Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos
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Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra Grupo de Estudos Monetários e Financeiros (GEMF) Av. Dias da Silva, 165 – 3004-512 COIMBRA, PORTUGAL http://www2.fe.uc.pt/~gemf/ - [email protected] CARLOS MANUEL GONÇALVES CARREIRA ECONOMIAS DE ESCALA E DE GAMA NOS HOSPITAIS PÚBLICOS PORTUGUESES: UMA APLICAÇÃO DA FUNÇÃO DE CUSTO VARIÁVEL TRANSLOG ESTUDOS DO GEMF N.º 1 1999 PUBLICAÇÃO CO-FINANCIADA PELA FUNDAÇÃO PARA A CIÊNCIA E TECNOLOGIA Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira ECONOMIAS DE ESCALA E DE GAMA NOS HOSPITAIS PÚBLICOS PORTUGUESES: UMA APLICAÇÃO DA FUNÇÃO DE CUSTO VARIÁVEL TRANSLOG ∗ de Carlos M. G. Carreira Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra Resumo: Nas últimas décadas, em Portugal, as despesas com a saúde em geral e os custos hospitalares em particular, não têm parado de crescer. Neste trabalho estimámos a função de custo variável translog para os hospitais públicos portugueses, utilizando dados em painel de 82 hospitais, para o período de 1991-95. A análise da função revela que os hospitais públicos estão a operar na zona de economias de escala crescentes no curto prazo e decrescentes no longo prazo. O estudo da elasticidade do custo variável em relação ao factor dimensão, permite-nos verificar que os hospitais não estão localizados na dimensão óptima de longo prazo, devendo proceder ao seu incremento, para poderem aumentar as economias de escala. A redução do número de dias de internamento e o aumento dos serviços de urgências e consultas traduzir-seiam em ganhos. Os hospitais têm poupanças substanciais de custos ao produzirem conjuntamente os seus serviços. Classificação JEL: I1, L23, L31 e L8. Palavras chave: custos hospitalares, economias de escala, economias de gama, empresas multiproduto, função de custo translog. Endereço para correspondência: Carlos Carreira Faculdade de Economia da UC Av. Dias da Silva, 165 3004-512 Coimbra Tel.: 351-39-790545; Fax: 351-39-403511 E-mail: [email protected] ∗ O autor agradece o estímulo, os comentários e as sugestões do Doutor Paulino Teixeira, e as sugestões econométricas do Dr. Pedro Bação. G.E.M.F. – F.E.U.C. 1 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira 1.Introdução Desde o início da década de setenta que as despesas com a saúde não têm parado de crescer nos países da OCDE, em particular os custos hospitalares. O peso da despesa pública e privada com a saúde no PIB, entre 1975 e 1995, passou de 6,2% para 8,1%, nos países da OCDE, e de 5,6% para 8,2%, em Portugal, o que corresponde a um crescimento de 31% e 46%, respectivamente. Os recursos públicos despendidos com a saúde, em percentagem do PIB, nos países da OCDE, representavam em 1975 e 1996, 4,8% e 5,5%, respectivamente, e em Portugal, 3,3% e 4,9% (OCDE, 1998). O crescimento das despesas com os hospitais foi ainda mais acentuado. Em Portugal, os gastos com os hospitais, em percentagem do PIB, passaram de 1,7%, em 1985, para 2,6%, em 1995, o que representa um crescimento de 53%. No entanto, esta percentagem é inferior à média dos países da OCDE: 3,5%, em 1995 (OCDE, 1998). Em 1991, as despesas com os hospitais públicos, representavam 49% do total das despesas do Serviço Nacional de Saúde (SNS), passando para 53%, em 1995. Este crescimento sistemático das despesas com a saúde e hospitais desviou a atenção dos analistas da necessidade de captação de recursos para o sector, para a centrar na questão da sua afectação eficiente. Por isso, nestas últimas três décadas, temse assistido a um crescente interesse pelo estudo da produção e custos dos hospitais. O sector da saúde em Portugal destaca-se pela sua baixa eficácia relativa (OCDE, 1998, p. 59). Com as obrigações orçamentais assumidas no âmbito da União Económica e Monetária e com o aumento da carga fiscal no PIB verificada durante os últimos anos, Portugal necessita de tomar medidas discricionárias ao nível da despesa corrente primária. Isso implica efectuar reformas fundamentais e difíceis na área da saúde. Nos últimos anos, Portugal tem alterado substancialmente a sua rede hospitalar pública, substituindo as antigas unidades por novas e de maior dimensão, mas também G.E.M.F. – F.E.U.C. 2 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira criando alguns novos hospitais de raiz. Esta política de renovação da rede hospitalar tem uma maior incidência a nível distrital, portanto, nos hospitais de média dimensão. Na procura da melhoria da eficiência dos nossos hospitais, coloca-se a questão de saber se o decisor político deverá optar por uma política de construção de uma rede nacional de pequenos hospitais, dispersos regionalmente, ou por uma política de grandes hospitais, em muito menor número e com áreas de influência muito mais alargadas. Outra questão é de saber se se deveria optar por uma rede hospitalar mais especializada (por exemplo, hospitais de serviços de urgências) ou por hospitais com grande diversificação de serviços. Muitos países europeus, ao contrário de Portugal, têm seguido uma política de redução do número de camas e de encerramento de hospitais (Abel-Smith, 1996). O facto de Portugal dispor de apenas de 4,3 camas por 1000 habitantes, em 1995, muito inferior ao índice apresentado pelos outros países europeus, pode justificar esta diferença de políticas. Com o presente estudo, pretendemos encontrar respostas para algumas destas questões. Numa primeira parte, iremos justificar a metodologia adoptada para estudar as relações de custo de produção dos serviços hospitalares. No seguimento do trabalho de Caves et al. (1980) sobre as formas funcionais flexíveis de funções de custo, iremos utilizar a função de custo multiproduto transcendental logarítmica (translog). A escolha das variáveis, para além das considerações teóricas, foi sujeita à disponibilidade de dados que os Relatórios e Contas do SNS nos oferecem. Na especificação da função de custo, optámos por uma função de custo variável em que existe a influência de um factor fixo de dimensão. G.E.M.F. – F.E.U.C. 3 Carlos Carreira Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Numa segunda parte, após a estimação da função de custo, utilizando dados em painel de 82 hospitais, para o período de 1991-95, analisaremos os indicadores de economias de escala e de gama. Os resultados alcançados indicam que os hospitais estão a operar na zona de economias de escala crescentes no curto prazo e decrescentes no longo prazo. A redução do número de dias de internamento e o aumento dos serviços de urgências e consultas traduzir-se-iam em ganhos. Os hospitais têm poupanças substanciais de custos ao produzirem em conjunto os seus diferentes serviços. 2. Metodologia 2.1. O modelo base Os modelos económicos utilizados nos diferentes estudos dos hospitais consideram a utilização de multifactores para produzir multiprodutos: F(y, x)=0 (1) onde y representa o vector de dimensão m dos níveis máximos de produção, x o vector de dimensão n da quantidade de factores consumidos e F a função de transformação que descreve a tecnologia eficiente de produção de serviços hospitalares. Se a função F for contínua, não decrescente e quase-côncava, Diewert (1982) demonstra que as características economicamente relevantes da tecnologia são retidas pela função de custo dual: C = C(y, w) (2) onde w representa o vector de dimensão n de preços dos factores e C os custos de produção dos serviços hospitalares. A função de custo decorre do pressuposto que os hospitais minimizam os custos, conhecida a tecnologia, o preço dos factores e o nível de produção: G.E.M.F. – F.E.U.C. 4 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses { } C( y , w) ≡ min w T x : F( y, x ) = 0 . x Carlos Carreira (3) Apesar dos hospitais públicos serem instituições sem fim lucrativo, não maximizando, portanto, o lucro, parece-nos razoável aceitar a hipótese de que as administrações hospitalares, na sua actuação, procuram minimizar os custos, afectando os recursos de modo a maximizar a produção, para um dado orçamento (Conrad e Strauss, 1983 e Scuffham et al., 1996). Para que a função (2) seja uma representação teoricamente válida da função de custo dual, deverá possuir as seguintes propriedades: i) não negativa, ii) linearmente homogénea nos preços dos factores, iii) não decrescente em w, iv) côncava em w, v) continua em w, vi) não decrescente no nível de output e vii) diferenciável em w (Diewert, 1982). A teoria da dualidade assegura que a tecnologia pode ser estudada quer através da função de transformação primal quer através da função de custo dual1, pois ambas fornecem a mesma informação económica acerca da tecnologia que se pretende descrever2. Coloca-se, assim, a questão de saber por qual das funções optar. Em termos empíricos, a escolha de uma delas depende, entre outros, dos objectivos do estudo e da indústria em análise. Em indústrias em que o nível de produção não é significativamente influenciável pela empresa e o preço dos factores e dos produtos são exógenos, a estimação da função de custo é, geralmente, mais adequada (Silva, 1996). É o caso dos hospitais públicos. Nos diferentes estudos sobre os serviços hospitalares, a utilização da função de custo é preponderante, veja-se Lave e Lave (1970), Conrad e 1 A tecnologia pode ainda ser caracterizada por uma segunda função dual, a função lucro (Diewer, 1982). No entanto, dado que os hospitais públicos não procuram a maximização do lucro, fica desde logo inviabilizada a sua utilização empírica no nosso trabalho. 2 Sobre as vantagens e limitações da utilização das funções duais, veja-se a síntese apresentada por Rebelo (1992). G.E.M.F. – F.E.U.C. 5 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira Strauss (1983), Cowing e Holtmann (1983), Vita (1990) e Scuffham et al. (1996), entre outros. Ao optarmos por estimar a função de custo dos hospitais centrais e distritais, é necessário que se tenham algumas precauções quanto à eventual aplicabilidade da hipótese da tecnologia ser a mesma nos dois tipos de hospitais, pelo que deveremos realizar testes estatísticos que permitam responder a esta questão. Outra problema é o de saber se os grandes hospitais possuem a mesma tecnologia dos pequenos. Pinho (1995, p. 5) refere que nas estimações da função de custo da banca "é comum pressupor que a tecnologia pode sofrer variações em torno do número de balcões do banco. Assim, é comum permitir a interacção entre vectores de outputs e preços com aquela variável (designada por B), numa função genérica do tipo: C = C (Y, W, B)." No nosso estudo, iremos supor que a tecnologia pode sofrer variações em torno de um factor fixo, indicador da dimensão do hospital. Assim, a função de custo (2) rescreve-se: C = C(y, w, k) (4) onde k é o parâmetro indicador de dimensão do hospital. Vita (1990) e Scuffham et al. (1996), na estimação da função de custo variável dos hospitais, também consideram a existência de um factor fixo. 2.2. Definição de produção de serviços hospitalares A análise empírica do comportamento dos custos, em qualquer indústria, confronta-se com o problema da definição da produção e os serviços hospitalares não são excepção. O hospital é uma empresa multiproduto que produz variadas quantidades de educação, investigação, serviços comunitários e tratamento de doentes externos. A sua actividade primordial é, no entanto, o tratamento de doentes com internamento e nisto se destingue de outras instituições (Lave e Lave, 1970). Enquanto as restantes G.E.M.F. – F.E.U.C. 6 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira actividades podem ser exercidas por outras unidades produtivas, o tratamento de doentes com internamento só é possível nos hospitais. A unidade de produção de serviços de internamento hospitalar mais utilizada é o número de casos tratados, traduzidos em termos de número de doentes admitidos ou saídos (Lave e Lave, 1970 e Butler, 1995). O custo total de um hospital (CT) é então dado pelo produto do custo médio por caso (CMC) e o número de casos tratados (n): CT = CMC × n . Como exemplo desta abordagem, podemos citar Fournier e Mitchell (1992), que, no estudo dos custos dos hospitais da Florida (EUA), utilizam como output o número de admissões. A utilização desta unidade apresenta, no entanto, o problema de não reter o tipo e qualidade dos tratamentos. Há doenças que requerem mais dias de internamento do que outras. Mesmo para tratamentos idênticos, a política de internamento é diferente entre hospitais. Por exemplo, alguns hospitais praticam a política de dar alta aos doentes no fim-de-semana, readmitindo-os no início da semana. Assim, o custo médio por caso pode variar em função de outros factores para além do número de casos tratados. Em alternativa à utilização do número de casos tratados, tem sido proposto a utilização do número de dias de internamento. Agora, o custo total de um hospital é dado pelo produto do custo médio por dia (CMD) e o número de dias de internamento (d): CT = CMD × d . Como exemplo, podemos referir Cowing e Holtmann (1983) e Conrad e Strauss (1983), que na estimação dos custos dos hospitais de Nova Iorque (EUA) e da Carolina do Norte (EUA), respectivamente, utilizam esta unidade de output. O inconveniente desta segunda unidade prende-se com o facto da sua utilização isolada, muitas vezes, não reflectir nos custos o efeito de um aumento do número de casos tratados. Um hospital pode aumentar o número de dias de internamento G.E.M.F. – F.E.U.C. 7 Carlos Carreira Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses incrementando o número de casos tratados e mantendo constante a demora média do internamento (DM) ou incrementando a demora média e mantendo constante o número de casos: ∆d = ∆n × DM + ∆DM × n + ∆n × ∆DM . Os primeiros dias de internamento são mais dispendiosos do que os últimos, dado que é nos primeiros dias que o doente utiliza os diversos meios de diagnóstico, a cirurgia e os cuidados intensivos. Nos últimos dias, na maior parte das vezes, o doente incorre somente em despesas do tipo "hotel" (Scuffham et al., 1996). Assim, não é indiferente em termos de consequências no nível de custos, a forma como se processa o aumento dos dias de internamento. Mais recentemente, para representar a produção dos serviços de internamento, tem sido proposto a utilização conjunta do número de casos tratados (admissões ou doentes saídos) e a demora média do internamentos. Atendendo a que a demora média corresponde à divisão do número de dias de internamento pelo número de casos tratados ( DM = d n ), podemos dizer que o custo total é igual ao produto do custo médio por dia, pela demora média e pelo número de casos tratados: CT = CMD × DM × n . Como exemplo desta abordagem, podemos citar Vita (1990), que na analise dos custos dos hospitais de Califórnia (EUA) utiliza como outputs o número de doentes saídos e a demora média, e Scuffham et al. (1996), que no estudo dos custos dos hospitais públicos da Nova Zelândia utilizam como outputs o número de admissões e a demora média. Será esta a unidade que iremos utilizar como variável explicativa da produção de serviços de internamento. A unidade de produção de tratamento de doentes externos mais utilizada é o número de consultas e urgências. A titulo de exemplo, podemos referir Vita (1990) e Fournier e Mitchell (1992), que utilizam conjuntamente o número de consultas e urgências, Cowing e Holtmann (1983), que utilizam o número de urgências, e Scuffham et al. (1996), que utilizam o número de consultas. No nosso trabalho, iremos G.E.M.F. – F.E.U.C. 8 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira usar como variáveis explicativas da produção de serviços de tratamento de doentes externos, o número de consultas e urgências. 2.3. Dados Os dados sobre o funcionamento dos hospitais públicos portugueses foram recolhidos nos Relatórios e Contas do Serviço Nacional de Saúde, publicados pelo Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde (IGIF), para o período entre 1991 e 1995. Abrangem 82 dos 83 hospitais gerais, centrais e distritais existentes em 1995. Excluiu-se o Hospital de Seia porque não funcionou durante todo o período em análise. Não se incluíram os hospitais especializados (por exemplo maternidades, psiquiátricos e IPO's), dado pretendermos uma amostra, à partida, mais uniforme. No que se refere à produção de serviços de internamento, os relatórios contêm o número de doentes saídos e a demora média em dias. Porém, estes valores agregados não permitem obter a quantidade e qualidade dos serviços necessários ao tratamento dos diferentes tipos de patologias dos doentes. Para corrigir esta unidade, deveria utilizar-se os valores por grupos de diagnóstico, o que não é possível a partir dos dados publicados nos Relatórios e Contas do SNS. Para a produção de serviços de tratamento de doentes externos, utilizou-se o número de consultas e o número de urgências, ambos publicados nos Relatórios e Contas do SNS. Iremos utilizar como variável dependente, o custo variável total. Compreende o total de custos anuais dos hospitais excepto de imobilizado, ou seja, as despesas em compras, fornecimentos e serviços, subcontratação, despesas com o pessoal e outras G.E.M.F. – F.E.U.C. 9 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira despesas que não de imobilizado. Está expresso a preços de 1991 e foi deflacionado pelo deflator do PIB3. Como podemos verificar no gráfico 1, 61% da despesa média anual dos hospitais refere-se a despesas com o pessoal. O IGIF não publica a desagregação desta rubrica em diferentes categorias profissionais (nomeadamente, em pessoal médico, pessoal de enfermagem e outro pessoal). Por este motivo, optámos por subdividir os inputs entre custos com o pessoal e outros custos. Gráfico 1: Repartição das despesas dos hospitais Outras despesas 11,5% Compras 21,2% Subcontratos 6,8% Desp. com pessoal 61% O preço do factor trabalho foi determinado pela divisão entre despesas anuais dos hospitais públicos com remunerações (excluindo pagamentos referentes a horas e noites) e o número de efectivos anuais ao serviço. O valor assim obtido, corresponde ao preço médio de uma unidade anual de trabalho. As despesas com horas e noites são consideradas consumo de mais unidades de inputs. Supusemos um preço do factor trabalho idêntico a nível nacional, dado que todas as remunerações são fixadas por uma tabela salarial comum a todos os hospitais. 3 O deflator do PIB foi calculado com base nos valores publicados pelo INE (Contas Nacionais). Foi realizado um teste de sensibilidade com a actualização dos valores com base no IPC da classe da saúde, concluindo que não existem diferenças significativas, pelo que optámos pela utilização do deflator do PIB. Barros e Sena (1998) utilizaram o IPC com habitação, tendo testado ainda o IPC sem habitação e o IPC da saúde, concluindo que não existiam diferenças significativas. G.E.M.F. – F.E.U.C. 10 Carlos Carreira Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses O preço de outros factores refere-se ao preço ponderado de uma enorme diversidade de factores produtivos. Assumindo que este cabaz de bens e serviços segue um movimento de preços idêntico ao da produção da economia, podemos utilizar o deflator do PIB, em índice-base 1991, para indicador do preço dos outros factores. Como variável de dimensão dos hospitais, retivemos o número de camas disponíveis, um procedimento também utilizado por Vita (1990) e Scuffham et al. (1996). O quadro 1 contém a síntese da identificação e descrição das variáveis. Quadro 1: Definição das variáveis Nome CV Definição Custo variável total Descrição Total de custos anuais dos hospitais excepto despesas de imobilizado (em contos). DS Doentes saídos Número de doentes saídos anualmente. DM Demora média Duração média dos internamentos. CO Consultas Número de consultas anuais. UR Urgências Número de urgências anuais. WP Preço do trabalho Salário médio anual do pessoal (em contos). Não foram incluídos os pagamentos referentes a horas e noites. WO Preço de outros factores Deflator do PIB. K Lotação Número total de camas disponíveis. SHP Peso das despesas com o pessoal Proporção das despesas com o pessoal no custo variável total. SHO Peso das despesas com outros factores Proporção das despesas com outros factores no custo variável total. Os hospitais públicos gerais estão divididos em três tipos: hospitais centrais, distritais e distritais de nível 1. Como podemos verificar pelos valores apresentados no quadro 2, a sua dimensão é muito diferente. Os hospitais centrais, em menor número, apresentam uma dimensão média e níveis de produção média muito superiores aos dos hospitais distritais. G.E.M.F. – F.E.U.C. 11 Carlos Carreira Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Quadro 2: Dimensão e produção média por tipo de hospital Tipo de Hospital Nº Média da lotação Média de Média de doentes saídos demora média (dias) 15 423,7 9,8 Média de consultas Média de urgências Central (a) 20 532,1 132 805,4 91 243,5 Distrital 38 244,8 8 930,3 7,3 44 894,8 59 770,1 Distri. N. 1 24 76,7 2 549,5 7,9 10 690,8 36 108,7 Média 82 264,3 8 614,8 8,1 55 896,7 60 367,7 Nota: (a) No período 1991-92, o hospital de Braga estava incluído nos hospitais distritais. Fonte: IGIF. No quadro 3 apresenta-se a descrição estatística das variáveis, para uma amostra de 82 indivíduos ao longo de cinco períodos consecutivos (410 observações). Quadro 3: Dados estatísticos sobre os hospitais públicos Variáveis CV- Custo variável total Média Desvio padrão Valor mínimo Valor máximo 2 913 353,0 3 802 929,6 223 446,0 20 590 160,2 DS - Doentes saídos 8 614,8 8 157,3 588,0 43 951,0 DM - Demora média 8,1 2,4 3,6 22,1 CO - Consultas 55 896,7 71 791,4 2 728,0 378 182,0 UR - Urgências 60 367,7 48 945,0 0,0 261 967,0 2 049,5 110,3 1 910,5 2 179,8 264,3 279,9 36,0 1 703,0 SHP - Peso das desp. com o pessoal 0,6142 0,0745 0,3920 0,7513 SHO - Peso das desp. com outros fac. 0,3858 0,0745 0,2487 0,6080 WP - Preço do trabalho K - Lotação Nota: Os custos e os preços dos factores estão expressos a preços de 1991 (em contos). Fonte: IGIF. Quer o custo variável total quer os outputs apresentam um desvio padrão muito elevado relativamente à média. Este facto reflecte a grande diferença de dimensão entre os hospitais. O custo variável mais baixo observado foi de 223 mil contos e o mais elevado de 20590 mil contos. O número médio de doentes saídos foi de 8615, o que representa uma média de 32,6 doentes saídos por cama. O hospital médio da Califórnia (EUA) estudado por Vita (1990), apresenta uma média de 43,8 doentes por cama, para um total de 7802 doentes G.E.M.F. – F.E.U.C. 12 Carlos Carreira Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses admitidos. O hospital-base4 da Nova Zelândia analisado por Scuffham et al. (1996), apresenta uma média de 19,6 doentes por cama e 5519 doentes admitidos. A dimensão média do hospital português é de 264 camas, similar ao do hospital base da Nova Zelândia, com 281 camas e superior ao do hospital médio da Califórnia, com 178. A demora média mais elevada é de 22,1 dias e a mais baixa de 3,6 dias, para uma média de 8 dias, verificando-se, assim, uma grande diferença na política de internamento entre hospitais. As despesas com o pessoal representam em média 61,4% dos custos dos hospitais, para um máximo de 75,1% e um mínimo de 39,2%. Os hospitais da Califórnia despendem em média 44,7% dos seus recursos em despesas com o pessoal e os da Nova Zelândia 75,8%. O quadro 4 contém os valores médios das variáveis para os anos de 1991 e 1995 e respectivas taxas de crescimento. Quadro 4: Evolução dos hospitais públicos entre 1991 e 1995 Variáveis CV- Custo variável total 1991 1995 Taxa de crescimento 22,5% 2581036,9 3161589,0 DS - Doentes saídos 7919,8 9014,3 13,8% DM - Demora média 8,7 7,7 -11,3% CO - Consultas 47651,0 72048,5 51,2% UR - Urgências 64086,0 56110,6 -12,4% 2062,7 1910,5 -7,4% 262,3 263,6 0,5% SHP - Peso das despesas com o pessoal 0,6575 0,5740 -12,7% SHO - Peso das despesas com outros factores 0,3425 0,4260 24,4% WP - Preço do trabalho K - Lotação Fonte: IGIF. 4 A amostra de Scuffham et al. (1996) é muito díspar, por isso, só fazemos referência a este tipo de hospital, que é o mais próximo da nossa amostra. G.E.M.F. – F.E.U.C. 13 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira O custo variável total cresceu 22,5%, entre 1991 e 1995, verificando-se maior crescimento nos hospitais distritais, 33,2%, que nos centrais, 11,9%. O número de casos tratados aumentaram 13,8%, sendo os hospitais distritais de nível 1 os que mais contribuíram para esse aumento, com 21,7%. A demora média dos internamentos foi reduzida em 11,3%, sendo maior a redução nos hospitais centrais, 15,8%, aqueles que também apresentavam maior valor médio para esta variável, 9,8 dias. O número de consultas aumentou 51,2%, sobretudo devido ao forte crescimento nos hospitais distritais e de nível 1: 120,7% e 51,9%, respectivamente. O número de urgências reduziu-se em 37,1% nos hospitais distritais, mas aumentou nos hospitais centrais e de nível 1 cerca de 10%. O preço relativo do factor trabalho reduziu-se em 7,4%, originando, consequentemente, uma redução do peso das despesas com o pessoal em 12,7%. 2.4. Especificação da forma funcional da função de custo A aplicação empírica da função de custo (4) requer a modelização da tecnologia através de uma forma funcional que seja homogénea linear nos preços dos factores para todos os níveis de preços e produtos, parcimoniosa no número de parâmetros, contenha no domínio permissível o nível zero de produto e permita economias e deseconomias de escala e de gama (Caves et al., 1980). A função de custo multiproduto transcendental logarítmica (translog) verifica os requisitos anteriores, excepto o de não admitir o valor zero para um ou mais produtos, dado que o logaritmo natural de zero é indefinido5. Para ultrapassar este problema, Caves et al. (1980) propõem a substituição 5 Caves et al. (1980) analisam as vantagens e inconvenientes de três formas funcionais flexíveis de funções de custo para empresas multiproduto: a função de custo multiproduto híbrida de Diewert, a função de custo multiproduto translog e a função de custo multiproduto quadrática. A função quadrática não satisfaz a condição de homogeneidade linear nos preços dos factores. A função híbrida de Diewert, G.E.M.F. – F.E.U.C. 14 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira da métrica de ln yi pela métrica proposta por Box e Cox (1964)6, criando a função de custo multiproduto translog generalizada. Em alternativa, Cowing e Holtmann (1983), Akridge e Hertel (1986), Rebelo (1992) e Given (1996) propõem a substituição dos níveis nulos de produção por uma constante arbitrária próxima de zero. A função translog é uma das funções de custo mais utilizadas no estudo da tecnologia de produção das mais diversas indústrias. Em Portugal, por exemplo, com o objectivo de analisar os custos e as economias de escala e de gama, Mendes (1990) aplicou-a à banca portuguesa, Rebelo (1992) às adegas cooperativas da Região Demarcada do Douro e Santos e Rebelo (1996) ao Sistema Integrado de Crédito Agrícola Mútuo. No sector da saúde, Conrad e Strauss (1983), Cowing e Holtmann (1983), Vita (1990), Fournier e Mitchell (1992), Dor e Farley (1996), Given (1996), Scuffham et al. (1996), Wholey et al. (1996), Grytten e Dalen (1997) e Escarce e Pauly (1998) são alguns dos investigadores que a utilizaram nos seus trabalhos. No nosso estudo, também iremos optar por esta forma funcional. A função de custo translog resulta de uma aproximação em série de Taylor de segunda-ordem da função (4), em torno de um ponto arbitrário, onde admite primeira e segunda derivada contínua7. No nosso caso, escreve-se: quando generalizada para permitir a variação dos rendimentos à escala, aumenta significativamente o número de parâmetros, tornando-se pouco atractiva para estimação. 6 A transformação Box-Cox é dada por: λ f ( y i ) = ( yi − 1) λi ⇐ λi ≠ 0 ∧ ln y i ⇐ λi = 0 . Esta transformação implica a estimação de um parâmetro λi para cada um dos outputs considerados. Para valores de λi muito próximos de zero, a métrica de Box-Cox aproxima-se da do logaritmo natural, λ porque lim ( yi − 1) λi = ln yi . λ →0 7 No nosso caso, devido à metodologia de estimação que iremos seguir, em que todas as variáveis serão normalizadas à volta da respectiva média, esse ponto é o vector unitário. G.E.M.F. – F.E.U.C. 15 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses 4 2 i =1 k =1 Carlos Carreira ln Cv = α 0 + ∑α i ln yi + ∑ β k ln wk + ρ1 ln k + 4 4 1 2 2 1 α β kl ln wk ln wl + + ln ln y y ∑∑ ij i j 2 ∑∑ 2 i =1 j =1 k =1 l =1 4 2 1 ρ11 ln 2 k + ∑∑ δ ik ln yi ln wk + 2 i =1 k =1 4 2 i =1 k =1 (5) ∑ϕ i1 ln yi ln k + ∑ µ k1 ln wk ln k + ε onde Cv é o custo variável total, yi os outputs (DS, DM, CO e UR), wk o preço dos inputs (WP e WO), k o factor fixo e ε o erro estocástico. Esta expressão possui uma constante (α0), sete parâmetros de primeira ordem (αi, βk e ρ1) e vinte e oito de segunda ordem (αij, βkl, ρ11, δik, ϕi1 e µk1). Só a variável UR é que apresenta valores nulos para vinte e sete observações, ou seja, para 6,6% destas, por isso, optámos pela solução de substituí-los pela aproximação 0,1 8. A função de custo translog requer a estimação de um largo número de parâmetros para um pequeno número de outputs e inputs. A função (5) é habitualmente estimada juntamente com as equações de proporção (shares), com o objectivo de obter estimadores mais eficientes. Utilizando o Lema de Shephard e diferenciando (5) em ordem ao preço de cada factor produtivo variável, obtemos, respectivamente, as equações de proporção: SH k = wk xk ∂Cv wk ∂ ln Cv = = Cv ∂wk Cv ∂ ln wk 2 4 l =1 i =1 = β k + ∑ β kl ln wl + ∑ δ ik ln yi + µ k1 ln k + ε k , k = 1, 2 (6) em que SHk representa a proporção do custo variável despendida na compra do késimo factor produtivo e εκ o termo de erro respectivo. 8 Cowing e Holtmann (1983), Akridge e Hertel (1986) e Rebelo (1992) utilizaram o mesmo valor. Given (1996) utilizou 0,00001. G.E.M.F. – F.E.U.C. 16 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira Para que (5) possa ser considerada uma função de custo, tem que verificar as propriedades definidas em 2.1, por isso, deve impor-se as restrições de simetria nos parâmetros de 2ª ordem: α ij = α ji , ∀i ≠ j , i, j = 1,...,4 β kl = β lk , ∀ k ≠l , k , l = 1,2 (7) e homogeneidade linear nos preços dos factores: 2 ∑β k =1 k =1 kl = 0, k = 1,2 2 ∑β l =1 (8) 2 ∑δ ik = 0, i = 1,...,4 k =1 2 ∑µ k =1 k1 =0 Esta última restrição obriga a que um dos preços dos factores seja tomado como numerário. No nosso caso, quer o custo total quer o preço do factor trabalho foram expressos em relação ao preço de outros factores. Portanto, o vector de preços tomado como referência foi [w1 w2 1] . T 2.5. Economias de escala e de gama Para a empresa multiproduto, a medida local das economias de escala globais, MPSE (multiproduct scale economies), corresponde ao inverso da soma das elasticidades do custo relativamente aos produtos: MPSE = Cv ( y , w) 4 ∑ y MC i =1 i i = 1 (9) 4 ∑η i =1 i onde MCi = ∂Cv ( y , w) ∂yi representa o custo marginal da produção do iésimo produto G.E.M.F. – F.E.U.C. 17 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira e ηi a elasticidade do custo relativamente ao iésimo produto, com: ηi = yi ∂Cv ( y , w) ∂ ln Cv ( y, w) = ∂yi Cv ( y, w) ∂ ln yi 4 2 j =1 k =1 = α i + ∑α ij ln y j + ∑ δ ik ln wk + ϕ i1 ln k (10) Os rendimentos à escala serão crescentes, constantes ou decrescentes, se MPSE for maior, igual ou menor do que a unidade, respectivamente. As economias de escala globais ilustram o comportamento dos custos variáveis quando a quantidade de todos os produtos varia na mesma proporção. Para a interpretação de (9), é importante a especificação adoptada para a função de custo. Se se adopta (2), em que o número de camas não surge como variável autónoma, então os custos associados à variação da lotação, devido a alterações de escala produtiva, já estão incorporados em (9). Se se adopta (4), então o cálculo de (9) é feito no pressuposto de que o número de camas permanece constante. Por vezes, para expandir o nível de actividade, os hospitais têm que aumentar a sua lotação. Neste caso, Vita (1990) propõe a utilização do conceito de economias de escala aumentadas, AES (augmented economies of scale)9: AES = 1− ∂ ln Cv ( y, w, k ) ∂ ln k 4 ∑η i =1 (11) i onde, 4 2 ∂ ln Cv ( y, w, k ) = ρ1 + ρ11 ln k + ∑ ϕ i1 ln yi + ∑ µ k1 ln wk ∂ ln k i =1 k =1 (12) e representa a elasticidade do custo variável em relação ao factor fixo, isto é, o impacto da variação do factor fixo nos custos variáveis. Se ∂ ln Cv ( y , w, k ) ∂ ln k = 0 , então as variações de dimensão não provocam qualquer alteração nos custos médios variáveis e 9 Para uma discussão acerca da utilização das medidas MPSE e AES, ver Vita (1990). G.E.M.F. – F.E.U.C. 18 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira MPSE = AES. Valores de AES inferiores à unidade sugerem a existência de deseconomias de escala, isto é, uma diminuição da lotação dos hospitais e da produção aumenta a eficiência e reduz os custos de longo prazo10. Na produção múltipla, para além das economias de escala globais, também é importante conhecer-se as economias associadas a cada produto. As economias de escala específicas, PSEi (product-specific economies of scale), mostram como o custo total se altera caso aumente a produção do iésimo produto, mantendo constante a produção dos restantes. São medidas pela relação custo incremental médio do iésimo produto, AICi (average incremental costs), e custo marginal do iésimo produto: PSEi = AICi MCi (13) AICi = Cv ( y, w) − Cv ( y − yi , w) yi (14) onde em que Cv(y-yi) representa o custo suportado na produção dos m produtos menos o iésimo. Note-se que, considerando (10), os custos marginais podem obter-se através da expressão: MCi = ηi Cv ( y , w) yi (15) Conforme PSEi seja maior, igual ou menor que a unidade, os rendimentos associados à produção do iésimo produto são crescentes, constantes ou decrescentes, respectivamente. Para além das economias associadas à dimensão da actividade, nas indústrias multiproduto, poderão existir ganhos relacionados com a produção simultânea de vários 10 Normalmente a MPSE é interpretada como sendo uma medida de curto prazo, dado que admite um factor fixo, e a AES de longo prazo. G.E.M.F. – F.E.U.C. 19 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira produtos. Existem economias de gama sempre que o custo de produzir conjuntamente todos os produtos for menor do que o custo de produzir cada um deles em separado: 4 ∑ Cv( y ) > Cv( y) i =1 i (16) onde Cv(yi) representa o custo de produzir o iésimo produto. Dividindo (16) por Cv(y) obtemos a medida das economias de gama globais, EOS (economies of scope): 4 EOS = ∑ Cv( y ) i =1 i Cv ( y ) (17) As economias de gama de um produto específico, EOSi (product-specific economies of scope), são dadas por: EOS i = Cv ( yi ) + Cv ( y − yi ) Cv ( y ) (17) Se EOS for maior que um, existem economias de gama, isto é, a exclusão de produtos da gama oferecida pela empresa leva a aumentos do custo médio de produção. Segundo Vita (1990), a existência de complementaridade fraca, WCC (weak cost complementarities), no ponto de aproximação da função de custo, é condição suficiente para que se verifiquem economias de gama. Neste caso, existe uma relação inversa entre o custo marginal do iésimo produto e o nível de produção do jésimo produto, isto é: ∂ 2 Cv ( y , w) <0 WCC ij = ∂y i ∂y j (18) Para a função de custo translog no ponto médio, (18) é-nos dado por: WCC ij = G.E.M.F. – F.E.U.C. ∂ 2 ln Cv ∂ ln Cv ∂ ln Cv + = α ij + α iα j ∂ ln yi ∂ ln y j ∂ ln yi ∂ ln y j (19) 20 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira Se WCCij = 0, significa que não existem economias de gama e aceita-se a hipótese de disjunção. 2.6. Método de estimação Para a estimação da função de custo utilizámos um cruzamento de informações cross-section com séries temporais, numa pooling de cinco cortes horizontais de 82 hospitais referentes ao período 1991-95. Os dados foram normalizados à volta da respectiva média, dividindo-se o valor observado de cada variável pela média aritmética respectiva, antes da transformação logarítmica. Assim, a função de custo pode ser entendida com uma aproximação local em série de Taylor, na vizinhança do vector unitário. Como o logaritmo natural de um é zero, um número importante de cálculos económicos no ponto médio são simplificados. As equações (5) e (6) foram estimadas conjuntamente num sistema de equações. A introdução das equações shares, permite aumentar os graus de liberdade, obtendo-se, assim, estimadores mais eficientes do que os obtidos com a aplicação dos mínimos quadrados ordinários à equação custo11. A soma das equações shares é igual a um e a soma dos seus erros igual a zero, originando uma matriz de variâncias-covariâncias indefinida. No nosso caso, como temos duas equações de proporção, só uma é linearmente independente, obrigando a omitir a outra. Durante a estimação, suprimimos a equação referente aos outros factores, uma vez que o respectivo preço foi utilizado para normalizar o preço do factor trabalho. Os estimadores de máxima verosimilhança são invariantes num sistema de equações de regressão em que uma delas é eliminada. Na investigação ao comportamento dos termos de erro, concluímos que era de aceitar as hipóteses de média zero, de simetria e de normalidade. Não foi pesquisada a G.E.M.F. – F.E.U.C. 21 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira hipótese dos termos de erro estarem autocorrelacionados, dado que as observações só dizem respeito a cinco períodos. Questionámos a hipótese da variância dos termos de erro ser constante, concluindo que o modelo é homoscedástico12. Foi ainda analisada a hipótese dos termos de erro poderem ser decompostos numa componente que varia por indivíduo (µi) e numa outra puramente aleatória (νit), isto é, εit = µi + νit, tendo-se concluído que não era de excluir esta hipótese13. Em conformidade, procedeu-se à correcção das variáveis, segundo a metodologia que propõem Hausman e Taylor (1981). Testámos a introdução de várias variáveis dummy por grupos de indivíduos e período de tempo. Só a dummy para os hospitais centrais se revelou significativa, sendo, portanto, de aceitar a hipótese destes possuírem uma tecnologia diferente da dos outros hospitais. Dado que alguns parâmetros relacionados com a variável dimensão não se mostraram significativamente diferentes de zero, testámos a exclusão conjunta desta variável. No entanto, a sua estatística F levou-nos a rejeitar o modelo restrito. O sistema constituído pelas equações (5) e (6), impostas as restrições (7) e (8), foi estimado iterativamente, de acordo com a metodologia proposta por Vilares (1989) para estimações com a técnica SURE (sistema de equações de regressão aparentemente não relacionadas) de Zellner (1962), para obtenção de estimadores iguais aos de máxima verosimilhança, utilizando o software RATS versão 4.21. 11 Para uma descrição mais detalhada do método de estimação, veja-se, por exemplo, Rebelo(1992). 12 Conclusão tirada a partir do teste Goldfeld-Quandt. 13 Conclusão tirada a partir dum teste do tipo Chow, em que o modelo não restrito inclui uma variável dummy por indivíduo (Baltagi, 1995). G.E.M.F. – F.E.U.C. 22 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira 3. Resultados empíricos e discussão 3.1. Consistência teórica da função de custo Os parâmetros estimados da função de custo translog e respectiva estatística t, estão expostos no quadro 5. Quadro 5. Coeficientes estimados e estatística t Coeficiente Variável Coeficiente estimado Estatística t Constante -0.2094 -7.631* α0 ln y1 0.3642 3.536* α1 ln y2 0.1737 1.918*** α2 ln y3 0.3062 9.521* α3 ln y4 0.1477 5.841* α4 ln w1 0.6177 154.547* β1 ln k 0.2127 2.054** ρ1 (1/2) ln2 y1 0.2295 0.789 α11 ln y1 ln y2 0.0686 0.257 α12 ln y ln y -0.1164 -0.999 α13 1 3 ln y1 ln y4 -0.0578 -2.541** α14 2 (1/2) ln y 0.1248 0.368 α22 2 ln y2 ln y3 0.0311 0.294 α23 ln y2 ln y4 0.0062 0.310 α24 (1/2) ln2 y3 0.0909 1.679*** α33 ln y3 ln y4 0.0146 0.995 α34 (1/2) ln2 y4 0.0245 6.631* α44 4.630* (1/2) ln2 w1 0.2682 β11 (1/2) ln2 k -0.1111 -0.352 ρ11 ln y1 ln w1 -0.0485 -2.563* δ11 ln y2 ln w1 -0.0403 -2.028** δ21 ln y3 ln w1 -0.0191 -2.577* δ31 ln y4 ln w1 0.0011 0.927 δ41 ln y1 ln k -0.0245 -0.090 ϕ11 ln y2 ln k -0.2304 -0.772 ϕ21 ln y ln k -0.0116 -0.112 ϕ31 3 ln y ln k 0.0322 1.682*** ϕ41 4 ln w ln k 0.0916 4.634* µ11 1 H 0.1368 8.296* θ1 Notas: * Parâmetro significativo a 1%. ** Parâmetro significativo a 5%. *** Parâmetro significativo a 10%. R2 da função de custo variável = 0,93. R2 da função "share" do factor trabalho = 0,99. As variáveis independentes (produção, preço dos factores e factor fixo) explicam 92,6% da variação da variável dependente (custo variável). Dos vinte e nove estimadores, catorze (48,3%) são significativos a 5% e três (10,3%) a 10%. Para os mesmos níveis de significância, por exemplo, Cowing e G.E.M.F. – F.E.U.C. 23 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira Holtmann (1983) obtêm, respectivamente, 29,1% e 29,9%, Vita (1990), 34,7% e 12,2%, e Scuffham et al. (1996), 30,9% e 7,3%. A normalização das variáveis permite obter directamente as elasticidades do custo em relação aos produtos para a média aritmética de cada produto, através dos parâmetros de primeira ordem de produção (αi)14. As quatro elasticidades do custo-produto são positivas e o t-estatístico de α1, α3 e α4 significativo a 1%, e de α2 a 10%. As elasticidades do custo relativamente aos preços dos factores, na média aritmética, são dadas pelos parâmetros de primeira ordem dos preços dos factores (βk). Estes coeficientes são iguais à proporção dos factores no custo variável. A elasticidade do custo-preço do factor trabalho é de 0,6177, com t-estatístico significativo a 5%, ou seja, um aumento em 1% do seu preço, mantendo-se constante as restantes variáveis, origina um acréscimo do custo variável de 0,6177%. Como o somatório das elasticidades do custo-preço é igual a um, para o mesmo ponto, β2 = 0,3823. Dado que as elasticidades do custo-produto e do custo-preço são não negativas, podemos dizer que no ponto de aproximação a função de custo variável estimada é monótona crescente nos preços dos factores produtivos e nos níveis de produção. Para que a função de custo translog com dois factores seja considerada não negativa no ponto médio, é condição necessária e suficiente o facto de 0 ≤ β1 ≤ 1 (Lau, 1986), o que se verifica. A homogeneidade linear em preços dos factores, foi imposta na estimação através da restrição (8), pelo que se considera satisfeita. Para que a função seja côncava é necessário que a matriz Hessiana ∂ 2 C ∂wk ∂wl seja semidefinida negativa. Segundo Lau (1986), no vector unitário, é condição necessária e suficiente o facto de β 1 ( β1 − 1) + β11 ≤ 0 . No nosso caso, a estatística de 14 Tendo em conta a equação (10) e dado que o logaritmo natural de um é zero, vem ηi = αi. G.E.M.F. – F.E.U.C. 24 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira Wald, ao nível de significância de 5%, diz-nos que devemos aceitar a hipótese da restrição assumir o valor nulo (ver quadro 6), pelo que podemos dizer que a função é côncava. Concluímos, assim, que a função translog estimada, no ponto de aproximação, verifica as propriedades necessárias para que seja uma representação teoricamente válida da função de custo. Para testarmos a adequação da função de custo estimada à tecnologia de produção de serviços hospitalares, realizámos ainda testes de Wald para as restrições estruturais de disjunção da produção, separabilidade dos factores produtivos e produtos, e economias de escala constantes. A disjunção na produção permite transformar a função de custo numa soma de funções de custo individuais, C = ∑iCi ( y, w, k ) , não existindo, portanto, economias de gama. A separabilidade dos factores produtivos e produtos permite transformar a função de custo numa função em que os produtos individuais são agregados numa única variável, C = C [ f ( y ), w, k ], não se podendo, portanto, investigar a existência de economias de escala específicas. Como se verifica da análise dos resultados do quadro 6, as três restrições estruturais são rejeitadas, ao nível de significância de 5%, concluindo-se que nenhuma delas constitui uma representação válida da tecnologia de produção dos serviços hospitalares, podendo calcular-se a partir da função de custo estimada os indicadores de economias de escala e de gama. G.E.M.F. – F.E.U.C. 25 Carlos Carreira Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Quadro 6. Testes de Wald Restrição Nº de Estatística de Nível de restrições Wald significância 1 0,0005 0,982 Concavidade: β1 (β1 − 1) + β11 = 0 Disjunção: α ij + α iα j = 0 , i ≠ j ∧ i , j = 1,...,4 6 12,842 0,046 Separabilidade: δ i1 = 0 , i = 1,...,4 4 26,513 0,000 6 44.343 0,000 4 ∑ αi = 1 i =1 4 4 i =1 j =1 4 4 ∑ α ij = ∑ α ij = ∑ ∑ α ij = 0 Economias de escala constantes: i =1 j =1 4 ∑ δ i1 = 0 i =1 4 ∑ ϕ i1 = 0 i =1 3.2. Análise das economias de escala e de gama Na análise das economias de escala e de gama considerou-se, para além do hospital médio, dois grupos distintos de hospitais: o primeiro, constituído pelos três tipos de hospitais gerais existentes, centrais, distritais e distritais de nível 1; o segundo, pelos 16 maiores hospitais (cerca de 20% da amostra), os 16 menores e os restantes, tomando como base o critério de lotação média, que designaremos por grandes hospitais, pequenos e intermédios, respectivamente. Se tivermos em conta os valores do quadro 2, esta segunda classificação não se traduzirá em resultados muito diferentes da primeira, podendo, no entanto, ajudar a clarificar a análise. Dos 16 maiores hospitais, 72,5% são hospitais centrais. Os valores das economias de escala e de gama, para cada grupo de hospitais, foram calculadas com base nos coeficientes estimados do quadro 5 e no ponto de aproximação à média aritmética respectiva. No cálculo das economias de escala globais, considerámos que todos os aumentos de produção se devem a incrementos no número de internamentos, consultas G.E.M.F. – F.E.U.C. 26 Carlos Carreira Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses e urgências, mantendo constante a demora média dos internamentos (Vita, 1990). Notese que um aumento da produção de serviços de internamento pode reflectir-se nas variáveis DS e DM, sendo que não é plausível fazê-lo recair sobre a segunda. Como podemos verificar pela análise dos valores da primeira coluna do quadro 7, os hospitais estão a actuar na zona de economias de escala crescentes (MPSE > 1). Um aumento simultâneo em 1% na produção dos três produtos, originará uma acréscimo nos custos variáveis de 0,82% para o hospital médio, de 0,85% para os grandes hospitais e de 0,77% para os pequenos hospitais. Comparando os valores obtidos pelos três tipos de hospitais (centrais, distritais e de nível 1) com os dos três grupos de hospitais (grandes, intermédios e pequenos), verificamos que são muito similares, podendo concluir que as pequenas diferenças se devem mais ao factor dimensão do que ao tipo de hospital. Quadro 7. Economias de escala globais e específicas Tipo/Grupo de hospital MPSE PSEDS PSEDM PSECO PSEUR Central 1,175 0,283 -1,247 1,337 1,820 Distrital 1,231 0,645 0,447 1,144 1,615 Distrital Nível 1 1,280 0,610 1,039 0,536 1,361 Grandes hospitais 1,178 0,168 -3,701 1,308 1,929 Hospitais intermédios 1,234 0,661 0,696 1,110 1,529 Pequenos hospitais 1,293 0,506 1,08 0,394 1,316 Médio 1,222 0,565 0,385 1,213 1,628 Analisando as economias de escala associadas a cada produto, isto é, o comportamento dos custos quando se incrementa a quantidade produzida de um produto, permanecendo constante a dos restantes, concluímos que nos serviços de internamento (doentes saídos e demora média) existem deseconomias de escala e nos serviços de ambulatório existem economias de escala. Nos grandes hospitais e nos hospitais centrais, uma diminuição da demora média do internamento originaria uma redução drástica nos custos. As economias de escala crescentes dos serviços de G.E.M.F. – F.E.U.C. 27 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira consultas e urgências são mais elevadas nos grandes hospitais e nos centrais. Os valores das economias de escala específicas parecem confirmar a ideia de que resultados estão directamente relacionados com a dimensão do hospital e não com o tipo. Dos valores do quadro 7, podemos, portanto, concluir que os hospitais têm interesse em expandir simultaneamente a produção no seu conjunto, mas existem fortes incentivos para aumentar as actividades de ambulatório e reduzir as de internamento. Um resultado similar foi obtido por Fournier e Mitchell (1992), no estudo dos hospitais da Florida, onde concluíram pela existência de economias de escala globais para o hospital médio (curiosamente no mesmo valor) e economias específicas associadas aos serviços de urgências e consultas. Também Cowing e Holtmann (1983), verificam que o hospital médio de Nova Iorque possui economias de escala crescentes. Barros e Sena (1998), na análise de três hospitais distritais (Abrantes, Almada e Leiria), estimam deseconomias de escala15. Atendendo à especificação da função de custo que se adoptou, os resultados anteriores devem ser entendidos no pressuposto de que a lotação dos hospitais permanece constante, portanto, apenas são válidos para situações em que variações da produção não implicam alterações na dimensão, ou seja, numa óptica de curto prazo, em que a produção e os factores variáveis variam e o factor fixo permanece constante. O quadro 8 dá-nos os valores das economias de escala aumentadas, isto é, as economias geradas por uma variação simultâneo de actividade produtiva e da dimensão do hospital. Excepto os hospitais centrais e grandes, todos os outros possuem deseconomias de escala, tanto maiores quanto menor a dimensão. 15 Barros e Sena (1998) estimam a função de despesas de exploração dos hospitais relativamente a um indicador agregado de output (doentes saídos ajustados), não utilizando, portanto, uma forma funcional flexível e não reconhecendo o papel dos preços relativos dos factores produtivos. Este procedimento deveu-se ao número reduzido de observações de que dispunham. G.E.M.F. – F.E.U.C. 28 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira Quadro 8. Economias de escala aumentadas Tipo de hospital AES Grupo de hospital AES Central 1,082 Grandes hospitais 1,094 Distrital 0,928 Hospitais intermédios 0,912 Distrital Nível 1 0,785 Pequenos hospitais 0,763 Médio 0,962 A interpretação destes resultados requer algum cuidado. Se os hospitais operassem na sua via de expansão eficiente, a medida MPSE seria igual à AES16. No nosso caso, a elasticidade do custo variável em relação ao factor fixo é positiva ( ∂ ln Cv ∂ ln k > 0 ), mas decrescente. Podemos avaliar a elasticidade das economias de escala relativamente ao factor fixo, diferenciando (11) em ordem a ln k (Vita, 1990): ∂AES =− ∂ ln k ∂ 2 ln Cv 4 ∂ ln Cv ∂ ln Cv 4 ∂ 2 ln Cv + 1 − ∑ ∑ ∂ ln k 2 i =1 ∂ ln y i ∂ ln k i =1 ∂ ln yi ∂ ln k 4 ∂ ln Cv ∑ y ∂ ln i = 1 i 2 (20) No ponto de aproximação, a expressão (20) assume o valor de 0,411, sugerindo que um aumento de dimensão leva a um acréscimo das economias de escala. Assim, para que os hospitais minimizem os seus custos, no longo prazo, devem aumentar a sua dimensão, aproximando de zero o valor da elasticidade do custo variável em relação ao factor fixo e aumentando o valor das economias de escala quando todos os factores são variáveis. Portanto, para que os hospitais sejam mais eficientes no curto prazo, devem intensificar a utilização da capacidade instalada, aumentando a produção e obtendo, assim, ganhos de escala. A este respeito, Abel-Smith (1996) sugere que o excesso de capacidade instalada é o responsável pelos elevados custos dos hospitais, propondo o aumento da taxa de ocupação, actualmente em cerca de 70%, para se poderem obter G.E.M.F. – F.E.U.C. 29 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira poupanças significativas de custos, mesmo que para isso seja necessário encerrar hospitais. Os resultados de longo prazo sugerem que as economias de escala são maiores nos grandes hospitais, pelo que acréscimos de produção e da actual dimensão média, permitirão reduzir as deseconomias de escala de longo prazo (compare-se o valor de AES, no quadro 8, para os pequenos e grandes hospitais). Para os hospitais da Califórnia, Vita (1990) também obtém deseconomias de escala no longo prazo, mas crescentes17, pelo que, contrariamente ao nosso resultado, estes deverão diminuir a sua dimensão para minimizar os custos. No estudo das economias de escala globais do hospital médio da Nova Zelândia, Scuffham et al. (1996) concluíram pela existência de rendimentos crescentes no curto prazo e constantes no longo prazo. Os resultados obtidos por Vita (1990) e Scuffham et al. (1996), referem-se a hospitais médios de menor dimensão (respectivamente, 7800 e 2100 casos tratados e 180 e 125 camas) do que o nosso (8600 doentes saídos e 265 camas). Dranove (1998) sugere que os hospitais possuem economias de escala até cerca das 280 camas. A produção conjunta dos serviços hospitalares na globalidade gera fortes economias de gama em todos os hospitais (EOS > 1), sendo maiores nos de grande dimensão, como podemos verificar pela análise dos valores do quadro 9. Também a produção conjunta de qualquer serviço específico se apresenta mais económica do que a sua produção em estabelecimentos separados. A economicidade da produção conjunta do número de internamentos (DS) é maior nos hospitais de grande dimensão. No que se refere aos serviços de urgências, as economias de gama são maiores nos pequenos hospitais. 16 Note-se que neste caso ∂ ln Cv ∂ ln k = 0 , ou seja, variações no factor fixo não provocam qualquer impacto nos custos variáveis médios. 17 ∂AES ∂ ln k < 0 . G.E.M.F. – F.E.U.C. 30 Carlos Carreira Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Quadro 9. Economias de gama globais e específicas Tipo/Grupo de hospital Central Distrital Distrital Nível 1 Grandes hospitais Hospitais intermédios Pequenos hospitais Médio EOS EOSDS EOSDM EOSCO EOSUR 1,980 1,807 1,920 2,123 1,756 1,977 1,793 1,587 1,367 1,289 1,735 1,315 1,316 1,381 1,222 1,098 1,119 1,308 1,059 1,158 1,096 1,351 1,255 1,304 1,415 1,229 1,329 1,245 1,127 1,211 1,317 1,127 1,216 1,323 1,186 Fournier e Mitchell (1992), com a produção conjunta, também obtêm poupanças significativas de custos nos hospitais da Florida. Deduzem que os grandes hospitais oferecem maior escala de produção e maior diversificação de serviços, permitindo-lhes ser mais eficientes. A partir do teste de existência de complementaridade fraca (WCC) no ponto médio, verificamos, por último, que existem economias de gama entre número de internamentos e consultas e entre número de internamentos e urgências18. Na medição de WCC, Cowing e Holtmann (1983) concluem pela existência de deseconomias de gama entre urgências e serviços de internamento. Vita (1990) verifica que existem deseconomias de gama entre serviços de internamento das diferentes especialidades e consultas e urgências, excepto entre serviços de internamento de medicina e cirurgia e consultas e urgências. Scuffham et al. (1996) também deduzem deseconomias de gama entre número de internamentos e consultas e entre demora média e consultas. 4. Conclusões No presente estudo foi nosso objectivo, estudar as relações de custo de produção dos hospitais públicos portugueses. Para isso, explorámos a utilização de uma forma flexível da função de custo multiproduto e multifactores produtivos: a função de custo translogarítmica. 18 α 1α 3 + α 13 = −0,005 e α 1α 4 + α14 = −0,004 . G.E.M.F. – F.E.U.C. 31 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira Com base nos resultados estimados, podemos verificar a existência de economias de escala crescentes no curto prazo, pelo que, para aumentar a eficiência dos hospitais, estes deverão aumentar a sua escala de produção, nomeadamente dos serviços de consultas e urgências. Uma redução na demora média dos internamentos levaria a uma diminuição desproporcional dos custos. Estes resultados vão de encontro às propostas de Abel-Smith (1996) de aumento da taxa de ocupação dos hospitais, concentrando a oferta de serviços hospitalares, e de redução do número de dias de internamento, responsáveis por grandes custos hospitalares. Verificámos também que, no longo prazo, os hospitais portugueses estão a operar na zona de deseconomias de escala. A análise da elasticidade do custo variável em relação ao factor fixo e da elasticidade de escala também em relação ao factor fixo, levou-nos a concluir que os hospitais estão longe da sua via de expansão óptima. É necessário que estes aumentem de produção e dimensão para se aproximarem da dimensão óptima de longo prazo, permitindo ampliar as economias de escala. Por fim, podemos constatar a existência de economias de gama globais e específicas. Os hospitais públicos portugueses conseguem, com efeito, poupanças significativas com a produção conjunta de serviços de internamento, consultas e urgências. Considerando os valores obtidos para as economias de gama e de escala dos serviços de urgências, vemos que é mais económico produzir em conjunto e que se deve apostar no aumento da produção deste serviço, o que contradiz algumas políticas recentes de encerramento dos serviços de urgências em alguns hospitais, concentrandoos em outros, e de redução do seu nível de produção, transferindo-os para os Centros de Saúde. Do ponto de vista dos custos, os resultados do estudo levam-nos, assim, a propor, como política hospitalar, a opção por grandes hospitais, com uma larga escala G.E.M.F. – F.E.U.C. 32 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira de produção e uma maior diversificação dos serviços. Uma opção que, de resto, parecenos estar a ser seguida pelo Ministério da Saúde Português, com a substituição de antigos hospitais por novos de maior capacidade, traduzida no aumento da lotação e prestação de serviços mais diferenciada, e de área de influência mais alargada. G.E.M.F. – F.E.U.C. 33 Economias de Escala e de Gama nos Hospitais Públicos Portugueses Carlos Carreira Referências Abel-Smith, Brian (1996), "The Control of Health Care Costs and Health Reform in the European Community", in Artur M. Vaz et al. (ed.), As Reformas dos Sistemas de Saúde, Associação Portuguesa de Economia da Saúde, Lisboa. Akridge, Jay T. and Thomas W. Hertel (1986), "Multiproduct Cost Relationships for Retail Fertilizer Plants", American Agricultural Economics Association, 68(4), 928-938. Andrade, João S. (1993), Análise Econométrica: uma Introdução para Economistas e Gestores, Texto Editora, Lisboa. Baltagi, Badi H. (1995), Econometric Analysis of Panel Data, John Wiley & Sons, Chichester. 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Duas Modalidades Complementares de Financiamento das Reformas - Maria Clara Murteira 1996 Nº. 8 A Crise e o Ressurgimento do Sistema Monetário Europeu - Luis Manuel de Aguiar Dias Nº. 7 Housing Shortage and Housing Investment in Portugal a Preliminary View - Vítor Neves Nº. 6 Housing, Mortgage Finance and the British Economy - Kenneth Gibb e Nile Istephan Nº. 5 The Social Policy of The European Community, Reporting Information to Employees, a U.K. perspective: Historical Analysis and Prognosis - Ken Shackleton Nº. 4 O Teorema da Equivalência Ricardiana: aplicação à economia portuguesa - Carlos Fonseca Marinheiro Nº. 3 O Teorema da Equivalência Ricardiana: discussão teórica - Carlos Fonseca Marinheiro Nº. 2 As taxas de juro no MMI e a Restrição das Reservas Obrigatórias dos Bancos - Fátima Assunção Sol e José Alberto Soares da Fonseca Nº. 1 Uma Análise de Curto Prazo do Consumo, do Produto e dos Salários - João Sousa Andrade G.E.M.F. – F.E.U.C. 39