Política da IBIS sobre Alterações Climáticas
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Política da IBIS sobre Alterações Climáticas
DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 Política da IBIS sobre Alterações Climáticas Introdução Tem sido bem documentado que o aquecimento global e as alterações climáticas dele resultantes têm graves efeitos nas vidas das pessoas em todo o mundo. Os efeitos negativos das alterações climáticas são maiores para as pessoas mais pobres, ameaçando fazer recuar alguns dos poucos avanços conseguidos nos países em vias desenvolvimento e dificultar a concretização dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. No fim da década de 1990, calculava-se que o número de crianças afectadas por calamidades naturais fosse de 66,5 milhões por ano, e prevê-se que os impactos das alterações climáticas venham a fazer aumentar este número até aos 175 milhões por ano no período 2010-20201. As catástrofes humanitárias relacionadas com alterações climáticas são tanto um resultado da vulnerabilidade das pessoas como da sua exposição ao risco. Além dos efeitos directos, como secas, cheias e furacões, as alterações climáticas têm o efeito de aumentar a vulnerabilidade e de servir como multiplicadoras de catástrofes e conflitos. Levando rapidamente as comunidades mais pobres e marginalizadas para além da sua capacidade de resposta, contribuem para uma distribuição desigual da riqueza e um aumento da pobreza. Este efeito é conhecido como injustiça climática2. Outro efeito das políticas de alterações climáticas globais para as comunidades locais são os programas de maneio florestal financiados internacionalmente, que são implementados nos países em desenvolvimento sem ter em conta as necessidades e os direitos das comunidades locais e dos povos indígenas. Os políticos e os actores do desenvolvimento têm, pois, boas razões para se preocupar com os alertas dos cientistas para o agravamento das alterações climáticas e os riscos com elas relacionados na próxima década. As consequências partilhadas e o grande peso da responsabilidade dos países desenvolvidos faz das alterações climáticas uma questão de emergência global. Os países desenvolvidos, a UE e a Dinamarca devem assumir responsabilidades, comprometer-se à redução das emissões e fazer face às consequências das alterações climáticas no Sul. As alterações climáticas têm constituído uma das prioridades do Plano de Trabalho Anual da IBIS desde que foi aprovado pela primeira vez em 2009. A IBIS é um membro activo da plataforma dinamarquesa Grupo 92, que é um actor decisivo no que toca ao lobbying das negociações internacionais sobre alterações climáticas, trabalhando por um ambicioso acordo internacional sobre o clima, no âmbito da Convenção-Quadro da ONU sobre Alterações Climáticas (UNFCCC), para evitar alterações climáticas perigosas, promover o desenvolvimento sustentável, compensar os países pobres em vias desenvolvimento pelos custos relacionados com adaptação e mitigação, e assegurar uma distribuição justa, no futuro, das emissões e compromissos financeiros para adaptação e mitigação3. A finalidade desta Política sobre Alterações Climáticas é definir a posição política da IBIS relativamente às alterações climáticas e à justiça climática global, relacionada com a sua abordagem 1 UNICEF, Iniciativa Regresso à Escola, 2012. Os princípios da justiça climática estão consagrados na Convenção-Quadro da ONU sobre Alterações Climáticas (UNFCCC) acordada na Cimeira da Terra do Rio de Janeiro em 1992. 3 Citação: Documento de tomada de posição do Grupo 92: 2 http://www.92grp.dk/cms/index.php?option=com_content&view=article&id=36&Itemid=45 1 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 baseada em direitos. Além disso, esta política vai definir alguns princípios orientadores e questões temáticas para orientar o trabalho com alterações climáticas em programas novos e em programas já em curso, bem como em campanhas de advocacia e de informação na Dinamarca. Com base nisto, a IBIS definiu as posições políticas que se seguem como princípios orientadores para as alterações climáticas e a justiça climática global: Posições Políticas da IBIS Os países desenvolvidos, a UE e a Dinamarca devem assumir a responsabilidade, comprometer-se à redução das emissões e fazer face às consequências das alterações climáticas no Sul. A Dinamarca deve ser protagonista do desenvolvimento e implementação de estratégias para lidar com as alterações climáticas, através de adaptação e mitigação, na Dinamarca, em África e na América Latina. A Dinamarca deve ser protagonista do desenvolvimento de energias renováveis. Deve ser alcançado um acordo internacional justo, ambicioso e juridicamente vinculativo, que proteja o planeta contra alterações climáticas provocadas pela acção humana. O acordo tem que seguir o princípio poluidor-pagador, segundo o qual os países ricos, que beneficiaram em termos de padrões de vida mais elevados, transferem recursos para os países pobres, que mais sofrem com as alterações climáticas. Um acordo global deve incluir mecanismos de financiamento de iniciativas de adaptação nos países em desenvolvimento. Este financiamento deve ser novo e adicional, dar prioridade aos países e às populações mais vulneráveis, e ser gerido de forma democrática e transparente, sob os auspícios do UNFCCC ou de outra instituição das Nações Unidas. O princípio da compensação deve ser abandonado, porque é uma falsa solução para a crise climática4. Os mecanismos internacionais para reduzir o desmatamento e a degradação (especialmente os programas REDD+) devem respeitar, proteger e promover os direitos humanos e os direitos dos povos indígenas, em conformidade com a Declaração das Nações Unidas, a Convenção 169 da OIT e os princípios do comércio justo para o sector da indústria extractiva (por exemplo, a Iniciativa Diamantes e Desenvolvimento5). Deve ser canalizado apoio a grupos pobres e marginalizados e a comunidades vulneráveis, permitindo-lhes adaptar os seus meios de vida. Deve ser dada especial atenção às mulheres, aos jovens e aos povos indígenas. Deve ser amplamente distribuída e estar acessível informação sobre as alterações climáticas e sobre os direitos das pessoas a este respeito. Deve agir-se agora. A IBIS procurará influenciar as política relativas às alterações climáticas, através de: Advocacia por políticas e regulamentos que promovam a igualdade no acesso aos recursos e na sua utilização, isto é, a gradual diminuição do consumo de recursos pelos países ricos e uso sustentável dos recursos internacionalmente; Capacitação das pessoas e das suas organizações para fazer ouvir a sua voz em negociações nacionais e internacionais sobre alterações climáticas; 4 Mecanismo através do qual os países desenvolvidos ou empresas privadas podem comprar créditos de carbono para compensar a poluição que continuam a fazer. Ver mais na p. 3. 5 Ver www.ddiglobal.org e ddi.d-ecoweb.uk. 2 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 Advocacia por políticas de economia verde sustentável, tanto a nível nacional como internacional, que progressivamente façam diminuir a dependência de fontes de energia não renováveis e apontem para alternativas novas e inovadoras; Definição dos direitos humanos e dos direitos dos povos indígenas como princípios orientadores para a implementação de programas REDD +, rejeitando a compensação como meio de financiamento da conservação da floresta; Lobbying por uma arquitectura coerente e transparente do financiamento do clima, de acordo com o princípio poluidor-pagador, a fim de assegurar que os fundos cheguem aos países e às populações mais vulneráveis, promovendo fontes de financiamento públicas, e também fontes de financiamento novas e inovadoras. Aspectos Fundamentais das Alterações Climáticas A natureza global das alterações climáticas faz com que os problemas, as políticas e as soluções nacionais e internacionais estejam estreitamente interligados. A IBIS definiu três aspectos essenciais para trabalhar com perspectivas de alterações climáticas na Dinamarca, na UE e noutros países desenvolvidos: 1) Redução de Emissões 2) Enfoque na Energia Renovável 3) Reposição da Justiça Climática – apoio aos países em desenvolvimento 1. Redução de Emissões O governo dinamarquês deu elevada prioridade aos planos de redução de emissões, tanto a nível nacional como em negociações internacionais. A nível nacional, as políticas governamentais incluem uma Política Climática com metas vinculativas, para 2020, de redução de gases causadores de efeito estufa, para cumprir as obrigações internacionais. Segundo declarações do governo, a Dinamarca está bem encaminhada para alcançar as metas da UE, embora existam importantes desafios relativamente ao óxido nitroso, ao metano e aos gases fluorados do sector agrícola, à gestão de resíduos sólidos e a processos industriais, que contribuem grandemente para as emissões dinamarqueses de gases causadores de efeito estufa. Ainda assim, a Dinamarca tem uma das maiores emissões de CO2 per capita. A redução de emissões a nível internacional é cumprida principalmente no quadro do Protocolo de Quioto e com os respectivos instrumentos. Esse protocolo obriga os países signatários a reduzir as emissões de gases causadores de efeito de estufa em 5% relativamente ao nível de 1990 até fins de 2012. A Dinamarca ratificou o Protocolo de Quioto em Maio de 2002, mas vários países com grandes emissões de dióxido de carbono, como é o caso dos EUA, não o assinaram, e o Canadá, o Japão e a Rússia não têm cumprido os seus compromissos e opõem-se a uma renovação do protocolo. Desde então, uma série de conferências internacionais não conseguiram levar avante a proposta de um acordo legalmente vinculativo para reduzir as emissões de dióxido de carbono. Em 2009, a conferência sobre clima COP15, em Copenhaga, introduziu a opção de os países se comprometerem a cumprir as metas de redução em função da sua capacidade económica, técnica e social. Esses 3 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 compromissos, porém, estão longe das metas recomendadas de redução de emissões. A avaliação de 2007 do Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC) propôs que seriam necessárias reduções de 25-40% até 2020 para impedir que a temperatura média aumentasse dois graus. A última conferência COP foi realizada em Durban em 2011. Mais uma vez, os EUA e outras grandes nações como a Austrália, o Canadá, a Rússia e o Japão não se comprometeram a reduzir as emissões sem um compromisso da China. Trata-se de um grande obstáculo a um acordo global vinculativo, uma vez que a China se recusa a comprometer-se aos mesmos níveis que os países desenvolvidos, alegando que há centenas de milhões de chineses que ainda precisam de sair da pobreza persistente. Outro grande obstáculo a um progresso substancial na redução das emissões é o mecanismo de compensação, pelo qual países desenvolvidos ou empresas privadas podem comprar créditos de carbono criados por “projectos de poupança de emissões”, para compensar a poluição que continuam a fazer. Este mecanismo suscita várias preocupações. Antes de mais, atrasa os ajustamentos internos tão necessários nos países desenvolvidos. Em segundo lugar, é muito difícil saber se estes projectos teriam sido desenvolvidos mesmo sem este mecanismo, e, nesse caso, a compensação vem de facto contribuir negativamente para a folha de saldo do carbono. Em terceiro lugar, sabe-se que alguns dos projectos resultaram em açambarcamento de terras e outras violações de direitos de que foram vítimas especialmente os povos indígenas. A Dinamarca tem um papel precursor, uma vez que o Ministério do Clima aboliu recentemente o uso do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). O MDL é o maior esquema de compensação actualmente existente e está colocado sob os auspícios da ONU. É necessário que a IBIS, em conjunto com organizações congéneres, advogue um acordo internacional, ambicioso, justo e juridicamente vinculativo, sobre redução de emissões, e que a Dinamarca desempenhe um papel de liderança. Este acordo deve incluir um aspecto de desenvolvimento, seguindo o princípio poluidor-pagador. Deve tentar-se alcançar uma transição para uma economia mais verde, tanto no Norte como no Sul. 2. Enfoque na Energia Renovável A energia renovável é um elemento fundamental de soluções sustentáveis e a longo prazo para limitar as alterações climáticas. Um investimento sério e ambicioso em fontes de energia renováveis e sustentáveis é essencial para o desenvolvimento humano e económico com vista a uma gestão global de recursos justa e limpa, sem exploração descontrolada e sem degradação ambiental. O desenvolvimento no sentido da não-dependência de combustíveis fósseis tem constituído uma prioridade política na Dinamarca, especialmente na última década, em que a indústria de energia eólica cresceu e se expandiu. Em Março de 2012, o governo dinamarquês lançou a Estratégia para a Energia 2050, com a finalidade de, até 2050, se tornar 100% independente de combustíveis fósseis, nos sectores da energia e dos transportes. Um primeiro marco é que em 2020, 35% do consumo final deve ser de energia proveniente de fontes renováveis, especialmente energia eólica, energia das ondas e biocombustíveis6. A nível da UE, o Conselho Europeu aprovou em 2007 o documento estratégico Uma Política Energética para a Europa, seguido do pacote sobre a Energia e o Clima em 2008, que lista uma série de medidas que visam reduzir a contribuição da UE para o aquecimento global e garantir o fornecimento de energia. A UE tem também o objectivo de aumentar em 20% a percentagem de energias renováveis no seu cabaz energético até 2020. Os objectivos das políticas são apoiados por 6 http://www.ens.dk/en-US/policy/danish-climate-and-energy-policy/Sider/danish-climate-and-energy-policy.aspx 4 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 instrumentos baseados no mercado, essencialmente taxas, subvenções e transacção de direitos de emissão de CO2. Se bem que a sustentabilidade seja o objectivo dos planos de acção no âmbito destes acordos, há outras questões políticas fundamentais que têm grande peso, como, por exemplo, a segurança do aprovisionamento energético e a competitividade dos mercados7. Isto significa que as energias renováveis continuam a ser marginais no cabaz energético europeu, dado que continuam a ser mais caras que as fontes de energia tradicionais. Deve haver mais enfoque e mais investimento no desenvolvimento tanto de tecnologias já existentes como de novas tecnologias, em especial as que se centram na eficiência energética e em energias renováveis. As novas tecnologias devem ser utilizadas pelas empresas que trabalham em países em desenvolvimento e devem ser tornadas acessíveis para as empresas desses países. Também deve reconhecer-se que as fontes de energia renováveis não são todas igualmente desejáveis. Muitos estudos indicam que biocombustíveis como o óleo de palma, de soja e de colza deixam pegadas de carbono ainda maiores que os combustíveis fósseis. Isto deve-se aos muitas vezes ignorados efeitos das alterações indirectas da utilização dos solos. Quando actores como a UE promulgam políticas que exigem que sejam usadas quantidades significativas de biocombustíveis, o acentuado aumento que daí resulta na procura global conduz à desflorestação nos países em desenvolvimento, para permitir a aumento de produção, que, por seu turno, pode ter como resultado o deslocamento forçado de comunidades indígenas e outras comunidades locais vulneráveis e pode ter consequências catastróficas para a biodiversidade. A utilização de biocombustíveis da primeira geração deve, por conseguinte, ser abandonada. A Dinamarca e a UE devem ser protagonistas do desenvolvimento, implementação e difusão de tecnologias energéticas renováveis, que sejam de baixo custo, fiáveis e sustentáveis. A IBIS procurará apoiar iniciativas de advocacia e campanhas que garantam um enfoque político e prático na energia sustentável, bem como a transferência de novas tecnologias, tanto na Dinamarca como na UE e nos países em desenvolvimento. 3. Reposição da Justiça Climática – apoio aos países em desenvolvimento A reposição da equidade com vista a uma maior justiça climática global tem vários aspectos que devem ser reflectidos nas políticas. Deve assegurar-se a redução das emissões a nível mundial, e esta deverá ser liderada pelos países desenvolvidos e seguir uma política e uma prática de desenvolvimento económico assente na gestão sustentável dos recursos. A Dinamarca deve assumir a liderança na promoção de uma economia sustentável e verde, por exemplo através da promoção de tecnologias de baixo carbono, energia renovável e estratégias de crescimento económico em que se dê destaque à sustentabilidade. Deve ser desenvolvida uma divisão justa dos encargos globais, na qual os países ricos assumam a responsabilidade de promover a economia verde e uma partilha equitativa dos recursos. Os países mais ricos devem fornecer meios financeiros para adaptação aos efeitos devastadores e injustos que as alterações climáticas têm para as pessoas dos países mais pobres, e para mitigação destes mesmos efeitos. A natureza injusta dos efeitos das alterações climáticas faz com que seja necessário canalizar apoio financeiro adicional para as iniciativas de adaptação e mitigação para as pessoas mais pobres do mundo, através de um financiamento maior, adicional, previsível e sustentável. 7 http://europa.eu/legislation_summaries/energy/european_energy_policy/index_en.htm 5 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 Deve ser feito um esforço para reduzir a vulnerabilidade das populações expostas, através de políticas e estratégias que promovam uma economia verde sustentável e uma gestão justa dos recursos humanos e naturais, promovendo nomeadamente propostas de políticas e alternativas concretas. Deve ser melhorada a capacidade de resistência a catástrofes das comunidades locais, a fim de evitar ou diminuir os efeitos das alterações climáticas no plano humanitário. A IBIS procurará levar os países desenvolvidos, incluindo a UE e a Dinamarca, a assumir responsabilidade e compromissos relativamente à redução das emissões e a tentar minorar as consequências das alterações climáticas no Sul, por meios políticos e financeiros. Alterações Climáticas no Sul Vários países onde a IBIS trabalha têm economias que dependem muito das dinâmicas climáticas. Na América Central, nos Andes, na Amazónia e na África Subsaariana, a grande parte da população que depende da agricultura está mal equipada para lidar com a alteração dos padrões de precipitação, campanhas agrícolas mais curtas e aumento da temperatura do ar. Secas, cheias e a limitação do abastecimento de água são ameaças cada vez maiores em muitos países onde a IBIS tem parcerias, que foram considerados altamente vulneráveis às alterações climáticas. Os povos indígenas nos países de cooperação da IBIS são também gravemente afectados pelas alterações climáticas, dado que a sua subsistência e culturas dependem inteiramente dos seus territórios ancestrais, situados em florestas de chuva, em zonas montanhosas e em volta de rios. Várias organizações parceiras da IBIS analisaram a necessidade de capacitação e acesso a informação relativamente a questões ligadas às alterações climáticas, tanto ao nível político como ao nível prático. A IBIS empenhar-se-á nas questões relativas a alterações climáticas ao nível programático e ao nível político, ligando questões identificadas pelos parceiros locais a iniciativas de advocacia nacionais e globais, e a campanhas e actividades de informação na Dinamarca. O nível e a natureza do compromisso e iniciativas dependerá do contexto local específico, mas deverão seguir as posições políticas e áreas de concentração definidas nesta política. Áreas de Enfoque da IBIS As alterações climáticas estão já contempladas em várias estratégias existentes da IBIS. Na Estratégia Global para Governação Democrática, Direitos dos Cidadãos e Justiça Económica 20122016, (secção 2.3), os Recursos Naturais e Alterações Climáticas são definidos como uma Linha de Acção específica para o trabalho de Governação da IBIS. Constituem áreas de intervenção o apoio aos povos indígenas e comunidades afectadas para assegurar que os seus direitos sejam respeitados nas iniciativas REDD e REDD +, e monitoria orçamental e advocacia relacionada com fundos para o clima nacionais e internacionais8. É também um objectivo específico do programa América Latina contra a Pobreza e a Desigualdade (ALCPD). As três áreas de intervenção seguintes foram definidas como relevantes para a IBIS, com base no quadro estratégico de parceiros e programas da IBIS: 1) Florestas, Direitos e REDD / REDD+ 2) Financiamento, Rastreio de Recursos e Monitoria Orçamental da Resposta às Alterações Climáticas 3) Vulnerabilidade e Resistência – Redução do Risco de Catástrofes 8 Estratégia Global da IBIS de Governação Democrática, Direitos dos Cidadãos e Justiça Económica 2012-2016. 6 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 1. 1) Florestas, Direitos e REDD / REDD+ Calcula-se que cerca de 20% das emissões globais de CO2 resultam de erradicação e degradação das florestas. A ideia de REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação) foi introduzida pela primeira vez em 2005, e é a área em que se fez mais progresso nas negociações internacionais. O princípio de base do REDD é criar um valor financeiro para o carbono armazenado nas florestas, oferecendo aos países em desenvolvimento incentivos para reduzirem as emissões de áreas cobertas por florestas. O conceito de REDD+ vai além do desmatamento e da degradação florestal e inclui o papel da preservação, maneio florestal sustentável e aumento dos stocks de carbono das florestas9. As iniciativas e os programas REDD/REDD+ também foram, porém, alvo de duras críticas. Se alguns actores descrevem as iniciativas REDD como uma poderosa ferramenta para mitigar os efeitos das alterações climáticas, outros criticam o REDD por não passar de um novo mecanismo de compensação – uma falsa solução, em que os países industrializados do Norte preservam as florestas do Sul em vez de reduzir as suas próprias emissões. A preservação da floresta através de REDD/REDD+ constitui uma importante prioridade da política externa dos países nórdicos, que apoiaram a implementação através da ajuda bilateral, da assistência multilateral através da UN-REDD, do Fundo de Parceria de Carbono das Florestas (FCPF) e de projectos de ONG. Através de algumas destas iniciativas, os direitos territoriais dos povos indígenas começaram a sofrer a pressão de empresas, ONGs e comerciantes de carbono que procuram lucro rápido. Os programas REDD são considerados por alguns uma oportunidade para promoção do maneio local da floresta, enquanto outros mostram como o REDD de facto desapossa comunidades de terras, territórios e direito à autodeterminação, e afecta os seus direitos a exercer influência nas suas próprias prioridades de desenvolvimento. Surgiu entre os povos indígenas e as comunidades dependentes das florestas uma séria preocupação sobre as consequências para os direitos humanos e colectivos. Os povos indígenas raramente são devidamente auscultados10. A IBIS acha que os direitos estão acima do REDD, o que implica que o REDD/REDD+ devem ser implementados de acordo com os instrumentos de Direitos Humanos, em particular a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a Convenção 169 da OIT, e após consulta apropriada e processos de consentimento livre, prévio e informado. As iniciativas REDD/REDD+ devem institucionalizar a propriedade da terra e os sistemas de gestão de recursos que proporcionem meios de vida ideais para os grupos afectados. Devem ser criadas soluções num diálogo entre grupos-alvo, especialistas e autoridades governamentais. A IBIS esforçar-se-á por garantir que este diálogo se efectue e que as soluções respeitem e incluam todas as partes interessadas e os titulares de direitos. A IBIS promoverá leis e políticas que respeitem o direito à terra e aos recursos, tanto ao nível nacional como ao nível internacional, incluindo a promoção de modelos concretos e alternativas para o desenvolvimento sustentável e com baixos níveis de emissão de carbono11. A IBIS dará aos grupos afectados acesso a informação sobre questões de alterações climáticas, sobre direitos e sobre as possibilidades de adaptação e mitigação. Neste trabalho, a IBIS e os parceiros procurarão salvaguardar e promover o conhecimento local sobre o meio ambiente, o uso sustentável dos recursos naturais, e estratégias de adaptação e mitigação das comunidades locais e dos povos 9 Para definições de REDD e REDD+, ver http://www.un-redd.org/AboutREDD/tabid/582/Default.aspx Para um avaliação dos programas REDD e problemas com eles relacionados, ver os estudos de caso da Accra Caucus Realising Rights, Protecting Forests [Concretizar Direitos Humanos, Proteger as Florestas], Abril 2011. 11 Um exemplo é a iniciativa Yasuní, em que governo equatoriano se comprometeu a deixar ficar o petróleo no solo e a proteger a floresta tropical com uma compensação económica da comunidade internacional. 10 7 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 indígenas. É necessário fazer avaliações dos grupos mais vulneráveis, como sejam as mulheres, na implementação das actividades. 2. Financiamento, Rastreio de Recursos e Monitoria Orçamental da Resposta às Alterações Climáticas É amplamente reconhecido que responder ao impacto das alterações climáticas e impedir que as temperaturas do ar subam mais de 2 graus centígrados requer uma mudança substancial das políticas económicas e de recursos económicos. Os acordos de financiamento para a adaptação às alterações climáticas no âmbito do UNFCCC estão concebidos para permitir aos países pobres lidarem com os impactos das alterações climática, o que deveria implicar uma transferência substancial de fundos do Norte para o Sul. Não há acordo, porém, sobre como obter financiamento suficiente para uma resposta global abrangente. Nas negociações internacionais, os países desenvolvidos declararam as suas boas intenções, mas hesitam em comprometer-se a dar o financiamento, embora os países escandinavos e a UE pareçam ser actores relativamente progressistas. Um imposto sobre transacções financeiras é uma das opções disponíveis mais óbvias e mais realistas como mecanismo para assegurar uma parte do financiamento necessário. O imposto está a actualmente a ser discutido na EU e o resultado mais provável parece ser um grupo de países dispostos a levar à prática o referido imposto no âmbito do procedimento de cooperação reforçada. Até agora, a Dinamarca tem, surpreendentemente, sido hostil à ideia. No decorrer da COP 15, em Copenhaga, as partes acordaram atribuir recursos novos e adicionais através de um Fundo Verde para o Clima de 30 mil milhões de dólares no período de 2010 a 2012, aumentando até 100 mil milhões de dólares anualmente até 2020. Entretanto, estes valores são números arbitrários e não reflectem uma avaliação das necessidades financeiras reais ou futuras para fins de mitigação e adaptação12. Para as intervenções para aliviar os efeitos negativos das alterações climáticas terem real impacto, o financiamento da adaptação às alterações climáticas e mitigação dos seus efeitos deve ser adicional à ajuda ao desenvolvimento e devem evitar-se mecanismos de compensação. Devem procurar-se propostas novas e inovadoras para obter fundos adicionais. A IBIS considera que o Fundo Verde para o Clima deve garantir a coerência na estrutura global do financiamento do trabalho com o clima, subordinada à COP, com um conselho directivo com representação democrática de povos e países. Caberá a este conselho desenvolver estratégias de mitigação, adaptação, transferência de tecnologia, capacitação e desenvolvimento institucional. O financiamento deve ser feito sob a forma de subvenções e deve ser directamente acessível através de mecanismos transparentes. Em consonância com as actividades de monitoria dos orçamentos dos governos locais e nacionais, a IBIS apoiará a monitoria de fundos relacionados com as alterações climáticas, para garantir que eles sejam geridos de forma transparente e beneficiem o grupo-alvo. A IBIS procurará apoiar os parceiros para obterem fundos para a gestão sustentável dos recursos e para garantirem que os fundos sejam utilizados onde sejam mais úteis para os grupos pobres e vulneráveis, e tenham maior efeito. 12 O estudo de 2009 do Departamento de Assuntos Económicos e Sociais das Nações Unidas calcula que sejam necessários anualmente 500-600 mil milhões de dólares para adaptação e mitigação nos países em desenvolvimento (ver Rede do Terceiro Mundo, 2011:19). 8 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 3. Vulnerabilidade e Resistência – Redução do Risco de Catástrofes A Redução do Risco de Catástrofes (RRC) cobre um leque de questões diferentes, muitas das quais coincidem com as preocupações do desenvolvimento de longo prazo. Pretende-se que o investimento em RRC se centre na redução da vulnerabilidade dos grupos-alvo e não na reacção a situações de emergência. O objectivo da redução da vulnerabilidade é o aumento da resistência. A resistência é a capacidade de prever e absorver o efeito de um acontecimento prejudicial (seja ele climático, social ou político), lidar com esse acontecimento e recuperar dele. Ao assinar a Declaração de Hiogo, no Japão, em 2005, os governos de 168 países reconheceram que é crucial reduzir o risco de catástrofes, reduzindo dessa forma a vulnerabilidade e aumentando a resistência, especialmente ao nível das comunidades. As avaliações de vulnerabilidade e as análises da resistência precisam de ser integradas em processos de planificação do desenvolvimento, a fim de garantir a sustentabilidade dos projectos e programas de desenvolvimento. A IBIS considera crucial eliminar as causas subjacentes de vulnerabilidade, como políticas nocivas e má governação, discriminação social e ecossistemas degradados, e que isso deve ser feito, através de regulamentação e políticas, pela comunidade internacional, organizações multilaterais e bilaterais, e governos. A IBIS trabalhará no sentido de garantir que as populações tenham uma voz forte e um papel activo na advocacia contra a injustiça climática, na avaliação das causas da vulnerabilidade e na preparação para emergências. Procurar-se-á realizar tudo isto através do reforço da capacidade dos actores locais e do governo, para melhor entenderem a natureza dos riscos que podem enfrentar e tomarem medidas adequadas para reduzir esses riscos e aumentar a resistência, e melhorar a prestação de contas dos governos e dos prestadores de serviços às populações em risco de serem afectadas por catástrofes. Implementação A implementação, nos programas temáticos, das posições políticas e das áreas de enfoque apresentadas na presente política variará em função do contexto de cada país. A identificação das questões concretas com que há que lidar e das actividades a implementar em cada um dos programas da IBIS dependerá da situação e da pertinência do impacto das alterações climáticos para os parceiros locais. Em certos países, podem ser da maior relevância questões relacionadas com vulnerabilidade e resistência. Estas questões podem incluir os efeitos sobre as crianças e a educação da urbanização e do deslocamento interno devido às alterações climáticas, ou do açambarcamento de terra por empresas internacionais para a produção agrícola para biocombustíveis. Noutros países, são questões urgentes a necessidade de transparência e de prestação de contas do investimento estrangeiro, e a violação dos direitos das comunidades locais e dos direitos dos povos indígenas ao consentimento prévio informado e livre. A maior parte dos novos programas temáticos incluem na sua análise do contexto considerações e avaliação das questões das alterações climáticas, e muitos têm actividades planeadas para lidar com questões relacionadas com o clima. Por enquanto, foram principalmente os programas de Governação a identificar objectivos específicos relacionados com as alterações climáticas, mas, à medida que forem sendo analisadas as necessidades e as possibilidades, os programas de Educação integrarão também estas questões, quando tal for relevante. Em países onde a IBIS trabalha, as estratégias e os programas nacionais estão a começar a incluir actividades de capacitação sobre REDD +, o direito das comunidades locais a consulta e consentimento prévio, livre e esclarecido, e 9 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 monitoria de financiamento do clima, bem como iniciativas para reduzir a vulnerabilidade através de capacitação e organização. Na América Latina, os programas temáticos ligarão as actividades relacionadas com alterações climáticas com o programa de advocacia global América Latina contra a Pobreza e a Desigualdade (ALCPD), que tem as alterações climáticas como objectivo programático, visando que a IBIS e os parceiros “contribuam para assegurar que a sensibilização pública, e acções de lobbying e advocacia de redes da sociedade civil tenham influenciado a (...) negociações (...) da UNFCCC; e, além disso, influenciem instituições internacionais e políticas ou estratégias nacionais de alterações climáticas no sentido de um desenvolvimento sustentável, e assegurem que os povos indígenas e a população pobre sejam tidos em consideração13”. Nos países africanos, os programas relacionarão as actividades de advocacia com iniciativas climáticas e redes regionais, e estabelecerão ligações com as actividades do ACP (África Contra a Pobreza) sobre recursos naturais e indústrias extractivas. Na Dinamarca, a IBIS procurará dar ênfase às alterações climáticas, através de campanhas e de actividades de informação, por exemplo através da divulgação de materiais didácticos sobre alterações climáticas e desenvolvimento14. Para facilitar e garantir uma implementação coerente da política em novos programas ou programas já existentes, a IBIS elaborará uma ferramenta para analisar a sensibilidade às alterações climáticas nas suas estratégias, programas e actividades nos diversos países onde opera. A análise resultante garantirá que sejam identificadas as alterações climáticas e as suas consequências, e que sejam criadas e adequadamente implementadas nos diferentes países, contextos e programas actividades relativas às áreas de enfoque da política, tanto ao nível dos programas locais como aos níveis nacional e internacional. Finalmente, as alterações climáticas devem ser tidas em conta nas estratégias de angariação de fundos nacionais e internacionais. Será elaborado um plano de implementação para capacitação e actividades relacionadas com alterações climáticas, de acordo com as necessidades específicas de cada país, incluindo a Dinamarca. 13 Documento do Programa ALCPD, 2009 A IBIS Dinamarca elaborou um conjunto de materiais didácticos na internet chamado Agent Footprint, em que questões globais complexas são simplificadas e adaptadas para as crianças e tem em conta as suas opções enquanto partes interessadas em futuras deliberações políticas. 14 1 0 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 Anexo 1: Bibliografia e recursos Accra Caucus. Abril 2011. Realising Rights, Protecting Forests: an alternative Vision for Reducing Deforestation. Case Studies from the Accra Caucus. [Concretizar Direitos Humanos, Proteger as Florestas: uma visão alternativa para a redução do desmatamento. Estudos de Caso de Accra Caucus] AIDESEP. Março 2011. Construyendo REDD indígena. [Construindo um REDD indígena.] Andrew, Beian. 2008. Market failure, government failure and externalities in climate change mitigation: the case for a carbon tax. [Fracasso do mercado, fracasso do governo e externalidades na mitigação das alterações climáticas: defesa de um imposto sobre o carbono.] Relatório da Comissão Mundial Sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, Nosso Futuro Comum. (em inglês: Our Common Future: http://www.un-documents.net/wcedocf.htm) Comissão para Agenda 21, 21 Perguntas e respostas para você saber mais sobre a Agenda Bretton Woods Project. Janeiro 2011. The role of the World Bank in carbon finance. [O papel do Banco Mundial no financiamento do carbono.] COICA. Setembro 2010. Posición política de COICA sobre REDD+. [Posição política de COICA sobre REDD+.] Concord. Julho 2009. Position Paper of the climate change group: “climate change and development.” [Documento de tomada de posição do grupo de alterações climáticas: “alterações climáticas e desenvolvimento.”] Funder, Mikkel. 2009. Reducing Emissions from Deforestation and degradation (REDD): An overview of risks and opportunities for the Poor. [Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD): Panorama dos riscos e oportunidades para os pobres.] Copenhaga: DIIS. Füssel, HM. 2008. Development and Climate change. Background note to the World Development Report. Review and quantitative analysis of indices of climate change exposure, adaptive capacity, sensitivity and impact. [Desenvolvimento e alterações climáticas. Nota informativa para o Relatório sobre Desenvolvimento Mundial. Revisão e análise quantitativa dos índices de exposição às alterações climáticas, capacidade de adaptação, sensibilidade e impacto.] Potsdam Institute for Climate Impact Research. Relatório do Desenvolvimento Humano 2007/2008. Combater as alterações climáticas: Solidariedade humana num mundo dividido. http://hdr.undp.org/en/media/HDR_20072008_PT_complete.pdf Fórum Internacional de Povos Indígenas sobre Alterações Climáticas [International Indigenous Peoples Forum on Climate Change, IIPFCC]. Junho 2010. Position of the IIPFCC on current Climate Change negotiations. [Posição do IIPFCC sobre as negociações em curso sobre Alterações Climáticas.] IWGIA. 2010. What is REDD? A guide for Indigenous communities. [O que é o REDD? Uma guia para as comunidades indígenas] Copenhaga: IWGIA. 1 1 DOCUMENTO APROVADO EM JUNHO DE 2012 The Moral Foundations of Occupy Wall Street [As Bases Morais de Occupy Wall Street] Jonathan Haidt, Outubro 2011 Em inglês: www.reason.com One World, Poverty Change and Poverty Guide [Um Mundo, Mudança da Pobreza e Guida da Pobreza.] Em inglês: http://uk.oneworld.net/guides/climatechange?gclid=CMDkgLSnyK0CFYMXzQodNhEUiA#Kyoto_Protocol) Rede do Terceiro Mundo. Junho 2011. A compilation of material on climate justice. [Uma compilação de material sobre justiça climática.] UN-REDD: site do programa: http://www.un-redd.org/Home/tabid/565/Default.aspx Conferência dos Povos do Mundo sobre alterações climáticas e os direitos da Mãe-Terra. Declaração dos povos indígenas de 21 de Abril de 2010. 92-gruppen. Maio 2011. Klima på Kredit: En kritisk gennemgang af Danmarks brug af CDM mekanismen. [Clima a crédito: Uma análise crítica da utilização pela Dinamarca do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.] 92-gruppen. 2009. Hvad en klimaaftale i København skal indeholde. [O que deve constar de um acordo sobre o clima em Copenhaga.] # 1 2