proposição - Pós-Graduação em Ensino de Ciências da UnB
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proposição - Pós-Graduação em Ensino de Ciências da UnB
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação Instituto de Física Instituto de Química PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM ENSINO DE CIÊNCIAS Módulo de Ensino A História da Ciência e a Experimentação no Ensino de Química Orgânica Cláudio Luiz Nóbrega Pereira Proposta de ação profissional resultante da dissertação realizada sob orientação do Prof. Dr.Roberto Ribeiro da Silva e apresentada à banca examinadora como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Ensino de Ciências – Área de Concentração “Ensino de Química”, pelo Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências da Universidade de Brasília. Brasília – DF Janeiro 2008 125 Sumário Introdução ............................................................................... 126 Orientações ao professor ......................................................... 129 Primeira Parte ......................................................................... 1 O uso dos corantes ao longo da história ............................. 1.1 Garança ......................................................................... 1.2 Índigo ............................................................................ 1.3 Púrpura do Tiro ............................................................. 1.4 Pau-brasil ....................................................................... 1.5 Urucum ......................................................................... 1.6 Corantes sintéticos ......................................................... 133 133 136 138 141 142 144 145 2 Os tecidos e os corantes ...................................................... 2.1 Fibras têxteis .................................................................. 2.2 Interações entre as fibras e os corantes ........................... 2.3 Classificação dos corantes .............................................. 150 150 152 154 3 A luz, as cores e os corantes ................................................ 3.1 A natureza da luz ........................................................... 3.2 As cores ......................................................................... 3.3 Interação luz e matéria ................................................... 157 157 161 165 Segunda Parte – Experimentos .............................................. 168 1. Tingindo tecidos ................................................................... 2. Corantes X Pigmentos .......................................................... 3. Desbotando a calça jeans ...................................................... 4. Colorindo com o índigo ........................................................ 5. Descolorindo com a eletricidade ........................................... 6. As cores dos objetos ............................................................. 7. A luz e os corantes ............................................................... 8. Ultravioleta a cor invisível .................................................... 168 172 175 177 180 183 186 190 Referências .............................................................................. 192 126 Introdução O ensino de ciência tem apresentado, em nível mundial, uma série de problemas. Assim como no Brasil, vários paises desenvolvidos propuseram novos currículos e novas abordagens para as disciplinas escolares ligadas a esta área do saber. Estas mudanças visam adequar o ensino as novas necessidades geradas pelas profundas mudanças que temos vivenciado no contexto sócio-econômico. Em nosso país a educação como um todo apresenta problemas estruturais graves, mas a área de ciência parece apresentar especificidades que vão além daquelas comuns as demais disciplinas. Esta crise no ensino de ciências pode ser sentida pela baixa procura de cursos ligados a careiras científicas. O Ministério da Educação estima que faltem entorno de 44 mil professores habilitados para lecionar Química e Física nas escolas. Este dado parecer ser paradoxal quando nos lembramos dos altos índices de desemprego em nosso país. Os motivos para este afastamento dos jovens das profissões ligadas a ciência certamente estão ligados à forma como as disciplinas da área são apresentadas aos alunos. Em geral o ensino é desvinculado da realidade, calcado na memorização excessiva, e na repetição de algoritmos. O conhecimento científico é apresentado fora de contexto, e de forma fragmentada. Aos alunos não é dado a conhecer que a ciência é uma construção humana, da qual todos somos herdeiros e convidados a participar. A imagem de ciência é apresentada nas escolas fortalece uma visão elitista, e tecnocrática. Somente gênios poderiam ter acesso a este saber, e a eles caberia solucionar os problemas da humanidade. A juventude assim, se percebe excluída deste empreendimento e não vê motivação para gastar energia com seu estudo. (Fourez, 1995). Além destes problemas, podemos acrescentar que o ensino de ciência ainda é calcado em uma visão do indutivista e empirista exacerbada. O conhecimento científico é tido como verdadeiro por ter como base fatos experimentais, sendo, portanto, inquestionável. Esta é a visão que permeia nossos livros didáticos. Neles o saber é apresentado como uma “retórica de conclusões”, o processo de sua construção não é discutido. As idas e vindas, as dúvidas que lhe são inerentes são omitidas. Tal visão sobre a natureza da ciência, também tem seus reflexos na forma como os professores concebem o uso da experimentação. Em geral a tomam como capaz de demonstrar a teoria vista em sala de aula. Toma-se como possível abstrair a teorias complexas de observações que fornecem apenas dados perceptíveis aos sentidos. O engano neste 127 posicionamento consiste em não se perceber que os conceitos da química são em sua maioria muito abstratos para poderem ser constatados por mera observação, como diria Giordan (1999). Reflexões a respeito destes problemas têm ocupado a pauta de pesquisa na área, sendo que a História da Ciência tem sido apresentada como uma fonte de material e idéias que podem ajudar a superar tais dificuldades. Uma síntese das justificativas para se usar este recurso nas salas de aula foi elaborada por Matthews (1995). Tabela A 1: Contribuições da História da Ciência para o ensino de ciências. 1. A história promove uma melhor compreensão dos conceitos e métodos científicos 2. A abordagem histórica conecta o desenvolvimento do pensamento individual com o desenvolvimento das idéias científicas 3. A História da Ciência é intrinsecamente motivadora. Importantes episódios da história da ciência e da cultura são conhecidos dos estudantes. 4. A história é necessária para entender a natureza da ciência. 5. A história contradiz o cientificismo e o dogmatismo presentes nos textos escolares 6. A história, pelo exame da vida de cada cientista, em seu período, humaniza os objetos de estudos da ciência, tornando-os menos abstratos e mais envolventes. 7. A história favorece a interdisciplinaridade. Uma proposta que busque associar a História da Ciência com o ensino de ciência tem, desta maneira, o compromisso de humanizar o conhecimento científico. Apresentando-o como parte integrante da cultura, conectado as demandas existentes em cada época, e sujeito as condições técnicas e as formas de compreender o mundo existente em cada período da história. Uma visão histórica da ciência pode ajudar a superar posições epistemológicas equivocadas. Um pouco de história pode ajudar o aluno a perceber que para compreensão de um fato muito de teoria é necessário. Afinal ver não é o mesmo que compreender. Lembremos que fenômenos químicos são conhecidos desde antiguidade. O domínio das técnicas metalúrgicas foi responsável pela ascensão de alguns impérios antes mesmo que o domínio da escrita. Todavia, a forma como nossos antepassados explicavam as transformações sofridas pelos minerais era completamente distinta da nossa. Levar os alunos a terem tal percepção pode ser fundamental para que venham a aceitar o conhecimento científico com sendo mais uma forma de pensar sobre o mundo, além daquela a que estão habituados no seu cotidiano. Feitas estas considerações, temos que a experimentação deve ter um papel diferenciado no ensino de ciência, que não aquele de comprovar teorias. Ela deve ser vista como uma provocadora de reflexão, um elemento capaz de suscitar discussões a partir das quais o conhecimento científico possa ganhar significado. 128 Essa busca de significado para o conhecimento químico, no nosso entendimento, implica em se procurar estabelecer as relações possíveis entre as dimensões que compreendem esta forma de ver o mundo. Olhar a realidade com os olhos da Química é saber interpretar os fenômenos como base em certas teorias, assim como conhecer as formas de representá-los. O conhecimento químico assim pode ser entendido por três dimensões: fenomenológico; microscópico; e representacional. Ao nível fenomenológico associam-se as observações macroscópicas acessíveis aos nossos sentidos, ou ainda aquelas percebidas por uso de instrumentos. Ao nível teórico associam-se as interpretações que damos aos fenômenos, que no caso da Química implica em fazer referencia a natureza corpuscular da matéria. As explicações em Química envolvem falar de átomos e moléculas, além de suas interações. Assim, o nível teórico associa-se a dimensão microscópica da natureza. Os símbolos, fórmulas e equações químicas associam-se a dimensão representacional. Por meio deles são descritas as transformações da matéria, indicam-se as substâncias contidas em um sistema, e os átomos com os quais seus constituintes são formados. Uma abordagem para o ensino de Química que vise superar as dificuldades apresentadas no início deve, naturalmente, incluir uma proposta de experimentação que leve em consideração a articulação entre estas três dimensões do conhecimento químico. Pelo contrário pode-se correr o risco de levar o aluno a ver as representações dos fenômenos como sendo o próprio fenômeno. 129 Orientações ao professor O material proposto consiste em um texto no qual abordamos a História e a Química dos corantes, e um conjunto de oito experimentos. A sugestão é de que no desenvolvimento da proposta sejam intercaladas a leitura e discussão dos textos com a realização dos experimentos. Objetiva-se com isso um processo de ensino mais dinâmico, em que as diversas dimensões do conhecimento químico sejam abordadas. Não tivemos a intenção de criar um compêndio de Química Orgânica aos moldes dos livros didáticos tradicionais. Estes, guiados pela lógica da formação profissional, repetem no ensino médio a abordagem apresentada nos cursos de nível superior. Entendemos que a formação da cidadania, objetivo maior do ensino básico, pode ser alcançada de forma mais efetiva quando abordamos problemas, ou situações reais, do cotidiano do aluno. Em conseqüência a organização do conteúdo tende a ser diferente daquela comumente trabalhada em sala de aula. O texto está divido em três capítulos. No primeiro exploramos a história dos corantes de uma maneira mais geral, indicando a importância que estes materiais apresentaram ao longo da história da humanidade. Destacamos alguns corantes que por conta de fatores comerciais ou sociais tiveram maior relevância histórica. Este é o caso do pau-brasil, que inegavelmente está associado a história de nosso país. No segundo capítulo, fazemos um apanhado de alguns conceitos químicos que nos ajudam a compreender o processo de tinturaria. Aí discutimos a constituição das fibras têxteis mais utilizadas, indicamos as formas pelas quais as moléculas de corantes se fixam aos tecidos e apontamos os princípios de classificação dos corantes. No terceiro capítulo abordamos o fenômeno das cores. Para tanto apresentamos um breve histórico a respeito da luz, iniciando pelas primeiras teorias formuladas na Grécia Antiga, passamos, sucintamente, pela contenda entre Newton e Huygens a respeito da natureza da luz e das cores. E por fim descrevemos como modernamente se aborda a interação entre energia radiante e matéria. Apresentamos, também, um conjunto de experimentos que poderão ser trabalhados em conjunto com o texto. Os experimentos não foram imaginados com a intenção de comprovar ou demonstrar quaisquer teorias. O objetivo é de que se prestem a iniciar discussões que tragam a tona os conceitos ou idéias apresentados ao longo do texto, permitindo associar a estas idéias a dimensão fenomenológica. Espera-se que sejam lastros com os quais se consiga construir uma fala que apresente significado para os alunos. 130 Nos roteiros dos experimentos, além de se indicar os materiais necessários e o procedimento a ser desenvolvido, apresentamos comentários que podem ajudar o professor no desenrolar das atividades. Indicamos os resultados macroscópicos esperados, e fornecemos a interpretação microscópica além das expressões representacionais dos fenômenos. Estas são as três dimensões ligadas ao conhecimento químico. É estabelecendo as inter-relações entre elas que a compreensão dos fenômenos torna-se mais efetiva. Saber Química é saber articular fatos, teorias e representações. Assim, é nossa intenção que o professor, partindo das discussões suscitadas pelo desenvolvimento dos experimentos, busque junto como seus alunos desenvolver os conceitos fundamentais da Química. Para isso recomendamos que se procure explorar as interpretações microscópicas dos fenômenos abordados nos experimentos sugeridos, associando-as com as respectivas representações. Os experimentos 1 e 2 estão associados ao primeiro capítulo do texto - A história dos corantes. Com eles procuramos levar os alunos a vivenciarem o processo de tinturaria, percebendo as diversas etapas envolvidas nesta atividade, assim como reconhecer a possibilidade de se extrair de fontes naturais materiais corantes. Pretende-se também iniciar a discussão a respeito da constituição da matéria, levando a distinção entre materiais orgânicos e inorgânicos. Os experimentos 3, 4 e 5 associam-se com ao segundo capítulo. Objetivamos que por meio deles o professor possa discutir com seus alunos conceitos ligados a óxido-redução no âmbito da química orgânica. Estes experimentos apresentam fenômenos que podem levar a ruptura da visão fragmentada da Química. Os demais experimentos – 6, 7 e 8 - buscam explorar o fenômeno da cor. Assim se associam ao terceiro capítulo. Com eles procuramos levar os alunos a refletirem sobre a interação entre luz e matéria, e perceberem que o uso dos sentidos tem limitações enquanto fonte de conhecimento da natureza. É importante que o professor, antes da realização de cada experimento, busque explorar os conhecimentos que os alunos já trazem consigo de suas vivencias cotidianas. Não somente no intuito de superá-las, tomando-as sempre como incorretas. Mas tentando, por outro lado, agregar a elas uma dimensão de reflexão. Havendo condições na escola, imaginamos que seja importante que os próprios alunos realizem as atividades. Todavia consideramos que as mesmas podem ser muito bem aproveitadas na forma de demonstrações. Para tanto é importante que o professor busque envolver a turma, fazendo com que cada aluno visualize as etapas do procedimento, e o 131 resultado que se obtém. Recomendamos que o professor esteja constantemente provocando os alunos com questionamento relacionados ao procedimento apresentado, no caso das demonstrações. Se o professor perceber que há necessidade de abordar outros conceitos que não foram aqui explorados, acreditamos que poderá fazê-lo. Ao contrário das abordagens tradicionais, a proposta não é fechada em si. Pelo contrário, a proposição de problemas que vão além do que se apresenta nos textos é um objetivo maior a ser desejado por todo educador. É necessário entender que a visão dominante em nosso sistema de ensino, pela qual há uma seqüência rígida a ser seguida, deve ser superada. Entendemos que os conceitos podem ser apresentados em uma ordem diferente daquela contida nos livros didáticos. Mesmo porque, aquela não é estritamente a ordem na qual se desenvolveram ao longo da história da Química. Para finalizar esta introdução, apresentamos abaixo um plano de ensino que pode imaginamos possa ajudar o professor no desenvolvimento do módulo. Este plano de ensino é apenas uma sugestão. Nele organizamos a forma como imaginamos ser possível intercalar a leitura do texto com os experimentos. Todavia alertamos que outras aulas se farão necessárias, no sentido de aprofundar questões que vierem a surgir durante as aulas experimentais, ou quando da leitura do módulo. Assim, sinta-se livre para organizar as atividades da melhor forma que lhe convir. Porém alertamos que fique atento no sentido de criar situações em que os alunos possam se expressar. Caso contrário pode-se cair nas mesmas armadilhas da abordagem tradicional, cuja superação foi a motivação para o desenvolvimento deste módulo de ensino. Tabela A 2. Sugestão de Plano de Ensino PLANO DE ENSINO PARA DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES Aula 1 Tempo 50 min. 2 50 min Atividade Orientação Leitura e discussão Organize a sala em círculo e solicite aos alunos que do texto da p. 133 a leiam o texto com atenção. Logo após a leitura, 136. peça a um aluno que expresse uma idéia retirada do texto, e a outro aluno que faça um comentário sobre o que o primeiro falou. Repita este procedimento enquanto achar conveniente. Realização do Inicialmente retome com seus alunos as idéias Experimento 1 (p. discutidas na primeira aula. Considerando que os 168). homens primitivos usavam materiais da natureza para tingir tecidos questione sobre quais materiais eles poderiam utilizar para tingir tecidos de algodão. Após esta discussão inicie o experimento. 132 3 50 min 4 50 min 5 50 min Realização do experimento 3 ou 4 (p. 175 e 177). 6 50 min. 7 50 min 8 50 min. Estudo dirigido sobre o tópico a respeito dos tecidos e classificação dos corantes (p. 150-156). Aula expositiva relativa à classificação dos corantes (p. 154-157). Realização do experimento 5 (p. 180). 9 50 min Leitura e discussão do tópico sobre a natureza da luz. (p. 157-160) 10 50 min 11 50 min 12 90 min Realização do experimento 6 (p. 183) Leitura e discussão do tópico sobre as cores ((p. 161-165). Realização do experimento 7 e 8 (p. 186 e 190). 13 50 mim Apresentação de cartazes sobre os corantes. Como base no texto das páginas 136 a 149. Realização do experimento 2 (p. 172). Estudo dirigido do tópico sobre interação luz e matéria (p. 165-168). Em uma aula que anteceda esta, divida a turma em grupos. Distribua as seções do primeiro capítulo entre os mesmo, e solicite que façam um cartaz para apresentação sobre o tópico indicado. Discuta como seus alunos sobre o que já ouviram falar sobre as pinturas nas cavernas. E indague sobre as condições necessárias para conservação destas pinturas. Depois realize o experimento. Discuta com seus alunos sobre as características que eles imaginam serem necessárias à um material corante. Retome os resultados do experimento 1 nesta discussão. A partir disto realize a atividade. Divida a turma em grupos e solicite que leia o texto estando atento às questões do roteiro. Ao final forme um grande círculo e discuta as questões com os alunos. Retome os resultados do experimento 3, ou 4 e discuta com os alunos buscando associar com a classificação dos corantes. Retome com seus alunos as observações do experimento 1, e as discussões relativas ao primeiro capítulo. Leve-os a perceberem que a grande demanda por corantes pode gerar impactos ambientais, e que assim se fazem necessários métodos para degradar os rejeitos industriais. Divida a sala em grupos e solicite que façam um resumo do texto. Depois disto organize um debate entre estes grupos. Busque aprofundar a discussão no sentido de se compreender como os conceitos científicos evoluem. Discuta inicialmente com seus alunos o que eles entendem o processo de formação das cores. Em seguida realize o experimento. Converse inicialmente com os alunos sobre o que eles entendem a respeito do processo da visão. A seguir proceda como na aula 1. Retome, junto a seus alunos, os resultados do experimento 6. A seguir realize o experimentos de 7 e 8. Depois de realizado a atividade discuta com eles, buscando resgatar os conceitos ligados ao modelo atômicos de Bohr. Procure faze-los relacionar este modelo com as observações feitas. Divida a turma em grupos e solicite que leia o texto estando atento às questões do roteiro. Ao final forme um grande círculo e discuta as questões com os alunos. 133 Primeira Parte – A Química e a História dos Corantes. Capítulo 1 – O uso dos corantes ao longo da história O uso de materiais para colorir objetos e exprimir as emoções é algo que acompanha a humanidade desde sua aurora. Datam do período paleolítico (350000 a.C.) as primeiras evidências da manipulação de pigmentos. Nesta época os homens faziam tatuagens com areia de cor vermelha, que se impregnava na pele por meio de espinhas de peixes. As primeiras pinturas em paredes de cavernas datam de 15000 a.C. A tinta utilizada para fazer estas inscrições consistia de uma mistura de areia colorida com gordura de origem animal (Fig. 1). A cor vermelha derivava de óxidos de ferro, o preto vinha do carvão e o roxo de compostos de manganês (Delamare e Guineau, 2000). a) b) Figura 1. Pinturas rupestres em interiores de cavernas: a) Altamira - Espanha b) parque da capivara Piauí-Brasil. Fonte: SBPC (2007). Uma curiosidade sobre estas figuras é que os “artistas” pré-históricos não se limitavam a usar unicamente os materiais disponíveis em sua região. Nas pinturas existentes nas cavernas do sul da França foram encontrados pigmentos de cor vermelha cuja origem só pôde ser relacionada a regiões que hoje pertencem a Espanha, ou seja, distantes cerca de 400 km. Isto indica a importância que os povos primitivos davam ao uso das cores. Além dos materiais de origem mineral, as cores também podiam ser obtidas a partir de seres vivos. Triturando sementes, raízes, cascas de árvores, pequenos insetos os povos préhistóricos conseguiam obter as mais diversas cores. Alguns corantes eram usados para modificar a cor de alimentos, e outros se prestavam ao tingimento de tecidos ou do couro. 134 Certamente utilizavam estes corantes para pintar também seus corpos, assim como fazem nossos índios. É muito provável que o uso de corantes seja tão antigo quanto o de pigmentos minerais. Flores, frutos e sementes coloridas sempre estiveram ao alcance de nossos antepassados. Todavia as evidências mais antigas do uso deste tipo de material datam de cerca de 6000 a.C. Elas consistiam em sementes de uma planta que fornecia um corante amarelo. Esta diferença de tempo entre os dois tipos de evidências se deve ao fato de que os corantes, por conta de sua origem, degradam-se com mais facilidade, exigindo condições muito específicas para sua conservação. Quando expostos a umidade, iluminação excessiva, ou em contato com o oxigênio do ar eles se oxidam, e as cores tornam-se mais tênues, até desaparecerem completamente (Delamare e Guineau, 2000). Um exemplo deste fenômeno de degradação dos corantes pode ser observado nas antigas estátuas gregas e romanas vistas hoje nos museus. A cor cinza ou branca se deve a ação do sol e da chuva. Quando concebida seus autores as pintavam em cores vivas e variadas, para que ficassem ainda mais parecidas com os personagens que retratavam (Ribeiro Jr., 2007). Uma exceção que tem chamado a atenção de pesquisadores a esta degradação é uma laca produzida pelos maias, conhecida como azul maia. Ela era obtida pela mistura de índigo com paligorsquite1. Esta mistura foi usada para produzir murais que enfeitavam vários templos maias a cerca de 1000 anos, e apresentam ainda hoje o brilho e a tonalidade original, apesar das condições de calor e umidade da selva tropical. O azul-maia é resistente inclusive a agentes redutores e oxidantes, nem ácidos minerais ou álcalis o afetam, como tão pouco solventes orgânicos (Cabral, 2007). Os corantes tiveram uma importância cultural e comercial muito grande ao longo da historia da humanidade, as evidências de transações comerciais são antigas também. A cerca de 4000 a. C, os habitantes da Mesopotâmia já dominavam as técnicas de tinturaria, e praticavam um intenso comércio. Este povo deixou registrou de suas transações comerciais na forma de escrita cuneiforme em tábuas de argila (Levey, 1955). Em torno do ano 2500 a.C já havia fábricas de corante pastel na região da Suíça, assim como na Índia existiam fábricas de tecidos de algodão. Os corantes constavam da pauta de exportação do comercio entre a Ásia e a Europa. Quando os portugueses se lançaram ao mar em busca de novos caminhos para as índias, 1 Mineral argiloso de estrutura fibrosa, semelhante a do amianto. Sua formula geral é: (Mg,Al)2Si4O10(OH)·4(H2O). 135 procuravam ter acesso ao mercado das especiarias. Além dos temperos, os porões dos navios portugueses carregavam grande quantidade de materiais destinados à tinturaria. Figura 2. Processo de tinturaria durante a idade média. Fonte: Bender (1947). Com a descoberta da América os europeus passaram a ter uma nova fonte de matéria prima. Das terras brasileiras foram levadas toneladas de madeira de pau-brasil para serem processadas pelas tinturarias européias. É inegável a influência dos corantes e da indústria têxtil na história da humanidade. Na China Antiga a rota da seda, estabelecida provavelmente por volta de 8000 a.C, se estendia por mais de 6000 km, tecendo uma verdadeira malha viária por uma vasta extensão do oriente. Considera-se que esta rota teve influencia marcante no desenvolvimento das grandes civilizações antigas, tais como a egípcia, a chinesa e até mesmo a romana. A revolução industrial, ocorrida na Inglaterra no século XIX foi promovida pelos fabricantes de tecidos. Mesmo sendo possível obter corantes de muitas plantas, a variedade de cores que se obtinha não era muito rica e nem tão pouco havia padronização nos tons. Por conta disto muitos químicos (e alquimistas) buscaram sintetizar em laboratório materiais corantes. Mas foi durante o século XIX, com a síntese da alizarina e do índigo que se pôde estabelecer as bases de uma potente indústria química neste setor. Hoje em dia, praticamente todo corante usado na indústria têxtil é produzido sinteticamente. Por outro lado, mesmo com a indústria de corantes oferecendo milhares de produtos diferenciados no mercado, para as mais diversas aplicações, a produção de corantes naturais voltou a ganhar força diante das fortes evidências de que muitos corantes sintéticos são carcinogênicos (quando empregados em alimentos). Assim muitos agricultores voltaram a ter na produção de corantes para indústria alimentícia uma fonte de renda substancial. 136 Dentre os diversos corantes utilizados pelo homem ao longo da história alguns tiveram especial importância. Foram eles a garança, o índigo, o púrpura do tiro, urucum, o pau-brasil e a malva. A seguir fazemos um breve relato sobre eles. 1.1 Garança O corante garança ou ruiva era extraído da planta ruiva dos tintureiros (Rubia tinctorium). A raiz desta planta era chamada de alizari (do árabe al-´usara). Quimicamente ele é uma mistura de antraquinonas, sendo que os componentes principais são a alizarina, a purpurina e a pseudopurpurina (Fig. 3). Na planta, estes componentes se concentram em maior quantidade nas raízes. Para a extração do corante picavam-se as raízes da planta e deixava-se que secassem ao sol. Em seguida o material era mergulhado em um recipiente com água, de onde se colhia a solução formada após algum tempo. Com a evaporação da água obtinha-se uma pasta (Araújo, 2005, p. 9). Figura 3. Componentes da garança. A purpurina é um componente indesejável no corante, diminuindo seu valor comercial. Ela se forma por oxidação da alizarina durante a secagem das partes da planta quando em contato com o ar (Cabral, 2007, p. 40). Era um corante muito popular no Oriente Médio e seu uso é muito antigo na tinturaria, os indícios datam do século XIV a.C. Já foram encontrados vestígios de alizarina em túmulos egípcios e em tecidos descobertos no deserto da Judéia. Em 350 a.C., Alexandre o Grande derrotou os persas com ajuda deste corante. As vestimentas vermelhas de seus soldados desconcentravam os oponentes, levando-os a derrota. Na Roma antiga era tomado como elemento de status. Em 60 a.C. “O imperador Júlio César, ao introduzir reformas estruturais no Império, decreta que só ele poderia usar toga na cor púrpura. Os senadores poderiam usar essa cor apenas nas bordas de suas togas”. O restante da população era proibido de utilizar roupas com qualquer detalhe vermelho (Bensaude-Vicent e Stenger, 1992). Durante mais de 1000 anos a garança foi o corante vermelho mais usado na Europa, sendo encontrado nesta região desde o século VII a. C. A agricultura da ruiva teve grande 137 destaque na economia dos Países Baixos, onde a planta se adaptou muito bem ao solo arenoso. No século XIX a produção deste corante natural sofreu um duro golpe mediante a síntese de um análogo artificial. Muito agricultores, principalmente na França, foram levados a falência, pois não conseguiam concorrer com o baixo preço do material sintético. Na França o impacto da produção sintética da alizarina foi maior porque anos antes um químico amador (Jean Henri Fabre) havia conseguido extrair o princípio ativo da garança (a alizarina). Fabre patenteou seu processo, que era barato e muito prático. Em seguida fundou uma fábrica e se associou aos produtores das regiões de Languedoc e da Provença, e começou a explorar seu método industrialmente. Porém, assim que a fábrica entrou em pleno funcionamento, a alizarina foi obtida artificialmente. Isto levou os agricultores daquelas regiões a passarem por sérias dificuldades. O governo francês procurou proteger os produtores de garança impondo barreiras fiscais à importação de corantes sintéticos. Além disto, passou a fornecer para o exército fardamento tingido exclusivamente com o corante natural. Durante a Primeira Guerra Mundial era possível ver os soldados franceses marchando ao longo das frentes de batalha usando calças na intensa cor vermelha (Bensaude-Vicent e Stenger, 1992). A síntese da alizarina foi resultado de longas pesquisas. De fato os químicos estavam muito animados àquela época com a possibilidade de produzir corantes em laboratório. Logo depois que William Henry Perkin (1838-1907) conseguiu, acidentalmente, sintetizar a mauveína muitos pesquisadores voltaram seus esforços para produção de corantes sintéticos. Mas foi somente em 25 de julho de 1869 que se patenteou uma rota sintética para a alizarina. Ela foi fruto do trabalho conjunto dos químicos alemães Carl Theodor Graebe (1841-1927), Carl Theodor Liebermann (1842-1914) e Heinrich Caro (1839-1911). Ironicamente Perkins registrou sua patente um dia depois. Este pequeno atraso foi o que possibilitou a ascensão da indústria de corantes alemã. Com base nos lucros da produção dos corantes sintéticos a indústria alemã pôde, então, financiar sua expansão, e avançar em outras áreas da química, como a dos fármacos por exemplo. Foi neste período que grandes empresas como a BASF e a BAYER começaram a dominar o mercado mundial de produtos químicos. E Alemanha voltou a se firmar como uma grande potência econômica. Em 1878 a produção alemã de corantes correspondia a 60 milhões de francos, enquanto que a da Inglaterra fica em 11000 milhões e a da França em meros 5 milhões (Decelles, 1949, p. 584). 138 1.2 Índigo O índigo (Fig. 4-e) é um dos corantes mais antigos e importantes conhecidos pelo homem. Na Índia já era utilizado a mais de 4000 anos na tinturaria do algodão. Amostras de tecidos coloridas com índigo foram encontradas em tumbas egípcias e em paredes de cavernas incas. Existem provas de que os gregos e os chineses também o usavam bem antes da era cristã. Cristovão Colombo e outros exploradores fizeram registro de que os nativos do Novo Mundo também usavam este corante para tingir tecidos. Na Índia o corante natural era extraído da planta Indigofera tinctoria. O processo de produção do índigo envolvia a maceração das folhas da planta em grandes tanques contendo água. Após um período de 9 a 14 horas a indacana e o isantan, dois dos componentes presentes nas folhas, se solubilizavam e sofriam fermentação, produzindo além da glicose um componente incolor, o indoxil. Em seguida o licor produzido era recolhido para outro tanque no qual, por meio de agitação, se promovia a aeração. Em contato com o oxigênio o indoxil era oxidado levando a formação de uma pasta colorida que precipitava. Esta era índigo, que após secagem podia ser vendido (Cabral, 2007). A figura 4 representa o processo. Figura 4. Reações envolvidas na produção do índigo. 139 Além da Indigofera tinctoria, o índigo também podia ser extraído de diversas outras plantas. Segundo Cabral (2007, p. 461), são conhecidas mais de 200 espécies do gênero Indigofera e existem ainda outras plantas que podem produzir o corante, como por exemplo a Isatis tinctoria. Esta era amplamente empregada na Europa para obter um corante azul de mesma composição, sendo conhecida como pastel-dos-tintureiros (woad em inglês) (Quye, 1999) Por volta de 1200 d.C. o índigo produzido na Índia começou a ser importado pela Europa. Por ter um tom de azul mais intenso era mais apreciado que o corante pastel-dostitureiros. Neste, a presença em maior quantidade da indirubina (Fig. 4.f), uma impureza de cor vermelha, o tornava menos valorizado. A introdução na Europa do índigo provindo de terras asiáticas foi intensamente combatida pelos agricultores daquela região. Os produtores europeus propagandeavam que sendo oriundo de terras pagãs era um produto maligno. A Inglaterra chegou mesmo a expedir um decreto proibindo a importação deste corante com intuito de proteger a produção local. Todavia, o baixo custo e a melhor qualidade do material indiano acabaram levando-o a dominar o mercado. Os produtores do pastel-dos-titureiros viram, assim, seus negócios decairem (Séquin-Frey, 1981, p. 301). No início do século XVIII o comércio de índigo era dominado pelos portugueses e alemães. A saída encontrada pela França, Inglaterra e Espanha foi a de cultivar a Indigofera em suas colônias na América, onde se encontravam solo e clima apropriados para esta cultura. Entre os anos de 1764 e 1775 estima-se que foram comercializadas, na Europa, cerca de 20000 toneladas de índigo oriundos do Novo Mundo (Delamare e Guineau, 1990, p. 92). O domínio inglês sobre a produção de índigo se consolidou após o final das guerras napoliônicas. A França, por conta do bloqueio naval britânico, tentou reavivar as culturas da planta pastel-dos-titureiros em seu território, mas como a qualidade deste corante ainda não melhorara, com o fim da guerra, esta cultura voltou a sucumbir. Enquanto isto a Inglaterra conseguiu o controle de fábricas de índigo na Índia e se tornou o maior produtor mundial. A produção do índigo natural em grande escala durou até o início do século XX, quando se conseguiu sintetizar um análogo comercialmente viável. Hoje o índigo foi substituído por outros corantes azuis em muitas aplicações, mas continua a ser usado na confecção de calças jeans. A síntese do índigo envolveu grandes esforços e pesados investimentos. Ela inaugura o que veio a se chamar no século XX de Big Science. A dificuldade de produção deste corante 140 demandou uma vultosa soma de dinheiro que só pode ser financiada por grandes empresas. Este tipo de pesquisa implicou na criação de verdadeiros cartéis. A busca pela síntese do índigo foi fortemente motivada pelo trabalho de Emil Fischer e de seu irmão que em 1878 conseguiram determinar a estrutura da fusteína, e em seguida fizer a sua síntese. O alemão Adolf Von Bayer (1835-1917) procurou seguir este caminho. Ele já estudava o índigo desde 1865, mas foi só em 1880 que conseguiu uma primeira síntese baseada no ácido cinâmico. Embora fosse pouco eficiente ela propiciou o apoio de duas grandes indústrias de corantes (BASF e a Höechst) à sua pesquisa. Após ter registrado 152 patentes de processos que tinham como base o ácido cinâmico, Bayer resolveu optar por outro método que desse maior rendimento, passando a usar o ácido orto-nitrotolueno. Aquelas duas empresas tentaram usar este processo, mas o mesmo se mostrou problemático, pois implicava em elevar a produção de benzeno e naftaleno, produtos para os quais havia pouca demanda. As pesquisas continuaram e somente em 1897 a BASF começa a comercializar o índigo sintético. Outro método com rendimento maior, proposto por Heumann e Pfleger (Fig. 5), passou a ser usado pela Höechst em 1904. A pesquisa pela síntese do índigo levou, assim, quase trinta anos e consumiu mais de 20 milhões de marcos (Bensaude-Vicent e Stenger, 1992, p. 262-263). Figura 5. Rota sintética para o índigo, proposta por Heumann e Pfleger. Diante dos resultados positivos na pesquisa sobre a síntese do índigo as duas empresas, BASF e a Höechst, garantiram uma reserva de mercado importante. Assim, a Alemanha, que em 1880 importava 1400 toneladas de índigo, passou a exportar cerca de 9000 toneladas em 1904 (Delamare e Guineau, 1990, p. 92). No início do século XX surge uma opção alternativa para o índigo sintético. O químico francês René Bohn, em 1901, chegou à síntese de um composto análogo ao índigo, a 141 indantrona. Pela fusão alcalina da 2-aminoantraquinona ele obteve um excelente corante azul, utilizado até hoje. Um exemplo interessante da relação entre ciência, tecnologia e sociedade é o das calças jeans. Os primeiros exemplares destas calças foram produzidos em 1850, durante a corrida do ouro, por um comerciante de tecidos chamado Levi Strauss. Ao fazer suas entregas ele havia percebido que as calças dos mineiros rasgavam com pouco tempo de uso. Tendo dificuldades para vender parte de seu carregamento de lona, ele teve a idéia de produzir calças usando aquele material. Os mineiros que compraram as primeiras peças gostaram do produto e espalharam a novidade. O sucesso foi tamanho que Levi logo abriu uma loja para vender seu produto. Em 1860 ele passou a fabricar as calças com um tecido mais macio, um Brim de cor azul, importado da cidade francesa de Nînes - daí a expressão denim. Assim surgiam as primeiras calças índigo blue. Existe uma diferença no modo de tingir os tecidos atualmente e o tingimento do denim. Enquanto neste os fios que comporão o tecido são mergulhados rapidamente, por vezes seguidas, em tanques contento índigo até adquirir a cor azul. O processo atual dá-se pelo mergulho do tecido em tanques contendo uma solução incolor, que pode ser obtida pela redução do índigo com hidrosulfito de sódio. Quando o tecido volta a ser exposto ao ar o material reage com o oxigênio e volta a tomar a cor azul, o índigo, então, volta a torna-se insolúvel. Em termos de resultado final, a diferença consiste que no denim o fio fica colorido apenas superficialmente. 1.3 Púrpura do Tiro Tiro foi uma antiga cidade fenícia, situada onde hoje se localiza o Líbano. Seus mercadores foram os primeiros na aventurar de navegar pelo mediterrâneo e espalharam diversas colônias por toda costa do mar Egeu. Entre os anos de 1.600 e 1.450 a.C. a população daquela região aprendeu a produzir um corante de cor púrpura a partir de um molusco do gênero Murex, que é comum nas águas do mediterrâneo. Sua exploração perdurou por aproximadamente 3.000 anos. Para se produzir um grama do corante era necessário cerca de 2 mil caracóis. Para extrair o corante o molusco era esmagado, colocado em sal por três dias, e depois cozido por mais 10 dias. Após este período a carne era separada por decantação, restando uma solução límpida, na qual se mergulhava o tecido a ser tingido. As fibras ficam inicialmente com uma coloração amarelada, que sob ação do ar e do sol ia tornando-se verde e por fim púrpura (Araújo, 2005, p. 24). 142 A substância responsável pela sua cor é o 6-6-dibromoindigo (Fig. 6). Como no caso do índigo ela não está presente no animal vivo. É produzida por mecanismo de hidrólise enzimática de um precursor derivado do indoxil (Ferreira et all, 2004, p. 331) Figura 6. Constituinte do corante púrpura do tiro (6,6 – dibromoindigo). Ao contrário do índigo que era muito comum, o púpura do tiro era um corante muito raro e caro, por conta de ser difícil obtê-lo (Schatz, 1999, p. 1442). A cor púrpura sempre foi símbolo da realeza. O imperador romano Nero chegou a decretar que seria punido com a morte aquele que além dele viesse a usar trajes com esta cor. Ainda, hoje a cor púrpura é um símbolo religioso, sendo usada por bispos. 1.4 Pau-brasil A árvore do pau-brasil é hoje considerada um símbolo nacional. Reconhecemos nela a origem do nome de nosso país. Mas poucos são os que atentam ao fato de que a designação da nossa nacionalidade (brasileiros) indicava uma profissão, igualmente as palavras: ferreiro, carpinteiro e marceneiro. O trabalho de produção de corantes vermelhos, a partir de madeiras, já era conhecido a mais de 700 anos. Em geral eram extraídos da madeira de árvores do gênero Caesalpinia. A Caesalpinia sappan, um arbusto originário da Índia, era conhecida dos europeus desde a idade média. Devido a cor vermelha de sua madeira os portugueses a chamavam de brasil, em referência ao carvão em brasa (Ferreira, 2004, p. 333). O pau-brasil (Caesalpinia echinata) recebia dos índios de nossa terra a denominação de ibirapitanga, nome significando também madeira vermelha. Os portugueses logo se interessariam pela exploração desta riqueza. Durante o Renascimento a demanda por corantes aumentou muito na Europa, por conta da melhoria da qualidade de vida. A busca por produtos para tinturaria fez com que o preço de certos corantes aumentasse bastante, a ponto de alguns terem seu peso cotado em ouro. Os europeus viram na América, recém descoberta, a possibilidade de buscar outras fontes de matérias primas, substituindo ou complementando suas fontes originais na Ásia. Neste contexto é que os portugueses ao descobrirem o pau-brasil em nosso território sentiramse motivados a explorá-lo comercialmente. 143 Os viajantes da época ficaram impressionados com a árvore do pau-brasil. Isto pode ser percebido na narrativa de Jean de Lery, viajante e historiador francês nascido em 1534: "Devo começar pela descrição de uma das árvores mais notáveis e apreciadas entre nós por causa da tinta que dela se extrai: o pau-brasil, que deu nome a essa região. Esta árvore, a que os selvagens chamam de arabutan, engalha como o carvalho de nossas florestas, e algumas há tão grossas, que três homens não bastam para abraçar-lhes o tronco" (apud Auricchio, 2007). O pau-brasil existia em grandes quantidades quando os primeiros portugueses aqui chegaram. Mas a intensa exploração ao longo de quatro séculos, quase levou a extinção da espécie. Segundo Pinto (2007) o preço do pau-brasil era muito elevado para o padrão da época. 60 kg de serragem correspondiam ao preço de 2,5 ducados. Como cada ducado equivalia 3,5 g de ouro, em nossos dias 1 kg de pau-brasil iria valer cerca de R$ 7,00. O interesse pela madeira foi tamanho que nos primeiros cem anos cerca de 2 milhões de árvores de pau-brasil foram derrubadas. De acordo com Cabral (2006, p. 39) a produção de corante seguia tradicionalmente as seguintes etapas: inicialmente a madeira era transformada em pó e depois mergulhada em água, com a adição de lixívia de cinzas ou urina fermentada se extraia o corante, o qual era precipitado com o uso de alúmem. O trabalho de extração do corante era realizado na Europa. No Brasil os índios apenas derrubavam as árvores e cortavam seus troncos em toras de 1,5 m de comprimento. Estas serviam como lastro para as caravelas portuguesas que aqui aportavam cheias de pedras para a construção das fortalezas. Pelo trabalho realizado os índios recebiam bugigangas como pagamento. O comércio do pau-brasil chamou a atenção de outras nações, que haviam ficado fora do tratado de Tordesilhas (França, Inglaterra e Holanda). Navegadores e piratas daqueles países começaram a retirar madeira às escondidas. O contrabando da madeira pode ser confirmado pelo relato de Paul Gaffarel, um historiador francês do século XIX: "o algodão e as especiarias só figuravam nos carregamentos a título de curiosidade, mas o mesmo não se pode dizer quanto às madeiras preciosas, principalmente as de tinturaria, que formavam o carregamento essencial de nossos navios" (apud Auricchio, 2007). 144 Portugal, que inicialmente, não tinham a pretensão de ocupar estas terras, mas somente a de realizar o extrativismo, acabou sendo motivado a colonizar nosso território. Para tanto veio a instituir as Capitanias Hereditárias para povoar e defender o nosso litoral de invasões. A extração do pau-brasil só encerrou no fim do século XIX, quando a espécie já estava quase extinta de nossas matas. Nesta mesma época os químicos também haviam conseguido sintetizar em laboratório uma substância vermelha, equivalente ao corante. Muitos químicos importantes estudaram o corante do pau-brasil. Em 1808, Michel Eugéne Chevreul (1786 – 1889) isolou o principal componente do corante, a brasilina (Fig. 7.a). Perkin e Robert Robinson (1886 – 1975) determinaram sua estrutura em 1908. Robinson, foi um ex-aluno de Perkin, recebeu Prêmio Nobel de Química de 1947 e investigou a brasilina por muitos anos, tendo publicado se seu último artigo em 1974, justamente sobre esta substância. Perkin consegui provar que a brasilina é apenas um intermediário, sendo que a substância responsável pela cor vermelha do corante de pau-brasil é a brasileína (Fig. 7.b). Ela se forma pela oxidação da brasilina quando esta é exposta ao ar durante o processo de extração (Pinto, 2007). Figura 7. Componentes do corante do pau-brasil. Os 300 anos de exploração do pau-brasil resultou em devastação da mata atlântica e no enriquecimento das aristocracia européia. Mas, de certa maneira, popularizou o uso da cor vermelha tornando-a mais acessível. 1.5 Urucum O urucuzeiro (Bixa ollerana) é um arbusto da flora nacional. Dele os índios retiravam um corante avermelhado com o qual pintavam o corpo desde antes do descobrimento. Pero Vaz de Caminha em sua carta ao rei D. Manoel mencionou como os índios utilizavam este corante para tingir o corpo. Traziam alguns deles ouriços verdes, de árvores, que na cor, quase queriam parecer de castanheiros; apenas que eram mais e 145 mais pequenos. E os mesmos eram cheios de grãos vermelhos, pequenos, que, esmagados entre os dedos, faziam tintura muito vermelha, da que eles andavam tintos; e quando se mais molhavam mais vermelhos ficavam (Caminha, 1500. apud Pinto, 1995). O componente principal que dá a cor do urucum é a bixina. Ela é um cis-polieno, é instável e em solução e isomeriza a forma trans (Fig. 8) (Araújo, 2005). Figura 8. Componentes do corante urucum. A palavra urucum em tupi significa vermelho. O nome científico da planta homenageia Francisco Ollerana, lugar tenente de Francisco Pizzaro, o primeiro navegante europeu a viajar pelo rio amazonas. Na tinturaria dos tecidos o urucum era esmagado e mergulhadas em água. Após isto se procedia à evaporação, obtendo-se uma pasta que era usada para tingir tecidos de algodão e lã (Araújo, 2005). Hoje em dia o urucum ainda é muito utilizado como corante alimentício. É aplicado a carnes para deixá-la coradas quando cozidas. Também está presente em sorvetes, balas, margarinas e tantos outros. Como corante alimentício recebe o nome comum de coloral. 1.6 Corantes sintéticos – uma relação frutífera entre a indústria e a pesquisa. Durante os primeiros anos do século XIX muitos químicos buscaram extrair os princípios dos corantes naturais. Eugene Chevreul, além de ter pesquisado a composição das gorduras, usou seu talento para estudar os corantes da lã. Em 1926, Pierre-Jean Robiquet isolou a alizarina da garança. Estes foram os primeiros passos de uma série de descobertas. O primeiro corante sintético comercialmente viável foi produzido acidentalmente por Willian Henry Perkin, em 1856. Nesta época ele ainda era aluno de August Wilhelm Hoffmann (1818-1892), eminente químico alemão que havia feito uma série de estudos sobre as aminas. 146 Perkin iníciou seu trabalho tentando sintetizar a quinina, um medicamento usado para o tratamento da malária e por isso importante para o extenso império Inglês. A hipótese de Perkin era a de que a toluidina (C10H12N) e a quinina (C20H24N2O2) eram substâncias básicas, e que se diferenciavam pelo fato da quinina possuir oxigênio ao contrário da primeira. Assim ele imaginou que poderia obter a quinina oxidando a toluidina com dicromato de potássio. De início ele obteve um material de coloração marrom, sem muito interesse. Ele então substituiu a toluidina por anilina (a qual, sem saber não estava pura) obtendo desta vez uma goma negra. Após analisá-la, obteve um material púrpura capaz de tingir a seda. Seu tino comercial imediatamente o levou a abandonar os estudos no Royal College of Chemistry, mesmo a contragosto de seu mestre, e se unir a um fabricante de corantes naturais para produzir a mauveína sintética (Fig. 9). Figura 9. Estrutura da molécula de mauveína. Após a descoberta da mauveína, houve uma intensa corrida dos químicos para conseguir sintetizar outros corantes. Perkin (Fig. 10) montou um amplo laboratório de pesquisa para dar apoio à sua indústria, onde conseguiu sintetizar outros corantes. Para se ter uma idéia do impacto que foi a descoberta deste corante sintético, basta dizer que ainda hoje utilizamos o termo "anilina" para designar qualquer substância corante, apesar da anilina em si não ser um corante, e sim o ponto de partida para muitos destes. Figura 10. Sir Willian Henry Perkin. Fonte: Jefrey (2002) 147 O sucesso da mauveína de Perkin chamou a atenção dos químicos para a anilina e seus derivados. Os químicos logo imaginaram que poderiam obter novas substâncias corantes usando outros agentes oxidantes. Em 1859, Emmanuel Verguin, produz o vermelho magenta (Fig. 11) por meio da oxidação da mistura toluidina/anilina com cloreto de estanho (Rose, 1926, p. 977). Figura 11. Vermelho magenta. Os direitos de produção deste corante são vendidos a empresa francesa Renard et Fréres. Essa não conseguiu proibir os concorrentes de fabricarem seu produto por conta das diferenças entre as leis de patente da França e da Alemanha. E não tendo condições para investir na pesquisa de novos corantes acaba falindo em 1868. Este foi apenas um exemplo da decadência da indústria francesa no fim do século XIX (Bensaude-Vincent e Stengers, 1992, p. 258). Com o prosseguimento das pesquisas, uma nova geração de corantes aparece. Embora ainda tenham como ponto de partida a anilina, os químicos passam a usar o ácido nitroso ao invés de agentes oxidantes. Esta reação foi estudada por um colaborador de Perkin, Peter Griess, em 1858. Ela consiste no ataque, pelo ácido nitroso, do grupo amina aromático, com a conseqüente substituição de dois hidrogênios deste grupo por um átomo de nitrogênio, formando um composto chamado de diazônio (Fig. 12). Este produto quando posto em contato com fenóis, naftóis, ou aminas sofre condensação, formando novos complexos mais estáveis (Rose, 1926, p. 981). Figura 12. Formação de um sal de diazônio. 148 Dois corantes importantes, produzidos por este método foram o amarelo e o castanho de Manchester. Ambos desenvolvidos, no ano de 1959, pelo alemães Heinrich Caro e Carl Martius, que trabalhavam na firma inglesa Robert Dalle and Co. Para a obtenção do castanho de Manchester eles fizeram reagir a meta-fenil-diamina com ácido nitroso, obtendo uma molécula com dois grupos azóicos (--N ==N -- ), como mostrado na figura 13. Figura 13. Castanho Manchester. Depois do trabalho de Caro e Matius surgiram muitos outros corantes azóicos. Em 1902 metade da produção mundial era de azocorantes. O vermelho do congo (Fig. 14) é um exemplo de corante deste grupo que ainda hoje é muito utilizado. A principal vantagem deste tipo de corante é que ele pode ser formado diretamente sobre o tecido. O método consiste em se mergulhar o tecido em uma solução das moléculas de acoplamento, e em seguida em outra do sal de diazônio. Consegue-se, assim, maior eficiência no processo de tinturaria (QMCWEB, 2006). Figura 14. Corante vermelho do congo, corante azóico. A síntese de corantes do tipo azo deu à indústria inglesa, daquela época, a supremacia na produção mundial de corantes. Todavia, nos anos de 1880, muitos químicos alemães retornaram a terra natal. Eles sentiram-se atraídos pelos investimentos de grandes empresas como a Bayer, e pela promulgação de uma lei de patentes que garantia direitos sobre os processos e não sobre o produto final, o que incentivava a pesquisa (Bensaude-Vicent e Stenger, 1992, p. 259). Foi neste contexto que os químicos alemães Karl Graebe e Karl Liebermann, trabalhando para a BASF, sintetizaram, em 1869, o componente responsável pela cor 149 vermelha da garança - a alizarina. Esta síntese foi particularmente importante, por permitir que a indústria dos corantes sintéticos conseguisse se sobrepor aos produtores de corantes naturais, devido ao baixo custo do processo. Segundo Rose (1926, p. 996) a síntese da alizarina fora prevista com antecedência, mediante a descoberta de sua estrutura em 1868. Ainda com o apoio econômico de grandes empresas alemãs, deu-se a produção do índigo. O químico Adolf von Bayer , em 1897, financiado pela BASF, produz o índigo sintético utilizando o naftaleno para obter o anidrido ftálico, oxidando-o com ácido sulfúrico concentrado. O índigo sintético, sendo mais barato que aquele obtido de plantas, levou a ruína regiões inteiras da Índia e do Caribe. Como conseqüência de todo este processo, o mercado mundial de corantes passou a ser dominado por grandes empresas alemãs. Um fato curioso, que demonstra bem esta situação, foi o caso do submarino Deutschland. Furando o bloqueio naval imposto pelos países aliados durante a primeira guerra mundial, ele aportou duas vezes em Nova York no ano de 1916, levando carga de corante para a indústria têxtil americana (Vanin, 1994, p. 78). O processo de desenvolvimento da indústria química Alemã foi resultado da associação entre o Estado e os interesses privados. Neste sentido foram criadas leis que incentivavam a pesquisa, a medida que protegiam os processos e não o produto final. De outro lado a indústria financiava o trabalho científico e a formação de mão de obra especializada. É importante destacar que boa parte dos grandes químicos do século XIX ou tiveram sua formação na Alemanha ou foram orientados por professores oriundos de lá. A quantidade de corantes sintéticos produzida hoje é muito grande e atende as mais diversas finalidades, e não somente a indústria têxtil. Muitos destes corantes apresentam cores que não podiam ser obtidas com os corantes naturais. E de certo modo a indústria de corantes contribui com o meio ambiente, evitando que grandes extensões de terra sejam usadas para plantações Por outro lado, a indústria dos corantes tem agora o desafio de minimizar seu impacto ecológico. Desde a década de 1960 os ecologistas têm chamado a atenção para os efeitos negativos deste ramo da produção. Segundo Guaratini e Zanoni (2000, p.75) estima-se que 15% da produção mundial de corantes têxteis são desperdiçados e acabam poluindo nossos mananciais de água. O que equivale a jogar todo dia 1,2 toneladas destes produtos na natureza. Em grande parte o motivo desta perda se dá pela baixa fixação (10-20%) dos corantes durante a etapa de tingimento. Muitos países ao redor do mundo tem se preocupado com esta situação. Mas a superação deste quadro ainda vai exigir muito esforço e pesquisa. 150 Capitulo 2 - Os tecidos e os corantes. 2.1 Fibras têxteis. A habilidade para tecer também é tão antiga quanto a própria humanidade. Alguns estudiosos acreditam que nossos antepassados faziam bolsas trançando folhas de palmeira. Esta habilidade teria determinado a forma de organização social que herdamos, pois com estas bolsas, feitas de palha, as fêmeas coletavam um maior número de frutos, e podiam levá-los para serem consumidos por todo o grupo. Assim as bolsas para coletar frutas teriam sido as primeiras ferramentas usadas pelos seres humanos. Esta teoria é inferida do fato de que os chimpanzés africanos são capazes de fazer tranças como folhas e cipós. A falta de evidências materiais para esta tese se deve aos mesmos motivos pelos quais identificamos o uso de corantes tão tardiamente: as bolsas feitas de palhas foram decompostas com o passar do tempo. (Leakey e Lewin, 1996, p. 128) De fato, os mais antigos indícios de tecelagem se referem a redes e cestos, feitos pelo entrelaçamento de fio e varetas, isto no neolítico. A produção de tecidos propriamente data de 5000 A.C. Os Egípcios nesta época trabalhavam com lã, seda, algodão e linho. Em 3000 a. C. os indianos usavam algodão para tecer, e os chineses já conheciam a seda. Nas Américas a tecelagem também era desenvolvida neste período, os tecidos maias eram da mesma qualidade dos egípcios (Barsa, 1999). Durante a idade média a tecelagem na Europa se desenvolveu bastante por conta dos conhecimentos obtidos dos mouros. Muitas tecelagens se espalharam por todo continente, com importantes centros de produção de seda, veludos e tapetes em Arras, Grande, Courtais e Bruxelas. No século XV as técnicas chegaram a Inglaterra, que se destacou na produção de lã, linho e seda. Neste país, a partir do século XVIII é que a tecelagem ganhou os avanços mais significativos, com a introdução de processos mecanizados, e com substituição da força hidráulica pela do vapor. Tal processo que consistiu na substituição de trabalhadores por máquinas veio a se chamar revolução industrial. Hoje a indústria têxtil é um segmento muito importante para a economia de qualquer país. Movimenta milhões de dólares e faz funcionar tanto o setor agrícola quanto o setor industrial. A produção de fibras têxteis e corantes, tanto naturais como sintéticos, é 151 responsável pela geração de grande quantidade de empregos, e requer um conhecimento especializado. Os tecidos podem ser classificados em naturais ou sintéticos, de acordo com a natureza das fibras dos quais são formados. As fibras naturais podem ser de origem vegetal como o algodão, linho, rami, cânhamo; bordado, juta, sisal, paineira, coco. Todas estas fibras são formadas pelo polímero celulose (Butler e Malott, 1981). As fibras animais mais usadas são a seda, a lã e a camurça. Estas fibras são compostas de materiais de natureza protéica. As fibras têxteis artificiais podem ser obtidas pela modificação nas estruturas dos polímeros das fibras naturais a partir de reações químicas. As fibras sintéticas deste tipo comercializadas em maior volume são a viscose, cujo polímero é o xantato de celulose e o acetato e o triacetato, obtidos pela reação da celulose com ácido acético, (Guaratini e Zanoni, 2000), além do rayon, que é uma fibra composta por celulose regenerada, após tratamento da madeira. As fibras sintéticas também podem ser obtidas pela síntese direta de seus polímeros, a partir de derivados do petróleo. Este é o caso do nylon, que é uma poliamida, do poliéster, um copolímero do ácido terfitálico com o etilenoglicol, e do acrílico, obtido pela polimerização da acrilonitrila (Guaratini e Zanoni, 2000). A figura 15 traz as representações dos polímeros que constituem essas fibras. Figura 15. Estrutura molecular de algumas fibras de uso comercial. 152 2.2 Interações entre as fibras e os corantes A fixação dos corantes nas fibras destes tecidos pode ocorrer por quatro vias: interações iônicas, forças de Van der Walls, ligações de hidrogênio ou ligações covalentes. A tinturaria da seda, da lã e das poliamidas pode envolver a interação iônica entre as moléculas do corante e a cadeia polimérica (Fig. 16). Estas fibras quando imersas em meio ácido desenvolvem cargas positivas nos grupos amino e negativas nos carboxilatos, o que torna possível a interação com os grupos polares das moléculas dos corantes, que tanto podem ser positivos quanto negativos. Figura 16. Interação iônica entre corante e fibra. Em fibras como a celulose, nas quais não há grupos ionizáveis, esta interação iônica é possibilitada pela adição de mordentes. Estes são substâncias formadas por sais complexos de metais. Os íons dos átomos metálicos formam complexos com os grupos polares da fibra. Como resultado se obtém sítios mais polarizados que possibilitam uma interação maior com as moléculas dos corantes (Fig. 17). A adição do mordente também propicia uma cor mais intensa ao tecido, pelo fato de que muitas vezes o átomo metálico pertence ao grupo dos metais de transição, tendo orbitais do tipo d disponíveis para transições eletrônicas. 153 Figura 17. Interação iônica, intermediada em pelo íon alumínio. As interações de Van der Walls são possíveis quando as moléculas de corantes são lineares e longas, possibilitando uma aproximação maior entre os orbitais destas moléculas com os orbitais das moléculas da fibra. Exemplo deste tipo de interação ocorre na tinturaria da lã e do poliéster quando se usam corantes que possuem alta afinidade com a celulose. (Guaratini e Zanoni, 2000). As interações do tipo ponte de hidrogênio são possíveis devido a existência nas fibras de grupos com átomos de N, O e S, que muito polares. Nos corantes, os átomos de hidrogênios que estão ligados covalentemente a átomos daqueles elementos podem interagir com os pares de elétrons livres disponíveis em centros doadores contidos nas fibras. Um exemplo são os grupos fenólicos das moléculas de corante que podem estabelecer uma ligação forte com grupos hidroxila das moléculas das fibras (Fig. 18). Figura 18. Ligação de hidrogênio entre corante e fibra encontrar uma referencia para a figura. Há certos tipos de corantes sintéticos que durante o processo de tinturaria reagem com as fibras do tecido, levando a formação de ligações covalentes. As moléculas destes corantes 154 possuem grupos reativos (eletrofílicos) os quais podem interagir com grupos aceptores contidos nas fibras. Os primeiros corantes deste tipo possuíam um grupo diclorotriazina. Os átomos de cloro do anel heterocíclico (Fig. 19) podem ser substituídos por grupos OH ou NH2 contidos na celulose ou na lã (Bonneau, 1995, p.724) corante N Cl corante N N N Cl O H O N N Cl ligação covalente Figura 19. Formação de ligação covalente entre corante e a fibra. Outro tipo de corante reativo possui um grupo vinil sulfona. A presença do grupo SO2 , altamente polar, gera uma carga parcial positiva sobre um dos carbonos da olefinicos, tornando-os aptos a formarem ligação covalente com grupos hidroxila da celulose (Fig.20) corante-SO2-CH=CH2 + HO-celulose corante-SO2-CH2CH2-O-celulose Figura 20. Formação de ligação covalente mediante presença do grupo SO2 2.3 Classificação dos corantes. Segundo (Guaratini e Zanoni, 2000, Webb, 1942, Meybeck, 1943) os corantes podem ser classificados em grupos diferentes de acordo com o processo de tinturaria, ou segundo as suas estruturas. Sendo que os corantes naturais pertencem somente a três grupos: corantes de tina; corantes diretos; e corantes com mordentes (Araújo, 2005 e Ferreira et all 2004). Os corantes de tina normalmente são insolúveis em água. O tingimento do tecido se dá primeiro por meio da redução das moléculas do corante a uma forma solúvel, chamada de forma leuco. O tecido então é mergulhado neste banho e absorve a solução. Quando exposto ao ar, ou a agentes oxidantes, a forma leuco é oxidada, voltando a apresentar a cor original do corante, e fixando-se na forma de finas partículas entre as fibras do tecido. Este tipo de corante é empregado na tinturaria de algodão e lã. 155 Hoje em dia usa-se o hidrosulfito de sódio para se obter a forma leuco, no passado isto era feito por meio da putrefação das partes da planta da qual se retirava o corante. Um exemplo deste tipo de corante é o índigo, cujo processo de solubilização esta representado na figura 21: Figura 21. Redução do indigo a forma leuco. Os corantes diretos podem se ligar diretamente as fibras do tecido, não sendo necessário tratá-las previamente. São exemplos deste tipo de corante o turmérico (Curcuma longa, Fig. 22) açafrão (Crocus sativa), e a bixina . Essas três substâncias pertencem a um subgrupo dos corantes reativos, os corantes ácidos, que são adequados a materiais protéicos pois suas moléculas podem formar ligações iônicas com resíduos amino ou carboxilatos da proteína que forma a fibra de lã ou de seda. (Araújo, 2005, p. 5). Figura 22. Componentes da Curcuma (Curcumina R1 e R2= OCH3, Demethoxi-curcumina R1= OCH3 e R2=H, Bis-demethoxi-curcumina R1 e R2 = H). Os corantes mordentes necessitam da aplicação de outra substância que possibilite a interação das moléculas do corante com as fibras do tecido. Os mordentes podem ser aplicados antes ou durante o processo de tinturaria. As moléculas do corante então interagem com o complexo mordente-fibra e formam um produto insolúvel com uma cor brilhante. Os mordentes em geral são sais ou hidróxidos de metais, o mais efetivo é o dicromato de potássio 156 (KCr2O4), mas também é comum o uso do alúmem de potássio (Al2(SO4)3K2SO4·. 24 H2 O) (Webb, 1942, p. 464). Há registro do uso de alúmem na Índia, Grécia, Egito e nas Américas. No passado outras substâncias também foram usadas com o mesmo fim. Gregos e romanos tingiam os tecidos de púrpura com índigo ou púrpura do tiro usando urina. Os hindus fizeram uso do leite de búfala para fixar o corante da ruiva indiana (xaja) nos tecidos (Araújo, 2005). 157 Capítulo 3 - A luz as cores e os corantes. 3.1 A natureza da luz A luz sempre despertou a curiosidade e imaginação humana. Na pré-história a chama das fogueiras em movimento constante dava vida às pinturas feitas nas paredes das cavernas, e certamente entretinham nossos antepassados. Sendo incompreensível sua natureza, era vista como uma divindade. No Egito era tomada como um deus que conhecia os erros e pecados cometidos pelas pessoas durante o dia. A essa forma de ver o mundo denominamos animismo, pois atribui aos fenômenos da natureza sentimentos, desejos, e ações humanas. Na Grécia Antiga forjou-se uma nova forma de compreender a natureza. Os mitos e a visão animista de mundo passaram a ser questionados. Procurou-se ver o mundo pelo olhar da razão. Compreender a natureza seria dar explicações lógicas, buscando os fundamentos e princípios da realidade. É neste contexto do pensamento humano que encontramos as primeiras reflexões sobre o que seria a luz, mais propriamente falando a visão. Compreender como era possível enxergar o mundo foi uma preocupação dos antigos pensadores gregos. Os problemas iniciais consistiam em: Como explicar que a imagens de objetos enormes entrassem no olho? Como explicar o fato de que objetos, mesmos pequenos, eram vistos borrados quando colocados próximo ao olho? Em Barros e Carvalho (1998) encontramos uma descrição de como os filósofos gregos propuseram solução para estas questões. As concepções mais antigas propunham que todas as sensações deviam-se a alguma forma de contato. Assim uma primeira explicação para a visão consistia em se imaginar que os objetos emanavam suas formas, como se fosse uma pele que se projetasse pelo espaço. O olho humano, assim captaria esta forma. Esta concepção apresentava alguns problemas. O principal consistia em explicar como era possível a imagem de objetos de grandes dimensões entrarem no olho para serem percebidas. A explicação proposta então consistia em atribuir as imagens a propriedade de sofrerem contração, ao longo do caminho até atingirem os nossos olhos. Todavia, essa nova explicação implicava em outro problema. Imagine que duas pessoas estejam observando um objeto qualquer, sendo que a primeira coloca-se mais próxima, e a segunda mais afastada deste mesmo objeto. A percepção do tamanho da imagem seria diferente para cada 158 observador. Isto implica que a mesma imagem estaria sofrendo contrações de proporções desiguais, em um mesmo instante, para que viesse a se adaptar aos olhos dos dois observadores. Outra teoria existente na antiguidade defendia a idéia dos raios da visão. O olho emanaria determinados raios que em contato com os objetos trariam sua forma. Esta teoria era defendida ardorosamente por Pitágoras de Samos. Embora apresentasse algumas dificuldades, como, por exemplo, não explicar por que não enxergamos no escuro, ela trouxe certo avanço para compreensão da visão. Sendo os raios luminosos emanados pelo olho de forma divergente (formando cones) podia-se explicar o fato de que objetos pequenos não são vistos a longa distância. Os raios luminosos afastando-se ao se propagarem, não conseguiriam tocar o objeto de maneira a trazer sua forma. O matemático Euclides no século III a. C. deu um tratamento mais aprimorado a esta teoria, fazendo com que prevalecesse durante toda a idade média. Além destas teorias, outra fora proposta pelo filósofo Platão, ainda na Grécia Antiga. Para ele a visão seria formada por três jatos de partículas. Um deles emanava do olho, outro do objeto percebido, e outro das fontes luminosas. O jato de partículas emanado pelos olhos dirigia-se até os objetos e lá se combinava com os raios de uma fonte luminosa. A sensação de visão se daria pelo retorno deste último raio combinado. Embora se considere esta última teoria como superada, ela traz a tona o fato de que na formação da imagem devemos levar em consideração três elementos básicos: a luz, a matéria (objeto); e a interpretação feita pelo sistema fisiológico. Com relação à compreensão da natureza da luz, um passo significativo foi dado por Isaac Newton (1643-1727). No ano de 1664, aos 19 anos, quando ainda era estudante, interessou-se por examinar o fenômeno das cores produzidas por um prisma de cristal. Este fenômeno já era conhecido, e encantava as pessoas daquela época, assim como hoje em dia ainda o faz. Todavia imaginava-se que as cores eram produzidas pelo cristal. Todavia, Newton deu um novo significado aquela “brincadeira”. Ele descreveu o experimento como segue: Procurei um prisma triangular de vidro, para tentar com ele os celebrados fenômenos das cores. E tendo assim para isso escurecido meu quarto, e feito um pequeno orifício na folha da janela, para deixar entrar uma quantidade de luz conveniente do sol, coloquei meu prisma em sua entrada, para que a luz pudesse ser assim refratada para a parede oposta. Foi de início um divertimento muito 159 agradável, ver as cores vivas e intensas assim produzidas (Isaac Newton, apud: White, p. 64) Depois de ter se deslumbrado com as cores, Newton colocou outro prisma de fronte ao primeiro, de maneira que as cores voltaram a formar a luz branca. Ele concluiu então que a luz branca era formada de diversas cores. Newton com este experimento pode concluir também que a cor dos objetos se relaciona com a parte do espectro que vinha a absorver. (White, p. 64). Comprometido com o atomismo, visão pela qual se postulava que o universo era constituído de pequenas partículas, Newton (Fig. 21. a) procurou interpretar o resultado deste experimento considerando a luz como um conjunto muito grande de partículas em movimento ordenado. Para ele os raios de luz com cores diferentes eram formados por partículas com velocidades diferentes. Na luz vermelha as partículas seriam mais lentas e na violeta mais rápidas. Assim a refração da luz pelo prisma podia ser explicada pela mudança na velocidade das partículas da luz. Podemos visualizar isto de maneira mais clara ao imaginarmos uma pessoa andando de bicicleta em uma pista asfaltada, e logo em seguida entrando em diagonal em um campo de areia. A bicicleta mudará de direção, pois a resistência causada pela areia diminuirá a velocidade, e em conseqüência o ângulo do movimento será alterado. Outra forma de compreender a luz, e que contrastava com as idéias de Newton, é percebê-la como uma onda. Leonardo da Vinci, por exemplo, tomando como base a idéia de que o som consistia em vibrações do ar, propôs que a luz também deveria ser uma forma de vibração. Durante o século XVII, frente aos resultados dos experimentos de Newton sobre a luz, muitos cientistas que discordavam do atomismo procuram dar interpretações diferentes imaginando que a luz seria uma oscilação. Neste campo um pensador que ganhou destaque foi Christiaan Huygens (1629-1695) (Fig. 23. b). a) b) Figura 23. a) Isaac Newton b) Huygens. Dois rivais sobre a natureza da luz. Fonte: Oliveira Filho (2000). 160 O fundamento básico que Huygens tomou para propor a natureza ondulatória da luz consistia no fato de que dois raios de luz ao se cruzarem não sofrem desvio, assim não poderiam ser corpos materiais. Apoiado nesta idéia, e considerando que a velocidade de propagação das ondas é diferente conforme o meio, ele consegui explicar fenômenos como a refração e a difração. Embora tenha explicado com elegância estes fenômenos o Huygens não propôs nenhuma hipótese que ajudasse a compreender as cores existentes, assim como também não conseguiu explicar a polarização da luz. Esta lacuna recebeu críticas de vários de seus opositores. E devido a grande repercussão que teve a obra de Newton sobre mecânica, o modelo ondulatório da luz elaborado por Huygens ficou esquecido até o fim do século XVIII. Esta contenda sobre a natureza da luz, se ela seria uma onda ou formada por partículas, perdurou ainda por todo o século XIX e início do século XX. E, embora pareça estranho a primeira vista, hoje as duas concepções são aceitas como corretas. Com os trabalhos de Thomas Young, Fresnell e de Maxwell a visão de que a luz é um fenômeno ondulatório ganhou consistência. Com os trabalhos de Einstein e Marx Planck a concepção de que a luz seria formada por pequeníssimos corpúsculos deixou de ser refutada. E hoje aceitamos que se trata de um fenômeno cujas manifestações ora podem ser tratado como oscilação, ora como partícula. A teoria da Maxwell diferencia-se da de Huyguens por que ele considera desnecessário a existencia de um meio material para propagação da luz. Para Huygens a luz consistiria na propagação de uma onda mecânica. Assim careceria de um meio para se propagar, semelhantemente as ondas do mar. Ao aceitarmos a luz tal qual concebido por Maxwell, a entendemos com um conjunto de oscilações eletromagnéticas que se propagam pelo espaço. Estas ondas compreendem uma estreita faixa do espectro de radiação (Fig. 22) cujos comprimentos de onda variam de 10 km (ondas de rádio) a 10 pm (os raios cósmicos). Com nossos olhos percebemos sinais com comprimento que variam entre 400 a 780 nm. As cores correspondem a pequenas parcelas desta estreita faixa. Nossa pele é capaz de perceber radiações na porção superior a 780nm, o infravermelho, dando-nos a sensação de calor. 161 Figura 24. Espectro das radiações eletromagnéticas. Por fim devemos citar que a partir dos trabalhos de Planck podemos associar a cada comprimento de onda uma quantidade discreta de energia que obedece a equação: E= hc/λ. Em que h é a constante de Planck (6,626 x 10-34), c é a velocidade da luz e λ o comprimento de onda. Observemos que pela equação quanto maior o comprimento de onda menor a energia que a radiação carrega. No espectro visível a cor vermelha é a que tem menor conteúdo de energia, enquanto a cor violeta, no extremo oposto do espectro, carrega em si uma maior quantidade. 3.2 As cores Compreender a natureza da luz é fundamental para compreensão das cores, porém não é suficiente. Também devemos levar em consideração o papel desempenhado pelo sistema nervoso na interpretação dos sinais luminosos recebidos por nossos olhos. É no cérebro que a sensação de cor se constitui (Melchior e Pacca, 2005). Figura 25. Processo de interpretação da luz como cor. Fonte: Melchior e Pacca (2005). 162 O olho humano possui três tipos de células, chamadas cones, que se encontram na retina (Fig. 26). Cada um destes grupos de células responde separadamente a partes específicas do espectro, sendo denotadas como vermelho, verde e azul-violeta. Figura 26. Diagrama esquemático do olho humano. Fonte: Portal Dr. Visão (2006) É de se notar, inclusive, que a sensibilidade de cada cone as respectivas bandas do espectro são diferenciadas. A figura 27 representa isto claramente, observa-se que a sensibilidade dos cones que captam a luz azul é menor que a dos outros dois tipos de células. Esta sensibilidade diferenciada justifica o uso das cores verde e vermelho nos semáforos. 2 Figura 27. Diagrama de absorção da luz pelos cones do olho humano. Fonte: Bertulani (2007). A sensação das cores será estabelecida em nosso cérebro pela interpretação dos sinais recebidos pelas células cone na retina. Este processo recebe o nome de tricomancia, porque somos capazes de distinguir uma infinidade de cores pela combinação de apenas três sinais distintos. Essa capacidade ocorre por conta da superposição entre as bandas de absorção de cada tipo de cone, que torna possível um sinal luminoso, com comprimento de onda específico, excitar dois tipos diferentes de células. O cérebro então interpreta os sinais 2 No eixo horizontal o comprimento de onda faz referencia a cor. No eixo vertical temos a indicação da fração de luz absorvida. Quanto maior a fração de luz absorvida por um cone em dado comprimento de onda maior sua sensibilidade para uma certa cor. 163 enviados por estes dois conjuntos de receptores como sendo uma terceira cor. Por exemplo, quando os cones receptores de azul e vermelhos são excitados a cor percebida é o magenta. A percepção das cores que fazem parte de nosso dia-a-dia é resultado da interpretação, pelo cérebro, dos sinais luminosos que sensibilizam nossa retina. Estes sinais, emitidos pelos diversos objetos que nos rodeiam, podem variar tanto em relação ao comprimento de onda, quanto em relação a intensidade ou largura espectral. Desta combinação de fatores é que surge a infinidade de cores com as quais temos contato. A intensidade com que certo comprimento de onda é percebido, é o que se chama de brilho. Um pintor pode diminuir o brilho de uma tinta ao acrescentar a mistura alguma substância de cor negra, que absorve radiação em toda faixa do espectro, diminuindo o sinal a ser percebido pelas células da retina, o que leva a sensação de que a cor esta “apagada”. (Bertulani, 2007). Saturação da cor é a concentração do sinal luminoso entorno de um comprimento de onda. Os corantes sintéticos apresentam uma maior aceitação no mercado porque apresentam uma banda de absorção mais curta, tornando as cores mais definidas (puras). A figura 28 ilustra estes conceitos de brilho e saturação Figura 28. Características que definem a cor a) matiz b) brilho c) saturação. Fonte: Bertulani (2007). Embora o processo fisiológico da percepção da luz seja sempre o mesmo a combinação dos feixes de luz no meio físico pode ocorrer de duas maneiras distintas. Pelo processo aditivo feixes de luz monocromática das cores primárias (vermelha, verde e azul) combinam-se levando a formação das diversas cores. Ao projetarmos em uma tela branca três feixes nas cores, vermelha, verde e azul, na região onde ocorrer a superposição teremos a luz branca. Este é o processo utilizado em televisores e monitores de computador, e é conhecido como RGB (sigla para as cores em vermelho, verde e azul em inglês: red, green and blue). Na síntese subtrativa ocorre o oposto. Os objetos quando iluminados pela luz branca refletem apenas determinados comprimentos de onda, absorvendo os demais. Este é o 164 processo utilizado nas artes gráficas. Este sistema é conhecido como CMYK (ciano, magenta yelow and black). O escritor e pintor Ghoethe (1749-1832), representado na figura 29, já havia observado este efeito de interação entre as cores no século início do século XIX. Ao apreciar uma paisagem ele percebera que: “durante o dia, devido aos tons amarelados, as sombras tendem a ser tornar violetas... ao pôr-do-sol, quando seus raios difusos são do mais bonito vermelho, a cor das sombras tornase verde”. De tal percepção é que se derivou o que se conhece hoje como circulo das cores (Fig. 30) (Sordilli, 2007). Figura 29. Goethe. Fonte: Sordili (2007). Figura 30. Círculo das cores de Goethe. Fonte: Sordili (2007). Conforme Santos e Vanin (2007) resultado semelhante a este também foi obtido pelo químico Chevreul nos anos de 1830. Ele foi um eminente químico francês que havia ganhado destaque por seus trabalhos com gorduras, e também por pesquisas em relação a corantes e pigmentos. Chevreul foi convidado a resolver um problema na tradicional Manufatura de Gobelins, onde os artesãos haviam percebido que a cor dos corantes após estampagem nos tecidos não era a esperada. Após ter feito inúmeros testes químicos, que incluíram analise da qualidade do tecido e fixação dos pigmentos, concluiu o que a vivacidade das cores se devia a fatores físicos e não químicos. Como base nestes resultados Chevreul propôs, com fins didático, uma figura para interpretar a composição das cores (Fig. 31), conhecida hoje como círculo das cores. 165 Figura 31. Roda das cores de Chevreul. Fonte: Sordili (2007). A roda das cores de Chevreul, semelhantemente ao disco de Goethe, dispõe as cores em um circulo de forma que as cores complementares ficam diametralmente opostas. Uma cor complementar é aquela que absorve a cor oposta, segundo sua definição. Os pares de cores complementares são: vermelho / verde; azul-violeta /amarelo; azul-ciano/ laranja. Chevreul, com base neste trabalho, indicou que a sensação visual tida pelos artesãos se devia a interação entre as cores. Ele concluiu que quando duas cores complementares estão próximas a luminosidade de cada uma torna-se mais intensa. Este efeito foi aproveitado por muitos artistas plásticos, Van Gog, por exemplo, declarou certa vez que sua intenção ao fazer um quadro era “pintar as paixões e contradições humanas através das cores verde e vermelho”. 3.3 Interação luz e matéria Em geral a obtenção de colorações diversificadas nas tinturarias, por parte de artistas plásticos, consiste em se misturar diferentes corantes. Como conseqüência algumas cores que compõem a luz branca passam a ser absorvidas. Em linguagem técnica diríamos que passa haver absorção de certas porções do espectro correspondentes as cores primárias (verde, vermelho, azul-violeta). Este é principio da síntese subtrativa. Neste processo as substâncias adicionadas atuam como filtros seletores de luz. Estas substâncias são os corantes ou pigmentos inorgânicos. A absorção ocorre por conta da interação entre a luz e a matéria. No caso dos corantes a absorção de partes do espectro da luz pode ser compreendida com base na estrutura de suas moléculas. Uma característica comum a todas moléculas desta substâncias é a presença de duplas ligações conjugadas. A existência de várias duplas ligações intercaladas permite a molécula absorver energia na faixa do espectro que somos capazes de enxergar. A cor percebida será a cor complementar a cor absorvida. 166 A substância bixina é exemplo do efeito que a presença das duplas conjugadas nas moléculas pode causar sobre a cor. Na figura 32 vemos o espectro da absorção para esta substância, perceba que o pico de absorção se dá entorno de 450nm, situando-se na região correspondente a cor azul. Por conta disto a cor percebida no coloral, corante feito com urucum, é o vermelho. Figura 32. Espectro de absorção da bixina. Fonte: Costa e Chaves (2005). A presença de outros grupos funcionais pode deslocar o espectro de absorção para comprimento de ondas ainda maiores. Alguns destes grupos estão representados na figura 33. Observe que eles possuem uma dupla ligação, e átomos com elétrons não ligantes. As duplas ligações e estes grupos são chamados de cromóforos, do grego portador de cor. Figura 33. Grupos cromóforos. Estes grupos ajudam a estabilizar as duplas ligações das moléculas que constituem. Com isso provocam uma diminuição nas energias de transições dos elétrons. O processo pelo qual uma substância absorve energia luminosa implica na transição de elétrons entre os níveis de energia das moléculas que constituem aquela substância. Ao receber um fóton de luz um elétron da molécula é promovido a um nível de energia mais elevado. Esta energia extra é dissipada na forma de movimentos vibracionais, ou rotacionais implicando num retorno do elétron ao nível original. O comprimento de onda do fóton absorvido está relacionado com a diferença entre os níveis de energia da molécula no estado 167 fundamental e no estado excitado. Assim a absorção da luz se dá em um comprimento de onda específico, sendo uma característica de cada molécula. Podemos dizer que o espectro de absorção de uma substância corresponde a sua identidade (Gouveia-Matos, 1999). Devido a esta capacidade de absorver luz os materiais corantes têm sido utilizados nos últimos anos na produção de células foto-elétricas mais eficazes. Estes dispositivos são capazes converter energia luminosa em energia elétrica. Estes dispositivos estão sendo chamados de células solares orgânicas. Aqui o termo orgânico se refere ao fato de o corante é um composto de carbono, semelhante as inúmeras moléculas que representamos anteriormente. Além do componente orgânico a células utilizam o dióxido de titânio como componente ativo. Mas tudo isto é outra história, e quem sabe você possa fazer parte dela! 168 A História e a Química dos Corantes Roteiros dos experimentos Experimento 1 - Tingindo Tecidos A prática de tingir tecidos é bastante antiga. Nossos antepassados obtinham da natureza os materiais necessários para colorir os tecidos. Eles utilizavam cascas, raízes, e folhas de plantas, além de extratos obtidos de certos animais. Mas você já parou para pensar que esta prática, a tinturaria tem por trás muito conhecimento químico? Do que se necessita • • • • • • Casca de cebola; 1 Beterraba; 1 pacote de açafrão (curcuma); 1 pacote de coloral (urucum); Alúmem de potássio (obtido em farmácias); Tecido de algodão na cor branca, lavado e seco previamente; Álcool; Uréia (obtida em lojas de produtos agropecuários) Lamparina; Tripé; Recipientes para aquecer a água, 1 de 500 ml e 3 de 50 ml; Coador de papel. • Corte o tecido de algodão em pedaços de 5 x 5 cm. • Junte um pouco de casca de cebola a 200 ml de água e aqueça até a fervura. Filtre a mistura com um coador e recolha em dois recipientes diferentes 20 ml da solução. • Mergulhe um pedaço de tecido branco no primeiro recipiente e aqueça por 5 minutos. Após este tempo retire o tecido e lave-o com água corrente. • • • • • • Como proceder Parte A • Pegue outro pedaço de tecido branco, mergulhe-o em uma solução de alúmem de potássio, e a seguir no segundo recipiente com a solução do corante. • Aqueça por 5 minutos, retire o pedaço de tecido e lave-o com água corrente. 169 • Repita os três últimos passos usando uréia no lugar do alúmem de potássio. • Repita todo o experimento substituindo a casca de cebola pela beterraba, e depois use o açafrão. Procedimento B • Coloque 10g do corante coloral em um copo de 200 ml, adicione 50 ml de álcool e agite. • Filtre a mistura. • Ao filtrado adicione 50 ml de água, e leve ao fogo, em um recipiente adequado, por 10 minutos, para que o álcool evapore. • Repita o procedimento usado para tingir os pedaços de tecido com a casca de cebola. Questões 1) Comparando o método de extração usado para obter o corante da cebola e o do coloral indique as vantagens e desvantagens de um em relação ao outro. 2) O que justifica o uso do álcool na extração do corante do urucum enquanto que para extrair o corante da cebola e da beterraba foi necessário usar somente água? 3) Feita suas observações, qual a importância do uso de substâncias como alúmem de potássio ou uréia no processo de tingimento? 4) Hoje sabemos que a indústria produz corantes sintéticos. Pelas suas observações, quais seriam as vantagens e desvantagens dos corantes naturais em relação aos artificiais? 5) Observando a quantidade de material descartado após a tintura de tecido, como você avalia o impacto da indústria têxtil sobre o meio ambiente? Sugestão o professor poderá indicar aos alunos que façam a leitura de textos didáticos sobre solubilidade para que compreendam a questão 4. Observação Macroscópica Após o cozimento da beterraba, das cascas de cebola, e do açafrão obtiveram-se soluções nas cores vermelha e amarela. Da mistura corante de urucum com álcool obteve-se uma solução de cor vermelha. Usando estas soluções para tingir os pedaços de tecido de algodão diretamente obteve-se um material com coloração tênue que desbotava facilmente com a água. Já fazendo o tingimento precedido do mergulho na solução de alúmem de potássio ou na de uréia a coloração dos tecidos ficou mais intensa, não saindo tão facilmente com a água. 170 Interpretação Microscópica O cozimento da beterraba, da casca da cebola propiciou a liberação de diversas substâncias para o meio aquoso. Estas substâncias são solúveis em água por possuírem grupos polares, o que possibilita a formação de pontes de hidrogênio com as moléculas de água. Algumas destas substâncias possuem, ainda, a propriedade de absorver parte da radiação visível, daí as soluções terem ficado coloridas. No caso da beterraba a substância envolvida é a betanina (Fig. 34), e no caso da casca de cebola é a petunidina-3-arabinosídeo (Fig. 35). Todas estas substâncias possuem em comum a presença várias ligações duplas conjugadas (Fig. 36 e 37). Estas ligações duplas, e a presença de alguns grupos funcionais específicos fazem com a absorção de energia eletromagnética, que normalmente ocorre na faixa do ultravioleta, se desloque para a região do espectro visível. Isto por que as conjugações reduzem as diferenças entre os níveis de energia das transições eletrônicas das moléculas. O fato das dos corantes terem se fixado melhor no algodão, após a imersão do tecido na solução de alúmem de potássio, ocorre por que este sal permite o estabelecimento de ligações iônicas entre as moléculas do corante e as cadeias de celulose que constituem o algodão (Fig. 39). Expressão Representacional Figura 34. Betanina (componente da beterraba). Figura 35. Petunidina-3-arabinosídeo (componente da casca de cebola). 171 Figura 36. Componentes do corante urucum. Figura 37. Componentes do açafrão. Figura 38. Cadeias do polímero da celulose. Figura 39. Interação iônica, intermediada pelo íon alumínio, entre a molécula de um corante (alizarina) com grupos polares de uma fibra. 172 Experimento 2 – Corantes X Pigmentos Os registros mais antigos de uso de materiais usados para colorir são os desenhos feitos pelos homens das cavernas. Mas será que eles não faziam nenhum outro tipo de uso das cores? Por que será que não se encontram outros tipos de registros tão antigos quanto estes das pinturas nas cavernas? 1- Teste do aquecimento Material • Raspas de vegetais (beterraba, cenoura, etc); • Corantes sintéticos para tecido (encontrados em armarinhos); • Amostras de areia de diversas cores e texturas; • Tubo de ensaio; • Pinça de madeira; • Lamparina. Procedimento • • • • Amostras 1. Escolha uma das amostras. Coloque uma pequena porção dentro de um tubo de ensaio e aqueça sob o fogo da lamparina; Observe se há mudanças em relação ao cheiro, ao estado físico, a cor, ou formação de fumaça, além de outras que você achar conveniente; Repita o procedimento utilizando as outras amostras; Faça suas anotações em uma tabela como a que segue: Observações. 2. 3. 4. Questões 1) Você observou algo em comum entre as amostras? 2) Segundo suas observações como você poderia agrupar os materiais? 3) Para você o que justifica o fato de que alguns materiais não sofreram alteração alguma mediante o aquecimento? 4) Por que alguns materiais se inflamaram antes mesmo de se derreterem? 173 Observação Macroscópica As amostras de areia e pequenas rochas coloridas quando aquecidas não sofreram nenhuma alteração perceptível visualmente. Ao aquecer as amostras de vegetais o tubo de ensaio ficou úmido no início. Logo após, as raspas que ficaram com aspecto ressecado, começaram a escurecer e iniciou-se a formação de uma fumaça branca e densa que ficou dentro do tubo de ensaio. O cheiro era semelhante a papel queimado. Ao aquecer as amostras de corantes para tecidos percebemos que as cores iniciais desapareceram. O material que inicialmente era verde, azul ou amarelo ficou branco, na forma de pequenos cristais. Percebemos também a formação de uma fumaça tênue de cor branca. Interpretação microscópica A areia e as pequenas pedras coloridas são materiais formados por misturas de compostos iônicos. Em geral óxido de silício, óxido e hidróxidos de ferro, dentre outros. Nestes compostos os átomos, que se encontram ionizados, estão unidos por meio de forças eletrostáticas que se estendem por todas as direções. Além disto, a organização das partículas constituintes nestes compostos forma uma rede cristalina (Fig. 40). Com isso o ponto de fusão dos mesmos é elevado. O aquecimento sob a chama da lamparina não é suficiente para fundi-los. Estes compostos também não sofrem decomposição quando aquecido por que se encontram no estado de oxidação mais estável. Para que ocorresse algum tipo de reação com os mesmos seria necessário levá-los à exposição com alguma substância redutora. As raspas de vegetais são materiais que possuem, além da água, compostos formados por átomos do elemento carbono, junto a outros átomos. Ao aquecer o material a água evapora, deixando o material ressecado. A seguir os compostos de carbono passam a reagir com o oxigênio do ar, formando gás carbônico (que é um gás denso), além de vapor de água e outros compostos em e menor quantidade. Esta é uma reação de combustão . Os corantes para tecidos encontrados em lojas de armarinhos são misturas de cloreto de sódio e de compostos sintéticos de carbono. Ao aquecer tal mistura estes últimos sofrem também uma reação de combustão formando o gás carbônico e vapor de água, que se dissipam no ar. A material que resta no fundo do tubo de ensaio é o cloreto de sódio que é um sólido iônico branco e pouco reativo. Expressão Representacional Aquecimento da areia e do cloreto de sódio Fe2O3 + O2 nada SiO2 + O2 nada 174 Reação de combustão dos compostos de carbono Composto de carbono (s) + O2 (g) CO2 (g) + H2O (g) Retículo cristalino do cloreto de sódio Figura 40. Retículo cristalino do cloreto de sódio. 175 Experimento 3 – Desbotando a calça jeans Hoje em dia as calças jeans são um grande sucesso. Não há jovem nas grandes cidades que não queiram ter uma. Mesmo entre pessoas mais maduras elas se tornaram uma peça básica do vestuário. Todavia, o que se valoriza não é somente a resistência do seu tecido, mas sim o efeito estético que ela proporciona. Poucos são os que preferem comprar uma legítima “blue jeans”, o que faz a cabeça da moçada é aquela calça com cara de velha. Quanto mais desbotada e desgastada melhor. Mas você já parou para pensar como é o processo de desbotamento usado para produzir o jeans délavé. Será que na indústria as calças são lavadas até desbotarem? Qual será a “química” envolvida? Figura 41. Calça Jeans desbotada A figura 41 apresenta uma calça que foi envelhecida durante sua manufatura. artificialmente. Do que vamos precisar • • • • Amostras de tecido jeans (cor azul); Comprimidos de permanganato de potássio (KMnO4); Água oxigenada 10 volumes; Copos descartáveis transparentes. Como proceder 1. Em um copo com 50 ml de água dissolva um comprimido de permanganato potássio (0,1 g); 2. Corte alguns pedaços do tecido jeans com dimensões de 3x3cm; 3. Mergulhe um dos pedaços de tecido na solução de permanganato de potássio por 5 minuto, retirando-a em seguida. 4. Lave o pedaço de tecido com água corrente, e logo após coloque-o em um recipiente contendo 5 ml de água oxigenada. 5. Repita o procedimento mais 2 vezes. Anote suas observações. Questões para discussão 1) A ação do permanganato de potássio sobre o jeans pode ser considerada uma reação química? Justifique. 2) A ação da água oxigenada sobre o tecido jeans após o tratamento com permanganato de potássio também pode ser considerada uma reação química? Justifique. 3) O permanganato de potássio é um agente oxidante. Consulte um livro didático e tente explicar a ação deste material sobre o índigo. 4) Observando o processo você considera coerente uma pessoa que se diz defensora do meio ambiente comprar calças jeans desbotadas? Explique sua resposta. 176 Observação Macroscópica Ao retirarmos o pedaço de tecido jeans da solução de permanganato de potássio, cuja coloração é roxa, observou-se que a cor original do jeans, que era azul, mudou para o marrom. Com a imersão deste tecido na solução de água oxigenada ocorreu uma efervescência sobre o tecido. Depois de cessado o processo de formação do gás, observou-se que o tecido tinha voltado à cor original, porém estando um pouco mais claro que o original. Interpretação Microscópica Ao mergulharmos o tecido jeans na solução diluída de permanganato de potássio este irá oxidar as moléculas de índigo, formando uma molécula que contem um grupo ácido carboxílico e um grupo amida (Fig. 42). A presença destes grupos faz com o índigo se solubilize na água. Os íons permanganato por sua vez são reduzidos a óxido de manganês. Este formar um material insolúvel de cor castanha, cujas partículas ficam impregnadas entre as fibras do tecido. O tecido de cor castanha quando mergulhado na solução de água oxigenada leva o óxido de manganês, que está impregnado em suas fibras, a entrar em contato com aquela substância. Consequentemente ocorre a redução do óxido de manganês a íons manganês II (solúvel em água). Além deste produto forma-se a água e o gás oxigênio, que é liberado para a atmosfera. Como o método leva a degradação de parte do índigo, pela formação de produtos solúveis em água. O tecido ao final do processo apresenta uma coloração menos intensa, que diminui quando da repetição de cada etapa. Expressão Representacional Oxidação do índigo (cor azul) com a formação do óxido de manganês (de cor castanha) Figura 42. Redução do óxido de manganês frente a água oxigenada com formação de gás oxigênio e íons manganês II. Reação de óxido-redução entre o óxido de manganês e a água oxigenada. MnO2 + 4 H+ + 2 e- Mn+2 + 2 H2O E°= +1,33 v H2O2 O2 + 2 H+ + 2e- E°= -0,68 v MnO2 + H2O2 + 2 H+ Mn+2 + 2 H2O + 2 O2 (Marrom) (Incolor) E°= + 2,01 v 177 Experimento 4 - Colorindo como o índigo Você já parou para pensar por que as calças jeans fazem tanto sucesso entre os adolescentes? A origem das calças jeans é curiosa. Ela surgiu da idéia de um comerciante, Levi Strauss (Fig. 43), durante a corrida do ouro nos Estados Unidos, por volta de 1850. Levi percebeu que a roupa dos garimpeiros se desgastava rapidamente por conta do trabalho pesado nas minas de ouro. Como possuía um grande estoque de lonas, que não conseguia vender, pensou em produzir calças mais reforçadas com aquele material. De início fez duas ou três peças, mas o sucesso foi tanto que logo estava atendendo uma grande quantidade de encomendas. Figura 43. Levi Strauss. Algum tempo depois Strauss passou a usar um brim azul, originado da cidade de Nînes, daí a expressão “denim”. O nome jeans é uma corruptela da palavra Gênes (grafia francesa para cidade de Gênova). O corante utilizado para tingir este tecido era extraído de uma planta chamada índigo. No início o processo de tintura era bastante demorado, e só cobria o tecido externamente. Hoje, por meio de processos químicos, a tintura do tecido é mais rápida e profunda. Agora responda: para você quais deveriam ser as características ideais de um corante para tingir tecidos? Do que se necessita • • • • • • Hidrossulfito de sódio (Na2S2O4), Corante Índigo;* Solução 1M de hidróxido de sódio (NaOH); Pedaço de tecido de algodão e de poliéster; Tubo de ensaio com 2,5 cm de diâmetro; Rolha de borracha, e uma conexão de vidro; Tripé, lamparina, tela de amianto. Como proceder • Monte o sistema como na figura 44 abaixo: Figura 44. Aparelhagem para tintura com o índigo. *Nota: Caso não seja possível obter o corante índigo puro, utilize um pequeno pedaço de tecido jeans novo (não desbotado). Ele servirá como fonte daquela substância. 178 • Misture uma pequeníssima quantidade de índigo (0,05 g) a 10 ml de água, aqueça a mistura e tente tingir um pedaço de cada tecido mergulhando-os na suspensão obtida. Observe e anote o que ocorre. • • • • • No tubo de ensaio dissolva 0,5 g (meia colher rasa de café) de hidrossulfito de sódio (Na2S2O4) em 15 ml de água; Adicione 5 ml da solução de hidróxido de sódio e 0,05 g (uma ponta de espátula) de índigo a solução; Feche o tubo de ensaio para evitar a entrada de ar, usando a rolha de borracha com a conexão de vidro já encaixada; Quando começar a ferver, mergulhe um pedaço do tecido de poliéster na solução e aguarde alguns instantes antes de retirá-lo. Faça o mesmo com o tecido de algodão Observe e anote o que ocorre. Observação macroscópica A mistura de corante índigo com água, mesmo quando aquecido permanece incolor. Embora as partículas de índigo se fragmentem ainda é possível percebe-las flutuando dispersas na água. O tecido branco quando imerso nesta mistura não alterou sua cor. Somente alguns pontos de cor azul se formaram no mesmo. Por outro lado, quando aquecemos a mistura de índigo com a solução contendo hidrossulfito de sódio e hidróxido de sódio forma-se uma solução de cor amarela. O tecido de algodão após ter sido embebido nesta solução e exposto ao ar passa da cor amarela para o azul. Esta coloração é homogênea em toda extensão do tecido. Repetindo o procedimento com o tecido sintético percebemos que não há alteração alguma, mesmo usando a solução com hidrossulfito de sódio e hidróxido de sódio. Interpretação microscópica O índigo é um corante sólido, insolúvel em água. O aquecimento de uma mistura deste corante em água forma uma dispersão, onde as partículas maiores são apenas fragmentadas, não chegando a se solubilizarem. O banho de um tecido com esta mistura não permite colorir o tecido efetivamente porque as partículas do corante são ainda muito grandes para penetrarem nas fibras do tecido. A insolubilidade do índigo se deve ao fato de suas moléculas possuírem como grupos polares apenas duas carbonilas. Estas por sua vez não são capazes de formarem ligações de hidrogênio com as moléculas de água. A adição de hidrossulfito de sódio, que é um agente redutor, a solução converte as moléculas de índigo a sua forma leuco, pelo rompimento de uma das ligações entre o oxigênio e carbono de cada carbonila, o que resulta na formação de uma carga negativa sobre o oxigênio (Fig. 45). Como conseqüência dessa carga negativa as interações entre as moléculas de índigo na forma leuco e as moléculas de água são mais fortes, e o material torna-se solúvel. Estando o índigo solubilizado na água, e, portanto com partículas dispersas em nível molecular, pode penetrar nas fibras de algodão, impregnando-o em maior intensidade. 179 Ao retirarmos o tecido do banho e expondo-o ao ar, a forma leuco do índigo entra em contato com o oxigênio, sendo oxidada a forma neutra, de cor azul. O fato de o índigo não ter tingido o tecido sintético, mesmo após tratamento para sua solubilização, se dá em conseqüência de que as cadeias poliméricas que formam suas fibras estão muito próximas umas das outras (Fig. 46.b). Com isso não há espaço para entrada das moléculas de índigo. Por outro lado, nas fibras de algodão, a conformação espacial das moléculas de celulose o permite o alojamento das moléculas daquele corante entre as cadeias poliméricas (Fig. 46.a). Expressão Representacional Redução do índigo a sua forma leuco. Figura 45. Redução do índigo a sua forma leuco. Cadeias poliméricas da celulose e do poliéster. Observe que entre as cadeias de celulose existe um espaço bem maior que entre as cadeias de poliéster. a) b) Figura 46. Estrutura dos polímeros das fibras de: a) celulose ; b) poliéster. 180 Experimento 5 – Usando a eletricidade para descolorir Para você será que o processo de tinturaria gera algum impacto sobre a natureza? Pelo que você observou no primeiro experimento qual o principal problema relativo ao processo de tingir tecidos? Como será que a indústria resolve este problema? Do que se necessita • • • • • • • • • • Grafite de lapiseira 2.0; 1 Ralador de verduras. 1 beterraba pequena; Corantes alimentícios coloral; Corantes sintéticos para tecidos; Cloreto de sódio (sal de cozinha). Grafite de lapiseira 2.0; 2 Garras jacaré; 2 Copos transparentes; 2 pilhas (com suporte) ou 1 fonte de voltagem de 3V; Como proceder • Com o suporte, as pilhas, as garras jacaré e dois pedaços de grafite monte o esquema conforme figura 47 abaixo: • Figura 47. Equipamento para eletrólise. • Em seguida coloque em um copo com água três fatias finas de beterraba; • Recolha 50 ml da solução que deve ter ficado colorida em um copo transparente; • Adicione meia colher de chá de cloreto de sódio (NaCl); • Mergulhe os eletrodos de grafite na solução; • Observe o que ocorre e faça suas anotações. • Para usar o coloral, misture inicialmente cada um destes corantes com álcool, agite a mistura e faça uma filtração; • Ao filtrado adicione uma quantidade equivalente de água e logo após o sal. • Agora você já pode inserir os eletrodos de grafite e observar o que ocorre. • As soluções com corantes comerciais podem ser feitas diluindo o material em água diretamente. Em seguida mergulhe os eletrodos nesta solução e proceda com nos outros casos Anote suas observações. 181 Questões. 1) Qual a necessidade de se usar álcool para dissolver e coloral (urucum)? 2) Os dois corantes, açafrão e coloral, podem ser considerados substâncias? 3) Por que foi necessário adicionar água a solução alcoólica de urucum para realizar o experimento? 4) No experimento que realizamos fez-se uso da eletricidade, podemos considerar que todo processo se resume a uma transformação física ou a uma transformação química? Justifique a sua resposta. 5) Considerando as fórmulas dos corantes utilizados no experimento e levando em conta o tipo de reação do hipoclorito com os materiais orgânicos, justifique as observações que se percebe junto ao pólo positivo. 6) Você conseguiria escrever as fórmulas dos produtos obtidos na reação que ocorre no pólo positivo? Observações Macroscópicas Ao mergulhar os eletrodos de grafite na solução inicia-se um processo de efervescência, sendo que no pólo positivo ela é menor que no pólo negativo. Nas imediações do pólo positivo as soluções tornaram-se lentamente incolores. Próximo ao pólo negativo não houve alteração relativa à cor, exceto para a solução de beterraba que mudou para uma coloração amarronzada. Passados alguns minutos é possível perceber um odor que lembra o dá água sanitária. Explicação Microscópica. Ao introduzirmos os eletrodos em uma solução de cloreto de sódio inicia-se o processo de eletrolise desta substancia juntamente com a da água. No pólo positivo, onde os elétrons são captados, ocorre a formação do gás cloro a partir dos íons cloro (Cl-1). Sendo que no pólo negativo ocorre a formação do gás hidrogênio, devido a quebra da molécula de água. A quantidade estequiométrica de gás hidrogênio é duas vezes maior que a do gás cloro. Por isso no pólo negativo a produção de gás é mais intensa. Neste pólo também ocorre a formação de íons OH-, o que reduz o pH em seu entorno. A perda de cor da solução junto ao eletro positivo pode ser compreendida se levar em conta que o gás cloro converte-se no íon hipoclorito na presença dos íons hidroxila. O hipoclorito por sua vez é um forte agente oxidante, sendo capaz de quebrar com facilidade as duplas ligações existentes nas moléculas orgânicas dos corantes (Fig. 48). Com o rompimento das duplas ligações as moléculas deixam de absorver energia eletromagnética na região do visível, e por conseqüência tornam a substância a qual pertencem incolor. A formação do hipoclorito justifica também o fato de que a produção de gás no pólo positivo seja tão menor que no pólo negativo. A mudança da cor solução obtida a partir da beterraba, junto ao pólo negativo, pode ser compreendida levando-se em conta que o componente que dá cor a esta solução é a betanina. Esta substância é sensível as condições de pH do meio, e pH ácido suas moléculas sofrem isomerização e formam a isobetanina, contudo esta substância continua sendo colorida. Já em pH básico, a betanina sofre decomposição formando formando dois produtos- o ácido betâmico e a ciclodopa- 5 – o – glicosídio. O ácido betâmico possui moléculas com várias duplas ligações conjugadas, sendo, portanto, o responsável pela cor marrom (Fig. 49). 182 Expressão representacional Reação que ocorre no ânodo (pólo positivo) - 2 Cl Cl2 Cl2 + H2O HClO + HCl - HClO + HO- ClO + H2O Reação que ocorre no cátodo (pólo negativo). + + - 2 Na + 2 H2O + 2e- 2 Na + 2 OH + H2 Oxidação de duplas ligações com hipoclorito (March, 1968, p. 612): Figura 48. Reação de oxidação de duplas ligações pelo hipoclorito. Conversão da betanina em função do pH do meio (Dias, Guimarães e Merçon, 2003) Figura 49. Transformações da betanina em relação ao pH do meio. 183 Experimento 6 - As cores dos objetos No passado os seres humanos eram dependentes dos materiais obtidos na natureza para dar cores aos tecidos de algodão, seda ou lã. Hoje em dia utilizamos na maior parte das vezes produtos obtidos em laboratórios. Mas será que para cada cor existe um corante específico? Como será que nossos antepassados produziam tons variados para cada cor? E como será que isto é feito hoje na indústria? Do que se necessita • • • • Uma folha de papel cartão preto; Folhas de papel celofane nas cores azul, vermelho, verde, amarelo e violeta; Cola e fita adesiva; Pedaços de tecidos em cores diversas. Como proceder • Inicialmente monte os filtros de luz. Para tanto recorte 5 pedaços de papel cartão com dimensões 20 cm x 10 cm e dobre-os ao meio. No quadro formado faça um recorte interno com dimensões 6 cm x 6 cm. Fixe internamente em cada quadrado vazado um pedaço de papel celofane de uma das cores, dobrado em quatro camadas. • Usando os filtros analise as mudanças de cores que irão ocorrer com cada um dos pedaços de tecidos. Anote suas observações Levando em consideração o fato de que em nossos olhos existem células sensíveis somente as cores vermelha, verde e azul-violeta, tente elaborar uma explicação para as observações feitas. A figura abaixo pode lhe auxiliar neste processo. Ela representa o fenômeno de associação de feixes de luz monocromática (de uma só cor). Observe que na interseção dos três feixes de luz a cor obtida é o branco e que, opostamente, quando associamos os filtros de cor vermelha, verde e azul obtém-se o preto. Figura 50. Representação da síntese aditiva das cores. 184 Observação Macroscópica Os resultados obtidos pela disposição dos filtros de luz sobre os pedaços de tecidos coloridos podem ser esquematizados como segue: Tecido Cor básica Vermelho Verde Violeta Vermelho --Preto Preto Cor do tecido/ Cor obtida Verde Violeta Amarelo Preto Preto Vermelho --Preto Verde Preto --Preto Azul Preto Verde Violeta Cor composta Amarelo Vermelho Verde Preto --Verde Magenta ** Vermelho Preto Violeta Vermelho Azul Azul Preto Verde Violeta Verde --** equivale a cor da solução diluída de permanganato de potássio Explicação Microscópica As cores que observamos nos objetos são resultado de dois fenômenos: o primeiro representa a interação da luz com a matéria, o segundo refere-se a interpretação pelo cérebro dos estímulos luminosos recebidos por nossa retina. Esta possui três conjunto de células, cada um capaz de perceber a radiação eletromagnética na faixa de comprimento de ondas correspondente ao que chamamos de cor vermelha, verde e violeta. A combinação dos estímulos luminosos é interpretada pelo nosso sistema nervoso como a sensação de cor. No que se refere a interação da energia (luz) com a matéria o que ocorre é que dependendo da estrutura molecular de cada composto determinadas porções do espectro visível podem ser absorvidas, enquanto outras podem ser refletidas. A radiação luminosa refletida é que irá excitar nossa retina. A combinação de luz que forma as cores pode ser entendida da seguinte maneira. Um material branco é aquele que reflete todas as cores. Um material vermelho, verde ou violeta reflete a cor correspondente e absorve as demais. Estas são as chamadas cores primárias, não sendo obtidas pela combinação de raios luminosos de outras cores. As cores amarelo, azul e magenta, designadas secundárias são obtidas pela combinação dos seguintes raios luminosos, respectivamente: vermelho e verde; violeta e verde; vermelho e violeta. Para compreender a ação dos filtros sobre os tecidos devemos ter em mente que eles são capazes de deixar passar somente os raios luminosos correspondentes a cor que representam, absorvendo as demais. Assim o filtro vermelho permite a passagem apenas do vermelho, que é uma cor primária. O filtro azul, por sua vez, permite a passagem do verde e do violeta, já que é uma cor secundária formada pela combinação de raios luminosos associados a estas duas últimas cores. Os demais agem de forma semelhante. 185 Exemplificando com alguns dos resultados obtidos (Fig. 51). • • • • O tecido vermelho foi percebido como preto, frente aos filtros verde e violeta, pois estes dois filtros, de cor primária não permitem a passagem da luz vermelha. O filtro azul também leva ao mesmo resultado, pois permite a passagem apenas da luz verde e violeta. O filtro azul sobre o tecido verde não altera a cor deste, pois permite, além dos raios violeta, a passagem da luz verde. O filtro amarelo por sua vez é capaz de absorver a cor violeta, deixando passar o vermelho e o verde. Assim quando sobreposto a um tecido azul, imprime a sensação de verde, pois bloqueia a luz vermelha, que é um dos componentes da cor azul. Raciocínios semelhantes podem ser desenvolvidos para as demais cores dos tecidos. Expressão representacional Objeto vermelho reflete o vermelho e absorve as demais cores Objeto a verde reflete a cor verde e absorve as demais cores Objeto violeta reflete o violeta e absorve as demais cores Objeto azul reflete apenas a cor verde e violeta Objeto amarelo reflete apenas as cores vermelha e verde Objeto magenta reflete as cores vermelha e violeta Figura 51. Representação da relação entre absorção da luz e formação das cores. O fenômeno também pode ser representado pelo círculo cromático. Nas regiões onde ocorre sobreposição das cores primárias forma-se uma cor secundária. Em conseqüência, o material corante que possui uma cor secundária deve absorver a cor primária que no gráfico está em posição oposta. Veja que a região em cor magenta está em posição oposta ao verde, logo deve absorver esta cor e refletir o azul e o vermelho como já ressaltamos. Figura 52. Representação da síntese aditiva das cores 186 Experimento 7 - A luz e os corantes Você saberia explicar de que maneira um corante ao ser aplicado sobre um tecido de algodão faz com que a cor deste material deixe de ser o branco? As cores dos corantes Do que nos vamos precisar • • • • • • • • Uma Beterraba; Corante açafrão; Corante coloral (corante de urucum); Corantes sintéticos para tecido (obtidos em armarinhos); Um ralador; O espectroscópio montado conforme roteiro acima; Uma lanterna; Copos de plástico transparentes. Como proceder Inicialmente vamos obter as soluções; Em um copo com água fervida coloque uma porção de beterraba ralada. Deixe descansar por pelo menos cinco minutos; • Repita o processo com o coloral e o açafrão, porém use álcool ao invés da água, e filtre o material colhendo cada filtrado em um copo transparente; • Para usar os corantes sintéticos dissolva 1 g ( uma colher rasa de café) em 100 ml de água; Transfira 15 ml de uma das soluções para um copo de plástico transparente, encaixe-o na parte superior do espectroscópio, posicione a lanterna acessa sobre a solução e observe através da lupa o espectro formado; Repita este último procedimento para as outras soluções, e compare os espectros obtidos com aquele que se forma quando a luz da lanterna é projetada diretamente no espectroscópio, sem que se use nenhuma das soluções; • • • • Obs. A solução que será colocada para análise deve ter uma concentração tal que permita a passagem de um pequeno raio de luz, de maneira que se possa perceber seu espectro. Caso isto não ocorra acrescente um pouco de água a mesma para diluí-la. Anote suas observações. 1) Pelas observações que você fez de que maneira os corantes atuam para dar cor aos materiais? 2) Quando observamos um material de cor verde o que estar acontecendo com a luz que incide sobre este material? E se o material tem a cor amarela, o que está ocorrendo? 187 3) Quais devem ser as características dos constituintes de uma substância para que ela apresente a propriedade de ter cor? Montagem do espectroscópio 3 Do que vamos precisar • 50 cm de cano de esgoto com diâmetro de 40 mm. • 1 conexão em Y para tubos de 40 mm; • Duas lentes de 4 ou 5 dioptrias (4 ou 5 graus) – elas podem ser obtidas de binóculos comprados em camelôs. • 1 junta redutora de tubos de 50 mm para 40 mm; • Um tampão de 40 mm. • Um CD. • Um parafuso de M5 com 10 cm de comprimento, e outro com 5 cm. Mais três porcas e duas arruelas; • Cola de silicone ou outra de secagem rápida. • Um pedaço de madeira com dimensão 20 cm x 20 cm (pode ter qualquer formato). Será usado como base de sustentação do conjunto. Como proceder Primeiramente iremos montar o sistema da difração (Fig. 53). Sobre um CD de boa qualidade recorte um disco de 36 mm de diâmetro. Este disco será nossa rede de difração. Fure a junção em Y com uma broca de 5 mm na interseção das linhas de centro, encaixe o parafuso e fixe sobre ele o disco que foi recortado. Tome o cuidado de observa qual o melhor direcionamento da rede de difração. Figura 53. Sistema de difração do espectroscópio. 3 Adaptado de Netto (2007). 188 Desmonte o binóculos e retire as duas lentes focais. Uma delas será usada como lente de campo, tornando os raios de luz incidentes paralelos entre si, a outra servirá como lupa, facilitando a visualização do espectro. Para encaixar a lente de campo recorte um anel de papel cartão com diâmetro externo de 40 mm e interno de 30 mm. Cole a lente sobre este anel. Para encaixar a lupa, adapte o suporte da lente do binóculos, e se isto não for possível repita o procedimento da lente de campo. Para finalizar encaixe sobre a lente de campo um pedaço de cano no qual se adaptou a luva de redução. O comprimento do cano deve ser igual a distancia focal da lente (Fig. 54). Para tomar esta medida, aponte a lente para o sol e procure focalizar os raios de luz em um único ponto, em seguida usando uma trena meça a distancia da lente até o ponto luminoso formado. Figura 54. Espectroscópio para análise das cores das soluções. Para fixar o espectroscópio em uma base de madeira, parafuse um tampão de 40 mm a esta base e use um pedaço de cano de 7 cm para encaixá-lo na montagem. Observações Macroscópicas Fazendo a luz incidir diretamente no espectroscópio foi possível ver todas as cores do arco-íris (vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil e violeta) formando uma linha. Ao colocar as soluções coloridas sob a lanterna, e observando a luz que as transpassa com o aparelho, percebeu-se que algumas cores ou tornavam-se muito fracas ou deixavam de ser vistas. Com a solução de beterraba foi possível perceber apenas as cores azul e vermelho. Com as soluções de corantes vermelho, verde e violeta, apenas a respectiva cor foi percebida. Com a solução de corante amarela pode-se perceber as cores vermelha e verde, as demais não foram vistas. Com a solução roxa as cores vistas foram o vermelho e o violeta. Usando a solução de azul viu-se somente o verde e o violeta. 189 Interpretação Microscópica Para entender a decomposição da luz em suas diversas cores pelo espectroscópio devemos levar em consideração que a luz pode ser vista como um fenômeno ondulatório. A luz branca (visível) seria um somatório de ondas com comprimentos que variam desde 400 até 700 nm. Cada cor do espectro corresponde a uma porção desta faixa de comprimentos de onda: o vermelho (625 a 740 nm) é que tem o maior comprimento; o violeta (380-440 nm) é a que tem o menor comprimento de onda. Assim como as demais ondas, a luz também pode sofrer difração. Este fenômeno consiste em um desvio na trajetória de uma onda, quando esta passa por um orifício, ou tem que contornar um obstáculo, cujas dimensões são da mesma ordem do seu comprimento de onda. No espectroscópio, o disco, feito com o CD, apresenta ranhuras da ordem 1/625 mm (pois o CD contém 625 ranhuras/mm). Estas ranhuras estão em uma dimensão próxima a do comprimento de onda da luz visível. A radiação luminosa ao incidir sobre estas ranhuras sofre, assim, difração de seus raios. O desvio na trajetória de cada onda está diretamente relacionado com o seu comprimento de onda. Por isso, a difração é utilizada para separar os componentes de uma fonte que emite ondas em diversos comprimentos. O feixe luminoso, ao incidir sobre o disco do CD, terá seus raios desviados em ângulos diferentes, que dependem do comprimento de onda. E, como já dissemos, as cores correspondem a faixas de comprimento de onda específicos. Com a propagação dos raios luminosos, após a difração, eles se afastam e os percebemos isoladamente. As diferentes faixas de cores, percebidas nos espectros, devem-se ao fato de que em cada solução temos substâncias corantes diferentes. Cada substância é formada por moléculas capazes de absorver energia luminosa em determinadas regiões do espectro visível. Estas absorções eliminam, por assim dizer, algumas cores (comprimentos de onda), sendo que as demais são refletidas ou passam diretamente pela solução. O espectro observado para cada solução indica quais são as cores que não estão sendo absorvidas (Fig. 55). Expressão representacional a) Refração da luz branca b) Refração da luz que emerge de uma solução colorida Figura 55. Representação do processo de refração da luz após passagem pelas soluções. 190 Experimento 8 – Ultravioleta: a cor invisível Em muitas boates é muito comum o uso de uma lâmpada especial, chamada de luz negra. Este tipo de luz faz brilhar com intensidade muitos objetos de cor branca, conferindo certa beleza. Mas para você faz sentido falar em luz negra? O que será que este tipo de lâmpada tem haver com os corantes? Do que vamos precisar Para luminária • Uma lâmpada de luz negra de 28 w, para bocal comum (110 v ou 220 v); • Um pedaço de cano de PVC de 75 mm de largura por 15 cm de comprimento com um tampão; • Um bocal para lâmpadas; • Fio elétrico flexível e um conector para tomadas; Para o experimento • Pedaços de tecido em cores variadas, sendo ao menos um na cor branca; • Uma caixa de algodão hidrófilo (aquele usado para limpar machucados.); • Folha de papel branco. Como proceder • • • Montagem da luminária. Monte a extensão ligando o bocal ao conector de energia. No centro do tampão de 75 mm faça um furo com 2,5 cm encaixe a lâmpada de luz negra e enrosque-a no bocal. Por fim encaixe o tubo de 75 mm no tampão, conforme figuras abaixo: . . b) a) Figura 56. a) Componentes da luminária b) Luminária montada Agora, em um ambiente com pouca iluminação, coloque os pedaços de tecidos, um chumaço de algodão e um pedaço de papel sob a luminária ligada e observe o que ocorre. 191 Questões 1) Pelas suas observações quais materiais brilham sob a luz negra? 2) Se o papel e o algodão são feitos de celulose por que será que eles se comportam diferentemente sob a luz negra? Observação Macroscópica. Ao colocarmos o papel, o tecido de algodão e o chumaço de algodão hidrófilo, sob a luz negra observamos que tanto o papel quanto pedaço de tecido ficaram brilhantes. O mesmo aconteceu com a água mineral com gás. Já o chumaço de algodão permaneceu escuro, sem brilho algum. Explicação Microscópica. As lâmpadas de luz negra são assim chamadas por emitirem radiação luminosa em um comprimento de onda que os nossos olhos não percebem - o ultravioleta (UV). No papel e no tecido de algodão existem substâncias que foram acrescentadas para minimizar o aspecto amarelado que aqueles materiais adquirem com o tempo, devido a formação de flavonóides (derivados da oxidação da celulose). A substância mais usada pela indústria é o Blankophor B (Fig. 57), que absorve energia na faixa de comprimento do UV e a devolve ao meio com comprimento de onda na região do visível (400 nm). Este comprimento de onda equivale a cor azul que é absorvida pelo papel e algodão envelhecidos. Assim quando colocamos as amostras de papel e de algodão sob a luminária estas passam a brilhar porque parte a luz ultravioleta, que ela emite, está sendo convertida para uma cor que conseguimos enxergar. Expressão Representacional Corante que converte luz ultravioleta em luz visível. Figura 57 . Corante capaz de converter radiação ultravioleta em luz visível. 192 Referências ARAÚJO, M. E. M. Corantes naturais para têxteis – da antiguidade aos tempos modernos. 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