- COPEDI - Universidade Federal de São Carlos

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REALIZAÇÃO:
APOIO:
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Organização do evento
Comissão Geral
Anete Abramowicz (UFSCar), Gabriela Guarnieri de Campos Tebet (FPEI e UNICAMP),
Mairise Ap. Souza (FPEI e Consultora em Ed. Inf. e Ed. Ambiental), Maria Walburga dos
Santos (FPEI e UFSCar), Peterson Rigatto da Silva (FPEI, MIEIB, Diretor de Creche
Municipal /Piracicaba), Renata Cristina Dias Oliveira (FPEI e Coord. Pedag. SP), Solange
Estanislau dos Santos (FASS), Suely A. Mello (UNESP), Tatiana Noronha Souza (FPEI e
UNESP/Jaboticabal).
Comissão Local (São Carlos)
Alexandre Rodrigo N. Silva (FPEI e Coord. Pedag. Creche/ USP), Anete Abramowicz
(UFSCar), Beatriz Boriollo (Fórum Regional S. Carlos e UFSCar), Cleonice Maria
Tomazzetti (UFSCar), Gabriela Guarnieri de Campos Tebet (FPEI e UNICAMP), Maria
Auxiliadora Farias (Fórum Regional S. Carlos e Creche Comunitária Estrela da Manhã),
Maria Walburga dos Santos (FPEI e UFSCar). Suely Mello (UNESP), Tatiane Cosentino
(Fórum Regional S. Carlos e UFSCar)
Comissão Científica
Ana Lúcia Goulart de Faria (UNICAMP), Ana Paula Soares (USP), Anete Abramowicz
(UFSCar), Cyntia Graziella Guizelim Simões Girotto (UNESP/Marília), Elieuza Aparecida
de Lima (UNESP), Eloisa Acires Candal Rocha (UFSC), Gabriela Guarnieri de Campos
Tebet (FPEI e UNICAMP), Ivone Garcia Barbosa (UFG), Jader Janer Lopes (UFF), Ligia
Maria Leão de Aquino (UERJ), Lucia Maria Lombardi (UFSCar/Sorocaba), Marcia Gobbi
(USP), Maria Carmem Barbosa (UFRGS), Maria Letícia Nascimento (USP), Maria
Walburga dos Santos (UFSCAR), Michelle de Freitas Bissoli (UFAM), Mônica Apezzato
Pinazza (USP), Silvia Cruz (UFC), Suely Amaral Mello (UNESP), Tizuko Morchida
Kishimoto (USP), Vera Vasconcellos (UFF)
Comissão de Divulgação
Débora Alves Neto (Fórum Regional Santos, FPEI e Consult. Ed. Inf. de Santos),
Alexandre Rodrigo N. Silva (FPEI e Coord. Pedag. Creche/ USP), Flávia Cristina O.
Murbach de Barros (FPEI e Docente Ens. Superior/Ourinhos), Indyra A. P. Castellanos
(FPEI e Coord. Pedg. SP), Márcia Satomi Tsuda (FPEI/Gestora – SME/Presidente
ii
Prudente), Railda Barreto (FPEI – Gestora-SME/Presidente Prudente), Renata Cristina D.
Oliveira (FPEI e Coord. Pedag. SP), Solange Estanislau dos Santos (FASS)
Comissão Orçamentária e Financiamento
Anete Abramowicz (UFSCar), Maria Walburga dos Santos (FPEI e UFSCar)
Colaboradoras/es
Adriana Maimone Aguillar (UFTM), Alexandre Rodrigo N. Silva (Creche/ USP), Alex
Barreiro (Faculdades Integradas Maria Imaculada), Ana Lúcia Goulart de Faria
(UNICAMP), Ana Maria Orlandina Tancredi Carvalho (UFPA), Anamaria Santana da Silva
(UFMS), Ana Paula Cordeiro (UNESP/Marília), Anete Abramowicz (UFSCar), Angela Maria
Scalabrin Coutinho (UFPR), Beatriz Boriollo (Creche/USP), Cassiana Magalhães (UEL),
Celia Regina Batista Serrão (Universidade Presbiteriana Mackenzie), Cleonice Maria
Tomazzetti (UFSCar), Cleriston Izidro dos Anjos (UFAL), Conceição de Maria Moura
Nascimento Ramos (UFMA), Daniela Finco( UNIFESP), Dourivan Camara Silva de Jesus
(UFMA), Elieuza Aparecida de Lima (UNESP), Fabiana de Oliveira (UNIFAL), Flávio
Santiago (Doutorando FE/UNICAMP), Flávia Cristina Oliveira Murbach de Barros (FIO),
Gabriela Guarnieri Campos Tebet (UNICAMP), Gabriel de Andrade Junqueira Filho
(UFRGS), Jaqueline Pasuch (UNEMAT), José Milton de Lima (UNESP/Presidente
Prudente), Juliana Campregher Pasqualini (UNESP/Bauru), Lúcia Lombardi
(UFSCar/Sorocaba), Luciane Muniz Ribeiro Barbosa (UNICAMP), Mairise Aparecida
Souza (Fórum Paulista de Educação Infantil), Márcia Anacleto (SME/Campinas), Márcia
Satomi Tsuda (Gestora – SME/Presidente Prudente), Marcos Garcia Neira (USP), Maria
Walburga dos Santos (UFSCar), Mariete Félix Rosa (FCG/FACSUL), Maristela Angotti
(UNESP/Araraquara), Marlene Oliveira dos Santos (UFBA), Mirian Lange Noal (UFMS),
Nara Soares Couto (SEE/SP), Narda Helena Jorosky (FIO), Paulo Fochi (UNISINOS),
Peterson Rigato Silva (Prefeitura Municipal de Piracicaba), Regina Aparecida Marques de
Souza (UFMS), Renata Cristina Dias Oliveira (Prefeitura do Município de São Paulo),
Rosali Rauta Siller (SME/SMJ), Rosânia Campos, Roselene Crepaldi (Instituto
Singularidades), Sandra Regina Simonis Richter (UNISC), Solange Estanislau dos
Santos(FASS), Sônia Regina dos Santos Teixeira (UFPA), Soraya Franzoni Conde
(UFSC), Sueli Palmen (SME/Campinas), Suely A. Mello (UNESP), Sylvie Bonifacio Klein
(Prefeitura do Município de São Paulo), Tatiana Noronha de Souza (UNESP/Jaboticabal),
Vera Lucia Guerra (UEMS), Viviane Drumond(UFT), Zoia Ribeiro Prestes (UFF)
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ISSN 2448-1157
O COPEDI - VII Congresso Paulista de Educação Infantil
III Simpósio Internacional de Educação Infantil
O Congresso Paulista de Educação Infantil – COPEDI – em sua sétima versão e o III
Simpósio Internacional de Educação Infantil é um evento tradicional de reconhecida
importância no cenário nacional na área de Educação Infantil. Organizado pelo Fórum
Paulista de Educação Infantil, congrega pesquisadores/as, professores/as, especialistas,
estudantes e demais interessados/as nos debates, pesquisas e proposições em relação à
infância, às crianças e seus direitos e à Educação Infantil, ancorado em três pilares:
políticas, práticas e teorias refletidos, em 2015, na temática “Eu ainda sou criança…
Educação Infantil e resistência: os lugares das infâncias na educação e nas lutas
políticas”. As duas últimas versões ocorreram na Universidade de São Paulo/USP. Pela
primeira vez, a realização do evento ocorre em uma Universidade Federal, no interior do
estado, a UFSCar, localizada em São Carlos.
Com metodologia própria dos congressos contou com conferências de abertura e
fechamento, mesas de debates temáticos, apresentação de trabalhos de pesquisa ou
relatos de experiências (nas formas de Comunicação Oral, Pôster e Vídeo), além de
Oficinas Pedagógicas e Atividades Culturais, prevendo a participação de convidados
estrangeiros e do Brasil como um todo, a partir do trabalho efetivado realizado por uma
Comissão Científica referendada pelo campo.
Durante o evento, ocorre também a assembleia do Fórum Paulista de Educação Infantil,
com processo de escolha do grupo gestor do Fórum para o próximo triênio.
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ISSN 2448-1157
Índice Geral
Eixo 1 ............................................... p.0001
Eixo 2 ............................................... p.0379
Eixo 3 ............................................... p.0813
Eixo 4 ............................................... p.1372
Eixo 5 ............................................... p.2003
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ISSN 2448-1157
Eixo 1
Políticas públicas para a Educação
Infantil e para a Infância
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Índice – Eixo 1
A construção do ambiente educativo: Uma metodologia participativa na área de projetos de
intervenção em edifícios escolares ...........................................................................................4
Projeto Parques Sonoros: um espaço de descobertas ..............................................................20
Implicações da obrigatoriedade de matrícula das crianças de 4 e 5 anos na educação infantil:
problematizações necessárias .................................................................................................27
O Currículo da Educação Infantil na Secretaria Municipal de Educação de Manaus:
reconstruções no contexto amazônico ....................................................................................36
A construção da concepção da infância como sujeito de direitos na Colômbia ......................43
O Brincar e o Educar na Educação Infantil: uma análise de dados de pesquisa com as
professoras da rede municipal de São Carlos .........................................................................55
Discussão Curricular da Educação Infantil com Assistentes Pedagógicas: Uma experiência
entre setores da Prefeitura de Santo André .............................................................................70
Obrigatoriedade da pré-escola: ...............................................................................................79
A Importância do Lúdico na Educação para o Trânsito ..........................................................80
“Pedagogias das raízes”: Por uma educação infantil no/do campo .........................................81
Movimento, arte e ludicidade na educação infantil: o papel do PIBID em uma turma de préescola de uma EEEF do município de São Francisco de Paula/RS .........................................95
As DCNEI no contexto das práticas educativas com bebês e crianças pequenas .................105
Relato de práticas de estágio em Gestão da educação infantil ..............................................117
As lutas nas tramas da pesquisa: um salto para a institucionalidade das creches universitárias
uspianas ................................................................................................................................131
O Protagonismo da Escola e da Criança no Foco da Formação Profissional e das Políticas
Públicas da Educação de Zero a Três Anos. .........................................................................144
Movimentos sociais e a luta pelo acesso e qualidade na Educação Infantil no Brasil ...........157
O Embate entre a Assistência e a Educação no Campo da Educação Infantil .......................171
Construindo coletivamente uma proposta para a escola pública de educação infantil ..........185
Fórum Sul Mineiro de Educação Infantil: Participação social desde 1999 ...........................191
Educação Infantil: regiões fronteiriças entre infância, educação e subjetividade .................191
Proposta pedagógica municipal de educação infantil: mais que um documento, uma
identidade coletiva ...............................................................................................................206
Gestão escolar da educação infantil: Estudo de caso em um município paulista ..................220
Gestão democrática na educação infantil: em foco as reuniões com as famílias...................221
Integração entre família e escola: retrato da experiência de professores no papel de
pesquisadores iniciantes .......................................................................................................233
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Expansão da oferta de educação infantil no contexto dos planos de educação: um estudo sobre
a evolução da matrícula em municípios do Rio Grande do Sul ............................................245
Os Indicadores da Qualidade na Educação Infantil Paulistana e o processo formativo
promovido pela Equipe de Educação Infantil na DOT-P/DRE-JT - 1º Sem 2015 ................257
Educação infantil indígena na legislação e na produção do conhecimento ...........................264
Relato de práticas da coordenação pedagógica na educação infantil: os desafios da
implementação do Conselho de turma ..................................................................................277
Avaliação da educação infantil: um aspecto de qualidade ....................................................286
A formulação de políticas de Educação Infantil com base nos documentos do Conselho
Municipal de Educação de Duque de Caxias: desafios entre o público e o privado............287
Entre lá e aqui: um mundo de descobertas além dos muros da Creche .................................300
Mapeamento da situação das escolas municipais de educação infantil (EMEI’s) da cidade de
Assis/SP em relação às metas propostas pelo Plano Nacional de Educação (PNE 2001-2010)
nas questões de oferta, atendimento e infra-estrutura. ..........................................................308
Projeto Onuki de Musicalização na Primeira Infância ..........................................................325
Experiência em Creches Públicas da Prefeitura Municipal de Cubatão ................................325
A Formação do Gestor de Educação Infantil: Desafios Atuais .............................................334
A Expansão da Educação Infantil por meio do PROINFÂNCIA .........................................335
O Programa Proinfância nos municípios da região central, noroeste e norte do Estado do Rio
Grande do Sul uma análise do assessoramento e acompanhamento pedagógico nas redes e
sistemas de ensino ................................................................................................................349
Construindo coletivamente uma proposta para a escola pública de educação infantil .........361
Educação infantil indígena na legislação e na produção do conhecimento ..........................367
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A construção do ambiente educativo: Uma metodologia participativa na área de
projetos de intervenção em edifícios escolares
Adriana Freyberger1
A construção do ambiente educativo é uma metodologia de projeto em parceria com
crianças e profissionais da educação e arquitetura. A criação partilhada parte da necessidade dos
espaços para infância serem democráticos, autorais, flexíveis, vivos e foquem o protagonismo
da criança.
O resultado é uma tipologia de espaço que aliada ao projeto pedagógico compõe uma
proposta inovadora suscitando situações mais ricas e que possibilitam às instituições qualificar e
compreender melhor seu espaço/ambiente como um elemento ativo na construção da qualidade.
Os projetos são desenvolvidos em diversos encontros entre arquiteto e usuários
trabalhando dentro de uma metodologia participativa e formativa (Dewey, Malaguzzi, Freire,
Kishimoto, Oliveira-Formosinho, Bronfenbrenner e Navir). As maquetes associadas aos
desenhos possibilitam intervenções com mais propriedade e segurança, onde os usuários
(crianças, professoras e funcionários) participam ativamente de todo o processo.
1. Introdução
Compreender o espaço para a infância como um ambiente vivo e participativo. Para a escola,
qualificar o espaço ou o ambiente implica em usos diferenciados e materiais que revelem uma
prática comprometida com a criança (Campos e Cruz, 2006; Oliveira-Formosinho, 2002; Lima,
1995). O respeito, a valorização da identidade cultural e de saberes se traduz pelas imagens,
lócus, materiais e elementos culturais dispostos no ambiente escolar e ou urbano (faz parte da
escola o entorno no qual está inserida).Uma escola viva e comprometida com suas práticas esta
associada a sua comunidade (Candau, 2006; Gimenez, 2000; Frago y Escolano 2001;
Malaguzzi, 1999; Cabanellas, 2011; Freire 1999).
1
Adriana Freyberger é arquiteta com doutorado em educação pela FEUSP,professora
universitária nos cursos de arquitetura em São Carlos e Araraquara e consultora na área de
projetos educacionais para infância na temática do espaço, do jogo e da brincadeira.
4
A complexidade da escola hoje tem a ver com a complexidade do mundo
atual. Freire (2000) nos lembra de que não é possível defender a visão
restrita da escola como um espaço exclusivo de aulas que devem ser dadas e
lições e que devem ser aprendidas imunes as lutas e aos conflitos que estão
fora da escola. Conflitos e lutas que nos lembra Hargreaves(1994), ocorrem
num tempo de insegurança de mudanças aceleradas, de vivência intensa do
tempo e do espaço, de reconhecimento da diversidade cultural, de
complexidade tecnológica crescente , de rápida evolução científica, num
tempo de questionamentos morais universais, como nos lembra Kolhberg
(1994) (Oliveira Formosinho, 2002 p.9)
Lopes e Macedo (2011) indicam que se deve garantir uma proposta
curricular intercultural e critica onde “o comum como direito de todos à
educação precisa ser reconstruído de modo que todas as culturas sejam
capazes de se reconhecer” e cujos conteúdos expressem no aluno o
desenvolvimento de valores plurais, o diálogo e as interações(Ibdem, p.193
apud Candau, 2006).
A identidade é construída no contexto vivido, assim, ao prever a utilização de materiais
qualificados e diferenciados, associados às praticas culturais, possibilita-se que a identidade
daquele grupo seja construída de forma profunda, respeitosa e valorada, inserindo a escola no
seio da comunidade.
O apoio do arquiteto à escola, em similaridade a projetos de pesquisas (CIEI) e a programas de
inovação (grupos de pesquisa e formação continuada na escola) relaciona conhecimentos
teórico-práticos (arquitetura e pedagogias) aos construídos na escola, construindo uma
metodologia de intervenção baseada nos seguintes parâmetros: 1. Associar elementos culturais,
estéticos e saberes construídos, enriquecendo as propostas pedagógicas, os currículos escolares
e os ambientes2. Oferecer subsídios e materiais/culturais para criar espaços diferenciados,
ampliando repertório cultural para potencializar as propostas e as práticas. 3.Assessorar
intervenções no ambiente escolar com foco nas praticas educativas e na ação da criança.
Os processos de formação-criação nas escolas experenciadas, foram construídos com base na
aprendizagem partilhada e em contextos democráticos, têm como referencial teórico o
envolvimento dos participantes e a formação continuada (Dewey, 1929, 1934, 1959a,
1959b; Oliveira-Formosinho, 2000, 2002; Oliveira-Formosinho e Kishimoto, 2002
Bronfenbrenner, 1996; Fullan e Hargreaves,2000),na construção de um espaço educador
(Navir, 1994, 1996; Lima, 1989, 1995; Edwards, Gandini e Forman, 1999; Almeida,1997;
Pinto e Almeida 2002, Bencostta, 2005; Montoya, 1997; Frago e Escolano, 2001 Frago, 2005 in
Bencostta 2005; Hoyuelos, 2006ª, 2006b; Cabanellas e Eslava, 2005 ), as perspectivas dos
componentes da arquitetura2e as áreas de percepção ambiental (Arnheim, 1980; Munari,
1981,1979; Hall, 1986; Tuan, 1983), a construção de um currículo crítico, multiintercultural (Lopes e Macedo, 2011, Arroyo, 2011; Gimenez, 2000) e que revelem a cultura
do adulto e a da criança (Tonucci, 1997).
2
Cor, plano, escala, textura, volume, etc.
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Os projetos para espaços e equipamentos destinados à criança precisam apreender
que é necessário estimular a iniciativa e a curiosidade da criança, sem querer
adiantar-se aos próprios projetos de apropriação da criança. Em outras palavras,
os adultos que projetam para crianças têm de perceber o difícil limite que separa a
produção das condições espaciais que permite à criança criar e construir seus
projetos e o ato inconsciente do adulto que quer se colocar no lugar das crianças,
projetando a priori suas fantasias e sonhos. (Lima, 1989 p.102)
2. Justificativa
No contexto brasileiro, conforme estudo de Bencostta (2005) o edifício escolar é construído
com viés de políticas sociais de apoio às classes menos favorecidas. Utiliza-se de parcos
recursos financeiros e projetos arquitetônicos racionais/higienistas que se proliferaram pelo
território nacional redundando em construções econômicas, com plantas simples, sistemas
modulares e estéticas simplistas, com poucas ou nenhuma diferenciações entre si cujo vínculo
com a proposta pedagógica é inexistente.
Nos anos 70, as teorias sociais sobre Nova Sociologia da Educação (NSE) (Young, 1978),
afirmam que o conhecimento é construído socialmente e pelas interações dos sujeitos; todo
conhecimento é válido se for constituído de valores éticos, portanto não possui superioridade
aos de valor científico, igualando em importância saberes populares e acadêmicos. Contextos
diferentes informam e constroem saberes diferenciados (currículo oculto), e o
edifício/território/lugar reflete para a comunidade o currículo vigente naquele contexto.
O grupo de pesquisa da Domus Academy Research Center, (arquitetos Giulio Ceppi e
Michele Zini), coordenou uma pesquisa em parceria a Reggio Children e as escolas de
educação infantil associadas, no norte da Itália, aponta as influências das nuanças arquitetônicas
no ambiente para a formação do individuo:
A riqueza de critérios das diferentes tonalidades do espaço é sensória e cultural.
A riqueza das cores e tonalidades do espaço possibilita a criança a desenvolver certas
capacidades sensitivas e de compreensão que se não forem postas nesta idade são muito difíceis
de serem recuperadas quando adulto. Assim as cores não são intrínsecas ou aplicadas, mas são
opacas e transparentes, quentes e frias, e possuem variações táteis e de texturas como
brilhantes, lisas ou rugosas o que oferece uma complexidade sensorial de identificação e maior
possibilidades exploratórias das sensações (CEPPI e ZENNI, 2003, pag. 68)
No Brasil, o padrão de construção dos prédios escolares está associado ao governo/gestão. edifícios escolares possuem tipologias construtivas que possam identificar o prédio e marcar o
nome do governo, lembrando a população de quem o construiu como revelam Moussatche,
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Alves Mazzotti e Mazzotti (1996), nos Estudos da Teoria da Representação Social3 (RS) Falta-nos compreender que o edifício escolar, a cultura local, os processos de aprendizagem e o
desenvolvimento social, físico e de identidade da criança,são indissociáveis.
Autores como Rabitti (1999), e Lima (1989), indicam a importância do entorno, do bairro e da
cidade para o edifício escolar, e Dewey (1959a) revela o aluno como participante da sociedade:
o aprendiz é participe do seu projeto educativo, tal quais é a professora, seus pais e a
comunidade educativa que o rodeia.
O espaço físico dá suporte às estruturas e objetos, mas são as pessoas e suas relações /
percepções e culturas que o qualificam como ambiente. Do objeto à paisagem urbana - a
percepção, a cultura e os costumes são determinantes na configuração espacial, caracterizando
as atividades e as relações sociais que ali se estabelecem.
Por isso o espaço em que se vive, ou o espaço que a memória preserva, funde em si tanto o calor
do ambiente e a cor das paredes quanto à alegria e a segurança que nele se sente (Lima, 1989,
p.13)
Assim, o espaço físico puro só existe na mente dos homens públicos, dos arquitetos e dos
projetistas.
O espaço material é, pois, um pano de fundo, a moldura, sobre o qual as sensações se revelam e
produzem marcas profundas que permanecem, mesmo quando as pessoas deixam de ser
crianças. É através dessa qualificação que o espaço físico adquire nova condição: a de ambiente.
(Ibidem p.13)O espaço da escola é um material riquíssimo para a população, professores e
crianças que será por eles transformado intencionalmente. Essa transformação não é só uma
questão de projeto arquitetural, limitada à ação do arquiteto, mas, sobretudo, à transformação do
modo de pensar o espaço/serviço educativo como local da propriedade coletiva pública e, por
isso, de sua apropriação dinâmica, a cada novo grupo que entre na escola, reelaborando a
história da sua produção e dos seus produtores. (Lima, 1989 p. 102)
Contrariamente aos conceitos da pós-modernidade (Fullan e Hargreaves, 2000) de flexibilidade,
individualidade, preservação da cultura local, a arquitetura escolar dos Centros de Educação
Infantil (CEI) e Escolas Municipais de Educação Infantil (EMEI) paulistas é caracterizada pelo
padrão repetitivo, por formas internas retangulares e ambientes consecutivos.
A repetição está dentro do contexto escolar. Não só a repetição de um conteúdo, através de
exercícios de memorização ou mecanização, mas também a repetição de uma forma, presente na
configuração das salas de aula e de todo o ambiente escolar, ajudando a garantir o controle e a
disciplina. (França, 1994 p.93)
Campos e Cruz (2006) realizaram uma pesquisa sobre qualidade em escolas situadas em
diversos municípios brasileiros, denominada Consulta Sobre Qualidade da Educação
3
Estudo que promove uma articulação teórica entre Arquitetura, Educação e Psicologia Social e
se insere no conjunto de trabalhos que utilizam a chamada “abordagem humano-ambiental” da
Arquitetura.
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Infantil: o que pensam e querem os sujeitos deste direito. As crianças ouvidas revelam que
faltam em suas escolas: beleza, qualidade ambiental e brinquedos (materiais).
Na voz de uma diretora de CEI (São Carlos, 2015), explicando o porquê de que só havia uma
boneca negra no seu acervo, constrói-se a importância do material nos contextos multiculturais
das Creches, informando e formando desde os anos iniciais os valores sociais, étnicos, raciais e
culturais naquele grupo. Sobre o canto das bonecas ela argumenta:
...As brancas eu ganho, as negras eu tenho que comprar e são essas as que eu mais tenho
demanda para as crianças. Nesse ano ainda não recebemos a verba. (Farias, março 2015)
Essa mesma diretora, ainda se preocupa que suas bonecas possuam além dos traços étnicos e
raciais, o gênero, explicando as dificuldades de encontrar bonecas/os com gênero para as
crianças brincarem.
O espaço escolar carrega concepções diversas e complexas que impactam nos alunos,
professoras e comunidade escolar. Para Bronfenbrenner (1996), os múltiplos ambientes sociais
nos quais as crianças vivem e suas relações pessoais, do microssistema ao macrossistema, são
fatores que refletirão em seu desenvolvimento pleno. Um bom ambiente escolar tal quais seus
materiais, ampliam repertórios e potencializam a percepção da criança, (Cabanellas e Eslava,
2005).
Um ambiente é um local onde as pessoas podem facilmente interagir face a face - casa, creche,
playground e assim por diante. Os fatores de atividade, papel, relação interpessoal constituem os
elementos, ou blocos construtores, do microssistema (BRONFENBRENNER, 1996, p.19)
O elo afetivo, negativo ou positivo entre a pessoa e o lugar alimenta e é alimentado pelas
imagens do ambiente (MOUSSATCHE, ALVES MAZZOTTI E MAZZOTTI, 1996, p. 146)
Tomando novamente o norte da Itália como uma proposta inovadora de educação infantil em
seu aspecto cultural, estético, o design, a arquitetura, a arte, a integração e interação social são
parte do projeto pedagógico: O PROJETO ZEROSEI4teve uma profunda preocupação com a
qualidade no quesito de valores éticos e estéticos (Hoyuelos, 2006).
O cunho artístico, o valor da cultura infantil e a qualidade da produção dos trabalhos
apresentados, são referências importantes para inúmeros projetos educativos. Para nós, ele
4
Projeto Zerosei é o nome do projeto educativo aplicado na região da Emilia Romana, norte da
Itália, que tornou-se referencia para sistemas educacionais que têm a criança como
protagonista e como ser de direito. A produção do material construído nessas escolas tornou-se
famoso mundialmente por utilizar recursos artísticos profissionais focados para a criança,
inclusive com a participação de artistas locais que inserem e produzem em conjunto com a
criança obras de arte. Os espaços e a arquitetura dos seus edifícios são frutos de pesquisas e
parcerias entre arquitetos e pedagogos, pois há uma profunda relação entre arquitetura,
espaços, educação, criança e a cultura local.
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revela: 1. A importância da qualidade ambiental associada aos projetos educacionais de cada
contexto educativo. 2. Entendem a criança/aluno e seu entorno de forma holística. Escola,
família e o espaço urbano (cidade, bairro) são microssistemas e mesossistemas nos quais a
criança atua, como parte de um único processo do seu desenvolvimento pleno (motor, social,
cognitivo, cultural, racial e de gênero). 3. Considera a diversidade uma riqueza, sinônimo de
qualidade e equidade. Para as professoras e atelieristas o intercâmbio multicultural e social é
essencial para aprendizagem. 4. Os projetos são elaborados com diversidade de recursos
materiais, quantidade e qualidade, que refletem o respeito e o investimento em propostas
pedagógicas comprometidas com a valorização e qualificação do contexto cultural/social/étnico
na qual estão inseridas.
O ambiente arquitetônico não pode ser isolado das práticas pedagógicas e dos usos que são
feitos pelos alunos. Por mais que os pesquisadores busquem isolar os efeitos do espaço sobre as
práticas pedagógicas, é certo que estas interferem sobre os resultados (Derouet-Besson,1996
p.103)
Metodologia
A experiência do trabalho no estudo de doutoramento (Freyberger, 2005) revelou a importância
de uma metodologia que se utiliza de modelos como o estudo de caso em uma pesquisa-açãocolaborativa para realizara formação em contexto, referendar as práticas partilhadas. A
experiência de formação externa ao ambiente da escola, e a participação de especialistas
no contexto do trabalho apontando novas formas de construir o mesmo projeto e a
oportunidade de agregar novos materiais/brinquedos nas práticas e nas experiências
construídas com as crianças, possibilitando aos projetos, que buscam a qualidade na educação
de forma permanente, sejam exitosos.
Nesse contexto podemos afirmar que arquiteto utiliza-se dos conceitos e metodologias da:
Pesquisa-ação-colaborativa, metodologia que se utiliza de estratégias, tal quais a formação e a
intervenção no formato colaborativo entre a equipe(s)do contexto(s) pesquisado e o pesquisador
para alcançar pelo desenvolvimento pessoal e profissional de professores e pesquisadores a
melhoria na qualidade da educação (Oliveira-Formosinho e Formosinho, 2000; Nóvoa, 2000).
Oficinas com atelieristas/artistas e especialistas para valorização estética e cultural dos
materiais no interior da escola.
Qualificação do ambiente educativo, por meio de intervenções partilhadas relacionando
espaços/lugares/currículos e práticas (ver metodologia do escritório de arquitetura NAVIR)
buscando a integração da criança e seu reconhecimento identitário cultural/social no ambiente
educacional e no interior da comunidade.
Levantamento iconográfico da escola apoiada como forma de documentação e construção
identitária.
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O modo de fazer e o exemplo de dois escritórios de arquitetura: NAVIR e CENÁRIOS
PEDAGÓGICOS
A metodologia do processo projetual, baseia-se na experiência de dois escritórios de arquitetura,
o francês NAVIR, e o brasileiro /paulista CENÁRIOS PEDAGÓGICOS5, que se utilizam de
metodologias de construção participativa – mutirão6, (Miagusko, 20107) – associadas à
formação em contexto e metodologias de projeto participativo para elaboração de projetos
de arquitetura educacional.
Nos projetos para espaços/arquitetura das creches na França e projetos de creches e escolas de
período integral (CEUs) no Brasil, esses escritórios são referências com trabalhos junto a
prefeituras, ministérios, associações de bairros, incluindo em suas propostas a voz das
professoras e educadores; crianças e suas famílias; e as políticas dos bairros em que estão
inseridos. Eles partem da premissa coletiva, interdisciplinar e reflexiva para que cada
participante atue da programação à concepção e da concepção à realização no processo
projetual.
Os projetos desses escritórios compõem-se das seguintes etapas de trabalho:
Técnicas e Instrumentos oriundos da arquitetura (levantamentos, croquis, maquetes de estudos,
desenhos gráficos);
Visitas ao lócus da ação;
Levantamento fotográfico e iconográfico da área a ser reformulada;
Levantamento iconográfico de como os usuários enxergam seu espaço - desenhos e fotos;
Coleta de entrevistas / escuta das opiniões de crianças, pais e funcionários sobre suas
necessidades e anseios em relação àquele espaço;
Construir espaços de intervenção com o grupo por maquetes;
Inserir a maquete no ambiente, tornando o projeto mais próximo da realidade;
Utilizar novos materiais e testá-los antes de aplicá-los nas intervenções;
Construir com o Grupo a intervenção para a reformulação do espaço.
5
Dirigido pela arquiteta Bia Goulart Faria, MS estruturas Urbanas pela FAU e autora de inúmeras parcerias
com órgãos públicos para qualificação do ambiente educativo na primeira infância.
6
Essa metodologia de mutirão é comumente utilizada em projetos de construções coletivas comumente denominadas
de mutirão, relacionadas a programas habitacionais de interesse social; e foi transposta para projetos de arquitetura
educacional.
7
CADERNO CRH, Salvador, v. 24, n. 61, p. 167-181, Jan./Abr. 2011
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A prática de um PROJETO DE PESQUISA/FORMAÇÃO/INTERVENÇÃO é possibilitar que
a instituição apoiada e sua comunidade educativa possam encontrar apoio às práticas
pedagógicas inovadoras. A qualidade do ambiente e dos materiais educativo é indissociável do
edifício e da proposta pedagógica, constitui um conjunto único, sua unidade fortalece nas
professoras, crianças e comunidade o senso de pertencimento ao lugar e forma uma imagem
positiva e de excelência da escola na sua comunidade e como bem público para todos.
3. Relato de uma intervenção
4.1 Primeiros contatos
A partir de uma sessão de formação sobre espaços de brincar e ambientes para educação
infantil a EMEI “A” firmou uma parceria com o arquiteto para renovação dos seus
espaços/ambientes cujo foco era a qualidade do ambiente educativo e suas praticas na
construção da qualidade dos serviços prestados as crianças.
O primeiro projeto de intervenção surgiu a partir da demanda das professoras sobre as
interferências do ruído vindo do refeitório. O barulho extremamente alto era fator de estresse
entre professoras, crianças e funcionários, prejudicando os trabalhos tanto no local quanto nos
outros ambientes da escola. O ruído das crianças no refeitório irradiava por todo edifício.
Melhorar a acústica era prioridade numero1, no entanto, nas queixas das professoras e
funcionárias a questão do ruído não era identificada como um problema passível de solução, era
inerente ao edifício, elas não viam como realizar essa solução, indicar a possibilidade de uma
consultoria especializada e instalação de um forro acústico foi apresentar uma solução
inovadora e inédita para aquele grupo que ingenuamente não via possibilidades de melhora no
ruído e má qualidade acústica do edifício.
Outra demanda no mesmo espaço era o saguão de entrada e o refeitório, um ambiente
contínuo,escuros, impessoal, não funcional para os usos que se faziam com as crianças, além
das questões acústicas já apresentadas.
As demandas:
Valorizar a alimentação e a autonomia, associada ao projeto da alimentação com autosserviço.
Trazer aconchego e intimidade para as refeições. - a cor resumia-se a alguns desenhos
ilustrados na parede indicando o local como área de alimentação.
Entender as dificuldades, como a questão acústica traz para o espaço e gera outras
problemáticas não perceptíveis no cotidiano da escola, mas resulta em estresse geral nos mais
diversos ambientes e práticas com as crianças.
As ações:
Estudo acústico para instalação de forro acústico para absorção do ruído (contratação de
técnicos externos)
Estudo cromático para pintura do saguão/refeitório.
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Fazer da entrada um ambiente de acolhimento
Com uma paleta cromática diferenciada escolhida em parceria com a comunidade educativa, o
saguão recebeu tons de azuis, verdes,um laranja e um amarelo e um rosa (indicação da presença
feminina na escola, na voz das professoras).
Ir além do padrão das cores primárias para criar um espaço diferenciado e de qualidade,
ampliando o repertório e transformando a identidade cultural da escola. A direção após a
intervenção ouviu de fornecedores externos que tal trabalho não era necessário para aquele
espaço naquele lugar, isso era coisa de “outra gente”, referindo-se ao espaço/cor/ambiente do
contexto da escola em relação ao bairro de periferia que se localiza a instituição.
A tinta de primeira linha ofereceu maior durabilidade aos serviços, qualidade cromática
diferenciada e a escola entendeu que ao custear ela mesma esses serviços (sem apoio da
prefeitura e das regionais) era importante investir em qualidade. A tinta feita sob medida (cor
escolhida e feita em máquina) possibilitou retoques e manutenção do espaço com maior
facilidade.
Estar em um espaço cuja qualidade ambiental acústica, luminosa, térmica é melhor, é também
poder trabalhar e vivenciar ações com mais qualidade. Foi a partir desse projeto que a equipe ao
receber a noticia que a escola receberia novos serviços de pintura, buscou ações para dar
continuidade aos trabalhos iniciado.
Novo projeto para pintura da fachada
A EMEI A situa-se em um vale,em um terreno que possui um declive. A divisa da parte baixa
dá para uma rua com um conjunto de moradias em situação precária. A situação de caos visual
ocorre tanto na paisagem externa quanto interna.
O objetivo da segunda intervenção foi criar uma identidade visual para escola, valorizar o
edifício e criar um marco na paisagem.
A proposta de trabalho surgiu a partir da oportunidade de uma obra de manutenção do edifício
para pintura e restauração da fachada e das salas do andar superior. Para a Direção da escola
(diretora e coordenadora pedagógica), a pintura do prédio ia além, era a possibilidade de
renovação. A partir de um projeto cromático de qualidade que oferecesse uma identidade ao
edifício, a escola, suas crianças e professoras, estavam repensando a imagem da escola como
edifício inserido no bairro em uma paisagem desoladora, na periferia de São Paulo. A situação
do prédio era precária, as cores originais estavam apagadas, era uma massa cinza, sem vida, sem
identidade em um ambiente urbano totalmente desolador.
Durante a sessão de formação continuada com toda a equipe foi discutido as questões sobre
como:
Pensar cores para sala, criar uma identidade e uma paleta cromática para a escola.
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Remover a linha divisória da parede nas salas de atividades, aquilo incomodava as professoras e
limitava o uso das paredes para pendurar trabalhos, etc.
Necessidade de uma tinta reforçada para limpeza, não necessariamente indica a necessidade de
paredes de duas cores (função x usos)
Grades evidenciavam um ambiente opressor. Retira-las estava fora de questão, como suavizar
sua presença na sala de atividades?
Corredor, possibilidade de colocar pastilhas para facilitar a manutenção, mas teria que ser algo
que pudesse trazer significado, vida e valorização ao espaço e as atividades da escola.
Refazer o quiosque que tinha sido construído de forma bastante precária e a equipe tinha
conseguido autorização para reconstrução do espaço
Pensar em uma fachada para escola
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Projeto Parques Sonoros: um espaço de descobertas
Alessandra Arrigoni8
Maria Cristina de Campos Pires9
Sonia Larrubia Valverde10
Viviane De La Nuez Cabral11
O presente relato comunica a experiência em curso no Município de São Paulo que visa
à implementação do Projeto Parques Sonoros que compõe o Programa São Paulo
Carinhosa do governo Municipal de São Paulo cujo objetivo é promover uma Política
para o desenvolvimento integral da primeira infância. O referido projeto garante aos
bebês e as crianças a expressão e criatividade pelas linguagens artísticas. Foi planejado
com foco na formação das Professoras12 que atuam nas Unidades de Educação Infantil
da Rede Municipal de Ensino. As formações são realizadas em lócus por profissionais
com experiência em arte educação e formados na linguagem artística da música. Os
encontros de formação acontecem semanalmente, nos momentos de formação coletiva
das Unidades Educacionais onde são organizadas e planejadas propostas pelas
professoras com orientação direta dos formadores, da assessora e equipe da Divisão de
Orientação Técnica de Educação Infantil. Esses momentos oportuniza as crianças,
vivências, experiências sonoras, incentivando-os a brincar, construir, desconstruir,
ressignificar objetos sonoros “cotidiáfonos”, dando oportunidade de realizarem e
apresentarem suas descobertas e composições. Essas experiências acontecem em vários
8
Integrante da Divisão de Orientação Técnica da Educação Infantil - SME- SP DOT E.I
9
Assessora do Projeto Parques Sonoros
10
Diretora da Divisão de Orientação Técnica da Educação Infantil - SME- SP DOT E.I
11
Integrante da Divisão de Orientação Técnica da Educação Infantil - SME- SP DOT E.I
12
Nesse texto opta-se pela palavra professoras para fazer referência a todos os professores e
professoras da Rede Municipal de Ensino de São Paulo. Da mesma maneira utilizaremos a
composição “bebês e crianças” para fazer referência a todas as crianças independente da cor,
etnia, classe social, gênero, entre outras variáveis.
20
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espaços das Unidades que podem ser, nas áreas externas, nos parques, nos corredores ou
até mesmo na sala.
Palavra chave: Formação de professores, Parques Sonoros, linguagens.
Por que implantar o projeto Parques Sonoros nas Unidades Educacionais de
Educação Infantil?
O “Projeto Parques Sonoros: espaços de descoberta” foi planejado com o objetivo de
garantir aos bebês e crianças a expressão e criatividade através da linguagem artística,
da música. Ele integra o Programa São Paulo Carinhosa publicado no Decreto nº
54.278, de 28 de agosto de 2013 que institui a Política Municipal para o
desenvolvimento integral da primeira infância, tendo com principal diretriz a atuação
intersetorial, articulando e integrando ações entre todas as Secretarias Municipais
envolvidas e nos territórios em articulação com as subprefeituras bem como com outras
esferas do poder público, a comunidade e suas representações e, considerando ainda, um
dos objetivos presentes no Programa de Metas estabelecidas na gestão do município de
São Paulo para 2013-2016 que diz respeito a ampliação da qualidade da Educação
Infantil, a Divisão de Orientação Técnica de Educação Infantil da Secretaria Municipal
de Educação coordena desde 2013 ações que integraram o Programa a fim de ampliar e
fortalecer na cidade atividades voltadas às crianças bem pequenas, em especial aquelas
moram em regiões consideradas em situação de vulnerabilidade social.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação Infantil, bem como os
documentos publicados pela Secretaria Municipal de São Paulo SME/SP: Programa
mais Educação São Paulo e Orientação Normativa nº 01 de 2013: “Avaliação na
Educação Infantil: aprimorando os olhares”, destacam em cada um em seu âmbito, a
busca da qualidade social da educação infantil que entre outros princípios, ressalta a
importância de se considerar a criança enquanto protagonista, sujeito histórico, capaz e
de direitos que se expressa e conhece o mundo por meio de múltiplas linguagens.
O que se pretende com o Projeto?
A música enquanto linguagem precisa ser explorada nas Unidades de Educação infantil
a fim de proporcionar aos bebês e crianças, a expressão do seu imaginário e o prazer de
descobrir e inventar novos sons. Essas experiências possibilitam que as crianças
explorem e vivenciem situações de um processo criativo musical por meio da
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exploração dos sons do ambiente, pesquisando, criando, imaginando individualmente ou
em grupos sons e objetos sonoros construídos com diferentes materiais do cotidiano e
reciclados. Outro aspecto a considerar é a formação in lócus nos horários de formação
coletivo para as professoras das Unidades Educacionais. Nesses momentos busca-se a
ressignificar e problematizar conceitos de música, instrumentos musicais e escuta
musical no trabalho que desenvolvido com os bebês e crianças. O ponto de partida
para a formação são as experiências das professoras como pesquisadoras que em
parceria com assessoria de um arte educador com especialização em musica, ajuda a
unidade educacional a rever suas práticas cotidianas identificando que a música está
presente nas Unidades de Educação Infantil em forma de cantos , eventos, na cantoria
nos horários de entrada, de refeições e de atendimento ao calendário escolar,
apresentando uma outra possibilidade do trabalho com a linguagem musical para as
crianças pequenas.
Caminhos Percorridos
Na busca de uma nova forma de trabalho, ou ao menos uma boa reflexão sobre esta
temática na formação a Divisão de Orientação Técnica de Educação Infantil, selecionou
pesquisadores e estudiosos que ajudam a pensar como acrescentar maiores desafios para
os bebês e crianças e a compreender melhor toda a musicalidade que envolve as
crianças bem pequenas.
Schafer (1991) nos leva à busca dos sons em seu timbre mais puro ao destacar o ouvido
pensante, que limpa os ouvidos, seleciona os sons e os analisa. Ao olhar para a infância,
percebe-se que as crianças já fazem esta escuta de forma atenta como uma experiência
lúdica. Bem pequenos, eles descobrem os sons do corpo e os experimentam de
diferentes maneiras: choro, balbucios, emitindo sons com a boca, sorrindo, entre outros
sons. Depois com objetos estruturados ou não pegam, jogam, batem, colocam na boca,
enfim, realizam experiências e mais experiências com os sons.
Além de Schafer (1991), Delalande (1993), músico francês que fez uma pesquisa com
um grande grupo de crianças bem pequenas em suas incursões sonoras experimentais
concluiu certa aproximação com a música contemporânea, nada tradicional.
No Brasil, Brito (2003) enriquece este olhar para a infância, através do seu trabalho com
crianças a partir dos quatro anos de idade e pesquisas permanentes com alunos da escola
de música.
Na Rede Municipal de Educação Infantil temos as professoras que trabalham com as
crianças pequenas nos Centros de Educação Infantil (CEI), nas Escolas Municipais de
22
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Educação Infantil (EMEI), algumas delas nos territórios dos Centros de Educação
Unificado (CEU), nos Centros Municipais de Educação Infantil (CEMEI) e nas Escolas
Municipais Bilíngüe para Surdos (EMEBS) instituições que atendem crianças entre
zero e cinco anos. A maioria destas profissionais da infância recebem uma formação
inicial que não contempla as linguagens artísticas e a lúdica.
Diante disso a formação do professor da primeira infância precisa ser pensada no
sentido de aprimorar olhos e ouvidos para a escuta de bebês e crianças, respeitando à
sua música nada convencional, porém muito séria e que resulta numa paisagem sonora,
que vai se construindo ao longo da vida.
Nesta construção, os bebês e crianças mostram autonomia para escolhas e seleções de
sons, desde que não sejam tolhidas disso. Ou seja, quando as professoras compreendem
este barulho das crianças, acabam por ajudá-los a afinar seus ouvidos, termo utilizado
por Shafer (1991). Neste contexto, as professoras precisam conhecer as propriedades
dos sons, experimentar a escuta dos ambientes internos e externos e assim começar a
compreender os sons da infância.
Malaguzzi (apud Zoccatelli, 2003, p.44), educador italiano diz destaca que para termos
adultos ouvintes, precisamos ter crianças ouvintes e ouvidas. Este é um convite a todos
os adultos que trabalham com bebês e crianças exercitarem suas escutas dos sons mais
simples aos mais sofisticados produzidos por eles.
O convite é para aquele que sabe escutar o que às vezes está à nossa volta e não temos
tempo e paciência para escutar... Nossa teoria diz que se não aprendermos a escutar as
crianças teremos dificuldades para aprender a arte de estar e conversar com elas. Não só
será difícil, como talvez impossível compreender como e por que pensam e falam, como
fazem, pedem, supõem, teorizam, desejam; quais as descobertas das crianças, o que
preferem, para entender como realizam explorações e fazem suas escolhas, para chegar
a atingir bons resultados de conhecimento (p.39).
Nos espaços educativos há a necessidade de ampliação das possibilidades lúdicas com
os sons e outras brincadeiras, para que as crianças possam exercitar a autonomia,
construam suas identidades e culturas infantis.
O fenômeno sonoro é a matéria prima da música. Suas diversas manifestações e formas
de apresentação, naturais, industriais, tecnológico, virtuais entre outros, merecem
atenção e exploração por todos, desde a mais tenra idade.
Para Sedioli (2005), a criança pequena constrói sua identidade como pessoa através do
corpo e dos sons. Quando nos dedicamos à formação musical de bebês e crianças
verificamos a semelhança feliz entre a riqueza sonora que existe, as necessidades e
possibilidades sonoras deles.
23
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Akoschky (2001) apresenta uma proposta a qual chama de cotidiáfonos os materiais do
cotidiano que podem ser usados na exploração dos sons, termo que adotamos também
para este trabalho do Projeto Parques Sonoros. Os espaços musicais e os Parques
Sonoros, construídos com materiais do cotidiano (cotidiáfonos) favorecem a autoria e o
protagonismo das crianças.
Para que os bebês e as crianças possam realizar suas pesquisas sonoras, pensamos que
as professoras deveriam receber uma formação para a compreensão deste movimento
das crianças e ao mesmo tempo, também realizar suas pesquisas sonoras.
Assim, uma parte integrantedo Projeto Parque Sonoros é a formação que acontece in
lócus envolvendo todas as professoras e professores nos horários coletivos de formação
(Projeto Especial de Ação ou Jornada Especial Integral de Formação) e dialoga com os
Projetos Político Pedagógico das Unidades Educacionais considerando os territórios e
seus diversos contextos culturais.
Conquista e ressignificações
Os Parques Sonoros possibilitam aos bebês e crianças, realizarem seus estudos sonoros
com liberdade tendo a oportunidade de levar suas descobertas para os espaços externos.
Próximo aos seus brinquedos do parque, os brinquedos sonoros possibilitaram ouvir de
diferentes formas os “Cotidiáfonos”.
O Projeto também favorece e amplia a interação das crianças e equipe escolar com sons,
pois incentiva a troca de experiências sonoras entre crianças/crianças, crianças/adultos,
incluindo a comunidade escolar e seu entorno.
A proposta do Projeto Parques Sonoros leva para dentro das Unidades de Educação
Infantil, a música, o lúdico, a formação das professoras e a intervenção sonora nos
espaços internos e externos da unidade, numa ação conjunta de toda a equipe escolar,
com a ajuda de um formador que se dedica a cada unidade onde atua, durante os
horários coletivos, viabilizando o estudo para as professoras e os professores e
discussões e reflexões sobre as ações que acontecem dentro da sala com os pequenos e
aos poucos vão saindo e se tornando instrumentos e brinquedos do lado de fora. É uma
ocupação dos espaços com brinquedos sonoros construídos por diferentes atores,
sobretudo as crianças.
Em 2014 foram atendidas 54 Unidades de Educação Infantil, 1635 educadoras e
educadores, 19.804 bebês e crianças. Em 2015 estão sendo atendidas 58 Unidades de
Educação Infantil.
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Os formadores realizam os encontros de formação semanalmente e são apoiados pela
assessora do Projeto e pela equipe da DOT-EI que subsidiam propondo reflexão,
problematização das ações desenvolvidas nos diferentes territórios nos quais estão
atuando.
O Projeto possui princípios claros, mas dentro de uma proposta aberta, na qual cada
Unidade Educacional deve se sentir autora nesta construção. Em 2014 houve a
organização de muitos “Parques Sonoros”, alguns em espaços internos das Unidades de
Educação Infantil , outros em espaços externos transformando espaços em verdadeiros
ambientes de exploração sonora.
Com o acompanhamento das formações nas Unidades Educacionais e dos momentos
propostos para bebês e crianças podemos constatar o maravilhamento e a aprendizagem
significativa que perpassa estes espaços.
Apesar do sucesso dessa proposta, ainda lidamos com muitos desafios, como exemplo é
possível destacar: a resistência de algumas professoras nas Unidades Educacionais em
trabalhar de forma coletiva; dificuldade em encontrar formadores com experiência em
arte educação e formação em música considerando enquanto linguagem expressiva .
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ISSN 2448-1157
Referências
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ISSN 2448-1157
Implicações da obrigatoriedade de matrícula das crianças de 4 e 5 anos na
educação infantil: problematizações necessárias
Aliandra Cristina Mesomo Lira
Comunicação oral
Resumo: O objetivo desse trabalho é problematizar questões decorrentes da Lei 12.796
(BRASIL, 2013) que institui como obrigatória a matrícula em pré-escolas de crianças de
4 e 5 anos de idade. Trata-se de um estudo teórico que busca refletir sobre os principais
aspectos envoltos em tal determinação. Tais ponderações são relevantes uma vez que a
educação infantil, embora figure como direito das crianças desde a LDB 9394/96
(BRASIL, 1996), continua marginalizada nas políticas públicas. Infelizmente, a
despeito da possibilidade de que uma parcela maior de crianças tenha garantido seu
direito à educação infantil com a extensão da obrigatoriedade do ensino, temos
acompanhado com preocupação os encaminhamentos para atender a determinação legal,
com atendimentos acontecendo em estruturas inadequadas, sem profissionais do quadro
próprio do magistério da educação infantil e com práticas que por vezes antecipam
forçadamente atividades preparatórias para a alfabetização.
Introdução e justificativa
O debate acerca da importância da educação infantil para a formação e
desenvolvimento humanos já há algumas décadas vem consolidando-se, em especial no
meio acadêmico e nos fóruns de debate e defesa da educação das crianças de 0 a 5 anos
de idade. A Lei 12.796 (BRASIL, 2013) que institui como obrigatória a matrícula em
pré-escolas de crianças de 4 e 5 anos de idade indica que os municípios têm até 2016
para universalizar esse atendimento. Tal encaminhamento também está explicitado na
Meta 1 da Lei 13.005, de junho de 2014, que aprovou o Plano Nacional de Educação a
vigorar para os próximos dez anos. Segundo o texto legal deve-se “Universalizar, até
2016, a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de
idade e ampliar a oferta de educação infantil em creches de forma a atender, no mínimo,
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50% (cinquenta por cento) das crianças de até 3 (três) anos até o final da vigência deste
PNE” (BRASIL, 2014).
Objetivos
O intuito desse texto é problematizar as implicações da extensão da obrigatoriedade do
ensino para as crianças de 4 e 5 anos de idade, buscando refletir acerca das condições
práticas para a efetivação do encaminhamento legal e os impactos diretos aos
atendimentos das crianças nessa faixa etária.
Referencial teórico
Embora em termos legais a educação infantil, como primeira etapa da educação
básica, figure como direito das crianças desde a LDB 9394/96 (BRASIL, 1996), na
prática esse nível de ensino continua marginalizado nas políticas públicas. Nesse
cenário, a extensão da obrigatoriedade ao mesmo tempo que procura garantir o
atendimento de todas as crianças de 4 e 5 anos, ao excluir as crianças de 0 a 3 anos,
focaliza em apenas um segmento da educação infantil. Segundo Campos (2012, p. 99),
como decorrência dessa forma de segmentação destaca-se
[...] aquela produzida pela introdução da obrigatoriedade na educação
infantil, que tende a romper com a unidade pedagógica e de gestão
arduamente conquistada nessa etapa educativa. Adotada pela maioria
dos países na região, tem produzido efeitos paradoxais e instaurado
uma nova dinâmica na composição e gestão dos sistemas educativos.
No que se refere ao primeiro aspecto, a focalização no ciclo etário
final - 4 a 5 anos de idade - tem induzido ao crescimento das
matrículas, verificando-se em alguns países a universalização de
acesso. No entanto, essa universalização tem sido feita em detrimento
da educação das crianças de 0 a 3 anos, destinatárias cada vez mais de
programas de caráter assistencial e de qualidade precária.
Assim, para atender o direito à educação infantil é necessário, por parte dos
gestores públicos, bastante empenho e responsabilidade para garantir o acesso de todas
as crianças (CAMPOS, 2010). Além disso, infelizmente, a despeito da possibilidade de
que uma parcela maior de crianças tenha garantido seu direito à educação infantil com a
extensão da obrigatoriedade do ensino, temos acompanhado com preocupação os
encaminhamentos dados para atender a determinação legal, com atendimentos
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acontecendo em estruturas inadequadas, sem profissionais do quadro próprio do
magistério da educação infantil e com práticas que por vezes antecipam forçadamente
atividades preparatórias para a alfabetização.
Segundo o texto das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil –
DCNEI (BRASIL, 2009) a educação infantil deve considerar as crianças como centro
das propostas pedagógicas, organizando um trabalho educativo com vistas à ampliação
das vivências e experiências infantis, de modo a interferir positivamente e contribuir
com o desenvolvimento infantil em seus múltiplos aspectos. Para tal, o documento
destaca como eixos norteadores do trabalho na educação infantil as interações e
brincadeiras, as quais se efetivarão no sentido do desenvolvimento infantil em contextos
estruturais adequados e por meio de intervenções e mediações de qualidade por parte
dos adultos envolvidos e da multiplicidade de relações das crianças entre si.
No que se refere à matrícula obrigatória na educação infantil para as crianças de
4 e 5 anos, nesse momento nos colocamos na posição de perguntadores, com inúmeras
dúvidas acerca da imposição decorrente da determinação legal. Se até então a educação
infantil era reconhecida como um direito da criança, agora associa-se o dever da família
em matricular os filhos de 4 e 5 anos, devendo o poder público garantir as vagas. Cury e
Ferreira (2010) lembram que durante muito tempo a obrigatoriedade à educação remetia
ao compromisso do cidadão, e não ao dever dos governos em fornecer educação para
todos.
Campos (2010) ressalta que no contexto dos países da América Latina os
governos têm optado pela focalização, tanto das políticas quanto dos atendimentos, no
segmento das crianças de 4 e 5 anos, transferindo para organizações da sociedade civil a
responsabilização pelas crianças de 0 a 3 anos de idade. Embora de modo geral a
maioria dos países iniciem a obrigatoriedade do ensino a partir dos 3 ou 4 anos, há
diferenças entre eles nessa orientação, configurando muitas vezes uma ‘universalização
sem direitos’.
Metodologia
O recorte apresentado nesse momento apresenta reflexões com base na
legislação e em autores como Campos (2013; 2012), Rosemberg (2009) e Serrão
(2012), que discutem sobre a educação infantil, em especial, as políticas públicas
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educacionais com impacto na educação das crianças de 0 a 5 anos de idade. Cabe
registrar que tais reflexões fazem parte do projeto “Implementação da matrícula
obrigatória das crianças de 4 e 5 anos na educação infantil: tensões, desafios e
possibilidades no município de Guarapuava-Pr”, financiado pelo CNPq, que se encontra
em execução. Assim, apresentam-se nesse momento considerações preliminares
decorrentes do desenvolvimento dessa pesquisa.
Desenvolvimento da pesquisa
As reflexões ora apresentadas são o resultado dos estudos teóricos que sustentam
a investigação acima mencionada, pois embora já tenhamos coletado alguns dados junto
ao município investigado esses encontram-se me fase de análise. Também
problematizamos algumas questões já constatadas, considerando as experiências prévias
e o conhecimento dos encaminhamentos tomados pela gestão municipal com vistas a
atender a determinação legal da universalização do atendimento na educação infantil
para as crianças de 4 e 5 anos, até 2016.
A preocupação com as implicações da obrigatoriedade do ensino para a
educação infantil é explicitada por Serrão (2012, p. 135), cujos questionamentos
compartilhamos:
Não compartilho da defesa da obrigatoriedade da educação infantil,
não estou convencida de que seja a melhor e única alternativa para a
formação das novas gerações e, por consequência, que todas as
crianças devam frequentar instituições de educação infantil. [...] para
atender a exigência legal da obrigatoriedade, a pré-escola será
impulsionada a expandir sob quais parâmetros de qualidade? A
resposta do poder público será o que temo presenciado na rede
municipal de São Paulo, com 3 turnos de atendimento e turmas de 35
a 40 crianças sob a responsabilidade de um único professor,
contrariando o que está disposto nas DCNEI? A expansão da préescola será viabilizada sem prejuízo da ampliação das vagas para as
crianças de 0 a 3 anos de idade? A não garantia de direitos é
preocupante. Igualmente preocupantes são as práticas escolares
presentes nas instituições de educação infantil.
Ao discutir as concepções políticas relacionadas à democratização da educação
infantil Campos (2010) registra a necessidade de não se dissociar a expansão do acesso
da qualidade, uma vez que quantidade e qualidade são dimensões indissociáveis.
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Considerando-se esse cenário, elencamos alguns aspectos que consideramos de maior
relevância par a presente discussão.
Estrutura física
Segundo as DCNEI (BRASIL, 2009) as instituições de educação infantil devem
estar organizadas do ponto de vista estrutural de modo a atender as necessidades e
especificidades das crianças pequenas, permitindo a vivência de experiências e
atividades, coletivas e individuais, no sentido de ampliar o desenvolvimento infantil.
Dessa forma, as salas devem ser amplas e arejadas, com mobiliário adequado ao
tamanho das crianças, com brinquedos variados e em quantidade suficiente à altura das
crianças, livros de literatura, dentre outros aspectos.
Embora muitas vezes as instituições de educação infantil, mesmo tendo sido
pensadas e projetadas especialmente para atender as crianças de 0 a 5 anos de idade, não
atendam por completo os padrões de infraestrutura, elas ainda são os locais mais
adequados para atender os pequenos. Dada a necessidade de ampliar o número de vagas
e considerando a insuficiência das vagas disponíveis, muitos municípios, por meio das
gestões locais, têm lançado mão de estratégias que podem estar desconsiderando as
especificidades infantis.
No caso do município analisado sabe-se que as crianças de 4 e 5 anos têm sido
retiradas dos Centros de Educação Infantil e estão sendo criadas turmas em escolas de
ensino fundamental já existentes. Assim, as crianças passam a frequentar uma
instituição inicialmente projetada para atender crianças maiores, e que não passou por
adequações estruturais para receber as crianças menores. De modo geral, do ponto de
vista da estrutura, temos constatado que os parques não têm brinquedos da altura das
crianças de 4 e 5 anos, as salas têm sua ‘decoração’ na altura do adulto e o mobiliário é
o mesmo utilizado pelas crianças do ensino fundamental. Além disso, as crianças que
anteriormente frequentavam as instituições de educação infantil em jornada integral (no
mínimo 7 horas) passam agora a ser atendidas em jornada parcial de apenas 4 horas.
A partir disso, consideramos que essa estratégia aumenta o número de vagas nas
instituições de educação infantil, mas opera de forma negativa sobre as crianças da préescola que são atendidas em instituições que não foram pensadas para essa faixa etária,
evidenciado a distância entre os parâmetros de quantidade e qualidade no atendimento.
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Formação de professores
As pesquisas que se debruçam sobre a formação de professores registram que
essa incide sobremaneira na qualidade das práticas pedagógicas. Assim, um profissional
bem formado terá melhores condições de desenvolver um bom trabalho com as
crianças, reconhecendo as características de desenvolvimento e da cultura infantis, e
lançando mão de atividades e encaminhamentos adequados para a faixa etária da
educação infantil.
Na última década pode-se reconhecer um avanço em termos do número de
crianças atendidas, contudo em muitos municípios a questão da formação ainda não está
no foco das políticas educacionais. Embora a LDB 9394/96 (BRASIL, 1996) coloque
como desejável a formação em nível superior, curso de licenciatura, muitos editais de
concurso público não têm respeitado essa orientação, mantendo a exigência mínima
permitida que é a formação em nível médio, Magistério. Além disso, em nosso
município os profissionais da educação infantil não fazem parte da categoria
professores, mas são enquadrados como educadores, com plano de carreira
diferenciado, o que acaba por manter e aprofundar o desprestígio associado a carreira
docente na educação infantil.
Com a ida das turmas de pré-escola para instituições de ensino fundamental há
outro agravante, esse relacionado com a formação do professor que atua com essas
turmas. Há no município uma cláusula do estatuto dos educadores infantis que não
permite que atuem fora dos Centros Municipais de Educação Infantil, assim, nessas
turmas de pré-escola quem trabalha como professor são profissionais concursados para
atuar com o ensino fundamental, que geralmente já atuam na instituição em outro turno
e fazem dobra de contrato, assumindo uma turma de educação infantil. Também,
comumente, são profissionais recém-chegados na escola, seja por transferência ou
porque assumiram recentemente o concurso, e por ‘não terem escolha’ ficam com as
turmas de educação infantil.
Além disso, o município não conta com uma política de formação continuada,
mantendo uma prática de encontros esporádicos, de curta duração, que muitas vezes não
discutem sobre temas importantes para a educação infantil e a formação docente.
Prática pedagógica
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A despeito das determinações legais que discutem de forma ampla e bem
fundamentada como devem estar organizadas as práticas na educação infantil,
efetivamente no cotidiano das instituições temos enfrentado inúmeros desafios para
concretizar tais orientações. Assim, por exemplo, as DCNEI (BRASIL, 2009) registram
a necessidade de que as práticas considerem as questões relacionadas à diversidade das
crianças, suas individualidades e também as questões relacionadas à cultura,
trabalhando com as múltiplas linguagens infantis. Asseveram, também, que o trabalho
com a linguagem escrita não deve sobrepor-se às outras formas de linguagem, em
especial as atividades que envolvem a música, o corpo, o teatro, a literatura.
Contudo, mesmo antes da Lei 12.796 (BRASIL, 2013) observávamos com
preocupação o ensino de letras e números de forma insistente e contínua, com registros
de cópias e treinos com o intuito de que as crianças chegassem ao primeiro ano
alfabetizadas. Com a ida das crianças para as escolas de ensino fundamental tanto o
contexto quanto a organização pedagógica reforçaram esse direcionamento, inclusive
antecipando esses encaminhamentos para as crianças de 4 anos.
Resultados
Como resultados preliminares, a partir das considerações apresentadas acima,
reconhecemos que a extensão da obrigatoriedade do ensino para parte da educação
infantil tem encaminhado uma série de ações por parte dos municípios que infringem os
direitos das crianças. Além disso, ao focalizar a escolarização obrigatória para apenas
uma parcela da educação infantil corre-se o risco de negligenciar os direitos das
crianças de 0 a 3 anos de idade. Como afirma Campos (2013, p. 204), “[...] o
reconhecimento da especificidade ou particularidade social da infância e as diversas leis
e declarações em favor de seus direitos não se traduziram em sinônimo de uniformidade
ou garantia de boas condições de vida a todas as crianças. Esse aparente descompasso
entre o proclamado e o efetivado é visível [...]”.
Além disso, as estratégias pensadas e implementadas configuram uma condição
problemática em termos de estrutura física, da formação dos profissionais que atuam
com as turmas de pré-escola e nas práticas pedagógicas, com efeitos que ainda não
podem ser avaliados uma vez que se trata de um cenário novo.
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Considerações finais
Considerando que a Lei 12.796 (BRASIL, 2013) indica que os municípios têm
até 2016 para implementar a matrícula obrigatória para as crianças de 4 e 5 anos são
necessários maiores estudos e investigações que desnudem e reflitam acerca dos
encaminhamentos tomados, bem como dos desdobramentos e impactos para os
envolvidos, em especial as crianças e professores. Como registra Campos (2010, p.
306),
Uma breve análise dos últimos vinte anos força-nos a reconhecer os
avanços já feitos. No entanto, em que pesem os avanços já
estabelecidos é preciso também confrontar a situação do atendimento
educativo das crianças de zero-cinco anões e as condições de sua
oferta, examinando, assim, se as políticas públicas dirigidas a esta
faixa etária têm logrado a democratização desta etapa educativa.
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ISSN 2448-1157
O Currículo da Educação Infantil na Secretaria Municipal de Educação de
Manaus: reconstruções no contexto amazônico
Ana Paula Lima Carvalho de Oliveira13
As ressignificações orientações pedagógicas da educação infantil do município
de Manaus vêm passando por ressignificaAsressignificaçõesmplantação das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Dcneis/Resolução CNE/CEB nº
05/09). Buscar alternativas de entendimento sobre os papéis da docência na infância em
contexto amazônico, a partir do documento das DCNEIs, é ação constante da Divisão de
Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação (Semed) de Manaus. Os
instrumentos de registro também passaram por modificações para atender ao documento
oficial do Ministério da Educação e buscar a identidade da etapa nas dinâmicas de
educação com as crianças de 0 a 5 anos. A atividade propôs reflexão sobre a concepção
de currículo na educação infantil de maneira a refleti-la nos documentos de registros
oficiais da Semed Manaus. Esta ação está resultando, processualmente, em práticas e
escritas que respeitam a relação educativa dos professores e professoras com as crianças
da cidade de Manaus.
Palavras Chave: Educação Infantil. Prática de Currículo. Identidade.
A gestão do currículo da educação infantil na cidade de Manaus
A ressignificação de práticas pedagógicas é uma constante na educação. Em
atendimento às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEIs /
Resolução CNE/CEB nº 05/09), a Secretaria Municipal de Educação de Manaus (Semed
Manaus) iniciou, em 2012, o processo de reestruturação de seus documentos e
orientações pedagógicas aos envolvidos com a primeira etapa da educação básica
pública de Manaus.
13
Professora e Pedagoga da Secretaria Municipal de Educação de Manaus.
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Sobre a ressignificação das práticas educativas na escola, o relatório das
Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação contribui com a seguinte
afirmação:
A escola, face às exigências da Educação Básica, precisa ser reinventada:
priorizar processos capazes de gerar sujeitos inventivos, participativos,
cooperativos, preparados para diversificadas inserções sociais, políticas,
culturais, laborais e, ao mesmo tempo, capazes de intervir e problematizar as
formas de produção e de vida. A escola tem, diante de si, o desafio de sua
própria recriação, pois tudo que a ela se refere constitui-se como invenção: os
rituais escolares são invenções de um determinado contexto sociocultural em
movimento (2013, p. 16).
A Proposta Pedagógico-Curricular da primeira etapa da Educação Básica da
Semed Manaus passou por processo de reestruturação no ano de 2012 para atender o
que preconiza as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEIs /
Resolução CNE/CEB nº 05/09). Consigo trouxe reestruturação de pensamentos e
fazeres na educação infantil pública da cidade.
O processo de construção desse instrumento considerou vozes de atores
institucionais e sociais da rede, incluindo diretores, professores, pais e crianças. Contou,
ainda, com a consultoria de representantes da Universidade Federal do Amazonas,
Universidade do Estado do Amazonas e Fórum Amazonense pela Educação Infantil.
O desafio foi esclarecer a concepção dos temas expostos na etapa da educação
infantil (criança, infância, currículo, avaliação) de maneira a refleti-la nos registros dos
documentos oficiais da Semed Manaus, sendo eles os diários de classe, fichas de
planejamento pedagógico e parecer descritivo do desenvolvimento da criança.
A Semed conta com uma consultoria de gestão que, dentre outras funções,
mensura o cumprimento do currículo nas etapas do ensino fundamental e da educação
infantil. Sendo assim, outro desafio foi esclarecer aos assessores de gestão que realizam
essa mensuração a concepção de currículo e avaliação na educação infantil e como esse
entendimento difere do ensino fundamental.
Assim, havia dois públicos alvos de trabalho: profissionais da etapa específica e
profissionais que ainda não haviam vivenciado nenhuma dinâmica da educação infantil
e ainda mensurariam o trabalho pedagógico na etapa.
Oliveira aponta que na educação infantil:
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O currículo busca articular as experiências e os saberes das crianças com os
conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, científico e
tecnológico da sociedade por meio de práticas planejadas e permanentemente
avaliadas que estruturam o cotidiano das instituições (2010, p.4).
Este entendimento de currículo norteia as orientações pedagógicas dadas aos
professores e pedagogos da rede municipal de ensino de Manaus pela assessoria
pedagógica da Divisão de Educação Infantil. Equilibrar esta definição de currículo com
instrumentos de mensuração do desenvolvimento da criança e da prática pedagógica do
professor foi o caminho a ser trilhado.
A reestruturação da proposta pedagógico-curricular de educação infantil
no município de Manaus
Após a conclusão da Proposta Pedagógico-Curricular de Educação Infantil, foi
necessário reestruturar o formato e as orientações dos instrumentos de acompanhamento
e registro à linguagem das DCNEIs. São eles: diário de classe, ficha de planejamento e
parecer descritivo do desenvolvimento da criança.
O objetivo de reestruturar as orientações aos professores quanto ao registro
nesses instrumentos foi de buscar uma escrita coerente com a etapa, que evidenciasse a
ação intencional que deve se propor qualquer ação pedagógica com crianças. A questão
do registro das atividades diárias, por exemplo, foi um dos principais focos de atuação
para ressignificações, pois o hábito era a escrita de conteúdos soltos e que não deixavam
clara a intencionalidade da atividade e que vencesse a concepção conteudista na
educação infantil.
Segundo Barbosa e Horn (2008, p 44) “presta-se atenção a tudo o que se passa
na escola, propiciando-se aos alunos as aprendizagens consideradas mais significativas,
na medida em que são oferecidas múltiplas possibilidades para a intervenção
pedagógica”.
A assessoria pedagógica então buscou dialogar com pedagogos e professores da
educação infantil na intenção de aproximar as Diretrizes das práticas pedagógicas. Esses
diálogos se deram em encontros bimestrais em 2014 e 2015 com temas voltados para o
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entendimento da nova Proposta Pedagógico-Curricular, Avaliação, Planejamento e
Currículo na Educação Infantil.
Em encontros como esse também participou a assessoria de gestão, equipe que
estava diariamente em contato com professores para mensurar o cumprimento do
currículo e que, portanto, causava impacto no entendimento destes temas.
Interessante foi perceber a profissão docente na primeira infância porque, através
dos processos de ressignificações de currículo e avaliação, notou-se necessidade de
entendimento das concepções de criança/infância e educação infantil no dia a dia da
escola.
Houve falas quanto à dificuldade do tempo para olhar a criança em sua
individualidade – de maneira que a avaliação na educação infantil de fato fosse
intervenção pedagógica – e para formação continuada de maneira a intensificar os
estudos sobre as fases do desenvolvimento infantil. Essas falas nessa prática em 2015 se
referem a uma das comprovações de Jussara Hoffman quando, em 1996, afirmou que:
(...) existe um longo caminho a percorrer nesse sentido, pois são muitas as
dificuldades e as resistências entre educadores, uma vez que elaborar
relatórios de avaliação exige estudo, tempo e muita observação das crianças.
Mas é justamente nesse último ponto que se encontra o maior significado
dessas tentativas, uma vez que a grande maioria das instituições aponta,
como resultado mais importante desse processo, a compreensão muito mais
aprofundada das crianças pelos os professores.
O trabalho da assessoria pedagógica foi de ressignificar a escrita das ações dos
professores com as crianças nos instrumentos de registros oficiais de planejamento e
avaliação. O cuidado com o registro se deve pelo fato de ser comprovação documental
da ação mediadora dos professores e professoras da primeira infância. Sobre a avaliação
na educação infantil, Hoffman (2012) aponta que:
A ação avaliativa precisa considerar as crianças em sua diversidade: sua
realidade sociocultural, sua idade, suas oportunidades de conhecimento, etc.,
e a diversidade dos professores que atuam com elas. Muitas de suas
percepções, o que esses pensam sobre as crianças, podem revelar o grau de
importância que atribuem ao espaço institucional em termos do futuro dessas
crianças e em relação ao seu desenvolvimento global, nem sempre
considerados (p. 26).
No caso do parecer descritivo, voltou-se a fala para a concepção de relatório de
desenvolvimento infantil, respaldando-nos com textos e vídeos de Jussara Hoffman
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através da obra “Avaliação na pré-escola: um olhar sensível e reflexivo sobre a criança”
e de Hilda Micarello através do texto “Avaliações e Transições na Educação Infantil”
contido nos Anais do I Seminário Nacional: Currículo em Movimento – Perspectivas
Atuais. O vídeo foi “Avaliação na Educação Infantil”, de Jussara Hoffman, da Univesp
TV, elaborado em 2011, exposto em seu formato integral.
Sobre o diário de classe da educação infantil, no campo das atividades diárias, a
orientação foi que se deixasse clara a intencionalidade da atividade descrita no
documento, evidenciando a identidade própria e específica desta etapa da educação
básica. Outra característica deste documento é o registro da frequência em folhas por
criança, mostrando-a em sua individualidade e obtendo-se um mapa de sua frequência
na escola ao longo de um ano letivo.
A resistência se deu pela dificuldade de registrar a intencionalidade das
atividades propostas, tanto pelo fato de re-planejar as ações conforme as manifestações
das crianças – o que pressupõe conhecê-las em sua condição de criança – quanto pela
orientação de atender a um currículo com 12 experiências propostas pelas Diretrizes
Curriculares, e que pela qual passariam por mensuração de cumprimento.
Essa dinâmica confundiu o processo de entendimento do currículo na educação
infantil pelos professores e professoras da rede pública de ensino de Manaus. De um
lado, o discurso atual da criança como centro do planejamento da ação mediadora e, de
outro, os registros de planejamento e de atividades diárias terem que, obrigatoriamente,
demonstrar o cumprimento de experiências entendidas como disciplinas isoladas.
Estávamos diante de orientações dúbias.
Criou-se, então, uma tabela que buscou atender às duas solicitações: o caráter
próprio de currículo na educação infantil e a assessoria de gestão na função de mensurar
o cumprimento do currículo da educação infantil e do ensino fundamental de Manaus.
A tabela relaciona as 12 experiências, a partir dos eixos interações e brincadeira,
e consiste em cinco espaços: eixo interações e brincadeiras – experiências – aspectos
experienciais – objetivos de desenvolvimento – procedimentos metodológicos – marco
de desenvolvimento.
A ideia foi orientar que esses espaços se relacionam entre si e caracterizam a
promoção das 12 experiências e seus aspectos com intencionalidade, que cada
procedimento é oriundo de um objetivo que, por sua vez, atende a uma experiência ou
40
ISSN 2448-1157
vivência proposta pelas Diretrizes. Dentre elas, tudo está relacionado na prática
educativa com as crianças. Oliveira lembra que as Diretrizes destacam:
(...) a necessidade de estruturar e organizar ações educativas com qualidade,
articulada com a valorização do papel dos professores que atuam junto às
crianças de 0 a 5 anos. Esses são desafiados a construir propostas
pedagógicas que, no cotidiano das creches e pré-escolas, deem voz às
crianças e acolham a forma delas significarem o mundo e a si mesmas (2010,
p. 1)
Considerações Finais
Após essas orientações, foi possível visualizar processos de escritas das ações
pedagógicas que buscam demonstrar a identidade da etapa considerando as realidades
das crianças em contexto amazônico – uma cidade que, apesar de rodeada pela selva, se
vive a infância em construções urbanas e cujos igarapés já não existem mais – ao
mesmo tempo em que buscar oportunizar experiências propostas para as infâncias de
todo o país.
Assim, o entendimento do currículo e da avaliação para a ação pedagógica com
a primeira infância se reflete como um dos critérios da educação de qualidade como
direito da criança. Fica a certeza da dúvida – assim como a vontade de continuar nas
tentativas – sobre qual prática, de fato, pode atender ao cumprimento de documentos
legais e garantir oportunidades de aprendizagem aos curumins e cunhantãs da cidade de
Manaus.
41
ISSN 2448-1157
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ISSN 2448-1157
A construção da concepção da infância como sujeito de direitos na Colômbia
Andrea Rodríguez Vega 14
O presente trabalho apresenta um recorrido histórico das ações desenvolvidas na
Colômbia a partir de 1960 e lembra as estratégias dos planos de governo dos presidentes
da Colômbia começando com o período de 1978 até a atualidade com o objetivo de
conhecer a perspectiva de atendimento a à infância durante finais do século XX e
começos de século XXI quando muda a concepção da infância pela influencia da Teoria
do Capital Humano; para fazer esse trajeto se expõem os antecedentes da infância na
América Latina. Assim mesmo se faz um analise do atendimento da infância hoje em
relação com as políticas e a mudança de perspectiva do Estado quando concebe a
criança como um sujeito de direitos e ator ativo na vida social. Este artigo é resultado de
uma pesquisa documental onde se ressalta a concepção da infância como uma categoria
histórica construída socialmente e que tem influencia de aspectos: sociais, culturais,
políticos e econômicos que determina o atendimento que recebem as crianças na
atualidade na Colômbia.
Introdução
Na atualidade os estados reconhecem a infância como um sujeito autônomo na
família, na escola e na sociedade, e é por isso que a infância muda os patrões da família
transformando-se em o centro da família moderna, porque a criança determina o
começo do desenvolvimento da dinâmica familiar. É assim que desde uma observação
sociológica, reconhecer a autonomia das crianças se torna a principal característica de
civilização das sociedades como derivação do reconhecimento como sujeito ao interior
da família e a sociedade contemporânea.
Na Colômbia a primeira infância tem importância nos últimos anos, pela
amplia mobilização mundial tecida ao redor do tema. Resultado das pesquisas cientifica
em diferentes disciplinas, apresentam que durante os primeiros anos de vida se
Estudante de Mestrado em Educação – Universidade do Estado de Matto Grosso, Licenciada em Educação Básica com Ênfase em
Educação Especial – Universidade Pedagógica Nacional, Colômbia, Assistente Social – Universidade Nacional da Colômbia.
14
43
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constroem a maioria das conexões fisiológicas e psicológicas que determinam as
condições físicas e emocionais do ser humano.
Por isso, qualquer intervenção no desenvolvimento nessa etapa da vida é
fundamental para estabelecer as características das pessoas e a sociedade do futuro na
teoria do capital humano. Por esta razão diferentes países na atualidade desenvolvem
ações de intervenção na primeira infância. Em relação com esta visão economicista da
inversão na infância os governos têm apoio e promoção de organizações multilaterais
como o Banco Mundial (BM) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID),
quem reconhecem a efetividade que tem a atenção da primeira infância como meio da
transformação social, econômica e cultural.
Quando se fala das crianças como sujeitos, se fez referência a um processo de
naturalização, socialização e subjetivação dos meninos e as meninas, reconhecendo-lhes
como sujeitos históricos. Assim, a configuração da condição da infância, implica a
construção de significados constituídos as crianças por meio de processos mediados
através da linguagem e as suas relações, daí a importância das pessoas que fazem parte
de um grupo num contexto particular. Por isso, é relevante refletir frente à necessidade
de ampliar o horizonte de possibilidades a respeito da potenciação dos recursos
individuais das crianças e dos recursos coletivos que surgem das relações com as outras
pessoas que fazem parte da vida das crianças.
As pesquisas a respeito de crianças e infância envolve inicialmente conhecer as
concepções históricas da categoria, por isso é necessário saber a origem do conceito da
infância no século XVIII, destaca uma concepção uma condição vulnerável da infância,
inocente e que precisava de proteção e governabilidade pelos governos por meio da
educação e atenção especializada. Assim, a infância no início do século XX
transformou-se sua concepção em produto da Convenção dos direitos das crianças em
1989.
Além das concepções de crianças é necessário um olhar histórico, pois também
são construções socioculturais da sociedade, no qual se consideram pessoas dependentes
biológica e economicamente das pessoas adultas que habitam o mundo de maneira
diferente. Nesse sentido, as crianças também constroem seu mundo através de patrões
culturais, produto de sua experiência e relação com a realidade na escola, na família e
em ambientes, como o parque.
44
ISSN 2448-1157
A imagem da criança é, por tanto um reflexo do que o adulto e a sociedade
pensam de si mesmos. A criança define-se assim, ela própria como referência
ao que o adulto e sociedade esperam dela. Esta relação é um espelho do que
os adultos e as sociedades querem, eles próprios. Um jogo de projeções
daquilo que os adultos gostariam de ser, eles mesmos (CHARLOT, 1997).
Antecedentes da Infância para América Latina
Durante o século XX marca-se o início de pensar e falar sobre a infância. No ano
1900 Ellen Key escreve o livro Barnets Arhundrade em Estocolmo que versa sobre a era
dos meninos a partir da chegada do século XX, retomando a importância e
reconhecimento das crianças como sujeitos parte integrante de uma sociedade.
Desde 1900 até 1912, se desenvolveram uma série de escritos e eventos com
relação às crianças e a importância de seu cuidado, assim em 1905 em Paris, se
organizou o Congresso sobre problemas da alimentação da infância, seguido em 1907
com o Congresso de Proteção da Primeira Infância em Bruxelas e em 1909 se faz 7
Congressos Estadunidenses sobre infância até 1970, dedicado a melhorar a condições
das crianças na institucionalização para assegurar e garantir o bom convívio na família e
a vida no lar.
Com a linha das infrações e institucionalização dos menores em 1911 em Paris,
se desenvolve o Primeiro Congresso Internacional de Tribunais de menores e em 1912
em Bruxelas se faz o Primeiro Congresso de Proteção à infância, uma iniciativa
constituinte do desenvolvimento das novas teorias psicológicas, com base nos seguintes
autores: Freud (1856 – 1939), Adler (1870 – 1937), Piaget (1896 - 1980), Erikson (1902
– 1994), Bowlby (1907 – 1990). Estas teorias fazem referências desde o nascimento da
criança, os diferentes pontos de vista do afeto, cuidado da mãe e estabilidade familiar,
que são fatores indispensáveis para o seu maior desenvolvimento.
Com o desenvolvimento destes eventos e finalizada a segunda década do
século XX, em consequência da primeira e segunda guerra mundial se gero uma visão
da criança em situação de vulnerabilidade que precisava de proteção, tomado como
elemento fundamental o conflito armado em Síria través das crianças refugiadas,
abandonadas, rechaçadas e nascidas em áreas de conflito. E assim na primeira guerra
mundial, as irmãs Dorothy e Eglantyne Jebb, constituíram em Londres um grupo
Fightthe Famine Council (Luta do Conselho de Fome) para exercer preção sobre o
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ISSN 2448-1157
governo britânico frente ao bloqueio sobre Alemanha e Áustria que deixavam as
crianças com fome.
Estas inciativas permitiram visibilizar a infância durante a época. Por isso, em
1923 a Organização Save Children faz uma redação da declaração dos direitos da
criança, aprovada em 1924 pela liga de nações.
Este ato faz articulação com a
Convenção das Nações Unidas sobre os direitos das crianças em 1989, com esta
ratificação se faz um reconhecimento jurídico dos primeiros 18 anos de vida como uma
etapa diferencial do crescimento humano com: características, necessidades, demandas
e direitos específicos das crianças e jovens, estabelecendo os princípios de “superior
interesse da infância” deste modo, a infância é social e culturalmente construída que
gera respostas a uma época, espaço e sistema socioeconômico particular.
História da Infância na Colômbia
A evolução da infância na Colômbia tem haver com a pluralidade das suas
configurações e contextos, sobre os quais se constituem as políticas e os planos do
governo durante a história do país. Assim, a infância é um conceito histórico cuja
significação é variável de acordo as condições: econômicas, políticas, sociais, culturais,
demográficas e pedagógicas.
Durante a década dos anos de 1960, a família como primer do contexto
socializador da criança, reconhece a importância da reivindicação do diálogo da
paternidade afetiva e responsável por esse vinculo afetivo. Deste modo, surge a
preocupação pelo desconhecimento da criança, procurando encontrar maneiras que
beneficiassem o equilíbrio e o bem-estar dos meninos e meninas, esta perspectiva
transformou olhar da concepção da família moderna que procura o equilíbrio da criança
nas relações do afeito, do amor num núcleo familiar saudável.
Com esta perspectiva, nos anos de 1970 surgem novos discursos frente à
criança referente às relações entre o adulto e criança, destaca-se que se o adulto pode
estabelecer uma corrente de compreensão e simpatia com as crianças, esse fator pode
gerar um ambiente de felicidade em que as crianças podem encontrar formas de
expressão legitimas. Estas novas concepções tem influencias nas práticas educativas na
Colômbia, pois começa-se apensar e discutir sobre a Educação pré-escolar e a
importância de desenhar novas ferramentas para a aprendizagem da leitura e escritura,
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de modo que exista uma nivelação entre os papéis dos pais e dos filhos com maior
familiaridade nas relações, transformando-se a concepção da severidade pela disciplina.
Desta maneira, se cria em 1968 o Instituto Colombiano de Bienestar Familiar
(ICBF) como entidade para a proteção da família e infância. Com a preocupação dos
governos pela infância, cada um desenvolve uma política frente à atenção das mulheres
e crianças, articulado por Alfonso Lopez Michelsen com seu programa Para cerrar la
Brecha (1974–1978).Michelsen formulou um programa nacional de alimentação e
nutrição (PAN) para garantir as condições mínimas que devia ter qualquer criança na
Colômbia, estabelece ainda, a garantia de participação na Pré-escola como nível
educativo em dois graus não obrigatórios o que se reconhece em 1976 para aprovar o
Decreto n. 088 do ano corrente.
Posteriormente, no governo de Julio Cesar Turbay Ayala (1978–1982),
consolidou-se a política nacional de atenção das crianças e teve como marco o Plano de
Integração Social para a atenção das crianças menores dos sete anos de idade em saúde
e socialização. Durante este governo se consolida o Sistema Nacional de Bienestar
Familiar (SNBF) que tinha por objetivo integrar a família como garantia dos direito das
crianças e coordenar as instituições do Estado em relação aos problemas da família e
das crianças.
Entre os anos de 1982 e 1986 durante o governo de Belisario Betancurt, em seu
plano de Cambio com Equidad, incluiu-se a atenção da família, como as mães e as
crianças de grupos vulneráveis, ampliando a cobertura da atenção das crianças menores
de cinco anos, criando-se, assim, creches “menores” (consideradas com espaço físico
limitado e por isso o atendimento são os cuidados básicos às crianças, tais como:
higiene e o programa de complementação da alimentação).
Com a nova concepção da família moderna se cria em 1985 o Plano Nacional
para a Supervivência e Desenvolvimento Infantil (SUPERVIVIR) que acentua a
importância da vinculação afetiva, jogo promovendo formas de relação entre os adultos
e as crianças, e estimulação adequada ao desenvolvimento intelectual e afetivo.
Posterior a esse governo, no mandato de Virgilio Barco que compreende os
anos de 1986 a 1990, cria-se o Plano Economia Social que promove o bem-estar e
seguridade social da família em: nutrição, aluguel, saúde e educação para a promoção
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do desenvolvimento integral que melhora as condições de vida das classes sociais em
especial do proletariado.
No governo de César Gaviria (1990–1994) La Revolución Pacifica¸ se
consolida a ratificação de várias normas de construção do Marco Jurídico para o
atendimento das crianças entre os 2 aos 6 anos de idade. Nesse Marco ratificam:
Programa Nacional de Atenção em Favor da Infância (PAFI) em 1993 e se inscreve no
Acordo de 19 de 1993 para a organização de creches “maiores” da comunidade para
atendimento às crianças em idade pré-escolar, ademais, se proclama a Lei 100 de 1993
de Seguridade Social, formalizando-seatendimento às mães gestantes, população infantil
menor de um ano de idade e mulheres que mantém financeira e estruturalmente a
família. Nessa perspectiva, se proclama a Lei Geral de Educação em 1994, em que se
advoga como obrigatório a pré-escola para o atendimento da Primeira Infância.
Durante o Governo de Gaviria se assina a Constituição Política de 1991,
proclamando a Colômbia com um Estado Social de Direito, ou seja, todas as populações
adquirem a condição de sujeitos de direito para participar na vida: social, política,
econômica e cultural do país. A infância se converte em uma condição de superioridade
sobre outras populações porque esta perspectiva posiciona as crianças como cidadãos e
sujeitos na vida social.
Com a modificação da Constituição Política de 1991, pode-se pensar que as
políticas e programas paternalistas desenvolvidos no passado tinham seu fim, mas a
cada
governo
que
sucedia
mantinham
o
desenvolvimento
dos
programas
assistencialistas para a infância.
Durante o governo de Ernesto Samper Pizano que corresponde ao período de
1994 a 1998 se formulou o Plano El Salto Social, que determinava como objetivo o
desenvolvimento nacional e o bem-estar da infância, consequentemente melhorar as
condições sócias para o aceso ao sistema educativo, frente a programas de paternalismo
e Instituto Colombiano de Bienestar Familiar (ICBF), fazendo a entrega de
complemento nutricional as: gestantes, lactantes e filhos entre os 6 e 24 meses de idade.
Durante este governo, escreve-se o primeiro documento do Conselho Nacional de
Politica Econômica e Social CONPES em 1995 como Política Pública sobre Infância e
qual e seguido por um Pacto pela Infância em 1997, onde se busca fazer uma
abordagem integral em Saúde, educação, recreação, proteção, justiça, serviços públicos,
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pessoas com deficiência e a Violência. Produto de isso se conhece a primeira
experiência local para acolhimento de crianças na Cidade de Bogotá chamado Por uma
cidade ao alcance de os meninos e meninas, esta iniciativa propõe a universalização da
educação pré-escolar em as escolas publicas da cidade.
Nos anos 2002 – 2010 durante o governo de Álvaro Uribe Velez se proclama o
Plano do governo Hacia um Estado Comunitario, onde para a democratização das
politicas publicas se adopta a figura de conselhos para a politica social. Em relação a
infância o planeamento de reestruturação de ICBF e o Sistema de Identificación y
Clasificación de PotencialesBeneficiarios para programas sociales SISBEN focado
para atenção das crianças menores de cinco anos, também se instaura a implementação
da estratégia “Creciendo y Aprendiendo” que tem por objetivo qualificar e progresso
das crianças desde sua gestação, por isso se implementam estratégias de capacitação a:
pais, agentes educativos e cuidadores.
No ano de 2010 começa o governo de Francisco Santos com a Política para
atenção integral para a “Primeira Infância de Zero a Sempre”, outorgando a infância
prioridade nacional, determinando as carências que tem Colômbia frente à atenção das
crianças tendo em conta as normas internacionais:
1.
Declaração Universal dos Direitos Humanos.
2.
Convenção sobre os Direitos das Crianças.
3.
Educação para todos, Marco de Ação para as Américas.
4.
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.
5.
Conferência Mundial da UNESCO sobre a atenção e educação da Primeira
Infância.
Esta normatividade leva a determinar as argumentações para escrever as ações
de desenvolvimento da infância no marco dos lineamentos do desenvolvimento de uma
nação em assuntos econômicos e sócias. E assim que se reconhecem os postulados de
Van Der Gaag (2002) em relação com o Desenvolvimento Humano quando estabelece
relação entre o progresso econômico e desenvolvimento da infância,melhorará as
condições nutricionais, de saúde, desenvolvimento cognitivo e a interação social
possibilitam o desenvolvimento humano para o crescimento das nações. Determina
também um foco na relação entre a Infância e os Direitos Humanos, na medida em que
inverter em educação, saúde, formação do capital social e igualdade das crianças,
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contribuem para reduzir a delinquência, desigualdade e podendo melhorar as
motivações e autoestima para que os adultos do futuro aceitem as normas e valores
culturais construindo para uma sociedade mais igualitária com equiparação de
oportunidades.
Esta nova perspectiva da infância faz das crianças uma inversão para os
Estados porque gera: aportes científicos, legais e jurídicos, económicos, sócio –
culturais,institucionais e éticos.
Neste período se investemnas crianças, os valores de acordo a projeção que
podem ter na visão do progresso de uma nação, com o reconhecimento do período
gestacional como etapa fundamental para a aprendizagem, comunicação, socialização e
desenvolvimento das habilidades, capacidades e competências do sujeito, assim se
estimula o desenvolvimento cerebral na infância para evitar danos nos homens e
mulheres do futuro, como revela Mustard (2002)
E estímulo externo e interno que se recebe durante e período de
gestação é imediatamente depois do nascimento, e por tanto,
determinante para o desempenho na idade adulta.
Na Colômbia cada período presidencial trouxe contribuições às concepções da
infância que hoje são importantes para o desenho de políticas e estágios relacionados
com a infância, as quais não são distantes aos interesses frente às crianças a nível
internacional, já que se problematizam situações e conceitos deste grupo da população
que respondem a uma lógica social e econômica.
A infância na Colômbia
As mobilizações internacionais em relação da infância contribuíram na existência da
politica publica da primeira infância na Colômbia. Assim durante os começos do século
XXI na Colômbia se tem uma intensa mobilização social na que confluem instituições e
pessoas dos diferentes setores da sociedade para pensar e propor de maneira conjunta
ações prioritárias de intervenção de parte do Estado para o atendimento das crianças
nesta etapa da vida, tendo como referencia os avances científicos e políticos a nível
internacional na primeira infância.
Como resposta a esse processo o governo da Colômbia recolhesse as reflexões
numa politica nacional formalizada no documento CONPES Social 109 de 2007
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chamado “Colômbia pela Primeira Infância” esta se converte na primeira política
pública que ao longo da historia se dirige de maneira explicita a este grupo da
população.
Assim mesmo, Colômbia foi testemunha das defesas ao redor dos direitos da
infância, resultado da ratificação em 1992 da convenção sobre os direitos das crianças,
realizada no marco das Nações Unidas no novembro de 1989, este processo levo a uma
mudança da perspectiva frente a à relação que estabelece-se entre menino, meninas e a
sociedade, onde eram considerados como objetos de proteção e atendimento especial
para pensar-lhes como sujeitos ativos e protagonistas de sua vida e da vida social.
Esta perspectiva torna-se como filosofia para a formulação da politica e a
promulgação da Lei 1098 de 2006 o “Código de Infância e Adolescência”,
institucionalizando a perspectiva dos direitos e a maneira de entender o papel da
infância na sociedade colombiana. Assim mudam a visão do Estado em relação com as
crianças determinando princípios constitutivos a partir do enfoque de direitos; se
reconhece as crianças como sujeitos titulares de seus direitos, se concebe o interesse
superior da infância, se prevalecem os direitos da infância sobre os outros, existe
interdependência entre os direitos, a intersectorialidade é a forma de intervenção do
Estado, existe uma corresponsabilidade entre: o Estado, a sociedade e a família na
proteção dos direitos das crianças. Estes princípios convertem-se o cenário para a
compreensão da infância como avance em comparação com as ações de décadas
anteriores onde a criança tinha um papel passivo na sociedade.
Esta nova perspectiva levo a transformações no ordenamento das instituições
frente a intervenção direita a primeira infância como: o Ministério da Proteção Social
(MPS), o Ministério de Educação Nacional (MEN), o Ministério de Ambiente, Moradia
e Desenvolvimento Territorial, o Ministério de Cultura e outras instituições que devem
fazer vigilância no cumprimento dos direitos da infância. Assim mesmo os governos
locais assumem responsabilidades que antigamente eram só da ordem nacional.
Desta maneira configura-se uma organização institucional distinta a à
predominante historicamente, ágora o Estado designa as responsabilidades para com a
realização dos direitos da primeira infância e ressalta como obrigação primordial em
todos os níveis do governo, porém estas iniciativas entram em contradição com outras
lógicas do âmbito institucional, assim a efetividade na nova organização institucional
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para a atenção da infância deve atravessar por discussões e transformações, de modo
que se convertam em princípios de atuação do Estado.
Considerações Finais
Colômbia apresenta uma problemática social caracterizada pela: violência,
pobreza, migração forçada e exploração infantil, em que as crianças a cada dia são
participantes ativas desta dinâmica, de modo que, as ações apontam o fortalecimento
das redes familiares e sociais como garantes para o cuidado e socialização das crianças
em condições que seja possível a transmissão de valores, tradições e costumes das
populações.
Dessa maneira, infere-se que a configuração da infância implica a construção
de significados acerca dos meninos e meninas, partindo de processos mediados pela
linguagem e suas relações, sendo importante ampliar o horizonte das possibilidades em
relação com a potenciação dos recursos individuais das crianças e de aqueles recursos
coletivos.
Percebe-se que a história da Colômbia em relação com a atenção da população
em condições vulneráveis e da infância foi paternalista, procurando ter um impacto
imediato em relação à cobertura dos serviços sociais e nutricionais. Isso porque as
políticas da infância pretendem responder de maneira coerente aos acordos
internacionais com relação ao desenvolvimento das nações, fazendo uma inversão
importante nos cuidados da primeira infância em idade escolar como inversão para a
formação do capital humano do futuro de nossos povos.
Nesta lógica é importante reconhecer a visão integral da infância, porque seu
discurso responde a uma lógica internacional de caráter econômico, social e político.
Por este motivo, Colômbia na atualidade reconhece suas carências frente à atenção
integral da infância e da família, já que não conta com uma política de bem-estar
familiar que clarifique o papel que tem o Estado na vida da família como unidade para
oferecer atendimento a cada um de seus membros.
Para a Colômbia, pensar em fortalecer a infância, implica ter clara uma política
de fortalecimento da família como unidade básica da sociedade e primer responsável do
desenvolvimento das crianças. Por isso, percebe-se a importância de se conhecer a
história e as políticas formuladas em cada um dos planos do governo, porque se
52
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identificam as carências e incoerências com os discursos internacionais para
desenvolver ações pertinentes e coerentes com as necessidades de nossa população no
contexto local.
As relações que se estabelecem com nossas crianças a partir das novas políticas
respondem uma lógica de desenvolvimento e são fundamentais na educação dos novos
cidadãos colombianos com uma responsabilidade ética, social, cultural e política. Por
tanto, é necessário fazer uma reflexão destas condições para determinar as mudanças
substanciais no setor educacional e social.
Para o trabalho Inter setorial é preciso assinar responsabilidades a as diferentes
instituições do Estado e da ordem territorial, tendo em conta a participação de novas
fontes de recursos, assim como a construção de estratégias de articulação e coordenação
entre as diferentes instituições e ordens do governo para gerar mudanças nas
perspectivas antigas para o atendimento da infância.
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O Brincar e o Educar na Educação Infantil: uma análise de dados de pesquisa com
as professoras da rede municipal de São Carlos 15
Andreina de Melo Louveira16
Lidiane Cristina Marques17
Resumo
Esta comunicação apresenta, em análise parcial, os dados coletados por meio do projeto
Políticas Públicas Municipais de Educação Infantil: diagnóstico e pesquisa, integrado ao
programa “Observatório da Educação”, desenvolvido na rede municipal de Educação
Infantil de São Carlos (SP). Neste projeto, foram coletados dados do grupo das
professoras que atuam na rede com o objetivo de realizar um diagnóstico de políticas
para a Educação Infantil (EI). A coleta de dados foi feita a partir da aplicação de um
questionário por autopreenchimento e sem identificação durante o horário de HTPC.
Para esta análise foram escolhidos os resultados de duas questões que evidenciam
concepções na EI sobre “brincar” e “educar” e, divergem de documentos que orientam a
construção da prática na EI. A proposta que se apresenta não é confrontar os dados da
pesquisa com a prática pedagógica das professoras, mas sim apresentar indicadores da
EI que contribuam para a construção de uma EI que respeite as crianças.
Palavras-chave: Brincar. Educar. Educação Infantil. Professoras.
Introdução
A proposta desta comunicação é apresentar uma análise parcial referente aos
dados coletados por meio do projeto Políticas Públicas Municipais de Educação Infantil:
15
O projeto, coordenado pela Prof.ªDrª Anete Abramowicz, é financiado pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, por meio do programa Observatório da
Educação - OBEDUC, e tem como objetivo a realização de um diagnóstico da referida rede para
a construção de indicadores que permitam subsidiar uma avaliação desta etapa da educação
básica
16
Professora de educação infantil, integrante da equipe do Projeto “Políticas Públicas Municipais de
Educação infantil: diagnóstico e pesquisa” e bolsista CAPES pelo Programa OBEDUC.
17
Professora de educação infantil na rede municipal de São Carlos, integrante da equipe do Projeto
“Políticas Públicas Municipais de Educação infantil: diagnóstico e pesquisa” e bolsista CAPES pelo
Programa OBEDUC.
55
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diagnóstico e pesquisa, desenvolvido na rede municipal de Educação Infantil (EI) de
São Carlos (SP). Neste projeto foram coletados dados de dois grupos: o grupo dos
pais/responsáveis, que forneceram informações sobre as crianças e o grupo das
professoras18, que é o foco deste texto.
A coleta de dados foi organizada considerando as especificidades dos dois
grupos consultados, pais/responsáveis das crianças matriculadas na rede e professoras
que atuam na EI. Para a etapa de coleta de dados junto às famílias das crianças e com as
professoras, o projeto contou com um grupo de professoras de educação infantil que
atuam na cidade de São Carlos (SP), como parte da equipe de pesquisa, que se
constituiu como uma forma efetiva e eficaz de interação da escola da educação básica
com a universidade. Convém salientar que contribuiu para a pesquisa o fato das
professoras estarem familiarizadas com o ambiente onde a pesquisa foi realizada. Para o
levantamento dos dados das famílias e suas crianças adotou-se o Survey como método
e, foram realizadas entrevistas, com horários agendados pelas pesquisadoras.
Na pesquisa com as professoras de Educação Infantil, optou-se por realizar um
censo a partir do autopreenchimento de questionário, com o objetivo de atingir o maior
número de professoras da área. O questionário foi aplicado às professoras atuantes em
turmas da EI durante os encontros do horário de trabalho pedagógico coletivo (HTPC) 19
em todas as instituições de EI.
Com os dados coletados e categorizados, as características da EI foram se
apresentando de forma sucinta e até mesmo surpreendente. Nesta comunicação,
apresentaremos os resultados relacionados as concepções do “brincar” e “educar 20”
18
Utilizamos a terminologia no gênero feminino, pois corresponde a 95% do total de professoras que
preencheram o questionário (HENRIQUES, 2015).
19
O HTPC (horário de trabalho pedagógico coletivo) acontece uma vez por semana em todos os Centros
Municipais de Educação Infantil, neste horário as professoras se reúnem para discutir problemas, planejar
suas atividades, realizar estudos e trabalhos em equipe. Tudo sob orientação e coordenação do diretor da
unidade.
20
Compreendemos que o termo “educar” utilizado nesta comunicação está relacionado às
questões do ensino, mais precisamente como uma preparação das crianças para o ensino
fundamental, porém apresentamos a categoria educar por ter sido o termo que mais se destacou
nas respostas das professoras. Salientamos que esta categorização poderá sofre alterações, pois
as análises do projeto estão em construção.
56
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expressas pelas professoras. Os índices nos deixaram intrigadas na análise das respostas
das professoras sobre quais os principais objetivos da EI e o que seria uma EI de
qualidade, pois, apresentam contradições em relação aos documentos oficiais
norteadores21 e a produção teórica que discute acerca da importância do brincar na
educação infantil.
Justificativa
Duas premissas foram consideradas para justificar a necessidade desta
comunicação. Primeiro, diante do objetivo deste projeto, a premência de diagnóstico de
políticas para a EI, já que, muitas não têm a preocupação nas crianças, sendo assim “a
única maneira de evitar o negativo ou de promover o positivo dessas políticas quando
elas afetam as crianças e a infância é fazer um diagnóstico” (QVORTRUP, 2010, p.
783).
A segunda premissa se refere- ao retorno à comunidade apresentando dados
importantes para a avaliação da rede municipal de EI, referimo-nos aos indicadores
apresentados nas duas questões respondidas pelas professoras no questionário aplicado.
As duas questões fornecem subsídios para futuras discussões e estudos sobre ações na
política pública voltada para a Educação Infantil.
Entre esses conhecimentos, os resultados de pesquisas sobre a
educação infantil no Brasil podem alertar os profissionais sobre
os problemas mais frequentes encontrados nas creches e préescolas, que precisam ser levados em conta no processo de
avaliar e aprimorar a qualidade do trabalho realizado nas
instituições de educação infantil (BRASIL, 2009, p, 15).
Objetivos
21
Os documentos utilizados para desenvolver a análise destes dados foram: Brinquedos e Brincadeiras de
Creches (2012); Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (2010); Critérios para um
Atendimento em Creches que Respeitem os Direitos Fundamentais das Crianças (2009); Indicadores de
Qualidade (2009)
57
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Objetivo geral
O objetivo deste trabalho é discutir dois dos dados levantados em duas questões
na pesquisa com as professoras, contrastando à luz das concepções de EI que nortearam
esta análise. As questões analisadas são: Quais são os três principais objetivos da
educação infantil e o que é uma Educação Infantil de qualidade.
Objetivo específico
●
Apresentar a contradição dos dados analisados entre as concepções do
brincar e educar das professoras de EI por meio de gráficos;
Referencial teórico
Existe uma ampla produção teórica sobre a importância do brincar na educação
infantil. A proposta deste trabalho não é apresentar o que foi ou o que está sendo
produzido sobre a temática, mas, analisar os dados desta pesquisa a partir do que tem
fundamentado nossa prática docente. Relacionar a criança e o brincar é resultado de
uma discussão que considera o brincar como atividade inata a criança, neste sentido é
importante destacar que “ Brincar não é uma dinâmica interna do indivíduo, mas uma
atividade dotada de uma significação social precisa que, como outras necessita de
aprendizagem” (BROUGÈRE, 1998, p.104).
Os documentos que subsidiaram esta análise dialogam no sentido de apresentar
o brincar como parte fundamental à experiência da infância. As “Diretrizes Curriculares
Nacionais da Educação Infantil” (201022), são constituídas por exigências para orientar
“as políticas públicas e a elaboração, planejamento, execução e avaliação de propostas
pedagógicas curriculares de Educação Infantil” (p.11). Em suas propostas apresenta o
princípio estético, contemplando a ludicidade, ou seja, o brincar. Como este documento
considera a criança enquanto sujeito de direitos, o brincar é reconhecido como um
22
Resolução do CEB nº 1, de 7 de abril de 1999 institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil. Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009 fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil. No ano de 2010 o MEC realizou a publicação das Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil.
58
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direito e mais, “As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da
Educação infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a brincadeira”
(p.25).
Para corroborar este direito, destacamos a concepção do brincar presente nas
“Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica” (2013):
Cada criança apresenta um ritmo e uma forma própria de
colocar-se nos relacionamentos e nas interações, de manifestar
emoções e curiosidade, e elabora um modo próprio de agir nas
diversas situações que vivencia desde o nascimento conforme
experimenta sensações de desconforto ou de incerteza diante de
aspectos novos que lhe geram necessidades e desejos, e lhe
exigem novas respostas. Assim busca compreender o mundo e
a si mesma, testando de alguma forma as significações que
constrói, modificando-as continuamente em cada interação,
seja com outro ser humano, seja com objetos. Uma atividade
muito importante para a criança pequena é a brincadeira.
Brincar dá à criança oportunidade para imitar o conhecido e
para construir o novo, conforme ela reconstrói o cenário
necessário para que sua fantasia se aproxime ou se distancie da
realidade vivida, assumindo personagens e transformando
objetos pelo uso que deles faz (BRASIL, 2013, p. 87).
Outro documento que apresenta a relação do brincar com a EI, é o “Critérios
para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças”
(2009), que também considera o brincar como direito da criança. Na constituição do
direito ao brincar, o documento amplia a discussão para questões sobre a importância do
brinquedo, a organização de espaços para brincar, a inclusão do brincar na rotina
enfatizando que “as rotinas da creche são flexíveis e reservam períodos longos para as
brincadeiras livres das crianças” (p.14).
Ainda neste documento, são apresentados
critérios relativos à definição de diretrizes e normas políticas para as creches e,
novamente, o direito ao brincar se destaca em seus princípios. A política da creche deve
reconhecer que a criança tem direito à brincadeira e nesse aspecto, destacamos alguns
critérios.
● (...)A construção das creches prevê a possibilidade de
brincadeiras em espaço interno e externo
● As creches dispõem de número de educadores
compatível com a promoção de brincadeiras interativas
(...)
59
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● A formação prévia e em serviço reconhece a
importância da brincadeira e da literatura infantil para
o desenvolvimento da criança
● A programação para as creches reconhece e incorpora o
direito das crianças à brincadeira (BRASIL, 2009, p.
38)
O brincar enquanto direito, o brincar incluído na prática pedagógica e o brincar
como possibilidade de experiência, são questões discutidas no manual de orientação
pedagógica “Brinquedos e brincadeiras de creche” (2012). Este manual apresenta uma
gama de orientações para implementar o brincar na prática docente. São apresentadas
possibilidades diversificadas para garantir o direito à brincadeira e, quando o brincar se
faz como eixo de uma proposta curricular compreende-se que é a criança quem inicia a
experiência, também, apresenta possibilidades para a construção da prática, o manual
ainda ressalta que:
Um currículo que adota a brincadeira como eixo precisa
valorizar a dimensão brincante e brincalhona da professora
como condição importante. Essa atitude da professora é
essencial para criar vínculos com a criança e para organizar
situações nas programações curriculares, em que as interações
e as brincadeiras estejam presentes (2013, p.54)
As orientações que os documentos apresentam para incluir o brincar na prática
pedagógica incidem diretamente na prática do professor. Desta forma, quando
refletimos sobre a importância do professor na relação do brincar com a criança,
compreendemos que o brincar é uma prática social e cultural. Brougère (1998)
conceitua esta prática como cultura lúdica, que é produto da interação social, interação
que a criança estabelece a princípio com a mãe e, quando começa a frequentar outros
espaços sociais estabelece, como na instituição de EI estabelece com as professoras e
seus pares.
A criança adquire, constrói sua cultura lúdica brincando. É o
conjunto de sua experiência lúdica acumulada, começando
pelas primeiras brincadeiras de bebê, evocadas anteriormente,
que constitui sua cultura lúdica (p.110)
60
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Apresentamos estes argumentos para evidenciar que brincar é uma prática na EI
que se constituiu enquanto direito da criança e, também, uma orientação especifica da
prática docente para a EI. Após todas essas análises, uma questão chamou bastante a
atenção do grupo, sabendo que o brincar é uma experiência fundamental na primeira
infância, garantido por direito e recomendado por documentos norteadores da educação,
tornou-se intrigante os índices obtidos após a categorização das perguntas feitas na
pesquisacom as professoras da rede. Além disso, nos surpreendeu os resultados diante
da convicção que tínhamos de que para as professoras o brincar era prioridade na
Educação Infantil. Foi a partir destes resultados que organizamos esta comunicação,
com o propósito de apresentar análises23 de um recorte dos dados do projeto.
Metodologia
Para compreender como os dados foram coletados é importante destacar que os
dados da pesquisa correspondem a dois grupos, para cada grupo foi utilizada uma
metodologia. Para coletar os dados com o grupo dos pais/responsáveis das crianças
matriculadas na EI optou-se por utilizar o método de pesquisa por amostragem
(Survey), devido ao número de crianças 8.096 crianças matriculadas na educação
infantil. De acordo com Babbie24 apud Henriques (2015, p.19) (2003), “surveys
amostrais quase nunca são realizados para descrever a amostra particular estudada. São
realizados para se entender a população maior da qual a amostra foi inicialmente
selecionada”.Após a seleção das amostras para o Survey, iniciou-se o processo de
entrevistar os responsáveis pelas crianças e, para isso, entramos em contato com a
direção das unidades e realizamos agendamentos de horários com esses responsáveis.
Conforme o horário agendado, a entrevista era realizada na unidade e em alguns casos
nas casas ou no trabalho dos pais/responsáveis. Foram entrevistados 1.300 pessoas.
23
É importante destacar que estas análises estão em construção. Este projeto ainda está em andamento e,
os dados apresentados correspondem ao um recorte de duas questões do questionário aplicado nas
professoras da rede municipal de EI em São Carlos.
24
BABBIE, E. Métodos de pesquisa Survey. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.
61
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A coleta de dados do grupo das professoras foi feita a partir da aplicação de um
questionário25. Diversas reuniões foram realizadas para a elaboração da metodologia de
aplicação do questionário, até a decisão do grupo de que a aplicação de questionário
com as professoras seria por autopreenchimento e sem identificação, pois acreditamos
que dessa forma a profissional se sentiria mais livre para expressar suas ideias e
opiniões. O horário escolhido foi o Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC),
em que todas as professoras da unidade estariam reunidas para realizar seus trabalhos, o
que facilitaria a aplicação dos questionários e atingiria o maior número de professoras.
Os questionários continham perguntas fechadas onde o respondente deveria selecionar
as alternativas, e perguntas abertas, duas das quais foram objetivo deste trabalho.
Encerrado o processo de levantamento dos dados, iniciou-se a codificação das
perguntas abertas realizadas com os pais/responsáveis e professoras. Foram realizadas
reuniões e estudos dos integrantes da equipe para elaborar e categorizar as respostas
obtidas. Os dados coletados apresentaram subsídios suficientes para levantarmos alguns
pontos intrigantes em relação ao que o grupo esperava. Dois deles relataremos nesse
trabalho, baseado nas concepções teóricas apresentadas.
Nesse momento o projeto encontra-se na etapa de elaboração da apresentação
dos dados coletados à comunidade, tendo como público principal as professoras de
educação infantil, gestores, pais/responsáveis e representantes do conselho escolar.
Esta comunicação, no entanto, apresentará um estudo sobre as categorias
“brincar” e “educar”, relacionadas as questões abertas respondidas pelas professoras a
respeito dos objetivos da educação infantil e o que é uma educação infantil de
qualidade. Nos tópicos seguintes apresentaremos gráficos que demonstrarão os
indicadores obtidos.
Desenvolvimento da pesquisa
Após finalizar a categorização das respostas do questionário aplicado nas
professoras, os resultados foram surgindo e instigando discussões sobre nossas
percepções diante dos resultados. Neste sentido, para esta comunicação escolhemos
25
O questionário foi desenvolvido pela Prof.ªDrª Fabiana Luci de Oliveira.
62
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duas perguntas que se destacaram diante das nossas percepções iniciais na pesquisa. São
elas; “Quais são os três principais objetivos do ensino infantil? ” e “O que é uma
Educação Infantil de qualidade? ”.
Confrontaremos dois dos dados escolhidos nessas questões, o “brincar” e o
“educar”. Na categorização das respostas, “educar” refere-se sempre às colocações das
professoras quando se remetem a ideia de aprendizagem, alfabetização e educar. Nesta
análise não discutiremos o sentido de “educar”, apenas apresentaremos os dados que
evidenciam que o “educar” sobressai ao brincar na EI. A categoria “brincar” refere-se às
respostas das professoras em que aparecem a palavra brincar, e quando citam sobre
brincadeiras, brinquedos e atividades lúdicas.
Os dados apresentados mostraram a grande diferença que existe na concepção
das professoras de educação infantil deste município sobre a importância do brincar
para as crianças. Nos gráficos que apresentaremos a seguir, o índice referente ao brincar
aparecerá muito abaixo do esperado, contrapondo alguns dos estudos realizados para
essa etapa da educação básica, até mesmo as Diretrizes Curriculares Nacionais:
Deve-se entender, portanto, que, para as crianças de 0 (zero) a 5
(cinco) anos, independentemente das diferentes condições físicas,
sensoriais, mentais, linguísticas, étnico-raciais, socioeconômicas, de
origem, religiosas, entre outras, no espaço escolar, as relações sociais
e intersubjetivas requerem a atenção intensiva dos profissionais da
educação, durante o tempo e o momento de desenvolvimento das
atividades que lhes são peculiares: este é o tempo em que a
curiosidade deve ser estimulada, a partir da brincadeira orientada
pelos profissionais da educação. (BRASIL, 2013, p. 36)
Segundo Kishimoto (2010), “todo o período da educação infantil é importante
para a introdução das brincadeiras” (p.1), pois essa atividade é característica dessa fase
na qual a criança se expressa, se relaciona, aprende e se desenvolve.
Para a criança, o brincar é a atividade principal do dia-a-dia. É
importante porque dá a ela o poder de tomar decisões, expressar
sentimentos e valores, conhecer a si, aos outros e o mundo, de repetir
ações prazerosas, de partilhar, expressar sua individualidade e
identidade por meio de diferentes linguagens, de usar o corpo, os
sentidos, os movimentos, de solucionar problemas e criar. Ao brincar,
a criança experimenta o poder de explorar o mundo dos objetos, das
pessoas, da natureza e da cultura, para compreendê-lo e expressá-lo
por meio de variadas linguagens. Mas é no plano da imaginação que o
brincar se destaca pela mobilização dos significados. Enfim, sua
importância se relaciona com a cultura da infância, que coloca a
brincadeira como ferramenta para a criança se expressar, aprender e
se desenvolver (KISHIMOTO, 2010, p.1)
63
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Encontraremos nos gráficos que representam esse estudo, várias categorias que
indicam as concepções das professoras sobre a Educação Infantil, mostrando claramente
suas prioridades e até mesmo uma realidade desta etapa da educação básica na rede
municipal. Para exemplificar a construção dos gráficos apresentaremos alguns excertos
dos questionários respondidos pelas professoras. Esta realidade poderá nortear novos
questionamentos e estudos com o intuito de analisar a situação desta rede de ensino.
Resultados
Após a análise das respostas das professoras e a categorização dos temas que surgiram,
elaboramos um gráfico para cada questão aberta do questionário aplicado com as
professoras. Durante os estudos, alguns itens nos chamaram a atenção devido a
frequência que apareciam nas respostas. Com isso, a atenção de todo o grupo de estudo,
inclusive a nossa, voltou-se para os índices relacionados ao “brincar” e ao “educar”. A
diferença entre ambos nos instigou a alguns questionamentos sobre quais os
pensamentos estão norteando os educadores da Educação Infantil.
Sobre o “Educar” é visível a importância que o professor atribui a essa categoria
na educação infantil. Lembrando que educar, nesta pesquisa, se refere as respostas das
professoras categorizadas como aprendizagem, alfabetização e educar. Para compor esta
comunicação selecionamos algumas respostas que as professoras expressaram nos
questionários, as professoras serão identificadas por números, conforme tabulação dos
Professora 35: “Ensinar – Educar para o convívio em sociedade – Socializar”.
Professora 73: “Preparar para o fundamental – Socialização”
Professora 75: “Preparar a criança para os demais níveis de escolaridade – Socialização”.
Professora 109: “Promoção de educação – Promoção de socialização”.
Professora 179: Preparar para o ingresso no fundamental”.
Professora 193: “Educar – Socializar”.
Professora 196: “Educar – Ensinar”.
Professora 203: “Educar formar indivíduos pensantes, criativos, alegres, capazes de enfrentar o
mundo que os cerca”.
Professora 223: “Ensinar socializar desenvolver a identidade de forma positiva”.
Professora 228: “Educar no sentido de ensinar”.
Professora 257: “Aprendizagem de conceitos, letras, números, etc”.
Professora 259: “Preparar para o ensino
ISSNfundamental”.
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Professora 263: “Ensino e aprendizagem (letramento) ”.
64
dados26.
Esses indicadores são baseados nas repostas que as professoras deram às
questões abertas sobre sua opinião a respeito dos objetivos da educação infantil e o que
elas consideram como uma educação infantil de qualidade. Compreendemos que o
educar está presente nos princípios das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil. Tais princípios citam que o cuidar é um fator indissociável ao educar
nessa fase da primeira infância.
Educar exige cuidado; cuidar é educar, envolvendo acolher, ouvir, encorajar,
apoiar, no sentido de desenvolver o aprendizado de pensar e agir, cuidar de
si, do outro, da escola, da natureza, da água, do Planeta. Educar é, enfim,
enfrentar o desafio de lidar com gente, isto é, com criaturas tão imprevisíveis
e diferentes quanto semelhantes, ao longo de uma existência inscrita na teia
das relações humanas, neste mundo complexo. Educar com cuidado significa
aprender a amar sem dependência, desenvolver a sensibilidade humana na
relação de cada um consigo, com o outro e com tudo o que existe, com zelo,
ante uma situação que requer cautela em busca da formação humana plena.
(BRASIL, 2013, p. 18)
O cuidar não está entre os índices mais altos (conforme vemos no gráfico 1),
quando se trata de falar em objetivos da educação infantil, na opinião das professoras,
os destaques se referem ao educar, a relação interpessoal e ao desenvolvimento. Ainda
neste gráfico 1 podemos notar que o índice do brincar se apresenta muito baixo em
relação aos outros. Esse índice é o que causou alguns questionamentos a respeito. No
questionário aplicado às professoras a pergunta era muito clara: Quais são os três
principais objetivos do ensino infantil? Analisando esta questão no gráfico podemos
perceber que os três maiores índices se referem ao educar, a relação interpessoal e ao
desenvolvimento, ou seja, de uma forma geral estes são os três principais objetivos da
Educação Infantil para as professoras dessa rede municipal.
O brincar, no entanto, escalado num grau de importância, segundo o gráfico 1,
ocuparia o 5° lugar entre as 7 categorias. Em contrapartida, nota - se que o educar
ocupa o maior índice na opinião das professoras, ressaltando que educar também irá se
referir a alfabetização e aprendizagem de um modo geral.
26
Afonso Canella Henriques, integrante do projeto, desenvolveu um sistema informatizado para
gerenciamento do banco de dados, que recebeu todas as informações coletadas na pesquisa com
os dois grupos consultados. Ver Henriques (2015).
65
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Gráfico 1 - Quais são os três principais objetivos do ensino infantil?
No gráfico 2 é apresentada a concepção das professoras em relação ao que seria
uma Educação Infantil de qualidade. O índice referente ao brincar aparecerá entre os
mais baixos das categorias. Dentre as categorias que as professoras julgam serem
necessárias para garantir uma educação infantil de qualidade, percebemos que o brincar
tem a mesma importância que o cuidar, isto é, numa escala de importância,
desenvolvimento, valorização profissional, pessoas/profissionais, espaço, educar e
direito da criança, ocupariam prioridade na questão sobre qualidade.
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Gráfico 2 – O que é uma educação infantil de qualidade?
Cuidar encontra-se no mesmo patamar de igualdade que brincar, sendo
considerado um dos itens menos importantes, praticamente um dos últimos índices entre
as categorias. Após essas, estariam as categorias que englobam aquelas consideradas
sem resposta, não declaradas e outros.
Novamente, notamos que este também não compõe uma prioridade no universo
de qualidade para as professoras. Interessante que nesta questão, educar já não ocupa
lugar de destaque entre as categorias como mostrado no gráfico 1, mas sim, num mesmo
patamar de consideração que a categoria brincar.A partir destes resultados
apresentaremos algumas considerações de análise dos dados e também para
continuidade da pesquisa.
Considerações finais
A proposta dessa comunicação não é confrontar os dados coletados na pesquisa
com a prática pedagógica das professoras da rede municipal de Educação Infantil, mas
sim apresentar indicadores que estão sendo produzidos na EI. Esta análise realizada nos
leva a pensar nas prioridades que as professoras da educação infantil estão considerando
em suas concepções.
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Os índices apresentados nos gráficos levantam questionamentos interessantes a
respeito do que se considera importante nessa etapa da educação básica e nos conduz a
refletir sobre qual a consequência disso na educação das crianças. Os documentos
norteadores dessa comunicação evidenciam o que consideramos fundamental para a
prática na EI.
Poderíamos nos estender e apresentar argumentos da Psicologia sobre a
importância do brincar para o desenvolvimento da criança, porém este não é nosso
objetivo. O que buscamos apresentar, ainda que a pesquisa esteja em andamento, é que
há um desencontro entre o que se tem produzido no campo teórico da EI com as
concepções das professoras. Se considerarmos que a prática docente é permeada por
concepções do que é ser criança, ter infância e de EI.
Podemos ter como pressuposto, a partir dos dados, que a EI, no ambiente
pesquisado, está se construindo como preparação para o ensino fundamental. Esta
comunicação, no entanto, possibilita direcionamentos para futuras discussões sobre a
realidade apresentada acerca das concepções e da formação das professoras e,
principalmente para a construção de uma EI que respeite as crianças.
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Referências bibliográficas
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica (SEB). Diretrizes
curriculares nacionais da educação básica. Brasília. 2013
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica (SEB). Diretrizes
curriculares nacionais para a educação infantil. Brasília. 2010
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica (SEB). Critérios
para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das
crianças. 2.ed. Brasília. 2009.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica (SEB). Indicadores
da qualidade na educação infantil. 2009.
BROUGÈRE, G. A criança e a cultura lúdica. Revista da Faculdade de Educação. São
Paulo,
vol.24,
n.2,
p.103-116,
jul/dez.
1998.
Disponível
em:
<http://www.revistas.usp.br/rfe/article/view/59630/62727>. Acesso em: ago. 2015.
HENRIQUES, A. C.Educação infantil: retrato de uma rede municipal de ensino. 2015.
104 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro de Educação e Ciência Humanas,
Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2006.
KISHIMOTO, T. M. Brinquedos e brincadeiras na educação infantil. In: I SEMINÁRIO
NACIONAL: CURRÍCULO EM MOVIMENTO- perspectivas atuais, 1., 2010, Belo
Horizonte. Anais, Belo Horizonte, 2010, p. 1-20.
69
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Discussão Curricular da Educação Infantil com Assistentes Pedagógicas: Uma
experiência entre setores da Prefeitura de Santo André
Carolina Mariane Miguel27
Jussara da Silva28
Este trabalho propõe a relatar uma prática de encontros formativos entre 3 setores da
Secretaria de Educação de Santo André, com a presença das assistentes pedagógicas. As
coordenadoras destes setores organizaram as pautas com o grupo, que já vinha
solicitando uma discussão curricular para a Educação Infantil. Assim realizamos
encontros periódicos, aproximadamente a cada 15 dias, desde o início de 2015, em que
realizamos estudos e vivências de formação continuada com as assistentes pedagógicas.
O objetivo foi o fortalecimento das mesmas para a discussão curricular da Educação
Infantil em suas escolas ao estudar os documentos oficiais e os livros do acervo das
escolas, trocar práticas e estabelecer relações com o Projeto Político Pedagógico (PPP)
de cada unidade escolar, buscando estratégias formativas para as reuniões pedagógicas,
o acompanhamento de sala de aula e do planejamento das professoras.
Palavras-chave – Educação Infantil, currículo, formação de formadores.
Contextualizando a experiência
A Prefeitura de Santo André organiza as Escola Municipal de Educação Infantil
e Ensino Fundamental (EMEIEF) e Creches da cidade em setores de escolas próximas,
cada qual com cerca de quatro a seis escolas, que ficam sob a responsabilidade de uma
Coordenadora de Serviços Educacionais. Estas são professoras da rede, porém exercem
uma função gratificada na Secretaria de Educação do Município.
O relato de experiência a seguir trata dos encontros de formação com as
assistentes pedagógicas, que exercem função de coordenadoras de escola e compõem as
equipes gestoras das unidades escolares destes setores, que tem como objetivo realizar
uma discussão sobre o currículo da Educação Infantil.
27
28
Coordenadora de Serviços Educacionais da Prefeitura de Santo André.
Coordenadora de Serviços Educacionais da Prefeitura de Santo André.
70
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Dois destes setores iniciaram os encontros em março de 2015 e são compostos
de seis EMEIEF que atendem crianças de três a dez anos aproximadamente. Outro setor
se juntou a esta discussão em agosto deste mesmo ano, sendo este composto por três
EMEIEF e duas creches.
Iniciamos os encontros motivadas pelas solicitações das assistentes pedagógicas
em realizar discussões curriculares voltadas à Educação Infantil. Desde 2014 iniciou-se
uma formação na rede com o foco na infância e na produção das culturas infantis, tal
formação despertou nas CSE a inquietação de como cada escola de seus setores estavam
entendendo as propostas trazidas, suscitando a necessidade de discutir com maior
profundidade este tema nas concepções e práticas educativas de cada escola.
Temos momentos quinzenais com as equipes gestoras, intitulados Setoriais,
porém as discussões são amplas considerando tanto aspectos pedagógicos como
administrativos. Assim vimos a necessidade de aprofundar as discussões e reflexões
acerca da infância, sendo este mais um motivo para os encontros com as assistentes
pedagógicas serem em horários diferenciados, as quais tem em sua função o
acompanhamento mais próximo das salas de aula.
A experiência do encontro
A metodologia dos encontros inclui vivências nas diversas linguagens, pois
entendemos que o adulto que experiência tais linguagens pode ser tocado de forma mais
efetiva. Bondía (2002) diz que “A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o
que nos toca. Não o que se passa, não o que acontece, ou o que toca”, sendo portanto
muito mais importante que a informação e ressignificando o que consideramos ser o
conhecimento ou a sabedoria.
Considerando que as experiências compõem a vida do ser humano desde a tenra
infância discutimos e contextualizamos os conceitos sobre o currículo na Educação
Infantil, situações de aprendizagem significativas, a arte, a leitura e a escrita, entre
outros,como parte do processo de reflexão conceitual da experiência.
A fundamentação teórica partiu das Diretrizes Curriculares Nacionais da
Educação Infantil. Como o referencial valoriza a questão da experiência e destaca que
os dois eixos do currículo da infância são a brincadeira e a interação, as vivências
71
ISSN 2448-1157
propostas colocam os adultos para também aprender por meio da brincadeira e da
interação.
Iniciamos os encontros com o filme “Tarja Branca – a revolução que faltava”,
que traz justamente a relação da brincadeira na sociedade atual, independente da nossa
idade como seres humanos.A partir daí fizemos uma breve pesquisa onde questionamos
quais eram seus brinquedos, brincadeiras e comidas preferidos da infância. Em cada
encontro explorávamos um destes temas através de vivencias corporais, da arte e da
linguagem, resgatando as memórias de infância de cada um. Essas experiências iam
ressignificando as discussões conceituais que partiram do PPP, já que estávamos no
inicio do ano, discutindo nos primeiros encontros as caracterizações das turmas, as
rotinas, os tempos e espaços, analisando quais as experiências que temos proporcionado
às crianças na escola.
Nos encontros que se seguiram continuamos com as vivências e, em paralelo,
realizamos um aprofundamento dos estudos das Diretrizes Curriculares Nacionais da
Educação Infantil (DCNEI) e dois livros que as escolas receberam do Ministério da
Educação (MEC), portanto estava disponível à todas. Consideramos que os livros
ofereceriam uma boa fundamentação para as discussões, principalmente por estarem se
baseando nas DCNEI.
O livro “Currículo na Educação Infantil: Diálogo com os demais elementos da
Proposta Pedagógica” (SALLES e FARIA, 2012), destaca no capítulo 1 a orientação
das DCNEI de que o currículo seja organizado no Proposta Pedagógica (PP) de cada
escola, considerando que a rede municipal adota o termo Projeto Político-Pedagógico
(PPP) para designar o plano que cada escola desenvolve para o ano letivo. No segundo
capítulo destacam algumas concepções e pressupostos norteadores e propõem uma
organização por Campos de Experiência. O terceiro capítulo destaca como articular e
dinamizar o currículo, concretizando-o em ações pedagógicas. No final comentam
obras, sugerem filmes e sites para repertoriar o leitor.
O segundo livro selecionado foi “O trabalho do professor na Educação Infantil”
(OLIVEIRA org., 2012), que faz uma breve retomada histórica da Educação Infantil e
destaca aspectos importantes das DCNEI, iniciando com uma explanação das
concepções, o planejamento das práticas pedagógicas ea construção de ambientes de
convivência e aprendizagem. Em seguida relata possibilidades de práticas pedagógicas
72
ISSN 2448-1157
para crianças de 0 a 2 anos e de 3 a 5 anos respectivamente. Finaliza destacando o
cuidar como eixo do trabalho pedagógico e trata da avaliação e registro.
No segundo semestre tínhamos como objetivo observar os objetivos destacados
no PPP e buscar fundamentação teórica nas DCNEI, nos livros destacados acima e nos
documentos oficiais: Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Infantil (RCN) e
um documento produzido coletivamente em Santo André, intitulado “Ressignificação
das Práticas”.
Ao longo dos encontros fomos discutindo quais seriam as nossas prioridades nas
discussões curriculares e o grupo apontou cinco eixos do trabalho pedagógico que
gostariam de discutir: Artes, Oralidade, leitura e escrita, matemática, natureza e
sociedade e movimento/corporeidade.
Iniciamos esta discussão com o eixo das artes, que já vinha sendo refletido
através das vivências. As coordenadoras organizaram uma proposta de estudo em que
foram selecionados nos referenciais teóricos e documentos oficiais, descritos acima, os
objetivos relacionados às artes. Nesta ocasião foi feita a vivência relacionada às obras
impressionistas e as Assistentes Pedagógicas (AP) foram convidadas à um passeio na
história e na arte da França e, posteriormente,experimentaram realizar uma pintura ao ar
livre em uma escola que possui um espaço externo arborizado. As assistentes
pedagógicas trouxeram a importância de experimentarem os materiais que normalmente
se oferecem às crianças, como tintas e pinceis, num contexto não tão comum das
práticas pedagógicas: pintura ao ar livre, contextualização do movimento artístico da
época e discutimos o conceito de releitura de obra de arte, pois ainda é comum nas
escolas propor às crianças que pintem cópias ou tentem copiar os quadros de artistas
famosos.
Após a vivencia a sala estava preparada para recebê-las com cartazes
sistematizados pelas coordenadoras com os objetivos encontrados para o eixo de Arte
nos materiais que estávamos estudando.
Numa parte os cartazes mostravam a forma de organização curricular de cada
referencial teórico.
73
ISSN 2448-1157
RCNEI - por
•
Movimento
eixos
•
Música
•
Artes visuais
•
Linguagem oral e escrita
•
Natureza e sociedade
•
Matemática
Ressignificação
Conteúdos-linguagem:
das práticas -
•
Artes
por Conteúdos-
•
Jogos e brincadeiras
linguagem
•
Leitura e escrita
•
Linguagem corporal
•
Mundo físico e natural
•
Matemática
•
Mundo social e cultural
•
Novas tecnologias de informação
•
Pesquisa
•
Roda de conversa
•
Tempos e espaços
•
Saúde
Oliveira (2012) Práticas Pedagógicas para Crianças de Práticas Pedagógicas para Crianças
por Campos de 0 a 2 anos - Campos de Experiência
de 3 a 5 anos - Campos de
Experiência
Experiência
1. Brincar e Movimentar
2. Ter
experiências
linguagem
exploração
com
Visual:
plástica
e
a
1. Brincar
a
2. Experiências
a
Produção de Marcas
3. Ter
experiências
com
a
com
Linguagem Verbal
5. Aspectos do Ambiente
com
as
Linguagens Artísticas e a
Fruição de Arte
a
4. Explorar o Mundo Natural e
Social e suas Relações
5. Explorar
Conhecimentos
74
ISSN 2448-1157
a
Linguagem Verbal
3. Experiências
Linguagem Musical
4. Experiências
com
Matemáticos
Salles e Faria
(2012) Campos
Experiência
por
Campos de Experiências:
•
•
(conhecimentos
Linguagens e Artes
de Linguagem
corporal,
Matemática
movimento,
números
e
sobre
quantidades,
teatro e dança
medidas
Brincar como linguagem e cultura
espaçotemporais)
Linguagem
verbal
e
literatura
•
(linguagem oral – linguagem escrita)
e
noções
Eu no mundo social e
natural
Linguagem e artes visuais e plásticas
Conhecimentos sobre o mundo
Linguagem e arte musical
social
Conhecimentos sobre o mundo
físico e natural
Conhecimentos sobre si e o outro
No espaço ao lado, podiam observar os objetivos destacados para Arte em cada
material.
As assistentes pedagógicas observaram a organização curricular de seus PPP e
os objetivos de arte destacados em cada escola, comparando-os com as sistematizações
e fazendo uma análise de como poderiam qualificar as discussões com seus grupos de
professores.
No começo algumas reações foram expressas, em que as assistentes pedagógicas
se sentiram compelidas às mudanças imediatas, porém foram feitas ponderações pelas
coordenadoras e pelo próprio grupo, em que o processo de discussão com a equipe
docente de cada unidade escolar é que poderia de fato trazer mudanças significativas
para as concepções e práticas docentes e não somente a mudança de nomenclatura e/ou
estruturação.
No encontro seguinte foi proposto que se dividissem em grupos e fizessem a
mesma pesquisa que fizemos em Arte, com os outros componentes curriculares que o
grupo havia apontado que gostaria de estudar: oralidade, leitura e escrita, matemática,
natureza e sociedade e movimento/corporeidade. As coordenadoras levaram uma
75
ISSN 2448-1157
sistematização, indicando que os livros e documentos oficiais fazem diferentes
organizações, mas todos tratam destes temas. É importante destacar que foi interessante
ter ficado de fora somente as questões de desenvolvimento de identidade e autonomia,
justamente tratando-se de crianças da Educação Infantil. Foi destacado também que a
música é tratada com especial atenção, encontrando-se separada da arte como um todo.
Nos próximos encontros pretendemos que socializem o que cada grupo discutiu
a respeito do eixo que ficou responsável. Ressaltamos que sempre que realizamos as
discussões, retomamos o PPP para que as assistentes pedagógicas estabeleçam relações
e tracem planos de ação para sua escola.
Posteriormente combinamos com o grupo de nos aprofundarmos em Arte ao
socializar os projetos coletivos e as práticas das escolas e realizar vivências e discussões
com músicas, uma vez que, até então, temos focado mais as artes plásticas. Ainda este
ano pretendemos estudar também os eixos de oralidade, leitura e escrita, sendo que esta
é uma solicitação que o grupo sempre retoma.
Considerações finais
Temos tido muitos retornos positivos das assistentes pedagógicas que dizem
estar percebendo que há muitas formas de organizar o currículo na Educação Infantil, de
modo que se respeite a infância e a necessidade de experiências da criança, não
reproduzindo o currículo do Ensino Fundamental ou apenas fazendo pequenas
adaptações, mas realmente considerando o que é importante para esta faixa etária.
Nas reuniões pedagógicas das escolas observamos que as vivências e discussões
conceituais tem se transformado, as assistentes pedagógicas estão levando esta prática
para os momentos formativos com o coletivo escolar. Além disso, muitas propostas de
arte têm se incorporado aos projetos coletivos das escolas, atingindo inclusive o Ensino
Fundamental, que tem participado das reflexões acerca da infância, considerando que
trabalhamos com crianças de 0 a 12 anos.
Ainda é necessário focar mais nas estratégias de formação das assistentes
pedagógicas, percebemos como foi dito acima que algumas práticas de formação têm se
modificado, mas ainda não conseguimos efetivar discussões sobre o acompanhamento
de sala de aula e do planejamento do professor. Sabemos que muita coisa já é feita nas
escolas, algumas assistentes pedagógicas têm maior facilidade com o grupo de
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ISSN 2448-1157
professores e outras enfrentam dificuldades, seja por resistência do professor ou por
ainda estarem buscando formas de participação legitima no planejamento e nas práticas
de sala de aula. Este é um objetivo que pretendemos ainda persistir e encontrar formas
de fortalecer ainda mais o trabalho de acompanhamento pedagógico das assistentes
pedagógicas.
Ao longo dos encontros começaram a surgir as propostas de Discussão do
Currículo Nacional da Educação Básica aberto à participação popular. Estamos
mobilizando o grupo para se cadastrar e participar da discussão nacional,
potencializando nossos encontros formativos. Esperamos assim, organizar uma proposta
para o ano de 2016, dando continuidade nas discussões de assistentes pedagógicas entre
setores, qualificando suas práticas e fortalecendo-as para as discussões pedagógicas nas
escolas.
77
ISSN 2448-1157
REFERÊNCIAS:
BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre experiência e o saber de experiência. In: Revista
Brasileira de Educação. n. 19. São Paulo, p. 20 – 28, jan/fev/mar/abr, 2002.
BRASIL. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Ministério da
Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. Brasília, MEC/SEF,
1998.
BRASIL. Diretrizes curriculares nacionais para a educação infantil. Secretaria de
Educação Básica / Ministério da Educação. Brasília: MEC, SEB, 2010.
DIAS, Fátima Regina Teixeira de Salles e FARIA, Vitória Líbia Barreto de. Currículo
na Educação Infantil: diálogo com os demais elementos da proposta pedagógica. São
Paulo: Scipione, 2007. (Percursos)
SANTO ANDRÉ. Ressiginificação das Práticas Pedagógicas e Transformações nos
tempos e espaços escolares. São Paulo, 2008.
OLIVEIRA, Zilma Ramos (Org). O trabalho do professor na Educação Infantil. São
Paulo, SP: Biruta, 2012.
Vídeo:
Tarja Branca – a revolução que faltava. Direção: Cacau Rhoden. Produção: Estela
Renner, Luana Lobo e Marcos Nisti. Maria Farinha Produções: Brasil,2014.
Documentário (1’20”)
78
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Obrigatoriedade da pré-escola:
Implementação em uma microrregião no estado de São Paulo
Caroline Barreto Brunelli Barbosa29
Analisamos a implementação da pré-escola na microrregião de Ribeirão Preto/SP,
segundo a Emenda Constitucional nº59/2009 e a Lei nº12.796/2013, analisando o
número de matrículas e a população até cinco anos de idade, identificando escolas e
salas e comparando-as ao número de crianças e professores da educação infantil.
Comparamos esses dados à legislação sobre direito e obrigatoriedade da pré-escola, sua
qualidade e os recursos orçamentários disponíveis. Consideramos a organização
adequada da gestão para uma oferta de qualidade, importando conhecer a situação da
infância e suas políticas para identificar os limites e possibilidades da gestão
democrática diante dos recursos disponíveis. A cooperação e contribuição técnica e
financeira entre os entes federados e seu regime de colaboração é imprescindível na
garantia de padrões mínimos de qualidade, possibilitando a integral implementação da
obrigatoriedade e ampliação do direito.
Palavras-chave: Educação Infantil. Políticas Públicas. Obrigatoriedade.
29
Mestranda em Educação pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto -
USP
79
ISSN 2448-1157
A Importância do Lúdico na Educação para o Trânsito30
Claudinete de Oliveira Carvalho31
A proposta dessa pesquisa concentra-se em mostrar que a educação para o
trânsito é importante na educação infantil e anos iniciais, visto que a grande causa de
morte externa em crianças é por motivo de acidente automobilístico. Promover o tema
trânsito é garantir os direitos previstos nos documentos oficiais como: a Constituição
Federal e ECA, além de proporcionar o ensino-aprendizagem de consciência como os
previstos na LDB e a PCN. Nesse sentido a pesquisa teve como objetivo verificar se o
tema Trânsito (sugerido no eixo transversal) é trabalhado nas escolas e qual meio
utilizado para educar as crianças na educação infantil e anos iniciais. Aqui foram
tratados os aspectos históricos da educação e o que os grandes teóricos do século XX
nos fala das características dos jogos e brincadeiras na fase do desenvolvimento infantil
e no que se refere ao ensino e aprendizagem. Para tanto se usou do método qualitativo
em que 25% dos professores nos últimos dois anos trabalharam a educação para o
trânsito em sala na educação infantil ou na semana do trânsito. Quanto aos anos iniciais
o tema é irrelevante nas disciplinas e inclusive em setembro (que é a semana do
trânsito). Quanto ao método foi constatada a palestra ou a pintura como principal meio
para levar e trabalhar um tema tão importante que é a educação para o trânsito. Concluise que o lúdico como ferramenta metodológica é um grande aliado desse ensinoaprendizado, pois o tema trânsito além de rico dentro das disciplinas, exige ludicidade
que é capaz de gerar nos alunos o gosto e o prazer no aprendizado, despertando nos
pequenos, os futuros motoristas, boas atitudes nas vias, que é um espaço social e
democrático.
Palavras-chave: Trânsito. Educação para o Trânsito. Lúdico.
30
Este texto é fruto de uma pesquisa apresentado como requisito para a conclusão do curso de
licenciatura em Pedagogia, realizado no período de setembro de 2014 a maio de 2015 na
Universidade Estadual do Maranhão.
31
Professora de Educação Infantil do Centro de Educação e Desenvolvimento para Ação
Comunitária – CEDAC localizado no Município de São Luis-MA.
80
ISSN 2448-1157
“Pedagogias das raízes”: Por uma educação infantil no/do campo 32
Crisliane Boito33
Simone Santos de Albuquerque34
RESUMO: Este trabalho apresenta parte dos dados da pesquisa “Caracterização do
atendimento às crianças de 0 a 6 anos residentes em áreas rurais no Rio Grande do
Sul/Brasil”, que busca conhecer as condições de oferta de Educação Infantil do Estado
do Rio Grande do Sul. Neste artigo o foco é dado a voz das famílias assentadas e de um
representante do Movimento Social, a partir dos dados coletados através de entrevistas e
registros de observação, no assentamento Integração Gaúcha- IRGA, localizado na
cidade de Eldorado do Sul/RS. Os sujeitos da pesquisa indicam uma proposta vinculada
a “Pedagogia das Raízes”, ou seja, a uma escola de educação infantil no campo que
reconheça a identidade, a realidade e a cultura local através de experiências educativas
significativas compartilhadas entre famílias, crianças e comunidade.
Palavras-chave: Educação Infantil do Campo; Famílias assentadas; escola; Movimento
Social.
1. Por que: Uma coisa é a lei, outra é a realidade 35.
32
Este texto é fruto de Pesquisa de Iniciação Científica “Caracterização das práticas educativas com
crianças de 0 a 6 anos residentes em áreas rurais no Rio Grande do Sul”, realizada no período de 2012 a
2015 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
33
Crisliane Boito - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestranda na Linha Estudos da
Infância.
34
Simone Santos de Albuquerque -Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora do
Departamento de Estudos Especializados- DEE e Coordenadora do Curso de Especialização
Docência em Educação Infantil, na mesma Universidade.
35
O título do capítulo expressa uma fala de um dos líderes do movimento social. (Entrevista
realizada em 12/05/2014).
81
ISSN 2448-1157
Este estudo resulta da pesquisa “Caracterização das práticas educativas com
crianças de 0 a 6 anos residentes em áreas rurais no Rio Grande do Sul/RS”, que vem
sendo desenvolvida desde o ano de 2012 através de um Projeto de Pesquisa aprovado
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A pesquisa no âmbito do estado foi
desencadeada pelas reflexões das pesquisadoras36 quando participaram da Pesquisa
Nacional “Caracterização das práticas educativas com crianças de 0 a 6 anos residentes
em áreas rurais”37, desenvolvida a partir de um Projeto de Cooperação Técnica entre o
Ministério de Educação e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul- UFRGS em
2011/2012.
Os estudos realizados durante a pesquisa nacional evidenciaram a importância
do tema para a Educação Infantil, frente à ausência de políticas públicas que
contemplem as crianças do campo. Rosemberg e Artes (2013, p. 64) apontam que,
relacionado a oferta de educação infantil em contexto rural, existem três principais
qualitativos para caracterizá-la: a insuficiência, a discriminação e a precariedade. As
pesquisadoras alertam ainda sobre a necessidade de olhar o campo, as crianças pequenas
que residem em área rural, e particularmente os bebês.
Nos últimos anos através de mobilizações dos povos do campo 38 juntos aos
sindicatos, movimentos sociais, associações e militantes vem se conquistando avanços
36
A coordenadora da Pesquisa Nacional na Região Sul foi a Profa. Dra. Simone Santos de
Albuquerque, que é a orientadora da pesquisa que resulta este artigo. A autora Crisliane Boito
participou da referida pesquisa de âmbito nacional como Bolsista de Iniciação Científica
Voluntária, também desenvolveu parte da pesquisa em âmbito estadual e, atualmente inicia a
escrita de um projeto de Mestrado vinculado a esta temática. Ana Paula Preto Flores é integrante
do grupo de pesquisa como bolsista PIBIC/CNPq desde 2013. O Projeto de Pesquisa foi
aprovado pela Comissão de Pesquisa em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul e está registrado pelo número 23125.
37
A pesquisa resultou em um livro intitulado “Oferta e demanda de educação infantil no campo”
e relatórios de pesquisa, disponíveis no site do Ministério da Educação e também publicado pela
Editora Evangraf, Porto Alegre/2012.
38
Nesta pesquisa reconhecemos como sujeitos do campo agricultores familiares, extrativistas,
pescadores artesanais, ribeirinhos, assentados e acampados da Reforma Agrária, quilombolas,
caiçaras, indígenas e outros, conforme as Diretrizes Complementares normas e princípios para o
desenvolvimento de políticas públicas da Educação Básica do Campo (2008).
82
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na legislação educacional brasileira das pautas reivindicadas historicamente. Neste
tocante os povos do campo estão legalmente apoiados em diferentes documentos tais
como: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL,1996); Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica do Campo (BRASIL, 2002); Diretrizes
complementares, normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de
atendimento da educação básica do campo (BRASIL, 2008); Diretrizes Curriculares
Nacionais de Educação Infantil (BRASIL, 2009), entre outros. Mas, entendemos, que é
necessário substituir a prerrogativa expressa no início desta sessão: “uma coisa é a lei,
outra é a realidade”. Acreditamos que é urgente passar do reconhecimento legal para o
real, isto é, que as crianças do campo possam vivenciar no cotidiano de suas vidas e das
práticas nas escolas o que já está previsto legalmente e nos documentos oficiais, que
legitimam o direito a uma oferta de educação infantil de qualidade.
Neste sentido, a pesquisa “Caracterização das práticas educativas com crianças
de 0 a 6 anos residentes em áreas rurais no Rio Grande do Sul/RS”, tem como objetivo
principal conhecer aspectos no que se refere a qualidade da oferta da educação das
crianças de 0 a 6 anos residentes no campo, bem como aprofundar conhecimentos no
que se refere às especificidades da infância do campo, as condições de vida, e suas
expectativas, desejos e necessidades no que se refere a educação das crianças pequenas.
2. Caminhos metodológicos
A primeira etapa (2012/2013) da referida pesquisa teve abordagem quantitativa e
o foco foi a análise no Banco de Dados elaborado pela pesquisa nacional à respeito do
atendimento das crianças de 0 a 6 anos residentes em área rural no estado do Rio
Grande do Sul. O relatório relacionado a esta etapa de pesquisa, vol.I, está
disponibilizado para acesso na Biblioteca Faced/UFRGS.
A segunda etapa da pesquisa (2013/2014/2015) tem abordagem qualitativa de
cunho etnográfico e se configura a partir da imersão em dois contextos que contemplam
a diversidade dos sujeitos do campo. A escolha dos locais de estudo se deu após a
realização de análise de dados levantados pelo Tribunal de Contas do Estado- TCE/RS
83
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(2011), Estudo-Situação de municípios que aderiram ao Proinfância no Rio Grande do
Sul -MEC/SEB/UFRGS- (2013), com base em dados do INEP (2010) e IBGE(2010),
onde mapeamos 53 municípios no RS que possuem oferta de EI para crianças que
residem no campo.
Nosso critério de seleção para a realização de estudo qualitativo em dois
municípios no estado visou dar conta de objetivos centrais, como ter escola em área
rural que atendesse crianças de 0 a 6 anos, ter aceitação da Secretária da Educação e da
escola para estudo e ser localizada o mais próximo de Porto Alegre, possibilitando o
deslocamento via setor de transporte da Universidade. Desse modo, selecionamos uma
comunidade quilombola, localizada no município de Gravataí e o assentamento
Integração Gaúcha localizado em Eldorado do Sul.
O método qualitativo, de abordagem etnográfica, subsídio desta pesquisa, foi
escolhido, pois, contempla a relação entre pesquisador, pesquisado e o contexto da
pesquisa. Víctoria, Knauth e Hassen (2000) elucidam que “o método que contempla esta
abordagem procura fazer com que os investigadores trabalhem e treinem o seu olhar
com profundidade sobre seus sujeitos de pesquisa, possibilitando ao pesquisador
compreender a forma da vida das pessoas do qual pretende investigar” (p.37).
Outro fator relevante a ser destacado aqui, é a forma como nós pesquisadoras
nos apresentamos aos sujeitos que constituíram nossa pesquisa. Nos apresentávamos
como pesquisadoras da UFRGS e falávamos à respeito da pesquisa Nacional já
realizada, em cooperação com o Ministério da Educação – MEC, bem como a segunda
etapa – analisando os dados do Rio Grande do Sul.
Dávamos destaque a importância da historicidade da pesquisa, e da importância
deles como sujeitos do estudo, dando início a uma relação importante e necessária.
Partindo desta premissa não poderíamos deixar de levar em consideração o que revela
Víctoria, Knauth e Hassen (2000) a respeito da interação entre pesquisador e pesquisado
aonde “Numa investigação sobre a realidade social, deve-se considerar o fato de que a
pesquisa de campo implica em uma relação social entre o pesquisador e pesquisado” e
que “a qualidade dos dados obtidos depende em grande parte da maneira como essa
interação social se estabelece” (p.55).
Esta perspectiva foi evidenciada em nossas imersões de campo, onde
reconhecemos, a partir de Caria (2002, p.12) que a abordagem etnográfica possibilita
84
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estranhamento, reflexão e a ruptura para que assim se possa pensar na diversidade
cultural.
Sendo assim, consideramos que inspiradas nos estudos qualitativos de
abordagem etnográfica, apoiadas em Fonseca (1998), Bogdan e Biklen (1994), Caria
(2002) e Víctoria, Knauth e Hassen (2000) tivemos aportes metodológicos
consideráveis para a realização do estudo, buscando sempre interagir com os sujeitos de
forma não intrusiva e não ameaçadora como sugerem Bogdan e Biklen (1994, p.68) .
O estudo foi realizado na comunidade de um assentamento, área rural do
município de Eldorado do Sul. Para subsidiar a escrita deste artigo, os dados referem-se
ao contexto de seis famílias que residem no assentamento IRGA, cujos filhos (as)
frequentam ou frequentaram a EMEI Flor da Terra, e de dois representantes do
Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra/MST. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, nas residências das famílias e no salão da Associação Comunitária do
referido movimento social, buscando sempre manter a clareza dos objetivos da
pesquisa, conforme indicam Víctoria, Knauth e Hassen (2000, p.64).
Neste artigo, abordaremos as vozes das famílias residentes no assentamento, e de
um representante do Movimento Social à respeito da necessidade do reconhecimento de
suas identidades e seus valores, procurando traçar algumas reflexões no que estes
sujeitos denominaram no estudo como uma proposta vinculada a “Pedagogia das
Raízes”
3. Situando o contexto pesquisado
O Assentamento Integração Gaúcha39 surgiu em 1991, quando um grupo de
pessoas integrantes do MST, tomaram posse da terra cedida pelo Governo do Estado do
Rio Grande do Sul/RS através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária39
Segundo Campos (2006), o nome dado ao assentamento deve-se ao fato ter se constituído
em uma propriedade de autarquia do governo Estadual-IRGA /Instituto Rio Grandense do
Arroz. Como as famílias que constituem o assentamento eram oriundas de diversas regiões do
Estado, as pessoas que moravam na cidade passaram a nominar os assentados como “os
colonos do IRGA”.
85
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INCRA. Ser assentado pelo Governo do Estado e não diretamente pelo INCRA
implicou a não obtenção de recursos destinados a moradia e custeio inicial, sendo que a
condição imposta é de que deveriam trabalhar, por um período, em cooperativas.
O representante do movimento social relata sobre a chegada ao assentamento,
quando não tinham infraestrutura, apenas a posse da terra:
“[...]já temos aqui a terra, mas aí começa todo um outro processo né, luz,
água, moradia, até mesmo estrada. Tinha aqui um atoleiro, a gente passava
aqui não tinha aquela estrada mais abaixo ali que tá empedrada agora, não
faz atoleiro em dia de chuva né... Vem toda a ação da educação, saúde né,
então isso, tem que ser trabalhado com o tempo. A gente nem sonhava como
taria hoje...”(Entrevista realizada em 12/05/2014)
Foi se formando então, conjuntos de trabalho com o intuito de garantir tais bens.
Esse arranjo possibilitou que este grupo fosse se constituindo de forma coletiva neste
novo espaço.
A condição imposta pelo Governo do Estado, do trabalho em cooperativa, fez
com que surgisse a necessidade de ter um local para permanecer o pequeno número de
crianças, filhas dos trabalhadores do grupo. No primeiro momento, as crianças ficavam
aos cuidados de uma militante formada pelo movimento, debaixo de uma árvore.
Depois, o movimento social construiu uma varanda e, com a chegada de dias frios e
chuvosos (típicos do inverno gaúcho) construiu-se um “galpãozinho” de madeira que
consistia em uma sala pequena, um banheiro e uma cozinha.
Outro aspecto constatado é que no início do assentamento a maioria dos
assentados eram homens e solteiros. Campos (2006) em seu estudo sobre a autonomia
das mulheres-mães neste assentamento aponta que:
Quando o grupo chegou a Eldorado havia muitas pessoas solteiras,
especialmente homens, e muitos casais jovens que haviam se conhecido no
acampamento. Com o passar dos anos a quantidade de crianças foi
aumentando significativamente. Os jovens casais passaram a ter filhos e a
maioria dos solteiros se casou e constituiu família. Com isso as mulheres
assentadas passaram a enfrentar dificuldades de conciliar os trabalhos da casa
e nas atividades agropecuárias com o cuidado das crianças pequenas.
(CAMPOS, 2006, p.11)
Com o passar do tempo, a condição de trabalho em cooperativa foi sendo
86
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repensada e a maioria das famílias deixou de integrar o grupo da cooperativa, não tendo
mais onde deixar seus filhos enquanto trabalhavam. Algumas famílias buscaram
matrícula para as crianças no centro da cidade de Eldorado do Sul, uma vez que as
famílias ainda passavam por dificuldades e muitas mulheres buscavam trabalho como
empregadas domésticas na própria cidade e, em cidades vizinhas para acrescentar na
renda da família.
Concomitante a isso, com as novas constituições familiares, o número de
crianças foi aumentando, fator que foi intensificando o desejo local para a construção de
uma escola de Educação Infantil.
Destaque deve ser dado ao fato de que as famílias do IRGA, diferentes da
maioria dos outros assentamentos, não optaram por cirandas40 pela razão de que estas
são espaços de educação não formais, predominantemente mantidas por cooperativas, o
que não era mais o caso do assentamento do IRGA. E, ainda conforme nos apresentou o
líder do movimento social, “a gente tinha a intenção de ter ajuda do poder público”
(Entrevista realizada em 12/05/2014).
Além das justificativas pela busca de Educação Infantil dentro do Assentamento
apresentadas acima, Campos (2006) contribui apontando outros fatores que levaram as
famílias entrevistadas a lutarem pela Educação Infantil dentro do IRGA:
“[...] o desejo de que esse lugar fosse no assentamento para que as crianças
pudessem ficar próximas das famílias; grande quantidade de crianças
pequenas no assentamento, em 2004 haviam 32 crianças de zero a seis anos;
consciência do direito das crianças e a falta de vagas na creche no centro da
cidade.”(CAMPOS, 2006, p.12)
No documento “Educação Infantil do Campo- Proposta para a expansão da
política” (2014), é entendido que,
40
Um espaço educativo da infância Sem Terra, organizado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST) e mantidos por cooperativas, centros de formação e pelo próprio MST, em seus
assentamentos e acampamentos. O nome foi escolhido pelo fato de ciranda remeter à cultura popular e
estar presente nas danças, brincadeiras e cantigas de roda vivenciadas pelas crenças no coletivo infantil.
(ROSSETTO, 2012, p.125)
87
ISSN 2448-1157
“[...] a reivindicação de escolas de educação infantil em áreas rurais implica,
na realidade em direito das mulheres e das crianças. A socialização dos
cuidados entre a família, o Estado e a sociedade possibilita à mulher
participar, autonomamente, da vida social e econômica, ao mesmo tempo em
que se consolida um novo paradigma de responsabilização do ato de “cuidar
e educar” de maneira compartilhada à educação das crianças em espaços
coletivos” (p.9)
Conforme Campos (2006), a oferta de educação infantil no assentamento
contribuiu para a emancipação das mulheres:
[...] Nas famílias cujas mulheres trabalham no assentamento, a redução do
tempo com o cuidado das crianças possibilitou “pegar junto” com os
companheiros nas atividades agropecuárias e com isso elas passaram a ter
mais poder de intervir nas decisões sobre o que produzir, bem como o que
fazer com o dinheiro. (CAMPOS, 2006, p. 18).
A conquista da construção da escola, em 2006, deu-se após um conjunto de
reivindicações das famílias e do movimento. As famílias entrevistas recordam da
marcha que fizeram até a cidade, em 2003, e das audiências com o prefeito e a
Secretária de Educação do município. Em 2004 uma comissão de mulheres/mães
acamparam com seus filhos no gabinete do prefeito. Um dos líderes do movimento
descreve a forma como se deu essa mobilização:
“Levamo lá na prefeitura, no saguão, a criança mobilizada lá. Naquela época
o prefeito primeiramente disse que ia fazer, depois viu que o negócio não era
bem assim, era mais complexo...mas daí fomos pressionando, “vamo
participar, vamo contribuir, vamo ajudá” e fomo mobilizando, levando gente
para lá. Chamei algumas reuniões aquí também né, mobilizar o pessoal daqui.
Teve reunião que o prefeito veio até aquí também, mas olha, não foi fácil, o
pessoal bastante resistente, até porque era a primeira experiência, eles não
sabiam como é que ia se dar isso. Mas se colocamo à disposição, o pessoal
querendo né... Enfim, depois de muita luta nós conseguimo..” (Entrevista
realizada em 12/05/2014).
As mobilizações fizeram e fazem parte da história do assentamento e a busca por
uma escola de educação infantil neste espaço reflete a consciência de um direito
fundamental a todo o sujeito, a educação.
Atualmente, segundo informações da professora responsável 41, 44 crianças estão
41
A organização das Instituições de Educação Infantil de Eldorado do Sul até pouco tempo era
através de uma Unidade de Educação, que congregava cada quatro escolas com uma diretora, nas
outras três existem professoras responsáveis. Ainda não foram realizadas eleições para diretores
e então o cargo ainda é de professor responsável.
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ISSN 2448-1157
matriculadas na escola: 6 no berçário, (fila de espera de 5 crianças); 13 crianças no
maternal I; 13 crianças no maternal II e 12 crianças no Pré1 42. Na EMEI Flor da Terra
todas as crianças são atendidas em turno integral. Ainda, algumas crianças que residem
na cidade de Eldorado do Sul, realizam um processo inverso ao que tradicionalmente
conhecemos, fazendo deslocamento cidade43 para campo.
4. “A creche é uma benção!” A Escola de Educação Infantil no contexto do
assentamento
A partir de dados coletados, através das entrevistas com os representantes do
movimento social e as famílias, é marcante o reconhecimento da importância da EMEI
Flor da Terra no contexto do assentamento.
No período em que as famílias assentadas foram entrevistadas foi recorrente as
demonstrações referentes a importância que a Escola de Educação Infantil tem em suas
vidas: “A creche é uma benção!” (mãe de família entrevistada em 17/06/2014); “a
escola do assentamento é muito bom, é muito tudo de bom” (pai de família entrevistada
em 30/05/2014).
Outra mãe de família entrevistada sobre a importância da Escola de Educação
Infantil apresenta que:
[...] aqui a gente tem acesso com os professores, de ajudar a planejar o ano também com os
professores, que lá na cidade a gente só entregava no portão da recepção e tu não sabia como e que era
lá. E aqui não, aqui tu tem contato com o professor. Tu vai e conversa, lá com a cozinheira, com a
diretora, tu tem bem mais acesso. Então é muito mais melhor [...] (Entrevista realizada em
14/02/2014).
42
Em virtude da falta de salas de aula, o pré II está locado na Escola de Ensino Fundamental
Almirante Tamandaré, que fica ao lado, com 9 crianças, atendidos no turno da manhã.
Informação obtida em 14/09/2015.
43
As crianças que vêm da cidade são trazidas pelos pais ou por transporte privado, (vans
escolares pagas pelos pais), não sendo atendidas, portanto, por transporte público.
89
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Ainda, foi possível observar o orgulho das famílias quando apontavam que a
Escola dentro do IRGA também atende crianças da cidade.
[...] os professores saem da sala de aula com as crianças, levam pra horta,
levam pra conhecer os animais, fazem alguns piqueniques, saem pra fora. E
agora tem bastante criança da cidade, nãos são só filhos de assentados, como
a escola é municipal então ela abrange mais famílias não só os filhos de
assentados. (mãe de família entrevistada em 14/02/2014)
Entendemos que, para as famílias assentadas, possibilitar que as crianças e as
famílias da cidade percebam que no assentamento também existem experiências
interessantes, potencializadoras de aprendizagens
é motivo de orgulho, que pode,
como relatado na entrevista abaixo, diminuir o preconceito em relação ao campo:
[...] porque chega lá na cidade vem o preconceito. Ah, porque tu é colono né!
Então queira ou não, sempre tem aquela gurizada. Ah, porque tu é colono,
porque não sei o que... mas, só que eles também são inocentes, não conhecem
a realidade do que é um assentamento né? Pra eles, acham que sendo colono
tem que ser feio, sujo, sei lá.É uma realidade diferente (mãe de família
entrevistada em 14/02/2014).
No que trata do tema, Pasuch e Santos (2013), apontam que:
“Percebido como um lugar atrasado, desorganizado e com poucas
potencialidades, o campo era visto como uma oposição ao urbano, este
último entendido como espaço de desenvolvimento, moderno [...]. [...]É
preciso destacar que, por conta dessa realidade atribuída ao campo, as
populações que nele viviam e produziam também eram consideradas como “
de segunda classe”. (p.112, 113).
Nesta perspectiva, a interação desde muito pequenas entre as crianças do campo
e da cidade e consequentemente de suas famílias, possibilita uma aprendizagem mútua e
coletiva destes dois contextos de vida, desenvolvendo experiências coletivas e
desconstruindo estereótipos, tornando a escola mais plural.
Para o representante do movimento social, há outra questão que emerge para
além da garantia de acesso das crianças pequenas a educação infantil: a relação entre
movimento social, famílias assentadas e escola. E, no decorrer da entrevista aponta
outros elementos, como a qualificação profissional específica para a educação do
campo, que a seu ver, precisa de uma atenção especial.
90
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O primeiro registro trazido pelo entrevistado evoca a questão dos profissionais,
professores e direção, que trabalham na EMEI Flor da Terra:
“[...] até mesmo pedagógico, pessoas que não tão preparadas pra isso.
Pessoas ali... Pessoas que eles não querem lá no centro... Aí eles mandam pra
cá que é meio periferia, né? E acaba dando conflito aqui dentro, e aqui os
pais não aceitam muitas coisas, é batido o pé, discutido no Conselho. Os
professores e até diretores foram trocados a pedido, né? Foi feito reunião... Ai
depende quando muda a direção da escola, esse ano eles querem retomar essa
questão educativa da escola, da horta né, como educativa né? Os professores
não são daqui né... Não precisa ser daqui, mas que tivesse mente aberta, para
conhecer. O ideal era que fosse daqui. Ele tem que estar aberto ao que vai
encontrar aquí.” (entrevista realizada em 12/05/2014)
No que diz respeito “as propostas ligadas ao que considera as “raízes do campo”,
recorda da horta, de projetos que envolviam a reciclagem do lixo, a questão ambiental,
bem como saídas de campo pelo assentamento mostrando as crianças o trabalho de suas
famílias. Considera importante que seja continuamente feito um resgate mais
aprofundado, com as crianças, a respeito da história do assentamento, contextualiza que:
“Tem umas pessoas já que pensam: “não, mas isso já é do passado”. Mas, é
contruir o passado para valorizar o futuro. Mostrar para crianças que a gente
não chegamos aquí e tava tudo prontinho que nem tá hoje. Não tá tudo
maravilha, mas tá melhor do que nós chegamos né. Então que eles valorizem
isso né, então esse é o sentido. Então conseguimos aprofundar muito ainda,
mas é uma coisa que a gente pode avançar melhor e é um espaço para gente
poder trabalhar.” (entrevista realizada em 12/05/2014)
Esse posicionamento do entrevistado está vinculado ao reconhecimento da
identidade cultural e política. Leal e Ramos (2013) em pesquisa realizada na região
Nordeste apontaram que dos municípios estudados não havia sido constatado
“direcionamentos pedagógicos sistemáticos que contemplem as especificidades do
modus vivendi e, portanto, da identidade do homem do campo” (p.170) , demonstrando
que esta é uma realidade encontrada em outras regiões do país.
Questionado sobre sugestões para o trabalho pedagógico sugere que:
“[…]essa questão envolvendo mais professores e a comunidade, pais, podia
fazer uma espécie assessoria técnica na escola e voltar a questão para nossas
raízes, mostrar de onde vem o alimento, reciclar, plantar, Esse é o nosso
ambiente daqui, que a gente tira o nosso sustento, aqui que as famílias vivem,
então valorizar essa terra que a gente conquistou. A escola não trabalha as
coisas daqui! Isso precisa aprofundar, esse trabalho é sempre isolado. Tinha
que ser permanente. Tinha que tá bom, as professoras vem aquí, tem que tá
no sangue, tem que circular né? A qualidade da alimentação, né. A prefeitura
arrecada a alimentação dos produtores. Mas podia ser assim, cada um pega a
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cesta e levar lá e depois passa para prefeitura o que cobriu e não cobriu, eu
não me importaria desde que fosse levado alí e valorizassem. Por que não
levam por exemplo: as mães sabem fazer alí um bolinho de espinafre, vamos
trazer um dia essa mãe. Isso é valorizar as raizes que a gente chama. Leva as
crianças na horta, mostrar a riqueza que a gente tem né. Mostrar tudo o que
sai da terra. Servir como exemplo isso, dizendo: bah! hoje aprendemos a
fazer a horta, cuidamos dos alimentos. Os professores tem que se inteirar das
coisas. Se integrar no ambiente.”
5. Por uma Escola de EI com a Pedagogia das raízes: considerações finais.
A partir das entrevistas, entendemos que as famílias e o representante do
movimento reconhecem a conquista da escola de educação infantil como um marco
importante, legitimador de direitos das crianças, das mulheres, das famílias e do
movimento. Um espaço que garante que trabalhem com mais tranquilidade e que além
disso, vem legitimando uma desconstrução histórica de campo de local estereotipado
como atrasado .
Mas, emerge também, neste estudo no IRGA, e de modo mais intenso a partir da
entrevista com o representante do movimento social, a demanda de uma escola de
educação infantil vinculada a uma “pedagogia das raízes” que envolva escola,
comunidade e movimento social, com experiências culturais, políticas e sociais do
campo.
92
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94
ISSN 2448-1157
Movimento, arte e ludicidade na educação infantil: o papel do PIBID em uma
turma de pré-escola de uma EEEF do município de São Francisco de Paula/RS
Denise Madeira de Castro e Silva44
Resumo
Este trabalho tem por objetivo relatar as práticas de oficinas desenvolvidas no
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência- PIBID, que pretendiam
disponibilizar atividades e materiais oportunizando interações e brincadeiras em que o
movimento, a arte e a ludicidade fossem os eixos condutores, em uma turma de préescola da rede pública da cidade de São Francisco de Paula/RS. Essas oficinas foram
definidas a partir de um diagnóstico inicial feito através de observações, entrevistas e
leitura de documentos oficiais. O presente momento histórico em que a pré-escola
torna-se obrigatória é tensionado teoricamente, através de autores que alertam para o
fato de que garantir o acesso não necessariamente garantirá a qualidade. Desse modo,
conclui-se que as oficinas desenvolvidas podem contribuir para efetivar uma pré-escola
com mais qualidade, pois oferecem situações de experimentação, de aprendizagem e de
expressão, ampliando conhecimentos e saberes.
Palavras-chave: Pré-escola. Obrigatoriedade. Oficinas.
O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID visa
valorizar e incentivar a formação docente da educação básica. No município de São
Francisco de Paula/RS este programa vem sendo executado desde 2012 com alunas do
curso de Pedagogia, da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS.
44
Professora assistente da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS e aluna do
Doutorado em Educação doPrograma de Pós-graduação da Universidade Federal de Santa Maria
– UFSM.
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O subprojeto desenvolvido nessa cidade intitula-se Alfabetização, letramento,
multiculturalismo e educação ambiental. A partir de 2015 com a entrada de nova
coordenadora de área e de troca de escola, a educação infantil foi incluída como
possibilidade para realização do PIBID.
Iniciou-se a prática das oficinas em uma turma de crianças de quatro e cinco
anos integrante de uma escola de ensino fundamental motivada pela indicação da
supervisora escolar, membro da equipe diretiva, em que o trabalho pedagógico
desenvolvido, na sua ótica, necessitaria de uma proposta mais lúdica e envolvente para
as crianças pequenas. As turmas em que as bolsistas realizam suas intervenções são,
inicialmente, indicadas em reuniões com a equipe diretiva e coordenadoras de área.
Cabe salientar, que a organização do PIBID designa coordenadoras de área, vinculadas
as IES (Instituições de Ensino Superior) e supervisoras da própria escola que
coordenam o trabalho desenvolvido pelos alunos das licenciaturas, havendo reuniões
mensais para avaliação do projeto e ajustes necessários ao mês subsequente.
Desse modo, o projeto elaborado para essa realidade foi desenvolvido com a
utilização de oficinas que objetivaram disponibilizar atividades e materiais que
oportunizassem interações e brincadeiras em que o movimento, a arte e a ludicidade
fossem os eixos condutores, podendo contribuir para a melhoria da qualidade da
educação infantil ofertada nessa escola.
Contextualizando a educação infantil municipal e estadual
Iniciaremos contextualizando o município de São Francisco de Paula, situado na
região dos campos de cima da serra do estado do RS. Sua população é de
aproximadamente 25.000 habitantes de acordo com o último Censo Demográfico 2010
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A rede municipal está
organizada com apenas duas escolas de educação infantil e acompanha a dificuldade
nacional da ampliação de vagas para as crianças da pré-escola, desde a emenda nº
59/2009. Por essa razão, as escolas estaduais e municipais de ensino fundamental
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começaram, desde 2014, a ofertar também essa etapa. De acordo com Krammer, Nunes
e Corsino (2011, p.72)
A ideia de educação infantil é uma construção histórica e social, sendo,
portanto, impossível conhecê-la apenas pelos critérios legais que a envolvem.
O termo é circunstanciado na legislação, mas adquire significação a partir da
experiência e do lugar que creches e pré-escolas ocupam no sistema de
ensino no Brasil e em outros países.
A autora adverte que pensar a educação infantil como um grupo constituído
reafirma essa etapa como a de ingresso à educação, porém dissimula contradições nas
condições de acesso e frequência, nos tipos de equipamentos existentes, na formação de
docentes, e sobre a sua importância educativa para as crianças na sociedade em geral.
Historicamente, as diferenças no acesso, na permanência e na qualidade da
educação infantil no Brasil têm sido um problema a ser superado. Considerada a
primeira etapa da educação básica de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases nº9394/96,
sua história denota diferenças existentes na oferta e na qualidade entre os diversos
segmentos da sociedade. Ao refletir sobre as políticas públicas, Pereira (2012, p.245)
afirma que elas “atendem aos interesses do Estado e, por conseguinte, aos interesses do
macro e dos microssistemas”; ainda conforme a autora, tais interesses “caracterizam
uma estrutura de reprodução das relações sociais”. Desse modo, na atualidade, a
educação infantil é constituída simultaneamente pelas escolas da rede privada, com
projetos pedagógicos aparentemente de vanguarda e dedicadas aos filhos das classes
mais abastadas, e pelas escolas públicas, para as classes menos privilegiadas, sem
garantias de qualidade e com imensa dificuldade de abarcar a totalidade da demanda.
O Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul vem desenvolvendo um
estudo intitulado Radiografia da Educação Infantil no Estado do Rio Grande do Sul.
Este estudo aponta para o fato de o estado do Rio Grande do Sul apresentar um déficit
de 215 mil vagas em creches e pré-escolas. A universalização pretendida ainda está
longe de ser alcançada. O estado em pré-escolas atinge o índice de 67,84% de
atendimento, enquanto o resto do Brasil já superou os 80%.
Desde a emenda constitucional nº 59/2009 que estabelece a obrigatoriedade e
gratuidade do ensino dos quatro aos dezessete anos o debate em torno do processo de
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escolarização precoce de nossas crianças vem sendo destacado por diversos autores. De
acordo com Krammer, Nunes e Corsino (2011, p.71)
O ingresso da educação infantil nos sistemas de ensino tem implicações nas
demais etapas, modalidades e níveis de ensino, conduzidos a repensar
concepções, rever práticas e adequar posições a partir das novas relações
estabelecidas. Por outro lado, tem provocado o retorno, o reforço e a
continuidade de práticas que associam educação à instrução, com atividades
mecânicas onde as crianças são treinadas a seguir instruções (cobrir
pontilhado, copiar e repetir).
Os caminhos percorridos na prática
Em março de 2015 iniciou-se a percorrer os caminhos metodológicos dessa
prática. Esse processo começou com o diagnóstico realizado por duas alunas bolsistas
do PIBID em uma turma de pré-escola de uma escola estadual situada no município de
São Francisco de Paula. Essa fase em que se desenvolve o chamado diagnóstico tem por
objetivo apreender as reais necessidades pedagógicas da escola e sobretudo da turma,
visando orientar o trabalho a ser desenvolvidos nas oficinas.
Essa análise foi composta da leitura de documentos oficiais da escola,
especialmente o Projeto Político Pedagógico e o Regimento Escolar. Também foram
realizadas entrevistas semiestruturadas com a professora da turma, com a supervisora e
com a direção. Essas entrevistas visavam compreender em que contexto a turma da préescola havia sido montada, qual concepção de criança, de infância e de educação
infantil a equipe diretiva e a professora dispunham.
Ao longo dos meses de março e de abril foram realizadas observações, uma vez
por semana, em turno de quatro horas, conforme planejamento prévio do PIBID
realizado pela coordenadora de área. A referida turma é composta de crianças de quatro
e cinco anos, sendo sete meninas e cinco meninos.
De acordo com os achados propiciados na fase do diagnóstico, parecia haver um
nível de despreparo ao receber as crianças de quatro e cinco anos na escola.
Primeiramente, porque a leitura do Projeto Pedagógico mostra que a educação infantil
não estava contemplada, pois não havia esse nível na escola. A turma foi formada a
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partir da obrigatoriedade da inclusão das crianças de quatro e cinco anos. A direção ao
ser questionada sobre isso afirma que “o projeto pedagógico necessita ser mudado,
refletido, porque quando pensamos esse PPP não tinha isso da obrigatoriedade”.
A gestão democrática dos sistemas públicos de ensino é um princípio constitucional expresso no
artigo 206 e ratificado pela LDB nº 9394/1996. Esse processo de gestão começa com a construção do
projeto pedagógico da escola que é uma tarefa coletiva, de acordo com o artigo 14, incisos I e II. O
projeto pedagógico é a identidade da escola, é o que poderá garantir a permanência com qualidade.
Apenas a igualdade no acesso não garante qualidade, mas o projeto pedagógico voltado aos interesses
sociais, buscando não reproduzir situações de exclusão, pode garantir o ponto de chegada para todos.
Veiga (2002, p. 34) afirma que
[...] o projeto político-pedagógico tem a ver com a organização do trabalho
pedagógico em dois níveis: como organização da escola como um todo e
como organização da sala de aula, incluindo sua relação com o contexto
social imediato, procurando preservar a visão de totalidade. Nesta caminhada
será importante ressaltar que o projeto político-pedagógico busca a
organização do trabalho pedagógico da escola na sua globalidade.
Essa organização pedagógica começa desde a delimitação do espaço destinado à educação infantil,
a escolha da professora, ao planejamento do uso dos espaços coletivos como parquinhos e pátio, e
também a biblioteca. A professora da turma, que por muitos anos lecionou para o primeiro ano, durante a
entrevista relata que “pelo fato da pré-escola estar junto a uma escola, parece que a responsabilidade é
maior de mandar as crianças preparadas para a alfabetização no ano seguinte”.
Como não havia salas de aula suficientes para inserir as crianças da pré-escola, a sala destinada ao
primeiro ano, foi dividida em duas. Desse modo, para entrar na turma da educação infantil, há a
necessidade de adentrar na sala do primeiro ano. Apesar de a sala ser grande, o fato de comportar duas
turmas distintas, sendo repartidas apenas por uma divisória de madeira que não isola o som, dificulta a
concentração das crianças e da professora, assim como não respeita as singularidades pertinentes a esses
dois diferentes níveis de ensino.
Nesse sentido, Flores, Santos e Klemann (2010, p.49) advertem que “a obrigatoriedade, agora da
família, de matricular seus filhos [...] não pode ser usada como justificativa para camuflar a omissão do
Estado” e seguem afirmando “a obrigatoriedade não garante a universalização nem a qualidade da
educação infantil”.
O projeto pedagógico da escola tem papel preponderante para uma gestão que visa
buscar a escola de qualidade voltada aos interesses sociais, formando cidadãos críticos e
comprometidos com a transformação social. A reflexão em torno da concepção de
criança, infância e de educação infantil necessitam ficar contemplados no projeto
pedagógico. A falta dessa reflexão pode indicar práticas que visem apenas a inclusão
sem a necessária qualidade. Sobre esse importante documento Pereira (2008, p.339)
afirma que,
o projeto pedagógico é o resultado de decisões que envolvem a comunidade
escolar como um todo no sentido de fazer da escola, não uma instituição
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produtora de fracassos, coadjuvante da exclusão, e sim uma instituição social
promotora da humanização de seus cidadãos. Nesta perspectiva, pensar e
construir um projeto pedagógico que tenha como horizonte o resgate da
função social da escola, implica uma revisão de sua organização
administrativo-pedagógica [...].
Inúmeras pesquisas realizadas em diversos países, inclusive no Brasil,
demonstram a importância positiva da frequência, de pelo menos dois anos, na escola de
educação infantil de qualidade para todas as crianças. Conforme Campos et.al. (2011,
p.29-30), a literatura especializada reconhece que
a criança se beneficia, tanto no presente como em sua escolaridade futura, da
oportunidade de acesso à EI, e esses efeitos são tão mais positivos quanto
melhor a qualidade dessa educação e são mais significativos para as crianças
mais pobres. [...] controlando-se o efeito de outros fatores, o acesso a uma
pré-escola de boa qualidade faz, sim, diferença nos resultados de
aprendizagem no segundo ano, tal como medidos na Provinha Brasil. Note-se
que a amostra foi composta por crianças de escolas públicas, a maioria delas
com renda familiar abaixo de dois salários mínimos.
Cumpre ressaltar que essa qualidade expressa no projeto pedagógico, voltada aos
interesses sociais, deverá priorizar práticas que valorizem a iniciativa da criança:
oferecer situações de experimentação, de aprendizagem e de expressão; valorizar as
brincadeiras de faz de conta; considerar a indissociabilidade entre cuidado e educação;
ampliar conhecimentos e saberes; ter compromisso com a sociabilidade cotidiana;
oportunizar qualidade nas relações estabelecidas entre crianças e adultos. (CAMPOS
et.al., 2011).
De acordo com Mota (2012), parece haver uma diluição de fronteiras entre o
ensino fundamental e a educação infantil. Essa diluição de fronteiras se faz presente
quando as práticas pedagógicas próprias da infância deixam de ser desenvolvidas e se
passa a aplicar atividades próprias do ensino fundamental. Conforme Krammer, Nunes e
Corsino (2011), essas práticas são observadas quando há ênfase na organização do
currículo de forma disciplinar,na pouca utilização das múltiplas linguagens,no uso da
pedagogia centrada na figura do professor,na exposição de conteúdos que devem ser
memorizados e, finalmente, no treino e repetição por parte dos alunos.
A pré-escola de qualidade, com compromisso social que fecunda o processo de
humanização e que poderá reduzir o fracasso escolar, não é aquela preparatória para o
ensino fundamental. Ainda sobre a antecipação da escolarização, pode se dizer que
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A obrigatoriedade de frequência das crianças de 4 e 5 anos à escola pode
levar à compreensão de que é aí que a educação básica começa, reiterando a
antiga cisão entre creches e pré-escolas e trazendo de volta à cena o ideário
de preparação para o ensino fundamental. Corre-se o risco de desvincular a
educação infantil dos princípios formulados para a creche e a pré-escola e
não se enfrenta a verticalidade do processo escolar, nem no que se refere à
formulação das políticas nem no que diz respeito aos projetos curriculares.
Acentua-se a fragmentação da educação básica sem atentar para as transições.
(KRAMMER, NUNES e CORSINO 2011, p. 75)
A partir da constatação, propiciada pela fase do diagnóstico, de que as práticas desenvolvidas na
turma da educação infantil estavam mais associadas a atividades mnemônicas e preparatórias à
alfabetização, e também como a professora apresentava uma grave lesão na bacia o que a impossibilitava
de se deslocar adequadamente, as oficinas desenvolvidas buscaram incorporar como eixo condutor o
movimento, a arte e a ludicidade. Outro dado curioso constatado é o fato do recreio ser realizado sempre
dentro da sala de aula, independente das questões climáticas. Essa delimitação do recreio, característica
própria do ensino fundamental, se dá pelo fato de a escola não organizar uma rotina própria para a
educação infantil, acompanhando, desse modo, as crianças dos anos iniciais. O pátio tão pouco é utilizado
para outras finalidades como brincadeiras livres ou dirigidas.
As oficinas estão sendo desenvolvidas de desde maio até o presente o momento, uma vez por
semana, em turno de quatro horas, conduzidas por duas alunas bolsistas. As oficinas foram constituídas
de dois momentos, o primeiro deles era a produção de jogos pedagógicos e de todos os materiais que
seriam necessários para a consecução das atividades e, o segundo momento a própria participação nas
brincadeiras propiciadas pelas oficinas. De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
educação infantil “as práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação infantil
devem ter como eixos norteadores as interações e a brincadeira” (DCNEI, 2010, p. 25).
Desse modo, os caminhos percorridos para o desenvolvimento da prática das oficinas buscavam
que a interação e a brincadeira estivessem presentes, trazendo ao cotidiano dessa turma de pré-escola,
momentos mais lúdicos e menos próximos as atividades tradicionalmente atribuídas ao ensino
fundamental, como as que haviam sido apontadas na fase do diagnóstico .
A primeira oficina foi intitulada de Construção de quebra-cabeça do corpo humano. Teve como
objetivos incentivar o desenvolvimento do hábito do desenho e estimular a confecção de brinquedos
através de sucata. As crianças foram o “modelo” em painéis de papel pardo. Puderam se perceber no
espelho e posteriormente foram desenhadas por colega. Esses moldes foram ornamentados com diversos
materiais como lã, roupas usadas, botões. Foi feito uma exposição desses painéis e, na aula seguinte o
recorte dos quebra-cabeças gigantes.
De acordo com o relato das alunas bolsistas, ao propiciarem um trabalho coletivo, as crianças
puderam aprimorar seu relacionamento interpessoal, pois necessitavam um do outro em clima
colaborativo e interativo. Todas as oficinas aqui apresentadas foram registradas através de fotografia e
vídeos que serviram de parâmetro para a avaliação e para a tomada de decisão dos novos planejamentos.
A segunda oficina foi denominada Brincando com as cores e as vogais, teve por objetivos
desenvolver a percepção das cores e ampliar o vocabulário. Foram utilizadas garrafas pet e aros
confeccionados e pintados pelas crianças. Essas garrafas continham as vogais. Desse modo, ao
arremessarem o aro deveriam falar um objeto que tivesse a cor relacionada e também uma palavra com a
vogal indicada. Essa atividade foi realizada no pátio da escola, o que muito alegrou as crianças, além do
desenvolvimento do trabalho coletivo propiciado. Os vídeos produzidos a partir das oficinas foram
disponibilizados aos pais e crianças em convite realizado para uma sessão de “cinema” em final de tarde.
101
ISSN 2448-1157
A terceira oficina foi o Jogo do Twister, que objetivou trabalhar o equilíbrio e a lateralidade
através de uma atividade lúdica. A turma foi dividida em pequenos grupos. Cada grupo ficou responsável
pelo desenho e pintura com moldes de seis círculos de cores diferentes, em quatro colunas. O
desenvolvimento dessa atividade foi muito divertido propiciando descontração e movimento entre as
crianças. Várias crianças externaram que gostariam de levar para brincar em casa. Desse modo, as
bolsistas incluíram mais um dia para a confecção de novos jogos de Twister a fim de que pudessem
efetivar esse intento das crianças.
Mais oficinas serão desenvolvidas nos próximos meses, dentro da metodologia de as crianças
construírem os brinquedos e artefatos necessários e, nas aulas seguintes a execução propriamente dita da
oficina. Cumpre ressaltar, o caráter simples dessas atividades feitas com a utilização prioritariamente de
sucata.
Porém, retomando o eixo do nosso subprojeto do PIBID, alfabetização, letramento e educação
ambiental, consideramos que as oficinas desenvolvidas contribuem no processo de formação educativa
das crianças. O reaproveitamento das sucatas para a construção dos artefatos e brinquedos foi permeado
pelo debate da questão do meio ambiente. A importância da diminuição do consumo e a
consequentemente redução da produção de lixo, foi debatido também com a participação dos pais na
ocasião da mostra dos vídeos.
Considerações Finais
Podemos citar como desdobramento das práticas desenvolvidas a aproximação da escola com as
famílias contribuindo para afinar uma relação que é fundamental para colaborar na aprendizagem das
crianças. O fato de as crianças se reconhecerem no vídeo juntamente com seus pais colaborou para a
afirmação da autoestima. Esse reforço positivo foi importante para que cada vez mais as crianças se
envolvessem na confecção dos brinquedos e artefatos necessários às oficinas, tendo como incentivo à
mostra para os familiares através dos vídeos. O incremento no processo de alfabetização com práticas de
letramento também foi bastante destacado pela professora da turma. Além disso, o divertimento, a
descontração e alegria das crianças superaram todas as nossas expectativas.
Alfabetizar com atividades de letramento, dentro de uma proposta lúdica, em que o movimento e
arte foram os fios condutores trouxe momentos de descoberta de dimensões pouco trabalhadas no
cotidiano dessa pré-escola. Acreditamos que as oficinas desenvolvidas no PIBID cumprem o papel de
contribuir para o resgate dos princípios da educação infantil
As propostas pedagógicas de Educação Infantil devem respeitar os seguintes
princípios: Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do
respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas,
identidades e singularidades. Políticos: dos direitos de cidadania, do
exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática. Estéticos: da
sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas
diferentes manifestações artísticas e culturais. (DCNEI, 2010, p.16)
Nesse sentido, trabalhar resgatando os princípios da educação infantil também pode contribuir para
diminuir o impacto de práticas escolarizantes tão presentes no cotidiano das pré-escolas, como destacam
vários autores em suas pesquisas discorridas nesse trabalho. Esperamos que a obrigatoriedade da préescola não contribua com o retorno do modelo preparatório ao ensino fundamental, pois contraria o estofo
do pensamento pedagógico desenvolvido em décadas de pesquisa em torno da infância e sua educação.
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O momento histórico atual, em que a crise política e econômica vem tomando proporções inimagináveis
com inúmeros cortes orçamentários na pasta da educação, destacar o papel do PIBID na formação dos
estudantes de licenciaturas é buscar mostrar a sua importância na construção de um currículo em que
prática e teoria se imbricam. Além da importância para a formação acadêmica dos estudantes é inegável o
colorido que as atividades desenvolvidas oportunizam, trazendo frescor e novo ânimo às práticas tão
estéreis ainda percebidas nos diferentes segmentos da educação básica em todo o Brasil.
Referências
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As DCNEI no contexto das práticas educativas com bebês e crianças
pequenas45
Diolinda Franciele Winterhalter46
Cleonice Maria Tomazzetti47
Resumo
O artigo apresenta resultados da pesquisa de Mestrado-PPGE/UFSM e integra trabalhos do Grupo de
Investigação e Estudos Contemporâneos em Educação e Infância – GIECEI. O objetivo foi
compreenderas especificidades das práticas educativas com crianças na creche considerando os
apontamentos da Resolução nº 5 - Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil –
CNE/CEB/DCNEI, como orientadora das propostas curriculares para essa etapa. A partir de observações
participantes em uma Escola Municipal de Educação Infantil, em duas turmas de berçário e, por meio do
método da pesquisa-intervenção (CHIZZOTTI, 2006; CASTRO; BESSET, 2008), foram propostas
intervenções pedagógicas com as crianças e diálogos formativos com as educadoras. Com base nos
registros em diário de campo e filmagens de vivências cotidianas, foi possível elaborar e analisar os dados
da pesquisa, que possibilitaram compreender especificidades das práticas educativas com bebês e crianças
pequenas,guiadas pelas DCNEI.
Palavras-chave: Bebês e crianças pequenas. Práticas educativas. DCNEI.
1. Introdução
Contemporaneamente, a Educação Infantil é reconhecida como a primeira etapa
da Educação Básica, o que ocorreu com a proposição da Lei 9.394 em 1996, a qual
45
Este texto é fruto de Pesquisa de Mestrado realizada no período de 2013 a 2015 na
Universidade Brasileira.
46
Mestranda em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE, da
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. Integrante do Grupo de Investigação e Estudos
Contemporâneos em Educação e Infância – GIECEI. Bolsista Capes Demanda Social. E-mail:
[email protected]
47
Doutora em Educação. Coordenadora do Grupo de Investigação e Estudos Contemporâneos em
Educação e Infância – GIECEI. Professora na Universidade Federal de São Carlos – UFSCAR.
Pesquisadora no Programa de Pós Graduação – PPGE/UFSM. E-mail: [email protected]
105
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instituiu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN. Desde então, outras
legislações, entendidas como políticas educacionais, passaram a implementar mudanças
na educação institucional das crianças pequenas. A partir disso, a preocupação das
políticas é não só regulamentar as práticas educativas, mas também, possibilitar o
acesso e condições de permanência na escola desde a infância (BRASIL, 1996;
AKKARI, 2011).
Como uma das principais políticas para a Educação Infantil, está a Resolução Nº
5, de 17 de dezembro de 2009, CNE/CBE, a qual institui novas Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil – DCNEI (BRASIL, 2009). Tendo em vista a
perspectiva contemporânea em que se estrutura, a Resolução é considerada o documento
orientador para a organização das propostas curriculares na Educação Infantil, sendo
assim, referência para as escolas e profissionais da Educação Infantil (OLIVEIRA,
2010).
Tomando tal política como base para as práticas educativas com bebês e crianças
pequenas na Educação Infantil, desenvolveu-se a pesquisa48ora apresentada sobre as
especificidades das práticas educativas com crianças na creche, observando as
interações produzidas entre crianças e suas educadoras, crianças e crianças e, crianças e
o ambiente coletivo, em duas turmas de berçário de uma escola da rede municipal de
Santa Maria-RS. A observação participante foi adotada como procedimento
metodológico (CHIZZOTTI, 2006; TRIVIÑOS, 2010) para que fosse possível analisar
práticas educativas desenvolvidas com bebês e crianças pequenas e, a partir
disso,identificar especificidades para essas práticas na Educação Infantil, de acordo com
necessidades/desejos expressados pelos bebês e crianças pequena sem suas diferentes
linguagens e, tendo em vista, os apontamentos da política DCNEI.
2. A política DCNEI, o currículo na Educação Infantil e a especificidade da docência com
bebês e crianças pequenas
48
Estudo desenvolvido no âmbito do curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em
Educação – PPGE, na Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, com a orientação da
professora Cleonice Maria Tomazzetti.
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As contribuições de Oliveira (2010) acerca das Diretrizes como documento
orientador das práticas educativas na Educação Infantil corroboram para a compreensão
de sua importância, bem como da necessidade de que sejam tomadas como base para a
estruturação das propostas pedagógicas a partir de sua publicação, o que as torna uma
referência para pensar o currículo e as práticas pedagógicas com as crianças de zero a
cinco anos de idade.Esta, portanto, é uma perspectiva teórica e também política que
justifica a consideração das ideias apontadas pelo documento neste estudo, pois foram
amplamente consideradas durante a pesquisa.
Entende-se que as concepções defendidas nesta política estão de modo a
contemplar as necessidades da criança, a partir de uma perspectiva que visa o seu
desenvolvimento de modo integral e, desse modo, considera-a sujeito em seus processos
de aprendizagem. Tais aspectos evidenciam a visibilidade atribuída às crianças, bem
como implicam a valorização dos profissionais e a organização de propostas
pedagógicas que considerem a criança o centro do planejamento curricular, não só
possibilitando que se expressem, mas também as correspondendo em suas formas de
interagir e se comunicar (BARBOSA, 2009; BRASIL, 2009).
Nessa perspectiva, as crianças são compreendidas como sujeitos capazes, que
interagem no mundo,constroem relações, possuem saberes, sentem desejos e
necessidades. Desse modo, entende-se que o cotidiano, ou seja, as ações que compõem
as práticas educativas com os bebês e crianças pequenas na Educação Infantil precisam
estar de acordo com esta concepção e correspondendo às necessidades das crianças.
Barbosa (2009) considera que o currículo são as ações que acontecem nos
estabelecimentos educacionais, ou seja, o que ocorre, de fato, nas situações cotidianas
vivenciadas pelos sujeitos adultos e crianças: escolhas, decisões, planejamento e outros.
Nesse sentido, segundo a autora, é necessário um currículo que vise o desenvolvimento
das crianças, de modo integralem sua expressividade motora, afetiva, cognitiva,
linguística, ética, estética e sociocultural, o que vai ao encontro das DCNEI.
Art. 3º O currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de
práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com
os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico,
ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento
integral de crianças de 0 a 5 anos de idade (BRASIL, 2009).
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O currículo é, portanto, compreendido como prática social e linguagem, já que
as aprendizagens das crianças são as práticas sociais e as linguagens. Especificamente
sobre o currículo para os bebês e crianças pequenas, Barbosa (2009) também entende
que deve se dar com práticas sociais que possibilitem a vivência de linguagens e a
expressão de saberes, em experiências vividas com o corpo, nas brincadeiras e relações
construídas com os outros.
Richter e Barbosa (2010) também tratam das propostas curriculares e, já
pensando as especificidades da creche, reconhecem as capacidades dos bebês e crianças
pequenas como seres linguageiros, que interagem com e no mundo. E, nesse sentido,
afirmam a função docente na co-produção do currículo, o que segundo as autoras, se dá
pela organização do espaço educativo que oportuniza experiências com diferentes
linguagens, práticas sociais e culturais.
Nesse sentido, surge a especificidade da docência nas práticas pedagógicas com
os bebês e crianças pequenas. As concepções construídas durante o processo de
pesquisa conduzem ao entendimento de que a professora de bebês e crianças pequenas
precisa ser atenta no sentido de perceber, e também atenciosa no sentido de
corresponder aos desejos e necessidades expressos pelas crianças, por meio de
diferentes linguagens, utilizadas em suas formas de comunicar.
Essas linguagens são compreendidas como forma de expressão, de comunicação
daquilo que se deseja ou necessita. Tais expressões ocorrem por meio do corpo da
criança, seja com gestos, ações, expressões faciais, balbucios, fala, choro, mordida ou
outras, o que irá depender do repertório expressivo de cada criança e, de acordo também
com sua faixa etária, o que constitui, portanto, as diferentes linguagens utilizadas pelos
bebês e crianças pequenas para se comunicar e interagir com o mundo que as cercam
(FARIA; DIAS, 2007; BARBOSA, 2009; OLIVEIRA, 2010; RICHTER; BARBOSA,
2010; FORMOSINHO; OLIVEIRA - FORMOSINHO, 2007; 2013).
Estas seriam, portanto, características essenciais para este profissional, as quais
foram sendo observadas, percebidas e compreendidas durante o processo de pesquisa a
que se refere este texto.
Gonçalves (2014) contribui para a compreensão da
especificidade docente nas práticas pedagógicas com os bebês afirmando:
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Na medida em que agimos com responsividade mediante as formas
comunicacionais dos bebês, suas necessidades, atendendo seu chamado – seja
corporalmente, com um choro, um bocejo, um sorriso -, informamos para
essa criança que seus sentimentos e desejos são considerados (p. 30).
A partir disso, compreende-se que a ação docente junto às crianças inclui: o
planejamento, o preparo e organização do espaço; a receptividade e acolhimento na
chegada das crianças, tanto delas, quanto de suas famílias. Nos espaços preparados para
situações de interação e brincadeiras, a docência exige a mediação das explorações e
conflitos surgidos, possibilitando também que as crianças atuem de modo autônomo,
sentindo em sua presença uma referência e também segurança (BARBOSA, 2010).
Tendo em vista a compreensão das crianças como sujeito social em uma
perspectiva integral do seu desenvolvimento, a faixa etária dos bebês e crianças
pequenas demanda ações de cuidado indissociadas das práticas de educação, ou seja, as
práticas educativas incluem também ações de cuidado; de si, de seu corpo e do
outro(BRASIL, 2009; SAYÃO, 2010). Nesse sentido, considerando que os bebês e
crianças pequenas têm necessidade de alimentação, higiene corporal e sono e que, para
isso, dependem dos adultos, seus educadores no contexto coletivo institucional, estes
profissionais são responsáveis por realizar essas ações junto às crianças em caráter
formativo, ou seja, ensinando-as a se alimentarem, a re-conhecer seu corpo em suas
características e necessidades fisiológicas, a identificar suas necessidades de repouso e
descanso, a cuidar de sua higiene e saúde, bem como a conviver com outros e suas
necessidades em um mesmo ambiente coletivo.
A partir dessas ideias, compreende-se a ação docente possibilitando a
atuação/participação das crianças. Richter e Barbosa (2010), além da participação das
crianças pequenas, compreendem o currículo como tempo e espaço, a possibilidade
pedagógica de oportunizar a experiência de uma infância rica, diversificada, lúdica que
possa oferecer sentido às aprendizagens. Momentos em que os bebês e crianças possam
participar, “[...] aprender a operar corporalmente linguagens e narrativas a partir das
brincadeiras e das repetições lúdicas” (p. 94).
Além disso, destacam a diversão, o encontro com sons, cheiros, cores, sabores e
outros, definindo que o currículo, na educação das crianças pequenas, tem o desafio de
proporcionar experiência de vida coletiva entre adultos, crianças pequenas e bebês. As
DCNEI trazem ainda outro conceito importante relacionado ao currículo:
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Art. 4º As propostas pedagógicas da Educação Infantil deverão considerar
que a criança, centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de
direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia,
constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja,
aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a
natureza e a sociedade, produzindo cultura (BRASIL, 2009, p.1) [grifos
nossos].
A partir do que é apontado pelas autoras destacadas e também pela política
tomada como base durante o desenvolvimento da pesquisa, observou-se e compreendeuse que as concepções de currículo, de acordo com as DCNEI, estavam presentes nas
vivências produzidas nos contextos Berçário I e Berçário II. Esse entendimento,
resultante da pesquisa e construído pela pesquisadora, dá-se em razão das diferentes
situações observadas em que foi proposto pelas educadoras, havendo para tanto a oferta
de objetos em determinado espaço e que as crianças puderam explorar.
Assim, as interações se constituíram em situações cotidianas vivenciadas por
adultos e crianças em que foram tomadas decisões, houve um planejamento, mas
também foi possibilitada a participação dos pequenos sujeitos a partir de seus saberes,
desejos e necessidades de exploração, expressados por meio de diferentes linguagens
(BARBOSA, 2009). Um exemplo disso foi a observação do preparo de uma atividade
por uma das educadoras na turma Berçário I. A professora tinha organizado o espaço
com objetos a serem explorados a partir de escolhas em seu planejamento e
intencionalidade inicial, exercendo assim, conforme Richter e Barbosa (2010), sua
função na co-produção do currículo.
No entanto, as necessidades e desejos de experiência das crianças, como sujeitos
ativos e que possuem saberes, deu outro direcionamento à atividade, o que foi
possibilitado pela educadora. A partir da situação observada, nota-se que a exploração
do material (papel pardo) ocorreu na própria mão, em um dos pilares da sala, no chão,
próximo ao pilar (local da intencionalidade da educadora), mas também em outro
espaço, longe dali, no movimento de rasgar e com o corpo todo, em um momento de
interação entre as crianças; que se observaram e agiram após as ações das outras, com a
educadora; quem conversava com elas e com os objetos do ambiente coletivo; o pilar da
sala, o papel pardo, o chão, os espaços próximos e distantes dali, brinquedos e outros.
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Assim, compreende-se que estas formas de exploração utilizadas pelas crianças
são as linguagens que utilizaram para expressar seus desejos, suas necessidades de
descobrir, modificar, transformar, tocar, rasgar, observar e sentir com o corpo todo por
meio de olhares, gestos, movimentos pela sala, a observação, a imitação do outro, o
deitar-se sobre o papel e outros (EDWARDS et. al., 1999; TARDOS; SZANTO, 2004;
GUIMARÃES, 2006; FARIA; DIAS, 2007; BARBOSA; 2009; BRASIL, 2009;
RICHTER; BARBOSA, 2010; FORMOSINHO; OLIVEIRA - FORMOSINHO, 2007;
2013).
Entende-se que a possibilidade de atuação das crianças nos contextos observados
traduz o que é defendido pelas DCNEI enquanto percepção de que elas – as crianças são sujeitos que possuem necessidades e saberes, bem como são capazes de atuar,
modificando o planejamento e a organização do espaço propostos pela educadora com
suas formas de expressão, por meio das diferentes linguagens, conforme seus desejos e
necessidades
(MALAGUZZI;
RINALDI,
1999;
FARIA;
DIAS,
2007;
ABRAMOWICZ; OLIVEIRA, 2010; BARBOSA, 2010).
Tal entendimento também pode ser percebido na fala da professora do Berçário
I, Corroborando com os aspectos apontados pelas DCNEI com relação ao currículo e a
criança como o centro do planejamento curricular (EDWARDS et. al, 1999;
BARBOSA, 2009; RICHTER; BARBOSA, 2010; FORMOSINHO; OLIVEIRA FORMOSINHO, 2007; 2013):
Essa parte do planejamento é bem interessante mesmo porque eles nos
surpreendem no sentido de que a gente pensa o planejamento, pensa que eles
vão fazer algo, na hora eles constroem, eles próprios constroem um outro
planejamento, eles fazem porque eles são umas crianças assim, é muito
natural, é deles realizar aquele tipo de [...] exploração (Professora Berçário
I - Intervenção Direta com as educadoras).
Nesse sentido, compreende-se que mesmo que as educadoras tenham planejado e
proposto algo de acordo com o que consideravam ser adequado para as crianças,
também permitiam que elas próprias atuassem sobre o que foi proposto e, como elas
mesmas afirmaram, recriando o planejamento. Tal fato evidencia também a concepção
delas em relação às crianças como sujeitos ativos e, com isso, permitiam suas
participações (DELGADO, MÜLLER, 2005; RICHTER; BARBOSA, 2010).
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No mesmo sentido, Oliveira (2010) afirma que o desenvolvimento da criança se
dá nestas interações, relações e práticas com adultos e outras crianças de diferentes
idades e, em contextos culturais e sociais nos quais estão inseridas. Assim, compreendese a importância de considerar os apontamentos das DCNEI nas práticas pedagógicas
com bebês e crianças pequenas.
Considerações finais
Com base nos dados produzidos durante o processo de pesquisa, considerandose a Educação Infantil como a primeira etapa da educação básica e como um direito das
crianças, entende-se que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil DCNEI se apresentam como política educacional que, contemporaneamente
compreende a criança como sujeito ativo e capaz de construir relações com outros
sujeitos.
A partir disso, o contexto educativo institucional que partilha com as famílias as
responsabilidades pelos processos de educação e desenvolvimento das crianças precisa
se adequar às suas necessidades. Elas que passaram a ser vistas, compreendidas e
significadas pelos adultos como parte do movimento de visibilidade alcançado por estes
pequenos sujeitos.
Assim, as DCNEI cumprem seu papel de política ao servir de referência, mas
são as escolas e docentes, professores de bebês e crianças pequenas que, materializando
ou não na prática pedagógica com as crianças, é que darão sentido e tornarão seus
pressupostos possíveis. Este estudo mostra que sim, é possível implementá-la nas
práticas educativas com bebês e crianças pequenas.
Dito de outro modo: os marcos legais estão postos, e sua adoção pelos sistemas,
redes, instituições e seus profissionais está em andamento, mas dependem, ainda, em
grande parte, da aceitação teórica e prática de que existem especificidades nos modos
como as crianças aprendem nos diversos momentos de sua vida, especialmente no
período entre zero e três anos de idade, e em espaços não domésticos, extra-familiares.
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116
ISSN 2448-1157
Relato de práticas de estágio em Gestão da educação infantil
Flávio Caetano da Silva
RESUMO
Há anos desenvolvemos trabalhos vinculados ao Estágio Supervisionado em
Administração Educacional – Educação Infantil no curso de Licenciatura em Pedagogia,
na UFSCar, levando estagiários/as da graduação a inserir-se em escolas da rede
municipal voltada para a faixa etária em questão. O presente texto refere-se ao relato
dessas práticas contendo, nossas propostas, nossos desafios, nossas dificuldades e
nossas aprendizagens. Consideramos momento propício para compartilharmos essas
experiências para enriquecer o debate em torno da gestão da oferta educacional para
unidades escolares que abrigam crianças pequenas. Destacamos, neste texto, nossas
preocupações com diversos temas que envolvem a gestão, mas nos dedicaremos, em
particular a um deles, devido a sua importância no atual cenário de políticas públicas
para a E.I.: o financiamento. Relatamos e analisamos as práticas de estágio para a E.I.
no âmbito da Licenciatura em Pedagogia, modalidade presencial, da UFSCar.
Palavras-Chave: Gestão educacional na E.I.; Gestão Escolar; Políticas Públicas na E.I.
Financiamento da Educação.
1. Considerações Iniciais
Os estágios supervisionados em gestão da Educação Infantil 49 representam
significativa etapa na formação dos estudantes da Pedagogia, pois encerram debates
sobre modelos teóricos e práticos de políticas educacionais e escolares. Estas
representam o conjunto de práticas efetivadas no âmbito do processo decisional em
unidades escolares, baseadas nas políticas gerais para a Educação, de âmbitos mais
gerais. Em síntese, é no chão da escola que podemos visualizar essas políticas
educacionais em estado prático. É essa a idéia-força que nos move nos estágios em
gestão da Educação Infantil, do curso de Pedagogia da UFSCar.
A partir de 2007 iniciamos os trabalhos de supervisão de estágio no curso de
Pedagogia, junto a outros professores com os quais vimos acumulando aprendizagens
até o presente. As práticas de estágio em gestão da E.I. nos levaram a compartilhar essa
experiência. Relatamos aqui as abordagens das concepções de gestão que percorrem os
textos de pesquisadores da área, à luz das vivências que nossos estudantes que são
49
Utilizaremos daqui em diante a sigla E.I. para identificar a Educação Infantil.
117
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levados a vivenciar junto àqueles profissionais que se dedicam a organizar o trabalho
desenvolvido nas escolas públicas. Esses educadores compartilham conosco o processo
de formação de futuros professores que irão atuar junto às escolas da rede municipal.
2. Educação Infantil no âmbito de políticas públicas educacionais – recortes
históricos
Michel Foucault, ao escrever sobre a arte de governar indicou que, dentre os
governados, estão as crianças, “problemática central da pedagogia, que aparece e se
desenvolve no século XVI” (FOUCAULT, 1998, p. 277). A partir daí, podemos dizer
que a Pedagogia pode servir como instrumento nas mãos do Estado, que, ao governar a
Pedagogia através das escolas, governa a população, em primeira instância, as crianças,
nesse caso, e as famílias, a cidade e a nação, em última. Analisar as opções de governo
das crianças na trajetória institucional em que se inscreveu o Brasil, sobretudo na
dimensão municipal, é nossa meta no presente texto, ressalvando que não almejamos,
nos limites deste texto, escrever o histórico da Educação Infantil no Brasil, mas, lançar
luzes sobre a temática em tela – Políticas Públicas em E.I. – a partir de nossas andanças
enquanto pesquisador e formador de professores e gestores de unidades escolares nesse
nível de ensino, nos últimos anos e pelas aulas que vimos ministrando no Estágio
Supervisionado em Administração – Educação Infantil – na Pedagogia da UFSCar.
Pretendemos compartilhar aprendizagens ao longo de anos de atuação nesse
estágio, por considerando duas grandes oportunidades de formação do gestor escolar na
E.I.: o curso de Pedagogia e as práticas da vida cotidiana de escolas da E.I.
Nas suas raízes, a E.I. surgiu no território das antigas creches, em um momento
histórico que a saída da mulher-mãe das atividades domésticas para atender às
demandas do capital e das necessidades que as famílias dos extratos mais baixos na
estratificação social, apresentavam. Nota-se aí que um determinado viés políticoconceitual se manifesta para fundamentar esse movimento e dar à luz dois novos
personagens: a mãe-de-criança-pequena, que precisa trabalhar e a criança-filha-de-mãetrabalhadora que precisa de intensivos cuidados. Ambas vistas como dependentes de
políticas compensatórias por parte do Estado, que, ao final das contas se interessava por
aquela mão de obra, mas necessitava responder a uma questão simples, porém, crucial:
118
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onde e com quem ficariam as crianças? Nunes nos auxilia a examinar aquele contexto
quando indica que,
O viés ideológico e moralizante ocultou as raízes sociopolíticas das
necessidades sociais e, no caso particular das creches e pré-escolas, fixou o
lugar social da mãe operária como o lugar desenraizado da moral e
responsável pela formação de crianças propensas a serem problemáticas. As
creches seriam, então, um “mal necessário” um lugar de formação
compensatória dos deslizes higienistas e moralistas da então nascente classe
operária.(2009, p.87-88).
Por razões que nos parecem explícitas, tanto essas mães quanto suas crianças
foram constituídas em sua gênese como desviantes, problemáticas e dignas de pena. A
transição desse cenário conceptivo para outro, no qual a criança e mãe figuram como
sujeitos de direitos – direito da mãe ao trabalho remunerado extra-doméstico e direito da
criança à educação – concebidos como subjetivos pela Constituição Federal, Art. 205
(BRASIL, 1988) e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN –
que em seus artigos 29, 30 e 31 estabelecem parâmetros para a Educação Infantil
(BRASIL, 1996) não configurou na prática social uma passagem das velhas concepções
para novas, mas, afirmamos que aquelas se reproduzem na nova configuração não do
direito educacional, preconizado nas leis, mas nos discursos que percorrem os
corredores escolares na E.I., bem como nas mentes de pais de crianças de zero a cinco
anos de idade.
Apesar de Nunes (2009) atestar um “significativo avanço”, segundo suas
palavras (p.89), considerando que se tenha obtido um resultado positivo do amplo
debate em que educadores, políticos, pais, mídia e outros agentes, tenham efetivado a
consolidação desse direito ao nível da lei, uma vez que entre o Código de Menores
(BRASIL, 1979) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) e a LDB de
1996 (BRASIL, 1996), se passou de uma concepção de criança como ser depositário e
dependente de políticas compensatórias, sobretudo aquelas oriundas das categorias
sociais mais baixas, para um ser portador de direito subjetivo, porém, sem mudar as
velhas concepções no âmbito das políticas educacionais, em particular aquelas afetas ao
financiamento da educação. Essa é a tese que aqui pretendemos explicitar e
fundamentar em tópicos adiante.
3. Situando o Estágio em E.I. da Pedagogia/UFSCar
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Antes de entrarmos nas questões do financiamento e da importância de
discussões dessa matriz discursiva na Pedagogia, em particular no Estágio, vamos
expor, sucintamente nossa proposta de formação dos estudantes, matriculados no
Estágio, para, nesse contexto, compreender a inserção das questões que envolvem tal
recorte das políticas públicas.
Há oito anos atuando na condução da disciplina de estágio em gestão
educacional e escolar, pautamos nosso trabalho com vistas a propiciar experiências dos
estudantes nos ambientes escolares, desenvolvendo atividades que envolvem a
organização escolar, o planejamento, a avaliação de atividades que compreendem
aquele universo, considerando os diferentes agentes, suas relações, suas dificuldades,
seus conflitos, enfim, suas vivências, na E.I.
O estágio está localizado no 8º semestre do curso, composto, neste momento de
três créditos teóricos, três créditos de estágio e dois créditos práticos, contabilizando, ao
final, 8 créditos. Reservamos uma parte dos créditos às discussões sobre políticas
públicas voltas à gestão educacional e escolar, examinando questões organizadas em
eixos temáticos nos quais se encontram temas fundamentais, como a E.I. no escopo do
processo de criação das redes municipais e dos processos de municipalização do ensino,
bem como a democratização das escolas entre o previsto na legislação e as vivências no
cotidiano escolar e a relação escola-família na E.I., a partir de publicações da área.
Outro aspecto que destacamos é a participação de agentes escolares, tais como diretores
ou servidores da Secretaria Municipal de Educação de São Carlos que atendem ao nosso
convite para relatar suas experiências nas escolas do município, em nossas aulas,
permitindo um momento de rica discussão entre os estudantes e aqueles que já possuem
as práticas de gestão em seus currículos.
Dentre as principais atividades que realizamos no estágio está a inserção dos
estudantes nas escolas da rede municipal de E.I. de São Carlos que ocorre
simultaneamente às discussões em torno dos textos realizados em nossas aulas.
Totalizando trinta horas de inserção, a atividade coloca nossos estudantes em contato
direto com eventos que ocorrem no interior das escolas, permitindo o aprofundamento
das questões analisadas em aula, bem como o trabalho desenvolvido por profissionais
da educação infantil. Essa atividade é pautada em uma extensa relação de demandas
planejadas em conjunto com as gestões escolares, enriquecendo o currículo dos
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estudantes-estagiários. Após diversas inserções, os estudantes trazem para as aulas as
experiências vividas nas escolas, favorecendo a ampliação dos conhecimentos sobre a
rede municipal de E.I. Todo o esforço realizado ao longo da disciplina – aulas e
inserções – culminam na escrita de um Relatório de Estágio que é elaborado ao final,
em caráter de avaliação e aprovação. Tal relatório, é encaminhado à escola que recebeu
os estagiários para que possam tomar conhecimento das questões abordadas com base
em toda o estágio. Temos desenvolvido, ao longo desses anos, respeito ao trabalho
realizado pelos profissionais da rede municipal que abrem suas portas aos nossos
estudantes, participando de sua formação, o que para nós é extremamente valioso.
3.1 Demandas, desafios e dificuldades na efetivação do estágio
A título de expor as demandas que vimos surgir ao longo de nossa experiência
na supervisão desse estágio, podemos citar duas categorias principais: a primeira referese ao cumprimento tanto da legislação de estágio quanto das determinações da LDB
para o curso, portanto, buscamos atender ao estabelecido no projeto pedagógico, o que
leva os estudantes a identificar, inicialmente, como exigências da disciplina, mas que,
aos poucos, apercebem-se da importância no processo de sua formação.
Por outro lado, as demandas das escolas e dos gestores que, em seu dia a dia, se
encontram assoberbados de tarefas, os levam a solicitar apoio dos estagiários, o que
orientamos que atendam, na medida do possível. Assim, atividades como auxiliar na
realização de eventos, decoração para datas comemorativas e outras, ocorrem
simultaneamente àquelas em que os estudantes passam a ter contato com documentos,
dentre eles o Projeto Político Pedagógico da unidade, bem como participam de reuniões
pedagógicas ou do Conselho Escolar; atendimento aos pais, contato com as crianças e
suas professoras, e, o que sempre nos chama a atenção, o exercício da coordenação
pedagógica que, mesmo não se tendo, na maioria das escolas, uma educadora específica
para essa função, é efetivada pela própria gestora em meio aos afazeres burocráticos e
administrativos, o que nos tem levado a classificá-las como “bombeiros da educação”,
denominação com a qual elas concordam plenamente.
121
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3.2 Conceitos, debates e aprendizagens
O desenvolvimento do trabalho teórico em nossas aulas do estágio, em torno de
grandes temas da gestão escolar, supõe debruçar-se sobre uma literatura que, a cada dia,
se aprofunda no debate de políticas educacionais. Assim destacamos alguns conceitos e
aprendizagens que têm nos afetado nesse processo.
Entre o direito à educação, hoje consolidado na legislação educacional e na
Constituição Federal, e as práticas gestionárias escolares na E.I., encontram-se embates
que remontam à história da oferta educacional nesse nível de ensino, no Brasil. Como já
indicamos anteriormente, não foram superados alguns dos princípios que determinaram
um caráter assistencialista e compensatório na E.I., herança de concepções autoritárias,
patrimonialistas nas políticas educacionais. Decorre dessa trajetória de políticas de
educação infantil a oposição entre a obrigação das famílias em levar crianças, desde os
quatro anos de idade à escola e o caráter suplementar que pulsa no imaginário social
sobre a mesma (FERNANDES, CAMPOS e GIMENES, 2013), o que nos leva a
questionar sobre as possibilidades de formas e práticas de participação esperadas e
efetivadas nesse âmbito educacional, o que tem representado disputas entre pais e
educadoras num efeito gangorra: ora os pais são mais valorizados pela hierarquia
superior à escola, ora os professores. Isso indica que os conflitos latentes nessa relação,
por vezes, estão submetidos a uma névoa discursiva que tende a caracterizar,
apressadamente, a escola como democrática (BARROSO, s/d).
O cenário está pronto: as famílias são obrigadas a levar as crianças à escola, a
escola recebe as crianças, mas evita os pais e as práticas são nomeadas como
democráticas, forçosamente, através de representações que, por vezes, não representam,
reuniões que não têm efetivo poder de decisão sobre questões que realmente interessam
aos pais. O discurso que permeia essas práticas é aquele que enuncia uma dada
compreensão de democracia, na qual uma lógica denegativa se apresenta. À escola se
atribui um caráter suplementar à educação que a família realiza no âmbito doméstico
com duplo efeito de negação: por um lado a família demanda políticas compensatórias
por questões de ordem social e econômica, por outro, a escola e seus agentes, que
abrigam crianças pequenas não é um ambiente visto como organizado e assumido por
profissionais, mas cuidadores de crianças.
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Faz-se necessário registrar que, nesse cardápio de desencontros, políticas de
gestão concebidas no chão da escola e reveladoras das políticas educacionais gerais, são
atravessadas e temperadas por um sem número de práticas políticas que têm endereço
certo, o de garantir que se oferece a E.I., mas sob condições que não efetivam uma
qualidade aceitável. Estamos a tratar de eventos que estão sempre presentes à mesa, tais
como, provimentos de cargo de diretor, feitos na forma de indicação pelo poder público,
listas de espera para novas matrículas e condições de infraestrutura que denotam
carências múltiplas e decisões que afetam a disponibilidade de vagas via convênios, que
tangenciam os problemas enfrentados, trazendo ao caldo, novas situações de difícil
solução (Fernandes, Campos e Gimenes, 2013). Alves (s/d) nos alerta que esse quadro
decorre de decisões tomadas em organismos internacionais que incitam gestores
públicos a estabelecerem políticas na E.I. que se aproximam da informalidade pois
representam baixos custos, voltadas para o atendimento de clientes (Barroso, s/d).
3.2 Políticas de financiamento na E.I.
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Nosso foco tem recaído, nos últimos anos, sobre questões vinculadas às políticas
de financiamento da educação pública (Silva, 2011, 2012, 2014), entre outros temas.
Dentre as principais preocupações destacamos a necessidade de se repensar políticas de
financiamento, uma vez que têm se pautado em algumas distorções, dentre as quais
podemos indicar: confusão entre custo aluno e gasto aluno, valores mínimos
considerados como máximos em investimento educacional, aporte de recursos com base
em impostos gerando oscilações e risco de desinvestimento em momentos de crise na
produção e circulação de bens, investimentos questionáveis por falta de clareza ou
opções equivocadas, baixos aportes de recursos, programas que transferem recursos mas
que podem ser encerrados da noite para o dia, enfim, diversos problemas que vem
acompanhando a garantia de investimento na Educação pública.
Desde o Subsídio Literário50 até os dias atuais, a trajetória do financiamento
público à educação, no Brasil tem apresentado muitos atalhos e peripécias contábeis
para se mascarar o desinvestimento no setor.
Atualmente, as políticas públicas de investimentos em educação supõem as
seguintes fontes básicas:
Art. 68. Serão recursos públicos destinados à educação os originários de:
I - receita de impostos próprios da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios;
II - receita de transferências constitucionais e outras transferências;
III - receita do salário-educação e de outras contribuições sociais;
IV - receita de incentivos fiscais;
V - outros recursos previstos em lei (BRASIL, 1996).
50
Valor estabelecido pela Coroa Portuguesa, em 1772, para manutenção, ainda que precária
das “Aulas Régias” em substituição ao modelo jesuítico. (PINTO e ADRIÃO, 2006)
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A primeira refere-se a receitas provenientes de impostos auferidos pela União,
receitas provenientes dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. A segunda
refere-se a receitas de transferências constitucionais – denominadas transferências
voluntárias realizadas pela União – e outras transferências. A terceira refere-se às
receitas oriundas do salário-educação e de outras contribuições sociais. A quarta é
relativa à receita de incentivos fiscais de acordo com os entes federados. A quinta indica
que podem haver outras receitas previstas em legislações dos Estados, Distrito Federal e
dos Municípios.
A passagem do FUNDEF para o FUNDEB, feita no apagar das luzes de 2006,
prazo em que expirava a vigência do primeiro, se fez no âmago das históricas disputas
entre privatistas e defensores da escola pública, além de manobras de cunho
orçamentário que viria, mais uma vez, consolidar uma realidade há muito conhecida dos
educadores em nosso país: a União, ente federado que mais arrecada, é o que menos
investe na educação (PINTO, 2007). Esse quadro deve mudar com a atual política de
financiamento após a aprovação do Plano Nacional de Educação que, em sua Meta 20 51,
segundo a qual a União passará, até o final da vigência do Plano, a investir 10% do PIB
em Educação (BRASIL, 2014).
As formas de investimentos públicos em educação têm sido muito variadas e
indicam claros aspectos de baixo investimento em geral. Quando tratamos desse tema
voltado para a Educação Infantil duas circunstâncias se destacam: a primeira se refere
ao fato de que, nas atuais políticas educacionais, a obrigatoriedade se estende dos 4 aos
17 anos de idade (BRASIL, 2008) e a segunda refere-se ao fato de que até 2006, último
ano de vigência do FUNDEF, a Educação Infantil não estava incluída nas contas do
financiamento público da União, quadro que foi modificado com sua inclusão no
FUNDEB, após pressão de setores sociais, ligados à E.I.
Tem se destacado o aporte público, sobretudo de municípios, ao setor privado,
com ou sem fins lucrativos para atendimento da E.I. Oliveira e Borghi (2013) indicaram
a tendência à celebração de convênios entre o poder público municipal e entidades que
se encaixam nas duas categorias, ressaltando que, transferências dessa natureza indiciam
51
Meta do PNE em que se registra as formas de financiamento da educação pública no Brasil
no decênio entre 2014 e 2024.
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aspectos privatistas na educação, sob uma clara justificativa de economia para os cofres
públicos, conforme já o anotara Domiciano, citado pelas autoras.
3.3 Discussão sobre financiamento da educação com estudantes do Estágio
em Gestão da E.I.
Ao abordar a temática do financiamento da educação com os estudantes da
disciplina Estágio em Gestão da E.I. notamos o completo desconhecimento da turma.
Isto nos levou a conjecturar sobre o que sabem os formados em Pedagogia sobre esse
tema e suspeitamos de que pouco conhecem a respeito. Se isso se pode verificar de fato,
cabe perguntarmos se o curso de formação de professores e gestores escolares não
deveria abrigar, ao menos, uma disciplina em que se abordem as políticas de
financiamento em educação. Provavelmente, muitos alunos, após a conclusão do curso,
vão atuar nas redes municipais, nas quais eventos relativos à temática estarão nas
discussões da escola, mas os recém-formados, talvez não estejam em condições de saber
de que se trata.
Por essas razões, resolvemos abordar, ao menos alguns desses temas – citados
anteriormente, com os alunos do estágio, sub-temas do financiamento. Em primeiro
lugar a confusão que é bastante comum entre custo aluno e gasto aluno. Diversos
autores que estudam o tema já nos deram pistas sobre a substituição do custo-aluno pelo
gasto-aluno, e podemos traduzi-la de forma bem simples. O custo-aluno supõe o
mínimo que se deve aplicar – o Município, o Estado ou a União – para que ofereça uma
educação de qualidade a todos os alunos. Já o gasto-aluno supõe partir-se do montante
de que se dispõe a aplicar, dividido pelo total de alunos que se vai atender. A diferença
é clara. A política pública estabelecida a partir do custo-aluno objetiva determinada
meta de qualidade pela via do investimento. A política do gasto-aluno objetiva otimizar
os recursos.
Outro aspecto apresentado e debatido com os alunos é um princípio em questões
do financiamento da educação básica. As determinações legais, dentre elas a CF/88 e a
LDBEN/96 estabelecem os marcos legais a partir dos quais a matéria encontra-se
normatizada. O art. 212 da CF/88 indica que “A União aplicará, anualmente, nunca
menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por
cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de
126
ISSN 2448-1157
transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino” (BRASIL, 1988, grifos
nossos). O que se verifica em muitos municípios é que os valores mínimos se tornam
máximos por duas razões básicas. Em primeiro lugar, pelo fato de muitos municípios
não disporem de recursos suficientes para ampliar os investimentos previstos na CF/88.
Em segundo lugar, pelo fato de que, uma vez cumprido o dispositivo legal, nada obriga
os gestores municipais a investir mais do que o estabelecido.
Até a aprovação do atual Plano Nacional de Educação, que entrou em vigor em
2014, a vinculação dos investimentos aos impostos determinava, por si, uma variação,
para cima ou para baixo. Sendo assim, o volume maior ou menor de recursos investidos
em educação dependia de uma melhor performance da produção e circulação de bens e
serviços. A conquista de vinculação ao PIB do país representa um avanço nas políticas
de investimento pois, pode dar mais solidez aos aportes de recursos e menos
instabilidade.
Por fim, apresentamos aos estudantes aspectos do Programa Dinheiro Direto na
Escola – PDDE – que transfere recursos da União, via FNDE, a contas bancárias de
Unidades Executoras – UEx – criadas para essa finalidade. A despeito dos problemas
oriundos do fato de se ter uma empresa privada dentro da escola pública (ADRIÃO,
2007), analisamos com os estudantes o fato desse tipo de política pública, denominada
de transferência voluntária – pois, pode simplesmente desaparecer da noite para o dia,
apesar de ter dezoito anos de existência – foi criado pela Resolução Nº 03, de 04 de
março de 1997, do FNDE (BRASIL/FNDE, 1997).
4. Considerações Finais
Debatemos políticas públicas em educação e questões relacionadas ao
financiamento da educação, analisadas com estudantes de Estágio em Gestão da
Educação Infantil, no curso de Pedagogia, na UFSCar. Nosso objetivo está voltado ao
debate das práticas de estágio na E.I. como processo de formação dos licenciandos em
Pedagogia e de futuros gestores escolares.
Ao analisar as práticas de estágio e, nelas, as discussões sobre o financiamento
da educação básica, descortinamos temáticas que não são amplamente tratados com
alunos da Graduação. Objetivamos trazer à tona a necessidade de se ampliar os debates
127
ISSN 2448-1157
com os estudantes da Pedagogia para expor-lhes temas que, certamente, farão parte do
cotidiano de suas atividades profissionais.
Diversos autores têm se debruçado sobre as questões relativas ao financiamento
da educação e, em sua maioria, têm indicado que estamos longe de alcançar patamares
de investimentos ideais para o atendimento das demandas da Educação Infantil, em
nossos municípios. Estes carecem de condições, em sua grande maioria, e de recursos
para ultrapassar os mínimos previstos na CF/88 e na LDB/96. Para esses municípios, as
transferências efetivadas pela União, voltadas para o investimento na educação,
constituem a única fonte de recursos disponíveis.
Os investimentos em educação, por si mesmo, não garantem a melhoria da
qualidade na educação. No entanto, sem recursos suficientes com continuidade
assegurada em Lei e sob uma cultura de que a Educação é direito subjetivo, não se pode,
sequer, sonhar com uma oferta educacional que atenda às necessidades, sobretudo da
Educação Infantil, para que a primeira etapa do processo de escolarização seja efetivado
nas melhores condições possíveis.
128
ISSN 2448-1157
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130
ISSN 2448-1157
As lutas nas tramas da pesquisa: um salto para a institucionalidade das creches
universitárias uspianas52
Flávia Maria de Menezes53
Introdução: questões que interpelam nosso pensamento e nos colocam em debate
As creches universitárias estaduais paulistas se apresentam no enredo da
educação infantil pública brasileira como contextos muito específicos de infância e de
educação da criança pequena. São unidades de educação infantil funcionando no seio e
na efervescência das universidades estaduais de São Paulo. Tiveram sua origem no final
da década de 1970 e início da década de 1980, na e pela luta legítima de mulheres, mães
e trabalhadoras, estudantes universitários, movimentos sociais e coletivos da sociedade
paulistana pelo direito à creche no local de trabalho.
Essa reivindicação da mulher trabalhadora decorreu do aumento da sua
inserção no mercado de trabalho, a partir de transformações na sociedade,
como a expansão industrial, o crescimento das cidades e as modificações na
organização e estrutura da família contemporânea, uma luta determinada por
razões concretas, ou seja, devido à necessidade de ter um local onde
pudessem deixar seus filhos para aumentar a renda familiar por meio do
trabalho remunerado (RAUPP, 2004, p. 4).
Raupp (2002, 2004) direciona seus estudos para as creches universitárias
vinculadas às universidades federais, enfatizando que as primeiras unidades de
educação infantil (universitárias) surgiram em algumas dessas instituições, em função
da necessidade do acolhimento dos filhos dos servidores e dos estudantes universitários
para que estes pudessem desenvolver suas atividades de trabalho. Entretanto, considera
que as creches universitárias, tanto federais quanto estaduais, representam um local
privilegiado de produção de conhecimento sobre a pequena infância, uma vez que
propõem um diálogo permanente entre o trabalho realizado com as crianças e suas
52
Este texto é fruto de pesquisa de conclusão do Curso de Mestrado em Educação realizada no
período de março de 2013 a agosto de 2015 na Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ).
53
Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Professora de Educação
Básica Técnica e Tecnológica do Colégio Pedro II campus São Cristóvão I
131
ISSN 2448-1157
famílias e as funções indissociáveis de ensino, pesquisa e extensão, o que nos leva a
articular as duas situações como questões que se enredam na constituição desses
espaços nas universidades (Raupp, 2004, p. 4).
As lutas e mobilizações, por serem legítimas e íntegras, foram geradoras de
muitas ações e transformações nas formas como o poder público configurou seu papel
na sociedade e, nesse enredo, pode-se considerar o Decreto nº 18.370, de 8/01/1982, que
cria os Centros de Convivência Infantil (CCI), um programa do Fundo de Assistência
Social do Palácio do Governo de São Paulo (FASPG) destinado aos “filhos de
funcionárias públicas, na faixa etária de 3 meses a 6 anos e 11 meses, em todas as
Secretarias de Estado” (Palmen, 2005, p. 60). Para a comunidade das universidades
estaduais paulistas, a criação dos CCI representou um salto na expansão das creches
universitárias, uma vez que efetivamente foram criadas, a partir do ano de 1982, 25
unidades de educação infantil nos campi da Universidade Estadual Paulista Julio de
Mesquita Filho (UNESP), da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMPI) e da
Universidade de São Paulo (USP), na qual as creches universitárias uspianas, seus
sujeitos e suas tramas, estão vinculados através da Superintendência de Assistência
Social (SAS) da universidade.
As creches e pré-escolas da USP recebem, hoje, cerca de 400 crianças com
idades entre 4 meses e 6 anos, filhos de professores, funcionários e estudantes
universitários da USP, embora a capacidade de atendimento seja de, aproximadamente,
600 crianças. Os processos históricos que constituíram as creches uspianas revelaram
que a luta legítima de seus sujeitos deram origem a instituições de educação infantil
com potência para expandir suas funções para além do cuidar e educar, tornando-se um
território fértil para a afirmação da infância brasileira, no sentido da relevância do
conhecimento que produziram ao longo de seus 30 anos de existência.
Todavia, a pesquisa de mestrado já referida anteriormente, e o Dossiê em Defesa
das Creches/Pré-Escolas da Universidade de São Paulo trouxeram questões para
pensarmos as condições em que as creches universitárias se encontram, sofrendo
pressões da própria universidade, através da SAS. Neste ano de 2015, por determinação
da Reitoria da universidade, em concordância com a SAS, houve um corte de 141 vagas
132
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nas cinco creches vinculadas à USP, impossibilitando a entrada de novas crianças, o que
representa a garantia da continuidade das instituições 54.
O referido Dossiê fez um levantamento da produção de conhecimento na/pela
creches/pré-escolas da USP realizada no período de 2009 a 2014, com a ideia de
fundamentar sua militância na relevância que essas instituições têm para o
fortalecimento da infância paulistana e brasileira. Sendo assim, foram localizados 99
trabalhos de pesquisa em iniciação científica, mestrado e doutorado; 182 trabalhos
apresentados pelas equipes das creches em congressos, seminários, oficinas e outros
eventos acadêmicos e de formação contínua de profissionais da educação infantil; 6632
visitas monitoradas que as creches receberam, inclusive de visitantes internacionais que
estiveram nas creches; a presença de 681 estagiários da graduação e da pós-graduação
de diferentes campos do saber da USP, o que mostra que a pulsação infância e
universidade continua vibrante, já que a pesquisa de mestrado referida neste projeto
investigou esta pulsação até o ano de 201255.
É neste sentido que o trabalho aqui proposto se configura: trazer elementos que
foram capturados na leitura contemplativa e tradução responsiva dos textos que
integraram o material documental referente à pesquisa de mestrado citada neste texto;
estabelecer um diálogo entre tais elementos e as tramas relatadas no Dossiê em Defesa
das Creches/Pré-Escolas da Universidade de São Paulo, no sentido de enriquecer o
debate aqui proposto com algumas questões que representariam as contradições, os nãoditos e os ruídos não capturados na e pela produção de conhecimento realizada pelas
creches em questão, que atualmente representa, em sua militância, um forte potencial na
defesa de seu funcionamento vinculada à universidade.
Justificativa e Objetivos
O presente trabalho foi escrito com o propósito de trazer para o debate questões
que saltaram a partir da referida pesquisa de mestrado, assinada pela autora deste texto e
54
Narrativa construída em diálogo com as informações contidas no item 01 do Dossiê em Defesa
das Creches/Pré-Escolas da Universidade de São Paulo.
55
Idem à nota de rodapé de nº1.
133
ISSN 2448-1157
pelo Grupo de Pesquisa Infância e Saber Docente, coordenado pela Profª Dra. Ligia
Maria M. L. de Aquino, do qual esta pesquisa faz parte. O objetivo central desta
pesquisa foi realizar uma investigação nas relações de alteridade entre pesquisador e
crianças, a partir da tradução dos encontros de pesquisa e produção de conhecimento
que aconteceram no decorrer das atividades de ensino, pesquisa e extensão envolvendo
pesquisadores e profissionais das universidades estaduais paulistas, em especial a
Universidade de São Paulo, e a Creche Carochinha, uma instituição de educação infantil
vinculada à USP, funcionando no campus Ribeirão Preto desta universidade.
Nas traduções do percurso histórico das creches universitárias paulistas,
principalmente da Creche Carochinha, processo necessário no enredo desta pesquisa,
percebemos nas lutas travadas a origem da transformação de um espaço que surgia para
atender as necessidades da comunidade universitária em um lugar para os encontros
entre a universidade e a infância, onde os acontecimentos desses encontros permitiriam
emergir ideias sobre as crianças e seu desenvolvimento, sobre as creches e o educar e
cuidar no coletivo, sobre os adultos e as formas como cuidam e educam as crianças,
principalmente os bebês, possibilitando novas configurações nos fazeres e nos saberes
sobre a educação das crianças pequenas nas instituições.
Pensamos que o recorte temporal eleito pelo grupo Infância e Saber Docente
para as investigações nesta pesquisa, permitiu localizar um tempo-espaço em que novas
configurações sobre as crianças e a infância surgiam no cenário da educação infantil,
principalmente no que tange às mudanças que aconteceram na legislação, mesmo que
não tenha encontrado trabalhos cujo objeto de investigação tenha se debruçado nessas
configurações, mas encontramos indícios delas nos discursos em boa parte dos textos
escritos pelos pesquisadores, como se desejassem enunciar a necessidade de um diálogo
entre as ideias tecidas sobre as crianças e o que de fato nos provocam quando
mergulhamos nos cenários onde as experiências infantis acontecem.
Todavia, a forma como desfocaram as políticas públicas, nas nossas traduções
pareceu acontecer em função do foco estar centrado no cenário das creches
universitárias estaduais paulistas, que, no seio dessas políticas, se configuram como
territórios de infância muito específicos. Os pesquisadores demonstraram querer
anunciar a importância desses espaços no cenário da infância, pelo menos no tocante à
produção de conhecimento.
134
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O Dossiê em referência neste trabalho revela o enfrentamento de novos desafios
para as creches universitárias, pois o que parece transparecer nesse documento é que o
que está posto em questão é a razão desses espaços de educação infantil existirem no
interior das universidades. Os estudos de Raupp (2002) trouxeram para o debate sobre
as creches universitárias o fato de que no início dos anos 2000 os fóruns de discussão da
área buscavam alternativas que pudessem sustentar o funcionamento das unidades
universitárias federais, já que, naquele momento, questionava-se a necessidade dessas
instituições, sendo de educação infantil, estarem vinculadas às universidades federais,
uma vez que a administração desta etapa da educação, por lei, é destinada à esfera
municipal.
Portanto, uma história que se atravessa nos enredos das creches universitárias
estaduais paulistanas. Entretanto, diferentes do contexto destas, as unidades de educação
infantil universitárias federais mantiveram, ao longo de sua trajetória, suas funções
fundamentadas no cuidado e na educação das crianças pequenas, filhas de servidores
das universidades das quais são vinculadas. Nesse âmbito, instalou-se a questão que
motivou os estudos da referida autora, visto que, como unidades universitárias, as
creches deveriam expandir sua função “para além do cuidado e educação das crianças”
(Raupp, 2002, p. 147), assumindo o caráter acadêmico o que “significa estar em
consonância com o princípio norteador da universidade, que é a indissociabilidade entre
o ensino, a pesquisa e a extensão” (Idem, p. 149).
135
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Em relação às unidades de educação infantil federais, Raupp sinalizou em seus
estudos que a homologação da Constituição Federal de 1988, assim como as medidas
legais para a oferta da educação infantil no Brasil oriundas da carta magna, trouxeram
tensionamentos para essas instituições uma vez que a C.F. direciona o direito à
educação a todas as crianças, sendo elas filhas de trabalhadores ou não, o que não
justificaria a existência de instituições públicas de educação infantil com critérios
específicos para o ingresso das crianças. Neste caminho, as unidades de educação
infantil federais se viram pressionadas a repensar não somente sua função como também
os seus critérios de atendimento, “direcionando essas questões para a realização de um
projeto institucional com definições claras do papel dessas unidades no interior das
universidades” (Raupp, 2002, p. 147).
No enredo que constitui os processos históricos das unidades de educação
infantil federais, algumas tramas saltam como contradições a serem refletidas no
contexto da luta que atualmente as creches universitárias uspianas estão mobilizando em
prol da sua sobrevivência. Tanto a dissertação de mestrado referida neste projeto quanto
as informações contidas no Dossiê sinalizam que ao longo de seus 30 anos de existência
as creches universitárias uspianas trilharam uma trajetória de trabalho que expandiu
suas funções para além da educação e do cuidado das crianças pequenas, definindo-se
como campo para experimentação, observação e investigação para os cursos de
formação inicial das universidades; como campo para a produção e aprofundamento do
conhecimento produzido por pesquisadores, pertencentes ou não à universidade; como
um local privilegiado para formação em serviço de educadores da infância, uma vez que
muitas dessas instituições são abertas à visitação e à prática de vivências que articulam
teoria e prática em cursos de extensão. Portanto, um espaço fértil de formação e
produção não somente para a universidade em que a creche está vinculada, como
também para pesquisadores da área e profissionais da educação infantil que atuam em
outras instâncias.
Nesta
perspectiva
percebe-se
que
as
creches
universitárias
uspianas
compartilham do princípio norteador que sustenta a universidade, que é a
indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão (Raupp, 2002, p. 149), e este fato já
se apresenta no enredo desta luta como uma contradição uma vez que a pesquisa, a
produção e a disseminação de conhecimento não acenaram para o salto da
136
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institucionalização que poderia configurar para essas creches uma outra realidade em
relação a sua afirmação como instituição pública de educação básica e sua inserção nas
políticas de financiamento destinadas à educação infantil.
As lutas foram o marco na origem das creches uspianas e vêm sendo a condição
de sua existência, pois resistem bravamente às condições adversas que estão lhes sendo
impostas pela Superintendência de Assistência Social (SAS) a qual estão vinculadas à
universidade, segundo o referido Dossiê. Embora a pulsação acadêmica lhes tenha
conferido um papel distinto no contexto das unidades universitárias de educação
infantil, no que tange as suas funções, a pesquisa de mestrado aqui inscrita revelou em
suas narrativas que a produção de conhecimento que se constituiu nessa trajetória na e
pela relação creche e universidade pareceu caminhar irmanada com as contradições que
emergiram ao longo do percurso histórico dessas creches, nos seus 30 anos de
funcionamento.
A Constituição Federal de 1988 e o ordenamento legal para a educação infantil
no Brasil, que se estabeleceu a partir da C.F., trouxeram questões que implicariam para
as creches uspianas e seus sujeitos a necessidade de definir claramente o lugar dessas
instituições no contexto das universidades, como a sua forma de vinculação à Educação
e não à Assistência Social, como se mantiveram vinculadas todos esses anos; o acesso
igualitário a todas as crianças na faixa etária que se destinam a atender; ocupar os
quadros de funcionários com profissionais habilitados para o exercício de suas funções
na educação infantil e garantir o ingresso desses profissionais por meio de concurso
público de provas e títulos. O que se pretende argumentar com o disposto anteriormente,
não é que não tenham ocorrido esforços institucionais, tanto das creches e seus gestores,
como da SAS e da própria USP, para a construção de um projeto institucional que
pudesse sustentar as creches, projetando uma outra situação diferente da que enfrentam
atualmente, mas sim que a referida pesquisa de mestrado não localizou, nos documentos
que investigou indícios que pudessem acenar para este processo, e, portanto, as
implicações legais para a educação infantil foram se colocando, ao longo desta
trajetória, como um alarme de incêndio.
Parafraseando Benjamin (1987), cuja filosofia histórica denunciava a visão
romântica da representação das lutas de classe, alertando para o fato de que vencer o
vencedor não garantiria ao oprimido o lugar de protagonista na sua história, o
137
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argumento aqui proposto faz referência ao fato de que a luta da comunidade uspiana
pelo direito à creche no interior da universidade e a criação dessas instituições
representaram a origem de um acontecimento que deveria se consolidar com a garantia
de sua institucionalização, no e pelo reconhecimento da universidade das práticas
institucionais e dos esforços institucionais para a produção das pesquisas na e pelas
creches, a partir de incentivos e políticas institucionais destinados a esta produção,
acordados entre as creches uspianas e seus coletivos e os gestores da universidade.
Não existe nenhum grande sucesso ao qual não correspondam esforços reais.
Seria um erro, no entanto, admitir que esses esforços sejam sua base. Os
esforços são a consequência. Consequência da elevada autoestima e da
elevada disposição para o trabalho daquele se se vê reconhecido. Por
conseguinte, uma grande existência, uma hábil réplica e uma feliz transação
são os verdadeiros esforços subjacentes aos verdadeiros sucessos
(BENJAMIM, 2011, p. 177).
Os pensamentos de Mikhail Bakhtin e Walter Benjamin trouxeram questões
fundamentais para o lugar dos processos históricos nos objetos de pesquisa, já que suas
ideias mostraram que a história perde seu sentido na medida em que ancora suas bases
em uma forma continuísta de pensar, negando as contradições, e é nesse enredo que o
texto aqui disposto fundamenta seu debate: pensar o lugar ou não-lugar da luta dos
coletivos das creches uspianas nos textos de pesquisa, propondo um debate acerca da
seguinte questão: como traduzir a luta e suas tramas quando esta foi invisibilizada na
produção de conhecimento?
Metodologia e Fundamentação Teórica
Através da leitura contemplativa e da tradução responsiva, atravessadas
em Bakhtin, seus leitores, outros pensadores que trouxemos em diálogo na
escrita do texto da pesquisa Onde estão as crianças da carochinha? Uma
investigação na relação pesquisador/criança na produção de conhecimento de
uma creche universitária foi possível “escutar” o que falam os textos (material
documental) e com essa escuta produzir uma escrita que permitisse transparecer
a identidade desta produção, ou seja, o que os fazeres e os saberes produzidos
pelos profissionais e pesquisadores da/na Creche Carochinha revelaram; o que
138
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essa produção traduz em relação à identidade acadêmica da instituição, já que se
trata de uma creche universitária; as tonalidades perceptíveis da relação
ensino/pesquisa/extensão que atravessam e aproximam a universidade e a
infância na Creche.
No trabalho de produção do corpus da pesquisa foram encontrados 107
documentos relacionados às atividades de ensino, pesquisa e extensão envolvendo a
Creche Carochinha, suas crianças, famílias e funcionários (profissionais, pesquisadores,
demais trabalhadores), que identificamos como Os tesouros da Carochinha. Todos
esses documentos foram organizados em uma planilha Excel, agrupados em
quinquênios56, no período de 1989 a 2012, e representam o material documental da
pesquisa em questão neste texto. Portanto, sendo referentes à comunicações (57),
dissertações (18), projetos (6), monografias (7), teses de doutorado (7), documentos
referentes à legislação (2), programas desenvolvidos na Creche (4), relatórios de
assessoria técnica (1), trabalho de conclusão de curso - TCC (1), relatórios de estágio
(3).
O Grupo de Pesquisa Infância e Saber Docente embarcou navegando em sítios
na internet, utilizando as palavras Creche Carochinha e creche universitária como
bússolas, orientando esta navegação ao encontro do conhecimento desejado. Como na
web a navegação não se dá em uma direção linear, muitas possibilidades de caminhos se
colocaram para o Grupo neste processo, como por exemplo, a Plataforma Lattes e osite
do Scientific Eletronic Library Online – Scieloque também contribuíram nesta pesquisa,
pois nestes locais foram encontrados trabalhos de extrema relevância na produção
acadêmica que tratava a Creche Carochinha e seus contextos como objeto de
investigação. Nessas possibilidades, outras palavras foram surgindo revelando novos
caminhos para a busca e outras tantas produções, como crianças em creches, pesquisas
com bebês.
Os tesouros da Carochinha, assim, se constituíram em 107 documentos que
foram produzidos num processo de “artesanato intelectual” como denomina Castro e
“assim o define na pesquisa com documentos” (Aquino, 2012, p. 5-6).
56
Uma opção adotada pelo próprio grupo de pesquisa, para favorecer o trabalho de investigação
e análise dos documentos.
139
ISSN 2448-1157
“[...] a imaginação sociológica é o resultado de um trabalho intelectual que se
assemelha ao de um artesão numa oficina, aperfeiçoando seus instrumentos e
métodos de trabalho (e a si mesmo, bem como aquilo que produz), a medida
que vai trabalhando. Esta perspectiva, válida para qualquer pesquisa social e
histórica, é particularmente apropriada à pesquisa em arquivos. A habilidade
em transformar um conjunto singular de documentos em algo útil para a
pesquisa é um processo que se aprende fazendo. Não há uma ‘receita’ para
seu sucesso.” (Castro, 2008 apud Aquino, 2012, p. 6).
Como a pesquisa que desenvolvemos não contemplou a relação direta com o
espaço/tempo do campo e os sujeitos, nossa investigação esteve centrada no corpus, ou
melhor, nos tesouros da Carochinha. Foram com esses tesouros que dialogamos; foram
eles que nos interrogaram, nos inquietaram e nos trouxeram revelações, possibilidades
para nutrir o objeto da pesquisa, mapeando nossos caminhos. Foi através da leitura
contemplativa e da tradução responsiva que se deu a relação com o objeto da pesquisa,
processos estes nos quais nos atravessamos com as ideias de Bakhtin.
Os documentos encontrados foram catalogados nos seguintes campos,
definidos pelo Grupo Infância e Saber Docente em função do objetivo da
pesquisa e do material encontrado: tipo de documento, finalidade, área de
conhecimento, autoria, orientador ou coordenador, instituição, ano de
publicação, número de páginas, suporte, linguagem, palavras-chave, local
depositado, institucional (tipo de pesquisa). Este último campo identifica os
trabalhos pela sua vinculação com a universidade, sendo institucional todos os
trabalhos cujos autores são docentes e/ou pesquisadores da Universidade de São
Paulo (USP).
Portanto, os tesouros da Carochinha se constituem em um conjunto de textos
elaborado por profissionais e estudantes das diferentes áreas do conhecimento, que
realizaram suas atividades de ensino, pesquisa e extensão tendo a Creche como campo
de investigação e produção de saberes sobre e com a infância e as crianças nesses
contextos.
Nos os vinte e três anos de produção em ensino, pesquisa e extensão no cronotopo
da Creche Carochinha foi visível o investimento da instituição na elaboração de
documentos cuja finalidade é a disseminação de conhecimentos elaborados na pulsação
do cotidiano da Creche, fundamentados na relação entre os saberes e os fazeres que
140
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constituem este cotidiano e se atravessam com a infância, a docência e a universidade,
através das atividades das crianças, dos educadores, estudantes e profissionais das
universidades paulistanas, principalmente a Universidade de São Paulo (USP).
Tecendo considerações finais
Em vistas de todas as questões narradas até então, percebe-se que no processo de
constituição acadêmica das creches uspianas há desencontros, ruídos e fragilidades no
que diz respeito à importância que a contribuição histórica desta produção de
conhecimento conferiu ou não para o salto da institucionalidade das creches, que hoje
lutam pela sua sobrevivência como instituição de educação infantil universitária.
Ainda que os resultados da referida pesquisa de mestrado demonstrem o
potencial das creches universitárias em relação à função social das universidades,
incentivando a pesquisa e a investigação científica; desenvolvendo a divulgação de
conhecimentos culturais, científicos e técnicos; comunicando o saber através das
atividades de ensino, pesquisa e extensão que produzem e outras formas de publicação
(BRASIL, 1996), tais ações não acenaram nas políticas da universidade como um ganho
para a institucionalização das creches, que continuam sendo entendidas como espaços
para o atendimento dos filhos dos servidores e estudantes universitários e, nesta
perspectiva, uma atividade-meio e não uma atividade-fim como de verdade se
configuram nas tramas da USP.
Portanto, se as creches uspianas tiveram sua origem na luta e se esta luta
continua sendo o objeto de sua história, o que se pode entender é que a pesquisa e a
produção de conhecimento que hoje estão colocadas em relevância no cenário desta luta
ficaram como ruídos não capturados pelas investigações, interrogações e traduções que
constituíram essas pesquisas e toda a produção de saberes e fazeres que se desenvolveu
ao longo dos 30 anos de trajetória das creches universitárias.
Pensar a história atravessada no pensamento benjaminiano implica tratar as
contradições como uma potência para os diálogos que se estabelecem no aqui-agora;
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significa se envolver na grande temporalidade, trazendo para o presente os rastros da
história que “saltam como lampejos no momento do perigo” (Benjamin, 1987, p. 224).
Assim sendo, entendemos que os processos de produção de conhecimento que se
constituiu ao longo dos 30 anos de trajetória das creches universitárias uspianas, apesar
de pulsarem sua identidade acadêmica, não estiveram ancorados na luta pela
institucionalização das creches. No mesmo sentido, também entendemos que embora os
processos de produção de conhecimento tenham revelado a necessidade da construção
de um projeto institucional que pudesse sustentar as creches uspianas, este fato ecoou ao
longo destes 30 anos de história como um alarme de incêndio não percebido pelas
creches uspianas e sua comunidade ou melhor dizendo, a produção de conhecimento
não acenou na história das creches uspianas e de sua comunidade como um devir-luta
(Abramowicz, Levcovitz e Rodrigues, 2009, p. 195) que possibilitasse sua
institucionalização.
Encontrar, no aqui-agora, o lugar da luta nos enredos da produção de
conhecimento implicará para as creches uspianas e seus sujeitos pensar a história que
atravessa essa produção. Implicará, sem dúvida, rememorar a produção de
conhecimento para que essa rememoração possa dizer sobre os atos de pensamento
desses autores/pesquisadores, no lugar de autores desses pensamentos e do lugar em que
estão interpelados pelo cronotopo atual em que as creches uspianas se encontram. Para
pensar o lugar ou o não-lugar da luta no enredo da pesquisa é necessário reencontrar os
fazeres e saberes que esse coletivo produziu na sua temporalidade, ou seja, nos 30 anos
de história de trabalho e produção desses saberes e fazeres, no tempo da militância que
marcou o princípio desta trajetória e no aqui-agora da luta no enfrentamento das
adversidades que se colocam para esse sujeitos na medida em que a sobrevivência
dessas creches no contexto da USP está sendo ameaçada.
142
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Referências
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Conhecimento nas Unidades Universitárias de Educação Infantil. Prociência,
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BAKHTIN, MIKHAIL. Tradução de Paulo Bezerra. Estética da Criação Verbal. São
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Universidades Federais. Revista Contexto e Educação. Editora UNIJUI. Ano 17, N. 68,
out/dez 2002, p. 147-176.
143
ISSN 2448-1157
O Protagonismo da Escola e da Criança no Foco da Formação Profissional e das
Políticas Públicas da Educação de Zero a Três Anos.
Angela Maria Roveri¹
Celia Cerqueira Araujo²
Elisete Cristiane Sacramoni³
Giuliana Trazzi Marcellino4
Karen Renata Zuppinger5
Patrícia Malvina Maestrello6
Rose Cristina de Aguirre Bernardes Dezena7
Resumo
O presente trabalho se refere ao relato de práticas da Diretoria de Educação Infantil do
segmento de zero a três anos da Secretaria Municipal de Educação de Jundiaí, São
Paulo, e objetiva apresentar o percurso de ações desencadeadas ao longo dos últimos
três anos no intuito de potencializar a autoria dos educadores e educadoras e
consequentemente o protagonismo das crianças bem como participação e o
envolvimento das famílias e comunidades. Considerou-se a importância da formação
continuada dos diversos atores envolvidos no processo educativo para a ressignificação
de suas práticas, oportunizando temáticas e metodologias que favoreceram o
empoderamento dos mesmos nas diferentes ações no interior das escolas. As diversas
frentes formativas contribuíram para a valorização de profissionais reflexivos,
pesquisadores, autores e observadores das manifestações infantis e das culturas
escolares, refletindo no reconhecimento da criança como sujeito potente que vive o
momento presente.
Palavras chave: autoria, pesquisa, reflexão sobre a prática, ressignificação da prática,
formação continuada.
1. Introdução
No ano de 2013, ao assumir na Secretaria Municipal de Educação, a Diretoria
de Educação Infantil do segmento de zero a três anos,foi considerado pelas profissionais
nomeadas, como ponto de partida fundamental, o levantamento do percurso profissional
constituído até o momento. Contou-se com a memória dos parceiros, profissionais do
segmento, nas diversas atribuições, para assim, ter-se um panorama real das
necessidades formativas, justificando portanto os caminhos escolhidos para trilhar o
percurso dos quatro anos de atuação que se iniciara.
A referida diretoria atende em média três mil e quatrocentas crianças em trinta
escolas, sendo atualmente, 23 em período integral e 7 em período parcial (organização
instituída no ano de 2014 visando servir a demanda da população). As equipes
pedagógicas das unidades escolares são compostas por diretor, coordenador, um
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professor por grupo e agentes de desenvolvimento infantil, bem como cozinheiros e
agentes de serviços operacionais, todos considerados educadores e educadoras, sujeitos
da formação continuada.
Foi estabelecido como objetivo principal a busca do pleno desenvolvimento da
criança, a valorização de seu repertorio cultural, da brincadeira, e da garantia de sua
especificidade em seus aspectos físico, afetivo, intelectual, linguístico e social,
conforme preconizam as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, a
partir de uma perspectiva de criança potente.
O trabalho pedagógico almejado foi voltado aos interesses socioculturais das
crianças, respeitando a autonomia dos educadores e educadoras. Dessa forma, buscou-se
o aproveitamento das experiências dos educadores e educadoras da rede vinculadas à
abordagem educacional que proposta.
Objetivava-se desenvolver políticas de formação voltadas para a reflexão e o
aprimoramento profissional, não restrita às fórmulas mágicas e técnicas frias,
contemplando a dimensão ético política da prática docente que estão relacionadas aos
fazeres pedagógicos e a potencialidade das crianças.
Também intencionou-se valorizar a humanização das relações entre os sujeitos,
a autonomia para o desenvolvimento dos projetos educacionais e a democratização da
gestão escolar, com propostas de ampliar a participação das comunidades locais nos
debates em torno dos projetos e destinos da escola.
Diagnosticadas as potencialidades e as necessidades formativas, iniciou-se o
estabelecimento de parcerias como Instituto Avisa Lá, por alinhar-se às expectativas
com relação a temáticas e estratégias formativas para docentes e equipes gestoras, e
desenvolveu-se modalidades formativas paralelas por nossa equipe com a diversidade
de profissionais das escolas.
Com as Agentes de Desenvolvimento Infantil, foi iniciado um processo de
formação em temáticas básicas e diretamente relacionadas ao quotidiano, no qual
gestores e profissionais convidados planejaram e ministraram, mensalmente, nove temas
de formação denominado “Ciclos do Conhecimento”, de forma a aproveitar e valorizar
os múltiplos saberes dos profissionais do sistema municipal nas ações de formação.
Parcerias e convênios foram estabelecidos para realização de formação inicial em
pedagogia para estes profissionais.
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Para alimentar as discussões foram chamados especialistas e estudiosos que
abarcam a educação infantil e a formação humana, em seus estudos, destacando aqui as
palestras ministradas pelo Professor Marcos Cesar de Freitas, da UNIFESP, acerca das
concepções de infância e de escola.
Paralelamente às formações externas, ofertou-se suporte de qualificação das
formações internas das escolas, que já ocorriam em horários de estudos, de acordo com
as demandas próprias inter-relacionadas com seu o Projeto Político Pedagógico.
Concomitantemente a estes processos, as supervisoras escolares iniciaram com
seu grupo de escolas, processos de formações com as duplas gestoras, buscando
aprofundar os olhares e entendimentos pertinentes a cada realidade, em formato de
grupos de estudos.
Com o intuito de socializar as práticas desenvolvidas nas escolas à partir dos
elementos formativos e de suas individualidades, foram organizadas a Primeira e a
Segunda Semana da Educação Infantil, em julho de 2014 e julho de 2015,
respectivamente.
No decorrer do processo outras modalidades formativas iniciaram, permitindo
que a coletividade dos profissionais das escolas aderisse a cursos livres de curta
duração, através da criação do “Centro de Imaginação e Estudos da Infância Moinhos de
Vento”, posteriormente transformado em Núcleo da Secretaria da Educação.
Os processos formativos iniciados culminaram com os estudos e revisão da
Proposta Curricular Municipal para a Educação Infantil, segmento zero a três anos,
iniciando com seminários preparatórios acerca de questões inerentes ao currículo, em
um processo de adesão voluntária com profissionais representantes das escolas, das
variadas atribuições.
2. Caminhos Percorridos
No início do ano de 2013 foi elaborada uma pesquisa de interesse por temáticas
que fossem ao encontro da coletividade de profissionais das escolas, considerando as
diversas especificidades do segmento, em relação ao educar e cuidar indissociáveis e a
diversidade da formação profissional. Essa pesquisa se fez presente em outros
momentos para definição de outros assuntos.
146
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Acerca das diversas formações anteriormente mencionadas, há especificidades
sobre cada uma das propostas, seja pela temática, público ou formato, que valem a pena
serem descritas, por suas contribuições para a ressignificação das práticas escolares,
conforme abordagem no decorrer do texto.
Tendo sido iniciados em tempos distintos, os caminhos formativos ainda estão
sendo percorridos na atualidade e passam por processos avaliativos constantes,
considerando a importância da reflexão e retomada das ações pelos diversos atores.
2.1 Formação em Rede
Em relação a Formação em Rede, realizada em parceria com o Instituto Avisa
Lá, que atendeu aos gestores e professores foram perpassadas as temáticas “Brincar”,
“Leitura com Crianças Pequenas”, “Movimento e Espaço”, “Gestão Democrática”e
“Tematização da prática”. O formato em rede, que subentende uma formação orgânica
direcionada às supervisoras, equipes gestoras e docentes simultaneamente com questões
similares e específicas para cada grupo, objetivava tornar a formação mais efetiva
possibilitando sua avaliação no processo.
A partir desta parceria fortaleceu-se o papel formador das equipes gestoras e
também da equipe de supervisão, que são compreendidas como coparticipes das práticas
pedagógicas realizadas no interior das escolas.
O “brincar” foi desenvolvido no ano de 2013, prevendo seu aprimoramento nos
anos subsequentes. A “leitura para crianças pequenas” foi desenvolvida ao longo do ano
de 2014. Havia muitas dúvidas sobre estratégias e pertinência de se ler para bebês com
seleção e zelo na escolha das obras literárias.
A partir desta formação ocorreu um movimento no sentido de valorizar
aquisição de livros de qualidade, reconhecer a potência das crianças e a reorganizar os
espaços favorecendo no interior das escolas momentos de leitura individual e coletiva,
bem como a contação de histórias.
A temática “movimento e espaço”,surgiu a partir de um novo diagnostico de
demanda formativa que apontava a necessidade de aprimoramento de estratégias do
trabalho docente que contemplassem a profundidade e extensa relação entre criança
pequena e movimento corporal,sendo desenvolvida no ano de 2015. Paralelamente, e
especificamente com equipes gestoras foram abordadas questões pertinentes ao
147
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processo de formação, como a tematização de práticas, e a qualificação do processo
democrático a partir de discussões e estudos sobre gestão democrática escolar.
2.2 Formação das Agentes de Desenvolvimento Infantil
Integram
o quadro de
profissionais do segmento as
Agentes de
Desenvolvimento Infantil. Essas profissionais tem como exigência de formação o
ensino médio, embora boa parte já possua formação em Pedagogia. Reconhecendo a
importância desta formação, a Secretaria de Educação tem incentivado, através de
convênio com universidade local, o curso de Pedagogia com o seu financiamento
parcial. Para suprir a necessidade formativa das equipes foram organizados os “Ciclos
do Conhecimento”, como formação continuada.
Os “Ciclos do Conhecimento” consistem em mini cursos com duração de nove
horas. Em sistema de rodízio,em que todas as oitocentas Agentes de Desenvolvimento
Infantil do município percorrem as nove temáticas de formação: Sexualidade e
Desfralde, Noções Básicas de Musicalização Infantil, Aprendizagem e Autonomia,
Leitura e Contação de Histórias, Desenvolvimento Motor, Nova Ortografia e Redação
Básica, Legislação Municipal, Ética e Serviço Público, Educador que Protege:
Combatendo a Violência contra Crianças e Adolescentes, Primeiros Socorros.
O princípio dessa formação está em sua constituição teórica e prática sendo
ministrada por profissionais da rede com estudos, pesquisas ou afinidades com as
temáticas elencadas. Um grande desafio foi proporcionar coesão entre todas as
temáticas para que os sujeitos envolvidos percebessem a continuidade do processo
formativo mesmo que em temas distintos.
No momento este processo formativo que teve início em 2013 encontra-se em
processo de finalização. Para o ano de 2016 novas temáticas serão elencadas, bem como
outros possíveis formatos.
A dedicação dos profissionais envolvidos, formadores e cursistas é um ponto
que merece ser destacado. Percebe-se no percurso o fortalecimento do vínculo entre as
Agentes de Desenvolvimento Infantil com a equipe de formação, que em sua maioria é
composta por duplas gestoras das escolas do segmento. Na prática é possível perceber
transformações significativas, tanto com as propostas realizadas com as crianças, como
na postura de educadores e educadoras.
148
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2.3 Grupos de Estudo de Gestores
As supervisoras escolares, a partir de reflexões e estudos, assumiram sua
função formativa junto às suas equipes. Em busca do aprofundamento dos olhares
pertinentes às realidades escolares, cada supervisora iniciou com seus grupos de duplas
gestoras, encontros em formato de grupos de estudo.
Os assuntos e as abordagens partiram de diagnósticos mas também
consideraram as demandas apontadas pelos participes tanto no início quanto no
percurso. Inicialmente, as temáticas versaram sobre variadas questões como gestão
democrática e participativa, gestão de pessoas, organização dos espaços, autonomia da
criança, princípios éticos, estéticos e políticos, entre outros, de acordo com as demanda
então apresentadas.
Nesse processo, além do aprofundamento de questões que partiram da
tematização das práticas, foram fortalecidos os laços profissionais entre gestores e
gestoras bem como a descaracterização do papel da supervisão como uma função à
parte do contexto escolar, consolidando sua parceria com as unidades.
No ano de 2015, a partir do consenso sobre a importância dos estudos para
reelaboração da Proposta Curricular de Educação Infantil, foi proposto o estudo comum
dessa temática, respeitando a diversidade das equipes, possibilitando que cada grupo
pudesse traçar seu próprio percurso.
2.4 Semana da Educação Infantil
A socialização de práticas escolares tem sido valorizada através da “Semana da
Educação Infantil”. Com edição anual, ocorreram em 2014 e 2015, durante cinco dias
no mês de julho. Durante a semana as escolas apresentaram suas propostas através de
painéis e de comunicação oral. Participaram do processo e da apresentação os diversos
profissionais envolvidos bem como familiares das crianças e comunidade.
Em 2014, a temática norteadora foi “Leitura”e, em 2015, “Educação de Corpo
Inteiro”. Comunicar práticas escolares de maneira reflexiva permitiu às equipes um
avanço no senso investigador e cientifico. O público, formado por educadores e
educadoras do sistema e de outras instancias, estudantes, outros profissionais e também
membros da comunidade local e familiares, foi levado a conhecer o interior de cada
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escola, podendo compreender sua história, sua trajetória e especificidades, e reconhecer
a pedagogia da criança pequena como campo de estudo.
A participação das famílias e comunidades locais não apenas como público,
mas como comunicadores das propostas apresentadas transmite a sensação de que há
um movimento considerável sobre a abertura das escolas, o que torna-se bastante
relevante, especialmente ao analisar historicamente o conceito de creche como
instituição assistencialista, e que atualmente é entendida em sua especificidade
educacional, com vínculos fortalecidos nos bairros, comunidades e culturas,
estabelecendo relação de respeito e parceria mútuos.
2.5 Centro de Imaginação e Estudos da Infância Moinhos de Vento
O Centro de Imaginação e Estudos da Infância Moinhos de Vento foi uma
iniciativa da referida Diretoria para contribuir com o processo de formação integral de
educadores e educadoras, prioritariamente no que concernia a educação infantil de 0 a 3
anos, mas estendendo a proposta a todos os segmentos da Secretaria Municipal de
Educação. Assumiram a coordenação e ministram cursos e vivencias, arte-educadores
do sistema municipal de educação e profissionais convidados.
Tendo como proposta a constituição em um espaço contínuo de vivência,
experimentação, intercâmbio de estudos e práticas, construção e divulgação de
conhecimento, as investigações dialogam com perspectivas histórica, científica, estética,
ética, sensível, imaginativa, corporal e criativa, como com políticas e práticas relativas à
infância e a escola.
Os temas oferecidos aos profissionais da escola, ocorrem fora do horário de
trabalho por adesão voluntária. As temáticas oferecidas até o momento consideram
vivencias corporais como pressuposto para as reflexões e a dialogicidade, incluindo a
necessidade e a valorização das criações manuais, como construção de brinquedos
personalizados, de elementos naturais numa concepção da integralidade do sujeito.
Os assuntos abordados relacionam-se com o contexto escolar e com a formação
humana, sendo: experimentação e estudos sobre a cultura afro-brasileira, a arte de
contar histórias, formação instrumental de arte-educadores e a arte de criar com as
mãos.Destaca-se a participação de Renata Meireles e Teca de Alencar, convidadas a
150
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ministrar cursos de curta duração aos profissionais da rede sobre os diferentes tempos
do brincar e o fazer musical com crianças pequenas, respectivamente.
2.6 Reelaboração da Proposta Curricular de Educação Infantil
O processo de reelaboração da Proposta Curricular de Educação Infantil do
segmento de zero a três anos, inseriu-se num contexto mais amplo de revisão das
Propostas Curriculares dos demais segmentos no Município, e teve início com
seminários preparatórios. Os temas desenvolvidos tiveram a intenção de alimentar
teoricamente seus participantes para as discussões que ocorreriam durante o processo de
elaboração coletiva do documento. Foram convidados palestrantes que, pelo seu
trabalho de pesquisa, tivessem propriedade para lidar com os diferentes temas
fundamentais do Currículo em Educação Infantil.
Cisele Ortiz introduziu os estudos com a palestra “Desvendando o Currículo na
Educação Infantil”, seguida da pesquisadora Silvia Maria Pereira de Carvalho, com o
tema Adaptação, escola e família. Bruna Ribeiro discutiu sobre Avaliação na Educação
Infantil, Silvana Augusto salientou a diversidade da infância com a temática das
Linguagens de Crianças; a pesquisadora Elsa Corsi, trouxe a discussão da proteção, do
cuidado e afeto com as crianças pequenas, Isabel Porto Filgueiras abordou a
corporeidade, Isabel Aparecida Mayer discutiu conosco a questão da diversidade e
Virgínia Gastaldi desenvolveu o tema Crianças da Natureza.
Para que esta construção se tornasse realmente significativa e conferisse
comprometimento à sua consecução, a adesão voluntária foi fundamental e garantiu um
público atento e envolvido, com disponibilidade para participar dos seminários
preparatórios, permitindo a representatividade das escolas do segmento nestes encontros
coletivos.
Os representantes das escolas discutiram com seus grupos, em reuniões
pedagógicas, os temas abordados nas palestras. O mesmo colegiado formado pelos
profissionais em cada unidade escolar, estudou textos sugeridos relacionados ao
currículo nos grupos de estudos de gestores.
Atualmente a Proposta Curricular está em fase de análise e reelaboração, sendo
o princípio desse processo a construção coletiva e participativa. Os estudos acontecem
em pequenas comissões formadas por supervisores, diretores, coordenadores
151
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pedagógicos, professores e agentes de desenvolvimento infantil. As etapas contemplam
reflexão sobre as práticas, pesquisa, leituras, análise e seleção bibliográfica, análise dos
textos produzidos pelas equipes escolares para discussão das ideias a serem agregadas
ao texto do documento da proposta curricular.
O trabalho coletivo entre todos os sujeitos da escola foi intencional, para que a
Proposta Curricular seja reconhecida e seja refletida nas práticas diárias. Com caráter
amplo e não prescritivo busca-se a escrita de um documento que ofereça subsídios aos
educadores e educadoras na garantia dos saberes essenciais às crianças, mas que
valorize e proponha o trabalho autoral e singular, considerando a especificidades e
diversidades.
3. Pressupostos Teóricos
Inserida em um contexto maior, a Diretoria de Educação Infantil do segmento
de 0 a 3 anos participou, como as demais Diretorias, de estudos para definição das
“Diretrizes Pedagógicas Fundamentais Iniciais da Secretaria Municipal de Educação”.
Este processo, que contemplou equipes gestoras, educadores e educadoras das unidades
escolares, dos segmentos de educação infantil de 4 e 5 anos e fundamental, bem como
os membros da Secretaria, norteou a escrita do documento com embasamento teórico da
Pedagogia Crítica, com forte influência do pensamento de Paulo Freire, e também
Michael W. Apple, Hannah Arendt, Henry Giroux, Antonio Joaquim Severino, Miguel
Arroyo, entre outros,sendo intitulada “Educação como Ação Política Transformadora”.
Desta forma, buscou-se no âmbito das formações deste segmento, caminhar em
comunhão com os princípios da Pedagogia Crítica conversando com autores e propostas
que consideram a criança como sujeito histórico e de direitos. A pedagogia Crítica
compromete-se com uma educação transformadora, voltada para a humanização dos
sujeitos, através da construção dos ideais de paz, liberdade e justiça social, por meio da
instauração de processos dialógicos e participativos de gestão que levem em
consideração a reflexão sobre a prática dos educadores e educadoras, potencializando
sua busca pela emancipação.
Defende assim, novas formas de organização do processo de ensino e
aprendizagem, que considerem a integralidade do educando, valorizando e incorporando
152
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os seus saberes ao processo educativo, considerando-os em suas diversidades e
singularidades.
Fundamentalmente organizou-se o estudo aprofundado das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Básica e Educação Infantil, não somentepelo
entendimento de seu caráter mandatório mas, principalmente, pela percepção da
possibilidade de ampliação do olhar à partir de seus desdobramentos, como os “Anais
do I Seminário Nacional: Currículo em Movimento – Perspectivas Atuais”, (2010), e
autores como Zilmade Moraes Ramos de Oliveira, Marcia Aparecida Gobbi, Mônica
Appezzato Pinazza, Rita Coelho, Maria Carmem Silveira Barbosa, Tizuko Morchida
Kishimoto, Lea Tiriba, Ana Lucia Goulart de Faria, Cisele Ortiz,entre outros.
4. Desdobramentos da Experiência
Refletindo acerca dos caminhos percorridos, foi verificado nos processos
formativos que consideram inscrições voluntárias, com público diversificado, um salto
na possibilidade de oportunizar o envolvimento de educadoras e educadores autores e
autônomos em relação a sua prática. Nesta perspectiva são incluídos profissionais de
apoio, nem sempre entendidos e valorizados como educadores em potencial.
Desta forma vislumbrou-se ofertar novas formações e permanecer investindo
nas temáticas que estão em andamento, possibilitando aos profissionais a busca da
formação continuada fora de seu horário de trabalho além da permanência das
formações específicas.
O potencial formativo dos educadores e educadoras da rede também é um
diferencial sob a ótica do reconhecimento e da valorização profissional. No caminho
percorrido até o presente momento foram identificadas figuras que se destacam no perfil
de formadores tanto pelo aprofundamento cientifico e teórico quanto pela qualidade de
suas formações estabelecendo vínculos afetivos e colaborando com a transformação das
práticas escolares.
Acredita-se que com isso seja possível propiciar formações cujas temáticas,
metodologias e equipe formadora seja pensada e gerenciada pelos próprios
profissionais, em sistema de coautoria.
Outro ponto percebido foi a necessidade de permitir que profissionais da
educação iniciassem um caminho formativo considerando a corporeidade como
153
ISSN 2448-1157
fundamental dimensão a ser estudada, mas acima disso, vivenciada e experimentada, o
que tem sido fomentado nas formações atuais e tendencialmente será um dos eixos para
os anos sequentes.
5. Resultados Obtidos
Atualmente, as equipes escolares tem procurado melhorar suas práticas, se
arriscando mais, repensando suas atitudes e questionando seu papel profissional:ponto
imprescindível para a produção de conhecimento.
As escolas têm liberdade para colocar em prática seus saberes adormecidos, e
ora apresentam excelentes resultados, ora faz-se necessário o repensar, e assim através
do diálogo com as supervisoras e com os outros formadores, novos saberes são
construídos e crenças são renovadas.
O elo criado entre equipes gestoras com os sujeitos de suas escolas, numa
proposta democrática e participativa, aponta para a permanência dos educadores e
educadoras no mesmo local de trabalho em oitenta porcento ao final de um ano letivo.
Seja pela proposta de trabalho que se configura geralmente como bi ou tri anual, seja
pelas relações humanas fortalecidas.
Professores e professoras apresentam propostas planejadas considerando a
parceria com as agentes de desenvolvimento infantil que consideram o respeito ao
tempo da criança, sua necessidade de interagir com crianças de idades diferentes, em
espaços distintos e com diversidade de materiais, repercutindo em períodos de
adaptação mais tranquilos, escolas vivas, com movimento criativo a todo tempo.
A criança, vista então como protagonista das ações é quem torna-se o foco das
observações dos profissionais, bem como é compreendida e valorizada em sua
autonomia para fazer escolhas, manifestar e apropriar-se de saberes. Rompe-se desta
maneira o formato de aulas em que o professor é o centro da proposta. Educadores e
educadoras trabalham em parceria para que a criança tenha seus direitos garantidos,
inclusive o da livre escolha, em ambientes convidativos, desafiadores e diversos.
Alguns paradigmas foram rompidos, trazendo à tona a valorização do vínculo
afetivo - essencial para o processo indissociável entre cuidar e educar - a atenção e
respeito às linguagens não verbais e expressividades, e a qualidade das propostas
planejadas, que cada vez mais se desenvolvem pela a criança do que sobre ou para a
154
ISSN 2448-1157
criança. Desta forma, regras ocultas que permeavam as escolas em seu processo
histórico começam a ser questionadas e rompidas interna e externamente.
As equipes escolares envolvem familiares e comunidade local para que ocorra
um real entrosamento entre a instituição e a sociedade. Observa-se diversos projetos
acontecendo nas unidades escolares com a participação efetiva desses sujeitos ao longo
do ano, assim como nos momentos de reunião de pais em que são realizadas palestras,
oficinas ou mesmo bate papos, com temáticas de interesse daquela escola ou
comunidade.
Há maior compreensão e valorização do trabalho realizado dentro da escola, e
propostas em que a criança seja protagonista do momento da entrada até a saída tiveram
valor agregado. Familiares encontram suas crianças brincando, interagindo,se possível,
brincam juntos. A preocupação das famílias em receber a criança limpa e alimentada,
pronta para dormir, pouco existe, tanto quanto o número de queixas recebidas na
Secretaria Municipal de Educação, que reduziu noventa porcento.
6. Considerações Finais
O presente trabalho objetivou apresentar a importância das políticas públicas
voltadas para a formação profissional. Os caminhos percorridos pela Diretoria de
Educação Infantil do segmento de 0 a 3 anos à partir da concepção adotada, da
Pedagogia Crítica e da criança como protagonista das ações educativas.
Há consenso, nesta perspectiva pedagógica, de que o trabalho com a formação
prioriza o movimento “ação reflexão ação” dos sujeitos envolvidos em todo o processo
e nos diferentes papeis assumidos, os que promovem a formação,os que participam dela
e os que assumem o papel de formadores.
Nesse processo agiu-se à partir de um diagnóstico, que permitiu valorizar o
percurso trilhado por toda a rede, estabelecendo algumas ações que pudessem colaborar
com as problemáticas levantadas, proporcionando subsídios para as mudanças
vislumbradas.
Enfim, a qualidade do atendimento às crianças de 0 a 3 anos teve um
crescimento notável, porém há e sempre haverá muitos caminhos a serem percorridos,
sendo o principal deles a ressignificação da formação profissional que aprimora,
fortalece e valoriza os educadores e educadoras sem perder de vista o principal sujeito
deste processo, que é a criança.
155
ISSN 2448-1157
7. Referências bibliográficas
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156
ISSN 2448-1157
Movimentos sociais e a luta pelo acesso e qualidade na Educação Infantil no
Brasil57
Janaína Vargas de Moraes Maudonnet58
Introdução
Esse artigo tem como finalidade apresentar o projeto de pesquisa: “Movimentos
sociais e infância: Um estudo sobre Fóruns Municipais de Educação Infantil no
Brasil”, iniciado em fevereiro de 2015, na Faculdade de Educação da Universidade de
São Paulo. Trata-se de uma pesquisa empírica em um Fórum Municipal de Educação
Infantil, na qual pretende-se analisar como esse movimento se articula localmente para
o enfrentamento dos desafios nessa etapa de educação, compreender suas dinâmicas
internas e como são estabelecidas as relações com o poder público e com outros
movimentos sociais.
A história da Educação Infantil no Brasil, em especial após o final da década de
1970, foi marcada por intensas mobilizações sociais em torno do acesso e da qualidade
do atendimento nessa modalidade de educação. Com o processo de redemocratização do
país, a sociedade civil encontrou espaço para a luta por direitos, e os movimentos
relacionados à educação infantil floresceram e se fortaleceram. O movimento de
mulheres na luta por creches na cidade de São Paulo é um exemplo dessa mobilização.
Rosemberg, Campos e Haddad (1991) e Gohn (1985) assinalam o papel decisivo desses
grupos na ampliação do atendimento público em creches nessa época.
Na Constituição Federal de 1988 aparece pela primeira vez, como dever do
Estado, “o atendimento em creches e pré-escolas às crianças de 0 a 6 anos” (Artigo 208,
Inciso IV); e como um direito de trabalhadores homens e mulheres, na zona rural e
57
Este texto trata-se de Projeto de Pesquisa de Doutorado iniciado em Fevereiro de 2015 na Universidade
de São Paulo/ USP.
58
Doutoranda em Educação na Universidade de São Paulo/USP
157
ISSN 2448-1157
urbana, “a assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 6 anos
de idade em creches e pré-escolas” (Artigo 7º, Inciso XXV).
A promulgação da Constituição Federal e doEstatuto da Criança e do
Adolescente (1990) que visaram garantir, entre os direitos fundamentais das crianças, o
acesso e a qualidade do atendimento na Educação Infantil, juntamente com as pesquisas
na área que constatavam a falta de uma política nacional e a precariedade das
instituições (CANAVIEIRA, 2010; NASCIMENTO, 2003; ROSEMBERG, 2002;
CAMPOS; FULLGRAF; WIGGERS, 2006; MONÇÃO, 2013) impulsionaram, nos anos
1990, um amplo debate sobre essa etapa de educação no país, com seminários nacionais
e a participação ampla de profissionais da área, pesquisadores, universidades e
movimentos sociais, o que gerou a produção de diversos documentos (ROSEMBERG,
2002), que visavam estabelecer uma política de Educação Infantil.
Entre os anos de 1994 e 1996, a Coordenadoria de Educação Infantil – COEDI,
do Ministério da Educação – MEC, na busca de socializar o conhecimento produzido na
área pelas universidades e grupos de pesquisa, lançou uma série de publicações que
traduziram esses conhecimentos em práticas que respeitassem as crianças nas
instituições educativas. Dentre eles, destaca-se os Critérios para um atendimento em
creche que respeitem os direitos fundamentais das crianças (BRASIL, 1995). O
documento estabelecia doze direitos que visavam garantir o respeito à singularidade da
Educação Infantil e à integralidade do atendimento à criança em suas necessidades
físicas, emocionais e sociais.
Publicada em 1994, a Política Nacional de Educação Infantil estabelecia metas
para a ampliação e permanência nas instituições de educação infantil públicas com
qualidade. Foi finalizada no Governo Itamar Franco (1992/1994) após ampla discussão
com segmentos governamentais e não governamentais envolvidos na área e teve o apoio
da Comissão Nacional de Educação Infantil (BARRETO, 2002).
Dois anos depois foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (Lei nº 9.394/96), que definiu a Educação Infantil pela primeira vez como
“primeira etapa da educação básica”, afirmando que esta etapa educativa deveria ser
submetida a “padrões mínimos de qualidade”, operacionalizados “por variedade e
quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis para o desenvolvimento do
processo ensino-aprendizagem” (Art. 5o. §2o.).
158
ISSN 2448-1157
Após o ano de 1996, houve uma quebra na condução das políticas de educação,
em especial de Educação Infantil, segundo Rosemberg (2002). A autora aponta que o
período fértil de debate sobre a área da Educação Infantil no país foi interrompido em
meados do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), que adotou
as regulamentações do Fundo Monetário Internacional (FMI) e os princípios do Banco
Mundial para a implantação das políticas educacionais, retomando as propostas dos
anos de 1970 e 1980, com a “prioridade absoluta de investimentos públicos no ensino
fundamental e a retomada de propostas de programas ‘não formais’ a baixo
investimento público de Educação Infantil para crianças pequenas pobres”
(ROSEMBERG, 2002, p. 42).
Embora a política do Ministério da Educação tenha se modificado, e os debates
com a participação de associações civis, pesquisadores e universidades promovidos por
esse órgão tenham sido interrompidos, o debate na área continuou intenso no Brasil. Em
1998, o Conselho Nacional de Educação, estabeleceu um “amplo diálogo com
segmentos responsáveis pelo atendimento de crianças de 0 a 6 anos” (CONSELHO
NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 1999, p. 2) e publicou as primeiras Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. De caráter mandatório, tinha como
principal objetivo orientar as instituições de Educação Infantil na organização, na
articulação, no desenvolvimento e na avaliação de suas propostas, além de estabelecer
paradigmas para a concepção de programas de cuidado e educação, visando discutir e
propor melhorias na qualidade do atendimento.
Os debates da área não ocorreram apenas em escala nacional, uma vez que as
mudanças legislativas na Educação Infantil criaram demandas para os gestores das
políticas públicas nos municípios e estados brasileiros. Esses gestores passaram a
realizar, em seus respectivos níveis, encontros para a discussão de políticas para a
infância. Os encontros envolveram entidades, movimentos sociais, estudiosos e
militantes, cujas atuações “a partir de mobilização social e sistematização de ações,
levam à criação de fóruns de Educação Infantil, engajados na defesa do direito e na
proposição de políticas, somando-se aos demais atores envolvidos” (FLORES, 2010, p.
30).
A criação de fóruns de Educação Infantil em diferentes regiões do país
impulsionou a instituição, em 1999, do Movimento Interfóruns de Educação Infantil do
159
ISSN 2448-1157
Brasil – MIEIBI. Movimento que se constituiu como um relevante espaço de pressão
sobre as políticas públicas nacionais e que, a partir do 1º Governo Lula (2003-2006),
com a retomada dos debates entre Estado e sociedade civil, passou a contribuir na
elaboração de diversas publicações produzidas tanto no âmbito do Ministério da
Educação, quanto do Conselho Nacional de Educação (CNE).
Entre esses documentos, destaca-se a nova versão da Política Nacional para a
Educação Infantil, lançada em 2006. Constituída a partir da realização de oito
seminários nas diferentes regiões do país com representantes de secretarias municipais
de educação e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME),
ampliou as metas do Plano Nacional de Educação (Lei nº 10.172/2001)59 – e apontou
as estratégias do Ministério da Educação para alcançá-las. Entre elas estavam a inclusão
da Educação Infantil no sistema de financiamento da Educação Básica, de modo a
responsabilizar também a União no atendimento as crianças de 0 a 6 anos, em
consonância com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e
de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb); a definição de parâmetros
nacionais de qualidade para o atendimento nas instituições de Educação Infantil,
considerando as legislações vigentes, as teorias e as pesquisas da área e a elaboração de
padrões de infraestrutura para o funcionamento adequado das instituições de Educação
Infantil, considerando as características regionais.
Mais recentemente, no intuito de auxiliar no processo de elaboração das novas
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, a Coordenadoria de
Educação Infantil do Ministério da Educação – COEDI – estabeleceu convênio de
cooperação técnica com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Dessa parceria,
gerou o documento Práticas cotidianas na Educação Infantil: bases para a reflexão
sobre as orientações curriculares, que também emergiu “de um processo significativo
de consulta e participação de várias instâncias comprometidas com a Educação Infantil
no Brasil, desenvolvido no segundo semestre de 2008” (BARBOSA, 2009, p. 6) e que
teve como uma das fontes:
59
Dentre as metas para a Educação Infantil no Plano Nacional de Educação, destaca-se: o atendimento de
50% da população de até 3 anos de idade e 80% das crianças de 4 e 5 anos até 2010; o estabelecimento de
um Programa Nacional de Formação de Profissionais da área; a definição de políticas municipais de
Educação Infantil e de projetos pedagógicos para essa etapa; a implantação de sistema de
acompanhamento, controle e supervisão na forma de apoio técnico-pedagógico, inclusive em parceria
com universidades.
160
ISSN 2448-1157
a voz de professores e militantes que há muitos anos atuam em defesa da
educação infantil, através da análise tanto das respostas aos questionários
enviados ao Movimento Interfóruns de Educação Infantil Brasileiro – MIEIB
– quanto da discussão sobre práticas cotidianas na Educação infantil,
realizada em encontro nacional ocorrido em Porto Alegre. (BARBOSA,
2009, p. 6)
A evidência da participação das associações civis organizadas, especialmente o
MIEIBI, nas políticas públicas, é explicitada tanto nos documentos oficiais, quanto nas
pesquisas que se debruçam sobre o tema, em especial Rosemberg (2002); Nunes (2010);
Flores (2010); Canavieira (2010). Todavia, essa participação não se deu sem fortes
embates. As políticas públicas destinadas às crianças sempre foram palco de
contradições e concepções diferenciadas por parte dos diferentes atores sociais. Apesar
dos diversos documentos pautados na garantia do acesso e do atendimento com
qualidade na Educação Infantil, a área é marcada por grandes controvérsias e tensões
que se refletem nas políticas públicas e nas práticas cotidianas vividas com as crianças
pequenas.
Um caso exemplar desse tensionamento entre políticas públicas nacionais e
movimentos sociais foi o “Movimento Fraldas Pintadas”, encabeçado pelo MIEIBI.
Com o slogan: “Direito à educação começa no berço e é pra toda a vida", diversas
entidades sociais - entre elas, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Fundação
Abrinq, Marcha Mundial de Mulheres, Articulação de Mulheres Brasileiras, Frente
Parlamentar da Criança e do Adolescente - saíram em passeata em frente ao Congresso
Nacional exigindo a inclusão do segmento de 0 a 3 anos no Fundeb, o que mais tarde
aconteceu, fruto dessa pressão.
Em que pesem os tensionamentos entre as políticas públicas e as associações
civis, é incontestável o avanço legal na área de Educação Infantil. Mas, ao mesmo
tempo que pesquisadores concordam com esses avanços, os mesmos vêm apontando o
distanciamento entre os preceitos legais e o cotidiano vivido nessas instituições
(ROSEMBERG, 2002; COUTINHO, 2002; CORREA, 2003; CAMPOS, FÜLLGRAF;
WIGGERS, 2006; HADDAD, 2006; MONÇÃO, 2013).
Um dos principais desafios da área é o acesso, em especial no segmento creches,
que atende bebês e crianças bem pequenas – 0 a 3 anos de idade. Há um aumento
161
ISSN 2448-1157
crescente da demanda pela Educação Infantil derivado da maior participação das
mulheres no mercado de trabalho
60
e do aumento do número de pesquisas que
demonstram a importância das instituições de educação coletiva para o desenvolvimento
infantil. Todavia, a oferta de vagas ainda está bem abaixo da demandada 61.
Para além da falta de vagas para grande parte da população que demanda o
acesso a creches no país, a fragmentação entre creche e pré-escola - e destas com os
anos iniciais do Ensino Fundamental - com políticas públicas e financiamento
diferenciados; as tensões que envolvem o currículo para a área – ainda polarizados
historicamente entre um caráter tutelar/substitutivo da família ou através de objetivos
preparatórios/compensatórios – a falta de uma formação de educadores coerente com a
especificidade dessa etapa de educação têm sido alguns dos desafios da área enfatizados
nas pesquisas.
Esses desafios são reveladores de que é imprescindível a manutenção das lutas
dos movimentos sociais para a garantia dos direitos fundamentais das crianças
pequenas. A pesquisadora Maria Malta Campos ressalta a importância e a necessidade
da atuação desses atores sociais para vencê-los:
Existem grupos e setores importantes que lutam para transformar em
realidade as conquistas legais: os Fóruns Municipais e Estaduais de Educação
Infantil e o Mieibi – Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil,
assim como a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, são exemplos
desses esforços. Outras organizações, como a Undime – União Nacional dos
Dirigentes Municipais de Ensino, a Anped – Associação Nacional de PósGraduação e Pesquisa em Educação, sindicatos e entidades da sociedade civil
também têm se mobilizado em favor da Educação Infantil. O desafio está
posto e a sociedade brasileira possui condições para enfrentá-lo no presente.
(CAMPOS, 2006, p. 99)
60
Dados do PNAD/IBGE apontam o crescimento da participação das mulheres no mercado de
trabalho. Em 1992, essa participação correspondia a 52,5% , já em 2012 essa porcentagem subiu
para 61%,
61
Segundo dados do IBGE; MEC/INEP de 2012, a população no Brasil correspondente a faixa
etária de 0 a 3 anos, é de 11.234.753, das quais apenas 2.531.129 – ou seja, 22,53% - estão
matriculadas em creches. O Plano Nacional de Educação de 2001 tinha como meta a cobertura
de 50% dessas crianças, meta mantida no novo Plano aprovado em 2014.
162
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Movimentos sociais no Brasil: um breve histórico
A demanda pela Educação Infantil e, especificamente por creches, é histórica e
pautou muitas ações coletivas nos bairros das periferias da cidade de São Paulo. A
história das organizações sociais de luta pelo acesso e a qualidade dessa etapa educativa
possui pontos de convergência em relação à trajetória dos movimentos sociais no país.
Intensas mobilizações, especialmente de mulheres trabalhadoras, foram
observadas no final da década de 70. O movimento de “mulheres na luta por creches” na
cidade de São Paulo é um exemplo. Rosemberg; Campos; Haddad (1991) assinalam o
papel decisivo desses grupos na ampliação do atendimento público institucional para a
educação e cuidado dos bebês e crianças pequenas nessa época.
Entre as décadas de 70 e 80 foram muitas as experiências da condição proletária
que compunham o cotidiano das populações de São Paulo, uma heterogeneidade que
prenunciava movimentos e valores muito diversos (SADER, 1988, p. 142). Contudo, é
notável a vitalidade de movimentos sociais que reelaboraram as condições vividas pelos
trabalhadores na época, marcadas por: uma constante remodelação da paisagem urbana,
definida por Sader, como “Voragem do progresso”; uma grande migração e como
consequência um “desenraizamento” dos lugares de origem; mobilização das relações
informais para superar os desafios cotidianos e; experiências tanto de desemprego como
de exploração nos empregos formais nas indústrias.
Desses condicionantes emergiram novos significados, por onde esses agentes proletários moradores da cidade de São Paulo -
identificaram suas realidades e
elaboraram suas representações. Para essa elaboração, afirma Sader, três grandes
matrizes discursivas – categorias de nomeação e interpretação - se constituíram na
“nomeação do vivido”: a Igreja Católica – através da imagem de Cristo como
referência para luta e libertação; a esquerda revolucionária de matriz marxista e; o
sindicalismo institucional. Os movimentos sociais recorreram a essas matrizes ao se
constituírem e as adaptaram, mesclaram e transformaram dependendo da situação.
Nesse contexto, um novo sujeito emergiu em um novo espaço político, marcado
pela experiência do cotidiano, pela reivindicação de direitos a partir da consciência de
seus interesses e vontades próprias e pela criação de novas práticas, constituídas pela
163
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imprevisibilidade dos acontecimentos e por uma solidariedade nascente. É nesse
contexto que se insere a luta das mulheres por creche entre as décadas de 70 e 80.
As classes populares se organizam em uma extrema variedade de planos,
segundo o lugar de trabalho ou de moradia, segundo algum problema
específico que as motiva ou segundo algum princípio comunitário que as
agrega. Em cada forma de organização se manifesta a obsessiva preocupação
com a própria autonomia. Suas formas de expressão são as mais variadas,
mas privilegiam as “ações diretas”, através das quais manifestam suas
vontades. Por isso tudo são muito intermitentes, mutáveis, ágeis, tanto quanto
instáveis”. (SADER, 1988, p. 313).
Doimo (1995) observa uma significativa mudança discursiva após o período de
redemocratização do país e demonstra que expressões como “democracia como valor
universal”, “movimentos sociais organizados”, “participação da sociedade e nas
decisões”, passam a ser utilizadas em lugar dos conceitos de “democracia de base”,
movimentos populares” e “luta contra o Estado”, comumente utilizadas no período
anterior.
Os grupos de esquerda que antes estavam comprometidos com a revolução
social, passaram a assumir crescentes compromissos com o sistema partidário e com o
Estado; as Organizações Não Governamentais passaram a incorporar critérios de
eficácia e focaram na elaboração de ações propositivas para políticas públicas em
detrimento das assessorias aos movimentos populares; e a Igreja Católica “oficial”,
antes comprometida com os movimentos populares adquiriu uma outra orientação que a
afastou desse segmento. (DOIMO, 1995)
Novos arranjos de força e novas formas de reacomodação das lideranças dos
movimentos sociais aconteceram nesse período. Se antes havia uma negação
indiscriminada à participação institucional e se privilegiava a ação direta como
estratégia de reivindicação, após a abertura política, afirma Doimo (1995), percebe-se
uma redefinição e uma nova postura nas relações entre sociedade e Estado, através de
ações ativo-propositivas na busca de alteração dos aparatos políticos e maiores
reivindicações e conquistas de dispositivos institucionais de participação mais direta.
A institucionalização da participação dos movimentos sociais significava para
esses sujeitos, a possibilidade do atendimento das demandas por meio de negociações,
164
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tendo em vista o orçamento disposto. Tratava-se da capacidade dos grupos de interesse
em influenciar, direta ou indiretamente as prioridades, diretrizes e formulações das
políticas públicas. É no contexto de institucionalização da participação dos movimentos
sociais que proliferaram os fóruns municipais, regionais e estaduais de Educação
Infantil no Brasil, que impulsionaram a criação do Movimento Interfóruns do Brasil MIEIBI.
O estudo da trajetória dos movimentos sociais no Brasil apontam questões
orientadoras para a pesquisa a ser desenvolvida: Que marcas esses diferentes momentos
históricos vividos pelos movimentos sociais no país trazem para as identidades dos
militantes na área de Educação Infantil? Quais são as matrizes discursivas atuais dos
movimentos e em que medida se aproximam ou se distanciam dos ciclos anteriores?
Quais as mudanças e permanências entre as formas de atuação contemporânea e as
estratégias dos ciclos anteriores?
O quadro teórico dessa pesquisa está embasado nos estudos de Tilly (1981;
1999),
Tarrow (2009) e Castells (1974 e 1978), que ressaltam a perspectiva de
movimento social enquanto sujeito social coletivo, que precisa ser analisado em seu
contexto histórico e conjuntural, de modo a compreender como organizam as ações
coletivas e a partir de que frames e repertórios orientam suas ações.
Metodologia de Pesquisa
O Projeto de Doutorado “Movimentos sociais na Educação Infantil:
dinâmicas internas e interfaces com o Estado”, tem como objetivo conhecer e analisar
o papel que Fóruns de Educação Infantil têm desempenhado na defesa dos direitos das
crianças e na proposição de políticas públicas para a infância. Pretende-se, a partir de
um estudo de caso,reconstruir a história de um Fórum Municipal de Educação Infantil,
identificando os princípios defendidos coletivamente; a natureza de sua mobilização; as
dinâmicas internas - posicionamentos, disputas, tensões e contradições entre seus atores;
suas estratégias de atuação e; as dinâmicas de interlocução, colaboração e/ou
enfrentamento tanto com os órgãos governamentais, como com outros movimentos
sociais, quer sejam locais e/ou nacionais.
Os instrumentos de registro serão compostos por notas de campo, coleta e
análise das produções do grupo, entrevistas com os militantes do Fórum – tanto aqueles
165
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que participaram de sua fundação quanto àqueles que se agregaram ao longo da
trajetória do movimento - e gravações por meio de áudio ou vídeo das falas e ações
observadas.
Considerações Finais
Reconstruir e analisar a história de um movimento social possibilita
compreender o papel que esses grupos têm desempenhado e podem desempenhar na
defesa dos direitos das crianças ao atendimento na Educação Infantil, o que pode
contribuir com o avanço das lutas na área.
Há pesquisas sobre movimentos sociais e suas lutas por creches, especialmente
na década de 1980, durante o processo de redemocratização do Brasil (ROSEMBERG;
CAMPOS; HADDAD, 1991; MUNERATO, 2001; FARIA, 2005), mas poucas se
debruçam sobre esses movimentos a partir da década de 1990 até o presente, com
destaque para os trabalhos de Flores (2010), Nunes (2010) e Canavieira (2010) que
discutem especificamente a contribuição do Movimento Interfóruns de Educação
Infantil do Brasil – MEIBI para o avanço da área de educação infantil.
Tanto Flores (2010) como Canavieira (2010) analisam algumas marcas
históricas da construção do direito à Educação Infantil, retomando o ordenamento legal
que marca essa etapa de educação. Neste percurso, apresentam o Movimento
Interfóruns de Educação Infantil e elencam algumas estratégias utilizadas por esse
movimento para o enfrentamento dos desafios da área, evidenciando que a conquista de
direitos foi fruto da mobilização de movimentos sociais, mais especificamente do
MIEIB.
Já Nunes (2010) sistematiza os estudos realizados pelo Grupo de Pesquisa
“Educação Infantil e Movimentos Sociais: um estudo sobre o Movimento Interfóruns de
Educação Infantil Brasileiro” coordenado por ela na Universidade Federal Fluminense.
A autora realiza uma análise geral desse movimento, baseando-se nos documentos
referentes aos encontros nacionais por ele promovidos. Para tanto, apresenta um breve
histórico de seu surgimento, alguns desafios enfrentados ao longo dos anos na busca de
expansão e articulação nacional e sua agenda de lutas, na qual se destaca a preocupação
com o fortalecimento da Educação Infantil enquanto campo de conhecimentos, de
166
ISSN 2448-1157
atuação profissional e de política educacional pública. Nunes conclui evidenciando que
o MIEIBI se transformou em um espaço público, participativo e combativo diante das
demandas da área.
As definições legais e as políticas nacionais têm criado uma identidade para a
Educação Infantil e impulsionado uma série de políticas públicas em nível municipal.
Políticas essas, nem sempre coerentes com os avanços da legislação e das publicações
oficiais da área. Considerando que é em nível municipal que as condições objetivas de
funcionamento das instituições se dão, a articulação local da sociedade civil –
juntamente com os movimentos nacionais – para o monitoramento, a proposição dessas
políticas e o enfrentamento dos desafios da área é de grande relevância. Todavia, não
foram encontradas evidências de estudos relativos à atuação de Fóruns estaduais,
regionais ou municipais de Educação Infantil no país, o que traz a essa pesquisa um
caráter inédito.
167
ISSN 2448-1157
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O Embate entre a Assistência e a Educação no Campo da Educação Infantil 62
Joselaine Cordeiro Pereira63
Este artigo, fruto do texto dissertativo, intitulado “Educação Infantil no
município de Juiz de Fora: múltiplas dimensões de um campo social” (PEREIRA,
2008), apresenta as múltiplas dimensões da Educação Infantil entendidas como um
campo denso que congrega vários agentes sociais em disputa. Partiu-se do pressuposto
de que as investigações em torno da temática do atendimento à infância demandam
interpretá-la como denso campo de disputa. Assim, o objetivo da pesquisa foi analisar a
constituição no campo do atendimento à infância, especificamente no Município de Juiz
de Fora, Minas Gerais, a partir dos processos históricos e políticos inscritos no período
de 1978 a 1988, mapeando o atendimento à infância, buscando caracterizar os agentes
sociais desse campo.
A pesquisa qualitativo-exploratória, sob o enlace interpretativo, dialogou com
os pressupostos teóricos de Pierre Bourdieu (1983, 2000), bem como dos autores que
tratam da Educação Infantil no Brasil como Lívia Maria Fraga Vieira (2002), Maria
Malta Campos (1991, 1999, 1993), Moysés Kuhlmann Jr. (1998, 2005), Sônia Kramer
(1984) e Márcia Veiga (2005). Os métodos e as técnicas demarcaram a base de dados
documental, ou seja, as análises do conjunto de informações contidas em documentos
oficiais e periódicos locais de circulação diária, regional como: Diário Mercantil (1978
a 1983), Tribuna de Minas (1984 ao primeiro semestres de 1986) e Tribuna da Tarde
(1986 a 1988) e os 41 boletins do movimento social Unibairros (1980 a 1989). Esse
percurso se justificou pela possibilidade de aproximação empírica singular dos
acontecimentos locais enleados por processos e agentes sociais não captados pelos
estudos macro históricos.
Realizar tal percurso propiciou a compreensão dos meandros da constituição
do campo, no qual se edificou a educação infantil, isso porque teve o privilégio de
62
Este texto é fruto de Pesquisa de Mestrado realizada no período de 2007 a 2008 na
Universidade Federal de Viçosa.Agência Financiadora: CAPES
63
Professora do Ensino Fundamental e Coordenadora Pedagógica na rede municipal de ensino
do município de Juiz de Fora, Minas Gerais. E-mail [email protected]
171
ISSN 2448-1157
perscrutá-lo sob as lentes do arcabouço teórico e legislativo atual acerca do direito à
educação infantil entendida como cuidado e educação da criança de 0 a 6 anos de idade.
Assim, os esforços investigativos construídos e concatenados estão dispostos a seguir.
A disposição do campo da educação infantil juiz-forana
Numa rápida síntese, percebe-se que o atendimento das mais variadas
necessidades da infância juiz-forana foi demarcado por um conjunto de instituições,
órgãos, entidades, associações, movimentos sociais e outros, aqui considerados agentes
sociais. A presença desses agentes compôs um quadro complexo caracterizado por
orientações e objetivos diversos. Entende-se que esse quadro se configurou, portanto,
como o produto histórico da realidade social na qual se ergueu a Educação Infantil do
Município de Juiz de Fora.
Para proceder à organização desse quadro multifacetado, recorreu-se à noção
de “campo”, conforme a delineada por Bourdieu (1983), uma vez que o objeto de estudo
foi apreendido em sua multidimensionalidade social, considerando-o produzido por
diferentes agentes em relativa aliança ou conflito.
Por essas lentes, percebeu-se a incorporação das necessidades das crianças ao
conjunto de ações empreendidas pelos diferentes agentes sociais que, na verdade,
concorreram para a constituição da própria concepção de atendimento à infância. A
partir da problematização de temas recorrentes como vacinação, preparação para
escolaridade compulsória, prevenção, abandono, nutrição, etc. tornou-se possível
vincular o tema infância aos preceitos médicos, jurídicos, religiosos, políticos,
econômicos e educacionais, entre outros. Essa vinculação, lida sob a ótica da disputa,
apresentou-se, pois, como continuidade do tenso conflito que demarcou a constituição
do campo da assistência no Brasil64 – herança histórica que tende a fadar ao fracasso,
ainda hoje, algumas políticas públicas.
64
Apesar de, no Brasil, o interesse de diferentes segmentos pela infância e sua proteção registrarse apenas no final do século XIX (KRAMER, 1984), os marcadores históricos podem ser
evidenciados na Europa dois séculos antes, considerando “A História Social da Criança e da
Família(1981)” – obra na qual Ariès apontou a descoberta da particularidade infantil enquanto
valor e sentimento, constituindo uma consciência social da criança, legitimada, sobretudo, por
médicos, moralistas e juristas.
172
ISSN 2448-1157
De um lado, a busca do poder público, influenciado pelos organismos
internacionais e pela expansão do atendimento através de programas de baixo custo que
demarcassem paulatina saída da questão do provimento social; por outro, entidades
assistenciais confessionais com atendimento precário apelando não só ao Estado, mas
também às comunidades e ao empresariado, o apoio à manutenção de seus préstimos
sociais. Em mesma instância, as comunidades cunhavam práticas associativistas,
ambicionando ser ativas e ampliar seus espaços de ação coletiva. Igualmente, o
empresariado, almejando a recolocação tradicional no êxito do desenvolvimento social.
A ainda nesse ínterim, as famílias carentes, cujas mulheres necessitavam trabalhar fora
do domicílio para o seu sustento.
Num quadro que em nada sugere regularidades estavam não só diferentes
agentes, mas também interesses variados, os quais estruturaram o campo do
atendimento infantil. Isso posto, aportou-se para a visualização na forma das relações
que, consoante Bourdieu (1983), são relações de conflito ou alianças entre seus diversos
agentes.
Interessante notar que, no município de Juiz de Fora, mesmo antes de o poder
público local elaborar e definir os critérios para a implantação dos programas
específicos de pré-escolas e creches, os quais iriam requerer a participação de diferentes
agentes, outras formas existentes de atendimento inauguraram relações diferenciadas
neste campo, estabelecendo arranjos diferenciados entre os agentes, como foi o caso de
abrigos e orfanatos.
Esses arranjos impeliram aos agentes sociais papéis específicos e, dentro do
campo de disputa, esses papéis tiveram fundamental importância no estabelecimento de
novas relações, de novos arranjos, imprimindo dinamicidades ao campo, legitimidade
aos agentes sociais e, por conseguinte, a definição de novos interesses. Isso significa
admitir, no caso em estudo, que os diferentes agentes transitaram no campo,
promovendo ações em prol da infância como forma de demarcarem sua competência no
atendimento.
Com o interesse de diferentes segmentos sociais pelas problemáticas que
inscreviam as crianças e, por consequência, suas famílias, especialmente as carentes,
acirraram-se conflitos em torno das demandas específicas sobre as quais dado modelo
de assistência foi demarcando categorias, competências e projetos balizadores da rede
173
ISSN 2448-1157
de proteção social que se formava. À exemplo, as associações filantrópicas, coligadas,
regra geral às igrejas, oferecendo, por meio da ação caritativa, o atendimento à infância
carente.
A segmentação do campo
O atendimento institucionalizado das crianças menores de 6 anos no município,
até o final da década de 1970, consistia mormente nas inúmeras obras sociais ligadas às
confissões religiosas que ofereciam abrigos, creches e pré-escolas, numa composição
bastante variada destes, incluindo também a prestação de serviços, como doações de
alimentos e roupas, consultas médicas, orientação familiar e outros. Havia também
instituições particulares compostas tanto por creches quanto por pré-escolas
aprovisionadas por um discurso incipiente de qualidade; instituições de ensino préescolar mantidas pelo poder público através dos programas de controle dos problemas
sociais que acometiam crianças antes da escolarização compulsória; instituições de
guarda mantidas pelas comunidades nas periferias, porém subvencionada pelo poder
público; e instituições de guarda e educação categorizadas como comunitárias mantidas
pelo poder público e comunidade, em conjunto.
A segmentação do atendimento à infância refletia a fragmentação na qual a
criança era concebida, na verdade, sua peculiaridade geracional. No conjunto, puderamse localizar homologias nos tipos de atendimento dispostos para a infância, sendo estes
categorizados em: abrigos confessionais e públicos; creches dos tipos confessionais,
particulares, comunitárias autogeridas e comunitárias conveniadas, e cada uma obedecia
às regras específicas de organização e de funcionamento; e pré-escolas confessionais,
particulares e públicas. O conjunto dos agentes sociais e seus papéis estão dispostos na
tabela abaixo.
Tabela 1 – Agentes sociais: seus objetivos e papéis
AGENTE SOCIAL
OBJETIVOS
PAPÉIS
 Compensar carências, materiais,
morais e afetivas das crianças
pobres;
 Garantir manutenção de benefícios
 Assistência social aos pobres
 Articulação com os demais agentes
para políticas de interesse comum
 Articulação políticas nas esferas
174
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ENTIDADES
ASSISTENCIAIS
PODER PÚBLICO
MOVIMENTOS
SOCIAIS
fiscais;
 Exigir participação nos repasses de
recursos;
 Legitimar-se
no
atendimento
assistencial;
 Compensar carências culturais das
crianças pobres;
 Reduzir os gastos públicos com a
paulatina retirada do campo da
assistência e o chamamento da
sociedade
 Regular as atividades no campo, na
forma de legislação e subvenções;
 Articular interesses políticos
 Legitimar o direito ao atendimento
em instituições públicas e gratuitas;
 Influenciar na formulação legal e no
controle do campo;
 Articular interesses políticos;
ORGANISMOS
INTERNACIONAIS
 Legitimar a autoridade técnicacientífica;
 Influenciar a formulação legal e no
controle do campo;
INICIATIVA
PRIVADA
 Desempenho
econômico;
FAMÍLIA
EMPRESARIADO
LOCAL
e
crescimento
 Solicitar intervenção do Estado na
proteção e promoção social;
 Guardar, proteger e educar os
filhos;
 Legitimação da atuação tradicional
na cena social juiz-forana;
 Receber incentivos fiscais;
 Assegurar contra os potenciais
marginais;
governamentais
para
manter
posição
nos
programas
de
assistência
 Equilibrar socialmente os desvios
sociais;
 Provimento da assistência e da
educação no âmbito público;
 Articulação com os demais agentes
para políticas de interesse comum
 Regulador das atividades por meio
de normatizações;
 Regulador das atividades por meio
de repasses financeiros;
 Articulação política entre os pares,
a comunidade e poder público;
 Organização das necessidades
transformando-as em demandas
reivindicativas;
 Interlocução com o Estado para
encaminhamento de demandas;
 Orientação das ações em prol da
infância pobre;
 Supressora das deficiências do
Estado
no
provimento
da
assistência e da educação;
 Articulação com os demais agentes
para políticas de interesse comum
 Supressor da deficiência do Estado
no provimento da assistência;
 Articuladora dos interesses dos
demais agentes;
 Mantenedor de obras sociais
Fonte: PEREIRA, J. C. (2008, p. 198-214)
Sendo considerado campo, o atendimento à infância correlacionava-se com os
demais campos num espaço social mais denso e complexo, agregando, regularidades em
torno das negociações, estratégias e embates assumidos pelos agentes sociais. Decorre,
pois, que os campos sociais não são estanques ou, mesmo, estáticos; ao contrário,
produzem-se a partir das relações sociais empreendidas por agentes, portanto relações
humanas complexas. Isso significa que “os campos não são espaços com fronteiras
estritamente delimitadas, totalmente autônomas (...) existe uma interpenetração dos
campos” (BONNEWITZ, 2003, p. 63).
175
ISSN 2448-1157
Partindo do pressuposto bourdieuniano de que a lógica de determinado campo
tende a permear outros, percebe-se que o atendimento infantil, especialmente em Juiz de
Fora, conforme Figura 1, manteve relações com outros campos que incisivamente
influenciaram sua constituição, como o campo da Educação Pública, por exemplo. Este,
a partir de suas instituições e programas voltados para a educação formal, sob a
premissa de compensação e preparação para o ensino primário, s obressaiu em relação aos
demais, provocando coalizões.
O campo da Previdência e Assistência Social, bem como o da Saúde Pública e
do Judiciário, voltava-se para a proteção e promoção social da criança pobre e suas
famílias. Sublinha-se, ainda, o campo político com o aparato legal vindo dos diferentes
ministérios; os campos judiciário, econômico e religioso; as diferentes entidades
específicas para a defesa da criança e do adolescente, que foram se constituindo a partir
da década de 1980; e os organismos internacionais que subscreviam orientações e
modelos de atendimento à infância.
Figura 1 – Campo da Educação Infantil Juiz-forana
Fonte: Pereira (p. 220, 2008)
176
ISSN 2448-1157
Cabe destacar que o conjunto de formas de atendimento institucionalizadas
confluiu-se na amplitude da condição social da infância, ou seja, toda a multiplicidade
temática, todos os interesses ao redor da competência pelo atendimento desvelaram a
particularidade de uma categoria geracional: a concomitância entre educação e cuidado.
Assim, parece possível afirmar que todo o embate do atendimento à infância, pela
própria variação de temas e distinção entre os agentes, conformaram a Educação Infantil
no município.
A instauração de redes oficiais de pré-escolar – a partir da construção das
Escolas Municipais de Educação Infantil em 1979 – e de creches – com as Creches
Comunitárias no ano de 1984 – assim como a ampliação do atendimento aos menores
de 6 anos em outras instituições por meio da prática de convênio, expressaram não só
reivindicações e demandas, mas a concretude da particularidade da infância juiz-forana
se fazendo presente no campo.
A própria abordagem historiográfica da Educação Infantil brasileira e seus
marcadores no campo da assistência e da educação refletem o acentuado campo de
forças arraigadas na redefinição do papel do Estado brasileiro, justamente no momento
em que as transformações históricas e políticas ocorriam. São os marcos
historiográficos que apontaram para uma possível percepção de que a Educação Infantil,
considerada em sua particularidade e diretamente ligada à categoria social geracional a
que se destina, tem sua constituição a partir do embate dos diferentes agentes sociais
num jogo de disputa no qual se inscreviam formas de atendimento, em tese,
antagônicas.
Entre outros, foi o momento em que diferentes olhares sobre a infância e a
família foram cunhados de forma a projetá-los na perspectiva da Segurança Nacional65 e
do Desenvolvimento de Comunidade66. Entretanto, ao mesmo tempo em que o Estado se
65
Para Rosemberg (2001), a Doutrina Brasileira de Segurança Nacional e Desenvolvimento tinha como
objetivo a integridade territorial; integração nacional; democracia; progresso social; paz social; e
soberania. Sintetizada durante os cinco governos militares – instaurados de 1964 a 1985 – “como
segurança e desenvolvimento”, tal doutrina apregoava a atuação nos bolsões de pobreza por meio de
políticas de assistência, de forma a prevenir a desordem nacional, impelindo à própria comunidade a ação
coletiva tutelada – intencionalmente no custeio dos programas –, com vistas ao progresso nacional.
66
Conforme Ammann apud Rosemberg (2001), a origem teórica e política do DC advém do
contexto da Guerra Fria e ensejada pela concepção na qual os pobres eram suscetíveis à
propaganda comunista. Compunha-se de um referencial que co-responsabilizava a população
177
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colocava no provimento das políticas públicas, também se retirava paulatinamente da
assunção do atendimento à infância, ao passo que o fazia co-responsabilizando os
demais seguimentos sociais através de programas comunitários, mutirões, subvenções e
conveniamento.
Antes, pôde-se ler a Educação Infantil, expressa por uma cultura política de
caráter assistencialista e compensatório, legitimada pelos processos de expansão a
baixos custos, bem como pela necessidade de preparação para a escolarização
obrigatória. Em meados da década de 1980, consoante o processo de redemocratização
nacional e Nova República, empreendeu outros debates, apontando a coexistência de
uma forma alternativa para se pensar o atendimento, sob a ótica da outra cultura
política, edificada na concepção do direito.
Devido à atuação dos diferentes agentes sociais, o atendimento à infância
angariou um debate político67, sob a ótica de outra cultura política edificada na
concepção de direito68. Alvarez et al. (2000) e Gohn (2005) pontuaram que a cultura
política é inerente à prática dos movimentos sociais, mas a partir da apreensão dos
demais agentes do campo social mais amplo percebeu-se que a complexidade das
relações de força pressupõe outros agentes que ajudam a compor as regras do jogo,
estabelecendo novos arranjos relacionais e construindo novos significados.
Ressalta-se que essa disposição se refere a um recorte parcial dos referidos
campos, nos quais foram privilegiados alguns agentes. Além disso, mesmo constando
de elementos que denotam disposição hierárquica – e a despeito da teoria
bourdiueniana, todo campo a tem devido à posse de diferentes volumes de capitais, por
seus agentes. Marcadamente, através do conjunto de agentes sociais que estiveram
circunscritos no atendimento à infância juiz-forana, podem-se, grosso modo, considerar
os campos político, religioso, científico e econômico que, entre os campos do espaço
pela busca de alternativas à solução das mazelas sociais que a assolavam, buscando evitar focos
comunistas no Ocidente.
67
No sentido apontado por Gohn (2005), referente aos argumentos e debates de temas públicos e
que constrói uma cultura política pública.
68
As próprias produções científicas demonstram isso quando, no final da década de 1980, ante a
diversidade de alternativas de educação para crianças pequenas geradas na luta dos movimentos
sociais e sua conseqüente expansão, angariam uma discussão política. Ver: ROCHA. E. A. C. (et
al) Educação Infantil (1983 – 1996). Brasília: MEC/INEP/COMPED, 2001 (Série Estado do
Conhecimento)
178
ISSN 2448-1157
social, confluíram para a constituição do campo específico da Educação Infantil,
conforme mostra a Figura 2.
Figura 2 – Confluência dos campos sociais na constituição da Educação Infantil em JF
CP
CC
CP = Campo Político
CR – Campo Religioso
CEI
CC = Campo Científico
CR
CE
CE = Campo Econômico
CEI = Campo da Educação Infantil
Fonte: PEREIRA, 2008, p. 219
Apesar de ser uma representação bastante limitada, tende a ilustrar a
conformação da Educação Infantil por diferentes campos. O campo político pode ser
considerado o grupamento dos partidos políticos, movimentos sociais, Sociedades PróMelhoramentos de Bairros e o poder público em suas três esferas; leiam-se também os
campos da educação, da assistência social e da saúde; o campo religioso, que agrega as
iniciativas caritativas vinculadas às confissões católicas, metodistas e espíritas; o campo
científico inscreve os diversos especialistas: médicos, assistentes sociais, psicólogos,
pedagogos e juristas, também advindos de campos diversos, distinguindo-se pelas áreas
de conhecimentos específicos; e, por fim, o campo econômico, a partir do empresariado
local e de programas de orientação e subvenção internacionais.
Um estudo aprofundado acerca das posses de capitais dos diferentes agentes e,
consequentemente, a percepção do capital predominante no conjunto mais amplo de
relações desses agentes poderiam contribuir para apreender a posição que cada um
ocupa no campo específico da educação infantil juiz-forana. Seria bastante pertinente tal
aprofundamento para visualizar as relações de poder, bem como a compreensão dos
arranjos relacionais, nos quais se denotam os limites e possibilidades das ações dentro
do campo. Isso poderia, por exemplo, apontar para o protagonismo dos movimentos
sociais na constituição de políticas públicas para a Educação Infantil ou, ainda, apontar
179
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novos arranjos interacionais, os quais – por exemplos, os conselhos – sirvam ou não de
canais de novas sociabilidades em que a concepção de criança, de atendimento infantil,
e de direito, entre outros, possam ou circular não, angariando novos elementos.
O objeto de disputa no campo da Educação Infantil juiz-forana
Na analogia empreendida por Bourdieu 1983 apud Bonnewitz (2003), como
num jogo o campo também possui móveis de disputa, ou seja, produto da competição
entre jogadores que têm história própria. Assim, essa história própria e turbulenta do
campo da Educação Infantil juiz-forana foi demarcada por uma disputa específica que
girava em torno da competência pelo atendimento. Tal disputa ainda é acirrada, ao
passo que o processo de transferência das creches do setor da assistência social para o
setor da educação ainda não se processou a contento da Lei 9.394/96 (COSTA, 2006).
Desde as iniciativas caritativas sob o forte preceito da piedade e salvação,
perpassando a filantropia com a profilaxia social, além da proteção social divulgada
pelo Estado, das práticas compensatórias inferidas pelos organismos internacionais até o
debate pelo direito social encampado pelos movimentos sociais, o atendimento da
infância servia aos diferentes interesses dos agentes sociais, conforme o jogo de força,
por estes empreendido.
O objeto de disputa foi, assim, legitimado por agregar conteúdos dos diferentes
agentes sociais que o disputavam, acionando e, ao mesmo tempo, sofrendo o jogo de
forças balizado pela diversidade de interesses, reconstituindo-os dinamicamente; ao
incorporar novos agentes, redistribuíam o poder no interior do campo.
Nesse sentido, a segmentação do campo da educação infantil juiz-forana no
período estudado – poder público, instituições particulares, movimentos sociais,
organismos internacionais, entidades assistenciais, família e empresariado – denotou
uma luta concorrencial, em que a relação de forças em torno da competência pelo
atendimento à infância conferiu diferentes conotações à Educação Infantil. Já para os
movimentos sociais e família, por exemplo, passou a significar objeto de direito social,
uma vez que apontava para o oferecimento de bens e de serviços por parte do poder
público ao cidadão; para o poder público, organismos internacionais e até mesmo
entidades assistenciais, mecanismo disciplinador da população carente, tendo em vista
180
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que apaziguaria as diferenças sociais; também para o poder público significou
possibilidade de alavancar financiamentos externos, bem como compor índices de
desenvolvimento social, além de recolocar o município no rol do desenvolvimento
regional, conforme exposto nas seções anteriores; para os movimentos sociais, tornouse instância de participação popular, tendo ampliado o leque de militância, os espaços
de interlocução e até mesmo de atuação; e para as instituições privadas, entre outros,
pôde significar a maximização de inserções no mercado; assim como para o
empresariado local pôde significar a contrapartida necessária na qual, por meio de
subvenção, não se viu obrigado ao cumprimento da lei trabalhista.
Considerações finais
O atendimento à infância configurou-se como objeto histórico, motor de
relações de conflito e aliança entre diferentes agentes sociais, fazendo-o materializar-se
em instituições específicas como creches e pré-escolas; atendimento que comportava
funções educativas, bem como de cuidados e de assistência. Entretanto, os múltiplos
agentes concorrentes carregaram consigo interesses que estigmatizaram tendências
distintas para essas instituições, fazendo que o atendimento ficasse cindido entre a
assistência e a educação.
As funções educativas voltaram-se à pré-escola e, conforme os processos
históricos arraigados pelo projeto de expansão a baixo custo, com vistas ao pré-escolar,
priorizaram o atendimento à faixa etária de 4 a 6 anos. Distintamente, as creches
voltaram-se para a faixa etária de 0 a 3 anos, permeada pelas funções de guarda e
assistência, como forma de dar possibilidade à mulher-mãe-trabalhadora condições de
manter os filhos em instituições onde seriam assistidos enquanto trabalhassem fora do
domicílio.
181
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184
ISSN 2448-1157
Construindo coletivamente uma proposta para a escola pública de educação
infantil
Juliana Campregher Pasqualini69
Com o presente relato, intentamos compartilhar uma experiência de extensão
universitária em parceria com a Secretaria Municipal da Educação de Bauru que tem
como objetivo organizar, orientar e fundamentar teoricamente o processo de construção
coletiva e implementação de uma (nova) proposta pedagógica para o segmento da
educação infantil do sistema de ensino municipal.
Iniciada em 2011, essa experiência foi motivada pela perspectiva de possibilitar: i)
a construção colaborativa de uma proposta de trabalho que oriente a ação pedagógica
nas unidades escolares do segmento da educação infantil que integram o sistema
municipal de ensino; ii) a sistematização dessa proposta em um documento escrito,
apresentando diretrizes, princípios e orientações didáticas para a (re)organização do
trabalho pedagógico na educação infantil; iii) a criação de espaços de discussão coletiva
e formação continuada de professores e gestores da rede municipal visando o
aprofundamento teórico e a reflexão acerca da prática pedagógica, tendo em vista seu
aprimoramento.
As ações do projeto foram organizadas e operacionalizadas tendo em vista
contribuir para a consolidação de uma unidade teórico-prática no sistema municipal e
para a melhoria na qualidade da educação ofertada, potencializando, assim, o
desenvolvimento humano de todos os envolvidos no processo educativo (alunos,
professores, gestores, funcionários, familiares).
Caminhos percorridos
A primeira ação para viabilizar a realização do projeto foi a formação de uma
Equipe de Coordenação, formada basicamente por profissionais alocados na Secretaria
Municipal da Educação, que assumiu a tarefa de organizar e planejar as ações. A
primeira etapa dos trabalhos consistiu na realização de reuniões periódicas de estudo
com a equipe de Coordenação, o que ocorreu durante o 2º semestre de 2011 e o 1º
semestre de 2012, permitindo aprofundar alguns temas imprescindíveis no campo
69
Docente do Departamento de Psicologia, Faculdade de Ciências, UNESP/Bauru e do Programa
de Pós-Graduação em Educação Escolar da UNESP/Araraquara.
185
ISSN 2448-1157
teórico no qual se basearia todo o trabalho subseqüente, a saber, a psicologia históricocultural em unidade com a pedagogia histórico-crítica. Nessa etapa, foram estudadas
pelo grupo as seguintes temáticas: concepção de desenvolvimento infantil,
desenvolvimento das funções psíquicas, periodização do desenvolvimento infantil,
relação entre desenvolvimento e ensino, planejamento do ensino na educação infantil.
Nesse momento inicial, foi também realizado um movimento de pesquisa e estudo de
propostas pedagógicas de outros municípios que pudessem iluminar a natureza da tarefa
e os desafios a serem enfrentados. Após a fase inicial de preparação da equipe gestora,
as reuniões de coordenação continuaram ocorrendo quinzenalmente ao longo de todo o
projeto.
A segunda etapa envolveu a participação direta de professoras e diretoras por
meio da formação de Grupos de Trabalho (GTs) por área de conhecimento e
realização de encontros periódicos com as diretoras das unidades escolares. Os GTs
foram constituídos por profissionais do sistema municipal interessadas e dispostas a
colaborar mais diretamente no processo de construção da proposta pedagógica. Foram
formados seis grupos nas áreas definidas pela coordenação, a saber: Língua Portuguesa,
Matemática, Ciência, Artes Visuais, Música e Cultura Corporal. Cada grupo tinha a
tarefa de produzir um texto que delimitasse o objeto da área e sistematizasse objetivos,
conteúdos e encaminhamentos metodológicos, articulando o conteúdo específico da área
de conhecimento aos conceitos gerais da base teórica/pedagógica, tendo em vista a
particularidade do segmento da educação infantil, tarefa que se mostrou altamente
desafiadora dada sua complexidade. Os GTs concluíram a sistematização preliminar no
final do primeiro semestre de 2012 e o material foi submetido a um exame da
coordenação, que identificou a necessidade de maior articulação entre os fundamentos
teórico-filosóficos e as proposições pedagógicas específicas das áreas de conhecimento,
bem entre as áreas entre si, tendo em vista garantir maior unidade e articulação. Com
isso, verificou-se a necessidade de continuidade do trabalho dos Grupos por área, que
finalizaram o trabalho de sistematização das áreas no final de 2014.
A outra ação estruturante do projeto anteriomente mencionado que iniciou-se
ainda em 2011 foi a realização de Encontros com as Diretoras das unidades
escolares. Foram realizados quatro encontros em 2011, dois encontros no ano de 2012,
quatro encontros em 2013 e um encontro em 2014. Esses encontros foram dedicados ao
186
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estudo teórico e a debates sobre a estrutura do documento da proposta pedagógica e
sobre o andamento de seu processo de construção e implementação, visando sua
construção de forma colaborativa e coletiva. Considerando que o sistema municipal
congrega 64 escolas de educação infantil, as reuniões com as diretoras forem realizadas
subdividindo-as em dois grupos, de modo a criar maior possibilidade de diálogo e
discussão.
Paralelamente a essas ações, uma versão preliminar do capítulo de fundamentação
teórica do documento referente à proposta pedagógica foi elaborado pela docente
coordenadora do projeto, incluindo um breve resgate histórico da teoria, seus principais
autores e os principais conceitos da base teórica. Este material foi disponibilizado a toda
a rede no segundo semestre de 2012, tendo em vista obter um retorno a partir da
apreciação e avaliação da versão preliminar por todas as escolas municipais de
educação infantil. As devolutivas escritas enviadas pelas escolas e as avaliações
verbais colhidas em encontro com as diretoras foram sistematizadas e categorizadas,
para futura incorporação ao documento final. De modo geral, o documento foi bem
avaliado pelas equipes das unidades escolares, que destacaram a clareza da linguagem e
acessibilidade do texto e apresentaram sugestões de aprofundamento e acréscimo de
temáticas específicas.
Em sua terceira etapa, o projeto passou a oferecer um curso de formação de
professores, ministrado diretamente pelos alunos de graduação envolvidos sob
supervisão da docente responsável, com o objetivo de proporcionar aos professores um
espaço de estudo e aprofundamento teórico. O curso adotou como texto-base a versão
preliminar do capítulo de fundamentação teórica da proposta pedagógica. No segundo
semestre de 2012, foram oferecidas duas turmas do curso, que foi intitulado
“Desenvolvimento Infantil Segundo a Escola de Vigotski” e teve duração total de 30
horas (10 encontros semanais com duração de 3 horas). No ano de 2013 foram
realizadas duas edições do curso, com duração estendida para 36 horas (12 encontros
semanais). Em 2014 o curso foi oferecido em versão reduzida (8 encontros semanais)
em função da paralisação das atividades da universidade durante movimento paredista.
No primeiro semestre de 2015 foi oferecido um novo curso abordando a periodização
do desenvolvimento infantil e no corrente semestre está em andamento mais uma turma
do curso introdutório sobre a teoria da Escola de Vigotski. Nota-se, assim, que as ações
187
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de formação continuada têm sido privilegiadas no contexto do projeto como ação
permanente, por serem compreendidas como canal para fortalecer o caráter participativo
da construção da proposta, permitindo captar necessidades e dificuldades das
professoras e obter seu retorno com relação às versões preliminares do documento da
proposta pedagógica.
A partir do oferecimento dos cursos, por solicitação das próprias participantes,
foram criados grupos de estudo para aprofundamento em temáticas específicas, como a
brincadeira de papéis sociais e o desenvolvimento afetivo-emocional na idade préescolar. No corrente semestre está sendo realizado um grupo de estudos sobre atividades
lúdicas e produtivas na educação infantil. Os grupos de estudos são também
coordenados diretamente pelos alunos de graduação extensionistas e têm se mostrado
um espaço propício para a articulação entre ensino-pesquisa-extensão, na medida em
que as temáticas propostas vinculam-se, de alguma forma, aos projetos de iniciação
científica dos alunos, cuja elaboração teve como ponto de partida problemas
identificados a partir da experiência de extensão.
No presente momento, encontra-se em fase de finalização, revisão e diagramação
o documento que objetiva a proposta pedagógica e planejamento da etapa mais
diretamente dedicada à implementação da proposta no município.
Dificuldades e desafios
A principal dificuldade enfrentada no projeto é a amplitude da rede municipal,
que torna grandemente desafiadora a perspectiva de construção colaborativa da
proposta. Dadas as condições objetivas, inclusive de número reduzido de profissionais
disponíveis para coordenação e operacionalização das ações do projeto, o envolvimento
de todos os professores do sistema no processo só é possível de modo indireto, por meio
da ação multiplicadora e mediadora das diretoras das unidades escolares, ou ainda pelo
mecanismo da consulta/apreciação das versões preliminares dos materiais produzidos.
Outra dificuldade refere-se à disponibilidade limitada de participação dos
profissionais da rede de ensino, uma vez que as professoras, diretoras e supervisoras da
Secretaria Municipal de Educação que integram a equipe de coordenação e os grupos de
trabalho acumulam um grande número de tarefas e atribuições, reduzindo as
188
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possibilidades objetivas de dedicação e envolvimento com o projeto de construção da
proposta pedagógica.
Apresentou-se ainda como complicador, em especial para a condução dos
trabalhos pelos GTs, a ausência de profissionais que tenham simultaneamente formação
na área de conhecimento específica e na teoria pedagógica e psicológica que
fundamenta o novo currículo. Para alguns grupos, foi possível obter a colaboração de
pesquisadores das áreas específicas; para os grupos em que isso não se mostrou
possível, a tarefa de sistematização do currículo de modo articulado com a perspectiva
teórico-metodológica da pedagogia histórico-crítica e psicologia histórico-cultural tem
se mostrado extremamente desafiadora.
Desdobramentos da experiência
Uma das principais conquistas do trabalho realizado é, sem dúvida, o
estreitamento da parceria com a Secretaria Municipal que tem sido alcançada e se
materializou na realização de um evento conjunto em julho de 2015, o “Congresso
Pedagogia Histórico-Crítica: educação e desenvolvimento humano” que contou com a
participação expressiva de professoras da rede básica do município bem como de
pesquisadores e estudantes de diversos Estados do país.
Decorridos cinco anos de seu início, consideramos que o projeto tem produzido
resultados bastante expressivos e frutíferos no sentido de colaborar para a consolidação
de um senso de unidade no segmento da educação infantil do sistema municipal,
contribuindo para a requalificação da ação pedagógica mediante o estudo e
aprofundamento teórico por parte dos professores orientado por um projeto coletivo
comum.
A participação dos alunos de graduação tem sido recorrentemente bem avaliada
pelos professores participantes dos cursos e grupos de estudo, bem como pelos próprios
alunos, que demonstram envolvimento e compromisso com o projeto, apresentam
visível desenvolvimento profissional e passam a dedicar-se a estudos e investigações
científicas de problemas relacionados à realidade concreta da educação infantil
brasileira.
O projeto tem permitido aos envolvidos alcançar uma inédita visão de totalidade
do trabalho pedagógico no segmento da educação infantil, abrindo novos caminhos para
a pesquisa nesse campo.
189
ISSN 2448-1157
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190
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Fórum Sul Mineiro de Educação Infantil: Participação social desde 1999
Kátia Batista Martins70
Cláudia Maria Ribeiro71
Desde 1999 o Departamento de Educação da Universidade Federal de Lavras,
atua na implementação/monitoramento/avaliação do Fórum Sul Mineiro de Educação
Infantil – espaço suprapartidário articulado por diversas instituições, órgão e entidades
comprometidas com a expansão e melhoria da Educação Infantil no Sul de MG,
instância de discussão, mobilização e divulgação das políticas para a Educação Infantil.
Tem caráter mobilizador, informativo e propositivo com vistas a congregar esforços
para promover a Educação Infantil no Sul de MG e subsidiar a atuação das instituições
participantes. A concepção de Educação Infantil que sustenta as ações do FSMEI é
comprometida com os direitos fundamentais das crianças como cidadãs e com a
importância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento do ser humano.
Palavras-chave: Participação social. Educação infantil. Formação de Educadoras.
Educação Infantil: regiões fronteiriças entre infância, educação e subjetividade
Késia D’Almeida72
70
Mestranda em Educação – Departamento de Educação da Universidade Federal de Lavras.
Integrante do Fesex.
71
Professora Associada do Departamento de Educação da Universidade Federal de Lavras. Líder
do Fesex.
72
Doutora em Políticas Públicas e Formação Humana - PPFH/UERJ, Pedagoga da Creche da
Fundação Oswaldo Cruz/Fiocruz; Coordenadora e Professora do módulo de Fundamentos
191
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Resumo
Objetivamos discutir a educação infantil no Brasil com foco na institucionalização da
criança desde a tenra idade, buscando embasar as análises na correlação entre infância,
educação e subjetividade. Entendemos a infância não como fato natural, mas como
acontecimento sócio e culturalmente produzido, organizado por regulações potentes que
instituem maneiras de cuidar e educar a criança seja na família ou nos demais espaços,
como a escola.
Imergirmos nas ações que caminham pela vertente de
institucionalização de crianças pequenas, ponderando na perspectiva foucaultiana, a
possibilidade de se estabelecer na educação infantil um espaço de correlação entre
campos de saber, tipos de normatividade e formas de subjetividade. A análise
genealógica e a análise institucional são metodologias viáveis para compreensão dos
processos em curso no campo da educação da infância, acreditando que precisamos
tensionar as práticas diárias, a fim de constituir, possivelmente, “linhas de fuga”.
Palavras chave: Infância, Educação e Subjetividade
Introdução: Campo de análise
Este trabalho se insere no âmbito da articulação entre a produção da tese de
doutoramento no Programa de Pós-Graduação de Políticas Públicas e Formação
Humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e da prática desenvolvida na
Creche da Fundação Oswaldo Cruz73 – Creche Fiocruz74 – e no Centro de Referência de
Pedagógicos do Curso de Desenvolvimento Profissional para Educadores Infantis - Creche
Fiocruz/EPSPJV-Fiocruz; e Professora Supervisora do Município de São Gonçalo/SG/RJ –
[email protected]
73
Instituição vinculada ao Ministério da Saúde do Brasil desenvolve ações na área da ciência e
tecnologia em saúde, incluindo atividades de pesquisa básica e aplicada, ensino assistência
hospitalar e ambulatorial de referência, formulação de estratégias de saúde pública,
192
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Educação e Formação Continuada/CREFCON, do Município de São Gonçalo75·.
Objetivamos discutir a educação infantil no Brasil com foco na institucionalização da
criança desde a tenra idade, buscando embasar as análises na correlação entre infância,
educação e subjetividade, partindo de “especial curiosidade em conhecer suas regiões
fronteiriças” (ROLNIK, 2006).
Para alcançar os objetivos propostos elegemos a análise genealógica de Michel
Foucault (1993) e a análise institucional de René Lourau (1993), como metodologias
viáveis para a compreensão dos processos em curso no campo da Educação Infantil.
Não há “nascedouros” e sim uma série de movimentos, situações que vão ajudar a
entender a produção da realidade posta, pois genealogia é
[...] chegar a uma análise que possa dar conta da constituição do
sujeito na trama histórica. É isto que eu chamaria de genealogia,
isto é, uma forma de história que dê conta da constituição dos
saberes, dos discursos, dos domínios de objeto, etc. sem ter que
se referir a um sujeito, seja ele transcendente com relação ao
campo de acontecimentos, seja perseguindo sua identidade vazia
ao longo da história (FOUCAULT, 1993, p.7).
informação e difusão, formação de recursos humanos, produção de vacinas, medicamentos,
kits de diagnósticos e reagentes, controle de qualidade e desenvolvimento de tecnologias para
a saúde.
74
Creche institucional, voltada a cuidar e educar de filhos dos trabalhadores servidores da
Fundação Oswaldo Cruz no Rio de Janeiro/Brasil.
75
Centro de Referência integrante da Secretaria Municipal de Educação/SEMED da Prefeitura
do Município de São Gonçalo. Destina-se a realização cursos, oficinas, palestras, encontros,
entre outros, voltados à formação continuada a profissionais da Rede Municipal de São
Gonçalo/RJ/Brasil.
193
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“A genealogia, como análise da proveniência está no ponto de articulação do
corpo com a história. Ela deve mostrar o corpo inteiramente marcado de história e a
história arruinando o corpo” (FOUCAULT, 1993, p. 16). Ao mesmo tempo, não
podemos elucidar a realidade com o que falta a ela, mas por algo que está nela, bem
como não é possível dizer qualquer coisa em qualquer tempo, conforme apontado por
Foucault (1996). Igualmente, não há preocupação com julgamentos de verdades, pois a
própria verdade é histórica e não existe uma, porém várias verdades. Reflexões acerca
das questões que se apresentam como verdades instituídas são necessárias, à medida que
a história é contada por forças hegemônicas de determinado momento, compondo uma
história linear mantenedora de um olhar único sobre as ideias e as práticas. Todavia, a
história não é concebida por uma linearidade dos fatos, mas para ligar fatos às relações
produzidas por eles e para eles.
Sob esta perspectiva qualquer que seja a história – ou as histórias – da infância –
ou das infâncias – encontraremos muitos enunciados sobre a criança e sobre as práticas
pedagógicas que se configuraram no universo infantil, conformando paradigmas e
paradoxos sobre a infância como fenômeno moderno, à medida que, de acordo com
Orlandi (1985), não podemos falar da população infantil de forma homogênea, visto que
“falar da infância de maneira geral é abstrair a idéia de infância. Existem na verdade,
várias populações infantis” (p.15).
Com base neste pressuposto pretende-se, então, analisar nossas implicações,
conforme propõe René Lourau (1993): o que nos une ao campo da educação infantil
enquanto direito das crianças de zero a cinco anos, problematizando a própria condição
dos especialismos que atravessam e são atravessados pelas práticas que se concretizam
nos estabelecimentos de atendimento.
Rastrear as práticas pedagógicas, em particular as escolares, tendo a infância
como objeto de controle, como prática discursiva no nosso próprio fazer, é uma maneira
de fazer emergir os fundamentos de sua forma contemporânea que, no Brasil, se
inscreve em códigos legais sustentados na noção de direitos sociais e obrigatoriedade,
visto que o direito, neste contexto, se apresenta como aparelho de governo, um
mecanismo de poder.
194
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Sob esta perspectiva, colocamos em análise a institucionalização da criança nos
ambientes de educação infantil, no sentido de problematizar a produção de
subjetividades existentes na prática pedagógica com crianças de zero a cinco anos,
compreendendo que, de acordo com Foucault (1986), os conceitos necessitam ser
analisados partindo do próprio discurso, à medida que as normas para sua constituição
“não residem na mentalidade nem na consciência dos indivíduos; pelo contrário, elas
estão no próprio discurso e se impõem a todos aqueles que falam ou tentam falar dentro
de um determinado campo discursivo” (p.70). O discurso, e consequentemente os
conceitos instituídos, estão intimamente ligados aos enunciados que os constitui; com
algo que nos identificamos e adotamos, com a materialidade dos fatos, com as
correlações existentes com outros discursos e efetivamente com outros enunciados
estabelecidos socialmente e, portanto, reconhecidos pelos sujeitos.
A perspectiva trazida por Foucault (1986) nos direciona a desnaturalizar as
práticas que estão postas, “estranhando” as questões que se apresentam como verdades
instituídas, entendendo que se na história da infância nunca houve tanta preocupação
com as crianças como acontece atualmente – com falas voltadas à valorização da
expressão infantil e da espontaneidade – também se conserva a disseminação do
discurso acerca de como devem viver e comportar-se. Discutir, portanto, os
enquadramentos propostos, com muito mais dúvidas e questionamentos, do que
respostas e certezas, mas compreendendo a pluralidade de idéias e a necessidade
premente de renovar e revigorar a prática pedagógica, colocando em análise as ações, as
relações sócio-políticas que se apresentam, bem como as formas de exercício de poder.
O conceito pedagogia, “pedagógico”, – as práticas pedagógicas – há de ser entendido de
forma mais ampla e não o restrito às práticas escolares, à medida que “pedagogizar” os
acontecimentos nos aproxima, com freqüência, de padronagens e moldes.
Infância tecida pela falta: Tecendo a análise pela “Falta que nos move”.
Os mecanismos de governo dos corpos infantis não foram produzidos a partir de
um único movimento e sim balizados em um número maior de normalizações,
195
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enquadramentos e discursos que surgiram a partir do século XVI (ALVAREZ-URÍA e
VARELA, 1991). Historicamente, a infância é efeito de demandas sócio/econômicas e
da decorrente importância política que a preservação das crianças passou a ter. Com o
decorrer dos anos, à medida que as demandas sociais, culturais e do mercado de
trabalho aumentaram, a educação se voltou gradativamente para crianças cada vez mais
novas e a proposta de cuidados pedagógicos e médicos em uma perspectiva higiênica
caracterizou-se efetivamente pela normalização de procedimentos e práticas desde a
mais tenra idade. A partir do século XVIII há uma prática educativa voltada às
adequações do homem aos pressupostos imperantes na sociedade capitalista, vinculando
o ideário de uma pedagogia liberal e não crítica, através da qual se expressa a concepção
burguesa de infância, família, educação, sociedade e mundo de maneira geral,
favorecendo a construção do conceito de infância na Modernidade.
E sob este referencial, entendemos a infância não como fato natural, mas como
acontecimento sócio e culturalmente produzido. Deste modo, é imprescindível
estremecer as verdades instituídas, pois segundo Foucault (1993) a sociedade legitima
certos poderes que se amparam em conhecimentos tidos como verdades, pois “[...] a
verdade não existe fora do poder ou sem poder [...] a verdade é deste mundo; ela é
produzida nele graças a múltiplas coerções e nele produz efeitos regulamentados de
poder” (p.10).
No campo da educação infantil observamos que, a partir da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional de 1996 (LDB 9394), proliferaram verdades através de
propostas pedagógicas, metodologias, normas e regras direcionadas a espaços, tempos,
rotinas, aprendizagem e construção do conhecimento. Todas reguladas por conceitos
que determinam espaços, seguindo programas, previsões e currículos. Foucault (2006)
alerta que “a idéia de um programa e de preposições é perigosa. Desde que um
programa se apresenta, ele faz a lei, é uma proibição de inventar”. (p.05).
Certo dia ao passar frente à chamada de uma peça de teatro intitulada “A falta
que nos move” fiquei por alguns instantes pensando na frase ali disposta no cartaz preso
à parede. Embora tímida e solta – e por certo nem sequer notada ou mesmo esquecida
pelos transeuntes que passam frente à mensagem impressa no cartaz – a afirmativa
196
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emana intensidades múltiplas e a exímia proliferação de demandas produzidas pelo
contexto social contemporâneo: atualização, requalificação, direitos, deveres,
flexibilização, relações mais fugazes, transitoriedade, “vestir a camisa” como uma
segunda pele – algo que gruda em nós como natural –, entre outros, indicando uma falta
ininterrupta.
Permaneci fazendo conexões a partir do apelo feito com minha realidade,
minhas expectativas, propostas sobre a educação infantil e a demanda atual de tornar
esta etapa da Educação Básica obrigatória. O que presenciamos em diversas situações
no dia-a-dia com crianças de zero a cinco anos em instituições de educação infantil é a
busca – em nome dos novos olhares e fazeres – pela ruptura com os propósitos voltados
à assistência e aos parâmetros compensatórios de instituições voltadas a cuidar e educar
crianças de zero a cinco anos de idade. Mas o quanto está atravessada a busca pela
ruptura pelo tão intenso ímpeto de suprir a falta de algo dito melhor ou fundamental? A
falta que nos move.
Contudo, mesmo que a escola se encarregue de produzir e manter na prática um
modelo a ser seguido, um padrão a ser mantido, um comportamento dito normal, seja
ele de desenvolvimento, gênero, religioso ou qualquer outro, Rocha e Aguiar (2003)
afirmam que “conflitos e tensões são as possibilidades de mudança, pois evidenciam
que algo não se ajusta, está fora da ordem, transborda os modelos” (p.7).
Para a discussão que se propõe, coloca-se em análise inicial a afirmação “A falta
que nos move”, à medida que a subjetividade que a mobiliza impõe sistematicamente o
prover algo mais – “o plus” – como condição sine qua non de existência do sujeito.
Grandiosa inquietação e grandes os impactos provocados frente à tentativa de
relacionar impressão e contexto produzidos pelo cartaz, imediatamente arrolados à
infância, à institucionalização de sua educação e ao processo de subjetivação – o
pensamento do tempo presente. O que somos nós? O que somos hoje? Jogos de
verdade que nos fazem ser o que somos, de pensar o que pensamos, de estar no presente
como estamos. Discursos que se propagam nos vaivens sociopolítico-culturais de
veracidade inquestionável e que acabam por controlar indubitavelmente as formas de
197
ISSN 2448-1157
contemplar os modos viventes. Conforma, enquadra, molda, determina saberes e
fazeres. Para Foucault, segundo Castro (2009),
[...] tudo isto começou a ser descoberto no século XVIII.
Percebe-se, consequentemente, que a relação do poder com o
sujeito, ou melhor com o indivíduo, não deve ser simplesmente
essa forma de sujeição que permite ao poder tomar dos sujeitos
bens, riquezas e, eventualmente, seu corpo e seu sangue, mas
que o poder deve exercer-se sobre os indivíduos, uma vez que
eles constituem uma espécie de entidade biológica que deve ser
levada em consideração, se queremos, precisamente, utilizar
essa população como máquina de produzir riquezas, bens, para
produzir outros indivíduos. O descobrimento da população é, ao
mesmo tempo que o descobrimento do indivíduo e do corpo
adestrável, o outro núcleo tecnológico em torno ao qual os
procedimentos políticos do ocidente se transforma (p.59).
Com base nesta perspectiva podemos afirmar que o sujeito constituído reside,
então, em um corpo sustentado pelos diversos campos de saberes instituídos. Um
“corpo capitalista”– que segue a lógica capitalista – que se fragmenta balizado em um
sistema científico usado de forma arbitrária e que constrói a ideia de um único caminho
para o que seria educação, saúde, poder, justiça, direito. Um corpo que se constitui em
faltas, em ausências, em infinita procura do que lhe falta. Falta produzida e deflagrada
socialmente pela captura dos desejos, possibilidades e potências, bem como por
agenciamentos existenciais. O “sujeito” moderno é por si só o sujeito que já nasce
estreito, sujeito da moral, homem da verdade conduzido pela falta. Sujeito
“empoderado”, mas em dívida permanente, dívida infinita oriunda da sua própria
existência. Dívida produtora da culpa que emana da falta. Culpa inerente à vida
“inventada” de condutas, moral e costumes sociais pautados na afirmação de um único e
bom modo de viver que não compreende e/ou aceita outras formas de ser e fazer. Uma
invenção ativa que produz um modo de viver, um ideal moral de bem e mal, no qual os
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modos viventes são enquadrados e fixados em condições ideais de existência.
Consequentemente, a culpa produz o desejo intrínseco de prover a falta, de sanar a
dívida.
Há instituída uma lógica mercadológica que entende o sujeito como corpo
avulso, fraturado, vulnerável, ligado à capacidade de produzir valor, amparado pelo
valor que produz. Corpo que tem um preço produzido por um cálculo social, que
procura colocar preços naquilo que não tem preço e transforma em quantidade o que
não é mensurável.
Sociedade imprevisível, ofuscada e cega às diferenças e desigualdades que vão
sendo lançadas cotidianamente, estabelecendo condições muitas vezes catastróficas de
sobrevivência àqueles que “habitam o lado oposto” do modelo determinado como ideal.
Segundo Rolnik (1999, p.206) “O medo não é mais o de não conseguir configurar-se
segundo certo mapa, pois múltiplos são os mapas possíveis. O medo agora é de não
conseguir reconfigurar-se de todo, de forma minimamente eficaz”.
Assim, estabelecem-se medidas – normativas ou não – que visam à proteção, ao
direito e à prevenção constantes, modelando os modos viventes por meio de uma
regulação permanente – e muitas vezes sutil. Organiza-se uma biopolítica, “[...] uma
tecnologia de poder que se dirige ao homem vivo, como espécie” (TÓTORA, 2011,
p.85) e que “[...] se exerce na regularização da vida, na maneira de viver, no “como” da
vida e no seu prolongamento”. Em Nascimento da Biopolítica, Foucault (2008) afirma
entender por “[...] biopolítica o modo como, desde o século XVII, a prática
governamental tem tentado racionalizar os fenômenos projetados pelo conjunto de seres
vivos constituídos em população: problemas relativos à saúde, higiene, natalidade,
longevidade, às raças e outros” (p. 313). “Trata-se de um poder contínuo, que não
prescinde dos recursos da ciência, que visa a fazer viver” (TÓTORA, 2011, p.86),
confiscando ideias, conhecimentos, diferenças, apossando-se do que há de diverso,
controlando tudo e todos a partir de práticas e políticas que objetivam salvaguardar os
padrões estabelecidos como civilizados, corretos, bons, justos e fundamentais.
Normaliza-se, então, a partir da criação de comportamentos que seguem padrões
determinados e normatiza-se instituindo leis e normas.
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A produção de uma subjetividade calcada em vigilância, controle, moldes,
pautada na máxima do “sujeito de direitos” opera pela criminalização, punição e
regulação de práticas e comportamentos. De forma geral, pode-se dizer que o conceito
de sujeito de direito é um conceito abstrato que traz a intenção ideológica dos princípios
da Era Moderna. Os princípios liberais de igualdade, liberdade e fraternidade, que
respondem à finalidade de sustentar o modo de produção capitalista, sob a perspectiva
de que todos os homens são iguais em valor e em direito.
A subjetividade, de tal modo, é processual e efeito de intercruzamentos, um
conjunto de elementos heterogêneos que vai sendo assumida por cada um. São vários os
campos que atravessam a lógica do sujeito de direitos. Para Foucault (2008), sujeito de
direitos é o homem que aceita a renuncia a ele mesmo, visto ter um contrato entendido
como parte da sua vida. De acordo com Marshall (2002, p.28), “[...] a construção de
identidades ou de sujeitos é, para Foucault, um ato altamente politizado. Essas
identidades são os efeitos daquilo que ele chama de poder/saber”.
É preciso, contudo, ter cuidado com a ideia lançada de que há duas sociedades,
à medida que existe um “atolamento” de todos na sociedade, nas práticas e dinâmicas
produzidas e reproduzidas socialmente e que acabam capturadas frente às contestações e
à heterogeneidade dos modos e fazeres viventes, transformando os diferentes arranjos
de vida em – ou os entendendo como – distorções e divergências do que é dado e
refletido como ideal culpabilizando os que não se “enquadram” e/ou não se “moldam”.
Nós somos a sociedade.
Sob esta perspectiva, é indispensável se deslocar da pessoa como uma questão e
da naturalização do sujeito, pensando o sujeito não como um princípio, mas como
formas que podem compreender as práticas que agem sobre o sujeito e as tecnologias
que operam na sua constituição, como propõe Nikolas Rose (2001). Compondo-se, o
sujeito, por práticas de assujeitamento ou libertárias, restringindo-se à reprodução de
modelos previamente estabelecidos ou singularizando-se e legitimando a criação de
outros modos viventes. Que forças, práticas e técnicas estão presentes em conceitos
como o de infância, por exemplo?
200
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Na perspectiva da falta que nos movimenta, igualmente na educação infantil a
todo instante somos conduzidos à ausência constante, capturados pelo desejo que é
produzido. A educação da infância produz, permanentemente, novos saberes,
atualizando não só as formas de poder, mas a disseminação fundada na relação
inequívoca da imperativa necessidade da educação das crianças. Educação infantil que
se relaciona, muitas vezes, analogamente com as práticas de “vigiar e punir”
(FOUCAULT, 2001), controlar e moldar, partindo de saberes e forças consideradas
fundamentais para “modernizar” cada vez mais a vida dos homens. Instrução
direcionada aos infantes cujos padrões são determinados por aqueles que julgam saber
as “reais” necessidades da criança sem ao menos ter escuta ou tempo para elas; sem
questionar se as crianças precisam ir à escola ou o que havia antes da escolarização ou
ainda quais outras formas são possíveis.
Educação Infantil: estranhamentos constitutivos de um repensar – Algumas
considerações finais
O modelo determina o comportamento existente a partir deste. São lógicas
produzidas que mantêm as formas de vida, de fazeres, de procedimentos. As normas,
regras e leis paralisam, assim, a diversidade e assumem um caráter identitário,
produzindo identidades que padronizam e enquadram em moldes (pré) decididos.
Suscitam uma cisão moral entre bem e mal, melhor e pior, correto e incorreto. No
entanto nos damos conta dos modelos que vão sendo produzidos e que também
produzimos? Problematizamos os processos de subjetivação subalternos agenciados e
que também promovemos? Discutimos as práticas, colocando-as em análise a fim de
constituir caminhos de entendimento sobre as produções que vão se firmando? O
desafio, então, é colocar em análise as atribuições de papéis e as identidades fixas que
acabam nos imobilizando, buscando desnaturalizá-las à medida que também nos
constituem.
Carecemos permanecer “metendo” coisas na cabeça das crianças? É esta a
prática que buscamos, queremos e promovemos?
É imprescindível continuar a
201
ISSN 2448-1157
propagação de ensinamentos sem contexto e significados? Perguntamos-nos o que
sabem as crianças? O que consideramos importante? Ou ainda o que é de fato
importante e para quem? Por que não fazemos estes questionamentos? Ainda há a
perpetuação da crença – seja por meio dos discursos instituídos ou pelas práticas
voltadas à infância ou por ambos – que a criança não tem um saber, mantendo a lógica
que entende a infância como “sujeito da falta”, daquele que necessita de cuidado e
educação enquanto modelação, enquadramento, controle e disciplinarização e, ainda,
com o argumento de que será bom para o futuro daquele “futuro cidadão”.
As identidades nos conformam em protótipos aceitáveis e tidos como “normais”,
sendo necessário comportar-se conforme o esperado e o determinado. O conceito de
identidade é modulado e nos engessa em movimentos pré-estabelecidos, fazendo com
que as dinâmicas grupais nos levem, muitas vezes, ao fechamento identitário, no qual os
comportamentos precisam seguir um modelo único determinado por modos
homogêneos de falar, vestir, proceder, agir.
Sob esta base, a prática na educação infantil volta-se, muitas vezes, para o
diagnóstico do atendimento escolar, sem problematizar a institucionalização
compulsória de crianças tão pequenas, gerando uma adequação das práticas às regras
liberais, ao situar a educação como mecanismo para que as crianças sejam moldadas e
enquadradas, acolhendo as demandas de eficiência.
Contudo, é preciso analisar nossas próprias práticas, perceber nossas
implicações, os atravessamentos e as relações de saber-poder que produzimos ou que
ajudamos a produzir e pelas quais também somos produzidos. É necessário “ler” nosso
cotidiano, tensionar nossas verdades, estar atento às resistências e potências que se
anunciam diariamente, uma vez que, segundo Passetti (2009), é “no perigo que pulsa a
vida [...] Estamos num momento propício para arruinar condutas – como são todos os
momentos –, livres de guias e propenso a ensaios de existências”. Momento propício
para uma vida libertária que implica práticas inovadoras, andando por fora das
prevenções alardeadas e, sob essa perspectiva, corremos riscos e temos que corrê-los, e
isso não tem a ver com direito e muito menos com direitos naturais, mas com prestar
atenção ao que acontece na vida, no mundo e na sociedade. Só assim, tentaremos
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romper com o mundo de adesão e assujeitamento, tentando ações libertárias que
compreendam práticas inovadoras e contrárias à uniformização das diferenças.
“Desconstruir para construir” – não a desconstrução para nada termos, mas para
possibilitar novas formas de agir e de pensar, pois para entender as diferenças é
necessário pensar nas relações estabelecidas e buscar estudar como se instituem as
práticas. E, em um contexto tão fragmentado, buscar “juntar” pontas que se encontram e
que estão imbricadas e não desconexas. Deleuze (1992) diz que “não cabe temer ou
esperar, mas buscar novas armas”, desta forma consideramos necessário ponderar, na
perspectiva foucaultiana, a possibilidade de se estabelecer na educação infantil um
espaço de correlação entre campos de saber, tipos de normatividade e formas de
subjetividade, dentro de uma determinada cultura (FOUCAULT, 1983). Espaço este
possível para trocas, interações, redimensionado como fluxo de resistências
(PASSETTI, 2007), de insurreição e de movimento de aversão à sociedade de controle
onde o rompimento ao modelo seja possível e não entendido como defeituoso e
violento.
Precisamos, talvez na educação infantil, tensionar as práticas cotidianas, dando
visibilidade a outras formas de fazer. Questionar as posições arraigadas e as
naturalizações das práticas, discutindo o processo de trabalho e estratégias de
resistência. Ver o mundo como diferença e as verdades em suas transitoriedades,
compreendendo que onde há poder há resistência e, principalmente, há potência.
Estabelecer regiões limítrofes de possibilidade de outros espaços de discussão. Outros
espaços criativos, mas não absorto na criatividade como exigência de vida. Assim,
constituiremos, possivelmente, na educação infantil, “linhas de fuga” – como proposto
por Deleuze e Guattari – em busca de “uma vida não fascista”, como convida Foucault.
Assim, discutir como se produzem historicamente as práticas e os conceitos, e
como se constituem em “nós”, são dimensões fundamentais para a análise que se
apresenta no campo da educação infantil para trazer à tona as implicações que estão
presentes nas normalizações produzidas, nas naturalizações cotidianas, nas modelações
instituídas, no sistema de regras cada vez mais sofisticado que vivenciamos dia a dia
nestes espaços.
203
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de 2012.
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ISSN 2448-1157
Proposta pedagógica municipal de educação infantil: mais que um documento,
uma identidade coletiva
Lilian Francieli Morais de Bastos76
Eduarda de Mello Porciuncula77
Mara Rúbia Garcia Pedroso78
Maria Angélica Noble Machado79
RESUMO:
O presente trabalho visa apresentar a Proposta Pedagógica Municipal de educação
Infantil da cidade de Rio grande/RS, dando ênfase ao seu processo coletivo e
democrático de construção. A PPMEI é um documento que busca ilustrar a identidade, a
organização e a gestão de trabalho da Educação Infantil no município e servirá de apoio
na sistematização e na organização da prática educativa na Educação Infantil,
respeitando as especificidades de cada instituição. O mais importante é destacar as
concepções trazidas pelas professoras sobre as temáticas que emergem do trabalho com
as crianças, bem como o protagonismo das crianças e das famílias na elaboração do
documento.
PALAVRAS CHAVE: Educação Infantil; Proposta Pedagógica; Participação.
76
Pedagoga (FURG), mestre em Educação (FURG), professora da Educação Infantil na Rede
Municipal de Ensino de Rio Grande/RS e assessora do Núcleo de Educação Infantil da Secretaria
de Município da Educação – Rio Grande/RS. E-mail: [email protected]
77
Pedagoga (FURG), mestranda em Educação (FURG), professora da Educação Infantil na Rede
Municipal de Ensino de Rio Grande/RS e assessora do Núcleo de Educação Infantil da Secretaria de
Município da Educação – Rio Grande/RS. E-mail: [email protected]
78
Pedagoga (FURG), especialista em Educação Infantil (UFPel), professora da Educação Infantil na Rede
Municipal de Ensino de Rio Grande/RS e assessora do Núcleo de Educação Infantil da Secretaria de
Município da Educação – Rio Grande/RS. E-mail: [email protected]
79
Pedagoga (FURG), especialista em Psicopedagogia, professora da Educação Infantil na Rede
Municipal de Ensino de Rio Grande/RS e assessora do Núcleo de Educação Infantil da Secretaria de
Município da Educação – Rio Grande/RS. E-mail: [email protected]
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A Educação Infantil no município de Rio Grande/RS: conhecer para
contribuir
A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, se configura como
um direito constitucional a todas as crianças de zero a 5 (cinco) anos de idade. Porém,
muito mais que a garantia do acesso e permanência das crianças nas instituições
escolares, cabe também priorizar a qualidade do atendimento oferecido a elas.
Imbricados à oferta deste serviço estão as concepções de criança, de
desenvolvimento infantil, de tempo, de espaço, de educação que definem os objetivos e
as funções das ações pedagógicas nos estabelecimentos educacionais, cujo foco
principal é o respeito às crianças. Segundo Ostetto
[...]o respeito à criança ganha concreticidade na medida em que, nas
práticas efetivas no interior da instituição de educação infantil,
estejam previstos: brincadeiras; atenção individual; ambiente
aconchegante, seguro e estimulante; contato com a natureza; higiene e
saúde; alimentação sadia; desenvolvimento da curiosidade,
imaginação e capacidade de expressão; movimento em espaços
amplos; proteção afeto e amizade; expressão de sentimentos; especial
atenção durante o período de adaptação; desenvolvimento da
identidade cultural, racial e religiosa. (2012, p.16).
O excerto acima demonstra o quão complexo é o trabalho com crianças de zero
a 5 anos de idade. Requer, tanto do poder público, quanto dos profissionais, um olhar
voltado às políticas públicas para a Educação Infantil na efetivação e no compromisso
com a qualidade do atendimento prestado às crianças.
Desde o momento em que a Educação Infantil surge como um direito das
crianças há também a necessidade de se criar espaços que visam a garantia desta
demanda, tanto pela rede púbica, quanto privada. No município do Rio Grande/RS, a
Secretaria de Município da Educação80, após realizar visitas nas instituições de
Educação Infantil – públicas e privadas – e apropriar-se das propostas administrativas e
80
Através do Núcleo de Educação Infantil – NEI/SMEd, composto pelas assessoras autoras deste
trabalho.
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pedagógicas que orientam o trabalho com as crianças, percebeu grandes disparidades
entre as realidades observadas81.
Diante do que foi observado, cabe salientar que as práticas pedagógicas na
Educação Infantil, pautavam-se numa perspectiva já superada, como por exemplo, nos
Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Infantil (2008). Em algumas
instituições, havia práticas e concepções expostas em documentos – Projeto Político
Pedagógico e Regimento Escolar – que fragmentavam os saberes e as aprendizagens das
crianças. Também foram notadas algumas práticas muito voltadas a preparação das
crianças para o ingresso no primeiro ano do Ensino Fundamental, ação esta negada pela
resolução Nº 05, de 17 de dezembro de 200982.
A partir do diagnóstico feito através das visitas às escolas, utilizou-se como
primeira ação a apresentação e discussão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (DCNEI) que, apesar de ser um documento de caráter mandatório,
criado em 2010, ainda não era de conhecimento de todos os profissionais que trabalham
com as crianças da Educação Infantil no município. As discussões foram feitas em um
encontro de formação continuada em serviço, onde cerca de aproximadamente 250
professores/as participaram. Neste, foi apresentada a resolução Nº05/2009, bem como
os temas que orientaram a elaboração das DCNEI (2010).
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
articulam-se às Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica
e reúnem princípios, fundamentos e procedimentos definidos pela
Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, para
orientar as políticas públicas e a elaboração, planejamento, execução e
avaliação de propostas pedagógicas e curriculares de Educação
Infantil. (BRASIL, 2010, p.11)
O encontro de formação sobre as DCNEI marcou o inicio de um processo de
debate democrático acerca das propostas e concepções presentes nas práticas com as
crianças de zero a cinco anos de idade nas instituições que ofertam Educação Infantil,
81
Cabe destacar que este documento foi elaborado com bases nas visitas realizadas a partir de
janeiro de 2013.
82
Esta resolução “Fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil”.
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visto que era necessário que todos os profissionais que trabalham na Educação Infantil
conheçam os documentos e as normativas que regem a primeira etapa da Educação
Básica.
Por meio das visitas e do encontro inicial de formação, verificou-se ainda a
necessidade de elaborar um documento cujo intuito fosse ilustrar a identidade, a
organização e a gestão de trabalho da Educação Infantil no município e também, uma
orientação que auxilie na sistematização e na organização da prática educativa na
Educação Infantil, respeitando as especificidades de cada instituição. Foi então que se
pensou na construção da PROPOSTA PEDAGÓGICA MUNICIPAL PARA A
EDUCAÇÃO INFANTIL – PPMEI. Trata-se de um documento teórico, conceitual e
metodológico que espelha a prática cotidiana do trabalho na Educação Infantil
municipal e estará sempre aberto para acompanhar a dinâmica da realidade apresentada.
É de extrema importância salientar que, os primeiros estudos giraram em torno
da temática “Proposta Pedagógica”, onde foram encontrados respaldos na obra de Salles
& Farias (2012) intitulada “Currículo na Educação Infantil: diálogo com os demais
elementos da proposta pedagógica”. Segundo as autoras, uma Proposta Pedagógica
[...] reconhece e legitima a instituição educativa como histórica e
socialmente situada, construída por sujeitos culturais que se propõem
a desenvolver uma ação educativa a partir de uma unidade de
propósitos. Assim, são compartilhados desejos, crenças, valores,
concepções, que definem os princípios da ação pedagógica e vão
delineando, em um processo de avaliação contínua e marcado pela
provisoriedade, suas metas, seus objetivos, suas formas de
organização e suas ações. (p.20)
Cabe destacar ainda que a estrutura e os elementos que a constituem a proposta
pedagógica foram pautados nas orientações das autoras acima citadas.
O que mais impressiona neste documento, que será apresentado a seguir, é o
seu processo de construção. Não se trata de uma política pública feita “em gabinete”, ou
uma proposta que não dialoga com a realidade. Muito pelo contrário, os grandes autores
da proposta são os profissionais que atuam na Educação Infantil no município de Rio
Grande, as crianças e as famílias.
209
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Conhecendo a Proposta Pedagógica Municipal para a Educação Infantil
A PROPOSTA PEDAGÓGICA MUNICIPAL PARA A EDUCAÇÃO
INFANTIL inicia trazendo um breve resgate histórico da Educação Infantil no Brasil e
no município de Rio Grande. Para tanto, buscou-se respaldo nas obras que relatam a
história do atendimento às crianças e também nos projetos pedagógicos das escolas da
rede municipal. O interessante neste capítulo é perceber que os discursos produzidos
sobre a história e os históricos das instituições nos PPP’s apresentam uma educação
Infantil com caráter, inicialmente, assistencialista, voltado aos cuidados e atendimento
das crianças cujas mães trabalham. Com o passar do tempo, os movimentos e as
políticas públicas nos levaram a perceber a Educação Infantil como direito das crianças.
Este capítulo foi construído com base nos estudos de Kuhlmann Jr (2011). Este autor
apresenta um resgate histórico da concepção de infância, bem como os movimentos que
nos levam a perceber a trajetória da Educação Infantil no país. Segundo ele
A caracterização das instituições de educação infantil como parte dos
deveres do Estado com a educação, expressa já na Constituição de
1988, trata-se de uma formulação almejada por aqueles que, a partir
do final da década de 1970, lutaram – e ainda lutam – pela
implementação de creches e pré-escolas que respeitem os direitos das
crianças e das famílias. (p.179).
Os capítulos 2, 3 da PPMEI abordam as concepções referentes ao trabalho
pedagógico com as crianças de zero a 5 anos e foram construídos através de encontros
periódicos83 com as professoras que atuam na Educação Infantil na rede municipal.
Nesses encontros, eram disponibilizados textos, artigos, imagens, vídeos que suscitavam
as discussões sobre cada temática e, ao final, as professoras faziam registros do que
havia sido dialogado. Foi um momento de alinhar os conceitos e fundamentar as
concepções.
De forma a evidenciar os debates e discussões promovidas nos encontros, serão
apresentadas a seguir as temáticas levantadas pelas professoras como as mais
pertinentes ao trabalho com as crianças na Educação Infantil, defendidas a partir dos
83
Os encontros de formação aconteceram durante o ano de 2013, nos sábados de formação.
210
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registros feitos por elas e também os referenciais teóricos que subsidiaram as
discussões:
TEMÁTICA
REGISTRO
REFERENCIAL
Educação infantil: “Entendemos ser determinante que DCNEI (2010)
ações de cuidado
fique claro neste documento que a
e educação
Educação Infantil faz parte do
LDB (1996)
sistema de educação e é a primeira
etapa da Educação Básica e é
decisiva nos processos posteriores
de desenvolvimento e deve ser
respeitada como tal. Para tanto,
práticas como brincar, vivências,
afetos, trocas, interações, o cuidado
e
a
educação,
favorecem
e
possibilitam para o desenvolvimento
e a aprendizagem”. (Registro das
professoras, 2013)
Crianças e
“[...] criança é um sujeito ativo em DCNEI (2010)
Infâncias
constante formação que deve ser
respeitada
em
sua
totalidade,
Sarmento (2004)
particularidades e especificidades.
Traz consigo vontades, anseios,
necessidades e
acima de
tudo
vivências que são construídas ao
longo de seu desenvolvimento”.
(Registros das professoras, 2013).
Currículo na
Educação Infantil
“[...] deve levar em consideração os DCNEI (2010)
questionamentos e as curiosidades
das crianças, partindo destes para a
formação
de
Cerisara (2002)
projetos,
211
ISSN 2448-1157
desvinculando-se assim da ideia de Salles e Faria (2012)
“conteúdo”
e
valorizando
a
construção, articulação e produção
de aprendizagens que acontecem no
encontro entre sujeitos e ambiente
social”. (Registro das professoras,
2013)
Tempo e espaço
na Educação
Infantil
“Acreditamos que o tempo e espaço DCNEI (2010)
na
Educação
possibilitar
Infantil
novos
dentro
dos
quanto
externos
devem
aprendizados
ambientes
e,
Barsosa e Horn (2010)
internos
a
melhor
utilização do tempo com atividade
que promovam o conhecimento hás
diversas áreas cognitivas, plástica,
verbal,
motora,
efetiva
entre
outras”. (Registro das professoras,
2013)
Linguagens na
Educação Infantil
“Contemplar as diversas linguagens, DCNEI (2010)
de forma não estanque e que
favoreçam
a
valorização
individualidade,
experiências
e Barbosa (2009)
vivências
das
Gobbi (2010)
da
crianças”.
(Registro das Professoras, 2013)
Avaliação na
Educação Infantil
“O grupo acredita que a avaliação DCNEI (2010)
na Educação Infantil deve se dar a
todo o momento, retratando o
cotidiano
das
desenvolvimento
crianças,
e
Ostetto (2000)
seu
vivências,
valorizando o melhor que cada
212
ISSN 2448-1157
indivíduo demonstra, respeitando
seu tempo e suas especificidades. A
avaliação também inclui a visão do
adulto em relação a essas questões
para aprimorar o trabalho a ser
desenvolvido,
enriquecendo
as
aprendizagens de acordo com as
características de cada criança e de
cada grupo. É um PROCESSO,
acima de tudo!” (Registro das
professoras, 2013)
Articulação entre
a Educação
“Um currículo assim montado, que DCNEI (2010)
permita ao aluno escolher e usar
Infantil e o Ensino seus
Fundamental
recursos
cognitivos
para
Kramer (2006)
resolver os problemas do cotidiano, Ferreiro (2000)
certamente estará propiciando a
estruturação do pensamento lógico
de que a criança necessita para
aprender a ler, escrever e contar”.
(Registro das professoras, 2013)
Diante dos relatos das professoras, é possível vislumbrar as concepções
imbricadas em cada registro. O papel da Secretaria de Educação foi sistematizar os
registros, buscando articular com os referenciais teóricos que corroboram com o
defendido pelas professoras.
Os capítulos 4 e 5 tratam da Educação Inclusiva e da Educação no Campo,
respectivamente. O trecho que aborda a Educação Infantil na perspectiva da Educação
Inclusiva foi elaborado tendo como base a legislação municipal 84. Em conversa com as
84
Resolução Nº 039/2014 do Conselho Municipal de Educação, que “Estabelece Diretrizes
Operacionais para Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva e para o Atendimento
Educacional Especializado dos estudantes com Deficiências, Transtornos Globais de Desenvolvimento
213
ISSN 2448-1157
professoras, foi possível perceber o quanto esta temática é nova e que muitas delas
possuem dúvidas sobre como trabalhar a inclusão na Educação Infantil85. Já em se
tratando da Educação Infantil no campo, o respaldo foi na publicação de Silva & Pasuch
(2010), quando defendem que as experiências vivenciadas nas Escolas do Campo
precisam se aproximar da realidade das crianças, valorizando os saberes do campo, sem
perder o contato com outras culturas, para além do campo.
No capítulo seguinte da PPMEI, está definido o papel dos profissionais que
atuam no cuidado e educação das crianças nas instituições escolares – equipe gestora,
professoras e funcionárias. Nesta perspectiva, as professoras relataram nos encontros
que formação que
“o real papel do professor de Educação Infantil é principalmente o de
mediar experiências, construir conhecimentos, proporcionar as mais
diversas linguagens, para que a criança aprenda sobre si e sobre o
mundo que o cerca, facilitar a socialização, propor desafios, estimular
a autonomia e a identidade, organizar ambientes, tempos e materiais.
Considerar os desejos e interesses das crianças, contemplando, assim,
o desenvolvimento integral da criança”. (Registro das professoras,
agosto de 2013)
Uma das professoras, utilizando a ideia de Lóris Malazugi (As cem
Linguagens), cria um poema relatando as Cem Linguagens da professora:
A professora também tem cem linguagens....
Ela também é feita de cem.
Ela tem:
Cem modos de ensinar,
Cem modos de amar,
Cem modos de falar,
Cem modos de escutar,
Cem modos de entender e
Cem modos de revelar as vozes de seus alunos, que aqui seguem
registrados. (Professora Eloisa Andrada, 2013)
(TGD) e Altas Habilidades/Superdotação para todas as etapas e modalidades da Educação Básica
Pública e de Educação Infantil Privada, pertencentes ao Sistema Municipal de Educação da Cidade do
Rio
Grande”
disponível
em
http://www.riogrande.rs.gov.br/smed/wp-
content/uploads/2014/12/20141219-cme-resolucao_039-educacao_especial.pdf
85
Cabe destacar que a Secretaria de Município da Educação possui um Núcleo de Diversidade e
inclusão que realizam encontros de formação períodos com as professoras da rede municipal,
com o intuito de orientar as práticas de educação inclusiva nas escolas.
214
ISSN 2448-1157
Nos capítulos finais da PPMEI é possível vislumbrar a participação das
crianças e das famílias na construção deste importante documento para o trabalho na
Educação Infantil municipal.
Quando se pensou numa proposta que identificasse a Educação Infantil no
município, de imediato foi lançado um desafio às professoras da rede municipal: ouvir
as manifestações das crianças, a respeito da escola onde estão inseridas, para que tais
manifestações também viessem a integrar a PPMEI. A proposta era elaborar um registro
que contemplasse as vozes/manifestações das crianças sobre a escola, respondendo a
seguinte questão: O que você pensa sobre a tua escola? Não ficou estabelecida
nenhuma metodologia para a produção deste material. As professoras puderam explorar
o máximo a capacidade criativa do grupo.
O material foi apresentado em uma reunião com as coordenadoras pedagógicas
das escolas. Neste encontro, foi possível vislumbrar a riqueza dos registros e também o
quanto as professoras se dedicaram em ouvir o que as crianças realmente tinham a dizer,
respeitando assim, seus desejos e suas vontades. Dentre os registros apresentados cabem
citar os vídeos com gravações das crianças, cartazes, fotografias, portfólios, cartas,
maquetes e atividades de recorte e colagem.
Com este material em mãos, a função da Secretaria da Educação foi sistematizar
as informações e elaborar uma escrita que viesse a contemplar os dados produzidos. Neste
sentido, percebeu-se que as crianças apontaram duas categorias: elas demonstraram a
necessidade de explorar as múltiplas linguagens e também a reorganização e valorização
dos espaços/ambientes nas escolas.
Quanto à exploração das múltiplas linguagens:
Brincar, pintar, desenhar, dançar, festejar, cantar, modelar, é o que as crianças
mais gostam de fazer nas escolas de Educação Infantil de nosso município. Com isso,
percebe-se uma forte relação com as diferentes linguagens da criança na satisfação em
experimentar, explorar, vivenciar diferentes formas de se manifestar.
Sabemos que as crianças expressam-se utilizando várias linguagens,
com as quais constroem a si mesmas e as culturas nas quais estão
inseridas levando-as ao encontro entre palavras, choros, sons,
movimentos, traçados, pinturas, todos imbricados em ricas
215
ISSN 2448-1157
manifestações, mas que, por vezes, encontra-se enfraquecida no
cotidiano infantil devido à ausência de propostas, que mesmo simples,
procurem garantir processos de criação em que os questionamentos, a
busca criativa por diferentes materiais, o respeito pelo trabalho
individual e coletivo, estejam presentes. (GOBBI, 2010)
É importante perceber as linguagens como formas da criança exteriorizar suas
sensações, seus sentimentos, que vão para além da expressão oral e/ou escrita. Nas
escolas da infância, as crianças devem, e a partir das manifestações foi possível afirmar
que experimentam e desfrutam das mais diversas formas de manifestação.
Quanto aos espaços/ambientes nas escolas:
A maioria das crianças prefere brincar na praça e ou pátio da escola, mas apontam
para falta de opções e fragilidade da maioria das praças das escolas, mostrando que
precisam do espaço e tempo adequado para o brincar, como foi relatado:
“Eu gosto de brincar. Brincar de um monte de coisas, água e gelo, de graça,
de bola, na pracinha. Ah e de esconde também, mas aqui não da né? Tinha
que ter árvore aqui nesse pátio, ai dava pra se esconder.” (Relato das
crianças, 2013).
Mas há também aquelas que preferem o aconchego da sala, da proximidade dos
colegas e o olhar da professora sobre ela. Como expresso uma criança:
“Minha escola é muito linda, eu gosto de vir para escola, para aprender
bastante coisa com a minha professora, também brincar, adoro dançar, ouvir
histórias, fazer teatro e também é muito bom ir na praça e brincar muito”.
(Relato das crianças, 2013)
A proposta de ouvir necessita da acolhida do adulto frente às manifestações das
crianças e estas estão em constantes descobertas no tempo e espaço a que pertencem e (re)
organizando-o conforme suas necessidades do momento. Foi observado também, através
dos relatos, que para as crianças não importa a dimensão do espaço/tempo, elas querem e
precisam aproveitar através das brincadeiras e interações com os colegas e as professoras.
Isto ficou claro nas palavras, desenhos, vídeos expressos pelas crianças nos registros.
A PPMEI além de afinar conceitos, de orientar o trabalho pedagógico na
Educação Infantil do município, de compreender a relação entre o que as crianças
desejam e as políticas públicas para a infância, buscou também possibilitar a criação de
parcerias entre as Instituições de Educação Infantil com as famílias.
As contribuições das famílias para a PPMEI se deu através de um questionário,
onde elas puderam destacar os principais pontos sobre a escola na qual seus filhos estão
216
ISSN 2448-1157
inseridos. Este instrumento foi um dos mecanismos escolhidos pelas instituições como
sendo o mais eficazes na relação entre família e escola. Staccioli (2013, p.149) destaca que
“O bem-estar de cada criança está estritamente ligado à relação que os educadores
conseguirão estabelecer com seus familiares.”
As questões contidas nos questionários giram em torno dos horários de
atendimento às crianças, organização de entrada e saída na escola, espaços físicos, as
relações entre a professora e as crianças, entre outros. Porém, cabe destacar aqui as
expectativas das famílias frente o trabalho da instituição.
Muitas famílias esperam que a Educação Infantil inicie com o processo de
sistematização da alfabetização das crianças. Para tanto, percebeu-se a necessidade de
salientar às famílias os objetivos da educação Infantil, mostrando o trabalho que é
desenvolvido com as crianças e que as prioridades na ação com elas giram em torno do
brincar e das interações, confirme disposto nas DCNEI (2010).
Durante uma reunião com as coordenadoras pedagógicas, uma delas relatou
que, a partir do questionário encaminhado às famílias, percebeu a necessidade de
chama-las para destacar o trabalho desenvolvido com as crianças na Educação infantil,
declarando que as aprendizagens acontecem através das experiências oportunizadas às
crianças no cotidiano da escola e que a prática de leitura e escrita sistematizada acontece
nos primeiros anos do ensino fundamental.
Avaliando a PPMEI
Após os movimentos, os encontros, as discussões que originaram o texto
referência da PPMEI, retornamos às escolas tal documento para que os profissionais da
educação Infantil pudessem ler, analisar, indicar alterações e /ou modificações que se
fizessem necessárias.
A devolutiva das escolas foi positiva, pois destacaram a importância do documento
para orientação das práticas educativas com as crianças na educação infantil no município.
Porém, sentiu-se a necessidade de algo mais concreto, mais metodológico que viesse a
definir as especificidades do trabalho na creche e na pré-escola.
Foi então que, após o estudo e aprofundamento teórico do que está estabelecido
pelas DCNEI (2010), verificou-se a necessidade de estabelecer as Diretrizes
Municipais para a Educação Infantil, de forma a elucidar aos profissionais as
217
ISSN 2448-1157
principais ações do seu fazer pedagógico, junto às crianças. Essas diretrizes, longe de
engessar o trabalho das professoras, busca orientar as propostas curriculares de cada
profissional e das instituições.
Na construção dessas diretrizes, de forma a não fragmentar os conhecimentos
por áreas, ou subordinar as práticas pedagógicas às etapas do desenvolvimento da
criança ou às datas comemorativas, está defendida uma concepção de currículo
integrado que leve em consideração as necessidades e interesses das crianças. Tanto as
DCNEI (2010), quanto as Diretrizes Municipais, visam a garantia das experiências
mínimas a serem vivenciadas no cotidiano da Educação Infantil. As Diretrizes
Municipais defendem que o professor da Educação Infantil deve oferecer às crianças da
creche e da pré-escola, experiências que valorizem as interações e as brincadeiras. É
importante destacar que as Diretrizes Municipais foram construídas com as
coordenadoras pedagógicas das instituições.
Encaminhamentos a partir da PPMEI
Após a versão final da PPMEI ser encaminhada às escolas da rede municipal, a
indicação era que ela pudesse dialogar com os Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) das
instituições. Além da revisão dos PPP’s, também se lançou às escolas uma proposta de
formação continuada para 2015, cuja finalidade era que o processo formativo ocorra
“por dentro da escola”, buscando constituir grupos de trabalho que possam pensar na
formação a partir da realidade que vivenciam, dialogando, problematizando, refletindo e
propondo estratégias pedagógicas que promovam ações e planos de trabalho que atendam as
necessidades e peculiaridades de cada instituição escolar 86.
Por fim, a Proposta Pedagógica Municipal para a Educação Infantil, afirma a
importância deste, que é considerado um documento voltado à politica pública da
Educação Infantil municipal. A forma coletiva e democrática na qual se pautou sua
construção garante a lisura do seu conteúdo.
86
Cabe destacar que esta estratégia ainda está em andamento, e teremos uma avaliação da
mesma no final do ano.
218
ISSN 2448-1157
Referências
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes
curriculares Nacionais para a educação infantil / Secretaria de Educação Básica. –
Brasília: MEC, SEB, 2010.
GOBBI, Márcia. Múltiplas linguagens de meninos e meninas no cotidiano da educação
infantil.
2010.
Acessado
em
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=6678multiplaslinguagens&category_slug=setembro-2010-pdf&Itemid=30192
KUHLMANN JUNIOR, Moysés. Infância e educação infantil: uma abordagem
histórica. 5ª ed. Porto Alegre: Mediação, 2010.
OSTETTO, Luciana Esmeralda. Encontros e encantamentos na educação
infantil: partilhando experiências de estágio. 10ª ed. Campinas, SP: Papirus, 2012.
SALLES, Faria.; FARIA, Vitória. Currículo na Educação Infantil: diálogo com os
demais elementos da proposta pedagógica. 2° edição. São Paulo: Ática, 2012.
SILVA, Ana Paula Soares da; PASUCH, Jaqueline. Orientações curriculares para a
educação
infantil
no
campo.
2020.
Acesso
em
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=6675orientacoescurriculares&Itemid=30192
STACCIOLI, GIANFRANCO. Diário do acolhimento da infância. Campinas, SP.
Autores Associados, 2013.
219
ISSN 2448-1157
Gestão escolar da educação infantil: Estudo de caso em um município paulista
Marcella Paluan87
Esta pesquisa, em nível de Mestrado, encontra-se em andamento e decorre de
uma pesquisa mais ampla intitulada “Gestão de sistemas e unidades públicas de
Educação Infantil: análise de uma microrregião no estado de São Paulo”. O município
escolhido para este estudo de caso, de tipo etnográfico (André, 2005), apresenta certa
especificidade na organização da estrutura administrativa da Educação Infantil em sua
rede municipal. A rede conta com duas diretoras para oito creches e uma diretora e vice
para sete pré-escolas. Diante disso, temos acompanhado a rotina de quatro unidades de
Educação Infantil, sendo duas consideradas como “sede” (em que a diretora permanece)
e duas como “não-sede”. Admitindo a gestão democrática como elemento indispensável
para se atingir os fins pedagógicos da educação (PARO, 2012), buscamos compreender
como essa estrutura organizacional da gestão educacional influencia na qualidade da
Educação Infantil.
Referências bibliográficas
ANDRÉ. M. E. D. A de. Estudo de caso em Pesquisa e Avaliação Educacional.
Brasília: Líber Livro Editora, 2005. 68p. (Série Pesquisa; vol 13).
PARO, V. H. Administração Escolar: Introdução Crítica. 17ª ed. São Paulo, Cortez,
2012.
Palavras-chave: Educação Infantil. Gestão. Gestão democrática.
87
Mestranda em Educação pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto,
Universidade de São Paulo.
220
ISSN 2448-1157
Gestão democrática na educação infantil: em foco as reuniões com as
famílias88
Maria Aparecida Guedes Monção 89
Resumo
O propósito deste trabalho é analisar a comunicação entre famílias e educadores nas reuniões.
Trata-se de um excerto de uma tese de doutorado cujo objetivo geral é analisar a interação entre
famílias e educadores em um Centro de Educação Infantil (CEI), com vistas a identificar a
especificidade da administração educacional nesse segmento. É uma pesquisa qualitativa,
mediante estudo de caso de cunho etnográfico, realizado no período de 2010 e 2011, em um CEI
da rede municipal de São Paulo, que atende crianças de 0 a 4 anos. Os procedimentos
metodológicos conjugaram observação participante, análise documental e entrevista
semiestruturada com os profissionais e com as famílias. Os resultados da pesquisa
evidenciaram que a relação entre educadores e familiares é permeada por conflitos e no que se
refere à comunicação entre educadores e famílias nas reuniões constatou-se que há pouco
diálogo e na maioria das vezes as famílias ouvem os profissionais e pouco se pronunciam.
Palavras-chave: Educação Infantil; Relação entre Educadores e Famílias; Gestão Democrática.
Introdução
A gestão90 democrática não é um tema novo em nosso cenário educacional. Desde 1988,
ela figura como um princípio de nossa educação nacional, expresso na Constituição Brasileira.
Alicerçada pelos princípios da descentralização, autonomia e participação, a gestão democrática
possibilita aos sujeitos envolvidos diretamente na educação definir os rumos do projeto político
pedagógico e das políticas públicas educacionais, de modo a garantir transparência e exercer o
controle social sobre o Estado.
Partindo da concepção de educação democrática, emancipatória, a função da escola é a
formação integral do ser humano, nas dimensões individual e social. Nessa perspectiva, a
“educação para a democracia” é um dos eixos que deve nortear o projeto político-pedagógico
das escolas, por meio da gestão democrática, referendando a dimensão dialógica da educação,
que deve ser expressa nas práticas de administração no âmbito dos sistemas de ensino e das
unidades escolares.
88
Este texto é fruto de pesquisa de doutorado realizada no período de 2009 a 2013 na
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
89
Professora do curso de Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo
(UNICID).
90
Neste texto utilizo os termos “administração escolar” e “gestão” como sinônimos.
221
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O conceito amplo de administração como a “utilização racional de recursos para a
realização de fins determinados” (PARO, 2000, p. 18) serve como ponto de partida para analisar
a administração escolar considerando sua especificidade, tendo em vista a existência de
objetivos antagônicos entre a área empresarial, movida pelos interesses capitalistas, e a
educacional, fundamentada na educação emancipatória.
A gestão escolar democrática volta-se para a mudança social, rompendo com o senso
comum de administração escolar originado na ótica empresarial capitalista, baseada em relações
autoritárias em que predomina a submissão. Acrescenta-se também, como condição necessária
para a constituição da gestão democrática a compreensão de que a gestão escolar envolve a
articulação de todos os trabalhos desenvolvidos na escola, integrando atividades, meios e fins
para seu funcionamento e organização: “[...] se o administrativo é a boa mediação para a
realização do fim e se o fim é o aluno educado, não há nada mais administrativo do que o
próprio pedagógico, ou seja, o processo de educá-lo” (PARO, 2002, p. 20).
Esse conceito crítico de gestão escolar, voltado para a mudança social, só pode ter como
fim o pedagógico e, portanto, a busca da educação para a democracia. Esta, por sua vez, exige a
democratização das relações internas da escola, seja no que tange ao interior da sala de aula,
seja no que se refere às relações estabelecidas entre os diferentes sujeitos que compõem a
escola: estudantes, professores, famílias, profissionais de apoio e equipe de gestão.
A educação infantil é a primeira etapa da educação básica, cuja função é integrar o
cuidado e a educação em ação complementar à família e à comunidade, de modo a promover o
desenvolvimento integral da criança e a garantia de seus direitos e de suas famílias. A
especificidade das instituições de educação infantil evidencia-se na integração entre o cuidado e
a educação e em seu compartilhamento entre educadores e famílias.
Compartilhar a educação da criança entre profissionais e famílias é um elemento-chave
para a constituição de uma educação infantil democrática e de qualidade. Trata-se de ampliar a
visão da educação das crianças pequenas nas sociedades contemporâneas, considerando as
novas configurações das organizações familiares e reconhecendo as instituições de educação
infantil como um dos contextos atuais de socialização da primeira infância.
O compartilhamento da educação da criança pequena situa-se em dois âmbitos: nas
políticas públicas, no que diz respeito ao papel do Estado, que é o de garantir a universalização
e a qualidade das creches e pré-escolas por meio de uma política pública que se paute nos
direitos fundamentais das crianças; e nas práticas cotidianas nas unidades de educação infantil,
ao consolidar uma cultura de diálogo e negociação, entre famílias e educadores, sobre a
educação das crianças pequenas.
222
ISSN 2448-1157
No cotidiano das unidades de educação infantil, para garantir os direitos e necessidades
das crianças pequenas, é necessário um permanente diálogo entre os adultos responsáveis por
sua educação – famílias e educadores –, para definir objetivos comuns e partilhar experiências.
A faixa etária das crianças que frequentam educação infantil exige um acompanhamento dos
adultos que lhes são próximos, para subsidiá-las, dentre outras coisas, a construir conhecimentos
sobre si e sobre o mundo.
Segundo o parecer sobre a revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil, o atendimento integral dos direitos da criança:
[...] requer que as instituições de educação infantil, na organização de sua
proposta pedagógica e curricular, assegurem espaços e tempos para a
participação, o diálogo e a escuta cotidiana das famílias, o respeito e a
valorização das diferentes formas em que elas se organizam. (BRASIL, 2009,
p. 13)
A participação das famílias no cotidiano das instituições de educação infantil é
considerada como um dos elementos que definem a qualidade do atendimento (CORRÊA, 2001;
BRASIL, 2006; SILVA, 2011). Entretanto, apesar da importância dessa interação, esse é um
dos aspectos mais delicados e complexos que permeia o cotidiano das instituições de educação
infantil e desencadeia conflitos permanentes (HADDAD, 1993; MONÇÃO, 1999). Há muitas
dificuldades no contato diário entre professoras e famílias para promover o compartilhamento
do cuidado e a educação da criança pequena. Os estudos sobre essa temática evidenciam que as
concepções de família, de maternidade e do papel da mulher são elementos centrais para
compreensão dessa relação (CASTELLO, 1992; FRANSCISCATO, 1996; VITÓRIA, 1997).
As crianças ouvem e acompanham cotidianamente as insatisfações das professoras com
as famílias, como também a insatisfação das famílias com relação às professoras, por meio de
comentários e reclamações realizados na sua presença, na maioria das vezes, sem nenhum
cuidado. Apesar de ser o mote de tais conflitos, a criança fica “invisível” para os adultos, que
pouco atentam aos seus sentimentos, esquecendo-se que as crianças aprendem ao observar e
participar das interações, as quais podem contribuir positiva ou negativamente para a
constituição da imagem que elas constroem sobre si, sobre sua família e sobre os educadores.
Nesse sentido, a natureza do compartilhamento evidencia-se especialmente pela sua
dimensão relacional, que historicamente é fonte de conflitos e tensões entre famílias e
educadores. As emoções, expectativas e valores que circundam essa relação exigem, tanto das
famílias quanto dos educadores, um olhar crítico e uma escuta cuidadosa a respeito das
impressões e sentimentos, nesse processo, bem como a compreensão de que as tensões e
contradições daí originadas provêm de questões sociais, econômicas, políticas e de gênero, não
se restringindo apenas às dificuldades individuais.
223
ISSN 2448-1157
Estudos italianos (BONOMI, 1998) assinalam a necessidade de se vincularem
necessidades e direitos das crianças, educadores e famílias, a fim de construir relacionamentos
que alicercem um atendimento de qualidade e a assunção de toda sociedade quanto à
responsabilidade na educação das crianças pequenas, considerando educação infantil um projeto
da comunidade.
Reconhecer a criança, em sua integralidade, como um compromisso de todos e não
apenas da família pressupõe ter como base o diálogo e a negociação, conhecendo as famílias e
suas expectativas, na trilha de uma cultura de partilha de ideias e experiências a respeito da
educação da primeira infância.
Com a preocupação de analisar as relações existentes entre famílias e profissionais da
educação infantil, no processo de compartilhamento da educação da criança pequena,
realizamos pesquisa empírica em um Centro de Educação Infantil – CEI – da rede municipal de
São Paulo, no período de 2010 a 2011.91 Os dados foram coletados por meio de observação
participante, análise documental e entrevistas semiestruturadas com 11 professoras, um
professor, três coordenadoras pedagógicas, uma diretora, dois agentes técnicos de educação, um
agente escolar, uma auxiliar de limpeza, uma auxiliar de cozinha, uma supervisora de ensino e
18 famílias92.
A observação foi realizada para compreender o cotidiano da instituição em diferentes
momentos da rotina, e nas diferentes modalidades de reuniões: de formação continuada, com as
famílias e conselho de CEI.
A análise documental envolveu a leitura e análise dos documentos internos da unidade e
da Secretaria Municipal de educação.
As entrevistas realizadas foram do tipo semiaberto, utilizando-se um roteiro préestabelecido. Ao compor o grupo de professoras que seriam entrevistadas, buscou-se garantir
91
Este texto é parte de um capítulo da tese Gestão democrática na educação infantil: o
compartilhamento da educação da criança pequena, defendida no Programa de Pós-Graduação
em Educação da Universidade de São Paulo, em 2013, sob a orientação do Professor Dr. Vitor
Henrique Paro.
92
Os nomes do CEI, dos profissionais, das famílias e das crianças são fictícios. Todos os
profissionais e famílias foram devidamente informados quanto ao teor desta investigação e
consultados no que diz respeito ao seu interesse em participar. Ao concordar em participar da
pesquisa, foi apresentado o Termo de Consentimento para cada sujeito, deixando uma cópia
com cada participante e uma com a pesquisadora.
224
ISSN 2448-1157
que entre elas estivessem representadas: 1) professoras de todos os agrupamentos – Berçários,
Minigrupo 1 e Minigrupo 2; 2) professoras dos dois turnos de trabalho – manhã e tarde; 3)
professoras oriundas da Secretaria de Assistência Social – SAS –, professoras de módulo e
professoras que eram membros do conselho de CEI.
Para a escolha das famílias a serem entrevistadas, os critérios estabelecidos foram: 1)
mãe ou pai de crianças de todos os grupos do CEI; 2) mãe ou pai cujo filho utiliza transporte
escolar e que não comparece no CEI, e mãe ou pai que comparece ao CEI cotidianamente para
levar e buscar seu filho; 4) mãe ou pai que participa das reuniões e mãe ou pai que não participa
das reuniões; e 6) mãe ou pai que participa do conselho de CEI e da APM.
A coleta e a organização dos dados foram realizadas a partir de três eixos analíticos: 1) a
relação entre professoras e crianças; 2) a relação entre professoras e equipe de gestão; e 3) a
relação entre educadores e destes com as famílias.
A análise dos dados deu-se ao longo de todo o processo de coleta, foi realizado um
minucioso trabalho de categorização buscando a relação com a bibliografia utilizada. A partir de
cada eixo analítico foram identificadas as categorias de análise.
As categorias analisadas no eixo relação entre educadores e famílias foram: 1) formas
de comunicação com as famílias; 2) o compartilhamento da educação e cuidado da criança; 3)
participação das famílias no conselho de CEI.
O presente artigo trata do conteúdo de uma subcategoria “reuniões com famílias” da
categoria “Formas de comunicação com as famílias”.
Formas de comunicação no CEI: em foco as reuniões com as famílias
A qualificação da comunicação entre famílias e educadores no dia a dia é essencial para
constituir uma relação profícua que permita aproximação e integração entre o contexto familiar
e o educacional.
As reuniões entre familiares, professoras e equipe de gestão são momentos importantes
para aprofundar o processo de compartilhamento da educação das crianças pequenas, ocasião
privilegiada para trocas de informações sobre as crianças entre professoras e famílias. Estas
últimas podem socializar a maneira como educam seus filhos, seus dilemas e suas inquietações
sobre o desenvolvimento das crianças. São ocasiões propícias também para estreitar os laços
entre as famílias, compartilhar experiências e reflexões e ampliar suas concepções sobre o papel
parental, a infância e a política pública de educação infantil.
Entretanto, é comum nas instituições de educação infantil esse momento transformar-se
em repasse de informações sobre regras de funcionamento, eventos, calendário da unidade.
Ouso dizer que em muitas instituições há um monólogo das professoras; as famílias escutam e,
algumas vezes, timidamente falam sobre seus filhos ou perguntam sobre algo.
225
ISSN 2448-1157
No pesquisado, as reuniões ocorrem em duas modalidades: a reunião geral, com todas
as famílias, equipe de gestão e professoras, realizada normalmente no início do ano; e em
momentos em que é preciso informar e encaminhar questões como: calendário da unidade,
reposição de aula e reuniões específicas de cada agrupamento.
Por dois anos consecutivos, observei as duas modalidades de reuniões, que ocorriam de
forma muito similar. A primeira reunião do ano é realizada de acordo com os agrupamentos:
berçários ou minigrupos. A primeira parte acontece no auditório, sendo conduzida pela diretora
e pela coordenadora pedagógica; na sequência, os familiares dirigem-se às salas em que suas
crianças permanecerão, para a reunião com as professoras.
No auditório, a reunião tem início com a apresentação das professoras. Os informes das
reuniões são sempre os mesmos e ressaltam exclusivamente as responsabilidades das famílias
com relação a cumprimento de horários cotidianamente e no período de adaptação, autorização
atualizada para buscar a criança na unidade, cuidados com a higiene e saúde das crianças,
organização das mochilas, leitura da agenda diariamente, colocação de nomes nas roupas e
materiais das crianças.
O segundo momento da reunião é realizado nas salas em que as crianças ficam
diariamente, e é coordenado pelas professoras. Em apenas uma das salas que observei foi
realizada uma dinâmica, em que as professoras solicitavam que as famílias escrevessem quais
eram suas expectativas com relação ao CEI. Nessa sala, as professoras acolhiam afetivamente as
famílias e suas perguntas, tentando tranquilizá-las e demonstrar a qualidade do atendimento.
Os informes são repetidos, enfatizando a necessidade de as famílias cumprirem as
regras e horários de funcionamento da unidade. Esse foi um aspecto que me chamou a atenção,
pois são os mesmos informes em todas as reuniões durante todo o ano, mas são passados como
se fosse pela primeira vez. Inexiste uma ação compartilhada entre as partes, apenas a
responsabilização das famílias com relação a seus deveres. Talvez pelo fato de não haver um
processo de matrícula que envolva e dialogue com as famílias de maneira a conhecer sua forma
de educar, tais informações parecem que não fazem muito sentido para elas ou não condizem
com suas condições de efetivá-las, sem contar que essas regras são constantemente retomadas
por meio de cartazes em frente às salas das crianças.
Apesar da importância da primeira reunião para a constituição do vínculo entre famílias
e educadores, o tom predominante nesse encontro é prescritivo, com ênfase exclusiva nas
normas, que, apesar de repetidas continuamente, não promovem reflexão a respeito de seu
significado para a educação da criança. São regras elaboradas para as famílias e não com elas.
Porém, a ausência de reflexão sobre isso impede os educadores de perceber que, introduzidos
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ISSN 2448-1157
dessa maneira, os informes em nada contribuem para modificar as relações com as famílias; ao
contrário, mesmo sem perceber as professoras reforçam uma relação impositiva e pouco
inclusiva.
Não há espaços que permitam às famílias socializar seus sentimentos; algumas até
expressam suas inseguranças, que são tratadas pelas professoras como algo individual e com
destaque na necessidade de a família confiar no trabalho realizado.
A recorrente afirmação das professoras com relação à necessidade da confiança da
família no trabalho realizado no CEI dá a entender que elas não concebem a confiança como
uma construção que requer tempo e conhecimento entre as partes envolvidas; ao que parece,
compreendem que a instituição já é revestida de uma “aura” que exala confiança, simplesmente
por existir e ter um quadro de profissionais com formação pedagógica.
Além da primeira reunião do ano, existem as reuniões bimestrais nos grupos específicos
– berçários ou minigrupos – ora no período da manhã ora no período da tarde, e as professoras
revezam-se na coordenação e definição da pauta. Essa forma de organização não garante a
reflexão sobre o planejamento e avaliação das reuniões entre as professoras dos dois períodos.
Os conteúdos abordados não são analisados coletivamente: ocorre apenas a socialização de
dinâmicas de grupo, textos ou vídeos, que podem ser utilizados por todos. Algumas professoras
preparam a reunião de modo a proporcionar diálogo com as famílias e estimulam que façam
perguntas, mas isso não é uma ação coletiva.
Há uma regularidade em iniciar a reunião com a leitura de um texto, seguida por uma
dinâmica de grupo e informes  que são sempre os mesmos. Após os informes, as professoras
relatam o trabalho desenvolvido, descrevem os projetos, socializam as produções das crianças –
desenhos  e, semestralmente, os relatórios de avaliação. Quando a reunião ocorre para repor
algum dia de funcionamento do CEI, em geral é realizada aos sábados, nos moldes de uma
oficina, e conta com a participação das crianças, tal como aconteceu na última reunião na sala
do Berçário 2, em 2010, em que as professoras realizaram uma roda de música com as famílias
e seus filhos, entregaram os relatórios de avaliação das crianças e depois as crianças e seus
familiares participaram de outra atividade recreativa.
Geralmente, os relatórios das crianças são entregues para que as famílias leiam, assinem
e devolvam para a professora. Não há nenhuma discussão sobre eles, é uma ação bem formal.
Pareceu-me que muitos pais nem compreendem seu conteúdo, além das questões
comportamentais. Apesar das reflexões para a sua elaboração, a apresentação dos relatórios para
as famílias parece não ter sentido, não tem efeito formativo.
Nessas reuniões, assim como na reunião geral, as famílias ouvem muito e pouco se
expressam. Quando falam, sempre fazem perguntas sobre a rotina, alimentação e
227
ISSN 2448-1157
comportamento das crianças, especialmente se batem em outras crianças, indagações às quais as
professoras respondem prontamente.
Mas a preocupação com o comportamento das crianças é reforçada muitas vezes pelas
professoras. Ilustrativo disso é o caso de uma reunião do Minigrupo 2, em que a professora
Zoraia falou sobre a agressividade das crianças e disse ter enviado bilhetes para as mães cujas
crianças apresentaram esse comportamento no CEI, o que desencadeou uma série de
manifestações das famílias, solicitando informações sobre seus filhos, como nos exemplos a
seguir:
Tatiana, mãe de Rosiska, diz: “Igual à questão do palavrão, eu não falo, mas
meu marido fala. Eu sabia que um dia ia acontecer isso na escola. Até no
posto de saúde, esses dias ele [filho] xingou porque doeu.”
Na sequência, Veruska, mãe de Karina, pergunta sobre sua filha e a
professora responde: “A Karina tem o gênio forte, mas ela não me responde
quando falo com ela. Ela tem dificuldade para comer.” A mãe pergunta em
que momento se manifesta essa dificuldade e a professora informa que é na
hora do almoço.
Núbia, mãe de Julieta, do Minigrupo 2, relata que sua filha fala sempre de
namorados e a professora Zoraia afirma: “Aqui a gente não deixa eles
ficarem com essas gracinhas, são amigos.”
Pode-se perceber que não há propriamente um diálogo, mas um conjunto de perguntas
que a professora responde sem promover nenhuma reflexão além de sua observação pessoal,
que pouco retrata os pressupostos teóricos educacionais ou os princípios do projeto pedagógico.
Outra questão que chama a atenção na reunião do Minigrupo 2 e que observei também
em outras salas refere-se a quando as famílias perguntam sobre algum momento da rotina ou
situação que não corresponde ao período em que a professora que está coordenando a reunião
trabalha: ela responde solicitando que os familiares conversem com a docente do outro período,
o que demonstra a falta de integração entre elas.
Percebi muito envolvimento das famílias quando há relatos sobre como seus filhos estão
se desenvolvendo. Os pais ficam felizes e demonstram grande satisfação com o trabalho do CEI.
Dona Floriana, mãe de Ademar, do Berçário 1, diz: “Ele já corre [quando chega ao CEI], quer
ver os amiguinhos dele, ele gosta daqui e eu fico tranquila com isso, ele é bem tratado.”
Tal como acontece nas reuniões do ensino fundamental, ao final permanecem alguns
familiares para tirar dúvidas ou por solicitação da professora.
228
ISSN 2448-1157
Em uma das salas do Minigrupo 1, em 2010, as famílias demonstraram muito interesse
e insegurança com relação à passagem das crianças para a Emei93 no final do ano; entretanto, as
professoras não haviam colocado esse assunto na pauta e, quando as famílias se manifestaram,
abordaram a temática sem aprofundamento.
Noélia, mãe de Fausto, que estava ao meu lado na mesma reunião, durante todo o tempo
falou-me sobre sua preocupação, pois seu filho estava muito acostumado no CEI e ela
acreditava que ele estranharia a nova escola. Essa mãe ficou após a reunião, para conversar com
as professoras sobre isso.
É conhecida, por parte das professoras e educadores do CEI, a preocupação e o receio
das famílias ao transferirem seus filhos para a Emei. A insegurança se dá, especialmente, por
conta do grande número de crianças por sala, com apenas uma professora, e da diminuição do
período de permanência da criança na escola, que passa do integral para o parcial. Entretanto, a
ciência desse fato não é suficiente para mobilizar ações que promovam um processo de
transição a fim de contemplar os cuidados necessários com as crianças e suas famílias.
Novamente, a política da secretaria trata esse momento como mais uma atividade formal, como
se fosse possível desconectá-la da proposta pedagógica.
A transição da criança do CEI para a Emei precisa ser melhor analisada, buscando-se
compreender as repercussões no desenvolvimento infantil, considerando, especialmente, a
ausência de integração entre essas instituições e a diferença em suas propostas pedagógicas.
O dia da família no CEI é um evento previsto para ocorrer semestralmente e tem como
proposta realizar atividades que envolvam as professoras, as crianças e as famílias.
Nesses encontros há sempre uma produção coletiva: desenhos, pintura da cortina da
sala, confecção de brinquedos. Os familiares apreciam muito realizar essas atividades com as
crianças.
As famílias entrevistadas teceram muitos elogios a esse momento, destacando a
importância da participação das famílias para as crianças. Relatam que, por diversas vezes,
ficaram comovidos em ver as crianças cujos familiares não compareceram, percebendo que,
mesmo com a acolhida das professoras, ficavam tristes e solitárias.
Apesar de seu caráter pontual, esse momento demonstra ser muito frutífero para
potencializar a relação com as famílias, talvez pelo seu formato de oficina, com um ambiente
descontraído e alegre. A análise desses encontros pode dar pistas para se repensar a metodologia
usual das reuniões com as famílias. Porém, a maioria das avaliações realizadas trata de aspectos
93
Escola Municipal de Educação Infantil que atende crianças de 4 e 5 anos.
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ISSN 2448-1157
de ordem organizacional – espaços e materiais –, sem nenhuma vinculação com a importância
do compartilhamento da educação da criança.
Considerações Finais
A comunicação entre educadores e famílias, é uma das dimensões presentes no
cotidiano de uma instituição de educação infantil, e que constitui o compartilhamento da
educação e do cuidado entre educadores e famílias, compreendendo-o como a natureza da
especificidade da gestão democrática nas instituições educacionais destinadas à primeira
infância.
A constituição de um projeto coletivo pressupõe compreender que a prática
democrática não é linear, tem contradições e, paradoxalmente, na busca da democracia podemse também promover ações autoritárias, como é o caso das reuniões: apesar de sua natureza
democrática, a forma como tem sido constituído na prática, além de burocrática, pouco favorece
a participação das famílias.
É preciso reafirmar o sentido da educação pública e o direito dos cidadãos de participar
das instituições educacionais, tanto nos espaços coletivos – reuniões com as famílias, conselhos
de escola e APM -, quanto na participação cotidiana direta sobre a educação das crianças.
Romper com a “invisibilidade” das famílias, nas reuniões e no dia a dia, pode contribuir
para inverter a visão negativa da maioria das professoras sobre as famílias e promover a
efetivação do compartilhamento da educação das crianças.
É preciso ter claro que, se o compartilhamento da educação da criança pequena é uma
das finalidades da educação infantil, é salutar enfrentar o debate sobre a especificidade do papel
de cada instituição, da família e do CEI. Mas, como identificar a linha tênue que marca o limite
entre essas duas instituições? Onde é o ponto em que elas se entrelaçam? Como garantir
interações que sejam minimamente invasivas, tanto por parte do CEI como da família?
A luta pelos direitos fundamentais das crianças associa-se à luta pelos direitos dos
trabalhadores que possuem filhos de 0 a 6 anos, a terem garantidos em lei dispositivos que
efetivem o compartilhamento da educação da criança pequena entre o Estado e a família, com
medidas que proporcionem tanto à mãe quanto ao pai a possibilidade de participar das reuniões
e acompanhar o trabalho desenvolvido com a criança no CEI, sem nenhum prejuízo financeiro
ou na carreira. Nessa batalha, os profissionais da Educação devem perceber as famílias como
aliadas.
A discussão sobre a importância da participação das famílias nas instituições de
educação infantil deve extrapolar o contexto educacional e somar força com as lutas por
melhores condições de vida, extinção das desigualdades sociais, pelos direitos das mulheres à
igualdade de oportunidades.
230
ISSN 2448-1157
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232
ISSN 2448-1157
Integração entre família e escola: retrato da experiência de professores
no papel de pesquisadores iniciantes
Ana Paula de Barcellos Almeida1
Helen Karina Alexandre Vicente2
Jaime de Freitas Vieira3
Maria Goreti Mião4
Núbia Gomes Mendes da Silva5
Prefeitura Municipal de São Carlos
Resumo:Neste artigo há um relato da experiência de 7 professores-pesquisadores da
Educação Infantil de São Carlos, bolsistas da CAPES pelo programa OBEDUC 6 , que
visa estabelecer uma relação orgânica entre a escola básica e a universidade através da
pesquisa “Políticas Públicas Municipais de Educação Infantil: diagnóstico e
pesquisa”.Neste trabalho há idéias sobre expectativas dos pais de crianças da préescola, melhoria da relação família e escola e qualidade na Educação Infantil.
Palavras-chave: Infância, Família e Escola, Qualidade na Educação Infantil.
1
Professora de Educação Infantil da Prefeitura Municipal de São Carlos
Professora de Educação Infantil da Prefeitura Municipal de São Carlos
3
Professor de Educação Infantil da Prefeitura Municipal de São Carlos
4
Professora de Educação Infantil da Prefeitura Municipal de São Carlos
5
Professora de Educação Infantil da Prefeitura Municipal de São Carlos
2
6
OOBEDUC(Observatório da Educação) foi coordenado pela Prof.ªDr.ªAnete Abramowicz da
UFSCar.
233
ISSN 2448-1157
Este trabalho conterá um breve relato da prática de um grupo de cinco professores em
efetivo exercício na Educação Infantil da Prefeitura Municipal de São Carlos, que são
bolsistas pesquisadores financiados pela CAPES em parceria com o Programa
Observatório da Educação (OBEDUC). A experiência como pesquisadores iniciantes foi
possível através da coleta de dados realizados para o desenvolvimento do projeto de
pesquisa “Políticas Públicas Municipais de Educação Infantil: diagnóstico e pesquisa”.
A partir de um projeto piloto desenvolvido atualmente no município de
São Carlos – SP pode-se afirmar que o objetivo principal da pesquisa é a elaboração
de indicadores para a realização de um diagnóstico da rede municipal de Educação
Infantil dos municípios brasileiros, com o intuito de subsidiar a avaliação das políticas
públicas considerando a qualidade do atendimento às crianças nesta primeira etapa do
ensino básico.
Para a oportunidade de vivência da
prática
como pesquisadores no
referido projeto, participamos de um processo seletivo realizado pela UFSCar em
parceria com a Prefeitura Municipal de São Carlos no início de 2013, no qual
respondemos um questionário sobre quais objetivos tínhamos para trabalhar com a
pesquisa e noções sobre a qualidade na Educação Infantil.
O processo seletivo dos bolsistas foi desenvolvido em seis Centros
Municipais de Educação Infantil de São Carlos (CEMEIs) que atendem tanto crianças
de creche (0 a 3anos) quanto de pré-escola (4 a 5anos) no início do anode2013.
A motivação do grupo de professores para iniciar a prática como
pesquisadores se relaciona com a necessidade de atualização de conhecimentos e a
percepção de que para existir qualidade no trabalho com a educação infantil é
imprescindível que o professor seja pesquisador e reflita sobre práticas que garantam
o direito da criança de ser criança, ou seja, não adiantem conteúdos e aprendizagens
que serão proporcionadas no ensino fundamental.
Cabe ressaltar que a metodologia utilizada foi por amostragem e a coleta
de dados ocorreu através da aplicação de questionário com as famílias das crianças
atendidas, possibilitando investigações
responsáveis,
nível
do
perfil
socioeconômico
dos
de escolaridade, raça e profissão dos mesmos, além do
conhecimento do tipo de interações que as famílias têm com as crianças dentro e fora
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do ambiente escolar; dos motivos pelos quais as famílias colocam as crianças nas
escolas e ainda considerações sobre aspectos positivos e negativos da unidade escolar.
Para a realização das entrevistas cada professor-pesquisador recebia uma
lista de alunos de uma unidade escolar especificamente selecionada por um
representante
da Secretaria Municipal de Educação (Afonso Canella Henriques,
responsável pela atualização do sistema de cadastro de alunos –SIAED) e contava
com o apoio da direção para adquirir os números dos telefones dos responsáveis e
realizar agendamento de horários.
A primeira visita à escola era basicamente para nos apresentarmos e falar
sucintamente sobre o projeto com a diretora, mostrar-lhe a lista de crianças préselecionadas e pedir autorização para que pudéssemos usar o espaço, o telefone e os
contatos dos responsáveis com o intuito de dar credibilidade à proposta da pesquisa.
Posteriormente, ligávamos para cada responsável e agendávamos um
horário para que comparecessem à escola. Na presença destes realizávamos uma
entrevista que durava cerca de15a 30minutos, variando de acordo com o interesse do
respondente em expor sua opinião detalhadamente.
No total foram 47 CEMEIs participantes da pesquisa e a coleta de dados
durou aproximadamente um ano, nesse período dentre as principais dificuldades
encontradas pode- se destacar o acesso aos números dos telefones dos responsáveis
pelas crianças, pois muitas vezes os pais não atualizam a mudança do número;
momentos em que o telefone da escola era utilizado por outras pessoas ou estava
quebrado e não era possível realizar os agendamentos; caso de crianças afastadas,
transferidas ou que abandonaram a escola e o não comparecimento dos pais aos
encontros marcados.
Para superar essas dificuldades com os pais que não conseguíamos
comunicar por telefone, abordávamos os mesmos na entrada ou saída das crianças na
escola, com ajuda da direção ou professor, e o agendamento era feito pessoalmente ou
ainda por bilhetes enviados nas mochilas. Quando o telefone da escola estava
quebrado usávamos o nosso celular ou íamos à escola mais próxima. Com relação aos
pais que não compareciam aos agendamentos remarcávamos a entrevista em outros
235
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horários, às vezes até depois do horário escolar, fazíamos por telefone ou na
residência dos mesmos. Para evitar o não comparecimento enviávamos mensagem
por
SMS com aproximadamente uma hora
de antecedência lembrando-os da
entrevista.
O fato das entrevistas serem realizadas nas escolas contribuiu para
contarmos com o apoio dos diretores e professores, pois já conheciam os pais e nos
auxiliavam em aspectos como a maneira adequada para interagir, melhor horário para
marcar a entrevista, confirmação se a criança foi transferida de escola, se os pais eram
separados e quem buscava ou levava a criança no espaço escolar (se era motorista de
van, irmãos, tios ou avós) etc.
Um momento marcante para o grupo durante o período de entrevistas com
as famílias ocorreu quando uma professora/pesquisadora perguntou a uma mãe sobre
a raça/cor de sua filha, ela respondeu com firmeza que sua filha era negra, e se
orgulhava de ser da raça negra. Ainda se posicionou a favor dos negros se aceitarem
da “cor que são”, ressaltando que não concordava quando uma pessoa negra se define
como morena.
Ao final, a entrevistadora se impressionou com a firmeza com que a mãe
expôs suas idéias e da autoestima desta como pertencente a raça negra. Após um mês
aproximadamente, esta, emocionada, pediu um abraço e agradeceu por ter participado
da entrevista, disse que as palavras a incentivaram cursar a graduação em Ciências
Sociais.
Outra situação relevante para o grupo foi numa escola localizada em um
bairro periférico, no geral, percebemos que neste bairro a maioria das crianças é criada
pelos avós. No dia combinado com os responsáveis pela criança selecionada
apareceram a avó e o avô.
Quando a entrevistadora explicou o motivo do contato, eles demonstraram
certa apreensão, pois disseram que não sabiam ler e nem escrever, após o
esclarecimento de que a entrevista era apenas uma conversa ficaram mais a vontade.
No entanto, quando as perguntas dirigiam-se aos pais da criança os avós ficavam com
os olhos cheios de lágrimas, já que a mãe era usuária de drogas e o pai estava preso.
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Ainda sobre esta entrevista, impressionou a percepção de que nas questões
sobre a convivência em casa diziam que o que eles mais queriam era salvar o neto e se
culpavam de não terem conseguido salvar a filha. Citaram também a importância do
professor, da educação e o quanto gostavam da escola. Ao final da aplicação do
questionário, a avó agradeceu muito porque naquele momento ela se sentiu importante
e respeitada. Parece uma história trivial das classes marginalizadas, mas representou
muito para todos nós.
Cabe ressaltar que os resultados gerais da pesquisa estão sendo
compilados em dados estatísticos, para serem divulgados a Secretaria de Educação e a
toda equipe escolar dos CEMEIs participantes, com o intuito do conhecimento da
clientela atendida na rede pública, possibilitando um direcionamento maior de
investimentos para a primeira etapa da Educação Básica e contribuindo para a futura
elaboração de indicadores de qualidade para a educação infantil.
Porém, através da relação com as famílias das crianças pudemos refletir
sobre a expectativa dos pais ao matricularem seus filhos nas creches e/ou pré-escolas,
estimulando a reflexão sobre concepção de infância, importância da melhoria das
interações entre família e escola e concomitantemente a necessidade de redefinir
políticas públicas para que exista qualidade no atendimento às crianças de 0 a 5 anos
de idade.
O que mais surpreendeu o grupo de professores-pesquisadores foi a
contradição entre o que os documentos legais indicam com o adequados para a prática
pedagógica dos docentes na Educação Infantil e o que pais esperam que a escola
proporcione a seus filhos.
Este fato trouxe à tona questões referentes a importância da atualização do
PPP (Projeto Político Pedagógico) com a participação das famílias, para que haja
reflexão sobre concepção de infância e o que é adequado proporcionar às crianças nos
ambientes escolares.
Segundo Ariès (1981) durante séculos a criança foi considerada como
“um adulto em miniatura”, sem a valorização de suas especificidades, dessa forma
237
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“mal adquiria algum desembaraço físico, era logo misturada aos adultos, e partilhava
de seus trabalhos e jogos”
(p.4).
No Brasil, a primeira abordagem do reconhecimento da Educação Infantil
como “uma extensão do direito universal da educação” é destacada na Constituição de
1988e é resultado das reivindicações de movimentos populares.
Segundo Moruzzi (2010) a partir desta conquista iniciou-se o debate sobre
qual modelo de educação infantil as creches e pré-escolas pretendiam oferecer, ao
mesmo tempo desencadeou a preocupação com a formação dos profissionais ligados à
áreada educação.
Em seu artigo primeiro, a LDB trata da educação de uma forma muito
ampla e reconhece que a escola compartilha a responsabilidade de educar as novas
gerações com várias outras instituições da sociedade; a família, a convivência
humana,o trabalho,as instituições de ensino e pesquisa, os movimentos sociais e as
manifestações culturais.
Portanto,
a família e
a escola compartilham a
responsabilidade pela educação com várias outras instituições, por isso, os
estabelecimentos de ensino já não podem mais, por imposição legal, serem geridos de
costas para a família e a comunidade.
Assim como existem nas escolas projetos pedagógicos e planos de gestão,
deve existir também uma estratégia de comunicação para promover uma relação de
qualidade entre professores, alunos, funcionários e direção e, destes, com as famílias.
Os pais, além de informações regulares sobre a frequência e o rendimento
de seus filhos na escola, devem ter acesso ao conhecimento da proposta educativa
(projeto pedagógico) da escola, de modo a ter condições de acompanhar a sua
execução. Sem o respeito a esse direito, as famílias não têm como avaliar e contribuir
para melhorar a qualidade da educação oferecida a seus filhos.
Ainda segundo a referida lei, a melhoria das relações da escola com a
família e a comunidade não é um dever apenas da direção da escola. O professor por
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ser aqueleque se relaciona mais diretamente com as crianças desempenha um papel
fundamental nesta integração.Esta é uma questão que precisa ser encarada não só para
a melhoria das relações escola-família-comunidade como também para o resgate do
prestígio e da função social do Magistério.
Silva (2011)indica a necessidade da aproximação “entre os adultos que
compartilham os cuidados e a educação das crianças dentro e fora dos espaços
coletivos e ressalta a importância de não existir uma “hierarquização de poder”, mas
que as relações entre a família e a escola sejam pautadas na abertura para o diálogo,
na confiança e na aceitação das diversas culturas participantes da instituição
educativa.
Segundo a autora as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil
(2009) especificam como deve ser a relação família-escola de modo a promover
trocas recíprocas, pois
apresentam a educação infantil como um espaço educativo que tem
o importante papel de compartilhar, de forma indissociável, a
educação e o cuidado das crianças pequenas com suas famílias.
Assegurar o direito à participação, o diálogo e a escuta cotidiana das
famílias, o respeito e a valorização de suas formas de organização
deve ser o desafio constante dos adultos que convivem com essas
crianças nos espaços coletivos das creches e pré-escolas, para que
as culturas infantis possam ser reconhecidas e valorizadas
(SILVA,2011,p.115).
Nesse sentido, pode-se afirmar que os aspectos referentes à prática
docente são primordiais para definir qual o tipo de relação que as famílias
estabelecerão com o ambiente escolar, se serão participativas e que visão terão sobre o
papel da instituição para o desenvolvimento integral da criança.
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Outro aspecto que chamou a atenção deste grupo, após o contato com os
pais pesquisados, foram estudos no campo da Sociologia da Educação, como o de
Vianna que nos fizeram refletir e mudar nosso ponto de vista, demonstrando que nem
sempre os destinos escolares improváveis podem ser explicados pelos “processos
familiares de mobilização escolar”(Laacher,1990; Lahire,1997; apud Viana,1998).A
noção de "mobilização escolar familiar" tem sido entendida como atitudes e
intervenções práticas voltadas para o rendimento escolar dos filhos, ou seja,
participação ativa na escola. Esses estudos apontam para a necessidade de melhor
qualificar e caracterizar as relações das famílias das camadas populares com a
escola.
Uma constatação das pesquisas acerca das relações das famílias populares com a
escola foi que estas não são omissas e indiferentes com relação à escolarização dos
filhos, a despeito da idéia disseminada, sobre tudo entre nós, docentes de que os pais
não se importam com a educação de seus filhos e filhas.
Pelas entrevistas realizadas, o grupo de professores-pesquisadores
puderam observar que uma parte dos pais demonstrou interesse em participar da vida
escolar de seus filhos ao irem à unidade escolar, outra parte avaliou a escola como um
lugar importante para o bom desenvolvimento deles e não sabem como participar da
vida escolar,
e uma terceira parcela, apesar de demonstrar pouco conhecimento do
cotidiano destes no interior da escola, acreditavam na instituição como um lugar
seguro e bom para seus filhos.
Concluímos a esse respeito que a omissão escolar dos pais das camadas
populares é um mito produzido pelos docentes, nós pedimos e exigimos a presença
dos pais, ou de alguns pais, geralmente queremos os que não comparecem, e
raramente nos ocupamos em saber os motivos pessoais; fechamos as portas para a
maioria dos pais que querem entrar, tememos de alguma forma estes pais. Ora, não há
omissão dos pais das famílias populares, com relação à escola, “ao contrário, os meios
populares expressam uma forte demanda com relação à escola.” (CHARLOT apud
VIANNA1997, p. 70).
240
ISSN 2448-1157
Durante as entrevistas observamos diariamente e posteriormente na
tabulação dos dados a preocupação dos responsáveis com a alfabetização. Não
estamos falando em letramento (apresentação do mundo letrado), mas em préalfabetização para que as crianças segundo os pais “entrem no primeiro ano sabendo
ler e escrever”. As falas indicavam pedidos para que seus filhos fossem mais
estimulados na área das letras e números, que a escola preparasse melhor as crianças,
que soubessem escrever o nome completo e o nome dos pais, aprender números pelo
menos até 30, dentre outros.
Nesse sentido, pode-se perceber que mesmo com o surgimento da
lei11.274/06 que instituiu a obrigatoriedade das matrículas no Ensino Fundamental
aos 6 anos de idade e a ampliação deste nível de ensino para 9 anos, as famílias
querem adiantar a fase de alfabetização na Educação Infantil.
Dessa forma, pode-se afirmar que é essencial esclarecer aos pais das
crianças de pré-escola que a função docente
Se desenvolve muito mais sobre a organização de contextos estruturantes
que sobre a proposta de estímulos diretos no fazer das crianças, muito mais
sobre a capacidade de reconhecimento e expansão das diversidades dos
estilos de condutas das crianças que sobre a ânsia de conduzi-las para
atuações precisas e pré-definidas (FORTUNATIAPUDSILVA,2009,P.38).
De acordo com o Manual de Orientação Pedagógica do MEC sobre
Brincadeira e Interações nas Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil (2012)
tanto na creche quanto na pré-escola as crianças vão “experimentando ler o mundo
para explorá-lo: vendo, falando, movimentando-se, fazendo gestos, desenhos, marcas,
encantando-se com suas descobertas” (MEC, p. 8).
Sendo assim, cabe ao professor de Educação Infantil explicar às famílias
que o objetivo principal da escola nessa etapa da educação básica é proporcionar
contextos em que as crianças tenham o direito de “poder brincar, criar, refletir,
analisar, pensar com cores, sons e com o corpo” (CUNHA, 2002,p.6).
Considerando a importância de
refletir
sobre
teoria
e
prática
enquanto professores-pesquisadores,vale ressaltar que este trabalho influenciou de
241
ISSN 2448-1157
inúmeras formas nossa atuação no ambiente escolar, tanto para o planejamento da
rotina pedagógica quanto para a relação com as famílias das crianças.
A participação no projeto foi importante para conhecer melhor a realidade
das famílias da unidade escolar em que trabalhamos e isto influenciou positivamente
em nossa convivência com as crianças.
Além disso, a
possibilidade
de coletar dados em diversos bairros
nos proporcionou conhecimentos sobre diferenças na renda e escolaridade das
famílias.Tal fato permitiu analisar, portanto, se existem influencias desses aspectos na
visão delas sobre a importância do ambiente escolar para seus filhos.
Nesse sentido, a experiência como pesquisadores permitiu a constatação
de como as ações dos professores podem impactar positivamente na formação social
não só das crianças, mas também de suas famílias.
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244
ISSN 2448-1157
Expansão da oferta de educação infantil no contexto dos planos de
educação: um estudo sobre a evolução da matrícula em municípios do Rio
Grande do Sul94
Msc. Ariete Brusius95
Drª. Maria Luiza Rodrigues Flores96
Resumo
O trabalho apresenta dados de pesquisa sobre a oferta da educação infantil em dois municípios
do Estado do Rio Grande do Sul. A metodologia da pesquisa se configura como estudos de caso
múltiplos (YIN, 2005), apoiada em uma abordagem quali-quantitativa em educação (ANDRÉ,
2013), envolvendo estudo documental e análise de dados estatísticos demográficos e
educacionais, usando como fonte três estudos do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande
do Sul e considerando a evolução desta oferta educacional no período 2006-2013. As análises se
apoiam em uma perspectiva histórico-crítica na pesquisa em política educacional (KRAWCZIC,
2013a; 2013b), abordando a oferta de educação infantil em seu contexto (DAHLBERG, MOSS,
PENCE, 2003). Os resultados apontaram que os dois municípios, com patamares semelhantes
em 2006, apresentavam, em 2013, desempenho aproximado em relação às taxas de atendimento
para a creche e para a pré-escola, ressalvando-se algumas diferenças nas políticas
implementadas.
Palavras-chave: Educação Infantil; Creche; Obrigatoriedade da Pré-escola; Plano Nacional de
Educação.
Apresentação do estudo
Este artigo apresenta dados de uma pesquisa que monitora a expansão da oferta da
educação infantil em um conjunto de municípios gaúchos no contexto das determinações da
Constituição Federal de 1988 (CF/88) em relação ao direito das crianças de até seis anos e de
suas famílias a esta oferta educacional. Sua relevância se justifica em função da necessidade de
monitoramento e avaliação da oferta de atendimento, especialmente, a partir da obrigatoriedade
de matrícula escolar na pré-escola para a faixa etária de quatro e cinco anos, consequência da
alteração constitucional promovida pela Emenda Constitucional 59/09 (EC 59/09). O objetivo
principal do recorte aqui apresentado foi analisar a evolução da matrícula em creche e pré94
Este texto é resultante da pesquisa “Monitoramento de Políticas Públicas de Educação Infantil
no Rio Grande do Sul: estudo sobre a implementação da Emenda Constitucional 59/09 –
obrigatoriedade de matrícula na pré-escola”, desenvolvida desde 2012 sob a coordenação da
Profª. Drª. Maria Luiza Rodrigues Flores, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS).
95
Mestre em Educação, professora da Rede Municipal de Ensino de Novo Hamburgo
96
Doutora em Educação, professora Adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul.
245
ISSN 2448-1157
escola em dois municípios do Rio Grande do Sul (RS), São Leopoldo (SL) e Novo Hamburgo
(NH). Como objetivos específicos, pretendíamos mapear o alcance das metas do Plano Nacional
de Educação (PNE): 2001-2010 (Lei 10.172/01) para a creche e a pré-escola em cada um dos
municípios e, ainda, sinalizar quanto às possibilidades por parte dos mesmos de efetivarem a
universalização da matrícula escolar na pré-escola até 2016. Nossa perspectiva de análise
pressupõe que cada município realize diagnóstico e estabeleça estratégias em relação à
universalização da pré-escola, desde que essa expansão não se constitua em justificativa para a
retração das vagas destinadas à faixa etária de até três anos, e nem mesmo para a ampliação de
vagas para as crianças de quatro a cinco anos com comprometimento de padrões mínimos de
qualidades necessários a esta oferta educacional no âmbito dos sistemas municipais de educação
(MALTA CAMPOS, 2010; ROSELANE CAMPOS, 2010).
Metodologia
Do ponto de vista teórico-metodológico, o estudo se enquadra em uma abordagem
quali-quantitativa em educação, desenvolvendo análises a partir da sistematização de dados
estatísticos demográficos e educacionais destes dois municípios, caracterizando-se como
estudos de caso múltiplos, nos quais procedemos, também, à análise documental (YIN, 2005;
ANDRÉ, 2013). Os dois municípios da amostra localizam-se na Região Metropolitana do
estado, próximos à Capital, possuindo perfil sociopolítico-econômico, cultural e educacional
com muitas características que aproximam suas histórias, o que permitiu que pudéssemos
colocar em relação a trajetória de ambos, no que se refere à oferta de educação para crianças de
até seis anos.
As principais fontes utilizadas para a coleta de dados estatísticos foram os estudos
disponíveis no site do Tribunal de Contas do Estado (TCE/RS, 2007, 2012, 2015), que
sistematizam informações referentes à evolução das matrículas nos municípios gaúchos, com
base no Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (INEP) e no Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
As análises se apoiam em uma perspectiva histórico-crítica no campo da pesquisa em
política educacional (KRAWCZIC, 2013a; 2013b), abordando as diferentes realidades de
maneira particular em seus contextos, sem incorrer no desenvolvimento de um estudo
comparativo linear. Inspiramos-nos em Dahlberg, Moss e Pence (2003), quando estes afirmam a
impossibilidade de analisarmos diferentes realidades mundiais quanto à atenção à primeira
infância sem considerar contextos locais.
Base legal e revisão da literatura
Resgatando o ordenamento legal vigente, iniciamos pela Constituição Federal de
1988 (CF/88), que determina a responsabilidade do Estado para com o atendimento às crianças
de até seis anos, elevando o direito educacional à categoria de direito fundamental.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9394/96 (LDBEN), alterada
pela Lei nº 12.796, de 2013, afirma a educação escolar pública obrigatória e gratuita dos quatro
aos 17 anos de idade, definindo a educação infantil como a primeira etapa da educação básica.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei 8069/90, coloca a criança como prioridade
absoluta no acesso às políticas sociais, fortalecendo o direito destas à educação. No ano de
2009, a Resolução CEB/CNE 01/99 foi revogada pela Resolução CEB/CNE 05/09, que instituiu
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação infantil (DCNEI), consolidando neste
documento de caráter mandatório uma concepção de criança e de infância que busca reconhecer
a diversidade brasileira, afirmando a necessidade de espaços e tempos adequados para esta etapa
da educação.
Como consequência de um processo histórico-social, político e pedagógico havido nas
últimas décadas, a educação infantil, vem se consolidando como espaço/tempo voltado à
vivência da infância, hoje entendida como plural dada à diversidade de formas para a sua
manifestação em cada contexto. Abramowicz e Oliveira (2011) destacam, neste quesito, que
246
ISSN 2448-1157
para pensarmos uma sociologia da infância na atualidade, considerando a realidade brasileira, é
mister incluirmos aportes teóricos sobre outras categorias, tais como as questões “[...] étnicoraciais, de gênero, sexualidade e classe social [...]”(ABRAMOWICZ e OLIVEIRA, 2011, p.
49).
Contudo, no Brasil, em que pesem alguns avanços recentes, ainda se colocam grandes
desafios vinculados ao financiamento adequado desta etapa de maneira a garantir a
implementação de padrões de qualidade próprios, sem inspiração em modelos vinculados à
educação formal ou a atendimentos alternativos de baixo custo (ARELARO, 2012).
Reconhecida como primeira etapa da Educação Básica e presente desde o primeiros plano
decenal de educação do Brasil instituído por lei, o PNE 2001-2010, a educação infantil constou
na Meta 1, sendo determinada a ampliação de sua oferta de forma a atender, em cinco anos, no
mínimo, a 30% da população de até três anos de idade e a 60% da população de quatro a seis
anos (ou quatro e cinco anos) 97. Até o final daquela década, a meta era alcançar o percentual de
50% da população de zero a três anos de idade e de 80% da faixa entre quatro a seis anos.
Em termos de metas de atendimento, para o caso da creche, comparando-se o
determinado no PNE anterior e no atual, criado pela Lei 13.005/14 e com vigência para o
decênio 2014-2024, percebemos que o texto da Meta 1 para o grupo etário correspondente à
creche não foi alterado. Se considerarmos que o país, ao final da vigência do PNE 2001-2010
alcançou apenas 20,93% para esta sub-etapa (TCE-RS, 2012), verificamos que esta meta de
atendimento permanece, ainda, como um grande desafio. Para a pré-escola, ao final daquela
década, o país alcançou, na média, o percentual de 80,23%, atingindo o previsto. Contudo,
vários estudos apontam para as desigualdades regionais e estaduais no acesso a esse direito.
Como exemplo, em 2011, o RS havia alcançado apenas 63,39% de atendimento na faixa da préescola (TCE-RS, 2012). No PNE atual, a Meta 1 determina a universalização da pré-escola até
2016 em consonância a alteração na faixa etária de matrícula escolar obrigatória efetivada pela
EC 59/09.
Estudos sobre eventuais impactos da obrigatoriedade de matrícula escolar para as
crianças de quatro e cinco anos (MALTA CAMPOS, 2010; ROSELANE CAMPOS, 2010;
FLORES et al., 2011 e VIEIRA, 2011) alertam quanto a indesejados processos de escolarização
precoce, ao risco do recurso a atendimentos de baixo custo para crianças bem pequenas, a uma
possível cisão entre creche e pré-escola, à redução do direito ao tempo integral ou, ainda, ao
congelamento das vagas para a creche.
Rosemberg (2012, 2014) destacou a recorrente inobservância por parte de alguns
gestores municipais no que se refere à efetivação do direito educacional para as crianças de até
três anos. A autora afirma a existência de discriminação para com este grupo etário no que se
refere ao acesso à educação, destacando que, quando desagregamos os dados por idade, fica
ainda mais evidente esta desigualdade, pois, quanto menor a criança, menos percentual de
atendimento observamos.
Aspectos como a situação de vulnerabilidade social das famílias e o nível de escolaridade
dos pais, também, já foram sinalizados como aspectos que interferem na efetivação do direito à
educação infantil (CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO, 2014). De
forma complementar às políticas de equidade no acesso a uma vaga, destacamos que também se
faz necessária a implementação de políticas que avancem em termos de qualidade da oferta,
enfocando áreas como a formação inicial e continuada de docentes, infraestrutura e materiais,
assim como a organização curricular, para que o país efetive o direito à educação para as
crianças de até seis anos.
Desenvolvimento da pesquisa e resultados
97
Em 2006, a Lei 11.274 determinou a ampliação do ensino fundamental para nove anos de
duração com ingresso aos seis anos de idade.
247
ISSN 2448-1157
Tomando como mote o papel do Estado em relação ao seu dever para com a oferta
educacional, o TCE-RS publicou, em 2007, um estudo divulgando a situação do estado quanto à
oferta de educação infantil, evidenciando importante defasagem deste estado em relação às
metas intermediárias do PNE 2001-2010. Com base neste estudo, o órgão desencadeou um
processo de monitoramento de 45 municípios gaúchos que concentravam 70% do déficit de
atendimento nesta etapa.
O mesmo Tribunal vem, desde então e periodicamente, divulgando uma análise
individualizada por Município (2011, 2012, 2013 e 2015), tornando públicos os dados
municipais. Este acompanhamento objetivou contribuir para a ampliação da oferta de vagas,
tendo o órgão avaliado que aqueles municípios monitorados aumentaram suas matrículas em um
percentual acima daqueles que não foram monitorados, a partir dos resultados do Censo
Educacional do INEP do ano de 2011. (TCE-RS, 2011). Chamadas de “Radiografias”, estes
estudos apresentam dados populacionais e de matrícula escolar correspondentes à faixa etária da
educação infantil, indicando percentuais de atendimento e demanda de novas vagas, tendo como
referência as metas dos planos de educação.
As trajetórias de NH e de SL compartilham um conjunto de características sóciohistóricas, demográficas, econômicas e educacionais que os coloca em posições muito próximas
em diversas estatísticas nos estudos do TCE-RS e em vários outros indicadores. NH é a maior
cidade em concentração de população de origem alemã do Rio Grande do Sul e SL, município
fundado em 1824, é o berço da colonização alemã no Brasil. No Censo do IBGE (2010), a
população de NH era de 238.940 habitantes e o grupo etário de zero a quatro anos incluía
14.750 crianças, representando 6,2% do total da população. Se compararmos ao ano 2000, NH
tinha 21.342 crianças, correspondendo a 9% do total da população. No município de SL, com
população de 214.087 habitantes (IBGE, 2010), observamos que para o grupo etário de zero a
quatro anos, no ano 2000, SL tinha 17.776 crianças. Em 2010, assim como em NH, houve uma
redução deste número para 14.381.
Utilizando o Índice de Desenvolvimento da Educação (IDEB) como um dos indicadores
educacionais, observamos que NH apresentou um IDEB médio de 5,6 para os anos iniciais do
ensino e 3,8 para os anos finais (2013). SL, no mesmo período, apresentou um IDEB médio de
5,3 para os anos iniciais do ensino e 3,7 para os anos finais.
Escolhemos três estudo do TCE-RS para evidenciar a evolução no percentual de
atendimento destes dois municípios: o relatório publicado em 2007, servindo como base para a
avaliação das metas intermediárias do PNE 2001-2010; a Radiografia de 2012, por conter os
dados censitários do INEP correspondentes ao primeiro ano após o término da vigência do PNE
2001-2010 e, por fim, utilizamos dados da última Radiografia (TCE-RS, 2015), referentes ao
Censo Escolar de 2013, conforme apresenta o Quadro1, a seguir 98:
Quadro 1: Evolução do atendimento da Creche NH e SL (2006; 2011; 2013)
Municípios
2006
2011
2013
População Matrícula Taxa bruta População Matrícula Taxa bruta População* Matrícula
NH
98
18.504
989
5,34%
11.591
1.949
16,81%
11.810
2.720
Taxa bruta
23,03
Neste Quadro, reproduzimos os dados constantes nos estudos do TCE/RS, que colocam em relação
duas bases diferentes: INEP e IBGE. Os estudos de Rosemberg (2012, 2014) evidenciaram que um
conjunto de elementos, tais como, momento de coleta, pergunta e informante levariam a diferenças
nos resultados relativos à população/ano, matrículas e percentuais de atendimento.
248
ISSN 2448-1157
15.537
SL
626
4,03%
Fonte: TCE-RS (2007, 2012, 2015).
das autoras (2015).
11.433
2.369
20,72%
11.706
2.715
23,12
*Estimativa populacional do ano de 2012 (IBGE). Sistematização
Ao verificarmos as matrículas para a sub-faixa correspondente à creche, no ano de 2006,
observamos que a taxa bruta de atendimento em NH era de 5,34%, enquanto em SL a mesma se
encontrava em 4,03%. Em relação ao final da década, os dados da tabela indicam que NH
triplicou o atendimento em cinco anos passando de 5,34% para 16,81%; contudo, não havia
alcançado a meta intermediária prevista para 2006, que era de 30%. Em relação a SL, o alcance
do percentual de 20,72% de atendimento significa que a ampliação da capacidade foi
quadriplicada, mas, ainda assim, este município chega a 2011 abaixo do percentual de
atendimento exigido como meta intermediária, confirmando os estudos de Rosemberg (2011,
2012, 2014).
Os dados apresentados na última Radiografia do TCE-RS (2015), também evidenciam o
descrito por Rosemberg (2011) em relação a uma discriminação interna no subagrupamento
creche, uma vez que em NH, no ano de 2013, o percentual da população atendida, de acordo
com a faixa etária, era 6,9% para crianças menores de um ano; 15%, para aquelas entre um e
dois anos; e 31% para crianças de dois a três anos. O mesmo estudo do TCE-RS (2015) aponta
que em SL, encontravam-se matriculadas 7,4% das crianças menores de um ano; 19,2%
daquelas entre um e dois anos; e 30,4% das crianças entre dois a três anos. Assim, em 2013,
ambos os municípios atingiram a meta intermediária apenas para o grupo de crianças entre dois
e três anos de idade. É neste sentido que Rosemberg (2012) afirma a necessidade de que os
estudos acerca do acesso à educação infantil procedam, também, análises por grupos por idade,
de maneira a identificar se a ampliação havida, de fato, vem garantindo equidade no acesso para
as crianças de até dois anos.
Quadro 2: Evolução do atendimento da Pré-escola em Novo Hamburgo e São Leopoldo (2006, 2011, 2013)
2006
2011
2013
Município População Matrícula Taxa bruta População Matrícula Taxa bruta População
Matrícula Taxa bruta
NH
14.649
2.732
18.65%
6.459
4.202
65,06 %
6.029
4.200
69,65%
SL
11.982
1.736
14,48%
6.098
3.387
55,54%
5.825
3.865
66,23%
Fonte: TCE-RS, 2015. *Estimativa populacional do ano de 2012/ IBGE. Sistematização das autoras
(2015).
O Quadro 2 evidencia os dados referentes à faixa etária de pré-escola, onde podemos
observar que NH apresentava a taxa bruta de atendimento de 18,65%, no ano de 2006, não
alcançando um terço da meta intermediária do PNE vigente, enquanto SL tinha uma taxa de
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atendimento de apenas 14,48% da população entre quatro e seis anos de idade. Para 2011, a
meta projetada era de atendimento a 80% desta população e os dados demonstram que a cidade
de NH apesar de triplicar o atendimento existente em 2006, atingindo a taxa de 65,06%, ainda
assim, não alcançou a determinação daquele PNE. SL evoluiu de 14,48%, em 2006, para
55,54% no final daquela década, o que significa uma ampliação do percentual de atendimento
em aproximadamente quatro vezes, mas, com esta taxa percentual, o município apenas se
aproximou, em 2011, da meta determinada para 2006.
Em 2013, NH apresentava um percentual de atendimento de 69,65% para a faixa etária
de quatro e cinco anos, enquanto SL atingiu 66,23%. É consenso entre pesquisadores a
importância do controle social para que o direito à matrícula na pré-escola não traga em seu
bojo a perda de outros direitos para as crianças (ROSELANE CAMPOS, 2010; FLORES et. al.,
2010; VIEIRA, 2011). Nesse sentido, nossa análise destaca os dados presentes no último estudo
do TCE (2015) sobre a oferta de educação preponderantemente em tempo parcial para esta faixa
etária no município de NH. Sanchez (2010) destaca a necessidade de um financiamento
adequado para sustentar esta expansão de acordo com os padrões de qualidade necessários,
enfatizando a sobrecarga hoje colocada para os gestores municipais, como consequência do
processo de municipalização da oferta desta etapa educacional, especialmente, para
atendimentos em tempo integral.
Outro aspecto que precisamos considerar em análises qualitativas se refere à dependência
administrativa das vagas ofertadas nestes dois municípios do estudo. De acordo com os dados
do IBGE (2012), em termos do número total de escolas que ofereciam matrículas para a
educação infantil, em SL esta oferta ocorre em 13 escolas a mais do que em NH. Analisando-se
a dependência administrativa desta oferta, percebemos que o número de escolas privadas em SL
(70) é muito superior ao número de NH (22), invertendo-se essa situação no que se refere ao
número de escolas mantidas pelo município, uma vez que em SL este número é de apenas 29,
enquanto em NH há um total de 64 escolas públicas municipais onde ocorre essa oferta.
Na Radiografia da Educação Infantil divulgada pelo TCE-RS em 2015, constatamos que
a Rede Municipal de Educação de SL ofereceu 2.190 matrículas, em 2013, enquanto a rede
privada era responsável por 4.390 matrículas. Na mesma fonte (TCE/RS, 2015) identificamos
que a Rede Municipal de Educação de NH oferecia 4.808 matrículas e a rede privada, um total
de 2.111 matrículas. Como ambos os municípios tem recorrido a conveniamentos para a
ampliação da oferta de atendimento, futuros estudos deverão focar na qualidade da oferta
educacional nas diferentes tipologias de atendimento, uma vez que o grupo das instituições
conveniadas pode incluir escolas privadas particulares, filantrópicas, confessionais, ou ainda,
comunitárias. Igualmente, no total de matrículas informadas como municipais, torna-se
250
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necessário identificar se todas são de fato de mantença exclusiva pelo poder público municipal,
uma vez que a urgência em relação à expansão de matrículas na pré-escola pode levar alguns
municípios brasileiros a arranjos e parcerias diversas, colocando em risco a qualidade na
conquista de um direito que, em primeiro lugar, é responsabilidade constitucional do Estado,
como analisam Susin e Peroni (2011); Flores e Susin, (2013); Pereira e Pinto (2011); Oliveira e
Borghi (2013).
Nos casos em que o recurso repassado às instituições conveniadas seja menor do que
aquele investido na rede própria, a perda em algum dos parâmetros de qualidade pode envolver,
por exemplo, a contratação de profissionais que não atenda à formação mínima exigida, a falta
de acesso cotidiano a materiais, espaços e oportunidades adequadas ou, ainda, a cobrança de
mensalidades das famílias, mesmo que a título de “contribuição espontânea”. Já considerando a
expansão do atendimento na rede própria, outros aspectos, tais como a duração da jornada diária
de atendimento, a relação adulto/criança/faixa etária, a existência de plano de carreira e a
remuneração docente, também, se constituem em aspectos que precisam ser investigados em
estudos futuros, de maneira a que possamos analisar a qualidade existente nas vagas que cada
município vem criando de maneira a atender às metas do PNE vigente.
Considerações finais
Considerando o término da vigência do PNE 2001-2010 e o fato de que o país encerrou
aquela década com 20,93% de atendimento para o grupo etário creche e 80,23%, em relação à
população de quatro e cinco anos, observamos que estes municípios acompanharam o
movimento nacional no que se refere à primeira sub-faixa, mantendo atendimentos próximos a
23% daquela população. Neste sentido nenhum deles alcançou a meta intermediária de 30%
prevista para 2006, nem àquela estabelecida para o final da década, que indicava a matrícula de,
no mínimo, 50% das crianças na faixa de até três anos.
No que se refere ao alcance do percentual de 50% no atendimento às crianças de até três
anos, observamos que ambos encontram-se significativamente distantes deste índice, ainda que
tenham mantido trajetória regular de ampliação ao longo do período aqui analisado.
Em relação às matrículas na pré-escola, evidenciou-se que ambos se encontravam
aquém da média nacional, não atingindo o percentual de 70% da população em 2011. Tomando
como indicador a exigência imposta pela CF/88 no sentido de que a matrícula na pré-escola
deve ser universalizada até março 2016, ambos os municípios ainda possuem um longo percurso
a ser realizado para o alcance desta determinação. Destaque-se que, além das metas previstas no
251
ISSN 2448-1157
atual PNE para toda a faixa etária da educação infantil, a expansão de vagas deve contemplar os
parâmetros de qualidade consensuados na área e referendados em normativas e documentos
oficiais.
252
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ISSN 2448-1157
Os Indicadores da Qualidade na Educação Infantil Paulistana e o processo
formativo promovido pela Equipe de Educação Infantil na DOT-P/DRE-JT - 1º
Sem 2015
Maria Matilde de Flório Costa
Sueli Ramos dos Santos Pereira99
RESUMO
Nesse relato de prática, pretendemos revelar como a Equipe de Educação
Infantil da Divisão de Orientação Técnico Pedagógica (DOT-P) da Diretoria Regional
de Educação Jaçanã-Tremembé (DRE-JT) da Secretaria Municipal de Ensino de São
Paulo (SME-SP), buscou promover e qualificar o processo formativo relacionado aos
Indicadores da Qualidade na Educação Infantil Paulistana(São Paulo, 2015) na região.
A Equipe priorizou à temática nas formações do 1º semestre de 2015, atendendo
boa parte dos/as educadores/as e realizando formações mensais com as equipes gestoras,
encontros com rede conveniada/indireta, cursos optativos e formação in loco (horários
coletivos das Unidades Educacionais).
Buscou-se subsidiar as equipes educacionais no entendimento da proposta e
qualificação de todos os processos que antecediam a data da aplicação, contribuindo
para a viabilização da auto avaliação institucional na perspectiva da gestão democrática
e participativa e potencializando esse momento como importante para o atendimento de
qualidade aos bebês e às crianças.
PALAVRAS-CHAVE:
DOT-P/DRE-JT; Formação; Educação Infantil; Indicadores da Qualidade na Educação
Infantil Paulistana; Auto Avaliação Institucional; Gestão Democrática e Participativa.
99
Ambas são Coordenadoras Pedagógicas - PMSP, atualmente atuam na Equipe de Educação Infantil da
DOT-P/DRE-JT
257
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QUAL A MOTIVAÇÃO PARA INICIAR A PRÁTICA?
A Equipe de Educação Infantil da Divisão de Orientação Técnico Pedagógica
(DOT-P) da Diretoria Regional de Educação Jaçanã-Tremembé (DRE-JT)da SME-SP
tinha como desafio qualificar o processo formativo relacionado aos Indicadores da
Qualidade na Educação Infantil Paulistana(São Paulo, 2015).
Esclarecemos que, em virtude da Portaria nº 6.570 de 25/11/2014 que dispõe
sobre as diretrizes e orientações para a elaboração do calendário de atividades e da
Portaria nº 6.569 de 25/11/2014 que dispõe sobre o cronograma e execução de serviços
nos CEIs Indiretos e nas Creches/CEIs da Rede Conveniada, ficou estabelecido que em
maio as Unidades aplicariam os Indicadores da Qualidade na Educação Infantil
Paulistana em todas as Unidades de Educação Infantil e em junho elaborariam o Plano
de Ação da Unidade Educacional.
É importante destacar que, em 2013 e 2014 por adesão voluntária, algumas
Unidades da região aplicaram os Indicadores da Qualidade na Educação Infantil (Brasil,
2009), entretanto, em 2015 vimosa obrigatoriedade do processo pela aplicação do
documento em construção no município de São Paulo.
Dessa forma, a Equipe deu prioridade à temática em suas formações no 1º
semestre e buscou promover ações formativas que garantissem a aplicação dos
Indicadores da Qualidade na Educação Infantil Paulistana e a elaboração do Plano de
Ação, esclarecendo quanto à perspectiva de Auto Avaliação Institucional e de Gestão
Democrática e Participativa.
Priorizou o atendimento de boa parte dos/as educadores/as, dando visibilidade
aos bons trabalhos realizados em 2013 e 2014e realizando formações mensais com as
equipes gestoras, encontros com rede conveniada/indireta, cursos optativos e formação
in loco.
O QUE SE PRETENDIA COM ESSA PRÁTICA?
No intuito de articular a política da SME com as demandas da região no que diz
respeito a auto avaliação instituicional, buscamos subsidiar os equipes das Unidades no
258
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entendimento da proposta e qualificação de todos os processos (estudo do documento
juntos aos diferentes segmentos nos espaços formativos das Unidades, sensibilização e
convite às famílias e Comunidades, tratamento do assunto em reuniões de Conselho de
Escola, troca de experiências com as Unidades que já haviam aplicado por adesão,
preparação dos materiais, dentre outros) que antecediam a data da aplicação, procurando
resignificar práticas e contribuir para a viabilização da aplicação na perspectiva da
gestão democrática e participativa.
Ainda manifestou-se a preocupação em realizar o processo formativo no que
tange o trabalho que garanta a qualidade da educação oferecida (e construída
conjuntamente) aos bebês e crianças atendidos em nossa rede, sendo procurado enfatizar
a importância dessa aplicação para além do cumprimento burocrático da Portaria. Ou
seja, como avaliação que, de fato, possibilitasse conhecer, reconhecer, levantar,
priorizar, pensar, planejar, replanejar, a partir do observado coletivamente, sendo
concretizada no Plano de Ação da Unidade no que se refere às demandas encontradas
que garantam o atendimento de qualidade dos bebês e das crianças.
QUAIS OS CAMINHOS PERCORRIDOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA
PRÁTICA E AS REFERÊNCIAS TEÓRICAS UTILIZADAS?
A partir no contido nas das Portarias e das orientações e formações da DOTEI/SME, a Equipe de Educação Infantil da DOT-P/DRE-JT planejou ações formativas
na região, buscando atender tanto a rede direta como a indireta/conveniada, assim como
diferentes segmentos que atuam nas Unidades de Educação Infantil.
Dessa forma realizou as seguintes ações:
 Encontros Formativos Mensais de Coordenações Pedagógicas – Rede Direta,
Indireta e Conveniada, tendo estendido a participação aos demais Gestores/as
(Diretores/as e Assistentes) e envolvido cerca de 150 profissionais;
259
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 Encontro Semestral com os/as educadores/as da Rede Indireta e Conveniada,
sendo atendidos todos os segmentos que atuam na rede conveniada/indireta e
oferecidas 400 vagas;
 Curso Optativo: “Diálogos com os educadores das Infâncias: construção e
aplicação dos Indicadores da Qualidade na Educação Infantil Paulistana”,
sendo atendidos todos os segmentos que atuam na rede direta e oferecidas 400
vagas;
 Curso Optativo: “Gestão Democrática e Participativa nas Unidades
Educacionais: construção e aplicação dos Indicadores da Qualidade na
Educação Infantil Paulistana”, sendo formadas 2 turmas de 60 vagas,
atendendo professores/as, gestores/as e supervisores/as;
 Formação in loco: “Diálogos com os educadores/as das infâncias no interior
dos Territórios”, caracterizando-se por visitas às Unidades da Rede Direta, em
horário coletivo (JEIF, PEA) ou em reuniões pedagógicas, com a intenção de
dialogar com as equipes quanto às dúvidas ou dificuldades, às conquistas, à
organização, às experiências já realizadas anteriormente, além de esclarecermos,
localmente, quanto à proposta da auto avaliação institucional da rede.
QUAIS OS DESDOBRAMENTOS DA EXPERIÊNCIA RELATADA?
Inicialmente, avaliamos que o processo vivido no 1º semestre de 2015
aproximou a Equipe da Educação Infantil da DOT-P da DRE-JT às Unidades da região,
sendo estabelecido diálogo constante, por meio de diferentes ações formativas: grandes
260
ISSN 2448-1157
encontros, formações mensais, cursos mensais e ida aos espaços formativos (in loco)
das Unidades.
Além disso, estabelecemos a estratégia de problematizar, a partir dos relatos das
experiências vividos pelas Unidades, quanto à metodologia inerente aos Indicadores e
oferecer subsídios teóricos que pudessem contribuir com os singulares processos de
cada Unidade.
Percebemos que o grande desafio mencionado pelas Unidades dizia respeito à
participação das famílias e Comunidade. Após a aplicação, boa parte das escolas
relataram que os pais ou membros da Comunidade participaram, se interessaram e
tiveram a possibilidade de dialogar com o Projeto Político Pedagógico da Unidade.
Ressaltamos que nem sempre a qualidade da participação refere-se à porcentagem alta
de pais presentes nas datas de maio e junho.
Outra questão dizia respeito ao receio de que a Equipe de Apoio talvez não
compreendesse todas as questões inerentes aos Indicadores ou não se envolvessem com
o processo. Da mesma forma, após o processo vivido, foram muitos os apontamentos de
colaboração, entendimento e envolvimento desse segmento.
Foi interessante notar que esses paradigmas foram quebrados, sendo verificado
que, principalmente, os/as gestores/as conseguiram resignificar o ‘olhar’ sobre e a
própria participação desses importantes segmentos: Família/Comunidade e Equipe de
Apoio.
Mencionamos ainda que, na elaboração do Plano de Ação, pudemos observar
certa dificuldade em compreender a real importância desse instrumento que deve ser
fruto de diálogo e negociação coletiva, organizando os resultados obtidos e definindo
prioridades na geração das demandas.
Verificamos que há, pelo menos, quatro desafios quanto ao Plano de Ação: a) a
credibilidade que essa construção deve ter; b) a elaboração para além do cumprimento
burocrático; c) ser instrumento de constante revisitar nos diferentes momentos coletivos
da Unidade e d) consolidar critérios comuns de qualidade, inegociáveis, para bebês e
crianças paulistanas.
Por meio das demandas que foram encaminhadas pelas Unidades à DOT-P/JT,
pudemos encontrar diversos dados que nos deram pistas para as prioridades quanto às
261
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nossas ações formativas do 2º semestre de 2015, sendo elas: a) Importância do brincar,
b) Documentação pedagógica e relatórios descritivos e c) Currículo integrador.
Vale ressaltar que daremos continuidade às nossas formações, sempre
retomando as questões contidas nos Indicadores da Qualidade da Educação Infantil
Paulistana, articulando os textos introdutórios ou os descritores com as temáticas
atualmente trabalhadas.
Essa escolha visa dar visibilidade constante à esse importante documento que
mobilizou a rede municipal e proporcionou diversos processos significativos e
singulares a cada uma das Unidades da rede, estreitando vínculos com as
famílias/Comunidade e resignificando relações internas das escolas, bem como apontou
a interessante possibilidade de construção de um currículo para e com os bebês e as
crianças de forma democrática e participativa.
262
ISSN 2448-1157
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263
ISSN 2448-1157
Educação infantil indígena na legislação e na produção do conhecimento 100
Marta Coelho Castro Troquez101
Resumo: Este trabalho apresenta resultados de pesquisa bibliográfica e
documental no campo das pesquisas qualitativas em educação. Objetivou investigar
pressupostos legais e teóricos sobre a educação infantil indígena, como primeira etapa
da educação básica nacional. Elegeu para análise documentos que normatizam a
educação básica no país, dando ênfase à sua primeira etapa. Procedeu a uma busca no
banco de teses e dissertações da CAPES e nos sites de busca para localizar artigos e
publicações sobre a temática. No que diz respeito à legislação educacional, a pesquisa
evidenciou, entre outros resultados, que, embora a educação infantil seja um direito
subjetivo da criança, para a educação indígena é facultativa. Na produção do
conhecimento, evidenciou grande contribuição de estudos da antropologia da criança
para esta área de estudos, contudo, no que diz respeito à especificidade da educação de
crianças indígenas em instituições de educação infantil (creches, pré-escolas, centros de
educação infantil) o estudo aponta mais questões para o debate/estudos que respostas.
Palavras-chave: Educação infantil; educação escolar indígena; educação
infantil indígena.
Introdução
A educação escolar indígena é um campo relativamente novo de investigação
no Brasil (CAPACLA, 1995; GRUPIONI, 2003; 2008; TROQUEZ, 2009; 2012). A
produção acadêmica sobre questões relacionadas a ela intensificou-se em meio ao
processo de “virada” no que diz respeito às políticas oficiais de escolarização dos
indígenas, sobretudo a partir da Constituição Federal de 1988 que garantiu, entre outros
direitos, o direito a uma educação escolar diferenciada para os indígenas, tomados
enquanto grupos ou povos específicos (BRASIL, 1988; 2002; 2009; 2010). Dentro deste
100
Este texto é fruto de Pesquisa iniciada em maio de 2015 na Universidade Federal da Grande
Dourados, MS, Brasil.
101
Professora Adjunta da Faculdade de Educação/UFGD.
264
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campo de estudos, podemos dizer que estudos sobre a educação infantil indígena são
considerados raros (MIEIB, 2005, p. 06).
Contudo, estudos desenvolvidos no campo da História (ARIÈS, 1978), das
Ciências Sociais (BEGNAMI, 2010) e, sobretudo no campo da Antropologia, mais
especificamente da antropologia da criança (NUNES, 1997; 2003; CONH, 2000a, 2005;
Buss-Simão, 2009) tem trazido grandes contribuições para pensarmos a criança
indígena, sujeito da educação infantil indígena. Tais estudos tem desconstruído ou
desmistificado noções naturalizadas de criança e infância e nos levam a considerar a
dinâmica cultural e a produção social da infância de acordo com cada contexto
sociocultural específico. Nos levam ainda a considerar a criança como sujeito produtor
de cultura, como ser social pleno (CONH, 2005, p. 21) e diferenciado. Como colocado
por Conh,
Precisamos ser capazes de entender a criança e seu mundo a partir do
seu próprio ponto de vista [...] Não podemos falar de crianças de um
povo indígena sem entender como esse povo pensa o que é ser criança
e sem entender o lugar que elas ocupam naquela sociedade – o mesmo
vale para as crianças nas escolas de uma metrópole. E é aí que está a
grande contribuição que a antropologia pode dar aos estudos das
crianças: a de fornecer um modelo analítico que permite entendê-las
por si mesmas. (COHN, 2005, p. 09).
De acordo com cada povo ou sociedade indígena há que se considerar
diferentes formas de ser criança, de socialização, de transmissão e aprendizagem de
conhecimentos. Precisamos considerar como é ser criança em cada grupo étnico
específico e em cada situação histórica e sociocultural específicas (TASSINARI, 2007).
Nesse sentido, podemos relacionar, entre outros, estudos que apontam para essas
especificidades: A criança indígena: a concepção Xikrin de infância e aprendizado
(CONH, 2000b); Crianças indígenas na cidade: a educação infantil no Centro Social
Mitangue-Nhiri (VIEIRA, 2012); Infância, participação e aprendizagens de meninos
indígenas Xakriabá (SILVA, 2012 ); Tornar-se aluno(a) indígena – Uma etnografia de
uma escola Guarani Mbya (MARQUI; CONH, 2011; MARQUI, 2012), As
transformações no modo de ser criança em Te’ýikue – 1950 - 2010 (CARIAGA, 2012).
Outras obras coletivas trazem mais contribuições a este campo de estudos (LOPES DA
265
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SILVA; FERREIRA, 2001; LOPES DA SILVA; MACEDO, 2002; TASSINARI;
GRANDO; ALBUQUERQUE, 2012).
Os avanços legais impulsionaram não só a produção acadêmica sobre educação
de crianças indígenas, como possibilitaram a construção de escolas específicas em áreas
indígenas e ampliação do número de matrículas de crianças indígenas em todas as
modalidades educativas (INEP/MEC, 2012).
De acordo com dados do IBGE (2012), em 2010, a população indígena no país,
ultrapassava 800.000 pessoas, cerca de 36,2% de indígenas residiam em área urbana, o
que correspondia a 379.534 indígenas vivendo nas cidades. Os dados indicam que nem
todos os alunos estão em escolas específicas, dentro das áreas indígenas. Há muitos
indígenas que estudam em escolas públicas rurais, de periferias e mesmo em escolas
particulares. Isso demanda a proposição de políticas públicas que atentem para as
diferenças socioculturais e linguísticas dos povos indígenas nas aldeias e fora delas.
Segundo Vieira,
[...] a educação infantil oferecida às crianças indígenas não se preocupa em
compreender a cosmovisão daquelas, a sua socialização primária ou, antes
disso, buscar o entendimento do que vem a ser criança para aqueles povos.
[...] pode- se afirmar que as políticas educacionais direcionadas às crianças
indígenas são iguais às oferecidas às crianças da sociedade nacional,
portanto, entende-se que para o Estado crianças são iguais em todo e
qualquer contexto. (VIEIRA, 2012, p. 181).
Diante do exposto, cabe questionarmos sobre as políticas públicas de educação
formal destinadas a crianças indígenas, especificamente, neste trabalho, atentamos para
as crianças de 0 a 5 anos, alvo da educação infantil, primeira etapa da educação básica.
Entendendo que a legislação educacional do país deve orientar as ações dos governos e,
consequentemente, a construção das políticas públicas, é importante investigar/conhecer
o que diz a legislação educacional sobre a o assunto. Também é preciso conhecer o que
está sendo produzido na academia. Há trabalhos acadêmicos específicos sobre a
educação infantil de crianças indígenas em instituições formais? O que apontam?
Pressupostos legais
No que diz respeito aos aspectos legais, a pesquisa considerou as conquistas da
Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
266
ISSN 2448-1157
(1996) para a realização da educação básica, o que inclui a educação das crianças de 0 a
6 anos, como direito subjetivo considerando as especificidades linguísticas e culturais
dos povos indígenas garantindo-lhes o direito a uma educação específica e diferenciada.
Foram foco da análise as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a
Educação Básica (BRASIL, 2010); as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (BRASIL, 2009); as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Escolar Indígena na Educação Básica (BRASIL, 2012) e o Plano Nacional
de Educação – Lei N. 13.005, de 25-06-2014 (BRASIL, 2014).
Na legislação educacional brasileira, a educação infantil é institucionalizada
como a primeira etapa da educação básica dedicada ao cuidar e ao educar a ser
oferecida enquanto um direito da criança em creches (0 a 3 anos) e pré-escolas (4 a 5
anos). Todas as crianças têm este direito o que inclui as crianças indígenas. Assim, é
obrigação do Estado oferecer a educação infantil para todas as famílias que buscarem
vagas para suas crianças.
Entretanto, o oferecimento da Educação Infantil aos povos indígenas é
opcional, cabendo a cada comunidade indígena decidir sobre seu oferecimento
(BRASIL, 2009; 2012). Como segue:
Art. 8º A Educação Infantil, etapa educativa e de cuidados, é um
direito dos povos indígenas que deve ser garantido e realizado
com o compromisso de qualidade sociocultural e de respeito aos
preceitos da educação diferenciada e específica.
§ 1º A Educação Infantil pode ser também uma opção de cada
comunidade indígena que tem a prerrogativa de, ao avaliar suas
funções e objetivos a partir de suas referências culturais, decidir
sobre a implantação ou não da mesma, bem como sobre a idade
de matrícula de suas crianças na escola. (BRASIL, 2012)
Cabe destacar que a oferta da educação infantil deve considerar as
especificidades e os direitos à diferença e à autodeterminação dos povos indígenas, bem
a participação da comunidade no processo.
No que diz respeito ao Plano Nacional de Educação de 2014-2024 (BRASIL,
2014), destaco a Meta 1 que trata da ampliação da oferta da Educação Infantil e duas
estratégias para atingi-la:
267
ISSN 2448-1157
Meta 1: universalizar, até 2016, a educação infantil na préescola para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e
ampliar a oferta de educação infantil em creches de forma a
atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das crianças de
até 3 (três) anos até o final da vigência deste PNE.
[...]
1.10) fomentar o atendimento das populações do campo e das
comunidades indígenas e quilombolas na educação infantil nas
respectivas comunidades, por meio do redimensionamento da
distribuição territorial da oferta, limitando a nucleação de
escolas e o deslocamento de crianças, de forma a atender às
especificidades dessas comunidades, garantido consulta prévia e
informada;
[...]
1.16) promover a busca ativa de crianças em idade
correspondente á educação infantil, em parceria com órgãos
públicos de assistência social, saúde e proteção a infância,
preservando o direito de opção da família em relação ás crianças
de até 3 (três) anos. (BRASIL, 2014)
Considero nesta análise que o plano trata a questão da educação infantil indígena
de forma inespecífica e tangenciada, pois prevê “fomentar o atendimento (...) por meio
do redimensionamento da distribuição territorial da oferta (...)”. Dando a impressão que
as dificuldades que envolvem este oferecimento dizem respeito a questões de
localização apenas.
Mesmo que inclua as comunidades indígenas em suas estratégias para a
ampliação da educação infantil, o documento associa a oferta da educação infantil para
estas comunidades à presença das escolas. Segundo Rosemberg (2006): “creche não é
escola”. As instituições de educação infantil não precisam ter o formato de “escolas”.
Produção do conhecimento
Para este estudo, busquei artigos científicos disponíveis on line e resultados de
pesquisas no banco de teses e dissertações da Capes. Como queria investigar trabalhos
específicos sobre a temática, fiz uma pesquisa refinada usando os seguintes termos:
educação infantil indígena, educação infantil na educação indígena, educação infantil na
educação escolar indígena, centro de educação infantil indígena.
268
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Na busca, observei que há estudos que tratam de questões mais gerais sobre a
infância indígena, especialmente no campo da antropologia da infância. Alguns
mencionam a questão da educação infantil indígena oferecida por instituições escolares
ou centros de educação infantil e fazem breves comentários a respeito, sem que o
objetivo do trabalho seja a educação de crianças indígenas na educação infantil formal
(centros de educação infantil, creches, pré-escolas, escolas específicas indígenas ou em
áreas urbanas). Neste campo de produção, além dos trabalhos já referendados
anteriormente, podemos incluir: ALVAREZ, 2004; CODONHO, 2007; LIMULJA,
2007; JESUS, 2011; ANDRIOLI, 2012.
A maioria dos trabalhos no campo da educação escolar indígena (em interface
com a antropologia e a história) focalizam a presença da escola de modo genérico nas
comunidades indígenas ou relacionada a outras etapas da educação básica. Desta forma,
muitos trabalhos buscam “refletir sobre o papel que a escola assume no processo de
educação dessas crianças, nas aldeias ou fora delas” (TASSINARI; GRANDO;
ALBUQUERQUE, 2012).
Entretanto, para este estudo, considerei artigos e pesquisas que tratam
especificamente da questão da educação infantil indígena formal, como definida na
legislação educacional. A pesquisa confirma a raridade de estudos deste tipo.
No banco de teses e dissertações da CAPES, localizei apenas um trabalho
dentro desta especificidade. Trata-se do trabalho de Edna Ferreira: A criação do Centro
de Educação e Cultura Indígena (CECI) e a educação infantil indígena na aldeia
Krukutu (FERREIRA, 2012). A pesquisa investiga a educação infantil indígena
destinada a um povo específico e analisa os desafios para a realização de uma educação
diferenciada e intercultural. As conclusões do trabalho apontam para a importância dada
pelos indígenas à educação infantil indígena102.
No que se refere a artigos ou publicações acadêmicas, deixando de lado (por
hora) artigos publicados em blogs educativos, entre outros, considerei os artigos
publicados em revistas científicas, livros e anais de eventos acadêmicos. Apresento
artigos/estudos identificados por ordem cronológica de publicação: NASCIMENTO; ET
102
Tive acesso apenas ao resumo do trabalho, o que dificulta aprofundamento na análise.
269
ISSN 2448-1157
AL, 2006; ROZEMBERG, 2006; MIEIB, 2006; VENERE; VELANGA, 2008; VIEIRA,
2012; SILVA; MOTA, 2014.
Os trabalhos identificados trazem excelentes discussões para a área. Um ponto
importante e recorrente é o caráter inconclusivo das discussões. Como colocado por
Toneto, em uma reportagem:
De modo geral, os parcos trabalhos que dedicam-se sobre a
temática revelam mais questões do que respostas no que diz
respeito à educação infantil indígena. O oferecimento de
educação infantil para as crianças indígenas tem suscitado
muitas críticas e um intenso debate entre especialistas,
lideranças e povos indígenas. Muitos defendem que a educação
infantil atenta contra as tradições indígenas, mas algumas
comunidades indígenas têm reivindicado espaços educativos
para suas crianças pequenas. (TONETO, 2007, p. 34)
O caráter de inconclusão, de não respostas rápidas à complexidade da questão
pode ser evidenciada em praticamente todos os trabalhos. Os trabalhos apontam também
os limites da educação infantil oferecida aos indígenas em relação a seus modos
próprios de socialização e transmissão de conhecimentos. Segundo Nascimento et al
(2006, p. 10):
[...] podemos afirmar que a educação infantil familiar, no âmbito
das aldeias Kaiowá e Guarani, segue parâmetros distintos
daquela percebida na proposta de educação infantil escolar.
Enquanto esta, por mais que seja suavizada, segue padrões de
organização da escolaridade formal, com todas suas
peculiaridades e consequências, aquela, como vimos
anteriormente, fundamenta-se completamente em um cotidiano
aberto e integrado no ritmo da convivência, em constante
contato com a natureza e os “afazeres” da própria comunidade.
Na conclusão do estudo afirmam:
Está claro que é necessário pesquisar mais para se chegar a um
posicionamento mais consistente sobre a necessidade ou não da
educação infantil escolar nas comunidades Kaiowá e Guarani.
Pesquisas que informem a respeito do outro lado da infância
indígena, suas aspirações, visão de mundo e, desejo de
autonomia. (P. 11)
O seminário do MIEIB aponta na mesma direção:
270
ISSN 2448-1157
Entretanto, no que se refere ao atendimento das crianças de 0 a 6
de idade fora da comunidade educativa, ou seja, que não seja no
ritual, na família, no trato com a terra, mas, em espaço próprio
para educação infantil mantido pelo Estado, é ainda um desafio
que está em processo de construção de um entendimento. De
modo que esse texto tenta somente dar um panorama de como os
professores, professoras, lideranças indígenas e o Centro de
Cultura Luiz Freire - CCLF vêm amadurecendo essa discussão.
Isto quer dizer também que não há ainda certezas construídas
sobre essa etapa da educação básica entre os povos indígenas em
Pernambuco. (MIEIB, 2006, p. 05)
Gostaria de destacar o artigo de Rozemberg (2006, p. 16) que compõe os textos
da publicação do seminário do MIEIB. A autora pontua a novidade da temática da
educação infantil indígena, aspectos teóricos e práticos das posições em debate
envolvendo a oferta desta etapa da educação básica aos indígenas opondo: expansão
irrestrita versus cautela e prudência e, ainda, propõe ricas sugestões para avançar o
debate.
Do artigo de Venere e Velanga (2008), destaquei os seguintes pontos:
As reflexões apontam para a necessidade de pesquisas na área e de um
currículo multicultural para atender a diversidade e promover a aprendizagem
a partir de conteúdos culturais significativos, bem como para a formação de
professores que atendam a estas necessidades. (p. 01)
[..]
A prática cotidiana nos revela, no entanto, que nem sempre uma legislação
progressista e elogiada internacionalmente significa que os direitos humanos
e da criança estejam, de fato, assegurados [...]. (p. 04)
[...]
Sendo a infância uma etapa percorrida para se aprender a viver em
sociedade, as crianças aprendem brincando, imitando os mais velhos,
participando da tradição oral, das atividades do dia-a-dia e dos rituais
inerentes a cada cultura, aprendendo assim as regras do convívio social. (p.
05)
Desta forma, um limite da educação infantil indígena relaciona-se à dificuldade
da realização de uma educação intercultural que considere as vivências das crianças
indígenas para além dos espaços escolares.
Vieira (2012) analisa a educação infantil de crianças Kaingang e Guarani na
cidade de Maringá e aponta para o caráter de assistencialismo que acaba assumindo.
Segundo a autora,
271
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[...] a educação infantil oferecida nas cidades impõe-se como uma
necessidade de assistência, em razão da ausência da mãe trabalhadora; já nas
terras indígenas, mesmo com o advento da colonização que gerou grande
perda territorial e, por sua vez, alterou todo o modelo econômico das aldeias,
a educação das crianças continuou sendo de responsabilidade dos mais velhos
e das mulheres que permaneceram aldeados. (p. 180)
A autora considera a distância entre os modos próprios de socialização destas
crianças no seio de suas famílias e a socialização realizada na instituição educativa com
profissionais/pedagogas formados nas universidades. E levanta um questionamento
sobre esta formação: “ Essa profissional está sendo preparada na universidade para lidar
com esta situação? O tema da diversidade cultural está sendo tratado de modo eficaz
dentro das universidades? A melhor alternativa seria a contratação de uma professora
indígena?” (VIEIRA, 2012, p. 189).
Já o artigo de Silva e Mota (2014), “traz análises acerca da concepção e
implementação da educação infantil na educação escolar indígena com ênfase no
princípio da facultatividade”. Segundo as autoras:
Às escolas indígenas foi salvaguardado o direito de ser ou não implementada
a educação infantil, tendo em vista a necessidade de manutenção da língua,
dos costumes e tradições de modo a contribuir para valorização e manutenção
da identidade étnica e cultura. Importa destacar que a política de educação
infantil de modo geral que traz à tona essas recomendações quando diz que o
trabalho na educação infantil deve integrar escola, cultura e a sociedade.
Essa política se contrapõe ao princípio de obrigatoriedade da educação das
Crianças de 04 a 17 anos na Educação Básica definido na Lei 12.796/2013
que altera a Lei 9394/96 – LDB. A adesão a esta lei traz à baila uma
discussão acerca da Educação Básica como um direito público subjetivo.
Acreditamos que o que está em questão não é a oferta mais a possibilidade de
cada etnia bem como cada sujeito fazer suas escolhas. E as crianças, público
alvo da educação infantil, enquanto sujeitos de direitos são ouvidas?
Essas questões postas devem ser objeto de reflexão para não incorrer em
velhos erros de exclusão educacional.
O trabalho evidencia a defesa da educação infantil pelos índios da etnia Ticuna:
Evidenciamos que os índios da etnia Ticuna são categóricos em defender e
reivindicar a educação escolar em suas aldeias e para todos os Ticuna porque
veem a escola como um instrumento que vai levá-los para um patamar de
igualdade na relação com a sociedade envolvente. Malgrado, tenha havido
uma resistência por parte do sistema de ensino na oferta da educação infantil,
os Ticuna se mantiveram e se mantém firme na defesa dessa etapa da
educação para suas crianças cuja importância está associada ao
desenvolvimento intelectual, mas conectada com os saberes da sua vivência.
(p. 14)
272
ISSN 2448-1157
Na defesa do direito à educação, mais especificamente, da educação infantil, as
autoras defendem que “É necessário uma igualdade que reconheça as diferenças mas
também uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades”.
Considerações
Busquei através desta pesquisa mapear questões legais e teóricas (ou da
produção do conhecimento) sobre a educação infantil indígena. No sentido de recolher
um arcabouço amparado na legislação e nas produções acadêmicas para pensar o
assunto e realizar outras pesquisas. Acredito que este trabalho poderá apontar caminhos
ou indagações para outras pesquisas.
Muitas são as questões postas, como as discutidas e não esgotadas no
seminário do MIEIB (2006, P. 05):
É grande o desconhecimento sobre a realidade da educação infantil ofertada à
população indígena. Também são muitas as dúvidas e questionamentos. As
creches são uma necessidade social destes grupos? São uma demanda
declarada? Os pais, avós e a comunidade, ao serem os principais responsáveis
pela educação das crianças nos primeiros anos de vida, conseguem garantir as
condições adequadas para tal? Existem circunstâncias que determinam outras
opções? Como garantir que crenças e valores das diferentes etnias sejam
respeitadas no atendimento em creches e pré-escolas? Como garantir a
formação do professor da educação infantil para aqueles membros da
comunidade que optam por cumprir este papel? Como incluir a
especificidade da realidade indígena na formação de professores? Quem deve
lecionar nesses
lugares, professores não-índios ou aqueles que fazem parte da comunidade?
Qual o papel do Estado, frente ao direito constitucional das crianças
indígenas à educação infantil?
A pesquisa bibliográfica também evidenciou grande contribuição de estudos da
antropologia da criança para esta área de estudos, sobretudo por considerarem as
crianças seres sociais ativos e produtores de cultura. Quem sabe muitas das respostas
elas mesmas nos darão.
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ISSN 2448-1157
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276
ISSN 2448-1157
Relato de práticas da coordenação pedagógica na educação infantil: os desafios da
implementação do Conselho de turma
Talita Ananda Corrêa103
Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA
Milca Aline Colares Gualberto
Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA
EIXO 1 Políticas públicas para a Educação Infantil e para a Infância
RESUMO:
A concepção de educação infantil com o objetivo de promover o
desenvolvimento integral da criança ainda é muito recente, perdurando ainda nas
instituições de educação a cultura de alfabetizar a criança pequena como um
preparatório para o ensino fundamental. Este relato baseia-se na prática de trabalho de
duas coordenadoras pedagógicas realizada no ano de 2012 em duas Unidades
Municipais de Educação Infantil (UMEI’s) localizadas na área urbana na cidade de
Santarém - Pará. O objetivo da prática foi promover a compreensão do trabalho
educativo e da concepção da educação infantil como a primeira etapa da educação
básica. Neste sentido foi implementado o Conselho de Turma nas instituições de
educação infantil como instrumento de interação família-escola. Como resultados
percebe-se que as diferentes ideias sobre educação infantil iniciais vão se
desconstruindo e sendo transformadas no decorrer do envolvimento maior entre todos
os envolvidos no processo.
Palavras-chave: Educação Infantil. Coordenação Pedagógica. Conselho de
Turma.
Serão descritos, neste relato, os desafios da atuação do coordenador pedagógico
a partir da implementação do Conselho de Turma em duas Unidades Municipais de
Educação Infantil (UMEIS’s) localizadas na área urbana de Santarém- Pará.
103
Acadêmicas do Programa de Pós-Graduação em Educação/Mestrado Acadêmico em Educação da
Universidade Federal do Oeste do Pará- PPGE/UFOPA- e membros do Grupo de Estudos e Pesquisas em
Educação Infantil- GEPEI- vinculado à Universidade Federal do Oeste do Pará.
277
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A motivação para iniciar essa prática ocorreu devido às dificuldades encontradas
no desenvolvimento do trabalho educativo e na compreensão das divisões de tarefas de
cada segmento das UMEI’s. Percebemos que inicialmente havia uma realidade de
descompasso entre a fala das professoras e a fala dos familiares das crianças referente
ao papel dos partícipes no processo educativo, bem como a concepção de educação
infantil para os mesmos.
O objetivo deste relato é compreender os desafios da função de coordenação
pedagógica, a partir das vivencias de duas coordenadoras pedagógicas na gestão de duas
instituições de educação infantil no ano de 2012.
Nesse sentido, os caminhos percorridos para o desenvolvimento dessa prática se
deu com a promoção dos encontros de formação continuada e reuniões com os pais ou
responsáveis pelas crianças, culminando com a implementação dos Conselhos de
Turma.
Segundo Leontiev (1978) podemos dizer que cada indivíduo aprende a ser
humano. O que a natureza lhe possibilita quando nasce não é suficiente para sua
humanização. Por isso, é necessário adquirir aquilo que foi alcançado no decurso do
desenvolvimento histórico da sociedade humana. Mello e Cação (2006) defendem que,
dentro da teoria Histórico-Cultural, o papel das professoras de educação infantil é criar
novas necessidades humanizadoras nas crianças.
Nesse sentido, a infância é uma etapa da vida significativa para o
desenvolvimento das potencialidades da criança, a qual necessita ter experiências
vivenciais diversificadas. E a instituição de educação infantil, que é o espaço de
atendimento para a primeira etapa da educação básica, deve ser o melhor lugar para a
educação das crianças até os 5 anos de idade.
Segundo Mello (2007) estudos desenvolvidos sob o enfoque da Teoria
Histórico-Cultural apontam como condição essencial para o desenvolvimento integral
da criança e sua apropriação das qualidades humanas o respeito às suas formas
peculiares de atividades como o tateio, a exploração de objetos, a interação entre ela e
outras crianças e entre elas e os adultos, o brincar.
Para tanto, se faz necessário que se transforme as salas de educação infantil
caracteristicamente organizadas como a sala de aula do ensino fundamental e se
278
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modifiquem as práticas que pouco favoreçam o desenvolvimento da criança como um
ser completo.
DESDOBRAMENTOS DA PRÁTICA
O primeiro desafio encontrado em nosso trabalho consistiu em diagnosticar as
concepções dos professores e dos familiares das crianças referentes ao conceito de
educação infantil, pois a fala de ambas as categorias destoava da concepção apresentada
nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (BRASIL, 2009). Neste
sentido, realizamos uma discussão informal com as professoras e procuramos sondá-las
sobre o papel de cada um neste processo (professor, família, unidade municipal de
educação infantil). E assim, foram constatadas algumas dúvidas das professoras sobre o
papel da educação infantil e sobre como desenvolver atividades para crianças de 0 a 5
anos de idade. Então foi necessário promovermos uma formação continuada durante
todo o período em que permanecemos nas instituições, a fim de melhor desenvolver este
trabalho e compreender as práticas que levam ao desenvolvimento integral da criança
pequena. Buscamos refletir nas formações sobre as fases do desenvolvimento da criança
e as atividades apropriadas para cada faixa etária, discutindo quais os tipos de atividades
e projetos educativos poderíamos promover nas unidades durante o ano letivo, para
promoção do desenvolvimento integral das crianças.
Em Santarém, a educação infantil passou por um processo significativo de
mudanças na redefinição das responsabilidades e papéis atribuídos às Secretarias
Municipais no ano de 2008. A educação infantil deixou de fazer parte da Secretaria
Municipal de Trabalho e Assistência Social (SEMTRAS), passando a integrar à
Secretaria Municipal de Educação e Desporto (SEMED). Para Waltrick (2008):
A municipalização da educação infantil, contemplada na Constituição
Federal/88 e reiterada pela LDB 9394/96, produziu mudanças importantes na
organização e gestão dos sistemas de ensino, especialmente pela transferência
das creches até então vinculadas às Secretarias de Assistência Social,
Promoção Social, Desenvolvimento Social para a Educação, num processo
longo e complexo de integração desses segmentos (p. 35-36).
279
ISSN 2448-1157
A função de coordenação pedagógica na educação infantil no município de
Santarém funciona equivalente à função do diretor na escola de ensino fundamental,
pois em seu trabalho tem o papel de proporcionar aos professores formações
continuadas para ressignificarem suas propostas, resgatando a autonomia sobre o seu
trabalho sem, no entanto, se distanciar do trabalho coletivo da unidade, partindo do
princípio da gestão democrática, visto que esta deva ser:
o eixo norteador do trabalho da coordenação pedagógica, absolutamente
necessária para a possibilidade de construção de um trabalho coletivo,
assentado na participação efetiva nos momentos de tomada de decisões,
unificando planejamento, execução e avaliação (ALVES, 2007, p.258).
Assim a coordenação pedagógica na educação infantil não pode se dar de outra
maneira que não a compartilhada entre todos que participam do trabalho com as
crianças pequenas incluindo nessa participação o papel importante dos funcionários
como as serventes, assistentes administrativos e familiares dos educandos, numa
perspectiva que todos entendam as questões de funcionamento que envolvem a
instituição de educação infantil.
O objetivo de nosso trabalho consistia, inicialmente, em investigar a visão que as
pessoas envolvidas no processo de inserção da criança pequena na educação infantil
apresentavam sobre concepção desta modalidade a fim de diagnosticar, analisar a
produção dessa visão e contribuir para a sua ruptura. Para tanto, realizamos uma
formação sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (BRASIL,
2009) com as professoras das instituições, visando discutir a dinâmica do trabalho da
comunidade escolar e nosso papel no desenvolvimento integral da criança. Essa
formação nos possibilitou embasamentos legais para compreender a atuação dos
profissionais da educação infantil.
Neste sentido, foi realizada a confecção de fichas cadastrais, juntamente com as
professoras, para o levantamento de informações individuais de cada criança e de sua
família. A ficha foi aplicada no ato da matrícula das crianças, realizando assim, um
diagnóstico individual de cada uma, a partir de suas dificuldades, anseios da família
entre outros pontos.
Posteriormente, realizamos encontros de formação com as professoras, a fim de
discutirmos alguns aspectos peculiares de cada faixa etária das turmas que iriam ser
280
ISSN 2448-1157
atendidas pelas UMEI’s,analisamos as fichas e chegamos à conclusão de que a família
espera que a instituição de educação infantil ensine as crianças a ler e a escrever. Isso
nos preocupou. Então, pensamos uma maneira de modificar a concepção que os
familiares tem em relação ao espaço de educação infantil e quais as atividades que as
crianças realizam no decorrer do dia nas unidades. Assim tivemos a ideia de introduzir
nas turmas de creche e pré-escolar das UMEI’s, o conselho de turma.
O conselho de turma é uma reunião particular de cada turma da educação infantil
que é elaborada pela coordenação e as professoras com intuito de abordar aspectos
particulares das crianças, suas atividades, alimentação, saúde e rotinas com a família.
Esta era convidada a participar uma vez no bimestre. Quem dirigia o andamento das
reuniões eram as professoras da turma e eram livres para introduzir qualquer assunto
que diagnosticasse como importante antes de cada encontro. Os participantes deste
conselho eram os pais e/ou responsáveis de cada criança de uma turma e as professoras
destas turmas. A coordenação pedagógica era mera observadora de cada conselho,
ajudando na confecção dos relatórios do que ocorrera.
Nos dias em que ocorriam os conselhos, as UMEI’s organizavam suas rotinas e
atividades de forma diferenciada, pois iriam receber um dos seus maiores aliados: a
família. Assim as professoras buscavam arrumar suas salas com as atividades
desenvolvidas pelas crianças, se organizando inicialmente para oferecer lanche e
direcionar tudo o que haviam planejado com antecedência. Os pais eram recebidos e
encaminhados às salas de atividades e o conselho era iniciado. A dinâmica do encontro
era ditada pelas professoras. Algumas decidiam planejar juntas e na hora do encontro
uma tomava frente às discussões ou ambas se responsabilizavam por cada parte.
A coordenação pedagógica ajudava com escolhas de dinâmicas e algum pequeno
texto que lhe fosse pertinente pelas professoras, que aceitavam ou não a sugestão, pois
tinham autonomia para organizar suas pautas e assuntos, tendo somente que apresentar
seu planejamento para apreciação. Alguns temas abordados durante esses conselhos
foram: Objetivo da Educação Infantil, rotinas da educação infantil, projetos da turma,
higiene corporal das crianças, saúde bucal, avaliação na educação infantil.
Os conselhos de turma duravam em média uma hora e ocorria bimestralmente
em cada turma e foram momentos de maior envolvimento entre os familiares e as
professoras, pois cada qual tinha sua forma autônoma de abordar assuntos peculiares de
281
ISSN 2448-1157
sua turma como: atrasos, passeios, doenças, atividades, culminância de projetos, entre
outros que minimizasse a distância entre a instituição e a família. Para enriquecer os
conselhos de turma realizávamos encontros de discussão em grupo com as professoras
para refletir sobre um determinado tema escolhido por elas com base em textos
acadêmicos que contribuíssem para sua fundamentação teórica, bem como na troca de
experiências e estratégias utilizadas pelos próprios participantes do grupo. Também
levávamos parceiros para esclarecimentos sobre esses temas, contando com o apoio de
palestras de professores das instituições de Ensino Superior do município, Conselho
Tutelar, Delegacia da Mulher, Presidente da Associação dos moradores dos bairros
entre outras entidades e instituições. Durante esse processo, buscávamos propiciar a
ruptura de preconceitos e estereótipos (inclusive os nossos) que se constituem em torno
do contexto da educação infantil.
Estes conselhos não tinham o mesmo papel que aqueles difundidos no ensino
fundamental e ensino médio que tinham intuito de falar das notas dos alunos, envolviam
todos os professores e tinham como participantes todos os professores de uma turma
com um representante da classe estudantil e um representante dos pais. Ele tinha
objetivo de aproximar as famílias e os professores das instituições com a intenção de
estreitar laços entre estes dois sujeitos do processo de promoção do desenvolvimento
integral da criança pequena; tendo como diferencial a dinâmica pensada pelo professor
para envolver e ouvir os pais e/ou demais familiares sobre o que tem sido desenvolvido
dentro da instituição como um todo e buscando envolver todos no trabalho com os
projetos.
Conforme nos lembra a pedagogia da infância defendida por OliveiraFormosinho (2007) o professor deixa de ser um mero transmissor de conhecimento,
como a pedagogia tradicional o definiu, mas no centro da construção dos saberes estão
as pessoas: os professores e os alunos, as crianças e os adultos. Isso fica claro no
desenvolvimento deste trabalho com as famílias.
Sempre ao final dos Conselhos de Turma fazíamos relatório sobre os assuntos
tratados e todos os aspectos que poderíamos melhor trabalhar num próximo Conselho.
Através dele, conseguimos envolver os pais em 90% dos projetos realizados entre eles:
aulas passeio, atividades dentro da instituição, dentro da turma e do próprio município
282
ISSN 2448-1157
envolvendo a instituição nas programações realizadas pela Secretaria Municipal de
Educação.
Ao final do ano letivo, após todas essas atividades e implementação do Conselho
de Classe como instrumento de intercâmbio entre família e escola, aplicamos uma
avaliação com todas as famílias envolvidas e percebemos a mudança nas falas quanto ao
objetivo da educação infantil, nas percepções sobre as atividades e recebemos a
aprovação quanto aos projetos realizados. Essa avaliação se deu na entrega dos
relatórios finais de cada criança sendo feita pelas professoras e analisada por todos os
funcionários de cada instituição.
Ao todo foram envolvidas aproximadamente 300 famílias das duas instituições
atendidas, 24 professoras, 7 estagiárias da graduação e 24 funcionários de apoio entre
serventes, vigias e auxiliares administrativos. Ressalta-se ainda que as UMEI’s
funcionavam durante o período diurno, em período integral e parcial.
O conselho de turma se tornou um forte instrumento para a aproximação das
famílias e das instituições de educação infantil. Foi responsável pela quebra de barreiras
entre o papel das instituições e o papel das famílias na promoção do desenvolvimento
integral da criança. A aproximação só foi possível com a abertura de cada ator ao novo
e ao desconhecido por base da conquista dos atores. Assim todos ganham
principalmente a criança que é para quem voltamos toda nossa atenção neste trabalho.
Claro que, nem tudo fora perfeito ao longo deste trabalho, deparando-nos com
diversas conquistas e frustrações ao longo das atividades efetivadas. Nelas contamos
com a parceria voluntária de profissionais, doações de instituições educacionais, visto
que os recursos e investimentos no sistema público de educação é precário. Porém
conseguiram possibilitar questionamentos e reflexões sobre a educação infantil no
interior das instituições.
Lidar com as limitações de conhecimento sobre o desenvolvimento da criança
tornou-se um dos principais desafios da atuação da coordenação pedagógica da
educação infantil, pois essa etapa da educação básica era pouco conhecida e difundida
com objetivo de promover o desenvolvimento integral da criança. Porém o processo de
desconstrução dessa concepção, inicialmente concebida pelas professoras, família e
comunidade escolar, possibilitou inúmeras contribuições para a construção do
283
ISSN 2448-1157
entendimento da educação infantil. Sabemos que esse processo é lento e gradual e
requer o comprometimento de todos os envolvidos no âmbito educacional.
284
ISSN 2448-1157
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, N. N. de L. Coordenação pedagógica na educação infantil: trabalho e
identidade de profissional na rede municipal de ensino de Goiânia. 2007, 290f. Tese
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dezembro
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Disponível
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Acesso
em
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MELLO, Suelly Amaral. Infância e humanização: algumas considerações na
perspectiva histórico-cultural. In: Perspectiva, Florianópolis, v. 25, n. 1, 57-82,
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MELLO, Suely Amaral e CAÇÃO, Maria Izaura. A liderança pedagógica e as
condições objetivas e subjetivas do trabalho de educadoras da infância. In: Educação
em Revista, Marília, 2006, v.7, n.1/2, p. 109-128.
OLIVEIRA-FORMOSINHO, Júlia; KISHIMOTO, T. M.; PINAZZA, M. A.
Pedagogia(s) da infância: dialogando com o passado: construindo o futuro. Porto
Alegre: Artmed, 2007.
WALTRICK, R. E. L. O Coordenador Pedagógico na Educação Infantil da Rede
Municipal de Educação de Florianópolis: Marcas De Uma Experiência Democrática.
Programa de Pós-graduação em Educação. Tese (Mestrado em Educação) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2008.
285
ISSN 2448-1157
Avaliação da educação infantil: um aspecto de qualidade
Natália Francine Costa Cançado104
O atual Plano Nacional de Educação em sua estratégia 1.6 da meta 1, define que
até o seu segundo ano de vigência devem ser implantadas, pelos municípios, formas de
Avaliação da Educação Infantil. Diante deste contexto e considerando que ainda são
escassos os estudos acerca desta temática no Brasil (ROSEMBERG, 2013), este
trabalho, em nível de mestrado, tem como objetivo compreender quais ações e/ou
ferramentas o(s) município(s) tem desenvolvido para realizar a avaliação, bem como se
esta segue orientada pelos documentos do MEC. Além disso, acreditando na interface
entre avaliação e qualidade da educação, pretende-se analisar o impacto destas formas
de avaliação na qualidade do atendimento. Este trabalho é desenvolvido como parte de
uma pesquisa mais ampla que envolve 16 municípios paulistas, deste modo, após a
revisão, da literatura e legislação vigente, será desenvolvido um estudo de tipo
etnográfico (ANDRÉ, 2005) em um dos dezesseis municípios.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRÉ. M. E. D. A de. Estudo de caso em Pesquisa e Avaliação Educacional.
Brasília: Líber Livro Editora, 2005. 68p. (Série Pesquisa; vol 13).
BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de
Educação. Brasília, 2014.
ROSEMBERG, F. Políticas de educação infantil e avaliação. Cadernos de Pesquisa,
São Paulo, v. 43, n. 148, p. 44-75, jan./abr. 2013.
Palavras-chave: Avaliação. Qualidade. Educação Infantil
104
Mestranda em Educação pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto –
Universidade de São Paulo.
286
ISSN 2448-1157
A formulação de políticas de Educação Infantil com base nos documentos do
Conselho Municipal de Educação de Duque de Caxias: desafios entre o público e
o privado
Priscila Basílio
EEI/UFRJ
RESUMO
No atual cenário da educação brasileira, verifica-se uma grande discussão acerca da
necessidade de políticas públicas que possam garantir a qualidade do ensino e gestões
de cunho democrático, que venham incentivar, possibilitar e valorizar a participação da
sociedade civil nas ações do Estado. Nesse cenário, o Conselho Municipal de Educação
assume um papel fundamental no planejamento da educação municipal. Esse trabalho
tem como objetivo compreender o quanto o Conselho Municipal de Educação de Duque
de Caxias lócus da pesquisa contribui ou não para a efetivação das políticas públicas de
Educação Infantil. De modo mais específico, é objetivo desta pesquisa é também
compreender as estratégias utilizadas para o credenciamento, autorização e fiscalização
das instituições de Educação Infantil pública e privada municipais, e refletir se os
critérios adotados contribuem para um atendimento de qualidade para as crianças de 0 a
6 anos de idade.
Palavras Chaves: Conselho Municipal de Educação; Educação Infantil; Público e
Privado.
Este texto busca refletir sobre os avanços e percalços do funcionamento do Conselho
Municipal de Duque de Caxias (CME/DC). Assim como apresenta debates e tensões
que sucedem no seu interior e procura saber de que modo podem ou não afetar o
processo de democratização das relações Estado e sociedade civil. Tomando como base
os desafios encontrados na pesquisa de campo, o texto se propõe a apresentar e
desenvolver reflexões acerca dos efeitos desta institucionalização na capacidade de
contribuir de fato para políticas de Educação Infantil (EI) do município. A partir das
diferentes técnicas de pesquisa, principalmente atas e entrevistas, foi possível colher um
287
ISSN 2448-1157
rico material que permitiu a investigação da dinâmica de funcionamento do CME/DC.
Sabe-se que a interação dos representantes da sociedade civil e do Governo afeta o
conjunto de questões que são encaminhadas e decididas no CME/DC.
1. Participação da sociedade civil : cooptação ou empoderamento?
Como referência para o desenvolvimento do trabalho, apresentam-se estudos de
autores, que ao longo dos anos de 1980 até os dias atuais, vêm discutindo esta temática,
em distintas perspectivas, propondo formas mais abrangentes de refletir sobre os
Conselhos, quais sejam: CURY, 2006, 2010; BORDENAVE, 1994; GOHN, 2001,
2010; AVRITZER, 2010 entre outros. Tendo como base a relevância dos Conselhos na
institucionalização da participação, os autores apontam questões importantes, que
permitem avançar na relação entre o Estado e a sociedade civil, dando subsídios para
pensar as complexidades das interações nesse processo.
Outra fonte de pesquisa utilizada são textos produzidos pelo Ministério da
Educação (MEC) que mantém o Programa Nacional de Capacitação de Conselheiros
Municipais de Educação (Pró-Conselho), orienta a formação de CMEs e financia
programas de capacitação. Esses documentos serão referenciais para dialogar com o
CME/DC; pois, constitui-se, na principal medida do MEC, em âmbito nacional, para
fortalecer a gestão democrática em todos os entes federados e contribuir para o
desenvolvimento de uma educação de qualidade, pensada com a sociedade.
Tendo em vista essas questões, os estudos chamam atenção, na perspectiva em
que os Conselhos gestores representam avanço e inovação em termos de políticas
públicas. Esse novo caminho na administração pública brasileira propicia um espaço de
aproximação dos diferentes atores e exige uma atuação diferenciada de diálogos e
negociação dentro dos espaços públicos. Compostos por representantes do aparelho
estatal e da sociedade civil possuem atribuições legais amplas com poderes consultivos,
deliberativos, até os mais recentes de proposição e mobilização.
No, inicio, pensava-se que a presença da sociedade civil, nesses espaços, já se
constituiria elemento democratizante, mas a automaticidade mostra-se insuficiente com
o tempo, “segundo diversos autores, não ficava suficientemente claro se a presença dos
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atores da sociedade civil nos Conselhos de políticas públicas permitia de fato sua
democratização”. (AVRITZER, 2010, p.22)
Constata-se, portanto, um avanço quando se amplia a intervenção da sociedade
no Governo, possibilitando, nesses ambientes a democratização das decisões. “A
sociedade civil não é amorfa ou inerte. Mas é preciso qualificar estas ações, que tanto
podem ter caráter emancipatório e transformador, como meramente integrativo e
conservador”. (Gohn, 2010, p.27).
Desse modo, Bordenave (1994) fornece ponderações as quais auxiliam
compreender que a participação vem aumentando nos últimos anos, no Brasil, de
diferentes formas: organizações não governamentais, associações, Conselhos entre
outras. O autor define que: “de fato, a palavra participação vem da palavra parte.
Participação é fazer parte, tomar parte ou ter parte”. (p.22) e continua a discussão
informando que essas “partes” podem ser abordadas de forma diferenciada e que uma
não está, necessariamente, atrelada a outra. Por exemplo, um pai de aluno pode estar
integrado ao Conselho Escolar, mas não age frente às discussões e lutas diretas para
reivindicações de melhorias da escola – o que exemplifica o que é uma participação
ativa ou passivo
Desse modo, a participação institucionalizada é complexa, requer um (re) fazer
contínuo porque precisa ser aprendida e aperfeiçoada na prática. A qualidade depende
da construção diária, pois quanto maior a atuação, mais capacitados estarão os
indivíduos para negociar e dialogar com o Estado. A participação é um processo de
conquista, lugar ocupado recentemente pela sociedade civil, segundo Bordenave (1994):
participação ser uma necessidade básica, o homem não nasce sabendo
participar. A participação é uma habilidade que se aprende e se
aperfeiçoa. Isto é, as diversas forças e operações que constituem a
dinâmica da participação devem ser compreendidas e dominadas pelas
pessoas. (p.46)
É preciso reconhecer que a incorporação das diferentes partes da sociedade, no
processo de tomada de decisões tende a ampliar a representação democrática e
modificar a dinâmica da negociação dos conflitos. Mas não se deve perder de vista que
a exigência de um órgão paritário para fazer valer o interesse do coletivo é, no mínimo,
contraditória, pois não pode o Poder Público pelejar por uma parcela da população. Faz289
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se necessário uma diluição dos interesses particulares nos órgãos públicos que, eleitos
pelo processo democrático deveria lutar pelo bem estar de todos. Portanto, compreender
se a sociedade civil é transformadora ou meramente integrativa e conservadora nesse
processo é o desafio. A “ausência” de uma participação efetiva é evidenciada no
primeiro dia de observação das reuniões pelos conselheiros:
__se o Conselho acabasse hoje não faria diferença em nada para a
sociedade. Não existe parceria com a sociedade. Ficamos dentro do
Conselho, discutindo os processos, mas o que fazemos para
transformar a educação do município? (Conselheiro da sociedade
civil)
__em alguns momentos, ficamos muito incomodados, mas não é
simples, pois somos indicados. Então, quando queremos alguma
mudança na SME temos que ir devagar. (Conselheiro governamental)
__para colocarmos temas de interesse da comunidade na pauta é
difícil, eles (SME) sempre querem fazer do Conselho um espaço de
resolução das suas prioridades. (Conselheiro da sociedade civil )
Nos relatos, observa-se que os mesmos ficam incomodados com a dificuldade de
discutir as políticas e se sentem “encurralados” pela pressão feita pelo Executivo. Esses
problemas também aparecem nos fóruns de saúde como descreve Cardoso (2007) “a
dessimetria entre os participantes, a falta de acesso a informações; o uso da linguagem
técnica; a manipulação política; as atitudes ambíguas por parte do Governo que ora
incentiva a participação, ora a boicota” (p.10).
Constata-se que, nas diferentes áreas, os Conselhos contribuem para a
democracia do país, mas não garantem que as decisões sejam acatadas e deliberadas.
Será que a participação da sociedade civil é legitimada nas decisões ou só quando é
conveniente para Executivo? Sua ação traz benefícios para as áreas específicas e o
controle ativo das ações públicas? Sabe-se que a participação cidadã tem como objetivo
a aproximação das discussões da realidade local. Gohn (2001), “diz que a participação
dos cidadãos provê informações e diagnósticos sobre os problemas públicos, gerando
conhecimentos e subsídios à elaboração de estratégias para resolução dos problemas e
conflitos envolvidos” (p.43).
A abertura de novos canais de comunicação entre os cidadãos e o Estado passou
a constituir um instrumento fundamental da gestão pública, demonstrando inusitados
aspectos da dinâmica política. A sociedade civil apresenta dificuldade de realizar
290
ISSN 2448-1157
proposições diante das situações críticas dos assuntos locais, além de não perceber esse
lugar como conquista, mas como uma concessão do Governo, o que torna o
procedimento de “compartilhar decisões”, fragilizado.
Por outro lado, existe uma dificuldade do Estado em legitimar essas culturas
participativas. Percebe-se a resistência em alguns Governos em aderir essa dinâmica
social, o que nos leva a observar que a sociedade civil só controlará efetivamente as
políticas do Governo, ao desenvolver aptidões que são necessárias para participação.
Conforme Freire (2003) será necessário propiciar espaços de aprendizado de
participação, pois somente através do diálogo e do confronto de ideias é que se constrói
uma gestão democrática. A palavra conselho, como esclarece Pereira (2008), “remete a
significados que postulam à coletividade, à convocação para discussão, à reunião de
uma assembléia” (p.29).
Destaca-se que a existência da Lei não garante por si só a transformação da
realidade, não se pode deixar de assinalar que a dificuldade de participação da sociedade
civil também aponta para um baixo grau de cidadania. Pois, uma sociedade com um
histórico mais atuante poderia significar uma participação mais eficaz no processo.
Além dessas questões, outros fatores podem ser considerados, nessa
dinâmica social, que sinalizam para um contexto desfavorável à participação da
sociedade civil, já que seus representantes estão ligados a diferentes instituições e
podem representar interesses particulares. Existem muitas contradições que são latentes
nos Conselhos e que, ao longo do tempo, vêm se mostrando insuficientes para dar conta
da complexidade dessa institucionalização a qual supera a dicotomia Governo e
sociedade Civil.
Nesse sentido, a sociedade organizada tem de aprender a operar dentro
dessa arena política do CME de encontros, desencontros, conflitos e negociações.
Portanto, é necessário adquirir habilidades que são básicas para influenciar a política:
formular, projetar, acompanhar, fiscalizar e mobilizar a sociedade como um todo, mas
principalmente,
os
atores
educacionais.
Compete,
também,
aos
respectivos
representantes eleitos pela base de um movimento, o compromisso de trazê-los para
reflexão dos problemas locais.
Na verdade, existe um rompimento da sociedade civil, que cansada de se ver
excluída das políticas, no processo de implementação e formulação, pressionam para
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construção de um cenário diferente para política educacional. Pois o que acontecia
anteriormente, era a tomada de conhecimento, pelos movimentos, quando as políticas já
estavam sendo introduzidas, ou seja, na finalização do processo, produzindo assim
resistência, que na maioria das vezes resultavam em políticas “vazias” que não atendiam
à necessidade da população local
2. Instituições de Educação Infantil: a unificação da normatização do público e o
do privado.
A unificação do processo de normatização de funcionamento das
creches públicas e privadas deve entrar na pauta da reunião. O
conselheiro propôs que alguém o convença de que há dois grupos de
crianças nas creches: o da rede pública e o da rede privada com
tratamentos bem diferenciados. (Ata 2011)
As normas internas do CME/DC, no art. 2º inciso XIX, consta como atribuição
“autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino”.
Na elaboração da primeira deliberação do CME/DC para EI 02/2005 segundo seu
depoimento, o entrevistado revela: “olha que coisa mais hilária que sempre colocaram
para gente: Não. Aqui, a pública, não. Tentaram incutir isso na gente. Fiscalização, só
para a privada e a pública, não. Mas agora, eu sei que a pública também tem que ser
fiscalizada”. (Conselheiro governamental). Até hoje, essa questão da rede pública e
privada tem-se colocado como questão central nas plenárias, gerando embates entre a
sociedade civil e o Governo. Na entrevista o conselheiro alega, “que se hoje o Conselho
não existisse, não faria falta nenhuma para a rede municipal”.
conselheiro perguntou se esta deliberação norteia as escolas
particulares de EI e as da rede pública municipal de ensino. A
presidente respondeu que o documento norteia as escolas particulares
de EI. O conselheiro perguntou como ter acesso à legislação que
normatiza as escolas da rede pública municipal de ensino. A
professora respondeu que a SME deve ter as normatizações. (Ata,
10/11/ 2011)
Nesse dia, a observação do campo possibilitou vivenciar certo “silêncio” diante do
questionamento do conselheiro sobre a rede pública. Afinal, o Decreto nº 4238/2003
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que institui o Sistema Municipal de Duque de Caxias e CME assegura que o órgão é
responsável pela rede pública e privada. Em um dos debates da plenária, “a conselheira
falou que leu o regimento no qual os estabelecimentos da rede municipal estão sob a
nossa competência”
O conselheiro explicou a sua fala, propondo a unificação da legislação e
aproveitou para informar que a Câmara de EI está revisando a Deliberação
CME/DC nº 02/2005, que trata das instituições de EI. E relatou quatro
situações da rede pública municipal: a)uma creche X que funciona sem
professor, somente com estimulador materno infantil; b) Escola Y onde as
cadeiras e o banheiro não são compatíveis com a idade das crianças de préescola; c)creche K que ele não falará nada porque até parece coisa de terror e
d) creche W, no bairro Figueira, onde as crianças estudam no pátio, porque
nas salas de aula não há condições. (Ata, 10/02/2011)
Com base no relato acima, o conselheiro propôs a unificação da legislação que
autoriza o funcionamento das instituições pública e privada e diz que não compreende o
porquê da equipe da Supervisão, ao constatar a precariedade das unidades de EI
municipais, não encaminham para o CME/DC. A partir do seguinte diálogo, foi
analisada essa separação:
__ gostaria de ouvir a conselheira responsável pela Supervisão das unidades
de EI da SME. Quando tem denúncia quais são os encaminhamentos?
(Conselheiro da sociedade civil)
__nós vamos até o local, realizamos a visita e elaboramos um relatório.
(Conselheiro governamental)
__ vocês vão até o local, verificam que realmente aquela situação da creche é
verdadeira e encontra-se em péssimas condições e fazem o que? Porque
nunca vi nenhum caso no CME para ser discutido quais seriam os
procedimentos da rede pública. Por isso que a deliberação nova tem que
contemplar as instituições públicas e privadas. Por que a rigidez que o CME
tem com as privadas, não acontece com as públicas. Bem, a gente nem sabe o
que acontece com a pública. Isso é um absurdo! (Conselheiro da sociedade
civil).
A partir da observação do avanço nos questionamentos dos conselheiros, uma
inquirição surge: estaria a simples presença do pesquisador, provocando esse
movimento? Pois o desconforto era visível. Em muitos momentos, com o olhar, na mesa
de reunião, os conselheiros buscavam uma interlocução; porque, as perguntas realizadas
na entrevista, demonstravam-lhes que a mesma poderia assumir o papel de uma
interlocutora qualificada.
Como fica então o atendimento nas nossas creches públicas? A conselheira
fez a proposta de ser ter mais cuidado na aprovação do funcionamento das
creches públicas. Continua falando que o Conselho deve se responsabilizar
pela autorização de funcionamento dos espaços públicos de educação. (Ata,
1/10/2009)
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Para atender às creches e pré-escolas públicas, a SME conta com o serviço da
supervisão escolar que realiza visitas periódicas, acompanhamentos e formações
continuadas com a parceria do Departamento da EI. Já a Inspeção precisaria criar
estratégias para aumentar seu quadro de recursos humanos com formação adequada, dar
assessoria também no trabalho pedagógico da rede privada e realizar proposições que
garantissem um acompanhamento mais sistemático: “somos poucos para dar conta de
tantos processos, visitas e formação. Isso compromete nosso trabalho” (Conselheiro
governamental).
As ações mais importantes da Secretaria e do Conselho são garantir que as
instituições sejam credenciadas e autorizadas. Mas para realização desse trabalho é
preciso que haja um investimento da SME, pois há a necessidade de profissionais
especializados nessa área, deslocamentos, elaboração de relatórios e flexibilidade.
3. A Câmara da Educação Infantil no CME/DC
O conselheiro disse que no Conselho também deve transitar a questão da
educação de um modo geral. Não apenas a análise de processos e emissão de
pareceres. (Ata, 03/09/ 2009)
As Câmaras têm caráter permanente e deliberam sobre os temas que lhe foram
apresentados e suas deliberações não precisam ser aprovadas. Essa estrutura de câmaras
é mais adequada para municípios onde os Conselhos efetivamente tenham atuação em
todas as suas funções, realizando um trabalho mais complexo, inclusive a composição
de comissões formadas por profissionais com competência em legislação, planejamento
e administração educacional.
As Comissões dão suporte para auxiliar o trabalho das Câmaras em situações
mais difíceis, as quais são escolhidas juntamente com a plenária e as câmaras – mas em
caráter provisório. A Comissão é constituída pelo Presidente do Conselho para estudo
de determinado assunto e, após a conclusão dos trabalhos, é desfeita. Portanto, os
conselheiros afirmam que a maioria do que é levado para plenária, após discussão nas
Câmaras, é aprovado.
Entende-se que a Câmara de EI, dentro dos Conselhos, possibilita um debate
mais consistente das questões especificas do tema. O CME/DC possui três Câmaras: EI,
Ensino fundamental e Ensino Médio. As reuniões acontecem de acordo com a demanda.
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ISSN 2448-1157
O fato de ter, no CME, câmaras que se debrucem para estudar sobre determinados
assuntos, fortalece suas ações e agiliza o andamento de algumas situações.
Na entrevista com o informante que compõe a Câmara de Ensino Fundamental, a
exposição foi a seguinte: “a nossa Câmara não está se reunindo, pois não estamos tendo
demanda nesse momento para discutirmos.” (Conselheiro governamental). Será que o
CME/DC foi criado com a perspectiva de responder as demandas que chegam? Ou cabe
a esse órgão, através de suas Câmaras, realizar uma função de proposição e política para
qualidade da educação no município? Deve a Câmara funcionar como um órgão
burocrático, respondendo as demandas emergenciais?
No entanto, durante o período de um ano e meio de pesquisa, a Câmara de EI
reuniu efetivamente quatro vezes. Sendo que para discutir mudanças na deliberação nº
02/2005 da EI, sendo feito esses debates com a presença do assessor técnico e a chefe
da inspeção escolar, nenhum encontro foi feito após a resolução dessa reformulação.
Apesar da EI pública e privada serem temas constantes na plenária e suscitar embates
“fervorosos”.
Vale a pena lembrar, que o fato do CME/DC possuir Câmara de EI aponta um
investimento para que as políticas sejam mais elaboradas e discutidas, garantindo um
empenho por parte desse órgão na qualidade da educação, ou seja, deram um passo
importante na política do município ao elaborar uma nova legislação que define
parâmetros de qualidade tanto para o privado quanto para o público. As discussões
travadas nessa Câmara eram enriquecedoras, pois contava com a representante do
governo (presidente da Câmara) possuidora de uma longa experiência, com seus
conhecimentos técnicos; tornando assim, mais eficaz o diálogo com os gestores
públicos, e favorecendo o desenvolvimento de determinados assuntos.
Durante a reformulação da deliberação da EI, o presidente (indicado pelo
Governo) foi substituído no final do ano passado pelo subsecretário do Prefeito.
Destaca-se que até chegar à plenária, a deliberação passou por intensos debates, dentro
da Câmara, contando com a participação dos conselheiros, assessoria técnica, secretária
executiva e chefe da inspeção. Até hoje, a nova deliberação não foi aprovada, pois o
novo presidente da Câmara solicitou a realização de outra revisão.
A Inspeção escolar após juntar as peças dos processos, encaminha as próprias
para o CME/DC, que são entregues aos participantes da Câmara de EI para emitirem
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ISSN 2448-1157
pareceres favoráveis ou desfavoráveis. Esses pareceres realizados pelos conselheiros
têm sua importância, o que não pode é se tornar um ato mecânico, pois a partir das
análises desses processos é possível encontrar pistas para a política da EI no município.
Considerações finais
Após a reflexão sobre a organização, funcionamento e atribuições do CME de
Duque de Caxias, nas políticas de EI, é possível apontar algumas conclusões, não com a
intenção de finalizar o assunto, mas de despertar novas indagações. Os Conselhos
Municipais de Educação constituem um novo modelo de relação entre o Governo e a
sociedade civil, instituídos nos municípios com o objetivo de contribuir para pensar a
gestão pública, a organização e os problemas educacionais na busca de garantir a
qualidade da educação para todos.
Apesar do CME/DC funcionar regularmente, muitas são as questões que
precisam ser (re)pensadas, já que seu funcionamento, a princípio, trouxe para a
sociedade civil organizada certo receio de ela ser cooptada pelo Estado. Permanece
nessa relação um tom de “desconfiança”, tanto do governo, quanto da sociedade civil, já
que vem de uma história de luta em Duque de Caxias de “bater panela na rua” e então
ficou com temor de a instauração de um CME ser uma forma de conter o movimento,
afirmou o conselheiro da sociedade civil.
O CME/DC começou a funcionar de maneira efetiva, há, somente, sete anos.
Sendo assim, a maioria dos conselheiros concorda que esse órgão constitui um caminho
para participação nas decisões da gestão do município, permitindo que essas aconteçam
de forma coletiva, compartilhando com a sociedade civil e o Governo os rumos da
educação municipal. Embora alguns conselheiros da sociedade civil tenham clareza de
sua representatividade e importância do seu compromisso com as políticas
educacionais, esses reconhecem que existe uma assimetria informacional entre eles e os
representantes governamentais, o que dificulta suas ações e os torna frágeis em
determinados encaminhamentos.
Desse modo, é certo que, por parte do governo, existe uma maior unidade nas
tomadas de decisões, o que também pode colocar em xeque a funcionalidade do órgão,
pois, ao pensar que as deliberações do CME/DC precisam contribuir para o bem
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coletivo, a unidade governamental pode representar uma fragilidade que implica
diretamente nas decisões do CME/DC, já que todos os representantes governamentais
são indicados pelo Prefeito e essa notável unidade entre eles inviabiliza discordância e
questionamento. Por meio das entrevistas, os conselheiros apontaram que, para uma
gestão mais democrática, é imprescindível um maior desempenho, sobretudo, da
sociedade civil para entusiasmar os debates.
Constata-se que existe uma pluralidade nas representações do conselho, no
entanto, a população de um modo geral ainda desconhece esse órgão e sua importância
no planejamento das ações municipais. Nas leituras das atas, foi possível constatar que
até os próprios funcionários, que trabalham no mesmo prédio em que funciona o
conselho, desconhecem não só suas atribuições, mas sua existência. Desse modo, o
CME/DC também deixa a desejar quando não dá publicidade aos atos decididos nesse
espaço, seja por meio de folhetos, folders ou cartilhas elaboradas pelo mesmo, como
vem propondo desde sua implementação.
Nesta pesquisa, foi possível concluir que embora exista um grande avanço nas
legislações como: Constituição Federal, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Estatuto
da Criança e do Adolescente e todos os outros documentos que fazem referências à EI, a
realidade ainda é muito distante do que preconizam as legislações. Os estudos
envolvidos neste texto identificam, até hoje, práticas assistencialistas instituídas no
município estudado para o atendimento às camadas mais pobres dessa população. Ao
pensar nas atribuições que o MEC/2009, no seu curso de capacitação e fortalecimento
dos conselhos, aponta – deliberar, normatizar, assessorar e fiscalizar o sistema
municipal (público e privado) –, deixa claro o papel imperioso do CME na política de
EI.
No entanto, verifica-se que ao sair da esfera Nacional para a local, as
deliberações deixam muito a desejar, provocando um distanciamento enorme entre a
realidade e as instituições de atendimento de criança de 0 a 6 anos de idade, provocando
retrocesso e continuidade de um trabalho improvisado e inadequado para as crianças,
violando diferentes direitos. Portanto, chega-se a conclusão que além de toda
infraestrutura precária, no que se refere aos recursos físicos e materiais (ausência de
brinquedos, livros, materiais pedagógicos e pátio), esses espaços ainda funcionam,
atendendo as crianças com a problemática dos profissionais mal remunerados, com
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pouca formação e baixos salários. Assim, pode-se afirmar que o direito da infância à
educação de qualidade, garantido nas legislações, é negligenciado, fortalecendo a
manutenção da atual estrutura social injusta.
A preocupação dos conselheiros com a demanda de vagas para a EI e com a
insuficiência de vagas na rede de Duque de Caxias, apreendidas nas entrevistas e atas,
torna se um argumento para o não fechamento de algumas unidades que já estão
atendendo a boa parte da população dessa faixa-etária há mais de dez anos de modo
precário, em que o discurso principal é a incapacidade de o Governo assumir toda a
procura.
Responsável pela normatização da EI e com a finalidade de garantir a sua
qualidade, o CME tem em suas mãos o compromisso de não fechar os olhos para o que
vem acontecendo, no que diz respeito ao atendimento oferecido às crianças: salas sem
brinquedos, com odor de urina; crianças que se alimentam sentadas em um pedaço de
jornal e dividem o precário espaço com animais. Diante de tal realidade fica uma
pergunta: será que a prioridade nas políticas sociais são, mesmo, as crianças? Pois, não
se justifica entregar as crianças a esses espaços precários por falta de infraestrutura na
EI, ou seja, calar-se diante de argumentos como “não temos capacidade de absorver
essas crianças”, pois é competência do conselho tomar providências com relação a essa
situação por meio de mobilizações, pareceres e, principalmente, fiscalizações.
Outro aspecto é a inexistência de diálogo do CME/DC com os profissionais da
educação e toda comunidade escolar, o que demonstra a falta de acompanhamento e de
construção coletiva na qualidade da EI, tanto pela ausência de regulamentações para
impulsionar esse processo, quanto pela falta de parceria, com a SME/DC para agilizar o
processo de autorização. A superação desse quadro exige uma atuação coletiva com o
poder público que tem manifestado interesse em ampliar o atendimento para essa faixa
etária.
As poucas creches credenciadas e autorizadas se constituem mais um limitador
para o alcance e avanço na qualidade desses espaços de educação; pois, uma vez
reconhecidas pelo CME, sofrem mais uma fiscalização sujeita a avaliação institucional
periódica. O ESTADO terá de dar respostas às exigências das ofertas da EI avançando
do patamar atual para o desejável. Apesar de se entender a importância dos conselhos de
um modo geral para o cenário da Educação. Pode-se concluir diante de todo trabalho
que o CME/DC ainda precisa avançar no que se refere à amplitude de suas influências
na elaboração e fiscalização das políticas educacionais da EI
298
ISSN 2448-1157
REFERÊNCIAS
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Paulo: Cortez, 2010(a).
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para autorização de funcionamento de instituições privadas de EI que assistem e
educam de 0 (zero) a 5 (cinco) anos e onze meses. Duque de Caxias, 1 de dezembro
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GOHN, Maria da Gloria. Conselhos gestores e Participação Sociopolítica. São Paulo:
Cortez, 2001.
299
ISSN 2448-1157
Entre lá e aqui: um mundo de descobertas além dos muros da Creche
Sandra Alves Naletto 105
O trabalho propõe apresentar uma das práticas construída na Creche/Pré-Escola
Oeste, pertencente ao programa de creches da USP, que envolve os profissionais dos
diferentes segmentos na organização para saídas culturais com as crianças. O relato
demonstra a importância de avançar além dos muros da instituição para descobrir uma
infinidade de possibilidades do brincar, conhecer e explorar o mundo em diferentes
contextos. É necessário compreender a importância das saídas das crianças como uma
situação de aprendizagem, de forma a ampliar o seu repertório quanto às diversas
formas de expressão cultural e científica. As saídas também passaram a ser
desenvolvidas com os adultos durante os encontros de formação continuada permitindo,
assim, o resgate de memórias, reflexão sobre as relações nas diferentes maneiras de
estar, permanecer, compreender, elaborar, expressar e se constituir no mundo como um
sujeito histórico e social.
Palavras- chave: Educação, Arte-Educação, Formação
Apresentação: motivação para iniciar a prática
Ao entrar em um espaço cultural, muitas questões fluem no contato entre o
visitante e a expressão cultural ali exposta. São informações, sensações, encontros e
estranhamentos que compõem o diálogo com as produções, sejam elas de qual
linguagem expressiva for, e um entendimento intrínseco dos conceitos que o indivíduo
social constrói ao longo de sua existência.
Na compreensão da criança como sujeito histórico e cultural, que não apenas a
recebe, mas intervém, produz e reelabora, nas últimas décadas, principalmente com a
elaboração dos dispositivos legais: Leis de Diretrizes e Bases da Educação (LDB),
Referenciais Curriculares e Parâmetros Curriculares Nacionais em todas as etapas da
105
Professora de Educação Infantil da Creche/Pré-Escola Oeste- Divisão de Creches- SAS-USP
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educação nacional, a cultura, em seu caráter mais amplo, passa a ser direito comum aos
cidadãos brasileiros seja qual for sua idade ou classe social.
Art. 3º - o ensino será ministrado com base nos seguintes
princípios: I – Igualdade de condições para o acesso e
permanência na escola; II – liberdade de aprender, ensinar,
pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber.
(LDB 9394/96)
A Creche/Pré-Escola Oeste, assim como as demais unidades da rede,
construíram, no decorrer dos anos, a prática de explorar diferentes espaços com as
crianças de 4 – 6 anos106. Como uma atividade permanente, a visita aos espaços
culturais passou a fazer parte do planejamento anual dos grupos.
Adultos e crianças foram se apropriando desses momentos e hoje contamos com
as sugestões para visitação de espaços vindas de toda a comunidade: professores,
funcionários dos diferentes segmentos, famílias e crianças. A sistematização dessa
atividade envolve um trabalho de pesquisa de espaços e eventos na cidade, mais
precisamente nas cercanias da Universidade, conhecimento prévio do espaço, da
proposta a ser explorada na visita, preparação de material para apresentar aos
professores e crianças, contratação de transporte, aviso às famílias e alterações de rotina
que envolvem as outras equipes de apoio.
Organizando as saídas
Para que as saídas com as crianças acontecessem de forma a dar segurança para
poder desfrutar desses momentos, foi construída uma grande organização de
106 As saídas da Creche/Pré-Escola Oeste, com crianças de 0-3 anos foram bastante discutidas
entre a direção, coordenação, professores e funcionários . Por questões de segurança e a
demanda que envolve a saída com crianças que necessitam de estrutura de trocador, rotina de
alimentação diferenciada, transporte adequado e contingente para locomoção, foi constatado de
que não haveria condições de desenvolver tal prática com essa faixa etária. Na conversa com
os pais, houve também consenso quanto a isso. Vale ressaltar que embora os dispositivos legais
citem como direito da criança, independentemente da faixa etária, o acesso à cultura, os
diferentes espaços ainda não se organizaram quanto ao oferecimento de infraestrutura para o
atendimento às crianças pequenas, como sanitários adequados, acessibilidade etc.
301
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procedimentos com todos os envolvidos - crianças, famílias, professores e demais
profissionais.
As visitas aos espaços externos são organizadas de acordo com as solicitações
das crianças, dos professores e eventos culturais que estão acontecendo na cidade. São
Paulo se transformou, no último quinquênio, em um pólo importante principalmente
para as exposições de arte dos grandes nomes das artes plásticas, a exemplo de Miró,
Kandinsky e Frida Khalo.
É importante que as crianças possam ter contato com a obra original, observar as
nuances e fazer as leituras e correspondências com a ideia do autor e as suas vivências
anteriores. Da mesma forma, poder entender a dinâmica da convivência em diferentes
espaços sociais: o comportamento é o mesmo em um museu e em um parque? Ou em
uma biblioteca?
Em alguns momentos atendemos as demandas dos projetos desenvolvidos em
grupo, buscando que as crianças possam pesquisar sobre seus temas em outros espaços
e em conversas com profissionais diversos. Um exemplo aconteceu com o Grupo
Meteoro, formado por crianças de seis anos, que estava pesquisando planetas, meteoros
e estrelas. Realizamos uma visita bastante interessante ao Museu de Geociências, onde
puderam conhecer uma réplica em tamanho natural do esqueleto de um dinossauro,
observar as rochas e meteoritos reais e conversar com um geólogo do museu que
explicou os processos de formação desses elementos. As crianças trocaram ideias e
saíram de lá com muitas informações que enriqueceram a pesquisa que estavam
realizando. A experiência de estarem em um museu, descobrirem que há peças que
podemos tocar e outras não e o porquê não, de terem acesso ao conhecimento científico
e relacioná-lo com sua realidade comporão, ao longo do tempo, os recursos para suas
relações em sociedade.
Antonio Joaquim Severino107 nos faz pensar, ao observar o repertório que vai se
construindo no cotidiano das crianças, no fortalecimento dos elementos subjetivos que
107
SEVERINO, Antonio Joaquim. Educação, Sujeito e história. São Paulo: 2006.
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compõe a cultura e na qual eles se fazem sujeitos de ação e, cuja reação, se transporá
para as relações sociais do presente e do futuro.
Da mesma forma, colocá-los em contato direto com as esferas de pesquisa, dá às
crianças a possibilidade de dialogar com outros produtores de conhecimento, nesse
caso, no centro da academia.
Visitação prévia aos espaços
Mesmo sendo defendido e promulgado em lei o direito da criança, de acesso à
cultura, enquanto cidadã, os espaços não estão adaptados para acolher as crianças
pequenas. Dessa forma, encontramos locais com vãos em escadas, degraus altos, difícil
acessibilidade aos banheiros, além das dificuldades de acesso aos locais e de paradas
para desembarque adequadas. Assim, além do conteúdo do programa, é preciso verificar
a viabilidade da visitação e calcular qual o número de adultos necessários para uma
supervisão que propicie desfrutar da visitação com segurança e tranqüilidade.
A visitação prévia do educador possibilita pensar num recorte do espaço
expositivo ou as delimitações de áreas para visitação. Vale lembrar que o tempo de
visita, em caso de exposições ou monitoramento em centro de pesquisa não ultrapassam
40 minutos, por isso é interessante escolher um roteiro que mais atenda às intenções dos
professores e o interesse das crianças.
Agendamento no espaço, quando necessário, na data disponível
Os agendamentos atendem à organização dos espaços. Hoje, mesmo os parques
públicos, precisam, muitas vezes, serem avisados da visitação de um determinado grupo
de crianças. Outro elemento importante é poder contar com a monitoria em espaços
expositivos e um tempo na ação educativa (ações de interação dirigida), mas nem
sempre os espaços contam com esse atendimento para as crianças nesta faixa etária.
Assim, a visita prévia auxiliará o professor a organizar e mediar essa visitação.
Disponibilidade do ônibus
Quando o transporte era realizado por veículo da Universidade a questão era
apenas organizar as agendas entre as três unidades da capital. Hoje, com a
impossibilidade de utilizar esse transporte, é preciso agendar, dentro da disponibilidade
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de um perueiro escolar, dia e horário. Isso reduziu a área em que buscamos espaços para
levar as crianças e o tempo de permanência fora da Creche. É importante salientar que a
questão de confiabilidade e segurança das crianças é de responsabilidade da Instituição,
portanto, cabe ao organizador verificar as condições do veiculo, os equipamentos de
segurança e se o condutor age de acordo com as leis de trânsito.
Disponibilidade de educadores para acompanhar o passeio
Para as saídas contamos sempre com o acompanhamento de professores do
grupo, professor volante e professora que acompanha e sistematiza os passeios na
instituição. Espaços muito abertos ou com grande número de visitantes demandam o
acompanhamento de muitos professores. Os agendamentos não podem coincidir com
eventos internos da Instituição e que envolvem saídas de professores.
Alterações de rotina- cozinha, módulos, limpeza, coordenação
A rotina dentro da instituição envolve diversas equipes, além dos professores e
crianças. Dessa forma, é preciso prever e informar quais alterações são necessárias para
o dia da saída: mudanças de horários de refeição, por exemplo.
Comunicação às famílias
As famílias participam desse planejamento dando sugestões, custeando o
transporte e precisam se organizar para que nos dias de saídas com as crianças elas
possam cumprir os horários, principalmente quando se diferenciam dos comumente
cumpridos, e não deixar de trazer a crianças na Creche.
Com uma antecedência de ao menos uma semana, as comunicações nas portas
das salas e via e-mail são importantes para colocar as famílias a par da programação das
crianças e das alterações dessa rotina. Vale lembrar que muitas delas ainda sentem
algumas dúvidas quanto ao que é seguro fora da creche. Com essa antecedência, as
famílias também podem expressar e terem respondidas suas preocupações. Os eventos
fora da instituição demandam muita organização do grupo de profissionais e da
confiança das famílias.
Identificação das crianças
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É importante criar uma forma de identificação do grupo de crianças,
principalmente quando a escola não adota um uniforme, como na Creche/Pré-Escola
Oeste. Depois de muitas conversas, e com o exemplo do que já ocorria na Creche
Central, o grupo sugeriu à Coordenação que fosse incluída na lista de material, no inicio
década ano, a solicitação de uma camiseta na cor laranja. Dessa forma, todas as crianças
em espaços externos vestem a mesma cor e tem discriminado em cada uma o nome da
criança, da instituição e os telefones.
Além da Creche, também com os adultos
“No meu tempo, parte da alegria de brincar estava na alegria de
construir o brinquedo. Fiz caminhõezinhos, carros de rolemã,
caleidoscópios, periscópios, aviões, canhões de bambu, corrupios,
arcos e flechas, cataventos, instrumentos musicais, um telégrafo,
telefones, um projetor de cinema com caixa de sapato e lente feita com
lâmpada cheia d’água, pernas de pau, balanços, gangorras, matracas
de caixas de fósforo, papagaios, artefatos detonadores de cabeças de
pau de fósforo, estilingues. Fazendo estilingues desenvolvi as virtudes
necessárias à pesquisa: só se conseguia uma forquilha perfeita de
jabuticabeira depois de longa pesquisa”108.
Há três anos, iniciamos uma prática, nas Formações em Serviço, com as equipes
de diferentes setores propondo resgatar e ampliar as vivências dos funcionários nos
espaços culturais de São Paulo. Dessa forma, entraram em contato com sua cultura de
origem (regionais), conheceram outras formas de pensar o folclore, as tradições, a
cultura e os conhecimentos científicos. A receptividade do grupo frente a essa proposta
nos possibilitou observar as muitas manifestações: silêncio, espanto, rejeição,
admiração etc. Esse encontro resultou em uma maior compreensão do trabalho
pedagógico desenvolvido na Creche, onde esses sujeitos inferem também no cotidiano
das crianças. Embora Jorge Coli, em O que é arte109, fale mais diretamente sobre a
relação do indivíduo com a expressão da arte, a concepção que traz é importante para
representar a relação dos grupos de outros setores com a compreensão do processo de
aprendizagem:
A fruição da arte não é imediata, espontânea, um dom, uma graça.
Pressupõe um esforço diante da cultura. Para que possamos
emocionar-nos, palpitar com o espetáculo de uma partida de
108
109
ALVES. Rubem. Cenas da vida. Campinas: Papirus, 2009, p. 119.
COLI, Jorge. O que é arte. São Paulo: Editora Brasiliense, 2006. p 117 e 119
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futebol, é necessário conhecermos as regras desse jogo, do
contrário tudo nos passará despercebido, e seremos forçosamente
indiferentes (...) “Gostar” ou “não gostar” não significa possuir
uma “sensibilidade inata” o ser capaz de uma “fruição
espontânea” – significa uma reação do complexo de elementos
culturais que estão dentro de nós dentro do complexo cultural que
está fora de nós (...)”, seja uma obra de arte ou outros
conhecimentos adquiridos pela humanidade.
Considerações finais
Segundo Dewey, “para a experiência ter valor e significado educacional, o
indivíduo deve experimentar o desenvolvendo a habilidade de lidar inteligentemente
com problemas que ele inevitavelmente encontrará no mundo”. Isso se refere ao homem
em seu processo de educação, ou seja, pela vida afora. O cerne da discussão está na
compreensão da importância do acesso a cultura e de sua apropriação pelos diversos
sujeitos históricos e sociais que constituem o ambiente educacional.
A Creche, como espaço de educação, tem buscado propiciar o encontro e
reencontro entre sujeitos e a cultura. As saídas para as crianças ampliaram o repertório
verbal, de conhecimento artístico e cientifico, proporcionando a busca por pesquisas
dentro de seus grupos, a troca de informações e percepções expressando as relações
entre o que se conhece e o que se observou. A troca de informações entre o objeto de
observação/experimentação e o seu observador, e que deve ser precedida de um
conteúdo anterior, acontece no encontro da criança que já refletiu e discutiu junto com
seu grupo de maneira prévia, antes de entrar em contato direto com os ambientes
visitados e suas proposições. O objeto, ou o espaço, foi concebido para essa interação,
trazendo consigo uma provocação explícita para travar um diálogo; o observador, da
mesma forma, apresenta-se não despido de intenções e de uma diversidade de
experiências que o constituem como um ser social. Todas as outras interações já
vivenciadas influenciarão direta e indiretamente nesse novo encontro. Aquele conjunto
de informações pré-concebidas direcionam o olhar e as demais sensações.
No grupo da Creche, vemos crianças produzindo conhecimentos diversos em
diálogo com essas observações vivenciadas nas visitações e na interação com o grupo
de adultos que agora contribui com um repertório de experiências reencontradas e
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valorizadas pela história que representa. A valorização desses sujeitos, historicamente
colocados à margem do processo educativo, trouxe em diversos momentos da rotina
uma riqueza ímpar e que constitui hoje, um patrimônio que dá identidade ao percurso da
Creche/Pré-Escola Oeste.
Referências
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Vozes: Petrópolis, RJ. 2ª edição: 2012.
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dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial
da União. Brasília, DF, 23 dez. 1996.
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Mapeamento da situação das escolas municipais de educação infantil (EMEI’s) da
cidade de Assis/SP em relação às metas propostas pelo Plano Nacional de
Educação (PNE 2001-2010) nas questões de oferta, atendimento e infraestrutura.110
Carlos da Fonseca Brandão111
Sandra Regina Gregório Oliveira112
Maria Cristina Bigele113
RESUMO
O objetivo de nossa pesquisa foi mapear a situação em 2013 das Escolas Municipais de
Educação Infantil (EMEI’s) da cidade de Assis, localizada no centro-oeste paulista.
Nossa análise centrou-se nas questões relativas à oferta, ao atendimento e à questão da
infraestrutura física e material das escolas pesquisadas, partindo de dados e informações
fornecidas pela respectiva Secretaria Municipal de Educação. Tomamos como
referência as metas propostas pelo PNE 2001-2011 e detectamos que no município
citado essas foram alcançadas no que se refere às questões de oferta, atendimento e
infraestrutura da educação infantil.
Palavras-chave: política educacional. Sistemas de ensino municipal. Educação infantil.
110
Este texto é fruto de pesquisa do COPPE – Coletivo de Pesquisa em Políticas Educacionais,
realizada em 2013, na UNESP – Marília.
111
Professor da Pós–graduação em Educação - UNESP - Marília e Coordenador do COPPE.
112
Professora do Instituto Educacional de Assis, Coordenadora Pedagógica da Educação Infantil,
da SME – Assis e doutoranda em Educação – UNESP – Marília.
113
Doutoranda em Educação – UNESP – Marília.
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1INTRODUÇÃO
As primeiras instituições de Educação Infantil na Europa e nos Estados Unidos
tinham como objetivos, cuidar das crianças e protegê-las, enquanto as mães saíam para
o trabalho. Dessa maneira, a origem e a expansão destas instituições estão associadas à
transformação da família na sociedade ocidental, que, segundo Didonet (2001), baseiase no trinômio: mulher-trabalho-criança. Desta maneira, as creches, escolas maternais e
Jardins de Infância tiveram, somente no seu início, o objetivo assistencialista, cujo
enfoque era a guarda, a higiene, a alimentação e os cuidados físicos das crianças.
Apesar da origem voltada para as questões assistenciais, Kuhlmann Jr. (2001)
ressalta que essas instituições também se preocuparam com questões relacionadas à
educação, pois se apresentaram como pedagógicas já em seu início. Para esse autor, as
propostas pedagógicas variam, “[...] seja em função da instituição ou da idade da
criança, seja por opção por um método pedagógico ou por um conjunto de objetivos
educacionais específicos” (KUHLMANN JR., 1998, p. 184)114.
Para esse autor, essa educação não seria sinônimo de emancipação, haja vista
que a pedagogia para as crianças pobres se constituía em submissão, “[...] uma educação
assistencialista marcada pela arrogância que humilha para depois oferecer o
atendimento como uma dádiva, como favor aos poucos selecionados para o receber”
(KUHLMANN JR., 1998, p. 186).
A partir da segunda metade do século XIX, o quadro das instituições
destinadas à primeira infância era formado, basicamente, pela creche e pelo Jardim de
Infância, ao lado de outras modalidades educacionais que foram absorvidas como
modelos em diferentes países.
114
Kuhlmann Jr. (1998) utiliza o termo “pedagógico”, para as instituições de atendimento à
infância que não se preocupavam apenas com os cuidados voltados ao corpo da criança, mas às
atividades que estimulavam a inteligência infantil, o desenvolvimento de habilidades, o
conhecimento das letras e as primeiras noções de moral e religião.
309
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2 JUSTIFICATIVA
No Brasil, por exemplo, a creche foi criada exclusivamente com caráter
assistencialista, o que diferenciou essa instituição das demais criadas nos países
europeus e norte-americanos, que tinham objetivos de caráter pedagógico. Um fator que
contribuiu para o surgimento das creches, dos asilos e dos orfanatos brasileiros foi à
iniciativa de acolhimento aos órfãos abandonados que, com o apoio da alta sociedade,
tinha como finalidade, segundo Rizzo (2003), esconder a vergonha da mãe solteira.
Fatores como o alto índice de mortalidade infantil, a desnutrição generalizada e
o número significativo de acidentes domésticos, fizeram com que alguns setores da
sociedade, dentre eles, a dos religiosos, dos empresários e dos educadores começassem
a pensar num espaço de cuidados da criança fora do âmbito familiar; “[...] foi por esse
lado, ou seja, como problema, que a criança começou a ser vista pela sociedade e com
um sentimento filantrópico, caritativo, assistencial, é que começou a ser atendida fora
da família” (DIDONET, 2001, p.13). Já para Kuhlmann Jr. (1998),o objetivo do
trabalho assistencialista se voltava mais para uma educação moral do que intelectual.
Ainda no final do século XIX, período da abolição da escravatura no país,
quando se acentua a migração para as grandes cidades e se dá a Proclamação da
República, surgem iniciativas isoladas de proteção à infância, com o objetivo de
combater os altos índices de mortalidade infantil. O discurso presente era de cunho
médico-higienista, cuja preocupação centrava-se nos cuidados e higiene do corpo da
criança. Mesmo com o trabalho desenvolvido nas Casas de Misericórdia, por meio da
roda dos expostos, foi criado um número significativo de creches não pelo poder
público, mas, exclusivamente, por organizações filantrópicas.
Assim, entendia ser fundamental uma reforma no sistema educacional
brasileiro que atendesse os pequenos. Rui Barbosa considerava que o Estado deveria
ofertar escolas gratuitas e obrigatórias para a população, cabendo à família a
responsabilidade de enviar seus filhos às mesmas (LARA; LUCAS; MACHADO,
2007).
310
ISSN 2448-1157
Com o mesmo ponto de vista, seu contemporâneo, o médico Menezes de
Vieira, defendeu a criação e a implementação dessas instituições com caráter educativo
e não com objetivos em si mesmas, tanto para as classes mais favorecidas, quanto para
as classes mais baixas. Apesar da profissão, inaugurou, no ano de 1875115, o primeiro
Jardim de Infância particular e oficial do Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, no Colégio
Menezes Vieira.
Este médico foi propagador do pensamento de Froebel, ao propor a adaptação
de seu método para nossa realidade local, ou seja, a nacionalização dos materiais e das
atividades froebelianas, para serem utilizados com as crianças brasileiras. O objetivo
desse estabelecimento, segundo Bastos (2001), era atender crianças do sexo masculino,
de três a seis anos de idade, sendo essas oriundas das classes mais abastadas da
sociedade. A proposta pedagógica dessa instituição priorizava atividades de ginástica,
pintura, desenho, exercícios de linguagem e de cálculo, escrita, leitura, história,
geografia e religião. O método utilizado era o intuitivo e tinha como objetivos o
desenvolvimento da percepção das crianças e a graduação do ensino, partindo sempre
do concreto ao abstrato116.
As tendências que acompanharam a implantação de creches e Jardins de
Infância, no Brasil, no final do século XIX e durante as primeiras décadas do século
XX, foram a jurídico-policial, a médico-higienista e a religiosa, já que “[...] cada saber
apresentava as suas justificativas para a implantação de creches, asilos e Jardins de
Infância, onde seus agentes promoveram a constituição de associações assistenciais
privadas em nosso país” (KUHLMANN JR., 1998, p. 88).
115
Em 1877, foi inaugurada, em São Paulo, uma turma de Jardim de Infância junto à Escola
Americana, ambas particulares.
116
Apesar dessa instituição não ter sido a primeira do Brasil, sua criação representou um marco
na realidade brasileira, já que, pelo trabalho desenvolvido, recebeu inúmeros prêmios, o que
propiciou a criação de outras instituições no Rio de Janeiro, décadas depois.
311
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Ainda nesse período117, foi criado o Instituto de Proteção à Infância do Rio de
Janeiro, o IPAI, pelo médico Arthur Moncorvo Filho 118. Essa instituição tinha como
objetivos não só atender às mães grávidas pobres, mas proporcionar assistência aos
recém-nascidos, fazer a distribuição de leite, a consulta de lactantes, a vacinação e a
higiene dos bebês. Foi considerada umas das entidades mais importantes, sobretudo por
ter expandido seus serviços por todo o território brasileiro. A filosofia da instituição era
justamente contribuir para a diminuição do alto índice de mortalidade infantil nas
camadas populares da sociedade.
Até a década de 1950, as poucas instituições existentes, fora das indústrias, eram
de responsabilidade de entidades filantrópicas ou particulares. Depois desse período,
com o avanço da industrialização e com o aumento das mulheres da classe média no
mercado de trabalho, cresceu a demanda pelo serviço das instituições de atendimento à
infância (OLIVEIRA, 1992). Haddad (1993) considera que a ideia do atendimento à
criança, fora do lar, possibilitaria a superação das precárias condições sociais a que ela
estava sujeita, por meio de uma educação compensatória, já estava presente em meados
de 1970.
Naquele momento, enquanto as instituições públicas atendiam as crianças das
camadas populares, as propostas das particulares, de cunho pedagógico, funcionavam
em meio turno, dando ênfase à socialização e à preparação para o ensino regular, pois,
enquanto as crianças das classes menos favorecidas eram atendidas com propostas de
trabalho que partiam de uma ideia de carência e deficiência; as crianças das classes
117
Em 1889 foi inaugurada a primeira creche da Companhia de Fiação e Tecidos de Corcovado
(RJ) para filhos de operários. Em meados de 1901, outras iniciativas de assistência à infância
foram criadas, dentre elas, às creches coordenadas por Anália Franco em São Paulo. Em 1906,
foi criado o Patronato de Menores, fundado por juristas brasileiros e em 1908, foi criado o Asilo
de Menores Desamparados no Distrito Federal.
118
Por seu trabalho de utilidade pública, o IPAI recebeu diferentes premiações como, medalha
de prata na Exposição da Louisiana no ano de 1904, medalha de ouro na Exposição de Higiene
em 1909, no Rio de Janeiro, e Diploma de Honra no ano de 1912, na Exposição de Higiene, em
Roma. Na década de trinta, possuía vinte e duas filiais em todo o país (KUHLMANN JR., 1998).
312
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sociais mais abastadas recebiam uma educação que privilegiava a criatividade e a
sociabilidade infantil (KRAMER, 1995).
Verifica-se que, até o final de 1970, pouco se fez, em termos de legislação, para
se garantir a oferta desse nível de ensino. Na década de 1980119, diferentes setores da
sociedade, como organizações não governamentais, pesquisadores da área da infância,
comunidade acadêmica, população civil e outros, uniram forças com o objetivo de
sensibilizar a sociedade sobre a necessidade de se garantir o direito da criança a uma
educação de qualidade desde o seu nascimento. Transcorreu-se quase um século para
que a criança tivesse garantido o seu direito à educação na legislação, pois foi somente
com a Carta Constitucional de 1988 que esse direito foi efetivamente reconhecido.
Assim, no Brasil, desde a promulgação da atual Constituição e da sanção da Lei
nº 8.069/90, que instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a concepção
de criança como sujeito de direitos120, que é detentora de potencialidades a serem
plenamente desenvolvidas, está em sintonia com as principais normas internacionais
sobre o direito da criança à Educação, quer sejam, a Declaração Universal dos Direitos
da Criança (UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância –, 1959) e Convenção
sobre os Direitos da Criança (ONU/UNICEF, 1989) (TIRIBA, 2001, p. 73 e LEITE
FILHO, 2001, p. 31).
Por determinação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB –
Lei nº 9.394/96), a Educação Infantil possui a finalidade de promover o
desenvolvimento integral das crianças de 0 a 5 anos, em seus aspectos físico,
psicológico, intelectual e social, de forma a complementar a ação da família e da
comunidade, sendo considerada como a primeira etapa da Educação Básica
(BRANDÃO, 2006, p. 84). A LDB também determina que a Educação Infantil seja
dividida em creches e pré-escolas, as primeiras (creches) atendendo crianças de 0 a 3
119
Em 1982, o Ministério da Educação criou o Programa Nacional de Educação Pré-escolar que
estabelecia as metas, diretrizes, prioridades e planos de ação da política para essa faixa etária.
120
Sobre as diversas formas de se interpretar essa concepção de criança como sujeito de
direitos, ver SARMENTO, 2001, p. 24-27.
313
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anos, ficando a faixa de 4 e 5 anos para as pré-escolas, que, por sua vez, deverão adotar
objetivos educacionais, transformando-se em instituições de educação, segundo as
diretrizes curriculares nacionais específicas para a Educação Infantil.
A seguir apresentamos a situação atual das escolas municipais de educação
infantil (EMEI’s) do município de Assis, em relação às metas propostas pelo antigo
Plano Nacional de Educação (PNE – Lei nº 10.172/01), que vigorou de 2001 a 2011,
nas questões relativas à oferta, ao atendimento e à infraestrutura.
3 O CENÁRIO DE ASSIS
3.1. Assis: um breve histórico
José Teodoro de Souza, um desbravador de terras provenientes do Estado de
Minas Gerais, chegou às proximidades de onde hoje se localiza a cidade de Assis por
volta de 1850. José Teodoro, com a intenção de conquistar a região habitada pelos
indígenas (PRADO, 2013), tomou posse das terras e fundou em 1855 os distritos de
Campos Novos do Paranapanema e Conceição de Monte Alegre.
Neste período, o Capitão Francisco de Acis Nogueira, também nascido em
Minas Gerais, adquiriu alqueires de terras que José Teodoro de Souza havia se
apoderado e em primeiro de julho de 1905, doou cerca de 80 alqueires dessas terras para
a construção de um patrimônio,nomeado de “Acis”, em homenagem ao homem que
ofertou as terras para a sua constituição.
O povoado de Acis foi reconhecido como distrito, com a promulgação da Lei
Estadual nº 1496 de 30 de dezembro de 1915, tendo também, a partir da citada lei, a
grafia do nome do distrito alterada para “Assiz”. Em 1917 o distrito de Assiz foi
elevado à categoria de município, mas apenas em 1944, por conta do decreto-lei
estadual 14.334, passou-se a grafar o nome utilizado até o presente momento “Assis”.
A cidade de Assis está localizada a 434 quilômetros da capital do Estado de São
Paulo, possuindo, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
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(IBGE) cerca de 100.204 habitantes (IBGE Cidades, 2013). Com a extensão de
aproximadamente 460 km², Assis faz fronteira ao norte com a cidade de Lutécia, ao sul
com Cândido Mota e Tarumã, ao leste com Platina e Echaporã e a oeste com as cidades
de Paraguaçu Paulista e Maracaí, todos localizados dentro do Estado de São Paulo.
No ranking do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), a
cidade de Assis figura na 28ª posição com o índice de 8,05, o que é considerado um
indicador alto segundo a escala de avaliação do IDHM. Na área de educação, o índice
de Assis é de 0,781 (considerado médio); o índice de longevidade é de 0,865
(considerado alto); e o de renda é de 0,771 (considerado médio).
Fonte:
PNUD,
IPEA
e
FJP.
Disponível
em:
<http://atlasbrasil.org.br/2013/perfil/assis_sp>. Acesso em 23 out. 2013.
3.2A Educação em Assis
315
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A cidade de Assis possui cinco escolas de ensino superior, sendo essas a
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), a Universidade
Paulista (UNIP), a Fundação Educacional do Município de Assis (FEMA), o Instituto
Educacional de Assis (IEDA) e a Universidade do Norte do Paraná (UNOPAR).
De acordo com os dados colhidos pelo IBGE na pesquisa sobre “Ensino Matrículas, Docentes e Rede Escolar 2012”, há em Assis 40 escolas que ofertam o
Ensino Fundamental, sendo 19 escolas públicas municipais, 12 escolas públicas
estaduais e 9 escolas privadas. Há 21 escolas com Ensino Médio, das quais 13 escolas
são públicas estaduais e 8 escolas são particulares. O ensino pré-escolar está presente
em 35 escolas, sendo 22 escolas públicas municipais, uma escola pública estadual e 12
escolas privadas.
No gráfico a seguir temos o resultado do IDHM de Educação da cidade de Assis,
o qual é formado pela proporção de crianças e jovens frequentando, ou que já
completaram determinados ciclos escolares, indicando a situação da educação da
população com idade escolar. De acordo com o PNUD, o IPEA e a FJP (2010), a
porcentagem de crianças assisenses de 5 e 6 anos frequentando a escola no ano de 1991
era de 43,32%, em 2000 a percentagem foi de 82,83% e em 2010 o número atingido foi
de 97,18%. Dessa maneira, a proporção de crianças de 5 e 6 anos frequentando a escola
entre os anos 1991 a 2000 teve um aumento de 91,20% e entre o ano 2000 a 2010 essa
proporção aumentou 17,32%.
Em 1991, Assis tinha um percentual de 69,36% de suas crianças, na faixa etária
de 11 a 13 anos, que frequentavam os anos finais do ensino fundamental. Em 2000, a
quantidade de crianças nessa situação e faixa etária subiu para 86,18% e no ano de 2010
esse percentual alcançou o patamar de 93,08%. Assim, houve um aumento significativo
(aproximadamente 24%) do percentual de crianças, nessa faixa etária, que passaram a
frequentar os níveis finais do ensino fundamental entre os anos de 1991 a 2000, ao
passo que entre os anos de 2000 a 2010, esse aumento foi de 8,01%.
316
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Fonte:
PNUD,
IPEA
e
FJP.
Disponível
em:
<http://atlasbrasil.org.br/2013/perfil/assis_sp>. Acesso em 23 out. 2013.
Comparando a média do Fluxo Escolar por Faixa Etária de Assis com a média
do Estado de São Paulo e do Brasil, verificamos que a quantidade de crianças e jovens
nas escolas da cidade de Assis está acima da média estadual e da média nacional.
317
ISSN 2448-1157
Fonte:
PNUD,
IPEA
e
FJP.
Disponível
em:
<http://atlasbrasil.org.br/2013/perfil/assis_sp>. Acesso em 23 out. 2013.
3.3 A Educação Infantil em Assis
A Educação Infantil em Assis teve início na década de 1980, que pretendia
atender as necessidades educacionais dessa faixa etária. Em 1984 foram instaladas as
primeiras unidades de ensino infantil, que receberam o nome de Setores Municipais de
Educação Infantil de Assis (SEMEIAS). A maior parte dos SEMEIAS não tinham boa
infraestrutura, tanto que o funcionamento de tais setores ocorria em condições precárias,
em lugares públicos. Alguns SEMEIAS foram implantados mais próximos das
periferias, em locais cedidos pelo próprio poder público, por igrejas e por comunidades
de bairros para que o atendimento de alunos dessas regiões da cidade também pudesse
acontecer.
318
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As EMEI’s (Escolas Municipais de Educação Infantil) e EMEIF’s (Escolas
Municipais de Educação Infantil e Fundamental) que atualmente constituem o ensino
municipal de Assis originaram-se dos SEMEIAS. Foi no final da década de 1990, ao
municipalizar todo o primeiro ciclo do ensino fundamental (do primeiro ao quinto ano,
como são designados atualmente), que a cidade de Assis ampliou o atendimento da
educação infantil dando origem as EMEIF’s.
Além das EMEI’s e EMEIF’s, o município também possui as EMEF’s (Escolas
Municipais de Ensino Fundamental), Escolas de Ensino Profissionalizante, escola de
Educação Ambiental, entre outros projetos. Ao todo a rede municipal possui 29
unidades escolares, as quais atendem cerca de 10.000 crianças matriculadas na educação
infantil e ensino fundamental.
A Secretaria Municipal de Educação (SME) alterou significativamente sua
filosofia de trabalho a partir do ano de 2009, procurando, segundo a própria SME, focar
no aluno de maneira humanizada, primando pela eficiência dos processos de ensino e
aprendizagem e assim contribuir para o crescimento pessoal e social dos habitantes da
cidade. Além disso, ainda de acordo com a SME, a qualidade dos serviços prestados à
comunidade assisense é uma prioridade, tendo como um dos principais objetivos
pedagógicos fazer com que as crianças estejam totalmente alfabetizadas quando
encerrarem seus ciclos na rede municipal.
3.4. O caminho da pesquisa
3.5 A coleta de dados
A pesquisa foi quali-quantitiativa (Triviños,1987).A coleta de dados foi
realizada diretamente na Secretaria Municipal de Educação do Município de Assis
(SME). O objetivo da pesquisa foi obter dados quantitativos referentes à oferta (número
de escolas e número de vagas), ao atendimento (número de matrículas realizadas) e à
infraestrutura (tanto a infraestrutura dos prédios físicos, como a disponibilidade de
materiais e recursos didáticos) da educação infantil municipal.
319
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A partir dos dados disponibilizados pela SME, constatamos que a cidade de
Assis possui 11 escolas de educação infantil, localizadas por vários bairros da cidade,
atendendo um total de 4332 crianças, sendo que as creches atendem 1419 crianças e as
escolas de educação infantil atendem 2913 crianças. A educação infantil no município
de Assis possui, como um todo, um quadro profissional composto por 299 professores,
sendo que 50% desses docentes são temporários contratados a partir de processos
seletivos realizados anualmente, e cerca de 90 estagiários-bolsistas, que são estudantes
do ensino médio e/ou estudantes do ensino superior, também contratados
temporariamente.
Algumas dessas escolas oferecem educação em período integral, perfazendo um
total de 10 ou 11 turmas, disponibilizando oficinas de alfabetização em matemática,
alfabetização e letramento, informática, artes visuais, além de outras atividades, nos
horários de contraturno das aulas regulares. Afora essas escolas que possuem período
integral, há cinco “escolas polos” que funcionam durante o ano inteiro, tendo
revezamento de funcionários nos períodos do recesso no mês de julho e das férias de
final/início de ano. Além disso, a rede municipal como um todo possui salas de
estimulação pedagógica, sala de recursos, além de vários projetos específicos aplicados
nas escolas.
Mesmo atendendo a mais de 4000 crianças na educação infantil, a SME
registrou uma quantidade de alunos que não conseguiram se matricular em nenhuma
creche e escola de educação infantil municipais. Cerca de 660 crianças estão fora das
creches porque não conseguiram vaga, e um número aproximado de 20 a 30 crianças
não estão matriculadas no ensino pré-escolar, também por falta de vagas nas escolas.
Com a tentativa de amenizar essa situação, a SME está reformando e ampliando
algumas creches, além de estar finalizando a construção de quatro novas unidades nos
bairros Jardim Paraná, Vila Xavier, Vila Ribeiro e Inocoop, e planeja a construção de
uma creche no bairro Residencial Parque do Bambú. A previsão com essas ampliações e
construções é atender mais 210 crianças nas creches e mais 132 crianças na pré-escola.
Mesmo com a entrega das creches já construídas e com a construção de uma nova, o
número de vagas a ser ofertado (342 vagas) não conseguirá suprir a necessidade que a
320
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cidade apresenta para toda a educação infantil (no total, cerca de 690 vagas), portanto,
para a SME, o foco do seu trabalho, nesse nível de ensino, a partir de 2013, é atender a
essa demanda.
Sobre a infraestrutura, as EMEI’s de Assis, segundo a SME, possuem prédios
em boas condições físicas, cozinhas próprias para cada unidade com refeições
balanceadas. Porém, ao mesmo tempo, as EMEI’s de Assis são deficientes com relação
aos parquinhos de brinquedos para os momentos de lazer das crianças atendidas,
havendo também falta de brinquedos, pois a quantidade que as escolas possuem
atualmente não é suficiente para que as crianças brinquem da mesma maneira em todas
as escolas da rede municipal. Também foi apontada a falta de instrumentos musicais,
que seriam necessários para o desenvolvimento musical das crianças.
A SME de Assis possui a preocupação de configurar as suas EMEI’s,
prioritariamente, como espaços educativos, relativizando o caráter assistencialista, que,
muitas vezes, é imputado a esse nível de ensino. Para isso, as creches desenvolvem uma
série de atividades educativas, como noções de higiene pessoal, musicalização, a “Hora
do Conto”, jogos pedagógicos, entre outros. Por fim, SME de Assis não possui uma
diretriz curricular própria, sendo que alguns livros utilizados pela sua rede municipal
são enviados pelo MEC e outros são adquiridos pela própria SME de Assis, conforme o
planejamento dos currículos pelas suas escolas.
4CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nossa pesquisa constatou que a SME de Assis atende uma considerável
quantidade de crianças de 0 a 5 anos (mais de 4300 crianças) e possui uma demanda
ainda não atendida de aproximadamente 690 crianças, apresentando assim, um déficit
de, aproximadamente, 13,7% de vagas na educação infantil. Este déficit deverá ser
diminuído, no médio prazo para, aproximadamente, a metade. Porém, quando
separamos as vagas a serem criadas para a creche das vagas a serem criadas para a préescola, temos que a SME de Assis diminuirá em apenas 1/3 o déficit de vagas nas
creches e, por outro lado, apresentará uma “sobra” de, aproximadamente, 100 vagas na
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pré-escola, considerando que não estamos levando em conta o aumento vegetativo da
população do município de Assis.
A respeito da infraestrutura, tanto a estrutura física como a oferta de espaços,
mobiliários e materiais das escolas de educação infantil de Assis, verificamos que, nessa
questão, o sistema municipal de educação de Assis possui prédios novos e outros em
boas condições físicas, cozinhas próprias para cada unidade e parquinhos de lazer em
boas condições em quase todas as escolas.
Por outro lado, verificamos que a fragilidade do sistema de educação infantil em
Assis está na falta de valorização da carreira docente. Faltam editais de concursos
públicos para a contratação de professores efetivos, o que implica nas escolas de
educação infantil terem 50% de seus docentes trabalhando em regime precário (os
chamados “temporários”). Com esse percentual tão elevado, torna-se muito difícil que o
trabalho pedagógico tenha continuidade, já que todo início de ano o professor precisa
participar do processo seletivo, ser classificado na prova e passar pela atribuição de
aulas.
Observando as atribuições realizadas no ano de 2013 disponíveis no site da SME
de Assis, notamos a grande quantidade de desistências desses professores temporários
(em 2013, aproximadamente 20% desistiram durante o ano), o que faz com que, durante
todo o ano, novos professores temporários tenham que ser contratados, nos mais
diferentes momentos do ano letivo, dificultando o trabalho pedagógico das atividades
realizadas com os alunos.
322
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Projeto Onuki de Musicalização na Primeira Infância
Experiência em Creches Públicas da Prefeitura Municipal de Cubatão
Sonia Maria da Silva Onuki
Idealizadora e Coordenadora do Projeto Onuki de Musicalização na PMC
Luciane Gouvêa de Sant’Anna
Coordenadora da Pratica do Projeto Onuki em Sala de Aula
Cecilia Maria Mondelo
Organizadora do Repertório para as Aulas de Musicalização
Projeto Onuki de Musicalização
Uma Experiência em Creche Publica na Prefeitura Municipal de Cubatão
Resumo: O presente trabalho tem como foco, a inserção da Educação Musical na
Escola Publica de Educação Infantil I. A motivação foi a Lei Federal nº 11.769/08, que
altera a Lei 9.394/96 (LDB), que dispõe sobre a obrigatoriedade do ensino da música na
educação básica. A Educação Musical aplicada à Escola tem como foco a sensibilização
do aluno, a ampliação de sua cultura, a valorização do ser humano, além dos objetivos
pedagógicos musicais. O objetivo específico do trabalho é a formação cognitiva,
psicomotora, afetiva, o desenvolvimento auditivo e respiratório, o estimulo da criança a
autoconfiança, a curiosidade, a disciplina, a criatividade, a análise, a cidadania, ao
respeito mútuo, ao conhecimento, ao desenvolvimento cultural e social, ao equilíbrio
emocional, além do desenvolvimento do canto e a utilização correta da voz. É aplicado
na Educação Infantil I com bebês entre um ano e meio e três anos, nas UMEs de
Educação Infantil I da Rede de Ensino da Prefeitura Municipal de Cubatão.
Palavra Chave: Educação Infantil I, Creche, Bebês, Musicalização de Bebês,
Musicalização na Educação Infantil I, Musica em Escola Publica.
Desenvolvimento do Projeto: O presente trabalho tem como foco, a inserção da
Educação Musical na Escola Publica de Educação Infantil I. A motivação foi a Lei
Federal nº 11.769/08, que altera a Lei 9.394/96 (LDB), que dispõe sobre a
obrigatoriedade do ensino da música na educação básica.
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A Educação Musical aplicada à Escola tem como foco a sensibilização do aluno, a
ampliação de sua cultura, a valorização do ser humano, além dos objetivos pedagógicos
musicais. O objetivo específico do trabalho é a formação cognitiva, psicomotora,
afetiva, o desenvolvimento auditivo e respiratório, a autoconfiança, a curiosidade, a
disciplina, a criatividade, a análise, a cidadania, ao respeito mútuo, o conhecimento, o
desenvolvimento cultural e social, além dos objetivos específicos da Musica como o
desenvolvimento do canto e a utilização correta da voz. É aplicado na Educação Infantil
I com bebês entre um ano e meio e três anos, nas UMES de Educação Infantil I da Rede
de Ensino da Prefeitura Municipal de Cubatão.
Foi em 2009, que a oportunidade de iniciar um trabalho de Educação
Musical no Município de Cubatão aconteceu. De encontro à lei 11.769/2008, que
alterava a LDB, que a música deveria ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do
componente curricular.
Com a nova legislação, as discussões acerca da Música na Escola
permearam diversas redes de ensino, e na Prefeitura Municipal de Cubatão não foi
diferente. A preocupação com o tema surgiu principalmente sobre quem deveria realizar
estas aulas.
Em uma primeira avaliação se acreditou que seriam os professores de Arte,
já atuantes no Município, a assumirem. Porém no perfil da maioria dos Professores de
Educação Fundamental II – Artes, não há formação em Educação Musical. A maioria
dos profissionais, são especialistas em Artes Visuais e em alguns casos, não havia
interesse de estudar outra linguagem.
Administrativamente havia mais um impasse: a lei não cita a criação de
cargos e a falta de regulamentação dificulta ainda mais o processo.
Foi um dilema, sendo necessário realizar um trabalho de capacitação em
vários níveis do ensino com professores ou não, para que compreendessem que ensinar
música ou desenvolver a educação musical em sala de aula iria além do cantar e da
realização de movimentos estereotipados.
Ao oferecer as capacitações através de oficinas, organizou-se um
levantamento sobre quais pedagogos da Rede Municipal, até então em sala de aula,
teriam conhecimento ou formação em música.
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Entre encontros e a união de sugestões possíveis, chegou se a um senso que
foi bem recebido por professores e dirigentes.
Após reuniões com os representantes dos setores na Secretaria de Educação
do Município de Cubatão, Departamento de Educação, Setor de Creches e Educação
Infantil, Setor de Ensino Fundamental e Divisão de Ensino definiu-se pela Educação
Infantil I, o inicio do trabalho. Iniciamos como um projeto piloto, cujo nome, a
principio foi Musicalização na Primeira Infância.
É muito comum nos depararmos com ideias equivocadas sobre a Educação
Musical. Preocupados com a questão das festividades, muitas vezes profissionais não
especialistas, se restringe ao repertório conhecido, repetindo canções e estimulando as
crianças a cantarem sem os devidos cuidados com a voz infantil.
Quando pensamos em Musicalizar, não podemos nos ater somente a
indústria fonográfica e nem a atividades passivas de escuta repetindo jargões prontos ou
expondo cidadãos em formação a conteúdo duvidoso.
Buscando caminhos possíveis, nos últimos anos com um olhar específico
para esta problemática, algumas ações foram realizadas. Entre capacitações de
profissionais, aquisição de materiais específicos, buscou-se uma proposta pedagógica
atuante, viva e efetiva para a comunidade escolar.
Em 2010 foi iniciado um projeto piloto na UME Vereador Domingos
Pucciariello e por ser bem sucedido, estendeu-se a todas as UMES de Educação Infantil
I, a partir do ano de 2014.
Nestas aulas explora-se percepção rítmica e melódica, expressão corporal,
repertório, canto, pulso e subdivisões, tudo apresentado de forma divertida para as
crianças. As aulas ocorrem uma vez por semana, 30 minutos de duração. São aplicadas
por professor adequadamente treinado para desenvolver a aula. Estes pedagogos são
Professores de Desenvolvimento Inicial da Prefeitura Municipal de Cubatão e que tem
formação em Musica. No passado estudaram, mas não exerceram como primeira
profissão. Foram convidadas a resgatar este conhecimento e aceitaram o desafio.
Tem como referência a Musicalização de Bebês, adaptado a realidade da
Educação Infantil I, onde a mãe está ausente e a criança participa sozinha.
Desenvolvimento do Projeto: As turmas são divididas por idades aproximadas e são
realizadas em espaço previamente organizado pelo gestor da Unidade de Ensino. As
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aulas ocorrem sempre no espaço escolhido, não sendo permitidas migrações durante o
processo de trabalho.
As professoras de Musicalização trabalham em duplas e apenas uma
interage com as crianças. Antes e durante o desenvolvimento do projeto participaram de
formações semanais.
São utilizados materiais de apoio para as aulas como brinquedos e
instrumentos musicais infantis.
O planejamento de aula é organizado por objetivos e a cada aula a escolha
do repertório respeita os objetivos previamente estudados. As musicas devem ser
escolhidas visando uma aula ativa e estimulando os sentidos do bebê e da criança.
Propor brincadeiras onde os alunos descrevem os sons que emitem quando
acordam, escovam os dentes, comem e colocam suas roupas e sapatos. Eles ainda
podem reproduzir sons de animais, cachorros, cavalos e o som dos carros. BRITO
(2003) relata em especifico que “esses jogos usando ações do cotidiano dão base para
desenvolver muito a criatividade e atenção das crianças”.
O ensino de música não tem o objetivo de formar músicos, a ela cabe
incentivar a criatividade, já que algumas vezes a escola deixa pouco espaço para a
criança criar e a música pode ser um caminho muito fértil para essa prática.
Durante as aulas, a Pedagogia Afetiva (ROSSINI, 2001) norteia a pratica
das professoras de musicalização, buscando desenvolver
indivíduos sensíveis,
conscientes, solidários, recebendo cultura e afetividade; atenção e respeito, fundamentos
básicos para a mudança da sociedade.
A afetividade é a base da vida. Se o ser humano não está bem afetivamente,
sua ação como ser social estará comprometida. Isto vale independentemente de sexo,
idade, cultura.
O desenvolvimento sócio-afetivo está relacionado aos sentimentos e as
emoções em virtude de uma série de interesses, solidariedade, cooperação, motivação e
respeito, visando desenvolver o indivíduo como pessoa, estimulando a formação de uma
personalidade estável e equilibrada, desenvolvendo também o aspecto cognitivo, que é o
desenvolvimento intelectual e a operação dos processos reflexivos e motor, que trata
diretamente do movimento e do desenvolvimento da criança. Esses processos visam
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garantir a formação integral (sócio, afetivo, cognitivo, motor, espiritual) do aluno.
(RODRIGUES, 2003, p.41).
A música promove no ser humano um apelo fortemente afetivo. Ouvir música
pode fazer lembrar, rir, chorar, dançar, cantar, desenhar, escrever, estudar e até
trabalhar. Portanto, o processo da escuta musical envolve todas as dimensões que
constituem uma pessoa e, desta forma, favorece o desenvolvimento como um todo .
A música está sempre presente em todas as sociedades e faz parte de ritos e
cerimônias, como nascimento, casamento e até a morte. Permite uma forma de
linguagem acessível a todos, contribuindo para o desenvolvimento de um nível de
escuta mais crítico e prazeroso. Contribui para o desenvolvimento integral da criança
nas suas dimensões afetiva, cognitiva, motora e social. Ela provoca sentimentos de bemestar, organiza os movimentos, promove uma melhor interação, desenvolve a atenção e
a concentração.
A função cultural, social e de expressão de sentimentos da música é
inquestionável. Trabalhar a musicalização a partir dos bebês trata se da continuidade de
suas vivencias desde a concepção. Elementos rítmicos e melódicos estão no seu dia a
dia e que ele capta sem filtrar. Daí a importância do trabalho de musica bem organizado
para uma vivencia construtiva.
Não se pensa apenas na construção de conceitos musicais ou aprendizados de
instrumentos musicais, mas em desenvolvimento que ultrapasse os limites da escola.
Outro fator a importante neste trabalho foi a formação do professor. Quem pode
dar aula de Musica? Através desta experiência entendemos que Educação Musical
acontece profundamente, quando os profissionais envolvidos, tem conhecimento sólido
sobre o assunto. Foi essencial que os pedagogos participantes do projeto, tivessem
conhecimento aprofundado dos conceitos musicais, para que pudessem aplicar os
objetivos e praticas com segurança para o educando.
A partir do Projeto Piloto, podemos apontar grandes mudanças no
desenvolvimento dos professores participantes e das crianças que participaram do
Projeto. As mudanças não apenas na afetividade e na tranquilidade com que as crianças
se desenvolvem, mas também no desenvolvimento intelectual, social e cultural.
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Entendemos que essa pratica pode contribuir para que seja repensado o papel da
Música na Educação, mostrando que é possível uma prática consistente e
transformadora a partir desta linguagem, na Educação Infantil.
ANEXOS
Coordenadora Sonia Onuki apresentando o Projeto para gestores das Escolas Municipais
de Educação Infantil I
Coordenadora Sonia Onuki – Ministrando curso para Professores da Rede Municipal de
Ensino da Prefeitura Municipal de Cubatão
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Professoras de Musicalização desenvolvendo aula aberta - 2014
Professora de Musicalização em aula aberta - 2015
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Professoras de Desenvolvimento Inicial que desenvolvem o trabalho de Musicalização nas
Creches Municipais de Cubatão – em Curso com a Dra. Enny Parejo
Equipe de Pedagogas Participantes do Projeto (foto anexa)
Além da Coordenadora e Organizadora do Projeto Professora Sonia Onuki e da
Coordenadora das Aulas de Musicalização Luciane Gouvêa, participaram ativamente
como Pedagogas Musicais as seguintes professoras:
Elenivalda Castelhano Alencar
Mariangela Gonçalves dos Santos Barbosa
Adriana Valeria Vilaverde de Mello
Christiane Magalhães Martins
Aline de Souza Figueiredo
Maricelma da Silva Rodrigues
Sara Faustino Ferreira da Silva
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Referencias Bibliográficas:
FERES, Luciana – Musicalização de Bebês – Apostila EMJ – 2012,
FERES, Josette - Bebê Musica e Movimento – Ed. Independente 2008,
BRITO, Teca de Alencar de. - Musica na E. Infantil – Ed. Peirópolis,
JEANDOT, Nicole. Explorando o Universo da Música –Ed. Scipione.
MARSICO, Leda Osório - A Criança e a Musica - Ed. Globo,
VASCONCELOS, Antônio Ângelo. Ensino da Musica. - Ministério da Educação
http://pedagogiaaopedaletra.com/analise-critica-do-livro-pedagogia-afetiva-de-mariaaugusta-sanches-rossini/ - consulta em 23/08/2015
GOMIDE, Rafaela Vale S. A Afetividade e o Processo de Ensino e Aprendizagem. Publicado em 05/03/2007. Disponível em: http://www.webartigos.com. – acesso em
17/09/2015
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A Formação do Gestor de Educação Infantil: Desafios Atuais
Suely Regina Ripamonti Calazans Dias¹
O avanço no campo da legislação não garante que os direitos das crianças sejam respeitados,
especialmente no que se refere ao acesso e a qualidade do atendimento nas creches e préescolas.Nos estudos sobre qualidade na educação infantil um dos elementos destacados refere-se
a importância da formação continuada dos educadores. Entretanto, há poucos estudos sobre a
formação de diretores de educação infantil.Considerando que o diretor é um elemento chave
para favorecer a constituição de um trabalho pedagógico que atenda os direitos das crianças,
esta pesquisa tem como objetivo analisar como se tem efetivado a formação continuada do
diretor na rede conveniada de educação infantil na cidade de São Paulo.A pesquisa empírica
será realizada em quatro creches conveniadas, por meio de entrevistas e análise documental. Os
principais autores utilizados são Vitor Paro, Maria M Campos, Fúlvia Rosemberg, Maria C
Barbosa e Maria A Monção.
Palavras-chave: Creche. Gestão escolar. Formação continuada.
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A Expansão da Educação Infantil por meio do PROINFÂNCIA 121
Thais Andrea Carvalho de Figueirêdo Lopes122
RESUMO
Essa pesquisa analisa o funcionamento do Programa Nacional de Reestruturação e
Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil PROINFÂNCIA, abrangendo as dimensões políticas e pedagógicas do programa. Têm
como fundamentação teórica os estudos e pesquisas da história e da política de
educação infantil, tomando por base autores como Kramer (1982), Kishimoto (1988),
Kuhlmann Jr. (1998), Correa (2002), Arelaro (2005), Faria (2005), Nascimento (2008),
além de autores que analisam as relações entre os entes federados na educação,
Farenzena (2000), Pinto (2007, 2014), Cury (2008), Oliveira (2010), dentre outros.Com
uma abordagem qualiquantitativa, serão coletados dados no MEC e FNDE e serão
verificadas as impressões de municípios participantes sobre o programa. Considerando a
necessidade de assegurar o disposto em relação ao direito das crianças a uma educação
de qualidade, os resultados dessa pesquisa podem contribuir para a melhoria da
qualidade do programa.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Infantil, Direito à Educação, Política Educacional.
1. INTRODUÇÃO
Em conformidade com as indicações de estudiosos da área de financiamento
da educação e da educação infantil como Bassi (2011), Pinto (2012) e Correa (2011),
essa nova situação de garantia de recursos para a educação infantil não foi suficiente
para atender à demanda e manter uma educação infantil de qualidade.
Previsto também na Constituição Federal de 1988, o Plano Nacional de
Educação (PNE) constitui-se em instrumento necessário para a organização e
planejamento da educação no país, com vigência por períodos sucessivos de dez anos, a
partir de sua formulação e edição. Nesses planos, o primeiro e o atual, podem-se
verificar as metas de expansão em face da demanda por vagas na educação infantil.
121
122
Esta pesquisa foi iniciada em 2014 e resultará na minha tese de Doutorado em 2017.
Professora da Universidade Federal do Maranhão. Doutoranda do Programa de Pós-
Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
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No primeiro PNE, instituído pela Lei 10.172/2001, com vigência de 2001 a
2010, foram traçados objetivos e metas para ampliar o acesso e melhorar a qualidade da
educação infantil. A meta que dizia respeito à expansão do atendimento de zero a três
anos, postulava que deveriam ser atendidas 30% das crianças dessa faixa em cinco anos
e, em 2010, esse atendimento deveria chegar a 50%. Essa meta não foi cumprida, pois,
em 2010, somente 23,6% das crianças brasileiras nessa faixa etária estavam
matriculadas em creches. (BRASIL, 2010).
No novo PNE (2014-2024), aprovado pela Lei 13.005/2014, a meta que
trata da ampliação do atendimento à criança de zero a três anos continua com o
propósito de atender, até 2024, o mesmo percentual de 50% de crianças estabelecido no
Plano anterior, o que demonstra que o acesso está longe de ser um problema resolvido
na educação infantil.
De acordo com os dados disponíveis, Cara e Araújo (2011, p.76) calcularam
a demanda em 3.134.000 novas vagas para o atendimento de 50% das crianças de zero a
três anos em creche em 2020,o que exigirá uma priorização desta etapa de ensino para
atingir este total.
Em relação à pré-escola, a meta do primeiro PNE estabelecia que, até 2006,
60% das crianças de quatro a seis anos deveriam ser atendidas e, em 2010, esse índice
deveria chegar a 80%. Já o PNE atual determina que o atendimento às crianças de
quatro e cinco anos (faixa atual da pré-escola) seja universalizado até 2016, no entanto,
em 2012, as matrículas na pré-escola representaram pouco mais de 80%. (BRASIL,
2012). Considerando os estudos de demanda realizados, “para a universalização do
atendimento das crianças de quatro e cinco anos até 2016, foi considerada a demanda de
1.361.000 novas vagas” (CARA, ARAÚJO, 2011, p. 76), expressando um aumento de
18,6% do total de crianças já atendidas.
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Embora os resultados de pesquisas científicas internacionais e nacionais
evidenciem que as crianças realizam aprendizagens significativas, desde que nascem,
necessitando de oportunidades para crescerem em ambientes adequados que favoreçam
o desenvolvimento mais integrado e humanizado de seus aspectos biopsicossociais e
suas potencialidades, historicamente a ausência do poder público é notória no
atendimento a esse segmento da população.
Essa ausência fez com que a educação infantil permanecesse por muito
tempo vinculada à assistência social, período em que, em diversas localidades do país,
as creches e pré-escolas eram majoritariamente comunitárias, conveniadas ou não com o
poder público, contribuindo para a tendência à privatização do atendimento.
2. JUSTIFICATIVA
Em face da constatação dessa defasagem de atendimento, o Governo
Federal instituiu, em 2007, o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), Decreto n.
6.094/2007, e como parte das ações do PDE foi criado o Programa Nacional de
Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação
Infantil (PROINFÂNCIA).
Esse programa é considerado a principal ação do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação Básica (FNDE) no campo da infraestrutura educacional
e foi criado para prestar assistência técnica e transferir recursos financeiros a municípios
e ao Distrito Federal para a construção de creches e pré-escolas, além de adquirir
equipamentos e mobiliários para essas escolas.
O referido programa passou a fazer parte da segunda etapa do Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC), prioridade do Governo para investimento de
recursos públicos, objetivando ampliar a capacidade de construção, reforma e aquisição
de equipamentos e mobiliário de escolas de educação infantil.
Para que o município possa pleitear a construção de uma unidade de
educação infantil é necessário que tenha aderido ao Termo de Compromisso “Todos
pela Educação” e tenha elaborado um Plano, que passou a ser denominado Plano de
Ações Articuladas (PAR), indicando a necessidade de construção da escola.
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Os projetos arquitetônicos das escolas de educação infantil construídas pelo
PROINFÂNCIA obedecem aos critérios estabelecidos nos Parâmetros Básicos de
Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (2006) e nas normas que dispõem
sobre a acessibilidade nas escolas, para garantir o acesso às crianças com deficiência.
São divididos em cinco tipos denominados A, B, C, 1 e 2. As escolas de educação
infantil do tipo A são aquelas para as quais a prefeitura municipal poderia desenvolver
projetos próprios e as do tipo B, C, 1 e 2deverão ser construídas com base em projetos
padronizados.
Para pleitear uma creche tipo B é preciso que o município tenha uma
demanda de 240 crianças a serem atendidas em dois turnos ou 120 em turno integral, e
para a tipo C, 120 crianças atendidas em dois turnos ou 60 em turno integral, assim
como o preenchimento de outros critérios, tais como a disponibilidade do terreno e o
cadastramento dos dados necessários no Sistema de Monitoramento, Execução e
Controle (SIMEC), do Ministério da Educação. A partir de 2015 foram criados também
os projetos tipo 1 e tipo 2, que deverão atender 188 e 94 crianças em tempo integral,
respectivamente.
Consultando o SIMEC a respeito da quantidade de escolas construídas pelo
programa é possível verificar que a maior parte dos recursos previstos foi destinada aos
projetos do tipo B, cerca de 80% do total, seguidos do tipo C, 16% do total, e do tipo A,
4% no ano de 2014.
Os recursos do programa atingiram o montante de R$9.252.297.149,24,
provenientes de convênios e emendas no período Pré-PAC, que totalizaram
R$2.401.358.515,28 (26%). No período PAC-2 (2011-2012) os investimentos foram de
R$3.420.938.633,96 (37%) e a estimativa para o PAC-2 (2013-2014) era de
R$3.430.000.000,00 (37%), segundo informações do Relatório de Auditoria do Tribunal
de Contas da União (2007-2013).
Para a compra de equipamentos e mobiliário para as unidades escolares de
educação infantil do PROINFÂNCIA, em fase final de construção ou com a obra já
concluída deverão ser repassados recursos financeiros, sendo que essa compra deverá
ser realizada de acordo com as normas do FNDE e do Inmetro.
A Medida Provisória 533/2011, convertida na Lei 12.499/2011, dispôs sobre
o repasse de recursos financeiros para as novas unidades educacionais construídas pelo
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governo federal, com o objetivo de mantê-las por, no máximo, dezoito meses, até que
recebam recursos do FUNDEB.
A referida legislação prevê a transferência automática de recursos via FNDE
mediante depósito em conta corrente específica, visando a atender mais rapidamente as
necessidades imediatas relacionadas a despesas correntes para a manutenção da
educação infantil pública.
Consoante as informações obtidas no site do FNDE, foram construídas
8.728 novas unidades escolares em todo o país, de 2007 a 2014, aumentando, sem
dúvida, o número de vagas na educação infantil brasileira, o que não significa que o
programa não tenha problemas em sua concepção e execução.
De acordo com os dados apresentados pelo FNDE relacionados à
distribuição geográfica do atendimento do PROINFÂNCIA, 27% das escolas de
educação infantil foram construídas nas Regiões Sul e Sudeste, 26% no Nordeste, 11%
no Centro Oeste e 9% na Região Norte. No que diz respeito à previsão de atendimento
em 2013 e 2014, a distribuição estimada era maior na Região Nordeste, com 34%, em
seguida no Sudeste, com 25%, no Sul, 17%, no Norte, 13% e Centro Oeste, com 11%.
A assistência financeira do governo federal para a construção de unidades
escolares de educação infantil é uma iniciativa importante, ainda que seja atribuída ao
município a competência e os encargos financeiros relativos à gestão, funcionamento,
manutenção da estrutura e pagamento de todos os profissionais que serão necessários.
Outra dificuldade é que mais da metade da população brasileira, 114,6 milhões de
habitantes ou 56% vivem em apenas 304 ou 5,5% dos municípios com mais de cem mil
habitantes (IBGE, 2015), ou seja, quase a metade da população vive nos 94,5% dos
municípios restantes, justamente os que tem a menor capacidade de arrecadação.
Ao analisar as políticas de educação infantil no Brasil desde o período FHC
até o governo Lula, relacionando-as à concretização do direito das crianças a uma
educação infantil de qualidade, Correa (2011, p. 26) avalia positivamente a criação do
PROINFÂNCIA, afirmando a importância da visibilidade dessa ação objetiva de
complementação financeira destinada aos municípios, por parte do governo federal.
Considerando que os municípios têm a responsabilidade da oferta do ensino
fundamental, atualmente ampliado para nove anos, além de ter que cumprir até 2016 a
determinação de ofertar educação infantil para todas as crianças de quatro e cinco anos,
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de acordo com a EC 59/2009, teme-se pelo não incremento das matrículas na faixa
etária de zero a três anos.
Essas iniciativas governamentais produzem resultados quantitativos
importantes em termos de expansão do atendimento às crianças na educação infantil,
porém ainda não suficientes para a universalização dessa oferta. Farenzena (2010, p.1)
estudou políticas de assistência financeira da União, dentre as quais está o
PROINFÂNCIA, e apontou “a insuficiência de recursos para implementar políticas
universalizantes que tenham resultados redistributivos e para que as focalizações surtam
efeitos de equalização de oportunidades educacionais”.
O objetivo geral deste trabalho é analisar a política de expansão e a
qualidade do atendimento educacional ofertado à criança de zero a cinco anos, mediante
a implementação do PROINFÂNCIA e os objetivos específicos são: analisar os dados
estatísticos populacionais e do atendimento educacional à criança de zero a cinco anos,
visando a caracterizar a oferta e a demanda, para identificar em que medida está
ocorrendo a materialização do acesso à educação; analisar de que forma o MEC está
realizando assessoria pedagógica aos municípios que sediam unidades escolares de
educação infantil construídas pelo PROINFÂNCIA, seja por meio da celebração de
convênios com organizações não governamentais, seja com universidades públicas ou
privadas;identificar e avaliar junto aos municípios que participam do PROINFÂNCIA
como está ocorrendo o processo de articulação e colaboração entre os entes federados,
nos aspectos político e pedagógico.
No Brasil, a história da infância é sistematizada e analisada por autores
como Priore (2004) e Rizzini (2008) e a história das instituições de educação infantil é
pesquisada também por Kramer (1982), Kishimoto (1988), Kuhlmann Jr. (1998), Faria
(1999). Esses autores têm dado uma contribuição significativa a novos estudos e
pesquisas sobre as políticas de educação infantil, o que faz da produção consolidada dos
referidos autores aporte teórico fundamental para o desenvolvimento deste trabalho.
Com enfoques mais voltados para os aspectos políticos da educação infantil,
Rosemberg (1985), Oliveira (1992), Campos (2001), Craidy (2001), Faria (2000),
Machado (2002), Corrêa (2002), Vasconcellos (2005), Arelaro (2005), Nascimento
(2008), empreenderam estudos e pesquisas que merecem destaque pela profundidade e
amplitude de suas análises, dentre outros pesquisadores que se propuseram a produzir
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conhecimento em uma área tão marcada pelas desigualdades e restrições, no que diz
respeito ao tratamento da infância nas suas particularidades, relativas à sua origem
social, econômica, étnica, dentre outros.
Os estudos e pesquisas mapeados sobre o PROINFÂNCIA, em geral buscam analisar a
ampliação da oferta de vagas na educação infantil em determinados municípios
brasileiros. Machado (2012) realiza seu estudo sobre os municípios alagoanos, Simões
(2013) circunscreve seu texto aos municípios de Pernambuco, Garcia (2014) analisa o
município de Chapadão do Sul, Martins (2011) examina a situação de municípios no
Estado de Minas Gerais, Flores e Mello (2012) e Schabbach e Ramos (2013) analisam a
implementação de unidades escolares do programa do Rio Grande do Sul, Mattos,
Moreira e Micarello (2014) estudaram o programa em Juiz de Fora e Ramos (2011)
analisa o programa em um município da região Nordeste e dois municípios localizados
na região Sudeste.
O Grupo de Pesquisa “Educação Infantil e Políticas Públicas” da Universidade Federal
do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) realizou uma pesquisa no período de 2011 a
2013, intitulada “Repercussões das Políticas de Educação Infantil no Estado do Rio de
Janeiro: o Programa PROINFÂNCIA e as estratégias municipais de atendimento a
crianças de 0 a 6 anos” com o objetivo de acompanhar e avaliar a implementação do
programa nos municípios do Rio de Janeiro. Essa pesquisa deu origem aos artigos de
Ricci (2014), Gomes (2014) e Almeida e Tavares (2014).
Também oriundo da UNIRIO, a pesquisa de Silva (2014) analisa as
condições de trabalho docente em unidades escolares do PROINFÂNCIA em quatro
municípios do Rio de Janeiro.
Algumas questões estão sendo indicadas pelas pesquisas nos municípios,
como assinala Ricci (2014), a respeito dos “importantes ajustes para que a relação
política de cooperação entre os entes federados se dê de forma menos burocratizada e
mais equânime e transparente” (p.5) e sobre a “eficácia da implantação desse Programa,
que tem sido comprometida pela escassez de estrutura organizacional” (p.10).
Rezende (2013) fez uma pesquisa sobre o PROINFÂNCIA na qual analisa o
desenvolvimento das ações do programa em nível nacional e propôs uma metodologia
de monitoramento e avaliação para pontos críticos do programa.
Nessa perspectiva de maior abrangência,um dos pontos centrais de
investigação desta pesquisa é o desenvolvimento do programa, analisando a distribuição
de unidades escolares em relação às demandas por vagas na educação infantil em todo o
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país, o montante de recursos públicos envolvidos e a adequação do programa aos
objetivos educacionais.
3. METODOLOGIA
A presente pesquisa parte de uma abordagem qualiquantitativa, na qual o
levantamento de fontes e a revisão de literatura constituirão o primeiro passo desse
trabalho de investigação.A estrutura e desenvolvimento do PROINFÂNCIA, incluindo
relatórios, dados estatísticos e informações relativas ao financiamento do programa,
serão alvo de exame e análise, junto ao FNDE.
A pesquisa de campo será realizada por meio da distribuição de
questionários a uma amostra de 30% dos municípios que constarem nos relatórios do
MEC como participantes do referido programa.Esta pesquisa também visa a apreender
quais os critérios utilizados pelo MEC para essa assessoria pedagógica aos municípios,
que sediam unidades escolares de educação infantil construídas pelo PROINFÂNCIA,
mediante a celebração de convênios com organizações não governamentais e
universidades públicas ou privadas.
O conjunto das análises fundamentadas em dados estatísticos da
implementação do PROINFÂNCIA possibilitará ainda uma avaliação do processo de
articulação e colaboração entre os entes federados, mediante a utilização de
questionários dirigidos aos entes envolvidos, conforme mencionado.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O direito das crianças a uma educação infantil de qualidade está assegurado
na legislação brasileira desde a Constituição vigente.Entretanto, as políticas de garantia
do acesso e permanência nas creches e pré-escolas, principalmente no que se refere às
crianças de zero a três anos, ainda não obedecem integralmente aos dispositivos legais,
tendo em vista que, de acordo com o Censo Escolar 2014, são atendidas menos de 25%
das crianças nesta faixa etária na educação infantil brasileira.
Daí a necessidade de maior controle e acompanhamento dos recursos
públicos destinados à educação e da participação mais ampla e qualitativa da sociedade
na definição das políticas educacionais para essa etapa de ensino, decisiva para
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ISSN 2448-1157
proporcionar as crianças o desenvolvimento de suas capacidades e potencialidades,
respeitando as diferenças inerentes a todos os seres humanos.
É interessante observar que diferentemente de muitas das creches e préescolas existentes nas mais diversas regiões brasileiras, que não possuem espaços
adequados e funcionam em locais improvisados, sem equipamentos e mobiliários
apropriados, as estruturas físicas das escolas de educação infantil construídas pelo
programa foram pensadas visando atender às necessidades educacionais das crianças.
Portanto, em princípio o programa pode ser considerado uma ação positiva, mesmo que
vários questionamentos possam ser feitos acerca de seu formato e execução.
Ao realizar esse levantamento mais amplo do funcionamento do programa
em nível nacional, as conclusões desse trabalho poderão contribuir com os estudos e
pesquisas já existentes sobre o PROINFÂNCIA, indicando possibilidades de melhoria
da qualidade deste, além de poder também subsidiar os estudos sobre a expansão da
educação infantil no Brasil.
343
ISSN 2448-1157
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partir do exercício de 2009, o percentual da Desvinculação das Receitas da União
incidente sobre os recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino de
que trata o art. 212 da Constituição Federal, dá nova redação aos incisos I e VII do art.
208, de forma a prever a obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e ampliar
a abrangência dos programas suplementares para todas as etapas da educação básica, e
dá nova redação ao § 4º do art. 211 e ao § 3º do art. 212 e ao caput do art. 214, com a
inserção neste dispositivo de inciso VI.
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BRASIL, Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação
e dá outras providências.
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financeiros aos Municípios e ao Distrito Federal, com a finalidade de prestar apoio
financeiro à manutenção de novos estabelecimentos públicos de educação infantil, e dá
outras providências.
BRASIL, Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a implementação do
Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, pela União Federal, em regime de
colaboração com Municípios, Distrito Federal e Estados, e a participação das famílias e
da comunidade, mediante programas e ações de assistência técnica e financeira, visando
a mobilização social pela melhoria da qualidade da educação básica.
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O Programa Proinfância nos municípios da região central, noroeste e norte
do Estado do Rio Grande do Sul uma análise do assessoramento e
acompanhamento pedagógico nas redes e sistemas de ensino
Débora Teixeira de Mello123
Viviane Ache Cancian124
O presente artigo é uma análise do Projeto de assessoramento e
acompanhamento pedagógico às redes e sistemas de ensino na implementação do
PROINFÂNCIA em municípios da região central, norte e noroeste do estado do
Rio Grande do Sul que tem oportunizado aos pesquisadores e formadores de
profissionais da Educação Infantil o enfrentamento dos “antigos e os novos problemas”
da área, buscando a integração de ações para fazer cumprir o papel do Estado como
instrumento político de igualdade para o acesso a Educação Infantil. O projeto integra a
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), a Universidade do Noroeste do Rio
Grande do Sul (UNIJUÍ) e a Universidade de Passo Fundo (UPF). E tem permitido
desenvolver parcerias entre a Universidade e a Educação Básica, articulando ações da
pesquisa, da gestão, e das práticas pedagógicas para a Educação Infantil. Constata-se
através desse estudo que até o presente momento através das ações desenvolvidas a
universidade cumprirá sua função de ensino, pesquisa e extensão assessorando as redes
e sistemas de ensino na implementação do PROINFÂNCIA e qualificando a Educação
Infantil.
Introdução
Impulsionados pelos movimentos sociais e pelas pesquisas acadêmicas, muitos
foram os desafios que os anos de 1980 e 1990 impuseram sobre as políticas públicas
para a educação de zero a seis anos, para a formação de profissionais e para o
conhecimento que temos das crianças como cidadãs de direitos, demandando
elaborações que ampliavam o conhecimento desse campo. No entanto, como a realidade
dos municípios nos informam, muitas dessas questões, apesar de terem obtido um
significativo avanço, ainda necessitam de mais estudos e, principalmente, de maior
123
124
Professora do CE/UFSM
Professsora do CE/UFSM
349
ISSN 2448-1157
inserção e integração entre as políticas de formação para a Educação Básica,
especialmente da Educação Infantil, e as políticas de ampliação do atendimento às
crianças menores de seis anos.
O novo marco legal que garantiu o direito à educação na Constituição Federal de
1988 – CF/88, considerada uma linha demarcatória pelos especialistas da área, no
sentido de que é a partir desta normativa que a criança pequena tem seu direito público
subjetivo à educação reconhecido como um dever do Estado (CAMPOS,1999).
Contudo, este direito reconhecido legalmente não é, ainda, de todo implementado, seja
do ponto de vista do acesso, seja no que se refere à qualidade desta oferta, quando
consideramos os índices de atendimento à população, especialmente àquelas crianças
dos grupos considerados mais vulneráveis. Nesse contexto, mesmo com as conquistas
na LDB 9394/96 e a consolidação da
Educação Básica, assistimos a uma
educação infantil como primeira etapa da
ampliação da municipalização da Educação
Infantil. Mas, este processo teve como consequências uma expansão da Educação
Infantil, muitas vezes, num padrão de infraestrutura de instalações e equipamentos que
não atendem as diretrizes da legislação. Diante desse cenário, esse projeto procurou
analisar as determinações e os impactos da legislação educacional nas políticas e
programas direcionados à pequena infância e a configuração das instituições
responsáveis pelo atendimento a essa população, nesse caso a implementação do
programa PROINFÂNCIA em municípios da região central, norte e noroeste do estado
do Rio Grande do Sul.
Em dados do INEP 2005 e 2007, encontramos dados dos municípios da região, em
termos educacionais, no IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) em
relação à região Sul, onde os índices encontrados são nas séries inicias Ensino
Fundamental de 4,8, e, nas séries finais do Ensino Fundamental de 4,1 - em municípios
da região no ano de 2007, como Agudo apresentam um desempenho de índice 3,9 nas
séries iniciais do Ensino Fundamental e nas séries finais do Ensino Fundamental 3,8. O
municípios de São Sepé, em 2007, apresenta índices preocupantes de 3,9 nos anos
iniciais do Ensino Fundamental e 3,6 nos anos finais do Ensino Fundamental. E em
Santa Maria, encontramos índices de 4,2 nos anos Iniciais do Ensino Fundamental e 3,8
nos anos Finais do Ensino Fundamental. Diante desse quadro, alguns municípios da
350
ISSN 2448-1157
região receberam apoio técnico do MEC para elaboração do PAR (Plano de Ações
Articuladas)125.
Com inclusão dos municípios da região no Plano de Metas Compromisso de
Todos pela Educação - os municípios que elaboraram o Plano de Ações Articuladas
(PAR) foram beneficiados com o Programa PROINFÂNCIA o Ministério da Educação
(MEC) considera que a construção de creches e escolas de educação infantil bem como
a aquisição de equipamentos para rede física escolar desse nível educacional são
indispensáveis à melhoria da qualidade de ensino. Instituído pela Resolução n 6 de 24
de abril de 2007 e fazendo parte do Plano de Desenvolvimento Educacional (PDE). O
MEC e o FNDE estabeleceram critérios para classificação dos municípios que foram
estabelecidos segundo três dimensões : a) populacional: prioridade aos municípios com
maior população na faixa etária considerada, maior taxa de crescimento da população
nessa faixa etária e como maior concentração de população urbana; b) educacional:
prioridade aos municípios com menores taxas de defasagem idade-série no ensino
fundamental e com maiores percentuais de professores com formação em nível
superior; c) vulnerabilidade social: prioridade dos municípios com maiores
percentuais de mulheres chefes de família, com maiores percentuais de jovens em
situação de pobreza e com menores disponibilidades de recursos para financiamento de
educação infantil (MEC, 2008).
Neste sentido, o conhecimento acumulado pela área nos remete a novas
intervenções e elaborações pautadas, em muitos casos, por “antigos/novos” problemas.
Dentre estes, podemos citar a redução de vagas para as crianças da faixa etária dos zero
aos três anos (creche) em função da obrigatoriedade do atendimento às crianças de 4-5
anos (pré-escola), pois mesmo sendo considerada a primeira etapa da Educação Básica
temos, no Brasil, o desafio de “oferecer acesso à educação desde os primeiros meses de
vida” (Brasil, PDE, 2011). Segundo dados publicados no Plano de Desenvolvimento da
125
A partir do lançamento do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), em 2007, todas as
transferências voluntárias e assistência técnica do MEC aos municípios, estados e Distrito Federal estão
vinculadas à adesão ao Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação. E a elaboração do Plano de
Ações Articuladas (PAR) — instrumentos fundamentais para a melhoria do IDEB. Atualmente todos os 26
estados, o Distrito Federal e os 5.563 municípios assinaram o Termo de Adesão ao Plano de Metas do
PDE. (INEP, 2009).
351
ISSN 2448-1157
Educação (Brasil, MEC, PDE), “das 12 milhões de crianças brasileiras de até 3 anos,
18,4% estão matriculadas na educação infantil.” Além disso, as crianças da zona rural
dispõem de 8% das matrículas nesta etapa. Acrescente-se a isto, a necessidade de
garantir a oferta de educação infantil com qualidade, destacado no Relatório Técnico
Final da Consulta sobre Qualidade da Educação Infantil126.
A formação inicial e continuada dos professores da educação básica
encontra-se entre as prioridades do Ministério da Educação explicitadas no Plano de
Desenvolvimento da Educação (PDE), para garantir educação de qualidade, centrada no
aprendizado do educando. A criação da Política Nacional de Formação de Profissionais
do Magistério da Educação Básica é uma das respostas a esse compromisso. Dentre os
princípios da política nacional está a formação docente construída em bases científicas e
técnicas sólidas, como compromisso público de Estado. Pretende o Ministério aumentar
o número de professores formados por instituições públicas de educação superior e
garantir um referencial de qualidade para os cursos de formação inicial e continuada,
sintonizando-os às necessidades formativas da educação básica e aos problemas da sala
de aula.
Tais especificidades estão explicitadas nas Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil, instituídas pela Resolução CNE/CEB nº 5, de dezembro de
2009. Resultado de amplo processo de discussão entre especialistas e dirigentes da área,
as diretrizes definem a concepção e o currículo da educação infantil, como primeira
etapa da educação básica. Para que sejam de fato implementadas, é fundamental que os
professores de educação infantil tenham sua formação, inicial e/ou continuada, baseada
na mesma concepção e que sua prática pedagógica seja orientada pelo currículo
explicitado nas DCNEI (2009). Daí ser estratégico que o MEC invista em ações de
formação de professores com essa característica.
Frente às demandas explicitadas, em parceria com a Coordenação Geral de
Educação Infantil (COEDI), da Diretoria de Concepções e Orientações Curriculares
para Educação Básica, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), juntamente com
126
CAMPOS, M. M.; COELHO, R. de C.; CRUZ, S. H. V. Relatório Técnico Final:
Fundação Carlos Chagas. Departamento de Pesquisas Educacionais. 2006.
352
ISSN 2448-1157
a Universidade do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ), e a
Universidade de Passo Fundo (UPF), Universidades parceiras do MEC, executoras do
PROINFÂNCIA, elaboraram um projeto com o objetivo de assessorar e acompanhar
pedagogicamente as redes e sistemas de ensino na implementação do PROINFÂNCIA,
visando qualificar a Educação infantil nos municípios do Estado do Rio Grande do Sul
para alcançar a excelência em qualidade no atendimento à criança de zero a seis anos.
O projeto através de suas ações realiza a formação continuada de gestores e
docentes das redes e sistemas públicos de educação infantil, das instituições do
PROINFÂNCIA, com vistas à implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil (DCNEI), abrangendo um total de 150 (cento e cinquenta)
municípios da região centro, noroeste e norte do Estado do Rio Grande do Sul. Os
municípios foram organizados em 3 (três) municípios polos: (1 (um) para a região
central, 1 (um) para região noroeste e 1 (um) para a região norte. Além da formação
para professores e gestores dos 150 municípios, 24 (vinte e quatro) desses municípios,
distribuídos em oito municípios, para cada um dos 03 três polos entre a Região Central,
Noroeste e norte recebem visitas técnicas, e formação em contexto nas Unidades do
PROINFÂNCIA. Busca-se acompanhar a organização da estrutura e o funcionamento
das instituições de Educação Infantil e contribuir para o fortalecimento das políticas
públicas municipais de Educação Infantil.
Os referenciais teóricos que assumimos no projeto baseiam-se em estudos
desenvolvidos que têm focalizado muito mais elementos da pesquisa educacional –
metodologias para pesquisar crianças em ambientes coletivos (Faria, 2002; Faria e
Mello, 2005), e também, pesquisas acerca de processos pedagógicos para creches e
escolas infantis, como demonstram os estudos de Kishimoto e Formosinho (2008). O
que buscamos destacar é, sobretudo, a necessidade de produzir um estudo que
evidencie o estado atual da oferta desse atendimento numa esfera municipal à luz de
referências internacionais e nacionais cujo foco seja identificar os componentes desse
atendimento que estejam relacionados à qualidade da educação.
Neste sentido, a pesquisa realizada junto a esse assessoramento técnico
pedagógico circunscreve-se num conjunto de reflexões próprias de nossas atuações
353
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acadêmicas e profissionais sobre a Pedagogia no escopo da Educação Infantil e das
Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Conforme Ardoino (1996) considera-se a
Educação uma ciência de natureza mestiça e poliglota e, como tal, ela dialoga, nesta
pesquisa, com a Sociologia, com a Economia, com a Antropologia, com a Pedagogia,
com a Psicologia. Esta afirmação, antes de qualquer coisa, ressalta aspectos específicos
das ciências da educação que a diferenciam de outras no que diz respeito à produção de
conhecimento, pois se há uma especificidade no campo da educação, essa deve ser
buscada via as pesquisas que geram o conhecimento neste campo de saber, o que
implica que devemos procurar desenvolver nossas práticas e análises no quadro de sua
especificidade epistemológica e metodológica, das linguagens a que recorrem e dos
objetivos que perseguem.
O assessoramento em 150 municípios:
A interação entre experiência vivida e o conhecimento educacional estabelece as
possibilidades de conexão entre o desenvolvimento profissional, a melhoria das práticas
educativas e a produção de conhecimento a partir das necessidades formativas. A partir
da experiência no ensino universitário, elaboramos uma perspectiva de formação
educacional cujas bases estão presentes na investigação-ação, que fornece as referências
do trabalho investigativo e colaborativo como princípio educativo.
Ao buscar a ampliação do entendimento de nossa atuação como professores(as)
formadores(as) no âmbito da universidade, situamos o trabalho a partir de experiências
de formação em contexto, a partir de estudos da Formosinho (2001), e as discussões a
partir das atuais Políticas de Educação para a Educação Infantil. O foco principal do
projeto de assessoramento tem considerado as práticas educativas como elemento
articulador da formação docente, assim como os formadores (que atuam nas três
universidades) e os profissionais das Unidades do PROINFÂNCIA. Com a finalidade
de criar movimentos que potencializem a aprendizagem, porque não dizer, criar formas
de aprender a partir dos problemas vivenciados e experienciados pelas unidades,
gestores, professores, pais, crianças-infâncias.
A realização desse trabalho das Universidades junto as Unidades e do
Proinfância tem no seu amâgo quatro princípios: sensibilização, problematização,
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investigação e criação. O primeiro princípio: a sensibilização é construído e
reconstruído durante todo o processo, com todos os sujeitos envolvidos a fim de que
todos se impliquem. O segundo princípio: a problematização busca interferir na
dimensão pedagógica das práticas educativas na E.I. através dos pressupostos políticos,
pedagógicos, sociais e culturais. O terceiro princípio: a investigação tem sido um
desafio para as três Universidades envolvidas, pois demanda rever conceitos, saberes e
concepções. O quarto princípio: a criação é um devir de possibilidades, que esperamos
com esse projeto, através das ações dos sujeitos envolvidos poder contribuir com a
Política Nacional de Educação Infantil.
Destaca-se as ações já executadas pelo projeto: reuniões semanais de estudo das
equipes das três Universidades; o planejamento, a realização e a avaliação do Ciclo
Formativo I, II, III e IV realizado nos micropolos de referência pelas equipes do polo de
Santa Maria, Ijuí e Passo Fundo; a realização de visitas técnicas das auxiliares de
pesquisa (algumas vezes acompanhadas pela coordenadora do projeto, professoras
formadoras e supervisoras de pesquisa) aos municípios; estudo dos relatórios das visitas
técnicas para a composição de documento de base para a devolutiva e formação na
unidade; devolutivas nas 24 unidades do PROINFÂNCIA com gestores, coordenadores
pedagógicos e professores das unidades que receberam visita técnica para entrega da
devolutiva. Nessas reuniões de devolutivas foram realizadas orientações para que as
Unidades pudessem resolver os problemas pontuados pela equipe técnica do
PROINFÂNCIA e foi solicitado um Plano de Ação para 2014; constituição de rede de
comunicação com as coordenações pedagógicas das Secretarias Municipais de
Educação dos municípios escolhidos como municípios referência do Polo Regional de
Santa Maria, Ijuí e Passo Fundo; Seminário Regional PROINFÂNCIA: Ciclo Formativo
e Auto Formativo dos Coletivos. II Seminário do Curso de Especialização em docência
na Educação Infantil. As temáticas abordadas foram relacionadas ao Currículo na
Educação Infantil e as Linguagens. O número de participações, inscrições foi de (340)
pessoas, (2) representantes por município. Mas de participação efetiva foi de 450
participantes, pois alguns municípios trouxeram mais participantes do que o previsto.
Elaboração primeiro produto; Participação no Fórum Gaúcho; Participação no II
Encontro Estadual de Educação Infantil MEC/COEDI/UFRGS na mesa de abertura:
355
ISSN 2448-1157
Políticas de Educação Infantil no Brasil: contextos de implementação do
PROINFÂNCIA no Brasil e no RS – Representantes do MEC e do FNDE; da UFRGS e
da UFSM; Participação no VI Encontro do Projeto PROINFÂNCIA MEC/SEBCOEDI/UFRGS por Polos; Participação no IX ENCONTRO REGIONAL SUL DO
MIEIB, IX ENCONTRO ESTADUAL DO FÓRUM GAÚCHO DE EDUCAÇÃO
INFANTIL no Painel: O PROINFÂNCIA no Brasil e na Região Sul: avanços e desafios
no contexto da política municipal Representantes do FCEI, FEIPAR e FGEI; Reunião
com os gestores( Prefeitos, secretarias de Educação, Coordenações Pedagógicas das
Secretarias de Educação e Equipes Diretivas das Unidades do PROINFÂNCIA nos
Municípios) nos Polos de Santa Maria Ijuí e Passo Fundo.
Ao estudarmos o desenvolvimento do projeto, ao longo dos Ciclos Formativos,
temos vivenciado uma mudança significativa no que se refere ao que abordar na
formação nos municípios polos, quanto como fazer o movimento de constituição das
redes formativas a partir do município e de sua política de formação continuada.
Realizar as visitas às unidades que receberam as visitas técnicas e que
participaram dos ciclos formativos, foi muito importante, pois foi possível identificar
nas unidades qual tem sido a contribuição do projeto de assessoramento para o
desenvolvimento de atividades pedagógicas comprometidas com concepção e prática de
Educação Infantil pautada pelas orientações das políticas.
Os desafios das Universidades e do coletivo nas Unidades do PROINFÂNCIA.
O projeto está em funcionamento, portanto em pleno processo, e nesse período
marca-se o estreitamento e a qualificação das relações de troca, entre as três
Universidades, UFSM, UNIJUÍ, UPF e as 150 municípios participantes do projeto,
numa constante interlocução e apropriação a partir dos quatro princípios que norteiam o
projeto, sensibilização, problematização, investigação e criação.
Ao assumirmos esse compromisso junto ao MEC tínhamos a clareza da
responsabilidade ao longo desses dois anos propostos pelo projeto através do
assessoramento junto aos municípios. Principalmente no que se refere à formação
coletiva, na constituição de redes formativas a partir dos municípios e de suas políticas
de formação continuada.
356
ISSN 2448-1157
Destacam-se até o momento, as reuniões com os gestores (Prefeitos, secretarias
de Educação, Coordenações Pedagógicas das Secretarias de Educação e Equipes
Diretivas das Unidades do PROINFÂNCIA nos Municípios) nos Polos de Santa Maria,
Ijuí e Passo Fundo como extremamente importante para pactuar responsabilidades,
propor rupturas em práticas cristalizadas nos Municípios e nas Unidades do
PROINFÂNCIA, a partir das visitas técnicas, devolutivas, formação em contexto e
processos formativos.
Avaliou-se, no âmbito deste estudo, que a realidade da inclusão das crianças de 0
a 3 anos no sistema municipal de educação é um dos desafios dos municípios frente à
necessidade de expansão da educação infantil pós-Constituição de 1988 e LDB
9394/96. Ao avaliarmos a inclusão da criança de 0 a 3 anos nas instituições de educação
infantil, podemos constatar que apesar de terem se passado mais de 19 anos da
aprovação da LDB 9394/96, grande parte do contingente de crianças dessa faixa etária
não tem sido prioridade nas políticas de expansão da educação infantil. Essa realidade é
explicada muitas vezes pela dificuldade de recursos financeiros até 2006, com a
vigência da Lei do FUNDEF, que não contemplava o segmento creche na distribuição
de recursos, ou ainda, pela dificuldade de incorporar ao sistema de ensino as
educadoras, monitoras que fazem parte dos recursos humanos dessa instituição.
Nessa ótica, outro desafio a ser enfrentado pelos municípios com a expansão da
educação infantil na garantia de uma educação infantil de qualidade é a expectativa da
formação de professores para atuar junto às crianças de 4 e 6 anos e, especialmente,
junto aquelas de 0 a 3 anos, atendendo as diretrizes da legislação. Consagrada na LDB
9394/96 art.62: a formação de professores para atuar junto à Educação Infantil e nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental – far-se-á em nível superior, em curso de
licenciatura, de graduação plena, admitindo-se como formação mínima a oferecida em
nível médio, na modalidade normal. O perfil do professor para atuar junto às
instituições de atendimento a crianças pequenas, como as creches vêm sendo
conquistado muito recentemente. A necessidade de formação desses grupos de
educadoras, é um desafio colocado aos estados e municípios.
357
ISSN 2448-1157
Outra dimensão de análise é a construção de uma proposta pedagógica para
essas unidades do PROINFÂNCIA, os municípios encontram-se, diante do desafio da
inclusão das crianças de 0 a 3 anos na unidade com uma proposta pedagógica para esse
grupo de crianças. Exigindo do sistema educacional reformulação curricular, formação
em serviço dos professores, programas de apoio com material pedagógico.
Em nossa investigação, ainda constatamos que é pauta de discussão nos
municípios a definição da faixa etária a ser atendida. As orientações do próprio MEC do
atendimento das crianças de 0 a 5 anos nas unidades, nem sempre são consideradas,
buscando-se matricular primeiramente o grupo de 4 e 5 anos, e com menor prioridade o
grupo de crianças de 0 a 3 anos. Encontra-se também ainda indefinida, a questão dos
critérios para a distribuição de vagas, contatamos que a análise da situação de
vulnerabilidade social da criança, nem sempre é atendida, prevalecendo como critério à
condição de mãe trabalhadora. E para alcançar um número maior de matrículas opta-se
pelo atendimento em turno integral para um número menor de crianças.
Esses dados demonstram que, apesar da legislação vigente, a situação de
atendimento educacional e de cuidados às crianças dessa faixa etária desde 1988, vem
se modificando lentamente, a iniciativa de uma cobertura nacional, a partir do
PROINFÂNCIA poderá ser uma política de ampliação de vagas na educação infantil. E
será uma política de maior impacto se os municípios conseguirem garantir a inclusão
das crianças de 0 a 3 anos na educação infantil e a formação de professores para atuar
nessa etapa da educação básica. Deve-se apontar que a expansão da educação infantil,
nesses municípios, depende de uma política de continuidade na consolidação da
ampliação ao acesso da educação infantil às crianças de 0 a 5 anos.
Essa experiência tem permitido que as universidades envolvidas se aproximem
das realidades vividas nos 150 municípios, refletindo, problematizando, dialogando e
socializando conhecimentos. Essa aproximação com a Educação Básica permitirá que se
crie culturas institucionais outras, culturas que superem a visão adultocêntrica nas
práticas pedagógicas na Educação Infantil, e que se institua processos auto-formativos,
formativos e formativos em contexto para os professores que atuam na área.
358
ISSN 2448-1157
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360
ISSN 2448-1157
Construindo coletivamente uma proposta para a escola pública de educação
infantil
Juliana Campregher Pasqualini127
Com o presente relato, intentamos compartilhar uma experiência de extensão
universitária em parceria com a Secretaria Municipal da Educação de Bauru que tem
como objetivo organizar, orientar e fundamentar teoricamente o processo de construção
coletiva e implementação de uma (nova) proposta pedagógica para o segmento da
educação infantil do sistema de ensino municipal.
Iniciada em 2011, essa experiência foi motivada pela perspectiva de possibilitar: i)
a construção colaborativa de uma proposta de trabalho que oriente a ação pedagógica
nas unidades escolares do segmento da educação infantil que integram o sistema
municipal de ensino; ii) a sistematização dessa proposta em um documento escrito,
apresentando diretrizes, princípios e orientações didáticas para a (re)organização do
trabalho pedagógico na educação infantil; iii) a criação de espaços de discussão coletiva
e formação continuada de professores e gestores da rede municipal visando o
aprofundamento teórico e a reflexão acerca da prática pedagógica, tendo em vista seu
aprimoramento.
As ações do projeto foram organizadas e operacionalizadas tendo em vista
contribuir para a consolidação de uma unidade teórico-prática no sistema municipal e
para a melhoria na qualidade da educação ofertada, potencializando, assim, o
desenvolvimento humano de todos os envolvidos no processo educativo (alunos,
professores, gestores, funcionários, familiares).
Caminhos percorridos
A primeira ação para viabilizar a realização do projeto foi a formação de uma
Equipe de Coordenação, formada basicamente por profissionais alocados na Secretaria
Municipal da Educação, que assumiu a tarefa de organizar e planejar as ações. A
primeira etapa dos trabalhos consistiu na realização de reuniões periódicas de estudo
127
Docente do Departamento de Psicologia, Faculdade de Ciências, UNESP/Bauru e do
Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar da UNESP/Araraquara.
361
ISSN 2448-1157
com a equipe de Coordenação, o que ocorreu durante o 2º semestre de 2011 e o 1º
semestre de 2012, permitindo aprofundar alguns temas imprescindíveis no campo
teórico no qual se basearia todo o trabalho subseqüente, a saber, a psicologia históricocultural em unidade com a pedagogia histórico-crítica. Nessa etapa, foram estudadas
pelo grupo as seguintes temáticas: concepção de desenvolvimento infantil,
desenvolvimento das funções psíquicas, periodização do desenvolvimento infantil,
relação entre desenvolvimento e ensino, planejamento do ensino na educação infantil.
Nesse momento inicial, foi também realizado um movimento de pesquisa e estudo de
propostas pedagógicas de outros municípios que pudessem iluminar a natureza da tarefa
e os desafios a serem enfrentados. Após a fase inicial de preparação da equipe gestora,
as reuniões de coordenação continuaram ocorrendo quinzenalmente ao longo de todo o
projeto.
A segunda etapa envolveu a participação direta de professoras e diretoras por
meio da formação de Grupos de Trabalho (GTs) por área de conhecimento e
realização de encontros periódicos com as diretoras das unidades escolares. Os GTs
foram constituídos por profissionais do sistema municipal interessadas e dispostas a
colaborar mais diretamente no processo de construção da proposta pedagógica. Foram
formados seis grupos nas áreas definidas pela coordenação, a saber: Língua Portuguesa,
Matemática, Ciência, Artes Visuais, Música e Cultura Corporal. Cada grupo tinha a
tarefa de produzir um texto que delimitasse o objeto da área e sistematizasse objetivos,
conteúdos e encaminhamentos metodológicos, articulando o conteúdo específico da área
de conhecimento aos conceitos gerais da base teórica/pedagógica, tendo em vista a
particularidade do segmento da educação infantil, tarefa que se mostrou altamente
desafiadora dada sua complexidade. Os GTs concluíram a sistematização preliminar no
final do primeiro semestre de 2012 e o material foi submetido a um exame da
coordenação, que identificou a necessidade de maior articulação entre os fundamentos
teórico-filosóficos e as proposições pedagógicas específicas das áreas de conhecimento,
bem entre as áreas entre si, tendo em vista garantir maior unidade e articulação. Com
isso, verificou-se a necessidade de continuidade do trabalho dos Grupos por área, que
finalizaram o trabalho de sistematização das áreas no final de 2014.
A outra ação estruturante do projeto anteriomente mencionado que iniciou-se
ainda em 2011 foi a realização de Encontros com as Diretoras das unidades
362
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escolares. Foram realizados quatro encontros em 2011, dois encontros no ano de 2012,
quatro encontros em 2013 e um encontro em 2014. Esses encontros foram dedicados ao
estudo teórico e a debates sobre a estrutura do documento da proposta pedagógica e
sobre o andamento de seu processo de construção e implementação, visando sua
construção de forma colaborativa e coletiva. Considerando que o sistema municipal
congrega 64 escolas de educação infantil, as reuniões com as diretoras forem realizadas
subdividindo-as em dois grupos, de modo a criar maior possibilidade de diálogo e
discussão.
Paralelamente a essas ações, uma versão preliminar do capítulo de fundamentação
teórica do documento referente à proposta pedagógica foi elaborado pela docente
coordenadora do projeto, incluindo um breve resgate histórico da teoria, seus principais
autores e os principais conceitos da base teórica. Este material foi disponibilizado a toda
a rede no segundo semestre de 2012, tendo em vista obter um retorno a partir da
apreciação e avaliação da versão preliminar por todas as escolas municipais de
educação infantil. As devolutivas escritas enviadas pelas escolas e as avaliações
verbais colhidas em encontro com as diretoras foram sistematizadas e categorizadas,
para futura incorporação ao documento final. De modo geral, o documento foi bem
avaliado pelas equipes das unidades escolares, que destacaram a clareza da linguagem e
acessibilidade do texto e apresentaram sugestões de aprofundamento e acréscimo de
temáticas específicas.
Em sua terceira etapa, o projeto passou a oferecer um curso de formação de
professores, ministrado diretamente pelos alunos de graduação envolvidos sob
supervisão da docente responsável, com o objetivo de proporcionar aos professores um
espaço de estudo e aprofundamento teórico. O curso adotou como texto-base a versão
preliminar do capítulo de fundamentação teórica da proposta pedagógica. No segundo
semestre de 2012, foram oferecidas duas turmas do curso, que foi intitulado
“Desenvolvimento Infantil Segundo a Escola de Vigotski” e teve duração total de 30
horas (10 encontros semanais com duração de 3 horas). No ano de 2013 foram
realizadas duas edições do curso, com duração estendida para 36 horas (12 encontros
semanais). Em 2014 o curso foi oferecido em versão reduzida (8 encontros semanais)
em função da paralisação das atividades da universidade durante movimento paredista.
No primeiro semestre de 2015 foi oferecido um novo curso abordando a periodização
363
ISSN 2448-1157
do desenvolvimento infantil e no corrente semestre está em andamento mais uma turma
do curso introdutório sobre a teoria da Escola de Vigotski. Nota-se, assim, que as ações
de formação continuada têm sido privilegiadas no contexto do projeto como ação
permanente, por serem compreendidas como canal para fortalecer o caráter participativo
da construção da proposta, permitindo captar necessidades e dificuldades das
professoras e obter seu retorno com relação às versões preliminares do documento da
proposta pedagógica.
A partir do oferecimento dos cursos, por solicitação das próprias participantes,
foram criados grupos de estudo para aprofundamento em temáticas específicas, como a
brincadeira de papéis sociais e o desenvolvimento afetivo-emocional na idade préescolar. No corrente semestre está sendo realizado um grupo de estudos sobre atividades
lúdicas e produtivas na educação infantil. Os grupos de estudos são também
coordenados diretamente pelos alunos de graduação extensionistas e têm se mostrado
um espaço propício para a articulação entre ensino-pesquisa-extensão, na medida em
que as temáticas propostas vinculam-se, de alguma forma, aos projetos de iniciação
científica dos alunos, cuja elaboração teve como ponto de partida problemas
identificados a partir da experiência de extensão.
No presente momento, encontra-se em fase de finalização, revisão e diagramação
o documento que objetiva a proposta pedagógica e planejamento da etapa mais
diretamente dedicada à implementação da proposta no município.
Dificuldades e desafios
A principal dificuldade enfrentada no projeto é a amplitude da rede municipal,
que torna grandemente desafiadora a perspectiva de construção colaborativa da
proposta. Dadas as condições objetivas, inclusive de número reduzido de profissionais
disponíveis para coordenação e operacionalização das ações do projeto, o envolvimento
de todos os professores do sistema no processo só é possível de modo indireto, por meio
da ação multiplicadora e mediadora das diretoras das unidades escolares, ou ainda pelo
mecanismo da consulta/apreciação das versões preliminares dos materiais produzidos.
Outra dificuldade refere-se à disponibilidade limitada de participação dos
profissionais da rede de ensino, uma vez que as professoras, diretoras e supervisoras da
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Secretaria Municipal de Educação que integram a equipe de coordenação e os grupos de
trabalho acumulam um grande número de tarefas e atribuições, reduzindo as
possibilidades objetivas de dedicação e envolvimento com o projeto de construção da
proposta pedagógica.
Apresentou-se ainda como complicador, em especial para a condução dos
trabalhos pelos GTs, a ausência de profissionais que tenham simultaneamente formação
na área de conhecimento específica e na teoria pedagógica e psicológica que
fundamenta o novo currículo. Para alguns grupos, foi possível obter a colaboração de
pesquisadores das áreas específicas; para os grupos em que isso não se mostrou
possível, a tarefa de sistematização do currículo de modo articulado com a perspectiva
teórico-metodológica da pedagogia histórico-crítica e psicologia histórico-cultural tem
se mostrado extremamente desafiadora.
Desdobramentos da experiência
Uma das principais conquistas do trabalho realizado é, sem dúvida, o
estreitamento da parceria com a Secretaria Municipal que tem sido alcançada e se
materializou na realização de um evento conjunto em julho de 2015, o “Congresso
Pedagogia Histórico-Crítica: educação e desenvolvimento humano” que contou com a
participação expressiva de professoras da rede básica do município bem como de
pesquisadores e estudantes de diversos Estados do país.
Decorridos cinco anos de seu início, consideramos que o projeto tem produzido
resultados bastante expressivos e frutíferos no sentido de colaborar para a consolidação
de um senso de unidade no segmento da educação infantil do sistema municipal,
contribuindo para a requalificação da ação pedagógica mediante o estudo e
aprofundamento teórico por parte dos professores orientado por um projeto coletivo
comum.
A participação dos alunos de graduação tem sido recorrentemente bem avaliada
pelos professores participantes dos cursos e grupos de estudo, bem como pelos próprios
alunos, que demonstram envolvimento e compromisso com o projeto, apresentam
visível desenvolvimento profissional e passam a dedicar-se a estudos e investigações
científicas de problemas relacionados à realidade concreta da educação infantil
brasileira.
O projeto tem permitido aos envolvidos alcançar uma inédita visão de totalidade
do trabalho pedagógico no segmento da educação infantil, abrindo novos caminhos para
a pesquisa nesse campo.
365
ISSN 2448-1157
Referências
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366
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Educação infantil indígena na legislação e na produção do conhecimento 128
Marta Coelho Castro Troquez129
Resumo: Este trabalho apresenta resultados de pesquisa bibliográfica e documental no
campo das pesquisas qualitativas em educação. Objetivou investigar pressupostos legais
e teóricos sobre a educação infantil indígena, como primeira etapa da educação básica
nacional. Elegeu para análise documentos que normatizam a educação básica no país,
dando ênfase à sua primeira etapa. Procedeu a uma busca no banco de teses e
dissertações da CAPES e nos sites de busca para localizar artigos e publicações sobre a
temática. No que diz respeito à legislação educacional, a pesquisa evidenciou, entre
outros resultados, que, embora a educação infantil seja um direito subjetivo da criança,
para a educação indígena é facultativa. Na produção do conhecimento, evidenciou
grande contribuição de estudos da antropologia da criança para esta área de estudos,
contudo, no que diz respeito à especificidade da educação de crianças indígenas em
instituições de educação infantil (creches, pré-escolas, centros de educação infantil) o
estudo aponta mais questões para o debate/estudos que respostas.
Palavras-chave: Educação infantil; educação escolar indígena; educação infantil
indígena.
Introdução
A educação escolar indígena é um campo relativamente novo de investigação
no Brasil (CAPACLA, 1995; GRUPIONI, 2003; 2008; TROQUEZ, 2009; 2012). A produção
acadêmica sobre questões relacionadas a ela intensificou-se em meio ao processo de
“virada” no que diz respeito às políticas oficiais de escolarização dos indígenas,
sobretudo a partir da Constituição Federal de 1988 que garantiu, entre outros direitos,
o direito a uma educação escolar diferenciada para os indígenas, tomados enquanto
grupos ou povos específicos (BRASIL, 1988; 2002; 2009; 2010). Dentro deste campo de
estudos, podemos dizer que estudos sobre a educação infantil indígena são
considerados raros (MIEIB, 2005, p. 06).
128
Este texto é fruto de Pesquisa iniciada em maio de 2015 na Universidade Federal da Grande
Dourados, MS, Brasil.
129
Professora Adjunta da Faculdade de Educação/UFGD.
367
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Contudo, estudos desenvolvidos no campo da História (ARIÈS, 1978), das
Ciências Sociais (BEGNAMI, 2010) e, sobretudo no campo da Antropologia, mais
especificamente da antropologia da criança (NUNES, 1997; 2003; CONH, 2000a, 2005;
Buss-Simão, 2009) tem trazido grandes contribuições para pensarmos a criança
indígena, sujeito da educação infantil indígena. Tais estudos tem desconstruído ou
desmistificado noções naturalizadas de criança e infância e nos levam a considerar a
dinâmica cultural e a produção social da infância de acordo com cada contexto
sociocultural específico. Nos levam ainda a considerar a criança como sujeito produtor
de cultura, como ser social pleno (CONH, 2005, p. 21) e diferenciado. Como colocado
por Conh,
Precisamos ser capazes de entender a criança e seu mundo a partir do seu
próprio ponto de vista [...] Não podemos falar de crianças de um povo
indígena sem entender como esse povo pensa o que é ser criança e sem
entender o lugar que elas ocupam naquela sociedade – o mesmo vale para as
crianças nas escolas de uma metrópole. E é aí que está a grande contribuição
que a antropologia pode dar aos estudos das crianças: a de fornecer um
modelo analítico que permite entendê-las por si mesmas. (COHN, 2005, p.
09).
De acordo com cada povo ou sociedade indígena há que se considerar
diferentes formas de ser criança, de socialização, de transmissão e aprendizagem de
conhecimentos. Precisamos considerar como é ser criança em cada grupo étnico
específico e em cada situação histórica e sociocultural específicas (TASSINARI, 2007).
Nesse sentido, podemos relacionar, entre outros, estudos que apontam para essas
especificidades: A criança indígena: a concepção Xikrin de infância e aprendizado
(CONH, 2000b); Crianças indígenas na cidade: a educação infantil no Centro Social
Mitangue-Nhiri (VIEIRA, 2012); Infância, participação e aprendizagens de meninos
indígenas Xakriabá (SILVA, 2012 ); Tornar-se aluno(a) indígena – Uma etnografia de
uma escola Guarani Mbya (MARQUI; CONH, 2011; MARQUI, 2012), As
transformações no modo de ser criança em Te’ýikue – 1950 - 2010 (CARIAGA, 2012).
Outras obras coletivas trazem mais contribuições a este campo de estudos (LOPES DA
SILVA; FERREIRA, 2001; LOPES DA SILVA; MACEDO, 2002; TASSINARI;
GRANDO; ALBUQUERQUE, 2012).
Os avanços legais impulsionaram não só a produção acadêmica sobre educação
de crianças indígenas, como possibilitaram a construção de escolas específicas em áreas
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indígenas e ampliação do número de matrículas de crianças indígenas em todas as
modalidades educativas (INEP/MEC, 2012).
De acordo com dados do IBGE (2012), em 2010, a população indígena no país,
ultrapassava 800.000 pessoas, cerca de 36,2% de indígenas residiam em área urbana, o
que correspondia a 379.534 indígenas vivendo nas cidades. Os dados indicam que nem
todos os alunos estão em escolas específicas, dentro das áreas indígenas. Há muitos
indígenas que estudam em escolas públicas rurais, de periferias e mesmo em escolas
particulares. Isso demanda a proposição de políticas públicas que atentem para as
diferenças socioculturais e linguísticas dos povos indígenas nas aldeias e fora delas.
Segundo Vieira,
[...] a educação infantil oferecida às crianças indígenas não se preocupa em
compreender a cosmovisão daquelas, a sua socialização primária ou, antes
disso, buscar o entendimento do que vem a ser criança para aqueles povos.
[...] pode- se afirmar que as políticas educacionais direcionadas às
crianças indígenas são iguais às oferecidas às crianças da sociedade
nacional, portanto, entende-se que para o Estado crianças são iguais
em todo e qualquer contexto. (VIEIRA, 2012, p. 181).
Diante do exposto, cabe questionarmos sobre as políticas públicas de educação
formal destinadas a crianças indígenas, especificamente, neste trabalho, atentamos para
as crianças de 0 a 5 anos, alvo da educação infantil, primeira etapa da educação básica.
Entendendo que a legislação educacional do país deve orientar as ações dos governos e,
consequentemente, a construção das políticas públicas, é importante investigar/conhecer
o que diz a legislação educacional sobre a o assunto. Também é preciso conhecer o que
está sendo produzido na academia. Há trabalhos acadêmicos específicos sobre a
educação infantil de crianças indígenas em instituições formais? O que apontam?
Pressupostos legais
No que diz respeito aos aspectos legais, a pesquisa considerou as conquistas da
Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(1996) para a realização da educação básica, o que inclui a educação das crianças de 0 a
6 anos, como direito subjetivo considerando as especificidades linguísticas e culturais
dos povos indígenas garantindo-lhes o direito a uma educação específica e diferenciada.
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Foram foco da análise as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a
Educação Básica (BRASIL, 2010); as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (BRASIL, 2009); as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Escolar Indígena na Educação Básica (BRASIL, 2012) e o Plano Nacional
de Educação – Lei N. 13.005, de 25-06-2014 (BRASIL, 2014).
Na legislação educacional brasileira, a educação infantil é institucionalizada
como a primeira etapa da educação básica dedicada ao cuidar e ao educar a ser
oferecida enquanto um direito da criança em creches (0 a 3 anos) e pré-escolas (4 a 5
anos). Todas as crianças têm este direito o que inclui as crianças indígenas. Assim, é
obrigação do Estado oferecer a educação infantil para todas as famílias que buscarem
vagas para suas crianças.
Entretanto, o oferecimento da Educação Infantil aos povos indígenas é
opcional, cabendo a cada comunidade indígena decidir sobre seu oferecimento
(BRASIL, 2009; 2012). Como segue:
Art. 8º A Educação Infantil, etapa educativa e de cuidados, é um direito dos
povos indígenas que deve ser garantido e realizado com o compromisso de
qualidade sociocultural e de respeito aos preceitos da educação diferenciada e
específica.
§ 1º A Educação Infantil pode ser também uma opção de cada comunidade
indígena que tem a prerrogativa de, ao avaliar suas funções e objetivos a
partir de suas referências culturais, decidir sobre a implantação ou não da
mesma, bem como sobre a idade de matrícula de suas crianças na escola.
(BRASIL, 2012)
Cabe destacar que a oferta da educação infantil deve considerar as
especificidades e os direitos à diferença e à autodeterminação dos povos indígenas, bem
a participação da comunidade no processo.
No que diz respeito ao Plano Nacional de Educação de 2014-2024 (BRASIL,
2014), destaco a Meta 1 que trata da ampliação da oferta da Educação Infantil e duas
estratégias para atingi-la:
Meta 1: universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para as
crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliar a oferta de
educação infantil em creches de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta
por cento) das crianças de até 3 (três) anos até o final da vigência deste PNE.
[...]
1.10) fomentar o atendimento das populações do campo e das comunidades
indígenas e quilombolas na educação infantil nas respectivas comunidades,
por meio do redimensionamento da distribuição territorial da oferta,
limitando a nucleação de escolas e o deslocamento de crianças, de forma a
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atender às especificidades dessas comunidades, garantido consulta prévia e
informada;
[...]
1.16) promover a busca ativa de crianças em idade correspondente á
educação infantil, em parceria com órgãos públicos de assistência social,
saúde e proteção a infância, preservando o direito de opção da família em
relação ás crianças de até 3 (três) anos. (BRASIL, 2014)
Considero nesta análise que o plano trata a questão da educação infantil indígena
de forma inespecífica e tangenciada, pois prevê “fomentar o atendimento (...) por meio
do redimensionamento da distribuição territorial da oferta (...)”. Dando a impressão que
as dificuldades que envolvem este oferecimento dizem respeito a questões de
localização apenas.
Mesmo que inclua as comunidades indígenas em suas estratégias para a
ampliação da educação infantil, o documento associa a oferta da educação infantil para
estas comunidades à presença das escolas. Segundo Rosemberg (2006): “creche não é
escola”. As instituições de educação infantil não precisam ter o formato de “escolas”.
Produção do conhecimento
Para este estudo, busquei artigos científicos disponíveis on line e resultados de
pesquisas no banco de teses e dissertações da Capes. Como queria investigar trabalhos
específicos sobre a temática, fiz uma pesquisa refinada usando os seguintes termos:
educação infantil indígena, educação infantil na educação indígena, educação infantil na
educação escolar indígena, centro de educação infantil indígena.
Na busca, observei que há estudos que tratam de questões mais gerais sobre a
infância indígena, especialmente no campo da antropologia da infância. Alguns
mencionam a questão da educação infantil indígena oferecida por instituições escolares
ou centros de educação infantil e fazem breves comentários a respeito, sem que o
objetivo do trabalho seja a educação de crianças indígenas na educação infantil formal
(centros de educação infantil, creches, pré-escolas, escolas específicas indígenas ou em
áreas urbanas). Neste campo de produção, além dos trabalhos já referendados
anteriormente, podemos incluir: ALVAREZ, 2004; CODONHO, 2007; LIMULJA,
2007; JESUS, 2011; ANDRIOLI, 2012.
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A maioria dos trabalhos no campo da educação escolar indígena (em interface
com a antropologia e a história) focalizam a presença da escola de modo genérico nas
comunidades indígenas ou relacionada a outras etapas da educação básica. Desta forma,
muitos trabalhos buscam “refletir sobre o papel que a escola assume no processo de
educação dessas crianças, nas aldeias ou fora delas” (TASSINARI; GRANDO;
ALBUQUERQUE, 2012).
Entretanto, para este estudo, considerei artigos e pesquisas que tratam
especificamente da questão da educação infantil indígena formal, como definida na
legislação educacional. A pesquisa confirma a raridade de estudos deste tipo.
No banco de teses e dissertações da CAPES, localizei apenas um trabalho
dentro desta especificidade. Trata-se do trabalho de Edna Ferreira: A criação do Centro
de Educação e Cultura Indígena (CECI) e a educação infantil indígena na aldeia
Krukutu (FERREIRA, 2012). A pesquisa investiga a educação infantil indígena
destinada a um povo específico e analisa os desafios para a realização de uma educação
diferenciada e intercultural. As conclusões do trabalho apontam para a importância dada
pelos indígenas à educação infantil indígena130.
No que se refere a artigos ou publicações acadêmicas, deixando de lado (por
hora) artigos publicados em blogs educativos, entre outros, considerei os artigos
publicados em revistas científicas, livros e anais de eventos acadêmicos. Apresento
artigos/estudos identificados por ordem cronológica de publicação: NASCIMENTO; ET
AL, 2006; ROZEMBERG, 2006; MIEIB, 2006; VENERE; VELANGA, 2008; VIEIRA,
2012; SILVA; MOTA, 2014.
Os trabalhos identificados trazem excelentes discussões para a área. Um ponto
importante e recorrente é o caráter inconclusivo das discussões. Como colocado por
Toneto, em uma reportagem:
De modo geral, os parcos trabalhos que dedicam-se sobre a temática revelam
mais questões do que respostas no que diz respeito à educação infantil
indígena. O oferecimento de educação infantil para as crianças indígenas tem
suscitado muitas críticas e um intenso debate entre especialistas, lideranças e
povos indígenas. Muitos defendem que a educação infantil atenta contra as
tradições indígenas, mas algumas comunidades indígenas têm reivindicado
espaços educativos para suas crianças pequenas. (TONETO, 2007, p. 34)
130
Tive acesso apenas ao resumo do trabalho, o que dificulta aprofundamento na análise.
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O caráter de inconclusão, de não respostas rápidas à complexidade da questão
pode ser evidenciada em praticamente todos os trabalhos. Os trabalhos apontam também
os limites da educação infantil oferecida aos indígenas em relação a seus modos
próprios de socialização e transmissão de conhecimentos. Segundo Nascimento et al
(2006, p. 10):
[...] podemos afirmar que a educação infantil familiar, no âmbito das aldeias
Kaiowá e Guarani, segue parâmetros distintos daquela percebida na proposta
de educação infantil escolar. Enquanto esta, por mais que seja suavizada,
segue padrões de organização da escolaridade formal, com todas suas
peculiaridades e consequências, aquela, como vimos anteriormente,
fundamenta-se completamente em um cotidiano aberto e integrado no ritmo
da convivência, em constante contato com a natureza e os “afazeres” da
própria comunidade.
Na conclusão do estudo afirmam:
Está claro que é necessário pesquisar mais para se chegar a um
posicionamento mais consistente sobre a necessidade ou não da educação
infantil escolar nas comunidades Kaiowá e Guarani. Pesquisas que informem
a respeito do outro lado da infância indígena, suas aspirações, visão de
mundo e, desejo de autonomia. (P. 11)
O seminário do MIEIB aponta na mesma direção:
Entretanto, no que se refere ao atendimento das crianças de 0 a 6 de idade
fora da comunidade educativa, ou seja, que não seja no ritual, na família, no
trato com a terra, mas, em espaço próprio para educação infantil mantido pelo
Estado, é ainda um desafio que está em processo de construção de um
entendimento. De modo que esse texto tenta somente dar um panorama de
como os professores, professoras, lideranças indígenas e o Centro de Cultura
Luiz Freire - CCLF vêm amadurecendo essa discussão. Isto quer dizer
também que não há ainda certezas construídas sobre essa etapa da educação
básica entre os povos indígenas em Pernambuco. (MIEIB, 2006, p. 05)
Gostaria de destacar o artigo de Rozemberg (2006, p. 16) que compõe os textos
da publicação do seminário do MIEIB. A autora pontua a novidade da temática da
educação infantil indígena, aspectos teóricos e práticos das posições em debate
envolvendo a oferta desta etapa da educação básica aos indígenas opondo: expansão
irrestrita versus cautela e prudência e, ainda, propõe ricas sugestões para avançar o
debate.
Do artigo de Venere e Velanga (2008), destaquei os seguintes pontos:
As reflexões apontam para a necessidade de pesquisas na área e de um
currículo multicultural para atender a diversidade e promover a aprendizagem
a partir de conteúdos culturais significativos, bem como para a formação de
professores que atendam a estas necessidades. (p. 01)
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[..]
A prática cotidiana nos revela, no entanto, que nem sempre uma legislação
progressista e elogiada internacionalmente significa que os direitos humanos
e da criança estejam, de fato, assegurados [...]. (p. 04)
[...]
Sendo a infância uma etapa percorrida para se aprender a viver em
sociedade, as crianças aprendem brincando, imitando os mais velhos,
participando da tradição oral, das atividades do dia-a-dia e dos rituais
inerentes a cada cultura, aprendendo assim as regras do convívio social. (p.
05)
Desta forma, um limite da educação infantil indígena relaciona-se à dificuldade
da realização de uma educação intercultural que considere as vivências das crianças
indígenas para além dos espaços escolares.
Vieira (2012) analisa a educação infantil de crianças Kaingang e Guarani na
cidade de Maringá e aponta para o caráter de assistencialismo que acaba assumindo.
Segundo a autora,
[...] a educação infantil oferecida nas cidades impõe-se como uma
necessidade de assistência, em razão da ausência da mãe trabalhadora; já nas
terras indígenas, mesmo com o advento da colonização que gerou grande
perda territorial e, por sua vez, alterou todo o modelo econômico das aldeias,
a educação das crianças continuou sendo de responsabilidade dos mais velhos
e das mulheres que permaneceram aldeados. (p. 180)
A autora considera a distância entre os modos próprios de socialização destas
crianças no seio de suas famílias e a socialização realizada na instituição educativa com
profissionais/pedagogas formados nas universidades. E levanta um questionamento
sobre esta formação: “ Essa profissional está sendo preparada na universidade para lidar
com esta situação? O tema da diversidade cultural está sendo tratado de modo eficaz dentro
das universidades? A melhor alternativa seria a contratação de uma professora indígena?”
(VIEIRA, 2012, p. 189).
Já o artigo de Silva e Mota (2014), “traz análises acerca da concepção e
implementação da educação infantil na educação escolar indígena com ênfase no
princípio da facultatividade”. Segundo as autoras:
Às escolas indígenas foi salvaguardado o direito de ser ou não implementada
a educação infantil, tendo em vista a necessidade de manutenção da língua,
dos costumes e tradições de modo a contribuir para valorização e manutenção
da identidade étnica e cultura. Importa destacar que a política de educação
infantil de modo geral que traz à tona essas recomendações quando diz que o
trabalho na educação infantil deve integrar escola, cultura e a sociedade.
Essa política se contrapõe ao princípio de obrigatoriedade da educação das
Crianças de 04 a 17 anos na Educação Básica definido na Lei 12.796/2013
que altera a Lei 9394/96 – LDB. A adesão a esta lei traz à baila uma
374
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discussão acerca da Educação Básica como um direito público subjetivo.
Acreditamos que o que está em questão não é a oferta mais a possibilidade de
cada etnia bem como cada sujeito fazer suas escolhas. E as crianças, público
alvo da educação infantil, enquanto sujeitos de direitos são ouvidas?
Essas questões postas devem ser objeto de reflexão para não incorrer em
velhos erros de exclusão educacional.
O trabalho evidencia a defesa da educação infantil pelos índios da etnia Ticuna:
Evidenciamos que os índios da etnia Ticuna são categóricos em defender e
reivindicar a educação escolar em suas aldeias e para todos os Ticuna porque
veem a escola como um instrumento que vai levá-los para um patamar de
igualdade na relação com a sociedade envolvente. Malgrado, tenha havido
uma resistência por parte do sistema de ensino na oferta da educação infantil,
os Ticuna se mantiveram e se mantém firme na defesa dessa etapa da
educação para suas crianças cuja importância está associada ao
desenvolvimento intelectual, mas conectada com os saberes da sua vivência.
(p. 14)
Na defesa do direito à educação, mais especificamente, da educação infantil, as
autoras defendem que “É necessário uma igualdade que reconheça as diferenças mas
também uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades”.
Considerações
Busquei através desta pesquisa mapear questões legais e teóricas (ou da
produção do conhecimento) sobre a educação infantil indígena. No sentido de recolher
um arcabouço amparado na legislação e nas produções acadêmicas para pensar o
assunto e realizar outras pesquisas. Acredito que este trabalho poderá apontar caminhos
ou indagações para outras pesquisas.
Muitas são as questões postas, como as discutidas e não esgotadas no
seminário do MIEIB (2006, P. 05):
É grande o desconhecimento sobre a realidade da educação infantil ofertada à
população indígena. Também são muitas as dúvidas e questionamentos. As
creches são uma necessidade social destes grupos? São uma demanda
declarada? Os pais, avós e a comunidade, ao serem os principais responsáveis
pela educação das crianças nos primeiros anos de vida, conseguem garantir as
condições adequadas para tal? Existem circunstâncias que determinam outras
opções? Como garantir que crenças e valores das diferentes etnias sejam
respeitadas no atendimento em creches e pré-escolas? Como garantir a
formação do professor da educação infantil para aqueles membros da
comunidade que optam por cumprir este papel? Como incluir a
especificidade da realidade indígena na formação de professores? Quem deve
lecionar nesses
lugares, professores não-índios ou aqueles que fazem parte da comunidade?
Qual o papel do Estado, frente ao direito constitucional das crianças
indígenas à educação infantil?
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A pesquisa bibliográfica também evidenciou grande contribuição de estudos da
antropologia da criança para esta área de estudos, sobretudo por considerarem as
crianças seres sociais ativos e produtores de cultura. Quem sabe muitas das respostas
elas mesmas nos darão.
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