Policy Brief Espionagem - Brasil Global
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Policy Brief Espionagem - Brasil Global
BRASIL GLOBAL – POLICY BRIEF Espionagem, e agora? O caso da Espionagem Estadunidense no Brasil Autora: Louise Marie Hurel Coordenação: Layla Dawood Colaboração: Equipe Brasil Global Edward Snowden. Nome um tanto quanto comentado nos últimos meses. Nome este que, em situações pontuais vem se revelando crucial para a compreensão da extensão das atividades de espionagem estadunidense. Evidente que a fonte não se respalda em um só elemento, e muito menos em uma só pessoa. Contudo, além das informações repassadas para o site Wikileaks, ele é acusado de ter liberado documentos/dados da Agência de Segurança Nacional (NSA) referentes ao Brasil. Pode-se definir espionagem como uma ferramenta encoberta, entretanto muito utilizada, para se obter informações a respeito de algo ou alguém. Tanto no âmbito estatal, quanto no regional, seja em tempos de guerra ou em momentos menos turbulentos, a espionagem e a aquisição de informação (inteligência) tem um proposito, uma utilidade e uma validade (KEEGAN, 2006) 1 . Imbuído de uma certa fragilidade e incerteza, a espionagem é expressa, no caso Brasil-EUA, pelo o desejo de obter certas informações a respeito do papel do Brasil em cenários futuros. Tendo em mente o conceito de espionagem, é de igual importância mencionar as consequências advindas do desenvolvimento tecnológico dentro desse meio. Dando um foco maior à questão da comunicação, os canais utilizados para a mesma tem se transformado de forma rápida. A implicação dessa transformação se evidencia na espionagem, pois muita das vezes pode facilitar o rastreamento e aquisição de informações sem muito alarde. A comunicação passou de e-mails para programas de mensagem instantânea e SMS. Um dos pontos a serem levados em consideração seria a melhoria, por parte do governo brasileiro, em arquivar e rastrear as 1 KEEGAN, John.; Inteligência na Guerra: Conhecimento do Inimigo, de Napoleão à AlQaeda. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. BRASIL GLOBAL – POLICY BRIEF Espionagem, e agora? O caso da Espionagem Estadunidense no Brasil mensagens entre políticos. Dessa forma buscando proteger a privacidade e sigilo das informações trocadas entre eles2. No dia 1o de setembro, uma entrevista do programa Fantástico revelou, através do jornalista Glenn Greenwald – que havia recebido documentos e informações sigilosas a respeito desse acontecimento de Snowden – uma apresentação investigativa da NSA realizada em junho de 2012 com o seguinte titulo: Filtragem inteligente de dados: estudo de caso México e Brasil. Constatou-se, dentro desse viés investigativo, que a agencia havia obtido informações resultantes do monitoramento de ligações, e-mails e o endereço IP (utilizado como numero identificador de rede do computador) da presidente Dilma Rousseff . O objetivo da apresentação era de aumentar o nível de compreensão em relação aos meios de comunicação entre a Dilma e os seus assessores. Todavia, esse documento foi apenas um dentre muitos outros. Outra apresentação focada em desafios e tendências geopolíticas de 2014 à 2019 enquadra o Brasil dentro de riscos para a estabilidade regional, bem como o destaca como tendo um posicionamento duvidoso ( intitulado: Friends, Enemies or Problem?)3. Possuindo, então, um quadro geral do que possivelmente vem a ser o caso da espionagem estadunidense no Brasil, compreende-se também o aspecto dúbio dessa relação. O que fazer? Como lidar? São perguntas constantes e inerentes as conversas entre Brasil e os EUA. Esta relação, que em algum grau foi abalada em termos de confiança, se vê em um momento crucial. Nesta ocasião, cada Estado vem com diversas propostas para reestabelecer o mínimo de confiança, ou melhor, de previsibilidade sobre o comportamento do outro Estado*. Não se sabe exatamente qual era o objetivo principal para que estas investigações fossem feitas e também não ha números concretos sobre a quantidade de e-mails e telefones que foram 2 RODRIGUES, Fernando. Espionagem e História, Folha de São Paulo, 4 set. 2013. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/fernandorodrigues/2013/09/1336595espionagem-e-historia.shtml>. Acesso em: 4 nov. 2013 3 BRIDI, Sonia. Documentos Revelam que Dilma foi Alvo de Espionagem Americana, G1 Globo, 2 set. 2013. Disponível em: <http://g1.globo.com/bom-diabrasil/noticia/2013/09/documentos-revelam-que-dilma-foi-alvo-de-espionagemamericana.html>. Acesso em: 22 set. 2013. BRASIL GLOBAL – POLICY BRIEF Espionagem, e agora? O caso da Espionagem Estadunidense no Brasil alvos dessa missão4. De fato o impacto da brecha de informação da agencia estadunidense tomou outras proporções. Diversos jornais internacionais, tais como BBC, CNN e Reuters escreveram, e continuam escrevendo acerca do desenvolvimento das conversas entre o Brasil e os EUA. Este caso abarca alguns tópicos tais como privacidade, direito internacional, soberania, espaço cibernético, inteligência e inevitavelmente, espionagem. É provável que assuntos abordando tópicos como estes entrem em pauta nos próximos discursos proferidos por representantes brasileiros. Dilma, por sua vez, ergue esta bandeira e faz questão de reforçar a necessidade de novas medidas para lidar com os limites da espionagem na abertura da 68a reunião da Assembleia Geral da ONU5. Quero trazer à consideração das delegações uma questão a qual atribuo a maior relevância e gravidade. Recentes revelações sobre as atividades de uma rede global de espionagem eletrônica provocaram indignação e repúdio em amplos setores da opinião pública mundial6. Mesmo após ter cancelado o seu encontro com Obama em meados de outubro, Dilma traz à tona o “direito de explicação”. Exigência de uma explicação, um pedido oficial de desculpas e o consolidação de uma garantia para que procedimentos como os tomados pela NSA não se repitam. Medidas bilaterais são insuficientes, “a ONU deverá desempenhar um papel de liderança no esforço de regular o comportamento dos Estados frente [...] a construção da democracia no mundo”. Repudiando qualquer iniciativa que tenha em sua origem o desejo da aquisição de informações sigilosas, o discurso reforça medidas que possam abordar multilateralmente questões como estas (SOUZA, 2013)7. 4 BBC, Brazil Asks US to Explain Internet Surveillance, 8 jul. 2013. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-latin-america-23222172>. Acesso em: 22 set. 2013. 5 MENDES, Priscilla. Dilma Cancela Envio de Equipe que Prepararia sua Viagem aos EUA. G1 Globo, Brasília, 5 set. 2013. Disponível em: <http://g1.globo.com/politica/noticia/2013/09/dilma-cancela-envio-de-equipe-que-preparariasua-viagem-aos-eua.html>. Acesso em: 22 set. 2013. 6 SOUZA, Beatriz. Veja a Íntegra do Discurso de Dilma Rousseff na ONU, EXAME, 24 set. 2013. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/brasil/politica/noticias/veja-a-integra-dodiscurso-de-dilma-rousseff-na-onu?page=1>. Acesso em: 24 set. 2013. 7 SOUZA, Beatriz. Veja a Íntegra do Discurso de Dilma Rousseff na ONU, EXAME, 24 set. 2013. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/brasil/politica/noticias/veja-a-integra-dodiscurso-de-dilma-rousseff-na-onu?page=1>. Acesso em: 24 set. 2013. BRASIL GLOBAL – POLICY BRIEF Espionagem, e agora? O caso da Espionagem Estadunidense no Brasil Sem barreiras, a internet e os meios de comunicação formam uma teia, constroem a interconectividade entre países, entre regiões, entre pessoas. A grande questão, porém, possivelmente repousa sobre o interesse. A agência de inteligência americana NSA não obteve somente acesso a dados pessoais de cidadãos, mas também a informações de empresas. Como apontado, informações como estas possuem “alto valor econômico e mesmo estratégico”. O posicionamento do governo brasileiro não passou desapercebido, e consequentemente, acabou levantando maiores questões sobre o que deveria ser feito, e qual deveria ter sido o posicionamento inicial do país. O Brasil não era o único alvo da espionagem promovida pela NSA. Contavam também com informações privilegiadas governamentais e corporativas da Alemanha, União Europeia, México, Índia e Turquia. Todavia, o Brasil singularmente ergueu sua voz em meio a essa questão. Muitos vêem essa situação como um possível resquício de um sentimento paternalista entre os EUA e o Brasil. Retratam a América Latina como um quintal dos EUA e formam um elo forte entre os EUA e a necessidade de responder e dar atenção às demandas dos países dentro dessa região. De fato, alguns analistas são mais adeptos dessa visão, especialmente uma vez que se tem em vista que outros países teriam consideráveis razões para argumentar contra a espionagem, porém preferiram lidar com essas questões de forma mais discreta8. Partindo da visão estadunidense, Barack Obama procurou clarificar em seu discurso (logo após o de Dilma) na Assembléia Geral da ONU, que estarão reavaliando os métodos utilizados até então para coletar informações. Afinal, o objetivo traçado pelos EUA era visto como um estudo de forma a combater as possíveis correntes terroristas, tendo em vista a 8 SABATINI, Chistopher. Own Goal, Foreign Policy, 18 set. 2013. Disponível em:<http://www.foreignpolicy.com/articles/2013/09/18/own_goal_brazil_nsa_dilma_rousseff>. Acesso em: 6 out. 2013. BRASIL GLOBAL – POLICY BRIEF Espionagem, e agora? O caso da Espionagem Estadunidense no Brasil gradual queda que o país vem enfrentando. Contudo, procurou focar, grande parte do tempo remanescente em assuntos ligados à situação na Síria9. As ações promovidas pela NSA gradualmente vêm se revelando não só no caso do Brasil, mas em diversos outros países. Críticas, repressões e novas formas de pensar contraespionagem vêm ocupando o atual cenário. Mais recentemente, a França (outro país que também foi espionado pela NSA) também buscou alguma justificativa que explicasse a utilização de táticas de espionagem para obtenção de informações sigilosas tanto do governo, quanto de redes telefônicas. Todavia, a noticia não soou como uma surpresa para o governo, que já investigava o caso desde julho de 2012. De acordo com Louis Caprioli 10 Espionar, mesmo seus amigos, faz parte da natureza das coisas. O objetivo é ter informações sobre os países mais importantes do mundo 11 . Por mais que essa revelação tenha sido parcialmente reveladora, o governo francês procura não só manter a conversa e o esclarecimento com o secretario de Estado John Kerry, bem como debater outras formas de combater e prevenir a extensão da espionagem. Olhando por uma outra perspectiva, ao observar o posicionamento indiano (seja por meio do governo ou de jornais), país que também foi um dos diversos alvos da espionagem juntamente com o Brasil, é possível depreender uma resposta diferente. A opinião indiana se divide em certa forma. Enquanto alguns jornalistas, como Siddharth Varadajaran, apontam a necessidade de uma manifestação mais enérgica (colocar como prioridade no discurso do governo), outros, tais como o ex-diplomata Gopalapuram Parthasarathy afirmam que todos espiam em todos. Alguns tem mecanismos mais eficientes. Se nós tivéssemos os seus mecanismos, é provável que 9 LYNCH, Colum; McCORMICK, Ty. Obama to World: Bad News. The American Empire Is Dead. Foreign Policy, 24 set. 2013. Disponível em: <http://thecable.foreignpolicy.com/posts/2013/09/24/obama_to_world_bad_news_the_americ an_empire_is_dead>. Acesso em: 6 out. 2013. 10 Ex-subdiretor da divisão responsável pela luta antiterrorista na França. 11 FERNANDES, Daniela. França se diz chocada com alcance de espionagem dos EUA. BBC Brasil, 21 out. 2013. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/10/131021_franca_nsa_df.shtml>. Acesso em: 4 nov. 2013. BRASIL GLOBAL – POLICY BRIEF Espionagem, e agora? O caso da Espionagem Estadunidense no Brasil faríamos o mesmo. 12 O relacionamento EUA-India é bom e estável, e se eles acham que a Índia merece tal atenção, bom para nós13. Firme, constante, e determinado. Palavras como estas podem representar, de alguma forma, o objetivo do discurso brasileiro. Como abordar o crescimento da tecnologia da informação? Seria possível determinar limites/barreiras para o uso da espionagem? Instrumento esse, comumente usado porem não revelado. Algumas dessas questões são abordadas pelo cientista politico Marco Aurélio Cepik na seguinte frase: “No plano internacional, no contexto anárquico das relações entre os países, não há limites estabelecidos. Os limites são geralmente dados pela capacidade que cada Estado tem de conduzir suas atividades de inteligência e de contrainteligência, ou seja, pela necessidade de neutralizar as operações de inteligência dos demais países”14. Uma cortina, atividade flutuante, elemento ambíguo. A espionagem no Brasil simboliza um dos diversos casos que podem vir a acontecer, e até em maiores proporções com outros Estados. O desafio esta lançado, e cabe a aos Estados que vem enfrentando, ou que possam vir a enfrentar situações como estas, a responder. A questão, não é necessariamente o que irá acontecer, mas sim a reflexão se a espionagem deixou de existir algum dia. 12 "Everybody spies on everyone else. Some just have better gadgets. If we had their facilities, I'm sure we would do it too. The US-Indian relationship is good and stable and if they feel India merits so much attention then good for us," (Gopalapuram Parthasarathy)(BURKE, 2013). 13 BURKE, Jason. NSA Spied on Indian Embassy and UN Mission, Edward Snowden Files Reveal. The Guardian, 25 set. 2013. Disponível em: <http://www.theguardian.com/world/2013/sep/25/nsa-surveillance-indian-embassy-unmission>. Acesso em: 6 out. 2013. 14 GUIMARÃES, Bruno Gomes. Entrevista com o Prof. Marco Cepik Sobre Espionagem. ISAPE Blog, 25 out. 2013. Disponível em: <http://isape.wordpress.com/2013/10/25/entrevista-com-o-prof-marco-cepik-sobreespionagem/>. Acesso em: 26 out. 2013.
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