Untitled - Acquaviva

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Untitled - Acquaviva
1
IV Conferência Regional sobre Mudanças Globais: o Plano Brasileiro para um
Futuro Sustentável
4 – 7 abril 2011 – Memorial da América Latina, São Paulo
TEMA: NEGOCIAÇÕES INTERNACIONAIS
A política climática dos Estados Unidos sob perspectiva
doméstica
Solange Reis, doutoranda pela Unicamp, pesquisadora do
CEDEC e do INCT-Ineu ([email protected];
[email protected])
Kelly Ferreira, mestranda pelo Programa de Pós
Graduação em Relações Internacionais, San Tiago Dantas
da UNESP, UNICAMP e PUC/SP, pesquisadora do
CEDEC e do INCT-Ineu ([email protected];
[email protected])
Tullo Vigevani, professor da UNESP, pesquisador do
CEDEC e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de
Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-Ineu)
([email protected]; [email protected])
2
Introdução
Os riscos de mudança climática decorrente do aquecimento global vêm
mobilizando a comunidade internacional desde os anos 60 e 70, quando o
Clube de Roma publicou o manifesto ―Os Limites do Crescimento‖ e a
Organização das Nações Unidas realizou a Conferência de Estocolmo de 1972.
A partir do fim da década de 80, outras reuniões, programas e documentos
permitiram avanços no sentido de conscientizar a opinião pública e os
dirigentes políticos em diversos países.
Dentre os principais eventos, destacaram-se o Relatório Brundtland de
1987, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) em
1988 e, finalmente, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente de
1992, no Rio de Janeiro. Todas essas iniciativas visavam desenvolver sistemas
de regimes internacionais para proteção ambiental.
A questão é simples na descrição: desde meados do século XIX, a
temperatura na Terra vem subindo em ritmo acelerado1. Estudos científicos
analisados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC)
indicam que o fenômeno deve-se a causas naturais, mas também ao modelo
de civilização industrial, cujo modo de produção depende do uso em larga
escala de recursos fósseis geradores de gases poluentes2. Atividades
humanas causariam por boa parte das emissões de gases de efeito estufa.
As consequências térmicas do consumo de recursos fósseis podem ser
desastrosas para a vida na Terra. Segundo a Agência Internacional de
Energia3,
Continuing on today’s path, without new polices, would mean
rapidly increasing dependence on fossil fuels and continuing
wasteful use of energy, taking us towards a concentration of
greenhouse gases in the atmosphere in excess of 1.000 parts
per million (ppm) of CO² equivalent. This (…) would almost
certainly lead to massive climatic change and irreparable
damage to the planet.
1
Climate Change 2001: Synthesis Report. Summary for Policymakers. An Assessment of the
Intergovernmental Panel on Climate Change. Disponível em: http://www.ipcc.ch/pdf/climatechanges-2001/synthesis-spm/synthesis-spm-en.pdf
2
O IPCC não conduz os estudos, mas avalia relatórios desenvolvidos por cientistas de diversas
instituições mundiais.
3
World Energy Outlook 2009. International Energy Agency. OECD/IEA, 2009, p/ 168.
3
Especialistas recomendam a adoção de medidas severas para que o
aumento da temperatura no atual século não ultrapasse em mais de 2°C os
níveis pré-industriais4. Em 1990, a concentração global de dióxido de carbono
na atmosfera era de 354 ppm contra 280 ppm da era pré-industrial. Para a
comunidade científica, o índice superior a 450 ppm incorrerá em incontornáveis
desastres ambientais5.
Em 2005, os Estados Unidos já eram responsáveis por 20% das
emissões globais6, vindo a ocupar a 7ª posição na lista de emissão de CO² per
capita em 20097. O país ocupou o posto de maior poluidor do mundo por
algumas décadas, até ser ultrapassado pela China em volume emitido em
20078. Essa condição não chegava a perturbar os formuladores de políticas no
país. Durante muitos anos, imperou nos Estados Unidos, bem como no mundo,
a crença de que o desenvolvimento econômico estava diretamente ligado ao
consumo energético. Para os norte-americanos, a relação do país com o uso
de energia apenas seguia o curso natural de uma história destinada ao
progresso contínuo.
As duas últimas administrações antes de Barack Obama – Bill Clinton e
George W. Bush – sofreram pressão da comunidade internacional para aderir
aos acordos internacionais. Em 1992, a Convenção-Quadro das Nações
Unidas sobre Mudança Climática estabeleceu os pilares de uma temática que
envolveria cada vez mais nações, governos e comunidades. Sem definir metas
e objetivos, o tratado deu o primeiro passo na criação de uma estrutura de
4
LIGHT, Andrew; WEISS, Daniel J; KAUFMAN, Lisbeth; JAMES, Adam. Prospects for U.S.
Climate Policy. National Action and International Cooperation in a Changed Political
Landscape. Friedrich Ebert Stiftung, dez. 2010, p. 2.
5
LEGGETT, Jane A. A U.S.-centric Chronology of the International Climate Change
Negotiations. Congressional Research Service 7-5700, R40001, mar.2010, p. 7.
6
Obama’s New Climate Policy. Opportunities and Challenges of Climate Policy Change in the
US. Stiftung Wissenschaft und Politik. SWP Research Papers, jul. 2010, p. 43.
7
World Energy Outlook 2009. International Energy Agency. OECD/IEA, 2009, p/ 177.
8
China increases lead as biggest carbon dioxide emitter. The New York Times, 4/6/2008.
Disponível em: http://www.nytimes.com/2008/06/14/world/asia/14china.html
4
colaboração internacional9. Os Estados Unidos foram o quarto país a assinar o
acordo e o primeiro entre os industrializados10.
Por tratar-se de um problema que desconhece fronteiras, qualquer
solução requer uma ação global coordenada, cuja execução não escapa de
implicações tecnológicas, econômicas e políticas.
A percepção de setores
domésticos sobre a extensão dessas implicações impediu uma cooperação
prática efetiva dos Estados Unidos. O que parecia ser o início de uma trajetória
positiva sobre ação climática no começo do governo Clinton, transformou-se
em forte resistência ainda no mandato deste presidente e consolidou-se no de
seu sucessor.
É sabido, porém, que o desenvolvimento de uma ação global eficiente
requer o engajamento deste país, bem como a conscientização de suas
lideranças sobre a premência de se estabelecer um novo paradigma de
consumo energético. Para compreender a sua atuação nas negociações
internacionais sobre mudança climática e aquecimento global, é preciso
observar de uma perspectiva minuciosa o cenário doméstico, de modo a
identificar os interesses que movem os poderes econômicos e políticos, e
determinam o papel do país nas esferas globais de discussão.
Este artigo pretende trazer à luz parte dos fatores que determinam o
posicionamento dos Estados Unidos nos debates internacionais, sobretudo
desde a posse de Barack Obama, e as perspectivas de acordo até 2012, ano
em que expiram o Protocolo de Kyoto e o mandato do atual presidente.
Na primeira parte do ensaio, faremos uma breve retrospectiva das
decisões tomadas nos dois governos anteriores: Bill Clinton (1993-2001) e
George W. Bush (2001-2009).
A segunda tratará do destaque dado pelo candidato Obama às questões
ambientais e energéticas, salientando o aumento da contribuição financeira das
indústrias do setor verde para a campanha eleitoral, especialmente a
democrata. Ainda na segunda seção, observaremos as realizações e o
descumprimento das promessas eleitorais durante seu primeiro mandato.
9
LEGGETT, Jane A. A U.S.-centric Chronology of the International Climate Change
Negotiations. Congressional Research Service 7-5700, R40001, mar.2010, p.2.
10
PARKER, Larry B; BLODGETT, John E. U.S. Global Climate Change Policy: Evolving
Views on Cost, Competitiveness, and Comprehensiveness. CRS Report for Congress. Order
RL30024, p.1.
5
O terceiro bloco do trabalho será dedicado a identificar os principais
atores – pessoas e instituições – que permitem ou inviabilizam avanços do (e
no) país para uma ação global.
Por último, procuraremos demonstrar as perspectivas de curto prazo
para as negociações internacionais, tendo em vista o crescimento de grupos
conservadores no espectro político dos Estados Unidos e as ações grassroots
– campanhas populares - para inibir o estabelecimento no país de políticas
climáticas.
Parte 1 – A política climática dos Estados Unidos nas administrações
Clinton e Bush.
1.1 – A política climática de Bill Clinton (1993-2001)
A política climática do democrata Bill Clinton pode ser dividida em duas
etapas: antes e depois das eleições de meio de mandato da primeira gestão.
Eleito em 1992, Clinton teve a seu favor o controle do Congresso pelo Partido
Democrata nos dois primeiros anos de governo.
Essa vantagem, contudo,
seria perdida antes do fim do primeiro termo, quando os republicanos saíram
vitoriosos das eleições gerais de 1994. O resultado foi a retomada, inédita
desde 1950, da maioria na Câmara e no Senado pelo Partido Republicano11.
Ao assumir o cargo, o presidente anunciara planos de criar um imposto
sobre consumo de energia e um programa em consonância com a ConvençãoQuadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática. Os projetos, no entanto,
viram-se rejeitados no Congresso quando os democratas ainda o controlavam.
Seis meses depois, divulgou-se o Plano de Ação para Mudança
Climática (CCAP – Climate Change Action Plan) - uma série de iniciativas
administrativas para reduzir as emissões de gases do país no ano 2000 ao
nível de 1990. Embora a decisão sobre a execução dos programas do CCAP
coubesse ao governo federal, o Congresso detinha um controle importante.
11
(1993/1995) Senado: 57 vagas democratas contra 43 republicanas; Câmara: 258 vagas
democratas contra 176 republicanas e 1 independente. (1995/1997) Senado: 48 vagas
democratas contra 52 republicanas; Câmara: 204 vagas democratas contra 230 republicanas e 1
independente. Disponível em: http://www.infoplease.com/ipa/A0774721.html
6
Para a implantação das medidas executivas, as agências encarregadas
dependiam da liberação de US$ 1.9 bilhões por parte das duas casas
legislativas. Em conformidade com o primeiro artigo da Constituição, os gastos
públicos devem ser aprovados tanto pela Câmara quanto pelo Senado.
Depois das eleições de meio de mandato, a liberação dos recursos
tornou-se uma batalha diária entre a administração e os congressistas. A
vantagem estava do lado dos republicanos, que passaram de uma posição
reativa às propostas federais para a condição de impor a própria agenda,
conhecida como ―Contrato com a América‖
12
. Da perspectiva dessa estratégia
republicana de governo, cuja essência era a participação mínima do Estado na
economia, o CCAP representava um instrumento de interferência estatal no
funcionamento do mercado. Em 1997, ao ser constatado que as emissões
estavam 13% acima de 1990, Clinton atribui o insucesso do plano ao bloqueio
da oposição às verbas para os quase 50 programas do CCAP13.
Como demonstraremos adiante, aspectos do cenário doméstico
repercutiram
significativamente
na
postura
dos
Estados
Unidos
nas
negociações internacionais. Seus representantes questionaram as metas e a
pressionaram por maior participação dos países ―em desenvolvimento mais
avançados‖
14
. Outra preocupação era enquadrar europeus e japoneses dentro
dos mesmos parâmetros, a fim de que as ―externalidades climáticas‖ não
tornassem a economia norte-americana menos competitiva do que a de seus
aliados.
Embora o aumento da participação da China no comércio internacional
mantivesse o ritmo médio de 7% ao ano desde 197915, ainda eram os
principais países da União Europeia e o Japão os maiores concorrentes dos
Estados Unidos. Para o governo, os custos inerentes à limitação das emissões
12
The Contract with America: Implementing New Ideas in U.S. The Heritage Foundation, 12
out. 1995. Disponível em: http://www.heritage.org/research/lecture/the-contract-with-americaimplementing-new-ideas-in-the-us
13
PARKER, Larry B; BLODGETT, John E.U.S. Global Climate Change Policy: Evolving
Views on Cost, Competitiveness, and Comprehensiveness. CRS Report for Congress.
OrderRL30024, p.11.
14
ROYDEN, Amy. U.S. Climate Change Policy Under President Clinton: A Look Back. Golden
Gate University Law Review. Volume 32, Issue 4 Rio’s Decade: Reassessing the 1992 Earth
Summit, 28 set. 2010, p.8.
15
PRASAD, Eswar (Editor). China’s Growth and Integration into the World Economy:
Prospects and Challenges. International Monetary Fund. Washington, 2004, p.1.
7
deveriam ser partilhados por todos os pares, de forma que nenhum deles
saísse em desvantagem no comércio internacional. Para Rafe Pomerance,
antigo vice-assistente do secretário de Estado para Meio Ambiente, o objetivo
principal do país na COP-1 (Conferência das Partes-1) , em Berlim no ano de
1995, era evitar que a União Europeia impusesse metas de emissão aos
Estados Unidos16.
Os negociadores concordaram que os países em desenvolvimento
participariam de forma voluntária, sem comprometimento com metas préestabelecidas. Contudo, estavam cientes de que transformar acordos externos
em legislações domésticas requeria bem mais do que a assinatura de
compromissos formais entre Estados, exigiria muito esforço mesmo depois de
alcançados os acordos internacionais. As condições de participação dos países
em desenvolvimento ainda hoje são um dos tópicos centrais da resistência do
Congresso ao engajamento do país em um regime climático global.
No início de 1996, os republicanos rejeitaram o orçamento fiscal
apresentado pela Casa Branca e propuseram uma nova versão com cortes
duros em setores como educação, saúde e meio ambiente. Pela regra, o
presidente tem a capacidade de acatar ou vetar a redução. Bill Clinton optou
pelo veto, o que levou à paralisação de serviços essenciais em um fenômeno
conhecido como government shutdown17. Diante de tal conjuntura interna, a
perspectiva de uma política climática de alcance nacional viu-se reduzida.
Apesar da dificuldade em coordenar exigências internacionais e
domésticas, a administração Clinton nunca chegou a abandonar as
negociações, como viria a fazer George W. Bush. Durante a COP-2, realizada
naquele ano em Genebra, o subsecretário para Assuntos Globais, Timothy
Wirth, declarou que o país concordava em estabelecer um instrumento legal
condicionante. A declaração, no entanto, continha premissas que continuam
pautando o comportamento do país nos fóruns de mudança climática e
dificultando acordos até hoje.
16
ROYDEN, Amy. U.S. Climate Change Policy Under President Clinton: A Look Back. Golden
Gate University Law Review. Volume 32, Issue 4 Rio’s Decade: Reassessing the 1992 Earth
Summit, 28 set. 2010, p.8.
17
A paralisação do governo representa o impedimento de funcionamento de algumas agências
federais por falta de verba, o que leva à interrupção da execução de programas, inclusive de
pagamento de salários de funcionários públicos e de benefícios sociais.
8
Em primeiro lugar entre as premissas, as metas de redução deveriam
ser realistas. O país não aceitaria trabalhar com números idealizados, sem
conexão com a realidade econômica. Além disso, as soluções adotadas
deveriam ser orientadas para o mercado, o que significava não apenas
preservar a margem de lucro das indústrias, mas fazer do combate ao
aquecimento global um negócio em si mesmo. Por último, os acordos deveriam
ser suficientemente flexíveis para incorporar um número cada vez maior de
países. Como sabemos, o tema da economia ecológica vem perpassando a
temática do meio ambiente desde os anos 1960. Sem ser nosso tema aqui,
deixamos à margem a pergunta de porque a incorporação dessa economia não
se deu, e certamente não produziu os resultados que já nos anos 1980 eram
imaginados (Pearce, David. Greening in the World Economy. London,
Earthscan Publications, 1991).
O que se observou previamente à COP-3, na cidade de Kyoto em 1997,
foi uma espécie de fase preparatória da opinião pública e de tomadores de
decisão em relação à importância do tratado. Com esse objetivo, foi criada a
Força Tarefa para Mudança Climática da Casa Branca sob a liderança de Todd
Stern, atual enviado especial de Obama. Funcionários de diversas agências
federais procuraram esclarecer a questão para os grupos ambientalistas, os
setores industriais, os políticos e a população em geral.
O próprio Clinton proferiu um discurso na Sociedade Geográfica
Nacional no dia 22 de outubro de 199718. A fala referia-se à questão climática
como um problema de amplitude global, particularmente preocupante nos
países industrializados e em desenvolvimento. O presidente destacara que,
não obstante as incertezas sobre a extensão do fenômeno, a comunidade
científica sabia o suficiente para soar o alarme para além dos meios
acadêmicos e de pesquisa. O objetivo de Clinton era legitimar o tema diante
dos formuladores de política e de opinião pública.
A situação do clima no planeta requeria uma ação coletiva, da qual os
Estados Unidos não poderiam abster-se. Uma série de diálogos bilaterais foi
iniciada junto a países com os quais os Estados Unidos mantinham interesses
18
ROYDEN, Amy. U.S. Climate Change Policy Under President Clinton: A Look Back. Golden
Gate University Law Review. Volume 32, Issue 4 Rio’s Decade: Reassessing the 1992 Earth
Summit, 28 set. 2010, p.22.
9
energéticos, a exemplo de Austrália, Japão, Canadá e, em alguma medida, a
Rússia. A preferência por fóruns reduzidos viria a pautar a atuação dos últimos
três presidentes, sobretudo George W. Bush.
As divergências mais profundas surgiam em relação aos tradicionais
parceiros no velho continente. A União Europeia (UE) propusera em Kyoto
reduzir 15% das emissões em 2000 em relação aos níveis de 1990. Para os
Estados Unidos, o foco deveria ser a estabilização, e não a redução das
emissões. Além de entender que o percentual proposto feria o fundamento da
factibilidade dos números, os Estados Unidos discordavam do critério escolhido
pelos líderes europeus: fazer valer o percentual para a UE como um todo,
cabendo à Comunidade Europeia estabelecer os limites de emissão para cada
país individualmente. Com isso, os europeus criavam seu próprio sistema de
comércio de quotas de emissão, no que os Estados Unidos discordavam
peremptoriamente.
Os esforços para conscientizar a classe política doméstica foram em
vão. Por 95 votos a favor e nenhum contra, o Senado - que ratifica os tratados
assinados pela Casa Branca - aprovou a resolução bipartidária Byrd-Hagel
(S.Res.98)
19
, introduzida pelos senadores Robert Byrd (D-WV) e Chuck Hagel
(R-NE). A resolução desaconselhava a assinatura do tratado por entender que
o instrumento, uma vez adotado, impunha limites insustentáveis à economia e
favorecia demasiadamente os países em desenvolvimento. O que se observa
na postura do Congresso – além da pressão do lobby do setor energético - é o
temor de impedir o funcionamento do livre-mercado.
Procurando responder às pressões internacionais, o governo tratou de
avançar internamente. Entre outros programas federais, estabeleceu a
Iniciativa Tecnológica para Mudança Climática (CCTI – Climate Change
Technology Initiative), que previa US$ 6,3 bilhões em investimentos e
incentivos fiscais para aumentar a eficiência energética no país.
O Congresso usou os instrumentos disponíveis para dificultar a gestão
do CCTI, como o veto às verbas solicitadas pelo governo e aos nomes de
pessoas
indicadas
pela
administração
para
ocupar
cargos
públicos
19
PARKER, Larry B; BLODGETT, John E. U.S. Global Climate Change Policy: Evolving
Views on Cost, Competitiveness, and Comprehensiveness. CRS Report for Congress.
OrderRL30024, p.12.
10
fundamentais. O maior duelo, no entanto, passou a ser travado com a Agência
de Proteção Ambiental (EPA – Environmental Protection Agency)
20
.
Congressistas desconfiavam que, diante da improbabilidade de aprovar
legislações climáticas, o governo regularia as emissões de carbono, conferindo
poderes a EPA com base na mais ampla legislação ambiental já aprovada no
país, o Clean Air Act de 1970 (CAA). Essa batalha reproduz-se com toda a
intensidade na administração Obama.
Quando teve início a COP-3 (Kyoto), Todd Stern apresentou propostas
para uma política global pautada nos seguintes princípios: ser guiada pela
ciência; ser consonante com o funcionamento do mercado; promover novas
tecnologias sem causar a destruição das antigas; promover participação global;
acompanhar revisões científicas e econômicas.
Ao fim da conferência, Bill Clinton assinou o Protocolo de Kyoto, pelo
que foi duramente criticado dentro de casa. "In signing the Kyoto Protocol, the
President blatantly contradicts the will of the U.S. Senate (Chuck Hagel).21 O
tratado, contudo, nunca foi enviado para ratificação no Senado. Logo depois da
assinatura, o presidente enfrentou a mais séria crise em seu governo. Após
confessar envolvimento em escândalo sexual na Casa Branca, Clinton viu-se
ameaçado pelo risco de impeachment nos meses seguintes22. Diante deste
cenário e da Resolução Byrd-Hagel, a chance de ratificação se havia tornado
nula.
Apesar do retrocesso, Clinton afirmou - no discurso do Estado da União
em janeiro de 199923 - que o aquecimento global representava o maior desafio
fatal para o país. No mês seguinte, o governo incluiu US$ 4.1 bilhões para
programas climáticos na proposta orçamentária fiscal para o ano 2000, 34% a
mais do que no ano anterior.
A contrarreação da oposição veio por meio de uma iniciativa bipartidária
introduzida no Senado. O Ato de Política Climática e Energia de 1999, que não
21
U.S. signs a pact to reduce gases tied to warming. The New York Times, 13 nov. 1998
Disponível em:
http://query.nytimes.com/gst/fullpage.html?res=9800E0DC1531F930A25752C1A96E958260&
pagewanted=all
22
Clinton impeachment timeline. Guardian.co.uk, 18 nov. 1998. Disponível em:
http://www.guardian.co.uk/world/1998/nov/18/clinton.usa
23
Declaração à nação feita pelo presidente sobre a estratégia anual do governo.
11
chegou a passar como legislação, diferia do Protocolo de Kyoto em vários
aspectos. Acima de tudo, o ato rejeitava a assinatura do tratado antes que os
países em desenvolvimento aderissem ao controle das emissões e enquanto
persistissem as cláusulas mandatórias. Ainda que paradoxalmente o
instrumento significasse um avanço na disposição do Senado em discutir um
tema tabu, continuou prevalecendo a crença de que o mercado e novas
tecnologias seriam suficientes para enfrentar o problema globalmente.
No que concerne às questões ambientais, os dois últimos anos de
Clinton foram direcionados para catapultar a figura do vice-presidente e ativista
ambiental, Al Gore, como candidato às eleições no ano 2000. Gore acabou
derrotado por George W. Bush após polêmica apuração de votos.
Os oito anos de governo Clinton lograram abrir o diálogo nas esferas de
discussão nacional, ainda que tenha sido pautado por avanços e retrocessos.
Do ponto de vista interno, o governo creditava à iniciativa privada maior
habilidade para lidar com o problema. Nas negociações internacionais, o
impasse girou em torno do papel dos países em desenvolvimento, das metas
de redução sobre índices de 1990 e de um instrumento jurídico mandatório.
1.2. A política climática dos Estados Unidos na administração de George
W. Bush (2001-2008)
Em janeiro de 2001, o Painel Intergovernamental sobre Mudança
Climática (IPCC) declarou haver ―nova e forte evidência de que a maior parte
do aquecimento nos últimos 50 anos é atribuível a atividades humanas‖.24 Dois
meses depois, o recém-eleito presidente, George W. Bush anunciou a saída
dos Estados Unidos das negociações para o Protocolo de Kyoto. A principal
razão e justificativa para o desligamento foi demonstrar alinhamento com a
Resolução Byrd-Hagel.
24
Climate Change 2001: Synthesis Report. Summary for Policymakers. An Assessment of the
Intergovernmental Panel on Climate Change. Disponível em: http://www.ipcc.ch/pdf/climatechanges-2001/synthesis-spm/synthesis-spm-en.pdf
12
Entre os dois eventos, o governo havia criado a força tarefa National
Energy Policy Development Group (NEPDG) sob a liderança do vicepresidente, Dick Cheney, para enfrentar três desafios: a crise elétrica da
Califórnia que ameaçava atingir outras regiões, o aumento do preço e a
redução da produção do gás doméstico, e a dependência de petróleo externo.
A ligação de Bush e Cheney com o setor petrolífero no Texas e em outras
regiões fez com que grupos ambientalistas conseguissem adiar os trabalhos da
NEPDG até 200525.
A questão primordial para a nova administração não era climática, mas
energética. Uma vez atuante, a NEPDG empenharia esforços para tornar o
país menos dependente de petróleo externo pelo estímulo à exploração
doméstica de hidrocarbonetos, sobretudo de gás em alto-mar e em áreas de
reservas naturais. Os planos de Cheney propunham avançar sobre terras
federais, incluindo o Arctic National Wildlife Refuge no Alaska, ainda hoje
protegido do alcance das empresas petrolíferas. O governo Bush marcou,
portanto, um claro retrocesso em relação aos mínimos avanços feitos por seu
antecessor.
Antes de oficializar o abandono formal e definitivo do acordo de Kyoto,
Bush enviara uma carta aos senadores republicanos Chuck Hagel (R-NE),
Jesse Helms (R-NC), Larry Craig (R-ID) e Pat Roberts (R-KS), traduzindo toda
a política que pautaria o comportamento dos Estados Unidos nos fóruns
globais durante seu mandato.
As you know, I oppose the Kyoto Protocol because it exempts
80 per cent of the world, including major population centres
such as China and India, from compliance, and would cause
serious harm to the US economy. [...] At a time when California
has already experienced energy shortages, and other Western
states are worried about price and availability of energy this
summer, we must be very careful not to take actions that could
harm consumers. This is especially true given the incomplete
state of scientific knowledge of the causes of, and solutions to,
global climate change and the lack of commercially available
technologies for removing and storing carbon dioxide (BUSH,
2001). 26
25
REIS, Solange. Geopolítica em tempos de crise energética. Publicado pelo Instituto de
Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU).
26
Disponível em: http://iospress.metapress.com/content/c87cge4kd7mcjbu4/fulltext.pdf
13
Para atenuar o impacto de suas declarações perante a comunidade
científica e ambientalista, Bush solicitou um estudo sobre as causas da
mudança climática à renomada Academia Nacional de Ciências (NAS). O
resultado não foi o esperado para a administração, uma vez que o relatório
produzido pela NAS acabou respaldando as conclusões do IPCC.27 O
presidente anunciou, então, a intenção de criar a Iniciativa de Pesquisa sobre
Mudança Climática para estudar áreas cientificamente incertas e priorizar
investimentos.
Enquanto isso, a associação Global Climate Coalition liderava uma
campanha agressiva para consolidar a ideia da mudança climática como uma
invenção dos cientistas28. O grupo acabou dissolvido em 2002 após seus
próprios especialistas confirmarem que a ação humana sobre o aquecimento
global era uma ideia irrefutável29.
Na prática, Bush tratou de desmontar alguns programas criados por
Clinton, como a Parceria para a Nova Geração de Veículos, que visava
produzir carros com autonomia para 80 milhas por galão de combustível. Em
lugar de aumentar a eficiência dos carros nacionais, o governo preferia investir
em veículos movidos a hidrogênio, tecnologia ainda hoje fora de aplicação em
larga escala, ainda que não possam ser excluída sua evolução futura.
No discurso do Estado da União de 2002, o presidente comunicou a
intenção de contribuir com US$ 4.6 bilhões em créditos fiscais para fontes
renováveis de energia, carros híbridos e movidos a hidrogênio, além de
tecnologias para redução de emissões de CO²
30
. Com relação à regulação da
emissão de gases poluentes, o presidente declarou-se contrário a metas préestabelecidas. A redução deveria ser alcançada a partir de ações voluntárias
do setor privado, sem qualquer interferência estatal.
27
ROSENCRANZ, Armim. U.S. Climate Change Policy under G.W.Bush. Golden Gate
University Law Review. Volume 32. Issue 4 Rio’s Decade: Reassessing the 1992 Earth
Summit, 28 sep. 2010.
28
Obama’s New Climate Policy. Opportunities and Challenges of Climate Policy Change in the
US. Stiftung Wissenschaft und Politik. SWP Research Papers, jul. 2010, p.14.
29
Industry Ignored Its Scientists on Climate’. The New York Times, 23 abr. 2009.
http://www.nytimes.com/2009/04/24/science/earth/24deny.html
30
ROSENCRANZ, Armin. U.S. Climate Change Policy under George W. Bush. Golden Gate
University Law Review, Volume 32, Issue 4 Rio’s Decade: Reassessing the 1992 Earth
Summit, Article 4, 28 set. 2010, p. 11
14
Como alternativa a Kyoto, Bush sugeriu a criação da Iniciativa para
Mudança Climática (Climate Change Initiative), em 2002, também com o
objetivo de reduzir não a emissão, mas a intensidade dos gases de efeito
estufa em 18% até 2012.
Na COP-6 em Haia, em novembro de 2000, um ano antes de os Estados
Unidos abandonarem as negociações para o Protocolo de Kyoto, a diferença
de posição entre os Estados Unidos e a União Europeia tornara-se ainda mais
evidente. Europeus defendiam que os países industrializados reduzissem o uso
doméstico de recursos fósseis para atingir as metas. Para a União Europeia,
uma estratégia climática somente com base na livre iniciativa não produziria os
cortes necessários para evitar o aumento do aquecimento global.
Os Estados Unidos preferiam adotar critérios menos definidos e que
permitissem eliminar os gases sem reduzir significativamente as emissões. Um
ponto defendido pelo país foi a inclusão de áreas de agricultura e floresta como
sequestradoras de carbono31. Essa condição o beneficiaria sem impor quotas
e restrições à economia nacional. Ademais, o país preferia estabelecer um
sistema de comércio para que os países mais poluidores pudessem adquirir
permissões dos países com menores índices de emissão.
A estratégia
evidenciava a disposição em contribuir para um regime de combate ao
aquecimento global sem necessariamente promover mudanças estruturais no
modo de consumo e produção.
Nos anos subsequentes à saída das negociações de Kyoto, o governo
procurou engajar o país em negociações bilaterais ou regionais, em detrimento
das discussões nos fóruns multilaterais da ONU.32 Este foi o caso da AsianPacific Partnership on Clean Development and Climate (2006), estabelecida em
parceria com Austrália, Canadá, China, Coreia do Sul, Índia e Japão para
resolver problemas de segurança energética, mudança climática e a poluição
do ar.
Como figura ligada tanto ao partido republicano como às indústrias
fósseis, Bush manteve certa coerência durante seu mandato. Sob a sua
administração, o governo apregoou o credo do livre mercado como panaceia
COP-6 – Haia, Holanda. Brasil.gov.br Disponível em:
http://www.brasil.gov.br/linhadotempo/epocas/2000/cop-6-2013-haia-holanda
32
Obama’s New Climate Policy. Opportunities and Challenges of Climate Policy Change in the
US. Stiftung Wissenschaft und Politik. SWP Research Papers, jul. 2010, p. 7.
31
15
para os males econômicos do país. Para a administração, a submissão a um
regime internacional resultaria em ineficiência do mercado.
Parte 2 – A política climática dos Estados Unidos na administração
Barack Obama (2009-ao presente).
2.1 O papel da nova administração nas negociações internacionais
COP-15 e COP-16
Barack Obama baseou boa parte de sua campanha à presidência em
2008 nas promessas de mudança em questões sensíveis para qualquer
sociedade, especialmente para a norte-americana, acostumada a um elevado
padrão de consumo de energia33. Enquanto candidato, Obama anunciou que
procuraria diminuir a dependência de petróleo e enfrentaria a mudança
climática combatendo as emissões de dióxido de carbono e outros gases
poluentes. As principais metas de campanha eram reduzir as emissões em
80% até 2050; aumentar a parcela de energia renovável para 25% do total
consumido; e criar um sistema de comércio de carbono no país34.
A campanha trouxe novos ares à política dos Estados Unidos de meio
ambiente, uma vez que o tema ambiental não constituía nenhuma plataforma
eleitoral desde as eleições presidenciais de 1970. A não ser o significado da
campanha de Al Gore de 2000, quando, ainda que em contexto de grande
polêmica, perdeu. O assunto voltava não como um diferencial, mas como um
ponto nevrálgico.
Deste modo, a Plataforma Obama-Biden (candidato a vice-presidente)
arquitetou um plano de trabalho apresentado como proposta eleitoral, que
visava a colocar os Estados Unidos na liderança da chamada "revolução
verde". Em meio à crise financeira de 2008, o candidato democrata vislumbrava
33
Barack Obama e Joe Biden: New Energy For America. Discurso no dia 04/08/2008 em
Michigan. Disponível em:
http://www.realclearpolitics.com/articles/2008/08/new_energy_for_america.html
34
Obama’s New Climate Policy. Opportunities and Challenges of Climate Policy Change in the
US. Stiftung Wissenschaft und Politik. SWP Research Papers, jul. 2010, p. 5.
16
a oportunidade de amalgamar a recuperação econômica e a transformação do
paradigma energético do país em um mesmo pacote de estímulo.
O Green Economic Recovery Program, criado pelo Center for American
Progress e a Unidade de Pesquisa em Economia Política da Universidade de
Massachusetts, reuniam medidas de curto e longo prazo para amenizar os
efeitos da crise, e a médio e longo prazo para reformar a economia e implantar
políticas ambientais. Assim, a retomada econômica e a adoção de políticas
energéticas e ambientais seriam interdependentes.
Esta estratégia, anunciada no material de campanha como New Energy
for America, buscava cativar eleitores com a promessa de um alivio rápido para
o aumento de preços no setor energético, diminuição dos níveis de carbono a
um patamar 80% inferior aos níveis de 1990, e redução da dependência
externa de petróleo.
No curto prazo, o plano propunha uma forma de reembolso de gastos
com eletricidade às famílias (Immediately Provide Energy Rebate): US$ 500
por pessoa ou US$ 1.000 por casal como compensação pela inflação de
preços de combustíveis e eletricidade.
Medidas de médio e longo prazo visavam promover uma reforma na
matriz energética do país com foco em energias limpas. Ao transformar o setor,
Obama esperava estimular a economia, gerar empregos e diminuir a
quantidade de gases de efeito estufa.
A fim de criar cerca de cinco milhões de empregos, US$ 150 bilhões35
seriam
investidos ao
longo
de
dez anos para
estimular
empresas
automobilísticas a produzir e comercializar carros híbridos. Procurando alinhar
os interesses do capital e do trabalho, seriam estabelecidos centros de
formação profissional, de modo a formar mão de obra qualificada, com
estabilidade de emprego e remuneração adequada. As empresas receberiam
US$ 4 bilhões para a aquisição de tecnologia necessária para produzir carros
híbridos. O candidato Obama esperava colocar nas ruas até 2012 um milhão
de veículos dotados desta tecnologia.
No que diz respeito aos biocombustíveis, o objetivo era alcançar uma
geração mais eficiente, como o etanol celulósico e o biobutenol para ajudar o
35
Fact Sheet: Barack Obama - Joe Biden New Energy for America, 2008
17
país a reduzir a dependência de petróleo tradicional. Para todos os
combustíveis, de fontes renováveis ou não-renováveis, seria criado um padrão
nacional de baixa emissão de carbono, obrigando os produtores a reduzir suas
emissões em 5% nos primeiros cinco anos e 10% na década seguinte.
Outros projetos de grande destaque seriam a criação de infra-estrutura
para a construção de redes inteligentes de energia (smart grids), associada à
instalação de painéis solares, e o desenvolvimento de eficiência energética.
O maior desafio, porém, girava em torno da implementação do sistema
cap-and-trade, que além de impor limites às emissões, era também gerador de
receita por meio do comércio de quotas. Cerca de US$ 15 bilhões anuais36
arrecadados com o comércio de emissões entre as corporações seriam
investido em projetos de desenvolvimento de energia limpa, aumento da
eficiência energética e criação de uma nova geração de combustíveis.
Em 20 de janeiro de 2009, Obama foi finalmente empossado como
presidente do país, trazendo na bagagem fortes convicções comunitárias,
amplo apoio da base progressista de seu partido, o recente grande
engajamento de importantes setores da população, como os jovens.
Poucos presidentes assumiram a Casa Branca despertando tamanha
expectativa na opinião pública nacional e internacional, o que não foi menos
verdadeiro para o universo de pessoas e instituições envolvidas no combate ao
aquecimento global. O diretor-executivo interino do Greenpeace nos Estados
Unidos, Mike Clark, declarou que a histórica posse de Obama iniciava um
momento de grande potencial37. Para o centro de pesquisas SWP (Stiftung
Wissenschaft und Politik) de Berlim, “a nova administração distingue-se pelas
notórias ambições em política climática” (SWP, 2010) 38.
No tocante às questões ambientais, as expectativas logo acabaram
frustradas: Obama compareceu à COP-15 em Copenhagen, em dezembro de
2009, mas não foi capaz de avançar nos acordos. A explicação desse fato, de
grandes conseqüências, é o nosso objeto. E não é possível fazê-lo sem
36
Idem.
37
Posse de Barack Obama renova expectativa sobre Copenhagen. Greenpeace Brasil,
18/01/2009. Disponível em http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/destino-do-climaglobal-nas-m/
38
Obama’s New Climate Policy. Opportunities and Challenges of Climate Policy Change in the
US. Stiftung Wissenschaft und Politik. SWP Research Papers, jul. 2010, p.6.
18
adquirir um bom conhecimento do policy-making norte-americano. Assim como
Bush, o novo presidente também adotaria algumas iniciativas em fóruns
reduzidos, como o U.S.-China Memorandum of Understanding to Enhance
Cooperation on Climate Change, Energy and the Environment (2009)39.
A proposta levada pela equipe norte-americana à COP-15 espelhava a
legislação democrata aprovada na Câmara alguns meses antes. O país se
comprometia a reduzir as emissões de carbono em 17% sobre os níveis de
2005 até o ano 2020, para finalmente alcançar 83% em 2050.
Para os países mais engajados nas negociações internacionais, o
equívoco começava pelos parâmetros adotados pelos Estados Unidos, uma
vez que a proposta da União Europeia girava em torno de redução tendo como
referência o ano de 1990. Se os Estados Unidos tomassem por base a
referência europeia, a redução real em 2020 seria de apenas 4%, já que os
níveis nacionais de emissão haviam subido fortemente desde 199040.
Os sinais emitidos pelo país eram contraditórios. No mesmo dia da
abertura da COP-15, a Agência de Proteção Ambiental anunciou finalmente a
tão esperada classificação do gás carbônico e mais outros gases como nocivos
à saúde pública. A partir desta constatação, a agência estaria habilitada a
regular as emissões de gases no país.
Evitando
soar
intransigentes,
os
negociadores
norte-americanos
levavam na bagagem algumas moedas de troca. A primeira delas confirmava o
a disposição em financiar US$ 100 bilhões por ano até 2020 para nações
menos desenvolvidas, desde que a aplicação e o uso da verba estivessem
sujeitos à supervisão internacional.
A COP-15 encerrou-se com um resultado inesperado: um grupo menor
de países que incluía China, Estados Unidos, Índia, Brasil e África do Sul
apresentou uma proposta em paralelo. O plano, que não foi considerado pelos
demais participantes, significou uma vitória do ponto de vista norte-americano
por ter conseguido o compromisso de redução de parte de alguns dos maiores
países em desenvolvimento41. Contudo, a COP-15 terminou sem resolver a
39
Disponível em: http://www.state.gov/r/pa/prs/ps/2009/july/126592.htm
Obama’s New Climate Policy. Opportunities and Challenges of Climate Policy Change in the
US. Stiftung Wissenschaft und Politik. SWP Research Papers, jul. 2010, p.9.
40
41
Q&A: The Copenhagen climate summit. BBC News. 21 dez. 2009. Disponível em:
http://news.bbc.co.uk/2/hi/science/nature/8278973.stm
19
questão central: encontrar um substituto para o Protocolo de Kyoto a partir de
2012.
No ano seguinte, em 2010, em Cancun, a COP-16 obteve conquistas
modestas, porém importantes para futuras discussões. Uma delas diz respeito
à recuperação de parte da credibilidade das Nações Unidas em conduzir os
esforços multilaterais. Destacou-se também a diminuição das divergências
entre países ricos e pobres, que permitiu estabelecer dois mecanismos formais:
o Fundo Climático Verde para transferência financeira de US$100 bilhões
anuais das economias centrais para projetos ambientais em nações menos
desenvolvidas, e o acordo para a Redução de Emissões por Desmatamento e
Degradação Florestal (REDD+), que compensará países que preservarem as
florestas tropicais.
Todd Stern, enviado especial dos EUA, ressaltou a aprovação do
sistema de monitoramento e verificação das reduções nos países em
desenvolvimento, ponto considerado chave para Washington aceitar acordos
mais abrangentes. Isto porque o Congresso dificilmente liberaria a contribuição
do país sem que mecanismos de controle fossem instituídos. Entretanto, os
EUA seguiram resistindo a um regime global que limite as emissões de
carbono.
2.2. Os constrangimentos e oportunidades no cenário doméstico
Para o professor de história e política social de Harvard, Alexander
Keyssar, Obama ganhou as eleições principalmente por não ser George W.
Bush e por apresentar uma agenda transformadora. Entretanto, restrições
políticas estruturais, bem como suas características pessoais, levaram-no a
negociar cotidianamente com seus mais ferrenhos opositores, desagradando a
sua própria base.42 Ao final de dois anos, seu governo havia sido
descaracterizado da natureza nitidamente progressista que pautara sua
trajetória e a campanha eleitoral, aproximando-o de uma posição política mais
centrista, obrigada cotidianamente à barganha e a concessões.
42
KEYSSAR, Alex. The Balancing Act of Barack Obama. Observatório Político dos Estados
Unidos. Disponível em: http://www.opeu.org.br/Estudos/OPEU_Estudos_03.pdf
20
Como diria o próprio Obama em entrevista recente, “(...) os dois primeiros
anos de governo foram essencialmente caracterizados por emergências”43
A crise econômica, o alto índice de desemprego e o gigantesco déficit
fiscal dificultavam a margem de manobra de Obama para enfrentar os
problemas climáticos. Ademais, o presidente havia empenhado esforços para
aprovar a reforma do sistema de saúde e o pacote de estimulo à economia.
Este último, embora dedicasse 12% dos investimentos ao setor de energia
alternativa44, não bastava para enfrentar plenamente os problemas climáticos.
Como atestam algumas análises,
(...) a política externa dos Estados Unidos para mudança
climática espelha a sua política doméstica para a questão.
Esta, por sua vez, é o resultado de uma complexa interrelação
entre os grupos de interesse nos níveis federais e estaduais
do governo, e composta por exigências econômicas, pelos
interesses industriais e pelo sentimento e conhecimento do
público em relação ao tema (SWP, 2010) 45.
Todos esses fatores reunidos formam um cenário complexo para o
avanço de regulamentações climáticas em nível local, estadual ou federal. Nas
próximas seções, discorreremos sobre a tentativa fracassada do governo em
aprovar uma legislação em âmbito nacional e a batalha que sucedeu à derrota,
opondo os congressistas e a EPA. Esta disputa será decisiva, não apenas para
a agenda climática do país (e do mundo), mas também para os planos de
reeleição de Obama em 2012.
2.3 American Clean Energy and Security Act of 2009 (ACESA)- A vitória
na Câmara dos Representantes.
Após a posse, Obama decidiu lutar por duas promessas de campanha:
energia e sistema de saúde. A estratégia era plantar a semente da reforma nos
43
Obama to Republicans: Let’s Build Consensus. National Journal, 21 out. 2010. Disponível em:
http://www.nationaljournal.com/magazine/obama-to-republicans-let-s-build-consensus-20101021
Obama’s New Climate Policy. Opportunities and Challenges of Climate Policy Change in the
US. Stiftung Wissenschaft und Politik. SWP Research Papers, jul. 2010, p.23
45
Idem, p.6 (Tradução própria).
44
21
dois campos e colher os frutos onde vingasse. Enquanto o representante Max
Baucus (D-MO) apresentou uma legislação de saúde no Senado, os
representantes Henry Waxman (D-CA) e Edward Markey (D-MA) introduziram
no Comitê de Comércio e Energia da Câmara, em 15 de maio, proposta que
seria aprovada na casa como o American Clean Energy and Security Act of
2009. Porém, o ato Waxman-Markey jamais será adotado como lei no país.
Os mandatos dos representantes na Câmara possuem duração de dois
anos, período ao final do qual são realizadas novas eleições. Antes do término
de um período legislativo, projetos de lei não votados na casa, ou leis
aprovadas e pendentes de análise no Senado, são arquivados. Como a
Waxman-Markey passou na Câmara, mas não foi encaminhada à votação no
Senado antes do fim do 111º Congresso (2009-2010), a legislação terminou
arquivada.
A proposta foi uma das mais ambiciosas que já tramitaram no
Congresso por tratar de cap-and-trade - sistema que determina os limites para
emissão de gases e quotas para comércio de carbono. Inúmeros congressistas
e grandes indústrias opõem-se radicalmente a qualquer iniciativa nesse sentido
por entendê-la como interferência do Estado na economia.
Os objetivos gerais da Waxman-Markey eram reduzir a emissão dos
gases causadores do efeito estufa em 17% até 2020 sobre o nível de 2005 (e
83% até 2050); criar empregos relacionados à produção de energia renovável;
conquistar independência energética; reduzir a poluição causadora do
aquecimento global; promover transição para uma economia baseada em
energia
renovável;
desenvolver
meios
de
transporte
ecologicamente
adequados; incentivar a energia limpa com programas de crédito; exportar
tecnologia para o desenvolvimento de energia renovável.
O texto também determinava as competências da EPA (Environmental
Protection Agency) para regular, juntamente com o Departamento do Interior,
as emissões de gases poluentes e o comércio de créditos de carbono entre
indústrias. Para amenizar a preocupação com a ―vantagem‖ das nações em
desenvolvimento, a legislação propunha que a EPA elaborasse relatórios
anuais sobre o desenvolvimento de legislações ambientais e a redução de
emissões na China e na Índia.
22
A iniciativa recebeu apoio de 61 grupos de interesse, entre os quais
Sierra Club, Union of Concerned Scientists, One Sky, Clean Water Action,
American Rivers e Environmental Defense Fund. Dentre seus críticos,
destacaram-se: Greenpeace, American Farm Bureau Federation, Friends of the
Earth, Rainforest Action Network, Public Citizen e Murray Energy Corporation.
Vale ressaltar que a composição eclética do segundo grupo inclui
ambientalistas, indústrias de energia fóssil e associações de consumidores e
contribuintes46. Isso se explica pelo posicionamento crítico partindo, às vezes,
de pontos de vista totalmente opostos.
Em 26 de junho de 2009, a proposta Waxman-Markey foi finalmente
aprovada na Câmara com uma margem apertada de 219 (incluindo oito
republicanos) a 21247, quando eram necessários 217 votos. É importante
ressaltar que os democratas, que detinham 255 cadeiras de um total de 435,
não votaram unidos.
A Waxman-Markey, apesar de ambiciosa, foi considerada fraca por
ambientalistas, que, a exemplo do Greenpeace48, acreditavam que a proposta
beneficiaria interesses capitalistas em detrimento da necessidade ambiental,
uma crítica à política de créditos como incentivo para a redução de gases.
Por razões diferentes, os representantes das indústrias petrolíferas
também condenaram a lei, que as obrigariam a comprar permissões do
governo para compensar a emissão de carbono produzida por todos os
veículos terrestres. Segundo Jack Gerard, presidente da maior associação
petrolífera do país, American Petroleum Institute (API), observou-se grande
resistência do público à lei durante as campanhas populares (grassroots)
promovidas pela API e outras indústrias49.
No ano seguinte, uma pesquisa feita pelo Pew Research Center revelou
que, dentre 20 temas escolhidos, os norte-americanos apontavam a mudança
46
OpenCongress.org. Disponível em: http://www.opencongress.org/bill/111-h2454/show
Disponível em: http://www.pewclimate.org/acesa
48
“Greenpeace opposes Waxman-Markey”. Greenpeace. Disponível em:
http://www.greenpeace.org/usa/en/news-and-blogs/campaign-blog/greenpeace-opposeswaxman-markey/blog/25644
49
US Senate will not approve House cap-and-trade bill. ICIS.com. Disponível em:
http://www.icis.com/Articles/2009/09/15/9247685/us-senate-will-not-approve-house-cap-andtrade-bill-api.html
47
23
climática como o último item da lista de prioridades50. Enquetes com outras
metodologias indicaram resultados diferentes. O trabalho conduzido pelas
Universidades de George Mason e Yale conclui que 65% dos americanos
consideravam a mudança climática alarmante e 50% atribuíam o aquecimento
global à ação humana51.
2.4 A proposta Kerry-Lieberman
A pretensão de tornar a Waxman-Markey uma legislação nacional
acabou interrompida no Senado, que optou por formular seus próprios projetos.
Todavia, o clima político do Senado não permitiria grandes progressos nesse
sentido. O controle da casa pelos democratas não impedia a manifestação
contrária dentro do próprio partido. A Gangue dos 16 – senadores democratas
dos estados que compõem o cinturão industrial (Rust Belt) – enviaram uma
carta aos líderes da casa alertando para os efeitos negativos do combate à
mudança climática sobre a economia52.
Inicialmente, a discussão na casa girou em torno da proposta dos
senadores John Kerry (D-MA) e Barbara Boxer (D-CA), o Clean Energy Jobs
and American Power Act (S.1733), apresentada em 30 de setembro de 2009.
Apesar de sugerir a redução de 20% sobre as emissões de 2005, a
iniciativa foi considerada mais branda do que a Waxman-Markey por fazer
maiores concessões de crédito de carbono ao setor industrial. Lançada meses
antes da COP-15 em Copenhagen, foi criticada no Congresso como um
instrumento planejado para impressionar os negociadores internacionais.
Segundo o presidente da Associação Nacional de Refinarias e Petroquímicas,
um sistema cap-and-trade beneficiaria as refinarias europeias em detrimento
das norte-americanas53.
50
LIGHT, Andrew; WEISS, Daniel J; KAUFMAN, Lisbeth; JAMES, Adam. Prospects for U.S.
Climate Policy. National Action and International Cooperation in a Changed Political
Landscape. Friedrich Ebert Stiftung, dez. 2010, p. 6.
51
Idem, p.7
52
Gang of 16 regroups to flex muscle. Politico.com, 04/03/2009. Dsiponível em:
http://www.politico.com/news/stories/0309/19583.html
Copenhagen… and bust! Intellectual honesty, economy take a back seat to political
expediency in the climate debate. The Hill’s Congress Blog. Disponível em:
53
24
Sem apoio suficiente dentro do próprio partido democrata, o líder da
maioria, senador Harry Reid (D-NE), optou por não introduzir a proposta KerryBoxer na pauta de votação.
O senador Kerry iniciou novas negociações com os senadores Joseph
Lieberman (I-CT) e Lindsey Graham (R-SC) para a formulação de um novo
projeto tripartidário a fim de reduzir em 17% a emissão de gases de efeito
estufa até 2020 sobre os índices de 2005, e em 83% até 2050.
Duas estratégias para angariar simpatizantes republicanos haviam sido
determinadas: oferecer aos senadores algum tipo de barganha ou tentar
influenciar os setores petrolíferos, nuclear e de eletricidade que financiavam as
campanhas republicanas. Depois de tentar sem sucesso a primeira opção, os
senadores optaram por buscar o apoio das indústrias com a promessa de
ceder em pontos considerados críticos por cada uma delas.
Inicialmente, procuraram o presidente da Câmara de Comércio dos
Estados Unidos, Tom Donohue, uma vez que a instituição é apontada como o
grupo de interesse mais influente em Washington. A moeda de troca para
Donohue era destituir a EPA do poder de regular as emissões de carbono.
O mesmo tipo de barganha foi oferecido ao empresário de gás natural,
T. Boone Pickens. Em relação à indústria petrolífera, o grupo conseguiu
negociar com a britânica BP, e as norte-americanas Shell e a ConocoPhillips
uma legislação compatível com o interesse dessas empresas em troca da
interrupção da campanha contra legislação climática promovida pelas
associações petrolíferas, especialmente o American Petroleum Institute. Por
último, os três senadores partiram para buscar o apoio da Edison Electric
Institute, principal representante das empresas de eletricidade.
Os planos de Kerry, Graham e Lieberman, no entanto, foram soterrados
por outros eventos. O primeiro acontecimento foi o acidente com a plataforma
da BP no Golfo do México. O maior desastre ambiental da história do país
obrigaria o governo a rever a liberação de licenças de exploração de petróleo
em alto-mar, o que impediria os três senadores de cumprir com as promessas
alinhavadas com os setores de petróleo e gás, e de eletricidade.
http://thehill.com/blogs/congress-blog/energy-a-environment/66751-copenhagen-and-bustintellectual-honesty-economy-take-a-back-seat-to-political-expediency-in-the-climate-debate
25
Do ponto de vista político, contudo, o fator determinante para o fracasso
da iniciativa foi a decisão de Harry Reid (D-NE) de priorizar a lei de imigração
na agenda da casa em lugar de incentivar a votação da legislação climática54.
Simultaneamente, a campanha dos grupos mais conservadores do
partido republicano e da mídia, como o Tea Party e a Fox News, levaram
Graham a desistir de apoiar a iniciativa55. Caso ainda venham a reunir os 60
votos mínimos para aprovação, Kerry e Lieberman prometem tentar reintroduzir
a proposta no 112º Congresso (2011-2012). O problema é que a derrota do
partido democrata nas eleições de meio de mandato em 2010 reduziu as
cadeiras para 51 contra as 59 que tinham em 2009. Além de garantir a
unanimidade dos votos democratas, a dupla de senadores precisará obter o
improvável apoio de nove republicanos.
2.5
Desafios e oportunidades no segundo período da presidência
Obama (2011 – 2012)
Em 15 de março de 2011, o Comitê de Energia e Comércio da Câmara
dos Representantes aprovou resolução para impedir que a EPA regule
emissões com base jurídica no Clean Air Act. A resolução deverá ser
introduzida no plenário como projeto de lei ainda este ano, após receber o
apoio de 34 membros do comitê, sendo que 19 votos foram desfavoráveis. Jim
Matheson (D-UT), um dos três democratas a favor da resolução, conseguiu
incluir uma emenda que confere ao Congresso parte da atribuição da EPA.
Matheson, como muitos outros críticos da agência, teme ser visto como inimigo
do ―clima‖ e procura demonstrar a inadequação da agência, e não do tema em
si.
A iniciativa dificilmente passará pelo Senado, onde outras propostas
republicanas ou bipartidárias também procuram ceifar o poder da agência
54
Sen. Reid to push climate bill before immigration. Reuters, 28 abr. 2010. Disponível em:
http://www.reuters.com/article/2010/04/28/us-climate-usa-idUSTRE63R4OP20100428
55
Graham completes break with Kerry climate plan, backs Lugar energy bill with no emissions
cap. The Hill, 09 jun. 2010. Disponível em: http://thehill.com/blogs/e2-wire/677-e2wire/102281-graham-completes-break-with-kerry-climate-plan-backs-lugar-energy-bill-withno-emissions-cap
26
reguladora. Com os democratas ainda majoritários na casa, existe a
possibilidade de que todas essas tentativas acabem frustradas e os avanços
republicanos desacelerados. Para isso, também será preciso vencer a
resistência dos chamados democratas moderados, ideologicamente mais
próximos dos republicanos.
A Casa Branca parece ter começado o segundo período do mandato de
Obama (2011 – 2012) com mais empenho para estabelecer regulamentações
climáticas. No discurso do Estado da União em janeiro de 2011, Obama lançou
proposta orçamentária para 2012, reforçando a postura pró-energia limpa56.
Embora a prioridade nacional seja reduzir o déficit do orçamento federal de
U$1,1 trilhão, o presidente defendeu aumento de investimentos no setor.
A proposta orçamentária do presidente enfoca o Departamento de
Energia, para o qual está previsto um aumento de U$29.5 bilhões, com
destaque para o aumento da eficiência energética; programas de inovação
para minerais raros, baterias e armazenamento de energia, e novas
tecnologias de rede elétrica; pesquisa, desenvolvimento e implantação de
investimentos em programas tecnológicos de energia limpa.
Em paralelo, o governo defende a liberação de US$ 36 bilhões em
empréstimos para a construção de reatores nucleares. O plano também busca
dar continuidade às promessas feita pelo presidente, como a contribuição de
U$580 milhões em pesquisas avançadas de tecnologia limpa para automóveis
e ajuda ao cumprimento de meta para atingir um milhão de veículos elétricos
nos EUA até 2015.
Para financiar os gastos, Obama propõe que os benefícios fiscais
fornecidos à indústria fóssil, da ordem de U$46.2 bilhões anuais, sejam
revogados pelos próximos 10 anos, bem como programas de pesquisa de
tecnologia para energia fóssil.
As intenções da Casa Branca veem-se ameaçadas pela radicalização do
cenário político. Mesmo os republicanos menos radicais defendem reformas
orçamentárias vigorosas, o que poderá afetar primeiramente os setores de
56
Obama's DOE Budget Request Promotes Clean Tech, Slashes Fossil Energy. The New York
Times, 14 fev. 2011. Disponível em: http://www.nytimes.com/gwire/2011/02/14/14greenwireobamas-doe-budget-request-promotes-clean-tech-32236.html?pagewanted=1&ref=energyenvironment
27
energia alternativa. Dentre os principais argumentos dos republicanos – e
democratas moderados – ressalta-se a crença de que a indústria limpa não
gera suficiente número de empregos.
Comparativamente ao seu antecessor, pode-se dizer que Obama
retomou a questão de maneira positiva. O presidente e seus assessores para
assuntos de energia e clima declaram publicamente concordar com as
pesquisas científicas e mostram-se dispostos a debater o assunto. Entre a
retórica e a prática, contudo, existe um Congresso radicalizado, um déficit
trilionário e a maior economia do mundo para reaquecer.
Obama e equipe acreditam que a adoção de um modelo energético
limpo é a solução não apenas para a mudança climática, mas para a economia
nacional. Assumir a liderança em desenvolvimento e comércio de tecnologia
verde poderá ser o fator determinante de poder econômico e político nas
décadas subseqüentes. Nos debates sobre economia ecológica, uma das
críticas fortes que surgem em relação à teoria neoclássica é a de que sua
concepção da função de produção não tem em conta que os recursos naturais
são finitos. Pode ser que algumas idéias na equipe de Obama estejam sendo
incorporadas, no sentido da absorção de elementos de economia ecológica,
numa perspectiva liberal.
De acordo com o Center for American Progress, a China investe US$
12.6 milhões por hora para tornar a sua economia mais ―verde‖
57
. Ao disparar
na corrida tecnológica nos anos recentes, os chineses vêm despertando a
preocupação da administração, congressistas e industriais. A disputa foi
referida pelo presidente no discurso do Estado da União, em 2011, como o
―Momento Sputnik‖ dos Estados Unidos. Obama apenas reproduzia a citação
do secretário de Energia, Steven Chu, dias antes da abertura da COP-16 em
Cancun. Lembrando o ano de 1957, quando os Estados Unidos foram
surpreendidos com o lançamento pela União Soviética do Sputnik (satélite),
Chu alertou para a liderança chinesa em investimento e desenvolvimento de
energia limpa.
57
FURNAS, Ben. We Must Seize the Energy Opportunity or Slip Further Behind: A Primer on Global
Competition in Green Technology Investments. Center for American Progress, 20 abr. 2009. Disponível
em: http://www.americanprogress.org/issues/2009/04/global_competition.html
28
Meanwhile, China had emerged as the world's largest producer
of wind and solar power, and was breaking ground on 30 new
nuclear reactors. It now has the fastest high-speed trains in
operation, with running speeds of 220mph.58
A competição por tecnologia para produção de energia limpa entre esses
países, que são as duas maiores economias, bem como os maiores poluidores
do mundo, beneficiaria indiretamente política climáticas em âmbito global.
Além disso, a preocupação da China com os elevados índices de poluição no
país a levam a rever algumas de suas opiniões em relação ao combate ao
aquecimento global. De fato, o 12. Plano Quinquenal (2011 – 2015) aprovado
em março de 2011 define como meta a redução do consumo de energia por
unidade do PIB entre 16% e !7%, o que implica o fechamento de empresas
intensivas em consumo energético. No período anterior, de 2006 a 2010, a
substituição de centrais termelétricas antigas por modernas permitiu economia
de 300 milhões de toneladas de CO2 que não foram emitidas na atmosfera.
Como observado na COP-16 em Cancun, uma nova perspectiva chinesa
poderia levar a um maior isolamento dos Estados Unidos nas negociações
internacionais, forçando-os a também adotar um novo posicionamento.
Parte 3. Atores e Instituições no debate doméstico
3.1. Agência de Proteção Ambiental (EPA) x Congresso
Existem dois caminhos para a adoção de uma política ambiental nos
Estados Unidos em âmbito nacional: por meio de legislação aprovada pelo
Congresso e sancionada pelo presidente, ou pela regulação da Agência de
Proteção Ambiental59.
58
US energy secretary warns of 'Sputnik moment' in green technology race. Guardian.Co.Uk, 29 nov.
2010. Disponível em: http://www.guardian.co.uk/world/2010/nov/29/us-green-technology-energyinvestment
59
GOULDER, Lawrence H; STAVINS, Robert N. Interaction Between State and Federal
Climate Change Policies. In: FULLERTON, Don; WOLFRAM, Catherine (Editors). The
Design and Implementation of U.S. Climate Policy. National Bureau of Economic Research.,
jun. 2010, p.1. Disponível em: http://www.nber.org/books/full10-1
29
A primeira alternativa apresenta algumas dificuldades
como já
discutimos, a explicação reside no sistema político do país. A constituição
prevê um sistema de ―verificações e pesos‖ a fim de equilibrar os poderes, o
que acaba por constranger a atuação do Executivo. Outro obstáculo é o
procedimento de votação no Senado, que requer maioria qualificada de 60
votos para aprovação de leis. Quando Obama assumiu o cargo, o Partido
Democrata detinha justos 60 assentos, mas o falecimento do senador Ted
Kennedy diminuiu a vantagem para 59.
Independentemente
da
composição
partidária
no
Congresso,
o
presidente não exerce liderança sobre a atuação de seu próprio partido em
plenário, como ocorre nos sistemas parlamentaristas europeus. Nesse
contexto, o controle das casas legislativas pelos democratas nos dois primeiros
anos de governo não se traduziu em apoio aos planos de Obama.
Depois das eleições em novembro de 2010, a vantagem foi perdida:
republicanos abriram uma grande diferença na Câmara, com 242 assentos
contra 193 democratas; no Senado, a vantagem anterior foi diminuída em oito
cadeiras, passando os democratas a ocupar apenas 51, contra 47 republicanas
e 2 independentes60.
A agressividade dos setores conservadores tem enfocado a EPA, a
segunda alternativa disponível ao governo para agir no tocante ao meio
ambiente e ao clima, na ausência de um cenário político ideal. A agência
federal regula emissões de gases provenientes da atividade econômica de
algumas das maiores empresas que utilizam energia fóssil no país. Indústrias
de carvão, petróleo e gás seriam tremendamente afetadas caso uma eventual
legislação energética e climática as sujeitassem ao pagamento de taxas e
impostos, e
ao
corte
dos subsídios atualmente vigentes.
Incentivos
governamentais à indústria de energia alternativa também afetariam a
concorrência, diminuindo o potencial de lucro do setor de energia tradicional.
Em 1970, o Congresso aprovou o Clean Air Act (CAA) com o objetivo de
legislar sobre emissões poluentes pela primeira vez na história do país. Leis
anteriores como o Air Pollution Control Act de 1955, o Clean Air Act de 1963 e
o Air Quality Act de 1967 tratavam de pesquisa e desenvolvimento, e
60
Disponível em: http://www.infoplease.com/us/government/112-congress.html
30
verificação de poluição, mas somente o CAA abrangeu o controle das
emissões.61 No mesmo ano, o então presidente Richard Nixon criou a Agência
de Proteção Ambiental (EPA) para consolidar em uma única agência uma série
de atividades decorrentes do CAA.
Após ter tido uma emenda em 1990, o CAA teve seus poderes
ampliados para execução e regulação de medidas de prevenção de poluição
relacionadas à saúde individual e ao meio ambiente. É com base
principalmente nessa emenda, que a EPA vem conseguindo burlar as barreiras
impostas ininterruptamente pelos sucessivos Congressos.
The Clean Air Act (...) defines the Environmental Protection
Agency’s responsibilities for protecting and improving the
nation’s air quality when a substance has been determined to
endanger human health and the environment (LIGHT, WEISS,
KAUFMAN, JAMES, 2010, p. 4)
Durante o governo de George W. Bush, o então chefe da EPA, Stephen
Johnson, não levou adiante os estudos que classificariam o gás carbônico e
outros gases poluentes como nocivos para a saúde humana. Para pressionar a
agência a tomar a medida, vários estados decidiram processar o governo. Em
2007, a Suprema Corte deu ganho de causa ao estado de Massachussetts no
caso Massachussetts v. EPA, obrigando a agência a concluir o processo de
análise e classificação dos gases. Porém, foi apenas no início do mandato de
Obama que a EPA concluiu a tarefa. A classificação dos gases como
prejudiciais à saúde humana os colocava sob a esfera de atuação da agência.
O mesmo, contudo, não é atribuído à mudança climática, cuja prevenção
foge à competência da agência. Desde que viu os seus poderes ampliados, em
1990, a EPA vem sofrendo repetidas investidas por parte de quase todos os
republicanos e de alguns democratas para destituí-la das atribuições. Em 2009,
a proposta de lei introduzida pela senadora Lisa Murkowski (R-AK) para
61
History of the Clean Air Act of 1970. Environmental Protection Agency. Disponível em:
http://www.epa.gov/air/caa/caa_history.html
31
desautorizar a EPA ficou a apenas 4 votos de aprovação, com 47 votos a favor,
dos quais 6 democratas62.
Mesmo que o presidente vete decisões desse tipo, o Congresso ainda
tem como trunfo o poder de cortar as verbas fundamentais para os programas
ambientais.
A estratégia, no entanto, poderia resultar no mesmo fracasso
vivenciado pelos republicanos em 1995.
Ao tentar bloquear algumas das
atividades da EPA durante o governo Clinton por meio do corte de verbas, os
congressistas acreditavam que o presidente cederia à pressão e reformularia
as atribuições. Clinton, no entanto, vetou o orçamento ―anti-ambiental‖ do
Congresso, fazendo com que a opinião pública se voltasse contra os
representantes e senadores.
Para aqueles que acompanham a política doméstica dos Estados
Unidos, o contexto atual soa como uma reprise da relação entre Clinton e o
Congresso. Obama, no entanto, é uma figura política diferente em uma
conjuntura bem diversa. Seu antecessor democrata não enfrentava a maior
crise econômica desde a Segunda Guerra ou o maior déficit fiscal de toda a
história do país. O cenário nos Estados Unidos de Obama é de elevados
índices de desemprego e uma grande pressão para ajustes fiscais.
Apesar dos ataques, a EPA anunciou, em 23 de dezembro de 2010, um
cronograma para adoção de parâmetros e critérios para emissão de gases de
efeito estufa pelos grandes poluidores. As primeiras indústrias submetidas às
limitações serão as usinas de eletricidade movidas a combustíveis fósseis e as
refinarias de petróleo, respectivamente obrigadas a adotar os critérios em julho
e dezembro de 2011.
Outra grande medida da EPA foi anunciada em 15 de janeiro último.
Trata-se de plano de regulamentações para reduzir emissões de mercúrio e
outras toxinas geradas por usinas termoelétricas. A administradora da EPA,
Lisa Jackson, disse que a medida vem com um atraso de 20 anos, pois estava
prevista pela emenda de 1990 do Clean Air Act. O plano divulgado obriga as
usinas a usar purificadores a partir de 2015 para reduzir em 91% as emissões
62
LIGHT, Andrew; WEISS, Daniel J; KAUFMAN, Lisbeth; JAMES, Adam. Prospects for U.S.
Climate Policy. National Action and International Cooperation in a Changed Political
Landscape. Friedrich Ebert Stiftung, dec. 2010, p. 4.
32
de mercúrio. Segundo estudos do Congresso, as termoelétricas respondem por
70% das emissões de dióxido de enxofre e 50% de mercúrio nos Estados
Unidos. Jackson disse que a decisão vai custar às empresas US$ 10 bilhões
em quatro anos, mas também permitirá economizar aos cofres públicos US$
100 bilhões por ano de gastos relativos a saúde e meio ambiente.
O plano de regulamentações substitui regra anterior de George W. Bush,
rejeitada por uma corte federal em 2008 por não incluir outros metais além de
mercúrio. Segundo o senador Jim Inhofe (R-OK), o procedimento reduz em
20% a capacidade produtiva das usinas, prejudicando a economia e
aumentando o desemprego. Para o futuro presidente do influente Comitê de
Energia e Comércio, o representante Fred Upton (R-MI), as normas previstas
pela EPA prejudicam o setor energético e não passam de tentativas
disfarçadas de se estabelecer quotas para emissão e comércio de poluentes.
A estratégia dos opositores da administração Obama na Câmara será
questionar a autoridade jurídica da agência. O plano dos republicanos encontra
apoio em parte dos democratas, preocupados com a incerteza sobre a rigidez
dos novos padrões e sobre o tipo de tecnologia que será exigido das indústrias
para atingir as metas.
3.2
As Iniciativas Regionais
Na ausência de legislação ambiental nacional, alguns estados decidiram
agir por conta própria nos últimos anos. No plano prático, 26 estados adotaram
regras para estimular a geração de energia a partir de fontes alternativas e
outros 22 criaram programas de quotas de emissão e comércio de carbono.
Muitos projetos nasceram de ações regionais63.
This is illustrated by California’s actions, by the collaborative
efforts of nearly a dozen mid-Atlantic and Northeast states
involved in the Regional Greenhouse Gas Initiative (RGGI), by
the rapid growth in operations of the Chicago Climate
Exchange—where over sixty million metric tons have been
traded voluntarily this year alone by over 300 companies, in
private sector efforts within the U.S. Climate Action Partnership
63
Regional Iniciatives. Pew Global Center on Climate Change. Disponível em:
http://www.pewclimate.org/what_s_being_done/in_the_states/regional_initiatives.cfm#midwest
33
(USCAP) as well as by the actions of citizens across the
country.64
Quase todas sofrem ataques de setores conservadores. Em New
Hampshire, a instituição Americans for Prosperity - ligada ao Tea Party e às
indústrias petroquímicas Koch - promoveu uma campanha para convencer a
população de que a Iniciativa Regional para Gases de Efeito Estufa (RGGI)
prejudica a economia. Pressionados pelos eleitores, os representantes
aprovaram uma proposta de lei republicana contra a permanência do estado na
RGGI, cabendo agora ao governador democrata John Lynch sancioná-la ou
vetá-la.
O radicalismo político se personifica no Tea Party, ala populista do
partido republicano, que repudia uma série de fundamentos e princípios da
atual administração. Opondo-se sempre a qualquer iniciativa que possa soar
limitadora de uma perspectiva individualista, beirando o fundamentalismo. As
campanhas do grupo, iniciadas em 2009, visavam a manter o corte de
impostos introduzidos por George W. Bush e derrubar a reforma de saúde, dois
temas da agenda do 111º Congresso. Outras temáticas como imigração,
incentivos fiscais, energia limpa e mudança climática também pairam na mira
do Tea Party e seus colaboradores próximos.
Apoiado por algumas indústrias do setor fóssil, o grupo rejeita os
progressos científicos que têm sido alcançados na análise sobre mudança
climática e combate ferozmente a mudança de paradigma energético 65.
Na essência, o Tea Party é um movimento libertário, cujo principal
inimigo é o poder público. O posicionamento de seus representantes se
transformou em um problema não apenas para os democratas, mas para os
próprios republicamos.
Estes arriscam perder o apoio de eleitores menos
conservadores caso sucumbam às pressões ultraconservadoras. Por outro
lado, o partido não pode desprezar o número de cadeiras ganhas pelos radicais
nas últimas eleições se quiser rejeitar ou aprovar qualquer legislação no atual
Congresso.
64
EIZENSTAT, Stuart. The U.S. Role in Solving Climate Change: green growth policies can enable
leadership despite the economic downturn. Energy Law Review. Volume 30, n. 1, 2009, p.4
65
The Big Question: What is the Tea Party movement, and could it change US politics? The Independent,
22 jan. 2010. Disponível em: http://www.independent.co.uk/news/world/americas/the-big-question-whatis-the-tea-party-movement-and-could-it-change-us-politics-1875229.html
34
Vale destacar a atuação dos empresários Charles e David Koch como
ícones anti-ambientalistas, muito embora seus interesses também perpassem
outras questões relevantes, como a redução de direitos trabalhistas e a defesa
de cortes fiscais66.
The Kochs are longtime libertarians who believe in drastically
lower personal and corporate taxes, minimal social services for
the needy, and much less oversight of industry—especially
environmental regulation. (…) In a study released this spring,
the University of Massachusetts at Amherst’s Political
Economy Research Institute named Koch Industries one of the
top ten air polluters in the United States. And Greenpeace
issued a report identifying the company as a ―kingpin of climate
science denial.‖ The report showed that, from 2005 to 2008,
the Kochs vastly outdid ExxonMobil in giving money to
organizations fighting legislation related to climate change,
underwriting a huge network of foundations, think tanks, and
political front groups. Indeed, the brothers have funded
opposition campaigns against so many Obama Administration
policies—from health-care reform to the economic-stimulus
program—that, in political circles, their ideological network is
known as the Kochtopus67.
O ―Kochtopus‖ também ajudou a eleger governadores e representantes
contrários a regulamentações climáticas. Outros projetos de lei já foram
introduzidos em 13 câmaras estaduais na linguagem sugerida pela organização
American Legislative Exchange Council, defensora da não-intervenção do
Estado na economia. Ideias comuns às propostas são a reversão de medidas
vigentes e o combate às regulações da Agência de Proteção Ambiental (EPA).
Independentemente das críticas, a expectativa é de que as Iniciativas
Regionais estabeleçam os pilares para uma política nacional abrangente.
Conflitos entre os interesses estaduais e nacionais, no entanto, deverão
emergir tão logo o país adote uma legislação ampla. Dada a particularidade de
cada estado e região, é possível o surgimento de divergências em relação a
sistema de comércio de quotas de emissão, à adoção de padrões de energia e
66
Billionaire Brothers’ Money Plays Role in Wisconsin Dispute. The New York Times, 21 fev. 2011.
Disponível em: http://www.nytimes.com/2011/02/22/us/22koch.html
67
Covert Operations. The New Yorker, 30 ago. 2010. Disponível em:
http://www.newyorker.com/reporting/2010/08/30/100830fa_fact_mayer
35
à modernização da rede inteligência para eletricidade (smart grid)
68
.
Relacionamos abaixo cinco Iniciativas Regionais:
 Midwest Greenhouse Gas Reduction Accord (MGGRA) Em novembro de 2007, seis estados norte-americanos (Illinois, Iowa, Kansas,
Michigan, Minnesota e Wisconsin) e uma província canadense (Manitoba)
formaram a MGGRA com o objetivo de estabelecer metas regionais de redução
de até 80% em gases e um sistema cap-and-trade.
 Energy Security and Climate Change Stewardship Platform for the
Midwest
No mesmo ano, 11 estados norte-americanos (Wisconsin, Minnesota, South
Dakota, Illinois, Indiana, Iowa, Kansas, Michigan, Missouri, Nebraska, North
Dakota e Ohio) e Manitoba, no Canadá, formaram a plataforma para aprimorar
eficiência energética, abastecimento de combustíveis de baixo carbono,
produção de energia renovável e de biocombustíveis. A plataforma também
estabelece objetivos para implementar captura e armazenamento de carbono,
de modo que todas as usinas termoelétricas possuam o sistema até 2020.
 Western Climate Initiative (WCI)
Igualmente em 2007, os estados de Arizona, Califórnia, New Mexico, Oregon e
Washington estabeleceram a WCI. Desde então, Utah, Montana e quatro
províncias canadenses somaram-se ao grupo como membros, além de vários
outros estados do México, Estados Unidos e Canadá na posição de
observadores. Os objetivos da WCI são reduzir em 15% as emissões de 2005
até 2020 e desenvolver um sistema cap-and-trade a partir de 2012.
 Regional Greenhouse Gas Initiative (RGGI)
A mais antiga das Iniciativas Regionais foi criada em 2005 e reúne os estados
de Connecticut, Delaware, Maine, New Hampshire, New Jersey, New York,
Vermont, Massachussetts, Rhode Island e Maryland. Juntos estabeleceram o
primeiro sistema cap-and-trade (limite e negociação) em caráter obrigatório
Obama’s New Climate Policy. Opportunities and Challenges of Climate Policy Change in the
US. Stiftung Wissenschaft und Politik. SWP Research Papers, jul. 2010, p.33.
68
36
para as usinas elétricas na região. Isto é, um mecanismo de mercado que cria
limites para a emissão de gases e induz a comercialização de direitos de poluir
até um certo patamar.
 Transportation and Climate Initiative (TCI)
A mais recente é a TCI, que reúne os membros da RGGI, a Pensilvânia e o
Distrito de Columbia, e tem por meta minimizar o impacto do sistema de
transporte regional sobre mudança climática.
3.3. Principais atores em Washington
No âmbito do governo federal, é possível destacar os seguintes
escritórios, agências, departamentos ou representantes:
 The White House Office of Energy and Climate Change Policy, criado na
administração Obama com a função de orientar o presidente nos temas
de energia e mudança climática. Responsável: desde a demissão
voluntária de Carol Browner no início de 2011 não foi designado outro.
 Cargo de Enviado Especial para Mudança Climática nas negociações
internacionais. Responsável: Todd Stern.
 Agência de Proteção Ambiental (EPA) está encarregada de proteger a
saúde e o meio ambiente por meio do estabelecimento, da execução e
da fiscalização de padrões. Responsável: Lisa Jackson.
 Departamento de Energia é responsável por todas as questões de
energia. Sua divisão interna Office of Policy and International Affairs é
responsável por orientar o secretário em assuntos internacionais.
Responsável: o secretario de Energia é Steven Chu.
37
 Federal Energy Regulatory Comission (FERC) é a agência ligada ao
Departamento de Energia para regular energia no plano interestadual.
Responsável: Jon Wellinghoff.
 Departamento de Agricultura está encarregado de diversos programas
para energia renovável. Responsável: Tom Vilsack
 Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos Representantes analisa e
recomenda propostas de lei e resoluções referentes aos temas. O papel
dos comitês é determinante para o encaminhamento de uma proposta
para votação. Responsável: Fred Upton (R-MI).
 Comitê de Energia e Recursos Naturais do Senado analisa e recomenda
propostas de lei e resoluções referentes aos temas. O papel dos comitês
também é determinante para o encaminhamento de uma proposta para
votação. Responsável: Jeff Bingaman (D-NM).
3.3 A influência de grupos de interesse
Os defensores do clima e do meio ambiente tiveram bons motivos para
comemorar
o
resultado
de
um
referendo
na
Califórnia
em
2010.
Concomitantemente às eleições legislativas de novembro, pelo voto foi
rejeitada a Proposição 23, medida que visava condicionar a vigência da atual
legislação ambiental AB 3269 (California Global Warming Solutions Act of 2006)
à manutenção do nível de desemprego em até 5,5% por quatro trimestres
seguidos.
Para os defensores da Proposição 23, a aprovação impediria que os
custos de energia aumentassem em tempos de recessão e crise financeira.
Empresas como SunPower, Microsoft, Google e Intel contribuíram com boa
parte dos US$25 milhões arrecadados pelo grupo opositor à proposta. A soma
69
Trata-se de lei estadual sancionada pelo então governador republicano da Califórnia, Arnold
Schwarzenegger, para limitar as emissões em 2020 ao nível de 1990.
38
superou os US$ 10 milhões angariados pelos defensores da Proposição 23
junto ao setor fóssil. O que nos Estados Unidos é um índice importante de
adesão a determinado projeto.
O líder da campanha anti-Proposição 23 foi Thomas Steyer, bilionário
administrador da Farallon Capital Management, empresa especializada em
fundos de investimentos em energia alternativa 70. Steyer promete combater os
grupos ligados à energia não-renovável, trabalhando junto com a administração
Obama nos chamados swing states, ou estados onde não existe preferência
partidária consolidada, podendo os eleitores facilmente migrar de um partido ao
outro após uma dada eleição. Para ele, o caminho para atrair a população para
a causa verde é trabalhar no nível local e estadual.
Linhas de transmissão de energia eólica offshore receberam oferta de
incentivo de um grupo de empresas lideradas pelo Google. Para poupar aos
desenvolvedores de turbinas o custo de cabeamento - e com isso estimular as
usinas eólicas em alto-mar – foram oferecidos US$ 5 bilhões em investimentos
para a construção de uma super autovia a partir de 2013.71
Os exemplos acima são apenas dois dentre inúmeras amostras de
envolvimento de corporações e empresários no processo de formulação de
política energética e climática. Seja para um lado ou outro, os interesses
variam em função de inúmeros fatores.
Dentre os grupos que procuram influenciar a formulação de políticas
ambientais, destacam-se: petróleo e gás, saúde, ambientalista, indústria e
comércio, mineração, operadoras elétricas, consumidores e contribuintes, entre
outros.
Embora possamos detectar uma tendência internamente a cada grupo,
seus componentes dificilmente podem ser vistos como uma massa monolítica,
e muitas vezes defendem posições diametralmente opostas sobre o mesmo
assunto. Contudo, dois grupos em especial se destacam pela unidade e
uniformidade de opinião: petrolífero e ambientalista.
70
A Foil for the Koch Brothers? The New York Times, 15 mar. 2011. Disponivel em:
http://green.blogs.nytimes.com/2011/03/15/a-foil-for-the-koch-brothers/?ref=energyenvironment
71
Google invests in major wind power projet. HuffpostTechnology, 12 dez. 2010. Disponível
em:
http://www.huffingtonpost.com/2010/10/12/google-wind-power-project_n_759208.html
39
O grupo das indústrias de petróleo e gás é composto por ExxonMobil,
Royal Dutch Shell, BP, Koch Industries, Chevron Corporation e ConocoPhillips,
entre outras gigantes do mercado ou companhias independentes. O setor
consta como um dos que mais investem em lobby para influenciar decisões em
Washington. Em 2010, 5% do total de US$ 3,49 bilhões gastos com lobby nos
Estados Unidos vieram de empresas como essas. Durante o período eleitoral
de 2008, os investimentos foram da ordem de US$36 milhões72 e em 2010,
aproximadamente US$27 milhões. Com o objetivo de visualizar a participação
nessas ações de parte desses grupos ligados à produção de combustíveis
fósseis, vejamos a tabela abaixo, onde são apresentadas as contribuições nas
campanhas eleitorais de 2008 e de 2010:
Contribuições para Candidatos
2010
Koch Industries
Exxon Mobil
Chief Oil & Gas
Chevron Corp
Marathon Oil
Valero Energy
Occidental Petroleum
Devon Energy
Williams Companies
Chesapeake Energy
ConocoPhillips
Independent Petroleum
Assn of America
Anadarko Petroleum
American Gas Assn
Halliburton Co
Pilot Corp
Tesoro Petroleum
Society of Indep
Gasoline Marketers
Bass Brothers
Enterprises
Petroleum Marketers
Assn
$1.931.562
$1.337.058
$1.192.361
$937.964
$678.290
$636.500
$575.900
$507.250
$491.685
$467.056
$462.204
Contribuições para
Candidatos 2008
Koch Industries
Exxon Mobil
Chevron Corp
Valero Energy
ConocoPhillips
Marathon Oil
Occidental Petroleum
Anadarko Petroleum
BP
Chesapeake Energy
Devon Energy
$1,860,873
$1,388,263
$1,088,067
$913,972
$695,596
$595,230
$577,451
$507,450
$488,910
$475,771
$460,396
$459.500 Pilot Corp
Independent
Petroleum Assn of
$443.260 America
$386.400 Hess Corp
$314.280 Sunoco Inc
$290.567 American Gas Assn
$277.883 Williams Companies
Bass Brothers
$274.000 Enterprises
$452,575
$247.465 Royal Dutch Shell
Moncrief Oil
$243.900 International
$315,725
$448,750
$426,907
$401,100
$384,100
$371,350
$362,550
$286,750
Fonte:Opensecrets.org
72
O candidato à presidência John McCain foi o maior receptor do setor de petróleo e gás, tendo recebido
recebeu cerca de US$2 milhões, seguido de Barack Obama com US$901 mil.
40
Essas indústrias se posicionam contra a legislação que visa fortalecer os
meios de proteção ao meio ambiente. Isso se manifesta diretamente pelo apoio
a
determinados
projetos
propostos
no
Senado
e
na
Câmara
dos
Representantes. Como discutimos no item 3.1, nos primeiros meses de 2011
nota-se o esforço concentrado em medidas que buscam contornar o controle
sobre as emissões de gases de efeito estufa exercido pela EPA.
Senadores e representantes que apoiam a resolução Energy Tax
Prevention Act of 2011, como vimos apresentada pelo presidente do Comitê de
Energia e Comércio da Câmara, Fred Upton (R-MI), visando restringir o Clean
Air Act e cercear o poder da EPA receberam cerca de US$100 mil em
contribuições do setor petrolífero. A proposta Energy Tax Prevention Act of
2011, apresentada por James Inhofe (R-OK), complementa o projeto de Upton
na batalha contra a EPA.
Outras propostas, como o Free Industry Act, apresentado pela
representante Marsha Blackburn (R-TN), visa a retirar do Clean Air Act
menções sobre os gases de efeito estufa e a sua relação com as mudanças
climáticas. Do mesmo modo, Defending America's Affordable Energy and Jobs
Act tem como fim minimizar os poderes da EPA sobre o controle de gases de
efeito estufa.
A senadora Lisa Murkowski (I-AL) apresentou outro projeto bastante
agressivo: American Energy Independence and Security Act of 2011. O ato
incentiva exploração, desenvolvimento, produção e transporte de petróleo e
gás no Alaska. Segundo o site OpenCongress, apoiadores da resolução
receberam cerca de
US$ 589 mil dólares de grupos petrolíferos como
financiamento de campanha.
Dentre
as
instituições
que
apoiam formalmente
estes projetos
encontramos repetidas vezes o think tank American for Prosperity, ligado às
indústrias Koch.
As empresas petrolíferas, no entanto, não são as únicas a tentar impedir
o avanço de legislação relativa ao clima. No grupo de opositores à legislação
de caráter protecionista, é possível destacar a National Association of
Manufacturers (NAM) como uma dos mais atuantes. A NAM apoia a adoção de
metas internacionais de redução de emissões, mas defende obrigações
semelhantes para as economias emergentes. A preocupação é preservar o
41
ambiente de competição para os exportadores norte-americanos. Essa questão
foi discutida nesse texto, e certamente é um dos aspectos mais relevantes no
debate sobre os regimes ambientais internacionais. O tema da participação
global na preservação do ambiente certamente tem impacto na tomada de
posição da opinião pública norte-americana não diretamente envolvida com os
interesses diretamente atuantes.
Lógica idêntica molda o posicionamento da Câmara de Comércio dos
Estados Unidos, a maior federação empresarial do mundo, cujo foco é manter
a competitividade das empresas exportadoras e a garantia de empregos.
The Business Roundtable, uma espécie de forum corporativista, defende
medidas de combate ao aquecimento global, desde que tomadas de forma
voluntária pelo setor privado.
O setor elétrico é o mais plural, uma vez que seus interesses são
determinados a partir dos recursos naturais utilizados na geração de
eletricidade. Usinas termoelétricas a carvão, gás ou derivados de petróleo
opõem-se à regulamentação de emissões. Outras, no entanto, são favoráveis a
ações de preservação do clima. Operadoras nucleares, usinas hidroelétricas e
movidas a recursos renováveis seriam particularmente beneficiadas por um
sistema que sobretaxasse as emissões de carbono de concorrentes fósseis.
Algumas dessas grandes corporações se desligaram da Câmara de Comércio
em 2009 por discordarem da política anticlimática da associação. Foi o caso da
Exelon (operadora nuclear) e da Pacific Gas & Electric.
Enquanto o lobby das indústrias de petróleo e gás torna-se cada dia
mais fervorso, o lobby ambientalista cresce discretamente, sendo ainda
pequeno se comparado ao primeiro. As maiores representantes do grupo são
Nature Conservancy, presidida por Mark Tercek (ex-diretor do Goldman
Sachs), e Environment Defense Fund, organizadora e co-autora do California
Global Warming Solutions Act of 2006, em parceria com Natural Resources
Defense Council. Em 2010, o lobby ambientalista gastou cerca de US$19
milhões.
Um mapeamento das contribuições partidárias de grupos de interesse
indica que candidatos republicanos receberam mais do lobby petrolífero do que
os democratas. Foram cerca de US$ 14 milhões contra US$ 4.9 milhões. Entre
os defensores de energia limpa, a equação se inverteu. Em 2010, os
42
republicanos receberam US$ 320 mil, ao passo que os democratas
arrecadaram US$3,6 milhões73.
Duas associações corporativas personificam espíritos ambientalistas:
Ceres e Clean Economy Networks, que englobam grandes empresas do setor
nuclear, como Duke Energy e Exelon; Constellation Energy, do setor de gás; e
outras, como Nike e eBay.
Conclusão
O papel dos Estados Unidos nas negociações internacionais sobre
aquecimento global é profundamente determinado por fatores de política
doméstica. A maior dificuldade é vencer a resistência de grupos políticos e
econômicos, que vêem na idéia de um regime internacional para o combate às
mudança climática uma ameaça à economia do país. Além dos interesses, há
concepções de mundo a serem discutidas. Sinalizemos o tema de grande
relevância ainda não suficientemente amadurecido, o da economia ambiental.
Como introduzir plenamente um debate que sinaliza haver forte a racionalidade
econômica na preservação do meio ambiente. A questão científica também é
muito importante, fortalecer a convicção na justeza das análises, inclusive as
elaboradas pelo IPPC (Intergovernmental Panel on Climate Change) e outras
instituições que se ocupam do tema. Mais recentemente, a questão do clima
tem si inserido fortemente na competição entre países e regiões. A União
Européia
utiliza
o
tema
ambiental
como
instrumento
importante
de
fortalecimento de seu soft power há muitos anos. Mais recentemente a China
intervém no debate, apresentando-se com posições inovadoras no tema da
indústria verde. As posições dos Estados Unidos tem como conseqüência
perda de prestígio internacional, o que acaba impactando os próprios
interesses norte-americanos globais.
A tudo isso, some-se o fato de que a imposição de limites de emissão de
carbono e o padrão de eficiência energética são vistos como interferência do
73
Dados extraídos do Opensecrets.org
43
Estado no funcionamento do livre mercado. Como a produção de energia limpa
demanda incentivos governamentais em sua fase inicial, a mudança de
paradigma requer a transposição de uma grande resistência de parte da classe
política.
Ademais, o sistema político do país permite que grupos de interesse
estabeleçam canais de influência junto aos tomadores de decisão no
Congresso e no corpo executivo. Dada a senioridade dos lobbies do setor fóssil
e a ligação de congressistas com alguns estados e distritos produtores de
energia tradicional, a aprovação de legislações climáticas torna-se mais
turbulenta e dificultosa.
As políticas de Bill Clinton e Barack Obama, ainda que tímidas,
apresentaram alguns avanços nesse sentido. Contudo, o atual cenário político
encontra-se altamente polarizado em torno da participação estatal na
economia. As alas extremistas e conservadoras do partido republicano, bem
como os moderados no partido democrata - rejeitam medidas para taxar
emissões ou subsidiar novas tecnologias. A ascensão de forças políticas
radicais torna-se um desafio nos últimos dois anos da administração Obama
2009 – 2012 e para seus planos de reeleição. Mais ainda, a emergência
dessas forças radicais dificultará fortemente a adesão do país a acordos
multilaterais para mudança climática.
Oportunidades
podem
emergir
com
a
busca
de
ganhos
de
competitividade por meio do desenvolvimento de tecnologia de energia de
baixo carbono. O domínio, outrora restrito aos países industrializados, migra
para a Ásia, mais especificamente para a China. O surgimento dessa potência
asiática como líder em produção de equipamentos em área relativamente
negligenciada pelos Estados Unidos poderá servir como um fator de estímulo
importante à transformação da visão do país sobre o tema.
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