aspectos culturais do brasil na visão do new york

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aspectos culturais do brasil na visão do new york
ASPECTOS CULTURAIS DO BRASIL NA VISÃO DO NEW YORK TIMES
São [email protected]
Revista Acadêmica do Grupo Comunicacional de São Bernardo
www.metodista.br/unesco/GCSB/index.htm
Ano 2 - nº 3 - (janeiro/junho de 2005)
Textos originais, revisados pelos membros do conselho editorial
ASPECTOS CULTURAIS DO BRASIL NA VISÃO
DO NEW YORK TIMES
Maria Inez Mateus Dota*
Resumo: Este trabalho objetiva mostrar qual a imagem propagada pelo jornal The New York
Times no tocante a aspectos culturais do Brasil. Alicerça-se na hipótese de que os textos da
mídia não espelham meramente a realidade, mas constituem versões da realidade que
dependem de posições sociais, interesses e objetivos daqueles que as produzem. Baseandose na análise crítica do discurso, principalmente nos trabalhos de Fairclough (1995 e 2001),
Bell & Garrett (1998) e Fowler (1991), examinam-se notícias veiculadas pelo referido jornal em
sua versão on line, que abordam aspectos culturais do Brasil durante os meses de novembro e
dezembro de 2003. Procura-se investigar as estratégias discursivas utilizadas pelo jornal para
representar o Brasil, analisando-se opiniões positivas e negativas sobre esse país e verificandose que escolhas são feitas nos vários níveis do processo de produção dos textos, desde as
escolhas lexicais até os vários tipos de discurso que se inter-relacionam na construção do
sentido.
Palavras-chave: linguagem; ideologia; discurso da mídia.
Este trabalho parte do pressuposto de que as representações envolvem determinados pontos
de vista, valores e objetivos e considera que o trabalho ideológico da linguagem da mídia inclui
formas específicas de representar o mundo. Uma vez que a ideologia envolve valores e que
esta se mostra na superfície dos textos como crenças e opiniões avaliativas, este estudo se
propõe a verificar qual é a imagem propagada pelo jornal The New York Times no que se
refere a aspectos culturais do Brasil.
ASPECTOS CULTURAIS DO BRASIL NA VISÃO DO NEW YORK TIMES
Alicerça-se na hipótese de que os textos da mídia não espelham meramente a realidade, mas
constituem versões da realidade que dependem de posições sociais, interesses e objetivos
daqueles que as produzem. Concretamente isso se caracteriza por meio de escolhas que são
feitas nos vários níveis do processo de produção dos textos, desde as escolhas lexicais até os
vários tipos de discurso que se inter-relacionam na construção do sentido.
Fundamenta-se na Análise Crítica do Discurso, principalmente nos trabalhos de Fairclough
(1995 e 2001), Bell e Garrett (1998) e Fowler (1991), e examina notícias veiculadas pelo
referido jornal em sua versão on line, que abordam aspectos culturais do Brasil durante os
meses de novembro e dezembro de 2003. A opção por essa versão do New York Times se deu
em função de seu alcance e importância na mídia internacional e da facilidade na coleta de
dados. A obtenção dos artigos foco da análise aqui apresentada se operacionalizou pelo
sistema de busca do jornal com base na palavra Brazil, selecionando-se, no caso do presente
trabalho, os artigos que abordam aspectos culturais. Dessa forma, obtiveram-se cinco artigos
cobrindo assuntos referentes a música, cinema e teatro.
Procura-se investigar as estratégias discursivas utilizadas pelo jornal para representar o Brasil,
analisando-se opiniões positivas e negativas sobre esse país e que implicações estas têm para
a imagem que se projeta do Brasil. Especificamente, a análise do discurso dos artigos
coletados, no que diz respeito à linguagem verbal, leva em consideração as escolhas lexicais,
a minimização ou saliência de determinados aspectos do tema abordado, a metáfora, a
intertextualidade – "como um texto incorpora partes de outros textos"- e a interdiscursividade –
"como o discurso da mídia de jornais é constituído por meio da articulação particular de tipos
de discurso e processos particulares de tradução entre eles" (FAIRCLOUGH, 2001, p. 147).
Os aspectos culturais foram tema do New York Times em apenas cinco artigos, um enfoque
bastante restrito se comparado com os vinte e dois artigos que abordaram aspectos políticos,
no mesmo período (DOTA, 2004). Os assuntos abordados dizem respeito a música – a
predileção do violoncelista Yo-Yo Ma pela música brasileira, a atuação do regente de orquestra
Roberto Minczuk nos Estados Unidos e o duradouro sucesso do cantor Roberto Carlos; a
teatro – o problema do diretor de teatro Gerald Thomas com a justiça, por desrespeitar a
platéia; e a cinema – uma crítica do filme Amarelo Manga.
Com relação à música, a imagem retratada é bastante positiva. Num dos artigos, o New York
Times mostra o violoncelista Yo-Yo Ma "apaixonado e subjugado" pela música brasileira,
trazendo, assim, para seu texto, vestígios do discurso dos apaixonados. Esse artigo é
publicado após o lançamento do CD "Obrigado Brazil", em que Yo-Yo Ma presta uma
homenagem a vários músicos brasileiros, gravando suas músicas. Os termos avaliativos
utilizados pelo sujeito enunciador e pelo locutor introduzido no texto (o músico) são de caráter
afetivo, conforme se verifica nos grifos abaixo:
(1)It’s taken a long time for master cellist Yo-Yo Ma to consummate his love affair with Brazilian
music. Now he is totally smitten. (Levou muito tempo para que o mestre violoncelista Yo-Yo Ma
consumasse seu caso de amor com a música brasileira. Agora ele está completamente
enamorado. - Cellist Yo-Yo Ma Falls in Love with Brazil Music, publicado em 1º de novembro
de 2003.)
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(2) "I didn’t know exactly the names or anything but it was like a magnet," he told Reuters in an
interview. ("Eu não sabia exatamente os nomes ou coisa alguma, mas foi como um ímã," ele
contou a Reuters numa entrevista. – Ibid.)
O uso da intertextualidade, na voz do músico em (2) e (5) abaixo, vem reforçar a posição do
jornalista que faz uma avaliação positiva da música brasileira e mostra-a, também, de forma
atraente para músicos estrangeiros, como apontam os trechos (3), (4) e (5):
(3)The work features classical pieces by Villa-Lobos, gentle bossa novas by Antonio Carlos
Jobim and lively choros by Pixinguinha among others. (O trabalho apresenta peças clássicas
de Villa-Lobos, suaves bossa-novas de Antonio Carlos Jobim e animados choros de
Pixinguinha, dentre outras. – Ibid.)
(4)With its blend of African, European and Indian strains, Brazilian music has long held an allure
for foreign artists – from jazz saxophonist Stan Getz, who brought the bossa nova craze to the
United States in the early 1960s, to Paul Simon and the followers of today’s techno-lounge
scene. (Com uma mistura de tendências africanas, européias e indígenas, a música brasileira
há muito tempo mantém um encantamento para os artistas estrangeiros – desde o
saxofonista de jazz Stan Getz, que trouxe a mania da bossa-nova para os Estados Unidos, no
começo dos anos 60, até Paul Simon e os seguidores do cenário techno de hoje. – Ibid.)
(5) "One of things that I love about it is not only its incredibly richness. In every age and every
era it seems to be reinvent itself and yet it remains quintessentially Brazilian," said Ma, his
charisma and enthusiasm evident even at the end of a phone line between New York and São
Paulo. (Uma das coisas que eu amo nela não é apenas sua incrível riqueza. Em cada época e
em cada era ela parece se reinventar e ainda assim permanece essencialmente brasileira,"
disse Ma, seu carisma e entusiasmo evidentes mesmo na outra ponta da linha telefônica
entre Nova York e São Paulo. – Ibid.)
Para destacar o encantamento do músico pela produção brasileira, o sujeito enunciador, num
recurso à intertextualidade (as palavras do músico) e à interdiscursividade, faz uma inserção
do discurso da psicanálise, descrevendo essa música como um estado de sonho que oscila
entre o consciente e o inconsciente:
(6)The essence of Brazilian music, he said, was "the feeling you get that it’s the fine line
between being in the conscious and the unconscious. There’s a very thin line when you
can draw from all your conscious thoughts but still be part of a dream-like state." (A
essência da música brasileira, ele disse, era "a sensação que você tem de uma linha tênue
entre estar consciente e inconsciente. Há uma linha muito fina quando você pode se inspirar
em todos seus pensamentos conscientes, mas ainda fazer parte de um estado de
sonho." – Ibid.)
Para argumentar sua avaliação positiva a respeito da música brasileira, o sujeito enunciador
faz questão de ressaltar a posição de destaque de Yo-Yo Ma, justificando, dessa forma, que as
opiniões do músico trazidas ao texto são abalizadas para emitir tais julgamentos, uma vez que
este usufruiu de uma educação elitizada:
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(7)"I’m trying to think how can I get into that same feel in those light syncopated rhythms that
are so essential to Brazilian music," said Harvard-educated Ma. (Estou tentando pensar como
eu posso chegar à mesma sensação desses leves ritmos sincopados que são essenciais para
a música brasileira," disse Ma, formado em Harvard. – Ibid.)
Observe-se que desde o início do artigo, constata-se sua estruturação a partir do
reconhecimento do "mestre violoncelista Yo-Yo Ma" em direção à música brasileira. O texto
não faz uma apreciação da música brasileira em si; mostra, porém, seus aspectos positivos e
atraentes para músicos estrangeiros, a partir do interesse de um deles em gravar as
composições brasileiras.
O segundo artigo a referir-se a música enfoca diretamente a atuação do regente de orquestra
brasileiro Roberto Minczuk na Filarmônica de Nova York. Traz aspectos positivos e negativos
de sua atuação. Com relação aos primeiros, são apresentados de forma comedida, sem muito
entusiasmo do enunciador pelo trabalho do músico, de acordo com o exemplo (8).
(8)Mr. Minczuk, who is also co-artistic director of the São Paulo State Symphony of Brazil,
presented himself as a capable and competent leader content to get the job done without
much flash or fanfare. (Minczuk, que é também diretor co-artístico da Orquestra Sinfônica do
Estado de São Paulo no Brasil, apresentou-se como um líder competente e capaz, disposto a
desempenhar o trabalho sem muita ostentação ou barulho. – Conductor in New Job Plays It
Quite Cool, 25 de novembro de 2003.)
No decorrer de sua crítica, também traz à tona os aspectos negativos que, de forma velada,
entremeiam o texto, conforme (9), (10) e (11) abaixo:
(9)The concert opened with the Prelude to Wagner’s "Parsifal," music of long-breathed
phrases and quietly glittering mythical landscapes that unfold ravishingly before the
eyes. Mr. Minczuk coaxed smooth and sleek playing from the strings, but one wished at
times for a bit more sonic intensity, if only by way of foreshadowing. (O concerto abriu com o
Prelúdio de "Parsifal" de Wagner, música de frases de longo fôlego e Minczuk convenceu
traquila e suavemente ao reger os instrumentos de corda [positivo], mas, às vezes,
desejava-se um pouco mais de intensidade sonora, se possível como prenúncio
[negativo]. – Ibid.)
(10)Gyorgy Ligeti’s "Lontano" came next, and with its understated grandeur, misty dreamlike
sonorities and upward-straining lines it was an inspired choice to complement the Wagner.
(Em seguida veio "Lontano" de Gyorgy Ligeti, e com sua diminuída grandeza, nebulosas
sonoridades oníricas [negativo] e as cordas mais esticadas, foi uma escolha inspirada para
complementar Wagner [positivo]. – Ibid.)
(11)After the Ligeti, any lingering late-Romantic fog was dispersed by the bright and clarion
tone of Philip Myers’s French horn in a fluid rendition of Mozart’s Horn Concerto in E flat
(K.495). the night ended with a satisfying if unspectacular reading of Brahms’s Third
Symphony. (Depois de Ligeti, qualquer sombra tardia do fim do Romantismo foi dispersa pelo
tom animado e estridente da corneta francesa de Philip Myers [positivo], numa fluida
interpretação do Concerto para Corneta de Mozart em Mi bemol (K. 495). A noite terminou com
uma satisfatória, senão modesta, leitura da Terceira Sinfonia de Brahms [negativo]. –
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Ibid.)
Com relação ao cantor Roberto Carlos, a apreciação do jornal é bastante favorável. Desde o
título do artigo – Songs by a Man With Heart Mean Christmas in Brazil (Canções de um homem
romântico significam o Natal para o Brasil), o New York Times valoriza o trabalho do cantor,
quando aponta que suas músicas marcam a época do Natal no Brasil, uma das datas mais
celebradas no país. Por meio de uma comparação ao papel de Pelé no futebol, o sujeito
enunciador estabelece o grande valor de Roberto Carlos para a música popular brasileira:
(12) What Pelé is to soccer, Roberto Carlos is to Brazilian popular music, as becomes
clear every year just before Christmas. In an annual ritual that coincides with and is as
predictable as the arrival of summer here, he releases an album that immediately takes over the
airwaves, and he tapes a Christmas special that is inevitably one of the country’s highestrated television shows. (Aquilo que Pelé é para o futebol, Roberto Carlos é para a música
popular brasileira, como fica claro a cada ano um pouco antes do Natal. Num ritual anual que
coincide com o verão aqui e é tão previsível quanto sua chegada, ele lança um disco que
imediatamente se difunde e ele grava um especial de Natal que é, inevitavelmente, um dos
mais bem cotados shows da televisão. – Songs by a Man With Heart Mean Christmas in
Brazil, 24 de dezembro de 2003.)
O uso da adjetivação superlativa em (12), acima, coloca a apresentação de Roberto Carlos na
TV em posição de destaque e aponta o lançamento de seu disco como fazendo parte da
cultura brasileira, constituindo, dessa forma, o recurso a uma "linguagem expressiva", no dizer
de Sousa (2004: 198). Para corroborar esse posicionamento favorável à atuação do cantor, o
sujeito enunciador faz a intertextualidade com declarações de uma renomada autoridade da
música popular brasileira – Caetano Veloso – para quem Roberto Carlos é o "Rei" nessa área:
(13)For Mr. Veloso, Roberto Carlos, as he is universally known here, represents a "profound
Brazil" whose appeal is so vast that he is immune to trends and tastemakers. "He could with
good reason be called the Elvis of Brazil," Mr Veloso wrote in "Tropical Truth," his recently
published autobiography. "He has been called the King, a title that he sports even today,
without anyone denying it to him." (Para Veloso, Roberto Carlos, como ele é geralmente
chamado aqui, representa um "profundo Brasil" cujo apelo é tão vasto que ele é imune a
tendências e influências. "Ele poderia, com boas razões, ser chamado o Elvis do Brasil,"
Veloso escreveu em "Verdade Tropical," sua autobiografia recentemente publicada. "Ele tem
sido chamado de Rei, um título que ele mantém mesmo hoje, sem ninguém negar-lhe." –
Ibid.)
Um eventual aspecto negativo trazido também intertextualmente na voz dos críticos, é rebatido
pelo sujeito enunciador, no sentido de manter uma avaliação positiva de Roberto Carlos, como
mostra o trecho (14) abaixo:
(14)Once a rock’n’roller, Roberto Carlos has evolved into a romantic crooner and pop singer.
Critics increasingly complain that his records have an unchanging sound – slow-paced ballads
surrounded by lush string arrangements. But that argument is lost on his admirers, who now
range over three generations. (Um roqueiro no passado, Roberto Carlos transformou-se num
cantor romântico e popular. Os críticos reclamam, cada vez mais, que seus discos têm um
som imutável – lentas baladas cercadas por arranjos de cordas harmoniosos. Mas o
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argumento é nulo para seus admiradores, que hoje abrangem três gerações. – Ibid.)
Com respeito a teatro, o New York Times aborda um desagradável incidente em que se
envolveu o diretor Gerald Thomas: ao final de uma das apresentações da ópera Tristão e
Isolda por ele dirigida, mostrou as nádegas para o público em função de vaias vindas da
platéia. Na abertura do artigo, o jornal faz uma espécie de advertência ao diretor, assumindo o
papel de uma autoridade responsável pela correção de ações inadequadas e configurando a
presença do jornalista na "situação de árbitro", como aponta Bourdieu (1989, p.55). É o
discurso autoritário que se antecede aos fatos já no início do texto e que, de certa forma, expõe
um sujeito enunciador que parece torcer para que o diretor Gerald Thomas seja realmente
punido:
(15) Avant-garde theater director Gerald Thomas is going to have to wait a little longer to learn
the price of a moon. (O diretor de teatro de vanguarda Gerald Thomas terá que esperar um
pouco mais para saber o preço de mostrar as nádegas. – Theater Director Mooing Hearing
Delayed, 12 de novembro de 2003.)
Em nenhum momento o artigo faz uma apreciação da apresentação teatral ou do desempenho
dos artistas nela envolvidos. O jornalista dá saliência à atitude do diretor com relação a seu
público:
(16) Following a performance of Richard Wagner´s "Tristan und Isolde" at Rio de Janeiro´s
municipal Theater, Thomas shocked audience members and much of the cast by taking
down his pants and displaying his buttocks in response to jeers at the curtain call.
(Seguindo uma apresentação de "Tristão e Isolda" de Richard Wagner no teatro municipal do
Rio de Janeiro, Thomas chocou os membros do público e grande parte do elenco
abaixando suas calças e mostrando suas nádegas em resposta a zombarias ao fechar da
cortina. – Ibid.)
Quando o jornalista se refere à ópera como uma produção de destaque, fá-lo apontando
também um aspecto que, provavelmente, gerou a polêmica no aludido espetáculo:
(17) The over-top-production featured sashaying fashion models and an actor playing Sigmund
Freud who threw around a white powder meant to be cocaine. (A super produção apresentava
modelos afetadas e um ator fazendo o papel de Sigmund Freud que esparramava um pó
branco pretendendo ser cocaína. – Ibid.)
Vale apontar que o New York Times dá espaço para a justificativa e o pedido de desculpas de
Thomas por sua atitude, bem como menciona sua inserção ao lado de grandes nomes do meio
artístico, conforme (18) e (19) abaixo:
(18) Thomas, who is Jewish, claims he mooned the audience in response to anti-Semitic
catcalls from the crowd.
Thomas apologized for his actions on a nationally televised talk show, but prosecutors
insist he be charged. (Thomas, que é judeu, afirmou que ele mostrou as nádegas para o
público em reposta a vaias anti-semitas da platéia. Thomas desculpou-se por suas
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ações num programa de entrevista da TV mostrado para todo o país, mas os promotores
insistem que ele seja acusado. – Ibid)
(19) The 49-year-old director who grew up in Rio de Janeiro, Berlin and London has
collaborated with the late Irish playwright Samuel Beckett and the American composer
Philip Glass. (O diretor de 49 anos que cresceu no Rio de Janeiro, Berlim e Londres
colaborou com o dramaturgo irlandês Samuel Beckett, recentemente falecido, e com o
compositor americano Philip Glass. – Ibid.)
Embora o jornal aponte a posição de destaque de Thomas no meio artístico, a avaliação que
se faz com relação a esse artigo é que o New York Times priorizou destacar o incidente com o
diretor, sem dar relevância para o espetáculo que este dirigiu.
Com referência a cinema, o New York Times faz uma apreciação do filme Amarelo Manga que
traz à tona personagens marginalizados da periferia de Recife, onde reina um clima de
soturnidade, marcado pela cor amarela da hepatite e da podridão:
(20) Hepatitis and rotten teeth are among the ills metaphorically invoked to suggest the malaise
that engulfs the noisily desperate characters in this raw slice of downscale urban life. (Hepatite
e dentes podres estão entre as doenças metaforicamente evocadas para sugerir o mal-estar
que absorve os personagens ruidosamente desesperados nesta porção crua da decadente
vida urbana. – A Tropical City as Fruit, Rotten at the Center, 13 de novembro de 2003.)
O jornal apresenta uma descrição dos personagens e de suas ações no filme, apontando as
metáforas (exemplificado em 20) e as imagens (exemplificado em 22) criadas pelo diretor
Cláudio Assis. As escolhas lexicais "desagradável galeria de retratos" (em 21) e "é apenas
levemente menos horrenda" (em 22) mostram aspectos da representação que o New York
Times faz de Amarelo Manga:
(21) The most sinister character in this unsavory portrait gallery is Isaac (Jonas Bloch), a
resident of the seedy Hotel Texas – an establishment just one step above a flophouse – where
most of the film is set. (O personagem mais sinistro nesta desagradável galeria de retratos é
Isaac (Jonas Bloch), um morador do puído Hotel Texas – um estabelecimento apenas um
passo adiante de uma pensão barata – onde a maior parte do filme se passa. – Ibid.)
(22) The imagery surrounding Wellington (Chico Diaz), a macho butcher, is only slightly less
gruesome. An extended early sequence observes him, blood-spattered in his slaughterhouse,
chopping and sawing the meat he is about to peddle, unrefrigerated, from the back of a dirty
pickup. (A imagem que circunda Wellington (Chico Diaz), um açougueiro machista, é somente
levemente menos horrenda. Uma prolongada seqüência inicial o observa, respingando
sangue em seu matadouro, cortando e serrando a carne que ele vai vender, sem refrigeração,
da traseira de uma camioneta suja. – Ibid.)
Ao término do artigo, o New York Times faz uma avaliação favorável dos personagens criados
pelo filme ao projetá-los como "pessoas robustas, totalmente dimensionais em contato com
seus sentimentos explosivos." Aponta a coerência do clima surreal estabelecido em Amarelo
Manga com o seu objetivo, ou seja, mostrar como vivem as camadas inferiores no Brasil e ao
redor do mundo:
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(23) For all the grimness and desperation on view in "Mango Yellow," the characters emerge as
robust, full-dimensional people in touch with their explosive feelings. The movie´s surreal
flavor underscores its message: This is how the lower half lives in Brazil, and by extension,
humanity at its most basic, getting along without the rose-colored protection that
affluence affords. (Por toda a soturnidade e desespero à mostra em "Amarelo Manga," os
personagens emergem como pessoas robustas e totalmente dimensionais em contato
com seus sentimentos explosivos. O sabor surreal do filme salienta sua mensagem: é
assim que vive a metade inferior no Brasil, e por extensão, a humanidade em sua
camada mais básica, vivendo sem as proteções cor-de-rosa que a riqueza proporciona. –
Ibid.)
Concluindo a análise aqui empreendida, observa-se que o New York Times desenha uma
imagem positiva no tocante à atuação de músicos/cantores brasileiros, na maior parte de suas
apreciações. Com relação a teatro, o incidente mostrado é bastante desfavorável a esse meio
artístico, pois o jornal opta por relatar um acontecimento desagradável ocorrido no meio e
deixa de comentar outros espetáculos da dramaturgia que estavam sendo encenados naquele
momento. Em atenção a cinema, a imagem projetada pelo jornal mostra-se equilibrada e em
conformidade com a temática e os personagens trabalhados no filme resenhado.
Fazendo em balanço dos cinco artigos que abordam aspectos culturais no período analisado,
pose-se afirmar que a imagem do Brasil é mais positiva que negativa, principalmente pelo
destaque dado a atuações no campo musical.
Bibliografia
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DOTA, M. I. M. A imagem do Brasil no discurso do New York Times: aspectos políticos. In:
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ASPECTOS CULTURAIS DO BRASIL NA VISÃO DO NEW YORK TIMES
*(Doutora em Letras/UNESP-Bauru,SP)
[email protected]