LEIA - Unijorge
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Gravidez na adolescência: motivos, perspectivas e percepções dessa realidade, para as adolescentes do Município de Madre de Deus – BA Nieuma Lôbo1 Milena Medrado2 Claúdia Borges3 Resumo: Trata-se de um estudo de caráter quanti-qualitativo, realizado no município de Madre de Deus – BA, no período de 03 a 23 de Janeiro de 2009. Os dados foram coletados mediante entrevista semi-estruturada, com perguntas relacionadas à condição socioeconômica da gestante e sua sexualidade, sua relação com a família e o parceiro. Neste período foram entrevistadas 17 gestantes adolescentes com idade, variando entre 13 a 19 ano devidamente registradas e acompanhadas pelo Programa de Saúde da Família do município. O presente trabalho teve por objetivo levantar dados que posteriormente servirão para a elaboração de um programa educativo visando à conscientização e prevenção da gravidez na adolescência e implementação de um programa fisioterapêutico. Palavras-chaves: Gravidez. Adolescentes. Fisioterapia. Abstract: This is a quantitative and qualitative study dealt from January 3rd to the 23rd on the municipality of Madre de Deus. The data analysis was made based on the answers given on a semi-structured interview with questions about the pregnant adolescent’s social and economical situation, sexuality and their relationship with their family and partners. In this research 17 pregnant teenagers with ages varying from 13 to 19 were interviewed and all of them were registered and accompanied by the town’s Family Health Program. This article’s goal is to collect data so it can be used to create an 1 Fisioterapeuta pelo Centro Universitário da Bahia – FIB – Estácio de Sá. 2 Fisioterapeuta pela EBMSP, Mestre em Gestão do Conhecimento pela UFSC. 3 Bióloga; Doutora em Patologia Humana pela UFBA. 54 educational program to bring awareness and prevent teenage pregnancy and to implement a physiotherapy program. Keywords: Pregnancy. Adolescents. Physiotherapy. INTRODUÇÃO A população de adolescentes no mundo já ultrapassa a faixa de 1 bilhão de jovens. Estima-se que 60 a cada 1000 jovens entre 10 a 19 anos são mães, o que significa 17 milhões de nascimentos a cada ano. (WHO, 2006). Embora a taxa de fecundidade, no Brasil, venha diminuindo desde a década de 1970, 26% dos nascidos são filhos de adolescentes entre 15 e 19 anos. Todavia, entre as adolescentes com idades entre 10 a 14 anos, no período de 1993 a 1998, houve um aumento no número de partos para cerca de 31%. As regiões norte, centro-oeste, nordeste e as zonas rurais são onde se concentram as maiores incidências de gestações na adolescência por serem regiões de condições socioeconômicas mais desfavoráveis. (IBGE, 2000). Adolescente é todo o indivíduo com idade entre 10 a 19 anos e tem como características um intenso crescimento e desenvolvimento que se manifesta por marcantes transformações anatômicas, fisiológicas, como também psicossociais. É o período compreendido entre a infância e a idade adulta. (MANDÚ, 2007; XIMENES NETO et al., 2007). A adolescência é um fenômeno bastante complexo que envolve o desenvolvimento da maturidade emocional, a inserção no mundo adulto e do trabalho, além de novos exercícios da sexualidade. (LEAL; WALL, 2005; SILVA; TONETE, 2006). O despertar da sexualidade para os jovens é geralmente mais conflituoso, pois os mesmos sentem as pressões de sentimentos estranhos e desconhecidos e vivenciam transformações, como conflitos da afirmação sexual, auto-erotismo e o início da interação com o sexo oposto. A educação sexual é muito importante nesse período e deve ser iniciada o mais cedo possível, pois dá oportunidade ao jovem de refletir, construir 55 um projeto de vida e concretizá-lo. (AMARAL; FONSECA, 2005; BRANDÃO; HEILBORN, 2006) A gravidez na adolescência é vista atualmente como um problema de saúde publica, devido às complicações físicas, psicológicas, socioeconômicas que dela derivam. Na gravidez todos os sistemas são modificados para a adequada adaptação da mãe a esse novo momento e o melhor desenvolvimento do feto. Essas modificações são suficientes para criar situações biológicas, corporais, mentais e sociais. (VALADARES, 2007). Tauil (2001), por sua vez, observou que o grupo de mães adolescentes, comparadas a mães adultas, teve uma proporção significativa de recém-nascidos prematuros, com baixo peso ao nascer (BPN) e com menor vitalidade. Já segundo Ponte Júnior e Ximenes Neto (2004), a gravidez na adolescência é considerada de alto risco, uma vez que existe a maior incidência de complicações na gestação, parto e puerpério. As complicações mais freqüentes são: DHEG (Doença hipertensiva especifica da gestação), Diabestes Gestacional, anemia, ITU (Infecção do trato urinário), desproporção feto-pélvica e maior índice de cesariana. A gravidez na adolescência, portanto, não gera apenas problemas físicos mas também problemas psicossociais tanto para a jovem grávida quanto para seus familiares. Tal fato está associado à maior liberdade e o inicio da vida sexual precoce, à vontade de perpetuação do namoro, o anseio de encontrar um objetivo para a vida, visualizar uma companhia para amenizar a solidão na figura de um filho, falha na educação sexual e no planejamento familiar, sensação de “invulnerabilidade”, além de problemas familiares. Para tanto, o município de Madre de Deus, no Estado da Bahia foi escolhido devido o contato direto com essa comunidade; na qual foi possível acompanhar o crescimento da cidade, observando suas dificuldades, como também a falta de profissionais específicos na área de fisioterapia. A população de adolescentes do sexo feminino com idade entre 10 a 19 anos é de 1.479 jovens, sendo que 73 delas, no ano de 2005, deram à luz a crianças nascidas vivas. A cidade é uma cidade litorânea, que possui 14.453 habitantes atualmente e tem como pontos 56 fortes, em sua economia, o turismo e a indústria petrolífera que se instalou no município na década de 1950, beneficiando os moradores com novos empregos e melhores condições de vida. Para o relator especial da ONU, Addendum (2003), em seu relatório sobre a venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil; adolescentes se prostituem nas ruas, principalmente em vias onde há um maior fluxo de homens e que entre as situações mais críticas, estão nos portos, vias para motos e grandes rodovias com tráfico intenso de caminhões e locais turísticos. Os adolescentes que estão envolvidos nesse tipo de exploração geralmente largaram à família e a escola. A fisioterapia, por sua vez, é uma ciência da saúde que caminha em direção as ações preventivas, como promoção e educação em saúde e prevenção de doenças; ao invés de centralizar-se somente nas ações curativas. Assim sendo, o profissional fisioterapeuta tem um papel de extrema importância para a comunidade em que atua, contribuindo para a melhora da qualidade de vida da mesma. O fisioterapeuta vem conquistando a cada dia seu espaço e mostrando-se peça essencial no âmbito da saúde pública, que se fundamenta na investigação, educação e na prática dos serviços de atenção preventiva e curativa, incluindo os conhecimentos do ambiente natural e social. (BARAÚNA et al., 2008). Nessa conjuntura, é de suma importância que o fisioterapeuta conheça melhor as necessidades e carências da comunidade na qual irá atuar, sendo essas ações norteadoras do seu plano terapêutico. Por conseguinte, por se tratar de uma gravidez de alto risco e pelos problemas físicos e psicossociais a ela relacionados, o presente trabalho teve por objetivo levantar dados que posteriormente servirão para a elaboração de um programa educativo visando à conscientização e prevenção da gravidez na adolescência. Além disso, pretende-se implementar um programa fisioterapêutico, uma vez que a implementação de um programa educativo não exclui a possibilidade de novos casos de gravidez entre as adolescentes locais. Logo, o profissional fisioterapeuta poderá atuar de maneira mais eficiente nas condutas com relação a adolescente gestante e aos recém natos. 57 METODOLOGIA Este estudo trata-se de uma pesquisa de caráter quantiqualitativo, realizada no município de Madre de Deus – BA, no período de 03 a 23 de Janeiro de 2009. Para a coleta de dados, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas composta por 62 perguntas relacionadas à condição socioeconômica da gestante, sobre a adolescência, sexualidade e família; perguntas referentes à gravidez e aborto; sobre o fato de serem filhas de mães adolescentes e sobre o parceiro da gestante. As entrevistas foram gravadas através do aparelho de MP4 (tecnologia que permite a compactação de dados digitais de vídeo e áudio) da marca Multilaser, e posteriormente transcritas na íntegra, e os dados analisados de forma descritiva. Essas entrevistas foram realizadas, primeiramente, nos postos do PSF do município mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelas gestantes ou pelos seus responsáveis no caso das menores de 18 anos, respeitando os aspectos éticos e legais da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde – CNS. Visto as dificuldades de obter as assinaturas dos responsáveis, pois os mesmos não acompanhavam as gestantes em suas consultas, fez-se necessário entrevistá-las em suas próprias residências com a ajuda das agentes comunitárias do município nas suas respectivas microáreas. Neste período foram encontradas 25 gestantes adolescentes, com idade variando entre 13 a 19 anos, devidamente registradas e acompanhadas pelo Programa de Saúde da Família do município. Porém somente 17 foram entrevistadas. A não aderência ao estudo ocorreu pois a genitora de uma gestante relatou a inexistência da gravidez; uma não quis participar da pesquisa; cinco estavam fora do município no momento da visita e uma foi encontrada em trabalho de parto em sua residência, impossibilitando sua participação no estudo. 58 RESULTADOS E DISCUSSÃO Perfil social das adolescentes gestantes A idade das gestantes variou entre 13 e 19 anos conforme dados demonstrados na tabela 1. Todavia, a literatura mostra um aumento da incidência na gravidez na adolescência especialmente na faixa etária de 10 a 14 anos de idade. (SANTOS, SCHOR, 2003). Quanto ao estado civil, 64,7% relataram ter uma união estável que seria um casamento informal, 23,5% estão solteiras, uma está casada oficialmente e uma separada. Na residência dessas gestantes, moram de duas a mais de cinco pessoas, sendo que na maioria das casas (64,7%) habitavam três a cinco pessoas. Esses números mostram que as adolescentes continuam dependentes dos adultos, sejam eles seus pais ou parentes de seu parceiro. A situação marital dessas adolescentes são freqüentes, revelando o desejo das jovens de alcançar uma pseudo-independência dos laços dos pais, sendo um motivo para “sair de casa”. Essa união prematura é um dos fatores de risco para a repetição da gravidez ainda na adolescência. (PERSONA, SHIMO, TARALLO, 2004; XIMENES NETO et al., 2007). Tabela 1: Distribuição das adolescentes segundo a idade, situação conjugal e números de pessoas na residência. Variáveis Idade 13 14 15 16 17 19 Estado civil União estável Casadas Solteiras Separadas N° de pessoas na residência 2 pessoas 3 a 5 pessoas Mais de 5 Outros n° % 1 1 1 2 5 7 5,9% 5,9% 5,9% 11,8% 29,5% 41% 11 1 4 1 64,7% 5,9% 23,5% 5,9% 3 11 1 2 17,6% 64,7% 5,9% 11,8% Fonte: pesquisa de campo, janeiro de 2009 59 Na tabela 2 constata-se que a maioria das gestantes (52,9%) ainda são estudantes e que a renda familiar é igual ou menor que 1 salário mínimo (41,3%). No que se refere à religião, a sua maioria eram católicas ou não possuíam religião. Segundo Leal e Wall (2005) e Duarte, Nascimento e Akerman (2006) a ocorrência de gravidez na adolescência é inversamente proporcional a renda, assim sendo, entre as adolescentes mais pobres o número de parto é também mais elevado. Tabela 2: Distribuição das adolescentes segundo a profissão, religião e renda familiar. Variáveis Profissão Estudante Desempregada Empregada Religião Católica Espírita Testemunha de Jeová Cristã Outros Não tem Renda Familiar < 1SM 1 SM 2SM > 2SM Não sabem n° % 9 7 1 52,9% 41,2% 5,9% 8 1 0 1 3 4 47,1% 5,9% 0% 5,9% 17,6% 23,5% 2 5 3 1 6 11,8% 29,5% 17,6% 5,9% 35,2% Fonte: pesquisa de campo, janeiro de 2009 Quando perguntadas sobre o número de filhos, o tempo de gestação e a escolaridade (Tabela 3), a maioria das gestantes (94,1%) não tinha outro filho e apenas uma já tinha um filho. O período gestacional variou de 3 a 9 meses, sendo que 70,6% estavam ainda no segundo trimestre de gestação. Quanto à escolaridade, demonstrou-se que as gestantes ainda estão em fase escolar, sendo que apenas três havia concluído o ensino médio. A baixa escolaridade e o abandono escolar são freqüentemente citados como fatores predisponentes a uma gravidez na adolescência, pois dificulta ao jovem adotar práticas 60 preventivas, além de diminuir as chances frente ao mercado de trabalho, ou, quando conseguem, são atividades de baixa remuneração, fazendo com que a adolescente continue dependente dos seus familiares ou companheiro. (GODINHO et al., 2000; HERCOWITZ, 2002; LEAL, WALL, 2005; DUARTE, NASCIMENTO, AKERMAN, 2006). Tabela 3: Distribuição das adolescentes segundo ao número de filhos, tempo de gestação e escolaridade. Variáveis N° de filhos nascidos vivos n° % Nenhum 1 filho 2 filhos Tempo de gestação 3 meses 5 meses 6 meses 7 meses 8 meses 9 meses 16 1 0 94,1% 5,9% 0% 5 4 3 1 2 2 29,4% 23,5% 17,6% 5,9% 11,8% 11,8% Escolaridade 1° incompleto 1° completo 2° incompleto 2° completo 7 0 7 3 41,2% 0% 41,2% 17,6% Fonte: pesquisa de campo, janeiro de 2009 A maioria das mães das adolescentes eram analfabetas ou tinham o 1º grau incompleto. Os dados revelaram que 29,4% das mães tinham como ocupação serviços gerais ou estavam desempregadas. As demais se dividiam em ocupações de escritório, nas escolas ou com seus próprios negócios. Quando perguntadas sobre a escolaridade do pai, a maioria delas relatou que o pai possuía o 2º grau completo ou era analfabeto, tendo como ocupação mais citada o trabalho na área industrial. Quanto ao estado civil dos pais, 53,0% estavam separados (Tabela 4 e 5). Essas meninas têm uma convivência direta com padrastos e muitas vezes distanciamento dos seus pais biológicos. A baixa escolaridade dos pais e disfunções nas relações familiares, 61 como viuvez e ausência da figura paterna, têm uma associação significativa com a gravidez na adolescência. (CAPUTO, BORDIN, 2008). Como no trecho abaixo: “Espero viver bem né? E que a criança também né?[...] Porque eu em criança não tive tanto... assim da parte de minha mãe e de meu pai [...] Porque se separou cedo. Fiquei desamparada.” (M.N.S., 19 anos) Tabela 4: Distribuição das adolescentes segundo a escolaridade e a ocupação da mãe. Variáveis n° % Analfabeta 4 23,5% 1° incompleto 3 17,6% 1° completo 1 5,9% 2° incompleto 2 11,8% 2° completo 5 29,4% 3° completo 1 5,9% Não sabe 1 5,9% Desempregada 5 29,4% Serviços Gerais 5 29,4% Pedagoga 1 5,9% Professora 1 5,9% Auxiliar de escritório 1 5,9% Marisqueira 1 5,9% Técnica de enfermagem 1 5,9% Empresária 1 5,9% Outros 1 5,9% Escolaridade da mãe Ocupação da mãe Fonte: pesquisa de campo, janeiro de 2009 62 Tabela 5: Distribuição das adolescentes segundo a escolaridade e a ocupação do pai e o estado civil dos pais. Variáveis n° % Analfabeto 1° incompleto 2° completo Não sabe Ocupação do pai 4 3 5 5 23,5% 17,6% 29,4% 29,4% Trabalham na industria Servidor publico Agricultor Vigilante Cobrador Pintor Desempregado Não sabem Outros Estado civil 4 1 1 1 1 1 1 5 2 23,5% 5,9% 5,9% 5,9% 5,9% 5,9% 5,9% 29,4% 11,8% Casados Separados Viúvos 5 9 3 29,4% 53,0% 17,6% Escolaridade do pai Fonte: pesquisa de campo, janeiro de 2009 Adolescentes, sexualidade e família Das 17 adolescentes grávidas entrevistadas, uma menstruou com idade inferior a 10 anos, dez entre 10 a 12 anos, quatro entre 13 e 14 anos e duas entre 15 a 17 anos. Com relação à reação de seus familiares à menarca, 12 falaram que a reação foi boa e cinco foram indiferentes. O desenvolvimento físico e a menarca acontecem cada vez mais cedo, fazendo com que essa jovens adquiram a capacidade reprodutiva sem um conhecimento adequado a respeito do corpo e das manifestações de sua sexualidade. “Historicamente a idade média da menarca vem diminuindo cerca de 4 meses a cada década, encontrando-se no momento por volta de 12,5 a 13 anos.” (SANTOS JÚNIOR, 1999 apud CAMPOS; REIS, 2002, p. 306). Sete gestantes tiveram algum esclarecimento por parte dos familiares sobre sexo e o que significa a menarca, sete não tiveram nenhum esclarecimento e três não precisavam, pois 63 relatam que já tinham um esclarecimento prévio. Os pais, geralmente, se sentem desconfortáveis em abordar esse assunto e pensam, muitas vezes, que negando aos jovens informações a respeito da sexualidade e contracepção estarão retardando o inicio da vida sexual. A atividade sexual muitas vezes é clandestina, sem privacidade e sem aconselhamento profissional prévio. (ANDRADE, 2002). Na avaliação dos dados a cerca da iniciação sexual, apenas uma adolescente manteve a 1ª relação sexual com idade igual a 18 anos, quatro entre 16 e 17 anos, nove entre 14 e 15 anos, três entre 12 e 13 anos. E os motivos mais relevantes que levaram essas meninas a terem a 1º relação sexual foram: “Rapaz, foi por que a gente tava numa festa. Eu já conhecia o menino a algum tempo, e lá cada um... cada casal.. foi num lugar. É o clima e a bebida, né? Por que curiosidade eu não tinha não.” (J.D.S., 19 anos). “Foi porque de uma prima minha. Porque ela se armou com um colega dela e queria que eu me armasse com o colega dele. Ai ela armou pra mim e pra ela. Ela falou que não queria ficar só, ai ela me chamou para ir.” (A.C.B., 13 anos). “Foi mais forçado né? Ele falava que já tava na hora. E ele era de maior e a gente ficava a 3 meses” (D.R.S., 17 anos). “Conheci ele no Madre Verão. Eu tinha curiosidade, eu via filme, revista e minha irmã falava.” (J.G.S., 14 anos). A iniciação sexual sempre gera inquietações e curiosidade, além de despertar sentimentos distintos como: medo, prazer, desejo de conhecer algo novo. Na maioria das vezes essa iniciação acontece sem o conhecimento dos pais e sem um preparo anterior, sob pressões de amizades, do parceiro, permeada de medo e a falta de informação sobre o uso dos meios contraceptivos, além de, não raro, a vontade inconsciente de engravidar para testar a sua fertilidade e galgar um espaço na sociedade. (AMARAL; FONSECA, 2005; BRANDÃO; HEILBORN, 2006). Quando perguntadas se contaram para algum familiar sobre a 1ª vez, 9 disseram que sim e 8 disseram que não. As mães continuam sendo as confidentes da maioria das jovens, sendo 64 as avós a segunda opção. Quanto ao conhecimento sobre os métodos contraceptivos, 13 já conheciam e 4 relataram não ter conhecimento. A escola e os amigos foram os meios mais usados para conhecer sobre contracepção, porém 8 não usaram nenhum tipo de contraceptivo na 1ª vez sendo um dos principais motivos não ter no momento, descaso do parceiro ou porque queriam engravidar, como no depoimento abaixo: “Eu acho que a gente não teve muita preocupação. Antes de engravidar eu queria engravidar. È porque eu gosto tanto de criança. Era o meu sonho. Ai depois de 1 ano e meio veio. Agora não quero mais, mas agora já ta aqui. Depois que veio é tão chato, é horroroso, é horrível. Eu não sei se a experiência de ser mãe é boa, mas de ficar grávida, não gostei não.” (R.J.S., 16 anos). Contudo, apesar do grande número de adolescentes terem conhecimento sobre os métodos contraceptivos, não existe uma associação entre os níveis de conhecimento e a taxa de utilização. Uma das razões para esse comportamento seria a imaturidade psico-emocional dos adolescentes. Os meios de comunicação e os serviços de saúde estão sempre fazendo campanhas de esclarecimento, porém as estatísticas mostram que no Brasil apenas 14% das jovens de 15 e 19 anos utilizam contraceptivos. (BALLONE, 2003). Quando perguntadas sobre o relacionamento com a família antes da gravidez, oito disseram que era bom, quatro ótimo, três regular e dois ruim. E se agora com a gravidez modificou esse relacionamento de alguma forma, dez disseram que sim e sete disseram que não modificou. Devido ao modo de vida adotado pelas famílias atualmente, os pais não têm mais tempo para ficar com os filhos, podendo gerar distanciamento entre as relações. O jovem, muitas vezes, se defronta com brigas e tristeza no seio familiar, levando-o a ter o desejo de formar a sua própria família. A modificação na atitude dos familiares ocorre quando é percebido que algo de “anormal” esta acontecendo com a adolescente. (PONTE JÚNIOR , XIMENES 65 NETO, 2004; REIS, OLIVEIRA-MONTEIRO, 2007). A exemplo dos seguintes depoimentos: “Não tá nem boa, nem ruim, mas sempre fica uma diferença, tem muita indiferença.” (D.A.S., 19 anos). “Melhorou, minha mãe ficou mais atenta a mim, mais chamego.” (L.S.A., 15 anos). “Ele (o pai) continua fazendo as mesmas coisas que fazia antes. Só não faz mais algumas coisas quando eu comecei a morar com o meu esposo. Ele bebia e não via a gente mais como filha e sim como mulher. Ele ficava se masturbando.” (R.J.S., 16 anos). A gravidez O atraso na menstruação foi o sinalizador da gravidez para a maioria das adolescentes (76,5%), que logo procuram fazer o teste de farmácia e/ou BETA-HCG, mostrando que as gestantes tinham conhecimento sobre o corpo e os métodos diagnósticos. Entre os motivos que levaram essas meninas a engravidarem, 64,7% foi descuido ou falha dos contraceptivos. Quando perguntadas se queriam engravidar, oito disseram que queriam e nove disseram que não. A maioria das adolescentes que queriam engravidar já vinha tentando há algum tempo. Para Leal e Wall (2005), apesar de a adolescência ser uma fase voltada aos estudos e preparação para a vida adulta, as adolescentes planejam e desejam a gravidez cada vez mais cedo. Perguntadas como contaram sobre a gravidez para os familiares, as adolescentes relataram que precisaram de alguém para contar por elas, pois tinham medo da reação dos pais. A gravidez na adolescência gera, muitas vezes, um medo exacerbado nas adolescentes por não saberem qual será a reação dos pais e do companheiro. Assim sendo, as jovens preferem comunicar-se, primeiramente, com pessoas fora do seu meio familiar. Esse comportamento é próprio da fase de desenvolvimento psicossocial do adolescente de identidade e emancipação. (GODINHO et al., 2000; SILVA, TONETE, 2006). Conforme as falas de algumas entrevistadas: 66 “Foi um reboliço. Chorei. E foi meu marido que contou. Porque fizemos tudo escondido dela.” (T.C.S., 17 anos). “Eu liguei para o meu irmão e ele contou para a minha mãe. Eu liguei para ela depois, porque ela tinha me colocado para fora antes de eu engravidar. Eu brigava muito como meu padrasto.” (D.R.S., 17 anos). A gravidez, para a grande maioria das adolescentes, foi descoberta ainda no 1º trimestre e apenas uma adolescente descobriu já no 2º trimestre. Quando perguntadas sobre se já praticaram aborto, somente três já tinham realizado, sendo dois provocados e um espontâneo. As idades eram 12, 13 e 16 anos, respectivamente. Todas só haviam abortado apenas uma vez. As que provocaram o aborto tiveram a ajuda da irmã e da mãe, sendo que uma dela tomou a decisão do aborto uma vez que se achava muito nova, e a outra o pai decidiu por ela. Durante a entrevista todas as adolescentes responderam que não tentaram realizar o aborto na gravidez atual. A gravidez é um momento de maior sensibilidade e instabilidade emocional e, quando inserida na adolescência, que possui as mesmas características, pode sobrecarregar a jovem grávida, levando-a à depressão e até mesmo ao suicídio. Adolescentes, quando amparadas pela família e/ou pelo parceiro, tendem a aceitar e assumir essa nova fase da vida com mais equilíbrio. (SUZUKI, 2007); fato observado nos segmentos abaixo: “Porque eu gosto do meu esposo, porque ele ta comigo e eu sabia que ele não ia me deixar e nem nada. Ia estar sempre comigo, me apoiar e eu queria porque a criança não tem nada a ver com isso.” (J.D.S., 19 anos). “Porque eu fiquei com medo. Porque teve uma menina lá no colégio que abortou e o menino caiu dentro de privada. Ai fiquei com medo.” (A.C.B., 13 anos). “Vê, né? Minha mãe teve 4 filhos e praticamente na mesma idade que eu e ta todo mundo criado aqui. E também achei que poderia acontecer comigo.” (A.C.R., 19 anos). 67 Os pré-natais foram iniciados até os 2 meses de gestação por seis adolescentes, oito de 3 a 4 meses, duas de 5 a 6 meses e apenas uma ainda não havia iniciado. Do total das gestantes, 11 disseram saber a importância do pré-natal e seis disseram não ter conhecimento. O pré-natal é um conjunto de ações que visa à promoção da saúde das mulheres grávidas e uma das principais finalidades é a realização de atividades educativas, as quais envolvem baixo custo tecnológico. Logo, o profissional fisioterapeuta deverá estar atento a essas questões e deve auxiliar a adolescente grávida – através de trabalhos de conscientização postural, exercícios respiratórios e relaxamento – a entender as alterações decorrentes da gravidez, dando-lhe oportunidade de se conhecer e entender melhor esse novo momento. A educação, por tanto, é de suma importância, pois proporcionará um desfecho saudável para mãe e filho. (STEPHENSON, O´CONNOR, 2004; STRASSBURGER, DREHER, 2006; CARVALHO, ARAÚJO, 2007; BARACHO et al., 2007). As percepções das adolescentes a cerca da gravidez e suas perspectivas futuras são, no contexto geral, positivas e algumas vezes contraditórias e até mesmo utópicas; permeadas de sentimentos como felicidade e contentamento, o medo e a esperança de um futuro melhor tanto para elas quanto para a criança, como também o desejo de galgar um espaço de destaque na sociedade. Isso mostra que, apesar de não terem desejado a gravidez, se acostumaram com essa nova realidade, como pode ser observado nos depoimentos abaixo: “Uma coisa muito forte de amor e carinho” (D.A.S., 19 anos). “Sei lá, mas mulher, né? Mãe.” (T.S.C., 17 anos). “Trabalhar.” (choro) (A.C.B., 13 anos). “Vou esperar o que da vida meu Deus?” (A.M.S., 17 anos). Das 17 gestantes, 15 acreditam que a criança não atrapalhará a sua vida; contra duas que pensam o contrário. Essas informações mostram que a gravidez na adolescência vem ocorrendo com mais freqüência porque as adolescentes desejam e acreditam 68 que esse acontecimento não atrapalhará a sua vida; o que pode ser verificado logo abaixo: “[...] Tem minha mãe também que vai estar me ajudando.” (T.S.C., 17 anos). “Porque vou colocar ela no colégio, ai, quando eu vir do trabalho, eu pego ela.” (A.C.B., 13 anos). “Vai porque mama, né? Não pode sair porque mama, não pode estudar porque mama.” (A.C.R., 19 anos). “Sim, atrapalha um pouquinho, porque eu gostava de muito de dançar, entrava em qualquer concurso [...] vou ter que ficar cuidando dele. Volto a dançar se meu corpo ainda prestar [...].” (R.J.S., 16 anos). Para Procópio e Araújo (2007), a gravidez na adolescência é vivida muitas vezes, como um período de muitas perdas em que as responsabilidades psicológicas, sociais e econômicas, impostas pela maternidade, paralela ao processo de amadurecimento em formação da adolescente, pode constituir-lhe uma experiência emocional difícil. A maioria das gestantes (7) pararam de estudar antes de engravidar, quatro pararam depois de engravidar e seis continuam estudando. As justificativas foram sonolência e enjôos, não sendo mais possível prestar a atenção e nem acompanhar as atividades propostas pela escola. Quando perguntadas se pretendem voltar algum dia a estudar, todas disseram que sim, e as que estudam pretendem continuar estudando após o nascimento da criança. Estudos associam a esse evento como uma forma de perpetuação da pobreza, da educação limitada, do abuso e da violência familiar tanto para a mãe quanto para a criança. Isso tudo está intimamente relacionado com o abando dos estudos para cuidar da criança, ocorrendo, assim, o aumento do risco de desemprego, mudança do estrato sócio-econômico e dependência econômica dos familiares. Dessa forma, o baixo nível social e de escolaridade estão intimamente relacionados com a gravidez na adolescência. (HERCOWITZ, 2002, XIMENES NETO, 2007). 69 Filha de mãe adolescente Foi observado que oito adolescentes eram filhas de mães que também tiveram filho na adolescência. Mas quando perguntadas se foram influenciadas por esse fato, todas disseram que não e que, para a maioria delas (94,1%), a história de suas mães foi positiva, não havendo assim uma ligação direta sobre o fato. Segundo Moreira et al. (2008, p. 318), “a adolescente que engravida hoje é muitas vezes filha de adolescentes que engravidaram ou tem outra na família – uma tia, uma irmã ou uma vizinha.” “Positiva porque a primeira gravidez da minha mãe, o padrasto dela fez minha avó escolher entre minha mãe e ele. E minha avó não tinha como escolher entre minha mãe porque, quem sustentava era ele. Ai, minha mãe batalhou e hoje meu irmão ta ai.” (I.A.P., 16 anos). O parceiro Das 17 adolescentes, 15 estão com o pai da criança e duas não estão. E quando perguntadas qual a reação dele diante da gravidez, a maioria das respostas (88,2%) foram positivas, mostrando que estavam de acordo com a gravidez. Mulheres que recebem cotas extras de afeto e atenção, posteriormente darão mais carinho e amor ao seu bebê. A aceitação dessa gravidez pelo parceiro e pela família faz com que a adolescente se sinta mais segura e amparada. (MORESCO, VAN DER SAND, 2005). A idade dos parceiros variou de 17 aos 31 anos, com média nos 24 anos. Entre eles, 12 estavam empregados e cinco desempregados. Foi perguntado também o tempo de relacionamento entre as adolescentes e seus parceiros antes de engravidar. Esse tempo variou de 1 dia a mais de 2 anos. Doze delas já moravam com os parceiros e cinco ainda não moram. E quando perguntadas se pretendem morar com ele após o nascimento, 15 disseram que sim e somente duas disseram que não. 70 Como a maioria das gestantes (70,6%) tem os pais separados ou viúvos, e não relataram durante a entrevista sobre a presença deles em suas vidas, pode-se justificar a união precoce e a diferença de idade entre as jovens e os parceiros, sendo uma busca da adolescente pela figura masculina ausente. (PERSONA, SHIMO,TARALLO, 2004). CONCLUSÃO Os dados coletados demonstram que as condições sócioeconômicas e de saúde das adolescentes atendidas pelo Programa de Saúde da Família no Município de Madre de Deus – Ba são precárias. Os motivos para a gravidez no período da adolescência, nesse estudo, foi caracterizado pelo desejo das jovens de engravidar e por uma desestruturação familiar, em que a adolescente buscava, na gravidez, algo que suprisse a sua solidão e a falta de atenção dos pais, além da tentativa de adquirir um lugar de destaque perante a sociedade. O conhecimento das adolescentes, a cerca dos métodos contraceptivos, mostrou-se pobre e a maioria não buscou nenhum meio de prevenção durante as relações sexuais, ocasionando a gravidez. Foi observado também que a menarca e a iniciação sexual acontecem cada vez mais cedo, e que os pais não estão fazendo o seu papel de educadores, deixando que isso seja feito pela escola ou pelos amigos da adolescente. As adolescentes inseridas neste estudo vêem a gravidez como um evento normal e corriqueiro e se sentem felizes e realizadas com a gestação. As perspectivas de vida das adolescentes são positivas e esperançosas, pois as mesmas acreditam em um futuro promissor e que a gravidez não interferirá em suas vidas. Isso pode ser justificado pelo possível apoio da família e do seu parceiro. Faz-se necessário à implementação de Programas de Educação no Município de Madre de Deus - Ba para prevenir a ocorrência de novos casos de gravidez na adolescência. Portanto, a participação do profissional Fisioterapeuta no Programa de Saúde da Família, no Município de Madre de Deus – Ba, é de suma importância, uma vez que este profissional pode atuar de maneira preventiva, 71 evitando que novas adolescentes engravidem. Além disso, tratase de um profissional que poderá atuar nas possíveis complicações de uma gravidez precoce. REFERÊNCIAS ADDENDUM, Juan Miguel Petit, Direitos da criança:- Relatório realizado pelo Relator Especial da ONU sobre a venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil, Sr. Juan Miguel Petit Addendum. 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