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Diretores executivos são ridicularizados pelos altos salários: por que com atletas e artistas não acontece o mesmo? Oprah Winfrey. Michael Jordan. Richard Grasso. O que estas três pessoas têm em comum? Todas ganharam quantias astronômicas de dinheiro, embora somente uma delas tenha recebido abertamente críticas e zombarias por isto. Grasso, ex-presidente da Bolsa de Valores de Nova Iorque, é apenas o mais recente dos vários executivos atacados por suas remunerações exageradas. Certamente muitos dos diretores executivos que estão sob fogo cerrado – Kenneth Lay da Enron, Dennis Kozlowski da Tyco e Bernie Ebbers da WorldCom para citar alguns exemplos – conduziram suas empresas de modo supostamente contrário aos interesses de um amplo espectro de elementos, entre os quais encontram-se acionistas, empregados e clientes. Não surpreende que estejam se revezando na berlinda. Mas Grasso, que só recentemente foi investigado por possível tráfico de influência durante sua permanência na NYSE, tem sido ridicularizado sobretudo por convencer seu conselho de diretores de que merecia todo aquele dinheiro – US$ 187,50 milhões de remuneração diferida – que lhe concederam. Certamente Jack Welch, o antigo presidente do conselho de administração da General Electric Co., foi responsável pela valorização das ações durante sua permanência na empresa, mas até mesmo ele agora está sendo criticado por ganância excessiva. Atores, atletas e executivos encontram-se entre a maioria dos participantes do seleto grupo de pessoas com rendas multimilionárias. Então, por que os executivos de corporações estão sujeitos ao fogo cerrado das críticas por pagamentos exorbitantes, quando atletas como Michael Jordan e artistas como Oprah Winfrey não parecem despertar tanta indignação? De fato, Winfrey é adorada por milhões de pessoas, muitas delas mulheres com rendimentos inferiores à media, e Jordan é respeitado e admirado por outros tantos milhões, entre eles muitos homens também com rendimentos abaixo da média. ‘Eu poderia fazer isso’ Parte da resposta, sugerem alguns especialistas, é a própria natureza das diferentes atividades. A atividade dos atletas e artistas é claramente visível para os seus admiradores. As estrelas, por exemplo, têm talento e presença tais que milhões de pessoas afluem aos teatros para vê-las e os atletas apresentam desempenhos tão surpreendentes na quadra de basquete ou no campo de futebol que os torcedores reconhecem não serem capazes de realizar nem em seus sonhos mais loucos. Os diretores executivos, por outro lado, geralmente têm dificuldades para demonstrar exatamente que benefício trazem para o grupo. “As pessoas obtêm um benefício direto a partir da atividade dos artistas”, diz Peter Fader, professor de marketing da Wharton. “A vida melhora graças aos artistas e existe uma admiração genuína por suas habilidades especiais. As pessoas olham para eles e dizem, ‘Puxa, eu gostaria de ser como esta pessoa, gostaria de ter este talento’. Mas quando as pessoas observam os administradores tendem a dizer, ‘Eu seria capaz de fazer isto’.” Fader acrescenta que os artistas e os atletas também possuem uma aura exagerada que faz com que os admiradores esqueçam – e até aplaudam – aquilo que em pessoas comuns, incluindo-se aí os executivos, pareceria pretensioso ou mesmo escandaloso. “É interessante observar como as pessoas comuns colocam as coisas em contextos diferentes. Se uma atriz desce de uma limusine, não surpreende, mas quando o mesmo acontece com um executivo, considera-se um exagero.” O professor de contabilidade da Wharton David F. Larcker, especialista em remuneração de executivos, afirma que é comum as pessoas compararem os salários dos executivos às remunerações pagas a atores e atletas para justificar as altas remunerações dos diretores executivos. Mas ele alega que os mercados para atores, atletas e executivos são diferentes e não funcionam suficientemente bem para que as comparações sejam válidas ou para garantir que se estabeleçam níveis de pagamentos corretos em cada um destes grupos. Dos três setores, segundo Larcker, o de entretenimento parece ser o mais transparente e eficiente. “Os artistas permitem que se veja, de fato, o que está sendo produzido. Existe um mercado no qual Julia Roberts ou George Clooney recebem de US$ 10 milhões a US$ 20 milhões por filme. Mas é uma indústria implacável. Kevin Costner era muito, mas muito bom mesmo, em um determinado nível, na faixa de US$ 5 milhões a US$ 10 milhões por filme. Mas agora saiu de cena e está tendo grandes dificuldades para arranjar trabalho. Este mercado funciona. Se você não está fazendo bilheteria, está arruinado.” Os atletas profissionais também sujeitam seus desempenhos ao julgamento público, mas são pagos diretamente pelo proprietário do time que nem sempre entra na jogada em busca de dinheiro. “Às vezes é uma espécie de hobby para o proprietário do time, em geral uma pessoa rica”, declara Larcker. “Eles podem querer uma determinada pessoa, com um determinado talento e podem querer lhe pagar grandes somas de dinheiro. A questão é se esse mercado de trabalho funciona realmente, o que é bastante discutível. Vê-se que o valor das franquias aumenta com o tempo, portanto deve haver algum benefício para os proprietários, mas os dados financeiros são todos acumulados e é difícil saber qual é o seu lucro.” Kenneth Shropshire, chefe do departamento de estudos jurídicos da Wharton e ex-agente de esportes, responde que os atletas não ficam imunes à raiva dos fãs quando seus desempenhos não são os esperados. Entre outras coisas, todo mundo sabe quanto os jogadores ganham, o que passa a fazer parte da avaliação da qualidade real do esportista feita pelo torcedor. A natureza estatística de muitos esportes profissionais também contribui para a avaliação minuciosa dos jogadores. “Muitos estatísticos vão publicar dados de ‘dólares-por-toque’ ou ‘dólares-por-passes’”, diz ele. E ultimamente os fãs podem votar, mediante os ingressos pagos, no tipo de valor que o talento coletivo de um time proporciona. Uma nova lista de melhores e piores Um exemplo da avaliação cuidadosa de atletas pode ser encontrado no site da revista Forbes, Forbes.com, que anualmente classifica o desempenho e a remuneração dos jogadores da liga profissional norteamericana de beisebol. Este ano foi incluída uma análise de custo-benefício, chamada de “The Best Pitchers for the Money”, que classificou estes jogadores a partir dos salários e desempenhos em 2002. O jogador mais bem colocado? Roy Edward Oswalt, um jogador de 25 anos do Mississipi, destro, relativamente desconhecido, que está jogando no Houston Astros com um recorde de 34-13 durante três anos e um salário de apenas US$ 500.000. O pior? O arremessador do Colorado Rockies, Mike Hampton, que teve escassas 7 vitórias em 2002 e terminou vendido para o Atlanta, apesar de um salário de US$ 12 milhões em 2003. E, naturalmente, é a vez do New York Yankees passar pelo vexame da derrota para o Florida Marlins, no World Series. Na cobertura deste evento a mídia tem comentado bastante a grande discrepância entre a folha de pagamentos anual do Marlins, de US$ 52 milhões, e a do Yankees, estimada de diferentes modos entre US$ 157 e US$ 185 milhões. Mais especificamente, o arremessador Josh Beckett do Florida Marlin recebe cerca de US$ 1,7 milhão enquanto o arremessador Andy Pettitte, do Yankees, ganhou cerca de US$ 11,5 milhões na última temporada. O professor de marketing da Wharton, David Reibstein, observa que o dono do Yankee, George Steinbrenner, depois da derrota de seu time, foi largamente citado por ter ameaçado alguns jogadores com o corte. Reibstein diz que os salários dos atletas “se ressentem muito” quando um jogador ou time não consegue ganhar, principalmente no beisebol. “Em parte porque muitas pessoas já jogaram beisebol e acham que entendem do assunto. Elas poderão dizer para si mesmas, ‘Eu não sou capaz de enterrar uma bola no basquete e não peso 135 quilos, mas não vou deixar que ninguém me faça de bobo’, mas são pessoas que jogaram beisebol.” Além disso, os fãs – conscientes do aumento dos preços dos ingressos e das concessões – correlacionam diretamente estes preços com os crescentes salários dos jogadores que pagam para assistir, afirma Reibstein. “Estes salários saem do bolso das pessoas e elas se revoltam com isso.” Por outro lado, diz ele, a maioria das pessoas não sabe quem é o presidente da Procter & Gamble nem quanto ele ganha e provavelmente não vêem nenhuma ligação entre sua remuneração e o preço de um tubo de dentifrício Crest. De qualquer modo, no que diz respeito à remuneração dos executivos, Larcker teme que o mercado destes talentos possa não estar funcionando muito bem. “Como economista, a gente observa a situação e pensa que, se esse mercado de trabalho funciona bem, então as pessoas recebem o que recebem e tudo bem. Mas será que é isso o que está acontecendo? Não se trata de um mercado que envolve transações imparciais ou muitas transações. Muitas vezes trata-se de amigos que contratam amigos.” Certamente está crescendo o número de pessoas que questionam se os diretores executivos que administram ou têm ações das empresas onde trabalham merecem o que recebem de remuneração – e chegam à conclusão de que não merecem. “Acho que a maioria das pessoas acredita que nas grandes empresas estas pessoas ganham excessivamente em comparação com o valor que criam”, afirma Larcker, “mas é difícil fazer uma afirmação abrangente. Há profissionais como Bill Gates ou Michael Dell que têm feito grandes coisas a partir do zero e a maioria das pessoas concordaria que eles merecem ser muito bem pagos. Em contrapartida, há inúmeros executivos cujas atuações decididamente não estão claras.” Weill versus Grasso O contraste entre os executivos que criaram valor palpável para o acionista durante seus anos de gestão e aqueles que receberam altos salários e têm pouco a apresentar em troca pode ser visto nas diferentes impressões causadas por Sanford Weill, o diretor executivo do Citigroup recentemente aposentado, e Richard Grasso, que se demitiu em meio às revelações de que teria recebido mais de US$ 187,50 milhões em remuneração diferida. Ambos vieram das ruas de Nova Iorque e iniciaram suas carreiras como empregados de escritório na Wall Street: Weill na Bear Stearns e Grasso na Bolsa de Nova Iorque. Weill utilizou essa experiência para iniciar, e logo perder, um império financeiro, e depois insistiu em criar um segundo império que resultou na criação do Citigroup. Grasso, por outro lado, permaneceu na NYSE, aprendendo as complexidades da Bolsa e fazendo contatos que no final o levariam à presidência. No ano passado Weill esteve sob investigação por intervir pessoalmente na colocação dos filhos de Jack Grubman, considerado uma estrela entre os analistas de telecomunicações, em uma pré-escola de prestígio em Nova Iorque, exatamente quando Grubman mudava sua opinião sobre a AT&T em uma licitação fictícia para conseguir da empresa o negócio de investimento bancário. Weill foi exonerado, mas proibido pelos órgãos reguladores de falar diretamente com os analistas de valores mobiliários de sua empresa, exceto na presença de terceiros. Grasso, enquanto isso, presidia a Bolsa de Valores de Nova Iorque e angariava reconhecimento por ter reiniciado seu funcionamento rapidamente depois do 11 de setembro de 2001, data do ataque terrorista ao World Trade Center. Atualmente, apesar de sua aposentadoria como diretor executivo do Citigroup, Weill continua sendo influente na empresa, onde continua trabalhando como presidente, desfrutando da grande fortuna que acumulou juntamente com os acionistas que investiram em suas empresas. Ele é visto como um dos maiores filantropos do país, tendo doado milhões de dólares ao Carnegie Hall e à Cornell Medical School. Grasso, entretanto, demitiu-se de modo humilhante depois da revelação do recebimento de uma dinheirama que lhe foi oferecida por um conselho de administração formado por diretores executivos de muitas empresas que a Bolsa de Valores de Nova Iorque deveria controlar. O ex-vice-presidente do Citigroup, John Reed, entrou para reformular toda a estrutura operacional da Bolsa em meio à preocupação sobre sua sobrevivência na forma como funcionava. “Sandy Weill tem seus defeitos, mas nunca houve qualquer dúvida de que a criação de valor para os acionistas tivesse sido e ainda fosse seu objetivo de vida”, assegura Monica Langley, uma repórter do Wall Street Journal que publicou recentemente uma biografia da carreira clamorosa de Weill chamada Tearing Down the Walls: How Sandy Weill Fought His Way to the Top of the Financial World …. and Then nearly Lost It All. “Qualquer um que tenha estado com ele desde o início ou que tenha investido em suas empresas desde o começo é muito rico. Ele tem sido muito bem pago mas, em geral, juntamente com os acionistas do Citigroup.” Grasso, porém, criou valores dificilmente perceptíveis durante sua carreira e assumiu poucos riscos. “Por certo, a Bolsa de Valores de Nova Iorque é uma parte crucial da economia, mas o que foi que ele fez para aumentar seu valor?” pergunta Larcker. “É difícil imaginar que Grasso, que é sobretudo um controlador, seria tão bem pago quanto os banqueiros de investimentos que têm milhões de dólares em investimentos de risco no mundo inteiro.” Grande parte da remuneração de Grasso era diferida, o que é outro ponto que está despertando a fúria dos acionistas, empregados e outros membros importantes da corporação. Jack Welch se aposentou da GE cercado de reconhecimento e foi unanimemente tido como um dos maiores diretores executivos de todos os tempos. Mas depois, como parte de uma amarga guerra de divórcio, sua pródiga remuneração de aposentadoria e seus benefícios generosos foram revelados e, de repente, ele se viu descendo do alto pedestal em que se encontrava. O problema, diz Larcker, é que enquanto a remuneração direta anual é bem divulgada, a remuneração diferida geralmente é obscura e raras vezes vem à luz. “Acho que se você trabalhou bem, merece ganhar muito”, assegura ele. “Mas depois que você sai, pronto, é esquecido. O que enfurece as pessoas é o tipo de remuneração dissimulada que se vê. Não acho que as pessoas invejem o dinheiro que Welch conseguiu ganhar como diretor executivo. Mas eis aqui um tipo que acumulou somas inacreditáveis de dinheiro, para quem os acionistas descobriram que ainda estão … pagando o apartamento, a viagem e até mesmo os ingressos para os jogos do Knicks.” Devido aos escândalos contábeis como os da Enron, da WorldCom e da Tyco, os comitês de auditoria de vários conselhos diretores estão sendo pressionados a fazer um trabalho melhor. Larcker acha que as questões relativas a pagamentos de executivos irão em breve fazer com que se coloque a mesma atenção nos comitês de remuneração. “As pessoas continuam investigando os comitês de auditoria, mas os próximos a ficar na mira são os comitês de remuneração”, diz ele. “Freqüentemente eles levam seus consultores a realizar uma pesquisa sobre níveis de pagamento em outras empresas para poderem se situar no mercado. Essa justificativa é bastante medíocre. É hora de os comitês de remuneração justificarem com maior rigor porque pagam o que pagam aos executivos”.