cidade alternativa

Transcrição

cidade alternativa
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNISEB
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL - HABILITAÇÃO EM JORNALISMO
“CIDADE ALTERNATIVA”
Francine Doracenzi Estevão
Juliana Jurkovick Garzon
Orientadora Profa. Ms. Marília Valente
RIBEIRÃO PRETO
2011
2
FRANCINE DORACENZI ESTEVÃO
JULIANA JURKOVICK GARZON
“CIDADE ALTERNATIVA”
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao
Centro Universitário UNISEB de Riebirão
Preto, como parte dos requisitos para obtenção
do grau de Bacharel em Comunicação Social Habilitação em Jornalismo.
Orientadora: Profa. Ms. Marília Valente
RIBEIRÃO PRETO
2011
3
E79c
Estevão, Francine Doracenzi.
Garzon, Juliana Jurkovick
Cidade Alternativa. Francine Doracenzi Estevão; Juliana
Jurkovick Garzon. - Ribeirão Preto, 2011.
38 f., il..
Orientadora: Profª. Ms. Marília Valente.
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro
Universitário UNISEB de Ribeirão Preto, como parte dos
requisitos para obtenção do Bacharel em Comunicação Social Habilitação em Jornalismo sob a orientação Profª. Ms. Marília
Valente.
1. Jornalismo. 2. Documentário. 3. Turismo. 4. Roteiro. 5. TV
I. Título. II. Valente, Marília.
CDD – 302.2
4
Aos meus pais, Sérgio e Cristina, pela oportunidade de ter chegado até aqui, pela
educação e pela paciência.
Francine Estevão
Aos meus pais, Jana e Osmar, pelo legado que eles escolheram deixar.
Juliana Garzon
5
AGRADECIMENTOS
Antes de mais nada, agradeço aos meus pais por tudo nesses 23 anos de vida. À Juh Garzon,
pelos planos e desafios compartilhados, pela paciência e pelo companheirismo. Às outras
Sedentárias®, Rose, Bah, Carla e Gabi por tornarem os últimos quatro anos mais agradáveis.
Às minhas amigas de muitos e muitos anos, Camilinha, Natalia e Érica, por estarem sempre
ao meu lado. À Maju, pela paciência e pela ajuda a cada grito de “help”. À Carol pelas
mirabolices bonjovianas compartilhadas por e-mail diariamente. E a todos que fizeram parte
de alguma forma, direta ou indiretamente, da realização desse trabalho. Especialmente aos
professores Marília Valente, Andrea Túbero, Denis Renó (que ensinou que para conseguir
tornar o Cidade Alternativa uma realidade seria preciso ter "Coragem e Vontade"), Jon... A
todos, muito obrigada pela atenção, dedicação e por contribuírem com a minha formação.
Francine Estevão
Agradeço aos meus pais, Jana e Osmar, por todo o apoio e paciência desde o primeiro
quilômetro. Só vocês sabem como me manter rodando quando o nível de combustível já está
na luz de emergência. Obrigada às minhas avós e aos avôs, Geny e Orlando; Marilena e
Epaminondas, por me fazerem acreditar que eu valho ouro.
Acho que só uma pessoa ouviu tanta abobrinha da minha parte durante quatro anos seguidos:
valew, Fran! A gente se entende, mesmo quando não parece. Os amigos, mais próximos e de
outros cantos do mundo, merecem um abraço especialmente apertado pelas palavras de
encorajamento e pelas ajudas técnicas (Maju, prometo que vou lembrar de devolver os seus
6
livros). Isaac, sua sugestão definiu a minha vida; obrigada por ter lido aqueles primeiros dois
capítulos há cinco anos.
Obrigada à nossa orientadora Marília Valente pelos puxões de orelha. Só assim conseguimos
polir o nosso carrango. Isso inclui os outros professores que passaram a cera enquanto
fazíamos um pit stop.
E, finalmente, o sentimento de gratidão vai ao trabalho do ator Garrett Hedlund, que faz parte
do elenco do filme “On The Road” como Dean Moriarty. Se não fosse esse meu lado
adolescente eu não sei se esse projeto teria virado para a direita ou para a esquerda ao nos
depararmos com uma bifurcação. E também à banda Bon Jovi, porque eu não ando em carro
sem aparelho de som.
Muito obrigada. End of Line.
Juliana Garzon
7
“Para mim, pessoas mesmo são os loucos, os que estão loucos
para viver, loucos para falar, loucos para serem salvos, que
querem tudo ao mesmo tempo agora, aqueles que nunca bocejam
e jamais falam chavões, mas queimam, queimam, queimam como
fabulosos fogos de artifício explodindo como constelações em cujo
centro fervilhante -pop!- pode-se ver um brilho azul e intenso até
que todos “aaaaaaaah!”.
Jack Kerouac
8
RESUMO
Este trabalho tem o objetivo de criar um programa documentário por meio da produção de um
piloto sobre turismo em cidades do interior do estado de São Paulo, em um raio de até 300
quilômetros de distância de Ribeirão Preto, tendo como público-alvo pessoas de 18 a 30 anos.
Baseado em referenciais teóricos do jornalismo e do documentário, pretende-se mostrar que
há uma opção para se conhecer cidades ainda não desvendadas pelo viajante de forma
alternativa. A realização do documentário piloto mostra ida a cidade de Bauru, que se
enquadra nos critérios de seleção apresentados, e na exploração desse local sem um roteiro
previamente determinado. Desta forma, a experiência dos moradores guiou uma parte da
viagem, assim como dispositivos alternativos de indicação de rotas como mapas e placas de
sinalização, fazendo com que o conhecimento da cidade seja feito do ponto de vista deles e
das próprias descobertas das documentaristas que estiveram em contato direto com essas
fontes. A estética do programa teve como base o filme “Fix” (2008) do diretor italiano Tao
Ruspoli. A documentação das explorações tem o objetivo de inspirar os espectadores a
fazerem o mesmo. A história acontece na Califórnia, EUA, onde um casal, Bella e Milo,
precisa levar o irmão de Milo de volta para a reabilitação. Toda a viagem é documentada por
Leo e o expectador, por meio da câmera olho usada, torna-se um personagem. Foi usado,
também, como referencia e inspiração para o programa o livro “On The Road” (1957) de Jack
Kerouac. A obra conta as aventuras de Sal Paradise e Dean Moriarty, dois amigos que cruzam
os Estados Unidos pela Rota 66. A influência está no fato de não haver caminho definido, o
destino pode mudar ao passo que eles conhecem novas pessoas, que lhes levam a novos
destinos. Com isso, o trabalho conclui que é possível conhecer qualquer cidade, no âmbito
nacional ou internacional, de forma independente dos roteiros tradicionais e espontânea
utilizando alternativas de orientação e localização.
Palavras- chave: documentário, turismo, roteiro, alternativo, TV.
9
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 10
2. “CIDADE ALTERNATIVA” ............................................................................................ 13
3. DOCUMENTÁRIO: HISTÓRIAS E CONCEITOS ....................................................... 15
3.1 Documentário x filme de ficção ....................................................................................... 16
3.2 Documentário x vídeo reportagem .................................................................................. 17
4. TIPOS DE DOCUMENTÁRIO ........................................................................................ 18
4.1. Modo Poético .................................................................................................................... 18
4.2. Modo Expositivo .............................................................................................................. 19
4.3. Modo Observativo ........................................................................................................... 19
4.4. Modo Reflexivo ................................................................................................................ 20
4.5. Modo Performático.......................................................................................................... 21
4.6. Modo Participativo .......................................................................................................... 21
5. A PRODUÇÃO DO “CIDADE ALTERNATIVA” ......................................................... 22
5.1 “Cidade Alternativa” como documentário participativo.............................................. 24
5.2. A apropriação do jornalismo pelo documentário ......................................................... 27
5.3. Técnicas de abordagem e entrevista .............................................................................. 29
6. DIÁRIO DE VIAGEM ....................................................................................................... 32
6.1 Mudança de Rota .............................................................................................................. 33
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 35
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................... 36
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ...................................................................................... 38
10
1. INTRODUÇÃO
Este projeto propõe a criação de um programa documentário piloto sobre turismo, o
“Cidade Alternativa”, que vai apresentar semanalmente em horário fixo pontos turísticos
tradicionais e pontos alternativos de cidades do interior de São Paulo.
O termo alternativo é adotado como referência a lugares visitados ao acaso por meio
de alternativas como a consulta a moradores na busca de locais que eles frequentam, mas que
não costumam ser muito visitados por turistas, com o auxílio de mapas, de fotos e a partir da
curiosidade despertada nas documentaristas conforme foram desbravando o município. Os
locais tradicionais são aqueles já conhecidos por moradores e turistas e que constam no
roteiro turístico da cidade.
O programa terá a duração de aproximadamente 20 minutos (o programa piloto tem
18‟53”). Com esse tempo, o programa pode ser transmitido tanto na web quanto na televisão,
deixando espaço para intervalos comerciais.
Um dos objetivos é mostrar os pontos turísticos por meio da visão dos moradores e das
documentaristas, que exploraram o município de forma espontânea e participativa, com a
ajuda de recursos alternativos como mapas e indicações de placas. O intuito é também mostrar
que é possível conhecer um local sem um roteiro de viagem definido, mas a partir das dicas e
experiências apresentadas pelo documentário, que pode inspirar os espectadores a seguirem a
proposta de ir em busca de algo desconhecido sem muito planejamento.
Além do mais, não existe um programa televisivo com tal proposta na região de
Ribeirão Preto, sendo assim, o “Cidade Alternativa” é interessante e uma novidade para o
mercado.
Quanto à carência de documentários na televisão aberta, Heydi Vargas e Valdir
Boffetti (2007, p. 162) apontam que eles são “produções que representam o mundo em que
vivemos de forma criativa e, por vezes, experimental, que colocam desafios quanto ao
formato e às técnicas e que se diferenciam dos programas apresentados pelas tevês
comerciais”.
O documentário é um gênero pouco freqüente em canais abertos de televisão por
causa da atemporalidade e do aprofundamento da pesquisa sobre o tema, levando
assim mais tempo e não sendo comercialmente viável. Com isso, as emissoras
acabam comprando as produções, terceirizando o serviço de produção de
documentário, não direcionando seus profissionais para esse trabalho, se tornando
quase exclusividade de tevês por assinatura e de tevês educativas (MELO, GOMES,
MORAIS, 2001).
11
O destino inicial foi definido a partir dos seguintes critérios: cidades do interior do
Estado de São Paulo, com até 300 quilômetros de distância de Ribeirão Preto e com pontos
que possam despertar o interesse das mais variadas idades, adequando, assim, o programa ao
seu público-alvo, que são pessoas entre 18 e 30 anos, da região de Ribeirão Preto (onde o
programa seria exibido de acordo com a proposta), com espírito aventureiro para desbravar e
conhecer novos lugares, mas não deixando de fora as demais faixas etárias que possam se
interessar pela inspiração do programa.
A definição por Bauru, como sendo o início da jornada do “Cidade Alternativa” e
portanto a cidade escolhida para o programa piloto, se deve ao fato de a cidade ter um pub
chamado “On The Road”, baseado no livro homônimo de 1957, de Jack Kerouac, obra que
serviu de inspiração para o surgimento do projeto. O livro narra diversas viagens feitas por
dois amigos, Sal Paradise e Dean Moriarty, ao longo dos Estados Unidos pela Rota 66. Os
personagens descobrem pessoas interessantes e se envolvem com elas sem uma pesquisa
prévia sobre o lugar para onde irão. O próprio destino de viagem sofre alterações durante a
narrativa, mostrando a realidade de quem viaja sem um roteiro pré-determinado.
Depois de definida a cidade, o encaminhamento do documentário foi feito “in loco”,
ou seja, durante a produção do produto, com depoimentos e entrevistas – não agendadas –
com os moradores, fontes iniciais e que ajudaram a documentar o turismo local indicando
lugares interessantes de serem visitados e os pontos mais frequentados.
O programa foi feito com base no gênero de documentário participativo, segundo a
teoria e definição de Bill Nichols na obra “Introdução ao documentário”.
A elaboração do trabalho não contou com um roteiro pré-produzido, dando maior
possibilidade de participação e interação das documentaristas como forma de mostrar o
encontro real destas com o espaço que foi explorado, mostrando assim determinada
representação do presente, que é uma das principais características do gênero, como define
Bill Nichols (2005, apud Heydi Vargas e Valdir Boffetti, 2007), “documentário não é uma
reprodução da realidade, é uma representação do mundo em que vivemos. Representa uma
determinada visão do mundo”.
Apesar de dispensar o roteiro para guiar as documentaristas durante as gravações e
edições, foi realizada uma pré-produção com pesquisas para a obtenção de informações
primárias sobre a cidade.
A estética e os movimentos de câmera são baseados no filme “Fix” (2008), do diretor
italiano Tao Ruspoli. O longa conta a história de um casal norte-americano de
documentaristas, Bella e Milo, que precisam realizar uma viagem pela Califórnia para levar o
12
irmão de Milo, Leo, da prisão para uma clínica de reabilitação. “Fix” foi feito com uma
câmera segurada pelos próprios personagens, em sua maioria por Milo. Assim, usando o
recurso da câmera olho, o espectador sente como se fizesse parte da história, identificando-se
com os personagens e com o que é contado.
Com tais recursos apresentados, foi possível constatar na prática que para conhecer
determinado local não há necessidade de um roteiro turístico pré-definido e que os moradores,
assim como as indicações de placas encontradas pelo caminho, a utilização de recursos
jornalísticos como as entrevistas e a curiosidade das jornalistas/documentaristas, são formas
valiosas de obtenção de informações para o público que deseja explorar uma cidade até então
desconhecida por ele.
Verificamos assim, que é viável a criação de um programa documentário sem a
obrigatoriedade de produção e de roteiro, no entanto, é importante contar com alternativas
tradicionais como mapa, por exemplo, para se localizar e descobrir novas indicações e locais a
serem visitados.
13
2. “CIDADE ALTERNATIVA”
Ilustração 1 – Logo “Cidade Alternativa”
FONTES: CD Lost Highway, 2007; Google – produção Denis Porto Renó
A ideia do produto surgiu durante um trabalho feito para a disciplina de
Empreendedorismo, ministrada ainda no primeiro ano de faculdade pelo professor Denis
Porto Renó, que contribuiu para a elaboração do logo do que até então seria uma empresa,
utilizando material retirado do Google e a capa do CD “Lost Highway” (2007) da banda
norte-americana Bon Jovi. Em tal etapa do curso, foi necessário criar uma empresa que
produzisse material jornalístico. Na época, o projeto sustentava que os documentários seriam
realizados com o apoio das prefeituras, tendo, portanto, a voz da administração municipal.
Não havia critério de seleção, já que o produto seria uma prestação de serviço a qualquer
contratante.
Já na disciplina de Projeto Experimental I, se exigiu que a ideia e o projeto fossem
amadurecidos, já que foi resolvido dar continuidade ao trabalho proposto no passado devido
ao seu caráter original, principalmente na região de Ribeirão Preto, e pela identificação das
autoras com o plano traçado.
A partir disso, se passou a adotar a visão de que a produção seria independente de
qualquer organização ou instituição, dando às documentaristas total autonomia para expressar
opinião e mostrar a visão desejada, uma das características de documentário, dar voz ao seu
14
“autor”. Logo, fez-se também necessário a escolha de critérios que viabilizassem a produção
do documentário como produto jornalístico e elaboração do piloto apresentado.
Foi definido então, com base na estética do filme “Fix” (2008), que o projeto seria
desenvolvido teoricamente como documentário participativo, tendo em vista que o objetivo é
mostrar a interação das documentaristas com o local onde estiverem inseridas.
O público-alvo foi definido levando em consideração a “aventura” de se fazer uma viagem
sem muito planejamento. Assim, os espectadores esperados estão entre os 18 e os 30 anos e
têm espírito aventureiro. No entanto, com a diversidade de lugares visitados dentro de uma
mesma cidade, não se exclui as demais faixas etárias.
A proposta original era de mostrar ao espectador uma viagem espontânea, tomando como
pressuposto as indicações dos próprios moradores e a curiosidade que a cidade despertaria nas
documentaristas conforme fossem se inserindo nesse contexto, não tendo, portanto, roteiro –
nem de viagem, nem de produção – pré-definido.
Dessa forma, foi buscando conhecer a cidade visitada de forma diferenciada e precisando
utilizar recursos estratégicos de última hora para viabilizar a produção e a conclusão do
documentário absorvendo da melhor forma a cultura local que surgiu o nome do programa:
“Cidade Alternativa”.
Por fim, definiu-se que seria feita a produção semanal do produto destinado
prioritariamente, mas não somente, ao público-alvo (acima mencionado), com duração média
de 20 minutos. Como exposto anteriormente, a ideia de ser um projeto financiado por
instituições que pretendem passar certa imagem da cidade foi descartada, o que não impede a
possibilidade de o documentário receber patrocínio de empresas que se identificam ou apóiam
a proposta do produto.
Concluindo, o “Cidade Alternativa” é um programa documentário para mostrar formas
alternativas de se conhecer uma cidade, sem seguir muitas regras pré-estabelecidas em
roteiros de viagens e produzido de forma a mostrar para o público que é viável seguir a
mesma ideia.
15
3. DOCUMENTÁRIO: HISTÓRIAS E CONCEITOS
O documentário não tem uma definição única e exclusiva. Podemos aqui apresentá-lo
como um gênero cinematográfico que se caracteriza pelo compromisso com a exploração da
realidade. Apesar das diferenças nas formas de planejamento dos gêneros de ficção e
documentário, por muito tempo a produção documentária se guiou no modelo de produção do
filme de ficção (apoiado em roteiro). Puccini complementa:
Estamos falando mais especificamente do período de 1920 a 1950, em que
predomina um estilo que ficou conhecido como documentário clássico.[...] A
ruptura mais significativa com um modelo de produção apoiado em roteiro ocorre
no fim da década de 1950, com o documentário direto americano [...] e com o
documentário verdade. [...] instauram uma busca pelo registro de “um real estado
bruto”, possível graças a um processo de filmagem espontâneo, sem todas as
formalidades e parafernálias exigidas por uma produção cinematográfica de grande
porte. (PUCCINI, 2009, p. 14 e 15)
De acordo com esta ideia, o documentário prevê a produção com “o imprevisto e o
improviso da filmagem” (PUCCINI, 2009, p. 15). No entanto, não se deve deduzir que o
documentário represente a realidade tal como ela é. Para Bill Nichols (2005, p. 47), o
documentário “não é uma reprodução da realidade, é uma representação do mundo em que
vivemos.”
Puccini também defende que o estilo é comandado pelas opiniões do cineasta, ou
realizador do projeto. Tais escolhas “marcam a apropriação do real com uma consciência
subjetiva” (PUCCINI, 2009, p. 15).
Nichols (2005, p. 136) acrescenta que o documentário não possui um estilo fixo e
definitivo de técnicas, formas ou estilos sendo que, muitas vezes, um modo de se fazer
documentário é testado, podendo ser posteriormente descartado ou reproduzido por outros
cineastas.
Assim, para Nichols (2005, p. 136 e 137) cada tipo de documentário surge em parte por
causa da insatisfação dos cineastas com o tipo anterior. Os novos modos também representam
de certa forma, características sociais da época em que surgiram, proporcionando maneiras
distintas de representar o mundo em que viviam os cineastas que os produziram. De acordo
com Bill Nichols (2005, p. 138) “O que muda é o modo de representação, não a qualidade ou
o status fundamental da representação.”
A história conta que os filmes documentários surgiram por acaso, sem que alguém tenha
tido a intenção de inventá-los e que os primeiros registros do gênero são dos irmãos Lumière,
16
inventores do cinematógrafo, quando gravaram e exibiram cenas do cotidiano como em
“Saída dos trabalhadores das fábricas Lumière” (1895) e “A chegada de um trem à estação”
(1895).
Assim, para Bill Nichols (2005, p. 118) o documentário surgiu da “combinação da paixão
pelo registro do real com um instrumento capaz de grande fidelidade atingiu uma pureza de
expressão no ato da filmagem documental”.
No entanto, foi só a partir dos anos 1920 que o gênero documentário começou a se
diferenciar do cinema de ficção levando o espectador a acreditar que o que é visto é o que
realmente existiu no momento em que foi registrado passando assim a sensação de
autenticidade, como explicado a seguir.
3.1 Documentário x filme de ficção
Todo documentário é um filme, mas um filme de não-ficção que possui caráter autoral,
que explora a realidade, com personagens reais, discute temas e propõe mudanças e reflexões.
Enquanto na produção cinematográfica todos os passos são previamente calculados e
planejados do começo até o final, o documentário é montado a partir das eventualidades do
assunto a ser abordado. “Se, no filme de ficção, o controle do universo de representação está,
desde a saída, todo à mão dos responsáveis pela concepção do filme, seja ele uma adaptação
ou não, em documentário esse controle é uma aquisição gradual.” (PUCCINI, 2009, p. 16)
Puccini (2009, p. 16) afirma que “É comum, em documentário, a análise do projeto
considerar apenas uma proposta de filme ou um argumento como peça de apresentação”.
Nesta proposta, há espaço para a atuação ensaiada, mesmo que representando uma visão da
realidade. Já o filme de ficção é todo montado na premissa de que cada etapa precisa ser
roteirizada, das locações até cada fala dos personagens, cheio de detalhes pensados e
trabalhados de forma que tudo saia exatamente como o planejado. Além do mais, de acordo
com o autor, os personagens não têm voz – não dão opinião clara e abertamente. O filme de
ficção também não tem o caráter de questionar o expectador, não deixando muito espaço para
a reflexão feita a partir da interpretação.
17
3.2 Documentário x vídeo reportagem
O documentário se aproxima e chega muitas vezes a ser confundido com vídeo
reportagem.
Tanto um quanto outro possuem pontos semelhantes que levam a tal dúvida sobre se
determinado produto é uma coisa ou outra. Para melhor esclarecimento, trata-se aqui de
apontar algumas características de cada um desses dois gêneros com base no artigo
“Documentário e video-reportagem: uma contribuição ao ensino de telejornalismo”, de Ana
Paula Silva Oliveira, Ivete Cardoso do Carmo-Roldão e Rogério Eduardo Rodrigues Bazi1.
Tanto vídeo reportagem como documentário se aprofundam no tema escolhido e contam
uma história com começo, meio e fim.
No entanto, o tema da vídeo reportagem está sempre ligado a algum assunto em pauta na
mídia. Nesse modelo de trabalho, a estrutura é mais clássica, sendo comparada a uma
reportagem para televisão, levando em consideração a utilização de offs, (texto do repórter)
sonoras (entrevistas) e passagem (presença do repórter no vídeo).
Já no documentário, o cineasta tem mais liberdade para montar essa estrutura podendo
utilizar ou não offs, fazendo entrevistas ou colhendo depoimentos, e o cineasta pode ou não
aparecer. Porém, se a escolha for pela presença do cineasta no documentário, essa
participação não é necessariamente como a passagem de uma reportagem. Ela é mais
informal, podendo mostrar o cineasta como um personagem (como no documentário
participativo, por exemplo).
Outra diferença entre vídeo reportagem e documentário é a neutralidade. Enquanto no
primeiro o repórter omite sua opinião e apresenta os dois lados, mostrando os fatos do tema
em questão e buscando a imparcialidade, no segundo o cineasta defende um ponto de vista,
toma um partido e emite sua opinião sobre o tema que é escolhido independentemente de
assuntos em pauta, possuindo assim um caráter mais autoral.
No caso do documentário, geralmente, existe a produção de um roteiro, mesmo que esse
seja sujeito a alterações (o que não é o caso do “Cidade Alternativa”, que se propõe a não ter
um roteiro sendo que a pré-produção consta apenas da busca de informações iniciais sobre a
cidade de Bauru, sem um roteiro de entrevistas e locais a serem visitados, sujeitando assim as
documentaristas ao encontro de intempéries), mas não possui uma estrutura padrão.
1
OLIVEIRA et al., Documentário e video-reportagem: uma contribuição ao ensino de telejornalismo.
Disponível em <http://www.fnpj.org.br>. Acesso em: 18 out. 2011.
18
4. TIPOS DE DOCUMENTÁRIO
De acordo com Bill Nichols, o gênero documentário pode ser dividido em seis
subgêneros: poético, expositivo, participativo, observativo, reflexivo e performático. No
entanto,
A identificação de um filme com um certo modo não precisa ser total. Um
documentário reflexivo pode conter porções bem grandes de tomadas observativas
ou participativas; um documentário expositivo pode incluir segmentos poéticos ou
performáticos. As características de um dado modo funcionam como dominantes
num dado filme: elas dão estrutura ao todo do filme, mas não ditam ou determinam
todos os aspectos de sua organização. Resta uma considerável margem de
liberdade. (NICHOLS, 2005, p. 136)
4.1. Modo Poético
Este tipo de documentário surgiu nos anos 1920 e é considerado um modo mais
abstrato de representação do real. É bastante subjetivo tendo em vista que o material
documentado não tem muito comprometimento com o que é concreto.
Os personagens são simples e representados por atores tratados como objetos que são
movidos de acordo com as idéias e com a vontade do cineasta, enfatizando assim seu estado
de ânimo. É um trabalho que passa por uma grande produção, como jogos de luz, por
exemplo, para dar uma nuance poética ao que é real, mostrando essa realidade de novas e
diferentes formas.
Segundo Bill Nichols (2005, p. 138), “O modo poético sacrifica as convenções da
montagem em continuidade, e a idéia de localização muito específica no tempo e no espaço
derivada dela, para explorar associações e padrões que envolvem ritmos temporais e
justaposições espaciais”.
Alguns exemplos de documentário poético: “Chuva”, de Joris Ivens, de 1929; “Um
cão andaluz”, de Luiz Buñuel e Salvador Dali, de 1928 e “A idade de Ouro”, Luiz Buñuel,
de 1930.
19
4.2. Modo Expositivo
O documentário expositivo data também dos anos 1920 e trata diretamente do mundo
histórico como ele realmente o é, sendo mais objetivo, o que o torna o modo mais aceitado
pelo público.
Possui uma lógica informativa exposta verbalmente, geralmente por meio da chamada
“voz de Deus”, ou off , que marca a autenticidade desse tipo documental. Portanto, a voz
possui mais valor do que as imagens, que têm um papel secundário, sendo utilizadas para
ilustrar, evocar ou se contrapor ao que está sendo dito. Dessa forma, a voz, também chamada
de voz over, julga o que está sendo exposto pelo documentário sem se envolver com ele,
passando credibilidade às informações.
A montagem serve para manter a continuidade dos argumentos expostos pela voz não
seguindo um padrão visual formal, sem lógica temporal ou espacial dando mais liberdade ao
cineasta para selecioná-las e rearranjá-las.
Este modo agrupa fragmentos do mundo histórico numa estrutura mais retórica ou
argumentativa do que estética ou poética. O modo expositivo dirige-se ao
espectador diretamente, com legendas ou vozes que propõem uma perspectiva,
expõem um argumento ou recontam a história. Os filmes desse modo adotam o
comentário com voz de deus (o orador é ouvido, mas jamais visto), [...] ou utilizam
o comentário com voz da autoridade (o orador é ouvido e também visto), [...].
(NICHOLS, 2005, p. 142)
Alguns exemplos de documentário expositivo: “A terra espanhola”, de Joris Ivens, de
1937 e “Por que lutamos”, de Frank Capra.
4.3. Modo Observativo
O subgênero observativo surge em 1960 e, diferentemente dos modos poético e
expositivo, esses documentários mostram a vida no momento em que ela está sendo vivida, de
forma espontânea, sem que haja uma intervenção explícita por parte do cineasta, como
observa Bill Nichols:
O respeito a esse espírito de observação, tanto na montagem pós-produção como
durante a filmagem, resultou em filmes sem comentários com voz-over, sem música
ou efeitos sonoros complementares, sem legendas, sem reconstituições históricas,
sem situações repetidas para a câmera e até sem entrevistas. O que vemos é o que
estava lá [...]. (NICHOLS, 2005, p. 147)
20
Este modelo de documentário mostra pessoas de verdade interagindo com terceiros
sem dar atenção ao papel do cineasta que registra essas cenas. Nestes casos, não há montagem
de imagens. No entanto, fica um questionamento sobre a veracidade das experiências
demonstradas: até onde as ações são reais e independentes da presença da câmera? Será que
esses „personagens‟ agiriam da mesma forma se não estivessem sendo observados?
Alguns exemplos de documentário observativo: “A escola”, de 1968, “Victory at
sea”, de Henry Solomon e Isaac Kleinerman, de 1952-53, “Modelo”, de Fred Wiseman, de
1980.
4.4. Modo Reflexivo
O documentário reflexivo aparece nos anos 1980 e questiona o formato dos
documentários, como aponta Bill Nichols (2005, p. 166) “O modo reflexivo é o modo mais
consciente de si mesmo e aquele que mais se questiona”.
É bastante abstrato perdendo de visita as questões concretas e objetivas. Para isso,
desafia as técnicas da lógica e do que é convencional. Ainda de acordo com Bill Nichols
(2005, p. 166), “Na melhor das hipóteses, o documentário reflexivo estimula no espectador
uma forma mais elevada de consciência a respeito de sua relação com o documentário e
aquilo que ele representa”.
Esse modelo de documentário mostra a relação do cineasta com o espectador e mostra
a representação do mundo histórico com uma aparente não intervenção do cineasta, ou
realmente com a ausência dela, nos acontecimentos levando os espectadores a um
questionamento sobre o que está sendo assistido sem ter a intenção de acrescentar algum novo
conhecimento, mas sim ajustar a visão de quem vê ao que é visto.
Alguns exemplos de documentário reflexivo: “Letter to Jane”, de Jean-Luc Godard e
Jean-Pierre Gorin, de 1972 e “O homem da câmera”, de Dziga Vertov.
21
4.5. Modo Performático
O modo performático de documentário também despontou nos anos 1980 e mostra o
lado subjetivo de questões simples e objetivas levantando questões, por exemplo, sobre o que
é o conhecimento (assim como o subgênero poético).
Os documentários desse tipo envolvem questões pessoais de experiências e de
memórias e contam também com envolvimento emocional tanto no que o cineasta tenta
transmitir quanto no que o espectador capta.
Muitas vezes, levam a uma mistura entre o real e o imaginário com estruturas
narrativas menos convencionais. Nesses casos, é como se o cineasta convidasse a quem
assiste a repensar o mundo e as coisas convencionais.
Para Bill Nichols (2005, p. 170), “O que esses filmes compartilham é um desvio da
ênfase que o documentário dá à representação realista do mundo histórico para licenças
poéticas, estruturas narrativas menos convencionais e formas de representação mais
subjetivas”.
Alguns exemplos de documentário performático: “Línguas desatadas”, de Marlon
Riggs, de 1989, “O corpo belo”, de Ngozi Onwurah, de 1991 e “Homenagem a Bontoc”, de
Marlon Fuentes, de 1995.
4.6. Modo Participativo
O modo participativo inclui pesquisa de campo com a inserção do cineasta no trabalho
de forma mais explícita, não apenas dando sua opinião, mas também de corpo presente, se
envolvendo mais com o tema do documentário. O próximo capítulo é dedicado a esse
subgênero, que será mais detalhadamente apresentado, já que ele foi o modo escolhido para a
realização do “Cidade Alternativa”.
22
5. A PRODUÇÃO DO “CIDADE ALTERNATIVA”
A viagem foi gravada para mostrar os locais conhecidos e os de visitação não tão
comum pelos turistas, mas que foram descobertos durante a exploração do local com a ajuda
de pessoas que moram no município e com a curiosidade despertada nas documentaristas
conforme percorriam a cidade sendo auxiliadas pela imagem de mapas e placas de indicação
de locais pelos moradores.
O método de produção deste projeto é baseado no modelo de documentário
participativo e, apesar de não dispor de roteiro com marcação de cenas, locações, entrevistas,
contou com a realização de uma breve e prévia pesquisa documental para obter informações
técnicas como distância do ponto de origem (Ribeirão Preto) até o destino (Bauru), número de
habitantes e principais características, como principal nicho econômico, e outros fatos
relevantes que poderiam ser úteis durante a viagem ou na hora da edição.
Nenhum roteiro de entrevista foi montado, já que não houve definição dos
entrevistados que foram abordados e incluídos na produção ao longo da própria gravação do
documentário, com exceção do pub “On The Road”. Bar temático inspirado no livro de Jack
Kerouac, que influenciou toda uma geração de jovens durante as décadas de 50 e 60 ao
mostrar ao mundo o outro lado do sonho americano através de uma viagem de dois jovens que
atravessaram os Estados Unidos pela Rota 66. Neste caso, como o bar só abre as sextas-feiras
a noite e vésperas de feriado, foi feito um contato prévio com os gerentes para que pudessem
falar com as documentaristas e mostrar o interior do bar fora do horário de funcionamento.
Em 2005, Eduardo Coutinho também apresentou um trabalho que foi produzido de
forma semelhante ao “Cidade Alternativa”. Para fazer “O fim e o princípio” (2005), ele não
realizou pesquisas prévias e não contou com a utilização de roteiro, estratégias utilizadas para
mostrar o encontro do documentarista com os moradores de um povoado no sertão da Paraíba.
De certo, existem apenas alguns critérios que determinaram a escolha da
comunidade a ser registrada (como o de possuir acomodação adequada para a
equipe de filmagem), o aparato cinematográfico à disposição do documentarista, a
equipe de filmagem e os equipamentos [...]. [...] O fim e o princípio esconde um
planejamento mínimo, que garante um interesse prévio para o filme. (PUCCINI,
2009, p. 72 e 73)
O programa foi gravado com uma câmera mini DV, como se fosse um diário de
viagem em imagens e também contou com a utilização de uma câmera fotográfica já que as
imagens obtidas a partir deste equipamento também compõem a apresentação da viagem no
23
documentário. Foram registradas a viagem, as conversas com os moradores, as experiências
vividas e a apresentação de cada local descoberto, alternando a operação do equipamento
técnico e a apresentação entre as duas documentaristas.
Segundo Vargas e Boffetti (2007), o formato escolhido, documentário participativo,
tem como base o cinema-verdade, que surgiu na década de 1950, com a proposta de interação
entre o diretor e os atores sociais que participam da situação que vai ser retratada no filme,
dando preferência à subjetividade.
Esta modalidade de investigação consiste ainda, segundo Silva e Grigolo (2006, apud
RAUPP e BEUREN, 2006), na “interação entre os pesquisadores e os membros das situações
investigadas. [...] Quanto maior for a participação, maior a interação entre pesquisador e
membros da investigação, contribuindo para o alcance de um resultado mais consistente a
partir do estudo”.
Vale ressaltar que, desta forma, o produto se distancia da característica impessoal das
pesquisas científicas, já que o projeto visa passar a impressão das documentaristas ao longo
do processo de produção.
O documentarista busca ouvir a opinião de várias pessoas sobre determinado
acontecimento ou personalidade, seja para confirmar uma tese, seja para confrontar
opiniões. No entanto, apesar de apresentar um emaranhado de vozes, que muitas
vezes se opõem e se contradizem, uma voz tende a predominar: aquela que traz em
si o ponto de vista do autor. Se por um lado o documentarista dá voz aos seus
retratados com o objetivo de levar ao espectador a tirar suas próprias conclusões em
relação a um tema, por outro, esse mesmo documentarista almeja convencer o
público de que a história que está sendo narrada tem uma moral. (MELO; GOMES;
MORAIS, 2002, p. 06)
As imagens e fotografias foram selecionadas e editadas de acordo com a ideia final de
apresentação do documentário, a fim de montar uma ordem cronológica e coesa dos fatos
conforme o andamento da viagem.
Primeiramente, todas as imagens e sonoras foram analisadas buscando aquelas que
melhor representavam o que se pretendia mostrar aos espectadores do programa
documentário, ou seja, os destinos visitados. Depois de selecionadas as imagens, foi feito o
trabalho de montagem, seguindo a ordem cronológica da viagem, que inicialmente seguiu as
sugestões dos moradores e depois a partir do que foi sendo encontrado em mapas e placas que
serviram de guia para os próximos locais visitados. Depois de estarem devidamente
encadeadas as imagens, utilizou-se do recurso de cartela de texto para fazer a ligação de
alguns pontos onde faltou uma relação na passagem de cenas (neste caso, de locais visitados),
dando assim coerência à ordem cronológica da viagem.
24
Acompanhando o raciocínio de Puccini (2009, p. 108) de que “o tempo das imagens
ficará submetido ao tempo da narração; o montador buscará imagens que acompanhem a
narração.”
De acordo com Melo (2002), “um documentário é construído ao longo do processo de
sua produção. Mesmo existindo um roteiro, o formato final se define após as filmagens, e a
conclusão dos processos de edição e montagem”. No caso do “Cidade Alternativa”, como não
houve a utilização de roteiro, o formato foi pensado ao longo da viagem e na hora da edição.
A música também tem papel importante na edição do “Cidade Alternativa”. “Lost
Highway”, da banda Bon Jovi, foi escolhida como música tema do trabalho, pela relação da
letra com o projeto apresentado. “Lost Highway” fala sobre uma viagem pelo desconhecido,
em busca do novo ainda a ser descoberto, assim como o “Cidade Alternativa”.
As outras músicas que também compõem a trilha sonora do programa documentário
são todas relacionadas a viagens e, no caso do pub “On The Road”, músicas que falam sobre
a Rota 66 e sobre o autor do livro, Jack Kerouac.
A proposta é, a longo prazo, produzir documentários até em outros países. Portanto,
ainda considerando-se o início do projeto, o programa seria produzido também em outras
cidades da região de Ribeirão Preto, no interior do Estado de São Paulo, passando por etapas
com mudança de Estado e posteriormente de país.
Bauru foi escolhida dentre os outros municípios, porque durante uma pesquisa sobre a
adaptação cinematográfica do livro “On The Road” de Jack Kerouac surgiu um anúncio sobre
um bar nesta cidade com o mesmo nome da obra, todo ambientado no cenário descrito pelo
autor, já no fim da década de 1950. Já que o presente projeto tem como inspiração tal livro, as
pesquisadoras julgaram propício e inspirador começar a jornada por esta cidade.
Durante a pesquisa prévia, foi verificado que Bauru fica a 209 quilômetros de Ribeirão
Preto e tem Zoológico, Jardim Botânico, Teatro Municipal, Parques, Shopping, Aeroclube,
Automóvel Clube, Museu Ferroviário, entre outros lugares.
5.1 “Cidade Alternativa” como documentário participativo
Bill Nichols (2009, p. 28) diz que “a tradição do documentário está profundamente
enraizada na capacidade de ele nos transmitir uma impressão de autenticidade”. É baseado
nesta ideia, que este projeto é definido como documentário do modo participativo, segundo
categorização feita pelo próprio autor e apresentada anteriormente.
25
Usando como exemplo primário o trabalho dos antropólogos, o teórico relaciona o
trabalho desses cientistas sociais com o de documentaristas que, “também vão a campo;
também eles vivem entre os nativos e falam de sua experiência ou representam o que
experimentaram” (NICHOLS, 2009, p. 153).
Neste tipo de documentário, que surgiu nos anos 1960, o documentarista além de estar
presente no local onde se passa o tema, ele participa da vida de outras pessoas, habitua-se e
reflete sobre o contexto do tema e como resultado, mostra exatamente o que vê, o que
aprendeu durante a experiência. No entanto, mantém certa distância do objeto principal. É um
trabalho que exige presença e observação.
Para Bill Nichols (2005, p. 153), “O documentário participativo dá-nos uma idéia do
que é, para o cineasta, estar numa determinada situação e como aquela situação
conseqüentemente se altera”, sendo que os tipos e graus de alteração colaboram para definir
variações dentro do modo participativo de documentário.
Nesses casos, o cineasta entra em cena e se torna um ator social como qualquer outro
apresentado no documentário, aqui fazendo entrevistas e dando sua calara opinião sobre os
lugares visitados. No entanto, ele tem certo controle por estar comandando a câmera e se
permite documentar apenas o que julgar necessário promovendo um encontro entre ele, que
está em posse da câmera, e alguém que não tem esse controle, deixando claro assim sua
opinião sobre o tema abordado.
Esse tipo de documentário também é chamado de “cinema verdade” porque mostra a
realidade como ela é e não como algo manipulado.
Em alguns casos, o documentário participativo coloca o cineasta como um pesquisador
ou um repórter investigativo que entra na história e se envolve com o desenrolar dos
acontecimentos. No entanto, em outras ocasiões, o cineasta deixa de lado a postura
investigativa e adota um comportamento mais receptivo e reflexivo em relação aos
acontecimentos que o envolve.
Esta última escolha nos leva em direção ao diário e ao testemunho pessoal. A voz
na primeira pessoa predomina na estrutura global do filme. É o engajamento
participativo do cineasta no desenrolar dos acontecimentos que prende nossa
atenção. (NICHOLS, 2005, p. 158)
Neste tipo de documentário é desnecessário o uso da voz over (que narra toda a
história), deixando de lado o anonimato e enriquecendo os comentários com vozes individuais
26
seja do cineasta que está em cena ou dos entrevistados. É um formato com maior apelo porque
enfatiza o engajamento do cineasta com o tema abordado.
Portanto, a teoria define fundamentalmente a metodologia utilizada na produção do
projeto “Cidade Alternativa”. As pesquisadoras se “infiltraram” em um ambiente
desconhecido por elas e utilizaram o conhecimento dos moradores e a curiosidade despertada
nelas para aprender sobre o local onde estavam e conhecê-lo melhor. Além disso, o
documentário expõe abertamente a opinião das documentaristas sobre os locais visitados
durante a jornada, seja esta expressão positiva ou negativa.
Os métodos e as práticas da pesquisa em ciência social permaneceram subordinados
à predominante prática retórica de comover e persuadir o público. [...] O
documentário participativo dá-nos uma ideia do que é, para o cineasta, estar numa
determinada situação e como aquela situação consequentemente se altera.
(NICHOLS, 2009, p. 153)
O “Cidade Alternativa” não tem nenhum tipo de vínculo com governantes ou terceiros
interessados em passar uma boa imagem da cidade, fortalecendo o objetivo de retratar a
opinião de cada participante envolvido na viagem e a documentação dela, dando a
oportunidade de o expectador, a partir disso, também formar seu próprio juízo de valor sobre
a cidade.
Baseando-se na teoria de Nichols, torna-se, então, imperativa a tentativa de persuasão
do público, durante a passagem de uma opinião, seja ela positiva ou negativa. Porém, como
exposto anteriormente, estas opiniões são de total autoria dos participantes e não relacionadas
a alguma instituição. O objetivo foi transmitir honestidade durante os depoimentos, sejam eles
de entrevistados ou das próprias pesquisadoras.
“Podemos ver e ouvir o cineasta agir e reagir imediatamente, na mesma arena histórica
em que estão aqueles que representam o tema do filme. Surgem as possibilidades de servir de
mentor, crítico, interrogador, colaborador ou provocador.” (NICHOLS, 2009, p. 155). Logo, a
atitude das documentaristas e diretoras e a necessidade de questionamentos foram definidas
ao longo da viagem dentro da cidade, de acordo com a receptividade de cada personagem
encontrado e com a curiosidade de cada uma em descobrir locais interessantes na cidade.
Para alcançar o objetivo com os moradores, foram utilizadas técnicas de entrevistas já
que segundo Bill Nichols (2009, p. 159) “a entrevista representa uma das formas mais comuns
de encontro entre cineasta e tema” e também a sensibilidade perante os fatos, relatos e lugares
encontrados.
27
O cineasta serve como pesquisador ou repórter investigativo. Em outros casos, a voz
do cineasta emerge do envolvimento direto, pessoal, nos acontecimentos, enquanto
eles ocorrem. [...] Em outros casos, distanciamo-nos da postura investigativa para
assumir uma relação mais receptiva com os acontecimentos que se desenrolam e que
envolvem o cineasta. Esta última escola nos leva em direção ao diário e ao
testemunho pessoal. A voz na primeira pessoa predomina na estrutura global do
filme. É o engajamento participativo do cineasta no desenrolar dos acontecimentos
que prende nossa atenção. (NICHOLS, 2009, p. 156 e 158)
Alguns exemplos de documentário participativo: “O homem da câmera”, de Dziga
Vertov e “Crônica de um verão”, de Jean Rouch e Edgar Morin.
5.2. A apropriação do jornalismo pelo documentário
O jornalista é um contador de histórias. Os preceitos básicos do jornalismo defendem,
além da linguagem clara e acessível, a objetividade. Mas, esta nem sempre está presente nas
narrativas jornalísticas. O texto é construído a partir de diferentes olhares e valores. E esses
pontos de vista podem caracterizar a subjetividade de cada notícia. Desde os critérios de
seleção até a escrita, a história passa pelo crivo de pessoas e instituições.
Assim como a reportagem, o documentário também conta histórias. O documentarista
não se preocupa com a imparcialidade como o jornalista, mas se apropria de técnicas de
apuração do jornalismo, como, por exemplo, o levantamento de dados e as entrevistas, para a
produção do “filme”, seja ele de ficção ou não ficção.
Em essência, segundo o teórico Nelson Traquina, o jornalismo trata do que acontece
ou aconteceu no mundo.
O principal produto do jornalismo contemporâneo, a notícia, não é ficção, isto é, os
acontecimentos ou personagens das notícias não são invenção dos jornalistas. [...]
Dever-se-ia acrescentar rapidamente que muitas vezes essa “realidade” é contata
como uma telenovela, e aparece quase sempre em pedaços. (TRAQUINA, 2004, p.
20)
No livro “Teorias do Jornalismo – Volume II – A tribo jornalística – uma comunidade
interpretativa transnacional”, Nelson Traquina destaca algumas características comuns entre
os jornalistas que servem de base para a prática da profissão. Ele destaca que esses
profissionais têm uma maneira de agir, de falar e de ver específica, com faro para o que é
interessante mostrar ao público.
Segundo Traquina (2005, p. 40 a 50), os jornalistas aprendem a lidar com o tempo
(geralmente apertado), além de serem profissionais que têm grande capacidade de controle de
28
ações, sabem reconhecer quando algo é importante, sabem contar algo dando destaque para o
que é importante e contam isso de forma a despertar o interesse do público. Além disso,
Traquina destaca a importância dos jornalistas saberem lidar com imprevistos.
Ainda de acordo com Traquina (2005, p. 44) citando Bárbara Phillips (1976/1993) “os
jornalistas são, por conseqüência, conhecedores não-teóricos que dependem de um contato,
concreto, em primeira mão, instintivo, com os acontecimentos”.
Bill Nichols (2008, p. 20) afirma que “quando acreditamos no que vemos é
testemunho do que o mundo é, isso pode embasar nossa orientação ou ação nele”. Os
diferentes tipos de documentários teorizam que a presença e a visão do cineasta pode ou não
ter como objetivo influenciar a opinião do espectador e o que é visto pode, ou não, ser ficção.
Alguns enfatizam a originalidade ou a característica distintiva de sua própria
maneira de ver o mundo: vemos o mundo que compartilhamos como se filtrado por
uma percepção individual dele [cineasta]. Alguns enfatizam a autenticidade ou a
fidelidade de sua representação do mundo: vemos os mundo que compartilhamos
com uma clareza e uma transparência que minimizam a importância do estilo ou da
percepção do cineasta. (NICHOLS, 2008, p. 20)
Portanto, é possível constatar que o documentário se apropria da essência do
jornalismo: contar uma história. Porém o gênero, já que é derivado dos filmes de ficção,
permite-se vagar pela imaginação do cineasta e divagar da chamada “realidade”, se assim for
desejado. Além disso, o documentário também permite a narração de uma história por meio
de um ou mais olhares.
Segundo Traquina,
A notícia, como recorda Patterson (1997), é uma forma de contar éstórias‟, e os
jornalistas querem „estórias‟ cativantes para contar. Os jornalistas discutem entre
eles temas ligados à forma de contar „estórias‟, questões sobre como contar uma
história, estilos e gêneros a usar (Zeliezer, 1993)”. (TRAQUINA, 2005, p. 22)
Assim como na citação de Traquina a Phillips, já que o documentário foi resultado de
um contato próximo e concreto com a cidade visitada tendo sido possível apenas a partir da
viagem em si se definir qual seria o resultado do trabalho que teve seu encaminhamento
determinado pelo feeling das documentaristas/jornalistas em perceber o que era interessante
ser documentado e conforme os acontecimentos se procediam.
Dessa forma, as documentaristas se basearam nas teorias jornalísticas deste teórico
quando foram a campo para a gravação do “Cidade Alternativa”, precisando, principalmente,
29
lidar com o imprevisto para descobrir locais para serem visitados e documentados e também
no momento da edição “contando” a viagem de forma interessante para atrair os espectadores.
O “Cidade Alternativa” é baseado no gênero participativo de documentário, no qual,
segundo Bill Nichols (2008, p. 153), os documentaristas vão a campo, “vivem entre os outros
e falam de sua experiência”.
Logo, no produto proposto, as agentes contam a “realidade”, as situações que
encontraram ao telespectador, narrando a história, descrevendo os acontecimentos e buscando
novos olhares como jornalistas, porém permitindo-se exprimir opinião e de alguma forma
integrar-se ao ambiente, como documentaristas participantes.
5.3. Técnicas de abordagem e entrevista
A entrevista tem importante papel na obtenção de informações para a realização do
“Cidade Alternativa”, já que o presente trabalho pretendia, além da investigação do local,
conversar com moradores locais para que destinos fossem descobertos e indicados na cidade
visitada pelas documentaristas, no caso do programa piloto: Bauru.
De acordo com o autor Nilson Lage (2003, p. 74 a 77), o procedimento de apuração
pode ser feito de quatro maneiras:
A) Ocasional: “é não programada - ou, pelo menos, não combinada previamente”. Segundo
Lage, essa modalidade pode produzir resultados interessantes, já que, o entrevistado não
estava preparado para um questionamento e “dará provavelmente respostas mais sinceras ou
menos cautelosas do que se houvesse aviso prévio”.
B) Confronto: “o repórter assume o papel de inquisidor, despejando sobre o entrevistado
acusações e contra-argumentando, eventualmente com veemência, com base em algum dossiê
ou conjunto acusatório”. Desta forma, a entrevista passa a ser um “espetáculo de
constrangimento” ou uma “peça de redenção”, dependendo de como conduzida pelo jornalista
e abordada pelo entrevistado.
C) Coletiva: um mesmo entrevistado é “submetido a perguntas de vários repórteres, que
representam diferentes veículos, em ambiente de maior ou menor formalidade”. Tal
modalidade é frenquente em eventos ou “quando há interesse geral por algum (ou alguns)
personagem(ns) que acaba(m) de participar ou de assistir a um evento interessante”.
Geralmente o evento é comandado pelo próprio entrevistado ou por um assessor de imprensa.
30
D) Dialogal: “é a entrevista por excelência. Marcada com antecipação, reúne entrevistado e
entrevistado e entrevistador em ambiente controlado”. As perguntas são previamente
estipuladas, mas a conversa não fica, necessariamente, reservada ao roteiro. Assim, “permitese o aprofundamento e detalhamento dos pontos abordados”.
Lage (2003, p. 78 e 79) destaca em seu livro “A reportagem: teoria e técnica de
entrevista e pesquisa jornalística” como a invenção do telefone e, mais recentemente, a
popularização da internet possibilitam que as entrevistas sejam feitas com agilidade. Porém, o
autor frisa que “a proximidade física permite uma aferição de resposta - um feedback - rápida,
visual e auditiva, corriqueira, a que nos acostumamos desde pequenos e que nos dá maior
segurança”.
Nilson Lage (2003, p. 74 e 75) também discorre sobre o objetivo das entrevistas,
teorizando que elas podem ser:
A) Ritual: “é geralmente breve. O ponto de interesse está mais centrado na exposição (da
voz, da figura) do entrevistado do que no que ele tem a dizer.” São situações em que se tenta
buscar algo no ambiente para “encontrar algo importante no que é declarado”.
B) Temática: “aborda um tema, sobre o qual se supõe que o entrevistado tenha condições e
autoridade para discorrer.” Uma pessoa, considerada referência no assunto, explica um
problema ou expressa uma opinião.
C) Testemunhal: “trata-se do relato do entrevistado sobre algo que ele participou ou a que
assistiu. [...] Em geral, esse tipo de depoimento [...] inclui informações a que teve acesso e
impressões subjetivas.”
D) Em Profundidade: o acontecimento não tem grande importância, mas sim “a figura do
entrevistado, a representação de mundo que ele constrói. [...] Procura-se construir uma novela
ou um ensaio sobre o personagem, a partir de seus próprios depoimentos e impressões.”
Para Lage (2003, p. 87), na televisão a entrevista pode ser categorizada como
ocasional e ao vivo; ocasional e gravada; produzida ao vivo e produzida em gravação. “Mais
do que em qualquer outro veículo, a entrevista televisiva devassa a intimidade do
entrevistado, a partir de dados como sua roupa, seus gestos, seu olhar, a expressão facial e o
ambiente.”
Portanto, acompanhando a proposta do presente projeto do programa documentário
“Cidade Alternativa”, as entrevistas feitas com os moradores são ocasionais, não sendo
previamente pautadas, e testemunhais, levando-se em consideração que os moradores
entrevistados indicam, para a visitação das documentaristas, locais que eles já visitaram e que
gostam, passando assim informações subjetivas sobre aquele local, dando a opinião deles de
31
que o lugar é bom para ser visitado. Tais depoimentos ajudam a moldar o itinerário das
documentaristas durante a filmagem.
No caso do programa piloto, filmado em Bauru, apenas a entrevista com o gerente do
pub “On The Road”, Amilcar, pode ser considerada uma entrevista dialogal, já que foi a
única previamente combinada, porém o objetivo foi manter a informalidade da ocasional e
também testemunhal, já que ele dá seu depoimento sobre a montagem do bar.
32
6. DIÁRIO DE VIAGEM
Sábado, 3 de setembro de 2010.
Com todos os equipamentos em mãos, a saída de Ribeirão Preto estava marcada para às
7h. O pé só tocou o acelerador às 7h20. O caminho era desconhecido, e foi uma surpresa tanto
o fato de que não há um posto (além dos destinados a caminhoneiros) no caminho e que a
pista entre Araraquara e Jaú tem péssimas condições, além de ser faixa simples na maior parte
do trajeto, a sinalização é precária e há tráfego constante de caminhões.
O trajeto de 209 km até Bauru foi completado em cerca de duas horas e meia, sem parada,
mas com direito a foto ao lado da placa. Logo de cara placas de sinalização apontavam que o
Zoológico não estava longe e este foi a primeira parada. De lá, o segurança, Nilson, nos
indicou pontos turísticos que, segundo ele, seriam interessantes, entre eles o Jardim Botânico.
Desde já, surgiu a dificuldade de diferenciar o independente do tradicional. Avançando na
narrativa, foi verificado que, para o nativo, não há idéia clara do que possa ser diferente e os
pontos turísticos tradicionais são os mesmo frequentados pelos próprios moradores.
No próprio Zoológico foi encontrado um painel com um mapa que continha os principais
pontos, turísticos ou não, de Bauru. Uma foto tirada deste mapa seria muito útil no futuro.
O próximo ponto de parada foi o Jardim Botânico, que fica próximo ao Zoológico. Depois
de explorado, uma funcionária do local, Sônia, indicou outro ponto de parada como uma
opção a ser conhecida, o museu ferroviário. No entanto, no meio do caminho, encontramos o
Teatro Municipal.
De lá, a estudante Bianca deu a dica do Parque Vitória Régia, que além de área verde,
também funciona como palco para apresentações culturais.
Já na hora do almoço, o cansaço falou mais alto e para satisfazer a fome de gostos
diferentes, o shopping foi a próxima parada escolhida, sendo encontrado pela sinalização
municipal.
No shopping as indicações dos moradores começaram a se repetir: Zoológico, Jardim
Botânico e, o favorito, o Parque Vitória Régia. Então, a foto do mapa de Bauru fez-se útil.
Próximo ao shopping está o Aeroclube, o destino seguinte do “Cidade Alternativa”.
Mais uma vez recorrendo ao mapa, e aos moradores perguntando direções, a viagem parou
no Museu Ferroviário, que estava fechado no horário em que chegamos lá.
Ao lado está uma antiga estação ferroviária abandonada, que se tornou uma parada
interessante, e um tanto quanto deprimente, pela magnitude da construção e do descaso. Um
destino que foi descoberto ao acaso, não estava no mapa e nem foi indicado.
33
De lá, o “Cidade Alternativa” seguiu sendo produzido na Praça Rui Barbosa, apontada no
guia, onde acontecia uma feira popular. Bem em frente está localizado o Museu do
Automóvel, prédio de arquitetura admirável, que também estava fechado.
Já era fim de tarde e o bar “On The Road” foi a penúltima parada. O cansaço parecia já
não existir e o fôlego era de quem havia acabado de começar a caminhada. O estabelecimento,
também fora do conhecimento geral, foi o único ponto já pré-definido da viagem, onde a
visita era obrigatória, já que o livro de Jack Kerouac é uma das inspirações para o projeto. Um
contato prévio, o único de toda a viagem, possibilitou que o local fosse aberto fora do horário
de funcionamento (às sextas-feiras e vésperas de feriado).
Questionado sobre onde era feito o tradicional Bauru, o lanche de presunto, mussarela,
rosbife, tomate e picles (os dois últimos discretamente dispensados pelas documentaristas), o
gerente do pub “On The Road”, Amilcar, indicou o bar Skinão como sendo o mais tradicional
da cidade e o mais famoso estabelecimento onde se pode encontrar o lanche com o nome da
cidade e nos mostrou o caminho até o local. Lá, Jacir, que aprendeu a fazer o sanduíche há
mais de 30 anos, preparou um especialmente para o “Cidade Alternativa” que já estava,
literalmente, com a bateria no vermelho, precisando assim encerrar o programa.
Pé na estrada, era hora de comer o lanche a caminho de Ribeirão Preto e descansar depois
de um dia inteiro desvendando Bauru.
Sábado, 3 de setembro de 2010 às 21h40, chegamos em casa.
6.1 Mudança de Rota
Apenas a experiência prática proporcionou que os fundamentos e objetivos do projeto
fossem esclarecidos. No encontro com a cidade, o alternativo que se pretendia encontrar foi
colocado a prova mostrando que a realidade local era diferente do que anteriormente
imaginado pelas documentaristas.
O que foi visto em Bauru não era tão alternativo quanto o esperado já que os locais
considerados tradicionais pontos turísticos da cidade são os mesmos locais frequentados pelos
moradores, fazem parte do cotidiano deles e, portanto, estes não passaram opções de rotas e
pontos turísticos tão alternativos quanto o esperado, locais que somente eles frequentam e que
escapam do radar de visitantes que chegam à cidade dispostos a conhecê-la de forma
tradicional.
34
Em determinado ponto da viagem, as indicações começaram a se repetir e, para a
produção foi necessário, aí sim, uma saída alternativa: a utilização de um mapa encontrado na
própria cidade. Uma foto foi tirada desse mapa encontrado na primeira parada do “Cidade
Alternativa” e quando as indicações dos moradores começaram a se repetir, as
documentaristas passaram a utilizar as indicações visuais desse item para encontrar novos
pontos para serem visitados.
Portanto, este trabalho conclui que a intenção é “investigar” a cidade, tanto utilizando o
conhecimento dos moradores, como também certo “instinto curioso” de procurar mais e assim
descobrir locais alternativos não se baseando somente em roteiros tradicionais nem só nas
indicações dos moradores.
O objetivo do “Cidade Alternativa” é, não apenas dar dicas e opiniões sobre locais
visitados, mas também estimular os telespectadores a fazerem o mesmo: explorar para
conhecer determinadas cidades e seus pontos turísticos por meio da visão dos moradores e da
curiosidade despertada ao longo do trajeto.
35
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O documentário “Cidade Alternativa”, ao longo de todo o processo de montagem,
tornou-se um programa viável para transmissão televisiva ou via internet. O objetivo do
projeto de produzir um vídeo que mostrasse a visita a uma cidade, até então desconhecida
pelas documentaristas, foi cumprido. Verificando também que é viável criar um programa
documentário sem produção e roteiro, buscando formas alternativas de encontro com o real.
Bauru, a 209 km de Ribeirão Preto, foi escolhida para a realização do projeto piloto
pela existência do pub “On The Road”, uma homenagem à obra de Jack Kerouac, que
também serviu de inspiração para as documentaristas no planejamento do presente trabalho.
Pode-se considerar que o objetivo de explorar a característica literária impulsiva foi
alcançado, visto que todo o programa foi gravado conforme os acontecimentos, sem a
elaboração de um roteiro prévio, tanto roteiro de gravação quanto de viagem.
Teoricamente, o trabalho baseia-se nas definições de Bill Nichols (2008) sobre
documentário, sendo o gênero participativo o escolhido para a apresentação da narrativa
incluindo, assim, tanto documentaristas como espectadores na mesma jornada de exploração
da cidade em questão. O recurso da “câmera olho”, inspirado no filme “Fix” (2008), é
essencial para tal inclusão. Desta forma, permite-se liberdade para exprimir opinião, seja ela
positiva ou negativa, e também não há imposição de padrão estético.
Parte da viagem é orientada pelas entrevistas realizadas com personagens encontrados
nos locais. A prática da entrevista, considerada a essência do jornalismo, de acordo com
Nilson Lage (2003) é feita de forma espontânea e consiste no relato dos moradores sobre a
própria cidade onde vivem. A curiosidade das documentaristas também é essencial para
mapear o caminho, principalmente a partir de determinado ponto, quando as indicações dos
moradores passaram a se repetir, levando-as a lugares que foram descobertos, e não indicados
previamente.
A ideia do “Cidade Alternativa” amadureceu do primeiro para o quarto ano de
faculdade, assim como as próprias documentaristas, possibilitando que o projeto pudesse
concretizar-se de acordo com os propósitos e da melhor maneira possível. Por ser uma série
de programas documentários, o projeto está aberto e sujeito a mudanças para que, assim como
aconteceu há quatro anos, a ideia seja ainda mais trabalhada e ajustada conforme as
necessidades. Assim como a estrada, ele tem inúmeras possibilidades.
36
BIBLIOGRAFIA
BOFFETTI, Valdir e VARGAS, Heydi. O documentário: de sua história à produção no
curso de Jornalismo. Revista Estudos de Jornalismo e Relações Públicas, dezembro de 2007,
ano 5, número 10.
LAGE, Nilson. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. Rio
de Janeiro: Editora Record, 2003.
MELO, Cristina Teixeira Vieira de. O Documentário como Gênero audiovisual.
INTERCOM – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXV
Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Salvador/BA – setembro 2002.
MELO, Cristina Teixeira V. de, GOMES, Isaltina Mello e MORAIS, Wilma. O
documentário jornalístico, gênero essencialmente autoral. INTERCOM – Sociedade
Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXIV Congresso Brasileiro de
Comunicação – Campo Grande/MS – setembro 2001.
NICHOLS, Bill. Introdução do documentário. Campinas, São Paulo: Papirus, 2009.
OLIVEIRA, Ana Paula Silva, ROLDÃO, Ivete Cardoso do Carmo e BAZI, Rogério Eduardo
Rodrigues. Documentário e video-reportagem: uma contribuição ao ensino de
telejornalismo. 9º Fórum Nacional de Professores de Jornalismo. Disponível em:
http://www.fnpj.org.br. Acessado em 18 outubro 2011.
PUCCINI, Sérgio. Roteiro de documentário: Da pré-produção à pós-produção. Campinas,
São Paulo: Papirus, 2009.
RAUPP, Fabiano M. e BEUREN, Ilse M. Como Elaborar Trabalhos Monográficos de
Contabilidade. 3ª Edição. São Paulo: Editora Atlas, 2006. Pg. 14 e 15. Disponível em:
<http://www.geocities.ws/cienciascontabeisfecea/estagio/Cap_3_Como_Elaborar.pdf>.
Acessado em 06 de junho de 2011.
37
TRAQUINA, Nelson. Teorias do Jornalismo- Volume I - Porque as notícias são como
são. Florianópolis: Editora Insular, 2004.
TRAQUINA, Nelson. Teorias do Jornalismo. Volume II - A tribo jornalística – uma
comunidade interpretativa transnacional. Florianópolis: Editora Insular, 2005.
38
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular. São Paulo: Perspectiva, 1976.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2002.
LOPES, Maria Immacolata Vassalo. Pesquisa em Comunicação. São Paulo: Loyola, 2005.
GILLMOR, Dan. Nós, os media. Lisboa: Editorial Presença, 2005.
GODOY, Hélio. Documentário, realidade e semiose: os sistemas audiovisuais como
fontes de conhecimento. São Paulo: Annablume: Fapesp, 2001.
JENKINS, Henry. Cultura da convergência. São Paulo: Alephe, 2009.
MARNER, Terence St. John. A realização cinematográfica. Lisboa: Edições 70, 1989.
RAMOS, Fernão Pessoa e CATANI, Afrânio (orgs.). Estudos de Cinema SOCINE 2000.
Porto
Alegre:
Editora
Sulina,
2001,
pp.
192/207.
Disponível
em:
http://www.bocc.ubi.pt/pag/pessoa-fernao-ramos-o-que-documentario.pdf (acessado em 18 de
setembro de 2011).
RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Editora
Atlas, 2007.
SERRA, Floriano. A Arte e a Técnica do Vídeo: Do Roteiro à Edição. São Paulo: Summus,
1986.
TRAMONTINA, Carlos. Entrevista – A arte e as histórias dos maiores entrevistadores da
televisão brasileira. São Paulo: Editora Globo, 1996.
YIN, Robert. Estudo de caso. Porto Alegre: Bookman, 2002.

Documentos relacionados