CAPITULO I- ESPAO FAMILIAR

Transcrição

CAPITULO I- ESPAO FAMILIAR
CURSO DE DIREITO
“NÃO BATA, EDUQUE”; CONSIDERAÇÕES SOBRE A
CRIAÇÃO INFATO JUVENIL NOS LARES DOMÉSTICOS NA
CIDADE DO RIO DE JANEIRO.
Josiane Damasceno Gonçalves
Orientadora: Profª. Viviane Duarte Nizzo
Rio de Janeiro
Outubro/2008
CURSO DE DIREITO
“NÃO BATA, EDUQUE”; CONSIDERAÇÕES SOBRE A
CRIAÇÃO INFATO JUVENIL NOS LARES DOMÉSTICOS NA
CIDADE DO RIO DE JANEIRO.
Josiane Damasceno Gonçalves
Monografia
apresentada
ao
Instituto Metodista do Rio como
requisito parcial para obtenção do
grau de Bacharel em Direito.
.
Aprovada em: ___/___/___
__________________________________
__________________________________
__________________________________
Rio de Janeiro
Outubro/2008
3
RESUMO
O presente trabalho pretende propor uma reflexão aos leitores acerca da temática
família, especificamente a família que apresenta a violência doméstica, com a
violência física de pais e mães contra filhos. Mostrando os conceito e natureza
jurídica e as leis que regem a violência doméstica contra crianças e adolescentes no
âmbito do Estatuto da Criança e do Adolescente e do atual Código Civil e do código
penal, além da interação entre esses instrumentos.
4
ABSTRACT
This paper aims to propose a reflection to readers about family issues, specifically
the family that shows domestic violence, with physical violence by parents against
children and mothers. Showing the concept and legal nature and the laws
governing domestic violence against children and adolescents under the Statute
for Children and Adolescents and the current civil code and the penal code as well
as an interaction between these instruments.
4
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................. ...06
CAPÍTULO I – ESPAÇO FAMILIAR ................................................................. ...12
1.1 – Sociedade Patriarcal ............................................................................. ...12
1.2 – Do Pátrio poder ao poder ao poder familiar em relação ao código civil de
1916 e de 2002 ...................................................................................................15
1.3 – A constituição Federal de 1988 em relação ao estatuto da crianças e do
adolescente...................................................................................................22
1.4 – A violência contra crianças e adolescentes no Brasil Colonial e
Imperial..........................................................................................................32
1.5
–
A
violência
contra
crianças
e
adolescentes
no
Rio
de
Janeiro..........................................................................................................35
CAPÍTULO II – MAUS TRATOS ONTEM, VIOLENCIA DOMÉSTICA HOJE ... .....40
2.1 – Maus Tratos .......................................................................................... .....40
2.2 – Violência Doméstica .............................................................................. .....44
CAPÍTULO III – TIPOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ................................... .....48
3.1 – Violência contra crianças e adolescentes.....................................................48
3.2 – Negligencia...................................................................................................49
3.3 – Violência física contra crianças e adolescentes..........................................53
3.4 – Violência psicológica.....................................................................................54
5
6
3.5 – Violência doméstica silenciosa contra crianças e adolescentes portadores
de necessidades especiais....................................................................................57
3.6.- Violência sexual...........................................................................................60
CAPITULO IV –VIOLÊNCIA FÌSICA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES.63
4.1- Violência física.........................................................................................63
4.2- A palmada................................................................................................66
4.2.1- locais do corpo mais acometidos..........................................................67
4.3 – Natureza da violência física....................................................................68
4.4 – Vitimas da violência física.......................................................................73
4.5 – Avaliando o incidente..............................................................................74
4.6 – Síndrome do bebê sacudido...................................................................81
4.7 -Direitos fundamentais contidos na constituição federal e no estatuto da
crianças e do adolescente (lei. 8.069/90)...............................................................84
4.7.1- Principio da proteção integral......................................................................87
4.7.2 – Política de atendimento à criança e o adolescente...................................88
ANEXO I...................................................................................................................
CONCLUSÃO................................................................................................... ....94
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................102
6
7
INTRODUÇÃO
No presente trabalho será analisado a violência doméstica contra crianças e
adolescentes, juntamente com suas transformações que serão percebidas em
diferentes momentos, na sua natureza jurídica, na finalidade do mesmo, as leis
que regem a temática da violência e sua contextualização no âmbito legislativo, o
Estatuto da Criança e do Adolescente, o atual Código Civil, e o código penal.
Como objetivo principal, analisar a violência doméstica, no âmbito familiar e
jurídico, sendo uma questão de grandes desafios e preocupações, ao se tratar das
crianças e jovens que representarão nosso país.
A família é o cenário das versões controversas sobre amor e agressão, confiança
e abuso, respeito e invasão, legitimadas em histórias de vida protagonizadas por
personagens oriundos das camadas populares da sociedade ao longo das
gerações. As histórias das famílias apelam para as dores sentidas, e as
lembranças evocadas não se limitam às interlocuções do sujeito consigo mesmo,
mas incluem as versões compostas pelas gerações que o antecederam.
O desafio desta monografia inclui a compreensão dos aspectos sociais e a
produção de subjetividade dos sujeitos, das famílias e das diferentes gerações das
famílias que convivem com a violência doméstica praticada por pais e mães contra
seus filhos.
Desde á década de 1970, as décadas de 1980 e 1990 foram marcadas pela
redução relativa do modelo tradicional de família nuclear, constituída por marido,
esposa e filhos e pelo aumento proporcional do número de famílias chefiadas por
mulheres e por unidades domésticas. A evolução dos diferentes tipos de unidades
7
8
domésticas mostra a significativa redução do tamanho das famílias, com número
médio menor de pessoas e de filhos.
As relações atualmente conhecidas que unem rede de parentesco, unidade
doméstica residencial e grupo conjugal tiveram estruturas diferenciadas nas
diversas sociedades e em momentos históricos específicos, confirmando que a
mutabilidade e a não-naturalidade são especificidades do estudo da família.
A família é uma unidade dinâmica, um grupo social, um espaço de convivência
fundamental
ao
desenvolvimento
dos
seus
membros;
contudo
possui
características e funções próprias, que são historicamente questionadas e
redefinidas.
Família é a unidade grupal onde se desenvolvem três tipos de relações pessoalaliança, filiação pais,filhos e consangüinidade irmãos - e que, a partir dos objetivos
genéricos de preservar a espécie, nutrir e proteger a descendência e fornecer-lhe
condições para a aquisição de suas identidades pessoais, desenvolveu através
dos tempos funções diversificadas de transmissão de valores éticos, estéticos,
religiosos e culturais.
A versão bíblica, com Eva e Adão e a expulsão do paraíso, representam,
simbolicamente, o repúdio do pai aos filhos. Os irmãos Caim e Abel espelham a
rivalidade entre os irmãos. O mito de Édipo, que envolve a punição, a culpa, o
desejo e o emaranhado afetivo, amplia a compreensão do ciclo afetivo da vida
familiar. As propriedades da família conferem-lhe, mitologicamente, a condição de
reduto do nascimento do relacionamento humano. Relação que, é definida pela
existência das pessoas em relação a outras, ordenação que se faz intrínseca, ou,
em latim, ordo ad aliquid. A família, originária das relações humanas, é entendida
como grupo primordial.
Se a família se constitui uma representação, é também um grupo de convivência
que se organiza de acordo com diferentes arranjos e se apresenta em distintas
versões. Faz-se mister a evocação dos cenários que não apenas a historicizam,
8
9
mas que a compõem: a casa, a domesticidade, a intimidade e a produção da
violência doméstica nessa conjunção.
Pensar a violência implica considerar as bases e o desenvolvimento histórico que
determinam as formas que ela assume ao longo da organização das sociedades.
O ser humano necessita da agressividade para viver, mas a violência institucional
e sistemática é um fenômeno que nasce com as sociedades de classe e penetra
no processo de exploração do homem pelo homem por meio de mecanismos de
repressão. A
ordem capitalista reproduz a violência assim como reproduz o
capital e, para isso, reproduz sujeitos ideologicamente violentos que, por fim,
produzem e consomem a violência.
A violência torna – se, como explosão primária predominantemente física. A
violência seria um caminho de descarga tensional na busca por um senso de
significação do sujeito. A agressão está associada a um objeto ao qual é
direcionada a fúria, por assim dizer. Na violência, a relação com o objeto é
danificada.
Os maus tratos contra crianças e adolescentes, como uma questão social, são
recentes e atravessou diferentes níveis no último século. Apesar do progresso
gradativo no estudo da violência ou maus tratos contra a criança, algumas
questões permanecem. Explosões emocionais contra os que estão mais próximos
e mais indefesos definem a síndrome do pequeno poder, em que o mais forte
exerce o seu pequeno poder sobre um mais fraco. A violência e vista de forma
intersubjetiva,
consiste
na
violência
interpessoal,
com
abuso
do
poder
disciplinador, ocasionando um processo de vitimização e imposição de maus
tratos.
Na cena da violência doméstica existem três formas de desempenhar o papel no
enredo familiar: como vítima, ator e ou testemunha. O autor da infração, o sujeito
que transgride não somente as normas sociais, mas invade a intimidade e a
organização afetiva e corpórea do outro, utiliza-se da persuasão e do controle
para manter o outro na condição de dominado e subjugado. O desafio é que a
9
10
violência doméstica nem sempre é claramente identificável e a vítima, inerte,
assujeitada, sofre mas tem dificuldade de encontrar alternativas de ajuda, seja
pela ameaça sofrida, seja pela ausência de elementos norteadores de auxílio,
como a escola, a creche e os vizinhos, no caso de crianças vitimizadas.
As definições sobre maus tratos infantis devem englobar tanto aspectos teóricos,
como uma definição operacional, com vistas a facilitar a identificação do
fenômeno. Qualquer dano físico ou psicológico não acidental contra uma criança
menor de dezesseis ou dezoito anos - segundo o regime de cada país - praticado
por seus pais ou cuidadores e que ocorre como resultado de ações físicas,
sexuais ou emocionais de omissão ou comissão e que ameaçam o
desenvolvimento normal tanto físico quanto psicológico da criança.
A violência doméstica se diferencia quatro tipos:
a) Violência sexual: envolve atos hetero ou homossexuais entre o adulto e uma
criança ou adolescente e tem por finalidade estimular sexualmente essa criança
ou adolescente para obter estimulação sexual para si ou para outrem;
b) Violência psicológica: ocorre nas ocasiões em que o adulto ameaça e deprecia
a criança provocando-lhe sofrimento mental;
c) Negligência: representa a falha ou omissão dos pais ou responsáveis em prover
as satisfações físicas e emocionais dos filhos, desde que a falha não seja mero
resultado das condições de vida que estão fora do seu domínio;
d) Violência física: a autora realiza um apanhado teórico e, em âmbito nacional,
oferece um espectro que inclui nomenclaturas como síndrome, violência, abusovitimização física.
A violência doméstica aparece em todas as camadas sociais em diferentes
momentos históricos, mas nas camadas populares ela se torna pública em virtude
da denúncia e do decorrente acompanhamento ou intervenção dos órgãos
10
11
públicos. As camadas altas da sociedade mantêm o anonimato e compram a
discrição através dos atendimentos particulares, quando o fazem.
O tema violência doméstica é contundente em dois âmbitos principais, desde sua
definição, em que os limites que vão do tapinha ao espancamento são
controversos, até os parâmetros éticos e pedagógicos sobre castigos e punições
físicas, que agregam pesquisadores de diferentes influências. Quiçá existam
outras formas de se pensar a violência física que incluam ainda o entendimento do
uso do corpo, esse corpo violento que usurpa o lugar do outro, mas que também
tenta se aproximar do outro, marcar o outro e não apenas machucá-lo.
A interdisciplinaridade é buscada no sentido de revistar as abrangências que
delineiam a violência física sem a frenética compulsão da categorização do tipo de
violência ou do atendimento à denúncia registrada nos prontuários das instituições
de atenção à infância. Fica premente a reflexão sobre as estratégias familiares na
educação dos filhos, estratégias que incluem há séculos a punição física. O olhar
se ajusta sobre a família agressora denunciada que recebe atenção e análise sem
rotulações reducionistas.
É preciso desconstruir o conceito e pesquisar a família, o que implica questionar
fórmulas prontas de análise e descobrir as sutilezas dos discursos dos
personagens que compõem os agrupamentos familiares. A atenção e o
investimento de pesquisadores sobre as organizações familiares alertam para a
prevenção do abandono de crianças, da institucionalização infantil e do
rompimento de relações afetivas desgastadas, mas, na maior parte dos episódios
verificados, passíveis de serem reconstruídas e trabalhadas.
A Antropologia auxilia a compreender a família não como bem de consumo
descartável, reposto por instituições secundárias às quais é delegado o papel da
maternagem
e
educação
básica,
e
sim
como
instituição
primária,
incondicionalmente importante na construção de identidades, valores, afetos e
cidadania. O Rio de Janeiro revela a cruel realidade de ter sido o último país a
abandonar as Rodas dos Expostos - dispositivos utilizados no Brasil no período
11
12
que vai do século XVIII até 1950, com o objetivo caritativo e religioso de abrigar
crianças e recém-nascidos abandonados por seus familiares - referendando, na
atualidade, a herança impregnada no movimento compulsivo da institucionalização
como recurso imediato frente aos desajustes familiares.
Abordar a família, considerando as peculiaridades que o termo pressupõe,
significa repesá-la na ordenação do passado, do presente e do futuro, numa
perspectiva circular, estrutural, dialeticamente efetivada na relativização de
parâmetros ditos universais.
A violência contra crianças e adolescentes, embora rejeitada socialmente, pode
ser considerada ainda hoje um fato cotidiano. Tornou –se um tema de
preocupação e de reflexão por parte da sociedade.
12
13
CAPITULO I
ESPAÇO FAMILIAR
1.1. SOCIEDADE PATRIARCAL
No início do século XX a família seguindo a tradição da época em que os
portugueses se instalaram no Brasil, a família não se compunha apenas de
marido, mulher e filhos. Era um verdadeiro clã, induindo a esposa, eventuais (e
disfarçadas) concubinas, filhos, parentes, padrinhos, afilhados, amigos,
dependentes e ex-escravos. Uma imensa legião de agregados submetidos à
autoridade indiscutível que emanava da temida e venerada figura do patriarca.
Temida, porque possuía o direito de controlar a vida e as propriedades de sua
mulher e filhos; venerada, porque o patriarca encarnava, no coração e na mente
de seus comandados, todas as virtudes e qualidades possíveis a um ser
humano.
Tal patriarca que jamais alguém ousou desrespeitá-lo, no lar ou fora dele, trazia
em si uma sabedoria que ninguém dele se aproximava sem que, de imediato, se
sentisse envolvido pela confiança que irradiava de sua marcante personalidade.
Não havia comunidades sólidas, sindicatos, clubes ou outros órgãos que
congregassem pessoas de interesses similares. A família, a grande família
13
14
patriarcal, ocupava todos espaços. O próprio Estado, que enquanto ordem
pública deveria estar acima das questões familiares, esbarrava nestas quando
necessitava intervir. Mas os governantes sabiam que essa família exclusivista,
dobrada sobre si mesma e solidamente organizada, era, por sua vez, o
sustentáculo do Estado, pois impedia que a população, tão escassa e quase
nômade,se pulverizasse neste imenso país.
Era, portanto, a espinha dorsal da sociedade e desempenhava os papéis de
procriação, administração econômica e direção política. Na casa-grande,
nasciam os numerosos filhos e netos do patriarca, traçavam-se os destinos da
fazenda e educavam-se os futuros dirigentes do país. Cada um com seu papel,
todos se moviam segundo intensa cooperação. A unidade da família devia ser
preservada a todo custo, e, por isso, eram comuns os casamentos entre
parentes. A fortuna do clã e suas propriedades se mantinham assim indivisíveis
sob a chefia do patriarca.
Crianças e mulheres não passavam de seres insignificantes e amedrontados,
cuja maior aspiração eram as boas graças do patriarca. A situação de mando
masculino era de tal natureza que os varões não reconheciam sequer a
autoridade religiosa dos padres. Assistiam à missa, sem a menor manifestação
daquela humildade cristã do crente assumindo sempre ares de proprietário da
capela, protetor da religião, bom contribuinte da Igreja. Jamais um orgulhoso
varão se dignaria de beijar as mãos de um clérigo, como o faziam sua esposa e
filhas. Nesse universo masculino, os filhos mais velhos também desfrutavam
imensos privilégios, especialmente em relação a seus irmãos. E os homens em
geral dispunham de infinitas regalias, a começar pela dupla moral vigente, que
lhes permitia aventuras com criadas e ex-escravas, desde que fosse guardada
certa discrição, enquanto que às mulheres tudo era proibido, desde que não se
destinasse à procriação. Uma senhora de elite, envolta numa aura de castidade
e resignação, devia procriar e obedecer. Com os filhos mantinha poucos
contatos, uma vez que os confiava aos cuidados de amas-de-leite, preceptoras e
14
15
governantas. Sobravam-lhe as amenidades, as parcas leituras e a supervisão
dos trabalhos domésticos. Até mesmo as linhas de parentesco, tão caras à
sociedade patriarcal, só se tomavam "efetivas" quando provinham do homem.
Desse modo, a mulher perdia a consangüinidade de sua própria família de
origem, para adotar a do esposo. 1
"A pátria é a família amplificada. E a família, divinamente constituída, tem por
elementos orgânicos a honra, a disciplina, a fidelidade, a benquerença, o
sacrifício. É uma harmonia instintiva de vontades, uma desestudada permuta de
abnegações, um tecido vivente de almas entrelaçadas. Multiplicai a família, e
tereis a pátria". (Ruy Barbosa) 2
Até meados do século XIX, a casa-grande era o modelo perfeito do fechado
mundo patriarcal. A reduzida elite das grandes cidades - comerciantes,
profissionais liberais e altos funcionários públicos - transportava esse modelo
para os austeros sobrados urbanos: a mulher restringia-se às quatro paredes de
sua casa, supervisionando o trabalho doméstico dos escravos ,como a
confecção de roupas e a destilação de vinho.
Nos primeiros anos da República, a família patriarcal começa a mostrar sinais de
fraqueza. Não que ela fosse incompatível com o novo regime. São as cidades,
as novas profissões, a luz elétrica, os bondes, os imigrantes, as lojas comerciais,
as indústrias, que ameaçam o patriarca.
Antes, ele podia manter seu extenso clã no mais completo isolamento. Seus
agregados, famílias inteiras submetidas a ele, podiam ser ricos ou pobres, não
importava, pois eram todos igualmente da grande Família. Trabalhavam em suas
terras e obedeciam. Pouco a pouco, o patriarca é obrigado a se relacionar com
os outrora indesejáveis elementos "de fora". Os filhos serão matriculados na
1
Editora Abril - NOSSO SECULO - BRASIL - VOLUME 1 - 1900 A 1910 - A ERA DOS BACHAREIS PARTE 1
2
Coríntios 13:4-7, interpretado por Rui Barbosa.
15
16
Faculdade de Direito. Um dia, toma-se mais conveniente que seu primogênito se
case, não mais com aquela obscura priminha remediada, mas com a filha de um
riquíssimo banqueiro da capital. Ele próprio é forçado a ampliar seus negócios
nos centros urbanos, para que seu patrimônio não sucumba à nova maré do
progresso. Ele irá aplicar dinheiro em outras atividades, além da fazenda. Chega
também o momento de abandonar a casa-grande e se mudar para um palacete
na Capital. Talvez seja possível levar junto um parente ou outro, mas o grosso
dos leais agregados fica por lá mesmo. E se tornam os "primos pobres" do
interior, que, com o tempo, serão cada vez mais pobres e menos primos.
O império do patriarca se reduz. Ou, por outra, muda de natureza: agora ele é
um industrial, um pioneiro no melhor estilo capitalista, um banqueiro, um grande
negociante e também um fazendeiro.
Homem que se prezasse era bem-falante. A oratória compunha a personalidade
masculina do mesmo modo que o fraque, o chapéu-coco, o cravo na lapela e o
soberbo bigode - tudo isso acompanhado, naturalmente, de um título de doutor.
"Seu Doutor" integrava o restrito exercito de bacharéis formados pelas
faculdades de Direito, Engenharia e Medicina. Todas elas, e não só as de Direito
(como geralmente se supõe), são terreno assolado pela retórica, a arte de bem
falar. E eram os bacharéis que assumiam as posições de controle no, Estado
nos negócios e na família.
Com eles, a arte da retórica transbordou os paços acadêmicos e as assembléias
políticas para invadir todos os recantos da sociedade. 3
3
Pessoa, Eduardo. História do Direito Romano.
16
17
1.2. DO PATRIO PODER AO PODER FAMILIAR EM RELAÇÃO
AOS CODIGOS CIVIS DE 1916 E DE 2002.
No Direito Romano, o pátrio poder tinha uma conotação eminentemente religiosa
– o pater familias era o condutor da religião em casa. E, como chefe da casa
conduzia não só a religião, mas também, todos os grupos familiares, que
compunha os seus entes familiares e seus escravos.
O pátrio potestas representava um poder incontrastável, detentor de uma
autoridade sem limites, na medida em que nem mesmo o Estado era capaz de
lhe tolher tal característica. A esposa, os filhos, os demais descendentes e os
escravos eram considerados personae alieni juris, ou seja, não possuíam
qualquer direito. Sobre eles, o pai romano detinha, inclusive, o direito sobre a
vida e a morte.
O pátrio poder significava, então, a completa submissão do filho em relação a
seu pai, em outras palavras, o conjunto de direitos dos pais com relação às
pessoas e aos bens dos filhos menores. O chefe da casa e da família era a
autoridade maior; era, melhor dizendo o dono e senhor de tudo.
A análise histórica mostra que essa noção romana do pátrio poder, ainda que
mitigada, chegou à Idade Moderna, transparecendo em nossa sociedade, por
meio do patriarcalismo – senhores de engenho e barões do café, regrado
mediante influência do Direito português. 4
Com a urbanização, a industrialização, a nova posição assumida pela mulher no
Ocidente, o avanço dos meios de comunicação e a globalização da sociedade,
modificaram -se irremediavelmente esse comportamento, passando o segundo
plano a idéia de um simples conjunto de direitos pertencentes ao pai em relação
aos filhos. Nessa fase, procurou-se entender o pátrio poder muito mais como
4
www.partes.com.br/cidadania/poderfamiliar.asp
17
18
sendo um conjunto de deveres desse pai, do que apenas o único e absoluto
detentor de todos os direitos sobre as suas crianças.
Com isso, o exercício desse poder acaba pressupondo o cuidado do pai e da
mãe em relação aos filhos, o dever de criá-los, alimentá-los e educá-los
conforme as condições morais, sociais e financeiras da família.
Passa a existir, então, uma visão mais humanista da criança. Há uma
preocupação maior com o meio em que ela vive e como ela é criada. O pátrio
poder, nesse sentido, tem em vista primordialmente a proteção dos filhos
menores.
Contudo, é sob a ótica do patriarcalismo que o Código de 1916 é elaborado.
Especialmente no Direito de Família e das Sucessões, esse conjunto de normas
evidencia a tradição e o estado social do país em que ele foi criado, quais sejam,
o conservadorismo da época e os princípios norteadores da sociedade do século
XIX.
Até bem pouco antes do término da escravidão, iniciou-se a elaboração do
Código Civil de 1916, quando a estrutura de nossa sociedade tinha a sua base
ainda praticamente no campo, fora, portanto, das cidades. A influência da
organização social no Brasil ocorre até o fim do século XIX, e é nos primeiros
anos do século seguinte que começa a elaboração desse conjunto de leis civis
por Clóvis Beviláqua.
O Código Civil sofreu a influência marcante dos usos e costumes próprios dessa
sociedade subdesenvolvida, com atividade econômica preponderantemente
agrícola, rudimentar e extensiva, que, no entanto, transformou-se de forma
extraordinariamente rápida logo após a sua promulgação, já que se viu a classe
média, antes inexpressiva, confinada a cargos burocráticos, emergir após a
urbanização, passando a ocupar espaços, sobretudo na política.
18
19
Na verdade, razões históricas e sociológicas influenciaram essa sociedade de
forma que preponderasse, na organização social, a ordem privada. Em razão
disso,
quando
da
elaboração
do
Código,
o
legislador
preocupou-se
essencialmente com o patrimônio, em detrimento dos direitos inerentes às
pessoas, e quanto a estas procurou imiscuir em suas regras jurídicas certos
princípios morais, vigentes àquela época.
Com o passar dos anos e, principalmente, com a promulgação da Constituição
Federal de 1988, muitas de suas regras foram substancialmente modificadas,
como, por exemplo, aquela que conferia a ambos os pais o pátrio poder e o seu
exercício sobre os filhos, mas afastava tal exercício de modo concomitante pelo
pai e pela mãe. O exercício era, em verdade, desmembrado. Durante o
casamento, competia ao pai e, apenas no caso de seu falecimento, ou quando
impedido por qualquer razão, é que se transferia o exercício desse poder à mãe.
Tal situação era encontrada no artigo 380 do Código Civil, que admitia a
simultaneidade do poder, mas a sucessividade do exercício.
Art. 380 - Durante o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo-o o marido com a
colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores passará o outro a
exercê-lo com exclusividade. 5
Após a Carta Magna de 88 tal situação não pôde mais ser aceita, na medida em
que o art. 226, § 5º dispôs que os direitos e deveres referentes à sociedade
conjugal deveriam ser exercidos igualmente pelo homem e pela mulher,
entendendo-se, assim, que o pátrio poder passaria a ser exercido de modo igual
e conjuntamente por ambos os pais.
Esse pátrio poder com a separação ou divórcio dos cônjuges, o Código de 1916,
mesmo que timidamente, já anunciava essa igualdade trazida pelo texto
Constitucional, ao enunciar que, nessa situação, esse poder não se extinguiria
em relação a um dos pais.
5
Código Civil de 1916.
19
20
Percebe-se que o Código Civil de 1916 em seu artigo 381, mesmo utilizando a
expressão “desquite” já dizia que nesse caso não haveria alteração nas relações
entre pais e filhos, senão quanto ao direito que aos primeiros cabe, de terem em
sua companhia os segundos, já que a um deles pertencerá a guarda do menor.
A explicação dada sobre o assunto por Clóvis Beviláqua refere que o desquite
dissolve a sociedade conjugal, mas não a parental, entre pais e filhos, cujos
laços feitos de afeto, direitos e deveres recíprocos, subsistem, apenas de certo
modo modificados, no intuito de adaptarem-se a nova situação.
Verifica-se que, no curso da história, mesmo tendo a redação de vários artigos
alterados pelas legislações posteriores, o Código de 1916 manteve a visão
individualista e, em algumas vezes até discriminante, como se pode ver nas
expressões “filhos legítimos, legitimados e legalmente reconhecidos” contidas no
artigo 379 que elenca os sujeitos ao pátrio poder, enquanto menores.
Com o advento do Código Civil de 2002, a relação da criança com os pais, ou
seja, o instituto do pátrio poder passou a ser denominado Poder Familiar. O
legislador, no intuito de afastar a conotação patriarcalista, na qual predominava a
figura paterna nas relações com os filhos menores (existente no Código de
1916), preferiu alterar a nomenclatura para o que então chamou de Poder
Familiar.
No entanto, tal modificação é bastante questionada, na medida em que essa
denominação não se mostra a mais adequada, porque mantém a ênfase no
poder. Antes do advento da Constituição de 1988, não faz sentido que seja
reconstruído o instituto apenas deslocando o poder do pai (pátrio) para o poder
compartilhado dos pais (familiar), pois a mudança foi muito mais intensa, na
medida em que o interesse dos pais está condicionado ao interesse do filho, ou
melhor, no interesse de sua realização como pessoa em formação.
20
21
Isso viria totalmente ao encontro do que hoje representa essa relação entre pais
e filhos, em que preponderam direitos e deveres numa proporção justa e
equânime no convívio familiar. Esse “poder” não é o exercício de uma
autoridade, mas de um encargo imposto pela paternidade e maternidade,
decorrente da lei. Nesse sentido é o poder familiar um conjunto de direitos e
deveres atribuídos aos pais com relação aos filhos menores e não emancipados,
com relação às pessoas destes e a seus bens.
Nessa nova visão, esse instituto passa a ser mais uma conduta dos pais
relativamente aos filhos, um acompanhamento para conseguir uma abertura dos
mesmos, que se processa lenta e progressivamente, à medida que evoluem na
idade e no desempenho físico e mental, de modo a ajudá-los a encontrarem a
sua própria capacidade para gerir e administrarem seus bens e negócios. Nessa
linha, não haveria tão-somente um encargo como dito anteriormente, mas um
encaminhamento, com certo “poder” para impor determinada conduta.
Entretanto, mesmo tendo o legislador o intuito de tentar adequar o instituto o
quanto mais próximo do que hoje se entende por ele e, mesmo que tenha, de
certa forma, se equivocado na nomenclatura utilizada, verifica-se que em relação
aos dispositivos a ele competente, muito pouca coisa foi alterada, havendo
apenas algumas modificações tópicas.
Do confronto entre os dois textos (de 1916 e de 2002), chega-se à
surpreendente conclusão de que a estrutura legal do antigo pátrio poder foi
mantida intacta. A ordem, a seqüência e o conteúdo dos artigos permaneceram,
como se a mudança do conceito e dos titulares (deixando de ser apenas a figura
paterna, para abranger a materna) e a exclusão das referências a filhos
ilegítimos fossem suficientes.
21
22
Entretanto, em relação à perda do exercício do poder familiar por um dos pais há
um aspecto bastante importante que existia desde 1916, permaneceu no novo
Código, e deve ser ressaltado.
A perda ou destituição do poder familiar é a mais grave sanção imposta aos pais
que faltarem com os deveres em relação aos filhos. Nesse contexto, o artigo
1.638 do NCC (antigo artigo 395, inciso II, do Código de 1916) estabelece:
Artigo 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
I – castigar imoderadamente o filho;
II – deixar o filho em abandono;
III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas nos artigos antecedente. 6
À luz do Código de 1916 somente se configuraria essa grave hipótese de perda
do poder familiar se o abandono fosse patrimonial. O que não causaria nenhum
espanto, na medida em que o referido conjunto de normas tinha como norte a
visão individualista e, por conseguinte, patrimonial dos institutos que dispunha.
No entanto, hoje, esse dispositivo significa mais do que o simples abandono
material do menor. Ele abre possibilidade para que o abandono moral e psíquico
seja também por ele punido. Isso se deve ao princípio norteador do Direito Civil
atualmente, o princípio da interpretação conforme a Constituição, que consiste,
basicamente, em explorar ao máximo a compatibilidade com a Carta Magna das
normas infraconstitucionais a ela anteriores ou supervenientes, e a partir dela.
Nessa linha, apenas deve ser declarada a inconstitucionalidade de uma norma
quando a incompatibilidade dela com a Constituição for insuperável. 7
A
partir
do
advento
da
Constituição
Federal
de
1988
houve
um
“redescobrimento” do papel central exercido pelo Direito Constitucional no
âmbito do sistema jurídico, redescoberta que logo passou a ser acompanhada
de uma gradativa e saudável tomada de consciência de que a Constituição terá
a sua eficácia e efetividade assegurada apenas se também incidir no âmbito da
6
7
Artigo 1.638 do novo código civil.
Revista Jurídica Cesumar – v.2, n. 1 - 2002
22
23
normativa infraconstitucional, isto é, se esta for produzida e aplicada à luz dos
princípios e regras constitucionais.
Assim, o Código deve ser interpretado, sempre, a partir da Constituição. Significa
dizer que suas normas hão de ser interpretadas em conformidade com os
princípios e regras que a Constituição estabeleceu para a família no
ordenamento jurídico de nosso país, incentivados por valores completamente
diferentes dos que predominavam na sociedade brasileira, na época em que se
deu a elaboração do Livro relativo ao Direito de Família, mais especificamente
no tocante ao pátrio poder, no Código de 1916, que, em grande medida,
manteve-se no capítulo destinado ao poder familiar para a família do século XXI.
Para Rizzato Nunes a interpretação “conforme” à Constituição busca apontar as
opções valorativas básicas do Texto Máximo fazendo com que os princípios
ocupem papéis importantíssimos no trabalho do intérprete, não só porque são,
de fato, superiores às normas, ainda que constitucionais, mas especialmente
porque, ao contrário das normas, que ao se chocarem geram antinomias, eles
são compatibilizáveis. Sendo que essa compatibilizarão deverá pôr em relevo
aquele princípio mais influente no contexto analisado – como, da mesma forma,
deverá ser dada sempre maior importância aos princípios mais fundamentais,
como por exemplo, o da dignidade da pessoa humana.
1.3. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 EM RELAÇÃO AO
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.
A partir da promulgação da Constituição de 1988 novos valores passaram a ser
cultivados e defendidos. Rompeu-se com aquela visão individualista e
patrimonial, passando-se a ter considerável preocupação com a pessoa humana,
elevando-se os valores existenciais sobre os materiais.
23
24
As relações de família modificaram-se substancialmente, passaram, na verdade,
por um processo de repersonalização, no qual a pessoa humana assumiu o
centro da relação estabelecida. A família deixou de ter aquele velho aspecto de
desigualdade entre seus membros, de superioridade entre os cônjuges para ser
concebida com base nos princípios da liberdade e da igualdade, entre os casais
– legalmente casados ou companheiros que vivem em união estável – e,
principalmente, entre os filhos, independentemente da condição de seu
nascimento.
O Código Civil adotou, como regra geral, o conceito de família no seu sentido
restrito, qual seja, a comunidade formada entre cônjuges e sua prole, refletindo o
pensamento machista e patriarcal da época.
Com as inovações constitucionais, admite-se uma maior flexibilidade na definição
de entidade familiar, agora em sentido amplíssimo, alcançando, por exemplo, a
comunidade formada entre a mãe viúva e seus filhos.
A esse grupo formado por qualquer dos pais e seus descendentes dá-se o nome
de família monoparental (artigo 226, § 4º).
Artigo 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§4° Entende –se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais
e seus descendentes. 8
Em seu artigo primeiro, inciso III, a Carta Magna de 88 consagrou o princípio da
dignidade da pessoa humana - princípio este tido como um dos fundamentos da
República – de modo a torná-la no dizer “uma verdadeira cláusula geral de tutela
e promoção da pessoa humana”.
Esse princípio, é o fundamento de proteção do ser humano, no presente caso,
do menor em relação à sua família. Ele é concebido como estruturante e
conformador dos demais, nas relações familiares, isso porque lida com a
dignidade, é tudo aquilo que não tem preço. Citando a tradicional formulação de
8
Artigo 226 da Constituição Federativa do Brasil.
24
25
Immanuel Kant, o referido autor enuncia que: “no reino dos fins tudo tem um
preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode-se pôr em vez
dela qualquer outra como equivalente, mas quando uma coisa está acima de
todo preço, e, portanto não permite equivalente, então ela tem dignidade”.
Nessa casos, têm-se o direito à vida, à honra, à integridade física, à integridade
psíquica, à privacidade, dentre outros, como direitos indisponíveis, dotados,
portanto, de dignidade e protegidos por esse princípio maior. A cada pessoa não
é conferido o poder de dispor sobre qualquer um desses direitos, sob pena de
reduzir sua condição humana, o que faz com todas as demais pessoas também
deva abster-se de violá-los. 9
Além do artigo primeiro não há como deixar de citar a dispositiva base de todas
as garantias protegidas pela Carta Magna de 1988: o artigo 5º. Em seu caput
ele traz dentre outros princípios, o da igualdade ao estabelecer que:
“todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
segurança e à propriedade”.
Aos olhos do Direito de Família essa novidade provocou mudanças profundas,
na medida em que sepultou definitivamente aquele patriarcalismo até então
existente. A partir de 1988 homens e mulheres passaram a ser iguais em direitos
e obrigações, ou seja, passaram a exercer igualmente os deveres decorrentes
não só do casamento (entre os cônjuges), mas, e principalmente, com relação
aos filhos.
Observa-se que ainda que as Constituições anteriores tenham reconhecido o
princípio de que a lei deve ser igual para todos, como por exemplo, a
9
Construído diverso, coletado no portal jurídico jus navegante. www.Jus.com.br
25
26
Constituição de 1824, art. 179, XIII, estabelecia que
10
“a lei será igual para
todos, quer proteja e quer castigue...”; a Constituição de 1891, art. 72, § 2º, que
dispunha: 11 “todos são iguais perante a lei...”; a Constituição de 1934, art. 113, §
1º, que estatuía: 12 “não haverá privilégios, nem distinções, por motivo de sexo...”;
as Constituições de 1937 13 e 1946 14 , arts. 122, § 1º e 141, § 1º,
10
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brasileiras, que tem por
base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do
Império, pela maneira seguinte.
XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em
proporção dos merecimentos de cada um.
11
Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos
termos seguintes:
§ 1º - Ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
de lei.
§ 2º - Todos são iguais perante a lei.
12
Art 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à
propriedade, nos termos seguintes:
1) Todos são iguais perante a lei. Não haverá privilégios, nem distinções, por motivo de
nascimento, sexo, raça, profissões próprias ou dos pais, classe social, riqueza, crenças religiosas
ou idéias políticas.
13
Art 122 - A Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no País o direito à
liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
1º) todos são iguais perante a lei;
14
Art 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à
propriedade, nos termos seguintes:
§ 1º Todos são iguais perante a lei.
26
27
respectivamente, que dispuseram: “todos são iguais perante a lei...”; a
Constituição de 1967, art. 150, § 1º, que determinava: “todos são iguais perante
a lei, sem distinção de sexo...”; princípio esse que foi confirmado pela Emenda nº
01, de 1969, art. 153, § 1º, 15 a legislação ordinária, por muitos anos, estabeleceu
regras marcadas pela desigualdade entre os cônjuges.
A Lei nº 4.121, de 27 de agosto de 1962, denominada “Estatuto da Mulher
Casada”, iniciou o movimento legislativo de equiparação entre o homem e a
mulher no casamento, aliviando as desigualdades, sem no entanto, tê-las
suprimido completamente. Ao marido continuou a caber a chefia da sociedade
conjugal, embora devesse exercê-la com a colaboração da mulher, e,
conseqüentemente, permaneceram na legislação ordinária os poderes do marido
na representação da família, na administração dos bens, na fixação do domicílio
conjugal e seu dever de manter a família. A mulher, entretanto, acabou
adquirindo a titularidade do pátrio poder, que, como visto anteriormente, cabia
exclusivamente ao pai e, supletivamente à mãe.
Diante desse contexto, não se pode entender a regra trazida pelo texto
Constitucional de 1988 como uma simples cópia literal das Constituições
anteriores. Ela representa muito mais que isso, pois, após anos de repressão, o
ideal de democracia e igualdade ventilava por todos os ramos e, com o direito
não poderia ser diferente, ainda mais com o direito de família, já que as próprias
normas infraconstitucionais – que antes obstaculizavam os preceitos trazidos
pelas Constituições – estavam mudando seus preceitos, conferindo mais
garantias e procurando estampar uma igualdade apenas posta no papel e muito
pouco vista na prática.
15
Art. 153. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos
têrmos seguintes:
§ 1º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e
convicções políticas. Será punido pela lei o preconceito de raça.
27
28
Nesse passo, não menos importante é o artigo 226 da Constituição Federal de
1988. Porque, não bastaria apenas explicitar o princípio da igualdade entre os
seres do sexo masculino e feminino sem voltar os olhos para a então chamada
base da sociedade, ou seja, a família. No caput desse dispositivo, o legislador
constitucional dispôs expressamente que a família é à base da sociedade e que,
em função disso, tem especial proteção do Estado.
E, para que fosse realmente assegurada essa proteção ela reconheceu os
diversos tipos de entidades familiares, que com o passar dos anos foram se
criando sem qualquer proteção legal, mas que assim mesmo existiam e não
poderiam de qualquer forma ser ignorada, como a união estável e a entidade
monoparental.
Toda essa mudança de valores acabou refletindo de modo extremamente
positivo em relação àqueles que nasciam no seio dessas famílias e dessas
entidades familiares, ao menos para a época, porque em função disso passou-se
também a ter grande preocupação com os menores. Antes, eram apenas objetos
de direitos e detentores de muitos deveres 1988, além do fim da desigualdade
entre os filhos – já que finalmente acabou com hedionda distinção entre filhos
legítimos, legitimados e legalmente reconhecidos, estabeleceu-se a consagração
do princípio da dignidade da pessoa humana, que, dentre outras mudanças,
tornou as crianças e os adolescentes verdadeiros sujeitos de direitos, os quais
deviam ser garantidos não só pela família, como pela sociedade e pelo Estado.
Essa é a interpretação do artigo 227 da Carta Magna:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de
toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
28
29
A partir desse dispositivo é obrigação legal dos pais assegurarem a seus filhos
direitos básicos como a dignidade e a convivência familiar, sendo a privação de
qualquer um deles uma verdadeira infração à lei, devendo como tal ser punida.
Antes, em 1979, a Assembléia Geral da ONU já havia aprovado a idéia de
proceder, de imediato, a elaboração de um projeto que viesse a dar efeito
jurídico e força obrigatória aos direitos específicos da criança. E, em 20 de
novembro de 1989, foi aprovada a Convenção sobre os Direitos da Criança que
reconhecia, pela primeira vez, a criança como sujeito de direitos.
Este tem sido o documento normativo com maior capacidade mobilizadora desde
a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, pois desde então tem
sido efetivada internacionalmente a conscientização sobre a necessidade de
medidas concretas para que os direitos por ela consagrados possam ser
consubstanciados.
Essa regra consolida juridicamente a noção de proteção integral da criança
(adotada, posteriormente, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente) e
reconhece direitos individuais de natureza civil, política, econômica, social e
cultural. A definição mais exata dessa doutrina seria o tratamento da questão da
criança e do adolescente como prioridade absoluta, pois, deve-se ter a proteção
à criança e ao adolescente como dever de toda a sociedade, desde a família a
que pertença o menor, até as autoridades públicas importantes. Deve -se,
também, ressaltar o reconhecimento de direitos específicos que a proteção
integral assegura à criança e ao adolescente, que visam garantir seus plenos
desenvolvimentos físicos, psíquicos, morais e intelectuais.
No Brasil, as legislações ordinárias, subseqüentes à nova Constituição no que
concerne à criança foi o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90),
o qual fez questão de reafirmar o texto constitucional, ao dispor em seu artigo 19
que “toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da
29
30
sua família
16
” e no artigo 22 que “aos pais incumbe o dever de sustento, guarda
e educação dos filhos menores” 17 .
O artigo 4º dessa Lei praticamente transcreveu o artigo 227 da CF/88 ao determinar que,
primeiro, a família e, supletivamente, o Estado e a sociedade, têm o dever de assegurar por
todos os meios, de todas as formas e com absoluta prioridade, todos os direitos inerentes à
constituição de um homem civilizado.
Na verdade, a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do
Adolescente formam um conjunto de princípios, de direitos, para garantir aos
menores um novo status, diferenciado daquele que, até o final dos anos oitenta
lhe era conferido nacional e internacionalmente. Esse novo status significa que a
criança e o adolescente foram, como já mencionado acima, reconhecidos como
sujeitos de direito, o que implica na impossibilidade de serem tratados como
meros objetos passivos da intervenção da família, da sociedade e do Estado.
A partir desse novo tratamento, a criança passou a ser considerada em sua
dignidade de pessoa humana e sujeito pleno de direito: à vida, à educação, à
saúde, ao lazer, à convivência familiar, à integridade física e psicológica
também.
E os Novos Códigos Civis da mesma forma, acompanhando a evolução desse
novo tratamento dado ao menor, ressaltou entre os deveres conjugais (art.
1.566, inc. IV) o de “sustento, guarda e educação dos filhos” e dispôs em
capítulo especial sobre a “proteção da pessoa dos filhos” 18 (arts. 1.583 a
1.590 19 ), em caso de separação ou divórcio dos pais, sempre tendo como
princípio norteador o melhor interesse dos filhos.
16
Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e,
excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em
ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.
17
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendolhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
18
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
V - respeito e consideração mútuos.
19
Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. (Redação dada pela Lei nº 11.698,
de 2008).
30
31
§ 1o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que
o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o
exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao
poder familiar dos filhos comuns. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 2o A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para
exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: (Incluído
pela Lei nº 11.698, de 2008).
I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; (Incluído pela Lei nº 11.698, de
2008).
II – saúde e segurança; (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
III – educação. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 3o A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os
interesses dos filhos. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 4o (VETADO). (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: (Redação dada pela Lei nº
11.698, de 2008).
I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma
de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar; (Incluído pela
Lei nº 11.698, de 2008).
II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da
distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. (Incluído pela Lei nº
11.698, de 2008).
§ 1o Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda
compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as
sanções pelo descumprimento de suas cláusulas. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 2o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada,
sempre que possível, a guarda compartilhada. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 3o Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob
guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se
em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar. (Incluído pela Lei nº 11.698, de
2008).
§ 4o A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda,
unilateral ou compartilhada, poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor,
inclusive quanto ao número de horas de convivência com o filho. (Incluído pela Lei nº 11.698, de
2008).
§ 5o Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe,
deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados,
31
32
Esse princípio não é apenas uma recomendação ética, mas também uma diretriz
determinante nas relações da criança e do adolescente com seus pais, com sua
família, com a sociedade e com o Estado. A aplicação da lei deve sempre
realizar o princípio, consagrado, como “critério significativo na decisão e na
aplicação da lei”, tutelando-se os filhos como seres prioritários. O desafio é
converter a população infanto-juvenil em sujeitos de direito, “deixar de ser
tratada como objeto passivo, passando a ser, como os adultos, titular de direitos
juridicamente protegidos”, ainda que exista o aparelhamento normativo, é
necessário mais que isso, é imprescindível que seja realmente posto em prática.
A evolução do status assumido pela criança, bem como a transformação do
papel do filho na família pode ser definida utilizando para tal uma figura de
imagem: em lugar da construção piramidal e hierárquica, na qual o menor
ocupava a escala mais baixa, tem-se a imagem do círculo, em cujo centro foi
colocado o filho, e cuja circunferência é desenhada pelas recíprocas relações
com seus genitores, que giram em torno daquele centro.
de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade. (Incluído pela Lei nº
11.698, de 2008).
Art. 1.585. Em sede de medida cautelar de separação de corpos, aplica-se quanto à guarda
dos filhos as disposições do artigo antecedente.
Art. 1.586. Havendo motivos graves, poderá o juiz, em qualquer caso, a bem dos filhos,
regular de maneira diferente da estabelecida nos artigos antecedentes a situação deles para com
os pais.
Art. 1.587. No caso de invalidade do casamento, havendo filhos comuns, observar-se-á o
disposto nos arts. 1.584 e 1.586.
Art. 1.588. O pai ou a mãe que contrair novas núpcias não perde o direito de ter consigo os
filhos, que só lhe poderão ser retirados por mandado judicial, provado que não são tratados
convenientemente.
Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los
em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como
fiscalizar sua manutenção e educação.
Art. 1.590. As disposições relativas à guarda e prestação de alimentos aos filhos menores
estendem-se aos maiores incapazes.
32
33
Assim, a Constituição Federal de 1988 atenua o modelo institucional de família
para residir na relação entre pais e filhos o poder paternal centrado na idéia de
proteção. A paridade de direitos e deveres tanto do pai quanto da mãe está em
assegurar aos filhos todos os cuidados necessários para o desenvolvimento de
suas potencialidades, para a educação, formação moral e profissional, tudo
calcado, obviamente, no princípio máximo do ordenamento jurídico brasileiro, no
que tange à proteção do indivíduo: o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
1.4. A VIOLENCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO
BRASIL COLONIAL E IMPERIAL.
A partir do descobrimento, em 1500 até 1822, o Brasil foi uma colônia de
Portugal, dependendo econômica, política e administrativamente do poder
instalado em Lisboa. As leis e as ordens para as crianças também vinham de
Portugal e eram aplicadas por meio da burocracia, dos representantes da corte e
da Igreja Católica. A Igreja e o Estado andavam juntos, unindo a conquista
armada e a religião. O cuidado com as crianças índias pelos padres jesuítas
tinha por objetivo batizá-las e incorporá-las ao trabalho.
Os padres, embora não aceitassem os castigos violentos e a matança de índios
pelos portugueses, fundaram casas de recolhimento ou casas para meninos e
meninas índias, nas quais, após separá-los de sua comunidade, impunham-lhes
costumes e normas do cristianismo, tais como o casamento religioso e outros
dogmas, com o intuito de introduzi-los na visão cristã do mundo.
A economia brasileira dessa época dependia de exportações de riquezas
naturais, como madeira e ouro, ou de produtos agrícolas. Para isso, foi muito
utilizada a mão-de-obra escrava proveniente da África. Os escravos eram
considerados mercadoria. A criação de crianças escravas era mais cara do que
a importação de um escravo adulto, já que com um ano de trabalho o escravo
33
34
pagava seu preço de compra. Havia grande mortalidade de crianças escravas.
As mães eram alugadas como amas-de-leite, sendo essa uma maneira de
separar os filhos de suas próprias mães. A criança escrava, mesmo depois da
Lei do Ventre Livre, de 1871, podia ser utilizada pelo senhor desde os 8 até os
21 anos de idade, se, mediante indenização do Estado, não fosse libertada.
Antes dessa lei, essas crianças começavam bem cedo a trabalhar ou serviam de
brinquedo para os filhos dos senhores.
Era grande o número de filhos ilegítimos, muitos eram filhos de senhores e
escravas. Segundo a moral dominante, a família normal era somente a família
legítima. Os filhos nascidos fora do casamento, com raras exceções, eram
fadados ao abandono. A pobreza também era causa de abandono. As crianças
eram deixadas nas portas das casas e, muitas vezes, eram comidas por ratos e
porcos. Essa situação chegou a preocupar as autoridades, levando o vice-rei a
propor, em 1726, duas medidas: coleta de esmolas na comunidade e internação
de crianças. Para atender à internação de crianças ilegítimas, foi implantada a
Roda. (roda: um cilindro giratório na parede da Santa Casa, que permitia que a
criança fosse colocada por fora, sem ser vista de dentro, e, assim, recolhida pela
Instituição, que criou um local denominado “Casa de Expostos”.) O objetivo
desse instrumento era esconder a origem ilegítima da criança e salvar a honra
das famílias. A grande maioria dessas crianças enjeitadas ou expostas era
branca ou parda, filhas de brancos ou de brancos e negros. A primeira Roda, na
Bahia, foi criada em 1726 e a última somente foi extinta nos anos 50 do século
XX. As crianças enjeitadas, uma vez posta na Roda, poderiam permanecer na
instituição até um ano e meio. Em geral, eram entregues a amas-de-leite
alugadas ou a famílias que recebiam pensões muito pequenas e utilizavam as
crianças para o trabalho doméstico.
Na Casa dos Expostos, havia grande mortalidade. Em torno de 90% das
crianças morriam, por omissão ou falta de condições da própria Santa Casa ou
por desinteresse da Corte. Além das Santas Casas, cabia às Câmaras
34
35
Municipais cuidar dos abandonados, podendo para isso criar impostos. Algumas
Câmaras prestavam assistência aos órfãos e abandonados por meio da
colocação familiar, ou seja, entrega de crianças a algumas famílias em troca de
pagamento. As instituições privadas e semi-oficiais cuidavam dos pobres,
favorecendo os ricos, isto é, encaminhando as crianças ao trabalho precoce,
transformavam-nas em futuros subalternos. Já em 1854, havia a intenção de
recolher os meninos que vagavam pelas ruas, segundo um decreto imperial
daquele mesmo ano. No entanto, somente em 1871 foi criado o asilo de meninos
desvalidos. As meninas desvalidas indigentes eram acolhidas na Santa Casa
desde 1740. No final do século XIX, havia trinta asilos de órfãos, sete escolas
industriais e de artífices e quatro escolas agrícolas.
Com a Proclamação da República, em 1889, precedida pela Abolição da
Escravidão, em 1888, não foi mudado o comportamento oficial relativo aos
asilos. Os asilos se expandiram, mas foi por iniciativa privada, já que as relações
entre Igreja e Estado foram abaladas. Predominou a política da omissão do
Estado, apesar dos discursos de preocupação com a infância abandonada.
Desde o início do século XX, os juristas, em congressos internacionais da
Europa e América Latina, preocuparam-se com o combate à “criminalidade de
menores” de forma distinta da dos adultos. Na perspectiva de “salvar o menor”
do ambiente perigoso, propunham uma “nova Justiça para a infância, para
corrigir os desvios do bom comportamento”. Desde 1913 a idéia de criação de
Tribunais para menores foram defendidos pelo desembargador Ataulpho de
Paiva. No Código de Menores de 1927 fica estabelecida a distinção entre
“abandonados” e “vadios”. Estes, maiores de 14 e menores de 18 anos, eram
submetidos a um processo penal especial, ficando a critério do Juiz estabelecer
a sanção segundo sua avaliação “da boa ou má índole” dos que eram julgados,
com encaminhamentos para seu disciplinamento.
Em 1927 ,o Congresso Nacional discutia a implantação de uma política chamada
de “assistência e proteção aos menores abandonados e delinqüentes”. Em 1903,
foi criada a Escola Correcional 15 de Novembro. Em 1903, foi autorizada a
35
36
criação do Juizado de Menores, e, em 1934, foram criados o Conselho de
Assistência e Proteção aos Menores e o Abrigo de Menores. Em 1927, toda essa
legislação é consolidada no primeiro Código de Menores.
O Código de 1927 cuidava, ao mesmo tempo, das questões de higiene da
infância. e da delinqüência e estabelecia a vigilância pública sobre a infância.
Vigilância sobre a amamentação, os expostos, os abandonados e os
maltratados, podendo retirar o pátrio poder. O menor de 14 anos não era mais
submetido ao processo penal e, se fosse maior de 16 e menor de 18 e
cometesse crime, poderia ir para prisão de adultos em lugares separados
destes. O juiz devia buscar a regeneração do menor. 20
1.5. A VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO
RIO DE JANEIRO.
Em média, 18 mil crianças são vítimas de violência doméstica por dia no Brasil.
Os dados, apresentados pela Sociedade Internacional de Prevenção ao Abuso e
Negligência na Infância (Sipani), representam 12% das 55,6 milhões de crianças
menores de 14 anos.
O perigo está mais próximo do que se imagina. Dados do Fundo das Nações
Unidas para a Infância (Unicef) mostram que 80% das agressões físicas contra
crianças e adolescentes foram causadas por parentes próximos. Ainda de
acordo com o Unicef, de hora em hora morre uma criança queimada, torturada
ou espancada pelos próprios pais.
No Rio de Janeiro, cerca de 40% de todas as ocorrências registradas por mês
nas delegacias do Estado são de agressão infantil. Sendo que, apenas 1% das
denúncias são feitas pelas vítimas.
Os tipos de agressão infantil são diversos. Os mais comuns são a violência
física, a psicológica e a sexual. Bater definitivamente não é a melhor solução, o
ideal é o diálogo com a criança, é mais eficaz explicar para a criança as
20
Subsídios para atuar no enfrentamento à violência contra crianças e adolescentes. MEC/ SECAD /2006
36
37
conseqüências de seus atos e como você se sente decepcionado com isso, do
que bater nela. Além de melhorar o relacionamento com a criança, esse tipo de
atitude acaba evitando que ela se torne um agressor no futuro.
Entre as causas da violência infantil está o trauma de quem foi agredido quando
criança. Pais que quando crianças foram vítimas de violência doméstica tendem
a repetir as agressões em seus filhos.
“Existe um pensamento no imaginário popular de que não devemos interceder
em problemas que ocorrem no âmbito familiar, o que é um equívoco.
Ariel Alves, 21 do Conanda, retoma a questão do papel da sociedade: “Não é só a
família a responsável por garantir os direitos da infância e juventude, o próprio
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) diz que é um dever de todos: da
família, do Estado e de toda a sociedade brasileira.”
Os atendentes do Disque-Denúncia recebem mais de 500 chamadas por mês
informando sobre maus-tratos contra crianças e adolescentes. O número de
ligações só é maior pra denunciar tráfico de drogas e jogos de azar.
As investigações sobre famílias têm se concentrado, sobretudo, no influente papel
da interação mãe-filho, mas pouco se tem falado dos efeitos do apoio mútuo dos
dois pais ao seu filho. O apoio mútuo está diretamente relacionado à coesão
familiar.
Muitos são os casais que, separados ou não, vivem depreciando-se um ao outro
para os filhos. Alguns estudos mostram que os meninos menos problemáticos
eram aqueles que tinham um pai que promovia a coesão familiar e uma mãe
pouco crítica com a postura desse pai.
Observa-se ainda, que as mães provenientes de ambientes familiares
estressantes, tendem a ser mais crítica com seus maridos diante de seus filhos.
21
Ariel Alves, responsável pelo Conanda.
37
38
Durante o período pré-escolar, as condutas agressivas aparecem mais nas
crianças que vêem de lares onde as mães são mais críticas com seus maridos.
Portanto, tanto a atitude hostilidade-competitividade, como a atividade
excessivamente crítica da mãe sobre o pai aparece como elementos de grande
influência no surgimento de conduta agressiva em idades pré-escolares.
A violência, em todas as suas formas, é para mim sempre impressionante. Não
me conformo em ver nos hospitais de emergência, em grande quantidade,
crianças e adolescentes atropelados em portas de escolas, vítimas de acidentes
de trânsito e de quedas, muitas vezes evitáveis, ou de intoxicações diversas. O
problema é saber quais dessas situações poderiam ter sido prevenidas e quais
delas foram intencionais. Voltando à violência de pais contra filhos, um dos casos
que mais me marcaram. Evidentemente, os piores foram aqueles que chegaram à
morte. Lembro-me do Willian, um menino de cerca de dois anos de idade, que
chegou morto à sala de emergência, numa manhã de sábado. Apresentava
inúmeros sinais externos de violência e fratura do crânio. A pessoa que o levou
era uma mulher de cerca de 30 anos, mãe substituta. Ela deitava-se sobre o corpo
do menino e chorava, gritando: "O que fizeram com você, Willian? Quem fez isso?
Vou me vingar”.Pouco depois, confessou que havia torturado o garoto durante
dias, como represália pelo fato de a mãe biológica não estar mandando
regularmente a importância combinada para a manutenção do menino. Ela foi
presa e condenada: pena máxima, por homicídio doloso. Outra criança que
morreu, com cerca de um ano de idade, encontrei na emergência em um
respirador, com inúmeras fraturas de crânio. A mãe, tranqüila e às vezes até
dormindo ao lado da criança, informou que a encontrou caída, junto à cama,
quando chegou em casa. O pai estava lá. A criança havia sido agredida
violentamente na cabeça, com algum instrumento. Os casos que chegam a um
hospital público são sempre de grande violência. Uma mãe colocou a mão da
criança em panela com água fervendo, causando queimaduras de segundo grau
profundo, queimadura em luva, típica de maus-tratos físicos. Outra queimou a
boca do filho com uma colher aquecida, porque ele dizia palavrões. Outros pais
colocaram a filha em uma bacia com água quente para castigá-la porque não
38
39
controlava oesfíncterurinário à noite. Outros, queimaram o períneo da filha com
objeto aquecido porque ela se masturbava. Ou queimaram a mão de uma menina
na prancha do fogão, ou colocaram um bebê sentado na frigideira com óleo
fervendo. São todos exemplos de casos graves que chegam aos hospitais. Os
casos levados ao SOS Criança da Abrapia são menos graves, permitindo uma
ação preventiva mais eficaz. Em relação à negligência, o que mais me
impressiona são as situações de crianças deixadas sozinhas em casa - que se
intoxicam, sofrem quedas e, às vezes, morrem ou ficam mutiladas em
conseqüência de incêndio em casa, com graves queimaduras, ou quedas de
apartamentos altos. O abuso sexual, quando chega ao hospital, é sempre muito
grave, com lesões graves de genitália e ânus. Os casos levados freqüentemente à
Abrapia apresentam menores conseqüências físicas, sem marcas evidentes e
exigindo para o diagnóstico a aplicação de técnicas sofisticadas de revelação do
abuso sexual na família. Maus-tratos e negligência de pais contra filhos continuam
a ocorrer em todos os países do mundo. A literatura científica está cheia de casos
quase inacreditáveis: bebês colocados em forno de microondas, ou mortos por
aspiração de pimenta em pó colocada pelos pais nas suas bocas, ou
assassinados por asfixia por travesseiro. Recordo-me que, certa vez, fiz uma
conferência sobre violência doméstica em um congresso internacional de cirurgia
pediátrica, no Rio. Após minha exposição, o presidente do congresso, um médico
suíço, parabenizou-me, mas disse que já conhecia todas as situações que eu
havia apresentado. Na sua terra também ocorria o mesmo. E citou casos que não
conhecemos pessoalmente, como colocar uma criança, para castigá-la, em um
armário fechado, ou para fora de casa, na neve. Efetivamente, o que mais me
impressiona não são os casos extremos, exemplares, que citamos. O pior é saber
que a violência de pais e parentes contra crianças que deles dependem totalmente
continua a existir, em todas as suas formas, com enorme freqüência, em todos os
países do mundo. Por analogia com as estatísticas americanas, pode-se calcular
que cerca de 40 mil crianças e adolescentes são severamente maltratados pelos
seus responsáveis, todos os anos, no Rio de Janeiro e no Brasil, no mínimo 600
39
40
mil ao ano. Dessas, 1800 (0,3%) morrem. Lamentavelmente, poucos são os casos
notificados. 22
Durante 10 anos, de janeiro de 1989 até junho de 1999, a ABRAPIA atendeu
crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica e suas famílias, no Estado
do Rio de Janeiro. Esta é uma análise preliminar de 1169 casos atendidos no SOS
Criança da ABRAPIA no período de janeiro de 1998 a junho de 1999.
LAURO MONTEIRO FILHO - Editor
[email protected]
22
40
41
CAPITULO II – MAUS TRATOS ONTEM, VIOLÊNCIA DOMÉSTICA HOJE.
2.1. MAUS TRATOS.
No direito romano o pai dispunha de absoluto poder disciplinar em relação ao
filho, nele incluído até o de matá-lo, de transferi-lo a outrem ou mesmo entregálo como indenização, venda, doação ou penhor; o poder de punição doméstica,
além de não observar qualquer regra de proporcionalidade e contraditório, era
absoluto, não respondendo o pater famílias pelos castigos e excessos impostos
aos filhos.
Com a evolução da civilização e a partir do cristianismo, tal poder – que se
situava na órbita do exercício regular de direito - foi se abrandando com
exigência de moderação, passando a ser punidos seus excessos quando deles
resultassem lesões corporais graves ou morte.
Hoje o pátrio poder é encarado como complexo de deveres em relação aos pais,
instituído no interesse dos filhos e da família, havendo denominação até de
pátrio-dever.
O Código Criminal do Império (1830) não tratou dos maus tratos, justificando os
castigos moderados; o Código Penal de 1890 não tratou da matéria, cabendo ao
41
42
Código de Menores de 1927 fazê-lo, nos arts. 137 23 a 141 24 , os quais foram
adotados na Consolidação das Leis Penais de 1932, nos incisos VI a X, do art.
292.
O Código Penal de 1940, no Capítulo III, do Título I, da Parte Especial, utilizando
uma forma unitária e com a rubrica “maus tratos” não só englobou aqueles
crimes individualizados na legislação anterior, como ampliou a proteção legal
dispensada para alcançar, além dos menores de dezoito anos, e agora sem
limite etário, todos aqueles que se encontrem sob a autoridade, guarda ou
vigilância de outrem, para fins de educação, ensino, tratamento ou custódia.
Efetivamente, prevê o art. 136, do Código Penal:
25
Sujeito ativo deste crime é apenas aquele que tenha a vítima sob guarda,
vigilância ou autoridade, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia.
Por isto é delito próprio, pois se exige uma específica relação jurídica entre os
sujeitos ativo e passivo; não havendo relação de subordinação entre o agente e
a vítima – de direito público ou privado, não se tratará de maus tratos, mas de
perigo para a vida ou saúde de outrem (CP, art. 132).
Já o sujeito passivo é aquele que estiver sob a autoridade, guarda ou vigilância
do sujeito ativo, para fins de educação (atividade docente que tenha por escopo
aperfeiçoar, sob o aspecto intelectual, moral, físico, técnico ou profissionalizante,
23
Art. 137. Aplicar castigos imoderados, abusando dos meios de correção ou disciplina, a menor de 18 anos,
sujeito a sua autoridade, ou que lhe foi confiado, para criar, educar, instruir, ter sob a sua guarda ou a seus
cuidados ou para o exercício de uma profissão ou arte. Pena de prisão de três meses a um ano; com a inibição
do pátrio poder ou remoção da tutela, si o culpado for pai ou mãe ou tutor.
24
Art. 141. Nos casos dos quatro artigos precedentes, si os castigos imoderados, os maus tratos, a privação de
alimentos ou de cuidados, o excesso de fadiga causaram lesão corporal grave, ou comprometeram gravemente
o desenvolvimento intelectual do menor, e si o delinqüente podia prever esse resultado, a pena será de prisão
de um a cinco anos; e de cinco a doze anos, si causaram a morte, e o delinqüente podia prever-o.
25
“Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para
fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados
indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios
de correção ou disciplina”.
42
43
a capacidade individual); ensino (são os conhecimentos transmitidos com vistas
à formação de um fundo comum de cultura – ensino primário, secundário, etc.),
tratamento (que reúne não apenas os processos e meios curativos, de caráter
médico-cirúrgico, como também a administração de cuidados periódicos,
destinados a prover a subsistência alheia e custódia (que é a detenção de uma
pessoa para fim autorizado legalmente).
Da delimitação do sujeito passivo do crime de maus tratos, exclui-se, por
evidente, a esposa e filho maior de vinte e um anos, ante a absoluta ausência de
relação de subordinação com o marido e pais, respectivamente.
O núcleo do tipo é o verbo expor, significando criar uma situação de perigo à
vida ou à saúde da pessoa subordinada; é típico crime de perigo, de conteúdo
variado por prever múltiplos meios de maltratar a pessoa:
1) privando-a da alimentação necessária, claro que de forma habitual, pois da
omissão alimentar deve resultar perigo, o que não se vislumbra com apenas uma
conduta; pode se caracterizar com privação parcial e, desde que exponha a vida
ou a saúde da pessoa subordinada a perigo, constitui maus tratos, (art. 45, § 1º,
da Lei n. 7.210/84) 26 , sob pena de caracterização do delito de tortura do § 1º, do
art. 1º da Lei n. 9.455/97 “.
27
2) privando-a dos cuidados indispensáveis – tem-se que estão compreendidos
entre aqueles que representam o mínimo necessário à vida e saúda da pessoa,
como não levar criança doente ao médico ou privá-la da higiene necessária.
Nesta modalidade a conduta também é omissiva e para caracterizar maus tratos
também se exige habitualidade, como o pai deixa o filho dormir sem agasalho no
inverno fora de casa, em região fria, sabendo-se que pode contrair doença grave
como pneumonia.
3) sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado – Trabalho excessivo é o
que supera as forças físicas ou mentais da vítima, ou o que produz fadiga
26
Art. 45. Não haverá falta nem sanção disciplinar sem expressa e anterior previsão legal ou regulamentar.
§ 1º As sanções não poderão colocar em perigo a integridade física e moral do condenado.
27
Art. 1º Constitui crime de tortura:
§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento
físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.
43
44
anormal, enquanto inadequado é o trabalho impróprio para as condições
orgânicas da vítima, segundo a idade ou sexo.
4) abusando dos meios de correção e disciplina – esta modalidade do crime
consiste no abuso de meios de correção ou disciplina, infligindo castigos
excessivos que resultem perigo para a vida ou saúde da pessoa, atuando o
agente imbuído para um fim inicialmente lícito (correção ou disciplina), ao
contrário das anteriores, quando os maus tratos são impostos por malvadez,
intolerância, impaciência, grosseria etc.
No crime de maus tratos o dolo é de perigo, pode-se distinguir que, se houver
dolo de dano, como, por exemplo, agressão física excessiva do pai ao filho,
malgrado o animus corrigendi, o delito será de lesões corporais (CP, art. 129),
podendo se transformar no crime de tortura do inciso II do art. 1º da Lei n.
9.455/97. 28
Assim, para que se configure o crime delito de maus tratos é necessário que o
abuso dos meios corretivos ou disciplinares ocorra mediante:
Os castigos físicos que não representem agressão contra a vítima. ‘O pai ou
mestre que põe o menor de joelhos, por longo tempo, ou que o obriga a subir ou
descer escadas, pode incorrer em crime de maus tratos, se excessiva a punição
disciplinar a ponto de tornar periclitante a saúde da vítima. Em tais hipóteses, o
crime será de lesões corporais, tão-só se o abuso do poder disciplinar foi praticado
com dolo de dano’. Se houver emprego de violência física, causadora de intenso
sofrimento físico ou mental, o agente responderá pelo crime de tortura (art. 1º, II,
da Lei n. 9.455/97).
Violência moral”. Exemplos: ameaças, intimidações, terror, impedimento do sono
etc., desde que idôneos a expor a perigo a vida ou saúde. Se, entretanto, a grave
ameaça causar intenso sofrimento físico ou mental, o agente responderá pelo
delito de tortura previsto no inciso II do art. 1º da Lei n. 9.455/97. Se, porém, o
sofrimento não for intenso, haverá delito de maus tratos, que, nesse caso, assume
o perfil de crime subsidiário.
28
II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou
grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou
medida de caráter preventivo.
44
45
2.2. VIOLENCIA DOMÊSTICA.
É na família onde tudo começa; sua função é importante para o desenvolvimento
da criança e do adolescente, pois não só os torna aptos, como também pode
qualificá-los como inaptos e até desajustados para viver em sociedade.
A partir do momento em que o núcleo familiar se desestrutura, por diversos e
conhecidos fatores, podem resultar atos violentos e agressivos ameaçadores do
convívio familiar; pode-se dizer que daí passa-se ao que doravante se
denominará violência doméstica contra a criança e o adolescente, exteriorizada
como abuso do poder disciplinar e coercitivo dos pais ou responsáveis em
relação aos filhos e pupilos. Tal abuso pode durar dias, meses ou anos
porquanto, enquanto não levado ao conhecimento das agências oficiais de
proteção, tudo se reveste com a característica do sigilo, vale dizer melhor, em
família de regra prevalece a “lei do silêncio”
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei n. 8.069/90), ao implantar a
doutrina da proteção integral em substituição à antiga doutrina da situação
irregular do revogado Código de Menores, em perfeita simetria com o comando
constitucional (CRFB, art. 227) reconhece os direitos próprios de toda criança e
adolescente, necessários à sua total proteção.
A seu turno, no art. 18 do mesmo Estatuto, contextualizado no Cap. II, que trata
“Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade”.
29
29
“É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer
tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”.
45
46
Daí resulta cristalizado que é dever primário dos pais e responsáveis garantir o
cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, remanescendo não só
como de caráter supletivo, mas também de natureza complementar, a
intervenção estatal na ordem familiar, vale dizer, na falha do mecanismo familiar
é dever do Estado garantir os direitos fundamentais de todas as crianças e
adolescentes.
30
Haverá violência, toda vez que houver violação aos direitos fundamentais das
crianças e dos adolescentes, tais como à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de deverem estar a salvo
de toda forma de negligência, discriminação, exploração, crueldade e opressão.
O termo violência não pode ser considerado como um termo global, porque ela
pode caracterizar determinados fenômenos num dado momento histórico. A
violência só pode ser entendida pela formação ideológica da sociedade em
conexão com uma análise de sua conjuntura social”
Os abusos que caracterizam violência contra crianças e adolescentes se
apresentam, de rotineiro, no geral, sob forma de agressão física, sexual,
psicológica ou mesmo como negligência no cumprimento e observância
daqueles direitos fundamentais. Uma não é menos grave que a outra, pois todas
ofendem aqueles direitos fundamentais garantidos.
A violência doméstica é encontrada em todas as classes sociais, mas assume
maior visibilidade nas camadas populares, primeiro por serem mais numerosas
e, segundo, por serem elas as que mais procuram, com maior freqüência, os
serviços públicos; por isto, vêm a lume fatores como pobreza crônica,
desemprego, subemprego, baixos salários, má ou falta de habitação, alcoolismo
e drogas, dentre outros, como responsáveis pela desestruturação familiar, com
conseqüências diretas na manutenção de prole consistente, gerando mais
30
www.dhnet.org.com.br.
46
47
violência. É a violência doméstica praticada contra crianças e adolescentes
gerando mais violência:
Indicadores físicos da criança ou adolescente” – presença de toda espécie de
lesões físicas, exemplificadas como queimaduras, feridas, fraturas que não se
adequar à coisa alegada. Ocultamento de lesões antigas.
Comportamento da criança ou adolescente “– muito agressivo ou apático.
Extremamente imperativo ou depressivo; assustável ou temeroso; tendências
autodestrutivas; teme aos pais, alega sofrer agressão dos pais; alega causas
pouco viáveis às suas lesões; apresenta baixo conceito de si; foge
constantemente de casa; tem problemas de aprendizagem e que podem ser
caracterizadas como “maus tratos”.
Características da família “– oculta as lesões da criança ou adolescente ou as
justifica de forma não convincente ou contraditória; descreve a criança como má
e desobediente; defende a disciplina severa, abusa de álcool e/ou drogas; tem
expectativas irreais da criança ou adolescente; tem antecedentes de maus-tratos
na família”.
Na realidade, estas “pistas” são apenas meros indicadores de comportamentos
para os profissionais que atendem aos protegidos, principalmente na área da
saúde e assistência social, buscarem a consolidação e padronização de critérios
para diagnósticos.
Neste ponto, a atuação séria e destemida dos Conselhos Tutelares, pelo menos
nas cidades de médio e pequeno porte, tem servido para receber notícias e
apurar atos de violência doméstica, muitas vezes reiterada, contra crianças e
adolescentes.
Aos pais e/ou responsáveis que se revelarem incapazes de cuidar do bem estar
dos filhos ou pupilos, ou que não exerçam com dignidade os devedores para
com eles, cuja responsabilidade lhes foi confiada pela lei ou pelo juiz, em
momento inicial poderão ser aplicadas as medidas previstas no art. 129 e
47
48
seguintes da ECA, 31 sobressaltando a advertência para aqueles que pratiquem
maus tratos – que não constituam crime -; depois, se o problema persistir, a
solução será a colocação da vítima em família substituta (guarda, tutela e
adoção); por fim, poderá o agressor ser afastado do lar, consoante dispõe o art.
130:
32
“Verificada a hipótese de maus tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou
responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do
agressor da morada comum”.
A partir da prática de tais atos, e com dificuldade probatória na maioria das
vezes, é que se poderá verificar se constituem simples crime de constrangimento
especial previsto no art. 232, do ECA.
33
31
Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:
I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;
II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e
toxicômanos;
III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;
IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;
V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento escolar;
VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;
VII - advertência;
VIII - perda da guarda;
IX - destituição da tutela;
X - suspensão ou destituição do pátrio poder.
32
Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou
responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da
moradia comum.
33
Artigo 232 do ECA.
Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento:
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
48
49
CAPITULO III
TIPOS DE VIOLÊNCIAS DOMÈSTICAS.
3.1. VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
“Todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra
crianças e/ou adolescentes que – sendo capaz de causar dano físico, sexual
e/ou
psicológico à vítima – implica de um lado numa transgressão de poder/dever de proteção
do adulto e, de outro, uma coisificação da infância, isto é, uma negação do direito que
crianças e adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição
peculiar de desenvolvimento”.
(Azevedo e Guerra, 1995) 34
34
Azevedo e Guerra, 1995
49
50
A família, que deveria fornecer aos seus jovens integrantes um ambiente
de proteção e tranqüilidade, auxiliando na formação da personalidade da
criança, instruindo-a e a preparando para enfrentar os "tropeços" da vida, inverte
seu papel, transformando-se no seio da violência, no palco de luta do mais forte
contra o desenvolvimento do mais frágil.
Existe violência infantil no momento em que uma ou várias pessoas invadem a
zona intocável da criança, de modo tão freqüente ou tão flagrante que o
desenvolvimento normal desta última corre o risco de ser afetado.
Ou seja, quando se violam direitos como o da intimidade, do respeito, da
liberdade, dignidade, entre outros, que compõem a personalidade da vítima,
pratica-se violência. Dessa forma, não só o abandono material identifica-se como
um ato de agressão, mas o simples fato de não se dar a devida atenção à
criança, aos seus problemas, ao seu universo, também a caracteriza.
São quatro as formas mais praticadas de violência: a física, a psicológica, a
sexual e a negligência podem-se conceituá-las como:
3.2. Negligência: "Privar a criança de algo de que ela necessita, quando isso
é essencial ao seu desenvolvimento sadio. Pode significar omissão em termos
de cuidados básicos como: privação de medicamentos, alimentos, ausência de
proteção contra inclemência do meio (frio / calor)”.
Um conceito amplo de negligência, ou omissão do cuidar, é o não atendimento
das necessidades básicas da criança, em variados níveis de gravidade. É uma
das formas mais freqüentes de maus tratos que há muito pouco tempo vem
sendo reconhecida como tal. Incluída no cotidiano de muitas famílias o
instituições, faz parte do contexto do que os adultos supõem ser seu direito de
escolher, na maioria das vezes sem questionamentos, a qualidade de vida
daqueles que deles dependem.
50
51
Sendo dever da família, da sociedade e do Estado colocar crianças e
adolescentes a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão (artigo 227 da Constituição Federal), compete à
equipe de saúde, ao atender uma suposta vítima de violência por ação o
omissão. Deve, também, agir com justiça, ou seja, garantir a qualquer criança ou
adolescente o acesso aos meios disponíveis de cuidados e de proteção que
viabilizem a sua existência, garantindo-lhe os direitos previstos nos Art. 5º e 227
da Constituição da República Federativa do Brasil.
Abandono: "Caracteriza-se como abandono a ausência do responsável pela
criança ou adolescente. Considera-se abandono parcial a ausência temporária
dos pais expondo-a a situações de risco. Entende-se por abandono total o
afastamento
do
grupo
familiar,
ficando
as
crianças
sem
habitação,
desamparadas, expostas a várias formas de perigo".
Abandono - Segundo o Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa, é a falta de
amparo ou de assistência. De acordo com o ECA, pratica o abandono os pais
que deixam, sem justa causa, de prover o sustento, a guarda e a educação dos
filhos menores de 18 anos (art. 22). O artigo 23 do Estatuto estabelece que a
falta ou carência de recursos não caracteriza, por si só, abandono de uma
criança ou de um adolescente e não pode servir de base para a decretação da
perda ou suspensão do poder familiar. Uma das violências mais cometidas
dentre a negligencia e o abandono.
A DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR PELO ABANDONO.
O abandono tem relevância jurídica tanto na esfera cível como na penal. A
análise desta situação revela a importância do conceito de abandono.
Código Civil de 1916.
Art. 395 – Perderá por ato judicial o pátrio poder o pai, ou a mãe:
I – que castigar imoderadamente o filho;
II – que o deixar em abandono;
III – que praticar atos contrários à moral e aos bons costumes.
51
52
Código Civil de 2002.
Art. 1638 – Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
I – castigar imoderadamente o filho;
II – deixar o filho em abandono;
III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.
Estatuto da Criança e do Adolescente.
Art. 22 – Aos pais incube o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendolhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações
judiciais.
Art. 24 – A perda e a suspensão do pátrio poderem serão decretadas judicialmente, em
procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de
descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o artigo 22.
Código Penal.
Abandono de incapaz.
Art. 133 – Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por
qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono.
Pena – detenção, de seis meses a três anos.
Ocorre diferença de pena caso do abandono resulte lesões corporais ou morte e
agrava-se a pena quando praticada por ascendentes. O abandono neste caso
significa largar, deixar sem assistência, o afastamento físico do incapaz.
Exposição ou abandono de recém-nascido
Art. 134
Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria.
Pena – detenção de seis meses a dois anos (agrava-se a pena se resulta lesão ou morte).
Abandono Material
Art. 244 – Deixar, sem justa causa, de prover à subsistência do cônjuge, ou de filho menor de
dezoito 2 anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou valetudinário, não lhes
proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia
judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar sem justa causa, de socorrer descendente ou
ascendente gravemente enfermo.
Pena: detenção de 1 a 4 anos, e multa .
Tais recursos necessários são os estritamente necessários à habitação,
alimentação, vestuário e remédios. Valetudinário é o incapaz de exercer
atividade em razão de idade avançada ou estada doentio.
Abandono intelectual .
Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar.
Pena: detenção de 15 dias a um mês ou multa.
52
53
As definições apresentadas pelos doutrinadores da área cível guardam uma
relação direta com a época em que foi lançada. Assim, os primeiros
doutrinadores citados definem o abandono com base no Código Civil de 1916 e
no Código de Menores. O último apresenta uma definição mais voltada ao
Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, uma pesquisa preliminar
aponta uma ausência de definição técnica do que vem a ser abandono,
ocorrendo a necessidade de se socorrer de outras áreas como o Código de
Menor, ECA.e Código Penal.
Abandono não é apenas o ato de deixar o filho sem assistência material, fora do
lar. Mas o descaso intencional, pela sua criação, educação e moralidade. O
Código de Menores, em seu artigo 26, caracteriza, com bastante pormenor, os
casos de abandono. Dentre as hipóteses figuradas nessa lei convém reproduzir,
a título de exemplo, os casos dos incisos III, IV, VII e VIII, que declaram
abandonados os menores de 18 anos:
III – que tenham pai, mãe ou tutor ou encarregado de sua guarda reconhecidamente
impossibilitado ou incapaz de cumprirem os seus deveres para com o filho ou pupilo ou
protegido;
IV – que vivam em companhia de pai, mãe, tutor ou pessoa que se entregue à prática de atos
contrários à moral e aos bons costumes;
VII – que, devido à crueldade, abuso de autoridade, negligência ou exploração dos pais, tutor ou
encarregado de sua guarda, sejam: a) vítimas de maus tratos físicos habituais ou castigos
imoderados; b) privados habitualmente dos alimentos ou dos cuidados indispensáveis à saúde;
c) empregados em ocupações proibidas ou manifestamente contrárias à moral e aos bons
costumes ou que lhes ponham em risco a vida ou à saúde; d) excitados habitualmente para a
gatunice, mendicidade ou libertinagem;
VIII – que tenham pai, mãe ou tutor, ou pessoa encarregada de sua guarda, condenado por
sentença irrecorrível: a) a mais de dois anos de prisão, por qualquer crime; b) a qualquer pena
como co-autor, cúmplice, encobridor ou receptador de crime cometido por filho, pupilo ou menor
sob sua guarda, ou por crime contra estes.
O abandono do filho é ato que implica desatendimento direto do dever de
guarda, bem como do de criação e educação. Revela falta de aptidão para o
exercício e justifica plenamente a privação, tendo em vista que coloca o filho em
situação de grave perigo, seja quanto à segurança e integridade pessoal, seja
quanto à a saúde e à moralidade. É o ato que afronta um dos direitos mais caros
dos filhos: o de estar sob os cuidados e vigilância dos pais. Traduz-se o
abandono na falta de cuidado e atenção, na incúria, ausência absoluta de
53
54
carinho e amor. O abandono que justifica a perda do poder familiar há que ser
aquele em que o pai deixa o filho à mercê da própria sorte, ainda que com
terceira pessoa ou com o outro pai, mas que não tenha condição alguma de
atendê-lo. O abandono pode ser de aspecto material, intelectual e afetivo.
COMPREENDENDO O ABANDONO NA DESTITUIÇÃO.
a) Princípio da proteção integral da ECA. O abandono familiar revela o não
cumprimento deste princípio por parte dos genitores.
b) Infringência ao dever de sustento, guarda e educação.
Não cumprimento dos deveres decorrentes do poder familiar.
c) Formas de abandono: material, intelectual, moral e afetivo.
d) O abandono que justifica a destituição é o voluntário e não o forçado ou não
querido.
e) Necessidade de ser demonstrado o abandono.
3.3.Violências Físicas contra Crianças e Adolescentes.
"Qualquer ação, única ou repetida, não acidental (ou intencional), cometida por
um agente agressor adulto (ou mais velho que a criança ou o adolescente), que
lhes provoque conseqüências leves ou extremas como a morte."
Os adultos com descontroles emocionais covardemente violentam a integridade
física da criança por atos atrabiliários e pela fragilidade da física da mesma. As
vezes podem não ter a reta intenção de ferir, mas assim mesmo, pelo uso da
força praticam atos de violência que culminam em graves ferimentos e terríveis
seqüelas quando não a morte.
Muitas crianças portam consigo seqüelas físicas que não chegam ao
conhecimento das autoridades porque são encobertos pelos próprios adultos no
caso os pais ou tutores.
54
55
São comuns murros e tapas, agressões com diversos objetos e queimaduras
causadas por objetos como cigarro, ferro elétrico de passar roupa, líquidos
quentes etc. 35
3.4.Violência Psicológica.
"É o conjunto de atitudes, palavras e ações dirigidas para envergonhar, censurar
e pressionar a criança de forma permanente. Ameaças, humilhações, gritos,
injúrias, privação de amor, rejeição, etc.”
É uma das violências de que os adultos estão constantemente praticando sem
tomarem a devida consciência como é o caso da discriminação e a segregação
em um ambiente familiar.
Os "patinhos feios" termo vulgar das crianças de uma constelação familiar, que
vivem, constantemente postas de lado, ou porque não são dotadas de pouca
inteligência que desagrada os pais, ou mesmo, não possuem características
estéticas bonitas. A segregação em muitos casos é tão evidente que até os de
fora passam a perceber.
A rejeição é a irmã gêmea da discriminação e da segregação. As crianças são
desprezadas, seus atos passam a ser constantemente reprovado com recusas e
são desdenhadas e repelidas.
A depreciação ocorre quando a criança perde a estima e a consideração; sendo,
desacreditada em todas os seus atos.
O desrespeito é parte da desconsideração, pois apesar de nítidos esforços que
determinadas
crianças
empregam
para
obterem
resultados
escolares
satisfatórios e não conseguindo seu intento são desrespeitadas sendo
comparadas com outras crianças que obtiveram notas altas, porém não sendo
levada em consideração a dedicação que as mesmas efetuaram.
35
Educar sem culpa, A gênese da Ética, Tânia Zagury.
55
56
Pais frustrados aproveitam o seu complexo de inferioridade para descarregarem
na frágil criança o seu mesquinho modo de ser, aplicando punições exageradas
como por exemplo em pleno inverno obrigarem a criança a tomar banho frio
como castigo, etc. Tais violências psíquicas podem não marcar fisicamente, mas
com certeza, deixarão marcas comportamentais negativas por toda a vida.
SÍNDROME DE MUNCHAUSSEN NA INFÂNCIA
Síndrome de Münchausen por procuração, é uma entidade relativamente rara,
de difícil diagnóstico, caracterizado pela fabricação intencional ou simulação de
sintomas e sinais físicos ou psicológicos em uma criança ou adolescente,
levando a procedimentos diagnósticos desnecessários e potencialmente
danosos O excesso de cuidados é uma forma grave de abuso da infância que
encontra na Síndrome de Münchausen por procuração a forma mais grave e
perigosa .A doença se torna para a criança münchausizada uma modalidade de
superar ou negar o medo de ser abandonada ou rejeitada pelos pais, convicta
que enquanto apresenta o sintoma físico à mãe se preocupará com ela,
enquanto a recuperação da saúde coincide com o medo do abandono materno.
A criança na Síndrome de Münchausen é tratada como figura de referência
afetiva, principalmente pela mãe que a considera como um doente, e perde a
capacidade de perceber corretamente a sensação que se origina do físico; com
a persistência do quadro perde o referencial de distinguir se os sintomas são
reais, imaginosos de sua parte ou induzidos pelos outros.
O nome da síndrome vem da literatura, em que o personagem, Barão de
Münchausen cujo nome era Hieronymus Karl Friedrich von Münchausen (17201797), alemão, tornou-se muito conhecido pelas mentiras humorísticas e
(agressivas) que contava de bar em bar. O barão de Münchausen criava
histórias fantasiosas, extremamente detalhadas, e todos acreditavam nelas.
Esse quadro foi inicialmente descrito em adultos, que criavam doenças em si
próprios. Posteriormente, em 1977, Meadow descreveu a situação em que pais
56
57
com desordens psiquiátricas produziam nos filhos o mesmo quadro. Daí a
denominação Síndrome de Münchausen by proxi, ou por procuração.
Burman foi o primeiro autor a referir-se com o nome de Síndrome de Polle a
forma de apresentação infantil da Síndrome de Münchaussen. Trataria-se de
uma forma muito particular de abuso ou maus tratos dirigidos contra as crianças,
que geralmente provem de seus próprios pais mais freqüentemente da mãe e as
motivações são similares as da Síndrome de Münchaussen, fazendo com que as
crianças sejam hospitalizadas e tratadas como doentes.
A etiopatogenia que é o estudo sobre a origem da síndrome da patologia, é
complexa, implicando na existência de uma patologia dual, em lugar da
individual Portanto enquanto a criança pode considerar-se objeto passivo desta
forma de adoecer, a mãe é o autentico sujeito atuante ou latente da patologia.
Poderíamos propor um perfil mais ou menos característico da criança vulnerável,
segundo o qual, casamentos com graves conflitos conjugais, ou mães imaturas,
com personalidades patológicas, ou com relações semióticas e dependentes
com seus filhos, chegam a elaborar sintomas ou estados patológicos para que
sejam consultados clinicamente, embora apesar de entrar numa dinâmica
contraditória entre a preocupação pela saúde do filho e a necessidade de que
esteja enfermo, como modo compensatório de seus próprios conflitos intra ou
extrapsíquicos.
Os métodos utilizados para a elaboração da sintomatologia são tão diversos
como surpreendentes, e os sistemas de produção e quadros clínicos podem
considerar-se quase ilimitados, sendo a maior ou menor acessibilidade dos
aparatos e o conjunto de elementos materiais, a imaginação das mães, é o que
determina a maior ou menor freqüência de apresentação.. Quanto aos métodos
a mais direta é a simples alegação e o exageros de sintomas anódinos que são
os medicamentos que mitigam ou fazem cessar a dor para que com tais
medicamentos
possa
provocar
de
forma
direta
lesões,
traumatismos,
57
58
intoxicações, etc. Em certas ocasiões as mães utilizam métodos mais
elaborados como manipulação de sinais de ferimentos.
Os quadros clínicos observados na criança podem ser muito variados tais como:
sintomas neurológicos, urológicos, digestivos, respiratórios, síndromes febris,
diabetes, hiperglicemias, traumatismos, infecções, desidratação, problemas
cutâneos etc. As crianças são submetidas a múltiplos exames, hospitalizações e
tratamentos que com freqüência causam um prejuízo no seu desenvolvimento
psicofísico,
quando
não
enfermidades
iatrógenas
(alteração
patológica
provocada no paciente por tratamentos não bem direcionados), graves riscos de
infecção hospitalar e inclusive a morte.
Nestes casos, os pais ou tutores utilizam artifícios diferentes para provocar-lhes
enfermidades fictícias em seus filhos, com o objetivo de obter um lucro ou
ganância secundaria mal definida na hospitalização da criança.
3.5. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA SILENCIOSA CONTRA A CRIANÇA
E O ADOLESCENTE PORTADOR DE NECESSIDADE ESPECIAS.
Dentro da história do fenômeno da violência doméstica contra crianças e
adolescentes um dos capítulos mais obscuros é o daquele que se relaciona a
vitimas portadoras de deficiências (de natureza mental, física) uma vez que as
contribuições científicas sobre a questão vem aumentando lentamente mais ao
final da década de 80 e inicio dos anos 90, acreditando-se que a Convenção das
Nações Unidas para os Direitos da Criança tenha tido o papel preponderante ao
alavancar este tipo de debate. Entretanto, o que se observa é que muitos
preconceitos cercam esta problemática e ainda perduram as atitudes de
descompromisso face à gravidade da questão.
A violência doméstica (através de espancamentos com cintos, chinelos,
sedação, confinamento, prática de atos libidinosos, estupros, negligência, etc)
58
59
pode fazer parte integrante da vida de crianças portadoras de deficiências físicas
e mentais;
Estas crianças são mais vulneráveis do que as demais como resultado do fato
de serem vistas como “diferentes” e, portanto, tratadas de forma também diversa
que diz respeito a suas freqüentes hospitalizações, educação com escolas
especiais, múltiplas pessoas incumbidas de seus cuidados, etc. Muito adultos
portadores de deficiências e que foram vitimas de violência doméstica em sua
infância ou de violência perpetrada por terceiros colocaram, por exemplo, que as
dificuldades de mobilidade física ou sua inabilidade para a defesa pessoal
contribuíram para estes quadros de violência se instalasse e perpetuasse;
As dificuldades para crianças deficientes em termos de relato da violência
doméstica se exacerbam na medida em que não conseguem se comunicar
adequadamente com os adultos que estão tentando investigar tais episódios,
bem como muitas vezes não dispõem de vocabulário necessário para descrição
dos fatos. O medo de ser desacreditado, o medo das repercussões do ato de
relatar, embora pertençam ao mundo de todas as vítimas de violência doméstica,
são mais agudos para os casos de deficiência;
As conseqüências do quadro de violência doméstica para as vítimas portadoras
de deficiências são da mesma natureza que para as vítimas não portadoras
deste tipo de problema. Acresce-se, entretanto, para elas o sentimento de maior
vulnerabilidade e o receio contínuo de que o fato se repita.
“Há muita relutância em se acreditar que qualquer pessoa pode perpetrar
violência contra crianças portadoras de deficiência (como se esta deficiência
conferisse algum grau de proteção). Elas podem ser vistas como tão sem
atrativos para se tornarem vítimas de violência sexual ou tão dignas de piedade
para serem vítimas de violência física”. Os pais também são considerados como
super-heróis, incapazes de cometer tais atos em relação a seus filhos, não se
percebendo com clareza o tipo de dificuldades que enfrentam. Isto leva a um
59
60
comportamento do profissional de “descrédito” ou de “negação” da violência
doméstica, aliás, muito perigoso e revelador de preconceitos.
Há dúvidas consideráveis em termos da possibilidade de que crianças com
deficiências especialmente de natureza mental possam funcionar como
testemunhas confiáveis em termos da violência que sofreram.
As oportunidades de tratamento para o problema da violência doméstica
oferecidas às vítimas portadoras de deficiência são, em geral, mais restritas
(dados relativos a países desenvolvidos), uma vez que demandam profissionais
treinados para a abordagem conjunta de dois fenômenos: a deficiência e a
violência, bem como implicam em maiores recursos financeiros, além
evidentemente da necessidade de que os serviços voltados à atenção para a
deficiência se conscientizem da necessidade do estabelecimento de medidas de
proteção à infância e os serviços voltados a esta mesma proteção dirijam
seu olhar para os casos de deficiência na tentativa de se proceder a um
diagnóstico precoce e a uma intervenção imediata quando quadros de violência
doméstica aparecem.
60
61
3.6.Violência Sexual.
"Entendemos todo ato ou jogo sexual, relação heterossexual ou homossexual
entre um ou mais adultos e umas crianças menores de dezoito anos, tendo por
finalidade estimular sexualmente a criança ou utilizá-la para obter uma
estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa".
Crime considerado grave contra a criança ou adolescente, cuja conseqüência
para os vitimizadores, se forem pais ou responsável, pode ser o afastamento da
moradia comum com a criança ou adolescente abusado, conforme previsto no
artigo 130 da ECA. 36
A cultura difundida na sociedade ocidental, a partir da Idade Moderna, criou
bases que expandiram a relação domínio-exploração entre os indivíduos. Para
tanto, houve a domesticação da sexualidade, posto a serviço dos interesses
capitalistas (a teoria utilitarista do sexo elegendo-o como fator gerador da massa
de trabalhadores). Dessa forma, proporcionou, no meio social, a formação de
dois pólos antagônicos, compostos de um lado pelo sexo masculino,
representando o ser ativo e pensante da família, e de outro o feminino e o
infanto-juvenil, desempenhando os papéis de seus subordinados.
Construiu-se então, com o auxílio de elementos - faixa etária, sexo, raça - uma
pirâmide social, que estabelecia quase que automaticamente a função de cada
36
Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou
responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do
agressor da moradia comum.
61
62
indivíduo na sociedade. Assim, as meninas, quando nasciam, já tinham seu
futuro destinado a servir aos homens, e como suas mães, desempenhar
fielmente as tarefas familiares.
Da mesma maneira, ocorria com os meninos, que tinham como retrato os
próprios pais. Portanto, ao homem, é atribuído o papel de liderança e autoridade,
e à mulher o exemplo de submissão, modéstia, discrição e eficiência doméstica.
Entretanto, nesse padrão hierárquico, os que mais sofriam com a discriminação
e a indiferença, eram as crianças e os adolescentes, pois se o homem reprimia a
mulher, ambos, por sua vez, dominavam os infantes.
Esse processo vicioso vem reforçando, durante séculos, a construção do
estereótipo feminino e masculino, e servindo como justificativa para a existência
das mais diversificadas situações de desigualdade.
Desde então, a violência contra a mulher e os infante-juvenis foi crescendo
desenfreadamente, tornando-se tão legítima a ponto de o próprio Estado e
outras instituições (escolas, igrejas, entre outras), também a exercerem.
Dentre várias formas de manifestações dessa violência, a sexual vem
mostrando-se como a mais agressiva, nos últimos tempos, já que o homem
consegue constranger, não só física como também moralmente, a liberdade
sexual do dominado, a tal ponto que obtém a anulação da vontade do mesmo,
concretizando sua agressão, numa demonstração de força e poder.
Dada a constante ocorrência de uma série de atos dessa natureza, que atingem
crescentemente as mais variadas classes sociais e faixas etárias, transportou-se
o assunto da esfera privada, onde era tratado com cautela e discrição, para o
espaço público; implicando não só a responsabilidade do violentador, como de
toda a sociedade que acobertou durante anos, entre quatro paredes, a gravidade
do problema.
62
63
Entretanto, discutir a problemática da violência sexual é enfrentar, ainda,
determinados tabus que insistem em impedir uma clara e ampla compreensão
da situação de abuso. Entre alguns, está a dificuldade que as pessoas possuem,
em aceitar a incidência do abuso sexual no âmbito familiar. Nesse caso, a
gravidade é reforçada pelo fato de se utilizar-se não só da mulher-adulta, como
alvo preferido, mas também por eleger as crianças e os adolescentes,
exercendo-se, o que os estudiosos das Ciências Sociais denominam por abusovitimização infanto-juvenil.
Abuso-vitimização expressa o fenômeno em sua totalidade de processo de causar
dano à criança através de sua participação 'forçada' em práticas ou atos eróticos.
A diferença reside no fato de que quando se emprega ABUSO, a ênfase é posta
no pólo adulto, isto é, naquele que impõe, que 'força', que coercitivamente domina
o processo. Quando se emprega VITIMIZAÇÃO, a ênfase é posta no pólo criança,
isto é, naquele que sofre a coação, que recebe a injúria e o dano.
63
64
CAPITULO IV.
VIOLENCIAS FISICAS CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES.
4.1. VIOLÊNCIA FÍSICA.
Às vezes, a pessoa que bate não está pensando na criança, mas na própria
raiva. Depois, o agressor acaba se sentindo mal e a criança percebe isso. É
preciso saber colocar limites, sem agressão física. A criança não nasce sabendo
as regras, ela precisa que alguém explique o que se deve ou não fazer.
“É o uso de força física de forma intencional; não acidental, por parte dos pais ou
responsáveis da criança / adolescente, com o objetivo de ferir, danificar e até
mesmo destruir, deixando ou não marcas evidentes”.
(Guerra, 1985).
Atualmente, no Brasil, o marco teórico adotado para conceituar a violência
contra crianças e adolescentes tem por base a teoria do poder.
Todo poder implica a existência de uma relação, mas nem todo poder está
associado à violência. O poder é violento quando se caracteriza como um
64
65
relação de força de alguém que a tem e que a exerce visando alcançar objetivo e
obter vantagens (dominação, prazer sexual, lucro) previamente definidos. A
relação violenta, por ser desigual, estrutura-se num processo de dominação,
através do qual o dominador, utilizando-se de coação e agressões, faz do
dominado um objeto para seus “ganhos”. A relação violenta nega os direitos do
dominado e desestrutura sua identidade. O poder violento é arbitrário ao ser
“autovalidado” por quem o detém e se julga no direito de criar suas próprias
regras, muitas vezes contrárias às normas legais.
As punições corporais contra crianças e adolescentes, como palmadas,
chineladas, são práticas habituais em quase todas as sociedades. Encarados
como ferramentas essenciais para a disciplina, estes castigos, que variam em
intensidade.
Embora para o senso comum, a “Pedagogia da Palmada” seja simplesmente um
instrumento corretivo (ou preventivo), ela encerra um problema muito maior que
é a banalização do uso da violência como meio de solucionar conflitos. Além
disso, ensina a criança que a violência é uma maneira plausível e aceitável de se
solucionar conflitos e diferenças, principalmente quando você está em uma
posição de vantagem física frente ao outro. 37
O castigo físico e humilhante imposto à infância poderá ter reflexos negativos ao
longo da vida da criança. Ademais, constituem uma violação aos Direitos
Humanos fundamentais, atentando contra a dignidade humana e a integridade
física das crianças.
Educar os filhos não é uma tarefa fácil. O relacionamento entre pais e filhos é
cercado de expectativas, que quando não são satisfeitas acabam gerando
frustrações e muitas vezes desentendimentos. As razões que levam a isso são
diversas. Por um lado os pais nem sempre tem condições para dar aos filhos o
necessário para um crescimento saudável e às vezes esperam que eles sejam
37
Educar sem culpa, A gênese da ética, Tânia Zagury editora Record 1993.
65
66
iguais a eles, ou ainda, que eles sejam aquilo que gostariam de ter sido e não
foram.
Muitas vezes acreditamos que a melhor forma de educá-los ou conseguir que
façam o que achamos melhor para eles é através da rigidez e do uso de castigos
físicos, o que nem sempre funciona e pode ter efeitos nocivos ao pleno
desenvolvimento da criança. Muitos pais justificam o uso do castigo físico
dizendo que tentaram educar na conversa e não deu certo. Isto pode ocorrer por
diversos motivos, mas geralmente ocorre por falta de consistência na aplicação
de estratégias educacionais positivas. 38
Estamos quase na porta de um novo milênio, e a violência educativa está.
Claramente banalizada em nosso país. "Dar uma boa palmada" como método
educativo está fortemente enraizado no cotidiano das pessoas, apesar de todas
as palavras que denunciam estes métodos. As pessoas gostam de afirmar que
"eu sempre apanhei de meus pais e como estou bem, vou continuar a fazer isso
com meus filhos". É preciso refletir que a criança sempre foi considerada, na
história da humanidade, como uma propriedade de seus pais que podiam fazer
com ela o que lhes aprouvesse. A violência nos métodos educativos previa
"domesticar" a criança, considerada um mini-adulto imperfeito, até que ela se
tornasse um adulto.
Não é possível deixar de pensar sobre o tipo de sociedade que temos hoje, feita
exatamente por crianças que sofreram coerção e violência, e, portanto,
aprenderam a utilizar estes mesmos métodos na construção do mundo,
perpetuando uma sociedade imersa na lei do mais forte. A violência física
praticada contra crianças e adolescente é uma violação dos direitos humanos
universais e dos direitos peculiares à pessoa em desenvolvimento, assegurados
na Constituição Brasileira, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na
38
Campanha, não bata eduque.
66
67
Normativa Internacional. O Código Penal prevê como crimes as lesões corporais
dolosas e culposas (artigo 1 9).
TIPOS DE VIOLÊNCIA COMETIDAS PELOS PAIS
Queimaduras (imersão em água quente)
Espancamentos com utilização de objetos (pau, palmatória, barra de ferro, cabo
de vassoura, chinelo, vara, chicote, algemas, cinta e etc)
Cortes
Socos
Pontapés
Beliscão
Imersão da cabeça na privada
Puxão de cabelo.
4.2. A PALMADA
A palmada aparentemente pode até resolver, porque num primeiro momento faz
com que a criança se sinta amedrontada e recue. Por outro lado, podem ocorrer
casos em que mesmo apanhando e com medo, a criança que se sente
extremamente agredida e que identifica – com razão – tal atitude como ação
covarde, humilhante, encontra forças para enfrentar os pais dizendo, por
exemplo: “Não doeu!”, Viu? Nem chorei!”, e coisas do gênero. É uma forma de
defesa que pode redundar em mais agressão, porque faz com que o pai ou a
mãe se descontrole (mais do que já está) e perca completamente o domínio
sobre si mesma. Dessa forma, pode acabar numa verdadeira pancadaria, e até
mesmo espancamento”.
O que ocorre com freqüência é que a palmada tende a ir “perdendo o efeito”, isto
é, a criança acaba se “acostumando” a apanhar, e passa, gradativamente, a
temer cada vez menos esse tipo de agressão. O perigo reside no fato de que a
67
68
tendência dos pais é começar a bater mais e mais, tentando conseguir de novo o
efeito inicialmente alcançado. 39
Acreditamos que, com algumas exceções, o que acontece é que muitas vezes
os pais agridem os filhos quando deixam de agir precocemente em situações
que desaprovam. Ocorre que ao não colocar limites, vão permitindo ou admitindo
certos comportamentos nos filhos, e só ao se sentirem irritados, cansados,
exauridos, é que agem, tentando proibir ou coibir atitudes que, até então, pelo
menos aparentemente, eram aceitas. Não é difícil entender que nessas
situações a tendência natural da criança é teimar, insistir na atitude que está
acostumada a ter, gerando então os momentos de “desespero”, os gritos, as
palmadas e os castigos exagerados dos pais.
4.2.1. LOCAIS DO CORPO MAIS ACOMETIDOS
PELE – Tipos de lesões incluem desde a hiperemia, escoriações, equimoses,
hematomas e queimaduras de 1º a 3º grau.
ESQUELETO – Os ossos longos são os mais comprometidos. Os ossos
cranianos são os ossos chatos mais lesados.
SISTEMA NERVOSO CENTRAL - “Síndrome do bebê sacudido”
ÓRGÃOS INTRA-ABDOMINAIS - Lesões, hemorragias internas provocadas
através de socos, chutes, pauladas, etc.
Como pode ser observado, quando for utilizado algum instrumento para se
efetuar a agressão, pode-se identificar a forma do mesmo através das marcas
deixadas sobre a pele.
INDICADORES DE VIOLÊNCIA FÍSICA
INDICADORES
FÍSICOS:
fraturas,
hematomas,
marcas
de
mordidas,
queimaduras, cortes, cicatrizes.
INDICADORES COMPORTAMENTAIS: dificuldade de concentração, distúrbios
de aprendizagem, relutância em voltar para casa, agressividade e rebeldia
39
Violência contra crianças e adolescentes em busca de uma definição, Simone Gonçalves de Assis, Suely
Ferreira deslandes, Maria Aparecida Barbosa Marques.
68
69
(repetição do comportamento punitivo dos pais e uso da agressão para afirmar
seu poder sobre os outros), fugas constantes.
4.3. NATUREZA DA VIOLÊNCIA FÍSICA
A preocupação com os direitos da criança e do adolescente trouxe à tona o
problema dentro dos lares; a história do direito da criança confunde-se com a
evolução da abordagem da violência doméstica, por isso, o histórico enfatizará
este aspecto, ressaltando uma trajetória de abusos, maus-tratos e um processo
de humanização da justiça.
Quanto mais regressamos na história, maiores as chances de depararmo-nos
com a falta de proteção jurídica à criança, aumentando as probabilidades de que
tivessem sido abandonadas, assassinadas, espancadas, aterrorizadas e
abusadas física e sexualmente. Exemplos são colhidos ao longo da história,
assinalando-se que, no Oriente Antigo, o Código de Hamurábi (1728/1686 a.C.),
em seu art. 192, previa o corte da língua do filho que ousasse dizer aos pais
adotivos que eles não eram seus pais, assim como a extração dos olhos do filho
adotivo que aspirasse voltar à casa dos pais biológicos, afastando-se dos pais
adotantes (art. 193). Punição severa era aplicada ao filho que batesse no pai.
Segundo o Código de Hamurábi, a mão do filho, considerada o órgão agressor,
era decepada (art. 195). Em contrapartida, se um homem livre tivesse relações
sexuais com sua filha, a pena aplicada ao pai limitava-se à sua expulsão da
cidade (art. 154). Em Roma, a Lei das XII Tábuas, entre os anos 303 e 304,
permitia ao pai matar o filho que nascesse disforme, mediante o julgamento de
cinco vizinhos (Tábua Quarta).
69
70
No período que antecedeu ao século XVIII, surge a utilização dos castigos, da
punição física, dos espancamentos através de chicote, ferros e paus às crianças.
Justificavam os pensadores da época que os pais deveriam cuidar para que
seus filhos não recebessem más influências. Acreditavam que as crianças
poderiam ser moldadas de acordo com os desejos dos adultos. Novas
concepções, como a contribuição de John Locke, em sua obra intitulada Da
educação das crianças, um dos clássicos da pedagogia européia do século
XVIII, alertava os pais para a importância da prevenção "como o meio mais
eficaz de preservar a saúde dos filhos". O mesmo autor propôs que se desse
"atenção rigorosa ao desenvolvimento intelectual e à capacidade de autocontrole
da criança". Assim como Locke, também Rousseau, no século XVIII, contribuiu
para o entendimento do significado da infância. Afirmava que "a criança é
importante em si mesma, e não meramente como um meio para um fim", além
de sustentar que "a infância é o estágio da vida em que o homem mais se
aproxima do “estado de natureza”. Na Inglaterra, em 1780, "as crianças podiam
ser condenadas por qualquer um dos mais de duzentos crimes cuja pena era o
enforcamento". Entre 1730 e 1779, metade das pessoas que morreram em
Londres tinha menos de cinco anos de idade. Somente no século XIX, o filho
passa a ser objeto de investimento afetivo, econômico, educativo e existencial. É
neste período que passa a ocupar a posição central dentro da família que, por
sua vez, passa a ser um "lugar de afetividade, onde se estabelecem relações de
sentimento entre o casal e os filhos, lugar de atenção (bom ou mau)". Surge o
interesse de filantropos, médicos e estadistas em auxiliar as crianças
provenientes de famílias pobres. Em 1841, é editada uma das primeiras leis
sobre a limitação do tempo de trabalho nas fábricas, voltada à proteção da
criança, "marcando a primeira guinada de um direito liberal rumo a um direito
social". Na Europa, a partir de 1850, percebe-se o filho como sendo objeto de
amor dos pais, e a sua morte passa a ser motivo de luto para o adulto. É, nesse
70
71
período, que os manuais de educação sinalizam para a prece infantil e maternal,
forma de aproximar mães e filhos em torno da aprendizagem da oração. 40
A chegada das primeiras crianças ao Brasil, mesmo antes do seu descobrimento
oficial, foi marcada por situações de desproteção. Na condição de órfãs do Rei,
como grumetes ou pagens, eram enviadas com a incumbência de casarem com
os súditos da Coroa. Poucas mulheres vinham nas embarcações, e as crianças
eram "obrigadas a aceitar abusos sexuais de marujos rudes e violentos". Por
ocasião dos naufrágios, comuns na época, eram deixadas de lado pelos adultos,
entregues à fúria do mar.
No final do século XIX, as descobertas de Freud e outros pensadores abriram
caminho para novos entendimentos sobre a infância:
"Freud e Dewey cristalizaram os paradigmas básicos da infância, que vinha
sendo formado desde a invenção da prensa tipográfica: a criança como aluno ou
aluna, cujo ego e individualidade devem ser preservados por cuidados especiais,
cuja aptidão para o autocontrole, a satisfação adiada e o pensamento lógico
devem ser ampliados, cujo conhecimento da vida deve estar sob controle dos
adultos".
Até o final do século XIX e início do século XX, a criança foi vista como um
instrumento de poder e de domínio exclusivo da Igreja. Somente no início do
século XX, a medicina, a psiquiatria, o direito e a pedagogia contribuem para a
formação de uma nova mentalidade de atendimento à criança, abrindo espaços
para uma concepção de reeducação, baseada não somente nas concepções
religiosas, mas também científicas.
O primeiro estudo científico sobre a violência contra a criança foi realizado na
França, em 1860, pelo Professor Ambroise Tardieu, presidente da Academia de
Medicina de Paris, estabelecendo o conceito de criança maltratada. Nos EUA, a
violência doméstica contra crianças veio ao conhecimento do público através do
40
Azevedo, MA, Guerra, VNA. Infância e violência doméstica: Fronteiras do Conhecimento.
71
72
caso da menina Mary Ellen, de 8 anos, que foi severamente maltratada,
resultando na fundação da Sociedade de Prevenção da Crueldade contra
Criança em 1874. No século XX, a redescoberta da violência doméstica foi
assinalada por Caffey (1946), que descreveu a síndrome de crianças com
hematomas subdurais associados a múltiplas fraturas de ossos longos, de
origem traumática. Até 1960, pensava-se que a violência contra a criança era
rara, em parte porque a disciplina física de crianças era mais aceita; em parte,
pela sua negação. Em 1962, Kempe et al. publicaram um importante artigo no
JAMA, descrevendo a síndrome da criança espancada, tornado o problema da
lesão infligida um problema evidente para a comunidade.
Nos anos 70, em todo EUA, foram aprovadas leis nas quais requeria-se a
designação de pessoas para notificar a violência doméstica contra a criança e o
adolescente. Isso acabou provocando um melhor entendimento da extensão da
violência sexual contra crianças. Era sabido que o incesto ocorria, mas muitos
acreditavam que deveria ser muito raro e que se sucedia apenas entre famílias
muito comprometidas.
Embora Freud já tenha abordado o assunto, em 1919, foi com a publicação da
obra "Síndrome da Criança Espancada", de Kempe e colaboradores, em 1962,
em Chicago, que o maltrato a infância começou a ser aceito como objeto de
investigação, passando a chamar a atenção dos profissionais da saúde e do
público em geral para a necessidade de proteção à criança.
Em 1924, a União Internacional do Fundo para a Salvação de Crianças
estabeleceu, através da Declaração de Genebra, a primeira tentativa de codificar
os direitos elementares das crianças, merecendo a ratificação pela Liga das
Nações. O texto, composto de cinco artigos, embora sem caráter coercitivo, foi o
marco inicial, em nível internacional, na luta pelos direitos da infância. Em 1948,
a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas reafirma o
direito a cuidados e assistência especiais a esta parcela da sociedade. No
72
73
mesmo ano, a Declaração de Genebra, através de revisão e ampliação, veio a
se constituir na base para a Declaração dos Direitos da Criança, adotada pela
Assembléia Geral da ONU em 1959. Dez princípios compõem o documento que
passou a incorporar novas diretrizes de proteção dos direitos humanos
aplicáveis à infância. Sua importância deve-se ao fato de ter contribuído para o
chamamento dos pais, dos cidadãos, das organizações não-governamentais,
das autoridades e dos governos ao reconhecimento dos direitos da criança.
A evolução das ciências, em sentido amplo, influenciou no surgimento das
diversas legislações protetivas à criança, permitindo constatar que, no Brasil, de
res, isto é, de simples objeto de satisfação dos desejos dos adultos, passou, na
pós-modernidade, mais especificamente no ano de 1988, à condição de sujeito
de direitos, com a introdução do art. 227 da Constituição Federal. Cada vez
mais, faz-se necessário um trabalho interdisciplinar, em que "médicos,
psicólogos, pedagogos e assistentes sociais, profissionais que, no exercício de
suas atividades, podem estar envolvidos com o atendimento e a defesa de
direitos de crianças e adolescentes e suas violações". Em que pesem os
avanços registrados ao longo da história, tanto no aspecto social, médico, como
jurídico, as crianças vítimas de violência, no Brasil, ainda formam um grande
contingente, no qual encontramos, basicamente, "a infância pobre, vítima de
violência social mais ampla; a infância explorada, vítima de violência no trabalho;
a infância torturada, vítima da violência institucional; a infância fracassada, vítima
da violência escolar; a infância vitimizada, vítima da violência doméstica".
Entre as inovações operadas a partir de 1988, de basilar relevância é o
chamamento lançado à família, à sociedade e ao poder público no que diz
respeito ao atendimento dos direitos fundamentais da criança, elevados ao
patamar de prioridade absoluta. De todos os setores, há de vir o envolvimento,
recaindo, de igual forma, sobre todos a responsabilização pelo descumprimento
dos novos deveres, hoje guindados à condição de direitos da infância. Negar à
criança os direitos humanos fundamentais, frente ao disposto na nova Carta
73
74
significa negar-lhe a essência da própria dignidade humana. O moderno
paradigma da infância passa a ser também o moderno paradigma da vida adulta.
Existe uma aliança solidária entre os pais, dificilmente um dos cônjuges exerce
este tipo de violência sem a cumplicidade silenciosa do outro, sendo mais raro
que o parceiro não agressor revele o problema a terceiros.
O agressor dificilmente reconhece espontaneamente a sua responsabilidade
sobre a situação.
Família com critérios estabelecidos à priori, isto é, pais detentores do saber,
inquestionáveis, “perfeitos e bons” versus filhos que não sabem nada, que
precisam ser corrigidos, de má índole. 41
4.4. VÍTIMAS DAS VIOLENCIAS FISICAS.
GÊNERO: masculino e feminino
IDADE: 0 à 18 anos sendo a faixa de maior risco a de 0 a 5 anos devido a
dificuldade de auto-proteção.
AGRESSORES
VÍNCULO: Pai ou mãe (biológicos; padrastos, madrastas; ou adotivos) –
estatísticas internacionais – pais biológicos 70%
GÊNERO: No Brasil, a figura feminina passa a maior parte do dia com os filhos,
o que a torna a agressora em geral, no entanto, as lesões mais graves são
causadas por agentes do sexo masculino, o pai, devido a sua força física.
FATORES FACILITADORES DA VIOLENCIA FISICA.
Imaturidade emocional
Desconhecimento das fases do desenvolvimento infantil e juvenil
41
www.usp.br/ip/laboratorios/lacri.
74
75
Gravidez indesejada
Dependência química
Distúrbios psiquiátricos / psicológicos
Doenças físicas e mentais
Grande número de filhos
Falta de espaço físico
Perda de entes queridos
Comportamento da criança
Histórico de violência doméstica durante a infância/adolescência.
Causas Fundamentais:
Podemos considerar a violência como abuso na família; pais que sofreram
violência intrafamiliar provavelmente abusarão mais de seus filhos; influência de
álcool/drogas; isolamento físico e social da família falta de controle dos impulsos;
stress financeiro/emocional; número de membros na família; expectativas
irrealistas por parte dos pais em relação aos filhos; gravidez difícil/indesejada;
prematuridade ou doenças na criança; falta de conhecimento sobre o
desenvolvimento infantil; desemprego; brigas conjugais e outros fatores.
4.5. AVALIANDO O INCIDENTE
Devido ao fato de crianças menores de 6 anos sofrerem maior risco de serem
abusadas, muito dos pais ao serem investigados do fato agressor, força
ferimentos na cabeça da criança para que pareça que foi um acidente.
Crianças também podem ser machucadas seriamente quando sacudidas
violentamente. Os motivos racionais dados pelos pais para sacudir são: como
meio de ressuscitação, dificuldades respiratórias, irritabilidade, letargia, perda do
apetite, vômito e choro. As pessoas têm impressão de que (uma boa sacudida)
parece ser socialmente mais aceitável e fisicamente menos perigosa do que um
soco, puxão, na cabeça ou em qualquer outra parte do corpo.
Porém,
75
76
dependendo da faixa etária, essa “sacudidela” poderá provocar sérias
conseqüências tais como: morte, coágulos no cérebro, problemas motores,
visuais, auditivos, letargia, vômito e estupor.
Em alguns incidentes de abuso, o responsável pode parecer despreocupado
com a criança ou tentado a ocultar os ferimentos; é possível que um adulto
proteja a identidade da pessoa responsável pela agressão. Geralmente também
os responsáveis atrasam o tratamento, ou eles selecionam o hospital e um
médico diferente em cada episódio de agressão (isto se for constante a violência
sofrida pela criança). Esta prática é conhecida como rodízio de hospitais.
INVESTIGANDO AS INJÚRIAS DOS FERIMENTOS.
É geralmente aceito que mãos e pés são as armas mais comuns usadas durante
o abuso. Se armas de verdade ou objetos são usados, são em geral
instrumentos domésticos.
O tamanho total e a forma do ferimento padrão
deixado no corpo da criança podem indicar que objeto foi utilizado. Existem dois
grupos de objetos a serem utilizados:
Objetos rígidos: raquete, bastões, tábuas, escova de cabelo, chinelo, fivela de
cinto, etc.
Objetos flexíveis: cinto, fio de eletricidade ou uma vara fina.
Objetos rígidos não acompanham as dobras do corpo, já os flexíveis
acompanham e podemos em algumas situações observar uma extensão maior
na pele provocada por esse objeto.
Período de tempo das contusões:
TEMPO
COR
0 – 2 dias
inchada e macia
2 – 5 dias
vermelha, azul
76
77
5 – 7 dias
verde
7 – 10 dias
amarela
10 – 14 dias
marrom
2 – 4 semanas
clara
Período de tempo das escoriações:
TEMPO
COR
Em algumas horas
sangue pisado, superfície inflamada e fluído claro
Depois de 6 horas
seco, vermelho dependendo do tratamento
Depois de 24 horas
forma de cicatriz
QUEIMADURAS
Queimaduras são a segunda causa mais freqüente de morte acidental em
crianças de 1 a 4 anos. Como forma de abuso de criança, queimaduras
receberam pouca atenção.
Mais de 70% das queimaduras infantis ocorrem em casa durante os momentos
de maior tensão do dia e meses mais difíceis do ano:
Meses de inverno, quando a família fica mais em casa.
No final do dia, quando a criança está mais cansada e como fome.
Pela manhã, quando a criança acabou de acordar.
Machucados por queimaduras em crianças são normalmente classificados como
acidentais, quando na verdade o abuso é a verdadeira causa. Os indicadores no
índice de suspeitas mostrado a seguir podem ser úteis ao se determinar se o
abuso foi um fator no incidente de queimadura.
Índice de suspeitas
Inexplicado atraso no tratamento que exceda duas horas;
Injúrias que parecem mais antigas do que quando o incidente supostamente
ocorreu;
Ambivalência ao procurar atendimento médico;
77
78
Uma causa de injúria incompatível com a idade e o desenvolvimento da criança;
Insistência do responsável de que não houve testemunhas do “acidente”;
Alguém que não seja o pai, a mãe ou o responsável que leve a criança para a
sala de emergência;
A culpa da queimadura é atribuída a um irmão, irmã ou outra criança qualquer;
A criança ferida ser excessivamente retraída, submissa, muito polida, ou não
reagir a tratamentos dolorosos;
Queimaduras isoladas nas nádegas;
A história do que aconteceu, mudar muitas vezes ou haver discrepância nas
versões contadas por cada um dos pais.
Os locais mais comuns para se suspeitar de fratura ou danos são:
Costelas.
Crânio.
Parte superior do braço no ombro.
Parte superior da perna na altura do joelho.
Mãos.
Pés.
Fraturas múltiplas nas costelas são raras quando uma criança é ferida
acidentalmente, como em uma queda da cama ou do berço. Estas fraturas
múltiplas normalmente são causadas por apertões violentos no tronco. Costelas
também são quebradas quando o bebê ou a criança pequena é agredido no
tronco, chutado ou arremessado contra um objeto duro. O abuso de criança deve
ser fortemente suspeitado quando o RAIO X mostrar múltiplas fraturas das
costelas em variados estágios de restabelecimento.
Uma fratura na base do crânio deve ser suspeitada se outros sinais de abuso
estiverem presentes. Isto inclui pequenos hematomas atrás das orelhas e
sangue ou algum outro fluido escorrendo do nariz ou dos ouvidos.
.
78
79
Uma grande parte dos incidentes de abuso físico de crianças causam injúrias no
tecido superficial, que são hematomas, vergões, lacerações, abrasões e
queimaduras.
HEMATOMAS
Hemorragia intradermal ou sangramento interiormente à pele.
Petéquia: Hematoma muito pequeno causado por rompimento de capilares
Púrpura: Pequenos hematomas que aparecem em grupo ou apenas um isolado
(medindo acima de 1 cm).
Equimose: Hematomas maiores.
VERGÕES
Sulco em relevo ou protuberância na pele
LACERAÇÕES
Corte denteada ou ferida
ABRASÕES
Superfície do corpo desprovida de pele devido a arranhão.
QUEIMADURAS
Efeitos de energia térmica na pele.
O hematoma é o escapamento de sangue dentro dos tecidos de uma pessoa
viva ou recentemente falecida devido ao rompimento de capilar por força
moderada.
Queimaduras resultam do efeito de energia térmica sobre a pele. A epiderme é a
mais fina das duas e fica na parte externa do corpo, servindo como uma capa
protetora. A derme forma a massa da pele e está localizada entre a camada
epidérmica e a área subcutânea de músculos e ossos. As terminações nervosas
79
80
que transmitem dor, temperatura, e sensações estão localizadas somente no
interior da camada dérmica da pele.
A classificação de queimaduras mais comumente usada é a que se refere a
queimaduras de primeiro, segundo e terceiro graus, sendo que a mais séria é a
de terceiro grau. Este tipo de classificação apenas se refere à característica
visual do ferimento e na verdade não é positivamente descritiva da injúria. A
classificação de queimaduras preferencialmente usada pela maioria dos médicos
é densidade “parcial” ou “total” da queimadura.
Uma criança forçada a sentar numa vasilha de líquido quente freqüentemente
produzirá uma queimadura em forma de “rosquinha”, porque as nádegas fazem
um firme contato com o fundo do recipiente, desta maneira poupando esta área
da queimadura. A presença deste tipo de queimadura “rosquinha”, indica que
alguém estava segurando a criança, impedindo a sua fuga.
Outras áreas comuns em casos de queimaduras por imersão são as mãos e os
pés. Quando algum destes apêndices e imerso em liquido quente, a
configuração resultante da injúria é conhecida como “queimadura tipo meia” ou
“queimadura tipo luva”.
A queimadura de contato, também conhecida como queimadura seca, é um tipo
de queimadura abusiva. Exemplos de utensílios que são sabidamente usados
para causar queimaduras de contato são ferros de passar roupa, estufas,
aquecedores, grelhas, canos de radiador, pratos quentes e ferros para enrolar
cabelos. Essencialmente, qualquer utensílio capaz de produzir calor pode ser
usado num incidente abusivo.
As queimaduras deliberadas, provocadas por cigarro vão produzir pequenas
queimaduras circulares com cerca de um centímetro de diâmetro. Os ferimentos
80
81
vão varias desde de uma bolha até uma cratera, dependendo da duração do
contato.
MARCAS NA ÁREA DA CABEÇA, PROVOCADA PELA VIOLENCIA.
OLHOS: quando uma criança aparece com os dois olhos roxos é mais lógico
que se assuma que deve ter ocorrido um comportamento agressivo, tipo de
injúria nos olhos é a hemorragia na retina; esta está presente em mais de 50%
das crianças com hematomas subdurais e são difíceis até mesmo para um
médico experimentado diagnosticar.
OUVIDOS: Danos no ouvido também podem ser causados por sacudidas na
criança. Alguns tipos de danos no ouvido, causados por repetidos golpes ou
puxões na orelha (resultado em “orelhas de couve-flor”), podem ser cobertos
pelo cabelo, escondendo a parte externa. O mais sério é quando ocorre dano no
ouvido interno, pois só o médico pode diagnosticar. Rupturas e dilacerações
podem deixar a criança permanentemente surda ou com sérios problemas de
redução auditiva.
BOCA: Dentro da boca existem muitas dobras de pele conhecidas como frênula.
Elas estão unidas ao lábio superior, inferior e parte de baixo da língua. Quando
um adulto fora de controle tenta enfiar qualquer coisa dentro da boca de uma
criança, estas pregas de pele podem ser danificadas. Socos diretos também
podem causar injúria na frênula. Normalmente, a frênula das crianças está bem
protegida e não pode ser danificada a não ser que tenha sido deliberadamente
atacada.
DENTES: Os dentes de uma criança podem ser danificados de muitas maneiras.
Listados abaixo estão os tipos de danos no dente que podem ser procurados se
a criança tiver sido ferida na face ou na boca;
Deslocações:
Dentes que estão frouxos, mas não caíram;
Intrusões:
Dentes que foram forçados dentro de gengiva/linha do osso;
81
82
Extrações:
Dentes que foram golpeados para fora da cavidade;
Fraturas:
Dentes que foram quebrados ou lascados;
NARIZ: Qualquer inchaço ao redor do nariz ou sangue seco nas narinas pode
indicar que a criança quebrou o nariz ou sofreu desvio de septo, o qual ocorre
quando a parede entre as duas narinas e danificada.
CÉREBRO: Concussões, contusões e lacerações são os tipos mais comuns de
injúria cerebral:
Concussões: Um choque na parte mole do cérebro, causando com freqüência
um entorpecimento ou inconsciência. O encobrimento é completo, deixando
apenas um corte ou afundamento no couro cabeludo.
Contusões:
Esmagamento
mais
sério
do
cérebro,
freqüentemente
envolvendo inconsciência por dias ou semanas.
Lacerações: Dilaceração na massa cefálica, esmagamentos e vasos sangüíneos
dilacerados normalmente levando a um hematoma subdural.
Um hematoma subdural é uma injúria na cabeça comum em casos de abuso de
crianças. E uma porção de sangue dentro da cobertura externa do cérebro
normalmente produzida por um soco na cabeça ou uma sacudida violenta. Esta
forma de abuso acontece no tratamento diário e freqüentemente leva a
inabilidades permanentes. Como redução da visão, cegueira, deficiências
motoras, doenças repentinas, atrasos no desenvolvimento e paralisia cerebral.
4.6. SÍNDROME DO BEBÊ SACUDIDO
Mais de 50% das crianças com hematomas subdurais não apresentam
associadas a eles nenhuma fratura de crânio, contusões ou inchaço sobre o
local da injúria por causa da “Síndrome do Bebê Sacudido” (em inglês conhecido
como “Whiplash Shaken Infant Syndrome” ou “Shaken Baby Syndrome”).
82
83
A “Síndrome de Bebê Sacudido” foi primeiramente documentada pelo Dr. John
Caffey em 1974 e foi descrita como “sacudida manual vigorosa de crianças pela
extremidade ou pelos ombros com sangramento intracranial induzido pela
velocidade do movimento, mas sem nenhum sinal externo de trauma na cabeça”.
Crianças são especialmente suscetíveis a este tipo de injúria durante os
primeiros
24
meses
de
vida
devido
às
seguintes
características
de
desenvolvimento:
Crânio macio e flexível e articulações abertas.
Cérebro macio e maleável – permitindo o estiramento excessivo do cérebro e
das veias sangüíneas.
Cabeça maior e mais pesada com músculos do pescoço fracos.
O ciclo de duas fases de aceleração e desaceleração causa uma flexão da
cabeça durante a qual o queixo bate no peito, seguido da extensão da cabeça
para trás na espinha. Casos históricos e pesquisas nesta área indicam que as
crianças normalmente são submetidas a numerosos episódios de sacudidas
antes do descobrimento das injúrias. As sacudidas podem ocorrer durante o
período de dias, semanas ou até meses.
A confirmação dos diagnósticos de “Síndrome do Bebê Sacudido” se tornou mais
fácil para os médicos desde a introdução da tomografia computadorizada, a qual
é superior aos Raios-X ao se diagnosticar fratura deprimida de crânio.
LESÕES ABDOMINAIS
Três conseqüências comuns de injúrias abdominais são:
COMPRESSÃO: Soco ou chute no abdômen causando ruptura no estômago ou
cólon.
ESMAGAMENTO: O órgão é comprimido contra a costela/coluna, danificando
rins, pâncreas, baço ou fígado.
ACELERAÇÃO: A criança é propelida após ter sido empurrada ou jogada,
causando um efeito de tosquia nos órgãos.
83
84
Os investigadores devem considerar a hipótese de injúria abdominal quando um
dos indicadores a seguir estiver ocorrendo:
Vômitos (material verde ou sangue)
Febre
Colapso ou paralisia (causados por sangramento interno)
Urina com sangue
Reclamações por parte da criança de dores no estômago.
Qualquer um ou todos estes sintomas podem começar depois de algumas horas
ou depois de um período de alguns dias. Se os sintomas forem severos e
persistentes um médico deve fazer um exame exploratório para determinar a
natureza exata e a extensão da injúria.
FRATURAS
Danos no esqueleto são comuns em casos de abuso de criança. De fato, tem
sido repetidamente demonstrado que a “Síndrome da Criança Sacudida” inclui a
presença de múltiplas fraturas em variados estágios de recuperação.
Uma fratura parcial é uma fratura próxima a metade da haste do osso (diáfise)
fazendo com que o osso se curve e quebre. Este tipo de injúria acontece quando
uma criança é agarrada pelo braço ou pela perna criando um efeito de alavanca
entre o peso da criança e o membro.
Fraturas em espiral ou transversa
Ocorrem no osso superior da perna (fêmur), no osso inferior da perna (tíbia), e
na parte superior do braço (úmero). Uma fratura espiral abusiva ocorre quando é
exercida uma força de torção aplicada ao membro. Fraturas abusivas
transversas resultam tanto de um golpe direto quanto por se agarrar a criança
pelos cotovelos ou punhos e fazer violentamente o movimento de arremesso
para cima e para frente.
Fraturas do osso peitoral
84
85
Fraturas do osso peitoral (externo) são raras. Quando este tipo de injúria na
estrutura esquelética é detectado, a causa é um geral um golpe severo e direito
com a mão cerrada, os pés ou algum instrumento.
4.7. DIREITOS FUNDAMENTAIS CONTIDOS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E
NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (LEI FEDERAL Nº
8.069/90)
A Constituição Federal trouxe em seu bojo um novo direito a ser aplicado a
Crianças e Adolescentes, como uma nova perspectiva no tratamento dos
mesmos.
Com
tal
perspectiva,
a
Constituição
Federal
preceituou
responsabilidade simultânea e solidária da família, da sociedade e do Estado
para promoção, proteção e preservação, com absoluta prioridade, dos direitos
fundamentais de Crianças e Adolescentes, os quais dizem respeito ao direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, prevendo ainda um
plus acerca da proteção dispensada aos mesmos quando menciona que também
a família, a sociedade e o Estado devem pô-los a salvo de toda e qualquer forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, traduz tal preceito
constitucional em seu Art. 3º 42 , quando menciona que a Criança e o Adolescente
42
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa
humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou
por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar os desenvolvimentos
físicos, mentais, morais, espirituais e sociais, em condições de liberdade e de dignidade.
85
86
gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem
prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei. Também a lei
infraconstitucional menciona direitos fundamentais específicos para a proteção
da criança e do adolescente. Verifica-se que o legislador, sabiamente,
compreendeu que a Criança e o Adolescente são pessoas em desenvolvimento,
portanto incapazes de se defenderem sozinhos, sem a proteção de todo um
conjunto sistematizado de ações por parte da família, da comunidade e do
Estado. Os direitos fundamentais específicos do Estatuto iniciam-se com o
direito à vida e á saúde, nos termos do Art. 7º 43 . Menciona a ECA que,
obrigatoriamente, a Criança e o Adolescente deve ter uma vida sadia e
harmoniosa. Tal direito é assegurado desde a concepção, pois a gestante
deverá ter atendimento pré e perinatal através do SUS. Atendimento este que
abrange desde as consultas médicas do pré-natal até o parto, bem como se
refere ao apoio alimentar à gestante e a nutriz que dele necessitem 8º 44 Outras
obrigações também buscam proteger tal direito à vida e à saúde, tais como:
atendimento médico pelo SUS, atendimento especializado para criança e
adolescente portadores de necessidades especiais, fornecimento gratuito de
medicamentos, próteses e outros recursos necessários ao tratamento,
habilitação e reabilitação, entre outros previstos nos Art. 10 a 14 45 da ECA.
43
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação
de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso,
em condições dignas de existência.
44
Art. 8º É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal.
§ 1º A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de atendimento, segundo critérios
médicos específicos, obedecendo-se aos princípios de regionalização e hierarquização do
Sistema.
§ 2º A parturiente será atendida preferencialmente pelo mesmo médico que a acompanhou
na fase pré-natal.
§ 3º Incumbe ao poder público propiciar apoio alimentar à gestante e à nutriz que dele
necessitem.
45
Art. 10. Os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à saúde de gestantes, públicos e particulares, são
obrigados a:
86
87
Preceitua também o Estatuto o direito à liberdade, ao respeito e à dignidade no
rol dos direitos fundamentais específicos, constantes nos Art. 16 a 18 46 . Além
dos direitos fundamentais específicos já mencionados possui, ainda, a Criança e
o Adolescente direito à convivência familiar e comunitária, o que significa que os
mesmos têm direito de serem criados e educados no seio de sua família natural
e, apenas excepcionalmente, serão encaminhados à colocação em família
substituta, bem como em contato com a comunidade em que está inserido, para
I - manter registro das atividades desenvolvidas, através de prontuários individuais, pelo prazo de dezoito
anos;
II - identificar o recém-nascido mediante o registro de sua impressão plantar e digital e da impressão digital
da mãe, sem prejuízo de outras formas normatizadas pela autoridade administrativa competente;
III - proceder a exames visando ao diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo do recémnascido, bem como prestar orientação aos pais;
IV - fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as intercorrências do parto e do
desenvolvimento do neonato;
V - manter alojamento conjunto, possibilitando ao neonato a permanência junto à mãe.
Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a
prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação
sanitária para pais, educadores e alunos.
Parágrafo único. É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.
46
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II - opinião e expressão;
III - crença e culto religioso;
IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;
V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI - participar da vida política, na forma da lei;
VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do
adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças,
dos espaços e objetos pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer
tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
87
88
que os mesmos possam desenvolver-se como cidadãos de forma seguram,
fortalecida e harmoniosa. São direitos fundamentais ainda os referentes à
educação, à cultura, ao esporte e ao lazer. Eis que se afiguram de
incomensurável valor para o bom desenvolvimento da Criança e do Adolescente
a participação conjunta com sua comunidade e escola em atividades
educacionais e de divertimento, proporcionando boas e saudáveis oportunidades
futuras em detrimento do fracasso e da ociosidade e livre de qualquer tipo de
ingerência criminosa de adultos. É de comprovada importância que a criança
viva intensamente os momentos de sua infância e adolescência, brincando livre
de opressões ou violências, e o adolescente ultrapasse essa fase cheia de
mudanças e questionamentos com segurança e preservação de seu direito de
freqüentar a escola e de ter uma vida tranqüila sem inquietações diversas da sua
correlata idade. Por fim, configuram-se também como direitos fundamentais a
profissionalização e a proteção ao trabalho, pois ao adolescente maior de 14
anos é permitido preparar-se para o futuro aprendendo um ofício como aprendiz,
possuindo, nesta categoria, todos os direitos protetivos inerentes. Como se vê, a
Constituição Federal e o ECA tiveram grande preocupação para preservação
das etapas da vida da Criança e do Adolescente.
4.7.1. PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL
Trata-se de dispositivo contido no Art. 1º 47 , que assim disciplina a doutrina que
rege o Estatuto: “Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao
adolescente”. Integral porque abrange todas as etapas da vida da Criança e do
Adolescente, considerando-se todos os tipos de proteção e prioridades. O
dispositivo retrata preceito constitucionalmente assegurado de que Crianças e
Adolescentes são sujeitos de direitos e devem ser tratados de forma especial e
47
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.
88
89
específica em face de sua condição de pessoa em desenvolvimento que
necessita de amparo diferenciado da família, da sociedade e do Estado.
Conforme já mencionado, a Constituição Federal trouxe um elenco de direitos
fundamentais específicos para proteção de Crianças e Adolescentes e para
caracterização como sujeitos de direitos.
Aliado ao princípio da proteção integral, tem o princípio da garantia de prioridade
que compreende: primazia de receber proteção e socorro em quaisquer
circunstâncias; precedência de atendimento nos serviços públicos e ou de
relevância pública; preferência na formulação de políticas sociais públicas e
destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a
proteção à infância e à juventude.
Significa dizer que Crianças e Adolescentes deverão ter privilégios e prioridades
em todas as esferas, públicas e privada, para a efetivação, promoção, proteção
e preservação de seus direitos.
Também é princípio complementar ao da proteção integral o da prevalência do
interesse do menor no que diz respeito à interpretação do Estatuto. Tal princípio
está previsto no Art. 6º 48 , ECA e determina que a interpretação dada o Estatuto
sempre será a que melhor interessar à criança e ao adolescente, considerandose os fins sociais, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais
e coletivos e a condição peculiar da Criança e do Adolescente como pessoas em
desenvolvimento.
Outros
princípios
auto-explicativos
podem
ainda
ser
mencionados, tais como: sigilosidade, respeitabilidade, contraditório e ampla
defesa, gratuidade, indisponibilidade, escolarização, reeducação e reintegração.
4.7.2 POLÍTICAS DE ATENDIMENTO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE .
A Constituição Federal prevê diretrizes para a realização de políticas públicas
para promoção, preservação e proteção dos direitos de crianças e adolescentes,
48
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do
bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente
como pessoas em desenvolvimento.
89
90
vejamos alguns: No Art. 227, em seu parágrafo primeiro, a Constituição Federal
menciona que:
“o Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente,
admitida a participação de entidades não governamentais e obedecendo aos seguintes preceitos:
I – aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência maternoinfantil; II – criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores
de deficiência física e sensorial ou mental”.
Mencionam, ainda, o mesmo diploma legal, no seu Art. 204 49 , que nas ações
governamentais de assistência sociais referentes ao atendimento dos direitos de
crianças e adolescentes serão utilizados recursos da seguridade social,
arrecadados nos termos do Art. 195 50 , entre outras fontes.
Como se vê, é preceito constitucional a previsão orçamentária derivada para
custeio das ações relativas à promoção, preservação e proteção dos direitos de
Crianças e Adolescentes. Ressalte-se, ainda, que a CF também determina quais
as diretrizes de organização das ações governamentais. O Estatuto da Criança e
do Adolescente, por sua vez, enquanto lei infraconstitucional específica que
regulamentou o Art. 227 51 da Constituição, estabelece que crianças e
49
Art. 204 - As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos
do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas
com base nas seguintes diretrizes:
I - descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera
federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal,
bem como a entidade beneficentes e de assistência social;
II - participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das
políticas e no controle das ações em todos os níveis.
50
Art. 195 - A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta,
nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
51
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
90
91
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão.
§ 1º - O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança e do
adolescente, admitida a participação de entidades não governamentais e obedecendo os seguintes
preceitos:
I - aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência maternoinfantil;
II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores de
deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente portador de
deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos
bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos.
§ 2º - A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público
e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas
portadoras de deficiência.
§ 3º - O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
I - idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º,
XXXIII;
II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;
III - garantia de acesso do trabalhador adolescente à escola;
IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na
relação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação
tutelar específica;
V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade;
VI - estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios,
nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou
abandonado;
VII - programas de prevenção e atendimento especializado à criança e ao adolescente
dependente de entorpecentes e drogas afins.
§ 4º - A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do
adolescente.
§ 5º - A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e
condições de sua efetivação por parte de estrangeiros.
§ 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos
direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
91
92
adolescentes possuem garantia de prioridade Art. 4º, Parágrafo 52 Único, bem
como prevê as linhas de ação da política de atendimento que são: políticas
sociais básicas; políticas e programas de assistência social; serviços especiais
de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência,
maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão; serviço de identificação e
localização de pais, responsável, crianças e adolescentes desaparecidos;
proteção jurídico-social por entidades defesa dos direitos de crianças e do
adolescente Art. 87, além de prescrever que tais políticas serão feitas através de
um conjunto articulado de ações governamentais e não governamentais, da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios Art. 86. No Art. 88 53 ,
§ 7º - No atendimento dos direitos da criança e do adolescente levar-se- á em consideração o
disposto no art. 204.
52
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural
dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.
53
Art. 86. A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através
de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos
estados, do Distrito Federal e dos municípios.
Art. 87. São linhas de ação da política de atendimento:
I - políticas sociais básicas;
II - políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, para aqueles que deles
necessitem;
III - serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de
negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão;
IV - serviço de identificação e localização de pais, responsável, crianças e adolescentes
desaparecidos;
V - proteção jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente.
Art. 88. São diretrizes da política de atendimento:
I - municipalização do atendimento;
II - criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do
adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a
92
93
também o Estatuto traça as diretrizes das políticas de atendimento quando
menciona: a municipalização; criação dos conselhos municipais, estaduais e
federais; criação e manutenção de programas específicos, observada a
descentralização político administrativa; a manutenção dos fundos ligados aos
conselhos; integração operacional dos órgãos do Poder Judiciário, Ministério
Público, Defensoria, Segurança Pública e Assistência Social. Observe-se que os
direitos de crianças e adolescentes são previstos de maneira pormenorizada na
Constituição Federal, bem como no ECA, além da formas de políticas sociais a
serem desenvolvidas e sua previsão orçamentária.
Porém, nossa realidade, infelizmente, é outra. Verifica-se a carência em todas as
linhas de políticas de ações sociais de proteção, promoção e de preservação dos
direitos de crianças e adolescentes. Há que se reconhecer que algumas
iniciativas estão sendo realizadas, mas ainda não suprem a imensa demanda.
Existente. A DPCA é, sem dúvida, um feliz avanço na proteção da Criança e do
Adolescente, principalmente no que tange à prática de crimes de violência
sexual contra estes seres em desenvolvimento.
A comunidade sente uma nova credibilidade nos órgãos públicos de defesa
quando se fala em DPCA, mas ainda é pouco, pois ainda existem muitos casos
que
não
são
submetidos
à
sua
apreciação
e
repressão
por
puro
desconhecimento dos jurisdicionados, que não possuem a informação adequada
ou que têm medo da exposição, pois ainda está em vigor o pacto do silêncio.
participação popular paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal,
estaduais e municipais;
III - criação e manutenção de programas específicos, observada a descentralização políticoadministrativa;
IV - manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos
conselhos dos direitos da criança e do adolescente;
V - integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Segurança
Pública e Assistência Social, preferencialmente em um mesmo local, para efeito de agilização do
atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional;
VI - mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação dos diversos
segmentos da sociedade.
93
94
A DPCA, quando se fala em casos de violência sexual praticados contra a
criança e o adolescente, está integrada em um SISTEMA DE ATENDIMENTO,
que é uma iniciativa das instituições que atuam no enfrentamento da violência
contra crianças e adolescentes, e tem a finalidade de garantir um serviço de
atendimento coordenado, especializado, com abordagens interdisciplinares,
ágeis e eficientes a crianças e adolescentes vitimizados sexualmente, de modo a
interromper o ciclo perpetuador dessa violência sistema de atendimento se inicia
com a denúncia da ocorrência do crime e imediata apuração. Após será feito o
encaminhamento às autoridades competentes como Ministério Público e Poder
Judiciário para a devida apuração bem como encaminhamento da vítima aos
serviços de assistência social, educação e saúde. O Conselho Tutelar também é
acionado para agir dentro de suas atribuições.
94
95
CONCLUSÃO.
Nesta perspectiva conceitual, a categoria “violência doméstica” engloba os
conceitos de abuso físico, sexual, emocional e negligencia. A violência doméstica
e uma forma de violência interpessoal que costuma apresentar contra as crianças
e adolescentes de todas as classes sociais, no entanto, mais comum os números
de registros nos grupos que mais sofrem desigualdades sociais, e onde o
capitalismo tem maior importância.
Vivemos numa sociedade que cultiva a ficção da cordialidade como forma
ideológica de mascarar a prática histórica e cotidiana da Violência em suas várias
formas. A sociedade brasileira costuma recorrer à Violência como forma
privilegiada de solucionar conflitos urbanos, rurais, familiares, institucionais, etc.
A violência doméstica ou contra crianças e adolescentes é cometido, na maior
parte das vezes, pelo pai da família, e, geralmente, eles consumem antes algum
tipo de droga ou álcool.
Todas as a respeito à violência domésticas contra crianças e adolescentes suas
transformações foram processadas na sociedade Brasileira com a mediação da
inserção subordinada do país no sistema capitalista mundial e por particularidades
da sua formação econômica, com decorrências na complexidade das classes, com
perda de sua dimensão, diferenciação, divisões, cortes e recomposições da classe
operária tradicional.
O presente trabalho permitiu apreender as percepções dos operadores do direito
sobre a violência doméstica cujos resultados, quanto aos seus aspectos
desencadeadores, desenhou caminhos para sua compreensão a partir do foco do
que é a questão social, palco privilegiado de sua encenação.
95
96
A violência, qualquer que seja ela, instaura-se por inúmeros e complexos fatores,
passando desde a questão ambiental e o problema da qualidade de vida que
atingem a realidade familiar, até o comprometimento das relações.
Por outro lado, a ordem jurídica compõe se e é produto do viver em comunidade,
constituinte precípuo de nossa cultura, cuja mater é a família. A mesma sociedade
que impõe regras e normas de conduta não transcende seus atos históricos nem
seus ditames; especificamente, quanto à violência doméstica, foi possível
confirmar nosso pressuposto de que, historicamente, ela é tratada pela sociedade
de forma a banalizar as suas características específicas.
O Poder Judiciário parece-nos ser formado numa cultura com pouca capacidade
de entender a sociedade e seus conflitos, além de estar fechado para discussão
interna ou externa. Seus operadores, enquanto ramos do Estado, comungam e
introjetam o ideário de sua possível redemocratização. Ultrapassamos, dessa
forma, a visão ingênua da realidade, para uma compreensão mais crítica,
possibilitada pelo diálogo entre a teoria e os dados concretos apresentados.
Os relatos dos entrevistados demonstram uma visão limitada quanto à violência
doméstica e à violência na sociedade, não citando, por exemplo, os aspectos
psicossociais, éticos, morais.
Acredito, ainda, que este estudo representa uma pequena contribuição para o
avanço do conhecimento com relação à violência contra a criança e o
adolescente, ao ultrapassar a simples descrição de fatos e desconstruir as falas
dos sujeitos, trazendo luz à compreensão da realidade estudada, participando,
assim, do desafio de construir o saber.
96
97
REFERÊNCIAS
LUIZ, António Miguel Ferreira: A distinção do poder familiar pelo abandono.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Ed. RT
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, lei 8.069 de 1990.
ADALBERTO, Bolleta Oliveira, ÀLVARO Rodrigues, MARIA Amélia Azevedo:
Crianças Vitimizadas. Ed.Iglu.
MARIA Aparecida , BARBOSA Marques, AZEVEDO, M.A e GUERRA. Violência
contra crianças e adolescentes em busca de uma definição: ED: Vozes LTDA
1994.
TANIA Zagury, Educar sem culpa, A Gênese da ètica. Ed. Record, 1993.
BACHARELADO do curso de direito da UNIBENETT, Área de Direitos Humanos,
História de crianças, de vida e abandono. Revista, FÈ e NEXO
NACA, Apostila sobre violência contra crianças e adolescentes.
VENOZA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Direito de Família, ED: Atlas, 2003
CLÒVIS, Beviláqua. Direito de Família VIII. Rio de Janeiro. ED: AIDE. 1994
CODIGO CIVÍL DE 1916.
COLEÇÃO, Nosso Século, volume 1, BRASIL. ED. Abril.
Sites visitados:
[email protected].
97
98
www.historianet.com.br
www.mundojurídico.com.br
www.g1.com/noticias/SãoPaulo
www.observatoriadainfancia.com.br
98

Documentos relacionados