus constituído para esse trabalho é formado
de vinte e nove registros taquigráficos de proferimentos de Deputados Federais em sessões
plenárias na Câmara dos Deputados ao longo do ano de 2007 e início de 2008. Todos os
proferimentos versam sobre a necessidade de uma política de segurança nacional capaz de frear a
escalada da violência no Brasil. Aqui, destacamos um dos parâmetros de nossa análise: a
localização da expressão modalizadora deôntica no construto discursivo. A Retórica secciona o todo
discursivo em partes, para efeito de depreensão de funções que, juntas, coadunam-se em um único
intento: aumentar a adesão dos ouvintes às teses apresentadas pelo orador. Tem-se que, ao Exórdio,
compete pôr em relevo a finalidade daquilo sobre o qual versa o discurso, ao mesmo tempo em que
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prepara o auditório para recebê-lo. Por sua vez, à Narração compete enunciar o assunto de que se
vai tratar, delimitando-o. Às Provas, etapa discursiva também chamada de “argumentação” (ou
argumentação-refutação), cabe a “demonstração” do assunto, com vistas a conduzir à persuasão por
meio de argumentos. Por fim, à Peroração convém arrematar, de modo a solidificar a adesão do
auditório às teses levadas ao seu assentimento. A pesquisa revelou que as expressões linguísticas da
modalidade deôntica fazem-se presentes em cada uma das partes do todo discurso, exercendo
funções argumentativas que coadunam com as funções a que cada parte discursiva se presta:
estimular a atenção do auditório, dispondo-o a ouvir o discurso; demarcar o tema sobre o qual se irá
discorrer; defender um ponto de vista; tornar o ouvinte favorável à causa defendida.
A EVIDENCIALIDADE REPORTATIVA EM ARTIGOS CIENTÍFICOS: A
INTEGRAÇÃO DE “VOZES” COMO ESTRATÉGIA DE ARGUMENTAÇÃO
Izabel Larissa Lucena-Silva – UFC/CAPES
O presente estudo propõe uma investigação da evidencialidade reportativa na construção da
argumentação em artigos científicos. Visa a demonstrar que as construções reportativas constituem
um contínuo tipológico que reflete, em maior ou menor grau, a interferência do sujeito discursivo
do artigo científico (narrador) no discurso por ele reportado. Para tanto, analisa 10 artigos
científicos da área de Letras/Linguística, publicados nas revistas DELTA e ALFA em 2010. Os
pressupostos teórico-metodológicos que norteiam a investigação da evidencialidade nesta pesquisa
são os da Gramática Discursivo-Funcional (GDF – HENGEVELD; MACKENZIE, 2008). Segundo
essa perspectiva funcionalista, a estrutura morfossintática das línguas naturais reflete propriedades
pragmáticas e semânticas originadas na cognição humana e na comunicação inter-humana. Neste
estudo, assume-se que a evidencialidade constitui um fenômeno cognitivo-comunicativo que tem
por função básica a indicação da fonte do conhecimento, expressando também graus de
comprometimento do sujeito enunciador com seu discurso. Em língua portuguesa, manifesta-se,
principalmente, por meio de itens lexicais, podendo ser classificada em três subtipos mais gerais:
evidencialidade direta (relacionada às experiências sensoriais – visuais ou não-visuais – do falante
na elaboração de um conhecimento), menos direta (relacionada às capacidades lógica e perceptual
do falante na geração de um conhecimento - inferência) e indireta (relacionada ao discurso
reportado - o falante indica que obteve a informação por meio de um relato de 2ª mão ou 3ª mão)
(WILLET, 1988; CASSEB-GALVÃO, 2001). Embora as marcas evidenciais reportativas estejam
relacionadas ao baixo comprometimento do sujeito enunciador com o conteúdo por ele reportado,
tal efeito não constitui uma escala absoluta, uma vez que o sujeito discursivo tem total liberdade no
manejo da fala reportada, podendo utilizar recursos formais e funcionais para marcar, em maior ou
menor grau, seu envolvimento com o discurso citado. A análise empreendida neste trabalho nos
permitiu descrever como os produtores textuais de artigos científicos da área de Letras/Linguística
representam a apropriação de outras “vozes” em seu próprio discurso, produzindo variáveis graus
de liberdade ou de comprometimento do sujeito discursivo com a voz que integra à sua fala. De
fato, ao reporta a voz de outro em sua fala, o sujeito discursivo está longe de exercer a mera função
de “indicador de fontes”. Na verdade, suas escolhas revelam um sujeito discursivo engajado e
comprometido não apenas com a fidedignidade das fontes reportadas, mas com sua argumentação,
afinal de contas é o sujeito discursivo que seleciona o que a voz reportada falará e como falará,
define o molde pelo qual encaixará essa voz (discurso direto, indireto), escolhe quais itens lexicais
introduzirão o discurso reportado (verbos de elocução semanticamente marcados ou não), decide
em qual circunstância textual esse discurso será colocado. Por essas razões, o discurso reportado
tem de ser tratado como reconstrução através da qual o sujeito discursivo integra à sua voz as vozes
que servem de instrumento para a construção dos significados que objetiva instaurar.
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MODALIDADE E EFEITOS DE SENTIDO NA INTERAÇÃO DE LEITORES NO
GÊNERO DISCURSIVO WEBCOMENTÁRIO
Erasmo de Oliveira Freitas – UFC
O presente trabalho objetiva articular a descrição das marcas modais deônticas e epistêmicas à
produção de efeitos de sentidos no gênero discursivo webcomentário, especificamente do jornal
eletrônico O Povo (www.opovo.br). A pesquisa parte da escassez de estudos concernentes ao
gênero webcomentário e principalmente de pesquisas acerca da modalização no continuum virtual
de linguagem. A problemática da pesquisa é averiguar qual o tipo de modalidade prepondera e
como as modalidades deôntica e epistêmica se manifestam linguisticamente para construírem os
efeitos de sentido crítica, denúncia, elogio e sugestão. Para isso, usamos os seguintes corpora: um
corpus de amostras textuais constituído por 155 webcomentários postados entre junho e dezembro
de 2011 e janeiro a março de 2012, pertencentes as temas Política, Economia, Cultura, Esportes e
Violência Urbana, e um corpus de ocorrências de expressões modalizadoras em seus respectivos
contextos de uso, nos webcomentários, totalizando 200 ocorrências. Estas foram analisadas a partir
das seguintes categorias: 1 - tipo de modalidade, 2 - propósito comunicativo, 3 - tema, 4 - modos de
expressão das modalidades deôntica e epistêmica, 5 - valores deônticos, 6 - tipo de fonte deôntica, 7
- tipo de alvo deôntico, 8 - valor epistêmico e 9 - natureza epistêmica. O tema Política alcançou
79,5% do número de webcomentários, a modalidade epistêmica se manifestou em 55% dos casos,
entre as quais preponderou a asserção irrealis (60%), seguida da realis (36,4%). No que diz respeito
à modalidade deôntica, foram 45% dos casos e apresentou a permissão (51,2%) como o valor
deôntico mais frequente, seguido de obrigação (46,6%). O estudo aponta ainda uma relação estreita
entre os efeitos de sentido almejados pelo enunciador com a seleção das marcas modais e de qual
modalidade servirá aos intentos para a orientação argumentativa.
O COMPORTAMENTO DO ENCAPSULAMENTO ANAFÓRICO E A CONSTRUÇÃO DE
SENTIDOS EM ARTIGOS CIENTÍFICOS DAS ÁREAS DE EXATAS E DE HUMANAS
Maria Sirleidy de Lima Cordeiro – UFPE
Esta pesquisa apresenta um estudo sobre o encapsulamento anafórico com foco no fortalecimento
das práticas de produção e interpretação textual pertencentes ao gênero artigo científico. O estudo
está ancorado sob as bases da linguística textual e das teorias sociopragmáticas e sociocognitivas, e
oportuniza uma ampliação teórica e prática no campo do comportamento das expressões
resumitivas textuais envolvendo a estratégia discursiva-textual do encapsulamento anafórico. O
encapsulamento anafórico é um recurso textual coesivo estudado no campo da linguística textual. É
constituído por um sintagma nominal (demonstrativo + um nome núcleo) que sinaliza a retomada
de uma porção textual anteriormente descrita, podendo ter caráter axiológico e argumentativo
(CONTE, 2003). Por esta razão, o encapsulamento anafórico pode funcionar como uma poderosa
estratégia textual de construção de sentidos e progressão temática ao apresentar um ponto de vista,
uma possibilidade interpretativa relacionada aos conteúdos expressos na porção anaforizada do
texto, influenciando o leitor para uma dada construção de sentido sobre o que foi lido. Além disso,
este tipo de recurso também mostra que a objetividade na linguagem científica não apresenta um
caráter rigoroso na escrita de artigos científicos. Este estudo parte das perspectivas de OLIVEIRA
(2008), MELO (2008), CONTE, (2003), FRANCIS (2003), MARCUSCHI (2000; 2003; 2004),
KOCH e CUNHA-LIMA (2004), KOCH (2005), SALOMÃO (1999), elucidando, de forma
reflexiva e prática, o encapsulamento anafórico como um recurso de referenciação textual que
constrói relações de sentido e de progressão tópicatextual. Desta forma, a parte encapsulada se torna
um referente do texto que encadeia a informação velha às futuras informações (FRANCIS, 2003), e,
neste sentido, o encapsulamento anafórico proporciona a progressão tópica textual e realiza uma
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rede lexical de relações de significação que acontece por processos associativos de natureza diversa,
estudados nos escopos da cognição e da sociocognição. Este trabalho faz uso de uma metodologia
essencialmente qualitativa e utiliza uma abordagem teórica e interpretativa com base nos
fundamentos teóricos explicitados neste trabalho e em outras fontes bibliográficas pesquisadas ao
longo do seu desenvolvimento. O corpus constituiu-se de 90 artigos coletados em revistas e anais de
divulgação pública e científica on-line, das áreas de exatas (matemática, física e química) fazendo
um contraponto com as áreas de humanas (pedagogia, letras e jornalismo). Mediante estas seleções,
analisamos o comportamento textual-discursivo dos encapsulamentos anafóricos, categorizando-os
de acordo com DUAS estratégias de retomada anafórica que indicam o acesso ao sentido construído
pelos encapsulamentos (MELO, 2008): I. retomada implícita da porção anterior do texto por meio
de inferência lógicosemântica ou pragmático-cognitiva, através do uso de paráfrase; II. retomada
implícita da porção anterior do texto por meio de inferência sociocognitiva, através do uso de
sinonímia associativa. Nesta perspectiva, o encapsulamento anafórico se constitui por meio de dois
fenômenos: a paráfrase e a sinonímia, cuja função é a categorização, a sumarização das ideias
precedentes de um enunciado produzindo uma mudança metadiscursiva. A PARÁFRASE encapsula
uma extensão precedente do texto de maneira mais objetiva e imparcial. Entretanto, a SINONÍMIA,
neste tipo de encapsulamento estudado por esta pesquisa, constrói relações inferenciais onde uma
expressão linguística possibilita a construção do sentido a partir de um conjunto de saberes de
natureza social, histórica e cultural (MELO, 2008). Assim, o sentido indicado pelo elemento
encapsulador pode apresentar uma possibilidade interpretativa que é inferida por uma construção
inferencial por evidências sociocognitivas, a partir do conteúdo anteriormente expressado. O
resultado da pesquisa aponta que nas ciências exatas e humanas, o objeto de estudo e pesquisa não é
considerado como TOTALMENTE mudo, ideologicamente. Concluímos que o uso do
encapsulamento indica um modo de interpretação construído sobre o enunciado anaforizado, que
por vezes apresenta um não apagamento total da origem enunciativa.
A CORREÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE REFORMULAÇÃO TEXTUAL: DISCURSO
PARLAMENTAR ORAL & DISCURSO PARLAMENTAR RETEXTUALIZADO
Maria Rodrigues de Oliveira – PUC-SP
Com embasamento em trabalhos voltados aos estudos do contexto e dos procedimentos de
reformulação textual – com destaque para a correção – e em manuais de retextualização de casas
legislativas, esta apresentação tem o objetivo de discutir as correções de discursos parlamentares
provocadas por interlocutores em textos orais e sua representação e seus efeitos nos textos
retextualizados, levando-se em conta os contextos de produção e de uso. Os parlamentares, não
raras vezes, produzem discursos com teores questionáveis por seus pares quanto ao significado e à
pretensão enunciativa. Nesses casos, a correção é um recurso bastante usado, seja para o simples
ajuste de palavras ou de expressões seja para a substituição ou eliminação de informações incorretas
ou consideradas ofensivas. Há um tipo especial de correção que se destaca nesses discursos, que é a
correção solicitada por terceiros e autorizada por um outro (o presidente da sessão), em face de
dispositivo regimental. Essa correção, cujo principal objetivo é o apagamento, no discurso
retextualizado, de termos considerados ofensivos, tem efeito de censura ao orador e deveria atuar
como artifício de salvamento de faces de pessoas presentes ou ausentes ao evento comunicativo. O
quesito salvamento de faces, ao contrário da censura, nem sempre é atendido, já que as correções
podem não ser efetuadas em razão da não autorização do presidente para a mudança ou devido à
solicitação do autor do discurso para que o termo seja mantido na forma pronunciada, acarretando a
ratificação da ameaça à face da pessoa ou da instituição ofendida. Além disso, quando as correções
são efetuadas, em regra, os retextualizadores indicam, na forma de pista contextual, a ocorrência da
alteração, despertando a curiosidade do leitor sobre o termo substituído/eliminado. O objeto de
discussão é um trecho da 82ª Sessão Ordinária da Câmara dos Deputados, realizada em 27 de abril
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de 2009, em que há solicitação de retirada de expressão considerada ofensiva ao ex-Presidente da
República Fernando Henrique Cardoso.
VARIAÇÃO SEMÂNTICA E VALORES REFERENCIAIS DO ADJETIVO GROSSEIRO
Maria Auxiliadora Ferreira Lima – UFPI
Encontramos, nos estudos linguísticos sobre a significação, uma reflexão que nos conduz a pensar a
significação das palavras, dos enunciados como decorrente de uma dinâmica de interação e de uma
organização própria à linguagem. Esta reflexão tem suporte na Teoria das Operações Enunciativas
(TOPE). A significação não é originária de uma moldagem do pensamento, de um referente
previamente estabelecido no empírico. Assim, a significação de um termo lexical é construída no e
pelo enunciado, sendo norteada por essa dinâmica de interação. Um termo lexical não apresenta
uma significação estável por ser desprovido de autonomia semântica. Esse aspecto não impede que
possa haver um levantamento de suas características fora de seu emprego, mas elas não podem ser
explicitadas em forma de significação. A significação de um termo é construída no e pelo
enunciado, parte-se de uma instabilidade para se chegar a uma relativa estabilidade, não havendo
para o quadro teórico no qual se insere a reflexão proposta uma significação primeira, básica para
uma unidade lexical. Através da diversidade de significações chega-se à identidade. Dentro dessa
perspectiva, propomos investigar como diferentes ocorrências do termo lexical grosseiro, que se
enquadra na categoria gramatical adjetivo, assume valores referenciais distintos nos enunciados.
Nossa preocupação não está voltada para o sentido em si da ocorrência lexical mas como esse
sentido é construído no e pelo enunciado e como se estabelece sua identidade e variação.
UMA PROPOSTA DE ANÁLISE DA DINÂMICA ENUNCIATIVA DOS VERBOS
ROMPER E QUEBRAR
Vanessa Santana Lima – UNIFESP
Márcia Romero – UNIFESP
Neste trabalho, buscamos apresentar uma abordagem de análise semântica que, examinando os
efeitos de sentido produzido pelos verbos romper e quebrar em diferentes contextos, discute e
analisa a forma como cada uma destas unidades se articula para produzir significação nos
enunciados em que se inserem. Nossa finalidade é verificar em que medida os processos
enunciativos característicos destas unidades se aproximam e se distanciam e os caminhos que
conduzem a esta aproximação ou distanciamento. Fundamentados na Teoria das Operações
Enunciativas, de Antoine Culioli (Pour une linguistique de l’énonciation, tomos 1, 2 e 3, Paris:
Ophrys), concepção teórica que entende o sentido como produto da materialidade verbal, e não
como um elemento constituído por eventos externos ao enunciado, propomo-nos, assim, por meio
de uma análise comparativa do funcionamento enunciativo destas unidades, refletir sobre o
conjunto de relações semânticas estabelecidas. Para tanto, temos como ponto de partida os
resultados obtidos por meio da manipulação de enunciados, tal como a metodologia de glosa
proposta por Franckel (2011), operação fundamentada na atividade epilinguística constitutiva da
linguagem cujo propósito é a reformulação controlada do material verbal, com vistas à identificação
dos processos de construção de sentido das unidades lexicais selecionadas. Tais atividades têm em
sua base um olhar diferenciado sobre a atividade de linguagem e sobre os processos de articulação
léxico-gramatical para a produção de sentido. Adotamos, dessa forma, uma postura reflexiva diante
das peculiaridades das construções semânticas, o que nos permite, de um lado, repensar as questões
vinculadas ao trabalho com a significação e problematizar conceitos tradicionalmente arraigados ao
estudo do léxico, tais como polissemia, sinonímia, conotação e denotação, e, de outro, assumir, em
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contrapartida, uma abordagem para qual a linguagem não é apenas um instrumento para expressão
do pensamento, mas a capacidade intrinsecamente humana que nos concede um potencial
enunciativo, por meio do qual somos capazes de simbolizar e significar o mundo.
OS ADJETIVOS FIEL E FALSO SOB A PERSPECTIVA ENUNCIATIVA
Claudiene Diniz da Silva – UFPI
O presente trabalho tem como objetivo geral analisar o adjetivo, sob a perspectiva enunciativa.
Após fazer um levantamento de literatura sobre o adjetivo, utilizaremos os pressupostos teórico e
metodológico de Antoine Culioli, precursor da Teoria das Operações Predicativas e Enunciativas
(TOPE), como também Franckel (2011), Lopes (2000), Vogüé (2011) e Paillard (2011) cujas obras
desenvolvem a teoria culioliana. Partindo do pressuposto de que o sentido das palavras não é dado,
mas construído, propomos uma investigação sobre a construção de sentido dos adjetivos, levando
em conta seu uso efetivo. Intencionamos superar as prescrições dos compêndios gramaticais, que
estabelecem categorizações incapazes de expressar a complexidade da língua, uma vez que uma
mesma palavra pode ser classificada de forma diferente, de acordo com sua a função
desempenhada. Nossa reflexão sobre o adjetivo é uma busca de compreender essa classe de palavra,
as vezes tão dependente do substantivo e outras vezes autônoma, capaz de suplantá-lo. Não é nosso
objetivo propor uma nova classificação ou uma subcategorização, visto que nenhuma delas
abarcaria a complexidade linguística, mas visionamos uma nova forma de encarar as palavras por
nós usadas para qualificar, descrever e avaliar o mundo e as coisas. Partimos de enunciados reais, e
elegemos os adjetivos fiel e falso para demonstrar as operações predicativas e enunciativas
envolvidas na construção de sentido desses adjetivos. A hipótese norteadora dessa pesquisa é que o
sentido dos adjetivos é construído, a partir de mecanismos, os quais pretendemos desvendar.
Inicialmente, concluímos que os adjetivos fiel e falso, focos da nossa análise, apresentam sentidos
diversos, construídos na enunciação, sendo alguns sentidos mais recorrentes e outros mais raros,
mas não havendo um sentido primeiro da palavra.
ALGUM: DETERMINANDO NOMES, MARCANDO OPERAÇÕES, DEFININDO
VALORES
Joana Darc Rodrigues da Costa – UFMG
Admitindo as unidades linguísticas como marcas da atividade de linguagem, isto é, marcas de
atividade de representação, referenciação e regulação, propomos, neste trabalho, uma investigação
das operações e mecanismos de construção enunciativa subjacentes ao uso da unidade linguística
algum, a fim de compreendermos o seu papel no processo de construção da significação dos
enunciados. Embasando-nos na Teoria das Operações Predicativas e Enunciativa, proposta por
Antoine Culioli, para quem o enunciado é um agenciamento de formas resultantes de operações de
determinação nominal, temporal, aspectual e modal a partir do qual os mecanismos enunciativos
podem ser analisados, observamos o comportamento dessa unidade linguística em enunciados,
dados empíricos, extraídos de artigos de opinião dos jornais O Dia e Meio Norte; enunciados
presentes nas notícias postadas no site Cidade Verde, e, quando necessário, buscamos ocorrências
dessa marca em sites de busca como o Google compreendendo a unidade algum como marcador de
operação de determinação nominal, isto é, operações das quais resultam os nomes, a fim de
caracterizá-los a partir de operações abstratas que estão subjacentes a sua manifestação nos
enunciados e, assim, reconstruir seus valores referencias. A análise desenvolvida permitiu-nos
comprovar a hipótese de que esse marcador ao resultar de operações de determinação nominal que
permitem ao nome construir graus diferentes de especificidade, cujos valores referenciais
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322
construídos junto a esse nome e em sintonia com outras operações podem ser de quantificação e
qualificação, não podem ser classificados como pronome indefinido, uma vez que o seu valor é
construído no enunciado em conjunto com as outras ocorrências, mas merecem ser analisados em
seus contextos de uso.
OPERAÇÕES DE LINGUAGEM: UM ESTUDO DA MARCA AINDA
Elizabeth Gonçalves Lima Rocha – UFPI
A Teoria das Operações Predicativas e Enunciativas (T.O.P.E.) elaborada pelo teórico francês
Antoine Culioli, defende que as unidades lingüísticas não veiculam um sentido por elas mesmas
uma vez que os sentidos dessas unidades lingüísticas são o produto da interação que se estabelece
entre estas e seu cotexto de inserção enunciativo. A T.O.P.E. concebe os enunciados como um
agenciamento de formas, a partir dos quais os mecanismos enunciativos que os constituem possam
ser analisados como um encadeamento de operações. A significação de um enunciado é resultante
de uma atividade de co-construção dos sujeitos envolvidos no processo enunciativo. Sob este viés,
rejeita-se o estudo das palavras a partir de categorizações pré-estabelecidas. A partir da observação
dos modos de interação das unidades com o seu cotexto, explica Franckel (2002), é possível
verificar como a variação de sentido é regida por uma organização regular na própria língua,
podendo-se assim extrair a identidade dessas unidades. Tomando como parâmetro esses princípios,
propomo-nos a estudar a unidade lingüística - ainda -, tradicionalmente categorizada como um
advérbio temporal, detendo-nos a identificar os traços que caracterizam o funcionamento dessa
marca em suas relações predicativas. A marca - ainda - não responde sozinha pelo valor referencial
de tempo-aspecto. A combinação desta com outras marcas linguísticas é que construirão certo valor
referencial. A enunciação, nesta abordagem, constitui-se como a construção de um espaço e o
estabelecimento de um quadro de valores referenciais. Se a enunciação é um ato de construção, a
realidade não se encontra pré-fabricada, mas é construída através da língua, encontrando-se nesta,
ou em suas formas, as marcas das operações constitutivas de significação e contexto. Essas formas
desempenham um papel fundamental nesse processo constitutivo à medida que têm funções
determinantes e coercitivas.
A SIGNIFICAÇÃO EM SEU PROCESSO DINÂMICO: ANÁLISE ENUNCIATIVA DO
VERBO CORTAR EM PB
Soraia Assis Garcia – UNIFESP
A proposta desta comunicação é compreender como se dá a construção da significação em
enunciados envolvendo o verbo “cortar” no português do Brasil. Fundamentadas na Teoria das
Operações Enunciativas, as análises a serem desenvolvidas partem de duas premissas: a
materialidade semântica constitutiva à unidade linguística não é apreendida em termos de sentidos
que lhe são inerentes; a estabilidade semântica da unidade a ser analisada é sempre provisória, e se
desenha através das interações dialéticas entre esta mesma unidade e os contextos que ela evoca. O
referencial teórico adotado prevê que a variabilidade subjacente à unidade possui também uma
regularidade, e que os elementos do enunciado não apenas são convocados pelo verbo, mas o
delimitam em seus modos de funcionamento, havendo uma mútua influência de comportamento
entre os elementos que compõem os enunciados. Assim, os chamados valores verbais não
pertencem isoladamente ao verbo, sendo estabilizados pelo jogo da atividade de linguagem. Como
objetivos específicos, por meio de manipulações capazes de evidenciar limites e especificidades
semânticas próprias à unidade, propomo-nos a apresentar uma hipótese capaz de identificá-la
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independentemente da variedade de usos, bem como a fornecer uma primeira sistematização de seus
modos de funcionamento enunciativo.
DA DIVERSIDADE DE VALORES À INVARIÂNCIA: UMA ANÁLISE ENUNCIATIVA
DA UNIDADE NEM
Waldemar Duarte de Alencar Neto – IFPI
Este trabalho tem por objetivo analisar os diferentes empregos da unidade nem, observando o seu
papel no processo de construção da significação do enunciado. Para isso, buscamos compreender as
operações e os mecanismos de construção enunciativa subjacentes ao uso dessa marca. Nesse
sentido e com base na abordagem teórica, partimos da ideia de que existe um quadro de invariância
que permite a variedade de funções assumida pelo nem nos diferentes enunciados em que aparece,
ou seja, existem, nos marcadores linguísticos, valores invariantes que podem sofrer ajustamentos,
conforme a significação que é construída em cada enunciado. Esta pesquisa se apoia na Teoria das
Operações Predicativas e Enunciativas, do linguista Antoine Culioli, e nos trabalhos desenvolvidos
nessa linha teórica por Franckel (1998), Vogué (1992), Valentim (1998), Lima (1997) e Rezende
(2003). Essa proposta enunciativa evidencia a questão da significação dos enunciados, tomando
como ponto de partida a sua construção e reconstrução. Essa análise é possível a partir da
manipulação de enunciados por meio de glosas linguísticas, ou seja, ao manipularmos um
enunciado que traz o nem, montamos e desmontamos valores e significados, e chegamos, assim, aos
mecanismos de linguagem subjacentes ao uso da marca em questão. Para essa análise de
construções de sentido, buscamos algumas ocorrências dessa unidade, levando em conta, segundo a
teoria em que nos apoiamos, que o valor atribuído a uma expressão linguística não é fixo, estável,
como vemos nas abordagens tradicionais, mas sim construído no e pelo enunciado. Dessa forma,
através da diversidade de valores associados ao nem, observamos que essa marca, impulsionada por
esses valores, relaciona propriedades que, de alguma forma, passaram pelo interior do domínio
nocional, mas que acabaram se situando no exterior desse domínio. No nível enunciativo, essa
relação e a (re) definição de valores pôde ser melhor compreendida quando analisamos as categorias
gramaticais, especialmente, os valores modais, de tempo e de aspecto, bem como as operações de
determinação e suas as implicações na construção do enunciado.
A GRAMATICALIZAÇÃO DO ITEM LINGUÍSTICO MESMO: ALGUMAS
CONSIDERAÇÕES SOBRE SUA MULTIFUNCIONALIDADE
Aline da Silva Santos – UEFS
Rosiane Silva de Almeida – UEFS
Josane Moreira de Oliveira – UEFS
Este trabalho apresenta discussões sobre o processo de gramaticalização do item mesmo. Nosso
objetivo central é analisar o estatuto do item mesmo no português culto falado em Feira de SantanaBA, por meio de uma amostra constituída de seis entrevistas, contendo apenas informantes de nível
superior, os quais fazem parte do banco de dados orais do projeto “A Língua Portuguesa no
Semiárido Baiano”. Além disso, pretende-se investigar os deslizamentos funcionais do item mesmo,
bem como suas concepções registradas em gramáticas e dicionários. A gramaticalização é
considerada como um processo de mudança linguística pelo qual itens ou construções lexicais
tornam-se gramaticais ou itens e construções já gramaticais tornam-se ainda mais gramaticais. Para
a análise e interpretação dos dados desta pesquisa, tomamos como base, portanto, a
Gramaticalização (HEINE, CLAUDI & HÜNNENMEYER, 1991), abordagem baseada no uso, que
se preocupa em descrever os mecanismos de mudança que propulsionam os empregos mais
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gramaticais dos termos da língua, através de uma progressão unidirecional que fomenta a mudança
em diversos aspectos linguísticos, tais como a frequência de uso, a produção fonêmica, a função do
termo dentro da estrutura linguística e seu significado. O item mesmo caracteriza-se por sua
multifuncionalidade, ainda que a tradição gramatical se preocupe em apresentá-lo apenas na
categoria de pronome demonstrativo ou como palavra denotativa, na categoria dos advérbios. No
corpus analisado, encontramos o item em diferentes contextos discursivos, funcionando como
substantivo, adjetivo, advérbio, pronome e conjunção. Essa multifuncionalidade do item mesmo já
foi atestada no trabalho de Santos (2009), que investiga o item em diferentes sincronias. Assim,
apresentaremos neste trabalho diferentes funções assumidas pelo item mesmo, com vistas a abordálo tanto do ponto de vista sintático quanto semântico, observando a propriedade do item no que diz
respeito ao seu valor referencial, pois atua também como um elemento fórico, podendo fazer alusão,
no discurso, a um componente anteriormente citado (anáfora) ou que ainda será citado (catáfora).
ESTUDO DO PROCESSO DE EXPANSÃO GRAMATICAL E LEXICAL DO ITEM
BOTAR NA LÍNGUA PORTUGUESA
Juliana Geórgia Gonçalves De Araújo – UFC
O presente trabalho demonstra alguns resultados de uma investigação acerca do processo de
expansão gramatical e lexical do item verbal botar na língua portuguesa na perspectiva do
Funcionalismo Linguístico. Pretendemos com essa pesquisa: (i) verificar a frequência dos usos
abstratos das formas verbais em estudo, relacionando-os à expansão do processo de
gramaticalização e lexicalização; (ii) identificar e descrever as categorias verbais resultantes do
processo de expansão gramatical; (iii) mostrar as características sintático-semânticas que botar
assume ao se integrar a um elemento não-verbal e os níveis dessa integração, relacionando esses
níveis à gramaticalização dos itens verbais e à lexicalização das construções às quais esses verbos
fazem parte. Por entendermos a língua como sistema maleável, capaz de ser moldado de acordo
com os propósitos comunicativos envolvidos num dado espaço discursivo, adotamos, para fins de
desenvolvimento desta pesquisa, a perspectiva funcionalista da linguagem. Consideramos ainda em
nosso trabalho o fenômeno de gramaticalização (HEINEet alii, 1991) como um processo de
transferência de itens lexicais à categoria de elementos gramaticais ou como um fenômeno de
mudança de itens menos gramaticais a itens mais gramaticais. As formas linguísticas passam por
esse processo de acordo com as necessidades de uso da língua, por isso, é possível vincular o estudo
da gramaticalização à concepção funcionalista de linguagem. Para o tratamento do fenômeno da
lexicalização em nossa pesquisa, adotamos a propostas de Lehmann (2002) e de Brinton e Traugott
(2002). Como se trata de um trabalho de base funcionalista e que, portanto, prioriza a investigação
da linguagem em uso, a amostra de dados coletados para nossa pesquisa pertence aos projetos
NORPOFORT - Norma popular oral de Fortaleza e VARPORT- Projeto de Intercâmbio Binacional
Análise de Variedades do Português. Fizemos uma análise qualitativa e quantitativa dos dados. Para
a análise quantitativa, utilizamos o programa SPSS For Windows 17.0.
ARTICULADORES ARGUMENTATIVOS: UM ESTUDO ACERCA DA CATÁFORA NAS
PROPAGANDAS DE 1937 E DE 2012 EM JORNAIS DE UBERABA, MINAS GERAIS
Thamiris Abrão Borralho – UFU
Juliana Bertucci Barbosa – UFTM
O texto é uma manifestação verbal significativa em que os elementos linguísticos ficam
estrategicamente concatenados para articular ideias, argumentos, frases durante a interação verbal.
Ele é produzido dentro de uma lógica informacional entre o dado e o novo para fins comunicativos.
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Comporta-se como um processo e não como um produto, haja vista que quem o produz tem
intenções de se comunicar com quem o lerá, dessa forma, exige-se também que o leitor interaja
nesse processo para tentar depreender o que o autor quis informar com o texto; sendo assim, o texto
se estabelece semanticamente por meio da tríade: produtor, texto e leitor. Visando a analisar a
composição do texto, diversas pesquisas atuais têm direcionado o olhar para o estudo da
referenciação, especialmente o que se refere ao uso de remissões anafóricas, seja por meio de
definição e ou de caracterização quanto ao seu uso em diferentes práticas textuais e discursivas. Na
contramão dessa perspectiva, busca-se, neste estudo, analisar as catáforas como articuladores
argumentativos em propagandas de jornais impressos, compreendendo como as catáforas foram
utilizadas em 1937 e em 2012; apontando semelhanças e dissemelhanças entre as duas sincronias;
para assim reconhecer algumas atualizações em relação ao uso desse recurso remissivo
especialmente no tocante à gramática normativa e a direção argumentativa. Para tanto, utiliza-se,
comparativamente, jornais de Uberaba, Minas Gerais, de 1937, o Lavoura e Comercio, e de 2012, o
Jornal da Manhã. Para compor o corpus, optou pelo uso do suporte textual “jornal”, pois ele é
composto por gêneros diferenciados em sua própria estrutura, como a notícia, as cartas do leitor, as
notas sociais, dentre outros: a propaganda, objeto de análise deste estudo. Além disso, o jornal tem
uma linguagem essencialmente acessível devido ao fato de ter que ser lido por diferentes tipos de
leitores. Para compor o arcabouço teórico, reportam-se as teorias abordadas na Linguística Textual,
principalmente aquelas especificadas por Mondada & Dubois (2003), Koch (1997) e Marcuschi
(2002).
PROPOSTA DE CATEGORIZAÇÃO DO QUADRO PREPOSICIONAL COMO FRUTO
DE UMA GRAMATICALIZAÇÃO INTERCLASSE E INTRACLASSE, COM BASE EM
UMA ESCALA DE GRAMATICALIDADE CALCADA NA DISPUTA LÉXICOGRAMATICAL DE EXPRESSÃO DAS CATEGORIAS LINGUÍSTICAS
Kilpatrick Müller Bernardo Campelo – FUFPI
Um princípio geral de uma concepção sociocognitiva de formação dos sistemas linguísticos naturais
é de que a expressão das categorias provém da abstratização da codificação de experiências
sensoriais e corporais, por meio de operações metafóricas e metonímicas. A codificação mais
concreta, originariamente, provém do léxico, o qual, a depender do tipo linguístico, gramaticaliza-se
para compor formativos de caráter flexional e derivacional para expressão das categorias. Para a
formação da classe relacional preposicional, concorre uma progressiva perda de nominalidade,
entendida como um feixe de categorias geratrizes. Essa perda de expressão de nominalidade
contribui para a formação das classes mais abstratas da língua emeixos interclasse e intraclasse, os
quais representam, respectivamente, uma gramaticalização vertical e uma horizontal. A
gramaticalização vertical sucede com a perda das categorias gramaticais dos itens das classes mais
gramaticais. As preposições representam o último estágio de gramaticalização interclasse antes do
ingresso na sintaxe intralexical. A gramaticalização horizontal sucede com a correspondência de
itens lexicais otimizadores dos traços categoriais de cada macroclasse, classe e subclasse. Assim,
para os nomes, as proformas nominais; para os verbos, as proformas verbais; para os advérbios, as
proformas adverbiais; para os elementos relacionais (conjunções e preposições), as proformas
relacionais. As preposições apresentam um continuum de gramaticalização intraclasse com a
disputa léxico-gramatical de formas mais concretas e emergentes do léxico com formas mais
gramaticalizadas de história mais longeva no sistema da língua.
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REFERENCIAÇÃO, ENCAPSULAMENTO ANAFÓRICO E CONSTRUÇÃO DE
SENTIDO
Cinthya Torres Melo – UFPE
Este trabalho apresenta uma abordagem teórica do encapsulamento anafórico a partir de
perspectivas sociopragmática e sociocognitiva com base em modelos de inferenciação estudados
nos escopos dos processos de textualização e que indicam acessos de construção de sentidos. A
referenciação estuda o encapsulamento anafórico como uma estratégia textual-discursiva na qual o
sintagma nominal encapsulador ocorre por meio de um pronome demonstrativo + um nome núcleo
que pode ter um valor axiológico (CONTE, 2003). A abordagem que se faz aqui é a de que a
escolha lexical registrada no sintagma nominal encapsulador ocorre por uma equivalência de
sentido construída por inferências diversas. Sendo assim, o sentido construído pelo sintagma
nominal apresenta-se um ponto de vista; um modo pelo qual compreendemos algo; uma
possibilidade de interpretação que se estabelece por um caminho inferencial constituído por uma
interação socialmente situada. A metodologia usada foi de caráter qualitativo/interpretativo, com
base em análises de exemplos extraídos de autores do referencial teórico utilizado, tais como Melo
(2008), Conte, (2003), Francis (2003), Marcuschi (2000; 2003; 2004), Koch e Cunha-Lima (2004),
Koch (2005), Sperber e Wilson (1986), Barsalou (1992) entre outros, nas perspectivas do acesso ao
sentido construído por 3 caminhos inferenciais: 1) Inferências por evidências lógico-analíticas; 2)
Inferências por evidências pragmático-cognitivas; e 3) Inferências por evidências sociocognitivas.
As análises mostraram que a construção de sentido no uso do encapsulamento anafórico é resultante
da união da uma série de outras ações conjuntas que envolvem um contínuo de inferências que
variam na aproximação ou no distanciamento entre o que está escrito na porção anaforizada do
texto e o sintagma encapsulador. Também indicam que o nome núcleo é o responsável por
evidenciar o ponto de vista do autor do texto de forma a manter o tópico discursivo ou alterá-lo
axiologicamente monitorando a compreensão do leitor para a categorização ou recategorização de
sentidos no texto.
O USO DA VÍRGULA COM ORAÇÕES CAUSAIS E EXPLICATIVAS
Eliane Mourão – UFOP
O trabalho consiste em um estudo do uso da vírgula com as orações tradicionalmente classificadas
como coordenadas explicativas e subordinadas adverbiais causais. Questionamos os critérios
fornecidos pela gramática tradicional para diferenciar essas orações e, portanto, os critérios que ela
estabelece para o uso da vírgula em ambientes nos quais essas orações ocorrem. Fundamentandonos no quadro da gramática funcional, particularmente em Halliday (2004), suspendemos as
diferenças postuladas pela gramática tradicional a fim de examinar essas orações do ponto de vista
da constituição das estruturas temática e informacional do português. Referenciamo-nos no trabalho
“As construções causais”, em que Neves (1999) mostra que no português falado culto as orações
causais antepostas são tema e as pospostas são rema da oração a que se subordinam. Tomamos
como corpus de investigação três volumes da revista Piauí e cinco volumes da revista Veja, de que
levantamos um total de 141 dados de orações causais e explicativas. Esses dados foram analisados
tanto qualitativa como quantitativamente, conforme as seguintes variáveis: presença de vírgula (sim
ou não); elemento conector ou transpositor (“pois”, “porque”, desinência de infinitivo etc.); posição
da oração (anteposta ou posposta ao verbo da oração a que se subordina ou a que se coordena);
participação da oração na constituição de uma estrutura temática (como tema, como rema ou como
tema + rema); participação da oração na constituição de uma estrutura informacional (como
informação dada, como informação nova ou como informação dada + nova). Nossa análise
forneceu-nos três padrões de emprego da vírgula: 1) presença de vírgula/ transpositor “como”/
oração anteposta, atuando como tema e como informação dada; 2) ausência de vírgula/ transpositor
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“porque”/ oração posposta, atuando como rema e como informação nova; 3) presença de vírgula/
conector “pois”/ oração posposta, atuando como tema + rema e como informação dada +
informação nova. Esses padrões sugerem que, diferentemente do que indica a gramática tradicional,
o emprego da vírgula no português escrito culto não está condicionado a fatores eminentemente
sintáticos. Com respeito às construções que investigamos, os componentes sintáticos da oração
determinam a presença da vírgula apenas indiretamente, à medida que assumem funções textuais,
ou seja, à medida que participam da estruturação das orações da língua como mensagens.
INTERJEIÇÃO: DOMÍNIOS E PARÂMETROS PARA ANÁLISE
Geovane Fernandes Caixeta – UNIPAM
A evolução dos estudos lingüísticos, desde a Antigüidade, com a noção de categoria, à
modernidade, com a valorização da noção de discurso, acarreta mudanças de visões acerca de
objetos de estudos – não seria normal se conceitos e modos de analisar um fenômeno, qualquer que
seja ele, não se alterassem na linha do tempo. O que não podia ser categorizado, explicável, ficava à
margem — e essa marginalização coube, com destaque, ao Fenômeno Interjeição. O presente
trabalho focaliza o Fenômeno Interjeição no português brasileiro. Há anos esse Fenômeno vem
sendo considerado, de acordo com compêndios gramaticais e com dicionários, uma das partes
orationis. A proposta de se considerar a Interjeição uma classe de palavras representa um acordo
tácito que apaga a natureza viva e e(a)fetiva de um fenômeno particularizante do falante em suas
(inter)locuções. Partindo-se da localização histórica (do problema) do Fenômeno Interjeição acerca
de sua posição final no continuum das partes orationis — posição essa que representa o limbo em
que se encontram os gritos “subitâneos da alma” —, objetiva-se demonstrar, numa perspectiva
funcional-discursiva, que o Fenômeno Interjeição é uma manifestação de caráter
emotivo/expressivo presentificada atitudinalmente pelo falante diante de seu interlocutor, da
situação e da mensagem. A relação do falante com esses diferentes “objetos”, denominada de Rede
Interjectiva, pode ser medida em uma escala de maior envolvimento, menor envolvimento. Para a
concretização desse objetivo, analisam-se manifestações interjectivas em gêneros diversos, como
conversação espontânea, entrevista e carta pessoal. Como critérios de análise, estabeleceram-se o
domínio lingúistico com os parâmetros configurações fônica e linguística e o domínio textualdiscursivo com os parâmetros autonomia comunicativa e preenchimento de afetividade. Os traços
definidores do Fenômeno Interjeição, identificados em função da análise empreendida, apontam
para o fato de que a noção de prototipicidade das manifestações interjectivas está ligada ao grau de
envolvimento expressivo do falante ou com todos os objetos da Rede Interjectiva [manifestações
mais prototípicas] ou com alguns objetos [manifestações menos prototípicas], em situações de
interlocução. O Fenômeno Interjeição é uma marca da expressividade e do envolvimento do falante
na enunciação, o que significa dizer que esse Fenômeno confere às trocas comunicacionais uma
coloração emocional e atitudinal do sujeito falante.
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SIMPÓSIO 29
ENSINO DE LITERATURA E FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO
É indiscutível a importância do texto literário para o desenvolvimento crítico e humano do leitor.
Nesse sentido, Candido ressalta o papel humanizador da literatura e o seu poder como instrumento
de instrução e de educação. Todorov diz que por ser mais densa e mais eloquente que a vida
cotidiana, a literatura permite que cada um responda melhor a sua vocação de ser humano, mas
problematiza o modo como a literatura tem sido “ensinada” aos jovens e alerta para o perigo de a
escola oferecê-la a esse jovem muito mais como uma “matéria escolar”, uma disciplina e afastá-lo
da leitura dos textos literários proporiamente ditos. Entre os documentos oficiais sobre o ensino no
Brasil, a LDB, em seu artigo 35, reforça a importância do aspecto humanizador na formação ética e
intelectual do educando. Eco destaca na literatura a sua função de “manter em exercício, acima de
tudo, a língua como patrimônio coletivo” e de contribuir para reforçar-lhe a identidade. O propósito
desse simpósio é, então, congregar pesquisadores que reflitam e investiguem sobre o modo como a
escola tem tratado a leitura literária; o ensino da literatura voltado para o texto literário em si ou em
uma abordagem disciplinarizada; os desafios e as possibilidades na formação do leitor literário na
escola; o papel da poesia na sala de aula; a atuação do professor como leitor e como mediador da
leitura literário; a dicotomia entre o texto literário e os veículos de comunicação de massa; as
escolhas de leitura literária feitas pelos alunos; o texto literário e o acesso ao conhecimento na
dimensão estética, ética, histórica, ideológica, social, existencial; a contribuição da literatura para
formar a identidade cultural e linguística do aluno.
COORDENAÇÃO
Célia Sebastiana Silva
Universidade Federal de Goiás
[email protected]
Vivianne Fleury de Faria
Universidade Federal de Goiás
[email protected]
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IMAGENS DA LEITURA DE ALUNOS E PROFESSORES DE ESCOLAS PÚBLICAS
Elsa Maria Mendes Pessoa Pullin – UEL-PR
Marilda Aparecida Behrens – PUC-PR
Romilda Teodora Ens – PUC-PR
Entendemos a leitura como uma prática cultural, encarnada em gestos, espaços e hábitos
(CHARTIER, 1988/1991), produzida nas/pelas relações entre grupos humanos, em tempos e
espaços sociais específicos (VÓLVIO, 2010), sendo que essas regulam as condições de acesso a
materiais, gestos, modos de ler e valorizar a leitura em função de significações compartilhadas pelas
ações comunicativas que nelas ocorrem as quais definem sua prática, por exemplo, de professores e
alunos de escolas públicas, este trabalho teve por objetivo desvelar as imagens de leitura de
professores (n=15) e de alunos (n=111), de duas escolas públicas da rede estadual do último ano do
Ensino Fundamental a partir dos sentidos de suas respostas aos questionários e testes de associação
de palavras usados na coleta de dados. Tendo por suporte a Teoria das Representações Sociais
(MOSCOVICI, 1961/2012), o trabalho foi desenvolvido ao abrigo da Teoria do Núcleo Central
(ABRIC, 1994). O exame documental dos três principais discursos oficiais da Secretaria de
Educação do Estado do Paraná que intentam regular o Ensino Fundamental (Educação Básica e a
Opção pelo Currículo Disciplinar; Diretrizes Curriculares para a Língua Portuguesa, Caderno de
Expectativas para a Aprendizagem) foi realizado. Análises das representações sociais sobre leitura
foram realizadas com auxílio do software “Ensemble de Programmes Permettant L’ Analyse des
Evocations”, EVOC (VERGÈS, 1999) e os resultados submetidos à análise de similitude
(Rousseau, 2003), bem como internamente triangulados com as informações recolhidas pelos
questionários, procurando-se tecer as significações mais importantes. De modo geral,
independentemente de como professores e alunos se autoavaliaram como leitores, os sentidos da
leitura inferidos a partir das suas respostas delinearam imagens que se distanciam das atividades em
que o leitor se implica com o que lê, visto circunscreverem-se à produção da leitura como meio para
a obtenção de informações, conhecimento, aprendizagem e, ocasionalmente, como fonte de prazer.
Considerações são apresentadas tendo por foco possíveis efeitos das políticas públicas estaduais que
regulam a oferta da disciplina Língua Portuguesa para as séries finais do Ensino Fundamental. Bem
como, inferimos um desafio que Instituições de Ensino Superior, principalmente as responsáveis
por cursos de formação de professores precisam enfrentar. Como preparar os professores para que
em seu trabalho possam com competência ler criticamente os discursos oficiais e os demais,
inclusive os pronunciados por seus alunos, e não sentir desalento?
LETRAMENTO LITERÁRIO: O PROFESSOR, A AULA, O TEXTO E A FORMAÇÃO DO
LEITOR
Raquel Barros Pinto – UFT
Vilma Nunes da Silva Fonseca – UFT
Esta comunicação apresenta resultados parciais e discussões do Projeto de Pesquisa ‘Analisando o
gênero aula com enfoque no processo formativo do professor de literatura e na formação do leitor
literário’ (Nº de Protocolo: AG4#009/2010), Universidade Federal do Tocantins/PROPESQ. Ela,
objetiva destacar os aspectos estruturadores do processo formativo do professor de língua materna e
literatura, no âmbito da educação básica, de instituições públicas da rede escolar da cidade de
Araguaína –TO, com vistas na caracterização da sua performance educacional e prática pedagógica,
tendo a aula como objeto de análise do estudo. Através da verticalização da temática, a proposta
detém-se também a discutir as estratégias aplicadas para a abordagem e exploração do texto
literário, a observação e o registro dos eventos de escrita e reescrita textual, relacionados às
imbricações relativas à formação do leitor literário. Para delinear o papel do professor e
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compreender o seu processo formativo, assim como a sua atuação na formação de leitores críticos e
a necessidade emergente de uma educação para a leitura, tendo a literária como recorte, optou-se
pela modalidade de pesquisa qualitativa, pois os seus procedimentos atendem as prioridades do
estudo. Para avançar no tema e teorizar a problemática, compreendendo a aula de literatura,
enquanto gênero textual e instância discursiva que congrega em si a presença de outros gêneros para
se constituir (aqui cenário da interação entre interlocutores, propiciado através do contato com
textos literários, obras e autores), partiu-se dos pressupostos teóricos estabelecidos por Bakhtin
(1992) e Marcuschi (2008). No tocante à leitura literária, à função da literatura, sua concepção e
ensino, recorreu-se a Candido (2006), Compagnon (2006), Cosson (2009), Todorov (2010), Barthes
(1988) e Benjamin (1994).
PROJETOS DE LEITURA DE GÊNEROS LITERÁRIOS E FORMAÇÃO DO LEITOR NA
ESCOLA BÁSICA
Milene Bazarim – UNICAMP
Nesta comunicação, apresento os resultados de uma pesquisa realizada no campo aplicado de
estudos da linguagem com o objetivo de verificar quais os discursos sobre letramento literário e
quais atividades foram desenvolvidas em sala de aula em três projetos de leitura de gêneros
literários. Esses projetos (Hora da Leitura – uma iniciativa do governo estadual de São Paulo –,
Lygia Bojunga em minha sala de aula e (Re)visitando os contos de fadas e as fábulas – iniciativas
da professora das turmas) foram criados a partir das/e para suprir algumas necessidades de
aprendizagem de alunos de 6º e 7º anos do Ensino Fundamental aferidas através de exames
institucionais (SARESP) e de avaliação diagnóstica feita pela própria professora. Apesar de serem
iniciativas tomadas em instâncias diferentes, em momentos diferentes, esses projetos, ao mesmo
tempo em que compartilham alguns discursos em relação ao ensino da leitura literária, divergem em
relação a outros. Todos aderem ao fato de que os alunos pouco lêem ou não lêem gêneros literários,
tornando necessários projetos específicos para a formação de leitores de literatura; mas nem todos
concordam que essa formação tenha que ser feita em outro espaço que não o das aulas de Língua
Portuguesa. As análises mostram que, em sala de aula, a condução dos projetos, feita pela mesma
professora, culminou em atividades muito semelhantes, nas quais vários discursos também estão em
tensão. As análises mostram também que há uma sobreposição, pois se, por um lado, o foco das
atividades foi, de fato, as estratégias de leitura; por outro, tais estratégias (localizaçao de
informação, inferência, levantamento de hipóteses, auto-regulação) são aquelas que devem ser
utilizadas independentemente do gênero. Foi possível perceber ainda que, mesmo trazendo em sua
fundamentação teórica um discurso sobre a leitura como prática social, como fruição estética etc.,
nas atividades realizadas em sala de aula, esses projetos reiteram a concepção de leitura como um
processo predominantemente cognitivo.
LER ESTE LIVRO E NÃO AQUELE: A FORMAÇÃO DE LEITORES E AS
DIFICULDADES DA PRÁTICA DE LEITURA NA VIDA E NA ESCOLA
Cloves da Silva Junior – UEG/UnU Jussara
O processo de ensino/aprendizagem da prática de leitura e suas consequências nas escolas é uma
discussão ampla. Vislumbrando essa situação, esta pesquisa tem por escopo, a priori, traçar um
panorama da constituição da leitura no Brasil a partir da chegada dos viajantes europeus ao Brasil,
bem como o desenvolvimento e amadurecimento do conceito de leitura desenvolvido em terras
brasileiras a partir de conceitos pré-definidos pelos europeus. Além disso, são discutidos os pontos
cruciais para a aprendizagem de leitura a partir da obra Como um romance, do autor francês Daniel
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331
Pennac (1993), que comenta os rumos do ensino de leitura nas escolas e sugere caminhos para a
resolução dos entraves que assombram a cada dia os professores e a sociedade em geral. A leitura
não pode ser associada, restritamente, à decodificação da escrita, e geralmente é esta a imagem que
está arraigada na cultura da sociedade brasileira. Desse modo, “[...] o espaço da literatura tornou-se
mais escasso em nossa sociedade há uma geração: nas escolas, onde os textos didáticos a corroem,
ou já a devoram; na imprensa, que atravessa também ela mesma uma crise, funesta talvez, e onde as
páginas literárias se estiolam; nos lares, onde a aceleração digital fragmenta o tempo disponível
para os livros. Tanto que a transposição entre a literatura infantil e a leitura adolescente, julgada
entediante porque requer longos momentos de solidão imóvel, não mais está assegurada”
(COMPAGNON, 2009, p. 21-22). Logo, faz-se necessário empreender esforços para que se chegue
a possíveis soluções para esse problema que assola o país como um todo, vislumbrando,
principalmente, o caráter humanizador da literatura, que permite ao homem refletir sobre sua
existência e seus atos em um mundo livre das imposições e ideologias sociais. Para a teorização do
assunto, serão discutidos os textos de Compagnon (2009); Kleiman (2001); Lajolo & Zilberman
(1996); Marinho (2001); Martins (1994); e Zilberman (1985). O intuito dessa proposta é contribuir
para que a leitura deixe seu estereótipo redentor e sacralizador, passando a ser tomada como uma
prática libertária, de forma que o leitor tenha direito de escolha.
O (DES)ENSINO DE LITERATURA NO ENSINO MÉDIO: LETRAMENTO LITERÁRIO
E MEDIAÇÕES DOS LIVROS DIDÁTICOS CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Bonfim Queiroz Lima Pereira – UFT
Nas últimas décadas do século passado, houve uma transformação na maneira de se compreender a
leitura e a escrita. A linguagem passou a ser vista como um processo dinâmico e o letramento
começou a ser dicutido no cenário educacional brasileiro. Ao conceber letramento como conjunto
de práticas sociais que usam a escrita como sistema simbólico, para finalidades específicas e para
contextos específicos, percebe-se que este conceito pode ser utilizado no campo dos estudos
literários quando se compreende a escrita dentro das especificidades do texto literário. Com relação
aos usos sociais da escrita literária, considera-se que esses são mais visivelmente observados no
espaço escolar com estudos que revelam que a falta de compreensão do texto literário pelos
discentes, pode ser causada pela própria organização do ensino de literatura, que leva a escola a
uma postura tradicionalmente prescritiva do significado dos textos, ou seja, o texto deve significar
aquilo que o crítico, o livro didático e o professor afirmam sobre ele. O ensino de literatura que se
desenvolve hoje nas escolas está aquém do desejado por muitos professores, literatos e até dos
próprios alunos. Pois o que se ensina na maioria destas aulas é a teoria literária, a gramática, a
história da literatura através das tão estudadas “escolas literárias”. O que agrava ainda mais a
situação é que, na maioria das vezes, o aprendizado literário na escola fica restrito ao livro didático,
que, para muitos alunos, é o único meio de acesso ao letramento. Acredita-se, no entanto, que a
literatura pode ser veículo de conhecimento e formação, desde que este não seja o seu fim e sim
uma de suas possibilidades. No Ensino Médio a responsabilidade de ensinar literatura é
significativa, já que esses três últimos anos na escola são decisivos para a formação do gosto
literário. Uma vez que o aluno sai da escola não gostando de leitura literária, dificilmente ele levará
essa prática para sua vida social. Como vimos, a escola é um dos principais meios onde se efetuam
as práticas de letramento literário e o livro didático, que, muitas vezes, é o único recurso utilizado
pelo professor, é a principal via de acesso dos alunos ao mundo da literatura. Faz-se necessária,
portanto, uma pesquisa aprofundada sobre o ensino da literatura no Ensino Médio e dos livros
didáticos adotados e disponíveis para seleção pelo Programa Nacional do Livro Didático –PNLD –
para que se tenha uma real dimensão de como se desenvolve nas escolas e nos livros didáticos a
prática de letramento literário. O Trabalho a ser apresentado está em andamento e objetiva levantar
e compreender as práticas e as orientações de letramento literário, no âmbito escolar, de estudantes
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de Ensino Médio do município de Xinguara-Pará, investigar a presença do texto literário em Livros
Didáticos de Língua Portuguesa do Terceiro ano do Ensino Médio e sua influência no processo de
formação do leitor, avaliando se os exercícios de compreensão leitora do texto literário exploram
aspectos mais complexos ou se limitam ao processo de identificação de técnicas e características de
um estilo de época. Após observação do fazer docente, entrevistas com aluno e professores, coleta e
análise de dados dos livros didáticos, pretende-se ter uma real visão do quadro de ensino de
literatura neste município, podendo tomá-lo como ponto de partida para elaboração de propostas de
melhorias para o letramento literário no âmbito escolar.
LITERATURA NA ESCOLA: CONVERGÊNCIA DE GÊNEROS E LINGUAGENS
Maria de Fátima Cruvinel – CEPAE/UFG
O estudo da língua materna determinado pela abordagem discursiva da linguagem recolocou a
literatura no currículo escolar da educação básica, situando-a no plano de outros gêneros
discursivos. Longe de diminuir sua importância no âmbito das práticas pedagógicas, esse tratamento
dispensado à literatura aproximou-a do leitor, na medida em que diversificou os textos dados a ler,
alargando o cânone e desmitificando o discurso literário de épocas e estéticas predeterminadas
como modelo absoluto da língua a ser ensinada. Mantido na escola como parte constitutiva do
programa de língua portuguesa, o gênero literário reafirma-se como bem cultural capaz de mobilizar
o leitor para a percepção tanto da língua quanto do mundo nomeado por ela. Manifestação de
linguagem marcadamente subjetiva, a literatura carrega em sua natureza traços que, somados,
culminam numa função essencialmente humanizadora e dialógica, especialmente se considerados
autor e leitor como sujeitos da construção dos sentidos. Essas são razões suficientes para manter o
texto literário na escola, espaço privilegiado para a promoção da leitura desse gênero, uma vez que
é ainda massiva a quantidade de crianças e jovens sem acesso a livros e práticas leitoras. Contudo,
considerando que os jovens de hoje estão cada vez mais distanciados da palavra impressa e afeitos a
práticas digitais, uma possibilidade de mobilizá-los para a leitura é buscar o diálogo entre a
literatura e outras linguagens e gêneros. Afinal, o objetivo com a “pedagogização” da literatura, ou
seja, sua frequência na sala de aula é franquear ao aluno a experiência estética, buscando levar o
aluno-leitor a usufruir da função inequívoca desse gênero: a reflexão sobre a natureza humana
mediada pela linguagem, e, consequentemente, promover o letramento literário. Para ilustrar e
problematizar essas ideias, uma prática de leitura realizada com alunos do 7º ano do ensino
fundamental do Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação (CEPAE/UFG) é aqui
apresentada.
O CORTIÇO EM SALA DE AULA: ESTRATÉGIAS DE LEITURA PARA ALUNOS DO
ENSINO MÉDIO
Vivianne Fleury de Faria – CEPAE/UFG
Um dos clássicos da literatura brasileira, “O cortiço”, de Aluísio de Azevedo é uma das obras
indicadas para o vestibular da UFG/2013. Contudo, a recepção dos alunos a este romance
naturalista do século XIX nem sempre é satisfatória. O aluno de Ensino Médio do CEPAE – centro
de Ensino Aplicado à Educação da Universidade Federal de Goiás – em geral já tem um gosto
formado pela literatura e rejeita obras que considera fora de seu contexto histórico e social. Ainda
que não seja o objetivo maior do Ensino de Literatura o entretenimento dos alunos, o desafio para o
professor é o de fazer com que a leitura da obra literária seja ao mesmo tempo aprazível, para que
cative o leitor adolescente, e proveitosa, para que, além de contribuir para a um maior rendimento
na prova de literatura do vestibular da UFG, cumpra o papel maior da literatura, que é o de
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instrumento humanizador e de formação do caráter. Com este propósito, este trabalho descreve
algumas estratégias de introdução e de trabalho com a obra literária “O cortiço” com alunos do
Ensino médio do CEPAE – UFG no ano de 2012.
LETRAMENTO LITERÁRIO: UMA EXPERIÊNCIA DE LEITURA COM ALUNOS DO
ENSINO MÉDIO TÉCNICO
Lucielena Mendonça De Lima – UFG
Priscila Rodrigues Do Nascimento – IFG-Ceres
As Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006) aliama importância da literatura no Ensino
Médio à formação ética, intelectual e crítica do educando. Entretanto, a forma como a leitura
literária vem sendo abordada na escola regular e nas instituições de ensino médio técnico tem sido
baseada, segundo Bordini (1989, p. 9), na revisão de conteúdos históricos. Sendo assim, a formação
de leitores literários, nesse contexto, torna-se um desafio tanto para alunos quanto para professores.
Na tentativa de atingir a função da leitura literária discutidas nas Orientações Curriculares e
despertar a formação de leitores literários em um contexto de Ensino Médio Técnico, propusemos a
um grupo de alunos uma experiência literária com a leitura dos contos Negrinha”, de Monteiro
Lobato (1920) e “Eu, um homem correto”, de Murilo Carvalho (1977). Essa experiência pautou-se
nos pressupostos do Letramento literário que consiste na apropriação das informações do texto para
realizar práticas sociais, segundo Cosson (2006) e Zappone (2008); na técnica do protocolo verbal,
a qual segundo Tomich (2007) consiste em pausas cujo objetivo é levar o leitor a verbalizar suas
impressões sobre o texto e nas estratégias de leitura (SOLÉ, 1998; DUKE; PEARSON, 2002;
FILLOLA, 2004). Tendo esse último procedimento, a finalidade de aproximar os participantes do
texto literário e de facilitar a compreensão dos contos. Essa nossa experiênciapossibilitou-nos traçar
um perfil da concepção dos participantes em relação à prática da leitura literária na escola, uma vez
que consideraram o ato de ler importante. Argumentam que a leitura literária apresenta uma
linguagem difícil, por isso, a realizam pouco. Esse fato sugere que a formação do leitor requer
práticas de leituras literárias que inicialmente podem ser feitas com textos de linguagem simples e
curtos, para depois realizar leituras de textos mais complexos. O uso das estratégias de leitura
contribuiu para facilitar a compreensão dos textos. A técnica do protocolo verbal os encorajou a
dizer suas considerações sobre os contos, aliando-as às suas experiências pessoais. Além disso,
acreditamos que a temática do preconceito racial discutida nos contos despertou os alunos para
sensibilizá-los em relação a práticas sociais como defende as teorias que norteiam o letramento
literário.
LITERATURA, LEITURA E ENSINO: DESENCONTROS E ENCONTROS NO
PROCESSO DE FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO
Dalva Ramos de Resende Matos – UFMT
Sabe-se que a escola – principalmente na Educação Básica – reserva à literatura um papel errôneo
ao fazer desta, predominantemente, um instrumento de aperfeiçoamento linguístico, ou,
simplesmente, uma matéria escolar. Além disso, estudos em Ensino de Literatura apontam que isso,
geralmente, acontece porque, muitas vezes, os professores não têm a formação competente, não
leem os textos, não compram livros, não têm acesso a bens culturais como cinema e teatro. Somamse, a tudo isso, baixas remunerações, bibliotecas mal equipadas e estratégias de leitura
completamente equivocadas. Como formar estudantes leitores se grande parte dos professores não
tem a formação necessária e nem a própria prática da leitura literária? Para que a literatura não seja
apenas mais uma disciplina escolar e a leitura dos textos literários propriamente ditos ocorra, é
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necessário, dentre outros requisitos, que existam projetos de formação continuada do professor de
literatura nos cursos de graduação, especialização, aperfeiçoamento e extensão. Com isso, espera-se
que ele adquira uma boa fundamentação teórica e metodológica, além de conscientizá-lo da
importância de ser um professor-leitor, uma vez que ele é o maior responsável pela seleção da
grande quantidade de obras oferecidas pelos mercados editoriais e o principal mediador da leitura
literária junto aos jovens leitores. Como sugestão, esta comunicação pretende apresentar e discutir
um projeto de leitura voltado para a formação do professor como leitor e mediador do texto
literário, já que cabe, principalmente, a ele a função de proporcionar aos alunos um convívio
estimulante com a literatura, para que esta cumpra seu papel no desenvolvimento humano e crítico
do leitor. Dessa forma, pretende-se contribuir para a formação de leitores competentes, que sejam
capazes de perceber no texto literário bem mais que entretenimento e deleite, mas também uma
possibilidade de aprender, refletir, comparar, criticar, amadurecer, transformar(-se), compreender a
estética e a linguagem plurissignificativa desse tipo de arte.
POESIA, ENSINO E FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO
Célia Sebastiana Silva – CEPAE-UFG
Para McLuhan, a situação nova que se impõe ao jovem é a “sala de aula sem paredes” em que todo
o ambiente urbano torna-se agressivamente pedagógico. Na contramão desse contexto, a poesia
oferece-se ao professor e ao aluno como possibilidade transformadora. O presente trabalho pretende
discutir as possibilidades de transformação que a poesia oferece, sobretudo, considerando-se o seu
papel humanizador na formação do aluno, conforme afirma Candido, ao defender o direito à
literatura, bem como os entraves que promovem a resistência à leitura do texto poético. Pretende-se,
ainda, problematizar o papel da poesia na formação do leitor de texto literário, avaliando como a
sua na sala de aula pode ativar a autonomia do aluno leitor, estimulá-lo para o exercício crítico,
criativo e expressivo da linguagem, despertar-lhe a sensibilidade e potencializar nele o letramento
literário.
A UTILIDADE DO ENSINO DE LITERATURA EM FUNÇÃO DA (IN)UTILIDADE DA
LITERATURA NA SOCIEDADE DA RENTABILIDADE
Antônio Adailton Silva – UFT
Em sua obra “Literatura para quê?”, Antoine Compagnon, tratando da realidade francesa, afirma
que a universidade passa por um momento de hesitação com relação às virtudes da educação
generalista. Trata-se da questão que se coloca no contexto de uma sociedade cujos membros são
afeitos ao consumismo, e que buscam na educação uma condição capaz de lhes trazer rentabilidade
em um curto prazo. O objetivo do artigo é apresentar uma discussão sobre a tensão formada entre as
intenções manifestas de alunos do ensino médio de uma escola particular no município de
Araguaína, Estado do Tocantins, no que tange a suas escolhas por cursos de nível superior e o
trabalho de leitura literária desenvolvido na escola onde a pesquisa foi realizada. A análise toma
como base as afirmações de Compagnon, e a discussão, pautada no discurso de críticos que elogiam
a literatura por sua linguagem sofisticada (PERRONE-MOISÉS, 2001) e seu potencial humanizador
(TODOROV, 2009; CANDIDO, 2002), é feita sobre uma questão colocada a alunos de uma turma
de 3º ano do ensino médio. Tal discussão passa ainda pela trilha deixada por Aristóteles e seguida
por Horácio, para quem o poeta deveria combinar prazer com preceitos úteis à vida. O estudo
revelou que, no ano de 2010, nenhum dos alunos que responderam ao questionário da pesquisa
tinha a intenção de concorrer a vagas em cursos de graduação em Letras, enquanto 53,1% das
opções manifestadas nas suas respostas eram voltadas para Medicina, 8,2% para Direito e 24,5%
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para alguma das várias Engenharias, confirmando as afirmações de Compagnon sobre a tendência
da busca de uma carreira que, na atualidade, é mais promissora em termos de rentabilidade. Apesar
desses dados, verificou-se entre os participantes um significativo índice de leituras literárias
realizadas nos anos de 2009 e 2010, sendo que a escola pesquisada, a qual atende alunos a partir da
educação infantil, tem relevante responsabilidade por tais leituras, pois promove,
concomitantemente a um forte trabalho de preparação para o exame vestibular, um projeto de
leitura literária em todas as turmas.
ENSINO DE LITERATURA E FORMAÇÃO DE LEITORES EM MS: QUESTÕES EM
TORNO DO ENSINO DE LITERATURAS
Danglei de Castro Pereira – UEMS
A comunicação discute aspectos teóricos/metodológicos relacionados ao ensino de literatura em
Língua Portuguesa em escolas da rede estadual de ensino no município de Campo Grande/MS.
Apresenta resultados parciais do projeto de pesquisa “O ensino de literaturas em Língua portuguesa
em escolas de Campo Grande/MS”, desenvolvido com apoio financeiro do CNPq. A pesquisa tem
como principal foco verificar a situação do ensino de literaturas na Educação Básica em escolas
estaduais de Campo Grande/MS ao focalizar as seguintes questões: a) os alunos valorizam a
literatura?; b) o que professores, coordenadores e alunos conhecem de literaturas em Língua
Portuguesa e c) em que medida professores, alunos e coordenadores valorizam a leitura literária.
Nossa preocupação é comentar em que medida a presença de professores leitores gera(m) influência
na prática docente em sala de aula e, na medida do possível, investigar a situação do ensino de
literaturas em Língua Portuguesa nas escolas que compõe o corpus da pesquisa.
ENTRETECER E ENREDAR LEITORES NAS TEIAS DO TEXTO LITERÁRIO: UMA
NECESSIDADE
Sinéia M. T. Silveira – UNEB
Sonia M. T. Xavier – UNILESTE-MG
Em depoimentos sobre sua experiência discente no Ensino Médio, graduandos (do segundo semestre do
Curso de Letras Vernáculas, da Universidade do Estado da Bahia, e em Comunicação Social, primeiro
semestre, de uma universidade particular do Leste de Minas Gerais) refletem sobre o ensino de
Literatura. Resultados apontam a forma equivocada como é tratado o texto literário em sala de aula,
comprometendo o processo de fruição e prazer da leitura. O estudo sinaliza a necessidade de um ensino
de Literatura que propicie ao aluno condições de transitar os espaços da possibilidade de ultrapassar
fronteiras, de se emocionar com os escritores lidos, de conviver com diversas formas de linguagem. Ao
criar tais mecanismos, os envolvidos no processo estabelecerão uma ligação entre a matéria ensinada e a
vida cotidiana dos alunos. Com essa atuação, a leitura literária será um pólo atrativo para eles,
fornecendo-lhes as chaves para uma maior compreensão da sociedade contemporânea. Nessas
discussões, dialogamos com Aguiar e Bordini (1993), Bagno (1993), Bakhtin (1981), Chiappini (2001),
Geraldi (1999), Lajolo (1993), Martins (2004) e Solé (1998).
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LEITURAS LITERÁRIAS E LETRAMENTO: PERSPECTIVAS DE DIÁLOGOS EM
SALA DE AULA
Márcia Rejany Mendonça – UFT
Ouvimos, repetimos e frequentemente lemos em autores que discutem as funções e o ensino da
Literatura que o papel essencial de uma obra literária é o de “construir e reconstruir a palavra que
nos humaniza” e que a literatura é uma forma de compreensão do mundo. Efetivamente a literatura
contribui para desenvolvimento crítico e humano do leitor, pois nela há um aprendizado de caráter
subjetivo que, quando alcançado, auxilia significadamente no modo do leitor perceber e apreender o
mundo. Mas esse caráter subjetivo geralmente se perde quando, em sala de aula, a obra literária é
submetida a uma avaliação formal ou quando é utilizada para o conhecimento predominantemente
historiográfico. Sobre o aprendizado de caráter subjetivo, apontamos outro aspecto relevante. Tal
aprendizado, para ser alcançado, também depende do processo de formação do leitor, que ele tenha
desenvolvido competências e habilidades que o possibilite apreender o conhecimento contido no
texto literário. A essas dificuldades do ensino de Literatura somam-se outras. Quando nos
deparamos com a Literatura enquanto disciplina e com a responsabilidade de despertar o gosto e o
prazer no leitor por uma obra literária previamente determinada pelo currículo escolar, ficamos
atônitos na tentativa de encontrar uma saída para não despertar a rejeição pelos textos literários.
Podemos dizer que um dos fatores que contribui para que isso aconteça é que no curso de Letras,
geralmente, o discente analisa, pesquisa, interpreta profundamente obras literárias canônicas, mas,
geralmente, não trabalha com estratégias que possam viabilizar a aplicação de tais estudos, na
realidade de uma sala de aula. Considerando a Literatura como matéria educativa, o ambiente de
sala de aula, o modo de avaliar as leituras de obras literárias e o que se entende por Literatura criase um embate entre o prazer e a obrigação. Por isso, em sala de aula, o professor tem dificuldades
de encontrar um caminho para ensinar Literatura onde prazer, fruição e deleite que acreditamos
fazer parte do ato da leitura de uma narrativa, também estejam presentes, mesmo diante do caráter
da obrigatoriedade do qual ela se reveste dentro da sala de aula. Diante de tudo isso, o comentário
de que alunos não gostam de ler tornou-se recorrente na fala dos professores. Concordamos, porém
acrescentamos que eles não gostam de ler obras literárias que assumem o caráter da
obrigatoriedade, tendo em vista que, na biblioteca escolar, livros de romances vampirescos e de
ficção histórica são emprestados com frequência. Nesse sentido, o que pretendemos com este
trabalho é buscar possibilidades de diálogos entre as leituras solicitadas aos alunos pelo professor e
aquelas que os alunos realizam por “livre escolha”, numa tentativa de amenizar o caráter da
obrigatoriedade que se reveste a leitura de obras literárias no ambiente de sala de aula.
LEITURA DE POESIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA
Alexssandro Ribeiro Moura – UFG
Um dos problemas mais discutidos ultimamente no ensino de Língua Portuguesa tem sido como
trabalhar a literatura, e mais especificamente a poesia, no currículo do Ensino Médio, na educação
básica. A concepção de gêneros textuais, apresentada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais
(1998, 2001), aponta para uma abordagem interdiscursiva, valorizando a leitura e o aprendizado das
estruturas que constituem as diversas formas de produção textual (oral e escrita) utilizadas pelos
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principais domínios discursivos utilizados pelo cidadão em seu cotidiano. A Literatura, diante desse
contexto, é integrada à Língua Portuguesa (BAKHTIN, 2000, MARCUSCHI, 2002), o que pode
representar um avanço no trabalho com diversas linguagens, mas, ainda assim, há uma certa
dificuldade em se promover atividades que envolvam poesia, valorizando suas características
artísticas, sem transformá-la num discurso funcional. Buscamos, portanto, discutir como promover
atividades de leitura e produção textual, envolvendo poesia, outras artes e aspectos morfossintáticos
e semânticos da Língua Portuguesa presentes nesses textos. Devido às transformações sofridas pela
literatura no século XX, o conceito de gêneros literários dividido em épico, lírico e dramático ganha
dinamicidade e provoca um trânsito constante entre estilos de composição literária. Dessa forma, a
concepção de eu poético é reconfigurada e podemos acompanhar poemas que aliam subjetividade e
objetividade, verso e prosa, podendo se modalizar em textos híbridos, que representam situações
diversas de interação verbal, ora valorizando a norma-padrão da língua portuguesa, ora mostrando
as possibilidades de reconstrução de significado com variedades linguísticas que colocam em bom
lugar as variantes cultivadas em diferentes ambientes sócio-discursivos. Ao ler, interpretar e
compreender as imagens que se formam através da articulação poética, o aluno se torna mais apto a
perceber as relações de argumentação, pressupostos, intertextualidades e interdiscursividades
presentes na produção de qualquer gênero textual. Assim, o discente não precisa ser
necessariamente um escritor de poesia, e sim um leitor crítico, capaz de desvendar os sentidos do
texto, percebendo aspectos de coesão, coerência textual e demais fatores de textualidade. O
processo de letramento em língua portuguesa se enriquece com um ensino que valoriza a
criatividade artística e a possibilidade de movimentação de sequências tipológicas e enunciados de
diversas formações discursivas num texto que não é um pretexto para o ensino de uma disciplina,
mas, sobretudo, uma rede articulada de diversos saberes e conhecimentos.
LER PARA APRENDER LER – ESTRATÉGIAS PARA DESENVOLVER A
PROFICIÊNCIA LEITORA E FORMAR O LEITOR LITERÁRIO NOS ANOS INICIAIS
DO ENSINO FUNDAMENTAL
Yara Maria Miguel – SEE/SP
Dentre as inúmeras funções da escola a formação de alunos usuários plenos da linguagem escrita é
uma de suas principais atribuições. Nesse contexto destacamos a formação do leitor literário. A
literatura nos permite acessar diferentes realidades, modos de pensar o mundo, de vivê-lo em
profundidade e consciência, favorecendo o desenvolvimento daquilo que temos de mais precioso: a
nossa humanidade. Por sua vez, a formação do leitor proficiente e, principalmente, do leitor
literário, tem sido um dos principais desafios para as escolas que atuam, sobretudo, nos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental. O acesso sistemático aos materiais impressos é condição para o
desenvolvimento pleno da proficiência leitora, contudo, não suficiente. É preciso garantir, além
disso, que os alunos desenvolvam comportamentos, procedimentos e habilidades de leitura que os
tornem gradativamente leitores autônomos e cada vez mais competentes. O final da alfabetização
inicial, caracterizado pela aquisição do sistema de escrita e aprendizagem da leitura estabelece no
que se refere ao aprofundamento dos processos de alfabetização, novas exigências para o ensino,
entre as quais destacamos o trabalho com o desenvolvimento da fluência leitora. A fluência leitora
refere-se, em linhas gerais, a capacidade de ler com rapidez e compreensão, e isso tem um papel
importante na constituição do leitor. Este trabalho analisará propostas de ensino realizadas com
alunos de 3º ao 5º ano do Ensino Fundamental, em uma escola do município de Sarutaiá – Estado
de São Paulo – Brasil, que possibilitaram trabalhar simultaneamente com o desenvolvimento da
competência leitora e formação do leitor literário. Utilizou-se como estratégia didática a leitura
pública de textos literários: poemas, contos e textos teatrais. Com respeito ao desenvolvimento da
competência leitora constatamos significativos avanços dos alunos no decorrer do trabalho,
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principalmente, porque, a situação de aprendizagem cumpriu sua função de contribuir para a
formação do leitor literário.
PRÁTICAS DE LETRAMENTO LITERÁRIO NA FORMAÇÃO INICIAL DO
PROFESSOR: UMA EXPERIÊNCIA COM O PRODOCÊNCIA (CAPES/2010-2012)
Maria Aparecida Lopes Rossi – UFG/CAC
Selma Martines Peres – UFG/CAC
A Literatura, como ressalta Cândido (2004), é uma manifestação universal do homem, seja em que
tempo for. Assim, ela traz elementos essenciais para uma compreensão dialética da realidade, além
de se constituir em uma das práticas letradas mais valorizadas pela sociedade moderna. Nessa
perspectiva, inserir os alunos nas práticas letradas, valorizando as diferentes manifestações da
produção cultural, tem sido colocado como uma das funções da escola. Para isso, é necessário que o
professor seja capaz de transitar por espaços de múltiplas leituras e diferentes linguagens, mormente
aqueles proporcionados pelas manifestações artísticas. Entendendo que essa formação deve ser
implementada desde o início da graduação, o subprojeto: Saberes, práticas educativas e letramento,
que integra o PRODOCÊNCIA (2010/2012), financiado pela Capes, vem desenvolvendo ações que
buscam ampliar os níveis de letramento dos licenciandos em Pedagogia da UFG/Campus Catalão. O
objetivo é, principalmente, implementar atividades voltadas para o letramento literário das alunas
integrantes do projeto, entendendo que este, se constitui em um processo de permanente
transformação, que se renova a cada leitura de uma obra significativa (PAULINO, COSSON,
2009). As ações visam a promoção de atividades culturais que envolvem também, além da
literatura, o cinema e a música, no entendimento de que a arte se constitui num meio de acesso a
dimensões humanas não passíveis de simbolização conceitual. Assim, obras literárias de autores
como: Marina Colassanti, Gabriel Garcia Marquez, Manoel de Barros e outros, foram lidas e
discutidas com as alunas-cursistas, entendendo, como Coelho (2000), “que a literatura atua de
maneira profunda e essencial para dar forma e divulgar os valores culturais que dinamizam uma
sociedade ou uma civilização”. Como conclusão parcial apontamos que as ações desencadeadas têm
possibilitado aos participantes a vivência de práticas de leitura e fruição estética, as quais muitas
não tiveram acesso, antes da graduação, visto que, por ser um curso de licenciatura noturno, o Curso
de Pedagogia atende principalmente alunos oriundos das camadas populares, onde as práticas de
leitura e escrita mais valorizadas pela sociedade, como é o caso da leitura da literatura, não se fazem
tão presentes. Além disso, os encontros realizados propiciaram a socialização das experiências do
docente leitor e futuro formador de leitores.
“QUAL O AUTOR MENOS CHATO: MACHADO DE ASSIS OU JOSÉ DE ALENCAR?”
Gabriela Rodella de Oliveira – FEUSP
A pergunta que consta do título, feita por um aluno de uma oficina desenvolvida na Escola de
Aplicação da USP em 2001 durante estágio da disciplina de Metodologia de Ensino de Língua
Portuguesa do curso de Licenciatura da FEUSP, tem nos acompanhado ao longo de nosso percurso
de pesquisa acadêmica. Por que esses dois autores seriam de antemão identificados à chatice, ao
tédio e à obrigação da leitura escolar? Como, por que e para quê é ensinada a literatura? Quais são
as práticas de leitura dos adolescentes que frequentam a escola? Das relações entre formação,
hábitos de leitura e práticas de ensino de literatura de professores de literatura de escolas públicas
do ensino médio paulistano tratamos em nosso mestrado. Atualmente, em nosso doutorado,
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desenvolvemos pesquisa cujo objeto são as práticas de leitura literária de adolescentes que
frequentam a escola. Trata-se de um estudo de caráter exploratório que busca combinar dados
quantitativos e qualitativos coletados no segundo semestre de 2011. Numa primeira etapa, foram
coletados dados por meio de questionário com 27 questões, respondidos por 289 adolescentes,
alunos do primeiro ano do ensino médio em duas escolas particulares e duas públicas da cidade e da
região metropolitana de São Paulo. Numa segunda etapa, foram coletados dados qualitativos por
meio de entrevistas compreensivas individuais ou coletivas (KAUFMANN, 1996) com 65 alunos
dentre os que participaram da etapa anterior. Esta comunicação pretende, portanto, apresentar
reflexões acerca das práticas anárquicas de leitura literária (Petrucci, 1999), em sua grande maioria
de best-sellers internacionais (ZILBERMAN, 1984; DARNTON, 1992; MEYER E DIAS, 1984;
ECO, 2008), dos alunos entrevistados, partindo da descrição de seus modos de ler, levando-se em
conta as seguintes questões: O que lhes interessa especificamente na leitura desse tipo de literatura?
Quais as razões que os levam à seleção do que escolhem para ler fora da escola? O que lhes causa
estranhamento a partir da leitura da literatura brasileira considerada canônica, cujo lugar continua
assegurado em nossas salas de aula? Quais as representações (CHARTIER, 1988) que têm do que
seja um leitor? A que a leitura é associada: apenas ao objeto livro de papel ou a outros suportes?
Apenas à literatura ou a outros gêneros textuais?
O ENSINO DE LITERATURA A PARTIR DE NOVOS CONCEITOS TEÓRICOS
METODOLÓGICOS
Rosenil Reis – UFMT
Simone Padilha – UFMT
Ultimamente, muitos são os autores que têm discutido o ensino da literatura no ensino médio.
Concebem a literatura não apenas como uma forma de expressão artística, mas como um
instrumento de caráter social, um fenômeno cultural, histórico e político capaz de revelar as
contradições e conflitos da realidade. Infelizmente, não é desta forma que a escola e os professores
do ensino médio a têm concebido, mas somente como um fenômeno de manifestação artística, sem,
no entanto, reconhecê-la como um instrumento condutor e/ ou colaborador para a transformação
social. Assim, o objetivo principal deste trabalho é propor algumas alternativas que contribuam para
o ensino significativo da literatura, através de algumas sugestões que sirvam para serem aplicadas
em sala de aula. A pesquisa tem como suporte teórico os princípios expostos por Martins (2006),
Pinheiro (2006), Cereja (2004), e pelas colocações dos documentos oficiais dos PCNEM –
Parâmetros Curriculares do Ensino Médio e das OCEM – Orientações Curriculares Nacionais.
Traçamos, ainda, como objetivo geral, encontrar meios concretos que facilitem o ensino da
literatura, possibilitando o conhecimento histórico, ideológico, simbólico e suas diversas formas de
manifestações. O que se observa dentro desse cenário é que a maioria desses autores discute o
assunto, mas não oferece um modelo real, concreto, a ser seguido em sala de aula, são apenas
explicações de como deve ser esse ensino, porém não apresentam a forma metodológica de como
aplicar esse ensino, ou seja, acreditamos que se trata de um problema de didatização ou
modelização didática. A necessidade de estudar o caráter emblemático e histórico da literatura,
principalmente sua função social, fez surgir a necessidade de se criar alternativas que
exemplifiquem melhor esses aspectos, no sentido de identificar os fatores que estabelecem conexão
com as mais variadas relações do cotidiano, os aspectos discursivos dos enunciados e os diferentes
momentos de produção e recepção. Afirmamos que a literatura não pode ser estudada como um
fenômeno isolado, sem interferências do leitor, sem o conhecimento das condições de produção e
recepção em que o texto foi produzido. Um dos espaços de recepção da Literatura consiste
exatamente no espaço escolar, em que esta é didatizada para o leitor-aluno. Para contribuir com a
discussão, acrescentamos ao estudo considerações sobre o letramento literário, as diferentes
abordagens sobre a relação entre literatura e sociedade e o contexto neoliberal e a educação. A
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temática da educação literária, relativamente nova e polêmica, devido à adoção ou não como uma
unidade base de ensino, suscitou-nos a possibilidade investigativa da situação escolar, a partir da
coleta de dados e da análise destes, criando-se uma posição nesse sentido. Decidimos, portanto,
investigar os reais motivos que dificultam a prática desse ensino e, partindo dos procedimentos
adotados metodologicamente, pretendeu-se contrapor os dados às teorias adotadas pelos
documentos oficiais e pelos referidos autores. Para tanto, foram utilizados questionários que
serviram de instrumento de coleta de dados analisados ao final deste trabalho. A metodologia
aplicada no trabalho foi a abordagem qualitativa e quantitativa na análise de dados e a pesquisa
bibliográfica e documental para o embasamento teórico. Os questionários foram aplicados aos
alunos das turmas do 3º ano do ensino médio de duas escolas da rede estadual de ensino, com o
objetivo de investigar como é a recepção do ensino da literatura. Já o questionário dos professores
foi organizado em duas partes: a primeira levantou alguns dados pessoais e profissionais, e a
segunda foi voltada ao exame das questões relacionadas com a prática de ensino de literatura.
A LEITURA LITERÁRIA EM SALA DE AULA: CONHECENDO REPRESENTAÇÕES
DOCENTES
Dayb Manuela Oliveira dos Santos – UEFS
Maria Helena da Rocha Besnosik – UEFS
Desenvolvido no contexto do Mestrado em Estudos Linguísticos da UniversidadeEstadual de Feira
de Santana, este estudo buscou conhecer representações de leituraliterária de professoras de Língua
Portuguesa do Ensino Médio de escolas públicas domunicípio de Feira de Santana – Bahia e os
desdobramentos de tais representações naprática docente. A nossa vivência no Núcleo de Leitura
Multimeios da UEFS, que temnos Círculos de Leitura sua metodologia fundante e que tematiza as
práticas culturais deleitura e as histórias de leitura tanto nos ambientes escolares, quanto nãoescolares,motivou o desejo de investigar tais representações. Essa busca partiu do pressuposto
deque as representações que se têm sobre as práticas influenciam e constituem o modocomo essas
mesmas práticas são realizadas. Assim, o conhecimento das representaçõesde leitura literária das
professoras contribui para a reflexão sobre a formação do leitorpor parte da instituição escolar. A
perspectiva teórica assumida buscou aproximar-se dahistória cultural e, especialmente, da história
da leitura e de autores como Chartier(1988; 1994), Darnton (1992), Hébrard (1999) e Goulemot
(2001), bem como daabordagem sobre a formação de professores e de autores como Batista (1998),
Catani(1997), Kramer (1994), Tardif (2011), Moraes (2001), Pétit (2008; 2009), Todorov(2010) e
Lewis (2003). De natureza qualitativa, a pesquisa contou com a entrevista e oquestionário como
instrumentos de coleta de dados. Os resultados apontam a relaçãoescolarizada e profissional que as
professoras mantêm com a literatura e como, a partirde seus relatos, nos parece que “reproduzem”
essa relação na prática docente deformação de leitores. Além disso, aborda a necessidade do
fortalecimento eaprofundamento das discussões acerca da leitura como prática cultural e da
leituraliterária na perspectiva da recepção estética nos cursos de formação de professores, afim de
facilitar a aproximação da literatura entendida como arte das propostas escolarescom vistas à
formação do leitor.
LITERATURA E FORMAÇÃO DO LEITOR: UMA EQUAÇÃO NECESSÁRIA NO CICLO
1 DO ENSINO FUNDAMENTAL
Sheila Oliveira Lima – UEL
O desempenho em leitura tem sido uma das principais preocupações das instituições ligadas ao
ensino básico e à difusão da cultura no Brasil, visto que os resultados obtidos pelos estudantes
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brasileiros, tanto do ensino fundamental quanto do ensino médio, nas avaliações externas (como o
PISA) e internas (como a Prova Brasil), evidenciam uma falha significativa nesse aspecto do ensino
do país. Os documentos oficiais – parâmetros e diretrizes curriculares – apesar de defenderem a
leitura como um dos principais objetivos do ensino de língua materna, consideram o texto literário
como uma especificidade, o que o coloca num lugar especial, porém não central. Tal situação pode
ser confirmada a partir do fato de que, mesmo deslocando a leitura literária para um campo especial
de abordagem, os documentos não reservam uma discussão específica sobre os modos de realizá-la,
o que acaba por produzir um vazio sobre tal campo de atividade. Paralelamente às orientações dos
documentos oficiais, as provas realizadas pelo governo federal para verificação da competência
leitora em alunos do Ciclo 1 do Ensino Fundamental (Provinha Brasil) reforçam a irrelevância da
literatura, na medida em que valorizam em seus testes uma prática que independe da vivência com o
texto literário, uma vez que centram o foco na decodificação alfabética e na apreensão de elementos
dados pela superfície do texto. Buscando estar de acordo com as orientações oficiais e, ao mesmo
tempo, pautar um trabalho que forme o aluno para estar de acordo com as expectativas demarcadas
nas avaliações nacionais, os livros didáticos (conforme pesquisa já iniciada) pouco abordam a
leitura literária, fixando-se em textos de uso cotidiano, como os cadastros, envelopes, receitas,
manuais de instrução etc. Em oposição aberta à situação acima descrita, alguns teóricos do campo
da educação e da leitura - Belintane (2011) , Colomer (2007), Lajolo (2007) - têm sido unânimes
em afirmar a relevância da leitura literária para a constituição de um leitor crítico em qualquer outra
esfera discursiva. O projeto de pesquisa Leitura Literária no Ensino Fundamental – Ciclo 1:
Concepções e Práticas, vinculado à Universidade Estadual de Londrina e sob coordenação da
professora doutora Sheila Oliveira Lima, busca compreender as concepções de leitura presentes nas
salas de aula a partir de um dos principais veículos de difusão das abordagens didáticas: o livro
didático. Por meio da análise dos volumes de coleções didáticas de língua portuguesa voltadas para
tal segmento, o projeto investiga a concepção de leitura e de leitor difundida por tais materiais.
Tendo em vista que o projeto está em sua fase inicial, no Simpósio, serão apresentados estudos
preliminares a respeito da concepção de leitura literária e de sua relevância nos primeiros anos do
ensino fundamental para a formação e posterior consolidação do leitor crítico. Também serão
divulgados os resultados iniciais da pesquisa, numa abordagem crítica e apontando as possibilidades
metodológicas para uma leitura literária já nos primeiros anos dono ensino fundamental.
LITERATURA, LEITURA E ENSINO: DESENCONTROS E ENCONTROS NO
PROCESSO DE FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO
Dalva Ramos de Resende Matos – UFMT
Sabe-se que a escola – principalmente na Educação Básica – reserva à literatura um papel errôneo
ao fazer desta, predominantemente, um instrumento de aperfeiçoamento linguístico, ou,
simplesmente, uma matéria escolar. Além disso, estudos em Ensino de Literatura apontam que isso,
geralmente, acontece porque, muitas vezes, os professores não têm a formação competente, não
leem os textos, não compram livros, não têm acesso a bens culturais como cinema e teatro. Somamse, a tudo isso, baixas remunerações, bibliotecas mal equipadas e estratégias de leitura
completamente equivocadas. Como formar estudantes leitores se grande parte dos professores não
tem a formação necessária e nem a própria prática da leitura literária? Para que a literatura não seja
apenas mais uma disciplina escolar e a leitura dos textos literários propriamente ditos ocorra, é
necessário, dentre outros requisitos, que existam projetos de formação continuada do professor de
literatura nos cursos de graduação, especialização, aperfeiçoamento e extensão. Com isso, espera-se
que ele adquira uma boa fundamentação teórica e metodológica, além de conscientizá-lo da
importância de ser um professor-leitor, uma vez que ele é o maior responsável pela seleção da
grande quantidade de obras oferecidas pelos mercados editoriais e o principal mediador da leitura
literária junto aos jovens leitores. Como sugestão, esta comunicação pretende apresentar e discutir
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um projeto de leitura voltado para a formação do professor como leitor e mediador do texto
literário, já que cabe, principalmente, a ele a função de proporcionar aos alunos um convívio
estimulante com a literatura, para que esta cumpra seu papel no desenvolvimento humano e crítico
do leitor. Dessa forma, pretende-se contribuir para a formação de leitores competentes, que sejam
capazes de perceber no texto literário bem mais que entretenimento e deleite, mas também uma
possibilidade de aprender, refletir, comparar, criticar, amadurecer, transformar(-se), compreender a
estética e a linguagem plurissignificativa desse tipo de arte.
A BIBLIOTECA ESCOLAR COMO ESPAÇO DE FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO
Verônica Maria de Araújo Pontes – UERN
Maria Carmem Silva Batista – UERN
A importância dada à leitura e à formação de leitores no espaço escolar tem sido frequente, pelo
menos nos discursos oficiais dos programas e propostas voltadas para a educação, incluindo o
Programa Nacional do Livro e da Leitura (PNLL) do governo Federal e a Lei estadual 9.169 de 15
de janeiro de 2009. Sendo assim, é necessário que possamos verificar se de fato o contexto
educacional, especificamente o espaço escolar tem sido contemplados por ações que tenham em
vista a formação de leitores para que então possamos modificar o quadro caótico já verificado e
divulgado internacionalmente, como é o caso do PISA (Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes) em que nosso país ficou entre os últimos em seus resultados gerais. Em nossas
pesquisas realizadas desde 1998 no Estado do Rio Grande do Norte podemos constatar que as
bibliotecas escolares encontram-se com instalações físicas inadequadas, além de um acervo
fragilizado e desatualizado e com pessoal que exerce suas funções para cumprir horários
estabelecidos, sem intenção nenhuma de formar leitores, mas apenas realizar empréstimos, e
nenhuma interferência real do poder público realizada. Nos anos de 2007, 2008 e 2009 podemos
constatar a existência de projetos voltados para a promoção da leitura no espaço da biblioteca
escolar, principalmente da rede pública estadual. Tendo em vista esses discursos voltados para a
biblioteca escolar, vimos a necessidade de realizar um estudo para a constatação da relação teoriaprática nesse contexto. Assim, objetivamos: verificar as condições de funcionamento da biblioteca
escolar, detectar as prioridades da biblioteca escolar, conhecer os projetos existentes para a
biblioteca escolar em torno da formação de leitores; compreender como se dá a efetivação dos
projetos existentes na rede pública estadual em torno da formação leitora, identificar o tipo de
acervo existente no espaço da biblioteca, e conhecer a formação dos responsáveis pela biblioteca
escolar. Para isso, realizaremos uma pesquisa bibliográfica através de autores como Silva (1986),
Azevedo (2006), Pontes (1998, 2009), Milanesi (1991), Manguel (1997), Zilberman (1988), entre
outros, e ainda uma pesquisa documental e de campo em que verificaremos os espaços da biblioteca
escolar e pessoal responsável na promoção da leitura nesse local.
O FANTÁSTICO E O MARAVILHOSO: UM PASSEIO PELOS ENCANTOS E CANTOS
DOS CONTOS
Verônica Maria de Araújo Pontes – UERN
A compreensão e análise do fantástico e do maravilhoso na Literatura Infantil de hoje, só é possível
se fizermos um resgate histórico inicial do conceito de imaginação e de fantasia, e de como esses
conceitos estão caracterizados na sociedade atual e qual o seu papel nas representações humanas, e
particularmente no ambiente escolar. Dessa forma, é que esperamos contribuir para a identificação
do mundo fantástico e maravilhoso e uma reflexão sobre sua função na literatura de potencial
recepção infantil na instituição escolar. Os contos de fadas, essas narrativas maravilhosas e que há
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muito tempo encantam e despertam interesses dos mais diversos tipos de leitores, principalmente o
público infantil é o nosso objeto maior de discussão nesse texto. É essa mistura de fatos reais e
imaginários que faz o leitor ficar motivado a ler e reler os contos, envolvendo-o, seduzindo-o e
fazendo-o um leitor assíduo e reflexivo deste tipo de obra literária. Compartilhamos do
posicionamento de Held (1980) quando nos afirma que uma história fantástica de maneira alguma
nos interessaria se não nos ensinasse algo sobre a vida dos povos e dos seres, reunindo assim, as
nossas preocupações, os nossos problemas, informando ainda sobre o coração no sentido mais
humano, tornando-se um documentário do ser. Segundo Góes (1984), os contos não são apenas
histórias criadas, mas histórias que retratam momentos reais vividos pelos povos. É por isso que
problemas como riqueza, pobreza, poder, trabalho, rivalidade e conflitos familiares são
caracterizados em quase todas essas narrativas. Os estudos em torno dos contos de fadas e sua
contribuição para a formação do leitor são embasados em teóricos como: Zilberman (2001), Pontes
(2012), Azevedo (2000), Coelho (2001), Held (1980), Góes (1984), entre outros.
EXPLORANDO O TRATAMENTO DIDÁTICO DE TEXTOS LITERÁRIOS EM LIVROS
DO ENSINO MÉDIO: UM ESTUDO BAKHTINIANO
Simone de Jesus Padilha – UFMT
Algumas questões podem ser feitas para dar início ao debate sobre a didatização dos textos
literários em obras voltadas para o ensino médio: O que o mercado editorial, na área da produção
didática, tem oferecido no que concerne à didatização dos textos literários? Como a literatura, ou
melhor, qual concepção de literatura tem sido repassada aos alunos do ensino médio, via material
didático? A análise dos primeiros dados nos revelou que: 1) os textos literários não são estudados
em suas características específicas, havendo ainda um privilégio de aspectos didáticos gerais do
ensino da língua materna sobre os literários; 2) a leitura literária e as “outras leituras” parecem
receber o mesmo tratamento na escola, por conseguinte, o livro didático segue este movimento
homogeneizador; 3) prevalece a compreensão dos estudos da literatura como historiografia. Além
disso, muitos manuais assumem a teoria dos gêneros, por um lado, mas praticam apenas um
exercício textual de superfície em busca de aspectos formais e/ ou memorização de nomenclaturas,
por outro. O livro não sabe o que fazer com as noções provenientes da teoria bakhtiniana e nem
mesmo tem realizado um trabalho satisfatório com os gêneros da esfera literária, como se a teoria
dos gêneros e todo seu embasamento (por ora esquecido) nos aspectos dialógicos, nas considerações
das formas arquitetônicas e composicionais não abrangesse e não contribuísse para a consolidação
de um importante aspecto do ensino de nossa língua materna: a formação do leitor literário. Isso já é
constatado nos livros voltados para o ensino fundamental, conforme podemos verificar, por
exemplo, nas pesquisas de Pinheiro (2001); Brandão&Martins (2003); Rangel (2003) e Padilha
(2005), mas será da mesma forma no ensino médio, através das proposições didáticas dos livros que
circulam no espaço escolar? Assim, este trabalho pretendeu explorar algumas coleções de livros
didáticos do ensino médio voltados para o ensino da língua portuguesa, cujos critérios de escolha
surgiram de uma análise quantitativa, de acordo com os dados estatísticos fornecidos pelo FNDE,
em relação à “Tiragem e valores negociados por editora”, no Programa Nacional do Livro Didático
2012, para o Ensino Médio, o que gerou um subconjunto de coleções apenas voltadas para a Língua
Portuguesa. Desta listagem, em ordem decrescente, por quantidade de livros adquiridos pelo
PNLD/MEC, escolhemos três coleções, o que compreendeu um trabalho com nove volumes,
abarcando de 1º ao 3º ano: “Português – Linguagens”, da Editora Saraiva, autoria de Willian
Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães; “Português- Literatura, Gramática e Produção de
Texto”, da Editora Moderna e autoria de Douglas Tufano e Leila Lauar Sarmento, e também da
Editora Moderna, “Português – Contexto, Interlocução e Sentido”, de Marcela Pontara, Maria
Bernadete M. Abaurre, Maria Luiza M. Abaurre. Para esta comunicação, vamos apresentar os dados
inicias de análise sobre a questão do tratamento dispensado à leitura do texto literário, enfocando as
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seções de leitura com textos em gêneros da esfera literária. Seguindo as trilhas da avaliação oficial,
e buscando compreender o olhar desta sobre a produção editorial voltada para o ensino de língua
portuguesa no Ensino Médio, consideraremos, ainda, os dados provenientes das resenhas do Guia
do Livro Didático do PNLD 2012 – Ensino Médio. Este estudo está vinculado ao Projeto de
Pesquisa “Relendo Bakhtin: contribuições do Círculo de Bakhtin para uma análisedialógica de
discursos produzidos em diferentes esferas da atividade humana”, desenvolvido na Linha de
Pesquisa Práticas Discursivas e Textuais, do Programa de Pós-Graduação em Estudos de
Linguagem (MeEL), da Universidade Federal de Mato Grosso.
O LUGAR DA MEDIAÇÃO NA FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO
Ebe Maria de Lima Siqueira – UFG/UEG
Nesta comunicação, trataremos de formação do leitor literário. Para tanto, discutiremos,
inicialmente, sobre leitura, leitor, literatura e sua função, para, em seguida, abordar o lugar da
mediação qualificada no processo de educação literária nas várias instâncias da formação de leitor
literário. Entendemos que, diante dos desafios impostos pela convergência de várias mídias na
atualidade, o papel do mediador precisa ser repensado, considerando que as mudanças sentidas
abrem reflexões em torno dos meios e, consequentemente, das mediações. A convivência do livro,
em seu modelo clássico pós códex a partir da invenção da impressa, com as mídias virtuais, cada
vez mais popularizadas, deverá ocorrer ainda por muito tempo, conforme sugere Roger Chartier
(1999). Entretanto, não podemos ignorar que novas práticas de leitura se fazem necessárias se
queremos garantir a formação de um leitor literário. Partindo da premissa de que o acesso à
literatura deve ser um direito incompressível, como a saúde, a alimentação, a moradia, como
assevera Antonio Candido (1995) e que o ato de ler não suporta a imposição autoritária, como levar
crianças e jovens ao gosto pela leitura literária se não se pode fazê-lo por decreto? Esta e outras
perguntas é o que nos propomos a alinhavar nesta comunicação. Trataremos de algumas premissas
que problematizam as várias instâncias de mediação: (1) a família, como responsável pela formação
da criança; (2) a escola, instituição tida no Brasil como a primeira a apresentar à criança o objeto
livro,acrescenta-se a essa perspectiva o fato de que desde a sua origem, fundada na oralidade, a
literatura era vinculada à educação; (3) e o mercado e sua relação com autores e editores que, de
alguma forma, exercem papel de mediação e interferem no processo de formação de leitores. Para
fundamentar nossas reflexões, face à formação do leitor literário, dialogaremos com Candido
(1995), Jolibert (1994), Cambi (1999), Colomer (2003), Petit (2008), Penac (2009 ), Cancline
(1997), Barbero (2009), Compagnon (2009) e Todorov (2011).
SUPORTES E PERSPECTIVAS DA LITERATURA TOCANTINENSE PARA A
FORMAÇÃO DE LEITORES EM ATIVIDADES ESCOLARES
Rubens Martins da Silva – SEDUC-TO
O presente trabalho discute sobre atividades práticas de leitura em sala de aula, a partir da
exploração de obras da literatura tocantinense no município de Araguaína-TO. Nesse intento,
problematiza-se: O que representa a literatura tocantinense para as atividades práticas de leitura nos
espaços escolares? Em resposta hipotética, afirma-se que a literatura tocantinense apresenta temas
de relevância destinados à formação crítica de leitores. Assim, o teor desta discussão faz diálogo
com a propósito do simpósio elencado porque trata a literatura como fonte de aproximação do aluno
com o texto literário, contribuindo com a difusão de saberes nos diversos campos educacionais,
tendo em vista seu funcionamento como suportes e perspectivas para a solidez das atividades de
leitura nas escolas. Nesse foco, objetiva-se analisar o lugar que as obras tocantinenses ocupam nos
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contextos de leitura e de sua contribuição para o ensino e formação de leitores nos espaços
escolares. As bases teóricas que ancoram o presente estudo estão centradas nas concepções de
Magda Soares (1999), sob o discurso da escolarização da literatura; de Antoine Compagnon (1999;
2009), quando não se percebe a relação do contexto do texto com o aluno, ante os porquês
assegurados; de Wolfgang Iser (1996), pela importância literária para a formação de leitores; de
Paul Ricouer (2005), pelo caráter metafórico da arte literária; da Proposta Curricular do Ensino
Médio do Tocantins (2009); das Orientações Curriculares Nacionais (2006); de Antonio Candido
(2002), na visão da contribuição social do estudo literário para a formação do homem; de Tzvetan
Todorov (2009), nas abordagens do perigo do uso literário se descumpridas as práticas necessárias
ao ensino; de Rildo Cosson (2007), na contemplação de práticas de letramento literário e, de Eni
Orlandi (1999), no discurso de que a leitura gera novos discursos durante a própria prática da
leitura, sendo estes formadores de novos saberes. Apoiando no critério do gênero conto, o foco das
atividades é refletido pelo estudo da obra “O Quati e outros contos”, de Fidêncio Bogo (2001), pois
as configurações temáticas e interdisciplinares apresentadas oferecem condições para a
compreensão dos aspectos da língua portuguesa ante a realização da leitura literária. Dessa forma, a
contribuição da literatura tocantinense com o contexto dos estudos literários pauta-se na justificativa
reflexiva de que as práticas de leitura efetivadas nas escolas, constituem-se em elementos sólidos
para o desenvolvimento de práticas de leitura cada vez mais consistente, mais abrangente para o
contexto educacional.
TERERÉ COM POESIA NO IFMS – COXIM/MS
Jozil dos Santos – IFMS/Coxim
Na literatura brasileira encontra-se uma infinidade de estilos, dentre eles estão a crônica, o romance,
a epopeia, a novela, etc, dentre esses ainda há o poema como forma de texto literário, porém, não
muito lido entre os jovens e adultos na sua maioria. O Tereré com poesia - IFMS/Coxim surgiu da
ideia de fazer com que esse público começasse a se interessar pela leitura do texto poético. Para se
tornar real, resolveu-se unir a prática da leitura da poesia com uma tradicional bebida sul-matogrossense, o tereré. Dessa forma surgiu o Tereré com poesia no IFMS/Coxim. O evento Tereré com
poesia do IFMS/Coxim começou em 2012 e já teve duas edições, a 1ª no 1° semestre de 2012 e a 2ª
no 2° semestre de 2012. A 1ª edição contou com a participação de alunos e professores (as) do
IFMS e convidados especiais como poetas da região, professores (as) totalizando cerca de 60
ouvintes e a 2ª edição contou também com a participação da Escola Marechal Rondon com
participantes mirins que também participam em projeto de leitura na referida escola como estímulo
à poesia, totalizando cerca de 100 ouvintes. O evento Tereré com poesia do IFMS/Coxim é um
momento de escuta e reflexão, os temas são variados, os autores dos poemas são elencados pelos
participantes e não há distinção de idioma, já foram lidos e declamados poemas nas línguas
portuguesa, inglesa, espanhola e até guarani. Para TREVISAN, a poesia só terá uma nova vez à
medida que surgirem leitores capazes de acionar o próprio “eros” poético, a faculdade criadora
emocional, existente em cada ser humano. O evento terá as próximas edições, pois se acredita que o
mesmo seja um apoio no incentivo à cultura dos alunos do IFMS/Coxim, bem como à comunidade
coxinense, visto que a cada momento que passa a mesma está cada vez mais sendo inserida no
âmbito desta instituição que é o IFMS/Coxim.
NARRATIVAS E FORMAÇÃO DE LEITORES
Márcio Araújo de Melo – UFT
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Esta pesquisa analisa algumas personagens/leitoras e sua relação com os modos de ler e as práticas
de leitura em sua formação, para tanto discute o processo de contaminação dessas personagens por
esse ato. São leitores que fazem da leitura mais que uma prática, mais que uma forma de percepção
de mundo; fazem dela a própria sobrevivência. Para tanto, parte-se de personagens ícones como:
Dom Quixote e Madame Bovary no intuito de compreender as figurações do leitor literário e a
ficcionalização do ato de ler. Algumas questões como: o que é um leitor?; o que é ler?; por quê? ;
onde e quando? ; quais livros ler? ; são discutidas a partir daquilo que Ricardo Piglia chamou de
uma lição de leitura, para se compreender como se forma e é formado a personagem/leitora
literária.
A POESIA PORNOGRÁFICA DE GLAUCO MATTOSO
Gyannini Jácomo Cândido do Prado – UFG
Este trabalho visa entender como se dá a construção da autoria de poesia e do ensino e, é claro,
nesta medida compreender a recepção seja ela instalada na escola ou na recepção autodidata.
Através da poesia de Glauco Mattoso, e particularmente pela poesia pornográfica, demonstramos a
possibilidade de a autoria e o ensino de poesia ser antes de tudo uma inscrição no mundo do
letramento. Buscamos em Mikhail Bakhtin alguns elementos fundamentais de compreensão de
autoria, de responsabilidade do autor e da obra e de ensino. Para Bakhtin o autor tem a
responsabilidade com a produção e mais, tem responsabilidade com a escritura da obra. É por esta
mão, portanto, que o autor atravessa a difícil estrada de produzir poesia com a responsabilidade de
estar não respondendo as questões sociais imediatas, mas, sobretudo, pensando nas coisas que
fundam mundo, portanto, não é só uma escrita simples para aliviar a tensão pessoal ou para se
regojizar com o escrito é para, na verdade, se impor como relação do real. Utilizamos também
Antônio Candido para dar dimensão à literatura como sendo brasileira, mas antes disso utilizamos
para dar noção de ensino e permanência da poesia. Candido nos diz que as condições de produção
importam sobremaneira a construção da poesia. É pela condição em que o autor está, no tempo, no
espaço é que também se constrói a dimensão da literatura. Na poesia de Glauco Mattoso, a
pornográfica, encontramos um tipo de confissão. Essa confissão que é autoral, pois encontramos o
poeta várias vezes na condição de personagem, mas mesmo que isso seja verdade (e pode ser
mesmo o autor sendo personagem) ao lê-lo (o poema) torna-se leitor simplesmente, sem nenhuma
condição especial. Mas, sendo ele autor lhe confere a condição, outra vez, de construir mundo, é
nesta dialética da linguagem que o faz poeta e leitor ao mesmo tempo, ou seja, autor e leitor são
dois sujeitos que não se separam mesmo aquele que não foi autor e foi somente leitor na medida em
que lê reescreve a obra, pois o texto não é mais do autor e assim sucessivamente. A poesia de
Glauco Mattoso, a pornográfica, é inapropriada aos estudos em ambiente escolar, ele concorda com
isso também, mas a pornografia da qual ele trata, pertencendo a escatologia, faz todo sentido no
mundo contemporâneo, assim como o fez Sade ou Boccacio, falar de felação ou da relação sadomasoquista não está distante das relações humanas de consumo de hoje. A maneira em que o poeta
consiste sua poesia, que nominamos de pornográfica, é na verdade a elucidação da nossa cegueira.
Assim, o poeta ao não enxergar traz a luz as nossas mais profundas marcas de verdades.
SÉRIE VAGA-LUME: UMA LITERATURA DE DOIS GUMES
Larissa Warzocha Fernandes Cruvinel UFG
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A Série Vaga-lume é uma das primeiras coleções literárias no Brasil a reunir obras voltadas
particularmente para os jovens leitores. A coleção foi criada pela editora Ática na década de 70 e até
os dias de hoje mantém uma vasta produção de novos títulos lançados no mercado a cada ano.
Apesar de elencar nomes de autores consagrados, como Orígenes Lessa, Maria José Dupré, Marcos
Rey, Luiz Antônio Aguiar entre outros, a Série apresenta características estéticas homogêneas. O
intuito é prender o jovem leitor em uma “fórmula de sucesso”, marcada pela ação, pelo suspense e
por temas próprios do universo adolescente. Além disso, as obras revelam um forte pendor didático
e, em meio à trama, há várias informações sobre conteúdos escolares, como dados históricos e
geográficos. As personagens apresentam uma postura ideal formada pelo hábito de leitura,
sentimentos virtuosos e dedicação aos estudos escolares. A maior parte das obras publicadas na
Série transmite a mensagem de que o mal não compensa e de que as pessoas valorosas vencerão
suas dificuldades e alcançarão um final feliz. Assim, o propósito da coleção é educar moralmente o
jovem leitor e atrair um vasto público consumidor formado pelas escolas. Contudo, estudos
voltados para a recepção realizados no Ensino Fundamental, como os de Juvenal Zanchetta,
mostram que as narrativas dessa coleção fascinaram gerações de leitores e contribuíram para
desenvolver o gosto pela leitura em inúmeros jovens. Se por um lado, a coleção se configura como
uma literatura de entretenimento. Por outro lado, oferece um texto que prende o leitor nas malhas da
narrativa. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é partir da análise da Série Vaga-lume para
discutir o impasse em torno dos limites da leitura de fruição e o papel do professor na formação
literária do jovem leitor.
CONTINGÊNCIAS DE ENSINO FORMAL E NÃO FORMAL NA CONSTITUIÇÃO E
CRIAÇÃO DE UM POETA: O CASO DE JORGE DE LIMA
Miguel d’Abadia Ramos Jubé Júnior – PG/FL/UFG/CAPES
A ideia de educação e ensino transborda a instituição Escola. Na verdade, ela começa bem antes
para qualquer ser humano socializado, na esfera social familiar direta – convivência com pai, mãe e
irmãos – e suas extensões em seus variados níveis de proximidade – avós, tios, primos, amigos.
Sem dúvida, todo tipo de contato com o mundo e seus elementos integrantes permite algum tipo de
aprendizagem: isso depende tanto da extensão de possibilidades cognitivas que cada coisa, cada
contato permite, ou seja, o quão relevante há para se aprender daquilo, quanto da extensão de
percepção de mundo apresentada por cada sujeito. Mas um objeto, que pode constituir processos de
educação dentro ou fora da escola – o livro –, consegue desempenhar um papel diferencial nas
relações de ensino aqui abordadas, principalmente quando o livro concede mais do que simples
informação, concede um universo ao mesmo tempo igual e diferente daquele em que vive o sujeito
leitor, ou seja, trata-se de um livro literário. Vinculado ao projeto de pesquisa “Estudos de poesia:
subjetividade, recepção, ensino e criação”, este trabalho pretende mostrar como as condições
contingenciais de ensino formal e informal pelas quais foi submetido Jorge de Lima (desde as
condições de restrição que se lhe deram, o posterior contato com o imaginário composto pela região
do Quilombo dos Palmares e suas instruções básica e superior) o capacitaram não somente para
além de um leitor literário comum, como o transformaram também em poeta, um sujeito que deve
estar, de qualquer maneira, num grau de percepção de mundo mais desenvolvido para que consiga
buscar/executar a tradução, a reflexão ou a inversão desse mundo no qual se insere. Como
referencial teórico, tomaram-se Platão (Íon) e Longino (Do sublime) como eixo de discussão de
como se dá/faz um poeta no mundo e a teoria da restrição de John Elster (Ulisses Liberto). Ainda
fundamentam o trabalho as ideias suscitadas por Jacques Rancière (O inconsciente estético), Roger
Chartier (Increver e Apagar; A aventura do livro: do leitor ao navegador), Herbert Marcuse (A
Dimensão estética) e Paul Valèry (Variedades) sobre estética, criação poética e recepção. O corpus
principal foram os textos de crítica e autocrítica publicados pelo próprio autor, no qual ele explicita
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348
seu processo de criação (como se deu e como determinadas leituras lhe foram fundamentais, por
exemplo). Consegue-se observar, então, que o autor em questão teve uma pluralidade
composicional cuja extensa formação subjetiva como leitor literário se comprova.
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SIMPÓSIO 30
VENCENDO FRONTEIRAS: COMO DERRUBAR A INIQUIDADE DA
EXCLUSÃO À INFORMAÇÃO?
A maior das iniquidades no mundo contemporâneo é aquela que exclui parcela considerável de
seres humanos do mundo da informação. Em recente entrevista à Rede Nacional, Vera Masagão
Ribeiro, Coordenadora do INAF (Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional), tornou público
que, apesar de haver diminuído o porcentual de analfabetos totais, no Brasil, apenas 24% da
população atinge o nível pleno de compreensão textual, tendo ocorrido um aumento do
analfabetismo funcional. Como derrubar tal inquidade? Somente começando pela base do processo
educacional, alfabetizando e bem para o letramento, poder-se-á fazer do futuro leitor, um leitor que
compreende os textos que circulam socialmente e, ao compreendê-los, poderá assumir uma posição
crítica frente a eles. Para tal, é necessário formar bons professores alfabetizadores, bem como
produzir material pedagógico, fundamentados no que de mais recente a neurociência e as ciências
da linguagem descobriram, derrubando mitos sem nenhuma base científica que se infiltraram nas
políticas públicas da educação, como os de que os métodos para alfabetizar devem ser abolidos,
bem como os livros para iniciar a criança, ao nível dela e de modo lúdico, nos princípios do sistema
alfabético de sua língua.
COORDENAÇÃO
Leonor Scliar-Cabral
Universidade Federal de Santa Catarina/CNPq
[email protected]
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VENCENDO FRONTEIRAS: COMO DERRUBAR A INIQUIDADE DA EXCLUSÃO À
INFORMAÇÃO
Leonor Scliar-Cabral – UFSC
A maior das iniquidades no mundo contemporâneo é aquela que exclui parcela considerável de
seres humanos do mundo da informação. Em recente entrevista à Rede Nacional, Vera Masagão
Ribeiro, Coordenadora do INAF (Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional), tornou público
que, apesar de haver diminuído o porcentual de analfabetos totais, no Brasil, apenas 24% da
população atinge o nível pleno de compreensão textual, tendo ocorrido um aumento do
analfabetismo funcional. Como derrubar tal iniquidade? Somente começando pela base do processo
educacional, alfabetizando e bem para o letramento, poder-se-á fazer do futuro leitor, um leitor que
compreende os textos que circulam socialmente e, ao compreendê-los, poderá assumir uma posição
crítica frente a eles. Para tal, é necessário formar bons professores alfabetizadores, bem como
produzir material pedagógico, fundamentados no que de mais recente a neurociência e as ciências
da linguagem descobriram, derrubando mitos sem nenhuma base científica que se infiltraram nas
políticas públicas da educação, como os de que os métodos para alfabetizar devem ser abolidos,
bem como os livros para iniciar a criança, ao nível dela e de modo lúdico, nos princípios do sistema
alfabético de sua língua.
PROCESSOS DE LEITURA/ESCRITA E CONDIÇÕES SOCIAIS PARA O
LETRAMENTO
Ana Aparecida Vieira Moura – UnB
Rosineide Magalhães de Sousa – UnB
Este trabalho situa-se no âmbito da formação acadêmica. Nele, propomos discutir estratégias e
mediação necessárias para o desenvolvimento da leitura e da escrita de educandas e educandos em
contextos de diversidade cultural. A pesquisa se dá na prática da formação do curso de Licenciatura
de Educação do Campo (LEdoC), da Universidade de Brasília – UnB, Campus Planaltina-DF, com
três turmas, de diferentes semestres, formadas por pessoas oriundas das regiões: Centro-Oeste,
Sudeste e Norte do Brasil. Esta pesquisa vem sendo desenvolvida há dois anos. Teve como
motivação, desenvolver estratégias que facilitem a leitura e a produção de gêneros discursivos
acadêmicos nesse curso, por meio da mediação. Visto que, o curso recebe, por meio de um
vestibular específico, pessoas do campo que tiveram um ensino básico de baixa qualidade e que, na
maioria das vezes, não tiveram acesso sistematizado a estratégias de leitura e de escrita, chegando à
universidade apresentando problemas nessas modalidades. Ao verificar essa problemática, que
também é comum em outros cursos universitários, procuramos utilizar o processo de construção de
sínteses, resumos, não como gênero discursivo acadêmico, mas como estratégia de compreensão e
interpretação leitora e também com o objetivo procuramos entender o aspecto sociocognitivo de
sujeitos de idades e identidades diferentes, oriundos de cultura de oralidade, na busca de um
letramento acadêmico, que estabelece seus gêneros discursivos como recursos para legitimar o
conhecimento acadêmico. Esta pesquisa se fundamenta na Sociolinguística Qualitativa que envolve
o conhecimento de contexto, interação, mediação, na Teoria dos Gêneros Discursivos e do
Letramento como Prática Social. Ainda, utiliza a Etnografia Educacional como base metodológica.
Verifica-se como resultado parcial da pesquisa, que a estratégia de resumir revela como os
educandos e as educandas da LEdoC compreendem a leitura de um determinado texto acadêmico,
mediante sua complexidade de linguagem, mostrando ser a leitura mais refinada (profunda) ou
superficial (de pouca apreensão e compreensão). Isso conduz à busca de estratégias de mediação
que conduzam à leitura mais elaborada, fazendo com que esses educandos e essas educandas
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apreendam esse processo de forma reflexiva, procurando por si mesmos seu aprimoramento leitor e
escritor.
CONVERGÊNCIA DAS MÍDIAS E ALFABETIZAÇÃO
Vera Wannmacher Pereira – PUCRS
Onici Claro Flôres – UNISC
Apesar da familiaridade das crianças com a Internet, a facilidade aparente de apertar botões e de
experimentar diferentes equipamentos eletrônicos, aliadas ao fato de terem precocemente contatos
não presenciais com pessoas (Skype, por exemplo), enfim todo o avanço tecnológico havido, isso
não garante em si e por si mesmo que o processo de alfabetização tenha ficado mais simples. Na
verdade, a escrita assimilou recursos das artes (pintura, desenho, escultura, arquitetura) e também
passou a se concretizar no espaço físico, no meio tridimensional, como objeto. Relações entre
linguagens, negociações semióticas com processos criativos artísticos, tecnológicos,
comunicacionais e poéticos exigem que o professor alfabetizador busque organizar um momento
especial, sem ignorar esse vasto e diversificado ambiente, para que a construção do sentido da
escrita (alfabética) realmente aconteça. Tudo indica que a evanescência e a fragmentação das
informações têm gerado modos diferentes de atenção, buscas continuadas do ainda não conhecido e
utilizado, ocasionado dificuldades de decodificação e de compreensão. De fato, o mundo atual
caracteriza-se tanto pelo excesso de informações e pela variedade de formatos disponíveis quanto
pela falta do entendimento. Assim, no que se refere à alfabetização há que estabelecer parâmetros
para alcançar essa meta. Dentre eles destacamos os seguintes: desenvolvimento da consciência
fonológica; desenvolvimento da consciência sintática; aquisição lexical através da leitura;
desenvolvimento da consciência textual. Esses quatro pré-requisitos podem garantir, a nosso ver, a
evolução da compreensão leitora desde o estabelecimento da relação fonema/grafema (leitura) e
grafema/fonema (escrita) até a apreensão da temática textual, passando pelo léxico e pela sintaxe.
Para tanto, recomendamos, ainda, o livro texto para a alfabetização por representar um material não
evanescente para o aluno e para o professor e a leitura de livros. Isso permitirá que a criança se
familiarize com a natureza dos dois tipos de experiência leitora com que vai se deparar – leitura
digital e leitura de texto impresso.
O PROJETO DIDÁTICO DE GÊNERO NA CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA
Íris Vitória Pires Lisboa – UNISINOS
O presente trabalho constitui-se em um exercício pedagógico baseado na construção de um Projeto
Didático de Gênero (PDG), proposta didática pensada pelas professoras Ana Maria Mattos
Guimarães e Dorotea Frank Kersch, da Unisinos, Rio Grande do Sul. A exemplo das Sequências
Didáticas, de Schneuwly e Dolz, da Universidade de Genebra, o Projeto prevê um trabalho de
leitura contemplando um gênero textual, com o desenvolvimento de oficinas pedagógicas. Diferente
das Sequências, porém, o PDG também se preocupa com a produção textual e alia a esta tarefa a
prática social do educando. Desta forma, o trabalho com a língua se desenrola em sintonia com o
contexto em que o aluno se insere e se torna mais objetivo e real, pois parte do próprio universo da
escola para retornar a ele na produção textual de forma mais competente. O PDG apresentado
desenvolve o gênero carta do leitor, gênero do domínio do argumentar. Como é dirigido às séries
iniciais do ensino médio, a argumentação parte de uma situação recorrente nas salas de aula desse
nível de ensino: o uso dos aparelhos celulares em sala de aula. Durante as oficinas, desenvolvem-se
noções sobre o gênero em questão, direcionando a atividade do aluno para a produção de sua
própria carta, com competência, o que lhe possibilitará a participação nas discussões sociais
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352
divulgadas pela mídia. Algumas questões sobre letramento também são apontadas, como
justificativa para a presença do termo “cidadania” no título do trabalho. Outro aspecto desenvolvido
no PDG, de forma implícita, é a necessidade do conhecimento teórico para o sucesso de uma
atividade didática. Pretende-se mostrar, pois, que o conhecimento da teoria que dá base aos projetos
didático-pedagógicos, assim como o conhecimento da realidade do aluno, preparam o professor,
inicialmente, para um trabalho que produza significado aos alunos e, posteriormente, prepara o
aluno para agir em sociedade através do domínio da linguagem.
LER+SERGIPE: POR UMA PEDAGOGIA (PSICO)LINGUÍSTICA NO ENSINO DA
LEITURA PARA O LETRAMENTO E CIDADANIA
Mariléia Silva dos Reis – UFS
“Ler+Sergipe: por uma pedagogia (psico)linguística no ensino da leitura para o letramento e
cidadania” aborda a importância da formação linguística e psicolinguística do professor das séries
iniciais, para uma atuação mais promissora no ensino/aprendizagem inicial da leitura para o
letramento e cidadania de crianças no ciclo da infância, ou seja, da primeira à terceira série (do
ensino fundamental de nove anos). Tomamos como premissas as palavras de Morais (2003):
“Lemos para compreender. O propósito da leitura é a compreensão. Mas ler não é o mesmo que
compreender. Podemos ler sem compreender. Podemos compreender sem ler. Ler é diferente de
aprender a ler” (BRASIL, 2003, p. 20). Por isso, não se há de confundir aprendizagem da leitura
com o seu objetivo, a compreensão, uma vez que “não é correto tomar a finalidade de uma atividade
como sendo sua definição” (J. MORAIS apud BRASIL, 2003, p. 21). Os autores do relatório citado
advogam que existe diferença entre aprender a ler e ler para aprender. “Ler é diferente de aprender
a ler. Aprender a ler ajuda o leitor a ler. Ler ajuda o leitor a compreender. Para entender um texto
escrito, primeiro o leitor precisa saber ler” (BRASIL, 2003, p. 21). Assim, “as pessoas aprendem a
ler, tornam-se capazes de ler, e usam essa capacidade para aprender a partir do que lêem” (op.cit., p.
21). “As crianças que lêem melhor e mais compreendem o que lêem são as que melhor aprenderam
a decodificar, pois essa habilidade permite que se tornem leitoras eficientes e independentes” (op.
cit., p. 48). Para esses mesmos autores, “ensinar a decodificar e ler com fluência é a forma mais
eficaz de preparar a criança para desenvolver vocabulário e compreensão de textos, posteriormente”
(op. cit., p. 48). Com base nos pressupostos acima, trazemos a reflexão sobre a importância de a
formação linguística e psicolinguística do professor-alfabetizador estar firmada no conhecimento
dos princípios do sistema alfabético do português do Brasil e da consciência fonológica, na
aprendizagem inicial da leitura, com base em Scliar-Cabral (2003; 2009). Neste artigo, analisa-se o
desempenho de um grupo de 42 sujeitos-professores que atuam nas séries iniciais de escolas
municipais de Itabaiana/SE, a partir de um instrumento de pesquisa sob forma de questionário,
aplicado ao grupo, antes de ser iniciado um curso de formação linguística (e metalinguística),
pautado: (i) na importância de estes profissionais compreenderem a necessidade de se trabalhar a
consciência fonológica na alfabetização; (ii) no domínio dos princípios do sistema alfabético do
português do Brasil, e (iii) no combate ao analfabetismo funcional, quando estas abordagens
linguísticas e psicolinguísticas somam à formação docente. Os resultados evidenciam que o
conhecimento linguístico e psicolinguístico destes profissionais pode ser melhorado, para deixar de
ser subaproveitado em suas práticas.
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FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES: COMO DERRUBAR A INIQUIDADE DA
EXCLUSÃO À INFORMAÇÃO?
Maria Celina Teixeira Vieira – PUC/SP
A pesquisa, como um todo, propôs-se a conhecer as condições e a compreensão de leitura de alunos
em processo de formação profissional, de licenciaturas diversas, quando em interação com
diferentes gêneros textuais. Este trabalho está organizado em três subpesquisas articuladas. Neste
momento apresentamos o estudo exploratório sobre o papel do professor formador na mediação da
leitura do futuro professor. Entendemos que a forma como a leitura é trabalhada nos cursos de
formação de professores já estabelece uma relação com a leitura. Tivemos por objetivo averiguar o
papel do curso de formação inicial de professores, enquanto possibilitador de práticas de letramento
diversas e verificar a integração entre biblioteca e sala de aula no planejamento curricular. O estudo
ocorreu numa instituição particular, confessional de referência na cidade de São Paulo, SP, Brasil,
reconhecida nacional e internacionalmente pela formação e atualização de educadores em todos os
níveis de ensino em nosso país. Foram feitas 10 entrevistas semiestruturadas com professores do
curso de formação de professores (Pedagogia). Os professores pesquisados lecionam na
universidade, em média, há 35 anos. Fizeram Mestrado e o Doutorado na área de Educação. A
atualização profissional dos professores é constante e se dá por meio de muita leitura geral e
especializada na elaboração de pesquisas, participação em congressos e preparação dos programas
das disciplinas. Para eles ser professor envolve o aprender que é uma ação que não tem fim. Numa
sociedade letrada em que o conhecimento produzido historicamente pelo Homem está sistematizado
em diferentes linguagens, entre elas a escrita e a leitura é a forma de acesso a ela. Os professores
entendem que ler é uma porta aberta para o universo, para conhecimento, para o lazer. É uma fonte
de encontro com outras pessoas, que estimula a reflexão, a atualização, a provocação e às vezes
acalma. É uma grande competência que se desenvolve em processos desde decodificação até a
interpretação; em que se percebe o que o autor quer transmitir e ao mesmo tempo há uma interação
com os objetivos do leitor na construção de sentido do texto num particular contexto. Os
professores têm possibilitado diferentes experiências de leitura em sala de aula. Todos entendem
que a participação tem que acontecer em sala de aula, através da interpretação que o aluno dá de um
texto. O professor percebe o contexto do aluno e faz uma mediação na compreensão do texto, não
para dizer o que é certo e o que é errado, mas para mostrar como as pessoas pensam e porque
pensam. Nesse processo pedem resenhas, seminários, elaboram questões de estudo ao texto a serem
discutidas em classe. Alguns professores usam a técnica de ler e ir comentando o texto em sala de
aula. Outros preparam uma síntese do texto solicitado e apresentam em classe. Percebem, também,
que a integração entre biblioteca e sala de aula é pequena. Alguns professores procuram usar fontes
digitais, no entanto, preocupam-se com as estratégias desse tipo de leitura, que não é linear e sim
em rede. O papel do professor no diálogo leitor-texto-autor/contexto, portanto, é o de provocador
e/ou incentivador, no sentido de tornar o aluno sujeito do ato de ler, disponibilizando-lhe estratégias
para jogar com as possibilidades de previsão em diferentes tipos de texto. O objetivo último de todo
o mestre é transferir, progressivamente, para os alunos o controle de sua aprendizagem; é tornar-se
desnecessário. (POZO, 2002, p. 273).
EFEITOS DA (FALTA DE) CONSCIÊNCIA SOBRE O SISTEMA VERBAL DO
PORTUGUÊS DO BRASIL EM ALUNOS DO ENSINO MÉDIO
Vera Vasilévski – UFSC
O analfabetismo funcional se inicia na alfabetização e se reflete durante todo o período escolar.
Assim, quando o aluno chega ao Ensino Médio, seu baixo desempenho em leitura já marcou todo o
Ensino Fundamental. Conseqüentemente, novos conteúdos podem não ser bem assimilados por ele.
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A neurociência mostra que cada objeto é identificado com base numa tensão entre seu aspecto
particular e sua ligação com um conceito universal, e essa tensão permite prever, compreender e
explicar, e é a fonte de conceitos e princípios que possibilitam elaborar novas teorias. Assim, ao
tomar conhecimento de um novo conteúdo, o cérebro evoca memórias que podem estar associadas a
ele, para formar novos conceitos. O aluno do Ensino Médio conhece bem o alfabeto e as
dificuldades para escrever. Ele expressa-se bem oralmente, mas não percebe que pode expressar-se
bem na escrita, pois se trata de estruturar as mesmas ideias em outra modalidade da mesma língua.
A falta de habilidade e a insegurança no manuseio da língua escrita, ao grafar as palavras e
organizá-las em sequências que expressem as ideias desejadas, desmotivam o aluno a aprender. Em
parte, isso se deve a ele não ser conscientizado sobre as relações que há ou não entre descodificação
e codificação da língua, ou seja, de conexões entre fonologia, morfologia, sintaxe, semântica,
pragmática, dentre outras áreas, e, então, de não ser bom leitor. A partir dessas considerações e de
dados autênticos de sala de aula, esta apresentação mostra a influência da má alfabetização e da
deficiência em leitura na assimilação de novos conceitos gramaticais, em alunos que iniciam o
Ensino Médio, bem como discute, com apoio nas novas descobertas da neurociência e em recursos
tecnológicos voltados ao processamento de língua natural, uma forma de amenizar essa situação.
A LÍNGUA PORTUGUESA NO "MAGISTÉRIO DA TERRA": UMA ABORDAGEM
DESCOLONIZADORA?
Claudiana Nogueira de Alencar – UFC
Neste trabalho, procuramos investigar as concepções de língua e linguagem na proposta pedagógica
libertadora desenvolvida no Brasil, através do programa de educação do campo do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra- MST. Utilizamos como aparato- teórico metodológico os Estudos
Críticos da Linguagem (RAJAGOPALAN, 2003), a partir de uma investigação-ação que realizada
como educadores/ativistas (SACHS, 2003), atuando na formação de educadores e educadoras do
campo através do Programa Nacional de Educação em áreas de Reforma Agrária (PRONERA) em
assentamentos do nordeste brasileiro. Fruto das discussões desenvolvidas no I Encontro Nacional de
Educadores da Reforma Agrária (ENERA) realizado em 1997, o PRONERA é uma conquista dos
Sem Terra que reivindicavam continuamente uma política de educação situada no campo e
libertadora para os camponeses que vivem em áreas de Reforma Agrária. Nesse sentido, a educação
é a luta contra a violência dos opressores, “afirmada no anseio de liberdade, de justiça, de luta dos
oprimidos, pela recuperação de sua humanidade roubada” (FREIRE, 2005, p. 32). A filosofia da
libertação de Paulo Freire, levada a efeito no projeto educacional do MST constitui-se em projeto
contra a colonialidade do poder (QUIJANO, 2009) que constitui hierarquias coloniais/raciais em
dinâmicas de poder colonizador que atingem preferencialmente as comunidades subalternas
situadas no lado oprimido da diferença colonial. Decidimos, pois, investigar de que modo essas
concepções freirianas são trabalhadas nas aulas de língua portuguesa desenvolvidas no curso
"Magistério da Terra" promovido pelo PRONERA no Ceará de modo a contribuir para uma
abordagem descolonizadora para o ensino da língua portuguesa.
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UM OLHAR SOBRE O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO BILÍNGUE ENTRE OS
A’UWÊ UPTABI, REALIZADO NAS ESCOLAS ESTADUAIS INDÍGENAS NO
MUNICÍPIO DE CAMPINÁPOLIS/MT
Rita Natália Batista da Silva – CEFAPRO/SEDUC-MT
Luciana Akeme Sawasaki Manzano Deluci – CEFAPRO/SEDUC/MT
Este trabalho insere-se em uma pesquisa maior sobre o processo de alfabetização dos alunos A’uwê
Uptabi das escolas estaduais indígenas do município de Campinápolis/MT. Os A’uwê Uptabi
constituem aproximadamente 60% da população deste município, onde está inserida a Terra
Indígena (TI) Parabubure. O povo A’uwê Uptabi mantém-se falante da língua materna: A’uwê
Mreme, portanto a escola nesse contexto e como prevê as diversas legislações a respeito, deve ser
bilíngue. Considerando ainda que este povo tem forte cultura oral, e teve contato com a língua
escrita há 6 décadas, espera-se com este estudo entender como é possível esse ensino bilíngue na
sua essência de maneira a generalizar para outras realidades, ainda de alfabetização monolíngue,
sem fundamentos do letramento, apenas alfabético e ortográfico e, assim, contribuir para a melhoria
do ensino aprendizagem: tanto da língua Materna, quanto do Língua Portuguesa, que é o anseio
dessas comunidades, diminuindo com isto o grande prejuízo à cultura, a sua identidade e
principalmente à língua, como expressão do seu livre pensamento, mas também possibilitando ao
educando o acesso a cultura geral por meio da Língua Portuguesa. Temos um país com 230 povos
indígenas e 180 línguas e para eles a língua portuguesa é a promotora desse diálogo intercultural.
Neste sentido, este projeto tem o objetivo de entender a experiência dos professores indígenas
Xavante, falantes da língua A’uwê, que atuam em escolas estaduais, como o português tem entrado
como segunda língua, como este processo contribui para que este professor alfabetize estudantes
falantes de Xavante e quais caminhos seguir para produção de um material didático específico.
Partindo da concepção da língua escrita como sistema formal, que se legitima pela possibilidade de
uso efetivo nas mais diversas situações e para diferentes fins, somos levados a admitir que o ensino
bilíngue torna-se uma forma de constituir a plena cidadania dos povos indígenas. E éimprescindível
entender esse caminho traçado por essa comunidade no ensino e aprendizagem que articula
conhecimentos e metodologias fundamentados em diferentes ciências, e sua tradução em uma
prática docente que integre o que é da cultura indígena e não-indígena. Aqui compreendido como
sendo o processo de alfabetização, com o desenvolvimento de habilidades e comportamentos de uso
competente da língua escrita nas práticas sociais de leitura e de escrita, pelo processo de letramento.
É uma experiência de educação que considera os projetos societários do povo A’uwê Uptabi.
Enfim, é preciso pensar em uma proposta de educação intercultural e bilíngue que consiga melhorar
as condições de vida destas comunidades, revitalizar a língua materna e os costumes e dar
condições de aprendizagem plena da Língua Portuguesa.
ALFABETIZAÇÃO PARA A INCLUSÃO: UMA FERRAMENTA PARA A FORMAÇÃO
ONLINE PARA PROFESSORES
Ângela Maria Vieira Pinheiro – UFMG
“Educação inclusiva e de qualidade baseia-se no direito de todos a uma efetiva formação que vá de
encontro às necessidades básicas de aprendizagem dos indivíduos e que enriqueça suas vidas.
Focando particularmente nos grupos vulneráveis e marginalizados, esta política garante que cada
aprendiz possa desenvolver sua plena capacidade” (website da UNESCO). Em uma tentativa de
exercitar essa política, Vincent Goetry e Dyslexia International lançaram in 2010 uma plataforma
para a formação de professores chamada Basics for teachers – dyslexia: how to identify it and what
to do. Esse recurso de ensino online e à distância torna acessível aos professores do Ensino
Fundamental o entendimento sobre o que é a dislexia, como identificar essa condição e como
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ensinar a leitura, soletração e escrita para crianças com ou sem dislexia, ajudando aquelas com
dislexia a lidar com suas dificuldades adicionais em concentração, memória e organização. Em
2012 essa plataforma foi traduzida e adaptada para o português brasileiro e implementada no site
dislexiabrasil.com.br. No momento, está sendo testada em uma amostra representativa e aleatória de
professores em Belo Horizonte, M.G.. O presente trabalho objetiva apresentar este site e encorajar a
sua utilização e testagem em diferentes partes do Brasil. A ideia é criar uma rede em que nossos
professores possam se beneficiar deste recurso para que passem efetivamente a alfabetizar seus
alunos para o letramento, levando-os a serem incluídos na sociedade de informação.
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SIMPÓSIO 31
A (TRANS)FORMAÇÃO SOCIOLINGUÍSTICA DOS PROFESSORES
DA EDUCAÇÃO BÁSICA: NOVAS PERSPECTIVAS
Este simpósio tem como objetivo principal discutir a (trans)formação sociolinguística dos
professores da Educação Básica com base em pesquisas etnográficas de/em sala de aula, realizadas
no âmbito da formação inicial e da formação continuada, especificamente nas áreas de Pedagogia e
de Letras. É importante ressaltar que, embora os estudos da Sociolinguística, tanto em sua vertente
variacionista quanto em sua vertente interacional, tenham contribuído para os avanços das pesquisas
relacionadas às questões educacionais, especialmente no tocante ao ensino da língua portuguesa
como língua materna, uma vertente Educacional da Sociolinguística vem despontando
paralelamente com vistas a buscar respostas para questões educacionais surgidas no microcontexto
da escola a fim de entender sua inserção no macrocontexto sociolinguístico e cultural e desenvolver
metodologias que auxiliem os professores em um processo de ensino-aprendizagem mais eficiente
do ponto de vista das habilidades cognitivas para uso da língua e da competência comunicativa dos
alunos (cf. BORTONI-RICARDO, 2005; BORTONI-RICARDO & FREITAS, 2009; SILVA,
2010).
COORDENAÇÃO
Caroline Rodrigues Cardoso
Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal
[email protected]
Kleber Aparecido da Silva
Universidade de Brasília
[email protected]
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FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES ALFABETIZADORES E OS SABERES
SOCIOLINGUÍSTICOS NECESSÁRIOS AO ENSINO DELINGUA MATERNA
Ana Aparecida Moura – UnB
Edinei Carvalho dos Santos – UnB
Grazielle Aparecida de Oliveira Ferreira – UnB
Marcelo Fabiano Rodrigues – UnB
Ângela Elisa de Sillos – UnB
O presente trabalho integra o Projeto Pontes, grupo de pesquisa em andamento coordenada pela
professora Stella Maris Bortoni-Ricardo, cuja proposta é “construir pontes” entre o produto da
pesquisa sistemática da Sociolinguística Educacional e a formação de professores. O principal
objetivo do projeto é a elaboração de um currículo de Sociolinguística Educacional para os cursos
de Licenciatura, especialmente em Pedagogia e Letras, uma vez que muito pouco desse
conhecimento sistematizado tem efetivamente chegado a essas áreas, em especial, àquelas voltadas
para a formação do professor de séries iniciais. Integrando esse grupo de pesquisa, de modo
específico, este trabalho visa refletir sobre o processo de formação continuada de professores
alfabetizadores do curso “Práticas de Letramento e Processos de Alfabetização”, do Centro de
Formação dos Profissionais da Educação de Anápolis, Goiás – CEFOPE no âmbito da
Sociolinguística voltada para a Educação, buscando compreender como os conhecimentos teóricos
(fundamentos da Sociolinguística Educacional) podem ser discutidos com os professores em
formação e estes por sua vez aplicá-los em sala de aula. Diante desse objetivo, algumas questões se
tornam pertinentes e despertaram a atenção dos pesquisadores deste artigo que são: O que os
professores almejam da formação continuada? Quais assuntos são abordados nesses cursos? Eles
trabalham a alfabetização na perspectiva do(s) letramentos(s)? Quais as principais contribuições que
a Sociolinguística Educacional tem a fornecer aos professores em formação? Os dados foram
gerados em atividades de formação (oficinas), registrados como protocolos interacionais, analisados
sob a metodologia da análise da conversação e confrontados com as observações dos pesquisadores
e os textos produzidos pelos professores alfabetizadores cursistas. Com base nos aportes teóricos da
Sociolinguística Interacional (Gamperz, Goffman), dos conceitos de monitoramento estilístico
tratado por Bortoni-Ricardo e do conceito de competência comunicativa de Hymes, buscou-se
elaborar, a partir da interação com grupo em formação, proposições para a formação do professor
alfabetizador, com a finalidade de integrá-las ao currículo proposto.
PEDAGOGOS EM FORMAÇÃO INICIAL E O ENSINO DA LÍNGUA MATERNA:
ENTRE A EXPERIÊNCIA ESCOLAR E A TEORIZAÇÃO DA ALFABETIZAÇÃO
Andréia Da Silva Pereira – UNISUZ
Valquiria Carvalho Machado – UNISUZ
São vastas as discussões sobre a alfabetização e os processos de aquisição da leitura e da escrita. No
campo da formação de professores, o pedagogo tem sido o responsável pela atuação nas séries
iniciais correspondentes à alfabetização. Além disso, avaliações externas como a Provinha Brasil –
aplicada na 1ª série/ 2º ano do Ensino Fundamental-, têm suscitado discussões sobre como
alfabetizar e a metodização ou não do ensino da linguagem escrita. Nesse panorama atual, esta
comunicação é baseada em uma pesquisa de Trabalho de Conclusão de Curso, que questionou quais
expectativas e concepções sobre alfabetização possuíam os professores do último período do curso
de licenciatura em Pedagogia, no ano de 2012, em uma instituição de ensino superior, localizada no
município de Suzano/SP. Mediante o problema apresentado, foi objetivo geral da pesquisa analisar
as expectativas de professores que cursavam o último período do curso de licenciatura em
358
359
pedagogia quanto à atuação em classes de alfabetização. Foram, ainda, objetivos específicos da
pesquisa: 1) analisar os discursos sobre a formação inicial de professores; 2) compreender como os
discursos se relacionam com as expectativas quanto à docência em classes de séries iniciais
(alfabetização); 3) analisar quais as compreensões dos entrevistados sobre os fundamentos teóricos
e práticos da alfabetização. A metodologia para abordagem da temática é baseada na pesquisa
qualitativa, realizada em uma faculdade particular em Suzano, que possuía no ano de 2012 duas
turmas em período noturno, que cursavam o último semestre da licenciatura em Pedagogia Foram
realizadas entrevistas, compostas por sete questões abertas. Para análise das respostas dos
participantes da pesquisa, utilizou-se abordagem dialógica (BAKHTIN, 1992; 2003), com base na
análise do discurso, que se justifica por consideração de que os discursos são variados e agregam
aprendizagens na licenciatura e das vivências escolares dos entrevistados (teoria e prática). Além
disso, a polifonia marca o discurso, pois são muitas concepções e experiências que constroem o
perfil docente. Em relação às análises, do ponto de vista teórico, utiliza-se os estudos de Mortatti
(2006) para aprofundamentos sobre a história dos métodos de alfabetização no Brasil, bem como
uma breve discussão sobre a formação inicial docente. Os resultados mostram que são diversos os
contextos e vivência docentes que constituem as expectativas de professores egressos do curso de
Pedagogia quanto à alfabetização, sendo que os métodos de alfabetização vivenciados pelos
participantes da pesquisa em suas experiências escolares como alfabetizandos se sobrepõem ao que
é discutido no curso de Pedagogia sobre os fundamentos teóricos e práticos nos processos
alfabetizadores.
A IMPORTÂNCIA DA SOCIOLINGUÍSTICA INTERACIONAL NO CONTEXTO DE
LEITURA EM SALA DE AULA
Angélica Torres Vilar de Farias – UFPB
Andréa Tôrres Vilar de Farias – UFPB
É função da escola, estimular no aluno o gosto e o prazer da leitura. Desde a educação infantil, a
criança deve ter oportunidades de vivenciar situações de aprendizagem de leitura e escrita de
maneira atraente e prazerosa e significativa. Para tanto, um ferramenta importante que pode auxiliar
nesse processo é a contação de histórias em sala de aula. Elas exercem um fascínio extremamente
importante para a formação moral da criança e do futuro adulto, pois são caracterizadas por uma
verdade vital que faz com que as crianças construam sua leitura de mundo. A contação de histórias
permite uma interação entre contador e ouvinte propiciando a recomposição de valores oriundos de
experiências coletivas que por vezes se perdem na aceleração da vida moderna. Assim, se faz
necessário que o professor alfabetizador privilegie os aspectos ligados à oralidade no processo de
construção da escrita, uma vez que esta última possui certas peculiaridades que envolvem o
conhecimento linguístico, o uso da fala e sua relação com a escrita. É imprescindível que esses
professores desenvolvam uma alfabetização mais democrática garantindo que as crianças oriundas
de classes populares se apropriem da linguagem escrita e ampliem seus conhecimentos acerca da
língua oral e saibam utilizá-la nos mais variados contextos sociais. Nesse sentido, a sociolinguística
interacional se reveste de grande importância no processo educacional, tendo em vista que a
verdadeira natureza da linguagem é a interação socioverbal e as interações são pois, a base da
comunicação humana. Este artigo é constituído de uma revisão teórica que pretende situar e
destacar a importância da sociolinguística interacional no contexto de leitura em sala de aula.
Acredita-se que a sociolinguística é de suma importância e pode auxiliar o docente alfabetizador em
sua principal tarefa, o ensino da língua materna. Para tanto, em nossas discussões, nos apoiaremos
em teóricos como: Bakhtin, Bortoni-Ricardo, Goffman, Soares, dentre outros.
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360
A CONTRIBUIÇÃO DA PESQUISA SOCIOLINGUÍSTICA NO PROCESSO DE
AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA
Flávia Freitas de Oliveira – UFG/CAC
Gisele da Paz Nunes – UFG/CAC
O interesse pelo Simpósio A (trans)formaçãosociolinguística dos professores da Educação Básica:
novas perspectivas parte do resultado de algumas pesquisas realizadas junto as escolas da rede
municipal da cidade de Catalão, Goiás. Nunes e Oliveira (2011) resenharam os resultados de uma
dessas pesquisas linguísticas em que apresentaram para os professores da rede municipal diferentes
exercícios para se trabalhar a aquisição da escrita levando-se em consideração que cada aluno pode
ter (ou tem) uma variedade linguística diferente. Cada exercício parte do pressuposto de que, se o
professor pretende que o aluno tenha domínio satisfatório da língua escrita, então esse professor
deve entender os fundamentos nos quais a mesma se baseia considerando que esse aluno chega à
escola com um conhecimento linguístico diferente daquele que a escola pretende atingir (linguagem
padrão). Complementamos aqui o fator de variação no uso da língua em sala de aula colocado por
Bortoni-Ricardo (2004) como uma problemática para os professores, já que a escola não parte do
conhecimento “linguístico” que a criança tem de sua fala e da fala de seus colegas, mas parte de
uma fala “padrão” que a priori é estranha à criança (CAGLIARI, 1989, p.29-30), ou seja, a escola
trata seus alunos como falantes de uma mesma língua, nesse caso, do português padrão,
desprezando, na maioria das vezes, a diversidade linguística e cultural existente no Brasil e que,
consequentemente, pode ser observada na interação aluno-professor. Entendemos que
oconhecimento sociolinguístico nos permite refletir sobre a “sistematicidade” das variações
linguísticas existente na nossa sala de aula. Tal teoria considera fatores da própria estrutura da
língua e fatores extralinguísticos que têm relação com o indivíduo em si, sendo assim, pensaremos
na variação existente na sala de aula. Desse modo, o objetivo desse trabalho é refletir a respeito da
influência da fala na aquisição da escrita, e mais do que isso, concluímos que a variedade linguística
em sala de aula não prejudica o ensino-aprendizagem da língua materna e aquisição da línguapadrão e sim, permite a elaboração de atividades que levam os alunos a refletirrem sobre a própria
língua fazendo-os entender que não existe o “certo ou errado”, mas a variação da própria língua.
Com isso, ainda compreendemos que cada “erro” de cada aluno necessita da busca de uma
explicação, ou mesmo de um exercício diferente para se chegar a um resultado satisfatório
valorizando a realidade social e a própria identidade cultural.
A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NO LIVRO DIDÁTICO: UM OLHAR SOB A
PERSPECTIVA SOCIOLINGUÍSTICA
Raimunda Gomes de Carvalho Belini – UFC
Embora possamos identificar grandes e importantes mudanças no cenário da educação brasileira, o
ensino de português na Educação Básica ainda se apresenta dicotômico em relação aos aspectos
variacionistas da língua e seus usos. Ainda priorizamos predominantemente o ensino da gramática
normativa, desvinculado do funcionamento da língua, descontextualizado do uso que se faz na vida
social, com base em prescrições de regras da variedade padrão. Delineamos, nesse sentido, esta
pesquisa, exploratório-descritiva, com abordagem qualitativa, fruto da preocupação em discutirmos
como está posto o ensino da Variação Linguística e a relação da abordagem gramatical com as
contribuições da Sociolinguística. Analisamos o tratamento da Variação Linguística em três livros
didáticos, de uma mesma coleção, de Língua Portuguesa do Ensino Médio e conduzimos a uma
reflexão crítica sobre o tratamento dessa temática em livros didáticos de Língua Portuguesa, cuja
resenha do Guia de Livros Didáticos do PNLD 2012 (BRASIL, 2011) traz excelentes qualitativos.
Os livros analisados apresentam aspectos positivos relacionados ao tratamento das variedades
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linguísticas, principalmente, por enfocar questões relacionadas à oralidade. No entanto, é
importante esclarecermos que, ao examinarmos os três volumes, observamos que os Volumes 01 e
02 não apresentam capítulos específicos sobre a temática, abordando-a de forma limitada. Já o
Volume 03, destinado à 3ª Série do EM, além de trazer um capítulo dedicado, especialmente, ao
tema, apresenta uma abordagem mais ampla do que os outros dois e estabelece comparações entre a
variedade padrão e os usos recorrentes dos falantes, mostrando exemplos de situações do falar
cotidiano ao enfocar o tema Concordância Verbal e Concordância Nominal. Enfatizamos que para
que haja de fato mudanças nos paradigmas atuais do ensino de língua materna, é preciso que o
professor, como protagonista desse processo busque conhecimento sobre as novas concepções de
língua e procure analisar e selecionar criticamente os livros didáticos a serem utilizados no
cotidiano escolar. Além disso, o livro não poderá constituir-se na única fonte de consulta e pesquisa
na sala de aula, tanto pelo professor com pelo aluno.
O REVERSO DA (TRANS) FORMAÇÃO SOCIOLINGUÍSTICA DOS PROFESSORES DA
EDUCAÇÃO BÁSICA: DA PONTA À ACADEMIA
Sandra Rodrigues Sampaio Campêlo – SEE/DF
Este trabalho é um relato das mudanças que vêm ocorrendo no Ensino de Língua Portuguesa há
alguns anos numa visão inversa das discussões que ocorrem em primeira instância nas academias.
Sou professora e minha análise parte sala de aula enquanto profissional e também como aluna. Fiz/
faço parte desta transformação que ora se torna mais clara à medida que aproximo meus estudos e
formação aos estudos dos pesquisadores. Trazemos enraizado em nossa cultura o uso “correto” da
gramática como um padrão único de língua “perfeita”. Um estereótipo que persiste até os dias atuais
por muitos professores. Mattoso alertava desde 1960 que “a norma não pode ser uniforme e rígida.
Ela é elástica e contingente, de acordo com cada situação social específica.” Ainda há uma ilusão
entre os professores de língua materna de que ensinando a escrita culta está ensinando uma língua
satisfatória. Mas um questionamento vem inquietando e provocando mudanças na forma de ensinar:
Por que ensinar Português? O que ensinar para nossos alunos? O que seria significativo para eles?
Outros questionamentos foram feitos nas Universidades e por linguistas que buscavam respostas
para a diversidade do uso da língua na sociedade. A crítica do ensino de Língua Portuguesa no
início dos anos 80 produzida por linguísticas possibilitaram avanços nas áreas de educação e
psicologia da aprendizagem, principalmente no que se refere à aquisição da escrita. Este novo
quadro permitiu a emersão de um corpo relativamente coeso de reflexões sobre a finalidade e os
conteúdos do ensino de língua materna. Vale salientar que estes estudos estão nas Universidades há
uns 30 anos, mas eles demoraram demais para chegar até nós – fim, e mais uma vez há uma
lentidão do professor e da comunidade em absorver tais mudanças. Várias teses desencadearam um
esforço de revisão das práticas de ensino da língua, na direção de orientá-las para a ressignificação
da noção de erro, para a admissão das variedades linguísticas próprias dos alunos, muitas delas
marcadas pelo estigma social, e para a valorização das hipóteses linguísticas elaboradas pelos
alunos no processo de reflexão sobre a linguagem e para o trabalho com textos reais, ao invés de
textos especialmente construídos para o aprendizado da escrita. (PCN, p. 18) Confesso nunca ter
lido o PCN e o Currículo com tamanha precisão nos detalhes até que me propus a fazer este
trabalho. Embora tenha a visão parcial desse processo, me enquadro no grupo da execução: onde
são efetivamente “testadas” as verbalizações da academia. É importante a constante formação do
educador, para que acompanhe com maior precisão e pontualidade tais discussões e se aproprie com
responsabilidade dos novos estudos da área de atuação. “As transformações sociais, políticas e
econômicas que vêm ocorrendo de forma acelerada requerem a formação do cidadão para conviver
com a complexidade do mundo moderno. E, sem dúvida, compete à Educação acompanhar o
desenvolvimento do país e se adequar a suas exigências, sob pena de tornar-se obsoleta e deixar de
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exercer sua função primordial de preparar o aluno para a vida.” (Apresentação do Currículo de
Educação Básica do DF 2002, assinado pela então secretaria de Educação Eurides Brito).
A CONSTITUIÇÃO DE SUJEITOS LETRADOS NO AMBIENTE ESCOLAR
Caroline Rodrigues Cardoso – SEDF
Coadunando-se com o principal objetivo deste simpósio, que é discutir a (trans)formação
sociolinguística dos professores da educação básica, esta apresentação objetiva refletir acerca da
construção dos letramentos escolares e de como professores e alunos deles se apoderam/se
apropriam para se constituírem como sujeitos letrados. Com base em uma pesquisa etnográfica em
uma escola pública de ensino médio do Distrito Federal realizada entre setembro de 2009 e março
de 2010 e em pressupostos da teoria dos Novos Estudos do Letramento, da Teoria da Enunciação
(BAKHTIN, 1997; BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1999), da Sociolinguística Interacional
(GUMPERZ, 2002), da Sociolinguística Educacional (BORTONI-RICARDO, 2005; 2009) e dos
estudos sobre Gêneros Discursivos (BAKHTIN, 1997; BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1999;
BAZERMAN, 2007; 2009; MARCUSCHI, 2005; 2008), analisam-se interações entre professores e
alunos a fim de encontrar respostas para algumas questões: Como se organizam as interações entre
professores e alunos no ambiente escolar? Como professores e alunos têm incorporado elementos
de suas práticas letradas locais às suas práticas letradas escolares? Os eventos de letramentos
escolares são pautados na diversidade de gêneros discursivos? Como têm se desenvolvido as
aprendizagens ligadas à leitura e à escrita dos diversos gêneros discursivos da esfera escolar, ou
seja, como professores e alunos se apoderam/se apropriam dos letramentos escolares? Parte-se da
concepção de letramentos escolares como o conjunto de práticas sociais letradas
predominantemente circunscritas ao domínio escolar/acadêmico, influenciadas em certa medida
pelos letramentos locais e baseadas nas relações de identidade e poder que permeiam as interações
no ambiente escolar cuja ocorrência se dá com objetivos específicos: o ensino e a aprendizagem.
Entende-se que as práticas letradas ideais na escola são as que possibilitam a democratização do
acesso às diversificadas práticas sociais atuais que envolvem a leitura e a escrita multissemiótica;
colaboram na construção da cidadania crítica, ética e protagonista; empoderam os sujeitos em vez
de torná-los impotentes e desestimulados em relação às situações que envolvem a leitura e a escrita
na vida contemporânea. Os resultados da pesquisa evidenciam que a formação dos professores
somada à estrutura física e pedagógica da escola certamente são elementos muito colaborativos na
constituição dos sujeitos letrados no ambiente escolar, mas elemento de fundamental importância é
a configuração interacional entre professores e alunos nos diversos ambientes da escola.
A (TRANS) FORMAÇÃO DE FORMADORES E DE PROFESSORES DE LÍNGUAS NO
ÂMBITO DO PIBID (LETRAS) NA UNB: PERSPECTIVAS E DESAFIOS
Kleber Aparecido da SILVA – UnB
Esta comunicação visa compartilhar o projeto institucional “A educação de professores de
português e a (trans) formação cidadã: Multiletramentos, Plurilinguismo e Transculturalidade”,
desenvolvido desde 2011 pelo departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas (LIP),
da Universidade de Brasília (UnB). A presente apresentação oferecerá as justificativas que
sustentam a implementação do projeto, tendo como base o movimento de uma visão de formação
prescritiva para uma nova perspectiva reflexiva. Os objetivos gerais e específicos do projeto se
organizam no sentido de oferecer oportunidades de desenvolvimento profissional, pedagógico e
pessoal aos licenciandos e profissionais de Língua Portuguesa em ação na rede pública de ensino do
Distrito Federal (DF). A base teórica está ancorada na perspectiva de ensino reflexivo, de
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aprendizagem reflexiva e de transletramento(s) ou letramentos múltiplos, além de ter como
sustentação o programa Gestão da Aprendizagem Escolar II. A proposta iniciada e desenvolvida é
descrita a partir das importantes e elucidativas experiências vividas por três grupos de trabalhos
compostos por licenciandos e professores supervisores, sob a coordenação dos autores: CULT, Ipê e
Geração Y. Com esses exemplos, os pesquisadores presentes serão convidados a compreender
experiências reais e propostas concretas de mudanças que servem de base para considerações sobre
o processo de agência desses participantes e de criação de novas formas de desenvolvimento dos
contextos em foco.
O ESPAÇO E O TEMPO DA ORALIDADE NA SALA DE AULA
Ana Aparecida Vieira de Moura – UnB/IFRR
Marcelo Fabiano Rodrigues Pereira – UnB/ SEEDF
O presente trabalho, parte integrante do Projeto Pontes coordenado pela professora doutora Stella
Maris Bortoni-Ricardo UnB/Capes cujo objetivo é “construir pontes” entre os conhecimentos
científicos desenvolvidos no campo da Sociolinguística e a formação de professores, se propõe a
apresentar reflexões sobre o espaço da oralidade na sala de aula. Pesquisadores desse grupo
identificaram problemas no trabalho pedagógico com alfabetização, leitura e escrita em que a
Sociolinguística tem uma efetiva contribuição a oferecer. Entre esses problemas está a “pouca
ênfase no desenvolvimento da competência oral dos alunos”. Com vistas a discutir essa
problemática, foram levantados os seguintes questionamentos: “como a oralidade tem sido
abordada no planejamento e condução das aulas”? “qual a importância da interação verbal como
estratégia de ensino e aprendizagem”? “Quais são as estratégias usadas, no ambiente de sala de
aula, para desenvolver a competência comunicativa dos alunos na modalidade oral”? As bases
teóricas nas quais este estudo se fundamenta assumem a oralidade como uma prática social
interativa para fins comunicativos que se apresenta sob variadas formas ou gêneros textuais
(Ramos - 1999; Travaglia – 2000; Fávero – 2005; Marcuschi - 1996, 2003; Geraldi - 2002). Os
dados foram coletados na Escola Classe 511 de Samambaia, uma escola pública, situada em zona
urbana e pertencente à Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Os protocolos
analisados nos permitem observar como professores e alunos exercem a oralidade como prática na
escola, e como eles a relacionam com as demais práticas de linguagem. Entende-se ser importante
que o professor assuma essa prática no ensino da língua portuguesa e que desenvolva estratégias
para a ampliação da competência comunicativa dos alunos na modalidade oral como recurso de
letramento. Acredita-se que, ao assumir uma prática escolar dessa natureza os alunos ampliarão sua
competência comunicativa na modalidade oral e serão capazes de refletir sobre seu(s) uso(s) e
adequá-la a diferentes contextos comunicativos.
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SIMPÓSIO 32
ESCRITAS POÉTICAS CONTEMPORÂNEAS DE LÍNGUA
PORTUGUESA
Há um certo consenso de que a baliza inicial da hoje chamada poesia contemporânea de língua
portuguesa remonta ao ocaso das vanguardas do século XX e, portanto, ao fim da tradição da
ruptura que assinala toda a modernidade poética, desde os românticos alemães. Mas a conformidade
de opiniões se encerra no marco inicial, uma vez que a poesia contemporânea parece ser assinalada
por uma grande heterogeneidade, pela ausência de linhas de força mestras, e os modos de olhá-la
têm se mostrado diferentes e, muitas vezes, divergentes. Nesse sentido, se há uma tendência crítica
que valoriza indiscriminadamente a lírica contemporânea, há também uma tendência negativa
generalizante, que nela vê um esvaziamento de uma modernidade excepcionalmente rica. Tanto a
valorização euforizante quanto a negativa generalizante obliteram o exercício da compreensão
crítica. A não permanência de determinados valores consensuais modernos nas produções líricas
contemporâneas, se é que se pode falar verdadeiramente em consenso tendo em vista a pluralidade
das poéticas da modernidade, pode significar que, em lugar da ruína do moderno, o discurso poético
contemporâneo apresenta suas razões de ser particulares, as quais, aprioristicamente, não são
melhores ou piores que as razões da modernidade, mas representam um modo possível de ser e estar
nestes tempos. Em lugar de assumir um gesto de recusa em relação a esse modo de ser, por não se
tratar mais daquele da alta modernidade, ou de incorrer em uma valorização euforizante, cumpre
tentar compreendê-lo em sua complexidade e tensões. Para esse exercício de compreensão das
escritas poéticas contemporâneas de língua portuguesa pretende contribuir este simpósio por meio
da reunião de trabalhos que examinem tais escritas a partir de diversas abordagens, entre as quais
sugerimos: estudo autoral; estudo comparativo; poesia e tradição; poesia e outras artes; ensino de
poesia; poesia e multimeios; estudo de tema ou motivo; metacrítica.
COORDENAÇÃO
Antônio Donizeti Pires
Universidade Estadual Paulista, Campus de Araraquara
[email protected]
Solange Fiuza Cardoso Yokozawa
Universidade Federal de Goiás
[email protected]
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O SUJEITO LÍRICO FORA DE SI: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A
SUBJETIVIDADE NA POESIA MODERNA E CONTEMPORÂNEA
Lidiane Alves do Nascimento – UFG
Ao investigarmos o modo de ser do sujeito moderno e contemporâneo, torna-se pertinente buscar
compreender a constituição do sujeito, desde a Antiguidade, percorrendo os meandros que
alinhavaram suas transformações. Ocorre que, entre os antigos gregos, o problema do sujeito não
fazia parte do que fundamentava o pensamento filosófico e a gama de conhecimentos que se erigia.
De fato, o sujeito tornou-se um problema, no início da Idade Moderna, séc. XVII, com Descartes e
o avanço das ciências e do pensamento investigativo, que permitiu ao indivíduo a tomada de
consciência de si e da sua subjetividade, sabendo-se existente no interstício entre a realidade e o
conhecimento. Com o avanço do progresso científico e a relativização das noções de verdade,
emergem, pois, a dúvida e a perda de estabilidade dos valores absolutos precedentes ao mundo
moderno. O sujeito, ao tomar consciência de sua constituição, vê suplantado o seu estado de fixidez
e soberania. Na cena da literatura, o ato de nortear-se pela consciência crítica, fundado no
Romantismo dos alemães de Jena, em fins do século XVIII, estruturou um modelo poético de
características inovadoras, que teria em mira a poesia como sinônimo de consciência, a transformar
a própria consciência da poesia em material poético. A conjunção entre poesia e crítica encetada
pelos românticos é, então, efetivada pela tríade francesa: Baudelaire, Rimbaud e Mallarmé,
considerados fundadores da modernidade literária, para ela estabelecendo novos paradigmas.
Baudelaire inaugura a despersonalização da lírica, dela destoando a unidade e a pessoa empírica;
Rimbaud, no mergulho em si mesmo, afirmará que “eu é o outro”; Mallarmé dirá que a poesia se
faz com palavras e não com ideias. Concorrendo para a despersonalização do sujeito, podemos citar
também a estética do sujeito fingido, em Pessoa, em que “eu é muitos outros”. No cenário de crise e
instabilidade do “eu”, pensado como a expressão da subjetividade pessoal, que se vai, doravante,
esboçando, o sujeito não chega a ser suplantado, conseguindo, no entanto, imprimir, no âmbito da
linguagem, a sua transformação, “no movimento que o faz sair de si para se reencontrar e se reunir
com os outros no horizonte do poema” (COLLOT, 2004, p. 168). Na experiência de seu
pertencimento ao outro, ao tempo, ao mundo, à linguagem e não mais a si, o sujeito moderno
assevera a reinterpretação da subjetividade lírica, marcada pela demolição do imperialismo do “eu”
hegeliano, o que acarreta a crise da ideia de interioridade e identidade. Nessa perspectiva,
sublinhamos o aspecto da expulsão do sujeito do poema, a testificar o redimensionamento do olhar
do poeta sobre o mundo, um olhar, não raro, matizado pela aparente impessoalidade.
O PROCESSO DE CRIAÇÃO DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE: O POETA
ENTRE A CONFISSÃO E A RESTRIÇÃO
Larissa Cardoso Beltrão – PG/UFG
Jamesson Buarque – D-METÁFORA/FL/UFG
Ao longo deste trabalho temos como objetivo evidenciar a relevância do processo contingencial
para a produção poética de Carlos Drummond de Andrade. Com vistas a comprovar, a partir de
parte de sua obra, que as restrições, impostas por ele, durante o fazer poético são cruciais para o
resultado de sua criação artística. Ademais, colaboram, de forma direta, para a afirmação de sua
pretensão de dizer a vida a partir de sua poesia. Para tanto partiremos de três de seus mais célebres
poemas, Confidência do itabirano, Infância e Sentimento do mundo, bem como de algumas
declarações do próprio poeta, relacionadas ao seu fazer poético, com o intuito de evidenciar as
linhas instauradas na poética drummondiana, justamente, a partir suas impossibilidades e que o
colocam em uma situação privilegiada, à medida que são, exatamente, as auto restrições, impostas
pelo poeta, que lhe conferem uma enorme gama de possibilidades de dizer-se, inventar-se e,
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principalmente, confessar-se a partir de seus versos. Ademais, as restrições às quais o poeta
submete-se, ao longo de seu processo de criação, vão sendo colocadas em cena a partir de alguns
elementos que surgirão dentro da poética drummondiana: fatos, situações, lugares e pessoas. Ao
reconhecer a vida como matéria de poesia, de acordo com a visão de Bakhtin (2010), o poeta
coloca-nos, enquanto leitores, diante de uma obra imbuída de preocupação e valoração social, à
medida que apresenta-nos o poeta como um alguém revestido de preocupação não somente estética,
mas também social e política. Desse modo, observamos que a percepção de Drummond é aguçada
pela perspectiva do olhar que ele lança tanto para dentro de si, interiormente, quanto a captura
resultante de flashes externos, uma vez que ele flagra os elementos que citamos anteriormente,
remete-nos a uma obra que tem como fio de criação a vida humana, com suas virtudes e mazelas.
Procuraremos, portanto, evidenciar a relevância do processo contingencial para a produção poética
drummondiana, de modo a comprovar que auto-restrição, imposta por ele é crucial, para o seu
processo de criação, bem como colabora de forma direta para a afirmação de seu estilo de dizer a
vida. Para tanto, fundamentamos nosso trabalho em Bakhtin (2010), Arrigucci (2002), Elster
(2009), Longino (1996) e Neto (2010).
O PROJETO DE CRIAÇÃO COMO CONSTITUIÇÃO DA AUTORIA EM PSICOLOGIA
DA COMPOSIÇÃO, DE JOÃO CABRAL DE MELO NETO
Gustavo Ponciano Cunha de Oliveira – FL/UFG
A proposta deste trabalho é apontar o projeto de criação como possibilidade de apreensão da
constituição de autoria, tomando como objeto a trilogia Psicologia da composição (1947), de João
Cabral de Melo Neto. A hipótese é a de que o referido texto é um meio de acesso privilegiado à
autoria e à criação não por apenas discutir seu plano poético, mas por tornar-se o próprio texto
literário o plano criativo. Na leitura, faz-se o levantamento de imagens e estratégias de composição
a partir da identificação de uma operação da função autor, como a compreende Foucault, no próprio
texto literário. Apreende-se que o autor Cabral cria na tensão injunção/inspiração, tendendo ao
primeiro de seus polos. O poeta parte da ausência, da não presença de inspiração. A fabricação do
texto é ordem sem espaço para o acaso. Tema e material não lhe são presenteados, nem por um
dom, por uma possessão ou por seu inconsciente; o poeta os escolhe e não há o que não possa
resultar em poesia: flor ou fezes. A injunção e o rigor são instrumentos fundamentais para a
composição poética: com eles o trabalho se fará forma. Fundado no rigor, o trabalho de composição
será lento, por vezes doloroso: o longo tempo dará oportunidade à correção, à autocrítica, aos
cortes, às adições e aos enxertos; em grau máximo, tende à não realização da poesia. Finalizado o
trabalho, o poeta, já ausente de seu texto, depara-se com sua produção. Além de constatar esta
ausência, há ainda no criador, tamanho é o seu rigor, uma relevante parcela de insatisfação ou
dúvida com relação a seu produto porque reconhece que atua na tensão injunção/inspiração; a
criação dá-se na crise. Diante desta insatisfação e da recorrente ausência do texto, o poeta está
novamente apto a criar, partindo mais uma vez do nada.
IMAGENS DE CIDADE EM POÉTICAS DA MODERNIDADE: RECIFE PARA
BANDEIRA, ITABIRA PARA DRUMMOND, GOIÁS PARA CORA CORALINA
Thaise Monteiro – FL/UFG
A cidade passa a ser tópico da literatura em consequência dos processos de urbanização e
modernização, bem como outros processos históricos que afetaram o homem como sujeito social
que é, o que incide também na cidade como elemento matricial em algumas vozes da poesia lírica
brasileira ao longo do século passado, matriz para criação de imagens, representações poéticas. A
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poetisa goiana Cora Coralina constrói imagens tendo como referência sua cidade e assim Goiás é
sua referência primordial, matriz para seu canto, principal metáfora do seu existir poético. A autora,
a exemplo de Baudelaire e da tradição moderna, também desentranhou o seu heroísmo do lixo
humano, das “vidas obscuras” que a sociedade condenou à clandestinidade dos becos. Mesmo que
alguns críticos destaquem o desprendimento da poetisa de qualquer tradição literária, e dela mesma
reiterar esse desprendimento, verifica-se em sua poética, como quando canta a “gentinha” do beco
da sua cidade, que fala em uníssono com a modernidade literária e o modernismo brasileiro. O
poeta Carlos Drummond de Andrade conheceu a poesia de Cora Coralina em Poemas dos becos de
Goiás e estórias mais, impressionado escreveu à poetisa uma carta no dia 14 de julho de 1979 e
enviou para a Editora Universitária, pois não tinha o endereço da autora. Na carta Drummond diz
que o verso de Cora é como água corrente, que seu lirismo tem a força e a delicadeza das coisas
naturais e segue com a seguinte exclamação: “Ah! Você me dá saudades de Minas, tão irmã do teu
Goiás!”. Ainda acerca da poesia de Cora, Drummond escreveu a crônica “Cora Coralina, de Goiás”
e publicou no Caderno B do Jornal do Brasil em 27 de dezembro de 1980. Na crônica, que
atualmente se encontra nas edições de Vintém de cobre (segundo livro de poemas de Cora), o poeta
apresentou a escritora, destacou e analisou trechos de poemas e apontou algumas de suas
características, entre elas seu sortido depósito de memórias e sua identificação com Manuel
Bandeira. Com base numa possível relação entre Cora Coralina, Drummond e Bandeira além do
fato de os três rejeitarem a distinção entre temas poéticos e não poéticos, de os três poetizarem o
que até então permanecera fora das esferas poéticas, surgindo personagens como João Gostoso de
“Poema tirado de uma notícia de jornal”, o moço leiteiro, de “Morte do leiteiro”, e a prostituta
mesentérica de “Becos de Goiás”, tipos humanos das margens sociais, numa atitude poética da
modernidade, os três poetas poetizam a cidade onde nasceram e viveram sua infância, assim, com
base nessas relações o objetivo deste trabalho é verificar como se configura a cidade na obra dos
poetas. Recife, Itabira e a Cidade de Goiás são representações poéticas, imagens fundadas na
memória dos autores, e a partir dela, a memória, verificaremos as configurações de cada cidade.
Para tanto, a obra de Bandeira solicitada, em que alguns poemas são permeados pela memória da
cidade, é Libertinagem; de Drummond, Boitempo; e de Cora Coralina, Poemas dos becos de Goiás
e estórias mais. Para fundamentar a discussão sobre memória e imagem como instrumento usado
pelos poetas para recriarem suas cidades, foram tomados como principais referenciais teóricos
Paul Ricoeur, em Metáfora Viva, Octavio Paz, em “A Imagem”, Maurice Halbwachs, em “A
memória coletiva”.
A ORALIDADE E A REPRESENTAÇÃO DO IMAGINÁRIO DA CIDADE DE GOIÁS NA
OBRA “POEMAS DOS BECOS DE GOIÁS E ESTÓRIAS MAIS” CORA CORALINA.
Jadson Borges de Assis – UEG
O objetivo desta pesquisa é analisar os traços de oralidade e a representação do imaginário da
Cidade de Goiás presente na obra Poemas dos becos de Goiás e Estórias mais, da escritora goiana
Cora Coralina. Poeta, contista e doceira a “menina da casa da ponte” é uma das personalidades mais
irreverentes da história de Goiás, e ganhou seu espaço na Literatura Brasileira divulgando através
de sua obra literária sutil e doce, a Cidade de Goiás para todo o Brasil, fazendo que o seu leitor
retroceda em um mundo repleto de histórias e crendices da cultura popular local, ganhado renome e
tornando-se um dos principais ícones da literatura contemporânea, imortalizando-se através de seus
escritos, Cora Coralina é hoje uma grande referência na literatura goiana. Sendo a autora uma
representante das ruas e becos vilaboenses é possível perceber em seu texto traços da oralidade
local e a representatividade de uma cidade sob o olhar doce de “Aninha”, onde percebe-se também
um espaço cultural, identifica-se em sua obra uma cidade construída em um olhar simples e
delicadamente feminino, mostrando bem mais do que espaço físico, uma representação viva de uma
cidade que se revela berço goiano da diversidade cultural, revelado através de uma linguagem
singular com traços de regionalismo local. A análise se dará atrás da constatação da oralidade e a
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percepção do imaginário literário da cidade de Goiás construído por Cora Coralina. Assim, a
pesquisa caracterizará como bibliográfica, já que o corpus será a obra mencionada anteriormente e
para que se tenha feição científica utilizarei dos seguintes pressupostos teóricos: Brito (2009)
Camargo (2002) Candido (1985) Delgado (2003) e outros que façam referência ao assunto.
O FAZER POÉTICO E A ESCRITA DO CORPO EM CHUVA DE OURO
Nismária Alves David Barros – UEG
Dentre as várias vozes individuais na poesia brasileira contemporânea, este trabalho elege o livro de
poemas Chuva de ouro (2000), da escritora goiana Yêda Schmaltz (1941-2003), a fim de estudar o
entrelaçamento de metapoesia e erotismo em sua lírica. Por essa razão, recorremos a Octavio Paz
(1994) que aborda a criação poética relacionada ao erotismo, no sentido de que a poesia é uma
erótica verbal e o erotismo é, por sua vez, uma poética corporal. Na análise do erotismo poético na
lírica brasileira contemporânea de autoria feminina, Angélica Soares (1999) aborda a tensão entre a
consciência literária do erotismo e a consciência erótica do literário. Nos poemas schmaltzianos,
explora-se o erotismo feminino e, assim, a matéria erótica torna-se matéria de poesia, constituindose em uma forma de liberação da subjetividade e de expressão do desejo. Composto por duas partes,
“Dânae” e “Obelysco”, Chuva de Ouro exibe várias imagens que tocam a questão do amor, sendo
que a mulher é o sujeito que deseja (e ama), em vez de ser o objeto de desejo (e de amor),
expressando a corporalidade pelo viés feminino. Ao analisar a corporalidade feminina na literatura,
Elódia Xavier (2007) destaca que as escritoras adentram no âmbito literário marcadamente
masculino e passam a expor o corpo erotizado, representando a sensualidade e o prazer, mediante
um discurso de sensações que permitem ao leitor recriar a experiência erótica. Considerando isso,
perguntamos qual é a identidade de mulher construída no corpo do livro em questão? Como se
vinculam corpo e poesia nos poemas desta poeta-mulher? Como estudar esta poesia de autoria
feminina por meio da questão corporal? Buscando responder essas perguntas, pretendemos
demonstrar a singularidade da escrita literária de Schmaltz, bem como colaborar com a busca de
compreensão da lírica brasileira contemporânea e, em especial, com a discussão sobre a poesia de
autoria feminina.
OS FIOS DO DESEJO NA POESIA ERÓTICA DE YÊDA SCHMALTZ
Paulo Antônio Vieira Júnior – UFG
A poesia de Yêda Schmaltz é fortemente assinalada pelos temas do erotismo desde a primeira
publicação em livro da autora. A partir dos anos 1970, o erotismo na obra yediana se manifesta
através da reinvenção de personagens mitológicas, a exemplo de Penélope, Eco, Narciso, Baco,
Áthis e Sulamita. Tomando como matéria de estudo as obras em verso da autora, a pesquisa de
doutoramento ora desenvolvida, detém-se sobre as obras fruto de sua maturidade poética: A
alquimia dos nós (1979), Baco e Anas brasileiras (1985) e A ti Áthis (1988). Tais obras estão em
consonância com o poetar moderno à medida que empreendem resistência simbólica por meio da
sobrevalorização do erotismo e pela volta a um passado situado como ideal. Os versos de Yêda
Schmaltz estão em conformidade, ainda, com o praticado pelas escritoras brasileiras a partir dos
anos 1970, quando Eros é convocado na busca da (re)constituição da identidade feminina. O
passado mitológico, o erotismo e a preponderância do corpo e das emoções, enfim, surge na poesia
yediana como uma forma de valorização da própria poesia ao asseverar a estreita relação entre
poesia e erotismo.
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INSTANTE POÉTICO: A HORA ABERTA DE GILBERTO MENDONÇA TELES
Rosemary Ferreira de Souza – UNIMONTES/PPGL/FAPEMIG
Ilca Vieira de Oliveira – PPGL/UNIMONTES
Este trabalho propõe uma leitura do poema “Hora aberta” da obra Arte de armar, de Gilberto
Mendonça Teles. A discussão será voltada para o ato de criação do poeta, que com a propriedade de
quem está munido de legítima confiança adentra na pontualidade do seu fazer poético. Nesse
sentido, a Hora aberta é o momento propício de criação e tem a ver com “as horas abertas” ou
“horas redondas” (seis da manhã, meio dia, seis horas da tarde e meia noite), relacionadas ao tempo
para a meditação e o encontro com o sagrado. A expressão hora aberta, tanto pode referir-se ao
momento místico, como à hora em que se abre para os sopros da inspiração. Este estudo será
incorporado na Dissertação de Mestrado sobre a trilogia Sintaxe invisível (1967), A raiz da fala
(1972) e Arte de armar (1977) de Gilberto Mendonça Teles. O aporte teórico utilizado se valerá das
contribuições de Alfredo Bosi, Gaston Bachelard, Jean Chevalier e A. Cheerbrant e Octávio Paz.
SOBRE POESIA CONTEMPORÂNEA E LEITOR: O CASO PAULO LEMINSKI
Solange Fiuza Cardoso Yokozawa – UFG
Proponho refletir sobre a relação entre poesia e leitor na contemporaneidade a partir do exame dos
ensaios críticos do poeta Paulo Leminski, das cartas que escreveu a Régis Bonvicino e do modo
como reorientou sua poesia tendo em vista o desejo de se comunicar com um público mais
horizontal. Em um primeiro momento, tecerei breves considerações sobre a relação entre poesia e
leitor na modernidade, numa tentativa de verificar o que se reconfigura nessa relação na passagem
para a contemporaneidade. Em seguida, acompanharei o caso Paulo Leminski. Apesar do seu
caráter relativo e parcial, a concepção de uma lírica hermética, que se afasta deliberadamente do
leitor mediano, firmou-se como traço caracterizador da modernidade quando a intenção do crítico é
sobrelevar as diferenças e proceder a uma descrição geral do fenômeno poético. Essa visão,
conforme as narrativas ainda em processo sobre poesia contemporânea, seria revista, sobretudo,
com o esgotamento da tradição da ruptura e, poder-se-ia acrescentar, com a grande voga, na
segunda metade do século XX, das teorias sobre o leitor; o que levaria a acreditar que, na
contemporaneidade, em lugar da indiferença ou mesmo da agressão, a parceria é a palavra de ordem
para caracterizar a relação entre poesia e receptor. Mas se há, de fato, uma mudança discursiva em
relação ao papel do leitor, professada pelos próprios poetas, esta se apresenta relativa e
problemática. Também, não nasceu com os contemporâneos, mas foi gestada dentro da própria
modernidade, como o atesta uma conhecida conferência proferida por João Cabral de Melo Neto, na
década de 1950, cujo objetivo era contribuir para diminuir o abismo entre poesia e leitor. A
preocupação de Cabral com a comunicação se tornará fulcral para Paulo Leminski, que nasceu,
como outros contemporâneos, no seio de uma vanguarda, a poesia concreta. Movido por uma
inquietação poética, por uma desconfiança em relação a todas as verdades, mormente aquelas
propostas pela vanguarda, incorporando outras influências, inclusive não literárias, como a
linguagem publicitária e a MPB, e tocado pela necessidade de falar a um público mais amplo,
Leminski reorientou sua obra, afastando-se do concretismo, e se fez um dos poetas contemporâneos
de maior apelo público. As tensões e contradições que movem o poeta nessa reorientação criativa
podem ser acompanhadas em sua crítica. Nos Ensaios e anseios crípticos, escritos entre 1976 e
1986, e hoje reunidos pela Editora da UNICAMP, encontramos, em vários momentos, um poeta
que, sob o signo da vanguarda, faz um malabarismo na tentativa de conciliar inovação e
comunicação e as incoerências são inevitáveis quando pulamos de um para outro ensaio. São as
cartas de Leminski enviadas ao poeta e amigo Régis Bonvicino, escritas entre os anos de 1976 a
1981, que permitem acompanhar o quanto o fiel da balança vai pendendo cada vez mais para o lado
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da comunicação e evidenciam como o poeta vai se afastando deliberadamente do ideário do
concretismo em prol do desejo de falar ao leitor mediano. Sua obra criativa reflete esse afastamento
que, não poucas vezes, reveste-se em crítica à vanguarda mãe. Para parte da crítica, esse
afastamento significou afrouxamento das tensões da vanguarda, de modo que o poeta que nasceu
maduro, com o romance Catatau, se apequena. Entretanto, tendo em vista o projeto que o autor foi
traçando para si, é preciso compreender as soluções poéticas que ele encontrou para sua poesia.
A AUTOFICÇÃO DE ANA CRISTINA CÉSAR
Mariana Nunes de Freitas – PGLET/UFU
Heloisa Buarque de Hollanda, em seu livro 26 poetas hoje, reuniu nessa antologia os mais
talentosos poetas da geração de 70 ou geração mimeógrafo. Em meio a artistas como Cacaso,
Francisco Alvim, Roberto Piva, Torquato Neto, Chacal e Roberto Schwarz, destaca-se Ana Cristina
César (1952), uma figura polêmica que, após ter cometido suicídio em 1983, teve sua genialidade
reconhecida no meio acadêmico e artístico. Tal morte trágica é um assunto privilegiado pela crítica
que, de modo geral, explica a subjetividade característica da produção de Ana C. por meio de traços
(auto)biográficos, como viagens, carreira, leituras, relações afetivas e até mesmo opção sexual.
Todavia, a estudiosa Flora Süssekind, no livro Até segunda ordem não me risque nada: os
cadernos, rascunhos e a poesia-em-vozes de Ana Cristina César, adota uma postura mais
“equilibrada” entre “biográfico, demasiado biográfico” ou o “literário, apenas literário”, em que
arrisca uma aproximação crítica da escrita dessa poeta. Nesse sentido, este trabalho apresenta-se, no
intuito de analisar a poesia de Ana C. sob o viés da crítica literária e não apenas sob a perspectiva
biográfica; a proposta é, portanto, analisar a autoficcionalização dessa literatura tão singular e de
uma dicção bastante intimista. Para tanto, a pesquisa de Philippe Lejeune, principalmente em O
pacto autobiográfico, e o estudo de Leonor Arfuch em O espaço biográfico: dilemas da
subjetividade contemporânea serão inicialmente de grande valia para atestar a que subjetividade e,
consequentemente, a (auto)biografia são uma necessidade contemporânea de um sujeito
fragmentado pelo individualismo, pela cultura cristã e pelo capitalismo. Sendo assim, Clara Rocha
em Máscaras de Narciso ainda acrescenta que devem ser considerados critérios para análise de
textos pretensiosamente (auto)biográficos, tendo em vista que o poeta que arrisca-se pela “escrita de
si” passa por dois dilemas; o primeiro é que a “baba” das palavras que deixa atrás de si não é a vida,
mas sim apenas um sinal da vida; o segundo problema é que a procura de uma identidade por meio
da escrita é sempre um exercício constante e inconcluso. Dessa forma, justifica-se o presente
trabalho, fruto de uma pesquisa de Mestrado em Teoria Literária, contribuir para a crítica ao
analisar os poemas de Ana Cristina César sob o viés da autoficção.
A MÁQUINA DO MUNDO (RE)QUEBRADA: POESIA E LINGUAGEM EM POR MARES
NUNCA DANTES DE GERALDO CARNEIRO
Leonardo Vicente Vivaldo – UNESP-Araraquara
Por mares nunca dantes, do poeta Geraldo Carneiro, é um poema épico-burlesco cujo protagonista
mais visível é o poeta Luís Vaz de Camões – que, durante a travessia do Cabo das Tormentas
(viagem que nunca aconteceu: apenas num erro biobibliográfico do filósofo francês Voltaire), cai,
devido a um “estranho estratagema astral”, no Rio de Janeiro de hoje: com seus “officetubinamboys”, executivos, prostitutas, travestis e pais de santos. A viagem imaginária de Camões
serve de pretexto para a viagem poética de Geraldo Carneiro na qual se misturam as falas do
português de diversas épocas. Portanto, por trás das peripécias de Luís Vaz, pela “terra das
vergonhas saradinhas”, conforme expressão do próprio Pero Vaz de Caminha (rima (in)voluntária),
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o grande protagonista de Por Mares Nunca Dantes é mesmo a própria linguagem. Entretanto, ainda
que partindo da hipótese da linguagem como principal arma, com ou sem varão, para o construto do
poema de Geraldo Carneiro, ou seja: sua essência caracteristicamente lírica, a leitura proposta para
este trabalho consiste em apurar mais detidamente as ferramentas expressivas que possibilitam a
comparação (por semelhança ou diferença) de por mares nunca dantes como um poema que, ainda
que conscientemente, mesmo tentando escapar das convenções épicas, acaba por usar ferramentas
dessa como “os vestígios de um amor contra o qual se luta, mas que não pode suprimir-se” (JESI,
1976, p. 207). Para adensar tal análise, foi levada em conta a ferramenta de construção de imagens
através do texto (fanopéia) e ferramenta de construção do texto através da imagem e do pensamento
(logopéia) – sendo que ambos são não apenas procedimentos comuns da epopéia, mas também
possibilidades de recursos cinematográficos (cortes, planos, etc) que vão aproximando Por mares
nunca dantes a outras epopéias – de Odisséia a Eneída – passando por Divina Comédia e, claro, Os
Lusíadas.
ESCRITAS POÉTICAS CONTEMPORÂNEAS: O CASO HAROLDO DE CAMPOS
Diana Junkes Martha Toneto – UNESP/ São José do Rio Preto
Haroldo de Campos é inegavelmente um dos maiores poetas brasileiros do século XX. Sua obra
poética constitui-se como um dos pontos cruciais para a avaliação das marcas da modernidade na
poesia brasileira pós-45 no que diz respeito aos preceitos de invenção, renovação das formas e
continuidade do discurso das vanguardas históricas, ao mesmo tempo que aponta para um
movimento profundo de leitura do cânone, o qual, por ser relido e recriado passa a constituir o
próprio discurso do autor. Além da obra poética, Haroldo de Campos dedicou-se a um amplo e
importante trabalho tradutório e, da mesma forma que a leitura do cânone é incorporada aos
poemas, a tradução influi grandemente no pensamento poético haroldiano, de modo que sua obra se
torna um curioso e desafiador palimpsesto. À poesia e à tradução soma-se a atividade crítica
exercida pelo poeta com muita perspicácia. Essas três linhas de força, a saber, criação poética,
tradução e crítica definem, a meu ver, um modo de estar do poeta na contemporaneidade que
culmina com suas reflexões sobre a poesia pós-utópica, a que ele chama de poesia da agoridade.
Tais reflexões assinalam uma perspectiva de leitura da situação do poeta, das poéticas e da poesia
no mundo contemporâneo à medida que apontam tanto para uma crise da subjetividade, que tem a
ver com a administração da herança da tradição; para uma crise da poesia moderna, que encontra,
na contemporaneidade, outros modo de ser e estar no mundo; e para uma crise da própria esfera da
crítica que, necessariamente, deve situar-se de modo a dialogar e enfrentar a multiplicidade do
contemporâneo. O objetivo desta comunicação é traçar algumas considerações sobre as escritas
contemporâneas de poesia tomando como ponto de partida a obra haroldiana. Serão analisados
alguns poemas do poeta em conjunto com transcriações e textos críticos para que as relações acima
apontadas possam ser mais bem elucidadas e debatidas.
OS AUTORRETRATOS NA LITERATURA BRASILEIRA: A SUBJETIVIDADE E SEUS
FOCOS NA LÍRICA CONTEMPORÂNEA
Elaine Cristina Cintra – UFU
É senso comum, nos dias atuais, afirmar a subjetividade lírica na contemporaneidade como
fraturada, fragmentada, em um longo processo de diluição que marcaria o ocaso da modernidade.
Essa hipótese pode ser testada na análise dos autorretratos que percorrem a poesia brasileira
contemporânea, uma vez que esta forma de escrita de si é tida por Clara Rocha (1992), como a que
mais dialoga com a linguagem poética, já que foge à ordenação cronológica do diário e da
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autobiografia, e não obedece a nenhum modelo, sendo, a cada vez, reinventado como único. Neste
trabalho, pretende-se percorrer mais especificamente três momentos em que o autorretrato apresenta
não só a inscrição de uma subjetividade, mas como esta se instaura como problemática em um
tempo tido como espectro de seu próprio projeto histórico. Assim, aqui proponho pesquisar os
autorretratos especulares de Sebastião Uchôa Leite, que, em espelhos trânsfugos, apresentam uma
figura que se esquiva de seu próprio olhar; os autorretratos de Júlio Castanõn Guimarães, no qual o
exercício pictorial de si mesmo resulta em uma quase figura, ou em um quase sujeito; e, por fim, o
álbum de retrato de Jorge Wanderley, que, dialogando com a autobiografia e a memória, compoem
um autorretrato imerso em um quadro histórico-pessoal, no qual emerge um sujeito destinado ao
nada. A partir do levantamento dessas pinturas de si, será possível analisar a hipótese do sujeito em
diluição, que a crítica antecipa nas leituras da poesia contemporânea, para perceber sua validade e a
importância da questão na análise da expressão poética hoje.
O PROCESSO DE CRIAÇÃO POÉTICA DE GERARDO MELLO MOURÃO
Jamesson Buarque – UFG
Eveline Almeida – UFG
A poesia ensina à poesia a ser poesia, portanto, somente há o poeta porque todo um investimento de
sujeitos, instituições, condutas e valores se arregimentaram de época a época e de lugar em lugar.
Um poeta, ainda que disto não tenha consciência, forma o outro. Este trabalho, como um dos
produtos do projeto de pesquisa “Estudos de recepção, ensino e criação de poesia”, que congrega
vários projetos de orientação em nível de graduação (licenciatura e bacharelado) e de pós-graduação
(mestrado e doutorado), decorreu da abordagem crítica da criação poética de Gerardo Mello
Mourão como poeta formulador de um universo mítico-histórico a partir do alinhamento de dois
domínios da língua portuguesa. Para desenvolver o trabalho, a investigação tomou como referência
a máxima longiniana de que a natureza dá a si mesma uma regra, logo, há nela um método a ser
observado, e este delimita e colabora com o que o poeta deve e precisa fazer. Como este produto
resulta de uma investigação sobre a prática da criação poética de Mello Mourão, toda a poesia deste
foi considerada no corpus, assim como arquivos que dizem respeito a sua formação estética. Em
termos teóricos, sobretudo buscamo-nos orientar pelos princípios de acabamento estético de
Bakhtin, no que diz respeito a uma teoria da autoria, e pelos fundamentos da teoria da restrição
estética de Elster. Especificamente no caso de restrição, observamos que Mello Mourão produz
poesia a partir de uma auto-restrição limitada ao trabalho sobre o âmbito formal mais erudito da
língua portuguesa em composição ao âmbito mais popular próprio das regiões sertanejas do
Nordeste brasileiro, produzindo uma espécie de dialeto poético arcaico que, no cenário da poesia
brasileira contemporânea, se apresenta como um caso peculiar da criação pela técnica da colagem,
da articulação de fragmentos do tempo histórico para nobilizar em dimensão mítica a nação, como
se esta tivesse uma origem digna de uma epopeia. Nesse sentido, observamos que o poeta trabalha
sua criação por uma via formular, como se tivesse inventado um sistema gerador de poemas, sejam
estes pertinentes aos mais variados temas da tradição literária: a guerra, a morte, o amor, a viagem
etc. De resultado, em virtude da formação estética erudita e da formação poética popular, Gerardo
Mello Mourão produz para a poesia brasileira contemporânea um mosaico lírico jamais
ensimesmado, nem meditativo nem emotivamente comprometido, posto que de olhar lançado ao
conjunto de vida da formação histórica dos brasileiros.
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O FATO SOCIAL E O FATO ESTÉTICO:LEITURA DE DOIS POEMAS
CONTEMPORÂNEOS
Antônio Donizeti Pires – UNESP/Araraquara
Bruno Darcoleto Malavolta – UNESP/Araraquara
A relação “literatura e sociedade”, em seus aspectos pares, ímpares ou díspares, é objeto de
investigação dos próprios estudos literários (história, teoria e crítica literárias), mas também de
ciências humanas afins à literatura como a sociologia, a filosofia, a história, a antropologia. Porém,
quando se ancora na prática analítica, a relação “literatura e sociedade” acaba por privilegiar mais a
prosa narrativa (romance, conto, novela) e menos a poesia lírica (mesmo quando esta é vincada por
certa narratividade, a exemplo de poemas de Drummond como “Caso do vestido” – de A rosa do
povo, 1945 –, e de modalidades poéticas antigas como a balada e o rimance). Habitualmente feita
em versos que vão e voltam no espaço em branco da página (a modo de um arado no campo
lavrado); calcada em constrições sintático-construtivas como o sistema de rimas e a estrofação, a
cesura, os acentos e as pausas diversas (às vezes, a metrificação); apoiada, portanto, num trabalho
de linguagem denso e condensado, em cujas sendas poucos prosadores/narradores se aventuraram; e
cuja massa rítmico-sonora significa mais do que pareceria à primeira vista, a poesia lírica acaba por
intimidar e afastar o analista, uma vez que ela não tem necessidade de contar ou narrar coisa
alguma, mas se compraz com tais jogos verbais de som/imagem, imprescindíveis em qualquer
análise ou interpretação porque já significam por si/em si, e vão fazendo desabrochar outros
significados e semantismos diversos a que estão atrelados denotativa e conotativamente, no corpo e
na alma do poema. Sobre este particular (a importância da massa sonoro-rítmica do poema), um dos
ícones dos estudos sociológicos voltados para a literatura, Lucien Goldmann (1989, p.77-78),
reconhece o problema quando afirma, em Sociologia da literatura, que o método estrutural aplicado
ao estudo da poesia deve privilegiar as “[...] estruturas não semânticas (sintácticas, fonéticas,
associativas, etc.) [...]”, uma vez que estas têm “[...] uma importância particularmente grande e um
peso particularmente decisivo.” Goldmann escreve em 1969, e conquanto hoje o método estrutural
esteja desacreditado, é patente que a preocupação com a linguagem específica da poesia (verso,
rima, estrofe...), com a construção rítmico-sonora e com os modos de sugestão, simbolização e
metaforização de um poema devem nortear a análise do estudioso preocupado em compreender os
significados latentes e manifestos da poesia. Portanto, a perspectiva deste trabalho é os estudos
literários, embora seu arcabouço crítico-teórico se valha também das ciências sociais e/ou de outras
ciências humanas, que embasam sua primeira parte. O ensaio completar-se-á com a análise de dois
poemas da literatura brasileira contemporânea (um de Ferreira Gullar e outro de Donizete Galvão),
nos quais se pretende surpreender como o fato social e a “historiografia inconsciente” (a expressão
é de Adorno) tornam-se inerentes aos objetos estéticos, em sua estrutura e significado profundos.
ENTRE O TODO E PARTE ALGUMA: IMPASSES DO SUJEITO POÉTICO EM “O
DUPLO”, DE FERREIRA GULLAR
Wilson José Flores Jr. – UFRJ
Como se sabe, o duplo é um dos temas mais recorrentes na história da literatura. As imagens que se
ligam a ele são conhecidas: o gêmeo usurpador, o perseguidor a atormentar permanentemente
alguém até destruí-lo, além do sentimento difuso de estranhamento em meio à aparente banalidade
daquilo que é familiar, entre outras. O poema “O duplo”, coligido em Em alguma parte alguma,
mais recente livro de Ferreira Gullar, estrutura-se em torno de um impasse (que reponta em vários
momentos da produção do poeta) expresso na tensão entre o “Eu mesmo” e uma imagem de si, feita
para os outros (e em parte pelos outros), visando uma determinada forma de inserção no mundo. A
cisão de fundo expressa no poema e constitutiva do eu (em oposição à configuração monolítica do
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duplo) é um dos pontos altos da poesia recente de Gullar: nas fraturas que a subjetividade confronta
encontram-se suas maiores obras. Além disso, como se sabe, a ideia da divisão do eu e a busca por
uma síntese que, de alguma forma, confronte as contradições é recorrente no poeta, sendo o móvel
de fundo de “Traduzir-se”, provavelmente seu poema mais conhecido. O mesmo móvel é retomado
em “O duplo” sob a forma de um impasse em face do qual nenhuma síntese, ainda que precária,
afigura-se. O presente estudo propõe uma análise do poema com base neste ponto de vista e em
contraste com a leitura de outros textos do poeta, a saber, “Inventário”, “Traduzir-se”, “Abduzido” e
“Um instante”.
SUOR É TEXTO: O CORPO NA LÍRICA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
Patrícia Aparecida Antonio – UNESP-Araraquara
A presente comunicação tem por objetivo pensar brevemente sobre os modos de configuração do
corpo na lírica brasileira da contemporaneidade, com base nas obras mais recentes de cinco poetas:
Francisco Alvim, Contador Borges, Donizete Galvão, Claudia Roquette-Pinto e Arnaldo Antunes.
Entendendo-se como corpo a estrutura física dos seres, pretende-se que se sobressaia seu lugar e
atuação no espaço lírico contemporâneo. Presença marcante, este corpo da atualidade aparece
sempre como um extremo que rivaliza a outro: seja ele a palavra a ser trabalhada desde a sua forma
mais bruta; a linguagem a ser criticada; o sujeito poético e suas configurações (materializando seu
próprio corpo ou o do outro a quem fala ou se refere); a tradição, farol que ilumina para trás, e que
deve ser ultrapassada ou apropriada; a realidade, alvo de crítica ou motivo de fuga; o leitor, que
esbarra o próprio corpo nessa poesia. Relações lastreadas por cicatrizes, arranhões, dores, odores,
desejos e materialização. Desses embates, surge um outro corpo, aquele construído de poesia e na
poesia. Nessas múltiplas e dispersas formas com que se relaciona a estrutura inalienável dos seres (e
das coisas), inscrevem-se modos também eles diversos de se ver e conceber o mundo assumidos
pela lírica brasileira contemporânea. O corpo, portanto, é índice claro do modo como o sujeito
poético tem se configurado. O que nos alça a questões como: quem é este sujeito corporal que
escreve poesia ou a que(m) se refere? Quem é o seu leitor? A experiência do corpo na poesia
brasileira contemporânea traz à tona um eu problemático, reflexo borrado do leitor, do poeta e até
da crítica. Nessa clave, do contato, toque, encontro, convívio, intercomunicação, orientados pelas
leituras de Michel Serres, Paul Zumthor, Octavio Paz, José Gil e Giorgio Agamben, é que
pensaremos os direcionamentos do corpo em algumas posturas poéticas contemporâneas.
POESIA E DRAMA: CONFIGURAÇÕES LÍRICAS DO TEATRO DE HILDA HILST
Cristyane Batista Leal – UFG
Em entrevista à oitava edição de Cadernos de Literatura, publicada em 1999, Hilda Hilst afirmou:
“Toda a minha ficção é poesia. No teatro, em tudo, é sempre o texto poético, sempre”. Portanto, a
autora admite a permanência do lirismo tanto em sua prosa de ficção quanto em seu teatro. Esta
comunicação pretende apontar elementos líricos da obra dramática da referida autora, escrita entre
os anos de 1967 e 1969. São notas que alertam para uma representação não realista, incorporação de
poemas da autora em falas das personagens, dissolução de tempo e espaço ou ainda musicalidade
que perpassa a estrutura das peças. Identificamos esse processo de liricização da forma dramática
como fenômeno das artes do século XX, conforme estudo de Anatol Rosenfeld em Reflexões sobre
o romance moderno (1996). Esse fenômeno se dá pelo esgarçamento do núcleo fabular, fluidez de
tempo e espaço, ausência de nitidez no contorno das personagens, entre outros elementos. Tal
construção é consequência da perspectiva de não afastamento do sujeito com o mundo em que a
realidade é apreendida de maneira fugaz, impedindo sua total compreensão. E é tendo em vista o
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não distanciamento entre o eu e o mundo que Emil Staiger, em Conceitos fundamentais da poética
(1975), desenvolve sua concepção de lirismo. Para o teórico, o mundo objetivo e o mundo subjetivo
estão fundidos na poesia lírica. Com base nas modificações ocorridas nas artes, apontadas por
Rosenfeld, bem como os pressupostos teóricos do gênero lírico descritos por Staiger, podemos dizer
que, a partir do século XIX, as artes, de um modo geral, tenderam a assumir uma atitude
essencialmente lírica. Com a iminência desses fenômenos apontados na obra hilstiana, localizamos
a presença lírica no teatro de Hilda Hilst. A autora é herdeira do fenômeno poético que banhou o
romance, as artes visuais e o teatro a partir do século XX. A dimensão lírica do teatro hilstiano,
inicialmente explicável por se tratar de uma dramaturgia realizada por uma poeta, está em
consonância com uma tendência da produção teatral moderna e encontra uma motivação histórica
no panorama político brasileiro, quando os dramaturgos sentiram uma necessidade ética de
empenhar politicamente a sua arte.A autora encontrou um caminho outro de resistência, o da poesia,
em meio ao teatro político desse momento.
DE “PONTE” A “PINGUELA”: UMA LEITURA DO POEMA “RELIGIÃO” DE WALDO
MOTTA
Ricardo Alves dos Santos – UFU
Este trabalho pretende fazer uma leitura do poema “Religião” do poeta capixaba Waldo Motta,
artista contemporâneo, que, desde a publicação da obra Bundo e outros poemas (1996), dedica-se
em seu projeto literário intitulado “erotismo sagrado”. Nesta obra, o universo sagrado se imiscui no
profano, situação esta que destaca o valor transgressor e subversivo da lírica waldiana, já que esta
parte da condição homossexual do autor para promover uma profanação de elementos sagrados e
consagrados pela religiosidade judaico-cristã. No poema selecionado, destacaremos o percurso
religioso e sagrado empreendido por Motta para situar sua poesia em uma instância de pura
transcendência e espiritualidade. A poesia torna-se para o sujeito lírico o local de se conectar com o
sagrado e o altivo, portanto, as metáforas “ponte” e “pinguela”, empregadas pelo poeta para compor
sua performance literária, acabam evidenciando ou frisando o papel que sua poesia almeja: religarse ao outro. A busca pelo outro é intermediada pela poesia, e esta sai da consagração metafórica de
“ponte” para assumir a designação de “pinguela”. A poesia não é o que liga o humano ao sagrado,
mas é o veículo para o humano atingir outro ser, já que a poesia-religião empreendida por Motta
guarda uma veia de protesto. A salvação do eu poético está na/pela poesia, a partir da “sacrossanta
escritura” sua “cruzada evangélica” se deflagrará. Do “púlpito” de seus versos, o poeta se coloca em
posição de destaque para que todos/leitores possam ouvir sua voz ardente e reveladora acerca dos
conflitos e desajustes que o sujeito enfrenta. Ao mostrar seu olhar atento para os problemas
culturais e sociais persistentes na história do homem, Waldo Motta atesta o quão atual é sua veia
poética. O altar sagrado conferido à poesia será o palco para a revelação de questões existenciais
esquecidas ou adormecidas na sociedade atual. O presente do poeta confronta-o e deixa emergir
uma necessidade de se pronunciar pela letra/escrita, frisando as contradições que cercam as relações
de poder. Assim, ao mergulhar nas sombras de seu tempo, Motta se faz contemporâneo e militante,
conferindo a sua poesia o espaço por onde a obscuridade de sua condição social confrontará o esteio
centralizador do poder e da cultura dominante.
A POÉTICA DE JOSÉ FERNANDES E DE PAULO HENRIQUES BRITTO
Rosângela Aparecida Cardoso – UFG/CAPES
Nossa proposta consiste em investigar, no âmbito da lírica brasileira contemporânea, dois diferentes
modos de estabelecimento de conexões entre literatura e filosofia. Para tal, selecionamos o texto
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“Poemito”, da obra poética Cicatrizes para afagos (2002), de José Fernandes, e o poema “VI” da
série das “Sete peças acadêmicas”, que integra o livro intitulado Tarde (2007), de Paulo Henriques
Britto. O texto “Poemito”, cujo título é uma aglutinação dos vocábulos “poema” e “mito”, ao valerse da simbologia da travessia à terceira margem do rio, configura uma alusão à narrativa de
Guimarães Rosa, ao mesmo tempo em que erige um dialogismo com os pressupostos linguísticofilosóficos de Martin Heidegger, procedimento recorrente na poética de José Fernandes: “Quando
as essências se revelam, / um barco as [palavras] leva à terceira margem, / e elas atravessam o ser
tão poema”. Assim como “Poemito”, a narrativa rosiana “A terceira margem do rio” se esclarece
sobremaneira à luz da concepção heideggeriana segundo a qual a forma originária de dizer se dá no
barulho do silêncio, cuja escuta constitui a dimensão mais profunda e o modo mais simples de o
pensamento falar. O ser, que se revela a partir do mistério do não dito que Guimarães Rosa conduz
à palavra, constitui a estância misteriosa que engendra a possibilidade de, no tempo das realizações,
o advento do sentido e da verdade ser pensado sempre pela primeira vez. O âmago de toda essa
questão elucida a eloquência do silêncio paterno, posto que a permanência do pai do narrador na
terceira margem do rio configura uma experiência de retraimento. Enquanto “Poemito”, de
Fernandes, se engendra mediante o conceito proposto em Arte y poesía, de Heidegger (1978,
p.140): “a poesia não toma a linguagem como um material já existente, mas a própria poesia torna
possível a linguagem”, o poema “VI”, de Britto, se constrói mediante uma tensão lúdica que se
instaura entre o tom erudito obtido com a citação da terminologia heideggeriana (“Ser, não-ser,
devir, dasein,/ ser-pra-morte, ser-no-mundo”) e o tom coloquial da expressão “Valei-me, são
Wittgenstein”, em que se imbricam o sagrado (abreviatura de santo) e o profano (nome do filósofo
austríaco). Cumpre ressaltar que, no poema “VI”, os versos rimados e metrificados coexistem com a
irreverência do jogo intertextual: “penso, portanto rabisco”. Se por um lado tal expressão é
destacada com o uso do itálico, indiciando uma cumplicidade entre o poema e o pensamento
cartesiano: “Penso, logo existo”, por outro, é colocada entre parênteses, apontando um
distanciamento entre ambos. Com tal procedimento, o poeta deleita o leitor e se deleita, ao parodiar
o antológico pensamento de Descartes, bem como ao aludir a obras de Heidegger e de Wittgenstein
que compõem o cânone da filosofia. O metapoema acadêmico “VI” demanda um leitor que conheça
os conceitos filosóficos e literários da modernidade e da pós-modernidade, sobretudo os relativos
aos limites da linguagem (do dizível, do expressável), ao mesmo tempo em que traz em seu corpus
a compreensão de que as possibilidades de sentido ultrapassam o conhecimento teórico. Britto
caracteriza como um “impulso fraudulento” a sua própria tentativa de superação dos limites da
poesia e de poeta. Tal reconhecimento é dissimulado, visto que funciona como uma forma de
legitimação de sua própria práxis poética, que, diante de “tudo já dito e escrito”, se realiza via
intertextualidade etematização reflexiva da poesia. Enfim, cada um dos poemas em questão
consubstancia, a seu modo, as originariamente abstratas indagações filosóficas.
TORNANDO O ABSURDO PALPÁVEL – ECOS DAS PRENDIZAGENS POÉTICAS DE
MANOEL DE BARROS EM ONDJAKI”
Elisa Duque Neves dos Santos – UFF
Nilma Lacerda – UFF
O estudo propõe explorar a interlocução da obra poética de Manoel de Barros com a poética de
Ondjaki presente em seus Há prendisajens com o xão e Materiais para a Confecção de um
espanador de tristezas. Explorar o imaginário ‘em estado de infância’ e temas circundantes de suas
obras, os caminhos que subvertem as ordens do real e trapaceiam a ordem da linguagem para tentar,
pela experimentação com a linguagem, criar absurdos palpáveis, e estabelecer uma
verdade/realidade poética que tem compromisso com a poesia potencial que a própria palavra
guarda é a finalidade deste trabalho. Nesse percurso, é oportuno perguntar de que maneira a voz de
Manoel de Barros ecoa em versos do poeta angolano? Como as imagens de Manoel se repetem na
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apropriação de Ondjaki? Como esses poetas são capazes de versar, subvertendo a noção intrínseca
de letramento = erudição, carregando a linguagem de valores renovados na procura pela
simplicidade do saber sensorial em detrimento do saber epistemológico através da quebra de
paradigmas impostos pelos sensos (o comum e o erudito)? Com o apoio de alguns discursos
teóricos da literatura e filósofos (Roland Barthes, Alfredo Bosi, Walter Benjaminm, Martin
Heidegger, Gaston Bachelard) para dialogar criticamente com as transfigurações de paradigmas
visuais e da linguagem, objetiva-se, especialmente, identificar/ponderar sobre o lugar coletivo e o
individual num espaço de conciliação entre o de fora e o de dentro – o ser poeta em plena
comunhão faz nulidade de hierarquias entre si, as coisas e o ambiente, a linguagem e os discursos,
numa perspectiva de troca mútua entre o ser e a linguagem que fazem parte de um comumpertencer. O encantamento dos poetas pelas coisas miúdas do chão⁄xão, pelos seres e pela palavra
em constantes processos de ressignificação permite, mais que um repensar do mundo moderno
desencantado, em que predominam a razão, a tecnologia, a produtividade da máquina e a
automatização dos discursos, trazer à tona um mundo em que a palavra, ao confeccionar devaneios
de puro deleite, ofereça opções palpáveis de aprendizados e intervenções.
OS LIMITES ENTRE PROSA E POESIA NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
Poliane Vieira Nogueira Valadão – UFG
Goiandira Ortiz – UFG
Na poesia contemporânea, os limites entre prosa e poesia são tênues, praticamente inexistem,
devido à liberdade de criação e ao livre trânsito do poeta entre os gêneros. Os moldes de se fazer
poesia que circularam há muito, desde a Poética, de Aristóteles (1933), passando pelo rigor dos
classicistas que têm na Arte Poética, de Boileau (1979) o seu manual de como fazer poesia e pelos
manuais de métrica dos parnasianos que, podem ser considerados, o último sopro da tentativa de
manualizar a escrita poética, não se enquadram mais na forma em que o poeta contemporâneo
produz. É praticamente impossível se pensar em um manual que ensine a fazer tal poesia. Tal
dificuldade se dá por três motivos. O primeiro se refere ao fato de que estamos vivendo no mesmo
momento em que essa poesia está sendo produzida, o que dificulta a nossa visão crítica sobre ela,
uma vez que os seus moldes de produção ainda estão sendo definidos. O segundo motivo nasce do
fato de que hoje não possuímos movimentos de produção literária, mas percursos individuais. Isso
se dá porque vivemos em um mundo não mais fechado, mais plural, com mais explosões de
subjetividade, um mundo sem balizas. Outra característica que marca o poeta contemporâneo é a
sua liberdade diante da criação poética, ele se sente livre de qualquer regra literária, de forma que o
limite do poema passa a ser o limite da escrita poética e o poema uma entidade discursiva. Essa
liberdade de que falamos permitiu também que os poetas ultrapassassem os limites do gênero
poético passeando também pela prosa. Philipe Lacoue-Labarthe (2000) afirma que essa é a coragem
da poesia contemporânea, ela tem coragem de ser prosa. Discutiremos essa constatação do autor a
partir de dois poetas. O primeiro é o poeta português Luís Miguel Nava e seus poemas em prosa. O
segundo é o poeta brasileiro Wesley Peres e seu romance Casa entre Vértebras, que pode ser lido
como uma obra poética. Esse afrouxamento dos limites da poesia levando-a a se aproximar tanto da
prosa a ponto de confundir-se com ela suscita-nos uma dúvida, se não estaríamos nós caminhando
em direção a uma espécie de escrita literária cuja modalidade não esteja demarcada.
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MORTE E TRANSCENDÊNCIA NA POESIA DE SOPHIA DE MELLO BREYNER
ANDRESEN
Alexandre Bonafim Felizardo – UEG
Conforme Maurice Blanchot, todo ato de escrita é um desvendar da morte. Se, de acordo com tal
autor, morrer é uma anti-experiência, a alteridade impossível de ser transposta pelo pensamento
racional, a literatura permite-nos, pelo onirismo, sondar esse liame do indizível, essa fronteira sem
limites. Além do mito e da religião, poderíamos também incluir a arte como forma de elaboração do
silêncio, da impossível realidade da morte. Em muitos autores, portanto, a poesia torna-se uma
elaboração simbólica da morte, uma forma de captar tal momento de nulidade, transformando-o em
arte. Confrontar a morte pela poesia é, assim, uma experiência fundamental para o homem, pois
através da palavra ele consegue esmiuçar a angústia da finitude, o medo da dissolução, sublimandoos pela palavra simbólica e lírica. Dessa forma, ao lidar com a exiguidade da existência humana, a
poesia reside no intricado jogo de forças entre Eros e Tânatos. Com efeito, tal poesia, de cunho
órfico, vive no permanente embate entre a pulsão de vida e a pulsão de morte. Nesse confronto
constante, está a razão da escrita lírica, verdadeiro exercício do irreconciliável, tentativa sempre
frustrada de se aproximar ‘por imagens’ do indizível. Na obra da poeta portuguesa Sophia de Mello
Breyner Andresen, o medo da morte, sentimento atávico, original, consubstancial à essência
humana, torna-se uma forma de sublinhar o espanto, a vivacidade primeva do olhar, intensificando
o estar do homem no mundo. Pela aguda consciência dos limites, Sophia irá buscar um real pleno,
transposto para a palavra, capaz de realçar e nuançar a força viva da realidade fenomênica. A
finitude torna-se via de acesso ao poético e sublimação de toda a caducidade de nossa condição
humana. Pela palavra lírica, portanto, Sophia de Mello Breyner Andresen dignifica não apenas a
vida humana, mas as literaturas de todas as pátrias de língua portuguesa.
BIBLIOTECA DE RAPAZES, UM LIVRO DE POESIA?
Julia Telésforo Osório – UFSC
Rui Pires Cabral chega ao seu décimo livro: Biblioteca de rapazes, publicado pela editora
portuguesa Pianola no final de 2012. Trata-se de um curioso livro do autor que, desde sua estreia
em meados da década de noventa do século XX, se destaca no cenário poético contemporâneo
português, sobretudo pelas publicações de parte de sua obra através da editora Averno, coordenada
pelo também poeta Manuel de Freitas, organizador da antologia Poetas sem qualidades (2002),
muito repercutida criticamente e que selecionou poemas de Rui Pires Cabral. Nota-se uma ruptura
formal importante no que diz respeito à composição poética, a maneira como os poemas foram
construídos e estão registrados nesta nova publicação. Ao contrário do modelo de registro
tradicional da poesia, utilizado pelo próprio poeta nos demais livros, Rui Pires Cabral apresenta
agora versos literalmente colados em imagens, fotografias semelhantes àquelas de cartões-postais.
Versos esses que não são, necessariamente, de sua autoria, sendo fragmentos de obras de autores
como, por exemplo, Julio Verne. Diante disso, um questionamento se faz necessário: por qual
motivo Biblioteca de rapazes pode ser considerado como um livro de poesia? Qual é, enfim, a
justificativa adequada para caracterizá-lo como tal? Esta novidade estética parece ser consequente
de um desejo de inovação do suporte pelo qual se materializa, majoritariamente, a poesia: a página
em branco, na qual as letras que compõem cada palavra poética são impressas. Ao escolher como
“pano de fundo” fotografias de cenários cotidianos como praias, residências, montanhas, ruas etc., o
autor problematiza as noções de autoria e de verso, conceitos caros à sua obra e a qualquer discurso
poético. Assim, o objetivo deste trabalho consiste em apresentar essa publicação de Rui Pires
Cabral a fim de refletir acerca das questões relativas à autoria e ao trabalho estético, pois este livro
parece querer tensionar as noções de registro e compreensão da arte poética na contemporaneidade.
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A PAISAGEM DO QUE NÃO HÁ OU QUANDO A POESIA NAUFRAGA NA PROSA
Patrícia Chanely Silva Ricarte – UFSC
Em um dos fragmentos do Livro do Desassossego, Bernardo Soares coloca o seguinte imperativo
para a poesia: “Dizer! Saber dizer! Saber existir pela voz escrita e a imagem intelectual!”. De
acordo com esse semi-heterônimo pessoano, a literatura é a única forma de tornar transmissíveis as
impressões. Assim, em seu texto em prosa, ao buscar uma definição concreta – ou seja, literária –
para aquilo que se vê ou se pensa, ele recorre a dois procedimentos poéticos bastante significativos,
quais sejam: a alegoria e a fala infantil. Partindo dessa questão, proponho, neste trabalho, uma
discussão sobre o modo como o problema da (in)definição em poesia é tratado em alguns textos de
outros dois poetas de Portugal: Ruy Belo, um dos maiores expoentes da poesia produzida naquele
país a partir da década de 1960, e Luís Quintais, poeta contemporâneo que vem publicando desde
1995. Interessa-me compreender em que medida esses dois poetas, cujos textos coloco em diálogo
com o referido fragmento de Soares, se propõem a responder, sobretudo a partir do poema em prosa
alegórico, a algumas questões em torno do dizer/fazer poético. A alegoria, que, em Soares, é “a
cobra sem cobra enroscada verticalmente em coisa nenhuma”, servindo para distinguir a literatura
daquilo que vem a ser uma definição abstrata das coisas, e que ganha, em Belo, a forma da “árvore
rumorosa” da qual nascem pássaros, indicando a travessia do verso à prosa empreendida pelo poeta,
passa a ser concebida, nos textos em prosa de Quintais, a partir da imagem da árvore naufragada,
destroçada ou desaparecida, numa espécie de esforço de dissolução desse lugar-comum erigido pela
tradição moderna. Entretanto, esse naufrágio da tópica poética (ou da própria poesia), em Quintais,
parece-me ser fruto de algo que já está presente na obra de Belo: trata-se de uma concepção da
poesia como experiência do não-saber, a qual justifica, muitas vezes, tanto em um quanto em outro
poeta, o exercício da forma em prosa, na medida em que esta melhor se prestaria à reflexão, à
especulação e, portanto, à experimentação. Há que se salientar, no entanto, a recusa de Quintais
àquilo que, na obra de Belo, consiste em uma ideia da poesia como país da origem no qual se atinge
um momento de plenitude ainda que fugaz. Nas composições em prosa de Quintais, a experiência e
o pensamento poéticos estão marcados quase sempre pela consciência de um fracasso, perda ou
morte, sem que haja possibilidade de restauração ou resgate, visto que essa consciência da ruína
constitui o próprio ápice de tal experiência.
“A LETRA P NÃO É A PRIMEIRA LETRA DA PALAVRA POEMA”: UM ESTUDO DA
OBRA POÉTICA DE JOSÉ LUÍS PEIXOTO
Vânia Rego – UBP
Quando se fala de poesia em Portugal, mesmo nos dias de hoje, os vultos mais ouvidos e citados
são, sem dúvida alguma, Camões, por razões históricas, e Fernando Pessoa, pela grandeza e pela
diversidade da sua obra inigualável no panorama lusófono e quiçá internacional. Contudo, depois da
passagem do movimento modernista, a literatura portuguesa, em geral, e a poesia, em particular,
metamorfosearam-se fortemente. A poesia contemporânea, desempossada do seu caráter
nacionalista e do seu cunho social e politicamente comprometido que se revelou de extrema
importância durante o período da ditadura, adquiriu um outro estatuto e revestiu-se de nova
importância. A entrada na União Europeia a partir da década de 80 e a abertura de Portugal ao
mundo na atualidade contribuíram para que assistíssemos a uma desconstrução dos modelos
considerados clássicos e a uma maior liberdade na criação poética que, se por um lado abre mais
possibilidades à criação e à linguagem poéticas, por outro torna mais difícil a categorização e a
definição de características específicas da poesia contemporânea portuguesa. É neste contexto que
surge a obra poética de José Luís Peixoto, atualmente, um dos autores consagrados da Língua
Portuguesa: A Criança em Ruínas (2001), A Casa, a Escuridão (2002) e Gaveta de papéis (2008).
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Impregnada de conceitos e reflexões universais sobre a vida e a morte, a filiação, a memória ou a
reflexão sobre o tempo, a obra deste autor apresenta-se na esteira de José Saramago ou de Lobo
Antunes, dado o poder universal e humanista que lhe é reconhecido. Escritor de romances, contos,
poemas e letras de músicas para horizontes musicais tão diversos como o são o fado e a música
heavy metal portuguesa, J. L. Peixoto presenteia-nos com uma poesia nova, cosmopolita e por vezes
desconcertante. De mãos dadas com a prosa lírica dos romances que escreve, a poesia de Peixoto é
um espaço de escrita do “eu”, onde a memória desempenha um papel fundamental. O estudo da
obra poética de J. L. Peixoto permitir-nos-á um olhar mais atento não só sobre as novas temáticas e
formas de construção poética, mas também sobre os caminhos e a evolução da poesia
contemporânea em Portugal.
A POESIA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA E O LEITOR
Claudine Faleiro Gill – UFG
Circula no senso comum a ideia de que a poesia moderna é hermética e, por isso, não é acessível ao
leitor mediano e, à respeito da poesia contemporânea, a impressão de que ela se quer comunicativa
e, assim, o leitor mediano a acessa com facilidade. Essa concepção sobre a poesia moderna não
engloba toda a produção poética moderna, uma vez que poetas como Manuel Bandeira, Cecília
Meireles e Carlos Drummond de Andrade caíram nas graças do leitor mediano. Em nosso estudo,
discutiremos a relação existente entre a poesia contemporânea e o leitor e questionaremos a
concepção de que a poesia contemporânea quer se comunicar com o leitor mediano e, assim,
aproximar novamente poesia e leitor. Veremos que há poetas contemporâneos que alcançam uma
comunicação maior e outros que são acessados por um número mais reduzido de leitores.
Discutiremos também o papel da escola na formação do leitor da poesia brasileira contemporânea.
Sendo um local privilegiado de circulação de saberes, o ambiente escolar é propício para a
divulgação da produção contemporânea de nossa poesia, uma vez que é possível ler com os alunos
os poemas que são acessíveis ao leitor mediano e aparelhá-los para que possam decifrar os versos
que exijam um leitor mais experiente. Desse modo, ampliando a discussão, analisaremos o espaço
que tem sido dado à poesia brasileira contemporânea na sala de aula através do livro didático.
A POSTURA CRÍTICA DE ORIDES FONTELA FRENTE À TRADIÇÃO
Elba Ferreira Marques – UFG
Este trabalho apresenta uma leitura da poesia de Orides Fontela considerando o criticismo como um
dos elementos centrais da sua escrita. Também propõe uma abordagem da relação da poeta com a
tradição literária, mais especificamente sua filiação poética a João Cabral de Melo Neto, em alguns
aspectos. Ao se aproximar a escrita desses dois poetas, pretende-se demonstrar sua afinidade com a
concepção de uma poesia destituída da expressão de uma subjetividade, que descrê no poder
encantatório da poesia e defende a racionalidade como elemento fundamental da criação poética.
Toma-se como referencial teórico: Paz (1984) que entende a poesia moderna como busca por
autossuficiência e soma de criação poética e crítica; Barthes (2003) ao defender a busca da poesia
por uma “linguagem-objeto” que a possibilita realizar sua crítica em seu interior; Friedrich (1991),
o qual afirma uma maior adesão da lírica ao tratamento da linguagem como elemento de
competência técnica, um indício de maior conscientização do poeta em relação ao seu instrumento
de trabalho; Merquior (1996), para quem o poema é um espaço propício à razão e à discussão dos
valores literários; Barbosa (1974) que toma o texto poético como meio de incessante autorreflexão
ao desdobrar sobre as matérias, meios e fins da poesia; Eliot (1962) que trata da supervaloriazação
da originalidade; Bloom (2002) ao apontar para a leitura e a problematização do cânone que acaba
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por resultar em revisionismos e distorções responsáveis pelo que ele nomeou “angústia da
influência” e Borges (1974) para quem o escritor é habilitado a determinar sua própria linhagem,
eleger, portanto, seu(s) precursor(s). Ao perseguir o criticismo fonteliano, compreende-se que a sua
consciência promove a reflexão a respeito da sua poesia e da sua relação com a tradição num gesto
crítico e criativo que a habilita a efetuar julgamentos de valor em relação não apenas a si mesma,
mas também a outro autor.
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SIMPÓSIO 33
O ENSINO DE PORTUGUÊS E AS NOVAS TECNOLOGIAS
Mesmo se o professor não as utiliza, as (N)TIC já entraram na sala de aula, tornando nossa prática
pedagógica mais dinâmica e mais complexa. Devemos, portanto, reconhecer uma modificação
radical em nossa relação com o saber: se antes este era estático, nos livros, hoje se encontra em
construção na Internet, em redes interativas de colaboração. Isso significa que passamos de uma
lógica de simples difusão do saber a uma lógica de construção dos saberes e de navegação nos
saberes; passamos de uma cultura baseada num pensamento linear a uma multiplicação de culturas
construídas a partir de perspectivas associativas: uma arborescência e/ou rizomescência interativa.
É assim que, dando continuidade aos simpósios realizados nas três primeiras edições do Simelp
(2008, 2009 e 2011), os quais ensejaram a criação do grupo de estudos Ensino de Português e
Novas Tecnologias (http://groups.google.com.br/group/epnt), este simpósio tem por objetivo reunir
professores e pesquisadores em torno de questões relativas ao uso das (N)TICs no
ensino/aprendizagem da língua portuguesa – como língua materna ou como língua não-materna.
Estudos longitudinais, qualitativos e quantitativos, propostas de cursos, análises de grades
curriculares e de políticas públicas, estudos comparativos entre diferentes países dos PALOPs,
relatos de experiência, apresentação de projetos de pesquisa básica ou aplicada são alguns dos
temas e formas que pode tomar essa discussão. Serão muito bem vindas comunicações que reflitam
sobre a relação entre as condições materiais (técnicas e logísticas) e as condições pedagógicas no
trabalho docente.
COORDENAÇÃO
Liliane Santos
Université Charles-de-Gaulle – Lille 3 (França) - UMR 8163 “Savoirs, Textes, Langage”(CNRS)
[email protected]
Cláudia Wanderley
Universidade Estadual de Campinas - Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência – CLE
[email protected]
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APRENDIZ DE LETRAS: DIGA-ME COM QUAIS TECNOLOGIAS ANDAS QUE TE
DIREI QUEM ÉS
Eliana Maria Severino Donaio Ruiz – UEL/USF
A cibercultura vem angariando discursos ufanistas e marqueteiros, como reflexo de um processo
mais amplo que está a demandar uma análise crítica e rigorosa. Já se tornou lugar-comum dizer do
impacto das (novas) tecnologias de informação e comunicação – (N)TIC – nas constituições
identitárias, nas relações humanas e na relação do homem com o conhecimento. Perseguindo, pois,
um objetivo mais amplo de investigar a influência das (N)TIC na constituição do sujeito
contemporâneo, em contexto de mundo globalizado, parece-nos haver espaço para um estudo, na
perspectiva discursiva, do modo com que as relações professor-aluno são por elas afetadas, seja na
escola, de um modo geral, seja na educação a distância, em particular. Assim, este trabalho visa,
especificamente, discutir a construção de um curioso posicionamento enunciativo do aluno por
parte de autores de materiais didáticos para cursos de Letras a distância, problematizando a maneira
como estes pretendem posicionar sócio-historicamente seus leitores em manuais veiculados para
leitura e estudo em contexto virtual. As representações a que os dados têm nos conduzido, em
conformidade ao gesto interpretativo que vimos tecendo, focam-se na expressão “aprendiz
autônomo”, bastante recorrente na literatura especializada sobre educação a distância. Ou seja, se,
por um lado, o material didático é dirigido àquele indivíduo que, por hipótese, não detém o
conhecimento e, por isso, deve ser guiado, via mediação pedagógica, para poder aprender; por
outro, e ao mesmo tempo, é voltado ao indivíduo dito autônomo, que detém as rédeas de sua própria
aprendizagem. Isso nos permite propor um eixo de análise para o corpus centrado numa relação
ambígua que o aprendiz manteria com o conhecimento, comparativamente à relação que o autor do
material didático, ou o professor, mantém com o conhecimento. As categorias “dentro” e “fora” que
propomos corresponderiam a diferentes perspectivas do olhar, no caso, do autor do material
didático online, como possibilidades interpretativas que se delineiam a partir das condições de
produção do discurso didático. Esperamos que tal proposta nos permita revelar o mascaramento das
relações de poder que se operam em rede no universo educacional, de modo a reforçar a assimetria
e garantir formas regulares de ação pedagógica, internalizadas e naturalizadas pela fixidez dos
lugares sócio-historicamente demarcados para serem ocupados na sala de aula pelos agentes do
processo de ensino-aprendizagem, seja este presencial ou a distância.
MULTIMODALIZANDO PRÁTICAS DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: O
TEXTO SOB NOVA PERSPECTIVA
Eni Abadia Batista – UnB
Com a sociedade imersa no mundo repleto de tecnologias, o grande desafio do ensino de Língua
Portuguesa é desenvolver nos alunos habilidades que envolvam textos constituídos pelas diversas
modalidades da linguagem. Nesse cenário, a disciplina de Língua Portuguesa exige dos docentes
práticas de ensino que valorizem textos multimodais os quais permitem explorar a construção do
conhecimento discursivo crítico e do conhecimento multimodal como potencial de significado
semiótico. Nessa perspectiva, este trabalho tem como objetivo apresentar uma discussão sobre essa
configuração de texto com um olhar sobre os aspectos multimodais da linguagem e, sobretudo,
vislumbrando a possibilidade de aplicar, nas práticas didáticas, a leitura composicional de textos
multimodais. A leitura multimodal busca compreender os significados dos recursos semióticos que
representam as relações sociais e os eventos discursivos que permeiam a sociedade. Para tanto,
considera, segundo Kress & van Leuwen (1997), que as imagens são inseridas no universo
multimodal porque fazem parte de tudo que pode ser comunicado com o uso de vários modos
semióticos. Nos textos multimodais os significados são representados por recursos comunicacionais
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que podem gerar multiplicidade de interpretações. Essa característica peculiar pode contribuir para
uma reflexão crítica nas interações didáticas. Para alcançar esses objetivos, adoto como aporte
teórico a Análise de Discurso Crítica proposta por Fairclough (1992, 2003), a Teoria Semiótica
Social Multimodal apregoada por Kress (2003, 2010), a Gramática Visual de Kress e van Leeuwen
(1997, 2006) e os estudos de Jewitt ( 2000, 2001, 2010) que envolvem o ensino realizado por meio
de diferentes modos semióticos para a construção discursiva do conhecimento científico em sala de
aula. Consiste em uma contribuição para pesquisas que postulam o ensino da Língua Portuguesa,
pois indica experiências significativas de que essa reconfiguração de texto pode promover o
desenvolvimento e a dinamização de práticas que favoreçam a aprendizagem mais condizente com
as demandas da atualidade.
DESENVOLVIMENTO DE UMA FERRAMENTA ONLINE DE MEDIAÇÃO
PEDAGÓGICA PARA O ENSINO DO TEXTO LITERÁRIO NA EDUCAÇÃO BÁSICA
Vinícius Carvalho Pereira – IFMT
Josiel Moiseis Plens Pereira – IFMT
A leitura isolada, compenetrada e linear, postulada como única forma de fruir a literatura, em outras
épocas, hoje se defronta com outros modos de ler, mais coletivos, interativos e hipermidiáticos. Por
sua vez, jovens das gerações Y e Z, inseridos na cultura letrada já dentro do contexto tecnocientífico
contemporâneo, frequentemente têm dificuldade de ler, interpretar e dialogar com obras literárias
escritas para outros modelos de recepção, especialmente os anteriores ao início do século XX.
Diante desse quadro, o presente artigo investiga procedimentos hipertextuais ensejados pelas TIC
que possam auxiliar jovens a ler obras literárias tradicionalmente estudadas nas aulas de Língua
Portuguesa e Literatura na Educação Básica, apresentando ainda uma proposta de ferramenta online
de mediação pedagógica que potencialize a competência leitora e comunicativa desses jovens no
contato com o texto literário. Todas as escolhas tecnológicas no desenvolvimento dessa aplicação
(já em curso) são respaldadas, ao longo do artigo, por pressupostos teóricos referentes ao
desenvolvimento da competência leitora, à comunicação mediada por computadores e ao papel
emergente das TIC na Educação Básica. O produto final para mediação pedagógica online ora
proposto consiste em um site dinâmico de auxílio ao leitor por meio de referências hipertextuais de
cunho lexical, contextual e interpretativo, bem como ferramentas colaborativas da web social, como
fóruns de debate sobre as obras literárias e bibliotecas para postagem de outros textos que
dialoguem com as obras. Do ponto de vista técnico, escolheram-se metodologias de
desenvolvimento de acordo com o tempo disponível de vida da bolsa de iniciação cientifica dos
alunos envolvidos no projeto, adotando-se procedimentos de RUP (Rapid Unified Process), ao
passo que, para a ferramenta de alimentação do banco de dados, foi utilizada a metodologia de
desenvolvimento ágil. Como alguns requisitos do software não foram identificados de início, foi
usada engenharia reversa para documentar a ferramenta, subscrevendo a documentação anterior.
Por fim, apresenta-se ainda uma proposta de teste para validação de ferramentas de mediação
pedagógica online dessa natureza, junto a alunos do Ensino Médio.
ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO PROGRAMA UCA EM MATO GROSSO:
DESAFIOS DA FORMAÇÃO DO PROFESSOR
Cláudia Lúcia Landgraf-Valerio – CAPES/PROPGLP/PUCSP
Esta comunicação faz parte de uma pesquisa de doutorado em andamento no PROPG de Língua
Portuguesa da PUC/SP e propõe uma reflexão sobre os desafios da formação continuada de
professores de Língua Portuguesa atuantes no programa UCA (Um Computador por Aluno) em
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Mato Grosso ao destacar a importância dos momentos formativos para reflexão e transformação das
práticas pedagógicas de sala de aula. Este trabalho é piloto da proposta de doutoramento
mencionada, uma vez que foram utilizadas somente duas escolas públicas que participam do
programa UCA (um computador por aluno) em Mato Grosso. Os procedimentos metodológicos são
de cunho qualitativo com uma pesquisa de procedências bibliográficas, seguida de entrevistas com
os professores da rede estadual sobre a proposta de formação continuada do Estado implementada
pelo CEFAPRO (Centro de Formação e Atualização dos Educadores da Rede Estadual de Educação
de Mato Grosso) ao atender in locus às necessidades formativas dos educadores das unidades
estaduais. Para apreciação dos dados coletados partimos da análise do discurso crítica (ADC) com a
aplicação do Modelo Tridimensional - dimensão textual, dimensão prática discursiva e dimensão
prática social - proposto por Fairclough (2001) e das premissas de Nóvoa (2007) sobre o processo
identitário na formação de professores definido, pelo autor, como a contínua construção de
maneiras de ser e estar na profissão. A presente pesquisa encontra-se em andamento, entretanto já
apresenta resultados parciais que mostram uma escola em processo de letramento digital.
Verificamos, até o presente momento da pesquisa, que as propostas de formação continuada
desenvolvida pela SEDUC-MT através do CEFAPRO têm contribuído para formação dos
professores de Língua Portuguesa da rede estadual de Mato Grosso ao implementar o uso do laptop
educacional de forma significativa para o processo de ensino/aprendizagem de Língua Portuguesa
em contexto digital. Desta forma, promover uma formação reflexiva, discutindo quais são as
dificuldades e as possibilidades reais de utilização da TIC no processo de ensino e aprendizagem,
apresenta-se como uma proposta viável para que os educadores incorporem o laptop educacioanal
como ferramenta em suas práticas pedagógicas.
UMA METODOLOGIA PARA CONSTRUÇÃO E APLICAÇÃO DE MATERIAL
DIDÁTICO: USO NA DISCIPLINA “FUNDAMENTOS DE EAD” PARA CURSOS DE
LETRAS A DISTÂNCIA
Lafayette Batista Melo – IFPB
O trabalho mostra como é construído e aplicado o material didático da disciplina de “Fundamentos
de EaD” para um um curso de letras a distância. A pesquisa baseia-se em estudos sobre gêneros
textuais digitais e esquemas de sequência didática adaptados às necessidades do curso e a tarefas de
produção de gêneros digitais por parte dos alunos. A disciplina de “Fundamentos de Ead” tem um
material em cinco livros com os seguintes temas: 1) Conceitos de Educação a Distância; 2) O aluno
de Educação a Distância; 3) Ferramentas e softwares educacionais, 4) Ferramentas e softwares
educacionais II e 5) Ambientes Virtuais de aprendizagem. Procurou-se estimular a produção de
gêneros digitais em cada livro como textos hipermodais materializados em práticas comunicativas
recorrentes para ação social. Ou seja, a cada tema tratado os alunos são orientados a como produzir
gêneros, tendo consciência dos papéis sociais e dos objetivos comunicativos necessários ao gênero
trabalhado. Como a disciplina é introdutória, o conceito de “gênero” fica transparente para os
alunos, mas as atividades são baseadas em um esquema de sequência didática adaptado, cujos
conceitos e exemplos são definidos nos livros, mas os exercícios podem estar nos livros e em
versões mais atualizadas no ambiente virtual de aprendizagem Moodle. Desse modo, o professor
acompanha os módulos produzidos pelos alunos e os orienta em fóruns próprios do ambiente
virtual. O esquema de sequência didática é produzido da seguinte forma: 1) apresentação da
situação para descrição de ferramentas ou habilidades e competências do aluno necessárias a um
curso a distância; 2) produção inicial que é tida como base para as novas versões; 3) produção de
novos módulos que podem retomar ou retirar o que foi feito na produção inicial conforme
orientações do professor; e 4) produção final – aquela considerada terminal, mas nunca a última em
conformidade com a ideia de que os gêneros podem mudar, se transformar e serem incorporados
por outros. A ementa do curso todo é a seguinte: Histórico e evolução da educação a distância:
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visão do mundo e do Brasil; Características, definições, regulamentações; Características do aluno
de educação a distância; Ferramentas de software utilizadas no processo de ensino-aprendizagem
baseado em educação a distância (email, blogs, listas de discussão, objetos de aprendizagem,
ferramentas de busca, chats, fóruns e redes sociais); Ambientes Virtuais de Aprendizagem; Moodle:
fundamentos e utilização. Contudo, para a definição das atividades e delimitação do conteúdo, foi
feita uma comparação com outras cinco experiências de cursos introdutórios semelhantes a este. Há
partes do material em teste também na versão móbile. Foi feito um questionário de satisfação com
os tutores em formação do curso, que sugeriram novas modificações, mas apontaram como
principal vantagem do material e da metodologia o aprendizado de novas práticas dentro de
contextos que podem ser utilizados imediatamente.
DA REVISTA ELETRÔNICA NA MODALIDADE A DISTÂNCIA ÀS PRÁTICAS DE
SALA DE AULA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NA BAHIA
Luciene Souza Santos – UEFS
A presente comunicação a ser divulgada no 33º Simpósio – O ENSINO DE PORTUGUÊS E
NOVAS TECNOLOGIAS – tem como principal objetivo apresentar um relato de experiência sobre
o uso da Revista Eletrônica como formato para estruturar as aulas de Metodologia da Língua
Portuguesa, através da ferramenta tecnológica Videostreaming, no curso de Letras de uma
instituição da rede privada do Estado da Bahia, entre 2000 e 2005, na modalidade a distância (EaD).
Buscou-se formar professores de Língua Portuguesa capazes de criar práticas inovadoras em suas
salas de aula e de transformá-las em espaço de aprendizagem lúdico e contextualizado com a
realidade dos seus alunos que são nativos da era tecnológica. A Revista Eletrônica é uma aula
transmitida no formato televisivo e tem na diversidade de atividades a sua principal característica,
isso porque, no universo da sala de aula, a televisão coexiste ao lado de livros, cadernos e outros
objetos de uso diário, propiciando dessa forma um confronto entre as relações de saber mais
estáticas e tradicionais e as mais inovadoras. A construção de saberes de maneira colaborativa
precisa ser levada em consideração no momento em que o professor realiza um curso de graduação
em serviço e quando ele efetiva a produção do seu planejamento; ou seja, a forma com que os temas
são conduzidos na disciplina da graduação precisa impulsionar o professor de Língua Materna a
(re)pensar a sua práxis pedagógica frente ao momento presente, onde as formas de aprender são
diversas. O referido relato trará amostras a partir das quais é possível analisar as possibilidades e
alternativas dinamizadoras das aulas de Língua Materna, além dos efeitos no processo de
aprendizagem dos(as) professores em formação e dos seus respectivos alunos. Os resultados
apresentados evidenciam a visão desses profissionais diante das inovações apresentadas pela
Revista Eletrônica e serão coletadas através das ferramentas interativas: e-mail, Fórum de
Discussões do Ambiente Virtual de Aprendizgem (AVA) e pela presença virtual de Tutores e
Tutoras.
A FORMAÇÃO DISCURSIVA DOCENTE NO USO DO LAPTOP EDUCACIONAL:
NOVOS OLHARES SOBRE O LETRAMENTO DIGITAL
Dorsa Arlinda Cantero – UCDB-MS
Esta pesquisa em andamento volta-se para a análise da formação discursiva docente no uso do
laptop educacional a partir do desenvolvimento de uma Comunidade Virtual Interativa, com
ferramentas de comunicação e informação, para a melhoria do ensino e aprendizagem
interdisciplinar em uma escola pública em Mato Grosso do Sul, com um duplo objetivo: investigar
(i) como tem ocorrido a formação continuada dos professores na escola pesquisada (ii) analisar as
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estratégias de leitura, produção e comunicação nas práticas discursivas dos docentes voltadas ao
letramento digital. Tem como ponto de partida os estudos já realizados pelo Grupo de Pesquisas e
Estudos em Tecnologia Educacional e Educação a Distância (GETED) e está ligado ao projeto sob
a coordenação do IFMS (Instituto Federal de Mato Grosso do Sul – Campus Campo Grande) com a
participação da UCDB (Universidade Católica Dom Bosco), no qual a pesquisadora está inserida.
Investigar as práticas textuais e discursivas existentes implica analisar a formação docente em seu
lócus de atuação e o esforço em adaptar as suas práticas pedagógicas a essas transformações.
NOVAS TECNOLOGIAS NO PLANEJAMENTO DE ENSINO DE LÍNGUA
PORTUGUESA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL
Nara Luz Chierighini Salamunes – Faculdade Padre João Bagozzi/
Prefeitura Municipal de Curitiba
O presente trabalho tem por objetivo registrar duas experiências de uso de novas tecnologias (NT)
nos processos de planejamento de ensino de língua portuguesa (LP) desenvolvidas em duas escolas
municipais de ensino fundamental de Curitiba entre os anos letivos de 2011 e 2013. A primeira
experiência, diz respeito a práticas de orientação e coordenação pedagógica do trabalho de
planejamento de ensino realizado por professoras dos anos iniciais do ensino fundamental para o
ensino de língua portuguesa e, a segunda, à organização de sequências didáticas como subsídios
teórico-práticos para professores efetivarem o aprofundamento do ensino de leitura e de produção
textual nesse mesmo nível de ensino. Descrevem-se modelos e estratégias de planejamento de
ensino que têm por base: o uso de tecnologias informáticas como suporte à desburocratização e à
organização factual de ações didáticas de LP; a aplicação de recursos informáticos e de rede de
computadores para a consecução de sequências de ações didáticas que objetivam o aprofundamento
da aprendizagem da leitura e da produção de textos; a implementação de dinâmicas didáticas
interacionais de uso da língua portuguesa em práticas sociais inerentes à vida cidadã atual; a
abordagem didático-gramatical de diferentes gêneros e suportes textuais, na perspectiva da
construção de significados e discursos contextualizados; a leitura e o desenvolvimento da
competência comunicativa na língua padrão. Com este relato de experiência, pretende-se fomentar o
debate sobre formas de instrumentalização teórico-metodológica de professores de língua
portuguesa por meio de formação continuada em serviço e com o uso de novas tecnologias.
PRÁTICAS DE LEITURA EM AMBIENTES DIGITAIS
Tânia Maria de Oliveira Rosa – UFT
Professora da Educação Básica – SEDUC-TO
A utilização do computador na educação e nos processos de ensino e aprendizagem tem uma
trajetória recente dentro da história da educação brasileira. Discutida desde o início da década de
80, influenciada pelo movimento de Tecnologia Educacional- TE, em voga nos anos 70, tal
discussão tem um caráter que visa garantir um ensino de melhor qualidade. O Programa Nacional
de Formação Continuada em Tecnologia Educacional, reformulado em 2007 inseriu cursos de
inclusão digital para os professores, com o objetivo de capacitá-los a fazer uso das tecnologias
digitais na prática docente. Por meio de Políticas Publicas que visam a inclusão digital dos alunos
foi implantado nas escolas da rede estadual do Estado do Tocantins, o Projeto Um Computador por
Aluno - UCA, que tem como um dos pilares de sustentação a melhoria da qualidade da educação, e
como princípios o uso pedagógico, a mobilidade e a conectividade à grande rede mundial de
computadores, a internet. O presente trabalho é resultado parcial de uma pesquisa que objetiva
analisar as potencialidades do computador na sala de aula como um recurso pedagógico e seus os
efeitos na aprendizagem. Analisando especificamente as contribuições para a prática de leitura no
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ambiente digital mediada pelos professores de língua portuguesa que atuam nas unidades escolares
piloto do Projeto UCA, implantado em 2010 na Escola Estadual Sancha Ferreira e na Escola
Municipal Willian Castelo Branco em Araguaína - Tocantins. No contexto educacional em que
vivemos atualmente percebe-se que analisar a informática educativa, e seus programas, criticamente
é uma necessidade, pois, entende-se que o professor é o agente da utilização do computador na
educação enquanto mediador pedagógico, ou seja, é a atuação docente que irá definir o uso dos
laptops na escola. Cysneiros (2000) salienta que em si a informática não conduz naturalmente a uma
aprendizagem efetiva, o que exige um trabalho do professor. A pesquisa trata de um estudo de caso
embasado nos aportes teóricos que abordam esta temática como: Oliveira (1997); Antunes (2009);
Marcuschi & Xavier (2010); Moran (2011) e na análise documental cujos dados foram gerados com
base na consulta de planos de aula; projetos de leitura; relatórios que evidenciaram ações voltadas
para a leitura; memorial reflexivo da formação continuada dos professores. Como resultados
preliminares a pesquisa está propiciando analisar a questão em relação à necessidade de inserir a
tecnologia digital nos processos educativos especialmente nas metodologias utilizadas para a leitura
em ambientes digitais, considerando que a leitura de hipertexto se diferencia da leitura de textos
estáticos; como o currículo está sendo adequado para atender o aluno neste contexto de mundo
digital. Outro aspecto interessante que a pesquisa está mostrando são as dificuldades dos
professores de corresponder à proposta da formação continuada, ofertada pelo Programa de
Tecnologia Educacional, de incorporar os computadores como recurso pedagógico na pratica em
sala de aula.
A EXPERIÊNCIA DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA EM UMA ESCOLA
TECNOLÓGICA
Renata da Silva de Barcellos – CEJLL/NAVE-UNICARIOCA
O presente trabalho pretende proporcionar a reflexão da atual necessidade de mudança da prática
pedagógica dos educadores de língua portuguesa não só devido à legislação e às teorias, como
também as provas externas (SAERJ / ENEM / ENADE...): Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, PCN’s (2002), Currículo mínimo (2011) – esse documento tem por objetivo “ser
referência a todas as escolas da rede, apresentando as competências habilidades e conteúdos básicos
que devem estar contidos nos planos de curso que darão a forma final ao que os professores da Rede
Estadual trabalharão com suas turmas” (2011) -, ementa do curso de Comunicação e expressão,
teoria de Vygotsky (1994) e da Sociolinguística (1960) e apresentar uma proposta de ensino
reflexivo (a partir do uso de recursos tecnológicos, de diferentes linguagens e de conhecimento de
mundo - CM). A partir da leitura desses documentos, começamos a experimentar diversas
possibilidades para a construção do conhecimento da língua materna. Esta metodologia é o
resultado de uma experiência com educandos de ensino médio do Colégio Estadual José Leite
Lopes / NAVE e de ensino superior da UNICARIOCA cuja proposta pedagógica das duas
instituições é com base na tecnologia. Na faculdade, a Prova colegiada e o sistema interno com uso
de fóruns, mensagens... e, na escola, além disso, criação e disseminação de boas práticas como o
uso das redes sociais como ferramenta pedagógica (hoje, sobretudo o facebook). Dessa forma, o
educador leva o educando a construir o seu conhecimento específico articulado com os fatos
ocorridos na sociedade em que está inserido a partir da tecnologia e a conscientizá-lo da
necessidade de manter-se atualizado e de utilizar adequadamente as diferentes variantes linguísticas
nas diversas situações comunicativas.
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TECNOLOGIA NAS AULAS DE PORTUGUÊS: DIFICULDADES DOS PROFESSORES
DO COLÉGIO ESTADUAL LUIS VIANA FILHO DE GUANAMBI – BA
Maria da Solidade Teixeira Fernandes – TOPA
O mundo está vivendo um processo de transformação nas formas de ser, viver e relacionar-se,
especificamente, com os grandes avanços nos meios de comunicação e da informática. Necessário
se faz que se desenvolva nos alunos competências e habilidades a fim de que eles possam estar
inseridos em uma sociedade, participando ativamente desse desenvolvimento. As tecnologias de
informação, em geral, são ferramentas fundamentais para o trabalho e para a educação,
principalmente, língua portuguesa. Dessa forma, não se pode imaginar uma nova geração sem que
esteja inserida nas Tecnologias de Informação e Comunicação. (TICs). Essas novas tecnologias são
ferramentas que deveriam ser úteis muito mais para a pedagogia, nas aulas de língua portuguesa,
pois só pela educação tecnológica é que se insere o discente mundo globalizado. Ninguém mais
duvida que o computador é coisa do presente. O que parecia futuro há pouco tempo atrás, já é
realidade em muitas salas de aula. Alguns professores ainda têm dificuldades em usar o
computador. Outra questão importante nesse processo é mudar a noção do que é uma aula de
português. A aula de português, como tradicionalmente concebida, não deve existir mais, pelo
menos não deveria. Ao invés de estudar português, os alunos vão aprender por meio do português.
Essa disciplina deverá ser usada como instrumento para se aprender outras. Mais do que nunca a
interdisciplinaridade deve tomar conta da escola. A partir de uma coleta de dados obtida no Colégio
Estadual Luis Viana Filho, localizado em Guanambi - Bahia foi elaborado este trabalho que visa
diagnosticar as principais questões relacionadas às dificuldades que a referida Instituição enfrenta,
face à inclusão da tecnologia educacional nas aulas de língua portuguesa. Este é um estudo de caso
em que o corpus é composto por professores em que foram utilizados questionários respondidos
pelos mesmos, transcritos e analisados posteriormente, com base em alguns autores como
Indezeichak (2008), Coscarelli (1999) Sobral (1999), Nogueira (2002) e outros. Após análise dos
dados e reflexão concluiu-se que, a democratização do saber virtual é algo que deve fazer parte,
atualmente, de todas as instituições escolares especificamente nas aulas de língua portuguesa. Por
meio desse, ficou evidenciado a necessidade e o interesse dos participantes na descoberta de novos
meios de ensinar e de como utilizar as tecnologias para a melhoria de suas aulas contribuindo,
assim, para a qualidade de ensino desse público que já foi excluído e que merece estar atualizado
em sua educação. As dificuldades enfrentadas por professores no uso dessa tecnologia, nas aulas de
língua portuguesa, têm sido enormes na referida instituição.
REFLEXÕES SOBRE UMA EXPERIÊNCIA DE ENSINAR LÍNGUA PORTUGUESA
UTILIZANDO RECURSOS TECNOLÓGICOS
Hélvio Frank de Oliveira – UEG/UFG
Tendo em vista que as novas tecnologias de informação e comunicação têm ocupado importante
função em contextos escolares, estudos nas áreas de Linguística Aplicada e Educação têm buscado
refletir sobre tais ferramentas com vistas a integrar o seu uso numa dimensão favorável à
aprendizagem de línguas. Sob tal perspectiva, neste texto, busco alavancar uma reflexão a partir de
uma experiência desenvolvida em escola pública de ensino médio por uma professora em formação
sobre o uso do computador, da Internet, entre outros recursos disponíveis na escola, em aulas de
língua portuguesa a partir de propostas de atividades on-line previamente planejadas e
posteriormente conduzidas. Procuro mapear, com base no experimento, que tipos de atividades
podem ser aplicáveis considerando-se o contexto, bem como a recepção de tais propostas de
atividades por parte dos alunos. Trata-se de uma pesquisa experimental, de ordem qualitativa,
desenvolvida durante algumas aulas envolvendo o cumprimento do estágio obrigatório docente em
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Letras, no primeiro semestre de 2012. Trinta e três alunos, pertencentes a uma turma de primeiro
ano matutino, com idade entre 14 e 20 anos, e a professora em formação, mentora do projeto, foram
os participantes desta investigação. Os instrumentos utilizados foram questionários escritos
respondidos pelos alunos e diários reflexivos produzidos pela docente. Por meio da efetivação de
seis propostas de atividades, foi possível sinalizar a simpatia com que os alunos aderiram ao
planejamento que, de certa forma, produziu inovações na aprendizagem ao utilizar diferentes
ferramentas de ensino. Algumas tarefas efetivas, no entanto, caracterizaram-se como (in)viáveis de
aplicação e, nesse sentido, são discutidos alguns aspectos inerentes à prática pedagógica do
professor de línguas ao manejar tais recursos tecnológicos.
ENSINO DA LÍNGUA NA TECNOLOGIA DE LABORATÓRIO
Luiza Alves de Moraes – FIMI-Mogi Guaçu/UERJ-SELEPROT
Maria Suzett Biembengut Santade – FIMI/FMPFM-Mogi Guaçu/UERJ-SELEPROT
O estudo aborda o uso dos recursos tecnológicos computacionais pelos professores nas escolas de
educação básica no ensino da Língua Portuguesa e suas disciplinas afins. As aulas desenvolvidas
com o uso específico de computadores estendem o uso reconhecido de aula diferenciada com as
diversas e infinitas atividades praticáveis em computador e trazem à Educação novos avanços, que
refletem nas escolas a realidade tecnológica que a sociedade mundial vivencia, na qual todos devem
efetivamente estar inseridos. A observação da prática educativa atual em relação ao uso dos
laboratórios de informática infere-se que ainda há uma exploração tímida e insipiente dessa
ferramenta pelos professores nas aulas. Há fatores inadequados que contribuem para que os
laboratórios de informática instalados nas escolas não sejam devidamente aproveitados: falta de
orientações curriculares, de treinamento aos professores, de incentivo e, principalmente, de
conhecimento dos recursos computacionais disponíveis nas escolas, de insegurança dos professores,
de problemas relacionados aos recursos físicos disponíveis nas escolas e de manutenção. Na
pesquisa, também se ressalta que a maior incidência de obstáculos está concentrada no despreparo
didático-pedagógico do professor que, consequentemente, afeta os alunos. Nas bases metodológicas
propostas, o professor deve (i) ser criativo e (ii) valer-se de sua competência profissional para
reproduzir atividades eficientes no desenvolvimento do conhecimento dos alunos. Este trabalho
suscita o professor preparado para a concretização das atividades em laboratório de informática na
aula de Língua Portuguesa com conhecimento técnico-computacional avançado e com domínio
básico sobre o editor de textos e browser instalados no laboratório de informática de sua escola e de
algumas ferramentas disponíveis na Internet. Assim, essas atividades propostas possibilitam que o
docente desempenhe sua capacidade tecnológico-criadora nas atividades práticas de linguagem
escrita no ensino básico e também no superior em contínua atualização do ensino de língua para
expandir sua formação de professor na área de letras interagida à multimídia educacional.
OBJETOS DE APRENDIZAGEM PARA O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA:
MODELO DE ATIVIDADES DE LEITURA E ESCRITA
José Hipólito Ximenes de Sousa – CMCB
Neste trabalho, buscamos compreender o uso dos Objetos de Aprendizagem e os reflexos destes
recursos nos processos de ensino-aprendizagem em Língua Portuguesa, bem como construir um
repositório que contenha os objetos analisados, além de propor uma metodologia de OA nas aulas
de língua portuguesa. Este estudo foi motivado pela função que os Objetos de Aprendizagem têm
apresentado como novo parâmetro no processo educacional, pois através do uso de tecnologias
digitais, agregam conteúdos e podem ser acessados e utilizados de forma interativa, seja
presencialmente ou à distancia. Analisar os Objetos de Aprendizagem para o ensino-aprendizagem
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de Língua Portuguesa, utilizando as Tecnologias da Informação e da Comunicação sobre as
recomendações e padronizados para OA disponibilizados em repositórios na Internet. A base
metodológica da pesquisa ( ainda em construção) é de caráter qualitativo, em que busca-se a
obtenção de dados descritivos, captados no contado direto do pesquisador com a situação em foco.
A era da informação (VIANA, 2004) é fruto do avanço das novas tecnologias digitais que estocam
de forma prática o conhecimento em gigantescos volumes de informações. Elas são armazenadas de
forma inteligente, permitindo a pesquisa e o acesso rápido, de maneira muito simples, amigável e
flexível. É o que acontece com a Internet. A informação deixou de ser uma área ou especialidade
para tornar-se uma dimensão de tudo, transformando profundamente como a sociedade se organiza.
Pode-se afirmar que está em andamento uma Revolução da informação como no passado ocorreu
com a Revolução Agrícola e a Revolução Industrial. A sociedade da informação traz também várias
consequências para a educação. No ciberespaço, a informação está sempre e permanentemente
presente em renovação constante, rompendo com a ideia de tempo próprio para aprendizagem. Os
modelos de atividades de leitura e escrita a partir dos OAs são imprescindíveis para as novas formas
de ensino-aprendizagem nas aulas de Língua Portuguesa.
NOVAS TECNOLOGIAS: NOVAS INTERAÇÕES, NOVAS ESCRITAS
Adriana Alves de Moura – SEE/DF
Sandra Rodrigues Sampaio Campêlo – SEE/DF
Os meios de comunicação estão potencializados pelo avanço das tecnologias, do som e da imagem.
A produção de mensagens e interpretações, representações sociais, conhecimentos etc. é gerada
coletivamente mediante a circulação da informação que chega até nós por esses meios (MARQUES,
1993; LÉVY, 1994). A aceleração nos tempos de hoje, em parte graças às novas tecnologias, traz
reflexos significativos na escola. Estamos vivenciando um tempo de revolução na informação e na
comunicação sem precedentes que está desafiando nossos métodos tradicionais de análise e de ação,
nossos modos de conhecer, de trabalhar e de educar. (SANTAELLA, 2005) Nossos jovens jogam,
pesquisam, ouvem música, veem TV e conversam na internet tudo ao mesmo tempo. É um repensar
a lei da física: estar em vários lugares ao mesmo tempo de forma rápida e passageira. Gupta e
Ferguson (1992) chamam as experiências onde espaço ou espaço-tempo são reordenadas, múltiplas,
não-sequenciais e simultâneas de "Reterritorialização” (1992 apud LEANDER, 2009). As Novas
Tecnologias de Informação e Comunicação, ou simplesmente: NTICs, implicam novas formas de
produção e circulação do texto e de novas formas de ler. “Nascem” novos gêneros textuais que
acompanham o surgimento dessas novas tecnologias. Uma mistura de linguagem imagética e
sonora. Textos curtos, expressivos, descritivos, “físicos”, gestuais. Predileção pelo “subjetivismo”,
exposição de críticas, pensamentos e sentimentos. Chartier (1998) ressalta que “o novo suporte do
texto [o ambiente digital] permite usos, manuseios e intervenções do leitor infinitamente mais
numerosos e mais livres do que qualquer uma das formas antigas do livro” (p. 88). Em conjunto às
novas mudanças, nascem novos leitores/ novos escritores que se “confundem” nestes novos
gêneros. Eles participam da criação conjuntamente, quase simultâneo num espaço de colaboração e
interação na internet, seja pelas redes sociais, e-mail, ou mesmo nas “nuvens”(outro espaço virtual
criado para armazenar e/ou compartilhar documentos do usuário). O ambiente, segundo Lévy
(1999), não só modifica as funções cognitivas humanas, como também implica “mutação da relação
com o saber” sobre a leitura e a escrita. As modernas mídias inundam os nossos olhos com imagens
e a linguagem visual tem sido extremamente valorizada na construção do sentido. Os textos que
circulam nas redes sociais têm características próprias desse meio acelerado em que vivemos: são
curtos, têm imagens e carregados de metáforas, ironias, hipérboles. São textos mais significativos e
complexos. Envolvem outras linguagens que trabalham a intertextualidade, a infratextualidade e a
contextualização de dados. Uma miscelânea de contextos que faz do professor um multileitor, um
professor global. As NTIC implicam novas formas de produção e circulação de textos e novas
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formas de ler, como bem ressaltado. Diante dessas mudanças, o que nós, professores de língua
portuguesa, podemos fazer para trazer essas NTIC para a sala de aula? Como compartilhar, curtir
e/ou comentar essas criações/ “aberrações” com nossos alunos? Atualmente trabalhamos no NTE Núcleo de Tecnologia Educacional - de Ceilândia. Este artigo relata o trabalho que desenvolvemos
com os professores da rede pública de ensino da região. Partimos da análise das linguagens nas
redes sociais (Facebook, Twitter e Orkut), do Google Docs e dos Blogs e propomos formas de
utilização destes recursos para professores em sala de aula.
AS NOVAS TECNOLOGIAS NO ENSINO E APRENDIZAGEM DA LÍNGUA
PORTUGUESA: O BLOG COMO RECURSO PEDAGÓGICO
Luana Fabrícia Correia Silva – CEFET/MG
Ana Maria Nápoles Villela – CEFET/MG
As Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) estão, cada vez mais, fazendo parte das
práticas sociais dos alunos, tanto do ensino fundamental quanto do ensino médio. Embora muitos
professores ainda resistam em utilizá-las com fins pedagógicos, elas já estão inseridas dentro da sala
de aula, dividindo espaço com as aulas tradicionais. Nesse cenário, observa-se a importância de
estudos que apontam as contribuições das TIC no âmbito escolar para que os professores possam
refletir acerca da potencialidade desses recursos que podem auxiliar no processo de ensino e de
aprendizagem. Nessa perspectiva, propomo-nos a fazer um levantamento das pesquisas publicadas
no Portal de Periódicos da CAPES que tenham como objeto de estudo o uso do blog como recurso
pedagógico. Pretendemos avaliar e discutir as contribuições didáticas do blog para o
desenvolvimento da capacidade argumentativa, do pensamento crítico e da criatividade do aluno.
Essa investigação é importante, também, para sistematizar as pesquisas brasileiras existentes desde
o ano 2000 sobre esse tema e para apresentar reflexões das pesquisadoras sobre possibilidades de
intervenções pedagógicas visando a minimizar os problemas determinantes das dificuldades de
aprendizagem da Língua Portuguesa tais como a falta de capacidade argumentativa, de pensamento
crítico e de criatividade. Nesse sentido, buscamos identificar, no corpus constituído pelas pesquisas
elencadas, suas principais implicações pedagógicas: as metodologias de uso do blog como recurso
pedagógico; o uso do gênero blog como mediador das práticas de leitura e de escrita; a integração
do blog ao processo de construção de conhecimento nas aulas de língua materna; o uso do blog
pedagógico como recurso didático. Além disso, buscamos apresentar as contribuições desse gênero
textual para o desenvolvimento dos processos de leitura e de escrita nas aulas de Língua Portuguesa.
Assim sendo, temos ainda, a intenção de possibilitar a formação de massa crítica a respeito da
utilização pedagógica das TIC para que possamos incrementar os processos educativos atuais.
PROJETO UCA EM MATO GROSSO: SOBRE PRÁTICAS DE LEITURA E DE ESCRITA
Enilda Euzébio da Silva - UFMT
Kátia Morosov Alonso- UFMT
Cristiano Maciel - UFMT
Devido ao grande impacto das tecnologias da informação e comunicação (TIC), nas últimas
décadas, em praticamente todas as esferas sociais, especialmente o computador e o advento da
internet, vão surgindo programas privados e também governamentais no âmbito federal, estadual e
municipal visando equipar um número cada vez maior de escolas com laboratórios de informática a
fim de promover, nesse contexto emergente, a integração das TIC ao trabalho docente. Sendo assim,
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refletir criticamente sobre o assunto torna-se cada vez mais necessário. Desse modo, esta
comunicação tem como objetivo apresentar dados parciais de uma pesquisa que se encontra em
andamento, no Instituto de Educação da UFMT, que visa discutir o projeto Um Computador por
Aluno, em Mato Grosso. Mais conhecido como UCA, esse programa federal objetiva integrar
planos e projetos de tecnologia educacional e inclusão digital de alunos da rede pública. Propomos
nesta pesquisa qualitativa, cujo método adotado foi o estudo de caso, uma análise e reflexão crítica
sobre práticas pedagógicas mediadas pelas TIC, em especial, no trabalho com a leitura e a escrita a
partir do uso do laptop educacional, realizadas por alunos do Ensino Fundamental, em uma escola,
do estado de Mato Grosso, inserida no referido programa – UCA.
APRENDIZAGEM DE PORTUGUÊS LÍNGUA ESTRANGEIRA EM CONTEXTO
VIRTUAL: TRÊS ANOS DE INTERAÇÕES ONLINE ENTRE ESTUDANTES
FRANCESES E BRASILEIROS
Liliane Santos – Université Charles-de-Gaulle/Lille 3 (França)
Na sua versão franco-brasileira, o projeto Teletandem Brasil (www.teletandembrasil.org) reúne
alunos de português da Universidade de Lille 3 (França) e alunos de francês da Universidade
Estadual Paulista (Unesp, campus de Assis) para, de acordo com os princípios do tandem
(BRAMMERTS, 2002; HELMLING, 2002) e do webtandem (APPEL & MULLEN, 2000;
BETHOUX, 2006), participarem de um processo de aprendizagem colaborativa das suas línguas e
culturas respectivas, com base nos princípios de autonomia e de reciprocidade: esse ambiente
permite que usem a língua estrangeira em interações autênticas, num processo socioconstrutivista
(KERBRAT-ORECCHIONI, 2005; VYGOTSKY, 1934/1998). As interações online, que se fazem
por intermédio de aplicativos de videoconferência (Skype ou ooVoo), ocorrem uma ou duas vezes
por semana, ao ritmo de uma hora por língua. Ao longo da parceria, os alunos de Lille 3 redigem
um diário de bordo, no qual indicam os principais elementos de cada sessão, redigindo também, no
final da parceria, um relatório, cujo elemento mais importante é uma reflexão sobre a parceria e o
processo de aprendizagem. Esses diários de bordo e relatórios constituem a base do nosso corpus,
que compreende ainda mensagens trocadas com os alunos e anotações feitas por ocasião de
conversações informais a respeito do projeto. Dando continuidade à reflexão iniciada em trabalhos
anteriores (SANTOS, 2009, 2010, 2012), a nossa análise, que abarca os três primeiros anos do
projeto (de 2006 a 2009), examinará os comentários dos alunos franceses sobre o funcionamento do
projeto e da parceria, bem como sobre os temas abordados com os parceiros. O estudo desses
elementos, aliado ao exame de questões relativas à construção de representações culturais e
identitárias, permitirá apontar os elementos necessários a uma parceria bem sucedida, tanto do
ponto de vista material e cultural quanto da relação entre os indivíduos implicados nesse tipo de
projeto.
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SIMPÓSIO 34
GRAMÁTICA COMUNICATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Embora, nas últimas décadas, os livros didáticos de Português para Estrangeiros (PPE) tenham
mostrado um notável esforço na tomada em consideração dos resultados da pesquisa linguística, o
tratamento que dão à gramática ainda deixa muito a desejar, na medida em que a descrição
gramatical tradicional do português, língua materna, continua a ser a base do ensino do PPE. É
justamente por essa razão que, muitas vezes, esses manuais ensinam mais a “evitar os desvios da
norma mais frequentes do que a construir enunciados” (SUSO LÓPEZ, 2004, p. 224).
Sabendo que (i) a significação é inseparável do seu contexto de produção e das relações que os
interlocutores entretêm não somente entre si, mas também com a própria língua, que (ii) o objetivo
do professor de língua estrangeira é fazer com que os seus alunos adquiram uma gramática
interiorizada – também chamada competência gramatical (GALISSON & COSTE, 1976, p. 253) –,
a qual, por sua vez, lhes permitirá construir uma competência comunicativa; e que (iii) “aprender
uma língua (…) é aprender a comunicar” (WILKINS, 1974), propomos, neste simpósio, uma
discussão em torno de dois eixos principais: (i) os elementos a levar em conta na elaboração de uma
gramática do PPE de acordo com os princípios da gramática comunicativa (ADAMSON, 1990;
MATTE BON, 1995a, 1995b) e (ii) a utilização da abordagem comunicativa em aula de PPE.
Assim, projetos de pesquisa aplicada ou básica, em curso ou concluídos, estudos quantitativos e
qualitativos, relatos de experiência, entre outros, são algumas das formas que poderão tomar os
trabalhos apresentados.
COORDENAÇÃO
Liliane Santos
Université Charles-de-Gaulle – Lille 3 (França) - UMR 8163 “Savoirs, Textes, Langage” (CNRS)
[email protected]
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O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA ALUNOS INDÍGENAS: ALGUMAS
REFLEXÕES
Maria Luceli Faria Batistote – UFMS
As discussões em torno do ensino de línguas, embora tenham sofrido modificações ao longo dos
tempos, ainda, apresentam a gramática de modo bastante marginalizado. No contexto dessa
problemática, temos a gramática comunicativa, cuja preocupação centraliza-se, segundo Santos
(2008), no fato de que no processo ensino/aprendizagem do PL2 o ensino da gramática deve tomar
como ponto de partida as necessidades comunicativas e os interesses comunicativos dos
aprendentes, integrando a reflexão gramatical, sempre que esta se coloca, ao serviço desses
interesses e necessidades. Nessa perspectiva, propomos apresentar neste trabalho algumas
considerações sobre o ensino de língua portuguesa para aprendizes indígenas, tomando como
enfoque a gramática dessa língua, bem como alguns dilemas vivenciados pelos profissionais,
especialmente os professores não-índios que atuam nessa área. A pesquisa parte, mais
especificamente, do aparato teórico de autores como Matte Bon (1995), Santos (2008), Marcuschi
(2008) e Travaglia (2009), que postulam uma abordagem de ensino de língua contextualizado em
situações comunicativas, considerando a situação enunciativa como fundamental para desenvolver
habilidades linguístico-textual-discursivas do aprendiz. Temos como objetivo propor reflexões
sobre o ensino de língua portuguesa, especificamente sobre a gramática e, também, tecer
considerações teórico-metodológicas como subsídios para esse processo. Apesar de o Brasil ser um
país multilíngue, as discussões sobre especificidades linguísticas apresentam-se, ainda, de forma
muito incipientes, presumivelmente em face de toda a trajetória percorrida desde a chegada dos
colonizadores até o momento em que os povos indígenas se apropriam da língua como elemento de
construção de identidade. A língua portuguesa surge para algumas comunidades indígenas como
segunda língua e ocupa um espaço importantíssimo face às necessidades hoje existentes de vindas
constantes à cidade, de serviços bancários, de negociações com parceiros de projetos agrícolas da
lavoura mecanizada e outras. Os resultados da pesquisa apontam que a ênfase ao conhecimento,
puro e simples, de aspectos gramaticais embasa-se na concepção de língua como um fim em si
mesma. Esses dados indicam o quão importante é para o professor uma nova postura em relação à
concepção de língua e à abordagem de ensino a ser adotada.
POR UMA GRAMÁTICA COMUNICATIVA PARA O ENSINO DOS PRONOMES A
ESTUDANTES DE PORTUGUÊS LÍNGUA ESTRANGEIRA.
Ana Clotilde Thomé Williams – Northwestern University
Com o advento da abordagem comunicativa ao ensino de línguas a partir dos anos 70, começou-se a
questionar a relação entre o ensino da gramática e o objetivo pedagógico em sala de aula. Se o foco
do ensino é a língua para a comunicação (WIDDOWSON, 1990) em que se evidenciam trocas
comunicativo-pragmáticas, faz-se necessário rever o conceito de gramática e sua função em sala de
aula (ODLIN, 1994). Que gramática ensinar? Com base em preceitos de uso da língua nas diversas
relações comunicativas, por que não adotar uma perspectiva em que a gramática esteja a serviço da
expressão sociolinguística e não ao contrário? Uma gramática da expressão e significado da língua
sem dúvida possibilita que o aluno reflita melhor sobre os mecanismos da fala e da escrita
(CHARAUDEAU, 1992; CEREJA E MAGALHÃES, 1999). Nesta comunicação, pretendo expor
os desafios de estudantes norteamericanos, falantes de espanhol ou inglês, em aprender o uso de
pronomes pessoais do português do Brasil. Proponho uma abordagem gramatical reflexiva, em que
aspectos interculturais também desempenham um papel importante na compreensão e no uso de
pronomes em português. Para que haja uma conscientização dos estudantes a respeito dessas
diferenças, eu tomo por base materiais autênticos do mesmo gênero discursivo nas três línguas
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396
(como a versão de novelas brasileiras, ou propagandas de um mesmo produto nos diferentes países).
Atividades de conscientização são oferecidas ao aluno antes de colocar o novo conhecimento em
prática.
AS CONSTRUÇÕES IMPESSOAIS EM PORTUGUÊS: UMA PROPOSTA
DEDESCRIÇÃO NA PERSPECTIVA DA GRAMÁTICA COMUNICATIVA
Liliane Santos – Université Charles-de-Gaulle - Lille 3
Tendo em vista que, geralmente, as gramáticas e os livros didáticos consideram a língua comoum
sistema de regras de combinação de palavras para formar frases, a impessoalidade –como, aliás, os
demais fatos gramaticais – recebe um tratamento por “grandes famílias depalavras” (MATTE BON,
1995: VII), o que provoca ao menos um problema importante: otratamento em unidades isoladas de
fatos que poderiam – e deveriam, e mereceriam – serreunidos. Dessa opção metodológica decorre,
portanto, a impermeabilidade entre os diferentespontos da descrição, cuja interrelação não se
percebe. Além disso – ou justamente por isso –,o tratamento dado à impessoalidade pelos manuais
didáticos concentra-se geralmente noschamados verbos impessoais, com haver e fazer como
paradigmas. Do mesmo modo, osestudos linguísticos sobre a questão muitas vezes prendem-se a
um único aspecto da questão –por exemplo, entre inúmeros outros, as “orações impessoais”
(FRANCHI, NEGRÃO & VIOTTI,1998), o “sujeito nulo” (BARBOSA, DUARTE & KATO, 2005;
CARRILHO, 2000; GONÇALVES, 2002), os“sujeitos indeterminados” (DUARTE, KATO &
BARBOSA, 2003). E, mesmo quando escolhem umponto de vista mais abrangente (cf. ILARI,
2010), tais estudos têm geralmente pouca ou nenhuma influência sobre a produção de materiais
didáticos para o ensino de Português, seja como língua materna (LM), seja como língua estrangeira
(LE). Como se sabe, as formas deexpressão da impessoalidade são múltiplas e variadas, assim como
múltiplos e variados são ospapéis e as atitudes do locutor, elemento essencial para a definição das
diferentes nuances decada uma das construções utilizadas e dos operadores escolhidos. Neste
trabalho,apresentaremos uma proposta de descrição das formas de expressão da impessoalidade
emlíngua portuguesa, de acordo com os pressupostos teóricos da gramática comunicativa, isto
é,uma proposta de descrição de fatos gramaticais em que as intenções comunicativas ocupamum
lugar central, pois o que se considera importante é a capacidade do aprendiz em criarenunciados em
lugar de simplesmente repetir frases. Assim, trataremos das construções comalguém, tu/você, a
gente, todo mundo, as pessoas, a 3ª pessoa do plural, as construçõesinfinitivas, as construções com
se – além, evidemente de certos verbos (haver, fazer, ter e osverbos que indicam fenômenos
meteorológicos, mas também o verbo dar), assim comoexaminaremos casos específicos de
concordância (por exemplo, construções com o verbo sere com a gente). Nossa descrição mostrará
que, além da atitude do locutor, o registro e o ato defala no qual se insere a construção impessoal
são fatores decisivos para a decisão de não apresentar o sujeito de um verbo de maneira explícita e
para a escolha de uma dada construção.
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SIMPÓSIO 35
CONSTRUÇÕES COM VERBO SUPORTE: DAS COLOCAÇÕES ÀS
EXPRESSÕES FIXAS
As construções com verbo suporte têm sido um tema desafiador que tem ocupado linguistas de
diversas correntes teóricas, assim como para a lexicografia e o processamento de linguagem natural.
A própria noção do que possa ser uma classe gramatical é colocada em questão com o estudo dessas
construções, com tudo o que isso pode acarretar no estudo da estruturação da frase. Neste simpósio
pretende-se abordar vários aspectos dessas construções, seja de sua constituição argumental, seja de
seu valor semântico-aspectual-discursivo, passando também pelos estudos exaustivos feitos com
essas construções, ou ainda usa descrição para criação de recursos linguístico-computacionais.
COORDENAÇÃO
Oto Araújo Vale
Universidade Federal de São Carlos
[email protected]
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398
DOS OBJETOS COGNATOS ÀS CONSTRUÇÕES COM VERBOS LEVES
Celda Morgado Choupina – FLUP/CLUP
Em diversas línguas do mundo, há construções com objetos cognatos, como espirrar um espirro
(PE/PB)/pleurer um pleur (F)/cantar un canto (E)), que podem ser parafraseadas por verbos leves
(ou suporte), como fazer um choro, cair uma chuva miudinha, dar um espirro. No entanto, algumas
paráfrases afiguram-se difíceis, pela agramaticalidade gerada (*fazer um sono), ou pelas leituras
semânticas que criam (#fazer um canto). A presente comunicação tem como objetivo fazer um
paralelo com as construções com verbos leves, a partir da análise de alguns aspetos sintáticos e
semânticos dos tipos de objetos cognatos existentes em PE.
Os objetos cognatos são de vários tipos: (i) OC verdadeiros (espirrar um espirro +SA/SP/SF); (ii)
OC aparentados (dançar uma dança); (iii) objetos hipónimos (dançar um tango); (iv) finalmente, OC
preposicionais (morrer de uma morte + SA/SP/SF) (Choupina 2012a) e b); in press). A paráfrase
por verbos leves não se afigura uniforme em todos os tipos de OC, assim como a definitude e a
modificação presentes nos SN cognatos. As Línguas Românicas colocam problemas novos e em
parte põem em causa o tratamento clássico deste fenómeno, encetado por Hale & Keyser (1993,
2002), principalmente para o Inglês, assim como a perspetiva contrastiva de Real-Puigdollers
(2008). Uma das semelhanças entre os OC e as construções com verbos leves é a impossibilidade de
apassivação (*um espirro foi espirrado…/*um espirro foi dado…). Nesta perspetiva, faremos uma
análise mais atenta da hipótese colocada por Mirto (2007), na sequência de Moltmann (1989): os
OC são nomes predicativos, inseridos num predicado nominal, tal como nas construções com
verbos leves.
Finalmente, discutiremos o estatuto argumental dos OC, inserindo-nos no tradicional debate da
literatura (Jones 1988; Massam 1990; Hale & Keyser 2002, entre outros) entre argumentos e
adjuntos (Choupina 2011).
UMA ANÁLISE HISTÓRICA DOS CLUSTERS DOS VERBOS SER, ESTAR, ANDAR E
TRAZER
Gabriele Cristine Carvalho – UFMG/IFMG-Congonhas
Neste trabalho, será realizada uma análise dos clusters dos verbos ser, estar, andar e trazer em
textos de língua escrita pretérita dos séculos XIV, XV e XVI. Será utilizada a teoria da Gramática
Baseada no Uso, proposta por Bybee (2006, 2010), segundo a qual a experiência do indivíduo com
a língua pode afetar sua representação mental. Isso significa que a frequência de uso de
determinadas construções pode afetar sua representação e, é por isso, que os indivíduos reconhecem
quais construções são convencionalizadas e quais não são. Em relação ao armazenamento dos
dados, Bybee defende que os tokens de experiência são organizados em uma rede, em que tokens
idênticos são armazenados juntos com o modelo existente, fortalecendo-o. Tokens que são
semelhantes aos existentes são armazenados próximos a eles, formando clusters. Para a autora, o
mesmo ocorreria com as construções, isto é, construções que compartilham uma semelhança formal
e uma coerência semântica são armazenadas próximas umas às outras. Nesta pesquisa, foram
analisados os verbos ser, estar, andar e trazer, em textos dos séculos XIV, XV, XVI. Recolheramse e analisaram-se todas as construções em que esses verbos ocorreram, independentemente se
foram utilizados como verbos significativos ou verbos leves, com o objetivo de se analisar seus
clusters. Mattos e Silva (1992) mostra que a oposição existente entre os verbos ser e estar, que
denotam, respectivamente, estado transitório e estado permanente, nos dias de hoje, não existia no
português arcaico. Segundo a autora, esses verbos poderiam ser usados em estruturas locativas e em
estruturas descritivas. Os resultados da presente pesquisa mostram que os verbos andar e trazer,
nesse período, funcionavam como verbos leves (sendo usados em estruturas descritivas e locativas)
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e como verbos significativos, podendo sinalizar que os clusters desses quatro verbos eram muito
semelhantes, o que poderia indicar também relações de herança entre eles.
<COMEÇAR A + INFINITIVO> NO PORTUGUÊS EUROPEU
Henrique Barroso – UM
Pretende-se, nesta comunicação, fazer o reconhecimento e caracterização da estrutura em epígrafe,
<começar a + infinitivo>. Para isso, proceder-se-á,
(i) em primeiro lugar, à identificação do seu significado, ou seja, ficar-se-á a saber que se trata da
construção geral, não marcada, de inceptivo (existe, ao seu lado, um número considerável de outras
construções com o mesmo significado mas portadoras de propriedades idiossincráticas, que as
distinguem, tais como: principiar a, desatar a, deitar a, largar a, romper a, meter-se a, pôr-se
a,recomeçar a), pois focaliza o ‘limite inicial’ de uma situação eventiva (valor aspetual);
(ii) em segundo lugar, à sua delimitação estrutural, isto é: recorrendo a testes quase exclusivamente
de natureza sintática, verificar-se-á que começar a se pode considerar um verbo semiauxiliar e a
sequência “começar a + infinitivo”, uma construção perifrástica (ou perífrase verbal, caso se
prefira);
(iii) em terceiro lugar, à descrição sintático-semântica (tipos e formas proposicionais, tipos de
sujeito, configurações sintáticas, classes aspetuais de predicações), no sentido de averiguar as suas
compatibilidades e restrições de seleção; discutir-se-á, de modo particular, o seu estatuto de
operador aspetual, ou seja, a sua capacidade de modificar os valores aspetuais básicos dos
predicados. Ficar-se-á a saber, por exemplo, que começar a se combina preferencialmente com
eventos (processos e processos culminados) e estados faseáveis, transformando-os, ao atuar como
operador, em eventos pontuais.
O corpus, para esta análise, é constituído por material linguístico autêntico, recolhido
predominantemente na imprensa escrita e em textos literários.
Como referências bibliográficas que sustentam este estudo podem citar-se, para já, Barroso (2007,
1994), Cunha (2007, 1998), García Fernández (2006), Gonçalves & Costa (2002), Moens (1987).
CORRELAÇÕES SINTÁTICO-SEMÂNTICAS ENTRE AS CONSTRUÇÕES COM OS
VERBOS-SUPORTE ‘DAR’, ‘TER’ E ‘FAZER’
Amanda Pontes Rassi – UFSCar
Este trabalho apresenta um estudo comparativo entre construções que se realizam com os verbossuportes (Vsup) ‘dar’, ‘ter’ e ‘fazer’ e os mesmos nomes predicativos (Npred). A descrição
sintático-semântica dos nomes predicativos que acompanham os verbos-suporte se justifica porque,
em muitos casos, esses nomes funcionam como predicadores das sentenças, juntamente com o Vsup
que os acompanha, ou seja, são essas construções complexas que selecionam os argumentos
necessários à construção frasal. O papel de predicador geralmente é atribuído aos verbos, porém,
nas construções com verbos-suporte quem faz o papel de predicador é o conjunto Vsup + Npred.
Nesse sentido, os Npred necessitam da mesma descrição atribuída aos verbos, uma vez que eles
constituem, junto com um verbo-suporte, núcleos de frases. Existem vários trabalhos que definem e
caracterizam os verbos-suporte isoladamente, e alguns trabalhos que descrevem os nomes
predicativos. O objetivo deste estudo, porém, é investigar a combinação entre esses dois elementos
para identificar diferenças semânticas impostas seja pelo verbo, seja pelo nome, considerando-se a
construção toda como uma construção complexa ou predicado complexo. Assim, pretende-se
rediscutir a noção de verbo-suporte, buscando demonstrar que eles não são esvaziados de sentido
nem possuem carga semântica reduzida, conforme costuma-se denifi-lo. Os dados linguísticos
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400
foram retirados do corpus PLN.Br FULL, com o auxílio da ferramenta Unitex, e foram analisados
manualmente. Assim, a metodologia se distingue em 4 grandes etapas: 1) pesquisa no corpus para
listagem das construções nominais; 2) classificação das construções nominais; 3) averiguação das
relações semânticas entre diferentes Vsup com o mesmo Npred; 4) formalização dos resultados.
Uma descrição sistemática de qualquer item lexical de uma língua requer uma metodologia que
permita repertoriar exaustivamente suas ocorrências. Para o estudo apresentado aqui, a metodologia
está sendo direcionada para a obtenção das seguintes respostas: a) Como diferenciar verbo pleno e
Vsup?, b) Como se configuram os predicados nominais com os Vsup ‘dar’, ‘fazer’ e ‘ter’? Os
nomes predicativos que acompanham cada um dos verbos foram comparados, resultando na
identificação de algumas relações semânticas entre as estruturas estudadas. Foram encontradas
relações semânticas entre as construções com os três Vsup e os Npred, como: sinonímia,
‘consequência’, etc. Uma das conclusões a que se chegou é a de que os Vsup têm uma carga
semântica importante dentro da construção com os Npred, uma vez que a alternância dos verbos
muitas vezes provoca mudanças de sentido nas construções. Por meio das descrições realizadas
neste estudo, espera-se contribuir para a descrição do PB e para a área de PLN, uma vez que os
resultados deste estudo podem ser utilizados em tarefas de PLN como parsers, tradução automática,
sistema de desambiguação de sentido, sistemas de pergunta e resposta, entre outros.
O CACHORRO FAZ AUAU E A VAQUINHA FAZ MUU: LIMITES PARA A NOÇÃO DE
“HUMANO” NAS CONSTRUÇÕES COM VERBO SUPORTE
Oto Araújo Vale - UFSCar/Nilc
Dentre das principais noções de traços sintático-semânticos utilizados na formalização linguística,
encontra-se a noção de [+animado] (cf. entre outros: Katz &Fodor 1963). A teoria do LéxicoGramática (M.Gross, 1968, 1975) introduziu a noção de Substantivo Humano (Nhum) por observar
que a simples noção de [+animado] era demasiado ampla e que a noção de Humano se aplicava a
um número muito maior de sujeitos sintáticos dos verbos classificados em M.Gross (1975), Boons,
Guillet&Leclère (1976) e Guillet&Leclere (1992). Na presente comunicação nota-se como essa
noção é importante para a classificação das construções nominais com verbo-suporte (Vsup) e
também os limites que existe para essa noção. A exemplo do que estabeleceu G.Gross (1995),
existem limites nem sempre claros dessa noção bastante intuitiva. No recenseamento das
construções com o Vsupfazer, Barros (2013) mostra que o número de Substantivos Predicativos
(NPred) que selecionam animais e não humanos é relativamente limitado. Alguns, como no caso
das ‘vozes da animais’, podem ser assimilados a noções de humanos e até mesmo ocorrer em textos
com um Nhum na posição de sujeito. Procura-se então estabelecer os limites para essa noção,
lançando mão do paralelismo entre construções com Vsup e com verbos plenos, com vistas a uma
classificação sistemática e a construção de recursos linguístico-computacionais do Português do
Brasil.
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SIMPÓSIO 36
O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA: BASES
EPISTEMOLÓGICAS, OBJETIVOS E CONTEÚDOS
De facto, numa época em que se procuram soluções e respostas para as exigências de uma
sociedade cada vez mais competitiva, urge refletir sobre a adequação e a pertinência de teorias e
práticas do português, muitas vezes desarticuladas entre si, e que, para os mais jovens, parecem
afastar-se cada vez mais da realidade que os circunda, culminando em resultados estudantis pouco
abonatórios.Assim, consideramos objetivos deste simpósio: i) partilhar estudos sobre a língua
portuguesa; ii) contribuir para a articulação das diferentes componentes científicas que envolvem o
estudo de uma língua; iii) contribuir para a consolidação do conhecimento científico.
COORDENAÇÃO
Madalena Teixeira
Instituto Politécnico de Santarém/Universidade de Lisboa
[email protected]
Elisete Mesquita
Universidade Federal de Uberlândia
[email protected]
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OS DOCUMENTOS OFICIAIS DO BRASIL E DE PORTUGAL: SEMELHANÇAS E
DIFERENÇAS
Elisete Maria de Carvalho Mesquita – ILEEL/UFU-CAPES
Profª. Drª. Madalena Dias Teixeira – IPS/UL-PT
O objetivo dos documentos oficiais, como os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN - (BRASIL,
1997; 1998), o Programa de Português do Ensino Básico - PPEB (2009) e as Metas Curriculares –
MC (2012), por exemplo, é fornecer orientações para que uma disciplina seja ensinada com base
nos mesmos pressupostos, o que se configura como uma tentativa de se fazer com que os conteúdos
aprendidos pelos alunos de um determinado ano de escolarização sejam os mesmos de qualquer
aluno residente no país, independentemente de sua extensão territorial. Considerando o valor
político-pedagógico desses documentos, objetivamos, com esta comunicação, discutir e comparar as
propostas de ensino de língua portuguesa que constam dos PCN e do PPEB, direcionadas ao Ensino
Fundamental (5º ao 9º anos). Partimos da hipótese de que esses dois documentos oficiais
apresentam diferentes concepções de ensino, o que, em parte, justifica o desempenho dos alunos
nessa disciplina.
TEORIA E PRÁTICA NO ENSINO-APRENDIZAGEM DE PORTUGUÊS NO BRASIL E
EM PORTUGAL
Cláudia Graziano Paes de Barros – UFMT
Otília Costa e Sousa – CIED/IPL
O presente trabalho é parte de grande um projeto de pesquisa entre instituições de ensino superior
em Portugal e no Brasil. Neste recorte, pretendemos apresentar alguns dados referentes a uma
investigação que objetivou conhecer as concepções que subjazem os curricula de ambos contextos,
assim como as concepções e práticas de professores de Língua Portuguesa, especialmente no que
trata do ensino-aprendizagem de leitura. Neste trabalho, pautamo-nos na perspectiva do letramento
crítico (LANKSHEAR & KNOBEL, 1998; SHOR, 1999; LUKE, 2000), que se alia às correntes da
crítica social. Na atualidade, boa parte dos trabalhos que discutem a lecto-escrita por esse viés
baseiam-se nas ideias do educador brasileiro Paulo Freire, cujo mais famoso legado é a ideia de que
a leitura do mundo precede a leitura da palavra e que o aprendizado desta não pode prescindir da
leitura daquele. Essa ligação é essencial para o desenvolvimento das capacidades de leitura, é essa
compreensão crítica que promove a emancipação do pensamento, amplia as capacidades de reflexão
e as possibilidades de atuação efetiva nas práticas sociais. Nesse sentido, observamos que a
assunção da expressão letramento crítico pela corrente da pedagogia crítica contemporânea, assume
contornos que vão além dos aspectos de higher order comprehension, ou seja, de competências
individuais de leitura de nível superior, para assumir também uma postura sociológica de práticas
situadas. Observando os dados coletados a partir do estudo dos referenciais curriculares e das
práticas desenvolvidas pelos professores nos dois países, acreditamos que, para que se possa pensar
em melhores resultados no que tange às capacidades letradas dos estudantes e discorrermos sobre
sucesso escolar, é preciso levar em conta as reais possibilidades de efetivação das teorias em que se
embasam os documentos oficiais dos dois países, sobretudo, no que trata do contexto brasileiro.
Defendemos, assim, a necessidade de cursos de formação de professores em que estes sejam
convocados a conhecer e discutir as teorias e a planejar a sua prática de maneira reflexiva e
emancipatória.
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UM PRETEXTO PARA DESENCADEAR UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA: ENSINOAPRENDIZAGEM E RAP
Elisabete Vieira Camara – IFSP
Karin Claudia Nin Brauer – IFSP
O presente trabalho pretende contribuir para o ensino de língua portuguesa e literatura no Brasil;
liga-se ao grupo de pesquisa “O ensino da Língua Portuguesa no Brasil e em Portugal”. Sua
proposta é analisar uma sequência didática que tem por objetivo a elaboração de um rap. A escolha
desse gênero musical deve-se ao fato de se tratar de um ritmo familiar aos alunos e, portanto, de
mais fácil aceitação para uma atividade educacional. Dessa forma, primeiramente, serão realizadas
análises de letras de algumas músicas de rap com a proposição de reflexão e uma posterior
discussão sobre assuntos pertinentes à estrutura linguística, literária e musical, a fim de
proporcionar um embasamento sólido para a produção final do rap. As atividades para desenvolver
a sequência didática serão construídas com alunos do quarto ano do Ensino Médio Técnico
Profissionalizante do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP). A
pesquisa recairá sobre os princípios da sequência didática de Schneuwly (2004), e procurará
compreender os significados privilegiados pelo grupo ao trabalhar com o tema proposto, a partir da
análise dessas sequências didáticas, que priorizará as concepções de ensino-aprendizagem
apresentadas pelos participantes.
ESTRATÉGIAS DE TEXTUALIZAÇÃO E “REGULAÇÕES DESCENDENTES”
PRESENTES NO DISCURSO ORAL: ANÁLISE DO GÊNERO “CONFERÊNCIA”
Gil Negreiros – UFSM
O trabalho tem como tema a organização textual e discursiva do gênero oral “c ferê c a” (também
chamado, no trabalho, de “a re e taçã ral”) Nosso objetivo é analisar, a partir dos planos do texto e
do contexto de produção, as estratégias de textualização empregadas pelo sujeito produtor e as
regulações “descendentes” (regulações que as situações de interação nos lugares sociais, nas línguas
e nos gêneros dados impõem aos enunciados) que interferem nessa produção e que, desta forma, se
fazem presentes nos textos em questão. O corpus escolhido faz parte das elocuções formais (uma
aula universitária), transcritas pelo Projeto da Norma Urbana Culta da Cidade de São Paulo NURC-SP e publicadas por Castilho e Preti (1986). Adotaremos, como referencial teórico, aspectos
ligados à Linguística Textual dos Discursos, na perspectiva divulgada por Adam (2000). A partir
dessa perspectiva, investigamos a relação entre a organização macroestrutural do texto e os diversos
fatores externos em jogo na elaboração textual do corpus em análise, focalizando a aspectos
referentes à situação comunicativa e à interação entre os sujeitos. Os resultados das análises
suscitam discussões relativas à interação postulada por Adam (2000) entre regulações “a ce de te ”,
que regem os encadeamentos de proposições no sistema que constitui o texto, e regulações “de ce
de te ”, aquela ta ela tuaçõe de teraçã e el gêneros. Com isso, também tentamos demonstrar, em
nossa análise, que a apresentação oral possui estratégias de textualidade específicas, como, por
exemplo, a adoção do tipo textual da narração, que pode ser um índice do caráter assíncrono do
gênero em questão, tendo em vista que a narração é monológica (no sentido conversacional) e limita
as possibilidades de cooperação dos ouvintes. Dessa forma, sob o impacto da busca por expressão e
por interação, os enunciados podem assumir formas infinitas, mas os gêneros e as línguas
interferem como fatores que regulam o processo de textualidade.
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O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PELO MIRANTE BAKHTINIANO DA
DIALOGIA E DA RESPONSABILIDADE: ALGUMAS PROBLEMÁTICAS E
PERSPECTIVAS
Ismael Ferreira-Rosa – UFU
“Em uma sala de aula de um tempo e um espaço não muito distante de nossa hodiernidade, um
professor ensinava a língua portuguesa... Uma língua de estruturas definidas. Uma língua regida por
regras e normas cuja apreensão se fazia assaz imprescindível para o domínio e uso efetivo e eficaz
do código linguístico. Na verdade, uma língua transparente – composta por signos de sentidos
únicos em um contexto e uma situacionalidade específicos –, cuja justaposição e articulação signosintáticas, normatizada por uma gramática própria, devia ser o objeto de ensino e aprendizagem”.
Essa é uma descrição que desde há muito tempo presenciamos em nossas práticas do processo de
ensino-aprendizagem de língua portuguesa (LP) e ainda perdura na atualidade. De fato, mais do que
a polissemia das palavras organizadas em um enunciado ou a construção de sentidos, não obstante
casos isolados de mudanças nas práticas de ensino, prevalece a concepção de que o que merece e
deve ser ensinado nas aulas de LP são os modos de organização, de estruturação de seu sistema
formal em sua disposição léxico-sintática; a significação que se constrói no contexto imediato de
aparecimento de um dizer provido das intenções comunicacionais dos enunciadores, envolvidos na
produção desse dizer; e assim por diante. Destarte, os fitos das aulas de língua portuguesa, não raras
vezes, convergem-se para o escrutínio das composições sintáticas e morfofonológicas de
enunciações e textos, analisando-se os comportamentos linguísticos das formas, de modo a rotulálas, seccioná-las, acomodá-las às gavetas conceptuais de um arquivo teórico da gramática formal,
cujos pressupostos, em nome da objetividade e da cientificidade comprobatória, elide a
subjetividade, a historicidade, a singularidade dos sujeitos ideológica e socioculturalmente
constituídos nessa e por essa língua. Mediante o estudo de metatermos e de um elenco teóricoconceptual, os alunos devem apreender a essência do funcionamento da LP em suas regras e
normas, descrever as estruturas desse funcionamento, para a partir daí saber ler, escrever,
interpretar, enfim, conhecer de fato e se fazer conhecido por esse sistema linguístico. Nessa
perspectiva, estudar a língua portuguesa é estudar, precipuamente, a gramática da variante padrão
dessa língua. É saber categorizar as partes constituintes das sentenças formadas pela lógica
gramatical que rege a organização sintática dessa variante linguística. É ser capaz de fazer uma
descrição metalinguística de comportamentos linguageiros de uma enunciação. Contudo, assim
concebida, a língua portuguesa se hermetifica em um limiar monológico objetivo-abstrato,
perdendo a dinamicidade e vivacidade que lhe constitui. Que língua é essa que fala de si, fala por si
e volta a si mesma? Por acaso essa língua não poderia ser um universo de signos que refletem e
refratam uma dada realidade, constituindo-se, com efeito, uma arena de lutas ideológicas enquanto
um espaço de constituição e interação? E quem fala? É apenas um usuário passivo que se submete à
autonomia de tal língua hermética? Não existe uma relatividade nessa autonomia? Esse sujeito não
pode ser alguém dialógico que se constitui na relação com outros, responsivo e responsável, dotado
do excedente de visão e da liberdade criativa? Partindo dessa problemática de que língua é ensinada
e a que sujeitos é ensinada esta língua, temos por alvitre, neste trabalho, apresentar alguns
questionamentos concernentes à concepção hermético-sistemática e metalinguística do/no processo
de ensino-aprendizagem de LP a sujeitos passivo-receptáculos na coetaneidade, tomando por base a
voz do Bakhtin professor, encontrada em um de seus manuscritos sobre a pedagogia dialógica da
gramática (BAKHTIN, 2004), como também delinear algumas perspectivas crivadas pelo mirante
da dialogia e da responsividade, que podem contribuir, de alguma forma, para o ensinar-aprender a
LP de forma mais ética, responsável e singular.
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A POSTURA COLONIAL NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA DIANTE DOS
DIFERENTES USOS DESSA LÍNGUA NO BRASIL
Maria de Lurdes Nazário – UEG/PG-UFG
O objetivo desta proposta é discutir a postura colonial e eurocêntrica da escola e seus atores quando
praticam um ensino tradicional da língua portuguesa, apesar de haver um crescente discurso de
valorização das variedades linguísticas brasileiras. A argumentação aqui elaborada tem como base
as discussões da Pedagogia Decolonial tecida por Catherine Walsh (2009) no seio dos estudos
decoloniais na América Latina e da Sociolinguística Educacional desenvolvida por Bortoni-Ricardo
(2004). Essa discussão se faz importante por entender, como Freire (2004), que a prática educativa é
uma prática política e, como tal, deve ser pensada e discutida. A valorização da identidade
linguística de cada indivíduo ou grupo social é pressuposto básico para qualquer ensino de língua.
No entanto, é comum uma prática social em que conhecimentos outros são ignorados, silenciados e
excluídos do domínio escolar. Por isso, em sala de aula, praticamos um ensino tradicional da língua
portuguesa, com abstrações que não representam de fato os usos que alunos, professores, diretores e
sociedade fazem cotidianamente, não favorecendo o desenvolvimento da competência comunicativa
do aluno. Essa atitude eurocêntrica se deve a nossa cultura social e escolar de valorizar um tipo de
cultura, um tipo de sociedade, um tipo de língua que, no ideário dos brasileiros em geral,
representam o que nós somos. Mas o tipo de língua valorizada na escola não representa a língua
realmente falada e escrita por todos nós. Além da norma-padrão prescrita nas gramáticas
normativas, há saberes linguísticos outros extremamente funcionais nas interações sociais (formais
ou informais). Bortoni-Ricardo (2004) postula que precisamos praticar uma pedagogia
culturalmente sensível aos saberes dos alunos, na qual a estratégia do professor diante de um uso
não-padrão deva ser a de incluir dois componentes: a identificação da diferença e a conscientização
da diferença. Disso, compreendemos que, no ensino de língua materna, devemos colocar em pauta
os diferentes usos da língua (padrão ou não), contextualizando a seleção da variedade linguística e
de suas variantes pertinentes ao contexto comunicativo. Uma postura assim se constitui como uma
atitude decolonial por fortalecer saberes outros em sala de aula. O professor que assim o fizer estará
assumindo uma política linguística de valorização, reconhecimento da importância dos diferentes
modos de se expressar através de um idioma, mostrando para seus alunos que a variação linguística
é muito produtiva, funcional e eficaz na comunicação diária. Com essa prática de ensino, a
competência comunicativa desses cidadãos será melhorada, pois as discussões e atividades críticas
os ajudarão no fazer linguístico diário. Desse modo, estaremos rompendo estruturas sociais,
políticas e ideológicas que resultam da colonização linguística praticada no Brasil, em que nos foi
ensinado que se comunicar de modo diferente da norma-padrão é errado. Com essa atitude,
estaremos efetivando uma pedagogia decolonial, pois, ao romper barreiras ideológicas e quebrar
estruturas sociais já estabelecidas, podemos promover a interculturalidade, a valorização do saber
do outro, a fim de adquirir novos saberes, aumentando os recursos comunicativos dos alunos (e não
substituindo) e sua segurança linguística.
PRÁTICAS DE SUCESSO NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: PARA ALÉM DO
DUALISMO TEORIA-PRÁTICA
Andressa Peres Teixeira – UFJF
Neusa Salim Miranda – UFJF
O presente trabalho insere-se no macroprojeto “Ensino de Língua Portuguesa - da formação docente
à sala de aula”, coordenado pela Profa. Dra. Neusa Salim Miranda e desenvolvido no âmbito do
PPG-Linguística/UFJF em sua linha de pesquisa Linguística e Ensino de línguas. O objetivo central
desse macroprojeto é o de investigar indicadores de sucesso e fracasso tanto na educação básica
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quanto na formação docente do profissional formado em Letras. Neste trabalho, nos focaremos nos
indicadores de sucesso, a partir da análise de relatos de quinze docentes sobre práticas de sucesso
desenvolvidas por eles nas escolas da rede estadual da cidade de Muriaé/MG. Deste modo,
propomos uma breve análise ancorada nos principais pressupostos teóricos orientadores de nossa
meta investigativa, tais como as contribuições basilares da Linguística Cognitiva (Lakoff &
Johnson, 1999; Lakoff, 1987; Fillmore, 1968, 1977, 1979, 1985; Salomão, 1999, 2006; Croft &
Cruse, 2004; Miranda & Salomão, 2009) e, em especial, de um de seus mais significativos modelos,
a Semântica de Frames (Fillmore, 1982, 2003; Petruck, 1996; Gawron, 2008; Ruppenhofer et. al.,
2010) - de onde emerge a categoria central de análise deste trabalho – o conceito de frame. Tendo
em vista que este trabalho não se encerra em uma análise puramente linguística, dada a
característica multifacetada do fenômeno investigado, contribuições da Linguística Aplicada
(Lopes, 2008; Fabrício, 2008; Rajagopalan, 2008), da Sociologia (Bauman 1998, 1999, 2007, 2010,
2011; Fridman, 2000; Hall, 2002) e da Antropologia Cognitiva (Tomasello, 1999, 2003) fazem-se
necessárias a fim de subsidiarem a análise hermenêutica dos dados, fornecendo perspectivas
variadas sobre educação, cultura e sociedade. Nessa direção, o recorte analítico dado aos relatos
docentes a partir do viés teoria-prática aponta desde a transposição didática de constructos teóricos
advindos da academia passando pela opressão do Estado via currículo, ao total desligamento teoriaprática. Assim, a discussão sobre o modo de inserção do currículo escolar oficial via academia é
salutar, tendo em vista seu papel ao mesmo tempo libertador e opressor.
CONHECIMENTO CONVENCIONAL E ENSINO: O LUGAR DO MÉTODO NA
ALFABETIZAÇÃO
Mariana Maíra Albuquerque Pesirani – FEUSP
Atualmente, há uma grande preocupação com a iniciação das crianças no mundo da leitura e da
escrita, a qual é feita, inicialmente, através da alfabetização. Tal preocupação diz respeito a como
levar as crianças a dominarem o código da escrita alfabética, bem como sobre qual seria a melhor
maneira de evitar fracassos nesse processo. A grande variedade de perspectivas na pesquisa sobre
alfabetização – a alfabetização vem sendo estudada do ponto de vista da psicologia, pedagogia,
psicolinguística, sociolinguística e linguística (MORTATTI, 2000) - aponta para essa preocupação
que permeia a sociedade. Entretanto, tal preocupação não é nenhuma novidade no campo
educacional, ela remonta ao final do século XIX, quando a alfabetização é apresentada como um
dos instrumentos privilegiados de aquisição do saber. Nesse momento histórico, questões sobre
como alfabetizar são levantadas. Os problemas pedagógicos, especialmente os relacionados aos
métodos de ensino e de formação de professores, começaram, então, a ocupar não apenas
educadores, mas também administradores, legisladores e intelectuais de diferentes áreas do
conhecimento. Houve, então, uma grande busca pela resposta definitiva para a seguinte questão:
Qual é o melhor método para alfabetizar crianças? Essa pergunta tornou-se central nos estudos
sobre alfabetização no Brasil. Porém, na década de 1980, em especial no estado de São Paulo,
houve um aparente abandono da questão do método em virtude das novas tendências da pesquisa
educacional, as quais apontavam para o fato de que a aquisição da língua escrita não é uma questão
de método, pois se trata de um processo de “reconstrução” do conhecimento e não da apropriação
de um conhecimento pronto. Tal noção da aquisição da língua escrita relaciona-se com as propostas
de Jean Piaget sobre a aquisição do conhecimento por crianças e, em especial, com a teoria de
aquisição da escrita proposta por Emília Ferreiro, a qual ficou conhecida como psicogênese da
escrita. Esse é um momento de muitas dúvidas entre os professores alfabetizadores, pois, as novas
teorias de aquisição do conhecimento apontavam para o fato de que a criança aprende através da sua
ação sobre o objeto de conhecimento, no caso, a escrita alfabética, tornando inevitável o
questionamento sobre qual seria o papel do professor alfabetizador e do método de ensino no
processo de aquisição da língua escrita. Uma vez que o processo de aquisição da escrita passa a ser
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centrado no sujeito que aprende, o lugar de destaque que o método vinha ocupando nas questões
sobre alfabetização é questionado. Inicia-se então uma um processo de desmetodização da
alfabetização. Tal processo, contudo, é bastante questionável, uma vez que o sistema alfabético e o
sistema ortográfico de escrita são sistemas convencionais, os quais, portanto, deveriam ser
aprendidos de maneira sistemática. O presente trabalho pretende problematizar o discurso a favor de
uma desmetodização da alfabetização, apoiando-se na concepção wittgensteiniana sobre a natureza
convencional do conhecimento.
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SIMPÓSIO 37
NEOLOGISMOS NA LÍNGUA PORTUGUESA
O léxico desempenha um papel essencial na comunicação de qualquer indivíduo. Assim sendo, na
época das literacias de comunicação, de informação, digital, é inevitável que os usos vocabulares
espelhem o dinamismo que lhes é inerente e que se vivencia à entrada do século XXI; ora
substituindo, ora rejeitando, uma vezes acrescentando, outras adaptando e até criando.
Assim, e tendo em conta que a Assembleia Geral das Nações Unidades designou os anos de 20052014 como a Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS), pelo facto de
reconhecer que o desenvolvimento depende de uma educação que promova nos cidadãos
competências linguísticas e culturais, entre outras, são objetivos deste simpósio: i) analisar, ii)
partilhar, iii) discutir quais as opções lexicais dos falantes e escreventes, seja no discurso oral, seja
no discurso escrito, independentemente dos corpora (literários, científicos, jornalísticos,...) serem
vernaculares ou estrangeirismos.
COORDENAÇÃO
Ieda Maria Alves
Universidade de São Paulo
[email protected]
Maria Teresa Lino
Universidade Nova de Lisboa
[email protected]
Madalena Teixeira
Instituto Politécnico de Santarém/Universidade de Lisboa
[email protected]
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ASPECTOS SEMÂNTICO-DISCURSIVOS DA NEOLOGIA NA POESIA MUSICAL
André Crim Valente – UERJ/CLUP
A integração de estudos sobre léxico e discurso vem constituindo a base das minhas pesquisas na
área neológica. Faço-as na condição de membro do GT de Lexicologia, Lexicografia e
Terminologia da ANPOLL e de integrante do CIAD (Círculo Interdisciplinar de Análise do
Discurso), em corpora das linguagens literária e midiática. Aqui se dará destaque ao discurso da
mídia e o corpus será constituído de neologismos retirados de linguagem musical midiática.
Convém recordar que o processo de renovação lexical, sempre presente na linguagem literária,
alcançou, nas três últimas décadas, grande destaque na linguagem da mídia. Nesta se encontram,
com alta frequência, vários neologismos vocabulares ou semânticos tanto nas publicações de maior
prestígio como nos jornais ditos populares. A neologia de forma e a neologia de sentido – na
terminologia de Dubois - também são encontradas no campo poéticomusical. Pretende-se, neste
trabalho, estabelecer uma relação entre os estudos neológicos e a criatividade na poesia musical
brasileira. Cabe recordar que já se estabeleceu - a partir do estudo de Anazildo Vasconcelos sobre a
poética de Chico Buarque, nos anos 1970 - uma distinção entre a poesia elaborada para a literatura e
a construída nas letras de canções. Os avanços obtidos na abordagem das criações neológicas
devem ser estendidos ao estudo das melhores obras do nosso cancioneiro uma vez que tal
linguagem tem forte presença na cultura brasileira tem sido objeto de investigações várias nas
pesquisas acadêmicas, tanto nas pesquisas de natureza descritiva ou didático-pedagógica. Busca-se
aqui uma releitura, numa abordagem linguístico-discursiva, de neologismos em letras de música
com o intuito de enfatizar a dinamicidade linguística e contribuir para a renovação de corpus nas
aulas de Língua Portuguesa. Na fundamentação teórica, serão utilizadas importantes obras de
destaque na lexicologia, como as de Ieda Maria Alves, Maria Aparecida Barbosa, Nelly de
Carvalho, Margarita Correia, Boulanger, Guilbert e Sablarroyles, entre outras.
A TERMINOLOGIA DO ESPIRITISMO: AS LEXIAS MÉDIUM E
MEDIUNIDADECRIAÇÕES LEXICAIS A PARTIR DO LIVRO DOS ESPÍRITOS
Celina Márcia de Souza Abbade – PPGEL/UNEB
A história e cultura de um povo podem ser retratadas a partir do seu léxico, pois é sabido que a
língua é uma das marcas de identidade de quem a utiliza. As palavras utilizadas por um grupo ou
pessoa são as palavras selecionadas, escolhidas e inventadas por quem as profere. Tudo que é vivo
está sempre se modificando. A língua enquanto um organismo vivo se transforma a cada dia e
novas palavras vão sendo constantemente criadas, utilizadas com novos sentidos, esquecidas,
tomadas de empréstimo de outras línguas... Muitas vezes, as lexias já existentes em uma língua não
dão conta de definir novos fenômenos, novas coisas que surgem e acontecem a cada dia, logo,
novas palavras são criadas, tomadas de empréstimo, ou novas significações são dadas as já
existentes. À luz da Lexicologia e dos recursos que se têm disponíveis para os estudos lexicais,
busca-se levantar e compreender as criações lexicais da doutrina espírita, uma religião que surge
nos finais do século XIX com uma literatura composta a partir de cinco livros escritos por um
pedagogo e cientista francês, Hippolyte Léon Denizard Rivaill, conhecido pelo pseudônimo de
Allan Kardec. Parte-se inicialmente do Livro dos Espíritos, primeiro da série dos cinco livros
editados pelo pedagogo sobre o mesmo tema e que foi publicado em uma época de grandes
transformações sociais, filosóficas, políticas e linguísticas, período do surgimento das ciências e dos
novos estudos sobre a mente humana. Esse livro iniciou a codificação e expansão de uma religião
que se diz também filosofia e ciência, cuja própria nomenclatura já foi uma criação lexical à época
da criação da doutrina: Espiritismo. Allan Kardec, ao escrever o Livro dos Espíritos apresentou
diversas palavras novas à época para dar conta do que queria dizer e as palavras existentes não
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conseguiam definir. Novos termos foram criados para explicar um novo dogma. A proposta aqui é
de apresentar as lexias médium, palavra de origem latina que foi apropriada pela doutrina espírita
para designar as pessoas portadoras de mediunidade, outra lexia que foi criada pela doutrina e será
abordada neste trabalho. Tal proposta faz parte de um projeto mais amplo, o de realizar um
vocabulário terminológico do Espiritismo, abrangendo obras espíritas de relevância, contribuindo
assim para tornar cada vez mais científico e claro as propostas dessa doutrina que tem no Brasil a
maior concentração de adeptos do mundo.
A OCORRÊNCIA DE ANGLICISMOS NA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
APLICADA À ADMINISTRAÇÃO
Eduardo Espindola Braud Martins – UFMS
Por estarem ligados à dimensão social de uma língua, os neologismos revelam o desenvolvimento
da própria sociedade que a fala, além de evidenciar o processo de evolução desse mesmo idioma. A
necessidade de se nomear novas realidades científicas resulta na criação de unidades neológicas nas
línguas de especialidade, os neônimos. Devido à influência da produção científica em língua
inglesa, o discurso técnico-científico em língua portuguesa é frequentemente constituído por um
grande número de neônimos anglicistas, revelando um processo de empréstimo bastante produtivo
nessa área. Diante desse fato, a presente pesquisa busca analisar como ocorrem os estrangeirismos
provenientes do inglês em uma língua de especialidade: a Tecnologia da Informação aplicada à
Administração, ramo que se desenvolveu em inúmeras áreas distintas muito rapidamente e que tem
beneficiado os Sistemas de Informação com a produção de programas para o setor administrativo. O
crescimento da Tecnologia da Informação em áreas diversas resultou na escolha desse ramo
específico, pelo fato de ser bem delimitado entre seus pesquisadores, além de possuir periódicos
específicos que tratem exclusivamente desse tema, ao contrário dos outros setores da Tecnologia da
Informação, de difícil delimitação. Para realizar a análise proposta, selecionamos os anglicismos
encontrados a partir dos candidatos a termos (extraídos através de ferramentas computacionais de
extração automática de termos e validados por um especialista da área de domínio) de dois
periódicos sobre a Tecnologia da Informação aplicada à Administração: Revista Eletrônica de
Sistemas de Informação – Resi, da Faculdade Cenecista de Campo Largo (FACECLA), com
publicações de 2002 a 2012; e Journal of Information Systems and Technology Management –
JISTEM, da Universidade de São Paulo (USP), com publicações de 2004 a 2012. Para determinar o
caráter neológico dos anglicismos encontrados, utilizamos o critério lexicográfico, onde um item
lexical é considerado neologismo quando não for registrado em um dicionário. Dessa forma, o
corpus de exclusão foi composto pelos dicionários Michaelis: moderno dicionário da língua
portuguesa, Dicionário Houaiss da língua portuguesa e Novo dicionário Aurélio da língua
portuguesa. A partir dos dados obtidos, calculamos a porcentagem desses estrangeirismos com
relação à totalidade dos itens lexicais do corpus e em seguida analisamos a formação dos neônimos
encontrados: os processos de formação mais usuais, a quantidade de lexias simples e complexas, as
classes gramaticais mais recorrentes e a inserção dessas unidades nos textos técnico-científicos.
Essa análise permitiu tanto a verificação da integração dos estrangeirismos no discurso científico da
área em questão quanto a criatividade léxica das terminologias científicas, as quais muitas vezes são
incorporadas ao léxico corrente dos falantes brasileiros.
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O NEOLOGISMO EM GRAMÁTICAS E LIVROS DIDÁTICOS DO PORTUGUÊS
Francisco Iací do Nascimento – UECE
Este trabalho tem por objetivo analisar o tratamento dado a neologia em gramáticas e livros
didáticos do Português. Baseamo-nos em Alves (2004), Correia e Almeida (2012) entre outros
estudiosos do assunto para conceituar neologia, bem como discutir suas características e processos
de formação. Construímos um corpus com cinco coleções de livros didáticos aprovados pelo
Programa Nacional do Livro Didático e cinco gramáticas de língua portuguesa. Analisamos nos
livros didáticos tanto o conteúdo apresentado como também as orientações didático-pedagógicas
direcionadas ao professor. Os resultados preliminares indicam que o fenômeno da neologia é tratado
de forma muito superficial, sem critérios bem definidos, geralmente, quando é tratado da formação
das palavras. Isso sinaliza que é preciso rever a forma como a neologia é tratada nos livros didáticos
e gramáticas de língua portuguesa.
O LÉXICO NO ENSINO DO PORTUGUÊS LÍNGUA MATERNA: NEOLOGIA EM
PROGRAMAS E MATERIAIS DIDÁTICOS
Fernanda Maria Alves Fernandes de Sousa Bertinetti – UNL/FCSH
Esta comunicação pretende apresentar uma problematização de quadros concetuais no âmbito do
léxico subjacentes em orientações curriculares, e em materiais didáticos, para o ensino formal da
língua portuguesa. O campo deste estudo circunscreve-se ao contexto do sistema educativo
português, mais precisamente à disciplina de Português nos cursos do ensino secundário
vocacionados para o prosseguimento de estudos (do 10º ao 12º ano de escolaridade). O programa da
referida área curricular, eixo estruturante e basilar na construção dos saberes escolares, institui o
léxico como objeto de ensino e de aprendizagem enquanto componente que contribui para o
desenvolvimento de competências linguísticas. Por outro lado, o Dicionário Terminológico para os
Ensinos Básico e Secundário, integra no seu reportório os conceitos de neologismo e de
estrangeirismo, formalizando assim a linha metodológica e conceptual à qual os ensinantes de
diversos ciclos de estudos estão vinculados. Na atualidade, os manuais continuam a assumir um
papel relevante no ensino-aprendizagem, na medida em que constituem um recurso amplamente
utilizado no espaço-aula. A par dos manuais, as gramáticas e outros auxiliares do ensino revelam-se
instâncias intérpretes e mediadoras no processo de ensino e aprendizagem, em que subjazem opções
científicas, pedagógicas e culturais. Interessa, pois, problematizar o(s) conceito(s) associados a
neologia, os termos selecionados para exemplificação bem como as áreas de conhecimento ali
privilegiadas. Com base na análise de um corpus, constituído por orientações curriculares e
materiais didáticos destinados ao ensino do português no ensino secundário, pretende-se neste
domínio proceder a um estudo da didatização da neologia terminológica. Tendo em conta que o
léxico se assume como um sistema heterogéneo, dinâmico, emerge igualmente a necessidade em
considerar coordenadas não só linguísticas como também culturais que possibilitem a compreensão
e explicação de elementos portadores de cultura nas escolhas de termos de diversas áreas de
conhecimento.
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CONFIGURAÇÕES DA NEOLOGIA SEMÂNTICA NA TERMINOLOGIA DA ÁREA DE
EDUCAÇÃO DO CAMPO: A METÁFORA CONCEITUAL
Fernanda Mello Demai – USP
Educação do Campo (EC) é a expressão atribuída aos conceitos referentes ao ensino, à
aprendizagem e à Educação nas regiões rurais. Esses conceitos abrangem os princípios, a
metodologia, os fins e ideais da área, bem como a organização da estrutura de ensino. O intuito
deste trabalho é apresentar uma análise da conceptualização e do engendramento de termos da EC,
com foco em sua configuração morfossintática e semântico-pragmática. Utilizaremos corpus de
análise neológico, organizado para nossa tese de doutorado (em andamento), constituído por 700
termos e que abrange a produção textual da EC dos últimos 10 anos. Para o levantamento, a análise
e a sistematização dos termos, seguimos os modelos da Lexicologia, da Semântica e da
Terminologia (vertente da Socioterminologia), com o auxílio de ferramentas informatizadas. O tipo
de neologismo que mais ocorre em nosso corpus é o sintagmático, ou seja: a organização inédita no
eixo horizontal ou sintagmático, com a utilização de elementos já existentes no eixo paradigmático
da língua. O que é novo é a composição, a combinatória dos elementos. Consequentemente, essa
reorganização no eixo sintagmático acarreta mudanças de ordem semântico-pragmática, como o
surgimento de novos significados, que podem ser metafóricos, entre outros. As metáforas estão
presentes na língua comum, nas terminologias e também nas manipulações estilísticas da
linguagem. Nos estudos das diversas terminologias, as metáforas trazem a discussão sobre a
motivação denominativa. Realmente há uma razão para o emprego dos termos metafóricos,
inclusive nas denominações técnicas e científicas. Só existem metáforas (de acordo com as teorias
cognitivistas, que versam sobre a metáfora conceitual) de acordo com a lembrança das experiências
humanas – logo as metáforas são motivadas por eventos e/ ou pensamentos anteriores. Dessa forma,
as metáforas não são aleatórias, são motivadas pelas experiências físicas, sociais e culturais, como
ocorre com as metáforas locativas, ou de deslocamento em uma trajetória, de acordo com uma
sistemática, à qual subjaz uma lógica. As metáforas prestam-se também ao objetivo de esclarecer
um conceito, pois há experenciação de um conceito em termos de outro, de uma realidade, talvez
mais complexa e hermética em termos de algo já conhecido, já vivenciado nos níveis mais básicos,
como o ato de respirar, de alimentar-se, de entrar e sair, de gritar por socorro, de engordar ou
emagrecer, de correr, andar, deslocar-se, procurar abrigo, fugir do perigo, buscar calor e conforto
etc. Nas terminologias, com a necessidade de mais e mais especificações, as metáforas aparecem
ligadas às formações sintagmáticas como um recurso elucidativo. Descreveremos esse aspecto da
lógica de criação de metáforas na área da Educação do Campo, visto que seus termos são altamente
motivados em relação à atuação de seus sujeitos, com seus objetivos, e lutas, e realizações. As
metáforas estão ligadas à natural seleção contextual que caracteriza toda a linguagem humana.
Como exemplos dessas metáforas conceituais da EC, podemos citar as metáforas belicistas brigada;
luta pela reforma agrária; luta pela terra; companheiro de luta; jornada de luta. A busca por
justiça social/ Reforma Agrária é uma luta no sentido de “busca de um objetivo”. Uma pessoa na
mesma situação de outra é um companheiro, no sentido de aliado que divide os ideais, o ônus da
batalha e o eventual bônus, se a luta for bem sucedida.
Numa área como a Educação do Campo, que está realmente ligada a uma luta - pela Reforma
Agrária no Brasil - este tipo de metáfora é altamente profícuo, motivado (como também o são as
outras metáforas) e altamente ligado à ideologia subjacente.
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O NEOLOGISMO POR COMPOSIÇÃO NA POÉTICA DE JOÃO CABRAL DE MELO
NETO
Gisele Alves – UNESP/CNPq
Este trabalho tem como proposta analisar as formações compostas criadas e empregadas por João
Cabral de Melo Neto em sua produção poética, buscando verificar o modo como se processam,
formal e semanticamente, as relações entre os constituintes que se articulam na estruturação das
unidades em causa, trazendo à baila aquelas formações cuja relação semântica entre seus
constituintes revele traços de incompatibilidade semântica, instaurando, consequentemente, no
contexto da poesia cabralina, efeitos de sentido inesperados e inovadores. Entendido que o presente
estudo visa verificar fenômenos de incompatibilidade semântica entre os elementos que participam
da formação das unidades vocabulares em estudo, é de suma importância investigar, também, a que
mecanismos o poeta recorre para assegurar a conexão semântica de elementos que, tomados
isoladamente, denotam significados muito díspares. Na esteira desse objetivo, busca-se, também,
observar a estrutura interna dos compostos em causa, analisando que tendências ocupam maior
representatividade no conjunto de criações do poeta pernambucano, além de verificar a instauração
dos significados que tais criações compostas irradiam no interior do texto poético. Nosso estudo
parte da hipótese de que Melo Neto segue uma tendência muito peculiar ao criar palavras
compostas cujas relações formais e semânticas processadas entre seus consituintes revela-se não
prototípica, não esperada, residindo justamente nisso o caráter inovador, criativo e original dos
produtos composicionais que, consequentemente, instauram na poesia cabralina efeitos de
expressividade. Ressalta-se que a formação e produção de sentidos das criações lexicais não fica
circunscrita apenas ao domínio de análise morfológica, gramatical e semântica, ou seja, cabe
também à Estilística investigar os efeitos de sentido instaurados por essas criações no texto literário,
pois são meios de expressão carregados de traços afetivos e estéticos. É a Estilística Léxica o ramo
responsável pelo tratamento dos significados impostos ao texto literário pelas criações lexicais. No
discurso literário, a criação neológica surge momentaneamente e dificilmente é incorporada ao
sistema lexical já que, na maior parte dos casos, é empregada somente no momento de sua gênese
em dado momento histórico, uma vez que o escritor faz da língua um emprego voluntário e
consciente, impulsionado por uma intenção artística e estética, diferentemente do falante comum
que utiliza a língua de maneira mais espontânea. Por isso, cumpre diferenciar as criações neológicas
empregadas em textos literários daquelas da língua corrente. Enquanto as formações no campo da
literatura atendem às intenções de expressividade que o autor visa conferir ao texto, as formações
recorrentes na língua geral correspondem às necessidades de nomeação, classificação ou
categorização de uma nova realidade.
PEJORATIVIDADE E LUDISMO EM FORMAÇÕES DERIVADAS NEOLÓGICAS
Ieda Maria Alves – USP
Os conceitos de pejoratividade e de ludismo, ainda que distintos, apresentam características
comuns. O caráter pejorativo de um afixo pode contribuir para que ele exerça, também, uma função
lúdica. Apresentamos, nesta exposição, alguns sufixos que contribuem para imprimir caráter
pejorativo e muitas vezes lúdico a novas unidades lexicais. Alguns sufixos, como –esco, possuem
uma função pejorativa já reconhecida por gramáticos e lexicógrafos da língua portuguesa. Assim,
em “caricato como o vilanesco Alberto”, o caráter depreciativo do substantivo vilão é acentuado
com o sufixo –esco, que expressa sempre uma relação com o substantivo de que se origina, não
raras vezes acrescida de características zombeteiras, como é observado nesse adjetivo neológico.
Outros sufixos podem expressar pejoratividade ao serem empregados fora de seu âmbito de atuação.
É o que ocorre com sufixos próprios de áreas de especialidade, como –óide, designativo de aspecto
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e forma em termos de várias ciências, e –ite, designativo de inflamação em termos da Medicina,
que, empregados em contextos não-especializados, imprimem valor desvalorativo e lúdico às
unidades lexicais que formam, a exemplo de “nunca precisaria dessa geringonça modernóide”,
“jetisquite crônica - um impulso incontrolável de andar de jet-ski”. Vários sufixos atribuem
esporadicamente caráter desvalorativo ou lúdico aos neologismos que formam. Esse caráter pode
depender do sentido da base a que se une o sufixo, como –ice ao derivar o substantivo panaquice,
originário da base panaca, ou de circunstâncias ocasionais, a exemplo de –ante, que deriva o
adjetivo privatizante: “discurso privatizante”. As formações neológicas que apresentamos são
extraídas da Base de neologismos do português brasileiro contemporâneo, projeto que, desde
janeiro de 1993, coleta, analisa e difunde neologismos coletados em um corpus jornalístico
constituído por jornais e revistas de grande circulação.
FACEBOOK VS. ESTRANGEIRISMOS – CONTRIBUTO PARA UM CONHECIMENTO
MORFOLÓGICO E ORTOGRÁFICO
Madalena Teixeira – IP-Santarém – ESSE/UL– CEAUL/CAPLE
O uso de estrangeirismos no léxico português parece ser portador de uma polémica que lhe é
inerente e que é potenciada pelas constantes contendas entre renovadores e puristas da língua.
Investigadores na área da linguística têm efetuado diversos estudos (CASTELEIRO, 2001;
FERNANDES, 2005; TEIXEIRA, 2008; CARVALHO, 2009) neste âmbito, na busca de
esclarecimentos concetuais, de tipologias, de causas para a respetiva utilização e de descrição de
contextos de uso diversificados, como jornais, revistas, livros escolares, dicionários, prontuários,
gramáticas. Ora, sendo nossa convicção de que atualmente os jovens portugueses, e de outras
nacionalidades, recorrem com elevada frequência a suportes digitais, sendo casos exemplificativos
o twitter, o facebook, o you tube, o vídeos, o thestartracker, o inSL Second Life, são objetivos deste
estudo: i) constituir três corpora de base “digital” – facebook; ii) averiguar a existência de
estrangeirismos; iii) analisar os vocábulos encontrados no que respeita à origem, à morfologia e à
ortografia – forma original e a adaptações, tanto morfológicas, como ortográficas; iv) comparar os
resultados obtidos nos três corpora.
A metodologia utilizada é de natureza qualitativa, tendo optado pelo estudo de caso de falantes que
integram uma turma do ensino básico, uma turma do ensino secundário e uma turma do ensino
superior.
O estudo ainda está em curso, mas os resultados apontam para uma predominância de
estrangeirismos de origem inglesa, destacando-se o uso de nomes e de adjetivos. A ocorrência de
verbos observa-se em menor número. Todavia, é nas formas verbais que se regista um número mais
elevado de adaptações morfológicas, sobretudo no infinitivo. As adaptações de caráter ortográfico
ocorrem, mais significativamente, em nomes e adjetivos.
COMUNICAÇÃO MÉDICA: NEOLOGIA, VARIAÇÃO E CONHECIMENTO
Maria Teresa Rijo da Fonseca Lino – UNL- Portugal
Madalena Contente – CLUNL-Portugal
A Medicina é uma ciência em constante evolução, diremos que é a ciência da incerteza e,
consequentemente, da descoberta permanente. Presentemente, esta ciência encara a investigação no
sentido de uma Medicina da diferença. Esta nova perspetiva da investigação médica visa novas
conceções e, logicamente, a criação de unidades terminológicas diferenciadas, que dão conta de
novas realidades. O domínio da Medicina compreende expressões que se efetuam numa língua
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natural cujo simbolismo é reforçado pela sua interpretação, através de uma riqueza dos
comportamentos da comunidade de especialistas que o compõem.
A neologia terminológica e a variação terminológica exigem uma observação constante da língua;
hoje, essa análise incide sobre diferentes tipos de corpora escritos e orais de línguas de
especialidade ou de corpora lexicográficos, por parte de terminólogos, lexicólogos e lexicógrafos.
Neologia terminológica e variação participam simultaneamente na inovação dos sistemas
terminológicos e na terminologia diacrónica. Observa-se que os sistemas terminológicos
apresentam um grande número de e neónimos de discurso (neologismos terminológicos) relativos a
conceitos não estabilizados ou não normalizados. Esta dinâmica conceptual reflete-se na língua de
especialidade onde novos termos e novas significações são criados para denominar novos conceitos
e mudanças conceptuais; nesta dinâmica surgem neologismos terminológicos que apresentam novas
particularidades cognitivas relativas a um conceito, no seio de um ou vários sistemas linguísticos.
Consequentemente, no plano da língua, o termo sofre, uma contaminação semântica que pode dar
origem a fenómenos de ambiguidade, de extensão semântica e de neologia.
A comunicação médica estabelece uma relação humana sobre o princípio fundamental de confiança
recíproca médico-doente, cujo princípio inicial é representado pela doença.
Os conhecimentos a nível internacional fazem-se através das línguas, estando a dimensão cognitiva
deste processo presente na conceitualização e na transferência de conhecimentos.
O VALOR ESTILÍSTICO DAS CRIAÇÕES LEXICAIS NO DISCURSO LITERÁRIO:
UMA ANÁLISE DAS COMPOSIÇÕES METAFÓRICAS EM JOÃO CABRAL DE MELO
NETO
Rosana Maria Sant'Ana Cotrim – UNESP/FCLAr
As criações lexicais literárias apresentam particularidades estilísticas que restringem o desempenho
de suas funções expressivas ao enunciado em que estão inseridas. Razão pela qual elas são
concebidas como um recurso discursivo. Valendo, portanto, pelo seu "efeito de momento"
(CÂMARA JR, 2004, p. 63), elas permanecem no nível do discurso e raramente são incorporadas
ao léxico de um língua. No entanto, dadas as circunstâncias em que aparecem e as características
que as especificam, elas engendram efeitos de sentido que lhes conferem relevância e as tornam
merecedoras de atenção, sobretudo, no que diz respeito à língua portuguesa do Brasil, as originárias
das produções modernistas. Ademais há que se reconhecer que as criações lexicais literárias têm a
capacidade de denotar a potencialidade das regras que as geram e a virtualidade do sistema. Diante
disso, este trabalho objetiva demonstrar a expressividade das unidades lexicais criadas pelo
processo de composição metafórica na poética de João Cabral de Melo Neto (1997a e b), escritor
pertencente à terceira fase do Modernismo brasileiro. Considera-se, em princípio, que a produção
do poeta, sintetizando os propósitos do período a que pertence, pauta-se na preocupação com a
própria linguagem cuja proposta de revalorização da palavra dá-se pelo rigor da forma linguística e,
de modo específico, pela constituição linguístico-discursiva obtida por meio de sua estratégia de
superação da dicotomia entre expressão e construção. A pesquisa fundamenta-se nos Estudos do
Léxico para a identificação e classificação das criações lexicais encontradas no complexo poético
cabralino partindo do ponto de vista teórico de Guilbert (1975), sendo complementado pelas teorias
e classificações aplicadas à língua portuguesa de Barbosa (1981), Alves (2002) e Correia e Lemos
(2009). Para a compreensão e demonstração dos efeitos de sentido por elas produzidos no discurso,
busca-se fundamentação na Estilística Léxica pelos pressupostos teóricos de Cressot (1976),
Câmara Jr. (2004) e Martins (2000). E, para a atestação das unidades criadas, baseia-se em corpus
lexicográfico de exclusão. Os resultados da pesquisa revelam a presença significativa de criações
lexicais na poética de João Cabral, perfazendo um total de 451 unidades léxicas criadas, dentre as
quais ora se pretendem destacadas 146 unidades formadas pelo processo de composição metafórica.
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A análise aponta que elas atuam como coadjuvantes no processo de "construção" da linguagem a
que almeja o poeta.
PRODUTIVIDADE DOS SUFIXOS NA LITERATURA BRASILEIRA: UM ESTUDO DE
ALGUNS CASOS PARTICULARES
Solange Peixe Carvalho – USP
Os estudos nas áreas da Morfologia e da Estilística voltados para a neologia confirmam a opinião
de, entre outros, Bechara (2002) e Martins (2000), sobre a formação de palavras na língua
portuguesa e a produtividade: segundos os autores, a sufixação é o processo que favorece a maior
criação de neologismos, devido ao grande número de sufixos existentes na língua portuguesa, bem
como à variedade de conotações que eles podem trazer para as palavras recém-criadas. A essas
opiniões acrescentamos as afirmações de Mattoso Camara Jr. (1985) sobre a afetividade das
palavras, que varia de indivíduo para indivíduo, e o uso que fazemos de um léxico supostamente
comum da língua portuguesa – os neologismos seriam, portanto, uma expressão da individualidade
de cada falante. Entretanto, observamos uma variação significativa nesses neologismos: se os
criados em textos jornalísticos podem ser incorporados à fala quotidiana da população, os literários
normalmente ficam restritos à obra em que foram criados, não passando para o domínio da língua
falada ou escrita, sendo quase impossível dissociá-los de seu autor e permanecendo como uma
espécie de “marca registrada” dele. A expressividade obtida por meio desses neologismos salienta
tanto as inúmeras possibilidades de criação de palavras quanto a criatividade dos escritores,
revelando matizes até então pouco discutidos de palavras que frequentemente, são de uso corrente
na língua falada. Assim sendo, o objetivo deste trabalho é examinar algumas criações neológicas
encontradas na literatura brasileira, discutindo os processos de criação, suas referências (culturais,
literárias) e o efeito que elas podem causar nos leitores desses textos.
NOVAS PALAVRAS, CONCEITOS NOVOS: A LÍNGUA PORTUGUESA NAS LÍNGUAS
INDÍGENAS BRASILEIRAS
Vitória Regina Spanghero – UFMS
As línguas estão em constante contato. Consequentemente, a mistura de conceitos, idéias, objetos e
sentimentos é traduzida em novas formas linguísticas. Há uma simbiose da categorização, da
maneira como os falantes enxergam o mundo e recortam a realidade, havendo, em alguns casos,
uma recategorização. O presente trabalho trata da criação lexical em algumas línguas indígenas
brasileiras, decorrente do contato com a língua portuguesa. As línguas se adequam para acomodar
as novas experiências, os novos objetos e conceitos encontrados como resultado do contato cultural
(BROWN, 1999). Essa experiência, vivida pelas sociedades indígenas, traduz-se, linguisticamente,
de modos variados, de acordo com cada etnia. Geralmente, as palavras adicionadas ao léxico são
formadas a partir de dois mecanismos lexicais: as criações vernáculas e os empréstimos. A criação
vocabular é bastante produtiva nessas línguas e demonstra a renovação do seu acervo lexical.
Existem situações diferentes, nas quais algumas sociedades resistem à introdução de objetos em sua
vida cotidiana, bem como ao empréstimo no léxico de seu idioma, enquanto algumas falam uma
língua sincrética. Um tipo específico de mudança da língua é a neologia, criando novos lexemas e
adotando formas estrangeiras. São notáveis os casos de formação com elementos pré-existentes,
como as formações onomatopaicas, bem como a adequação aos padrões fonológicos da língua. Em
ofayé, 'katek' (espingarda), em yanomami, 'koaturu' (quatro), em matis 'pisiukete' (desodorante),
evidenciam a produtividade destes processos. A respeito da produtividade lexical, Sandmann (1991)
acentua que a competência lexical do usuário de uma língua se compõe de dois momentos: o da
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análise e da interpretação das unidades lexicais estabelecidas no léxico, isto é, já formadas, e o da
formação ou entendimento de novas palavras de acordo com modelos ou regras que a gramática da
língua põe à disposição. Verificamos, assim, nessas línguas, os processos de formação de novas
palavras, considerando os mecanismos linguísticos envolvidos na criação.
O NEOLOGISMO COMO PROCEDIMENTO DE COMPOSIÇÃO POÉTICA: ANÁLISE
DO ROMANCE “CATATAU”, DE PAULO LEMINSKI
Carlos Augusto Novais – UFMG
Nosso artigo, resultado de pesquisa realizada sobre a obra ficcional de Paulo Leminski, analisa
alguns dos principais procedimentos de composição presentes no romance “Catatau”, publicado em
1975, em edição própria e independente. Carregando a fama de ininteligível, o livro permaneceu
restrito a um pequeno grupo de apreciadores e/ou especialistas. Somente em 1989, a Editora
Sulinas, de Porto Alegre, publica a sua segunda edição. O texto fora revisto e ligeiramente alterado
por Leminski. Em 2004, temos sua terceira edição, crítica e anotada, produzida por uma equipe de
pesquisadores da área de Letras da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, seguindo uma
sugestão do poeta Décio Pignatari, então consultor de literatura da Fundação Cultural de Curitiba.
Nossa análise evidencia o método da montagem e seu aproveitamento no plano específico dos
neologismos literários. É inequívoco o prestígio que o conceito de montagem experimenta, mais
claramente a partir do século XX, no universo das artes, seja no plano da produção, seja no da sua
crítica. Em torno dele gravitam vários outros como os de acaso, aleatoriedade, fragmentação,
descontinuidade, simultaneidade, justaposição e colagem, dependendo do campo considerado. Sua
ascensão à categoria de recurso diferenciado acompanha as reverberações transdisciplinares
desencadeadas pela alteração da cosmovisão ocidental clássica, que colocou em crise o modelo
tradicional de representação do mundo, baseado na unidade das concepções de tempo e espaço, e na
centralidade da noção de “sujeito”. Romance identificado como experimental, no qual os próprios
procedimentos de criação e produção são postos em evidência, o campo lexical ocupa, no
“Catatau”, papel fundamental. Da complexa orquestração fônica, combinando sonoridades e
favorecendo os trocadilhos, passando pelas modificações morfológicas operadas em palavras já
existentes, até a montagem propriamente dita de novas palavras, justapondo campos semânticos
díspares, a experimentação desenvolvida no seu âmbito deixa o texto fragmentado e aberto a
múltiplas leituras. As camadas de sentidos se sobrepõem num ritmo alucinante colocando em xeque
a linearidade lógico-discursiva, representada, no universo diegético, pela identificação do seu
narrador-personagem com o pensamento cartesiano. Importantes críticos e escritores brasileiros se
posicionaram diante desse livro original. Risério (1989, p. 221) assim se refere a ele: ”O Catatau
não é romance nem ensaio. Texto conceitual e poético, além ou aquém de gêneros”; Bonvicino
(1989, p. 224) o aponta como “a prosa mais densa e inventiva dos últimos dez anos”; Costa (1989,
p. 226) afirma que ele é “a retomada da linha evolutiva da poesia concreta. É vanguarda”; Barbosa
(2004, p. 392) o qualifica como “romance pós joyciano que pode ser considerada a peça de prosa
mais ousada escrita no Brasil depois (cronologicamente) de Guimarães Rosa e das Galáxias, de
Haroldo de Campos”. Todos esses testemunhos confirmam o compromisso do “Catatau” com a
prosa de invenção e, consequentemente com a chamada “literatura da criação” (PINO, 2004). Nossa
pesquisa dividiu-se em duas etapas. A primeira constituiu-se na elaboração de um Glossário das
palavras-valise presentes no texto (2.835 ocorrências), formando uma base de dados para a análise.
Os efeitos estéticos de linguagem nelas presentes favorecem os jogos de palavras, trocadilhos e a
multiplicidade de sentidos em breves doses poéticas. A segunda etapa do trabalho, a partir da
distinção entre neologismo na língua e neologismo literário, efetuada por Michael Rifaterre (1989,
p. 52), compreendeu a análise do caráter estético dos mecanismos formadores das palavras-valise e
da produtividade de outros processos neológicos, como a derivação e a onomatopéia, e a
transfiguração criativa de palavras já existentes no léxico comum. Procuramos demonstrar que o
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método ideogrâmico realiza na dimensão micro da palavra o que o procedimento reconhecido como
montagem desempenha no plano macro de composição do texto.
ANÁLISE DOS NEOLOGISMOS NA OBRA O GATO E O ESCURO, DE MIA COUTO
Rosemeire de Souza Pinheiro T. Silva – IFG/UFG/CAC
Braz José Coelho – UFG/CAC
Diante de tantas mudanças, revoluções e inovações pelas quais a sociedade passa, a língua como
reflexo social também tem alterações. Mesmo portando um estandarte conservador, a língua, em sua
dinamicidade, permite empréstimos, invenções de palavras, renovações ou ampliações de sentidos,
pois a mesma acompanha a necessidade do indivíduo se expressar e de reafirmar os sentidos de seu
discurso, além de sua individualidade. Com isso, uma das formas acessíveis e práticas para estudar
a dinamicidade da língua é por meio de uma obra literária. A literatura além de oferecer uma
imersão espacial, cultural e histórica, ela, ao ser escrita, seleciona a estrutura e o léxico para dar
uma maior sensação de veracidade a sua narração. Assim, optamos por estudar neste campo literário
o saber lexical, por carregar nos termos a marcas da região, da história e da cultura. Lançar um
olhar lexical nas obras literárias é entender as palavras não somente como partes que constrõem o
todo, mas como termos que transcedem o papel e representam a vida. Para materializar as
identidades ou expressar momentos, nem sempre encontra-se palavras prontas ou com o sentido
desejado pelo emissor de um discurso, então surgem os neologismos. A criação de novas palavras
ou a atribuição de novos sentidos as palavras já existentes servem para materializar sentimentos ou
vontades, ou intenções que não se serviram do acervo de palavras ou significados oferecidos nos
dicionários. Na obra literária, sob a ótica lexical, o neologismo é um dos estudos que mais aguçam e
despertam a imaginação dos leitores, por exigir reflexão. No livro O Gato e o Escuro (2008), de
Mia Couto, o autor confessa o prazer em trabalhar com a língua como se ela estivesse em
construção e assim, na sua obra, com o intuito de levar o leitor, inicialmente infantil, a reflexão a
respeito do escuro, o autor se serve de neologismos inteligentes que exigem uma reflexão dos
leitores acerca de suas construções. Logo, este trabalho tem o objetivo de analisar os neologismos
presentes na narração. E cabe-nos questionar: os neologismos são inventados usando algum padrão
ou são formados aleatoriamente? Os neologismos são entendidos no contexto ou precisam de
elementos externos para ser compreendidos? Na tentativa de responder tais questionamentos, este
estudo se apoiará em estudo bibliográfico de literaturas lexicais e como corpus será trabalhado os
neologismos da obra O Gato e o Escuro. Fundamentado na Linguística Lexical, especificamente
nos estudos neológicos, este trabalho busca mostrar que os neologismos são formados por
composição e derivação, sendo formados com o objetivo de prender e despertar a atenção dos
leitores. O arcabouço teórico deste estudo se fundamenta, nas contribuições de Basílio (2002),
Vilela (1994), Biderman( 2001; 2011) , Coelho (2008), Sandmann(1997) e dentre outros teóricos
que trilham pelo mesmo caminho.
ESTRANGEIRISMOS: AS VARIANTES GRÁFICAS DAS MATRIZES LEXICAIS
INGLESAS APRESENTADAS NA LINGUAGEM DOS DESENHOS ANIMADOS DA TV E
A NOVA REALIDADE NA PRÁTICA PEDAGÓGICA NO APRENDIZADO DE LÍNGUA
MATERNA
Antônio Elias Lima Freitas – FAETEC/IST-Petrópolis/FEUDUC
Até mesmo a escola, em sua prática pedagógica, vem sofrendo as influências da linguagem dos
desenhos animados da TV no ambiente escolar. Foi observado na Escolas Municipal Professor
Paulo Monte, Araras, Petrópolis, uma classe de primeiro ano de escolaridade onde a professora
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utiliza de forma muito eficaz e atrativa, personagens de desenhos animados modernos da televisão.
A professora com quase trinta anos de magistério público municipal, às vésperas de sua
aposentadoria, mesmo com noções mínimas de língua inglesa, e sem observar o processo pelo qual
a alfabetização é processada (teorização), cria meios para que aconteça uma interação entre ela,
mediadora da aprendizagem, e alunos de seis e sete anos. De forma suave e eficaz, os alunos são
alfabetizados com palavras inglesas e portuguesas sem distinção lingüística entre português e
inglês. A professora e os alunos não apresentam conhecimento de língua inglesa e assim, uma
alfabetização tendenciosa ao bilinguismo ocorre de forma completamente harmoniosa e cheia de
tudo que as crianças gostam muito: o binômio televisão e desenhos animados. Os estrangeirismos se
adaptam facilmente ao processo de aprendizagem de língua materna na escola atual. O ambiente
onde o processo de ensino/aprendizagem ocorre, apresenta em suas paredes as estampas de
desenhos animados com as letras e as sílabas do alfabeto. Nas paredes aparecem diversos quadros
como B de BARBIE, B de BEN 10, K de KEN, J de JERRY, T de TOM, C de CARS, G de
GARFIELD dentre muitos outros cartazes de desenhos animados.
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SIMPÓSIO 38
VARIEDADES ÉTNICAS DO PORTUGUÊS: CARACTERÍSTICAS DO
PORTUGUÊS COM INFLUÊNCIA DE UMA PRIMEIRA LÍNGUA (L1)
E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O ENSINO
Línguas em contato com o português, sendo a L1 usada no processo de aquisição, simultânea ou
sucessivamente, apresentam variedades linguísticas únicas, singulares,as chamadas variedades
étnicas, ainda pouco exploradas no universo das variedades ora existentes. As características dessas
variedades ocorrem nos vários âmbitos da língua portuguesa e mostram a influência da L1 na
prosódia, fonética, fonologia, morfologia, sintaxe, semântica e pragmática (eventos de fala). O
objetivo geral desse simpósio é trazer à luz essas variedades apontando como elas diferem das
atualmente reconhecidas. As variedades do português indígena (em cada uma de suas etnias), do
português arábe, do português alemão, do português japonês, do português italiano, do português
inglês, do português espanhol são algumas dessas variedades, entre outras, que poderão ser tratadas
dentro das diversas teorias que lhes dão suporte. O objetivo específico é fornecer subsídios para o
ensino de língua portuguesa aos falantes dessas variedades.
COORDENAÇÃO
Silvia L B Braggio
Universidade Federal de Goiás
[email protected]
Heloisa A B de Mello
Universidade Federal de Goiás
[email protected]
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DESENTERRANDO O TALENTO: (TRANS)FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE
PORTUGUÊS LÍNGUA ADICIONAL EM CARÁTER EMERGENCIAL
Marcia A. Mendes – UNB
Maria Lucia Calhau Pereira
Trabalhando com o ensino de português como língua adicional (aqui, PLA), sentimos a flagrante
oferta insuficiente de cursos de (trans)formação incial ou continuada de professores. As soluções
propostas pelo Plano de Ação 2011-2015 do SEM e os PCNs (Brasil, 2006) estariam avançando o
bastante quantitaviva (ALMEIDA-MENDES, 2012) e qualitativamente (LEFFA, 2005; CELANI,
2010). A obrigatoriedade do ensino de português nas escolas argentinas e o crescente interesse na
língua tendo em vista o crescimento econômico, além dos maiores eventos esportivos do planeta a
serem realizados no Brasil, ajudam a evidenciar a urgência do tema. Vemos, com frequência,
profissionais de outras áreas a verem-se levados a assumir o posto de professores de PLA no Brasil
e fora dele - o ensino da língua tantas vezes é um passo fundamental para o sucesso de projetos que
são desenvolvidos pelas organizações às quais estão vinculados. Nesta comunicação, pretendemos
discutir esta questão e apresentar os relatos da experiência de um curso intensivo de (trans)formação
de professoras de português com destino à Guiné-Bissau – a proposta de uma solução emergencial.
Inicialmente, as professoras participantes, missionárias protestantes sem (trans)formação inicial em
PLA, tinham o objetivo final de alfabetizar a população carente de uma determinada região do país.
Contudo, com base na leitura de Mortatti (2007) e Barbato (2007), houve a conscientização da
importância em se refletir sobre abordagens interculturais, letramento e prática reflexiva (GIL &
VIEIRA-ABRAHÃO, 2008; ALMEIDA FILHO, 2004; FREIRE, 2008). A partir daí, um curso de
formação foi desenvolvido tendo estes construtos como eixo. Durante a experiência realizamos uma
pesquisa qualitativa de base etnográfica, aplicando questionários e fazendo entrevistas a fim de
identificar que crenças (BARCELOS, 2007; CONCEIÇÃO, 2004) e experiências (MICCOLI, 2010)
as participantes tinham e que identidades (MASTRELLA-DE-ANDRADE, 2012; HALL, 2002)
concebiam como professoras de português como língua adicional no início do processo de
(trans)formação e ao final dele. O curso teve dois módulos: o primeiro, à distância, foi realizado
com discussões via fórum virtual e a leitura de textos científicos a respeito de interculturalidade,
letramento e prática reflexiva. O segundo módulo foi um curso presencial em Belo Horizonte, com
duração de 30h, com atividades relacionadas a fundamentos de abordagens e elaboração de material
didático e desenvolvimento de propostas de atividades e planos de aula e provocações lúdicas à
experimentação de aspectos culturais em aulas de línguas. Acreditamos que ao compartilhar este
desafio concluído poderemos incentivar (trans)formadores de professores a buscarem soluções para
um problema tão latente e que urge soluções (im)possíveis.
BILINGUISMO E DOMÍNIOS DA LINGUAGEM NA EDUCACÃO DAS CRIANÇAS
BRSILEIRAS NO JAPÃO
Patrícia Elisa Kuniko Kondo Komatsu – FFLCH-USP
Aapresentação pretende apontar as dificuldades enfrentadas pelas crianças brasileiras residentes no
Japão paradominar a linguagem num contexto de bilinguísmo,falando português em casa e japonês
na escola. Certamentesão muitos osproblemas decorrentes do bilinguismo num momento
daaquisição da linguagem,concomintante,com o desenvolvimento cognitivo. Alguns autores
afirmam que a competência linguística é adquirida emtorno doscinco anos de idade,enquantooutros
dizem que a competência línguística é adquiridaaté os 12 anos, desde que os pais induzam seus
filhos aserem bilíngues num ambiente social favorável à aquisição de duas línguas,ao mesmo tempo
que desenvolvem umaboa interação cognitiva, psicológica e social.Nesse ciclo de vida ascrianças
conseguemarmazenar na mente as primeiras normas da língua materna, independentemente da
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classe social. Os falantes nativos bilíngues aprendem as duas línguas em planos sociodiscursivos
semelhantes (ambas seriam, por exemplo, em casa) e dominamambas as línguas da mesma forma,
desde que eles continuemse dedicando aosestudos de leitura de livros em contato com a
línguaescrita, partindo de estudos gramaticais, sintaxe,semânticas eaté chegar no nível discursivo. A
língua materna adquirida, somente em casa estacionaria numalinguagemcoloquial e infantil.
Enquanto
quecom
continuidade
nos
estudos
e
bom
desempenho
os
indivíduos,verdadeiramente,bilínguesconseguem dominarem níveis quase idênticos, as duas línguas
com que se comunicam.Nossos comentáriossobre obilinguismo baseiam-se nas teorias
desenvolvidas por Backer(2006) e Nakajima (1998). Assim como apresentaremoscasos de crianças
brasileirasque passaram por essa experiência no Japãopelos pais,descendentes de japoneses quejá
tinham uma vivência de falar japonês em casa, mas falavam português na escola brasileira.No
Japão,esse ambiente linguístico foi invertido –passaram a falar português em casa e japonês na
escola. Diga-se de passagem que há escolas brasileiras no Japão dedicadas aos filhos dos imigrantes
brasileiros, mas muitos pais acabam por optar pela escola japonesa, uma vez queo curso é gratuito
eseus filhos mais cedo ou mais tarde terão que enfrentar a sociedade japonesa e o contexto da
cultura local.
KOUHÉPUNETI: LÍNGUA E CULTURA TERENA: EMPRÉSTIMOS LÍNGUÍSTICOS NA
LÍNGUA TERENA
Raimunda Madalena Araujo Maeda – UFMS
O que mais chama a atenção hoje sobre educação indígena são as dimensões que ela pode alcançar,
sejam administrativas, pedagógicas ou pela própria construção do conhecimento a partir das
experiências culturais de cada povo indígena. Por isso, defendemos que o processo de inclusão das
escolas indígenas no sistema de ensino oficial como escolas específicas, diferenciadas e
interculturais, deverá ter como eixo central o protagonismo indígena. Para isso, é necessário a
implementação de políticas de educação escola indígena a partir de perspectivas indígenas e o
fortalecimento de movimentos e organizações indígenas na luta pela consolidação da legislação
vigente. Os sistemas de ensino por sua vez têm um grande desafio de lidar com este novo processo
de escolarização, das necessidades culturais e linguísticas dos povos indígenas. Assim, frente a essa
realidade observada na aldeia indígena Ipegue, localizada no município de Aquidauana-MS, mais
especificamente na escola, esta pesquisa se propôs realizar a coleta de “empréstimos linguísticos”
da língua portuguesa para a língua terena, haja vista a situação de aprendizagem dessas duas
línguas. A escolha do local e do assunto pesquisado obedeceu aos critérios da acessibilidade e de
resultados de trabalhos que vêm sendo desenvolvidos pelo grupo de pesquisadores ligados aos
Projetos de pesquisa “kouhépuneti: língua e cultura terena”, “educação escolar indígena: língua,
raça, cultura e identidade”, e projeto de extensão: “keukapana ra vemo’u e yakutipapu”. Esta
pesquisa se fez necessária, pois os dados coletados irão contribuir para a constituição do banco de
dados sobre essa língua, que servirá de base para futuras pesquisas envolvendo a língua e o povo
Terena, tais como: comparação do Terena com outras línguas relacionadas; comparação entre a
variante falada em outras aldeias terena localizadas nos municípios de Aquidauana e Miranda, bem
como a reconstrução de suas estruturas com a finalidade de constatar a evolução histórica das
línguas que possuem origem comum; verificação de universais ou categorias gramaticais e a
aprendizagem da língua Terena. Além disso, este trabalho constitui-se como ponto de partida para a
elaboração de materiais didáticos que servirão de apoio ao ensino da língua Terena por professores
indígenas.
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INFLUÊNCIAS INTERLINGUÍSTICAS: SINGULARIDADES DA COMPETÊNCIA
BILÍNGUE
Heloisa Augusta Brito de Mello – UFG
A influência interlinguística entre L1 e L2 é uma característica da produção oral ou escrita de
pessoas que estão em processo de aquisição de uma L2. Nesse percurso de se tornar bilíngue, a L1
tem um papel fundamental na construção da competência bilíngue na medida em que ela é
referência para a aquisição da L2, tanto no nível da estrutura gramatical quanto no das práticas
discursivas, sobretudo na fase inicial do processo. Similarmente, a L1 também absorve
características da L2 que lhe imprimem uma singularidade própria do falar/escrever bilíngue.
Apoiado na sociolinguística interacional, este estudo tem como objetivo discutir algumas dessas
influências envolvendo o par linguístico português (L1) – inglês (L2) a partir de exemplos oriundos
da sala de aula de inglês como segunda língua / língua estrangeira. Espera-se com esta proposta
trazer subsídios tanto para a pedagogia de ensino e aprendizagem de L2/LE quanto para a de L1 em
contextos de aquisição bilíngue.
O PORTUGUÊS DE UM PORTO-RIQUENHO EM SITUAÇÃO DE INTERCÂMBIO NA
UFG
Aline Gomes Souza – UFG
A mudança de código é um fenômeno observado com recorrência nas práticas discursivas entre
indivíduos bilíngues ou em processo de tornarem-se bilíngues, mas poucos estudos tratam do
continnum inglês-português. Este trabalho tem como objetivo discutir aspectos interlinguísticos
observados na narrativa de um estudante universitário, oriundo de Porto Rico, participante de um
intercâmbio na UFG. Em termos mais específicos, espera-se focalizar aspectos interlinguísticos do
português (L2) e do inglês (L1) presentes na competência comunicativa desse aluno, com ênfase
especial no fenômeno mudança de código. Para realizar esta investigação, tomo como orientação
metodológica a pesquisa qualitativa de natureza etnográfica, utilizando instrumentos de pesquisa
tais como entrevistas, diários, notas de campo, observações, questionários, conversas informais e
gravações em áudio e vídeo com os participantes. A análise dos dados se apoia na teoria da
sociolinguística interacional. Espera-se, com este estudo, contribuir para os estudos da linguagem
na área do bilinguismo.
O ENSINO/AQUISIÇÃO DO PORTUGUÊS EM UM CONTEXTO DE IMIGRAÇÃO
BOLIVIANA: QUESTÕES DE ATITUDES LINGUÍSTICAS, INFLUÊNCIA LINGUÍSTICA
E ESTIGMA
Sidney de Souza Silva – IFG
O momento atual da globalização tem favorecido a inserção do Brasil na dinâmica das migrações
internacionais com destaque para imigrantes latinoamericanos, africanos e asiáticos, que
vislumbram encontrar aqui melhores condições de trabalho e de subexistência. Contudo, o que a
princípio se apresentava como um sonho acaba se transformando, para muitos, em um pesadelo, a
começar pelo idioma brasileiro que precisam adquirir em curto espaço de tempo, os conflitos
culturais, os problemas legais etc. Essas adversidades iniciais aparentemente simples acabam
dificultando o acesso dessas pessoas a serviços básicos como educação, saúde, trabalho legalizado,
além do preconceito e da discriminação que sofrem. É nesse contexto que procuro analisar a
situação sociolinguística de um grupo de imigrantes bolivianos residentes na cidade de São Paulo,
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focalizando nesta apresentação, de forma mais específica, as influências interlinguísticas e a
mudança de código oriundos do contato entre o espanhol (L1) e o português (L2), línguas usadas
cotidianamente naquele contexto.
A AQUISIÇÃO DO PORTUGUÊS ESCRITO PELA CRIANÇA INDÍGENA XERENTE
AKWÉN: ASPECTOS COGNITIVOS, SOCIOLINGÜÍSTICOS E EDUCACIONAIS
Silvia Lucia Bigonjal Braggio – UFG
Pesquisas sobre bilinguismo vêm recebendo uma significativa atenção nas várias áreas da
linguística, principalmente na Europa e nos Estados Unidos, trazendo à luz resultados importantes
sobre o tema. Embora o Brasil seja um dos países com mais diversidade linguística, essas pesquisas
ainda são um tanto raras, principalmente em se tratando de línguas indígenas em contato com o
português. Meu objetivo geral neste trabalho é tratar do contato entre o português e a língua xerente
akwén, do povo do mesmo nome e das influências que a língua indígena exerce no português. Para
tanto me fundamento nas pesquisas mais recentes da sociolinguística, ciências cognitivas e
semântica da gramática. A análise dos dados coletados apresenta a descrição de um texto infantil de
uma criança adquirindo o português como segunda língua, de forma sucessiva. Os dados de outros
participantes foram coletados através de observação contínua, entrevistas, questionários semiestruturados ao longo de 20 anos de trabalho dessa autora com o povo akwén e dão suporte para a
análise dos textos infantis. Na análise, aponto o papel do cérebro /mente para lidar com as diferentes
situações de uso das línguas a partir da estrutura da língua xerente akwén. Os resultados apontam
que a influência da primeira língua da criança na aquisição do português escrito faz parte de um
processo constante observado por pesquisadores que trabalham com línguas em contato e devem ser
considerados positivamente nesse processo. Meu objetivo específico é contribuir para essa área de
estudos e para políticas de língua e educacionais do povo Xerente Akwén.
O PAPEL DO PORTUGUÊS NA FALA BILÍNGUE XERENTE: CODESWITCHING E
EMPRÉSTIMOS
Rodrigo Mesquita – UFG
O povo xerente tem um histórico de contato superir a 200 anos com os não índios e, assim como
vários outras comunidades indígenas brasileiras, são bilíngues. A população estimada é de 3.600
pessoas divididas em mais de 60 aldeias em duas reservas indígenas ao norte do estado do
Tocantins. A língua xerente (Jê) geralmente é a primeira língua (L1) a ser adquirida pelas crianças
indígenas e o português a L2, embora já haja casos de aquisição simultânea e/ou de português como
L1. Em contextos de contato linguístico e cultural com indícios de conflito diglóssico, as línguas
podem assumir diferentes papéis dependendo das variáveis extralinguísticas que operam em cada
situação. O objetivo desta comunicação é discutir o papel do português no discurso bilíngue
xerente, considerando algumas características peculiares da variedade da L2 falada pelos indígenas
em consonância com os contextos de produção e a atual situação sociolinguística do povo xerente.
Assim, colocamos em foco as adequações gramaticais desta variedade que possibilitam a
alternância entre as línguas, ou seja, o codeswitching (CS) e também os empréstimos. Para análise
dos dados de CS intrasentencial, utilizamos como suporte o modelo MLF – Matrix Langue Frame
Model (MYERSSCOTTON, 1993a; 2002). Tal modelo possibilita, nesse tipo de dados, entender a
organização hierárquica das gramáticas das línguas envolvidas que possibilita a ocorrência de CS,
entendido aqui como um processo criativo e não arbitrário. Ao realizar uma descrição e análise
gramatical preliminar do CS utilizado pelos Akwén, procuramos identificar a língua que
(geralmente) fornece o quadro morfossintático para a CP bilíngue xerente-português, dentro do
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quadro teórico proposto no modelo MLF. Os dados preliminares indicam que a língua matriz (LM),
exceto em casos específicos, é a língua xerente, restando ao português a posição de língua
encaixada (LE) dentro da CP bilíngue. Segundo Myers-Scotton (2002), a língua que geralmente
funciona como língua matriz é a L1 do falante, o que coincide com nossos dados. Contudo, os
registros em que o português aparece como LM, analisados sob variáveis extralinguísticas operantes
no momento da enunciação, fornecem informações valiosas para entender o papel desempenhado
pelo português e sua relação (ou não) com o processo de obsolescência da língua indígena. De
forma específica, buscamos dar nossa contribuição com subsídios para a educação escolar indígena
envolvendo o ensino da língua portuguesa e para a vitalidade da língua e da cultura akwén.
EXPRESSÃO ASPECTUAL DE ESTADO NO XERENTE (L1) E NO PORTUGUÊS (L2)
Rodrigo Guimarães Prudente Marquez Cotrim – UnB
As línguas podem apresentar dispositivos fonológicos, morfológicos, sintáticos e lexicais para
marcar o “tempo interno” de uma situação de fala. Este tempo interno ou “tempo psicológico” da
situação, Comrie (1976) denomina aspecto. A marcação de aspecto pode se dar por meio de
morfemas gramaticais no verbo, no nome e em outras partículas [+ gramaticais] (neste caso,
denomina-se ‘aspecto’, propriamente dito), assim como há línguas em que uma unidade lexical
pode apresentar uma semântica inerente de aspecto na própria palavra, sem a necessidade de
elementos “externos” à ela para indicar tal categoria (neste caso, denominado ‘aktionsart’,
conforme Sasse, 2006). A língua Xerente, língua indígena brasileira, da família Jê central (c.f.
Rodrigues, 1986), por exemplo, apresenta marcação aspectual de estado e de aspecto habitual
presente e passado, assim como ocorrido em várias outras línguas do mundo. A gramática Xerente
parece marcar, também, morfossintaticamente, o aspecto inceptivo – noção de uma ação que se
principia; o recente, remetente a uma ação ou estado do verbo no presente ou passado recente; o
incoativo, aspecto que se refere a algo que começa a se tornar em outro algo; além do progressivo,
do hipotético, do iterativo, do incerto, bem como o (re)iterativo e o aspecto inconclusivo. Dentre
esses, focaremos o primeiro, demonstrando como a língua Xerente expressa categorias aspectuais
de estado e como essas mesmas categorias são expressas na variedade indígena do português falado
por esse povo. De acordo com a tipologia estabelecida por Vendler (1967), os verbos são definidos
em quatro tipos: de atividade, de accomplisment, de achievement e de estado. No Xerente, os
verbos “estativos” se caracterizam por possuir um período de tempo “constante”, podendo ser
expressos, por exemplo, por verbos de posse e de sentimentos psicológicos e fisiológicos, se
destacando pelos traços [+duração no tempo] e [+estabilidade no tempo]. Nesta língua, os
sintagmas verbo-nominais acompanhados de morfema estativo específico podem expressar
categorias de qualidade, atributo, posse e negação. Esse morfema é sufixado a nomes, verbos e a
partículas mais gramaticais, como as de aumentativo e de negação da língua, sufixando-se, portanto,
a morfemas livres e presos da mesma. Ao expressar categorias aspectuais de estado no Português
como L2, a fala do “português xerente” apresenta padrões variáveis de uso. Percebe-se, por
exemplo, que a expressão de certos verbos como ‘pintar’, ‘pescar’, ‘descansar’, etc., – geralmente
representando estados no Xerente, parecem sofrer uma expansão semântica, mostrando um padrão
de tranferência em duas mãos: xerente-português e português-xerente. Ademais contribuir para o
conhecimento linguístico de uma língua indígena brasileira e de uma das variedades do português
falado no Brasil, pretende-se elucidar padrões de uso, no Xerente e no Português, de sintagmas
verbo-nominais estativos para, assim, contribuir para o ensino-aprendizagem de categorias verbais
bastante produtivas e de uso constante no falar Xerente, tanto na sua L1, como em sua L2.
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PARTICULARIDADES DA VARIEDADE DO PORTUGUÊS WAJÃPI ESCRITO
Lilian Abram dos Santos – IEL/Unicamp
Este trabalho tem como objetivo apresentar parte dos resultados da minha pesquisa de doutorado,
realizada entre os anos de 2006 e 2010, na Unicamp. A pesquisa teve como objetivo investigar as
relações entre oralidade e letramento na produção escolar escrita em português de jovens e adultos
wajãpi, tomando como pressuposto que o português indígena (MAHER, 1996), mesmo não sendo a
língua materna de muitos índios, também é um lugar para a manifestação da identidade desses
sujeitos. O contexto da investigação foi a formação de professores, pesquisadores e agentes de
saúde wajãpi, que ocorre de acordo com a política pública de educação específica aos povos
indígenas do Brasil, conhecida como educação escolar indígena específica, diferenciada, bilíngüe e
intercultural. A partir da análise da produção escolar dos alunos, procurei investigar como se dava o
funcionamento sociopragmático na modalidade escrita da variedade do português wajãpi. Mais
especificamente, minha pesquisa foi conduzida na tentativa de compreender de que forma os textos
por eles escritos apresentavam, em sua composição, marcas de modos orais de transmissão do
conhecimento e quais eram os significados dessas marcas. Foi possível verificar que os textos
apresentam forte influência da tradição oral (VANSINA, 1982; CALVET, 1997; FERREIRA
NETTO, 2008), sobretudo nos aspectos relacionados ao predomínio da tipologia narrativa, à
remissão constante à memória coletiva do grupo, aos modos particulares de apresentar o discurso
reportado e o fechamento narrativo. A questão que direcionou a pesquisa foi motivada pelo fato de
os Wajãpi serem um povo que tradicionalmente usa a oralidade para a transmissão e produção de
seu conhecimento. Os Wajãpi são um povo indígena, de aproximadamente 1000 pessoas, que habita
a Terra Indígena Wajãpi, localizada no estado do Amapá (BR). Sua primeira língua é o Wajãpi, da
família linguística Tupi Guarani. O português é aprendido assistematicamente e, desde meados da
década de 1990, nas escolas instaladas nas aldeias, dispersas ao longo do território wajãpi. Os
modos wajãpi de usar a oralidade e a escrita possibilitam defini-los como um povo de tradição oral
em processo recente de letramento. O contato desse povo com práticas sociais letradas é bastante
recente. Formas letradas de comunicação passaram a se fazer presentes nesse contexto somente
após o contato realizado com a FUNAI (Fundação Nacional do Índio), na década de 1970. Nas duas
décadas seguintes, foram implantados em território Wajãpi um posto da FUNAI, postos de saúde,
escolas e começou a ocorrer o curso de formação de professores wajãpi, que, posteriormente, se
formalizou em Magistério Indígena. Em 1998, teve início a formação em saúde e no começo dos
anos 2000, a Formação de Pesquisadores. Ao longo desse mesmo período, os Wajãpi se envolveram
com a demarcação do que hoje é a Terra Indígena Wajãpi e criaram associações representativas,
com sede na cidade de Macapá, capital do estado onde está localizado seu território. Diretamente
envolvidos nesse processo, estão os jovens e adultos, a maioria do sexo masculino, autores dos
textos por mim analisados.
PORTUGUÊS – TAPIRAPÉ: CONCEPÇÕES DE MUNDO EM INTERAÇÃO
Eunice Dias de Paula – UFG
Os Apyãwa (Tapirapé), habitantes da região nordeste do Estado de Mato Grosso, são falantes da
língua tapirapé como primeira língua (L1) e de Português como segunda língua (L2). Jovens e
adultos podem ser considerados bilingues com diferentes graus de domínio da segunda língua,
configurando um continuum situacional próprio de indivíduos que usam duas ou mais línguas
(GROSJEAN, 1994; MELLO, 1999; GOUVÊA DE PAULA, 2001). Este trabalho focaliza
produções orais e escritas elaboradas em Português por jovens e adultos Apyãwa, nas quais é
possível constatar traços da língua e da cultura Apyãwa (GORETE NETO, 2005), bem como
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construções sintatico-semânticas singulares que configuram um novo uso da língua portuguesa. O
parâmetro de análise dos fenômenos observados é a Etnossintaxe ou Semântica da Gramática
(ENFIELD, 2002; WIERZBICKA, 1997; BRAGGIO, 2011, entre outros) que concebe a língua
como portadora de indícios que possibilitam o desvelamento dos valores e ideais que organizam
uma dada sociedade. Os resultados mostram que o uso da segunda língua pelos Apyãwa apresenta
marcas identitárias próprias da cosmovisão deste povo, constituindo uma variedade étnica da língua
portuguesa, o que acarreta novas posturas no ensino de L2 aos falantes indígenas.
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SIMPÓSIO 39
TRADUÇÃO: TRANS-FORMAÇÃO LINGUÍSTICA E CULTURAL
Inserindo-se no IV SIMELP e na sua concepção básica, este simpósio, cujo título é “Tradução:
trans-formação linguística e cultural”, propõe-se como espaço de abrigo e debate sobre teoria e
prática de tradução. Identifica-se, pois, na concepção do IV SIMELP, enquanto propõe o diálogo de
diferentes disciplinas e a variedade de discursos. O presente simpósio abre-se a diferentes
aplicações e interesses no âmbito da tradução, reafirmando a intenção de catalizar, e, possivelmente,
identificar novos rumos, novas pesquisas no panorama atual dos estudos sobre tradução em língua
portuguesa. Para tal, esta proposta de simpósio abrange vários temas possíveis: tradução e literatura,
tradução técnica, tradução e didática das línguas, formação de tradutores, teoria da
tradução/tradutologia, identidade do tradutor, prática da tradução da/em língua portuguesa, tradução
e tecnologia, tradução e etnografia, tradução e sociologia, interpretação consecutiva, interpretação
simultânea. Além de outros temas propostos em trabalhos que visem ao compartilhamento de
experiências e pesquisas que envolvam estudos de tradução intralingual, interlingual e
intersemiótica.Considerando que a língua portuguesa se constitui em espaços culturais em que as
teorias pós-coloniais proporcionaram novos modelos interpretativos da realidade dos países
colonizados, considerando que a admiração pela cultura estrangeira produziu uma transformação
radical da cultura/língua alvo por meio da “canibalização” dessa cultura/língua, parece-nos que os
novos rumos dos estudos de tradução podem ser traçados no âmbito do IV SIMELP por ser o lócus
de discussão multifacetada e multicultural, de diálogo intercultural e interdisciplinar.
COORDENAÇÃO
Katia de Abreu Chulata
UniversitàdelSalento (Lecce, Itália)
[email protected]
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A DEMORA SECRETA DO EU INDETERMINADO
Luís Fernando Protásio – UNICAMP
Partindo da hipótese de que a filosofia, de algum modo e em certa medida, teria sobreposto à escuta
[listening, écoute] algo da ordem da compreensão [understanding] e, nesse sentido, imposto, como
própria possibilidade do pensamento filosófico, os limites de uma relação com um Outro que ouve e
compreende [hear, entendre], como pondera o filósofo francês Jean-Luc Nancy (2002), como seria
possível, então, acercar-se de um corpo pulsante [falante, simbólico] como é o corpo da língua em
situação de tradução (em tradução), situação em que esse corpo se coloca à escuta [être à l’écoute,
to be listening], ainda que uma escuta, sempre, em segredo, sempre, da esfera do secreto? Como,
ainda, colocar-se à escuta da tradução, um ritual exemplarmente realizado [performed] por seres
cujo processo de [auto]apagamento serve, exatamente, para dar corpo [para emprestar o corpo] a
uma entidade virtual [um avatar]? Balizado por essas questões, é objetivo deste trabalho investigar
o problema da identidade mediada pelas relações corpo/espírito, real/simbólico e teoria/prática,
cujas traduções podem ser rastreadas de forma espetacular (no duplo sentido do termo) no filme A
pele que habito (2011), do diretor espanhol Pedro Almodóvar. Consideradas no contexto teórico
contemporâneo dos estudos da linguagem e, em particular, dos estudos da tradução, tais questões
revelam, segundo a hipótese com a qual trabalho, os discursos produzidos e difundidos as
impossibilidades de um discurso teórico que, de fato, supere as distinções absolutas, mas seja
emancipatório, aberto a uma nova abordagem da coincidência de duas diferenças e capaz de
manobrar a passagem do clone ao avatar sem reincidir no poder soberano de uma biopolítica
dominada pela sacralização da diferença. Ainda, pretende-se discutir até que ponto esses discursos
podem funcionar como um grito de resistência que simultaneamente retirem as vendas de nossos
olhos, obrigando-nos ao enfrentamento da crise do idêntico, e removam os protetores de nossos
ouvidos, permitindo-nos escutar a diferença e o diferente, cujo gênero, indecidível, em geral é
recolhido, institucionalmente, sob a rubrica indeterminada de uma “trans-formação”.
OS ANOS DOURADOS DA TRADUÇÃO NO BRASIL
JohnMilton – USP
EmLínguas, Poetas e BacharéisLia Wyler refere-se à década de 1930 e ao começo da década de
1940 como os “Os Anos Dourados” da tradução literária no Brasil. Foi a época do grande
crescimento de editoras como a Globo de Porto Alegre e a José Olympio de Rio de Janeiro, que
empregavam escritores de renome como Cecília Meirelles, Manuel Bandeira, Mário Quintana,
Érico Veríssimo e Carlos Drummond de Andrade enquanto tradutores. E foi a época na qual muitos
autores estrangeiros, especialmente os da língua inglesa, foram traduzidos para o português pela
primeira vez: exemplos são Ernest Hemingway, Virginia Woolf e Aldous Huxley. Foi também a
época da tradução daComédia Humanade Balzac da Editora Globo, em 17 volumes, e organizada
por Paulo Rónai, que recentemente foi reeditada. Esta apresentação analisa este período do ponto de
vista econômico, enfatizando o ponto que as barreiras comerciais do governo Vargas e a
desvalorização do mil-réis produziram condições propícias para fomentar a aumentar esse grande
crescimento no mercado de traduções no Brasil; do ponto de vista político-cultural – através da
tradução a jovem “nação” brasileira demostrava que guardava os bens culturais mundiais; e do
ponto de vista linguística – a tradução de obras importantes no Brasil mostrava a independência do
português do Brasil.
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LEITURA E TRADUÇÃO NO ENSINO DE PORTUGUÊS COMO PONTES PARA A
PERMANÊNCIA NO LETRAMENTO
Natalia Klidzio – UMCS
Com este trabalho tenho o objetivo de apresentar e compartilhar a minha experiência como
professora de português na Polônia e a opção pela tradução como atividade prática de ensino.
Pretendo levantar um questionamento do espaço ocupado ou não, pelas atividades de leitura e de
tradução na prática de ensino de português. Gostaria de dividir os resultados concretos de alguns
projetos de leitura e de tradução de obras da literatura brasileira como atividades de ensino de LP
como LE. Como sintonizar a leitura, a tradução e o aprendizado da língua? Esta é uma questão que
levanto. Queria expor sobre as atitudes e posicionamentos observados pelos estudantes durante e
pós as atividades de leitura e tradução. E mais, as pontes e redes que se criam entre países e entre as
pessoas de um país estrangeiro com o de língua portuguesa. Também queria relatar e refletir sobre
as possibilidades de interação cultural de quem estuda a língua portuguesa com o país desse idioma
e de como a leitura e a tradução promove a trans-formação linguística e cultural. Ainda, pretendia
apresentar a experiência de como o ensino da língua portuguesa pode andar paralelo à formação de
novos tradutores. Queria mostrar que, quando se ensina a língua, no caso o português, num outro
país, pode-se também abrir caminhos para a permanência no letramento, no idioma após a
conclusão do curso pelos estudantes. Esta experiência durante o aprendizado da língua pode
conduzir ao encorajamento de permanecer na literatura do país da língua estudada e adquirida,
divulgar e propagar em seu país o patrimônio linguístico e cultural acumulado, e ainda o de praticar
a tradução como meio de subsistência. Por fim, gostaria de discutir os procedimentos didáticos e
caminhos para um diálogo e um discurso comum entre os professores de LP no que diz respeito à
leitura e tradução nas práticas do ensino de português.
LÍNGUAS NA FRONTERA: UMA REFLEXÃO CRÍTICA SOBRE TRADUÇÃO E
TRÂNSITO DE TEXTOS E IDEIAS NO ATUAL CENÁRIO GLOBAL
Thaís Bueno – UNICAMP
Já é conhecido o fato de que o número de traduções que se realiza no Brasil, do português para o
inglês, supera em muito as traduções do inglês para o português realizadas na América do Norte.
Esse cenário configura um determinado trânsito cultural cujo sentido norte-sul se dá de forma
intensa e impositiva, envolvendo fatores de ordem política e social. Partindo desse cenário, meu
trabalho tem por objetivo propor uma visão de tradução segundo a qual o movimento tradutório
pode funcionar como uma ferramenta de subversão desse eixo de ideias, uma vez que ela
necessariamente está no cerne de uma série de negociações políticas e culturais no cenário global
atual. Tendo em vista o fato de que questões de classe, gênero, sexualidade, migração e mestiçagem
passam pela negociação de paradigmas e jogos de poder locais e translocais, minha hipótese é a de
que essas questões podem ser abordadas pela via da tradução de forma subversiva e politicamente
engajada. Para tanto, analiso algumas questões envolvidas na tradução (em andamento) do livro
Borderlands/La Frontera – The New Mestiza, escrito pela chicana Gloria Anzaldúa. Entendendo
que o contexto da cultura chicana (localizada na fronteira entre México e Estados Unidos), no qual
o livro em questão foi escrito, constitui um campo fértil para se pensar mestiçagem e hibridação, a
experiência empírica de tradução do texto de Anzaldúa, por sua vez, é uma fonte inesgotável de
cruzamentos e pontos de tensão a partir dos quais é possível pensar não apenas as questões culturais
acima mencionadas, mas também o status da língua portuguesa frente aos outros idiomas
envolvidos no ato tradutório e a efetividade da tradução como subversão do eixo norte-sul de
trânsito de significados e ideias. O aporte teórico a partir do qual realizo as análises para este
trabalho parte de textos e ideias de autores de correntes pós-estruturalistas e pós-colonialistas
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(sobretudo aqueles que estabelecem cruzamentos entre os estudos da tradução, a filosofia, os
estudos feministas e a antropologia), entre eles Jacques Derrida, Gayatri Spivak e Judith Butler.
A LÍNGUA PORTUGUESA E A TRADUÇÃO EM SINTONIA COM O QUE (SE) PASSA
EM SILÊNCIO ENTRE LÍNGUAS
Viviane Veras – UNICAMP
Diante do estranhamento provocado por um texto traduzido, invade-nos a sensação de estar diante
de uma cópia mal feita, de uma reprodução infiel. Uma boa tradução é aquela que não parece
tradução. Eis um lugar comum que a despeito de toda a querela da (in)visibilidade do tradutor
continua difícil de contestar. Entre a tradução orientada para o texto de partida e aquela com vistas
ao texto de chegada, o tradutor pode tanto forçar as convenções de sua língua (às vezes até o ponto
de se tornar ilegível) como calar em suas letras a voz do texto que traduz. Parece-nos, enfim, que a
presença do outro, para ser bem tolerada, não pode deixar ouvir sua voz sob o texto traduzido. Este
trabalho tem como objetivo refletir sobre o que resiste à tradução e ao tradutor, especialmente nos
casos em que essas línguas estrangeiras, línguas do outro, não se oferecem como meios de
transmissão de uma experiência prévia (que elas teriam traduzido nesse texto estranhamento dito
“original‟), mas se oferecem elas mesmas, em suas materialidades, como experiências a traduzir.
Se, como diz Walter Benjamin em A tarefa do tradutor (1923-2010), “toda tradução é apenas uma
forma de algum modo provisória de lidar com a estranheza das línguas”, levantamos a hipótese de
que essas formas provisórias em língua(s) portuguesa(s) sejam ditadas por aquilo que em cada
língua permanece intraduzível. Entendemos essas formas provisórias em tradução como recriações
singulares não mais estrangeiras, mas também não maternas, no sentido em que dizemos: “o
português é minha língua materna”. Pensamos a experiência dessa escrita autoral como uma
aventura não “precisa‟, errante, que nos conduz em nossa língua de tradução; língua que
conhecemos, mas que precisamos, a cada tradução, aprender a falar de novo, a escrever, a
experimentar (muitas vezes com surpresa) sua sintaxe, sua morfologia, suas sonoridades, seus
silêncios. Se “todas as línguas são mistérios”, como diz Fernando Pessoa, trata-se de uma
experiência de sintonia entre línguas, considerando seus equívocos e lacunas que, com frequência,
apenas as traduções tornam audíveis.
TERMINOLOGIA, MONSTRUAÇÃO E TEXTO LITERÁRIO: UM IMBRICADO NÓ DE
TRADUÇÃO NO TEXTO HUGOANO
Dennys da Silva Reis – UnB
O estudo da terminologia é complexo porque este termo/área pode ter não somente uma, mas várias
definições no que concerne a seus fundamentos, seus enfoques, aplicações práticas, como disciplina
ou mesmo como prática e/ou produto dessa prática. Todavia, não podemos nos esquecer que os
tradutores, muitas vezes, se deparam com termos específicos em seus textos que devem ser
traduzidos e compreendidos pelo público alvo. Ou seja, os tradutores se servem da terminologia.
Até mesmo os tradutores de textos ditos literários utilizam a terminologia, visto que há textos
literários que em meio à narrativa trazem uma gama de informações especializadas das mais
diversas áreas técnico-científicas. O presente trabalho visa discutir a relação entre terminologia e
texto literário em Notre-Dame de Paris de Hugo, determinar algumas áreas especializadas que
acompanham a escritura hugoana nessa obra e mostrar como a terminologia, por vezes, acaba se
tornando um “monstro” para o tradutor de texto literário. Para alcançarmos tal objetivo,
primeiramente fazemos uma pequena explanação sobre a hibridação no texto literário de Victor
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Hugo, mostrando que seu texto é híbrido porque apresenta misturas de línguas seja no nível dos
diferentes idiomas (neologismos, justaposições, aglutinações, derivações e hibridismos), seja no
nível de registro da própria língua francesa (formal, informal, familiar), ou de léxicos
(especializados ou não). Em seguida, foi empreendida a tradução do capítulo um do décimo livro de
Notre-Dame de Paris intitulado “Gringoire a plusieurs bonnes idées de suite rue des Bernardins” e
após isso, foram estabelecidos neste mesmo capítulo termos especializados, definições, fraseologias
e suas devidas áreas. E em um terceiro momento, se utilizando da Teoria “Monstruosa” ou
Frankensteiniana da Tradução – exercida por Augusto de Campos e explicitada nos trabalhos de
Célia Magalhães – tenta-se estabelecer a terminologia específica no texto literário como um
processo de monstruação produzido pelo tradutor, um imbricado e monstruoso nó tradutório. O
estudo da terminologia específica em texto literário tem, a princípio, duas finalidades: primeiro, a
validação de certas terminologias utilizadas no texto literário e, depois, a homogeneização do
mesmo, principalmente quando este é um texto extenso como Notre-Dame de Paris. Além disso,
possivelmente, muito contribuirá para uma nova formulação ou definição do que vem a ser o
discurso e o texto literário.
COMO SE CHAMA O MICKEY NA SUA LÍNGUA? – A TRADUÇÃODOS NOMES
PROPRIOS DE PERSONAGENS FICCIONAIS
Caio César Christiano – UBP
Uma questão ainda muito pouco debatida no universo da tradução consiste na adaptação ou não dos
nomes próprios na obra literária de ficção. Enquanto parece haver um certo consenso quanto à
manutenção dos nomes originais para a literatura dita « adulta », a literatura ficcional infantil e
infanto-juvenil é terreno para algumas disputas em torno do tema, com alguns ferrenhos defensores
da preservação dos nomes originais e outros adeptos à aproximação com o público-alvo através do
aportuguesamento dos nomes próprios. Neste trabalho, concentrando-nos sobretudo no estudo de
caso dos personagens do universo das histórias em quadrinhos (banda desenhada, em Portugal), da
literatura infanto-juvenil e da animação, partimos de uma visão histórica da tradução dos nomes de
personagens ficcionais em língua portuguesa e analisamos as tendências que imperaram em
diferentes períodos do século XX e neste início de século XXI. Argumentamos que a tradição da
tradução em língua portuguesa não oferece, por si só, subsídios suficientes que possam validar ou
refutar a tradução dos nomes próprios de personagens ficcionais e comparamos algumas soluções
encontradas no Brasil e em Portugal para os nomes de séries que se tornaram populares. Tocamos
ainda as possíveis razões linguísticas que poderiam levar à tradução de um nome e os motivos
extra-linguísticos, notadamente os mercadológicos, que conduzem à manutenção de um elemento
alheio à língua portuguesa em uma obra vertida para esta língua. Apresentamos alguns casos
particulares de personagens que tiveram mais de um nome em língua portuguesa ao longo de sua
história e discutimos as razões que levaram os tradutores a descartarem o nome inicial. Estudamos
também a relação entre a língua fonte e a adaptação do nome original em língua portuguesa e
constatamos uma evolução em curso no sentido da manutenção dos nomes de origem anglo-saxã.
Por fim, apresentamos o embrião de um dicionário de personagens fictícios que tem por objetivo
auxiliar o trabalho de todos os que traduzem do e para o português.
TRADUÇÃO AUDIOVISUAL E ADEQUAÇÃO SOCIOLINGUÍSTICA: AS VERSÕES
ITALIANAS DE FDP E DE MANDRAKE
Gian Luigi de Rosa – UNISALENTO
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A comunicação pretende analisar uma série de questões ligadas à tradução audiovisual de textos
mistilíngues, que são caraterizados pela presença de diferentes (variedades de) línguas e de traços
sociolinguisticamente marcados. A reflexão será limitada, por questões de espaço e tempo, a dois
seriados televisivos brasileiros: Mandrake (2005-2007) e FDP (2012), o primeiro transmitido pelo
canal SKY, em 2009, e o segundo legendado em novembro de 2012 pelos alunos de Língua
Portuguesa da Universidade do Salento (Itália), dentro de um projeto organizado pelo Grupo
Departamental de Tradução Audiovisual.
O SUJEITO/TRADUTOR CONSTRUINDO(-SE) NO ARQUIVO, PERDENDO(-SE) NA
MEMÓRIA
Kátia de Abreu Chulata – UNISALENTO
Parte de um projeto de pesquisa sobre o sujeito-tradutor, a presente comunicação apresenta alguns
resultados da análise de entrevistas realizadas a dez tradutores e tradutoras brasileiras atuantes no
cenário nacional. Partindo dos conceitos de arquivo e memória, postulados por Foucault ( 1969 ), ao
longo da leitura-análise dos dizeres dos tradutores entrevistados, identificar-se-ão alguns aspectos
do “discurso” desses tradutores que dizem respeito principalmente à inscrição do tradutor na sua
história pessoal e na história daquilo que, por convenção, chamamos teorias da tradução.
Interessante observar que a postura dos tradutores em relação aos próprios “métodos” e ao trabalhoprocesso da tradução, pode ser identificada quer nos momentos em que é (deliberadamente?)
explicitada quer quando é (deliberadamente?) camuflada.
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SIMPÓSIO 40
DIVERSIDADE DIALETAL, MULTILINGUISMO E CONTATO DE
LÍNGUAS: IMPLICAÇÕES PARA A AQUISIÇÃO DE PORTUGUÊS
(COMO L1, L2, L3) NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS FORMAIS
A pesquisa sobre o português brasileiro (PB) tem alcançado resultados significativos, e seu impacto para
os estudos linguísticos vem contribuir para o surgimento e afirmação das diferentes subáreas que
constituem o cenário da pesquisa em Linguística na atualidade. É assim que vimos florescer, nas últimas
décadas, o interesse pelo estudo das propriedades que caracterizam os diferentes falares e dialetos do
português do Brasil, em quadros teóricos de base formal e funcionalista. Na análise dos fenômenos, os
estudos investigam os fatores que determinam a variação e a mudança linguística, diante das
especificidades que envolvem a formação do português brasileiro, considerado na perspectiva da
diversidade dialetal, por um lado, e na perspectiva do contraste translinguístico, por outro. No campo
dos estudos formais, sobressai-se a contribuição pioneira de Roberts & Kato (1993), a que se seguiram
vários estudos, com abordagens que integram dados empíricos colhidos em corpora de base histórica, de
situações de fala espontânea e de base experimental, com a aplicação de modelos formais de análise.
Neste Simpósio, propomos reunir estudos voltados para a investigação do desenvolvimento linguístico
tendo em vista o interesse teórico em relação a problemas colocados pelo contato de dialetos em
situação de estratificação social, pelo processo de escolarização, e pela situação de acesso tardio ao input
linguístico. O estudo formal de tais questões tem como referência o pressuposto, formulado
originalmente por Noam Chomsky, de que a aquisição de língua é determinada pelo aparato da
gramática universal (GU), um estado mental inato, que, no contato com o input linguístico, propicia o
desenvolvimento de sucessivos estados mentais até que a gramática madura de uma língua particular
seja alcançada (supostamente um estado mental estável). Dessa abordagem, extraem-se questões
relevantes para o entendimento das propriedades do conhecimento gramatical, bem como para a
formulação de hipóteses em relação às condições que propiciam a variação e a mudança linguística. Em
particular, assume-se que condições diversificadas de acesso ao input linguístico determinam o
surgimento de propriedades inovadoras, as quais se manifestam de forma sistemática nas línguas
quando consideradas em seu desenvolvimento histórico (cf. CHOMSKY 1986, 2001; LIGHTFOOT
1991, 1999; KATO 1997; ROBERTS &ROUSSOU 2003; ROBERTS 2007, entre muitos outros). As
implicações entre a natureza das propriedades dos sistemas gramaticais e sua manifestação variável nas
diferentes línguas, por um lado, e o modo de aquisição, por outro, são, portanto, fundadoras na
constituição dos modelos de análise, cabendo à pesquisa linguística testar as hipóteses nos termos
propostos. Como se depreende dos estudos prévios (cf. PIRES &ROTHMAN 2009, e referências ali
citadas), existem resultados significativos para o entendimento das propriedades do português brasileiro
e de questões relativas à aquisição de língua em condições diversificadas (L1, L2, L3), com implicações
para a caracterização da gramática universal, e para as tomadas de decisão relativas ao ensino de língua.
COORDENAÇÃO
Heloisa Maria Moreira Lima Salles
Universidade de Brasília
[email protected]
Marina Rosa Ana Augusto
Universidade Estadual do Rio de Janeiro
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[email protected]
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ALÇAMENTO DE SUJEITO A SUJEITO EM PORTUGUÊS COMO L3: MAIS
EVIDÊNCIASPARA TRANSFERÊNCIA PSICOTIPOLÓGICA
Jennifer Cabrelli Amaro – UF
Jason Rothman – UF
O presente estudo testa três modelos gerativistas de transferência morfossintática no início da
aquisição duma terceira língua (L3), examinando a configuração característica de T encaixado nos
estágios iniciais do português brasileiro (PB) como L3. A metodologia combina espanhol e inglês
como primeira língua (L1) e segunda língua (L2) para identificar a origem da transferência.
Pretendemos determinar se a língua tipologicamente mais semelhante é sempre transferida (neste
caso espanhol), se a língua menos semelhante com a L3 (neste caso, inglês) é selecionada para
transferência, ou se a ordem da aquisição determina estritamente a transferência multilingue.
Grupo L3
A
B
L1
inglês
espanhol
L2
espanhol
inglês
L3
PB
PB
O L2 Status Factor (L2SF, Bardel & Falk 2007, Falk & Bardel 2011) alega que a L2 bloqueia
transferência da L1, predizendo diferentes padrões de transferência nos grupos A e B. A
Cumulative-Enhancement Model (CEM, Flynn et al. 2004) alega que a transferência só pode ser
facilitadora, o que, como veremos, fará predizer que nenhum grupo terá transferência do espanhol.
Inversamente, o Typological Proximity Model (TPM, Rothman 2010, 2011; Rothman & Cabrelli
Amaro 2010) alega que a semelhança tipológica entre as línguas determina a transferência inicial na
L3, predizendo a transferência do espanhol para ambos os grupos A e B.
Em espanhol, o clítico dativo do verbo de alçamento parecer não pode co-ocorrer com o alçamento
de sujeito a sujeito (ASS) como em *Pedro me parece saber todo (TORREGO, 1996).
Inversamente, como em inglês, o ASS sobre um experimentador é totalmente aceitável em PB,
como nos exemplos: O Pedro me parece saber tudo/Pedro appears to me to know everything.
Seguindo Ausín & Depiante (2000), o contraste é explicado por diferentes características de T
encaixado: em inglês (e por extensão em PB), T encaixado é defeituoso (Tdef), especificado como
[-finito, -tempo], e não atribui caso. Entretanto, T encaixado em espanhol não é defeituoso, e atribui
caso a Pedro. O movimento de Pedro sobre o experimentador me então constitui uma violação da
Minimalidade Relativizada somente em espanhol. Se o L2SF está correto, somente o grupo B
deveria ter conhecimento precoce que ASS sobre um experimentador é gramaticalmente correto em
PB, visto que nesse grupo o inglês é a L2. Se o CEM estiver no caminho certo, os grupos A e B
podem transferir os valores facilitadores do inglês do T encaixado. Porém, o TPM prediz que ambos
os grupos A e B vão ter performances igualmente más, visto que o espanhol, a língua
tipologicamente semelhante mas neste caso não facilitadora, deveria transferir independentemente
da ordem da aquisição.
Um teste de julgamento de aceitabilidade utilizando uma escala do tipo Likert de 5 pontos foi
administrado nas três línguas a dois grupos de aprendizes de português brasileiro como L3 (20
sujeitos por grupo) que mostrou (como critério de inclusão no estudo) sucesso na aquisição das
propriedades da L1 e da L2; a L3 foi sempre testada primeiro. O experimento testou a aceitação de
sentenças com o verbo de alçamento parecer/to appear (utilizado como verbo lexical e modal, no
presente e pretérito com complementos adjetivais (condição APX) e de TP (condições VPN, VPX).
Os resultados (Figuras 1 e 2) mostram inequívoca transferência do espanhol para ambos os grupos,
sustentando somente o TPM.
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Figura 1: Resultados do teste nas três línguas para o Grupo A. Diferenças insignificantes para
ascondições VPN e APX; para a condição VPX, PB é tratado como espanhol.
Figura 2: Resultados do teste para Grupo B. Novamente, diferenças insignificantes para as
condições VPN/APX; PB tratado como espanhol.
OS EFEITOS DE UMA TERCEIRA LÍNGUA NA ESTABILIDADE FONOLÓGICA DE
UMA L1 VERSUS UMA L2
Jennifer Cabrelli Amaro – UF
Jason Rothman – UF
Considerando existentes pesquisas na aquisição da fonologia de uma segunda língua (L2), não fica
claro que diferenças fonológicas entre pessoas que adquiriram o idioma cedo ou tarde devam ser
uma consequência de um amadurecimento em os mecanismos implícitos. Portanto, para testar o
quão nativo são os sistemas adquiridos por adultos, nós examinamos a extensão de que sistemas
adquiridos cedo ou tarde são igualmente flexíveis à influência de uma terceira língua (L3).
Considerando a falta de consenso no campo, esta nova abordagem pode ser fundamental para
determinar possíveis diferenças na constituição mental entre esses tipos de sistemas fonológicos.
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Nós testamos a Phonological Permeability Hypothesis (Hipótese da Permeabilidade Fonológica,
PPH) (CABRELLI AMARO & ROTHMAN 2010), que sustenta que o sistema fonológico
adquirido na fase adulta, mesmo quando o mesmo evidencia os rankings de restrições do sistema de
um falante nativo (assumindo a estrutura da Teoria da Otimidade, Prince & Smolensky 1993
[2004]), é diferente de um sistema adquirido na infância com relação à estabilidade. Para testar esta
hipótese, nós examinamos a aquisição do Português Brasileiro (PB) como L3 e seus efeitos no
sistema fonológico espanhol de três tipos de aprendizes: dois grupos de bilíngues sucessivos (L1
inglês/L2 espanhol n=26); L1 espanhol/L2 inglês n=11), e bilíngues simultâneos de inglês/espanhol
(n=16). Tendo como manter as línguas constantes pelos grupos experimentais, idade e contexto de
aquisição são os variáveis determinantes. Um estudo transversal testando a percepção e produção de
espanhol e PB por aprendizes intermediários e avançados do PB foi implementado para observar a
influência do PB no espanhol durante o desenvolvimento do PB. Para testar a PPH, nós
investigamos a alternância entre segmentos [-contínuo] e [+contínuo] em espanhol, que
crucialmente não existe em PB e inglês. Em espanhol as oclusivas [b d g] surgem depois de uma
pausa ou uma oclusiva nasal, enquanto [β d dz] surgem em posição pósvocálica (1). Piñeros (2002)
postula que esta alternância é devida a uma interação entre a restrição LAZY (Kirchner 1998), uma
família de restrições que proíbe esforços articulatórios, e a restrição de fidelidade
IDENT(continuant), a qual proíbe segmentos no output que sejam distintos do input com respeito
ao traço [contínuo]. LAZY(100) especificamente proíbe a sequência de vogal + oclusiva, e domina
IDENT(CONT), permitindo obstruintes [+contínuo] a surgirem pós-vocalicamente (2). Em PB,
restrições de fidelidade superam LAZY(100), de forma que oclusivas surgem independentemente
do contexto (3). Como aprendizes de L3 convergem no ranking de PB por demissão da restrição
LAZY(100), nós hipotetizamos que o sistema do PB pode afetar o ranking do espanhol. Ambos a
aquisição e o atrito podem ser modelados pelo Gradual Learning Algorithm (BOERSMA &
HAYES 2001), que gradualmente altera rankings quando o input conflita com o ranking atual.
Dado que a mudança de ranking é gradual, as restrições se sobrepõem em diferentes pontos e
permitem outputs variados dependendo do grau de sobreposição. Então, a influência do PB pode
surgir de uma sobreposição entre LAZY(100) e IDENT(CONTINUANT) no sistema espanhol.
Análise acústica de relação de intensidade entre grupos de segmentos CV mediu o grau de
constrição na produção de dados por tarefas de repetição atrasada e concatenação. Uma tarefa de
preferência foi também utilizada para medir percepção. Os dados indicam variados outputs e assim
sobreposição de restrições no grupo adulto de L2 espanhol, inclusive entre alunos intermediários de
PB como L3. Entretanto, diferentemente do grupo de adultos L2 espanhol, os nativos falantes de
espanhol produzem e preferem obstruintes pós-vocálicas [+contínuo], independentemente da
proficiência em PB. Juntando os resultados, essa evidência de estabilidade diferenciada apoia a
PPH.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O VALOR ASPETUAL ITERATIVO NO
PORTUGUÊS EUROPEU E EM POLACO.
Jennifer Cabrelli Amaro – University of Florida
Jason Rothman – University of Florida
Propomo-nos, no presente estudo, comparar os processos de expressão da iteratividade no
Português Europeu e em Polaco. Partimos do princípio de que a iteratividade é um dos valores
específicos da categoria linguística Aspeto. Esse valor é uma das variantes do valor aspetual
durativo. Se compararmos os meios linguísticos disponíveis nas duas línguas em questão,
verificamos que, enquanto o Polaco exprime obrigatoriamente o valor aspetual iterativo pelos
recursos linguísticos circunscritos à morfologia derivacional, o Português utiliza meios linguísticos
438
439
diversificados para atingir o mesmo alvo; trata-se de meios morfológicos, morfossintáticos, lexicais,
construções sintáticas complexas e meios textuais. Assim, os estudiosos não-nativos costumam
encontrar grandes dificuldades na expressão do mesmo valor aspetual em Português que possui a
riqueza de recursos linguísticos para exprimir a iteratividade inerente à forma verbal polaca,
marcada morfologicamente. Com a análise efetuada procura demonstrar-se que o valor aspetual
iterativo encontra, nas línguas em questão, os seus processos de expressão e que estes não
costumam coincidir.
ESTUDO DOS QUANTIFICADORES ‘TUDO’ E ‘TODO’ NA INTERLÍNGUA DE
SURDOS
Ramon Corrêa Mota - PPGL/UnB
Rozana Reigota Naves - UnB
O estudo investiga o processo de aquisição de português (L2), na modalidade escrita, por aprendizes
surdos, que têm a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), como língua nativa (L1). Em especial,
será observado o processo de aquisição do quantificador universal ‘tudo’ e ‘todo’, extraídos de
dados de interlíngua. Percebe-se que, em LIBRAS, existem diferentes sinais para realizar o
quantificador universal, os quais não apresentam flexão para número e gênero, e não são
intercambiáveis nos contextos em que ocorrem. Além disso, existem contextos em que ocorre
incorporado a nomes específicos, formando um único sinal, como em TODO-DIA. No português
brasileiro, o quantificador universal pode ser pronome substantivo (tudo) ou pronome adjetivo
(todo/a/s). Como pronome adjetivo apresenta flexão para número e gênero, concordando com o NP
(sintagma nominal) a ele associado, ocorrendo em posição anteposta ou posposta em relação ao NP.
De acordo com Vicente (2006), é possível ocorrer um movimento interno do quantificador em
âmbito do DP: ‘(Todos) os alunos’ e ‘Os alunos (todos)’. Em contextos menos formais, é possível
que o quantificador ‘tudo’ ocorra após o NP, correspondendo a ‘todos’, porém, se esse
quantificador surgir antes do NP, a sentença é agramatical: (*Tudo) os menino (tudo). Lacerda
(2012) propõe uma estrutura de Top e Foc, adaptada de Rizzi (1997), para o nível do QP (estrutura
funcional para alojar o quantificador), em que é possível explicar o motivo de Tudo+DP não ser
autorizada na estrutura. Nos dados de interlíngua, os aprendizes surdos, na maioria dos casos, optam
pelo uso do ‘tudo’, tendo como base o conhecimento da L1: “A pantera dedo ficou azul tudo”,
“ficou sujo de ovos tudo”. Ainda há casos em que acionam a flexão do quantificador, divergente, da
língua alvo: “O Pantera tem dedo azul todos”, embora haja casos em que a flexão converge: “O
homem pinta porta toda”. Desse modo, a hipótese adotada é a de que o conhecimento gramatical da
L1 interfere no processo de aquisição de L2. Além disso, é possível demonstrar que a convergência
em relação à língua alvo na escolha e colocação do pronome e em relação à flexão ocorre à medida
que o surdo tem acesso ao input linguístico do português, com a escolarização.
Nessa ótica, o acesso à Gramática Universal (GU) acontece de modo parcial, conforme atestam
estudos de Ellis 1997, White 2003, e muitos outros.
A VARIAÇÃO DAS PLOSIVAS BILABIAIS NO PB: CARACTERÍSTICAS FONÉTICOFONOLÓGICAS DO CONTATO COM A LÍNGUA ALEMÃ NA REDE SOCIAL
Claudia Camila Lara – UFRGS
O fenômeno linguístico em questão é a variação da consoante vozeada que sofre desvozeamento
(baile~paile) e a desvozeada que pode sofrer vozeamento (pudim~budim). Neste trabalho, objetivase analisar a realização variável das plosivas bilabiais (/p, b/) da fala em português brasileiro (PB)
de habitantes da zona rural do município de Estrela, no Rio Grande do Sul, nas redes sociais
439
440
pessoais. Os informantes desse trabalho estão em contato com a língua de imigração alemã,
Hunsrückisch-PB. Altenhofen (1996) apresentou o inventário fonêmico do Hunsrückisch. Os
fonemas do Hunsrückisch com o diacrítico apresentam o processo de desvozeamento do AP e
também do PB, podendo ser completo ou não. Muitos dos traços linguísticos foram superados e
vem sendo, atualmente, superados na aprendizagem do PB. Porém, percebem-se, ainda, alguns
traços na fala, em PB, de falantes em contato como o a colonização alemã. Um desses traços, objeto
de estudo dessa pesquisa, é a variação na fala em língua portuguesa, da plosiva bilabial desvozeada
/p/ em lugar da vozeada /b/ e vice-versa. Para a realização deste estudo será analisada a fala de vinte
e quatro informantes pertencentes a uma pesquisa de mestrado em andamento. A partir das
entrevistas sociolinguísticas em que foi realizada a gravação espontânea de fala com o entrevistador
levantaram-se os dados e foram submetidos ao pacote computacional VARBRUL, versão GoldVarb
X, para verificar os fatores linguísticos e extralinguísticos que condicionam a realização das
plosivas. Qualitativamente, verificaram-se os graus de interação entre os informantes, sendo os
graus adaptados da escala de 1 – 4 (-) de Blake & Josey (2003). Os informantes interagem em
comunidades de prática, segundo Eckert (2000), e estabelecem redes sociais pessoais, conforme
Milroy (1987, 2007). Como resultado parcial deste estudo, ressalta-se que é baixa a frequência da
troca das plosivas bilabiais (/p, b/). Ocorre com os informantes mais velhos que permanecem na
comunidade. Os jovens deslocam-se para trabalhar em centros urbanos, onde a frequência da
aplicação da regra é ainda mais baixa.
ADJETIVOS EM –VEL E NOMINALIZAÇÕES EM –ÇÃO: EFEITOS PRAGMÁTICOS
EM INTERAÇÃO COM ASPECTOS FORMAIS
Bruna Elisa da Costa Moreira – PPGL/UnB
Déborah Christina de Mendonça Oliveira – PPGL/UnB
Heloisa Maria Moreira Lima Salles – UnB
O presente trabalho, desenvolvido na perspectiva dos estudos formais, tem como objetivo discutir
as propriedades morfossintáticas do sufixo –vel, formador de adjetivos, e do sufixo –ção, formador
de nominalizações, buscando-se estabelecer relação com efeitos pragmáticos relacionados ao uso de
algumas formas encontradas no léxico do português do Brasil (PB). Em particular, examinamos a
ocorrência de formas como ‘beijação’, ‘começão’, ‘presidenciável’, ‘imexível’, entre outras, que
têm manifestação recente, sendo vinculadas a situações discursivas informais e/ou a certas
condições sociohistóricas e culturais, estando seu uso associado a certos efeitos pragmáticos. Nossa
hipótese é a de que a escolha desses sufixos justifica-se pela sua alta produtividade na língua (cf.
Basílio, 1996). Buscamos examinar, neste trabalho, o lugar dos aspectos relacionados às condições
discursivas e sociohistóricas que atribuem a tais formações uma significação ‘marcada’, supondo
que tais ocorrências estejam relacionadas à escolha de processos de formação altamente produtivos.
No PB, o sufixo –vel forma adjetivos, como: ‘lavável’, ‘quebrável’ e ‘amável’, que apresentam
propriedades passivas e modais (Salles & Melo, 2005). Esse sufixo, em geral, é acrescido a bases
verbais. No entanto, há casos de formações com bases nominais, como: ‘carroçável’. Nesse grupo,
pode ser incluído ‘presidenciável’, ‘prefeitável’, ‘ministeriável’, com o significado de ‘X conferir a
Y a função de presidente/ prefeito’ ou ‘X conferir a Y um ministério’, respectivamente. Em todos
os casos, o verbo correspondente (‘presidenciar’, ‘prefeitar’, ‘ministeriar’) não é atestado no léxico,
o que vem confirmar que a regra não precisa ser aplicada a partir do verbo. Igualmente interessante
é o caso das formações com o sufixo –ção como ‘começão’, ‘falação’ e ‘beijação’, o qual, além de
descrever o evento, manifesta um significado iterativo. Cabe notar que seu uso está associado a
contextos informais, recebendo geralmente uma avaliação pejorativa. Tais nominalizações se
distinguem, portanto, de ‘construção’ e ‘elaboração’, em que não se identificam tais propriedades.
A discussão quanto à natureza da regra que gera o adjetivo tem um significado teórico importante,
com implicações para o lugar da morfologia na gramática. A esse aspecto se acrescenta o fato de
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que, nos exemplos citados, existe algum tipo de ‘violação’ à regra de formação. No caso de formas
como ‘presidenciável’, a ausência do verbo correspondente poderia ser o elemento que contribui
para ‘forçar’ uma leitura marcada, com implicações para efeitos pragmáticos associados ao seu uso
– no caso dessas formas, sabe-se que surgiram quando da redemocratização do Brasil, e estão em
consonância com a vitalidade das campanhas eleitorais no país, desde então, e com a atividade
política. No caso de ‘imexível’, tem-se a aplicação do sufixo –vel a uma base verbal que seleciona
um locativo (‘mexer em algo/alguém’), o que distingue tal caso da regra geral, em que o verbo é
transitivo (lavar o carro/ o carro é lavável). Tal situação pode ser comparada a ‘gostável’ e ‘ficável’,
em que o verbo correspondente seleciona um complemento preposicionado (‘gostar de
algo/alguém’; ‘ficar com Y’), este último descrevendo relacionamentos fortuitos, geralmente entre
jovens casais. No caso das nominalizações em –ção, com leitura iterativa, como ‘começão’,
‘beijação’, a relação com o verbo pode ser observada por meio da estrutura argumental e por meio
da leitura de evento possível para esses nomes (X comer Y/muito; X beijar Y/muito → A começão
(=prolongada/intensa/repetida) de Y por X; A beijação (=prolongada/intensa/repetida) em Y por X).
A partir da discussão das propriedades aspectuais dessas formações, pretende-se abordar questões
relativas às categorias das formas derivantes e das formas derivadas, no que se refere às restrições
de escolha da base pelo sufixo e à noção de produtividade (Aronoff, 1976; Di Sciullo & Williams,
1987), na interação com os efeitos pragmáticos associados ao seu uso.
A ESCRITA NA EDUCAÇÃO FORMAL COMO AQUISIÇÃO DE SEGUNDA LÍNGUA
(L2)
Lilian Coelho Pires – UnB
O estudo pretende investigar a aquisição da escrita do português brasileiro (PB) na educação
formal, assumindo-se a hipótese de que se constitui como aquisição de segunda língua (doravante
AL2). Para tanto, fundamenta-se na teoria de Princípios e Parâmetros e no Programa Minimalista
(CHOMSKY, 1995), buscando-se examinar o desenvolvimento do conhecimento linguístico e
caracterizar a gramática do indivíduo letrado. Parte-se da ideia de Kato (2006), que propõe tratar-se
de uma “segunda gramática nuclear”, caracterizada antes por propriedades periféricas, que passam a
ter estatuto de propriedades nucleares (cf. SILVA-CORVALÁN, 1993 sobre a “permeabilidade das
gramáticas”; ROEPER, 1999 sobre a “G2 na periferia marcada”). Focamos nossa análise na
aquisição das propriedades morfossintáticas das funções gramaticais, em particular a função de
objeto direto. Assim, identificamos diferenças paramétricas relacionadas ao PB (oral) e ao PB
escrito-padrão, para verificarmos, na produção escrita de estudantes, se há transferência de
parâmetros do português oral (L1), segundo a Hipótese do Acesso Parcial (STROZER, 1992).
Estudos apontam a perda do clítico acusativo de 3ªp. no PB oral e o aumento na ocorrência de
objeto nulo e de pronomes fortes (CYRINO, 1990, 1997; KATO, CYRINO, CORREA 1994;
GALVES, 2001). Além disso, no PB, a posição do clítico é inovadora (PAGOTO, 1993; KATO,
2005), caracterizando-se na oralidade a preferência pela próclise; em contrapartida, a norma da
escrita-padrão determina que a posição “lógica, normal” do clítico objeto direto é a ênclise
(CUNHA e CINTRA, 2008), e a próclise ocorre em casos específicos. Acredita-se que, no estágio
inicial, os valores paramétricos do PB oral interferirão e, sendo a escola o ambiente formal para as
práticas de letramento, espera-se que, com o decorrer da escolarização, o indivíduo seja exposto ao
input necessário para a aquisição da sintaxe dos clíticos. Adotando-se perspectiva transversal,
examinam-se estruturas sintáticas, produzidas em situação experimental, por estudantes do Ensino
Fundamental (7º. ano) e do Ensino Médio (3º. ano). Os dados consistem de sentenças, obtidas
conforme a técnica experimental denominada produção eliciada (THORNTON, 1998), com lacunas
cujo preenchimento implicaria a escolha entre pronomes nulos, pronomes fortes, pronomes clíticos
(em próclise e ênclise). Os resultados da análise apontam semelhanças entre a aquisição da escritapadrão do PB e aquisição de L2, identificando-se opcionalidade, uma característica associada à
441
442
indeterminação lexical no mapeamento dos traços formais (WHITE 2003). Entre os objetivos da
pesquisa, consta o interesse em contribuir para o desenvolvimento de tecnologias educacionais e
políticas públicas para o ensino português na Educação Básica.
A NEUTRALIZAÇÃO DAS VOGAIS MÉDIAS /E/ E /O/ POSTÔNICAS FINAIS NO
DIALETO PORTUGUÊS URUGUAIO NA CIDADE DE TRANQUERAS: UM CONTATO
ENTRE SISTEMAS
Alexander Severo Córdoba – PPGL/UCPEL
A realidade do contato linguístico na região norte do Uruguai acontece, de fato, pela influência do
Espanhol numa base bem estabelecida do Português. Fatos históricos mostram a prevalência do
português nessa região, por isso, detecta-se, no espanhol uruguaio (EU) o emprego de elementos
portugueses (LIPSKI, 2012). Salienta-se que o denominado Português do Uruguai, doravante PU, é
o Português falado, como L1, no interior dos departamentos da região norte do Uruguai. Segundo
Behares (2011), o 80% das crianças nascidas em Minas de Corrales (interior do Departamento de
Rivera) têm, como L1, o PU. Dentro dessa perspectiva, o fenômeno do contato linguístico nas
fronteiras entre cidades brasileiras e uruguaias tem sido foco de diferentes estudos relacionados ao
PU, especialmente em Rivera, ao norte do Uruguai, onde foram detectadas diversas denominações
referentes a essa variante: fronterizos, DPUs (Dialetos Portugueses no Uruguai), brasilero, entre
outras (RONA, 1965; ELIZIANCÍN; BEHARES; BARRIOS, 1987). Tais manifestações da língua
configuram-se como variedades do português, segundo Carvalho (2007; 2010), tendo sido objeto de
análises em diversos níveis linguísticos, como por exemplo, nos níveis fonético-fonológico; sendo
este o foco de análise no referido estudo. Afastando-se de Rivera (URU), que é cidade gêmea de
Santana do Livramento (BRA), a presente pesquisa centra-se no PU falado na cidade de Tranqueras,
a fim de descrever o comportamento das vogais médias, precisamente, a neutralização das vogais
medias /e/ e /o/ na posição postônica átona final. A partir de questionamento relativo à existência ou
não de influência das fonologias do Português do Brasil (PB) e do Espanhol do Uruguai (EU) sobre
o PU falado nessa localidade. Considerando-se, quanto à posição postônica átona final, ocorre o
fechamento variável /e/ para [i], como ocorre também com /o/, que passa para [u]. Tem-se então,
nessa posição um sistema de três vogais (CAMÂRA JR., 2004 [1970]). Hensey (1972) aponta que o
sistema fonológico vocálico do espanhol é parecido com o do português, por isso, é necessário
abordar o sistema vocálico de ambas as línguas para serem apresentadas as semelhanças e
diferenças. Além disso, serem detectadas as interferências entre os referidos sistemas vocálicos no
processo de aquisição de uma e de outra língua. Os dados foram codificados de acordo com as
variáveis controladas neste trabalho e posteriormente, os dados serão submetidos ao aplicativo
(GOLDVARB 2001). Os dados para análise quantitativo são tratados como instâncias individuais
de uma variável linguística de acordo com a Teoria da Variação laboviana (AMARAL; BORGES,
2009).
CONCORDÂNCIA SUJEITO-VERBO OU TÓPICO-VERBO: NOVAS
CARACTERÍSTICAS DO PB E IMPLICAÇÕES PARA L2
Marina R.A. Augusto – UERJ
Erica dos Santos Rodrigues – PUC-Rio
Igor da Oliveira Costa – PUC-Rio
Amanda Tobio Grille Viegas – UERJ
A possível mudança paramétrica pela qual vem passando o Português Brasileiro (doravante, PB) em
relação ao preenchimento do sujeito sentencial tem promovido uma série de alterações estruturais
nessa língua. O PB, diferentemente do Português Europeu (doravante, PE), já vem sendo
classificado como uma língua de sujeito nulo parcial (HOLMBERG, 2010; MODESTO, 2000).
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443
Embora sujeitos nulos não-referenciais ainda sejam atestados em construções com verbos
meteorológicos, impessoais, existenciais e de alçamento, o sujeito nulo referencial de 3ª pessoa
sofre restrições de ocorrência, sendo legitimado apenas em construções em que é controlado a partir
de uma sentença matriz (FERREIRA, 2000; RODRIGUES, 2004). Mais recentemente, têm sido
atestadas construções com verbos existenciais do tipo ter e ver com preenchimento de um sujeito
não-referencial (DUARTE, 2003). A tendência pelo preenchimento de uma posição à esquerda do
verbo, ou em outras palavras, a preferência por se evitarem construções do tipo V1, tem
possibilitado que constituintes deslocados à esquerda, como elementos locativos ou temporais,
possam ser considerados como alocados na posição de argumento externo do verbo (Franchi et alii,
1998). Segundo Negrão & Viotti (2008), estruturas desse tipo constituiriam uma estratégia de
impessoalização encontrada no PB que o aproxima de línguas africanas como o quimbundo. Galves
(1998) e Avelar & Galves (2011) propõem uma análise em que os elementos deslocados à esquerda
possam disparar a concordância com o verbo da sentença. Este trabalho trata desse aspecto da
língua, com o qual estão possivelmente correlacionados dois fenômenos sob investigação, a saber,
marcas de concordância plural encontradas em verbos meteorológicos, particularmente em
sentenças relativas (COSTA & AUGUSTO, 2011; COSTA, RODRIGUES & AUGUSTO, 2012) e
possíveis transferências do PB no inglês como L2 (VIEGAS & AUGUSTO, 2013). No que diz
respeito à presença de marcas de plural em verbos meteorológicos no interior de orações relativas,
Costa e colaboradores têm discutido a possibilidade de se tratar de uma mudança em andamento na
gramática ou de uma interferência pós-spell-out, na codificação morfofonológica dos traços do
verbo, nos moldes de Rodrigues (2006), ao propor a explicação de lapsos de concordância, na
produção de sentenças, a partir de um modelo que incorpora um mecanismo de parsingmonitorador. Por outro lado, a possibilidade de tomar um elemento deslocado à esquerda como
“sujeito”, no sentido de estar satisfazendo a exigência de um traço EPP em T, como seria o
esperado em línguas de sujeito manifesto obrigatório como o inglês, é explorada por Viegas &
Augusto (2013) no que diz respeito à aquisição de inglês como L2 por falantes de PB. Observa-se, a
partir de testes de gramaticalidade aplicados a alunos iniciantes e avançados de inglês como L2, que
sentenças sem sujeito preenchido, mas com um elemento deslocado à esquerda, são mais
dificilmente reconhecidas como agramaticais em inglês por esses falantes do que aquelas sem
elementos deslocados à esquerda, ou seja, sentenças sem sujeito manifesto do tipo V1. Os
fenômenos discutidos permitem discorrer sobre a possibilidade de diferentes dialetos estarem
convivendo no Brasil, de que a mudança pode partir de tipos de sentenças com alta frequência que
impõem condições de processamento específicas e de que a aquisição de L2, particularmente no que
diz respeito a valores paramétricos distintos, pode enfrentar caminhos mais tortuosos diante de
paramêtros não polares, como o que se dá em relação ao PB e ao inglês nesse aspecto particular – a
possibilidade de uso de sujeitos nulos ou preenchidos.
OBJETO NULO X CLÍTICO DE 3ª PESSOA NA FALA DE CRIANÇAS E ADULTOS:
UMA ANÁLISE CONTRASTIVA
Jan Carlos Dias de Santana – UEFS
Luziane Amaral de Jesus – UEFS
Hely Dutra Cabral da Fonseca – UEFS
Com este estudo, analisamos o emprego do objeto nulo e do clítico acusativo de 3ª pessoa na fala de
crianças e adultos. Seguindo Cyrino (1993; 1994; 2003) e Kato (2005), sustentamos a hipótese de
que os clíticos de terceira pessoa não faz mais parte do processo natural de aquisição do Português
Brasileiro (doravante PB), sendo aprendido durante o processo de escolarização, de acordo com
Correa (1991) e Magalhães (2006). Sabe-se que o objeto nulo já é usado nos primeiros anos do
processo de aquisição do Português Brasileiro, conforme Kato (2005). A título de exemplo,
trazemos duas sentenças com o uso do clítico acusativo e do objeto nulo, respectivamente: Meu
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filho foi à escola. Vou buscá-lo / Vou buscar_. Para a análise, utilizamos amostras de língua falada
em Feira de Santana-BA, tendo como base um corpus com 12 entrevistas (4 crianças com idades
entre 2;0 a 2;10 e 8 adultos distribuídos nas variedades popular e culta do PB com idades entre 20 a
60 anos). Seguimos a metodologia da Sociolinguística Quantitativa e os pressupostos teóricos
básicos da Teoria Gerativa. De acordo com os resultados obtidos, verificamos que o uso do objeto
nulo é maior do que o uso do clítico acusativo 96% contra 4%, mostrando que o apagamento do
objeto é bem mais frequente na gramática nuclear dos falantes do PB e que os 4% de uso dos
clíticos representam 1 (uma) ocorrência no português popular e 6 (seis) no português culto. Foram
realizadas duas rodadas binárias com os dados, alterando-se a regra de aplicação, a fim de
verificarmos quais fatores linguísticos e sociais influenciam no uso dessas variantes. A primeira
rodada foi clítico acusativo x objeto nulo e os fatores que condicionam o uso são: animacidade do
objeto ([+ animado] .95; [- animado] .40) e escolaridade (0 ano de escolaridade .00; de 1 a 4 anos de
escolaridade .26; nível superior completo .86). Assim, pudemos inferir que o falante associa o uso
do clítico ao traço de maior animacidade do complemento verbal em sentenças do tipo “[...] tive um
problema com o motorista de ônibus [...] aí eu comecei a xingá-lo [...]”. Pudemos perceber,
também, que os adultos com maior grau de escolarização incorporam, ainda que em sua gramática
periférica, o uso dos clíticos. É importante aclarar que a faixa etária de 0 a 4 anos possui uma
gramática nuclear com o parâmetro - marcado para o uso dos clíticos acusativos de 3ª pessoa, pois a
criança brasileira faz uso de objetos nulos referenciais (KATO, 2005). Na segunda rodada objeto
nulo x clítico acusativo, observamos que os principais fatores condicionadores também foram a
animacidade do objeto ([+ animado] .05; [- animado] .60 ) e a escolaridade (0 ano de escolaridade
.00; de 1 a 4 anos de escolaridade .74; nível superior completo .14). Ou seja, quando se trata de um
ser [- humano], há uma maior tendência de o falante utilizar o objeto nulo para o complemento
verbal como na seguinte sentença: Premeiro tira o milho, descasca_, limpa_, corta_.). Desse modo,
registramos que o maior número dessas ocorrências no corpus examinado foi elucidado no
português popular, mas salientamos que este tipo de uso está presente na variedade falada da língua
independentemente da escolaridade. Concluímos, a partir da análise dos dados, que o PB se
encontra em processo de mudança em relação ao preenchimento do objeto direto anafórico de 3ª
pessoa, sendo que os falantes optam, na maioria das vezes, pelo apagamento, corroborando, assim,
com o resultado de outras pesquisas já realizadas com diferentes amostras do português brasileiro.
O SUJEITO NO PB DO SÉCULO XXI: PREENCHIDO OU NULO?
Noemia Carla Santana Reis – UNIFACS
Edivalda Araújo – UFBA
Alguns estudiosos mostram em suas pesquisas que o Português Brasileiro tem apresentado maior
índice de preenchimento do sujeito, em comparação às línguas românicas de sujeito nulo. A
realização do sujeito no Português Brasileiro, no decorrer da história, tem passado por
modificações. Pesquisas comprovaram que o PB está caminhando para o sujeito realizado
(DUARTE, 1993, 1996, 2003), no entanto, estudos recentes (SILVA, 2004) demonstram que os
falantes, em algumas áreas do Brasil, estão optando pelo não preenchimento do sujeito. Os
principais objetivos desse trabalho são: (i) fazer um estudo diacrônico do português brasileiro do
século XIX ao XXI, envolvendo a realização do sujeito; (ii) analisar cartas pessoais, peças de teatro
e depoimentos de redes sociais: facebook e Twitter para fazer uma análise comparativa da
realização do sujeito, do século XIX ao XXI. Trata-se de uma pesquisa diacrônica que busca colher
dados a fim de investigar uma possível mudança na realização do sujeito no que se refere à
tendência ao sujeito preenchido ou ao sujeito nulo. Alguns fatos da pesquisa, ainda em fase inicial,
podem ser vistos nos seguintes exemplos:
(1). Ø Recebi hontem sua prezada carta. Por Ella Ø vejo que Ø não recebeu ainda os livros, Ø
creio porém que Ø ser-lhe-hão entregues desta vez. (séc. XIX)
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(2). Não muito bem hoje, Ø fui pra academia, Ø alonguei, Ø sentei na bicicleta, Ø dei umas
pedaladas e de repente... (rede social – Facebook)
Nos exemplos (1) e (2), os dados encontrados parecem evidenciar a tendência ao uso do sujeito
nulo, aproximando-se da observação feita por Silva (2004), a de que o sujeito nulo pode estar em
variação estável no português brasileiro ou, hipótese nossa, talvez esteja ocorrendo uma volta ao
parâmetro do sujeito nulo. Mais análises precisam ser realizadas para que se possa avaliar a
caracterização dessa vertente do português e qual é a hipótese que a ele se aplica.
DESMITIFICANDO CRENÇAS E PRECONCEITOS SOBRE LIBRAS: UMA
ABORDAGEM SOCIOLINGUÍSTICA
Graciely Cândido Macêdo – UEFS
Soliane Silva Souza – UEFS
Josane Moreira de Oliveira – UEFS
Muitas pessoas em Feira de Santana, cidade do estado da Bahia, acreditam que a Língua Brasileira
de Sinais (LIBRAS) é mímica. Gesser (2009) afirma que em tal pensamento está implícito um grave
preconceito que perpassa a discussão acerca da legitimidade linguística. Ainda hoje, apesar de a
LIBRAS ter sido legitimada como língua materna dos surdos brasileiros pela Lei nº. 10.436, de 24
de abril de 2002, faz-se necessário reafirmar o seu status linguístico. Em virtude disso, pergunta-se:
LIBRAS é língua? A LIBRAS é uma língua natural? A LIBRAS apresenta variação linguística? A
LIBRAS é marca identitária dos surdos brasileiros? Por meio dos questionamentos apresentados,
objetiva-se desmitificar algumas crenças e alguns preconceitos que se fazem presentes no âmbito da
LIBRAS, tendo em vista a falta de esclarecimento dessa língua minoritária por grande parte da
sociedade feirense. (Re)afirmar a legitimidade da LIBRAS enquanto língua pode parecer um
discurso repetitivo. No entanto, essa repetição é justificável pelo estranhamento existente por parte
da sociedade fora do âmbito da surdez. Nesse sentido, destaca-se a relevância de (re)afirmar a
LIBRAS como uma língua natural (QUADROS; KARNOPP, 2004), já que, assim como as línguas
orais, essa língua também apresenta todas as características linguísticas inerentes a qualquer língua
natural humana. Diante dos questionamentos acima mencionados, ratifica-se que a LIBRAS
apresenta todas as propriedades linguísticas presentes nas línguas humanas orais. Além disso, essa
língua também varia no território brasileiro, apresentando a diversidade linguística e cultural do
povo surdo, bem como variações (históricas, regionais, sociais ou estilísticas). Tendo em vista os
pressupostos da Sociolinguística adotados no presente trabalho, concebemos a LIBRAS (do mesmo
modo que qualquer língua natural) como um sistema heterogêneo ordenado que é regulado por um
conjunto de regras, do qual a variação linguística é parte inerente. Entende-se por variação a
possibilidade de expressar uma mesma informação de duas ou mais maneiras diferentes, as quais
serão tratadas como um conjunto denominado de variável dependente. Nesse sentido, uma variável
é entendida como dependente porque o emprego das variantes não é aleatório, mas condicionado
por grupos de fatores linguísticos ou sociais (MOLLICA, 2008). Embora a variação linguística
presente na LIBRAS represente a diversidade linguística e cultural do povo surdo, fica evidente que
a luta dos surdos no que diz respeito à efetivação da LIBRAS como língua de instrução e via de
aprendizado precisa ser (re)afirmada, por ser perceptível que o discurso do ouvintismo ainda se faz
presente como ideologia dominante.
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LINGUISTICA E METODOLOGIA DE ENSINO- CAMINHOS PARA
DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES EM LÍNGUA PORTUGUESA EM SALA DE
AULA
Eloisa Pilati – UnB
Helena Guerra Vicente – UnB
Há uma ampla bibliografia nacional que se propõe a discutir questões relacionadas ao ensino de
língua portuguesa nas escolas no Brasil, as quais levam em consideração os conhecimentos
advindos das pesquisas linguísticas, tais como:Luft 1998; Marchuschi. 2001; Franchi 2006; Neves
2007; Perini, 2007; Rocha 2007; Vieira e Brandão 2008 Pilati et al 2011 entre muitos outros. De
forma geral, pode-se observar que tais obras mostram um considerável avanço no que se refere à
consolidação dos conhecimentos advindos das pesquisas linguísticas e suas aplicações ao ensino de
língua materna. No entanto, apesar desse avanço, alunos formados nos cursos de Letras ainda não
têm a segurança de como direcionar sua atuação docente, articulando teoria e conhecimentos
linguísticos, sob um ponto de vista da prática docente. Considerando essa afirmação, a presente
pesquisa tem três objetivos: 1) defender a ideia de que para tornar o processo de ensinoaprendizagem da variedade escrita e padrão da língua portuguesa mais efetivo é fundamental que
haja uma proposta pedagógica em que estejam presentes, no mínimo, três tipos de saberes: i)
conhecimentos oriundos das pesquisas linguísticas, ii) conhecimentos da gramática normativa, ou
seja, sobre as características da variedade linguística que se deseja atingir, e iii) conhecimentos
sobre métodos e técnicas específicos para o desenvolvimento de habilidades linguísticas (cf. Lobato
2003, Pilati & Guerra, 2012, Guerra & Pilati 2012) e 2) apresentar diferentes técnicas para o
desenvolvimento de habilidades em língua materna na educação básica, que levem em consideração
o saber linguístico que o aluno já possui: eliciação, procedimento de descoberta, técnica de
resultados (cf. Lobato 2003) e 3) apresentar modelos de atividades em que as ideias defendidas em
1 e 2 estejam implementadas (cf. Pilati & Salles 2013).
A CONCORDÂNCIA NOMINAL: UM ESTUDO MINIMALISTA
Alane Luma Santana Siqueira – UFRPE/UAST/PIBIC/FACEPE
Adeilson Pinheiro Sedrins – UFRPE/UAST
Apresentaremos uma análise sobre a concordância nominal do Português Brasileiro (PB), sob a
perspectiva da teoria de valoração de traços (CHOMSKY, 2001). Para isso, nosso estudo parte da
discussão do trabalho de Magalhães (2004), uma proposta baseada na operação Agree (Chomsky,
2001). Podemos entender a relação Agree como uma operação que visa à eliminação de traços que
não são interpretáveis pelas interfaces da gramática. Nesse sentido, de acordo com Chomsky
(2001), os itens lexicais podem apresentar traços interpretáveis e não-interpretáveis. O item que
apresenta um traço não-interpretável assume um papel de sonda, procurando na estrutura um alvo a
fim de que, a partir da relação estabelecida com esse alvo, seu traço não-interpretável possa ser
valorado e eliminado antes de atingir as interfaces. Nessa teoria, um traço não-interpretável só será
eliminado se o elemento que o contiver estabelecer relação com outro elemento que apresenta o
mesmo tipo de traço, mas com natureza interpretável. Baseada nessa teoria, Magalhães (2004)
propõe que a operação Agree, responsável pela concordância entre o sujeito e a flexão verbal da
sentença, seja estendida também ao domínio do DP. De acordo com a autora, no PB, adjetivos (A)
possuem traços-phi de gênero e número não-interpretáveis; nomes (N) possuem traço de gênero e
pessoa interpretáveis, mas traços de número e Caso não-interpretáveis. No momento em que A entra
em relação com N, A tem seu traço de gênero valorado. O determinante (D) seria o núcleo que
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possui traço de número interpretável, mas traço não-interpretável de gênero. Então, D, ao ser
concatenado na estrutura, estabelece relação com A, valorando o traço de número de A. No entanto,
D não valora o seu próprio traço de gênero, já que A não tem traço interpretável de gênero, e
continua procurando um alvo, encontrando N, que valora o seu traço de número com D, e D valora
o seu traço de gênero. Duas questões centrais, a partir do estudo de Magalhães (2004), são
exploradas em nossa pesquisa. A primeira é o fato de o adjetivo funcionar como um “alvo”,
valorando seu traço não-interpretável de gênero com D, D não “ganhando” nenhuma eliminação de
seus próprios traços não-interpretáveis. Assim, assumimos que na relação estabelecida entre D e A,
ambos obtêm traços valorados.A segunda questão diz respeito à nossa investigação sobre a presença
de traço de pessoa não-interpretável no DP, uma questão não explorada por Magalhães.
ASPECTOS SINTÁTICOS DOS MARCADORES NEGATIVOS NO PORTUGUÊS
BRASILEIRO - RESTRIÇÕES DE OCORRÊNCIA EM SENTENÇAS COM
MARCADORES PÓS-VERBAIS
Moacir Natercio Ferreira Junior – UnB
Este trabalho investiga as diferenças no comportamento sintático dos marcadores negativos no
português brasileiro (PB) e os contextos de restrição de ocorrência em sentenças com negação pósverbal. O PB desenvolveu diferentes estratégias de posicionamento dos marcadores negativos,
sendo permitido o posicionamento da negação pré-verbal (NEG-V), pós-verbal (V-NEG) e a duplanegação (NEG-V-NEG). Nesse sentido, adota-se a proposta de Zanuttini(1991) que considera a
existência de duas posições diferentes para alocar os marcadores de negação: uma posposta, que
abriga um marcador negativo de caráter adverbial, e uma preposta, de caráter gramatical e com
estatuto de clítico. Os marcadores negativos classificados como gramaticais possuem posição fixa
em relação ao verbo: sempre prepostos, inclusive com infinitivos; não admitindo elementos entre si
e o verbo, salvo pronomes átonos. Já os marcadores negativos classificados como adverbiais não
possuem posição fixa em relação ao verbo e admitem a ocorrência de elementos entre si e o verbo.
Dessa forma há evidência de que marcadores românicos de negação pré-verbais são “elementos da
morfossintaxe verbal”, pois interagem com outros elementos a ela associados; marcadores de
negação pós-verbal, ao contrário, são elementos morfossintaticamente autônomos, com distribuição
semelhante à de advérbios. Em consonância com a análise de Zanuttini (1991), Ramos (2006)
aponta evidências do enfraquecimento do marcador negativo pré-verbal (não >num) no PB,
reconhecendo-o como uma "forma fraca", favorecida quando imediatamente pré-verbal (posição
dos pronomes átonos) e desfavorecida em posição final (tônica). Além disso, reconhece a
coocorrência do marcador pós-verbal (a dupla negação) como uma forma inovadora no PB. Assim,
o português brasileiro apresenta um processo de “gramatização” da negação pré-verbal, e o
surgimento de uma “negação adverbial” pós-verbal. Diante dessas análises, pretende-se observar as
diferenças no comportamento dos marcadores negativos em posição pós-verbal (V-NEG),
comparando-se com o comportamento da dupla negação (NEG-V-NEG), considerando, para tal
análise, dados dos dialetos mineiro e goiano. Assim, objetiva-se apresentar os contextos de
restrições à ocorrência exclusiva do marcador negativo pós-verbal (V-NEG) na sentença, sendo
necessária a existência de dupla negação para que a sentença seja bem formada.
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CONSTRUÇÕES ERGATIVAS E MÉDIAS NO PORTUGUÊS DO BRASIL
Cristiany Fernandes da Silva – UnB
Analisamos as construções ergativa e média no português do Brasil a partir das propriedades
descritas pela literatura para cada uma dessas estruturas e das configurações sintáticas de duas
classes de verbos, “abrir” e “pintar”. Ambas as classes admitem uma sentença transitiva com um
argumento Agente/Causa e um Tema, como em João abriu a porta e João pintou a janela. Todavia,
enquanto a classe dos verbos de abrir admite tanto a alternância ergativa (A porta abriu) como a
média (Essa porta abre facilmente), a classe dos verbos de pintar permite apenas a alternância
média (Essa janela pinta facilmente), isto é, as sentenças ergativas com verbos desse tipo são
agramaticais (*A janela pintou). Adotamos os pressupostos teóricos da gramática gerativa e a
hipótese segundo a qual a estrutura argumental do verbo está relacionada com sua estrutura
conceitual lexical (LEVIN & RAPPAPORT-HOVAV, 2008).
A distinção entre sentenças médias e ergativas tem gerado debate entre os teóricos. Para Perini
(2008), essas sentenças são construções de mesma diátese verbal, ou seja, tanto em sentenças
médias quanto em ergativas há a demoção do argumento externo e a promoção do argumento
interno para a posição de sujeito. Entretanto, existem verbos que não formam sentenças ergativas,
mas apenas médias, e esse nos parece ser o caso de uma investigação mais apurada, que considere
as particularidades de cada uma das estruturas e dos verbos alternantes e não alternantes.
Discutimos as características de sentenças ergativas e médias a fim de restringi-las a apenas duas
propriedades: uma aspectual e outra semântica. A Propriedade Aspectual é relativa a sentenças
ergativas expressarem eventos esentençasmédias estados. Essa distinção explica propriedades
atribuídas às sentenças médias – atemporalidade, interpretação genérica e presença de
modificadores – em oposição às sentenças ergativas, que têm tempo marcado, possuem uma
interpretação episódica, indicando um acontecimento, e não pressupõem a presença de
modificadores. A Propriedade Semântica se refere ao traço Modo/Instrumento: os verbos do tipo de
“pintar” possuem em sua estrutura conceitual lexical a informação de Modo/Instrumento,
contrariamente, aos verbos do tipo de “abrir” (cf. SALLES & NAVES, 2009). A interpretação de
Agente Implícito, típica das sentenças médias, é decorrente, segundo nossa análise, da propriedade
de Modo/Instrumento. Nossa argumentação também se baseia na formação de nomes pela sufixação
em -or, que parece revelar traços da estrutura conceptual daqueles verbos. Além disso, podem prover
uma explicação para o licenciamento (ou não) das alternâncias verbais em questão. Por fim, aplicamos
uma bateria de testes sintáticos e semânticos que demonstram as diferenças entre construções ergativas e
médias (Apoio: CAPES).
O PARÂMETRO DO SUJEITO NULO NA FALA DE CRIANÇAS DE FEIRA DE
SANTANA-BA
Rosiane Silva de Almeida – UEFS
Aline da Silva Santos – UEFS
Hely Dutra Cabral da Fonseca – UEFS
Neste trabalho, investigamos o parâmetro do sujeito nulo na fala de crianças em fase de aquisição
da linguagem em Feira de Santana-BA. Nosso objetivo é analisar como se dá a aquisição do
parâmetro do sujeito nulo (também conhecido como pro-drop), tendo como embasamento a Teoria
Gerativa, conforme Chomsky (1981,1986, 1995), dentro do modelo que ficou conhecido como
Teoria dos Princípios e Parâmetros. Sobre o sujeito nulo no português brasileiro, um dos estudos
que se destaca é o de Duarte (1993), que analisa a trajetória do sujeito nulo e revela que o português
brasileiro está passando por uma mudança que reflete a perda do parâmetro do sujeito nulo em
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virtude da redução no paradigma pronominal e flexional. Com a análise das amostras colhidas,
pretende-se verificar qual dessas vertentes se confirmam. Para a realização do trabalho, estamos nos
apoiando na Sociolinguística Paramétrica, conforme os postulados de Tarallo e Kato (1989) e Kato
(2002). A amostra utilizada para análise é constituída de oito entrevistas, contendo dados de fala de
crianças de Feira de Santana-BA, sendo 4 meninas e 4 meninos, com faixa etária entre 1,8 a 2,6.
Analisamos a variação entre sujeito nulo e realizado apenas com sujeitos pronominais no singular,
tendo sido encontradas 191 ocorrências, sendo 107 de sujeito nulo (55%) e 86 de sujeito realizado
(45%). Os dados foram submetidos ao programa GoldVarb a fim de se verificar o que condiciona
essa variação como também observar os contextos que ainda favorecem o uso do sujeito nulo.
Consideramos os fatores linguísticos pessoa gramatical (1ª, 2ª e 3ª pessoa do singular),
transitividade verbal (verbo ser e outros verbos), tempo verbal (presente do indicativo, pretérito
perfeito do indicativo e futuro do presente do indicativo), forma verbal (simples ou composta),
presença de um elemento entre a posição specIP e o verbo (advérbio de negação, advérbio
aspectual, clítico ou nenhum elemento) e o traço semântico do sujeito de terceira pessoa (+animado
ou -animado), e o fator social sexo/gênero. Contudo, o programa só selecionou três grupos de
fatores como significativos: presença de um elemento entre a posição specIP e o verbo, traço
semântico do sujeito de terceira pessoa e sexo/gênero. De acordo com os resultados, a presença de
advérbio aspectual entre a posição specIP e o verbo, como no exemplo “Ei! Já vai?”, favorece o uso
do sujeito nulo (peso relativo .89); assim como o traço semântico (-animado) do referente do sujeito
de terceira pessoa - como em: “Sumiu não!”, em que a criança faz referência a um brinquedo - com
peso relativo foi .58. O sexo/gênero masculino (peso relativo .67) é, também, outro fator que
condiciona o uso do sujeito nulo. Com esses resultados, verificamos que o sujeito nulo pronominal
ainda é favorecido na fala de crianças em Feira de Santana-BA, o que corrobora a afirmação de
alguns pesquisadores, dentre eles Hymes (1996) e Guasti (2002), no que concerne ao fato de que
crianças expostas a uma língua pro-drop estabelecem o valor positivo para o sujeito nulo desde
muito cedo. Contudo, como o português brasileiro está passando de uma língua [+ pro-drop] para [pro-drop] e tendo em vista que em nossos dados a diferença entre o uso do sujeito nulo e o
realizado foi de apenas 10%, pressupomos que as crianças encontrarão cada vez menos o input para
o uso do sujeito nulo, porque os adultos estão usando cada vez mais o sujeito realizado.
A INDETERMINAÇÃO DO SUJEITO EM REDAÇÕES: UMA ANÁLISE À LUZ DA
SOCIOLINGUÍSTICA PARAMÉTRICA
Soliane Silva Souza – UEFS
Graciely Cândido Macêdo – UEFS
Hely Dutra Cabral da Fonseca – UEFS
Tomando como base teórico-metodológica a Sociolinguística Variacionista (LABOV, 1972)
associada à noção de parâmetro proposta pela Teoria Gerativa (CHOMSKY, 1981), o presente
trabalho objetiva investigar as estratégias de indeterminação do sujeito empregadas em redações de
alunos de um curso preparatório para vestibulares e concursos públicos sediado em Feira de
Santana, município do estado da Bahia. A escolha por tal objeto de estudo deve-se ao fato de
constatar nas redações dos alunos em nossa trajetória profissional a ocorrência de estratégias de
indeterminação do sujeito que não aquelas abordadas pelas gramáticas tradicionais. Com a análise
do corpus, composto por 53 redações, que foi coletado durante 2011 e 2012, foi possível depreender
seis variantes, classificadas em dois grupos: com sujeito lexical (nós) e sem sujeito lexical (Ø + V +
SE ➜ verbo na terceira pessoa do singular + partícula “se”, Ø + V1PP ➜ verbo na primeira pessoa
do plural, Ø + VINF ➜ verbo no infinitivo, verbo no gerúndio e Ø + V3PP ➜ verbo na terceira
pessoa do plural). Essas variantes foram analisadas sob os pontos de vista linguístico e social,
buscando perceber se haveria alguma influência dos fatores ‘tipo de verbo (classificação
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semântica)’, ‘tipo de oração’, ‘tipo de verbo (classificação de acordo com a gramática tradicional)’,
‘modo verbal’ e ‘sexo/gênero’. Após o levantamento e a codificação dos dados, submetemos os
dados encontrados ao tratamento matemático/estatístico do Programa Computacional GoldVarb,
ferramenta utilizada em pesquisas sociolinguísticas quantitativas. Em linhas gerais, os resultados do
estudo em questão mostram que a variante Ø + V + SE (54%) é a estratégia mais usada para
indeterminar o sujeito no corpus analisado, seguida das variantes Ø + V1PP (22%) e Ø + VINF
(20%). Para obtenção dos pesos relativos, consideramos como regra de aplicação a variante Ø +
V1PP. Dessa forma, foram selecionadas pelo Programa como estatisticamente significativas, nesta
ordem, as variáveis ‘tipo de verbo (classificação semântica)’ e ‘modo verbal’. Com a análise dos
resultados numéricos, percebemos que a variante Ø + V1PP é favorecida nos contextos em que se
usam verbos estativos, com peso relativo de .85, e com verbos no modo subjuntivo, com peso
relativo de .91. Com a análise e a interpretação dos dados, foi possível perceber/constatar que o
conceito de sujeito indeterminado ampliou-se, não se limitando apenas as formas de indeterminação
registradas nas gramáticas tradicionais.
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