CADEIA DE SUPRIMENTOS, SUSTENTABILIDADE E
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CADEIA DE SUPRIMENTOS, SUSTENTABILIDADE E
ANAIS CADEIA DE SUPRIMENTOS, SUSTENTABILIDADE E ANÁLISE MULTINÍVEL: CONGRUÊNCIA ENTRE CONSTRUCTOS ANA PAULA FERREIRA ALVES ([email protected]) UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul JAQUELINE GUIMARÃES SANTOS ([email protected]) UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul Resumo Considerando o contexto da cadeia de suprimentos e da sustentabilidade, surge o conceito de Sustainable Supply Chain Management, ou sustentabilidade na gestão da cadeia de suprimentos (SGCS). Para compreensão da SGCS é importante considerar todos os elos que formam a cadeia de suprimentos e seus diferentes níveis. Assim, tem-se que fenômenos que envolvam diferentes articulações entre níveis podem ser estudados a partir de uma análise multinível. Nesse sentido, o objetivo deste estudo teórico é refletir sobre as possibilidades de interação entre as temáticas de sustentabilidade na cadeia de suprimentos e da análise multinível. Palavras-chave: cadeia de suprimentos, cadeia de suprimentos sustentável, análise multinível. 1. Introdução A emergência de problemas socioambientais fomentou o surgimento de conceitos relacionados ao desenvolvimento sustentável e à sustentabilidade. Divulgado pelo Relatório “Our Common Future”, o conceito mais comumente utilizado para definir desenvolvimento sustentável considera-o como aquele que “satisfaz às necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas necessidades” (WCED, 1987, p.43). Por sua vez, uma das interpretações mais disseminadas sobre sustentabilidade é o conceito triple bottom line de Elkington (2001), que afirma que a sustentabilidade deve incorporar, ao mesmo tempo, dimensões sociais, ambientais e econômicas. A interpretação de Elkington passou a ser apropriada por gestores em suas organizações, em resposta a pressões da sociedade, governantes e entidades não governamentais. Em outras palavras, aspectos socioambientais passaram a ser introduzidos nas rotinas, atividades e estratégias organizacionais. Conforme Seuring e Gold (2013), a introdução efetiva da sustentabilidade em empresas exige ações que extrapolam os limites organizacionais, abarcando o ambiente interorganizacional. Assim, as empresas deixam de ser 1/16 ANAIS consideradas isoladamente e passam a ser analisadas de acordo com suas cadeias de suprimentos (CARVALHO; BARBIERI, 2013). Dessa maneira, a cadeia de suprimentos é formada por elos que contribuem para o alcance dos mesmos objetivos de desempenho: aqueles valorizados pelos consumidores finais. A gestão das operações dessa cadeia é conceituada como a coordenação estratégica e sistemática de processos-chave de negócios por uma empresa específica (a empresa focal), que visa ao contínuo aumento do desempenho de seus elos e da própria cadeia (MENTZER et al., 2001). Uma empresa que deseja colaborar para um desenvolvimento mais sustentável deve ser capaz de influenciar seus elos para que, juntos, possam contribuir para a transformação do conceito de sustentabilidade em uma estratégia consolidada na cadeia de suprimentos (CLARO; CLARO; AMÂNCIO, 2008). Considerando a integração das dimensões do triple bottom line, surge o conceito de Gestão da Cadeia de Suprimentos Sustentável (GCSS). A GCSS pode ser conceituada como a gestão dos fluxos de informação, material e capital, bem como a cooperação entre empresas ao longo da cadeia de suprimentos, possuindo objetivos referentes às três dimensões da sustentabilidade, derivados das necessidades dos clientes e das partes interessadas. Na GCSS, critérios ambientais e sociais precisam ser cumpridos por todos os elos da cadeia para que os mesmos se mantenham como integrantes da mesma. Assim, a gestão da cadeia de suprimentos sustentável leva em conta uma ampla gama de questões e, portanto, considera um maior número de níveis da cadeia e um maior número de membros em comparação à visão tradicional (SEURING; MÜLLER, 2008). Fenômenos que envolvam diferentes articulações entre níveis podem ser estudados a partir de uma análise multinível (DIEZ-ROUX, 2002). Segundo Hitt et al (2007), a análise multinível pressupõe que os fenômenos são o resultado de influências que emanam de diferentes níveis de análise. Nos estudos organizacionais, verifica-se que grande parte das pesquisas investiga fenômenos em níveis individuais (micro) de análise de forma mais pontual (HITT et al, 2007), como se tais fenômenos pudessem ser separados ou isolados de uma ótica mais macro. No entanto, é preciso uma análise mais complexa dos fenômenos organizacionais, uma vez que estes se relacionam em vários níveis simultaneamente. Nesse contexto, é preciso direcionar esforços para integrar os múltiplos níveis de investigação dos fenômenos. Diante dessas considerações, este estudo teórico busca refletir sobre as possibilidades de interação entre as temáticas de sustentabilidade na cadeia de suprimentos e da análise multinível. Para tanto, argumenta-se que a cadeia de suprimentos sustentável – e a cadeia de suprimentos na visão tradicional – é um sistema multinível que exigem uma análise entre seus múltiplos níveis para o melhor entendimento dos fenômenos relacionados. Cabe salientar que não há nem mesmo a mais remota intenção de que este seja um tratado teórico sobre a complexidade da análise multinível ou dos conceitos de desenvolvimento sustentável e sustentabilidade. A ambição deste artigo é instigar a curiosidade acerca dos temas propostos, enriquecendo o diálogo e aumentando a sua aplicabilidade no dia-a-dia das cadeias de suprimentos. Para tanto, exploraremos as definições de cadeia de suprimentos sustentável, conceitos relacionados à análise multinível, bem como uma reflexão sobre as possibilidades de interação entre as temáticas. 2. Cadeia de Suprimentos e Sustentabilidade 2/16 ANAIS Para apresentar uma discussão sobre sustentabilidade na cadeia de suprimentos, entende-se que é preciso comentar sobre conceitos relacionados com a cadeia. Dessa maneira, nesta seção, são apresentados os principais conceitos e definições referentes à cadeia de suprimentos tradicional. Posteriormente, discute-se a temática da sustentabilidade na cadeia de suprimentos. Diante do crescimento da competitividade, resultado de pressões de globalização, aumento dos mercados consumidores e avanços na tecnologia da informação, a cadeia de suprimentos passou a desempenhar um papel-chave para o melhor desempenho das organizações (RAO; HOLT, 2005). Estabelecer um bom relacionamento com fornecedores, distribuidores e outras partes interessadas tornou-se fundamental para a atuação das organizações. Nesse sentido, entende-se que as transações do mercado mundial estão cada vez mais baseadas na lógica de cadeia de suprimentos versus cadeia de suprimentos (ASHBY; LEAT; HUDSON-SMITH, 2012; RAO; HOLT, 2005). De tal modo, é preciso ampliar a análise das organizações de um ambiente intra-organizacional para um ambiente interorganizacional: a cadeia de suprimento passa a ser a unidade de análise. A cadeia de suprimentos é comumente definida como um caminho linear, que integra as atividades associadas ao fluxo e à transformação de bens, desde a extração de suas matérias-primas até o usuário final (BEAMON, 1999; SEURING; MÜLLER, 2008). Algumas cadeias consideram ainda a etapa do pós-consumo. Nota-se, neste conceito, a expressão “caminho linear”, que sugere que a cadeia de suprimentos possui um sentido único de direção. O fluxo parte dos fornecedores, passando pela empresa compradora e chegando aos clientes. Proposta por Lambert, Cooper e Pagh (1998), a Figura 1 é uma representação da estrutura tradicional de uma cadeia de suprimentos. Figura 1. Estrutura Tradicional de uma Cadeia de Suprimentos Fonte: Lambert, Cooper e Pagh (1998). A cadeia de suprimentos é formada por membros que devem contribuir para os mesmos objetivos de desempenho, valorizados pelos consumidores finais (MAURER, 2012). O ponto central da Figura 1 é a empresa focal, membro que usualmente gerencia ou comanda a cadeia de suprimento, mantendo contato com o cliente organizacional ou o consumidor e 3/16 ANAIS projetando o produto e/ou serviço oferecido pela cadeia (SEURING; MÜLLER, 2008). Os membros que estão à direita da empresa focal representam a cadeia à montante, enquanto que os membros que estão à esquerda, a cadeia à jusante. Quanto maior os níveis de fornecedores e/ou de clientes, maior e mais complexa será a cadeia. Cabe apontar que os fornecedores de primeiro nível são aqueles que têm um relacionamento direto com a empresa focal. Nesse sentido, assume-se que a empresa focal tem o poder de influenciar os outros membros de sua cadeia: os stakeholders. Parte interessada, ou stakeholder, é caracterizada como qualquer indivíduo ou grupo que pode afetar ou é afetado pelo alcance dos objetivos de uma organização. Salienta-se que stakeholder contempla não somente os investidores, acionistas e donos da empresa, mas também funcionários, consumidores, empresas fornecedoras, órgãos governamentais, organizações não-governamentais, empresas de comunicação e mídia, a sociedade civil, dentre outros (SVENSSON, 2007). Uma vez que tem o poder de influenciar a cadeia, espera-se que a empresa focal esteja à frente do gerenciamento da cadeia de suprimentos, norteando suas operações. O Global Supply Chain Forum entende a Gestão da Cadeia de Suprimentos (GCS) como uma integração de processos-chave de negócios, incluindo desde os usuários finais aos fornecedores originais que provêm mercadorias, serviços e informação, que geram valor aos clientes e outros stakeholders (LAMBERT; COOPER; PAGH, 1998). Para Mentzer et al (2001), a GCS pode ser conceituada como uma coordenação sistêmica e estratégica das funções de negócio tradicionais e das funções táticas desses negócios em uma cadeia de suprimentos, por parte de uma empresa específica, visando à melhoria do desempenho em longo prazo de cada empresa e da cadeia de suprimentos como um todo. Esta conceituação salienta a coordenação entre empresas para melhorar o desempenho da cadeia. 2.1 Sustentabilidade na Cadeia de Suprimentos Em virtude da responsabilidade pela gestão da cadeia de suprimentos, os méritos pelo bom desempenho da cadeia recaem sobre a empresa focal. Seguindo esta mesma lógica, espera-se que esta empresa também seja responsabilizada pelos impactos de sua atuação e pelos problemas resultantes da má conduta dos fornecedores (CARVALHO; BARBIERI, 2012; KOPLIN; SEURING; MESTERHARM, 2007). Nessa perspectiva, partem os debates que relacionam a sustentabilidade e a cadeia de suprimentos. Segundo Ashby, Leat e HudsonSmith (2012), a gestão representa uma relevante ferramenta para consolidar conceitos e práticas de sustentabilidade, com intuito de alcançar boas metas de desempenho social e ambiental. As discussões sobre a sustentabilidade e a gestão da cadeia de suprimentos estão centradas, principalmente, no conceito de Gestão da Cadeia de Suprimentos Sustentável (GCSS). Conforme Seuring e Müller (2008, p.1700), a GCSS pode ser definida como “a gestão de fluxos de capital, materiais e informações, bem como, a cooperação entre as empresas ao longo da cadeia de suprimentos, visando metas para as três dimensões, econômica, ambiental e social, que são requisitos dos clientes e stakeholders”. Os conceitos de GCSS e GCS possuem similaridades, e pode-se entender o primeiro como sendo uma extensão do segundo (BESKE; SEURING, 2014; HALLDÓRSSON; KOTZAB; SKJOTT-LARSEN, 2009). Em comparação à GCS, pode-se alegar que a GCSS possui três características diferenciais: (a) requer o exame de maior número de impactos em uma cadeia de suprimento estendida; (b) considera um grupo mais numeroso de objetivos de 4/16 ANAIS desempenho, em virtude da introdução dos aspectos socioambientais; e, (c) apresenta maior necessidade de integração e cooperação entre elos da cadeia de suprimento (SEURING; MÜLLER, 2008). Além disso, Seuring e Müller (2008) evidenciam que o grupo stakeholders deve incluir fornecedores, clientes, entidades não-governamentais, membros da comunidade, órgãos governamentais e até mesmo competidores, que cadeias tradicionais geralmente ignoram ou tratam como adversários (PAGELL; WU, 2009). A proposta é que nenhum stakeholder seja considerado um problema ou uma ameaça para a cadeia. Dessa maneira, percebe-se que a introdução da sustentabilidade na gestão da cadeia de suprimentos passou a considerar mais processos que os anteriormente incluídos no gerenciamento tradicional da cadeia (SVENSSON, 2007), como o desenvolvimento de fornecedores, a transparência, a rastreabilidade, a certificação e a comunicação reforçada entre todos os elos (PAGELL; WU, 2009). As práticas que conduzem a uma gestão da cadeia de suprimentos mais sustentável são melhores práticas em comparação à gestão tradicional e exigem uma nova postura em relação às questões socioambientais (PAGELL; WU, 2009). Para Kleindorfer, Singhal e Van Wassenhove (2005), a SSCM aproximou a visão tradicional das operações da gestão da cadeia de suprimentos com aspectos mais amplos e complexos envolvendo a sociedade e o meio ambiente. Assim, tem-se que a gestão da cadeia de suprimentos sustentável leva em conta uma ampla gama de questões complexas e mais elos, olhando, portanto, para uma parte mais longa da cadeia de suprimentos (SEURING; MÜLLER, 2008). Contudo, na conceituação de Seuring e Müller, fica clara a existência de um fluxo que não necessariamente é linear na cadeia de suprimentos. Em outras palavras, pode-se perceber que a empresa focal e os stakeholders são ligados por fluxos de material, informação e capital, os quais não apresentam um sentido único de direção (SEURING; MÜLLER, 2008; BESKE, 2012). Portanto, compreende-se que a gestão da cadeia de suprimentos sustentável evidencia outros membros da cadeia de suprimentos, que estão distribuídos em outros níveis (além dos níveis de fornecedores e de clientes) e que não estão organizados de forma linear. Os fluxos não estão dispostos do nível mais próximo ao fornecedor para avançar até o cliente. Material, informação e capital se movimentam ao longo de todos os níveis da cadeia, em distintas direções. Ademais, salienta-se que Beske e Seuring (2014) propõem algumas categorias e práticas para analisar a cadeia de suprimentos sustentável, tanto interna como externamente: a orientação, a continuidade, colaboração, gestão de riscos, e proatividade. A orientação inclui os valores estratégicos da empresa, por meio de orientação à sustentabilidade e orientação à cadeia de suprimentos. A continuidade está vinculada à estrutura, organização e ao relacionamento de longo prazo da cadeia de suprimentos. A colaboração conecta decisões estruturais e operacionais relativas à integração colaborativa dos stakeholders aos negócios. A gestão de riscos leva as empresas à adoção de várias práticas de minimizar tais riscos. Por fim, a proatividade (para a sustentabilidade) engloba o engajamento dos stakeholders, processos de aprendizagem e capacidade de inovar (BESKE; SEURING, 2014). Segundo Beske e Seuring (2014), as categorias da GCSS podem ser estruturadas em três níveis hierárquicos: valores estratégicos (orientação), estrutura (continuidade e colaboração) e processos (colaboração, gestão de risco e proatividade). Nesse sentido, é possível identificar que a própria cadeia de suprimentos possui diferentes níveis – tanto de tamanho da cadeia, no sentido de níveis de membros da cadeia, quanto de análise da cadeia de suprimentos sustentável. Essa relação será discutida em uma 5/16 ANAIS seção posterior. Na próxima seção, serão apresentadas as definições e características centrais da perspectiva multinível. 3. Possibilidades na Análise Multinível De acordo com Diez-Roux (2012), a análise multinível é aplicável a uma ampla gama de situações que envolvam unidades em um nível inferior articulados em unidades de nível superior. Assim, tem-se que o pressuposto subjacente à análise multinível é que os fenômenos são o resultado de influências que emanam de diferentes níveis de análise (HITT et al, 2007). Em virtude disso, a análise multinível vem sendo utilizada em diversos campos de conhecimento, incluindo, por exemplo, a educação, a saúde pública, a epidemiologia, a sociologia (DIEZ-ROUX, 2002). Hitt et al (2007) relatam que avanços teóricos e analíticos na pesquisa de multiníveis foram iniciados principalmente a partir da década de 1980, por meio de conhecimentos inter-disciplinares. No campo dos estudos organizacionais, verifica-se que grande parte das pesquisas investiga fenômenos em níveis individuais de análise de forma mais pontual (HITT et al, 2007). Em outras palavras, os fenômenos são estudados apenas sob uma ótica “micro”, como se pudessem ser separados ou isolados de uma ótica mais macro. Entretanto, alguns autores argumentam que as organizações são sistemas que abrangem relacionamentos em vários níveis simultaneamente, o que exige uma análise mais complexa dos fenômenos organizacionais (ver, por exemplo, HITT et al, 2007; HERRANZ, 2010; GEELS, 2002; KLEIN; KOZLOWSKI, 2000; PANTOJA; BORGES-ANDRADE, 2004; MENDONÇA; CUNHA; NASCIMENTO, 2013). Dessa maneira, é preciso direcionar esforços para integrar os níveis de investigação dos fenômenos. Eis a importância da análise multinível para o estudo organizacional. Pantoja e Borges-Andrade (2004) comentam que as bases teóricas da análise multinível estão atreladas à teoria geral dos sistemas. De forma resumida, esta teoria assume que cada sistema é formado por subsistemas e é parte de um sistema maior. A teoria geral de sistemas permite supor que os fenômenos micro estão embutidos em contextos macro e que estes frequentemente emergem da interação dinâmica com elementos de nível inferior. Deste modo, uma abordagem multinível combinaria os níveis micro e macro (e meso) (PANTOJA; BORGES-ANDRADE, 2004). Segundo Klein e Kozlowski (2000), o desafio da análise multinível não está em pensar no nível micro nem no nível macro, mas sim pensar micro e macro de modo alinhado. Nesse contexto, ao utilizar a análise multinível para compreender fenômenos organizacionais, compreende-se que as organizações são sistemas multiníveis, que integram processos que podem ocorrer nos níveis individual (micro), grupal (meso) e organizacional (macro) (KLEIN; KOZLOWSKI, 2000). O nível micro tem seu foco na compreensão dos pensamentos, sentimentos e ações dos indivíduos, isto é, no entendimento de características pessoais que afetam/podem afetar o comportamento do indivíduo. Por sua vez, o nível macro foca no estudo do comportamento agregado ou coletivo (organizações, setores e mercados). O nível meso, por fim, está associado aos grupos de trabalho, vinculando-se com as áreas de comunicação e psicologia social. A Figura 2 ilustra uma representação de um arranjo multinível. Ao centro da figura, tem-se como micro o nível individual, que traz consigo conhecimento, habilidades e outras características pessoais. Em seguida, têm-se os níveis de 6/16 ANAIS grupos, subunidades, organizações, rede interorganizacional e ambientes – este último como nível macro. Figura 2. Arranjo Multinível Fonte: Hitt et al (2007). Para Hitt et al (2007), o tema central da análise multinível é que as organizações se estruturam em arranjos com diferentes camadas de níveis. A lógica geral é de que os indivíduos são organizados em grupos de trabalho, que por sua vez são organizados em unidades organizacionais maiores, tais como departamentos ou unidades de negócio estratégicas, que fazem parte de organizações nacionais ou multinacionais. Além disso, as organizações estão estruturadas em redes de relações interorganizacionais (por exemplo, alianças estratégicas, cadeias produtivas ou cadeias de suprimento), que por sua vez são encaixadas em ambientes de desempenho geral. Embora o número exato e a natureza das camadas são suscetíveis à variação, é evidente que o arranjo multinível traz certas implicações para a teoria e pesquisa organizacional (HITT et al, 2007). Isso porque uma mudança em alguma camada do arranjo influencia e é influenciada por outras camadas que influenciam e são influenciadas pelo arranjo. Nessa concepção, não faz sentido analisar um fenômeno organizacional em apenas um nível, dissociado dos demais. Herranz (2010) propõe o desenvolvimento de indicadores para avaliar redes organizacionais do setor público a partir de uma análise multinível. De acordo com o autor, tais redes são caracterizadas por relacionamentos interorganizacionais (empresas, ONGs, órgãos governamentais etc.), que incluem processos formais (contratos) e informais (voluntários). Nessas redes colaborativas, gestores normalmente não possuem o controle organizacional usualmente associado com abordagens tradicionais da administração pública. Ao mesmo tempo, os mesmos gestores públicos estão sendo responsabilizados pelo desempenho, ainda que os serviços públicos sejam prestados através dos arranjos da rede. Visando definir o desempenho de uma rede, é preciso definir sua complexidade multinível. Para tanto, Herranz (2010) se utiliza de três níveis de eficácia da rede originalmente indicados por Provan e Milward (2001): comunidade, rede e organizacional. A eficácia a nível comunitário refere-se aos resultados do sistema maior em que uma rede opera. A eficácia no nível da rede está associada ao desempenho de uma rede particular, com ênfase 7/16 ANAIS nas alterações dos atributos estruturais da rede. Por fim, a eficácia a nível organizacional está relacionada ao desempenho de um organismo específico dentro de uma rede. Dessa forma, o autor estabelece indicadores para cada nível e conclui que o desempenho de uma rede multinível está relacionado com diferentes abordagens de controle e coordenação dessa rede. Geels (2002) afirma que diferentes níveis e unidades de análise são estudados a partir da análise multinível. O autor define que a análise multinível busca discutir a mudança tecnológica como um processo social de assimilação de novas tecnologias, que transformam regras existentes, analisando episódios passados da inovação transformacional em múltiplos níveis. Dessa maneira, a análise da relação multinível tem como foco a ação recíproca entre três níveis de estudo (micro, meso e macro). Para observar esses níveis, Geels (2002) propõe o conceito de sistema sócio-técnico, que inclui a produção, difusão e uso das tecnologias, configurando-se como sistemas heterogêneos de relações entre elementos necessários para cumprir as funções sociais e é composto por artefatos, conhecimentos, capital, trabalho, significados culturais, infraestrutura, relações com fornecedores, entre outros (MENDONÇA; CUNHA; NASCIMENTO, 2013). De forma geral, as inovações emergentes ocorrem no nível micro, também chamado de nicho. As trajetórias e desenvolvimento tecnológicos ocorrem no nível das configurações existentes ou sistemas, ou no nível meso de regimes sócio-técnicos. No nível macro, no nível dos cenários, acontecem as mudanças estruturais da sociedade como um todo. Mendonça, Cunha e Nascimento (2013) alegam que o modelo de relação micro-meso-macro oferece a possibilidade de perceber como e em qual nível as diferentes fases da mudança acontecem. Ainda, os autores alertam que uma trajetória meso é resultado de mudanças que ocorrem simultaneamente no nível micro e no nível macro durante três fases. A Figura 3 apresenta diferentes níveis de análise: cenário (ou em inglês landscape, macro), regimes (meso) e nichos (micro). Figura 3. Diferentes níveis de análise Fonte: adaptado de Mendonça, Cunha e Nascimento (2013). No nível micro, estão os nichos. Os nichos são definidos em termos de domínios locais em que tecnologias novas e não padronizadas são usadas e, em termos de indivíduos, interagem entre si e cumprem regras estabelecidas. Tais indivíduos podem aprender ou 8/16 ANAIS desenvolver novas regras, fundamentais para uma mudança tecnológica e social, porém, os hábitos e as rotinas desenvolvidas também nesse nível podem se configurar como barreiras à inovação no nível meso. O processo de formação de novas tecnologias está relacionado com o alinhamento de expectativas, o processo de articulação e formação dos relacionamentos entre stakeholders. Destaca-se que as novidades que emergem dos nichos são inicialmente configurações sociotécnicas incertas com baixo desempenho. Ainda, a inovação radical dos nichos ocorre tanto em resposta às mudanças no ambiente, quanto na forma de processos de baixo para cima e, espera-se que sejam utilizadas nos regimes ou que substituam os existentes (GEELS, 2002; MENDONÇA; CUNHA; NASCIMENTO, 2013). O nível meso é formado por regimes sócio-técnicos que criam estabilidade, uma vez que ocorrem em diferentes empresas, pesquisas e trabalhos em direções similares. Isso resulta em trajetórias tecnológicas a nível setorial com mudanças incrementais para refinar tecnologias já existentes. Este nível exerce uma força estrutural sobre as alternativas de novidades surgidas nos nichos. Para que uma mudança ocorra no regime, é preciso que ela seja reconhecida como necessária, factível e vantajosa por multi-stakeholders. No regime, a dinâmica deriva em parte por um desenvolvimento autônomo dentro dos componentes do regime, e também pode ocorrer em resposta ao desenvolvimento do ambiente. Vale ressaltar que, como os regimes são caracterizados como um fenômeno social, eles também envolvem processos como consenso, divergências, inclusão, exclusão e relações de poder entre os diferentes stakeholders envolvidos. As intervenções são negociadas por processos de governança envolvendo múltiplos agentes, mas nenhum com poder decisivo. Nesse sentido, são as redes de atores – incluindo os membros do regime e outros atores – que buscam influenciar as transformações do regime (GEELS, 2002; MENDONÇA; CUNHA; NASCIMENTO, 2013). Cabe ressaltar que no nível micro, os hábitos e as rotinas são regras dos indivíduos ou firmas, enquanto que, no nível meso, os hábitos e suas atualizações criam uma estrutura generativa que os reproduzem. Tanto os regimes quanto os nichos estão situados dentro de um amplo ambiente de fatores sociais e físicos, o nível macro. No nível macro, tem-se o cenário. As mudanças no cenário acontecem lentamente, como crescimento econômico, mudanças nos valores culturais e normativos, padrões demográficos, mudanças políticas, problemas ambientais e escassez de recursos, podendo exercer pressão no nível do regime e criar oportunidades para novas tecnologias nos nichos. Alguns aspectos do nível macro incluem ainda, mudanças ambientais e demográficas, novos movimentos sociais, mudanças na ideologia política, reestruturação econômica ampla, paradigmas científicos emergentes e desenvolvimento cultural (GEELS, 2002; MENDONÇA; CUNHA; NASCIMENTO, 2013). Nessa perspectiva, é possível entender que existem três níveis de análise, que interagem entre si. Diante disso, pode-se propor a seguinte relação: novidades que surgem nos nichos, e poderão ser consolidadas apenas se forem consideradas como necessárias no nível do regime (surgindo um novo regime), passando a ser parte do cenário. Outras novidades que surgem devem passar pelo mesmo processo para assegurar sua sobrevivência. De acordo com Mendonça, Cunha e Nascimento (2013), a diferenciação entre nichos, regimes e cenário auxilia no entendimento do processo de mudanças, como no caso das inovações radicais que geralmente ocorrem de fora dos regimes, pois os atores do regime estão ligados a antigas tecnologias e formas de pensar. Mendonça (2014) buscou, em sua tese de doutoramento, analisar as relações multiníveis e a transição para ecoinovação a partir do caso do Programa Veículo Elétrico da 9/16 ANAIS Itaipu Brasil. A autora entende ecoinovação como uma nova perspectiva em que se colocam como aliadas a tecnologia e o desenvolvimento econômico de forma ambientalmente responsável. Tomando como base as pesquisas sobre relações multiníveis e transição para a inovação ambiental, é destacado o papel dos nichos como locais propícios ao surgimento de inovações radicais e de transição para um novo regime. A partir da análise do caso, a autora conclui que o processo de transição para a inovação ambiental é influenciado por três níveis que coevoluem com vistas a formar um novo regime. Portanto, estes níveis devem estudados de forma integrada para ampliar o entendimento das inovações ambientais. Diante dessas considerações, pode-se entender a aplicabilidade e a relevância da análise multinível. Na seção seguinte, são traçadas algumas reflexões sobre a sustentabilidade na cadeia de suprimentos e a análise multinível. Evidencia-se que não se pretende esgotar a discussão sobre as temáticas, mas sim ressaltar pontos considerados importantes para debates na área. 4. Reflexões sobre a Cadeia de Suprimentos e Cadeia de Suprimentos Sustentável à luz da Análise Multinível De acordo com Hitt et al (2007), para que o estudo organizacional continue avançando no sentido de explicar os comportamentos dos indivíduos, grupos e organizações, é preciso expandir as teorias e as pesquisas empíricas para abranger esses efeitos a vários níveis. Diante disso, entende-se que é possível uma discussão, ou aproximação, da temática de sustentabilidade na cadeia de suprimentos e da análise multinível. Assim sendo, ao argumentar sobre as temáticas, acredita-se que alguns pontos merecem destaque. Um primeiro ponto está no relacionamento com múltiplos stakeholders, ressaltando que uma cadeia possui níveis de membros. Cabe destacar que a cadeia de suprimentos não está organizada de forma linear, cujo fluxo se direciona em um sentido único. Conforme Maurer (2012) é preciso ter cautela ao analisar uma cadeia de suprimentos, uma vez que esta não pode ser estudada apenas sob uma perspectiva tradicional focada em retângulos os quais representam organizações e setas as quais indicam as relações existentes. A cadeia deve ser percebida como uma estrutura em si, com formas distintas, diferentes divisões de trabalho e de mecanismos de coordenação, demonstrando uma nova visão sobre cada membro que a compõe. Ademais, o próprio conceito de gestão da cadeia de suprimentos sustentável descarta a noção de um fluxo linear de sentido único de material, informação e capital ao longo da cadeia. Neste estudo teórico, argumenta-se que a cadeia de suprimentos deve ser representada mais como uma rede de relações entre uma empresa focal e stakeholders múltiplos (cadeiarede), do que um caminho de sentido único (cadeia-linear). A cadeia deve ser estruturada conforme a interação entre os seus membros, o que indica que a existência de diversas formas, tamanhos e mecanismos de coordenação, como aponta Maurer (2012). Nesse sentido, é possível identificar que o próprio conceito de cadeia de suprimentos já evidencia que diferentes níveis e múltiplos stakeholders fazem parte de uma cadeia. Uma vez que amplia a visão tradicional de stakeholders, incluindo também concorrentes e organizações nãogovernamentais, o próprio conceito de cadeia de suprimentos sustentável também salienta que existem diferentes níveis e múltiplos membros na cadeia. 10/16 ANAIS Pressuposto 1a – O conceito de cadeia de suprimentos evidencia que a cadeia é multinível, formada por n níveis e múltiplos stakeholders. Pressuposto 1b – O conceito de cadeia de suprimentos sustentável evidencia a cadeia sustentável é multinível, formada por n níveis e múltiplos stakeholders. Tais pressupostos representam uma primeira aproximação da cadeia de suprimentos numa visão mais tradicional e da cadeia de suprimentos sustentável a uma análise multinível mais geral. A cadeia torna-se mais complexa com o aumento de seus níveis, trazendo a necessidade de maior gestão e coordenação. Nesse cenário, os diferentes níveis de membros acabam exigindo uma gestão de stakeholders por parte da empresa focal, sendo uma maneira de gerenciar as expectativas, objetivos, desempenho, responsabilidades e conflitos de interesses desses membros. Dessa maneira, recomenda-se que seja realizada uma gestão de stakeholders em uma cadeia de suprimentos considerando diferentes níveis para análise. O segundo ponto destacado relaciona-se à utilização da análise multinível para compreender fenômenos organizacionais a partir de níveis micro, meso e macro. De acordo com Klein e Kozlowski (2000), o uso da análise mutinível parte de um entendimento de que as organizações são sistemas multiníveis, que integram processos que podem ocorrer nos níveis individual (micro), grupal (meso) e organizacional (macro). Carvalho e Barbieri (2013) afirmam que, em virtude do aumento da competitividade dos mercados, as cadeias de suprimentos competem umas com outras em vez de empresas competirem contra empresas, e as interações organizacionais se tornam geradoras de maior desempenho e de competitividade. Dessa maneira, sob a ótica da cadeia, as empresas deixam de ser consideradas unidades de análise. A unidade de análise é, portanto, a cadeia. Nesse contexto, assume-se que as cadeias de suprimentos são sistemas multiníveis, que podem ser analisadas a partir de níveis micro, meso e macro. Contudo, devem ser definidos novos parâmetros para esta análise. Ao desenvolver indicadores para avaliar redes organizacionais do setor público a partir de uma análise multinível, Herranz (2010) se utiliza de três níveis de eficácia da rede originalmente indicados por Provan e Milward (2001): comunidade (macro), rede (meso) e organizacional (micro). Dessa maneira, pode-se perceber que o autor utilizou de outros padrões, sem deixar de seguir a lógica macro-meso-micro para análise multinível. Diante disso, propõe-se que o nível micro seja associado a um nível organizacional, que representa os membros que fazem parte da cadeia de suprimentos. O nível micro se refere aos stakeholders, aqueles que influenciam e são influenciados pelas atividades da cadeia de suprimentos. Por seu turno, o nível meso deve estar relacionado a um nível de grupos organizacionais, ou grupos de membros da cadeia. De tal modo, parte-se da premissa de que diferentes stakeholders podem manter relacionamentos além daqueles necessários para o bom andamento das atividades da cadeia. Por fim, o nível macro estaria vinculado a cadeia de suprimentos propriamente dita. Pressuposto 2a – Entendendo a cadeia de suprimentos como sistema multinível, é possível analisá-la nos níveis micro, meso e macro: (a) no nível micro, estão as organizações da cadeia; (b) no nível meso, estão os grupos de organizações; e, (c) no nível macro, está a cadeia de suprimentos. 11/16 ANAIS Pressuposto 2b – Entendendo a cadeia de suprimentos sustentável como sistema multinível, é possível analisá-la nos níveis micro, meso e macro: (a) no nível micro, estão as organizações da cadeia; (b) no nível meso, estão os grupos de organizações; e, (c) no nível macro, está a cadeia de suprimentos sustentável. Dessa maneira, a cadeia é considerada um sistema multinível e sua análise está baseada em diferentes níveis. São eles: organizacional (micro), grupo de organizações (meso) e cadeia de suprimentos/cadeia de suprimentos sustentável (macro). Além disso, acredita-se que existam outros caminhos a serem seguidos no que diz respeito aos níveis micro-mesomacro. Por exemplo, pode-se seguir o caminho em que a cadeia de suprimentos é estabelecida no nível micro, o grupo de cadeias relacionado ao nível meso e o setor em que a cadeia está atuando atrelado ao nível macro. A diferença está na perspectiva que o pesquisador deseja utilizar para atingir o objetivo de seu estudo. Considerando o que já foi apresentado, pode-se perceber que os pressupostos estão relacionados com uma visão mais tradicional da cadeia e também com uma visão mais sustentável da cadeia de suprimentos. Beske e Seuring (2014) e Halldórsson, Kotzab e SkjottLarsen (2009) afirmam que se pode entender a cadeia de suprimentos sustentável como sendo uma extensão da cadeia de suprimentos. Esta relação de pressupostos é, então, viável. Acredita-se que tal relação é importante para que estudiosos, ainda que não sigam uma linha de pesquisa voltada para a sustentabilidade, possam entender que a importância da análise multinível na cadeia de suprimentos. Ademais, um terceiro ponto merece destaque, considerando uma transição de cadeia de suprimentos mais tradicional para uma cadeia de suprimentos sustentável. Em virtude de pressões feitas pela sociedade em geral, governantes e entidades não governamentais, gestores passaram a inserir práticas de sustentabilidade nas rotinas, atividades, processos e estratégias organizacionais. Seuring e Gold (2013) alertam que a introdução efetiva da sustentabilidade em empresas exige ações que extrapolam os limites organizacionais, abarcando o ambiente interorganizacional. Assim, práticas de sustentabilidade vêm sendo introduzidas na cadeia de suprimentos, o que caracteriza uma transição de uma visão mais tradicional para uma visão mais sustentável (PAGELL; WU, 2009). De tal modo, esta transição pode ser analisada a partir das interações entre processos que acontecem em três níveis: nichos, regimes e cenários. Segundo Geels (2002), novidades e inovações dos nichos desenvolvem uma dinâmica interna através de processos de aprendizagem, melhorias de preço e desempenho, e suporte de grupos de apoio, mudanças no nível do cenário criam pressões no regime, e, então, a desestabilização do regime cria janelas de oportunidades para que essas inovações e novidades dos nichos possam se consolidar. A análise nos três níveis (nicho-regime-cenário) permite uma apreciação dos hábitos e rotinas tanto como padrões de comportamentos, quanto como mecanismos genéricos que os produzem (MENDONÇA; CUNHA; NASCIMENTO, 2013). Nesse sentido, argumenta-se que práticas para a introdução da sustentabilidade na cadeia foram desenvolvidas nos nichos e que as mudanças que surgiram no cenário passam a criar pressões no regime, fazendo com que surjam cada vez mais espaços para que essas práticas possam se consolidar – e constituir um novo regime em que práticas de sustentabilidade se tornem parte consolidada da cadeia de suprimentos. Em outras palavras, a transição de um regime mais tradicional para um mais sustentável faz com que práticas de 12/16 ANAIS sustentabilidade se tornam pré-requisitos para a atuação das cadeias de suprimentos neste regime. Pressuposto 3a – Considerando uma transição para a cadeia de suprimentos sustentável, entende-se que a concepção, desenvolvimento e introdução de práticas de sustentabilidade na cadeia de suprimentos parte dos nichos (nível micro). Pressuposto 3b – Considerando uma transição para a cadeia de suprimentos sustentável, acontecem, no cenário (nível macro), mudanças nos valores e nas ideologias voltadas para uma sociedade mais sustentável, bem como uma reestruturação econômica que não considere apenas. Pressuposto 3c – Considerando uma transição para a cadeia de suprimentos sustentável, pressões são feitas nos regimes (nível meso), diante do surgimento de práticas mais sustentáveis na cadeia e por mudanças pró-sustentabilidade no cenário, para ampliar o espaço de práticas mais sustentáveis na cadeia de suprimentos. Logo, entende-se que os nichos (nível micro) são o espaço para o desenvolvimento das inovações relacionadas com a sustentabilidade na cadeia de suprimentos. Aqui, destaca-se o papel dos nichos como locais propícios ao surgimento de inovações radicais e de transição para um novo regime mais sustentável. No cenário (nível macro), se encontram mudanças estruturais e que ocorrem lentamente, como mudanças pró-sustentabilidade em valores culturais, ideologias, reestruturação econômica e mudanças sócio-técnicas. A partir da pressão exercida por inovações sustentáveis nos nichos e na mudança pró-sustentabilidade no cenário, regimes são pressionados a ampliar o espaço para o desenvolvimento de mais inovações sustentáveis na cadeia de suprimentos. Portanto, uma mudança efetiva em prol da sustentabilidade na cadeia de suprimentos deve envolver os múltiplos níveis. Acredita-se que o cenário atual encontra-se em fase de ampliação do espaço das práticas de sustentabilidade na cadeia de suprimentos. Embora várias cadeias entendam sua responsabilidade para um mundo mais sustentável, a visão tradicional parece ser ainda dominante. No entanto, com o aumento desse espaço, existe a expectativa de que práticas sustentáveis na cadeia de suprimentos passem a ser o novo regime: que exerça uma força estrutural sobre o relacionamento inter-organizacional exigindo melhores práticas em suas operações. 5. Reflexões Finais Este estudo teórico partiu do pressuposto de que a análise multinível pode trazer grandes contribuições para os estudos organizacionais, particularmente, no que diz respeito aos estudos relacionados à cadeia de suprimentos. Desse modo, buscou-se discutir as possibilidades da cadeia de suprimentos sustentável a partir de uma análise multinível. O ambiente de possibilidades dá espaço para o otimismo. A sustentabilidade – e, portanto, considerar simultaneamente as questões econômicas, sociais e ambientais – está aos poucos se tornando questão de sobrevivência para as empresas e, consequentemente, para suas cadeias 13/16 ANAIS de suprimentos. Além disso, certos autores parecem entender e a importância e a necessidade de sua aplicação nos estudos organizacionais. Diante do que foi discutido, foram elaborados três pressupostos – e seus respectivos desdobramentos – com o objetivo de evidenciar possibilidades de interação entre as temáticas estudadas. Cabe salientar que esses pressupostos, que tratam da cadeia de suprimentos sustentável e também cadeia de suprimentos em sua visão tradicional, representam apenas uma interação inicial. Compreende-se que existe espaço para maiores discussões e contribuições, tanto nas construções teóricas quanto nas observações de tentativas de implantação de iniciativas práticas de sustentabilidade sob a ótica da análise multinível. Ainda que existam certas limitações nesses pressupostos, acredita-se que as possibilidades são imensas. Assim, recomenda-se para pesquisas futuras estudo que explorem as aplicações das discussões apresentadas neste artigo, de modo a observar se tais relações são apresentadas empiricamente. Referências ASHBY, A.; LEAT, M.; HUDSON-SMITH, M. Making connections: a review of supply chain management and sustainability literature. Supply Chain Management: An International Journal, v.17, n.5, p.497-516, 2012. BEAMON, B. M. Designing the green supply chain. Logistics Information Management, v.12, n.4, p.332-342, 1999. BESKE, P. Dynamic capabilities and sustainable supply chain management. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, v.42, n.4, p.372-387, 2012. BESKE, P.; SEURING, S. Putting sustainability into supply chain management. Supply Chain Management: an international journal, v.19, n.3, p. 322-331, 2014. CARVALHO, A. P.; BARBIERI, J. C. 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