calculadoras gráficas como auxiliar didático no ensino de

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calculadoras gráficas como auxiliar didático no ensino de
CALCULADORAS GRÁFICAS COMO AUXILIAR DIDÁTICO
NO ENSINO DE MATEMÁTICA PARA AS ENGENHARIAS
Yuriko Yamamoto Baldin1 e Nelio Baldin2
Universidade Federal de São Carlos 1
Departamento de Matemática
Rod. Washington Luiz km 235
13565-905, São Carlos, SP
[email protected]
Universidade Federal de São Carlos 2
Departamento de Matemática
Rod. Washington Luiz km 235
13565-905, São Carlos, SP
[email protected]
Resumo. Dentro do Projeto REENGE, as novas metodologias introduzidas no Ensino de
Matemática para os Cursos de Engenharia da UFSCar utilizam fortemente programas
computacionais como Maple, Matlab e outros em salas de aula informatizadas, e têm contribuído
para a modernização dos nossos cursos. Porém, a utilização das salas de aula informatizadas
possui algumas limitações como número grande de alunos numa turma, turmas no mesmo horário,
alto custo de manutenção, etc. Neste contexto, as calculadoras gráficas se apresentam com
características próprias que as tornam muitas vezes uma alternativa para suprir a falta de sala
informatizada, e também equipar com custo mais baixo os alunos com instrumento que se comporta
como um computador. Além disso, é importante observar que o uso de calculadoras permite
desenvolver novas metodologias de ensino para dinamizar as aulas teóricas e de laboratório, vindo
somar à metodologia em prática através de computadores. O objetivo deste trabalho é apresentar a
pesquisa que estamos realizando nesta linha e discutir algumas das características da calculadora
TI-92 plus da Texas Instruments como auxiliar didático no Ensino de Matemática para as
Engenharias. Analisaremos alguns exemplos, discutindo o contexto em que seriam desenvolvidos e
também comparando situações de utilização pelo computador e pela calculadora.
Palavras-chave: Calculadora gráfica, Ensino com tecnologia, Ensino integrado.
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1.
INTRODUÇÃO
A metodologia de ensino de disciplinas básicas de Matemática e Física para os cursos de Engenharia da
UFSCar com uso da tecnologia provocou nos últimos anos uma mudança tanto entre os professores das disciplinas
básicas como dos professores das disciplinas profissionalizantes, no sentido que o uso da tecnologia no ensino não é
mais uma novidade, mas uma ferramenta valiosa para alcançar os objetivos de ensino.
Dentro do Subprograma de Melhoria da Infraestrutura de Disciplinas Básicas para os Cursos de Engenharia do
Projeto REENGE-UFSCar o Departamento de Matemática vem contribuindo com a pesquisa sobre “métodos
inovadores de ensino com o uso da informática”. Tendo em princípio que os processos de remodelação do ensino para
os futuros engenheiros precisam iniciar-se no ano de ingresso, os efeitos das primeiras atividades deste Subprograma,
iniciadas há 4 anos, começaram a se manifestar nos anos mais recentes, modificando o perfil dos alunos que chegam às
disciplinas profissionalizantes do seu Curso, mais abertos à utilização de recursos tecnológicos nos estudos.
Na fase inicial do projeto REENGE, trabalhamos com uma sala informatizada com 28 microcomputadores em
rede interna, onde os primeiros projetos da equipe de professores foram implementados. Após os primeiros anos de
implementação de novas metodologias, cujos relatos estão divulgadas nos congressos, as experiências foram se
consolidando, permitindo numa outra fase do Projeto REENGE a montagem de mais duas salas de aula informatizadas
para os Departamentos de Engenharia Química e de Engenharia de Materiais, tornando uma realidade também para os
professores de disciplinas profissionalizantes trabalhar didaticamente em ambiente informatizado.
Portanto a concepção de uso de equipamentos de informática apenas como auxiliar nos laboratórios
especializados de cada curso começou a ser modificada, acrescentando a exploração do potencial didático de uma sala
de aula informatizada.
Este fato constitui um indicador positivo na direção de que um dos objetivos do projeto REENGE de mudança
conceitual sobre as aulas tradicionais está sendo trabalhado num processo progressivo. Por outro lado, como mais
professores estão adotando a inclusão de atividades de laboratórios nas suas aulas, isto gera uma demanda cada vez
maior de salas de aula equipadas, e o conflito de horários e a sobrecarga dos equipamentos se tornam inevitáveis.
Neste contexto, o surgimento das modernas calculadoras gráficas com capacidades modeladas para utilização
como auxiliar didático abre novas perspectivas para o andamento do projeto. Não estamos falando de calculadoras
científicas poderosas que já se tornaram ferramenta básica dos engenheiros como as HP’s, mas sim de calculadoras com
objetivos educacionais como as da Texas Instruments, Casio, etc. Estas têm potencial e capacidades comparáveis às de
um computador de modo que uma utilização com sabedoria poderia substituir uma sala de aula informatizada na sua
falta, ou ainda abrir caminhos para novas metodologias de ensino enriquecendo as aulas tradicionais.
Baseados na nossa experiência com a utilização do programa Maple V no ensino de disciplinas básicas de
matemática, estamos iniciando os experimentos didáticos com a calculadora gráfica TI-92 plus da Texas Instruments.
Neste trabalho, analisamos a calculadora gráfica TI-92 plus sob o ponto de vista da exploração de novas
possibilidades no ensino, e o objetivo principal é apresentar considerações a respeito da aplicabilidade de seus
programas em situações de ensino e de comparações com o uso do Maple.
2.
O PAPEL DAS CALCULADORAS NO ENSINO
As mudanças provocadas no ensino das disciplinas básicas de Matemática para as Engenharias são muito
importantes, devido ao fato que o uso da tecnologia permite a modelagem de problemas com dados mais próximos da
realidade e possibilita a realização de atividades experimentais que dão suporte aos conceitos e teorias tradicionalmente
considerados abstratos pelos alunos. Um melhor aproveitamento das disciplinas básicas influi na formação de futuros
engenheiros.
O computador como auxiliar didático trouxe novas possibilidades de ensino e são vários os métodos de sua
utilização. Essencialmente podemos destacar três maneiras de participação da tecnologia no processo de ensinoaprendizagem de Matemática:
a) numa aula teórica tradicional, quando o professor faz uso da tecnologia para ilustrar a sua aula;
b) num laboratório, onde alunos aprendem a utilizar equipamentos e programas para resolução de problemas,
para fixação de conteúdo já tratado, ou ainda para explorar possibilidades em torno de um problema e
desenvolver projetos;
c) numa sala de aula informatizada onde o conteúdo pode ser desenvolvido com a participação dos alunos
através do uso de programas computacionais.
Como auxiliar do professor para uma aula tradicional, expositora e teórica, o uso combinado de computador e
projetor multi-mídia traz possibilidades para o professor de melhorar a profundidade e a adequação dos exemplos e
resultados discutidos, e neste caso o aluno não é participante ativo do uso de tecnologia.
O uso de laboratórios para estudo dos alunos já está sendo bastante adotado em muitas escolas, e contribui de
maneira significativa para mudar o conteúdo e a forma das avaliações.
Ambos os aspectos acima se relacionam às mudanças que são provocadas nas tradicionais práticas de ensino e
aprendizagem, porém o uso de sala informatizada para desenvolver novas metodologias de ensino é a novidade que a
tecnologia trouxe ao cenário de ensino-aprendizagem e que oferece os maiores desafios de pesquisa nesta nova linha.
Podemos citar como exemplos de pesquisa metodológica nesta linha: o ensino através de folhas de exercício
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eletrônicos, instrução programada através de hipertextos, desenvolvimento de novos softwares, ensino à distância, uso
de sites educacionais da Internet, etc.
As salas informatizadas mudam a postura do aluno de passiva para ativa e aumentam as possibilidades de
exploração de novos exemplos e resolução de problemas diferentes, provocando uma aprendizagem mais dinâmica.
Porém, o alto custo da instalação e manutenção de salas informatizadas têm como conseqüência mudanças mais lentas
que as desejáveis nas nossas salas de aula. Com um número grande de alunos e poucas salas equipadas, não é possível
em geral planejar mais de 4 ou 5 sessões de laboratório por semestre, para cada disciplina. E é nestas sessões que o
aluno estaria efetivamente aprendendo a utilizar a tecnologia para compreender os conceitos abstratos e desenvolver os
exemplos mais significativos.
Além das aulas informatizadas, quando o aluno possui um computador pessoal, ou tem acesso regular a um
laboratório de graduação, então o computador e os programas educacionais exercem um papel destacado no processo
de aprendizagem.
As novas metodologias de ensino que utilizam a tecnologia têm efeito diminuído se as aulas de laboratório não
são acompanhadas desta fase de estudo individual e de pesquisa de projetos. E esta realidade de ensino é difícil de se
conseguir apenas com poucas salas de acesso restrito.
Neste contexto queremos colocar o potencial didático das calculadoras gráficas como mais um recurso
tecnológico que, somado aos programas de computador, significarão novos avanços no processo de ensinoaprendizagem.
Em B.K. Waits and F. Demana [1], os autores expõem claramente o impacto que a introdução das calculadoras
gráficas trouxe no cenário do ensino de matemática após os projetos iniciais baseados no uso de computadores pessoais,
justamente se referindo à dificuldade de acesso freqüente dos alunos aos computadores e a posterior diferença causada
pela posse de calculadoras que se portam como computadores. Na Ref.[1] encontramos a observação de que “as
calculadoras gráficas herdaram dos computadores as experiências sucedidas e tornaram-nas acessíveis a um número
muito maior de estudantes”. Também de acordo com eles, “as mudanças no ensino podem ocorrer se colocar os
instrumentos com potencial de mudança nas mãos de cada estudante”. Uma das considerações que aparece na página 6
da Ref.[1] sobre o papel das calculadoras gráficas se refere a resultados positivos sobre a aprendizagem de alunos que
tiveram um equilíbrio entre as atividades tradicionais combinadas com as atividades com calculadoras, regularmente
durante as aulas tradicionais.
Neste sentido, as calculadoras gráficas como a TI-92 plus (cerca de 350 dólares a unidade, em 2001) permitem
tornar cada sala de aula tradicional em uma sala informatizada com relativo baixo custo com os equipamentos portáteis
e independentes da instalação elétrica, e se usada por cada aluno em conjunto com o professor durante o
desenvolvimento de uma aula teremos a possibilidade real de integrar o ensino e a aprendizagem num processo
dinâmico.
Estamos colocando as calculadoras gráficas como uma opção eficiente para completar os três aspectos do papel
da tecnologia no cenário de ensino de Matemática, citadas no início desta seção.
3.
A CALCULADORA TI-92 PLUS
Vamos citar algumas das características que observamos nesta calculadora que a tornam adequada para ser
usada como complementar das metodologias com computador, e que não são evidentes ou não constam do manual da
mesma.
A mais atraente das características é precisamente, além da sua portabilidade, o fato de ser um pequeno
computador com sistema de computação algébrica baseada no Derive e o programa de geometria dinâmica CabriGeometry disponíveis. Esta característica é tornada possível pelo uso da moderna tecnologia de memórias Flash ROM,
introduzida no mercado por Texas Instruments em 1998, que combina as propriedades funcionais de memórias ROM e
boas propriedades de memórias RAM, no sentido que possui capacidade de ter muitas funções embutidas e pode
também salvar novas informações em formas de arquivos ou executar gráficos. Este tipo de memória é que permite
transformar a calculadora em plataformas para programas computacionais (Derive, Cabri, ou outros programas)
chamadas “Flash applications” escritas para rodar em calculadoras. Graças aos programas “Flash applications” cada vez
mais variados e disponíveis, que podem ser constantemente atualizados na calculadora por meio de um cabo conector
que a liga a um computador ligado à rede Internet, podemos aumentar constantemente a capacidade computacional da
calculadora (Ref. [1]).
Depois de primeiros manuseios verifica-se que esta calculadora é bem adaptada para uso em uma aula
tradicional, os seus comandos são fáceis de se familiarizar e o seu uso pode ser encarado como um preparatório para
Programas com linguagem computacional mais sofisticada. A grande quantidade de opções disponíveis, acessadas com
toques de botões e cujas sintaxes são mais simples que as correspondentes em programas como Maple, torna esta
calculadora atraente e apropriada para utilização mesmo para os iniciantes na informática. Algumas dificuldades de
implementação de novas metodologias de ensino com Maple ou Mathematica se referem ao fato que os alunos não se
familiarizam de imediato com as sintaxes e as lógicas de programação dos comandos.
A calculadora possui a facilidade de guardar uma seqüência de comandos executados na resolução ou
exploração de um problema sob forma de “variável”, que fica armazenada como se fosse um arquivo de computador e
permite seus usos futuros como se fossem rotinas pré-programadas. São os chamados “scripts”. Em J.D.Child [2]
encontramos uma grande seleção de scripts que são excelentes sugestões para serem utilizadas nas salas de aula. O
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treinamento com “scripts” numa sala de aula serve não somente como um atalho para facilitar as exposições teóricas do
professor mas também para treinar os alunos em pequenas atividades de programação.
A facilidade no trato com números serve como um treinamento de sensibilidades em relação a quantidades,
uma qualidade indispensável na formação de um engenheiro e que nem sempre os conceitos teóricos de matemática
podem transmitir. Uma opção que distingue esta calculadora dos programas computacionais usuais é a possibilidade de
tratar as quantidades inseridas no cálculo como dados reais de problemas de Física com as unidades apropriadas, de
modo que o cálculo executado com eles realmente fornece a resposta em unidades corretas. Isto é altamente educativo,
tendo em vista a surpresa e a dificuldade que os ingressantes nos cursos superiores demonstram quando são solicitados
que façam a análise dimensional e de unidades nos seus cálculos. Esta característica permite desenvolver aulas de
Matemática integradas com as aulas de Física.
Um dos objetivos das disciplinas de Matemática para as Engenharias é desenvolver a capacidade de trabalhar
graficamente os conceitos. A opção gráfica dos programas computacionais tem contribuído de forma decisiva neste
aspecto, e muitas das novas metodologias de ensino exploram a visualização e manipulação de gráficos e figuras.
A capacidade gráfica desta calculadora possui opções imediatas de traçar gráficos de funções de uma variável
real, traços de curvas planas parametrizadas, gráficos na forma polar, pontos de uma seqüência, gráficos 3-dimensionais
de funções de 2 variáveis e funções soluções de equações diferenciais de 1ª ordem com campo de direções. A opção de
gráfico 3D tem uma resolução na tela bastante limitada e deixa muito a desejar em relação aos gráficos obtidos com
Maple, de modo que consideramos esta opção realmente como uma alternativa na falta de um computador. Entretanto,
por permitir a visualização e a análise manipuladas individualmente pelos alunos ao mesmo tempo que acompanha a
teoria, consideramos a sua utilização extremamente eficiente, principalmente quando o professor puder acompanhar
também com um computador e um projetor multi-mídia apresentando os gráficos 3D com melhor resolução. Por
exemplo, mesmo com limitação na resolução, a opção imediata de obtenção de curvas de nível com simples comando
“DrwCtour” embutido em Catalog é clara suficiente para permitir ao aluno acompanhar e entender uma aula sobre
gráficos de maneira eficaz. Para obter as curvas de nível com Maple, o aluno precisaria executar os comandos de
soluções algébricas um a um, uma tarefa mais abstrata e demorada que um primeiro estudo visual.
A opção gráfica possui também uma qualidade excepcional que o Maple não possui que é a possibilidade de
interagir com o gráfico com simples movimento do cursor, isto é, o posicionamento do cursor sobre um ponto do
gráfico fornece automaticamente as coordenadas do ponto, o que é impossível nos gráficos obtidos com Maple.
Portanto exercícios rápidos de exploração de comportamento de função e o conceito de pontos de máximo e mínimo
podem ser primeiro testados graficamente na calculadora e depois fundamentados com a teoria. Também as opções de
Zoom que permitem localizar partes do gráfico e aumentá-las na tela compensam o tamanho da tela gráfica que é
restrita. Não podemos deixar de observar também que o programa de geometria dinâmica Cabri-Geometry possui
excelentes qualidades didáticas para explorar os gráficos de funções em 2D. Este programa merece ainda ser muito mais
explorado em nível universitário, mas não vamos tratar deste programa neste trabalho.
A possibilidade dos alunos acompanhar ativamente uma aula teórica, executando simultaneamente uma
variedade maior de exemplos tem como conseqüência o aumento do nível de entendimento dos conceitos de
Matemática.
As características da calculadora que citamos acima vêm completar o papel didático que os computadores
iniciaram nas salas de aula, principalmente no aspecto c) citado na seção anterior.
3.1.
Exemplos interessantes com a calculadora
Vamos agora descrever alguns exemplos que queremos destacar neste artigo, principalmente aqueles
relacionados à aplicabilidade numa aula tradicional em que o uso de recurso tecnológico se torna indicado. Não temos a
intenção de esgotar o assunto, pois são muitas as possibilidades e analisar cada tópico demandaria tratamento mais
detalhado que não é o objetivo principal deste trabalho.
Nos problemas de matemática aplicados à engenharia não raramente encontramos a necessidade de estudar
comportamentos de dados modelados através de curvas e de suas interseções. Torna-se necessário saber interpretar um
problema graficamente e resolvê-lo com técnicas algébricas. A grande dificuldade dos alunos de engenharia em
interpretações geométricas de problemas motiva a abordagem dos mesmos com os recursos gráficos e o seu estudo se
torna bastante didático com uso da tecnologia.
Dois exemplos interessantes do potencial gráfico desta calculadora que queremos mencionar pela sua
simplicidade são: 1) a possibilidade de resolver sistemas não lineares graficamente; 2) exploração de ajuste de curvas
aos dados por curvas de regressão.
No primeiro caso, quando duas equações não lineares a duas incógnitas são dadas para compor um sistema,
normalmente a sua resolução envolve cálculos não triviais. No Maple, a análise gráfica daria sugestões apenas sobre a
possibilidade de haver ou não uma solução, incluindo a dificuldade de ajustar o intervalo de definição dos gráficos, já
na linha de comando de “plot”. Na calculadora, a edição de gráficos é automático, entrando apenas com as expressões
algébricas das funções e o gráfico simultâneo das duas funções é executado. As soluções visíveis fornecem uma idéia
do intervalo do domínio para a sua existência e podem ser “lidas” com a posição do cursor sobre os pontos de
interseção no próprio gráfico. Esta primeira experiência gráfica é educativa no sentido de cultivar o bom senso em
relação aos resultados obtidos por cálculos que são efetuados em seguida, evitando respostas improváveis.
Vamos ilustrar este caso com o seguinte problema, testado durante um projeto de treinamento de professores.
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Suponhamos que tenhamos o problema de resolver o sistema x*y = (2.5)*(1.5) e (x +1.5)^2 + (y +2.5)^2 =36.
Este sistema modela o problema de encontrar a posição de uma escada de 6 metros que deve alcançar uma parede,
apoiando-se sobre um muro de 2.5 metros de altura que está afastado 1.5 metros da parede. Aparentemente fácil de
enunciar, os cálculos envolvidos neste problema não são evidentes e este é um problema adequado para utilizar recursos
de tecnologia. A solução gráfica na calculadora, obtendo gráficos de y1(x) = (2.5*1.5)/x e y2(x) = -2.5 + sqrt(36 –
(x+1.5)^2)) imediatamente oferece duas soluções que podem ser “lidas” aproximadamente com o posicionamento do
cursor. As respostas podem ser confirmadas usando o comando “Solve” para a função y2(x) com a substituição da
variável x=(2.5*1.5)/y. A sintaxe do comando é exatamente como dizemos na aula tradicional:
Solve((expressão de y2) tal que x = expressão), onde a condição tal que é uma função embutida na calculadora,
acionada com os botões [2nd] e K. Na tela de edição aparece o símbolo tradicional |, portanto a calculadora apresenta
uma linguagem muito amigável para trabalhar.
Após a leitura dos valores de y obtidos, o mesmo procedimento aplicado agora para a variável x calculado com
os valores de y encontrados, fornece as respostas. Comparando com a solução gráfica podemos observar o grau de
aproximação ocorrido na leitura visual.
Explorando ainda outras estratégias algébricas neste exemplo, lembrando que a segunda função y2(x) vem de
uma expressão implícita na forma (x + 1.5)^2 + (y + 2.5)^2 - 6^2= 0, podemos simplesmente expandir a expressão
acima na variável x, substituindo a variável y pela expressão y= (2.5*1.5)/x, que é a 1ª equação do sistema. A
multiplicação da expressão resultante por x^2 fornece uma função polinomial de grau 4 em x, cujos “zeros” são as
soluções do problema.
O raciocínio algébrico é natural e o comando “Solve” na expressão obtida fornece as respostas. Ao mesmo
tempo, a visualização do gráfico da função polinomial de 4º grau leva também ao estudo do comportamento desse tipo
de função, cujos zeros possuem agora um significado concreto no problema. Este problema permite várias outras
atividades que ainda podem ser exploradas. Uma referência é Y.Y.Baldin e G.A.L.Villagra [3].
A rapidez e a versatilidade de argumentos com que podemos trabalhar com este tipo de problema não são
encontradas no Maple, onde o uso de comandos exige maior preparo e raciocínio prévios. Observamos entretanto que
para a solução de sistemas lineares achamos o Maple mais capaz.
Comentando agora a capacidade gráfica de ajuste de curvas, a calculadora TI-92 é muito eficiente e fácil de
usar, e na nossa opinião não encontramos facilidades iguais em Maple. A calculadora possui um menu de opções de
Estatística (mais vasto que o menu de Maple) que, após obter o gráfico de pontos no plano que são os dados a ajustar,
permite testar as curvas de regressão linear, quadrática, cúbica, quártica, e outras incluindo a exponencial, uma de cada
vez para que o aluno perceba o significado de ajuste de curvas através de experiências visuais. A parte teórica seria
desenvolvida paralelamente. Este é mais um exemplo de utilização da calculadora que ilustra como podemos
transformar uma sala de aula tradicional num laboratório onde a experiência e a teoria são conduzidas simultaneamente.
Um exemplo deste tipo de atividade se encontra na Ref. [2] onde o problema de modelar o fenômeno de um
carro que vai parar num sinal de tráfego é colocado: “uma tabela mostra, desde o instante 0 (tempo em segundo)
quando o carro está a 100 metros do sinal, os dados de distâncias (em metros) do carro até o sinal em 6 instantes,
espaçados de 1 segundo, sendo que no 5º segundo o carro já havia alcançado o sinal. Determinar a função que descreve
a distância percorrida em função do tempo.”
A experiência é executada usando o menu de opções das curvas de regressão disponível na Math/Statistics
/Regressions, acompanhada da análise que a função da curva escolhida deve satisfazer a condição de ter derivada no
instante 5 segundos próximo suficiente de 0, para ser considerada adequada ao problema. Neste caso, a sintaxe para usar
a derivada na calculadora é a natural: d((expressão em x), x).
A dinâmica metodológica de salas informatizadas exige um desenvolvimento da aula diferente da tradicional.
Por outro lado, este exemplo não precisa de uma sala com computadores. Usando a calculadora com este exemplo, a
aula seria tradicional com uma compreensão maior de alunos acompanhando a teoria. Outros métodos numéricos
também podem ser tratados de maneira semelhante com auxílio das funções embutidas na calculadora. Assim, achamos
que as mudanças na sala de aula com a introdução da tecnologia apresentam um salto menor com o uso de calculadoras
gráficas, facilitando para os professores e alunos. Após uma aula com calculadoras, os alunos certamente aproveitarão
melhor as aulas de laboratório para desenvolvimento de projetos e outros exercícios.
Comentamos agora um exemplo de utilização de calculadora para desenvolver a intuição sobre o conceito de
limite. Uma das características de qualquer calculadora é a capacidade de fazer operações recorrentes, iterando a mesma
operação com simples toque no teclado, utilizando cada vez o resultado anterior, armazenado temporariamente. Este
recurso é utilizado didaticamente desde o ensino fundamental, no tratamento de problemas de juros sobre capital, etc.
Vamos considerar o estudo do comportamento da função (1 + (1/x))x . Na edição gráfica de função, definimos
y1(x) = (1+ (1/x))^x. Na opção embutida de Configuração de Tabela ([♦]TblSet), podemos escolher as opções com
primeiro valor igual a 1, passo 1, gráfico OFF, Independent = AUTO. Abrindo a tabela ([♦] "TABLE), podemos
observar a tabela de valores desta função, calculada para cada x inteiro positivo. Percorrendo a tabela com o Cursor
pode-se estudar o comportamento da função quando x se torna grande, levando o aluno a intuir o conceito de limite,
neste caso de uma seqüência numérica. Estabelecendo passos menores que um inteiro é bastante ilustrativo e leva ao
conceito de limite de uma função. O gráfico da função através da tabela também leva à idéia de que este limite existe e
uma aproximação para seu valor pode ser intuído. Estamos em condição de introduzir um limite fundamental que define
o número transcendental e. Uma interessante referência para este exemplo e outras aplicações na sala de aula é T. Ikeda
[4].
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O desenvolvimento de Taylor disponível na calculadora também é um excelente auxiliar para explorar o
conceito de convergência de séries e aproximação de funções, tópicos delicados nos cursos de Cálculo. Consideramos
interessante executar experiências com calculadora durante as aulas tradicionais e depois explorar os problemas mais
complexos com o Maple, numa sala informatizada. Estamos destacando o papel da calculadora como auxiliar para
introduzir ferramentas tecnológicas mais sofisticadas.
Vamos agora comentar brevemente sobre a definição de unidades na calculadora. O menu de configuração
(Mode) possui uma opção para a escolha de sistemas de medição. O padrão é o sistema métrico. No Menu ([♦]UNITS)
temos uma gama de escolha de unidades para diversas constantes (como a da constante gravitacional), comprimento,
área, volume, tempo, velocidade, aceleração, temperatura, intensidade luminosa e mais. Com a escolha adequada de
unidades, os cálculos de dados podem envolver a sua unidade de medida, digitando [2nd] PKG por exemplo depois de 2
para significar 2_KG (kilograma). A resposta dos cálculos envolvem as unidades correspondentes e existe a conversão
para a unidade correspondente do objeto físico calculado.
Não queremos alongar na descrição de procedimentos para este exemplo, o que queremos destacar é que esta
característica é própria destas calculadoras que as tornam poderosos auxiliares didáticos na Instrução Integrada,
principalmente nas aulas básicas de Cálculo e Física como foi a experiência bem sucedida de J.A. Salvador et al. [5].
Também a capacidade que a calculadora possui em transformar as salas de aula em laboratórios de Física e Química
através de sensores conectados abre uma grande perspectiva no cenário de metodologias de ensino de ciências com uso
de tecnologia.
Para explorar todas as capacidades das funções da calculadora o manual de TI-92 plus [6] deve ser consultado.
4.
CONCLUSÃO
Resumindo as nossas discussões, queremos concluir que o papel das calculadoras gráficas no ensino de
Matemática é fundamentalmente de facilitar:
a) a transição das aulas tradicionais de “giz/quadro-negro/conceitos teóricos” com postura passiva dos alunos
para uma aula/laboratório mais participativa com experiências e simulações realizadas juntamente com o
desenvolvimento teórico;
b) a transição de utilização de primeiros comandos computacionais numa interação mais amigável para a
utilização de uma linguagem computacional mais poderosa e outras estruturas de programação;
c) um acesso sistemático e intenso aos recursos tecnológicos contornando as dificuldades de uso de
laboratórios mais sofisticados.
Em cada um dos três aspectos da participação da tecnologia no ensino citado na seção 2, a calculadora gráfica
pode fazer parte como um auxiliar eficaz, principalmente para desenvolver novos modelos de construção de
conhecimento com a participação de alunos.
As considerações apresentadas neste trabalho são baseadas em experiências de utilização desta calculadora
com professores e alunos que estão sendo realizadas através de mini-cursos na Universidade Federal de São Carlos e em
alguns eventos científicos, desde o ano 2000. As repercussões de tais experiências até agora obtidas nos fazem refletir
que a sua utilização como auxiliar didático antes de explorar o computador deverá ampliar os efeitos de mudança já
alcançados com os projetos anteriores usando apenas computadores e programas como Maple e Matlab.
Finalizando, afirmamos que a pesquisa de novas metodologias de ensino com esta ferramenta é um vasto
campo para ser desenvolvido na realidade brasileira, tendo a vantagem de ter como referência relatos de pesquisa bem
sucedida como Ref. [1].
Agradecimentos
Agradecemos o apoio constante recebido pela Texas Instruments em todos os eventos em que experimentamos
as nossas metodologias usando a calculadora TI-92 plus, pelo empréstimo de equipamentos, indicações de bibliografias
e encorajamento.
5.
REFERÊNCIAS
[1]
B.K.Waits and F.Demana, “Calculators in Mathematics Teaching and Learning: Past, Present and Future,” in
Hand-Held Technology in Mathematics and Science Education: A Collection of Papers, Teachers Teaching
with Tehnology, College Short Course Program at The Ohio State University, pp.2-11.
[2]
Y.Y. Baldin e G.A.L.Villagra, Texto de Mini-Curso “Atividades de Geometria aplicadas à Resolução de
Problemas (uso auxiliar de informática),” Projeto Pró-Ciências CAPES/FAPESP, UFSCar, 2001.
[3]
J.D. Child, Explorations, Scripting Guide for the TI-92 and TI-92 Plus: Precalculus and Calculus Applications,
Editor Texas Instruments, Inc, USA, 1998.
[4]
T.Ikeda, Calculus, Support Classroom with Technology, Editor Casio Computer Co., 2000.
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[5]
J.A. Salvador, C. Constantino, N. Baldin e J.M. Póvoa, “Integração de Cálculo e Física nos Cursos de
Engenharia da UFSCar,” nos Anais do COBENGE 99 CD-ROM, Natal, RN, 1999.
[6]
TI-92 Plus (Guide), Editor Texas Instruments, 1999.
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