Relatório Clínico na área das condições músculo

Transcrição

Relatório Clínico na área das condições músculo
ACTIVIDADE 2
RELATÓRIO CLÍNICO - 2
MARIA INÊS DOMINGUES, Nº1892
MÓDULO 6 | RACIOCÍNIO CLÍNICO NAS DISFUNÇÕES MÚSCULO
ESQUELÉTICAS
UNIDADE CURRICULAR | FISOTERAPIA TEORIA E PRATICA III
RESPONSÁVEL DO MÓDULO | PROF. MARCO JARDIM
2010- 2011
Introdução
No âmbito da Unidade Curricular de Fisioterapia Teoria e Prática III, foi proposta a
elaboração de um relatório clínico referente ao Sr. Jorge Jesus que sofreu um fractura do colo do
úmero.
Com a realização deste relatório é esperado adquirir conhecimento e compreensão das
principais condições Músculo-Esqueléticas, Orto-Traumatológicas e Reumatológicas, congénitas
e adquiridas, reconhecendo os sinais clínicos associados, das principais estratégias de
intervenção cirúrgica e conservadora na vertente Orto-Traumatológica e Reumatológica, dos
mecanismos de resposta fisiológica da aplicação de técnicas de mobilização articular, do sistema
nervoso, dos diferentes tipos de fortalecimento e alongamento muscular, da proprioceptividade e
das ligaduras funcionais e conhecimento e compreensão do modelo de intervenção em
disfunções músculo-esqueléticas, tendo em conta os princípios do raciocínio hipotético-dedutivo
e narrativo.
É esperado também ser demonstrado raciocínio clínico subjacente aos objectivos de
tratamento, ao plano de intervenção, aos resultados esperados, prognóstico funcional e critérios
de alta.
O Sr. Jorge Jesus de 55 anos, vive no Seixal, é casado e tem cinco filhos. Trabalha
como pintor por conta própria há cinco anos, e há dois meses sofreu uma queda de escadote, da
qual resultou uma fractura do colo do úmero. Segundo Serra (2001), estas fracturas ocorrem por
contusão directa devido a quedas. Foi submetido a cirurgia e foi-lhe colocada uma tala gessada
axilo-palmar, com o cotovelo em 90º de flexão, e um sling para poder suportar o membro
superior direito junto ao tronco. Retirou a tal gessada há 48 horas atrás, após terem sido
verificados bons sinais de consolidação óssea, através do RX.
Após a fractura de um osso, verifica-se a consolidação do mesmo. Durante este
processo é necessário, que não exista movimento entre os segmentos da fractura para proteger
a área envolvida e permitir uma boa recuperação (Serra, 2001). A consolidação de um osso
ocorre em cinco fases: formação do hematoma, organização do hematoma, formação do calo
ósseo, consolidação por osso lamelar definitivo e remodelação (Serra, 2001). Segundo este
autor, num adulto, são necessárias 6 semanas de imobilização para que este processo ocorra. O
Sr. Jorge Jesus esteve imobilizado 2 meses (8 semanas), portanto esteve imobilizado mais 2
semanas que o suposto. Apesar da imobilização ser necessária e recomendada após uma
fractura, esta pode tornar-se prejudicial, consoante o tempo de imobilização (Hougulum, 2001).
2
Com a imobilização dos tecidos há um aumento na produção e síntese de colagénio.
Sem movimento, esse colagénio é depositado de forma aleatória, o que provoca uma redução na
força de tensão do tecido e por consequência uma restrição do movimento normal (Cruz et al.,
2007). Durante o período de imobilização, várias estruturas sofrem alterações ao nível das
propriedades dos seus tecidos. Quando uma articulação é imobilizada, os ligamentos associados
perdem força, rigidez e os seus pontos de inserção tornam-se fracos (Cruz et al., 2007).
Relativamente aos músculos, a imobilização afecta tanto a estrutura muscular como a função,
sendo que os efeitos da imobilização dependem da posição em que o músculo foi imobilizado
(Cruz et al., 2007). No caso do Sr. Jorge Jesus, o membro superior direito foi imobilizado com o
cotovelo a 90º de flexão, o que significa que ocorreu numa posição de encurtamento. Quando o
músculo é imobilizado em encurtamento, ocorre uma diminuição do número de sarcómeros,
aumento da taxa de colagénio e atrofia muscular (Cruz et al., 2007). Estas alterações levam a
que o ponto de tensão máxima se encontre ao nível da posição em que o músculo foi
imobilizado, o que significa que o músculo não estará apto a funcionar efectivamente após a
imobilização (Cruz et al., 2007).
Durante o período de imobilização também existem défices de proprioceptividade devido
à falta de uso do segmento imobilizado (Stone et.al., 1994) e uma vez que o fuso neuromuscular
também é afectada pela imobilização (Petty, 2007).
Principais Problemas
O Sr. Jorge Jesus apresenta vários problemas que restringem a sua participação social
(profissão de pintor). Para tornar mais fácil a elaboração do plano de intervenção e de modo a
poder estabelecer os objectivos de tratamento é necessário identificar os problemas do utente.
Os principais problemas são a dor, na região anterior do ombro direito (8/10) e posterior
(6/10), e na região anterior do cotovelo (5/10) e a diminuição das amplitudes articulares nas
articulações do membro superior direito, mais concretamente, ombro, cotovelo e punho. O
edema, embora ligeiro, também constitui um problema, uma vez que contribui para a diminuição
das amplitudes articulares e para a limitação dos movimentos.
A diminuição da força muscular bem como do volume muscular constitui outro problema;
o utente apresenta atrofia muscular do membro superior direito que traz repercussões no
movimento quer na realização de simples AVD´S quer a nível da sua profissão.
Como consequência do tempo e do próprio processo de imobilização, as alterações ao
nível da rigidez devido à atrofia muscular é outro problema. Isto pode levar uma diminuição dos
3
órgãos proprioceptivos nos músculos, levando a alterações da proprioceptividade que
contribuem para modificações do movimento normal (Petty, 2008).
Para além disto, o utente apresenta uma ligeira inclinação da cabeça para o lado direito,
associada a um ligeiro encurtamento dos músculos trapézio superior e esternocleidomastoideu,
o que constitui outro problema. Este pode ter sido consequência da postura adoptada pelo utente
durante a imobilização. É possível que após a fractura, o Sr. Jorge Jesus tenha ficado com
algum receio em movimentar o membro lesado, então o utente pode ter adoptado uma postura
de elevação do ombro como forma de o proteger e de se defender das agressões exteriores.
Objectivos de Intervenção
Segundo Robalo e Silva (2005), após a identificação dos principais problemas do utente,
passa-se á definição dos objectivos de intervenção. Estes devem apresentar-se como um guia
para a acção de modo a clarificarem o que é preciso atingir. Assim, os objectivos de intervenção
devem ser direccionados para superar os problemas do utente, permitindo-lhe que volte a
realizar todas a as actividades que realizava.
Objectivos da Intervenção
Objectivos Funcionais
 Educação ao Utente
 Levar a mão à boca
 Diminuição do edema no ombro direito
 Fazer a barba
 Diminuição da dor no ombro e cotovelo  Escovar os dentes
direitos, para um valor próximo de zero
 Aumento das amplitudes articulares do
Curto Prazo
Semana 1 e 2
ombro, cotovelo e punho direitos
 Diminuição da rigidez
 Diminuição dos encurtamentos dos
músculos
trapézio
superior
e
esternocleidomastoideu direitos
 Diminuição da atrofia muscular
 Aumento da força muscular
 Aumento da proprioceptividade
Médio Prazo
Semana 3 à 8
 Educação ao Utente
 Realizar a sua higiene
 Diminuição da dor no ombro e cotovelo pessoal
direitos para 0/10 na EVA
 Realizar algumas AVD’s
4
 Aumento das amplitudes articulares do
ombro, cotovelo e punho direitos para as
esperadas na idade do utente (segundo
Boone, 1979; Ombro: Flexão – 165,1º,
Abdução – 182,6º, Rot. Externa – 97,5º
Cotovelo: Extensão – 139,7º, Supinação –
81,4º, Pronação – 75º Punho: Flexão –
72,8º, D. Radial – 34,7º, D. Cubital – 21,6º
 Aumento da força, potência e
resistência muscular
 Aumento da proprioceptividade
 Educação ao utente
 Realizar todas as AVD’s
 Manter e melhorar as amplitudes  Voltar à sua actividade
articulares do ombro, cotovelo e punho profissional de pintor
direitos
Longo Prazo
Semana 9 à 12
Manter e melhorar a força, potência e
resistência muscular
 Manter e melhorar a proprioceptividade
 Promover a autonomia do utente
 Atingir um score próximo de zero no
questionário DASH
Plano da Intervenção
Para o plano de intervenção der elaborado é necessário que os objectivos e respectivas
estratégias de intervenção sejam elaboradas em conjunto com o utente, promovendo uma
colaboração mais efectiva por parte deste e nunca ignorando os seus objectivos pessoais.
Devem ser considerados também outros aspectos do utente, como a sua situação económica,
disponibilidade para se deslocar à fisioterapia, expectativas, valores e crenças. O envolvimento
do utente no processo de intervenção é muito importante uma vez que, como o terapeuta
procura ir de encontro àquilo que o utente considera como seus problemas e necessidades,
poderá fazer com que o utente esteja mais motivado a colaborar no tratamento, podendo assim,
contribuir para melhores resultados do mesmo (Petty, 2008).
5
Segundo este autor, é necessário um período de tempo maior para a recuperação após
um período de imobilização do que o tempo da imobilização. Assim, como o Sr. Jorge Jesus teve
o seu membro superior imobilizado durante 2 meses (8 semanas), segundo Gozna (2000) e
Thompson et al. (2008), a intervenção irá ter a duração de 12 semanas, com 3 sessões
semanais, cada uma delas com a duração de 50 a 60 minutos (Pollock M.L. et al., 1998).
A educação ao utente é um objectivo para toda a intervenção. Tem por finalidade
aumentar a autonomia através da promoção de mudanças de comportamentos e estilos de vida
(Canteiro, 2003). É muito importante esclarecer o utente sobre a sua condição bem como todo o
seu tratamento. A educação dentro do contexto da reabilitação deve incluir programas de
exercícios para o utente fazer em casa que permitam continuar a reabilitação (Petty, 2008). O Sr.
Jorge Jesus deve ser informado a cerca dos movimentos que provocam os sintomas, as
actividades que deve evitar, as estratégias para realizar outras actividades, incluindo estratégias
de coping adequadas ou outras estratégias (Petty, 2008).
Curto prazo (Semana 1 e 2):
Para além da educação ao utente, que deve ser feita durante as 12 semanas de
intervenção, outro dos objectivos definidos consiste na diminuição da dor do ombro e no
cotovelo. Para solucionar este problema do Sr. Jorge Jesus sugere-se a aplicação de
electroterapia, massagem e mobilização articular.
Relativamente à electroterapia, a Estimulação Nervosa Eléctrica Transcutânea (TENS) é
utilizada para o controlo e diminuição da dor. É uma técnica analgésica simples e não evasiva
usada em dores crónicas ou agudas (Clover, 2011). Através dos eléctrodos colocados na pele, o
TENS provoca uma activação das vias descendentes da dor, levando a uma redução da
sensação de dor de uma forma quase imediata (Kitchen, 2003). Os eléctrodos são colocados
nas áreas de dor, que no caso do Sr. Jorge Jesus é na região anterior e posterior do ombro
direito e região anterior do cotovelo, durante aproximadamente 30 minutos (Clover, 2001).
A massagem também pode ser aplicada para reduzir a dor, utilizando: stroking,
deslizamento, rolamento e deslocamento da pele. Durante a aplicação destas técnicas os
mecano-receptores do tipo I, responsáveis pela transmissão de informação ao SNC, são
estimulados, tendo um efeito inibidor na espinal medula, o que provoca a inibição da transmissão
da dor (Wike e Placek, 1975 citados por Petty, 2008). Para além de reduzir a dor, a massagem
também provoca um aumento do fluxo de circulação, relaxamento muscular, alongamento dos
tecidos, aumento da drenagem tecidular e libertação de aderências (Thomson e tal, 1991 citado
6
por Petty, 2008). Isto significa que a massagem também pode ser aplicada para diminuir o
edema no ombro direito, outro dos objectivos definidos.
A mobilização articular é muito importante para a reabilitação do utente uma vez que,
para além de permitir aumentar as amplitudes articulares, permite a diminuição da dor. Esta
técnica estimula os receptores aferentes de grande diâmetro da articulação, que ao nível da
medula espinhal provocam uma inibição da actividade do nociceptor da articulação, diminuindo a
sensação de dor (Petty, 2008).
Para reduzir o edema que o utente apresenta na região do ombro direito, para além da
aplicação de massagem referida anteriormente, a aplicação de gelo também é fundamental. Ao
refrescar os tecidos, o gelo pode diminuir o fluxo de sangue, reduzir o espasmo muscular, a dor
e o edema. Contudo estes efeitos só são conseguidos quando o frio é aplicado na pele durante
15 a 20 minutos (Clover, 2001).
De modo a aumentar as amplitudes articulares do ombro, cotovelo e punho direito do Sr.
Jorge Jesus, devem ser aplicadas as seguintes técnicas: mobilização articular (movimentos
acessórios e fisiológicos), mobilização dos tecidos moles, alongamentos, PNF (facilitação
neuromuscular proprioceptiva) e electroterapia.
Antes de iniciar qualquer técnica é fundamental aumentar a temperatura dos tecidos,
uma vez que, esta influencia o comportamento mecânico dos mesmos (Petty, 2008). O aumento
da temperatura para um intervalo entre os 40 e os 45° provoca a diminuição da rigidez muscular
e o aumento da flexibilidade, o que significa que, aquecer os tecidos antes de os alongar permite
um aumento das amplitudes articulares (Petty, 2008), melhorando a extensibilidade da cápsula
articular e estruturas musculo-tendinosas (Clover, 2011). Para aumentar a temperatura dos
tecidos pode-se utilizar calores húmidos ou técnicas de electroterapia como os ultra-sons, sendo
utilizados durante 7 minutos (Petty, 2008).
Em relação aos movimentos acessórios, estes são fulcrais para recuperar as amplitudes
das articulações do ombro, cotovelo e punho do Sr. Jorge Jesus, sendo que todos os
movimentos acessórios devem ser realizados antes dos fisiológicos, pois sem a recuperação da
amplitude nos movimentos acessórios não é possível obter movimento fisiológico normal (Petty,
2008).
Também os movimentos fisiológicos podem ser aplicados como técnica de tratamento,
podendo ser efectuados passivamente ou activamente (Petty, 2008).
Segundo Porter (2005), a mobilização passiva é utilizada numa fase prematura da
reabilitação, e no caso do Sr. Jorge Jesus torna-se necessário começar por aí. Neste tipo de
mobilização articular não existe actividade muscular, uma vez que, é o terapeuta que realiza os
7
movimentos. A contracção muscular que produz movimento só é possível a partir do grau 3 de
força (Queirós et. Al. 2002), o que significa que, como o utente não tem esse grau de força, a
mobilização terá que ser passiva. Após este tipo de mobilização realiza-se a activa assistida, em
que os movimentos já são realizados em parte pelo utente. Quando o utente já tem força,
realizam-se os movimentos activos que dependem única e exclusivamente da contracção
muscular do utente.
Como o Sr. Jorge Jesus apresenta dor que lhe está a limitar as amplitudes articulares,
deve ser aplicado em cada tipo de mobilização os graus I ou II, e só quando a dor deixar de ser
severa aplicar um grau III- ou IV- (Petty, 2008). As técnicas devem ser aplicadas lentamente,
pois assim existe uma redução da rigidez e um aumento da amplitude articular (Petty, 2008).
Cada técnica deve ser feita com 3 repetições, cada uma de 30 segundos a 1 minuto (Petty,
2008).
Durante a fase de regeneração e remodelação da cicatriz, é apropriada a mobilização
dos tecidos moles pois contribui para a síntese e orientação das fibras de colagénio, para
promover o comportamento viscoelástico normal promovendo o aumento de amplitude (Hunter,
1998 citado por Petty, 2008).
Os alongamentos são também necessários para o aumento de amplitude articular e
sobretudo utilizados no alongamento dos músculos encurtados (Petty, 2008) que no caso do Sr.
Jorge Jesus tratam-se do trapézio superior e do esternocleidosmastoideu. Estes exercícios
permitem que ocorram deformações plásticas nos tecidos, fazendo que diminua a rigidez e
aumente elasticidade. O alongamento estático é o mais adequado para o Sr. Jorge Jesus e deve
ser mantido entre 15 a 30 segundos e realizadas entre 3 a 4 repetições (Hougulum, 2001). Estes
exercícios podem ser utilizados para diminuir os encurtamentos musculares, outro dos objectivos
definidos.
A facilitação neuromuscular proprioceptiva (PNF) provoca o relaxamento muscular e
permite um aumento das amplitudes articulares. O objectivo primordial das técnicas de PNF é
promover o movimento funcional através da facilitação, inibição, fortalecimento e relaxamento
dos grupos musculares (Pereira et al, 2007). As técnicas de PNF irão promover respostas ao
nível dos mecanismos neuromusculares face aos estímulos dos proprioceptores (Queiros et al,
2002). Tem como objectivos iniciar o movimento, a aprendizagem motora e alongamento
muscular bem como, aumentar a estabilidade, o controlo dos movimentos, a coordenação, a
força e resistência muscular e a amplitude articular e diminuir a dor (Adler et al, 2008).
8
As técnicas de PNF a aplicar são o segurar-relaxar e o contrair-relaxar. Estes padrões
de movimento permitem um movimento dos músculos através de toda a sua amplitude, desde a
posição de maior alongamento até à máxima posição de encurtamento (Petty, 2008).
Nesta primeira etapa, devem ser realizados exercícios isométricos que permitam
aumentar a amplitude articular e diminuir a atrofia muscular, o que significa que deve utilizar-se
a técnica do segurar-relaxar. Nesta técnica, o músculo é posicionado em alongamento e o
terapeuta solicita uma contracção isométrica do músculo aplicando resistência. Após a
contracção máxima, o utente relaxa e o terapeuta vai reduzindo gradualmente a resistência,
permitindo que ocorra o relaxamento muscular progressivo. O terapeuta move então a
articulação dentro da amplitude para aumentar o alongamento muscular (Petty, 2008). Esta
técnica deve ser utilizada para os grupos musculares do ombro, cotovelo e punho. A contracção
deve ser mantida durante cerca de 6 segundos e cada grupo muscular deve realizar 4
repetições (Pollock et al, 1998).
Após os alongamentos deve aplicar-se frio, de modo a promover o arrefecimento dos
tecidos alongados, preservando assim os ganhos de amplitude (Clover, 2001).
Dada a imobilização prolongada a que o Sr. Jorge Jesus foi sujeito, os grupos
musculares do membro superior direito ficaram atrofiados e com diminuição de força, potência e
perímetro muscular. Durante estas primeiras 2 semanas de intervenção, os exercícios que o
utente irá realizar serão isométricos, uma vez que o utente sente dor ao movimento articular. As
contracções isométricas permitem um aumento de força e devem executar-se com a duração 5
minutos contraindo 6 segundos e relaxando 6 segundos (Queirós et al, 2002). Só se poderá
passar para os exercícios isotónicos quando os grupos musculares atingirem pelo menos um
grau de força 3 (Queirós et al, 2002).
O treino da proprioceptividade deve ser iniciado com exercícios proprioceptivos simples
para o membro superior, como o treino da preensão, uma vez que o utente, devido à
imobilização prolongada apresentará dificuldades a nível da motricidade fina. O treino
proprioceptivo deve começar com exercícios simples e progredir para os mais complexos
(Hougulum, 2001).
Médio Prazo (Semana 3 à 8):
Para que os objectivos definidos para estas seis semanas possam ser alcançados, é
fundamental que os objectivos anteriores tenham sido atingidos. A intervenção é um processo
contínuo em que é necessário melhorar as capacidades desenvolvidas e atingir as propostas.
9
As técnicas a aplicar para a diminuição da dor devem ser continuadas até que se atinja o
valor de 0/10 na EVA. As técnicas para o aumento da amplitude articular também devem
continuar a ser realizadas. Uma vez que nesta etapa a dor do utente é menor, poderão ser
aplicadas as técnicas de mobilização articular num grau III- ou IV- (Petty, 2008).
As técnicas de PNF também deverão ser continuadas. Nesta etapa, deve utilizar-se a
técnica do contrair-relaxar. Esta caracteriza-se pela solicitação de contracções isotónicas
resistidas dos músculos antagonistas, seguidas do seu relaxamento e posterior movimento
agonista. Desta forma, com um relaxamento do grupo antagonista obtém-se um aumento da
amplitude do movimento agonista (Pereira et al., 2007). Esta técnica é direccionada para o
aumento da força muscular e amplitude articular. Tal como no segurar-relaxar, esta técnica deve
ser realizada para os grupos musculares do ombro, cotovelo e punho direitos. A contracção deve
ser mantida durante cerca de 6 segundos e cada grupo muscular deve realizar 4 repetições
(Pollock et al., 1998).
Em relação ao aumento da força muscular, nesta fase, devem iniciar-se os exercícios
isotónicos, uma vez que são mais efectivos no aumento da força muscular. A contracção
muscular excêntrica parece ser mais eficaz e eficiente no aumento da força muscular excêntrica,
isométrica e concêntrica, em comparação com a contracção muscular concêntrica (Petty, 2008).
Nesta fase, será aplicado o programa de Dotte, sendo este baseado no cálculo de 1RM (1
Repetição Máxima). Os exercícios devem ser realizados em séries de 5 minutos, 1 minuto para
cada série de 10 repetições com intervalos de 1 minuto, 1 segundo para realizar o movimento, 1
segundo para voltar à posição inicial e 3 a 4 segundos de repouso (Jardim, 2010).
Quanto à contracção concêntrica, esta pode ser dinâmica ou estática. Dentro da estática
pode ser activa, em que o segmento é colocado em estiramento devido à contracção dos
músculos antagonistas durante 10 a 20 segundos, e pode ser passiva, em que existe um
aumento progressivo do alongamento que impede o reflexo de estiramento, onde as posturas
devem ser mantidas durante 15 a 20 segundos (Queirós e tal., 2002).
Uma vez que a potência muscular é uma função da força muscular e da velocidade de
contracção, melhorando um destes aspectos contribui-se para o aumento da potência muscular
(Petty, 2008). A prática repetida do movimento, ou de uma componente do movimento, em
velocidade, provoca uma melhoria da potência muscular, sendo este movimento efectuado o
mais rápido possível contra uma resistência de 30% de força máxima isométrica (Petty, 2008).
Quando se fala em resistência muscular fala-se na capacidade de um músculo se
contrair repetitivamente ou de aguentar uma contracção durante um certo período de tempo
(Bruton, 2002 citado por Petty, 2008). A resistência muscular só poderá ser aumentada quando
10
houver um ganho significativo de força muscular, daí ser incluída nesta fase. Para aumentar a
resistência muscular, um músculo deve contrair-se a 30-50% da sua contracção máxima durante
20 a 30 minutos, 3 vezes por semana, onde em cada sessão se efectuem 25 a 35 repetições
(Petty, 2008).
Quanto ao treino da proprioceptividade, nesta altura, os exercícios proprioceptivos
podem ser mais complexos, em que devem ser retirados estímulos. Por exemplo, o utente pode
estar sobre a tábua de balanço ou sobre o trampolim com os membros superiores apoiados,
primeiro com os olhos abertos e depois com os olhos fechados (Stone e tal., 1994).
Longo Prazo (Semana 9 à 12):
Nesta fase, todos os objectivos devem estar maioritariamente atingidos. O PNF irá
continuar a ter um papel fundamental, pois irá facilitar o movimento desejado e inibir o
indesejado, com o objectivo de aperfeiçoar o padrão de movimento (Petty, 2008). A utilização
das diagonais no membro superior permite aproximar o movimento às actividades que o Sr.
Jorge Jesus desempenha no seu dia-a-dia.
O plano de fortalecimento muscular deve ser continuado, mas com algumas alterações:
deve haver um aumento da resistência muscular e uma diminuição do número de repetições
(Petty, 2008). Também o treino proprioceptivo deve ser continuado, com exercícios mais
complexos no sentido de melhorar quer a coordenação dos movimentos quer a agilidade
(Hougulum, 2001).
Todos estes exercícios devem ser continuados com a finalidade de promover uma
recuperação completa e efectiva do utente, possibilitando-o a regressar à sua actividade
profissional como pintor, desempenhando da melhor forma possível todas as actividades da vida
diária. Isto irá conduzir a um score próximo de zero no questionário Disabilities of the Arm,
Shoulder and Hand (DASH).
Para que o utente também possa contribuir para a eficácia da sua reabilitação, é
importante que seja programado um plano de exercícios para o Sr. Jorge Jesus poder fazer em
casa. Este programa poderá ser uma estratégia para a prevenção de recidivas.
Resultados Esperados
Espera-se que no final de cada fase de intervenção todos os objectivos definidos para
cada fase tenham sido atingidos. É esperado que ao fim de 8 semanas de tratamento, ou seja,
no final da segunda etapa, se verifique a aprendizagem motora (Petty, 2008), ao fim das 12
semanas se verifique hipertrofia muscular (Petty, 2008), no final das primeiras 2 semanas já não
11
exista edema que possa causar dor e contribuir para a limitação do movimento, no final das 8
semanas se verifique o ganho das amplitudes articulares do ombro, cotovelo e punho direitos
para as esperadas na idade do utente e que a dor no ombro e cotovelo já não se verifique. Ao
fim das 12 semanas de tratamento é esperado que se verifique uma boa coordenação dos
movimentos realizados no membro superior e que o utente consiga regressar ao seu trabalho
(Thompson et al., 2008). Ao fim das 12 semanas, o utente também poderá conduzir (Thompson
et al., 2008).
Reavaliação
A reavaliação faz parte de todo o ciclo de intervenção em Fisioterapia. Representa o
processo que permite evidenciar, comparar e medir os resultados atingidos com um determinado
plano de intervenção (Robalo & Silva, 2005). O terapeuta deve reavaliar o utente ao longo de
toda a intervenção, principalmente no final de cada fase, para compreender a evolução do utente
bem como se os objectivos foram atingidos e desta forma compreender a efectividade da sua
intervenção. Caso esta não esteja a permitir que os objectivos sejam alcançados, o terapeuta
deve alterar a sua intervenção. Todas as reavaliações devem ser registadas para poderem ser
comparadas mais tarde.
No caso do Sr. Jorge Jesus, o terapeuta deve avaliar a dor através da Escala Visual
Análoga (EVA), o edema utilizando uma fita métrica, as amplitudes articulares recorrendo à
goniometria, a força muscular com a realização de testes musculares, a educação do utente
questionando-o sobre o seu conhecimento acerca das actividades que deve ou não deve fazer
através de simples perguntas (orais ou escritas), a proprioceptividade recorrendo à aplicação de
dinamómetros isocinéticos ou através de vários testes, e a funcionalidade aplicando o
questionário Disabilities of the Arm, Shoulder and Hand (DASH).
Prognóstico Funcional
O Sr. Jorge Jesus apresenta vários factores que contribuem para a sua evolução
positiva durante o tratamento, entre os quais, a idade (55 anos), ter uma família que o apoia e
para a qual tem bastante mais tempo desde que trabalha por conta própria, de no Rx terem sido
verificados bons sinais de consolidação óssea, e o facto de ter uma vida profissional estável.
No entanto, também existem factores que poderão levar a considerar o prognóstico
deste utente negativo, entre os quais, o longo período de imobilização a que o utente foi
submetido, pois 6 semanas teriam sido suficientes e não 8 como foi o caso (Serra, 2001), e o
12
tipo de imobilização que foi efectuada, pois tratando-se de uma tala gessada axilo-palmar,
afectou não só a articulação do ombro como também a do cotovelo e do punho.
Contudo, o Sr. Jorge Jesus aparenta ter um prognóstico funcional positivo. Com o apoio
da família e também com a sua força de vontade conseguirá evoluir positivamente ao longo da
intervenção, atingindo os resultados esperados. Assim poderá voltar a realizar as actividades
que realizava, podendo regressar à sua actividade profissional de pintor.
Critérios de Alta
O Sr. Jorge Jesus irá ter alta da Fisioterapia quando tiver atingido todos os objectivos de
intervenção definidos no início desta. Os critérios de alta são estabelecidos principalmente em
termos funcionais, o que significa que o utente irá ter alta quando conseguir realizar a sua
higiene pessoal bem como todas as AVD’s sem qualquer limitação.
Desta forma, se no final das 12 semanas de intervenção o utente for autónomo nas suas
actividades, poderá ter alta.
13
Bibliografia
 Adler, S., Beckers, D. & Buck, M. (2000). PNF in Practice- an Illustrated Guide (2ª ed.). Berlin:
Springer.
 Canteiro M.E. (2003). Patogenia e fisiopatologia. (secção V, cap. 142.1). In Gomes, M.J,
Sotto-Mayor,R. Tratado de Pneumologia (Vol. II). Lisboa: Permanyer Portugal
 Clover, Jim. (2001). Sports Medicine Essentials – Core Concepts in athletic Training and
Fitness Instruction. Thomson Delmar Learning.
 Cruz, E., Matias, R., & Fernandes, R. (2007). Estudos do Movimento Humano I. Estefanilha,
Setúbal: ESS - IPS.
 Cruz, E., Silva, H. & Matias, R. (2006). Fisioterapia e Disfunção do Movimento. Estefanilha,
Setúbal: ESS – IPS.
 Disabilities of the Arm, Shoulder and Hand (DASH). Consultado em Dezembro 9, 2010, de
http://www.dash.iwh.on.ca/assets/images/pdfs/DASH_Portuguese.pdf
 Gozna, E. (2000). Extremity Fracture Case Management Guidelines. Consultado em
Dezembro
7,
2010,
de
http://www.grandroundsnow.com/whscc/whscc_pdfs/Fractures_Guidelines.pdf
 Houglum, P.A.(2001). Therapeutic Exercise for Athletic Injuries. USA: Human Kinectics.
 Jardim, M. (2010). Fortalecimento Muscular. Setúbal: Escola Superior de Saúde
 Kitchen S. (2003). Electroterapia: Prática baseada em evidências. (11ª ed.) São Paulo:
Manole.
 Pereira, C.M., Lucena, A. & Mimoso, T.P (2007). Terapia pelo Movimento I. Estefanilha,
Setúbal: ESS – IPS.
14
 Petty, N. (2008). Princípios de Intervenção e Tratamento do Sistema Neuro-MúsculoEsquelético. Um guia para terapeutas. Oxford, Reino Unido: Elsevier
 Petty, N. J. (2007). Exame e Avaliação Neuro- Músculo-Esquelética (Terceira ed.). Loures:
Lusodidacta
 Pollock, Ph, D., Gaesser, G. A. et al (1998). The Recommended Quantity and Quality of
Exercise for Developing and Maintaining Cardiorespiratory and Muscular Fitness, and Flexibility
in Healthy Adults. Medicine & Science in Sports & Exercise (30).
 Porter, S. (2005). Fisioterapia de Tidy. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda
 Queirós, P., Cardoso, F. & Margarto, C. (2002). Técnicas de Reabilitação I: Movimentar e
Transferir, Reeducação Vesical e Intestinal, Técnicas Cinesiológias (3ª edição). Coimbra:
Formasou
 Robalo, L. & Silva, M.G. (2005). A Promoção e a Protecção da Saúde em Fisioterapia.
EssFisiOnline 1 (3): 52-70.
 Serra, L. M. (2001). Critérios Fundamentais em Fracturas e Ortopedia. Lousã: LIDEL
 Stone J.A., Partin N.B., Ryan E.J., Lueken J.S. & Timm K.E. (1994). Upper Extremity
Proprioceptive Training. Journal of Athletic Training, 29 (1), 15 – 18.
 Thompson, H., Dean, R. & Haworth,G. (2008). Shoulder Post-operative Guidelines.
Consultado
em
Dezembro
5,
2010,
de
www.upperlimbservice.co.uk/.../IMPACTED%20STABLE%20PROXIMAL%20HUMERAL.doc
15

Documentos relacionados