mais - Mercosur

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DIANGÓSTICO REGIONAL
O TRÁFICO DE MULHERES COM FINS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL NO MERCOSUL
Reunião de Ministras e Altas Autoridades da Mulher do MERCOSUL
ARGENTINA
Ministério de Relações Exteriores e Culto
Representação para os assuntos da Mulher em Âmbito Internacional
Embaixadora Gloria Bender
Conselho Nacional das Mulheres
Presidenta Mariana Gras Buscetto
BRASIL
Secretaria de Políticas para as Mulheres – Presidência da República Federativa do Brasil (SPM).
Ministra Eleonora Menicucci
PARAGUAI
Secretaria da Mulher – Presidência da República do Paraguai.
Ministra Gloria Rubin
URUGUAI
Instituto Nacional das Mulheres – Ministério de Desenvolvimento Social.
Diretora Beatriz Ramirez
Este documento foi realizado com o apoio do Programa MERCOSUL da Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento -AECID-, Projeto de Fortalecimento da Institucionalidade e a perspectiva
em gênero no MERCOSUL.
Autoras do Diagnóstico Regional: Diana González Prett e Andrea Tuana Nägel.
Dezembro de 2011
Texto original em espanhol.
Tradução para o português: Ana Maria Gomes Raietparvar.
Projeto gráfico: Maru Acorinti / Ana Canelo.
Autoriza-se a reprodução sempre que citada a fonte. É proibido o uso deste material, de suas reprodução ou
traduções com fins comerciais.
Nota: os resultados desta investigação refletem a exclusiva opinião das autoras, as quais a Reunião de Ministras e Altas Autoridades da Mulher do MERCOSUL considera competentes no assunto.
2
ÍNDICE GERAL
Prólogo
Pag. 5
Apresentações
Pag. 6
Reunião de Ministras e Altas Autoridades
da Mulher do MERCOSUL (RMAAM)
Organismos que integram a RMAAM
Programa MERCOSUL – AECID
Projeto de Fortalecimento da institucionalidade e
da perspectiva em gênero no MERCOSUL
As autoras regionais
Diagnóstico regional
Diana González – Andrea Tuana
Pag. 11
Diagnósticos nacionais:
Argentina
Laura Sardá – Liliana Russo
Pag. 83
Brasil
Verónica Teresi
Pag. 89
Paraguai
Lourdes Barboza
Pag. 95
Uruguai
Cristina Prego
Pag. 99
3
PRÓLOGO
casos, os organismos competentes apoiaram a tarefa
das consultas e deram aval aos informes apresentados
em meados de 2011.
“Diagnóstico regional
sobre a
situação das mulheres vítimas de tráfico de pessoas
para fins de exploração sexual no MERCOSUL” é resultado de um trabalho impulsionado e liderado pela
Reunião de Ministras e Altas Autoridades da Mulher do
MERCOSUL (ex Reunião Especializada da Mulher) no
marco do Projeto ‘Fortalecimento da Institucionalidade
e perspectiva em gênero no MERCOSUL’, financiado
pelo Programa de Cooperação MERCOSUL – Agência
Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (AECID).
Esta publicação forma parte de uma estratégia regional de abordagem a uma das formas mais flagrantes
de violência contra as mulheres: o tráfico de mulheres
com fins de exploração sexual.
Com base na plena consciência de que o tráfico de
mulheres é um fenômeno complexo que prende as
mulheres em um círculo vicioso de violência, exclusão
e pobreza, a Reunião de Ministras e Altas Autoridades
da Mulher do MERCOSUL priorizou a criação de uma
estratégia regional que contenha ferramentas para
fortalecer o trabalho conjunto no enfrentamento deste
fenômeno, de suas causas e consequências sobre a
vida das mulheres.
Este diagnóstico implicou numa análise profunda da
caracterização do tráfico de pessoas, com ênfase no
tráfico de mulheres com fins de exploração sexual, permitindo assim avançar no conhecimento da temática e
na avaliação de possíveis estratégias conjuntas entre os
países do MERCOSUL.
A equipe responsável selecionada para realizar o trabalho em nível regional foi formada pela Doutora Diana
González Perett e a Assistente Social Andrea Tuana
Nägeli e foi realizado durante o ano de 2011.
Com o objetivo de realizar diagnósticos aprofundados
em cada um dos países, as consultoras contaram com
documentos nacionais elaborados por especialistas em
direito e/ou ciências sociais, com amplo conhecimento
do tema. Na Argentina, o documento foi elaborado pela
Doutora Laura Sardá e pela Bacharel Liliana Russo, no
Brasil pela Mestre Verónica María Teresi, no Paraguai
pela Doutora Lourdes Barboza e no Uruguai pela Socióloga Cristina Prego. Cabe destacar que em todos os
No processo de elaboração do presente diagnóstico
foram requeridas instâncias presenciais para o aprofundamento de temas concretos, especialmente em
algumas zonas de fronteira comum (Brasil-Argentina,
Argentina-Paraguai e Tríplice fronteira). Para tanto, a
equipe de consultoras regionais realizou uma missão
a estes pontos-chave, onde puderam intercambiar com
alguns dos atores principais1.
Este diagnóstico passou por um processo de enriquecimento e validação no marco do Seminário Internacional
“O tráfico de mulheres no MERCOSUL. Por um acordo
regional de atendimento a mulheres em situação de
tráfico de pessoas”, organizado com o apoio do Programa MERCOSUL – AECID e do Centro de Formação
da Cooperação Espanhola. O mesmo contou com a participação de organismos nacionais, regional e internacionais com competência na identificação, intervenção,
resgate /ou reinserção de pessoas em situação de tráfico dos quatro países envolvidos neste projeto, assim
como especialistas de organismos internacionais como
a Organização Internacional para as Migrações (OIM) e
o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e crime
(UNODC).
1. As consultoras regionais
realizaram uma missão de
trabalho entre 30 de agosto
e 1 de setiembre de 2011,
participando em reuniões
em Assunção, Ciudad Del
Este e Encarnación (Paraguai), Tríplice Fronteira (Argentina-Brasil-Paraguai),
Posadas (Argentina), Foz do
Iguaçu (Brasil) e também
ao Posto de Atendimento
no Aeroporto de Guarulhos,
São Paulo (Brasil).
2. Por exemplo, as consultoras regionais apresentaram
o Diagnóstico na Mesa Interinstitucional no Paraguai e
no II Encontro Nacional de
Enfrentamento ao Tráfico
de Pessoas no Brasil (que
se desenvolveu na cidade
de Recife dos dias 7 a 9 de
novembro de 2011).
Com o fim de permitir o intercâmbio e comentários
necessários ao Diagnóstico Regional, cada país considerou diferentes mecanismos para a sua validação,
através do encontro regional ou de instâncias nacionais, o que também produziu um impacto positivo enriquecendo as políticas de enfrentamento ao tráfico.2
Por último, esta publicação contém duas ferramentas:
por uma parte, uma publicação em papel que inclui
duas seções: o diagnóstico regional e uma breve síntese de cada um dos diagnósticos nacionais; e, por
outra parte, a publicação e os diagnósticos nacionais
completos em formato digital.
A Reunião de Ministras e Altas Autoridades da Mulher
do MERCOSUL celebra esta publicação por vê-la como
de fundamental importância para a construção de uma
resposta integral regional de enfretamento da problemática, e parabeniza as consultoras regionais e nacionais pela finalização desta pesquisa, que constitui
uma importante contribuição para a visibilização das
diferentes formas de violência de gênero que sofrem as
mulheres no MERCOSUL.
Reunião de Ministras e Altas Autoridades da Mulher
do MERCOSUL
5
APRESENTAÇÕES
Reunião de Ministras e Altas
Autoridades da Mulher
(RMAAM)
Desde a constituição do MERCOSUL, ONGs feministas,
sindicalistas, a FLACSO, a UNIFEM e o Fórum de Mulheres do MERCOSUL uniram esforços para introduzir
a dimensão de gênero no processo de integração regional. Estas iniciativas se dirigiram em particular ao
Subgrupo de trabalho nº 11 do MERCOSUL, dedicado
às relações trabalhistas, emprego e previdência social.
Entre 1995 e 1997, antes da IV Conferência Mundial das
Nações Unidas sobre a Mulher, foram realizados seminários de formação e análise da situação das mulheres no MERCOSUL. Estes encontros permitiram que as
áreas governamentais da mulher dos países integrantes do MERCOSUL emitissem, ao final da atividade,
uma declaração conjunta que expressava a necessidade do Conselho do Mercado Comum de implementar
mecanismos para garantir a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres no desenvolvimento dos
trabalhos nos âmbitos de negociação que integram o
MERCOSUL, e que se considerasse a criação da Reunião de autoridades (a mais alta categoria) dos órgãos
governamentais responsáveis por executar as políticas
públicas para mulheres nos países do MERCOSUL.
Estas declarações foram o antecedente direto da
criação da Reunião Especializada da Mulher do MERCOSUL (REM), concretizada em 1998 pela Resolução
do Grupo Mercado Comum (GMC) (Resolução 20/98).
Uma década mais tarde, levando em consideração os
avanços institucionais que tiveram os organismos nacionais de políticas para as mulheres, a REM solicitou
a elevação de seu status a Reunião de Ministras e Altas
Autoridades. A partir da Resolução do Conselho do
Mercado Comum Nº 24/02 de dezembro de 2011, é reconhecida a institucionalidade e as hierarquias dos mecanismos nacionais participantes e é criada a Reunião
de Ministras e Altas Autoridades da Mulher do MERCOSUL (RMAAM).
De acordo com esta Resolução, a RMAAM mantém seu
objetivo: «analisar a situação da mulher, levando em
consideração a legislação vigente nos Estados Partes
do MERCOSUL, em relação ao conceito de igualdade de
oportunidades, com o objetivo de contribuir ao desenvolvimento social, econômico e cultural das comunidades dos Estados Partes do MERCOSUL».
Integram a RMAAM os/as representantes governamentais dos quatro Estados Partes, com a coordenação
das respectivas seções nacionais determinadas por
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cada Estado Parte. São estas: a Representação Especial para Temas no Âmbito Internacional da Mulher, da
Chancelaria Argentina; a Secretaria de Políticas para as
Mulheres da Presidência da República do Brasil; a Secretaria da Mulher da República do Paraguai, e o Instituto Nacional das Mulheres, do Uruguai. Participam da
RMAAM Venezuela e como Estados associados Bolivia,
Chile, Colômbia, Equador e Peru , e assessoram como
representantes da sociedade civil várias organizações
não governamentais.
Desde a sua criação, o organismo regional realizou 26
reuniões semestrais, nas quais as ministras fizeram
intercâmbios e realizaram acordos para favorecer os
avanços de gênero em cada um dos países, e ainda promovem a inclusão da perspectiva de gênero na institucionalidade do MERCOSUL.
Desde seu começo, os temas debatidos fizeram referencia à participação econômica e política das mulheres, à eliminação da violência em todas as suas formas,
à saúde das mulheres, às condições sociolaborais e
enfrentamento e ao tráfico de mulheres, entre outros.
Para aprofundar nos temas concretos, a RMAAM acordou a organização de duas mesas técnicas: luta contra
a violência de gênero (em particular: a erradicação da
violência doméstica e o enfrentamento ao tráfico de
mulheres e gênero); e trabalho e integração econômica.
A RMAAM é o principal fórum de coordenação política entre as máximas autoridades na problemática da
mulher, onde se debatem, promovem e implementam
políticas públicas regionais em questões de gênero.
É prioritário continuar trabalhando pelo melhoramento
das condições de vida de todas as mulheres do MERCOSUL, assim como pelo aprofundamento da institucionalidade de gênero.
Organismos que integram a
RMAAM
ARGENTINA
Representação Especial da Mulher em Âmbito Internacional (REMUI)
Este organismo está atrelado ao Ministério de Relações
Exteriores e Culto da Argentina. É encarregado de efetuar o seguimento da agenda de gênero em âmbito regional e internacional.
A REMUI articula com o Conselho Nacional das Mulheres (CNM) as ações da RMAAM. Este Conselho forma
parte do Conselho Nacional de Coordenação de Políticas Sociais da Presidência da Nação, e é o organismo
nacional responsável pelas políticas públicas de igualdade de oportunidades e tratamento entre homens e
mulheres. Preside o Conselho Federal de Mulheres.
BRASIL
Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República Federativa do Brasil (SPM).
A SPM foi criada no ano de 2003 e a partir de 2007, mediante a ‘medida provisória 483’, torna-se um órgão
essencial da Presidência da República, passando a ter
um caráter ministerial. O organismo é responsável
por estabelecer as políticas públicas que contribuam
para melhorar a vida das mulheres e reafirmar o compromisso do Governo Federal com todas as mulheres
do país. Atualmente, executa o II Plano Nacional de
Políticas para as Mulheres e realizou a III Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres no final de
2011.
PARAGUAI
Secretaria da Mulher da Presidência da República do
Paraguai (SMPR)
O organismo foi criado em 1992 mediante a Lei 34/92.
É a instância governamental regente normativa e estratégica das políticas de gênero. Conta com autonomia
técnica e de gestão e impulsiona planos de ação para
promover a igualdade de oportunidades e a equidade
de gênero entre mulheres e homens. Está diretamente
integrada à Presidência da República.
Atualmente coordena a implementação do III Plano
Nacional de Igualdade entre Mulheres e Homens 20082017.
URUGUAI
Instituto Nacional das Mulheres (Inmujeres) do Ministério de Desenvolvimento Social.
O Instituto Nacional das Mulheres, criado em 2005 na
órbita do Ministério de Desenvolvimento Social (lei Nº
17.886, art. 6), é o organismo regente das políticas de
gênero no Uruguai, responsável pela promoção, desenho, coordenação, articulação e execução das políticas públicas a partir de uma perspectiva de gênero, e
também pelo seu seguimento e avaliação, garantindo a
igualdade de direitos e a equidade de oportunidades de
mulheres e homens nos âmbitos político, econômico,
social, cultural e territorial. Sua visão é integrar a perspectiva de gênero como enfoque de análise e gestão no
Estado considerando a diversidade da sociedade, de
modo a garantir o exercício de uma cidadania ativa de
mulheres e homens, aprofundando, assim, a democracia e garantindo a justiça social.
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Programa de Cooperação
MERCOSUL-AECID
O Programa de Cooperação MERCOSUL- Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento –AECID, forma parte da aposta decidida da
Cooperação Espanhola por apoiar os organismos regionais e os processos de integração na América Latina.
Em 20 de junho de 2008, sob a Presidência pro tempore
da Argentina, foi assinado em Buenos Aires um Memorando de Entendimento entre a AECID e o MERCOSUL. Neste documento, o MERCOSUL reconhece haver
definido eixos de ação para contribuir e aprofundar a
integração regional, o desenvolvimento e a competitividade na região e a cooperação política e social entre os
países, como claro comprometimento com as demandas da população.
A AECID ratifica assim seu compromisso com o progresso da América Latina e com a execução de ações
que permitam seu desenvolvimento sustentável.
Ambas partes reiteram que compartilham de uma visão
a médio e longo prazo orientada à ampliação de capacidades regionais e ao aproveitamento de oportunidades com fim de contribuir para a redução da pobreza e
de fomentar sociedades mais equitativas. A área geográfica contemplada pelo Programa de Cooperação
MERCOSUL-AECID é compreendida entre as fronteiras
físicas dos Estados Partes do MERCOSUL: Argentina,
Brasil, Paraguai e Uruguai. Não se exclui a possibilidade de realizar ações no âmbito da região sul americana, especialmente incluindo os estados associados
ao MERCOSUL (Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Peru
e Venezuela).
Isto, sempre que os Estados Partes assim o solicitem
ou não tenham inconvenientes e tenham prévia negociação e diálogo com a AECID.
O âmbito temporal de aplicação do Programa de Cooperação MERCOSUL-AECID, conforme estabelecido no
Memorando de Entendimento (MDE), se inicia desde o
momento de sua assinatura e tem um prazo de quatro
anos, renováveis por mútuo acordo das partes. Em consequência, se estabelece como primeiro período o quatriênio 2008-2011.
O Programa tem a finalidade de contribuir para o fortalecimento das instituições do MERCOSUL e de impulsionar ações de desenvolvimento e favorecer a geração
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de maiores níveis de coesão social em seus Estados
Parte. Com este objetivo, se torna essencial o apoio às
instituições do MERCOSUL, com participação da sociedade civil, para que sejam elas que elaborem e executem políticas públicas e ações em setores estratégicos
do processo de integração regional.
O Programa de Cooperação MERCOSUL-AECID contempla seis linhas de trabalho, cinco delas definidas
no MDE por serem do âmbito de interesse comum às
partes, e uma sexta linha incorporada mais tarde por
solicitação do MERCOSUL:
1. Formação de capacidades e fortalecimento institucional
2. Gênero
3. Meio-ambiente
4. Integração produtiva
5. Desenvolvimento local, rural e fronteiriço
6. Saúde
O orçamento previsto do Programa para o período
2008-2011 é de €5.000.000. Na linha de ação de gênero,
a AECID busca propiciar a inclusão da agenda de gênero
nas instituições do MERCOSUL e sua transversalização
nas políticas públicas dos Estados Parte.
Projeto: Fortalecimento da
institucionalidade e a
perspectiva de gênero no
MERCOSUL
A necessidade de aprofundar a inclusão da perspectiva de gênero no processo de integração regional e
de atualizar as ações acordadas entre os países com
relação às políticas de gênero conduziu à elaboração
do projeto Fortalecimento da institucionalidade e da
perspectiva de gênero no MERCOSUL. Este foi aprovado
pela institucionalidade do MERCOSUL em dezembro de
2008, para ser executado com fundos da AECID pela
Reunião de Ministras e Altas Autoridades da Mulher do
MERCOSUL.
O projeto possui quatro eixos. O primeiro é o fortalecimento dos organismos de gênero, tanto com recursos
financeiros como humanos, para o qual são previstas
ações em cada um dos países e na institucionalidade
do MERCOSUL. O segundo eixo pretende comparar em
escala regional indicadores de violência doméstica baseada em gênero. O terceiro inclui a promoção da parti-
cipação política das mulheres no âmbito do MERCOSUL
e de cada país membro, favorecendo a regionalização
das políticas. O quarto promove a luta contra o tráfico
de mulheres com fins de exploração sexual comercial.
Os eixos ou componentes dão lugar a várias ações e
atividades de sensibilização, consultorias nacionais e
regionais, articulação com outras reuniões especializadas e organismos do MERCOSUL, busca e sistematização de informação, ferramentas de comunicação e
outros mecanismos que propõem impactos concretos.
O projeto conta com 700 mil euros para serem geridos durante os anos de 2009 a 2012, prazo em que se
espera ter avançado nos seguintes temas concretos:
• Fortalecimento da RMAAM.
• Sensibilização em gênero dos servidores nacional e
regional.
• Implementação de indicadores comparáveis em nível
regional em violência doméstica baseada de gênero.
• Favorecimento da participação política das mulheres
no MERCOSUL.
• Implementação de ações de luta contra o tráfico de
mulheres com fins de exploração sexual
As autoras
Diana González Perett
Doutora em Direito e Ciências Sociais pela Universidad de la República de Uruguay, cursou mestrado
em Direitos Humanos na Universidad de Andalucía
– Espanha e cursos especializados na Argentina, nos
Estados Unidos e no Uruguai. Têm ampla formação e
experiência em direitos humanos, direitos de crianças
e adolescentes, exploração sexual, assim como em violência contra a mulher, especialmente em tráfico de
mulheres com fins de exploração sexual. Participou de
diversas pesquisas sobre estas temáticas. É assessora
jurídica em temas de direitos humanos, mulher, infância, adolescência e diversidade sexual, tanto em organizações sociais quanto no âmbito público (executivo e
legislativo). Publicou diversos estudos sobre direitos
humanos, violência, gênero e idade, incluindo o tráfico
de mulheres com fins de exploração sexual.
Andrea Tuana Nâgeli
É graduada pela Escuela Universitaria de Trabajo
Social del Uruguay, diplomada em Gênero, Desenvolvimento e Planejamento no Chile. Sua experiência de
trabalho é centrada na luta contra as discriminações
a partir de múltiplas perspectivas. Tem experiência no
trabalho direto, na docência e na definição de políticas
pela sociedade civil e pelo âmbito público em questões de violência baseada em gênero e discriminações.
Especialista em violência doméstica e sexual contra
mulheres, crianças e adolescentes. Realizou múltiplas investigações e participou na redação de Planos
e Programas nacionais que lutam contra a Violência
Doméstica, a Violência Sexual e o Tráfico de Mulheres.
Publicou diversos estudos sobre direitos humanos, violência, gênero e idade, incluindo o tráfico de mulheres
com fins de exploração sexual. Integra organismos internacionais de luta contra o tráfico de mulheres (Coalizão contra o Tráfico de Mulheres e Crianças na América
Latina e no Caribe – CATWLAC) e nacionais (Mesa Interinstitucional de luta contra o tráfico de mulheres com
fins de exploração sexual comercial do Uruguai)..
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DIAGNÓSTICO REGIONAL ›MERCOSUL‹
TRÁFICO DE MULHERES COM FINS DE
EXPLORAÇÃO SEXUAL NO MERCOSUL
Diana González
Andrea Tuana
Março 2012
11
INDICE
Indice Diagnóstico Regional
Apresentação
Pag. 16
Capitulo 1. Marco de referência
·1.1. Perspectiva de gênero
·1.2. Perspectiva pos estruturalista
·1.3. As teorias Queer
·1.4. Violência baseada de gênero
Pag. 19
Capitulo 2. Cenário internacional
·2.1. Mobilização internacional contra o tráfico de pessoas
·2.2. Síntese dos convênios internacionais e instrumentos de
direitos humanos sobre tráfico de mulheres com fins de exploração sexual
Pag. 23
Capitulo 3. Marco conceitual
·3.1. Diferenças entre tráfico de pessoas e contrabando de migrante
·3.2. Características do tráfico
·3.3. Fatores que favorecem ou causam o tráfico
·3.4. Objetivos do tráfico
Pag. 29
Capitulo 4. CCaracterização do tráfico de pessoas
·4.1. Principais fatores de vulnerabilidade detectados na região
·4.2. Amplitude do problema
·4.3. Características das vítimas
Pag. 33
Capitulo 5. As Rotas de tráfico de pessoas na região
·5.1 Principais zonas de captura e recrutamento
·5.2 Principais zonas de destino de tráfico interno e internacional
·5.3 Zonas de fronteira altamente vulneráveis
Pag. 37
Capitulo 6. Redes tráfico de pessoas
·6.1 Estratégias de captura e recrutamento
·6.2 Viagem e trânsito
·6.3 Destino e exploração
Pag. 45
Capitulo 7. Respostas institucionais e legislação
·7.1 Síntese descritiva
·7.2 Análise das respostas institucionais
Pag. 49
Capitulo 8. Conclusões
·8.1 Caracterização
·8.2 Respostas institucionais
Pag. 75
Capítulo 9. Recomendações
Pag. 79
Bibliografia
Pag. 81
13
Indice de mapas
Mapa I: Principais zonas de captura e recrutamento na região
Mapa II: MERCOSUL como região de origem
Mapa III: MERCOSUL como zona de destino
Mapa IV: Fronteiras vulneráveis
Pag. 38
Pag. 40
Pag. 42
Pag. 44
Índice de quadros
Quadro 1: Principais zonas de captura e recrutamento
Quadro 2: Principais zonas de destino de tráfico interno e internacional
Quadro 3: MERCOSUL como região de destino
Quadro 4: Zona de fronteira altamente vulnerável
Quadro 5: Políticas públicas
Quadro 6: Campanhas de sensibilização e informação
Quadro 7: Linhas telefônicas
Quadro 8: Capacitação e fortalecimento institucional
Quadro 9: Protocolos realizados
Quadro 10: Penalização do tráfico de pessoas
14
Pag. 37
Pag. 39
Pag. 41
Pag. 43
Pag. 56
Pag. 57
Pag. 62
Pag. 64
Pag. 65
Pag. 72
RESUMO EXECUTIVO
Identificam-se também circuitos de tráfico interno em
cada um dos países.
Em diversos momentos
da História ocorreu o crime do tráfico de mulheres com fins
de exploração sexual, mas só recentemente foi reconhecido e visualizado como um problema na região. No
final do século XIX e princípios do século XX, começase a detectar a existência de redes de traficantes que
transferiam mulheres de países europeus como a Polônia e a França para serem exploradas em diversos
países da região. Recentemente, no final do século XX,
dá-se início a uma mobilização internacional para enfrentar o problema. Desse modo, nas últimas décadas
foi possível desenvolver ações de prevenção, atendimento, combate e enfrentamento ao tráfico de mulheres em todos os países do MERCOSUL.
O tráfico de pessoas é um crime praticado por redes
criminosas de diversa complexidade e organização,
que desenvolvem suas ações na região do MERCOSUL, dentro de suas fronteiras e fora delas, dentro das
fronteiras de cada país e fora delas. O caráter transnacional, regional e nacional deste delito desafia as
capacidades nacionais dos países da região e visualiza
a necessidade crucial de fortalecer as ações de cooperação regional para seu enfrentamento.
Identifica-se na região uma diversidade de fatores de
vulnerabilidade que compõem cenários favoráveis para
a expansão das redes de tráfico de pessoas. Os principais fatores são a inequidade e a violência de gênero;
a discriminação de grupos sociais determinados –
povos originários, afrodescendentes, pessoas trans-;
exclusão social; pobreza; o impacto de modelos de
desenvolvimento existentes na região; as barreiras migratórias nos países de destino; a permeabilidade das
passagens de fronteiras em algumas zonas da região e
a existência de população não documentada.
O MERCOSUL constitui uma região predominantemente de origem e destino. Existem circuitos e rotas de
tráfico que posicionam a região como abastecedora de
mulheres para destinos como Europa, Estados Unidos
e Ásia. A Espanha é assinalada como o principal país de
destino das vítimas do tráfico internacional de pessoas
provenientes da região.
Sem desconsiderar as iniciativas que estão se realizando em alguns países da região com relação à sistematização de informação, os dados com que se conta
atualmente são parciais: permitem obter uma caracterização do problema, mas ainda não permitem medir
sua dimensão. É preciso um esforço em nível regional
para desenvolver investigações que permitam quantificar a dimensão do tráfico de pessoas no MERCOSUL.
Os caminhos traçados por cada país são diferentes,
tanto nas principais modalidades do tráfico de pessoas
a serem enfrentadas, quanto nos mecanismos que são
utilizados.
a. A Argentina destinou principalmente seus esforços
para o enfrentamento do tráfico de pessoas em que
a exploração é feita dentro de seu território, dando
ênfase ao resgate das vítimas e à articulação do retorno
aos seus lugares de origem, quando for de sua vontade.
Ainda, recentemente foram intensificados os esforços
para: articulação interinstitucional para a prevenção e
investigação deste crime; capacitação e profissionalização das Forças Policiais e de Segurança; unificação
e sistematização dos critérios de registro da informação; implantação de campanhas de conscientização
e divulgação dos canais de denúncia; identificação precoce dos casos de tráfico de pessoas e atendimento
adequado às vítimas, tanto em passagens fronteiriças
internacionais quanto em delegacias na Cidade Autônoma de Buenos Aires.
b. O Brasil aprovou importantes documentos de Políticas e Planos de Ação e intensificou a investigação das
rotas de tráfico e a articulação de ações de investigação
e prevenção com os países do exterior, assim como a
criação de espaços para a identificação precoce de situações potenciais de tráfico.
c. O Uruguai está desenvolvendo uma resposta através
da instalação de um serviço nacional de atenção a vítimas de tráfico com fins de exploração sexual.
d. O Paraguai e o Uruguai criaram espaços de articulação interinstitucional permanentes, nos quais se definem as ações a serem seguidas.
Em toda a região foram realizadas campanhas de sensibilização e informação à população, e reformas na
legislação.
Ainda, a região do MERCOSUL é considerada destino e
trânsito de mulheres de outros países da América Latina
e também dos próprios países que integram o bloco.
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APRESENTAÇÃO
O Diagnóstico Regional apresenta um olhar sobre as características do tráfico de
mulheres com fins de exploração sexual no MERCOSUL. Contribui com aspectos globais que caracterizam
a região, assim como estabelece um olhar comparativo
dos países sobre as diferentes dimensões do problema.
O objetivo principal deste diagnóstico é de identificar as
principais características do tráfico em nível regional,
assim como mapear as respostas institucionais, com
enfoque especial nas ações de cooperação regional.
Para a realização do diagnóstico se tomou como base
os resultados provenientes das pesquisas nacionais
que foram realizadas em cada um dos quatro países da
região, no marco das ações desenvolvidas pela Reunião
de Ministras e Altas Autoridades, com apoio do Projeto
de Fortalecimento da Institucionalidade e da perspectiva de gênero no MERCOSUL (chamaremos de ‘informes nacionais’ de aqui em diante).
O presente informe está estruturado em cinco capítulos. O primeiro capítulo expõe as principais correntes
de pensamento que oferecem um marco analítico a
partir do qual se posicionar para trabalhar o problema.
O segundo capítulo descreve os esforços realizados em
nível internacional para colocar o tema na agenda pública e conseguir a atenção e o compromisso dos Estados. O terceiro capítulo descreve os principais conceitos
para compreender o tráfico de pessoas.
Os capítulos seguintes apresentam a composição do
panorama regional, que traz informação sobre a caracterização geral do tráfico de pessoas no MERCOSUL
– rotas, zonas vulneráveis, características das vítimas,
dinâmica do tráfico, respostas institucionais e marco
normativo.
Por fim, são apresentadas conclusões gerais e recomendações prioritárias. Neste sentido, se definiu contribuir com linhas gerais e prioritárias para nortear a
região no sentido de fortalecer o enfrentamento ao tráfico de mulheres com fins de exploração sexual.
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METODOLOGIA
Para poder compor o panorama
regional sobre o tráfico de mulheres com fins de exploração sexual é necessário destacar os aspectos
comuns entre os países. Em alguns capítulos a partir
de uma lógica comparativa, e em outros a partir de uma
visão global; buscando não perder de vista as especificidades e riquezas particulares de cada país, o que se
mostrou um grande desafio.
O enfoque metodológico utilizado foi baseado na definição de uma série de aspectos a serem pesquisados
em cada um dos países da região, de modo que nos
permitisse sistematizar de forma comparativa os resultados obtidos.
Foram desenvolvidas pesquisas nacionais cujo objetivo
principal era compor um panorama nacional com as
informações que o país continha no momento da realização do estudo. Essas pesquisas foram realizadas
por consultoras de cada país, com ampla experiência e
conhecimento da temática. Foi elaborada uma pauta de
recopilação da informação, que foi ajustada e consensuada com as consultoras nacionais.
A recopilação da informação foi realizada com base nas
pesquisas e produções existentes em cada país, complementando este panorama nacional com entrevistas
com informantes chaves, estrategicamente selecionados. O trabalho foi elaborado em um curto espaço de
tempo.
A partir dos resultados obtidos nas pesquisas nacionais, deu-se início à elaboração de um panorama regional.
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CAPÍTULO 1
·MARCO DE REFERÊNCIA
e em alguns países europeus como França e Inglaterra, de uma corrente de pesquisa crítica no campo do
conhecimento científico sobre a Condição da Mulher e
as diferenças entre os sexos, denominada Estudos da
Mulher.
O tráfico de mulheres com fins
de exploração sexual é um crime que adquire dimensões nacionais e transnacionais. É cometido por redes
de crime organizado, de maior ou menor complexidade,
que utilizam diversos meios para a captação, mobilização e exploração das vítimas. Em todos os casos é
utilizado poder, controle, domínio e manipulação das
vítimas para conseguir a submissão e/ou o cativeiro.
As formas em que essa dominação se expressa são diversas e dependem das características das vítimas, da
forma de recrutamento utilizada, dos recursos que as
redes de traficantes dispõem, entre outras.
O tráfico de mulheres com fins de exploração sexual
provoca diferentes tipos de danos profundos, e em
muitos casos, de difícil reversibilidade. Trata-se de uma
violação extrema dos direitos humanos das mulheres e
constitui uma forma de violência de gênero.
As principais vítimas deste crime são meninas, adolescentes e adultas e, cada vez mais, são detectadas
situações de mulheres trans recrutadas por redes de
tráfico interno e internacional.
Para entrarmos na complexidade do tráfico de mulheres com fins de exploração sexual é necessário se aprofundar nas principais perspectivas que nos permitem
analisar e compreender as dimensões do problema.
1.1. Perspectiva de gênero
Ao longo da História, mulheres organizadas em diferentes movimentos feministas conseguiram visibilizar
a situação de subordinação e discriminação em que
se encontravam e promover a mobilização social em
defesa de seus direitos.
Em meados dos anos 70 é produzido um impacto cultural muito forte com o surgimento, nos Estados Unidos
Esta corrente contribuiu para criar conhecimento sobre
as condições de vida das mulheres, resgatando no passado e no presente as contribuições das mulheres à
sociedade e à cultura; visibilizando-as na História, na
criação cultural, na vida cotidiana; focalizando, então, a
mulher como objeto de estudo. Os Estudos da Mulher
criaram antecedentes para o surgimento da categoria
de gênero. Aqueles que desenvolveram os estudos da
Mulher centraram seu objeto nas sociedades como
criadoras da subordinação das mulheres. Esta corrente
vai dar surgimento e expansão ao conceito de gênero.
O conceito de gênero foi definido como a construção
social e cultural das diferenças sexuais. Este conceito
questiona o caráter determinante do sexo biológico e as
diferentes características atribuídas a homens e mulheres.
1. Norma Fuller. ”La disputa de la Feminidad en el
psicoanálisis y las ciencias
sociales”.Debate en sociología No 18, Lima 1993.
2. Joan Scott:”El género,
una categoría útil para el
análisis histórico” en De género a mujer, compilación
de Cangiano M y Du Bois L.;
Centro Editor de América
Latina. Bs.As., 1993.
3. Teresita De Barbieri,
“Sobre la categoría de género: una introducción metodológica”, en Fin de siglo y
cambio civilizatorio, Ediciones de las mujeres, No. 17,
Isis Internacional, Santiago
1992,p.p 111-128.
Segundo Norma Fuller1 “Cada cultura elabora suas
próprias identidades de gênero a partir do dado biológico das diferenças entre os sexos. Isso supõe que
a identidade de gênero se constrói a partir de um
processo onde cada indivíduo aprende o que é ser
homem ou mulher, a assumir papéis e atitudes que
lhe são próprios e a interpretar a si mesmo segundo
tais parâmetros”.
Para a autora Joan Scott2, o gênero, além de ser um
elemento constitutivo das relações sociais baseadas
nas diferenças sexuais, constitui uma forma primária
de relações significantes de poder.
Teresa De Barbieri aprofunda e define os sistemas
sexo/gênero como: “os conjuntos de práticas, símbolos, representações, normas e valores sociais que as
sociedades elaboram a partir da diferença sexual
anatômico-fisiológica e que dão sentido à satisfação
de impulsos sexuais, à reprodução da espécie e em
geral ao relacionamento entre as pessoas.”3
O enfoque de gênero provocou transformações decisivas nas concepções socioculturais e políticas ao transcender o plano natural de interpretação das causas da
19
4. Rubin, Gayle (1989)[1984]
“Reflexionando sobre el
sexo: notas para una teoría
radical de la sexualidad”
en Vance, Carole (comp)
Placer y Peligro. Explorando la sexualidad femenina Madrid: Revolución.
5. Alcoff, Linda (1989) “Feminismo cultural versus
postestructuralismo: la crisis de la identidad en la
teoría feminista” en Feminaria. Año II. Nº4. Bs. As,
Feminaria editora.
6. AAVV (1994) “Feminismo,
entre la igualdad y la diferencia” en El Viejo Topo;
Nº73. Barcelona: marzo.
7. De Lauretis, Teresa
(1996) “La tecnología del género” en mora nº 2; Bs As,
UBA, noviembre.
desigualdade entre homens e mulheres e centrá-la no
plano sociocultural.
Em primeira instância, ao discriminar os termos diferença de desigualdade caem os argumentos mais estendidos sobre a subordinação de um sexo sobre outro,
questionando esta situação. Descobre-se e explica-se
que as diferenças naturais entre homens e mulheres,
as diferenças morfológicas, de sexo, de comportamento, associadas a um programa genético de diferenciação social não implica na superioridade de um sexo
sobre outro.
Em antropologia, Gayle Rubin (1986) explica que as relações entre sexo e gênero conformam um sistema que
varia em cada sociedade. Cada sociedade possui um
sistema sexo/gênero, ou seja, um conjunto de arranjos pelos quais uma sociedade transforma a sexualidade biológica em produtos da atividade humana. Esta
autora introduz o conceito de heteronormatividade4
em que através das normais sociais se determina uma
imposição à heterossexualidade, castigando de forma
simbólica e real a quem transgredir essas normas, mediante a utilização de mecanismos disciplinares.
1.2 Perspectivas
pós-estruturalista
8. Grupo de Trabajo Queer
(GtQ) (eds) (2005) El eje del
mal es heterosexual. Figuraciones, movimientos y
prácticas feministas queer.
Madrid: traficantes de sueños. Introducción
Esta corrente de pensamento parte da premissa que
toda identidade é uma construção e não há essencialidade. Destacam-se autores como Lacan, Derrida,
Foucault, Deleuze e Guattari, entre outros. Esta visão
das identidades se contrapõe ao essencialismo do feminismo cultural e ao pensamento moderno de igualdade.
O risco que se adverte nestas correntes de pensamento
é o de negar a existência de parâmetros a partir dos
quais se constroem as identidades em movimento. A
autora Linda Alcoff5 explica que, quando se aplica esta
ideia ao conceito de mulher, implica no que a autora
chama de nominalismo, que define a ideia de que a categoria “mulher” é uma ficção e que o feminismo deve
orientar seus esforços para desmantelá-la. Juli Kristeva6 (autora ligada a esta corrente de pensamento)
propõe: “uma mulher não pode ser; é algo que sequer
pertence à ordem do ser.” Este pensamento abre um
campo de grande liberdade para as mulheres, derrubando todo condicionamento da identidade de gênero,
abrindo horizontes muito amplos nas capacidades de
um sujeito construir-se em função de seus próprios
desejos, sentires, lógicas, pensamentos e idéias;
escapa dos condicionamentos do feminismo cultural e
20
da opressão da hegemonia masculina. O risco que se
vislumbra nestas correntes é de neutralizar, paralisar
e/ou até aniquilar as lutas políticas feministas, dado
que seu objetivo é reconstruir o sujeito feminino. Neste
sentido, se voltaria a invisibilizar o gênero, tirando a
perspectiva de gênero da análise dos fenômenos sociais e da construção da subjetividade. Neste ponto
se apresenta um dilema entre o essencialismo do feminismo cultural que termina reafirmando o que quer
transformar (a natureza do feminino que é argumento
para a opressão) e a diluição do sujeito político feminista por parte dos pensamentos pós-estruturalistas
que, ao posicionarem-se a partir de uma visão de que
tudo que se constrói, nada está determinado, neutralizam a perspectiva de gênero entre outras e caem definitivamente na postura da igualdade que sustentou o
pensamento moderno.
Neste dilema, Teresa de Lauretis7 contribui ao debate
com o conceito de experiência, que permite sair do essencialismo do feminismo cultural. Para de Lauretis:
“a subjetividade é o que cada um percebe e apreende
como algo subjetivo”. A noção de experiência é chave
nesta autora para o desenvolvimento da subjetividade.
1.3. As teorias Queer
As teorias Queer rejeitam a ideia do binarismo sexual
e da heteronormatividade. Promovem a concepção de
que existem outras identidades sexuais e buscam visibilizar como grupos de diferentes classes sociais,
origens étnicas, nacionalidades, etc. vivenciam e gerenciam seus desejos e prazeres sexuais diferentes da
norma heterossexual.8
Judith Butler realiza contribuições fundamentais às
teorias queer, entre elas, a definição de gênero em
termos de performance, para desnaturalizar a diferença sexual; o masculino e o feminino não são naturais, são atuações aprendidas, comportamentos que
vão se adquirindo ao serem repetidos quase como se
fossem um ritual. O gênero é uma performance, e as
paródias de gênero constituem atos corporais subversivos. A relação entre sexo e gênero é performática,
isto é, segue um roteiro cultural, e está normalizada de
acordo com o contexto (as regras heterossexuais).
Neste sentido, a autora coloca:
“A univocidade do sexo, a coerência interna do
gênero e o marco binário para sexo e gênero são
ficções reguladoras que reforçam e naturalizam os
regimes de poder convergentes da opressão masculina e heterossexista. No capítulo 3 se investiga a
própria noção de “o corpo”, não como uma superfície disponível que espera significação, mas como
um conjunto de limites individuais e sociais que
permanecem e adquirem significado politicamente.
Dado que o sexo já não pode ser considerado uma
“verdade” interior de disposições e identidade, se
argumentará que é uma significação performativamente realizada (e, portanto, que não “é”) e que, ao
desvencilhar-se de sua interioridade e superfície naturalizadas, pode provocar a proliferação paródica
e a interação subversiva de significados com gênero.
Sendo assim, este texto continua se esforçando em
refletir se é possível alterar e deslocar as noções de
gênero naturalizadas e reificadas que sustentam a
hegemonia masculina e o poder heterosexista, para
problematizar o gênero não mediante manobras que
sonhem com um além utópico, mas mobilizando,
confundindo subversivamente e multiplicando aquelas categorias constitutivas que tentam preservar o
gênero no lugar que lhe corresponde ao apresentarse como as ilusões que criam a identidade.”9
Gayle Rubin10 explica que na sociedade heteronormativa, à margem da respeitabilidade estão os casais gays
e lésbicos estáveis, seguidos em ordem decrescente
pelo sexo “mal” dos gays e lésbicas promíscuos, até
chegar aos níveis mais baixos da hierarquia sexual,
os mais estigmatizados: prostitutas, travestis, transexuais, sadomasoquistas, fetichistas.
1.4. Violência de Gênero
A autora Rita Laura Segato (2003) realiza uma análise profunda e um desenvolvimento teórico que tenta
avançar até a gênese da violência contra as mulheres. Em seus trabalhos, reflete sobre a noção de que
o fenômeno da violência é um produto da relação entre
dois eixos interconectados, um horizontal que está
conformado por relações de aliança e competição e
outro vertical, caracterizados por vínculos de entrega
e expropriação. Explica que ambos eixos formam um
sistema único, mas que este sistema é instável, possui
um equilíbrio instável. O primeiro eixo (o vertical) rege
as relações entre categorias sociais ou indivíduos que
se classificam como pares ou semelhantes. O segundo ordena as relações entre categorias que, como o
gênero, exibem marcas de status diferenciados, sinais
classificatórios que expressam um diferencial de valor
em um mundo hierárquico. Estas marcas são construídas e percebidas como indeléveis. Neste sentido, a
autora explica:
“...no eixo horizontal se alternam relações de compe-
tição ou aliança, que para fins de análise são equivalentes – uma vez que só tem sentido se falar de
aliança em um regime marcado pela disputa e pela
competição. Enquanto no eixo vertical, dos estratos marcados por um diferencial hierárquico e por
graus de valor, as relações são de exação forçada ou
de entrega de tributo, em sua forma paradigmática,
de gênero, o tributo é de natureza sexual.” 11
A respeito dos crimes perpetrados contra mulheres de
forma massiva, crimes que em geral estão presentes
ataques sexuais, cometidos com extrema crueldade
contra as mulheres como nos casos de Ciudad Juárez,
a autora discorda de quem os qualificam como crimes
de ódio. Segato propõe que os assassinatos são produtos da criação e perpetuação de uma fraternidade mafiosa. Neste sentido, a autora explica:
“...os membros destas fraternidades selam seu pacto
de silêncio e lealdade quando, em comunhão nefasta, mancham suas mãos com o sangue das mulheres mediante sua morte atroz, em verdadeiros
rituais onde a vitima do é colocada nesta posição
por nenhuma razão além de sua anatomia feminina – índice último de subalternidade na economia
desigual de gênero-, destinada ao consumo canibalístico no processo de realimentação da fratria mafiosa. Longe de ser a causa do crime, a impunidade
é a sua consequência, pois a confraria mafiosa sela
seu juramento de lealdade e silêncio com o sangue
do corpo profanado em cumplicidade. O tributo,
rendido em uma festa macabra, aqui coincide com a
própria vida subalterna, e seu destino é creditar aos
confrades o ingresso ou a permanência na ordem de
pares.” 12
9. Butler, Judith (2001)
[1990] El género en disputa.
México: Paidós. Capítulo 1
10. Rubin, Gayle (1998)
[1975] “El tráfico de mujeres: notas sobre la economía
política del sexo” en Navarro M y Stimpson C. (comp)
¿Qué son los estudios de
mujeres? México: FCE.
11. Segato, Rita Laura, Las
estructuras elementales de la
violencia -1era ed.- Bernal.
Universidad Nacional de
Quilmes, 2003
12. Idem
13. Declaración sobre la eliminación de la violencia contra
la Mujer. Naciones Unidas. Diciembre, 1993. artículo 1
Em âmbito internacional, na Declaração das Nações
Unidas sobre a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, se define por violência contra a mulher “todo
ato de violência baseado no pertencimento ao sexo
feminino que tenha ou possa ter como resultado um
dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico
para a mulher, inclusive as ameaças de tais atos, a
coação ou a privação arbitrária da liberdade, produzidos tanto na vida pública ou na vida privada”.13
Nesta definição se explicita o tipo de dano que é considerado violência contra as mulheres, assim como os
âmbitos onde é produzida. Assinala, ainda, que é um
ato de violência baseado no pertencimento ao sexo feminino, isto é, que o principal condicionante para que
ocorra é justamente o fato de ser mulher.
Na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir
e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção
de Belém do Pará) se define como violência contra a
21
mulher “qualquer ação ou conduta baseada em seu
gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico,
sexual ou psicológico à mulher, tanto em âmbito público quando privado”(art.1).
SEntende-se, assim, que a violência contra as mulheres é consequência da ordem de gênero que se estabelece na sociedade, ordem socialmente construída
que determina uma hierarquia e poder distintos para
ambos os sexos. Segundo esta ordem, as mulheres se
encontram em posição subordinada com relação aos
homens, que, por sua vez, exercem poder sobre elas
de distintas maneiras, sendo a violência uma manifestação deste poder.
A violência de gênero se expressa em práticas de exclusão e discriminação, na violência no lar ou violência
doméstica, no assédio sexual e laboral, na exploração
sexual em suas diversas formas, entre elas o tráfico de
mulheres para a prostituição forçada.
É a expressão mais extrema de um sistema de dominação baseado em uma cultura patriarcal, que estabelece pautas de comportamento tanto para homens
quanto para mulheres, hierarquias entre os sexos e
que modela os papéis e posicionamentos de adultos e
crianças, homens e mulheres. Os homens, as mulheres, os meninos, meninas e adolescentes são vítimas
desta expressão de gênero, mas em sua ampla maioria,
a violência de gênero é predominantemente a violência
do homem ou violência dos homens contra as mulheres, meninos, meninas e adolescentes.
A violência de gênero também se expressa na violência
homofóbica e transfóbica, por se dirigir contra homens
e mulheres que não cumprem com o modelo hegemônico da heteronormatividade, que desafiam e rejeitam
as pautas de gênero culturalmente impostas a seu ser
homem ou mulher.
.
22
CAPÍTULO 2
·CENÁRIO INTERNACIONAL
onde se conseguiu que a violência contra a mulher
fosse considerada uma violação aos direitos humanos.
Um dos frutos relevantes desta Conferência foi a Declaração sobre a Eliminação da Violência contra a Mulher,
acordada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em
dezembro do mesmo ano.
Durante
as últimas décadas as diferentes expressões deste tipo de violência passam a ser concebidas como uma violação aos direitos humanos.
Os movimentos feministas, os grupos de mulheres organizadas e ativistas de diversos âmbitos conseguiram
a inclusão do enfrentamento à violência de gênero.
Na década de 70, se realiza a Primeira Conferência
Mundial sobre a Mulher, organizada no México em
1975, onde se começa a discutir estes temas. Porém,
é em 1979 que se dá um passo fundamental, com a
aprovação por parte da Assembléia Geral das Nações
Unidas da Convenção Sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW, da
sigla em Inglês).
Na década de 80, os movimentos de mulheres e movimentos feministas começam a priorizar e denunciar o
problema da violência doméstica como uma das formas
mais duras de violência de gênero, com efeitos muito
graves na vida das mulheres. Passa-se a desnaturalizar as situações de opressão e submissão que eram
aceitas como parte da convivência matrimonial e começam a surgir as primeiras respostas de atenção ao
problema.
Em 1981, durante o Primeiro Encontro Feminista da
América Latina e Caribe, realizado em Bogotá, Colômbia, as mulheres participantes decidiram declarar o dia
25 de novembro como o Dia Internacional pela Não Violência contra as Mulheres, em memória à morte das
irmãs Mirabal, por parte da ditadura de Trujillo, na República Dominicana. Assim, é constituído um dos principais marcos do movimento de mulheres em relação
ao tema, que seria logo retomado pela Assembleia
Geral das Nações Unidas em 1999.
Um avanço muito importante foi obtido na II Conferência
sobre Direitos Humanos, realizada em 1993 em Viena,
Os principais avanços conquistados com esta Declaração são:
- Situar a violência contra as mulheres como um problema de direitos humanos, ao afirmar que as mulheres têm igualdade de direitos no usufruto e proteção
de seus direitos humanos e liberdades fundamentais;
incluindo sua própria liberdade e segurança, uma vida
livre de tortura ou qualquer castigo ou trato cruel,
desumano ou degradante.
- Ampliar o conceito de Violência contra as Mulheres
para refletir as condições reais de vida das mulheres,
reconhecendo não só a violência física, sexual e psicológica, mas também ameaças deste tipo. Abordar a
violência contra as mulheres tanto no entorno familiar
quanto comunitário e confrontar o problema da violência perpetrada e tolerada pelo Estado.
- Visibilizar que a Violência de gênero é aquela em que
as vítimas não são por acaso mulheres ou meninas,
mas cujo fator de risco é o precisamente o fato de ser
mulher.
Outra conquista significativa da Conferência de Viena
foi a criação pela Comissão de Direitos Humanos das
Nações Unidas do cargo de Relatora Especial sobre
Violência contra a Mulher assumido por Radhika Coomaraswamy, advogada do Sri Lanka, em 1994. A função
desta Relatora é recopilar informação sobre a violência
contra a mulher, definindo suas causas e consequências; identificar aqueles Estados onde ordinariamente
se cometem abusos contra os direitos das mulheres e
recomendar medidas para acabar com este sofrimento.
Vários marcos surgiram depois desta Conferência, gerando avanços substantivos na priorização deste problema e no comprometimento por parte dos estados no
enfrentamento deste problema:
- A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência contra a Mulher foi adotada pela
Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos, em junho de 1994 em Belém do Pará, Brasil.
23
Nela, os Estados Parte afirmaram que a violência
contra a mulher constitui uma violação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e limitam total
ou parcialmente a mulher ao reconhecimento, usufruto
e exercício de tais direitos e liberdades.
- A IV Conferência Mundial sobre a Mulher (Pequim,
1995)
Em setembro de 1995, foi realizada em Pequim, China,
a IV Conferência Mundial sobre a Mulher. O documento
resultante desta Conferência, a Plataforma de Ação
mundial, se orienta para a conquista da igualdade entre
homens e mulheres e para a proteção dos direitos
destas, constituindo-se em uma orientação para os governos, ainda que a sua efetivação dependa em grande
parte da vontade política dos mesmos. Especificamente
sobre a violência contra as mulheres, a Plataforma assinala que este fenômeno se deriva de pautas culturais,
em particular de tradições e costumes danosos para as
mulheres; de esforços inadequados por parte das autoridades para prevenir e fazer cumprir ou fomentar a
legislação sobre o assunto; da ausência de educação
sobre suas causas e consequências; do uso negativo
da imagem da mulher nos meios de comunicação,
entre outros fatores. Explica a necessidade de adotar
medidas para prevenir e eliminar a violência contra a
mulher, estudar suas causas e consequências, assim
como as medidas de prevenção; eliminar o tráfico de
mulheres e dar assistência a vítimas provenientes da
prostituição e do tráfico de mulheres.
2.1. Mobilização Internacional
contra o tráfico de pessoas
No final do século XIX, o tráfico de mulheres tomou proporções consideráveis na região. Estava intimamente
ligado às correntes migratórias para o “novo mundo”,
quando mulheres polonesas, russas e francesas eram
transladadas para os países da América do Sul com a
promessa de matrimônio ou de melhorias substantivas
na sua qualidade de vida e status. Meios de transporte
como barcos a vapor e trens e meios de comunicação
como o telégrafo foram utilizados para expandir o comércio sexual. Entre 1860 e 1930 o tráfico de mulheres
era feito da Europa para a América e também, ainda
que em menor escala, para a África ou Ásia. Neste contexto, surge um primeiro antecedente de mobilização
internacional: a Convenção para a supressão do tráfico de pessoas e da exploração da prostituição adotada em 2 de dezembro de 1949 pelas Nações Unidas.
Esta convenção foi resultado de uma grande luta abolicionista e feminista, que surgiu em 1866, e foi levada
adiante na Inglaterra por Josephine Butler. Enquanto a
escravidão acabava de ser abolida na maior parte dos
países europeus, Josephine Butler considerava que o
sistema de prostituição constituía uma forma contemporânea de escravidão que oprimia as mulheres e atentava contra a humanidade como um todo.
No Preâmbulo da Convenção se estipula que a prostituição e o contrabando são incompatíveis com a dignidade e o valor da pessoa humana. O posicionamento
desta Convenção parte da concepção de que as mulheres que exercem a prostituição são vítimas, que
devem ser protegidas. Esta Convenção estabelece que
a repressão deve ser dirigida contra todo indivíduo que
explore ou encaminhe outrem para a prostituição. Permanece dentro do marco ideológico abolicionista internacional, dos primeiros acordos internacionais sobre o
tráfico e a prostituição, estabelecendo um nexo de ligação entre a prostituição e o tráfico.
A Convenção para a supressão do tráfico de pessoas
e da exploração da prostituição prostituição forma
parte do conjunto de instrumentos internacionais universais sobre Direitos Humanos das Nações Unidas
que se ocuparam da escravidão ou de práticas análogas
à escravidão. Estas se encontram descritas na Convenção Suplementar sobre a Abolição da Escravatura,
do Tráfico de Escravos e das Instituições e Práticas
Análogas à Escravatura, das Nações Unidas, em 1957:
A. A servidão por dívidas: “o estado ou a condição
resultante do fato de que um devedor se haja comprometido a fornecer, em garantia de uma dívida,
seus serviços pessoais ou os de alguém sobre o qual
tenha autoridade, se o valor desses serviços não for
equitativamente avaliado no ato da liquidação da
dívida ou se a duração desses serviços não for limitada nem sua natureza definida.”
B. A servidão por gleba: “a condição de qualquer um
que seja obrigado pela lei, pelo costume ou por um
acordo, a viver e trabalhar numa terra pertencente
a outra pessoa e a fornecer a essa outra pessoa,
contra remuneração ou gratuitamente, determinados serviços, sem poder mudar sua condição”.
C. Toda Instituição ou prática prática em virtude da qual
uma mulher, sem que tenha o direito de recusa, é prometida ou dada em casamento, mediante remuneração
em dinheiro ou espécie entregue a seus pais, tutor, família ou a qualquer outra pessoa ou grupo de pessoas;
ou a prática pela qual o marido de uma mulher, a família ou clã deste têm o direito de cedê-la a um terceiro, a
título oneroso ou não.
D. Toda instituição ou prática em virtude da qual uma
criança ou um adolescente de menos de dezoito anos é
entregue, quer por seus pais ou um deles, quer por seu
tutor, a um terceiro, mediante remuneração ou sem
ela, com o fim da exploração da pessoa ou do trabalho
da referida criança ou adolescente. Na última década,
foram aprovados instrumentos internacionais que retomam e revisam o problema do tráfico de pessoas a
partir de um enfoque que busca fortalecer os direitos
das pessoas traficadas
No ano de 2003 entra em vigor o Protocolo para Prevenir, Reprimir e Sancionar o Tráfico de pessoas, especialmente mulheres e crianças (Protocolo de Palermo),
que complementa a Convenção das Nações Unidas
contra o Crime Organizado Transnacional. Uma das
principais conquistas deste instrumento foi chegar a
uma definição do Tráfico de Pessoas, acordada e consensuada entre os diferentes setores especializados
nesta temática.
Deriva de um órgão das Nações Unidas que tem como
função a investigação e prevenção do crime nacional e
internacional, incluindo o crime organizado, pelo que se
enfatiza especialmente os aspectos relativos à investigação e criminalização do tráfico. Entretanto, também
aborda aspectos relativos à proteção das vítimas, à prevenção e a restituição de direitos.
O conteúdo do Protocolo de Palermo sobre Tráfico é
enriquecido com os “Princípios e Diretrizes recomendados sobre Direitos Humanos e Tráfico de Pessoas” do
Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos
Humanos ao Conselho Econômico e Social das Nações
Unidas que abundam em uma série de recomendações
e diretrizes para a prevenção, proteção e recuperação
das pessoas que vivem ou viveram situações de tráfico.
Estes Princípios e Diretrizes demonstram um profundo
conhecimento da problemática e das melhores práticas para enfrentá-la e restituir os direitos das pessoas
afetadas. Seu objetivo principal é proteger a dignidade
das pessoas traficadas, evitando uma nova vitimização
e sua possível criminalização, uma vez que são comumente tratadas como responsáveis pelo ocorrido, invisibilizando ou minimizando a conduta dos indivíduos
que exercem abuso de poder. Também procuram evitar
que as vítimas sejam utilizadas como meros objetos de
provas do crime, priorizando os direitos humanos sobre
os ganhos na investigação criminal. Ressaltam a necessidade de garantir às pessoas traficadas seus vínculos afetivos, familiares e comunitários, entendendo
que estes constituem um direito fundamental.
2.2. SÍNTESE DOS CONVÊNIOS
INTERNACIONAIS E
INSTRUMENTOS DE DIREITOS
HUMANOS SOBRE O TRÁFICO
DE MULHERES COM FINS DE
EXPLORAÇÃO SEXUAL
14. Naciones Unidas/Oficina del Alto Comisionado
para los Derechos Humanos (ACNUDH). Comentario.
Principios y Directrices recomendados sobre Derechos
Humanos y Trata de Persona.
Nueva York y Ginebra, 2010.
O tráfico de pessoas, sobretudo o tráfico com fins de exploração sexual, tem sido objeto de regulação no âmbito
internacional, interamericano regional. A seguir serão
mencionados os principais convênios e instrumentos:
Nações Unidas
O tema do tráfico de mulheres com fins de exploração
sexual está incluído na agenda das Nações Unidas
desde princípios do século XX, através de diversos convênios e acordos14, entre os quais se destacam:
- Acordo para a repressão do tráfico de mulheres brancas (1904);
- Convênio Internacional repressão do tráfico de mulheres brancas (1910);
- Convênio Internacional para a repressão do tráfico de
mulheres e crianças (1921);
- Convenção Internacional para a supressão do tráfico
de Mulheres maiores (1933);
- Protocolo que modifica a Convenção Internacional
para a supressão do tráfico de Mulheres maiores de
idade de 1933 (1947);
- Protocolo que modifica o Acordo internacional para a
repressão do tráfico de mulheres brancas e o Convênio
Internacional para a repressão ao tráfico de mulheres
brancas (1949);
- Convênio para a repressão do tráfico de pessoas e da
exploração da prostituição (1949).
Posteriormente, o tema do tráfico de mulheres e exploração sexual destas, foi incluído como uma das
formas de discriminação às mulheres na Convenção
Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW, 1979, entra em vigor
em 1981), nas quais são Estados Parte os países do
MERCOSUL:
“Artigo 6- Os Estados Partes tomarão todas as medidas adequadas, inclusive de caráter legislativo,
para suprimir todas as formas de tráfico de mulheres e exploração da prostituição das mulheres”.
A partir de 2000, a normativa internacional realizou revisões e avanços importantes na temática. O principal
instrumento é o PProtocolo sobre Tráfico de pessoas,
em especial Mulheres e Crianças, complementar à
Convenção das Nações Unidas contra o Crime Orga25
15. http://www.unodc.org/
unodc/en/treaties/CTOC/signatures.html
16. Naciones Unidas/Consejo
Económico y Social, Principios y Directrices recomendados sobre los derechos
humanos y la trata de personas E/2002/68/Add.1, 2002,
17. Naciones Unidas. Plan de
Acción Mundial de las Naciones Unidas para combatir la
Trata de Personas. Resolución de la Asamblea General
de las Naciones Unidas en el
64º.Período de Sesiones A/
RES/64/293, Distribución General 12 de agosto de 2010.
18. Naciones Unidas/Oficina
de las Naciones Unidas contra
la Droga y el Delito. Marco
Internacional de Acción para
la Aplicación del Protocolo
contra la Trata de Personas.
Viena- Nueva York, 2010
19. Naciones Unidas/Oficina de las Naciones Unidas
contra la Droga y el Delito. Ley
Modelo contra la Trata de Personas. Nueva York, 2010.
nizado Transnacional (conhecido como Protocolo de
Palermo sobre Tráfico). É uma norma vinculada que –
em outubro de 2011- foi ratificada por 146 Estados, incluindo os países do MERCOSUL15. Foi adotado no ano
de 2000 e entrou em vigor em 25 de dezembro de 2003.
Nele, se define de forma integral o tráfico de pessoas,
incluindo as formas de tráfico que têm fins diferentes ao da exploração sexual (e que, portanto, também
violam os direitos humanos: tráficos para fins de exploração do trabalho, remoção de órgãos, submissão à
servidão, entre outros), se estabelecem os direitos fundamentais das vítimas e as regras básicas para a busca
e julgamento dos traficantes.
Ao Protocolo de Palermo sobre Tráfico de Pessoas se
somaram outros instrumentos de importância especial
para as tarefas dos países:
- Os Princípios e Diretrizes recomendados sobre Direitos Humanos e Tráfico de Pessoas (a seguir Princípios e Diretrizes) são o principal guia para garantir os
direitos humanos das vítimas em todas as intervenções
que sejam realizadas para o enfrentamento ao tráfico
de pessoas.
- O Plano Mundial de Ação contra o Tráfico de Pessoas16, aprovado pelo Conselho Econômico e Social
das Nações Unidas, a pedido do Alto Comissariado de
Direitos Humanos (ACNUDH), o Marco de Ação Internacional para a Implementação do Protocolo contra o
Tráfico de Pessoas17 e a Lei Modelo contra o Tráfico de
Pessoas18 do Escritório das Nações Unida sobre Droga
e Crime (UNODC) para o enfrentamento ao Tráfico de
Pessoas, são documentos chaves para a implantação
adequada do Protocolo e dos Princípios e Diretrizes.
de pessoas, tráfico de mulheres, prostituição forçada,
seqüestro e assédio sexual no lugar de trabalho, bem
como em instituições educacionais, estabelecimentos
de saúde ou qualquer outro lugar, e
c. que seja perpetrada ou tolerada pelo Estado ou
seus agentes, onde quer que ocorra”.
A partir da aprovação e posterior entrada em vigor do
Protocolo de Palermo sobre Tráfico de Pessoas, na OEA
se desenvolveram ações complementares para favorecer sua ratificação e fortalecer sua implantação.
Na Segunda Reunião de Autoridades Nacionais em
Matéria de Tráfico de Pessoas da Comissão de Segurança Hemisférica do Conselho Permanente da OEA20,
de março de 2009, se recomenda aos Estados Parte a
ratificação do Protocolo de Palermo sobre Tráfico de
Pessoas e sua aplicação e implantação adequada, contribuindo com “Conclusões e Recomendações”. Nesta
mesma reunião foi aprovado um glossário hemisférico
de termos ligados ao tráfico21.
No ano de 2010 foi realizada a Recomendação da Oitava
Reunião de Ministros da Justiça ou Outros Ministros,
Procuradores-Gerais da OEA22, que, tendo em conta
os resultados da Reunião das Autoridades em Matéria
de Tráfico de Pessoas, aprovou uma série de recomendações para a ação dos organismos de justiça.
MERCOSUL
No âmbito do MERCOSUL foi aprovada uma série de
acordos e resoluções para a colaboração entre países,
tanto no âmbito da prevenção quanto da proteção das
vítimas e julgamento dos traficantes, dos quais serão
destacadas as principais ações.
Organização de Estados Americana (OEA)
20. OEA/Ser.K/XXXIX.2 RTP-II/
doc.5/09 rev. 10- 18 septiembre 2009
21. OEA/Ser.K/XXXIX.2/
RTP-II/INF.3/09
26
No âmbito da OEA, a Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher
(Convenção de Belém do Pará) constitui uma norma essencial para a proteção e promoção dos Direitos Humanos das Mulheres. Nesta Convenção, que também foi
ratificada por todos os países do MERCOSUL, se dispõe:
“Entender-se-á que violência contra a mulher inclui
violência física, sexual e psicológica:
a. que tenha ocorrido dentro da família ou unidade
doméstica ou em qualquer outra relação interpessoal, em que o agressor conviva ou haja convivido
no mesmo domicílio que a mulher e que compreende,
entre outros, estupro, violação, maus-tratos e abuso
sexual;
b. que tenha ocorrido na comunidade e seja perpetrada por qualquer pessoa e que compreende, entre
outros, violação, abuso sexual, tortura, maus tratos
Em primeiro lugar, deve-se assinalar o Plano de Ação
para a Luta contra o Tráfico de Pessoas entre os Ministérios do Interior dos Estados parte do MERCOSUL e
Estados Associados, aprovado em 200623, eno qual designam pontos focais para a ação coordenada na região
e entram em acordo para o desenvolvimento de campanhas preventivas em comum. Neste mesmo ano, o
Conselho do Mercado Comum do MERCOSUL decidiu
realizar uma campanha conjunta de prevenção e combate ao tráfico de pessoas24.
No ano de 2007 a Reunião de Ministros da Justiça do
MERCOSUL (RMJ) aprovou um Guia de Boas Práticas
para a Assistência Jurídica em relação à assistência jurídica mútua na questão do tráfico de pessoas entre os
Estados partes do MERCOSUL e Estados Associados.25
No ano de 2008, o Centro de Coordenação e Capacitação
Policial entre os Estados Parte do Mercosul (CCCP),
criado no ano de 200026, rrealizou um encontro de trabalho entre os países do Mercosul e do Chile (como
Estado associado), no qual houve intercâmbio de informações, e foram acordadas linhas e recomendações de
extrema importância a respeito dos procedimentos e
ações policiais para a investigação do crime de tráfico
de pessoas27. Nesta instância, as Forças de Segurança
Pública e Policiais do Mercosul e do Chile assinaram a
chamada “Carta da Tríplice Fronteira”, com recomendações para fortalecer as ações de enfrentamento ao
tráfico de pessoas.
Destacam-se três Decisões do Conselho do Mercado
Comum do MERCOSUL adotadas no ano de 2010 que
dão conta dos avanços importantes na matéria:
- Acordo-Marco de Cooperação entre Estados partes
do MERCOSUL para a criação de Equipes Conjuntas
de Investigação, incluindo abertamente a investigação
do contrabando de migrantes, corrupção e lavagem de
dinheiro (agosto 2010) 28.
- Acordo sobre Mandado MERCOSUL de captura e procedimentos de entrega entre os Estados membros do
MERCOSUL e Estados associados29, entre os quais se
incluem as que tenham em virtude da aplicação do Protocolo de Palermo sobre Tráfico (dezembro 2010).
- AAprovação pelo Conselho do Mercado Comum30 do
Plano Estratégico de Ação Social do MERCOSUL em
que, entre os objetivos prioritários, se assinalam: o
combate ao tráfico de pessoas, à violência e à exploração sexual (com ênfase em crianças e adolescentes)
e a articulação e implantação de políticas públicas dirigidas à plena integração dos migrantes e proteção de
refugiados (dezembro, 2010).
22. OEA/Ser.K/XXXIV.8
REMJA-VIII/doc.4/10 rev. 1, 26
febrero 2010
23. MERCOSUL/CMC/RMI
1/06
24. MERCOSUL/CMC/DEC
12/06
25. MERCOSUL/RMJ/
ACUERDO 01/07
26. MERCOSUR/CMC/DEC
No. 16/00
27. SPRANDEL, Marcia y
PENNA, Rodrigo, Cooperação
e coordenação policial no
MERCOSUL para o enfrentamento ao tráfico de pessoas,
OIT, 2009.
http://www.oitbrasil.org.br/
node/375
28. MERCOSUL/CMC/DEC
22/10
29. MERCOSUL/CMC/DEC
48/10
30. MERCOSUL/CMC/DEC
67/10
27
CAPÍTULO 3
·MARCO CONCEITUAL
jamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à
ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação,
ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou
à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação
de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra
para fins de exploração.”
O tráfico de pessoas
é um crime
existente em diversos momentos da História. Durante
o período colonial, mulheres e crianças, principalmente
indígenas e africanas, eram “caçadas” em suas comunidades de origem e transladadas nos chamados “navios
negreiros” para serem comercializadas como mão de
obra para escravidão, servidão ou para a exploração
sexual. No final do século XIX e início do século XX começou a ser visto como um problema social a existência
de rotas de tráfico de países europeus onde se transportavam mulheres brancas para a exploração sexual em
países latino-americanos, sobretudo do cone sul (Argentina e Uruguai). Esta situação foi denominada tráfico
de mulheres brancas e foi objeto de preocupação por
parte dos Estados. Nos meios de comunicação se difundia a existência de uma máfia que enganava mulheres
provenientes de países europeus e norte-americanos
lhes oferecendo melhores condições de vida em países
da região ou as transladavam com promessas de casamento. O “tráfico de mulheres brancas” começou a ser
difundido e teve repercussões importantes, tanto que
atualmente continua-se a usar esta expressão apesar
de já não se ajustar às complexidades do fenômeno.
É no fim da década de 80 que se começar a substituir o
termo tráfico de mulheres brancas por tráfico de pessoas ou de seres humanos a nível internacional, até que
no fim do século XX consegue-se chegar ao termo que
se utiliza atualmente para denominar este crime: tráfico de pessoas ou tráfico de seres humanos. A definição
deste conceito também foi consensuada pela comunidade internacional a partir do Protocolo para prevenir,
reprimir e sancionar o tráfico de pessoas, especialmente Mulheres e Crianças (Protocolo de Palermo), que
complementa a Convenção das Nações Unidas contra
a Delinquência Organizada Transnacional. Neste documento, se define o tráfico de pessoas como:
“o recrutamento, o transporte, a transferência, o alo-
Esta definição abarca as diferentes facetas e etapas
do fenômeno, dando conta de sua complexidade, o que
requer a coordenação e cumplicidade da multiplicidade
de atores – públicos e privados - e a comissão de uma
somatória de feitos ilícitos concatenados, através de poderosas redes criminais, que submetem pessoas a condições sub-humanas”
O tráfico de pessoas se caracteriza, então, por três elementos principais:
1. Atividade – mobilização da pessoa (captura, recrutamento, transferência, retenção).
2. Meios – abuso de autoridade, engano, ameaça e diferentes formas de vícios de consentimento.
3. Finalidade – exploração da pessoa (com fins econômicos ou não).
Mobilização, poder e exploração são três eixos que se
articulam para submeter as pessoas às redes de tráfico.
Em relação ao consentimento das pessoas existe um
consenso de que o consentimento de uma pessoa para
ser submetida a condições de escravidão não legitima
a ação do traficante. O nó aparece quando, em algumas facetas do tráfico, se invisibiliza a violência a que a
pessoa está submetida, podendo distorcer a verdadeira
dimensão do problema.
O Protocolo de Palermo menciona abertamente que se
o meio utilizado foi o engano, o abuso de autoridade ou
a violência, o consentimento dado pela vítima do tráfico
de pessoas a toda forma de exploração não se considerará válida e que o mesmo se dá em relação a crianças
e adolescentes.
29
3.1. Diferenças entre tráfico
de pessoas e contrabando de
migrantes
É fundamental identificar a diferença entre os processos de tráfico de pessoas e o contrabando de migrantes, já que cada um tem impactos diferentes sobre os
indivíduos e demandam diferentes políticas de enfrentamento.
O Protocolo contra o Contrabando de Migrantes por
Terra, Mar e Ar, que complementa a Convenção das
Nações Unidas contra a Delinquência Organizada
Transnacional, define o contrabando ilícito de migrantes
como:
“facilitação da entrada ilegal de uma pessoa a um
Estado Parte, do qual a pessoa não seja nacional ou
residente permanente, com fins de obter, direta ou
indiretamente, benefício financeiro ou outro benefício de ordem material”.
Identificamos como aspectos comuns ao tráfico de pessoas e ao contrabando de migrantes a mobilidade e a
utilização lucrativa das pessoas mobilizadas.
Entre as principais diferenças se assinala que no tráfico
de pessoas:
a. Os direitos humanos são consideravelmente violados.
b. O lucro é gerado mediante a exploração da pessoa.
c. A relação entre traficante e vítima é prolongada e frequentemente gera vínculos ambivalente.
d. Nem sempre implica na travessia de fronteiras (tráfico interno).
e. O maior risco de vida ou dano físico e psicológico
grave se produz durante o processo de exploração..
No contrabando de migrantes se apresentam os seguintes diferenciais:
a. É um delito contra a ordem migratória.
b. No contrabando, o lucro é gerado pelo serviço de migração irregular ou ilegal.
c. A relação entre contrabandista e vítima é de curta
duração e finda uma vez que se chega ao destino.
d. Sempre implica na travessia de fronteiras.
e. O maior risco de vida se encontra na etapa de trânsito,
em que ocorre o translado e a travessia de fronteiras.
O contrabando de migrantes pode se transformar em
tráfico de pessoas quando estas são capturadas por
redes criminosas para explorá-las, aproveitando da
vulnerabilidade própria à condição de migrante ou residente ilegal. Paralelamente, a travessia de fronteiras
de forma irregular, pode ser um dos componentes do
processo de tráfico de pessoas.
30
3.2. Características do Tráfico
de Pessoas
O tráfico pode ocorrer dentro de um país (tráfico interno), através de suas fronteiras nacionais ou entre
regiões (tráfico internacional).
É um crime altamente complexo, uma vez que é realizado ao longo de um processo, com etapas que se
sucedem, através das quais os traficantes alcançam o
objetivo final de transladar a vítima de um lugar a outro,
para explorá-la de diferentes formas, obtendo com isso
lucro econômico.
Este processo consiste em uma sequencia de acontecimentos que se desenvolvem em passos ou etapas. Cada
um destes momentos tem um resultado próprio. Por
exemplo, capturar ou transladar a vítima. Estes resultados parciais se integram e se sucedem nos momentos
do tráfico, conduzindo por encadeamento ao objetivo
principal dos traficantes: obter lucro econômico com a
exploração da vítima.
Diversos atores podem estar implicados no processo,
incluindo recrutadores, intermediários, falsificadores,
transportadores, patrões, donos de bordéis e até amigos
e membros da família.
Para funcionar, as redes podem envolver atores com
certo grau de acesso ao poder público, para poder falsificar documentos, driblar inspeções, obter autorizações
ou habilitações, silenciar quem tiver conhecimento do
ato, entre outros, e, sendo assim, a corrupção é um fator
importante para a continuidade do tráfico.
Os traficantes podem utilizar mecanismos complexos
próprios do crime organizado e movimentar grandes
quantias de dinheiro através de redes nacionais e transnacionais semelhantes ou coincidentes com as redes de
tráfico de drogas e de armas. A Convenção das Nações
Unidas contra o Crime Organizado Transnacional define
no Artigo 2 “grupo criminoso organizado” como: “grupo
estruturado de três ou mais pessoas, existente há
algum tempo e atuando conjuntamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou
enunciadas na presente Convenção, com a intenção
de obter, direta ou indiretamente, um benefício
econômico ou outro benefício material”.
Ainda assim, existem redes de complexidade menor,
integradas por familiares ou pessoas conhecidas das
vítimas, como parentes próximos, amigos e integrantes
da comunidade. A dinâmica de funcionamento é semelhante, com indivíduos que desempenham funções diversas no processo do tráfico.
Vários meios podem ser utilizados para capturar as
vítimas, incluindo persuasão, engano, ameaças e coerção. Em alguns casos, pessoas mais pobres tomam a
iniciativa de emigrar e se aproximam de recrutadores,
ficando presas às redes através de promessas falsas de
trabalho.
É relativamente comum constatar que habitantes das
áreas rurais são transferidos para serem explorados
em centros urbanos; que indivíduos de países pobres
são levados a países vizinhos ou mais remotos considerados mais ricos; que mulheres jovens são exploradas para responder à demanda do comércio sexual
dos países ricos; que desempregados/as migram sem
documentação e vivem em clandestinidade no país de
destino, ficando impedidos de acessar os serviços de
justiça e outros serviços fundamentais para sua própria
proteção e submetidos a diferentes formas de exploração para sua sobrevivência.
3.3. Fatores que favorecem ou
causam o tráfico de pessoas
a) Demanda de Serviços
A principal causa e sustentação econômica do tráfico de
pessoas é a demanda de serviços sexuais no lugar de
destino e o desenvolvimento de mercados inescrupulosos que buscam atingir lucro máximo a qualquer custo.
b) Fatores Culturais
Destacam-se a estrutura hierárquica de gênero e a
heteronormatividade. Os contextos de desigualdade e
inequidades de gênero e geração, a cultura patriarcal
e adultocêntrica e a heteronormatividade são aspectos
culturais historicamente presentes em diferentes sociedades e culturas.
A violência de gênero como mecanismo disciplinador
destas estruturas (abuso sexual intrafamiliar e principalmente violência doméstica) e a discriminação violenta homofóbica e transfóbica.
c) Fatores socioeconômicos
A discriminação de diversos grupos sociais – populações afrodescendentes, povos originários, população
rural, identidades sexuais diversas – geram condições
de vulnerabilidade para que estas populações sejam
capturadas por redes de tráfico, especialmente mulheres, crianças e adolescentes.
A exclusão social, a pobreza, a desigualdade e os obstáculos de acesso a oportunidades, bens e serviços. Os
deslocamentos de populações por conflitos armados
também se identificam como um cenário de alta vulnerabilidade às ações das redes de tráfico.
O tráfico de pessoas é um fenômeno antigo, mas a glo-
balização capitalista, neoliberal e patriarcal consolida
as condições para que este fenômeno cresça e as contradições sejam aprofundadas.
d) Políticas migratórias restritivas
As fortes medidas adotadas em vários países para limitar o ingresso de migrantes é uma barreira para que as
pessoas que decidem migrar o façam de modo regular.
Estes processos migratórios se dão em condições precárias, com documentações falsas ou ingresso irregular
nos países, deixando os indivíduos em condições vulneráveis para serem capturadas por redes de tráfico.
e) Deficiência das respostas estatais dos países de
origem, trânsito e destino
Nos países onde as respostas de prevenção e combate
ao tráfico são deficientes, as redes de crime organizado
encontram um cenário propício para expandir e desenvolver suas ações criminosas. Ainda assim, a corrupção
e conivência de funcionários públicos é um fator chave
para a perpetuação destes crimes.
São fatores chave de atração as desigualdades entre
países e regiões, que permitem a existência de grandes
redes de crime organizado com capacidade de financiamento e transporte internacional. Estas redes abusam
das necessidades de sobrevivência da população dos
países pobres, que entendem a existência de melhores
condições de vida em lugares relativamente mais ricos.
Do mesmo modo, dentro de um mesmo país, os habitantes das regiões mais pobres têm esse mesmo entendimento com respeito às cidades, que concentram
maior riqueza e acesso a oportunidades.
3.4. Objetivos do tráfico de
pessoas
A finalidade do tráfico de pessoas é sempre a exploração da vítima. A exploração pode incluir as seguintes
formas:
› Trabalho forçado em empresas maquiladoras, fábricas, trabalho agrícola, plantações, minas, construção,
pesca, mendicância, trabalho doméstico.
› Seu outras formas subumanas de trabalhorvidão o.
› Venda ou entrega ilegal de crianças para adoção.
› Casamentos servis.
› Remoção de órgãos.
› Crianças soldados ou soldados cativos.
› Exploração no comércio sexual, prostituição forçada,
pornografia, turismo sexual, entre outras.
31
CAPÍTULO 4
·CARACTERÍSTICAS DO TRÁFICO
DE MULHERES NO MERCOSUL
4.1. Principais fatores de vulnerabilidade detectados na
região
Os países da região compartilham em maior ou menor
grau um conjunto de contextos de alta vulnerabilidade
ao tráfico de mulheres com fins de exploração sexual.
Com diferentes expressões e em conjunturas diversas,
em todos os países se identificam fatores de vulnerabilidade estrutural, ligados a modelos econômicos, fatores
sociais, culturais e políticos. Entre estes destacamos:
a) Inequidade de gênero e discriminação contra a
mulher
Na região, a violência sexual exercida por homens
contra mulheres é uma prática milenar sustentada por
uma concepção patriarcal, em que diferentes sociedades legitimam a supremacia dos homens sobre as mulheres e legitimam o direito de apropriação e controle
de seus corpos. Um panorama geral sobre a situação
das mulheres na região mostra o acesso tardio à categoria de cidadãs. As mulheres de todo o mundo entram
no século XIX sem poder de cidadania, fora do sistema
educativo formal, fora do âmbito dos direitos e bens do
modelo sociopolítico liberal que a modernidade consolidava.
A luta dos movimentos feministas conseguiu consolidar a ideia de que o pessoal é político e avançar na
criminalização da apropriação violenta dos corpos das
mulheres. Embora estes aspectos não tiveram um corolário na diminuição da violência contra as mulheres,
começou um processo de visibilização do problema e
preocupação dos Estados em colocar esta problemática
na agenda pública.
Atualmente, a violência contra as mulheres no âmbito
público e privado representa um dos problemas mais
urgentes dos países da região.
b) Violência doméstica
A violência doméstica se identifica como um fator de
vulnerabilidade altamente associado às situações de
tráfico. Os antecedentes de violência doméstica na família ou no casal são frequentemente presentes nas
vítimas do tráfico. Os danos produzidos pela exposição
precoce a situações de maltrato, submissão e dominação colocam as mulheres em condições de vulnerabilidade para serem submetidas a novas formas de
controle e manipulação. Em muitos casos, a captura se
produz como uma saída de uma situação de violência
doméstica.
Nos países da região, a violência doméstica é um problema instaurado, que afeta quase exclusivamente mulheres, crianças e adolescentes.
São frequentemente identificados antecedentes de
abusos sexuais na infância das vítimas do tráfico de
pessoas. A exposição em idades precoces a situações
de incesto e abusos sexuais no âmbito familiar provoca danos graves nas crianças e adolescentes que em
muitos casos implica num processo de múltiplas submissões sexuais durante seu crescimento e desenvolvimento. A percepção de estarem “manchadas” ou de
que não há nada que possa lhes machucar mais do que
o abuso vivenciado coloca estas crianças em situação
altamente vulnerável à exploração sexual e à captura
pelas redes de traficantes. O descrédito e a rejeição
familiar que comumente ocorre nessas situações gera
muitas vezes a expulsão do lar e a exposição à situação
de rua onde a vulnerabilidade aumenta sensivelmente.
A presença de adultos “salvadores” que capturam essas
meninas na rua é muitas vezes o início do caminho para
as redes de tráfico interno e internacional.
c) Abuso sexual intrafamiliar
Se identifican antecedentes de abusos sexuales en
la infancia en forma muy frecuente en las víctimas de
trata. La exposición a edades tempranas a situaciones
de incesto y abusos sexuales dentro del ámbito familiar
provoca daños muy graves en los niños, niñas y adolescentes que en muchos casos habilita a un proceso de
múltiples sometimientos sexuales durante su crecimiento y desarrollo. La percepción de estar “manchadas” o que no habrá nada que les provoque más daño
que el abuso vivido, coloca a estas niñas en situación
altamente vulnerable a la explotación sexual y la captación por parte de redes de tratantes. El descrédito y rechazo familiar que ocurre habitualmente frente a estas
situaciones genera muchas veces la expulsión del hogar
y la exposición a situaciones de calle donde la vulnerabilidad aumenta sensiblemente. La presencia de adultos “salvadores” que captan a estas chicas en calle es
muchas veces el inicio de un camino a hacia las redes
de trata interna e internacional.
33
d) Exclusão social e pobreza
Sob estas categorias se identificam muitas e diversas
situações ligadas à dificuldade e impossibilidade de
acessar a bens e serviços necessários para cobrir as
necessidades básicas das pessoas (saúde, educação,
trabalho, moradia, alimentação, entre outras). Muitas
vítimas de tráfico provêm de contextos onde não há
oportunidades de acesso aos recursos necessários para
desenvolver a vida desejada; sonhar e poder cumprir
estes sonhos, traçar projetos pessoais e ter meios para
alcançá-los. A impossibilidade de projetar o futuro cria
nichos de oportunidade para os traficantes oferecerem
novos horizontes e alternativas de melhorar as condições de vida destas mulheres e de suas famílias.
e) Migração como estratégia de melhora das condições
de vida e políticas migratórias restritivas nos países de
destino
A migração é uma estratégia legítima utilizada pelas
populações dos países da região para enfrentar as diversas contingências. As crises econômicas e políticas
têm sido os principais motores para a migração. Entre
as motivações que levaram algumas mulheres a aceitar
as propostas das redes estão: buscar novas oportunidades, melhorar as condições de vida, desenvolver um
projeto de vida melhor e garantir o futuro de suas famílias. Muitas mulheres não contam com recursos para
realizar uma migração independente, sendo essa uma
oportunidade utilizada pelos traficantes para realizar a
captura; outras não têm possibilidade de ingressar de
forma regular no país de destino em decorrência das
políticas restritivas existentes, fazendo com que muitas
vezes recorram a redes de traficantes para conseguirem o ingresso.
f) Impacto social dos modelos de desenvolvimento
Em vários países da região houve a expulsão das comunidades de povos originários e camponeses para o uso
das terras para cultivo intensivo dos setores agrícolas
em expansão. Estes processos provocaram em muitas
áreas da região a migração da zona rural para as zonas
urbanas em áreas periféricas, com altos índices de pobreza e exclusão social. Isso cria cenários altamente
vulneráveis para mulheres e meninas serem vítimas de
diversas formas de exploração sexual, como o tráfico
interno e internacional.
Ainda, a expansão dos pólos de desenvolvimento produtivos que caracterizam os modelos de desenvolvimento
econômico da região – como a construção de rodovias,
portos de grande porte, grandes fábricas de celulose,
represas, florestamento massivo em determinadas
zonas, entre outras – gera uma alta concentração de
mão de obra masculina. Este fato reproduz os mandatos de gênero tradicionalmente estabelecidos sobre o
34
uso e a compra do corpo da mulher para a satisfação
sexual, provocando um aumento da demanda de serviços sexuais que são parcialmente atendidas pelas
redes de tráfico.
As safras de produção se caracterizam por deslocar ciclicamente a mão de obra masculina, que migra para
diversos territórios seguindo as safras produtivas. Em
muitos casos estes homens se transferem com suas famílias, colocando muitas vezes suas filhas e filhos em
condições de extrema vulnerabilidade para serem capturados por redes de tráfico.
A indústria do turismo teve um desenvolvimento e crescimento muito importantes nos países da região. Em
alguns países trouxe conjuntamente um aumento da
demanda de turismo sexual, que potencializa as redes
de tráfico internas e internacionais.
g) Fronteiras permeáveis
As zonas de fronteira da região se identificam como
espaços territoriais altamente vulneráveis às redes de
tráfico, dado que, por características geográficas, existe
uma diversidade de passagens fronteiriças não controladas, tanto secas quanto líquidas. Este aspecto é um
obstáculo importante regionalmente para poder-se
aprofundar tanto no combate das redes quanto na prevenção e detecção dos casos.
h) Falta de documentação de identidade civil
Em alguns países da região persiste o problema de falta
de documentação de certas populações, criando oportunidade aos traficantes para providenciarem documentação falsa para realizar a mobilização da pessoa,
dentro e fora do país.
Ainda, a legislação referente às autorizações de saída do
país para menores de idade é diferente entre os países
da região, o que dificulta a aplicação de critérios uniformes que permitam um controle adequado destes fluxos
migratórios, a fim de prevenir o translado de possíveis
vítimas de tráfico.
4.2 Amplitude do problema
No atual contexto não é possível dimensionar a amplitude do problema em nível regional. Sem desconsiderar as iniciativas de sistematização de informação que
estão sendo realizadas em alguns países da região, até
o momento não foi alcançado um sistema de registros,
pesquisas e dados estatísticos unificados que permitam
quantificar dados globais sobre a amplitude do tráfico.
No entanto, existem dados e fontes setoriais que permitem visualizar de forma parcial como este crime se
expande nos diferentes territórios da região do MERCOSUL.
No caso da Argentina, de acordo com dados do Informe
Nacional:
“A partir da lei 26.364 “Prevenção e Sanção do Tráfico de Pessoas e Atendimento às Vítimas”, foram
realizadas duzentos e oitenta e nove investigações
pela comissão do crime de tráfico de pessoas. Destas,
cento e cinquenta e nove (159), foram iniciadas por
denúncias feitas por forças de segurança, ONG’s e
pessoas que não quiseram se identifica e sessenta e
uma (61) denúncias foram feitas diretamente pelas
vítimas à UFASE. Do total de denúncias, sessenta e
quatro (64) foram arquivadas e sessenta e cinco (65)
estão em tramitação atualmente. Também houve informes sobre o tipo de exploração denunciada que,
em cento e trinta e nove (139) casos, a finalidade do
crime de tráfico foi a exploração sexual. Em cinquenta e uma (51) investigações pôde-se advertir a
presença de menores de idade.”31
O informe citado acrescenta
“Os dados obtidos são parciais, considerando que
ainda não existem registros oficiais, estatísticas e informes qualitativos consensuados a nível nacional
feitos pelas forças de segurança, pelo poder judicial,
poder executivo ou ONGs, que reúnam e compilem
oficialmente a totalidade da informação de cada
província do país. Há que considerar também a
inexistência atualmente de um organismo nacional
que centralize a informação em relação ao problema
e aos dados recolhidos nesta pesquisa. Ainda assim,
foi possível atingir uma aproximação da amplitude
da situação, que permitiu inferir que, desde a sanção
da lei 26.464 em abril de 2008 até maio do ano 2011,
o tráfico interno alcançaria 60%, e o tráfico internacional chegaria a 40%.”32
Posteriormente ao período citado conta-se com dados
das Forças policiais e de Segurança Federais durante
o período Janeiro - Outubro de 2011, que marcou uma
tendência ao aumento de casos de tráfico internacional
de pessoas, considerando que, no período mencionado,
61,78% das vítimas resgatadas eram estrangeiras.
No caso do Brasil, ainda que existam diversas pesquisas sobre o tema, não fornecem dados que possam dar
uma aproximação da amplitude do problema. O Informe
Nacional contribui com dados obtidos de uma pesquisa
referente ao país:
“Desde 2002, com a elaboração da pesquisa sobre
Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para
fins de Exploração Sexual no Brasil – PESTRAF , a
problemática nacional passou a ter visibilidade e começou a considerar-se, a partir do âmbito público,
respostas para o enfrentamento ao fenômeno, que
era pouco conhecido.
A partir deste momento, verificou-se, especialmente
com a pesquisa PESTRAF, que o Brasil era um país
de destino (recebe vítimas de tráfico de pessoas de
outros países, como foi identificado no Paraguai,
Bolívia e Argentina) e, principalmente, de origem a
vítimas brasileiras de tráfico encontradas em países
como Espanha, Portugal, Suíça, Holanda, Suriname, entre outros. Estes feitos evidenciaram a necessidade de se implementar políticas públicas para
o enfrentamento deste crime com dimensões transnacionais.” 34 35
No caso do Paraguai, o Informe Nacional apresenta:
“O Informe do Componente Estatístico elaborado
pela Direção Geral de Estatísticas, Pesquisas e
Censos da Presidência da República do Paraguai,
no ano de 2009, no marco do “Programa de Apoio
à Luta contra o Tráfico de Pessoas, sobretudo Mulheres, Meninas e Meninos” da Secretaria da Mulher,
com apoio do BID, identificou, mediante fontes do
Ministério Público, um total de 199 casos de tráfico
de pessoas com fins de exploração sexual, ingressados na Promotoria desde o ano de 2003 ao ano de
2009 através de todas as jurisdições do país. Se mencionam especialmente as quantidades correspondentes à Cidade de Assunção, onde se registraram
87 casos, Encarnación 23 casos e Ciudad de Este 32
casos. Não foi possível discriminar quantas vítimas
estão envolvidas nestes casos.” 36
No caso do Uruguai, evidencia-se no informe nacional
as dificuldades no levantamento de dados que possam
quantificar este delito. Assim, o Informe nacional expressa:
“No país não se produzem estatísticas que relevem
o tráfico de mulheres com fins de exploração sexual
comercial, pelo que não é possível dar conta da amplitude real do problema”.37
4.3. Características das
vítimas
31. Informe Nacional Argentina (p. 9 )
32. Informe Nacional Argentina (p. 19 )
33. A Pesquisa Nacional sobre
Tráfico de Mulheres, Crianças
e Adolescentes (Pestraf),
coordenado pelo Centro de
Referência, Estudos e Ações
sobre Crianças e Adolescentes (Cecria), foi realizada em
2002 e mapeou 241 rotas de
tráfico de pessoas para fins
de exploração sexual. Deste
total, 131 rotas eram internacionais, 78 interestatais e 32
intermunicipais. O trabalho
serviu como ponto de partida
para os trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de
Investigação (CPMI), instalada
no Congresso Nacional entre
2003 e 2004, que investigou a
prática da exploração sexual
comercial de crianças e adolescentes no país. A partir
desta investigação, percebeuse o desafio de combater o
crime de tráfico de pessoas,
principalmente contra mulheres, crianças e adolescentes.
34. Informe Nacional Brasil
(p. 11 )
35. Original em português.
36. Informe Nacional Paraguai (p. 11)
37. Informe Nacional Uruguai
Na região, as vítimas de tráfico são predominantemente
mulheres e há um aumento dos casos de mulheres
trans. São, em geral, mulheres jovens entre 15 e 30
anos de idade chegando, em alguns casos, até os 35.
Na Argentina, segundo dados do Informe Nacional, as
vítimas têm entre 18 e 35 anos e são na maioria heterossexuais.
Dos procedimentos com intervenção das Forças Po-
35
liciais e de Segurança Federais durante o período Janeiro-Outubro de 2011, 89,56% das vítimas resgatadas
eram maiores de 18 anos.
São originárias de províncias com altos níveis de pobreza, desemprego, falta de rede social, baixo nível
educacional, dificuldade de acesso a serviços sociais,
médicos, déficit habitacional de infraestrutura e pouco
acesso a oportunidades.
As mulheres provenientes de povos indígenas são as
mais excluídas, discriminadas e vulneráveis ao tráfico
de pessoas.
No Brasil, segundo dados do Informe Nacional, as vítimas têm entre 15 e 30 anos de idade, nível educacional variado – do ensino básico à universidade - e com
frequência têm filhos no Brasil. O Informe assinala que
muitas mulheres não exerciam a prostituição previamente.
Em relação aos lugares de origem, em geral provêm
de todos os Estados do Brasil, principalmente de Goiás,
Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Região Nordeste.
As adolescentes são capturadas majoritariamente para
tráfico interno e as maiores de 18 anos são capturadas
para tráfico internacional.
Muitas mulheres não se identificam como vítimas, colocando-se em um processo migratório exercendo prostituição de forma momentânea enquanto conseguem
dinheiro suficiente para voltar ao Brasil e reorganizar
sua vida e família.
No caso do Paraguai, dados apresentados pelo Informe
Nacional mostram que os setores e grupos mais vulneráveis são as mulheres de todas as idades, crianças e
adolescentes, membros de povos indígenas e pessoas
em situações de violência, discriminação ou pobreza
extrema.
As vítimas de tráfico interno são geralmente adolescentes capturadas em localidades do interior do país
e transportadas aos centros urbanos da capital e de
outras capitais departamentais; por exemplo, Coronel
Oviedo, Ciudad Del Este, Encarnación. Muitas vezes
contam com o consentimento verbal não formal dos
pais, que acreditam que suas filhas viajam para exercer
serviço doméstico.
No caso do Uruguai foram identificados casos de adolescentes mulheres a partir de 16 anos e de mulheres
jovens. As adolescentes em geral são capturadas para
tráfico interno - embora também se identifiquem casos
de adultas jovens – e no tráfico internacional em geral
são jovens entre 18 e 30 anos com filhos.
36
CAPÍTULO 5
·AS ROTAS DE TRÁFICO NA REGIÃO
Na região, se identificam rotas de tráfico interno e internacional. No tráfico interno as vítimas são sobretudo
adolescentes, ainda que existam também casos de
adultas e, nos casos de tráfico internacional, a maior
parte das vítimas são adultas, ainda que tenham sido
detectados casos de adolescentes viajando com documentação falsa.
A região do MERCOSUL
é uma
região predominantemente de origem e destino, detectando-se, em menor escala, rotas de trânsito. Assim, os
países da região se identificam como:
Argentina: país de origem, trânsito e destino.
Brasil: país de origem, destino e em menor medida
trânsito.
Paraguai: país de origem e em menor medida trânsito
e destino.
5.1. Principais zonas de captura e recrutamento
No seguinte quadro se descrevem as principais zonas
onde as redes de tráfico de pessoas realizam suas estratégias de captura e recrutamento.
Uruguai: país de origem e em menor medida trânsito
e destino.
ARGENTINA
Misiones
Jujuy
Entre Ríos
Catamarca
Corrientes
Santiago del Estero
BRASIL
Região Norte, Nordeste
e Sudeste - tráfico interno
Região Norte, Nordeste,
Sudeste,
Centro oeste tráfico internacional
PARAGUAI
URUGUAI
Central
Paysandú
Caaguazu
Río Negro
Alto Paraná
Cerro Largo
Itapúa
Montevideo
Ñeembucú
Colonia
Amambay
San José
Chaco
Canelones
Formosa
Lavalleja
Santa fe
Maldonado
La Rioja
Rocha
Salta
Treinta y Tres
Quadro 1:
Zonas de captura e
recrutamento
Tucumán
Fontes: Informes Nacionais da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai
37
Mapa I: Principais zonas de captação e recrutamento na região
38
5.2. Principais zonas de
destino de tráfico interno e
internacional
A seguir são descritas as zonas de destino das vítimas
de tráfico de cada um dos países da região. No tráfico
internacional, a Espanha é o principal destino das rotas
de tráfico de todos os países da região.
A Itália é apontada como país de destino por todos os
países da região, mas em menor escala. No Informe
ARGENTINA
Nacional, o Brasil destaca que esta rota é utilizada especialmente para o tráfico de indivíduos transexuais. O
restante dos destinos varia entre os países.
Nas rotas de tráfico dentro da região, todos os países do
MERCOSUL são países de destino das rotas de tráfico de
pessoas intraregional. Isto é, nos quatro países se identificam redes de tráfico internacional que mobilizam
mulheres de um país a outro dentro da região.
TRÁFICO INTERNO DE PESSOAS
TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESOAS
Buenos Aires
ESPANHA
Córdoba
ITÁLIA
La Pampa
CHILE
Chubut
ÁFRICA DO SUL
Quadro 2:
Zonas de destino de tráfico de
pessoas interno e
internacional
Santa Cruz
Tierra del Fuego
BRASIL*
78 rotas interestaduais
ESPANHA (32 rotas identificadas)
32 intermunicipais
- A Região Norte é origem da maioria das
rotas de tráfico
- Em segundo lugar está a Região Nordeste
HOLANDA (11 rotas identificadas)
Em menor escala seguem
- Região Sudeste
- Norte
- Centro-Oeste
- Sul
VENEZUELA (10 rotas identificadas)
ITÁLIA
PORTUGAL
PARAGUAI
SUÍÇA
ESTADOS UNIDOS
ALEMANHA
SURINAME
PARAGUAI
Assunção e capitais departamentais
ESPANHA
ARGENTINA
CHILE
BOLIVIA
BRASIL
ITÁLIA
FRANCIA
SUDAFRICA
CORÉIA
JAPÃO
URUGUAI
Maldonado
ESPANHA
Montevideo
ITÁLIA
Cerro Largo
ARGENTINA
Treinta y Tres
BRASIL
Fontes: Informes Nacionais da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai
* Fonte: CECRIA. Pesquisa sobre o Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para fins de exploração sexual no Brasil,
coordenada pelo CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes, 2002, pg. 61 (Pesquisa
conhecida como Pestraf).
39
Mapa II: MERCOSUL como região de origem
40
a) MERCOSUL como região de destino
No parágrafo seguinte são estabelecidas as zonas de
procedência das vítimas detectadas em cada um dos
países do MERCOSUL. Esta informação foi elaborada
realizando o cruzamento das informações contidas nos
informes nacionais, dado que nem todos os países identificam as vítimas das nacionalidades que se traz neste
capítulo. Algumas nacionalidades são identificadas pelo
país de destino, porém não do país de origem e viceversa.
menor medida, República Dominicana e Bolívia. Ainda,
foram detectados alguns casos de vítimas provenientes
de outros países (Colômbia, Peru e Uruguai)..
› A Argentina é o país de destino para vítimas provenientes do: Paraguai (origem majoritária das vítimas de tráfico com fins de exploração sexual na Argentina) e, em
› O Uruguai se constitui um país de destino para vítimas
provenientes da: Bolívia, Paraguai, Brasil e Argentina.
ARGENTINA
› O Brasil se constitui como um país de destino para
vítimas provenientes da: Argentina, Paraguai e Bolívia
(especialmente no caso de tráfico de mulheres para fins
de trabalho escravo).
› O Paraguai se constitui um país de destino para vítimas
provenientes do Brasil.
BRASIL
PARAGUAI
Paraguai
Argentina
República Dominicana
Paraguai
Paraguai
Brasil
Bolivia (especialmente no
caso de tráfico mulheres
para fins de trabalho
escravo)
Brasil
Colombia
Perú
Brasil
URUGUAI
Quadro 3:
MERCOSUL como
região de destino
Bolivia
Argentina
Uruguai
41
Mapa III: Mercosul como uma área alvo
REPÚBLICA
DOMINICANA
PAR
ARAGUAI
GUAI
URUGUAI
Referências
42
b) Zonas de fronteiras altamente vulneráveis
A seguir são assinaladas as zonas de fronteira com maior vulnerabilidade e onde se detectam redes de tráfico de
pessoas operando, seja na captura, transporte ou exploração das mulheres.
ARGENTINA
BRASIL
PARAGUAI
Bolivia (Jujuy)
Paraguai
Argentina (Itapúa, Alto
Paraná, Ñeembucú)
Brasil (Misiones)
Uruguai
Brasil
Bolivia
Brasil (Amambay, Alto
Paraná
Paraguai (Misiones e
Formosa)
Venezuela
Bolivia (Alto Paraguai e
Boquerón))
URUGUAI
Quadro 4:
Zonas de fronteiras
altamente vulneráveis
Argentina
Brasil (cidades gêmeas)
Suriname
43
Mapa IV: Zonas vulneráveis
PAR
ARAGUAI
GUAI
URUGUAI
Referências
zonas vulneráveis
44
CAPÍTULO 6
·REDES DE TRÁFICO DE PESSOAS
As mulheres vítimas de tráfico ocasionalmente são
pressionadas a recrutar e captar novas mulheres para a
rede, em troca de uma posição melhor, com mais privilégios ou benefícios, em troca de diminuir a dívida, entre
outros.
As redes de tráfico
de pessoas identificadas na região são grupos de delinquência organizada,
integrados por atores que cumprem papéis diversificados nas diferentes etapas do processo de tráfico.
As redes operam com diferentes dinâmicas e modalidades, existindo redes mais complexas de caráter transnacional, que incluem em suas atividades criminais o
tráfico de drogas e de armas.
Existem redes menos sofisticadas com uma composição basicamente familiar, com atores que cumprem
distintos papéis no processo e que têm membros ativos
(atores primários e secundários) em diferentes zonas e
territórios. Os atores primários são os traficantes, que
realizam o recrutamento, transporte e acolhimento
(recrutamento, proxenetas, chefes de prostíbulos). Os
atores secundários facilitam a ação da rede, desenvolvendo diversas tarefas (motoristas, taxistas, facilitador
de locais, integrantes de forças de segurança, empregados de empresas de transporte terrestre aéreo, agências de viagem, pessoas que se dedicam a conseguir
documentação falsa, fornecedores de apartamentos,
etc).
“As agências de viagem, sobretudo quando o destino
é a Europa, buscam estratégias que facilitem o ingresso das vítimas aos lugares de destino, principalmente à Espanha. Para tal, providenciam convites
especiais para as vítimas, organizam excursões, por
exemplo, religiosas, onde incluem as vítimas para
que passem despercebidas, entre outras. Com países
mais próximos como a Argentina, há a modalidade
que o próprio explorador viaja ao Paraguai e organiza sua rede, deixando um agenciador responsável
por ativar todos os atores em cada caso concreto do
envio de mulheres. O explorador entra em contato
com as agências de transporte, compra a passagem
de ida das vítimas e enviam dinheiro ao agenciador”
(Informe Nacional Paraguai)
38. A PESTRAF indica que
59% dos aliciadores são
homens, contra 41% de aliciadoras mulheres, pg.64
39. Original em português.
“No Brasil, a pesar da prevalência de homens
como aliciadores/agenciadores das vítimas de
tráfico38,verifica-se o grande número de aliciadoras
mulheres que conseguem convencer mulheres das
vantagens da inserção nas redes sexuais, através
de suas experiências” bem sucedidas “com a prostituição no exterior. Percebe-se que essas aliciadoras
já estiveram em condição de vítimas, mas conseguiram pagar sua dívida e foram inseridas na estrutura das redes de tráfico para exercer um poder de
convencimento sobre outras mulheres. Ou ainda, que
essas aliciadoras se envolvem sentimentalmente com
algum traficante ou dono de clube de prostituição e
acabam sendo as principais fontes de aliciamento de
mulheres no Brasil.” (Informe Nacional Brasil) 39
6.1. Estratégias de captura e
recrutamento
A captura mediante engano é a principal forma de recrutamento em nível regional; seja o engano de tipo e/
ou condições de trabalho a se desenvolver no país de
destino.
As ofertas de trabalho enganosas sobre o tipo de trabalho a se desenvolver em geral são tarefas de cuidado
(crianças, idosos) serviço doméstico, garçonetes. Uma
vez no destino, a pessoa é submetida à exploração
sexual.
Outra forma de engano é a oferta para o exercício da
prostituição e consiste em que a pessoa será submetida
a condições de exploração sexual ao chegar ao destino.
“Lá, descobre que aquele trabalho oferecido não
existe, ou que as condições não eram as acordadas,
e quando tenta rejeitá-las ou ir embora, os exploradores põem em marcha mecanismos de violência e
de coerção com os quais asseguram a submissão da
45
vítima. As vítimas, na maioria dos casos, passaram
por situações de vulnerabilidade e/ou submissão, e
desenvolveram diversas estratégias de sobrevivência nas quais naturalizam os processos tais como:
dominação, abuso de poder e vulnerabilidade de
direitos. Deste modo, a vítima, por questões pessoais – situação de vulnerabilidade pré-existente –
e externas – prisão, estupros sistemáticos, falta de
recursos econômicos, de acesso a meios de comunicação e outros – não consegue adquirir as defesas
necessárias para enfrentar os danos provocados por
seus exploradores e colaboradores. A vítima adapta
seus mecanismos psíquicos com fins de sobreviver no
lugar onde é explorada”. (Informe Nacional Argentina)
6.2. Modalidades de
recrutamento
A partir das informações documentadas nos Informes
Nacionais, as modalidades de recrutamento mais utilizadas na região são as seguintes:
- Realização de ensaios fotográficos para promoções.
São difundidos por diversos meios como jornais, letreiros, avisos publicitários.
- Aliciamento mediante oferecimento de diversos objetos de consumo. Roupas, passeios, acesso a festas,
cartões telefônicos como forma de criar a “isca” para
a posterior inserção no mercado do sexo, nas ruas ou
em zonas de exploração como bordéis, prostíbulos ou
certos bares.
- Anúncios e/ou agências que oferecem oportunidades
para trabalhar ou estudar.
- Avisos em jornais de grande tiragem. Nestes avisos
publicados e exibidos nos meios de comunicação em
massa, se oferecem endereços e/ou números telefônicos para contato.
- Captura utilizando a sedução e a manipulação afetiva.
São situações onde as mulheres são capturadas a partir
de vínculos de “namoro” onde a manipulação tem uma
dimensão muito importante. A ambivalência, a confusão
e o envolvimento afetivo não permitem que as vítimas
identifiquem nestas estratégias uma modalidade de
captura.
“A abordagem na rua é um dos mecanismos de primeiro contato. Este é feito por intermédio de outras
mulheres ou agenciadores que se apresentam como
‘salvadores que compreendem as necessidades da
vítima’ e lhe oferecem abrigo e acolhimento, a princípio sem necessidade de intercâmbio. Também aparecem familiares, amigos ou amigas próximas que
relacionam as vítimas com as redes, ou promovem
46
as condições para serem capturadas. O telefone celular começa a ter um papel importante nos contatos seguintes. As novas tecnologias de comunicação,
principalmente para as adolescentes (e-mails e
chats) se transformaram em ferramentas de contatos com os agenciadores. Este meio é utilizado para
oferecer a adolescentes e mulheres jovens a possibilidade de modelar ou começar uma tarefa como atriz
em filmes pequenos com cenas eróticas, explicando
que talvez tenham que viajar”(Testimonio extractado
de Informe Nacional de Uruguai).
“Existe um tempo de preparação, onde as mulheres
passam vários dias fora de sua casa, são levadas
pelo agenciador que em muitos casos é seu parceiro,
a trabalhar em diferentes prostíbulos do país; é um
tempo de namoro, onde se mostra às mulheres que
seus filhos ficarão bem cuidados com outros familiares, que o oferecimento de trabalhar no exterior
vai mudar suas vidas, que poderão ter sua própria
casa. Envolvem a mulher em uma história de felicidade futura, cortam seus vínculos por um tempo,
a isolam e quando aceitam, em 4 ou 5 dias estão
viajando. Não as deixam nem pensar, compram
roupas novas, passam de festa em festa, o recrutador a acompanha constantemente, lhe diz que não
se preocupe com nada, que não leve muita roupa e
em poucos dias adquire o passaporte e vai embora”
(Depoimento retirado do Informe Nacional do Uruguai)
O sequestro é um método utilizado com menor frequência nos países da região. É realizado por algum membro
da rede que, depois de estudar os movimentos da vítima,
geralmente as intercepta em via pública e as transporta
em automóvel até o lugar de exploração. Utilizam-se
drogas para manter as mulheres presas durante o processo de sequestro e de preparação para a exploração
sexual.
6.4. Viagem e trânsito
Na maioria dos países as vítimas viajam custodiadas
pelo traficante ou recrutador. A viagem pode incluir
várias etapas e destino, e, uma vez chegado ao país de
destino, o transporte até os locais de exploração é efetuado por via terrestre.
Nesta etapa, trabalhadores do setor de transporte como
caminhoneiros de transporte nacional e internacional e taxistas podem cumprir papéis no translado. Os
meios mais utilizados são desde as linhas regulares de
transporte aéreo e terrestre, travessia em lancha para
atravessar fronteiras, travessia em diversos veículos
particulares ou a pé.
Em geral as passagens são adquiridas em dinheiro para
evitar o seguimento ou rastreio bancário.
Em alguns casos, as mulheres viajam sós e são instruídas em como se comportar em toda a viagem, inclusive
em que idioma devem falar e o que dizer, especialmente
ao chegar ao país de destino frente às autoridades migratórias.
No caso da Espanha, as vítimas são recebidas por representantes dos exploradores no aeroporto e o translado é feito por via terrestre.
6.4. Destino e exploração
Os lugares de exploração podem ser prostíbulos, pubs,
bares, bordéis, night clubs, sinucas, apartamentos particulares, entre outros.
As vítimas podem estar alojadas nos próprios lugares
de exploração ou serem alojadas em lugares diferentes,
em geral em casas ou apartamentos onde se alojam
outras vítimas da mesma nacionalidade ou de outras.
É comum a rotatividade de lugares de exploração de
forma frequente dentro de uma cidade ou em diferentes
cidades e países. Podem ser vendidas a outras redes
neste país e serem transferidas a outros lugares.
- Violência física, sexual e psicológica.
- Estupro sistemático pelos exploradores ‘processo de
amaciamento’.
- Fornecimento de álcool e drogas.
- Privação ou restrição da liberdade.
- Privação ou restrição do contato com a família (as
comunicações com a família são controladas e supervisionadas). Em alguns casos permanecem totalmente
incomunicáveis.
- Sanções e multas por brigas entre as vítimas ou por
negarem-se a realizar determinadas coisas, como
beber álcool, entre outras.
- Restrição de comidas.
- Ameaça de represálias diretas a seus entes queridos.
- Ameaça de serem enviadas à prisão ou de serem deportadas quando são estrangeiras em situação irregular.
- Isolamento social e linguístico.
Durante o processo de exploração, as vítimas são
obrigadas a colaborar ou participar em ilegalidades
administrativas ou penais, tais como: ingresso ou permanência irregular no país, uso de identidade falsa, tráfico de drogas, captura ou custódia de outras vítimas.
A ameaça de serem denunciadas ante as autoridades
do país funciona como um mecanismo de controle altamente eficiente.
AS condições de exploração implicam jornadas de trabalho de 10 a 12 horas por dia em prostíbulos, bordéis
ou locais semelhantes, onde devem realizar relações
sexuais, beber e induzir os clientes a beberem álcool.
Também se identificam – principalmente nos apartamentos – mulheres que ficam 24 horas à disposição
dos clientes. Em outros casos, os lugares de exploração
são os estacionamentos de carros, pontos em determinadas ruas e estradas, chegando a estar até 12 horas
na rua.
Existem redes que recrutam mulheres para atender
clientes de alto poder aquisitivo em lugares exclusivos
e de alto nível. Estas mulheres passam por períodos de
treinamento antes de chegar aos locais de exploração.
São treinadas em como atender estes clientes, no modo
de se vestir, maquiar, entre outras coisas.
Os mecanismos de controle utilizados pelos traficantes
coincidem nos quatro informes nacionais, entre os quais
se destacam:
- Retenção de documentos.
- Pressão ou chantagem por dívidas ou supostas dívidas.
- Retenção de documentos de viagem ou identidade.
- Obrigação de exercer a prostituição durante jornadas
extensas.
47
CAPÍTULO 7
·RESPOSTAS INSTITUCIONAIS E
LEGISLAÇÃO
Com a ratificação do Protocolo de Palermo, os países
da região se obrigaram a desenvolver ações de prevenção (sensibilização, informação, pesquisa), de proteção e restituição dos direitos das vítimas, incluída a
indenização e reparação, de repressão ao delito e de
penalização dos traficantes.
A fim de abordar estes diferentes âmbitos de ação e
responsabilidade dos Estados frente ao Tráfico, serão
analisadas as respostas institucionais e a legislação
dos países de acordo com os seguintes:
I. Políticas públicas.
II. Visibilização do delito e informação à população.
Para analisar as respostas institucionais
e a legislação dos países da região, é imprescindível
partir dos padrões internacionais resultados dos instrumentos de direitos humanos internacionais e regionais, em especial a Convenção Internacional para a
Eliminação da Discriminação da Mulher (CEDAW) e a
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém
do Pará).
III. Capacitação e fortalecimento institucional.
IV. Primeiro atendimento: resgate, retorno seguro e voluntário e alojamento provisório.
V. Recuperação física, psicológica e social das vítimas
do tráfico de pessoas.
VI. Accesso à justiça pelas vítimas.
VII. Criminalização do tráfico de pessoas.
VIII. Repressão ao delito.
Estes instrumentos constituem um marco de referência imprescindível quando se analisa um fenômeno que
afeta principalmente as mulheres e se sustenta em valores patriarcais que legitimam a submissão sexual e a
utilização do corpo das mulheres como mercadoria de
consumo. Ambos instrumentos compreendem o tráfico
de mulheres com fins de exploração sexual como manifestação da violência de gênero que os Estados não
podem tolerar e devem adotar todas as medidas a seu
alcance para preveni-la, combatê-la e penalizá-la.
Avançando no tema específico do tráfico de pessoas, o
Protocolo de Palermo, complementar à Convenção das
Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional e aos Princípios e Diretrizes da Nações Unidas
sobre Tráfico e Direitos Humanos, direciona a adotar
legislação e respostas institucionais que abordem o
problema de forma integral, tendo especialmente em
conta o enfoque dos direitos humanos e da perspectiva
de gênero.
7.1. Síntese descritiva
O tipo de resposta dada por cada país está fortemente
determinado pelos seguintes fatores:
a) amplitude territorial,
b) quantidade e diversidade da população,
c) estrutura político-organizacional, e
d) laspectos do tráfico que foram incorporados com
maior ênfase na agenda político-institucional.
A seguir será apresentada uma descrição sintética das
características e respostas de cada país, para, assim,
aprofundar em pontos que consideramos chave para a
análise e diagnóstico regional.
49
ARGENTINA
A Argentina é um país com extensão territorial de
2.780.440 Km, com cerca de 40 milhões de habitantes.
Faz fronteira com a Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e
Uruguai. Está organizado politicamente federativamente, com 23 províncias e a Capital Federal (Cidade
Autônoma de Buenos Aires). Cada uma das províncias
se subdivide em departamentos.
As medidas de prevenção e sanção do tráfico, assim
como as de atendimento e proteção que devem ser
implantadas e os direitos das vítimas estão ordenados
pela Lei 26.362 de Prevenção e Sanção do Tráfico de
Pessoas e Atendimento a suas Vítimas, de 2008.
Tanto em nível nacional quanto provincial, existem organismos com autoridade no assunto.
As ações foram dirigidas principalmente aos casos de
tráfico de pessoas em que a exploração ocorre dentro
do país, seja por constituir tráfico interno ou por casos
de tráfico internacional em que a Argentina é o país de
destino.
Neste marco, o Ministério de Segurança da Nação colocou entre seus principais eixos de gestão, desde a sua
criação, em dezembro de 2010, o aprofundamento do
enfrentamento ao tráfico de pessoas.
Entre as políticas implantadas por este Ministério, podemos assinalar as seguintes:
a) Incremento na quantidade e profissionalização do
pessoal das Forças Policiais e de Segurança federais,
destinados a divisões específicas que trabalhem com o
tema.
b) Atividades de capacitação:
• Capacitação específica para pessoal que cumpra
funções em delegacias da Polícia Federal.
• Inclusão da temática na formação curricular das
Forças Policiais e de Segurança federais.
• Formação de formadores nas Forças federais para a
multiplicação das capacitações em todo território nacional.
c) Unificação e sistematização dos critérios de registro de informação provenientes dos procedimentos
policiais, tendo resultado a implantação do Sistema
Integrado de Informação Criminal do Delito de Tráfico
de Pessoas (SisTrata). Tal sistema registra de maneira
uniforme uma considerável quantidade de variáveis
que permitirão contribuir com informação valiosa
acerca das dimensões quantitativas e qualitativas do
fenômeno.
50
d) Criação de marcos de cooperação interinstitucional
para a prevenção e investigação do delito, atendimento
às vítimas e capacitação dos atores institucionais com
intervenção no tema. Neste processo participam junto
ao Ministério de Segurança e Ministério de Justiça e
Direitos Humanos, o Ministério Público Fiscal, a Corte
Suprema de Justiça da Nação, a Direção Nacional de
Migrações e a Associação de Mulheres Juízas da Argentina.
e) Criação de marcos de cooperação internacional, alcançando Acordos de Cooperação com organismos do
Chile e do Uruguai com autoridade no assunto.
f) Criação de protocolos e guias de atuação para a
atuação das Forças de Segurança e Polícias Federais.
Por outro lado, o serviço central para abordagem destas
situações é o Departamento de Resgate e Acompanhamento a Pessoas Danificadas pelo Delito de Tráfico de
Pessoas do Ministério da Justiça e Direitos Humanos da
Nação. Acompanha e atende vítimas do delito de tráfico de pessoas durante o resgate das mesmas, até a
recepção do depoimento em sede judicial. Articula suas
ações com as Forças de Segurança Federais.
Uma vez culminada esta etapa, as situações são atendidas por serviços nacionais ou provinciais, segundo sua
procedência:
a) Se as vítimas são de nacionalidade estrangeira, são
atendidas pela Área de Exploração Sexual infantil e Tráfico da Secretaria Nacional da Infância, Adolescência e
Família, do Ministério de Desenvolvimento Social. A
assistência consiste na provisão de alojamento apropriado, atenção psicológica, assistência social, médica,
econômica, assessoria jurídica, capacitação profissional, reinserção educativa, provisão de documentação e
retorno voluntário assistido.
b) Se forem vítimas argentinas são encaminhadas aos
organismos provinciais responsáveis pela proteção
social.
A perseguição penal é responsabilidade dos Tribunais
e Promotorias Federais. No Ministério Público e Fiscal
funciona a Unidade Fiscal de Assistência em Sequestros Extorsivos e Tráfico de Pessoas (UFASE) que, por
requisição do promotor, presta assistência para a investigação destes delitos. Neste mesmo âmbito, funciona o Departamento de Assistência Integral à Vítima
do Delito (OFAVI), que é o ponto focal para a adequação
legislativa, sensibilização, capacitação e elaboração de
planos de contingência com esta temática.
A Área Mulher do Ministério de Relações Exteriores e
Culto participa na negociação dos documentos interna-
cionais sobre a temática e nos Comitês de Fronteira.
Ainda, é responsável em difundir a normativa internacional no país.
A forma de abordagem das situações de tráfico de pessoas no âmbito provincial tende a replicar o modelo
nacional, através da criação de Departamentos de
Resgate e Serviços de assessoria, atendimento e alojamento provincial, coordenando suas ações com os
organismos nacionais.
BRASIL
O tamanho do Brasil é quase continental:
8.547.403,5Km². Sua população foi calculada em 2010
em 190.732.694 habitantes. Faz limite com a Venezuela,
Guiana, Suriname, Guiana Francesa, Colômbia, Bolívia,
Peru, Argentina, Paraguai e Uruguai.
É um país federal, organizado administrativamente em
26 Estados e um Distrito Federal.
As respostas contra o tráfico de pessoas estão acordadas na Política Nacional e no Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, no Pacto Nacional pelo
Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, de caráter intersetorial, que consolida a Política. Esta deve ser
desenvolvida em cada Estado e nos Planos Estaduais
de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e transversalizadas nos distintos serviços públicos do país.
Intervêm especialmente na questão os seguintes organismos: Secretaria de Políticas para Mulheres,
Secretaria de Direitos Humanos, Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Ministério da
Justiça, Ministério Público e os Tribunais Federais do
Poder Judicial.
A Secretaria de Políticas para Mulheres desenvolve
suas ações através do Plano Nacional de Políticas para
as Mulheres, da Política Nacional de Enfrentamento à
Violência contra as Mulheres e do Pacto Nacional pelo
Enfrentamento à Violência contra as Mulheres de caráter intersetorial, que consolida a política que deve
ser desenvolvida em cada Estado. Este Pacto conta
com cinco eixos, um dos quais a exploração sexual e
o tráfico de mulheres. Constitui um pilar fundamental
para atendimento de mulheres vítimas de tráfico, já que
fortalece a rede e os serviços especializados de atendimento às mulheres.
O atendimento às vítimas se canaliza através da Central
de Atendimento à Mulher (Ligue 180) e da Rede de Serviços distribuída no país:
187 Centros de Referência da Mulher, 57 Defensorias
ou Núcleos da Mulher, 359 Delegacias da Mulher, 72
Casas de Abrigo, 608 serviços de saúde e 42 Juizados/
Seções especializadas.40
O Ministério do Desenvolvimento Social realiza suas
ações através do Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) em dois níveis de proteção social: básica e especial. A primeira tem como objetivo a prevenção das
situações de vulnerabilidade e risco social e o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. É fornecida pelos Centros de Referência e Assistência Social
(CRAS) ou por organizações ou entidades autorizadas.
A proteção social especial tem como finalidade o atendimento das situações de risco pessoal ou social, assim
como as situações de ameaça ou vulnerabilidade de direitos.
40. Este dado corresponde ao
Informe Nacional do Brasil,
apresentado em julho de 2011.
41. Idem.
No âmbito da proteção social especial se diferenciam as
situações de média complexidade das de alta complexidade. A articulação das ações de média complexidade
está a cargo dos Centros de Referência Especializada e
Assistência Social (CREAS), que funcionam em âmbito
municipal e regional. De um total de 1200 CREAS em
funcionamento no país, 255 estão especialmente capacitados para atendimento de situações de tráfico de
pessoas. A Proteção Social Especial de Alta Complexidade fornece serviços de acolhimento institucional,
entre os quais se inclui o acolhimento/abrigo.
No Ministério da Justiça funciona o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI)
que desenvolve a política pública do governo federal no
país para enfrentamento e prevenção da criminalidade.
A Polícia Federal é a responsável pela investigação no
crime de tráfico de pessoas.
En el ámbito estadual funcionan los Núcleos Estaduales
de Prevención y Enfrentamiento de la Trata de Personas
(NEPTs) y los Puestos de Atención al Migrante. Estos
últimos funcionan en áreas de tránsito (aeropuertos,
puertos y zonas de frontera) y tienen como cometido la
identificación de las víctimas y brindar la primera atención. Coordinan con la policía federal y civil y con otras
instituciones estatales o regionales, asesoran a las víctimas, derivan a las mismas a los servicios de atención
social, de la salud, alojamiento, etc.
Em âmbito estadual e municipal funcionam os Núcleos
Estaduais de Prevenção e Enfrentamento do Tráfico de
Pessoas (NEPTs) e os Postos de Atendimento ao Migrante. Estes últimos funcionam em áreas de trânsito
(aeroportos, portos e zonas de fronteira) e têm como
função a identificação das vítimas e fornecer o primeiro
atendimento. Coordenam com a polícia federal e civil e
51
com outras instituições estatais e regionais, assessoram as vítimas, encaminham as mesmas aos serviços
de atendimento social, de saúde, alojamento, etc.
42. Idem.
No Brasil existem seis NETP’s nos Estados do Acre,
Bahia, Goiás, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro e São
Paulo. Os Postos se encontram nos aeroportos de Guarulhos/São Paulo, Rio de Janeiro, Belém do Pará e no
porto e na Rodoviária de Manaus . Também funcionam
as Casas de Migrantes com funções similares, uma em
Foz do Iguaçu, (fronteira Brasil-Paraguai-Argentina) e
outra em Oiapoque (fronteira com a Guiana Francesa).
Assessoram os migrantes em geral e vítimas potenciais ou reais do tráfico de pessoas, encaminhando-as
aos Núcleos ou a outros serviços de atendimento.
O Serviço Disque Denúncia 100 recebe denúncias de
todo país relacionadas a violações de direitos humanos.
1. Delegacia Especializada
de Atendimento às Mulheres (DEAM)
52
O serviço telefônico da Central de Atendimento da
Mulher – Ligue 180 realiza atendimento especializado
às mulheres, fornece orientações sobre direitos e enfrentamento da violência e recebe denúncias de tráfico
de mulheres. A Central ampliou seus serviços para
atendimento internacional através da implantação de
um projeto piloto com atendimento em 3 países: Espanha, Itália e Portugal.
Os Tribunais Federais, o Ministério Público Federal, a
Polícia Federal e a Defensoria Pública da União são os
órgãos competentes nos processos penais por tráfico
de pessoas.
Em anexo a seguir o esquema da rede de atendimento
e enfrentamento da violência contra as mulheres:
PARAGUAI
Tem uma extensão territorial de 406.752 Km2. e população de 6.459.058 habitantes. Faz fronteira com a Argentina, Brasil e Bolívia. É um país unitário, dividido em
17 departamentos e um distrito capital (Assunção).
A Mesa Interinstitucional de Prevenção e Combate ao
Tráfico de Pessoas é responsável pela articulação da
política nacional de prevenção e enfrentamento ao tráfico de pessoas nos âmbitos internos e internacional.
A Secretaria da Mulher da Presidência (SPMR) é a responsável por desenvolver a política de prevenção ao
tráfico de mulheres. Conta com uma Direção de Prevenção e Atendimento a Vítimas do Tráfico de Pessoas
que desenvolve ações preventivas, de assistência e
atendimento às vítimas.
Em relação às crianças e adolescentes, é responsável
a Unidade de Atendimento a Vítimas de Tráfico e Exploração Sexual da Secretaria Nacional da Infância e
Adolescência (SNNA).
Dentro da policia nacional, ligada ao Vice Ministério de
Segurança Interna do Ministério do Interior foi criada
a Divisão de Tráfico e Paraguaios Desaparecidos que,
junto com a INTERPOL, apóia a investigação penal e
colaboram na segurança das vítimas de tráfico. Ainda,
funciona a Divisão Especializada em Atendimento a
vítimas de violência contra a mulher, crianças e adolescentes, que trabalham em âmbito comunitário e
detectam situações de tráfico de pessoas.
o contrabando, é responsável pela perseguição dos delitos de tráfico de pessoas e de exploração sexual de
crianças e adolescentes. Tem sua sede na capital do
país (arts.414 e 415 da Lei 18.362 e Lei 18.390 de 2008).
7.2. Análise das respostas
institucionais
I. Políticas Públicas
› Políticas de igualdade de gênero na região.
Os quatro países do MERCOSUL criaram mecanismos
de regência das políticas públicas de igualdade de
gênero, desenvolvendo planos e ações com diferentes
níveis de alcance.
ARGENTINA
O Conselho Nacional das Mulheres é o órgão regente
das políticas públicas sobre os direitos das mulheres,
conforme criado pela Lei integral de Proteção para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra as Mulheres,
encarregando-o da elaboração, implementação e monitoração do Plano Nacional de Ação.
BRASIL
O órgão responsável é a Secretaria de Política para as
Mulheres, que possui caráter ministerial e está vinculada à Presidência da República.
URUGUAI
O Uruguai tem uma extensão de 176.215 Km ², onde habitam três milhões de habitantes, a metade concentrados na capital do país (Montevidéu).
Administrativamente também é um país unitário, organizado em 19 departamentos.
O tráfico de mulheres com fins de exploração sexual
comercial é enfrentado no âmbito do Poder Executivo
pelo Instituto Nacional de Mulheres, que desenvolve
ações de sensibilização, capacitação e atendimento às
vítimas.
Este Instituto coordena uma Mesa Interinstitucional,
que tem por objetivo articular as ações de prevenção,
capacitação e atendimento.
Em âmbito judicial foram criados dois juizados, duas
promotorias e duas defensorias especializadas no
crime organizado com autoridade nacional, que, entre
outros delitos organizados, como o tráfico de drogas e
Aprovou Planos, Políticas e Pactos Nacionais:
a) II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres
(2008).
b) Política Nacional de Enfrentamento à Violência
contra as Mulheres.
c) Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência
contra as Mulheres. Este Pacto conta com cinco eixos,
um dos quais é a garantia dos direitos sexuais, enfrentamento à exploração sexual e tráfico de mulheres.
PARAGUAI
O órgão regente é a Secretaria da Mulher da Presidência da República. Está desenvolvendo o Terceiro Plano
Nacional de Igualdade de Oportunidades entre Mulheres e Homens (2008-2017).
53
URUGUAI
O órgão regente é o Instituto Nacional das Mulheres,
dependente do Ministério de Desenvolvimento Social.
Está desenvolvendo o Plano de Igualdade de Oportunidades e Direitos entre Homens e Mulheres (cujo eixo 5
prevê a transversalização de ações contra o tráfico de
mulheres).
O Plano Nacional de Luta contra a Violência Doméstica
(2004-2010) está em processo de avaliação e revisão.
› Políticas Públicas sobre Tráfico de Pessoas
A aprovação de documentos de políticas públicas para o
enfrentamento do tráfico de pessoas é mais incipiente
na região.
No Brasil, rege uma Política Nacional e um Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. A Política Nacional foi aprovada pelo Decreto Presidencial
No. 5948-2006. Nela se determinam os princípios, diretrizes e ações de prevenção e de repressão ao tráfico e
atendimento às vítimas.
Os princípios regentes são:
- Respeito à dignidade da pessoa humana.
- Não discriminação por gênero, orientação sexual,
origem étnica ou social, procedência nacional, atuação
profissional, raça, religião, faixa etária, situação migratória ou outro status.
- Proteção e assistência integral às vítimas diretas e
indiretas, independentemente de nacionalidade ou de
sua colaboração nos processos judiciais..
- Promoção de garantia dos direitos humanos..
- Respeito aos tratados e convenções internacionais de
direitos humanos.
- Universidade, indivisibilidade e interdependência dos
direitos humanos e transversalidade das dimensões de
gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, raça e faixa etária nas políticas públicas
As diretrizes gerais são:
- Fortalecimento do pacto federativo por meio da ação
articulada de todas as esferas do governo..
- Fomento da cooperação internacional..
- Articulação com as organizações não governamentais.
- Geração de redes de enfrentamento ao tráfico de pessoas, que incluam atores governamentais e da sociedade civil.
- Fortalecimento das ações em zonas de fronteira e
demais áreas de incidência..
- Atenção e proteção às vítimas no exterior e no território nacional e sua inserção social. .
- Realização de investigações.
54
- Capacitação de profissionais..
- Harmonização legislativa e de procedimentos administrativos. .
- Garantir o acesso à informação.
O Primeiro Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Brasil vigorou entre 2008 e 2010.
Se encontra em processo de avaliação e revisão para a
aprovação do II Plano. Em âmbito estadual devem ser
aprovados Planos Estaduais que sigam a linha da Política Nacional e do Plano Nacional.
Os outros três países do MERCOSUL, Argentina, Uruguai e Paraguai, não contam com planos nacionais de
ação, nem planos provinciais de ação.
No entanto, é de especial relevância que a Argentina
aprovou as principais linhas para o combate do crime
de tráfico de pessoas através de uma Lei Nacional, No.
26.324, na qual, além de incorporar dois tipos penais
para sua perseguição, determinam os direitos das vítimas, assegurando assim alguns aspectos básicos de
intervenção. Por sua parte, o Paraguai elaborou uma
“Política Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico
de Pessoas 2010-2019”, que se encontra pendente da
aprovação do Poder Executivo.
› Espaços Interinstitucionais de Articulação e Coordenação.
Dada a complexidade da problemática que causa o
crime de tráfico de pessoas, é de especial importância
considerar os espaços de articulação interinstitucional
para sua abordagem.
Estes espaços, para serem efetivos, terão que levar em
conta os diferentes níveis organizacionais de cada país
(nacionais ou federais/ provinciais, estaduais ou departamentais).
ARGENTINA
Em âmbito nacional, embora não haja um espaço unificado de coordenação, progressivamente foram estabelecidos espaços de cooperação interinstitucional.
Assim, articulam permanentemente suas ações o Ministério de Segurança da Nação, a Direção Nacional de
Migrações, o Ministério do Trabalho, o Ministério Público e Fiscal, os Tribunais Federais e o Ministério de
Desenvolvimento Social da Nação.
Em nível provincial, foram criadas comissões interinstitucionais na:
- Província de Buenos Aires
Nesta Província foi criada a Comissão Provincial para
a Prevenção e Erradicação do Tráfico de Pessoas por
Decreto No. 978/010. Encontra-se integrada por: um
representante do Ministério da Justiça e Segurança,
um representante do Conselho Provincial da Mulher,
um representante da Secretaria de Direitos Humanos,
dois representantes da Câmara de Senadores, dois representantes da Suprema Corte de Justiça, um representante da Procuração Geral da Província de Buenos
Aires, um representante da Federação Argentina de
Municípios.
- Província de Misiones.
Nesta província o Ministério de Direitos Humanos criou
a Mesa Interinstitucional da luta contra o tráfico de pessoas da Província, coordenada pela Vice-governadora e
integrada pelo Ministério do Governo (Polícia Provincial
e Subsecretaria de Relações com a Comunidade), Ministério de Desenvolvimento Social (Subsecretaria da
Mulher e Direção da Infância, Família e Deficiência),
Ministério da Saúde Pública (Hospital de Fátima), Ministério de Direitos Humanos (Departamento de Tráfico
e Contrabando de Pessoas e Equipe Interdisciplinar
de assistência e acolhimento da vítima,) Ministério da
Educação, Ministério do Trabalho, Forças de Segurança
Nacionais.
-Província de Neuquén
Nesta Província foi criada a Comissão Interinstitucional pela Lei 2717 de 2010, coordenada pela Subsecretaria de Justiça e Direitos Humanos e integrada pelos
Centros de Atendimentos a vítimas de Delitos, Conselhos das Mulheres e forças de segurança. É integrada
também por outros organismos cuja participação não
é efetiva.
- Províncias do noroeste Argentino
O Conselho Federal de Direitos Humanos do Noroeste
argentino promoveu um Acordo de cooperação e Assistência Mútua para a prevenção do tráfico de pessoas.
Integram as províncias de Jujuy, Tucumán, Santiago del
Estero, La Rioja, Catamarca e Salta.
Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. É coordenada
pelo Ministério de Relações Exteriores e está integrada
por 47 instituições públicas e Organizações Não Governamentais.
Entre seus desafios se destaca o objetivo de fortalecer
as ações de coordenação com os Conselhos Nacionais
para populações específicas, tais como o Conselho Nacional da Infância e Adolescência, o Conselho Nacional
de Saúde e o Conselho Nacional de Políticas Migratórias e articulação com a Rede de Direitos Humanos,
criada pelo Decreto 2290/09 do Poder Executivo.
A partir desta Mesa, foram constituídas Mesas Departamentais em Alto Paraná, Itapúa, Ñeembucú e San
Pedro.
URUGUAI
A Mesa Interinstitucional de Enfrentamento ao tráfico
de mulheres com fins de exploração sexual comercial
do Uruguai é coordenada pelo Instituto Nacional das
Mulheres do Ministério de Desenvolvimento Social e
integrada pelo Ministério de Relações Exteriores, Ministério do Interior, Ministério do Turismo, Ministério
de Saúde Pública, Ministério de Educação e Cultura,
Poder Judicial, Ministério Público e Fiscal, Instituto da
Infância e Adolescência e Organizações Não Governamentais. Conta com o apoio e assessoria da Comissão
Nacional para a Erradicação da Exploração Sexual e
não Comercial (CONAPESE) e da Organização Internacional das Migrações (OIM) em posição de assessora;
ainda, contou com o apoio das Nações Unidas, União
Européia e Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento.
BRASIL
Neste país foram criados Comitês Interinstitucionais
em nível estadual ou regional (dentro dos Estados),
constituídos por atores públicos, privados e da sociedade civil. .
PARAGUAI
Conta com a Mesa Interinstitucional de Prevenção e
55
Quadro 5:
Políticas públicas
POLITICAS PÚBLICAS
POLÍTICAS DE ÓRGÃOS
IGUALDADE DE RESPONSÁVEIS
GÊNERO
ARGENTINA
Conselho Nacional
das Mulheres
PLANOS DE
IGUALDADE DE
GÊNERO
56
POLITICAS E
PLANOS DE
PREVENÇÂO
E ENFRENTAMENTO AO
TRÁFICO DE
PESSOAS
POLÍTICAS E
PLANOS
A Lei 26.364 é o
marco geral de
ação para as políticas públicas do
Governo Nacional
em termos de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de
Pessoas.
ESPAÇOS
INTERINSTITUCIONAIS DE
ARTICULAÇÃO
E COORDENAÇÃO
FEDERAL/
NACIONAL
Espaços de Cooperação entre o
Departamento de
Resgate e Acompanhamento a
Pessoas Danificadas pelo Delito de
Tráfico de Pessoas,
o Ministério de Segurança da Nação,
as Forças Policiais
de Segurança, a
Direção Nacional
de Migrações, o
Ministério Público
Fiscal, os Tribunais
Federais e o Ministério de Desenvolvimento Social da
Nação.
PROVINCIAL/
ESTADUAL/
DEPARTAMENTAL
Comissão
Provincial para
a Prevenção e
Erradicação do
Tráfico de Pessoas
(Província de
Buenos Aires).
Mesa Interinstitucional da luta
contra o Tráfico
de Pessoas da
Província (Província
de Misiones)
Comissão Interinstitucional da Província de Neuquén.
BRASIL
PARAGUAI
URUGUAI
Secretaria de
Políticas para as
Mulheres
Secretaria da
Mulher da Presidência da República
Instituto Nacional das Mulheres
- Ministério de
Desenvolvimento
Social
- II Plano Nacional
de Políticas para as
Mulheres (2008)
- Política Nacional
de Enfrentamento à
Violência contra as
Mulheres
-Pacto Nacional
pelo Enfrentamento
à Violência contra
as Mulheres
Terceiro Plano Nacional de Igualdade
de Oportunidades
entre Mulheres e
Homens (20082017)
Plano Nacional
de Igualdade de
Oportunidades e
Direitos (PIODNA)-I Plano Nacional
de luta contra a
Violência Doméstica (2004-2010)
-Política nacional de
Enfrentamento ao
Tráfico de Pessoas
-I Plano Nacional de
Enfrentamento ao
Tráfico de Pessoas
-Plano Nacional
de Políticas para
Mulheres.
- Pacto Nacional
pelo Enfrentamento
à Violência contra as
Mulheres
Pendente de aprovação pelo Poder
Executivo:
“Política Nacional
de Prevenção e
Enfrentamento ao
Tráfico de Pessoas
2010-2019”
-Mesa Interinstitucional
-47 instituições
públicas e ONGs
Comitês interinstitucionais Estaduais
e Regionais
Núcleos estaduais
de prevenção e
enfrentamento ao
tráfico (NETP´S)
-Mesas Departamentais: em
quatro dos dezoito
departamentos:
Alto Paraná, Itapúa,
Ñeembucú, San
Pedro
-Mesa interinstitucional de enfrentamento ao tráfico
de mulheres com
fins de exploração
sexual comercial.
II. Visibilização do delito e informação
à população
ARGENTINA
Como o tráfico de pessoas é um tema que entrou recentemente na agenda dos países, as campanhas de
sensibilização, as linhas telefônicas de acesso aos centros de assessoria e encaminhamento são canais de
grande importância para a prevenção do problema.
ORGANIZADORES/
CONVOCANTES
• Campanhas de Sensibilização e Informação
A seguir é fornecida uma lista das campanhas de sensibilização e informação desenvolvidas pelos países para
prevenção do delito. Não inclui necessariamente todas
as ações realizadas, mas as que foram destacadas nos
informes dos paises.
LEMA/CONTEÚDOS
PÚBLICO ALVO
MINISTÉRIO DE SEGURANÇA DA NAÇÃO
E MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA E DIREITOS
HUMANOS DA NAÇÃO
População em geral
“Não daremos um minuto mais às orgaPassageiros de Transporte urbano
nizações que se dedicam ao tráfico de
pessoas”. “Se não há clientes, não há tráfico”.
Spots televisivos difundindo a problemática e
os canais de denuncia, difundidos principalmente durante a programação de “Futebol
para todos” (transmissão na televisão dos
jogos da liga profissional de futebol) e nos
serviços de transporte automotor de passageiros de caráter interurbano.
MINISTÉRIO DE SEGURANÇA DA NAÇÃO
“Ajude-nos a combater a escravidão do século População em geral
XXI. Abra os olhos”. Cartazes difundindo o
número gratuito para denúncias ao Ministério
da Segurança.
MINISTÉRIO DE SEGURANÇA DA NAÇÃO
E SECRETARIA DE
TRANSPORTE DA
NAÇÃO (COMISSÃO
NACIONAL DE REGULAÇÃO DO TRANSPORTE)
“Tráfico de pessoas é escravidão. Se souber
algo, denuncie”. Legenda impressa em
todos os bilhetes emitidos para os serviços
de transporte automotor de passageiros de
caráter interurbano, difundindo o número
gratuito para denúncias do Ministério de
Segurança.
Passageiros de transporte interurbano
OIM Março 2010
- Prog. AVOT
Não ao Tráfico de Pessoas. Não à Escravidão
Moderna.
Dirigido às vítimas (sobre seus direitos e métodos de engano), amigos e familiares (para
a reação precoce), assim como a clientes do
comercio sexual, incitando-os a denunciar em
situações de tráfico.
INADI
Campanhas informativas de prevenção e
debate, jornadas de sensibilização, presença
em rádios, entre outras ações.
População em geral
MINISTÉRIO DEDESENVOLVIMENTO
SOCIAL DA NAÇÃO
1a. Campanha contra o Tráfico e a Exploração
Sexual.
População em geral
GOVERNO DA CIDADE
DE BUENOS AIRES
23 DE SETEMBRO
2010
DIA INTERNACIONAL CONTRA O TRÁFICO
Lema: Sabe qual o preço do silêncio? Tua Voz
pode ajudar que a exploração não encontre
mais vítimas.
População em geral
NÃO AO TRÁFICO DE PESSOAS.
REDE DE ORGANIZAÇÕES SOCIAIS DA
Mulheres mobilizadas a través de um desfile.
PROVÍNCIA DE MENDOZA
24 DE SETEMBRO2010
População em geral
MINISTÉRIO DE
DESENVOLVIMENTO
SOCIAL NA TRÍPLICE
FRONTEIRA -2010
População da Tríplice Fronteira, incluindo a
população originária.
Difundido em quéchua, aimará e espanhol.
Pelos direitos das crianças e adolescentes
contra o Tráfico e a Exploração na Tríplice
Fronteira. Três Países. Três Poderes.
Quadro 6:
campanhas de
sensibilização e
informação
57
ARGENTINA
ORGANIZADORES/
CONVOCANTES
LEMA/CONTEUDOS
RATT ARGENTINA
O tráfico e o contrabando de Crianças, Adolescentes e Jovens é a soma das Violações de
Direitos Humanos.
População em geral
COLETIVOS E MULHERES FEMINISTAS
Nem uma mulher mais vítima de prostituição.
População em geral
AÇÃO PÚBLICA PELO
DIA INTERNACIONAL
CONTRA A EXPLORAÇÃO SEXUAL-2010
A rota dos telefones públicos é a rota da
exploração sexual.
População da Cidade Autônoma de Buenos
Aires
ONGs. ABOLICIONISTAS
DEZ. 2010
Se a prostituição fosse um trabalho, você
recomendaria à sua filha?
População em geral
INSTITUIÇÕES PÚBLI- “Eles traficam e nós Podemos”, entre outros
CAS DE SALTA: MINIS- lemas.
TÉRIO DE GOVERNO
E SEGURANÇA,
Secretaria de Direitos
Humanos, OFICINA DE
RESGATE.
População de Salta
FUNDAÇÃO MARIA
DE LOS ANGELES
Campanhas preventivas
Revista Sol Y Azares
Telenovela “Vidas Roubadas”
População de Tucumán e de todo o país
MINISTÉRIO DE DIREITOS HUMANOS DE
MISIONES. 2007-2010
Sem clientes não há tráfico, entre outros.
Dirigida aos jovens de programas sociais de
Misiones
MINISTÉRIO DE DIREI- Curta metragem NINA, sobre a situação de
tráfico em Misiones/Encarnación.
TOS HUMANOS DE
MISIONES. 2007-2010
58
PÚBLICO ALVO
População em geral
BRASIL
ORGANIZADORES/
CONVOCANTES
LEMA/CONTEÚDOS
PÚBLICO ALVO
SECRETARIA NACIONAL DE JUSTIÇA
DO MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA. 2004
Tráfico internacional de Mulheres. Denuncie.
Dirigido à população em geral e aos migrantes em particular. Anexava-se um panfleto
referente ao tema ao emitir o passaporte
SECRETARIA NACIONAL DE JUSTIÇA
DO MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA. 2010
Tráfico de Pessoas. Ajude o Brasil a não cair
nessa armadilha.
População em geral
MINISTÉRIO DE
RELAÇÕES
EXTERIORES
Portal na web com informação para residentes no exterior
Migrantes em geral. Pessoas vítimas de
tráfico no exterior.
DIVISÃO DE ASSUNTOS CONSULARES
DO ITAMARATY (Ministério de Relações
Exteriores)
Campañas preventivas
Revista Sol y Azares
Telenovela “Vidas Robadas”
População de Tucumán e de todo o país
MINISTERIO DE DERECHOS HUMANOS
DE MISIONES.
2007-2010
Guia de retorno ao Brasil
Brasileiros residentes no exterior.
59
PARAGUAI
60
ORGANIZADORES/
CONVOCANTES
LEMA/CONTEÚDOS
PÚBLICO ALVO
SECRETARIA DA
MULHER DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA (SMPR).
2006
“Não acredite em contos de fadas”
Distribuiu cartazes de sensibilização e difundiu através da televisão um spot que fornecia
informação sobre o risco do tráfico de pessoas com fins de exploração sexual
“Minha vida vale e não tem preço”
BID/SPMR O objetivo da campanha foi
alcançar uma maior conscientização sobre o
tráfico de pessoas e a exploração de crianças
e adolescentes, nos grupos que elaboram as
políticas públicas ou que têm influências na
formulação das mesmas; autoridades nacionais, meios de comunicação, organizações da
sociedade civil, membros das comunidades
e outros.
A mesma campanha foi apoiada pela UNPFA
para a realização de outdoors e aluguel de
espaço para a instalação. Foram instaladas
no endereço: Chaco com Bolívia, Eusebio
Ayala e 22 de setembro.
Com o apoio do Comitê de Equidade e Gênero
da Itaipu Binacional, se realizou um documentário e um guia prático sobre o tráfico de
pessoas, estes materiais até a data seguemse socializando no interior do país, especialmente em oficinas de capacitações. Assim
como a reprodução dos da campanha “Minha
vida vale e não tem preço”
SECRETARIA NACIONAL DA INFÂNCIA E
DA ADOLESCÊNCIA
(SNNA).
SECRETARIA DA
MULHER DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA (SMPR).
GLOBAL INFÂNCIA.
ANISTÍA INTERNACIONAL
POLÍCIA NACIONAL
SECRETARIA NACIONAL DE TURISMO
(SENATUR)
PREFEITURA DE
ASSUNÇÃO
2007-2008
Foram distribuídos panfletos e cartazes.
População em geral
Voltou a passar o spot na TV “Não acredite em
contos de fadas”
OIT-IPEC
SNNA
MOVIMENTO PELA
PAZ, PELO DESARMAMENTO E PELA
LIBERDADE
AGÊNCIA GLOBAL DE
NOTÍCIAS
KUÑA ROGA
Campanha Não Tem Desculpas
População em geral
KUÑA ROGA
PREFEITURA DE
ENCARNACION
Em Encarnación também não tem Desculpas
População de Encarnación
População em geral
4 meses de alta temporada internacional
PARAGUAI
URUGUAI
ORGANIZADORES/
CONVOCANTES
LEMA/CONTEÚDOS
PÚBLICO ALVO
Para que não te enganem
GLOBAL INFANCIA,
GABINETE DA
Concurso de Cartazes entre adolescentes.
PRIMERA DAMA DA
NAÇÃO (DPD)
BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO (BID),
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL PARA AS
MIGRAÇÕES (OIM)
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
Adolescentes de escolas de Caaguazú,
Coronel Oviedo e Encarnación, Departamento
Central e de Assunção
OIM
Cartazes em três idiomas: Aimará, Quéchua
e Espanhol
Linha telefônica de acompanhamento.
Tríplice Fronteira.
DIREÇÃO DE POLÍTICAS DE GÊNERO
DA PREFEITURA DE
ASSUNÇÃO
“ Por uma vida digna: Basta de Tráfico de
Pessoas”
População de Assunção
COMISSÃO DE PREVENÇÃO E DIFUSÃO
DA MESA INERINSTITUCIONAL
2009
Não ao tráfico!
Participantes da festividade de Caacupé.
GLOBAL INFANCIA
SAVE THE CHILDREN
ASSOCIAÇÃO DE COMUNIDADES DE CASTILLA E LA MANCHA
“Para chegar a tempo”.
Referente ao Tráfico e à exploração laboral
Através de rádios comunitárias de Capiatá,
Luque e Mariano Roque Alonso
População de Capiatá, Luque e Mariano
Roque Alonso
PREFEITURA DE ASSUNÇÃO
Portal na WEB com informação sobre o tema
ORGANIZADORES/
CONVOCANTES
LEMA/CONTEÚDOS
PÚBLICO ALVO
ONG Casa Abierta
INMUJERES
Cartaz com recomendações para uma migração segura
Migrantes e migrantes em potencial
ONG Casa Abierta
INMUJERES
Se for viajar, assegure que possa voltar
Migrantes e migrantes em potencial
Mulheres em situação de prostituição
INMUJERES
2011
Com um engano podem te escravizar
População em geral
Mulheres em situação de prostituição
Fontes: informes Nacionais da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai
Fonte: CECRIA. Pesquisa sobre tráfico de mulheres, crianças e adolescentes para fins de exploração sexual no Brasil,
coordenada pelo CECRIA - Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes, 2002, pag.61 (Pesquisa
conhecida como PESTRAF)
61
• Linhas Telefônicas
As campanhas de sensibilização massiva, em geral,
anexam números telefônicos e lugares de contato para
solicitar ou fornecer informação.
A seguir serão mostradas as linhas existentes nos
países da região.
Quadro 7:
Linhas telefônicas
ARGENTINA
BRASIL
MINISTÉRIO DE SEGURANÇA DA NAÇÃO
0800-555-5065
CENTRAL DE ATENDIMENTO À MULHER
LIGUE 180 (atendimento
nacional e internacional,
atualmente em 3 países:
Espanha, Portugal e Itália)
DEPARTAMENTO DE
RESGATE
4331-2223
DISQUE DIREITOS HUMANOS
DISQUE 100
PARAGUAI
URUGUAI
INADI
0800-999.2345
OFAVI/MPF
0800-33-FISCAL
SALTA
0800-444-4488
FUNDAÇÃO MARIA DE
LOS ANGELES
0800-7776466
›Centros de consulta e encaminhamento
Sob este item destacamos os espaços que assessoram
todas as pessoas que solicitam assessoria em relação
ao tráfico de pessoas, qualquer que seja sua vinculação com o problema, informando a respeito dos serviços existentes e recomendando possíveis caminhos a
seguir para sua solução.
lizão de ONG Alto a la Trata y la Explotación Sexual
Infantil da Província de Misiones, que fornecem, entre
seus serviços, assessoria e encaminhamento.
BRASIL
No Brasil, se destacam os seguintes centros de assessoria e encaminhamento:
ARGENTINA
Neste país, tanto os Departamentos de Resgate e
Acompanhamento e os serviços de assistência dos Ministérios de Desenvolvimento Social e dos Ministérios
de Direitos Humanos, assim como os departamentos
do Instituto Nacional contra a Discriminação são espaços de consulta e encaminhamento nas situações de
Tráfico de Pessoas.
Ainda, existe uma ampla cobertura de organizações
não governamentais que colaboram nessa tarefa. Entre
elas, se destacam a Fundação María de los Ángeles, a
Fundação El Otro-Programa Esclavitud Cero e a Coa-
62
• Núcleos estaduais de prevenção e enfrentamento ao
tráfico (NETP’S)
Estes núcleos dependem do Ministério da Justiça e têm
as seguintes atribuições:
- Articular ações com organismos públicos e entidades
civis
- Fornecer informações à Polícia Federal e Civil
- Encaminhar denunciantes aos órgãos policiais
- Encaminhar aos serviços de abrigamento
- Encaminhar aos Centros de Referência de atendimento às mulheres, que dão apoio psicológico às vítimas e trabalham em sua reinserção social.
Atualmente funcionam 15 NETP’s no Brasil, nos Estados do Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Ceará, Bahia,
Goiás, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio
Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e no Distrito
Federal.
- A Casa do Migrante de Foz do Iguaçu também pode
se constituir em um lugar de referência e encaminhamento, mas atualmente não conta com pessoal capacitado para tal. .
• Postos Humanizados de Atendimento aos Migrantes
Estes Postos, denominados Postos Humanizados ou
Postos de Atendimento ao Migrante, funcionam em aeroportos, espaços de trânsito ou em postos hidroviários na região amazônica. Têm como atribuição:
- Prestar atendimento imediato ao migrante
- Atender pessoas identificadas no exterior como vítimas
- Atender pessoas com indícios de serem vítimas de
tráfico que retornam
- Articular com os NETP’s
- Orientaro migrante em partida, assessorando sobre
riscos e direitos
- Atender os migrantes brasileiros não admitidos em
outros países
Atualmente funcionam Postos Avançados em São
Paulo, Belém do Pará, Rio de Janeiro e Manaus.
• Centros de Referência de Atendimento às Mulheres
Estes centros atendem especificamente mulheres vítimas da violência em todos os âmbitos, incluindo o tráfico de pessoas.
Para o retorno, o Ministério de Relações Exteriores em
2010, por meio da Divisão de Assistência Consular do
Itamaraty, elaborou o Guia de Retorno ao Brasil, que
fornece uma lista de instituições de apoio aos recémchegados e têm como foco principal as vítimas de
tráfico de pessoas. Se realizou com o apoio da Polícia
Federal, do Ministério da Justiça e da Secretaria de Políticas para as Mulheres.
URUGUAI
Neste país, a assessoria é realizada principalmente
pelo Departamento de Violência de Gênero do Instituto Nacional das Mulheres, onde funciona um serviço
piloto para o atendimento nestas situações.
Este serviço funciona na capital e recebe consultas dos
organismos de Gênero dos diferentes Departamentos
do país, assim como de outros serviços nacionais e Organizações Não Governamentais, principalmente das
instituições integrantes da Mesa Interinstitucional de
combate ao tráfico de mulheres com fins de exploração
sexual comercial.
Em relação às vítimas no exterior, o Departamento de
Assistência ao Compatriota, da Direção de Assuntos
Consulares e Vinculação constitui-se num lugar de recepção de denúncias e de solicitações de informação
por parte de familiares que se encontram no país ou
através de chancelarias do Uruguai no exterior.
III. Capacitação e Fortalecimento Institucional
Os países destinaram os principais esforços de capacitação aos operadores policiais, de justiça e integrantes
das equipes interdisciplinares de atendimento.
A seguir se destacam as capacitações mencionadas
nos informes nacionais.
PARAGUAI
Neste país, a assessoria e encaminhamento é uma
tarefa que desenvolvem:
• A Direção de Prevenção e Atendimento a Vítimas do
Tráfico de Pessoas
• As Secretarias da Mulher do Governo
• Os Conselhos Municipais da Mulher, distribuídos por
todo o paísen todo el país
63
ARGENTINA
Quadro 8:
: Capacitação e
fortalecimento
institucional
INSTITUIÇÃO
ATIVIDADES E PÚBLICO ALVO
Ministério de
Segurança da
Nação
Capacitação de pessoal que trabalha em Delegacias da Polícia Federal Argentina para a
detecção precoce de casos de tráfico de pessoas na recepção de denúncias
Formação de formadores das Forças Policiais e de Segurança no assunto.
Formação profissional na problemática para os quadros de condução das Forças Policiais
e de Segurança Federais.
Inclusão de um módulo específico sobre o delito de tráfico de pessoas nos cursos de promoção de oficiais e suboficiais das Forças Policiais e de Segurança Federais, assim como
na formação policial inicial.
Departamento
de Resgate do
Ministério
49 capacitações a funcionários judiciais, do Ministério Público, das forças de segurança e
das equipes interdisciplinares, tanto na Capital como nas Províncias.
UFASE
Elaborou material de capacitação para estes cursos
OIM- Programa AVOT
Capacitou operadores judiciais e de segurança.
Conferência em Chubut, junto à Secretaria de Desenvolvimento Humano de Comodoro
Rivadavia
PARAGUAI
BRASIL
Jornadas de Capacitação em Mar del Plata, co-organizadas pelo o Ministério Público da
Nação e Defensoria do Povo da Região do General Pueyrredon.
64
MIDES
Capacitou 1145 operadoras da saúde, da educação, psicólogos, forças de segurança,
operadores do poder judicial e do Ministério Público e Fiscal.
Ministério
de Direitos
Humanos de
Missiones
Capacitou entre 2008 e 2010: 760 forças de segurança e operadores judiciais, 1180 docentes, 120 pessoas das Províncias de Corrientes e Chaco.
Secretaría
Nacional de
Justicia (M.J.)
Desarrollo capacitaciones en san Pablo, Ceará y Rio de Janeiro enre 2003 y 2005.
Secretaria Nacional de
Justiça (M.J.)
Desenvolveu capacitações em São Paulo, Ceará e Rio de janeiro entre 2003 e 2005.
Secretaria Nacional de
Segurança Pública (M.J)
Seminário sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes com fins de exploração
sexual (2004) dirigido a policiais civis, militares, rodoviários e operadores do direito (2004)
Capacitou 400 profissionais da Segurança Pública através de 4 Escritórios regionais.
Implementou a Rede Nacional de Educação a Distância, um dos cursos oferecidos se
refere ao tráfico de pessoas.
Departamento
de Polícia
Federal (M.J)
A Associação nacional de Polícias elaborou um Manual sobre o Tráfico de Pessoas com
fins de exploração sexual, que é utilizado pela Rede Nacional de Educação a Distância
OIM
Capacitações na Ciudad del Este, dirigida a responsáveis pela prevenção, detecção e
investigação do tráfico de pessoas.
OIT – CENIJU
Capacitação a juízes/as, fiscais, defensores, acadêmicos.
GLOBAL
INFANCIA
Capacitações a docentes e pessoal técnico do Ministério da Educação e Cultura e funcionários do sistema de justiça e policial
SMPR-CENIJU-BID
Capacitação a juízes e fiscais de Assunção, Coronel Oviedo, Ciudad del Este e Encarnación.
ITAIPU/
SMPR/OIM
Seminário Internacional sobre Tráfico de Pessoas: Assistência e Reintegração das Vítimas
(nov. 2010)
PUE/SMPR/
CENIJU
Capacitação sobre Detenção do Tráfico de Pessoas dirigida a Funcionários/as a Operadores de Turismo/ (Junho 2011)
CENIJUCENTRO
ENTRENAMIENTO
MINISTERIO
PUBLICOCORTE
SUPREMA DE
JUSTICIA-OIM
Conversa com Juízes Penais de Garantias e Sentenças e Promotores para analisar o
marco legal.
4 oficinas de capacitação a promotores e juízes de Assunção, Central, Ciudad del Este,
Caaguazu e Encarnación, sobre o novo marco normativo de Tráfico de Pessoas.
INSTITUIÇÃO
ATIVIDADES E PÚBLICO ALVO
Seminários sobre Tráfico de Pessoas a atores públicos e privados (2006-2008)
Oficinas de capacitação sobre o tema nos Departamentos do Interior do país (2008-2009)
junto com a Inmujeres.
Seminários de capacitação sobre o Tráfico de Pessoas e Migração (2011)
Seminários Binacionais Abordagem Institucional para a Assistência à Vítimas do Tráfico
de Pessoas. Um foi realizado no Departamento de Colonia em 29-08-09 e o outro em
Montevidéu em 01/09/09.
Atividades dirigidas em geral, ao funcionalismo público e a operadores sociais de todo o
país.
INSTITUTO NACIONAL DAS MULHERES /MIDES- AECID
Oficinas de capacitação em Montevidéu e Departamentos do Interior do País, dirigidos ao
funcionalismo público e a operadores sociais de todo o país.
INSTITUTO NACIONAL
DAS MULHERES -U.E.
Oficinas de capacitação em Montevidéu e Departamentos do Interior do País, dirigidos ao
funcionalismo público e a operadores sociais de todo o país.
URUGUAI
OIM
Os países fortaleceram suas ações protocolando
algumas ações de intervenção, de acordo com o
detalhamento no quadro a seguir:
PAIS
ARGENTINA
PROTOCOLOS REALIZADOS
Quadro 9:
Protocolos
realizados
PROTOCOLOS DE ATUAÇÃO PARA A ASSISTÊNCIA A VÍTIMAS DE DELITOS E PARA
RECEPÇÃO DE SEU DEPOIMENTO. Elaborado pela UFASE e OFAVI. Ministério Público e
Promotoria.
PROTOCOLO DE ASSISTÊNCIA A PESSOAS VÍTIMAS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL INFANTIL
E TRÁFICO DE PESSOAS. Elaborado pela Secretaria Nacional da Infância, Adolescência e
Família. Ministério de Desenvolvimento Social.
LINHAS DE INVESTIGAÇÃO DO TRÁFICO DE PESSOAS. Elaborado pela UFASE e OFAVI do
Ministério Público e Promotoria.
PROTOCOLO DE ATUAÇÃO DAS FORÇAS FEDERAIS PARA O RESGATE DE VÍTIMAS DE
TRÁFICO DE PESSOAS.
GUIA ORIENTADOR PARA A RECEPÇÃO DE DENÚNCIAS EM DELEGACIAS DIANTE DA
POSSÍVEL COMISSÃO DE UM DELITO DE TRÁFICO DE PESSOAS.
PROTOCOLO PARA A IDENTIFICAÇÃO PRECOCE DE SITUAÇÕES DE TRÁFICO DE PESSOAS EM PASSGENS FRONTEIRIÇAS (em processo de elaboração)
PROTOCOLO DE ALOJAMENTO DE VÍTIMAS. Elaborado pela Direção de Participação e
Liderança da Subsecretaria de Igualdade de Oportunidades do Ministério de Direitos
Humanos da Província de Misiones.
CÓDIGO DE ÉTICA HOTELEIRA EM SITUAÇÕES DE TRÁFICO E EXPLORAÇÃO SEXUAL DE
CRIANÇAS E ADOLESCENTES
PARAGUAI
ROTA DE INTERVENÇÃO PARA ATENDIMENTO NA PRIMEIRA E SEGUNDA ABORDAGEM.
URUGUAI
PROTOCOLO DE ATUAÇÃO PARA A ABORDAGEM DE TRÁFICO DE MULHERES,CRIANÇAS
E ADOLESCENTES COM FINS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL NAS EMBAIXADAS E
ESCRITÓRIOS CONSULARES
65
IV. Primeiro atendimento: Resgate, retorno seguro e
voluntário e abrigamento provisório
a atuação do Departamento de Resgate (é o caso, por
exemplo, de Misiones).
Dado que uma das complexidades do tráfico de pessoas está dado pelo fato das vítimas terem sido alienadas das suas redes básicas de proteção e da perda
de possibilidades de sair das redes voluntariamente, a
localização das mesmas (em caso de que se encontrem
desaparecidas), seus resgates, assim como sua proteção imediata e o retorno a seu país de origem – se
for o caso – são etapas cruciais nas ações de enfrentamento ao tráfico de pessoas.
Em Salta e Chubut foram criados os Departamentos de
Resgate e Acompanhamento de Pessoas Danificadas
pelo delito de Tráfico de Pessoas em âmbito provincial,
com competência nos procedimentos em que intervêm
a polícia federal, dependentes da Secretaria de Direitos
Humanos do Ministério de Governo, Segurança e Direitos Humanos de Salta e da Secretaria de Direitos Humanos e da Família, de Chubut, respectivamente.
IImplica em que os Estados assumam uma forma diferente da tradicional na investigação dos fatos, promovendo ações proativas e não só reativas à apresentação
explícita do fato ante a autoridade, que prevejam mecanismos para resgatá-las de forma segura e alojá-las e
protegê-las de possíveis represálias.
Com fins de analisar as respostas institucionais nestas
situações, estudam-se os seguintes itens:
• Equipes especializadas para a localização e resgate
das vítimas,
• Serviços de alojamento e abrigamento provisório,
• Regularização da documentação de identificação e de
viagem,
• Programas de retorno seguro e voluntário, e
• Direito à permanência no país.
Na Província de Neuquén, o Centro de Atendimento às
Vítimas do Delito (CAVD) atende situações de tráfico de
pessoas (entre outras) derivados da Justiça Federal.
De modo semelhante aos Departamentos de Resgate
e Acompanhamento, logo da prestação de depoimento
à justiça o atendimento das vítimas é encaminhado ao
Ministério de Desenvolvimento Social.
As forças de segurança que participam na localização e
resgate das vítimas são integrantes das Divisões Especializadas em Tráfico da Polícia Federal, Guarda Nacional, força de segurança policial e Polícia de Segurança
Aeroportuária.
No caso do Ministério de Segurança, a informação é
recopilada pelas Forças Policiais e de Segurança Federais utilizando critérios estipulados pelo Sistema Integrado de Informação Criminal do Delito de Tráfico de
Pessoas (Sis Trata).
ARGENTINA
Neste país, esta etapa é de responsabilidade do Departamento de Resgate e Acompanhamento de Pessoas
Danificadas pelo delito de Tráfico de Pessoas, com competência nacional, dependente do Ministério da Justiça
e Direitos Humanos da Nação. Este Departamento está
integrado por uma equipe interdisciplinar, formada por
profissionais da psicologia, trabalho social, ciência política e direito.
Sua função é fornecer atendimento e assistência às
vítimas do delito de tráfico de pessoas durante o resgate das mesmas, e até a recepção do depoimento na
sede judicial. Articula suas ações com o Ministério da
Segurança, através das Forças Policiais e de Segurança
Federais. Durante as buscas, sua tarefa é garantir que
seja realizada a correta identificação e tratamento das
vítimas que se encontram nos centros de exploração.
Posteriormente, oferece um lugar seguro (casa abrigo)
com atendimento e acompanhamento especializado
até a declaração testemunhal.
Em varias províncias foram criadas equipes locais para
66
› Retorno Seguro e Voluntário
Uma importante ferramenta para garantir a voluntariedade do retorno é o fato da legislação Argentina não
exigir o retorno das vítimas de tráfico a seus países de
origem.
A Área de Prevenção da Exploração Sexual e Tráfico da
Secretaria de Infância e Família do Ministério de Desenvolvimento Social da Nação desenvolve ações para
garantir o retorno seguro e voluntário. Em especial,
desenvolve ações de colaboração e cooperação recíproca com o Paraguai, Colômbia, República Dominicana e a Organização Internacional para as Migrações.
Também se ocupa de facilitar a coordenação com os
consulados para a regularização dos documentos de
identidade e viagem das vítimas.
Na Província de Misiones, a coalizão de ONGs “Alto a la
Trata y la explotación sexual” assinou uma carta acordo
com o Consulado do Paraguai para a repatriação de pa-
raguaios/as menores de idade.
Ainda, o programa AVOT da OIM oferece assistência
integral às vítimas de tráfico, incluindo: abrigamento
seguro e protegido com provisões básicas para a vida
diária, assistência jurídica psicossocial e médica, regularização da documentação e articulação dos meios
necessários para o retorno voluntário em condições de
segurança. De 2005 a 2009 deu assistência a 456 vítimas na Argentina, 190 vítimas de exploração sexual.
BRASIL
Nos casos de tráfico internacional, a autoridade para
a localização das pessoas e resgate é da Polícia Federal, que desenvolve ações de inteligência. Coordenou
investigações com os países de destino (destacam-se
Espanha, Portugal e Alemanha). Se a situação referese ao tráfico interno, a Polícia Federal trabalha conjuntamente com a Polícia Estadual.
Os Postos de Atendimento aos Migrantes e os Núcleos
Estaduais facilitam o retorno das vítimas às suas cidades de origem.
O abrigamento das vítimas nesta etapa não se diferencia do previsto na etapa posterior de atendimento a
médio e longo prazo.
A legislação brasileira prevê o direito das vítimas a residência temporária por até um ano a pedido do Ministério da Justiça e a prorroga por um ano ou transforma
em residência permanente se colabora de forma voluntária.
PARAGUAI
Para a localização e resgate das vítimas, o Vice-Ministério de Segurança do Ministério do Interior conta com
uma Divisão especializada no tema, denominada “Divisão de Tráfico e Paraguaios Desaparecidos.” Ainda,
criaram unidades especializadas da polícia em tráfico
de pessoas em regiões do interior do país, que participam no processo de denúncia e investigação do delito.
URUGUAI
Recentemente foi criado o Departamento de Crime Organizado e INTERPOL. Ali funcionam dois departamentos de especial relevância na temática: o Departamento
de Vigilância e o de Registro e Busca de Pessoas Ausentes. No Departamento de Vigilância conta-se com
uma Seção especialmente responsável pela investigação do Tráfico de Pessoas.
Quando a vítima se encontra em outro país, intervêm a
Chancelaria através dos Consulados Uruguaios,, aplicando um Protocolo e um Roteiro elaborado especificamente para estas situações. São estes departamentos
que oferecerão a documentação e os meios necessários
para a viagem, contando com o apoio, em alguns casos,
do Programa de Retorno Assistido da OIM. Coordenam
suas ações com os serviços especializados da Inmujeres, que se encarrega da recepção das vítimas no país,
garantem o alojamento e o primeiro atendimento.
V. Recuperação física, psicológica e social das vítimas
de tráfico de pessoas
A recuperação integral das pessoas vítimas de tráfico
compreende todas as ações de atendimento para a
plena restituição de seus direitos. Seguindo o Protocolo
de Palermo, inclui, pelo menos:
• Atendimento psicossocial,
• Atendimento médico,
• Alojamento/acesso à moradia,
• Inserção laboral e/ou educativa, e
• Indenização pelos danos sofridos.
ARGENTINA
A assistência psicossocial, o abrigamento das vítimas
posterior ao resgate e a primeira recepção do testemunho estão a cargo da Secretaria da Infância e da
Família do Ministério de Desenvolvimento Social, caso
trate-se de uma vítima estrangeira (tráfico internacional) ou dos respectivos Ministérios em âmbito provincial do lugar de origem da vítima argentina (tráfico
interno).
Não existem serviços de saúde especializados, recorrendo-se aos universais.
Província de Misiones
A Direção Geral de Participação e Liderança da Subsecretaria de Igualdade e Oportunidades do Ministério de
Direitos Humanos da Província de Misiones oferece assistência desde o mecanismo de busca. Além do atendimento psicossocial, oferece alojamento seguro em
três lugares de Misiones: Agrupa, El Dorado e Oberá.
Ainda, conta com um programa para oferecer moradia
econômica às vítimas e capacitação em expressão artística, padaria, jardinagem e horta.
67
Nesta província, também oferece assistência integral
a coalizão de ONG´s “Alto a La Trata y La Explotación
Sexual”.
No âmbito não governamental, a Fundación María de
los Ángeles oferece assistência integral às vítimas e
abrigamento em sua casa-abrigo em todo o país.
BRASIL
Os serviços de atendimento psicossocial são prestados
nos Centros de Referência à Mulher. Nas localidades
onde ainda não existem tais Centros, as vítimas são encaminhadas aos Centros de Referência Especializada
de Assistência Social (CREAS).
O abrigamento no Brasil é de responsabilidade do Sistema Único de Assistência Social em nível de alta complexidade. Não são abrigos dirigidos especialmente a
esta população, mas o objetivo é buscar a capacitação
de suas equipes técnicas para que possam abordar
adequadamente a temática. A respeito do atendimento
em saúde, o mesmo é feito através dos serviços universais, existindo também serviços de saúde especializados em situações de violência contra a mulher.
PARAGUAI
A assistência psicossocial no Paraguai é fornecida
principalmente através da Secretaria da Mulher da
Presidência da República, pela Direção de Prevenção e
Atenção a Vítimas de Tráfico de Pessoas, que oferece
acolhimento e atendimento primário.
Contam com um albergue transitório para mulheres
maiores vítimas de tráfico de pessoas e em alguns
casos para adolescentes, na cidade de Assunção. Organizações não governamentais também oferecem
abrigamento (ONG Luna Nueva para vítimas menores
de 18 anos).
URUGUAI
O atendimento psicossocial das vítimas de tráfico de
pessoas foi desenvolvido a partir do Instituto Nacional
das Mulheres. Ali, conta-se com um Serviço de Atendimento em Violência de Gênero e muito recentemente
foi incorporado um Serviço Piloto de Atendimento a
Mulheres Vitimas de Tráfico de pessoas com fins de exploração sexual.
68
Este novo serviço nacional funciona em convênio com a
União Européia e o Fórum Juvenil (Programa El Faro).
No Uruguai, utiliza-se a rede de abrigos do Ministério
de Desenvolvimento Social. Não são abrigos especializados em situações de tráfico. Utilizam-se os abrigos
existentes para outros fins: situações de rua, de violência doméstica, ou os destinados à pessoa em tratamento médico provenientes do interior do país.
O atendimento de saúde é coordenado com serviços
universais que presta a Administração de Serviços de
Saúde do Estado do Ministério de Saúde Pública, no
marco do Projeto com financiamento da União Européia.
› Indenização econômica da vítima
A indenização econômica das vítimas é um passo fundamental no processo de responsabilização das redes
criminais e também do Estado, em seu papel de garantir os direitos das pessoas afetadas pelo Tráfico de
pessoas. No entanto, na região não existem ainda experiências positivas neste sentido e não foram criados
fundos nacionais para garantir as indenizações. Isto,
considerando que o dinheiro que poderia ser obtido dos
processos de confisco dos bens das redes criminais é
uma soma muito importante que permitiria não só garantir as indenizações econômicas, mas também melhorar a qualidade dos serviços de atendimento.
VI. Acesso à justiça das vítimas de tráfico de pessoas
A Declaração Universal de Direitos Humanos (de
10/12/48), em seu artigo 8 proclama:
“Toda pessoa tem direito a receber dos tributos nacionais competentes remédio efetivo para os atos que
violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.”
Significa que toda pessoa, sem nenhum tipo de discriminação, deve ser ouvida e apresentar petições ou
recursos diante dos organismos encarregados de praticar a justiça, que participe no processo de tomada de
decisões em condições de equidade, com a assessoria
especializada correspondente e que a resposta obtida
seja de qualidade, especializada e em tempo.
Cumprir o dever de garantir o acesso à justiça implica43:
“a) garantir o devido processo, para o qual o Estado
deve levar em conta as desigualdades que existem
devido ao gênero, etnia, idade, deficiência e condição
econômica, etc. e b) estabelecer garantias judiciais que
levem em conta as necessidades de todas as pessoas, a
fim de permitir, entre outras coisas:
• ser parte do processo judicial em condições de igualdade,
• não ser revitimizada no processo judicial,
• ser aceita e protegida como testemunha,
• participar e compreender o processo,
• gozar de serviços de administração justos em equidade e igualdade,
• gozar de informação judicial que oriente as pessoas
usuárias e lhes facilite a tomada de decisões.”
de tráfico e a isenção de sanções migratórias (art. 5 Lei
Integral de Tráfico de Pessoas).
Existe assessoria em serviços especializados de atendimento a vítimas, mas o financiamento não está
garantida , podendo as vítimas recorrer aos serviços
públicos gratuitos (nas universidades, ordem de advogados, etc.).
43. JIMENEZ, Rodrigo y
SANCHEZ, Héctor. El Derecho Internacional y la
Perspectiva de género en la
reforma del Código Procesal
Penal uruguayo. Seminario
Perspectiva de Género en la
legislación penal y procesal
penal. Bancada Bi Cameral
Femenina- UNIFEM En proceso de edición, 2009.
A Fundação El Otro, Programa Escravidão Zero, oferece
assistência jurídica às vítimas e aos operadores do sistema de justiça.
BRASIL
ARGENTINA
Na lei integral de tráfico de pessoas se prevê especialmente o direito das vítimas a:
• Serem informadas do conteúdo e alcances das perícias,
• Reserva de sua identidade,
• Direito à privacidade,
• Serem escutadas e poder participar com interprete e
tradutor se necessário,
• Fornecer testemunho em condições de proteção e
cuidado.
O juiz pode adotar medidas para a proteção das vítimas
e familiares sempre que não impliquem restrição de
direitos nem garantias da vítima, nem privação de liberdade.
É possível a inclusão das pessoas afetadas no Programa de Proteção a Testemunhas, sempre que:
• Solicite ao Juiz,
• Se encontre acreditada em situação de risco,
• O depoimento seja relevante para a investigação,
• A pessoa tenha condições de adaptabilidade ao Programa.
Dentro das possíveis medidas a serem adotadas nestes
programas se encontram:
• custódia pessoal ou domiciliar,
• Alojamento transitório,
• Mudança de domicílio,
• Ajuda econômica por no máximo seis meses,
• Assistência para a reinserção laboral,
• Documentação do nome fictício.
Uma medida especialmente destacável na legislação
argentina para garantir o acesso à justiça pelas vítimas
de tráfico é a não penalização das mesmas por condutas contrárias à lei penal ocorridas durante o período
O Brasil não apresenta a existência de normas dirigidas especificamente às vítimas de tráfico de pessoas.
Em consequência, tampouco está garantida a reserva
das atuações, nem a confidencialidade da identidade da
vítima.
No entanto, contam com programas nacionais de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, aos que
podem aceder as pessoas que se encontram nas seguintes condições:
• Sofrem uma situação de risco atual,
• O risco é consequência direta da sua colaboração no
processo judicial,
• Sua personalidade é considerada compatível com as
exigências do programa,
• Não se encontra privada de liberdade,
• Manifesta sua vontade de ingressar ao programa.
Aquelas que não cumprirem os requisitos, mas se
encontram em situação de risco, têm direito a serem
protegidos pelas forças de segurança, ainda que as
mesmas não tenham as características e alcances dos
programas de proteção a testemunhas.
As defensorias públicas são responsáveis pela assessoria e proteção. Em relação ao idioma, são utilizados
intérpretes voluntários.
PARAGUAI
O Paraguai prevê a prova antecipada como mecanismo
jurídico para facilitar o acesso das vítimas à justiça. Isto
é, a vítima presta depoimento antes do início do processo judicial.
Outras ferramentas de garantia são o depoimento através da Câmara “Gessel”, a reserva de identidade e o
acesso à informação sobre as perícias.
69
As vítimas recebem assessoria jurídica, porém não têm
garantido o direito a serem protegidas no processo judicial.
URUGUAI
O Uruguai prevê uma série de medidas de proteção dos
direitos das vítimas de tráfico de pessoas e seus familiares (art. 13 e 14 da lei 18026 de delitos de danos à
humanidade, genocídios e guerra por remissão da Lei
No. 18.250 de Migração):
• Propor provas,
• Pôr à disposição provas que tenham em seu poder,
• Participar em todas as diligências judiciais,
• Solicitar o reexame do caso, incluindo se for disposto
o arquivo dos antecedentes,
• Solicitar informação a respeito do estado do trâmite.
Estabelecem-se como critérios específicos em todos os
processos referentes a casos de violência sexual e de
gênero:
• Não se requer a corroboração do depoimento da
vítima,
• Não se admite nenhuma evidência relacionada com a
conduta sexual anterior da vítima ou das testemunhas,
• Não se admite utilizar como defesa o argumento do
consentimento,
• O tribunal pode utilizar meios eletrônicos para evitar
a vitimização,
• Deve-se procurar a participação no processo de assessores com conhecimento em situações de violência
sexual e de gênero.
Nos Juizados de Crime Organizado se prevê:
• Proibição de revelar a identidade,
• Representação legal,
• Intérprete,
• Não identificação visual de terceiros alheios ao processo,
• Meios visuais alternativos,
• Proibição de acareação (se são maiores de idade,
deve provar-se a aptidão para a acareação)..
Como medidas de proteção, estes mesmos Tribunais
podem dispor de:
• Proteção física,
• Mudança de domicílio,
• Uso de outro nome,
• Assistência econômica em caso de relocação.
Estas medidas são estendidas não só aos familiares e
testemunhas da vítima, mas também a peritos, colaboradores e outras pessoas próximas à vítima.
VII. Penalização do Tráfico de Pessoas
70
O Protocolo de Palermo define o tráfico de pessoas
como:
“o recrutamento, o transporte, a transferência, o
alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo
à ameaça ou uso da força ou a outras formas de
coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de
autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à
entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios
para obter o consentimento de uma pessoa que tem
autoridade sobre outra para fins de exploração. A
exploração incluirá, no mínimo, a exploração da
prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares a escravatura, a
servidão ou a remoção de órgãos;”
Para além dos debates que esta definição gerou, pela
inclusão dos meios de tráfico de pessoas, é uma definição amplamente ratificada no âmbito das Nações
Unidas e útil como padrão mínimo de referência.
Apresentam-se a seguir os tipos penais previstos em
cada país para sancionar o tráfico de pessoas, os que
têm sido recentemente modificados ou incorporados
na legislação para adequá-la ao Protocolo de Palermo.
ARGENTINA
A tipificação do delito neste país se efetua transcrevendo quase textualmente a definição de tráfico de
pessoas do Protocolo de Palermo: “o recrutamento, o
transporte e/ou transferência, -dentro do país ou para
o exterior- o acolhimento ou a recepção de pessoas,
mediante engano, fraude, violência, ameaça, ou qualquer outro meio de intimidação ou coação, abuso de
autoridade ou de situação de vulnerabilidade, entrega
ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter
o consentimento de uma pessoa que tem autoridades
sobre a vítima, com fins de exploração” (artigos 145
bis e 145 ter do Código Penal na redação dada pela Lei
26.364 do ano de 2008).
As ações penalizadas se referem diretamente à mobilização das pessoas: oferecer (no caso de menores de
idade), capturar, transportar, transferir, acolher, receber. A finalidade é a exploração, incluindo “quando se
promove, facilita, desenvolve ou se obtém proveito de
qualquer forma de comércio sexual”. Quando a vítima
for maior de 18 anos, os meios de execução do delito
devem ser provados: o engano, a fraude, a violência, o
abuso de autoridade, etc. A pena é de no mínimo 3 anos
e no máximo 6 anos, podendo subir para até dez anos
em caso de existirem agravantes.
No caso de vítimas menos de 18 anos, a pena é de no
mínimo quatro anos e no máximo dez anos, com possibilidade de se estender a quinze anos se apresentarem agravantes. Neste caso, a utilização dos meios de
execução não é necessária para que exista o delito de
tráfico, mas constitui um agravante.
Ambos os tipos penais (o tráfico de maiores e de menores de idade) compreendem tanto o tráfico interno
como o internacional.
Como delitos conexos relevantes podem-se assinalar:
promoção e facilitação da prostituição e corrupção de
menores (artigo 125 e 125 bis Código Penal); promoção
e facilitação da prostituição de maiores de dezoito anos
(art. 125 Código Penal); exploração econômica do exercício da prostituição alheia (art. 127 Código Penal);
exploração da prostituição alheia (art.17 Lei de Profilaxia Antivenérea 12.331) e redução à servidão (art. 140
Código Penal).
vidão através de outros tipos penais).
Pune tanto o tráfico interno como o internacional. Não
requer a prova dos meios executivos, se não que estes
funcionam como agravantes.
Da leitura destas disposições, resulta claro que para
penalizar o tráfico de pessoas foi incorporado, ao préexistente delito de promoção da prostituição, os verbos
nucleares previsto no Protocolo de Palermo para o tráfico de Pessoas. Esta forma de legislar em relação ao
tráfico dificulta a tarefa de perseguição e punição do
delito, sendo um obstáculo para sua identificação adequada e diferenciação de outras formas de exploração
das mulheres no comércio sexual. Além disso, é provável que a aplicação deste tipo penal fique manchado
pelos estereótipos e preconceitos contra as mulheres
que se encontram em situação de prostituição.
PARAGUAI
BRASIL
O Brasil tipifica o tráfico internacional e interno de pessoas com fins de exploração sexual.
O tráfico internacional de pessoas com fins de exploração sexual se tipifica com o seguinte texto:
“Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a
saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro.”
“1° Incorre na mesma pena aquele que agenciar,
aliciar ou comprar a pessoa traficada, assim como,
tendo conhecimento dessa condição, transportá-la,
transferi-la ou alojá-la”. (Art. 231 Código Penal na redação dada pela Lei 12.015 de 2009)
O tráfico interno se tipifica incorpora com o seguinte
texto:
“Estende-se esta penalização àqueles que mobilizam
com iguais mecanismos e fins as pessoas dentro do
território nacional, como disposto no (art. 231).
As ações penalizadas são a promoção ou facilitação
da entrada ou saída do país, a mobilização no país, a
captura, o recrutamento, o transporte e a compra das
pessoas traficadas.
A finalidade é o exercício da prostituição ou outra forma
de exploração sexual. Não se tipificam outras formas
de tráfico (no entanto, se penaliza a submissão à escra-
O Paraguai tipifica o tráfico de pessoas com fins de exploração sexual como: :
“1°.- Aquele que, usando de uma situação de constrangimento ou vulnerabilidade de outrem por se
encontrar em país estrangeiro, lhe induza à coação
ao exercício ou à continuação do exercício da
prostituição ou a realização de atos sexuais em si,
com outro ou ante outro, com fins de exploração
sexual...” (art. 129 b. do Código Penal na redação dada
pela Lei 3440 do ano de 2008)
Os verbos nucleares deste delito são induzir ou coagir
e a finalidade é a prostituição ou a realização de atos
sexuais com fins de exploração sexual.
Inclui somente o tráfico internacional, não penaliza o
tráfico interno. Os meios de execução constituem agravantes.
A redação dada a este tipo penal merece a mesma análise que se realizara a respeito do análogo no Brasil.
Os delitos conexos que se destacam são: a redução à
condição de escravidão, o sequestro, o sequestro extorsivo, o favorecimento da prostituição e a gestão de
casas de prostituição.
URUGUAI
O Uruguai tipifica o delito de tráfico de pessoas como:
“Aquele que, de qualquer maneira ou por qualquer
meio participar no recrutamento, transporte, transferência, acolhimento ou recepção de pessoas para
o trabalho ou serviços forçados, para a escravidão
71
ou práticas similares, para a servidão, exploração
sexual, remoção ou extração de órgãos ou qualquer outra atividade que menospreze a dignidade
humana” (art. 79 Lei de Migração No. 18250 de 2008).
As ações penalizadas são o recrutamento, transporte,
acolhimento ou recepção e a finalidade é qualquer atividade que menospreze a dignidade humana, incluindo
explicitamente a exploração sexual.
Penaliza-se tanto o tráfico interno como o internacional. Exclui totalmente a consideração dos meios de
execução para a configuração do ilícito, estes sendo
considerados agravantes.
Os delitos conexos que se destacam são o proxenetismo, a lavagem de dinheiro, os delitos de exploração
sexual e a indução ou promoção da prostituição.
Quadro 10:
penalização do
tráfico de pessoas
PENALIZAÇÃO
AÇÕES
PENALIZADAS
(VERBOS NUCLEARES)
ARGENTINA
BRASIL
a) Oferecer (menores
de idade)
a. promover ou
facilitar a entrada ou
a saída do território
nacional ou a mobilização dentro do país
b) Capturar
c) Transportar
d) Transferir
e) Acolher
f) Receber
FINALIDADE DA
EXPLORAÇÃO
-Escravidão ou
servidão ou práticas
análogas.
- Trabalhos ou serviços forçados.
PARAGUAI
a. coagir
a. recrutar
b. capturar
b. transportar
c. induzir
c. transferir
d. acolher
b. capturar (agenciar),
recrutar, comprar,
transportar, transferir ou alojar (tendo
conhecimento da
situação)
e. receber
- Exercer prostituição
- Exploração sexual
- Outra forma de
exploração sexual
comercial
- Prostituição ou
permanecer nela
-Proveito de qualquer
forma de comércio
sexual.
- Escravidão /servidão/trabalho forçado
- Extração não
consentida de seus
órgãos.
-Extração ilícita de
órgãos ou tecidos
humanos.
72
URUGUAI
- trabalho ou serviços
forçados,
-escravidão ou práticas similares,
-servidão,
- exploração sexual,
-remoção e extração
de órgãos
-qualquer outra atividade que menospreze
a dignidade humana.
ÂMBITO
INTERNO E
INTERNACIONAL
INTERNO E
INTERNACIONAL
INTERNACIONAL
INTERNO OU
INTERNACIONAL
MEIOS
Requer prova dos
meios de execução
(que invalidam o
consentimento), salvo
relacionado a vítimas
menores de 18 anos
de idade
Não requer prova de
meios (são agravantes)
Requer prova de
ausência de consentimento
Não requer prova de
meios nem de falta de
consentimento
PENALIZAÇÃO
PENA
ARGENTINA
PENA
Vítimas
maiores de idade: 3 a
6 anos.
Agravantes: 4 a 10
anos quando:
a) vínculo familiar/
afetivo/autoridade
b) for cometido por
um ministro de um
culto reconhecido ou
não ou um funcionário
público
c) pluriparticipação
d) as vítimas forem
três ou mais.
Vítimas menores de
idade: 4 a 10 anos.
Agravantes: 6 a 15
anos quando:
a) mesmos agravantes
de quando a vítima é
maior de idade
b) se utilizar algum
dos meios executores
DELITOS CONEXOS
a. Promoção e facilitação da prostituição
de menores e maiores de idade
b. Promoção e facilitação da corrupção de
menores de idade
c. Exploração econômica do exercício da
prostituição alheia
d. Exploração da
prostituição alheia
BRASIL
PARAGUAI
3 a 8 anos
Mínima: não prevista
Agravantes: 4 e meio
a 12 anos
a. menor de 18 anos
b. não discernimento
c. relação de familiaridade
d. obrigação de cuidado ou vigilância
e. violência grave,
ameaça ou fraude.
Máxima: até 8 anos
Agravantes: até 12
anos
a. força, ameaça ou
engano
b. vítima menor de
catorze anos;
c. maus tratos físicos
graves ou um perigo
para a vida.
Vantagem econômica: d. atuou comermulta
cialmente ou como
membro de uma quadrilha que se formou
para a realização dos
fatos
URUGUAI
4 a 16 anos- participantes
2 a 8 anos- facilitam
ou favorecem
Agravantes: (aumentam de um terço à
metade)
a) pôr em risco de
saúde ou a integridade física dos e das
migrantes,
b) menor de 18 anos,
Não sei se traduz
como deficiência ou
discapacidade
c) funcionário policial,
pessoa a cargo da segurança, custódia ou
controle de migração,
d) habitualidade/familiaridade
a. Redução à condição Exploração da prostide escravos
tuição alheia
a. Lavagem de Dinheiro
b. Extorsão. Extorsão
mediante sequestro
b. Exploração sexual
de crianças.
c. Recrutamento com
fins de emigração
c. Proxenetismo
Indução ou promoção
do exercício da prostituição no país ou no
exterior.
d. Favorecimento da
prostituição
e. Casa de prostituição
e. Redução à servidão.
VIII. Repressão ao delito de tráfico de pessoas
A repressão ao delito gerou mudanças institucionais
nos âmbitos da justiça e investigação de todos os países,
que têm como objetivo melhorar as investigações policiais e a proteção das vítimas nos processos judiciais.
ARGENTINA
Todas as Forças Policiais e de Segurança Federais têm
unidades específicas para a investigação do tráfico a
nível provincial em 18 das 24 províncias. Através da implantação de Protocolos e guias de atuação, o ministério
de Segurança da Nação tende a otimizar a atuação das
Forças no que se refere à detecção precoce, à eficácia
das investigações e à proteção dos direitos das vítimas.
No âmbito das Promotorias, contam com uma Unidade
de Promotoria de Assistência em Sequestros Extorsivos e Tráfico de Pessoas (UFASE). Esta unidade presta
assistência ao Promotor durante a instrução penal e a
preparação do julgamento oral (sempre que o magistrado assim o solicite, sob suas diretivas).
No Ministério Público da Província de Buenos Aires foi
criada a Comissão de coordenação e seguimento dos
delitos conexos ao tráfico de pessoas (Res 724/2010),
de forma a otimizar a investigação do delito. Até o momento proporcionaram informações das províncias de
Santa Fe, Tucumán e Misiones.
É destacável as ações tanto do Ministério Público Fiscal
Nacional como da Província de Buenos Aires, as quais,
através de protocolos e diretrizes de boas práticas,
buscam melhorar a intervenção em casos de tráfico de
73
45. PESTRAF. Pesquisa
sobre o Tráfico de Mulheres,
Meninas e Adolescentes para
fins de exploração sexual
no Brasil, coordenada pelo
CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre
Crianças e Adolescentes,
em 2002.
pessoas, tanto em relação à proteção dos direitos das
vítimas, como em relação à efetividade da perseguição
penal.
que trabalham no exterior trabalhando em coordenação com a polícia dos países de destino e com os
consulados brasileiros.
Por outro lado, para facilitar a investigação do delito
são previstos mecanismos como a possibilidade de
escutas telefônicas e a possibilidade de reduzir a pena
de atores (participantes ou encobridores) que revelem
informação a respeito de pessoas com maior nível de
responsabilidade penal.
Entre 2004 e 2010 foram realizadas 22 operações especiais de desmantelamento de redes de tráfico com fins
de exploração sexual no exterior.
URUGUAI
BRASIL
O delito de tráfico internacional é de competência dos
Juízes/as, Promotores/as e Forças Policiais Federais.
A perseguição do delito de tráfico interno corresponde
aos Juízes/as e Promotores/as Estaduais. A Polícia Federal, nestes casos, coordena ações com a Polícia Estadual.
Para a melhor perseguição do delito, o Brasil criou
um Banco de dados na Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça com informação sobre
os casos de tráfico de pessoas (perfil das vítimas, localidades de maior incidência, perfil das organizações
criminais, dados sobre os processos de investigação e
condenação sobre tráfico de pessoas). Também realizou investigações para mapear as rotas de tráfico no
Brasil – PESTRAF (2002); “Tráfico de Seres Humanos
com fins de exploração sexual no Rio Grande do Sul”
(2006), financiado pela Secretaria Nacional de Justiça
e “Promovendo Parcerias transnacionais: prevenção e
resposta ao tráfico de pessoas do Brasil nos estados
membros da União Européia” (2009).
Existem adidos policiais da Polícia Federal do Brasil
que trabalham no exterior trabalhando em coordenação com a polícia dos países de destino e com os
consulados brasileiros.
Entre 2004 e 2010 foram realizadas 22 operações especiais de desmantelamento de redes de tráfico com fins
de exploração sexual no exterior.
PARAGUAI
No âmbito da promotoria, atuam as Unidades Especializadas em Tráfico de Pessoas e Exploração Sexual
Infantil, com autoridade nacional, que agem conjuntamente com a Promotoria de Assuntos Internacionais.
Existem adidos policiais da Polícia Federal do Brasil
74
No Uruguai funcionam dois juizados, duas promotorias e duas defensorias públicas com competência em
crime organizado, no qual está incluído o tráfico de
pessoas.
Para a investigação se conferem prerrogativas especiais aos investigadores, como escutas telefônicas,
interceptação de comunicações e a figura do agente
encoberto. Ainda, se prevê a possibilidade de redução
de pena aos atores, cúmplices ou encobridores que forneçam informação relevante.
› Cooperação Internacional para a Repressão ao delito
Este tema é de extrema importância, mas a informação
obtida não resulta suficiente para fornecer um panorama completo neste informe. De qualquer forma, é
relevante indicar que os países assinalaram a utilidade
de:
• Iber Red como um sistema que facilita a investigação
dos delitos.
• Convênio de guarda com polícias da Bolívia, Paraguai
e Chile.
• Protocolo de Intervenção conjunta Argentina, Brasil
e Paraguai.
• Investigações conjuntas entre países de origem e
destino do tráfico de pessoas.
CAPÍTULO 8
CONCLUSÃO
O tráfico de mulheres
com fins
de exploração sexual foi reconhecido e visualizado
como um problema na região recentemente. Apesar
disso, conseguiu-se desenvolver ações de prevenção,
atenção, combate e enfrentamento a este crime em
todos os países da região.
A partir da ratificação do Protocolo de Palermo, foi dada
continuidade à construção de respostas institucionais
ao enfrentamento do Tráfico de Pessoas.
– construção de rodovias, florestamento massivo,
construção de portos de grande porte, instalação de
fábricas, entre outras - em que o impacto gerado é a
migração do campo para as zonas urbanas, colocando
as mulheres em condições de grande vulnerabilidade
em relação às redes de tráfico.
• Fatores vinculados a barreiras migratórias nos países
de destino.
• A permeabilidade de passagens em fronteiras de toda
a região do MERCOSUL e a existência de população não
documentada em algumas zonas da região.
As vítimas são, em sua maioria, mulheres entre 15 e
35 anos. Cada vez mais se observa a captação de mulheres trans. Os grupos mais vulneráveis ao tráfico são
as mulheres provenientes de povos originários e zonas
rurais.
São identificadas na região rotas de tráfico interno e
internacional.
8.1. Características do tráfico
na região
Ainda não foi possível estabelecer a magnitude do
problema a nível regional, uma vez que os dados com
os quais se trabalha são parciais. Permitem, no entanto, obter a caracterização do problema, ainda que
não seja possível medir a sua amplitude. É necessário
um esforço a nível regional para o desenvolvimento de
pesquisas que permitam quantificar o tráfico no MERCOSUL.
A região do MERCOSUL constitui uma região majoritariamente de origem e destino, e, em menor escala, de
trânsito.
Identifica-se na região uma diversidade de fatores de
vulnerabilidade que compõem cenários favoráveis à expansão das redes de tráfico.
• Fatores vinculados a dimensões socioculturais como:
inequidade de gênero, violência de gênero - abuso
sexual e violência doméstica, discriminação de determinados grupos sociais – povos indígenas, afrodescendentes, indivíduos trans-.
• Fatores vinculados a dimensões socioeconômicas
como a exclusão social e a pobreza, o impacto social
e os modelos de desenvolvimento existentes na região
No tráfico, as vítimas são, sobretudo, adolescentes.
Nos casos de tráfico internacional a maiorias das vítimas são adultas, embora tenham sido detectados
casos de pessoas menores de 18 anos viajando com
documentação falsa.
Existem circuitos e rotas de tráfico que identificam o
MERCOSUL como uma região predominantemente
de origem ou abastecedora de mulheres para destino
como Europa, Estados Unidos e Ásia.
A Espanha é identificada como o principal país de destino do tráfico internacional, assim como a Itália é identificada como um país de destino do tráfico de mulheres
trans.
Ainda, a região é considerada destino e trânsito de
mulheres de outros países latino-americanos e dos
próprios países da região, sobretudo Brasil e Argentina.
Em relação a rotas de tráfico dentro da região, os países
do MERCOSUL são países de destino de vítimas provindas da própria região ou de outros países da América
Latina, como é o caso das mulheres colombianas e dominicanas.
As redes de tráfico identificadas na região são grupos
de delinquência organizada, integrados por atores que
75
cumprem papéis diversificados em função das diferentes etapas do processo de tráfico.
As redes operam com dinâmicas e modalidades distintas, existindo redes mais complexas, de caráter transnacional, que incluem nas atividades criminais o tráfico
de drogas e de armas.
Existem também redes menos sofisticadas com uma
composição basicamente familiar, com atores que
cumprem diferentes papéis no processo e que têm
membros ativos (atores primários e secundários) em
diferentes zonas e territórios. Estas redes podem ter
conexão com as redes de maior complexidade.
A captura mediante engano é o meio principal de recrutamento na região, seja o engano no tipo de trabalho a
se desenvolver no país de destino, seja o engano das
condições do trabalho a ser desenvolvido.
O sequestro é um método utilizado com menos frequência nos países da região.
Na maioria dos países, as vítimas viajam custodiadas
pelo traficante ou recrutador. A viagem pode incluir
várias etapas e destinos, e uma vez chegado ao país de
destino, o transporte aos locais de exploração é feito
por via terrestre. Nesta etapa, os sistemas de transporte podem cumprir papéis no translado. Os meios
utilizados vão desde linhas regulares de transporte
aéreo e terrestre, caminhoneiros, taxistas, utilização de
lanchas para adentrar fronteiras, utilização de diversos
veículos particulares ou a pé.
As vítimas podem estar alojadas nos locais de exploração ou serem alojadas em lugares diferentes, em
casas ou apartamentos onde se alojam outras vítimas
da mesma nacionalidade ou de outras.
8.2. Respostas Institucionais
Os caminhos seguidos por cada país são diversos, tanto
em relação às modalidades do enfrentamento ao tráfico, como nos mecanismos utilizados para tal.
A Argentina destinou seus principais esforços para enfrentar as formas de tráfico de pessoas nas quais a exploração ocorre dentro do seu território, dando ênfase
ao resgate das vítimas e a articulação de retorno das
mesmas, quando assim desejarem, a seus lugares de
origem. Ainda, recentemente aprofundaram os esforços tendentes a: articulação interinstitucional para a
prevenção e investigação do delito; capacitação e profissionalização das Forças Policiais e de Segurança;
unificação e sistematização dos critérios de registro da
informação; implementação de campanhas de conscientização e difusão dos canais de denúncia; detecção
precoce de casos de tráfico de pessoas e o atendimento
adequado às vítimas tanto em passagens fronteiriças
internacionais, quanto em delegacias da Cidade Autônoma de Buenos Aires.
O Brasil aprovou importantes documentos de Política e
Planos de ação, aprofundou a investigação das rotas de
tráfico e a articulação das ações de investigação e prevenção com países do exterior, assim como na geração
de espaços para a detecção precoce das situações potenciais de tráfico.
O Uruguai, conta com um serviço piloto nacional de
atendimento a mulheres adultas vítimas de tráfico com
fins de exploração sexual.
O Paraguai y Uruguai criaram espaços de articulação
interinstitucional permanentes em que são acordadas
as ações a seguir.
É comum a rotatividade frequente de lugares de exploração em uma cidade ou em diferentes cidades e
países. Podem ser vendidas a outras redes no país e
serem transladadas a outros lugares.
Em toda a região foram realizadas campanhas de sensibilização e informação à população e foi reformada a
legislação.
Durante o processo de exploração, as vítimas são obrigadas a colaborar ou a participar de ilegalidades administrativas ou penais, como ingresso ou permanência
irregular no país, o uso de identidades falsas, o tráfico
de drogas e a captura ou custódia de outras vítimas.
I. Políticas públicas
Nem todos os países da região contam com leis integrais, Políticas e ou Planos Nacionais de ação.
A Argentina se destaca por ter aprovado uma lei de enfrentamento ao tráfico de pessoas que não se restringe
à penalização da mesma, mas que incorpora os principais direitos das vítimas e as correspondentes responsabilidades dos organismos do país.
O Brasil aprovou Políticas Nacionais, Planos Nacionais
e Planos Estaduais de enfrentamento ao Tráfico de
76
Pessoas, transversalizando suas ações nas diferentes
instituições do país.
O Paraguai se encontra em processo de aprovação de
um Plano nacional e conta com uma Mesa Interinstitucional que desenvolve ações de prevenção, capacitação,
protocolização de ações e articulação entre os diferentes serviços e poderes do Estado.
O Uruguai também conta com uma Mesa Interinstitucional e iniciou recentemente um Programa para o
fortalecimento das políticas públicas de Tráfico de Pessoas com fins de exploração sexual. Destacam-se os
avanços deste país na legislação para a proteção das
vítimas e perseguição do delito.
Os mecanismos de gênero estão especialmente envolvidos nas respostas ao tráfico de pessoas, com exceção
da Argentina; no entanto, a perspectiva de gênero não
aparece suficientemente priorizada nas campanhas
de sensibilização, nas capacitações nem na normativa
para o acesso à justiça das vítimas de tráfico.
II. Visibilização do delito e informação à população
A principal estratégia para a visibilização do delito e informação à população tem sido o desenvolvimento de
campanhas de sensibilização. Estas campanhas enfatizam a conceitualização do fenômeno em termos de direitos humanos e combate à impunidade e nos fatores
a levar em conta por potenciais vitimas para preveni-lo.
Oferecem lugares ou telefones de contato para a denúncia de eventuais situações de tráfico.
São quase nulas as campanhas dirigidas aos consumidores do comércio sexual.
Tampouco é feita referência específica à população
trans como grupo vulneráveis ao tráfico de pessoas.
A Argentina e o Brasil contam com linhas telefônicas
gratuitas para a população em geral, com cobertura
nacional.
No Brasil se avançou muito, especialmente na criação
de espaços de assessoria através dos Núcleos Estaduais e dos Postos de Atendimento, com assessoria
aos migrantes nos aeroportos, portos e terminais rodoviários.
III. Capacitação e fortalecimento institucional
Foram desenvolvidas ações de capacitação dirigidas
aos operadores do sistema de justiça (juízes/as, promotores/as, forças de segurança) e às equipes técnicas
que se ocupam do atendimento e/ou acompanhamento
das vítimas. No entanto, estas capacitações não conseguem constituir-se em programas sistemáticos e contínuos de capacitação integral no tema.
Foram protocolizadas algumas ações importantes no
processo de enfrentamento ao tráfico de pessoas, seja
para a articulação ou para a atuação de determinados
operadores. Os protocolos que foram acordados são
especialmente ricos no enfoque que dão ao gênero e
aos direitos.
IV. Primeiro atendimento: resgate, retorno seguro e
voluntário e abrigamento provisório.
Nem todos os países contam com equipes especializadas para a localização e resgate das vítimas, serviços de abrigamento e abrigo provisório, programas
de regularização de documentos de identificação e de
viagem, retorno seguro e garantias para assegurar
o direito das vítimas à permanência no país em que
foram resgatadas.
O modelo mais acabado para a abordagem desta etapa
é o da Argentina, principalmente através dos Departamentos de Resgate e Acompanhamento às pessoas
danificadas pelo Tráfico.
Nos demais países, a resposta nesta etapa é dada utilizando serviços universais que se encontram em processo de capacitação para uma intervenção adequada.
V. Recuperação física, psicológica e social das vítimas
de tráfico de pessoas
As ações para a recuperação integral das vítimas de
tráfico são incipientes e fragmentadas na região.
O principal serviço oferecido é o atendimento psicossocial. O atendimento médico é garantido pelos serviços
universais, mas, em geral, ainda não contam com especialização suficiente no tema. O acesso à moradia, à
educação e ao trabalho e a indenização econômica são
temas pendentes na região.
VI. Acesso à justiça
O acesso à justiça das vítimas não conseguiu ainda o
padrão assinalado pelas normas internacionais.
Para garantir o acesso à justiça é necessário, em primeiro lugar, garantir a aplicação e efetividade das medidas de proteção, assim como o tratamento adequado
às vítimas em processo judicial.
77
A legislação na região não é uniforme em relação à
garantia da preservação da identidade, à confidencialidade e à proibição de acareação e enfrentamentos com
o agressor.
Ainda, com exceção da Argentina, não existem normas
legislativas expressas que isentem penalmente as vítimas dos delitos nos quais se teria feito incorrer durante
o processo de tráfico.
O Uruguai aprovou uma regulamentação na qual se
destacam as normas para garantir a participação ativa
das vítimas em condições de segurança..
As medidas de proteção estão condicionadas à denúncia e à colaboração com a justiça.
O Paraguai não conta com patrocínio jurídico gratuito,
e, se por um lado, as vítimas têm acesso ao processo
penal e contam com serviços de Promotoria Especializados, o acesso a outras esferas judiciais está condicionado economicamente.
VII. Penalização
Todos os países incorporaram tipos penais que punem
o tráfico internacional de pessoas com fins de exploração sexual. Com exceção do Paraguai, também incorporam a tipificação do tráfico interno com estes fins.
Os tipos penais aprovados para esta figura requerem
ainda uma revisão para sua melhoria. Em especial, se
assinala a forma de descrever a conduta na legislação
do Brasil e do Paraguai, a qual mantém os modelos tradicionais de combate à prostituição, obstaculizando a
superação dos preconceitos e estereótipos machistas
em relação às mulheres vítimas.
Tanto na Argentina como no Brasil, é exigida a prova dos
meios para a penalização (salvo com relação a vítimas
menores de 18 anos de idade), sendo que toda forma
de submissão das pessoas ao tráfico, de forma análoga
à escravidão, deve ser perseguida penalmente, ainda
quando possa caber a possibilidade de considerar que
existiu alguma forma de consentimento da vítima para
cair ou permanecer nesta situação.
VIII. Repressão ao crime
Para a perseguição do crime, os países da região criaram brigadas policiais especializadas, mas nem todas
criaram ações de investigação proativa e de alta complexidade.
78
O delito de tráfico de pessoas é considerado delito federal na Argentina e também no Brasil; o último, somente
quando se refere ao tráfico internacional.
A Argentina, o Paraguai e o Brasil criaram Promotorias
e equipes técnicas especializadas para o julgamento
em situações de tráfico de pessoas.
O Uruguai criou Juizados, Promotorias e Defensorias
com competência sobre crime organizado, incluindo o
tráfico de pessoas e a exploração sexual de crianças e
adolescentes.
CAPÍTULO 9
RECOMENDAÇÕES
a. Dar ênfase a campanhas de sensibilização dirigidas à
demanda de comércio sexual.
b. Incluir a população trans nas campanhas contra o
tráfico com fins de exploração sexual.
Realizar pesquisas
nacionais e regionais que permita abordar a dimensão quantitativa
do tráfico de mulheres no MERCOSUL,aprofundar na
caracterização do problema, atualizar as rotas existentes na região e os conhecimentos sobre as zonas mais
vulneráveis (como as zonas de captura) e compilar informação sobre os clientes que sustentam a demanda.
Estabelecer um programa regional de assistência a
vítimas do tráfico no MERCOSUL que promova a articulação de ações na detenção, atendimento, retorno e
repatriação, assim como na fase de restituição de direitos.
Gerar continuamente espaços de intercâmbio de boas
práticas e lições aprendidas na região com objetivo de
colaborar com os países no fortalecimento das respostas brindadas às vítimas do tráfico.
I. Políticas públicas
Buscar a aprovação de leis integrais e Planos Nacionais
para o enfrentamento do tráfico de pessoas com fins de
exploração sexual, incluindo os princípios, diretrizes e
ações de prevenção, proteção e reparação dos direitos
das vítimas e a criminalização e repressão das redes
criminais.
Garantir o enfoque de gênero e a participação da sociedade civil e dos organismos de políticas para as mulheres nestas leis e Planos Nacionais.
Fortalecer os serviços de detecção precoce das possíveis situações de tráfico de pessoas, como centros de
assessoria, linhas telefônicas, etc.
· Criar em todos os países serviços de denúncia e assessoria por linhas telefônicas gratuitas.
· Potencializar as linhas telefônicas, habilitando para a
colaboração do enfrentamento ao tema no âmbito regional.
· Assegurar que a assessoria e o atendimento não se
encontrem condicionados à apresentação da denúncia
para a perseguição do delito.
· Incorporar a perspectiva de gênero em todas as ações
de detecção.
III. Capacitação e fortalecimento institucional
Buscar realizar planos sistemáticos e integrais de capacitação.
Garantir a introdução da perspectiva de gênero e da
diversidade sexual em todas as capacitações para
enfrentamento do crime de tráfico de pessoas e dos
crimes correlatos (exploração sexual, proxenetismo,
etc.).
Ampliar o público alvo das capacitações, incluindo a
rede de atendimento em saúde, atores comunitários,
docentes e estudantes, entre outros.
Fortalecer as ações de capacitação sobre os efeitos do
tráfico de pessoas e da violência sexual e os modelos de
atendimento às vítimas.
Sistematizar as investigações realizadas nos diferentes países e buscar modelos comparáveis de pesquisa
social.
II. Visibilização do problema e informação
Criar uma biblioteca comum na região, em um portal
da web, em que se possa compartilhar o material produzido pelos países, nos temas de pesquisa social, capacitação, sensibilização e protocolos de ações.
Desenvolver campanhas comuns de sensibilização na
região e nos países de destino das vítimas.
Desenvolver pesquisas sociais com ênfase nos direitos
das vítimas.
Capacitar os operadores dos serviços de identificação
com ênfase na escuta das possíveis vítimas e suas famílias, informação e assessoria, respeito às decisões
das vítimas e a proteção de seus direitos.
79
IV. Primeiro atendimento: resgate, retorno seguro e
voluntário e abrigamento provisório.
Criar em todos os países dispositivos suficientes, seguros e de qualidade para a intervenção nesta etapa,
com ênfase nas zonas de fronteira e em outros lugares
vulneráveis ao tráfico de pessoas.
Incluir as vítimas do tráfico de pessoas nos planos sociais de equidade.
• Não condicionamento das medidas de proteção à colaboração das vítimas na investigação do crime.
• Garantir o direito da vítima em ser escutada pelo tribunal, apresentar provas e solicitar a revisão no caso de
arquivamento do caso.
Garantir assessoria e financiamento (defesa) legal, gratuito e obrigatório das vítimas de tráfico de pessoas.
Incorporar equipes de assessoria em gênero e violência
sexual a promotores, juízes e defensores das vítimas e
acusados.
V. Recuperação física, psicológica e social das vítimas
Fortalecer os serviços de atenção psicossocial, incluindo no público alvo indivíduos trans.
Fortalecer a capacitação dos profissionais da área
social e de saúde mental em tratamentos especializados a vítimas que sofreram este tipo de violência.
Fortalecer las acciones para dar respuesta a la adecuada reintegración familiar, social y laboral.
Revisar as legislações nacionais para a adequação dos
tipos penais à figura prevista no Protocolo de Palermo,
levando em consideração as inequidades de gênero.
VIII. Repressão ao delito
Fortalecer as ações para dar resposta adequada à reintegração familiar, social e laboral.
Fortalecer a capacidade das promotorias, tribunais e
defensorias de atenderem à complexidade deste tipo
de caso, equipes técnicas e de investigação.
Incorporar a legislação que garanta que o dinheiro proveniente do crime de tráfico de pessoas seja retornado
para a reparação das vítimas, ações de prevenção ao
crime e capacitação dos operadores.
Fortalecer as brigadas policiais, garantindo a formação
no enfrentamento a crimes sexuais e ao crime organizado, e com pessoal de alta confiança ética.
Promover reparação que incida não somente sobre os
danos provocados pelo crime, mas também sobre suas
causas.
Promover a sistematização da informação obtida nos
diferentes organismos de investigação do crime e de
colaboração interinstitucional com os países do exterior para aumentar a efetividade das investigações.
VI. Acesso à justiça
Aprofundar em pesquisa de qualidade sobre os crimes
ligados ao tráfico: prostituição forçada, exploração
sexual de crianças e adolescentes, proxenetismo,
crimes de violência sexual não comercial, corrupção
vinculada a crime de migração, lavagem de dinheiro,
tráfico de drogas e outros tipos de tráfico de pessoas.
Garantir o financiamento jurídico gratuito e especializado a todas as vítimas do tráfico.
Buscar respostas judiciais justas e oportunas, que eliminem todas as formas de discriminação de gênero.
Fortalecer o acesso à justiça pelas vítimas com medidas como:
• Não criminalização das vítimas pelos crimes cometidos no processo de tráfico de pessoas.
• Isenção da prova dos meios violentos, cujo resultado
tenha sido a exploração.
• Possibilidade processual de adiantamento da prova
quando o tempo do processo pode prejudicar a recuperação da vítima.
• Proibição de realizar acareação ou outro tipo de confrontação entre vítima e acusado.
• Proibição de investigar a respeito da vida sexual anterior ou atual da vítima.
80
VII. Penalização
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81
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os temas da Mulher em Âmbito Internacional, Ministério de Relações Exteriores e Culto, Argentina. 2011.
Informe Nacional Brasil, elaborado por Veronica Teresi, com a aprovação da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Brasil 2011.
Informe Nacional Paraguai, elaborado por Lourdes Barboza, com a aprovação da Secretaria da Mulher da República do Paraguai. 2011.
Informe Nacional Uruguai, elaborado por Cristina Prego, com a aprovação do Instituto Nacional das Mulheres do
Ministério de Desenvolvimento Social do Uruguai. 2011.
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www.mercosurmujeres.org/pt
www.spm.gov.br
www.cnm.gov.ar
www.mrecic.gov.ar
www.mujer.gov.py
www.inmujeres.gub.uy
www.mercosur.int
www.oas.org
www.un.org
www.unodc.org
82
DIAGNÓSTICO NACIONAL
TRÁFICO DE MULHERES COM
FINS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL
ARGENTINA
Laura Sardá
Liliana Russo
Julho 2011
83
ARGENTINA
das causas que facilitam o desenvolvimento das redes
de tráfico.
Tais problemáticas, certamente globais, fazem com
que uma pessoa que viva em outro país ou em alguma
província Argentina, aceite um trabalho afastado de
seus vínculos afetivos, longe da segurança, de redes
sociais, sem conhecer as modalidades oferecidas, as
condições em que se desenvolverá o trabalho, o pagamento de seu salário, ou o lugar onde residirá.
O tráfico de pessoas é uma atividade criminal que viola
os direitos humanos de suas vítimas, a liberdade, a
vida, dignidade, a segurança pessoal, a integridade
física, sexual, psicológica e a saúde.
A República Argentina vem realizando importantes
avanços na luta contra o tráfico de pessoas, em 2002
ratificou a Convenção Internacional contra o Crime
Transnacional Organizado e seu Protocolo Facultativo
para Prevenir, Reprimir e Punir o Tráfico de Pessoas
(Protocolo de Palermo).
O documento intitulado “Informe Nacional
Sobre o Tráfico de Mulheres com Fins de Exploração
Sexual”, reúne informações sobre o crime do tráfico
de pessoas na República Argentina com finalidades de
exploração sexual. Tais informações foram fornecidas
por distintas instituições dedicadas à perseguição, prevenção e assistência às vítimas, nos diferentes níveis de
governo como também não governamentais.
Propõe-se uma aproximação da realidade atual desse
flagelo na República Argentina, que é um país de
origem, trânsito e destino, no qual se detectaram casos
de tráfico interno e internacional. Por isso, esse país
tem destinado seus maiores esforços em combater
as formas do tráfico de pessoas em que a exploração
ocorre dentro de seu território, com ênfase no resgate
das vítimas e na articulação do retorno das mesmas,
quando assim o desejarem, a seus lugares de origem.
Sem desvalorizar as iniciativas que já existem nos
países da região, e particularmente na Argentina, com
respeito à sistematização da informação, os dados obtidos são parciais. Os mesmos permitem uma aproximação ao problema. A unificação e sistematização
dos critérios de registro da informação permitirão em
médio prazo contar com uma informação cabal e ajustada à realidade atual no campo.
A origem do crime do tráfico de pessoas tem íntima
vinculação com as condições de desigualdade social: a
pobreza, a precariedade nas condições de trabalho, a
discriminação por gênero, a falta de direitos, como a
saúde, educação, moradia, entre outros, são algumas
Depois de atravessar uma das crises econômicas mais
importantes de sua história e avançar o processo de
transformação implementado a partir do ano de 2003,
em 29 de abril de 2008 cumpriu as obrigações assumidas frente à comunidade internacional sancionando a
lei 26.364 de Prevenção e Punição do Tráfico de Pessoas e Assistência a suas vítimas. A mesma inclui nos
artigos 145 bis e 145 ter do Código Penal o crime de
tráfico de pessoas e reconhece explicitamente um conjunto de direitos a suas vítimas.
A partir do ano de 2008 nosso país reforça em sua
agenda de governo a luta contra o tráfico de pessoas,
adotando progressivamente políticas específicas, partindo de três perspectivas:
- A prevenção e repressão do crime do Tráfico de Pessoas em matéria de exploração sexual.
- A criminalização penal e punição dos responsáveis.
- O resgate e acompanhamento da pessoas afetadas
pelo crime.
Esta determinação obriga a todos os atores envolvidos,
organismos governamentais e não governamentais a
implementar e coordenar ações concebidas para esse
fim.
E é assim que o Ministério da Justiça e Direitos Humanos
da Nação, através do Escritório de Resgate e Acompanhamento às Pessoas Afetadas pelo Delito de Tráfico, o
Ministério da Segurança através das Forças de Segurança Federal, o Ministério do Desenvolvimento Social
através da Secretaria da Infância Adolescência e Família, o Ministério Público Fiscal através da Unidade Fiscal
85
de Investigação em Sequestros Extorsivos e Tráfico de
Pessoas, o Ministério do Interior, através da Direção
Nacional de Migrações e o Ministério do Trabalho,
junto aos organismos públicos provinciais, trabalham
ativamente a partir de suas distintas competências. O
Ministério de Relações Exteriores, através da Representação para os Temas da Mulher no Âmbito Internacional, coordena ações dos demais Ministérios e se
encarrega de negociar documentos e posições a nível
internacional.
O crime do tráfico de pessoas, como parte do crime
organizado, vai flutuando em suas formas e modalidades com o objetivo de evitar e dissuadir as políticas de
prevenção, repressão e consequente punição de seus
responsáveis. Portanto resulta necessária a articulação
em rede entre os distintos organismos envolvidos, para
identificar tais mutações e prevenir suas consequências.
Os meios utilizados pelos responsáveis por esta atividade criminosa são fundamentais para obter o consentimento das vítimas às ofertas de emprego. O engano,
os meios de coação, as ameaças, o aproveitamento da
situação de vulnerabilidade, são alguns dos mecanismos utilizados pelos traficantes para materializar as
ações de exploração. Deve-se somar, com relação à
exploração sexual, que o gênero “mulher” foi historicamente tido em nossas sociedades patriarcais como
“fonte” provedora de prazer, objeto sexual ou objeto de
reprodução para a transmissão hereditária.
Neste sentido é importante destacar que 90% a 95% das
pessoas vítimas do tráfico com fins de exploração sexual
são mulheres de 18 a 35 anos e crianças, as quais são
exploradas por homens: traficantes e clientes.
Ganhar dinheiro ou encontrar melhores oportunidades
de trabalho mobiliza as pessoas a aceitar as ofertas
de emprego dos traficantes para poder encontrar uma
forma digna de subsistir e ajudar seus familiares.
A maioria das mulheres provenientes das províncias
mais pobres da República Argentina são transportadas
a zonas mais favoráveis economicamente como as do
Centro e da Patagônia, esta última se converteu em
una zona de grande importância comercial e turística
– empresas petroleiras e lugares com atrações turísticas para argentinos e estrangeiros – aumentando nos
últimos anos ostensivamente a demanda por serviços
sexuais. O tipo de fronteiras existentes, passagens de
fronteira habilitadas e não habilitadas, terrestres ou
fluviais, tornam mais permeável à entrada de pessoas
com controles diferentes.
86
Também se identificam casos de mulheres que a partir
dos pontos de destino do país, foram transportadas a
Europa, África do Sul e Chile.
O crime do Tráfico provoca em suas vítimas consequências graves para a saúde das pessoas, degradação psicológica e física, perda de sua capacidade de decisão,
perda de personalidade, substituição da identidade e
coisificação. Situações que conduzem à geração e estabelecimento de estratégias de adaptação e sobrevivência. As mulheres que sofrem as consequências deste
crime apresentam dificuldades de inserção na sociedade, são estigmatizadas e rejeitadas socialmente.
Afeta a dignidade da mulher, sua liberdade ambulatória, sua sexualidade, sua salubridade, sua capacidade
de escolher e decidir. Os traficantes conseguem exercer um “aprisionamento” tanto físico como psicológico
sobre as vítimas através de diferentes mecanismos de
coação, servidão por dívida, violência, retenção de documentos, multas, ameaças de prejudicar familiares
diretos, razão pela qual em muitas ocasiões costumam
encobrir aos traficantes e recusam cooperar com a
justiça, com a finalidade de proteger a seus familiares.
No país, salvo exceções, os traficantes tendem a ser
parte de estruturas familiares organizadas, onde cada
membro desenvolve uma atividade dentro da cadeia.
De acordo às distintas fases que compõem o crime, é
importante destacar a existência de vários atores envolvidos; o aliciador, recrutador, transportador, agenciador, proxeneta (cafetão), entre outros. Cada um
cumpre uma etapa do crime e obtém um lucro direto
ou indireto da atividade.
A quantidade de atores envolvidos confunde a vítima
que não consegue saber quem é o responsável por seu
sofrimento, dado que os aliciadores e recrutadores são
geralmente pessoas de sua confiança, familiares, vizinhos ou conhecidos. É por tais pessoas que se sente
traída, desenvolvendo por sua vez sentimentos de culpa
e vergonha por haver confiado nelas.
É interessante ressaltar que a repressão do crime
não pode acontecer em detrimento do atendimento e
acompanhamento das vítimas. Os serviços de atenção
implementados no país se encontram capacitados para
responder a suas necessidades, evitar a vitimização,
fomentar mecanismos de inserção no mercado de trabalho, único modo de enfrentar a possibilidade de retorno ao circuito de exploração.
É importante destacar que as práticas institucionais
instrumentadas têm tido resultados satisfatórios. A
participação de Equipes Profissionais Especializadas no
momento do resgate das vítimas; a criação nas distintas forças de Segurança de divisões específicas para a
prevenção, perseguição e investigação do crime do tráfico de pessoas; a articulação interinstitucional entre os
distintos poderes do Estado; a implementação de Casas
Abrigo em distintas localidades do país; controles nas
estradas, aeroportos, terminais de ônibus, trens e cruzamentos de fronteira, levados a cabo por funcionários
das forças armadas de segurança e do Ministério do Interior – Direção nacional de Migrações; como também
a articulação, a partir da Procuradoria Geral da Nação
e do Poder Judicial, com a Rede Ibero-americana de
Cooperação Judicial Internacional; o desenho e implementação de protocolos de atuação para a assistência
às vítimas do crime e para a recepção das declarações
de testemunhos em sede judicial; as campanhas de
sensibilização da população e capacitações das forças
de segurança, dos membros do Poder Judicial e Ministério Público, dão conta do compromisso assumido
a partir dos organismos de governo para a luta contra
este crime.
Em síntese, o crime do tráfico de pessoas com fins de
exploração sexual é um delito que viola todos e cada
um dos direitos fundamentais da pessoa humana. Nos
dias atuais, a naturalização do consumo da prostituição
por parte dos clientes obriga a reforçar políticas de prevenção, repressão e assistência às vítimas por meio da
articulação de redes institucionais governamentais e
não governamentais que respondam às necessidades
dos grupos vulneráveis. Estas políticas públicas, e não
outras, colaborarão no desincentivo da oferta e da demanda.
Consideramos que este é o desafio de todos os atores
envolvidos.
87
DIAGNÓSTICO NACIONAL
TRÁFICO DE MULHERES COM
FINS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL
BRASIL
Verónica Teresi
Julho 2011
89
BRASIL
para fins sexuais é predominantemente entre meninas
negras e mulatas, com idades compreendidas entre 15
e 25 anos. As vítimas menores de idade são aliciadas
para o tráfico interno. Já as maiores de 18 anos, seriam
submetidas às redes internacionais de tráfico.
O presente relatório
é resultado da
consultoria nacional Brasil realizada no âmbito do projeto “Fortalecimento da institucionalidade e da perspectiva de gênero no MERCOSUL” com a finalidade de
identificar os principais aspectos referentes ao enfrentamento ao tráfico de mulheres no Brasil. A metodologia utilizada baseou-se principalmente: na recopilação,
classificação e análise dos documentos, pesquisas e
relatórios produzidos pelo governo brasileiro assim
como pela sociedade civil organizada no Brasil e; nas
consultas realizadas aos principais atores responsáveis
pelo enfrentamento ao tráfico de pessoas no Brasil,
sejam eles governamentais e não-governamentais.
O relatório inicia fazendo um diagnóstico situacional
com uma contextualização política, social e econômica do Brasil. Levanta-se a magnitude do problema
do tráfico de mulheres, caracterizando basicamente: 1.
Os perfis das vítimas de tráfico de pessoas e dos traficantes; 2. As etapas do tráfico de pessoas (captação,
recrutamento, a viagem, o trânsito, as rotas de tráfico,
os destinos e a exploração sofrida pelas vítimas).
O Brasil caracteriza-se por ser um país principalmente de origem de vítimas de tráfico de pessoas, mas
também de trânsito e destino de vítimas. Essa caracterização torna-se visível ao ponto do enfrentamento ao
tráfico de pessoas no Brasil ocupar um papel importante na agenda interna.
Nesse contexto verificou-se que não é possível precisar
um único perfil, nem mesmo o número de mulheres
traficadas no Brasil, uma vez que os dados existentes
não são suficientes, seja porque estamos abordando
um tipo de crime que abrange aspectos transnacionais, ou porque a particularidade do crime, que envolve
a vítima como próprio objeto do crime, dificulta a sua
própria identificação, quando a vítima não se identifica
como tal. Por outro lado, percebe-se que as mulheres,
meninas e adolescentes constituem as vítimas preferenciais desse “mercado sexual”. No Brasil, o tráfico
Muitas vezes essas mulheres, ao aceitarem ir a outro
país, mesmo estando cientes de que irão trabalhar no
mercado sexual, não imaginam as condições reais que
as esperam ali. Quando chegam, têm seus documentos
retidos pela rede de tráfico, confinadas em locais próprios para a prostituição, padecendo de maus tratos,
exploradas - uma vez que não podem sair até pagarem
toda a dívida contraída com a viagem, transporte e alojamento – vendo ameaças constantes contra suas famílias e principalmente contra seus filhos.
O relatório apresenta as respostas institucionais criadas e desenvolvidas pelo Brasil a partir de 2004, principalmente no âmbito das políticas públicas gerais e
específicas criadas para o enfrentamento do tráfico
de pessoas. Podem-se ressaltar a Política Nacional de
Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (2006), que traz
os princípios norteadores dessa Política, com os eixos
da prevenção, responsabilização e repressão penal e o
atendimento às vítimas; o I Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (2008), que definiu ações,
metas, indicadores para o enfrentamento ao tráfico de
pessoas até o ano 2011 e, o II Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (2012 – ainda em fase
de finalização). No marco específico do enfrentamento
ao tráfico de mulheres, é importante ressaltar a relevância do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres
na promoção do empoderamento das mulheres e prevenção ao tráfico, além da Política e do Pacto Nacional
pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres,
que tem um eixo específico para a garantia dos direitos sexuais e reprodutivos, enfrentamento à exploração
sexual e ao tráfico de mulheres.
Essas políticas públicas foram promulgadas no âmbito
federal e suas ações têm capilaridades a serem desenvolvidas por/em todos os entes da federação: nacional,
estadual e municipal, seja no âmbito da prevenção, da
repressão e responsabilização dos agentes, e no atendimento às vítimas de tráfico, conforme suas competências específicas.
Nesse contexto, a criação dos Núcleos de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e dos Comitês Estaduais
e Regionais de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas
vem permitindo essa capilaridade das ações de enfrentamento ao tráfico de pessoas nos Estados, permitindo a percepção e análise específica sobre as
necessidades prioritárias para cada região, levando a
91
um enfrentamento mais focado e eficaz. Além disso, os
NETP´s e os Postos Avançados (de âmbito municipal)
foram criados para serem os Pontos focais de recepção, atendimento inicial, encaminhamento e monitoramento das vítimas de tráfico à rede de enfrentamento
ao tráfico de pessoas. Nos locais onde não há ainda
NETP´s e Postos, essas funções de recepção, atendimento inicial, encaminhamento e monitoramento das
vítimas de tráfico são feitas pelos Organismos Governamentais de Políticas Públicas para as Mulheres, considerando que mais 70% das pessoas em situação de
tráfico são mulheres.
O diagnóstico brasileiro elenca uma abordagem particularizada de cada instituição pública, principalmente
os Ministérios. No âmbito do atendimento às vítimas
de tráfico, descreve como se pensou e se está estruturando o atendimento às vítimas de tráfico no Brasil,
principalmente por meio dos Centros de Referência da
Mulher e dos serviços especializados da Assistência
Social, distribuídos por todo o Brasil. Relata e analisa
outros atores que colaboram no desenvolvimento das
políticas de enfrentamento ao tráfico de pessoas no
Brasil, como as parcerias desenvolvidas e em desenvolvimento com organismos internacionais e o papel
das organizações não governamentais no enfrentamento ao tráfico de pessoas.
Ainda no campo do atendimento às vítimas, verifica-se
que, o Brasil decidiu ampliar e capacitar a rede especializada de atendimento às mulheres em situações de
violência, para o atendimento das vítimas de tráfico,
além da criação de alguns serviços específicos, como
os Núcleos Estaduais de Enfrentamento ao Tráfico de
Pessoas e os Postos de Atendimento nos aeroportos.
Outro capítulo importante do relatório refere-se à compilação e análise dos aspectos legais relacionados com
o enfrentamento do tráfico de pessoas. Abordam-se: 1.
As normativas assinadas e/ou ratificadas pelo Brasil
resultante de tratados internacionais; 2. A legislação
interna específica sobre tráfico de pessoas (principalmente artigos 301 e 301-A, do Código Penal Brasileiro),
assim como as legislações específicas que tenham relação direta ou indireta com o enfrentamento do tráfico de pessoas; 3. A legislação específica ministerial
referente ao tráfico de pessoas; 4. A legislação estadual
específica já existente sobre tráfico de pessoas; 5. As
autoridades competentes para a persecução do delito
do tráfico de pessoas no Brasil.
Nesse capítulo verifica-se, depois de feita à compilação
e análise da legislação existente, que o Brasil tem se
adequado à normativa do Protocolo de Palermo, porém,
no âmbito da criminalização ao crime do tráfico de
92
pessoas, ainda necessita avançar mais, uma vez que
o Brasil somente criminaliza especificamente o tráfico internacional e interno de pessoas para o fim da
exploração sexual e prostituição e não prevê todos os
meios descritos no Protocolo de Palermo. O Brasil deve
avançar na adequação do tipo penal para possibilitar
mais responsabilização dos traficantes pelo crime do
tráfico internacional e interno.
Outro capítulo aborda aspectos relacionados com a
cooperação internacional desenvolvida pelo Brasil no
âmbito do enfrentamento ao tráfico de pessoas, abordando especificamente a cooperação com o Mercosul,
Venezuela, Guiana Francesa, Suriname, Portugal, Espanha e Estados Unidos da América.
O documento demonstra algumas experiências de retornos de vítimas e atendimentos realizados a vítimas
de tráfico de pessoas, atendimentos estes realizados
nos Postos Avançados e serviços especializados de
atendimento às mulheres, finalizando com algumas
conclusões e recomendações, referências bibliográficas e anexos.
No âmbito das recomendações podem-se
citar:
1. No âmbito do atendimento, recomendou-se que a
rede de atendimento às situações de violência seja amplamente capacitada, assim como sejam criados mais
Centros de Referência para atendimento das mulheres
em situação de violência, não sendo necessário encaminhá-las aos Centros de Referência Especializados
da Assistência Social, uma vez que aqueles têm mais
especificidade no atendimento.
2. Verificou-se a necessidade de melhor estruturação,
integração e articulação dos Serviços de Proteção
Social (assistência social, saúde, segurança, justiça,
entre outros) para garantir o atendimento integral às
pessoas em situação de tráfico de pessoas.
3. Verificou-se a necessidade da criação de um Mecanismo Comum de Referência que determine e divulgue
os mecanismos e competências da rede de atendimento às vítimas de tráfico, padronizando esses mecanismos e competências.
4. No que se refere ao acesso à justiça, e pensando
tanto nos casos de vítimas de tráfico interno como internacional, recomendou-se que sejam instituídas leis
que garantam a todas as vítimas de tráfico::
- Direito à informação. O que se verifica hoje é que esse
direito somente é efetivado quando o NETP ou Posto
Avançado intervém no caso.
- Direito a preservação da sua identidade: como ainda
não há legislação específica penal ou processual que
obrigue essa preservação da identidade, ainda fica à
critério da sensibilidade dos profissionais do âmbito do
Judiciário.
- Direito a acesso a interprete/tradutor: criação de legislação que garanta o direito de acesso a esse profissional nas entrevistas, depoimentos, etc das vítimas de
tráfico que necessitem desse profissional.
- Direito a proteção, cuidado e não acareação: Hoje essa
garantia depende da sensibilidade dos profissionais do
Poder Judiciário. Deve ser criada legislação que garanta esse direito para a preservação da identidade e
não revitimização da vítima.
- Direito a acesso ao programa de proteção à testemunha: O acesso ao programa não pode estar vinculado
à colaboração da vítima com as autoridades policiais e
judiciais.
5. Seria importante a realização de outra pesquisa de
âmbito nacional para a identificação de perfis das vítimas de tráfico e a criação de metodologias para a
unificação, na medida do possível, dos dados referentes a essa temática. Além disso, seria importante a
realização de uma pesquisa específica que pudesse
verificar os perfis e as rotas de tráfico internacional das
vítimas do Mercosul, uma vez que os dados ainda não
foram suficientemente explorados.
6. No âmbito da cooperação fronteiriça, seria fundamental equipar melhor a Casa do Migrante, em Foz do
Iguaçu, para que este pudesse ser um centro de Referência para atender e encaminhar vítimas de tráfico
identificadas pertencentes aos Estados do Mercosul.
Além disso, seria fundamental articular o Comitê de
Fronteira formado pelo Paraguai, Argentina e Brasil
para que cada país apóie e dê encaminhamento aos
atendimentos e demandas geradas pelo Centro do Migrante.
7. No âmbito da responsabilização dos agentes é fundamental uma maior capacitação dos atores responsáveis pela responsabilização e conhecimento sobre a
complexidade que envolve o tráfico de pessoas garantindo, por um lado, mais responsabilizações dos agentes e um trato mais humano às vítimas do tráfico.
rias de cada um dos países da região.
2. Padronizar as garantias no acesso à justiça das vítimas do tráfico nos três países, com Planos Integrais
de Assistência e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.
3. Padronização dos Programas de Proteção às Testemunhas nos países do Mercosul no sentido de não
limitar o acesso das vítimas pela colaboração nos inquéritos policiais e processos judiciais.
4. Criação de policiais de ligação (adidos policiais) de
cada país, localizados nos países de destino das vítimas do Mercosul, para que estes possam ser os elos
de cooperação e diminuição da burocracia no âmbito da
responsabilização e repressão penal.
5. Disponibilizar e divulgar o fluxo de encaminhamento
das vítimas para cada um dos países. No caso de algum
país não ter definido internamente seu fluxo, criá-lo
para que possa funcionar o fluxo de encaminhamento
entre os países.
6. Criação de um fluxo de encaminhamentos das vítimas dentro do Mercosul.
7. Conforme as particularidades das vítimas da região,
estabelecer acordos de cooperação que levem em conta
as particularidades dessas vítimas, principalmente no
que se refere a atendimento, a exemplo das mulheres
indígenas da região.
8. Estruturar e capacitar o Núcleo do Migrante, localizado em Foz do Iguaçú, para que esse possa ser um
Centro de Referência para a identificação, encaminhamento e atendimento das vítimas de tráfico originárias
dos países do Mercosul, até o envio destas para seus
lugares de origem.
9. Assinar termo de comprometimento dos países para
a revisão da legislação penal sobre o tráfico de pessoas,
possibilitando mais responsabilizações e cooperação
entre os Corpos de Segurança dos Estados que compõe
o Mercosul.
10. Assinar acordos de extradição específicos para traficantes de pessoas no âmbito dos países do Mercosul.
11. Necessidade da realização de Capacitações conjuntas dos atores envolvidos principalmente no atendimento direto das vítimas de tráfico do Mercosul.
Além dessas recomendações, o relatório conta com recomendações específicas para a criação do Protocolo
Regional Mercosul:
1. Criar acordos de cooperação entre os países do Mercosul para a assistência das vítimas de tráfico originá93
DIAGNÓSTICO NACIONAL
TRÁFICO DE MULHERES COM
FINS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL
PARAGUAI
Lourdes Barboza
Julho 2011
95
PARAGUAI
nos quais funcionou como país de trânsito, cujas vítimas, mulheres dominicanas, estavam em trânsito na
cidade fronteiriça de Ciudad del Este e seriam levadas
à Europa. O Paraguai também funciona como país de
destino do tráfico de pessoas com fins de exploração
sexual, sobretudo em zonas de fronteiras, cruzamentos estratégicos de estradas internacionais e zonas
de agricultura intensiva principalmente habitadas por
colônias de migrantes. Existem referências sobre o
turismo sexual no Paraguai, através de ofertas pela
internet, principalmente em zonas de fronteira. Não
existem casos registrados que pudessem confirmar a
existência desta modalidade de exploração sexual das
vítimas do tráfico de pessoas.
O tráfico de pessoas no Paraguai
afeta principalmente mulheres, crianças e adolescentes do sexo feminino. Mesmo quando detectados casos
de tráfico de homens, crianças e adolescentes do sexo
masculino e transexuais, estes são escassos. Têm-se
conhecimento da existência destes casos principalmente através de investigações realizadas na temática,
os casos denunciados ou detectados relacionados ao
tráfico de pessoas de sexo masculino são principalmente de tráfico com finalidade de exploração laboral.
Tais referências são elencadas para enfatizar que o
tráfico de pessoas no Paraguai corresponde principalmente ao tráfico de mulheres, crianças e adolescentes
do sexo feminino.
No mesmo sentido, a principal finalidade do tráfico de
pessoas detectado no Paraguai é a exploração sexual,
ainda que existam casos denunciados de tráfico com
fins de exploração laboral e, não obstante, falhas no
teor desta informação poderiam ter origem no fato de
que o tipo penal do tráfico de pessoas contemplado na
Lei Penal do Paraguai, há pouco tempo, punia exclusivamente o tráfico com finalidade de exploração sexual.
Não obstante, as investigações qualitativas realizadas
no Paraguai dão conta, principalmente, da existência
do tráfico de pessoas com fins de exploração sexual, ao
menos até o momento deste relatório.
No tocante à expressão internacional do tráfico de
pessoas, o Paraguai é assinalado principalmente
como país de origem. Ainda que se conheçam casos
Os principais países de destino do tráfico com fins de
exploração sexual com vítimas de origem paraguaia
são Argentina e Espanha, também são destinos regionais Bolívia e Chile e, em zonas fronteiriças, o Brasil.
Com relação aos destinos transcontinentais, a Espanha
coloca-se em primeiro lugar havendo ainda outros
destinos na Europa, tais como Itália e França. Constataram-se casos de tráfico de pessoas também para
casamento servil sendo destinos os países da Ásia, especialmente Coréia, também há casos no Japão e na
África do Sul.
O tráfico interno de pessoas no Paraguai não se encontra penalizado como tal, sendo esta expressão sub
registrada no país, de forma a ser difícil dimensionar
sua magnitude. Não obstante, sabe-se pela experiência de investigação do tráfico interno através de outros
delitos, como proxenetismo ou cafetinagem, bem como
através de pesquisas realizadas sobre o assunto, que
mostram que esta expressão do tráfico de pessoas
afeta principalmente pessoas menores de idade e
do sexo feminino, traficadas com fins de exploração
sexual. Tal exploração se realiza frequentemente em
bordéis e outras modalidades similares e as vítimas
são transportadas do interior do país aos centros urbanos e zonas fronteiriças. Conforme a experiência dos
órgãos de atendimento nacionais, muitas vezes o tráfico interno precede o tráfico internacional.
Em geral, resulta difícil dimensionar quantitativamente
o tráfico de pessoas no Paraguai, dado que se soma
às limitações do tipo penal do tráfico de pessoas que
incide na detecção e registro do mesmo como tal, existem deficiências com relação ao registro e sistematização da informação tais como: falta de formulários
unificados, pouca tradição de sistematização escrita da
informação, sistemas de informações insuficientes ou
inapropriados, complexidade no levantamento e manuseio da informação nestes casos. Não obstante, existem
97
interessantes iniciativas levadas adiante pelos órgãos
públicos competentes, principalmente em matéria de
atenção e investigação, tais como a Promotoria Geral
do Estado e a Secretaria da Mulher da Presidência da
República, assim como de organizações da sociedade
civil, dirigidas a reverter esta deficiência.
As redes de traficantes no Paraguai, tomando-o principalmente como país de origem das mulheres vítimas
do tráfico internacional de pessoas com fins de exploração sexual, funcionam com a participação de pessoas
e empresas que cumprem distintos papéis durante o
processo de captação, documentação para viagem ao
estrangeiro e os traslados. Pode se mencionar o aliciador, o gestor da documentação da viagem, as agências de viagens, os financiadores, os exploradores no
estrangeiro que se mantém em contato, selecionam as
mulheres e também, em determinados casos, financiam as viagens.
É possível encontrar no Paraguai redes de traficantes
com condições pouco sofisticadas que, ainda assim,
funcionam perfeitamente para atingir a finalidade de
captar, transportar, e em outros casos, recepcionar e
explorar mulheres vítimas do tráfico de pessoas com
fins de exploração sexual. Entretanto, também existem
no Paraguai redes de traficantes mais sofisticadas e organizadas, geralmente vinculadas à prática de outros
crimes transnacionais como o tráfico de drogas. Estas
têm um proceder diferente das redes mais precárias.
Não há dúvidas de que existem no Paraguai fatores que
favorecem o tráfico de pessoas, entre os quais pode-se
mencionar a corrupção, a impunidade, os altos níveis
de pobreza e inequidade, a falta de oportunidades,
falta de acompanhamento suficiente aos migrantes, o
escasso controle fronteiriço, os fatores culturais que
trazem a discriminação baseada em gênero, a violência doméstica e o abuso sexual, a precarização do emprego, a pouca formalidade dos atos incluindo a falta de
documentação pessoal e de propriedade da terra, entre
outros.
Com relação às políticas públicas, no Paraguai funciona uma “Mesa Interinstitucional para a Prevenção
e o Combate do Tráfico de Pessoas na República do
Paraguai”, que constitui a política de articulação e
coordenação interinstitucional e intersetorial a nível
nacional. Foi criada pelo “Decreto do Poder Executivo Nº 5093/05”. Participam da mesa, em caráter de
membros, 47 instituições públicas e organizações da
sociedade civil e desde seu início tem elaborado planos
estratégicos e anuais de trabalho desta instância.
Atualmente foi aprovado por esta Mesa o documento
referente à Política Nacional de Prevenção e Combate
98
ao Tráfico de Pessoas, 2010 – 2019. Não obstante esta
política ainda não foi aprovada por Decreto do Poder
Executivo e carece de dotação orçamentária no orçamento público, portanto, ainda não se encontra implementada.
No âmbito legislativo, a situação do Paraguai é precária, dado que o tipo penal do tráfico de pessoas não contempla a expressão do tráfico interno de pessoas e em
aspectos gerais não se ajustam à definição do artigo 3
do Protocolo adicional à Convenção das Nações Unidas
contra o crime organizado transnacional para Prevenir, reprimir e punir o tráfico de pessoas, especialmente mulheres e crianças, conhecido como Protocolo
de Palermo, ratificado pelo Paraguai através da lei Nº
2396/04. O Paraguai também ratificou a Convenção das
Nações Unidas contra o crime organizado transnacional. Atualmente encontra-se em elaboração um anteprojeto de lei sobre o tráfico de pessoas, para abordar
esta dificuldade legislativa.
Com relação à cooperação internacional, existem experiências principalmente com a Argentina, Chile, Bolívia e Espanha para a investigação penal dos casos e a
atenção às vítimas.
Concluindo, os problemas relacionados ao tráfico de
pessoas no Paraguai são múltiplos, e os recursos e
esforços para enfrentá-los ainda escassos. Entretanto,
avanços importantes vem sendo dados neste sentido,
porém é necessário admitir que ainda não são suficientes, o que acarreta num número crescente de mulheres
que acabam sendo vítimas deste crime.
DIAGNÓSTICO NACIONAL
TRÁFICO DE MULHERES COM
FINS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL
URUGUAI
Cristina Prego
Julho 2011
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URUGUAI
Atualmente não se conta com dados estatísticos articulados nem cifras oficiais que evidenciem a real magnitude do problema, porém há certas características do
país, como: as fronteiras permeáveis com países que
possuem evidências da existência deste problema, o
crescente relevância do turismo, os importantes fluxos
migratórios, as brechas na redistribuição da riqueza
com uma forte presença das variáveis de gênero e geração, constituem condições propícias para o desenvolvimento destes crimes.
A partir do levantamento realizado pode-se afirmar que
o Uruguai se identifica especialmente como país de
origem, ainda que se tenha identificado situações nas
quais é configurado como um espaço de trânsito e destino para mulheres de outras nacionalidades, principalmente argentinas, paraguaias e brasileiras.
O tráfico de mulheres
com fins
de exploração sexual comercial é um problema cujo
debate é recente no Uruguai. Desde 2006 até os dias
atuais, o Estado Uruguaio vem desenvolvendo ações
com o objetivo de visualizar o problema, caracterizá-lo
e construir marcos legais segundo os requerimentos
internacionais. Estas ações configuram os primeiros e
fundamentais avanços na construção de uma política
pública de enfrentamento ao tráfico de mulheres com
tais fins. Desde 2008, funciona na órbita do Ministério
do Desenvolvimento Social, a Mesa Interinstitucional de
enfrentamento ao tráfico de mulheres com finalidade
de exploração sexual comercial, presidida pelo Instituto
Nacional de Mulheres, com a ativa e constante participação dos Ministérios com competência na temática.
As investigações, específicas ou vinculadas a problemas
afins46, não têm mais de 10 anos. É possível identificar
num primeiro momento feitos importantes no âmbito de
pesquisas jornalísticas 47 e, nos últimos anos, estudos
de cunho acadêmico, que caracterizam o problema com
o objetivo da sensibilização social e da construção de
abordagens adequadas para combater o crime e proteger as vítimas. Estes avanços são escassos e em geral de
caráter exploratório, porém conseguem identificar rotas
internas e externas, caracterizações sociodemográficas
das vítimas, além de pormenorizar os processos em que
tais pessoas são submetidas a violações brutais de seus
direitos fundamentais. A Organização Internacional para
as Migrações (OIM), Unicef, Instituto Interamericano da
Criança48 e profissionais vinculados à temática tem sido
os atores principais na geração deste conhecimento.
46. As primeiras pesquisas
relacionadas a violência
sexual focalizavam o objeto
de estudo na exploração
sexual de meninas, meninos
e adolescentes.
47. Em 1991 a jornalista
María Urruzola desenvolveu
uma investigação jornalística publicada pelo periódico
semanal Brecha que depois
foi publicada no livro “O ovo
da serpente. Tráfico de mulheres Montevidéu-Milão”.
48. Estes organismos, pela
sua competência, realizaram
pesquisas focalizadas na
infância e adolescência em
âmbito nacional e regional.
“…considera-se o Uruguai como país de origem,
trânsito e destino, pelas facilidades de ingresso existente entre os países da região e a localização estratégica do nosso país, possibilitando um alto nível
de conexão através do eixo Buenos Aires, Colônia,
Montevidéu, Canelones, Maldonado, Rocha, para
cruzar ao litoral brasileiro, ou a partir deste, a qualquer um dos pontos mencionados. Pode-se destacar
que alguns destes pontos configuram-se como saídas
para os Estados Unidos ou Europa.
…sConseguiu-se reunir informações sobre a existência de uma rota de tráfico de adolescentes partindo
da Argentina (Formosa, Chaco, Missiones, Corrientes) com destino a Punta del Este, vinculada ao turismo sexual. Também foi possível identificar uma
rota proveniente da Argentina e passando pelo Uruguai (Paysandú, Tacuarembó e Rivera) com destino
à São Paulo, na qual o Uruguai situa-se se como
país de destino e trânsito para o Brasil” (González D.,
Tuana A. 2006: 35).
As pesquisas que levantaram tais informações focalizam o olhar sobre as meninas, meninos e adolescentes, porém evidenciam a utilização das mesmas rotas e
redes para o tráfico de mulheres adultas.
As zonas de fronteira seca com o Brasil e a fronteira
líquida com Argentina constituem espaços permeáveis
por onde se evidenciou o trânsito cruzado de mulheres
com fins de exploração sexual comercial. Montevidéu
e Maldonado são pontos finais do trajeto nacional
para o exterior, principalmente com destino à Espanha
e Itália. Estados Unidos é outro destino identificado e
recentemente também o México. O tráfico interno é um
problema crescente que envolve também adolescene-
101
tes e mulheres, sendo uma etapa prévia e preparatória
aotráfico internacional. A zona do litoral, especialmente
o departamento de Paysandú e zonas do departamentode Rio Negro, tem sido identificada, assim como o
departamento de Montevidéu, como origem para o recrutamento de muitas destas mulheres.
A invisibilidade do fenômeno é sustentada no ocultamento, por se tratar de uma atividade criminosa e pela
naturalização de práticas sociais associadas a exploração sexual infantil, o proxenetismo, a prostituição,
sustentam um processo de naturalização ou negação
que nos últimos anos tenta-se reverter a partir de diversos organismos.
Nos últimos anos tem-se desenvolvido ações de capacitação para operadoras e operadores organismos com
competência no assunto, porém são muito incipientes e
restritas a poucas pessoas.
O tema não é prioritário dentro dos organismos com
competência designada para seu enfrentamento.
Dentro dos fatores de vulnerabilidade associados a este
problema identifica-se com maior força a incidência da
violência intrafamiliar, o abuso sexual e as situações de
descuido do entorno familiar. A situação econômica é
um fator que influi, porém com menor incidência que
os anteriormente mencionados.
O meio utilizado com maior frequência para o aliciamento é o engano sobre as condições de exploração
em que permanecerá a mulher no lugar de destino. Na
maioria das situações identificadas as mulheres são levadas sabendo qual será a atividade (comércio sexual )
que realizarão, porém não em que condições será realizada. Também aparecem enganos onde as propostas
versam em ser camareiras, empregadas domésticas
ou empregadas para cuidar de crianças ou idosas/os
no exterior.
Os aliciadores ou aliciadoras, em geral, são próximos
às mulheres, muitas vezes seus parceiros, onde a promessa de uma vida juntos e em melhores condições
impulsiona à busca de melhoras econômicas no exterior.
As redes estão revestidas de diversidade em sua complexidade e funcionamento, incluem desde familiares,
amigos/as, parceiros, transportadores, donos de prostíbulos e bordéis, pessoas que realizam sua tarefa no
país e outros no lugar de destino, coincidindo com os
circuitos de tráfico de drogas e contrabando. As repostas institucionais são escassas e com avanços importantes durante o último ano.
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É um importante avanço, (maio de 2011) a partir do Instituto Nacional das Mulheres e da ONG Fórum Juvenil a
concretização de dois serviços de atenção especializada,
psicossocial e legal, um específico para vítimas mulheres e outro para meninas, meninos e adolescentes.
A normativa penal tipifica todas as etapas do crime, fornece prerrogativas importantes para a investigação e
para a garantia do acesso à justiça das vítimas, porém
um importante obstáculo para a concretização das
mesmas é a escassez de recursos destinados ao tema.
Isto se traduz em dificuldades pra concretizar investigações pela falta de pessoal policial capacitado designado à investigação, pela falta de pessoal nos juizados e
procuradorias, pela carência de equipes técnicas especializadas e interdisciplinares que façam a assessoria
ao juiz e ao promotor, pelas dificuldades para a proteção da vítima e para a restituição de direitos a partir
de ressarcimento econômico.