efeito da terapia comportamental dialética no tratamento

Transcrição

efeito da terapia comportamental dialética no tratamento
EFEITO DA TERAPIA COMPORTAMENTAL DIALÉTICA NO TRATAMENTO DA
PERSONALIDADE BORDERLINE COM COMORBIDADES PSIQUIÁTRICAS
EFFECT OF DIALECTICAL BEHAVIOURAL THERAPY IN THE TREATMENT OF
BORDERLINE PERSONALITY DISORDER WITH PSYCHIATRIC COMORBIDITY
Alexandre de Aquino Câmara1
Alexandre Menezes Sampaio 2
Resumo
O transtorno de personalidade borderline (TPB) é um diagnóstico crônico e grave afetando de
1,2 a 3% da população em geral. As taxas de comorbidades psiquiátricas variam de 14 a 87%.
A terapia comportamental dialética (TCD) é a técnica psicoterápica mais estudada para o
tratamento de TPB. No entanto, pouco se sabe sobre seu efeito nos casos em que há patologia
psiquiátrica concomitante. Pretendemos analisar as atuais evidências sobre TCD em pacientes
com TPB e diagnósticos psiquiátricos comórbidos e averiguar se o efeito desta psicoterapia se
mantém nessa situação específica. Foi realizada uma revisão sistemática nas bases de dados
Scielo, Pubmed e ISI Web of Knowledge, no período de maio a julho de 2011, sobre todos os
trabalhos publicados na literatura acerca do uso da TCD em pacientes com TPB apresentando
outros transtornos psiquiátricos até a data de 30 de abril de 2011. Nove artigos foram
identificados. A TCD parece ser uma técnica eficiente para o tratamento de sintomas de TPB
e de transtorno por uso de substâncias comórbido. Bons resultados também foram vistos para
os casos em que o TPB aparece associado a bulimia nervosa, transtorno compulsivo alimentar
periódico e transtorno de estresse pós-traumático, melhorando tanto a psicopatologia destes
quanto daquele. Para anorexia nervosa, os achados se mostram mais modestos. Mais estudos
são necessários para averiguar eficácia da TCD em outras patologias psiquiátricas que não
foram contempladas neste estudo (depressão maior, transtorno de pânico, transtorno
obsessivo-compulsivo, etc.) e se há necessidade de adequá-la a essas situações específicas.
Descritores: transtorno de personalidade borderline, terapia comportamental dialética,
tratamento, comorbidades, transtornos psiquiátricos.
1
2
Médico psiquiatra, Faculdade Christus.
Médico psiquiatra, mestre em farmacologia pela Universidade Federal do Ceará, Faculdade Christus.
Endereço para correspondência: Alexandre de Aquino Câmara
Hospital de Saúde Mental de Messejana (HSMM), Núcleo de Atenção à Infância e Adolescência (NAIA).
Rua Vicente Nobre Macêdo, s/n - Messejana - Fortaleza, CE - CEP: 60841-110, Brasil. Tel: (85) 3101-4317.
E-mail: [email protected]
1
Introdução
O transtorno de personalidade borderline (TPB) é um quadro psiquiátrico grave e
crônico enquadrado no Eixo II do Manual diagnóstico e estatístico (DSM-IV-TR) da
Associação Americana de Psiquiatria, assim como os quadros de retardo mental
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2000). Os pacientes com essa patologia
costumam despertar um desconforto significativo nos terapeutas em virtude de sua
hostilidade, das ameaças de suicídio freqüentes e por não reforçarem o empenho dos mesmos,
o que leva muitos terapeutas a se esquivarem do atendimento a esses pacientes (ZANARINI,
2009).
Atribui-se ao psicanalista Adolph Stern, em 1938, a primeira pessoa a utilizar o termo
borderline para se referir a pacientes que se encontravam com características tanto neuróticas,
quanto psicóticas (RIBEIRO, CORDÁS et al., 2011).
Roy Grinker, em 1968, elaborou os seguintes critérios diagnósticos para o que ele
chamou de síndrome borderline (GRINKER, WERBLE et al., 1968):
1. Falha do senso de identidade;
2. Relacionamentos instáveis;
3. Sintomas de depressão, e não um quadro com todos os critérios para transtorno
depressivo;
4. Raiva inadequada ou intensa.
Com o passar do tempo, o TPB foi sendo mais estudado, o que culminou com uma
maior compreensão e refinamento de seus critérios diagnósticos. Se antes ele chegou a ser
comparável com o diagnóstico de quadros psicóticos, hoje sabemos tratar-se de um quadro
relacionado ao desenvolvimento de uma personalidade patológica. Alguns de seus sintomas
núcleos são a desregulação emocional, sentimentos crônicos de vazio existencial e uma
grande dificuldade para lidar com frustrações. Na tabela 1 podemos identificar todos os
critérios
diagnósticos
segundo
o
DSM-IV-TR
(AMERICAN
PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2000).
Estudos de prevalência de TPB na população geral mostram taxas variando de 1,2 a
3% (GUNDERSON, 2001; OLDHAM, 2001). Já nos atendimentos ambulatoriais em saúde
mental, essas taxas situam-se entre 10 a 15% e, nos pacientes internados por indicação
psiquiátrica, de 20 a 25% (GUNDERSON, 2001). As mulheres correspondem a cerca de 75%
dos casos (RIBEIRO, CORDÁS et al., 2011). A comorbidade com outros transtornos
psiquiátricos é bastante comum, particularmente com transtorno depressivo maior (61 a 87%),
transtorno por uso de substâncias (14 a 62%), transtorno de estresse pós-traumático (TEPT)
2
Tabela 1. Critérios diagnósticos para o transtorno de personalidade borderline segundo o
DSM-IV-TR.
Um padrão global de instabilidade dos relacionamentos interpessoais, da auto-imagem e dos afetos e
acentuada impulsividade, que se manifesta no início da idade adulta e está presente em uma variedade de
contextos, indicado por, no mínimo, cinco dos seguintes critérios:
(1) esforços frenéticos para evitar um abandono real ou imaginado.
Nota: Não incluir comportamento suicida ou automutilante, coberto no Critério 5.
(2) um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos, caracterizado pela alternância entre
extremos de idealização e desvalorização.
(3) perturbação da identidade: instabilidade acentuada e resistente da auto-imagem ou do sentimento de self.
(4) impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente prejudiciais à própria pessoa (p. ex., gastos
financeiros, sexo, abuso de substâncias, direção imprudente, comer compulsivamente).
Nota: Não incluir comportamento suicida ou automutilante, coberto no Critério 5.
(5) recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamento automutilante.
(6) instabilidade afetiva devido a uma acentuada reatividade do humor (por ex., episódios de intensa disforia,
irritabilidade ou ansiedade geralmente durando algumas horas e apenas raramente mais de alguns dias).
(7) sentimentos crônicos de vazio.
(8) raiva inadequada e intensa ou dificuldade em controlar a raiva (por ex., demonstrações freqüentes de
irritação, raiva constante, lutas corporais recorrentes).
(9) ideação paranóide transitória e relacionada ao estresse ou severos sintomas dissociativos.
Fonte: American Psychiatry Association, 2000.
(36 a 58%), transtorno de pânico (29 a 45%) e transtornos alimentares (17 a 54%)
(ZIMMERMAN e MATTIA, 1999; ZANARINI, FRANKENBURG et al., 2004; LINEHAN,
COMTOIS et al., 2006).
Quanto a sua etiologia, alguns trabalhos evidenciam uma correlação entre o
desenvolvimento do TPB com traumas na infância, particularmente abuso sexual, violência
doméstica e abuso físico grave (BRYER, NELSON et al., 1987; HERMAN, PERRY et al.,
1989; ZANARINI, GUNDERSON et al., 1989; WESTEN, 1990). Além disso, estudos de
neuroimagem vêm apresentando dados que sugerem alterações como: volume reduzido da
amígdala e do hipocampo, alteração na ativação da amígdala, alterações do lobo frontal e
hipometabolismo hipocampal (OLDHAM, 2001).
Ao contrário da impressão que se tinha antigamente, estudos que avaliaram a evolução
do TPB ao longo do tempo mostraram, em sua maioria, uma redução ou atenuação importante
dos sintomas (RIBEIRO, CORDÁS et al., 2011). Um dos artigos mais recentes que analisou o
prognóstico ao longo de 10 anos de pacientes com TPB constatou taxas altas de remissão
(85%), baixas taxas de recaídas (12%) mas, em relação ao funcionamento social, estes
pacientes persistiam com graves comprometimentos (GUNDERSON, STOUT et al., 2011).
Numa avaliação de 27 anos de evolução, apenas 8% dos pacientes continuavam apresentando
critérios diagnósticos para TPB (PARIS e ZWEIG-FRANK, 2001).
A eficácia de medidas farmacológicas no tratamento de sintomas alvos do TPB é alvo
de interesse de muitos clínicos. Numa recente revisão publicada pelo grupo Cochrane foi
evidenciado que os antipsicóticos de segunda geração (particularmente a Olanzapina),
3
estabilizadores de humor e suplementação dietética com ômega-3 teriam algum efeito
benéfico para o alívio de alguns sintomas específicos. Os antidepressivos só se mostraram
úteis na presença de quadros de humor comórbidos. Nenhuma medicação se mostrou eficaz
no tratamento dos sintomas núcleo do TPB: sentimentos crônicos de vazio, distúrbios na
identidade e medo do abandono (STOFFERS, VÖLLM et al., 2010).
Devido aos modestos resultados encontrados com o tratamento farmacológico,
considera-se que o tratamento psicoterápico seja a principal forma de intervenção nos
pacientes com TPB. Algumas abordagens já demonstraram sua eficácia, entre elas podemos
citar: terapia de compreensão e validação, terapia interpessoal, terapia cognitiva, terapia
cognitiva analítica e a terapia comportamental dialética (TCD) (RIBEIRO, CORDÁS et al.,
2011). Esta última é considerada a intervenção psicossocial mais estudada para o tratamento
dessa população (KRÖGER, SCHWEIGER et al., 2010).
A TCD foi desenvolvida por Marsha M. Linehan e ganhou grande repercussão
acadêmica especialmente após a publicação de seus manuais para o tratamento do TPB
(LINEHAN, 1993a; 1993b). O primeiro artigo na literatura que fala sobre teoria e método da
TCD data de 1987 (LINEHAN, 1987). Ela utiliza princípios das ciências comportamentais, da
filosofia dialética e da prática Zen, visando um equilíbrio entre estratégias de aceitação de si
mesmo e necessidade de mudança (LINEHAN, 1993a; LYNCH, TROST et al., 2007).
Segundo requisitos do Division 12 Task Force (CHAMBLESS e HOLLON, 1998), a
TCD pode ser considerada uma abordagem “bem estabelecida” para o tratamento do TPB,
uma vez que já demonstrou ser eficaz em mais de dois ensaios clínicos randomizados
controlados com uma situação semelhante a placebo ou outra abordagem terapêutica
reconhecida (KOONS, ROBINS et al., 2001; LINEHAN, DIMEFF et al., 2002; LINEHAN,
COMTOIS et al., 2006).
Inicialmente, a TCD foi pensada como uma abordagem terapêutica para o tratamento
de mulheres com TPB (LINEHAN, 1993a). No entanto, com a evolução de sua teoria e
publicação de novos estudos, houve uma expansão das indicações as quais a TCD se aplicaria
como técnica eficaz, não ficando mais restrita só ao sexo feminino e podendo ser utilizada em
diagnósticos como: transtornos alimentares (SAFER, TELCH et al., 2001; SAFER, LIVELY
et al., 2002), transtornos por uso de substâncias (TUS) (DIMEFF, RIZVI et al., 2000;
DIMEFF e LINEHAN, 2008), depressão maior (LYNCH, MORSE et al., 2003), entre outros.
A teoria biossocial da TCD reconhece que há uma inter-relação entre duas variáveis
que contribuem para o modo de ser dos pacientes borderline: uma vulnerabilidade emocional
(fator biológico) e um ambiente invalidante (fator social) (LYNCH, CHAPMAN et al., 2006).
4
A vulnerabilidade emocional caracteriza-se por uma sensibilidade e reatividade
emocional desproporcional ao estímulo desencadeante e a um retorno lento ao seu estado
emocional basal de excitação. Já o ambiente invalidante envolve situações onde a
comunicação de pensamentos e emoções pelo indivíduo são constantemente punidos ou
ignorados. Assim, vemos momentos onde a intensa reação emocional dos pacientes
borderline elicia comportamentos invalidantes dos cuidadores que, por sua vez, reforçam
mais reações emocionais disfuncionais por parte dos pacientes e vice-versa (LYNCH,
CHAPMAN et al., 2006).
A TCD é estruturada em quatro modelos de intervenção que descreveremos
sucintamente a seguir (LYNCH, TROST et al., 2007):
1. Terapia individual - visando estabelecer um vínculo terapêutico entre paciente
e terapeuta e focando nos seguintes objetivos: eliminar comportamentos
suicidas e automutilação, eliminar obstáculos à evolução da terapia (falta de
adesão, falta de compromisso) e abordar comportamentos e fatores ambientais
que levam a uma diminuição da qualidade de vida (dependência de drogas,
isolamento social, etc.).
2. Terapia de grupo - objetiva trabalhar habilidades sociais e técnicas de atenção
plena (mindfuness), tolerância ao estresse, regulação emocional e efetividade
interpessoal.
3. Contatos telefônicos - funciona como uma técnica de coaching, onde o
terapeuta ajuda o paciente a integrar os princípios e habilidades ensinados pela
TCD nas suas situações de vida cotidiana.
4. Reuniões de consultoria para os terapeutas - objetiva, especialmente, reduzir o
desgaste do terapeuta perante situações de conflitos com seus pacientes e
aumentar a capacidade dos mesmos de empatizar com o sofrimento do outro.
A maioria dos trabalhos que visam estudar a eficácia de abordagens psicoterapêuticas
costuma ter rigorosos critérios de inclusão e exclusão e se propõe a analisar uma única
patologia. Contudo, na prática clínica, observamos que a presença de comorbidades
psiquiátricas nos indivíduos com TPB costuma ser muito freqüente e isso já foi demonstrado
no início desta introdução. Por conta disso, acaba se tornando difícil generalizar os achados
desses estudos para o ambiente da prática clínica real.
O objetivo do presente artigo é analisar todas as atuais evidências sobre TCD em
pacientes com TPB e outros diagnósticos psiquiátricos comórbidos e averiguar se a eficácia
desta abordagem terapêutica se mantém nessa situação específica.
5
Métodos
Esse estudo foi realizado no período de maio a julho de 2011 e faz uma revisão
sistemática de todos os trabalhos publicados sobre o uso da TCD em pacientes com TPB
apresentando outros diagnósticos psiquiátricos até a data de 30 de abril de 2011.
Utilizamos as bases de dados Scielo, Pubmed e ISI Web of Knowledge para a
realização da busca bibliográfica. Os termos utilizados para a pesquisa foram: “borderline
personality disorder” e “dialectical behavior therapy”. Em seguida, foi feita uma inspeção
visual por parte dos autores, de todos os artigos encontrados buscando selecionar apenas os
que abordavam a presença de TPB com outras comorbidades psiquiátricas.
Foram adotados os seguintes critérios de inclusão e exclusão para a seleção dos
trabalhos:
1. Critérios de inclusão:
a. Pacientes com diagnóstico de TPB com alguma comorbidade
psiquiátrica;
b. Estudos publicados na língua inglesa ou portuguesa;
c. Amostra com indivíduos maiores de 18 anos;
d. Desenho de estudo dos tipos: ensaio clínico randomizado controlado,
ensaios abertos e série de casos.
2. Critérios de exclusão:
a. Artigos que não pesquisassem nenhum desfecho para a situação
comórbida ao TPB;
b. Desenho de estudo do tipo relato de caso, uma vez que são
reconhecidamente de baixo nível de evidência científica e com
tendência a muitos vieses.
Após a seleção final, os trabalhos foram divididos por categoria comórbida para
possibilitar uma análise de resultados mais homogênea.
Resultados
A pesquisa inicial nas bases de dados mencionadas resultou em 113 artigos sobre TCP
em pacientes com TPB. Desses, apenas 12 abordavam a presença de comorbidades
psiquiátricas e três foram descartados por não atenderem os critérios de inclusão. Restaram,
ao final, nove trabalhos para serem analisados. A figura 1 sumariza o processo de seleção
desses artigos, enquanto que a tabela 2 traz um resumo de todos os principais achados dos
estudos citados.
6
Figura 1. Seleção dos artigos para a análise de resultados.
1. Transtorno de personalidade borderline em comorbidade com transtorno por uso de
substâncias (TUS):
Dos três trabalhos que abordavam esse tema, dois fizeram comparações de TCD com o
que foi chamado de “tratamento usual” (em serviços de saúde mental comunitária) e o outro
artigo comparou a TCD com a terapia de validação compreensiva (TVC) associada ao
programa de 12 passos utilizado em programas como o dos Alcoólicos Anônimos (AA).
O trabalho de Linehan (LINEHAN, SCHMIDT et al., 1999) comparou TCD com o
“tratamento usual” (amostra randomizada de 28 pacientes, sendo 12 no grupo de TCD e 16 no
outro grupo) por 12 meses e posterior seguimento aos 16 meses. O uso de medicações para
auxiliar no tratamento dos sintomas de abstinência foi permitido para ambos os grupos. Os
principais resultados foram os seguintes: redução significativa no abuso de substância entre os
indivíduos que estavam fazendo TCD comparados aos que estavam com “tratamento usual”
(informações corroboradas pelas análises de urina para rastreamento de drogas) com tamanho
de efeito variando de 0,6 a 1,1; maior retenção de pessoas durante o tratamento no grupo da
TCD (64% vs 27% no grupo de “tratamento usual”) e melhora no ajustamento global e social
7
Tabela 2. Resumos dos artigos que abordaram TCD em TPB com comorbidades
psiquiátricas selecionados nesta revisão.
Estudo
Comorbidade
Amostra
Tipo
de
estudo
Desfecho em relação
ao TPB
Desfecho em
relação à
comorbidade
Instrumentos
e Escalas
Linehan
et al.,
1999
TUS
TCD
(n=12) vs
TUsual
(n=16)
ECR
Maior retenção de
pacientes, melhora
no ajustamento
global e social (TCD
> TUsual)
Redução no abuso
de substâncias
(TCD > TUsual)
Análise de
urina, SCID,
STAEI, PHI e
SHI
Linehan
et al.,
2002
TUS
(opióides)
TCD +
MED
(n=11) vs
TVC +
12 passos
+ MED
(n=12)
ECR
Melhora no
ajustamento global,
nos comportamentos
parasuicidas (TCD +
MED = TVC + 12
passos + MED).
Maior retenção de
pacientes (TVC + 12
passos + MED >
TCD + MED)
Manutenção da
abstinência a
opióides ao final do
tratamento (TCD +
MED > TVC + 12
passos + MED)
Análise de
urina, SCIDI, SCID-II,
PHI, SHI,
BSI e PDE
van den
Bosch et
al.,
2002
TUS
TCD
(n=27) vs
TUsual
(n=31)
ECR
Maior retenção de
pacientes, redução
nos comportamentos
de automutilação e
impulsividade (TCD
> TUsual)
Não houve
mudanças (TCD =
TUsual)
PDQ-4,
SCID-II e
EuropASI
Palmer
et al.,
2003
TA (exceto
AN)
TCD
(n=7)
Série
de
casos
Retenção de 100%
de pacientes,
redução nos
comportamentos de
automutilação
3 pacientes
remitiram e 4
mudaram
diagnóstico para TA
SOE
Entrevista
clínica criada
para a
pesquisa
Chen et
al.,
2008
TCAP e BN
TCD
(n=8)
Série
de
casos
Redução nos
comportamentos de
automutilação e nas
tentativas de
suicídio, melhora no
ajustamento social
Redução nos
comportamentos
purgativos e escores
de psicopatologia
alimentar geral
SCID-I,
SCID-II,
PDE, THI,
SHI, EDE-Q,
LPC e SASII
BenPorath
et al.,
2009
TA
TCD +
TA
(n=24) vs
TCD +
TA +
TPB
(n=16)
Ensaio
aberto
Melhora em
ansiedade e
depressão (TCD +
TA = TCD + TA +
TPB), melhora na
regulação afetiva
(TCD + TA + TPB >
TCD + TA)
Redução nos
escores de
psicopatologia
alimentar geral
(TCD + TA = TCD
+ TA + TPB)
EDE-Q,
NMR, BDI-2,
BAI-2 e
PDQ-4
8
Kröger
et al.,
2010
AN e BN
TCD
(n=24)
Ensaio
aberto
Não houve
mudanças
Remissão de 53,8%
em BN e 33% em
AN. Redução de
comportamentos
purgativos em BN,
melhora no
funcionamento
psicossocial e
psicopatologia
alimentar geral
SCID-I,
SCID-II,
EDI-2, SCL90-R e GAF
Harned
et al.,
2010
TEPT
TCD +
TPB
(n=25) vs
TCD +
TPB +
TEPT
(n=26)
Ensaio
aberto
Redução no risco de
suicídio e no
comportamento de
automutilação (TCD
+ TPB + TEPT >
TCD + TPB)
Redução na
dissociação severa e
no uso de
substâncias (TCD +
TPB + TEPT >
TCD + TPB). 50 a
68% passaram a ser
elegíveis a TEP
SCID-I,
SCID-II,
SASII, LIFE,
DES-T, SBQ
e IPDE
Harned
et al.,
2008
Várias
TCD
(n=52) vs
TCE
(n=49)
ECR
Não houve
mudanças
Maior remissão de
TUS (TCD > TCE),
menor remissão nos
transtornos de
ansiedade (TCD =
TCE)
SCID-I,
SCID-II, THI
e LIFE
TCD, terapia comportamental dialética; TPB, transtorno de personalidade borderline; TUS, transtorno por uso
de substâncias; TA, transtornos alimentares; AN, anorexia nervosa; TCAP, transtorno compulsivo alimentar
periódico; BN, bulimia nervosa; TEPT, transtorno de estresse pós-traumático; ECR, ensaio clínico
randomizado; TUsual, “tratamento usual”; MED, medicação; TVC + 12 passos, terapia de validação
compreensiva junto com o programa de 12 Passos; TA SOE, transtorno alimentar sem outra especificação;
TCE, terapia comunitária por especialistas; TEP, terapia de exposição prolongada; PHI, Parasuicide History
Interview; SHI, Social History Interview; SCID, Structured Clinical Interview for DSM-3-R; SCID-I,
Structured Clinical Interview I for DSM-IV; SCID-II, Structured Clinical Interview II for DSM-IV; STAEI,
State-Trait Anger Expression Inventory; BSI, Brief Symptom Inventory; PDE, Personality Disorders Exam;
PDQ-4, Personality Diagnostic Questionnaire – DSM-IV version; EuropASI, European version of the
Addiction Severity Index; EDE-Q, Eating Disorders Examination Questionnaire; LPC, Life-time-Parasuicide
Count; SASII, Suicide Attempt Self-Injury Interview; THI, Treatment History Interview; NMR, Negative Mood
Regulation Scale; BDI-2, Beck Depression Inventory-2; BAI-2, Beck Anxiety Inventory-2; EDI-2, Eating
Disorder Inventory-2; SCL-90-R, Symptom Checklist-90-Revised; GAF, Global Assessment of Functional of
Functional Scale; LIFE, Longitudinal Interval Follow-Up Evaluation; SBQ, Suicidal Behaviors
Questionnaire; DES-T, Dissociative Experiences Scale-Taxon; IPDE, International Personality Disorders
Examination;
Fonte: O Autor.
dos indivíduos em TCD em relação ao outro grupo, medidos pelo instrumento Social History
Interview.
Outro estudo da mesma autora (LINEHAN, DIMEFF et al., 2002) procurou avaliar a
eficácia da TCD versus TVC + 12 passos no tratamento de mulheres dependentes de opióides
9
ao longo de 12 meses e posterior seguimento aos 16 meses. 23 pacientes foram randomizadas
para os 2 grupos, sendo que 11 fizeram TCD e 12 foram alocadas para o grupo TVC + 12
passos. O tratamento medicamentoso de reposição de opiáceos foi implementado para as 2
amostras. Ambos os grupos apresentaram redução no uso de opiáceos tanto na avaliação aos
12 meses de tratamento, quanto no seguimento 4 meses após o término da intervenção
psicossocial. No entanto, o grupo de TCD obteve uma melhor manutenção desses ganhos ao
longo dos 12 meses de tratamento ativo, enquanto que no outro grupo houve um aumento
significativo no consumo de opióides nos últimos 4 meses de tratamento. Em relação à
retenção dos pacientes, o grupo de TVC + 12 passos obteve a surpreendente taxa de 100%,
enquanto que no grupo de TCD essa taxa foi de 64%, semelhante à obtida no outro trabalho já
citado. Ambos os grupos apresentaram melhoras no ajustamento global e na incidência de
comportamentos parasuicidas, sem diferença estatística entre eles.
O terceiro trabalho buscou comparar o uso de TCD em pacientes borderline com e
sem TUS (VAN DEN BOSCH, VERHEUL et al., 2002) ao longo de 12 meses de tratamento
utilizando um grupo controle de “tratamento usual” (TCD com n=27 e controle com n=31).
Os indivíduos alocados no grupo TCD permaneceram mais tempo no tratamento do que o
grupo controle, apresentaram maior redução nos comportamentos de automutilação e
impulsividade e a presença de TUS não modificou esse impacto. Contudo, nenhuma redução
nos problemas relacionados ao uso de substâncias foi encontrada no seguimento de 6 meses
pós-tratamento em ambos os grupos. Os autores sugerem que a TCD possa ser adaptada para
atender as necessidades específicas de pacientes com TUS.
2. Transtorno de personalidade borderline em comorbidade com transtornos
alimentares (TA):
Palmer conduziu um estudo de série de casos, com duração de 6 a 18 meses
(dependendo do tempo em que a voluntária entrou no estudo), onde selecionou sete pacientes
com TPB e algum transtorno alimentar (PALMER, BIRCHALL et al., 2003). Cinco destas
sete pacientes apresentavam bulimia nervosa (BN), uma tinha transtorno compulsivo
alimentar periódico (TCAP) e a última tinha um transtorno alimentar sem outra especificação
(TA SOE). Não houve nenhuma desistência da pesquisa. Houve uma redução marcante em
comportamentos automutilatórios em todas as participantes. Ao final da intervenção, três
pacientes não apresentavam mais critérios diagnósticos para algum transtorno alimentar e as
outras quatro participantes ficaram com o diagnóstico de TA SOE, o que pode ser visto como
melhora dos sintomas alimentares. Contudo, o estudo não utilizou instrumentos validados
10
para medir tanto os sintomas do TPB quanto os de transtornos alimentares, o que mostra uma
limitação metodológica importante deste.
Uma pesquisa procurou avaliar a eficácia da TCD em pacientes com TCAP ou BN
durante um período de 6 meses de tratamento (CHEN, MATTHEWS et al., 2008). A amostra
constou de oito mulheres, das quais 05 tinham diagnóstico de TCAP e 03 de BN. Os
principais
resultados
foram
a
redução
de
comportamentos
automutilatórios,
de
comportamentos alimentares purgativos, número de transtornos psiquiátricos comórbidos não
relacionados a transtornos alimentares e melhora no ajustamento social. As principais
limitações são o fato de ser uma série de casos (sem controle com uma condição placebo),
amostra pequena, tempo relativamente curto de tratamento (apenas 6 meses, enquanto outros
estudos avaliam no mínimo 12 meses) e o fato de algumas pacientes estarem em uso de
psicotrópicos (n=06) enquanto outras não.
Ben-Porath realizou um estudo comparando um grupo de pacientes com TA e outro
grupo de indivíduos com TA + TPB visando avaliar se a presença de TPB mudaria o desfecho
do tratamento de pessoas com TA (BEN-PORATH, WISNIEWSKI et al., 2009). A amostra
consistia de 40 voluntários, sendo que 16 apresentavam TA + TPB e o restante apenas algum
TA. Todos os participantes eram do sexo feminino, com exceção de um único homem no
grupo TA + TPB. Ao final da pesquisa observou-se uma melhora significativa nos sintomas
alimentares em ambos os grupos, sem diferença estatística entre eles. Quanto aos sintomas de
ansiedade e depressão, embora se tenha evidenciado melhora em ambos os grupos, o com
comorbidade apresentava tanto no início quanto no final do estudo maiores níveis desses
sintomas que o grupo com TA isolado. Em relação à regulação afetiva, a amostra com TA +
TPB apresentava, no início do tratamento, menor habilidade para lidar com problemas
emocionais do que o outro grupo, mas essa diferença desapareceu ao final da intervenção
terapêutica. Os autores sugerem que a regulação afetiva possa ser um fator importante na
melhora tanto do quadro de TPB quando no TA.
Um estudo aberto foi conduzido para avaliar a eficácia da associação de TCD com um
módulo de tratamento cognitivo comportamental específico para TA em 9 mulheres com AN
e 15 com BN apresentando TPB comórbido e que apresentaram falha terapêutica em um
tratamento anterior para TA (KRÖGER, SCHWEIGER et al., 2010). As participantes se
submetiam a um programa de tratamento de três meses de duração e eram avaliadas
novamente após 15 meses do início do estudo. Ao final da pesquisa, 53,8% das pacientes com
BN e 33% das com AN remitiram de seus quadros. O comportamento purgativo reduziu
significativamente entre as pacientes com BN. Não houve redução importante dos sintomas
11
relacionados ao TPB em ambos os grupos no seguimento de 15 meses. Entretanto, nesse
período, os escores no funcionamento psicossocial global tiveram um aumento importante
(tamanho de efeito de 1,40 para BN e 1,29 para AN), enquanto que os escores de
psicopatologia geral alimentar atingiram melhoras modestas (tamanho de efeito de 0,41 para
BN e 0,60 para AN).
3. Transtorno de personalidade borderline em comorbidade com transtorno de estresse
pós-traumático (TEPT):
Apenas um trabalho abordou essa temática (HARNED, JACKSON et al., 2010). Ele
visava avaliar a eficácia da TCD como precursor ao tratamento de TEPT convencional em
mulheres com TPB e comportamento suicida. Foram avaliados 2 grupos de pacientes: um
com TEPT + TPB (n=26) e outro apenas com TPB (n=25) que se submeteram a TCD por um
período de 1 ano. O grupo com TPB + TEPT, em comparação ao período pré- e póstratamento, apresentou uma remissão tanto do risco iminente de suicídio (28% vs 0%) quanto
da dependência de substâncias (19,2% vs 0%). Ainda, a taxa de participantes que exibiam
comportamento automutilatório (96,2% vs 29,2%) e dissociação severa (44% vs 22,7%)
reduziu significativamente na amostra com TPB + TEPT. Não houve melhora no uso de
substâncias e na dissociação severa no outro grupo. A conclusão final é de que a TCD se
mostrou eficaz para reduzir os fatores de exclusão que costumam tornar as pessoas inelegíveis
para o tratamento de TEPT por meio de terapia de exposição.
4. Transtorno de personalidade borderline em comorbidade com outros diagnósticos
psiquiátricos:
O estudo de autoria de Harned (2008) buscou avaliar a eficácia da TCD em mulheres
com TPB e tentativas de suicídio freqüentes que apresentavam outros diagnósticos
psiquiátricos (HARNED, CHAPMAN et al., 2008). Trata-se de um ensaio randomizado de 2
anos de duração onde foi adotado um grupo controle de tratamento comunitário por
especialistas (TCE). Participaram 101 pacientes que foram distribuídos nos 2 grupos (TCD
com n=52 e TCE com n=49). Os diagnósticos comórbidos identificados foram os seguintes:
transtorno depressivo maior (n=59), transtorno de pânico (n=32), TEPT (n=40), outros
transtornos de ansiedade (n=35); TUS (n=17) e TA (n=15). De maneira geral não houve
diferença nas taxas de remissão ou de recaídas nos 2 grupos estudados. Contudo,
especificamente relacionado ao diagnóstico de TUS, as pacientes no grupo da TCD tiveram
uma chance muito maior de obter remissão total em comparação com o grupo TCE (87,5% vs
12
33,3% respectivamente), além de terem passado maior tempo em remissão parcial e menor
tempo preenchendo todos os critérios diagnósticos para TUS. Não houve diferença nos 2
grupos em relação à diminuição dos sintomas de TPB. Cerca de 74% dos pacientes em TCD e
67% dos que estavam em TCE atingiram remissão total de pelo menos um transtorno
psiquiátrico. A principal limitação dessa pesquisa é a possível falta de poder para detectar as
diferenças entre os grupos devido a amostra ser relativamente pequena para cada grupamento
específico de transtornos psiquiátricos.
Discussão
O presente artigo procurou fazer uma revisão ampla sobre o efeito da TCD nos
pacientes borderline com outras patologias psiquiátricas associadas. Entre estas, destacamos
os transtornos por uso de substâncias, os transtornos alimentares e o transtorno de estresse
pós-traumático.
A grande maioria das pesquisas aponta para uma redução de alguns sintomas típicos
do TPB independente de ser comórbido ou não com outro diagnóstico psiquiátrico. Entre eles
podemos citar: redução das tentativas de suicídio e parasuicidas, dos comportamentos de
automutilação e da impulsividade e uma melhora no ajustamento social. Além disso, a taxa de
abandono foi menor do que outras intervenções terapêuticas, com a exceção do trabalho de
Linehan (2006), que mostrou uma retenção de 100% no grupo de pacientes submetidos à TVC
+ 12 passos. Isso condiz com o suposto teórico da TCD de trabalhar estratégias de aceitação
de si mesmo, contribuindo para não reproduzir o mesmo esquema de ambiente invalidante no
qual o sujeito se constituiu e, assim, melhorando sua adesão ao tratamento (Lynch, Chapman
et al., 2006).
Em relação ao TUS, 2 dos 3 trabalhos analisados mostraram uma redução significativa
no consumo de substâncias, tanto no pós-tratamento quanto no seguimento posterior ao
tratamento (dados comprovados por análises urinárias), sendo que a diferença foi maior
quando comparado ao grupo de “tratamento usual” do que com o grupo TVC + 12 passos
(LINEHAN, SCHMIDT et al., 1999; LINEHAN, DIMEFF et al., 2002). Essas pesquisas
utilizaram uma forma de TCD adaptada para o tratamento de dependência química. O outro
estudo, que utilizou a TCD “padrão”, não demonstrou melhoras importantes em
características ligadas ao TUS, mas somente ao TPB (VAN DEN BOSCH, VERHEUL et al.,
2002). Vale ressaltar que todos os 3 estudos eram do tipo ensaio clínico randomizado.
Os transtornos alimentares também apresentaram melhoras significativas em relação à
psicopatologia específica e ao comportamento alimentar purgativo, atingindo taxas de
13
remissão de até 53,8% para BN e de até 33% para AN (KRÖGER, SCHWEIGER et al.,
2010).
Enquanto que a eficácia para BN e TCAP pareceu ser bem demonstrada, os resultados
para AN foram mais modestos. Apenas a pesquisa de Kröger e Schweiger (2010), não
demonstrou melhorar os sintomas relacionados à síndrome borderline, mas somente aos
comportamentos alimentares patológicos. Vale lembrar que nenhum dos artigos que avaliaram
TCD + TA era do tipo ensaio clínico randomizado controlado, o que limita maiores análises
nessa área.
Quanto ao TEPT, a discussão ficou restrita a um único artigo. Os autores comentam
que a terapia de exposição prolongada (TEP) é o tratamento mais usado e estudado para o
tratamento de TEPT. Contudo, costumam fazer parte de seus critérios de exclusão os
seguintes: risco de suicídio iminente, comportamento automutilatório recente, dependência de
substâncias e dissociação severa. Como sabemos, todas essas são características muito
presentes nos pacientes com TPB. A pesquisa mostrou que, ao final da intervenção
terapêutica, houve uma melhora significativa de todas essas características no grupo de
pacientes com TEPT + TPB (melhora expressiva na dissociação severa e na dependência de
substâncias não foi observada na amostra com TPB apenas). Com isso, cerca de 50 a 68%
desses indivíduos passariam a ser elegíveis para o tratamento com TEP (HARNED,
JACKSON et al., 2010).
O trabalho que avaliou o uso de TCD em pacientes borderline com outras patologias
psiquiátricas comórbidas era um ensaio clínico randomizado controlado com um grupo de
TCE. Por conta da amostra não ter sido grande, ficou difícil fazer inferências mais relevantes.
Dois fatos, entretanto, chamam a atenção: (1) a remissão de TUS foi estatisticamente maior
no grupo de TCD em relação ao grupo de TCE; (2) todos os outros diagnósticos tiveram uma
melhora em ambos os grupos, mas os transtornos de ansiedade tiveram taxas de remissão
inferiores aos encontrados em outras abordagens psicoterápicas (HARNED, CHAPMAN et
al., 2008).
Um grupo de pesquisadores questiona a eficácia da TCD para mais de um diagnóstico
concomitante (VAN DEN BOSCH, VERHEUL et al., 2002). Eles acreditam que esta forma
de terapia tenha que sofrer adaptações do seu “modelo padrão” quando tal objetivo é desejado
e isso já foi utilizado em outros trabalhos sobre TCD. Em nossa revisão, tal fato foi observado
em três estudos (VAN DEN BOSCH, VERHEUL et al., 2002; HARNED, CHAPMAN et al.,
2008; KRÖGER, SCHWEIGER et al., 2010). Por conta da grande heterogeneidade de
14
metodologia dos artigos, torna-se uma tarefa difícil fazer maiores inferências acerca dessa
impressão.
As principais limitações dessa revisão são: (1) número limitado de trabalhos
científicos sobre essa temática, (2) diversidade metodológica importante (com estudos de
série de casos, ensaios abertos, ensaios clínicos randomizados controlados e não-controlados)
para proporcionar uma análise estatística que pudesse fornecer dados mais fidedignos sobre
eficácia da TCD, (3) população essencialmente feminina (o que dificulta a generalização dos
resultados para pacientes masculinos), (4) resultados restritos a, praticamente, três situações
comórbidas ao TPB (TUS, TA e TEPT), (5) amostra pequena em quase todos os estudos e (6)
medidas de desfecho heterogêneas.
A terapia comportamental dialética parece ser uma técnica eficiente para o tratamento
de sintomas de transtorno de personalidade borderline e de transtorno por uso de substâncias
comórbido. Bons resultados também foram vistos para os casos em que o transtorno de
personalidade borderline aparece associado a bulimia nervosa, transtorno compulsivo
alimentar periódico e transtorno de estresse pós-traumático, melhorando tanto a
psicopatologia destes quanto daquele. Para anorexia nervosa, os achados se mostram mais
modestos. Mais estudos são necessários para averiguar a real eficácia da terapia
comportamental dialética nessas condições citadas, bem como em outras patologias
psiquiátricas que não foram contempladas neste estudo (depressão maior, transtorno de
pânico, transtorno obsessivo-compulsivo, etc.) e se há necessidade de adequá-la a essas
situações específicas.
ABSTRACT
Borderline personality disorder (BPD) is a chronic and severe diagnosis affecting about 1.2 to
3% of the general population. The rates of comorbidity with other psychiatric diagnoses vary
from 14 to 87%. Dialectical behavioral therapy (DBT) is the most studied psychotherapy for
the treatment of BPD. However, little is known about its effect in cases where there is another
concomitant psychiatric pathology. We intend to review all current evidence on DBT in
patients with BPD and other psychiatric comorbidity and whether the effect of this therapeutic
approach remains in this particular situation. A systematic review was made in the databases
Scielo, Pubmed and ISI Web of Knowledge, in the period from May to July 2011, on all works
published in the literature about the use of DBT in patients with BPD showing other
psychiatric diagnoses to date of April 30, 2011. Nine articles have been identified. DBT
seems to be an efficient technique for the treatment of symptoms of BPD and substance use
disorder comorbidity. Good results were also seen for the cases in which DBT appears
associated with bulimia nervosa, binge-eating disorder and post-traumatic stress disorder,
improving the psychopathology of all these situations. For anorexia nervosa, the findings are
more modest. Further studies are needed to ascertain the effectiveness of DBT in other
15
psychiatric pathologies that were not contemplated in this study (major depression, panic
disorder, obsessive-compulsive disorder, etc.) and if there is a need to adapt it to these
specific disorders.
Keywords: borderline personality disorder, dialectical behavioral therapy, treatment,
comorbidity, psychiatric disorders.
REFERÊNCIAS
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and statistical manual of
mental disorders: DSM-IV-TR. 4th ed. Washington (DC): American Psychiatry Association,
2000.
BEN-PORATH, D. D.; WISNIEWSKI, L.; WARREN, M. Differential Treatment Response
for Eating Disordered Patients With and Without a Comorbid Borderline Personality
Diagnosis Using a Dialectical Behavior Therapy (DBT)-Informed Approach. Eat Disord, v.
17, n. 3, p. 225-41, 2009.
BRYER, J. et al. Childhood sexual and physical abuse as factors in adult psychiatric illness.
American Journal of Psychiatry, v. 144, n. 11, p. 1426-1430, 1987.
CHAMBLESS, D.; HOLLON, S. Defining empirically supported therapies. Journal of
Consulting and Clinical Psychology, v. 66, n. 1, p. 7-18, 1998.
CHEN, E. Y. et al. Dialectical behavior therapy for clients with binge-eating disorder or
bulimia nervosa and borderline personality disorder. International Journal of Eating
Disorders, v. 41, n. 6, p. 505-512, 2008.
DIMEFF, L. et al. Dialectical behavior therapy for substance abuse: A pilot application to
methamphetamine-dependent women with borderline personality disorder. Cognitive and
Behavioral Practice, v. 7, n. 4, p. 457-+, 2000.
DIMEFF, L. A.; LINEHAN, M. M. Dialectical behavior therapy for substance abusers.
Addict Sci Clin Pract, v. 4, n. 2, p. 39-47, 2008.
GRINKER, R. R.; WERBLE, B.; DRYE, R. C. The borderline syndrome: a behavioral
study of ego-functions. New York: Basic Books, 1968.
GUNDERSON, J. G. Borderline personality disorder: a clinical guide. Washington (DC):
American Psychiatric Press, 2001. 329.
GUNDERSON, J. G. et al. Ten-Year Course of Borderline Personality Disorder:
Psychopathology and Function From the Collaborative Longitudinal Personality Disorders
Study. Arch Gen Psychiatry, v. 68, n. 8, p. 827-837, 2011.
HARNED, M. S. et al. Treating Co-Occurring Axis I Disorders in Recurrently Suicidal
Women With Borderline Personality Disorder: A 2-Year Randomized Trial of Dialectical
Behavior Therapy Versus Community Treatment by Experts. Journal of Consulting and
Clinical Psychology, v. 76, n. 6, p. 1068-1075, 2008.
16
HARNED, M. S. et al. Dialectical Behavior Therapy as a Precursor to PTSD Treatment for
Suicidal and/or Self-Injuring Women With Borderline Personality Disorder. Journal of
Traumatic Stress, v. 23, n. 4, p. 421-429, 2010.
HERMAN, J.; PERRY, J.; VANDERKOLK, B. Childhood trauma in borderline personality
disorder. American Journal of Psychiatry, v. 146, n. 4, p. 490-495, 1989.
KOONS, C. R. et al. Efficacy of dialectical behavior therapy in women veterans with
borderline personality disorder. Behavior Therapy, v. 32, n. 2, p. 371-390, 2001.
KRÖGER, C. et al. Dialectical behaviour therapy and an added cognitive behavioural
treatment module for eating disorders in women with borderline personality disorder and
anorexia nervosa or bulimia nervosa who failed to respond to previous treatments. An open
trial with a 15-month follow-up. J Behav Ther Exp Psychiatry, v. 41, n. 4, p. 381-8, 2010.
LINEHAN, M. M. Dialectical behavior-therapy for borderline personality disorder: theory
and method. Bulletin of the Menninger Clinic, v. 51, n. 3, p. 261-276, 1987.
LINEHAN, M. M. Cognitive-behavioral treatment of borderline personality disorder.
New York: Guilford, 1993a.
LINEHAN, M. M. Skills training manual for treating borderline personality disorder.
New York: Guilford, 1993b.
LINEHAN, M. M. et al. Two-year randomized controlled trial and follow-up of dialectical
behavior therapy vs therapy by experts for suicidal behaviors and borderline personality
disorder. Archives of General Psychiatry, v. 63, n. 7, p. 757-766, 2006.
LINEHAN, M. M. et al. Dialectical behavior therapy versus comprehensive validation
therapy plus 12-step for the treatment of opioid dependent women meeting criteria for
borderline personality disorder. Drug and Alcohol Dependence, v. 67, n. 1, p. 13-26, 2002.
LINEHAN, M. M. et al. Dialectical Behavior Therapy for patients with borderline
personality disorder and drug-dependence. American Journal on Addictions, v. 8, n. 4, p.
279-292, 1999.
LYNCH, T. et al. Dialectical behavior therapy for depressed older adults - A randomized
pilot study. American Journal of Geriatric Psychiatry, v. 11, n. 1, p. 33-45, 2003.
LYNCH, T. R. et al. Mechanisms of change in dialectical behavior therapy: theoretical and
empirical observations. J Clin Psychol, v. 62, n. 4, p. 459-80, 2006.
LYNCH, T. R. et al. Dialectical behavior therapy for borderline personality disorder. Annual
Review of Clinical Psychology, v. 3, p. 181-205, 2007.
OLDHAM, J. M. Guideline watch for the practice guideline for the treatment of patients
with borderline personality disorder.
Washington (DC): American Psychiatric
Association, 2001.
PALMER, R. L. et al. A dialectical behavior therapy program for people with an eating
disorder and borderline personality disorder - Description and outcome. International
Journal of Eating Disorders, v. 33, n. 3, p. 281-286, 2003.
17
PARIS, J.; ZWEIG-FRANK, H. A 27-year follow-up of patients with borderline personality
disorder. Comprehensive Psychiatry, v. 42, n. 6, p. 482-487, 2001.
RIBEIRO, H. L.; CORDÁS, T. A.; NOGUEIRA, F. C. Transtorno de personalidade
borderline. In: NETO, M. R. L. e CORDÁS, T. A. (Ed.). Transtornos de personalidade.
Porto Alegre: Artmed, 2011. cap. 8,
SAFER, D. et al. Predictors of relapse following successful dialectical behavior therapy for
binge eating disorder. International Journal of Eating Disorders, v. 32, n. 2, p. 155-163,
2002.
SAFER, D.; TELCH, C.; AGRAS, W. Dialectical behavior therapy for bulimia nervosa.
American Journal of Psychiatry, v. 158, n. 4, p. 632-634, 2001.
STOFFERS, J. et al. Pharmacological interventions for borderline personality disorder.
Cochrane Database Syst Rev, n. 6, p. CD005653, 2010.
VAN DEN BOSCH, L. M. et al. Dialectical Behavior Therapy of borderline patients with
and without substance use problems. Implementation and long-term effects. Addict Behav, v.
27, n. 6, p. 911-23, 2002.
WESTEN, D. Towards a revised theory of borderline object relations: contributions of
empirical research. International Journal of Psycho-Analysis, v. 71, p. 661-693, 1990.
ZANARINI, M. et al. Axis I comorbidity in patients with borderline personality disorder: 6year follow-up and prediction of time to remission. American Journal of Psychiatry, v. 161,
n. 11, p. 2108-2114, 2004.
ZANARINI, M. et al. Childhood experiences of borderline patients. Comprehensive
Psychiatry, v. 30, n. 1, p. 18-25, 1989.
ZANARINI, M. C. Psychotherapy of borderline personality disorder. Acta Psychiatr Scand,
v. 120, n. 5, p. 373-7, 2009.
ZIMMERMAN, M.; MATTIA, J. Axis I diagnostic comorbidity and borderline personality
disorder. Comprehensive Psychiatry, v. 40, n. 4, p. 245-252, 1999.
18