Avaliao das perdas de receita da lavoura cacaueira da Bahia

Transcrição

Avaliao das perdas de receita da lavoura cacaueira da Bahia
Avaliação das perdas de receita da lavoura cacaueira da Bahia
provocadas pela introdução da doença da vassoura-de-bruxa
07/08*)
02/03
97/98
92/93
87/88
82/83
77/78
72/73
67/68
62/63
57/58
52/53
47/48
42/43
sc de 60 kg
Quase 20 anos depois da chegada do fungo da vassoura-de-bruxa nos cacauais da Bahia é
oportuno avaliar os prejuízos causados.
Segundo consta, o fungo chegou ao estado em 1988 e foi descoberto em 1989, entretanto, os prejuízos materiais decorrentes da quebra de produção só começaram a ser registrados estatisticamente a partir do anoInício das perdas pela
vassoura-de-bruxa
safra
agrícola
de
Quadro 1 - Safras de cacau da Bahia
Período de
1994/95. O Quadro 1
7.000.000
comparação
ao lado mostra a evo6.000.000
lução das safras de
5.000.000
cacau da Bahia nos últimos 66 anos. Nota4.000.000
se que a produção ex3.000.000
perimentou
crescimento contínuo até
2.000.000
meados da década
1.000.000
‘90, modulado apenas
pelas variações climá0
ticas inerentes à atividade agrícola. A partir *) Previsão
Ano safra
daí,
ocorreu
uma
queda brusca da produção, conseqüência direta da doença de fungo, que fez as safras da Bahia
retroceder para os mesmos níveis baixos registrados no meio do século passado.
Se a cacauicultura baiana não tivesse sido atingida pelos efeitos deletérios do fungo Crinipellis
perniciosa, é de supor-se que sua produção teria prosseguido em curva ascendente, tal qual
aconteceu no resto do mundo, que, entre 1995 e 2007, registrou aumento de 28%. Contudo, o
presente estudo não considerará esta hipótese. Numa avaliação conservadora, parte-se do
pressuposto que, mesmo sem o advento da doença, o volume de produção das 14 safras
decorridas a partir de 1994/95 apenas teria mantido o mesmo nível das temporadas antecedentes,
ou seja, que a produção teria ficado estagnada. Portanto, atribui-se às perdas sofridas um valor
mínimo, que na realidade certamente foi bem superior. A simulação leva em conta as oscilações
da produção anual decorrentes das variações climáticas que efetivamente ocorreram. O Quadro 2
contém os dados numéricos utilizados.
Quadro 2 - Produção provável de cacau na Bahia sem o advento da V.-B.
sc de 60 kg
8.000.000
Produção
Projetada
Efetiva
6.000.000
4.000.000
2.000.000
05/06
03/04
01/02
99/00
97/98
95/96
91/92
93/94
Ano safra
07/08*)
*)Previsão
89/90
0
87/88
Produção
efetiva
projetada
3.895.410 4.280.000
2.636.974 3.690.000
2.955.242 5.020.000
2.546.087 5.090.000
2.239.716 5.260.000
1.643.620 4.440.000
1.757.574 5.360.000
2.155.484 6.440.000
1.685.298 4.940.000
2.390.468 6.860.000
2.040.421 5.730.000
2.388.597 6.540.000
1.928.866 5.150.000
1.715.000 4.460.000
31.978.757 73.260.000
85/86
Ano
Safra
94/95
95/96
96/97
97/98
98/99
99/00
00/01
01/02
02/03
03/04
04/05
05/06
06/07
07/08*)
83/84
Produção
efetiva
5.041.348
4.609.296
5.284.206
5.876.205
5.029.780
6.026.764
6.622.695
4.993.183
5.243.338
5.366.094
5.938.778
4.229.927
4.099.951
4.912.919
73.274.484
81/82
Ano
Safra
80/81
81/82
82/83
83/84
84/85
85/86
86/87
87/88
88/89
89/90
90/91
91/92
92/93
93/94
O valor da produção de cada safra pode ser calculado com boa precisão a partir das estatísticas
oficiais do Convênio Comcauba/ACB, que registram as entregas semanais do produto no sistema
econômico de cacau da Bahia, e dos preços praticados no mercado do produtor aferidos
diariamente, obtendo-se uma estimativa da receita realizada pela lavoura de cacau da Bahia nos
14 anos sob exame que deve estar bastante próxima à realidade. Os totais assim obtidos
referentes às 13 temporadas anteriores à safra corrente foram trazidos para os valores presentes,
sendo o fator de correção mais adequado para a lavoura de cacau o montante do Salário Mínimo,
já que a mão-de-obra representa cerca de 90% do custo de produção do cacau. Esses valores são
comparados com os que teriam sido realizados se a produção se tivesse mantido nos níveis
projetados no Quadro 2, igualmente trazidos para valores presentes.
Entretanto, a fim de preservar a objetividade do estudo, foi levado em conta que os preços pagos
ao produtor a partir de 1999 haviam sido inflados pela necessidade da importação de cacau. Se a
produção tivesse permanecido nos níveis anteriores, as importações não teriam sido realizadas e
não teriam exercido o efeito valorizador sobre os preços da lavoura. Estudos mostram que, neste
caso, os preços do produtor teriam sido inferiores em cerca de 15%, razão pela qual os valores
utilizados no cálculo da receita projetada foram reduzidos nesta mesma proporção.
Quadro 3 - Avaliação das perdas de receita da cacauicultura da Bahia
Ano
safra
94/95
95/96
96/97
97/98
98/99
99/00
00/01
01/02
02/03
03/04
04/05
05/06
06/07
07/08*)
Receita realizada
Receita projetada
Perda de receita
Produção Pr.méd.
Valor - R$
Produção Pr.méd.
Valor - R$
Valor - R$
sc
R$/@
nominal
corrigido
sc
R$/@
nominal
corrigido
nominal
corrigido
3.895.410 13,31 207.425.699 1.126.025.222 4.280.000 13,31
227.904.642 1.237.196.625
20.478.943
111.171.404
2.636.974 14,89 157.019.853
596.675.440 3.690.000 14,89
219.722.779
834.946.562
62.702.927
238.271.121
2.955.242 16,90 199.808.239
677.920.811 5.020.000 16,90
339.409.551 1.151.568.120
139.601.312
473.647.308
2.546.087 23,40 238.264.597
754.504.557 5.090.000 23,40
476.325.749 1.508.364.873
238.061.152
753.860.316
2.239.716 24,97 223.670.989
653.807.506 5.240.000 24,97
523.296.789 1.529.636.769
299.625.800
875.829.262
1.643.620 25,60 168.324.073
470.317.264 4.400.000 21,76
383.015.560 1.070.190.535
214.691.486
599.873.271
1.757.574 23,31 163.845.982
412.327.636 5.310.000 19,81
420.761.139 1.058.869.092
256.915.157
646.541.456
2.155.484 38,34 330.602.251
697.938.086 6.380.000 32,59
831.764.935 1.755.948.195
501.162.683 1.058.010.109
1.685.298 101,31 682.958.364 1.297.620.892 4.890.000 86,11 1.684.400.291 3.200.360.553 1.001.441.927 1.902.739.661
2.390.468 65,05 621.992.060
984.820.761 6.790.000 55,29 1.501.725.675 2.377.732.319
879.733.616 1.392.911.558
2.040.421 68,03 555.236.078
811.498.883 5.670.000 57,83 1.311.474.582 1.916.770.542
756.238.504 1.105.271.659
2.388.597 49,49 472.856.917
598.952.095 6.470.000 42,07 1.088.704.630 1.379.025.865
615.847.714
780.073.770
1.928.866 49,75 383.880.775
416.784.841 5.090.000 42,29
861.055.238
934.859.973
477.174.463
518.075.131
1.715.000 59,87 410.691.169
410.691.169 4.460.000 50,89
907.831.033
907.831.033
497.139.864
497.139.864
31.978.756
4.816.577.045 9.909.885.164 72.780.000
10.777.392.594 20.863.301.056 5.960.815.548 10.953.415.893
*) Previsão
Obedecendo a essa metodologia de cálculo, a última coluna do Quadro 3 demonstra – numa
avaliação extremamente conservadora – a perda de receita sofrida pela lavoura cacaueira da
Bahia em conseqüência do surto da doença da vassoura-de-bruxa, que monta a
quase R$11 bilhões em valores de hoje.
Note-se que a presente avaliação apenas abrange as perdas demonstráveis das receitas diretas
oriundas da atividade produtora de cacau. Além destas, muitos outros prejuízos foram causados
pelo ação devastadora da doença, sendo as de maior significado e monta:
Para os produtores de cacau:
elevação dos custos do manejo com os trabalhos de controle da doença (em grande parte
inúteis) e com a renovação genética das plantações velhas suscetíveis à doença;
endividamento progressivo através de dívidas assumidas no Plano de Recuperação da
Lavoura Cacaueira, desperdiçadas na aplicação compulsória dos recursos obtidos em
práticas agrícolas ineficazes ou mesmo contraproducentes.
Para os trabalhadores rurais da região:
desemprego de dezenas ou mesmo centenas de milhares de trabalhadores rurais com a
concomitante perda de suas moradias e fontes de subsistência;
deslocamento dos trabalhadores e de suas famílias das fazendas de cacau para a periferia
de centros urbanos, onde subsistem em condições subumanas, sem o atendimento às
suas necessidades básicas.
Para as empresas ligadas ao setor cacau:
desativação das firmas exportadoras de cacau em grão, com perdas de investimentos, do
fundo de comércio e de receitas operacionais;
elevação dos custos da indústria processadora em conseqüência da necessidade de
importar cacau de outros países.
Para a economia da região cacaueira em geral:
queda de toda atividade econômica resultante da redução drástica do poder aquisitivo de
uma grande parte da população, da desativação de numerosas empresas e da redução dos
investimentos e gastos das empresas remanescentes.
Para o Poder Público:
queda da arrecadação tributária em todos os níveis, federal, estadual e municipal, em
função da redução da atividade econômica em todos os setores;
aumento expressivo dos gastos sociais assumidos pelas administrações municipais com a
acomodação e sustento dos trabalhadores rurais e suas famílias, deslocados para as
periferias dos centros urbanos;
elevação dos investimentos em programas de combate à pobreza e auxílio ao desemprego,
diante do crescimento do contingente de desempregados, tanto na atividade rural, quanto
empresarial.
O abaixo assinado não dispõe de dados para avaliar os prejuízos causados por todas essas
ocorrências, mas recomenda que sejam feitos estudos objetivos para seu levantamento, com a
finalidade de aferir um quadro abrangente e confiável da extensão desse verdadeiro desastre que
afligiu a região cacaueira da Bahia em conseqüência da introdução do fungo Crinipellis perniciosa.
Também se sugere que os dados apresentados no presente estudo, bem como os demais que
vierem a ser levantados, sejam considerados para o dimensionamento do “PAC do Cacau”, cuja
implementação já foi prometida repetidas vezes desde setembro do ano passado, mas ainda não
foi efetivada.
Salvador, 7 de fevereiro de 2008
Thomas Hartmann
Produtor de cacau e analista de mercado

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