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44 MERCADO
Projeções e expectativas
Percentual de mistura de anidro na gasolina cai, mas mercado de etanol ainda segue
pressionado, com preços elevados e sem perspectiva de solução no curto prazo
Por Natália Fernandes
Paulo Pereira
A redução de 25% para
20% do percentual de anidro
na gasolina trouxe certo alívio
para o mercado e deve ajudar a
minimizar as pressões sobre os
preços especialmente durante
a entressafra que se aproxima.
Mas não quer dizer que passaremos por esse período sem
sobressaltos. De acordo com
dados do Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA-15),
divulgados recentemente pelo
Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), o preço do
etanol subiu 1,17% em outubro,
acumulando alta de 16,30% em
2011. O combustível aumentou em
oito das onze capitais analisadas
pelo Instituto no mês passado.
Já a gasolina, teve alta de 0,11%
no mês e acumulou elevação de
7,01% no ano.
“A redução no percentual
de etanol anidro adicionado à
gasolina tem como objetivo reduzir a pressão que este produto
exerce na oferta de gasolina C.
20 • Combustíveis & Conveniência
Por outro lado, isso provoca
também a necessidade de aumento de gasolina produzida
pelas refinarias, para suprir
esse volume adicional de cinco
pontos percentuais. Aos poucos,
a oferta vem se equilibrando. No
que diz respeito ao etanol anidro,
de certa forma, observamos a
redução no ritmo de subida dos
preços, o que indica que a medida foi adequada”, diz Ricardo
Menezes, diretor institucional do
Brasilcom.
Menezes ressalta, no entanto,
que a solução para a questão da
oferta de etanol vai bem além
da diminuição de anidro na
gasolia. “Isso implica ampliar a
área de cana plantada - medida
que depende do efetivo plantio
e maturação dos canaviais, o
que leva tempo - e assegurar
junto aos produtores volumes
mínimos a serem destinados ao
mercado”, diz. De acordo com
pesquisa divulgada pela União
da Indústria de Cana-de-açúcar
(Unica), o volume de cana-deaçúcar processado pelas unidades produtoras da
região Centro-Sul
do país, até 1º de
outubro, totalizou
411,99 milhões de
toneladas. O número
representa queda de
7,39% em relação ao
total observado em
igual período da safra
passada. Uma notícia
nada animadora.
Além da redução do anidro, o
governo tem buscado outras formas
de conter a crise, como mostra a
decisão de passar ao controle da
ANP a produção e comercialização do etanol. Um dos objetivos
é exigir mais comprometimento
dos produtores e distribuidores
de etanol na formação de estoques, visando evitar escassez de
produto e fortes oscilações nos
preços, como temos visto nos
últimos dois anos. Estima-se que
R$ 2 bilhões (crédito) sejam oferecidos pelo governo para financiar
os estoques pelas usinas.
“Hoje vemos os anúncios de
pacote beneficiando a produção
de etanol. No entanto, temos que
aguardar as medidas. O próprio
ministro de Minas e Energia já
anunciou isso, mas ainda não
há nada definido”, diz Alísio Vaz,
presidente do Sindicom. Ricardo
Menezes, do Brasilcom, chama a
atenção para um comportamento
atípico. “Sabe-se que os estoques de passagem entre esta e
a próxima safra serão novamente
baixos. Algumas empresas já
estão efetuando a importação
do produto como forma de se
prevenir e assegurar suprimento.
O irônico é que até bem pouco
tempo o Brasil buscava romper
barreiras para a exportação e, hoje,
tem problemas de abastecimento
interno. Enquanto isso, superamos
volumes históricos de exportação
de etanol”, afirma Menezes.
De acordo com os dados do
Centro de Estudos Avançados em
Economia Aplicada (Cepea/EsalqUSP), de 17 a 21 de outubro, o
indicador do hidratado (estado
de São Paulo) aumentou pouco
mais de 1% sobre a semana
anterior e chegou a R$ 1,2322/
litro (preço a retirar na usina,
sem impostos). Já o indicador de
anidro baixou 0,1%, no mesmo
período, indo para R$ 1,3822/
litro (preço de retirada na usina,
sem impostos). “O índice Esalq
tem se mantido como uma referência de mercado, ainda mais
depois que passou a apresentar
indicadores estaduais. Isso não
significa que os preços sejam
equivalentes, pois fatores como
condição de pagamento, frete
etc. também influenciam na
formação dos preços a cada
cliente, mas as oscilações de
preço têm sido, em geral, semelhantes”, explica Ricardo
Menezes, do Brasilcom.
E o IPI?
O aumento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI)
sobre veículos importados também causou polêmica recentemente.
Disputas entre as montadoras à parte, é importante lembrar que
os carros importados não são flex fuel, ou seja, rodam apenas
com gasolina.
A previsão da Empresa de Pesquisa Energética é de que, em
2020, 80% dos carros sejam flex, ante os 49% atuais. E como
será o impacto no mercado de combustíveis? De acordo com
Leonardo Rezende, pesquisador do departamento de economia
da PUC-Rio, o comportamento do carro importado é, de fato, um
fator importante.
“Como os carros importados tendem a funcionar somente com
gasolina, há um estímulo (com o novo IPI) para que o consumidor
migre para o carro flex”, diz. Rezende coordenou um estudo e
analisou como esse novo cenário influenciou os preços da gasolina
e do etanol. “Quando há aumento do número de carros flex, há
uma queda no preço dos combustíveis. Em alguns municípios
do Rio de Janeiro, por exemplo, quando temos uma estimativa
de aumento da frota de flex em 10%, há uma queda de R$ 0,08
no valor do etanol e de R$ 0,02 a R$ 0,04 no valor da gasolina”,
diz. Ou seja, esse tipo de tecnologia possibilitou muito mais que
o poder de escolha do consumidor.
Cide, um novo capítulo
Em paralelo à redução do
anidro na gasolina, o governo decidiu diminuir, também, a alíquota
da Contribuição de Intervenção
no Domínio Econômico (Cide),
para neutralizar um possível
aumento do preço da gasolina
para o consumidor. Há quem
diga que essa iniciativa seja uma
forma de beneficiar a Petrobras,
que aumentará as importações
de gasolina, agora mais caras
por conta do dólar. “A redução
da Cide teve como objetivo estabilizar os preços de gasolina
C, mantendo-os em um mesmo
patamar, pois com a mudança no
percentual de gasolina A, caso
isso não fosse feito, levaria a um
reajuste no preço da gasolina
C. Não entendemos que isso
venha a impactar a importação
do produto”, acredita Ricardo
Menezes, do Brasilcom.
Mais que o dobro do preço
Essa é a previsão nada animadora de um estudo da consultoria Ernst & Young Terco em parceria com a Fundação Getúlio
Vargas para o valor do etanol no mercado internacional até 2020.
A pesquisa faz parte da série “Brasil Sustentável” e também
apresenta o lançamento do Centro de Inteligência de Petróleo e
Gás da E&Y no Brasil. De acordo com o estudo, o petróleo será
cada vez mais substituído por combustíveis alternativos, como o
etanol, mas os preços não acompanharão o rápido crescimento
da demanda.
Por isso, o preço médio real do barril equivalente deverá subir
entre 99% e 154%, alcançando de US$ 292 a US$ 374. Como
no Brasil o valor do etanol está diretamente ligado às variações
de preços da gasolina, em 2020, o combustível pode atingir um
preço de R$ 1,37 a R$ 2,03/litro, o que representa uma queda
de 13% e, ao mesmo tempo, um aumento de 29% em relação
ao patamar atual. O estudo foi baseado em um modelo computacional dos mercados de energia e suas interações. Com isso,
foi possível projetar os preços a longo prazo, com base em um
conjunto de fatores, que vão desde fatores físicos a questões
político-institucionais da oferta e da demanda. n
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