Lucia Hippólito - Associação Paulista do Ministério Público
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Lucia Hippólito - Associação Paulista do Ministério Público
Ano II # 18 Lucia Hippólito Por eleições mais limpas Consumidor MP contra a invasão de privacidade Torneio Esportivo Itália campeã (também em Barra Bonita) Expediente: Novos desafios para o MP A questão da violência e criminalidade organizada ocupou grande parte do noticiário nos últimos dois meses. Isso mostra a importância da nossa Instituição. E, ao contrário do que possa parecer, não apenas na questão da repressão, onde a sociedade com certeza precisará de nossos préstimos. Mais necessária, porém, é a atuação do MP como agente de transformação social. Precisamos intensificar a fiscalização para que os políticos realmente destinem os recursos públicos para saúde, transporte e educação. Necessitamos de mais e melhores instrumentos para combater a corrupção, mal que corrói as esperanças da população. É imperativo que as Instituições, estatais e privadas, cerrem fileiras para a urgente mudança do status social. É certo que este desafio é de toda a sociedade, mas podemos - e devemos - ser os indutores dessa mudança. Se abrirmos mão desta prerrogativa, todos os esforços de nossos antecessores poderão ser desperdiçados. Não basta a nossa atuação esmerada para a punição dos criminosos. Precisamos agir para evitar que a “indústria do crime” continue recrutando crianças e adolescentes. Nesses últimos dois anos, lutamos para que a sociedade conhecesse um pouco mais do MP de São Paulo e, de outro lado, que formadores de opinião nos mostrassem como somos vistos pelos cidadãos. E a entrevista desta edição talvez sintetize um pouco de tudo isso. Nossa equipe procurou uma das primeiras pessoas a vaticinar a gravidade da crise que se alastrou pelas Instituições políticas. Mais que isso, tratou de sair pelo país afora para pregar eleições mais limpas e transparentes. É com imensa honra que apresentamos entrevista exclusiva com Lucia Hippólito, cientista política, jornalista e historiadora. Também nesta edição, artigo de nosso associado João Lopes Guimarães Júnior sobre a o direito do consumidor à privacidade, a cobertura do II Torneio Esportivo e a continuação do debate sobre os limites da intervenção do Conselho Nacional do Ministério Público em nossos concursos de promoção e remoção. Boa leitura a todos. Não basta a nossa atuação esmerada para a punição dos criminosos. Precisamos agir para evitar que a “indústria do crime” continue recrutando crianças e adolescentes. João Antonio Garreta Prats Presidente Revista APMP EM REFLEXÃO Veículo mensal de comunicação da Associação Paulista do Ministério Público. Ano II, Número 18 (2006). Tiragem: 4.000 exemplares. Conselho Editorial João Antonio Garreta Prats Cláudia Jeck Garcia de Souza Paulo Roberto Dias Júnior Sérgio de Araújo Prado Júnior Contraponto | Lucia Hippólito 04 Coordenação Geral Luciano Ayres Jornalista Responsável Elaine Zaninotti – MTB 31.529 Redação Ayres.PP – Comunicação e MKT Estratégico (19) 3242-1180 Assessoria de Imprensa ReDe Comunicação (11) 3061-3353 Fotos Ayres.PP – Comunicação e MKT Estratégico Leandro Irmão Acompanhe o universo jurídico com a APMP TV Justiça Quarta-feira - 19h30. Reprises: Domingo -10h30 Segunda-feira - 10h00 TV Justiça Terça-feira - 19h30 Reprises: Domingo - 18h00 Terça-feira - 09h00 Maxima Venia | A criação de bancos de dados clandestinos e o direito do consumidor à privacidade 14 MP em foco | Futuro do MP X MP do Futuro 24 História Institucional | 20 anos da Carta de Curitiba 32 APMP Esportes | II Torneio Esportivo. Deu Itália aqui também! 34 Destinos | Caribe 40 Gastronomia | Culinária Mexicana Leia também: Cultura e Lazer| A travessia de Guimarães Rosa 44 48 Contraponto Como os formadores de opinião enxergam o MP Lucia Hippólito Que um bom cientista político é um analista arguto dos meandros e perspectivas da política nacional, todo mundo sabe. Como também sabe que um bom jornalista de rádio e TV tem como principais dons a articulação e concisão de idéias, o domínio da palavra e o pensamento rápido. O que poucos sabem é que existem personalidades que acumulam as duas qualidades. Lucia Hippólito é uma delas. O diploma de jornalismo veio muito tempo depois de Lucia já dominar inteiramente a comunicação em todas as mídias. Imprensa escrita, Internet, rádio e, por fim, a “telinha”. A essa altura, impressionava a desenvoltura dessa cientista política, que se portava como uma jornalista experiente, ainda que autodidata. E o que dizer do conteúdo de suas manifestações. Na Rádio CBN, o jingle do quadro “Por dentro da po- www.apmp.com.br lítica”, seguido do indefectível “Bom dia, Lucia” de Heródoto Barbeiro, é a deixa para comentários e análises por vezes demolidores, mas sempre sensatos e precisos. Nesta entrevista exclusiva, Lucia Hippólito fala de sua trajetória profissional, analisa com profundidade o governo Lula e as perspectivas da política brasileira e faz um balanço da atuação do Ministério Público no combate à corrupção e na luta por eleições limpas e transparentes. Tudo isso só para você, leitor de APMP em Reflexão. www.apmp.com.br Contraponto Perfil Lucia Hippólito é cientista política, historiadora, jornalista, consultora e conferencista. Formada em História pela PUCRJ e em Ciência Política pelo IUPERJ, concluiu recentemente o curso de Jornalismo. Comentarista da Rádio CBN, do UOL News e da Globonews, também colabora com diversos jornais e revistas. Em eleição promovida pela revista Imprensa, foi escolhida a melhor jornalista de rádio de 2004. APMP em Reflexão: Como foi sua trajetória profissional? Lucia Hippólito: Desde cedo a História e a Política me interessaram muito. Sempre tive talento didático para traduzir a política para o dia-a-dia. Comecei como professora de História, fui fazer Ciência Política, até que enveredei para o campo das questões constitucionais. O cientista político trafega numa área muito próxima do Direito Constitucional. É preciso conhecer a Constituição, ter intimidade com a lei e eu sempre gostei muito disso. Posteriormente, achei que deveria ter uma experiência no Estado e comecei a trabalhar no IBGE, onde fui chefe de gabinete da Presidência e coordenei a comunicação do Censo. APMP: E sua experiência no Jornalismo? LH: Sempre escrevi para jornais. Fui convidada para trabalhar em O Globo, como professora da Redação, Acredito firmemente na democratização da informação. Na medida em que você coloca a informação à disposição de um maior número de pessoas, você está trabalhando pela democracia. www.apmp.com.br APMP: Qual a importância da informação no desenvolvimento social? LH: Acredito firmemente na democratização da informação. Na medida em que você coloca a informação à disposição de um maior número de pessoas, você está As pessoas de bem se afastaram da política, que está entregue à pior escória do país (...) A política, que era uma vocação, hoje está sendo encarada como profissão, como forma de ascensão social ou para escapar da cadeia, por conta desse inadmissível foro privilegiado. trabalhando pela democracia. Uma população mais bem informada é uma população que pode escolher melhor, fazer suas escolhas de maneira mais consciente e entender melhor o que está se passando. ministrando aulas sobre política e questões constitucionais. Era a época do plebiscito e comecei a ensinar os repórteres que desconheciam os diferentes sistemas de governo. Fizemos também algo bastante interessante: passamos a responder às perguntas dos leitores sobre esse assunto, sobre regimes de governo no mundo etc. APMP: Como a sociedade brasileira tem avaliado o exercício da política? LH: Hoje, um dos problemas é que as pessoas de bem se afastaram da política, que está entregue à pior escória do país. Quando mais da metade da Câmara dos Deputados está envolvida em corrupção, “sanguessuga” e “mensalão”, as pessoas se perguntam: “mas o que é isso?”. A política, que era uma vocação, hoje está sendo encarada como profissão, como forma de ascensão social ou para escapar da cadeia, por conta desse inadmissível foro privilegiado. Acho que é função de todos fazer com que as pessoas de bem voltem a se preocupar com a política. APMP: E isso possibilitou sua ida para o rádio, não é mesmo? LH: É verdade. O trabalho em O Globo proporcionou o convite da direção da Rádio CBN para fazer uma experiência nas eleições de 2002. Aceitei o desafio e fui ampliando minha atuação, com comentários sobre a área política na Internet e agora na TV. Senti, então, a necessidade de fazer o curso de Jornalismo, que concluí este ano, até para evitar essa controvérsia a respeito da necessidade do diploma. APMP: Essa indignação foi por você extravasada em livro sobre a recente crise política ... LH: Admito que fiquei muito assustada quando comecei a reunir os textos para esse livro, que contém comentários feitos na Rádio CBN desde 2003. Em agosto de 2003, eu já falava do aparelhamento da máquina. Em janeiro de 2004, depois do escândalo do Waldomiro, citei a desarticulação da base partidária, a suspeita de que parlamentares estavam vendendo mandatos, a história do deputado “pré-pago”. Isso é, ao mesmo www.apmp.com.br Contraponto tempo, curioso e assustador. Cheguei a ficar assustada ao ver como os ingredientes da crise estavam debaixo dos nossos olhos. APMP: E a maior parte da população não percebeu nada... LH: Nesse ponto a imprensa tem grande responsabilidade, porque os dados estavam ali expostos. Um livro feito “a quente”, como foi, corre o risco de ficar obsoleto. Até agora não encontrei nenhuma razão para achar que isso aconteceu. APMP: Nem quanto à sua afirmação de que o governo Lula terminara? LH: O livro foi lançado no final do ano passado e nele mencionei que o governo Lula acabou em agosto de 2005. Acho que não errei, porque eu me referia àquele governo Lula montado sob dois pilares muito firmes: José Dirceu, de um lado, e Palocci, do outro. Com o Dirceu cassado e o Palocci, naquela época, acossado por denúncias, o Governo Federal, tal como desenhado em 2003, de fato acabara. O que temos agora é uma outra história, pois o governo, de lá para cá, mudou radicalmente. APMP: Que lições o país pode tirar de tudo isso? O Brasil estará melhor na próxima legislatura? LH: Melhor eu não sei. Tenho muitas dúvidas para trabalhar com esse conceito de “pior” ou “melhor”. Ele está mais informado. Agora, as escolhas que o país vai fazer é que serão analisadas. Nem sempre renovar é melhorar. Está circulando na Internet uma campanha: “Não reeleja, eleja!”; ou seja, para não votar em quem tem mandato. Nada garante que o próximo Congresso, se for todo renovado, será melhor que o anterior. Porque não adianta mudar as pessoas, se as práticas e os métodos não mudarem. APMP: A questão “Lula sabia?” ainda tem relevância? LH: Sim. Acredito que o presidente Lula sabia. Ou, pior, escolheu não saber. Há muito tempo ele escolheu não saber quem pagava a casa onde ele morava, quem custeava as despesas dele enquanto líder sindical, quem pagou as despesas de campanha... e escolheu não saber como o partido dele se viu às voltas com aquela quantidade enorme de dinheiro. Eram jatinhos alugados, festas, computadores comprados para todos os lugares, enfim, campanhas milionárias, onde nunca faltava dinheiro, muito diferente www.apmp.com.br A Petrobrás não era apenas uma empresa estrangeira investindo na Bolívia, ela fazia parte de acordos firmados desde 1978 por dois Estados independentes (...) Então, a Petrobrás não era uma mera empresa privada nesse episódio, era um agente do Estado Brasileiro para que os acordos fossem viabilizados. E qual foi o sinal que o Brasil deu ao mundo inteiro? Pode interferir, encampar e se apropriar de empresas brasileiras em qualquer lugar do mundo, porque isso não tem importância. das campanhas anteriores. Para mim, o presidente tomou uma decisão: ele não quis saber. Mas no fundo eu acho que ele sempre soube. APMP: Nesse particular, o presidente reclamou muito que sua esfera pessoal foi invadida. Isso tem fundamento? LH: Minha posição é a seguinte: autoridades não têm vida privada. Ninguém é obrigado a fazer política e ninguém é obrigado a ser presidente da República. Ao escolher esse caminho, deve estar ciente de que viverá numa vitrine. O presidente da República não deixa de sê-lo nem quando está dormindo. Ele é presidente 24 horas por dia. Se estourar uma crise pavorosa de madrugada, ele não pode dizer para o assessor que está dormindo. Vida privada tem o Ronaldinho, que pode ir para a boate e reclamar de invasão da esfera pessoal. Não uma autoridade que mora num palácio pago pelo nosso dinheiro. A comida que ele come, os lençóis da cama onde ele dorme, tudo é pago por nós. Então, ele tem que prestar contas à sociedade, sim, inclusive de sua vida privada. APMP: Parte do Partido dos Trabalhadores parece bastante incomodada com os desmandos da cúpula do partido. É uma sensação correta? LH: Acho que a esquerda do PT, que cobra ética de seus dirigentes, tem sua parcela de responsabilidade, porque não é possível que eles não estivessem vendo os jatinhos com os quais o Delúbio se deslocava. Não é possível que não vissem como o Silvinho Pereira progredia. Será que não estranharam como, em 2004, não faltou dinheiro ao PT para as eleições municipais? Essa esquerda de certa forma se beneficiou um pouco e foi omissa. Teve várias oportunidades, inclusive nos últimos congressos do PT, e de novo se curvou à estratégia quase que “bolchevique” de se apropriar do poder. APMP: Pela primeira vez na história, uma crise política de tamanha proporção não migrou para o cenário econômico. Qual a razão disso? LH: Até agora ela não havia migrado, mas acho que ainda vai acontecer, porque há uma série de decisões que dependem da esfera política. Por exemplo, a agricultura do Rio Grande do Sul está vivendo a pior crise dos últimos 40 anos. Decisões políticas não foram tomadas no sentido de liberar créditos e consertar estradas. Por causa da crise e da quebra da safra de soja, fomos salvos de um engarrafamento de caminhões de 100 km, do porto de Paranaguá até a cidade de Curitiba. Por isso devemos aplaudir a crise? Se a safra de soja não tivesse quebrado, ia ser um desastre, porque decisões políticas não foram tomadas. www.apmp.com.br Contraponto APMP: Poderia dar outros exemplos? LH: Não foram tomadas decisões a respeito das parcerias público-privadas e do marco regulatório. O projeto sobre as agências regulatórias está parado no Congresso. Quem irá investir no Brasil se não houver estabilidade das regras? Tudo o que aconteceu até agora foi reflexo de boas ações plantadas por muitos governos anteriores, como exportações recordes, safras recordes. O presidente reclama do Congresso, mas quando o Executivo quer o Congresso vota. Daqui para frente, as decisões políticas vão interferir muito fortemente na economia. tos mais interessantes foi a inserção internacional do presidente. Fernando Henrique era quase um europeu, um “igual”. Lula era o “diferente” e por isso chegou ao cenário político cercado de expectativas pela esquerda mundial, de que iria fazer um governo de esquerda não populista e nem revolucionário, diferente da maioria dos governos da América Latina. Sob esse ponto de vista, ele despertou expectativas muito positivas da comunidade internacional. Porém, no caso desse delírio em busca da cadeira no Conselho de Segurança da ONU, o governo tomou decisões absolutamente equivocadas. APMP: A ambição do presidente Lula era fazer um governo de projeção internacional. Ele conseguiu isso? LH: No primeiro ano do governo Lula, um dos pon- APMP: Como assim? LH: Dar à China status de economia de mercado acabou com a indústria têxtil do sul do Brasil e Está circulando na Internet uma campanha: “Não reeleja, eleja!”; ou seja, para não votar em quem tem mandato. Nada garante que o próximo Congresso, se for todo renovado, será melhor que o anterior. Porque não adianta mudar as pessoas, se as práticas e os métodos não mudarem. O voto nulo, numa eleição majoritária, tem um sentido enorme. De outro lado, numa eleição proporcional o voto nulo faz com que você deixe de eleger o cidadão de bem e acabe elegendo o “clientelista”, que é o sujeito votado por gente menos informada. Em suma, na ânsia de protestar, com o voto nulo você acaba piorando o resultado da sua ação. com a indústria de calçados. Dar prioridade ao perdão da dívida de países africanos, às relações com os países da América Latina...não que não devamos mantê-las, mas em política internacional não existem amigos, existem interesses. Pela primeira vez houve grande confusão ideológica no Itamaraty, que é uma casa muito profissional e vem sofrendo com interferências indevidas durante o governo Lula. APMP: Nessa avaliação, como se insere a crise Bolívia-Petrobrás? LH: Esse episódio é algo complicado, porque a Petrobrás ficou muito desamparada. A Petrobrás não era apenas uma empresa estrangeira investindo na Bolívia, ela fazia parte de acordos firmados desde 1978 por dois Estados independentes. Houve aproximações sucessivas entre Brasil e Bolívia, que culminaram na presença da Petrobrás como investidor para viabilizar, inclusive, a economia do gás. Então, a Petrobrás não era uma mera empresa privada nesse episódio, era um agente do Estado Brasileiro para que os acordos fossem viabilizados. E qual foi o sinal que o Brasil deu ao mundo inteiro? Pode interferir, encampar e se apropriar de empresas brasileiras em qualquer lugar do mundo, porque isso não tem importância. É paradoxal você conjugar uma posição de liderança com uma atitude tão paternalista. APMP: Como vê o crescente aumento da influência de Hugo Chávez no continente? LH: O presidente Chávez está numa situação também um pouco complicada. Ele está sentado em cima de um “mar de petróleo”, mas a indústria petrolífera venezuelana vive um momento difícil. Eles diminuíram muito a produção nos últimos anos e, para honrar seus acordos com os Estados Unidos, estão importando petróleo da Europa para poder refinar e manter seus canais abertos com os EUA. Recurso natural é o seguinte: você pode estar sentado em cima da maior mina ou jazida do mundo. Se ela está no solo sem exploração, não vale nada. APMP: O Congresso não promoveu nem metade das cassações que se esperava. Teme que isso cause uma enxurrada de votos nulos? LH: O voto nulo é uma faca de dois gumes. Por um lado, é um voto legítimo de protesto, absolutamente democrático. Uma das minhas brigas com a Justiça Eleitoral é que a urna eletrônica tem teclas para voto branco, mas não para voto nulo. O voto nulo, numa eleição majoritária, tem um sentido enorme. De outro 10 www.apmp.com.br www.apmp.com.br 11 Contraponto lado, numa eleição proporcional o voto nulo faz com que você deixe de eleger o cidadão de bem e acabe elegendo o “clientelista”, que é o sujeito votado por gente menos informada. Em suma, na ânsia de protestar, com o voto nulo você acaba piorando o resultado da sua ação. APMP: Como projeta um possível segundo mandato do presidente Lula? LH: Imagine que em 2002, quando já havia aquela maré de boa vontade em relação ao PT e ao presidente, ele não fez maioria na Câmara, apenas 91 deputados, ou seja, 17% da Câmara. Num eventual segundo mandato, é evidente que a posição do PMDB é estratégica, porque o presidente precisa de apoio, de coalizão. O PT deve “emagrecer” e o PMDB, que provavelmente fará a maior bancada, sabe que seu apoio será crucial e já está cobrando adiantado. APMP: Qual a importância de associações como a AMB e a APMP encamparem uma campanha como a “Operação Eleições Limpas”? LH: Tudo que ajudar a esclarecer o eleitor e aumentar o grau de informação sobre o “pode” e “não pode” de uma eleição é ótimo. Quem tem informação, tem poder. Na medida em que se democratiza a informação, você tira o poder de certos grupos, de certas elites, de certas corporações, e dissemina esse poder pela sociedade. Isso só pode ser bom. Uma iniciativa como essa tem que ser aumentada e repetida inúmeras vezes. É evidente que a APMP e a AMB têm um papel crucial nessa história. O papel pedagógico de ensinar, de dividir conhecimento. APMP: Volta e meia vem à tona a idéia de amordaçar o Ministério Público e impedir que investigue a corrupção, além das tentativas de controlar a imprensa. Qual sua análise sobre isso? LH: Qualquer forma de censura é uma barbaridade. Nós lutamos demais neste país, perdemos energia, gente e tempo de vida para instalar a liberdade de imprensa e acabar com a censura. E lutamos muito para ver uma instituição como o Ministério Público funcionar no país. Qualquer atitude que signifique censura vai me colocar na linha de frente contra isso. Eu e muita gente. APMP: O Ministério Público tem trabalhado adequadamente para combater a corrupção estatal? LH: A partir de um início um pouco exagerado, do que eu chamava de “jovens jacobinos, salvacionistas”, 12 www.apmp.com.br Desde a criação desse novo Ministério Público, nós tivemos um avanço extraordinário. E acredito que ele seja uma das peças importantes na instalação da democracia real, não essa democracia formal, em qual falta a universalização do acesso aos bens da civilização, o que ainda está longe de conquistarmos. acredito que hoje o Ministério Público está equilibrado, porque diminuiu aquele “namoro com os holofotes” e passou a ter uma atuação mais discreta. O trabalho do Procurador-Geral da República, por exemplo, no caso do “mensalão”, foi impecável. O Ministério Público trouxe um sopro de ar fresco na investigação. Portanto, é bom não perder esse entusiasmo dos jovens promotores. Alguns equívocos que eles cometeram são naturais do processo de aprendizado. De qualquer forma, desde a criação desse novo Ministério Público, nós tivemos um avanço extraordinário. E acredito que ele seja uma das peças importantes na instalação da democracia real, não essa democracia formal, na qual falta a universalização do acesso aos bens da civilização, o que ainda está longe de conquistarmos. “Por dentro do Governo Lula” Lucia Hippólito Editora Futura “Nunca mais as coisas serão as mesmas. O PT não é mais o mesmo partido que era até quinta-feira passada. O cristal se quebrou”. Com essa frase profética a cientista política Lucia Hippolito se dirigiu a seus ouvintes da Rádio CBN logo após o golpe letal sofrido pelo mais poderoso ministro do Governo, num enredo escabroso que envolveu seu principal assessor, em fevereiro de 2004. José Dirceu não caiu naquele momento, mas desde então Lucia vem acompanhando de perto as manobras do Planalto para colar os cacos. Esforços frustrados que, somados a novas acusações de corrupção, perda do controle da agenda política, derrota em eleições municipais e implosão da base aliada, fizeram a autora afirmar, antes do desfecho da crise, que o governo Lula acabara “antes da hora”. Por Dentro do Governo Lula mostra ao leitor tudo o que ele quer saber sobre os bastidores de uma crise política sem precedentes na história da democracia nacional. www.apmp.com.br 13 Maxima Venia A Contribuição de nossos associados para a Sociedade A Revista APMP em Reflexão abre espaço para os seus associados divulgarem artigos de interesse da comunidade e com isso aproximar nossa Instituição do destinatário final de nossas ações: o cidadão. As condições para a publicação estão disponíveis na página: www.apmp.com.br/ apmpemreflexao/maximavenia. Colabore e escreva para: [email protected], com sugestões de matérias ou artigos. Os artigos da seção Maxima Venia são assinados, não refletindo necessariamente a opinião do Conselho Editorial da Revista APMP em Reflexão. CRIAÇÃO DE BANCOS DE DADOS CLANDESTINOS E O DIREITO DO CONSUMIDOR À PRIVACIDADE João Lopes Guimarães Júnior Promotor de Justiça do Consumidor em São Paulo 1. Privacidade como condição para a liberdade e para a democracia O direito à privacidade é uma das garantias fundamentais concernentes à liberdade. A Constituição Federal assegura a todo cidadão proteção de sua vida íntima, para que não seja devassada por terceiros: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” (art. 5º, inc. X).1 Essa garantia, que consta da Declaração Univer- 14 www.apmp.com.br sal dos Direitos Humanos2, é de inspiração liberal, tendo sido concebida inicialmente para impedir a intromissão indevida do Estado na esfera particular da vida das pessoas. É fruto também de uma concepção individualista que surgiu como base da democracia moderna, e que “repousa na soberania não do povo, mas dos cidadãos”. Norberto Bobbio afirma que “não há nenhuma Constituição democrática que não pressuponha a existência de direitos individuais, ou seja, que não parta da idéia de que primeiro vem a liberdade dos cidadãos singularmente considerados, e só depois o poder do Governo, que os cidadãos constituem e controlam através das suas liberdades”.3 No que concerne à privacidade, aspectos sociais e psicológicos ajudam a compreender sua importância. Em qualquer sociedade humana, a hierarquia estará presente e as pessoas tenderão a buscar prestígio e aceitação social.4 Para manter um bom nível de auto-estima e uma boa posição no ranking social, cada indivíduo cuida de criar para si uma imagem aceitável nos ambientes em que circula. Nessa lógica, há aspectos de sua vida pessoal que poderão afetar negativamente o apreço que goza de seus pares e que, portanto, não lhe interessa que cheguem ao conhecimento alheio. Pela mesma lógica, a competição e as inimizades estimulam a maledicência e a fofoca: o interesse em divulgar informações depreciativas sobre os outros mobiliza muita energia em qualquer ambiente social humano.5 Existe interesse concreto na devassa da vida privada e até mesmo o lixo doméstico pode se transformar em fonte de informações sobre os hábitos de alguém.6 É, portanto, para preservação da honra pessoal – bem que alcançou proteção da lei penal – que o ordenamento jurídico preocupa-se com a manutenção de determinadas informações fora do alcance de outras pessoas: ninguém é obrigado a suportar a completa transparência do seu modus vivendi. Todo homem tem direito de manter suas atividades pessoais, sejam elas excêntricas ou não, desconhecidas do público. Não se pode, antecipadamente, aquilatar a importância das diversas informações sobre a vida pessoal de alguém: o repúdio e a admiração de cada aspecto pode variar conforme os valores vigentes em cada época ou grupo específico. Muitos homens, por exemplo, avaliam que a divulgação de suas aventuras sexuais às vezes pode lhes trazer prestígio. No entanto, para o juiz Clarence Thomas, da Suprema Corte dos EUA, e para o ex-Presidente Bill Clinton, episódios envolvendo relacionamento com mulheres afetaram negativamente suas reputações. Há mais de cem anos, o consumo de cocaína, que atraía intelectuais da importância de Sigmund Freud, não trazia a depreciação social que traz hoje. 2. Conteúdo do direito à privacidade Assim como outras liberdades, o direito à privacidade implica em comando negativo: garanti-la ao cidadão significa proibir que aspectos de sua vida particular sejam devassados. A CF, no art. 5º, X, quer impedir que qualquer pessoa, sob qualquer pretexto, invada sem autorização qualquer um dos diversos aspectos da esfera pessoal do indivíduo, que devem ser preservados em nome da privacidade.7 Para que a vida privada se mantenha sob sigilo é preciso impedir que terceiros a investiguem, divulguem, ou mesmo conservem informações indevidamente obtidas.8 E são indevassáveis todos os aspectos da intimidade 9, como “o modo de vida doméstico, nas relações familiares e afetivas em geral, fatos, hábitos, local, nome, imagem, pensamentos, www.apmp.com.br 15 Maxima Venia segredos, e, bem assim, as origens e planos futuros dos indivíduos”.10 Informações sobre os hábitos pessoais são objeto de proteção. A rotina de cada um, os locais que freqüenta, as pessoas que encontra, os produtos que consome: nada está disponível ao conhecimento alheio. Tércio Sampaio Ferraz Jr. lembra que o “terreno da individualidade privativa é regido pelo princípio da exclusividade”, explicando que “aquilo que é exclusivo é o que passa pelas opções pessoais, afetadas pela subjetividade do indivíduo e que não é guiada nem por normas nem por padrões objetivos. No recôndito da privacidade se esconde, pois, a intimidade. A intimidade não exige publicidade porque não envolve direitos de terceiros. No âmbito da privacidade, a intimidade é o mais exclusivo dos seus direitos”.11 Concerne à vida íntima do indivíduo tudo aquilo que ele consome, inclusive os produtos que adquire num supermercado. Ninguém tem direito de saber quais mercadorias ele leva para sua casa; se compra produtos viciadores, cujo consumo abusivo é mal visto por alguns, como cigarro e bebidas alcoólicas; se compra preservativos, cujo uso permite ilações sobre sua vida sexual. Pode ofender o pudor do consumidor a divulgação da informação de que compra raticida, xampu que combate a caspa, tintura de cabelo ou fixador de dentadura. Pode haver legítimo interesse na discrição sobre eventuais gastos exagerados com produtos caríssimos e supérfluos, como caviar. É evidente, pois, que da coleta e do armazenamento dessas informações resulta uma ameaça à privacidade dos consumidores. Segundo Celso Bastos, “todas as despesas ordinárias feitas pelo cidadão comum em sua vida cotidiana devem ser consideradas parte de sua vida privada, familiar ou doméstica e, portanto, protegidas contra interferências a despeito de qualquer pretexto. Desde as condutas mais corriqueiras, como as compras efetuadas em um supermercado para manutenção da família, quanto aquelas outras moralmente reprováveis, como presentes ou jóias compradas e dadas a quem presta ao homem serviços de natureza extraconjugal, tudo está abarcado pelo manto da proteção à vida privada, familiar ou doméstica”. 12 Para manter um bom nível de auto-estima e uma boa 3. Empresas privadas e seu interesse por informações pessoais posição no ranking social, Quem pode devassar indevidamente a privacidacada indivíduo cuida de criar de do cidadão? para si uma imagem aceitável nos Os Estados totalitários, com seus serviços de inteligência e polícias secretas, ambientes em que circula. Nessa ocuparam tradicionalmente o papel lógica, há aspectos de sua vida pessoal de grandes inimigos da privacidade dos indivíduos. No final do século que poderão afetar negativamente o apreço passado, no entanto, as ameaças que goza de seus pares e que, portanto, não lhe passaram a vir de grandes conglointeressa que cheguem ao conhecimento alheio. 16 www.apmp.com.br Ninguém tem direito de saber quais mercadorias ele leva para sua casa; se compra produtos viciadores, cujo consumo abusivo é mal visto por alguns, como cigarro e bebidas alcoólicas; se compra preservativos, cujo uso permite ilações sobre sua vida sexual. merados que surgiram disputando mercado numa escala massificada.13 Estratégias de marketing, essenciais para o bom desempenho das empresas num mercado competitivo, alimentam-se de informações sobre os hábitos dos consumidores. Listas com determinados perfis de consumidores possibilitam aos fornecedores um acesso direto a seus compradores ou clientes potenciais, com racionalização e economia de custos. Além disso, as informações servem para aumentar o grau de rapidez e segurança nas decisões, dinamizando, assim, a economia, pois “se o armazenamento ou uso dessa informação é restringido, financeiras reagirão como reagiram em outros países, através da redução do número e do universo de pessoas para as quais concederão financiamentos. Um estudo do Banco Mundial de 2000, por exemplo, mostrou que leis de privacidade restritivas eliminariam 11 de cada 100 pessoas normalmentequalificadas para obter hipotecas, cartões de crédito e outros empréstimos. Tais leis, portanto, correm o risco de negar oportunidade para dezenas de milhões de consumidores americanos.”14 Os defensores da eficiência do mercado argumentam: “Quando há menos informação disponível, as empresas precisam gastar mais para negociar seus produtos e serviços. A concessão de crédito e outras decisões financeiras são menos precisas e, portanto, resultam em mais inadimplência. O uso indevido de identidade alheia e outras perdas fraudulentas aumentam”.15 Os cidadãos – agora tratados como meros consumidores – são vigiados, pesquisados, interrogados. Bancos de dados minuciosos armazenam diversas informações pessoais, muitas delas íntimas: nome, sexo, endereço, profissão, idade, estado civil, número e idade dos filhos, patrimônio, rendimentos, hobbies, hábitos de consumo etc.16 Cartões de fidelidade de redes de comércio varejista permitem a reunião de dados sobre os livros e os remédios que compramos. No caso dos supermercados, temos a nossa despensa vigiada. Empresas de cartões de crédito podem saber tudo sobre nosso cotidiano: as viagens que fazemos, as lojas e os restaurantes que freqüentamos, a quantidade de dinheiro que gastamos. Empresas de telefonia celular podem monitorar nossos deslocamentos pela cidade. Pode-se afirmar que o cidadão moderno não se importa e que até gosta de ser tratado como consumidor. Que nossa sociedade é de fato marcada pelo hedonismo, pelo materialismo e pela vaidade que geram o consumismo e que é através do consumo que suprimos necessidades primordiais. Nessa perspectiva, a violação de nossa privacidade pelas empresas é aceitável: quanto melhor os fornecedores conhecerem os consumidores, melhor atenderão seus desejos. Há, todavia, um limite ético a ser imposto: o ser humano deve ser tratado sempre como agente, como sujeito titular de direitos, e não como mero objeto na lógica de um sistema voltado para o lucro. No que toca a esse esquadrinhamento de sua vida pessoal, é preciso que ele tenha pleno conhecimento da devassa, de seus limites e de seu uso, e que ele expressamente a autorize. Cada indivíduo é o senhor de sua intimidade. Cabe a ele permitir ou não qualquer intromissão. O emprego de meios sub-reptícios para a obtenção de dados, seu armazenamento e uso clandestinos são práticas que violam o tratamento ético, fundado na confiança e na boa-fé, que deve prevalecer nas relações de consumo. www.apmp.com.br 17 Maxima Venia 4. Banco de dados de proteção ao crédito e banco de dados com fins mercadológicos: legalidade e requisitos Apenas motivos relevantes – como a proteção ao crédito e o combate ao crime e à sonegação – autorizam, excepcionalmente, o acesso a informações privadas. Existem bancos de dados criados exclusivamente para proteção ao crédito (Serasa, SPC etc.). A lei reconhece, e portanto autoriza, sua existência e até lhes confere caráter público (CDC, art. 43, § 4º).17 Há, aqui, um evidente balanceamento dos interesses envolvidos, com a ponderação de que o registro de informações destinadas à segurança das transações é admissível porque resulta no bom funcionamento do sistema econômico.18 Numa sociedade de consumo de massa, os fornecedores contratam com pessoas desconhecidas, estando sempre presente um fator de imprevisão e, conseqüentemente, de risco. Esse risco pode ser minimizado através da consulta a um banco de dados com informações sobre o nível de adimplência das pessoas em suas obrigações contratuais. Estamos diante de uma exceção, pois o direito de privacidade não é absoluto: “O direito à inviolabilidade dessa franquia individual – que constitui um dos núcleos básicos em que se desenvolve, em nosso País, o regime das liberdades públicas – ostenta, no entanto, caráter meramente relativo. Não assume e nem se reveste de natureza absoluta. Cede, por isso mesmo, às exigências impostas pela preponderância axiológica e jurídico-social do interesse público”.19 É importante atentar para o silogismo subjacente: 1) o direito de privacidade é garantido com ressalvas; 2) apenas uma razão socialmente relevante autoriza a sucumbência do direito de privacidade; 3) para fins de proteção ao crédito justifica-se excepcionalmente a existência de arquivos. E é justamente por essa razão – proteção ao crédito – que a Lei Complementar nº 105/01 não considera violação do dever de sigilo o fornecimento, pelas instituições financeiras, de informações constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisão de fundos e de devedores inadimplentes a entidades de proteção ao crédito (art. 1º, § 3º, II).20 É legal o banco de dados quando sua finalidade é a proteção ao crédito: o consumidor não pode se opor a sua criação. Há, no entanto, uma série de restrições, como o direito do consumidor de ser comunicado de sua abertura, de ter acesso às informações arquivadas a seu respeito e de corrigir informação inexata. Existe ainda a proibição de manter informações desabo- Cartões nadoras referentes a período superior a cinco anos e de fidelidade o dever de comunicação por escrito de redes de comércio (art. 43). E os Tribunais brasileiros vêm reconhecendo o dano moral resultante do uso indevarejista permitem a reunião vido de bancos de dados de proteção ao crédito. de dados sobre os livros e os Ou seja, mesmo o banco de dados autorizado por lei para proteção ao crédito está sujeito a remédios que compramos. No caso ressalvas. Herman Benjamin sustenta que “os dos supermercados, temos a nossa organismos privados ou públicos que armazenam informações sobre os consumidespensa vigiada. Empresas de cartões dores necessitam, assim, de controle de crédito podem saber tudo sobre nosso rígido, seja administrativo, seja judicial. A acumulação de inforcotidiano: as viagens que fazemos, as lojas e os mações sobre o consumidor, restaurantes que freqüentamos, a quantidade de por mais singelas que sejam, não deixa de ser uma invasão dinheiro que gastamos. Empresas de telefonia celular de sua privacidade”. podem monitorar nossos deslocamentos pela cidade. O emprego de meios sub-reptícios para a obtenção de dados, seu armazenamento e uso clandestinos são práticas que violam o tratamento ético, fundado na confiança e na boafé, que deve prevalecer nas O sigilo bancário não teria qualquer consistência se, relações de consumo. para aparelhar a execução, o credor pudesse desvelar os As exceções devem ser interpretadas restritivamente. A finalidade está limitada à proteção do crédito de caráter preventivo: outros interesses privados de credores não prevalecem diante do direito de sigilo de dados. O Superior Tribunal de Justiça não admite violação dos sigilos bancário e fiscal em outros casos, conforme os seguintes precedentes: saldos depositados pelo devedor em instituições financeiras, valendo o mesmo para o pedido de acesso às declarações do contribuinte, em face do sigilo fiscal.23 Assentado na jurisprudência da Terceira Turma do STJ o entendimento no sentido de que as declarações, para fins de imposto de renda, têm caráter sigiloso que deve ser resguardado, salvo 21 22 18 www.apmp.com.br razão excepcional, que não se configura pelo simples interesse de descobrir bens a penhorar.24 E o que dizer do banco de dado que não visa à proteção do crédito, cuja abertura não encontra justificativa na segurança das transações? Não há nenhum interesse público que legitime o armazenamento de informações pessoais para fins meramente mercadológicos. Existe, portanto, uma distinção fundamental: há dois tipos de banco de dados. Um deles, que visa à proteção ao crédito, é como visto admitido pelo ordenamento jurídico em razão de vantagens que propicia ao sistema econômico (segurança, rapidez, baixo custo etc.). O outro tipo de banco de dados não se relaciona à proteção ao crédito, mira apenas interesses de fornecedores (criação de mailing lists, orientação de decisões empresariais, marketing etc.). Não há proibição legal para a formação desse segundo tipo de banco de dados, desde que isso não implique em violação do direito de privacidade. A garantia constitucional do art. 5º, X, impede que se bisbilhote o comportamento alheio e que se armazene indevidamente informações pessoais. Assim, sob pena de violar o direito de privacidade, só é possível colher e arquivar informações pessoais de quem expressamente os autorize, ciente do alcance da intromissão e de suas finalidades. O consumidor pode, por um ato de liberalidade, participar de pesquisas de mercado e divulgar, de qualquer modo, seus hábitos de consumo. Só ele pode decidir soberanamente sobre os limites que concede ao avanço na esfera de sua intimidade. A coleta furtiva de informações é proibida. É possível, neste particular, uma analogia com a inviolabilidade do domicílio, garantia constitucional também relacionada com a proteção da privacidade. O morador é soberano para decidir quem adentra sua casa, quando, se o acesso fica limitado à área social, se pode se estender à área íntima etc. Ou seja, inviolabilidade não significa proibição total de acesso ao domicílio, mas sujeição à autorização do morador, que estabelecerá os limites. É natural a circulação de informações pessoais nas diversas formas em que se desenvolvem os relacionamentos sociais. Como afirma Tércio Sampaio Ferraz Jr., “ninguém tem um nome, uma imagem, uma reputação só para si mesmo, mas como condição de comunicação. Contudo, embora sejam de conhecimento dos outros, que deles estão informados, não podem transformar-se em objeto de troca do mercado, salvo se houver consentimento”.25 www.apmp.com.br 19 Maxima Venia tradicional, quando a pessoa celebra contrato, estabelece, como regra, que o seu nome, seu endereço e o número constarão no catálogo; entretanto, se disser que não o deseja, a companhia não pode, de modo algum, fornecer tais dados. Da mesma maneira, temos cadastro nos bancos, entretanto, de uso confidencial para aquela instituição, e não para ser levado a conhecimento de terceiros.26 5. Banco de dados e os riscos para o consumidor Sobre a soberania do cidadão quanto ao destino das informações sobre si, o seguinte precedente do STJ: Quando uma pessoa celebra contrato especificamente com uma empresa e fornece dados cadastrais, a idade, o salário, endereço, é evidente que o faz a fim de atender às exigências do contratante. Contrata-se voluntariamente. Ninguém é compelido, é obrigado a ter aparelho telefônico tradicional ou celular. Entretanto, aquelas informações são reservadas, e aquilo que parece ou aparentemente é algo meramente formal pode ter conseqüências seriíssimas; digamos, uma pessoa, um homem, resolva presentear uma moça com linha telefônica que esteja no seu nome. Não deseja, principalmente se for casado, que isto venha a público. Daí, o próprio sistema da telefonia É preciso que o consumidor pondere sua autorização à inclusão de dados sobre sua vida pessoal num arquivo mantido por terceiros levando em conta todos os riscos envolvidos. Os riscos à sua segurança, por exemplo: A proteção da vida privada integra também o direito à segurança, porquanto (...) o conhecimento sem justa causa das relações comerciais, bancárias e toda sorte de gastos ordinários – em época onde até mesmo os menos afortunados são alvo de extorsões, seqüestros e outras formas de violência – constitui grave risco potencial à segurança pessoal e familiar.27 Outra conseqüência visível do banco de dados é o assédio de ofertas, muitas vezes indesejada, que gera: Nossa economia gera uma enorme quantidade de dados. A maioria dessas informações provém de negócios honestos – ao receber e dar informação legítima. Apesar dos benefícios de viver nessa era de informação, alguns consumidores eventualmente desejam limitar a quantidade de informação pessoal que querem compartilhar. Isso é possível: mais e mais organizações utilizam uma alternativa de ‘optar por não participar’ que limita a informação que é compartilhada com outros ou utilizada para propósitos promocionais. Quando você ‘opta por não participar’, é possível reduzir o número de chamadas comerciais não solicitadas (telemarketing), correio promocional, e bombardeios publicitários enviados por correio eletrônico (spam e-mail) que possa receber.28 A informática permite que as empresas criem bancos de dados de forma mais rápida, barata e eficiente. Permite que uma quantidade imensa de informações seja armazenada. E traz um risco concreto e notório de que essas informações sejam acessadas por estranhos, como advertem os especialistas: É legal o banco de dados quando sua finalidade é a proteção ao crédito: o consumidor não pode se opor a sua criação. Há, no entanto, uma série de restrições, como o direito do consumidor de ser comunicado de sua abertura, de ter acesso às informações arquivadas a seu respeito e de corrigir informação inexata. 20 www.apmp.com.br O outro tipo de banco de dados não se relaciona A Internet, a maior rede de à proteção ao crédito, mira apenas interesses computadores do planeta (4,5 mide fornecedores (criação de mailing lists, lhões de computadores interligados, mais de 30 milhões de usuários, 150 orientação de decisões empresariais, mil novos usuários por dia) também marketing etc.). Não há proibição legal para tem os seus cibernautas delinqüentes. São os “hackers”, geralmente jovens a formação desse segundo tipo de banco entre 15 e 25 anos de idade, que penede dados, desde que isso não implique tram ilegalmente em computadores ligados à rede, e roubam ou destroem dados acumulados em violação do direito de privacidade ali por centenas ou até milhares de usuários. (...) Assim (...) só é possível colher O Federal Trade Commission, dos Estados Unidos, também adverte: e arquivar informações pessoais Avanços na tecnologia dos computadores tornaram de quem expressamente os possível que informações detalhadas sobre as pessoas sejam compiladas e partilhadas de modo mais fácil e autorize, ciente do alcance barato do que nunca. Isso é bom para a sociedade como da intromissão e de um todo e para os consumidores individuais. Por exemplo, é mais fácil para encalçar criminosos para a imple- t a d o r i z a suas finalidades. 29 mentação da lei, aos bancos para prevenir fraude, e para os consumidores para aprender sobre novos produtos e serviços, permitindo-lhes fazer decisões de compras mais bem informados. Ao mesmo tempo, uma vez que a informação pessoal torna-se mais acessível, cada um de nós – empresas, associações, órgãos governamentais, e consumidores – devemos tomar precauções para nos proteger contra o uso indevido dessa informação.30 E é evidente que a proliferação de bancos de dados pessoais afeta o direito à privacidade: Com os computadores, o armazenamento de dados fica cada vez mais fácil, com todos os riscos que uma má utilização possa causar. ... Existem muitas entidades privadas que possuem um sem-número de informações dos cidadãos e que ficam com a guarda de muitos dados, sem que haja um controle efetivo sobre os mesmos. O conteúdo comercial, ao estabelecer um perfil do consumidor, é evidente. A intimidade do cidadão fica exposta por largo período de tempo. ( ... ) Os bancos de dados contêm informações que traduzem aspectos da personalidade, que permitem traçar um perfil do consumidor. Essas informações são uma nova mercadoria com interesse comercial. É necessário, por essa razão, proteger o cidadão juridicamente com relação aos avanços da tecnologia, que pode ter sua intimidade violada, caso os dados sejam divulgados ou utilizados indevidamente.31 O risco à liberdade é expressamente reconhecido pelo constitucionalista José Afonso da Silva: O intenso desenvolvimento de complexa rede de fichários eletrônicos, especialmente sobre dados pessoais, constitui poderosa ameaça à privacidade das pessoas. O amplo sistema de informações compu- das gera um processo de esquadrinhamento das pessoas, que ficam com sua individualidade inteiramente devassada. O perigo é tão maior quanto mais a utilização da informática facilita a interconexão de fichários com a possibilidade de formar grandes bancos de dados que desvendem a vida dos indivíduos, sem sua autorização e até sem o seu conhecimento.32 Autorização e conhecimento são dois aspectos lembrados pelo jurista, que assumem grande relevância quando se estuda o tratamento jurídico do problema.33 www.apmp.com.br 21 Maxima Venia 6. Proteção legal à privacidade do consumidor Além da já referida proteção prevista de forma genérica na CF (art. 5º, X), o direito à privacidade é também objeto de tutela por normas infraconstitucionais. O CDC, como visto, impõe no art. 43 ressalvas aos bancos de dados de proteção ao crédito. A Lei Complementar nº 105/01 determina que “As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados” (art. 1º). O Código Civil traz importante dispositivo em seu art. 21: “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”. Essa regra repete a prescrição da Constituição Federal e sua utilidade consiste em afastar qualquer discussão sobre a aplicabilidade da própria norma constitucional (discussão, aliás, que está afastada pelo que determina o § 1º do art. 5º).34 O Código Civil, portanto, não deixa nenhuma dúvida sobre o modo como deve ser efetivada a proteção do direito à inviolabilidade da vida privada: basta ao interessado requerer ao juiz as providências necessárias para impedir ou fazer cessar o ato atentatório. Importante observar que a lei não quis apontar quais seriam as providências possíveis, nem mesmo indicar quais atos devem ser considerados contrários ao direito tutelado. Preferiu atribuir ao juiz tais poderes, o de identificar uma hipótese concreta de violação da vida privada e o de impor as providências necessárias para impedir ou fazer cessar a violação. Toda e qualquer providência, portanto, é, em princípio, admissível, desde que suficientes e imprescindíveis para reparar ou prevenir a violação. De grande utilidade, pois, tal comando legal, uma vez que tantas são as formas possíveis de violação da vida privada que seria impossível prevê-las completamente. Do mesmo modo, muito variadas podem ser as medidas preventivas e corretivas. Não seria conveniente, ademais, deixar que tão relevante garantia constitucional ficasse sem a proteção de um remédio judicial. 22 www.apmp.com.br Notas do texto: 1. Outros dispositivos do art. 5º da CF também salvaguardam a privacidade: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial” (inc. XI). “É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal” (inc. XII). 2. Art. XII: “Ninguém será sujeito a interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Todo homem tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques”. Lembro aqui que “a Declaração Universal representa um fato novo na história, na medida em que, pela primeira vez, um sistema de princípios fundamentais de conduta foi livre e expressamente aceito, através de seus respectivos governos, pela maioria dos homens que vive na Terra” (Norberto Bobbio, A Era dos Direitos, 10ª ed., Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 28). 3. A Era dos Direitos, 10ª ed., Rio de Janeiro: Campus, 1992, p.120. 4. Cf. Robert Wright, O Animal Moral, 9ª ed., Rio de Janeiro: Elsevier, 1996, especialmente Capítulo 12. 5. “Em um pequeno grupo (digamos um grupo do tamanho de uma aldeia de caçadores-coletores), uma pessoa tem um grande interesse em diminuir a reputação dos outros, particularmente outros do mesmo sexo e idade, por quem sente uma rivalidade natural” (Robert Wright, op. cit., p. 230). Na lista dos universais humanos compilados pelo antropólogo Donald E. Brown constam os mexericos e a preocupação com a percepção alheia da auto-imagem (A lista está reproduzida em Tábula Rasa – a negação contemporânea da natureza humana, de Steven Pinker, São Paulo: Cia. Das Letras, 2004, pp. 587-591. 6. Cf. Eliane Cantanhêde, O lixo e a intimidade, Folha de S. Paulo, 08/12/2004. 7. Cf. ensina José Afonso da Silva, “o caráter imperativo das normas jurídicas revela-se no determinar uma conduta positiva ou uma omissão, um agir ou um não-agir; daí distinguirem-se as normas jurídicas em preceptivas – as que impõem uma conduta positiva – e em proibitivas – as que impõem uma omissão, uma conduta omissiva, um não-atuar, não fazer” (Aplicabilidade das Normas Constitucionais, São Paulo: Malheiros. 3ª ed., 1999, p. 67). O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concedeu liminar determinando a proibição, a empresa atacadista, de proceder a revistas ou conferências de compras já realizadas por seus fregueses por ofensa à intimidade e privacidade, ao direito de locomoção e à propriedade (Quinta Câmara de Direito Privado – Agravo de Instrumento nº 252.684.4/9 – rel. Des. Marcus Andrade – 24.10.02). Sobre o sigilo dos vencimentos: “1. A remuneração dos servidores públicos está prevista em lei, com publicidade ampla para conhecimento dos interessados. 2. Diferentemente, não pode o cidadão ter acesso à intimidade de cada servidor. 3. Impossibilidade de conceder a Administração certidão nominal dos ganhos de cada servidor. 4. Recurso ordinário improvido.” (STJ – RMS 14163 – Relatora Min. Eliana Calmon – Segunda Turma – 27.08.2002) 8. Cf. José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo: Malheiros. 14ª ed., 1997, p. 204. 9. Tércio Sampaio Ferraz Jr. diferencia a vida privada da intimidade pelo maior grau de exclusividade da última. Sustenta que “a intimidade é o âmbito do exclusivo que alguém reserva para si, sem nenhuma repercussão social, nem mesmo ao alcance de sua vida privada que, por mais isolada que seja, é sempre um viver entre os outros (na família, no trabalho, no lazer em comum)”. Já a vida privada, segundo o jurista, “envolve a proteção de formas exclusivas de convivência. Trata-se de situações em que a comunicação é inevitável (em termos de relação de alguém com alguém que, entre si, trocam mensagens), das quais, em princípio, são excluídos terceiros” (Sigilo de Dados: O Direito à Privacidade e os Limites à Função Fiscalizadora do Estado, Cadernos de Direito Constitucional e de Ciência Política 1/79). 10. Citação da doutrina de Moacyr de Oliveira em José Afonso da Silva, op. cit, p. 202 . 11. Op. cit., p. 78. O autor baseia-se no pensamento de Hannah Arendt, inspirado em Kant. 12. Sigilo Bancário, in Estudos e Pareceres de Direito Público, São Paulo: RT. 1993, p. 62. 13. Cf. Têmis Limberger, As Informações Armazenadas pela Instituição Bancária e o Direito à Intimidade do Cliente. Revista de Direito do Consumidor 43/288; e Fábio Comparato, A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva. 2ª ed., 2001, p. 310. 14. Fred Cate, Invasions of Privacy? artigo publicado no jornal Boston Globe Published, 2.9.2001, disponível no endereço http://www.aei.org/news/ newsID.14758,filter./news_detail.asp 15. Fred Cate, op.cit. 16. As informações básicas meramente identificadoras do indivíduo (nome, filiação, endereço, CPF) não integram, em princípio, o âmbito da intimidade, embora componham a vida privada, porque são informações justamente destinadas à interação social. Não possuem o atributo da exclusividade que marca os aspectos da vida pessoal que integram a intimidade. Tércio Sampaio Ferraz Jr. entende que este tipo de dado, “embora privativo do sujeito, é condição de sua identificação para efeito dos intercâmbios sociais que ocorrem inclusive na vida privada. Destacados dos intercâmbios privados, eles não estão protegidos pela privacidade” (op. cit., p. 87). 17. O caráter público de um banco de dados permite ao cidadão impetrar habeas data (CF, art. 5º, inc. LXXII, a). Para ser considerado de caráter público, o registro ou banco de dados deve conter informações que “sejam ou que possam ser transmitidas a terceiros ou que não sejam de uso privativo do órgão ou entidade produtora ou depositária das informações” (parágrafo único do art. 1º da Lei nº 9.507/97). 18. Herman Benjamin aponta as vantagens para o sistema econômico das entidades de proteção ao crédito que armazenam dados sobre os consumidores: “a um só tempo, superam o anonimato do consumidor (o fornecedor não o conhece, mas alguém está a par da sua vida), auxiliam na utilização do crédito (por receber informações de terceiros sobre o consumidor, a instituição financeira, mesmo sem conhecê-lo, lhe concede o crédito), e, por derradeiro, permitem que os negócios de consumo sejam feitos sem delongas (se o crédito é rápido, o consumidor pode aproveitar essa economia de tempo e adquirir outros produtos ou serviços de fornecedores diversos)” (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, Rio de Janeiro: Forense Universitária. 5ª ed., 1998, p. 327). 19. Voto proferido pelo Min. Celso de Mello aos 25.3.92 na Petição nº 577-5 Distrito Federal – Questão de Ordem. 20. Observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil. 21. Segundo precedente do STJ, “A inscrição do nome da contratante na Serasa depois de proposta ação para revisar o modo irregular pelo qual o banco estava cumprindo o contrato de financiamento, ação que acabou sendo julgada procedente, constitui exercício indevido do direito e enseja indenização pelo grave dano moral que decorre da inscrição em cadastro de inadimplentes” (JSTJ 16/330). O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul decidiu que “constitui ilícito, imputável à empresa de banco, abrir cadastro na Serasa sem comunicação ao consumidor (artigo 43, § 2º, da Lei nº 8.078/90). O atentado aos direitos relacionados à personalidade, provocados pela inscrição em banco de dados, é mais grave e mais relevante do que lesão a interesses materiais” (5ª Câm. Cível – Ap. nº 597.118.926 – Rel. Des. Araken de Assis – j. 7.8.97 – Boletim AASP 2.044/481). 22. Op. cit., p. 328. A manipulação de informações, ainda que para proteção ao crédito, deve sofrer um estrito controle e seu limite pode gerar controvérsias. O Ministério Público Federal questiona judicialmente, por exemplo, a possibilidade da Serasa receber informações da Receita Federal (vide petição inicial do Procurador André de Carvalho Ramos publicada na RDC 39/205-224). 23. RESP 50354 - 01.06.99 - Terceira Turma - Relator Min. Ari Parglender - JSTJ 9/194 24. RESP 59812 - 050.9.95 - Terceira Turma - Relator Min. Waldemar Zveiter - RT 725/165. 25. Op. cit., pp. 78-79. Em 1990, o legislativo da Califórnia aprovou uma lei protegendo a privacidade do consumidor quando paga com cartão de crédito. Essa lei impede os varejistas de colher informação pessoal sobre transações com cartões de crédito e de usá-las para suas próprias finalidades de marketing ou vender as informações para especialistas em mala-direta. (Cf. California’s Advocate For The Public Interest, no sítio http://calpirg.org/CA.asp) 26. RHC 8493 - 20.05.1999 - Sexta Turma - Relator Min. Luiz Vicente Cernicchiaro - JSTJ 9/402 27. Celso Bastos, Sigilo Bancário, in Estudos e Pareceres de Direito Público, São Paulo: RT. 1993, p. 67. Em sua edição do dia 22.2.03, o jornal “Folha de S. Paulo” (p. C5) informou que um estudante de 18 anos foi preso pela Polícia Federal dois dias antes “em Petrópolis (região serrana do Rio), sob a acusação de clonar sites de instituições bancárias do Brasil e do exterior e aplicar golpes em correntistas pela internet. Segundo agentes da CGCOIE (Coordenação Geral de Combate ao Crime Organizado), o estudante criou páginas idênticas às de bancos brasileiros como o Bradesco, a CEF (Caixa Econômica Federal) e o Banco do Brasil, além de instituições da Coréia, do Peru e dos Estados Unidos, e conseguiu ter acesso a senhas e números de contas e de cartões. A partir daí, teria realizado compras, saques e transferências, lesando um número ainda não determinado de pessoas.” 28. Sua Informacão Privada: O Que Você Sabe Pode Protegê-lo, texto disponível no site do Federal Trade Commission dos EUA na Internet. 29. Renato M.E. Sabbatini, Os piratas da Internet, Jornal Correio Popular, Caderno de Informática, 21/4/95, Campinas-SP. Em outro artigo, o professor escreveu que “a Internet é um verdadeiro faroeste, em matéria de proteção da privacidade do usuário. Enquanto você usa um site de comércio eletrônico, dezenas de informações são coletadas sobre você, desde seu nome, endereço e número de cartão de crédito, até os seus hábitos de navegação e de compra. Você não tem a menor idéia de onde estão sendo armazenadas essas informações, se elas não são alteradas sem o seu conhecimento, vendidas para outros sites, ou roubadas. Assustador? Pode apostar que sim. A segurança da Internet, como se pode ver pelos recentes ataques de hackers a grandes sites de comércio eletrônico nos EUA, é precária, para falar o melhor. A ausência de diretivas morais e legais também é rampante entre os sites de comércio eletrônico. Um levantamento recente feito pela Federal Trade Commission, órgão do Governo Americano que regulamenta as atividades comerciais naquele país, descobriu que apenas 8% dos sites de comércio eletrônico têm um ‘selo de privacidade’, ou seja, alguma política, claramente visível, de que os usuários daquele site têm garantia de privacidade. A FTC deseja que os sites tenham quatro normas básicas: aviso, escolha, acesso e segurança. Em outras palavras, o site deve avisar claramente ao usuário qual informação está sendo coletada sobre ele, e como é usada; dar opção para que ele escolha como a informação será usada, dar acesso às informações já coletadas sobre ele, para fins de verificação, correção e apagamento, e tomar as medidas necessárias para proteger os dados de acesso por terceiros. No levantamento realizado nos EUA, apenas 20% dos sites de comércio eletrônico com mais de 40 mil visitantes por dia tinham implementando essas quatro políticas de privacidade. Como conclusão de um estudo de 208 páginas sobre práticas de privacidade na Net, a poderosa FTC concluiu que o Governo deve implementar exigências legais de proteção, pois a indústria falhou em regulamentar a si própria de maneira independente, como os líderes empresariais do setor desejam. A controvérsia se instalou. A Aliança de Privacidade na Internet, um grupo que defende a ausência de quaisquer barreiras ou legislação que tente domar o vale-tudo da Internet, é contra. ‘Achamos que os consumidores bem informados devem decidir que nível de privacidade preferem. Eles podem disciplinar o mercado para que ele forneça a proteção de privacidade que exigem e merecem. As recomendações da FTC são muito amplas, prematuras, pouco práticas e desnecessárias’. Já os consumidores pensam diferente. De acordo com um relatório de outubro de 1999 da empresa Forrester, 90% dos consumidores querem controlar como a informação coletada sobre eles é coletada e usada por terceiros, 57% favorecem leis destinadas à proteção da privacidade online, e 56% não permitiriam a coleta, se a eles fosse dada a escolha.” (Os piratas da Internet, Jornal Correio Popular, Caderno de Informática, 26/5/2000, Campinas-SP) 30. Texto disponível em seu site na Internet aos 20.2.03. 31. Têmis Limberger, As Informações Armazenadas pela Instituição Bancária e o Direito à Intimidade do Cliente. Revista de Direito do Consumidor 43/286-287 e 297. 32. Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo: Malheiros.1997, 14ª ed., p. 205. 33. Quando, no início da década de 90, os geneticistas pretenderam estudar a diversidade genética das diversas populações humanas, surgiu um impasse: grupos indígenas norte-americanos recusaram-se a fornecer as amostras de sangue imprescindíveis para o mapeamento dos genes. A recusa se baseava na desconfiança sobre a utilização das informações que seriam coletadas. Nesse contexto, Henry Greely, professor de Direito em Stanford, empregou o conceito de consentimento informado, para, junto com geneticistas, criar um Protocolo Modelo de Ética. Pelo processo do consentimento informado, “as pessoas que estão pensando em se submeter a um teste genético devem saber exatamente o que as espera. Precisam conhecer a precisão do exame e o que será feito com os resultados. Precisam saber de que forma os resultados poderão afetar os membros da família, os patrões, as seguradoras e outras pessoas envolvidas. Apenas depois que as pessoas forem perfeitamente informadas a respeito do teste e suas possíveis conseqüências é que se deve perguntar se desejam ser testadas” (Steve Olson, A História da Humanidade. Rio de Janeiro: Campus. 2003, p. 247. (v. Annual Review of Antropology 27 (1998):473-502) (Henry Greely, Informed Consent and Other Ethical Issues in Human Population Genetics. Annual Review of Genetics. 2001. 35:785-800) 34. “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.” www.apmp.com.br 23 MP em Foco X Futuro do MP O merecimento e o Conselho Nacional do Ministério Público (Parte II) MP do Futuro Discussão sobre fatos que repercutirão nos rumos de nossa Instituição. TRECHO DA EMENTA DA DECISÃO DO CNMP “Normas gerais que estabelecem critérios para avaliação do merecimento, Novos capítulos foram adicionados ao imbróglio envolvendo o Conselho Nacional do Ministério Público e o Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo. Como noticiamos na edição anterior, liminar concedida pela integrante do Conselho Nacional do Ministério Público Janice Ascari suspendeu “qualquer ato de promoção ou remoção de membro do Ministério Público do Estado de São Paulo até o julgamento do mérito deste processo”. Essa decisão atingiu diretamente o concurso, por remoção, para provimento dos 75 cargos de promotores de justiça substitutos de segundo grau criados pela Lei Complementar Estadual nº 981/2005. No julgamento do mérito do feito (Procedimento de Controle Administrativo nº 93/2006), malgrado o reconhecimento de que “as normas do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo (...) de um modo geral, não discrepam muito das diretrizes gerais fixadas por este Conselho Nacional”, decidiu-se, por unanimidade, anular o referido concurso e determinar a exclusão e a alteração de dispositivos do art. 70 do Regimento Interno do Conselho Superior de São Paulo, que regulamenta os critérios de merecimento. Sobre essa decisão e suas implicações é que dedicamos esta seção. 24 www.apmp.com.br para fins de promoção e remoção estabelecidas, no caso em exame, na Lei Orgânica Nacional do MP – Lei nº 8.625/93, na Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo – Lei nº 734, de 26/11/1993 e no Regimento Interno do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo, aprovado pelo Ato nº 005/94 – CSMP, de 18 de outubro de 1994 e publicado no D.O.E. de 21 de outubro de 1994. Normas internas que não discrepam muito das diretrizes gerais fixadas por este Conselho Nacional, a não ser nos pontos destacados no acórdão. Exclusão dos critérios que não se coadunam com a Resolução CNMP nº 02/2005. Anulação do concurso de promoção/remoção por merecimento, desde o seu edital, inclusive, procedendo-se integralmente a novo certame, com a observância, doravante, dos critérios ora redefinidos.” www.apmp.com.br 25 MP em Foco O reflexo da decisão do CNMP nos critérios de merecimento Regimento Interno do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo (aprovado pelo Ato nº 5/94CSMP, de 18/10/94) Art. 70: Para aferição do merecimento, o Conselho levará em conta: I - os dados constantes de seu prontuário; II - o exercício das funções institucionais com esforço e independência; III - o volume de serviços da Promotoria de Justiça ocupada pelo candidato, bem como a sua operosidade; IV - os problemas e as dificuldades que o promotor de justiça enfrentou; V - a conduta do membro do Ministério Público na sua vida pública e particular; VI - o conceito de que goza na Comarca; VII - a dedicação no exercício do cargo; VIII - a presteza ou pontualidade e a segurança no cumprimento das obrigações funcionais (v. arts. 129, § 4º, e 93, II, b, da CF); IX - as iniciativas que resultaram na modificação de leis, orientações jurisprudenciais ou de procedimentos administrativos internos; X - a eficiência no desempenho de suas funções, verificada através das referências dos procuradores de justiça em sua inspeção permanente, dos elogios insertos em julgados dos Tribunais, da publicação de artigos e trabalhos forenses de sua autoria e das observações feitas em correições e visitas de inspeção; XI - a contribuição à organização e melhoria dos serviços judiciários e correlatos da Comarca; XII - o número de vezes que já tenha participado de listas de promoção ou remoção, pelo critério de merecimento; XIII - a freqüência e o aproveitamento em cursos oficiais, ou reconhecidos, de aperfeiçoamento (v. arts. 129, § 4º, e 93, II, b, da CF); XIV - participação como conferencista, palestrante, autor de teses ou assistente em cursos, seminários e congressos de interesse institucional; XV - o aprimoramento de sua cultura jurídica, através da publicação de livros, teses, estudos, artigos e a obtenção de prêmios relacionados com sua atividade funcional; XVI - a participação em debates, mesas redondas, painéis, exposições e conferências de cunho institucional; 26 www.apmp.com.br XVII - o fato de ter exercido efetivamente seu cargo em Comarcas de difícil provimento, e sua permanência no cargo; XVIII - a atuação em Comarca que apresente particular dificuldade para o exercício de suas funções; XIX - a participação em atividades da Promotoria de Justiça que tenham trazido destacado retorno social; XX - iniciativas que redundaram em reais benefícios para a comunidade; XXI - atuação em inquéritos ou processos com especiais dificuldades e com grande relevância ou repercussão social; XXII - a observância das Recomendações expedidas pelos Órgãos da Administração Superior do Ministério Público; XXIII - iniciativas visando à defesa de prerrogativas institucionais; XXIV - elaboração de peças forenses que serviram de modelos para Centros de Apoio Operacional ou Promotorias de Justiça; XXV - colaboração ou palestras em cursos de adaptação ou atualização de membros do Ministério Público; XXVI - notória especialização em matérias de interesse institucional; XXVII - elogios e votos de louvor consignados pelos Órgãos Superiores do Ministério Público ou em decorrência da inspeção permanente dos procuradores de justiça; XXVIII - exercício da função de professor em cursos de Direito; XXIX - titulação universitária; XXX - o tempo de exercício na entrância ou no cargo, bem como a posição relativa do interessado na lista de antigüidade, entre outros fatores (v. arts. 134 e 147, § 2º, c, da LOEMP). incisos ou expressões excluídos pelo CNMP. segundo o CNMP, apenas a avaliação negativa desses critérios deve ser levada em conta. segundo o CNMP, esses critérios só devem ser considerados se a participação não tiver ocorrido por indicação do Procurador-Geral de Justiça ou do Conselho Superior do Ministério Público. www.apmp.com.br 27 MP em Foco A repercussão no Conselho Superior 28 Na reunião de 4 de julho de 2006, o conselheiro José Benedito Tarifa apresentou proposta de modificação do art. 70 do Regimento Interno do CSMP de São Paulo, para adequá-lo integralmente à decisão do CNMP. Seguiu-se, então, interessante discussão sobre a possibilidade de o CNMP excluir dispositivos do Regimento Interno do CSMP de SP que, na verdade, reproduziam normas previstas em nossa Lei Orgânica Estadual. Cabe ressaltar que a conselheira Janice Ascari, em seu voto, não tratou da questão. Ou seja, não fez referência direta aos dispositivos da Lei Orgânica envolvidos e, por conseqüência, não analisou, no caso concreto, se essas normas foram ou não recepcionadas depois da alteração do art. 93 da Constituição Federal, com seus reflexos no art. 129, § 4º, da Carta Magna. Veja os aspectos principais do debate: “ (...) apesar de o voto condutor mencionar o artigo 61 da Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e transcrever o artigo 134 e seus incisos da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público do Estado de São Paulo, conclui pela exclusão integral ou parcial de incisos constantes do Regimento Interno do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo, que são cópias do constante nessas leis...Vejamos: a) A expressão “particular”, constante do inciso V, que se refere à expressão “verificada através das referências dos procuradores de justiça em sua inspeção permanente, dos elogios insertos em julgados dos Tribunais, da publicação de artigos e trabalhos forenses de sua autoria e das observações feitas em correições e visitas de inspeção” (art. 70, X, RICSMP). Isto porque tal expressão é cópia do constante na Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo (art. 134, IV e VII) (...) As observações feitas no voto condutor a respeito dos incisos II, VII e VIII do artigo 70 do RICSMP, por contrariarem o disposto no artigo 93, inciso II, “c”, da Constituição Federal, tampouco podem conduta na vida particular do membro da Instituição, e a expressão “o conceito de que goza na Comarca”, constante no inciso VI. Tais expressões constam da Lei Complementar Estadual (art. 134, I) e, mesmo que se admitisse que o Conselho Nacional do Ministério Público pudesse proceder a tais alterações em normas internas do Ministério Público do Estado de São Paulo – o que se admite apenas para argumentar –, restaria o texto legal, o qual não pode ser revogado pelo Conselho Nacional do Ministério Público, que não tem atribuições constitucionais e legais para tanto (...) As mesmas observações feitas acima são válidas quanto à ser aceitas, ainda mais que recomenda a análise do desmerecimento do membro da Instituição. O Conselho Superior do Ministério Público deve avaliar o merecimento (...) apenas quem contar com a maioria dos votos dos conselheiros é que será indicado, sem que se faça referência ao “desmerecimento” dos demais membros da Instituição inscritos e não indicados, o que poderia representar uma ofensa a esses colegas, com sérios desdobramentos jurídicos (...) A recomendação feita a respeito dos demais incisos é desnecessária. Conclui-se, por conseguinte, que a decisão do Conselho Nacional do Ministério Público não é apta para produzir resultados concretos quanto aos critérios de merecimento do Ministério Público do Estado de São Paulo.” (manifestação do conselheiro Fernando José Marques) www.apmp.com.br “ (...) gostaria de deixar bem claro que sempre fui – e continuo sendo – favorável ao controle externo do Ministério Público e do Poder Judiciário, considerando-o, mesmo, fator primordial para a evolução dessas instituições (...) É extremamente saudável, por outro lado, a preocupação do Colendo Conselho Nacional do Ministério Público com o tema “merecimento”, em virtude da extraordinária importância que tem para o estímulo do bom desempenho funcional (...) Sem embargo desses registros, cabe desenvolver análise crítica da decisão daquele órgão, o qual, de vida recente em nosso ordenamento, não tem definidos com absoluta clareza os limites de sua atuação (...) O questionamento, respeitoso e de fundo essencialmente jurídico, é um dever para aqueles que, como nós, atuam nos órgãos de direção do Ministério Público estadual: temos a responsabilidade de zelar para que o âmbito de nossas competências não seja indevidamente – ou seja, de forma contrária à lei – invadido por quem quer que seja (...) Pois bem, depois de se dedicar à análise de alguns dispositivos do Regimento Interno do Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo – mais especificamente de alguns incisos do seu art. 70 –, o Conselho Nacional do Ministério Público de Controle Administrativo, expurgá-la, ainda que parcialmente, de nosso ordenamento. Por outro lado, a expressão “verificada através das referências dos procuradores de justiça em sua inspeção permanente, dos elogios em julgados dos Tribunais, da publicação de artigos e trabalhos forenses de sua autoria e das observações feitas em correições e visitas de inspeção” consta do disposto no art. 134, inciso IV, da Lei Orgânica estadual e também deveria ser “excluída”. Tem o Conselho Nacional do Ministério Público o poder de revogar lei em vigor? Pode fazê-lo por decisão proferida em Procedimento Administrativo? Em outro ponto, aquele órgão pode ter exorbitado de seus poderes, mais exatamente quando determinou que a presteza nas manifestações dos membros do Ministério Público somente poderia ser considerada negativamente, ou seja, no caso de impontualidade (...) O entendimento desse Colendo Órgão, sem dúvida, restringe a aplicação da norma constitucional, cabendo uma vez mais indagar: pode o Conselho Nacional, em procedimento administrativo, determinar que os Ministérios Públicos estaduais adotem interpretação restritiva (e inegavelmente subjetiva) de regra da Constituição Federal? (...) determinou a exclusão de alguns deles (...) Acontece que alguns desses dispositivos apenas repetem normas da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo (Lei Complementar nº 734, de 26 de novembro de 1993)! Assim, a decisão do Conselho Nacional, embora se refira apenas ao Regimento Interno, na verdade alcançou normas legais em pleno vigor. O art. 134, inciso I, da Lei nº 734/93 manda que na aferição do merecimento se levem em conta, dentre outras coisas, o conceito de que goza o membro do Ministério Público na Comarca e a conduta por ele observada em sua vida pública “e particular”. Não se trata, aqui e agora, de discutir o acerto ou a modernidade dessa norma legal, mas de questionar a possibilidade do Conselho Nacional do Ministério Público, no âmbito de simples Procedimento Por todas essas razões, dirijo-me ao Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral de Justiça para solicitar que, no exercício da representação do Ministério Público do Estado de São Paulo, tome as providências necessárias para a defesa das competências deste Conselho Superior, assim como da própria Lei nº 734/93, seja em eventual pedido de reexame da decisão do Egrégio Conselho Nacional do Ministério Público, seja por meio das medidas judiciais cabíveis”. (manifestação do conselheiro Antonio Augusto Mello de Camargo Ferraz) www.apmp.com.br 29 MP em Foco “ (...) o caso deve ser discutido judicialmente, conforme propostas dos conselheiros Fernando e Antonio Augusto” (manifestação do conselheiro Dráusio Lúcio Barreto) “A Emenda nº 45 modificou o artigo 93 da Constituição, em especial o seu inciso II, alínea c, ao estabelecer a “aferição do merecimento conforme o desempenho e pelos critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição e pela freqüência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento”, com aplicação ao Ministério Público em razão do disposto no artigo 129, § 4º, do texto constitucional. A Legislação Federal, a Legislação Estadual e as normas regulamentares que não estiverem de acordo com os critérios estabelecidos pela nova redação dada a este dispositivo não foram recepcionadas pela ordem constitucional estabelecida pela Emenda Constitucional nº 45. Desta forma, não se trata de reconhecer a esse Órgão Administrativo o poder de revogar leis, mas sim de interpretar as leis vigentes de acordo com o novo texto constitucional aprovado pelo Poder Constituinte Derivado (...) Devemos observar a inexistência, por ora, de elementos seguros para a aferição do merecimento conforme o desempenho e pelos critérios objetivos de produtividade e presteza. Como comparar desempenho, produtividade e presteza entre colegas que atuam em áreas tão diferentes, como uma Promotoria Criminal, uma Promotoria de Execução Criminal, uma Promotoria de Família e uma Promotoria de Interesses Difusos? Salvo situações claras de demérito apontadas pela Corregedoria da Instituição ou colegas de notório merecimento para determinados cargos, que possam ser motivados com clareza, a utilização da antigüidade como critério de desempate, como feito há muito no Ministério Público de São Paulo, se mostra, no meu entender, adequado.” (manifestação do conselheiro e PGJ Rodrigo César Rebello Pinho, à qual aderiu o conselheiro José Oswaldo Molineiro) 30 www.apmp.com.br Desfecho (parcial) do caso Por maioria de votos o Conselho Superior deliberou aguardar a decisão do Conselho Nacional do Ministério Público nos pedidos de providências formulados por membros do MP de São Paulo para, depois, discutir as questões relativas à abertura de novos concursos de promoção e remoção (em todas Direto do Conselho Super ior Proposta do cons elheiro Tarifa de ção do art. 71 do alteraRegimento Inte rno do CSMP (redação propos ta: “Os assentam entos relativos às atividad es funcionais e à conduta dos membros do M inistério Públic o, pa ra fins de apuração de seu merecimento, se rão coligidos em seu prontuár io individual (v. ar t. 42, X, da LOEMP). Parágr afo único – O C on selho levará em conta os da dos constantes dos assentamentos, além do s documentos e trabalhos do promotor de just iça por ele próp rio enviados à Corregedoria-G eral ou ao Con selho Superior do Ministério Pú blico”) (reunião de 4/7) o d o t e r i D l a i c e p s Órgão E criaosta de p o r p J G P ea tada pela rador de justiça Apresen u c o entes pr rgos de respond r a o c c 5 s 7 o e d to ção d cância substitu a v a a iç t n s ju extinção e promotor de 7/6) os d união de 75 carg e r ( u a r ndo g de segu as entrâncias) e aos critérios de merecimento (votos vencedores: conselheiros Sabella, Fernando, Dráusio, Shimizu e Rodrigo, com voto de desempate; votos vencidos: conselheiros Tarifa, Garrido, Antonio Augusto, Zanellato e Molineiro; ausente, justificadamente, o conselheiro Fink). Retrocesso? atual to anterior, o da an m u se Em rtaria nº al baixou a po er -G or ad ur oc alPr 6, pela qual form /0 /2 17 de , 06 932/20 de estuiu a comissão tu ti ns co te en 2m Normativo nº 40 to A no ta is ev dos pr julho de CGMP, de 27 de P/ SM /C PJ C J/ PG nco é implantar o ba vo ti je ob jo cu 2005, ucional do MP. 06, de dados instit de março de 20 21 e 14 as di Nos al inteProcurador-Ger por iniciativa do eiras as as duas prim ad iz al re m ra fo rino, comissão. reuniões dessa pois da atro meses de qu , to an et tr En eral para l Procurador-G posse do atua e nedato, não houv an m o nd gu se seu união. nhuma outra re rtante tiva tão impo ia ic in e qu ra Pa itucional olvimento inst para o desenv APMP te estancada, a en m va no ja se não palavras fazendo suas as em Reflexão, Mello onio Augusto nt A o ir he el ns do co de 6 de rraz na reunião de Camargo Fe ita ao o Superior, solic lh se on C do o junh or-Geral Senhor Procurad Excelentíssimo hos da ados os trabal m to re m ja se que . Comissão Mista www.apmp.com.br 31 ayres|pp H istória Institucional Transparência e responsabilidade na distância de um clique. Mais uma inovação da Diretoria e do Conselho Gestor. Para que você saiba como anda saudável o seu Plano APMP-Gama. A partir deste mês, o usuário do Plano de Saúde APMP tem acesso ao balanço online das contas do Plano. Com um simples clique, você pode ver onde e como são aplicados os recursos obtidos com as mensalidades, os gastos detalhados com reembolsos e rede credenciada e vários outros dados importantes. E, assim, comprovar a solidez e eficácia do Plano de Saúde APMP. Feito especialmente para você e sua família. Com transparência e responsabilidade. 13% Acessando o site da APMP você saberá que entre janeiro e abril deste ano foi possível formar um “colchão” com 13% do total arrecadado, conforme o gráfico ao lado. 50% 37% Para garantir a segurança e a privacidade dos associados, os dados permanecerão na área restrita do site. DESPESA 32 www.apmp.com.br R E C E I TA SALDO A PMP Esportes II Torneio Esportivo Deu Itália aqui também! Confraternização na medida certa! O Brasil pode não ter vencido a Copa, mas os associados da APMP tiveram muitos motivos para comemorar de 09 a 11 de junho. O II Torneio Esportivo reuniu no Hotel Estância Barra Bonita - SP cerca de 300 pessoas, que desfrutaram de diversas atividades culturais e eventos, como o show da Banda Saigon, o famoso Churrasco do Bassi e a tão esperada Festa Junina. Nos esportes, as competições foram marcadas pela euforia e animação, que motivaram todos os atletas durante os jogos. E, claro, não foram economizados gritos da torcida, do pontapé inicial ao último apito. No futebol, as equipes vencedoras foram: Itália (campeã), Togo (vice-campeã) e em terceiro lugar a Fúria Espanhola. Destacaram-se os atletas: Tomas Busnardo Ramadan (artilheiro e gol mais bonito) e Luciano Coutinho (goleiro menos vazado). Aqui em Barra Bonita, Cafu, Roberto Carlos e Cia. Limitada esquentariam o banco de reservas dos craques da APMP. Confira as equipes participantes do futebol: ITÁLIA Luciano G. De Qu eiroz Coutinho André Luiz dos Santos Julio Sérgio Abbu d Tatsuo Tsukamot o Flavio Okamoto José Augusto M ustafá Alexandre Cid de Andrade Felipe Freitas Paulo Henrique de O. Arantes TOGO Coutinho De Queiroz . G o n a ci Lu ndes rlando Me Marcelo O eida ldo de Alm José Reyna dan ardo Rama Tomas Busn ndelai eovam Sca Anderson G s Júnior s Guimarãe o rl a C io n Anto Jr. rto Melluso Carlos Albe o ias Brandã Eduardo D rreira l e u io Mig Fe Luiz Anton a Zarif Tiago Cintr ira eu G. Teixe Marcos Tad anu Roberto Livi ESPANHA mra Rafael Abuja es ando Mend Marcelo Orl Costa isto Fabricio Heitor Evar tas ncini de Frei Fábio Bianco icius Seabra Marcus Vin eitas ancisco S. Fr Salvador Fr io Masson Cleber Rogér o Loubeh Silvio de Cill rzella Vaz Gustavo Zo Lima gues Franco Fabio Rodri INGLATERRA Virgilio Antonio Ferraz do Amaral Marcelo Freire Garcia Eduardo Caetano Querobim Ismael Marcelino Gilberto Nonaka José Carlos Cosenzo Mário de Magalhães Papaterra Landolfo Andrade de Souza Paulo Cesar Correa Borges Gabriel Lino de Paula Pires Rodrigo Mazzili Marcondes 34 www.apmp.com.br www.apmp.com.br 35 A PMP Esportes Nas demais modalidades a participação também foi intensa. A premiação aconteceu na noite de sábado durante o jantar dançante com a apresentação da Banda Saigon, que animou a festa até altas horas. Tranca Natação Campeões: Irineu Jorge Fava e José Eduardo Monaco. Vice-Campeãs: Mariana Santiloni e Eni C. de Andrade. 1º lugar - Fabio Rodrigues Franco Lima. 2º lugar - Antonio Carlos Guimarães Júnior. 3º lugar - Luiz Henrique Cardoso Dal Poz. Biribol Corrida Feminina Campeões: Alex Facciolo Pires, Salvador Francisco de Souza Freitas, Haroldo César Bianchi e Luiz Henrique Cardoso Dal Poz. Vice-Campeões: André Luiz Dezotti, Virgilio Antonio Ferraz do Amaral, Paulo Sérgio Ribeiro da Silva e Paulo Cesar Correa Borges. Campeã: Sandra Barros Antunes. Vice-Campeã: Ruth Duarte Garcia. Medalhas: Katia Dezotti e Maria Clara Dezotti. Os vencedores de cada categoria foram: Tênis Campeões: Carlos Romani e Natalia Tsukamoto. Vice-Campeões: João Antunes de Souza e Priscila Walcker. Truco Campeões: Marcelo Freire Garcia e Tito Lívio Seabra. Vice-Campeões: Antonio Padovani e Carlos Alberto Melluso Júnior. 36 www.apmp.com.br Corrida Masculina Campeão: André Luiz Dezotti. Vice-campeão: José Maria Gomes. Medalhas: Luiz Carlos Gonçalves Filho e Salvador Francisco de Souza Freitas. Além dos eventos esportivos, a APMP zelou pela saúde de seus atletas. Em parceria com o CLUB D.A MEDICINA DIAGNÓSTICA, empresa do GRUPO DIAGNÓSTICOS DA AMÉRICA, foram realizados exames de dosagem de glicose no sangue e verificação de pressão arterial. Além disso, uma ambulância disponibilizada pela Medicar Emergências Médicas permaneceu a serviço dos associados e familiares durante todas as competições, desde o check-in até o check-out. www.apmp.com.br 37 A PMP Esportes 38 A Copa no Telão! Replay do Bassi! E viva São João! Os colaboradores do Torneio O público também pôde acompanhar os melhores momentos dos primeiros jogos na Alemanha em telão disponibilizado especialmente para transmitir a Copa. Para quem não quis “suar a camisa”, caminhadas, relaxamento na hidrospa, massagens e o curso de maquiagem foram muito procurados. O Parque Aquático, sempre cheio, fez a alegria das crianças e também dos adultos, que se divertiram com as aulas de mergulho. Para repetir o sucesso do ano passado, a APMP trouxe mais uma vez Marcos Guardabassi para preparar o seu famoso churrasco. E a surpresa! Simulando estar na Alemanha, com link ao vivo no telão, Bassi surge inesperadamente na festa, para admiração dos presentes. Sua equipe, composta por especialistas no preparo e corte da carne, foi muito elogiada pelo jantar servido. Para animar ainda mais o evento, um empolgante arraial agitou a noite. Quentão, pipoca, doces, entre outras comidas típicas que devolveram as calorias queimadas nas competições. Para a realização deste evento, a APMP teve a honra de contar com a colaboração de importantes parceiros. O Club Med do Brasil sorteou entre os associados hospedagens em qualquer uma de suas filiais. Já a SulAmerica Turismo ofereceu hospedagens no Hotel Nogaro, em Bueno Aires. Por sua vez, a Narwhal - Atividades Sub-aquáticas disponibilizou todos os equipamentos de mergulho, além das aulas e sorteios de vários cursos. www.apmp.com.br www.apmp.com.br 39 APMP Destinos Ondas musicais Beleza, história e sons do Caribe Banhado por um dos mares mais bonitos do planeta, o Caribe seduz turistas do mundo inteiro por suas belezas naturais e sua música caliente KD 15 36.0 Quilômetros de praias continentais e mais de 7 mil ilhas traduzem as muitas facetas do Caribe. Cada pedaço de terra banhada pelo Mar das Caraíbas possui características próprias. A diversidade cultural é resultado da influência de povos europeus. Espanhóis, ingleses, holandeses, suecos, entre outros, colonizaram a região. Africanos e índios também deixaram seu legado. Mesmo com todas as diferenças, existe um ponto em comum entre os caribenhos: a musicalidade. Um dos sons mais bonitos do Caribe é produzido pela natureza, não pelo homem. Trata-se do barulho do mar. 65 001 00 Um dos sons mais bonitos do Caribe é produzido pela natureza, não pelo homem. Trata-se do barulho do mar. Tulum é um bom lugar para ouvir a sinfonia de ondas quebrando na praia. Esse centro arqueológico fica no México, 130 quilômetros ao sul de Cancún. O contraste entre o mar cristalino e as ruínas maias impressiona. As praias de Tulum são pequenas, algumas desertas. O principal atrativo da cidade são palácios e templos que datam de 1400 d.C, resquícios do fim da civilização maia. Outra atração são os cenotes, lagoas incrustadas em pedras e que se estendem pelo subterrâneo. Mergulhos com snorkel dentro dessas cavernas mostram estalactites, estalagmites e peixes coloridos. Se preferir praias mais badaladas, Cancún é a pedida. De intensa vida noturna, há uma profusão de bares e boates para todas as faixas etárias, além de ótimos restaurantes. Algumas páginas adiante e você terá informações completas sobre a culinária mexicana. Por ora, recomendamos os tacos e burritos, sem muita pimenta, para evitar efeitos indesejados que impeçam aproveitar tudo o que o balneário tem a oferecer. Durante o dia, por exemplo, pode-se simplesmente ficar na praia tomando piña colada ou então praticar esportes náuticos. Jet Sky, passeios de veleiros ou lanchas, windsurf e mergulhos são algumas das modalidades oferecidas. Por falar em mergulho e saindo do México, Aruba é o lugar certo para os aficionados. A água do mar é cristalina e, em alguns pontos, a visibilidade chega a 30 metros. 001 0065 001 5 006 001 0065 001 00 65 40 www.apmp.com.br www.apmp.com.br 41 APMP Destinos Um dos passeios mais procurados pelo turista é o que leva ao Antilla. Em 1945, esse cargueiro alemão foi afundado de propósito pelo comandante, para evitar que a embarcação caísse em mãos holandesas. Para os mergulhadores experientes, vale a pena conhecer Bonaire, vizinha de Aruba e que, juntamente com Curaçao, compõem o ABC holândes do Caribe. Isso porque Aruba é um território dependente dos Países Baixos. Sendo assim, o holandês é um dos quatro idiomas ensinados nas escolas da ilha. Os outros são o inglês, o espanhol e o papiamento. Este último é uma mistura de vários idiomas, entre eles, o português. Por isso, não estranhe ao ouvir os nativos pronunciarem sons conhecidos. O que você ouvirá assim que chegar é bon bini (bem-vindo). Outro lugar que vale a visita é Cuba. Se quiser conquistar a simpatia dos cubanos, mostre interesse pela música do país. Ritmos como a rumba, o danzón e o cha-cha-cha nasceram na ilha. O son é um estilo musical ligado à formação da nacionalidade cubana. Ele começou a se popularizar nos carnavais do final do século XIX. No início, era apenas tocado nos bailes destinados às classes mais pobres. Por muitos anos, o ritmo foi tido como imoral e sua execução proibida (qualquer semelhança com o tango, na Argentina, não é mera coincidência). Com o tempo, esse estigma foi desaparecendo e, em 1920, ele já era considerado o principal gênero musical do país. Os instrumentos de corda (tres e o violão) são legados hispânicos; a percussão (conga e maracá) é fruto da influência africana. A musicalidade de Cuba é tão rica quanto sua história. Inicialmente ocupada pelos espanhóis, tornou-se posteriormente um protetorado dos Estados Unidos. Assim como a música, o rum anima a viagem do turista. Sua origem data do século XVI. Conhecido como “bebida dos piratas”, era moeda de troca no comércio de escravos. 0065 No século XX, foi palco de dois fatos marcantes. A Revolução de 1959, que trouxe Fidel Castro e o comunismo para o poder e afastou o país da influência norte-americana, e a Crise dos Mísseis, em 1962, que envolveu Cuba, os EUA e a extinta URSS e gerou o temor de um confronto nuclear. As marcas do passado podem ser vistas nas ruas, rostos, relatos e costumes dos habitantes. A arquitetura de alguns prédios evidencia o passado colonial; os Cadillacs e Oldmobiles nos dão pistas sobre os efeitos do comunismo na economia cubana; a elevada expectativa de vida e as baixas taxas de analfabetismo mostram as conquistas da ditadura de Fidel Castro; a baía de Guantánamo é um resquício da Guerra Fria. Enfim, Cuba oferece ao turista mais do que belas praias. Confluência sonora Os ritmos cubanos são apenas um aperitivo. O Caribe nos traz o limbo, calipso e reggae, comuns nas áreas de influência inglesa, como a Jamaica. Já o zouk aparece nos locais onde houve ocupação francesa, enquanto o merengue é característico das ilhas espanholas. Essa divisão, entretanto, não é rígida. Existe um intercâmbio intenso entre os vários estilo, a ponto de um compositor cubano propor a expansão dos limites do Caribe levando em conta a música. Natalio Galán (19311985) sugeriu que fossem integrados ao território caribenho o sul dos Estados Unidos, o norte e nordeste do Brasil e alguns outros países da América Latina. Não entendeu? Então, pense na salsa, gênero criado na década de 40, nos Estados Unidos. Nessa época, reuniam-se em bares americanos centenas de músicos latinos, oriundos de diferentes países, como a Venezuela, Cuba, Porto Rico, México etc. O contato entre eles deu origem a uma nova maneira de fazer música. Entendeu agora? A salsa é a síntese de vários estilos e expressa uma característica tipicamente caribenha: a alegria. E já que sua imaginação viajou embalada pela música, arrume sua mala e vá para o Caribe. ” a a viacaribenha rum anim o lo A “cachaça música, do sécu a t a d como a m tas”, orige Assim dos pira ta. Sua is a r id u t b e o ab gem d de escr como “ o io c id r c é e m h n a no co surgimento de XVI. Co de troc a d e o ado , com o era m o destil ulo XIX e c u é s q , o n m ltrage , a bevos. Foi dos de fi ior. Hoje r o e t é p u m de s s e novo espécie ualidad a q m a u m u a e dois siderad ganhou a base d ser con é e m d o u r p aliO bida ião: o M e g ibenha”. e r r a c a d a ç “cacha amosos amaica s mais f ue é feito na J e r o c eita. li dos sua rec aria - q m e M r a ia c T ú bu e o a e aç baunilh , é f a c leva 001 0065 001 O son cubano ay tel Holid m no Ho e seguro e g a d e sp ho os noites de manhã, traslad partir de ianca, 7 A a Aéreo Av ree com café d 006 (Feriado). /2 sp ro n b u m S Inn /Sete Saída 02 415 viagem. R$ 890 + 5x R$ ) 5 6 .9 2 (R$ o Hotel dagem n slados e sp o h a e d n tra Punta oCpaa Airlines, 6 noitsteesma ALL INCLUSIV9E/D, ezembro. Aéreo C ravo Golf com si º/Setembro a 1 a Barceló B viagem. Saídas 1 3 4 ro $ u R g x se 5 e 921 + $ R ) 6 7 .0 (R$ 3 o Hotel edagem n 23/Agosto sp o h e n d Cancúeromexico, 6 noites manhã. Saídas4 Aéreo A com café da 805 + 5x R$ 37 $ Flamingo bro. (R$ 2.675) R m e z e a 8/D o Hotel edagem n iagem. sp o h e d v es in St. Mamretrican Airlines, 6 naonithã, traslados e seg+uro5x R$ 405 8 A m 6 a 8 o d Aére afé 3) R$ za com c . (R$ 2.89 Beach Pla ulho a 31/Outubro ulo, e São Pa /J saindo d lidos para Saídas 24 lo p u d vá to Aruba 001 0065 001 00 65 001 00 65 001 00 001 0065 m ap aviso, pessoa e ração sem prévio mbio do ços por e re lt uárias. Câ lados P a rt e : o e p ta d o ro a e N id a u il s a ib a x n c o ta disp ciais lc ue. em sujeitos a licação. Não inclu 2. Preços referen cheq m e o ,3 b v 2 u si p $ data de 1,00 = R arcelamento exclu /06 US$ P dia 14/07 o dia do pagto. to. anciamen io d ao câmb tras formas de fin u o Consulte 65 42 www.apmp.com.br www.apmp.com.br 43 Gastronomia México: Entre tacos e quesos! Os antropólogos afirmam que a escolha dos alimentos e a formação dos hábitos alimentares obedecem a critérios culturais. No México, costuma-se fazer três refeições por dia: o café da manhã, a merienda e a ceia. Cada qual de um modo diferente, uma vez que os habitantes locais, em geral, seguem um ditado segundo o qual para ter saúde deve-se quebrar o jejum como um rei, almoçar como um príncipe e jantar como um plebeu. O banquete do Rei Desde o tempo dos astecas, o café da manhã é uma refeição farta para os mexicanos. Comem-se frutas, pães doces e até mesmo carnes. Para acompanhar esse banquete, hochata (água de arroz). O milho – base da culinária do país – também é herança dos povos pré-colombianos. Maias e astecas já cultivavam esse alimento, usado para fazer panquecas recheadas com girinos, lagartas ou peixes. Hoje, utiliza-se o grão para o preparo das tortillas: massa feita com água, farinha de milho branco (masa harina), manteiga e sal. Essa receita é utilizada na confecção de outros pratos, como os burritos, enchiladas, fajitas, chimichangas, nachos e tacos. Quem, na faixa de 40 anos, não se lembra dos indefectíveis tacos do Jack in the Box da rua Augusta, esquina com a alameda Santos? Essa lanchonete não existe mais no Brasil, mas a iguaria continua fazendo sucesso no mundo, em grande parte devido ao seu 44 www.apmp.com.br A cozinha mexicana também sofreu influência espanhola. Assim como aconteceu no Brasil, a tradição dos povos locais misturou-se com os costumes do colonizador. Os espanhóis trouxeram as especiarias, a cebola, a carne de porco e o requinte de suas receitas. O resultado dessa fusão é uma culinária saborosa e muito colorida. www.apmp.com.br 45 Gastronomia Apesar das diferenças, temos duas unanimidades: tomar um aperitivo antes da merienda e fazer a sesta depois. Noutras palavras, uma bebida para “abrir o apetite” e um cochilo após a refeição. recheio à base de carne moída, pimenta, milho, tomate, cebola e guacamole (abacate). Outra peculiaridade dos hábitos alimentares mexicanos está no fato de as tortillas serem usadas como talher. Essa antiga prática vem do tempo em que as pessoas não tinham dinheiro para comprar talheres. Por isso, ao invés das mãos, era como se uma unidade de “Doritos” substituísse garfo e colher. A cozinha mexicana também sofreu influência espanhola. Assim como aconteceu no Brasil, a tradição dos povos locais misturou-se aos costumes do colonizador. Os espanhóis trouxeram as especiarias, a cebola, a carne de porco e o requinte de suas receitas. O resultado dessa fusão é uma culinária saborosa e muito colorida. 46 www.apmp.com.br O aperitivo e a sesta do príncipe A merienda, servida entre as 14 e 17 horas, é composta por quatro pratos: sopa leve, prato principal, porção de feijão e sobremesa. Os ingredientes utilizados variam de acordo com a região do país. No norte, devido à criação de gado, a carne é muito utilizada. Na região central, consome-se muito feijão. E no Golfo do México predominam os peixes e a carne bovina. Apesar das diferenças, temos duas unanimidades: tomar um aperitivo antes da merienda e fazer a sesta depois. Noutras palavras, uma bebida para “abrir o apetite” e um cochilo após a refeição. Se você quiser experimentar esse costume local, pode beber uma cerveja mexicana. Elas são mais suaves do que as européias. Pode também tomar um vinho nacional. Mas a rainha dos aperitivos é a tequila, produzida a partir do Agave, planta parecida com um cactus. O nome da bebida surgiu entre os século XVIII e XIX. Na província de Jalisco existia uma cidade chamada Tequila. Como o destilado produzido naquela região era o melhor do país, o produto foi batizado com o nome do local. As características da tequila mudam de acordo com a forma como é produzida. As brancas, mais fortes, normalmente são usadas na preparação de drinks. As escuras, envelhecidas, possuem gosto mais suave, o que recomenda que sejam bebidas puras. A bebida não pode envelhecer mais de dez anos, caso contrário seu sabor fica amargo. Sua textura deve ser sempre um pouco oleosa. Outro destilado famoso no país é o mezcal, ainda mais antigo do que a tequila, de sabor mais forte e que guarda uma característica pitoresca: dentro de sua garrafa é colocada uma larva de gusano, inseto que cresce entre as plantas de Agave. O simpático bichinho serve para indicar o teor alcoólico do líquido. Se a concentração de álcool for pequena, a larva se desintegra. Lendas populares afirmam que se um homem ingerir o gusano, ficará mais másculo e corajoso. Será a versão mexicana da “Jurubeba Leão do Norte”? Tem pimenta na ceia do plebeu A ceia ou jantar é a refeição mais leve: sopas, pães, sanduíches. Como acontece no café da manhã e na merienda, os pratos são preparados com bastante pimenta, muito apreciada pelos mexicanos. Os botânicos afirmam que ela é originária do continente americano. Os índios já cultivavam a planta quando os europeus chegaram. Com os nativos, os colonizadores aprenderam a utilizá-la e difundiram-na pelo mundo. As cores das pimentas têm relação com seu ardor. As vermelhas, por exemplo, são mais fortes do que as verdes. A pimenta realça o sabor dos alimentos, mas alguns chefs afirmam que ela mascara o paladar. Essa idéia é reforçada por restaurantes fast food que exageram no uso desse ingrediente, enquanto as receitas mexicanas tradicionais usam o tempero com parcimônia. Ardida ou não, a culinária é uma das atrações do México. Por isso, uma vez lá, certifique-se apenas que o restaurante é de qualidade. Se for, aproveite. Entre garfadas e goles de tequila, você não estará apenas conhecendo a cultura mexicana: estará vivenciando-a. História de Chocolate Os suíços carregam a fama de produzirem o melhor chocolate do mundo, embora os belgas disputem com eles essa primazia. O cacaueiro, entretanto, é originário da América Central. Os astecas cultivavam a planta, cuja semente era símbolo de riqueza e poder, tanto que servia como moeda. Esse povo adorava o deus Quetzalcoatl, personificação do conhecimento e sabedoria. Segundo lendas, foi essa divindade que trouxe o cacau para a terra. A bebida extraída do cacau, o xocoalt, era usada em rituais sagrados. Naquela época, o precursor do chocolate não tinha o sabor doce e agradável que possui hoje. Ao contrário, era amargo e apimentado. Sua preparação incluía um purê de milho fermentado e pimenta. www.apmp.com.br 47 Cultura & Lazer A travessia de Guimarães Rosa “Que nasci no ano de 1908, você já sabe. Você não deveria me pedir mais dados numéricos. Minha biografia, sobretudo minha biografia literária, não deveria ser crucificada em anos. As aventuras não têm tempo, não têm princípio nem fim.” João Guimarães Rosa nasceu em Cordisburgo no dia 27 de junho. Era o filho mais velho de Francisca Guimarães Rosa e Floduardo Pinto Rosa, o “Seu Fulô”. Passou a maior parte da infância em sua cidade natal e desde cedo mostrava interesse pela natureza e pelo estudo das línguas. Aos seis anos, leu o primeiro livro em francês. Aos dez, foi morar com o avô em Belo Horizonte, onde cursou o ginasial junto com Carlos Drummond de Andrade, que se tornaria seu grande amigo. Com apenas 16 anos ingressou na Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais e, durante o curso, passou a se dedicar à literatura. Começou escrevendo quatro contos para um concurso da revista O Cruzeiro: Caçador de camurças; Chronos Kai Anagke; O mistério de Highmore Hall; Makiné. Todos foram premiados e publicados. Anos depois, confessou que escrevera os contos motivado apenas pelo prêmio de 100 mil réis. Casou-se com Lígia Cabral Penna, seis anos mais nova que ele, no mesmo ano em que se formou em Medicina. O 48 www.apmp.com.br casal teve duas filhas: Vilma e Agnes. Formado, foi exercer a profissão em Itaguara, um distrito do município de Itaúna. Esse período foi decisivo em sua carreira literária. Guimarães Rosa andava sempre com um caderninho, no qual anotava os costumes, as crenças, as terminologias, os ditos e as histórias do povo, informações sobre fauna, flora e tudo mais que despertasse seu interesse. Essas anotações serviram de subsídio para muitos de seus livros. Quando explodiu a Revolução Constitucionalista de 1932, ele tornou-se voluntário na Força Pública. Por meio de concurso, efetivou-se e foi trabalhar em Barbacena como Oficial Médico do 9° Batalhão de Infantaria. Nessa época, aproveitou para se aprofundar em idiomas estrangeiros. Certa vez, revelou para sua prima: “Falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com o dicionário agar- Guimarães Rosa andava sempre com um caderninho, no qual anotava os costumes, as crenças, as terminologias, os ditos e as histórias do povo, informações sobre fauna, flora e tudo mais que despertasse seu interesse. rado); entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: do húngaro, do árabe, do sânscrito, do lituânio, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do tcheco, do finlandês, do dinamarquês; bisbilhotei um pouco a respeito de outras. Mas tudo mal. E acho que estudar o espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais profunda do idioma nacional. Principalmente, porém, estudando-se por divertimento, gosto e distração.” www.apmp.com.br 49 Cultura & Lazer “...Só posso agir satisfeito no terreno das teorias, dos textos, do raciocínio puro, dos subjetivismos.” Essa declaração foi retirada de uma carta na qual Guimarães Rosa confidencia a um amigo que não estava feliz com sua profissão. Desmotivado com a medicina, resolveu prestar um concurso para o Ministério do Exterior. Sua erudição e a fluência em vários idiomas garantiram-lhe a segunda colocação. Em 1938, é nomeado cônsul-adjunto em Hamburgo e vai para a Europa. Já separado de sua primeira mulher, conhece Aracy Moebius de Carvalho, que se tornaria sua segunda esposa. Durante a II Guerra Mundial, vivenciou uma experiência que trouxe à tona seu lado supersticioso. No meio de uma noite, sentiu uma vontade irresistível, de acordo com suas palavras, de fumar. Saiu para comprar cigarros e, quando voltou, encontrou apenas os escombros de sua casa, que fora sido destruída por um bombardeio. Depois desse episódio, o misticismo o acompanhou pelo resto da vida. Ele acreditava em energias positivas e negativas, nas forças da lua, no kardecismo, no conhecimento de curandeiros e feiticeiros. Uma das maiores realizações do diplomata, durante a guerra, foi facilitar a fuga dos judeus perseguidos pelo nazismo. Sua mulher, Aracy, o ajudou nessa tarefa. Em 1985, o Estado de Israel homenageou os dois com a mais alta distinção que os judeus prestam a estrangeiros: um local público, no caso um bosque próximo a Jerusalém, foi batizado com o nome do casal. Quando o Brasil declarou guerra à Alemanha, ele ficou detido em Baden-Baden com outros compatriotas. Quatro meses depois, libertado, 50 www.apmp.com.br Durante a II Guerra Mundial, vivenciou uma experiência que trouxe à tona seu lado supersticioso. No meio de uma noite, sentiu uma vontade irresistível, de acordo com suas palavras, de fumar. Saiu para comprar cigarros e, quando voltou, encontrou apenas os escombros de sua casa que fora sido destruída por um bombardeio. O Sertão de Guimarães Rosa na Estação da Luz A primeira exposição temporária do Museu da Língua Portuguesa homenageia uma das maiores obras da literatura nacional: Grande Sertão: Veredas. Conheça a história de amor de Riobaldo e Diadorim através dos sete caminhos criados por Bia Lessa. Cada um corresponde a um personagem ou aspecto importante do livro. Uma das maiores atrações é a gravação da voz de Maria Bethânia lendo as 14 últimas páginas do Grande Sertão. Museu da Língua Portuguesa Endereço: Estação da Luz, Praça da Luz, s/nº, voltou para o Brasil e logo em seguida foi transferido para Bogotá. Alguns anos depois, tornou-se conselheiro diplomático em Paris. Em 1958, ascendeu a ministro de primeira classe (embaixador). Um de seus últimos encargos profissionais foi chefiar o Serviço de Demarcação de Fronteiras, participando da solução de dois casos famosos: Pico da Neblina (1965) e Sete Quedas (1966). “E meus livros são aventuras; para mim são minha maior aventura. Escrevendo descubro sempre um novo pedaço de infinito.” Apesar de médico e diplomata, Guimarães Rosa tinha como grande paixão escrever. Depois da experiência da época da faculdade, participou de mais dois concursos literários. Em 1936, a coletânea de poemas intitulada Magma recebeu o prêmio de poesia da Academia Brasileira de Letras. Depois de um ano usando o pseudônimo Viator, concorreu ao prêmio Humberto de Campos com a obra intitulada Contos, que anos depois seria revisada e se transformaria no livro Sagarana. O reconhecimento veio com a publicação de Corpo de Baile e Grande Sertão: Veredas. Depois dessas duas obras, publicou também Primeiras Estórias (1962) e Tutaméia:Terceiras Estórias (1967). Guimarães Rosa renovou o romance brasileiro com São Paulo, SP Telefone: (11) 3326-0775 Em 19 de novembro de 1967, três dias após assumir sua cadeira na Academia, João Guimarães Rosa prova ao mundo que viveu. No mesmo ano ele fora indicado para o prêmio Nobel de Literatura, mas a indicação foi cancelada devido a sua morte. seus experimentos lingüísticos, sua técnica, seu mundo ficcional. Os críticos chamam-no de “romancista instrumentalista”. Esse apelido referia-se à extrema preocupação que o escritor tinha com o “instrumento da palavra” na construção de seus trabalhos. Essa preocupação fica evidente quando observamos a riqueza e a ousadia na reinvenção de vocábulos: fiúme, levantante, maravilhal, fluifim, ossoso e muitos outros. Outra característica de sua obra é a aproximação entre narrativa e lírica. O resultado é um texto que possui musicalidade, como podemos perceber nesse trecho do conto O Burrinho Pedrês, que está no livro Sagarana: “As ancas balançam, e as vagas de dorsos, das vacas e touros, batendo com as caudas, mugindo no meio, na massa embolada, com atritos de couros, es- tralos de guampas, estrondos de baques, e o berro queixoso do gado junqueira, de chifres imensos, com muita tristeza, saudade dos campos, querência dos pastos de lá do sertão...” O autor extraiu do sertão a matéria-prima para escrever seus livros. No entanto, o sertão de Guimarães Rosa não é restrito aos limites geográficos brasileiros. O crítico literário Antônio Cândido fez considerações sobre esse assunto: “A experiência documentária de Guimarães Rosa, a observação da vida sertaneja, a paixão pela coisa e o nome da coisa, a capacidade de entrar na psicologia do rústico - tudo se transformou em significado universal graças à invenção, que subtrai o livro da matriz regional, para fazê-lo exprimir os grandes lugares-comuns, sem os quais a arte não sobrevive: dor, júbilo, ódio, amor, morte, para cuja órbita nos arrasta a cada instante, mostrando que o pitoresco é acessório, e na verdade, o Sertão é o Mundo”. A alta qualidade de sua literatura garantiu-lhe um lugar na Academia Brasileira de Letras. A indicação aconteceu no ano de 1963. Guimarães Rosa adiou sua posse por quatro anos. No seu discurso, proferiu as seguintes palavras: “(...) a gente morre é para provar que viveu.” Em 19 de novembro de 1967, três dias após assumir sua cadeira na Academia, João Guimarães Rosa prova ao mundo que viveu. No mesmo ano ele fora indicado para o prêmio Nobel de Literatura, mas a indicação foi cancelada devido a sua morte. Lançamento de Livros A APMP dá uma “forcinha” para que surjam novos Guimarães Rosa, Gustave Flaubert, James Joyce, Friedrich Nietzsche e Franz Kafka. Participe! www.apmp.com.br 51
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as seções a que já se acostumaram nossos fiéis leitores. Boa leitura.
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