ROTINA DE MRSA E CA

Transcrição

ROTINA DE MRSA E CA
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MINISTÉRIO DA SAÚDE
HOSPITAL FEDERAL DE BONSUCESSO
COMISSÃO DE CONTROLE DE INFECÇÃO HOSPITALAR
Revisada em 25/05/2010
ROTINA A 11
ROTINA DE MRSA E CA-MRSA
Introdução
A emergência e disseminação global de MRSA (Staphylococcus aureus resistente à
meticilina) devem ser vistas como um processo de evolução acelerado, direcionado pela
pressão seletiva através da disponibilidade de diversos antimicrobianos introduzidos na
prática clínica.
O MRSA adquiriu grande importância, pois tende a ser multi-resistente e a opção
terapêutica torna-se limitada ao uso de glicopeptídeos (vancomicina e teicoplanina),
oxazolidinonas (linezolida) e estreptograminas. O mecanismo molecular de resistência à
meticilina consiste na aquisição de um elemento genético móvel denominado Staphylococcal
Cassette Cromossome
MEC
(SCCMEC) que contém o gene, mec A, responsável pela alteração
das proteínas ligadoras de penicilina (PBP). As PBPs são enzimas necessárias para a síntese
da parede celular bacteriana. A ligação dos beta-lactâmicos a PBP bloqueia sua função e há
formação de uma parede celular débil ou imperfeita que prejudica o desenvolvimento
adequado da bactéria. O gene mec A codifica a PBP com baixa afinidade aos antibióticos
beta-lactâmicos, denominada PBP2A ou PBP2’. O SCCMEC contendo o mec A é incorporado
ao cromossomo do S.aureus em um sítio de localização específica, promovendo, então,
resistência bacteriana.
Uma série de fatores tem sido associada ao alto risco de aquisição nosocomial de
MRSA:
•
Hospitalização prolongada (mais de 7 dias),
•
Internação em unidade de terapia intensiva,
•
Procedimentos cirúrgicos,
•
Terapia antimicrobiana prolongada,
•
Proximidade de pacientes colonizados por MRSA
•
Esquema dialítico,
•
Internação no último ano,
•
Lesão dermatológica extensa,
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Procedência
•
de
serviço
tipo
“home
care”
e
história
prévia
de
colonização/infecção por MRSA.
Em 1999, casos por MRSA resistente apenas a beta-lactâmicos ocorreram
seqüenciados e foram alarmantes para a comunidade científica, uma vez que os pacientes
eram previamente hígidos e não tinham nenhum fator de risco conhecido para aquisição de
MRSA.
Estas amostras foram seqüenciadas e revelaram apenas um único SCCMEC, denominado
SCCMEC tipo IV, denominados, então, Staphylococcus aureus meticilina resistentes
adquiridos na comunidade (CA-MRSA). Recentemente, vários estudos têm demonstrado um
aumento na freqüência de MRSA adquiridos na comunidade e predominantemente em
pessoas sem fatores de risco conhecidos para aquisição de MRSA.
As espécies de S. aureus adquirem resistência aos antimicrobianos através da
incorporação de vários genes, que determinarão o perfil de resistência específico não só a
beta-lactâmicos, como também fluorquinolonas, sulfametoxazol-trimetopim (SMX-TMP),
macrolídeos e lincosamidas, dentre outros.
Ao contrário do outros tipos, o SCCMEC tipo IV possui um único gene de resistência, o
mec A somente para beta-lactâmicos e apresenta susceptibilidade a outros antimicrobianos
que não os beta-lactâmicos. Os CA-MRSA também apresentam um fator de virulência
denominado Panton Valentine Leucocidin (PVL), que é uma citotoxina presente em menos de
5% dos S. aureus, com elevada atividade lítica específica para polimorfonucleares, monócitos
e macrófagos. Está também associada à necrose tecidual.
O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) estabeleceu alguns critérios
para a definição de CA-MRSA. O paciente não pode estar hospitalizado e as culturas devem
ser obtidas até 48h de admissão hospitalar. Durante um ano prévio à infecção, o paciente não
pode ter tido cateter venoso central de longa permanência ou qualquer dispositivo que passe
pela pele. Não pode também ter tido internação em hospitais, manicômios, instituições de
saúde e/ou submetido à diálise ou cirurgia.
Acredita-se que as cepas de CA-MRSA surgiram dos S. aureus meticilina-sensíveis,
que ganharam alguns genes de resistência e não de uma adaptação dos MRSA hospitalares na
comunidade.
A disseminação desta cepa na comunidade tem aumentado, e varia de acordo com
fatores de risco para aquisição de MRSA. Alguns grupos populacionais parecem ter um risco
aumentado para infecções com MRSA, como jogadores esportistas, recrutas militares e
presidiários. Os fatores de risco para a aquisição do CA-MRSA ainda não estão totalmente
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estabelecidos, mas acometem principalmente crianças e adultos jovens, usuários de drogas
injetáveis e histórias de contato rotineiro com instituições de saúde.
No Brasil, até o momento, não se sabe a prevalência do CA-MRSA, mas estudo
recente identificou a presença de Staphylococcus aureus SCCMEC IV em hemoculturas e
100% eram hospitalares.
As infecções por CA-MRSA podem ter manifestações múltiplas e variam desde
infecções leves de pele e partes moles (> 90%) que podem ser tratadas ambulatorialmente a
doenças invasivas, como choque séptico.
O tratamento empírico deve ser direcionado conforme o padrão de sensibilidade do S.
aureus na própria comunidade e a gravidade da doença. Especialistas sugerem modificar a
terapia empírica se houver uma prevalência de MRSA na comunidade acima de 10-15%. Em
nosso meio, não se justifica o tratamento empírico com glicopeptídeos para infecções da
comunidade, pois esta não parece ser a realidade brasileira, embora não haja estudos de
prevalência publicados até o momento.
Pacientes com infecções leves a moderadas podem usar clindamicina, sulfametoxazoltrimetopim (SMX-TMP), teraciclinas e fluorquinolonas, desde que haja sensibilidade a estes
antimicrobianos. A clindamicina é uma das drogas de primeira escolha, o SMX-TMP é uma
droga que geralmente se utiliza em casos de infecções leves a moderadas e as fluorquinolonas
devem ser utilizadas com cautela, já que a resistência do MRSA a esta droga pode ser
adquirida rapidamente. Em pacientes com infecções sistêmicas graves é recomendado o uso
de glicopeptídeos ou linezolida. As recomendações para prevenir a disseminação do CAMRSA na comunidade de acordo com o CDC são: realizar curativo nas lesões com secreções,
lavar mãos freqüentemente, evitar compartilhar itens pessoais e lavar roupas com água
quente.
A epidemiologia dos MRSA é dinâmica e vem sofrendo mudanças com o decorrer dos
anos. As infecções por MRSA comumente confinadas aos hospitais estão sendo descritas
cada vez mais na comunidade entre pacientes com e sem fatores de risco clássicos.
Embora em situações endêmicas exista questionamento do valor custo/benefício de
medidas de controle, esta ação ainda se mostra eficaz em situações epidêmicas.
A despeito desta controvérsia a CCIH do HGB preconiza controle de MRSA com
medidas de controle e eventualmente descolonização (situação epidêmica).
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NORMAS E ROTINAS DE CONTROLE
•
Nas unidades críticas, tais como Unidade intermediária da emergência, UTI
pediátrica e adulto, Unidade Coronariana, pacientes em programa de diálise, e
pacientes com mais de 7 dias de internação em outros setores, realizar swab da
mucosa nasal na internação dos pacientes de risco e encaminhar ao laboratório. Na
UTI Neonatal e Berçário de Alto Risco coletar swab peri-umbilical e perianal.
•
Em pacientes com feridas extensas ou provenientes de unidades de queimados devese coletar também material da ferida.
•
Os pacientes sob investigação quanto à colonização por MRSA deverão ser
mantidos em isolamento de contato (ver a seguir) até resultado negativo do
rastreamento.
•
Em pacientes com swab nasal e/ou qualquer outro material (sangue, secreção
traqueal, outros) que apresente bacteriologia positiva para MRSA proceder
isolamento de contato até a alta, da seguinte forma:
1. Lavagem das mãos e antebraços antes e após a manipulação dos pacientes e após
contato com equipamentos e mobiliário.
2. Na higienização das mãos, o profissional de saúde deverá utilizar o anti-séptico
clorexidina ou álcool- gel.
3. O uso de capote (não estéril, de manga longa) e luvas de procedimento é
recomendado quando se prevê o contato com o paciente e/ou seu mobiliário.
4. Na impossibilidade do uso exclusivo do capote, o mesmo poderá ser reutilizado por
outro profissional de saúde. Para tanto, orientamos que em sua retirada evite-se a
contaminação de partes internas, pendurando-o pelo avesso.
5. A troca das luvas e a higienização das mãos com álcool gel são obrigatórios entre os
procedimentos realizados num mesmo paciente, não possibilitando desta forma a
disseminação do microorganismo.
6. Desinfecção do termômetro e do diafragma e reentrâncias do estetoscópio com
álcool a 70%, antes e após examinar cada paciente.
7. Quarto separado ou centralizar em uma mesma enfermaria os pacientes com MRSA
é uma medida indicada. Preferencialmente, manter equipes separadas de
profissionais de saúde no atendimento do paciente com MRSA.
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8. O mobiliário e os equipamentos da enfermaria devem ser o mínimo necessário e
utilizados unicamente por estes pacientes (termômetros, aparelhos de pressão,
estetoscópio, bombas infusoras). Na impossibilidade do uso exclusivo do aparelho
de pressão, recomendamos a utilização do protetor (plástico impermeável, papel)
entre a pele e o aparelho.
9. A mobilização do paciente na unidade hospitalar deve ser restringida. Quando
necessária, como para exames (radiografia e outros), os procedimentos de
isolamento de contato devem ser mantidos. O profissional responsável pelo
transporte ou exame deverá seguir as orientações quanto ao isolamento de contato,
usando a paramentação indicada.
10. Os visitantes e acompanhantes deverão respeitar os procedimentos para o
isolamento de contato (lavagem das mãos, uso de capote e luvas de procedimento).
•
Pacientes infectados com MRSA deverão ser tratados com vancomicina ,
teicoplamina ou linezolida.
•
Pacientes suspeitos de CA-MRSA deverão ser informados a CCIH.
•
As medidas de descolonização de pacientes (banho com clorexidina e mupirocina
nasal, 3 vez ao dia, durante 5 dias) e de rastreamento do profissional de saúde serão
indicadas apenas em situações epidêmicas quando orientadas pela CCIH.
•
No momento da transferência do paciente colonizado/ infectado entre os setores do
HGB ou para outras unidades de saúde é indispensável a notificação do setor de
destino.
•
O rastreamento dos pacientes (contactantes) de uma mesma enfermaria de um caso
colonizado/ infectado é indicado somente para aqueles considerados de risco para a
colonização.
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REFERÊNCIAS:
1. Crisóstomo MI, Westh H, Tomasz A et al. The evolution of methicillin
resistance in Staphylococcus aureus. Similarity of genetic bacgrouds in
historically early methicillin-susceptible and resistant isolates and contemporary
epidemic clones. Proc Natl Acad Sci USA 2001;98 (17): 9865-9870
2. Said-Salim B, Mathema B, Kreiswirth BN. Communit-Acquired MethicillinResistant Staphylococcus aureus: An Emerging Pathogen. Infect Control Hosp
Epidemiol 2003; 24:451-455
3. Oliveira DC, Tomasz A, Lencastre H. Secrets of success of a human pathogen:
molecular evolution of pandemic clones of methicillin-resistent Staphylococcus
aureus. Lancet Infect Dis 2002; 2: 180-89
4. Salgado CD, Farr BM, Calfee DP. Community-Acquired Methicillin-Resistant
Staphylococcus aureus: A Meta-Analysis of Prevalence and Risk Factors Clin
Infec Dis 2003; 36:131-139
5. Centers for Disease Control and Prevention. Community-associated MRSA.
Information from the U.S. Centers for Disease Control and Prevention, 2003.
Available from http://www.cdc.gov/ncidod/hip/aresist/mrsa_comm_faq.htm
6. Trindade PA, Pacheco RL, Costa SF et al. Prevalence of SCCmec Type IV in
Nosocomial Bloodstram Isolates of Methicillin-Resistant Staphylococcus
aureus. J Clin Microbiol 2005: 34353437
7. Rybak MJ, LaPlante KL. Community Associated Methicillin-Resistant
Staphylococcus aureus: A Review. Pharmacother 2005;25:74-85
8. Kaplan SL. Treatment of Community Associated Methicillin-Resistant
Staphylococcus aureus infections. Pediatr Infect Dis J 2005;24:457-458
9. WENZEL, R. P., NETTLEMAN MD, J. RN, PFALLER, MA. Methicilliunresistant Staphylococcus aureus: implications for the 1990s and effective control
measures. Am J Med. n . 91 (suppl 3 b ), p . 221 – 227, 1991.

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