Caderno de Pesquisas 2 - Prefeitura de Anápolis
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Caderno de Pesquisas 2 - Prefeitura de Anápolis
ANTÔNIO ROBERTO OTONI GOMIDE Prefeito Municipal AUGUSTO CÉSAR DE ALMEIDA Secretária Municipal de Cultura TIZIANO MAMEDE CHIAROTTI Diretor do Museu Histórico de Anápolis “Alderico Borges de Carvalho” HERMOGÊNIA ELEUTÉRIO Revisão de Texto GÉDSON CHRISÓSTOMO Arte & Capa 2 Caderno de Pesquisas – Museu Histórico de Anápolis “Alderico Borges de Carvalho”, Ano 2, nº. 1. Anápolis, Go, 2010. Periodicidade Semestral 1. História – Periódicos. ISSN 2178-6100 Fotografia da capa: Mercado Municipal “Carlos de Pina” em fins de 1950 Acervo iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho” 3 APRESENTAÇÃO A publicação do segundo número do “Caderno de Pesquisas” do Museu Histórico significa a afirmação de um projeto que a cada dia que passa ganha mais consistência. O número anterior já demonstrava o potencial que uma publicação desse tipo tem, em termos de aglutinar e motivar à produção intelectual. Se tomada isoladamente estaríamos restringindo essa publicação a uma atividade histórico-literária, por mais valoroso que isso seja, mas inserida num conjunto de ações políticas e administrativas que vem sendo adotado na cidade de Anápolis, o “Caderno de Pesquisas” assume uma dimensão ainda maior. Anápolis é uma cidade importante no cenário regional e nacional, construída com o esforço e dedicação de valorosos homens e mulheres trabalhadores. Porém, nem sempre esses valores foram respeitados e os esforços reconhecidos. Sabemos que o resgate do valor e auto-estima de um povo não se limita ao registro de sua história e memória, ações nas mais diversas áreas da administração pública são fundamentais para que nos sintamos capazes de tomarmos nas mãos nosso destino e promovermos nosso desenvolvimento com sustentabilidade. Juntamente com as várias ações que vem sendo implementadas em nossa cidade, essa publicação assume sua real grandeza. O “Caderno de Pesquisas” tem servido de referência para conhecermos melhor nosso patrimônio material e imaterial, para nos identificarmos junto a nós mesmos e àqueles que nos visitam. Pode parecer muito para uma pequena publicação, mas em se tratando do trabalho empreendido nas pesquisas e produção dos textos aqui divulgados, sabemos que esse projeto tem seu papel nesse conjunto de ações que vem resgatando nossos valores e dignidade. Aproveitamos para agradecer a todos aqueles que contribuem para que essa publicação se efetive e se consolide naquilo que ela depende de iniciativas do poder público e, principalmente, do empenho dos pesquisadores. Reforçamos, também, o convite para que cada vez mais escritores venham 4 somar forças nessa ação que busca contribuir com o desenvolvimento de Anápolis, essa cidade que vem sendo construída por todos nós. Augusto César de Almeida Secretário Municipal de Cultura 5 SUMÁRIO EDITORIAL 06 Breve ensaio sobre a historiografia Anapolina Juscelino Polonial 08 O Município de Anápolis: elucidações sobre sua emancipação política e historicidade Tiziano Mamede Chiarotti 16 Cedoc – Centro de Documentação da Câmara Municipal e a guarda de documentos em Anápolis Arnaldo Salustiano de Moura 26 Breve descrição dos patrimônios históricos de Anápolis Rosenilda Rodrigues da Silva 30 Histórico dos locais de privação da liberdade em Anápolis: aspectos do patrimônio arquitetônico e cultural Wesley Costa 38 Caminhoneiros em greve: histórico do movimento grevista de 1948 em Anápolis Elizete Cristina França 50 Correios: evolução desta instituição na cidade de Anápolis Irene Rodrigues de Oliveira 57 Evolução dos cinemas em Anápolis: final da década de 1920 a meados de 1950 Ricardo Lage Leite Informações gerais sobre as atividades do Museu Histórico de Anápolis 63 73 6 EDITORIAL O Museu Histórico, mais uma vez, cumpre com o seu papel de gestor do patrimônio histórico e cultural, sendo respaldado pela concepção da museologia social ao disponibilizar para a municipalidade este periódico. Assim como no primeiro número, este “Caderno de Pesquisas” informa sobre aspectos de determinados temas de nossa cidade. A idéia do periódico, desde sua concepção no ano passado até o fim do mandato do nosso prefeito Antônio Roberto Gomide, concebido pela “Instituição Museu” e materializado pela Secretaria Municipal de Cultura, é contribuir com a historiografia local no que diz respeito à explicação da dimensão temporal do Município. É uma maneira de demonstrar que a Prefeitura não faz somente coisas materiais, aliás, muito bem realizadas nos aspectos da economia, da política, da infra-estrutura, entre outros, mas, também, nos aspectos imateriais, como a discussão sobre a História Local. Com o propósito supracitado, então, os artigos aqui contidos podem ser divididos em três grupos, que demonstram a realidade histórica plural da nossa querida Anápolis e que serão explicados a seguir. O primeiro grupo, composto por um artigo do cientista social Juscelino Polonial, tece uma interessante análise sobre a historiografia local, isto é, o que foi escrito sobre a História de Anápolis. Outro artigo do grupo, de nossa autoria, escreve sobre o processo de emancipação política, bem como a trajetória histórica da “Ribeirão Preto” goiana, sendo uma contribuição para o esclarecimento da temática. Com o aniversário da cidade celebrado, os textos são muito pertinentes, pois lançam luzes sobre o tema, informando a população anapolina. O segundo grupo reúne artigos que relatam sobre o patrimônio cultural nas suas diversas manifestações. O artigo do historiador Arnaldo Salustiano de Moura mostra, de forma direta, a sua experiência frente ao patrimônio documental da cidade, especificamente sobre a implantação do Arquivo da Câmara Municipal. O segundo artigo deste grupo, da acadêmica de geografia Rosenilda Rodrigues da Silva, faz uma importante descrição dos patrimônios 7 tombados de Anápolis. O último artigo do grupo, do geógrafo Wesley Costa, realiza uma interessante análise sobre os locais de privação da liberdade em Anápolis, desde o primeiro, provavelmente construído em 1905, até o atual. Por fim, no terceiro grupo são reunidos artigos que analisam aspectos da nossa história que dizem respeito a fatos até recentemente não contemplados na historiografia, como a greve, o correio ou o cinema. O artigo da historiadora Elizete Cristina França aborda um acontecimento pouco relatado na literatura histórica, uma greve de caminhoneiros que teve repercussões regionais. O artigo da auxiliar administrativa do Museu Histórico, Irene Rodrigues de Oliveira, por seu turno, aborda a evolução dos Correios na cidade e o terceiro artigo, por sua vez, é um texto belíssimo do historiador Ricardo Lage Leite, no qual é descrita a evolução dos cinemas em Anápolis. O fechamento do “Caderno de Pesquisas” ocorre com um relatório das atividades do museu nesse primeiro semestre de 2010, numa prestação de contas à comunidade. O presente “Caderno de Pesquisas”, enfim, é uma forma de levar aos cidadãos anapolinos conhecimentos sobre a sua realidade histórica, cumprindo o museu seu papel de gestor do patrimônio histórico e cultural, sendo assim, esperamos que todos e todas tenham uma boa leitura! Tiziano Mamede Chiarotti Diretor do Museu Histórico de Anápolis “Alderico Borges de Carvalho” 8 BREVE ENSAIO SOBRE A HISTORIOGRAFIA ANAPOLINA JUSCELINO POLONIAL∗ Resumo: O objetivo deste ensaio é apresentar a incipiente produção historiográfica sobre Anápolis, deixando claro que ainda há um grande trabalho no resgate dessa História e na análise das publicações. O artigo destaca os primeiros escritos em jornais sobre a história local na década de vinte e trinta, passa pela produção de diletantes, até chegar à atual produção acadêmica, de alunos e professores, nas universidades da região. Palavras-chave: historiografia, Anápolis, produção acadêmica e diletante. Introdução A História de Anápolis, só recentemente, começa a ser descoberta pelos pesquisadores acadêmicos (universitários), o que permite uma elaboração mais conceitual e analítica do nosso processo histórico. No entanto, os primórdios revelam uma produção incipiente, diletante e, às vezes, tendenciosa, elaborada por voluntariosos sem uma formação teórica e metodológica, mas com muito gosto pela história. Essas obras, porém, não invalidam o conhecimento apresentado e, com certeza, as suas contribuições são valiosas. Com isso, dividimos o texto em duas partes: Escritos diletantes sobre Anápolis e Trabalhos acadêmicos sobre Anápolis. Escritos diletantes sobre Anápolis Podemos encontrar os primeiros escritos sobre Anápolis em artigos de jornais e revistas nas décadas de 1920 e 1930, com destaque para os jornais Voz do Sul e O Anápolis, ambos da década de 1930. Com certa freqüência, alguns articulistas desses jornais faziam um relato sobre a História Local, como os textos produzidos pelo ex-prefeito João Luiz de Oliveira. Mais tarde, a revista A Cinqüentenária, publicada em 1957, por época da comemoração dos 50 anos de elevação de Anápolis como cidade, foi um ∗ Cientista social (UniEvangélica), Mestre em História (UFG) e professor na UniEvangélica. 9 esforço no sentido de resgatar a memória local. Fala de personagens ilustres no campo social, religioso, político e intelectual, lembra dos potenciais econômicos do Município, tanto na cidade, quanto na zona rural, faz apologia do nosso dinamismo na educação e na saúde, e destaca alguns aspectos da nossa cultura na poesia e na crônica. Porém, foi só na década de setenta que duas obras em português marcaram a cidade pela sua importância, o livro de Humberto Crispim, "História de Anápolis", publicado em 1975 pela editora do Cerne e o livro de Haydée Jayme, de 1979 com o título "Anápolis: sua vida, seu povo", pela gráfica do Senado Federal. Se a segunda obra é um trabalho mais diletante, resgatando a memória de famílias tradicionais da cidade, o livro de Crispim é mais elaborado, mostra uma pesquisa mais trabalhada, o que caracteriza uma maior erudição do seu autor sobre o tema. Num outro enfoque, para conhecer um pouco da nossa cultura e que, de uma forma ou de outra, descreve aspectos da nossa história, é importante ler o livro que José Sisenando Jayme publicou em 1990, Goiás: Humorismo e Folclore, onde o autor retrata o cotidiano de quatro cidades goianas, Corumbá, Pirenópolis, Silvânia, além de Anápolis, a quem dedica 98 páginas da sua obra para relatar aspectos sociais, políticos e folclóricos dos habitantes das Antas, entre o início do século vinte e os anos oitenta. Nesse viés cultural, temos o livro Anápolis em Tempo de Música, escrito por Jarbas de Oliveira e Paulo Nunes Batista, foi publicado em 1993, em projeto idealizado e produzido por Adriana Moreno. A obra faz um balanço da História da Música em Anápolis, desde a formação do Arraial, no século XIX, até a década de sessenta do século XX. Uma leitura obrigatória para quem aprecia a história cultural, pois vai encontrar nessa obra um panorama dos pioneiros na música em Anápolis, em livro escrito por dois grandes intelectuais da cidade. No século XXI, fora do âmbito acadêmico, mas importante para o entendimento da nossa história, foi criado, por Manoel Vanderic, o Projeto Resgate cultural – Memória de Anápolis, que já produziu quatro trabalhos sobre a história da cidade: Jerônimo Maneco – o homem que vivenciou três séculos, escrito por Júlio Alves, em 2001; Raul Silva – sou anapolino com muito orgulho, escrito por Wolney Ronaldo Silva; Memórias – Anapolino de Faria, escrito por 10 Vanderic Filho, em 2004; e História da Câmara Municipal de Anápolis, escrito por Júlio Alves, também em 2004. Nessa linha de autores diletantes, destacamos o Advogado Olimpio Ferreira Sobrinho, que publicou três livros sobre a História da Associação Educativa Evangélica: em 1997, Meio Século Formando Gerações; em 2002, Sob as Luzes do Milênio; e 2004, A um passo da Universidade. Nas três obras, o autor aproxima educação e religião, articulando o avanço do protestantismo em Anápolis com a consolidação da UniEvangélica. Na próxima parte veremos, com mais detalhes, outra fase da produção historiográfica local. Trabalhos acadêmicos sobre Anápolis Apesar dos esforços vistos no tópico anterior, no sentido de contar a história da cidade, os primeiros trabalhos acadêmicos só começaram a aparecer na década de setenta, quando a professora Maria de Souza França publicou um ensaio com o título, A formação histórica da cidade de Anápolis e a sua área de influência regional, nos anais do VII Simpósio Nacional dos Professores de História da Associação Nacional dos Professores de História (ANPUH), realizado em Belo Horizonte entre 2 e 8 de setembro de 1973. Esse texto faz uma análise do desenvolvimento econômico de Anápolis entre os anos vinte e cinqüenta, passando a ser uma área de influência para mais de trinta municípios goianos, nas áreas da educação, saúde, do comércio, do setor financeiro e da imprensa. Entretanto, o primeiro livro acadêmico publicado sobre a cidade foi em língua estrangeira, a obra Anápolis, Brasil – Regional capital of an Agricultural Frontier, de Robert Carmin, em 1953. É um trabalho vinculado ao departamento de Geografia da Universidade de Chicago, dos Estados Unidos, que analisa os aspectos urbanísticos e econômicos de Anápolis, na década de cinqüenta, quando a cidade era o pólo desenvolvimentista da região. Outro trabalho acadêmico foi o da professora Maria Aparecida de Morais, que escreveu três ensaios sobre os trabalhadores anapolinos, todos 11 ainda inéditos: o primeiro de 1986 e é uma especialização em História com o título O Movimento Sindical Operário em Anápolis (1871-1964); em 1995 fez uma atualização na UFG com o título P.C.B.- um partido à procura de sua identidade; o último trabalho foi sua dissertação de mestrado na UnB em 2004 com o título Memória dos Trabalhadores da Construção Civil de Anápolis. Essas pesquisas buscam resgatar a luta dos trabalhadores anapolinos, as suas organizações classistas e as suas manifestações culturais e políticas, bem como o enfrentamento com os setores dominantes No campo da História Econômica, em 1988, os professores Juscelino Polonial e Revalino Antônio de Freitas escreveram a monografia "Formação Econômica de Anápolis", trabalho mimeografado e também inédito, mas de grande valor para o conhecimento da evolução econômica do Município, das origens, quando a cidade ainda apresentava uma economia de agricultura de subsistência, até a fase de crescimento industrial, representado pelo DAIA. Em 1994, o professor Revalino Antônio de Freitas publicou o livro didático Conhecendo Anápolis, dedicado aos alunos da primeira fase do ensino fundamental e no ano seguinte, a Voga editou, do mesmo autor, o livro Anápolis, Passado e Presente, que destaca aspectos geográficos, históricos, sociais, econômicos e político-administrativos, sendo uma leitura obrigatória para quem quer entender um pouco mais da história dos anapolinos No ano de 1996, o professor Juscelino Polonial publicou o livro "Anápolis nos tempos da Ferrovia", obra derivada do seu mestrado na UFG e que resgata a importância da ferrovia para a formação da economia anapolina e do seu crescimento demográfico e urbano. A obra analisa, também, as péssimas condições dos trabalhadores nesse processo, contrastando com a idéia da modernidade, sempre associada à expansão dos trilhos. Do mesmo autor, em 2000, foi publicado o livro "Ensaios sobre a História de Anápolis", tendo como base artigos escritos por época do doutorado iniciado em 1999, como aluno especial, na Universidade de Brasília (UnB). O livro analisa a História de Anápolis entre as décadas de 1930 e 1960, com destaque para a relação do discurso da modernidade e a crises sociais e políticas no período, indo desde o autoritarismo da Era Vargas até o golpe militar de 1964. Em outra vertente de investigação, destacando aspectos econômicos e ambientais, o livro Anápolis: desenvolvimento industrial e Meio Ambiente, de 12 Joana D’arc Bardella Castro, publicado em 2004 pela UniEvangélica, faz uma análise do desenvolvimento econômico da cidade, tendo como eixo central o desenvolvimento industrial e o impacto ambiental desse processo. Quatro trabalhos acadêmicos importantes e ainda inéditos investigam a História de Anápolis. O da professora Júlia Bueno, que na sua dissertação de mestrado em História na UFG fala da economia da cidade na década de 1920 e do seu dinamismo por época da chegada da ferrovia em 1935; o da professora Sandra Elaine, investigando a História da Faculdade de Filosofia Bernardo Sayão, por época do seu mestrado em Educação na UFG, relacionando História, Educação e Religião com o título A criação da Faculdade de Filosofia Bernardo Sayão e o protestantismo em Anápolis, que foi publicada parcialmente em 2000, na Revista de nº 5/6, da FFBS/UniEVANGÉLICA; o da professora Lygia Borges Ferreira, que em 2001 defendeu a dissertação de mestrado na UFG com o título "A Memória do PCB em Goiás", resgatando um personagem importante da História de Anápolis, o jornalista A.G. Pinto, fundador do periódico A Luta, na década de 1930, sendo um porta-voz dos excluídos na luta contra a ideologia dominante da época. Em 2004, Tiziano Mamede Chiarotti defendeu o seu mestrado na PUCGoiás com a dissertação O Edifício como Artefato: Um estudo do antigo Fórum de Anápolis (1938-2001), uma importante investigação sobre o patrimônio histórico da cidade. Por época das comemorações do centenário da cidade de Anápolis, muitos livros foram escritos para lembrar essa história, tanto por professores universitários, portanto com um maior rigor na pesquisa, quanto por diletantes, mas todas as obras colaboraram no objetivo de levar ao anapolino uma maior informação sobre a sua história. Entre os trabalhos de pesquisa, podemos destacar o Jornal o Centenário. Patrocinado pela UniEvangélica e sob coordenação do professor Juscelino Polonial, o periódico circulou entre 2005 e 2007, tendo 15 exemplares e em cada número uma temática foi pesquisada como: a história econômica, uma investigação sobre o ensino superior, o resgate sobre a luta dos trabalhadores anapolinos, aspectos históricos da cultural local, a importância dos meios de comunicação, o enfoque no poder executivo, a análise da religiosidade em Anápolis, a importância dos imigrantes na construção da cidade, a pesquisa sobre a educação básica, a importância das mulheres na história da cidade, o poder legislativo, uma análise do 13 patrimônio cultural municipal e a geografia anapolina . Foram mais de trinta colaboradores, entre professores e alunos da UEG e da UniEvangélica. Muitos livros foram publicados no ano do centenário de Anápolis. Destacamos alguns: primeiro a coletânea 100 anos: Anápolis em pesquisa, sob coordenação da professora Mirza Seabra Toschi. O livro tem 12 artigos de professores e alunos da UEG e UniEvangélica com os mais variados temas e áreas de pesquisa, mas sempre tendo como objetivo de análise a cidade de Anápolis. Um segundo trabalho a destacar foi o livro Introdução à História Política de Anápolis (1819-2007), do professor Juscelino Polonial, que faz uma análise do processo eleitoral e político do município, desde as suas origens, ainda nos primórdios do século XIX, passando pela sua emancipação política, em 1892, à elevação à categoria de cidade, em 1907, com o nome de Anápolis, até as eleições municipais de 2004. Considerações finais As informações discorridas acima formam a historiografia sobre Anápolis: livros, artigos, textos em geral que mostram a história de nossa cidade. No entanto, para o pesquisador, é importante destacar que o Museu Histórico de Anápolis tem um fundo de arquivo importante para pesquisa sobre a cidade com: acervo de jornais entre 1929 e 2008, com alguma interrupção entre os anos oitenta e noventa; possui importante acervo iconográfico; uma biblioteca com muitos trabalhos sobre Anápolis; revistas e documentos que podem servir de suporte para interpretação da história dos anapolinos, tanto para os alunos da graduação, quanto para professores e pesquisadores da pós-graduação, seja especialização, mestrado ou doutorado. Outros trabalhos importantes servem para consulta da História de Anápolis e que auxiliam o pesquisador no resgate do passado da cidade são: a Revista Informação Goyana, que circulou entre os anos de 1917 e 1935, contendo muitas referências sobre Anápolis e que pode ser encontrada na Biblioteca da UEG de Anápolis; e a Revista Imagem, que circulou entre os anos oitenta e noventa, que pode ser encontrada no Museu Histórico de Anápolis. 14 Por fim, é importante destacar a produção dos alunos na graduação e pós-graduação, tanto da Universidade Estadual de Goiás (UEG), quanto da Associação Educativa Evangélica (AEE), em trabalhos que buscam investigar a História dos anapolinos. Mas também em trabalhos de professores e alunos na Universidade Federal de Goiás (UFG) e na Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUCGoiás) e até mesmo na Universidade de Brasília (UnB), que tem como objetivo de investigação alguma temática sobre Anápolis, ocorrendo, principalmente, nos cursos de História, Geografia, Economia, Ciências Sociais, Arquitetura e Pedagogia Sobre o assunto apontado no parágrafo anterior temos um pequeno exemplo: na UEG, os alunos da graduação de História, entre os anos de 1989 e 2000, apresentaram quase três centenas de monografias e desse total, 46,31% abordam alguma temática sobre Anápolis. Alguns trabalhos são biografias que destacam personagens que marcaram a vida política e religiosa da cidade, outros versam sobre as instituições históricas, sejam religiosas, filantrópicas ou esportivas. Temos, também, os trabalhos sobre a História da Educação no município, analisando a importância de algumas escolas na formação cultural da população, tanto as privadas, quanto as públicas. Outras monografias no campo da História Econômica destacam momentos importantes para Anápolis, como a chegada da ferrovia, a instalação do DAIA e das entidades classistas originárias nesse processo desenvolvimentista, representando tanto os patrões, quanto os operários. São trabalhos iniciais, com limites teóricos e metodológicos, mas apontando temáticas importantes que poderão ser aprofundadas em estudos posteriores pelos próprios alunos ou por outro pesquisador que se interessar pelo tema. Referências: BORGES, H. C. História de Anápolis. Goiânia: Editora do Cerne, 1975. FERREIRA, H. J. Anápolis: Sua Vida, Seu Povo. Brasília: Gráfica do Senado Federal, 1981. FRANÇA, M. S. A Formação Histórica da Cidade de Anápolis e a sua Área de Influência Regional. São Paulo: ANPUH, 1974. p. 635-664. 15 FREITAS, R. A. Anápolis: Passado e Presente. Anápolis: Voga, 1995. JAYME, J. S. Goiás: Humorismo e Folclore. Goiânia: edição do autor, 1990. Jornal Correio do Planalto. Edições de 1974 a 1983 - Museu Histórico de Anápolis; Jornal Gazeta Popular. Janeiro/1984 a Janeiro/1989 – Museu Histórico de Anápolis; Jornal O Anápolis. 1947 a 1969 – Museu Histórico de Anápolis; Jornal Voz do Sul. Edições de 1930 a 1936. Museu Histórico de Anápolis; Jornal O Verbo. 1931. Museu Histórico de Anápolis. LEAL, O. Viagem às Terras Goyanas (Brazil Central). Goiânia: Editora da UFG, 1980.256p. Coleção Documentos Goianos, n.4. POLONIAL, J. M. Ensaios Sobre a História de Anápolis. Anápolis: AEE, 2000. _________. A Historiografia Goiana e Anapolina. In Educação & Mudança, revista da F.F.B.S. Anápolis-Go. 2001, nº 7/8. p.71-87. SAINT-HILAIRE, A. Viagem à Província de Goiás. Belo Horizonte: Itatiaia, 1975. SILVA, J. B. M. O interior e sua importância no projeto centralizador do Brasil: Anápolis - anos 20 e 30. 1997. 123f. Dissertação (Mestrado em História) ICHL,UFG,Goiânia. 16 O MUNICÍPIO DE ANÁPOLIS: ELUCIDAÇÕES SOBRE SUA EMANCIPAÇÃO POLÍTICA E HISTORICIDADE TIZIANO MAMEDE CHIAROTTI∗ Resumo: A emancipação política da cidade de Anápolis, bem como a sua historicidade, é um tema que gera muitas discussões, sendo um assunto controvertido. Para uns, a grande minoria, isto ocorre com a instalação da Vila em 10 de março de 1892 e, para outros, a grande maioria, este acontecimento ocorre em 31 de julho de 1907. Além disso, por conseqüência dessa polêmica muitos acreditam que Anápolis tem pouco tempo de história, confundindo-se sobre sua historicidade. Assim, com base em pesquisa bibliográfica no acervo do Museu Histórico de Anápolis, compomos o presente artigo para esclarecimentos. Palavras-chave: município, emancipação política, historicidade. Introdução O artigo tem o objetivo de discutir a emancipação política da cidade de Anápolis e sua trajetória histórica. Essa discussão é pertinente em vista do desconhecimento da história do Município por grande parte dos anapolinos, principalmente quando dizem que este é recente, apresentando poucos anos de existência e que, em 31 de julho de 2010, completou somente 103 anos. Indagações como: “para que estudar a História Local?” ou “o que um acontecimento ocorrido há muito tempo na cidade tem a ver com a minha vida hoje?” refletem o desprezo da sociedade contemporânea pelas experiências do passado, a tal ponto que o historiador Eric Hobsbawm, em seu livro “A Era dos extremos”, afirmou sobre o perigo representado pela perda dos referenciais históricos e reafirmou, ainda, a importância do historiador como guardião da memória coletiva: A destruição do passado, ou melhor, dos mecanismos que vinculam nossa experiência pessoal à das gerações passadas, é um dos fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado público da época em que vivem. Por isso, os historiadores, cujo ofício é lembrar o que os outros esquecem, ∗ Historiador (UFG), Mestre em Gestão do Patrimônio Cultural (PUCGoiás) e Diretor do Museu Histórico de Anápolis “Alderico Borges de Carvalho” – MHABC da Secretaria de Cultura / Prefeitura Municipal de Anápolis. 17 tornam-se mais importantes que nunca no fim do segundo milênio. (HOBSBAWM, 1995, p.13) Desse modo, com o intuito de desmistificar concepções errôneas, estabelecemos a seguinte divisão do texto, a saber: O Município no Brasil, Emancipação política de Anápolis e Historicidade de Anápolis. No primeiro tópico, procuramos apresentar, do ponto de vista da História do Direito1, como era representado o Município no período colonial, nas cartas constitucionais brasileiras de 1824 e de 1891 para entendermos a estrutura político-administrativa da época e dar luzes, conseqüentemente, ao processo de emancipação política de Anápolis. Já no segundo tópico, abordamos a emancipação política daquela que é considerada a capital econômica do Estado de Goiás. No último tópico, por fim, realizamos uma construção cronológica mediante leis, documentos e outros registros contidos em livros do acervo do Museu Histórico de Anápolis “Alderico Borges de Carvalho” para traçar a longa historicidade desse Município. O Município no Brasil O Município brasileiro é herdeiro da instituição municipal romana que, por sua vez, nos foi passada pelos portugueses via período colonial (15001822). De acordo com o Instituto Brasileiro de Administração Municipal – IBAM (2010), as Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas regendo Portugal também regeram o Brasil desde seu descobrimento até a Independência, transplantando o modelo municipal lusitano para nosso País com as mesmas atribuições políticas, administrativas e judiciais. Desta forma, nossos Municípios tinham um Presidente, três Vereadores, um Procurador, dois Almotacés, um Escrivão, um Juiz de Fora vitalício e dois Juízes Comuns, 1 De forma ampla, para Renan Aguiar (2008), é possível a identificação de dois enfoques no estudo do Direito: o dogmático e o zetético. A História do Direito parte do segundo enfoque, pois passa a ser entendida como uma disciplina que busca reconstituir as idéias e práticas jurídico-sociais em determinado contexto histórico, social e intelectual. 18 eleitos com os Vereadores. Assim nasceu a administração da primeira Vila brasileira, a de São Vicente, em 1532. Da mesma opinião é Hely Lopes Meirelles (1993) quanto aos aspectos administrativos, porém, ele nos mostra que naquele período a expansão municipalista foi restringida pela idéia centralizadora das Capitanias, uma vez que as municipalidades de então realizavam obras públicas, estabeleciam posturas, fixavam taxas, julgavam injúrias verbais e, não raras vezes, chegaram a decretar a criação de arraiais, a convocar “juntas do povo” para discutir e deliberar sobre interesses da Capitania, a exigir que governadores comparecessem aos seus povoados para tratar de negócios públicos de âmbito estritamente local, a suspender governadores de suas funções e até mesmo depô-los. Com a Constituição Imperial promulgada em 25 de março de 1824, o Município tem sua autonomia modificada, pois esta Carta Magna deu novas diretrizes às municipalidades, conforme atesta Meirelles (1993): Foram instituídas Câmaras Municipais em todas as cidades e vilas existentes “e nas mais que para o futuro se criarem” (art. 167), com caráter eletivo, e presididas pelo vereador mais votado (art. 168). A estas Câmaras competia “o governo econômico e municipal das mesmas cidades e vilas” e “especialmente o exercício de suas funções municipais, formação das suas Posturas policiais, aplicação das suas rendas e todas as suas particulares e úteis atribuições”, a serem regulamentadas por lei ordinária (art. 169). (MEIRELLES, 1993, p.29) Entretanto, como o próprio autor escreve, as liberdades locais garantidas pela Carta Imperial foram suplantadas pela Lei Regulamentar de 1º de outubro de 1828, no sentido de que, ao disciplinar o processo de eleição dos vereadores e juízes de paz e catalogar todas as atribuições da nova corporação, trouxeram para as municipalidades a mais estrita subordinação administrativa e política aos presidentes das Províncias. Tal afirmativa é confirmada pelo IBAM (2010) quando relata que o período imperial foi nefasto para os Municípios, pois estes perderam as 19 funções políticas, financeiras e judicantes por meio da Lei Regulamentar de 1828. Este instituto jurídico imperial foi inspirado na legislação napoleônica de 1804, transformando os Municípios em “corporações meramente administrativas2”. Mais tarde, com a Proclamação da República (1889), fazia-se necessária uma nova Constituição para adequar o país ao ideal republicano, o que ocorreu em 24 de fevereiro de 1891, determinando que os Estados se organizassem “de forma a assegurar a autonomia dos Municípios em tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse” (art. 68). De modo que, segundo Meirelles (1993), as Constituições estaduais modelaram os seus Municípios em termos que lhes asseguravam a autonomia pregada na Lei Magna e, inclusive, as leis orgânicas destes reafirmaram o princípio e discriminaram as atribuições municipais, mas a autonomia propalada só ficou nos textos legais, pois, na prática, isto era outra história. De fato, da subestima forçada e do imobilismo imposto sob o regime imperial, o Município, conforme aponta o IBAM (2010), vai ser objeto de manipulação ostensiva por parte das oligarquias estaduais, visto que o poder político se concentrava nas mãos dos “velhos caciques”, que dominavam a política estadual3. Daí que o Município ficou sujeito aos interesses e às feições que lhe desse o Estado, tais como: • Organizar as instituições municipais; • Definir a competência destas instituições; • Definir a composição do governo; • Definir os tipos de controle que exerceria sobre o Município; • Nomear o Chefe do Poder Executivo (apenas em 8 Estados era eleito); • Denominar o Chefe do Executivo (em alguns, era Prefeito, noutros, Intendente e, ainda noutros, Presidente Municipal); • Manipular as finanças municipais. 2 Conforme Pontes & Faria (2009), seguiu-se à Lei Regulamentar o Ato Adicional (Lei nº16, de 12 de agosto de 1834) que subordinava os municípios às assembléias legislativas provinciais. 3 Essa prática ficou conhecida pela historiografia como coronelismo, cuja explicação no Estado de Goiás é magistralmente analisada por Itami Campos no livro Coronelismo em Goiás, de 2003. 20 O quadro abaixo resume as características da instituição municipal nestes períodos históricos: QUADRO 01 – CARACTERÍSTICAS DO MUNICÍPIO LEI ORDENADORA: ATRIBUIÇÕES: CHEFE DO EXECUTIVO: COLÔNIA Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas Políticas, administrativas e judiciais Presidente IMPÉRIO Constituição de 1824 e Lei Regulamentar de 1828 1ª REPÚBLICA Constituição de 1891 Administrativas Políticas e 4 administrativas Procurador e / ou Vereador mais votado Prefeito, Intendente ou Presidente Municipal Fonte: Meirelles, H. L. Direito Municipal Brasileiro e dados trabalhados pelo autor. Depois desta explanação vamos perceber, no próximo tópico, o processo de emancipação política daquela que viria a ser a cidade de Anápolis. Emancipação política de Anápolis Muitos acreditam que o processo de emancipação política de Anápolis ocorre com a sua elevação à categoria de cidade, no dia 31 de julho de 1907. Porém, tendo como base os argumentos apresentados pela historiografia local, esclarecemos que tal acontecimento não ocorreu nesta data. Assim, a nossa emancipação ocorre em 1887, quando há a elevação da Freguesia a “Vila de Santana das Antas”, mas somente se efetivando com a instalação do Município em 1892. No que diz respeito àquele atraso, a historiografia local aponta como fatores determinantes para essa demora as seguintes causas: a) Abolição da Escravidão, em 13 de maio de 1888; b) Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, e c) Resistência de Pirenópolis, então sede do Município, que englobava a região onde hoje está Anápolis. A última causa é colocada de melhor forma por Polonial (1996), quando diz que: 4 A atribuição política, na República Velha, ocorreu somente em oito Estados e que consistia somente na eleição do chefe do Executivo e dos seus Vereadores. 21 A troca de mercadorias também aumentava, surgindo na Freguesia as primeiras casas de comércio, que ofereciam os mais variados produtos: gêneros alimentícios, armarinhos, calçados, ferragens, chapéus, tecidos e outros produtos de consumo geral. Essas mudanças na ocupação do espaço urbano levaram à elevação da Freguesia à condição de Vila, concretizada pela Lei Provincial nº 811 de 15 de dezembro de 1887. A autonomia política e tributária daria maior dinamismo aos agentes econômicos. Em 1888, foi criada a Coletoria Provincial. A instalação da Vila, porém, só aconteceu em 10 de março de 1892. Basicamente, esse retardamento deveu-se à resistência de Pirenópolis, que não queria perder a Freguesia, de solo fértil e geradora de impostos, com potencialidade econômica considerável. (POLONIAL, 1996, p.38) A afirmação acima é muito pertinente, uma vez que mostra a data da emancipação, como também da instalação do Município. Apesar disso, baseando-se na estrutura político-administrativa municipal fornecida pela História do Direito, acreditamos que a explicação para o atraso não é a correta, pois durante o Império do Brasil, o Município não tinha a atribuição política, financeira entre outras, então, não fazia sentido Pirenópolis opor resistência ao processo de emancipação. Da mesma forma, outro dado incoerente sugerido é a colocação de que a Lei Provincial nº. 811 daria maior autonomia política e tributária aos agentes econômicos da Freguesia, o que se revela incorreto, pois vimos que o Município só tinha a atribuição administrativa. Quanto aos fatores externos que causaram o atraso, concordamos com a argumentação apresentada pela historiografia local, principalmente com a Proclamação da República (1889), porque este acontecimento proporcionou uma nova dinâmica ao Município atribuindo-lhe, por exemplo, a autonomia política por meio de dispositivo contido na nova Constituição, promulgada em 1891. Esse fato é corroborado com a nomeação de nosso primeiro intendente, o conhecido “Zeca Batista”, em 1892 e a primeira eleição do Executivo Municipal que elegeu Lopo de Souza Ramos no ano de 1893. Já a Abolição da Escravidão (1888), por seu turno, atingiu indiretamente a instalação do Município, pois este não exibia a autonomia financeira, somente existindo esta atribuição no Estado, que manipulava as finanças municipais através da Coletoria Provincial (1888), o que explica o atraso da instalação. 22 A título de curiosidade, na Figura 01 vemos a Intendência Municipal em fins da década de 1920: FIGURA 01 – INTENDÊNCIA MUNICIPAL EM FINS DE 1920 Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2010. Com efeito, esclarecido o assunto, no próximo tópico vamos mostrar a historicidade do Município, procurando identificar a diferença entre esta e o tema que abordamos acima. Historicidade de Anápolis Os registros que apontam o passado anapolino são variados e de diferentes tipos e que são também denominados fontes históricas, pois para Silva (2006): Fonte histórica, documento, registro, vestígio são todos termos correlatos para definir tudo aquilo produzido pela humanidade no tempo e no espaço; a herança material e imaterial deixada pelos antepassados que serve de base para a construção do conhecimento histórico. (SILVA, K. V., 2006, p.158) 23 As fontes escritas para o conhecimento da história de Anápolis, portanto, podem ser divididas em depoimentos e documentos oficiais5. A do primeiro tipo refere-se a relatos de viajantes que passaram por aqui no passado, enquanto que a última diz respeito a legislações provinciais / estaduais e documentos cartorários. Assim, muitos já registraram sobre estas fontes, mas a nossa pretensão é catalogar, em quadro esquemático, algumas destas: QUADRO 2 – DEPOIMENTOS E DOCUMENTOS SOBRE ANÁPOLIS VIAJANTE Augusto de Saint-Hilaire Raimundo José da Cunha Matos Francis Castelnau Oscar Leal Relatório da Missão Cruls Leopoldo de Bulhões Joaquim Ferreira dos Santos Azevedo Lourenço Moreira Lima DENOMINAÇÃO Termo de Doação Resolução nº. 514 Lei nº. 2.514 Lei nº. 695 Lei nº. 778 Lei nº. 811 Designação estadual Lei Orgânica Lei nº. 155 Lei nº. 267 Lei nº. 320 DEPOIMENTOS PROCEDÊNCIA França Portugal DATA 1819 1824 França Pernambuco Rio de Janeiro Goiás Rio de Janeiro 1844 1887 1893 1893 1910 Membro da Coluna Prestes DOCUMENTOS CONTEÚDO Doação de terras para o Patrimônio de Nossa Senhora Santana Criação da Freguesia Estabelecimento dos limites da Freguesia Mudança de denominação da Freguesia Freguesia volta a ter a antiga denominação Freguesia elevada à Vila com emancipação política Instalação da Vila Disciplina o funcionamento do Conselho Municipal Alterações de limites territoriais da Vila Revogação de Lei que alterou os limites do Município Vila elevada à categoria de Cidade 1925 DATA 25/04/1870 06/08/1873 18/06/1879 19/07/1884 13/11/1886 15/12/1887 10/03/1892 01/05/1896 17/06/1898 12/07/1905 31/07/1907 Fonte: Borges, H. C. História de Anápolis e dados trabalhados pelo autor. 5 Além destas fontes escritas, existem também as construções interpretativas de historiadores que compõem a chamada historiografia local, em especial nas obras de Ferreira (1981), Borges (1975), Polonial (1996, 2000 e 2008), Freitas (1995), dentre outros. 24 O que percebemos deste quadro é a longa duração temporal do lugar onde hoje é Anápolis, pois este nos remete à sua antiguidade, especificamente aos inícios do século XIX. Por isso, podemos enumerar a seguinte cronologia: • 1819-1873 – da Fazenda ao Povoado de Santana das Antas; • 1873-1887 – Freguesia de Santana das Antas; • 1887-1907 – Vila de Santana das Antas; • 1907-2010 – Cidade de Anápolis. Assim sendo, podemos apontar como trajetória histórica 191 (cento e noventa e um) anos, considerando o registro do viajante Saint-Hillaire em 1819 até o ano de 2010. Também apontamos 123 (cento e vinte e três) anos para a emancipação política, tendo como base a Lei Provincial nº. 811 de 15 de dezembro de 1887 e, efetivamente, 118 (cento e dezoito) anos para a instalação do Município em 1892. Da mesma forma, para finalizar, consideramos 103 (cento e três) anos da elevação da Vila de Santana das Antas para a Cidade de Anápolis, tendo como base a Lei nº. 320 de 31 de julho de 1907. Considerações finais A instituição municipal no Brasil é muito antiga, remontando à instalação da primeira Vila, em 1532. Durante os períodos da história brasileira que analisamos, principalmente o Colonial, o Imperial e o da 1ª República, o Município passou por diferentes transformações, tendo as suas atribuições modificadas. Com base nisso, então, mostramos que o processo de emancipação política da atual cidade de Anápolis ocorreu em 1887, quando esta passa a ser Vila, mas com sua instalação somente em 1892. Ainda mostramos, igualmente, que o atraso da instalação se deve às atribuições do Município fornecidas pela História do Direito, aperfeiçoando-se, assim, a explicação da historiografia local sobre o fenômeno. 25 De igual modo percebemos a diferença entre historicidade e emancipação política, de vez que a primeira significa a trajetória histórica da Fazenda de Santana das Antas a Anápolis, contando com 191 (cento e noventa e um) anos, enquanto que a última significa a nossa autonomia, fato datado em torno de 123 (cento e vinte e três) anos, levando-se em consideração a Lei nº. 811 de 1887. Em outras palavras, na data de 31 de julho de 2010, portanto, completamos 103 (cento e três) anos de elevação de Anápolis à categoria de Cidade e não sua emancipação política como a maioria dos anapolinos estão acostumados a pensar. Referências: Acervo Iconográfico e Bibliográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2010. AGUIAR, R. História do Direito. São Paulo: Saraiva, 2008. BORGES, H. C. História de Anápolis. Goiânia: Editora do Cerne, 1975. CAMPOS, F. I. Coronelismo em Goiás. Goiânia: Vieira, 2003. FERREIRA, H. J. Anápolis: Sua vida, Seu povo. Brasília: Gráfica do Senado Federal, 1981. FREITAS, R. A. Anápolis: Passado e Presente. Anápolis: Voga, 1995. HOBSBAWM, E. J. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. MEIRELLES, H. L. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 1993. POLONIAL, J. M. Introdução à história política de Anápolis (1819-2007). Anápolis: Edição do Autor, 2007. ________. Ensaios Sobre a História de Anápolis. Anápolis: AEE, 2000. ________. Anápolis nos tempos da ferrovia. Anápolis: AEE, 1996. PONTES, D.R. & FARIA, J.R.V. Direito Municipal e Urbanístico. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2009. SILVA, K. V. Dicionário de conceitos históricos. São Paulo: Contexto, 2006. www.ibam.org.br . Acesso em 19/03/2010. 26 CEDOC - CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO DA CÂMARA MUNICIPAL E A GUARDA DE DOCUMENTOS EM ANÁPOLIS ARNALDO SALUSTIANO DE MOURA∗ Resumo: Nosso artigo objetiva levar ao conhecimento do público interessado, os trabalhos de recuperação da massa documental da Câmara Municipal de Anápolis com vistas à criação de um Centro de Documentação. Propõe também uma discussão sobre a preservação do patrimônio cultural, da memória e da história da cidade e da região, contidos nos documentos produzidos no exercício do poder público, alem de sugerir a criação de um Arquivo Público Municipal, conforme legislação federal vigente, como solução dos problemas identificados. Palavras-chave: documentos, preservação, CEDOC. Introdução A Câmara Municipal de Anápolis, assim como toda instituição, gera em sua rotina de atividades, uma infinidade de documentos que são arquivados nos seus respectivos departamentos. Desta forma, os papéis do departamento de pessoal têm seu próprio arquivo, assim como o departamento jurídico, a administração, a procuradoria, as comissões, entre outros. Desde o início de suas atividades, o que se convencionava fazer, após alguns anos, era encaminhar a “papelada” mais antiga para o “arquivo morto” onde ficavam “guardados” para uma possível consulta. Manuseando estes documentos, hoje, podemos constatar que houve momentos em que se lhes pretendeu dar alguma “organização”; grande parte está acondicionada em pastas, dentro de caixas de papelão (as chamadas “caixas de arquivo morto”), contendo descrição de conteúdo e numeração. Ainda havia outras, simplesmente guardadas em pastas, também de papelão e etiquetadas. Todas abrigadas em um grande arquivo que funcionava no prédio da Câmara Municipal. Até aqui tudo em ordem. Assim, para relatar um pouco do nosso trabalho para recuperar o arquivo da Câmara Municipal, dividimos o texto em duas partes: O acaso a serviço do descaso e Salvando a história e a memória da região. ∗ Historiador (UEG), funcionário do CEDOC de História da UEG-Anápolis e gestor do projeto para criação do CEDOC da Câmara Municipal. 27 O acaso a serviço do descaso Nos anos oitenta, fortes chuvas atingiram a cidade e a “baixada das Antas”, local onde o prédio da Câmara foi construído, alagando-a várias vezes. Em duas ocasiões, a cheia elevou o nível de água a quase um metro acima da base do prédio da Câmara... Parte dos documentos ficou submersa. Antigos funcionários dizem que na última enchente, foram retirados dois caminhões de papéis misturados à lama. Ou seja: misturados ao barro, que as águas trouxeram. Parte da história da Câmara e de Anápolis, foi para o lixo. Na tentativa de preservar o que sobrou, decidiram “guardar” estes papéis em um cômodo situado sob as arquibancadas do Estádio Jonas Duarte. A pretendida organização se perdeu no transporte para o estádio. Os que foram salvos estavam umedecidos, e ainda foram sujeitos à umidade do novo local. As pastas e caixas de papelão mostraram-se verdadeiras guloseimas para ratos, cupins e brocas. Associado a ausência de luz, o ambiente se mostrou excelente para a cultura de fungos e bactérias... Anos se passaram... Salvando a história e a memória da região Meses atrás fomos procurados pelo Presidente da Câmara, que manifestou o interesse de melhor acomodar estes documentos, salvaguardando-os. Sugerimos então a criação do Centro de Documentação da Câmara Municipal com a colaboração do CEDOC de História da Unidade Universitária de Ciências Socioeconômicas e Humanas – UnUCSEH da Universidade Estadual de Goiás – UEG, do qual fazemos parte. Assim foi feito. Paralelamente a tarefa inicial de higienização do acervo (muito sujo e danificado), iniciamos o trabalho de reconhecimento dos documentos. Observamos um grande volume de balancetes do Executivo e da Câmara. Documentos da rotina de RH, do jurídico, requerimentos, processos, Livros de Atas, de Leis sancionadas, de Decretos, dentre outros. Uma leitura prévia, temática e cronologicamente aleatória, nos fez reconhecer, de imediato, a importância histórica daquele acervo. Por estarmos próximos a pesquisadores do Departamento de História da UEG, tivemos 28 oportunidade de poder contribuir com material para pesquisas com temas diversos como “a lepra no estado de Goiás”, “manicômios e doenças mentais”, “o período da ditadura em Anápolis” e muitos outros. Os documentos trazem informações não somente de Anápolis, mas também de outros Municípios. Muito da história das cidades vizinhas, que um dia foram Distritos do Município de Anápolis, como Damolândia, Nova Veneza, Nerópolis, Brazabrantes, Ouro Verde, Goianápolis e Campo Limpo, se encontra no Acervo da Câmara Municipal. Quanto mais conhecemos o acervo, mais temos certeza de sua importância. O acervo está sendo higienizado, recuperado e catalogado e pelo menos parte dele estará à disposição de pesquisadores e interessados em pouco tempo. São documentos, fotos, mapas, jornais, sendo os mais antigos datados de 1922. Estamos preparando, também, um livro que auxiliará o pesquisador na consulta dos documentos. A gestão deste acervo está sendo realizada conforme a legislação vigente. Uma destas leis preconiza que “é dever do Poder Público a gestão documental e a proteção especial a documentos de arquivo, como instrumentos de apoio à administração, à cultura, ao desenvolvimento científico e como elementos de prova e informação”.6 Quanto à técnica, toda mão-de-obra utilizada é composta por estagiários do Curso de História da UEG, tendo sido devidamente capacitados e treinados. Em sua rotina, utilizam-se de equipamentos de EPI de modo a tornar mais segura a convivência com os documentos e aplicam técnicas modernas de recuperação e conservação de acervos impressos. A bem da verdade, alguns critérios técnicos lamentavelmente têm sido omitidos e isto se deve à grande distância entre o que “deve” ser feito, tecnicamente, e o que “é possível” ser feito, principalmente pela ausência de recursos, que somente com muito boa vontade do setor administrativo da Câmara e a criatividade da gestão do acervo, têm possibilitado a continuidade dos trabalhos. 6 Art. 1º da Lei Federal de Arquivos nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991. 29 Considerações finais A iniciativa de instalação do CEDOC da Câmara Municipal de Anápolis deveria ser de fato, o primeiro passo para a implementação de uma Política Municipal de Arquivos que encaminharia as discussões para a aprovação em plenário do Sistema Municipal de Arquivos que, na prática, organiza legalmente toda a geração, guarda e proteção do patrimônio arquivístico do Município em todas as suas fases (fase corrente ou ativa; fase intermediária e fase final ou permanente). Temos notícias de outro grande volume de documentos antigos, estes, do poder executivo, também “guardados” inadequadamente... . O descaso foi o principal causador do muito que a cidade perdeu de seu patrimônio artístico, arquitetônico, histórico e cultural. Ainda há tempo de preservar estes documentos e que bom seria se as providências tomadas levassem à instalação de um Arquivo Público Municipal, com acesso livre ao cidadão, assegurando a este, pleno direito de acesso e consulta aos documentos públicos municipais, como determinam as leis. Referências: Casa Civil, Arquivo Nacional, Conselho Nacional de Arquivos: Resolução nº 27, de 16 de Junho de 2008 Lei Federal de Arquivos nº 8.159, de 08 de janeiro de 1991. FERREZ, H. D. Documentação Museológica: Teoria para uma Boa Prática Documentalista, Recife, 1991. 30 BREVE DESCRIÇÃO DOS PATRIMÔNIOS HISTÓRICOS DE ANÁPOLIS ROSENILDA RODRIGUES DA SILVA∗ Resumo: O presente trabalho aborda a importância e descrição dos patrimônios históricos de Anápolis. Em muitas cidades, com forte inclinação turística, os patrimônios históricos constituem-se em importantes atrativos turísticos que são conservados beneficiando, assim, o desenvolvimento local por meio da atividade turística como é o caso de Pirenópolis e Cidade de Goiás. No entanto, a intenção desse artigo é identificar como se encontram esses bens materiais juntamente com sua importância no nosso Município. Palavras-chave: patrimônio histórico, descrição. Introdução A preocupação com a preservação e a valorização de bens culturais e ambientais no Brasil reporta à Semana de Arte Moderna de 1922 e, desde então, vem sendo objeto de estudos e de interesse tanto do governo como da sociedade. De acordo com o IPHAN, define-se oficialmente Patrimônio Histórico Artístico e Nacional como sendo o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público que, por sua vinculação a fatos memoráveis da História do Brasil, possuem excepcional valor arqueológico, etnográfico, bibliográfico ou artístico. Segundo o referido Instituto, existem no Brasil mais de dezesseis mil edifícios tombados como patrimônios históricos. Eles são preservados e/ou restaurados mantendo suas características originais. Essas restaurações são realizadas com verbas públicas ou privadas envolvendo arquitetos, historiadores e profissionais técnicos. Os patrimônios históricos devem ser preservados porque fazem parte da história dos lugares e de seus habitantes. Eles retratam uma parte do passado de uma sociedade, mas também da história construída cotidianamente e que será referencial para as gerações vindouras tais como: arquitetura, valores da ∗ Graduanda do Curso de Geografia da Unidade Universitária de Ciências Socioeconômicas e Humanas – UnUCSEH da Universidade Estadual de Goiás – UEG. 31 época, desenvolvimento econômico e organização social. Isso fica bem explicado nas palavras de Horta (2005): Nada substitui o objeto real como fonte de informação sobre a rede de relações sociais e contexto histórico em que foi produzido, utilizado e dotado de significado pela sociedade que o criou (HORTA, 2005, p.9). Nesse artigo buscaremos identificar como se encontram esses bens materiais do Município de Anápolis, juntamente com sua importância histórica. O artigo se volta, portanto, para uma análise do patrimônio cultural material, expresso em algumas edificações, cujo valor histórico e identitário é inegável. Histórico dos patrimônios de Anápolis Anápolis como outras inúmeras cidades brasileiras possui seus patrimônios históricos e sua importância relacionada às transformações socioeconômicas e culturais desenvolvidas ao longo dos anos. Além dessas construções os objetos e artefatos também são elementos importantes na composição da história. Mas, em escala geral não é raro o fato de que muitos desses bens se encontram em péssimo estado de conservação e outros chegam até mesmo a deixar de existir devido às mudanças impostas pela própria dinâmica socioeconômica das cidades. Em Anápolis casas, prédios, praças, monumentos são diariamente “escondidos” ou retirados para dar lugar a novos empreendimentos, usos e funções. Isso ocorre principalmente na área central da cidade em que a refuncionalização dos espaços urbanos transformam tais construções para atender a demanda comercial e de serviços. Segundo Polonial (2007), Anápolis possui uma arquitetura em estilo “Art Déco”7 que merece ser preservada, pois retrata a mudança de cidade interiorana, pacata, para uma cidade moderna. Entretanto, o Município possui 7 Estilo arquitetônico muito usado em Anápolis entre as décadas de 30 e 40. 32 apenas nove monumentos tombados8 como patrimônios históricos, sendo os seguintes: QUADRO 01 – PATRIMÔNIOS HISTÓRICOS MUNICIPAIS Mercado Municipal “Carlos de Pina” Tombado pela Lei nº 025 Estação Ferroviária Tombada pela Lei nº 1.824 Museu Histórico Tombado pela Lei nº 1.824 Escola de Artes “Oswaldo Verano” Tombado pela lei nº 1.824 Prédio da Diretoria de Cultura Tombado pela Lei nº 1.824 Morro da Capuava Tombado pela Lei nº 2.511 Casa JK Tombada pela Lei nº 2.952 Colégio Estadual Antesina Santana Tombado pela Lei nº3. 171 Colégio Couto Magalhães Tombado pela lei nº 3.171 Fonte: Arquivo do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2010. Alguns desses bens foram restaurados mantendo suas características originais como o Colégio Estadual Antesina Santana e o Museu Histórico. Assim, passaremos agora a descrever um pouco da história de cada um desses patrimônios tombados. Colégio Estadual Antesina Santana É o mais antigo da cidade, foi inaugurado em 18 de abril de 1926. Desde a fundação do povoado, até 1926, o ensino em Anápolis era ministrado em pequenas escolas públicas mantidas pelo Estado e por algumas escolas particulares. O Antesina se chamou primeiramente Grupo Escolar Doutor Brasil Ramos Caiado. Após a vitória da Aliança Liberal, em 1930, o então grupo escolar mudou de nome, desta vez se chamando Grupo Escolar 24 de outubro, homenagem a data em que se instalou a democracia em todo o país. Com o decorrer dos anos o espaço físico da escola já não comportava mais o grande número de alunos. Então, foi fundado, em 1945, um novo prédio situado na parte central da cidade e novamente mudou de nome, agora passando a se 8 Tombar nesse contexto refere-se a inventariar, pôr sob proteção do Estado bens móveis ou imóveis que sejam de interesse público. 33 chamar Grupo Escolar Antesina Santana, em homenagem à filha de Moisés Augusto Santana, professora falecida precocemente. Essa escola resiste até a atualidade desempenhando um papel muito importante no cenário educacional do Município, pois funciona nos três períodos e recebe estudantes de todos os bairros da cidade. Museu Histórico Construção em estilo neocolonial possui onze cômodos e seu terreno é de 411m². Aí residiu o Coronel José da Silva Batista que liderou a emancipação política e empreendeu esforço para a elevação da Vila de Santana das Antas à categoria de Cidade no ano de 1907. Na década de 30 essa edificação foi vendida à Igreja Católica passando a sediar o Colégio Paroquial Dom Bosco, sendo habitada também em1940 por Cônego Trindade. Porém somente no dia 26 de julho de 1975, o museu seria aberto à comunidade na gestão do então ex-prefeito Jamel Cecílio. Jan Magalinski tornou-se seu primeiro diretor e a partir dessa época o Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho” vem dando sua contribuição para a rica história do Município contando com grande acervo de peças, objetos, documentos, livros, fotografias e jornais . Mercado Municipal “Carlos de Pina” Este mercado foi inaugurado em 1951, em um momento em que a cidade era principal centro comercial de Goiás sendo a primeira edificação da cidade tombada como patrimônio histórico e ainda hoje é referência no comércio anapolino, oferecendo uma infinidade de produtos e, no ano em que iria completar 50 anos, ele passou por reformas. Colégio Couto Magalhães Tal prédio se encontra em estado de conservação variando de boa a regular devido à intervenção privada, sendo que naquele ambiente funciona uma instituição privada de ensino. Ele nasceu com o intuito de se ter uma escola que atendesse às crianças anapolinas e especialmente aos filhos dos 34 evangélicos. Foi inaugurado no dia 1 de fevereiro de 1932 e, a principio, essa instituição de ensino funcionou numa casa alugada na matriz de Santana. Em 1948 foi administrada pelo reverendo Arthur Wesley Archibald, a quem o colégio deve tudo sobre a aquisição da propriedade onde até hoje está situada a Associação Educativa Evangélica. Ele transformou a escola em regime de internato e implantou um novo modelo de escola permanecendo como diretor e professor até 1957. Escola de Artes “Oswaldo Verano” O edifício foi criado em 1968, tendo primeiramente o nome de Escola Belas Artes de Anápolis. Em 1974 o então prefeito Irapuã Costa Júnior através do decreto nº 1.248 instala a Escola de Artes de Anápolis e em março de 1980 a prefeitura decidiu homenagear o primeiro diretor e professor de artes plásticas de Anápolis mudando seu nome para Escola de Artes “Oswaldo Verano”. O objetivo maior desse estabelecimento era o de criar uma escola que servisse de instrumento eficaz na descoberta dos valores artísticos da juventude Anapolina. Iniciou-se com a proposta do ensino da arte de forma acadêmica, tendo como disciplinas desenho e pintura a óleo. Atualmente ela se encontra em pleno funcionamento, contribuindo grandemente com a cultura do Município. Prédio da Diretoria de Cultura Esse prédio está situado na Praça Bom Jesus e já foi sede da Prefeitura e do Fórum de Anápolis, entre os anos de 1938 até 1975. Segundo Chiarotti (2003) “sua construção foi realizada para simbolizar o processo de modernização pelo qual o município passava com a chegada da ferrovia e que pudesse dar a administração municipal um caráter moderno.” Atualmente essa edificação tem seus espaços ocupados por atividades culturais além de expor obras de artes de artistas e artesãos locais e regionais. Morro da Capuava 35 Esse patrimônio tem a natureza como referência e foi tombado em 2003. Quando a coluna prestes passou por Anápolis em julho de 1925 os revoltosos vindos do sul com destino ao norte fizeram parada nas suas imediações contribuindo, dessa forma, para complementar a história do município. Como o nome sugere, esse morro é uma das partes mais altas do relevo do Município, possibilitando assim uma vista ampla de quase toda a cidade. Hoje serve como espaço de lazer, passeios e meditação espiritual, tornando-se um lugar bastante visitado, principalmente aos finais de semana. Casa JK A importância histórica desse patrimônio é devido ao fato que foi aí que o ex-presidente assinou o termo de transferência da capital federal para o Centro-Oeste, no dia 18 de abril de 1956. Esse patrimônio histórico está localizado no aeroporto municipal de Anápolis tendo como fundador e diretor Érides Guimarães que guarda até hoje a caneta usada pelo presidente JK. Tal construção é aberta a visitações. Estação Ferroviária Propositalmente, deixou-se essa edificação para ser discutida por último devido à sua extrema importância para o Município. Situada na Praça Americano do Brasil, ela foi tombada em 1991. A Estação foi inaugurada no dia 7 de setembro de 1935, contando com a presença de bandas musicais, representantes políticos, oradores solenes e a presença dos engenheiros Castilho e Portela responsáveis pela construção. Com o passar dos anos, o aumento populacional juntamente com um maior número de veículos nas ruas, fizeram com que os trilhos da estrada de ferro fossem retirados e a Estação Ferroviária desativada, chegava ao fim a era ferroviária em Anápolis. Tal fato aconteceu no dia 3 de maio de 1976 na administração do ex-prefeito Jamel Cecílio (Figura 01). Os trilhos, que foram símbolo do progresso na década de 30, passaram a ser um problema para os moradores, pois o automóvel passava a ser o meio de transporte preferencial. 36 Atualmente o espaço interno da Estação Ferroviária se encontra desocupado e devido às transformações socioespaciais, sua visibilidade foi obstruída pela ampliação do terminal urbano ocorrida em 1998 e bancas de vendedores ambulantes que se instalaram em volta daquela construção. Esses vendedores pagam imposto à Prefeitura do Município devido ao uso do solo e garantem que serão prejudicados se tiverem que sair daquele local. As Figuras abaixo permitem uma comparação entre os dois momentos distintos da antiga Estação. FIGURA 01 – RETIRADA DOS TRILHOS DO CENTRO EM 1976 Fonte: www.anapolis.go.gov.br/galeria. FIGURA 02 – SITUAÇÃO ATUAL DA ESTAÇÃO FERROVIÁRIA Fonte: www.anapolis.go.gov.br/galeria. 37 Em maio de 2009, conseguiu-se judicialmente a demolição do Terminal Urbano 2 e, enquanto isso não acontece, a sociedade Anapolina espera que a Estação Ferroviária seja restaurada e mantenha viva a sua importância histórica para o município. Considerações finais A preservação de patrimônios históricos é dever dos órgãos competentes por meio de políticas públicas, cabendo também à sociedade zelar por esses bens. Mesmo sabendo da importância de preservá-los existem fatores que contribuem para a não preservação, fatores esses que são de ordem social, urbana, cultural e política. Preservar não é apenas guardar um objeto e conservá-lo, é necessário garantir, além disso, a preservação da memória social que a comunidade tem daquele mesmo objeto. Nesse artigo abordamos apenas os bens arquitetônicos da cidade de Anápolis, mas sabemos, todavia, que nosso patrimônio cultural é composto por muitos bens imateriais que não foram o objeto dessa discussão. Referências CHIAROTTI,T.M. O edifício como artefato: um estudo do Antigo Fórum de Anápolis (1938-2001). Goiânia: PUCGoiás, 2003. (Dissertação de Mestrado). HORTA, P.L.M. O objeto cultural como fonte primaria de conhecimento. Guia básico de educação patrimonial, Brasília. v.1n.1,6-65, dez.2006. POLONIAL, Juscelino Martins. O patrimônio histórico de Anápolis. O centenário, Anápolis, mar.2007. _________. Ensaios sobre a história de Anápolis. Anápolis: AEE, 2000. www.anapolis.go.gov.br/galeria. Acesso em 20/11/09. www.brasilia50anos.com.br. Acesso em 20/11/09. www.iphan.gov.br. Acesso em 21/03/10. 38 HISTÓRICO DOS LOCAIS DE PRIVAÇÃO DA LIBERDADE EM ANÁPOLIS: ASPECTOS DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO E CULTURAL WESLEY COSTA∗ Resumo: O presente artigo realiza uma abordagem geocrítica acerca do tema ambiente prisional, além de uma pesquisa geo-histórica sobre as localizações das primeiras cadeias na cidade, resgatando a partir desse ponto, valores históricos perdidos através dos tempos, mas que deixaram marcas na dinamização da paisagem Anapolina. Cidades históricas de Goiás tiveram suas Casas de Câmara e Cadeia hoje atrativos turísticos, porém seus prédios restaurados são usados para outros fins, mas, permanecendo com a memória resguardada. Anápolis não teve essa mesma sorte com relação à riqueza desse seu passado que seria hoje mais um dos seus patrimônios históricos, mas por meio deste trabalho, há de se considerar que essa memória foi resgatada. Palavras-chave: paisagem, patrimônio histórico, cadeia. Introdução A o pesquisar sobre os locais que serviram como cadeia pública na cidade de Anápolis houve a necessidade de se fazer entrevistas com moradores da cidade, envolvendo, tanto pessoas mais simples, bem como aqueles que se destacam na sociedade Anapolina e que descendem de pessoas ilustres vinculadas até mesmo a fundadores da cidade, como é o caso, dentre outros, do atual Secretário Municipal de Desenvolvimento Econômico Dr. Mozart Soares Filho, bisneto de Zeca Batista, um dos fundadores da cidade de Anápolis, além do Dr. Amir de Souza Ramos, da descendência de Gomes de Souza Ramos, outro personagem da história local ligada à fundação da cidade, conforme destacam pesquisas junto ao Museu Histórico de Anápolis. Nesse sentido, o artigo destaca as transformações que ocorreram na paisagem Anapolina, no que tange às construções utilizadas como locais de privação da liberdade, por isso, resgata informações sobre a história desses locais, como por exemplo, a Casa de Câmara e Cadeia, depois, a sua demolição e a construção do Grupo Escolar, mais tarde denominado de ∗ Geógrafo (UEG) e Especialista em Geografia, Meio Ambiente e Turismo (UEG). 39 Colégio Estadual Antesina Santana, caracterizando a existência de um centro histórico oculto que compreende uma parte da memória perdida. Nesse processo, outros locais foram criados para servirem de prisão, como é o caso da Cadeia Pública de Anápolis, antes localizada no centro da cidade, cuja transferência deu origem ao Centro de Inserção Social, fora dessa área. Dessa forma, na seqüência destacamos essa discussão, todavia permeia a análise a questão sobre o turismo e a valorização do patrimônio arquitetônico local. Anápolis teve sua Casa de Câmara e Cadeia Para alguns Anapolinos, a Casa de Câmara e Cadeia se localizava na Rua 07 de Setembro quase esquina com a Rua Barão do Rio Branco, no centro, ao lado das residências da família Roriz. Porém, pesquisas posteriores destacaram que não era a Casa de Câmara e Cadeia que estava situada naquele local, altura do número 259, mas sim a Delegacia Geral de Polícia de Anápolis que guarda, até hoje, as principais características da época. FIGURA 01 – CASA CONSIDERADA A 1ª DELEGACIA DE ANÁPOLIS Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. 40 Historicamente, a Casa de Câmara e Cadeia era construída em terreno cuja estrutura permitia a construção, na parte inferior, de instalações para detenção e, na parte superior, de espaço mais adequado para funcionamento das dependências dos poderes Legislativo e Executivo. Há, porém, relatos que apontam outro local que serviu como cadeia pública: o prédio do Colégio Estadual Antensina Santana, situado à Rua Desembargador Jaime em frente à Matriz de Santana. Mas, em que local, exatamente, funcionou a Casa de Câmara e Cadeia, considerado o primeiro espaço de privação da liberdade de Anápolis? Segundo Freitas (1995), a primeira cadeia pública de Anápolis foi construída em 1905 em estilo neocolonial, mas, esse autor não traz detalhes sobre a sua localização. Todavia, a partir de pesquisa, tendo como ponto de partida detalhes de registros fotográficos (Figura 02) e o trabalho de Borges (1975), verifica-se que em 15 de dezembro de 1887 a elevação de Freguesia de Santana à categoria de Vila foi consolidada pela Lei Provincial nº 811. De acordo com essa Lei, determinava-se que fosse instalada a Vila desde que na região existisse a Casa de Câmara e Cadeia, além de um Grupo Escolar para atender a municipalidade. FIGURA 02 – CASA DE CÂMARA E CADEIA DE ANÁPOLIS Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. 41 Por meio destas abordagens, verificamos ainda no campo das suposições que, amparados pelas informações que os registros históricos nos revelam e, também, segundo entrevista realizada com o historiador e Diretor do Museu Histórico de Anápolis, Tiziano Chiarotti, que a data de 1905 ressalvada por Freitas (1995) pode ser imprecisa, pois, se a Lei Provincial em questão de 1887 fazia exigências quanto à construção de prédios para fins distintos como requisito para se instalar a Vila de Santana das Antas, portanto, com a instalação da mesma, em 10 de março de 1892, pressupõe-se que tais exigências foram atendidas e essas construções estavam prontas naquele ano. Dessa forma, a Casa de Câmara e Cadeia, já existia antes de 1905. O que não pode deixar de ser ressaltado também é que, talvez em 1905, tenha acontecido uma reforma em tal prédio, dois anos antes de acontecer à elevação da Vila em Cidade e este detalhe pode ter se perdido nos meandros da história com relação a esta temática. Da Casa de Câmara e Cadeia ao Colégio Estadual Antensina Santana O Colégio Estadual Antensina Santana, o mais antigo da cidade, inaugurado em 18 de março de 1926, ainda em atividade, funcionou como cadeia no passado. Nessa linha de pensamento, ressaltamos Foucault (2000) no qual destaca que colégios, conventos, quartéis, fábricas, orfanatos, reformatórios são espaços peculiares a uma forma de clausura temporária da liberdade: A disciplina às vezes exige a “cerca”, a especificação de um local heterogêneo a todos os outros e fechado em si mesmo. Local protegido da monotonia disciplinar... e em primeiro lugar segundo o princípio da localização imediata ou do “quadriculamento”. Cada indivíduo no seu lugar; e em cada lugar um indivíduo. (FOUCAULT, 2000, p. 122) Nesse ínterim, percebe-se a junção entre as categorias forma e função na discussão sobre a produção do espaço, principalmente, no que tange ao 42 aspecto da paisagem urbana. Inclusive, Carlos (2004) destaca que a cidade, considerada como construção humana, é um produto histórico-social. Nesta dimensão aparece como trabalho materializado, acumulado ao longo do processo histórico e desenvolvido por uma série de gerações. Daí o mistério desvendado: ambos ocuparam o mesmo espaço, porém, a Casa de Câmara e Cadeia foi demolida dando lugar ao novo prédio do Grupo Escolar, primeiro nome do Colégio Antensina Santana. Houve, assim, a necessidade de se construir este novo prédio, pois o primeiro Grupo Escolar antes localizado próximo à Praça das Mães já não comportava mais a clientela conforme Ferreira (1981): Atendendo aos anseios da população e considerando o crescente número de crianças em idade escolar o Intendente Graciano Antônio da Silva pleiteou junto ao governo estadual a criação de um Grupo Escolar. Em 1925 enviou um ofício ao governo neste sentido juntando ao mesmo a escritura de doação de um prédio para o funcionamento do Grupo. No dia 30 de novembro do mesmo ano pela Lei Municipal nº 213, fundou-se o Grupo escolar. Em 11 de fevereiro de 1926, Brasil Ramos Caiado, Presidente do Estado, assinou o Decreto nº 8.913 que designava diretores e professores para aquele estabelecimento de ensino. (FERREIRA, 1981, p.134) Ainda, segundo Ferreira (1981): Depois de alguns anos o prédio do Grupo já se tornara pequeno para comportar tão grande número de alunos. Por coincidência ou pré-destinação foi Graciano Antônio da Silva, seu fundador, quem concluiu o novo prédio situado na Praça Santana em 1945, quando era então prefeito de Anápolis. O Grupo mudou novamente de nome passando a se chamar Antensina Santana em homenagem a filha de Moisés Augusto de Santana, grande educadora prematuramente ceifada pela morte. Doutor Nicanor de Faria e Silva, viúvo de Antensina, doou ao Grupo a placa com a nova denominação. A feliz sugestão daquele nome foi feita por João Luiz de Oliveira e unanimemente aceita. (FERREIRA, 1981, p.135) Dessa forma, torna-se relevante a discussão que apresentamos na seqüência deste artigo, ao discutirmos a existência de um centro histórico oculto na cidade de Anápolis, entendido aqui como uma parcela da memória perdida. Ao mesmo tempo ressaltamos a importância da preservação do 43 patrimônio arquitetônico que pode se tornar um atrativo turístico, portanto, uma atividade de geração de renda e promoção social. Só para ilustrar, perceba a edificação do Colégio Antesina Santana na Figura 03: FIGURA 03 – COLÉGIO ESTADUAL ANTESINA SANTANA Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. Um centro histórico oculto e o turismo: uma parte da memória perdida Ao contrário das principais cidades históricas do Estado, como Cidade de Goiás e Pirenópolis, que têm suas Casas de Câmara e Cadeia tombadas como patrimônio histórico, Anápolis, também, poderia ter resgatada essa face oculta de um centro histórico digno, se não fosse o descaso com os casarios antigos que deram lugar a atacadistas e lojas, marca do expansionismo comercial na cidade. Por sinal: A paisagem, assim como o espaço, altera-se continuamente para poder acompanhar as transformações da sociedade. A forma é alterada, renovada, suprimida para dar lugar a uma outra forma que atenda às necessidades da nova da estrutura social. (SANTOS, 2004, p.53) 44 Exemplo de como a memória deveria ser levada mais a sério está na cidade de Pirenópolis. Segundo o site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 27 de março de 2007 aconteceu à entrega da restauração da Casa de Câmara e Cadeia de Pirenópolis, marcando a instalação de um espaço cultural no imóvel. A obra recebeu o investimento de R$ 242 (mil) do Instituto para a realização da empreitada, mediante parcerias entre o IPHAN e o governo estadual e municipal. Dessa maneira, de um lado, temos um espaço denominado prisão que no passado não era convidativo a turistas e, de outro, o peso histórico com o reconhecimento de um espaço que tinha sua função no passado, mas que hoje é um importante atrativo turístico. Inclusive, sempre que nos deparamos com o tema prisão no meio científico, “Vigiar e Punir” de Michel Foucault é uma leitura obrigatória, pois, todos os modelos prisionais, desde a estrutura física até as relações interpessoais e hierárquicas que regem o meio prisional, seguem, praticamente, o mesmo modelo. Nesse sentido, Foucault (2000) observa: As disciplinas, organizadas as “celas”, “os lugares” e “as fileiras” criam espaços complexos: ao mesmo tempo arquiteturais, funcionais e hierárquicos. São espaços que realizam a fixação e permitem a circulação, recortam segmentos individuais e estabelecem ligações operatórias; marcam lugares e indicam valores; garantem a obediência dos indivíduos, mas também uma melhor economia do tempo e dos gestos. São espaços mistos: reais, pois que regem a disposição dos edifícios, de salas, de móveis, mas ideais, pois se projetam sobre essa organização, caracterizações, estimativas, hierarquias. (FOUCAULT, 2000, p.126) A prisão, em suma, tem todo um histórico não só do complexo estrutural como, também, das relações que acontecem ali e das interdependências tanto dentro como fora de um presídio. Mas o que é prisão? Segundo Foucault (2000): A prisão é menos recente do que se diz quando se faz datar seu nascimento dos novos códigos. A forma prisão preexiste à sua utilização sistemática nas leis penais. Ela se constitui fora do 45 aparelho judiciário, quando se elaboraram por todo o espaço social, os processos para repartir os indivíduos, fixá-los e distribuílos espacialmente, classificá-los, tirar deles o máximo de tempo, e o máximo de forças, treinar seus corpos, codificar seu comportamento contínuo. (FOUCAULT, 2000, p.195) Sobre a definição do conceito de cárcere ou prisão, Born (1971) destaca o significado associado à privação da liberdade, como castigo. A prisão encontrava-se, às vezes, dentro do palácio real ou na proximidade, mesmo, no subterrâneo debaixo da casa do comandante da cidade ou na porta da cidade. O prisioneiro em geral ficava amarrado, às vezes preso a um cepo de madeira. Comumente, era possível visitar os presos, certamente, no Novo Testamento, essa ação era recomendada como obra de misericórdia. A discussão sobre a questão da prisão passa pela análise do local escolhido para tal. Assim, quando destacamos a função de uma determinada construção, considera-se também o aspecto locacional, bem como, a opinião que a sociedade tem sobre a atividade, pois, é a sociedade que legitima a ação do Estado, conforme aponta Claval (1979): Só consegue controlar efetivamente o espaço que dominar e transformar se for considerado como legítimo por uma parte da população que lhe dá sua colaboração e assegura, para ajudá-lo, uma vigilância efetiva do espaço. (CLAVAL, 1979, p.188) Por isso, a localização de uma cadeia pública que funcione como presídio na área central da cidade é sempre problemática. Causa insegurança e repercute de forma negativa na própria imagem, principalmente, ao pretender se projetar como moderna e que ofereça qualidade de vida. Dessa forma, compreende-se com mais clareza a discussão em torno da mudança da Cadeia Pública de Anápolis, antes, situada na esquina da Avenida Goiás com a Rua 14 de Julho no centro da cidade. Podemos visualizar a antiga cadeia, na localização apontada no parágrafo anterior, na Figura 04: 46 FIGURA 04 – PRÉDIO DA ANTIGA CADEIA PÚBLICA Fonte: Arquivo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. Todas as fontes de pesquisa, principalmente por amostragens ou em forma de enquetes junto à população, são uníssonas em apontar aquele local como sendo a “primeira” e principal cadeia de Anápolis até aproximadamente 1984. Registros fotográficos históricos datam tal local em funcionamento desde a década de 1940. Esta cadeia, folcloricamente é lembrada como antigo cadeião e apelidado também pelo já falecido radialista Almir Reis, pai do Dr. Gladson Reis, atualmente Delegado Civil na cidade, que comandava um programa radiofônico chamado “Ronda Policial”, de “Conde Drácula”, alcunha que permaneceu por muito tempo. Em 1985 houve, a partir do clamor da sociedade, a necessidade de mudar aquela realidade em pleno centro da cidade. Isso aconteceu no governo do ex-prefeito Adhemar Santillo em seu primeiro mandato (1985-1988), quando ocorre a inauguração da cadeia pública que se localiza, atualmente, no Jardim das Américas II Etapa próxima ao Bairro “Recanto do Sol”. Criou-se com essa mudança a resolução de um problema e o surgimento de outro: ao sair da condição de cadeia o prédio em questão 47 passou a ser o Instituto Médico Legal (IML), sem oferecer as condições satisfatórias de funcionamento. Posteriormente, o espaço da antiga cadeia passou a ser utilizado como espaço de formação artística e cultural, uso que se mantém até a atualidade. De Cadeia Pública de Anápolis a Centro de Inserção Social A atual cadeia pública de Anápolis foi construída na década de 1980 com o objetivo de desafogar os distritos policiais e a delegacia regional, pois estes não tinham condições físicas e de segurança e que funcionasse como cadeia temporária. De lá para cá houve uma acomodação institucional e governamental para o problema do ambiente carcerário na cidade, no que diz respeito a um acompanhamento visando, pelo menos a uma solução parcial para o problema crônico da delinqüência humana. Tanto, que um segundo pavilhão foi construído por iniciativa da Diocese de Anápolis e Pastoral do Encarcerado, ambos da Igreja Católica, com o apoio da comunidade. FIGURA 05 – ATUAL CENTRO DE INSERÇÃO SOCIAL Fonte: Arquivo Iconográfico de Wesley Costa, 2009. 48 Todavia, a localização do Centro de Integração Social se apresenta problemática, pois se trata de uma área de expansão urbana recente, próxima ao Centro Universitário de Anápolis – UniEvangélica e cada vez mais a região, considerada saída norte da cidade, atrai novas atividades comerciais como por exemplo, o atacadista e de construção, que se consolidam em toda a extensão da Avenida Brasil Norte até o trevo de acesso à Belém-Brasília e a BR 414 saída para Corumbá de Goiás. Por causa disso, então, teremos com toda a certeza outros problemas a enfrentar, no que diz respeito à localização de locais de privação da liberdade. Considerações finais As lacunas que passam a ganhar notoriedade sobre o tema levantado em dado momento encontram respaldo no campo das suposições onde detalhes passam a merecer atenção especial e daí se descobre uma riqueza imensa de informações a partir de uma abordagem sistematizada de uma realidade quase pouco explorada na academia em Anápolis: o meio prisional. Amparados pelas Geografias Crítica, Urbana, Humana e pela Geo-história surgiu este breve histórico sobre os espaços físicos que serviram como locais de privação da liberdade em Anápolis. É indiscutível nossa percepção para diversos outros valores que envolvem este assunto como o patrimonial, histórico, turístico. Neste trabalho, também se pretendeu revelar a importância do tema, compreender o amplo e grandioso campo de ação que este representa, pois se trata de uma realidade distinta e passível de aprimoramentos e reformas, enquanto pesquisa aplicada. O ambiente prisional requer estudos periódicos e dinâmicos com uma maior abrangência no sentido de universalizar a cidadania, fator primordial para um ser social. Uma prisão representa a certeza da punição. A ociosidade individual ou em grupo se torna a pior punição que possa existir, pois o condenado é apenado duas vezes: uma, quando entra na prisão, outra, quando sai. Por mais que as estatísticas tentem mostrar números aproximados da realidade da população carcerária ainda existe o efeito surpresa que são os mandados de 49 segurança não cumpridos e que uma vez cumpridos mudam cotidianamente o espaço físico bem como as inter-relações no ambiente. Referências: Arquivo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. Arquivo Iconográfico Particular de Wesley Costa, 2009. BORGES, H. C. A História de Anápolis. Goiânia: Cerne, 1975. BORN, A. V. D. Dicionário Enciclopédico da Bíblia. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1971. CARLOS, A. F. A. O espaço urbano. São Paulo: Contexto, 2004. CLAVAL, P. Espaço e poder. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978. FERREIRA, H. J. Anápolis sua vida seu povo. Brasília: Senado Federal, 1981. FREITAS, R. A. Anápolis passado e presente. História, Geografia e Economia. Anápolis: Voga Pesquisas Assessoria e Comunicação, 1995. FOUCAULT, M. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 2000. SANTOS, M. Pensando o Espaço do Homem. 5ª. ed. São Paulo: Edusp, 2004, www.iphan.gov.br. Acesso em 15/11/2009. 50 CAMINHONEIROS EM GREVE: HISTÓRICO DO MOVIMENTO GREVISTA DE 1948 EM ANÁPOLIS ELIZETE CRISTINA FRANÇA∗ Resumo: O artigo tem por finalidade relatar a greve dos motoristas de caminhões de 1948, sua repercussão na cidade de Anápolis e cidades circunvizinhas e, ainda, sua conseqüência para a economia Anapolina e a do Estado de Goiás. Palavras-chave: luta de classes, economia, motoristas. Introdução A greve é um mecanismo utilizado pela classe trabalhadora para reivindicar melhorias em sua categoria profissional. É a última tentativa para conseguir os seus objetivos. Desse modo, o texto apresenta um breve histórico da greve no mundo e no Brasil e um relato pormenorizado de um movimento grevista que ocorreu no Município de Anápolis, em 1948. Histórico das greves no mundo e no Brasil Após a Revolução Industrial, nos meados do século XIX e de acordo com Mason (2003), surgiram várias fábricas de tecidos e, com isso, multiplicou o número de operários para trabalhar com maquinário, já que antes isto era restrito a pequenas casas de artesanatos, onde trabalhadores fabricavam os seus produtos manualmente. Dessa forma, a Europa logo se tornou industrial e o primeiro país a modernizar e introduzir máquinas em suas fábricas foi à Inglaterra, tornando-se assim, o palco das primeiras manifestações de trabalhadores por possuir o maior número de operários. No final do século XIX e início do século XX, as principais cidades do Brasil eram São Paulo e Rio de Janeiro e nestas cidades se concentrava a ∗ Historiadora (UFUMG), Especialista em Metodologia do Ensino de História (IBPEX-PR) e Assessora Técnica do Museu Histórico de Anápolis “Alderico Borges de Carvalho” – MHABC da Sercretaria de Cultura / Prefeitura Municipal de Anápolis. 51 maior população e, também, o maior número de trabalhadores. Entre as várias manifestações grevistas deste período, uma de grande destaque foi a “greve de três dias dos Cocheiros”, no Rio de Janeiro, em 1900, lutando por melhores condições de trabalho. Ao longo de nossa história, portanto, as classes trabalhadoras sempre estiveram em busca de algo melhor e, na maioria das vezes, isto não foi conseguido através de simples diálogo entre patrão e empregado. Na sociedade atual, os trabalhadores se organizaram através de classes, criando um sindicato específico para cada categoria profissional e, com isso, os operários sentem mais segurança para lutar pelos seus direitos reivindicando melhores condições de trabalho e oportunidades de uma vida melhor. Assim, no próximo tópico, vamos perceber um movimento grevista numa realidade local. A greve dos caminhoneiros de Anápolis Em Anápolis, nos anos 1940, após a chegada de Estada de Ferro, que se deu em 1935, a cidade passou por um processo de urbanização muito rápido com a presença de imigrantes de vários países e, também, brasileiros vindos de outras regiões, atraídos por melhores oportunidades em uma terra em pleno desenvolvimento industrial e comercial. A pacata cidadezinha do interior se transformou em uma movimentada cidade comercial, mobilizando seu aspecto social, político e econômico. Isso ocorreu tendo como protagonista o trem de ferro responsável por receber e escoar mercadorias por este Brasil e que passava por Anápolis. O coadjuvante nesse contexto histórico e figura imprescindível para a economia foram os motoristas de caminhões, que abasteciam os vagões para que os produtos agrícolas chegassem ao Sudeste como também os descarregava com as mercadorias para abastecer o comércio local e cidades circunvizinhas. Nesse período, de pleno desenvolvimento, um fato histórico marcou a vida de moradores desta cidade, uma grande manifestação feita pelos motoristas. De acordo com a Revista “A Cinqüentenária”, “no dia 12 de junho 52 de 1948, os profissionais do volante se rebelaram contra certas exigências do governo estadual da época e contra certas falhas do Código Tributário”. A partir daquele momento, essa discordância entre trabalhadores e governo iria mudar a rotina da cidade e se tornar um movimento de grande repercussão, surgindo assim a greve de 1948, sendo que podemos observar, a título ilustrativo, tal movimento na Figura 01: FIGURA 01 – MOVIMENTO GREVISTA DE 1948 EM ANÁPOLIS Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2010. Ainda na Revista “A Cinqüentenária” percebe-se mais detalhes deste movimento: A greve começou na Avenida Tiradentes, onde o governo mandou atravessar uma corrente, montando também um posto fiscal. Os motoristas resolveram resistir contra a medida e cerca de 80 veículos e uns 300 homens ali ficaram paralisados. Veículos carregados de cereais e outras mercadorias. Homens trabalhadores, de mãos calosas e vestes sujas de óleo. (Revista “A Cinqüentenária”, 1957) Assim começou a histórica greve dos motoristas, que sabiam de sua importância como trabalhadores. Não apenas para a economia local, mas 53 também para as cidades próximas, como Jaraguá, Colônia Agrícola, Goiânia, Goiás, Inhumas, Matauna, Trindade e todo o Norte. Além de transportar as mercadorias, os motoristas também eram responsáveis pelo transporte de passageiros em suas carrocerias, pois o sistema de ônibus coletivo de passageiros ainda era bastante reduzido e o número de veículos automotores na cidade era mínimo, e deslocar do centro para a periferia ou fazendas circunvizinhas, quando não era feito em carros de boi ou charretes, o caminhão era a única opção. Isso pode ser constatado na Figura 02: FIGURA 02 – ADESÃO DOS ÔNIBUS AO MOVIMENTO GREVISTA DE 1948 Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2010. O impacto da greve dos motoristas, portanto, foi sentido por comerciantes, consumidores e a população em geral e o dia 12 de junho foi apenas o começo. No dia 13, motoristas, trabalhadores em geral, autoridades locais se reuniram na Praça Bom Jesus, em frente à Prefeitura e o Fórum, para negociações, conforme nos atesta a Revista “A Cinqüentenária”: 54 Iniciando as conversações foram estas as palavras do Cel. Valois: inicialmente, cabe-me dizer que os grevistas se excederam, pois sitiaram a cidade, coisa que não deviam fazer por que a Lei não lhes faculta o privilégio de tolher a ninguém no seu direito de ir e vir. E por isso mesmo o governo teria de agir em função de ordem pública, garantindo aos cidadãos o direito de cuidar normalmente de suas atividades. (Revista “A Cinqüentenária”, 1957) De um lado a participação da polícia, delegado do fisco, secretário de agricultura e do outro os motoristas e população em geral, e diante de reivindicações que não chegaram a uma solução final, o presidente da associação comercial, Jonas Duarte, resolveu discursar apoiando os grevistas e pedindo que fossem para casa e liberassem a cidade, e que lutaria com eles. Assim, terminou a manifestação do dia 13, sem nenhuma conclusão. Tal acontecimento pode ser visualizado na Figura 03: FIGURA 03 – MOVIMENTO GREVISTA EM FRENTE À PREFEITURA Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2010. No dia 14, o comércio solidarizou-se com os grevistas fechando suas portas, e os ônibus que faziam as linhas de ligação Colônia Agrícola, Goiânia, Nerópolis, também decidiram parar. Diante de tudo isso a diretoria da 55 Associação Comercial, reuniu-se em sessão extraordinária e resolveu dar inteiro apoio aos grevistas. O jornal “O Anápolis”, de 17 de junho de 1948, notificou detalhes do ocorrido com a seguinte nota: A Associação dos Motoristas entrou logo em ação para auxiliar os grevistas, propondo a nomeação de uma comissão para entenderse diretamente com o Sr, Governador do Estado e a ele expor as justas reivindicações grevistas. (Jornal “O Anápolis, 1948) Com o total apoio da Câmara Municipal que, através dos vereadores, dirigiu um requerimento a Assembléia Legislativa do Estado solicitando uma solução imediata do caso, organizando uma comissão que se dirigiu para Goiânia. De acordo com o Jornal “O Anápolis”, de 20 de junho de 1948: Os motoristas de Anápolis tiveram êxito alcançando as suas justas reivindicações, evidentemente é porque contaram com o apoio unânime e decidido da população de Anápolis e de seus colegas de Goiânia e outros pontos do Estado. O comércio local cerrou as suas portas, estudantes fizeram passeatas. A Associação Comercial, Industrial e Agro-pecuária de Anápolis se movimentou. Os bancos não funcionaram. A Câmara Municipal, por unanimidade de votos, aprovou um requerimento de solidariedade à laborosa classe dos motoristas. (Jornal “O Anápolis”, 1948) Assim foram os fatos mais importantes desse movimento grevista, considerado um dos maiores de nosso Município e, talvez, um dos que tiveram maiores repercussões. Considerações finais Depois de passeatas, portas fechadas e toda a discussão na Câmara Municipal e Assembléia Legislativa, os motoristas conseguiram 80% dos seus objetivos e ainda um caminho aberto para continuar a negociação, com maior destaque para os pontos relacionados abaixo: 56 • Diminuir a questão tributária; • Continuar levando passageiros nas carrocerias, entre outras exigências. Por se tratar dos anos 1940, a categoria se mostrou unida e o apoio local foi fundamental, reconhecendo a importância de tais trabalhadores para a economia goiana e também de outros estados, já que os motoristas descarregavam e abasteciam os vagões do trem que passava na cidade. Podemos dizer, assim, que é através das lutas e ideais é que vislumbramos um mundo melhor, ter esperança em alcançar nossos sonhos e seguir em frente nessa longa caminhada pela vida. Referências: Jornal “O ANÁPOLIS” de junho de 1948. MASON, A. Memórias do Século XX: O surgimento da Era Moderna (1900-1914). Rio de Janeiro: Reader’s Digest, 2003. REVISTA “A CINQÜENTENÁRIA”, Edição Única, comemorativa do jubileu da cidade de Anápolis (1907-1957). Anápolis, 31 de julho de 1957. 57 CORREIOS: EVOLUÇÃO DESTA INSTITUIÇÃO NA CIDADE DE ANÁPOLIS IRENE RODRIGUES DE OLIVEIRA∗ Resumo: Historicamente, o desenvolvimento dos meios de comunicação foi um dos fatores fundamentais para o progresso da civilização, como tantas outras conquistas do homem. Assim, mostramos um relato histórico dos Correios, instituição esta que lida com a temática na cidade de Anápolis. Palavras-chave: comunicação, correios. Introdução O Presente artigo tem a finalidade de mostrar que desde os tempos mais antigos, o homem tem necessidade de se comunicar. Mesmo entre os animais existe um sistema rudimentar de comunicação, embora limite-se a sinais e sons ligados ao instinto da conservação da espécie. Com a escrita, que foi uma grande invenção do homem, logo houve a criação dos correios, encurtando as distâncias e possibilitando a todos um melhor relacionamento e união entre os povos. De um início lento e difícil até a rapidez que possui hoje, a história dos correios demonstra essa trajetória cheia de vicissitudes e vitórias, o que demonstraremos abaixo. Breve história do surgimento dos correios O surgimento do correio remonta ao mais antigo império do Oriente – o Império Chinês. Outra menção a isso vem da Bíblia, especificamente no livro de Jó, quando faz referência a um serviço regular de correio egípcio nos tempos da XII Dinastia. ∗ Auxiliar Administrativa do Museu Histórico de Anápolis “Alderico Borges de Carvalho” – MHABC da Secretaria de Cultura / Prefeitura Municipal de Anápolis. 58 Com o tempo, os serviços de entrega vieram se aperfeiçoando e se atribui a Augusto a instituição dos correios no Império Romano. Já na Idade Média, conforme a Revista “A Cinqüentenária”: O surto de desenvolvimento das grandes rotas comerciais da Europa cada vez mais se expandindo e já alcançando o Extremo Oriente, foi se formando uma vasta rede de mensageiros, tornando em pouco tempo de maior importância para a vida européia. (...) Antigamente o serviço dos correios não era como atualmente organizado pelo Estado. Na Idade Média, por exemplo, os Carteiros eram mantidos pelo bispado e os conventos. As autoridades se comunicavam de cidade para cidade por meio de mensageiros oficiais. Até o século XIV e XV somente as autoridades possuíam Carteiros próprios. As correspondências particulares, conforme registra a História, tanto para a entrega, como para a execução de certos encargos, eram confiados aos monges, viajantes e peregrinos, havia também os chamados “açougueiros”, que era exercido pelos boiadeiros, que em suas viagens faziam entrega de cartas particulares. (Revista “A Cinqüentenária”, 1957) Na história do nosso país, podemos subentender que Pero Vaz de Caminha, no “Descobrimento do Brasil”, em 22 de abril de 1500, resolveu relatar a descoberta de novas terras ao Rei de Portugal e o fez por intermédio de uma carta. Talvez com o envio desta, tenha se iniciado, ou melhor, marcado o surgimento dos Correios no Brasil, o que nos leva a uma indagação, a saber: fantasia ou realidade? De qualquer forma, há de se admitir, também, que aquele evento alimentou as representações e crenças de muitos brasileiros. No entanto, de acordo com a Revista “A Cinqüentenária”, as atividades postais iniciaram oficialmente em 1663, com a “Organização do Correio”, inaugurada pelo Alferes João Cavaleiro Cardoso, nomeado em 25 de janeiro daquele ano como primeiro Correio-mor do Rio de Janeiro. Com este pequeno resumo, feito para contextualizar a “Instituição Correios” no mundo e no Brasil em particular, passaremos a entender a evolução histórica desta instituição da comunicação numa realidade local no próximo tópico. 59 Correios em Anápolis Anápolis, sempre atenta, como uma menina curiosa, caminhou a passos largos para o desenvolvimento, desde sua elevação como cidade, seja na economia, seja em outros segmentos. Isso também ocorreu na comunicação, pois foi justamente em 1907 que os Serviços dos Correios foram instalados em Anápolis. Porém, segundo a historiadora Haydée Jayme Ferreira, em seu livro “Anápolis: sua vida, seu povo”, desde 1879 os antenses9 já pleiteavam a criação dos correios. Contudo, somente após a elevação como cidade é que se torna possível este acontecimento, conforme atesta o jornal “O Anápolis”: Somente no ano de 1908, não se sabe o dia nem o mês, o Sr. Américo Borges de Carvalho, em sua própria casa, situada na Praça Santana instalou a Agência Postal Telegráfica do Município, marca decisiva para o desenvolvimento de Anápolis que dava os seus primeiros passos. (Jornal “O Anápolis” de 1975) Ainda segundo o Jornal “O Anápolis”: Mesmo antes de ser instalado o serviço telegráfico em Anápolis, o Sr. Américo Borges de Carvalho já trabalhava para isto, sem alcançar êxito, sendo que seus esforços eram infrutíferos e sua voz não conseguia encontrar eco nas montanhas de reivindicações junto aos órgãos competentes da época. (Jornal “O Anápolis”, 1975) Por motivo ignorado, no dia 06 de agosto de 1914, o Sr. Américo Borges de Carvalho passava o cargo para seu irmão, outro abnegado, o Sr. Alberico Borges de Carvalho, que se dispunha a continuar a obra iniciada em 1908 e que já havia dado os primeiros passos rumo à sua evolução. Contudo, sua permanência frente aos correios teve curta duração, não chegando a 4 (quatro) meses, sendo substituído pelo Capitão Gerônimo de Souza. Nesse período, ano de 1914, era instalada no interior da própria Agência, a primeira caixa de coleta para correspondência da cidade (esta caixa, por curiosidade, se encontra exposta hoje no nosso Museu Histórico), 9 Antiga denominação das pessoas nascidas em Anápolis que, na época, era a Freguesia de Santana das Antas. 60 sendo que isto ocorreu por que as correspondências eram tiradas das mãos do próprio chefe encarregado dos serviços. Ainda segundo o Jornal “O Anápolis”, percebemos que: No dia 15 de novembro de 1915 inaugurava o Serviço Telegráfico, primeiro registro na evolução das comunicações de Anápolis que olhava o futuro com mais fé e otimismo, acreditando no desenvolvimento correspondendo, assim, aos anseios de uma comunidade que acabava de receber sua emancipação política. (Jornal “O Anápolis”, 1975) Inaugurado o telégrafo a sua operação ficou a cargo do auxiliar imediato do Capitão, o Sr. João Fleury de Amorim, que transmitiu e recebeu o primeiro telégrafo da cidade de Anápolis. Em 1913, o serviço de correspondência postal em Anápolis era muito lento e somente em março de 1932 deu um salto qualitativo com o Avião Correio, passando a fazer escala na cidade todas as quartas-feiras. Por sua vez, em 1950 as instalações dos Correios passaram para o prédio do Palace Hotel, cujo funcionamento se deu entre 1950 a 1960. Nesta época, a Prefeitura desapropriou uma área pertencente à Igreja Bom Jesus, entre as ruas Engenheiro Portela esquina com Barão do Cotegipe. Assim, em 1961, os Correios começaram a funcionar em sua sede própria. FIGURA 01 – SEDE DOS CORREIOS Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2010. 61 Os Correios de Anápolis, além dos serviços postais, Sedex, fax, telegrama e outros, também possuem serviços de Franquia, pois há na cidade algumas agências, mas as mais antigas são as da Vila Jaiara e a outra na Rua dos Carreiros, no Jundiaí. Essas agências trabalham em regime de parceria e os proprietários têm participação sobre o montante da comercialização. Na Figura 02 vemos a sede dos Correios nos dias atuais: FIGURA 02 – SEDE DOS CORREIOS EM 2010 Fonte: Acervo Iconográfico do “Biola”. Na Agência Central existem 1450 (um mil e quatrocentas e cinqüenta) caixas postais, o atendimento é de 200 (duzentas) pessoas por dia, também diariamente são exportados 18.000 (dezoito mil) objetos, 70% dos importados são transportados via aérea e os 30% restantes são transportados via marítima. Para garantir ao usuário um atendimento modelo, a Agência de Anápolis possui mais de 63 (sessenta e três) funcionários internos e mais de 29 (vinte e nove) carteiros, que percorrem diariamente as ruas de Anápolis, além da existência de 18 (dezoito) funcionários para entrega motorizada. Nesse serviço são usados 3 (três) furgões e 4 (quatro) motocicletas. Assim, o atendimento dentro da Agência é feito por 14 (quatorze) funcionários, dados estes confirmados pelo Sr. Joanes José Oliveira, gerente da Agência Central desde 1992. 62 A título de curiosidade, o código de endereçamento postal (CEP) de Anápolis era único, mas com a reformulação desenvolvida pela Agência dos Correios o CEP passa a ser codificado em nível de logradouro. Com isso, cada logradouro (Rua, Avenida, Praça, entre outros) possui código próprio. Com todos esses serviços oferecidos pelos Correios, existe ainda a “filatelia10”, fundada em 1995 e que tem o apoio regional da diretoria, pois isto é um importante canal de projeção da imagem da empresa dos Correios e Telégrafos, visto que suas atividades atraem, naturalmente, grande número de pessoas, pois a filatelia é uma arte que apaixona as pessoas. Considerações finais Quando se fala em Correios, a idéia que ocorre é o transporte de correspondências. Ao longo do tempo, o serviço dos Correios em Anápolis evoluiu, acompanhando o progresso e o crescimento da cidade, se organizando para atender as exigências empresariais, os serviços de utilidade pública e das correspondências pessoais. Em qualquer parte do planeta a eficiência dos Correios é marcada pelo dinamismo e trabalho. Isso não é diferente em Anápolis, mediante o trabalho e a luta de seus idealizadores. Em suma, os Correios de Anápolis prima pelo trabalho que oferece à população Anapolina. Referências: Arquivo Iconográfico do “Biola”, 2010. Arquivo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2010. Jornal “O Anápolis”, ano 1975. REVISTA “A CINQUENTENÁRIA”, Edição Única, comemorativa do jubileu da cidade de Anápolis (1907-1957). Anápolis, 31 de julho de 1957. 10 Entende-se por “filatelia” a coleção de selos e seus colecionadores são conhecidos como filatelistas. 63 EVOLUÇÃO DOS CINEMAS EM ANÁPOLIS: FINAL DA DÉCADA DE 1920 A MEADOS DE 1950 RICARDO LAGE LEITE∗ Resumo: O período compreendido entre o final da década de 1920 a meados de 1950 corresponde a um momento de surgimento e desenvolvimento dos cinemas na cidade de Anápolis. O presente artigo, por meio de uma sucinta análise sobre o surgimento do cinema e a representação social deste acontecimento, busca demonstrar como o mesmo chegou e se integrou à vida dos anapolinos. O texto teve como suporte metodológico a pesquisa bibliográfica e os métodos oferecidos pela história regional e local, apoiados por pesquisas em jornais de época encontrados no acervo do Museu Histórico de Anápolis. Palavras-chave: cinema, representação social. Introdução O surgimento do cinema na cidade de Anápolis teve início de forma bastante incipiente nos anos de 1920. O Cine Bruno e, posteriormente, o Cine Goianás prenunciam uma relação do Município com a arte cinematográfica, embora naquele tempo, de acordo com Ferreira (1979), não houvesse nada parecido com salas de projeção de filmes, mas sim um ambiente rústico voltado para a apresentação de filmes mudos acompanhados pelo som de um gramofone. Já na década de 30, o cinema atraia empresários locais interessados em explorar a atividade como um ramo comercial propriamente dito. O Cine Áurea destacou-se neste período com a exibição de diversos filmes, propagandeados semanalmente nos jornais da época. O mais marcante advento, contudo, veio em 1936, com a inauguração do Cine Teatro Imperial, que contou, na noite de estréia, com um público de aproximadamente 1.000 (hum mil) pessoas, ávidas para conhecer as modernas instalações adquiridas. (FERREIRA, 1979). O apogeu do cinema em Anápolis deu-se nas décadas de 50 e 60, quando o Município contou simultaneamente com os seguintes cinemas: Cine Teatro Imperial, Cine Santana, Cine Vera Cruz, Cine Santa Maria, Cine Bom Jesus e Cineminha Carajá. Ao todo, mais de 4.000 (quatro mil) lugares estavam disponíveis à população Anapolina. ∗ Historiador (UniEVANGÉLICA) e serventuário da justiça. 64 O que se seguiu, no entanto, foi a derrocada do cinema nas décadas de 80 e 90, com o fechamento de praticamente todas as salas de projeção, encerrando um ciclo de mais de quatro décadas de sucesso e entretenimento. Atualmente, estão em funcionamento as salas de cinema dos dois shoppings da cidade, tendo as antigas instalações dos cinemas tradicionais se transformado em pontos comerciais, embora estes últimos períodos não sejam objeto do nosso artigo. Com isso, buscamos demonstrar a história do cinema entre as décadas de 1920 a 1950, através dos seguintes tópicos: A trajetória das salas de cinema em Anápolis e Cinema e representação social em Anápolis. A trajetória das salas de cinema em Anápolis O primeiro contato da cidade com o cinema deu-se nos anos de 1920. Pouco se escreveu sobre a história referente aos dois primeiros cinemas de Anápolis, o Cine Bruno e o Cine Goianás. Sabe-se que um sucedeu ao outro e que se localizavam onde atualmente se encontra o edifício do Hotel Itamaraty (Rua Manoel D'abadia, 209 - Centro). O primeiro, de propriedade de José Bruno Filho, funcionou na década de 1920 e, em 1924, recebeu uma isenção do pagamento de impostos municipais (FERREIRA, 1979); o segundo, de propriedade de Maximiano Alves Cunha existiu de 1929 até 1933. Sobre o Cine Bruno, João Asmar relata que: Os assistentes acomodavam-se em toscos bancos, cadeiras, tamboretes e caixotes, espalhados sobre o piso de terra batida. Não havia som. Tudo era mudo. Os filmes, chuviscados, eram mostrados em partes, com intervalos, com letreiros explicativos das cenas. A cada uma delas as luzes eram acesas. (ASMAR, 2006, on line) Por sua vez, em relação ao Cine Goianás, o mesmo autor, na reportagem acima mencionada, assim se pronuncia: Também era mudo, porém ouviam-se músicas, produzidas por uma vitrola manual, tipo caixote, acionada por José Leôncio, um soldado aposentado, que diziam ter sido capanga de um coronel. Ali, no seu interior, realizavam-se as festas de formaturas do grupo escolar e da Escola Normal. (ASMAR, 2006, on line) 65 Mesmo precariamente, já nesta época, o cinema se fazia apresentar como elemento referencial. Exemplo curioso disto é a jocosa nota publicada ainda em setembro de 1931 no jornal O Verbo (1931), em que a esquina do “Cine Goyanaz” é apontada como o “ponto predileto onde se reúnem os semtrabalho ou vagabundos para se ocuparem da vida alheia”. A década de 1930 é, sem dúvida, marcante para a história de Anápolis. A onda migratória de estrangeiros (sírios, libaneses, italianos e outros) que se iniciara anos antes contribuiu, sobremaneira, para a cultura e a economia do Município. Do mesmo modo, a chegada da ferrovia em 1935, indiscutivelmente, foi o fator norteador do incremento da cidade em seu surto desenvolvimentista. Neste período, seguindo a ordem cronológica do surgimento dos cinemas em Anápolis, o outro estabelecimento deste ramo foi o Cine Áurea (Figura 01), inaugurado em 1933, na mesma Rua do Cine Goyanaz, sendo que, até a inauguração do Cine Teatro Imperial, em 1936, era o único cinema da cidade e apresentou diversos filmes, conforme divulgado nos jornais da época. FIGURA 01 – CINE ÁUREA Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. 66 Apesar das inegáveis limitações do período em que funcionou, podemos dizer que o Cine Áurea iniciou uma nova forma de se explorar a arte cinematográfica na cidade. Maximiano Alves da Cunha, um dos donos deste cinema, assim como do antigo Cine Goianás, chegou, inclusive, a ampliar a capacidade de lotação com a instalação de camarotes laterais. Sobre o Cine Áurea, João Asmar relata que: O Cine Áurea tinha instalações modestas, mas já era falado e mobiliado com fileiras de poltronas, de madeira. Em seu interior, em forma de “U”, havia uma espécie de mezanino, assoalhado, apoiado em esteios de aroeira e cercado com uma grade. Para essa área, chamada “camarote”, afluía a meninada, que pagava meia-entrada. As sessões eram anunciadas pelo zunido de uma sirene, por três vezes. (ASMAR, 2006, on line) Esta iniciativa marcante do Cine Áurea, contudo, esteve aquém do impacto causado com a construção do Cine Teatro Imperial em 1936 que passou a ser o principal cinema da cidade (FERREIRA, 1979). Desde sua estonteante inauguração, o Cine Imperial cativou os habitantes de Anápolis. De fato, investiu em novos aparelhos sonoros e de projeção, além de contar com sessões diárias e contínuas com vasta programação. Mais tarde, o informativo do jornal O Annapolis (1941) anuncia que o Cine Imperial será possuidor da mais bem montada cabine cinematográfica e única no Estado a dispor de um equipamento duplo para projeções. O relato da moradora e escritora Haydée Jayme Ferreira é bastante elucidativo quanto ao saudosismo dos que viveram esta época: Havia diariamente as sessões noturnas, e as matinês, apenas aos domingos. Na quinta-feira era dia de Sessão das Moças, em que as mulheres pagavam apenas quinhentos réis pelo ingresso. No sábado – e depois parece-me que passou a ser na terça-feira – além do filme, havia os seriados, entre os quais Flash Gordon no Planeta Mongo, Flash Gordon no Planeta Marte, em que todas as mocinhas se apaixonaram pelo Buster Crab, O Aranha Negra e outros mais. Havia filmes que contavam com lotação certa, como os de Tarzã, os famosos filmes da Dorothy Lamou, tais como Princesa 67 das Selvas, Idílio nas Selvas, Furacão, etc. (FERREIRA, 1979, p. 254) Ainda, no período áureo do Cine Teatro Imperial, no início da década de 1940, “houve, além dos diversos filmes em cartaz, apresentações de diversos grupos de teatro”, conforme o Jornal “O Annapolis” (1940). Desse modo, na Figura 02 vislumbramos a opulência de tal cinema: FIGURA 02 – CINE TEATRO IMPERIAL Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. A década de 1950 é palco da continuidade do progresso do cinema na cidade com a promessa de inauguração de mais uma sala de projeção, o luxuoso Cine Teatro Santana (Praça Bom Jesus, nº 111). Este cinema contou com capacidade para 1.200 (hum mil e duzentas) pessoas e foi inaugurado em fevereiro de 1951 em meio a vários discursos das autoridades presentes. 68 Vejamos a reportagem jornalística às vésperas da inauguração em A Notícia (1950) juntamente com a Figura 03 que mostra a construção deste cinema: [...] No próximo mês de julho, será inaugurado, nesta cidade, o maior e mais luxuoso cinema do Estado. Visitando a sua construção, a nossa reportagem lá encontrou o Sr. José Pedro de Lima, que, como seu gerente, não vem medindo esforços para conclusão de tão importante empreendimento. Fomos informados por aquêle senhor que os aparelhos de projeções já se encontram na cidade, sendo os mesmos dos mais modernos. No interior do cinema, já estão sendo atacados os serviços de acabamentos os quais se acham entregues a verdadeiros mestres no assunto, dando à construção um aspecto dos mais modernos possíveis. (Jornal “A Notícia”, de 28 maio de 1950) FIGURA 03 – CINE TEATRO SANTANA Fonte: Acervo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. Podemos ver nos jornais da época três cinemas em concomitante funcionamento no início dos anos de 1950: o antigo Cine Teatro Imperial, o recém inaugurado Cine Teatro Santana e um pequeno cinema denominado Cineminha Carajá. Este último gabava-se por apresentar filmes diferenciados, utilizando, nas colunas do Jornal “A Notícia” (1950), o jargão: “As pessoas de bom gosto preferem o Cineminha Carajá”. Mais dois cinemas de médio porte foram instalados em Anápolis, o Cine Vera-Cruz e o Cine Santa Maria, mas estes novos empreendimentos escapam ao período ora analisado. 69 Cinema e representação social em Anápolis Na fase inicial de implementação do cinema em Anápolis, década de 1920 e início da década de 1930, é inegável a rusticidade que caracterizava tanto o Cine Bruno quanto o Cine Goianás. Contudo, o Cine Áurea inaugurou uma nova fase em que podemos vislumbrar o início de uma penetração do cinema na vida social dos anapolinos. Para exemplificarmos este contato inicial, vejamos a seguinte propaganda: CINE AUREA – HOJE. PRINCEZA DE BRODWAY. Gostosíssimo “Cocktell” com Marion Davies e Billie Dove. 9 partes falladas e 1 natural – 5ª Feira. EMBOSCADA SANGRENTA. Movimentado – Farwest com Jack Perrini – (fallada). (Jornal “O Annapolis”, de 03 novembro de 1935) Percebe-se na referência à quantidade de partes faladas, demonstrando que o cinema da época era bastante incipiente. Os próprios títulos dos filmes demonstram essas características de inocência e ingenuidade. Assim, o público começou a freqüentar o Cine Áurea com o propósito puro e simples de se deliciar com aquele novo entretenimento. Os filmes de “cowboy” e as comédias marcaram esta fase. Nas décadas de 1930 a 1950, houve em Anápolis um clima progressista nos campos econômico e social. Conseqüentemente, em especial por meio do cinema, a cultura também foi influenciada. Iniciava-se o contato dos anapolinos com inúmeros filmes, em especial os produzidos pela indústria cinematográfica norte-americana. Estava aberta a porta para o encantamento de uma população que, predominantemente rural, deparou-se com os deslumbramentos de um mundo que não lhe era concreto, a não ser por intermédio das telas de cinema. A exemplo do que aconteceu com milhões de pessoas em todo o mundo crianças, jovens, adultos e idosos, das mais variadas classes sociais, abarrotaram as salas de cinema de Anápolis em busca de uma transposição de mundos. 70 O filme Fuzileiros do Ar foi escolhido para a estréia do Cine Teatro Imperial em 1936. No início da década de 1940 este cinema vai se destacar como o grande cinema de Anápolis. Uma infinidade de filmes foi projetada, sempre com divulgação no jornal “O Annapolis”. Com esse incremento e a melhora dos aparelhos de projeção, mais pessoas freqüentavam os cinemas. Estava definitivamente instituída a relação dos habitantes da cidade com a sétima arte. O papel do cinema começa a se delinear de maneira clara na representação social destes freqüentadores. Os filmes passam a ser aguardados com ansiedade pelo público, cada vez mais influenciado por eles em sua vida particular. O que dizer da superprodução “E o Vento Levou”? Tendo entrado em cartaz no Cine Teatro Imperial em 1943, quatro anos após sua produção que data de 1939, o romance de Margaret Michell’s, dirigido pelo renomado Victor Fleming, retratava a Guerra Civil Americana ocorrida no século XIX e encantou a todos que o assistiram. Os novos tempos chegavam à Anápolis em grande parte por meio das estrelas de Hollywood. Nesta “época de ouro”, quantas moças e rapazes, embalados por uma euforia juvenil, não tomaram para si os trejeitos mimados de Scarlett O’ Hara ou o charme másculo de Rhett Butler, (personagens interpretados, respectivamente, por Vivien Leigh e Clark Gable em “E o Vento Levou”). Do mesmo modo, considerado por muitos como um dos melhores filmes de todos os tempos, “Casablanca”, exibido em Anápolis em julho de 1944, dois anos após ser produzido, oferecia a seu público fiel tipos ideais e galantes eternizados por Humphrey Bogart e Ingrid Bergman. Por sua vez, o Cine Teatro Santana, que durante a década de 1950 dividiu as atenções dos anapolinos ao lado do Cine Teatro Imperial, apresentou como filme inaugural em 1951 a famosa projeção “Transatlântico de Luxo”, um romance que se encaixa, perfeitamente, na aura cultural efervescente dos anos de 1950. É substancial a diferença entre os filmes apresentados nas inaugurações do Cine Teatro Imperial (1936) e do Cine Santana (1951). Enquanto o primeiro (Fuzileiros do Ar) revela um período de incertezas e crescente investimento em armamentos, o outro (Transatlântico de Luxo) demonstra uma ‘‘época de ouro”, em que o cinema entra como elemento propulsor destas novidades, encarado 71 não como um simples entretenimento, mas como uma paixão mundial que atinge de forma contundente Anápolis e seus habitantes. Enfim, com os parágrafos supracitados, viramos uma página da história local sobre um período para sempre marcado na memória dos que viveram nesta época. Considerações finais O que aconteceu em Anápolis nas décadas de 1930 a 1950 foi justamente o casamento de duas verdades complementares. De um lado a inquestionável força de atração do cinema, com todas as suas peculiaridades e marcas características. De outro, uma sociedade em processo acelerado de mudança, carente de meios que hoje conhecemos como a televisão e a informática, que aprendeu com o cinema um jeito novo de viver. O produto dessa experiência permanece entre os cidadãos anapolinos de hoje. Talvez o distanciamento temporal - lá se vão mais de meio século após o período analisado - não nos permite perceber de forma nítida a importância destes filmes e personagens na construção do imaginário das pessoas que passaram por aquela experiência. Contudo, um olhar mais cuidadoso sobre nós mesmos será capaz de provar o quanto estamos ainda hoje impregnados de todos os valores ali difundidos. A geração de nossos pais ou avós bebeu intensamente na fonte do cinema que marcou o mundo naquelas décadas. Portanto, é constituída da inocência dos filmes de cowboy, dos seriados e seus super-heróis, da vivacidade do cinema de Hollywood e suas estrelas, tudo isso envolto em uma lembrança tardia, mas inesquecível: o frenesi que acometia a todos os que lotavam as grandes salas de cinema com o apagar das luzes. Neste ponto, o encantamento daqueles que viveram a novidade cinema nas décadas de 1930, 1940 e 1950 foi bem superior ao vivido hoje pelos freqüentadores de cinema de nossa sociedade altamente informatizada. O reconhecimento deste fato, contudo, não implica crítica saudosista de tempos que não voltam mais, mas apenas nos ajuda a esclarecer as peculiaridades de 72 um período histórico sem precedentes do Município anapolino, no qual o cinema teve participação inquestionável. Referências: Arquivo Iconográfico do Museu Histórico “Alderico Borges de Carvalho”, 2009. FERREIRA, Haydée Jayme. Anápolis: sua vida, seu povo. Brasilia: Senado Federal, 1979. GÊNEROS DE FILMES. DVD Transatlântico de Luxo. Disponível <www.submarino.com.br/produto/6/1375774#A1>. Acesso em: 29 nov.2009. em: Jornal “A Notícia”. Anápolis, 28 maio de 1950. Jornal “O Annapolis”. Anápolis, 19 abril de 1936. ________, Anápolis, 03 novembro de 1935. ________, Anápolis, 16 janeiro de 1941. ________, Anápolis, 16 janeiro de 1941. Jornal “O Verbo”. Anápolis, 30 setembro de 1931. JOÃO, Asmar. Lembranças-2. Cinemas. Jornal do Estado, Anápolis, p.2, 28 set. 2006. Disponível em: <www.jornalestadodegoias.com.br>. Acesso em 29 nov. 2009. 73 INFORMAÇÕES GERAIS SOBRE AS ATIVIDADES DO MUSEU HISTÓRICO DE ANÁPOLIS N ovamente, assim como no Caderno anterior, deixamos esta última parte para colocar informações sobre as ações desenvolvidas pelo museu no primeiro semestre de 2010, cumprindo nossa missão de ser o gestor do patrimônio histórico e cultural do Município. Seguindo a mesma forma expositiva, desenvolvemos projetos, visitas guiadas e publicações, cujas atividades são as seguintes: I. Projetos: • Janeiro / 2010: - Planejamento museológico e estratégias para o ano corrente; - Participação na reunião da AGEPEL para a escolha da delegação goiana de museus para participarem da Conferência Nacional de Museus no Rio de Janeiro, no dia 25/01. • Fevereiro / 2010: - Participação no “Ato Carnavalesco” da Diretoria de Cultura, no dia 12/02. - Elaboração e encaminhamento de projetos para o Ministério do Turismo e Agência Goiana de Cultura – AGEPEL, para aquisição de material permanente para o museu bem como para digitalização do seu acervo documental; • Março / 2010: - Participação no encontro “Folia, Catira e Viola”, nos dias 26/03, 27/03 e 28/03. • Abril / 2010: 74 - Sarau de lançamento do 1º Caderno de Pesquisas do Museu, no dia 13/04. • Maio /2010: - Participação no documentário “Aula de História” do Canal 5, idealizado pelo Professor Alaor Martins, no dia 06/05. - Exposição em comemoração ao Dia Internacional dos Museus, do dia 25/05 ao dia 04/06. II. Visitas Guiadas (de estudantes da rede municipal, estadual e particular de ensino, bem como, de visitantes): MÊS NÚMERO DE VISITANTES Janeiro 449 Fevereiro 310 Março 551 Abril 434 Maio 433 Junho 316 Total 2493 Observação: o museu também contou com a visita de 08 pesquisadores de diversas Instituições de Ensino Superior – IES como a UniEvangélica, UEG e UFG. III. Publicações: • Lançamento do 1° Caderno de Pesquisas do Museu His tórico de Anápolis “Alderico Borges de Carvalho”, em abril de 2010. 75 76
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