corte interamericana de direitos humanos caso serafina conejo
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corte interamericana de direitos humanos caso serafina conejo
277 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS CASO SERAFINA CONEJO GALLO E ADRIANA TIMOR VS. ELIZABETIA CONTESTAÇÃO MEMORIAL DO ESTADO ELIZABETIA 2013 277 ÍNDICE LISTA DE ABREVIATURAS .................................................................................................... II I. DECLARAÇÃO DOS FATOS ..................................................................................................1 II. ANÁLISE JURÍDICA ..............................................................................................................3 A. QUESTÕES PRELIMINARES ...............................................................................................3 1. A CORTE É COMPETENTE PARA JULGAR VIOLAÇÕES À CADH .............................................3 2. DA APLICAÇÃO DE OUTRAS FONTES DE DIREITO INTERNACIONAL .......................................4 3. DAS EXCEÇÕES PRELIMINARES ..............................................................................................4 3.1 DA VIOLAÇÃO AO DIREITO DE DEFESA ..................................................................................4 3.2 DA FALTA DE ESGOTAMENTO DOS RECURSOS INTERNOS .....................................................5 3.2.1 DA SITUAÇÃO PROCESSUAL NO MOMENTO DA INTERPOSIÇÃO DA PETIÇÃO .....................6 3.2.2 DA EXISTÊNCIA DA AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE...................................................7 B. QUESTÕES DE MÉRITO .......................................................................................................9 1. DA OBSERVÂNCIA AO ARTIGO 11 EM RELAÇÃO AO ARTIGO 1.1 .............................................9 2. DA OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 17 EM RELAÇÃO AO ARTIGO 1.1 ...........................................13 2. DA OBSERVÂNCIA AOS ARTIGOS 2 E 24 EM RELAÇÃO AO ARTIGO 1.1..................................17 3. DA OBSERVÂNCIA AOS ARTIGOS 8 E 25 EM RELAÇÃO AO ARTIGO 1.1 .................................20 3.1 DA EFETIVIDADE DOS RECURSOS INTERNOS .......................................................................21 C. DO NÃO CABIMENTO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS .................................................24 D. DA NÃO CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DO ESTADO .......................................................................................................................................28 E. DA IMPUGNAÇÃO DOS PEDIDOS DE REPARAÇÃO...................................................29 III. SOLICITAÇÃO DE ASSISTÊNCIA ..................................................................................30 I 277 LISTA DE ABREVIATURAS Artigo ou Artigos art. ou arts. Combinado com c/c Comissão Interamericana de Direitos Humanos CIDH Convenção Americana sobre Direitos Humanos Convenção ou CADH Corte Interamericana de Direitos Humanos Corte , Corte IDH ou Corte Interamericana Corte Internacional de Justiça CIJ ou ICJ Corte Permanente de Justiça Internacional PCIJ Draft Articles on State Responsibility for Internationally Wrongful Acts Draft Edição Estado de La Atlantis European Court of Human Rights Human Rights Committee Número Opinião Consultiva Organização das Nações Unidas Página ou Páginas Parágrafo Ed. Estado ou La Atlantis Corte Europeia ou ECHR HRC No. ou nº OC ONU p. ou pp. § II 277 ÍNDICE DE JUSTIFICATIVAS Artigos e Livros BROWNLIE, Ian. Principles of Public International Law, 6ª Ed. Oxford: Oxford University Press, 2003 ................................................................................................................................ 28 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 15ª Edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2004 ........................................................................................................................ 21 CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional didatico. Belo Horizonte: Del Rey, 1991........................................................................................................................................... 22 DELMAS-MARTY, Mireille. Les forces imaginantes du droit (II). Le pluralisme ordonné. Éditions du Seuil, 2006 ............................................................................................................. 15 DIHN, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain. Direito Internacional Público. 2ª Ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003 ........................................................................... 4 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Soberania e margem nacional de apreciação. Revista Eletrônica Direito e Política, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v.6, n.2, 2º quadrimestre de 2011. Disponível em: www.univali.br/direitoepolitica - ISSN 1980-7791 .................................................................. 15 GOMES, Luiz Flávio. As Garantias Mínimas do Devido Processo Criminal nos Sistemas Jurídicos Brasileiro e Interamericano. In: O Sistema interamericano dle proteção dos Direitos Humanos e o Direito Brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000 .................. 24 GONZALEZ. F. As medidas de urgência no Sistema Interamericano de Direitos Humanos. SurRevista Internacional de Direitos Humanos, São Paulo, SP,v.7, n. 13, p.51, dez. 2010. ......... 25 JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito processual civil. 41ª ed. v.1 Rio de janeiro: Ed. Forense, 2004............................................................................................................................................. 8 LEDESMA, Héctor Faúndez. El sistema interamericano de protección de los derechos humanos: aspectos institucionales y procesales. 3 ed. San José, C.R.: Instituto Interamericano de Derechos Humanos, 2004 ....................................................................................................... 5, 7 MEIRELLES, Hely Lopes; AZEVEDO, Eurico de Andrade.; ALEIXO, Delcio Balestero.; BURLE FILHO, Jose Emmanuel. Direito administrativo brasileiro. 33. ed., atual. até a Emenda Constitucional 53,. São Paulo: Malheiros, 2007 ......................................................... 22 MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, 1960. In: JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito processual civil. Rio de janeiro: Ed. Forense, 2004 ........................................ 8 MOWBRAY, Alistair. Cases and materials on the European Convention on Human Rights.New York, OUP, 2007 ...................................................................................................................... 28 III 277 PASQUALUCCI, Jo M. The application of International Principles of State Responsibility by the Inter-American Court of Human Rights. In: Liber Amicorum Antônio A. Cançado Trindade. Secretaría de la Corte Interamericana de Derechos Humanos: Costa Rica, 2005 .... 28 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade Internacional de Direitos Humanos. 1ª edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2004 .................................................................................................. 28 SHAW, Malcolm N. International Law. 3ªEdição. Cambridge Press, 1991 .................................. 6 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v. 1. 51ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010 ................................................................................................. 21 Jurisprudência Corte IDH. Assunto Adrian Melêndez Quijano e outros. Medidas Provisórias respeito de El Salvador. Resolução da Corte de 2 de fevereiro de 2010. ........................................................ 29 Corte IDH. Assunto Alemân Lacayo. Medidas Provisórias, respeito da Nicaragua. Resolução da Corte de 2 de fevereiro de 1996 ................................................................................................ 29 Corte IDH. Assunto Alvarado Reyes. Medidas Provisórias, respeito de México. Resolução da Corte de 23 de novembro de 2012. ..................................................................................... 28, 30 Corte IDH. Caso "Instituto de Reeducación del Menor" Vs. Paraguay. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 2 de septiembre de 2004.Serie C No. 112 ......... 27 Corte IDH. Caso 19 Comerciantes Vs. Colombia. Sentença de 5 de julho de 2004. Série C No. 109............................................................................................................................................. 24 Corte IDH. Caso 19 comerciantes. Medidas Provisórias respeito de Colômbia. Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 26 de junho de 2012 ................................. 29, 30 Corte IDH. Caso Alvarez e outros. Medidas Provisórias respeito de Colômbia. Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 08 de fevereiro de 2008 .................................. 29 Corte IDH. Caso Atala Riffo y niñas vs. Chile. Fondo, Reparaciones e Costas, Sentencia de 24 de febrero de 2012 .............................................................................................................. 10, 11 Corte IDH. Caso Atala Riffo y niñas vs. Chile. Fondo, Reparaciones e Costas, Voto parcialmente dissidente del juez Alberto Pérez Pérez. Sentencia de 24 de febrero de 2012.......................... 16 Corte IDH. Caso Baena Ricardo y otros Vs. Panamá. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 2 de febrero de 2001. Serie C No. 72 ................................................................................... 16 Corte IDH. Caso Baldeón García v. Perú. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentença de 6 de abril de 2006. Serie C No 147 ........................................................................................................... 23 Corte IDH. Caso Bámaca Velasquez. Medidas Provisórias respeito de Guatemala. Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 29 de agosto de 1998 ...................................... 29 IV 277 Corte IDH. Caso Castillo Petruzzi e outros v. Perú. Exceções Preliminares. Sentença de 04 de setembro de 1998. Serie C No. 41 .............................................................................................. 5 Corte IDH. Caso Cesti Hurtado Vs. Perú. Reparaciones y Costas. Sentencia de 31 de mayo de 2001. Serie C No. 78 ................................................................................................................. 34 Corte IDH. Caso Chitay Nech y otros Vs. Guatemala. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 25 de mayo de 2010. Serie C No. 212 .......................... 14 Corte IDH. Caso Cinco Pensionistas vs. Perú. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 28 de febrero de 2003. Serie C No. 98 ............................................................................................... 18 Corte IDH. Caso de la “Panel Blanca" (Paniagua Morales y otros) Vs. Guatemala. Reparaciones y Costas. Sentencia de 25 de mayo de 2001. Serie C No. 76 ................................................... 34 Corte IDH. Caso de la “Panel Blanca” vs. Guatemala. Fondo. Sentencia de 25 de enero de 1996. Serie C No 23 ............................................................................................................................ 24 Corte IDH. Caso de La Masacre de Pueblo Bello v. Colombia.Sentencia de 31 de enero de 2006. Serie C No. 140. Voto do Juiz A. A. Cançado Trindade .......................................................... 22 Corte IDH. Caso del Tribunal Constitucional Vs. Perú. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 31 de enero de 2001. Serie C No. 71.................................................................................... 26 Corte IDH. Caso Escher y otros Vs. Brasil. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 6 de julio 2009. Serie C No. 200 ...................................................... 10, 11 Corte IDH. Caso Escué Zapata vs. Colombia. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 4 de julio de 2007. Serie C No. 165 .................................................................................................. 10 Corte IDH. Caso Fairén Garbi y Solís Corrales Vs. Honduras. Excepciones Preliminares. Sentencia de 26 de junio de 1987. Serie C No. 2 ...................................................................... 23 Corte IDH. Caso Fernándes Ortega e outros vs. Mexico. Exceção Preliminar, Fondo, Reparaciones e Costas. Sentencia 30 de agosto de 2010 .................................................... 10, 11 Corte IDH. Caso Fontevecchia y D`Amico, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentença de 29 de novembro de 2011. Serie C No. 238 ......................................................................................... 10 Corte IDH. Caso Godínez Cruz Vs. Honduras. Fondo. Sentencia de 20 de enero de 1989. Serie C No. 5.......................................................................................................................................... 26 Corte IDH. Caso Goiburú y otros Vs. Paraguay. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 22 de septiembre de 2006. Serie C No. 153 ................................................................................... 23 Corte IDH. Caso Herrera Ulloa Vs. Costa Rica. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 2 de julio de 2004. Serie C No. 107 ..................................................... 23 V 277 Corte IDH. Caso Juan Humberto Sánchez Vs. Honduras. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 7 de junio de 2003. Serie C No. 99 ............................... 24 Corte IDH. Caso Las Palmeras Vs. Colombia. Fondo. Sentencia de 6 de diciembre de 2001. Serie C No. 90 .................................................................................................................................... 24 Corte IDH. Caso López Álvarez vs. Honduras. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia del 1 de febrero de 2006. Serie C No. 141 ............................................................................................. 24 Corte IDH. Caso Maritza Urrutia vs. Guatemala. Sentença de 27 de novembro de 2003. Serie C No103........................................................................................................................................ 24 Corte IDH. Caso Rosenda Cantú e outra Vs. México. Exceção Preliminar, Fondo, Reparações e Costas. Sentença 31 de agosto de 2010 .................................................................................... 11 Corte IDH. Caso Suárez Rosero Vs. Ecuador. Fondo. Sentencia de 12 de noviembre de 1997. Serie C No. 35 ........................................................................................................................... 24 Corte IDH. Caso Tibi Vs. Ecuador. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 7 de septiembre de 2004. Serie C No. 114 .......................................................... 24 Corte IDH. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Excepciones Preliminares. Sentencia de 26 de junio de 1987. Serie C No. 1 ........................................................................................... 23 Corte IDH. Caso Ximenes Lopes vs. Brasil. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 4 de julio de 2006. Serie C No. 149 .................................................................................................. 32 Corte IDH. Caso Yatama Vs. Nicaragua. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 23 de junio de 2005. Serie C No. 127 ..................................................... 23 Corte IDH. Caso Zambrano Vélez y otros v. Ecuador. Sentença de 4 de julho de 2007, série C No. 166........................................................................................................................................ 6 Corte IDH. Condición Jurídica y Derechos Humanos del Niño. Opinión Consultiva OC-17/02 de 28 de agosto de 2002. Serie A No. 17........................................................................... 14, 19, 20 Corte IDH. Informes de la Comisión Interamericana de Derechos Humanos (Art. 51 Convención Americana sobre Derechos Humanos). Opinión Consultiva OC-15/97 del 14 de noviembre de 1997. Serie A No. 15, §113......................................................................................................... 4 Corte IDH. La Expresión "leyes" en el Artículo 30 de la Convención Americana sobre Derechos Humanos, Opinião Consultiva OC-6/86de 9 de maio de 1986, série A No. 6 ..................... 6, 12 Corte IDH. Propuesta de Modificación a la Constitución Política de Costa Rica Relacionada con la Naturalización. Opinión Consultiva OC-4/84 del 19 de enero de 1984. Serie A No. 4 ....... 19 VI 277 Corte IDH. Restricciones a la Pena de Muerte (Arts. 4.2 y 4.4 Convención Americana sobre Derechos Humanos). Opinión Consultiva OC-3/83 del 8 de septiembre de 1983. Serie A No. 3 ................................................................................................................................................... 19 Corte IDH.Caso de las Masacres de Ituango Vs. Colombia. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentença de 1 de julho de 2006 Serie C No. 148 ................................. 9 Corte IDH.Caso Tristán DonosoVs. Panamá. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 27 de enero de 2009. Serie C No.193 ..................................................... 10 ECHR Case of Kruslin v. France, judgment of 24 April 1990, Serie A, No. 176-A .................... 12 ECHR. Case of Boner v. United Kingdom. Judgment of 28 October 1994, series A No. 300-B 33 ECHR. Case of Campbell and Fell vs. United Kingdom. Judgment of 28 June 1984, Series A no. 80............................................................................................................................................... 26 ECHR. Case of Darby v. Sweden. Judgment of 23 October 1990, series A No. 187 .................. 34 ECHR. Case of Huvig v. France, judgment of 24 April 1990, Serie A No. 176-B ...................... 13 ECHR. Case of Langborger vs. Sweden, Judgment of 27 January 1989, Series A no. 155 ......... 26 ECHR. Case of Ruiz Torija v. Spain. Judgment of 9 December 1994. Series A No. 303-A ....... 34 ICJ. Barcelona Traction Light and Power Company, Limited (Belgium v. Spain) (Exceções Preliminares), Order of 10 April 1961: ICJ Reports 1961 .......................................................... 6 ICJ. Case Concerning the Application of the Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of Genocide ( Bosnia and Herzegovina v. Serbia and Montenegro). Merits, ICJ Rep 2007........................................................................................................................................... 32 ICJ. Corfu Channel (United Kingdom v. Albania). Merits, ICJ Rep. 1949.................................. 32 ICJ. Elettronica Sicula S.p.A. (ELSI) (United States v. Italy), Judgment, ICJ Reports 1989 ......... 6 ICJ. Interhandel Case (Switzerland v. United States), Judgment of March 21st, 1959, ICJ Reports 1959............................................................................................................................................. 6 Tribunal Constitucional de Portugal, Acórdão n.º 359/2009. Processo n.º 779/07. Diário da República, 2.ª série - N.º 214 - 04 de Novembro de 2009 ........................................................ 22 Tribunal da Relação de Lisboa, Processo 6284/2006-8. Julgado em 15/02/2007 ........................ 21 Miscelânea CIDH. Caso José Pereira vs. Brasil. Informe n. 95/03. Caso n. 11.289. Solução amistosa. 24 de outubro de 2003 .......................................................................................................................... 9 VII 277 CIDH. El acceso a la justicia como garantía de los derechos económicos, sociales y culturales. Estudio de los estandares fijados por el Sistema Interamericano de Derechos Humanos, OEA/Ser.L/V/II.129. Doc. 4, 7 septiembre 2007 ..................................................................... 22 CIDH. Relatório Nº 61/03, Petição 4446/02 (Admissibilidade), Roberto Moreno Ramos, Estados Unidos da América, 10 de outubro de 2003 ............................................................................... 6 HRC. Observación General No. 16 (32º período de sesiones, 1988). Derecho a la intimidad (artículo 17), HRI/GEN/1/Rev.9 (Vol.I) ................................................................................... 14 HRC. Observación General No. 19 (39º período de sesiones, 1990). La familia (artículo 23), HRI/GEN/1/Rev.9 (Vol.I)................................................................................................... 13, 14 ONU. Comité de los Derechos del Niño, Observación General No. 7. Realización de los derechos del niño en la primera infancia, CRC/C/GC/7, 30 de septiembre de 2005 ................ 13 ONU. Comité para la Eliminación de la Discriminación contra la Mujer, Recomendación General No. 21 (13º período de sesiones, 1994). La igualdad en el matrimonio y en las relaciones familiares ................................................................................................................. 13 ONU. Doc. E/1991/23, Comité de Derechos Económicos, Sociales y Culturales de las Naciones Unidas, Observación General No. 3: La índole de las obligaciones de los Estados Partes (párrafo 1 del artículo 2 del Pacto), adoptada en el Quinto Período de Sesiones, 1990. ......... 16 ONU. Draft Articles on State Responsibility for Internationally Wrongful Acts with commentaries, extract from the Report of the International Law Commission on the work of its Fifty-third session, Official Records of the General Assembly, Fifty-sixth session(2001), Supplement No. 10 (A/56/10), chp.IV.E.1 ............................................................................... 28 ONU. Resúmenes de los Fallos,Opiniones Consultivas y Providencias de la Corte Internacional de Justicia. New York, 1992 ....................................................................................................... 6 UNHCR, Ireland v. The United Kingdom, 5310/71, Council of Europe: European Court of Human Rights, 13 December 1977 ........................................................................................... 15 VIII 277 EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA HONORÁVEL CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS A República de Elizabetia vem, respeitosamente, apresentar a sua defesa à Corte Interamericana de Direitos Humanos, em face do memorial de pedidos, argumentos e provas apresentado pelos Representantes das supostas vítimas, solicitando a improcedência do pedido pela não configuração da responsabilidade internacional do Estado por supostas violações aos arts. 2, 8, 11, 17, 24 e 25, à luz do art. 1.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos bem como solicitar a não concessão de medidas provisórias em relação à Serafina Conejo Gallo eà Adriana Timor. I. DECLARAÇÃO DOS FATOS A República de Elizabetia estende-se por uma área aproximada de 100.000 quilômetros ao longo do continente americano, é formada por três grandes regiões divididas em sete províncias e tem por capital a cidade de São Benito. Cerca de dois milhões de pessoas habitam a capital e gozam de excelentes índices de saúde, alfabetização e bem estar social. Em termos históricos, o Estado elizabetano foi berço do povo indígena granti e colônia européia até o início do século XIX, quando conquistou a independência e voltou-se rumo ao processo de democratização das estruturas políticas vigentes. Em 1960, foi convocada uma Assembléia Constituinte para a proclamação da Constituição Democrática de Elizabetia. A Constituição promulgada, ainda vigente, estabelece termos referentes à igualdade e a não discriminação (Art. 9) e marcou o início da VI República. Hoje, Elizabetia porta-se conforme a tradição democrática presente nas estruturas políticas de sua forma de Estado de Direito. No dia 10 de fevereiro de 2000, uma petição individual foi apresentada ante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (petição P-300-00) por Serafina Conejo Gallo indicando 1 277 que o Estado de Elizabetia teria cometido discriminação ao não reconhecer, inicialmente, a identidade de gênero de Serafina. Diante do caso, a CIDH apontou existência de violação por parte do Estado de Elizabetia, que por sua vez, não apenas declarou que aceitaria todas as recomendações realizadas pela CIDH como também, em ato profundamente emotivo realizado pela Presidenta da República eleita em 2005, pediu perdão à Serafina pelos infortúnios que pudessem ter sido gerados por ação ou omissão do Estado. Em 2007, a República de Elizabetia aprovou a lei de identidade de gênero, que assegura a mudança do nome e a retificação do sexo no registro civil. Serefina Conejo Gallo foi a primeira mulher transexual em Elizabetia a obter o reconhecimento de sua identidade de gênero. Em 2010, em pleno ato de usufruto de sua tradição democrática, Elizabetia elegeu Antonio da Goblana do Atelo como Presidente. No mesmo ano, Serafina Conejo Gallo envolveuse em uma relação sentimental com uma mulher homossexual chamada Adriana Timor; um ano após o envolvimento, ambas as partes decidiram se casar. Em maio de 2011, o casal requereu o reconhecimento do casamento perante a Secretaria Nacional da família. O pedido foi negado através de um ato administrativo fundamentado pelo artigo 396 do Código Civil. Serafina e Adriana apresentaram um recurso com base no artigo 9 da Constituição e requereram a nulidade do ato administrativo, o que foi resolvido negativamente em 5 de agosto de 2011. No dia 1° de fevereiro de 2012, uma nova petição (P-600-12) foi apresentada a CIDH por Mariposa, um movimento informal fundado por Serafina com o objetivo de praticar o ativismo da comunidade transexual. O Estado alegou a inadmissibilidade do caso, tendo em vista o não esgotamento dos recursos internos pela existência da ação de constitucionalidade, passível de ser ativada sob o artigo 396 do Código Civil. A CIDH entendeu que no exato momento do 2 277 pronunciamento de admissibilidade, já havia esgotado os recursos internos e que, nas circunstâncias do caso, não havia necessidade de esgotamento da ação de inconstitucionalidade. Logo, a alegação do Estado acerca da admissibilidade não lhe parecia procedente. Em total discordância com o parecer da CIDH, o Estado de Elizabetia acionou a Corte Interamericana de Direitos Humanos no dia 1° de fevereiro de 2013 para solicitar o controle de legalidade da ação ante a CIDH. Diante do caso, a Corte convocou uma audiência para maio de 2013. Após a convocação da audiência, Adriana Timor foi internada por ter sofrido ruptura de um aneurisma cerebral congênito. O médico responsável alertou à Serafina sobre as possibilidades de tratamento: uma cirurgia de alto risco ou o monitoramento da situação. A decisão sobre o tratamento médico cabe, primeiramente, à Adriana. Como ela se encontra em coma e impossibilitada de declarar sua vontade, a decisão passa a ser dos familiares, ou, na falta destes, do Conselho Médico Regional. Diante disto, o Movimento Mariposa requereu a aplicação de medida provisória que permitisse à Serafina outorgar o consentimento informado para a realização da cirurgia. A Corte IDH manteve a audiência pública por meio de uma Resolução para que as partes apresentem seus respectivos argumentos. II. ANÁLISE JURÍDICA A. QUESTÕES PRELIMINARES Em 1º de fevereiro de 2012, a petição que originou este caso foi apresentada à CIDH. Todos procedimentos e prazos estabelecidos pela CADH e pelo Regulamento da CIDH foram cumpridos. 1. A CORTE É COMPETENTE PARA JULGAR VIOLAÇÕES À CADH Considera-se que este Tribunal é competente para o julgamento da causa, em 3 277 conformidade com o art. 62(3) da CADH, tendo em vista que o Estado de Elizabetia ratificou os principais instrumentos regionais e universais sobre Direitos Humanos e reconheceu a competência contenciosa da Corte Interamericana em 1º de janeiro de 1990. 2. DA APLICAÇÃO DE OUTRAS FONTES DE DIREITO INTERNACIONAL Outrossim, em conformidade com os arts. 29.b e 29.d da CADH 1 e, em clara demonstração de boa-fé, o Estado entende que esta Corte tem competência para utilizar-se de outras fontes de Direito Internacional com o fim de interpretar o sentido e alcance dos dispositivos da CADH. Não obstante, importa ressaltar que, em razão do princípio da competência atribuída 2, tais fontes carecem de força vinculante, razão pela qual devem ser utilizadas apenas como instrumentos de interpretação. De toda sorte, a utilização de outros instrumentos na análise deste caso será de fundamental importância para que reste demonstrado o comprometimento do Estado de Elizabetia em cumprir as obrigações assumidas internacionalmente e efetivar o respeito ao pluralismo e à diferença. 3. DAS EXCEÇÕES PRELIMINARES Inicialmente, o Estado ressalta sua discordância no que se refere ao exame de admissibilidade feito pela Comissão Interamericana. Apesar de reconhecer a competência da Corte para o julgamento do caso, é necessário levar em conta determinados aspectos processuais que podem prejudicar a análise de fundo. 3.1 DA VIOLAÇÃO AO DIREITO DE DEFESA Houve violação da garantia do direito de defesa do Estado, em razão da incorporação do artigo 2 da Convenção Americana de Direitos Humanos, o qual não havia sido expressamente 1 Corte IDH. Informes de la Comisión Interamericana de Derechos Humanos (Art. 51 Convención Americana sobre Derechos Humanos). Opinión Consultiva OC-15/97 del 14 de noviembre de 1997. Serie A No. 15, §113. 2 DIHN, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain. Direito Internacional Público. 2ª Ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003, p. 912. 4 277 admitido e não formava parte do objeto processual do caso do qual se defendeu na fase do mérito. A inserção posterior de afirmações de violação não antes alegadas impede o direito de defesa do Estado de forma a macular as garantias do devido processo, fato que provoca um vício na admissibilidade da demanda e impede sua apreciação pela Corte. Em oportunidade anterior esta Corte já reconheceu que: “se bem é certo que a demanda não há de ser, necessariamente, uma simples reiteração do informe rendido pela Comissão, também o é que não deveria conter conceitos de violação que o Estado não conheceu durante a etapa do procedimento se segue ante a própria Comissão, e que por isso mesmo não pode desvirtuar oportunamente. Vale lembrar que nessa etapa o Estado dispõe da possibilidade de admitir os feitos aduzidos pelos denunciantes, rechaçá-los motivadamente ou procurar uma solução amistosa que evite a remissão do assunto à Corte. Se o Estado não conhece certos feitos ou determinadas afirmações que logo serão apresentados na demanda, não pode fazer uso dos direitos que lhe assistem naquela etapa processual”. 3 Assim, violado do direito de defesa do Estado ante a Comissão, fica prejudicada a análise do caso perante a Corte. 3.2DA FALTA DE ESGOTAMENTO DOS RECURSOS INTERNOS “Para que uma petição ou comunicação seja admissível é indispensável que previamente se hajam interposto e esgotados os recursos da jurisdição interna, conforme os princípios do Direito Internacional geralmente reconhecidos sobre esta matéria”. 4 A regra de exaustão dos 3 Corte IDH. Caso Castillo Petruzzi e outros v. Perú. Exceções Preliminares. Sentença de 04 de setembro de 1998. Serie C No. 41 4 LEDESMA, Héctor Faúndez. El sistema interamericano de protección de los derechos humanos: aspectos institucionales y procesales. 3 ed. San José, C.R.: Instituto Interamericano de Derechos Humanos, 2004. p.293 5 277 recursos internos, 5 amplamente reconhecida no Direito Internacional, 6 possibilita que o Estado dirima seus litígios de acordo com seus próprios procedimentos antes que os mecanismos internacionais sejam invocados. 7 Dessa forma, não é função dos tribunais internacionais suplantar os órgãos nacionais, 8 sendo que a omissão do indivíduo na utilização do sistema nacional para pleitear suas reclamações é um obstáculo fatal para a admissibilidade de sua petição em âmbito internacional. 9 Nesse sentido, o Estado de Elizabetia vem demonstrar que havia na legislação interna recursos processuais legais para a proteção do direito supostamente ameaçado, bem como o livre acesso por Serafina Conejo Gallo, ou qualquer cidadão, a tais recursos 10. 3.2.1 DA SITUAÇÃO PROCESSUAL NO MOMENTO DA INTERPOSIÇÃO DA PETIÇÃO Inicialmente, é evidente o fato de que a petição da representante não atende ao requisito do esgotamento dos recursos internos haja vista que foi levada ante a Comissão ainda no decurso do prazo legal que o Estado tinha para dar resposta ao recurso de amparo. Interposto o recurso de amparo em 18 de novembro de 2011, respeitada a legislação interna que estabelece o prazo de três meses para a resolução do recurso, o Estado tinha a prerrogativa legal de dar resposta até o dia 18 de fevereiro de 2012. Apesar disso, a parte representante, ignorando os preceitos da legislação interna, apresentou a petição P-600-12 na data de 01 de fevereiro de 2012, não aguardando o devido pronunciamento do Estado. 5 ICJ. Barcelona Traction Light and Power Company, Limited (Belgium v. Spain) (Exceções Preliminares), Order of 10 April 1961: ICJ Reports 1961, p.9, 19; ICJ. Elettronica Sicula S.p.A. (ELSI) (United States v. Italy), Judgment, ICJ Reports 1989, p. 15, §46; ICJ. Interhandel Case (Switzerland v. United States), Judgment of March 21st, 1959, ICJ Reports 1959, pp. 6, 27. 6 ONU. Resúmenes de los Fallos,Opiniones Consultivas y Providencias de la Corte Internacional de Justicia. New York, 1992. p. 253. 7 SHAW, Malcolm N. International Law. 3ªEdição. Cambridge Press, 1991, p. 239. 8 Corte IDH. Caso Zambrano Vélez y otros v. Ecuador. Sentença de 4 de julho de 2007, série C No. 166, §47; Corte IDH. La Expresión "leyes" en el Artículo 30 de la Convención Americana sobre Derechos Humanos, Opinião Consultiva OC-6/86de 9 de maio de 1986, série A No. 6, §26. 9 CIDH. Relatório Nº 61/03, Petição 4446/02 (Admissibilidade), Roberto Moreno Ramos, Estados Unidos da América, 10 de outubro de 2003 §33. 10 Artigo 31.2 do Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos 6 277 É consenso que, enquanto exista a possibilidade de que as reclamações possam ser resolvidas no âmbito interno “não podem ser consideradas como violações do Direito Internacional dos Direitos Humanos, cujos mecanismos de proteção devem ser considerados como meramente subsidiários do Direito interno, para o caso em que este não tenha recursos disponíveis, ou que os existentes resultem inadequados ou ineficazes”. 11 Assim sendo, esta questão independe de mérito e é eminentemente processual, já que não foram respeitados os prazos processuais internos antes de ser levada a petição à Comissão. 3.2.2DA EXISTÊNCIA DA AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE Sabe-se que “os recursos da jurisdição interna devem esgotar-se em sua integridade, não bastando a decisão de um mero incidente dentro do procedimento, ou com uma sentença interlocutória que não ponha fim ao mesmo”. 12 Assim sendo, havendo recurso judicial disponível, adequado e efetivo, é indispensável que seja utilizado. O artigo 110 da Constituição de Elizabetia estabelece que a Ação de Inconstitucionalidade pode ser interposta a título pessoal por qualquer cidadão ou cidadã 13, sendo um remédio judicial disponível e acessível a todos, ofertando a possibilidade de levar a conhecimento da Promotoria de Direitos Humanos da República e à Câmara Constitucional da Corte Suprema da Justiça qualquer fato que possa ser violatório de Direitos Humanos. Esse é o único meio adequado para declarar a inconstitucionalidade de uma norma, tendo em vista que esta é uma prerrogativa exclusiva da Câmara Constitucional do Supremo Tribunal. 14 No presente caso, é alegada uma suposta discriminação legal nas normas dispostas no 11 LEDESMA, Héctor Faúndez. El sistema interamericano de protección de los derechos humanos: aspectos institucionales y procesales. Op.cit., p.296. 12 LEDESMA, Héctor Faúndez. El sistema interamericano de protección de los derechos humanos: aspectos institucionales y procesales.Op cit., p.295 13 Caso Hipotético, §14. 14 Perguntas de Esclarecimento, n. 47. 7 277 artigo 396 do Código Civil e artigo 85 da Constituição Política de Elizabetia ante o artigo 9 da mesma. Diante dessa suposição, a questão necessariamente deveria ter sido levada à Câmara Constitucional, para que pudesse ser apreciada e julgada por quem tem competência para fazê-lo. Questionada a constitucionalidade de uma norma ou um ato do Estado, é imprescindível que seja usado o meio judicial adequado, caso contrário, se torna impossível a correta solução da demanda. É sabido que quem tem interesse em recorrer “há de usar a figura recursal apontada pela lei para o caso; não pode substituí-la por figura diversa”, 15 pois, “em face do princípio da adequação, não basta que a parte diga que quer recorrer, mas deve interpor em termos o recurso que pretende”. 16 Isso porque, os órgãos jurisdicionais não foram instituídos para agir ex officio nos conflitos privados de interesse entre os cidadãos, uma vez que “a função jurisdicional só atua diante de casos concretos de conflitos de interesses (lide ou litígio) e sempre na dependência da invocação dos interessados, porque são deveres primários destes a obediência à ordem jurídica e a aplicação voluntária de suas normas nos negócios jurídicos praticados”. 17 Ora, não havendo sido levantada a questão perante a Câmara Constitucional, o Estado de Elizabetia não possuía qualquer outra forma de se manifestar em relação à demanda, uma vez que é limitado pelo princípio ne procedat iudex ex officio. Não se pode ignorar a existência da Ação de Inconstitucionalidade, único meio adequado e efetivo para tratar de casos como o de Serafina Conejo Gallo declarando a suposta inconstitucionalidade na norma, o qual, apesar disso, não foi utilizado pela parte. Desta forma, ante a existência de recurso adequado e efetivo no âmbito interno, o qual não foi empregado no caso, conclui-se que o Estado não teve a devida oportunidade de se manifestar, se tornando 15 MOREIRA, Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, 1960. In: JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito processual civil. Rio de janeiro: Ed. Forense, 2004. 16 JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito processual civil. 41ª ed. v.1 Rio de janeiro: Ed. Forense, 2004. p.521 17 JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito processual civil. Op.cit., p.32. 8 277 evidente que a demanda não atende ao requisito de esgotamento dos recursos internos. B. QUESTÕES DE MÉRITO 1. DA OBSERVÂNCIA AOARTIGO 11 EM RELAÇÃO AO ARTIGO 1.1 O artigo 11.2 da CADH proíbe toda ingerência arbitrária ou abusiva na vida privada e familiar das pessoas. Em decorrência, o Estado tem o dever de garantir a intimidade de invasões agressivas, abusivas ou arbitrárias realizadas por terceiros ou pela autoridade pública 18. Segundo a Corte, a abrangência da vida privada é ampla e não permite conceitos exaustivos 19. Entretanto, em diversas oportunidades afirmou que a vida privada, familiar e o domicílio se encontram intrinsecamente ligados 20. A CIDH, por sua vez, determinou que a vida privada abrange a intimidade e a autonomia de um indivíduo, incluindo sua personalidade, identidade, decisões sobre sua vida sexual e suas relações pessoais e familiares 21. É necessário ressaltar que o direito a intimidade não é absoluto 22. Apenas ingerências abusivas ou arbitrárias caracterizam a violação do artigo 11.2 da CADH. Segundo a Corte, é lícita a interferência à vida privada e familiar se for prevista legalmente, for idônea, necessária e proporcional a cumprir um fim legítimo em uma sociedade democrática 23. A jurisprudência da Corte recorrentemente reconhece a violação do art. 11.2 quando a própria autoridade pública interfere na vida privada sem respeitar a legalidade, a idoneidade, 18 Corte IDH.Caso de las Masacres de Ituango Vs. Colombia. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentença de 1 de julho de 2006 Serie C No. 148, §194; Corte IDH. Caso Fontevecchia y D`Amico, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentença de 29 de novembro de 2011. Serie C No. 238, §48. 19 Corte IDH. Caso Atala Riffo y niñas vs. Chile. Fondo, Reparaciones e Costas, Sentencia de 24 de febrero de 2012, §162. 20 Corte IDH. Caso Escué Zapata vs. Colombia. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 4 de julio de 2007. Serie C No. 165, §95; Corte IDH. Caso Fernándes Ortega e outros vs. Mexico. Exceção Preliminar, Fondo, Reparaciones e Costas. Sentencia 30 de agosto de 2010, §157. 21 Corte IDH. Caso Atala Riffo y niñas vs. Chile, §156. 22 Corte IDH. Caso Atala Riffo y niñas vs. Chile, §164; CIDH. Caso José Pereira vs. Brasil. Informe n. 95/03. Caso n. 11.289. Solução amistosa. 24 de outubro de 2003, §24.4. 23 Corte IDH.Caso Tristán DonosoVs. Panamá. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 27 de enero de 2009. Serie C No.193, §56; Corte IDH. Caso Escher y otros Vs. Brasil. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 6 de julio 2009. Serie C No. 200, §116. 9 277 necessidade e a proporcionalidade do fim almejado 24. No Caso Fernández Ortega e outros vs. México, por exemplo, houve a violação do mencionado artigo pois militares entraram no domicílio da vítima sem o seu consentimento 25. No caso Rosendo Cantú e outra Vs. México, a violação sexual da vítima por militar caracterizou desrespeito à vida privada, posto que seu direito de tomar decisões sobre sua sexualidade fora violado 26. Em Escher e outros Vs. Brasil, foram interceptadas ligações telefônicas e divulgadas de maneira midiática e indevida 27. No presente caso, não há qualquer ocorrência relatada nos fatos semelhante àquelas que reconhecidamente violaram o artigo 11.2 da CADH. Desde 1990, quando Elizabetia aceitou a competência contenciosa da Corte, as relações do Estado com as supostas vítimas se resumiram à (i) atividade administrativa e jurisdicional do Estado, (ii) prestação do serviço educacional e (iii) prestação do serviço médico. Quanto à atividade administrativa jurisdicional, não há o que se falar em interferência na vida privada. Essa atividade é, por essência, inerte. Sendo assim, foram os interessados que provocaram a jurisdição. Vale ressaltar que os procedimentos realizados foram em observância do devido processo legal e todas as decisões foram legalmente fundamentadas. Não houve, durante o processo, invasão à intimidade, busca de fatos íntimos para fundamentar decisões, depreciação da orientação sexual das peticionárias, ou qualquer interferência na personalidade, na vida sexual, amorosa e familiar das supostas vítimas. Faz-se necessário evidenciar que o processo administrativo e judicial é devidamente regulamentado pelas leis internas 28 e tem por objetivo a proteção dos direitos e da ordem estabelecida democraticamente pela Constituição. 24 Corte IDH. Caso Atala Riffo y niñas vs. Chile. Op. cit., §225. Corte IDH. Caso Fernándes Ortega e outros vs. Mexico. Exceção Preliminar, Fondo, Reparações e Costas. Sentença 30 de agosto de 2010, §158. 26 Corte IDH. Caso Rosenda Cantú e outra Vs. México. Exceção Preliminar, Fondo, Reparações e Costas. Sentença 31 de agosto de 2010, §119. 27 Corte IDH. Caso Escher y otros Vs. Brasil, §164. 28 Corte IDH. La Expresión "leyes" en el Artículo 30 de la Convención Americana sobre Derechos Humanos, Opinião Consultiva OC-6/86, §§ 27 e 32. 25 10 277 O serviço educacional, prestado com qualidade, de fato falhou ao nomear Serafina Conejo Gallo por Serafim, desconsiderando assim a sua identidade de gênero. O Estado, contudo, reconheceu sua responsabilidade internacional e já tomou as medidas necessárias. Quanto à prestação do serviço médico, ainda em andamento, o Estado reconhece a delicadeza do caso. Adriana sofreu um aneurisma cerebral congênito e corre risco de vida. No momento, está internada e incapaz de se comunicar. O médico responsável pelo caso, devidamente capacitado e habilitado, informou a Serafina que sem o consentimento de algum familiar, o Conselho Médico Regional iria tomar as providências necessárias para a melhor proteção da vida da Adriana. A exigência legal de obter o consentimento de um familiar demonstra prudência, posto que é incabível confiar o futuro dos pacientes a qualquer pessoa. In casu, Serafina, além de não ser legalmente considerada um membro da família, passou a se relacionar com Adriana há apenas um ano. Elizabetia não reconhece a suficiência desse breve relacionamento para a responsabilidade dessa decisão. Destarte, faz se necessário que o Conselho Médico intervenha e tome a medida que considerar mais prudente. O Estado reconhece que a decisão médica irá, de fato, interferir na vida de Adriana. Fazse necessário, portanto, analisar os requisitos legais da intervenção. Quanto ao critério de legalidade, no caso Kruslin v. França, a Corte Européia determinou que deve ser indicado regras claras e detalhadas sobre as circunstâncias da medida, o procedimento a ser seguido, as pessoas autorizadas a solicitá-la, a ordená-la e executá-la. 29 No caso presente, foi informado à acompanhante da paciente o procedimento legalmente previsto: em caso de extrema emergência em que o assistido não seja capaz de declarar sua vontade, faz-se necessário o consentimento de parente próximo ou cônjuge para tomar as decisões necessárias. Caso não haja esse 29 ECHR Case of Kruslin v. France, judgment of 24 April 1990, Serie A, No. 176-A, §33; ECHR. Case of Huvig v. France, judgment of 24 April 1990, Serie A No. 176-B, §32. 11 277 consentimento, o Conselho Médico Regional passa a ter a responsabilidade da escolha. Esta decisão está sujeita a recurso e à proteção constitucional, da CADH e de outros tratados internacionais. Quanto ao critério de idoneidade, proporcionalidade e necessidade deste procedimento, tem-se que o seu objetivo principal é salvaguardar a autonomia do paciente em escolher o tratamento ao qual será submetido. Caso não seja possível garanti-la por meio dos seus familiares, o Estado assegura que seja tomada a melhor decisão técnica, a fim de garantir o direito a vida da paciente. Esta intervenção na vida privada é necessária pois garante que toda pessoa sujeita à jurisdição de Elizabetia seja submetida a um tratamento médico após uma decisão consciente e deliberada, seja pelos familiares ou, subsidiariamente, pelo Conselho Médico. A medida é também proporcional ao fim almejado pois apenas quando o paciente estiver impossibilitado de declarar a sua vontade, se os familiares não puderem faze-lo em substituição, é que o Conselho irá atuar. Ou seja, a intervenção é proporcional na medida em que é adotada de maneira subsidiaria: O Conselho Médico só decide pela paciente se não for possível colher a sua declaração de vontade ou de familiares. Por fim, a intervenção é idônea pois visa garantir que a escolha do tratamento médico de todos os pacientes seja previamente deliberada. Dessa forma, caso a pessoa não tenha familiares ou alguém apto a decidir por ela, o Estado garante a atuação do Conselho Médico. A autonomia da vontade do paciente é respeitada, mas, se não estiver em condições de exercê-la, o Estado irá intervir para garantir o melhor tratamento. Resta claro, portanto, que a intervenção é idônea pois se dá apenas em casos específicos, quando não for possível colher a vontade autônoma da paciente. 12 277 2. DA OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 17 EM RELAÇÃO AO ARTIGO 1.1 O artigo 17 da CADH consagra a proteção da família, considerada como o núcleo fundamental da sociedade. O dispositivo garante o direito do homem e da mulher a contraírem matrimônio e constituírem uma família e estabelece o dever do Estado de zelar por sua unidade 30. Sobre a inexistência de um conceito único de família, vários órgãos internacionais de direitos humanos já se pronunciaram a respeito: O Comitê para a eliminação de discriminação contra a mulher declarou que a forma e o conceito de família são variáveis de um Estado para o outro 31. O Comitê dos Direitos da Criança, por sua vez, reconheceu que família se refere a uma variedade de estruturas, incluindo as famílias nucleares, ampliada e outras modalidades tradicionais ou modernas 32. Finalmente, o Comitê de Direitos Humanos confirmou a impossibilidade de estabelecer uma definição uniforme de família, tendo em vista as suas diversas modalidades 33. A estrutura familiar é variável de acordo com diferenças históricas, geográficas, de costumes, tradições religiosas e outros fatores. Ou seja é uma instituição cultural, particular de cada povo, variável em tempo e espaço 34. É exatamente por isso que não é cabível um conceito único e fechado. Inclusive, o Comitê de Direitos Humanos, na observação geral n.16 sobre o direito à intimidade, fez referência ao direito estatal de estabelecer o próprio entendimento de 30 Corte IDH. Condición Jurídica y Derechos Humanos del Niño. Opinión Consultiva OC-17/02 de 28 de agosto de 2002. Serie A No. 17, §66; Corte IDH. Caso Chitay Nech y otros Vs. Guatemala. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 25 de mayo de 2010. Serie C No. 212, §157. 31 ONU.Comité para la Eliminación de la Discriminación contra la Mujer, Recomendación General No. 21 (13º período de sesiones, 1994). La igualdad en el matrimonio y en las relaciones familiares, §13. 32 ONU.Comité de los Derechos del Niño, Observación General No. 7. Realización de los derechos del niño en la primera infancia, CRC/C/GC/7, 30 de septiembre de 2005, §12. 33 HRC. Observación General No. 19 (39º período de sesiones, 1990). La familia (artículo 23), HRI/GEN/1/Rev.9 (Vol.I), §2. 34 HRC. Observación General No. 19, §2. 13 277 família 35. A presente demanda, iniciada pela petição P-600-12, acusa o Estado de ter violado o artigo 17 da CADH, o qual, literalmente, “reconhece o direito do homem e da mulher de contraírem casamento e de constituírem uma família”. É necessário ressaltar que, enquanto todos os outros dispositivos da Convenção garantem os direitos a “toda pessoa”, o artigo 17 garante o direito de constituir família ao homem e a mulher. Redação muito similar ao artigo 85 da Constituição da República de Elizabetia, que também garante o direito de constituir família ao casal heteroafetivo. É claro, porém, que a convenção é um instrumento vivo e deve ser interpretado conforme o entendimento evolutivo atual dos direitos humanos, de maneira a adotar a norma mais favorável ao indivíduo 36. O Estado está atento às rápidas mudanças socioculturais e ao reconhecimento dos direitos da comunidade LGBTI, especialmente quanto à não discriminação pela orientação sexual e identidade de gênero. A família, instituição não só jurídica, mas também social e cultural 37, também vem sofrendo alterações significativas. Porém, não existe ainda um consenso internacional sobre o dever ser da estrutura familiar. Prova disso é o reconhecimento, por vários documentos internacionais, da impossibilidade de desenvolver um conceito universal de família 38. Segundo o juiz desta Corte Alberto Perez Perez, para a evolução de um dispositivo internacional, é necessário existir um consenso, um espaço de coincidência ou uma convergência 35 HRC. Observación General No. 16 (32º período de sesiones, 1988). Derecho a la intimidad (artículo 17), HRI/GEN/1/Rev.9 (Vol.I), §5. 36 Corte IDH. Caso Baena Ricardo y otros Vs. Panamá. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 2 de febrero de 2001. Serie C No. 72, §101. 37 Corte IDH. Caso Atala Riffo y niñas vs. Chile. Fondo, Reparaciones e Costas, Voto parcialmente dissidente del juez Alberto Pérez Pérez. Sentencia de 24 de febrero de 2012.§10. 38 HRC. Observación General No. 19, §2. 14 277 de standards entre os Estados partes 39. Neste momento, não é possível afirmar que existe um standard em questões de família. Em determinados casos concretos, não há como pensar em valores universais, pois aspectos relacionados a fortes sentimentos humanos, religião, moral, ética, impedem que se chegue a um denominador comum. 40 No caso Ireland v. Reino Unido 41, a Corte Europeia desenvolveu a doutrina de margem nacional de apreciação: quando não houver um consenso sobre a abrangência de um direito, os Estados têm discricionariedade para decidir sobre o seu alcance. Este poder discricionário do Estado está fundado em três razões: a natureza subsidiária da proteção internacional, a ausência de standards comuns e o fato dos Estados estarem, a priori, mais bem preparados para a decisão do que o juiz da Corte Internacional, posto que estão em contato direto com as preces e necessidades locais 42. O Estado Elizabetia entende que a preservação da instituição familiar tem um impacto não apenas individual, mas, sobretudo, coletivo. A instituição da família é essencial para a organização social da comunidade nacional, posto que integra o padrão moral que orienta o país . 76% da população não aprova a equiparação da união de fato entre pessoas do mesmo sexo à família. Este dado, ainda que por sí só, não sirva de escusa para o Estado regular apenas matrimônios entre homem e mulher, reflete bem como a maior parte da população entende que essa matéria deve ser regulada. Destarte, Elizabetia entende que não há um entendimento concreto do artigo 17 da CADH 39 Corte IDH. Caso Atala Riffo y niñas vs. Chile. Fondo, Reparaciones e Costas, Voto parcialmente dissidente del juez Alberto Pérez Pérez, §20. 40 DELMAS-MARTY, Mireille. Les forces imaginantes du droit (II). Le pluralisme ordonné. Éditions du Seuil, 2006. 41 UNHCR,Ireland v. The United Kingdom, 5310/71, Council of Europe: European Court of Human Rights, 13 December 1977. 42 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Soberania e margem nacional de apreciação. Revista Eletrônica Direito e Política, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v.6, n.2, 2º quadrimestre de 2011. Disponível em: www.univali.br/direitoepolitica - ISSN 1980-7791. 15 277 e, portanto, não é possível estabelecer o seu significado de maneira unilateral, sem haver um consenso entre os Estados-partes. Não existindo um entendimento comum, não é possível avançar na interpretação do dispositivo, e, dessa forma, não é cabível a responsabilização internacional de Elizabetia pelo artigo mencionado. Caso, porém, esta Corte entenda que a família deve ser estruturada por valores estabelecidos internacionalmente, deve reconhecer que esta instituição tem como pilar a moralidade coletiva, tendo em vista que é essencialmente cultural. Dessa forma, é necessário considerar que esses valores coletivos, tão fortes na nação de Elizabetia, não são cambiáveis instantaneamente, mas sim progressivamente no tempo. A Corte IDH já se pronunciou sobre a progressividade da garantia dos direitos econômicos, sociais e culturais 43. Segundo o Comitê de Direitos Econômicos Sociais e Culturais, o Estado tem o dever de adotar medidas positivas a fim de garantir o gozo pleno de todos esses direitos. Não é cabível, contudo, a sua eficácia imediata 44. Quanto às medidas positivas adotadas recentemente para a garantia dos direitos à comunidade LGBTI, o Estado ressalta que a proibição da discriminação pela orientação sexual foi expressamente prevista pela Constituição da República. Em 2007, foi aprovada a lei de Identidade de Gênero, que garante a possibilidade de alteração do nome e do sexo do registro civil. Em 2010, houve uma mudança legislativa reconhecendo a união de fato a casais homoafetivos. O Estado tem apresentado mudanças progressivas no sentido de garantir a efetivação dos direitos à comunidade LGBTI. Porém, como a cultura não pode ser alterada radicalmente de maneira instantânea, a legislação também não poder ser, ou perderia a sua 43 Corte IDH. Caso Cinco Pensionistas vs. Perú. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 28 de febrero de 2003. Serie C No. 98, § 147. 44 ONU. Doc. E/1991/23, Comité de Derechos Económicos, Sociales y Culturales de las Naciones Unidas, Observación General No. 3: La índole de las obligaciones de los Estados Partes (párrafo 1 del artículo 2 del Pacto), adoptada en el Quinto Período de Sesiones, 1990. 16 277 legitimidade e teria pouca ou nenhuma eficácia. Dessa forma, o artigo 17 da CADH, que prevê o direito do homem e da mulher constituírem uma família, mesmo que interpretado de maneira progressiva, não pode gerar a responsabilização internacional do Estado. Primeiro, porque não existe um consenso entre os países partes sobre a abrangência deste direito. Segundo, porque se trata de uma instituição cultural e, caso esta Corte estipule valores a serem seguidos internacionalmente, a sua implementação não poderia se dar de maneira imediata, já que a cultura não pode ser alterada instantaneamente. Destarte, no momento histórico atual, não é cabível a responsabilização internacional de Elizabetia quanto ao artigo 17. 2. DA OBSERVÂNCIA AOS ARTIGOS 2 E 24 EM RELAÇÃO AO ARTIGO 1.1 O artigo 24 da CADH, c/c com o artigo 1.1 estabelece, em vista do princípio da igualdade, a obrigação dos Estados de se absterem de oferecer aos indivíduos tratamento legal discriminatório. Já o artigo 2 da Convenção estabelece que os Estados-partes tem o dever de adotar as medidas legislativas a fim de efetivar os direitos e liberdades ali tutelados. Nesse sentido, a Corte IDH já teve oportunidade de declarar que “nem toda distinção de tratamento pode ser considerada ofensiva, por si só, da dignidade humana”. 45 Inicialmente, cumpre demonstrar que, à luz do artigo 2 da CADH, o Estado de Elizabetia tem feito o que lhe compete para progressivamente adequar sua legislação de forma a oferecer efetiva tutela jurídica e legal às pessoas quanto à sua orientação sexual, seja se abstendo de incorporar ao ordenamento legislação discriminatória, quanto agregando a ele normas protetivas desses direitos. Exemplo disso é o próprio texto constitucional, que proíbe qualquer tipo de 45 Corte IDH. Condición Jurídica y Derechos Humanos del Niño. Opinión Consultiva OC-17/02 del 28 de agosto de 2002. Serie A No. 17, §46; Corte IDH. Propuesta de Modificación a la Constitución Política de Costa Rica Relacionada con la Naturalización. Opinión Consultiva OC-4/84 del 19 de enero de 1984. Serie A No. 4, §56; Corte IDH. Restricciones a la Pena de Muerte (Arts. 4.2 y 4.4 Convención Americana sobre Derechos Humanos). Opinión Consultiva OC-3/83 del 8 de septiembre de 1983. Serie A No. 3, §89. 17 277 discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, a criação da Lei de Identidade de Gênero em 2007 e a alteração legislativa feita no ano de 2010, regulamentando a figura da União de Fato entre pessoas do mesmo sexo. Além disso, o Estado tem cumprido seu dever de abstenção ao não introduzir em seu ordenamento jurídico quaisquer normas de cunho discriminatório, pelo contrário, como já ressaltado, tem tomado providências a fim de incluir nele legislação referente à identidade de gênero e tutelando os relacionamentos homoafetivos. Em oportunidade anterior a Corte IDH já esclareceu que “o art. 24 da Convenção consagra o principio de igualdade perante a lei. Assim a proibição geral de discriminação estabelecida no art. 1.1 ‘se estende ao direito interno do Estados-partes, de tal maneira que é possível concluir que, com base nestes dispositivos, estes se comprometeram (…) a não introduzir em seu ordenamento jurídico regulamentações discriminatórias referentes a proteção da lei” 46 (grifo nosso). É necessário atentar para o fato de que as alterações sofridas na sociedade elizabetana, também visíveis no cenário mundial, no que tange à orientação sexual e identidade de gênero, podem ser consideradas ainda incipientes, na medida em que são modificações sucedidas a pouco tempo e, por isso, ainda não encontram posicionamento pacificado na doutrina ou na jurisprudência, seja no âmbito interno ou internacional. Desta forma, o mero fato de a Constituição Política de Elizabetia bem como de sua legislação ordinária serem anteriores às mencionadas mudanças sociais e, portanto, não contemplá-las, não pode ser por si só considerado como ato violatório de direitos humanos. Tampouco parece justa a exigência de que a legislação de um Estado seja automática e imediatamente alterada e conformada, sem que haja respeito às normas internas do processo 46 Corte IDH. Condición Jurídica y Derechos Humanos del Niño. Opinión Consultiva OC-17/02 . Op. cit.,§44. 18 277 legislativo. A ausência de norma prévia aos fatos apenas aponta a necessidade de criá-las, porém não pode ser interpretada como omissão dolosa. Em caso semelhante, o Tribunal da Relação de Lisboa já ressaltou que “uma coisa é a violação do princípio – o que não se verificou –, coisa diversa é o legislador ordinário não lançar mão do caminho que lhe foi deixado aberto” 47. Além disso, torna-se clara a falta de regulação e consenso, o fato de que o próprio direito internacional também oferece proteção e reconhecimento legislativo apenas aos casamentos entre pessoas de sexos distintos, como por exemplo, o faz a Declaração Universal dos Direitos Humanos ao dispor que “os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução” (art. 16.1), e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem que estabelece quanto ao direito ao casamento que “a partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de se casar e de constituir família, segundo as leis nacionais que regem o exercício deste direito” (art.12). É importante ter em mente que a legislação de Elizabetia acerca do casamento somente pode ser considerada discriminatória caso retirada de seu contexto histórico-social e da concepção de sua população de tal instituto. O Estado de Elizabetia concebe o casamento como instituição baseada em valores sociais, fundada no relacionamento entre homem e mulher, com o fim social de incentivo à perpetuação das gerações e por essa razão é um instituto que oferece específica tutela jurídica a casais de relacionamentos heterossexuais. Destaque-se que apesar disso, o Estado não se exime de oferecer proteção jurídica aos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo, regulando para elas, o instituto da União de Fato. A pesquisa de opinião realizada pelo governo em 2010 revela que esta concepção adotada 47 Tribunal da Relação de Lisboa, Processo 6284/2006-8. Julgado em 15/02/2007. (Consultado no sítio virtual de Bases Jurídico Documentais do Ministério da Justiça: http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc73231 6039802565fa00497eec/f2c9a606d4e2613180257296004e5975?OpenDocument&Highlight=0,6284%2F2006-8) 19 277 pelo Estado reflete o pensamento dos cidadãos e cidadãs elisabetanos, sendo que a maioria da população reconhece que o relacionamento homoafetivo merece tutela jurídica, porém, 76% dela entende que o casamento é instituto familiar reservado à relação entre homem e mulher. Esta também é o entendimento já adotado pelo Tribunal Constitucional de Portugal que assim se posicionou: “Como se afirmou anteriormente, saber se as normas impugnadas violam o princípio da igualdade é uma questão cuja resposta se encontra na concepção do casamento adoptada. Se se entender o casamento como uma instituição social que é apresentada aos cônjuges com um significado relativamente estável, enquanto união entre homem e mulher, designadamente assente na função que lhe cabe na reprodução da sociedade, pode fazer sentido reservar o casamento aos casais heterossexuais. Pelo contrário, apenas se se adoptasse uma concepção do casamento como relação puramente privada entre duas pessoas adultas, sem qualquer projeção na reprodução da sociedade, a exclusão dos casais homossexuais surgiria necessariamente como discriminatória. Ora, como se disse, não foi essa a opção legislativa.” 48 Pelo exposto, o Estado de Elizabetia reafirma sua posição de que tem zelado por observar atentamente ao princípio da igualdade perante a lei, da não discriminação, e demais dispositivos da Convenção Americana de Direitos Humanos. 3. DA OBSERVÂNCIA AOS ARTIGOS 8 E 25 EM RELAÇÃO AO ARTIGO 1.1 O acesso à justiça constitui norma imperativa de direito internacional (jus cogens) 49 com efeitos erga omnes e um dos institutos do Estado Democrático de Direito 50 pois se aplica a todos os âmbitos do procedimento interno. Conjuntamente, os arts. 8 e 25 c/c ao art. 1.1 da CADH 48 Tribunal Constitucional de Portugal, Acórdão n.º 359/2009. Processo n.º 779/07. Diário da República, 2.ª série N.º 214 - 04 de Novembro de 2009. 49 Corte IDH. Caso de La Masacre de Pueblo Bello v. Colombia.Sentencia de 31 de enero de 2006. Serie C No. 140. Voto do Juiz A. A. Cançado Trindade, §64. 50 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 15ª Edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2004, p. 97. 20 277 guardam em seu bojo a obrigação dos Estados-partes em garantir que qualquer pessoa tenha condições concretizar seu direito de acessar a justiça. Formam, assim, um núcleo indissociável51 cuja análise só é possível conjuntamente. 3.1 DA EFETIVIDADE DOS RECURSOS INTERNOS Os recursos judiciais (art.25) devem ser efetivos e receber tratamento processual em conformidade com as regras do devido processo legal (art.8.1) 52. Isso exige, então, que a lide seja submetida a exames sucessivos, por juízes diferentes 53, “como garantia de boa solução” 54. Além disso, o recurso deve ser idôneo, i. e., deve ser um instrumento processual “capaz de produzir resultados ou respostas às violações dos direitos contemplados na CADH” 55. Em face disso, o Estado tem obrigação de fornecer meios adequados para que os indivíduos possam aceder aos recursos internos 56. No presente caso, as Sras. Gallo e Timor apresentaram solicitação de autorização para contrair casamento à Secretaria Nacional de Família sob alegação de que o art. 9 da Constituição 51 Corte IDH. Caso Goiburú y otros Vs. Paraguay. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 22 de septiembre de 2006. Serie C No. 153, §110. 52 Corte IDH. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Excepciones Preliminares. Sentencia de 26 de junio de 1987. Serie C No. 1, §§90, 91 e 92. Corte IDH. Caso Fairén Garbi y Solís Corrales Vs. Honduras. Excepciones Preliminares. Sentencia de 26 de junio de 1987. Serie C No. 2, §90, 90 e 92. 53 Corte IDH. Caso Herrera Ulloa Vs. Costa Rica. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 2 de julio de 2004. Serie C No. 107, §158.158. 54 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v. 1. 51ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010, p. 572. 55 Corte IDH. Caso Baldeón García v. Perú. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentença de 6 de abril de 2006. Serie C No 147, §144; Corte IDH. Caso Yatama Vs. Nicaragua. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 23 de junio de 2005. Serie C No. 127, §169; Corte IDH. Caso Tibi Vs. Ecuador. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 7 de septiembre de 2004. Serie C No. 114, §135; Corte IDH. Caso Juan Humberto Sánchez Vs. Honduras. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 7 de junio de 2003. Serie C No. 99, §121; Corte IDH. Caso López Álvarez vs. Honduras. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia del 1 de febrero de 2006. Serie C No. 141, §137; Corte IDH. Caso 19 Comerciantes Vs. Colombia. Sentença de 5 de julho de 2004. Série C No. 109, §192; Corte IDH. Caso Las Palmeras Vs. Colombia. Fondo. Sentencia de 6 de diciembre de 2001. Serie C No. 90, §58; Corte IDH. Caso de la “Panel Blanca” vs. Guatemala. Fondo. Sentencia de 25 de enero de 1996. Serie C No 23, §164; Corte IDH. Caso Suárez Rosero Vs. Ecuador. Fondo. Sentencia de 12 de noviembre de 1997. Serie C No. 35, §61; Corte IDH. Caso Maritza Urrutia vs. Guatemala. Sentença de 27 de novembro de 2003. Serie C No103, §117. 56 CIDH. El acceso a la justicia como garantía de los derechos económicos, sociales y culturales. Estudio de los estandares fijados por el Sistema Interamericano de Derechos Humanos, OEA/Ser.L/V/II.129. Doc. 4, 7 septiembre 2007. 21 277 proíbe discriminação por razões de orientação sexual. Não obstante, o artigo que confere competência a esta Secretaria para autorizar este ato jurídico é o art. 396 do Código Civil, o qual também estipula quem é capaz para contrair casamento. É preciso frisar que a Secretaria em questão é órgão da Administração Pública, e como tal, deve agir conforme o princípio da legalidade. Esse princípio preceitua que a Administração Pública deve agir secundum legem, i.e., estritamente nos limites da lei 57. Nesse sentido, ao contrário do indivíduo que tem liberdade para fazer tudo que a lei não proíbe, a Administração Pública deve ater-se a fazer aquilo que a lei manda ou permite. 58 Assim, a autorização para contrair matrimônio é um ato vinculado ao disposto no art. 396 do Código Civil. A Secretaria está obrigada a denegar a autorização para contrair casamento a casos que não se enquadram nos critérios do art. 396 do CC. Por isso, esta decisão não tem caráter de ato arbitrário. Contra esta decisão, foi interposto recurso de nulidade – remédio idôneo contra ato administrativo ilegal. O 7º Tribunal Contencioso Administrativo, fundamentando-se em dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, entendeu que não houve ilegalidade no ato contestado e, em conseqüência, denegou o pedido. Inconformadas, as supostas vítimas interpuseram recurso de amparo, o qual se presta a reformar decisões judiciais manifestamente arbitrárias. A 3ª Vara de Família, que recebeu o recurso, entendeu pela não arbitrariedade da decisão do 7º Tribunal Contencioso Administrativo tendo em vista que foi fundamentada e, assim, denegou o recurso de amparo. Essa decisão foi confirmada posteriormente pelo Tribunal Colegiado de Causas Diversas. Todas as decisões, portanto, estiveram em conformidade com o devido processo legal, 57 MEIRELLES, Hely Lopes; AZEVEDO, Eurico de Andrade.; ALEIXO, Delcio Balestero.; BURLE FILHO, Jose Emmanuel. Direito administrativo brasileiro. 33. ed., atual. até a Emenda Constitucional 53,. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 67. 58 CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional didatico. Belo Horizonte: Del Rey, 1991, p.301. 22 277 por terem sido fundamentadas, prolatadas em conformidade com a competência de cada tribunal e dentro de prazos razoáveis. Cabe lembrar que a mera resposta jurisdicional negativa à pretensão das supostas vítimas não constitui por si só violação ao direito ao acesso à justiça 59, há que se verificar inobservância das regras do devido processo, o que não ocorre in casu. A partir do exposto, observa-se que as supostas vítimas buscavam, na realidade, a declaração de inconstitucionalidade do art. 396 do Código Civil. Não obstante, em Elizabetia, os tribunais em geral não têm competência para declarar leis inconstitucionais. Ou seja, não há controle difuso de constitucionalidade razão pela qual a única via judicial eficaz para resolver a pretensão das Sras. Gallo e Timor era a ação de inconstitucionalidade. Frise-se, essa ação pode ser proposta por qualquer cidadão à Câmara Constitucional da Corte Suprema de Justiça conforme art. 101 da Constituição. Além de ser este o meio formal idôneo para a consecução desse objetivo, materialmente, a jurisprudência recente da Câmara Constitucional é favorável a essa causa já que, em 2009, determinou a inconstitucionalidade da frase “entre um homem e uma mulher” do art. 406 do Código Civil que rege a união de fato. Sendo assim, os tribunais Contencioso Administrativo, de Família e o Colegiado de Causas Diversas prolataram decisões limitadas à matéria de sua competência, obedecendo às regras do devido processo legal, em conformidade com a jurisprudência desta e outras Cortes em relação à necessidade de que as causas sejam analisadas por tribunais competentes e independentes 60 e em respeito ao duplo grau de jurisdição 61. Resta comprovado, assim, que em momento algum, o Estado deixou de garantir às supostas vítimas o direito ao acesso à justiça em 59 Corte IDH. Caso Godínez Cruz Vs. Honduras. Fondo. Sentencia de 20 de enero de 1989. Serie C No. 5, §70. Corte IDH. Caso del Tribunal Constitucional Vs. Perú. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 31 de enero de 2001. Serie C No. 71, §75; ECHR. Case of Langborger vs. Sweden, Judgment of 27 January 1989, Series A no. 155, §32. ECHR. Case of Campbell and Fell vs. United Kingdom. Judgment of 28 June 1984, Series A no. 80, §78. 61 GOMES, Luiz Flávio. As Garantias Mínimas do Devido Processo Criminal nos Sistemas Jurídicos Brasileiro e Interamericano. In: O Sistema interamericano dle proteção dos Direitos Humanos e o Direito Brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 203. 60 23 277 sua completude. Portanto, não houve violação aos artigos 8 e 25 c/c ao art. 1.1 da CADH. C. DO NÃO CABIMENTO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS A CADH, pelo artigo 63.2, garante a competência da Corte em adotar medidas provisórias em casos específicos, desde que estejam presentes os requisitos de (i) extrema gravidade e urgência e (ii) necessidade de evitar danos irreparáveis às pessoas ante à violação ou ameaça à direito protegido pela Convenção. 62 Antes de analisar o requerimento da parte, faz-se necessário esclarecer os fatos que se relacionam à saúde da peticionária Adriana. Após sofrer a ruptura de um aneurisma cerebral, Adriana Timor encontra-se hospitalizada em estado estável. Segundo o neurologista responsável, existem dois tratamentos possíveis que atendem ao caso da paciente. O primeiro, trata-se de uma cirurgia intracraniana que, se bem sucedida, pode manter a integridade das faculdades mentais da paciente. Porém, é uma cirurgia de alto risco: estatisticamente apenas 15% daqueles que se submetem a ela sobrevivem. A segunda possibilidade é o monitoramento da situação. Neste caso, a taxa de sobrevivência é de 85%. Contudo, se houver apenas o monitoramento, as faculdades mentais da paciente estariam comprometidas. Como previsto em lei, casos em que o paciente não estiver em condições de declarar sua vontade, a decisão é tomada pelo cônjuge, parceiro da união de fato ou por membro da família. Se não for possível, o Conselho Médico Regional passa a ser o responsável pela decisão. Quanto à saúde da Adriana, todas as medidas necessárias já foram tomadas: o Estado garantiu o atendimento médico imediato à paciente quando a mesma chegou ao hospital, garantiu também o acompanhamento contínuo do caso pelo médico especialista e, neste momento, 62 Corte IDH. Caso "Instituto de Reeducación del Menor" Vs. Paraguay. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 2 de septiembre de 2004.Serie C No. 112, §108. 24 277 garante que a decisão a ser tomada será consciente dos riscos e efeitos dos tratamentos. Destarte, o direito à vida e à integridade pessoal da paciente encontram-se devidamente protegidos pelo Estado. Apesar desta proteção, Serafina requereu à Corte a aplicação de medida provisória a fim de tutelar o direito previsto pelo art. 17 da CADH, qual seja, o de contrair matrimônio com o fim de outorgar o consentimento informado no caso de Adriana. Ora, a tutela do art. 17 já está sendo analisado pelo procedimento ordinário e, considerando não haver gravidade, possibilidade de causar danos ou urgência para se casar, não é plausível o requerimento de medida provisória para tal fim. Vale ressaltar que, caso esta Corte assim decidir e tão logo seja proferida a decisão, Adriana e Serafina poderão se casar, independentemente do tratamento a que a paciente será submetida. De fato, a exigência estipulada pelo art. 63.2 de haver dano ante violação ou ameaça à direito, faz como o que, na prática, a maioria das medidas provisórias concedidas pela Corte objetivem a tutela do direito à vida e à integridade pessoal, 63como é possível perceber naquelas concedidas em favor de Alvarado Reyes no México 64,Alemân Lacayo na Nicarágua 65, Adrian Meléndez Quijano e outros em El Salvador 66 e nos casos 19 comerciantes vs. Colômbia67, Alvarez e outros vs. Colômbia 68, Bámaca Velásquez vs. Guatemala 69 e diversos outros. 63 GONZALEZ. F. As medidas de urgência no Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Sur- Revista Internacional de Direitos Humanos, São Paulo, SP,v.7, n. 13, p.51, dez. 2010. 64 Corte IDH. Assunto Alvarado Reyes. Medidas Provisórias, respeito de México. Resolução da Corte de 23 de novembro de 2012. 65 Corte IDH. Assunto Alemân Lacayo. Medidas Provisórias, respeito da Nicaragua. Resolução da Corte de 2 de fevereiro de 1996. 66 Corte IDH. Assunto Adrian Melêndez Quijano e outros. Medidas Provisórias respeito de El Salvador. Resolução da Corte de 2 de fevereiro de 2010. 67 Corte IDH. Caso 19 comerciantes. Medidas Provisórias respeito de Colômbia. Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 26 de junho de 2012. 68 Corte IDH. Caso Alvarez e outros. Medidas Provisórias respeito de Colômbia. Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 08 de fevereiro de 2008. 69 Corte IDH. Caso Bámaca Velasquez. Medidas Provisórias respeito de Guatemala. Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 29 de agosto de 1998. 25 277 Há casos, porém, em que a medida provisória fora concedida a outros direitos, como em AwasTingni em que se protegeu o território comunal indígena, ou em Herrera Ulloa vs. Costa Rica em que a liberdade de expressão fora tutelada. Naquele havia o risco dos indígenas se verem impossibilitados de usufruir da sua propriedade, posto que as atividades predatórias de terceiros poderiam degradar os recursos naturais inerentes ao território. Em Herrera Ulloa, por sua vez, se fez necessário suspender as publicações posto que as mesmas causariam um dano irreparável ao demandante. Percebe-se, nos casos em que a Medida Provisória foi outorgada a direitos outros, que não a vida e a integridade, a necessidade imediata de proteger o direito tutelado. Caso contrário, o território indígena perderia suas características essenciais ao modelo de vida Awas Tingi. Ou, no caso Herrera Ulloa, a imagem do demandante seria atingida de maneira irreparável. Este não é o caso desta demanda. O matrimônio entre Serafina e Adriana é objeto de mérito do determinado processo e não há urgência em antecipar tal decisão, posto que a constituição do matrimônio poderá se dar após a decisão final do caso, sem haver qualquer dano à alguém. Ademais, esta Corte já determinou que a Medida provisória, além do seu caráter tutelar, é também uma medida essencialmente cautelar 70. Ou seja, visa preservar uma situação jurídica. O casamento entre casais homoafetivos não é legalmente permitido em Elizabetia e, portanto, os peticionários não demandam a garantia imediata do exercício de um direito já estabelecido e garantido pelo Estado e pelo Sistema Interamericano de Direitos humanos, mas demandam a garantia de um direito controvertido, que necessita da sentença de mérito para ser exigível no país. Aí está a necessidade de analisar a possibilidade de casamento das peticionárias no mérito e não via medida provisória. Caso esta Corte reconheça a validade dos argumentos 70 Corte IDH. Caso 19 comerciantes. Medidas Provisórias respeito de Colômbia. Op cit.; Corte IDH. Assunto Alvarado Reyes. Medidas Provisórias, respeito de México. Op cit.,§3. 26 277 estatais, tal medida perderia o próprio sentido de existência. Considerando porém que Serafina tenha pedido a tutela do artigo 17 como o objetivo de se tornar apta a decidir por Adriana e, assim, proteger indiretamente a vida e integridade da paciente, o Estado reitera que tais direitos já estão sendo devidamente protegidos. Ademais, deve-se ter em vista que a requerente se relaciona com a paciente há apenas um ano.Dessa forma, o Estado considera prudente garantir que a decisão médica seja tomada por um corpo técnico, capaz de analisar o caso com mais profundidade e optar pelo tratamento mais adequado à saúde da paciente. Em detrimento disso, não é plausível conceder, por essa medida essencialmente provisória, o poder de uma decisão definitiva, irreversível, à Serafina, que pouco conhece da paciente e da ciência médica. Logo, na hipótese da Serafina ter requerido a tutela do art. 17 com o fim de garantir os direitos previstos pelos artigos 4 e 5 da CADH, é reconhecida a gravidade do caso de Adriana. Contudo, não há o que se falar em urgência e prevenção de danos ante a violação ou ameaça a direito, posto que as medidas cabíveis e necessárias aplicáveis ao caso já foram tomadas e, destarte, não há violação ou ameaça aos direitosà vida e à integridade. Por fim, faz-se necessário destacar que Serafina deseja casar-se imediatamente com Adriana, que se encontra hospitalizada, incapaz de declarar sua vontade de maneira autônoma. Considerando a necessidade do consentimento do casal para o casamento, este pedido é improcedente. O Estado não pode anuir com o matrimônio de ambas sendo que Adriana não poderá manifestar sua vontade. A partir do exposto, resta claro que a medida requerida é improcedente. Primeiro, pois a vida e a integridade da Adriana, considerando a gravidade da situação, estão garantidos. Segundo, tendo em vista a prudência do Estado em garantir a melhor decisão do tratamento 27 277 médico e, conseqüentemente, a desnecessidade de tutelar os artigos 4 e 5, não há que se falar em urgência em exercer o direito controvertido de constituir matrimônio. Ademais, o Estado, em respeito à autonomia privada da Adriana, não poderia suplantar a sua manifestação de vontade em relação ao casamento, sob pena de violar o art. 11.2 da CADH. D. DA NÃO CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DO ESTADO Além de fonte do princípio da não-discriminação, o art. 1.1 da CADH traz em seu bojo o dever dos Estados em garantir a toda pessoa o livre e pleno exercício os direitos e liberdades reconhecidos Convenção 71. Trata-se, em conseqüência, de amparo legal para a responsabilização dos Estados no âmbito do sistema interamericano 72. O Anteprojeto de Artigos em Responsabilidade Internacional 73 é amplamente aceito 74 como regra costumeira de Direito Internacional 75 e como tal deve guiar esta Corte na interpretação do art. 1.1. Este documento, em seu art. 2.b, estabelece quando resta configurada a responsabilidade internacional do Estado. Segundo o referido artigo, o descumprimento de uma obrigação internacional por meio de ação ou omissão que seja atribuível ao Estado, inclusive nos casos em que falte com a devida diligência 76, gera responsabilidade internacional. No caso sub judice, restou demonstrado que o Estado de Elizabetia, não obstante as 71 PASQUALUCCI, Jo M. The application of International Principles of State Responsibility by the Inter-American Court of Human Rights. In: Liber Amicorum Antônio A. Cançado Trindade. Secretaría de la Corte Interamericana de Derechos Humanos: Costa Rica, 2005, p.1213 72 RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade Internacional de Direitos Humanos. 1ª edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 107 73 ONU. Draft Articles on State Responsibility for Internationally Wrongful Acts with commentaries, extract from the Report of the International Law Commission on the work of its Fifty-third session, Official Records of the General Assembly, Fifty-sixth session(2001), Supplement No. 10 (A/56/10), chp.IV.E.1, art. 1. p. 32-34. 74 ICJ. Case Concerning the Application of the Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of Genocide ( Bosnia and Herzegovina v. Serbia and Montenegro). Merits, ICJ Rep 2007, §385. Corte IDH. Caso Ximenes Lopes vs. Brasil. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 4 de julio de 2006. Serie C No. 149, §86. MOWBRAY, Alistair. Cases and materials on the European Convention on Human Rights.New York, OUP, 2007. 75 BROWNLIE, Ian. Principles of Public International Law, 6ª Ed. Oxford: Oxford University Press, 2003, p. 5; DIHN, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain. Direito Internacional Público. Op. cit.. p. 912; 76 ICJ. Corfu Channel (United Kingdom v. Albania). Merits, ICJ Rep. 1949, §54. 28 277 adversidades da compatibilização de interesses em um ambiente democrático, vem, de maneira progressiva, implementando medidas cujo objetivo que visam a efetivar os direitos das pessoas homossexuais e transgêneras na sua plenitude. Medidas essas consonantes com os preceitos da CADH e com toda normativa internacional na matéria. Nesse sentido, todas as ações estatais relatadas nos fatos que resultaram em restrição de direitos das supostas vítimas ocorreram em estrita obediência aos limites impostos pela CADH. Quanto às supostas omissões, as autoridades estatais agiram no limite da competência conferida pela legislação interna, a qual, cabe ressaltar, vem sofrendo modificações constantes. Assim, no mesmo sentido não há que se falar em omissão na adequação da legislação interna à CADH tendo em vista que há um movimento estatal no sentido de alteração das leis. Desconsiderar este fato é desconsiderar todo o avanço alcançado nos últimos tempos em relação a essa matéria pelo Estado de Elizabetia. É mister, portanto, que esta Corte reconheça que o Estado, em tempo algum, violou os direitos da Sra. Serafina Conejo Gallo e da Sra. Adriana Timor, nem por ação, nem por omissão e julgue improcedente a presente demanda. E. DA IMPUGNAÇÃO DOS PEDIDOS DE REPARAÇÃO Caso se declare a responsabilidade internacional do Estado, pelo princípio da eventualidade, cabe impugnar os pedidos reparatórios da parte demandante. O Estado deve, no máximo, ser instado a cumprir reparações simbólicas, tendo em vista que algumas questões suscitadas pelos peticionários já se encontram em curso, considerando que o processo legislativo é uma atividade constante e amplamente influenciada pelas mudanças sociais. O Estado ressalta, ainda, que a sentença condenatória, per se, já constitui um meio eficaz de reparação. 77 77 ECHR. Case of Boner v. United Kingdom. Judgment of 28 October 1994, series A No. 300-B, §46; ECHR. Case of Darby v. Sweden. Judgment of 23 October 1990, series A No. 187, §40. ECHR. Case of Ruiz Torija v. Spain. 29 277 III. SOLICITAÇÃO DE ASSISTÊNCIA A República de Elizabetia vem, respeitosamente, solicitar a esta Corte que julgue improcedente o pedido inicial dos representantes das supostas vítimas em razão da não violação dos artigos 2, 8, 11, 17, 24 e 25 todos em correlação ao art. 1.1 da CADH e insta pelo indeferimento dos pedidos de adoção de medidas provisórias e de reparação apresentados pela parte contrária. Judgment of 9 December 1994. Series A No. 303-A, §33; Corte IDH. Caso Cantoral Benavides Vs. Perú. Op. cit., §24; Corte IDH. Caso de la Comunidad Mayagna (Sumo) Awas Tingni Vs. Nicaragua. Op. cit., §166; Corte IDH. Caso Cesti Hurtado Vs. Perú. Reparaciones y Costas. Sentencia de 31 de mayo de 2001. Serie C No. 78, §51; Corte IDH. Caso de la “Panel Blanca" (Paniagua Morales y otros) Vs. Guatemala. 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